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Luzes lusitanas: Mendes Corrêa (1888-1960) e a construção de uma ciência colonial
Marcus Vinicius de Oliveira1
Resumo: António Augusto Mendes Corrêa (1888-1960) teve importante papel na constituição
da Antropologia portuguesa, sendo premiado em diversos países por seus trabalhos e
reconhecido nacionalmente por suas pesquisas. Sua proposta de Antropologia Física
constituiu uma escola em Portugal, a chamada “Escola do Porto” como o próprio designava, a
qual teve patrocínio e prestígio a partir da articulação política de Mendes Corrêa, ainda mais
quando identificamos a sua participação e destaque em instituições de pesquisas (como a
Academia Portuguesa da História e a Junta das Missões Geográficas e Investigações
Coloniais), além da Câmara Municipal do Porto. Esta posição favorecia tanto a sua captação
de recursos para o desenvolvimento de trabalhos nas coloniais portuguesas, como também
contribuía para a sua hegemonia dentro do campo em construção principalmente quando
identificamos sua relação com o regime salazarista e sua atuação para diminuir outros
trabalhos que almejavam um grau de cientificidade também. Logo, a comunicação se propõe
retomar a trajetória intelectual e política deste antropólogo identificando como sua ação
contribuiu para a formação de uma ciência capaz e disponível para o controle e projetos
coloniais capazes de possibilitar a “revalorização das colônias”, assim como sua utilização
pelo recém-instaurado Estado Novo português nos anos 1930 e 1940.
Palavras-chaves: Mendes Corrêa. Ciência colonial. Estado Novo. Intelectual. Trajetória.
Abstract: António Augusto Mendes Corrêa (1888-1960) played an important role in the
constitution of Portuguese Anthropology, being awarded in several countries for his work and
recognized nationally for his research. His proposal of Physical Anthropology constituted a
school in Portugal, a so-called "Escola Antropológica do Porto" as the design itself, a
qualification and a prestige from the political articulation of Mendes Corrêa, even more when
he identifies his participation and prominence in research institutions (as the “Academia
Portuguesa da História” and “Junta das Missões Geográficas e Investigações Coloniais”), as
well as the Porto City Council. This position favors its fundraising for the development of
works in the Portuguese colonies, as well as contributions to its hegemony within the field
under construction mainly when we identify its relation with the Salazar regime and its
1 Mestrando em História Social pela Universidade Federal Fluminense. E-mail: [email protected]
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updating to diminish other works that aimed for a degree of scientificity as well. Therefore,
the communication is a proposal for a training and a platform for a formation capable of
obtaining a "revaluation of the colonies", as well as its use by the new established Estado
Novo Portuguese in the years 1930 and 1940.
Keywords: Mendes Corrêa. Colonial Science. Estado Novo. Intellectual. Trajectory.
“(…) a Ciência Social suscita hoje no mundo civilizado investigações numerosas e
importantes. Os ingleses (…) possuem nas suas colónias um corpo de investigadores
oficiais, que chamam ‘colonial social scientists’ (cientistas sociais coloniais), como
possuem antropologistas do governo. Numerosas organizações existem em vários
países para o estudo da matéria. Encara-se entre nós a formação de investigadores da
disciplina em questão. Ainda bem. É necessário substituir à intuição, ao palpite, à
improvisação, à fantasia, a iniciativas isoladas e sem continuidade, a tarefa
sistemática, metódica, contínua, integral, em suma verdadeiramente científica2”
(Mendes Corrêa)
1. Introdução
Em 1934, ocorria na cidade do Porto, em Portugal, um grande evento que se propôs a
reconstruir a vida nas colônias portuguesas a partir da vinda de diversas pessoas das colônias
para viverem semelhante ao ambiente colonial, inclusive usando seus “trajes típicos” e
vivendo em “habitações características” de suas localidades. Este acontecimento teve uma
grande divulgação na imprensa portuguesa e nos convites endereçados a diversas nações
anunciando que durantes os meses de junho a setembro, Portugal iria realizar um grande
evento em sua segunda maior cidade. Assim sendo, angariar público e curiosos para aquele
momento era necessário e fundamental para o recém-instaurado Estado Novo3.
Todo esse cenário público organizado pelo regime salazarista buscou demonstrar “não
só os resultados brilhantes do seu esforço e atividade modernos, como também os seus
métodos coloniais originalíssimos, reorganizados e valorizados por uma Política de
ressurgimento nacional”4. Este funcionaria como um primeiro momento de propaganda para o
novo governo e a sua demonstração pública tanto em âmbito nacional, quanto internacional de
seu “ressurgimento” e sua “grandeza” dentro do cenário europeu, como também,
2 CORRÊA, A. A. Mendes. Sociedades secretas africanas e ciência social. In: Boletim da Sociedade de
Geografia de Lisboa, 72.ª série, n.° 4-6, Sociedade de Geografia de Lisboa: Lisboa, 1954. Pág. 232. 3 Com a ascensão de António Salazar ao poder em 1933, o governo se autoproclama como Estado Novo,
buscando, desse modo, construir uma ideia de um governo novo e diferente da I República Portuguesa (1910-
1926) e a Ditadura Militar (1926-1933) anteriormente instauradas. 4 Convite da Primeira Exposição Colonial Portuguesa de 1934.
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principalmente dentro das nações colonialistas que, semelhante a Portugal, realizaram
diversos eventos coloniais como aquele.
Essa exposição não apenas tentou recriar os espaços coloniais para demonstrar à
população portuguesa o “esforço colonial”, mas também permitiu construir uma narrativa
pública do que seria a própria experiência colonial portuguesa pelas lentes do regime de
Salazar e como ela estaria inserida no cenário de recuperação das políticas coloniais que o
período liberal não teria colocado em prática5. Além disso, proporcionou uma demonstração
para a população metropolitana que nunca havia pisado nas colônias como seria
“verdadeiramente” a vida colonial, a contribuição portuguesa para o “desenvolvimento”
daquele povo e território, além de contribuir para uma defesa da presença lusitana nos
territórios coloniais.
Enquanto esse evento público ocorria e agitava a cidade do Porto, outro evento
paralelo ocorria com diversos pesquisadores: o I Congresso Nacional de Antropologia
Colonial. Tal qual a I Exposição Colonial, o Congresso teve a contribuição e atuação em prol
de sua realização do importante antropólogo português António Augusto Mendes Corrêa
(1888-1960), o objeto de análise desse trabalho.
Mendes Corrêa caracterizaria o seminário em questão como o local onde os
antropólogos físicos buscariam colocar a pesquisa científica a serviço da “revalorização das
colônias”6. Como também, apontava para a importância do investimento em uma Ciência
capaz de contribuir para os objetivos defendidos pelos organizadores da Exposição Colonial,
além de estar totalmente disponível para a coleta de informações fundamentais para a
proposição de uma nova política colonial, a qual possibilitaria a incorporação de Portugal no
cenário científico internacional no mesmo patamar de França e Inglaterra, outras nações
coloniais e inspiração destes políticos.
Deste modo, Mendes Corrêa encaminhava sugestões e direcionamentos de uma
Ciência capaz de pôr em prática os desejos daquele grupo, como também sinalizava para os
ganhos possíveis a partir do financiamento dos seus estudos e pesquisas nos territórios
coloniais. Este não trariam apenas ganhos científicos, mas também políticos e econômicos
para o novo governo. Logo, esta Ciência prestaria um serviço social para o regime que não se
restringiria ao meio científico, mas poderia contribuir para o desenvolvimento de políticas de
5 O Estado Novo se apresenta com forte crítica ao "Século negro" do Liberalismo em Portugal, o qual se reporta
ao período de vitória de D. Pedro IV e a ascensão do Regime (1833-1933). Foi neste período que a alma e
essência portuguesa foi perdida, a qual a ascensão de António Salazar buscaria recuperar. 6CORRÊA, A. A. Mendes. Discurso inaugural do Primeiro Congresso Nacional de Antropologia Colonial. In:
Trabalhos do 1.° Congresso Nacional de Antropologia Colonial. Porto. Setembro de 1934, vol. I, Tipografia
Leitão, Porto, 1935.
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interesses do governo colonial. Esta relação entre a ciência defendida e exposta no
posicionamento de Mendes Corrêa e a sua utilização por um governo colonial foi analisada
por Raewyn Connell quando a autora observa a construção do cânone nas Ciências Sociais e
as principais discussões que esta realizava no período de construção e consolidação.
Para a autora, as Ciências Sociais em sua constituição enquanto uma ciência do século
XIX, integrada aos parâmetros e referências utilizados para a definição de uma ciência (razão
e método) desse período, não estava tão preocupada com questões referentes às mudanças
ocorridas nos países industrializados daquele século, mas sim com as questões referente aos
seus domínios coloniais. Portanto, argumenta que esta ciência teria sido formada dentro de
uma cultura imperial que condicionou as primeiras produções científicas e orientou os
trabalhos daqueles responsáveis pela constituição do campo científico naquelas localidades,
incorporando-os como uma resposta intelectual para a situação colonial.7
Para permitir tal afirmativa a autora aponta para a não existência de um corpo clássico
de textos usado pela recém-formada ciência. De modo que os escritores induziam nomes
como Comte e Darwin para desenvolver a sua origem científica. Entretanto, no final do século
XIX, as ciências sociais estavam se posicionando como a principal ciência do século XX em
suas revistas, periódicos, sociedades científicas, cursos universitários que se formavam,
almejando, deste modo, substituir a importância conferida à Biologia durante o século XIX.
Para dar mais força ao seu argumento, como aponta a autora, a nascente área de conhecimento
se classificava como a ciência da nova sociedade industrial e moderna, capaz de responder as
demandas e questões específicas daquela sociedade emergente, ou seja, as Ciências Sociais se
apresentavam como o meio científico mais adequado para analisar e contestar as questões
envolventes naquelas sociedades, pois a própria também era fruto das mudanças que haviam
ocorrido naquelas localidades8.
Um ponto sinalizado pela autora fundamental para perceber essa constituição é a
noção de tempo dentro do pensamento sociológico desse período. O tempo assumia a função
de marcador da diferença global, ou seja, “a diferença entre a civilização da metrópole e
outras culturas cuja característica principal era seu primitivismo”.9 Esta diferença era
apontada a partir de um discurso das “origens” que funcionavam como formas racionais e
científicas para justificar tanto a autoridade colonial, quanto a superioridade das nações
industrializadas frente a outros povos. Aos poucos esta noção funcionaria como uma narrativa
7CONNELL, Raewyn. O Império e a criação de uma Ciência Social. In: Contemporânea – Revista de
Sociologia da UFSCar. São Carlos, v. 2, n. 2, 2012. Pág. 309-336 8 Idem.
9 Ibidem.
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científica ensinada e aprendida em diversos espaços educativos, onde contribuiriam para sua
capilaridade nas sociedades industriais e angariaria novos adeptos ao projeto colonial
defendido.
Desde modo, a autora argumenta que no período de institucionalização da Sociologia,
na última década do século XIX, a prova central dp progresso estava baseada no contraste
entre as sociedades metropolitanas e as colonizadas. Suas discussões não estavam
preocupadas na importância dessa diferença, mas sim em como interpretar essa diferença, ou
seja, no desenvolvendo de estudos científicos que buscavam através da evolução física de
tipos humanos definirem suas características de inferioridade ou superioridade, ou então
explicando a partir de uma evolução dos padrões mentais e sociais, ou ainda questionando se
a competição ou cooperação seria realmente o motor do progresso10
.
Connell atenta ainda que a preocupação com o progresso não era um “valor” separável
da ciência, ao contrário, ele era um dado constitutivo do conhecimento sociológico do período
de sua constituição. Portanto, desenvolver um método que fosse capaz de apresentar essas
diferenças (além de ser eficaz no agrupamento de exemplos de “espécies” sociais particulares
almejando examinar suas variações) era fundamental. Assim sendo, o método comparativo
apareceu como o mais apropriado para essa ação e foi largamente utilizado nos estudos desse
período, como destaca a autora. Pois, ele “apoiava-se em um modo abundante de informação,
uma capacidade de examinar uma variedade de sociedades remotas e uma habilidade de se
mover livremente de uma sociedade a outra – características todas que projetam a relação da
dominação colonial”11
.
Assim sendo, é fundamental compreender que as Ciências Sociais no período de sua
constituição se apresentaram como um veículo científico para explicar e analisar as questões
que assolavam aquelas sociedades, principalmente os assuntos relacionados aos seus
domínios coloniais. Por este fato, propõe-se analisar a trajetória do antropólogo Mendes
Corrêa para observar como a antropologia defendida por ele no congresso mencionado acima
proporcionaria uma “revalorização das colônias” a partir do investimento em uma dada
ciência, que estaria à serviço do novo governo e permitiria na coleta de dados fundamentais
para as políticas coloniais colocadas em práticas com o governo salazarista. Portanto, a partir
dessa figura almeja-se identificar como foi realizada a constituição do campo antropológico
em Portugal e quais eram os seus projetos, além de indicar suas relações com o regime
salazarista.
10
Ibidem. 11
Ibidem.
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2. Mendes Corrêa: trajetória e construção da ciência colonial
António Augusto Esteves Mendes Corrêa foi um dos mais destacados pesquisadores
portugueses de sua época. Professor, antropólogo, arqueólogo, historiador, etnólogo,
criminologista, político, sócio efetivo e correspondente de várias academias nacionais e
internacionais12
, Doutor Honoris Causa por três universidades (Montpellier, Lyon e
Witwatersrand), além de ter sido condecorado por vários países13
. Nasceu no Porto em 4 de
abril de 1888, cidade onde se formou e se consolidou profissionalmente. Foi aluno do Liceu
Nacional Central do Porto e concluiu o seu curso de Medicina, em 1911, na Escola Médica
Cirúrgica, com o trabalho de conclusão intitulado O genio e o talento na pathologia, no qual
buscou contribuir para o debate científico internacional em torno da teoria de Jacques-Joseph
Moreau e seguida por Cesare Lombroso, que estabeleciam uma analogia entre genialidade e
patologia mental14
.
Neste trabalho se encontram alguns princípios que norteiam os trabalhos de Mendes
Corrêa, como: a obediência à cientificidade e o princípio da desigualdade biológica. Pois,
como atenta Henriques, o último estaria pautado num princípio hegeliano, no qual apenas
alguns possuem a capacidade de fazer evoluir o processo histórico, logo sua origem biológica
está inserida numa hierarquia intelectual que condiciona sua capacidade intelectual. Enquanto
a primeira está justamente na defesa da sustentação científica para uma tese, assim como no
rigor para lidar com indícios que possibilitem a defesa de uma hipótese. No caso analisado em
seu trabalho o antropólogo apresenta que a falta de documentação no trabalho dos
pesquisadores que relacionam a genialidade e a patologia mental, os conduz a uma
interpretação que não possui base científica sólida15
.
Atente-se para o fato que no mesmo ano que Mendes Corrêa defendeu seu trabalho na
Escola Médica Cirúrgica, ele foi nomeado como assistente da disciplina de Ciências
Biológicas na recém-criada Faculdade de Ciências do Porto, onde, no ano seguinte, introduziu
a disciplina de Antropologia, cadeira que ministrou por cerca de 40 anos. É na área da
12
Em Portugal, ele foi acadêmico titular da Academia Portuguesa da História e sócio efetivo da Academia das
Ciências. Além disso, foi sócio correspondente de 6 academias e honorário de 14 na Europa e nas Américas. 13
Dentre suas premiações podemos apontar: I) na Espanha, Cavaleiro de Afonso, o Sábio, e Comendador de
Afonso XII; II) na Itália e Bélgica, Comenda da Coroa; III) no Brasil, Oficial do Cruzeiro do Sul; IV) na França,
Comenda da Legião de Honra; V) em Portugal, Grandes Oficialatos da Ordem de Cristo e da Ordem de Santiago
e Grã-Cruz da Ordem da Instrução Pública. 14
Cf. CORRÊA, Mendes. O genio e o talento na pathologia. Porto: Imprensa Portugueza, 1911. 15
HENRIQUES, Bruno Miguel Cunha. A ressurreição da raça portuguesa no pensamento de Mendes
Correia: História, Antropologia, Eugenia (1911-1960). Universidade do Porto: Porto, dissertação de mestrado,
2012.
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Antropologia que teve grande reconhecimento nacional e internacional, inclusive
institucionalizando a disciplina na cidade do Porto e criando discípulos, a ponto de criar a
Escola Antropológica do Porto organizada em torno da tradição do núcleo da Portugália16
, a
revista de Ricardo Severo, Rocha Peixoto, Fonseca Cardoso e José Fortes. Além disso,
Mendes Corrêa criou, em 1912, na Faculdade de Ciências do Porto, o Museu e Laboratório
Antropológico e, em 1918, em conjunto com Luís Viegas, Aarão de Lacerda e José Ferreira,
fundou a Sociedade Portuguesa de Antropologia e Etnologia. Em 1921, já catedrático da
Faculdade de Ciências do Porto, passou a ser seu diretor entre 1929 e 193517
.
Em 1936, a vida acadêmica se unira a sua participação política enquanto presidente da
Câmara Municipal do Porto, cargo que ocupou até 1942. Durante seu mandato buscou
salvaguardar e valorizar o patrimônio da cidade a partir da criação do museu de Etnografia e
História e a instalação do museu Soares dos Reis no Palácio dos Carrancas (1940), como
também a criação do Gabinete de História da Cidade (1936) e a promoção da pesquisa em
história local com a publicação do Boletim Cultural (1938)18
.
Mendes Corrêa não restringiu sua atuação política ao âmbito local, durante o período
de sua presidência na Câmara do Porto, participou da Câmara Corporativa19
nas I e II
legislatura enquanto representante da administração local, além de, entre 1945 e 1957, ser
deputado na Assembleia Nacional durante as IV, V e VI legislatura. Durante este período, o
antropólogo assumiu alguns cargos e funções importantes em órgãos portugueses
relacionados à pesquisa, e, em especial, aqueles voltados para os domínios ultramarinos
lusitanos. Dentre eles podemos destacar o cargo de diretor da Escola Superior Colonial
(1946), como também a função de presidente da Junta de Missões Geográficas e de
Investigações Coloniais (1946), do Instituto Superior de Estudos Ultramarinos (1946) e da
Sociedade de Geografia de Lisboa (1951).
16
JÚNIOR, J. R. dos Santos. O Professor Mendes Correia, fundador e 2º presidente da Sociedade
Portuguesa de Antropologia e Etnologia. Porto: Imprensa Portuguesa, 1969. 17
Note que a Exposição Colonial e o Seminário de Antropologia Colonial acontecem no período que Mendes
Corrêa era diretor da Faculdade de Ciências do Porto. 18
RAMOS, Luís (Org.). História do Porto. 3ª edição, Porto: Porto Editora, 2001. 19
A Câmara Corporativa foi um órgão consultivo existente entre 1935 a 1974. Embora possuísse um caráter
acessório dentro da estrutura dos órgãos do poder político do salazarismo, a Câmara teve um papel relevante na
definição e concepção das políticas públicas do regime autoritário português. Sofreu diversas mudanças ao longo
de sua existência, entretanto manteve alguns atributos, como: a apreciação de projetos de lei da Assembleia
Nacional e os diplomas do Governo, emitindo sobre eles pareceres não vinculativo. Deste modo, membros que
representavam interesses administrativos, acadêmicos e econômicos constituíram um decisivo elemento de
suporte técnico da ação governativa, refletindo e ampliando os principais debates que envolveram a elite política
do Estado Novo. Cf. CARDOSO, José Luís; FERREIRA, Nuno Estêvão. A Câmara Corporativa (1935-1974) e
as políticas públicas no Estado Novo. In.: Ler História, nº 64, 2013. Pág. 31-54.
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O portuense ainda aparece como deputado da VII legislatura e nomeado para integrar
a comissão de comemorações do 5º centenário do Infante D. Henrique20
, a decorrer em 13 de
novembro de 1960, o que não ocorreu, pois o antropólogo veio a falecer, em Lisboa, no dia 7
de janeiro de 1960. Esse cenário supracitado sinaliza não apenas para o auge da carreira
política e intelectual do antropólogo dentro de Portugal, mas também por seu envolvimento e
atuação em um período ditatorial no país que possibilitou o crescimento e constituição da área
antropológica em Portugal a partir desta figura.
Para compreender como ocorre isso é importante recuperar alguns escritos e falas
desse importante antropólogo português, principalmente suas obras em apologia às pesquisas
nas coloniais que buscaram ressaltar a importância política desses estudos para a manutenção
das colônias e para o desenvolvimento de um processo civilizatório dos indígenas que
estivesse em total consonância com os interesses coloniais do Estado Novo salazarista, ou
seja, a “revalorização das colônias” defendida e apontada já no I Congresso Nacional de
Antropologia Colonial que teve a organização dele.
Nesse caminho, Mendes Corrêa ressaltou que as pesquisas científicas e a educação
possuíam uma importância central dentro dos interesses colonialistas portugueses frente a
outros países europeus já no discurso inaugural do I Congresso Nacional de Antropologia
Colonial.
As nossas Universidades e escolas vivem geralmente num mundo abstrato em que parecem
ignoradas as colônias, a não ser por vezes ao comentarem-se literariamente algumas estrofes
dos Lusíadas ou quando se entra em conta com alguns pobres mapas, suspensos das paredes
e mais visitados pelas moscas indiscretas do que pelos olhares verdadeiramente interessados
da mocidade dum país dotado duma consciência imperial.21
Em sua fala, Mendes Corrêa não apenas ressalta a importância de uma intervenção real
nas colônias a partir das pesquisas científicas realizadas nas universidades, mas incorpora em
seu discurso o projeto defendido no Ato Colonial de 1930, no qual Portugal se afirma como
uma nação que tem “função histórica e essencial de possuir, civilizar e colonizar domínios
ultramarinos”.22
Ainda pontua que para isso acontecer era necessário formar quadros jovens
que mantivessem suas atenções no Ultramar para que, assim, o país não perdesse a sua
condição de Império. Portanto, desejar as colônias para não perde-las, passava por possuir um
20
Assim como a Exposição do Mundo Português, em 1940, o Brasil também participa desse evento, inclusive
com a ilustre presença do ex-presidente Juscelino Kubitschek. 21
CORRÊA, A. A. M. Discurso Inaugural no I Congresso Nacional de Antropologia Colonial. Extracto das
Actas do Congresso. Porto: Edições da 1º Exposição Colonial Portuguesa, 1934, p. 8. 22
ROSAS, Fernando. O Estado Novo (1926-1974). História de Portugal, VII Volume, Dir. José Mattoso.
Lisboa: Editorial Estampa, 1994.
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conhecimento efetivo daqueles territórios sob seu domínio, o qual viria a partir da
contribuição especial das pesquisas científicas:
Entre as disciplinas que nos últimos anos têm sido estudadas com certa intensidade entre nós,
no domínio das pesquisas respeitantes às colônias portuguesas, figuram a Antropologia
física, a Pré-história e a Etnografia, havendo já alguns trabalhos publicados em tais matérias
[...]. Enfim, o estudo científico da população das nossas colônias sob os mais variados
aspectos não é menos importante e imprescindível do que o das maiores riquezas do subsolo
ou do revestimento vegetal daqueles territórios. Pelo contrário, é mais urgente e mais
imperioso do que qualquer outro, pois, se apresenta incontestável interesse econômico e
nacional, a par do seu interesse científico, não possui menor valor nos pontos de vista
político e humanitário.23
As Ciências Humanas pontuadas por Mendes Corrêa são colocadas em equiparação de
importância com a exploração das riquezas das colônias. Segundo o antropólogo, para além
dos interesses econômicos apontados em primeiro lugar, também estariam presentes aspectos
científicos e humanitários. Enquanto o primeiro estaria relacionado com a exploração da mão-
de-obra dos indígenas das colônias, o segundo responderia a demandas do debate científico
internacional, principalmente aquele remetido às origens presente nos primeiros debates das
Ciências Sociais.
Logo, podemos indicar que Mendes Corrêa também trilha aquelas preocupações
ressaltadas por Connell no início deste trabalho, associado a essa questão, está a sua inscrição
na construção do campo antropológico português, a importância política apresentada e sua
relevância nos mais diversos espaços científicos do país. Portanto, o antropólogo se apresenta
como uma figura chave para entender como ocorreu a constituição de uma ciência colonial
em Portugal, quais pontos estavam interessados em responder e quais meios utilizaram para
ganhar espaço no regime salazarista.
Neste âmbito, vale ressaltar que tais temas desenvolvidos pela pesquisa de Mendes
Corrêa e seus discípulos proporcionaram uma notória importância no cenário internacional,
capaz de propiciar Portugal de boa representatividade em congressos acadêmicos de grande
visibilidade e participação em associações científicas consagradas. Deste modo, esta
participação funcionaria para além de interesses particulares dos cientistas envolvidos, como
também possibilitaria ao regime salazarista uma reafirmação no âmbito internacional
enquanto uma nação imperialista que ocupava e conhecia efetivamente os seus territórios,
procurando assegurar ali, assim, a sua permanência.
23
CORRÊA, A. A. M. Missões Antropológicas às Colónias. Separata do Jornal do Médico, VII (149): 11-12,
Porto: Costa Carregal, 1945ª, pp. 5-9.
1160
Com relação ao aspecto humanitário ressaltado por Mendes Corrêa, é importante
compreender ele dentro de um projeto civilizatório dos nativos coloniais, considerado como
um benefício cristão e uma missão espiritual que os portugueses haviam cumprido, desde o
início das conquistas marítimas, nos seus territórios dominados. Logo, o discurso oficial do
Estado Novo que ressaltava a importância histórica da presença portuguesa em seus domínios
coloniais desde as Grandes Navegações encontrava eco nos discursos e trabalhos
apresentados pelo portuense, consequentemente, o tom científico desejado para a ideologia
nacional emergente encontrou em Mendes Corrêa a figura fundamental para propagar as
ideias coloniais portuguesas.
Se por um lado ocorria esse quadro apresentado acima, por outro precisamos definir
melhor como a Ciência defendida por Mendes Corrêa se apresentaria ao serviço e ao interesse
do regime salazarista a ponto do Estado mover recursos e financiamentos para sua
viabilidade. Para isso podemos retomar a ideia defendida, em 1933, no seu texto Introdução à
Antropobiologia, no qual expõem as seguintes ideias:
(…) a Antropologia é entendida num sentido lato embora não tão amplo que ela constitui
uma verdadeira enciclopédia de todas as ciências que dizem respeito ao homem e às
sociedades humanas. É, sobretudo, tomada num sentido comparado: comparação do homem
com os antropóides, e dos tipos humanos, raças e povos entre si, mas comparação que incide
sobre caracteres não apenas somáticos ou físicos, mas também psíquicos e sociais. Isto é, a
Antropologia aparece como um estudo integral do homem e dos grupos humanos,
abrangendo, portanto a Antropologia zoológica, a Antropologia física étnica (a ‘Etnologia’,
segunda a Escola de Broca), a Antropologia psíquica e cultural (a ‘Etnologia’ de outras
escolas; Etnografia num sentido comum), a Pré-história, etc24
.
Segundo Rui Pereira, esse conceito largo empregado por Mendes Corrêa na sua
definição de Antropologia proporcionava uma aparente “contradição” nos textos da “Escola
do Porto”, já que as palavras etnografia e etnologia aparecem como o estudo das raças
humanas. Para ele, essa questão aparece porque para o antropólogo português tanto a
Antropologia Física étnica expressa na forma de Etnologia ou Raciologia (conceito defendido
pelo antropólogo físico francês Broca e inspirador para Mendes Corrêa), assim como a
Antropologia psíquica e cultural em que o conceito de Etnologia era utilizado como sinônimo
de Etnografia25
.
Logo podemos apontar que a Antropologia defendida por Mendes Corrêa era
contraditória em sua concepção, pois se o antropólogo português, de certo modo, defendia que
seus estudos antropológicos deveriam ser pautados não apenas na Antropologia Física, mas
24
CORRÊA, Mendes. Introdução à Antropobiologia. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1933. 25
PEREIRA, Rui. Sangue, Raça e Robustez: Os paradigmas da Antropologia Física colonial portuguesa. In:
Cadernos de estudos africanos. Lisboa: FCSH/Universidade Nova de Lisboa, 2005. Pág. 209-241
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também deveriam ser incorporados a Etnografia, a Pré-História e a Psicologia nas análises
antropológicas. Sua ideia de Antropologia física estava pautada em uma ideia de raças e na
teoria de hereditariedade que, por natureza, excluiria uma perspectiva social e cultural daquele
grupo estudado.
Não é à toa que essa definição de Antropologia se encontra em um livro introdutório
para a Antropobiologia, no qual o mesmo defende a importância desse método para o
desenvolvimento de estudos de grupos humanos, já que ela possibilitaria determinar a
“mentalidade das diferentes raças” partir de uma explicação biológica dentro dos grupos
sanguíneos da amostra analisada. Em suas palavras,
a Antropobiologia ocupa-se de investigações sobre a hereditariedade normal e patológica no
homem, dos estudos eugénicos, da fisiologia das raças, dos grupos sanguíneos e outros
assuntos de bioquímica humana, das constituições e temperamentos, da determinação da
base biológica da mentalidade e atividade das diferentes raças26
.
Vale ressaltar que essas ideias estão na larga produção científica produzida pela
“Escola do Porto” como destaca Pereira27
, principalmente em seus trabalhos de campo nas
colônias portuguesas e nos trabalhos realizados por Mendes Corrêa sobre os portugueses
também, como a pesquisa com os criminosos portuenses28
e a própria origem dos
portugueses29
. Assim, podemos observar como se pautou os trabalhos desse antropólogo e
como ele buscou lidar com as questões encontradas em campo, além de também responder a
questões lidadas pelos portugueses no período de seu trabalho.
Pois, havia uma crítica, neste período, aos portugueses no Ocidente. Os lusitanos não
eram considerados como raças dignas e em seus trabalhos sobre os portugueses, Mendes
Corrêa tentou sempre apontar que os portugueses são uma “raça pura” desde o período
romano e comungava dos mesmos valores que as nações mais avançadas da Europa, mas que
era necessário fazer pequenos ajustes30
. Embora, o antropólogo defendesse isso antes da
instauração do regime salazarista, esse ponto de vista que se ajustava muito ao discurso de
construção do Novo Homem dentro do “salazarismo” e a “política do espírito” posta em
prática nos anos 1930 e 1940.
Essa política assentava-se numa ideia mítica da nação e do interesse nacional, no qual
o “resgate das almas dos portugueses” ocorreria sob a orientação de organismos estatais de
propaganda política. Seu objetivo central era estabelecer uma ideia mítica da “essência
26
CORRÊA, Mendes. Op. Cit. 1933. 27
PEREIRA, Rui. Op. Cit. 28
Cf. CORRÊA, Mendes. Os Criminosos Portugueses. Coimbra: F. França Amado Editor, 1914. 29
Cf. CORRÊA, Mendes. Raízes de Portugal. Lisboa: Vista “Ocidente”, 1944. 30
Idem.
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portuguesa” (atemporal e supraclassista), no qual o Estado Novo, na figura de António
Salazar, reassumiu ao encerrar o período liberal no país e moveriam ações para “reeducar” os
portugueses no cenário de uma nação reencontrada e regenerada consigo mesma, com a sua
essência eterna e com o seu destino providencial31
.
Portanto, podemos perceber os trabalhos de Mendes Corrêa como fundamentais dentro
da própria reconfiguração posta em prática pelo Estado Novo. Pois o antropólogo apareceu
como uma figura científica e respeitada no meio acadêmico que permitiriam dar tons
científicos a uma propaganda ditatorial, como também auxiliariam em uma postura
internacional do regime, principalmente nos congressos científicos. Demonstrando que, assim
como outras nações coloniais, Portugal também contribuiu para o desenvolvimento científico
internacional e caminhava com investimentos significativos em trabalhos importantes na área
dos estudos coloniais.
É nesse cenário que Mendes Corrêa alcançou seu prestígio acadêmico e ocupou cargos
importantes tanto dentro da estrutura do Estado Novo, quanto nas instituições científicas do
país. Logo não é à toa que sua ação possibilitou a construção da hegemonia de um grupo
dentro dos estudos coloniais, os quais tinham nele um mentor intelectual e um agente capaz
de angariar recursos para o desenvolvimento de pesquisas de campo, como foi o caso da
Missão Antropológica de Moçambique (entre 1937 e 1956) e a Missão Antropológica e
Etnológica da Guiné (entre 1946 e 1947), ambas realizadas, respectivamente, por Joaquim dos
Santos Júnior e Amílcar de Magalhães Mateus, discípulos do antropólogo português e
membros da “Escola do Porto”. Por conseguinte, a marca colonial da construção do campo
antropológico em Portugal, na figura de Mendes Corrêa, se ajustou e possibilitou uma
propaganda em tons científicos para um regime que buscou se consolidar e angariar apoio
durante as décadas de 1930 e 1940.
3. Considerações Finais
A epígrafe que inicia esse trabalho faz parte de um trabalho de Mendes Corrêa durante
os anos 1950, momento que o governo salazarista alterou tanto a Constituição portuguesa,
quanto os códigos referentes às colônias, que passaram a partir de então a serem denominadas
territórios ultramarinos. Acompanhada dessa ação política ocorreu também uma mudança de
paradigma dentro da política colonial, mais precisamente o desenvolvimento da ideia do
lusotropicalismo com Gilberto Freyre e a realização de trabalhos que dessem suporte a teoria
31
ROSAS, Fernando. O salazarismo e o homem novo: ensaio sobre o Estado Novo e a questão do totalitarismo.
In: Análise Social, vol. XXXV (157), 2001, pág. 1031-1054.
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defendida pelo Estado Novo nessa altura, o qual a contribuiu para que a Antropologia Física
perdesse espaço e investimento.
Essas alterações acompanharam um período que o colonialismo entrou em crise
internacional, não apenas devido aos movimentos de independências das colônias e as tensões
coloniais acirradas que anunciavam o seu fim em pleno contexto da Guerra Fria, mas também
através da forte crítica dentro da Organização das Nações Unidas materializada na defesa de
autodeterminação dos povos no pós-II Guerra Mundial. Não é à toa que Portugal realizou
essas mudanças, já que almejava participar do organismo internacional e necessitava ajustar
sua política aos parâmetros internacionais defendidos pela instituição. Suas mudanças
permitiram a entrada na ONU nos anos 1950.
Portanto, mais uma vez o governo português tentou se ajustar ao cenário internacional
realizando mudanças aparentes em sua política colonial32
, mas também alterando a política
científica desenvolvida em suas coloniais. Logo, Mendes Corrêa e seus seguidores começam a
perder tanto financiamento, quanto espaço dentro do cenário acadêmico nacional.
Entretanto, todo esse cenário trilhado por Mendes Corrêa exposto acima aponta para a
sua capacidade e maleabilidade dentro da política colonial salazarista gestada a partir do Ato
Colonial de 1930. Ele não apenas reafirmou a missão histórica portuguesa, como também
atuou na reconfiguração da política colonial portuguesa. Este documento, que determinou
tratamentos voltados para os indígenas nas colônias, encontrou nos estudos de Mendes Corrêa
a possibilidade de demonstrar que havia um esforço do governo em desenvolver aqueles
territórios utilizando estudos científicos, semelhante ao praticado por França e Inglaterra em
suas colônias.
Logo, o desenvolvimento de pesquisas científicas em cenário colonial estaria em total
consonância ao conceito defendido pela Europa Imperialista de “ocupação científica” das
colônias, o qual vestiria uma nova forma de colonialismo. Este concebido dentro da ideia do
desenvolvimento de uma ciência capaz de auxiliar na dominação dos territórios e dos nativos.
32
As mudanças colocadas em práticas a partir da Constituição de 1951 não alteram completamente a política
colonial portuguesa, mas sim altera a denominação a fim de ajustar as exigências das instituições internacionais.
Tanto que durante os anos 1950 e 1960, o governo português foi intimado para responder na ONU sobre o
trabalho forçado e o seu colonialismo. Entretanto, o governo, junto com outro aliado fundamental (o governo
brasileiro de Juscelino Kubischet), marcam a defesa daquele território como parte integrante de Portugal, não
havendo relações coloniais. Além disso, inicia-se também o período de Guerra Colonial, no qual perdurara
durante 11 anos e impôs o fim da Ditadura Salazarista em Portugal, depois de 49 anos de existência. Cf.
RAMPINELLI, W. J. As duas faces da moeda: as contribuições de JK e Gilberto Freyre ao colonialismo
português. Florianópolis: Editora da UFSC, 2004; e Cf. VARELA, Raquel. “O povo já não tem medo”: o 25 de
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VEGA, Rubén. Trabalhadores e Ditaduras: Brasil, Espanha e Portugal. Rio de Janeiro: Consequência, 2014,
pp. 99-124.
1164
Assim, o conhecimento colonial, a sua dominação e sua exploração, eram partes
constituintes de um mesmo processo na concepção dos intelectuais colonialistas e Portugal
não esteve fora desse processo. Pois, a modernização portuguesa posta em prática a partir de
sua ditadura civil também buscou seguir um programa desenvolvido por outras nações
imperialistas, as quais obtiveram algum resultado em suas possessões coloniais. Portanto, uma
nação com uma missão histórica, como Portugal, não poderia ficar de fora desse processo e
intelectuais, como Mendes Corrêa, responderam a demandas daquelas elites políticas que
assumiram o governo português a partir do Estado Novo em 1933.
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