Modelos de Negocio Audiovisual 2010

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Reflexões e Modelos de Negócio para Comercialização de Conteúdos Audiovisuais de Curta Duração Seminário de Comercialização de Conteúdos Audiovisuais de Curta Duração de 23 a 25 de agosto de 2010 São Paulo

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Business Dissertacao

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Ref lexões e Modelos de Negócio para Comercialização

de Conteúdos Audiovisuais de Cur ta Duração

Seminário de Comercialização de Conteúdos Audiovisuais de Curta Duração

de 23 a 25 de agosto de 2010

São Paulo

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Sumário

Apresentação..................................................................................................... .5..Relações.entre.Curta.e.Mercado...................................................................... .7.

Abertura.do.Seminário.................................................................................... .11... Palestras................................................................................................. .23.. . •. Economia.da.Cultura....................................................................... .25.. . •. O.Mercado.de.Curta-Metragem.na.França.................................... .39

. Modelos.de.negócio.e.Iniciativas.de.Comercialização........................ .51

.

. Mesas.................................................................................................... .135.

.

. . •. .Multiplataforma:.Tempo.e.Formatos.para..Conteúdos.de.Curta.Duração....................................................... .137

. . •. .Políticas.Públicas.e.o.Mercado.do.Curta.no.Século.XXI............ .141

Anexo.Projeto.Curta.em.Todas.as.Telas.da.ABD-N..................................... .147

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O 21º Festival Internacional de Curtas-metragens de São Paulo teve o prazer de receber produtores, realizadores, agentes de mercado, representantes de políticas públicas e interessados no Seminário

de Comercialização de Conteúdos Audiovisuais de Curta Duração - Curta & Mercado, realizado de 23 a 25 de agosto de 2010, na Cinemateca Brasileira.

Principal evento no país dedicado exclusivamente ao formato, o Festi-val de Curtas de São Paulo chegou à sua maioridade justamente exibindo e discutindo as inúmeras possibilidades que o curta-metragem oferece. Cada vez mais contemporâneo, o audiovisual de curta duração se adapta dinami-camente às diversas propostas, suportes de captação e janelas de exibição. Espaço privilegiado de experimentação, o formato inova e busca seu futuro com criatividade para alimentar de forma dinâmica e orgânica seu ciclo pro-dutivo.

Durante os três dias deste Seminário, os diversos protagonistas do setor tiveram a oportunidade de apresentar suas realidades e discutir, com os presentes, as mais divrsas possibilidades de comercialização e viabilida-de econômica para o formato de curta duração. Agradecemos a Secretaria do Audiovisual, a Cinemateca Brasileira e a ABD Nacional pela confiança depositada na Associação Cultural Kinoforum como organizadora do evento e, é claro, a todos os participantes que muito contribuíram para formatar e enriquecer os debates.

Neste livro, apresentamos um resumo das discussões desenvolvidas e convidamos os interessados a continuar o debate conosco no blog criado para apoiar o Seminário (kinoforum.org/curtaemercado) onde estão dispo-níveis as informações completas sobre o evento e seus participantes, o con-teúdo deste livro e vídeos com as mesas e apresentações gravadas ao vivo. O blog continuará sendo alimentado no decorrer do ano com a mediação da ABD-Nacional e convidamos a todos para contribuir ativamente e preparar uma nova rodada de negócios já agendada para o próximo Festival, em agos-to de 2011.

Zita CarvalhosaDiretora do Festival Internacional de Curtas-Metragens de São Paulo - Curta Kinoforum

Apresentação

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Relações entre Curta e Mercado hoje

O Brasil é um dos maiores produtores mundiais de obras de curta metragem, com centenas de títulos realizados anualmente. O esto-que de obras, acumulado especialmente após a criação da reserva

de mercado para o curta-metragem em cinemas em 1978, soma milhares de títulos, muitos deles consagrados em festivais e mostras internacionais por suas qualidades técnica e artística.

No entanto, esse ativo não conta ainda com canais de distribuição que proporcionem a seus produtores as condições econômicas de reinvestimen-to em novas obras, a autossuficiência produtiva do segmento e a desejável ampliação do público que poderia fruir esse significativo acervo.

O recente cenário de barateamento dos equipamentos digitais de cap-tação e edição, somado ao acelerado processo de convergência digital, tem proporcionado condições inéditas de produção de uma diversificada gama de formatos, gêneros e duração de obras de curta metragem, e fomentado a criação de novos modelos de negócios capazes de potencializar a comerciali-zação desses produtos em todas as plataformas de difusão audiovisual.

Para começar a dar respostas a esses novos desafios, a Secretaria do Audiovisual (SAv) do Ministério da Cultura, a Associação Brasileira dos Documentaristas Nacional (ABD-N) e a Associação Cultural Kinoforum rea-lizaram, em agosto de 2010, sob minha coordenação, o Seminário de Comer-cialização de Conteúdos Audiovisuais de Curta Duração - Curta & Mercado, durante o 21º Festival de Curtas-metragens de São Paulo.

Reunimos, no mesmo espaço, realizadores, produtores, experiências de distribuição e comercialização de conteúdos brasileiros de curta duração nas diversas plataformas de difusão audiovisual — cinema, televisão, internet, telefonia móvel.

O objetivo principal do Seminário era identificar os entraves ao desen-volvimento dessas experiências e avaliar as condições de sua ampliação em

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escala regional e nacional, criando um ambiente propício à formulação de modelos de negócio, originais e criativos, capazes de rentabilizar esse eleva-do e diversificado acervo, especialmente a produção recente, e integrar os mercados potenciais para as obras audiovisuais de curta-metragem, dentro de uma perspectiva multiplataforma.

Os primeiros passos para a concepção e execução desta tarefa foram dados há cerca de um ano, quando a equipe da Secretaria do Audiovisual reuniu-se com a ABD e decidiu realizar esse Seminário para discutir e situar a produção atual dos conteúdos de curta duração, levando em conta as novas configurações do mercado audiovisual brasileiro no século XXI.

Em março de 2010, realizamos em João Pessoa, na Paraíba, um encon-tro preparatório deste Seminário, com vistas a produzir uma primeira ava-liação do estado da arte do mercado audiovisual brasileiro em relação aos conteúdos de curta duração.

Naquela oportunidade, um magnífico encontro concentrado num dia de intenso trabalho de representantes de toda a cadeia produtiva resultou no conteúdo do Caderno do Participante, que distribuímos a todos os inscri-tos no Seminário Curta & Mercado. Neste caderno, publicamos também o documento O curta em todas as telas, produzido pela ABD, em um encontro realizado em julho de 2010, em Vitória (ES), com a participação de represen-tantes de suas 27 regionais.

O Seminário, realizado de 23 a 25 de agosto de 2010, foi composto por duas conferências, três mesas, um painel de debates e uma rodada de encontros.

As palestras versaram sobre o tema indústria criativa e mercado. Na pri-meira delas, a economista e consultora em economia criativa Ana Carla Fonse-ca fez uma interessante e importante abordagem sobre o papel do audiovisual na economia da cultura. Na segunda palestra, o cineasta e produtor francês Alain Rocca apresentou um estudo sobre o mercado de curta-metragem na França, realizado por ele a pedido do ministro da cultura francês, em 2006.

Na primeira mesa, “Multiplataforma: tempo e formatos para conteúdos de curta duração”, discutiu os diversos, formatos, gêneros e duração de con-teúdos que mais se adaptam às atuais plataformas de difusão e comercializa-ção, ampliando o conceito de curta-metragem vigente até então.

A segunda mesa, “Modelos de negócio para difusão do curta-metra-gem”, discutiu-se alguns modelos de negócio em operação para estimular o desenvolvimento de novas propostas que possam multiplicar as fontes de rentabilização dos produtos de curta duração.

A terceira mesa, que encerrou o Seminário, “Políticas públicas e o mer-cado do curta no século XXI” propiciou um debate com as principais auto-

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ridades do audiovisual no âmbito federal e do estado de São Paulo sobre as perspectivas das políticas públicas, tanto no campo legal quanto no fomento para o mercado de curta-metragem hoje e no futuro próximo.

O painel “Iniciativas de comercialização de conteúdos de curta dura-ção” foi uma rica oportunidade de encontro propositivo com os principais agentes do mercado, responsáveis pelas experiências e políticas institucio-nais consolidadas de comercialização de conteúdos de curta-metragem.

Fizemos também uma Rodada de Encontros, um espaço reservado para que os participantes, tanto os convidados para as mesas e painel, como o público do Seminário, pudessem realizar encontros interpessoais para a troca de expe-riências, esclarecimento de dúvidas, propostas de negócios e troca de cartões.

Esta rodada teve um sucesso inesperado e logo passou a ser denomina-da pelos participantes do encontro de Rodada de Negócios. As agendas rapi-damente se completaram e, ao final, houve uma ampla sinergia com muitos negócios fechados ou ali iniciados.

É importante destacar que, entre as principais preocupações que nortea-ram as discussões, a definição de curta-metragem esteve presente a todo o momento. Um consenso que logo se estabeleceu foi a necessidade imediata de se revisar o conceito de obra de curta duração. A ideia de que um filme curto deve ser uma obra ficcional ou documental, de caráter estritamente autoral, com cerca de 15 minutos de duração para ser exibida no circuito de salas de cinema, já não atende mais aos desafios do presente.

A oferta de obras de curta duração foi outro aspecto fundamental que se apresentou durante o Seminário. O Brasil é hoje um grande produtor de curtas-metragens no mundo, mas não temos disponíveis pesquisas consis-tentes para assegurar exatamente o volume atual dessa produção. Arrisco estimar que seguramente são produzidas cerca de 700 obras de curta-metra-gem por ano no País.

O financiamento dessas obras provém de diversas fontes. São inúme-ros os editais de fomento à produção em órgãos públicos federais, estaduais e municipais. As escolas de formação audiovisual espalhadas em todo o ter-ritório nacional, respondem por um grande número de obras de curta dura-ção, bem como os projetos de formação audiovisual dos programas sociais do terceiro setor.

A enorme disseminação de aparelhos de captação e tratamento digital de imagem e som, à mão da maioria dos usuários de computadores e telefo-nes celulares, também faz com que brotem, de forma espontânea, inúmeras obras nos mais diversos formatos, gêneros e duração, que contribuem para esse quadro de abundância de produtos.

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A janela do cinema não é mais a única, nem mesmo a mais importante via de comunicação da produção audiovisual com o público, em qualquer formato de duração. A convergência digital aproximou os processos de pro-dução audiovisual e criou inúmeras possibilidades de circulação e consumo desses conteúdos. As obras de curta duração tornaram-se os produtos mais visados pela cadeia de difusão comercial de conteúdos audiovisuais.

Para as emissoras de televisão, principalmente as do campo público, além dos tradicionais programas dedicados aos filmes de curta-metragem, as obras de curta duração são muito versáteis no processo de ajuste da progra-mação. Cada vez mais utilizam-se interprogramas, obras de micro-metragem que variam de 30 segundos a dois minutos de duração, com temas de grande interesse público relacionados a meio ambiente, cidadania, esportes, aspec-tos históricos e turísticos, entre outros.

Portais dedicados à distribuição de conteúdos de curta duração ofe-recem um cardápio de opções e de gêneros aos mais variados segmentos de atividades. São programas para apoio didático em escolas de primeiro, segundo e terceiro graus, para circuitos internos empresariais, companhias aéreas, estações, trens metropolitanos, terminais de ônibus e toda a sorte de circuitos fechados de televisão. As empresas de telefonia móvel, por sua vez, buscam estimular cada vez mais a produção de conteúdos que possam ser oferecidos aos seus milhões de clientes.

É importante ressaltar ainda que houve um consenso entre os partici-pantes do Seminário sobre a inviabilidade e inadequação, nos dias de hoje, da chamada Lei do Curta Metragem, de 1975. O possível retorno dos fil-mes de curta metragem ao mercado exibidor de salas de cinema só poderá ocorrer mediante um novo modelo de negócio, sintonizado com o Brasil do século XXI, em que ganhem todos — produtores, distribuidores, exibidores e, acima de tudo, o público.

Enfim, os conteúdos de curta duração ocupam hoje um lugar privi-legiado no mercado audiovisual nacional e internacional. Resta aos atores da cadeia produtiva desse tipo de conteúdo ocupar, de maneira organizada, eficiente e criativa, a janela de oportunidades que este momento, de rápidas e profundas transformações, oferece.

Adilson RuizCoordenador de Conteúdo do Seminário Curta & Mercado

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Seminário

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Seminário.de.Comercialização.de.Conteúdos..Audiovisuais.de.Curta.Duração

PROGRAMAÇÃO

23.de.agosto.(segunda-feira)

9h00 – Credenciamento

10h00 – AberturaAdilson Ruiz (Coordenador de Conteúdo do Seminário Curta & Mercado), Newton Cannito (Secretário do Audiovisual – SAv/MinC), Silvio Da-Rin (Cineasta e Membro da Comissão de Formulação do Seminário Curta & Mercado), Solange Lima (Presidente da ABD Nacional)

11h00 às 13h00 – MESA.01: “Multiplataforma: Tempo e Formatos para Conteúdos de Curta Duração” Mediador: Aletéia Selonk (ABD) Composição da Mesa: Carlos Dowling (ABD/TV UFPB/Rede Nordestina do Audiovisual), Douglas Silveira (TV Escola), João Garção Borges (RTP), Moema Mϋller (Programadora Brasil), Sabrina Nudeliman (Elo Company)

14h30 às 18h00 – PALESTRAS: “Indústria Criativa e Mercado”Mediador: Zita Carvalhosa (Kinoforum)Ana Carla Fonseca, economista da cultura e consultora em economia criativaAlain Rocca, produtor de cinema e autor de um estudo sobre a economia do curta-metragem na França

24.de.agosto.(terça-feira)

10h00 às 10h10 – “Homenagem do Fórum de Festivais à ABD-Nacional”

10h10 às 13h30 – MESA.02: “Modelos de Negócio para Difusão do Curta Metragem”Mediador: Celso Gonçalves (ABD)Composição da Mesa: Adhemar de Oliveira (Circuito Espaço), Alberto Magno (M1ND), Alexandre Cunha (Canal Brasil), Gilberto Perin (RBS-TV), Vanessa de A. Souza (Porta Curtas)

15h00 às 18h00 - Rodada de Encontros e Encontro Nacional da ABD

25.de.agosto.(quarta-feira)

10h00 às 13h30 - PAINEL: “Iniciativas de Comercialização de Conteúdos de Curta Duração” Relatos de experiências consolidadas sobre as políticas comerciais e/ou institucionais de cada um dos participantes, com relação aos conteúdos de curta duração.Mediador: Francisco Cesar Filho (Cineasta e Curador)Participantes:Alexandre Costa (Cult Vídeo) Ana Luiza Azevedo (Casa de Cinema de Porto Alegre)Antonio Leal (Fórum dos Festivais)Cacá de Carvalho (Auwé Digital)Calmin Borel (Mercado do Filme de Clermont-Ferrand)Carlos Wagner La-Bella (TV Cultura)Getsêmane Silva (TV Câmara)Guilherme Coelho (ZeroUm Digital/Blowpix)Gustavo Steinberg (Festival do Minuto)Jaime Lerner (APTC/ABD)Marcus Mannarino (Curta o Curta)Marco Altberg (Cel.U.Cine)Marcio Motokane (Canal Futura)Regina Gambini (Sesc TV)Sérgio Sá Leitão (RioFilme)Silvio Da-Rin (EBC/TV Brasil)Vanessa Gabriel (Claro)

15h00 às 18h00 – MESA.03: “Políticas Públicas e o Mercado do Curta no Século XXI “Mediador: Solange Lima (ABD-N)Composição da Mesa: Newton Cannito (Secretário do Audiovisual - SAv/MinC), Manoel Rangel (Diretor-Presidente da Agência Nacional de Cinema - Ancine), André Sturm (Coordenador da UFDPC da Secretaria de Estado da Cultura), Cícero Aragon (Congresso Brasileiro de Cinema- CBC)

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Quando cheguei à Secretaria, algumas coisas já estavam encaminha-das, como este Seminário, que foi organizado pelo Silvio Da-Rin, pelo Adilson Ruiz e por outras pessoas da ABD. Fiz questão de man-

tê-lo porque nós temos que manter o que já está acontecendo e porque o Seminário está muito bem conduzido. Tanto a proposta como o assunto são muito pertinentes e importantes.

Até hoje, quando eu estou na Secretaria, uma das coisas que me impres-sionam é que muitas pessoas vêm para apresentar projetos e sempre fazem questão de deixar claro que não vão ganhar nada. Elas têm certo trauma de admitir que vão receber. Eu respondo “se você não vai ganhar nada, dê um jeito nisso, porque é importante as pessoas serem remuneradas, é importan-te a gente criar economias. Isso está nas linhas do Ministério”.

Nós temos de batalhar pelos projetos. Mesmo no caso daqueles que hoje não têm nenhuma perspectiva de sustentabilidade, que serão a fundo perdido, temos de começar a imaginar como poderiam ser financiados em um horizonte futuro, nem que seja em longo prazo. É preciso começar a pen-sar nisso e não só, necessariamente, em modelos tão óbvios. Temos mode-los muito mais complexos, mais inovadores. Inovar no modelo de negócios possibilita mudar esteticamente, pois você descobre novos públicos, outras formas de se comunicar com as pessoas, conhece pessoas que estão gostando de outros tipos de conteúdo e, então, consegue inovar também no resultado estético e na forma.

Gostaria que vocês refletissem ao ouvir as palestras, até porque esta-mos começando agora com esse assunto de comercialização e, muitas vezes, tenho a impressão de que ainda estamos numa lógica dos anos 1970, que antecede a ideia de marketing. Mas como era essa pré-ideia de marketing? Nós criávamos o produto e depois um cara genial inventava como vendê- -lo. Foi a era do “vendedor”. Hoje em dia todo mundo sabe que não é assim.

Abertura

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O marketing introduziu a ideia de que fazemos o produto a partir das neces-sidades do cliente. No caso da arte, essa relação não precisa ser de completa submissão aos desejos do público. Não é necessário que o artista “se venda” ao público. Até para fazer sucesso, é importante o artista se expressar autoral-mente, pois a grande função da arte é antecipar os desejos do público, crian-do obras que ele ainda não sabe que deseja. No entanto, mesmo na produção artística, é possível e desejável dialogar com as necessidades do público.

O cinema, em especial, é uma arte que agrega todas as outras artes e expressa a cultura e o imaginário de um povo. Um filme pode ser pensado em diálogo com ambientes culturais e movimentos artísticos que já fazem sucesso em outras áreas, agregando valor ao filme, sem que ele precise e deixar de ser autoral. É possível, por exemplo, fazer grupos de filmes que dialoguem com o tema futebol (já pensando no ambiente da Copa de 2014). Ou que dialoguem com estéticas musicais de sucesso, como o tecnobrega, o forró etc. Isso é um exemplo de como podemos pensar o filme a partir de conceitos de marketing, criando obras que sejam pensadas para atingir determinados públicos já sedimentados.

Muitos outros exemplos seriam possíveis. O importante é entendermos a ligação entre a “comercialização” e a criação artística. A distribuição de um filme começa na ideia inicial. Isso é debatido desde os anos 1970, e hoje, com o ambiente digital, chegamos à era do “Google marketing”, na qual o cliente/cidadão fica ainda mais poderoso. Antigamente, a gente ainda buscava as pessoas, mas agora são as pessoas que nos procuram. No ambiente digital, o cliente, ao invés de ser “atingido” pela propaganda, ao invés de ser um “alvo”, se torna um “seguidor” (como no Twitter e nas comunidades virtuais). Ou seja, o cliente escolhe o que quer receber. Fica ainda mais importante criar obras a partir dos hábitos culturais do público. Temos de aprender a debater a venda do produto já pensando em sua forma e em seu conteúdo.

Às vezes, caímos no erro de ficar fascinados demais com as chamadas “novas tecnologias” (que já têm uns 20 anos). Ficamos acreditando que a saída de tudo é o celular ou a internet, as “tecnologias digitais”. No entanto, apostar todas as fichas apenas nas tecnologias digitais é um típico raciocínio analógico. A grande característica do digital é a convergência de mídias. A tecnologia digital, que é uma cultura que contamina todas as mídias, inclusi-ve mídias físicas, mídias que a gente nem considerava digitais, coisas como livros, performances etc. Essas novas mídias podem, às vezes, fazer parte do plano de negócios. A cultura digital é mais ampla porque atua em multipla-taforma. Digo isso porque passei muito tempo pensando em coisas como “Qual é o modelo de negócios para o celular? Qual é o modelo de negócios

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para internet?”. Depois vi que eram perguntas falsas, que estavam erradas e nunca seriam respondidas.

O modelo de negócio não é separado por mídia. Esse é um raciocínio analógico. Está errado perguntar qual é o modelo de negócios para o celular, para a internet, para todas as mídias. O raciocínio digital é diferente, não funciona assim. Ele parte do conteúdo. O modelo de negócios é pensado para determinado conteúdo e ele é que determina qual mídia será usada para dar retorno financeiro. Um exemplo, a série [norte-americana] “Glee” vende músicas no iPhone porque é uma série musical. Então, necessaria-mente, não vende apenas a série, vende também a música. Outra série vende outra coisa. “Família Soprano”, por exemplo, virou uma marca mundial, um “clássico”, vendendo muitos DVDs e tendo uma longa vida útil. Cada conteú-do vende algo que não é necessariamente o próprio conteúdo. Nós pensamos sempre em vender o curta, mas, às vezes, são vendidos os itens agregados a ele. Ou, às vezes, ele pode ser usado como parte de um show, uma perfoman-ce, um evento que o transcende. Quer dizer, ou nós entendemos o raciocínio do digital ou ficamos nessas lógicas analógicas que separam tudo por mídia.

Tenho certeza de que todos os debates vão aflorar. Eu queria dar essas dicas para orientarmos os palestrantes nesse sentido, para que se consiga realmente descobrir formas novas de comercializar os nossos produtos e de atingir novos públicos. E lembrar que a questão da distribuição é maior do que a questão do comércio. Distribuir nossos conteúdos é parte da vontade que temos de nos comunicar. Porque, como já sacou o mestre americano Carnegie, o objetivo da vida é “fazer amigos e influenciar pessoas”. E é isso que estamos fazendo. Muito obrigado.

Newton CannitoSecretário do Audiovisual

do Ministério da Cultura

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São históricos os encontros da ABD neste que é um dos maiores festi-vais da América Latina, nas eleições das ABDs e, mesmo fora dos anos de eleição, nos encontros que fortalecem o conhecimento e que fazem

com que o Brasil se encontre aqui em São Paulo. Isso mostra que não somos um país segmentado, dividido por regiões. Até tivemos políticas perversas, mas o Brasil só é completo se todos os estados estiverem juntos, trabalhando por uma proposta comum.

Há cerca de oito anos, desde as gestões de Marcelo Laffitte, do Guigo Pádua e da minha – citando as diretorias pelas quais passei –, a ABD discute propostas para o curta. Sem falar de Leopoldo Nunes, um grande batalhador, que representou muito bem a ABD Nacional. E também não poderia deixar de citar o Silvio Da-Rin, que nos cutucou durante três anos seguidos para que fizéssemos este Seminário.

O encontro da Paraíba foi bastante propositivo. Tivemos presentes várias vertentes do audiovisual e também alguns diretores da ABD Nacio-nal, que inclusive estarão aqui coordenando mesas com projetos que a ABD desenvolve em várias partes do Brasil. É o caso da Aletéia Solonk, do Celso Gonçalves e do Carlos Dowling. A Paraíba nos mostrou um trabalho pioneiro com a Rede Nordeste do Audiovisual. Com a reunião das ABDs nordestinas, foi criado o Pontão de Cultura, um trabalho mais abrangente que dá maior visibilidade a esse produto. São casos que serão contados aqui ao longo des-tes três dias, em quatro mesas, e que nos levarão a refletir e sair com uma proposta mais completa do queremos para o curta.

Como o secretário Newton Cannito falou, essas plataformas podem ser janelas de comunicação de uma campanha forte da visibilidade do curta. Cada vez mais, o curta pontua como um produto que agrada por ser rápido, por passar mensagens concretas e dinâmicas, ideal para a juventude que vive com um iPod na mão.

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Disponibilizamos os sites da ABD Nacional, da Kinoforum , do Ministé-rio da Cultura – por meio da SAv –, além do Twitter para a imprensa e para as pessoas que querem participar ativamente dos debates a fim de chegamos ao último dia com uma proposta para o curta-metragem em todas as telas. Representantes da SAv, da Ancine, do próprio Ministério e de outros seg-mentos do Audiovisual estarão aqui para examinar conosco essa proposta no último dia.

Desejo um bom trabalho a todos, agradeço mais uma vez à Secreta-ria do Audiovisual pelo empenho e também à Programadora Brasil, que é uma parceira da ABD. Vamos aprofundar as discussões não só com as quatro mesas de debates da ABD, mas também com os Seminários dedicados ao tema. Vamos nos debruçar sobre uma proposta para o curta-metragem que consequentemente vai se desdobrar para uma proposta para o Audiovisual. Porque eu acho que o curta é exatamente a janela, é a porta de entrada para o nosso cinema e para o público.

Solange LimaPresidente da ABD Nacional

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Quero confessar a vocês minha excitação e também minha expectativa, motivadas pela grande quantidade de pessoas que confirmaram a pre-sença em São Paulo nestes dias. São 70 convidados, incluindo a nume-

rosa delegação da ABD, que vão compartilhar conosco suas experiências no campo da comercialização do curta-metragem, aqui na Cinemateca Brasileira.

Preciso reconhecer que há um certo atraso na realização deste Seminá-rio. Nesta última década, as políticas públicas para o audiovisual avançaram bastante, especialmente no campo do fomento. Somente na Secretaria do Audiovisual – e apenas nos 30 meses que vão de novembro de 2007 até abril de 2010 – foram realizados 30 editais. Um investimento de R$ 57 milhões, que resultou em mais de 500 obras. Novos editais continuam sendo lança-dos, o secretário do Audiovisual deve apresentar mais alguns ainda este mês, sem contar a grande quantidade de outros editais realizados por instituições federais, estaduais e municipais.

As facilidades trazidas pelos equipamentos digitais na grande capaci-dade espontânea de produção de curtas, a contribuição das escolas de cine-ma, as experiências populares em audiovisual, tudo isso nos levou à produ-ção de cerca de 700 títulos de curta-metragem anuais. Essa quantidade não comprometeu a qualidade técnica e artística do curta-metragem brasileiro, que continua sendo muito alta.

Também tivemos avanços significativos no campo da difusão: a reor-ganização do movimento cineclubista brasileiro nestes últimos sete ou oito anos, a criação da Programadora Brasil, que já disponibilizou mais de 700 títulos para cineclubes de todo o país, e também os Cines Mais Cultura, cujo acervo tem base inicial no catálogo da Programadora Brasil, em que 75% dos títulos são curtas-metragens.

Apesar disso, nem sempre a difusão proporciona rentabilização para os produtores das obras audiovisuais. Tanto no cineclubismo quanto nos Cines

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Mais Cultura, as exibições não são comerciais. Evidentemente, a Programa-dora Brasil remunera os curtas e também os médias e os longas, mas trata-se de uma remuneração ainda pequena. Na verdade, nós precisamos dar escala a essa remuneração se quisermos que um dia o curta-metragem brasileiro seja uma atividade sustentável.

De fundamental importância no campo da difusão e da circulação dos nossos filmes, muitos festivais ainda não remuneram os filmes de curta-metragem. O Fórum dos Festivais realiza um belíssimo trabalho há dez anos e está trabalhando para que esse quadro se reverta, para que as obras, que formam a base de qualquer evento cinematográfico, venham a ser objeto da sua justa remuneração.

Mas afirmo que o Seminário acontece com atraso porque faltou uma ênfase, um foco na comercialização, que é determinante para alcançarmos um nível mínimo de sustentabilidade em nossa atividade.

Tivemos um encontro preparatório em João Pessoa, ao qual compare-ceram mais de 30 empresas, instituições e grupos envolvidos na comerciali-zação do curta-metragem. Aquele encontro mostrou que existe uma grande quantidade de iniciativas em curso que colocam curtas em telas de cinema, na televisão aberta e por assinatura, em dispositivos móveis e na internet, de forma remunerada.

No entanto, essas experiências dialogavam pouco entre si, ainda não tinham uma articulação minimamente satisfatória. Acredito que o objetivo principal deste Seminário seja criar uma fricção, um contato, uma interação entre essas atividades, para que possamos induzir a formulação de modelos de negócio inovadores, criativos, dar finalmente uma escala à comercializa-ção do curta-metragem, para que o curta seja encarado como ativo comercial que precisa ser rentabilizado.

Não devemos correr o risco de nos dispersar. Já participei de dezenas, talvez centenas de reuniões com curtametragistas, ao longo das minhas qua-tro décadas de atividade na área de cinema. Como são muitas as questões que nos afligem, acho que deveríamos fazer um esforço, na linha do que dizia Tancredo Neves: “Não vamos nos dispersar”. Um esforço para, nes-se Seminário, realmente nos fixarmos nas questões que dizem respeito à comercialização.

Vejo aqui no auditório diversas gerações de abedistas. Eu e o Adilson Ruiz fomos presidentes de duas importantes seções regionais da ABD, Rio de Janeiro e São Paulo, entre 1983 e 1984, e novamente entre 1987 e 1988. Naquele momento, nós estávamos empenhados em recuperar um dispositi-vo que nos parecia absolutamente essencial de ser consolidado: a chamada

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“Lei do Curta”. Que não é propriamente uma lei, é o artigo de nº 13 da Lei que criou a Embrafilme em 9 de dezembro de 1975 — e lá se vão 35 anos desde que essa lei foi promulgada... Um artigo muito singelo, simples, curto, que diz o seguinte:

“Nos programas em que constar filme estrangeiro de longa-metragem, será estabelecida a inclusão de filme nacional de curta-metragem, de caracte-rística cultural, técnica, científica ou informativa, além da exibição do jornal cinematográfico, segundo normas a serem expedidas pelo órgão a ser criado na forma do artigo 2º”.

Esse órgão era o Concine, criado no ano seguinte e extinto pelo ex-presidente Fernando Collor de Mello em 1990, como foram extintos também a Fundação do Cinema Brasileiro e a Embrafilme — até a Lei Sarney, Collor achou por bem extinguir.

Nós, que vínhamos do malogro de uma primeira tentativa de funciona-mento de um sistema de distribuição, arrecadação e remuneração do curta-metragem, estávamos tentando consolidar uma segunda tentativa, um novo formato, um sistema com premiação à vista para os realizadores dos filmes selecionados por um júri. E lutávamos contra a resistência do exibidor em colocar nossos curtas nas telas — alguns pagavam, mas pouquíssimos exi-biam. E começamos a desenvolver ali — eu, Adilson e nossos companheiros da época – a campanha “Curta nas Telas”.

Naquele momento, nós tínhamos um presidente que dizia: “Eu prendo e arrebento”. João Batista Figueiredo mandava os projetos para o Congresso, que obedecia e aprovava. O Brasil mudou, o mundo mudou. Hoje, vivemos um novo marco legal no Estado de Direito, simbolicamente inaugurado com a promulgação da Constituição de 1988, que estabelece um conjunto de direi-tos e que tornou inteiramente inviável a criação de mercados compulsórios.

Acredito que nenhum de nós tem a expectativa e o interesse de que nossos filmes sejam impingidos goela abaixo do exibidor ou do público que comprou um ingresso para assistir a um filme em uma sala de cinema. Esta-mos na era da afirmação dos direitos do público. O Conselho Nacional de Cineclubes divulga e lidera essa campanha, a disseminação dessa consciên-cia, porque nós queremos que nossos filmes sejam exibidos para plateias que o desejem e que o aplaudam. Não temos a perspectiva de impor conteú-dos, impor nossas obras em espaços compulsórios, até porque não teríamos como regulamentar essa compulsoriedade com base em um dispositivo de 35 anos atrás.

Existe um conjunto pequeno de nostálgicos que desenvolve uma estra-nha militância, que consiste em exigir sistematicamente das autoridades a

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regulamentação da chamada “Lei do Curta”. Mas nenhum desses militan-tes propõe absolutamente nada que responda às quatro perguntas funda-mentais: “Que filmes teriam direito? Como seriam programados? Quem os distribuiria? E de onde viriam os recursos para remunerar os produtores, distribuidores e exibidores?”

Não têm projeto. E não conseguem reconhecer a característica defasada desse dispositivo. Nós precisamos ter coragem para enfrentar essa questão. Acredito que a comissão organizadora deste Seminário acertadamente não incluiu a “Lei do Curta” com um dos temas, exatamente porque estamos olhan-do para frente. Estamos entrando na segunda década do terceiro milênio e pre-cisamos desenvolver mecanismos, dispositivos, modelagens comerciais compa-tíveis com esse admirável mundo novo que nos proporciona o domínio digital.

Bem, eu dizia que vejo aqui uma diversidade de gerações de abedistas. Temos a Solange Lima, liderança da ABD Nacional, participante do processo preparatório deste evento, realizado conjuntamente com a Secretaria do Audio-visual, que traz o projeto “Curta em Todas as Telas”, inteiramente sintonizado com a perspectiva multiplataforma que Newton Cannito nos apresentou com tanta clareza. É o ambiente em que devemos colocar nossa criatividade e inte-ligência para formular novos modelos de negócio, que vão estimular também a inovação no campo da criação, no conteúdo e na forma das nossas obras.

Por fim, gostaria de mencionar também a produtora Zita Carvalhosa, nossa anfitriã, diretora do Festival Internacional de Curtas-Metragens de São Paulo, um festival que atinge este ano sua 21ª edição, em sua plena matu-ridade, em sua maioridade absoluta. É um evento plenamente afirmado no panorama dos festivais internacionais de curta-metragem. Basta ver a for-ma como este Seminário foi organizado, desde os materiais preparatórios à organização das mesas, para percebermos que não poderia acontecer em outro lugar a não ser aqui, neste Festival. Todo ano, é aqui que se reúnem os curtametragistas do Brasil e do mundo, os críticos, as escolas de cinema, as experiências populares em audiovisual, enfim, todos aqueles que têm pro-fundo interesse no curta-metragem e no desenvolvimento desse formato de expressão audiovisual.

Silvio Da-RinCineasta e Membro da Comissão de

Formulação do Seminário Curta & Mercado

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Palestras

Economia da CulturaAna Carla Fonsecaeconomista da cultura

e consultora em economia criativa

O Mercado de Curta-Metragem na FrançaAlain Rocca

produtor de cinema e autor de estudo sobre a economia do curta-metragem na França

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Quando comecei a trabalhar com economia da cultura, já se vão sete ou oito anos, esse tema gerava surpresa e, para alguns, até mal-estar. Não raro eu ouvia: “lá vêm os neoliberais conspurcar a nobre arte, lá

vem o capital tomar conta da cultura”. A economia da cultura nasceu no seio da cultura (e não no da econo-

mia), graças à inquietação de algumas fundações de Nova York, que perce-biam que, por maior que fosse o orçamento dedicado ao campo cultural, especialmente na região da Broadway, alguns teatros não tinham condições de cumprir suas obrigações devido a grandes dificuldades financeiras. E a dúvida dessas fundações era onde estava o problema, se a questão era de má gestão, de falta de capacidade de organização etc..

Isso foi ainda na década de 1960. E então foram contratados dois econo-mistas muito gabaritados, J. Baumol e W. Bowen, para desenvolver um estudo sobre isso e entender as peculiaridades do campo cultural. Uma das explica-ções para essa questão era que justamente quando se trabalha com cultura, em muitos setores, o ganho de tecnologia não é o mesmo que se tem no resto da economia. Explico: para realizarmos um concerto, precisamos do mesmo número de músicos; para produzir uma peça de teatro, do mesmo número de atores, independentemente de termos um aporte tecnológico no resto da economia, como ocorre do setor automobilístico, por exemplo.

Essa discussão chegou ao Brasil agora, no início da década passada. E isso traz uma grande preocupação para nós — que é a de correr atrás do pre-juízo —, e uma grande possibilidade — de aprender com as cabeçadas dos outros e tomar um caminho mais adiantado nesses debates. O que eu trago aqui é um pano de fundo para as discussões que vocês terão ao longo desses próximos dois dias e meio, para entender um pouco em que momento da eco-nomia nós estamos e a ótica da economia da cultura, especificamente, dando foco a um termo que começou a permear todas as discussões: a criatividade.

Economia da CulturaAna Carla Fonseca

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Começamos a ver uma profusão de termos ligados a “criatividade”. Indústrias criativas, economia criativa, cidade criativa, classe criativa e a gente se pergunta: “Se criatividade sempre foi importante desde que o mundo é mundo, o homem descobriu o fogo, enfim, inventou a roda, por que surge com tanta força hoje em uma coisa que parece ser tão árdua como a economia?”.

Será que a economia criativa soa paradoxal, como a economia da cul-tura? Quero trazer então esse recorte da criatividade, como isso abre outros olhares sobre a questão econômica e as oportunidades para o audiovisual, especialmente para os curtas-metragens. Vou diferenciar um pouco os ter-mos indústrias criativas, economia criativa, chegando também ao exemplo prático de clusters criativos, que é outra denominação que encontramos. Só que para entender o presente e poder pensar no futuro, temos de dar um passinho atrás e fazer um breve resgate histórico.

Comecemos com uma passagem histórica de meados do século XIX. A Inglaterra era o centro do mundo durante a Revolução Industrial, ainda em condições trabalhistas inexistentes e de higiene precaríssimas, como em todo filme à la Tempos Modernos que assistimos. Nesses cenários de condi-ções tão combalidas social, econômica e culturalmente, a pessoa era desvin-culada de sua alma e passava a valer pelo que fazia e não pelo que pensava. Destituída da alma do poder da criação, só valia pelo poder da execução. E, na época, execução era apertar o botão.

Nesse cenário existia um questionador de grande estatura. Imaginem, estamos diante de uma pessoa que falava para quem viria a ser o chefe do país que era o dono do mundo naquele momento. E das aulas de John Ruskin nos chegou Economia Política da Arte. É uma compilação de vários discursos que ele fez na universidade, um livro delicioso de ler, recomendo candidamente. Ele dizia o seguinte:

“Para homens cercados pelas circunstâncias deprimentes e monótonas da vida manufatureira inglesa, o design simplesmente não é possível, podem ter certeza disso.”

E o que ele chama aqui de design? A inovação, o criar, o pensar diferen-te, o se permitir trazer algo novo. O operário moderno, naquela época, era inteligente e engenhoso ao mais elevado grau. O que significava ser inteli-gente e engenhoso naquele momento? Para apertar botão, era necessário ser sutil no toque e preciso no olhar.

“Mas, de modo geral, falta-lhe inteiramente o poder do design”, conti-nua Ruskin, pois não consegue criar nada novo. “Sem observação e expe-riência não há design”. Essa pessoa mora na fábrica, praticamente dorme na fábrica, às vezes em cima do balcão mesmo. Não respira nada diferente.

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Como vai criar algo diferente? Algumas pessoas começavam a ficar inquie-tas com isso, a grande maioria não. As que achavam que não, diziam: “Ora, o operário está lá para apertar botão, o que estamos perdendo? Não estamos perdendo nada”. E Ruskin alertava que, diante disso, dali a dois minutos um país do lado de cá do oceano, emancipado há um tempo, estava investindo no talento dessas pessoas que na Inglaterra eram negligenciadas.

Dito e feito. Na virada do século, os Estados Unidos já se firmavam como contraponto econômico à Europa, aproveitando talentos criativos. Isso é muito emblemático quando se analisa o acordo pós-guerra firmado em 1946 entre a França e os EUA, alguns meses após o término da Segunda Guerra Mundial, portanto. Toda vez que temos um grande conflito bélico, algum país vira banco. Durante a Primeira Guerra Mundial, foi a Inglaterra, e, durante a Segunda, foram os Estados Unidos, que também estavam envol-vidos na Guerra, mas do outro lado do oceano. Os Estados Unidos empresta-ram dinheiro para vários países, inclusive para a França.

O acordo de Blum-Byrns gerou uma série de impactos e discussões na França. Na proposta, os EUA concediam anistia de metade da dívida, mais uma ajuda financeira pagável ao longo de 35 anos. Imagine o que são 35 anos para uma pessoa que está saindo da guerra, que nem sabia se na hora seguinte estaria viva. E ainda havia um novo empréstimo bancário, com a condição de que a França abrisse as salas de cinema de seu país para que os EUA decidissem o que seria veiculado neles, durante três semanas por mês. Então, nesse momento, a França perdeu o poder de controlar sua distribui-ção. Os EUA já tinham percebido há muito tempo que isso era fundamental para conseguir escoar seus produtos, fazendo esse esquema de “para que

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vou vender o pão da padaria do vizinho? Eu vou produzir o meu pãozinho e vender na minha padaria”. Essa lógica foi muito discutida, simplificando o acordo que depois foi revisto e abrandado, mas esse tipo de lógica foi o que levou ao fato de termos hoje mais de 80% das salas de cinemas do mundo nas mãos de grandes conglomerados, segundo dados da ONU.

Quando observamos essas questões, vemos que criatividade sempre foi importante, mas não podemos dizer que essa noção de cadeia entre produ-ção, distribuição e demanda também o tenha sido. Focamos muito na pro-dução, pensamos menos na distribuição e esse fluxo não se autoalimenta se não houver demanda. E se não houver distribuição, não adianta ter produ-ção. Nem sempre foi muito claro para nós, até porque essas discussões são de fato muito novas, especialmente no Brasil.

Primeiro, temos a desindustrialização de parte da economia. Fala-se muito da sociedade pós-industrial, que é fato em muitos países ou em re giões de vários países. No Brasil também vemos o abandono de nosso patrimônio industrial nas grandes cidades. Não que a economia global inteira tenha vira-do pós-industrial. Há países que estão começando a se industrializar agora, mas os blocos mais pujantes preferem partir para serviços e valor agregado de setores industriais do que para a industrialização básica.

Isso faz com que se tenha uma mudança na lógica de agregação de valor. Antes havia uma cadeia muito definida, industrial, e o valor ia sendo agregado a cada etapa de produção do produto, do bem. Agora temos de pensar de uma forma diferente, buscar outras formas de agregar valores ao que é reproduzido. Em paralelo, temos uma padronização de bens e serviços. Basta pensar em telefonia celular: é possível pular de uma operadora para a outra com uma facilidade exuberante. Por quê? Porque parece que estão oferecendo exatamente a mesma coisa. O mesmo ocorre com produtos: qual é a grande diferença entre um detergente em pó A e um B, fora o perfume e a cor? Então, essa padronização de bens e serviços dos tais atributos fun-cionais faz com que a gente, como ser humano, se volte para os atributos emocionais, para os intangíveis, para aquilo que de fato agrega alguma coisa ao que se parecia tão padronizado.

Damos grande importância a tudo que diz respeito ao intangível cul-tural. Podemos usar isso para o bem ou para o mal, dependendo de quem for. A intensificação dos fluxos financeiros também é superimportante, pois diz respeito a todos nós que, de alguma forma, somos empreendedores ou agentes econômicos. Por quê? Vocês viram o que aconteceu agora na crise, com a Grécia? A Grécia teve um problema, os investidores do mundo tiraram recursos da Bolsa do Brasil e colocaram na Bolsa dos EUA, que, aliás, estava

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no epicentro da história, apesar de o Brasil ter fundamentos sólidos. É uma loucura a velocidade do trânsito internacional financeiro.

Na lógica que estamos seguindo ao longo do último século e meio, tudo que dizia respeito à economia tendia a três grandes fatores de diferenciação: capital — se eu tenho ou não dinheiro; tecnologia — se eu tenho ou não tec-nologia; e mão de obra. E o que é que se percebe agora? Se capital é transferi-do de uma forma tão rápida; tecnologia também, até fisicamente, porque eu tiro uma fábrica daqui e ponho uma fábrica lá... Bem, se esses dois grandes fatores de diferenciação da economia — capital e tecnologia — estão mais móveis do que já foram, o que realmente diferencia a capacidade de compe-tição da minha economia são as pessoas e sua criatividade. Então, voltamos essa lógica para exatamente o que vocês fazem aqui, que é conseguir criar alguma coisa que seja diferente do resto, de outros bens e serviços, que tenha um valor intrínseco, e, sim, intangível, que é tão complicado de valorar, de precificar, com o propósito de aumentar a competitividade do país ou de uma cidade, porque essa sim é a tal da classe criativa que existe em todos os setores da economia.

Hoje, essa discussão está na “crista da onda” do que temos discutido como economia criativa. E a globalização e as tecnologias digitais só fazem aumentar essa rapidez de circulação das questões. Se criatividade sempre foi importante, a diferença hoje é que ela é reconhecida como recurso econômico. Deixa de ser a coisa bacaninha, bonitinha, cool, e passa a ser aquilo que de fato consegue diferenciar uma economia da outra. E como começou essa história?

A primeira menção a esses novos termos ligados à criatividade surgiu na Austrália, em 1994, em um discurso do Primeiro-Ministro Paul Keating. Sem-pre é bom entender o contexto. Em 1994, estávamos no ápice das discussões da globalização. E muita gente dizia: “Puxa, lá vem a globalização, com sua pata de elefante. As culturas locais vão desaparecer, porque haverá uma enxur-rada de valores de fora, especialmente diante da expansão das novas mídias”.

Esse quadro todo gerava uma série de constrangimentos, de preocupa-ções e de oportunidades, e é exatamente isso que Keating diz neste pequeno trecho de seu discurso:

“A evolução das tecnologias de informação e a onda de cultura de mas-sa global podem pôr em risco nossa identidade e as oportunidades que as gerações terão de crescimento intelectual e artístico de autoexpressão”.

A que remete falar de gerações futuras? Essa é a tônica de qual con-ceito? Que conceito está ligado a isso? Eu não posso consumir hoje o que amanhã poderá faltar às gerações futuras. Palpites? O que é que é isso: se eu acabar hoje, amanhã não terá?

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Isso, sustentabilidade. O que é sustentável, segundo o Relatório Brundtland?1 É aquilo que

não priva as gerações futuras de acesso. O consumo de hoje não pode fazer com que os outros não venham a ter acesso, e aplicamos isso a qualquer coi-sa, ao planeta, aos negócios, às atitudes. Essa discussão veio à tona no discur-so do Keating. Mesmo momento histórico. “Podemos, porém, transformar o poder notável dessa nova tecnologia” – aqui o outro lado da moeda – “em um propósito cultural criativo e democrático, que pode nos informar e enrique-cer. Pode gerar novos campos de oportunidade criativa”.

Então, das duas, uma: ou fingimos que não está acontecendo nada e perdemos o trem da história ou aproveitamos que o trem vai passar e nos preparamos para subir a bordo. E agora já podemos começar a pensar um pouco, fazer uma transposição do que acontece no mercado de curtas. Será que estamos vendo que o trem vai se aproximar? Vemos que ele está pas-sando ou que ele já passou e estamos correndo atrás? O que significa esse mercado de curtas? Estamos pensando em produção, distribuição e deman-da? Temos noção de onde estão os gargalos, esses estrangulamentos, aquilo que falta para que os projetos se concretizem? Temos formas múltiplas de financiamento? Temos acesso a crédito? Temos capacitação suficiente? Por-que não é só o processo de criação e produção, é todo um fluxo... Em que momento desse mercado estamos?

1 O Relatório Brundtland, intitulado “Nosso futuro comum”, de 1987, foi o primeiro documento internacional a abordar a questão da sustentabilidade.

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Quem se apropriou de fato desse conceito de criatividade ligado à economia foi Tony Blair, em 1997, lembram-se? Em 1997, Blair foi eleito primeiro-ministro da Inglaterra, o ministro mais bacana, mais bonito, mais simpático, mais tudo, e ele transmitiu o seguinte pensamento: “A gente pre-cisa mudar a trilha desse país”. Por quê? Porque a Inglaterra é um paradigma dessa lógica de pós-industrial. Apesar de continuar muito forte em vários setores — farmacêutico, tecnologia de ponta e afins — e de ter sido berço da Revolução Industrial, a Inglaterra precisava ganhar competitividade. E a lógica de Tony Blair era mudar. Para perceber para que lado levar a economia britânica, ele organizou uma força-tarefa representada por todos os órgãos públicos e mais uma série conselheiros privados.

E isso revela que não adianta fazer uma política de economia de desen-volvimento, se não reunirmos diferentes pastas para conversar. Não adianta falar do mercado de curtas só com o pessoal da pasta de Cultura. Precisa também ter Ciência e Tecnologia, e, mais ainda no setor de Cinema do que em outros, precisa ter Educação, Relações Internacionais, porque existe um mercado enorme a ser desbravado. Então não é questão de considerar uma pasta especificamente; o diálogo precisa ser feito entre as várias pastas. Ao mesmo tempo, é preciso haver um diálogo muito íntimo com o setor priva-do, que não é o setor do patrocínio, é o setor do investimento, que entende o cinema como negócio. Se estamos falando de economia, precisamos enten-der como mercado mesmo.

E quem participava das várias reuniões dessa força-tarefa na Inglater-ra? Grandes nomes como Richard Branson, da Virgin Records; Eric Salama da WPP; Paul Smith2... Nessa chave entre público e privado, definiram os setores de maior potencial competitivo na Inglaterra, designados de “indús-trias criativas”.

Indústrias, em economia, são setores. Por isso, quando se fala de indús-tria financeira, não é necessariamente uma indústria física, mas um setor. Eles perceberam que todos esses setores em conjunto tinham uma série de caracte-rísticas comuns, tinham essa capacidade de agregação de valor ao que parece tão padronizado, tinham um valor intangível maravilhoso e um diferencial que só podia ser gerado por gente dentro desses três grandes fatores de diferencia-ção de uma economia. Tinham uma capacidade de gerar diretos de propriedade intelectual, daí toda a discussão internacional, não só no Brasil, em cima disso.

2 A palestrante se refere à gravadora Virgin Records, à agência de publicidade WPP e ao proprietário de uma grande grife de roupas inglesa.

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Isso passou a ser o carro-chefe da economia e não uma coisa acessória, não é uma regulamentação. As prioridades das discussões mudaram e todos esses setores foram considerados os mais relevantes como potencial compe-titivo de alguns países, como o Reino Unido, especialmente nesse momento, e vários outros países seguiram essa pauta depois. Porque, de novo, se o grande fator competitivo de uma economia são as pessoas, a criatividade não é transferível. É nisso que se deve investir, porque não é possível deslo-car milhões de pessoas de um país para o outro, dentro dessa ótica. Por isso a fuga de cérebros e talentos sempre foi uma oportunidade. Reforçar a eco-nomia criativa é refrear a tendência de saída desses talentos. E começamos a derivar esse conceito de criatividade para várias outras questões. Das indús-trias criativas passamos para economia criativa e depois passamos para uma discussão que é interessante e pertinente no que vocês têm para discutir: os clusters criativos. Vamos ver rapidamente cada um deles.

Falar de indústrias criativas exige análises setoriais. Então, para citar o mercado de curtas, estamos falando de um pedaço de uma indústria criativa, a do audiovisual. No Brasil, temos uma carência absurda de dados, indicado-res, o que leva à “equação Tostines de ser”: se não há dado, não é importante; se não é importante, não meço; se não meço, não vejo se é importante, e aí continuo achando que não é importante. A gente entra na lógica de achar que cultura é despesa e não investimento. E não percebe que a cultura pode gerar mais dinheiro do que “consome”, já que também produz e agrega valor.

Quando se faz uma análise setorial dos números da cultura (e esse é um dos poucos levantamentos que temos no Brasil, fruto de um convênio entre o MinC e o IBGE), há uma visão setorial sistêmica. E, não é para menos, quando analisamos os vários dados ligados ao audiovisual aqui, especifica-mente ao cinema, percebemos a posição dos estados no Brasil frente à exis-tência de cursos de graduação, grupos artísticos de cineclube, ao número de municípios que realizaram festivais, à presença de cinema, enfim, os vários momentos desse mercado, e não por acaso o Rio de Janeiro consegue estar em todos eles e outros estados mudam de posição conforme a tabela.

Se não houver uma visão sistêmica desse mercado, não conseguiremos avançá-lo. Não adianta ter pessoas gabaritadíssimas em curtas se não houver gente para dar uma capacitação que aumente esse mercado e leve a indústria adiante. Ou seja: pensar em criação, produção, distribuição e demanda dessa forma sistêmica é absolutamente fundamental. Eu adoraria que vocês me contassem justamente quais são os grandes problemas existentes nesse mer-cado. É importante investigar o que surgir das discussões que vocês terão nos próximos dias.

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É como se fosse um sistema de vasos comunicantes. Se um deles está rasinho, a água flui para ele e não conseguimos andar como indústria, como setor econômico. Daí, o que temos é a situação de televisão, que é sempre muito curiosa, porque é “o” equipamento cultural que existe no Brasil, mas que tem uma entrada e uma participação muito pequena de produtos dife-renciados. O mercado de curtas é um exemplo disso. Este gráfico mostra a distribuição que existe entre conteúdo, em número de horas, categorizado em educação, entretenimento, informação, publicidade, religiosos... Temos 16% das horas de TV de informação. Se a gente tem mais programação reli-giosa, especial e de eventos do que informação, isso já diz muito.

De que capacitação estamos falando? Da capacidade de pensar. No fim, temos uma tautologia entre distribuição e demanda, ou seja, a distribuição é tão absolutamente estrangulada que a gente treina o mercado naquilo que

ele deve pedir. Acho que isso vai exatamente contra a lógica dos curtas, que estão aí para se enveredar por novos caminhos, por experimentações, por coisas diferentes, novos olhares em outras velocidades. Uma economista fã de curta é muito atrevimento, mas, enfim, isso é um pouco da percepção que temos de fora, que é fascinante no mercado de vocês.

Mas a mensagem que precisa ficar é: uma indústria só é possível a par-tir do conhecimento claro e contínuo do comportamento do seu mercado. E não dá para pensar só em criação e produção. Um país que vem fazendo isso muito bem é a Índia. Não sei se vocês conhecem www.worldmapper.org, mas quem quiser copiar o endereço é uma diversão, porque ele sempre apresenta para as variáveis mais diferentes, a proporção do que existe em relação à variável por distribuição de país.

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Explico: vamos supor a relação entre distribuição audiovisual e idas ao cinema. Qual é a média de idas ao cinema no mundo? X. Se as pessoas vão em média mais do que X vezes ao cinema, o país fica redonducho na foto. Se vão menos vezes do que a média, o país fica anêmico. No caso da Índia, com toda a produção audiovisual que existe lá, o que acontece? Fica esse ama-relão na tela, com a Índia crescendo enormemente de tamanho. Na Índia, o cinema é uma questão de modo de vida. Há estimativas de que 1% da população (de um país de 1,3 bilhão de pessoas) vai ao cinema todos os dias. É muita gente, mas olhem só os números também que o mercado gera: mil produções por ano, 21 línguas faladas nos filmes, orçamentos megaelásticos, de US$500 mil a US$10 milhões, gerando 10 milhões de empregos. Vemos aí toda uma percepção inclusive do potencial de diferenciação desse mercado, que é custo-efetivo. Porque tem um alto volume de ingressos de faturamento no final e um baixo custo de exibição.

A Índia conseguiu encontrar seu posicionamento em um mercado alta-mente competitivo, para a gente desmistificar essa história de “Ah, mas não tem como ir contra o poder dos grandes estúdios...” Qual será o nosso posi-cionamento no mercado de curtas? O que podemos fazer melhor do que ninguém, jogando com os recursos que temos nessa análise sistêmica entre criação, produção, distribuição e demanda? Para vocês verem que a gente não está aqui falando de pouco dinheiro, esse é um levantamento que foi feito pela ONU chamado Creative Economy Reporting 2008 (Relatório de Economia Criativa 2008), disponível inclusive para download gratuito, que

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mostra a participação do PIB e das gerações de empregos de vários países desse conjunto de indústrias criativas. Tive o prazer de participar de sua realização, como a consultora para a América Latina. Bem, para vocês terem uma ideia, nos EUA, 11% do PIB vem de indústrias criativas, algo como US$1,25 trilhão.

Sob essa lógica, a cultura passa a ser investimento e não despesa. Ago-ra, para saber se é importante ou não, é preciso ter esses indicadores. Só que quando se fala de economia criativa, a coisa fica muito mais apetitosa, por-que percebemos que a cultura e esses setores vistos como indústrias criati-vas não são só importantes em si, mas agregam valor a vários outros setores que não tem nada de cultural. Passo aqui a um exemplo numérico da moda sobre têxtil e confecções e sobre o algodão. São dados levantados pela São Paulo Fashion Week, junto ao Banco Central, dando conta de que um quilo de algodão exportado gera US$1, um quilo de têxtil e confecção gera US$20 e um quilo de moda, entre US$70 e US$80.

A surpresa está não só no pulo dos números, mas em uma série de ques-tões ligadas à competitividade do país, e é aí que eu falo que a incorporação da criatividade é a economia. Quando vamos brigar no mundo pela venda do algodão, é complicado bater o Egito, que tem o fio penteado XPTO, um algodão maravilhoso. Então, nosso nível de competitividade é X, e quando a confecção é feita em um parque têxtil próximo à produção de algodão, há a vantagem de usar o algodão que temos em casa. Não que todo o algodão vá ser consumido aqui, estamos inseridos em um mercado internacional, mas já se parte de uma vantagem, nem que seja de custo menor de transportes e sem alíquotas de exportação.

Pode-se comprar uma camiseta branca aqui ou na China, sem grandes elaborações. Quando se fala de moda, porém, não existe só uma agregação no setor. O setor têxtil de confecções passa a ser mais competitivo e o algodão ajuda a movimentar as indústrias de fertilizante, de trator etc. Vemos como a cultura é economicamente generosa, a ponto de não só contribuir como con-junto de setor, mas no impacto dos setores que não tem nada de culturais.

E como os dados de fato no Brasil são raros, a FIRJAN, Federação das Indústrias do Estado do Rio, fez um estudo muito bacana, considerando dados da RAIS de 2006. Está para download gratuito com o nome “Cadeia da Indústria Criativa no Brasil”. Esse estudo define como indústrias criativas centrais artes visuais, música, filme e vídeo, arquitetura, design e todas estas que vocês veem elencadas. Porém, o impacto dessas indústrias não pode ser medido apenas por seu faturamento, geração de emprego, arrecadação tributária, exportações etc.

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Por exemplo, falando de curtas e de audiovisual... São indústrias que demandam equipamentos de informática, que não são culturais, mas sem eles seria improvável produzir, porque não raro preciso utilizar esses equi-pamentos. As várias tecnologias acabam entrando aqui. A máquina em si não é cultura, mas sem ela não vou conseguir produzir o que quero, e isso, por sua vez, puxa outros setores: turismo, escritórios de advocacia, quem trabalha com contrato no mercado de curta... A gente precisa de um contrato comercial, aquele advogado está sendo pago por vocês, então o setor jurídi-co está se beneficiando economicamente de um setor cultural, o de curtas. Parece um setor tão pequeno, mas quando a gente percebe o impacto sobre a economia, vemos que é muito maior do que se pode imaginar à primeira vista. E então não se fala mais dos setores, mas da economia como um todo.

E esses conjuntos de indústrias criativas, segundo o estudo da FIRJAN, com quanto contribui para o PIB do Brasil? Só os setores em si contribuem com 2,59% do PIB, o que não é pouca coisa. As atividades relacionadas, aquelas na coluna do meio – os equipamentos, tecnologias, aquilo que uti-lizamos para produzir inclusive os curtas, responde por 5,37% do PIB; e aquele terceiro conjunto, que inclui os escritórios de advocacia, os festivais e afins, 8,39%; somando-se tudo chegamos a 16,35% do PIB do Brasil vindo desse conjunto de setores, ou seja, do impacto de fato não só das indústrias criativas, mas das indústrias criativas na economia.

E por que isso é fantástico? Porque quando se tem esse tipo de núme-ros, podemos ter outro nível de discussão orçamentária. “Isto é o que este setor gera. E tanto é o que se requer de orçamento, se quisermos ter mais retorno.” Será que estamos investindo nas coisas certas? Mas, sem números, sem levantamentos, fica muito difícil. Os levantamentos são importantís-

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simos nos vários setores, inclusive para entender quanto se pode negociar de verbas públicas, verbas privadas. Com números é possível chegar a um banco e dizer: “Olha, você acha que 11% do PIB dos Estados Unidos se sus-tentam sem um sistema atento a esses setores?”. E também dá para localizar essas discussões quando a gente fala dos clusters criativos, e aqui, pela brevi-dade do tempo, eu trouxe só um exemplo, o de Toronto.

Toronto criou um cluster criativo investindo também no que eles entenderam ser o fator de diferenciação, ou seja, talentos, gente, incentivos fiscais para que as pessoas produzissem nos estúdios de Toronto, e tecnolo-gia de ponta para fazer o que existe de mais avançado. Esse posicionamento do cluster audiovisual de Toronto, essa singularidade, é o que o diferencia dos outros. O objetivo de transformar a cidade em um grande estúdio se dava em duas frentes: na valorização internacional – mostrar que a cidade era bacana, inclusive porque isso gera turismo; e no impacto econômico, que vimos há pouco.

Fizeram um investimento em uma série de estúdios, no que havia de mais moderno, gerando cerca de 25 mil postos de trabalho e uma contri-buição de 1,1 bilhão de dólares canadenses por ano para a economia local, valendo-se também de uma série de incentivos tributários. Vejam que são incentivos que geram resultados e não na lógica do incentivo pelo incentivo. E quanto isso está gerando de retorno? Essa conta é superimportante, até para que se possa pleitear mais investimentos, porque daí deixa de ser visto como despesa e passa a ser investimento. Em 2004, foram 4.302 licenças e 7.700 dias de filmagem.

Para finalizar, se pudermos pensar em alguns caminhos de reflexão, tenho alguns atrevimentos. Talvez vocês tenham respostas para algumas, talvez não tenham para outras, dentre as que soarem relevantes. Mas a título de brainstorming, vejamos: se os números mostram que a cultura pode ser investimento e não despesa, primeiro precisamos entender onde estão esses números e como eles estão na produção, como estão na demanda, como se dá esse fluxo entre produção, distribuição e demanda para os filmes.

Será que não estamos muito na lógica de edital para produção e exibi-ção para os festivais? Alguém tem uma ideia de como está a demanda? As pessoas que não trabalham no setor estão começando a se interessar, nota-se mudanças de hábito? Vão mais a festivais? E quem são essas pessoas? Como pode haver uma demanda que chame produção, em vez de produzir e exibir? Em que momento será que a gente está nisso? Eu não sei. Enten-der a cadeia econômica completa, aqueles três blocos, é fundamental para entender onde estão os problemas do caminho. Falta tecnologia? Falta um

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escritório de advocacia que saiba lidar com contrato? Falta capacitação? O que será que falta? Porque se a gente de novo mexer nos vasos comunicantes e não pegar os vasinhos mais vazios, continuará passando água do mais alto para o mais baixo.

Envolver o setor privado, de novo, é superimportante. Alguns bancos estão no primeiro momento de discussão de investimento, em especial em audiovisual e música. Talvez a gente esteja com a faca e o queijo na mão e eu não estou falando de edital, não estou falando de microcrédito, estou falando, de fato, de investimento. Se o sistema financeiro tiver interesse em um setor que gera tanto dinheiro, talvez, por parte de vocês também, valesse um movi-mento de aproximação com algum banco que já tenha sinalizado interesse em investir em novos setores. Vocês como um conjunto, vocês como classe, vocês como indústria e não individualmente.

Esse diálogo talvez seja oportuno. Nos últimos dois meses, quem não recebeu uma proposta de banco concorrente ao seu, oferecendo exatamente a mesma coisa? Eles estão procurando formas de investir em coisas que ren-dam dinheiro e que os outros não estejam explorando, então essa vantagem competitiva, de ser o primeiro a se enveredar por outro setor, talvez seja bacana e eventualmente caberia um diálogo. E outra questão é: será que a gente está conseguindo ter um diálogo suficientemente amplo com outros setores culturais no mercado de curtas? Com música para fazer videoclipe, com o setor de artes de espetáculo para fazer uma instalação com uma peça diferente... Esses diálogos entre os setores são cruciais, porque a nossa lógi-ca industrial colocou tudo em caixinhas e agora as coisas estão muito mais fluidas. Talvez vocês já estejam fazendo isso aos borbotões, mas acho que é uma questão para considerarmos com muito cuidado e carinho, entre outras várias questões que eventualmente venham a surgir nos próximos dias.

(Os estudos citados pela palestrante podem ser encontrados no site da Garimpo Soluções www.garimpodesoluçoes.com.br, entre outras bibliografias sobre o assunto).

Ana Carla Fonseca Graduada em Administração Pública pela FGV e Economia pela USP, é mestre em

Administração e doutoranda em Urbanismo pela USP. Pela Garimpo de Soluções – Economia,

Cultura & Desenvolvimento atua como consultora e assessora em economia criativa e cidades

criativas. É conferencista em cinco línguas e autora de diversos livros, com destaque para

Economia da Cultura e Desenvolvimento Sustentável – Prêmio Jabuti 2007.

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A evolução acelerada das tecnologias digitais, a procura crescente por imagens de todos os tipos para as milhares de telas que os habi-tantes do planeta observam, a facilidade cada vez maior com que

podem ser geradas imagens audiovisuais de todos os tipos e principalmente em formatos curtos, a importância simbólica constante ocupada pelo cine-ma na galáxia de conteúdos audiovisuais, tudo isso alimenta uma questão que volta regularmente aos debates sobre o curta-metragem:

Existe um mercado para o curta-metragem? Essa questão é, no entanto, extremamente ampla.

Quem muito abraça pouco aperta, diz um provérbio francês, algo como “quem tudo quer, tudo perde”. E, efetivamente, seria possível considerar que a questão do mercado se coloca da mesma maneira para um clipe musical, um spot publicitário, um episódio de 13 minutos de uma série de TV, um vídeo experimental, o vídeo que meu sobrinho acabou de postar no YouTube ou o curta-metragem que ganhou a Palma de Ouro em Cannes?

Do meu ponto de vista, a resposta é claramente não.E, por isso, eu limitaria minha intervenção ao que chamamos na França,

sob um termo um tanto administrativo, de “criação cinematográfica de curta-metragem”. Isso significa uma obra audiovisual original, de duração inferior a 60 minutos, destinada por seu ou seus autores a ser apresentada ao público, ini-cialmente em salas de cinema, depois igualmente em todas as outras telas que apresentam obras cinematográficas – televisores, computadores, terminais etc.

1. A comercialização de curtas-metragens, um caso particular na pro-blemática geral da colocação no mercado de formatos audiovisuais de curta duração

1.1. Vamos observar um primeiro conjunto de obras audiovisuais, os múltiplos formatos curtos que são patrocinados com o objetivo de uma

O Mercado de Curta-Metragem na FrançaAlain Rocca

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distribuição prioritária junto a este ou aquele público: clipes, spots publici-tários, coberturas, filmes de desenvolvimento de marcas, séries de televisão de programas curtos…

A questão do mercado é simplesmente muito diferente para eles, já que sua existência depende essencialmente da decisão ou não de uma empresa comercial (canal de televisão, marca comercial, selo musical, rede de telefonia móvel) de determinar a produção dessas obras audio-visuais.

São objetos de mercado, sem dúvida. O que não impede, evidentemen-te, nem a criatividade, nem a inovação, nem a beleza. Mas esses formatos audiovisuais de curta duração não são produtos que têm como prioridade dar a possibilidade ao autor de se expressar com toda liberdade que os meios do cinema oferecem.

É justamente essa absoluta liberdade de expressão que caracteriza, em primeiro lugar, o que temos chamado da mais alta criação cinematográfi-ca de curta-metragem. E isso é o que rende não melhores ou piores obras audiovisuais de formatos curtos “patrocinados”, mas que dá uma primeira especificidade à produção de curta-metragem.

1.2. O segundo conjunto de produtos audiovisuais que igualmente des-tacaremos é constituído do conjunto de formatos curtos que são produzidos com uma ausência total de encomenda, mas que não se impõem nenhuma das exigências técnicas e editoriais que o objetivo de apresentar o filme ao público em uma sala implicam.

Aqui, novamente, nenhum julgamento de valor. A rede mundial é hoje repleta de incontáveis conteúdos audiovisuais de curta duração cujos auto-res nunca alegaram que devam primeiro ser descobertos pelo público de uma sala de cinema. Esses conteúdos são produzidos com o objetivo princi-pal de uma difusão pela internet.

Essa escolha, ao evitar as exigências das inúmeras pressões que a pro-dução destinada à projeção nos cinemas impõe (e os objetivos derivados, como a apresentação ao público em outras redes de distribuição dos filmes de cinema), permite a realização a custos extremamente baixos. A questão do mercado para essas produções se coloca, de fato, de maneira radicalmente diferente, tendo em conta os custos de produção mínimos e o baixo nível de exigência quanto aos sistemas de distribuição.

A segunda característica do curta-metragem é, então, a alta exigência em matéria de sistema de apresentação do filme ao público. Todos que um dia tiveram de suportar a ira de um diretor descontente das condições nas quais seu filme era projetado vão entender o que digo. E é verdade

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que uma grande parte das pressões, tanto técnicas quanto dramáticas, da produção do curta-metragem é consequência dessa exigência de projeção em cinemas.

Essa alta exigência encontra sua consequência na existência de uma rede “gerencial” de apresentação de filmes ao público, que é constituída do conjunto de festivais de curta-metragem existente no mundo.

1.3. Uma produção que dá prioridade à liberdade de expressão dos autores do filme, à vontade de seus autores de realizar uma obra cuja melhor apresentação ao público seja aquela que tenha lugar numa sala de cinema, duração inferior a uma hora — é isso o que definirá os “curtas-metragens” aos quais nos referimos, modesto arquipélago perdido no imenso império dos conteúdos audiovisuais...

1.4. Do ponto de vista “macroeconômico” de políticas públicas, essa diferenciação entre obras audiovisuais de mercado, curtas-metragens de criação cinematográfica e vídeos digitais de curta duração é frequentemente percebida como inútil.

Creio que seja uma falha de análise.Como eles, estou convencido de que as obras audiovisuais “de mer-

cado” têm um potencial de crescimento certamente muito importante, e o interesse macroeconômico é certo (as famosas “indústrias criativas” sobre as quais os países “desenvolvidos” pretendem posicionar suas bases econômicas).

Como eles, estou igualmente convencido de que o desenvolvimento de tecnologias digitais vai abrir um campo cada vez maior à produção “pessoal”, de cada indivíduo, de produtos audiovisuais de qualquer natureza.

Mas, mais do que eles ainda, estou convencido do papel singular que representa o setor de curta-metragem no dinamismo do conjunto de for-matos curtos. Porque, em termos de conteúdo, ele prioriza a descoberta do filme em uma sala de cinema ou espectadores se esforçam para se reunir para descobrir o filme. Para tentar uma metáfora, poderíamos considerar as obras audiovisuais patrocinadas e os vídeos digitais como a parte imersa do iceberg de conteúdos audiovisuais de formato curto, os curtas-metragens de criação cinematográfica constituindo, então, a parte emersa.

1.5. O papel singular representado pelo curta-metragem, acrescido da aproximação do mercado que é diferente para cada uma dessas três famílias (essencial para as obras audiovisuais patrocinadas, uma piada para os vídeos digitais, indireto para os curtas-metragens), faz com que a questão da comer-cialização apenas dos curtas-metragens me pareça suficientemente específi-ca para merecer que seja efetivada de uma forma particular.

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2. Breve análise da economia do curta-metragemPara compreender o que liga o setor do curta-metragem ao mercado de

direitos cinematográficos, vamos rever a especificidade da economia de sua produção.

2.1. Ela é constituída, não só na França, mas no mundo inteiro, em torno de dois “pilares”. O primeiro “pilar” da economia do curta-metragem é constituído pelos recursos institucionais, ou seja:

- aportes financeiros provenientes de organismos públicos ou para-públicos criados pelos poderes públicos: na França, existe uma estrutu-ra nacional (o CNC — Centre National du Cinéma et de L’image Animée) e dezenas de estruturas regionais (praticamente uma em cada uma das 22 regiões francesas) para o essencial, que dispõem cada uma de orçamen-tos anuais destinados a sustentar a economia do curta-metragem, principal-mente utilizados para financiar a produção. Um ponto importante sobre o sistema francês é que os recursos disponíveis para esses organismos não são provenientes do Tesouro Público, mas são extraídos do conjunto de negócios da área de cinema na França. Não são, portanto, os contribuintes franceses que financiam o apoio público ao cinema, mas a própria área de cinema, reservando sobre o total de negócios uma pequena parcela para ser reinjeta-da nesses organismos de sustentação à criação cinematográfica.

- aportes de patrocínio ou de isenção fiscal (tax shelter) pelos quais as empresas privadas utilizam dispositivos previstos pelos poderes públicos para lhes dar certas vantagens em troca de suas participações no financia-mento da produção do curta-metragem.

É preciso acrescentar, enfim, as escolas de cinema, que em todos os países do mundo financiam e produzem de maneira autônoma uma porcen-tagem às vezes muito importante de curtas-metragens nacionais.

Relativamente fácil de quantificar, esse primeiro “pilar” da economia é claramente dependente da vontade dos poderes públicos para sustentar a indústria cinematográfica em geral e o curta-metragem, em particular.

O segundo “pilar” é constituído do conjunto infinito variado de aportes, feitos por pessoas (participações) ou empresas (aportes da indústria) que escolheram participar de uma produção de curta-metragem aceitando uma remuneração muito baixa ou até inexistente, ou mesmo investindo nela financeiramente.

Isso vai do técnico que aceita trabalhar por um período de duas semanas por um salário muito inferior a seu salário de referência em um longa-metra-gem, até o laboratório que vai realizar gratuitamente os trabalhos de finaliza-ção, passando pela empresa que produz o filme sem pagar seus custos nem

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remunerar seu produtor. O coração do sistema frequentemente é o diretor que vai investir no projeto tempo, energia, às vezes dinheiro sem medir a remune-ração que poderá receber. Muito mais difícil de avaliar do que o primeiro, esse segundo “pilar” da economia do curta-metragem é, talvez, um indicador muito justo do que eu chamaria o “desejo de cinema” de uma comunidade nacional.

Esses dois primeiros pilares são complementados por um terceiro, que se constitui da comercialização dos direitos de distribuição: venda de direi-tos de exclusividade nas salas de cinema (em vias de desaparecer) ou aos canais de televisão (mais comuns), e então a venda de direitos, exclusivos ou não, além da primeira janela de exclusividade, a todas as redes capazes de pagar para disseminar filmes de curta-metragem (locação de salas de cinema ou de festivais, distribuidores de vídeo, canais de televisão, plataformas de internet, redes móveis etc.). Para simplificar, acrescentaremos a esse terceiro tipo de recursos os valores obtidos por um curta-metragem a título de sua exibição em destaque em um festival, como um bônus suplementar ao valor obtido pela locação do filme.

2.2. O que se constata na maioria dos filmes de curta-metragem de criação cinematográfica é que esses filmes só puderam entrar em produção se um ou outro dos dois primeiros pilares de recursos estiveram presentes no início da aventura: a energia e o suporte trazidos ao projeto por todos aqueles que decidiram se engajar (do diretor aos prestadores de serviços, passando pelo produtor e técnicos) de um lado, e pelo “dinheiro” aportado pelos mecanismos institucionais de financiamento do curta-metragem.

A comercialização dos direitos, terceiro tipo de recursos, nunca repre-senta esse papel decisivo. Essas são contribuições que podem ser importan-tes, mas que não são suficientes para permitir, sozinhas, que a produção do filme engrene.

Certamente isso não significa que o papel desses tipos de recursos sejam negligenciados, ao contrário (veremos mais adiante que é justamente a partir deles que se organiza o elo entre a produção do curta-metragem e o mercado).

2.3. Essa breve análise da economia do curta-metragem de criação cine-matográfica nos traz às três constatações seguintes:

2.3.1. A economia do curta-metragem é essencialmente construída sobre investimentos de longo prazo, cujo retorno sobre o investimento não é esperado em um cenário estritamente financeiro.

Com efeito, sejam recursos institucionais ou de participações e contri-buições da indústria, as instituições, as pessoas ou as empresas interessadas têm investido sem esperar um retorno imediato sobre seus investimentos, mas dentro de uma perspectiva mais distante:

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- para as instituições, trata-se de manter as condições corretas de reco-nhecimento e formação dos futuros profissionais na área audiovisual, de um lado, e de apoiar um espaço de liberdade de expressão no coração da cadeia audiovisual de outro.

- para os indivíduos, trata-se de tentar ser parte desses futuros profis-sionais, para os mais jovens, ou de manter um elo real com as novas gera-ções, para os mais velhos.

- para os prestadores de serviço, é o caso de construir o mais cedo pos-sível as relações de confiança e de troca de práticas profissionais com os futuros profissionais.

- para as empresas de produção, trata-se de se manter os indivíduos para quem a empresa poderá passar produções mais “pesadas” contra a cor-rente e em áreas de produção menos pesadas que as de longa-metragem ou televisão.

2.3.2. Uma parte importante dos investimentos “decisivos” destinados à produção do curta-metragem é muito difícil de quantificar e, por isso, de prever.

Os “recursos institucionais” são relativamente fáceis de quantificar, portanto não é problema, por exemplo, se inscrever nos planos de ação dos poderes públicos: uma vez tomada a decisão pelos poderes públicos quanto à alocação de um orçamento, ou a modificar as condições de atribuição, a execução dessa decisão é imediata.

Pelo contrário, quem pode afirmar dominar a evolução da parte desse segundo “pilar” que são as contribuições em participação ou da indústria? E essas contribuições são decisivas para a economia do curta-metragem.

2.3.3. Os recursos provenientes da comercialização de direitos repre-sentam uma parte minoritária dos financiamentos para o curta-metragem.

Como os custos de produção são cobertos em grande parte por contri-buições que, estruturalmente, não exigem contrapartidas comerciais de cur-to prazo (recursos institucionais de um lado, participações e contribuições da indústria de outro), o curta-metragem de criação cinematográfica pode assim ser comercializado a preços muito mais baixos, em comparação com aqueles praticados para outros conteúdos audiovisuais, sobre as diferentes redes de difusão capazes de os apresentar ao público.

3. Os trunfos essenciais de um mecanismo sólido de comercialização do curta-metragem

Não há nada de surpreendente, de fato, nessa relativa fraqueza de recur-sos comerciais para a produção do curta-metragem: por definição, como sua

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existência não é construída por uma resposta a uma demanda precisa e iden-tificada do mercado, é lógico que o valor comercial desses curtas-metragens se mantenha baixo.

Duas consequências dos pontos citados acima são:- o valor comercial corresponde a uma parte minoritária na avaliação

do ativo que um filme de curta-metragem representa.- o valor comercial de um filme de curta-metragem é mínimo dentro da

base estrutural da sua economia.O que não impede de modo algum que certos filmes de curta-metra-

gem sejam igualmente sucessos comerciais reais, mas não podem constituir a base de um sistema de produção.

Essa constatação não significa absolutamente, muito pelo contrário, que se deixe passar as problemáticas de comercialização. Essa tentação é tão forte que a natureza da primeira rede de exibição ao público dos filmes de curta-metragem, a rede de festivais de cinema, não foi constituída sobre a prioridade de uma rentabilidade econômica dos festivais, mas sobre o desejo de respeitar a vontade de exibição em salas daqueles que fazem os filmes. E se encontra, aliás, na economia dos festivais esse peso decisivo de recursos institucionais e de contribuições em participação (benevolência, mecenas de empresas…).

A existência dessa primeira rede é fundamental e prioritária para os filmes de curta-metragem. Mas ela é historicamente constituída em torno de uma ideia que os recursos devam antes de tudo ser atribuídos a mostrar o filme, e não a remunerar os direitos de distribuição.

Essa situação (a difusão cultural, não remunerada, de obras produzi-das sem apelar para o mercado) escondeu durante muito tempo a questão da comercialização do curta-metragem. Considerando que afinal o valor comercial é estruturalmente fraco, e que as energias são essencialmente mobilizadas em torno da produção (o essencial é fazer o filme), a questão da comercialização (pagar para distribuir o curta-metragem) era uma piada em relação à difusão prioritária que constituía a rede de festivais. E que, desse fato para sua exploração posterior nessa primeira distribuição em fes-tival, a produção do curta-metragem constituiria assim uma jazida de filmes nas quais todas as redes poderiam obter à vontade e por preços ridículos, partindo do princípio de que um filme a mais distribuído é melhor, princí-pio reforçado pela gestão desses recursos não decisiva para a produção de filmes.

Essa visão, que reduz a questão da comercialização do filme de curta-metragem a uma única dimensão de seu preço de venda no momento da distribuição, é muito insuficiente. Ela se esquece do conjunto de vantagens

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que a existência de um mecanismo sólido de comercialização traz ao curta-metragem, o que momentaneamente vamos chamar assim:

Recursos adicionais para a produção. Mesmo se o montante de recur-sos provenientes da comercialização de filmes não seja decisivo para dar sua “luz verde”, ele permite, todavia, constituir uma parte considerável do financiamento de curtas-metragens.

Um elo com a demanda comercial que permanece compatível com a exigência de liberdade de expressão do curta-metragem. É através da existência dessa parte de recursos comerciais que o curta-metragem pode integrar a demanda do público de redes de distribuição interessadas, sem por isso perder a liberdade editorial completa que o caracteriza: todos aque-les que um dia produziram um curta-metragem sabem que as exigências editoriais provenientes de recursos institucionais ou de contribuições em participação sobre o filme permanecem muito baixas. Por outro lado, é a existência de recursos reais provenientes da comercialização, sob forma de adiantamentos ou de receitas de exploração, que pode permitir uma intera-ção entre o conteúdo do filme e a demanda do público. E é justamente o fato que o valor comercial seja baixo que permitirá que o comprador não exija uma intervenção forte no conteúdo.

A possibilidade de uma remuneração de esforços de participação e de contribuições da indústria permitiu o caráter de receitas de explora-ção, portanto posteriores à produção do filme, da maioria dos recursos de comercialização, o que deixa uma esperança de remuneração aos esforços das pessoas e empresas que fizeram com que o filme existisse.

Pagar um preço, mesmo baixo, para toda distribuição de um filme, assim, torna real a esperança de um retorno financeiro para as participações e as contribuições da indústria, e justifica a renovação desse esforço.

Ao contrário, se desinteressar do preço pago para a difusão do curta-metragem leva a desconsiderar a importância desses investimentos, e a des-motivar aqueles que, no entanto, essenciais para os filmes de curta-metra-gem existam.

A consolidação de um mecanismo completo, comercial e crítico de diferenciação dos filmes. A existência de um mecanismo de comercializa-ção reequilibra o trabalho indispensável de seleção e de comparação de fil-mes uns com os outros, permitindo associar ao reconhecimento crítico dos festivais os mecanismos de reconhecimento comercial que representam os compradores de direitos.

A apresentação ao grande público de resultados concretos da política de apoio ao curta-metragem. É o mecanismo de comercialização nas janelas

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de exibição ao grande público, desenvolvidas por uma parte selecionada da produção de curta-metragem, o melhor meio de justificar junto ao grande público a legitimidade das políticas públicas de apoio ao curta-metragem.

Amadurecendo o conjunto de vantagens resultantes, mede-se como um mecanismo sólido de comercialização de filmes de curta-metragem, especifi-camente dedicado a esses filmes, pode representar um trunfo essencial para todo sistema de produção do curta-metragem.

Mas uma coisa é estar convencido da necessidade de um mecanismo sólido de comercialização do curta-metragem, outra é de fazê-lo funcionar. Como o valor comercial do curta-metragem é estruturalmente baixo, o acor-do com redes de difusão, quaisquer que sejam elas, para que se integrem a esse mecanismo não é evidente. Em outras palavras, as empresas de difusão de conteúdos que pretendem apresentar curtas-metragens a seus públicos tendo remunerado corretamente seus direitos não se mexem.

4. Algumas considerações tiradas do exemplo francêsExiste um certo mecanismo de comercialização na França, imperfeito

e capaz de ser melhorado. Seria ridículo usá-lo como modelo. Proponho, por isso, terminar essa intervenção apresentando alguns eixos principais que estruturam esse mecanismo de comercialização:

Uma agência coletiva dedicada à comercialização. A existência de um organismo coletivo dedicado à comercialização, com toda transparência, do conjunto de curtas-metragens desejosos de utilizar seus serviços. Chama-se Agência do Curta-metragem. Os produtores ou diretores confiam à Agência a tarefa de comercializar seus curtas-metragens junto a todas as redes que possam interessar (salas de cinema, canais de televisão, portais de internet…), cuidando para que essas comercializações efetuem-se sistematicamente no quadro contratual definido e remunerado. A agência retira uma comissão sobre as vendas que realiza, e reverte em seguida o valor líquido aos deten-tores dos direitos.

O reforço de um apoio exigido dos poderes públicos aos festivais. Apoio financeiro forte aplicado pelos poderes públicos às redes de festivais, em contrapartida de uma exigência elevada em termos de qualidade de apre-sentação dos filmes. De fato, é a qualidade dessa primeira “vitrine de exposi-ção” dos filmes que rende atrativos para as outras redes de difusão a ideia de mostrar a eles também os filmes.

Graças igualmente a esse apoio que os festivais podem recuperar os recursos suficientes para, eles também, dar o exemplo pagando os direitos de locação dos filmes.

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A livre escolha deixa às redes de difusão optar por difundir o curta. A construção do mecanismo de comercialização não é feita contra as redes de difusão, mas com elas, sem nenhuma obrigação regulamentar de nenhum tipo, argumentando-se sobre a ideia de que a programação de filmes de cur-ta-metragem deve representar um interesse real para a rede interessada.

Explicar, demonstrar, convencer, rede por rede, responsável por res-ponsável, que fazer a escolha de uma programação assumida de curta-metra-gem permite se destacar junto aos seus espectadores para essa programação, e, portanto, aumentar seu próprio valor de marca (que se trata de uma sala de cinema, de um canal de televisão ou de uma plataforma de internet) a um custo pouco elevado. É quase certo dentro desse ramo que é melhor começar com algumas redes de comercialização e algumas pessoas motivadas e con-vencidas que saberão justamente tirar o melhor benefício de sua programa-ção de curta-metragem, em vez de ter a esperança de regular massivamente a questão da comercialização de filmes por imposição regulamentária.

A união entre “a galera do conteúdo” em torno de alguns grandes princípios. É certo que esse mecanismo não pôde se constituir até agora por-que não existia entre todos os “agentes de produção” (diretores, produtores, funcionários de instituições públicas) uma convicção muito forte dos TRÊS princípios seguintes:

- resistir sistematicamente à ideia de que a produção do curta-metra-gem do ano constitui uma jazida de filmes na qual todo mundo pode extrair à vontade, partindo do princípio que quanto mais filmes distribuídos melhor, e reivindicar que toda difusão seja objeto de remuneração.

- impor sistematicamente para os filmes de curta-metragem conven-ções comerciais equilibradas entre distribuidores e detentores de direitos, que especifiquem claramente a natureza e a duração dos direitos adquiridos, assim como os preços pagos, salários ou proporcionais de cada um.

- aceitar o princípio de que uma parte (na França, é hoje da ordem de 20% a 30%) dos recursos institucionais alocados a priori ao curta-metragem possa ser jogada nesse mecanismo de comercialização (e consequentemente, diminuída do montante alocado na produção).

Esse mecanismo, colocado em funcionamento no início dos anos 1980, ocupou ao longo do tempo um lugar essencial no mecanismo geral da políti-ca dos poderes públicos de apoio ao curta-metragem na França.

Sua existência não constitui a prova absoluta da necessidade de um mecanismo de comercialização do curta-metragem, mas tem o mérito de mostrar que há ao menos um local no mundo ou um tal dispositivo.

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Tanto a ideia da necessidade de uma produção de curta-metragem vigo-rosa ser uma das chaves para uma área de cinema dinâmica é hoje imposta em numerosas cinematografias do mundo inteiro, quanto a ideia da neces-sidade de uma estratégia forte de comercialização do curta-metragem, a fim de respeitar e reforçar esse espaço único de liberdade de expressão, estão ainda começando.

Não sei o que o futuro nos reserva. As coisas são tão rápidas, a explosão digital e as possibilidades tecnológicas oferecidas pela internet em matéria de difusão de imagens, às vezes, nos trazem dor de cabeça.

Razão maior para deixar os olhos abertos e o cérebro em ebulição... Espero que essa intervenção tenha ajudado os cineastas e os produtores bra-sileiros de curta-metragem a se encontrar nessas agitações.

Alain RoccaEngenheiro de formação, Alain Rocca deixou a profissão para se dedicar ao cinema. Em 1985

fundou a sociedade de produção Lazennec, que logo obteve sucesso com os longas Un

Monde sans pitié, de Eric Rochant, e La discrète, de Christian Vincent. A Lazennec produziu

cerca de 50 longas e diversos curtas. Além de sua atividade como produtor, tem destacada

atuação na profissão, tanto no sindicalismo como na educação: foi presidente da AFPF –

Associação Francesa dos Produtores de Filmes; fundou a API – Associação dos Produtores

Independentes; e dirigiu o departamento de produção da FEMIS de 1996 até 2009. Em 2006,

a pedido do Ministério da Cultura francês, apresentou um estudo sobre as perspectivas da

evolução do sistema francês de difusão do curta-metragem. É também um dos fundadores e

o presidente de UNIVERSCINE, distribuidora de cinema independente pela internet.

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Modelos de Negócio e Iniciativas de Comercialização

Edição dos depoimentos dos agentes de mercado ligados a modelos de negócios e iniciativas de comercialização de conteúdos audiovisuais de

curta duração em funcionamento no país que participaram do Seminário. Os resumos estão organizados por ordem alfabética dos projetos.

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A Auwé Digital não é uma empresa distribuidora e nem exibidora. Nós gerenciamos conteúdo digital, ou seja, digitalizamos diversos produtos audiovisuais para que eles sejam exibidos em salas de

cinema ou em espaços alternativos, como clubes e condomínios, ao ar livre ou onde o espetáculo de cinema for representado. Atualmente, trabalhamos com 25 grupos de exibidores, totalizando 165 salas de cinemas espalhadas em 75 complexos pelo Brasil afora. Também trabalhamos com 29 distribui-doras independentes, além das que trabalham com filmes nacionais, e algu-mas produtoras que resolveram escoar os seus produtos, já que estavam com dificuldades de fazer com que eles chegassem às telas de cinema.

Com relação ao tema proposto aqui pelo Seminário, infelizmente o que nós tínhamos para apresentar não está mais acontecendo, mas creio que a experiência que tivemos serve como embasamento para novas frentes de trabalho no futuro bem próximo. É o caso do Instituto Brasil Leitor, que aconteceu no metrô de São Paulo. Fazia parte do Projeto Encontros, cujo objetivo principal era levar dança, exposição, teatro, poesia e também cine-ma à nossa geração. E o produto escolhido para representar o cinema foi o curta-metragem, justamente em função de sua duração.

Nós montávamos uma sala de cinema aberta, dentro da estação Santa Cecília do metrô, onde exibíamos toda sexta-feira um programa de 30 minu-tos só com curtas-metragens, que passavam às seis, seis e meia e sete horas, que é o horário de pico. A ideia era fazer com que as pessoas que estives-sem chegando de uma semana cansada conseguissem dar uma paradinha, assistir a um curta, dar uma relaxada, rir, pensar. Exibíamos documentário, comédia, drama, enfim, a ideia era propiciar o cinema para aquela população que não tinha muito acesso.

De abril de 2009 até julho de 2010 fizemos cerca de 180 exibições de curta-metragem desses programas, em um espaço aberto dentro da estação,

Auwé DigitalCacá de Carvalho, gerente de atendimento da empresa

www.auwe.com

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mas com toda a propriedade de cinema. Tinha tela, projetor, áudio 5.1, pufes espalhados e era aberto para que quem estivesse passando por ali se sentisse convidado a parar um pouquinho e assistir. O Instituto Brasil Leitor não está mais coordenando o projeto. Agora, segundo uma licitação, será coordenado por outra empresa. Vale lembrar que esse projeto inicialmente se espalharia por mais 14 estações de metrô aqui em São Paulo e se propagaria depois para o Brasil.

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O Blopix nasceu há dois anos como uma plataforma de distribuição controlada de conteúdo audiovisual profissional em computadores e celulares, não apenas para fins de entretenimento, mas também

para o mercado corporativo. Montamos uma forma de locação de conteúdo audiovisual em computadores, notebooks, desktops e também vários forma-tos de celulares para atender a uma base grande desse mercado.

Além do curta-metragem, trabalhamos com longa, documentário, fic-ção, uma série de coisas. Os filmes ficam à disposição no catálogo do site, que tem versão em português e inglês e também filtro geográfico para con-trole de direitos que os produtores e os distribuidores possuem. Depois do filme escolhido, é só entrar na página do filme e escolher o formato. Estamos até estudando ter um formato download, de compra mesmo. Por enquanto, disponibilizamos o streaming, exibição contínua em que a pessoa não baixa o arquivo, mas tem acesso ao filme por um tempo determinado. Há vanta-gens e desvantagens em relação a esse formato. É mais rápido porque não

BlopixGuilherme Coelho, empresário, sócio da ZeroUm Digital, e empreendedor do mundo digital

www.blopix.com

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é preciso esperar o download inteiro para assistir, mas é necessário estar conectado. A facilidade de baixar o arquivo é que se pode assistir depois, mesmo não estando conectado.

O pagamento é feito por meio de cartão de crédito. Os realizadores tam-bém recebem cartões de vale-filme para distribuir às pessoas que quiserem ou mesmo para disponibilizar no ponto de venda. Isso quebra um pouco a barreira do e-commerce, porque ainda há uma resistência quanto a pagar com cartão pela internet. Os filmes comprados ficam todos reservados. Não há preocupação de copiar os arquivos, pois eles serão exibidos em qualquer computador ou celular que seja compatível. É só acessar a conta no Blopix e encontrar a filmoteca disponível.

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Assim que o pagamento é processado, a pessoa tem 30 dias para come-çar a ver o filme. Esse prazo ainda está sendo estudado, podemos aumentar para 60 ou 120 dias, mas isso não influencia tanto. O importante é que em até 48 horas após a primeira visualização pode-se assistir ao filme quantas vezes quiser. Para a pessoa que já que usa o cartão de crédito on-line, o pro-cesso é muito fácil.

O realizador que quiser saber se alguém já alugou seu filme, pode encontrar esta e outras informações no site. Todos que nos fornecem títulos têm uma conta com login e senha. É só entrar, buscar por período, escolher num dropdown o título desejado e checar o relatório. Nosso esquema de trabalho com os produtores funciona assim: recebemos a obra, fazemos a digitalização para vários formatos, cadastramos no site e colocamos o filme à disposição. Depois, fazemos um share de 50% do que gerar dos aluguéis com o produtor ou negociamos ações com vale-filme.

Aproveito para citar o exemplo do curta-metragem Espalhadas pelo ar, de Vera Egito, produzido pela Ioiô Filmes, que é um dos maiores sucessos de locação na Blopix. Ele foi selecionado para o Festival de Cannes, saiu em jornais e revistas e nesse período foi o curta que nós mais alugamos no site. O Blopix nasceu por causa disso. Na hora que um curta é lançado e está nos festivais, saindo em vários órgãos da imprensa, geralmente, não está dispo-nível em nenhum lugar para exibição. É claro que nossa batalha é comercial. No momento em que o curta tem o seu maior potencial, escutamos dos pro-dutores “Eu tenho um ano ainda de janela de festival, vou cumprir em vários festivais, daqui a um ano a gente conversa”. Para tentar fazer o audiovisual ser produtivo, esse tempo perdido pode ser mais bem trabalhado.

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Para explicar a relação do Canal Brasil com o curta-metragem, vou começar falando da política de aquisição, que é norteada por dois pressupostos básicos. O primeiro é que um dos objetivos do canal é

construir um amplo painel da produção audiovisual brasileira, não só em curta-metragem, mas em todos os formatos. Aqui vamos falar mais espe-cialmente de curta-metragem. O segundo pressuposto é que não fazemos qualquer tipo de restrição quanto à duração, região da produção, gênero ou suporte utilizado. O Canal Brasil exibe curtas em 35mm, 16mm, vídeo, Super 8, enfim, não há restrição a nenhum tipo de suporte ou formato.

Com relação à precificação, na época do nascimento do Canal, em 1998, muito pouco se comprava de conteúdo com menos 30 minutos. A solução que encontramos foi utilizar um parâmetro do departamento de aquisições da GloboSat. O que se comprava ali com menos de 30 minutos era conteú-do internacional, quer dizer, existia um teto de US$ 1 mil para esse tipo de produto. Na época fizemos uma conversão e chegamos a um valor de R$ 1,2 mil como referencial para começar a comprar curtas-metragens brasileiros.

Em 2004, procuramos fazer algo diferente: criamos um piso e um teto. O valor, então, variava de R$ 1 mil a R$ 2 mil. Atualmente, o Canal Brasil ampliou um pouquinho esse teto e agora o valor varia de R$ 1 mil a R$ 2,5 mil. Os nossos termos de negociação, de 1998 a 2010, também passaram por oscilações significativas. Por exemplo, no início trabalhávamos com exclu-sividade total, hoje essa exclusividade acompanha o tempo da janela, que é de um ano para TV aberta. Em 1998, não tínhamos ideia de como seria a utilização, as exibições eram ilimitadas, hoje estão limitadas a 24.

Além da aquisição normal, o Canal Brasil também procura estimular a produção de curta-metragem. Já em 1998 foi criado o Prêmio Aquisição Canal Brasil. Começamos com dois festivais, Gramado e Brasília, e premiáva-mos dez curtas. Ao longo dos anos, o prêmio se modificou, fomos tentando

Canal BrasilAlexandre Cunha, gerente de programação do canal

http://canalbrasil.globo.com

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ajustar o formato. Em 2010, chegamos a esse modelo de nove festivais, pre-miando um curta por festival ao valor unitário de R$ 15 mil. Se somarmos de 1998 até 2010, o Prêmio Aquisição distribuiu R$ 785 mil em prêmios.

Outra forma de estimular ainda mais a produção se deu com a criação do Grande Prêmio Canal Brasil, que foi criado em 2006 como resultado do Prêmio Aquisição. Os vencedores do ano concorrem novamente ao Gran-de Prêmio e o vencedor recebe um prêmio ainda maior. Começamos com R$ 20 mil em 2006 e em 2008 chegamos a R$ 50 mil.

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Em termos de programação, ocupamos uma faixa permanente de curtas-metragens e também temos uma programação especial muito voltada para a democratização dos festivais. Ou seja, levar o festival local para a televisão, para torná-lo nacional. Já tivemos vários programas especiais, como o “Anima Mundi”, em duas temporadas; o “Cine Mix Brasil”, apresentado pelo André Fischer, que é curador dessa faixa; o “Curta São Paulo”, apresentado pela Bár-bara Paz, que em 2011 vai se expandir e passa a se chamar “Curta na Estrada”, possibilitando visitar outros lugares do Brasil. Conseguimos levar o Super 8 para a televisão no programa “Tamanho Também é Documento”, apresentado pelo Clovis Molinari, que fez um trabalho arqueológico que resultou em uma temporada de 13 programas. Somos parceiros do Cel.U.Cine no formato celu-lar: um dos prêmios para os vencedores é ter exibição no Canal Brasil.

Nossa faixa de curtas se chama Curta na Tela e seu horário principal é nobre, às 20h30. Há também um horário alternativo de segunda a sex-ta, às 15h30. No fim de semana o curta é exibido em forma de maratona, quer dizer, é outro jeito de assistir ao curta-metragem. O horário principal da maratona é sábado às 14h30 e vai até as 16h00, e o horário alternativo é aos domingos às 9h30.

Em relação à divisão da ocupação do curta-metragem na grade do Canal Brasil, o predomínio é da região Sudeste, com 70% praticamente. Depois temos a participação do Sul, do Nordeste e muito pouco no Centro-Oeste e no Norte (veja gráfico abaixo). Acredito que esse gráfico reflete a produção do Brasil. Dentro de cada região, no Sudeste, São Paulo e Rio de Janeiro impulsionam e Minas também contribui; no Sul, o Rio Grande do Sul é o

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grande impulsionador, incluindo os curtas da RBS; no Nordeste existe uma participação bastante significativa em Pernambuco, Bahia, Ceará e Paraíba. Por enquanto, não conseguimos colocar Goiás, Acre, Amapá e Tocantins na nossa grade de programação.

Os dados fechados até julho mostram que 1.231 curtas-metragens já passaram pela grade do Canal Brasil, negociados com 359 produtores distin-tos, com um volume total de negociação ultrapassa R$ 2 milhões. A previsão até dezembro é que o investimento de 2010 chegue a R$ 500 mil. É o maior investimento dos últimos 10 anos.

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O Canal Futura pretende fazer diferença na televisão porque se trata de um projeto social de comunicação, de interesse público, gerado e construído por parceiros da iniciativa privada, pois trabalhamos

com licitações, terceirização de projetos, e isso é importante para termos sempre novos horários e novos fornecedores.

Ser uma TV que trabalha como uma rede social de mobilização é o nosso grande diferencial. Em 12 anos, 11 mil instituições – desde presídios, cooperativas, escolas, grupo de terceira idade, entre outras – passaram pelo canal. Sempre buscamos um formato atrativo para valorizar a diversidade da produção audiovisual brasileira. Afinal, para que ficarmos sempre no mesmo olhar de um eixo se podemos trabalhar com um Brasil de ponta a ponta? Temos cinco regiões que nos proporcionam novos modos e novos olhares para se fazer uma narrativa de televisão. Esses são os nossos parceiros. Temos um grupo de 73 milhões de brasileiros prontos para assistir ao canal. Desses 73 milhões de brasileiros, 40 milhões têm o hábito de assistir ao Canal Futura.

E como assistir ao Canal Futura? O principal modo é a banda C, ou seja, o sinal de parabólica. Devemos sempre ficar atentos à parabólica. É uma dis-cussão que as pessoas tentam sempre retornar, às vezes deixam um pouco de lado, mas acho que possuímos um potencial muito grande de público ali. Todo mundo deveria olhar para esse público. Na TV por assinatura, que é onde a gente nasceu, o Canal Futura é veiculado pela NET e também pela Sky. Já nas TVs universitárias disponibilizadas em várias regiões do Brasil, basicamente nós utilizamos as nossas redes de comunicação, com uma mes-cla de produção local de ambos. E o mais recente modo de veiculação é a nossa geradora, o canal 18, que fica na cidade de São Gonçalo, Rio de Janei-ro. A população do Grande Rio realmente assiste ao Canal Futura como um canal de TV aberta, então nós precisamos passar por todos os trâmites, estar totalmente voltados a uma legislação de radiodifusão de TV aberta.

Canal FuturaMarcio Motokane, coordenador artístico do canal

www.futura.org.br

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Resumidamente, o perfil de espectador do Canal Futura é formado pela Classe C, D e E. É o nosso público, é onde está a parabólica. Nosso público C, D e E está muito concentrado nas regiões Norte e Nordeste, e o retorno da audiência pela nossa rede de mobilização é sempre destaque na região do semiárido nordestino. Então, essa busca de novos olhares é bem forte ali, no Sudeste também, obviamente, mas ali há um DNA interessante para o Futura.

Espalhados pelo Brasil, contamos com vários mobilizadores que traba-lham os nossos conteúdos como realizadores, tentando expandir suas jane-las de exibição. Às vezes, esses conteúdos são exibidos em circuito fechado, outras vezes com retorno na televisão e, depois de um tempo, onde a gente sequer imaginava. Assim, a rede de mobilização desenvolve um trabalho de educação com uma temática específica que se torna uma demanda de exibi-ção, ampliando a nossa janela.

Ao articular essa rede de 11 mil instituições que passaram pelo canal, começa então uma produção cooperativa entre canal, mobilização, o grupo local e às vezes também entre os grupos. O resultado é transformado em produto de televisão. Nós acompanhamos o retorno disso na mobilização e, às vezes, conseguimos dados interessantes de pesquisa formativa. Por exem-plo, eu posso criar um piloto de programa a partir da própria rede de mobi-lização, passar isso na televisão, devolver para a rede e juntos mudarmos na medida do possível. Claro que isso depende de orçamento também, mas na medida do possível tendemos sempre a pensar que trabalhar na pesquisa articulando redes é um fator de qualidade.

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Tentando definir o que seria a nossa iniciativa de aquisição de conteú-do de curta duração, trouxemos quatro casos para o Seminário, divididos em produtos de dois tipos: programas (com mais de cinco minutos de duração) e interprogramas (menos de cinco minutos de duração). Vou especificar três casos de interprogramas de cinco minutos e um de 15 minutos.

Quando olhamos uma iniciativa, pensamos sempre em um apoio maior do que a veiculação do produto no canal. Foi pelo envolvimento de processo com incentivo de produção artística, capacitação audiovisual, busca e propa-gação de talentos, que aqui na rodada de negócios foi exposta a divulgação de projetos de multiplataformas, pensando não apenas na televisão, mas em internet e celular entre outros, como também a participação no júri. É uma forma muito legal de nos aproximarmos para determinados processos e pro-jetos audiovisuais, veiculação de conteúdos e uso de conteúdos pela mobili-zação comunitária.

Um deles é o Animart, que é o Festival Brasileiro Estudantil de Animação. Trabalhamos com a divulgação de concurso, participação no júri, premiação para os vencedores e veiculação do canal. É uma premiação simbólica, mas mexe com categorias de estudantes do Brasil, isso é bem interessante.

O Plural Plus é o projeto internacional de vídeo juvenil que agrega uma temática voltada para a migração, diversidade e inclusão social e a gen-te participa com a divulgação do concurso, participação no júri e veiculação do canal, sendo que eu mesmo fiz parte do júri fazendo a avaliação pela

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própria internet, que isso é uma nova janela, que isso possibilita, viabiliza muitas formas de negócio em aproximação.

A Olimpíada das Artes na Infância é um concurso internacional voltado para as crianças da International Child Art Foundation (ICAF). Nós trabalhamos com a divulgação do concurso, participação do júri e com o diferencial que é a animação de vinhetas para a veiculação no canal. A pro-dução é feita conjuntamente: pegamos os desenhos das crianças brasileiras finalistas e criamos vinhetas na programação do canal, num processo cola-borativo. Assim, além de incentivar o concurso, você incentiva outras pesso-as do Brasil a participar desse tipo de produção, não necessariamente do pró-prio ICAF, mas de outros modos de produção, outros modelos de negócio.

E o Revelando os Brasis é um projeto de 40 curtas-metragens com 15 minutos de duração para cidades de até 20 mil habitantes. Juntamente com o Ministério da Cultura, entendemos que essa era uma boa forma de veicular curtas, mas se eles durassem 15 minutos seriam considerados programas. Então, jogamos para a faixa de 30 minutos adicionando entrevistas com os realizadores e com os diretores de curta-metragem, e aplicamos oficinas de formação audiovisual que acabam participando do processo. O Futura é um canal que trabalha com esses valores, basicamente, que são espírito empreen-dedor, espírito comunitário, pluralismo, ética e sustentabilidade do planeta.

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EEstou muito feliz em acompanhar este Seminário, que considero fun-damental, e ver tanta gente pensando no curta como negócio. Fui convidada para relatar a nossa experiência e acho que se a Casa de

Cinema de Porto Alegre teve alguma participação importante nesses seus 23 anos de existência foi a de tentar mostrar que o curta é e poderia ser um negócio. Quando criamos a produtora, em 1987, a ideia era exatamente essa: éramos 12 pessoas (organizadas em quatro produtoras) que trabalha-vam com cinema, que faziam longas, mas principalmente curtas. As quatro empresas produtoras se uniram para criar uma distribuidora, para fazer com que nossos filmes fossem considerados um produto do nosso trabalho e por isso fossem remunerados. Queríamos fazer com que fossem veiculados e assistidos. Não víamos sentido em realizar aquela quantidade de filmes, e ter as latas empoeirando nas prateleiras (ou embaixo das camas), sem que fossem exibidos.

A Casa de Cinema tem três eixos principais de ação: distribuição, exi-bição e produção. A produção é o carro-chefe e os outros dois servem como apoio ao nosso trabalho, principalmente a distribuição. A exibição é bem mais recente, nós administramos e programamos uma sala de cinema em um centro cultural, o Santander Cultural. A sala é pequena, tem 85 lugares, mas conseguimos com ela pensar um pouco no que é a exibição de cinema hoje, promover a formação de platéia e a reflexão sobre cinema, além de nos divertir bastante, é claro. Isso complementa o trabalho que temos feito. Compreender a relação do público com o cinema é fundamental para quem quer realizar filmes.

Mas focando na distribuição, que é o tema deste seminário, como eu disse, criamos este braço para dar apoio ao nosso trabalho de produção, que já estava sendo reconhecido nacional e internacionalmente. A ideia era que não ficássemos esperando convites para exibir os fimes, mas que criásse-

Casa de Cinema de Porto Alegre (Distribuidora)

Ana Luiza Azevedo, sócia da empresa e diretora cinematográfica

www.casacinepoa.com.br

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mos alternativas de exibição. Naquele momento, e por um bom tempo ainda, eram alternativas de exibição físicas, não havia a possibilidade de exibição virtual. Criamos uma tabela para venda e aluguel dos filmes que acabou se impondo como uma referência para quem trabalhava com curta-metragem no país todo. Naquele momento, final dos anos 80 e início dos 90, quem trabalhava a distribuição de curta era a CDI, uma distribuidora indepen-dente de curtas criada por cineastas paulistas com a mesma preocupação nossa e a Fundação de Cinema Brasileiro, que fazia um trabalho de fomento (criando editais de produção), difusão ( facilitando e participação de curtas em festivais internacionais) e distribuição. Era à Fundação que qualquer um recorria quando queria exibir um curta brasileiro, mas a FCB praticava uma tabela de locação que era quase de graça, o que foi discutido e alterado. A troca de informação e a prática de cobrança pela exibição dos curtas fosse em cinemas, mostras, associações ou na televisão por estes três agentes (Casa de Cinema de Porto Alegre, CDI e Fundação do Cinema Brasileiro) foi fun-damental para que os realizadores acreditassem que este formato era viável e poderia ser encarado como negócio. Em dois ou três anos (de 87 à 90), as vendas e alugueis dos curtas chegaram a 60% da receita da Casa de Cinema de Porto Alegre.

Claro que 60% não era tanto, já que nossa receita era pequena. O retor-no do curta não sustentou ninguém (nenhum de nós ficou rico ou teve auto-nomia financeira com o curta), mas nos permitiu manter um espaço físico, uma pessoa trabalhando exclusivamente para a distribuição, como temos até hoje e, principalmente, conseguimos manter o acervo em dia, com controle das cópias e fazendo novas quando necessário. Esta organização é funda-mental para o trabalho. Quando pensamos na difusão do curta-metragem, seja na bitola que for, é preciso ter uma estrutura mínima de organização que dê suporte a essa distribuição. Muitas vezes o produtor ou realizador não sabe onde está a cópia, não tem CPB, ... o que dificulta muitíssimo o trabalho de exibição e distribuição.

Com a produção de longas a partir dos anos 90, passamos a trabalhar com as grandes distribuidoras internacionais, e com as pequenas e médias distribuidoras brasileiras para fazer a distribuição destes filmes. Mas ter um departamento organizado nos facilitou o trabalho de apoio que todo produ-tor de longa precisa fazer junto ao distribuidor, pelo menos no Brasil. No filme “3eFes”, do Carlos Gerbase, nós mesmos fizemos a distribuição, porque esta era a proposta do filme: experimentar um lançamento na sala de cinema, na internet e na televisão ao mesmo tempo. O filme foi pensado para isso, foi produzido para ficar em cartaz na sala de cinema, e disponível na internet

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por uma semana. A experiência foi bastante positiva e provocou uma grande discussão interna sobre as eternas trocas de paradigmas da distribuição. E esta é uma prática fundamental: estar sempre repensando o mercado do audiovisual, que muda constantemente, não só em relação ao suporte, mas como dinâmica de mercado em si. Quais são as possibilidades do mercado? Como fazer com que esta atividade seja sustentável? O que fazer para man-termos uma estrutura e que ela seja lucrativa? De que forma trabalhar com as novas mídias? O que nos interessa nesta forma de expressão? E agora, o cinema é o quê, mesmo? Estamos nos questionando constatemente. Por isso é que fomos criando esses braços. São apoios para que possamos experimen-tar todas as possibilidades de negócios que vão surgindo.

Um suporte extremamente importante ainda hoje no nosso negócio de curta-metragem é a loja virtual. A criamos há uns cinco anos, vendemos todos os nossos produtos, e geram uma receita razoável. Claro, não é o que sustenta a produtora, mas sustenta o braço da distribuidora e viabiliza aven-da e circulação dos produtos. Para se ter uma ideia, nos primeiros 20 dias de agosto vendemos 26 curtas. Em termos de receita não é muito, mas os filmes estão girando. E é aquilo que eu disse antes, é um dinheiro que sustenta a estrutura para que a gente possa continuar fazendo com que nossos filmes sejam assistidos. Hoje também distribuímos, sem exclusividade, filmes gaú-chos, de pessoas que trabalham conosco. É uma forma de oferecer um apoio de infraestrutura, para que estes realizadores ou produtores usufruam dos mecanismos já criados. Mas a distribuição de nossos filmes não ficam res-tritos a nossa estrutura. Também trabalhamos com outros projetos, como o Porta Curtas, o Curta o Curta, e as distribuidoras dos longas.

Quando a Casa de Cinema fez 20 anos, lançamos uma caixa de curtas, com quatro DVDs. Na época o mercado de DVD era bom e chegamos a ven-der 1,9 mil caixas, quase 8 mil DVDs. É bastante.

Bem, essas são algumas das nossas ações como uma distribuidora cria-da para apoiar a produtora e manter os filmes em circulação. É uma expe-riência de 23 anos de quem sempre acreditou no potencial do curta como expressão, criação e possibilidades de experimentação e negócio.

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Os festivais no Brasil são na verdade uma vitrine muito especial do curta-metragem brasileiro, pois é a principal janela de exibição des-se tipo de formato. É uma responsabilidade muito grande começar-

mos a ter uma interlocução dentro da questão da economia da cultura, da economia criativa.

Hoje, possuímos um circuito com 220 festivais de cinema, construído ao longo de 20 anos, à disposição da produção brasileira não só de curta-metragem, mas também de outros formatos. Quando falamos sobre festivais de cinema, é preciso saber que para montar um festival é necessário um grande esforço do organizador. É construir uma nova edição a cada ano e colocar esse circuito à disposição da produção brasileira para que ela cresça.

A partir de uma relação muito próxima com a Secretaria do Audiovisu-al, nós fizemos a primeira pesquisa do setor de festivais do Brasil. São núme-ros bastante impressionantes e é importante que entendamos que esse é um circuito bastante heterogêneo. Essa variação de perfis enriquece e valoriza muito a nossa atividade. Temos vários realizadores de curta-metragem que hoje organizam festivais de sucesso, com boas propostas, seriedade na exibi-ção e preocupação em relação aos filmes exibidos. Ao mesmo tempo, temos festivais com décadas de existência. Por exemplo, o Festival de Brasília tem 43 anos, está plenamente consolidado.

O circuito é muito diverso e essa heterogeneidade às vezes provoca uma má compreensão das possibilidades e capacidades financeiras dos festivais. Nós temos 220 festivais mapeados, 28 deles são brasileiros que acontecem no exterior e cumprem o papel de garantir a exibição de filmes nacionais em países americanos e europeus. E sabemos que quase 90% desse circuito é feito com orçamentos modestos. Um dado dessa pesquisa aponta que ape-nas 46% do volume de recurso que circula nos festivais vêm da chamada Lei Federal de Incentivo à Cultura, que é a Lei Rouanet. A partir da realização

Circuito de Festivais AudiovisuaisAntonio Leal, diretor executivo do Fórum dos Festivais

www.forumdosfestivais.com.br

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deste Seminário, pretendemos fazer uma interlocução mais profunda para compreender como estamos nos relacionando com a produção de curtas.

E o que nós entendemos que seja da responsabilidade de um organiza-dor é colocar seu evento à disposição da sociedade, principalmente no aspec-to de formação de público – é por meio dos festivais que muitas pessoas têm contato pela primeira vez com o cinema –, e, ao mesmo tempo, estabelecer uma relação entre os festivais.

Conversando com vários organizadores, percebemos que o caderno de encargos dos organizadores brasileiros é superior aos dos festivais de cine-ma de outros países. É um perfil que foi construído assim, temos inúmeras e enormes responsabilidades. A Luísa Lins, que realiza a Mostra Infantil de Cinema, batalha para a implantação de políticas públicas para o cinema infantil. Nós sempre vamos além da obrigação de encontrar um espaço para realização do festival e de exibir bem os filmes, o que também não é uma tarefa simples.

Atuamos em mais de 100 municípios do Brasil. Normalmente, os even-tos não acontecem nos cinemas de shopping, mas em espaços culturais, luga-res adaptados ou mesmo em cidades que sequer têm salas de exibição. Neste caso, são construídas tendas para que as pessoas possam ter contato com o cinema. Esse é o papel que os festivais têm, de colocar uma plataforma con-sistente, forte e regular para que os nossos filmes sejam exibidos. É muito ruim para todos nós quando um festival é cancelado ou a edição daquele ano não ocorre por uma questão de viabilidade financeira. Todos perdem.

Como empreendedores culturais, os festivais têm como meta e como objetivo renovar os seus esforços para cumprir a viabilidade do evento a cada ano. Da relação com o curta-metragem, nós exibimos mais de 12 mil por ano nesse circuito. Além de sediar eventos, procuramos contratar e requisitar serviços de curtas-metragistas para criação de oficinas e da chamada cultura audiovisual na localidade de atuação do profissional.

É importante destacar também que os festivais têm um poder muito forte de inter-relações com as diversas atividades que compõem essa cadeia produtiva do audiovisual brasileiro. Não só na questão da gestão governa-mental, já que sediamos também vários encontros que possibilitam o debate e o encaminhamento de políticas públicas, como também na articulação de tudo o que circula em torno dos festivais.

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Vejo o curta-metragem como uma das expressões da nossa cultura e da nossa juventude, mas também tenho um lado contraditório. Ao mesmo tempo em que apoio o curta-metragem de tudo quanto é

forma como exibidor, minha posição é contrária ao Estado intervir no mer-cado como fez na época da Lei do Curta. Afinal, o cinema não é uma conces-são pública como a televisão. Foi a fraqueza dos sindicatos de exibidores que permitiu essas intervenções indevidas.

Às vezes, elogiamos uma forma momentânea de democratização de acesso que, na realidade, é uma adversidade. Quando se considera os festi-vais como janela de exibição, isso nada mais é do que a expressão de uma pobreza enorme na própria exibição. Nós não podemos fazer da riqueza dos festivais um tapume para o acesso.

Normalmente, a porta de entrada para o cinema é o curta-metragem. É a forma de conhecer e de se relacionar, porque o cinema é uma das artes que precisam desse relacionamento na exibição, distribuição, produção, criação ou roteiro. De todas as artes, é a mais profundamente coletiva.

De certa forma, todos que participam da possibilidade de que a exibi-ção do curta chegue ao olhar do espectador – seja ele de qualquer canto do país ou de que formato – sabem que hoje nós temos uma realidade muito mais rica de potencialidades comparada à de 15 anos atrás, embora continue deficiente na capacidade de execução.

Desde o início, o Circuito Espaço abriu uma janela de exibição a partir da parceria com o Festival de Curtas-Metragens de São Paulo exibindo parte de sua programação. Em 1999, criamos o Curta às Seis, patrocinado pela Petrobras, que durante sete anos tornou possível a 500 mil pessoas assisti-rem aos filmes com entrada franca.

Com o modelo formatado e o patrocínio da Lei Rouanet, essa asso-ciação para exibição de curtas em salas Multiplex aconteceu no Congresso

Circuito Espaço de CinemaAdhemar de Oliveira, exibidor

www.cinespaco.com.br

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Brasileiro de Cinema, entre a ABD e a Associação Brasileira de Multiplex (Abraplex). Conseguimos articular interesses de empresas exibidoras e dos realizadores e tivemos uma experiência de qualidade.

Essas ações objetivam aliar elementos de uma cadeia produtiva sem intervenções, que produzam resultados tocando na questão econômica das salas de cinemas, para que o exibidor consiga fazer projetos patrocinados. A inventividade que outros projetos naquela ocasião demonstraram tem de ser transformada em permanências que não enganem a nossa realidade, seja na internet e na telefonia, seja nos movimentos de comunidade de base ou itinerantes.

A busca da diversidade não é só uma questão do curta, é da progra-mação do cinema. Hoje, o realizador de longa-metragem, aliado ao curta-metragista, também tem dificuldades nessa busca. O ponto em comum que eu tenho, tanto com um quanto com outro, é a filosofia de que a diversidade exposta da cultura do próprio País é um dos pilares da construção de uma sociedade democrática.

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A operadora de telefonia celular Claro criou o Instituto Claro em mar-ço de 2009 com o objetivo de estruturar seu investimento social privado e estimular o uso de novas tecnologias na educação. Uma

das primeiras ações desse movimento resultou no Claro Curtas, festival de curtíssima metragem para vídeos de até 90 segundos a partir de celulares, webcams, câmeras digitais e outros dispositivos móveis.

Em 2008, organizamos a primeira edição do festival, que unia o serviço de tecnologia da empresa ao audiovisual. A ideia era trabalhar o tema “Diver-sidade e Inclusão” em vídeos de um minuto e meio, que podiam ser produ-zidos por meio do celular e outras mídias. Recebemos mais de 1.300 filmes, de 22 estados brasileiros, vindos de 194 cidades. A premiação foi de R$ 100 mil divididos entre os três primeiros lugares e o filme mais votado pelo júri popular. Depois, 20 finalistas foram selecionados para vir à capital paulista participar de oficinas técnicas de aprimoramento, incluindo a acessibilidade dos filmes para pessoas portadoras de deficiência visual e auditiva.

Após a criação do Instituto Claro, lançamos a segunda edição do fes-tival, repensada para trabalhar as novas tecnologias ligadas à educação. Apos tamos em uma plataforma que busca a democratização do audiovisual, principalmente para as pessoas que não têm tanto acesso. É muito comum chegar a Macapá, Belém, Rio Branco ou ao Sul do Brasil e encontrar pesso-as que possuem um celular com câmera e acesso ao YouTube e às mídias sociais. Mas o que elas estão produzindo, qual é a qualidade do que produ-zem? De que forma podemos trabalhar o olhar dessas pessoas para a produ-ção de audiovisual?

Para ampliar os debates sobre as possibilidades trazidas pelas novas tecnologias, suas formas de expressão e participação no mundo contempo-râneo, criamos materiais educativos gratuitos para aprimorar a realização dos vídeos, disponíveis no site do Claro Curtas para download. Por exemplo,

Claro CurtasCarime Kanbour, vice-presidente do Instituto Claro e gerente de responsabilidade corporativa da Claro

www.claro.com.br

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temos uma cartilha feita em parceria com a produtora Casa Redonda e o editor multimídia Carlos Seabra, que ensina como captar o áudio com o celu-lar ou o que fazer se a câmera digital não possuir zoom, entre outras dicas. É uma nova linguagem destinada a quem quer fazer o curtíssimo formato nessas novas tecnologias.

Em 2009, a segunda edição recebeu por volta de 1,9 mil vídeos, vol-tados para o tema “Ser digital”. Além das oficinas, o Claro Curtas disponi-bilizou para download cinco vídeos tutoriais e um miniguia, que também teve versão impressa e foi distribuído para instituições parceiras, ONGs que trabalham com audiovisual e para os Pontos de Cultura do Programa Cultura Viva do Ministério da Cultura. A premiação continuou com o mesmo valor da primeira edição, R$ 100 mil, distribuídos para quatro vencedores. Dez finalistas vieram para o Museu da Imagem e do Som (MIS-SP) participar de Seminários ministrados por especialistas em audiovisual e novas mídias, promovidos em parceria com a Gullane Filmes.

Enfim, para a próxima edição queremos discutir os novos formatos com o Claro Curtas, saber qual é o caminho desse incipiente mercado de audiovisual, como as novas tecnologias entram no mercado e descobrir como isso pode ser importante para a economia criativa.

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Dentro do cenário de produção do curta-metragem, acredito que já estava na hora de fazer um Seminário dessa natureza e também de formatar e botar em operação um sistema para que o curta-metra-

gem dê conta do conteúdo que temos nas mais diversas janelas. É importan-te falar de mercado, de sustentabilidade, mas o poder público sempre terá um papel a cumprir. Na medida em que vamos avançando, o mercado agre-gará parceiros que querem lucrar com esse negócio e essa parcela do poder público diminuirá, mas certamente nunca estará ausente.

Para avançarmos precisamos fazer uma sinergia entre os setores públi-co e privado. O projeto Curta nas Telas é um produto de uma iniciativa da Associação Profissional dos Técnicos Cinematográficos do Rio Grande do Sul e Associação Brasileira de Documentaristas (APTC – ABD/RS) e da Pre-feitura Municipal de Porto Alegre, em conjunto com o Sindicato dos Exi-bidores do RS, com o objetivo de divulgar a produção nacional de curtas- -metragens em sessões comerciais nos cinemas da capital gaúcha. São cur-tas de todo Brasil, inscritos em dois editais por ano. Os filmes selecionados recebem R$ 1,5 mil reais e são exibidos durante duas semanas em sistema de rodízio nos cinemas da capital antecedendo o longa-metragem. Até o último edital, todos os filmes precisavam ser exibidos em 35 mm, com limite de 15 minutos. Adotamos posturas mais flexíveis na renovação do convênio e expandimos para filmes digitais (em Rain), pois vários cinemas possuem hoje sistema de exibição digital. Também ampliamos a minutagem. De 2007 para cá, identificamos uma boa safra de curtas com 16, 17 minutos, então ampliamos para filmes de 15 minutos sem contar os créditos finais, o que dá uns dois minutos a mais para o curta.

Com o novo edital, serão selecionados mais 12 filmes e o Curta nas Telas chegará a quase 250 filmes exibidos em 14 anos de existência – até agora exibimos 237 curtas. O projeto começou na APTC, em 1994, junto

Curta nas TelasJaime Lerner, presidente da Associação Profissional dos Técnicos Cinematográficos do RS (APTC) e da ABD-RS e cineasta

www.aptc.org.br

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com dois vereadores da Câmara de Porto Alegre. Pensávamos em como fazer uma lei de incentivo ao curta-metragem e descobrimos que a existência da Lei do Curta, federal, possibilitava a criação e regulamentação de uma lei parecida no município. Com base nela, expusemos o projeto em uma sessão plenária e tivemos o consenso dos vereadores para criamos a Lei do Curta de Porto Alegre. Precisamos ainda negociar com o sindicato dos exibidores para que não houvesse liminares, pois eles eram contra a obrigatoriedade das exibições. Assim, ao invés da Lei, negociamos entre as três partes e cria-mos o Convênio Curta nas Telas. Hoje, a Prefeitura cria os folders, entra em contato com os realizadores,recebe as inscrições e publica os editais, além de pagar os produtores. Os exibidores exibem e a APTC tem a função de divulgar e fiscalizar o funcionamento e pensar na qualificação do projeto. Nós identificamos duas fragilidades nesse sistema. Alguns exibidores têm boa vontade, outros acham que estão perdendo parte do horário que podiam usar para exibir comerciais. Ainda não existe um incentivo, então eles pas-sam os filmes quase por uma obrigação, apenas porque existe um convênio. Precisamos cobrar, fiscalizar, criar um mecanismo, um incentivo real para que os curtas sejam exibidos. E isso passa pela segunda fragilidade: o públi-co de Porto Alegre não conhece o Curta na Tela. Queremos que, na hora de escolher um filme, a pessoa saiba que em alguns cinemas ela também pode ver um curta-metragem com o mesmo ingresso. Para isso, fizemos um concurso junto aos alunos de Publicidade da PUC de Porto Alegre e criamos uma campanha de incentivo. Até o início do ano vamos divulgar o projeto com o apoio da mídia – RBS, TVE, algumas rádios, BusTV (televisão em ôni-bus) – porque é importante incentivar o exibidor.

Sobre a questão nacional: se a gente conseguir criar um sistema nacio-nal em que o curta já sai casado com um longa será importante para o cine-ma, para o homevdeo e para outras plataformas que venham a ser geradas. Pode ser um casamento temático ou de gênero, o mais importante é que o público crie uma identificação e curta ver o curta-metragem. Não podemos deixar cair a peteca, precisamos avançar com todo o acúmulo de informação deste Seminário e desenhar um formato para um sistema de distribuição que possa ser promovido rapidamente. Eu acredito numa integração de esforços capitaneada pela SAv/Minc para a criação de um sistema de distri-buição e comercialização do curta.

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O momento é muito oportuno para se falar de curta-metragem na perspectiva de um produto. Nos últimos 20 anos, houve um cres-cimento e uma consolidação do circuito de festivais e mostras de

cinema em todas as regiões do País. Eles são a evidência da enorme produ-ção de curtas. Já existe uma economia de curta-metragem. Há muita troca de valor, são centenas de produções anuais, mais recursos são investidos tanto na produção das obras quanto na de eventos, geram-se empregos, o públi-co assiste às exibições nos eventos. Agora, é o momento de pegarmos essa pujança e transformá-la em benefício para os produtores dos filmes.

A Curta o Curta é uma distribuidora exclusiva de curta-metragem nacional. O produtor Guilherme Whitaker criou em 2000 o website Curta o Curta, pioneiro em exibição e divulgação de informações sobre curtas-metra-gens. No final de 2005, me associei ao Guilherme e montamos a Distribui-dora Curta o Curta com o objetivo de desenvolver o mercado exibidor do curta-metragem brasileiro, por meio da promoção e distribuição dos filmes e da publicação de notícias relacionadas ao setor, contribuindo, assim, para a formação de público, valorização cultural das obras e geração de receita para seus realizadores.

Buscamos oportunidades de exibição tanto em salas físicas — e esta-mos olhando para instituições culturais e para grandes empresas que inves-tem em gestão de recursos humanos. Essas últimas estão descobrindo que podem oferecer sessões de cinema, de curta duração, para seus funcionários. Atendemos escolas, também. E prospectamos oportunidades de exibição em mídia eletrônica: telefonia móvel, internet, mídia indoor, TV.

Na relação com os produtores, não adquirimos direitos sobre as obras. Na verdade, funcionamos como um agente. Oferecemos para o produtor o seguinte: eu tenho uma operação comercial para prospectar exibidores. A sua obra fica disponível no meu catálogo, que está no website — não tenho

Curta o CurtaMarcos Vinícius Mannarino, sócio-diretor da distribuidora

www.curtaocurta.com.br

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catálogo impresso. O acesso aos filmes do Catálogo Curta o Curta é restrito para exibidores que se cadastram no site (o cadastro como exibidor não sig-nifica um compromisso de contratação). E, sempre que houver um contrato de licenciamento em negociação com um exibidor, eu volto para o produtor, passo as informações completas e negocio com ele. Por exemplo: o exibidor XPTO está negociando com a Curta o Curta um contrato que inclui 40 fil-

mes. A exibição é em sala física, no endereço tal. Seu filme vai ser exibido em duas sessões, nos dias X e Y. O custo unitário pelo licenciamento é R$ XX,00, e a participação da distribuidora é XX%. Você autoriza?

Nossa atuação comercial busca construir um relacionamento, com transparência e equilíbrio, com os produtores. O produtor sempre sabe onde o filme dele está sendo exibido, por quem, quando e como. E ele tem remu-neração na receita que cada contrato gera.

Privilegio a remuneração do produtor. Viabilizo meu negócio no volu-me de contratos firmados.

E o modelo de negócio, na relação com os exibidores, lhes oferece um único interlocutor para fazer negócio com dezenas de produtores. O exibi-dor não tem de buscar 10, 20, 30 produtores de curta-metragem, negociar valores, firmar contratos, checar documentação, receber mídias etc. para montar a programação para seu público.

Há produtoras profissionais com boa coleção de filmes. Mas muitas vezes são produtores independentes. É um trabalho árduo identificar bons títulos, checar licenças, reunir masters, negociar condições. E é justamente o

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que fazemos para viabilizar a exibição remunerada dos curtas e o acesso do público aos filmes.

Parte desse trabalho é educativo. Dizemos: para o filme entrar no Catá-logo Curta o Curta é preciso ter o CPB. Nem sempre a oportunidade de exi-bição vai exigir o CPB. Mas para a evolução e profissionalização da distri-buição dos curtas, é preciso que o filme tenha o CPB. O registro sistemático das obras ajuda a desenvolver o mercado. Ele permite que a Ancine gere e divulgue séries históricas sobre a produção mais próximas da realidade, conheça melhor esse nicho e desenvolva políticas públicas mais adequadas às nossas necessidades.

Para o exibidor, nosso cuidado dá maior tranquilidade pois reduz o risco de exibição de obras com irregularidades legais relacionadas ao direito autoral. Nossa atuação especializada em curta-metragem é uma vantagem para o mercado porque a produção é extremamente difusa e ainda requer esse grau de cuidado, esse esforço de profissionalização.

Temos mais de 160 títulos no Catálogo Curta o Curta. Temos uma estra-tégia exclusiva e diferenciada para ampliação permanente de nosso catálo-go. Além da Distribuição Curta o Curta, nós temos outro serviço chamado Distribuição Cultural Curta o Curta. Esse último não envolve licenciamento. É, na verdade, um serviço de pós-produção. Ele cuida da inscrição dos fil-mes em festivais. O produtor, ao finalizar sua obra, nos procura, escolhe em quais festivais nacionais quer ter seu filme inscrito, nos contrata e nós cui-damos de tudo: preenchemos fichas de inscrição, fazemos cópias do filme, enviamos pelo correio. Por conta desse serviço, nós apoiamos festivais de cinema. Firmamos parcerias com eles para oferecer gratuitamente pacotes de Distribuição Cultural aos filmes que conquistarem prêmios. Assim, man-temos relacionamento com os festivais e conhecemos os filmes premiados, convidando-os para integrar o Catálogo Curta o Curta.

Desenvolvemos parcerias com festivais e entidades para manter o Catá-logo Curta o Curta atualizado com filmes selecionados e premiados. Firma-mos parceria com a Mostra de Cinema Infantil de Florianópolis, a Mostra do Filme Livre e a Associação Brasileira de Documentaristas Nacional (ABD-N). A produção de curtas que circula nos festivais é a mais nobre. Os festivais têm um papel muito relevante no que diz respeito ao curta-metragem nacio-nal. Eles dão conta da consistência da produção do curta, se olharmos para os últimos 10 anos de produção.

O Catálogo Curta o Curta possui obras de ficção, documentários, ani-mações e experimentais. Infantis e adultos. Sem pornografia. Filmes recen-tes. Temos esse foco de ter no catálogo os filmes que estão circulando nos

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festivais. Mas isso é um foco, não é uma restrição. Também temos filmes mais antigos, que já não participam dos festivais. Casa de Cinema de Porto Alegre, Superfilmes, Urca Filmes, Quadro Vermelho, ABCA são algumas das produtoras com quem já temos um contato mais próximo.

Para falar um pouco sobre resultados e o negócio em si, há um poten-cial enorme de organização de sessões de curtas para exibição remunerada em salas físicas.

Desde 2008, negociamos anualmente com a Secretaria Municipal de Educação do Rio licença de filmes. Eles desenvolvem um projeto fantástico para formar professores e alunos como público de cinema. Hoje, há mais de 200 escolas municipais do Rio de Janeiro com filmes infantis de curta-metragem licenciados pela Curta o Curta para exibição permanente aos alu-nos e professores.

O senador Cristovam Buarque elaborou um projeto de lei que está em tramitação no Congresso para abrir uma janela de duas horas de exibição de audiovisual nas escolas. O curta pode, efetivamente, atender parte dessa demanda que enriquece a educação, faz a democratização do acesso ao cine-ma nacional e forma público.

O “Curta no Almoço”, realizado na Caixa Cultural do Rio de Janeiro com patrocínio da Caixa, é um evento de exibição de curtas em sala física. Lá, atuamos não apenas como distribuidores. Somos produtores do even-to, com projeto aprovado no edital da Caixa Cultural. São três semanas de sessões diárias de curta-metragem no horário do almoço. Uma sessão por dia (de terça a sexta-feira), de até 20 minutos, com 1 a 3 filmes, às 12h30, e reprises às 13h e às 13h30min. Começamos em 2007 e fazemos uma edição por semestre.

Desde a primeira edição, em fevereiro de 2007, até a última em setem-bro, um total de 7.841 pessoas assistiram aos 91 curtas exibidos. A média diá-ria de público chegou a 164, em 2010. Em 2007, foi de 75. Cada edição é uma experiência fantástica onde acontece nosso contato diário com o público.

Em cada edição do evento fazemos sessões exclusivas para alunos de escolas da rede pública estadual. Alugamos ônibus para transportar as crianças da escola para a Caixa e levá-las de volta. São duas sessões infanto-juvenis. A programação é de curtas infanto-juvenis. Em uma das sessões promovemos debate entre os alunos e realizadores dos filmes da TV Morri-nho, uma iniciativa na comunidade do Pereirão (Laranjeiras). Então, além da exibição, os alunos batem papo com os produtores que são da comunidade.

O Curta no Almoço tem sido nossa experiência mais consistente de licenciamento para exibição em salas físicas, com fortes desdobramentos.

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Fizemos o Curta no SESI-RJ em 2009, durante quatro meses, com sessões semanais. Em 2010, foram retomadas durante quatro meses. Estamos nego-ciando para ampliar para outras unidades SESI que existem no Rio em 2011. E o CCBB de São Paulo aprovou o projeto Curta o Curta no Almoço, no edital, com sessões de outubro a novembro deste ano.

Em 2010, licenciamos três filmes para o Congresso Nacional de Medici-na do Trabalho e dois para o Congresso Brasileiro de Geriatria.

Em mídia eletrônica, firmamos contrato com a Claro. Oito curtas já estão disponíveis no Minha TV Claro. E outro com a EnterPlay, um canal de veiculação web&celular. Temos filmes em exibição na SESCTV pelo progra-ma CurtaDoc. Já licenciamos filmes para a TV Brasil (em 2008), para o portal web da Oi.

Este ano, apoiamos o Festival Olimpikus, na seleção dos ganhadores. E o festival ofereceu para o filme vencedor “Elton e a bailarina”, de Diógenes Fritsh de Moraes, um pacote da Distribuição Cultural Curta o Curta.

A Dobra Digital é uma empresa de recursos humanos que licenciou filme para ação interna de RH.

Além da Distribuição Curta o Curta e da Distribuição Cultural Curta o Curta, mantemos o website. Lá mantemos o Acervo Curta o Curta de fil-mes com acesso gratuito, na íntegra, por streaming. Produtores de filmes do Catálogo Curta o Curta podem optar por ter o filme exibido, sem custo e sem restrições, no Acervo Curta o Curta.

O Curta o Curta foi o primeiro website brasileiro de exibição de curtas e divulgação de informações, em 2000.

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A inovação do nosso modelo de negócios, onde tentamos desenvolver uma relação com os produtores de confiança, de transparência, de valoriza-ção dos filmes, é sustentada em sistemas de informação. Nossa operação é baseada em sistemas de informação. Precisamos manter um nível perma-nente de investimento para desenvolver essa área.

Seria muito interessante licenciar filmes para unidades Sesc. Já fizemos alguns contratos isolados com as unidades como Santos, São José do Rio Pre-to e Birigui. Mas há um enorme potencial de desenvolvimento econômico e cultural com a circulação regular de filmes em salas físicas de unidades do sistema ‘S’, bastante atraente para os produtores.

Entendemos que o curta-metragem é parte da produção audiovisual nacional que promove cultura e lazer. Ele forma público para o cinema bra-sileiro. Nossa missão é desenvolver o mercado exibidor do curta-metragem brasileiro, por meio da promoção e distribuição dos filmes e da publicação de notícias relacionadas ao setor, contribuindo, assim, para a formação de público, valorização cultural das obras e geração de receita para seus reali-zadores.

Queremos ser reconhecidos por produtores e exibidores como a melhor distribuidora de filmes de curta-metragem brasileiros, pioneira, inovadora, comprometida com o desenvolvimento do setor e com visão de longo prazo.

A distribuição tem um caráter muito importante na formação de valor do curta-metragem. Exibidores e produtores não possuem estruturas pre-paradas para fazer a intermediação necessária. Essa riqueza não pode ser desperdiçada.

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Acredito que a TVE tenha sido a primeira televisão brasileira de sinal aberto a veicular curtas-metragens. A TV Brasil herdou essa tradi-ção, que vem do final dos anos 1970, mais de 30 anos atrás, quando

foi criado o programa “Cinemateca”, produzido pelo SRTV da Embrafilme. Mais tarde, o programa foi transformado no “Telecine Brasil”, de responsa-bilidade da Fundação do Cinema Brasileiro, com curadoria do CTAv. Mais adiante, se transformou no “Curta Brasil”, que durante anos exibia dois fil-mes por semana. Sem exagero, milhares de curtas brasileiros foram exibidos nesses programas, que foram sucessivamente mudando de nome e tendo seu formato aperfeiçoado. Eu mesmo participei pelo menos cinco vezes, seja para debater curtas realizados por mim, seja como debatedor convidado. Testemunhei a evolução contínua do programa, que por meio dos curtas promovia debates não só sobre cinema, mas sobre a sociedade brasileira, de modo geral. O “Curta Brasil” está em fase de reformulação e, ainda no final de 2010, passará a ser realizado por uma produtora independente que vai proporcionar nova roupagem, novo formato e nova apresentadora.

Outro programa dedicado ao curta na TV Brasil é o “Curta Criança”, que também começou na TVE, em parceria com a Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura. É um programa que envolve também um esforço de formação, por meio de oficinas para desenvolvimento dos projetos, com participação de especialistas em comunicação para a infância. Essas oficinas também têm como objetivo ajudar o realizador a melhor formatar o seu cur-ta para a grade de televisão. Temos também na nossa grade de programação o “Animania”, dirigido por Quiá Rodrigues, um programa que exibe curtas de animação.

Além desses, a TV Brasil está realizando, juntamente com o Ministério da Cultura, o programa AnimaTV. Não é exatamente um programa de cur-tas, mas uma iniciativa que visa o fomento da animação e também a criação

EBC/TV BrasilSilvio Da-Rin, gerente executivo de articulação e licenciamento da rede e do canal

www.ebc.com.br

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no Brasil da cultura da série de televisão. Em outubro de 2008, lançamos um concurso público que selecionou 18 projetos. Seus autores receberam recursos para desenvolver as “bíblias” e produzir os pilotos de série, exibidos e reexibidos no começo de 2010. Os produtores dos dois melhores projetos, escolhidos por uma comissão, com apoio de grupos focais e pesquisa de público, estão realizando séries de 13 curtas de 11 minutos.

Também no campo da animação, em 2011 vamos ter a segunda edi-ção do “Tela Verde”, uma iniciativa conjunta do Ministério da Cultura com o Ministério do Meio Ambiente. São programas curtos, com um minuto de duração. O tema do primeiro concurso foi “Aquecimento Global”. Para a segunda edição o tema é “Consumo Sustentável e Biodiversidade”. Outro edi-tal em parceria da TV Brasil como MinC, também para realização de micro-metragens de animação, prevê a produção de 50 interprogramas, com dura-ção de 90 segundos cada. São séries de animação, centradas em dez temas de interesse social, como Cidadania, Gentileza Urbana, Patrimônio Histórico, entre outros. Cada contemplado receberá R$ 125 mil para a produção das cinco micrometragens de um mesmo tema.

Outro programa de curta-metragem da TV Brasil, que saiu do ar mas está sendo renegociado, é um formato proposto pelo José Araripe Jr. - o “Fes-tival de Vídeo Tela Digital”. O programa atrai uma produção espontânea, feito com celular ou minicâmeras, que veicula uma produção independen-te bastante inovadora. Também estamos desenvolvendo novos formatos de programas para exibição de curtas-metragens.

Chegamos então à segunda parte da minha intervenção, que diz respei-to diretamente às atribuições da gerência executiva da TV Brasil que recen-temente me foi confiada. Trabalhamos em três vertentes. Uma delas é o licenciamento, ou seja, a aquisição de direito de antena de produções já exis-tentes. Nós desmontamos o balcão para negociação conforme o currículo e o prestígio do produtor e adotamos a modalidade do edital, completamente compatível com uma empresa pública de televisão. Os produtores entram no sistema eletrônico, via internet, leem a proposta e, caso se interessem, inscrevem seus filmes. Nós formamos comissões com cinco membros, três da televisão e dois colaboradores externos, que selecionam os filmes pelo mérito, conforme os objetivos da TV pública, a qualidade técnica e artística. A precificação é objetiva, vem com a obra. No momento em que decide ins-crever o filme, o produtor pode fazer as contas e saber exatamente qual será o preço do licenciamento, caso o título venha a ser indicado pela Comissão Avaliadora. O primeiro edital, para longa-metragem de ficção, está em aná-lise no departamento jurídico e será lançado nos próximos meses. O segun-

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do será para curta-metragem, exatamente para criar um estoque de filmes para a Superintendência de Programação e os produtores e curadores desses diversos programas que eu citei.

Para esse primeiro edital de longa-metragem de ficção nós adotamos como preço básico o valor mais alto que a casa estava praticando: R$ 12 mil. E criamos uma série de critérios de suplementação. Para a animação, que é uma produção mais demorada e mais cara, são acrescentados 30%. Caso a obra seja inédita em TV aberta, 50% a mais - ou 70%, caso seja também inédita em TV por assinatura. Conforme o público atingido em sala de cine-ma, novos percentuais de suplementação ao preço básico, de 15 até 60%. A participação ou premiação em festivais também contribui para aumentar o valor do licenciamento. Enfim, condições objetivas que acompanham a obra e não dependem de negociação caso a caso.

Vamos adotar um formato semelhante no primeiro edital para curta-metragem. Em seguida, haverá um terceiro edital, para longa-metragem documentário, que vai dar lugar a uma faixa de programação com deba-tes sobre documentários brasileiros de longa-metragem na TV Brasil. Na sequência, pensamos lançar um quarto edital, para séries.

Para finalizar, eu diria que uma demanda especialmente significati-va, não só da televisão brasileira, mas de toda a comunicação audiovisual no Brasil, é de conteúdos infantis. A TV Brasil tem 38 horas semanais de conteúdo infantil, e infelizmente só conseguimos preencher 72,5% dessa demanda com conteúdos brasileiros. Somos obrigados a licenciar no mer-cado internacional — essa também é uma atribuição da gerência executiva que me foi confiada. A Programadora Brasil também recebe uma enorme demanda de conteúdos infantis, e as apresentações feitas nesse Seminário de algum modo vão contribuir para mostrar à comunidade de produtores e realizadores brasileiros que esse segmento de mercado necessita muito da nossa atenção e certamente será compensador em termos financeiros.

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Especialmente nos últimos anos, o Brasil tem produzido muito conteú-do audiovisual de diferentes gêneros e formatos, mas a distribuição ainda está abaixo desse potencial de realização. Esse é o foco da Elo

Company. No mercado nacional, a empresa trabalha com distribuição tradi-cional para televisão, cinema e linhas aéreas e possui um catálogo com mais de mil títulos, entre curtas-metragens, documentários e pílulas, predominan-temente brasileiros.

Fora do Brasil, conta com uma rede de representantes de vendas na Alemanha, Colômbia, Venezuela, França, Espanha, Portugal, Ásia e envia participantes aos principais eventos de cinema e televisão nacionais e inter-nacionais. Hoje, podem-se encontrar produtos nacionais nas companhias aéreas Air France, TAP e Avianca. Em televisão, há programas brasileiros no Irã, em Moçambique, na BBC, no Canal Plus, entre outros.

O curta-metragem tem demanda no Brasil e no exterior com resultados impressionantes. Um exemplo disso é a exibição de curtas brasileiros em salas de cinema na Rússia. Mas como qualquer outro produto que não seja o norte-americano. A distribuição deste conteúdo exige trabalho constante.

Presente na maioria dos festivais e mercados internacionais, a Elo par-ticipa dos programas Cinema do Brasil e Brazilian TV Producers, que são óti-mos para quem se concentra na distribuição internacional. Por mais que se esteja falando de um produto cultural, necessitamos de pessoas e empresas que conheçam e que mantenham relacionamentos no mercado local e que estão ali presentes no dia-a-dia.

Há mais de três anos, percebemos que havia uma demanda na área de mídias digitais. Então, primeiramente nos concentramos na venda dos pro-dutos brasileiros nessas mídias para o mercado internacional. Por exemplo, na época em que o Skype montou na internet a TV Joost, a Elo foi sua parcei-ra e fornecia conteúdo brasileiro, incluindo curtas-metragens no canal ELO

Elo CompanySabrina Nudeliman, co-fundadora e diretora da distribuidora

www.eloaudiovisual.com

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CINEMA. Hoje, nosso foco é o desenvolvimento de ações inovadoras com o incentivo à difusão da produção independente e à democratização do acesso por meio das mídias tradicionais e digitais.

O Brasil é um dos maiores mercados de mídias digitais, é líder em uso de redes sociais, tem mais de 70 milhões de internautas e um mercado de mídias digitais maior do que salas de cinema. Do outro lado, temos uma abundante produção audiovisual. Então, por que não juntar as duas coisas?

Existem várias iniciativas, como TV Escola online e outras já citadas. É claro que o YouTube tem de tudo, mas é preciso organizar a busca por-que a maioria do público brasileiro que não é expert em cinema nacional talvez procure hits como o “Tapa na Pantera”, da Ioiô Filmes. Então, para todos os outros filmes é preciso dar um direcionamento. A Elo tem 18 canais temáticos gratuitos de conteúdo nacional segmentado, como Elo Sustentável (www.elosustentavel.com), Elo Anima (www.eloanima.com) e Elo Cinema (www.elocinema.com).

Dicas para a produção e comercialização em mídias digitais

Os direitos autorais devem ser levados em conta na adaptação de qual-quer obra. É preciso tomar cuidado com a trilha sonora e as conversões de peças literárias. Vale utilizar trilhas brancas e conteúdos com licenças Creati-ve Commons. Ler, fazer os contratos e estar envolvido no processo são fato-res importantes para que o filme não seja barrado por conter um trecho de

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uma música do Pink Floyd, por exemplo. Quem assina o contrato é respon-sável pelos direitos de imagem e de áudio, entre outros. Para distribuir um filme é necessário estar envolvido no processo ou ter o auxílio de um bom produtor. É pensar no expectador antes de produzir e pensar na distribuição quando estiver produzindo.

Já o foco para a exibição e distribuição depende de um público-alvo, porque quem tenta atingir todas as audiências provavelmente não atingirá nenhuma. Quem tem como foco a distribuição precisa conhecer seu público-alvo, saber qual o tipo de história está contando e se o consumidor está na TV, internet ou celular.

Em termos de roteiro, vale a pena conhecer os editais de fomento ao desenvolvimento de roteiro. Afinal, é a alma de todo filme. Esse é um dos gran-des desafios do cinema nacional, pois muitas vezes o projeto tem boa produção, trilha excepcional, mas não obtém a difusão devido a falhas de argumento.

Com a vocação das redes sociais para divulgação, o uso de material extra se tornou ainda mais importante. Durante as filmagens, pode-se fotografar o processo de making of e adicionar entrevistas e outros materiais em um perfil de rede social, tanto no pré quanto no pós-lançamento.

O barateamento dos meios de produção possibilita fazer um curta com poucos recursos. Existem ótimos guias de produção que ensinam como fazer um roteiro, filmar e editar. Vários softwares livres também ajudam a realizar o processo de produção. Um bom roteiro, dedicação e produção legal não estão necessariamente ligados a grandes verbas. Em nosso catálogo, há exemplos de curtas universitários que foram distribuídos no mercado com sucesso.

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Existem mecanismos automáticos de inscrição em festivais e alguns podem oferecer mais prestígio do que outros, por isso é importante conver-sar com o distribuidor. Ele pode aconselhar a melhor estratégia para difun-dir o curta e impedir que o realizador perca a chance de entrar no Festival de Cannes porque já participou de outro evento no interior da França. Outra dúvida constante é saber se é possível colocar o filme primeiramente na internet. Não há empecilho. Cannes, Karlovy-Vary e vários outros europeus já possuem festivais online, que acontece em paralelo ao de sala de cinema.

Vivemos uma fase de mudanças, há certa preocupação de como traba-lhar no meio digital em uma época em que as pessoas sobem tudo para o YouTube. Mas também há uma grande oportunidade, principalmente para que o curta-metragem possa ir para o celular, iPad, games e uma série de mídias digitais. Não há mais diferenciação entre veículos porque há um aumento de funcionalidades e interfaces tecnológicas. Temos o 3D, a reali-dade aumentada, roteiros transmídia, tudo é interessante. No Brasil, é alto o consumo de games e das redes sociais, mas a nossa produção voltada para essas novas tecnologias ainda é muito pequena.

Vale estar atento a estas novas oportunidades que se apresentam.

O comportamento do consumidor

Todos já devem ter ouvido falar no conceito “cauda longa”. Com o baixo custo de carregamento que as mídias digitais trazem, pode-se disponibilizar uma infinidade de conteúdos sem ter que ocupar prateleiras com DVDs e ainda possibilitar a segmentação. Por exemplo, em um supermercado, a pra-teleira recebe um conteúdo de nicho que pode ser ocupada por outro que gere mais lucro. Mas as novas tecnologias contribuíram para a defasagem desse modelo por apresentar um baixíssimo “custo de carregamento”.

A Elo parte de duas premissas: a grande maioria de consumidores não vai pagar para assistir conteúdo nas mídias digitais; e o mercado de Comuni-cação e Marketing está sofrendo com a queda de impacto dos 30 segundos, que praticamente não existe mais. Por isso, a empresa direcionou seu foco para o relacionamento das marcas com os conteúdos e para a disponibiliza-ção gratuita.

Ainda não se sabe o impacto dessas mídias digitais no cinema. Uma analogia interessante é ver as experiências que aconteceram no mercado da música. É raro encontrar pessoas que ainda comprem CDs. Pegando um dado simplista, a venda de música por mídias digitais já representa 12%

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do total do faturamento. É um valor que cresce muito se analisarmos essas mídias como difusores do artista e como receita incremental nos shows.

Para quem trabalha com canal de cinema, videoclipe de música, moda ou sustentabilidade, é muito interessante estudar o comportamento desses segmentos. Os produtores de sustentabilidade aceitam com simpatia a difu-são gratuita de conteúdo audiovisual na internet porque o foco deles é o engajamento com a causa. Já o mercado de cinema ainda não está convenci-do. Em nosso canal temos material da Vera Cruz, da Ioiô Filmes, mas grande parte do mercado ainda resiste por desconfiança.

Em termos de ineditismo, as mídias digitais não queimam as janelas. Há casos como o filme “3 EFES”, da Casa de Cinema de Porto Alegre, lança-do simultaneamente em quatro mídias diferentes. Os próprios festivais de cinema europeus exibem online em paralelo ao festival, antes mesmo do lançamento em sala de cinema. Na ELO, disponibilizamos um curta online da Ioiô Filmes que foi comprado também pelo canal francês Plus.

Já o temor em relação à pirataria é o mesmo que se deve ter em relação a outras mídias tradicionais. Todos os sites sérios têm um sistema de prote-ção de conteúdo por meio do DRM, um conjunto de tecnologias anticópias. A ferramenta restringe, mas não barra por completo quem copia ilegalmen-te. Há pessoas que gravam até em salas de cinema.

Também há dúvidas quanto aos produtos cujos direitos estão compro-metidos em alguns territórios, como as séries americanas da Hulu que são bloqueadas para o Brasil. Basta usar um filtro de tráfego (GeoBlock) contra outros mercados e não haverá impedimento para difusão em mídias digitais.

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Fui presidente da ABD em 1974, quando criamos a Lei do Curta. Pas-saram-se 36 anos e podemos notar que, embora a lei não tenha sido implementada daquela forma, os formatos de curta duração se multi-

plicaram e encontraram vários canais diferentes de veiculação.Hoje, o objetivo principal do Cel.U.Cine é buscar novos formatos de cur-

ta-metragem para serem exibidos no celular, criar e encontrar novos talen-tos. Criamos o termo micro-metragem porque são produtos de 30 segundos a 3 minutos e não existia essa classificação em lugar algum.

Todo realizado no ambiente do site, o Cel.U.Cine tem edições temáticas e é apresentado em outros festivais. Nossa primeira experiência aconteceu em 2008, no Festival de Brasília. Em 2009 tivemos uma participação importante no Festival Internacional de Curtas-Metragens de São Paulo, quando apre-sentamos o Festival e realizamos um workshop sobre novas mídias. Também participamos do Cine PE, do Festival de Cinema do Ceará, da Mostra de Tira-dentes, do Festival Indie de BH e do Visões Periféricas no Rio, entre outros.

Festival de Micrometragens Cel.U.CineMarco Altberg, produtor e diretor de cinema, TV e novas mídias e coordenador geral do festival

www.celucine.com.br

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O Cel.U.Cine é uma porta de entrada para o cinema e para o setor de audiovisual. A cada edição temática, propomos um tema para estimular o realizador, que na maioria das vezes é iniciante. Os cinco semifinalistas rece-bem kits de celulares com câmeras filmadoras e depois se juntam aos outros semifinalistas e seguem para o Festival do Rio, quando concorrem à premia-ção final.

No ano passado o vencedor foi A palavra mais difícil, de Bruna Baitelli (RJ). André Pinto Silva (PE), um cineasta revelado pelo festival, recebeu o segundo lugar por 100 em 1; Fernando Lima ficou com o terceiro lugar, pelo filme Carajás; e também tivemos o prêmio do júri popular, por meio de vota-ção no site. Tivemos quatro edições em 2009, mas neste ano começamos um pouco mais tarde e realizamos apenas duas. O primeiro tema foi “O mundo é uma bola”, com mais de 150 inscrições. Os cinco selecionados ainda aguar-dam os próximos cinco que concorrerão com o tema “Lendas urbanas”.

O objetivo do Festival é ter uma massa de produtos para criar canais na telefonia celular que exibam esses curtas no futuro. Os filmes devem ser captados com qualquer tecnologia digital e qualquer suporte, e também devem ser inéditos. A inscrição é toda feita pelo site, que possui um formato de blog. O primeiro lugar recebe a premiação de R$ 15 mil; o segundo, de R$ 7 mil; o terceiro, de R$ 5 mil e a RioFilme ainda oferece um prêmio espe-cial para o filme eleito pelo voto popular.

Nosso corpo de jurados é composto por José Wilker, Selton Mello, Esmir Filho, Adriana Alcântara, da Oi TV, e Cora Rónai, jornalista especializada em novas mídias. O Cel.U.Cine é realizado em parceria com o Oi Futuro, que é o instituto de arte, cultura e responsabilidade social da empresa, com apoio da RioFilme, que fornece o prêmio e é nossa parceira na criação de um trabalho de capacitação junto às escolas municipais do Rio de Janeiro, além do Canal Brasil, que veicula os filmes selecionados e premiados.

É importante saber que o curta-metragem tem realmente amplas possi-bilidades, sobretudo com a TV. Hoje a televisão é uma grande janela para o formato de curta duração e as chamadas novas mídias, internet celulares, e até a possibilidade de games.

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Com a proposta de fazer curtíssimas-metragens, o Festival do Minuto é um pouco diferente dos outros festivais. Possuímos categorias des-tinadas aos filmes de até cinco segundos ou de até dez segundos, por

exemplo. Pode parecer exagerado, mas os resultados são interessantes. Apesar de todas as dificuldades do mercado de curta-metragem, acu-

mulamos alguns dados interessantes com a experiência que o Festival do Minuto tem desde 2007, quando começamos a investir mais pesado na inter-net – nós recebemos e exibimos os filmes por esse meio – e a central do Festival passou a ser online.

Eu ousaria dizer que o Festival do Minuto hoje em dia é um dos prin-cipais compradores de curta-metragem do Brasil. Não são exatamente com-pras, mas prêmios são entregues mensalmente e isso soma mais ou menos uns R$ 100 mil por ano, divididos em remunerações de R$ 100, 500, 2 mil, 5 mil ou, em alguns casos, computadores, câmeras, entre outros, dependendo do concurso que é feito. Nosso foco principal é revelação de talentos tanto de profissionais como de amadores. Vale lembrar que já passaram pelo Fes-tival do Minuto pessoas como Fernando Meirelles e Esmir Filho, e que os próximos diretores de cinema, que vão fazer sucesso daqui a alguns anos, certamente estão fazendo seus filmes do Minuto. Somos o maior celeiro de talentos do audiovisual do Brasil.

Agora, temos outro foco de trabalho que é o desenvolvimento de tec-nologia tanto para o nosso portal online, como para o sistema de avaliação de filmes. Para se ter uma ideia, recebemos por dia em média 15 filmes e, perto da data de vencimento do concurso, chegamos a receber 250. Come-çamos a investir em tecnologias de inteligência artificial, combinadas com tecnologias de avaliação por curadores online espalhados pelo Brasil inteiro, para manter a qualidade dos julgamentos mesmo quando recebemos 250 fil-mes. Ao contrário de outros portais de vídeos na internet, nós só publicamos

Festival do MinutoGustavo Steinberg, produtor executivo e diretor de novos negócios do festival

www.festivaldominuto.com.br

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filmes julgados pela equipe de curadoria do Festival do Minuto, que chega a ter entre 30 e 35 curadores, dependendo do volume de filmes recebidos.

Essa tecnologia está cada vez mais consolidada e já foi utilizada pelo Festival de Curtas e também na realização programa Tela Digital, da TV Bra-sil. Todo o sistema de julgamento foi desenvolvido pelo Festival do Minuto e estamos trabalhando com possibilidades de parcerias, além de desenvolver-mos outros itens diretamente para o usuário. Hoje, ao entrar no portal do Fes-tival do Minuto, o usuário pode avaliar os trabalhos e receber recomendações de vídeos de acordo com seu perfil, ou seja, estamos criando tecnologias para que as pessoas consigam penetrar no nosso catálogo de 15 mil filmes online.

Temos os vídeos destacados pela curadoria que recebem maior atenção, mas nem sempre os usuários concordam com essas seleções. Então, essa tec-nologia de inteligência artificial é interessante para que as pessoas tenham acesso a outras opções, de acordo com sua preferência. Isso tem funcionado bastante bem. É só entrar lá e julgar dez vídeos para começar a receber reco-mendações de filmes que combinam com seu perfil.

Nós também fortalecemos nossas parcerias para exibição. Por exemplo, agora o YouTube exibe e destaca os filmes que são premiados mensalmente com o Festival do Minuto. O participante faz um filme, edita, manda para o site e daqui a uma semana pode ser premiado. Duas semanas depois, o filme será exibido em uma série de canais de parceiros nossos que são UOL, IG e YouTube. Alguns desses vídeos chegam a 500 mil expectadores em apenas duas semanas depois de terem sido criados.

É uma experiência bastante interessante. Os conteúdos que são veicula-dos no YouTube geram receita quando são monetizados, ou seja, quando são adicionadas propagandas. E já é uma política do Festival do Minuto dividir o que ganhamos meio a meio com o realizador. Também oferecemos todo o dinheiro do período para os cinco filmes mais vistos no YouTube. Isso acaba gerando uma receita razoável, R$ 400, 300.

Os realizadores também são pagos quando fazemos projeções em locais que não contam com equipamentos de exibição. É muito chato exibir sem pagar. Só não pagamos quando se trata de uma exibição não comercial. Faze-mos em mais de 250 municípios, atingindo mais de 100 mil espectadores. Também veiculamos no exterior porque o Festival do Minuto foi o primeiro festival de vídeos e filmes de até um minuto do mundo. Depois, outros fes-tivais foram surgindo em outros países. Então, eles têm uma relação muito boa conosco. Fazemos troca de filmes, exibimos aqui trabalhos estrangeiros e eles exibem os nossos no exterior. Nós exibimos em museus, em televisão e em centros culturais ao longo do ano inteiro.

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Além disso, temos um projeto piloto em 4.500 escolas estaduais do Estado de São Paulo para trabalhar a formação. É um projeto interessante que capacita professores para ensinar seus alunos a fazerem vídeos. Isso dá um universo de 3,5 milhões de alunos e pretendemos ampliar o projeto para o resto do Brasil. A ideia é que os professores ajudem os alunos com nosso material didático – produzido com base nos filmes que a gente tem no acer-vo –, e entrevistas dos próprios realizadores. Ou seja, não é uma coisa teó-rica. Nós entrevistamos realizadores que explicam como foram feitos seus filmes, depois montamos o material didático, distribuímos para as escolas e capacitamos os professores. Os resultados são bem legais e são colhidos por meio do mesmo modelo de concurso que nós temos, mas criado especifica-mente para as escolas.

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Antigamente se falava de multiplataformas, hoje isso é coisa do pas-sado. Hoje são multimeios. Primeiro, vamos falar sobre esse tipo de mercado e sobre resultados financeiros. Segundo, podemos falar

sobre métricas, porque temos que saber o resultado, ou seja, quem assiste, o que e quando. Nossas plataformas não são apenas para celular, também são para Web TV, IPTV e agora estamos criando um novo canal de televisão que vai ser transmitido por cabo e por DTH. Esperamos também chegar à TV aberta, não para concorrer com a Rede Globo de Televisão, mas para fazer uma diferençazinha no caminho, para criar um ponto fora da curva. Nossa ideia é “liberar geral”, sem censura, e colocar o veículo à disposição de vocês.

O produtor que tiver conteúdo pode entregar para a Talitha e receberá uma interface web para acompanhar os acessos. Nesse primeiro momento, não vai ganhar dinheiro, porque nesse momento o que temos de fazer é criar novos conceitos, formar opiniões e medir o público. A cultura móvel

M1ND – Laboratório de Aplicativos em TelefoniaAlberto Magno, CEO da empresa

www.m1nd.com

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é muito nova, mas tem um potencial de outro planeta, é outro universo. O Circuito Espaço, por exemplo, vai abrir quatro novas salas de cinema em Novo Hamburgo, uma delas 3D, com um potencial para 300 mil pessoas. Mas até o fim de 2010 existirá 1,5 celulares por habitante no Brasil, dos quais 87% são aptos a assistir TV. Esse futuro é o nosso presente.

Por isso é que, na minha opinião, o conteúdo deve ser feito para multi-meios, não mais para multiplataformas. Podemos disponibilizar um canal só para a exibição de curtas e traçar gráficos e parâmetros métricos, para que vocês possam acompanhar os acessos e disponibilizar a venda on demand dos seus produtos. Aí sempre pinga e, como dizia meu pai, onde pinga nunca seca. Esse é o tipo de negócio que pode ser feito hoje, a menos que exista algum patrocínio.

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Nós já temos alguns cases. Quatro grandes anunciantes acreditaram na gente aqui no Brasil e hoje somos líderes absolutos no mercado. Estamos expandindo para América Latina, África, Leste Europeu e Oriente Médio. A princípio só queremos trabalhar no Terceiro Mundo. Nossos primeiros patrocinadores foram a IBM, Xerox, Johnny Walker e Nike.

O mundo móvel se tornou tão importante que além de transmitirmos a Copa do Mundo da África do Sul em 3D para o mundo todo, a Nike, um dos principais patrocinadores deste evento, escolheu os devices móveis (celula-res) para lançar o filme da Copa, de três minutos, antes de lançá-lo em qual-quer outro veículo. Esse mundo é o do IP, onde posso falar com cada um de vocês. Quando entrego uma publicidade para uma pessoa, é uma publicida-de um a um. Pelo IP, sei exatamente quando a pessoa está assistindo, o quê e por quanto tempo. Não é preciso sentar todo mundo e ver a mesma coisa. Além disso, todo mundo pode opinar e programar, e então formar seu line-up, porque é tudo digital. Além de chats, interação, essas coisas todas que só estarão por aqui nas TVs abertas em 2014, com a TV Digital, e que no mundo móvel já acontecem.

No caso, a Nike nos deu 80 mil números de celular entre Argentina, Brasil e Itália para que enviássemos esses filmes de três minutos. Era um comercial com Cristiano Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho e outros atletas, foi visto por essas pessoas um dia antes da estreia mundial na mídia convencio-nal. Essas pessoas puderam opinar antes, através de um chat, sobre a Cam-panha. Entrou no Brasil às 19h de sexta-feira e saiu sábado às 12h. Só depois de 108 inserções na TV Móvel é que foi veiculado nas TVs abertas. Isso significa que eles já estão enxergando de forma diferente o mundo móvel.

A Campari acabou de nos contratar. Eles estão lançando mundialmente 150 filmetes de 3 minutos, veiculados durante um ano com 1,8 mil inser-ções. Então meu conselho como cientista — eu fui o único que dei errado na família, o resto todo é artista — é o seguinte: busquem patrocínio apre-sentando todas as plataformas de exibição. Nós conseguimos oferecer os dados da quantidade de acesso, o tempo de acesso e ainda no mundo móvel a pessoa assiste em média de 3 a 8 minutos em média. Ou seja, é a duração de um curta.

Nosso modelo de negócio atualmente é igual ao de uma TV por assina-tura. Oferecemos vários pacotes de canais para exibição nessa televisão que tem duas ou três polegadas — a tela do celular. O cliente compra um pacote e nós também oferecemos canais gratuitos para degustação, com o objetivo de mostrar essa diversidade cultural por meio dos filmes curtos. Nesse caso, não há dinheiro envolvido, nem da operadora, nem da dona da solução (que

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é a M1ND), nem do usuário final. É uma plataforma que serve para medir a aceitação dos produtos.

Além das plataformas da M1ND, estou fundando um canal de televisão chamado HUMM! TV. Montamos uma equipe de 585 profissionais volun-tários — roteiristas, atores, câmeras, iluminadores — que durante 180 dias vão trabalhar de graça, porque acreditaram no sonho, com contratos pré-assinados. Vamos passar esses 180 dias experimentando e ver o que dá certo. Se der audiência, vão receber a partir dessa audiência. O que estou propondo é um estudo de viabilidade. Estou abrindo um veículo para que se possa tes-tar a viabilidade, ver se vai ter audiência, que tipo de público vamos atingir. Vamos precisar segmentar, ter horários específicos para o público feminino, para o público jovem. A partir do momento que der audiência, vira dinheiro. Todo mundo ganha, é uma cadeia.

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Estou representando a Associação Brasileira de Videolocadoras, mas somos ao todo em dez pessoas que, de alguma forma, tentam fazer as coisas andarem. Também sou proprietário da CultVídeo, tenho qua-

tro lojas em Brasília. O foco são filmes de arte e também filmes brasileiros e curtas-metragens, porque existe uma demanda nas locadoras de vídeo para o formato, embora seja pouquíssimo explorado.

Quero dar um panorama rápido do que é o mercado de vídeo no Bra-sil, apesar de muita gente estar dizendo que as locadoras estão acabando, que o mercado de vídeo não existe mais. Realmente houve uma queda, hoje podemos falar que temos algo em torno de 45% do mercado que existia há uns cinco anos, mas ao mesmo tempo houve um enxugamento, uma profis-sionalização maior e as lojas que restaram estão mais fortes, mais rentáveis. Existem aproximadamente 5 mil locadoras no Brasil hoje. É um número que não pode ser desprezado, ainda mais quando se fala de políticas públicas, de formação de público, de distribuição de filmes brasileiros.

Geralmente a locadora não é pensada nesses modelos, apesar de hoje ser um mercado real e praticamente inexplorado pelo curta-metragem. Logi-camente, daqui a alguns anos esse modelo deve perder espaço para outros que estão surgindo, mas ainda são cerca de 5 mil locadoras, em mais de 4 mil municípios, ou seja, existe uma capilaridade, um alcance que só perde para a TV aberta. Em alguns municípios não existe TV a cabo, nem acesso rápido à internet. A locadora acaba sendo a única opção de se consumir conteúdo audiovisual. E audiovisual americano, pois são as distribuidoras americanas que colocam os conteúdos nessas locadoras.

Apesar do número grande de lojas que fechou nos últimos anos, o pri-meiro semestre de 2010 aponta um crescimento. Esse mercado tem basi-camente duas vertentes principais, a locação ou rental, que são os filmes dirigidos para as locadoras com janela de exclusividade e, em um segundo

Mercado de locadoras de vídeo e DVDAlexandre Costa, vice-presidente da Associação Brasileira de Vídeolocadoras (ABVL) e sócio da CultVídeo (DF)

www.cultvideo.com.br

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momento, sell-thru, a venda direta ao consumidor. No mercado de rental, no primeiro semestre de 2010, houve um aumento de aproximadamente 6% a 7% nas vendas para esse mercado, e de 12% no número de filmes para ven-da direta. É um mercado que começa novamente a respirar, mesmo com a pirataria, mesmo com as outras formas de entretenimento, que precisam ser consideradas. Antes havia o VHS, depois o DVD, e não havia outras formas. Hoje existe a internet, a TV a cabo que está crescendo muito, então as loca-dores têm de se repensar dentro desse contexto.

Mas apesar dessas novas tecnologias, a mídia física ainda tem uma importância muito grande. Só para se ter uma ideia, vou citar os dados do mercado americano, porque no Brasil não temos dados mais precisos. Uma pesquisa recente apontou que 79% das pessoas nos Estados Unidos prefe-rem consumir conteúdo em casa, entretenimento doméstico em mídia física. Existe espaço para outras, mas as pessoas estão investindo em televisões gigantescas, equipamento de som e querem esse conteúdo com uma quali-dade legal. É importante olhar para esse mercado. Daqui a pouco outros for-matos surgirão, como o Bluray que já está se firmando e ganhando espaço, e o 3D que vem por aí, então novas oportunidades aparecem.

Tivemos também uma experiência de distribuição de DVDs de curta-metragem, em 2005. Fizemos mil cópias dessa coletânea chamada Curta Bra-sília e todas foram distribuídas por esses canais, não através das grandes dis-tribuidoras mas por canais alternativos, procurando maneiras de fazer com que esses DVDs cheguem a quem você quer, seja por vendas na internet, seja na colocação em pontos fortes de distribuição. A 2001, aqui de São Paulo, por exemplo, tem muita força nas vendas pela internet e existem também outras distribuidoras com esse foco. A experiência foi muito legal e agora estamos girando o volume 2 do Curta Brasília e o Anima Brasília. Fizemos dois mil DVDs de cada para distribuir nessa rede que criamos.

Para finalizar, eu e Ana Arruda somos sócios agora em um empreendi-mento novo. Temos uma empresa incubada na Universidade de Brasília, no centro de desenvolvimento tecnológico da UnB, e estamos discutindo exa-tamente essas possibilidades de comercialização do curta-metragem. Espero que daqui a alguns meses estejamos com tudo realmente consolidado, no caso uma distribuidora especializada em filmes brasileiros especialmente de curta-metragem, algo mais ou menos parecido com o que faz a Progra-madora Brasil, com a criação de programas. A ideia é reunir conteúdos de forma inteligente, mas comercialmente, porque esse espaço existe e há uma demanda mal aproveitada no mercado de videolocadoras.

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O Festival de Clermont-Ferrand alcançou sua 32ª edição em fevereiro de 2010, com 145 mil espectadores e mais de 3 mil profissionais presentes, incluindo produtores, distribuidores, compradores, rea-

lizadores etc. Dentre os 6 mil filmes inscritos para a seleção, 221 eram bra-sileiros. Ao todo, foram selecionados um pouco menos de 200 filmes. Sete brasileiros participaram da competição, o que é um número enorme quando olhamos a quantidade de filmes e de países representados. Foram 500 curtas exibidos no festival, somando os filmes em competição e fora dela. Cada pro-grama foi exibido seis ou sete vezes em uma das 15 salas do circuito, sendo que a maior sala de exibição do festival tem 1.500 lugares.

Neste ano, tivemos o 25º Mercado do Filme de Curta-metragem, o úni-co mercado no mundo dedicado só a esse formato, que acontece paralela-mente ao Festival. O mercado funciona com vários espaços, o principal é uma videoteca com 39 boxes de visionamento. Todo mundo pode ver filmes ao mesmo tempo, sem filas ou espera por um DVD ou VHS, pois as obras são digitalizadas gratuitamente para os diretores. Além disso, com a digita-lização dos curtas, os profissionais presentes no festival podem assistir aos curtas pela internet por até seis meses depois do evento.

Outro serviço oferecido é o acesso ao banco de dados. Com todas as informações atualizadas sobre os filmes e sobre os profissionais presentes, pode-se criar uma lista de filmes ou de profissionais, mandar e-mail para seus contatos, indicar filmes e sessões. Isso permite que os profissionais pos-sam trabalhar bem durante e depois do festival. Há também o espaço dos expositores, com 1.000 m2. Agrega indústria técnica, instituições, distribui-dores, enfim, são vários estandes para as organizações do mundo inteiro apresentarem seus trabalhos.

O México foi o único representante da América Latina na edição do ano passado. Isso é uma pena, porque a Ancine ajudou quem tinha filme

Mercado do Filme do Festival de Clermont-Ferrand (França)

Calmin Borel

www.clermont-filmfest.com

(com tradução simultânea de Anne Fryszman)

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em competição a ir ao Mercado, mas, sem o apoio necessário, os realizadores ficaram perdidos. Para a promoção do cinema e para a comercialização do curta-metragem brasileiro seria importante ter um estande.

Duas salas de exibição são utilizadas unicamente para as sessões do Mercado. Lá, os expositores podem alugar espaços por duas horas e mostrar sua produção. Os espanhóis, por exemplo, fizeram sessões para mostrar toda a produção espanhola do ano. É uma janela a mais. Já na plataforma Media-room Devù pode-se organizar encontros profissionais em que distribuidores e compradores de trabalhos para televisão explicam o que querem, o que esperam e sua política de compra. Assim, realizadores e produtores ficam sabendo para quem propor e vender seu filme.

Depois do festival, cada realizador recebe uma lista com informações específicas, por exemplo, quais foram os produtores que assistiram a seu filme, entre outros dados. Isso permite constituir um caderno de endereços a partir dessa lista e trabalhar melhor a política de distribuição da obra.

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Para me apresentar rapidamente, há 35 anos trabalho em cinema, 31 em televisão e há 15 anos tenho um formato, um programa espe-cial na Rádio e Televisão de Portugal, mais precisamente na RTP2, o

segundo canal da RTP. Para quem não conhece, o canal mais próximo seria a TV Cultura aqui no Brasil, com quem inclusive já temos alguns protocolos. Os padrões da RTP2, portanto, sempre foram de canal cultural, apesar de ser um jogo de palavras perigoso, porque a cultura deve estar presente em todos os canais, não necessariamente apenas em um canal menos comercial. No caso, sobretudo em relação à RTP1, que é mais comercial, e inclusive tem publicidade, apesar de ser um serviço público de televisão.

Há 15 anos, portanto, eu me beneficiei da posição de chefe de depar-tamento de toda a ficção e foi fácil convencer a direção da área a que eu pertencia de termos um formato específico para curtas-metragens. É preciso saber, porém, que o curta-metragem em Portugal sempre foi exibido nas televisões, e até em cinemas. Mas até 1996 era exibido de forma errática, não exatamente para preencher os buracos da programação, mas havia uma falta de disciplina. Podiam ser exibidos filmes notáveis ao lado de desenhos animados e não havia uma definição muito clara do que era um curta.

Hoje já temos uma definição mais clara disso, mas é preciso ter em mente que existem processos narrativos diferentes, alguns muito conheci-dos, outros mais subterrâneos. Uma sitcom para a televisão pode ter 22 ou 23 minutos, mas não é um curta-metragem. Em meu programa, posso comprar e exibir até uma hora de curta-metragem. Mas nem todos os documentários que se formatam para caber nos blocos televisivos vão ser exibidos, porque podem ter uns 50 e tantos minutos.

Em 1996 fiz sobretudo essa distinção, deixei claro que o programa Onda Curta era para curtas-metragens sem diferença de gênero. Exibo tudo, experimental, animação, documentário e ficção. Não existe limite,

Onda Curta (Portugal)

João Garção Borges, autor e programador do programa da Rádio e Televisão de Portugal (RTP2)

http://tv1.rtp.pt

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exceto a própria noção de curta, que, como defendo, vai até o tempo que outrora era do média-metragem. Os curtas que exibo também são o que se costuma se chamar em Portugal de curtas de criação, de autor. Portanto, para mim, o curta não é só uma questão de duração, mas de estrutura inter-na, que tem a ver com o processo criativo e ponto final. Na minha opinião, é como um fórum de autoria, não apenas da direção ou da realização, mas também de todas as áreas criativas que envolvem esse curta.

No início, o programa tinha 40 minutos e tivemos de aumentar para uma hora. Isso nos permitiu imediatamente ampliar o catálogo. Depois, impus uma coisa: se logo depois houvesse algum evento, um jogo de futebol, e quisessem que nós reduzíssemos o horário, eu não aceitava. Preferia não exibir o programa a ter uma duração menor.

Não tenho tanto poder sobre a grade, se vai haver o pronunciamento de um ministro, não posso evitar, mas posso dizer que não vou colocar o programa no ar. Isso foi um santo remédio, porque no final só uma vez, e por uma razão muito especial, o programa não foi ao ar com uma hora. Con-segui, portanto, impor uma certa disciplina e, ao mesmo tempo, a própria programação recebeu essa disciplina com bons olhos.

Em relação ao público, o curta-metragem infelizmente era considerado mais voltado ao público jovem. A própria produção também era uma coisa muito voltada para os jovens que faziam curtas, porque se falhassem não fazia mal, enfim, era uma espécie de cartão visita para o longa. Queriam então me dar o horário do meio-dia e eu disse: “Não, muito obrigado” Eu até teria uma audiência interessante em Portugal nesse horário. Não digo durante a semana, mas no fim de semana, sim. Mas isso ia reforçar o caráter juvenil do programa e eu não queria, porque a programação infanto-juvenil já é imensa, sobretudo no canal português, com a transmissão principalmen-te de séries compradas e produtos do mercado internacional.

O que eu queria era transformar essa lógica, fazer um formato para adultos, onde pudesse exibir filmes adultos, o que não quer dizer sexo, embo-ra isso seja permitido, mas com temática adulta. Então me deram o horário das 9 da noite, eu aceitei imediatamente, modéstia à parte, foi uma conquis-ta. Porque uma coisa sagrada em qualquer estação de televisão do mundo é a informação. E o RPT2 exibe sua informação às 10 da noite. Ao contrário de praticamente quase todo o mundo, nos canais mais agressivos do ponto de vista comercial, as hard news começam às 8 da noite, mas justamente para não se sobrepor no RTP2 as notícias vão às 10.

Então harmonizamos assim, o programa começava uma hora antes das notícias. Confesso que usei alguns truques também para impor determinado

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formato, mas, enfim, as oportunidades nos negócios também se fazem com truques. Não se pode chegar lá com uma auréola de santo, porque nem eu tinha vocação para mártir, nem o curta-metragem merecia essa falta de empenho.

Ao fim de algum tempo, os curtas-metragens exibidos no Onda Curta começaram a ter uma audiência absolutamente extraordinária, que ninguém esperava. Eu mesmo não esperava, e os curtas se tornaram líderes de audi-ência não apenas do dia, nem da hora, mas da semana. Obviamente, que eu não consegui isso com filmes experimentais, apesar de gostar muito, mas, obviamente, o público é mais reduzido.

Uma hora permite uma latitude muito grande de opções e combinações de gêneros e temáticas, então consegui misturar azeite e água, como se cos-tuma dizer. Programei desenhos animados clássicos com filmes de Mathias Müller, Christophe Girard, quer dizer, filmes bastante diferentes entre si. E obviamente eu sabia que o público iria atrás de algumas coisas e poderia ver outras. E isso aconteceu, aliás, em várias áreas da programação, não apenas de curtas mas também de documentários de criação, enfim, a audiência esta-va associada a uma combinação mais ou menos astuta de diversas propostas.

Gostaria de fazer um parêntesis: acredito que o público tem seu gosto. Aliás, não é o público, são vários públicos que formam esse grande público. Portanto, não tenho a pretensão de trabalhar para toda a gente. Penso que tenho informações privilegiadas, já que sou profissional dessa área, ando nos festivais, vejo milhares de filmes por ano, entre curtas, médias, longas e por aí a fora. Por isso estou em ótimas condições, se for sincero na aborda-gem da minha profissão, a mostrar ao público o que se faz de melhor.

Acho, então, que os públicos se formam ao longo dos anos e, hoje, quando se fala de Onda Curta em Portugal, não estamos falando necessaria-mente de todo o curta-metragem, mas se falarmos de Portugal, quase toda a produção passa pelo Onda Curta. E isso também porque a RTP, há muitos anos, vem oferecendo participação financeira em regime de co-produção e, mais recentemente, participação financeira a fundo perdido não só em curtas mas em todo cinema. O Onda Curta não tem obrigação de exibir todos esses curtas, seria um tiro no pé, mas se houver a qualidade técnica, fazemos questão de exibir, para que o público conheça. E justamente por-que nós investimos, temos os direitos de exibição e, nas co-produções, até da comercialização.

Gostaria de dizer também que não pensei o meu programa na RTP apenas como um espaço de programação que, devido ao sucesso, ficaria por ali contente, dormindo descansado. Procurei sempre parcerias com festivais

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e com os mais diversos eventos de cinema, do audiovisual e procurei, inclu-sive, parcerias com outros canais de televisão, e hoje isso existe tanto em Portugal como no estrangeiro. Aqui no Brasil já ofereço um prêmio do Onda Curta no festival Curta Cinema, do Rio.

Portanto, toda essa estratégia nacional e internacional de parcerias me parece fundamental para criar pouco a pouco os pontos, como naqueles desenhos da infância, em que vinham os pontos numerados e depois aquilo formava um rosto, uma imagem. Acho necessário, seja em Portugal, na Fran-ça, na China, seja onde for, e aqui no Brasil em particular, porque é um país muito grande, criar esses pontos todos e unir — e daí resultar uma imagem, ou duas ou três.

Outra questão é que também estou em contato permanente com as pla-taformas de distribuição, que imagino serem as plataformas mais importan-tes antes de se pensar na comercialização pura. Individualmente, o produtor, em casa com seu laptop, envia suas propostas, mas precisa pensar em termos de distribuição, pois isso representa uma ajuda imensa para a circulação internacional dos curtas-metragens. Em minha experiência, ajuda inclusive a rentabilização posterior e não apenas momentânea desse curta no merca-do nacional e internacional.

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Este Seminário é sobre curtas-metragens, mas temos um problema que não é restrito ao curta, e sim de todo o cinema nacional: o grande público não está habituado a consumir o nosso cinema. O resultado

são centenas de filmes lançados anualmente e ignorados pelo público. Entre as causas, eu coloco a falta de salas de cinemas nos municípios brasileiros, o pouco tempo que os títulos ficam em cartaz, a ausência de grande parte dos títulos do catálogo em DVD ou na internet e o preconceito do próprio brasi-leiro com a produção local. As pessoas não estão acostumadas a assistir fil-mes brasileiros, não conhecem, não sabem se é bom, então não consomem.

O desafio, nesse contexto, é como transformar o curta-metragem em um produto cultural acessível e festejado pelo grande público, e, consequen-temente contribuir para a formação de plateia para o cinema nacional. Esse foi o desafio que o Instituto Tamanduá trouxe para a si, e a nossa propos-ta foi o Porta Curtas, um site dedicado à exibição e catalogação de curtas-metragens, disponível via web no endereço www.portacurtas.org.br. O Porta Curtas foi publicado em 2002, três anos antes do YouTube, e é patrocinado pela Petrobras desde então. Hoje temos 750 curtas para assistir, 6 mil fichas de filmes catalogadas, 5 mil profissionais de cinema catalogados, 1,5 milhão de pageviews por mês e 150 mil exibições de curtas metragem por mês.

Temos quatro pilares de sustentação para o site: o conteúdo editorial, as ferramentas interativas, os resultados de busca e o sistema automatizado de parcerias de difusão. Quanto ao conteúdo editorial, toda semana o site traz estreias. As obras são publicadas com a ficha completa, então é possível nave-gar pelo diretor, pelo fotógrafo. Toda a exibição é autorizada por contrato de licenciamento, com a remuneração dos realizadores. No contrato de licencia-mento existe uma cláusula que permite a comercialização, ou seja, venda ou aluguel desse conteúdo, não só para internet mas também para outros veícu-los. Freqüentemente, curadores, produtores culturais, emissoras de televisão,

Porta Curtas e Curta na Escola Vanessa de A. Souza, gerente dos projetos do Instituto Tamanduá Synapse Cultural

www.portacurtas.com.br

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instituições de ensino, secretarias de educação, entre outros, entram em con-tato interessados no licenciamento de curtas. O Porta Curtas já licenciou para TVs a cabo, como TV Escola e Multishow, por exemplo. Também são comuns exibições públicas em eventos e cursos. No site, existe a seleção por temas, por mais vistos, mais cotados, mais recomendados, por festivais.

O Porta Curtas também oferece um prêmio aquisição em vários festi-vais, inclusive no de Curtas de São Paulo. São três curtas premiados, a R$ 1 mil por título. Não existe exclusividade, então ele pode ser contratado pelo Porta Curtas e entrar também em outros veículos. Semanalmente, enviamos informativos semanais por e-mail, que é uma forma de agitar o espectador e aproximá-lo do curta-metragem. Mesmo que ele não entre no site, vai rece-ber essas indicações de estreias.

Temos então as ferramentas interativas comuns hoje em dia, como dar nota, postar comentário. Entre os destaques, temos o download roteiros, as indicações por e-mail e a própria parte de exibição. Depois temos os resulta-dos de busca, com diversos filtros. Você pode procurar por palavra no diálo-go, pelos nomes na ficha, tudo é hiperlink.

E por fim nosso sistema de parcerias. Muita gente não conhece o pró-prio formato de curta-metragem e o Porta Curtas surgiu com o objetivo de conquistar os não cinéfilos, de formar público para o cinema. A estratégia foi estabelecer parcerias com vários portais e sites web: é só se cadastrar no site e você pode publicar o conteúdo. Temos algumas parcerias de sucesso, por exemplo com o UOL Cinema, onde existe uma coluna semanal Porta Curtas Petrobras — toda a semana um curta entra em destaque na página princi-pal do UOL Cinema. E o bacana disso é que você traz o público que não vai direto ao Porta Curtas porque nem conhece os curtas-metragens. Na verdade, ele não está consumindo o formato em si, mas uma produção nacional com a qual pode se entreter e a partir de então passar a visitar o Porta Curtas e outras janelas de exibição.

Em termos de números, hoje temos 416 sites profissionais cadastra-dos e mais de 8 mil páginas de pessoas e blogs cadastrados. Esses parceiros podem acessar relatórios on-line para acompanhar as exibições nos veículos deles. Tivemos 13 milhões de exibições de curtas-metragens brasileiros des-de a estreia em 2002, o que equivale a 25 mil sessões no cinema (usei Cinema Odeon como exemplo). Nossos espectadores estão em mais de 2,6 mil cida-des em 154 países — essa é a vantagem de estar on-line. São 205 mil usuários cadastrados e 123 mil assinantes Curta Clube semanal.

Em comparação com as causas do pouco consumo do cinema nacional, podemos dizer que as razões do nosso sucesso são que o site é acessível a

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todos os municípios brasileiros, inclusive os que não possuem sala de cine-ma. Ou seja, a internet torna esse conteúdo acessível mesmo em locais com mais dificuldade. Os títulos não saem de cartaz, então é possível consumir sob demanda no horário que quiser. A maioria dos títulos está disponível para comercialização em DVD, ou seja, se a pessoa gostou pode adquirir um DVD com o filme e assistir em casa, no seu televisor LCD. O público não cinéfilo é surpreendido por excelentes obras de entretenimento, organizadas por gênero, temas de interesse, ficha técnica, entre outros. Acho que esse é o item principal, conquistar o não cinéfilo que se surpreende com a qualidade daquele conteúdo.

O acervo do Porta Curtas transcende também o entretenimento e pode ser usado como conteúdo didático em salas de aula. Essa foi uma grande

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sacada do projeto, justamente pela grande quantidade de professores que acessavam o site, comentavam e falavam de cases.

A experiência do Porta Curtas nos ensinou algumas lições, tais como a importância de não tratar o curta-metragem como um produto único, como um formato isolado, porque ele tem muitas variações. Existem curti-nhas de um minuto excelentes para o celular, por exemplo. Alguns com uma duração um pouco maior podem melhor trabalhados em sala de aula.

Essa é a ideia do Curta na Escola, que pega o conteúdo de curta-metra-gem e usa na educação, formando também uma rede colaborativa de gera-ção de conteúdo em cima dos filmes. Funciona assim: os professores pegam um curta, utilizam na aula e relatam sua experiência. Isso fica acessível a outros educadores. Eles podem reproduzir essa ideia ou partir daí para criar outra coisa.

Além de representar nossa sociedade e cultura, e ter sua qualidade reconhecida no mundo todo, a curta duração é ótima para usar na sala de aula. O longa-metragem precisa de uma aula toda só para assistir, enquanto é possível passar o curta-metragem para abrir um assunto e gerar uma dis-cussão nessa mesma aula, sem perder o calor do momento.

Hoje temos 21 mil escolas cadastradas no Curta na Escola. São esco-las que manifestaram interesse em utilizar o curta-metragem como material didático durante o planejamento pedagógico da instituição. Normalmente essa escola é representada pela figura do diretor ou do coordenador pedagó-gico. Temos 43 mil educadores cadastrados. Também oferecemos pareceres elaborados por pedagogos, que fazem um roteiro sugerindo a aplicação dos curtas em diversas disciplinas e temas. Esses pareceres ficam disponíveis para download no site. É possível baixar roteiros, assistir o filme como no Porta Curtas, dar nota para o parecer também. Para mim, o mais legal é essa parte de partilhar os relatos de experiência com a exibição de filmes aos alu-nos em sala de aula. Tudo isso fica em um banco de dados, acessível. Temos até o concurso cultural “Procura-se Professor Autor”, para estimular a utiliza-ção e a postagem dos relatos de experiência do conteúdo.

O site também gera uma série de relatórios, outra vantagem do on-line que permite registrar vários dados e gerar relatórios. Como alternativa à exi-bição on-line nós lançamos dois DVDs, cada um com oito curtas-metragens com alto potencial didático. Já distribuímos gratuitamente 3 mil unidades para escolas brasileiras.

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A Programadora Brasil é um programa da Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura, desenvolvido pela Cinemateca Brasileira através da Sociedade Amigos da Cinemateca. Seu objetivo principal

é promover o encontro do público com o cinema brasileiro, em uma ação de formação de plateia para o nosso cinema. E ainda fomentar o pensamento crítico em torno da produção nacional e fortalecer iniciativas de difusão cul-tural similares e complementares.

O trabalho da Programadora consiste na organização de filmes e vídeos em programas disponibilizados em uma mídia de fácil acesso, o DVD, que possibilita o desenvolvimento de atividades audiovisuais em todo o país e nos mais diferentes espaços: escolas, centros culturais, prefeituras, ONGs etc.

Os filmes são contratados e licenciados para exibição pública nesses pontos de circuitos não comerciais. Só associados têm acesso a esses DVDs, mas o processo da associação é simples e rápido. É feito a partir de alguns dados básicos preenchidos no site www.programadorabrasil.org.br. Depois desse cadastro no site, a Programadora entra em contato com o novo asso-ciado, que se torna apto a adquirir os programas. Nossos associados então são cineclubes, centro culturais, pontos de cultura, escolas, universidades, museus, bibliotecas, enfim... A Programadora não está disponível para pes-soas físicas, apenas para pessoas jurídicas.

As atividades começaram em 2006, com o primeiro lançamento em fevereiro de 2007. Em setembro de 2010 chegamos aos 700 títulos. Des-se total, 549 filmes têm até 30 minutos. Fazemos essa divisão em nossos contratos: até 30 minutos, entre 31 e 69, mais de 70, e assim por diante. A remuneração é feita a partir dessa divisão. Os filmes estão organizados em 214 DVDs que chamamos de programas. Cada DVD é um programa, uma sugestão de programação. É interessante notar que não existe nenhuma res-trição para que os pontos façam sua própria programação. Sugerimos, por

Programadora BrasilMoema Müller, produtora audiovisual e coordenadora da Programadora Brasil

www.programadorabrasil.org.br

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exemplo, essa programação: “Wood e Stock: Sexo, Orégano e Rock’n’Roll” com “Dossiê Rê Bordosa”. Mas se o programador quiser passar só o “Dossiê Rê Bordosa” com outro filme, ele tem total liberdade. Até incentivamos os pontos de exibição para que façam suas próprias programações, a partir do acervo disponibilizado.

Voltando aos números, vemos que 78% dos filmes da Programadora têm até 30 minutos de duração. Esses filmes são de todas as regiões do Brasil e o conteúdo é destinado a todas a faixas etárias e a um perfil de público muito diversificado. Temos filmes históricos, filmes do período do cinema silencioso, filmes contemporâneos de todos os gêneros, animação, documen-tários, experimentais, ficções. A Programadora Brasil realmente tem esse compromisso com a diversidade de filmes e realizadores.

Nesse tempo em que estamos atuando, sentimos que a principal expec-tativa dos associados num âmbito geral é mesmo o acesso à cultura. Temos mais de 1,4 mil pontos associados. Desses, 431 estão nas capitais e 1.016 no interior – e muitos em lugares onde não existe sala de cinema. Mas isso muda o tempo todo, porque o sistema é online, então os dados aqui forneci-dos são de 18 de agosto (de 2010).

O que vemos é que a Programadora realmente atende a essa expectati-va de dar acesso à cultura e ao cinema brasileiro, oferecendo filmes que não estão ao alcance do grande público. E principalmente o que temos notado é que a audiência da Programadora é 50% infanto-juvenil. Temos tentado suprir, com um esforço de programação, a carência de um catálogo dispo-nível desses filmes voltados ao público infantil e adolescente, que é mais notadamente de âmbito escolar. Cerca de 10% dos associados são algum tipo de escola.

Temos três tipos de programa basicamente. Os programas compostos de curtas e médias-metragens, que chegam a 82 minutos. Os programas de longas acompanhados de curtas, que são 68, e programas com apenas um longa-metragem. Ao todo, são 214 programas. Somados aos programas só de curtas e médias aos longas acompanhados de curta metragem, temos 70% de programas com algum filme de até 30 minutos.

Todos os DVDs têm uma apresentação, que mostra a linha da curadoria e da programação. Dentro das caixinhas temos encartes com informações técnicas dos filmes e sempre uma crítica inédita. Essas informações também estão disponíveis no nosso site. Esse encarte foi criado como uma proposta de ajuda aos exibidores, para que eles possam fomentar o debate.

Os programas são criados por equipes de curadoria. A cada ano, a Pro-gramadora trabalha com um lote de filmes sugerido por esses curadores,

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que são variáveis, mas sempre pessoas do meio audiovisual atuantes na área, pessoas que conhecem a cinematografia brasileira. A partir de 2008, abri-mos inscrições proporcionando aos realizadores a oportunidade de deixa-rem seus filmes à disposição dos curadores. A única exigência é que as obras tenham o Certificado de Produto Brasileiro. Os realizadores preenchem os dados do filme em uma ficha técnica e nos mandam uma cópia em DVD com a cópia do CPB. Os curadores não têm a obrigação – muito pelo contrário – de trabalhar apenas no universo dos filmes inscritos. Mas a abertura de inscrições foi pensada para democratizar o trabalho de curadoria , já que a produção de curtas vem crescendo cada vez mais e é difícil ter acesso a todos os filmes que são realizados por ano.

Mas não é uma inscrição como em festival: o filme não precisa ser recente nem inédito. Se o filme não foi selecionado em um ano, ele conti-nua disponível, porque depende do tema que a curadoria define. Programas infantis, por exemplo, são absolutamente necessários e estamos aumentan-do cada vez mais. No primeiro lançamento, apresentamos dois programas infantis, agora estamos em torno de 5 ou 6 por edição. Também não temos nenhuma restrição intransponível de gênero ou formato, nem de conteúdo. É raro a gente contratar filmes com menos de 5 minutos, mas existem exce-ções, como animações voltadas à primeira infância.

Tabela 1: Filmes da Programadora Brasil por década

Até 1960 4,85%

De 1961 a 1990 24%

De 1991 a 2000 22%

A partir de 2001 47%

Tabela 2: Filmes da Programadora Brasil por gênero

Ficção 43%

Documentário 33,77%

Animação 17%

Experimental 4,8%

Um dos compromissos dos associados é enviar relatórios de agenda-mento das sessões, de exibição e de público, para que a Programadora pos-

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sa traçar o perfil do público. É claro que é um trabalho lento, as pessoas demoram um pouco a aderir. O próprio projeto demorou um pouco a entrar nos eixos, mas agora já caminha mais tranquilamente. E o que vemos é que apenas 50% dos associados cumprem essa obrigação. De qualquer forma, conseguimos ver que os filmes mais programados são de ficção, seguidos da animação, no caso por causa dos infantis. Ou seja, temos 17% de filmes de animação na Programadora, mas eles são 35% dos filmes programados.

Em termos de formato, os curtas são 52,86% dos filmes programados. O público predominante aqui é 40,48% infantil e 10,27% juvenil, o que repre-senta 50% do público da Programadora. Entre os nossos filmes campeões de audiência estão o “Historietas Assombradas (para crianças malcriadas)”, de Victor Hugo Borges. Como ele faz parte do primeiro lançamento, foi adqui-rido por mais pontos e o curta mais visto. Temos um registro de mais de 11 mil pessoas como espectadores deste filme. Entre os nossos programas cam-peões de público, estão justamente os programas de Curtas Infantis I e II.

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A RBS TV é uma rede de televisão regional brasileira ligada à Rede Globo, que ocupa um fade, ou seja, parte de um horário que a Globo permite veicular a programação regional, exceto noticiário e espor-

te. A história da RBS TV espelha o que aconteceu com outras emissoras em vários Estados. No início, 18 jovens partiram do Rio Grande do Sul para o Rio de Janeiro para aprender como é que se fazia televisão. Em 1959, eles ins-talaram a TV Gaúcha no estado, a partir das experiências em teatro e rádio, e que mais tarde veio a se chamar Rede Brasil Sul de Televisão.

O tempo passou, vieram as grandes redes e isso diminuiu a participa-ção regional nas TVs. Em 1999, surgiu o Núcleo de Especiais e desde então temos conseguido nos manter no ar, com uma produção que combina docu-mentários e programas de ficção. São programas semanais de 15 minutos, exibidos aos sábados às 12h20 e eventualmente aos domingos após o pro-grama Fantástico. Tanto o público quanto nós preferiríamos que as produ-ções fossem exibidas em horários mais nobres, mas fizemos dessa grade que possuímos um sucesso há 11 anos.

Como tudo numa televisão comercial aberta, o Núcleo de Especiais depende do equilíbrio econômico, do projeto sustentado pelo mercado publicitário, ou seja, tem de se pagar e dar lucro à empresa, de outro modo já estaríamos fora da grade. Foi preciso sistematizar todo o esquema de pro-dução, envolver todas as áreas, marketing, comercial, administrativo, ope-rações e técnica, e explicar o projeto no ano de 1999, já que a RBS TV não exibia documentários e programas de ficção desde o final da década de 1970. A emissora também teve de se aproximar do mercado publicitário e dos clientes para que todos entendessem a proposta e apostassem no talento das pessoas que estavam no projeto.

Estabelecemos algumas linhas de estímulo ao talento local, entendendo que os profissionais não estavam apenas dentro da RBS TV. Em alguns casos,

RBS TVGilberto Perin, diretor do núcleo de programas especiais da emissora

www.rbs.com.br

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a emissora faz toda a produção dos projetos. Em outros, contrata produtoras para realizar uma série, mas mantém a direção artística. Nós pretendíamos estimular o crescimento de produtoras no mercado, fomentar o crescimen-to da área de atuação, da área técnica, de roteiros, enfim, isso foi possível também por meio de um concurso público que lançamos em que a televisão financia oito projetos de curta-metragem por ano, um concurso público nos mesmos moldes do que alguns governos fazem.

Para uma inovação constante dentro da programação, a emissora ela-borou uma política de direitos autorais, com regulamentos, contratos trans-parentes — vários estão na internet para consulta —, para que não houvesse nenhum problema de direitos autorais de ambos os lados, cedendo parte dos direitos e reservando outros. Apostou-se também em novos talentos que sur-giram das escolas de atores, dos cursos de cinema, misturados aos talentos já conhecidos, muitos remanescentes do caldeirão de artes dos anos 1970.

O Núcleo de Especiais fez sua estreia com o documentário “Anjo Mala-quias”, sobre o poeta Mario Quintana, em 31 de julho de 1999. Para se ter uma ideia, até julho de 2010, produzimos 607 programas e exibimos 718. Essa diferença de praticamente 100 programas são os curtas gaúchos exi-bidos no horário de meio-dia de sábado, produtos já finalizados pelos quais pagamos os direitos de exibição.

Alguns projetos foram premiados nos Estados Unidos e na Alemanha. Uma das preocupações da emissora é mostrar a cultura regional, sem ser regionalista, justamente para ser entendida em qualquer parte do País ou do mundo. Os programas foram gravados em 299 cidades, 17 estados e 25 países,

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e exibidos em emissoras da RBS TV, no Canal Brasil, que é um parceiro da RBS, e também na Globo Internacional, que transmite alguns de nossos pro-gramas para 115 países.

Modelos de produção

Recentemente, o Núcleo de Especiais produziu um documentário cha-mado “Guerra e Paz” formado por cinco programas com a temática da Segun-da Guerra Mundial. Um dos episódios reconstituiu a história do falsário de Hitler, que está enterrado em Porto Alegre. O programa fala de um caso regio-nal, mas abre a discussão para um tema mais universal do que se imagina no princípio. Judeu, artista plástico e falsificador, o homem foi preso em um campo de concentração e obrigado a falsificar dinheiro para Hitler. É uma história famosa que até foi tema de um longa-metragem ganhador do Oscar.

O Núcleo de Especiais pode trabalhar de várias maneiras. Quando se transforma em produtora, são contratados diretor, roteirista, atores, equipe técnica, além de atender todas as necessidades que o diretor possa ter. Esse é um dos modelos usado pela RBS para produzir seus programas, tanto para documentário, quanto para ficção.

Já a série “Online” toma outro caminho. Realizada a partir da sugestão de uma produtora de Porto Alegre, chamada Sangue Bom, a ideia era criar um programa de ficção relacionado ao universo do mundo virtual e a garota-da de 11 a 13 anos e suas famílias. É um sucesso, está na segunda temporada e deve se tornar um longa-metragem, cujos direitos serão cedidos pela RBS para que a produtora realize o filme.

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Esses programas têm a supervisão artística do Núcleo de Especiais, ou seja, nunca o produto é entregue na hora para ser exibido na TV. A emissora tem uma participação direta, como se a produção fosse feita lá dentro, mas a extensão é gerenciada por uma produtora reconhecida pela experiência no mercado.

Também temos as histórias curtas selecionadas por concurso público para residentes do Rio Grande do Sul, conforme já citado anteriormente. São oito projetos selecionados por um júri, com prêmio de R$ 40 mil e a possibilidade de usar nosso equipamento de captação e montagem. Às vezes temos roteiros muito bons que ultrapassam o valor estabelecido e por isso são eliminados.

Com rígida grade de produção, a inscrição é feita em janeiro, em março temos o júri, depois já começa a pré-produção, oficina de roteiro e direção, com acompanhamento de Carlos Gerbasi e Jorge Furtado, até o momento de pré-produção, produção, primeiro corte, discussão, escolha de elenco e exibi-ção, que acontece em outubro ou novembro.

Finalmente, temos o exemplo de “Fundo do Mar”, série em quatro epi-sódios dirigida por Rafael Figueiredo. A RBS TV comprou as imagens de uma empresa de Santa Catarina porque não tinha tempo para acompanhar o crescimento de um determinado molusco durante um ano. Depois o con-teúdo foi reembalado com história de pescadores, belíssimos cenários e par-ticipação de especialistas.

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Distribuidora da Prefeitura do Rio de Janeiro, a RioFilme funciona de um modo diferente de um órgão da administração direta ou de uma autarquia, pois pode reinvestir sua receita em novos projetos

sem destiná-los ao Tesouro, seja da Prefeitura, do governo do Estado ou da União.

Nós empregamos recursos em produção e distribuição de conteúdos para cinema e televisão de diversos formatos, principalmente longas-metra-gens, também investimos na realização de 11 eventos estratégicos para o desenvolvimento da indústria audiovisual do Rio de Janeiro como o Festival do Rio, o Cel.U.Cine, o Festival Internacional de Curtas do Rio de Janeiro, e temos também um programa de editais que será lançado durante o Festival do Rio.

Historicamente, a RioFilme apresenta um número de editais voltados para a produção de curtas, que vamos ampliar bastante mantendo a linha para a produção. Fazemos operações reembolsáveis, nas quais a distribuido-ra se torna sócia do agente privado envolvido e passa a fazer jus aos valores advindos dos projetos; e não reembolsáveis, ou seja, ações de patrocínio em que não há sociedade em receitas.

Em 2008, a capacidade de investimento da RioFilme era muito peque-na. A partir de um contrato de gestão com a Prefeitura do Rio de Janeiro, várias medidas foram tomadas e iniciamos um processo de revitalização muito forte a partir do início de 2009. Para se ter uma ideia, em 2008 a RioFilme investiu um total de R$ 1,2 milhões. Nós saltamos desse patamar para R$ 11,5 milhões no ano passado e vamos terminar este ano na casa dos R$ 17 milhões em investimentos, números que ajudam a empresa a ter um peso na promoção do desenvolvimento da indústria audiovisual do Rio de Janeiro, considerando todos os elos da sua cadeia de valor e os seus impactos econômicos e sociais na cidade.

RioFilmeSérgio Sá Leitão, diretor-presidente da empresa

www.rio.rj.gov.br/web/riofilme

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Em relação aos curtas-metragens, a Rio Curtas é um caso muito pecu-liar. Foram realizados 92 curtas com o investimento da RioFilme e produ-ziremos mais dez. Dos realizados até agora, 73% dos curtas foram exibidos em festivais e tiveram alguma forma de comercialização. Majoritariamente autoral ou experimental, os filmes possuem ambições artísticas e são volta-dos para o circuito dos festivais. Como os festivais se constituíram ao longo do tempo na principal janela de exibição de curtas no Brasil, de alguma for-ma isso condicionou o tipo de produção.

Hoje, temos uma multiplicação de janelas para o curta, desde plata-formas on-line e empresas privadas de distribuição, como a Curta o Curta, a projetos relacionados à exibição em salas de cinema. Também temos as emissoras de televisão que compram curtas e que, na verdade, do ponto de vista de quem faz o curta, criam novas possibilidades de produção que de alguma forma atinjam um público mais amplo que o público dos festivais.

Em relação à comercialização de curtas-metragens, minha equipe fez um levantamento de todos os curtas que a RioFilme já ajudou a produzir e de todo o investimento que já foi feito. Chegamos à conclusão de que o retorno equivale a 10% do investimento. Basicamente, a comercialização é feita para emissoras de televisão. Por exemplo, o Canal Brasil tem um papel essencial como grande comprador de curtas, a TV Cultura, a TV Brasil e a TV Câmara também são compradoras, enfim, nós temos procurado oferecer o acervo como conteúdo para essas e outras emissoras. A duração e o formato são, sem dúvida, impeditivos à comercialização para a televisão porque são complicados para se ajustar a uma grade. Quando mencionei essa receita de 10% do custo de produção de cada filme, estava falando de uma média de R$ 5 mil por filme, que advêm da comercialização para a televisão.

Também procuramos disponibilizar esse conteúdo para sites em ini-ciativas como o Porta Curtas, em que os filmes acabam conquistando maior audiência, muitas vezes mais do que em algumas emissoras de TV por assi-natura. Esse caminho é bastante interessante, pois os curtas têm grande importância do ponto de vista da formação, da capacitação e da revelação de novos profissionais. É uma atividade que precisa ser subsidiada de algu-ma forma, mas acho que nós vivemos hoje uma explosão de formatos, de plataformas, de janelas de exibição e também de possibilidades de receitas que ampliam muito as possibilidades para o curta-metragem. A RioFilme continuará estimulando a produção e também a comercialização de curtas.

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A TV UFPB é a mais nova associada da TV Brasil. Atualmente, fun-ciona retransmitindo a cabo o canal Futura, mas até os próximos meses vamos retransmitir a TV Brasil na Paraíba, em sinal aberto de

televisão. Como sempre, o processo é muito mais demorado do que gostaría-mos, há uma série de problemas de estrutura do serviço público, mas existe uma perspectiva muito interessante de juntar os produtores independentes do audiovisual.

A partir de 2005, a ABD Paraíba estabeleceu a Urbe Audiovisual, um Ponto de Cultura que trabalha com capacitação do audiovisual e auxilia a produção independente e a difusão. E entre 2007 e 2008, iniciamos um pro-jeto de Pontão de Cultura chamado Rede Nordestina Audiovisual (RNA), cuja principal função é fomentar e estabelecer esse campo de articulação entre pontos de cultura e produtores culturais independentes da região Nordeste.

Estudando um pouco o modelo do programa Cultura Viva do Governo Federal, entendemos que os primeiros Pontos de Cultura foram ampliados para Pontões de Cultura exatamente para fazer esse tipo de articulação. A estrutura de formação de redes contribui para pensarmos em como propor uma distribuição diferenciada dos poucos mecanismos comerciais que exis-tem para o curta-metragem e para a produção audiovisual independente de maneira geral.

Uma das parcerias estabelecidas no Pontão de Rede Nordestina Audio-visual é com o Laboratório de Aplicações de Vídeos Digitais (LAVID), um laboratório de vanguarda do Departamento de Informática da UFPB. Estu-dando como formar essas redes, percebemos que era necessário criar novas tecnologias de difusão e compartilhamento do audiovisual.

As ações da RNA atuam com uma estrutura de grupos permanentes de trabalho, grupos de trabalhos complementares e grupos de trabalho suple-mentares, que juntos são projetos em processo de preparação para serem

RNA – Rede Nordestina AudiovisualCarlos Dowling, coordenador de programação da TV da Universidade Federal da Paraíba (TV UFPB) e coordenador institucional da RNA

www.rna.org.br:8080/rna

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apresentados em parceria. Uma das linhas de atuação da Rede é o portal de intercâmbio e compartilhamento de vídeos. Além de visualizar os filmes no próprio browser, os membros participantes da comunidade podem subir e baixar conteúdos de curta duração com qualidade em Mpeg2 ou H264, for-matos de compressão com a qualidade de DVD ou superior.

A segunda linha de ação da Rede é fazer uma seleção, compilação e dis-tribuição dos curtas-metragens paraibanos. Parte considerável da filmografia em curta-metragem paraibana foi compilada e dividida por década, para dis-tribuição sem fins econômicos ou para exibições não comerciais. Além des-ses filmes, também há a comercialização de DVDs com curtas-metragens do projeto Curtas ABD Paraíba, em tiragem limitada de 100 discos por vez, cujos recursos são repassados para os realizadores. A terceira linha de atuação é a realização de encontros regionais. Já realizamos uma edição em João Pessoa e temos a perspectiva de concretizar mais duas nos próximos dois anos.

Atualmente, o portal da RNA está em teste de usabilidade e passa por um processo de integração com o programa XPTA.Lab, um projeto de imple-mentação de uma estação escola de televisão digital aprovado pelo LAVID em parceria com a ABD Paraíba. Conseguimos ativar os núcleos de produ-ção digital da Rede Olhar Brasil e articular as cidades de João Pessoa, Forta-leza, Aracaju, Belém, Rio Branco, Teresina, Salvador, Maceió, Natal, Aracaju e São Luís para um processo de capacitação, culminando com a produção de 11 episódios pilotos de 26 minutos, exigidos pelo edital do XPTA.Lab.

A lógica do portal é trabalhar, diferenciar o público e pensar em mode-los de possível comercialização. A priori seriam duas linhas: trabalhar pelo cinema digital, por meio de uma tecnologia de compressão em alta defini-ção, e integrar as redes que estão em perspectivas de formação.

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O SESCTV é um canal do SESC São Paulo, atualmente distribuído por diversas operadoras de Tv por assinatura, além de parcerias com televisões educativas em todo Brasil. Estamos no ar 24 horas por

dia, trabalhando com a visão da educação informal e permanente,e, para isso, os programas são desenvolvidos com o objetivo de gerar reflexão, inquietação e provocação.

Não funcionamos apenas como um canal de aquisição e exibição. Os programas são produzidos com produção terceirizada e formatados e desenvolvidos com o acompanhamento técnico do SESC São Paulo. Nesse sentido, trabalhamos com a ideia de acervo, pois não existem programas tipicamente jornalísticos, e o curta-metragem tem um papel bem importante na programação.

Atualmente, as séries que exibem curta-metragem são produzidas em dois formatos: curtadoc, que está na segunda temporada, é um projeto que agrega documentários em curta-metragem unidos por um eixo temático. São 52 programas produzidos pela produtora Contraponto, de Florianópolis, com direção de Kátia Klock e produção executiva de Maurício Venturi. Os filmes passam por um processo de inscrição pela internet, a produtora faz a seleção e discute conosco. Então, reunimos trabalhos autorais de diversas épocas e formatos, com um tema específico que está em primeiro plano nes-sa discussão. A média do licenciamento tem sido R$ 65,00 por minuto e as exibições também são negociadas por um prazo de até dois anos de exibição. O curtadoc é exibido todas as terças-feiras, às 21 horas, com alguns horários de reprise. Para saber os demais horários, é só acessar o site do SESCTV: www.sesctv.org.br

O segundo projeto em andamento é o faixa curtas, voltado para curtas-metragens de ficção. A produção é da produtora Bambu Filmes, com cura-doria de Luis Carlos Soares, sempre com o acompanhamento do SESCTV. A

SESCTVRegina Gambini, gerente adjunta do canal

www.sesctv.com.br

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ideia é misturar produções de várias épocas, suportes e linguagens. Incluí-mos desde produções realizadas em super-8 a conteúdos desenvolvidos em suportes digitais. Os filmes são licenciados seguindo uma tabela com varia-ções de tempos: de 3 a 8 minutos, de 9 a 15, de 16 a 25, de 26 a 40 minutos. Esse projeto está em fase de produção com estreia prevista para início de 2011.

O SESC São Paulo, parceiro de longa data do Festival Internacional de Curtas-Metragens, exibe os filmes no Cinesesc e participa com o prêmio- -aquisição SESCTV. São três prêmios, dois na categoria KinoOikos, de R$ 2,5 mil cada, e outro de R$ 5 mil para a Mostra Brasil e Panorama Paulista. Os curtas são licenciados para exibição no canal por um determinado período. Também lançamos a coleção “20 Anos”, mais um desdobramento dessa par-ceria com o Festival. Com a curadoria da Zita Carvalhosa, a programação foi exibida no SESCTV e também em diversas unidades do SESC São Paulo, na capital e interior.

Dentro da possibilidade dos curtas serem formatados em projetos que agregam conteúdos e discussões, nós pensamos neles também como pro-gramações especiais- interprogramas e outros. Há pouco tempo, lançamos o Poéticas do Invisível, um trabalho da videoartista Lucila Meirelles, cuja proposta é discutir a visão subnormal do ponto de vista estético. Ela agregou alguns curtas e médias-metragens em seus programas.

O SESCTV trabalha com os sistemas de produção, co-produção e licen-ciamento. Além disso, pelo caráter educativo e cultural, há uma constan-te solicitação de programas por parte de instituições e universidades que querem ampliar seus acervos. Recentemente fechamos uma parceria com o Ministério da Educação e Instituto Arte na Escola para disponibilizar parte do acervo de artes visuais do canal para a rede pública de ensino.

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Sou diretor da TV Câmara, em Brasília, e queria apresentar um pouco da experiência do canal em relação aos conteúdos de curta duração. Disponível para 94 milhões de pessoas no Brasil inteiro em TV a cabo,

parabólica, banda C e internet, a TV Câmara foi o primeiro canal que pôs todo o seu conteúdo em VOD na internet há cinco anos. Transmitimos em UHF no Distrito Federal e agora também pelo canal digital em São Paulo.

Nossa programação hoje tem 32% de sessões ao vivo e gravadas de plenárias e comissões da câmara federal, 33% da grade são ocupados de programa de debates, 17% de telejornais – transmitimos até quatro por dia ao vivo –, os culturais preenchem 11%, e os documentários ocupam 5% da grade. Entre os culturais e os documentários estão os curtas-metragens.

Nosso público é formado por pessoas de mais idade. As pessoas que nos assistem querem debater e refletir sobre o Brasil, pois não é um canal de entretenimento. Aproximadamente 64% dos expectadores têm mais de 35 anos. Cerca de 20% têm entre 25 e 34 anos, um público mais jovem que também assiste ao canal.

TV CâmaraGetsêmane Silva, diretor do canal

www2.camara.gov.br

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Como é que nos relacionamos com o curta-metragem? A compra é feita de maneira transparente, por edital, concurso. Da última vez, tivemos 450 filmes inscritos e compramos, mais ou menos, 10% deles. Adquirimos 42 filmes de uma vez e pagamos R$ 5 mil pelo licenciamento não exclusivo por 24 meses. Também usamos o licenciamento sem custo, com termos nego-ciáveis. Tem realizador que diz assim “Olha, eu quero que você passe ape-nas uma vez”, e tem outro que diz “Você poder passar quantas vezes quiser durante um ano”. Dessa maneira, já exibimos 146 curtas. Isso é um pouco controverso, até determinadas associações de curta-metragistas e até ABDs estaduais já nos questionaram por apresentar licenciamento sem custo, mas é uma porta aberta.

A TV Câmara tem um limite orçamentário, há uma burocracia para que o dinheiro saia. Não conseguimos pagar por tudo o que gostaríamos. Uma vez, um pessoal do Ceará proibiu os realizadores cearenses de mandar filmes pra TV Câmara. Também acho que os filmes devem ser remunerado, mas todo mundo tem o direito de fazer o que quiser. Nós pagamos por edital, que é a única maneira de tirar o licenciamento do orçamento da Câmara.

Está no ar desde 14 de maio a nova temporada do programa Olhares, que tem uma média de 88 mil telespectadores a cada janela de uma hora. De maio até agosto de 2010, tivemos uma programação de curtas que atingiu numa única sessão 244 mil pessoas na máxima, e uma mínima com 18 mil assistindo. Ou seja, existem curtas e curtas, as pessoas vão gostar mais de uns e menos de outros. Mas essa média é importante para mostrar que há um mercado de pessoas querendo ver curta-metragem na TV por assinatura.

Segundo as medições do IBOPE, nosso alcance semanal atinge em mé dia 352 mil pessoas que assistem a essa grade de programação. Ao estudar

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essa audiência, percebemos que o curta-metragem é importante para nós, pois a retenção na TV a cabo é muito rápida, as pessoas zapeiam muito. Por favorecer a reflexão sobre os temas e ter curta duração, o curta-metragem é ótimo para o canal. Em média, a cada 12 minutos temos um novo grupo de pessoas assistindo à programação. E você fala assim: “Ah, são 12 minutos porque é meio chato, as pessoas não assistem muito à TV Câmara”.

Não é bem assim. Incluindo os canais de filme longa-metragem, a maio-ria dos canais da TV a cabo também é pouco assistida em termos de tempo. As pessoas não assistem ao filme inteiro, apenas passam pelo canal. Então, pensando nesses dados, o curta-metragem é um conteúdo excepcional, por-que ele se resolve em cerca de 10 minutos. Tanto a TV Câmara quanto o Canal Futura e o Canal Brasil trabalham com interprogramação, oferecendo conteúdos que o espectador pode ver do começo ao fim.

Minha mensagem principal é esta: existe um mercado, as pessoas que-rem ver curta-metragem na TV por assinatura e, se as pessoas querem ver, boa parte delas estaria disposta a pagar. Agora, é pensar em algum modelo de negócio.

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Antes de começar, eu peço permissão aos não catarinenses e aos não gaúchos para prestar uma homenagem aos parceiros e colegas de trabalho de curta-metragem gaúchos e catarinenses – nasci no Rio

Grande do Sul e foi no Estado de Santa Catarina que eu trabalhei nos últi-mos 20 anos. E preciso fazer uma homenagem especial à Ana Luiza Azeve-do. Não sei se ela sabe, mas conheci o curta-metragem na Casa de Cinema. Lá, aprendi que era um formato maravilhoso e fiquei encantado com O Dia que Dorival encarou a guarda, o primeiro curta que vi.

Não tenho a produtora há cinco anos, mas trabalhei muito tempo como produtor independente. De 1996 a 2004, vivemos de curtas-metragens, de 1 minuto e meio até 15 minutos. Foi maravilhoso porque nós tínhamos con-dição de produzi-los para a televisão. A RBSTV foi uma grande parceira, ela é pioneira na abertura do curta como negócio. Para se ter uma ideia, um dos nossos projetos com a RBSTV rendeu US$ 9 milhões em três anos. Eviden-temente que esse projeto foi um momento, um investimento de uma direto-ria que acreditava nos projetos e deu resultado. Então, temos um mercado, temos condições de trabalhar e de fazer projetos sustentáveis.

Hoje, sou diretor da área de produção independente e aquisições da TV Cultura. Nós temos dois espaços dedicados ao curta-metragem: o Zoom, programa histórico que exibe cerca de 70 a 80 curtas por ano; e o A’Uwe, destinado a produções de documentários indígenas. Exibimos na TV curtas dirigidos tanto por cineastas indígenas quanto por não indígenas. Para mim é um orgulho, pois o A’Uwe nasceu de um projeto da minha diretoria há dois anos. Há uma diferença nos valores de direitos. Os que a gente adquire para o Zoom ficam por volta de R$ 450, 470 reais, se não me engano. Já com o A’Uwe cada curta sai por R$ 2 mil cada, porque precisamos de uma duração aproximada de 20 minutos.

TV CulturaCarlos Wagner La-Bella, diretor de prestação de serviços, documentários e produção independente da emissora

www.tvcultura.com.br

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São curtas de festival ou mesmo autorais, que temos vontade de fazer. É muito difícil colocar a minutagem numa grade exclusiva. No caso do A’Uwe, nós fazemos uma sanfona, inserimos um curta e um média, com interme-diação do ator Marcos Palmeira. Agora, para uma grade de meia-hora só de curtas-metragens, nós teríamos uma grande dificuldade porque o formato não possui um tamanho regular.

Infelizmente, nós não temos hoje na TV Cultura um espaço satisfatório para a importância do curta-metragem. Embora tenhamos na área infantil também espaço para curtas, investimos na última Finep em um projeto de curta para um programa muito legal de animação, da Marca. Precisamos pensar o curta-metragem lá na TV Cultura de outra forma, discutir com os produtores como fazer isso, de que tamanho, ou talvez possamos criar um edital específico que se divulgue o tamanho que interessa para TV, para que o realizador já pense nessa possibilidade.

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Antes de compor o Núcleo de Produção e Comunicação da TV Escola, canal do Ministério da Educação, trabalhei durante 6 anos no Canal Futura, da Fundação Roberto Marinho, como produtor e coordena-

dor de projetos especiais. Há três anos estou no Núcleo de Produção da TV Escola, do Ministério da Educação e hoje coordeno o Núcleo de Comunica-ção, que é um novo departamento. Desde a fundação da TV Escola temos um contrato de transmissão e de produção firmado com a ACERP – Associa-ção Educativa Roquette Pinto. São produtores, conteudistas e coordenadores pedagógicos trabalhando para a TV Escola.

O projeto TV Escola, do Ministério da Educação, é muito conhecido entre professores e alunos das redes públicas e também particulares do Bra-sil, mas o público em geral só conhece a TV como o “canal da mãozinha”. No ano passado, quando trocamos a identidade visual, precisamos explicar aos professores que a marca era bonitinha, mas que não tinha boa aplicação e dava à TV Escola um caráter de canal infantil simplesmente. Nós exibimos programas e documentários de acordo com a grade curricular da educação básica, que não estão limitados à educação infantil.

Qual é o objetivo do projeto TV Escola? No início, em 1996, era ofe-recer aos professores conteúdos audiovisuais, de acordo com as diretrizes curriculares da educação básica. Ou seja, exibir programas de Matemática, Língua Portuguesa, Ciências, Biologia e temas transversais como Educação no Trânsito, Saúde, Meio Ambiente etc, para servir de suporte pedagógico aos professores, em sala de aula ou em sua formação.

Nessa época, o Ministério da Educação distribuiu um kit tecnológico, formado por televisão e videocassete, depois substituído pelo DVD, e antena parabólica. Cerca de 60 mil escolas receberam esses kits para que seus pro-fessores tivessem acesso à TV Escola e montassem videotecas. Nosso sinal

TV EscolaDouglas Silveira, coordenador do núcleo de comunicação do canal

http://tvescola.mec.gov.br

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era transmitido pela ACERP e os professores recebiam a grade de programa-ção e gravavam os conteúdos para uso em sala de aula.

Começamos a receber muitas ligações, cartas e mensagens de médi-cos, psicólogos, engenheiros e profissionais de várias áreas, solicitando os programas da TV Escola. Então, em 2007, realizamos uma pesquisa com as escolas que utilizavam o projeto e também com outras pessoas não ligadas ao corpo docente e discente. Identificar nosso espectador foi um dos moti-vos dessa pesquisa, cujos números revelaram um público muito maior do que professores e alunos: a TV Escola era vista como um canal de televisão convencional.

Então, resolvemos abrir a grade e criamos esse Núcleo de Comunicação para poder divulgar a TV Escola dentro do próprio canal e transformá-la não só em um bloco de programas no qual os professores copiam e exibem aos alunos, mas que o público, de maneira geral, também pudesse assistir em casa com a família.

Hoje a programação da TV Escola é exibida por meio de antena para-bólica analógica e digital, pela Sky – canal 112, e também por cerca de 50 operadoras a cabo no Brasil. Hoje é possível também assistir à TV Escola ao vivo, 24h, pela internet. Estreamos o portal neste ano e está em fase de experimentação, mas até o final do ano outros aplicativos ainda serão desen-volvidos para que mais conteúdos estejam disponíveis em nosso site, como exemplo, video on demand/VOD - vídeo sob demanda. A TV Escola também está no YouTube.

Entre 60 e 70% da nossa programação é comprada de empresas interna-cionais, de países como Holanda, França, Canadá, Coréia e Inglaterra. O restan-te é produzido aqui. Para a TV Escola ainda é muito complicado produzir seus programas, porque nos submetemos às leis de licitação. Não podemos ficar presos à morosidade dos editais, pois não conseguiríamos manter as 24 horas de programação no ar por sete dias na semana. Então, compramos o que há no mercado e procuramos produzir os conteúdos específicos às necessidades brasileiras, como programas educativos de Língua Portuguesa e História do Brasil, por exemplo, dando prioridade internamente a essas produções.

A vantagem de produzir internamente, de realizar um processo de lici-tação, é que conseguimos trabalhar com produtoras do Brasil inteiro e incen-tivar as produções educativas nacionais. Recentemente, fizemos uma série sobre saúde gravada em João Pessoa, na Paraíba, nossa única dramaturgia da TV Escola até agora, chamada “Geração Saúde”. Foi toda feita em parceria com a Universidade Federal da Paraíba e com uma produtora de Natal/RN que ganhou a licitação e que montou uma base para nos atender em João Pessoa.

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Todo elenco dessa série foi formado por atores paraibanos, a maioria com pouca ou nenhuma experiência em audiovisual. A atriz paraibana Mar-célia Cartaxo foi a preparadora de elenco da série. Fizemos uma prepara-ção de três meses, antes de gravar, com exercícios de interpretação para a câmera, palestras e workshops. Recife, por exemplo, conta com um pólo de produções audiovisuais, mas não vi nada parecido na Paraíba e acredito que o Estado ainda proporciona poucos trabalhos nesse setor. Então, foi gratifi-cante ver a realização dos profissionais paraibanos na produção dessa série. Essa é a parte interessante do processo de licitação.

Com relação à compra dos produtos, três distribuidoras trabalham conosco atualmente: Didak, Synapse e Magnatel. Mas trabalhamos também com outras distribuidoras que representam as empresas internacionais de quem compramos conteúdo. Todas as empresas brasileiras ou internacio-nais podem vender curtas-metragens, médias ou longas para a TV Escola, desde que estejam de acordo com as diretrizes exigidas pelo departamento jurídico do MEC e que estejam de acordo também com a linha editorial do canal, que tem como base as diretrizes curriculares da educação básica.

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Mesas

Multiplataforma:.Tempo.e.Formatos..para.Conteúdos.de.Curta.Duração

Políticas.Públicas.e.o.Mercado.do.Curta.no.Século.XXI

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A primeira mesa do Seminário Curta e Mercado, intitulada Multi-plataforma: Tempo e Formatos para Conteúdo de Curta Duração, tinha como objetivo apresentar experiências do mercado voltadas

à difusão, distribuição e exibição de produtos audiovisuais de curta dura-ção. Assim, formou-se um painel de informações sobre o perfil desses cases, as características dos produtos a serem comercializados e as oportunidades existentes.

Defendo a ideia de que o audiovisual de curta duração pode ser um protagonista do mercado atual. Isto ao considerar as suas características e possibilidades de distribuição em todas as janelas de exibição. No entanto, conhecer iniciativas em andamento e obter informações sobre o mercado é sempre um passo fundamental para compreendermos o nosso ambiente e sermos capazes de gerar novas estratégias para as nossas produções e para todo o segmento audiovisual. Esse estudo favorece o desenvolvimento de novos modelos de negócios por parte dos realizadores e produtores. Essa foi a proposta que norteou toda a primeira mesa do Seminário.

Douglas Silveira foi o primeiro convidado a falar. Ele coordena o Núcleo de Comunicação da TV Escola, um canal do Ministério da Educação que entrou em operação em 1996. A TV Escola é exibida por meio de ante-na parabólica analógica e digital, por algumas operadoras a cabo do Brasil e pela internet. Silveira explicou que a emissora tem a sua programação composta por documentários e programas educativos voltados ao público infantil. Além do uso em sala de aula, feito por professores e educadores de escolas que dispõem de kits tecnológicos — TV, DVD e antena parabólica — a grade também atende ao público em geral, às famílias brasileiras.

Entre 60 e 70% da programação é adquirida de empresas educativas internacionais, a maioria proveniente da Holanda, França, Canadá, Coréia e Inglaterra. O restante é produzido aqui mesmo, no Brasil.

Conhecendo as demandasAletéia SelonkDoutora em Comunicação Social, produtora da Okna Produções e integrante da diretoria da ABD-N.

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Os conteúdos adquiridos são, normalmente, aqueles que não são encon-trados no mercado brasileiro. E a produção pela emissora segue regras rígi-das de licitação, o que pode causar uma lentidão nos processos, o que não se adéqua ao ritmo acelerado da montagem de uma grade de TV. Assim, como é difícil encontrar produtos prontos que abordem, de maneira educativa, a língua portuguesa ou a história do Brasil, por exemplo, a tendência é que estas demandas sejam atendidas por produções internas. Silveira salientou que a principal vantagem dessas licitações é a possibilidade de contratos de trabalho com produtoras de todo o Brasil.

João Garção Borges apresentou a todos o case do programa Onda Cur-ta – um espaço para exibição de curtas-metragens na RTP – Rádio e Televi-são de Portugal – da qual ele é criador e programador. O programa de Garção Borges é exibido no canal RTP2, que tem perfil cultural. No Brasil, a TV Brasil se assemelha a ele.

Importante destacar que o curta-metragem sempre foi exibido nas tele-visões portuguesas. O Onda Curta vai ao ar em horário nobre, às 21 horas, e tem uma hora de duração, agrupando vários filmes. O programa exibe, especialmente, filmes de criação, de autor. Mas, todos os gêneros são acei-tos — ficção, documentário, experimental, animação. A seleção do que vai ar é feita pelo próprio Garção, que programa os filmes de melhor qualidade segundo a sua opinião. Ele acredita que cada filme tem seu público especí-fico e, dessa forma, mantém-se firme aos seus próprios critérios na hora de fazer a seleção.

Todos os filmes exibidos são remunerados a partir de uma mesma média de preço, hoje estimada em 65 euros por minuto, para duas exibições, sem exclusividade. Como seu trabalho já está consolidado, o Onda Curta também possui importantes parcerias com eventos internacionais, como o prêmio de aquisição do Festival Curta Cinema, do Rio de Janeiro.

O terceiro participante da mesa, Carlos Dowling — coordenador de programação da TV da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) — apresen-tou o trabalho da Rede Nordestina do Audiovisual (RNA), projeto que ele também coordena. A RNA é um “pontão de cultura”, iniciado em 2007, que tem como objetivo promover a articulação e o intercâmbio das experiências do “fazer audiovisual” na região Nordeste. Mas, além de encontros presen-ciais, ela cria novos mecanismos para viabilizar essa troca de experiências.

O principal deles é o portal Rede Nordestina do Audiovisual – um espa-ço na internet que possibilita o compartilhamento de conteúdo audiovisual, especialmente de filmes de curta duração. Realizadores podem disponibili-zar seus filmes para que sejam assistidos através do portal além de possibi-

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litar a troca de informações através de listas de conteúdo. Ainda em teste de usabilidade, o portal já conta com uma parceria com o programa XPTO.Lab, para trabalhar com a capacitação para o uso de tecnologias interativas para a TV Digital, aproximando programadores de tecnologia da informação e produtores de conteúdo. As exibições dos filmes através do portal não têm fins lucrativos, mas modelos de comercialização são possíveis dentro desta estrutura e serão pensados nas fases posteriores do projeto.

O funcionamento da Programadora Brasil – um programa da Secreta-ria do Audiovisual do Ministério da Cultura, desenvolvido pela Cinemateca Brasileira através da Sociedade Amigos da Cinemateca, desde 2006 — foi apresentado por sua coordenadora, a produtora Moema Müller. O objeti-vo principal da iniciativa é promover o encontro do público com o cinema brasileiro através de uma ação que visa a formação de público, o fomento ao pensamento crítico em torno da produção nacional e o fortalecimento de iniciativas de difusão cultural. Isso se dá pela organização de programas de filmes brasileiros, disponibilizados em DVD, e autorizados a serem exibidos em pontos associados ao programa, que hoje já são mais de 1.400 – nor-malmente, espaços de exibição sem fins comerciais tais como cineclubes, centro culturais, pontos de cultura, escolas, bibliotecas, museus, são alguns exemplos de associados.

Com mais de 700 filmes disponíveis, sendo que a maioria deles, 78%, tem menos de 30 minutos de duração, a Programadora Brasil oferece 214 DVDs. Cada DVD é um programa que, na prática, funciona como uma suges-tão de programação, organizada por um rigoroso trabalho de curadoria que disponibiliza curtas-metragens, curtas e longas-metragens ou apenas longas-metragens.

Todos os filmes recebem remuneração e são escolhidos entre as produ-ções nacionais e os inscritos no edital de seleção da Programadora. A única exigência é que os títulos possuam CPB – Certificado de Produto Brasileiro, expedido pela Ancine.

Sabrina Nudeliman fechou a mesa e focou-se no tema da distribuição. Ela é co-fundadora e diretora da distribuidora Elo Company – uma distribui-dora de conteúdo audiovisual. A empresa trabalha com distribuição tradicio-nal e, em seu catálogo, estão filmes de todos os formatos, duração e gêneros. Sabrina explicou também que, além de comercializar os títulos no Brasil — para televisões, linhas aéreas —, a Elo possui um forte trabalho de colocação do produto brasileiro no mercado internacional. E a área de mídias digitais vem ganhando espaço em virtude de um aumento na demanda. A própria Elo criou canais na internet que disponibilizam conteúdo sob demanda, de

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modo segmentado, ou seja, um canal para documentários, outro para anima-ção, e assim por diante.

Ainda sobre as mídias digitais, Sabrina defendeu a tese de que quanto mais perto dos olhos, menor a tela — por exemplo, a tela do celular — e, portanto, menor duração deve ter o conteúdo. Além disso, a ordem das jane-las começa a se alterar e disponibilizar os filmes na internet já não impede a exibição ou comercialização em festivais e televisões, segundo ela.

Durante a apresentação, Sabrina condensou dicas sobre a comerciali-zação de conteúdo. Elas são úteis, pois apontam cuidados que realizadores devem ter desde a concepção do projeto. Os principais tópicos abordados foram: o produtor deve se responsabilizar e ter todos os contratos de libe-ração de direitos de obras literárias adaptadas e trilhas sonoras; ao criar um produto audiovisual deve-se pensar no seu público, direcionando-o para algumas das fatias, pois assim, evita-se trabalhos muito abertos, que tentam dialogar com todas as audiências, o que é muito difícil; produzir materiais extras — vídeos, fotos, releases — para serem usados na divulgação; selecio-nar os festivais e pensar na distribuição, desde o início do projeto.

O que fica claro aqui é que os realizadores precisam definir as suas intenções de distribuição, bem como o perfil dos produtos que estão sendo criados. Quando estas questões são levadas em consideração desde a concep-ção dos projetos, os resultados podem ser mais efetivos. Já para as produções concluídas, é necessário adaptar-se aos perfis de cada oportunidade e colocar a “cara na rua”, ou seja, oferecer as produções audiovisuais para distribuido-res, programadores e exibidores.

As chances de uma boa remuneração são maiores se considerarmos modelos de negócio que possam ser explorados a médio e longo prazo, acu-mulando remunerações advindas de diversos contratos. Ou então, produzir de modo a atender uma real demanda do mercado. Mesmo assim, não pode-mos desconsiderar, neste momento, a importância da difusão do produto nacional, mesmo que isso não se reverta em remuneração. A oferta do filme de curta duração pode ser encarada como uma estratégia para o aumento da demanda já existente, para a consolidação das cinematografias regionais e para o estímulo às iniciativas em funcionamento. Afinal, bons resultados geram novas demandas e novas demandas impulsionam o mercado para modelos de negócios capazes de gerar benefícios financeiros para todos os agentes envolvidos. E essa é a nossa meta.

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Interlocução com o Poder Públicoresumo elaborado por Lizandra Magon de Almeida, editora do material impresso do Festival Internacional de Curtas-metragens e desta publicação.

Para encerrar o Seminário Curta & Mercado, foram reunidos alguns representantes das instâncias de governo ligadas ao audiovisual, sob a coordenação da presidente da ABD-N, Solange Lima. Também com-

pareceu o presidente da Fundacine e diretor executivo do Congresso Brasi-leiro de Cinema (CBC), Cícero Aragon, convidado a falar sobre a realização do Congresso que aconteceria alguns dias depois, de 12 a 15 de setembro, em Porto Alegre.

André Sturm, coordenador da Unidade de Fomento e Difusão de Pro-dução Cultural (UFDPC) da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo, e personalidade importante na história recente do curta-metragem brasileiro abriu os trabalhos. Sturm foi diretor do Cineclube da Fundação Getulio Var-gas, em São Paulo, um dos pontos de exibição mais efervescentes do final da década de 1980, quando o curta-metragem começou a retomar seu prestígio perante o público e quando surgiram diversas iniciativas para promovê-lo.

Ele falou sobre esse período e também apresentou um projeto que está sendo desenvolvido pela Secretaria da Cultura para levar o cinema brasilei-ro de curta-metragem a cidades do interior paulista que não contam com salas de exibição. Segundo Sturm, foi feito um mapeamento das cidades onde havia auditório ou biblioteca e foram doados projetores digitais com a condição de que fossem criados cineclubes. Ao todo, 50 municípios foram contemplados. A Secretaria também está fazendo uma compilação de curtas-metragens produzidos com recursos do Prêmio Estímulo, que completa 30 anos, para doar para essas cidades.

Em seguida, apresentou-se o secretário do Audiovisual do Ministério da Cultura, Newton Cannito. “Sentimos que estamos em um momento de inovação, e dentro desse momento queremos apoiar a distribuição”, afirmou ao começar. Cannito comentou a necessidade de se fomentar o debate a res-peito do produto audiovisual brasileiro. “Debate e comercialização são duas

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coisas muito próximas, pois os filmes discutem a sociedade brasileira e isso impulsiona a campanha do filme. Muita gente fica pensando na publicidade do filme, mas esse conceito é antigo. É preciso haver um posicionamento no campo das ideias, divulgar ideias e conceitos para que o filme tenha reper-cussão.”

Nesse sentido, Cannito propôs uma valorização dos críticos e curado-res. “O mundo digital valoriza os curadores, que são agregadores indepen-dentes de conteúdo. São pessoas, não empresas, e eles têm prestígio junto às comunidades. Estamos sempre desprestigiando o campo intelectual e isso acaba tendo repercussões na economia. Dentro das políticas de distribui-ção de curtas-metragens, existem pessoas importantíssimas que funcionam como agentes.”

Outra questão levantada por Cannito foi a importância dos festivais para agregar valor aos filmes. Segundo o secretário, é muito importante haver tantos festivais, mas seria fundamental investir para tornar suas mar-cas mais fortes e com isso alavancar a exibição e comercialização dos filmes. “Falamos em mercado como se fosse uma coisa só, mas são vários segmen-tos. Os festivais precisam refletir essa variedade, e não o contrário. Muita gente acaba tentando fazer filmes que são o estilo deste ou daquele festival.”

Em relação ao mundo digital, Cannito disse que é preciso saber que a Internet tem uma vocação para o gratuito, que é realmente difícil conseguir remuneração nessa mídia. Mas que justamente não se pode mais pensar em segmentação por mídias. “O raciocínio digital é transmidiático, então a estratégia precisa ser pensada para o conteúdo. Hoje existem séries de TV que ganham dinheiro vendendo música para IPhone, outras vendem brin-quedos, outras vendem DVDs. São várias ações em paralelo, de acordo com o conteúdo, que já precisa ser pensado nesse sentido.” Outra forma é por tipos de público, completou. “Estamos pensando em financiar pesquisas sobre a tendência do gosto do consumidor.”

O convidado seguinte foi Manoel Rangel, diretor da Ancine. Ele des-tacou a importância da convergência digital, citando o Plano Nacional para Banda Larga, do Governo Federal, que pretende levar o acesso à banda larga para toda a população do país. “O cenário projetado para o futuro aponta para a perspectiva de que o cidadão vai estar diante de uma tela, qualquer tela, e vai receber conteúdo audiovisual. Precisamos estar preparados para isso.”

Rangel também destacou a importância da existência de projetos pro-postos pelos próprios realizadores audiovisuais, como uma maneira consis-tente de avançar nas discussões. Nesse sentido, aposta no projeto Curta em Todas as Telas (veja no final desta publicação). Ele alertou os realizadores

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sobre a demanda futura por obras audiovisuais que deve surgir com a apro-vação do PL 29/PLC 116. “Vejo este como um momento que pode marcar uma geração de realizadores.”

Antes de abrir para as perguntas da plateia, Solange Lima afirmou que um dos maiores desafios dos realizadores brasileiros, diante de tantas mudanças no cenário do audiovisual, é a profissionalização do setor. Ques-tões de direitos autorais e documentação são algumas das preocupações que precisam estar na mente dos realizadores, tema que também foi comentado por Paulo Alcoforado, da Ancine, que afirmou que é preciso avançar a dis-cussão nesse sentido, pois o pagamento de direitos está diretamente ligado à geração de negócios. “A organização dos direitos morais e patrimoniais decorrentes da autoria resolve muitas dificuldades, mas exige uma capaci-tação que ainda não existe da produção executiva”, afirmou. “No âmbito do audiovisual, a Ancine é a agência responsável por isso, para ajudar nessa capacitação.”

Caio Plessman, da ABD-SP, comentou sobre a questão dos festivais levantada por Cannito. Segundo Plessman, hoje os festivais não agregam mais valor no sentido de levar público às salas de cinema, pois a lógica do mercado atual é diferente. Entretanto, os festivais agregam no sentido cul-tural, o que em última análise pode ajudar na carreira do filme. Plessman também afirmou que existem mais de 220 festivais cadastrados pelo Forum de Festivais e que existe uma diversificação na temática.

Em seguida, Paulo Alcoforado se manifestou sobre o assunto, dizendo que os festivais poderiam articular lançamentos de filmes brasileiros visan-do ocupar as salas de cinema. Também informou que está sendo criado o Programa Banco de Conteúdos Audiovisuais Brasileiros, uma central de pro-duções brasileiras de audiovisual. A Cinemateca Brasileira será a responsá-vel pelo projeto, mantendo as atividades de preservação e restauro que já desenvolve e passando também a digitalizar esses conteúdos para disponibi-lizar para o licenciamento a outras instituições e distribuição em banda lar-ga. A Cinemateca já está conectada ao backbone da Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP) e fará parte do Plano Nacional de Banda Larga.

Cannito respondeu aos comentários dizendo que é preciso ir além das avaliações feitas até o momento, com abordagens mais críticas e menos defensivas. “Temos muitas coisas para abordar, podemos falar em lançar melhor os filmes, em reserva de mercado, em ações regulatórias, mas tam-bém temos de atacar por outro lado. Não podemos ficar tentando encontrar culpados, como o cinema americano. Nós precisamos bolar outra estratégia, ir além, atacar os nichos.”

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Solange lançou uma provocação a Manoel Rangel, de que faltou abor-dar a questão das salas de cinema. Para Rangel, a exibição em salas hoje não é tão prioritária para o filme de curta-metragem, diante da multiplicidade de formatos digitais e novas mídias. “Respeito o direito desse formato estar na sala de cinema e acho que deve estar, mas não acho que esse seja o problema mais importante da comercialização. É uma ponta, mas o centro é a deman-da em larga escala, o que pode gerar uma demanda econômica efetiva.” Para Rangel, o mundo convergente impôs outro ritmo à cena do audiovisual. “A sala de cinema é uma vitrine, e eu admito que é preciso ter vitrine quando se trata de um produto audiovisual, mas para se ter resultado econômico é necessário pensar em todas as plataformas.”

Sobre a questão dos direitos autorais, Rangel explicou que a Ancine não tem atribuições nesse sentido, mas que o tema precisa ser acompanha-do na discussão da nova lei de direitos do autor. Para Cannito, a ideia é que exista uma arrecadadora privada ligada às associações de autores.

Cícero Aragon interveio para propor uma reflexão sobre o papel estatal na organização do banco de conteúdos brasileiros, que está sendo desenvol-vido pela Cinemateca Brasileira. Segundo ele, é necessário que o governo dê suporte às iniciativas privadas e que evite uma concorrência entre os negó-cios já existentes e os projetos governamentais. Rangel respondeu dizendo que o banco de conteúdos apenas organiza os materiais, mas que não tem o propósito de ofertá-los ao usuário.

O cineasta Geraldo Moraes comentou a importância dos festivais de cinema no sentido de desenvolver novos públicos e de promover a inclu-são audiovisual. “Antes alguns festivais se preocupavam em levar estrelas e isso realmente gerava mídia, mas hoje esse aspecto festivo foi substituído por outro que me parece mais importante, que é levar os filmes ao grande público.” Rangel complementou afirmando que deveria haver mais apoio do Estado a iniciativas que abram esse tipo de possibilidade.

Em seguida, todos os demais inscritos fizeram suas perguntas para Newton Cannito e Manuel Rangel. Cynthia Alario, da Rede Brazucah, reme-teu-se à palestra de Ana Carla Fonseca (veja na página 25), que falou sobre o desenvolvimento de uma indústria criativa com a participação do governo, e perguntou como os representantes da SAv e da Ancine veem o audiovisual de curta duração dentro da indústria criativa. Talitha Dalacosta, da M1ND Tecnologia, lembrou que a empresa desenvolveu ferramentas para mensurar o desempenho da produção audiovisual em meios como o telefone celular, e se colocou à disposição para eventuais estudos que o governo quisesse desenvolver.

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Retomando o comentário de Manuel Rangel sobre a exibição dos curtas-metragens em sala de cinema, Jaime Lerner, da APTC-RS, lembrou que projetos citados por Rangel como bem-sucedidos — caso do Curta nas Telas, do Rio Grande do Sul — não foram reproduzidos em outros estados. “O que se poderia levar para o âmbito nacional de iniciativas como essa?”, perguntou.

Silvio Da-Rin, da EBC/TV Brasil, se pronunciou a seguir fazendo um apanhado histórico da Lei do Curta e, apesar de concordar com a afirma-ção de Rangel de que a exibição em salas não é mais a questão central do curta-metragem, cobrou um posicionamento no sentido de substituir essa legislação por outra mais adequada ao momento atual. “Essa é uma ques-tão chata, um cadáver que ficou insepulto em minha gestão na Secretaria do Audiovisual, mas é uma janela que não pode ser desprezada. Acho que é preciso que o setor se posicione claramente em relação a isso, para que não continuemos sendo admoestados pelos jurássicos nostálgicos que con-sideram falta de vontade política a regulamentação de um dispositivo que é anacrônico, limitadíssimo.”

A produtora Paula Pripas comentou que a participação de curtas em festivais internacionais é uma boa oportunidade de comercialização, seja dos direitos, seja de cópias em DVD ou até de coletâneas e outros produtos semelhantes. Ela perguntou se existe a possibilidade de que o produtor seja o próprio distribuidor das obras de curta duração, já que tem sido difícil con-seguir que uma distribuidora comercial lance filmes desse formato.

Aletéia Selonk, da diretoria da ABD-N, abriu o Seminário coordenando a primeira mesa e foi a última inscrita para perguntas. Ela fez um breve apanhado do processo de criação do Seminário, dizendo que se no início da discussão, há cerca de um ano, a ideia da Lei do Curta ainda estava muito presente, ao longo do tempo foi sendo esquecida, já que as ideias foram atualizadas, avançaram e devem continuar avançando já que existe a expec-tativa de que o assunto continue a ser fomentado no blog do Seminário até a próxima edição do evento, prevista para 2011 no Festival Internacional de Curtas-metragens de São Paulo.

Manuel Rangel começou então a responder às perguntas, fazendo um apanhado da ação da Ancine nos últimos dez anos. “Toda a operação que se conduziu ao longo dos últimos dez anos de ação do Estado brasileiro repre-senta um esforço de construção de uma economia do audiovisual robusta, na qual o produto audiovisual brasileiro e as empresas brasileiras estejam no centro da ocupação do mercado interno. Digamos que as condições oferecidas nunca foram tão expressivas como são hoje, as condições de financiamento,

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a quantidade de novos que entraram na cena, a construção de laços com a rede de TVs públicas.”

Em resposta ao questionamento de Jaime Lerner, Rangel inverteu as perguntas: “Como vocês farão com que os projetos de vocês se materializem? Que iniciativas estão sendo pensadas de articulação com empresas do setor? E com distribuidores, exibidores, programadores? Que visitas estão sendo programadas às televisões abertas para oferecer parcerias? Que estratégia as ABDs construíram para que seu projeto tenha continuidade?”.

Rangel se referia ao projeto “Curta em Todas as Telas”, e afirmou que fez essa “provocação” sentindo-se em casa, já que também fez parte da ABD. “Sempre é bom lembrar que não se espere uma iniciativa redentora do Esta-do. Esse é um processo de construção articulada.” Para o diretor da Ancine, “o documento da ABD constitui uma belíssima plataforma de diálogo com o poder público, mas sobretudo com os outros parceiros do mercado. É pre-ciso pensar no agregador, no agente de vendas, em quem vai abrir mão de seu impulso criativo, de autor, para se dedicar ao negócio, porque é preciso pensar sob esse ponto de vista — poucas pessoas estão dispostas a cumprir esse papel.”

O secretário do Audiovisual então fez seu pronunciamento final, reto-mando a ideia da indústria criativa e a necessidade de valorizar o autor e todos os elos da cadeia. “Sempre insisto que ninguém deve trabalhar de gra-ça, isso é antiético, é errado. O audiovisual é uma indústria que tem um pro-cesso de feitura artesanal e uma distribuição industrial. Não é um processo fordista, isso nunca funcionou na arte. Mas precisamos ver o cidadão como um consumidor, consumir é um processo político. É uma mudança de racio-cínio que precisamos ter, de que o processo tem de ser pensado para que todos ganhem e nem sempre o financiamento fique só a cargo do Estado.”

A coordenadora da mesa, Solange Lima, agradeceu a todos os organiza-dores e participantes, e encerrou dizendo que a nova geração que hoje está pensando em fazer cinema “dialoga, cobra e também propõe, porque é só assim que se avança. Acho que essa foi uma grande mudança, que pudemos ver aqui neste Seminário”.

A partir das discussões elaboradas durante os três dias de evento, o documento “Curta em Todas as Telas” foi atualizado e sua nova versão está disponível nas páginas seguintes.

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ANEXO

Projeto Curta em Todas as Telas da ABD-N

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A ABD-N, como representante nacional dos realizadores independentes, propõe a

atualização das políticas públicas e da interação entre os agentes da cadeia produtiva do

audiovisual de todo país, a fim de estabelecer novas iniciativas voltadas à comercialização e

à exibição de filmes de curta duração, produzidos por produtores independentes brasileiros.

Os focos da nova estratégia residem em uma ação que contempla todas as janelas

de exibição – da sala de cinema à internet –, novos modelos de negócios e uma constante

valorização do produto perante toda a sociedade.

Os filmes de curta duração têm um papel importante no espaço audiovisual global,

pois estão em sintonia com as formas contemporâneas de consumo do audiovisual, que

privilegiam novos formatos e versões reduzidas, além de representarem um grande volume

das produções nacionais.

Histórico

A ABD-Nacional completa, em 2010, 37 anos de existência, e representa as

27 ABDs presentes em todas as capitais das unidades federativas do Brasil. Nestes anos

de militância, a entidade sempre se mobilizou em torno das principais pautas nacionais do

setor audiovisual.

Em agosto de 2009, quando membros da Associação estavam reunidos para a

realização de um balanço sobre as ações desenvolvidas e para a eleição de uma nova

diretoria, o tema do curta-metragem, tão valioso à entidade, ganhou força. No encontro,

que aconteceu durante o Festival Internacional de Curtas-Metragens de São Paulo, a

Secretaria do Audiovisual se fez presente pela intervenção do Sr. Adilson Ruiz, então diretor

do audiovisual da SAv, que manifestou a abertura desta Secretaria para um amplo diálogo

que contemplasse os novos caminhos para as políticas públicas e a organização do setor

para uma melhor distribuição, comercialização e exibição do curta-metragem.

A ABD-N reforçou, a partir de então, a sua postura de interlocutora e propositora

de iniciativas que tivessem esse objetivo. A primeira parte do trabalho foi a realização

de uma pesquisa sobre as oportunidades para o filme de curta duração no mercado

Curta em todas as telas

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audiovisual contemporâneo e sobre as atuais problemáticas que dificultam a circulação e

a comercialização desses produtos audiovisuais no mercado brasileiro. Uma reflexão seria

o passo seguinte.

Surge, então, o projeto Curta em Todas as Telas, que busca explorar todas as

oportunidades de comercialização, difusão e exibição de filmes de curta duração nas

diversas plataformas existentes. Nasce, então, uma visão panorâmica e atualizada sobre a

validade e a importância do curta metragem enquanto produto audiovisual nacional.

Em fevereiro de 2010, durante a Pré-Conferência da Cultura, entregamos uma primeira

minuta sobre o tema para o então Secretário do Audiovisual, Sr. Silvio Da-Rin. Na sequência,

a Secretaria do Audiovisual organizou um evento chamado de Reunião Preparatória para

o Seminário de Comercialização de Conteúdos de Curta Duração, em João Pessoa. Nele,

estiveram presentes, além do Secretário do Audiovisual, Sr. Silvio Da-Rin, e do Sr. Adilson

Ruiz, membros da diretoria da ABD-N, exibidores de conteúdo audiovisual, representantes

de TVs públicas, produtores vinculados a ações responsáveis pela difusão de curtas-

-metragens em diferentes janelas. Informações sobre iniciativas e demandas do mercado

para o filme de curta duração foram apresentadas a fim de incrementar a discussão em

torno do tema e contribuir para um amadurecimento da discussão.

Como forma de disseminar a discussão no país, as representantes estaduais da

ABD-N também desenvolveram discussões internas junto às suas diretorias e associados.

O projeto, em toda a sua plenitude, foi apresentado no Festival Internacional de

Curtas de São Paulo, em agosto de 2010. Neste momento, a grande oportunidade foi a de

dialogar de forma mais ampla com o setor e com a sociedade. Um passo a mais foi dado.

O esforço conjunto de todos resulta nas proposições a seguir, sempre firmes em

seu objetivo de valorizar o produto de curta duração proveniente da produção audiovisual

independente e inseri-lo na cadeia produtiva do setor.

Importante ressaltar que o curta metragem é, antes de tudo, um produto audiovisual

nacional. A ABD-N entende que a atenção dispensada às ações de distribuição e

comercialização de filmes de curta duração trará benefícios para toda a cadeia audiovisual

do Brasil, independente do formato dos produtos. O conteúdo nacional e a sua supremacia

no mercado é o mais importante.

O.filme.de.curta.duração

O conceito que propomos para o entendimento de filme de curta duração é mais

amplo do que a noção vigente de curta-metragem.

Até então, o curta-metragem vem sendo entendido como uma obra audiovisual com

duração média de 15 minutos, finalizado em película cinematográfica – 35mm e/ou 16mm

– e, posteriormente, concluído também em formato digital, em sua maioria destinado ao

circuito de festivais e mostras de cinema.

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A atualização do tema nos faz migrar para a noção de filme de curta duração,

que contempla diferentes formatos – com durações que podem variar entre 1 minuto

e 20 minutos, sendo até mesmo produzidos de forma seriada – e uma finalização mais

diversificada que pode até misturar imagens captadas em película e digital, mas vê a

sua cópia final igualmente valorizada, independente de tê-la em película ou permanecer

apenas em matrizes digitais. Sua destinação volta-se também para os festivais e mostras

de cinema, mas pretende uma abrangência mais plural ao integrar diferentes janelas como

suas possibilidades de exibição – DVD/home vídeo, televisões públicas, televisões privadas

abertas e fechadas, internet e mídias móveis.

Vale destacar aqui importantes características que fazem desse produto um protago-

nista do mercado audiovisual contemporâneo, sem esquecer de seus tradicionais atributos:

- o filme de curta duração sempre foi fundamental para a indústria audiovisual brasileira,

especialmente no eixo da produção. Desde as primeiras décadas do século passado,

ele se manteve em produção sendo, em alguns períodos, o único produto audiovisual

independente produzido em território nacional. Enquanto outros formatos esbarravam em

dificuldades de produção, sejam elas de viabilização, técnicas ou de outra ordem, o curta-

-metragem resistiu às diferentes fases da cinematografia nacional.

- o filme de curta duração pode apoiar-se em estruturas de produção ágeis e enxutas

e em planejamentos de viabilização de curto prazo, garantindo assim o volume de produção.

Claro que as particularidades de cada projeto precisam ser respeitadas.

- o curta-metragem mostra-se receptivo à entrada de novos talentos no mercado, às

produções universitárias, autorais, à experimentação, bem como à diversidade de gêneros

e narrativas. Esse caráter merece ser preservado e valorizado, em um momento em que

a indústria audiovisual brasileira pretende se diversificar em termos de produtos e janelas

de exploração e, consequentemente, em alcance de público, repercussão entre críticos e

formadores de opinião, entrada no mercado internacional.

- o filme de curta duração é produto adequado às novas janelas de exibição, tais como

a internet e as mídias móveis, em virtude do seu tempo de duração e sua comunicação com

o público.

- a produção de curtas metragens está disseminada em todo o território nacional,

diferentemente da realização de longas-metragens, por exemplo, que têm seus polos de

produção concentrados em algumas regiões do país.

- o público brasileiro gosta de assistir curtas-metragens, como é atestado em diversas

experiências. Quando bem programado e divulgado, as ações de difusão e exibição

mostram-se eficientes também ao atender os gostos do público.

Programa.Integrado

Assim sendo, propomos um Programa Integrado, capaz de fazer convergir ações dos

agentes do setor audiovisual – a esfera pública, os produtores audiovisuais, os distribuidores,

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os diversos circuitos de exibição, as universidades. Entendemos ser esta a proposta mais

condizente com o contexto atual.

O Programa deve promover uma real integração entre os agentes do setor. E estes

precisam compartilhar um primeiro objetivo: o de considerar o filme de curta duração um

produto audiovisual apto a ser comercializado e exibido. Claro que, dependendo da sua

localização na cadeia, os agentes terão outros objetivos, que podem não convergir para uma

mesma visão. No entanto, a intervenção pública pode contribuir para o equilíbrio dessas

posições, de forma saudável, competitiva e vinculada a uma meta maior de sustentabilidade

e alta difusão em todo o Brasil.

A organização deste Programa deve prever diferentes caminhos para estimular e

recompensar essa integração.

Outras premissas devem ser consideradas, tais como a remuneração do produtor

em face à distribuição/comercialização do produto, o respeito aos direitos autorais, as

diferentes camadas do público, seus gostos e hábitos de consumo audiovisual e cultural.

As.janelas.de.exibição

Sala de cinema

Como primeira janela, o cinema valoriza o produto que entra no circuito exibidor,

contribuindo para sua performance em todas as janelas de exibição. Além disso, é a referência

para o público e para formadores de opinião sobre “os novos produtos audiovisuais” que

entram no mercado.

Atualmente com aproximadamente 2.200 salas de cinema, o Brasil possui um circuito

de salas de cinema com perfil comercial concentrado nas regiões Sudeste e Sul, e nas

capitais dos demais estados. O controle é feito por empresas privadas com fins lucrativos

que exploram as potencialidades desse circuito junto ao público consumidor.

Os equipamentos vem sendo atualizados e mais de 300 salas do território nacional já

possuem equipamentos de projeção digital, viabilizado através do sistema Rain.

O curta-metragem, atualmente, quase não existe dentro da programação dos cinemas,

que é baseada na exibição de filmes de longas-metragens, especialmente os estrangeiros.

Porto Alegre é uma cidade que possui um programa modelo de exibição de curtas-

metragens em salas de cinema – o Curta nas Telas. Pelo programa, filmes são selecionados

e ganham 15 dias de exibição em sala comercial da cidade, antes da projeção do filme de

longa duração, seja brasileiro ou estrangeiro. Os curtas recebem uma remuneração pela

exibição no período, mantida pela Secretaria Municipal de Cultura de Porto Alegre.

Assim sendo, esse espaço é entendido como uma importante janela de exibição para

o curta-metragem. No entanto, distante da obrigatoriedade que consta na Lei do Curta,

propomos:

- o desenvolvimento de um trabalho de aproximação entre o Programa Integrado

para a Comercialização de Filmes de Curta Duração e os exibidores do circuito de salas de

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seminário de comercialização de conteúdos audiovisuais de curta duração

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cinema. Primeiramente, para que os exibidores conheçam a potencialidade desse produto

de acordo com o que vem sendo produzido em todo o Brasil e, ao mesmo tempo, visando

modelos de negócios inovadores.

- a criação de um Programa de Distribuição para os Filmes de Curta Duração capaz

de selecionar filmes de curta duração e organizar pacotes de programação atraentes para

exibidores e público.

Sobre os pacotes de programação:

- poderia-se agrupar filmes com mesma temática, gênero ou outra característica,

a fim de facilitar a comunicação com o público e o encaixe na grade de salas de cinema

comercial;

- poderia-se realizar uma curadoria em parceria com outras distribuidoras nacionais

de filmes brasileiros e estrangeiros, a fim de unir um curta a um longa. Essa união deveria

criar uma identidade a este programa também, sempre com foco na grade e no público;

- os pacotes poderiam ser em película e em formato digital, a fim de baratear despesas

de distribuição como transporte de cópias e fretes.

- verificar a possibilidade de incluir as exibições de filmes de curta duração na con-

tagem do cumprimento da Cota de Tela Anual.

- nos moldes do Prêmio Adicional de Renda, que premia distribuidores e exibidores

comprometidos com a comercialização e a exibição de filmes nacionais de longa-metragem,

criar modalidades de estímulo à participação dos exibidores e distribuidores junto às

iniciativas do Sistema Integrado.

DVD/Homevídeo

O mercado de DVD/Homevídeo é hoje umas das principais janelas de exibição,

tanto no que se refere à geração de receita quanto ao alcance de público. O filme de curta

duração pode também se beneficiar desta janela.

E, aproveitando a organização de uma estrutura de distribuição, criar programas que

comercializem DVDs com vários filmes, agrupados por temas, gêneros, estilos, os melhores

de um festival, entre outros

Também é possível desenvolver uma parceria com o Ministério da Educação.

Televisão

No Brasil, o Canal Brasil é o único canal de TV paga que conta com espaço reservado

à exibição do curta-metragem nacional em sua grade de programação.

Na TV aberta, a TV Brasil – antiga TVE – tem cumprido um importante papel que pode

ser aprimorado e ampliado. A TV Brasil também tem mantido um diálogo com a produção

independente e espera-se que esse trabalho conjunto se fortaleça.

A afiliada da Rede Globo no Rio Grande do Sul – a RBS TV – possui uma integração

com a produção local que tem rendido bons frutos nos últimos 10 anos. Eles possuem um

edital anual que seleciona 8 filmes de curta duração. Os projetos contemplados ganham

recursos para a sua viabilização e são exibidos na emissora, em um espaço da grade

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seminário de comercialização de conteúdos audiovisuais de curta duração

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reservado à produção de conteúdo local – aos sábados, por volta das 12h20. Além disso,

co-produções estão sendo desenvolvidas entre a RBS TV e empresas produtoras gaúchas

para a produção de séries de ficção e documentais.

Mas isso é apenas o começo, pois a produção independente nacional de curta duração

possui volume e atrativos para ganhar mais espaços nesses veículos tão importantes.

Televisão paga

Através de uma aproximação com esse segmento, aproveitando a ampla discussão

no que diz respeito à produção de conteúdo feita por produtores independentes, pode-se

inserir a TV paga existente no Brasil como janela de exibição do filme brasileiro de curta

duração.

Para isso, torna-se necessário:

- um mapeamento e uma aproximação com os principais players do setor;

- uma política de estímulo à exibição do curta brasileiro;

- um acompanhamento da audiência do curta-metragem brasileiro nos canais pagos.

Televisão aberta

As TVs públicas são responsáveis, hoje, pela exibição da produção independente

brasileira. Essa relação pode ser aprimorada no que diz respeito à manutenção e aumento

da grade disponível para a exibição do curta-metragem.

Assim, propomos:

- o aprimoramento do DOC-TV Brasil para que esta iniciativa possa se consolidar e, de

fato, favorecer a integração entre TVs e produtores. A ABD-N organizou um relatório sobre

as primeiras edições dessa iniciativa, apontando seus pontos fortes e os que necessitam

de aperfeiçoamento.

- o estabelecimento de novas parcerias com emissoras públicas e privadas com o

objetivo de gerar ações capazes de fomentar a aquisição de produtos já produzidos, bem

como a produção de novas realizações já concebidas para a televisão, sejam elas filmes,

séries ou seriados.

- o fortalecimento da produção nacional através de amplas ações de comunicação –

campanhas publicitárias, inserção do tema em programas já existentes, entre outros.

Internet

A internet e as novas mídias são segmentos que confirmam a potencialidade da

produção audiovisual de curta duração como importante produto capaz de atender às

demandas do mercado. Muitas são as possibilidades para esse segmento inovador:

- a criação de plataforma digital que funcione como banco de dados da produção

audiovisual de curta duração.

- a criação de editais que contemplem filmes de curta duração para exploração em

mídias digitais.

- a articulação junto a provedores e canais de conteúdo para iniciativas de aquisição

de material audiovisual de curta duração.

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- o estímulo a iniciativas empresarias voltadas ao desenvolvimento e execução de

comercialização de produção audoovisual de curta duração através de plataforma digital na

internet (pay per view, vídeo on demand).

Mídias móveis

Criação de editais em parceria com empresas de telefonia móvel para aquisição de

conteúdo audiovisual de produção independente e produção de formatos específicos.

Mostras e Festivais de Cinema

Aproveitando eventos que já contam com o apoio das instituições do setor – MinC,

Ancine – o curta-metragem deveria integrar a programação de todas as mostras de filmes

brasileiros. Em uma mostra de documentários brasileiros, por exemplo, poderia haver um

curta-metragem atrelado a cada longa, do mesmo gênero e com afinidade de conteúdo.

Uma ação como essa pontua o entendimento nacional de que o curta-metragem é um

produto audiovisual brasileiro e faz parte de todas as ações.

PROPOSTAS.A.SEREM.DESENVOLVIDAS.EM.CURTO.PRAZO

Programa de CaPaCitação e estruturação de agentes Para a distribuição de

Filmes naCionais de Curta duração

Para nós, é fundamental a existência de políticas que incentivem e fomentem

iniciativas empresarias voltadas à distribuição de curtas-metragens no mercado

brasileiro, criação e programação de filmes de curta duração para grades de televisão

e distribuição internacional. O agregador de conteúdo tem papel fundamental nesse

contexto, por ser capaz de selecionar e posicionar a produção para um diálogo

eficiente junto ao mercado, em busca de oportunidades. Enquanto a produção é

naturalmente pulverizada em inúmeras estruturas de produção, a distribuição deve

se fortalecer ao agregar conteúdos e disponibilizá-los ao mercado.

Assim, propomos:

- a criação de uma Rede de Distribuição, formada por Núcleos de Distribuição

representantes de cada região brasileira – Sul, Sudeste, Centroeste, Norte e

Nordeste. Cada núcleo seria composto por dois ou mais agentes estaduais,

representantes de cada estado das regiões. Esta Rede teria a função de distribuir

conteúdo audiovisual desde a sua seleção e curadoria, até o “empacotamento” dos

produtos em programas individuais ou em agrupamento de filmes, atendendo todas

as janelas de exibição.

Através de uma seleção, seriam escolhidos os agentes, que seriam pessoas

jurídicas, pois espera-se que essas estruturas empresariais pudessem se tornar, em

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seminário de comercialização de conteúdos audiovisuais de curta duração

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média prazo, estruturas autossustentáveis em modelos de negócios de distribuição.

Eles se beneficiariam através do Programa da seguinte forma:

- capacitação para a distribuição de produtos audiovisuais, através de

workshops e Seminários dedicados ao tema.

- após a fase de estudos, os integrantes do grupo desenvolveriam um amplo

projeto para a distribuição de conteúdo. Esses projetos seriam viabilizados através

do Programa, que daria sustentabilidade às ações planejadas por dois anos.

- todas as ações seriam acompanhadas por representantes da SAv e seu

desempenho seria analisado, caso a caso.

- os resultados da iniciativa serviriam como análise para a continuidade do

Programa, em novos moldes.

É importante destacar que, na seleção dos agentes, seria levado em conta

as orga nizações empresariais que já estão comprometidas com o curta-metragem.

Além disso, os resultados do Programa podem ser otimizados na medida

em que ele desenvolve pessoas e empresas para a atuação no setor. Esse ganho é

irreversível e seu impacto é profundo dentro do espaço audiovisual como um todo.

• Criação e desenvolvimento de editais, estabeleCidos em ParCeria Com Canais de

televisão, a sav e a abd-n, a Fim de estimular a aquisição de obras já realizadas

O edital da TV Câmara, realizado em 2009/2010, é um modelo desta ação.

Mas pode ser aprimorado, da seguinte forma:

- contemplando diversos formatos e gêneros de produtos;

- valorizando o produtor através de remuneração compatível;

- acoplando ao edital uma ampla campanha informativa sobre o programa, as

obras e a produção nacional.

• Criação de um selo de Produto brasileiro Para distribuição em dvd/homevídeo

de obras audiovisuais de Curta duração

O selo seria responsável pela Chancela dos produtos que seriam colocados

à dispo sição para a comercialização junto a videolocadoras, livrarias e lojas de

variedades.

A Rede de Distribuição poderia apoiar essa ação, atuando como agente de

marketing e divulgação.

• estabeleCimento de um CirCuito alternativo de exibição audiovisual Com Força

ComPetitiva e inserção em todos os estados

Em parceria com os cineclubes, pode haver a seleção de iniciativas de exibição

de excelência em cada Estado para integrar o Circuito. Este seria beneficiado com:

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seminário de comercialização de conteúdos audiovisuais de curta duração

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- programa de filmes de curta duração devidamente selecionado e com

curadoria para ser exibido em calendário próprio;

- apoio para a divulgação da ação, como materiais gráficos e mídia, a fim de

aumentar o público de cada cineclube para esta ação;

- estrutura de produção para realização de debates com os realizadores dos

filmes que, em alguns casos, poderiam fazer parte do projeto e participarem de

exibições em vários estados brasileiros.

Nota final:

Este texto representa o status atual do trabalho da ABD-N em torno do

Projeto Curta em Todas as Telas. Assim como a própria Associação, o projeto é vivo

e, a cada dia, a cada nova oportunidade, ele vem sendo aprimorado.

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Comitê de OrganizaçãoAdilson Ruiz (Coordenador de Conteúdo)Celso Gonçalves (Presidente da ABD-SP e Vice-presidente da ABD-Nacional)Zita Carvalhosa (Diretora do Festival Internacional de Curtas-metragens de São Paulo)

ProduçãoDeize Bélgamo (Produtora)Bianca Casemiro (Assistente)

Receptivo de convidadosAlice CoutinhoJoana Lins

Edição do material gráficoPólen EditorialLizandra M. Almeida (Edição)Marcio Soares e Soraia Scarpa (Projeto Gráfico e Diagramação)Adriana de Oliveira e Sabrina Pereira (Revisão de Texto)

AgradecimentosAfonso Gallindo, Ana Paula Dourado, Dolores Papa, Emerson Rodrigues da Silva, Fernanda Senatori, Ieda Fontes, Patrick Leblanc, Vânia Silva, Cinemateca BrasileiraDepartamento de Multimeios, Mídia e Comunicação da Unicamp

Apoio AdministrativoDiana Azeredo e Fabiana Amorim

Organização do Encontro Preparatório ao Seminário Curta & Mercado (realizado em João Pessoa em 14 de março de 2010)Supervisão Geral: Silvio Da-Rin (SAv)Coordenação: Adilson Ruiz (SAv)Produção: Sérgio Ribeiro de Aguiar Santos e Emerson Rodrigues da Silva (SAv)Apoio local: Francisco César Gonçalves (Diretor Executivo da Fundação Cultural de João Pessoa - FUNJOP); Ana Bárbara Ramos (Chefe da Divisão do Audiovisual da Fundação Cultural de João Pessoa - FUNJOPE); Tereza Cecília Lucena de Miranda (Chefe de Gabinete da Fundação Cultural de João Pessoa - FUNJOPE); Fernado Abath Cananea (Diretor Geral da Estação Cabo Branco) e Glaucia Azevedo (Chefe de Divisão de Programas e Atividades da Estação Cabo Branco).

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Impresso em novembro de 2010 na PowerGraphics