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CONSTRUINDO A CIDADE SUSTENTVELCaderno de Referncia para Elaborao de Plano de Mobilidade Urbana

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CONSTRUINDO A CIDADE SUSTENTVELCaderno de Referncia para Elaborao de Plano de Mobilidade Urbana

Repblica Federativa do Brasil Presidente da Repblica Lus Incio Lula da Silva Ministrio das Cidades Ministro das Cidades: Marcio Fortes de Almeida Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana Secretrio Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana: Luiz Carlos Bueno de Lima Diretor de Mobilidade Urbana: Renato Boareto Diretor de Cidadania e Incluso Social: Luiz Carlos Bertotto Diretor de Regulao e Gesto: Fernando Antnio Carneiro Barbosa Departamento de Mobilidade Urbana Diretor: Renato Boareto Gerente de Integrao de Polticas de Mobilidade: Augusto Valiengo Valeri Assistentes Tcnicos: Carlos Roberto Alvisi Junior Cludio Oliveira da Silva Daniela Santana Canezin Novaes Paulo Augusto Souza Bandeira Rodrigo Ribeiro Novaes Assistentes Administrativos: Erika Alves Carneiro Erica Ruth Rodrigues Morais Thiago Barros Moreira Estagirio: Vincius Brochado Urbangarin Vianna

Ficha Tcnica

PlanMob - Caderno de Referncia para Elaborao de Plano de Mobilidade Urbana

Diretor: Renato Boareto Gerente: Augusto Valiengo Valeri Agente Financiador: Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento - PNUD Desenvolvimento: Oficina - Engenheiros Consultores Associados Coordenao Geral: Arlindo Fernandes Antnio Luiz Mouro Santana Organizao e Sistematizao: Marcos Pimentel Bicalho Colaboradores SeMob: Carlos Morales Assessor Luiza Gomide Gerente de projetos Mrcia Macedo Gerente de desenvolvimento da gesto Textos: Antnio Carlos Miranda Arlindo Fernandes Denise Maria Ziober Dominique Mouette Ida Marilena Bianchi Jos Carlos Xavier Lus Fernando Di Pierro Marcos Pimentel Bicalho Wagner Bonetti Jnior

Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana - SeMob Diretoria de Mobilidade Urbana DEMOB Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento PNUD Projeto BRA/00/019 Habitar BID

Desenvolvimento do Guia PlanMob para orientao aos rgos gestores municipais na elaborao dos Planos Diretores de Transporte e da Mobilidade 2007 Ministrio das Cidades

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Todos os direitos reservados. permitida a reproduo parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte e que no seja para a venda ou qualquer fim comercial. A responsabilidade pelos direitos autorais de textos e de imagens dessa obra da rea tcnica. A coleo institucional do Ministrio das Cidades pode ser acessada em: www.cidades.gov.br Disponvel tambm na Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana Tiragem: 3000 exemplares Distribuio gratuita Impresso no Brasil

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GUIA PlanMob GUIA PlanMob

Foto: SPTrans

GUIA PlanMob

GUIA PlanMob

O Guia PlanMob uma contribuio do Ministrio das Cidades para estimular e orientar os municpios no processo de elaborao dos Planos Diretores de Transporte e da Mobilidade, obrigatrios para as cidades com mais de 500 mil habitantes, fundamental para as com mais de 100 mil habitantes e importantssimo para todos os municpios brasileiros. Sua concepo pretende ser inovadora, seguindo os princpios estabelecidos na Poltica Nacional de Desenvolvimento Urbano e na Poltica Nacional de Mobilidade Urbana Sustentvel, principalmente na reorientao do modelo de urbanizao e de circulao das nossas cidades. O PlanMob pretende ser efetivamente um instrumento na construo de cidades mais eficientes, com mais qualidade de vida, ambientalmente sustentveis, socialmente includentes e democraticamente geridas. Nesse sentido, o Guia preciso, ao afirmar novos conceitos e princpios para o planejamento da mobilidade urbana, e tambm genrico para poder contribuir para dirigentes pblicos e tcnicos vivendo situaes particulares e distintas em suas respectivas cidades. Afinal, os problemas de desenvolvimento urbano, transporte e circulao se manifestam de forma desigual em funo de um enorme conjunto de fatores que foram tratados neste documento: do porte da cidade sua insero na rede de cidades, passando por suas caractersticas fsicas, econmicas e sociais. Com tamanha diversidade, um ponto fundamental unifica a nova abordagem da gesto das polticas de mobilidade urbana em qualquer cidade do pas, independente de seu tamanho, de sua localizao geogrfica ou da dinmica de sua economia, que ela deve ser orientada para as pessoas. Por isso tiveram tanto destaque no Guia temas que tratam da incluso social, da sustentabilidade ambiental, da equidade na apropriao dos espaos pblicos e da gesto democrtica. O Guia PlanMob no pretende ser um manual, apesar de conter, em alguns captulos, orientaes precisas sobre metodologias e formas de organizao dos trabalhos; tambm no um texto terico, apesar de ter se aprofundado na definio de alguns conceitos considerados estratgicos. Nele os leitores, com maior ou menor preocupao tcnica, encontraro um conjunto sistematizado de informaes sobre os elementos que constituem o planejamento da mobilidade, sobre mtodos de trabalho e sobre o processo de planejamento. Nem todas as suas informaes sero de interesse de todos os leitores, mas todos encontraro nele referncias que podero ajudar na elaborao do PlanMob para suas cidades. O Ministrio das Cidades pretende, com este trabalho, contribuir para que as mudanas necessrias no planejamento e na gesto das polticas de mobilidade urbana ocorram no maior nmero de cidades possvel, afinal se trata de alterar significativamente o padro de urbanizao e de circulao nos municpios, de implementar um processo de desenvolvimento econmico sustentvel e de garantir incluso social de toda a populao.

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Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana SeMob

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SUMRIO SUMRIO

Foto: SeMob

UMRIO

SUMRIO

1. Apresentao ........................................................................................................................................13 2. Introduo .............................................................................................................................................17 2.1 A Reforma urbana e o direito cidade ...................................................................................19 2.2 A atuao do Ministrio das Cidades .....................................................................................19 2.3 A atuao da SeMob Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana .........20 2.4 A poltica de mobilidade urbana para a construo de cidades sustentveis ...................21 2.5 Mobilidade, meio ambiente e planejamento urbano .............................................................22 2.5.1 Consumo e externalidades ................................................................................................23 2.6 O Caderno PlanMob .................................................................................................................23 3. Conhecendo o Caderno PlanMob .......................................................................................................27 3.1 Conhecendo o Caderno PlanMob ...........................................................................................29 4. Definindo o Plano Diretor de Transporte e da Mobilidade ...............................................................31 4.1 O planejamento da mobilidade ...............................................................................................33 4.2 Princpios do PlanMob.............................................................................................................34 5. Conhecendo os Fundamentos para o Planejamento da Mobilidade ...............................................37 5.1 Cidades sustentveis e com qualidade de vida objetivo final do planejamento da mobilidade e do transporte .............................................................................................................39 5.2 Conceitos bsicos para formulao dos Planos Diretores de Transporte e da Mobilidade... 40 5.2.1 Mobilidade ..........................................................................................................................41 5.2.2 Sustentabilidade.................................................................................................................42 5.2.3 Acessibilidade ....................................................................................................................42 5.2.4 Circulao ..........................................................................................................................44 5.3 A gesto democrtica da poltica de mobilidade urbana .....................................................45 5.3.1 A gesto pblica do transporte ...........................................................................................45 5.3.2 A participao da sociedade ..............................................................................................47 6. Apresentando os Componentes do Planejamento da Mobilidade ..................................................49 6.1 Entendendo os fatores condicionantes da mobilidade urbana ...........................................51 6.1.1 Porte das cidades ..............................................................................................................51 6.1.1.1 Classificao dos municpios .....................................................................................51 6.1.1.2 Perfil da mobilidade....................................................................................................52 6.1.2 Organizao institucional ...................................................................................................54 6.1.3 Urbanizao e mobilidade urbana .....................................................................................56

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6.1.3.1 Insero na rede de cidades ......................................................................................57 6.1.3.2 Caractersticas morfolgicas e urbanas .....................................................................59 6.1.3.3 Cidades com caractersticas especficas ...................................................................60 6.1.3.4 Mobilidade em zonas rurais .......................................................................................62 6.1.4 Plano Diretor e os Instrumentos urbansticos ...................................................................63 6.1.5 Aspectos scio-econmicos ...............................................................................................70 6.1.5.1 Condies sociais ......................................................................................................70 6.1.5.2 Aspectos econmicos ................................................................................................73 6.2 Entendendo o papel do sistema virio no planejamento da mobilidade ...........................74 6.2.1 Sistema virio.....................................................................................................................74 6.2.1.1 Classificao funcional...............................................................................................74 6.2.1.2 Hierarquizao viria regional....................................................................................75 6.2.1.3 Gesto do sistema virio............................................................................................76 6.2.1.4 Planejamento e projeto da circulao ........................................................................77 6.2.1.5 Sinalizao das vias...................................................................................................78 6.2.1.6 Operao e fiscalizao .............................................................................................79 6.2.1.7 Paz no trnsito e educao para a circulao ...........................................................80 6.3 Entendendo os servios de transporte pblico ....................................................................81 6.3.1 Servios de transporte coletivo ..........................................................................................81 6.3.2 Servio de txis ..................................................................................................................83 6.3.3 Servio de mototxi e motofrete ........................................................................................84 6.3.4 Servio de transporte escolar ............................................................................................85 6.4 As caractersticas e o papel dos diferentes modos de transporte ......................................86 6.4.1 Modos no motorizados .....................................................................................................86 6.4.1.1 Circulao das pessoas no sistema virio .................................................................86 6.4.1.2 Bicicleta ......................................................................................................................88 6.4.1.3 Carroas e veculos com trao animal .....................................................................89 6.4.2 Modos motorizados coletivos .............................................................................................90 6.4.2.1 Micronibus e nibus convencionais .........................................................................90 6.4.2.2 Sistemas estruturais com veculos leves sobre pneus e trilhos .................................91 6.4.2.3 Trens urbanos e regionais..........................................................................................92 6.4.2.4 Metrs ........................................................................................................................92 6.4.2.5 Barcas ........................................................................................................................93 6.4.3 Modos motorizados individuais ..........................................................................................93 6.4.3.1 Automveis.................................................................................................................93

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6.4.3.2 Motos .........................................................................................................................94 7. Construindo o Plano de Mobilidade ...................................................................................................97 7.1 Conhecendo mtodos para o trabalho de anlise das condies da mobilidade .............99 7.1.1 Obtendo dados de campo ..................................................................................................99 7.1.1.1 Inventrios fsicos ....................................................................................................100 7.1.1.2 Pesquisas de comportamento na circulao ...........................................................101 7.1.1.3 Pesquisas operacionais do transporte coletivo ........................................................103 7.1.2 Obtendo dados secundrios ............................................................................................107 7.1.2.1 Informaes scio-econmicas................................................................................107 7.1.2.2 Informaes gerais do setor de transportes.............................................................107 7.1.2.3 Levantamento da legislao ....................................................................................107 7.1.2.4 Anlise de estudos e projetos existentes .................................................................108 7.1.3 Ouvindo a sociedade .......................................................................................................108 7.2 Utilizando mtodos de planejamento de transporte ...........................................................109 7.2.1 Utilizando modelos de transporte.....................................................................................109 7.2.2 Realizando estudos de projeo ......................................................................................110 7.2.3 Analisando alternativas ....................................................................................................111 7.2.3.1 Anlise de viabilidade...............................................................................................111 7.2.3.2 Hierarquizao das alternativas ...............................................................................112 7.3 Temas a serem tratados no Plano de Mobilidade ...............................................................112 7.3.1 Temas gerais e de presena obrigatria ..........................................................................112 7.3.1.1 Diretrizes e instrumentos para a difuso dos conceitos de mobilidade ...................113 7.3.1.2 Diretrizes para avaliao dos impactos ambientais e urbansticos dos sistemas de transporte .........................................................................................................114 7.3.1.3 Diretrizes e normas gerais para o planejamento integrado da gesto urbana e de transporte ..................................................................................... 115 7.3.1.4 Diretrizes normas gerais e modelo para a participao da populao no planejamento e acompanhamento da gesto do transporte ................................................116 7.3.1.5 Diretrizes para a execuo continuada dos instrumentos de planejamento ............116 7.3.1.6 Diretrizes e meios para a acessibilidade universal ..................................................117 7.3.1.7 Diretrizes e meios para a difuso dos conceitos de circulao em condies seguras e humanizadas ......................................................................................119 7.3.1.8 Diretrizes e modelo de gesto pblica da poltica de mobilidade urbana ...............120 7.3.2 Temas particulares ..........................................................................................................121 7.3.2.1 Classificao e hierarquizao do sistema virio ....................................................122 7.3.2.2 Implantao e qualificao de caladas e reas de circulao a p .......................123 7.3.2.3 Criao de condies adequadas circulao de bicicletas ...................................126

SUMRIO

7.3.2.4 Tratamento virio para o transporte coletivo ............................................................127 7.3.2.5 Sistemas integrados de transporte coletivo .............................................................129 7.3.2.6 Sistemas estruturais de transporte coletivo de mdia capacidade ..........................131 7.3.2.7 Sistemas estruturais de transporte coletivo de alta capacidade ..............................132 7.3.2.8 Modelo tarifrio para o transporte coletivo urbano ..................................................133 7.3.2.9 Sistemtica para avaliao permanente da qualidade do transporte coletivo e de indicadores de trnsito...................................................................135

7.3.2.10 Acessibilidade, transporte coletivo e escolar para a rea rural ..............................136 7.3.2.11 Organizao da circulao .....................................................................................137 7.3.2.12 A circulao nas reas centrais..............................................................................138

7.3.2.13 Controle de demanda de trfego urbano ...............................................................139 7.3.2.14 Regulamentao da circulao do transporte de carga ........................................139 7.3.2.15 Modelo institucional em regies metropolitanas e reas conurbadas ...................140 8. Orientando o Processo de Elaborao do PlanMob .......................................................................143 8.1.1 Consideraes iniciais .....................................................................................................145 8.1.2 Definindo objetivos ...........................................................................................................145 8.1.3 Definindo metodologias....................................................................................................146 8.1.4 Estabelecendo o plano de trabalho..................................................................................147 8.1.5 Estabelecendo cronogramas ...........................................................................................155 8.1.6 Definindo recursos ...........................................................................................................156 8.1.7 Estabelecendo acompanhamento e gesto dos trabalhos ..............................................156 8.2.1 Municpios com populao de 60 a 100 mil habitantes ...................................................157 8.2.2 Municpios com populao de 100 a 250 mil habitantes .................................................158 8.2.3 Municpios com populao de 250 a 500 mil habitantes .................................................160 8.2.4 Municpios com populao de 500 mil a um milho de habitantes ..................................163 8.2.5 Municpios com populao superior a um milho de habitantes .....................................166 8.2.6 Municpios em regies metropolitanas.............................................................................169 8.3 Instituindo o Plano de Transporte e da Mobilidade ............................................................170 8.4 Implementando o Plano de Transporte e da Mobilidade ....................................................172 9. Referncias para Elaborao do PlanMob .......................................................................................175 9.1 Referncias bibliogrficas empregadas neste Guia ...........................................................177

8.1 Preparando o Termo de Referncia para a elaborao do PlanMob .................................145

8.2 Sugestes de roteiros............................................................................................................156

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9.2 Bibliografia Complementar ...................................................................................................179 9.3 Sites de referncia para consulta .........................................................................................180

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APRESENTAO APRESENTAO

Foto: Christian knepper (Embratur)

APRESENTAO

1. APRESENTAO

O Estatuto da Cidade determina que todas as cidades brasileiras com mais de 500 mil habitantes elaborem um plano de transportes e trnsito, rebatizado pela SeMob de Plano Diretor de Mobilidade, ou na expresso simplificada aqui usada, PlanMob. No s uma mudana de nome, mas uma reformulao de contedo: a mobilidade urbana um atributo das cidades, relativo ao deslocamento de pessoas e bens no espao urbano, utilizando para isto veculos, vias e toda a infra-estrutura urbana. Este um conceito bem mais abrangente do que a forma antiga de tratar os elementos que atuam na circulao de forma fragmentada ou estanque e de administrar a circulao de veculos e no de pessoas. Esse conceito recebe ainda quatro complementos, igualmente estruturais da poltica desenvolvida pelo Ministrio das Cidades: a incluso social, a sustentabilidade ambiental, a gesto participativa e a democratizao do espao pblico. O primeiro afirma o compromisso do Governo Federal com a construo de um pas para todos, tendo o direito mobilidade como meio de se atingir o direito cidade. O segundo demonstra a preocupao com as geraes futuras e com a qualidade de vida nas cidades. O terceiro traduz a busca pela construo da democracia poltica, econmica e social. E o quarto complemento se refere ao princpio da equidade no uso do espao pblico A importncia estratgica desta nova abordagem tanta, que o Ministrio das Cidades decidiu avanar na obrigao legal e incentivar a elaborao do PlanMob por todas as cidades com mais de 100 mil habitantes e as situadas em regies metropolitanas e em regies de desenvolvimento integrado. Afinal, nesta faixa de cidades que ainda possvel reorientar os modelos de urbanizao e de circulao de maneira preventiva, sem descuidar das propostas corretivas para as grandes metrpoles e para o

Distrito Federal. Neste Caderno 1, foram abordados os aspectos relacionados infra-estrutura do sistema de mobilidade, os meios de transportes urbanos e seus servios. Oportunamente sero tratados em outra publicao o arranjo institucional e o modelo de gesto associada, bem como o modelo de financiamento e os aspectos fundamentais para a implementao do sistema de mobilidade urbana. O apoio elaborao dos Planos de Mobilidade apenas uma das aes do Ministrio das Cidades desenvolvidas pela Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana SeMob. A Poltica Nacional de Mobilidade Urbana para a construo de cidades sustentveis, coordenada pela SeMob, conta com um programa de aes para diversos projetos neste sentido, incluindo apoio a projetos, consolidao institucional, capacitao de equipes, investimentos diretos de recursos do oramento da Unio e diversas linhas de financiamento. Este novo conceito de planejamento da mobilidade, com escopo ampliado, precisa ser incorporado pelos municpios. Duas outras diferenas fundamentais devem ser destacadas entre os planos de transporte tradicionais e o PlanMob para evitar que as administraes municipais incorram nos mesmos problemas que levaram a que aqueles planos, muitas vezes, no sassem do papel. Primeiro, em sua maioria, os antigos planos se limitavam a propostas de intervenes na infra-estrutura e na organizao espacial dos servios de transporte pblico, quando muito estimando os investimentos necessrios para a sua execuo. Normalmente os processos de planejamento ignoravam a dimenso estratgica da gesto da mobilidade urbana, principalmente nos aspectos institucionais e de financiamento, como tambm, no abordavam adequadamente conflitos sociais de apropriao dos espaos pblicos ou de mercado, no caso do transporte coletivo. A

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APRESENTAO

omisso daqueles planos com relao a estes aspectos, desconsiderando as reais condicionantes da mobilidade urbana, talvez a principal razo da sua baixa efetividade. O caderno PlanMob no uma enciclopdia, muito menos um receiturio a ser automa-

ticamente implantado em qualquer lugar. Ao contrrio, seu objetivo contribuir para que o debate das polticas pblicas de transporte e de circulao urbanas seja levado ao maior nmero de cidades possvel, envolvendo os segmentos organizados da populao de forma democrtica e participativa.

Renato Boareto Diretor de Mobilidade Urbana

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INTRODUO INTRODUO

Foto: Srgio Fecuri (Embratur)

INTRODUO

2. INTRODUO

2.1 A Reforma urbana e o direito cidade O Brasil um pas predominantemente urbano, com mais de 80% da populao vivendo em cidades, onde deveriam ter acesso s oportunidades de trabalho, educao, sade, lazer e a todas outras dimenses da vida cotidiana. No isto, porm, o que ocorre: na maioria das cidades, os benefcios da urbanizao so inacessveis para uma boa parcela das pessoas. Esta foi, sem dvida, uma das razes do surgimento, por ocasio do processo constituinte no final da dcada de 1980, do movimento pela Reforma Urbana, uma luta em defesa do direito cidade, habitao digna, ao transporte e aos demais servios pblicos de qualidade e em prol da gesto participativa e democrtica. A incluso na Constituio de 1988 de um captulo especfico sobre a poltica urbana foi um avano, ao afirmar o princpio da funo social da propriedade urbana. Porm, para surtir efeito, dependeu de uma legislao complementar especfica para a qual foram necessrios quase onze anos de mobilizaes, elaboraes e negociaes at a aprovao do Estatuto da Cidade1, em 2001. nesse ambiente de fortalecimento da poltica urbana que foi criado, em 2003, o Ministrio das Cidades, reunindo as reas mais relevantes, do ponto de vista econmico e social, e de estratgicas do desenvolvimento urbano, em torno da Poltica Nacional de Desenvolvimento Urbano que pretende, como objetivo ltimo, a melhoria das condies materiais e subjetivas de vida nas cidades, a diminuio da desigualdade social e a garantia da sustentabilidade ambiental, social e econmica.

2.2 A atuao do Ministrio das Cidades Ao retomar a questo urbana como parte importante da agenda nacional, o Governo Federal parte do reconhecimento da existncia de uma crise que, para ser superada, exige uma poltica nacional orientadora e coordenadora de esforos, planos, aes e investimentos dos vrios nveis de governo e, tambm, dos legislativos, do judicirio, do setor privado e da sociedade civil, porm formulada e implementada de forma democrtica e participativa, totalmente distinta do modelo tecnocrtico e autoritrio adotado no passado. (Ministrio das Cidades, 2004a, p. 7) O planejamento participativo procura envolver os diferentes segmentos sociais nas definies da cidade e do desenvolvimento desejado. Estas definies indicaro o produto das relaes econmicas, sociais e polticas de cada local. Mas, na viso do Ministrio das Cidades, este planejamento deve seguir algumas das diretrizes que foram expressas para a elaborao dos Planos Diretores: (Ministrio das Cidades, 2004d, p. 40 - 41) Prover espaos adequados para toda a populao do municpio e garantir instrumentos para que a propriedade urbana e rural cumpra a sua funo social.

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Reverter a lgica que orienta as polticas urbanas que realocam as classes populares em lugares distantes, sem infra-estrutura, onde o preo da terra mais baixo. Descentralizar as atividades, melhorando seu acesso, criar espaos econmicos nas reas perifricas, redistribuir setores econmicos industriais e comerciais em todo o territrio.

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A lei federal n 10.257, de 10 de julho de 2001 ficou conhecida como Estatuto da Cidade.

2. INTRODUO

Preservar a qualidade ambiental das reas rurais,diversificandoasatividades.

Desde a criao do Ministrio das Cidades, em 2003, o Governo Federal concentrou em uma nica Pasta as polticas pblicas de trnsito e transporte urbano que, at ento, encontravam-se dispersas, articulando-as tambm com outras polticas setoriais essenciais para o desenvolvimento urbano do ponto de vista econmico, social e estratgico. Quatro Secretarias Nacionais: Habitao, Saneamento Ambiental, Transporte e Mobilidade Urbana e Programas Urbanos; o Departamento Nacional de Trnsito (DENATRAN) e duas empresas pblicas: Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) e Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre S/A (TRENSURB) constituem a estrutura para o desenvolvimento e a conduo da Poltica Nacional de Desenvolvimento Urbano (PNDU), cujo objetivo :

integrado de transporte e uso do solo, a atualizao da regulao e da gesto do transporte coletivo urbano, a promoo da circulao no motorizada e o uso racional do automvel. (Ministrio das Cidades, 2004a) Com essa nova viso, o Ministrio das Cidades estabeleceu diversos programas que passaram a nortear a aplicao dos recursos do Oramento Geral da Unio (ver www.cidades.gov.br) Quase todos estes programas interferem, direta ou indiretamente, nas condies de circulao e de transporte das cidades, ora induzindo a instalao das atividades no territrio, principalmente onde h populao de baixa renda, ora atuando sobre a dinmica econmica e social da cidade ou de regies, ora condicionando a implantao da infra-estrutura viria. 2.3 A atuao da SeMob Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana A atuao da SeMob promove a articulao das polticas de transporte, trnsito e acessibilidade, qualificando os sistemas de transporte pblico, por meio de aes que estimulam a prioridade ao transporte coletivo e aos meios no motorizados de transporte e a implementao do conceito de acessibilidade universal. So desenvolvidas tambm atividades relacionadas estruturao da gesto pblica e atualizao profissional dos tcnicos envolvidos no planejamento e implantao da mobilidade urbana. Estas aes so fundamentais para a mudana de valores pretendida pelo Ministrio das Cidades, atuando diretamente sobre seus principais elementos: Ao 1 - Apoio a projetos de corredores estruturais de transporte coletivo urbano: contempla projetos de implantao, ampliao ou adequao de infra-estrutura metroferroviria ou viria, que priorizem a circulao do transporte coletivo em relao ao individual, incluindo corredores exclusivos e de transporte coletivo, sistema virio nas reas centrais, terminais e pontos de parada.

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orientar e coordenar esforos, planos, aes e investimentos dos vrios nveis de governo e, tambm, dos legislativos, do judicirio, do setor privado e da sociedade civil... (na) busca (da) equidade social, maior eficincia administrativa, ampliao da cidadania, sustentabilidade ambiental e resposta aos direitos das populaes vulnerveis: crianas e adolescentes, idosos, pessoascomdeficincia,mulheres,negros e ndios. (Ministrio das Cidades, 2004a, p. 7) Especificamente para a mobilidade urbana, a PNDU estabeleceu objetivos em trs campos estratgicos de ao: para o desenvolvimento urbano, a integrao entre transporte e controle territorial, a reduo das deseconomias da circulaoeaofertadetransportepblicoeficiente e de qualidade; para a sustentabilidade ambiental, o uso equnime do espao urbano, a melhoria da qualidade de vida, a melhoria da qualidade do ar e a sustentabilidade energtica; e para a incluso social, o acesso democrtico cidade e ao transporte pblico e a valorizao da acessibilidade universal e dos deslocamentos de pedestres e ciclistas. A consecuo destes objetivos, por sua vez, orientada por trs conceitos de aplicao prtica: o planejamento

Caderno para Elaborao de Plano Diretor de Transporte e da Mobilidade - PlanMob

Entre tantos temas envolvidos na gesto urbana, o da mobilidade tem suma importncia. Primeiro, por ser um fator essencial para todas as atividades humanas; segundo, por ser Ao 3 Apoio a projetos de sistemas de um elemento determinante para o desenvolvicirculao no motorizados: financia pro- mento econmico e para a qualidade de vida; jetos e intervenes que promovam e va- e, terceiro, pelo seu papel decisivo na incluso lorizem os meios de transporte no moto- social e na equidade na apropriao da cidarizados, priorizando a sua integrao com de e de todos os servios urbanos. Tambm os sistemas de transporte coletivo, mais devem ser destacados os efeitos negativos do especificamenteestimulandootransporte atual modelo de mobilidade, como a poluio a p (construo de passeios, com espe- sonora e atmosfrica; o elevado nmero de cial ateno para os princpios do desenho acidentes e suas vtimas, bem como seus imuniversal) e o uso de bicicletas. Esta ao pactos na ocupao do solo urbano. contempla as iniciativas previstas no Programa Bicicleta Brasil. As cidades brasileiras vivem um momento de crise da mobilidade urbana, que exige Ao 4 Apoio a projetos de acessibilidade uma mudana de paradigma, talvez de forma para pessoas com restrio de mobilidade e mais radical do que outras polticas setoriais. deficincia:financiaprojetoseimplantao Trata-se de reverter o atual modelo de mode infra-estrutura que garantam a circula- bilidade, integrando-a aos instrumentos o pela cidade e o acesso aos sistemas de de gesto urbanstica, subordinando-se transporte pblico para toda a populao. aos princpios da sustentabilidade amEsta ao contempla as iniciativas previstas biental e voltando-se decisivamente para no Programa Brasil Acessvel. a incluso social. Ao 5 Apoio elaborao de Planos Diretores de Mobilidade Urbana: contempla as aes da SeMob, destinadas promoo da elaborao de planos de mobilidade urbana por parte dos municpios com populao superior 100 mil habitantes. Contempla os estudos, pesquisas e atividades relacionadas ao PlanMob. Ao 6 Desenvolvimento Institucional e capacitao de pessoal: contempla as atividades relacionadas regulao e gesto dos servios de mobilidade urbana, com nfasenaatualizaoprofissionaldostcnicos vinculados aos rgos gestores municipais e estaduais. Destaca-se o curso Gesto Integrada da Mobilidade Urbana Ao 7 Sistema de Informaes: envolve a realizao de pesquisas sobre mobilidade urbana, cujos resultados so disponibilizados para toda a sociedade. O novo conceito (mobilidade urbana) em si uma novidade, um avano na maneira tradicional de tratar, isoladamente, o trnsito, o planejamento e a regulao do transporte coletivo, a logstica de distribuio das mercadorias, a construo da infra-estrutura viria, das caladas e assim por diante. Em seu lugar, deve-se adotar uma viso sistmica sobre toda a movimentao de bens e de pessoas, envolvendo todos os modos e todos os elementos que produzem as necessidades destes deslocamentos. Sob esta tica, tambm para a elaborao dos Planos de Mobilidade, foram definidos dez princpios para o planejamento da mobilidade, considerando tambm sua relao com o planejamento urbano: 1. Diminuir a necessidade de viagens motorizadas, posicionando melhor os equipamentos sociais, descentralizando os servios pblicos, ocupando os vazios urbanos,

Ao 2 - Apoio elaborao de projetos de sistemas integrados de transporte coletivo urbano: estimula a elaborao de projetos de sistemas de transporte pblico intermodais, incluindo a implantao da infra-estrutura necessria.

2.4 A poltica de mobilidade urbana para a construo de cidades sustentveis

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2. INTRODUO

favorecendo a multi-centralidade, como formas de aproximar as oportunidades de trabalho e a oferta de servios dos locais de moradia. 2. Repensar o desenho urbano, planejando o sistema virio como suporte da poltica de mobilidade, com prioridade para a segurana e a qualidade de vida dos moradores em detrimento da fluidez do trfego de veculos. 3. Repensar a circulao de veculos, priorizando os meios no motorizados e de transporte coletivo nos planos e projetos - em lugar da histrica predominncia dos automveis - considerando que a maioria das pessoas utiliza estes modos para seus deslocamentos e no o transporte individual. A cidade no pode ser pensada como, se um dia, todas as pessoas fossem ter um automvel.

9. Promover a integrao dos diversos modos de transporte, considerando a demanda, as caractersticas da cidade e a reduo das externalidades negativas do sistema de mobilidade. 10. Estruturar a gesto local, fortalecendo o papel regulador dos rgos pblicos gestores dos servios de transporte pblico e de trnsito. 2.5 Mobilidade, meio ambiente e planejamento urbano No plano internacional, cada vez mais claro que o transporte motorizado apesar de suas vantagens, resulta em impactos ambientais negativos, como a poluio sonora e atmosfrica, derivada da primazia no uso de combustveis fsseis como fonte energtica, bem como de outros insumos que geram grande quantidade de resduos, como pneus, leos e graxas. No h soluo possvel dentro do padro de expanso atual, com os custos cada vez mais crescentes de infra-estruturas para os transportes motorizados, o que compromete boa parte dos oramentos municipais. A poltica de mobilidade urbana adotada pelo Ministrio das Cidades se inspira largamente das principais resolues e planos emanados dos encontros internacionais sobre meio ambiente e desenvolvimento sustentvel, com particular referncia queles aprovados nas Conferncias do Rio (1992) e de Joanesburgo (2002). Nestes encontros, que contaram com a participao ativa do Brasil, foi fundamental o entendimento atual de que a interdependncia entre o desenvolvimento humano e a proteo ao meio ambiente crucial para assegurar uma vida digna e saudvel para todos. Torna-se cada vez mais evidente que no h como escapar progressiva limitao das viagens motorizadas, seja aproximando os locais de moradia dos locais de trabalho ou de acesso aos servios essenciais, seja ampliando o modo coletivo e os meios no motorizados de transporte. Evidentemente que no se pode reconstruir as cidades, porm

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4. Desenvolver os meios no motorizados de transporte, passando a valorizar a bicicleta como um meio de transporte importante, integrado-a com os modos de transporte coletivo. 5. Reconhecer a importncia do deslocamento dos pedestres, valorizando o caminhar como um modo de transporte para a realizao de viagens curtas e incorporando definitivamente a calada como parte da via pblica, com tratamento especfico. 6. Reduzir os impactos ambientais da mobilidade urbana, uma vez que toda viagem motorizada que usa combustvel, produz poluio sonora, atmosfrica e resduos. 7. Propiciar mobilidade s pessoas com deficincia e restrio de mobilidade, permitindo o acesso dessas pessoas cidade e aos servios urbanos. 8. Priorizar o transporte pblico coletivo no sistema virio, racionalizando os sistemas, ampliando sua participao na distribuio das viagens e reduzindo seus custos, bem como desestimular o uso do transporte individual.

Caderno para Elaborao de Plano Diretor de Transporte e da Mobilidade - PlanMob

possvel e necessria a formao e a consolidao de novas centralidades urbanas, com a descentralizao de equipamentos sociais, a informatizao e descentralizao de servios pblicos e, sobretudo, com a ocupao dos vazios urbanos, modificando-se assim os fatores geradores de viagens e diminuindo-se as necessidades de deslocamentos, principalmente motorizados. 2.5.1 Consumo e externalidades

por habitante cerca de trs vezes maior que o consumo nos municpios menores. Emisso de Poluentes: A poluio produzida pelo transporte individual custa sociedade o dobro da produzida pelo transporte pblico. No caso dos Poluentes Locais esta relao passa de cinco vezes. Na mobilidade urbana so emitidas 1,6 milho de toneladas/ ano de poluentes locais, sendo 84% atribuda ao transporte individual. So emitidas ainda 22,7 milhes de toneladas/ano de CO2 (estufa), sendo 66% atribuda ao transporte individual. O total de emisses por habitante apresenta uma mdia de 225 quilos por habitantes por ano, sendo que os municpios maiores emitem cerca de seis vezes mais poluentes por habitantes do que os municpios menores. O custo das emisses atinge um total de 4,5 bilhes de reais por ano, representando um valor mdio de R$ 41,80 por habitante. Acidentes: O custo dos acidentes representa um total de 4,9 bilhes de reais por ano, correspondendo um valor mdio de R$ 45,89 por habitante. Seguem, na tabela abaixo, Indicadores comparativos entre nibus, moto, automvel e bicicleta 2003 (municpios com mais de 60 mil habitantes).

No estudo Perfil da Mobilidade Urbana no Brasil 2003, elaborado pela ANTP, BNDES e Ministrio das Cidades, foi possvel estimar os seguintes resultados para o consumo de energia, emisso de poluentes e custo de acidentes para o conjunto das cidades com mais de 60 mil habitantes. Energia: So consumidas 10,7 milhes de TED (Tonelada Equivalente de Petrleo) por ano na realizao da mobilidade urbana, sendo 75% no transporte individual e 25% no transporte coletivo. Considerando o consumo de energia por habitante, a mobilidade urbana representa um consumo mdio de aproximadamente 100 mil GEP (Grama Equivalente de Petrleo) por habitante por ano, sendo que os municpios maiores apresentam um consumo Indicadores ComparativosMODO nibus Moto Auto ENERGIA1 1,0 1,9 0

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POLUIO2 14,0 6,4 0 1,0

NDICES POR PASS-KM

CUSTO TOTAL3 1,0 3,9

REA DE VIA 1,0 4,2

Bicicleta1 2

4,5

0,1

8,0

1,1

6,4

Base calculada em gramas equivalentes de petrleo (diesel e gasolina). Monxido de carbono (CO), Hidrocarbonetos (HC), xidos de Nitrognio (NOx) e Material Particulado (MP). 3 Custos totais (fixos e variveis). Fonte: Panorama da Mobilidade no Brasil, ANTP, 2006 e SeMob.

2.6 O Caderno PlanMob O caderno PlanMob no pretende ser um receiturio a ser seguido e automaticamente implantado em qualquer lugar. Ao contrrio, seu objetivo contribuir para que o debate das polticas pblicas de transporte e de circulao urbana seja levado ao maior nmero de

cidades possvel, envolvendo os segmentos organizados da populao de forma democrtica e participativa. O pblico alvo deste caderno so tcnicos e dirigentes pblicos que atuam diretamente com as questes de mobilidade e transporte nas administraes municipais, bem como di-

2. INTRODUO

rigentes municipais, lideranas polticas e dos movimentos sociais que se interessam pelas questes urbanas. Est voltado tanto aos tcnicos responsveis pela conduo da elaborao do Plano Diretor de Mobilidade, como aqueles a quem compete a definio dos objetivos, alcances e recursos que podem ser mobilizados para a sua realizao. Nesta condio, um pblico que rene distintos perfis profissionais, cada um com interesses especficos. Some-se a isso, o fato de que o Caderno orienta a execuo de Planos Diretores de Mobilidade para cidades de portes populacionais, situaes urbanas, insero regional e outras caractersticas distintas, o que conduz os interesses do leitor para alguns temas, em detrimento de outros. Para conciliar tantas diversidades o contedo do Caderno PlanMob modular, podendo ser lido integralmente ou de forma orientada por um interesse especfico. No obstante, alguns itens so de interesse geral, sem os quais a compreenso dos elementos necessrios elaborao do Plano poder ficar prejudicada. Os temas abordados foram divididos em dois conjuntos: um, de presena obrigatria, traz assuntos que todo o Plano de Mobilidade dever abordar, independente do porte ou das outras caractersticas dos municpios; e outro, denominado temas particulares, apresenta uma longa lista de assuntos que variam em necessidade e importncia, em razo das caractersticas de cada localidade. O Plano de Mobilidade pode ser elaborado com diferentes nveis de aprofundamento. Pode assumir uma verso estratgica, quando se limita a estabelecer as diretrizes gerais do sistema de mobilidade, do modelo de financiamento e da gesto pblica, somadas a uma relao de aes, programas e projetos com vistas sua implementao. Pode assumir uma verso executiva, quando acrescenta, viso estratgica, um maior detalhamento dessas propostas, por exemplo, compondo um plano de investimentos e o modelo de financiamento para realizaes nos campo operacional ou tecnolgico para as

redes de transporte coletivo e toda a infraestrutura urbana associada mobilidade. O arranjo institucional e o modelo de gesto associada, principalmente nas regies metropolitanas tambm fazem parte do PlanMob. Nos dois casos, o resultado final do Plano ser um conjunto de normas e diretrizes, que devem ser transformadas em lei ou decreto, e medidas concretas a serem implementadas durante o seu horizonte de vigncia para atingir as metas fixadas, a partir do diagnstico das condies de mobilidade dos municpios. Plano de Ao No mnimo, uma verso estratgica do PlanMob dever conter um Plano de Ao, compreendendo um conjunto de medidas para serem executadas pelo poder pblico, pelo setor privado ou pela sociedade, para atendimento das suas diretrizes. importante destacar que uma ao entendida como um comando para que algo venha a ser planejado, projetado ou executado, como, por exemplo: a regulamentao do servio de transporte coletivo, a estruturao do rgo municipal gestor das polticas de mobilidade urbana, a reorganizao da rede de transporte coletivo, a implantao de campanhas permanentes de divulgao de trnsito seguro, a qualificao da infra-estrutura nas paradas de nibus, a execuo de plano de transporte de cargas perigosas e outros. O Plano de Ao tratar mais dos temas identificados neste Caderno como de presena obrigatria, de carter mais geral e aplicveis a qualquer cidade, concentrando as suas proposies basicamente nas condies estruturais da gesto pblica da mobilidade urbana e os conceitos da Poltica Nacional de Mobilidade Urbana. Sistema de Mobilidade Urbana e sua infra-estrutura O Sistema de Mobilidade Urbana um conjunto de sub-sistemas de infra-estrutura, dos meios de transporte e seus servios, organizados segundo comandos de gesto e dispo-

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Caderno para Elaborao de Plano Diretor de Transporte e da Mobilidade - PlanMob

sitivos regulatrios, cujo objetivo proporcionar o acesso equnime das pessoas aos bens e oportunidades que a cidade oferece. A aplicao dos dez princpios fundamentais para a elaborao do PlanMob resultar em um sistema de mobilidade.que passar a tratar de forma mais efetiva e eficaz os servios e a infra-estrutura propriamente ditos, avanando em propostas para a melhoria do transporte coletivo, com a utilizao dos modos adequados demanda verificada (corredores de nibus e sistemas sobre trilhos) sua integrao fsica e tarifria evitando deseconomias, propostas de intervenes urbanas, implantao e ampliao da rede cicloviria, vias para pedestres e acessibilidade para pessoas com deficincia, com metas de implantao, indicadores de resultados, dimensionamentos preliminares dos investimentos necessrios e outras medidas de carter mais operacional. A abordagem deve ser integrada e os temas sero tratados de acordo com as condies especficas de cada cidade. Plano de investimentos e modelo de financiamento Em um nvel mais avanado de propostas, na verso executiva do PlanMob, est o Plano de Investimentos, com definio de um conjunto de obras priorizadas, servios e tecnologias necessrias para a efetivao do seu Plano de Ao e a implantao do Sistema de Mobilidade. No Plano de Investimentos, cada elemento includo deve ser identificado, nominado, quantificado e dimensionado, inclusive do ponto de vista financeiro. O nvel de detalhamento deve ser suficiente para permitir o seu desenvolvimento posterior, na forma de projetos bsicos, especificaes e demais providncias para sua efetivao. O modelo de financiamento deve identificar todas as fontes de recursos existentes e aquelas que podem ser criadas, a partir da utilizao dos instrumentos urbansticos previstos no Estatuo da Cidade, da Lei de PPPs e Lei de Concesses, contemplando investimentos em infra-estrutura, custeio dos sistemas de transporte coletivo de mdia e alta capacidades e os investimentos na gesto e regulao.

Arranjo institucional, gesto associada e seus instrumentos A articulao entre as diferentes esferas de governo envolvidas nos sistemas de transportes pblicos metropolitanos e regionais deve resultar em um arranjo institucional adequado, que resulte em uma gesto nica e associada, que contemple tambm a participao da populao. O trabalho de preparao do PlanMob resulta em um acmulo razovel de dados sistematizados sobre a mobilidade no municpio que constituem ferramentas da maior importncia para o acompanhamento da poltica de mobilidade e da gesto cotidiana dos servios de transporte O PlanMob deve ainda ser entendido como um elemento necessrio e fundamental para a alimentao de um processo continuado de planejamento e gesto da mobilidade urbana, isto , o Plano no apenas o ponto final de um trabalho de reflexo e planejamento, mas tambm ponto de partida para a Administrao Municipal implementar suas polticas, e reavaliar e atualizar continuamente as propostas formuladas. Avaliao da poltica de Mobilidade Outro componente do PlanMob a proposta de uma metodologia de avaliao da poltica de mobilidade desenvolvida pelo municpio. Inicialmente a avaliao pode ser feita a partir de existncia ou no de temas considerados fundamentais e de presena obrigatria, estabelecendo-se nveis de amadurecimento. Como exemplo podem ser considerados os temas controle social sobre a poltica de mobilidade e acessibilidade para pessoas com deficincia, que podem estar em estgio de desenvolvimento inicial, intermedirio ou avanado. Numa segunda etapa, a metodologia pode envolver o estabelecimento de indicadores e metas para a poltica de mobilidade, como por exemplo a reduo de emisso de poluentes, o aumento da participao das viagens coletivas em relao s individuais, o aumento da participao da bicicleta e a reduo do nmero de acidentes.

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CONHECENDO

Conhecendo o Caderno PlanMob

Foto: Ministrio do Turismo

CONHECENDO

3. CONHECENDO O PlanMob

3.1 Conhecendo o Caderno PlanMob Como afirmado anteriormente, o pblico alvo deste Caderno so tcnicos e dirigentes pblicos que atuam diretamente com as questes de mobilidade e transporte nas administraes municipais. Para conciliar tantas diversidades envolvidas no tema, o contedo do PlanMob modular, podendo ser lido integralmente ou de forma orientada por um interesse especfico. No obstante, alguns itens so de leitura obrigatria, sem os quais a compreenso dos elementos necessrios elaborao do Plano poder ficar prejudicada. Os captulos 4 e 5 so obrigatrios. No primeiro esto expressos os princpios e os produtos de um Plano Diretor de Transporte e da Mobilidade, entendido como um instrumento de planejamento e de gesto. No segundo, so apresentados os fundamentos para o planejamento da mobilidade. O objetivo de construo de cidades sustentveis e com qualidade de vida explicitado em um sub-item do captulo. Em seguida, so definidos os conceitos bsicos que norteiam a discusso sobre o tema, na viso do Ministrio das Cidades (mobilidade, sustentabilidade, acessibilidade e circulao); so conceitos amplos, usados s vezes com outros sentidos, por isto o seu entendimento na forma como usado no Caderno PlanMob fundamental. Um ltimo item aborda a gesto democrtica do transporte nas cidades, tambm como um conceito geral e imprescindvel para a adequada formulao de um Plano de Transporte e da Mobilidade que se coadune com a finalidade de ser um instrumento da sociedade para a promoo de mudanas na poltica urbana. O captulo 6 apresenta, em temas modulados, os principais componentes do planejamento da mobilidade. Os assuntos podem ser lidos de forma salteada, segundo o interesse de cada leitor e a particularidade de cada cidade, sem prejuzo da compreenso do conjunto. Nele, so expostos alguns fatores condicionantes na mobilidade da populao: o porte

das cidades, medido pela sua populao; a relao entre os instrumentos de poltica urbana e a mobilidade urbana; e a influncia dos aspectos scio-econmicos (item 6.1). O papel do sistema virio e da gesto da circulao (item 6.2), as caractersticas dos servios de transporte pblico (item 6.3) e os diferentes modos de transporte (item Erro! Fonte de referncia no encontrada.) so introduzido de forma resumida, com elementos de reflexo e de problematizao que sero teis na avaliao da situao particular de cada cidade, sem entretanto esgotar os temas, que devem ser aprofundados na literatura tcnica. O objetivo do captulo 7, Construindo o Plano de Mobilidade, apresentar indicaes objetivas e, sempre que recomendado, com normas de execuo. Sua abordagem tambm no linear e permite uma leitura aleatria dos temas abordados, cujo objetivo, mais uma vez, no foi substituir ou consolidar o conhecimento acumulado nas diversas reas que atuam no planejamento dos transportes, mas apenas apresentar um rol de metodologias que a equipe de execuo do Plano poder se valer para a conduo adequada de suas atividades. Os assuntos de maior interesse podem ser acessados com maior detalhamento diretamente nas fontes bibliogrficas citadas. A primeira seo do captulo aborda os mtodo de trabalho para obteno de dados de fontes primrias ou secundrias (itens 7.1.1 e 7.1.2), com destaque importncia da participao da sociedade tambm nesta etapa (item 7.1.3). Os mtodos utilizados pela engenharia no planejamento de transportes constituem o contedo do item 7.2. Ambas procuram simplesmente oferecer o conhecimento bsico do conjunto de tcnicas e procedimentos utilizados tradicionalmente no planejamento dos transportes. Ainda na linha de orientao metodolgica, o captulo apresenta temas que devam ser tratados no PlanMob (item 7.3), isto , para os quais deve haver anlise e reflexo

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CONHECENDO O PlanMob

sobre a situao de cada cidade e proposies de medidas a serem implementadas pelo poder pblico ou pelos agentes privados que contribuam para melhorar as condies da mobilidade local. Os temas abordados foram divididos em dois conjuntos: um, de presena obrigatria, traz assuntos que todo o Plano de Mobilidade dever abordar, independente do porte ou das outras caractersticas dos municpios; e outro, denominado temas particulares, apresenta uma longa lista de assuntos que variam em necessidade e importncia, em razo das caractersticas de cada localidade. Os temas de presena obrigatria traduzem, na forma de diretrizes, instrumentos e aes propostas, as iniciativas necessrias para implementar os conceitos definidos na poltica de mobilidade urbana para a construo de cidades sustentveis de fortalecimento da gesto pblica, de prioridade ao transporte coletivo e aos meios no motorizados de transporte, de incluso social, de gesto democrtica e sustentabilidade ambiental. Os temas particulares dependem das condies locais de cada municpio e adquirem maior complexidade conforme o porte da cidade, exigindo, muitas vezes, maiores investimentos. O contedo de cada item apresentado deve ser utilizado como uma referncia para o desenvolvimento dos trabalhos. A abordagem adotada procurou sensibilizar o leitor e oferecer uma orientao inicial para o debate de cada questo. O captulo 8 outro item que deve ser lido obrigatoriamente. Ele traz orientaes objetivas para a elaborao dos Planos. Na sua primeira parte, o processo de trabalho necessrio para o desenvolvimento do Plano apresentado na forma de um Termo de Referncia (item 8.1.), contendo referncias bsicas para o planejamento das atividades recomendadas neste Caderno. A segunda parte

direcionada para os municpios divididos de acordo com sua dimenso populacional, contendo roteiros indicativos com sugestes de temas, metodologias e atividades a serem tratados pelo PlanMob. Ainda neste captulo, dois ltimos sub-itens (8.3 e 8.4) tratam dos processos finais de consolidao do PlanMob como instrumento da poltica urbana, abordando a sua formalizao e a sua implementao. Finalizando o Caderno, o captulo 9 traz referncias bibliogrficas para aqueles que pretendam aprofundar os temas aqui apresentados de forma sucinta e de sites bsicos que constituem importantes fontes de consulta para uma melhor compreenso das condies de mobilidade urbana no pas ou para a obteno de informaes direta ou indiretamente relacionadas com os temas tratados.

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D

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Definindo o Plano Diretor de Transporte e da Mobilidade

DEFININDO

Acervo Oficina Consultores

DEFININDO

4. DEFININDO O PLANO DIRETOR DE TRANSPORTE E DA MOBILIDADE

4.1 O planejamento da mobilidade Os planos de transporte, independente do seu nvel de detalhe e grau de abrangncia, so um instrumento conhecido e bastante empregado na gesto do transporte urbano nas grandes cidades, principalmente aps a dcada de 70, atravs dos esforos do Governo Federal, por meio da Empresa Brasileira de Planejamento de Transportes Urbanos - GEIPOT e da Empresa Brasileira de Transportes Urbanos EBTU, j extintas. Deste processo, ficaram alguns legados: a ao pblica federal no trato das questes do transporte urbano (que foi interrompida por um longo perodo e retomada com a criao do Ministrio das Cidades); a disseminao de uma cultura de planejamento em transportes; a implantao de vrios rgos de gesto de transporte nos municpios; e a formao de um quadro de dirigentes pblicos e tcnicos. Segundo a viso predominante na poca sobre os problemas de transporte urbano, esses planos se concentraram nos modos motorizados, com a proposio de uma infra-estrutura viria e de transporte coletivo capaz de fazer frente a um acelerado processo de urbanizao e de crescimento populacional do pas. De l para c, foram muitas as mudanas ocorridas no cenrio urbano, do transporte e da gesto pblica de transporte. Em particular, h quatro entendimentos bsicos: I. O transporte deve ser inserido em um contexto mais amplo, o da mobilidade urbana (ver item 5.2.1), que relaciona qualidade de vida, incluso social e acesso s oportunidades da cidade;

III. O planejamento da mobilidade, tratado de forma ampliada e, em particular, considerando a sustentabilidade das cidades, deve dedicar ateno especial para os modos no motorizados e motorizados coletivos e observar as condies de acessibilidade universal; IV. O planejamento da mobilidade deve ser realizado com a mxima participao da sociedade na elaborao dos planos e projetos, para garantir legitimao e sustentao poltica na sua implementao e continuidade. Este novo conceito de planejamento da mobilidade, com escopo ampliado, precisa ser incorporado pelos municpios. Recentemente, o Estatuto das Cidades estabeleceu a obrigatoriedade das cidades com mais de 500 mil habitantes elaborarem um Plano de Transporte Urbano Integrado, compatvel com o seu plano diretor ou nele inserido (artigo 41, 2, da lei n 10.257, de 10 de julho de 2001). Para a atuao da SeMob, a denominao destes planos foi alterada pela Resoluo n 34, de 01 de julho de 2005, do Conselho das Cidades, recebendo o nome de Plano Diretor de Transporte e da Mobilidade (PlanMob). A mesma Resoluo estabeleceu os princpios e diretrizes gerais a serem observadas na elaborao destes Planos: I. Garantir a diversidade das modalidades de transporte, respeitando as caractersticas das cidades, priorizando o transporte coletivo, que estruturante, sobre o individual, os modos no motorizados e valorizando o pedestre; Garantir que a gesto da Mobilidade Urbana ocorra de modo integrado com o Plano Diretor Municipal;

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II. A poltica de mobilidade deve estar crescentemente associada poltica urbana, submetida s diretrizes do planejamento urbano expressas nos Planos Diretores Participativos;

II.

III. Respeitar s especificidades locais e regionais;

4. DEFININDO O PLANO DIRETOR DE TRANSPORTE E DA MOBILIDADE

IV. Garantir o controle da expanso urbana, a universalizao do acesso cidade, a melhoria da qualidade ambiental, e o controle dos impactos no sistema de mobilidade gerados pela ordenao do uso do solo. Duas outras diferenas fundamentais devem ser destacadas entre os planos de transporte tradicionais e o PlanMob para evitar que as administraes municipais incorram nos mesmos problemas que levaram a que aqueles planos, muitas vezes, no sassem do papel. Primeiro, em sua maioria, os antigos planos se limitavam a propostas de intervenes na infra-estrutura e na organizao espacial dos servios, quando muito estimando os investimentos necessrios para a sua execuo. Normalmente os processos de planejamento ignoravam a dimenso estratgica da gesto da mobilidade urbana, principalmente nos aspectos institucionais e de financiamento, como tambm, no abordavam adequadamente conflitos sociais de apropriao dos espaos pblicos ou de mercado, no caso do transporte coletivo. A omisso daqueles planos com relao a isso, desconsiderando as reais condicionantes da mobilidade urbana, talvez a principal razo da sua baixa efetividade. Os Planos, por exemplo, devem incorporar mecanismos que ampliem a capacidade gestora do poder pblico; tratar dos interesses e da forma de organizao do setor privado na explorao dos diversos servios; avaliar o impacto das medidas propostas sobre o custeio das atividades desenvolvidas tanto pelo setor pblico como por agentes privados; e propor aes que contribuam para mudar as prprias expectativas da populao com relao a um padro de mobilidade urbana econmica e operacionalmente eficiente, socialmente includente e ambientalmente sustentvel. Um segundo cuidado no se refere propriamente ao contedo do Plano, mas a forma como ele concebido e implementado, quando deve contar com ampla participao e o mximo envolvimento da sociedade em todas as suas etapas, desde a populao usuria at os principais agentes econmicos e polticos locais.

Tomando como base essas consideraes, necessrio que os planos de transporte e da mobilidade sejam elaborados de uma forma renovada em relao s aplicaes tradicionais, incorporando alm dos aspectos metodolgicos consagrados, novas vertentes de anlise do problema, bem como uma maior participao social na sua elaborao. Define-se, assim, o Plano de Transporte e da Mobilidade: O Plano Diretor de Transporte e da Mobilidade um instrumento da poltica de desenvolvimento urbano, integrado ao Plano Diretor do municpio, da regio metropolitana ou da regio integrada de desenvolvimento, contendo diretrizes, instrumentos, aes e projetos voltados proporcionar o acesso amplo e democrtico s oportunidades que a cidade oferece, atravs do planejamento da infra-estrutura de mobilidade urbana, dos meios de transporte e seus servios, possibilitando condies adequadas ao exerccio da mobilidade da populao e da logstica de distribuio de bens e servios 4.2 Princpios do PlanMob A partir da definio do PlanMob, podem ser identificados os principais elementos que devem nortear a elaborao destes planos: I. O PlanMob instrumento de orientao da poltica urbana, isto , faz parte do arcabouo normativo e diretivo que a cidade dispe para lidar com o processo de consolidao, renovao e controle da expanso urbana, logo, dele se exige que contenha, no campo da mobilidade, as diretrizes que: (i) fundamentam a ao pblica em transporte; (ii) delimitam os espaos de circulao dos modos de transporte, incluindo as prioridades; (iii) regulam a relao com os agentes privados, provedores de servios de transporte; e (iv) disciplinam o uso pblico dos espaos de circulao.

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Caderno para Elaborao de Plano Diretor de Transporte e da Mobilidade - PlanMob

II. O PlanMob deve estar vinculado ao Plano Diretor Municipal, e aos planos regionais caso o municpio esteja inserido em uma regio metropolitana, aglomerado urbano ou regio integrada de desenvolvimento, obedecendo as diretrizes urbansticas neles fixadas; importante destacar que o PlanMob no um outro plano urbano, mas parte complementar, seqencial e harmnica do Plano Diretor. III. O PlanMob deve analisar e propor diretrizes, aes e projetos para: a infra-estrutura da circulao motorizada e no motorizada das pessoas e das mercadorias, incluindo: caladas, travessias, passarelas, passagens inferiores, escadarias, ciclovias, terminais de nibus, estacionamentos pblicos, pers, pistas de rolamento, viadutos, tneis e demais elementos fsicos; a funcionalidade da circulao, definindo as regras de apropriao da infra-estrutura viria pelos diferentes modos de transporte e a regulamentao de seu uso, expressando prioridades; a organizao, o funcionamento e a gesto dos servios de transporte pblico e da poltica de mobilidade urbana, com especial ateno ao transporte coletivo.

produtos por elas gerados e das cargas em geral que circulam nas cidades, de forma a contribuir para a eficincia do processo econmico; melhoria da qualidade de vida urbana; e sustentabilidade das cidades. Os elementos para a estruturao da gesto da mobilidade so amplamente abordados nos cadernos Mobilidade e poltica urbana: subsdios para uma gesto integrada e Uma abordagem sistmica gesto da mobilidade (editados pela SeMob) e no outro caderno Curso Gesto Integrada da Mobilidade Urbana (oferecido no plano de capacitao), disponveis na pgina eletrnica do Ministrio das Cidades na Internet.

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IV. O PlanMob tem como principal objetivo proporcionar o acesso toda a populao s oportunidades que a cidade oferece, com a oferta de condies adequadas ao exerccio da mobilidade da populao e da logstica de circulao de bens e servios, devendo os seus produtos refletir a preocupao com: ampliao da mobilidade da populao, principalmente de baixa renda, em condies qualificadas e adequadas; oferta de condies adequadas para prestao de servios e a circulao das mercadorias que abastecem o comrcio, dos insumos que alimentam as indstrias, dos

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Conhecendo os Fundamentos para o Planejamento da Mobilidade

CONHECENDO

Foto: Christian knepper (Embratur)

CONHECENDO

5. CONHECENDO OS FUNDAMENTOS PARA O PLANEJAMENTO DA MOBILIDADE

5.1 Cidades sustentveis e com qualidade de vida objetivo final do planejamento da mobilidade e do transporte Segundo os dados do Censo 2000, 82% da populao brasileira vivem em reas urbanas e, mesmo nas regies consideradas como rurais, crescente a presena de relaes sociais e econmicas caractersticas do modo de vida urbano.

O intenso processo de urbanizao do pas nas ltimas dcadas se deu com profundas diferenas regionais, mas com um elemento comum: a tendncia para a concentrao, para o crescimento das grandes cidades, para a metropolizao. Hoje, cerca de 70 milhes de pessoas vivem em 27 regies metropolitanas oficialmente constitudas; nelas, 453 municpios concentram 41% da populao brasileira.

% acumulada da quant. de cidades x % acumulada de populao100% 90% 80% 70% % acumulada de habitantes 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% % acumulada da quant. de cidades

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A concentrao no ocorre apenas nas regies metropolitanas: 50% dos brasileiros vivem em apenas 209 cidades (3,77%) enquanto em metade do nmero de cidades vivem 91,15% da populao. Se consideradas as 224 cidades com mais de 100 mil habitantes, so 86,6 milhes de pessoas (51%), e apenas as 31 cidades com mais de 500 mil habitantes somam 46,9 milhes de pessoas (27,7%). As projees oficiais para os anos de 2005 e 2015 mostram que esta concentrao tende a se acentuar. E, quanto maior a cidade, mais os seus habitantes dependem das redes de infra-estrutura de circulao para ter pleno acesso s oportunidades de trabalho e de consumo nela concentradas.

Porm, esta acessibilidade no homognea. O padro desta urbanizao, de baixa densidade e com expanso horizontal contnua, comandada pela especulao imobiliria, segrega a populao de baixa renda em reas cada vez mais inacessveis, desprovidas total ou parcialmente de infra-estrutura e de servios, prejudicando o seu acesso a essas oportunidades, impedindo uma apropriao eqitativa da prpria cidade e agravando a desigualdade na distribuio da riqueza gerada na sociedade. A poltica de mobilidade verificada na quase totalidade das cidades brasileiras, ao invs de contribuir para a melhoria da qualidade da vida urbana, tm representado um fator de sua

5. CONHECENDO OS FUNDAMENTOS PARA O PLANEJAMENTO DA MOBILIDADE

deteriorao, causando reduo dos ndices de mobilidade e acessibilidade, degradao das condies ambientais, desperdcio de tempo em congestionamentos crnicos, elevada mortalidade devido a acidentes de trnsito e outros problemas, j presentes at mesmo em cidades de pequeno e mdio portes. Esta situao tem razes em fatores sociais, polticos e econmicos mas, fundamentalmente, produto de decises passadas nas polticas urbanas. Nossas cidades foram, ao longo de dcadas, construdas, reformadas e adaptadas para um modelo de circulao, hoje percebido como insustentvel, fundado no transporte motorizado, rodovirio e individual: o automvel. Poucos so os investimentos nos sistemas de transporte pblico, relegados ao delicado (des)equilbrio entre custos operacionais, tarifas e receitas. O resultado uma apropriao diferenciada do espao pblico com uma clara separaoentreaquelesquetmacessoaoautomvel e aqueles que dependem do transporte coletivo, refletindo, na prtica, as grandes disparidades sociais e econmicas da nossa sociedade; enquanto uma parcela reduzida desfruta de melhores condies de transporte, a maioria continua limitada nos seus direitos de deslocamento e acessibilidade. (ANTP, 1997, p. 18-19) falta de uma infra-estrutura urbana adequada, deve ser acrescida a frgil atuao dos poderes pblicos na gesto dos servios de transporte coletivo urbano. Em muitos casos, a subordinao aos interesses econmicos privados dos operadores, e no ao interesse pblico, impediu um planejamento adequado das redes de transporte coletivo, j prejudicadas pela falta de prioridade no uso do sistema virio, moldando-a de forma insuficiente, desarticulada, inadequada aos desejos e necessidades da populao e ineficiente operacional e economicamente. A combinao destes dois movimentos: investimentos em infra-estrutura direcionados para o transporte individual e subordinao da organizao da rede aos interesses privados, produz um ciclo vicioso que est conduzindo as cidades imobilidade.

Esta situao permanece e tende a se agravar: a falta de transporte pblico de qualidade estimula o uso do transporte individual, que aumenta os nveis de congestionamento e poluio. Esse uso ampliado do automvel estimula no mdio prazo a expanso urbana e a disperso das atividades, elevando o consumo de energia e criando grandes diferenas de acessibilidade s atividades. (ANTP, 1997, p. 19) O desafio que se apresenta para o planejamento, objeto dos Planos Diretores e dos Planos de Mobilidade est em alterar as condies que produziram esse quadro. Sero necessrias medidas no mbito estrito das polticas de mobilidade, acompanhadas de outras, relacionadas aos instrumentos de controle urbano, parcelamento e uso e ocupao do solo, controle ambiental, desenvolvimento econmico e incluso social. 5.2 Conceitos bsicos para formulao dos Planos Diretores de Transporte e da Mobilidade Tradicionalmente, as questes de transporte, circulao e mobilidade tm sido tratadas de maneira isolada: planejamento urbano, gesto do uso do solo, implantao de sistema virio, gesto do sistema virio, gesto dos servios de transporte coletivo, gesto do trnsito, gesto do uso das caladas, e outras atividades inter-relacionadas com as condies de circulao so comumente administradas pelo poder pblico, dentro das estruturas administrativas, de forma estanque. Esta abordagem , em si, um dos problemas para a construo de um novo modelo de mobilidade urbana. Naturalmente, a estrutura da Administrao Pblica deve considerar aspectos caractersticos de cada local - tcnicos, polticos ou culturais, alm de refletir concepes e prioridades tambm particulares. Alm disto, nas cidades maiores, a complexidade dos problemas, as diversidades regionais e o tamanho da prpria estrutura gestora exigem diviso de atribuies e especializao das equipes. Porm, necessrio que haja a mxima articulao e coordenao entre as diversas unidades.

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Nesse cenrio, o conceito de mobilidade urbana para a construo de cidades sustentveis surge como uma novidade, precisando ainda consolidar um conjunto de denominaes, conceitos e significados, uma vez que estes esses termos so empregados em outros contextos, com significado um pouco distinto. 5.2.1 Mobilidade

te coletivo, motorista, etc.; ou vari-los em funo do motivo, do momento ou de outras condies particulares dos seus movimentos. Alm da opo individual, diversos fatores podem induzir, restringir ou at mesmo condicionar essa mobilidade; no caso de pessoas, por exemplo, idade, renda, sexo, habilidade motora, capacidade de entendimento de mensagens, restries de capacidades individuais, so interferentes, alguns em carter temporrio, outros em carter definitivo. Do mesmo modo, na estrutura urbana, a disponibilidade e a possibilidade de acesso s infra-estruturas urbanas, tais como o sistema virio ou as redes de transporte pblico, propiciam condies maiores ou menores de mobilidade para os indivduos isoladamente ou para partes inteiras do territrio. Em outras situaes, como na movimentao de cargas, medidas regulatrias do poder pblico podem condicionar ou restringir rotas, horrios, regies, tipos de produtos (perecveis, ou perigosos, por exemplo) e tipos de veculos, sempre em funo do interesse coletivo, procurando resolver conflitos de rudo, segurana, capacidade do sistema virio e outros aspectos. Alm disso, um novo atributo deve ser vinculado mobilidade, a sustentabilidade ambiental. Os meios de transporte tm duplo impacto nas condies ambientais das cidades: direto, pela sua participao na poluio atmosfrica e sonora e na utilizao de fontes de energia no renovveis; e indireto, na incidncia de acidentes de trnsito e na saturao da circulao urbana (congestionamentos).

Nas pesquisas de Origem/Destino, o ndice de mobilidade a medida do nmero mdio de viagens que as pessoas realizam em um dia tpico, por qualquer modo e para qualquer finalidade. Em oposio a ele, o ndice de imobilidade mostra a porcentagem de pessoas que, tambm em um dia tpico, no realizam nenhuma viagem, comparadas com a populao total de um determinado universo. Ambos partem do princpio que uma maior mobilidade positiva, pois indica maior possibilidade de apropriao da vida urbana, refletindo a condio das pessoas terem acesso aos bens e servios que a cidade oferece para o trabalho, consumo ou lazer. A Poltica Nacional de Mobilidade Urbana Sustentvel vai alm, e define mobilidade como: um atributo associado s pessoas e aos bens; corresponde s diferentes respostas dadas por indivduos e agentes econmicos s suas necessidades de deslocamento, consideradas as dimenses do espao urbano e a complexidade das atividades nele desenvolvidas, ou, mais especificamente: a mobilidade urbana um atributo das cidades e se refere facilidade de deslocamento de pessoas e bens no espao urbano. Tais deslocamentos so feitos atravs de veculos, vias e toda a infra-estrutura (vias, caladas, etc.)... o resultado da interao entre os deslocamentos de pessoas e bens com a cidade. (Ministrio das Cidades, 2004c, p. 13) Nos dois casos, a idia de mobilidade trata dos deslocamentos independentes da utilizao de qualquer meio de transporte - afinal a sua primeira manifestao andar a p, e conseqentemente, independente da escolha modal (bicicleta, automvel, carroa, nibus, trem, etc.). Na verdade, durante seus deslocamentos, as pessoas costumam desempenhar, sucessivamente, diversos papis: pedestre, passageiro do transpor-

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Foto: SeMob

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5.2.2

Sustentabilidade

A preocupao com as questes ambientais um aspecto central hoje de todas as atividades humanas, refletindo uma preocupao crescente com o que se denominou como desenvolvimento sustentvel, isto , um modelo de desenvolvimento que permite s geraes presentes satisfazer as suas necessidades sem que com isso ponham em risco a possibilidade das geraes futuras virem a satisfazer as suas prprias necessidades. As atividades de transporte e mobilidade, em todas as suas dimenses, constituem um setor que produz fortes impactos no meio ambiente, tanto diretamente, pela emisso de poluentes ou pelo efeito dos congestionamentos, quanto indiretamente, ao servir como fundamental elemento indutor do desenvolvimento econmico e urbano.

veis inferior ao ritmo de desenvolvimento de substitutos renovveis. (CESUR, 1999) A sustentabilidade, para a mobilidade urbana, uma extenso do conceito utilizado na rea ambiental, dada pela capacidade de fazer as viagens necessrias para a realizao de seus direitos bsicos de cidado, com o menor gasto de energia possvel e menor impacto no meio ambiente, tornando-a ecologicamente sustentvel. (BOARETO, 2003, p. 49) Outra orientao importante para a poltica de mobilidade o princpio de internalizao dos custos externos (deseconomias) gerados pelas atividades, como poluio, acidentes e congestionamento, transferindo para os seus prprios usurios. Esta posio afeta especialmente o transporte individual, cujos benefcios hoje so apropriados pelos seus usurios enquanto a maior parte dos seus custos sociais so transferidos para o conjunto da sociedade, reforando a premissa de priorizao dos meios de transporte no motorizados e dos meios de transporte coletivos. A mobilidade urbana para a construo de cidades sustentveis ser ento produto de polticas que proporcionem o acesso amplo e democrtico ao espao urbano, priorizem os modos coletivos e no motorizados de transporte, eliminem ou reduzam a segregao espacial, contribuam para a incluso social e favoream a sustentabilidade ambiental. 5.2.3 Acessibilidade

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As questes relativas aos transportes vm sendo tratadas com destaque dentro das preocupaes ambientais. A Conferncia das Naes Unidas para o Ambiente e Desenvolvimento (ECO-92) realizada no Rio de Janeiro e, posteriormente, a Agenda 21 denunciaram a necessidade de alterao dos padres de comportamento do setor, cobrando investimentos em tecnologias menos poluentes e sistemas de circulao que reduzam os impactos ambientais associados aos transportes. Especificamente dentro da Agenda 21, foram definidos objetivos fundamentais para o setor de transportes para a promoo do desenvolvimento urbano sustentvel atravs de: utilizao de energias alternativas e renovveis, reduo dos nveis de emisso de poluio atmosfrica e sonora. O conceito de transporte ambientalmente sustentvel foi ento definido como os transportes que no colocam em perigo a sade pblica ou os ecossistemas e tm necessidades consistentes com uma taxa de utilizao de recursos no renovveis inferior sua (dos recursos) taxa de regenerao e com um ritmo de utilizao dos recursos no renov-

Em termos gerais, acessibilidade significa garantir a possibilidade do acesso, da aproximao, da utilizao e do manuseio de qualquer objeto. Esta definio genrica caberia a qualquer pessoa, mas, no Brasil, esse conceito se associa mais diretamente s pessoas com deficincia. Acessibilidade significa ento a condio do indivduo se movimentar, locomover e atingir um destino desejado, dentro de suas capacidades individuais, isto , realizar qualquer movimentao ou deslocamento por seus prprios meios, com total autonomia e em condies seguras, mesmo que para isso precise se utilizar de objetos e aparelhos especficos.

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Nesse sentido, a ampliao da acessibilidade , antes de tudo, uma medida de incluso social, um dos trs macro-objetivos definidos pelo Ministrio das Cidades para a PNDU2. No estranho, portanto, que a idia de acessibilidade aparea explicitamente em trs dos quatro objetivos nela estabelecidos: o acesso democrtico cidade, a universalizao do acesso ao transporte pblico e a acessibilidade universal (o quarto a valorizao dos deslocamentos de pedestres e ciclistas). comum serem encontradas nas cidades brasileiras espaos que, pelas suas condies fsicas, so inacessveis para pessoas que possuam limitaes em seus movimentos. Constituem barreiras, isto , definidas como qualquer entrave ou obstculo que limite ou impea o acesso, a liberdade de movimento, a circulao com segurana e a possibilidade de as pessoas se comunicarem ou terem acesso informao (Decreto n 5.296/2004, artigo 8, inciso II). As barreiras podem ser fsicas, no interior das edificaes ou nas vias pblicas, ou tcnicas, neste caso caracterizadas pela adoo de tecnologias que, pela dificuldade de sua compreenso, impeam o acesso de algumas pessoas ou grupos sociais. Na gesto da mobilidade urbana, a convivncia com esse tipo de problema cotidiana. As pessoas que se deslocam de um ponto para outro no espao urbano utilizam as redes de servios pblicos: o sistema virio (ruas e caladas) e os meios de transporte pblico que, do modo em que esto hoje, muitas vezes constituem barreiras: a sinalizao das ruas, o desenho e o estado

de conservao das caladas, a ausncia de guias rebaixadas, a concepo e a localizao do mobilirio urbano, ou os meios de transporte coletivo. O transporte coletivo o principal meio de deslocamento para a maior parte da populao para trabalhar, estudar, fazer compras ou apenas lazer. Por muito tempo, a discusso de acessibilidade ficou restrita instalao de elevadores nos nibus para usurios de cadeiras de rodas, impedindo uma abordagem mais abrangente do problema e ignorando outros tipos de deficincias e necessidades existentes. Para que os sistemas de transporte sejam plenamente acessveis, so necessrias aes sobre o ambiente construdo (caladas, pontos de parada dos nibus, estaes e outros), sobre os veculos e at sobre elementos de identificao dos servios, no caso para facilitar a sua utilizao por pessoas com deficincias visuais. Muitas dessas necessidades podem ser resolvidas apenas com uma especificao adequada na fase de projeto (aplicao dos princpios do desenho universal3), outras demandam investimentos significativos. Uma poltica de mobilidade orientada para a acessibilidade deve combinar aes normativas com investimentos diretos no espao urbano e nos equipamentos associados aos servios de transporte. A ampliao da acessibilidade dentro de uma poltica de mobilidade urbana no pode ser vista de forma isolada, pois se trata de fomentar um amplo processo de humanizao das cidades, a partir do respeito s necessidades de todas as

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O Ministrio das Cidades desenvolve o Programa Brasil Acessvel que tem como objetivos estimular e apoiar os governos municipais e estaduais a desenvolver aes que garantam a acessibilidade para pessoas com deficincia e restrio de mobilidade a sistemas de transportes, equipamentos urbanos e circulao em reas pblicas Desenho universal: concepo de espaos, artefatos e produtos que visam atender simultaneamente todas as pessoas, com diferentes caractersticas antropomtricas e sensoriais, de forma autnoma, segura e confortvel, constituindo-se nos elementos ou solues que compem a acessibilidade. (Decreto n 5.296, de 2 de dezembro de 2004) O conceito de Desenho Universal foi criado por uma comisso em Washington, EUA, no ano de 1963 e tem como objetivo considerar a diversidade humana e garantir acessibilidade todos os componentes dos ambientes, tais como edificaes, reas urbanas, mobilirios, comunicaes, etc. Princpios do desenho universal: uso equiparvel (para pessoas com diferentes capacidades); uso flexvel (com leque amplo de preferncias e habilidades); simples e intuitivo (fcil de entender); informao perceptvel (comunica eficazmente a informao necessria); tolerante ao erro (que diminui riscos de aes involuntrias); com pouca exigncia de esforo fsico; e tamanho e espao para o acesso e o uso. (CREA-RJ)

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pessoas usufrurem a vida urbana. As suas aes devem buscar a adequao dos ambientes naturais e construdos e dos sistemas de transporte pblico, por meio do aperfeioamento da legislao e da regulamentao locais, da orientao de investimentos pblicos e privados e da capacitao das equipes da administrao pblica e dos agentes privados envolvidos na produo da circulao, destinando recursos para a eliminao de situaes indesejveis e evitando que sejam criadas, diariamente, novas barreiras. Outra forma de definir acessibilidade a facilidade em distncia, tempo e custo, de se alcanar, com automomia, os destinos desejados na cidade, o que adiciona a esse conceito dois novos componentes fundamentais: o tempo e o custo dos deslocamentos. (Projeto de Lei n 1.687/2007) Por isso, as medidas de ampliao da acessibilidade fsica nos transportes devem sempre cuidar para que no gerem, em seu lugar, outros tipos de barreira, principalmente a econmica, pela elevao descontrolada dos custos de implantao ou de operao que, no caso especfico do transporte coletivo urbano, podem causar a majorao das tarifas e um conseqente aumento da excluso social, principalmente da populao de baixa renda. Duas outras dimenses ainda devem ser agregadas ao conceito de acessibilidade dentro da poltica de mobilidade que no se limitam ao atendimento das pessoas com restries de mobilidade e sim proviso das infra-estruturas urbanas. A primeira a adequao das redes s necessidades de deslocamentos das pessoas em termos de abrangncia, quantidade e qualidade. Tanto para o sistema virio como para o transporte coletivo urbano, usual a existncia de regies da cidade com limitaes de acessibilidade, expressa, por exemplo, em ruas em estado precrio, intransitveis em perodos de chuvas, ausncia de caladas ou bairros desatendidos por linhas de nibus ou com atendimento parcial e insuficiente. A segunda dimenso qualitativa. Tratase de repensar o padro de mobilidade de que a sociedade dispe, de mudar a forma tradi-

cional de organizar a circulao urbana, no mais tendo o automvel como foco privilegiado das polticas. Significa repensar a forma de administrao do sistema virio, priorizando o transporte coletivo, o pedestre e os meios de transporte no motorizados. Significa ainda repensar a prpria cidade, o desenho urbano, a localizao e distribuio das atividades e a localizao dos equipamentos pblicos, tendo como objetivos reduzir a necessidade de viagens motorizadas, reforar novas centralidades, desconcentrar o processo de urbanizao e valorizar as relaes locais. 5.2.4 Circulao

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A circulao urbana, ou o ato de circular pela cidade, o exerccio da mobilidade mediante o prprio esforo pessoal (a p ou de bicicleta) ou atravs de meios motorizados de posse ou uso pessoal, ou providos por terceiros, atravs de servios oferecidos. Em todas as situaes, a sua manifestao efetiva se d na infra-estrutura urbana. A circulao tem regras que, em sua maioria, so estabelecidas pelo poder pblico e afetam as pessoas de maneira diversa, dependendo do papel que desempenham em um determinado momento. O fato da maior parte das regras de circulao tratar dos meios de transporte motorizado indica, por um lado, a importncia deste tipo de transporte para a sociedade e, por outro, a ameaa que eles potencialmente representam. Para os veculos em geral, so estabelecidos sentidos obrigatrios de direo em algumas vias, regulamentados limites para as velocidades permitidas, definidos lugares da via pblica onde permitida ou no a parada ou o estacionamento; para o transporte coletivo, so pr-determinados os trajetos e os pontos de parada; bicicletas no so autorizadas a circular em algumas vias; o transporte de carga pode sofrer restries espaciais ou temporais de circulao; e assim por diante. No caso da movimentao urbana, o poder pblico precisa intervir nos conflitos entre os di-

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