Lazer como possibilidade de intervenção

29
Seminários Internos em Promoção da Saúde: conceitos e possibilidades de intervenção em Programas e Políticas Públicas Ministério da Saúde Departamento de Atenção Básica

description

O lazer como Possibilidade de Intervenção nos Determinantes Sociais da Saúde - Prof. Dr. Fernando MascarenhasVídeo da palestra disponível em: http://youtu.be/COPLmf7USgE

Transcript of Lazer como possibilidade de intervenção

Seminários Internos em Promoção da Saúde: conceitos e possibilidades de intervenção

em Programas e Políticas Públicas

Ministério da Saúde Departamento de Atenção Básica

O lazer como possibilidade de intervenção nos Determinantes Sociais da Saúde

Fernando Mascarenhas

[email protected]

O lazer como possibilidade de intervenção nos Determinantes Sociais da Saúde

Ementa. Ao longo do século vinte, o lazer foi incorporado no discurso sobre o desenvolvimento humano. Seus trajetos transitaram pelas bandeiras que reivindicam a necessidade de redução das jornadas de trabalho, do direito social, da ocupação do tempo disponível das pessoas, sejam crianças, jovens, adultos ou idosos. Na atualidade é parte das construções teóricas e do planejamento de atividades e ações relativas à Promoção da Saúde no campo da saúde pública. Mas de que lazeres o campo da saúde faz seu discurso? O lazer pode efetivamente ser um indutor do desenvolvimento humano? O lazer pode ser uma estratégia de promoção da saúde? Qual sua relação com os determinantes sociais da saúde? Tais perguntas só podem ser respondidas por meio de reflexões coletivas que possibilitem uma leitura crítica das teorias que balizaram os conceitos de lazer na Europa e EUA e suas formulações brasileiras a partir da realidade social do Brasil.

Caminho...

• MASCARENHAS, Fernando. Entre o ócio e o negócio:

teses acerca da anatomia do lazer. 2005. 308 f. Tese (Doutorado em Educação Física) - Faculdade de Educação Física, Universidade Estadual de

Campinas, Campinas, 2005.

10 teses...

LAZER

= ou

≠ ÓCIO ?

≠ de Skholé e o ideal clássico de ócio

≠ de Otium romano

e o ócio como oposição ao negócio

≠ doócio da nobreza, do ócio popular e doócio como vício da Idade Média

= ao Ócio burguês pós-Revolução

Industrial

1ª tese

O lazer é uma fenômeno tipicamente moderno, portanto,

uma “invenção” cultural bastante recente...

Era das Revoluções (1789-1848) O jogos e passatempos da aristocracia palaciana

Era do Capital (1848-1875)

O ócio conspícuo da burguesia ascendente

Era dos Impérios (1875-1914) O “quem é quem”de classe

Era dos Extremos (1914-1991)

A organização das práticas operárias de tempo livre O direito ao lazer

Era do Mercado... globalização, terrorismo e democracia (1991-...)

O mercolazer

2ª tese

O Lazer, como síntese de múltiplas determinações,

expressa as condições econômicas,

políticas e culturais de sua época, observando-se a

“centralidade do trabalho”.

3ª tese

Constitui um tempo e espaço próprio e de estatuto ampliado, correspondendo à uma

experiência orientada pelo prazer e marcada por vivências lúdicas

que envolvem desde a... “tradição” dos jogos, dos passatempos,

das festividades e da recreação... até a “modernidade”e

“pós modernidade”, “neo modernidade”ou “modernodade tardia” da diversão e do

entretenimento...

4ª tese

O lazer, no contraditório entre “conformismo” e “resistência”,

reinventado na e pela

experiência da

“vida cotidiana”,

se sincretiza e se transforma monotonamente no

“tempo de longa duração”.

5ª tese

O lazer é um “(não)lugar”de “organização da cultura”

perpassado por “relações de hegemonia”,

radicando-se, portanto, em visões de homem e de mundo distintas.

6ª tese (a central)

O lazer, sob o ponto de vista sistêmico, não mais responde à função de produção e reprodução

(moral e física) da força de trabalho,

o que se expressa por um processo de “subsunção formal”, pois é “re-

funcionalizado” assumindo uma posição de “subsunção real” ante

as necessidades de reprodução

ampliada do capital.

A 6ª tese como síntese de múltiplas determinações...

Taxa decrescente de valor de uso das mercadorias e a ascensão da Sociedade Involucral;

Taxa crescente de exploração do trabalho e a tendência de diminuição e ou fragmentação do tempo livre, com a aceleração dos ritmos e processos cotidianos da vida;

Disjunção entre produção de riqueza e necessidades humanas, com a relativização do luxo e da necessidade;

O americanismo de novo tipo e o afrouxamento do puritanismo e do proibicionismo frente à propagação da cultura hedonista;

A mundialização da cultura e o surgimento da Industria Cultural Globalizada;

O adeus ao Welfare State e o adeus a Teoria do Capital Humano;

A desintegração dos Direitos Sociais;

As políticas sociais de manejo social do risco e os serviços sociais competitivos.

7ª tese

O lazer hoje está subordinado à forma mercadoria, o que significa que o “mercolazer” ocupa uma posição

histórica tendencialmente dominante e que sua expansão segue uma “lógica de desenvolvimento desigual” que, sob o ponto de vista do consumo, polariza, de uma lado, um “lazer rico para os ricos”,e, de outro, “um lazer pobre

para os pobres” .

O “Mercolazer”...

A expressão categorial “mercolazer” procura traduzir tanto a dinâmica tendencial de mercantilização do lazer em sua manifestação mais imediata, quando assume a forma de uma “mercadoria propriamente dita”, como, também, sua manifestação como:

• “valor de uso prometido”, quando seu poder imagético,

como coisa significante, aparece involucralmente colado ao corpo de outras mercadorias;

• como “palco de vivências”, servindo de atrativo divertido e emprestando o estatuto do lazer a um conjunto de pontos de venda ou equipamentos de comércio; e

• como “compra divertida”, quando o próprio processo de troca assume a identidade de uma atividade de lazer.

A PIRÂMIDE DISTRIBUTIVA DO LAZER:

No meio: » Sob fogo cruzado, a classe média, com

perda real do rendimento médio de 10,3% nos últimos 5 anos;

» Para os quais também predomina o “mercolazer”, no entanto... o “lazer- genérico” ou... o “lazer de segunda-mão”.

No topo: • Os 10% mais ricos que concentram 46,9% de toda a renda nacional; • Para os quais predomina o melhor do “mercolazer”... o “êxtase-lazer”.

Na base:

• Os 56,7 milhões (33,94%) de pobres, mais os 24,7 milhões (14,6%) de

miseráveis;

• São os “sem-lazer”. (PNAD/IBGE, 2001)

A ALTERNATIVA PARA OS “SEM-LAZER”

• Os “Sem-Lazer”: São os setores da população que se encontram à margem do mercado dos bens, serviços e equipamentos de lazer.

• Entre o conformismo e a resistência, as alternativas são:

• De um lado, as práticas de lazer espontâneas verdadeiramente solidárias e, muitas

vezes, até explosivas que brotam no cenário das periferias de nossas grandes e médias cidades, com toda sua tensão, tecendo vínculos entre trabalho, exclusão, inclusão e educação.

• De outro, o chamado “lazer-solidário” ou “lazer-filantrópico” das políticas “focalistas”, materializando-se pelos programas governamentais e não-governamentais tendencialmente inspirados na “filosofia” de manter a juventude ocupada, balizados pelos princípios quantitativos da eficácia e pensados como uma espécie de redutor dos índices de violência, drogadição e vulnerabilidade social.

A cópia empobrecida do “MERCOLAZER”, reforçando sua essência polarizadora:

LAZER RICO PARA OS RICOS X

LAZER POBRE PARA OS POBRES

Ex.: As Academias de Ginástica

8ª tese

O desenvolvimento do “mercolazer” traz consigo o esvaziamento do conteúdo “humanizador” do lazer, o que se expressa através do processo de sua

“reificação”, afastando-o da possibilidade de ser vivido como uma

“prática educativa multilateral”,

frutificadora de uma nova ética e uma nova estética, assentada em uma nova relação

entre educação, cultura, alegria e sensibilidade.

9ª tese

O projeto humanizador de lazer não pode ser

confundido com a busca do ócio perdido, desconsiderando a hostilidade do

capitalismo ao ócio e sua dissolução em

processo, fazendo com que ele, o ócio, subsista isoladamente ou como abstração e referência de valores já alcançados,

portanto, como referência de uma outra relação possível do homem com seu tempo

disponível.

10ª tese

Outro lazer é possível!

atenção às relações de hegemonia

no sentido da construção de

outros parâmetros para a

organização do lazer, o que

requer a participação na e das

políticas públicas.

PROBLEMATIZAÇÕES

DIREITO SOCIAL AO LAZER

De que lazer estamos falando?

LAZER DE QUALIDADE

De que qualidade estamos falando?

QUALIDADE SOCIAL

O que fazer?

LAZER E DIREITO SOCIAL

As relações entre lazer e direito social devem traduzir a qualidade de uma sociedade cujo acesso ao lazer tem seu reconhecimento alicerçado

sobre princípios como planificação, participação, autonomia, organização, transformação, justiça e democracia,

deixando de ser monopólio ou instrumento daqueles que concentram o

poder econômico.

PENSANDO EM POLÍTICA DE LAZER...

• Redução da jornada de trabalho com ampliação do rendimento;

• Ampliação dos direitos e proteção social do trabalhador do lazer;

• Definição de políticas de planejamento urbano voltadas à questão da distribuição dos espaços e equipamentos de esporte e lazer;

• Ampliação quantitativa-qualitativa dos equipamentos de esporte e lazer disponíveis à população, com financiamento público e gestão participativa;

• Atenção para o lazer associativo e privado não-mercantil;

• Controle democrático das políticas e programas de esporte e lazer, fixando parâmetros e diretrizes para sua avaliação;

• Atenção para a questão do lazer ambiental ou práticas de lazer na natureza;

• Atenção para a formação do educador social que trabalha com o lazer.

Perspectivas

Um “outro lazer” cobra política econômica e política social.

O protagonismo do esporte (?) como prática social articuladora de políticas intersetoriais de lazer.

A qualificação das políticas de lazer, i.é., das políticas de “lazerania”,

cobram, necessariamente, uma “pedagogia crítica do lazer”.

Por uma “pedagogia crítica do lazer”

Lazer como um fenômeno tipicamente moderno, resultante das tensões entre capital e trabalho, que se materializa como um tempo e espaço de vivências

lúdicas, lugar de organização da cultura, perpassado por relações de

hegemonia.

Lazer e educação popular:

O protagonismo dos “de baixo””;

O empoderamento na transformação da realidade;

A prática social ponto de partida: os pilares dos temas, redes e ciclos;

A organização do trabalho pedagógico:

o coletivo de educadores.

As exigências da PEDAGOGIA CRÍTICA DO LAZER

Lazer e educação cidadã: Exige rigor e pesquisa; Exige respeito aos saberes dos educandos; Exige criticidade e bom senso; Exige ética e estética; Exige consciência do inacabamento; Exige curiosidade, alegria e esperança;

Exige competência e generosidade; Exige saber escutar e ter disponibilidade para o diálogo; Exige reconhecer que a educação é ideológica; Exige tomada consciente de decisões;

Exige sensibilidade social e compromisso político.

Muito Obrigado! Parabéns pelo Seminário!

Fernando Mascarenhas [email protected]