manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da...

62
manual SUL apoio à vítima imigrante a p o i o à v í t i m a i m i g r a n t e manual

Transcript of manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da...

Page 1: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

1

manual SULapoio à vítima imigrante

apoio

à

vítima

imig

ran

te

manual

Page 2: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

2

Introdução 5

I - O FENÓMENO DA IMIGRAÇÃO 7

1. Enquadramento Histórico 7

1.1. Realidade Nacional e Regional 7

1.2. Crimes que afectam especificamente a comunidade imigrante 7

II – FENÓMENO DO TRÁFICO DE SERES HUMANOS 11

2.1. Conceito do Tráfico de Seres Humanos 11

2.1.1. Métodos de Recrutamento 12

2.1.2. Formas de exploração 12

2.1.2.1. Exploração sexual 13

2.1.2.2. Exploração laboral 13

2.1.2.3. Extracção de órgãos 14

2.2. Enquadramento Legal 14

2.2.1. Diplomas internacionais: 14

2.2.2. Legislação Nacional: 15

III – VÍTIMAS DE TRÁFICO DE SERES HUMANOS 17

3.1. Mitos e Factos 17

3.2. Quem é a Vítima de Tráfico 18

3.2.1.Indicadores do crime de tráfico de seres humanos 18

3.2.2.Reacções das vítimas de tráfico 19

3.2.3. Avaliação de risco 20

IV - PROCEDIMENTOS DE ATENDIMENTO 23

4.1. Atendimento 23

4.1.1. Utentes que não são vítimas de crime: 23

4.1.2. Utentes que não se consideram vítimas de crime, e que na realidade o são 24

4.1.3. Terceiros que têm conhecimento de alguém que foi ou está a ser vítima de crime 25

4.1.4 Utentes que se consideram e que, efectivamente, são vítimas de crime 26

4.2 Atendimento à vítima 26

Page 3: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

3

4.2.1. Tipos de atendimento 26

4.2.2. Atendimento presencial 27

4.2.3. Comunicação verbal 28

4.2.4.Comunicação não verbal 30

4.2.5 Atendimento telefónico 30

4.2.6. Atendimento por escrito 32

4.3. O Processo de Apoio à Vitima - Vítimas de Tráfico 33

4.3.1. O primeiro atendimento 34

4.3.2.Princípios orientadores da entrevista 34

4.3.2.1. Fases da entrevista 35

4.3.3.Autonomia da vítima 37

4.3.4. Intervenção na crise e intervenção continuada 38

4.3.4.1. Intervenção na crise 39

V - APOIO ESPECIALIZADO 43

5.1. Apoio Jurídico 43

5.1.1.Protecção legal das vítimas de Tráfico de Seres Humanos 44

5.2. Apoio Psicológico 47

5.2.1. Apoio psicológico a vítimas imigrantes 47

5.2.2. Vítimas de tráfico – O Stresse pós Traumático 49

5.3. Apoio Social 50

5.3.1. Problemática específica 51

VI - COOPERAÇÃO INTERINSTITUCIONAL 53

6.1. Vitimação secundária 53

VII – CASOS PRÁTICOS 57

Caso I 57

Caso II 58

Caso III 59

VIII - CONTACTOS ÚTEIS 61

Page 4: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

4

Page 5: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

5

Introdução

Tendo presente a vulnerabilidade da população imigrante e a complexidade dos crimes que afectam especi-ficamente esta comunidade, em especial o crime de Tráfico de Seres Humanos, o Manual de Procedimentos de Apoio à Vítima Imigrante inclui a indicação de elementos básicos para compreender o fenómeno e apre-senta um conjunto de boas práticas para capacitação dos técnicos na intervenção no domínio do apoio às vítimas de crime.

O Manual é uma compilação de informação e orientação da acção dos técnicos das instituições que traba-lham, directa ou indirectamente com a população imigrante e resulta da experiência adquirida no atendimento a vítimas imigrantes acumulada ao longo de duas décadas.

Este instrumento tem como objectivo partilhar metodologias essenciais para padronização de procedimentos, tendo em vista a prestação de um melhor apoio e protecção às vítimas, garantindo uma actuação eficaz e adequada.

Page 6: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

6

Page 7: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

7

I - O FENÓMENO DA IMIGRAÇÃO

1. Enquadramento Histórico

Portugal, até à década de 60 do século passado, era um país de índole predominantemente emigratória, sendo que no início da década de 80 se verificou um aumento exponencial do número de estrangeiros resi-dentes em Portugal. Nos anos 90 existiu uma consolidação e crescimento da população das comunidades oriundas dos países africanos de expressão portuguesa e do Brasil. Com o novo século surgem os fluxos do leste europeu e o aumento da comunidade brasileira. Hoje em dia, Portugal é um país de origem, trânsito e de destino para a população migrante com um número estimado de 452.725 imigrantes em território português.

1.1. Realidade Nacional e Regional

Segundo os dados do Instituto Nacional de Estatística, a região com maior número de imigrantes é o distrito de Lisboa, seguida pela região do Algarve na qual os dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) demonstram que é a segunda área com mais residentes estrangeiros em Portugal, que em 2009 em números é equivalente a 38.125 residentes de outras nacionalidades para além da portuguesa.É um facto que a população imigrante é mais vulnerável a situações de crime, tendo sido registadas situações de tráfico de seres humanos, associação criminosa, extorsão, etc.

1.2. Crimes que afectam especificamente a comunidade imigrante

Burla relativa a trabalho ou emprego

Código Penal:

Quem, com intenção lucrativa de obter para si ou para terceiro enriquecimento ilegítimo, causar a outra pessoa prejuízo patrimonial, através de aliciamento ou promessa de trabalho ou emprego no estrangeiro, é punido com pena de prisão até 5 anos ou com pena de multa até 600 dias.

Com a mesma pena é punido quem, com intenção de obter para si ou para terceiro enriquecimento ilegítimo, causar a pessoa residente no estrangeiro prejuízo patrimonial, através de aliciamento ou promessa de traba-lho ou emprego em Portugal.

Page 8: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

8

O tráfico de seres humanos

Moldura Penal:

O artigo 160º do Código Penal que entrou em vigor a 15 de Setembro de 2007, estipula a punição de quem oferecer, entregar, aliciar transportar, alojar ou acolher pessoa para fins de exploração sexual, exploração laboral ou extracção de órgãos por meio de:

Violência rapto ou ameaça grave

Ardil ou manobra fraudulenta Abuso de autoridade resultante de uma relação de dependência hierárquica, económica, de trabalho ou fa-miliar

Aproveitamento da incapacidade psíquica ou da especial vulnerabilidade da vítima

Obtenção do consentimento da pessoa que tem o controlo sobre a vítima

No que respeita a situações de tráfico de crianças (abaixo dos 18 anos), é punido quem, mediante pagamento ou outra contrapartida, oferecer, entregar, solicitar ou aceitar menor, ou obtiver ou prestar consentimento na sua adopção, é punido com pena de prisão de um a cinco anos

É punido quem tendo conhecimento destes crimes, utilize os serviços ou órgãos das vítimas, bem como quem ocultar, danificar ou destruir documentos de identificação ou de viagem de pessoa vítima.

Este crime tem uma natureza pública, pelo que qualquer pessoa singular ou colectiva poderá denunciar a qualquer autoridade policial (Guarda Nacional Republicana, Polícia de Segurança Pública, Policia Judiciária, Serviço de Estrangeiros e Fronteiras) ou Serviços do Ministério Público uma situação que consubstancie este tipo de crime.

Devido ao facto de se tratar de um crime que envolve cidadãos estrangeiros (pois implica a passagem de fronteiras), o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras concorre na competência de investigação com a Policia Judiciária – Direcção Central de Combate ao Banditismo, nos casos em que lidamos com crime organizado.

Auxílio à imigração ilegalEntrada, Permanência, Saída e Afastamento do Território Nacional (Lei 23/2007 de 4 de Julho):

Page 9: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

9

Artigo 183º – Auxílio à imigração ilegal - Penaliza quem, com ou sem intenção lucrativa, favorecer ou facilitar a entrada ou o trânsito ilegal de cidadão estrangeiro em território nacional. A tentativa é punível.

Artigo 184º - Associação de auxílio à imigração ilegal - penaliza quem fundar grupo, organização ou associa-ção para a prática do crime acima mencionado. A tentativa é punível.

Artigo 185º – Angariação de mão-de-obra ilegal - Penaliza quem, com ou sem intenção lucrativa, aliciar ou angariar para si ou para terceiro, com o objectivo de introduzir no mercado de trabalho cidadão estrangeiro não habilitado. A tentativa é punível.

Assim, no que diz respeito a situações de auxílio à imigração ilegal que se transformam em situações de tráfico, e apesar da não existência de moldura penal específica para as situações de tráfico para efeitos de exploração laboral, existe a penalização do auxílio à imigração ilegal, bem como a criminalização de outros crimes normalmente conexos com os actos consubstanciam normalmente situações de tráfico nos termos do conceito adoptado pelo Protocolo de Palermo.

Para melhor entendimento abaixo encontra-se um quadro explicativo da diferença entre estes dois tipos de crime. Auxílio à imigração ilegal Tráfico

Tipo de crime Crime contra o Estado Crime contra as pessoas

Razão da sua tipificação Protecção de soberania do Estado Protecção dos Direitos Humanos

Natureza do crime e relação entre as partes

Relação comercial que termina com a passa-gem da fronteira e respectivo pagamento

Relação de exploração com o objectivo de maximização económica

Forma de actuação Movimento organizado de pessoas canaliza-do para o lucro

Recrutamento organizado e exploração contínua de vítimas com intuito lucrativo

Passagem ilegal da fronteira Elemento identificativo é a pessoa ser ilegal no país de destino Ser ilegal não é elemento identificativo

Consentimento Imigrante dá o seu consentimentoImigrante não dá o seu consentimento, ou é tornado irrelevante em qualquer estado do processo

Page 10: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

10

Page 11: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

11

II – FENÓMENO DO TRÁFICO DE SERES HUMANOS

2.1. Conceito do Tráfico de Seres Humanos

O Tráfico de Seres Humanos consiste na oferta, entrega, aliciamento, aceitação, transporte, alojamento ou acolhimento de pessoas, através de certos meios, tendo como fim a exploração sexual, exploração do traba-lho ou extracção de órgãos. É um processo que se inicia com o recrutamento e tem como objectivo a explo-ração da vítima.

Sendo o terceiro negócio mais lucrativo e é o que está a crescer mais rapidamente na indústria do crime em todo o mundo, existe em todos os países, quer a nível interno (verificando-se a exploração no país de resi-dência da vítima), quer a nível transfronteiriço (em que as vítimas são exploradas no país de origem, no país de destino e nos países de trânsito), e não apenas nos países mais pobres.

O tráfico seres humanos é um crime, um fenómeno transnacional em constante evolução e que afecta pa-íses de origem, trânsito e destino (Portugal por exemplo é um país de origem, de transito e de destino). O crescimento deste fenómeno é notório, mas continua a estar muito associado a exploração para fins sexuais, apesar da notória existência de exploração laboral.

Apesar de ser um fenómeno que afecta todos, existem grupos mais vulneráveis a esta forma de vitimação como mulheres e crianças. Numa análise de género por indivíduos em risco de pobreza, verifica-se que é su-perior para as mulheres nos inquéritos realizados nos últimos 3 anos: 19,1% em 2007, 19% em 2008, e 19,1% 2009 enquanto para os homens foram de 17,7%, 17,2% e 17,7%. A Convenção das Nações Unidas para os Direitos das Crianças reafirma a extrema vulnerabilidade, destas como o direito inalienável de protecção face a qualquer forma de maus-tratos, abuso, violência e negligência.

O tráfico de pessoas é uma problemática que está em constante mutação, a forma mais usual hoje, pode amanhã tornar-se obsoleta, isto significa que os métodos de exploração adaptam-se sempre a novas realida-des e novas formas de exercer pressão sobre os grupos mais vulneráveis. A partir do momento em que decide abandonar o seu país de origem, a ruptura com os seus familiares e amigos, desconhecimento da cultura, a geografia, a língua de um novo país, esta população torna-se mais vulnerável.

Dentro da população imigrante as mulheres e crianças são mais vulneráveis a serem vítimas de tráfico. No que se refere ao tráfico de crianças, a nível mundial 1,8 milhões são exploradas sexualmente. Quanto às mulheres, estas são muitas vezes discriminadas nos seus salários, no acesso ao mercado de trabalho, e na formação vocacional. Os estereótipos perpetuam a sobre representação no salário inferior, empregos menos

Page 12: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

12

seguros e considerados como tradicionalmente femininos e determinam a distribuição pelo trabalho pago e não pago.

2.1.1. Métodos de Recrutamento

As vítimas de tráfico na sua grande maioria são pessoas que procuram alternativas para melhorar a sua situa-ção económica, na maior parte das situações vão à procura de um melhor trabalho, acreditam nas promessas e mesmo que possam conhecer a natureza do trabalho, são enganados e iludidos quanto à remuneração e condições que lhe esperam no país de destino.

O recrutamento de vítimas é feito de formas muito diversas. Por vezes as vítimas vêem-se privadas da sua liberdade através da força ou condicionada a sua vontade através da retenção de documentos ou da iniciação no consumo de drogas.

Porém, na maioria das situações são utilizadas formas de engano, sendo as mais comuns as ofertas de emprego, criando nas vítimas a expectativa de conseguirem melhorar as suas condições de vida e da sua fa-mília. Estas pessoas viajam muitas vezes em situação irregular, socorrendo-se de redes de crime organizado para conseguirem documentação falsa, razão pela qual se transformam em vítimas perfeitas para os trafi-cantes, uma vez que os alegados “custos” da documentação, viagens, alojamento, alimentação serão pagos pela vítima após a chegada ao local de destino, com o seu próprio trabalho (debt-bondage, sendo montantes claramente inflacionados.

Outra forma de engano muito comum é a criação de laços afectivos com a vítima e a oferta de projectos de vida aliciantes.

2.1.2. Formas de exploração

Após o recrutamento, a vítima é deslocada do seu local de residência, para outro local que geralmente não conhece e que pode ser uma região diferente dentro do seu próprio país ou um país estrangeiro e a sua des-locação pode prolongar-se por vários dias. Durante este período, em muitos casos, a vítima é impedida de satisfazer as suas necessidades básicas, como a higiene ou a alimentação. Chegadas ao local de destino as vítimas são maltratadas física e psicologicamente e privadas da liberdade de movimentação.

O processo de recrutamento e deslocação da vítima tem como objectivo final a sua exploração, que se con-cretiza de três formas.

Page 13: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

13

2.1.2.1. Exploração sexual

Consiste no aproveitamento da prostituição e outras formas de exploração sexual, como a pornografia ou o turismo sexual.

Exploração da prostituição: A vítima é induzida ou forçada a prostituir-se em benefício do traficante.

Pornografia: A vítima é coagida a participar neste tipo de comércio sexual.

Turismo sexual: Esta forma de exploração sexual relaciona o comércio do sexo com o turismo. Na maior parte das situações, as crianças e os adolescentes são o alvo principal deste tipo de indústria.

2.1.2.2. Exploração laboral

Entre outras actividades, as vítimas são exploradas na agricultura, na indústria e no trabalho doméstico.

Agricultura e indústria: Os trabalhadores são atraídos mediante propostas aliciantes, com salários relativa-mente elevados e boas condições de trabalho, para laborar em explorações agrícolas, fábricas ou na cons-trução civil. Na generalidade das situações, são obrigados a trabalhar em regime de quase escravidão, vivem em condições degradantes, não têm o que comer, não têm dinheiro e muitas vezes são sujeitas a maus-tratos e a ameaças de morte.

A escravatura doméstica é uma das formas mais frequentes de exploração laboral, e também a mais difícil de combater uma vez que ocorre na esfera doméstica, em condições de grande fragilidade da vítima e muitas vezes confundida com violência doméstica.

Também a exploração da mendicidade de outros é relativamente frequente no crime de Tráfico de Seres Humanos, as vítimas são transportadas de zonas rurais para grandes centros urbanos e obrigadas a pedir dinheiro para terceiros que os exploram, através de violência física e/ou de ameaças.

Page 14: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

14

2.1.2.3. Extracção de órgãos

Consiste na remoção forçada de partes do corpo de crianças ou de adultos para transplante ou feitiçaria.

2.2. Enquadramento Legal

De acordo com o “Relatório sobre Tráfico de Pessoas 2007”, publicado em Junho pelo Governo dos Estados Unidos (EUA), existem 3 rankings nos quais se integram os vários países relativamente à forma como lidam com a problemática do Tráfico de Seres Humanos.

No primeiro grupo estão integrados os países mais eficazes no combate ao tráfico humano (países como o Reino Unido, Suécia, Alemanha, Bélgica, Suíça e Noruega). Quanto ao segundo grupo, no qual Portugal se encontra, estão inseridos países que apesar de não cumprirem os requisitos mínimos recomendados para o combate ao tráfico de seres humanos, têm tomado medidas de erradicar (como o Brasil, Grécia, Malta, Timor-Leste e Angola). O terceiro grupo abarca 16 países, grande parte deles do Médio Oriente, a Coreia do Norte, Cuba, Irão e Venezuela, que não cumprem nem tomam medidas que satisfaçam os mínimos padrões recomendados.

Porém, o documento norte-americano salienta o esforço levado a cabo por Portugal, em 2006, na prevenção destes crimes, desenvolvendo campanhas de sensibilização e informação, assim também a criação de um site português sobre o tráfico humanos e que contêm dados úteis para ajudas vítimas.

Neste sentido, é de salientar a criação do primeiro Plano Nacional Contra o Tráfico de Seres Humanos, que previu, entre várias iniciativas a criação do observatório para identificação de vítimas, acções de formação e programas especiais de segurança às potenciais testemunhas e seus familiares

Este plano surge como concretização de diplomas internacionais e correspondentes alterações legislativas:

2.2.1. Diplomas internacionais:

Convenção n.º 29 sobre o trabalho forçado da OIT;

Convenção contra a Criminalidade Organizada Transnacional, especificamente o protocolo adicional relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas em especial Mulheres e Crianças das Nações Unidas;Decisão Quadro do Conselho da União Europeia de 19 de Julho de 2002;

Page 15: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

15

Plano de Acção da OSCE contra o Tráfico de Seres Humanos de 2003;

Directiva 2004/81/EC do Conselho da União Europeia de 29 de Abril de 2004;Convenção contra o Tráfico de Seres Humanos do Conselho da Europa de 16 de Maio de 2005;

Plano de Acção da União Europeia sobre boas práticas, normas e procedimentos para combate e prevenção do Tráfico de Seres Humanos adoptado em Dezembro de 2005.

2.2.2. Legislação Nacional:

Resolução do Conselho de Ministros n.º 81/2007 de 22 de 22 de Junho, aprova o I Plano contra o Tráfico de Seres Humanos (2007-2010);

Lei n.º 23/2007 de 4 de Julho, veio alterar o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros. Este diploma legal, no seu artigo 109.º estabelece o estatuto da vítima de tráfico,

Lei n.º 51/2007 de 31 de Agosto, define os objectivos, prioridades e orientações de política criminal para o biénio 2007/2009, em cumprimento da Lei n.º 17/2006 de 23 de Maio, que aprova a Lei-quadro de Política Criminal;

Lei 59/2007 de 4 de Setembro, veio precisar o conceito de tráfico, distinguindo bem as actividades de explo-ração sexual, labora e extracção de órgãos, introduzindo-se pela primeira vez a punição do cliente, operou-se a criminalização da retenção, ocultação ou destruição de documentos de identificação;

Decreto-lei n.º 368/2007 de 5 de Novembro, define o regime especial de concessão de autorização de resi-dência a vítimas de tráfico de pessoas a que se referem os n.ºs 4 e 5 do artigo 109.º e o n.º 2 do artigo 111.º da Lei n.º 23/2007 de 4 de Julho;

Resolução da Assembleia da República n.º 1/2008, aprova a Convenção do Conselho da Europa relativa à luta contra o tráfico de Seres Humanos;

Lei 49/2008 de 27 de Agosto, aprova a Lei da Organização da Investigação Criminal;

Sendo certo que o adequado enquadramento legal da problemática é um passo importantíssimo para uma melhor compreensão do problema e adequada protecção das vítimas, é ainda necessário trabalhar nas exe-cuções das medidas estabelecidas, garantindo o respeito pelos Direitos Humanos e vontade da vítima.

Page 16: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

16

Page 17: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

17

III – VÍTIMAS DE TRÁFICO DE SERES HUMANOS

3.1. Mitos e Factos

No senso comum, há uma imagem distorcida do que é o fenómeno do tráfico de seres humanos. Existem várias ideias vagas acerca do fenómeno, conceitos errados acerca da realidade. A estes conceitos pode-se chamar mitos, espelham ideias afastadas da realidade, devem ser desmistificados para todos que lidam directamente ou indirectamente com este fenómeno. É importante esclarecer alguns mitos comuns sobre o tráfico de seres humanos, eis alguns exemplos desses mitos:

“Tráfico de seres humanos refere-se unicamente às vítimas de exploração sexual”.Na realidade, existem outras formas de exploração no tráfico de seres humanos, como a laboral e a extracção de órgãos. Sendo que em muitos casos há mais que um tipo de exploração.

“ O tráfico de seres humanos acontece com as pessoas pobres e sem educação”Embora a pobreza seja um dos factores de risco, qualquer pessoa se pode tornar uma vítima de tráfico hu-mano.

“Só as mulheres são vítimas de tráfico”Embora as estatísticas apontem que a maioria das vítimas que solicitam apoio são do sexo feminino, contudo na realidade tanto homens como mulheres de qualquer idade podem ser vítimas de tráfico.

“ Quando pagam para passar a fronteira irregularmente sabem bem para o que vêm.”O movimento ilegal de pessoas através de fronteiras chama-se imigração ilegal. O tráfico humano é uma ofensa a uma pessoa com uso de uma variedade de meios tais como força, engano para fins de exploração. O tráfico de seres humanos pode acontecer a nível nacional, a vítima poderá estar em situação regular ou irregular.

“ O tráfico de seres humanos envolve sempre força física, rapto ou escravidão física”.Não é obrigatório o uso de força física, existem outros elementos como a pressão psicológica que fazem com que a vítima se sinta encurralada a fazer o que os traficantes a estão a obrigar. De facto as situações de ameaças aos familiares no país de origem ou o receio de ser alvo de agressões físicas, revelam-se muitas vezes como métodos mais eficazes e menos dispendiosos para controlar a vítima de tráfico seres humanos.

As vítimas de tráfico são sempre recrutadas por grupos criminosos ou pessoas desconhecidas”Embora existam muitas situações relacionadas com grupos criminosos mais ou menos organizados, na re-

Page 18: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

18

alidade a maioria das vítimas são recrutadas por familiares, “amigos” , conhecidos. Muitas das jovens são enganadas por namorados que são recrutadores.

3.2. Quem é a Vítima de Tráfico

Não existe propriamente um perfil de vítima de tráfico, isto é não se pode apontar um perfil específico que nos permita enunciar que determinada pessoa homem ou mulher de determinada idade é, ou pode vir a ser vítima deste crime.Qualquer pessoa pode ser vítima, independentemente do meio social, político, religioso, moral ou educacio-nal.

Contudo, este fenómeno está frequentemente relacionado com pessoas que se encontram numa situação de vulnerabilidade ou de pobreza. Assim, as crianças e mulheres são mais facilmente aliciadas devido aos seguintes factores:

Falta de recursos económicos. Em situações que as pessoas nos seus países de origem estão a viver uma crise económica, ou de insegurança. Esta insegurança leva a procurar outros países para uma melhor quali-dade de vida.Fuga da opressão e da estigmatização. As pessoas que vivem em sociedades conservadoras, para fugirem ao isolamento e à reprovação.Turbulência Política. As guerras civis, situação em que há opressão política, restrição de liberdades ou mesmo práticas que atentem aos Direitos Humanos no país de origem surgen como um dos estímulos à emigração.

3.2.1.Indicadores do crime de tráfico de seres humanos

Alguns indicadores podem nortear, a compreensão sobre quem é a vítima de tráfico, ou as razões para man-terem a situação de tráfico:

As vítimas não têm o controlo dos seus documentos de identificação ou de viagem.

As vítimas têm indicações específicas sobre como comunicar com agentes de autoridade, frequentemente desconhecem a língua do país de destino.As vítimas foram recrutadas para determinado trabalho, e são forçadas a trabalhar em um diferente.

São retiradas às vítimas uma parte do ordenado para pagar as despesas da viagem.

Page 19: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

19

A vítima é violentada fisicamente, psicologicamente e sexualmente.

A vítima não tem liberdade de movimentos.

A vítima é ameaçada que poderá sofrer deportação ou sanção legal.

A vítima não pode livremente socializar com outras pessoas.

A vítima tem receio das represálias à família.

Debt – Bondage – Quando um trabalhador trabalha para pagar uma dívida ou empréstimo, quando emprega-do providencia alimentação e alojamento, mas o trabalhador não é pago pelo seu trabalho.

Estes indicadores poderão ser facilitadores para identificar uma situação de tráfico, frequentemente depara-mo-nos com outros crimes associados ao tráfico de seres humanos, tornando-se difícil identificar a situação de tráfico.

3.2.2.Reacções das vítimas de tráfico

As vítimas de tráfico podem reagir de formas muito diversas, são diversos os meios e propósitos utilizados no tráfico, diferentes são os traficantes, as relações com as vítimas, a duração da vitimação, etc. Cada vítima, é uma pessoa singular, com uma personalidade, cada uma com reacções diferentes.

Existem algumas reacções gerais que podem ser apontadas:

Medo. As vítimas de tráfico sentem determinados medos: medo da deportação medo das autoridades, medo de não serem compreendidos, bem como o medo das represálias (em especial com a família no país de ori-gem).

Sentimento de insegurança. As vítimas de tráfico sentem frequentemente as mesmas preocupações quando foram traficadas, sentem-se observadas e sob vigilância.

Sentimentos de vergonha/culpa. A vítima tem vergonha de relatar a sua situação e solicitar apoio, e dos fami-liares que se encontram no país de origem.

Page 20: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

20

Mas, especificamente podem registar-se nas vítimas determinados danos:

Perturbações funcionais: ao nível do apetite, aparecimento de dores de cabeça e musculares, fracturas, trau-matismos faciais, fadiga e sexuais (infecções ginecológicas, dor ao urinar, dor pélvica, doenças sexualmente transmissíveis, etc.

Perturbações afectivas: choro incontrolado, pessimismo, sentimento de humilhação, desvalorização pessoal, crenças negativas, etc.

Perturbações cognitivas: dificuldade de concentração, atenção e memória, etc.

Alterações psiquiátricas: tentativas de suicídio, desenvolvimento de stress pós traumático, depressões, etc.

Alterações sociais: danos ao nível das relações sociais, isolamento e desconfiança, etc.

3.2.3. Avaliação de risco

As vítimas de tráfico são pessoas que se encontram numa situação de grande vulnerabilidade, apesar de terem escapado à situação de tráfico (são pessoas que estão frequentemente longe da rede social primária). Por outro lado, são pessoas que foram sujeitas a uma grande violência física ou psicológica.É fundamental avaliar e realizar uma boa gestão dos indicadores de risco, para tal é essencial:

Identificar e compreender os indicadores de risco. É importante o técnico identificar e perceber quais os indi-cadores que estão relacionados com cada vítima de tráfico:

Questões relacionais (relação com o traficante, estratégias utilizadas e meios na situação de tráfico)

Questões sociais (dependência económica, necessidades sociais da vítima)

Questões psicológicas (avaliar as reacções das vítimas, o stress pós trauma, a capacidade própria da pessoa para confrontar o problema) etc.

Compreender os indicadores de risco como dinâmicos. É essencial perceber que os indicadores não são estáticos ao longo do tempo, são sempre mutáveis. Essas mudanças têm implicações no plano de acção de respostas de apoio às vítimas.

Monitorizar e planear respostas adequadas para a protecção à vítima.

Page 21: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

21

Reavaliar sempre os indicadores de risco.

Para procedermos a um processo de apoio adequado, é necessário uma adequada identificação e compre-ensão dos indicadores de risco, através dessa identificação poderemos iniciar o apoio e encaminhamento das vítimas. Será ainda nesta altura em que se formalizarão todos os procedimentos de sinalização.

Page 22: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

22

Page 23: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

23

IV - PROCEDIMENTOS DE ATENDIMENTO

A APAV tem técnicos especializados para apoiar vítimas imigrantes, em especial vítimas de tráfico de seres humanos. Estamos a lidar com problemáticas muitas vezes interligadas, sendo a questão que trouxe o utente à APAV apenas um elemento dentro de um complexo de situações que podem passar por casos de violência domés-tica, exploração laboral, burla em contrato de trabalho, discriminação, entre outras.O apoio pode ser prestado de forma presencial, telefónica via correio electrónico, correio postal ou fax.

Estes utentes têm expectativas diferentes relativamente às competências da APAV, desde a desconfiança, por um lado, à atribuição de competências de resolução imediata dos problemas (competências como que mágicas), por outro lado. Os TAV (técnicos de apoio à vítima) deverão assim estar atentos a estas expectati-vas, tentando elucidar cada utente, de forma assertiva, do âmbito, finalidades, possibilidades e limitações do apoio às vítimas.

Torna-se essencial, em primeiro lugar, conhecer as diversas categorias de utentes que procuram a APAV e os procedimentos gerais a empreender perante cada uma dessas categorias.

4.1. Atendimento

4.1.1. Utentes que não são vítimas de crime:

- pessoas com problemáticas do foro médico e/ou psiquiátrico (por exemplo, doentes de esquizofrenia para-nóide);

agressores em busca de informação sobre vítimas (por exemplo, cônjuges ou companheiros de mulheres vítimas de maus tratos e/ou agressores de crianças vítimas de crimes sexuais);

pseudo-vítimas (por exemplo, indivíduos que tentam burlar a APAV, inventando uma história e solicitando expressamente apoio monetário);

utentes com solicitações de informação que transcenda o âmbito da APAV (por exemplo, utentes que preten-dam informação e/ou aconselhamento jurídico sobre assuntos não relacionados com crimes).

Page 24: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

24

Procedimentos:atender;

iniciar o processo de apoio, preenchendo boletim para processo de apoio;elucidar sobre o âmbito, finalidades e limitações do Projecto SUL;

efectuar o despiste imediato, isto é, não criar condições de continuação futura de solicitações que são neces-sárias a sua resposta imediata;encaminhar, se for caso disso, para a rede de cooperação institucional.

4.1.2. Utentes que não se consideram vítimas de crime, e que na realidade o são

Em situações de exploração laboral, muitos dos utentes não se apercebem que estão a ser alvo de um crime. Muitos deles vêm de países nos quais um pagamento inferior ao salário mínimo nacional será um óptimo ordenado, pelo que nem sequer questionam o montante oferecido, outros contraíram dívidas para sair do seu país de origem, e não se questionam quando se vêem com pouco ou nenhum ordenado no fim do mês (depois de supostos descontos para amortizar a dívida contraída).

- Nos casos específicos de Tráfico de seres humanos, é muito comum que a solicitação de apoio seja refe-rente a outra problemática exemplificando: mulheres de nacionalidade brasileira queixam-se ser vítimas de violência doméstica, identificamos uma situação de tráfico, ou situações de exploração trabalho doméstico.

Assim, torna-se fulcral que no âmbito do atendimento haja um guião de entrevista para que o técnico se possa aperceber de todas as questões que carecem de apoio.

Procedimentos:

atender; Considerando que estamos a lidar com uma população que muitas vezes não fala Português, e que tem cultura diferente, o técnico terá de ter especial atenção a nacionalidade do utente, e deverá, sempre que pos-sível, falar a língua do mesmo, excepto se este quiser falar Português, tendo sempre em conta que entre os técnicos do SUL exista o conhecimento do Inglês, Francês, Espanhol e Russo.

Caso tal não seja possível, ou quando a língua do país de origem não seja uma das acima mencionadas, deverá recorrer ao Serviço de tradução telefónica;Tel: 808 257 257 (rede fixa); 21 801 61 91(rede móvel)Horário: 2ª a 6ª das 10:00 às 18:00

Page 25: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

25

Poderá ainda recorrer à respectiva Embaixada a fim de solicitar apoio nesse sentido.Como acima foi referido, o atendimento tem de corresponder a um guião de entrevista:

abrir processo, preenchendo boletim para processo de apoio;

identificar o(s) crime(s) no contexto do discurso do utente;

informar o utente que é vítima de crime;

promover a consciencialização do utente sobre os seus direitos;

se o contacto não for presencial, sensibilizar o utente para se deslocar à APAV, de preferência ao gabinete geograficamente mais próximo da sua área de residência, de modo a realizar um diagnóstico mais real da situação;

prosseguir com o processo de apoio da APAV ao nível dos apoios jurídico, psicológico e social.

4.1.3. Terceiros que têm conhecimento de alguém que foi ou está a ser vítima de crime

Procedimentos:atender;

iniciar o processo de apoio, preenchendo boletim para processo de apoio;

identificar o crime;

salientar a importância de terem contactado o SUL - APAV com a preocupação por outrem;

informar sobre os direitos da vítima de crime, em questão;

sugerir a mediação junto da vítima com a finalidade de esta contactar o gabinete de apoio à vítima geografi-camente mais próximo da sua área de residência caso a situação não possa ser acompanhada via e-mail ou telefonicamente SUL;

se as vítimas de crime em questão forem menores de idade, e tratando-se de crime público, o SUL, através de ofício assinado pela Gestora, denuncia a situação ao tribunal competente;se as vítimas de crime em questão forem idosos ou deficientes, deve informar-se o Técnico de Serviço Social ou Santa Casa da Misericórdia da área de residência da vítima.

Page 26: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

26

4.1.4 Utentes que se consideram e que, efectivamente, são vítimas de crime

Procedimentos:atender;

iniciar o processo de apoio, preenchendo boletim para processo de apoio;

identificar o(s) crime(s);

prestar apoio aos níveis emocional, jurídico, psicológico e social.

4.2 Atendimento à vítima

O cerne do trabalho da Unidade é o apoio às vítimas, pelo que o atendimento surge como o momento mais importante do processo de apoio.

É aqui que o técnico começa a estabelecer laços de confiança, sublinhando a confidencialidade, cooperando e apoiando a vítima para a concretização do seu projecto de vida.

Como tal, os seus procedimentos deverão ser reflectidos e ponderados, de modo a haver a mais adequada resposta à solicitação da vítima.

4.2.1. Tipos de atendimento

Existem três tipos de atendimento através das quais as vítimas se poderão dirigir ao SUL, a fim de solicitar apoio: presencial, telefónico, e por escrito (e-mail, carta e fax).

De entre estas três vias, deve privilegiar-se a presencial, por ser a que permite um melhor conhecimento da vítima e das suas problemáticas levando assim a um apoio mais efectivo. Assim, uma das vertentes dos ou-tros dois tipos de atendimento – telefónico ou por escrito – é a sensibilização da vítima para, quando possível, se deslocar à Unidade.

Tendo em conta que o SUL, apesar de ser uma Unidade localizada no concelho de Tavira, presta apoio à rede de gabinetes de apoio à vítima do Algarve, o SUL desloca-se de forma itinerante entre os vários GAV (Albufeira, Faro, Loulé, Portimão e Tavira) consoante as necessidades das vítimas. Caso as vítimas não se

Page 27: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

27

possam deslocar aos gabinetes, os técnicos deslocam-se às IPSS, Forças de segurança Pública, entre outras para realizarmos os atendimentos.Há assim, alguns procedimentos específicos correspondentes a cada um destes tipos de atendimento, que importa agora abordar.

4.2.2. Atendimento presencial

Quando uma vítima se desloca à Unidade, independentemente da problemática, importa ter em conta alguns aspectos não directamente relacionados com o atendimento propriamente dito, mas que terá de se ressalvar não só por se tratarem de regras elementares de cortesia mas também porque ajudam a mostrar ao utente que é bem-vindo às nossas instalações:

o utente deve ser recebido de forma gentil e imediatamente encaminhado para a sala de espera ou, se o técnico estiver disponível, para a sala de atendimento;

considerando que há imigrantes que poderão não falar português e caso o técnico com as competências linguísticas adequadas não esteja disponível, existem cartões em cinco línguas, (Inglês, Francês, Russo, Es-panhol e Chinês), informando acerca da situação, solicitando que aguarde um pouco, ou caso prefira, deixe o contacto para que o técnico possa contactar mal esteja disponível. E ainda, existe um cartão que pergunta se aceita que entremos em contacto com a linha de tradução simultânea. Nestes casos, bastará mostrar os cartões aos utentes.

o utente não deve esperar mais de quinze minutos para ser atendido; contudo, se tal não for possível, deve ser explicada ao utente a razão para a demora, solicitando-se a sua compreensão;

na zona de espera, o utente deve ter uma cadeira ou sofá onde se acomodar, bem como revistas e/ou jornais;

os utentes devem ser atendidos por ordem de chegada, salvo aqueles que tiverem previamente solicitado atendimento a determinada hora; deve contudo dar-se prioridade às pessoas idosas, com deficiência, aos que manifestarem sinais de se encontrarem em situação de crise, abaixo abordada, e aos que apresentarem sequelas físicas que se possam considerar constrangedoras diante de outros utentes que esperam;

no espaço reservado ao atendimento, deve convidar-se o utente a sentar-se no lugar mais confortável;

se o utente manifestar sinais de estar a vivenciar uma situação de crise, como chorar e/ou tremer, deve-se oferecer-lhe lenços de papel e um copo de água com açúcar; se desejar fumar, deve-se oferecer-lhe um cin-zeiro;

Page 28: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

28

não se deve conversar de pé com o utente quando este estiver sentado;

se o utente trouxer consigo crianças, deve solicitar-se a outro técnico que cuide delas durante o atendimento, de preferência noutro espaço do GAV, onde possam brincar com brinquedos e jogos apropriados;

deve acompanhar-se o utente à saída do GAV.

No atendimento presencial, deve estabelecer-se entre o TAV e o utente que solicita apoio um processo de comunicação e empatia, em que este comunica primeiramente como emissor e o primeiro deve, enquanto receptor, assegurar uma boa recepção e compreensão.

Neste processo, numa necessária interacção, ambos alternam papéis de emissor e receptor, estabelecendo por isto uma relação da qual deverá resultar o apoio e/ou o encaminhamento necessários ao utente para que se autonomize das suas próprias problemáticas.

Algumas técnicas há, pois, a apresentar para que o técnico possa estabelecer esta comunicação, sendo que, em primeiro lugar, compete-lhe apresentar-se como Técnico de Apoio à Vítima: este é sempre o primeiro pas-so a dar no início do atendimento, devendo estar perfeitamente interiorizado pelo TAV.

4.2.3. Comunicação verbal

ouvirDurante o discurso do utente, o técnico deve:

prestar atenção como ouvinte, recebendo a mensagem que este emite verbalmente e apreendendo os seus conteúdos, tanto racionais, como emocionais;

responder não-verbalmente, mostrando ao ouvinte que está a prestar atenção ao seu discurso, através do uso de sinais, como sejam manter os olhos fixos nos seus, acenar com a cabeça ou utilizar interjeições;

não interromper o utente, de modo a não tirar conclusões prematuras sobre o que este está a dizer.

reformularO técnico deve expor os conteúdos emitidos pelo utente no seu discurso, de modo a certificar-se de os ter apreendido adequadamente, podendo também fazer uso de exemplos simples que os expliquem em concre-to. Isto é importante também para que o utente se certifique de que está a ser ouvido com atenção, o que o encoraja a continuar.

Page 29: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

29

questionarO técnico deve questionar o utente sempre que este não tenha emitido toda a informação necessária ao pro-cesso de apoio e/ou ao encaminhamento, ou quando a informação tenha sido contraditória ou menos clara.

Para tal, pode utilizar questões abertas, que geralmente implicam conteúdos mais ou menos vastos e/ou complexos ou que en-volvem abstracção e cujas respostas não serão simples e/ou curtas, como Que receio tem de ir a Tribunal?, Como se sente agora? ou O que o preocupa?;

questões fechadas, que geralmente implicam conteúdos simples e cujas respostas são simples e curtas, como A que horas é o julgamento?, Como se chama? ou Qual a sua idade?.

Contudo, o TAV deve ter especial cuidado em evitar que o utente se sinta interrogado, pois tal pode levar à sua inibição ou à adopção de uma atitude defensiva. Para tal, deve promover um equilíbrio entre as questões abertas e as questões fechadas, o que facilitará a comunicação.

A questão Porquê? deve ser evitada, pois em determinados contextos da comunicação pode incutir no utente sentimentos de culpa.

encorajar a expressão de emoções e/ou sentimentosO TAV deve estar disponível para que o utente se expresse espontaneamente, auxiliando-o na libertação de emoções e/ou sentimentos, com expressões como Não se reprima, chorar é natural e pode fazer-lhe bem, esteja à vontade..., É natural que se sinta assim abalado..., Chorar não é motivo de vergonha... ou Desabafe, pode fazer-lhe bem.

O técnico deve encorajar a expressão de emoções e/ou sentimentos sobretudo quando o utente se encontrar em situação de crise. Contudo, o técnico não deve ter a iniciativa de sugerir ou impor que o utente expresse as suas emoções e/ou sentimentos se este não tiver manifestado vontade de o fazer, pois poderá ainda não estar preparado para tal.

informarO técnico deve informar o utente dos seus direitos, de como exercê-los, dos vários recursos de que pode dispor na comunidade e das diversas opções que pode tomar, abstendo-se contudo da emissão de juízos e opiniões pessoais, pois essa actuação pode incutir no utente uma ideia de submissão e de inexistência de autonomia de decisão. Não deve fornecer informação desnecessária, impraticável, irrealista ou incorrecta.

Page 30: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

30

Deve o técnico informar de um modo adequado e adaptado às características socioculturais do utente, de modo a que este compreenda correctamente, evitando também o uso de termos técnicos de emprego restrito. Deve ainda o técnico fornecer informações de um modo doseado, conforme a capacidade de assimilação manifestada pelo utente. resumirO técnico deve resumir todos os aspectos do discurso do utente e do seu próprio discurso, de modo a certi-ficar-se de que se compreenderam adequadamente. Resumir é igualmente um modo de colmatar falhas de informação de ambos, informação que, por esquecimento ou falta de oportunidade no contexto dos discursos, não foi referida.

4.2.4.Comunicação não verbal

O técnico deve estar atento à comunicação não-verbal, enquanto vector enriquecedor dos conteúdos verba-lizados, mas também transmissor per si de informação. Assim,

o técnico deve estar atento à linguagem corporal do utente, estabelecendo paralelismos com o discurso que este está a emitir: certos aspectos, como o gaguejo ou a voz vacilante, podem denunciar vontade de emitir informações que contudo aquele teme revelar. A linguagem corporal pode ainda ser reveladora de problemas do foro psiquiátrico - balançar-se compulsivamente, lacerar-se ou arranhar-se com algum objecto ou parecer visualizar e tocar entidades sobrenaturais – ou de um determinado estado emocional - fumar nervosamente ou tremer as mãos. Pode também revelar incoerência em relação ao que verbaliza: descrever um atropelamento muito violento de que foi vítima há poucos dias e não apresentar qualquer vestígio corporal, por exemplo; o técnico deve estar atento à sua linguagem corporal, não revelando sinais de impaciência ou ansiedade, como cruzar os braços, suspirar insistentemente ou olhar para o relógio, de modo a que o utente não sinta que não há disposição e/ou tempo para ser ouvido. Deve ainda adoptar uma atitude corporal serena e coe-rente com o discurso que emite, não assumindo posturas excessivamente descontraídas ou passivas ou que revelem permeabilidade excessiva aos dramas apresentados pelo utente, como chorar e tremer.

4.2.5 Atendimento telefónico

Ao telefone, o técnico deve ter especial cuidado, visto não estar diante do utente, tendo apenas como ins-trumento a sua voz e o discurso. Para além do que acima, em sede de atendimento presencial, ficou escrito acerca da comunicação verbal e que, na quase totalidade, tem aqui aplicação, há outros aspectos específicos que importa referir.

Page 31: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

31

Assim, o técnico deve:

atender imediatamente as chamadas telefónicas;

atender de modo gentil e assertivo: apresentar os serviços, seguido da saudação adequada: bom dia ou boa tarde;

se for necessário transferir internamente uma chamada, proceder com a maior brevidade possível. Se não for possível efectuar de imediato a transferência, explicar essa impossibilidade ao utente e perguntar-lhe se prefere ligar mais tarde;

se não houver nenhum técnico disponível para efectuar o atendimento, deve explicar-se esta indisponibilida-de ao utente e pedir-se o seu número de telefone, para que um técnico lhe possa telefonar mais tarde;

ter sempre junto do telefone a lista de contactos dos GAV e o dossier de recursos;

evitar interromper a conversação para falar com outra pessoa;

não mastigar ou comer durante a conversação;

evitar que se verifiquem interferências provocadas por ruídos nocivos ao atendimento, como conversas na mesma sala, música de fundo e/ou chamadas de telemóveis;

manter um discurso com construções frásicas simples e curtas;

manter a constância de um tom de voz sereno e claro;

lembrar-se de que o silêncio é sempre mal suportado pelo utente, pelo que é necessário, pelo tom de voz, mostrar-se disponível, isto é, estar “presente”;

colocar-se sempre ao dispor para ouvir a solicitação do utente interlocutor, com expressões convidativas, como queira dizer, por favor... ou se faz favor..., especialmente se este parecer hesitante na manifestação da solicitação;

reforçar tais expressões, com outras como não tenha receio, os nossos serviços são confidenciais..., se o interlocutor manifestar sinais - voz trémula e/ou choro - de se encontrar em situação de crise, tranquilizando-o de imediato e transmitindo-lhe confiança;

Page 32: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

32

evitar que o interlocutor repita várias vezes a sua solicitação: se no início da conversação o técnico inferir de imediato que não é a pessoa indicada para efectuar o atendimento, interromper o utente explicando-lhe que vai passar o telefone a outro técnico e transmitindo sucintamente a este o conteúdo da conversação até à interrupção;

ouvir atentamente e anotar as informações essenciais, transcrevendo depois os dados recolhidos para um boletim para processo de apoio;

sensibilizar e encaminhar o interlocutor, se este for vítima de crime, para o atendimento presencial, no qual a sua situação poderá ser mais adequadamente avaliada e como tal o apoio prestado será mais consentâneo com as suas necessidades: o técnico deve indicar a morada e o horário do gabinete, ou de outro geografica-mente mais próximo da área de residência da vítima;

terminar a chamada, perguntando ao interlocutor se deseja deixar o seu nome e contacto e apresentando-se, caso não o tenha feito no início da conversação;

agradecer e disponibilizar a APAV para futuros contactos, com expressões como muito obrigado por nos ter contactado, estaremos sempre ao dispor....

4.2.6. Atendimento por escrito

O utente pode dirigir-se à APAV por escrito - carta, fax ou correio electrónico -, o que, em princípio, implicará uma resposta pela mesma via, a não ser que o utente tenha sugerido que a resposta se faça por contacto telefónico. Estas missivas são recebidas pelo/a Gestor/a do GAV, que as encaminha para o técnico cuja competência seja a mais adequada face à problemática apresentada. Elaborada a resposta pelo técnico, o/a Gestor/a deve confirmá-la, mediante a junção de um ofício em que a apresenta ao utente.

As missivas devem ser respondidas no prazo de quinze dias após a sua recepção, dando-se prioridade às que abordam problemáticas que se afigurem mais urgentes.

Ao responder por escrito, o técnico, para além de respeitar as formalidades universalmente convencionadas para a correspondência, deve:

acusar a recepção da missiva enviada pelo utente, indicando a data do seu envio e/ou da sua chegada;

Page 33: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

33

se a problemática não for crime, referir o âmbito e a finalidade da APAV e encaminhar para os serviços com-petentes;

se a problemática apresentada pelo utente o indiciar como vítima de crime, reconhecer-lhe esse estatuto;

informar brevemente sobre os direitos da vítima e da forma de os exercer;

sensibilizar a vítima para o atendimento presencial na Unidade, ou para o GAV geograficamente mais próximo da sua residência, garantindo a cooperação e articulação;

agradecer ao utente o seu contacto;

assinar e identificar-se: nome e função na APAV (Técnico de Apoio à Vítima).

4.3. O Processo de Apoio à Vitima - Vítimas de Tráfico

O apoio a vítimas de crime, enquanto finalidade estatutária da APAV, concretiza-se no quotidiano do SUL através do contacto entre as vítimas e os TAV, seja presencialmente, por telefone e/ou missiva.

Este contacto pode limitar-se a um atendimento ou desenvolver-se em várias diligências, consoante as pro-blemáticas apresentadas pelo utente que solicita o apoio do SUL.

Todo o processo de apoio não pode fluir livremente sem ser regulado e planeado, nos casos específicos de tráfico de seres humanos todas as diligências têm que ser articuladas e avaliadas (atendimentos, cooperação interinstitucional, apoio nas questões sociais), em prol sempre da vítima.Isto é, não pode tratar-se de um conjunto de procedimentos soltos no tempo, o técnico deve-se preocupar por fazer um processo realmente seguro.

Um processo de apoio, pode desenvolver-se em quatro tipos de apoio, o primeiro (apoio emocional) de natu-reza não especializada, e os restantes de natureza especializada (jurídico, psicológico e social).

Page 34: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

34

4.3.1. O primeiro atendimento

O primeiro atendimento no âmbito do processo de apoio é uma entrevista – entre o técnico e a vítima de trá-fico. É de vital importância a forma como decorre o primeiro atendimento momento difícil, quer para a vítima quer para o técnico.

A entrevista à vítima, é muito importante, para o contacto inicial, bem como para o apoio continuado, pois ao ser compreendida por alguém, pode ser muito importante para a vítima na resolução dos seus sentimentos de medo, insegurança, culpa, vergonha, etc.

Estes medos e expectativas são trazidos para o primeiro atendimento e podem exercer alguma influência sobre o técnico, pelo que importa que sejam abordados de forma clara, para se poder iniciar o processo de apoio. Para além de responder a este tipo de percepções e de dúvidas da vítima, o técnico vai também experimentar as suas próprias ansiedades: receio de ser visto como incompetente, de fracassar no controlo da conversa, de não saber o que dizer, de o utente se mostrar pouco cooperativo ou hostil, de não conseguir responder adequadamente às necessidades do utente. De modo a que esta ansiedade inicial não afecte significativamente o primeiro atendimento, é essencial o técnico ter atenção a vários aspectos de modo a proporcionar um espaço de confiança para a vitima e para si mesmo.

4.3.2.Princípios orientadores da entrevista

Na entrevista com as vítimas de tráfico o técnico deverá assegurar, entre outros, os seguintes aspectos:

as condições físicas do espaço. O técnico deverá conhecer quanto possível o espaço físico da entrevista, proporcionar um espaço agradável (iluminação, estética, conforto, etc…). Será útil quer para a vítima quer para o técnico. Caso sejam atendimentos, fora do espaço do SUL-APAV, tentar conhecer previamente antes da entrevista.a privacidade.

O técnico deverá assegurar-se que o espaço onde decorrerá a entrevista as pessoas não são ouvidas e vistas por terceiros.a segurança e protecção da vítima. O técnico deve reconhecer que se trata de uma vítima de tráfico, identifi-car e compreender todos os indicadores de risco.apresentar-se .

O técnico deve apresentar-se pelo seu nome e função.ser autêntico. O técnico deve procurar ser autêntico, fiel, dentro das fronteiras do papel de técnico.

Page 35: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

35

princípio anonimato e confidencialidade. O técnico deverá assegurar o sigilo profissional, só fornecer informa-ções com o consentimento da vítima.assegurar o atendimento na sua língua. O técnico deverá assegurar às vítimas o atendimento na sua língua (caso não saiba falar a língua da vítima ou a vítima não tenha conhecimento da língua portuguesa), deverá assegurar a tradução.ser realista. O técnico não deve criar grandes expectativas nas vítimas. Isto é, não fazer grandes promessas, falar aber-tamente sobre os indicadores de risco, de forma que a decisão de colaborar no processo apoio seja de livre vontade.escuta activa. O técnico deve escutar activamente permitir à vítima os tempos de pausa ou de silêncio, intervir sobre eles quando lhe parecer estritamente necessário.

Consciencialização dos limites. O técnico como qualquer profissional tem os seus limites de conhecimento, deve evitar expressar verbalmente ou corporalmente estranheza e confusão, e encaminhar para outro técnico.

4.3.2.1. Fases da entrevista

No crime específico de tráfico de seres humanos, a vítima encontra-se cheia de medos que frequentemente é incutido por os próprios traficantes (medo da deportação, medo das autoridades, medo das represálias), sente-se totalmente desprotegida e insegura, como se estivesse ainda sob o controlo dos traficantes. Na grande maioria, não têm conhecimento do crime que está ser alvo, encontram-se frequentemente em situa-ção irregular desconhecem os seus direitos como vítimas de tráfico (julgam que não têm acesso a cuidados médicos, à justiça, apoios sociais), e ainda desconhecem o tipo de apoio fornecido pelas ONG (neste caso específico a APAV, através do projecto SUL).É um momento de avaliação mútua, é essencial que o técnico se focalize que a entrevista poderá ter várias fases dentro do processo de apoio:

prestação de apoio emocional. Na primeira entrevista é, porventura, o momento em que a vítima se apresenta numa situação emocional mais precária - em virtude da proximidade temporal da ocorrência traumática -, mo-mento no qual necessita de comunicar com alguém que saiba demonstrar compreensão e, mais do que isso, empatia perante a sua problemática; a qualidade deste apoio decorre fundamentalmente das competências pessoais de cada técnico, da assimilação e aplicação das regras de comunicação atrás vertidas bem como da experiência que for acumulando.

Page 36: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

36

fase da recolha dos indicadores. O técnico deve procurar recolher informação da vítima, visa sobretudo um conhecimento profundo sobre a história da vítima:

- identificação do crime específico dos indicadores de tráfico (aliciamento, meios, propósito) utilizando como instrumento o boletim de processo de apoio (ficha de atendimento da APAV), e o guião de sinalização (tem como objectivo apoiar na identificação das situações), para posteriormente procedermos à sinalização (sem-pre com o consentimento da vítima);

- recolha da história pré-vitimação e pessoal: técnico deve compreender se for o caso de uma vítima de na-cionalidade estrangeira ou portuguesa (os acontecimentos biográficos mais importantes, vivências no país de origem, contexto social, etc.);

- narração da vitimação: o técnico deve procurar compreender após a identificação dos indicadores de tráfico, a evolução e as dinâmicas de vitimação (importa recolher e explorar alguns dados) que nos permita começar a avaliar o grau de risco (detalhes acerca do tipo de meios utilizados, relação com o traficante (s), padrões de severidade e de frequência (isolamento, tipo de privações, violência perpetrada), identificação de sinais de alarme, a existência de factores de risco para si e para a sua família (represálias, tipo de ameaças, tipo de controlo, etc.)

Fase de avaliação e gestão do risco. Esta fase deverá ter início quando o técnico recolher toda a informação consistente para proceder a avaliação, e elaborar uma gestão das estratégias de intervenção a utilizar:

- definição de estratégias e objectivos de intervenção: nesta fase deve ser toda um planeamento da inter-venção, uma vez que já foram identificados e avaliados os indicadores de risco, deverá se projectar o futuro desejável para a vítima.É essencial nesta fase, informar detalhadamente a vítima dos seus direitos como vítima de tráfico (acima referido no manual), esclarecimento de dúvidas e respeitar sempre a decisão da vítima. Ou seja, todas as estratégias que serão realizadas serão com o consentimento da vítima- estabelecer um plano de segurança para que a vítima fique a salvo, ou que não se exponha a novas situa-ções de vitimação

fase de encaminhamento. A complexidade do fenómeno do tráfico de seres humanos leva a que o processo apoio não se reduza simplesmente a uma visão. Isto é, cada serviço reconheça as suas competências e limi-tes quanto aos apoios que a vítima necessita. É essencial que o técnico prossiga as suas estratégias de inter-venção em contacto com outras instituições, não reduzindo unicamente à própria unidade. Isto é, fundamental ter uma lista de contactos das instituições que trabalham directamente ou indirectamente com este fenómeno (IPSS, forças de autoridade, embaixadas, associações de imigrantes, etc.), para tal é necessário promover protocolos de cooperação estabelecendo parcerias informais e formais com as instituições.

Page 37: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

37

Quanto mais pormenorizada e útil for a informação recolhida, mais correcta será a avaliação da (s) problemá-tica (s) e o levantamento das necessidades ao nível jurídico, psicológico e social e, consequentemente, mais eficientes serão as estratégias de intervenção delineadas. Contudo, caso o discurso da vítima revele contra-dições, dúvidas ou omissão de informação importante, o técnico deve explorar outras fontes de informação (instituições), mediante prévia autorização da vítima.

O plano de intervenção deve ser estruturado conjuntamente, tendo sempre presente o pedido formulado. Este pedido no caso do crime de tráfico de seres humanos, não é, frequentemente, muito explícito, podendo even-tualmente ser solicitado apoio por parte da vítima não tendo conhecimento que está ser vítima deste crime, ou encaminhado por outra instituição por ex: embaixada canadiana que identificou o crime da cidadã como violência doméstica, isto é o pedido é concretizado de forma camuflada. Cabe ao técnico de apoio à vítima, proceder à decomposição, compreendendo o que está implícito.

4.3.3.Autonomia da vítima

O técnico tem de ir ao encontro das necessidades da pessoa com a qual está a trabalhar e nunca o oposto, ou seja, tem de identificar as necessidades mais urgentes e prioritárias na óptica da vítima, que podem ser divergentes das que o técnico colocaria em primeira linha.

Ao longo de todo o processo de apoio, as possíveis respostas às necessidades são sempre estudadas em conjunto com a vítima: cabe ao técnico construir e analisar com a vítima as várias alternativas de resolução dos problemas e informá-la, rigorosamente, dos seus direitos; por sua vez, cabe à vítima, enquanto sujeito activo, tomar as respectivas decisões. Só assim, o técnico respeitará os seus direitos e a sua dignidade e individualidade. É nisto que consiste, grosso modo, o princípio da autonomia da vítima. Porém, também o técnico tem, e deve fazer prevalecer em determinados casos, o seu direito à autonomia técnica. Esta questão coloca-se na medida em que podem surgir situações em que o técnico considere não dever seguir a vontade da vítima.

Exemplificando: se uma vítima de exploração sexual solicita apoio, apesar de não querer proceder à denuncia junto dos serviços estrangeiros ou Polícia Judiciária, o técnico tem de respeitar a decisão e apoiá-la.Porém, ter-se-á de imaginar o caso de um menor vítima de exploração laboral, não pretende igualmente que esta situação seja denunciada. Aqui sobrepõe-se o interesse superior do menor: a protecção deste tem um valor mais elevado.

Para que o princípio da autonomia seja de facto garantido, há que promover aquilo que se designa por con-sentimento informado, e cujos pressupostos são os seguintes:

a vítima deve estar na posse das capacidades necessárias para poder decidir;

Page 38: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

38

deve existir liberdade de decisão - a vítima não pode ser coagida ou forçada, competindo ao técnico avaliar o grau de liberdade de cada pessoa para determinada decisão;

a vítima deve ser informada sobre os seus direitos, alternativas possíveis e procedimentos a adoptar perante cada uma das alternativas, devendo esta informação ser fornecida de modo a que a vítima a compreenda na íntegra, tendo como tal em conta a sua capacidade de assimilação.

4.3.4. Intervenção na crise e intervenção continuada

A natureza do pedido e respectiva formulação podem estar condicionadas pelo momento que a vítima está a vivenciar, isto é, consoante se encontra ou não num período de crise. Neste sentido também a intervenção pode ser de dois tipos: na crise ou continuada. Imagine-se a situação de uma vítima de violência conjugal que decide sair de casa, por razões de segurança e por ser a única forma de começar a construir o novo projecto de vida que deseja. Numa fase de crise, o trabalho do técnico passa por procurar uma resposta imediata em termos de acolhimento, ao mesmo tempo que se promove um intenso apoio emocional e psicológico.

Contudo, este trabalho tem uma continuidade que muitas das vezes se desenrola durante um largo período de tempo, pois há que desenvolver esforços em diversas vertentes: processo de regularização, busca de alojamento, (re)inserção no mercado profissional (quando em idade activa), restabelecimento de laços rela-cionais e afectivos, ultrapassagem das consequências psicológicas da vitimação, participação em processos judiciais (processo crime, questões laborais, indemnização,etc.), entre outros aspectos.

Neste sentido, a intervenção, que pode começar a ser delineada logo no período de crise, não será de for-ma alguma um trabalho estanque e isolado. É, pelo contrário, um trabalho que encontra a sua continuidade no tempo e na transdisciplinaridade. Quer isto dizer, que, ainda que se compartimente a problemática nos diferentes tipos de apoio, em cada domínio do apoio à vítima, na prática este tem de ser um trabalho multi-disciplinar.

Exemplificando esta multidisciplinaridade num processo de apoio a uma vítima de exploração laboral: compe-te ao técnico da área jurídica informar a vítima acerca dos seus direitos; o papel do TAV da área de psicologia: compete: avaliar o impacto causado na vítima, enquanto o técnico da área social tem de avaliar as necessida-des e os recursos disponíveis à vítima tanto no âmbito de uma intervenção na crise como continuada.

Page 39: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

39

4.3.4.1. Intervenção na crise

A vítima de crime, e em especial de crime de Tráfico de Seres Humanos, sofre um acontecimento traumático, repentino, negativo e de alguma forma violento, que põe em causa a integridade física e/ou psicológica da vítima potenciando o surgimento de determinadas circunstâncias situacionais de crise.

Este estado da vítima deve ser tido em conta pelo técnico, pelo que cumpre enunciar os seus principais tra-ços. Assim, a situação de crise abarca as seguintes repercussões:

manifestação de reacções psicológicas: choro, pânico, confusão, angústia, vergonha, baixa auto-estima, cul-pa, revolta, perturbações psicossomáticas, predomínio de memórias das vivências traumáticas, entre outras;

manifestação de pressões sociais e económicas que propiciam o bloqueamento, associadas ao desconheci-mento dos seus direitos.

Estes dois traços definem aquilo que normalmente se designa por negatividade da situação de crise. Perante esta negatividade, o técnico deve, no contexto da sua relação com a vítima, centrar-se no desejo de mudança que esta circunstância também comporta, desejo que a vítima, durante este período de desequilíbrio, coloca nessa relação, para que possa ser apoiada. Deste modo, a situação de crise também se apresenta como um desafio: é a positividade da situação de crise, que o técnico deve explorar na intervenção junto da vítima.

Tendo em conta que a duração e a intensidade do período de crise dependem essencialmente de três factores – o grau da violência exercida sobre a vítima, a capacidade da própria para enfrentar o problema e o auxílio que recebe após o episódio traumático –, torna-se claro que o apoio prestado num momento de crise é crucial, exigindo-se uma intervenção imediata junto de uma população que se encontra altamente fragilizada.

Assim, este tipo de intervenção é destinado a pessoas às quais é necessário prestar um apoio rápido e eficaz, uma vez que se encontram submergidas por factores bastante stressantes e debilitantes da sua vida no mo-mento presente. É indicada para vítimas de tráfico, violência doméstica, violação ou abuso sexual, sobretudo quando a vitimação ocorreu há menos de 48 horas. Por ser um modelo de intervenção que pode ser aplicado a variados tipos de situações, esta abordagem deve obedecer às seguintes premissas gerais:

avaliação pronta e provisão de serviços à pessoa ou família em crise;

intervenção intensiva, focalizada e limitada no tempo, dirigida a problemas do aqui e do agora e a objectivos específicos;

um estilo activo e flexível.

Page 40: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

40

Neste tipo de intervenção, o técnico deve adoptar as seguintes estratégias:explorar as características do período crítico: neste período, a pessoa em crise responde mais facilmente à ajuda; o contacto inicial é o fundamental: os objectivos são os de ganhar confiança, estabelecer entendimento e identificar claramente os eventos recentes relevantes, sobretudo aqueles que levam a pessoa a procurar ajuda. Através de um inquérito minucioso acerca das últimas 48 horas obtém-se muita informação útil, que permitirá apontar para problemas chave. clarificar: é importante clarificar quais são as exigências a que pessoa tem de fazer face, incluindo obrigações práticas. Deve prestar-se atenção ao estado mental do utente: se existem ideias suicidas, qual o grau de ansiedade, de agitação e de angústia e, em particular, se a sua condição permite dar os passos cuja imple-mentação imediata se impõe. avaliar: avaliar o apoio da família ou dos amigos - rede de suporte primária - e a natureza da situação em casa do utente. Desta forma, é possível formar uma imagem completa do utente, não só do passado e do de-senvolvimento dos seus problemas, mas também de como este os resolveu anteriormente e da qualidade de recursos disponíveis. Esta avaliação poderá ter de esperar até que a desorganização e o desamparo, muitas vezes associado a um estado grave de descompensação, diminuam, ou até que seja possível efectuar um outro atendimento ao utente, numa situação emocional mais estável e compensada.

diminuir a activação e a angústia: é comum o utente encontrar-se numa situação extrema de activação e de angústia, pelo que se torna necessário utilizar meios psicológicos para os reduzir: passando o tempo e falan-do com o utente de uma forma segura e tranquilizante. reforçar a comunicação adequada: reforçar a conversa normal e relevante com o utente, prestando-lhe aten-ção e desencorajando o comportamento agitado, persistente ou não comunicativo.

mostrar interesse e calor e encorajar a esperança: o técnico deve transmitir ao utente que se interessa, está disposto a ouvir, é empático e estimula a esperança de uma resolução positiva, o que promove a autocon-fiança do utente.

Podem enumerar-se algumas tarefas importantes que o técnico, no âmbito da intervenção na crise, deve desenvolver:

empowerment: ajudar a vítima a encontrar as sua próprias potencialidades de resolução, reforçando as suas capacidades e poder de decisão;

validação dos direitos e das decisões da vítima: informá-la devidamente tanto sobre os procedimentos judi-ciais como sobre os constrangimentos de vária ordem que podem surgir; respeitar as decisões, mas ajudar a

Page 41: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

41

perceber as vantagens e desvantagens de cada uma;

optimização de todos os recursos existentes: desde os recursos materiais até aos recursos humanos, no sentido de possibilitar uma relação de proximidade;

ajuda à vítima na formulação de um plano de segurança pessoal que lhe permita lidar melhor com a violência;

apoio à vítima na reformulação do seu projecto de vida, a curto e a longo prazo.

A intervenção na crise comporta duas fases. Numa primeira fase da intervenção, o técnico deve reconhecer ao utente o estatuto de vítima, mostrando-se disponível para:escutar a sua versão dos factos e circunstâncias situacionais adjacentes ao crime;

respeitar as suas reacções psicológicas, valores, dificuldades, condições de vida e necessidades; facilitar-lhe a libertação de emoções e sentimentos negativos.

Numa segunda fase da intervenção é importante: contribuir para a tomada de consciência de que o estatuto de vítima representa uma forma de desgaste da auto-estima;

ter uma atitude positiva relativamente às potencialidades da vítima;

incentivar uma visão mais perspicaz e realista da sua condição.

Este abandono do estatuto de vítima, que corresponde à superação das reacções psicológicas manifestadas e do bloqueamento sentido, só poderá acontecer através da utilização de estratégias de auto-defesa pela vítima, utilização que o técnico apoiará.

Porém, e dadas as características específicas da vitimação, esta intervenção não é, as mais das vezes, sufi-ciente, sendo necessário assegurar um trabalho contínuo no sentido de colaborar com as vítimas de crime na reorganização do seu projecto de vida, visto este estar desestruturado. As duas fases – intervenção em crise e intervenção continuada – são, portanto, complementares.

Page 42: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

42

Page 43: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

43

V - APOIO ESPECIALIZADO

Reconhecendo as necessidades específicas da população imigrante, é prestado às vítimas de crime apoio especializado em três áreas:

Apoio Jurídico

Apoio Psicológico

Apoio Social

5.1. Apoio Jurídico

No apoio jurídico à vítima imigrantes e especialmente de Tráfico de Seres Humanos, o trabalho do TAV na área jurídica consiste em:

informar a vítima acerca dos seus direitos;

elucidar acerca das várias etapas de determinados processos judiciais;

auxiliar a vítima a elaborar requerimentos e peças processuais que ela possa, por si, assinar (isto é, quando não é necessário advogado), como sejam o pedido de apoio judiciário, a denúncia de crime, a queixa, o pe-dido de indemnização civil, o pedido de suspensão provisória do processo criminal ou, no caso de vítimas de crimes violentos ou de violência conjugal, o pedido de indemnização dirigido ao Ministro da Justiça.

Indemnização civil

Há a possibilidade de a vítima requerer indemnização Civil no âmbito do processo crime pendente, ao argui-do, (nos termos do artigo 71º e segs do Código de Processo Penal), por danos patrimoniais e morais sofridos.Nestas situações há um dever, por parte do Ministério Público e dos órgãos de polícia criminal, de informar os eventuais lesados da possibilidade de pedirem aquela indemnização, das formalidades a observar, do prazo a cumprir e das provas a apresentar.Só é obrigatória a representação por advogado se o valor da indemnização pedida exceder a alçada do tribu-nal de 1ª instância, ou seja, 5000 €. Quando a indemnização pretendida for inferior a este valor, pode o pró-prio lesado efectuar o pedido através de simples requerimento, que não está sujeito a formalidades especiais, podendo consistir em declaração em auto, com as indicações do prejuízo sofrido e das provas. Nestes casos poderá o TAV jurista auxiliar na sua elaboração.

Page 44: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

44

Caso não tenha sido feito este pedido nos termos dos artigos 72º e 77º, o tribunal em caso de condenação, pode arbitrar uma quantia a título de reparação pelos prejuízos sofridos quando particulares exigências de protecção da vítima o imponham (82º-A).

Indemnização pelo Estado

Subsidiariamente ao acima exposto, quando não for possível ressarcir a vítima nos termos do ponto anterior (porque não foi requerido em tempo útil, porque o arguido não tem forma de pagar o montante estipulado na sentença), ou quando não houver outra forma de reparação eficiente e eficaz, uma compensação poderá ser atribuída pelo Estado, nos termos da Lei n.º 140/2009 de 14 de Setembro.

Esta forma de compensação abrange os danos morais e patrimoniais resultantes de lesões corporais graves ou dano morte sofrido pelas vítimas.

Neste caso o TAV jurista deverá auxiliar na elaboração do requerimento que endereçado ao Ministro da Justi-ça, será enviado à Comissão de Protecção às Vítimas de Crimes Violentos, após assinatura do utente.

Ajudar no preenchimento do pedidoelaborar relatórios e informações auxiliares para os tribunais e outras instituições; acompanhar, caso seja necessário, o utente ao tribunal e às autoridades policiais

5.1.1.Protecção legal das vítimas de Tráfico de Seres Humanos

Nos processos judiciais, as vítimas de tráfico tem também o papel de testemunhas. Atendendo à estrutura das redes criminosas envolvidas e ao perigo a que estão exposta, estas vítimas necessitam de protecção.

Lei de Protecção de Testemunhas (Lei 93/99, de 14 de Julho)

Esta Lei regula a aplicação de medidas para a protecção de testemunhas em processo penal quando a sua vida, integridade física ou psíquica, liberdade ou bens patrimoniais de valor consideravelmente elevado se-jam postos em perigo no seguimento do seu contributo para a prova dos factos que constituem objecto do processo.

De entre as medidas passíveis de ser utilizadas, temos a possibilidade de ocultação de imagem, a distorção de voz (ou ambas), no seguimento de depoimento em acto processual público (no contraditório), bem como o recurso a teleconferência (igualmente nas modalidades anteriormente anunciadas). Para além destas, exis-

Page 45: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

45

tem ainda medidas que visam garantir a segurança pontual, como a indicação no processo de morada dife-rente da habitual, o transporte em viatura fornecida pelo Estado, a possibilidade de esperar em sala especial (eventualmente vigiada e com segurança), ter protecção policial.

No caso das testemunhas ou os seus familiares próximos se encontrem numa situação que cumulativamen-te se verifique perigo grave para a vida, a integridade física ou psíquica ou para a sua liberdade, quando o depoimento ou declarações versem sobres certos tipos de crimes1, e quando estas constituem um contributo que se presuma ou se tenha revelado essencial para a descoberta da verdade2 também poderão usufruir da mesma protecção.

Quando num determinado acto processual deva participar testemunha especialmente vulnerável (vulnera-bilidade essa resultante da sua diminuta ou avançada idade, do seu estado de saúde ou do facto de ter de depor contra pessoa da própria família ou de grupo social fechado em que esteja inserida numa situação de subordinação ou dependência), a autoridade judiciária competente deverá providenciar para que, indepen-dentemente da aplicação de outras medidas, tal acto decorra nas melhores condições possíveis, com vista a garantir a espontaneidade e a sinceridade das respostas:

durante o inquérito – o depoimento da testemunha especialmente vulnerável deve ter lugar o mais brevemen-te possível;

após o inquérito – o juiz que presida a acto processual público ou sujeito ao contraditório pode:

dirigir os trabalhos de modo a que a testemunha especialmente vulnerável nunca se encontre com certos intervenientes no mesmo acto;ouvir a testemunha com utilização de meios de ocultação ou de teleconferência;proceder à inquirição da testemunha, podendo, depois disso, os outros juízes, os jurados, o Ministério Públi-co, o defensor e os advogados das partes civis pedir-lhe a formulação de questões adicionais.

Logo que se aperceba da especial vulnerabilidade da testemunha, a autoridade deverá designar um técnico do serviço social ou outra pessoa especialmente habilitada para o seu acompanhamento e, se for caso disso, proporcionar à testemunha o apoio psicológico necessário por técnico especializado (por ex. técnico de apoio à vítima - voluntário ou não - da APAV).

1 Crimes previstos nos artigos 169º, 299º a 301º do C.P. e no 28º do D.L. nº 15/93 de 22 de Janeiro, ou crimes puníveis com pena de prisão igual ou superior a 8 anos.2 Emissão de novos documentos oficiais de identificação, alteração do aspecto fisiológico ou aparência do beneficiário, con-

cessão de nova habitação e transporte gratuito para esta, juntamente com a criação de condições para a sua subsistência ou subsidio

para o mesmo fim.

Page 46: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

46

Em qualquer fase do processo, o juiz, a requerimento do Ministério Público, pode determinar o afastamento da testemunha especialmente vulnerável da família ou do grupo social fechado em que se encontra inserida.

Para poder usufruir das formas de protecção que este diploma estipula, será necessário que haja uma de-monstração de factos que consubstanciem situações de intimidação ou elevado risco de intimidação da tes-temunha3.

Estatuto da Vítima de Tráfico (Lei n.º 23/2007 de 4 de Julho)

Por se encontrarem longe das redes sociais de apoio, as vítimas de tráfico de seres humanos estão em situ-ação de grande vulnerabilidade, tendo presente esta realidade, bem como a gravidade e perigosidade deste crime, o novo quadro legal relativo ao tráfico de seres humanos, veio definir o estatuto da vítima que prevê:

Concessão à vítima de um prazo de reflexão: Antes da emissão de uma autorização de residência, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras ou, o responsável pelo Plano Nacional contra o Tráfico de Seres Humanos dá à vítima um prazo de reflexão entre 30 e 60 dias, que lhe permita recuperar e escapar à influência dos autores das infracções em causa. Este período tem início a partir do momento em que a vítima manifesta a sua von-tade de colaborar com as autoridades com competência para a investigação do crime ou a partir do momento em que é sinalizada como vítima de tráfico.

Atribuição de autorização de residência: Mesmo que a vítima tenha entrado ilegalmente em território nacional, após o decurso do período de reflexão, pode ser concedida pelas autoridades uma autorização de residência, a cidadãos estrangeiros vítimas de tráfico de seres humanos, desde que:

Seja necessário prorrogar a permanência do interessado em território nacional, tendo em conta o interesse da sua presença no decurso da investigação;A vítima demonstre querer colaborar com as autoridades na investigação;A vítima tenha rompido relações com os presumíveis criminosos.

Os requisitos dos números 1 e 3 podem ser dispensados de acordo com condições estipuladas em legislação especial.

É ainda garantido às vítimas que não disponham de recursos suficientes para a sua subsistência, o acesso a tratamento médico urgente e adequado e assistência psicológica. A segurança, protecção, tradução, interpre-tação e assistência jurídica são igualmente direitos que assistem a estes cidadãos.

3 Intimidação enquanto toda a pressão ou ameaça, directa, indirecta ou potencial, exercida com o objectivo de condicionar o seu depoimento ou declarações (artigo 4º nº2 e 2º alínea b))

Page 47: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

47

No caso de serem menores, será sempre tido em consideração o superior interesse da criança, efectuando-se todas as diligências necessárias para identificar a criança ou jovem, determinar a sua nacionalidade e lo-calizar o mais rapidamente possível a sua família. Nestas situações, o prazo de reflexão pode ser prolongado e é garantido o acesso à educação

5.2. Apoio Psicológico

5.2.1. Apoio psicológico a vítimas imigrantes

O apoio psicológico a vítimas imigrantes, na sociedade contemporânea, onde a migração é um fenómeno corrente, é necessário conhecer acerca das reacções da vítima face ao crime, assim como do processo psi-cológico de adaptação e integração do migrante ao novo contexto social.

Ao planearmos o atendimento psicológico às vítimas imigrantes, temos imprescindivelmente que considerar a fase de adaptação e integração em que a pessoa se encontra. O conhecimento das etapas do processo de adaptação permite-nos inferir a origem do mau estar explícito, que pode ir para além da situação de vitimação e estar associado ao mau estar causado por este processo de adaptação.

O migrante sai do país de origem com a expectativa de um futuro mais promissor, mas ao chegar ao seu des-tino e depara-se também com a necessidade de fazer mudanças ao nível das motivações, das atitudes, da identidade individual e étnica para as quais não estava preparado dando-se assim aquilo a que se chama o “choque cultural”. Este termo foi introduzido para descrever a incomodidade física e emocional, que se traduz em sintomas físicos e psicológicos, ansiedade, depressão e pensamentos disfuncionais, solidão, desespero e angústia de separação. São estes os sentimentos que uma pessoa sofre quando vai viver numa sociedade diferente da de origem.

Os sintomas do choque cultural podem aparecer em diferentes momentos. Embora o choque cultural possa ser uma experiência dolorosa pode ser também uma oportunidade para redefinir os objectivos de vida. É uma grande oportunidade para aprender a integrar diferentes perspectivas, desenvolver a consciência de si próprio e estimular o crescimento pessoal.

Na literatura são descritas várias etapas do choque cultural. As etapas podem aparecer duma maneira contí-nua ou em momentos diferentes. A primeira etapa é a etapa de incubação. Nesta primeira etapa, o imigrante encontra-se em lua-de-mel está entusiasmado com tudo o que é novo. Pode encontrar-se eufórico com o novo ambiente e sentir-se afectado por todas as coisas novas que encontra.

Numa segunda etapa o imigrante pode encontrar alguns momentos difíceis e algumas crises próprias da vida

Page 48: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

48

quotidiana. Como por exemplo a dificuldade de comunicação e de aceitação pelas pessoas da nova cultura. Nesta etapa apresentam-se sentimentos de descontentamento, impaciência, raiva, tristeza, de incompetên-cia.

Isto acontece porque o indivíduo está a enfrentar uma nova cultura que é muito diferente da sua cultura de origem. Este é um processo de transição entre os valores próprios e os valores do novo país. Este processo de transição é difícil e moroso. Enquanto a pessoa não o completa encontra grandes sentimentos de insatis-fação.

Uma terceira etapa é a compreensão da nova cultura. É um período em que volta a ganhar o sentimento de prazer e o sentido do humor. A pessoa começa a sentir alguma estabilidade emocional e equilíbrio psicológi-co, está mais familiarizado com o ambiente e já possui um sentimento de pertença. Nesta fase inicia-se uma avaliação sobre as diferenças existentes entre os valores da sua cultura e os da nova.

Na quarta etapa, a pessoa já consegue aceitar que na nova cultura existem coisas positivas e negativas. Esta etapa pode ser uma etapa de dupla ou de tripla integração depen-dendo do número de culturas que o indivíduo está a assimilar no seu interior. Este processo de integração é acompanhado também por um sentimento de pertença mais sólido. A pessoa começa a estabelecer metas mais claras e a definir o seu destino no novo ambiente.

A quinta etapa está relacionada com o retorno ao país de origem. Esta é a chamada etapa do choque do retorno. Acontece quando o indivíduo regressa ao seu país de origem e verifica que as coisas não são iguais. Descobre que alguns dos novos costumes desenvolvidos não se conciliam com a cultura de origem.

Embora as etapas sejam distintas e se apresentem em diferentes momentos, cada pessoa tem a sua maneira de reagir ao choque cultural. Em consequência, algumas etapas serão mais largas e difíceis do que outras. Existem muitos factores que contribuem para a duração do efeito do choque cultural, nomeadamente a saúde mental, tipo de personalidade, experiências prévias, condições socioeconómicas, facilidade no entendimento de uma nova língua/linguagem, apoio familiar ou social, condições familiares, nível de educação, e outros.

No processo migratório as mudanças exigidas constituem um desafio á capacidade de adaptação do indiví-duo. Podendo segundo os seus recursos pessoais incitar o desenvolvimento da sua criatividade ou disfunção ao nível da personalidade.

Assim o técnico da área da psicologia, neste atendimento especializado às vítimas imigrantes, deve procurar, em conjunto com o indivíduo identificar e clarificar as condicionantes do sofrimento emocional vivenciado e pensar com a pessoa nas possíveis alternativas existentes para a resolução da problemática.

Page 49: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

49

5.2.2. Vítimas de tráfico – O Stresse pós Traumático

O stresse pós-traumático é experimentado por pessoas que viveram experiências traumáticas de extrema ameaça ou violência. A experiência (violação, assalto, rapto, etc.) pode afectar as pessoas de tal forma, que as próprias tornam-se incapazes de compreender a natureza do acontecimento.As vítimas que sofreram grandes abusos de tráfico (abusos sexuais, privação de liberdade, etc.), torna-se difícil de encaixarem esta experiência no sistema de valores do comportamento humano, isto é perdem a capacidade de racionalização sobre a experiência ocorrida, e muitas vezes entram no processo de negação.Este processo poderá acompanhar em geral os seguintes sintomas:

Apatia.

As vítimas poderão reagir de uma forma apática e passiva em relação à experiência traumática. Pode ser uma estratégia de protecção da própria vítima.Flashbacks.

As vítimas podem reviver novamente a experiência contra si, pode ser despertado por um ruído, som, cheiro, etc.Confusão mental.

As vítimas podem não ser capazes de descrever a experiência de forma coerente e detalhada.

Perda de controlo. As vítimas podem sofrer de perdas de memória, percepção, sentimentos e consciência.

A experiência traumática pode permanecer durante anos, como um factor psicológico que provoca medo, terror, pânico, ou desespero e se transformar em pesadelos e flashback.

As vítimas de tráfico, na sua grande maioria, estão expostas durante um grande período de tempo a deter-minados abusos, violência ou privacidade, as vítimas vão se adaptando criando mecanismos psicológicos de sobrevivência, tais como:

Evitamento. As vítimas farão tudo que esteja ao seu alcance para prevenir nova vitimação. Exemplificando: uma vítima de exploração sexual pode dedicar-se à actividade com um entusiasmo aparente para evitar por parte do trafi-cante novos abusos ou violência.Identificação com o traficante.

Page 50: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

50

O conhecido síndrome de Estocolmo, surge quando a vítima têm a percepção que não pode fugir, está com-pletamente isolada do resto do mundo, não tem qualquer tipo de apoio e de saída, o que acontece no crime de tráfico de seres humanos. A vítima adopta a postura do traficante, esta identificação poderá fazer com que a vítima não coopere e não queira ser apoiada. Em algumas situações poderá ocorrer que a própria vítima ofereça explicações não plausíveis quando a confrontam com a situação de tráfico. Exemplificando: situações em que as vítimas são exploradas no trabalho doméstico argumentam que o traficante até tem interesse na vítima ou auxiliou a sua entrada no mundo do trabalho ou no país. Este apoio aparente aumenta a confusão e falta de orientação da vítima.

Abandono. As vítimas muitas vezes identificam-se de tal forma com os traficantes, que acabam por abandonar as suas emoções, pensamentos e as suas personalidades. Estes comportamentos são mecanismos de sobrevivência para lidar com a situação de vitimação.

A recuperação de vítimas de tráfico é um processo complexo, exige tempo e apoio do técnico da área da psi-cologia, é essencial uma intervenção contínua para apoiar em todo o processo de reintegração social.

5.3. Apoio Social

O Serviço Social promove a solução de problemas sociais, que atingem a sociedade em geral e os indivíduos em particular, visando a mudança social. Para alcançar estes objectivos, baseia-se nos princípios dos direitos humanos e da justiça social.

Quer isto dizer que o trabalho social4 tem como objectivo central a defesa e a promoção de direitos humanos e de expressão social, pelo que rejeita, na sua prática, as lógicas assistencialistas e filantrópicas. A sua fi-nalidade é a promoção do bem-estar dos indivíduos, grupos e comunidades, identificando e dinamizando os recursos que satisfaçam as necessidades individuais, colectivas e nacionais na prossecução da justiça social.

O técnico deve concentrar-se no diagnóstico da situação relacional, social e institucional da pessoa, atenden-do às suas necessidades peculiares, de forma a tornar possível uma adequada articulação entre a vítima e as redes primária e secundária de suporte chamadas a intervir no processo de apoio. Com a mediação visa-se a obtenção de bens e serviços que permitam a autonomização da vítima, satisfazendo assim as necessidades sociais desencadeadas pela vitimação.

4 Na medida em que o apoio social na APAV é concretizado por técnicos com formação académica em diferentes áreas das ciências sociais, doravante usaremos as expressões trabalho social e trabalhador social, de forma a simplificar a linguagem escrita.

Page 51: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

51

5.3.1. Problemática específica

A situação torna-se mais complexa quando lidamos com populações que não têm rede social de apoio e se encontram numa grande carência económica, não tem qualquer conhecimento dos seus direitos e do funcio-namento da protecção social e do acesso à saúde.

No caso específico do crime de tráfico de seres humanos, através do estatuto de vítima apesar de se encon-trarem em situação irregular, têm direito a protecção social (acolhimento), podem recorrer ao serviço nacional de emergência social (existe em Portugal um centro de acolhimento para vítimas de tráfico), têm direito no acesso à saúde não unicamente nos casos de urgência, como sucede com os restantes imigrantes que se encontram em situação irregular e que não são vítimas deste crime.

Estas vítimas, na maioria das situações necessitem de uma total protecção, confidencialidade e abrigo (ne-cessitam de um espaço totalmente seguro), para tal existem um conjunto de procedimentos para colocar esta vítima em segurança (sempre com a vontade e consentimento da vítima):

Caso a vítima queira denunciar a situação (período de reflexão de 30 dias). Procedemos ao Guião de sina-lização (guião criado em Portugal para a identificação de situações de tráfico), isto é sinalizamos a situação às autoridades ou ao centro de acolhimento (existente em Portugal para as vítimas de tráfico), após esta sinalização inicia-se o processo de identificação pelas autoridades, se for identificada como vítima de tráfico, será automaticamente acolhida.

Em casos que a vítima não queira ser acolhida mesmo em situação irregular (avaliamos todos os indicadores risco), apoiamos igualmente.

Page 52: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

52

Page 53: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

53

VI - COOPERAÇÃO INTERINSTITUCIONAL

As parcerias que são construídas formalmente ou informalmente, com outras instituições e profissionais, são facilitadoras e produtivas a nível dos processos de apoio, bem como são uma forma de sensibilizar e prevenir o fenómeno do tráfico de seres humanos.A existência destes protocolos de parcerias poderá actuar positivamente sobre determinados problemas que afectam diariamente, as instituições:formalidade.

O técnico deve esforçar-se para diminuir os efeitos negativos de uma excessiva formalidade com outras ins-tituições (excesso de burocracias) exemplificando: A possibilidade da não exigência em muitas situações de relatório para começar a agirsentido prático.

O técnico deve esforçar-se para ter uma visão prática no contacto com as instituições (em especial neste crime).visão global.

O técnico deve esforçar-se para evitar a falta de visão global sobre um processo de apoio, deve evitar uma visão redutora. Deve considerar importante a participação activa de outras instituições exemplificando: A parceria informal que foi construída entre a APAV e os Serviços estrangeiros e Fronteiras sempre que existe uma situação de tráfico identificada (SEF) encaminham para ser atendida por um técnico de apoio à vítima.

Esta cooperação coordenada entre instituições vai reduzir bastante os riscos de vitimação secundária.

6.1. Vitimação secundária

As vítimas após a experiencia traumática (crime) sentem-se desorientadas, fragilizadas emocionalmente, com vergonha, medo, sentimento de culpa, etc.

A este tipo de vitimação designamos por primária: Causada pelo agressor enquanto consequência directa do crime. Este tipo de vitimação poderá existir em várias fases: durante o crime, imediatamente após o crime, e nos dias seguintes ao crime.

Page 54: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

54

A vítima imediatamente após o crime confronta-se com a necessidade de recorrer a serviços: sistema de saúde, sistema judicial, sistema social, educativo, a sociedade civil, etc. Nesta situação, a forma como os serviços atendem a vítima poderá ter consequências, chamando-se a um atendimento que não considere que a pessoa é vítima de um crime, vitimação secundária.

Poderá então haver uma dualidade vitimológica, para além de ser vítima do crime, é igualmente vítima por parte da sociedade, instituições e profissionais, etc., (vitimação secundária). Este tipo de vitimação é causado pelas instituições:

Discrepância entre as necessidades das vítimas e os objectivos das instituições. Exemplificando: Uma vítima de tráfico que colabora com as autoridades, é essencial não a colocar sob pressão devido às investigações.

Quase inexistência colaboração interinstitucional. Os profissionais por vezes “fecham-se” nos seus próprios conhecimentos e instituições, não zelando pelos interesses das vítimas.

Exemplificando: O tráfico de seres humanos é um fenómeno muito complexo, é essencial a articulação de instituições de diferentes áreas para se fornecer à vítima um apoio qualificado.Falta ou inadequação de espaços físicos para realizar um atendimento à vítima. É essencial existir um espaço (sala atendimento) por questões de confidencialidade e anonimato.Para prevenir este tipo de vitimação, causada por as instituições, é essencial apostar na área da prevenção visando os seguintes aspectos:

Reconhecimento das potencialidades, dificuldades e necessidades de cada instituição

Definir a política de intervenção

Promover formação inicial e continua aos profissionais

Promover uma verdadeira política de parceria.

Outro tipo de vitimação secundária, poderão ser os causadores os profissionais:

Juízos de valor por parte das instituições. Exemplificando: Uma mulher brasileira vítima de exploração sexual quando narra a sua história pessoal o profissional argumentar a sua ingenuidade por ter aceite a oferta, ou discriminar pela sua nacionalidade.

Gentileza e acolhimento da vítima. Não demonstrar qualquer tipo de empatia com a vítima, e de regras de educação.

Page 55: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

55

Gestão emocional. Os profissionais que se descontrolam emocionalmente, não conseguem adoptar uma postura profissional.

Insuficiência ou erros fornecidos acerca dos direitos da vítima. Os profissionais que não reconhecem os seus limites e área de intervenção, dificuldade de trabalho em equipa e de cooperação com os colegas.

Confidencialidade. Os profissionais que não adoptam uma postura de anonimato e confidencialidade sobre as vítimas. Exemplificando: Um profissional que é contactado pela comunicação social sem o consentimento da vítima fornece os dados de identificação, imagem e história pessoal.

Para prevenir este tipo de situações é essencial que os profissionais que trabalhem directamente ou indirec-tamente na área da vitimação:

invistam na formação inicial e contínua

constituição de equipas multidisciplinares

desenvolvimento de competências pessoais

apoio psicológico individual ou em grupo

Os profissionais e as próprias instituições devem adoptar uma postura ponderada quando afinal se tratam de pessoas que foram na sua grande maioria violados muitos dos direitos humanos, como são os casos das vítimas de tráfico de seres humanos.

Page 56: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

56

Page 57: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

57

VII – CASOS PRÁTICOS

Caso I

A N. no ano de 2009, conheceu no país de origem (Bulgária) uma pessoa que a convidou para vir trabalhar em Portugal, como ajudante de cozinha de um restaurante. A N. veio para Portugal para melhorar a sua vida a nível económico, acreditando tratar-se de uma oferta irrecusável, aceitou de imediato o convite por parte do conhecido.

A N. veio para Portugal de autocarro (durante 2 dias), ficou a residir em casa do conhecido que ofereceu apoio, iniciou o trabalho no restaurante como tinha sido combinado inicialmente nos primeiros dias. Pouco depois da sua chegada, aproximadamente quinze dias o conhecido começou a marcar-lhe encontros com vários homens, a N. quando começou aperceber-se da real intenção do conhecido, que a tinha aliciado para vir para Portugal, entrou em desespero.

Um dia, em um dos encontros um possível cliente de nacionalidade portuguesa ao ver a sua situação, dis-pôs-se a apoiar, pois não conhecia ninguém, e nem sequer falava português. Através dele, a N. tomou co-nhecimento que o conhecido tinha contactos com outros indivíduos em Lisboa e em Espanha (para futuros encontros).

A N. foi ainda ameaçada por parte do conhecido, retirou-lhe o dinheiro que tinha juntado para vir para Portu-gal, e tinha em sua posse os documentos da utente.Aproveitei uma oportunidade com o apoio do cliente, dirigiu-se à PSP para denunciar a situação e solicitar apoio para regressar ao país de origem.

A N. foi encaminhada para o SUL, que se encontrava em situação de crise, foi contactada no sentido de pon-derar as soluções mais adequadas face a esta situação.Assim, a utente como necessitava de uma resposta automática (estava em crise), procuramos acolher numa casa de acolhimento na região Algarve (para aquela noite).Contactamos a linha SOS imigrante (uma vez que a utente não falava português), não tínhamos nenhum técnico que falasse a mesma língua, para nos apoiar na tradução. Prestamos apoio emocional, informamos a utente acerca do crime que estava a ser vítima (tráfico de seres humanos), e do estatuto de vítima para este tipo de situações (apesar de estar em situação irregular).

Com o consentimento da vítima (procedemos à sinalização da situação – Guião de sinalização para casa de acolhimento e protecção de vítimas de tráfico), qual a utente foi identificada como vítima de tráfico.Enquanto não foi realizado o transporte da vítima (permaneceu um dia e uma noite protegida num centro de acolhimento na região Algarve), prestando-lhe apoio psicológico pontual, apoio social (alimentação).

Page 58: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

58

No dia seguinte, em articulação com a Cruz Vermelha (Linha de Emergência Social) foi transportada por um dos técnicos e com acompanhamento de um policial e marcado com as forças de autoridade do Norte e técni-cos da casa de acolhimento e protecção de mulheres vítimas de tráfico ( a vítima ficou protegida e acolhida).

Caso II

A L., de nacionalidade brasileira, foi encaminhada para o SUL pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, sen-do alvo de tráfico humano para fins de exploração laboral “ escravatura doméstica”.L. residia numa zona rural do Brasil tinha uma filha menor (entregue aos cuidados da sua madrinha), essa madrinha aliciou-a vir trabalhar para Portugal, que seria bom para ela iria melhor a sua condição de vida. Pro-meteu-lhe um trabalho em casa da sua filha como ama, esta é casada com o cidadão de nacionalidade alemã.

A filha entrou em contacto com a utente prometendo-lhe óptimas condições (oferecia a carta de condução, um dia de folga, rendimento mensal razoável).A L. ficou fascinada com as condições decidiu viajar para Portugal, a filha da madrinha pagou-lhe a passagem para Portugal e afirmou que lhe trataria de todo o seu processo de regularização.

Após uns dias, a patroa solicitou-lhe o passaporte (afirmando que era para tratar da sua situação), iniciaram-se os primeiros maus-tratos psicológicos (ameaças, injúrias), nunca a deixavam sair de casa (controlavam totalmente a sua vida), só saia na companhia da patroa para ir às compras ao mercado.Ainda, nunca lhe pagaram como tinham prometido mensalmente, argumentando que era pagar a sua viagem, nunca a deixaram contactar com a madrinha (mãe da patroa) para ter informações sobre o filho.Para além desta situação, o marido da patroa mais que uma vez abusou da utente (forçou-a ter relações sexuais) e ameaças frequentes.Passado aproximadamente 8 meses de se encontrar em Portugal, a patroa expulsou-a de casa (argumentan-do que a utente insinuava-se para o marido), não lhe devolveu o passaporte e documentação.

A L. encontrava-se muito amedrontada (não tinha documentação), com receio das autoridades, sem qualquer tipo de rede social em Portugal. Nesses dias, realizou vários contactos, um casal de nacionalidade brasileira acolheu – a em casa, e acompanhou até ao SEF para solicitar apoio.Face a esta situação, informamos acerca dos seus direitos estatuto de vítima de tráfico, que o estatuto lhe concedia o período de reflexão para decidir se queria colaborar com as autoridades. Caso colaborasse, seria lhe concedido uma autorização de residência.

Devido ao estado de fragilidade em que a utente se encontrava, o apoio psicológico foi proposto e aceite.Propusemos à utente apoio social a nível do acolhimento, qual não foi aceite uma vez que preferiu ficar aco-lhida em casa do casal brasileiro.

Page 59: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

59

Caso III

X., cidadã marroquina veio para Portugal trabalhar para as estufas, residia em casa de pessoas conhecidas do seu país de origem.

Contactou telefonicamente solicitando o apoio da APAV -SUL referindo que necessitava de apoio para a sua situação de regularização. Agendamos com a utente um atendimento presencial, no âmbito do atendimento através da entrevista, averiguamos que poderia existir exploração laboral.A utente não sabia localizar o local de trabalho, era transportada por o patrão juntamente com colegas numa carrinha (não sabiam o percurso), trabalhava cerca de 10h, o rendimento auferido era muito inferior ao ren-dimento mínimo nacional. A utente relatou que entidade patronal tinha em sua posse os documentos para celebrar o contrato de trabalho (até à data não tinha contrato).

Falámos acerca da situação de exploração laboral, podendo denunciar às autoridades para efeito de procedi-mento criminal, e podendo igualmente denunciar às Autoridades para Condições de Trabalho (ACT). A utente não pretendia no momento denunciar a situação.Prestamos apoio jurídico, deixando em aberto a hipótese de auxiliar na elaboração da denúncia, e articulamos com o Centro Nacional de Apoio ao Imigrante (CNAI) para informações acerca da situação de regularização.

Page 60: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

60

Page 61: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

61

VIII - CONTACTOS ÚTEIS

Associação Portuguesa de Apoio à VítimaRua José Estêvão, 135-A, piso 11150-201 LisboaNúmero único: 707 20 00 77Página internet: http://www.apav.ptCorreio electrónico: [email protected]ário: 10h00 às 13h00 e das 14h00 às 17h00

Alto comissariado para a imigração e Diálogo Intercultural (ACIDI)Centro Nacional de Apoio ao Imigrante Lisboa (CNAI)Rua Álvaro Coutinho, 141150-025 LisboaTelefone: 21 810 61 00 Fax: 21 810 61 17Página internet: http://www.acidi.gov.ptCorreio electrónico: [email protected]ário: 2ª a 6ª das 08h30 às 18h30

Centro Nacional de Apoio ao Imigrante Porto (CNAI)Rua do Pinheiro, 94050-484 PortoTelefone: 22 207 38 10Fax: 22 207 38 17Correio electrónico: [email protected]ário: 2ª a 6ª das 08h30 às 16h30 Sábado das 09h00 às 13h00

Centro Nacional de Apoio ao Imigrante Faro (CNAI)Loja do cidadãoMercado Municipal, 1º pisoLargo Dr. Francisco Sá Carneiro,8000-151 FaroCorreio electrónico: [email protected]ário: 2ª a 6ª das 08h30 às 19h00 Sábado das 09h00 às 13h00

Linha SOS ImigranteTelefone: 808 257 257 (a partir da rede fixa)Telefone: 21 810 61 91 (a partir da rede móvel)Horário: 2ª a 6ª das 08h30 às 20h30

Centros Locais de Apoio à Integração de imigrantes (CLAII)(procurar mais próximo da área de residência)Página da internet: http://www.acidi.gov.pt

Serviços Estrangeiros e Fronteiras (SEF)Rua Conselheiro José Silvestre Ribeiro, 41649-007 LisboaTelefone: 21 711 5000Fax: 21 714 332 Página da internet: http://www.sef.ptCorreio electrónico: [email protected](O SEF tem delegações espalhadas por todo o país)

Page 62: manual SUL manual apoio à vítima imigrante - APAV PTapav.pt/sul/manual_SUL.pdf · Fases da entrevista 35 4.3.3.Autonomia da vítima 37 4.3.4. Intervenção na crise e intervenção

62

Instituto de Solidariedade e Segurança SocialRua Rosa Araújo, 431250-194 LisboaTelefone: 21 310 2000Fax: 21 313 11 02Página da internet: http://www.seg-social.ptCorreio electrónico: [email protected]

Linha Nacional de Emergência Social (LNES)Telefone: 144Horário: Todos os dias 24h

Instituto de Desenvolvimento e Inspecção das Condições de TrabalhoRua Barata Salgueiro, 37, 5.º1250 - 42 LISBOATelefone: 21 316 3210Fax: 21 316 3249Página internet: http://www.idict.gov.ptCorreio electrónico: [email protected](existem cerca de 30 Delegações e sub-delegações espalhadas por todo o pais)

Conselho Português para os RefugiadosAv. Vergílio Ferreira, Lote 764, Loja D 1950-309 LisboaTelefone: 21 831 43 72Fax: 21 837 50 72Página internet: http://www.cpr.ptCorreio electróncio: [email protected]

União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR)Rua de S. Lázaro, nº 111,1º1150-330 LisboaTelefone: 21 8873 005Fax: 21 888 4086Página internet: http://www.umarfeminismos.orgCorreio electrónico: [email protected] Associação de Mulheres contra a ViolênciaTelefone: 21 380 21 60Fax: 21 380 21 68Correio electrónico: [email protected]

APF – Associação para o Planeamento FamiliarCentro de Acolhimento temporário para vítimas de tráfico Telefone: 96 460 82 88Página internet: http://www.apf.ptCorreio electrónico: [email protected]

projecto SUL Rua José Pires Padinha nº44, esc. 7

8800 TaviraTelf. 281 325 763 Fax: 281 325763