Micro Albi Nuria

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313 Arq Bras Endocrinol Metab vol 50 nº 2 Abril 2006 RESUMO Embora de fácil determinação, a medida da excreção de albumina na urina tem sido pouco utilizada na identificação de indivíduos com diabetes tipo 2 (DM2), de maior risco para o desenvolvimento de doença renal e cardiovascular (CV). Tem sido demonstrado que as medidas das concentrações de albumina e creatinina (Cr) em amostras isoladas de urina, permitindo o cálculo da relação entre elas, podem ser suficientes para o rastreamento e mesmo para a avaliação da eficácia de medidas adotadas para a redução da microalbuminúria. Valores >30 mg/g de Cr ou 3,4 mg/mmol de Cr são indicativos de microalbuminúria e, em pacientes com DM2, a associação freqüente com a elevação dos níveis da pressão arterial representa condição de alto risco CV. Evidências epidemiológicas indicam que a presença de microalbuminúria prediz maior morbidade e mortalidade CV independente de outros fatores de risco. Por outro lado, a microalbuminúria mostra-se também freqüentemente associada a outros fatores de risco CV, sendo um dos componentes da síndrome metabólica. A capacidade de reduzir a pressão arterial, a pressão intraglomerular e a permeabilidade da membrana glomerular, fatores determinantes da progressão da lesão renal, explica o efeito renoprotetor dos inibidores da enzima conversora da angiotensina (IECAs) e dos bloqueadores dos receptores da angiotensina II (BRAs). No tratamento da nefropatia diabética, o uso de IECAs e BRAs associado ao controle rígido da pressão arterial, que deve ser mantida em níveis iguais ou inferiores a 130/80 mmHg, tem se mostrado como estratégia não só para promover proteção renal como também para promover proteção CV. (Arq Bras Endocrinol Metab 2006;50/2:313-321) Descritores: Microalbuminúria; Risco cardiovascular; Proteção renal; Proteção cardiovascular ABSTRACT Microalbuminuria: Cardiovascular and Renal Risk Factors Underestimated in Clinical Practice. Determination of microalbuminuria has been shown to be useful to identify patients with type 2 diabetes (DM2) at high risk of renal and cardiovascular (CV) diseases. The determination of the albumin/ creatinine (Cr) ratio in an isolate sample of urine has been shown to be sufficient for the diagnosis as well as for the evaluation of the efficacy of the therapy employed to reduce microalbuminuria. Values of urinary albumin >30 mg/g of Cr or 3,4 mg/mmol of Cr are evidence of microal- buminuria. This condition is frequently associated with high blood pres- sure levels, which increases dramatically not only the progression of renal disease but also de risk of a CV event. Epidemiologic studies have de- monstrated that the presence of microalbuminuria is predictive of higher morbi-mortality independent of the presence of other CV risk factors. It appears to reflect a generalized vascular lesion not confined to the glomeruli. The capacity of reducing blood pressure, intraglomerular revisão Microalbuminúria: Fator de Risco Cardiovascular e Renal Subestimado na Prática Clínica Maria Teresa Zanella Disciplina de Endocrinologia da UNIFESP, São Paulo, SP. Recebido em 20/12/05 Aceito em 17/01/05

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Artigo cientifico sobre micrialbinuria

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  • 313Arq Bras Endocrinol Metab vol 50 n 2 Abril 2006

    RESUMO

    Embora de fcil determinao, a medida da excreo de albumina naurina tem sido pouco utilizada na identificao de indivduos comdiabetes tipo 2 (DM2), de maior risco para o desenvolvimento dedoena renal e cardiovascular (CV). Tem sido demonstrado que asmedidas das concentraes de albumina e creatinina (Cr) em amostrasisoladas de urina, permitindo o clculo da relao entre elas, podem sersuficientes para o rastreamento e mesmo para a avaliao da eficciade medidas adotadas para a reduo da microalbuminria. Valores>30 mg/g de Cr ou 3,4 mg/mmol de Cr so indicativos demicroalbuminria e, em pacientes com DM2, a associao freqentecom a elevao dos nveis da presso arterial representa condio dealto risco CV. Evidncias epidemiolgicas indicam que a presena demicroalbuminria prediz maior morbidade e mortalidade CVindependente de outros fatores de risco. Por outro lado, amicroalbuminria mostra-se tambm freqentemente associada aoutros fatores de risco CV, sendo um dos componentes da sndromemetablica. A capacidade de reduzir a presso arterial, a pressointraglomerular e a permeabilidade da membrana glomerular, fatoresdeterminantes da progresso da leso renal, explica o efeitorenoprotetor dos inibidores da enzima conversora da angiotensina(IECAs) e dos bloqueadores dos receptores da angiotensina II (BRAs). Notratamento da nefropatia diabtica, o uso de IECAs e BRAs associadoao controle rgido da presso arterial, que deve ser mantida em nveisiguais ou inferiores a 130/80 mmHg, tem se mostrado como estratgiano s para promover proteo renal como tambm para promoverproteo CV. (Arq Bras Endocrinol Metab 2006;50/2:313-321)

    Descritores: Microalbuminria; Risco cardiovascular; Proteo renal;Proteo cardiovascular

    ABSTRACT

    Microalbuminuria: Cardiovascular and Renal Risk FactorsUnderestimated in Clinical Practice.Determination of microalbuminuria has been shown to be useful toidentify patients with type 2 diabetes (DM2) at high risk of renal andcardiovascular (CV) diseases. The determination of the albumin/creatinine (Cr) ratio in an isolate sample of urine has been shown to besufficient for the diagnosis as well as for the evaluation of the efficacy ofthe therapy employed to reduce microalbuminuria. Values of urinaryalbumin >30 mg/g of Cr or 3,4 mg/mmol of Cr are evidence of microal-buminuria. This condition is frequently associated with high blood pres-sure levels, which increases dramatically not only the progression of renaldisease but also de risk of a CV event. Epidemiologic studies have de-monstrated that the presence of microalbuminuria is predictive of highermorbi-mortality independent of the presence of other CV risk factors. Itappears to reflect a generalized vascular lesion not confined to theglomeruli. The capacity of reducing blood pressure, intraglomerular

    reviso

    Microalbuminria: Fator de RiscoCardiovascular e Renal Subestimado naPrtica Clnica

    Maria Teresa Zanella

    Disciplina de Endocrinologia daUNIFESP, So Paulo, SP.

    Recebido em 20/12/05Aceito em 17/01/05

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    pressure and the permeability of the glomerularmembrane, which are important factors in theprogression of renal disease, may explain therenoprotective effects of the angiotensin convertingenzyme inhibitors (ACEIs) and the angiotensin IIreceptors blockers (ARBs). In the treatment ofdiabetic nephropathy, the control of blood pressure,which has to be maintained near or below 130/80mmHg associated to the blockade of the renin-angiotensin system with ACEIs or BRAs are the beststrategies to promote renal and CV protection. (ArqBras Endocrinol Metab 2006;50/2:313-321)

    Keywords: Microalbuminuria; Cardiovascular risk;Renal protection; Cardiovascular protection

    AOCORRNCIA DE EXCREO URINRIA excessiva dealbumina em indivduos com diabetes tipo 2 provavelmente o sinal de alerta mais precoce e impor-tante do incio de um comprometimento vasculargeneralizado (1), no somente limitado ao glomrulo,mas tambm presente em outros stios vasculares, par-ticularmente em rgos vitais como o crebro e ocorao. Acredita-se que, sem uma intervenoespecfica, 2040% dos pacientes com diabetes tipo 2 emicroalbuminria progridem para a fase proteinrica efinalmente para os estgios finais da doena renal(2,3). Ainda que nos faltem evidncias, a adoo demedidas teraputicas que promovam a reduo damicroalbuminria provavelmente se mostrar efetivano s para promover proteo renal como tambmproteo cardiovascular. Assim sendo, a identificao enormalizao da excreo urinria de albumina devemser sempre consideradas no tratamento de pacientescom diabetes tipo 2.

    Definio e determinao damicroalbuminriaEmbora de fcil de determinao, a medida da excre-o de albumina na urina tem sido muito pouco utili-zada como arma til na identificao de indivduoscom diabetes tipo 2, passveis de evolurem para insufi-

    cincia renal crnica e de maior risco para o desen-volvimento de doena cardiovascular. A albuminriapode ser definida atravs de diferentes medidas, comomostra a tabela 1.

    Existem basicamente trs mtodos diferentes derastreamento para detectar aumentos na excreo uri-nria de albumina: 1. Medida da relao entre as medi-das de albumina e creatinina em amostra isolada deurina; 2. Medida da albuminria em quantidade deurina obtida dentro de um perodo de tempodeterminado (p. ex. 12 horas noturnas ou diurnas),expressa em microgramas por minuto (g/min); 3.Determinao da quantidade de albumina excretadanas 24 horas, considerada como padro ouro de deter-minao da albuminria.

    Determinao em amostra isolada de urinaA determinao da albuminria em amostra isolada a mais fcil de ser realizada na prtica clnica e forneceinformao bastante confivel. Tem sido demons-trado que este mtodo tem uma sensibilidade de 90%na determinao da microalbuminria comparada aomtodo de avaliao que utiliza a urina de 24 horas,mesmo aps ajustes para idade e sexo (4,5) A melhoravaliao obtida quando a determinao feita naprimeira urina da manh, evitando-se as variaesdiurnas que ocorrem com a atividade fsica. Aocorrncia de microalbuminria pouco provvel se,em uma amostra isolada de urina, a concentrao dealbumina for menor que 20 a 30 mg/dl. Valoresmaiores, principalmente aqueles logo acima desteslimites, podem representar resultados falso-positivos edevem ser confirmados repetindo-se as determina-es. O problema de se medir apenas a concentraourinria de albumina que podemos ter um nmerogrande de resultados falso-positivos ou falso-negativos, uma vez que a concentrao de albuminana urina influenciada pelo volume urinrio (6). Istopode ser minimizado repetindo-se as determinaesdas quantidades de albumina na primeira urina damanh (7).

    Tabela 1. Valores da albuminria utilizados para definies de micro- emacroalbuminria em pacientes diabticos.

    Amostra Amostra Amostra Amostra Amostraisolada isolada de de 12hs de 12hs mg/ml mg/g 24hs diurnas noturnas

    Creatinina mg g/min g/minNormoalbuminria < 20 < 30 < 30 < 20 < 15Microalbuminria 20199 30299 30299 20199 15150Macroalbuminria 200 300 300 200 150

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    Relao albumina / creatinina O efeito dovolume pode ser evitado totalmente se pudermoscalcular a relao entre as concentraes de albumina ecreatinina em uma amostra isolada de urina. Valoressuperiores a 30 mg/g de creatinina ou a 3,4 mg/mmolde creatinina levam a crer que a excreo de albuminanas 24 horas deve estar ultrapassando 30 mg/dia e,portanto, so indicativas de microalbuminria. Mesmodeterminaes em colees de urina obtidas duranteperodos de 12 ou 24 horas levam a resultados maisfidedignos se expressos atravs da relao albumina/creatinina, uma vez que difcil se fazer a coleta deforma perfeita. Perdas urinrias dentro de um deter-minado perodo subestimam a excreo urinria dealbumina quando esta expressa em g/min. Isto nosfaz concluir que as medidas das concentraes de albu-mina e creatinina em amostras isoladas, permitindo oclculo da relao entre elas, podem ser suficientespara o rastreamento e mesmo para a avaliao da efic-cia de medidas adotadas para a reduo da microalbu-minria. Uma vez que existe uma certa variabilidadena excreo urinria de albumina, considera-se queduas ou trs medidas dentro de um perodo de 3 a 6meses devam se mostrar anormais, utilizando-se qual-quer um dos mtodos de coleta de urina para que sepossa estabelecer o diagnstico de microalbuminria(2). Tambm preciso ressaltar que parte da variabili-dade nas medidas da albuminria pode ser decorrentede exerccios, infeces ou febre no perodo prvio de24 horas. Alm disso, um controle inadequado dosnveis glicmicos ou da presso arterial, insuficinciacardaca ou infeco urinria e at mesmo hematriapodem elevar a excreo de albumina acima dos valo-res normais (2). Por fim, importante lembrar que deveser sempre realizada a determinao das quantidadesde albumina e no de protena na urina. Medidas dasconcentraes de protena na urina, quando em nveisbaixos, no so sensveis e so pouco confiveis (1,8).

    Microalbuminria: evidncia de leso renalA presena de microalbuminria no paciente diabticotipo 2 freqentemente se associa elevao dos nveisda presso arterial, e representa uma condio de altorisco cardiovascular (9). Alm de aumentos na pressoarterial sistmica, dados clnicos e experimentais indi-cam que no diabetes ocorre aumento na presso capi-lar glomerular. Esta determinada no somente pelapresso arterial sistmica, mas tambm por um distr-bio da auto-regulao renal e uma hemodinmicaglomerular alterada, caracterizada pela vasodilataopr-glomerular e vasoconstrio ps-glomerular (10).A ltima fortemente regulada pela atividade do sis-

    tema renina angiotensina intra-renal, que tem suaatividade aumentada pela hiperglicemia (11). Oaumento da produo de angiotensina II no rim, atra-vs do estmulo do receptor AT1, leva menor produ-o de nefrina, protena importante na integridade damembrana glomerular como barreira filtrante (12). Areduo na produo de nefrina resulta em aumentoda permeabilidade por aumento do tamanho dosporos da membrana glomerular. A presso intraglo-merular aumentada leva a hiperfiltrao e, na presenade um aumento da permeabilidade da membranaglomerular, favorece o aumento na excreo dealbumina/protena.

    Alm de aumentar a permeabilidade da mem-brana glomerular e de suas aes hemodinmicas quefavorecem a hipertenso intraglomerular, a AII tam-bm exerce efeitos nos rins, que contribuem paraaumentar a produo da matriz extracelular (13). Ahiperglicemia e a angiotensina II parecem produzirefeitos semelhantes sobre as clulas renais em cultura,estimulando a sntese da matriz protica (14) einibindo sua degradao enzimtica (15).

    Como demonstrado em estudos experimentais,a captao de protenas filtradas pelas clulas epiteliaistubulares pode levar ao acmulo anormal de protenasnos endolisossomos e no retculo endoplasmtico,que, por sua vez, podem estimular a produo desubstncias vasoativas e inflamatrias (16). Estassubstncias no interstcio renal podem levar proliferao de miofibroblastos, fibrognese e fibrose.A ocorrncia de hipertenso capilar glomerular, albu-minria e reabsoro de protenas pelas clulas epite-liais tubulares pode ser a seqncia de eventos neces-sria para promover a leso renal progressiva. Atransudao de protenas do plasma em outros leitosvasculares como o corao, por outro lado, poderiacontribuir para o desenvolvimento de fibrose carac-terstica da cardiomiopatia diabtica e para o maiorrisco de insuficincia cardaca que se verifica empacientes com macroproteinria (16).

    Microalbuminria: sinal de comprometimentovascular generalizadoEvidncias epidemiolgicas indicam que a presena demicroalbuminria prediz maior morbidade e mor-talidade cardiovascular independente de outros fatoresde risco (1). Tem sido demonstrada uma correlaopositiva e praticamente linear entre a presena dequantidades aumentadas de albumina na urina e aocorrncia de infarto do miocrdio ou de acidentesvasculares cerebrais, tanto em pacientes com diabetestipo 2 quanto em pacientes no diabticos (17-20).

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    Gerstein e col., analisando os resultados doestudo HOPE (Heart Outcomes Prevention Evalua-tion), verificaram que, entre mais de 9.000 parti-cipantes considerados de alto risco cardiovascular, amicroalbuminria se mostrava como um forte fatorpreditivo dos principais eventos cardiovasculares(infarto do miocrdio, acidente vascular cerebral emorte cardiovascular) e mortalidade por todas as cau-sas, tanto em pacientes diabticos como em pacientesno diabticos. Alm disso, foi observada correlaolinear entre valores da razo albumina/creatinina emamostra isolada e a morbi-mortalidade cardiovascular.No incio do estudo, os valores da razo albumina/creatinina mostravam-se elevados em 33% dos pacien-tes diabticos e 15% dos pacientes no diabticos (21).

    Foi tambm observado aumento do risco car-diovascular associado ao aumento da excreo urinriade albumina no estudo LIFE, que incluiu 7.143pacientes hipertensos no diabticos e 1.063 pacienteshipertensos com diabetes, todos apresentando evidn-cias eletrocardiogrficas de hipertrofia ventricularesquerda (22). Neste estudo, para cada aumento de 10vezes no valor da relao albumina/creatinina, o riscode morte por doena cardiovascular, infarto domiocrdio ou acidente vascular cerebral aumentava em57% em pacientes no diabticos e 39% em pacientesdiabticos.

    Microalbuminria e sndrome metablicaA microalbuminria mostra-se tambm freqentemen-te associada a outros fatores de risco cardiovascular(23), fazendo parte da condio que conhecemoscomo sndrome metablica. Esta se caracteriza pelaconstelao de fatores de risco cardiovascular queinclui hipertenso arterial, obesidade central, dislipi-demia, intolerncia glicose, um estado de hiper-coagulabilidade, alem de leso endotelial que semanifesta atravs da microalbuminria.

    Existem evidncias de que aproximadamente40% dos pacientes diabticos tipo 2 com microal-buminria, em decorrncia de leso vascular progres-siva, evoluiro ao longo de uma dcada para a condi-o de macroproteinria (24-26). Esta condio, querevela leso vascular mais grave, associa-se a um riscode eventos cardiovasculares ainda maior (17).

    Se considerarmos a vasta interface sanguefiltra-do glomerular provida por 500.000 a 1.000.000 deglomrulos renais, fica fcil compreender porque umsinal de leso na superfcie vascular envolvida na filtra-o glomerular pode representar medida fidedigna decomprometimento vascular generalizado por todo oorganismo. A excreo aumentada de albumina ou

    protena na urina de pacientes diabticos seriaresultado de um distrbio mais abrangente da funode barreira da clula endotelial, ocorrendo tambm namacrocirculao, especialmente nas coronrias, onde atransudao da protena do plasma para a parede dovaso poderia promover o processo aterognico (27).Assim, a microalbuminria, parmetro de avaliao damicrocirculao renal, pode ser utilizada tambmcomo parmetro de leso vascular generalizada, noconfinada aos glomrulos. Nesta condio, existe,portanto, a necessidade de maior ateno para asmedidas de controle dos diversos fatores de riscocardiovascular, em particular da hipertenso arterial,objetivando atingir com mais rigor as metas dessecontrole e a proteo vascular. Embora as diretrizespreconizem que valores da presso arterial inferiores a130/80 mmHg devam ser atingidos para maiorproteo renal e cardiovascular (28,29) em pacientesdiabticos, possvel que nveis at mais baixos pre-cisem ser atingidos quando se constata a presena demicroalbuminria.

    Resultados de estudos mais recentes mostramque mesmo valores baixos da albuminria, beminferiores queles que atualmente definem a microal-buminria, tem sido associados a um aumento do riscocardiovascular, fazendo crer que os limites da norma-lidade devam ser revistos.

    No Third Copenhagen City Heart Study (30)foram includos, entre 1992 e 1994, 1.734 pacienteshipertensos sem histria de doena coronariana, queforam submetidos a coleta de urina para a medida daalbuminria durante 12 horas noturnas, e seguidos at2000 no que se referia ao desenvolvimento de doenacoronariana e at 2004 no que se referia mortalidade.

    Durante o seguimento, 123 pacientes apresen-taram evidncias de doena coronariana e foram cons-tatadas 309 mortes. A incidncia de doena corona-riana foi de 11% em indivduos com excreo urinriade albumina 5 g/min e de 5% em indivduos comexcreo urinria de albumina < 5 g/min (p< 0,001).

    Da mesma forma, a mortalidade acumulada noperodo foi de 28% e 13% (p< 0,001) nos indivduoscom excreo urinria de albumina maior e menor que5 mg/min respectivamente. Os riscos relativos dedoena cardaca coronariana e morte associada excreo urinria de albumina 5 g/min foram de2,0 (1,4 a 2,9; p< 0,001) e 1,9 (1,5 a 2,3; p< 0,001),respectivamente.

    Tambm foi observado maior risco de desen-volvimento de hipertenso arterial associado a nveisbaixos de albuminria em 1.499 indivduos no diab-ticos normotensos seguidos por 2,9 anos no Fra-

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    mingham Heart Study (31). Em anlise multivariadaajustada para os conhecidos fatores de risco, a razo dachance de desenvolvimento de hipertenso foi de 1,20para cada desvio padro da relao albumina/creatinina.Os indivduos que apresentavam valores da relaoalbumina/creatinina no quintil superior (6,6 mg/gnos homens, 15,4 mg/g nas mulheres) em relaoqueles com valores no quintil mais inferior, apresen-taram uma probabilidade 1,93 maior de desenvolverhipertenso.

    Hipertenso arterialA presso arterial elevada um fenmeno precoce efreqente na nefropatia diabtica, e tem sido docu-mentada uma relao direta entre a presso arterial e ataxa de declnio de TFG em pacientes com diabetestipos 1 e 2 (32,33). Vrios estudos mostram claramen-te que a terapia anti-hipertensiva precoce e intensivareduz com eficcia tanto a albuminria quanto a taxade declnio da TFG em pacientes com nefropatiadiabtica clinicamente manifesta (34,35).

    Contrariamente ao que ocorre no diabetes tipo1, nos pacientes com diabetes tipo 2, a hipertenso nonecessariamente est vinculada presena de doenarenal e, em geral, precede o diagnstico de diabetes. Ahipertenso duas vezes mais freqente em pacientesdiabticos que em no diabticos e est fortementerelacionada ao aumento do peso corporal, resistncia insulina e hiperinsulinemia (36).

    A hipertenso aumenta o risco de morbidade emortalidade cardiovascular, especialmente quando afuno renal comea a decair (10,25,26). A combi-nao de diabetes e hipertenso est associada a umaumento de cerca de 4 vezes no risco cardiovascular, secomparada populao diabtica normotensa. Adler ecols. avaliaram o risco de complicaes diabticasassociadas presso arterial sistlica (PAS) em 3.642pacientes com diabetes tipo 2 recm diagnosticados,entre 25 e 65 anos de idade, inscritos no UKPDS (37).

    Os pacientes foram acompanhados por cerca de10,4 anos para avaliao da mortalidade por todas ascausas, infarto do miocrdio, insuficincia cardaca,AVC, amputao da extremidade inferior ou compli-caes microvasculares. O aumento da PAS foi signi-ficativamente associado tanto mortalidade quanto aodesenvolvimento das complicaes (p< 0,0001). Oaumento de risco medida que se eleva a PAS semostrou contnuo e linear, sugerindo a inexistncia deum ponto de corte para a ocorrncia de qualquercomplicao decorrente do diabetes ou para morte.

    Sendo a hipertenso um dos principais fatoresque contribuem para as complicaes do diabetes, o

    controle dos nveis pressricos essencial na terapia depacientes com nefropatia diabtica. Dados obtidos noUKPDS (38) e no HOT Study (39) mostraram que ocontrole da presso arterial de forma intensiva no sreduz as complicaes e a mortalidade no diabetes tipo2, mas tambm que no existe um limite inferior dapresso arterial estabelecido abaixo do qual no se devaprosseguir com o tratamento. Quanto mais baixos osnveis pressricos, menores os riscos de complicaes

    Angiotensina II (AII) e nefropatia diabticaApesar da atividade plasmtica de renina encontrar-sereduzida em pacientes diabticos (40), estudosmltiplos em modelos animais mostram que os nveisteciduais de renina e mesmo a produo de renina sonormais ou at mesmo elevados (41). Portanto, asmedidas da atividade da renina ou mesmo da AII nacirculao podem ser enganosas, fornecendo poucasinformaes sobre o estado do sistema reninaangio-tensina intra-renal. Vale lembrar que a AII a media-dora principal do SRA e parece ser responsvel porimportantes efeitos patolgicos em nvel celular pormeio de estimulao do receptor AT1 da AII.

    Os benefcios dos bloqueadores do sistemareninaangiotensina na nefropatia diabtica so vistoscomo resultado, pelo menos em parte, da atenuaodos efeitos da AII na presso arterial e na hemodin-mica glomerular (42). Evidncias indiretas indicamque a acentuada resposta vasodilatadora renal aosinibidores da enzima conversora da angiotensina(IECAs) e aos bloqueadores dos receptores da AII(BRAs) em pacientes diabticos pode ser atribuda reduo dos efeitos da AII no rim. Ao reduzir osefeitos vasoconstritores da AII na arterola glomerulareferente, os IECAs reduzem a presso intraglomerular,a qual parece ser um determinante importante da pro-gresso de nefropatia diabtica.

    Em indivduos saudveis e pacientes hiperten-sos, os BRAs possuem efeitos idnticos aos dos IECAsna hemodinmica renal, decorrente de sua ao diretasobre os receptores de AT1 (43). Tambm tem sidodemonstrado que os BRAs so capazes de reduzir otamanho dos poros excessivamente grandes da mem-brana glomerular, um mecanismo tambm envolvidono efeito antiproteinrico destes agentes. Experimen-talmente, j se demonstrou que o efeito antiprotei-nrico do irbesartana se associa ao aumento da expres-so glomerular da nefrina, que reduz a permeabilidadeda membrana glomerular comprometida (44).

    A AII tambm exerce, nos rins, efeitos quepodem contribuir para aumentar a produo da matrizextracelular, estimulando a sntese da TGF-1 por

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    meio da ativao do seu receptor AT1 (45). A AIItambm ativa a protena quinase C (PK-C) nas clulasrenais tubulares proximais e mesangiais por meio dosreceptores AT1 (46). Esses efeitos no-hemodinmi-cos da AII so muito semelhantes aos da hiperglicemiae existem evidncias, obtidas in vitro e in vivo, de quea hiperglicemia ativa o sistema reninaangiotensinatecidual (12,47).

    Microalbuminria: importncia do bloqueio do SRAA capacidade de reduzir a presso intraglomerular e apermeabilidade da membrana glomerular explica oefeito antiproteinrico dos IECAs e BRAs demonstra-do em estudos randomizados prospectivos de desfecho,os quais documentaram menor velocidade de deterio-rao da funo renal durante o bloqueio do SRA.

    O uso de IECAs e BRAs tem se mostradonitidamente benfico, no s para promover proteorenal em pacientes com nefropatia diabtica comotambm para promover proteo cardiovascular empacientes diabticos com outros fatores de risco(20,21). Com relao proteo renal, a maioria dosresultados com IECAS foi obtida em pacientes comdiabetes tipo 1. Resultados mais recentes foramobtidos com BRAs em pacientes diabticos do tipo 2.

    Os estudos RENAAL (48) (The Reduction inRenal Endpoints in Type 2 Diabetes with Angiotensin IIAntagonist Losartan) e IDNT (49) (IrbesartanDiabetic Nephropathy Trials) foram realizados empacientes com diabetes tipo 2, hipertensos, cominsuficincia renal inicial e proteinria clnica. Oresultados mostraram claramente que o bloqueio dosreceptores AT1 da AII, quer com 100 mg de losartan,quer com 300 mg de irbesartana, mostrou-se como aestratgia mais eficiente para prevenir o desfechocomposto, que inclua duplicao nos nveis sricos decreatinina, insuficincia renal terminal ou morte,quando comparada abordagem teraputica tradicio-nal que compreendia o uso de medicao anti-hiper-tensiva sem o emprego de bloqueadores do sistemareninaangiotensina.

    A importncia de se reduzir a excreo urinriade protenas foi demonstrada no estudo IDNT, ondea proteinria inicial foi capaz de prever a progressopara os desfechos do estudo, mostrando um riscodobrado para cada duplicao nos valores da protenaurinria. Alm disso, reduo de 50% na proteinriaobservada aos 12 meses de tratamento com irbesartanase associou a uma reduo de 50% no risco deduplicao da creatinina ou de atingir os estgios finaisda insuficincia renal.

    Embora o uso de bloqueadores do sistemareninaangiotensina seja importante na preveno danefropatia diabtica, importante lembrar que o con-trole da presso arterial essencial e que a maioria dospacientes requer a combinao de mltiplas drogas parareduzi-la a nveis que permitam a correo da hiper-tenso no capilar glomerular e a reduo mxima daproteinria. Embora se preconize que em pacientesdiabticos devam ser atingidos valores da pressoarterial abaixo de 130/80 mmHg, possvel que amanuteno de nveis ainda mais baixos possa trazermaiores benefcios.

    Talvez se deva procurar atingir nveis de pressoarterial suficientes para reduzir a microalbuminria empelo menos 50%, incluindo sempre, entre os anti-hipertensivos utilizados, bloqueadores do sistemareninaangiotensina em doses mximas. No estudoIRMA2 (50), no grupo de pacientes diabticos tipo 2microalbuminricos em tratamento com 300 mg/diade irbesartana, uma reduo de 46% na albuminria seassociou, aps dois anos, menor progresso da lesorenal para a fase proteinrica, quando comparada elevao de 9% observada no grupo controle, no quala medicao anti-hipertensiva no inclua bloquea-dores do SRA (5,2% vs. 14,9%, respectivamente). Esteefeito se mostrou independente da ao anti-hipertensiva da droga, uma vez que os trs gruposestudados, tratados com placebo ou irbesartana nasdoses de 150 e 300 mg, atingiram nveis semelhantesda presso arterial. Alm disso, no grupo de pacientesem uso de 300 mg de irbesartana, 34% dos pacientesmicroalbuminricos tornaram-se normoalbuminricos,o que ocorreu em apenas 21% dos pacientes em uso deplacebo (p< 0,0006).

    Mais recentemente, demonstrou-se que a utili-zao de 900 mg de irbesartana em dose nica diriaem pacientes diabticos tipo 2 com microalbuminriapromove um bloqueio ainda mais completo do sistemareninaangiotensina e uma reduo adicional na excre-o urinria de albumina, independente de alteraesnos nveis pressricos e na filtrao glomerular (51).

    Os pacientes que apresentavam os valores maiselevados da albuminria com a dose de 300 mg foramos que mais se beneficiaram com o uso da dose de 900mg. Estudos adicionais so necessrios para se verificarse existem benefcios da utilizao desta dose elevadatambm na fase proteinrica da nefropatia diabtica, ese um efeito antiproteinrico maior pode ser obtidocom doses ainda mais elevadas de irbesartana, uma vezque um plat na curva de dose-resposta no foiatingido, apesar da dose de 900 mg ser muito superior usualmente recomendada (51).

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    Com relao utilizao dos inibidores da ECAem pacientes com diabetes tipo 2 e microalbuminriaou proteinria instalada, o nico estudo aleatriocomparou o enalapril ao BRA, a telmisartana, no ensaioDETAIL, que incluiu 250 pacientes com nefropatiainicial, definida pelo valor da albuminria (82% commicroalbuminria e 18% macroalbuminria de no m-ximo de 1,4 g/dia) e uma taxa de filtrao glomerular(TFG) basal (medida com a utilizao de radiois-topo) de cerca de 93 ml/min por 1,73 m2 (52).

    Uma queda na TFG mais acentuada, prxima a10,0 mL/min por 1,73 m2, aps cinco anos, foi pr-definida como indicador de uma diferena clinica-mente significativa entre os grupos. Aps cinco anos,houve uma queda mais atenuada na TFG do grupoenalapril, no significativa estatisticamente (14,9versus 17,9 mL/min por 1,73 m2 no grupo telmi-sartana). Ambos os grupos se mostraram semelhantespara os desfechos secundrios, os quais incluramalteraes anuais na TFG, presso arterial, creatininasrica, albumina urinria, doena renal crnicaterminal, eventos cardiovasculares e mortalidade.

    As duas limitaes do estudo foram as de quesomente 168 dos 250 pacientes concluram o estudo ede que somente 20% apresentaram macroalbuminria.Embora tenha sido feita apenas esta nica comparaoentre as duas classes de bloqueadores do sistemareninaangiotensina, os resultados condizem com ahiptese de que os inibidores de ECA seriam pelomenos to eficazes quanto os BRAs em pacientesdiabticos com microalbuminria.

    Combinao de um IECA com um BRADiscute-se se haveria vantagens na associao de umIECA com um BRA. Em um estudo clnico controladoque incluiu pacientes diabticos do tipo 2 com microal-buminria, o lisinopril (20 mg/dia) e a candersartana(16 mg/dia) produziram redues equivalentes na pres-so arterial, mas que se mostraram inferiores quela ob-tida com a terapia combinada (14,1/10,7 e 16,7/10,4mmHg versus 25,3/16,3 mmHg) (53). A candesar-tana tambm provocou reduo da albuminria, maseste efeito se mostrou menor que o obtido com o lisi-nopril ou com a terapia combinada. Entretanto, a com-binao dos dois agentes no foi comparada a dosesmximas de cada um dos agentes administrados isolada-mente. possvel que doses maiores de cada um delesisoladamente resultassem em redues equivalentes ouat maiores daquela obtida com a combinao. De fato,com relao irbesartana, j se demonstrou que oaumento da dose utilizada promove reduesadicionais na excreo urinria de albumina (51).

    RecomendaesA deteco da microalbuminria medida impor-tante para identificar indivduos com maior risco dedoena cardiovascular e com leso renal passvel deprogresso para a insuficincia renal. O rastreamentopara microalbuminria, segundo as recomendaesda American Diabetes Association e da SociedadeBrasileira de Diabetes, deve ser feito anualmente empacientes diabticos do tipo 1 a partir do quinto anodo diagnstico e em pacientes com diabetes do tipo2 a partir do diagnstico. A presena de microal-buminria requer maior ateno para as medidas decontrole da presso arterial, que deve ser mantida emnveis inferiores a 130/80 mmHg, assim como paraas medidas de controle dos lpides e glicemia, alm daadoo de medidas eficazes na reduo da excreourinria de albumina como o uso de inibidores daECA ou de antagonistas da angiotensina II. Estesltimos, em pacientes diabticos do tipo 2 j na faseproteinrica da nefropatia diabtica, se mostraramcomprovadamente eficazes para promover renopro-teo e certo grau de cardioproteo, uma vez quetambm reduziro a necessidade de hospitalizaespor insuficincia cardaca (48,49).

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    Endereo para correspondncia:

    Maria Teresa ZanellaRua Leandro Dupret 36504025-002 So Paulo, SPE-mail: [email protected]