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Ministério Público do Estado de Mato Grosso Procuradoria Geral de Justiça EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO EXCELENTÍSSIMOS SENHORES DESEMBARGADORES NOBRE DESEMBARGADOR RELATOR O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO, pelo Promotor de Justiça abaixo firmado, no exercício de suas atribuições legais, vem perante Vossa Excelência, na forma dos arts. 522 e seguintes do CPC, não se conformando com a r. decisão aportada às fls. 221 dos autos n. 148/00, em trâmite na 1ª Vara Cível da comarca de Alta Floresta, interpor o presente

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Ministério Público do Estado de Mato Grosso Procuradoria Geral de Justiça

EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO

EXCELENTÍSSIMOS SENHORES DESEMBARGADORES

NOBRE DESEMBARGADOR RELATOR

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO, pelo Promotor de Justiça abaixo firmado, no exercício de suas atribuições legais, vem perante Vossa Excelência, na forma dos arts. 522 e seguintes do CPC, não se conformando com a r. decisão aportada às fls. 221 dos autos n. 148/00, em trâmite na 1ª Vara Cível da comarca de Alta Floresta, interpor o presente

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Ministério Público do Estado de Mato Grosso Procuradoria Geral de Justiça

AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO LIMINAR

em face de ZENIITE OKADA, brasileiro, casado, pecuarista, inscrito no CPF sob o n. 156.856.918-15, residente e domiciliado na Fazenda Zeniiti III, Zona Rural de Alta Floresta /MT, pelas razões que seguem em anexo.

A decisão objurgada, se não tiver seus efeitos suspensos, resultará em evidente dano ao meio ambiente porque o Agravado, não obstante esteja com sua área embargada administrativamente desde o ano de 2000, permanece de forma continuada a degradar o meio ambiente, inclusive áreas de preservação permanentes incluídas ou não nas reservas florestais legais existentes em sua propriedade rural.

Diante disto requer seja o presente recurso recebido e, na forma do art. 527 do CPC, distribuído imediatamente eis que se requer do eminente desembargador relator a concessão de tutela antecipada (CPC, art. 527, III), prosseguindo-se ao processamento na forma legal até decisão final de provimento do pedido para que o agravado seja compelido a recompor o ambiente degradado, bem como para que a área explorada seja interditada judicialmente obstando sua exploração econômica.

Informa, por oportuno, o nome e endereço completo do advogado constante do processo, cumprindo, dessarte, com o estabelecido no art. 524 do mesmo Diploma Processual:

1.Suetonio Paz – OAB n. 5203-B MG – Av. Leste, n. 1974, CEP 78.580-000, Alta Floresta /MT;

2.Laudemar Pereira da Silva Júnior – OAB n. 9415 – Av. Ludovico da Riva Neto, n. 1974, Centro, Alta Floresta/MT – CEP 78.350-000;

Segue, ainda, cópia das procurações dos advogados (Doc. 01), da decisão agravada (doc. 02), da certidão da intimação do Agravante (doc. 03), de comprovantes de

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capacitação técnica dos peritos oficiais (doc. 04) e de todo o feito n. 148/00 (doc. 05), com o que cumpre o disposto no art. 525.

Nestes termos,

P. Deferimento.

Alta Floresta/MT., 09 de novembro de 2006.

Marcelo Caetano Vacchiano

Promotor de Justiça

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EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

COLENDA CÂMARA CÍVEL

PRECLAROS JULGADORES

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO não se conformando com a r. decisão que indeferiu o pedido de antecipação de tutela, vem à augusta presença de Vossas Excelências expor e requerer o que segue:

Em março de 2000 o Ministério Público ajuizou ação civil pública em face do Agravado imputando-lhe conduta danosa ao meio ambiente consistente no fato de ter destruído e danificado floresta nativa sem autorização do IBAMA. Consta na exordial que o dano se estendeu por uma área de 1.500 (um mil e quinhentos) hectares.

Busca-se na demanda seja o Agravado condenado a obrigação de recompor o meio ambiente que lesou.

A materialidade do dano ambiental vem estampada pelo auto de infração n. 235506, auto

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de embargo e interdição n. 166184 e outros documentos fornecidos pelo IBAMA, os quais foram encartados às fls. 14/21 dos autos.

Passados mais de cinco anos após o ajuizamento da ação, havendo notícia nos autos de que o Agravado estaria recuperando as áreas degradadas, inclusive mediante a apresentação de PRADE junto ao órgão ambiental estadual (fls. 86/108), pugnou o Ministério Público às fls. 171/172 pela realização de perícia no local dos fatos, o que foi deferido às fls. 175.

Técnicos do IBAMA, atendendo requisição judicial, se dirigiram a propriedade do Agravado. Após realizarem perícias técnicas, o laudo pericial foi acostado às fls. 193/202, sendo que o órgão ambiental federal, constatando que o Agravado estaria impedindo a regeneração natural dos 1.500 hectares degradados, lavrou novo auto de infração, o qual foi juntado às fls. 203.

Diante do fato de que o Agravado continuava a degradar o meio ambiente, pugnou o Ministério Público pela realização de audiência de conciliação visando sensibilizar o Recorrido para a necessidade de se elaborar PRADE (Projeto de Recuperação de Área Degradada) para fins de restauração ambiental.

Tencionava-se obter conciliação onde o Agravado além de elaborar novo PRADE o executasse.

Por ocasião da audiência de conciliação (fls. 213) o Agravado não demonstrou interesse em recuperar o meio ambiente. Aliás, esta sua postura já está assente nos autos quando se constata que não chegou sequer a dar execução ao PRADE apresentado ainda no ano de 2000 perante a então Fundação Estadual do Meio Ambiente.

E isto foi constatado pelos peritos do órgão ambiental quando responderam aos quesitos 07 e 08 (fls. 195), verbis:

07 – O PRADE JUNTADO AOS AUTOS ENGLOBA TODA A EXTENSÃO DA ÁREA DEGRADADA NA PROPRIEDADE DO REQUERIDO?

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Não foi apresentada qualquer documentação referente à recuperação da área degradada descrita no AI-235506.

08 – O REQUERIDO ESTÁ EXECUTANDO O PRADE, OBSERVANDO O CRONOGRAMA FIXADO?

Na localidade não foi encontrado qualquer procedimento que indique a execução de Plano de Recuperação de Área Degradada

Nesta audiência, não obstante o teor do laudo pericial requisitado ao IBAMA pelo Juízo, o magistrado presidente do feito consignou sentir “dúvidas e incertezas com relação à real situação da área objeto da lide” (fls. 213), razão pela qual designou data para realização de inspeção judicial.

Diante disto, constatando a degradação ao meio ambiente e o fato de que, conforme verificado pelos senhores peritos, o Agravado está impedindo a regeneração natural dos 1.500 hectares degradados por si, o Ministério Público pleiteou antecipação de tutela, conforme se depreende da manifestação de fls., 215/220, o que foi indeferido pelo magistrado a quo por meio do despacho aportado às fls. 221.

Contra este despacho é que se insurge o Ministério Público.

É este o necessário relato dos autos.

Passa-se a indicar os fundamentos fáticos e jurídicos pelos quais a decisão merece ser reformada.

1. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO

Dispõe o art. 93, IX da Constituição Federal que “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de

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nulidade (...)” (sem grifo no original).

O Código de Processo Civil, por seu turno, dispõe em seu art. 165 que as sentenças e acórdão serão proferidos com observância do disposto no artigo 458; as demais decisões serão fundamentadas, ainda que de modo conciso.

A fundamentação é uma garantia das partes de conhecer os motivos pelos quais seus pleitos são acolhidos ou não.

No caso vertente o magistrado indeferiu o pedido de antecipação de tutela aduzindo que assim o faria porque realizaria uma inspeção na área. O outro motivo é por “existirem dúvidas instaladas na convicção deste magistrado em relação à real situação da área” (sic).

Em novo despacho proferido no dia 1º de novembro de 2006 revogou a decisão na qual havia consignado que iria realizar vistoria judicial. Assim, não mais visitará a área degradada.

Não há como se entender o porquê que o pedido de tutela antecipada foi indeferido. Existe no feito um laudo subscrito pelo órgão ambiental federal, por dois técnicos de nível superior, sendo um biólogo (Perito Cláudio Cazal de Araújo) e um Engenheiro Florestal (Felipe Augusto Finger), ambos os analistas ambientais efetivos nos quadros do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis e com Mestrado, como se comprova nos documentos que acompanham o presente recurso.

O laudo aportado às fls. 193/202 respondeu os questionamentos apresentados de forma fundamentada.

Foram apresentados dez quesitos, todos referentes aos danos causados ao meio ambiente e às medidas específicas que devem ser implementadas pelo Agravado para que se possa recompor e evitar novos danos.

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Os dez quesitos indicados às fls. 172, são os próprios quesitos do Juízo, conforme se depreende do despacho acostado às fls. 175.

O laudo aportado às fls. 193 indica o local do dano, sua constituição, inclusive constatando que houve supressão e degradação de área de preservação permanente. O Agravado, conforme consta no laudo, chegou ao cúmulo de obstruir fluxos de água, “alterando o regime hídrico (...) com provável comprometimento do abastecimento de água nas áreas adjacentes que compõe a microbacia hidrográfica”.

Concluiu que o Agravado efetivamente degradou, como continua degradando e obstando a regeneração da área objetada nos autos. Demonstrou isto inclusive por meio de fotografias, materializando o dano ambiental.

O juízo a quo simplesmente deixou de considerar os termos do laudo sob o argumento de que “existem dúvidas instaladas na convicção deste magistrado”. Isto, data venia, não é fundamentação. Como pode o Agravante se insurgir contra esta decisão, de forma fundamentada, sem saber o porquê o magistrado possui dúvidas instaladas em sua convicção????

Quais são as dúvidas que ali se instalaram???

O Ministério Público, tendo por suporte fático um laudo elaborado por peritos oficiais, de reconhecida capacidade técnica (aliás, foram submetidos e aprovados em concurso público federal de notória envergadura), demonstrou, fundamentadamente, a necessidade da concessão da tutela antecipada como único meio de proteção e recuperação da área degradada. Confira-se, a propósito, a petição juntada às fls. 215/220.

O despacho de fls. 221, data venia, causou espécie na medida em que não indicou os motivos pelos quais se instalaram dúvidas na convicção do magistrado. Diante disto não é possível concordar com o teor do despacho, pois se torna impossível entender quais foram suas dúvidas.

Não há como sequer se contrapor porque não se sabe os motivos pelos quais o pleito

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ministerial não foi acolhido.

Não se pode admitir a ditadura do “indefiro porque entendo não se fazerem presentes os requisitos legais” ou do “defiro porque entendo se fazerem presentes os requisitos legais”. Esta postura depõe contra o verdadeiro estado democrático de direito. Avilta a Constituição Federal e o Código de Processo Civil.

Assim porque “é nula a decisão interlocutória sem nenhuma fundamentação” (RSTJ 168/339, STJ RF 368/324, 372/277).

Confira-se, ainda, o seguinte precedente do colendo Superior Tribunal de Justiça que entende ser nula a decisão quando insuficientemente motivada:

Direito Processual Civil. Paridade de tratamento das partes e seqüestro de bens da sociedade. Ausência de prequestionamento.

Requisitos da decisão judicial. Ausência de explicitação dos fundamentos em que apoiado o acórdão. Contrariedade aos arts. 165 e 458, II, do Código de Processo Civil.

I – “Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo tribunal 'a quo'” (Súmula n.º 211/STJ).

II – Deficiente a fundamentação do acórdão, reconhece-se a contrariedade aos arts. 165 e 458, II, do Código de Processo Civil.

III – Recurso especial provido. (RESP 317044/RJ; Rel. Min. Antonio de Pádua Ribeiro – 3ª T, data do julgamento 19/05/2005, data de publicação DJ 20.06.2005, p. 265)

Diante disto requer seja decretada a nulidade do despacho não fundamentado (ou fundamentado deficientemente) e, ato contínuo, diante da urgência, concedida a antecipação da tutela pelas razões fáticas e jurídicas declinadas na manifestação de fls. 215/220 dos autos.

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DO PEDIDO DE CASSAÇÃO DA DECISÃO E CONCESSÃO DA TUTELA ANTECIPADA

Conforme consta na narrativa supra, o Agravado foi autuado no ano de 2000 porque estava degradando o meio ambiente, eis que, conforme consta na petição inicial, “promoveu a destruição e danificação de floresta nativa sem autorização do IBAMA, sendo que a extensão do dano abrange área de 1.500 (um mil e quinhentos) hectares”.

No decorrer do processo o Agravado apresentou cópia de Projeto de licenciamento ambiental (fls. 62/85) e do Plano de Recuperação de Área Degradadas (PRADE) que integra o projeto da LAU (fls. 86/108).

Como é cediço, é por meio do PRADE que se recuperam áreas degradadas. Com efeito, sendo o projeto elaborado por técnicos ambientais, minimizam-se os riscos de nova intervenção humana na natureza que possa vir a causar novos danos ou os potencializar.

Transcorridos mais de seis anos foi a área degradada submetida à nova perícia, conforme alhures exposto.

O laudo respectivo, aportado às fls. 193/202, constatou que além de não ter sido executado o PRADE apresentado, o dano ambiental tem se potencializado.

Diante destes novos fatos, i.e., constatação de que o Agravado não recuperou a área danificada além de que vem impedindo a regeneração natural dos 1.500 hectares de floresta amazônica, não cumprindo sequer o termo de embargo n. 166184, lavrado no dia 25/10/1999 (juntado às fls. 16) – vide auto de infração n. 504624 juntado às fls. 203 – o Ministério Público pugnou pela realização de audiência de conciliação onde propôs ao Recorrido que o mesmo elaborasse novo PRADE “(...) com base na perícia realizada pelo Ibama de fls., 192/2003 dos autos, o que foi recusado pelo mesmo” (conforme termo de audiência de fls. 213).

A recusa do Agravado não foi motivo de espanto ao Ministério Público porque o mesmo

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demonstrou, durante os seis longos anos de tramitação processual, desinteresse com causas ambientais. Pudera, nunca sofreu nenhuma conseqüência, o que se denota inclusive pelo desrespeito ao embargo administrativo.

Realmente, como se depreende dos autos, acredita que se passarão mais alguns anos até que venha a ser compelido a adotar qualquer providência que lhe cause “gastos desnecessários”.

Sabe que, mesmo diante de um laudo pericial elaborado por técnicos do IBAMA, onde se demonstra se tratar de verdadeiro degradador ambiental, poderá contar com as dúvidas que instalou na convicção do juízo a quo.

Ledo engano, pois o Tribunal ad quem não tem se compadecido com as degradações ambientais que se tem verificado na Floresta Amazônica.

E é por isso que o Ministério Público se socorre da experiência e sensibilidade dos julgadores que compõe este e. Sodalício.

Segundo apurado pelo órgão ambiental na autuação realizada, o Agravado, ainda no ano de 1999, “desmatou quase que integralmente a área da fazenda, alegando que iria comprar outra área para cobrir a reserva legal” (fls. 20).

Ocorre não ser possível desmatar propriedades na floresta amazônica para, quando bem entender, na forma que preferir, adquirir outra área a título de composição ambiental.

Realmente, após o indeferimento do pedido de tutela antecipada o Agravado atravessou petição nos autos informando ter adquirido nova área para que ultimasse a composição ambiental.

Juntou laudo elaborado por engenheiro florestal de sua confiança tentando abalar a credibilidade do laudo elaborado por perito do Juízo.

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Importante anotar que, por ocasião da nomeação, pelo Juízo, do IBAMA para realização da perícia, o Agravado não indicou assistente técnico nem apresentou quesitos. Este fato fez com que o magistrado a quo constatasse que o direito do Agravado estava precluso na medida em que não observou o estatuído no art. 421 do Código de Processo Civil. Nesse sentido é o teor do despacho aportado às fls. 181.

É óbvio que o Ministério Público acompanhou todo o feito, indicando ao MM. Juiz o órgão do IBAMA para realização da perícia, bem como ofertando seus quesitos às fls. 172.

Pois bem, o laudo apresentado pelo Agravado traz algumas conclusões que indicam não merecer nenhuma credibilidade, exceto quando confirma a degradação do meio ambiente, quando, por exemplo, constatou desmatamentos e queimadas em áreas de preservação permanente.

Tenta suavizar os danos quando, de forma imprecisa e lacônica consigna que “praticamente em todos os córregos e nascentes existe uma faixa marginal de vegetação nativa remanescente, entretanto a largura destas faixas é inferior à largura exigida pela legislação vigente” (sem grifo no original).

Nos termo do art. 58 da Lei Complementar Estadual n. 38/95, “consideram-se de preservação permanente, no âmbito estadual, as florestas e demais formas de vegetação situadas ao longo de qualquer curso d'água, desde o seu nível mais alto, em faixa marginal, cuja largura mínima será:

1 - de 50m (cinqüenta metros), para os cursos d'água de até 50m (cinqüenta metros) de largura;

2 - de 100m (cem metros), para os cursos d'água que tenham de 50m (cinqüenta metros) a 200m (duzentos metros) de largura;

3 - de 200m (duzentos metros), para os cursos d'água que tenham de 200m (duzentos metros) a 600m (seiscentos metros) de largura;

4 - de 500m (quinhentos metros), para os cursos d'água que tenham largura superior a 600m (seiscentos metros)”

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Além destas, também são áreas de preservação permanentes aquelas situadas “b) ao redor das lagoas ou lagos e reservatórios d'água naturais ou artificiais, represas hidrelétricas ou de uso múltiplo, em faixa marginal, cuja largura mínima será de 100m (cem metros); c) nas nascentes, ainda que intermitentes, nos chamados "olhos d'água", qualquer que seja sua situação topográfica, nas veredas e nas cachoeiras ou quedas d'água, num raio mínimo de 100m (cem metros); d) no topo dos morros, montes e serras; e) nas encostas ou partes destas, com declividade superior a 45 (quarenta e cinco) graus; f) nas bordas dos tabuleiros e chapadas, a partir da linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100m (cem metros) em projeção horizontal”.

A normatização possui clareza solar. Agora, vem uma pessoa que se diz técnica e aduz que as Áreas de Preservação Permanente da propriedade estão praticamente protegidas!!!!

O próprio Agravado indica ter causado danos ao meio ambiente. Danos estes, vale dizer, que não pretende recompor. Permitam as seguintes indagações: O que são áreas praticamente protegidas? E o que são áreas praticamente degradadas? Qual a diferença?

Conforme restou consignado na manifestação aportada às fls. 215/220 o Agravado efetuou desmates sem autorização do órgão ambiental. Para explorar a Floresta Amazônica deveria ter obtido autorização para desmate. Não o fez.

É evidente que, para obter esta autorização necessitaria estar com sua propriedade devidamente licenciada. Assim o exige os artigos 17 e seguintes da Lei Complementar Estadual n. 38/95.

Em Mato Grosso não se pode explorar florestas e demais formas de vegetação sem que se cumpra o disposto no art. 14 da Lei Complementar Estadual n. 233/04. Imprescindível, portanto, que se licencie a área a ser explorada.

Com a licença deveria dar execução a um plano de recuperação de área degradada. Também não o fez.

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Estas considerações jurídicas não alteram a causa petendi da presente ação, mas, apenas, demonstram o desrespeito às normas ambientais. Explica-se: se tivesse obtido e respeitado a LAU não teria degradado o meio ambiente porque a exploração haveria de observar preceitos de sustentabilidade ambiental.

Agora, para recuperar a área deverá o fazer observando orientações técnicas, as quais devem constar no PRADE.

O desmatamento somente seria autorizado em áreas não incluídas na Reserva Florestal Legal e não incluídas em áreas de preservação permanente.

Nos termos do art. 1º, § 1º, III da Lei n. 4771/65, considera-se reserva legal “a área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de preservação permanente, necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas”.

Sua localização dever ser aprovada pelo órgão ambiental estadual (Código Florestal, art. 16, § 4º) e averbada à margem da inscrição da matrícula do imóvel (Código Florestal, art. 16, § 8º).

Nas propriedades rurais situadas em área de floresta localizada na Amazônia Legal, por força da MP 2.166-67/2001, permite-se supressão da vegetação desde que se mantenha, a título de reserva florestal legal, o mínimo de 80 % (oitenta por cento), excetuando-se, vale repetir, as áreas de preservação permanente.

Estes critérios são importantes para demonstrar que o Agravado, mesmo se obtiver compensação ambiental, não poderia, à luz da legislação ambiental, efetuar desmates sem a prévia licença ambiental única que indicaria onde poderia ser feito o desmate. Acautelam-se, destarte, as reservas florestais legais e demais áreas objetos de proteção ambiental.

A alegação do Agravado de que teria aberto a área antes da modificação do art. 16 da Lei n. 4717/65 não afasta sua responsabilidade civil pela recomposição do dano

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porquanto não existe direito adquirido a causação de dano ambiental.

Veja-se que, conforme já salientado ao Juízo a quo, com a nova redação dada ao art. 16 do Código Florestal, inicialmente pela MP 1956-50, de 20/05/00, passou a ordem jurídica a firmar posicionamento legal no sentido de constituir degradação ambiental a supressão de vegetação em área de floresta localizada na Amazônia legal que não observe o percentual máximo de proteção.

Trata-se de presunção jures et de jure.

Entretanto, o Agravado não observou seu dever legal de preservação do meio ambiente, tendo efetuado derrubadas sem qualquer preocupação com a legislação ambiental, embora tivesse se comprometido, quando da aquisição do imóvel, em “preservar a floresta na forma do Código Florestal, responsabilizando-se pela preservação dos castanhais e demais”, conforme consta na matrícula do imóvel (fls. 187).

O laudo aportado às fls. 192/202 indica que não respeita o meio ambiente nem os órgãos ambientais.

Mesmo com a propriedade embargada administrativamente continuou (e continua) a explorá-la economicamente, eis que, conforme consta no laudo de fls. 197/202, foi constatada a degradação ambiental diante da “supressão total da vegetação nativa abrangendo parte da área de preservação permanente da propriedade – matas de galeria às margens de cursos de água" (fls. 193).

Esta exploração econômica é ilegal na medida em que a ordem jurídica a proíbe da forma como o faz.

Não poderia explorar a área antes de obter licença única em que indicasse, com precisão, a parte destinada à reserva legal (Lei n. 4771/65, art. 16, § 4º) e o local onde seria possível a supressão da vegetação para fins de exploração econômica.

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Preferiu simplesmente derrubar a vegetação nativa, em plena floresta amazônica, e ali colocar gado vacum.

Como salientado, embora tenha se comprometido textualmente perante o Sr. Tabelião de Registro de Imóveis em preservar os castanhais, na verdade, segundo indicado no laudo pericial, “a maior parte dos indivíduos remanescente se encontra comprometido pelo desmatamento e uso de fogo na área” (fls. 194).

A fotografia juntada às fls. 200 demonstra o desmatamento e uso de fogo. Este, além de causar evidente degradação ao meio ambiente, é causa da poluição atmosférica que os moradores da região suportam diante das espessas nuvens de fumaças (efeitos sinérgicos).

Absurdamente, e sem qualquer autorização do órgão ambiental, o qual de toda forma o não daria, nestas condições, embora com a propriedade embargada, o Agravado obstruiu o fluxo de águas por meio da construção de taludes, conforme constas no laudo pericial (fls. 194).

Não respeita, vale repetir, áreas de preservação permanente.

O PRADE apresentado pelo Agravado initio litis é virtual porque, conforme constatado pela perícia do IBAMA, “na localidade não foi encontrado qualquer procedimento que indique execução de Plano de Recuperação de Área Degradada” (fls. 195).

No Quesito n. 09, indaga-se do órgão ambiental responsável pela perícia se houve recomposição natural da área degradada, eis que, presumia-se o respeito ao embargo, o que inocorreu.

Respondendo a este quesito, salientaram os senhores peritos que “não houve regeneração da área degradada” (fls. 195).

Pior: “Verificou-se que mesma ainda encontrasse sob constante ação degradante em

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decorrência do desenvolvimento normal das atividades na propriedade, mesmo após a autuação e o embargo” (sem grifo no original – fls. 195).

Por esse motivo foi novamente autuado administrativamente (fls. 203).

Concluíram os senhores peritos:

“Conforme constatação in loco, verificou-se que a área apresenta sinais de desgaste do solo, provavelmente causados em parte pela exposição deste às intempéries como também pela atividade agropecuária, corroborando com a não recuperação da área em questão e o impedimento da regeneração natural da vegetação” (fls. 195).

Consta, a seguir, às fls. 196:

“(...) a legislação vigente já foi desrespeitada e a maioria dos danos possível já foi provocada – corte raso, uso de fogo, obstrução dos cursos d’água, compactação do solo pela mecanização agrícola, perda de biodiversidade, etc.. Portanto é fundamental que as áreas degradadas sejam, recuperadas, em se tratando da Reserva Legal, ou restauradas, no caso de Áreas de Preservação Permanente”.

O resultado da perícia requisitada pelo Juízo é fato novo que demonstra o gradual agravamento das condições ambientais, com nítidos impactos negativos sobre os meios biótico e abiótico.

É este fato novo, continuidade da degradação ambiental no mesmo local, que autoriza a concessão de tutela antecipada.

Vejam, eminentes Desembargadores, o Agravado confessa, toda vez que vem aos autos, que sua propriedade, onde explora atividade pecuária, possui danos ambientais inclusive em áreas de preservação permanente. A única coisa que o MP

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pleiteia na defesa do meio ambiente é que o Agravado seja compelido a recuperar as áreas degradadas. A única forma viável de recuperação é por meio da elaboração, aprovação e execução do Projeto de Recuperação de Área Degradada.

O laudo emitido pelo órgão ambiental, atendendo requisição judicial, é isento de qualquer impugnação, sendo que comprova o dano ocorrido, o qual continua a ocorrer sistematicamente.

Isto demonstra, por razões óbvias que, enquanto não se decidir a demanda, o Agravado continuará a degradar a área, mantendo interrompidos fluxos de águas, impedindo a regeneração da floresta nativa e das áreas de preservação permanente etc.

Tem agido a seu alvedrio. Não respeita a legislação ambiental nem as determinações dos agentes ambientais. Não pode contar com a aquiescência da Justiça.

É com este fundamente que se pleiteia desta augusta superior instância a concessão de antecipação de tutela visando “deferir provisoriamente ao autor, antes do julgamento definitivo da ação, o próprio provimento jurisdicional pretendido, ou seus efeitos (tutela satisfativa). Trata-se de decisão interlocutória e provisória, que não dispensa o advento ulterior de sentença” (Hugo Nigro Mazzilli in A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo. São Paulo : Saraiva. 2002. p. 377).

Confiram-se, a propósito, as ponderações de Mazzilli:

“Embora o adiantamento de tutela não seja propriamente uma medida cautelar, a Lei n. 10.444/02 estabeleceu que, se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar, em caráter incidental ao processo já ajuizado.

Ainda que suponha urgência, a tutela antecipada não é, pois, medida cautelar, com liminar, e sim medida liminar em processo principal, com satisfação imediata do direito pretendido” (idem).

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O art. 12 da Lei n. 7347/85 possibilita a concessão da liminar antecipatória do direito, sendo que o art. 84, § 3º da Lei n. 8078/90 dispõe que “sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receito de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu”.

A cada dia que passa o dano vem aumentando em prejuízos irreparáveis aos meios bióticos e abióticos.

O princípio da efetividade da tutela de direitos trasindividuais deve ser aplicado ao caso vertente em razão de que o bem jurídico lesado reclama imediata intervenção estatal em sua defesa. Pleiteia-se nesta instância superior a sensibilidade não encontrada no Juízo de 1º Grau.

No caso vertente torna-se imperiosa a concessão de antecipação de tutela para que o Agravado faça a “recomposição do ambiente degradado, utilizando-se por base a refloresta de plantas e arbóreos típicos da vegetação nativa presente na região dantes da ação destruidora, a serem individualizados e indicada s por técnicos (INDEA, FEMA, IBAMA, etc.. (...) realizando estudos prévios com técnicos especializados, às condições naturais (...)” (fls.11), conforme pleiteado na exordial.

Isto porque, também conforme narrado na petição inicial, o Agravado “promoveu a destruição e danificação de floresta nativa sem autorização do IBAM. (...) que a extensão do dano abrange área de 1.500 (um mil e quinhentos) hectares (...). a ação destruidora do réu infringe os dispositivos normativos insculpidos no art. 2º, II e VII c.c. art. 38 do decreto n. [3]179/99, bem como art. 19, § único da lei nº 4771/65. Desta forma, resta por demais evidente a autoria e o nexo causal que une a conduta do réu e a causa da agressão, ensejando a responsabilização civil de que sejam reparados os prejuízos ao meio ambiente (...)” (fls. 05/06)

Conforme salientado alhures, a única forma idônea de recompor o ambiente lesado é através do PRADE.

A transcrição do pedido e da causa de pedir constante na exordial é importante porque o juízo a quo afirmou na despacho de fls. 221 que estaria havendo alteração na causa de

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pedir, o que na verdade inocorre.

Conforme assinala o magistrado goiano Ari Ferreira de Queiroz, “A causa petendi é o resultado de uma combinação entre os fatos constitutivos do direito e os fundamentos jurídicos do pedido que autorizam a demanda em juízo” (in Direito Processual Civil – Teoria Geral do Processo de Conhecimento. 8ª ed. Goiânia : IEPC. 2005. p. 308).

Incumbe ao autor descrever a situação de fato geradora do direito pleiteado. O fato a ser descrito, como se sabe, é o constitutivo da relação de direito material.

Não se olvida que, com relação à causa de pedir, o CPC se filiou à teoria da substanciação e não a teoria da individuação, que a ela se opõe. Significa dizer, conforme escólio de CHIOVENDA, que o CPC exige a descrição tanto da causa próxima quanto da causa remota. Em outras palavras, incumbe ao autor indicar o fato constitutivo do direito e o fato constitutivo da ação.

Conforme consta na petição inicial o Agravado é o proprietário da área. Possui, portanto, o dever propter rem de preservar seus recursos naturais, explorando-os de forma racional com menor prejuízo possível ao meio ambiente. Eis a causa remota, o fato constitutivo do direito.

Além disto, como também é narrado na petição de ingresso, o Agravado promoveu a destruição e danificação de floresta nativa sem autorização do IBAMA. Ora, nos exatos termos do § 3º do art. 255 da Constituição Federal, “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores (...) a sanções penais e administrativas, independente da obrigação de reparar os danos causados”.

Eis o fato constitutivo da ação que gerou ao Ministério Público o interesse de agir.

Não se entende o que quis dizer o magistrado quando consignou ter havido mudança da causa de pedir no despacho guerreado, cujo excerto é transcrito com a devida vênia:

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“(...) a presente ação civil pública foi ajuizada somente para a análise do provável desmatamento de 1500 hectares, não podendo em seu curso, mesmo que, apresentados fatos novos, ser alterada a causa de pedir, visto que, diante do relatório apresentado pelo IBAMA às fls. 193/203 dos autos, fatos novos vieram a ser apontados”(sem grifo no original).

Como salientado, não houve qualquer modificação na causa de pedir, sendo que o termo técnico talvez foi utilizado pelo magistrado em sentido conotativo.

De qualquer forma, pede-se, novamente, vênia para transcrever o escólio de Nelson Nery Júnior o qual diferencia com meridiana clareza os fundamentos de fato (causa de pedir próxima) e os fundamentos jurídicos (causa de pedir remota):

“Fundamentos de fato. Compõem-se a causa de pedir próxima. É o inadimplemento, a ameaça ou a violação do direito (fatos) que caracteriza o interesse processual imediato, quer dizer, aquele que autoriza o autor a deduzir o pedido em juízo. Daí porque a causa de pedir próxima, imediata, é a violação do direito que se pretende proteger em juízo, isto é, os fundamentos de fato do pedido, o direito em si, em tese e abstratamente considerado, não pode ser o fundamento imediato do pedido: afirmar-se ser titular de um direito não é suficiente para justificar o ingresso em juízo, pois é necessário que se diga o motivo pelo qual (fundamento de fato) o direito está ameaçado ou foi violado. Por isso é que a causa de pedir imediata (próxima) são os fundamentos de fato, vale dizer, o que imediatamente motivou o autor a deduzir sua pretensão em juízo” (in CPC Comentado e legislação extravagante. 8ª ed. São Paulo : RT. 2004. p. 743).

Conforme consta na exordial, o inadimplemento, a ameaça ou a violação do direito (fatos) referidos por Nelson Nery é o fato de que o Agravado “promoveu a destruição e danificação de floresta nativa sem autorização do IBAMA. (...) a extensão do dano abrange área de 1.500 (um mil e quinhentos) hectares”.

O laudo aportado às fls. 193/203 apenas avilta que a destruição e a danificação continuam ocorrendo nos 1.500 (um mil e quinhentos) hectares. O laudo indica o tipo de vegetação ali existente, inclusive salientado que dentro desta área degradada existem áreas de preservação permanente.

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Isto não é mudar a causa de pedir próxima porque o dano é o mesmo desde o ingresso da ação. O que ocorreu é que, conforme ressai do laudo pericial de fls. 193/203, o Agravado potencializa o dano ano após ano.

Com relação aos fundamentos jurídicos, preleciona Nelson Nery Júnior:

“fundamentos jurídicos. Compõem a causa de pedir remota. É o que, mediatamente, autoriza o pedido. O direito, o título não podem ser a causa de pedir próxima porque, enquanto não ameaçados ou violados, não ensejam ao seu titular a necessidade do ingresso em juízo, ou seja, não caracterizam per se o interesse processual primário e imediato, aquele que motiva o pedido. Fundamento jurídico é a autorização e a base que o ordenamento dá ao autor para que possa deduzir pretensão junto ao Poder Judiciário. É o título do pedido (a que título você pede?), que tanto pode ser a lei como o direito, o contrato etc. Não há necessidade de o autor indicar a lei ou o artigo de lei em que se encontra baseado o pedido, pois o juiz conhece o direito ( iura novit curia). Basta que o autor dê concretamente os fundamentos de fato para que o juiz possa dar-lhe o direito (da mihi factum, dabo tibi ius)” (idem)

Também, por razões óbvias, certamente não é a casa de pedir remota a que se referiu o Juízo a quo, eis que, além dos fundamentos jurídicos insertos na exordial, presume-se que o juízo a quo conheça os demais fundamentos, verbi gratia, o substrato constitucional subjacente.

Também não há que se falar no caso vertente em compensação ambiental por manifesta inobservância, pelo Agravado, das normas legais pertinentes (art. 44 e §§ da Lei n. 4771/65 com a redação dada pela MP 2166-67/01 e art. 62-A da Lei Complementar Estadual n. 233/05).

O que se discute nos autos foi a degradação em 1500 hectares, e tudo o que nele existe, como, por exemplo, áreas de preservação permanente.

Diante destas considerações, mister seja concedida tutela antecipada para que o Agravado faça cessar a exploração na área degradada e a recomponha, elaborando o indispensável PRADE – Projeto de Recuperação da Área Degradada, o qual deverá incidir sobre toda a área degradada/desmatada, inclusive áreas de preservação

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permanente objetos de alteração ilícita insertos nos 1.500 hectares indicados na exordial e no laudo pericial de fls. 193/203.

Que seja concedido o prazo máximo de 45 (quarenta e cinco dias) para elaboração do PRADE e apresentação junto ao órgão ambiental federal.

Caso o PRADE não seja aprovado pelo IBAMA, para que a decisão tenha real efetividade, deverá nela constar a obrigação do Agravado em adotar, no prazo de 15 (quinze) dias (ou outro a ser fixado pelo IBAMA), todas as providências necessárias à sua aprovação/regularização, sanando eventuais irregularidades, observadas as orientações do órgão ambiental, reapresentando-o tão logo expire seu prazo.

Mas não basta elaborar o obter a aprovação do PRADE. Em razão disto, que a decisão concessiva da antecipação de tutela determine, de forma clara, que deverá dar imediata e completa execução ao PRADE, respeitando fielmente o cronograma nele fixado.

Que conste na decisão que o PRADE deverá observar, a critério do órgão ambiental federal, as prescrições constantes às fls. 196/198.

Como a área, embora embargada, esta sendo explorada economicamente, também é preciso que seja concedida medida cautelar, interdiando-a judicialmente, para que o Agravado fique proibido de realizar qualquer exploração econômica e, assim, garantir sua regeneração, cumprindo, portanto, o embargo administrativo não respeitado.

DO PEDIDO LIMINAR

Eminente Relator:

Diz o art. 558 do CPC que “o relator poderá, a requerimento do agravante, nos casos de prisão civil, adjudicação, remição de bens, levantamento de dinheiro sem caução idônea e em outros casos dos quais possa resultar lesão grave e de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação, suspender o cumprimento da decisão até o pronunciamento

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definitivo da turma ou câmara”.

Como a decisão guerreada possui conteúdo negativo, o que se pleiteia é a concessão liminar da tutela antecipada.

“decisão impugnada negativa. Caso a decisão impugnada seja de conteúdo negativo, como, por exemplo, o indeferimento de medida liminar, o relator pode conceder, liminar e provisoriamente, a medida pleiteada como mérito do recurso, atuando neste caso como juiz preparador do recurso” (Nelson Nery Júnior. op.cit. p. 1045)

No caso dos autos é imprescindível a concessão da antecipação da tutela porque o Agravado persiste em degradar continuadamente o meio ambiente, sendo certo que os danos causados com os desmatamentos e destruição das áreas de preservação permanente são em sua maior parte irreversíveis, potencializando seus deletérios efeitos a cada dia que passa.

Não se deve olvidar que o dano está sendo causado em área inserida na Amazônia Legal, num ecossistema extremamente frágil onde os danos ambientais são de difícil reparação, o que tornará inviável o retorno ao status quo ante se lesados ainda mais.

Por que o Agravado continua a degradar o meio ambiente, o que precisa ser prevenido, e para que o mesmo seja recomposto enquanto ainda pode ser possível é que se entende presente o periculum in mora, sendo que o fumus boni juris se dessume de todo o expendido no corpo deste recurso.

O art. 527, III do CPC autoriza a concessão da antecipação de tutela.

Diante do exposto, pugna o agravante pelo conhecimento do presente recurso e:

1.Seja cassada a decisão guerreada por falta de fundamentação ou por error in judicando e, assim, concedida a antecipação da tutela para que o Agravado faça

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cessar a exploração na área degradada e a recomponha, elaborando o indispensável PRADE – Projeto de Recuperação da Área Degradada, o qual deverá incidir sobre toda a área degradada/desmatada, inclusive áreas de preservação permanente objetos de alteração ilícita insertos nos 1.500 hectares indicados na exordial e no laudo pericial de fls. 193/203.

2.Que seja concedido o prazo máximo de 45 (quarenta e cinco dias) para elaboração do PRADE e apresentação junto ao órgão ambiental federal. Que conste na decisão que o PRADE deverá observar, a critério do órgão ambiental federal, as prescrições constantes às fls. 196/198.

3.Caso o PRADE não seja aprovado pelo IBAMA, para que a decisão tenha real efetividade, que nela conste a obrigação do Agravado em adotar, no prazo de 15 (quinze) dias (ou outro a ser fixado pelo IBAMA), todas as providências necessárias à sua aprovação/regularização, sanando eventuais irregularidades, observadas as orientações do órgão ambiental, reapresentando-o tão logo expire seu prazo.

4.Conste na decisão liminar a determinação para que, aprovado o PRADE, seja o mesmo executado, observado o cronograma nele inserto.

5.Como a área, embora embargada, esta sendo explorada economicamente, também se requer a concessão de medida cautelar, interdiando-a judicialmente, e, assim, obstando sua exploração econômica, garantindo sua regeneração e cumprindo, inclusive, o embargo administrativo não respeitado.

DOS PEDIDOS FINAIS

Diante de todo o expendido, é a presente para levar a matéria a superior instância para que esta Augusta e Colenda Corte, reeditando mais uma de suas brilhantes atuações, conheça do presente recurso, determine seu regular processamento e:

1.Seja intimado o agravado, via ofício com aviso de recebimento, para que responda no prazo de dez dias na forma do art. 527, V do CPC, colhendo-se, a seguir, parecer da Procuradoria de Justiça e prosseguindo-se com a regular tramitação do recurso.

2.Seja dado provimento do pedido cassando a r. decisão agravada para que seja

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confirmada ou concedida a tutela antecipada pleiteada, na forma indicada nos itens 1 a 5 dos pedidos liminares;

3.Protesta pela juntada de cópia integral do feito para possibilitar amplo conhecimento da matéria, bem como cópia dos documentos que comprovam que os peritos do IBAMA possuem alicerçados conhecimentos técnicos acerca do periciado, notadamente porque comprovam a conclusão de Mestrado na área.

P. Deferimento.

Alta Floresta/MT., 09 de novembro de 2006.

Marcelo Caetano Vacchiano

Promotor de Justiça

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Doc. 01

CÓPIA DAS PROCURAÇÕES

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Doc. 02

CÓPIA DA

DECISÃO AGRAVADA

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Doc. 03

CERTIDÃO DE

INTIMAÇÃO

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Doc. 04

COMPROVANTES

MESTRADO

TÉCNICOS DO

IBAMA

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Doc. 05

CÓPIA INTEGRAL

DOS AUTOS