Justiça Como Equidade e o Problema Da Razoabilidade (1)

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37 Justiça como Equidade e o Problema da Razoabilidade Denis Coitinho Silveira [email protected] Universidade do Vale dos Sinos (UNISINOS), São Leopoldo, Brasil resumo Neste artigo eu quero mostrar a importância do conceito de razoável na teoria da justiça como equidade, de John Rawls e, também, quero explicar o problema da razoabili- dade nessa teoria. O ponto de partida será ressaltar a exigência de razoabilidade que é feita ao agente moral na justiça como equidade. Posteriormente, procurarei identificar algumas críticas a esse critério. Partirei da crítica formulada por Estlund a respeito do estreitamento do conceito de razoabilidade e a necessidade da verdade e das críticas estabelecidas por Timmons e Gaus sobre a exigência demasiada e ineficaz da razoabilidade. O passo seguinte será tentar responder a essas críticas formuladas e, na parte final do texto, procurarei es- tipular um argumento a respeito de um tipo de responsabilidade moral razoável que pode estar contida na justiça como equidade. palavras-chave Equidade; Razoabilidade; Limites da razão; Limites do juízo; Responsabilidade; Rawls I Qual é a exigência adequada que se pode fazer a um agente moral? Que ele saiba todos os critérios morais, como princípios e virtudes, que devem ser aplicados ao caso, de forma que ele conheça esse critério como verda- deiro, isto é, correspondente a um certo estado de coisas? Ou, alternativa- mente, bastará que ele oriente sua ação a partir de suas convicções morais mais profundas? O que uma teoria normativa pode exigir factivelmente de um sujeito moral, de forma que essa exigência seja eficiente, isto é, que Recebido em 06 de dezembro de 2012. Aceito em 15 de fevereiro de 2013. doispontos, Curitiba, São Carlos, vol. 10, n. 1, p.37-59, abril, 2013

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Artigo que trata sobre umas das teses de John Rawls.

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    Justia como Equidade e o Problema da Razoabilidade

    Denis Coitinho Silveira [email protected] do Vale dos Sinos (UNISINOS), So Leopoldo, Brasil

    resumo Neste artigo eu quero mostrar a importncia do conceito de razovel na teoria da

    justia como equidade, de John Rawls e, tambm, quero explicar o problema da razoabili-

    dade nessa teoria. O ponto de partida ser ressaltar a exigncia de razoabilidade que feita

    ao agente moral na justia como equidade. Posteriormente, procurarei identificar algumas

    crticas a esse critrio. Partirei da crtica formulada por Estlund a respeito do estreitamento

    do conceito de razoabilidade e a necessidade da verdade e das crticas estabelecidas por

    Timmons e Gaus sobre a exigncia demasiada e ineficaz da razoabilidade. O passo seguinte

    ser tentar responder a essas crticas formuladas e, na parte final do texto, procurarei es-

    tipular um argumento a respeito de um tipo de responsabilidade moral razovel que pode

    estar contida na justia como equidade.

    palavras-chave Equidade; Razoabilidade; Limites da razo; Limites do juzo; Responsabilidade;

    Rawls

    I

    Qual a exigncia adequada que se pode fazer a um agente moral? Que ele saiba todos os critrios morais, como princpios e virtudes, que devem ser aplicados ao caso, de forma que ele conhea esse critrio como verda-deiro, isto , correspondente a um certo estado de coisas? Ou, alternativa-mente, bastar que ele oriente sua ao a partir de suas convices morais mais profundas? O que uma teoria normativa pode exigir factivelmente de um sujeito moral, de forma que essa exigncia seja eficiente, isto , que

    Recebido em 06 de dezembro de 2012. Aceito em 15 de fevereiro de 2013.

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    ela realmente obrigue o sujeito a fazer a ao X ou Y? Ela pode exigir o conhecimento de um critrio ltimo de justificao das crenas morais, bem como de um ponto arquimediano, ou ela apenas pode sugerir que o sujeito revise suas convices quando em uma situao de conflito? Qual seria a dose adequada de exigncia?

    Como se pode facilmente perceber, as respostas dadas s questes an-teriormente formuladas ou recaem sob um modelo fundacionalista de justificao ou sob um modelo epistmico-moral contextualista. Mas, ser que nossas opes se restringem apenas a essas duas? No seria possvel encontrar um modelo intermedirio que nem exigisse do agente o co-nhecimento ltimo do critrio moral e nem se contentasse apenas com a revisibilidade de suas crenas? Creio que podemos encontrar essa posio intermediria na teoria da justia como equidade de John Rawls. O ar-gumento central dessa teoria parece ser o de que, de um ponto de vista social (social point of view), se pode chegar a um consenso do que contar como tendo um valor moral pblico de uma forma independente das crenas privadas de bem, de forma que se vo construir princpios morais polticos (de igual liberdade, igualdade equitativa de oportunidade e dife-rena) a partir dos prprios valores morais reconhecidos socialmente em uma sociedade democrtica do tipo contempornea e, ento, a estratgia ser test-los por (i) sua coerncia com os pontos fixos dos juzos morais ponderados (considered judgments) em todos os nveis de generalidade e (ii) por seu resultado quando aplicado s instituies democrticas, isto , por sua garantia de estabilidade pelas razes corretas (stability for the right reasons) que conduz legitimidade poltica (political legitimacy), o que outra forma de dizer que eles sero testados por um equilbrio reflexivo (reflective equilibrium) amplo (wide) e geral (general), sendo a justificao concebida em um equilbrio reflexivo pleno (full)1.

    O ponto de partida, ento, o que j aceitvel socialmente, isto , os prprios valores morais polticos que so assumidos pelos cidados de uma democracia contempornea, tais como: razoabilidade, reciprocidade, tolerncia, civilidade, cooperao etc., valores esses que sero usados no procedimento de construo da posio original (original position. Isto demonstrado pelo papel central que a ideia normativa de sociedade como um sistema equitativo de cooperao social desempenha no procedimen-to, que implica nas ideias normativas de pessoas como livres e iguais e

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    sociedade bem ordenada, ideias essas que estaro pressupostas no proce-dimento de deliberao das partes (parties) sob as restries do vu da ig-norncia (veil of ignorance) e circunstncias da justia (circumstances of justice) para a construo/escolha dos princpios morais e o teste pelo equilbrio reflexivo. Nas palavras de Rawls:

    Reunimos as convices arraigadas, como a crena em tolerncia religiosa e a rejeio da escravido e tentamos organizar as ideias e princpios bsicos implcitos nessas convices numa concepo poltica de justia coerente. Tais convices so pontos fixos provisrios que parece que qualquer concepo razovel deve levar em conta. Comeamos, ento, observando a prpria cultura pblica como fundo compartilhado de ideais e princpios bsicos implicitamente reconhecidos. (RAWLS, 1996, p. 8)2.

    Veja-se que o que essa teoria normativa exige do sujeito moral ser uma disposio de propor e cumprir os termos equitativos de cooperao, como j vimos anteriormente e, tambm, uma disposio para reconhecer os li-mites da razo em justificar arquimedianamente os juzos morais proferidos pelos indivduos, isto , ela exigir o reconhecimento da sobrecarga da razo (burdens of reasons), o que uma outra forma de dizer que ela exigir que o sujeito moral seja razovel (reasonable). Mas, o que isso significa? Que o sujeito deve se dispor a partir da ideia de sociedade equitativa para o estabe-lecimento do critrio moral pblico porque j faz uso da ideia de recipro-cidade. Que ele deve se dispor a reconhecer o fato do pluralismo razovel e o fato da opresso, que igual a reconhecer a existncia de vrias convic-es morais sobre o bem em sociedades complexas contemporneas como uma caracterstica permanente e, tambm, que a nica forma de alcanar uma unidade moral absoluta seria pelo uso da fora do Estado para obrigar todos os sujeitos a aceitar uma mesma concepo de bem3. Esse parece ser um posicionamento de aceitao da falibilidade humana em alcanar a justificao absoluta de suas crenas morais e, por isso, no exige do sujeito moral o conhecimento do critrio ltimo de justificao, isto , sua verdade. Antes, trata-se de uma tentativa de aplicar o conceito de tolerncia prpria filosofia moral. Dessa forma, a razo deflacionada, no sentido que ela ter uma capacidade limitada para alcanar a justificao. A exigncia de razoa-bilidade (reasonableness) explicada nesses termos por Rawls:

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    O primeiro aspecto bsico do razovel , portanto, a disposio de propor termos equitativos de cooperao e cumpri-los, desde que os outros tambm o faam. O segundo aspecto bsico, como agora revejo, a disposio de reconhecer os limites do juzo e aceitar suas consequncias para o uso da razo pblica na conduo do exerccio legtimo do poder poltico em um regime constitucional (RAWLS, 1996, p. 54)4.

    Por ser uma disposio, a ao razovel ou a razoabilidade est sendo to-mada como uma virtude necessria ao agente moral para sua deliberao, pois exigir do agente uma disposio moral de agir a partir do critrio de reciprocidade e uma disposio intelectual de reconhecimento da li-mitao racional. Por outro lado, importante frisar que a justia como equidade no se contentar com apenas uma exigncia mnima de revisi-bilidade das crenas por parte do indivduo, embora essa caracterstica seja de fundamental importncia nesse modelo coerentista holstico e prag-matista de justificao. por esse motivo que os procedimentos ocupam um papel central para a justificao da norma, de forma a exigir, tambm, o reconhecimento de determinados fatos que podem contar como razes no procedimento ou da posio original - equilbrio reflexivo ou do consenso sobreposto (overlapping consensus). Mas, que fatos contam como uma razo no procedimento? As crenas que so justificadas intersubjeti-vamente, isto , que podem ser tomadas como fatos sociais (institucionais). Por exemplo: que a cooperao boa socialmente, que as pessoas so morais, isto , livres e iguais, que a exigncia de reciprocidade uma boa medida para a resoluo de conflitos. Esses fatos no dependem da apro-vao de um indivduo isolado, mas requerem uma aprovao social que, inclusive, pode ser percebida em uma dimenso histrica5.

    Procurei mostrar acima como o critrio de razoabilidade parece central para o projeto de Rawls. Mas, pode uma teoria normativa de justia pres-cindir do conceito de verdade para a justificao, contentando-se apenas com o critrio de razovel? No se perderia toda a normatividade com esse movimento e a recada no relativismo seria inevitvel? Ou, alternati-vamente, no seria demasiado e ineficaz exigir a razoabilidade do agente moral, uma vez que exigiria um tipo de conhecimento que o agente moral comum no tem acesso ou, no limite, que as pessoas so absolutistas

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    e no razoveis em seus juzos cotidianos? No restante desse artigo procu-rarei responder a essas questes. Partirei da crtica formulada por Estlund a respeito do estreitamento do conceito de razoabilidade e a necessidade da verdade e das crticas estabelecidas por Timmons e Gaus a respeito da exigncia demasiada e ineficaz da razoabilidade. Posteriormente, tentarei responder a essas crticas formuladas e, na parte final do texto, procurarei formular um argumento a respeito de um tipo de responsabilidade moral razovel que pode estar contida na justia como equidade.

    II

    Deixem-me iniciar com a crtica de Estlund feita no artigo The Insularity of the Reasonable, que afirma que a justia como equidade deve admitir a verdade, sendo o critrio de razoabilidade ou aceitabilidade limitado para garantir a justificao dos princpios morais em razo de seu modelo de legitimao no ser defensvel por sua incompletude. Isso porque a tese central do Liberalismo Poltico afirmar princpios morais polticos de tolerncia no mbito da justificao pblica que no precisam ser verda-deiros. Isso implica que mesmo doutrinas verdadeiras so inadmissveis a menos que elas sejam aceitas por todos os cidados razoveis. Estlund v acertadamente, ento, que a verdade no nem condio necessria e nem suficiente para a admissibilidade das doutrinas abrangentes:

    A ideia moral por trs desse princpio que nenhuma pessoa pode legitimamente ser coagida ou moralmente obrigada a seguir normas legais e obrigaes a menos que razes suficientes possam ser dadas que no violem as convices morais e filosficas razoveis das pessoas sobre o verdadeiro ou falso, certo ou errado. (ESTLUND, 1998, p. 253).

    O argumento que Estlund parece defender que se esse princpio sobre justificao ele prprio oferecido como parte da justificao pblica, ele, ento, se aplica a si mesmo. Segue da que ele deve ser aceitvel para todos os cidados razoveis e no pode ser invocado como verdadeiro, nem mesmo a prpria concepo de razoabilidade. A tese parece afirmar que esse modelo de justificao pblica deve afirmar a verdade e no ape-nas a razoabilidade de seu princpio fundamental, a saber, a ideia de que

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    doutrinas so admissveis como premissas na justificao pblica somente se forem aceitveis para todos os cidados razoveis. Embora um tanto di-ferente da crtica j bem conhecida feita por Raz, em razo de fazer uma conexo correta entre justificao e legitimidade, tambm afirmar que uma teoria poltica normativa no pode pairar acima da verdade moral, sem qualquer ponto de contato6.

    Seu argumento central apresentado com a seguinte formulao in-titulada de RAN (Reasonable Acceptance Necessary): Nenhuma doutrina admissvel como uma premissa em qualquer estgio da justificao poltica a menos que ela seja aceitvel para todos os cidados razoveis, e no necessita ser aceitvel para mais ningum. (ESTLUND, 1998, p. 254). Entendendo o termo doutrina de forma a significar declaraes factuais, princpios, propostas e mesmo juzos morais, RAN, assim, ela prpria uma doutrina. A questo, ento, a de que essa doutrina no pre-cisa ser verdadeira, mas apenas aceitvel por todos. A crtica de Estlund que a razoabilidade, que a aceitabilidade de todos, deve ela prpria ser verdadeira, ou, ento, essa doutrina seria arbitrria e os indivduos no precisariam se ver obrigados a segui-la. O problema aqui que RAN aplicada a ela mesma, sendo ela prpria uma premissa na justificao p-blica. O ponto central nessa argumentao mostrar que Rawls deveria considerar a questo de que seu princpio liberal de legitimidade deveria ser tomado como verdadeiro. Sumarizando o argumento de Estlund at o momento, temos: dado que Rawls quer aplicar o princpio da tolerncia prpria filosofia, a justia como equidade aplica o princpio de tolerncia nela prpria e, dessa forma, deveria afirmar o requisito de tolerncia tam-bm como verdadeiro. A concluso a de que uma concepo poltica alternativa de justia, ao reivindicar sua verdade, seria substantiva e, logo, no dogmtica (ESTLUND, 1998, p. 256).

    O prximo passo ser o da apresentao de uma verso modificada de RAN, com o interesse de investigar a questo independentemente do contedo da ideia de razoabilidade. Assim, AN (Acceptance Necessary): Nenhuma doutrina admissvel como premissa em qualquer estgio da justificao poltica a menos que ela seja aceitvel por um certo con-junto de cidados (reais ou hipotticos), C, e nada mais que a aceitao necessrio. (ESTLUND, 1998, p. 257). Aqui o ponto ser o de mostrar que AN afirma uma condio necessria, mas que no suficiente para

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    a admissibilidade. Como Rawls sustenta que a razoabilidade suficiente para a justificao, evitando a pretenso de verdade, o problema que quando uma certa verso de C posta frente de outras verses alternati-vas possveis em AN, parece no haver critrios seguros para sustentar que essa seja uma verso correta de C. A concluso parece clara: no possvel uma escolha no arbitrria dos possveis contedos de C nas relaes entre este e as diferentes instncias de AN que no viole sob algum aspec-to a pretenso da no necessidade da verdade para a justificao pblica (ESTLUND, 1998, p. 261-263).

    A proposta de Estlund a de que a teoria de Rawls deve tomar RAN como verdadeira, estabelecendo contato com a verdade, ao menos em um sentido mnimo. O critrio deve ser modificado da seguinte forma: MAC (Modified Acceptance Criterion):

    Como exceo dessa doutrina, nenhuma doutrina admissvel ou excluda como uma premissa na justificao poltica sobre as bases de sua verdade ou falsidade, mas admissvel apenas quando e porque ela aceitvel para todos os cidados razoveis (...). A presente doutrina deve ser aceitvel para todos os cidados e verdadeira. (ESTLUND, 1998, p. 266).

    importante procurar compreender qual mudana realizada aqui. Veja-se que o critrio de aceitabilidade/razoabilidade continua como uma condio necessria para a justificao pblica, pois o que vai justificar qualquer doutrina abrangente sua aceitabilidade social. Por outro lado, essa doutrina da aceitabilidade deve ser ela prpria aceitvel e verdadeira; sendo ela verdadeira, ento, tambm condio suficiente para a justifi-cao. Com a afirmao da verdade dessa premissa liberal, ento, juzos morais razoveis podem ser tomados como verdadeiros. O que Estlund parece ter em mente que a noo de verdade que deve ser utilizada no pode ir alm de um sentido mnimo: Para qualquer declarao P, P verdadeiro no sentido mnimo se e somente se P. Por exemplo, se todos podem aceitar que assassinar errado, ento, assassinar errado verdadeiro no sentido mnimo requerido pelo liberalismo poltico. A concluso a que ele chega a seguinte: para uma teoria da legitimao ser defensvel, ela precisa ir alm dessa dimenso prtica de aceitabilidade como critrio de justificao e refletir e posicionar-se sobre sua verdade (ESTLUND, 1998, p. 270-275)7.

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    Mas h, tambm, um outro tipo de crtica ao papel do critrio de razoabilidade na justia como equidade que acentua, no a sua fraqueza, mas a sua excessividade. Essa a constatao central de Timmons, a saber, que teorias morais ao estilo da proposta por Rawls exigem em demasia do agente moral, pois exigem uma disposio para o reconhecimento dos limites da razo. Alternativamente, ele situar a responsabilidade do agente em um mbito mais modesto, que ser o de (i) obter evidncia, (ii) lidar e considerar as possibilidades alternativas e (iii) lidar com conflitos internos de crenas (TIMMONS, 2004, p. 195)8.

    Vejam-se as razes disso. Timmons est comprometido com um modelo de epistemologia moral contextualista, propondo uma justificao doxsti-ca da crena moral, uma vez que a maior parte das crenas ticas comuns podem ser justificadas pela responsabilidade epistmica do agente, o que implica em avaliar as situaes alternativas. Sua tese central que se pode ser responsvel epistemicamente em assegurar certas crenas sem necessitar de justificao para elas, bastando a avaliao das crenas de primeira ordem por parte do agente, o que envolve parmetros variveis como: objetivo, perspectiva e recursos. Para ele, no necessrio estar engajado em uma aceitao de uma teoria moral para um indivduo estar doxasticamente jus-tificado em assegurar uma crena moral particular. Ao contrrio, defende que as crenas doxasticamente justificadas devem ser justificadas proposi-cionalmente por um indivduo, o que no implica assumir que essa justi-ficao se dar pela coerncia com um princpio moral. O problema desse modelo coerentista, como o de Rawls, que ele no se encaixa com as deliberaes morais cotidianas, pois os indivduos no escolhem princpios entre teorias morais primeiro para s depois verificar se suas crenas esto corretas. Dessa forma, a regra da responsabilidade epistmica contextualista formulada da seguinte maneira por Timmons:

    Normalmente, uma pessoa S responsvel epistemicamente em acreditar em algumas proposies p ao tempo t apenas se S checar todas as possibilidades alternativas que seriamente esto indicadas por um adequado conjunto de crenas de fundo em t. (TIMMONS, 2004, p. 200).

    Qual o problema aqui? A questo que Timmons est se contrapondo ao coerentismo que exige que o agente possua uma bateria muito grande de crenas: crenas de primeira ordem, tanto crenas morais como no morais, e crenas de segunda ordem, que so crenas para a justificao das

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    primeiras. Sua proposta se pretende menos exigente, uma vez que defende o conservadorismo das crenas de segunda ordem sobre as crenas con-textualmente bsicas, sendo as crenas de primeira ordem justificadas se asseguradas responsavelmente pelo agente. Assim, algumas crenas morais, especialmente as que so parte constitutiva de nossa perspectiva moral, servem como um corpo de assunes morais bsicas que, em contextos comuns de pensamento e discusso moral, no precisam de justificao (TIMMONS, 2004, p. 213).

    Na justia como equidade, o reconhecimento dos limites racionais, que o mesmo que razoabilidade, se constitui como crenas de segunda ordem que tero o papel de julgar a validade das crenas de primeira ordem. Como a legitimidade da coero do poder poltico dada pela aceitabilidade das crenas feitas por pessoas razoveis, a legitimidade al-canada pela razoabilidade/aceitabilidade, sendo ela o prprio critrio de justificao. Um problema que poderia estar relacionado com a crtica de Timmons de uma exigncia demasiada seria o de questionar se as pessoas no razoveis teriam a sua autonomia poltica desrespeitada pelo mtodo de legitimao/justificao de Rawls? Ser que a justia como equidade no infringiria os direitos bsicos e liberdades dos indivduos no razo-veis? Seria isto justo, uma vez que no mundo real as pessoas geralmente no so razoveis?9

    A constatao de que as pessoas no so de fato razoveis pode servir, tambm, para ressaltar a ineficincia do critrio de razoabilidade para a justificao. Esse parece ser o argumento apresentado por Gaus ao esta-belecer uma crtica ideia de justificao pblica de Rawls, que estaria baseada no critrio de razoabilidade, implicando em uma teoria popu-lista do raciocnio prtico, pois deve contar com um assentimento das pessoas para a justificao (GAUS, 1996, p. 130-131). Qual a estratgia empregada por Gaus? Parece ser a de mostrar a fraqueza desse critrio de razoabilidade, que indicaria uma disposio para propor e seguir os princpios que podem ser publicamente justificados; para reconhecer os limites do juzo; para raciocinar corretamente; para fazer raciocnios aces-sveis aos outros, fazendo uso de argumentos de bom senso e concluses no controversas da cincia. O problema que, para Gaus, as pessoas no so razoveis, apresentando trs razes para comprovar sua tese: (i) falcia do jogador, que mostra que as pessoas podem ser induzidas a abandonar

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    normas vlidas de inferncia e cometer erros em juzos probabilsticos; (ii) akrasia epistmica, que revela que as pessoas no tem disposio para aceitar os argumentos de bom senso e as provas cientficas; (iii) juzos ab-solutistas, que aponta que as pessoas geralmente proferem seus juzos com certeza absoluta, o que no encaixa com a exigncia dos limites dos juzos e com a condio de acessibilidade10. Os trs exemplos revelam um mes-mo argumento: as pessoas reais no so razoveis no seu cotidiano, logo, a razoabilidade no suficiente para a justificao, devendo ser substituda pela racionalidade, colocando a vitria de uma crena sobre outra no lu-gar do acordo (GAUS, 1996, p. 131-136).

    III

    Agora, procurarei responder a essas objees. A respeito da crtica de Estlund sobre a necessidade do critrio de razoabilidade ser verdadeiro a fim de resultar em uma concepo de legitimao adequada, inicio ressal-tando uma caracterstica central do modelo de justificao defendido por Rawls: ele quer superar os modelos dicotmicos em filosofia moral que estabelecem uma distino radical entre uma esfera factual e outra nor-mativa, procurando estabelecer uma relao de complementaridade entre valores e fatos, o que fica evidenciado pelo papel do mtodo do equilbrio reflexivo, que tem a tarefa de organizar nossos juzos morais ponderados de forma a servirem de base para a construo dos princpios, o que pos-sibilita uma concepo moral coerente (RAWLS, 1971, p. 579; RAWLS, 1999, p. 507). Aps essa observao geral, gostaria de precisar o que eu estou dizendo: que a tentativa de Rawls de superao da dicotomia fato/valor o levar a adotar uma estratgia pragmatista de justificao - justi-ficao uma questo prtica antes que terica. Assim, a prpria noo de razoabilidade dentro da justia como equidade tem, ela prpria, uma dimenso prtica e no terica, isto , ela no tomada como um critrio ltimo que estaria descolado de toda a realidade, mas, preferencialmente um ideal poltico e, por essa razo, estipulada como condio necessria e suficiente para a justificao. Nas palavras de Rawls:

    Observe que aqui ser razovel no uma ideia epistemolgica (embora tenha elementos epistemolgicos). Preferencialmente, ela parte de

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    um ideal poltico de cidadania democrtica que inclui a ideia de razo pblica (RAWLS, 1996, p. 62)11.

    Veja-se que a crtica de Estlund que a razoabilidade no poderia ser uma condio suficiente para justificao, sendo apenas condio necessria, uma vez que garantir a legitimidade pela pura aceitabilidade poderia recair em arbitrariedade. Por isso, sua proposta a de tomar esse princpio da aceitabi-lidade como minimamente verdadeiro, na forma Para qualquer declarao P, P verdadeiro se e somente se P. Mas, essa acusao procedente? Creio que no. E a razo para defender essa posio que o critrio de razoabili-dade, mesmo no sendo verdadeiro, serve para a justificao pblica, o que implicar na afirmao de valores morais-polticos de forma freestanding, isto , valores que se sustentam sozinhos na esfera poltica, por meio do proce-dimento da posio original, que normativo. Veja-se que esses valores so tomados como aquilo que assumido socialmente, ou, dito de outra forma, esses valores proporcionam uma base satisfatoriamente compartilhada de justificao pblica.12 (RAWLS, 1989, p. 485).

    Essa estratgia pode ser vista como uma tentativa de procurar esta-belecer o valor em coerncia com o fato, isto , de relacionar os valores morais-polticos com as prticas sociais, polticas e econmicas de socie-dades democrticas contemporneas com diversidade moral. por isso que para estabelecer a justificao dos princpios de justia se precisar de uma justificao pblica, o que implicar em ver se eles garantiro estabilidade social e legitimidade poltica. Aqui a tese parece ser que o que contar para a legitimao ser o mesmo que o que valer para a justificao. por isso que o consenso aquilo que tanto garante a legitimidade do uso do poder poltico quanto assegura a validade da norma (RAWLS, 1971, p. 580; RAWLS, 1999, p. 508; RAWLS, 1996, p. 136)13. Assim, a tarefa real de justificar uma concepo de justia no primordialmente um problema epistemolgico:

    A busca por fundamentos razoveis para alcanar um acordo enraizado em nossas concepes de ns mesmos e em nossa relao com a sociedade substitui a busca pela verdade moral interpretada como fixada por uma ordem anterior e independente de objetos e relaes, naturais ou divinas, uma ordem aparte e distante de como ns nos concebemos. (RAWLS, 1980, p. 306)14.

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    Seria esse modelo de justificao arbitrrio? Penso que no. Isso porque os princpios de justia aceitos com base em nossas convices morais mais profundas podem ser testados tanto por um procedimento formal de simetria na deliberao quanto por um procedimento pragmtico de esta-bilidade e legitimidade. verdade que no se conta com um critrio lti-mo que pairaria fora do mundo; entretanto, a norma est sendo estipulada porvalores sociais que vem obtendo aceitao nas prprias prticas e so validados por procedimentos. A normatividade factual-procedimental. A concepo alternativa de Estlund, por sua vez, diz que acabaria com a arbitrariedade em razo do uso de uma concepo mnima de verdade. Ser mesmo? Vejamos o exemplo dado por ele: se todos podem aceitar que assassinar errado, ento, assassinar errado verdadeiro no sentido mnimo exigido pelo liberalismo poltico. Qual a diferena em relao justia como equidade at aqui? Parece que nenhuma, uma vez que o argumento o mesmo: se todos podem aceitar que a intolerncia religiosa e a discriminao racial so injustas com uso do(s) procedimento(s), ento, a intolerncia religiosa e a discriminao racial so injustas e, sendo injustas, no devem ser praticadas15. Note-se que esta estratgia procedi-mental parece possuir o mesmo peso que uma concepo minimalista de verdade. Isso porque uma concepo minimalista no pressupe a existn-cia de uma ordem de coisas independente dos sujeitos que serviriam de critrio para saber se o dito corresponderia ou no a essa ordem de coisas; entretanto, possibilita que o juzo moral seja tomado como objetivo. esta concepo de verdade representacionalista que est sendo recusada por Rawls e no uma concepo deflacionada de verdade que, inclusive, adequada a um modelo coerentista e pragmatista de justificao16. Penso que no muito elucidativo uma inflao demasiadadessa distino entre o razovel e o verdadeiro, uma vez que a razoabilidade pode ser tomada como uma verdade prtica, isto , como uma convergncia prtica social. Se Estlund parece tambm recusar essa concepo tradicional de verdade, no compreendo, ento, qual a forte distino entre o que ele est pro-pondo e o que defendido por Rawls. E assim, porque apenas o modelo rawlsiano seria arbitrrio? No seria essa posio ela prpria arbitrria?

    E o que dizer da outra objeo a respeito da exigncia da razoabilida-de do agente moral? Seria ela excessiva e ineficaz, uma vez que o agente moral comum parece no possuir esse critrio metajustificatrio para a

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    validao de suas crenas, isto , crenas de segunda ordem? Retomemos a explicao do que razoabilidade para Rawls com a finalidade de iden-tificar seu contedo especfico. Com isso em mos, pretendo mostrar que essa exigncia no demasiada, mas, ao contrrio, uma exigncia comum que se faz a qualquer cidado de uma sociedade democrtica contempornea.

    Em primeiro lugar, razoabilidade uma disposio para propor e cum-prir os termos equitativos de cooperao e, sendo assim, compreendida como uma faculdade moral que capacita o agente a propor e depois moti-var-se a agir em conformidade com os termos equitativos de cooperao por seu valor intrnseco. Isto quer dizer que a razoabilidade uma virtude social que pressuposta pela justia como equidade (RAWLS, 1996, p. 54). Explicando mais detalhadamente essa virtude moral social, temos que a razoabilidade: (i) parte da sensibilidade moral; (ii) est conectada com a ideia de reciprocidade, que intermediria entre o altrusmo e o egosmo; (iii) no derivada da racionalidade; (iv) pblica, de forma que garante a igualdade entre as pessoas no mbito do reconhecimento social (RAWLS, 1996, p. 48-54).

    Em segundo lugar, razoabilidade a disposio para reconhecer os limites do juzo e da razo e aceitar suas consequncias para o uso p-blico da razo na conduo do exerccio legtimo do poder poltico em um regime democrtico constitucional (RAWLS, 1996, p. 54). J vimos que isso implicar em reconhecer o (i) fato do pluralismo razovel, isto , reconhecer como legtima a diversidade moral que obedece a restrio do razovel e o (ii) fato da opresso, que a compreenso que s com um Estado forte e opressivo se garantiria a unidade moral. Essa uma exign-cia intelectual, uma vez que o indivduo deve compreender a realidade em que vive, identificando que nem toda a pessoa razovel defende a mesma doutrina abrangente e, logo, no possvel que todas essas doutri-nas sejam verdadeiras. Tambm, isso implicar em endossar alguma forma de liberdade de conscincia e autonomia de pensamento. Pode-se perce-ber, ento, que esse reconhecimento dos limites do juzo fundamental para a ideia democrtica de tolerncia. A esse respeito, importante fazer referncia a essa observao de Rawls:

    No realstico ou pior, isto desperta suspeita mtua e hostilidade supor que todas as nossas diferenas esto enraizadas apenas na

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    ignorncia e perversidade, ou ainda, em rivalidades pelo poder, status ou ganho econmico. (RAWLS, 1996, p. 58)17.

    De posse desse contedo da razoabilidade, se pode agora tentar respon-der a objeo de Timmons, usando o seguinte argumento: no uma exigncia demasiada a um agente moral porque no uma exigncia demasiada a um cidado de uma democracia constitucional, uma vez que o agente moral um cidado. legtimo exigir que um cidado aja de forma racional e razovel, isto , que deva fazer uso de juzos, inferncias e pensamento e, tambm, que aja a partir de um senso moral adequado. Um agente moral uma pessoa. Uma pessoa tem capacidade de senso de justia (razoabilidade) e concepo de bem (racionalidade). Isso quer dizer que os agentes devem ter essas duas capacidades (de pessoa) num grau mnimo que lhe permitam sercidados livres e iguais em um regime constitucional e, assim, a exigncia legtima (RAWLS, 1996, p. 61-62).

    Quero chamar ateno para o seguinte fato: no h uma grande ce-leuma a respeito de serem demasiadas as exigncias que se fazem aos cidados reais em comunidades reais. Vemos como legtimas as exigncias de ter que obedecer s leis, como as encontradas na constituio, cdigo penal, cdigo civil e outros cdigos socialmente reconhecidos. Se algum estuprar ou sequestrar uma pessoa e for presa e acusada por esse ato, no servir de desculpa o fato dela no saber que isso era proibido por lei. Nem no caso da pessoa no saber ler ou ter passado um perodo em coma. Isso quer dizer que exigimos dos cidados que eles obedeam ao que a lei determina e, alm disso, que eles se conduzam de certa forma moral, isto , de certa forma imparcial ou que respeita a reciprocidade, que o mesmo que dizer que os cidados devem ser civilizados, podendo convi-ver harmoniosamente com os outros. O que isso seno exigir o reco-nhecimento dos limites dos juzos e da razo? Agora, se no demasiado para os cidados comuns, por que seria uma exigncia demasiada para o agente moral?

    A crtica de Timmons que a exigncia do reconhecimento dos limi-tes da razo implica no conhecimento de uma crena de segunda ordem que possibilitar a justificao das crenas de primeira ordem. Creio que isso seja um engano ao menos parcialmente, pois Rawls procura deixar claro que esse reconhecimento dos limites racionais no uma posio

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    ctica, no implicando em um argumento ctico sobre a limitao do co-nhecimento, pois, se no, o consenso sobreposto seria inviabilizado. Antes, obtido por experincia histrica e no por um argumento de dvida do conhecimento e da razo: Essa dificuldade resulta da experincia histri-ca, dada por sculos de conflitos sobre crenas religiosas, filosficas e mo-rais (RAWLS, 1996, p. 63). Isso no impede que alguns agentes possam ter uma crena epistemolgica de segunda ordem, mas isso no uma exigncia para todo o agente moral. No geral, o agente deve ter um saber como ser razovel, no necessitando de um saber que a razoabilidade seja uma premissa verdadeira. Nada mais do que um respeito tolerante aos valores defendidos pelas outras pessoas e isso se aprende mais com a histria do que com a epistemologia. Ento, seria demasiado exigir do cidado algum conhecimento da histria? Creio que no, da mesma for-ma que no seria demasiado exigir esse tipo de conhecimento do agente moral em razo dele mesmo ser um cidado.

    Mas, se as pessoas no forem efetivamente razoveis, no seria ineficaz essa exigncia? A isso respondo que o argumento central da justia como equidade no requer que os agentes sejam de fatos razoveis, mas que pos-sam ser razoveis. Dito de outra forma, a teoria moral rawlsiana pressupe uma importante distino entre competncia e performance e isso implica em dizer que a exigncia da razoabilidade recai sobre essa capacidade moral e no sobre a real ao dos agentes18. Tudo o que a teoria de Rawls necessita que os indivduos possam agir razoavelmente, que possam es-colher a partir do que seria uma posio de razoabilidade, mas no precisa contar com a ao real dos sujeitos. Para Rawls:

    Agora se pode pensar inicialmente da filosofia moral (e eu ressalto a natureza provisria dessa concepo) como uma tentativa de descrever nossa capacidade moral, ou, no caso presente, se pode pensar uma teoria da justia como descrevendo nosso senso de justia. (RAWLS, 1971, p. 46; 1999, p. 41)19.

    Para provar o argumento, basta mostrar que uma ou algumas pessoas so de fato razoveis. Dessa forma, se pode perceber que a prpria pesquisa de Deana Kuhn que utilizada por Gaus prova o argumento central da justia como equidade, uma vez que a investigao mostra que um pouco menos da metade dos sujeitos investigados agem de forma razovel, isto ,

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    mostra que os sujeitos no so absolutistas em seus juzos cotidianos. Isso j o bastante para se estipular que os agentes morais devem agir razoa-velmente, uma vez que eles possuem a capacidade para agir dessa forma moral, pressuposto tal que se pode comprovar ao mostrar que pessoas reais de fato agem razoavelmente.

    IV

    Nessa parte final do texto, eu quero ressaltar qual o ganho que podemos ter ao usar a razoabilidade ao invs da verdade como critrio objetivo para a determinao do que o justo. Vejamos isso a partir da forma como a justia como equidade estabelece os preceitos da discusso razovel. Sendo uma pessoa razovel aquela que tem conscincia dos limites da razo e do juzo, ela reconhecer certos preceitos para orientar a delibe-rao e a discusso no mbito pblico. Esses preceitos de razoabilidade so: (i) disposio para alcanar o acordo razovel na discusso poltica; (ii) estabilidade psicolgica para encontrar desacordos substanciais sobre questes bsicas (questes constitucionais e de justia bsica); (iii) dispo-sio para creditar aos outros uma certa boa f, aceitando a diversidade (RAWLS, 1989, p. 478-479). O que isso mostra? Que uma concepo de justia que est sendo construda a partir do critrio da razoabilidade ou aceitabilidade (preferencialmente do que ao critrio de verdade), no precisa estar comprometida nem com um realismo ontolgico, nem com um fundacionalismo epistemolgico e nem mesmo com um representa-cionalismo semntico. Com o uso de um critrio de verdade no mnimo temos um modelo de filosofia moral e poltica que se baseia na descoberta de determinadas premissas que fundamentaro os princpios morais, sen-do essa descoberta dada por um indivduo a partir de sua razo privada, no havendo a valorizao da histria para essa deliberao individual em razo do teste final ser dado por correspondncia. Isso implicar em du-alismo, dogmatismo, assimetria e input solipsista. Alternativamente, com o uso do critrio de razoabilidade, conseguimos superar os problemas epis-temolgicos anteriormente citados. Isso em razo, principalmente, desse modelo coerentista e pragmatista fazer uso de premissas que podem ser publicamente reconhecidas a partir de uma razo coletiva, o que traz por

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    consequncia a valorizao da histria nessa deliberao social. Veja-se que o problema do input solipsista resolvido, uma vez que a determina-o das normas morais ser dada por um teste da coerncia e da eficincia, com o respeito reciprocidade. Note-se, tambm, o ganho desse modelo para se pensar a respeito da responsabilidade moral do agente. No modelo de descoberta, a ao moral verdadeiramente responsvel poderia pressu-por uma escolha verdadeira pelo o que se (o tipo de pessoa que se ); e como as pessoas no podem escolher verdadeiramente como so, elas no seriam verdadeiramente responsveis por suas aes20. Com o modelo de reconhecimento, como o modelo coerentista de Rawls, podemos subs-tituir o verdadeiramente pelo razoavelmente e o como se pelo o que se pode ser e, assim, teramos:

    (i) A ao moral razoavelmente responsvel pressupe uma escolha razoavelmente responsvel pelo o que se pode ser;

    (ii) As pessoas podem escolher razoavelmente como podem ser;(iii) Logo, as pessoas so razoavelmente responsveis por suas aes.

    O termo razoavelmente significa aqui que se seguiu os preceitos da dis-cusso razovel, o que implica tomar o razovel pelo o que tem aceita-bilidade social. Assim, ser responsvel por uma ao no ser responsvel nem pelo que se e nem por todas as suas consequncias. Antes, uma responsabilidade que est centrada na deliberao do agente que pesa razes e escolhe a melhor alternativa. Por isso, o agente pode ser responsa-bilizado pelo tipo de pessoa que ele pode ser, pois tem capacidade de agir de forma moral (senso de justia) e racional (concepo de bem) e, assim, sua ao pode ser responsabilizada. No se trata de uma responsabilida-de ltima, claro, mas de uma concepo exequvel de responsabilidade moral, que est circunscrita a um mbito de pluralismo moral razovel. E assim, toda a dramatizao a respeito da perda da normatividade da justia como equidade, em razo da ausncia do critrio de verdade, creio que se mostra excessiva.

    1 O equilbrio reflexivo o mtodo por excelncia da justia como equidade, o que j revela sua filiao a uma epistemologia coerentista do tipo holstica, isto por que o que ser exigido

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    para a justificao de uma crena moral ser que ela deve ser coerente no apenas com outra crena, mas com um conjunto coerente de crenas. No artigo Reply to Habermas, Rawls faz referncia ao equilbrio reflexivo pleno (full) como um ponto ao infinito que ns nunca poderemos alcanar, mas que podemos chegar prximos atravs da discusso em que nossos (i) ideais, (ii) princpios e (iii) juzos paream mais razoveis para ns, apresentando como ca-racterstica central a intersubjetividade: The overall criterion of the reasonable is general and wide reflective equilibrium; (...). Reflective equilibrium resembles his test in this respect: it is a point at infinity we can never reach, though we may get closer to it in the sense that though discussion, our ideals, principles, and judgments seem more reasonable to us and we regard them as better founded than they were before. (RAWLS, 1995, p. 384-385). Thus citizens have achieved general and wide, or what we may refer to as full, reflective equilibrium. (The adjective full we reserve for features as realized in a well-ordered society). (RAWLS, 2001, p. 31). O uso do equilbrio reflexivo geral, ou consenso sobreposto, tambm parece apontar para uma filiao a uma tradio pragmatista de justificao, que conecta de forma forte a justificao com a questo da legitimao (detalharei esse ponto mais adiante). Creio que podemos afirmar, sem um grande receio de errar o alvo, que o mtodo nada mais do que um teste de aceitabilidade pessoal/social, teste que tanto em primeira (equilbrio reflexivo amplo), quanto em terceira pessoa (equilbrio reflexivo geral). A sua funo mostrar para ns os valores morais que ns j aceitamos de um ponto de vista social e orientar nossa deliberao moral nessa mesma direo.2 We collect such settled convictions as the belief in religious toleration and the rejection of slavery and try to organize the basic ideas and principles implicit in these convictions into a coherent political conception of justice. These convictions are provisional fixed points that it seems any reasonable conception must account for. We start, then, by looking to the public culture itself as the shared fund of implicitly recognized basic ideas and principles. (RAWLS, 1996, p. 8).3 Essa referncia exigncia de razoabilidade se d a partir dos cinco fatos gerais que so to-mados como pontos de partida da justia como equidade: (i) pluralismo razovel, (ii) fato da opresso, (iii) apoio ao regime democrtico, (iv) ideias intuitivas da cultura pblica, (v) revisibi-lidade das crenas. A esses fatos gerais se adicionam duas ideias normativas de (i) sociedade co-operativa e (ii) pessoas livres e iguais. Ver RAWLS, 1989, p. 474-478 e RAWLS, 1996, p. 48-58. 4 The first basic aspect of the reasonable, then, is the willingness to propose fair terms of cooperation and to abide by them provided others do. The second basic aspect, as I review now, is the willingness to recognize the burdens of judgment and to accept their consequences for the use of public reason in directing the legitimate exercise of political power in a cons-titutional regime. (RAWLS, 1996, p. 54). Um esclarecimento para a traduo da expresso burdens of judgment. O termo burden melhor traduzido como carga ou sobrecarga. O problema que a expresso sobrecarga do juzo diz muito pouco. Dessa forma, usarei preferencialmente limites do juzo e limites da razo para burdens of reason, pois creio que melhor expressa a ideia do texto, que a do reconhecimento de que a razo no capaz de encontrar uma justificao ltima para os juzos morais dos cidados. 5 Os procedimentos da posio original e equilbrio reflexivo so explicados detalhadamente em RAWLS, 1999, 4 e 9. Importante observar que esse procedimento de construo e teste no faz uso de um processo inferencial de conhecimento em que os princpios de justia

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    seriam deduzidos de premissas autoevidentes. Alternativamente, a justificao tomada como uma questo de apoio mtuo de vrias consideraes, todas elas encaixando em conjunto numa viso coerente. Ver RAWLS, 1999, p. 19. Por outro lado, a funo do procedimento do consenso sobreposto garantir a estabilidade social pelas razes corretas, de forma que pes-soas que professam doutrinas abrangentes razoveis podem endossar uma mesma concepo poltica de justia, cada qual a partir de seu prprio ponto de vista. Ver RAWLS, 1996, p. 134. 6 Sintetizando, o argumento de Raz no artigo The Case of Epistemic Abstinence o se-guinte: como a justia como equidade tem uma tarefa prtica de possibilitar estabilidade social e no terica, tendo um fundamento fraco nos valores morais comuns dados pela tradio, sendo tomada como autossuficiente e, consequentemente, sofrendo de abstinncia epistmica, mesmo se falsa a teoria poderia ser aceita se realizasse seu papel prtico. Diz que se evitarmos a abstinncia epistmica ns reconheceramos que o papel prtico dos princpios de justia em alcanar o consenso sobreposto que garante unidade e estabilidade seria uma questo terica sobre a verdade dos princpios. Ver RAZ, 1990, p. 16. Isto significa que para Raz, justificao est necessariamente conectada a uma ideia de verdade. Para Estlund, diferentemente, como apontado no final de seu artigo, determinadas obrigaes podem estar fundadas na sua le-gitimidade e no na verdade. Em outras palavras, ele avalia que a fora coercitiva do poder poltico legtima com base em sua aceitabilidade/razoabilidade, isto , com base na aceitao dessas regras por parte de pessoas razoveis e racionais, o que revela que ele est distinguindo justificao de verdade e a aproximando da legitimao. A discordncia em relao a Rawls se d por ele achar que essa proposta falhar a menos que sua doutrina fundamental, o critrio de aceitabilidade, seja ao menos aproximadamente verdadeira. Ver ESTLUND, 1998, p. 275.7 Veja-se que Estlund e Raz no esto isolados nessa posio crtica que tambm compar-tilhada por vrios outros autores, como o caso de Alan Thomas. Ele faz uma interpretao muito semelhante de Estlund, reivindicando que o princpio da restrio ao razovel para a justificao/legitimao deve ele prprio ser verdadeiro e no apenas razovel. Em suas prprias palavras: Precisamos procurar por verdades independentes em uma moralidade po-ltica sui generis para melhorar o sentido geral dessa posio (THOMAS, 2010, p. 282). A esse respeito, ver, tambm, o artigo de Gardiner: Rawls on Truth and Toleration (GARDINER, 1988, p. 103-111).8 Esta crtica esta situada em uma proposta mais ampla de defender uma justificao mo-ral contextualista, defendendo um contextualismo estrutural. nessa perspectiva que ele in-vestigar sobre um ideal realstico de responsabilidade epistmica. Ver TIMMONS, 2004, p. 178-246. 9 Este parece ser o argumento central desenvolvido por Marilyn Friedman no artigo John Rawls and the Political Coercion of Unreasonable People. Ela defende que as pessoas ge-ralmente no so razoveis em razo de terem crescido sob instituies injustas ao invs de sob instituies livres como as postuladas no ideal de sociedade bem-ordenada de Rawls. Ver FRIEDMAN, 2000, p. 16-19. 10 Gaus cita a pesquisa de Deanna Kuhn para mostrar a inviabilidade de contar com o reco-nhecimento dos limites dos juzos para a justificao, uma vez que ela mostra que ao menos metade dos sujeitos investigados (entre a adolescncia at a idade madura) se revelaram absolu-tistas em seus juzos. O estudo coordenado por Kuhn revelou que mais da metade das pessoas

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    investigadas que deviam explicar as causa do crime, desemprego e falha na escola, viam suas crenas como corretas e nunca como erradas. Esse estudo est documentado em The Skills of Argument. Ver GAUS, 1996, p. 134-135. 11 Observe that here being reasonable is not an epistemological idea (though it has epistemo-logical elements). Rather, it is part of a political ideal of democratic citizenship that includes the idea of public reason. (RAWLS, 1996, p. 62)12 A passagem inteira a seguinte: We hope that by doing this we can, in working political practice, firmly ground the constitutional essentials in those political values alone, and that these values will provide a satisfactory shared basis of public justification. (RAWLS, 1989, p. 485).13 Maffettone fala acertadamente de uma conexo estrutural entre dois tipos de consenso entre o liberalismo e a democracia e entre justificao e legitimao (MAFFETTONE, 2010, p. 249). A tese de Maffettone que se pode responder a esse tipo de crtica a respeito da pretensa fraqueza do critrio de razoabilidade ressaltando que justificao e legitimao esto conectadas na forma que Rawls pensa a justificao das normas, conectando um consenso ideal com um consenso real. Ele explica esta complementaridade entre justificao e legiti-mao na forma de um institucionalismo normativo (MAFFETTONE, 2010, p. 23). Ver a se-minal reflexo sobre a centralidade do critrio de razoabilidade na justia como equidade em MAFFETTONE, 2010, p. 237-249. Numa direo similar, Laden ressalta um projeto alterna-tivo da justia como equidade, destacando quatro importantes elementos. Para nossa discusso especfica, chamo ateno para os elementos 3 e 4: (3) seus argumentos so estabelecidos para servir de justificao pblica preferencialmente a que sejamtomados como dedues a partir de premissas sobre a natureza humana ou racionalidade e (4) a ideia central e o ponto mais alto de seu projeto a ideia de razo pblica e deliberao pblica. Ver LADEN, 2003, p. 379.14 The search for reasonable grounds for reaching agreement rooted in our conception of ourselves and in our relation to society replaces the search for moral truth interpreted as fixed by a prior and independent order of objects and relations, whether natural or divine, an order apart and distinct from how we conceive of ourselves. (RAWLS, 1980, p. 306)15 Freeman tambm pensa que possvel aproximar o conceito de razovel com verdadeiro: Rawls tambm acredita que a justia como equidade a concepo poltica mais razovel (ou verdadeira, se voc quiser) e que ela est em uma melhor posio para encontrar o critrio de reciprocidade e possibilitar uma base para a justificao pblica requerida pelo princpio liberal de legitimidade. Ver FREEMAN, 2009, p. 230.16 Isso pode soar estranho, mas precisamente isso que Rawls faz. Veja sua definio de jus-tificao: Preferencialmente, justificao endereada aos outros que discordam de ns e, dessa forma, deve sempre proceder de algum consenso, isto , de premissas que ns e os outros reconhecemos publicamente como verdadeiras; ou melhor, que reconhecemos publicamente como aceitveis para ns para o propsito de estabelecer um acordo vivel sobre questes fun-damentais de justia poltica. (RAWLS, 1985, p. 394). Veja-se que aqui premissas verdadeiras e premissas aceitveis esto sendo tomadas como intercambiveis. A substituio do termo verdadeiras por aceitveis parece ter a funo especfica de ressaltar que no se far uso de uma epistemologia representacionalista e uma ontologia realista.

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    17 It is unrealistic or worse, it arouses mutual suspicion and hostility to suppose that all our differences are rooted solely in ignorance and perversity, or else in the rivalries for power, status, or economic gain. (RAWLS, 1996, p. 58).18 Estou fazendo uso de uma interessante abordagem de John Mikhail que interpretou a jus-tia como equidade como fazendo uso da hiptese de uma gramtica moral universal, em que os seres humanos nascem com uma gramtica moral, em analogia com a gramtica lingustica como postulada por Chomsky, analogia feita por Rawls em RAWLS, 1999, 9. No quero me deter na abordagem naturalstica feita por Mikhail, da qual eu tenho muitas reservas, mas res-saltar a importncia da distino que ele identifica na justia como equidade. Mikhail defende que a distino entre competncia e performance, que to importante na teoria lingustica de Chomsky, tambm utilizada por Rawls, distinguindo o que competncia moral e perfor-mance moral. Para ele, a competncia moral est associada ao conhecimento moral individual, sendo as condies mentais do agente para ao, enquanto que performance moral est associada a como o conhecimento moral usado, isto , com o comportamento moral dos indivduos. Ver MIKHAIL, 2011, p. 17-19.19 Now one may think of moral philosophy at first (and I stress the provisional nature of this view) as the attempt to describe our moral capacity; or, in the present case, on may regard a theory of justice as describing our sense of justice. (RAWLS, 1971, p. 46; 1999, p. 41).20 Estou pensando em uma compreenso de responsabilidade moral como a de Galen Strawson, que conecta em ltima instncia responsabilidade da ao com uma escolha ver-dadeira sobre o tipo de pessoa. que se (autodeterminao). Ele prova a impossibilidade da responsabilidade moral com o seguinte argumento bsico: (i) A ao moral verdadeiramente responsvel pressupe uma escolha verdadeiramente responsvel pelo que se (o tipo de pes-soa que se ); (ii) As pessoas no podem escolher verdadeiramente pelo que so (no podem se autodeterminar); (iii) Logo, as pessoas no so verdadeiramente responsveis por suas aes. Ver STRAWSON, 1994, p. 6-7.

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