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10 FACULDADE BOA VIAGEM MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO ROBERTA DE MORAES GUERRA Microcrédito como Ferramenta de Melhoria de Qualidade de Vida na Comunidade Diamante PE Recife 2008

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FACULDADE BOA VIAGEM

MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO

ROBERTA DE MORAES GUERRA

Microcrédito como Ferramenta de Melhoria de Qualidade de Vida na

Comunidade Diamante – PE

Recife

2008

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ROBERTA DE MORAES GUERRA

Microcrédito como Ferramenta de Melhoria de Qualidade de Vida na

Comunidade Diamante – PE

Dissertação apresentada como

requisito complementar para obtenção

do grau de Mestre em Administração

do Centro de Pesquisa e Pós-

Graduação em Administração (CPPA)

da Faculdade Boa Viagem

Orientador: Professor Olimpio José de Arroxelas Galvão, Ph.D.

Recife

2008

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ROBERTA DE MORAES GUERRA

Microcrédito como Ferramenta de Melhoria de Qualidade de Vida na

Comunidade Diamante – PE

Dissertação submetida a Banca

Examinadora do Mestrado em

Administração do Centro de Pesquisa

e Pós-Graduação em Administração

(CPPA) da Faculdade Boa Viagem

Em: _____/_____/_______

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________________________________

Olimpio José de Arroxelas Galvão, Ph.D.,Faculdade Boa Viagem (Orientador)

_____________________________________________________________

Ferdinand Rohr, Doutor, Universidade Federal de Pernambuco (Examinador Externo)

________________________________________________________________

José Raimundo de Oliveira Vergolino, Ph.D., Faculdade Boa Viagem (Examinador Interno)

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“Possivelmente a maior lição da vida a ser aprendida é a

liberdade: liberdade em relação às circunstâncias, ao ambiente, a

outras personalidades e, para muitos de nós, em relação a nós

mesmos...” (Edward Bach)

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Dedico este trabalho a minha avó materna, Vego, a minha

mãe, Eliane, e ao meu amado marido, Tota.

Esta dedicatória é mais que um agradecimento a vocês,

cujo amor, a credibilidade que em mim depositaram, e o

apoio incondicional me fizeram chegar até aqui.

Amo muito vocês.

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AGRADECIMENTOS

Ao final de mais uma caminhada quero agradecer ao Pai, que está sempre me

mostrando os melhores caminhos.

À minha família, pelas palavras e atos de incentivo.

Ao meu orientador e professor, Olimpio Galvão, pelas várias contribuições.

Ao professor Ferdinand Rohr pelo seu apoio e contribuição, de valor inestimáveis à conclusão

deste trabalho.

À minha irmã Daniela, que mesmo a distancia sempre me incentivou.

À querida professora Sumaia Madi, que com sua sabedoria fez tudo parecer tão simples

quando eu já não tinha mais forças para continuar.

Aos meus alunos que sempre acreditaram que eu teria sucesso nessa jornada.

Ao colega de mestrado Jenner Rego, pela sua enorme boa vontade e prestatividade.

À Dona Madalena e todos os integrantes da comunidade Diamante, por terem aberto a porta de

suas casas e de suas vidas tão gentil e desprendidamente, permitindo a realização desse

trabalho.

Aos meus colegas do mestrado, pelo maravilhoso período que passamos juntos.

À todas as pessoas que direta ou indiretamente contribuíram para essa conquista.

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RESUMO

Esta Dissertação teve como objeto de estudo uma comunidade rural no interior de Pernambuco,

situada na Zona da Mata Norte, denominada comunidade Diamante. Seu objetivo principal foi

analisar se, após o acesso ao programa de microcrédito rural do PRONAF, os integrantes da

comunidade tiveram melhoria de qualidade de vida e se o programa contribuiu para promover a

auto-sustentabilidade da comunidade.

O trabalho foi baseado em um estudo de caso, investigando a formação da comunidade,

a sua relação com o programa de microcrédito e a geração de renda permanente para os

agricultores, permitindo-lhes a auto-sustentabilidade. O papel que a associação de moradores

exerceu no desenvolvimento dessa comunidade também foi uma questão importante a merecer

análise.

A pesquisa, realizada em bases qualitativas, usou como método de coleta de dados a

entrevista aberta e a análise de conteúdo, como forma de compreender de que maneira se

processaram essas relações.

Os resultados identificam que houve melhoria de qualidade de vida para os integrantes

da comunidade Diamante, caracterizada principalmente pelo acesso à educação, saúde, bens

de consumo e geração de renda.

Os achados mostram, também, que a auto-sustentabilidade ocorreu estreitamente

interligada ao apoio que a associação de moradores forneceu à comunidade, através do auxílio

na gestão de seus pequenos empreendimentos.

A percepção dos entrevistados sobre a ação da associação dos moradores foi positiva,

pois a mesma oferece suporte para o desenvolvimento dos integrantes da comunidade, tanto

em aspectos relacionados ao trabalho, quanto nos aspectos sócio-educacionais, influenciando a

formação de uma cultura que valoriza o coletivo e os laços de solidariedade.

Palavras-Chaves: Microcrédito, PRONAF, Comunidades Rurais, Auto-sustentabilidade,

Qualidade de Vida.

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ABSTRACT

This Dissertation aimed at the study of a rural community in the interior of the state of

Pernambuco, located in the Zona da Mata Norte, called Comunidade Diamante. Its main

objective was analyzing if, after the access to the PRONAF microcredit rural program, the

community members achieved a better quality of life and if the program has contributed to

promote the self-sustainability of the community.

The work was based in a case study, investigating the creation of the community, its

relationship with the microcredit program and its capacity to generate permanent income for the

agriculturists, allowing them self-sustainability. The role that the functioning of the community

association played in its developed was also evaluated.

The research, undertaken in a qualitative basis, made use of open interviews as a means

of data collection

The main results of the field research identified a substantial improvement in the quality

of life of the community members, especially through the access to education, health services,

consumption goods and income generation.

The field research findings also showed that self-sustainability was largely a product of

the support by the community association, which provided, since the beginning, most of the

support that the community needed to manage the small undertakings of its members.

It remained clear, in the perception of the interviewed population, that the association role

was crucial for community success, as far as economic, social and educational aspects are

concerned, and that in doing so the association has largely contributed to the development of a

collective culture of solidarity among its members.

Key-words: Microcredit, PRONAf, Rural communities, Self-sustainability, Quality of Life.

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LISTA DE SIGLAS

FIESPE – Federação das Industrias do Estado de Pernambuco

IMF – Instituição Microfinanceira

ONG – Organização não-governamental

ONU – Organização das Nações Unidas

OSCIP - Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público

PMPO – Programa de Microcrédito Produtivo Orientado

PMNPO – Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado

PRONAF - Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar

SCM - Sociedade de Crédito ao Microempreendedor

SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio as Micro e Pequenas Empresas

SENAC – Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial

UFRPE – Universidade Federal Rural de Pernambuco

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO........................................................................................ 10

1.1 Contextualização................................................................................... 10

1.2 Caracterização da Comunidade........................................................... 14

1.3 Pergunta de Pesquisa........................................................................... 15

1.4 Objetivo da Pesquisa............................................................................ 15

1.4.1 Geral........................................................................................................ 15

1.4.2 Específico............................................................................................... 15

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA.............................................................. 16

2.1 Microcrédito e Microfinanças............................................................... 16

2.2 Objetivos do Microcrédito.................................................................... 20

2.3 Marco Legal e Estrutural Institucional................................................ 21

2.4 História das Microfinanças.................................................................. 24

2.4.1 O Caso da Irlanda................................................................................... 24

2.4.2 O Caso da Alemanha.............................................................................. 25

2.4.3 Outras Experiências Internacionais......................................................... 27

2.5 Microfinanças no Brasil........................................................................ 28

2.5.1 Iniciativas Pioneiras e Evolução do Microcrédito no Brasil..................... 28

2.6 O Crédito Rural do PRONAF................................................................ 30

2.6.1 Público-Alvo, Grupos e Linha do PRONAF............................................. 32

3 METODOLOGIA..................................................................................... 34

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3.1 Delineamento da Pesquisa................................................................... 34

3.1.1 Estudo de Caso..................................................................................... 35

3.2 Coleta de Dados.................................................................................... 37

3.2.1 Processo................................................................................................. 37

3.2.2 Roteiro de Entrevista.............................................................................. 38

3.2.3 Entrevistados........................................................................................... 39

3.3 Análise de Dados.................................................................................. 39

4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS................................................ 41

4.1 A Formação da Comunidade da Fazenda Diamante.......................... 41

4.2 Qualidade de Vida................................................................................. 43

4.3 O Microcrédito como Gerador de Melhoria de Qualidade de Vida... 56

4.4 Investimento Auto-Sustentável............................................................ 71

5 CONCLUSÂO......................................................................................... 85

REFERÊNCIAS....................................................................................... 91

APÊNDICES .......................................................................................... 95

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1. INTRODUÇÃO

1.1. Contextualização

O combate à pobreza é um dos principais objetivos na pauta dos organismos

internacionais, assim como de todas as nações.

A vital necessidade de se combater a pobreza e os seus efeitos desastrosos

estabelecem o tema como prioritário e ampliam o debate para várias esferas da

sociedade, em especial nos países com avançados níveis de desigualdade social,

como o Brasil.

O tema exige tal atenção que vários organismos internacionais de relevante

importância, como a Organização das Nações Unidas e o Banco Mundial, vêm

investindo grandes esforços na busca de políticas e ações capazes de superar a

pobreza extrema.

Contundente indicação deste objetivo é o projeto lançado pela ONU, e acordado

entre os 191 países membros, intitulado Millennium Development Goals que objetiva

reverter, até 2015, o quadro de pobreza, fome e doenças opressivas que afetam bilhões

de pessoas no mundo.

Não é o foco deste trabalho discutir a pobreza e suas dimensões em termos

gerais, mas reconhecer o tema como marco norteador de estudos e trabalhos que

culminaram em sugestões e ações políticas e econômicas para superação de tal

problema.

Duas idéias centrais estão presentes na maioria dos estudos dedicados a temas

correlatos à pobreza: Crescimento econômico e Políticas públicas que contemplem o

desenvolvimento local e a inclusão social.

Dentro deste contexto inclui-se o acesso ao crédito como ferramenta de

desenvolvimento local e conseqüentemente de combate à pobreza.

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Néri (2005) defende a idéia de que o crédito em si mesmo não gera

oportunidades de negócios, mas somente viabiliza a realização das oportunidades

existentes, e que, quando este é utilizado com eficiência, apóia a abertura de

empreendimentos produtivos.

Contudo, o crédito nos países menos desenvolvidos, e em especial no Brasil, é

bastante caro, o que dificulta a vida de quem deseja produzir.

Se para as empresas de médio e grande porte a situação de crédito é complexa,

para as micro ela se torna proibitiva na medida em que não são capazes de oferecer

garantias reais para a tomada de empréstimos. Ainda segundo Néri (2005) a grande

maioria das microempresas não têm acesso a créditos públicos facilitados e a

incentivos que as grandes empresas possuem, nem tampouco conseguem captar

empréstimos no exterior, o que as deve tornar mais vulneráveis ao problema de crédito

nacional.

Assim, é foco deste trabalho discutir a temática do microcrédito, avaliando seu

desempenho no embate contra a pobreza e sua importância na transformação da

qualidade de vida da população economicamente menos favorecida.

É muito comum na literatura a referência a dois termos que tratam de assuntos

correlatos: microcrédito e microfinanças. Assim, um esclarecimento prévio de ambos

evitará possíveis dúvidas. De acordo com Schiavinotto (2004), enquanto a microfinança

compreende tanto os serviços de crédito como os de poupança, o microcrédito limita a

sua atuação unicamente à concessão de empréstimos. O que existe em comum nos

dois termos é que tanto os empréstimos, como os serviços de captação de poupança,

são direcionados para uma população de baixa renda.

O uso de serviços relacionados à microfinanças vem crescendo paulatinamente,

e hoje o microcrédito se faz presente em quase todos os países menos desenvolvidos e

até mesmo em países ricos. Grande parte dos programas de microcrédito direciona-se

explicitamente a ações promotoras de melhoria da qualidade de vida e de combate à

pobreza. Contudo, existem especialistas no assunto que partem de uma outra

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perspectiva, a de que é possível priorizar o lucro financeiro sobre os outros aspectos

sociais.

Existe uma vasta e rica controvérsia sobre o papel subsidiador do Estado na

oferta de crédito.

Alguns sustentam que o crédito subsidiado acabaria enfraquecendo as iniciativas

microfinanceiras, liquidando a possibilidade desse setor de atividade conquistar

sustentabilidade sem distorcer as condições do mercado. Outros, ao contrário, pensam

que, diante das carências de segmentos majoritários de vários países, é uma obrigação

pública usar o microcrédito como um instrumento de desenvolvimento social.

Independente da perspectiva que este tema esteja sendo observado, é possível

afirmar que os investimentos neste tipo de iniciativa vêm crescendo, através da

participação de componentes da sociedade civil, de organismos internacionais,

governos, instituições sem fins lucrativos, e até de filantropos com intuitos voltados para

o desenvolvimento local, a inclusão social ou o lucro financeiro.

Vale assinalar que no dia 18 de novembro de 2004, em cerimônia na Bolsa de

Nova Iorque, a Organização das Nações Unidas (ONU) lançou o movimento Ano

Internacional do Microcrédito 2005, com o objetivo de propagar o tema e promover

parcerias entre governos, organizações internacionais, ONGs, setor privado, mundo

acadêmico e clientes das microfinanças. De acordo com Alves e Soares (2006, p.18) o

resultado esperado pelos idealizadores do movimento é o aumento do acesso aos

serviços financeiros, principalmente o crédito, para famílias pobres de modo a

proporcionar a geração de renda e perspectiva de segurança e prosperidade futuras.

Assim este movimento reflete o microcrédito como uma importante ferramenta para

cumprimento das metas do milênio, estabelecida em âmbito das Nações Unidas, e que

projeta como uma das metas a redução pela metade da pobreza absoluta no mundo até

2015. Este foi o maior exemplo de dedicação da atenção mundial com as

microfinanças. e esta certeza ficou explicita nas palavras do secretário-geral da ONU,

Koffi Annan, durante o lançamento do Ano Internacional do Microcrédito:

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O ano internacional do microcrédito 2005 sublinha a importância das microfinanças como parte integral de nosso esforço coletivo para cumprir com os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. O acesso sustentável a microfinanças ajuda a minimizar a pobreza por meio da inclusão social e da criação de empregos, possibilitando as crianças o acesso à escola, as famílias obter assistência à saúde, e as pessoas a capacidade de tomar decisões que se adaptem às suas necessidades. O grande objetivo que teremos pela frente é retirar do caminho as travas que excluem as pessoas e as impedem de participar cabalmente do setor financeiro. Juntos podemos e devemos criar setores financeiros que promovam a inclusão social e ajudem as pessoas a melhorar suas vidas. (ANNAN, 2003, p.-) falta referencia

A idéia central desta dissertação é a de que é importante, para qualquer

sociedade interessada em desenvolver-se e erradicar a pobreza, avaliar atentamente

as iniciativas propostas pelas instituições microfinanceiras, focando o estudo nos

principais resultados alcançados.

Para tanto, esta dissertação terá como objeto de pesquisa uma comunidade rural

denominada Fazenda Diamante, estabelecida no município de Goiana, Zona da Mata

Norte de Pernambuco, formada por 75 famílias, todas beneficiadas por programas de

microcrédito.

O foco desta pesquisa será analisar o efeito do microcrédito como instrumento

de combate à pobreza, conseqüente promoção de melhoria de qualidade de vida e

geração de auto-sustentabilidade para as famílias que compõem a comunidade

Fazenda Diamante.

No intuito de dirimir quaisquer dúvidas sobre os conceitos que esta pesquisa

utiliza para definir qualidade de vida e auto-sustentabilidade, eles estarão descritos no

capítulo de análise e discussão dos resultados

1.2. Caracterização da Comunidade

Fundada em 1991 a comunidade Fazenda Diamante é composta por 152

hectares de terra, igualitariamente divididos para as 75 famílias que lá residem.

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Composta por famílias de agricultores rurais, a comunidade, atualmente já com

17 anos de formada, conta com uma estrutura comunitária que inclui uma casa de

farinha que beneficia a produção de mandioca das unidades familiares, uma mini

fábrica de laticínios, uma fábrica artesanal de doces de frutas cultivadas na própria

comunidade, uma fábrica de picolé caseiro, escola, posto de saúde e uma associação,

de moradores que trabalha para discutir as necessidades de progresso da comunidade.

.

A partir de 1996, as famílias da comunidade Fazenda Diamante passaram a fazer parte

do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – Pronaf, e assim

tiveram seu primeiro contato com um programa de microcrédito. Nos anos que se

seguiram, as famílias continuaram a fazer uso desta ferramenta, microcrédito, para

desenvolver atividades geradoras de renda.

Atualmente, a comunidade, já com 17 anos de formada, conta com uma estrutura

comunitária que inclui uma casa de farinha que beneficia a produção de mandioca das

unidades familiares, uma mini fábrica de laticínios, uma fábrica artesanal de doces de

frutas cultivadas na própria comunidade, uma fábrica de picolé caseiro, escola e posto

de saúde.

Na tentativa de buscar recursos para investir de forma produtiva na comunidade, os

moradores fundaram também uma associação, composta das figuras de presidente,

vice-presidente, tesoureiro e conselheiro, que realizam assembléias mensais para

discutir as necessidades de progresso da comunidade e as rotas de investimento.

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1.3 Pergunta de Pesquisa

A utilização do microcrédito proporcionou melhoria de qualidade de vida e auto-

sustentabilidade para as famílias da comunidade Fazenda Diamante ?

1.4 Objetivos da Pesquisa

1.4.1 Geral:

Analisar os efeitos do microcrédito como gerador de melhoria de qualidade de vida e

auto-sustentabilidade para as famílias da comunidade Fazenda Diamante.

1.4.2 Específicos:

a)Descrever o processo de formação da comunidade Fazenda Diamante

b) Analisar, a partir de experiências individuais, a ocorrência de mudanças

comportamentais decorrentes do acesso ao microcrédito que implicaram melhoria de

qualidade de vida;

c) Verificar os benefícios do processo de melhoria de qualidade de vida através da

aquisição de bens de consumo e serviços

d) Analisar como os recursos recebidos foram utilizados por cada membro da sociedade

e) Analisar se o acesso ao microcrédito gerou auto-sustentabilidade às famílias da

comunidade Fazenda Diamante.

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2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1. Microcrédito e Microfinanças

Para dirimir possíveis dúvidas de natureza terminológica será esclarecida a

ambigüidade existente entre microcrédito e microfinanças, e entre microcrédito, crédito

popular e microcrédito produtivo orientado, pois essas definições sobrepõem-se,

frequentemente, anulando as diferenças.

A literatura distingue as organizações de microcrédito das de microfinanças

através do escopo de serviços oferecidos por cada uma delas.

Como já citado anteriormente Schiavinotto (2004) explica que enquanto a

microfinança compreende tanto os serviços de crédito como os de poupança, o

microcrédito limita a sua atuação unicamente à concessão de empréstimos.

Assim caracteriza-se microfinanças como “um conjunto de serviços financeiros

(poupança, créditos e seguros), prestado por instituições financeiras ou não, para

indivíduos de baixa renda e microempresas (formais e informais) excluídas, ou com

acesso restrito, do sistema financeiro tradicional”. (NICHTER, 2002; NAQVI;

GUZMAN,2004). Neste contexto microcrédito é apenas um dos serviços financeiros

oferecidos por instituições de microfinanças.

Abrangendo este conceito, microfinanças compõe “a prestação de serviços

financeiros adequados, e sustentáveis para a população de baixa renda

constantemente excluída do sistema financeiro tradicional com a utilização de produtos,

processos e gestão diferenciados”. (SERVIÇO BRASILEIRO DE APOIO AS MICRO E

PEQUENAS EMPRESAS - SEBRAE, 2005).

Inserida no contexto de microfinanças , a atividade de microcrédito, é então

definida como aquela que se dedica apenas a conceder pequenos créditos a uma

população economicamente menos favorecida. Nesta perspectiva vale ressaltar que o

microcrédito é comumente identificado como a principal atividade do setor de

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microfinanças, dada a importância que tem junto às políticas públicas de redução da

miséria e geração de renda.

Sandroni (2005, p. 540) assinala que o microcrédito é um crédito fornecido em

pequena escala para pessoas menos favorecidas, destinado ao crescimento de seus

negócios e que deve ser usado de alguma forma como “investimento” em seus

empreendimentos. Ratificando assim a também muito utilizada terminologia,

Microcrédito Produtivo.

De acordo com Nichter (2002), o microcrédito é a “concessão de empréstimos de

relativamente pequeno valor, para a atividade produtiva, no contexto das

microfinanças”. Para Barone, Lima, Dantas et al. (2002), “microcrédito é a concessão de

empréstimos de baixo valor a pequenos empreendedores informais e microempresas

sem acesso formal ao sistema financeiro tradicional, principalmente por não terem

como oferecer garantias reais. É um crédito destinado à produção (capital de giro e

investimentos) e é concedido com o uso de metodologia específica”.

Assim sendo, microcrédito seria o termo utilizado para a instituição que restringe-

se a concessão de crédito (especializado no segmento de pessoas economicamente

menos favorecidas), enquanto que microfinanças seria, por exemplo, um conjunto de

serviços financeiros voltado ao atendimento das necessidades das camadas menos

privilegiadas, envolvendo créditos, poupanças e seguros.

Esse conceito lança uma perspectiva evolutiva, “do microcrédito às

microfinanças”, elucidada em Ribeiro (2004).

Ainda no sentido da evolução do conceito, a existência de serviços de poupança,

por exemplo, pode ter implicações não apenas quanto à sustentabilidade, mas também

relacionadas ao impacto na vida ou no negócio dos membros/clientes das

organizações.

Levando-se em conta os conceitos definidos acima, o Banco Grameen de

Bangladesh não seria uma organização apenas de microcrédito, embora tenha sido

assim que esta tornou-se mundialmente reconhecida, pois atualmente o banco também

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desenvolve serviços de captação de poupança e de concessão de empréstimos não

voltados exclusivamente para o financiamento de atividades produtivas.

Nesta dissertação será adotada a definição de microcrédito utilizada pela

organização do Microcredit Summit1, que retrata as instituições de microcrédito como

aquelas que fazem

empréstimos pequenos para pessoas muito pobres, para gerar renda por meio de

atividades de auto-emprego, majoritariamente não formais.

Para microfinanças será usada a definição de Johnson e Rogaly (1997), qual

seja, a provisão de serviços financeiros voltados para os pobres, lidando com depósitos

e empréstimos muito pequenos.

Dentro dessa atmosfera de conceituação, faz-se necessário também distinguir

microcrédito de crédito popular, pois este último é frequentemente e inadequadamente

usado como sinônimo de microcrédito.

O uso indevido desses termos deve-se ao fato de bancos federais, como o

Banco do Brasil, através do Banco Popular, conceder créditos de pequenos valores

voltados, teoricamente, à população de baixa renda.

Em princípio as idéias dos programas são similares, o que os diferencia é fato de

que os créditos populares não condicionam o uso dos recursos à fins produtivos, sendo

usados em geral para consumo e quitação de dívidas. Além disso, o sistema de

garantias presente nesses programas não garante que tais recursos sejam

efetivamente canalizados para a população de baixa renda.

1 A Cúpula do microcrédito teve sua primeira reunião em fevereiro de 1997, quando conseguiu reunir, na

cidade de Washington D.C. mais de 2.900 pessoas vindas de 137 países com o intuito de prover crédito

para mais de 100 milhões de famílias pobres, na tentativa de tirá-los da pobreza. Essas reuniões

alcançaram grande êxito e desde então repetem-se anualmente, em países distintos. No ano de 2008 a

reunião da cúpula do microcrédito será sediada na Indonésia, entre os dias 28 e 30 de julho.

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Por último é necessário distinguir Microcrédito Produtivo (conceito de

microcrédito) de Microcrédito Produtivo Orientado, cuja principal característica é

desenvolver um relacionamento mais estreito entre a instituição de microcrédito e o

empreendedor, no intuito de promover sustentabilidade aos pequenos negócios através

de capacitação.

O Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado (PNMPO), iniciativa

do Governo Federal e instituído pela Lei nº 11.110, de 25 de abril de 2005, define

microcrédito produtivo orientado conforme abaixo (BRASIL, 2005):

“O microcrédito produtivo orientado é o crédito concedido para o atendimento

das necessidades financeiras de pessoas físicas e jurídicas empreendedoras de

atividades produtivas de pequeno porte, utilizando metodologia baseada no

relacionamento direto com os

empreendedores no local onde é executada a atividade econômica, devendo ser

considerado, ainda, que:

O atendimento ao empreendedor deve-ser feito por pessoas treinadas

para efetuar o levantamento socioeconômico e prestar orientação

educativa sobre o planejamento do negócio, para definição das

necessidades de crédito e de gestão voltadas para o desenvolvimento do

empreendimento;

O contato com o empreendedor deve ser mantido durante o período do

contrato de crédito, visando ao seu melhor aproveitamento e aplicação,

bem como ao crescimento e sustentabilidade da atividade econômica;

O valor e as condições de crédito devem ser definidos após a avaliação da

atividade e da capacidade de endividamento do tomador final dos

recursos, em estreita interlocução com este.”2

2 Fonte: www.mte.gov.br/pnmpo/conteudo

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A orientação que o agente de crédito fornece pode ser muito importante e alguns

programas enfatizam explicitamente esse papel, como é o caso do Programa de

microcrédito do Banco do Nordeste, o Crediamigo. Já para o Banco Grameen,

reconhecidamente um caso exitoso, os agentes de crédito, conforme declaração de

Yunus (1998), quando perguntados sobre aconselhamentos a respeito de

oportunidades de negócio, são instruídos a responder que o banco têm muito dinheiro

para lhes fornecer, mas nenhuma idéia sobre negócios.

Contudo a não utilização da prática de Microcrédito Produtivo e Orientado pelo

banco Grameen, não interferiu no crescimento do número de financiados que obtiveram

sucesso, em um outro continente com uma outra cultura

2.2 Objetivos do Microcrédito

A literatura traz uma série de referências sobre os objetivos do microcrédito, e

alguns deles estão descritos a seguir:

Combater a pobreza e o desemprego, através do fortalecimento das atividades

econômicas de pequeno porte, substituindo as formas assistencialistas de

atender a população de menor poder aquisitivo (TANURI, 1997)

Promover a “experimentação, não lucrativa, de novos modelos sócio-produtivos e

de sistemas alternativos de produção, comércio, emprego e crédito” que

atendam a população de baixa renda, de forma a criar condições de

sobrevivência, auto-sustentabilidade, crescimento e formalização dos pequenos

negócios (Lei 9.790 de 23/03/99, art. 3º, alínea IX) (BRASIL, 1999).

Promover a implantação, a modernização, a ampliação e/ou diversificação de

atividades capazes de gerar e manter trabalho e renda, em bases auto-

sustentáveis, com base em investimentos de pequeno valor, com respaldo

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principalmente no sistema de crédito solidário (Resolução nº59 do CODEFAT de

25 de março de 1994) (BRASIL, 1994)

Elevar a produtividade dos empreendimentos, através do incentivo fixo associado

à capacitação técnico-gerencial do empreendedor, de forma a minimizar o risco

do negócio, possibilitar o seu crescimento e estimular a formalização das

microempresas (BNDES – Crédito Produtivo Popular)

2.3 Marco Legal e Estrutura Institucional

Até 1999 não havia no Brasil um marco legal específico para as atividades de

microcrédito. Somente a partir desta data ocorreram esforços mais efetivos no sentido

de construir algum instrumento jurídico que contemplasse as diversas iniciativas

existentes. Esse trabalho foi desenvolvido por um grupo idealizado pelo Conselho da

Comunidade Solidária, oficializada pelo Conselho Monetário Nacional e coordenado

pelo Ministério da Fazenda, tendo o objetivo de expandir o microcrédito no Brasil. Assim

esse grupo formula as propostas e as adéqua juridicamente para regulamentar a

atividade de instituições microfinanceiras.

Esse ato foi de extrema relevância para a consolidação e ampliação das

microfinanças no Brasil, já que as experiências pioneiras com microcrédito em âmbito

nacional desenvolveram-se a margem de qualquer regulamentação específica para o

setor.

(...) as organizações não-governamentais agiam à margem do sistema financeiro oficial e, sem qualquer cobertura do arcabouço jurídico, estavam sujeitas à lei da Usura. Os programas ligados a governos municipais ou estaduais, por seu lado, funcionavam no quadro da ação pública de geração de emprego e renda. Por fim, bancos oficiais ou privados que atuavam com microempresas o faziam obedecendo às regras usuais e genéricas do sistema financeiro. (PARENTE, 2002, p.114)

De acordo com Carvalho e Ribeiro (2006) na formulação do marco legal dois

tópicos são destacados como prioritários:

Page 24: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

33

Permitir que organizações da sociedade civil atuassem no microcrédito sem

estarem submetidas à Lei da Usura;

Criar e regulamentar uma nova modalidade institucional e caráter privado,

integrada ao sistema financeiro e com menores exigência de capital, para operar

microcrédito.

Ainda de acordo com Carvalho e Ribeiro (2006) esse desenvolvimento gerou

frutos que resultaram nas leis nº 9.790/99, nº 10.194/01, Medida Provisória nº 2.172-

32/01 e Resolução CMN nº 002874/01, que estabeleceram os seguintes modelos

institucionais para a atuação do setor público e privado, com e sem fins lucrativos, na

operacionalização de serviços de microcrédito:

Instituições da Sociedade Civil

O início das atividades de microcrédito no Brasil foi marcado pela atuação das

ONGs de microcrédito, com o foco na economia solidária e desenvolvimento local.

Contudo com a evolução do marco legal do microcrédito, grande parte dessas

ONGs transformaram-se em Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público

(Oscips).

Tal razão para essa permutação baseia-se no fato de que, apesar de tanto as

ONGs quanto as Oscips serem pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos,

as Oscips estão livres do enquadramento na lei da usura, sendo reguladas pela Lei nº

9.790 (Lei do Terceiro Setor) que estabelece o cumprimento obrigatório de pelo menos

um dentre os vários objetivos sociais, destaca-se entre eles: “(...) promoção do

desenvolvimento econômico e social e combate à pobreza”.(BRASIL, 1999).

Vale ainda salientar que tanto ONGs quanto Oscips não são autorizadas pelo

Banco Central do Brasil a captar nenhum depósito do público sob qualquer modalidade.

Page 25: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

34

Programas de Governo Locais

Iniciativas constituídas a partir de fundos públicos e conhecidas como “bancos do

povo” são encontradas em estados e municípios, sendo gerenciados pelo setor público,

não se enquadram totalmente nas premissas do microcrédito, principalmente por

questões de metodológicas.

Sociedade de Crédito ao Microempreendedor (SCMs)

Seguindo a rota da evolução do setor de microcrédito o Banco Central autoriza a

criação de uma nova figura jurídica, na forma de instituição privada com fins lucrativos e

com o objeto social exclusivo de conceder crédito produtivo a pessoas físicas e

microempresas.

Programas de Bancos Comerciais

Grande parte dos bancos comerciais ainda resiste à idéia de trabalhar para este

setor por questionarem a viabilidade financeira deste tipo de atividade.

O Programa Crediamigo do Banco do Nordeste é uma exceção,operando com o

maior sucesso com recursos oriundos de organismos internacionais e do próprio banco.

Este modelo institucional está livre da lei da usura e é autorizado pelo Banco

Central do Brasil a captar depósitos do público, tendo acesso assim a facilidades

adicionais no financiamento da atividade de microcrédito, comparativamente com os

outros modelos institucionais.

Cooperativas de Crédito

Sociedades de natureza civil, sem fins lucrativos cuja atividade fim é a

concessão de empréstimos e a prestação de serviços aos seus associados. O seu

Page 26: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

35

grande diferencial para alguns dos outros modelos citados anteriormente é o fato de

poderem captar depósitos, que por sua vez são investidos apenas na área de atuação

das cooperativas.

2.4 História das Microfinanças

A mais notória experiência de microcrédito foi sem dúvida o Grameen Bank, em

Bangladesh, desenvolvida brilhantemente pelo então professor de economia da

Universidade de Chittagong, Muhamad Yunus, em meados da década de 70.

Assim corrobora Silva (2005, p.3) quando afirma:

“O grande marco que desenvolveu, difundiu e serviu de modelo para popularizar o microcrédito foi à experiência iniciada em 1976 em Bangladesh, pelo professor Muhamad Yunus”

Contudo, as benesses trazidas pelas microfinanças datam de períodos bem mais

remotos, registrados em experiências menos conhecidas, porém não menos

importantes para os seus beneficiários da época. Segundo Seibel (2003, p.11) ao se:

Atribuir a origem das microfinanças a iniciativas recentes, perdem-se não somente a profundidade histórica e as dimensões das microfinanças,mas também séculos de experiência , que representam: aprendizado através das tentativas e dos erros, dos fracassos e dos sucessos.

De acordo com Seibel (2003) as primeiras iniciativas teriam surgido na Europa,

em pequena escala e informalmente, como conseqüência de um grande aumento da

pobreza, a partir do século XVI. Os casos a seguir relatados por este autor, servem de

testemunho de quão remota é a instituição do microcrédito em vários países europeus.

Page 27: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

36

2.4.1 O Caso da Irlanda

Na Irlanda, no início do século XVII, constituem-se fundos de empréstimos a

partir de doações, com pagamentos semanais e sem cobranças de taxa de juros, e

usando-se como garantia o aval solidário.

Esses fundos continuaram a operar na informalidade até 1823, quando uma lei

transforma-os em intermediários financeiros, permitindo a cobrança de juros e a

captação legal de recursos através de depósitos remunerados. A legalização trouxe, em

1836, a regulamentação e o supervisionamento dos mesmos, através do Loan Fund

Board, que, com seu apoio institucional, impulsionou o crescimento do número desses

fundos, chegando em 1840 a marca de 300 instituições de empréstimos legalizadas,

realizando pequenas operações de crédito.

Em processo de franca expansão, e gerando três vezes mais lucro que os

bancos comerciais, os fundos de empréstimos, que já detinham 20% das famílias

Irlandesas como clientes, colocaram-se como uma ameaça aos bancos comerciais, os

quais, por sua vez usaram de seu poder para pressionar o governo e conseguir que o

mesmo estipulasse valores mínimos para as taxas de juros praticadas pelos fundos de

empréstimos. Como conseqüência, deu-se a perda da vantagem competitiva e o

declínio gradual de suas atividades, que vieram a desaparecer por volta dos anos 1950.

2.4.2 O Caso da Alemanha

A história das microfinanças na Alemanha tem três raízes, todas de origem

informal: fundo de poupança comunitário e dois tipos de cooperativas de crédito e

poupança, uma rural e a outra urbana.

Page 28: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

37

A comunidade administrava os empréstimos e poupanças baseados na

experiência irlandesa de que fundos baseados em doações e caridade não são

sustentáveis.

Depois do rigoroso inverno de 1846/47 na Alemanha, muitos fazendeiros ficaram

endividados e sem capital de giro para darem continuidade aos seus negócios rurais.

Na tentativa de reverter esta situação, o então pastor Friedrich Wilhelm Raiffeisen criou

a associação do pão na zona rural de Weyerbusch com capital proveniente de doação,

para financiamento de farinha de trigo, fabricação e comercialização do pão,

conseguindo, entre outras coisas, derrubar o preço final do pão em 50% poucos meses

depois de ter iniciado a associação, beneficiando produtores e consumidores.

Semelhante à associação do pastor Raiffeisen surge, em 1850, criada por

Hermann Schulze-Delitzsch, a primeira associação de crédito urbana, diferenciando-se

da primeira principalmente por não considerar a possibilidade de doação como fonte de

financiamento.

Raiffeisen percebe que a caridade não permite a criação de um modelo auto-

sustentável, e por isso, em 1864, funda a primeira associação de crédito rural em

Heddesdorf, seguindo o exemplo de Schulze-Delitzsch.

Nos 20 anos seguintes, esse processo evoluiu lentamente, propiciando o

estabelecimento de 245 cooperativas em meados de 1880.

A grande virada nesse processo foi a promulgação, em 1889, do Ato das

Cooperativas do Império Germânico, a primeira lei para cooperativas do mundo voltada

para legalizar associações de crédito urbanas e rurais,

Essas mudanças estimularam um rápido crescimento do número de cooperativas

rurais na Alemanha.

De acordo com Seibel (2003) o espetacular sucesso das microfinanças na

Alemanha, que tirou de foco agiotas e bancos comerciais, deve-se a vários fatores:

Page 29: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

38

o Cooperativas auto-sustentáveis, através da captação e manutenção das

poupanças

o A evolução para uma estrutura legal

o A evolução do marco regulatório do sistema bancário abrangendo todas

as instituições financeiras, inclusive os fundos de poupança e as

cooperativas de crédito

Este modelo, aplicado às microfinanças adotado na Alemanha, tem continuidade

nos anos vindouros. Dados de 1997 indicam o cenário construído pelos investimentos

em microfinanças: 39.000 filiais, 75 milhões de clientes, 51,4% de todos os ativos

financeiros bancários da Alemanha e 64% de todas as intermediações financeiras.

De acordo com Seibel (2003), a experiência alemã permite concluir que as

Microfinanças não são uma solução pobre para países pobres: as Instituições

microfinanceiras - IMF – organizadas sob a forma de cooperativas ou geridas pela

própria comunidade, baseadas no modelo de captação e administração de poupanças,

são igualmente viáveis tanto em áreas urbanas como rurais. Este autor ainda assinala

que se estas organizações forem reguladas e supervisionadas adequadamente, serão

capazes de constituir uma excelente ferramenta de combate à pobreza e de estimulo ao

desenvolvimento.

2.4.3 Outras Experiências Internacionais

Em 1900, um jornalista da assembléia Legislativa de Quebec criou as Caísses

Populaires que, com ajuda de 12 amigos, reuniu o montante inicial de 26 dólares

canadenses para emprestar aos mais pobres. Atualmente, estão associados às Caísses

Populaires cinco milhões de pessoas, em 1.329 agências. Nos Estados Unidos, em

1953, Walter Krump, presidente de uma metalúrgica de Chicago, criou os “Fundos de

Ajuda” nos departamentos das fábricas, onde cada operário participante depositava

Page 30: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

39

mensalmente US$ 1,00, destinados a atender aos associados necessitados.

Posteriormente, os Fundos de Ajuda foram consolidados e transformados no que foi

denominado Liga de Crédito. Após esta iniciativa, outras se sucederam, existindo ,

atualmente, a Federação das Ligas de Crédito, operadas nacionalmente e em outros

países.

Muitas outras manifestações pontuais e isoladas com características de

microcrédito devem ter ocorrido ao redor do planeta. Porém, o grande marco que

desenvolveu, difundiu e serviu de modelo para popularizar o microcrédito foi a

experiência iniciada em 1976, em Bangladesh, pelo professor Muhamad Yunus.

Observando que os pequenos empreendedores das aldeias próximas à universidade

onde lecionava eram reféns dos agiotas, pagando juros extorsivos e, mesmo assim,

pagando corretamente, o professor Yunus começou a emprestar a essas pessoas

pequenas quantias com recursos pessoais e posteriormente, com recursos advindos de

empréstimos . A ação prosperou tanto que deu origem, em 1978, ao Grameen Bank. Os

princípios filosóficos da atuação e as estratégias para garantirem o retorno dos valores

emprestados foram aprimorados na prática durante anos de gestação e atuação do

Grameen Bank. Com adaptações locais, este modelo foi adotado em diversos países,

inclusive no Brasil.

Ao provar que os pobres são merecedores de crédito, e que pagam seus

pequenos empréstimos destinados a atividades reprodutivas, o professor Yunus

conseguiu financiamento e doações junto a bancos privados e internacionais para criar

o Banco Grameen. Com o passar do tempo, obteve ajuda de bancos e instituições

privadas, criando, em 1978, o Grameen Bank e o modelo atual de microcrédito, definido

como financiamentos aos micro produtores via grupos solidários que prestam garantia

mútua, dispensando a garantia dos bancos.

2.5. Microfinanças no Brasil

Page 31: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

40

2.5.1. Iniciativas Pioneiras e Evolução do Microcrédito no Brasil

Embora tenha sediado uma das primeiras experiências de microcrédito informal

urbano, o Brasil teve um crescimento muito lento neste setor, e enfrentou também fortes

restrições legais para expandir os serviços do microcrédito às microfinanças e implantar

outros produtos além do crédito, como por exemplo a captação de poupança.

Segundo Nichter (2002) a evolução histórica do microcrédito no Brasil se deu nesta

seqüência:

o Os líderes da sociedade civil iniciaram os esforços e colaboraram com os

membros da comunidade internacional de microfinanças para desenvolver

instituições afiliadas a redes internacionais. (Ex: Banco da Mulher).

o Os líderes locais desenvolveram organizações da sociedade civil, que

empregaram metodologias de microfinanças para ajudar os membros de menor

renda em suas comunidades. ( Ex: Portosol).

o Os líderes políticos começaram a ver as microfinanças como uma maneira

possível de atender à população e lançaram iniciativas governamentais. ( Ex:

Banco do Povo Paulista)

o Em uma etapa mais recente, investidores e gerentes do setor privado atraídos

para microfinanças como um nicho do mercado, estão trabalhando por

intermédio de instituições financeiras regulamentadas. (Ex: Banco do

Nordeste)

O primeiro registro de microcrédito no Brasil data do ano de 1973, e foi

denominado Projeto UNO ( União Nordestina de Assistência a Pequenas

Organizações). Sediado na cidade do Recife, o projeto não teve longo alcance, mas

serviu como base para a construção da rede Ceape (Centro de Apoio ao Pequeno

Empreendedor).

Page 32: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

41

Em meados da década de 1990 outras duas instituições ganham destaque:

Fenape (Federação nacional dos Pequenos Empreendedores) e o Banco da Mulher.

De acordo com Carvalho e Ribeiro (2006), algumas razões podem caracterizar o

atraso no desenvolvimento das atividades de microcrédito no Brasil, como por exemplo,

a inflação, o crédito governamental subsidiado e a legislação restritiva.

No processo evolutivo das IMF’s brasileiras, outras experiências são marcantes:

o Portosol, criada em agosto de 1995, no Rio Grande do Sul, o Vivacred, criada em

1996, no Rio de Janeiro, e o Crediamigo, criado em 1997, como o programa do Banco

do Nordeste que formou a maior carteira de microcrédito do país, segundo Carvalho e

Ribeiro (2006, p.142).

2.6 O Crédito Rural do PRONAF

A política agrícola brasileira por um largo período de tempo teve como foco os

latifúndios. Segundo Kageyama (1996) o processo de modernização conservadora,

caracterizado pela integração entre agricultura e indústria e a formação de complexos

agroindustriais, promove uma crescente marginalização dos pequenos agricultores

familiares, reproduzindo um padrão de desenvolvimento rural bastante excludente e

desigual.

De acordo com Cerqueira e Rocha (2002) o processo de modernização da

agricultura brasileira constituído em bases latifundiárias gera no campo o

aprofundamento das desigualdades sociais e o aumento da pobreza nas áreas rurais,

com reflexos nos grandes centros urbanos.

O processo de abertura comercial, no início dos anos 90, aliado a integração da

agricultura com a indústria nacional, coloca os produtos agrícolas brasileiros em

condições de competição no mercado internacional, paralelamente a esses

acontecimentos o crédito rural torna-se cada vez mais escasso, a inflação apresenta

crescimento acelerado e o governo desativa a Empresa Brasileira de Assistência e

Page 33: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

42

Técnica e Extensão Rural (Embrater). Diante deste cenário de grandes proporções a

importância dada à agricultura familiar torna-se proporcional ao tamanho de suas

pequenas glebas.

Como toda ação precede uma reação, foi apenas uma questão de tempo

para se iniciar o acirramento dos conflitos rurais e as reivindicações sociais, que

levariam o governo a repensar a política agrícola e a reconhecer a importância dos

produtores familiares.

O primeiro passo para consolidar as bases de apoio à agricultura familiar era

conceituá-la com mais precisão, uma vez que a mesma era tratada de várias formas

(pequena produção, produção familiar, produção de subsistência). Este problema foi

resolvido por estudos realizados conjuntamente entre a FAO e o INCRA, que segundo

Mattei (2001) definem com precisão conceitual a agricultura familiar, e estabelecem um

conjunto de diretrizes para ajudar na formulação das políticas deste setor.

Assim em 1994, em meio a este ambiente social, político e econômico inicia-se o

processo de mudanças na política agrícola no governo do presidente Itamar Franco

com a criação do Programa de Valorização da Pequena Produção Rural (PROVAP),

que tinha como meta a concessão de crédito com taxas de juros mais acessíveis aos

agricultores familiares.

No intuito de aprimorar este programa o governo seguinte, de Fernando

Henrique Cardoso, reformula totalmente o PROVAP dando origem assim em 1996 ao

Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF, que vem de

acordo com Mattei (2001), atender as exigências dos trabalhadores rurais, que

colocavam como vital a formulação e implementação de políticas de desenvolvimento

rural específicas para o segmento numericamente mais importante, porém mais

fragilizado da agricultura brasileira, tanto em termos de capacidade técnica como de

inserção nos mercados agropecuários. Desde então este programa apresenta-se como

a principal política pública de apoio aos agricultores familiares.

Sobre os objetivos do PRONAF discorre Nunes (2007):

Page 34: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

43

O Pronaf se propõe a fortalecer a agricultura familiar como categoria social, mediante apoio financeiro (financiamento para custeio e atividades agrícolas), e à infra-estrutura social e econômica dos territórios rurais fortemente caracterizados pela agricultura familiar. Embora seja um programa de fortalecimento da agricultura familiar, a maior parte de seus esforços e resultados estiveram concentrados no crédito desde a sua criação.

Entretanto, cabe destacar que, nos três últimos anos, o governo federal passou a

desenvolver novas ações, principalmente na área de comercialização (estoques,

compras, garantia de preços mínimos), assistência técnica e extensão rural e seguro

agrícola”

O Banco do Nordeste, principal agente na oferta de recursos do Pronaf na região

Nordeste do Brasil, caracteriza como objetivo do programa:

“Fortalecer a agricultura familiar, mediante o financiamento da infra-estrutura

de produção e de serviços agropecuários e atividades rurais não-

agropecuárias3, com o emprego direto da força de trabalho do produtor rural

e de sua família, objetivando a geração de ocupação e manutenção do

homem e da mulher do campo”

2.6.1. Público-Alvo, Grupos e Linhas do Pronaf

De acordo com o Banco do Nordeste o público-alvo do Pronaf são

empreendedores rurais que desenvolvam suas atividades agropecuárias e não-

agropecuárias utilizando-se, basicamente, de mão-de-obra familiar. É composto de

diversos Grupos (A, A/C, B, C, D, E), de acordo com a renda bruta anual obtida pelo

produtor que pode variar de R$ 4.000,00 para o grupo B até R$ 110.000,00 para o

grupo E.

3 Entende-se por serviços, atividades ou renda não-agropecuárias aqueles relacionados ao turismo rural, à

produção artesanal, ao agronegócio familiar e à prestação de serviços no meio rural, que sejam compatíveis com a

natureza da exploração rural e com o melhor emprego da mão-de-obra familiar

Page 35: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

44

Ainda de acordo com o Banco do Nordeste o Pronaf também disponibiliza linhas

de crédito para públicos e atividades específicas – Pronaf Mulher, Jovem, Agroindústria,

Floresta, Agroecologia, Agrinf, Semi-árido.

Para esta dissertação é necessário um conhecimento mais específico das

características e peculiaridades do Pronaf Grupo B, por ter sido esta a linha de crédito

utilizada pelos integrantes da Comunidade Diamante, objeto de pesquisa deste

trabalho.

Dentre as linhas oferecidas pelo Pronaf, a B é reconhecido como a linha de

microcrédito rural, tem no seu público-alvo agricultores familiares, inclusive

remanescentes de quilombos, trabalhadores rurais e indígenas que:

Explorem parcela de terra na condição de proprietário, posseiro, arrendatário ou

parceiro;

Residam na propriedade ou em local próximo;

Não disponham a qualquer título, de área superior a 4 módulos fiscais,

quantificados segundo a legislação em vigor;

Obtenham renda familiar oriunda da exploração agropecuária ou não-

agropecuária do estabelecimento;

Tenham o trabalho familiar como base na exploração do estabalecimento

Obtenham renda bruta anual familiar até R$ 4.000,00, excluídos os proventos

vinculados a benefícios previdenciários decorrentes de atividades rurais

Público Alvo Finalidade Crédito Juros Bônus de

Adimplência *

Prazo e

Carência

Agricultores

Familiares

com renda

anual familiar

de até

Financiamento das

atividades

agropecuárias ou

não-agropecuárias

e custeio para

mamona

R$ 4.000,00 **

limitado a R$

1.500,00 por

operação

0,5%

ao ano

25% aplicado

em cada

parcela

Prazo de até

2 anos com

carência de

até 1 ano

Page 36: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

45

R$ 4.000,00

* O Produtor somente fará jus ao Bônus se pagar as parcelas do financiamento em dia

** Alcançado esse limite os novos financiamentos concedidos não terão bônus de adimplência

Fonte: Banco do Nordeste

Page 37: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

46

3 METODOLOGIA

A proposta do presente capítulo é apresentar a metodologia que foi utilizada na

pesquisa, abrangendo o delineamento da pesquisa, a descrição das técnicas de coleta

dos dados e da análise dos dados, e os limites e limitações do estudo conforme será

apresentado a seguir.

3.1 Delineamento da Pesquisa

A pesquisa é de base qualitativa, do tipo descritiva, pois tem o objetivo de obter

informações e opiniões do universo (ROESCH, 1999). A pesquisa qualitativa é

importante para compreender as relações que ocorrem entre os personagens

estudados tanto no âmbito da comunidade quanto fora dela analisando o grupo sobre

temas específicos. De acordo com Minayo (1998) as diferenças entre a pesquisa

qualitativa e quantitativa vão além da simples escolha de estratégias de pesquisa e

procedimentos de coleta de dados, representam posições epistemológicas diferentes.

A pesquisa qualitativa não considera somente as interpretações das realidades

sociais, mas também objetiva uma categorização do mundo social, análise em direção a

questões referentes à qualidade e coleta de dados, com estratégias de pesquisa

independente. É igualmente relevante, após o levantamento, o direcionamento de

análise dos dados obtidos ou o embasamento da interpretação com observações mais

minuciosas (BAUER; GASKEL; ALLUM, 2002).

Para Macedo (2001), os métodos qualitativos procuram descrever a cultura do

ponto de vista do indivíduo que está dentro dela, ao contrário da perspectiva do

indivíduo que está fora da cultura, como pesquisador. Entrevistas sem estrutura,

observações e outras técnicas qualitativas são assim desenhadas para compreender o

ponto de vista do sujeito. Pesquisadores evitam impor suas próprias categorias ou

Page 38: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

47

outras idéias a uma cultura, procurando trazer à tona o sistema de categorias ou idéias

que os membros da cultura usam, eles mesmos, para pensar seus mundos.

Procurando resumir as características básicas da pesquisa qualitativa, podemos

identificar alguns aspectos essenciais tais como:

_ Os ambiente a as pessoas nela inseridos não são reduzidos a variáveis, mas

observados como um todo.

_ A preocupação do investigador está no significado que as pessoas dão às coisas e à

própria vida, e ainda porque não partem de hipótese, a priori, utilizam enfoque indutivo

na análise das informações. Quando o estudo é de caráter descritivo e o que busca é o

entendimento do fenômeno como um todo na sua complexidade, é possível que uma

análise qualitativa seja a mais indicada.

Este estudo teve como objetivo principal aumentar a compreensão e o

conhecimento das relações de trabalhadores rurais com o acesso ao

microcrédito, e unindo a este fato a vivencia em uma comunidade rural. Nesse

sentido foi adotado o método qualitativo, considerado este mais adequado para

explorar e interpretar os fenômenos propostos na pesquisa, através de um

estudo de caso, conforme detalharemos a seguir.

3.1.1 Estudo de Caso

O estudo de caso não é uma escolha metodológica, mas uma escolha do que

deve ser estudado. Ele se concentra no conhecimento experiencial do caso e a sua

atenção é focada para compreender as influências sociais, políticas e de grupo, além

de outros contextos (STAKE, 2000).

O estudo de caso surge do desejo de se compreender fenômenos sociais

complexos, que permita uma investigação fiel as características holísticas e

Page 39: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

48

significativas dos acontecimentos da vida real, tais como ciclos de vida individuais,

processos organizacionais e administrativos, mudanças ocorridas em regiões urbanas,

relações internacionais e a maturação de setores econômicos (YIN, 2005).

De acordo com Gil (1995), o estudo de caso é uma pesquisa caracterizada pelo

estudo profundo e exaustivo de um ou poucos objetos, de maneira que permita o seu

amplo e detalhado conhecimento, tarefa praticamente impossível em outro tipo de

estudo.

Para Yin (2005), quando se tem um fenômeno contemporâneo a ser investigado

dentro do seu contexto de vida real e suas fronteiras uma das formas de pesquisa

social que se pode utilizar é o estudo de caso. Ainda de acordo com o mesmo autor, o

pesquisador de estudo de caso deve ser hábil em saber fazer perguntas, em saber

ouvir, ser flexível e adaptável, ter plena compreensão das questões que estão sendo

pesquisadas, e tentar evitar que idéias preconcebidas impeçam a possibilidade de

novas descobertas, evitando viés.

Para Castro (1977), é muito melhor fazer o uso sofisticado de uma técnica

simples, do que procurar técnicas sofisticadas pelo fato de estarem disponíveis. Em

contrapartida, existem críticas ao método do estudo de caso, principalmente no que se

refere à sua falta de objetividade e rigor científico, uma vez que dependem em grande

parte da intuição do investigador, estando, portanto, sujeito a eventual subjetividade.

De qualquer maneira, subjetividade é algo inerente ao ser humano. (YIN, 2005).

Uma questão alvo de críticas no uso do estudo de caso é a limitação com a

generalização, alegando que esse tipo de pesquisa oferece pouca base que possibilite

replicação, inclusive quando comparado aos experimentos. Um argumento defensivo a

essa acusação “é que os estudos de caso, da mesma forma que os experimentos, são

generalizáveis a proposições teóricas, e não a populações e universos”. (YIN, 2005).

Assim sendo, acredita-se ser o estudo de caso relevante e que poderá contribuir

para o melhor entendimento dos processos de geração de melhoria de qualidade de

vida através do microcrédito na comunidade Diamante.

Page 40: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

49

3.2 Coleta de Dados

A seguir, será apresentada a coleta de dados, especificando assim o seu

processo, o roteiro de entrevista como instrumentação das variáveis.

3.2.1 Processo

De acordo com Richardson (1999) a entrevista não estruturada, também

chamada de entrevista em profundidade, em vez de responder à pergunta por meio de

diversas alternativas pré-formuladas, visa obter do entrevistado o que ele considera os

aspectos mais relevantes de determinado problema: as suas descrições de uma

situação de estudo.

Por meio de uma conversação guiada, pretende-se obter informações

detalhadas que possam ser utilizadas em uma análise qualitativa. A entrevista não

estruturada procura saber o que, como e por que algo ocorre, em lugar de determinar a

freqüência de certas ocorrências, nas quais o pesquisador acredita.

Ainda segundo Richardson (1999), as técnicas de entrevista variam de acordo com

o contexto no qual estão inseridas. A forma de realizar a entrevista dependerá do tipo

de informação necessária em função do problema a ser pesquisado.

As técnicas utilizadas irão variar se apenas deseja-se obter informação sobre certos

acontecimentos, explorar as atitudes e motivações de um indivíduo ou modificar os

comportamentos. Yin (2005) considera as entrevistas como uma das mais importantes

fontes de Informação para o estudo de caso, assim como uma ferramenta essencial

para tratar de questões humanas.

Segundo Gaskell (2002) a entrevista qualitativa é uma metodologia de coleta de

dados amplamente empregada que fornece os dados básicos para o desenvolvimento e

a compreensão das relações entre os atores sociais e sua situação. Para o mesmo

autor, as entrevistas qualitativas são conduzidas sob três formatos: semi-estruturada,

que pode ser em profundidade com um único respondente; fortemente estruturada, que

Page 41: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

50

apresenta questões predeterminadas; e a entrevista de conversação continuada, que é

a menos estruturada, onde a ênfase é maior na absorção do conhecimento local e da

cultura.

A partir das entrevistas qualitativas, o pesquisador poderá mapear e

compreender o mundo socialmente construído dos entrevistados. Em termos gerais, no

início do processo a entrevista deverá ser bastante livre, podendo ser mais diretiva

quando os aspectos da problemática de pesquisa já estiverem levantados

(RICHARDSON, 1999).

A seguir, será detalhado o roteiro de entrevista que foi utilizado na pesquisa. Isso

será feito de tal forma que possamos compreender através do referido roteiro como

será feita a instrumentação das variáveis.

3.2.2 Roteiro de Entrevista como Instrumentação das Variáveis

A pesquisa utilizou entrevistas abertas, pois se acredita ser essa a melhor

maneira de acessar os dados pertinentes ao trabalho. Para tal, criou-se um roteiro de

entrevistas que visa coletar informações previamente determinadas, mas também

deixar o entrevistado com bastante liberdade para falar sobre o que julgar importante.

Teve-se como objetivo compreender o que caracteriza a relação entre o acesso

ao microcrédito e a melhoria de vida na comunidade Diamante. Assim, foram

entrevistados membros da comunidade que consentiram essa abordagem.

Procurou-se escolher casos em que a relação Acesso ao microcrédito X Melhoria

de qualidade de vida, tivesse sido exitoso, e casos em que esta mesma relação não

tenha alcançado um grau de sucesso desejável.

O roteiro de entrevistas propriamente dito, poderá ser examinado em apêndices

onde se encontra anexo.

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51

3.2.3 Entrevistados

A escolha dos entrevistados procurou obedecer o critério sugerido pelos integrantes da

banca de defesa do projeto. Assim a pesquisadora deveria entrevistar 10 integrantes da

comunidade, dos quais 5 deles tivessem alcançado sucesso nos objetivos propostos

pelo acesso ao microcrédito, e outros 5 integrantes que não tivessem obtido êxito nessa

relação.

Contudo a comunidade atualmente apresenta pouquíssimos casos de insucesso ,

assim não sendo possível entrevistar mais que duas famílias que reconhecem não

terem obtido melhoria de qualidade de vida, nem auto-sustentabilidade após acesso ao

microcrédito.

Para evitar coletar uma quantidade de dados insuficiente às análises, foram realizadas

16 entrevistas em contraposição as 10 sugeridas inicialmente. O critério de escolha do

número de entrevistados foi a exaustão, ou seja as entrevistas foram acontecendo até

nem mais um dado novo e relevante para a nossa pesquisa aparecer

3.3 Análise dos Dados

Como técnica de análise para tratamento dos dados, será utilizada a análise de

conteúdo, através de inferências básicas a partir do texto, objetivando descrever

sistematicamente o teor da comunicação (LAKATOS E MARCONI, 2001).

Dentre as perspectivas da análise de conteúdo foi utilizada a análise de

enunciação, que se diferencia das outras técnicas de análise de conteúdo porque

existem duas grandes características: primeiro apóia-se na comunicação como um

processo e não como um dado, e também funciona, desviando-se das estruturas e

modelos formais. A análise de enunciação aplica-se bem ao discurso de entrevista não

diretiva, discurso que é geralmente abandonado pelas técnicas exatas. Nesse caso, o

discurso é toda a comunicação estudada não só ao nível dos seus elementos básicos,

Page 43: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

52

a palavra, por exemplo, mas também a um nível igual e superior à frase, ou seja, as

proposições, os enunciados e as seqüências (BARDIN, 2000).

A análise de enunciação está baseada no conceito do discurso enquanto palavra

em ato e não como um dado, conforme a análise de conteúdo clássica. Considera que

na produção da palavra é efetuado um trabalho, elaborado um sentido e operadas

transformações.. O discurso não é uma transposição transparente de opiniões, atitudes

e representações que existem de modo completo antes da passagem à forma de

linguagem.

Nesta perspectiva o discurso não é um produto acabado, mas um momento num

processo de elaboração, que pode ser ao mesmo tempo espontâneo e constrangido

pela situação, na qual se confrontam motivações, desejos e investimentos do sujeito,

com as imposições do código lingüístico. Também, devido às circunstâncias de

espontaneidade e constrangimento, o trabalho de elaboração é, ao mesmo tempo,

emergência do inconsciente e construção do discurso (BARDIN, 2000).

A entrevista não diretiva segue a lógica do entrevistado, sendo limitada somente

pela instrução temática colocada para centrar a entrevista no assunto que interessa ao

entrevistador. É caracterizada por pré-formação mínima de roteiro, ao contrário dos

questionários pré-formulados. Ela tem o foco no conteúdo sobre a relação subjetiva do

locutor com o objeto do discurso, ou seja, as representações, atitudes etc. Trata-se,

portanto, de um discurso dinâmico e não estático (BARDIN, 2000).

Analisar significa “fazer análise, decompor um todo em suas partes; estudar,

examinar; criticar [...]” (LAROUSSE, 2001). Lakatos e Marconi (2001, p.167) entendem

análise como “a tentativa de evidenciar as relações existentes entre o fenômeno

estudado e outros fatores”.

A análise de conteúdo é, portanto, uma técnica para produzir inferências de um

texto focal para seu contexto social de maneira objetivada, traçando um meio caminho

entre a leitura singular verídica e o “vale tudo”, sendo, em última análise, uma categoria

de procedimentos explícitos de análise textual para fins de pesquisa social (BAUER;

GASKEL; ALUM, 2002).

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53

Segundo Bardin (2000), a análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de

análise das comunicações, ou seja, um único instrumento, mas possuidor de uma

grande quantidade de formas diversas e adaptáveis ao campo de aplicação das

comunicações. Desde mensagens lingüísticas em forma de ícones, até comunicações

em três dimensões podem ser realizadas, o que significa que quanto mais complexo,

instável, ou mal explorado for o código, maior terá de ser o esforço do analista, no

sentido de uma inovação com vistas a uma elaboração de novas técnicas.

Assim, quanto mais o objeto de análise e a natureza das suas interpretações

forem incomuns ou excepcionais, maior será a dificuldade do analista em colher

elementos nas análises já realizadas, que possibilitem a inspiração nelas. Em última

análise, qualquer comunicação, isto é, qualquer transporte de significações de um

emissor para um receptor controlado ou não por este, deveria poder ser escrito,

decifrado pelas técnicas de análise de conteúdo.

Após apresentação e detalhamento da metodologia utilizada no trabalho, serão

relatados os limites e as limitações encontradas para a realização da pesquisa.

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54

4. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Neste capítulo, serão apresentados os resultados obtidos após a coleta de dados

feita através de entrevistas abertas e será utilizada a análise de conteúdo para a

interpretação dos achados.

Esta apresentação será feita em capítulos que incluem um ou vários objetivos

específicos, onde em cada capítulo serão apresentados os achados e feitas as análises

e discussões pertinentes ao conteúdo. Abaixo estão listados os objetivos específicos

na ordem que será utilizada para apresentação dos resultados.

a) Descrever o processo de formação da comunidade Fazenda Diamante

b) Analisar as mudanças individuais decorrentes do acesso ao microcrédito que

indicaram claramente melhoria de qualidade de vida

c) Verificar os benefícios do processo de melhoria de qualidade de vida através da

aquisição de bens de consumo e serviços

d) Analisar como os recursos recebidos foram utilizados por cada membro da sociedade

e) Analisar se o acesso ao microcrédito gerou auto-sustentabilidade as famílias da

comunidade Fazenda Diamante

4.1 A Formação da Comunidade Fazenda Diamante

Fundada em julho de 1991, a comunidade Fazenda Diamante origina-se de um

acordo entre o Governo do estado de Pernambuco, proprietários de terras e

trabalhadores agrícolas com o intuito de desapropriar áreas adequadas ao cultivo de

lavoura e criação de animais, e assentar famílias de baixa renda.

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55

Logo depois de firmado o acordo, a faixa de terra desapropriada, que totalizava 152

hectares, foi dividida em 76 lotes de 2 hectares cada, e distribuída para 75 famílias de

baixa renda, que deveriam fixar moradia no local e desenvolver atividades produtivas

rurais. O lote 76 foi destinado à formação de uma área comum às famílias assentadas.

Para realizar a escolha das famílias que iriam passar a residir neste assentamento,

foi feita uma seleção para escolher as 75 entre as 300 famílias que se candidataram a

uma vaga. A escolha das famílias obedeceu os seguintes critérios: Ser uma família de

agricultores rurais, morar nas regiões circunvizinhas. Assim foi dada prioridade aos

trabalhadores remanescentes da então fazenda desapropriada, e as famílias que

tinham o maior número de filhos

A partir de 1996, as famílias da comunidade Fazenda Diamante passaram a fazer

parte do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – Pronaf, e assim

tiveram seu primeiro contato com um programa de microcrédito. Nos anos que se

seguiram, as famílias continuaram a fazer uso desta ferramenta, microcrédito, para

desenvolver atividades geradoras de renda.

Atualmente, a comunidade, já com 17 anos de formada, conta com uma estrutura

comunitária que inclui uma casa de farinha que beneficia a produção de mandioca das

unidades familiares, uma mini fábrica de laticínios, uma fábrica artesanal de doces de

frutas cultivadas na própria comunidade, uma fábrica de picolé caseiro, escola e posto

de saúde.

Na tentativa de buscar recursos para investir de forma produtiva na comunidade, os

moradores fundaram também uma associação, composta das figuras de presidente,

vice-presidente, tesoureiro e conselheiro, que realizam assembléias mensais para

discutir as necessidades de progresso da comunidade e as rotas de investimento. Para

manutenção da associação de moradores os integrantes da comunidade contribuem

com uma cota mensal de R$ 3,00 (três reais).

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56

4.2 Qualidade de Vida

O cerne do objetivo geral de nossa pesquisa é perceber a relação entre o

microcrédito e a qualidade de vida dos integrantes da comunidade Diamante, assim é

de extrema relevância a descrição do que a literatura aponta como índices e conceitos

de qualidade de vida.

O conceito de qualidade de vida se expande e se refina compondo um processo

evolutivo que caminha em uma velocidade acelerada, fruto das alterações sociais do

mundo moderno e globalizado.

Há, entretanto, discordâncias entre os vários estudiosos do tema sobre quais

aspectos seriam privilegiados para caracterizar qualidade de vida. Outros criticam o

próprio conceito como Herculano (2000, p.3) que coloca:

“ ........ A questão do entendimento sobre o que é qualidade de vida pode ser vista como desnecessária, não por ser desimportante ou pouco palpável, mas pela sua obviedade. Algo que ninguém saberia definir, mas que parodiando a referencia da poeta Cecília Meirelles à liberdade, todos entendem o que é. Talvez por isto a ênfase dos estudos sobre qualidade de vida enfoque predominantemente a sua mensuração, ficando embutido na escolha sobre o que mensurar os pressupostos do que se entende venha a compor qualidade de vida”

Ainda de acordo com ele a qualidade de vida da população vem sendo

frequentemente avaliada sob dois aspectos:

1) Avaliando e mensurando os recursos disponíveis que permitem a sociedade, ou

determinados grupos dela, satisfazer suas necessidades. Por exemplo é possível

analisar as condições de saúde baseada no número de leitos e médicos disponíveis,

as condições de educação pela quantidade de escolas, professores, livros

publicados e níveis de escolaridade atingidos, as condições ambientais pela

potabilidade da água, da emissão aérea de poluentes, pelo número de domicílios

com acesso a água encanada e esgotamento sanitário, pela dimensão per capita de

área verde.

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57

2) Avaliar a qualidade de vida através das necessidades, mensurando a mesma pela

distancia entre o que se deseja e o que se alcança. Neste caso há que se considerar

que a definição de qualidade de vida irá oscilar em função das diferenças individuais,

sociais e culturais.

Se fosse possível, mesmo acreditando que não o é, ainda seria muito difícil pautar o

que deveria ser “normal” dos seres humanos desejarem alcançar para terem qualidade

de vida.

Contudo existem definições de patamares mínimos de bem-estar a serem

coletivamente assegurados e aceitos pela maioria dos estudiosos.

Alguns desses patamares sustentam-se por exemplo na teoria de Maslow, que no

início da década de 1940, desenvolveu sua teoria sobre a hierarquia das necessidades,

e chegou ao esquema mostrado na figura abaixo. (BATEMAN; SNELL, 2006, p.430).

1. Necessidades Básicas ou Fisiológicas (comida, água,descanso, sexo, abrigo)

2. Necessidades de Segurança (Proteção contra ameaça ou privação, indica desde a simples necessidade de sentir-se seguro dentro e uma casa até formas mais elaboradas de segurança como um emprego estável, um plano de saúde ou um seguro de vida)

3. Necessidades Sociais (amor, afeto, afeição, e sentimentos tais como o de fazer parte de grupos)

4. Necessidade de Status (independência, realização, liberdade,estima reconhecimento dos outros face à nossa capacidade)

5. Necessidade de Auto-Realização (Conscientização do próprio potencial máximo, tornar-se tudo que é capaz de ser)

Hierarquia das Necessidades

Concepção das necessidades humanas organizadas em uma

hierarquia de cinco tipos principais

Page 49: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

58

Fonte: Bateman e Snell (2006)

Para Lacombre e Heilborn (2006), a teoria de Maslow indica que há uma tendência,

na maioria das pessoas, de satisfazer primeiro as necessidades básicas, e

complementa Bateman e Snell (2006, p.31) só depois que as necessidades fisiológicas

e de segurança são razoavelmente satisfeitas é que os níveis mais altos de

necessidades sociais, de status e de auto-realização se transformam em interesses

dominantes.

Criticando essa teoria Lacombre e Heilborn (2006) destacam que:

As necessidades de cada pessoa variam no tempo, não só em função da

satisfação, como também em função das alterações na hierarquia dos valores

de cada um.

A teoria de Maslow representa uma tendência e não deve ser encarada

como uma escala rígida, pois partindo do princípio de atender as

Page 50: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

59

necessidades básicas dos seres humanos até chegar as necessidades de

auto-realização, os indicadores sociais surgem como elementos que

agrupados constroem os vários conceitos de qualidade de vida.

Anteriormente a esta discussão Allardt (1975) apud Nussbaun; Sen (1993), no

seu estudo construiu um modelo de aplicação focado na Escandinávia para caracterizar

o bem-estar, onde três verbos definem o básico de uma vida humana:

TER – Refere-se as condições materiais necessárias a uma sobrevivência livre

da miséria: Recursos Econômicos (medidos por renda e riqueza),

Condições de Habitação (medidas pelo espaço e conforto doméstico),

Emprego (medido pela ausência de desemprego), Condições Físicas de

Trabalho (avaliado pelos ruídos nos postos de trabalho, rotina física e

stress), Saúde (dores e doenças, acessibilidade de atendimento médico),

Educação ( medida por anos de escolaridade).

AMAR – Diz respeito à necessidade de se relacionar com outras pessoas e

formar identidades sociais: União e contatos com a comunidade local,

Relações com Familiares, Amizade, União e contatos com companheiros

em associações e organizações, Relações com companheiros de trabalho

SER – Necessidade de integração com a sociedade e de harmonização com a

natureza: Nível de participação de uma pessoa nas decisões e atividades

coletivas que influenciam sua vida; Atividades Políticas; Obtenção de

Tempo de Lazer; Oportunidades de construir uma vida profissional

satisfatória, Oportunidade de estar em contato com a natureza.

Em 1987 Robert Erikson publica um estudo sobre qualidade de vida, usando três

grupos distintos que são acompanhados durante vários anos, ele buscava analisar

mudanças nos níveis de qualidade de vida entre os diferentes grupos com o passar do

tempo. Para isso ele define parâmetros de mensuração de qualidade de vida:

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60

1. Saúde e acesso a cuidados médicos

Sintomas e doenças, acesso a médicos e tratamentos .

2. Emprego e condições de trabalho

3. Recursos Econômicos

Renda e riqueza, propriedade, capacidade de cobrir as despesas

necessárias básicas

4. Educação

Anos de escolaridade, nível mais alto de escolaridade alcançada

5. Integração Familiar e Social

Estado civil, contatos com amigos e parentes

6. Habitação

Número de pessoas por cômodo, conforto doméstico

7. Segurança de Vida e de Propriedade

Exposição à violência

8. Recreação e Cultura

Tempo de lazer, viagens de férias

9. Recursos Políticos

Capacidade de apresentar opiniões, sugestões e reclamações

Já no conceito de qualidade de vida proposto por Herculano (2000) a questão

ambiental agrega-se aos demais itens hoje mensurados pelo Índice de

Desenvolvimento Humano (IDH), assim definem qualidade de vida como:

Page 52: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

61

“... Soma das condições econômicas, ambientais, científico-culturais e políticas

coletivamente construídas e postas à disposição dos indivíduos para que estes possam

realizar suas potencialidades: inclui a acessibilidade de produção e ao consumo, aos

meios para produzir cultura, ciência e arte, bem com pressupõe a existência de

mecanismo de comunicação, de informação, de participação e de influencia nos

destinos coletivos, através de gestão territorial que assegure água e ar limpos, higidez

ambiental, equipamentos coletivos urbanos, alimentos saudáveis e a disponibilidade de

espaços naturais amenos urbanos, bem como da preservação de ecossistemas

naturais.”

Ainda de acordo com Herculano (2000), mensurar qualidade de vida implicará

mensurar também:

1. Níveis de conhecimento e tecnologia já desenvolvidos e os mecanismos para o seu

fomento;

2. Canais institucionais para a participação e geração de decisões coletivas e para

resolução de dissensos;

3. Mecanismo de acesso à produção (financiamentos)

4. Mecanismos de acessibilidade ao consumo (distribuição de renda, de alimentos e

acesso aos equipamentos coletivos – água , luz, saneamento, etc);

5. Canais democratizados de comunicação e de informação;

6. Proporção de áreas verdes para a população urbana, proporção de áreas de

biodiversidades protegidas;

7. Organismos governamentais e não-governamentais ( volume de recursos financeiros

e de pessoal alocados para as políticas sócio-ambientais)

Apesar da abrangência do conceito de qualidade de vida, a sua veracidade não

se aplica inflexível e igualitariamente para todos os seres humanos. Dependendo das

condições de vida a que um indivíduo esteja sendo exposto, seus parâmetros de bem-

estar podem oscilar bastante, assim é factível que um homem do campo, com baixo

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62

nível de escolaridade e poucos recursos tenha uma percepção de bem-estar diferente

de um executivo bem-sucedido.

Para que não permeiem dúvidas sobre o uso adequado dos indicadores de

qualidade de vida na análise desta comunidade, todos os entrevistados foram inquiridos

sobre o que compreendiam a esse respeito. Assim surgiram em ordem de importância

para os mesmos os indicativos abaixo:

a) Tranquilidade em relação à sobrevivência

Especificamente no caso dos entrevistados desta comunidade, objeto de estudo

em questão, encontra-se como indicador absoluto de qualidade de vida a tranqüilidade

alcançada pela garantia de sobrevivência, através da posse da terra.

Como já citado anteriormente, as famílias que foram escolhidas para compor

esta comunidade, receberam como doação e se tornaram proprietárias, cada uma

delas, de 2 hectares de terra adequadas ao cultivo ou criação de animais.

Esse acontecimento foi registrado pelos entrevistados como uma garantia de

sobrevivência que é representada através da possibilidade real de ter alimento contínuo

e residência fixa e própria, que se transformará em uma rica herança para os

descendentes.

A certeza de possuir um espaço próprio para pousar, trabalhar e colher os frutos

do seu trabalho, sem temer que em um futuro próximo ou distante lhe seja tirado o seu

lar, atribui a esse aspecto uma larga importância para os moradores desta comunidade.

Essa tranqüilidade em relação à sobrevivência, a certeza do alimento na mesa, o

orgulho de possuir uma moradia própria para si e os seus dependentes pode ser

percebido nas opiniões e posicionamentos dos entrevistados:

“ (...) Eu vim para cá para ter uma terrinha minha, nós moramos 53 anos

naquele engenho ali, mesmo ali pertinho, eu tinha um sítio lá, mas o sítio de

lá era do homem, do proprietário, não era meu, lá quando plantava um pé de

côco o homem mandava derrubar, se a gente plantava um pé de banana o

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homem mandava arrancar, ou um pé de qualquer coisa o homem mandava

empatar, porque a terra não era da gente. Quando o governo deu essa

terrinha aqui viemos pra cá e andamos pra frente, hoje na necessidade tem

comida a fole aí nos pés, fome nós não passa mais, aqui tem côco, banana,

macaxeira, manga, inhame, milho, e assim a gente não passa mais aperto,

aqui a gente trabalha no que é da gente, ali no engenho Tabatinga a gente

não tinha nada, porque lá nem a casa era da gente, aqui a gente tem um

futuro pra família e um descanso pra minha velhice, pra sempre.”

Neste depoimento confirma-se que a posse da terra, e a capacidade de nela

trabalhar para tirar o alimento traduz-se em tranquilidade no presente e no futuro

“ (...) Tô com os meninos aqui já plantando mais manga, jaca, cajú, e outras

fruteiras, porque a lavoura branca só dá pra um ano só, depois tem que

plantar tudo de novo, mas os pés de fruta leva a gente a prosperar e como a

terra é da gente é segurança de ter por muitos anos os frutos do trabalho de

pouco tempo, porque tem uma vida prolongada.”

A fala do Sr. Nildo demonstra a necessidade de sentir que o futuro está

garantido, e isso se traduz através da garantia do alimento na mesa por um período

longo. Vários dos agricultores familiares entrevistados lutaram por muito tempo para

conseguir um dos elementos básicos garantidores da sobrevivência, a capacidade de

nutrir-se, assim é possível entender o grau de importância que a fartura alimentar

representa para esses agricultores, ocupando assim lugar de destaque no ranking de

indicadores de qualidade de vida que eles construíram.

Corroborando com a Teoria da Hierarquia das necessidades de Maslow a base

da pirâmide agrupa características fundamentais consideradas básicas como descanso,

abrigo e comida, e em um estágio um pouco mais avançado na realização do ser

humano, a questão de segurança que pode ser compreendida, pela garantia da

proteção seja ela dentro de uma casa ou, adequando ao nosso estudo, possuindo uma

propriedade para viver e sentir-se seguro.

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64

b) Educação

Um outro aspecto identificado como representante de uma boa qualidade de vida

pelos integrantes desta comunidade foi o acesso à educação.

Contudo os depoimentos dos entrevistados ressaltam que os mesmos se

referem não apenas ao acesso a uma educação formal, mas também a uma formação

que propicie a construção de um pensamento crítico e prático, que possa transformar o

conhecimento adquirido, em vantagens no dia-a-dia do trabalhador rural através da

qualidade do trabalho desenvolvido e consequentemente no aumento da produtividade.

Ultrapassando as esferas rurais, os entrevistados atribuem também à educação

a tarefa de melhorar a sociedade em que vivemos, na medida em que acreditam que a

educação ensina o indivíduo a pensar e fazer suas escolhas com mais segurança. Além

de acreditarem que, por terem tido acesso a educação, mesmo que em alguns casos,

um pouco tardio, se sentem co-responsáveis pela construção de caminhos que tornem

a educação acessível para a totalidade da sociedade.

A fala abaixo transcrita pelo Sr. Sebastião ilustra o valor que a educação tem

para esse grupo:

“ (...) Eu não pude estudar porque comecei na lida aos 8 anos de idade,

meus filhos quando pequenos também não estudaram porque no engenho

onde nós morava não tinha escola, e era tudo muito isolado, mas o meu

orgulho são meus netos que desde pequetitinhos tão na escola. (...) Assim a

vida deles será boa desde cedo, e a nossa mais tranqüila de ver eles

seguindo nas letras”

O depoimento torna muito claro que apesar do baixo índice de escolaridade os

entrevistados reconhecem a educação como uma forma de obter melhoria de qualidade

de vida. Demonstrando que orgulham-se de participar do processo de formação de

seus descendentes.

c) Saúde

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Os entrevistados apontam o fator saúde como a chave para a continuidade de

seus negócios. A importância do acesso à saúde de melhor qualidade indica também a

possibilidade de uma “vida mais longa e mais produtiva”, onde seja possível

desenvolver o trabalho em suas terras pelo máximo de tempo possível.

“(...) Quanto mais saúde Deus me der,mais eu vou agradecer, porque um

homem com saúde é um homem rico. (...) Com saúde ele pode tudo, mas

quando cai doente vai depender da esmola dos outros”

Neste depoimento o Sr. Luiz confirma a importância da saúde para uma vida

completa, indicando que a falta da mesma pode causar dependência, cerceando a

possibilidade de ter uma vida com qualidade longa e produtiva.

d) Condições de Habitação

As condições de habitações explicitam muito sobre a realidade da vida desses

agricultores rurais, que demonstram em seus depoimentos ter consciência do bem-estar

que desfrutam ao residirem em habitações mais adequadas aos padrões básicos de

higiene e conforto.

A fala do Sr.João transcrita logo abaixo ilustra bem essa situação:

“(...) da casa de taipa só sobrou a lembrança, pra puder contar aos meus

netos quando tiverem mais velhos, e saberem que eles já nasceram no luxo,

tem banheiro com água dentro de casa, parede branquinha, esse piso que

passou pano e tá limpo, e se chover não tem goteira. (...) Ah, quando chovia

na casa antiga era uma túia de panela espalhada pelo meio da casa pra

aparar a água, a gente não podia nem cozinhar, (...) agora eu tô no bem

bom”.

A qualidade de vida indicada pelos entrevistados através deste tópico está muito

ligada a questão conforto, pois os depoimento demonstram claramente a possibilidade

de ter acesso as benesses da água encanada, do banheiro no interior das residências,

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66

do piso fácil de higienizar, do telhado sem vazamentos, entre outros aspectos

relacionados ao bem-estar no lar.

e) Segurança

Muito embora este conceito abranja vários aspectos como indicado na

previamente referida Teoria de Maslow, os entrevistados o usaram para indicar apenas

segurança contra a violência urbana.

“(...) a moça me desculpe mas eu não acredito que seja feliz lá na cidade

não, a gente vê na televisão é todo dia o dia todo aquele horror de gente

morrendo, com medo, é cheio de grade pra todo lado, (...) vida é aqui, espie

mesmo se eu tenho muro, tenho não, porque aqui não precisa, a gente bota

um ferrolho na porta,mas só de noite, o resto do dia é tudo aberto, as

crianças correndo para todo lado, aqui não tem aperreio não. (...) Olhe em

tenho um casal de pavão, eles saem pra passear, passeiam, passeiam,

depois alguém encontra eles e mandam me avisar para eu ir buscar, aqui

não se tira nada que é dos outros não, até fruta quando a gente quer a gente

pede, aqui é bom de morar, quando a moça quiser venha passar uns dias

aqui com nós, e depois não vai mais querer voltar pra lá não”.

A fala do Sr. Deda indica claramente a compreensão sobre as vantagens de se

viver longe dos centros urbanos, o que para eles representa um indício muito forte de

privilégio em comparação com a vida dos moradores das grandes metrópoles.

f) Proximidade da Natureza

Há consciência, por parte dos integrantes desta comunidade, da importância da

proximidade da natureza para se obter uma vida de melhor qualidade, e em

contrapartida há também a compreensão da preservação ambiental, como meio de

perpetuarem o ambiente em que vivem.

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A fala do Sr. Manoel ilustra o respeito pela natureza:

“(...) A minha parcela podia ter uma área produtiva maior, mas quando eu

cheguei aqui, logo depois, o fazendeiro aí do lado botou abaixo o resto de

mata que tinha pra poder plantar cana, aí os bichinhos que viviam lá

correram tudo pra cá, pro meu pedaço de mata, aí veio cobra, sapo, preá,

passarinhos, e eu não tive coragem de tirar a mata porque do outro lado é

estrada, se eu acabo com tudo para onde é que eles iam? Aí eu resolvi que

não ia mexer, vez em quando eu vejo eles tudo correndo aí dentro”.

O próximo relato refere-se ao privilégio que os entrevistados consideram ter

sobre os residentes dos centros urbanos, que os permite ter acesso a uma alimentação

mais saudável, respirar o ar puro do campo, curar possíveis indisposições ou até

mesmo doenças mais graves com remédios caseiros como chás de ervas colhidas em

suas terras.

“ (...) Tá achando a minha cara boa é? Pois sim, é porque aqui no campo a

gente não se acaba tão cedo não, porque num clima desses a gente não

pode se acabar tão cedo, a natureza contribui também com o nosso

desenvolvimento, agente aqui não tem aperreio com nada, o clima é bom, o

ar é puro, a comida é mais saudável,até o céu aqui tem mais estrelas. (...) A

gente vai se aborrecer com o que aqui ? E quando vem ter uma gripe ou

coisa parecida, tem sempre uma folhinha de algum pé de planta que sirva

para passar. (...) Só é Deus e a natureza, eu mesmo não saio daqui é nunca,

só mesmo quando morrer e é porque os outros vão me levar porque por

gosto eu não vou não.”

Assim, e da mesma forma como já citado na fundamentação teórica para

Herculano et. al. (2000) o conceito de qualidade de vida agrega a questão ambiental

aos demais itens hoje mensurados pelo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH),

corroborando então com importância dada por esta comunidade a proximidade da

natureza, onde eles possam desfrutar de um ar mais puro, alimentos mais saudáveis e

cooperarem com a preservação de ecossistemas naturais.

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68

g) Participar de uma associação de moradores pró-ativa

Esta indicação refere-se ao fato dos entrevistados terem a presença de uma

associação de moradores que é presidida por uma líder comunitária extremamente

ativa quando se trata de defender os interesses da comunidade.

Esse sentimento de ter alguém que lute pela melhoria do local onde vivem, e que

vá em busca de oportunidades interessantes para comunidade, alguém em que se

possa confiar e seguir seus passos, traz para os entrevistados uma confiança de ter

com quem contar.

“... Graças a Deus dona Madalena olha por nós, nunca que a gente vai

deixar ela sair da presidência da associação, porque se tem uma glória na

vida é saber que a gente vive em um lugar organizado como este, em vista

das outras comunidades que tem aqui em Goiana, isso aqui é um paraíso e a

gente deve a ela e à associação que trabalha sempre melhorando a nossa

vida aqui.”

A colocação do Sr. Edimilson demonstra a sensação de conforto diante da figura

paternalista de Dona Madalena, que assume o papel, de orientadora, guia, educadora,

protetora, suprindo uma carência típica de um ser humano que se desenvolve distante

dos cuidados familiares, da formação escolar e da aceitação da sociedade.

Buscando interligar os relatos dos entrevistados com a literatura citada sobre

qualidade de vida, realmente não há um termo que se apresente com a mesma

nomeclatura que os eles utilizaram para explicar este último item. Contudo Allardt

(1975) apud Nussbaun; Sen (1993) usa o verbo AMAR para esclarecer que qualidade

de vida também agrega o relacionamento com outras pessoas e a formação de

identidades sociais, inclusive através da união e contatos com a comunidade local e

com companheiros em associações e organizações.

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69

4.3 O Microcrédito como Gerador de Melhoria de Qualidade de Vida

Após analisada a compreensão de qualidade de vida, sob a ótica dos

entrevistados da comunidade Diamante, seguimos com uma correlação para entender

quais melhorias de qualidade de vida foram alcançadas por eles em decorrência do

microcrédito.

Em primeira instancia perguntamos aos entrevistados sobre a influência do

microcrédito em suas vidas, ao que obtivemos respostas completamente opostas.

Assim conseguimos encaixar os 16 entrevistados em dois grupos distintos:

Grupo 01 – Os 14 entrevistados deste grupo corroboram com a idéia de que o acesso

ao microcrédito foi de extrema relevância para a melhoria da qualidade de suas vidas.

Grupo 02 – Os 02 entrevistados deste grupo indicam por várias razões descritas

posteriormente que o acesso ao microcrédito não só não proporcionou melhoria de

qualidade de vida, como chegou até impingir uma piora relativa.

Na seqüência estão dispostos os relatos dos entrevistados do grupo 01 sobre

como o microcrédito influenciou positivamente o processo de melhoria de qualidade de

vida.

De todos os aspectos de qualidade de vida elencados pelos integrantes desta

comunidade, apenas dois não tem seu alcance atribuído ao microcrédito. São eles o

aspecto Segurança e uma Associação de Moradores Pró-ativa.

Contudo esses itens não têm por isso uma menor representatividade na

composição do quadro que demonstra qualidade de vida.

É interessante observar também que ao analisar os benefícios trazidos pelo

microcrédito, surgiram dois novos aspectos que não compunham o conceito de

qualidade de vida estabelecido pelos entrevistados: Acesso a Bens de Consumo e

Perspectiva de Crescimento dos Negócios

Page 61: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

70

Indicativos de melhoria de qualidade de vida do grupo 01

Tranqüilidade em relação à sobrevivência

Os entrevistados, neste caso, são essencialmente homens do campo, como eles

mesmos preferem ser denominados, que desenvolveram durante anos a prática de

plantio de alguma cultura ou criação de algum animal para os seus antigos patrões,

proprietários das terras onde eles trabalhavam e viviam com suas famílias.

A realização para vários deles era poder ter seu próprio pedaço de terra, forma a

que referem-se quando tratam de explicar sobre propriedades, de onde pudesse retirar

o seu sustento.

No momento em que essa comunidade foi formada e os seus integrantes

receberam cada um 2 hectares de terras cultiváveis, perceberam que um fator adicional

os impedia de desenvolver algum trabalho produtivo nessas terras, a ausência de

recursos financeiros para iniciar e manter a plantação ou criação.

Esse fato era tão decisivo para o êxito da independência desses indivíduos como

trabalhadores autônomos, quanto a própria posse das terras, já que as mesmas são

frequentemente arrendadas para propiciar o plantio ou criação temporárias, prática

muito comum na área rural.

A ausência dos recursos financeiros implicava na impossibilidade de cumprir etapas

necessárias para realizar o plantio ou criação, como por exemplo o preparo antecipado

das terras com nutrientes que porventura sejam necessários para melhorar o nível de

produtividade, aquisição de material para trabalhar nas terras, os sistemas de irrigação,

as sementes, e em caso de criação a compra de matrizes ou reprodutores, e animais de

recria, ração, vacinas, e outros implementos importantes nessa atividade. Adicione-se a

isso, o tempo necessário para colher os resultados, no período em que o trabalhador

não tem outra fonte de renda, já que é ele a própria mão-de-obra deste trabalho.

Page 62: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

71

Diante deste panorama os trabalhadores, agora patrões, compreendem que não

é possível gerir qualquer negócio por menor que seja, sem recursos para investir, nem

mesmo possuindo as próprias terras.

As falas transcritas abaixo demonstram que os entrevistados têm consciência da

importância do acesso a algum tipo de crédito e o reconhecem como fator impeditivo ou

indutor do sucesso do seu trabalho , instrumento de fomento a sobrevivência de cada

unidade familiar.

“(...) Olhe eu dou Graças a Deus de o governo ter dado essa terrinha para

nós que traz o nosso futuro para frente, que é o melhor futuro ter uma

terrinha porque nunca se acaba, agente se acaba mas a terra prospera pra

família toda, e se a família souber guardar isso aqui, isso aqui vale mais do

que ouro........ Aqui agente trabalha no que é da gente, aqui hoje eu tenho 25

pés de manga, mais de 20 pés de caju, 70 pés de côco, fora minhas

lavouras, e isso tudo contribuiu para o nosso futuro para frente, por isso eu

agradeço primeiramente a Deus, depois aos nossos governantes que me

deram essa terrinha e depois a Dona Madalena que me ajudou a tirar o

crédito lá com os homens do banco, porque com ele eu pude trabalhar na

minha terrinha”

O depoimento do Sr. Nino ilustra o sentimento de vitória que se apresenta quando

eles descrevem com muita felicidade a situação de fartura alimentar que eles desfrutam

no momento, e atribui as benesses desta nova fase de sua vida ao microcrédito, que só

foi possível através do apoio prestado pela associação dos moradores, representada

pela figura da presidente Dona Madalena.

“(...) Eu tirei o dinheiro do crédito aí melhorou mais a condição, porque eu

não podia trabalhar sem ter nem um centavo. Com esse dinheiro eu

trabalhando e crescendo e aumentando a produção, quer dizer que tem

Page 63: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

72

melhor futuro o camarada que sabe um empréstimo quanto vale, porque vale

muita coisa, agora para quem não compreende um empréstimo não vale

nada porque quando pega no dinheiro só quer gastar, mas se ele for certinho

ele vai para frente, mas agora gastou, avoou aquele empréstimo ele não vai

porque vai ficar devedor do banco. Olhe eu vou dizer um negócio a senhora,

o banco empresta o dinheiro prá nós, e nós devemos aceitar e depois temos

que pagar, porque se a gente não paga, aí vem outro camarada e também

não paga, o banco não pode contribuir para todo mundo não, porque vai

secar o dinheiro se acaba. (...) Não pode ser assim, nós deve contribuir tudo

certo, nós deve andar direito, se tem algum problema vai lá fala com o

gerente, explica, paga um pedaço primeiro depois paga o outro, faz um

acordo, e quando dá fé ta tudo pago, aí tem direito a um novo crédito

novamente. Se todos pensassem como eu o Brasil era outro, mas muita

gente quer tirar só pra si, a í o banco vai e deixa o empréstimo mais caro,

prejudica a gente mesmo, (...) e a gente tem que pensar na família que fica,

para que um dia na precisão eles também tenham direito ao crédito, é melhor

pagar direitinho pra que isso nunca acabe e tenha o que é bom pra todo

mundo ”.

É interessante observar que em seu depoimento o Sr.Manoel tem a consciência

da importância do uso adequado dos recursos, inclusive a percepção da

responsabilidade que cada tomador de crédito tem para manter o serviço funcionando,

com taxas de juros baixas e volume de dinheiro disponível para empréstimos. Essa

forma de pensar demonstra o respeito à coletividade, compreendendo que as escolhas

individuais repercutem positiva ou negativamente no caminhar da sociedade.

Capacidade de produzir o próprio alimento e se sustentar

Os entrevistados atribuem ainda, ao microcrédito a possibilidade de produzirem

seus próprios alimentos, afastando da família o estigma da fome, ou da contenção de

alimentos. Além disso demonstram que os financiamentos levaram para eles a

Page 64: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

73

possibilidade de investir em pequenos negócios que se tornem a fonte de renda da

família, e que sejam desses negócios que eles se sustentem com dignidade e

perspectivas de crescimento.

É interessante destacar a fala da Sra. Ana sobre a fartura de alimentos em

contraposição a fome vivida, anteriormente ao uso do microcrédito.

“ (...) Eu vim do nada, hoje pode abrir ali a minha freezer que você vai ver

que 30 pessoas comem, mas antes em um dia como o de hoje (sábado) eu

só tinha um peixinho assado, e era aqueles peixinhos pequeninitos,

comprava um peixinho salgado bem magrinho daqueles que não tem nome,

o que sobra na feira, o que ninguém quer, nem os bichos querem. Era isso

que eu tinha dia de hoje para comer, e lá dentro tinha uma galinha do pé

seco, que é aquelas galinhas bem magra do pé duro, que ficava lá amarrada

no canto que era para almoçar no dia de amanhã que era domingo. A partir

de segunda-feira em diante era cuscuz com leite puro, meio dia (almoço) na

semana que tinha uma sobra eu comprava meio quilo de charque, para

passar a semana, e era muito, eu hoje compro10 quilos de charque e não dá

pra 15 dias. Essas coisas feito queijo, manteiga, presunto, nada disso agente

conhecia, não sabia nem o que significava. Hoje eu sou rica, tem comida

farta aqui, eu nunca provei mas já sei até o que é caviar.”

E a do Sr. Deda que além de garantir o sustento da família, investiu em

pequenos negócios, ultrapassando a economia agrária. O comércio como correlato,

passou a fazer parte da atividade dessa família.

“ (...) Hoje meu padrão de vida em relação a vida que eu vivia antes do ano

de 2000 é muito melhor, hoje eu tenho ovos de capoeira que eu vendo muito

bem, e tudo isso aqui eu consegui através dos financiamentos juntamente

com a associação, eu tenho meus carneiros, tenho meus coqueiros de onde

Page 65: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

74

eu tiro água de côco para vender aos meus clientes aqui e isso ajuda a

minha renda, tem minhas fruteiras que eu vendo, faço doce, até os pés de

pupunha que eu plantei já estão me dando lucro, os clientes já chegam aqui

final de semana procurando pelas pupunhas, e muitas coisas dessas vão me

ajudando. Agora mesmo peguei mais um financiamento para plantar sapota

e pinha que são duas frutas caras e a quantidade que produzir dela vai

vender, agora mesmo plantei o limão tahiti e deu certo, porque repare

mesmo, hoje chega um cliente aqui no meu restaurante querendo um limão

eu tiro da minha própria terra, eu não vou mais pra feira comprar R$ 5,00 ou

R$ 6,00 de limão, aí tudo isso vai ajudando o camarada a crescer, e todas

essas coisas que eu tenho aqui hoje elas só chegaram depois dos

financiamentos.”

As informações acima ilustram o potencial construtivo que o acesso ao crédito,

aliado a alguns outros fatores, teve na vida dos integrantes desta comunidade.

Habitação Adequada

Ao chegarem nesta comunidade, os moradores conseguiram através da sua

associação financiamento para construção de habitações populares para as famílias

que lá iam passar a residir.

Esse financiamento só conseguiu garantir habitações simples e pequenas, que

não comportavam todos os membros da família decentemente. Ao ter acesso aos

microcréditos, que possibilitou o desenvolvimento de suas atividades agrícolas, os

moradores usaram parte do lucro para investir em suas habitações, compreendendo

claramente a relação de uma boa moradia com a qualidade de vida. O dinheiro,

portanto, reverteu-se em ampliações, reformas, colocação de piso de cerâmica e teto

estucado, e em vários casos construções de outras habitações para presentear filhos e

netos, com o intuito de levar melhoria de qualidade de vida e manter a família vivendo e

trabalhando unida.

Page 66: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

75

Quando Allardt (1975) apud Nussbaun e Sen (1993) Erikson (1987) apud Nussbaun;

Sen (1993) avaliam o quesito Habitação, como indicador de qualidade de vida,

observam o número de pessoas por cômodo dentro de uma mesma residência e o

conforto doméstico, o que corrobora com o depoimento dos entrevistados que alegam

terem priorizado melhorias em suas habitações através de ampliações e reformas.

Ilustra Sr.Sebastião exemplificando o significado de uma melhor moradia

“ (...) A primeira coisa que eu fiz quando tive o meu lucro foi investir em

melhorar minha casinha (...) Hoje agente tem três casinhas aqui dentro a

nosso favor, porque lá onde morava antes a casa era de taipa, aí como as

coisas melhoraram meu filho que é casado já fez uma casinha pra ele, e

agora meu outro filho que é solteiro já fez também uma outra casinha pra ele,

aí já estamos com três casinhas dentro do sítio né, agente dá Graças a

Deus.”

Acesso a Bens de Consumo

Outro aspecto citado em concordância pelos entrevistados que sugerem

melhoria de qualidade de vida em decorrência do acesso ao microcrédito, foi a

possibilidade de ampliação do acesso a bens de consumo.

De acordo com Allardt (1975) apud Nussbaun e Sen (1993) o índice intitulado

Recursos Econômicos mensura qualidade de vida analisando pela ótica da riqueza e

renda do indivíduo, pois o autor considera esse índice um indicativo de capacidade de

compra.

Herculano (2000) ainda é mais objetiva quando sugere um índice denominado

Mecanismos de Acessibilidade ao Consumo para demonstrar a relação entre qualidade

de vida e acesso a bens de consumo

Page 67: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

76

“... Na minha casa não tinha uma televisão, o que tinha era um rádio porque

não tinha energia, tinha somente um rádio velho, eu botava pilha quando

dava fé ela descarregava, e a pilha tava estourada, porque eu não podia

comprar uma pilha que a pilha era cara, e agora hoje em dia funciona uma

televisão aí, é geladeira é tudo, graças a Deus a gente tem, e se eu

prosperar mais tenho fé que antes de eu partir vou ter um carrinho na

garagem.”

Nessa descrição do Sr. Lourenço, constata-se que houve melhoria de qualidade

de vida através do aumento do poder aquisitivo e consequentemente do acesso a um

número maior de itens de bens de consumo. Ainda é possível perceber que o

entrevistado nutre uma expectativa de prosperidade em relação aos seus

empreendimentos, expondo assim, a credibilidade que ele tem na oportunidade que lhe

foi oferecida através de recursos do programa de microcrédito rural do Pronaf.

Proporcionar Educação aos Filhos

Os entrevistados atribuem ao microcrédito a possibilidade de permitir que os

filhos estejam na escola por um período enquanto os pais trabalham e tem recursos

para manter a família. Muitos alegam não terem podido estudar na fase da infância e

adolescência por precisarem estar trabalhando pelo sustento, e agradecem o acesso ao

microcrédito pela possibilidade de oferecer uma vida melhor aos seus dependentes.

A comunidade atualmente desempenha um papel importante na educação dos

moradores, pois a associação conseguiu fundar uma escola que funciona nos três

turnos, pela manhã provendo a educação as crianças e adolescentes que estão na

idade escolar regular, a tarde aos adultos que estão fora da faixa escolar e a noite aos

idosos que já não acreditavam mais na possibilidade de freqüentar uma escola.

A existência de uma escola no local facilita o acesso à educação, mas não é

determinante para que o mesmo ocorra, pois se os moradores desta comunidade não

Page 68: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

77

tivessem uma fonte de renda garantida para a família, necessitaria usá-la como meios

de obter o sustento.

Além disso, nesta comunidade a expectativa de futuro garantida pela educação

vai além do ensino básico, haja vista as várias famílias que já conseguiram ou estão se

preparando para proporcionar a continuidade da educação dos filhos e netos, em rumo

a uma educação superior ou curso técnico. A idéia é que esses jovens sejam

estimulados a estudar algo interligado com a área rural e possam trazer de volta para a

comunidade, através do conhecimento adquirido, inovação tecnológica que impulsione

aumento da produtividade, da qualidade do trabalho e proporcione o constante

aprimoramento das atividades desenvolvidas nesta comunidade.

Os depoimentos a seguir demonstram que os moradores desta comunidade

vêem a educação como fator decisivo de ascensão social e consequentemente de

melhoria de qualidade de vida para seus familiares

“(...) meus filhos tem agora condições de freqüentar a escola, graças a

comunidade que trouxe escola para os nossos desde 2000. Eu tenho um

filho formado já na leitura né, ele agora que terminou só ta para arrumar

emprego, mas ele é formado, e nós temos é que agradecer a Deus que ele já

tem um curso que vai abrir uma frente de trabalho pra ele, para ir mais para

frente também. Lá no lugar que eu morava antes de vir para cá não tinha

escola, não tinha nem um lugar para as crianças estudarem, aqui temos um

colégio para as crianças e aqui prospera tudo, porque daqui eles vão

prosperar.E quando tá mais velhinho pode ir para rua para terminar a escola,

e eu e a velha aqui ficamos felizes de puder sustentar a família enquanto

eles estudam, porque um dia isso tudo vai ficar para eles, e se Deus quiser o

banco vai continuar dando o crédito que é pra gente sempre prosperar mais,

é só pagar direitinho que vai ter.”

Nesse relato do Sr. Manoel percebe-se a importância que os integrantes desta

comunidade atribuem à educação como meio de ascensão social. No caso desta

comunidade em particular o elevado índice de acesso a educação, propiciou-se pela

Page 69: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

78

infra-estrutura oferecida pela comunidade aliada a capacidade que o microcrédito gerou

aos chefes dessas famílias de tornarem-se os provedores dos filhos e dependentes,

cabendo a esses últimos, enquanto crianças e adolescentes, apenas a tarefa de se

dedicarem aos estudos.

“(...) Hoje nós temos formado aqui na comunidade biólogo, professor,

contabilista, e advogado. (...) Claro que alguns deles vão querer ter outros

trabalhos, mas o contabilista hoje trabalha para a associação, e tem seus

clientes por fora, como a advogada, que cobra caro para seus clientes de

fora, mas aqui dentro ela trabalha de graça, trabalha pela consciência de

ajudar a comunidade a crescer e prosperar com os outros que estão vindo”

(Sra. Madalena)

“(...) se meu pai tivesse tido a oportunidade de pegar esse crédito a 46 anos

atrás e eu ao invés de ter ido pra lida com ele tivesse ido pra escola eu não

era esse burro chucro de hoje, mas Deus quem quis assim, e me deu a

oportunidade de vir para essa comunidade tirar o crédito e puder mandar

meus filhos pra escola, (...) meus filhos se alembram que lá em Mangará não

tinha escola, por isso só vieram estudar mais velhinhos, mas meus neto são

meu orgulho, eu sei que eles vão pra frente e eu pude ajudar.” (Sr. Godo)

Este depoimento do Sr. Godo confirma a análise anterior afirmando que o acesso

ao crédito representou para estes entrevistados a possibilidade de proverem suas

famílias, não precisando contar com trabalho infantil, para se sustentarem. Essa

possibilidade de ajudar no desenvolvimento educacional dos filhos e dependentes foi

registrada pelos entrevistados como fonte de muito orgulho e prazer.

Acesso a saúde particular

Uma questão abordada por alguns entrevistados como dignificante foi a

possibilidade de em caso de necessidade extrema, ter acesso a serviços médicos

particulares.

Page 70: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

79

De acordo com a Teoria de Maslow a necessidade de segurança pode ser

refletida na simples imagem de um plano de saúde, e apesar de nenhum dos

entrevistados desfrutar de plano de saúde, eles preenchem essa carência com a

garantia de poder pagar serviços médicos particulares nas disseminadas clínicas de

bairro, onde o preço é mais acessível e o atendimento mais digno do que na rede

pública de saúde.

“(...) Pra mim eu não ligo muito não, mas pras crianças de casa eu tenho de

guardar um dinheirinho para comprar as coisas das minhas queridas, porque

ainda não são casadas então contam tudo só comigo mesmo (...) mas tem

que regrar também porque quando elas pedem R$ 50,00 aí eu digo: - não

minha filha só tem R$ 20,00, porque se ela pedir os R$ 50,00 e eu der, pra

semana ela pede R$ 100,00, aí eu vou perguntar pra que tanto dinheiro ? Vai

pro médico ? e se ela responder que vai pro médico eu tô bebido, o jeito é

dar o dinheiro porque elas não querem ir para fila do hospital público, tá tudo

cheia de luxo, mas a mãe é que bota esses luxo, então o que eu posso fazer

? (...) mas fora de brincadeira eu dou graças a Deus de hoje poder pagar

médico particular para as minhas filhas, eu dou graças a Deus e a dona

Madalena que me mostrou o caminho da luz para eu tirar esses

financiamentos e ter minha vida organizada aqui.” (Sr. Manoel)

O relato do Sr. Manoel confirma claramente que o acesso a serviços essenciais,

como por exemplo, saúde particular, aparece como mais um resultado positivo gerado

pelo microcrédito

Transporte

Outro indicador de qualidade de vida é o acesso aos meios de transporte que

permite o exercício do direito de ir e vir.

Por residirem fora do perímetro urbano, entrevistados esclarecem que não há

uma abundancia de transporte coletivo público como ocorre nas cidades, e recordam da

dificuldade que tinham antes de morarem nesta comunidade para conseguir se

locomover até o centro urbano mais próximo.

Page 71: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

80

Mas apesar disso, hoje se tem condições de locomoção muito melhores do que

as que tinham antes de residirem nesta comunidade.

A situação atual já indica possibilidades de melhoria, inclusive através da

aquisição de transporte particular. O Sr. Trajano indica tal desejo em sua fala

“... Sabe qual o sonho que eu ainda tenho se mais eu prosperar aqui? É ter

uma daquelas caminhonetinhas, para levar os negócios para a feira para não

precisar mais pagar transporte a ninguém, porque a melhor coisa é botar seu

carrinho na sua garagenzinha, quando é de 05:00 horas vamos pra feira, não

vamos pagar nada para ninguém, quando der fé ta na sua casinha de novo

com o restinho que não vendeu na feira e pronto. Hoje podemos pagar o

transporte pra vim buscar nós e a mercadoria em casa, era melhor do que

antes no lombo do burro, mas ter uma caminhonetinha era ainda melhor.”

Já o Sr. Deda conseguiu realizar este desejo

“... O transporte não é problema aqui porque tem o carro da linha que faz o

percurso diário, e depois que eu cheguei aqui já consegui comprar o meu

carrinho próprio, agora eu terminei de pagar o do meu genro também, para

ajudar ele a progredir também.”

Vale ressaltar que não só o aspecto do acesso a um meio de transporte

particular de melhor qualidade está em foco, mas também o uso do mesmo para

alavancar os empreendimentos. Assim os entrevistados associam a posse do

transporte particular à independência e progresso, que foram possibilitados pelo acesso

ao microcrédito.

Perspectiva de crescimento dos negócios, com reinvestimento

Antes empregados, não pensava, como os negócios se desenvolvem.

O acesso ao microcrédito que em primeira instancia havia trazido a tranqüilidade

em relação a sobrevivência, a possibilidade da melhoria de qualidade de vida em

Page 72: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

81

relação ao acesso a educação básica e profissional, saúde de melhor qualidade,

habitações mais adequadas as necessidades dos entrevistados, construções de novas

habitações para restante dos novos familiares, tornou-se insuficiente para a

comunidade, que foi em busca de ampliar seus horizontes.

Assim os financiados desfrutam do benefício de recorrer várias vezes ao

programa de microcrédito rural Pronaf, para buscarem recursos que lhes permitam

investir ou até mesmo diversificar seus microempreendimentos, melhorando sua

produtividade e propiciando uma maior estabilidade aos seus negócios rurais.

GRUPO 02

Por várias razões os entrevistados do grupo 02 tiveram problemas para

utilizarem os créditos conseguidos com o Pronaf adequadamente e estão ainda hoje em

situação de inadimplência. Para explicar como chegaram a tal situação os entrevistados

enumeram os problemas encontrados

1. A falta de orientação adequada por parte das instituições fornecedoras dos créditos

permite muitas vezes a escolha de decisões inadequadas.

O entrevistados alegam que as Instituições Microfinanceiras (IMFs) não se

preocupam em orientar corretamente os candidatos aos financiamentos, que apenas

oferecem um crédito fácil e rápido sem se quer explicar corretamente o que os

financiados devem fazer para gerir seus negócios.

A liberação dos financiamentos é aprovada mesmo sem um estudo adequado

para cada caso, que venha garantir que o projeto de financiamento escolhido é

apropriado para a região ou para as condições de plantio, cultivo ou criação que o

financiamento possa oferecer. Não leva-se em consideração, o tamanho das terras,

volume de água das terras, acesso as estradas para escoar a produção, as formas de

transporte, a superprodução da região para um mesmo produto, os custos de se

Page 73: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

82

conseguir água, a contenção das chuvas, os lucros possíveis pelo volume de produção,

etc.

Essa prática pode desencadear o parco desempenho do programa refletindo

negativamente nos números de inadimplentes como explicita o coordenador do

Programa de Políticas Públicas de Projetos em Agricultura Alternativa, senhor Jean

Marc Von der Weid em entrevista concedida na III Conferência Nacional de Segurança

Alimentar e Nutricional, quando indica uma gestão inadequada do programa por parte

do banco ao afirmar:

Um problema do Pronaf B foi o fato de que em muitos lugares houve uma pressão forte dos bancos para dirigir o crédito de determinadas atividades. Por exemplo, criação de gado de leite. Houve uma enorme quantidade de projetos nessa direção, não porque os agricultores quisessem, mas foi aquilo que os bancos disseram que pagavam. E mais, caprino e bovino de raça de qualidade, raças mais sofisticadas que não se adaptam a qualquer clima, e que exigem condições de criação e de alimentação mais difíceis e que o agricultor familiar não tem condições de manter. (DER WEID, 2007).

A explicação do Sr. Jean Marc Von der Weid apenas corrobora com as

informações do Sr. Severino que relata:

“... Os homens deram dinheiro pra vaca leiteira, mas como é que eu vou ter

lucro com vaca de leite em um pedaço de terra de 2 hectares? Não tem

pasto bastante para elas comerem (...) e elas comem demais, quase por dois

machos, não tem condições de eu ganhar nada assim. (...) eu peguei os

créditos porque o banco liberou pra vaca leiteira, mas eu me compliquei.”

Dessa forma os entrevistados criticam a liberação de projetos de financiamentos,

sem uma avaliação mais criteriosa de viabilidade, pois dependendo das condições de

cultivo ou de criação que o agricultor tenha para oferecer o empreendimento torna-se

pouco vantajoso ou até mesmo inviável.

02. Inadimplencia dos financiamentos

Page 74: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

83

Pelas razões explanadas no tópico anterior os financiados se sentem

desamparados por terem se envolvido em uma situação da qual não tem condições de

suplantar.

Alegam piora na qualidade de vida, pois além de terem tido acesso aos pontos

indicados na seção que retrata melhoria de qualidade de vida, passam a ter que buscar

subempregos nos centros urbanos mais próximos, ou empregos temporário no corte da

cana de açúcar, para conseguirem o seu sustento e o da família,( tiram os filhos da

escola para que estes trabalhem também) e conseguirem pagar a dívida com o banco e

sair da lista de inadimplentes.

Além disso, existe latente nesse tipo de abordagem a idéia de que dinheiro

público é sempre um dinheiro que não precisa ser reposto, e que o governo sempre

deveria perdoar os devedores. Isso faz alguns agricultores acreditarem que o governo

deveria intervir por eles mesmo que seja necessário cobrir gastos com bancos privados

“(...) Eu tirei o financiamento para carneiro, mas eu precisava melhorar a

minha casa e resolver um probleminha financeiro, aí eu vendi os carneiros

para usar o dinheiro para essas coisas (...) aí chegou o tempo de pagar o

financiamento e eu não tinha o dinheiro, e aí meu nome tá sujo. (...) eu acho

que o governo podia perdoar porque pra mim é muito, mas pra eles esse

dinheiro é muito pouquinho, e eu só posso limpar meu nome se eu quitar as

promissórias. (...) Pegar crédito, nunca mais, isso só trouxe preocupação, e

agora que agente já ta meio idoso, sem muita disposição pra trabalhar é que

não presta mesmo.” (Sr. Trajano)

Para prevenir essa distorção de foco, que existe há muito tempo na história

brasileira, julga Costa (2006) que é importante a compreensão por parte dos

agricultores, do que é de fato um financiamento rural, para que os mesmos possam

distingui-lo de programas de auxílio financeiro e políticas compensatórias,

intermediadas pelo Governo ou não.

O depoimento anterior retrata uma situação um tanto quanto comum na área

rural brasileira e registrada por (CERQUEIRA; ROCHA, 2002) que defendem a idéia de

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84

que a situação precária em que se encontram muitas dessas famílias torna o crédito

do Pronaf uma alternativa de sobrevivência. Nesse sentido, o crédito agrícola acaba

sendo utilizado não para investimento ou melhoria de produção, mas como uma

estratégia adicional de sobrevivência imediata dos pequenos agricultores que terminam

por utilizá-lo em atividades não-produtivas como despesas da casa, sustento da família,

saúde, e outras necessidades.

Nesse sentido é possível compreender que a opção que alguns dos integrantes

da comunidade Diamante fizeram para mudança de rumo da aplicação dos créditos, de

uma área produtiva para uma não produtiva, tem confluência com a atitude de outros

financiados que tiveram o mesmo resultado, a inadimplência.

Ao finalizar a análise de todos os relatos dos entrevistados, concluímos que sem

dúvida, para maioria deles o microcrédito foi um instrumento poderoso de geração de

renda e melhoria de qualidade de vida, no momento em que permitiu a esses

agricultores rurais a proximidade dos indicadores que eles consideram essenciais à

uma vida de qualidade.

4.4 Investimentos Auto-Sustentáveis ?

A auto-sustentabilidade a que se refere este trabalho não tem seu foco nas

instituições microfinanceiras, sejam elas com ou sem fins lucrativos, assunto a respeito

do qual já foram realizados vários estudos. A observação agora é focada no tomador de

créditos, com o intuito de avaliar se nessa comunidade os financiados conseguiram se

tornar independentes, ou auto-suficientes, depois de terem tido a oportunidade de

acessarem valores em dinheiro para investir em negócios que deveriam prosperar e

proporcionar que esses financiados passassem a ter um meio de sustento que gerasse

lucro e lhes dessem oportunidade de prover a família, pagar os empréstimos e

continuar com seus negócios.

Page 76: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

85

No intuito de responder essas questões, foi perguntado aos entrevistados se

esse programa de microcrédito trouxe para os mesmos a possibilidade de se auto-

sustentarem.

Na pesquisa de campo realizada os entrevistados relataram que o acesso ao

crédito é sem dúvida alguma um item importantíssimo para os mesmos atingirem a

meta de se auto-sustentarem ou se proverem de recursos para a geração de renda no

futuro, sem a necessidade de mais financiamentos bancários. Contudo, ficou claro que

o programa de microcrédito rural do Pronaf, sob a ótica dos entrevistados, deveria

redirecionar sua forma de gestão. Abaixo seguem observações, tanto com elogios

quanto com críticas ao programa no intuito de indicar possíveis caminhos a auto-

sustentabilidade dos agricultores familiares.

Entre os benefícios gerados pelo programa e percebidos pelos entrevistados

estão os seguintes

A oportunidade que se dá a alguém que não tem nada para oferecer como

garantia de ressarcimento dos empréstimos .

Acostumados a sentirem-se excluídos da sociedade, os entrevistados

demonstraram enorme satisfação em poder participar como cidadão, com direitos e

deveres, de um programa, que tem o intuito de promover a geração de renda para

famílias agrícolas. O importante é que não funciona como uma política assistencialista

que ofereça apenas doação, quando tudo que eles precisavam era de uma

oportunidade para mostrarem seu potencial produtivo.

De acordo com Vieira (2006) realizar um empréstimo no banco significa muito

para agricultores familiares, frequentemente excluídos da sociedade. De alguma

maneira esses agricultores se sentem importantes e orgulhosos de si mesmos, além de

nutrirem o sentimento de que o governo está acreditando que eles são capazes de

responder aos possíveis estímulos proporcionados pelo acesso ao crédito. O aumento

da auto-estima dos agricultores familiares dá ao Pronaf B o mérito de estar contribuindo

com a possibilidade dos seus beneficiados reagirem a um processo que, para muitos,

os condenariam ao atraso social e à inviabilidade econômica. Assim o impacto deste

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86

programa não pode ser visto apenas sob o aspecto econômico, pois ele resgata a auto-

estima de um numeroso grupo social de áreas rurais pobres do nosso país.

Oferecer uma oportunidade para os mais pobres poderem ter uma fonte de

renda, sustentarem a família e deixarem herança para que os filhos possam garantir o

sustento através do trabalho

Condições de pagamento e taxa de juros bem acessíveis, possibilitando que os

empréstimos sejam quitados, sobrando ainda dinheiro para sustentar os familiares e

reinvestir na incrementação dos negócios.

“... A oportunidade é boa, pois é que nem o camarada que tira o empréstimo

de um garrote desses, o melhor negócio do mundo, o cabra tira três garrotes

são 1.500 contos, o cabra que sabe tratar dele direitinho, com a venda de um

ele vai pagar ao banco e fica com dois de lucro, é bom”

“... O banco empresta já sem correção monetária, sem juros quase,

empresta um dinheiro muito bom, baixa o preço para bem pouquinho pra

gente poder pagar, então a gente deve cooperar com o banco, já que eles

cooperam com a gente, uma mão lava a outra”

“ Uma vez teve um crédito pequenininho que eu peguei, e eu pensei isso é

que vai dá bom pra mim, mas olhe na hora de pagar eu paguei tão

tranquilamente ao banco, mas tão tranquilamente, ainda fiquei com uma

cesta básica, um carro de mão de lucro e mais o lucro de dinheiro, porque

como eu paguei antes da data quando eu fui pagar, o preço foi mais baixo do

que o valor que eu tirei.”

Page 78: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

87

Os depoimentos acima retratam que os financiados acreditam serem

beneficiados pela taxa de juros cobrada pelo Banco do Nordeste, instituição que lhes

concede os créditos, indicam que o dinheiro que eles pegam emprestado é muito

barato, e que com a taxa de juros cobrada torna-se viável a utilização desses

empréstimos continuamente.

A percepção que alguns entrevistados têm sobre os baixos juros cobrados pelo

banco, vem da comparação que os mesmos fazem com empréstimos informais a que

tiveram acesso, anteriormente quando eram absolutamente excluídos dos sistema

financeiro brasileiro, através de agiotas que cobravam juros bem mais elevados.

Críticas ao programa de microcrédito Pronaf

Um trabalho realizado por Guanziroli (2007), reúne as pesquisas realizadas

sobre o Pronaf em âmbito nacional no período de 1996 até 2006, ou seja os dez

primeiros anos de sua atuação.

Este trabalho apresenta os problemas levantados pelos pesquisadores e

descreve quais os fatores que influenciam negativamente o processo de geração de

renda dos agricultores, impedindo muitas vezes a quitação do empréstimo rural:

1) Falta de Assistência Técnica:

O tamanho do corpo técnico das instituições oficiais de assistência técnica, seria

insuficiente para dar orientação individualizada aos agricultores, o resultado sendo a

padronização dos projetos e o escasso acompanhamento técnico, restrito na maioria

dos casos a visitas de fiscalização para a liberação de novas parcelas

2) Dificuldades no Gerenciamento dos Recursos de Crédito:

A ausência da instituição credora na atividade de auxílio ao gerenciamento dos créditos

recebidos pelos agricultores, abre margem para que esses recursos em alguns casos

não sejam aplicados integralmente na atividade programada. O agricultor realiza

economias na adubação e tratos culturais, por exemplo, seja porque existem muitas

Page 79: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

88

carências de investimentos em outras atividades produtivas na mesma propriedade

agrícola ou por falta de condições de sustentar a família até que o projeto comece a dar

retorno. Essa situação diminui a possibilidade de pagamento dos créditos.

3) Falta de Visão Sistemica dos Técnicos:

Existem divergências entre a avaliação feita pelos técnicos de como o projeto deve

proceder e a forma de plantio ou criação, muitas vezes, praticada a décadas pelos

agricultores

4) Falta de Integração dos Mercados, de Estrutura de Comercialização e de Agregação

de Valor:

Há uma tendência de os técnicos focarem muito em aumento da produção e da

produtividade na hora de fazer os projetos para a liberação dos créditos, porém

muitas vezes a produção e a produtividade aumentam, mas os preços caem, e assim

os ganhos de produtividade são absorvidos pelos intermediários financeiros e

comerciais. Assim deveriam ser levados em consideração, primeiro as necessidades

sinalizadas pelo mercado, para depois produzir aquilo que tem demanda, adequando

o crédito necessário a realização dos projetos.

Durante as entrevistas com os integrantes da comunidade Diamante, os

problemas relatados Guanziroli (2007) foram também identificados pelos entrevistados

como obstáculos ao sucesso do programa de microcrédito Pronaf.

O que Guanziroli (2007) considera como Falta de Assistência Técnica, os

entrevistados traduzem como falta de orientação por parte da instituição microfinanceira

no sentido de indicar onde o candidato ao financiamento deve investir, levando em

consideração as características climáticas e comerciais da região, e a capacidade de

gestão do agricultor.

“(...) O homem lá do banco liberou o financiamento pra carneiro, igualzinho

ao projeto que ele fez pro seu Romildo lá do outro assentamento, que mora

no alto e tem a terra mais enxuta, mas só que o meu pedaço de terra fica

numa várzea, aqui em volta é muito úmido, se eu pegasse pra criar carneiro

Page 80: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

89

aqui só era dá o tempo das chuvas pra eles morrerem todos, e aí como é

que eu ficava ?”.

O trecho acima mostra a percepção que o entrevistado tem sobre a importância

da instituição fornecedora do crédito realizar uma avaliação individual e mais criteriosa

antes de liberar os projetos para os financiados, ressaltado ainda que essa falha de

avaliação pode comprometer a capacidade de ressarcimento dos créditos

Em relação à Falta de Visão Sistêmica citada por Guanziroli (2007) os

entrevistados afirmam que vários funcionários das instituições microfinanceiras não são

treinados para compreender a realidade dos agricultores familiares e propor soluções

adequadas ao atendimento das suas necessidades.

Um outro aspecto citado na pesquisa como Dificuldades no Gerenciamento dos

Recursos de Crédito é identificado pelos integrantes da comunidade Diamante como a

necessidade de se capacitar os tomadores de créditos a lidar com empréstimos e a

gerenciar seus negócios.

O depoimento do Sr. Jairo destaca muito bem esse aspecto:

“... Pra quem não sabe pegar crédito a vida fica pior do que antes, o caso do

crédito é saber administrar ele, muitas vezes o camarada pega o crédito mas não

sabe administrar, põe o dinheiro na mão e acha que aquele dinheiro chegou

muito fácil e começa a gastar de qualquer jeito, pensando que vai ter muito prazo

pra pagar, quando dá fé acabou-se o prazo e o camarada não tem o dinheiro

para pagar ao banco. (...) Quem ajuda ao camarada a administrar é a nossa

própria associação, que está sempre presente orientando, explicando, fora que a

gente tem sempre as palestras que ocorrem aqui dentro da associação, mas o

camarada que é só, solitário, se complica, porque o banco não faz essa

orientação de pertinho, mas vai querer o dinheiro na data.”

É interessante destacar, como os moradores desta comunidade tem clareza da

necessidade de orientação para ajudar na gestão dos recursos financiados. No caso

da comunidade Diamante esse suporte é prestado pela associação dos moradores, e

Page 81: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

90

tem sido muito bem aceito pelos seus integrantes, que o compreendem como um

diferencial competitivo. Ao observarem o resultado do acesso ao microcrédito em

comunidades circunvizinhas, os integrantes de Diamante valorizam ainda mais o

trabalho realizado nesta comunidade, mesmo acreditando que esta tarefa de apoio

deveria ser prestada pela instituição fornecedora de crédito, já que essa última também

é prejudicada quando o resultado do financiamento tende para a inadimplência.

Um último aspectos citado na pesquisa e também corroborado por integrantes da

comunidade Diamante é a Falta de Integração dos Mercados, de Estrutura de

Comercialização e de Agregação de Valor.

Sob este aspecto os entrevistados acreditam que não é feita uma análise prévia

pelas instituições microfinanceiras em relação a demanda dos mercados sobre os

produtos, liberando assim vários projetos similares para a mesma região.

Neste caso há um excedente de produção, que declinará os preços finais dos

produtos, diminuindo assim o lucro dos produtores, e consequentemente dificultando o

pagamento dos empréstimos.

“(...) eu mesmo não acho difícil vender meus produtos na feira, mas

também eu não pego crédito para plantar milho na época que eu sei que

todo mundo vai plantar, porque se não quando o camarada for vender o

dinheiro as vezes nem dá para cobrir as despesas. (...) eu planto cajá, que

aqui na região não tem, assim quanto eu tiver vai vender, agora tô pensando

também em plantar sapota, que é maior que o sapoti, e assim eu vou

plantando o que nem todo mundo tem.”

A percepção dos entrevistados é de que a diversificação dos produtos em uma

região deve ser praticada para harmonizar o mercado, diminuindo assim o risco de

prejuízo para os agricultores familiares.

Além dos aspectos elencados pelo trabalho publicado por Guanziroli (2007), os

integrantes da Comunidade Diamante ainda apontam mais um outro obstáculo ao

Page 82: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

91

programa de microcrédito Pronaf, que é a dificuldade no preparo da documentação

adequada para ter acesso ao financiamento.

“(...) uma vez que eu pelejei para tirar o crédito, mas pelejei para tirar 100

cruzeiros, fui falar com dois senhores de engenho para me ajudar, porque

tinha uns negócios para assinar que eu não entendia, aí eles não ajudaram e

eu fiquei sem tirar, mas hoje é diferente, quando agente precisa do crédito

agente vai na associação e se reuni para tirar”

Demonstrando a dificuldade de conseguir romper a barreira burocrática para

acessar os créditos, entrevistados explicam que tinham muita dificuldade para

compreender e participar de um processo de financiamento.

Corroborando com esse aspecto Cerqueira e Rocha (2002) indicam que o

Pronaf, que tem como um dos objetivos democratizar o acesso ao crédito, é ineficiente

no que diz respeito à desburocratização dos financiamentos. Por mais simples que

possa parecer a trajetória de acesso aos recursos financeiros, há que se considerar que

ainda é um enorme obstáculo a ser vencido por um público-alvo com tão baixo nível de

escolaridade e não habituado a exigências bancárias.

O Modus Vivendi desta comunidade influencia no resultado da relação dos

financiados com o programa de mcirocrédito

De acordo com os entrevistados que afirmam terem tido melhoria de qualidade

de vida, existe um aspecto nesta comunidade que contribui de forma benigna e decisiva

para o sucesso de seus negócios: a existência atuante de uma associação de

moradores.

Constituída desde a formação da comunidade, a associação de moradores tem

presença atuante e forte na vida de cada família que integra a comunidade Diamante.

Page 83: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

92

Das tantas atribuições que esta associação de moradores desempenha, três são

muito importantes para a compreensão da relação de sucesso que os integrantes da

comunidade têm com o programa de microcrédito rural Pronaf

1. Informar sobre existência dos produtos e serviços microfinanceiros

De acordo com a análise dos dados da pesquisa de campo foi em virtude da

associação dos moradores que os entrevistados tiveram acesso ao microcrédito. Eles

registram que antes de chegarem para viver nesta comunidade desconheciam a

existência desses programas de microcrédito ou mesmo tendo ciência dos mesmos

alegam não se sentirem capacitados para tomar a iniciativa de requerer os empréstimos

e cuidar de toda documentação necessária sem ajuda de ninguém.

Corroborando com essa apreciação Garcia (2003, p.- falta referencia) que conclui:

“Os agricultores familiares, em particular os que acessam o Pronaf B, jamais serão atendidos adequadamente pelo sistema bancário na situação em que se encontram, analfabetos, muitos sem documentação civil, com precária titulação de suas propriedades ou até mesmo sem propriedades, sem nenhuma assistência técnica e com baixíssima renda”.

Essa afirmação fortalece a idéia do quanto esta associação foi peça chave no

processo de melhoria de qualidade de vida de seus integrantes, quando tomou para si o

papel de guia e facilitador, construindo a ponte que liga os integrantes da comunidade

ao sistema financeiro brasileiro.

Os entrevistados ressaltam que talvez na data atual, este tipo de programa

esteja mais difundido, do que na época que esta comunidade começou a ter acesso

aos créditos (1996), e que talvez nos dias de hoje, mesmo as cidadãos com o perfil

semelhante aos dos moradores desta comunidade (trabalhadores rurais, muitas vezes

analfabetos, que vivem distante dos centros urbanos) tenham conhecimento mais

facilmente deste tipo de programa. Essa reflexão também é realizada por Costa (2006)

PROCURAR PÁGINA DO RELATO quando descreve a seguinte situação:

Page 84: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

93

Habituados com a exclusão das políticas públicas, poucas vezes famílias pobres de origem rural são despertadas ou estimuladas a empreenderem esforços no sentido de modificarem sua trajetória de vida. A falta de informação, o isolamento e, muitas vezes, o fato de estarem localizadas em áreas de acesso precário findam impedindo ou dificultando a ação de mediadores que lhes possam conceder uma oportunidade de mudança nas condições de vida.

Assim os entrevistados atribuem explicitamente o conhecimento do programa ao

esforço da associação dos moradores em buscar novas informações e oportunidades

que favoreçam todos os integrantes desta comunidade.

“... Mesmo que a terra fosse minha, morar aqui nesta comunidade foi melhor

do que morar isolado por muitas coisas, uma delas foi por causa do crédito,

aqui a gente tem o crédito para tirar aqui com a associação (...) foi com a

associação que a gente conseguiu o crédito, e se a gente tivesse lá onde

morávamos antes a gente não tinha tirado, que nem uma vez que eu pelejei

para tirar uma vez, mas pelejei para tirar 100 cruzeiros, fui falar com dois

senhores de engenho para me ajudar, porque tinha uns negócios para

assinar que eu não entendia, aí eles não ajudaram e eu fiquei sem tirar, mas

hoje é diferente, quando agente precisa do crédito agente vai na associação

e se reuni para tirar”

MP4 GravaçãoDomingo (1:00)

“ ... Eu sabia criar galinha e cabra que aprendi com meu pai, quando eu

cheguei aqui descobri através da associação que eu podia tirar um

financiamento para criar o que eu quisesse e melhorar de vida, e foi assim

com a ajuda de Dona Madalena (presidente da associação de moradores)

cheguei até o BNB fizemos um pequeno empréstimo, e assim comecei

tocando a vida aqui dentro e fui crescendo, e a associação sempre

informando a gente da disponibilidade de outros créditos, e assim eu

crescendo e hoje graças a Deus eu tenho minha vida padronizada, muito

melhor do que como era antes lá na região que eu vivia.”

Page 85: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

94

“... a senhora não sabe como é viver isolado, lá onde eu morava não subia

um pé de gente não, como é que eu podia melhorar de vida daquele jeito ?

Agora aqui tem gente pra conversar e informar das novidades do mundo, a

situação melhorou muito quando eu vim pra cá”

2. Indicação da forma de uso dos financiamentos

Uma outra questão atribuída à associação dos moradores era ajudar aos futuros

financiados a decidir sobre que tipo de financiamento tirar, ou seja, ajudar a decidir

sobre em que tipo de negócios investir (plantações ou criações).

Durante as reuniões quinzenais da associação de moradores são apresentadas

sugestões de investimentos apropriadas às condições climáticas e comerciais da

região. Caso alguns dos integrantes se interesse por alguma das propostas é realizado

um estudo de viabilidade, modesto, mas sem dúvida funcional, e em seguida

apresentado para os interessados, para que os mesmos decidam se vão entrar neste

empreendimento coletivo ou individualmente. Agregadas ao estudo seguem as fontes

de informação consultadas para que os interessados em caso de dúvida possam

esclarecê-las.

A indicação da forma de uso dos financiamentos ajuda aos entrevistados

suprirem a carência no programa de microcrédito rural, indicado em Guanziroli (2007)

que aponta para a Falta de Integração dos Mercados, de Estrutura de Comercialização

e de Agregação de Valor, como um dos aspectos que pode levar à diminuição da

capacidade de ressarcimento dos créditos.

3. Capacitação

Uma das grandes críticas dos entrevistados aos programas de microcrédito, do

tipo que foi contratado pelos integrantes desta comunidade, Pronaf B do Banco do

Page 86: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

95

Nordeste, é que eles não prestam assistência ao financiado no sentido de oferecer

capacitação sobre os negócios escolhidos.

Muitas vezes os financiados sabem na prática como trabalhar com cultivos de

diversas culturas ou criação de animais comercializáveis, mas isso não lhes dá

gabarito, apenas por ser trabalhador rural, para gerir negócios rurais.

Com isto os entrevistados demonstram a necessidade de serem capacitados por

profissionais, que possam instruí-los sobre a forma mais lucrativa de gerenciar seus

negócios, e assim diminuírem os riscos oriundos a gestão de qualquer negócio.

Toda essa lacuna é constantemente preenchida pela ação da associação dos

moradores, que atua promovendo, através de parcerias com instituições como UFRPE,

SEBRAE, SENAC, FIESPE, e ONG´s, capacitação profissional para os membros desta

comunidade.

Além dos programas de capacitação sobre técnicas de cultivo e colheita de

várias culturas, criação de animais, e produção de alimentos processados , eles

englobam também assuntos como escoamento da produção, reaproveitamento das

sobras, precificação, armazenagem, distribuição, reinvestimento, custos, e outros

tópicos que são indicados pelos moradores

A fala do Sr.Deda, reproduzida abaixo, nos dá a noção de como os programas

de gestão e capacitação são importantes para a melhoria das condições de vida do

homem do campo

“... Eu aqui produzo e comercializo dentro da minha própria parcela, mas isso

foi o Sebrae que me ensinou, a mim só não a todos aqui que freqüentam as

palestras que a nossa associação traz, repare mesmo, o Sebrae veio até

aqui dentro, deu o curso lá dentro da associação explicando como agente

deve fazer para escoar a nossa produção, para não jogar na mão do

atravessador (...) porque o atravessador chega aqui hoje e quer levar uma

galinha por R$ 6,00 enquanto eu posso pegar essa galinha e fazer R$ 25,00

Page 87: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

96

nela, só depende do meu esforço, da minha força de vontade e de querer

aprender com sabe para me ensinar como fazer, o atravessador quer

comprar um côco por R$ 0,20, enquanto que eu posso pegar esse côco

despejar a água dentro de umas garrafas botar na freezer e quando o meu

cliente chegar aqui eu vender um copo de água de côco por R$ 0,25, então

em um côco eu faço R$ 1,00, veja quanto eu já ganhei a mais, é assim que

eu vejo uma oportunidade de melhorar também mais rapidamente a minha

vida. (...) Eu escoou meu produto dentro da minha própria terra, mas isso foi

o Sebrae que me ensinou, até planta eu vendo aqui, minha esposa está

preparando os jarrinhos e agente deixa aqui exposto, aí quando os clientes

perguntam: - E aquelas plantinhas ali ? Aí eu digo é R$ 3,00, eles terminam

levando e o dinheiro vai entrando”

De acordo com os entrevistados o programa de microcrédito rural Pronaf tem o

mérito de conceder os créditos necessários ao investimento produtivo, com taxas de

juros e condições de pagamento que propiciam o ressarcimento dos empréstimos,

permitindo a inclusão dos agricultores familiares na sociedade através da geração de

renda. Contudo esse programa também tem falhas que sob a ótica dos integrantes da

comunidade, poderiam ter comprometido o desempenho de seus empreendimentos

agrícolas. Essas falhas foram na maioria dos casos superadas pelo apóio técnico e

operacional prestado pela associação de moradores existente na comunidade

Diamante.

Assim essa pesquisa conclui que o programa de microcrédito rural Pronaf

propiciou melhoria de qualidade de vida aos agricultores rurais que passaram a integrar

esta comunidade, e permitiu que através das várias formas de apoio oferecidas pela

associação de moradores, seu integrantes alcançassem o equilíbrio de seus

empreendimentos, que com o propósito de geração de renda permitisse aos

agricultores a auto-sustentabilidade financeira tão almejada.

Page 88: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

97

É muito válido informar que após os vários trabalhos publicados a respeito dos

problemas ocorridos nos programas de microcrédito no Brasil na área rural, o Banco do

Nordeste inicia em 2004, através de projeto piloto, em dois municípios do estado do

Piauí, o Programa AGROAMIGO, o qual tinha como objetivo transformar o programa de

microcrédito rural do Pronaf, em uma opção de microcrédito produtivo orientado

(PMPO) focado na área rural.

A operação do AGROAMIGO segue em relação à finalidade, valor e formatação,

as mesmas regras do Pronaf. A grande diferença é o acompanhamento que se dá

através de assessores de crédito, cuja função é exercida por técnicos agrícolas,

devidamente treinados nessa metodologia, contratados através de uma OSCIP

(Instituto Nordeste Cidadania), com o papel primordial de prestar orientação e

capacitação técnica e elaborar com mais funcionalidade os projetos de investimento.

Em 2005 o projeto piloto foi aprovado, e essa nova metodologia começou a ser

disseminada para alguns estados onde o Banco do Nordeste (BNB) está presente,

atualmente o programa encontra-se cobrindo 50% dos municípios da região de atuação

do banco, com pretensão de em 2009 chegar a todos os municípios de sua jurisdição.

(INFORMAÇÃO VERBAL)4

4 Estas informações foram fornecidas pelo atual superintendente do Banco do Nordeste, o economista Francisco

Carlos Cavalcanti, através de entrevista direcionada para esta pesquisa.

Page 89: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

98

5. CONCLUSÃO

Esta Dissertação buscou analisar o processo de organização da comunidade

rural Diamante, situada no município de Goiana, interior de Pernambuco, observando

como seus integrantes tiveram suas vidas modificadas após o acesso aos recursos

financeiros concedidos pelo programa de microcrédito rural do Pronaf.

As questões norteadoras convergiram para que os achados da pesquisa, após

analisados, respondessem se, nesta comunidade rural, o acesso ao microcrédito gerou

melhoria de qualidade de vida e garantiu meios de promover renda permanente para as

famílias, o que resolvemos chamar de auto-sustentabilidade do indivíduo.

Para obter essa resposta buscamos inicialmente entender que atributos os

entrevistados desta comunidade reconheciam como indicadores de qualidade de vida, e

assim chegamos a um escopo formado sob a ótica dos entrevistados que agrega os

conceitos de Tranquilidade em relação à sobrevivência, Educação, Saúde, Condições

de Habitação, Segurança, Proximidade da Natureza e Participação de uma associação

de moradores pró-ativa.

A importância da compreensão desses indicadores antecipadamente recaiu

sobre a necessidade de correlacionar quais deles foram alcançados após o acesso ao

microcrédito.

Feita essa correlação, identificamos que os financiados atribuem o alcance de

quase todos os indicativos de melhoria de qualidade de vida ao microcrédito, com

exceção do item que retrata “Associação de Moradores Pró-ativa”, ao qual atribuem a

presidente da associação Madalena Diamante, pelo esforço de trabalhar para

desenvolver, entre os moradores, uma cultura de coletividade e buscar oportunidades

de melhorias para todos os integrantes da comunidade.

Vale salientar, ainda, que ao indicarem quais as melhorias de qualidade de vida

que o microcrédito trouxe para os moradores, os mesmos ainda adicionaram mais dois

indicativos, aos quais não haviam feito referência anterior, nem incluídos em seu

Page 90: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

99

escopo de qualidade de vida. Assim, apareceram a Capacidade de Produzir seu próprio

Alimento e se Sustentar, e o Acesso a Bens de Consumo.

Na visão dos entrevistados é explícita a importância do acesso ao programa de

microcrédito rural do Pronaf para o alcance dos indicativos de melhoria de qualidade de

vida. Através dos créditos concedidos, os financiados principiaram vários

microempreendimentos agrícolas que funcionaram como meio de sustento para suas

famílias.

O uso adequado dos financiamentos permitiu que essas famílias obtivessem o

retorno financeiro suficiente para pagar os empréstimos com as instituições

financiadoras e reinvestissem os lucros em seus próprios negócios aumentando assim

a saúde financeira dos empreendimentos e a possibilidade de sucesso.

Como o programa de microcrédito rural do Pronaf prevê a concessão de mais de

um empréstimo para os financiados que estiverem em situação de adimplência, os

mesmos se utilizaram desse benefício para continuarem implementando seus negócios,

aumentando sua capacidade produtiva e diversificando seus investimentos, de modo a

proporcionar maior solidez e sustentabilidade ao empreendimento.

O sucesso desses microempreendimentos abriu um leque de oportunidades

direcionadas ao consumo de bens e serviços, antes inacessíveis a esses agricultores

familiares. Os depoimentos dos entrevistados demonstram que os bens mais

consumidos foram os eletro-eletrônicos em geral, como geladeiras, televisores, DVDs,

telefones celulares, aparelhos de som, ventiladores, motocicletas, automóveis e

melhorias na habitação, e os serviços mais acessados foram os relacionados com

saúde, educação e transporte particulares.

Um achado revelador nesta pesquisa foi descobrir que, na comunidade

estudada, o programa de microcrédito rural do Pronaf teve uma relação de sucesso e

adimplência na grande maioria dos casos pesquisados, em contraposição aos registros

revelados por Guanziroli (2007) e Peraci (2008), que afirmam que programas de

microcrédito produtivo (sem ser orientado, como é o caso do Pronaf) têm um grande

índice de inadimplência,

Page 91: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

100

Criticado sob alguns aspectos que foram apontados como responsáveis pela

diminuição da sustentabilidade dos empreendimentos agrícolas e, conseqüentemente,

do aumento da inadimplência, este programa teve suas falhas, identificadas nos dez

primeiros anos de atuação, reunidas e publicadas em Guanziroli (2007), que as

descreve como:

Falta de assistência técnica suficiente para customizar os projetos e

individualizar a orientação para os agricultores, falta de auxílio para o gerenciamento

dos créditos recebidos pelos agricultores, divergência entre a prática dos técnicos e dos

agricultores, falta de integração entre a demanda de mercado e o incentivo à produção.

Além dessas mesmas falhas também identificadas pelos integrantes da

comunidade Diamante, adiciona-se outra, que apesar de não ser co-responsável pelo

índice de inadimplência contribui para que um número menor de agricultores familiares

tenha acesso aos créditos, que é a barreira burocrática. Conseqüentemente, muitos

agricultores com baixíssimo nível de escolaridade, fixados em áreas rurais isoladas e

sem muito acesso à informação, não conseguem ultrapassar este obstáculo.

Contudo, o que representa um obstáculo para ser vencido individualmente pelos

agricultores familiares, é facilmente transposto pelos integrantes da comunidade

Diamante que se beneficiam do apoio e infra-estrutura criados por uma associação dos

moradores pró-ativa que, organizada em prol do coletivo, conseguiu suprir todas as

lacunas deixadas pelo programa de microcrédito rural Pronaf, proporcionando um

acesso mais fácil ao financiamento e alavancando o sucesso dos empreendimentos

rurais.

A atuação dessa associação de moradores traduz-se através da preparação dos

documentos necessários à retirada dos créditos, da indicação de investimentos viáveis

às condições climáticas e de comércio da região, da capacitação dos integrantes da

comunidade via cursos e palestras realizados em parceria com entidades aptas a

prestar esses serviços, como SENAI, SENAC, SEBRAE, UFRPE, e outras entidades

que porventura possam contribuir com a formação profissional desses agricultores

rurais.

Page 92: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

101

Essas práticas permitiram a comunidade desenvolver um alto índice de

competência no que diz respeito à gestão de empreendimentos rurais, e assim

constituírem negócios que lhes permitissem se auto-sustentarem, proporcionarem uma

melhoria de qualidade de vida às famílias e compartilharem de perspectivas de um

futuro mais promissor.

Essa comunidade é uma exceção dentre tantas outras que se constituíram da

mesma forma que ela, em terras desapropriadas pelo governo para assentar famílias

pobres de origem rural.

Contudo, a visão de coletividade e cooperativismo de alguns integrantes

propiciou a formação de uma associação de moradores que atua na gestão dessa

comunidade.

Apesar dessa forma de agrupamento e de gestão ter sido constituída

informalmente e por iniciativa própria, obteve êxito.

Pelo mundo afora outras comunidades também se organizaram através de

associações de moradores e desenvolveram trabalhos para se auto-impulsionarem

criando uma atmosfera de cooperação mútua e de melhoria de qualidade de vida, para

os que dela participavam.

Foi focado no funcionamento de comunidades que se organizaram na tentativa

de, unidas, melhorarem suas vidas rompendo barreiras de exclusão social que surgiu o

conceito de Village Bank ou, como foi incorporado no Brasil, Crédito Comunitário.

O Village Bank foi criado com o intuito de prover famílias muito pobres com

pequenos empréstimos para que as mesmas pudessem investir em

microempreendimentos, propiciando assim condições de se auto-sustentarem,

melhorarem ou obterem sua fonte renda, adquirir ou melhorar suas propriedades e,

enfim, pudessem proporcionar melhoria de qualidade de vida a suas famílias.

Os Villages Banks, ou bancos comunitários, são modelos de serviços financeiros

que permitem às comunidades pobres fundarem suas próprias associações de crédito e

poupança.

Page 93: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

102

Com sua primeira experiência na Costa Rica nos anos 80 desenvolveu-se como

alternativa ao crédito rural. Os bancos comunitários concediam empréstimos financeiros

e prestavam serviços de poupança para os integrantes da sua comunidade, sem a

exigência de garantias, o que promovia, entre outras coisas, a solidariedade social.

O banco que patrocinava esse projeto concedia um empréstimo ao banco

comunitário e este, por sua vez, concedia empréstimos individuais aos seus membros.

Os beneficiários integrantes da comunidade iniciavam com um pequeno empréstimo e

iam progredindo para atingir volumes maiores de recursos. O crédito era associado às

poupanças, pois o volume de empréstimos estava relacionado com a quantia que cada

beneficiário conseguisse poupar. As poupanças dos membros eram guardadas no

banco comunitário e emprestadas ou investidas para aumentar os recursos do banco.

Esse programa difundiu-se com sucesso em países da África, América Latina e

Ásia, como importante instrumento de política para redução da pobreza.

Um programa de grande atuação lançado no Brasil no ano de 2005 em parceria

com a Acción Internacional e tendo como piloto no interior do Ceará, foi o Crediamigo

Comunidade. A iniciativa segue a metodologia dos Villages Banks que pode ser

aplicada em áreas urbanas, semi-urbanas e rurais. Assim, eram constituídos bancos

nas comunidades, que queiram desenvolver uma cultura de coletividade, onde os

integrantes desejavam iniciar seus próprios negócios.

Nesse programa, os próprios integrantes se responsabilizam pela gestão do

negócio, decidem quem participará do banco, os valores de crédito a serem

concedidos, controle de recebimentos e pagamentos, cobrança das parcelas em atraso,

estímulo à poupança.

Por meio de orientação empresarial prestada pelos assessores de crédito, os

integrantes dos bancos são conduzidos a investir o crédito em atividades produtivas,

orientar e capacitar os financiados, formar poupança familiar, e discutir o norte do

empreendimento baseado nas questões de interesse da comunidade, conferindo ao

produto um forte conteúdo econômico e social.

Page 94: Microcrédito como ferramenta de melhoria de qualidade de vida na ...

103

Observando a essência do Village Bank, podemos encontrar várias semelhanças

com a forma de organização da Comunidade Diamante, que identificou desde cedo a

necessidade de assessorar seus integrantes a atingirem a auto-sustentabilidade,

oferecendo-lhes capacitação na gestão de seus pequenos empreendimentos, servindo

como apóio técnico na desburocratização do processo de tomada de créditos.

Além do exposto, o papel da comunidade tornou-se fundamental também para o

estímulo da formação educacional, e da compreensão da importância da coletividade

para o desenvolvimento do indivíduo e da sociedade.

Por fim, e de acordo com o acima descrito, observa-se que houve melhoria de

qualidade de vida para os integrantes da comunidade Diamante decorrente do acesso

ao microcrédito, mas que o sucesso obtido por esses pesquisados, no que diz respeito

à manutenção dos créditos para geração de auto-sustentabilidade está estreitamente

ligado ao belo trabalho de suporte realizado por sua associação de moradores, que

vem ao longo dos anos funcionando como fio condutor para a transmissão de valores e

crenças no intuito de estabelecer uma cultura de cooperação de coletividade e de

superação dos obstáculos impostos pela exclusão social.

Sendo assim, esta Dissertação espera ter cumprido o seu objetivo, seja através

dos relevantes achados da pesquisa de campo, seja chamando a atenção para a

necessidade de pesquisas futuras e, finalmente, contribuindo para o oferecimento de

proposições de políticas, ao assinalar que programas de microcrédito rurais podem

funcionar com eficácia, desde que ocorra um esforço de se trabalhar conjuntamente

com comunidades rurais para vencer a barreira da exclusão social, mediante iniciativas

voltadas para a geração de renda através de empreendimentos auto-sustentáveis,

promovendo melhorias de qualidade de vida para seus integrantes.

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APÊNDICES

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APÊNDICE

Roteiro para Entrevistas

1. Como e quando o Sr.(a) chegou nesta comunidade ?

- Qual era o meio de sustento

- Onde residia

- Qual situação de vida antes de chegar nesta comunidade

2. O que o Sr.(a) entende por ter qualidade de vida ?

3. A sua convivência nessa comunidade lhe trouxe melhoria de qualidade de vida ?

4. Se sim, em que melhorou ? Quais os fatores que mais contribuíram ? Faça uma

sequencia de importância.

5. Se não, responder o que piorou ?

6. Explique como foi sua experiência com o micrcrédito.

7. Em que o Sr.(a) acha que o microcrédito interferiu na sua qualidade de vida ?

8. Questionar sobre os indicativos de qualidade de vida que não foram citados pelos

entrevistados.

9. A convivência nesta comunidade facilitou o acesso ao microcrédito ?

10. Se sim, explique como a convivência nesta comunidade facilitou o acesso ao

microcrédito.

11. O Sr.(a) gostaria de continuar tendo acesso ao microcrédito ?

12. O que o Sr.(a) mudaria no processo de tomada de crédito para melhorar os

resultados, tanto para quem recebe quanto para quem cede ?