Monografia - Alimentos Filhos Maiores

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1 UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE – UNESC CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO RANGEL PATRICK TIBÚRCIO MINOTTO A MANUTENÇÃO/EXONERAÇÃO DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR EM FACE DA AQUISIÇÃO DE CAPACIDADE CIVIL PELO ALIMENTANDO À LUZ DO CÓDIGO CIVIL DE 2002 CRICIÚMA, JUNHO DE 2010.

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Monografia Alimento para filhos maiores

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UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE – UNESC

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

RANGEL PATRICK TIBÚRCIO MINOTTO

A MANUTENÇÃO/EXONERAÇÃO DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR EM

FACE DA AQUISIÇÃO DE CAPACIDADE CIVIL PELO

ALIMENTANDO À LUZ DO CÓDIGO CIVIL DE 2002

CRICIÚMA, JUNHO DE 2010.

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RANGEL PATRICK TIBÚRCIO MINOTTO

A MANUTENÇÃO/EXONERAÇÃO DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR EM

FACE DA AQUISIÇÃO DE CAPACIDADE CIVIL PELO

ALIMENTANDO À LUZ DO CÓDIGO CIVIL DE 2002

Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado para obtenção do grau de Bacharel no Curso de Direito da Universidade do Extremo Sul Catarinense - UNESC. Orientadora: Profª. Esp. Rosangela Del Moro.

CRICIÚMA, JUNHO DE 2010.

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RANGEL PATRICK TIBÚRCIO MINOTTO A MANUTENÇÃO/EXONERAÇÃO DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR EM

FACE DA AQUISIÇÃO DE CAPACIDADE CIVIL PELO

ALIMENTANDO À LUZ DO CÓDIGO CIVIL DE 2002

Trabalho de Conclusão de Curso aprovado pela Banca Examinadora para obtenção do Grau de Bacharel, no curso de Direito da Universidade do Extremo Sul Catarinense, UNESC, com Linha de Pesquisa em Direito de Família.

Criciúma, .... de junho de 2010.

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________________________ Profª. Esp. Rosangela Del Moro, - Unesc – Orientadora

_______________________________________________________ Profº. Msc – Marcus Vinícius Almada Fernandes

_______________________________________________________ Profº. Msc – Ismael Francisco de Souza

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Aos meus pais, Terezinha e Valdir, que,

estando sempre ao meu lado, incentivaram-me

a cumprir esta jornada. Aos meus irmãos

Rodrigo, Robson e Roger.

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AGRADECIMENTOS

À minha orientadora, Professora Rosangela Del Moro, pelo constante

auxílio e paciência com este formando inquieto, por suas sugestões, sem as quais o

presente trabalho não se realizaria.

Aos meus pais, por terem me ensinado desde cedo o verdadeiro sentido

da expressão família, com atos de amor, solidariedade e respeito.

À minha mãe Terezinha, mulher guerreira, por seus dias de trabalho em

uma máquina de costura para sempre me auxiliar no custeio do colégio fundamental,

o qual me concretizou a viabilidade e desempenho em conseguir entrar em um curso

superior. Pelos seus puxões de orelha no momento certo, pelo carinho no momento

oportuno, por sua dedicação de mãe ao qual tenho muito respeito e admiração.

Ao meu pai Valdir, que um dia se orgulhará do seu filho mais novo.

Aos meus irmãos Rodrigo, Robson e Roger, pela batalha de vida que

tiveram e jamais deixaram se abater por algumas derrotas, as quais hoje dão fôlego

e união a esta família.

A minha irmã Renata que, com certeza, está sempre ao meu lado,

desviando-me dos caminhos errados, me orientando nas decisões difíceis e, de

onde estiver, me vê concluindo o curso superior, algo tão sonhado por ela, que se

dedicava com intensidade ao estudo, mas que após muita luta foi interrompida para

se juntar aos anjos.

Ao amigo Dorival, o “bruxo”, amigo para todas as horas, que partilha sua

experiência e conhecimento sempre que preciso.

A minha namorada Stefani, que foi a pessoa que mais me deu suporte

para conclusão deste trabalho, passando junto pelo famoso “estresse do TCC”,

estando sempre do meu lado, confortando com palavras e gestos, passando a

verdadeira expressão da palavra namoro, conhecimento de um ao outro,

compreensão e dedicação.

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“todos os homens nascem livres e iguais em

dignidade e direitos. São dotados de razão e

consciência e devem agir em relação uns aos

outros com espírito de fraternidade.”

Art I, Declaração Universal dos Direitos

Humanos

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RESUMO

MINOTTO, Rangel Patrick Tibúrcio. A manutenção/exoneração da obrigação alimentar em face da aquisição de capacidade civil pelo alimentando à luz do código civil de 2002 e da jurisprudência de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Superior Tribunal de Justiça a partir do ano de 2002. 2010. 56 p. Orientadora: Rosangela Del Moro. Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Direito. Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC. Criciúma – SC.

O estudo que ora se apresenta tem por finalidade demonstrar em quais situações permanece a obrigação alimentar dos pais em relação aos filhos, apesar da aquisição da capacidade civil por estes. Por meio de pesquisas bibliográficas em livros, artigos, Constituição da República Federativa do Brasil – CRFB e outros materiais, sendo utilizada a metodologia de pesquisa bibliográfica com abordagem qualitativa e método dedutivo. A manutenção e exoneração em face da aquisição da capacidade civil pelo alimentando são abordadas em seus aspectos jurídicos e práticos, visando demonstrar a aplicabilidade deste ordenamento, com amparo no Código Civil de 2002 e Jurisprudências do Estado do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Superior Tribunal de Justiça. Destacam-se o tratamento jurídico conferido a essa modalidade, por meio do qual se busca situá-la num entendimento civil-constitucional. Abrange, outrossim, a idéia de que o dever dos pais não é apenas o de prestar alimentos aos filhos, mas sim prestar a guarda, educação e respeito. Desta forma, verificou-se que as possibilidades de manutenção da obrigação alimentar após a maioridade civil do alimentando se faz por meio da incapacidade civil e nos casos em que o filho ainda está cursando faculdade ou curso profissionalizante, visto que é também dever dos pais conservar estabilidade até que os filhos possam manter uma vida profissional calçada na ética e moral. Palavras-chave: Capacidade Civil; Obrigação Alimentar; Manutenção dos Alimentos; Exoneração dos Alimentos.

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LISTA DE SIGLAS CC/16 – Código Civil de 1916 CC/2002 – Código Civil de 2002 CF – Constituição Federal CPC – Código Processo Civil CRFB – Constituição da República Federativa do Brasil ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente STJ – Superior Tribunal de Justiça TJRGS – Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul TJSC – Tribunal de Justiça de Santa Catarina

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 10 2 OS ALIMENTOS EM FACE DOS NOVOS PARADIGMAS DO DIREITO DE FAMÍLIA .................................................................................................................... 11 2.1 Evolução Histórica da Família .......................................................................... 11 2.2 Novos Conceitos de Família ............................................................................. 13 2.3 Tipos de Família ................................................................................................ 14 2.4 Os Princípios do Direito de Família ................................................................. 15 2.4.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana ................................................. 15 2.4.2 Princípio da Igualdade e Respeito à Diferença ............................................ 16 2.4.3 Princípio da Afetividade ................................................................................. 18 2.4.4 Princípio da Solidariedade ............................................................................ 20 2.5 O Poder Familiar ................................................................................................ 21 2.5.1 Evolução Conceitual do Pátrio Poder ao Poder Familiar ............................ 23 2.6 Deveres dos Pais ............................................................................................... 25 2.6.1 Guarda ............................................................................................................. 25 2.6.2 Educação ........................................................................................................ 27 2.6.3 Dever de Prestar Alimentos ........................................................................... 29 2.6.4 Respeito .......................................................................................................... 30 3 A AÇÃO DE ALIMENTOS ..................................................................................... 32 3.1 As Partes na Ação de Alimentos ..................................................................... 32 3.2 A Causa de Pedir na Ação de Alimentos ......................................................... 33 3.3 O Pedido na Ação de Alimentos ...................................................................... 36 3.4 Ações de Alimentos e Coisa Julgada .............................................................. 36 4 A MANUTENÇÃO/EXONERAÇÃO DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR EM FACE DA AQUISIÇÃO DA CAPACIDADE CIVIL PELO ALIMENTANDO .............................. 38 4.1 As Consequências Advindas da Aquisição da Capacidade Civil pelos Filhos .................................................................................................................................. 38 4.1.1 Da Emancipação ............................................................................................. 42 4.1.2 Da Maioridade Civil ....................................................................................... 43 4.1.3 Exoneração da Prestação Alimentar versus Incapacidade Civil do Maior de Idade .................................................................................................................... 44 4.2 Ação de Exoneração de Alimentos e os Efeitos da sua Não Interposição .................................................................................................................................. 46 5 CONCLUSÃO ....................................................................................................... 48 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 51

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1 INTRODUÇÃO

Recentes entendimentos jurisprudenciais vêm construindo a idéia de que

o dever dos pais não é apenas o de prestar alimentos aos filhos, mas também lhes

transferir afeto, carinho, compreensão, amor, estabilidade, ajudando-os a construir

também uma vida profissional baseada na ética e moral. Por isso, diz-se que os

deveres inerentes à qualidade de pai e mãe não cessam aos dezoito anos do filho,

mais sim quando este encontrar-se maduro suficiente para enfrentar os percalços da

vida.

Vive-se um momento em que os jovens estão voltados essencialmente à

vida profissional, sendo que, mais do que nunca precisam da ajuda de seus pais, a

fim de tornar seus sonhos realidade.

O dever de assistir, criar e educar os filhos menores e maiores é princípio

constitucional, no entanto, devido aos muitos pontos controvertidos que envolvem a

matéria, a doutrina e jurisprudência divergem em seu entendimento.

Deste modo, o implemento da maioridade serviria como única e suficiente

justificativa para se buscar a exoneração dos alimentos? Deve-se considerar que o

filho, mesmo após a maioridade, pode ainda necessitar da ajuda financeira dos pais,

sendo deles ainda dependente.

Com o objetivo de conferir amparo científico ao presente trabalho,

realizou-se pesquisa bibliográfica com a abordagem qualitativa e método dedutivo,

visando reunir subsídios complementares para os temas desenvolvidos, em especial

o tratamento conferido a pensão alimentícia a filhos com maioridade civil, à luz do

Código Civil de 2002 e da Jurisprudência de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e

Superior Tribunal de Justiça – STJ, a partir do ano de 2003.

Por meio do estudo apresentado, busca-se demonstrar em quais

situações permanecem a obrigação alimentar dos pais em relação aos filhos, apesar

da aquisição da capacidade civil por estes.

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2 OS ALIMENTOS EM FACE DOS NOVOS PARADIGMAS DO DIREITO DE

FAMÍLIA

Esse capítulo irá abordar o conceito de família, sua evolução histórica e

as mudanças de valor ocorridas em relação aos membros que a compõem e seu

papel na sociedade.

2.1 Evolução histórica da família

Todo arcabouço do direito de família encontra raízes no Direito Romano.

Em um retrospecto histórico, observa-se que o dever de alimentos sempre foi de

responsabilidade do marido, sendo a mulher o sexo frágil com menos recursos

financeiros. (DIAS, 2006). Assim, a família romana possuía uma estrutura

tipicamente patriarcal, onde as mulheres não detinham qualquer autoridade e o

poder patriarcal era absoluto.

Assim, detinha o poder sobre toda família era o marido. “A pátria potestas

é a designação usada para indicar a autoridade de que possui o detentor do poder

de educar. Ele é quem exerce as funções sagradas, o chefe do culto.” (VERONESE,

2005. p. 15-16).

Foi também no Direito Romano que a obrigação alimentar, considerada

antes de tudo, um dever moral, oficum pietatis, cristalizou-se como obrigação jurídica

derivada do parentesco. (MUJALI, 2006). Pode-se, portanto afirmar que, desde os

primórdios, o direito de prestar alimentos já era reconhecido através do contrato

matrimonial, consolidando o dever do marido de prestar alimentos à mulher e filhos,

ainda que adotivos. (MUJALI, 2006).

Na evolução no direito de família brasileiro, deve se ter em mente que o

legislador, ao elaborar o Código Civil de 1916 – CC/16, encontrava-se em uma

sociedade conjugal centrada na autoridade marital e com total influência do direito

canônico. (MUJALI, 2006).

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Tal influência pode-se perceber através da leitura de alguns artigos, os

quais mencionavam que “o marido é o chefe da sociedade conjugal”1, e ainda “o

marido detém a representação legal da família”2.

Em 1977, a Lei 6.515 introduziu o divórcio em nosso ordenamento,

possibilitando a regularização das uniões irregulares de grande número de pessoas

que, embora desquitadas de seus cônjuges, não podiam contrair casamento com

seus novos companheiros. (DIAS, 2006).

Porém, foi somente com a Constituição da República Federativa do Brasil

de 1988 - CRFB/88 que advieram as mais profundas mudanças, principalmente com

relação à família e à mulher. (DIAS, 2006).

No que se denota, a CFRB/88 eliminou as expressões “colaboração da

mulher” e “durante o casamento”, existentes no antigo artigo 380 do CC/16, fazendo

subentender, atualmente, os termos “atuação conjunta e igualitária” e “durante o

casamento e a união estável, ou, durante da comunidade formada por qualquer dos

pais e seus descendentes”, assim, deixando clara a igualdade entre o homem e a

mulher, ou seja, entre o pai e mãe. (VERONESE, 2005).

Observando o artigo 21 da Lei 8069/903, referente ao Estatuto da Criança

e do Adolescente – ECA (BRASIL, 2010A):

o Pátrio Poder será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a Legislação Civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência.

Hoje a realidade mudou, ambos os sexos têm sua independência

econômica, seu trabalho, sua ideologia, de modo que o dever de alimentos não mais

é de responsabilidade exclusiva do homem, devendo a mulher contribuir em

igualdade de condições.

1 Artigo 233, Código Civil Antigo – Lei – 3.071-1916. (Revogado pelo Código Civil de 2002 – Lei – 10.406-2002. (BRASIL, 2010C) . 2 Artigo 233, inciso I, Código Civil Antigo – Lei – 3.071-1916. (Revogado pelo Código Civil de 2002- Lei – 10.406-2002. (BRASIL, 2010C). 3 A expressão “Pátrio Poder” fica substituída pela expressão “Poder Familiar”, conforme Art. 3º da Lei 12.010/2009 (BRASIL,2010B).

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2.2 Novos conceitos de família

O conceito atual de família em nada se assemelha àquele dos tempos

romanos. Antes da revolução familiar, o pai era visto como o centro familiar. Hoje o

homem deixou de ser o provedor exclusivo da família, ocorrendo à emancipação

feminina e sua inserção no mercado de trabalho, o que, consequentemente, fez com

que a deixasse o trabalho do lar e passou a trabalhar fora. Isso acarretou nos dias

de hoje, que, em algumas situações, passasse a exigir a participação masculina nas

atividades domésticas. (WAMBIER, 1993).

Assim dispondo, a norma constitucional encerrou uma fase de nossa

história, de forte influência religiosa judaico-cristã na qual os filhos eram penalizados

por atos praticados por seus pais. (VERONESE, 2005).

No enfoque do acima abordado Albuquerque Filho (2002, p.146), ressalta:

O pluralismo das relações familiares – outro vértice da nova ordem jurídica – também ocasionou mudanças na própria estrutura da sociedade. Rompeu-se o aprisionamento da família nos moldes restritos do casamento, mudando profundamente o conceito de família. A consagração da igualdade, o reconhecimento da existência de outras estruturas de convívio, a liberdade de reconhecer filhos havidos fora do casamento operaram verdadeira transformação na família.

O novo modelo de família funda-se sobre os pilares da repersonalização,

da afetividade, da pluralidade e do eudemonismo, embutindo nova roupagem

axiológica ao direito de família. (ALBUQUERQUE FILHO, 2002).

Atualmente é necessário ter uma visão pluralista da família, abrigando os

mais diversos arranjos familiares, devendo-se buscar a identificação do elemento

que permita enlaçar no conceito de entidade familiar a todos os relacionamentos que

tem origem em um elo de afetividade. (WAMBIER, 1993).

Cada vez mais as pessoas têm o direito de escolha e podem transitar de

uma comunidade de vida para outra que lhe pareça mais atrativa e gratificante.

(DIAS, 2006).

Agora, a predominância reside no indivíduo, e não mais nos bens ou

coisas que guarnecem a relação familiar. (ALBUQUERQUE FILHO, 2002). Deste

modo, hoje existe a liberdade de trânsito entre ideologias distintas das seguidas

pelos ascendentes ou aquelas determinadas pelo casamento, ocorrendo a

modificação nos modelos de famílias.

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2.3 Tipos de família

O CC/16 regulamentava a questão familiar, desde o início do século

anterior, como tão somente reconhecida através do matrimônio.

Até 1977, não havia o divórcio no Brasil. A única modalidade de

separação que existia era o desquite. As uniões, surgidas sem o selo do matrimônio,

eram identificadas como o nome de concubinato, sendo que tal expressão era tida

com carga pejorativa. (RODRIGUES, 2002).

Contudo, após queixas generalizadas, passou a justiça a reconhecer a

existência de sociedade de fato. Porém, para ensejar a divisão dos bens adquiridos

na constância da união, havia ainda necessidade da prova da contribuição financeira

efetiva de cada consorte para a constituição do patrimônio. Ou seja, os

companheiros eram considerados sócios, procedendo-se à divisão dos “lucros”.

Deste modo, para evitar que também a mulher que contribuiu para a arrecadação de

bens na união não ficasse desamparada quando de seu término. (RODRIGUES,

2002).

Assim, as uniões de fato entre um homem e uma mulher foram

reconhecidas como entidade familiar com o nome de união estável. Também foi

estendida proteção estatal aos vínculos monoparentais, formados por um dos pais

com seus filhos. (RODRIGUES, 2002).

O autor afirma ainda que com a evolução dos costumes, as uniões

extramatrimoniais acabaram merecendo a aceitação da sociedade, levando a

CRFB/88 a dar nova dimensão à concepção de família e introduzir um termo

generalizado: entidade familiar.

Dias (2006), explica que destas entidades familiares, surgiram, a família

homoafetiva, a família monoparental e a família anaparental.

A familia homoafetiva é constituída por pessoas do mesmo sexo, isto

pois, reconhecidas as uniões homoafetivas como entidades familiares, as ações

devem tramitar nas varas de família. Assim, mesmo que por analogia, deve ser

aplicada a legislação da união estável, assegurando-se partilha de bens, direitos

sucessórios e direito real de habitação. (DIAS, 2006).

Em relação a família monoparental, Dias (2006) destaca que é aquela

constituída por quaisquer dos pais e seu filho. Estas entidades familiares receberam

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em sede doutrinária o nome de família monoparental, como forma de ressaltar a

presença de somente um dos pais na titularidade do vínculo familiar.

No que se refere à família anaparental, considera-se a convivência entre

parentes ou entre pessoas, ainda que não parentes, dentro de uma estruturação

com identidade de propósito. Impõem o reconhecimento da existência de entidade

familiar batizada com o nome de família anaparental. (DIAS, 2006).

Deste modo, os tipos de família saem do modelo tradicional, sendo visto

apenas pelo homem, sua uma mulher e cercados por seus filhos, passando por uma

repaginação e sendo aceito pela sociedade através de famílias compostas por

homosexuais, monoparental e anaparental.

2.4 Os princípios do direito de família

Esse tópico tratará dos princípios do Direito de Família, sob a luz da

CRFB/88, incluindo o “Princípio da Afetividade”.

2.4.1 Princípio da dignidade da pessoa humana

Este é considerado o princípio de maior valor, ou ainda no entender de

Dias (2006, p. 52), valor nuclear da ordem constitucional:

[...] é o principio maior, fundante do Estado Democrático de Direito, sendo afirmado já no primeiro artigo da Constituição Federal. A preocupação com a promoção dos direitos humanos e da justiça social levou o constituinte a consagrar a dignidade da pessoa humana como valor da ordem nuclear constitucional. Sua essência é difícil de ser capturada em palavras, mais incide sobre uma infinidade de situações que dificilmente se podem elencar de antemão.

No mesmo enfoque, Sarmento (2003, apud Dias, 2006, p. 52) explica que

este é

o mais universal de todos os princípios. É um macroprincípio do qual se irradiam todos os demais: liberdade, autonomia privada, cidadania, igualdade e solidariedade, uma coleção de princípios éticos, os quais representam o epicentro axiológico e delimitando não apenas os atos

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estatais, mas toda a miríade de relações privadas que se desenvolvem no seio da sociedade.

O princípio da dignidade da pessoa humana engloba a liberdade de

constituir o matrimônio, de modo que é também direito das pessoas que estas

possam desconstituí-lo, pois, se de fato temos liberdade para ser feliz, devemos

encontrar esta felicidade. Deste modo, não corremos o risco de comprometer a

existência digna, pois é direito constitucional do ser humano ser feliz e dar fim àquilo

que o aflige sem inventar motivos. (ROSA, 2001).

Dias (2006, p. 53) afirma que

a dignidade da pessoa humana encontra na família o solo apropriado para florescer. A ordem constitucional dá-lhe especial proteção, independentemente de sua origem. A multiplicação das entidades familiares preserva e desenvolve as qualidades mais relevantes entre os familiares: o afeto, a solidariedade, a união, o respeito, a confiança, o amor, o projeto de vida comum, permitindo o pleno desenvolvimento pessoal e social de cada partícipe, com base em idéias pluralistas, solidaristas, democráticas e humanistas.

A mesma autora afirma que o princípio constitucional da dignidade da

pessoa humana é fundamento da República Federativa do Brasil, de forma que o

Estado existe em função de todas as pessoas e não estas em função do Estado.

Neste sentido, não representa apenas um limite à atuação do Estado,

mas constitui também um norte para a sua ação positiva. O Estado não tem apenas

o dever de abster-se de praticar atos que atentem contra a dignidade humana, mas

também deve promover esta dignidade através de condutas ativas, garantindo o

básico existencial para cada ser humano em seu território. (DIAS, 2006).

Assim toda e qualquer ação do ente estatal deve ser avaliada, sob pena

de inconstitucionalidade e de violar a dignidade da pessoa humana, considerando

que cada pessoa é tomada como fim em si mesmo.

2.4.2 Principio da igualdade e respeito à diferença

Não se poderia deixar de começar a falar deste principio, sem lembrar da

frase de Rui Barbosa: “tratar a iguais com desigualdade ou a desiguais com

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igualdade não é igualdade real, mas flagrante desigualdade.” (apud DIAS, 2006, p.

54).

O princípio da igualdade está intimamente ligado à idéia de justiça. No

âmbito da família, pode-se dizer que esta relação deve ser pautada não pela pura e

simples igualdade, mas pela solidariedade entre seus membros. Desmembra-se,

pois, nos princípios da igualdade de direitos e deveres entre os cônjuges e no

respeito à pessoa dos filhos. (MELLO, 1974).

Hoje, felizmente, com a CRFB/88 e a transformação de nossa sociedade,

pode-se dizer que foi atenuada a desigualdade de gêneros, onde mulheres e filhos

eram desconsiderados na ordem social, ou vistos como pessoas de menos

importância, sem personalidade própria e sem vontades. É sabido, ainda, que a

igualdade hoje alcançada não apaga as diferenças entre os gêneros, porém estas

devem ser encaradas com naturalidade e sabedoria, distinguindo-se o tratamento

desigual pelas diferenças, da pura e simples discriminação. (DIAS, 2006).

A CRFB/88 apregoou o principio da igualdade ao expressar em seu artigo

5º:

Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes[...] (BRASIL, 2009, p.14)

Atendendo à ordem constitucional, o CC/2002 aplica o princípio da

igualdade no âmbito do direito de famílias. A relação de igualdade nas relações

familiares deve ser ajustada não pela pura e simples igualdade entre iguais, mas

pela solidariedade entre seus membros, caracterizada da mesma forma pelo afeto e

amor. (DIAS, 2006).

Assim, seguindo a CRFB/88 em seu art. 227, § 6º (BRASIL, 2009), ainda

no direito de família e focando no âmbito das relações paternas e com seus filhos,

de forma a assegurar aos filhos os mesmos direitos e qualificações, vedando

denominações discriminatórias, conforme segue:

Art. 227 - É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. [...] § 6º - Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

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Deste modo, no entendimento de DIAS (2006, p. 58), “agora a palavra

‘filho’ não comporta nenhum adjetivo. Não mais cabe falar em filhos legítimos,

ilegítimos, naturais, incestuosos, espúrios ou adotivos. Filho é simplesmente filho”.

No mesmo sentido a autora explica que

A organização e a própria direção da família repousam no princípio da igualdade de direitos e deveres dos cônjuges (CC 1.511), tanto que compete a ambos a direção da sociedade conjugal em mútua colaboração (CC 1.567). São estabelecidos deveres recíprocos e atribuídos igualitariamente tanto ao marido quanto à mulher (CC 1.566).[...] É acentuada a paridade de direitos e deveres do pai e da mãe no respeitante à pessoa (CC 1.631) e bens dos filhos (CC 1.690).

Assim, é possível afirmar que a igualdade não é apenas um princípio de

Estado de Direito, mas também um princípio de Estado Social; é o mais vasto dos

princípios constitucionais, informador de toda a ordem judicial. (DIAS, 2006).

É dispositivo constitucional que, por um lado representa promessa

legislativa de busca da igualdade material e, por outro lado, mostra a necessidade

da conscientização de que promover a igualdade é, também, levar em consideração

as particularidades que desigualam os indivíduos. (MELLO, 1974).

Vale ressaltar que nas situações em que ocorrerem preconceitos e

posturas discriminatórias, o juiz, “em nome da isonomia, reconheça direitos às

situações merecedoras de tutela” (DIAS, 2006, p. 56).

Desta forma, pode-se afirmar que é função do judiciário aplicar a lei de

modo a não gerar desigualdades, assim como a lei não pode conter normas que

eventualmente estabeleçam vantagem.

2.4.3 Princípio da afetividade

O novo olhar sobre a sexualidade valorizou os vínculos conjugais, que

passaram a se sustentar no amor e no afeto. De acordo com Dias (2006), na esteira

da evolução, o direito das famílias instalou uma nova ordem jurídica para a família,

atribuindo valor jurídico ao afeto.

No mesmo enfoque, Villela (1994, p. 645) afirma:

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[...] as relações de família, formais ou informais, indígenas ou exóticas, ontem como hoje, por mais complexas que se apresentem, nutrem-se, todas elas, de substancias triviais e ilimitadamente disponíveis a quem delas queira tomar afeto [...], em fim, tudo aquilo que, de um modo ou de outro, possa ser reconduzido à arte e à virtude do viver em comum. A teoria e a pratica das instituições de família dependem, em ultima analise, de nossa competência em dar e receber amor.

O princípio da afetividade foi basicamente o norteador para o atual

reconhecimento da União Estável como entidade familiar. Sendo que antigamente

duas pessoas somente poderiam ser consideradas casadas caso o fossem pela lei

civil, aceitando-se ainda aquele realizado perante a Igreja. (DIAS, 2006).

Graças a este princípio que eleva a afetividade, tendo-a como mais

significativa que uma simples burocracia, casais que conviviam juntos há muitos

anos passaram a ser reconhecidos pela sociedade como casados, e principalmente,

como integrantes de uma mesma família.

Dias (2006) afirma que outra questão importante, também trazida por este

princípio, é o reconhecimento das famílias monoparentais, as quais compostas por

apenas duas pessoas (pai ou mãe e filho).

O princípio jurídico da afetividade faz despontar a igualdade entre irmãos

biológicos e adotivos e o respeito a seus direitos fundamentais. Desta forma o

sentimento de solidariedade recíproca não pode ser perturbado pela preponderância

de interesses patrimoniais. (DIAS, 2006).

Dias (2006, p. 60) identifica quatro fundamentos essenciais do princípio

da afetividade:

(a) a igualdade de todos os filhos independentemente da origem (CF 227 § 6º); (b) a adoção, como escolha afetiva com igualdade de direitos (CF 227, §§ 5º e 6º); (c) a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, incluindo os adotivos, com a mesma dignidade da família (CF 226, § 4º); e (d) o direito à convivência familiar como prioridade absoluta da criança e do adolescente (CF 227).

O CC/2002 não utiliza a palavra afeto, ainda que, em alguns dispositivos,

se possa verificar esse elemento para caracterizar situação merecedora de tutela.

Invoca apenas o laço de afetividade como referência para definir a guarda do filho

quando da separação dos pais. Porém, ainda que com grande esforço, pode-se

observar na lei o acréscimo do afeto a valor jurídico. (DIAS, 2006).

Na maioria dos casos a filiação deriva da relação biológica, todavia, ela

surge da construção cultural e afetiva permanente, que se faz na convivência e na

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20

responsabilidade. Assim, o afeto não é fruto da biologia. Aos laços de afeto e de

solidariedade derivam, além da relação sanguínea, também da convivência.

2.4.4 Princípio da solidariedade

O princípio da solidariedade está calçado nos deveres e direitos

recíprocos entre os familiares.

Aproveita-se a lei da solidariedade no âmbito das relações familiares. Ao

gerar deveres recíprocos entre os integrantes do grupo familiar, livra-se o Estado do

encargo de prover toda a gama de direitos que são assegurados

constitucionalmente ao cidadão. Basta atentar que, em se tratando de crianças e de

adolescentes, é imputado primeiro a família, depois à sociedade e finalmente ao

Estado o dever de garantir com absoluta prioridade os direitos essenciais aos

cidadãos em formação. (DIAS, 2006).

Tal princípio encontra respaldo em diversas leis, como por exemplo, na

Lei de Alimentos, a qual preceitua que não só os filhos possuem direito a pleitear

alimentos aos pais, mas também estes, se necessário, podem pedi-los aos filhos. E

vai além. Na impossibilidade dos pais em fornecer o suficiente a seus filhos, estes

podem solicitá-los junto a seus avós ou outros familiares que tenham condições.

(DIAS, 2006).

Deste modo, ocorre a possibilidade de posteriormente buscar alimentos

frente aos filhos invocando o princípio da solidariedade familiar.

De acordo com Dias (2006, p. 56):

Na ordem jurídica, as pessoas integrantes da família são, em regra, reciprocamente credoras e devedoras de alimentos. A imposição de obrigação alimentar entre parentes representa a concretização do princípio da solidariedade familiar. Esse princípio, que tem origem nos vínculos afetivos, dispõem de conteúdo ético, pois contém em suas entranhas o próprio significado da expressão solidariedade, que compreende a reciprocidade. Assim, deixando um dos parentes de atender com a obrigação parental, não poderá exigi-la de quem se negou a prestar auxilio. Vem a calhar o exemplo do pai que deixa de cumprir com os deveres inerentes ao poder familiar, não provendo a subsistência dos filhos. Tal postura subtrai a possibilidade de posteriormente buscar alimentos frente aos filhos invocando o princípio da solidariedade familiar.

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No mesmo enfoque destaca-se a seguinte jurisprudência do Tribunal de

Justiça do Rio Grande do Sul - TJRGS:

ALIMENTOS – SOLIDARIEDADE FAMILIAR – DESCUMPRIMENTO DOS DEVERES INERENTES AO PODER FAMILIAR. É descabido o pedido de alimentos, com fundamento no dever de solidariedade, pelo genitor que nunca cumpriu com os deveres inerentes ao poder familiar, deixando de pagar alimentos e prestar aos filhos os cuidados e o afeto de que necessitavam em fase precoce do seu desenvolvimento. Negado provimento ao apelo. (BRASIL, 2010D).

“Nunca declinou a lei a natureza da obrigação alimentar. O silêncio do

legislador sempre ensejou acirrada controvérsia”. (CAHALLI, 2006, p. 141). De

acordo com o CC/2002, art. 265 “como a solidariedade não se presume; resulta da

lei ou da vontade das partes”, pacificaram-se a doutrina e a jurisprudência

entendendo que o dever de prestar alimentos não era solidário, mas subsidiário e de

caráter complementar, pois condicionado às possibilidades de cada um dos

obrigados. Em face de sua natureza divisível, tal sempre serviu de justificativa para

que se reconheça que não se trata de obrigação solidária. (CAHALLI, 2006). Desta

forma, no caso de existir mais de um obrigado, cada um responde pelo encargo que

lhe foi imposto, não havendo responsabilidade em relação ao total da divida

alimentar.

Por fim, vale frisar que o princípio da solidariedade familiar também

implica respeito e consideração mútuos em relação aos membros da família. É, pois,

um princípio de grande importância para o direito, em especial ao direito de família,

possuindo grande aplicabilidade.

2.5 O poder familiar

O tema aqui tratado é a transformação do poder exercido sobre a família

por aquele que tem a guarda dos filhos ou que representa civilmente a prole.

O poder familiar inicia-se na antiga tradição indo-européia, que é a origem

do poder familiar para os romanos, onde, por sua vez, teve origens religiosas.

(SANTOS NETO, 1994).

O poder paterno, aliado à autoridade extrema que esse poder então

enunciava, configura uma das peças que deram fundamento estrutural à sociedade

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familiar, sendo que o poder paterno indicativo de uma autoridade cujos traços ainda

hoje remanescem.

Coulanges, (apud SANTOS NETO, 1994, p. 69), fundamenta esta

questão:

[...] a família compõe-se do pai, mãe, de filhos e escravos. Este grupo, por muito reduzido que seja, deve ter uma disciplina. A quem competirá, pois, a autoridade principal? Ao pai? Não. Porque existe em todas as casas algo superior senhor do lar. Estia despoina, a que os latinos conhecem por Lar familiae Pater. Nessa divindade interior ou, o que vem a dar o mesmo, na crença existente na alma humana, reside a autoridade menos discutível. É essa crença que indica na família a condição de cada um. O pai é o primeiro junto ao fogo sagrado; é ele que o acende e o conserva; é o seu pontífice. Em todos os atos religiosos desempenha a função mais elevada; degola a vítima; sua boca pronuncia a fórmula de oração que deve chamar sobre si e os seus a proteção dos deuses. A família e o culto perpetuam-se por seu intermédio; só o pai representa toda a série dos descendentes. No pai repousa o culto doméstico; quase podendo dizer como o hindu: “Eu sou o Deus”. Quando a morte chegar, o pai será um ser divino que os seus descendentes invocarão”.

De acordo com Veronese (2005, p.15) “a família não recebeu suas leis da

Cidade”. Segundo tal autora, quando a cidade passou a criar suas leis, já encontrou

o poder familiar, na sua feição prática paternalista, enraizado nos costumes dos

povos ali viventes.

Assim, segundo a mesma autora:

a cidade foi obrigada a aceitá-lo, não ousando fazer modificações, a não ser com o passar dos tempos. Se não foi a Cidade-Estado que criou o Poder Familiar, apenas reconhecendo algo já existente, então sua origem é muito mais remota. (2005, p. 15).

Em sua origem, o poder familiar, marcado pela autoridade do pater,

indicava uma idéia de sobreposição absoluta do pai.

Para Rizzardo (2007, p. 604):

O poder familiar nada mais significa que o conjunto de prerrogativas conferidas ao pai sobre o filho. No direito romano, ocupava aquele uma posição de chefe absoluto sobre a pessoa dos filhos, com tantos poderes a ponto de ser-lhe permitida a eliminação da vida do filho. Dizia que o pater tinha o direito sobre a vida e a morte do filho – ou o jus vitiar et necis, sem que, no entanto, pudesse ele agir arbitrariamente. De acordo com os escritos antigos, reunia-se um conselho familiar – o judicium domesticum – para opinar a respeito da morte do filho. Mas, dado o parecer, permanecia a vontade do pater.

Segundo se nota, a origem do pátrio poder – que antecedeu à moderna

noção de poder familiar - mostra a feição exageradamente patriarcal das sociedades

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à época, na qual, em tema de família, a relação intrínseca era hierarquizada, onde,

de cima para baixo, o pai reinava isolado e absoluto.

Pode-se bem depreender que, em sua origem, e da forma como

praticado, esse poder implicava na sobreposição do pai em relação aos filhos, de

maneira que a relação se estabelecia como que de pessoa para objeto, e não de

pessoa para pessoa.

Com tais contornos absolutistas, e marcado pela individualidade extrema,

absoluta e ilimitada do pai, foi que se constituiu o pátrio poder.

2.5.1 Evolução conceitual: do pátrio poder ao poder familiar

O pai, considerado “Deus” no Direito Romano, tinha o poder de decisão,

sendo ele o responsável por tudo. (VERONESE, 2005).

Os poderes do pater familiae alcançavam também os escravos e as

pessoas in mancipio (pessoas semilivres). Era ele o chefe religioso, político e jurídico

destes. (VERONESE, 2005).

Monteiro esclarece:

Nos tempos mais remotos o pater familiae tinha o poder de vida e morte (jus vitae et necis) sobre os seus filhos; estes nada possuíam de patrimônio, que se concentrava, apenas, nas mãos do pater. Todavia, com o passar do tempo, esses poderes ilimitados foram diminuindo. Foi, sem dúvida, o cristianismo, e a consequente crença em um Deus único, que, trazendo para a Igreja o monopólio religioso, muito contribuiu para o fim daquilo [...] que se chama de tirania do pai sobre o filho. (apud, VERONESE, 2005, p. 18-19).

A colocação de Monteiro deixa explícita a prevalência do cônjuge varão

sobre a pessoa dos filhos. Expressa ainda a importância da Igreja para a revolução

histórica do poder familiar, ao qual foi se modificando aos poucos com a criação do

Deus único, como aqui já dito. (VERONESE, 2005).

Afirma Veronese (2005, p. 19):

o Poder Familiar nasce como instituto de direito privado e evolui, adquirindo, com o passar dos tempos, características de um direito com conotação social, pois, embora regule relações de ordem privada, tem o Estado como interventor e protetor dessas relações. Esse interesse não é novo, e já podia ser observado no antigo Direito Romano, quando este suprimiu do pater familiae o direito de dispor da vida dos filhos. Para o Estado Romano, marcado por grandes conquistas, o filho era um cidadão romano e

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representava um possível soldado ou político. Desejava, assim, manter a incolumidade física dos seus compatriotas.

Atualmente, o poder sobre os filhos não é exercido com exclusividade

pelo pai. Este não figura mais como senhor absoluto, devendo respeitar os filhos

como seres individuais, que se encontram protegidos por normas que resguardam o

direito à personalidade, integridade física, integridade moral, educação e proteção

dos filhos, que se encontram protegidos enquanto pessoas, vedado quaisquer

formas de tratamento enquanto meros objetos, como na origem remota acontecia.

Além disso, a mulher, que passou a ter direitos iguais aos dos homens

tem igual poder de decisão sobre a prole.

RIZZARDO (2007, p. 606) diz: “pátrio poder é o conjunto de direitos que a

lei concede ao pai, ou à mãe, sobre a pessoa e bens do filho, até a maioridade, ou

emancipação desse, e de deveres em relação aos filhos”.

Sem deixar explícito que para o Estado também o bom desempenho

sobre a atuação do poder dos pais na pessoa dos filhos. Tanto que deixa expresso

no caput do art. 227 da CF/88 e ainda no art. 229 da CF/88: “os pais tem o dever de

assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e

amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”.

No ECA, a norma do art. 22 trás: “Aos pais incumbe o dever de sustento,

guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a

obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais”.

Também expressa no art. 1.634 e seus incisos, do CC/2002:

Art. 1.634. Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores: I - dirigir-lhes a criação e educação; II - tê-los em sua companhia e guarda; III - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem; IV - nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar; V - representá-los, até aos dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; VI - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha; VII - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.

Quando da vigência do Código Civil revogado, dizia-se que ambos os pais

tinham o poder familiar sobre o filho que ainda não atingira a maioridade civil, ou que

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o exercício do poder familiar pelo pai não excluía a mãe desse direito. Mas tratava-

se de um poder cujo exercício era não-concomitante, ou seja, era desmembrado, na

forma de uma simultaneidade que colocava a mãe em um segundo e secundário

plano de atuação. (RIZZARDO, 2007).

Hoje, pensa-se, e assim legalmente vigora, sobretudo a partir da abolição

da expressão “pátrio poder”, que o poder familiar, mais que um poder, constitui-se

de uma relação, ou do exercício de várias atribuições, cuja finalidade última é o bem

do filho, mas mediante uma atuação conjunta e igualitária, no que toca aos poderes

e atribuições do pai e da mãe. (RIZZARDO, 2007).

Assim, de uma sobreposição extrema, individualista e absoluta de uma

espécie drástica de um poder autoritário do pai, evoluiu-se, a passos lentos, para o

reconhecimento positivado de prerrogativas, direitos e deveres conjunta e

igualitariamente titularizados por ambos os companheiros e o responsável.

2.6 Deveres dos pais

Os deveres dos pais ou do responsável são elencados como sendo de

guarda, educação, manutenção e respeito, os quais trataremos a seguir.

2.6.1 Guarda

A guarda não é apenas dever de prestar assistência e alimentos, ela vai

além. Também é dever de dar afeto e convivência contínua. Comel (2003), enfatiza

não apenas o dever de guarda, mas também o dever de companhia e guarda.

Deste modo, Comel (2003, p. 111) explica:

[...] ter em companhia é função típica e da essência do poder familiar, e não significa apenas morar com o filho, tê-lo sob o mesmo teto, numa convivência contínua e de relativa permanência. É tudo isso e mais ainda, algo muito mais complexo e profundo.

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Assim o dever de guarda é de suma importância, devendo haver

cumplicidade entre pais e filhos e trazendo benfeitorias para o convívio mútuo da

relação. Podendo, deste modo, haver trocas de informações, experiências, um

aprendizado importante, o qual os professores não podem passar ao filho.

Comel (2003, p. 111-112) ainda diz:

[...] A função de ter os filhos em companhia, tem, inclusive, aspecto de proteção dos perigos a que ficam expostos os filhos longe dos pais, de vigilância e acompanhamento das companhias e amizades, de retê-los em casa inclusive por causa da responsabilidade civil dos pais sobre os atos dos filhos.

O dever de guarda traz ínsito consigo a responsabilidade civil, expressa

no artigo 932, inciso I, CC/2002: “São também responsáveis pela reparação civil: I –

os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua

companhia”. (BRASIL, 2009, p. 200).

O desenvolvimento da sociedade, aliado à inserção crescente da mulher

no mercado de trabalho, fez com que, diferentemente do que ocorria no passado, a

disponibilidade feminina para a criação dos filhos seja praticamente a mesma da dos

homens. Esse fato considerado faz com que homens e mulheres, neste quesito,

fiquem em paridade de condições no caso de uma ação judicial pela guarda dos

filhos. (COMEL, 2003).

Há que se ponderar ainda que a lei, por mais que demore, acaba

trazendo em seu bojo a evolução do comportamento e dos costumes sociais,

refletindo essas tendências. Assim se pautou o legislador ao esculpir os artigos

1584, inciso I e II (BRASIL, 2009, p. 260) e 1612 da Lei 10.406, de 10 de janeiro de

2002 (BRASIL, 2009, p. 262), que assim dispõe, “in verbis”:

Art. 1.584. A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser: I – requerida, por consenso, pelo pai e pela mãe, ou por qualquer deles, em ação autônoma de separação, de divórcio, de dissolução de união estável ou em medida cautelar; II – decretada pelo juiz, em atenção a necessidades específicas do filho, ou em razão da distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe.

E mais adiante:

Art. 1.612. O filho reconhecido, enquanto menor, ficará sob a guarda do genitor que o reconheceu, e, se ambos o reconheceram e não houver acordo, sob a de quem melhor atender aos interesses do menor.

Verifica-se que em ambos os artigos a determinação é expressa no

sentido de preservar o bem-estar dos filhos atendendo a requisitos objetivos tais

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como: melhores condições para o exercício da guarda que atendam aos interesses

da criança e do adolescente.

Repita-se: o princípio da igualdade entre os sexos foi consagrado na

CF/88, conforme Art. 5º, inciso I (BRASIL, 2009, p. 14) “I - homens e mulheres são

iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”, princípio este de

grande importância nas relações conjugais e nas relações entre pais e filhos. No

mesmo diapasão, o CC/2002, no artigo 1.630, que dispõe: “Art. 1630: Os filhos estão

sujeitos ao poder familiar, enquanto menores.” (BRASIL, 2009, p. 263).

Nota-se, assim, que o exercício do poder familiar, por meio do

desempenho da guarda - que, como já dito, compete igualmente aos pais -, assumiu

hoje uma conotação mais ampla, não limitada a um encargo meramente material, ou

de simples localização da criança e do adolescente. Na sua concepção mais

moderna, a guarda abrange necessidades outras do ser humano enquanto ser

humano, o que exige o atendimento de necessidades não-materiais, que envolvem

sentimento, apego, respeito, consideração, entre outros valores imateriais.

2.6.2 Educação

O dever dos pais de prestarem educação a seus filhos é considerado um

dos mais relevantes deveres familiares, pois é através da educação que os filhos

terão sua vida construída e a fortificação da sua manutenção individual.

Comel (2003, p. 103) separa em duas etapas as formas de educação

dada pelos pais, a formal e a informal.

A educação informal seria inerente ao dever anteriormente citado, o de

companhia e guarda, uma vez que é a partir da companhia e contato com os pais

que serão administrados a educação informal, deste modo, o filho com este convívio

aprende os valores importantes da vida, desenvolvendo seu próprio caráter, sua

personalidade, e aprendendo suas habilidades, sendo o impulso final para um maior

aperfeiçoamento na educação formal. (COMEL, 2003)

A respeito:

[...] reveste-se de significativo conteúdo afetivo e emocional, à medida que acontece espontaneamente, na convivência estabelecida com o filho, também de relevante valor no aspecto intelectual e social, refletindo, enfim,

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na formação do cidadão como um todo e no amadurecimento e aprimoramento da personalidade, com a transmissão de noções e conceitos que se integrarão de modo relativamente estável e duradouro na personalidade do filho. Aliás, é dessa estreita comunhão que resulta o ditado popular: tal pai, tal filho, ressaltando a importância, a gravidade e a extrema responsabilidade dos pais no tocante à educação do filho. (COMEL, 2003, p. 103).

Assim, é a partir da educação informal que se dará o grande salto para

uma boa formação da educação formal, consistindo esta na escolarização do filho,

por meio de escolas e demais entidades capacitadas para educar.

A função dos pais, nesse passo, consiste em proceder à escolha do

estabelecimento escolar, em matricular o filho e acompanhar-lhe a freqüência e o

aproveitamento escolar, bem como o trabalho dos professores. (COMEL, 2003).

Deste modo, na responsabilidade e dever dos pais fica inclusa também à

educação formal do filho.

Além dos pais, é de máxima importância atribuir esta responsabilidade

também ao Estado e à sociedade.

Veremos o que demonstra o artigo 227 da CRFB/88 (BRASIL, 2009, p.

85):

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

A respeito do assunto abordado:

a educação é um dos instrumentos mais importantes para a consolidação dos princípios cardeais da Doutrina da Proteção Integral. Dificilmente crianças e adolescentes exercerão com qualidade sua prerrogativa de sujeitos sem uma sólida formação psicológica, social e intelectual. (VERONESE; VIEIRA, 2006, p. 37)

A preocupação com a questão educacional refletiu positivamente no texto

constitucional aprovado pelos parlamentares constituintes. (VERONESE; VIEIRA,

2006). Preocupação não vã, na medida em que a educação, além de configurar

dever típico e inerente ao exercício do poder familiar, constitui-se num dos

pressupostos básicos para o exercício de outros demais direitos.

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2.6.3 Dever de prestar alimentos

O dever de prestar alimentos é obrigação dos pais, conforme expressa

nossa CRFB/88 em seu artigo 229: "os pais têm o dever de assistir, criar e educar os

filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na

velhice, carência ou enfermidade".

O Código Civil em vigor caminha no mesmo sentido - nem poderia ser

diferente, ante a absoluta primazia da norma constitucional -, aduzindo no artigo

1.566, inciso IV, em termos imperativos, que: “São deveres de ambos os cônjuges:

[...] IV – sustento, guarda e educação dos filhos.”

Enquanto menores os filhos, a obrigação de sustento tem sua causa ou

razão no poder familiar, consoante pontua Cahali (2006). Fora do poder familiar, o

dever de prestar alimentos também subsiste (ou pode subsistir), obrigação de

caráter mais geral vinculada à relação de parentesco em linha reta, conforme

esclarece o mesmo autor.

Com efeito, trata-se de direito (dos filhos) que pode ser tido por

fundamental, direito esse que, do outro lado da relação jurídica que se trava no

âmbito familiar, invoca um dever oriundo de normas de natureza pública e eficácia

cogente.

Deste modo, não cabe aos pais qualquer discricionariedade quanto a tão

importante dever, tendo eles o dever de amparo social e afetivo dos filhos, sobretudo

quando esse dever deriva do poder familiar.

Subsiste no poder familiar a obrigação alimentar dos pais em relação aos

filhos, enquanto a não maioridade civil, fundada única e exclusivamente no dever de

sustento a que se refere a lei civil. (CAHALI, 2006). Trata-se, naturalmente, de

obrigação que não se exaure num “jato só”, mas sim de obrigação de trato

sucessivo.

Tamanha é a relevância dessa obrigação no seio de nossa sociedade

hoje dita organizada que a CRFB/88 predica no artigo 5º, inciso LXVII, verdadeira e

grave penalidade, a da prisão do inadimplente: “não haverá prisão civil por dívida,

salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação

alimentar [...]”.

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A doutrina pontua que o dever de alimentos vinculado ao poder familiar só

cessa com a maioridade, mesmo que, eventualmente, o filho já esteja apto para o

trabalho, segundo a legislação trabalhista (CAHALI, 2006). Isto porque, durante a

menoridade, a presunção de necessidade é absoluta.

Diferente é a situação, sob a ótica do filho, quando se trata de obrigação

de alimentos depois da menoridade, esta baseada na relação de parentesco em

linha reta, onde a presunção (de necessidade) passa a ser relativa, e, em juízo,

pauta-se na indagação retratada pelo binômio possibilidade-necessidade.

Então, pode-se depreender que a maioridade, só por si, não retira do filho

o direito de pedir alimentos dos pais. Com ela (a maioridade), transmuda-se - agora

sob a ótica dos pais - a natureza da obrigação, que não é mais pura e simplesmente

de sustento, derivada automaticamente do poder familiar, mas sim derivada da

relação de parentesco, e arrimada no pressuposto do estado de necessitado do

alimentário e da possibilidade do alimentante (CAHALI, 2006).

Nessa segunda categoria de obrigação alimentar, surgida após a

maioridade do filho, a relação de sustento pode eventualmente perdurar por toda a

vida do alimentário, diversamente do que ocorre na obrigação alimentar reflexiva do

poder familiar.

De uma forma ou de outra, por uma por outra categoria de obrigação

alimentar, como visto acima, é cabível o pedido de alimentos.

2.6.4 Respeito

O dever de respeito é mútuo, cabendo, pois, tanto aos pais quanto aos

filhos, reciprocamente.

Comel (2003, p. 127) relata o assunto:

A função de exigir respeito é manifestamente fundada no direito natural. Aliás, o 4º mandamento do decálogo reza: Honrar pai e mãe. E, por isso, como observou Carvalho dos Santos, o dever de respeito, em particular, não cessa com a maioridade: ‘É um dever do bom filho para com os pais, qualquer seja a idade a atingir’. Por sua vez, o termo respeito se refere à consideração, reverência e deferência que os filhos devem ter com relação aos pais, cuja medida é dada pelos usos e costumes sociais, e também pelas circunstâncias.

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Dias (2006) assevera que as vantagens de um pai tratar os filhos com o

devido respeito são decisivas. Se a relação entre eles não se baseia na

consideração, torna-se impossível alcançar uma ação educativa eficaz, e, daí, à

medida que vão crescendo, uma convivência mais plena e feliz. Além disso, o amor

entre pais e filhos é apresentado logo no nascimento, sendo este amor o primeiro

sinal de respeito.

O respeito dos pais aos filhos cabe ao acatar a escolha do filho em

relação à consideração expectante e benevolente pelo que o filho é, pelo que pode

ser, pelo que deve ser, conforme o seu querer. (DIAS, 2006).

Complementa afirmando que o respeito do filho aos pais cabe em

primeiro o respeito a sua dignidade de filho, e isso inclui também, o respeito ao

processo de seu crescimento e desenvolvimento. É um respeito ativo que implica

estimular, apoiar, motivar e compreender esse desenvolvimento.

Respeito, assim, diante do que se vê, é um dever que atua

reciprocamente, podendo ser considerada uma condição importante para um pleno

crescimento da pessoa, já que é uma forma de manifestação do amor,

imprescindível para a realização do ser humano.

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3 A AÇÃO DE ALIMENTOS

Este capítulo tratará da ação de alimentos, as partes envolvidas, sua

causa de pedir e consequências.

3.1 As partes na ação de alimentos

A ação de alimentos vem a ser instrumento processual vocacionado à

(eventual) realização prática da obrigação de prestar alimentos, obrigação esta

reconhecida e regulamentada pelo Código Civil. É a via pela qual se pleiteia esse

benefício.

Sob a ótica do direito processual, a ação de alimentos é ação civil de rito

sumário especial, com procedimento descrito pela Lei n° 5.478/68. Quando não há

definição do parentesco (da paternidade, por exemplo), o pedido de alimentos deve

ser pleiteado cumulativamente à investigação, caso em que o rito da ação será

necessariamente o ordinário, segundo o Código de Processo Civil (VENOSA, 2005).

A ação de alimentos pode ser proposta pelo filho, em razão do direito de

parentesco. Esta envolve especialmente a relação entre pais e filhos, protegida pelo

direito de parentesco. (RIZZARDO, 2007).

O mesmo autor explica que o alimentando é aquele considerado incapaz

para desenvolver atividade remunerada, seja em razão da idade, seja em razão do

despreparo real para o mercado de trabalho.

O alimentante é o genitor ou parente do alimentando que tem o dever

legal de garantir a sua subsistência digna (vestuário, tratamento médico, instrução

ou educação e lazer). (RIZZARDO, 2007).

Tal ação geralmente decorre de vínculo familiar, devendo ser trazido aos

autos documentos comprobatórios do parentesco ou da obrigação de prestar

alimentos. (DIAS, 2006).

Dias (2006, p. 434) afirma:

[...] modo geral, a ação é intentada pelo credor de alimentos. Mas não só a ele cabe a iniciativa de pleitear pensionamento. O Ministério Público tem

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legitimidade de propor a ação. Como também atua como fiscal da lei tem legitimidade tanto para recorrer como para propor a execução de alimentos.

Assim, se verificado o dever de alimentos, o Ministério Público ou o

interessado poderão ajuizar a ação de alimentos.

A obrigação de prestar alimentos aos filhos é do pai e/ou da mãe. É

direito do filho receber alimentos, deste modo expresso no art. 1566, CC/2002:

Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges: [...] III - mútua assistência; IV - sustento, guarda e educação dos filhos;

Com efeito, o instituto da ação de alimentos foi criado e disciplinado para

socorrer aos reconhecidamente necessitados, e não para fomentar a ociosidade ou

estimular parasitismo. (DIAS, 2006).

E assim deve ser, na medida em que se trata de importante e séria via de

acesso ao Poder Judiciário para a realização de direitos, mediante a imposição de

obrigações.

3.2 A causa de pedir na ação de alimentos

Em tema de alimentos, a causa de pedir desta ação envolve, de um modo

geral, os seguintes pressupostos: vínculo de parentesco (que denote linha reta, no

caso de o autor da ação ter alcançado a maioridade, ou que denote poder familiar,

no caso dele não ter alcançado a maioridade civil), necessidade do filho que não

promove o sustento por si próprio (no caso de dever alimentar após a maioridade) e

condições financeiras do genitor (também após a maioridade do alimentário).

No que concerne à obrigação dos pais de sustentar seus filhos, assim

dispõe o artigo 1.696 do CC/2002:

Art. 1.696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros.

Venosa (2005, p. 392) disserta que os alimentos compreendem:

[...] além da alimentação, também o que for necessário para moradia, vestuário, assistência médica e instrução. Os alimentos, assim, traduzem-se

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34

em prestações periódicas fornecidas a alguém para suprir suas necessidades e assegurar sua subsistência.

Posto desta forma, Cahali, (2002, p. 523) conclui que:

Incube aos genitores – a cada qual e a ambos conjuntamente, sustentar os filhos, provendo-lhes a subsistência material e moral, fornecendo-lhes alimentação, vestuário, abrigo, medicamentos educação, enfim, tudo aquilo que se faça necessário à manutenção e sobrevivência dos mesmos.

Por sua vez, quando se fala de ação de alimentos movida em decorrência

do poder familiar, no qual a presunção de necessidade atua de forma absoluta,

invoca-se a norma constante do artigo 1.566, inciso IV, do CC/2002, que predica:

“São deveres de ambos os cônjuges: (...) IV – sustento, guarda e educação dos

filhos”.

Nessa espécie de ação, a causa é consequência direta do poder familiar,

no qual atua o dever de sustento.

Na ação movida por aquele que já alcançou a maioridade civil, “A

necessidade é o aspecto de maior relevância, porque dele depende o exame dos

demais pressupostos” (RIZZARDO, 2007, p. 742)

Na hipótese de filho maior, invoca-se o art. 1695 do CC/2002, (BRASIL,

2009, p. 269) “são devidos alimentos, quando quem os pretende não tem bens

suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de

quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu

sustento”.

A maioridade é alcançada aos dezoito anos, conforme regime do

CC/2002. Embora seja atingida pelo alimentando a maioridade, ela não cessa, em

alguns casos, a obrigação de alimentar.

A jurisprudência do egrégio Tribunal de Santa Catarina já decidiu a

respeito da manutenção do dever de alimentar mesmo após atingida a maioridade.

Vejamos:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE ALIMENTOS -VERBA ALIMENTAR - INSURGÊNCIA AO QUANTUM ESTABELECIDO - OBSERVÂNCIA DO BINÔMIO LEGAL (NECESSIDADE E POSSIBILIDADE) - ALIMENTANDO COM MAIORIDADE CIVIL E FREQÜENTANDO CURSO SUPERIOR - SITUAÇÃO QUE NÃO DESONERA A OBRIGAÇÃO NO SUSTENTO DECORRENTE DO PODER FAMILIAR - CONSTITUIÇÃO DE NOVA FAMÍLIA - ESCUSA IRRELEVANTE - PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE - INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 1.694, § 1º, DO CÓDIGO CIVIL - OBRIGAÇÃO DE SUSTENTO DECORRENTE DO PODER FAMILIAR - MINORAÇÃO VEDADA - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO

Page 35: Monografia - Alimentos Filhos Maiores

35

Na fixação da verba alimentar deve ser observada a regra preconizada no art. 1.694, § 1º, do Código Civil, no qual se sopesa as necessidades do alimentando e a capacidade financeira do alimentante. A maioridade civil não é requisito suficiente para a exoneração do dever alimentar do progenitor, porquanto necessária a sua conjugação com demais circunstâncias, tais como a comprovação de independência financeira, a contração de núpcias, dentre outras. A constituição de nova família e o comprometimento com os cuidados dos filhos desse novo enlace não são motivos suficientes para desobrigar o alimentante de prestar alimentos. (BRASIL, 2010E).

Segundo se percebe desse julgado, o advento da maioridade,

só por si, não implica em exoneração do dever alimentar, prevalecendo a

preocupação com a efetividade da dignidade da pessoa, princípio cuja realização

depende dos alimentos.

MAIORIDADE CIVIL DO ALIMENTANDO. REGULARMENTE MATRICULADO E FREQÜENTANDO CURSO SUPERIOR. NECESSIDADE. IMPOSSIBILIDADE DO ALIMENTANTE NÃO COMPROVADA. PRESERVAÇÃO DA PENSÃO ALIMENTÍCIA ATÉ A FILHA DO ALIMENTANTE ATINJA A IDADE DE VINTE E QUATRO (24) ANOS. RECURSO NÃO PROVIDO. A maioridade, por si só, não é causa de exclusão da obrigação alimentar entre pais e filhos. À exoneração, deve o alimentante comprovar, satisfatoriamente, a ausência de necessidade da alimentanda, por ter condições de prover sua subsistência. (BRASIL, 2010F).

Nesse julgado, a maioridade também não implicou em exoneração,

porque o fator necessidade preponderou, necessidade que o alimentante não logrou

provar inexistente.

A causa de pedir na ação de alimentos implica, pois, na comprovação da

necessidade do alimentante, do vínculo familiar e das condições do alimentante em

prestá-los.

Inexorável que a menoridade civil do necessitado gera obrigação

alimentar, desde que comprovado a relação familiar.

Já em relação à maioridade do desprovido, é necessário a comprovação

da incapacidade do mesmo em prover seu sustento.

Assim, a maioridade do alimentando, como fato isolado, não gera a

exoneração automática da prestação alimentícia.

Page 36: Monografia - Alimentos Filhos Maiores

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3.3 O pedido na ação de alimentos

O pedido, na ação de alimentos, é o elemento que mais caracteriza esse

tipo de demanda, já que determina a providência jurisdicional a ser obtida, lembrado

que a ação de alimentos é instrumento processual vocacionado à realização prática

da obrigação de prestar alimentos.

Em regra, o pedido visa à obtenção de ordem judicial no sentido de

compelir o réu, denominado devedor, a prestar os alimentos, impondo-se, então,

obrigação de fazer. Para a definição da medida ou extensão do pedido, na hora de o

autor fazê-lo (na petição inicial), ou para a definição dessa medida na hora de deferi-

lo (na liminar ou na sentença), deve ser levado em consideração a regra da

proporcionalidade estatuída pelos parâmetros da necessidade do alimentando e das

condições financeiras do alimentante. (DIAS, 2006).

O pedido de manutenção dos alimentos, depois de atingida a maioridade

do alimentando, ocorre geralmente pela forma de objeção contrária à pretensão

daquele que pede exoneração de alimentos, como defesa que visa à improcedência

do pedido liberatório, e, portanto, a manutenção da obrigação de prestar alimentos.

3.4 Ações de alimentos e coisa julgada

As ações de alimentos envolvem três ritos processuais. O rito especial,

conforme Lei 5.478/68 (BRASIL, 2010G), dispõe que é cabível nos casos em que a

relação de parentesco ou de casamento já se encontram previamente provados.

Rizzardo (2007) explica que, o rito ordinário (art. 274 do CPC) é aplicado para casos

cujo parentesco não se acha previamente provado, como nos casos do filho não

reconhecido. Por fim a ação cautelar de alimentos provisionais (arts. 852 a 854 do

CPC) contempla a hipótese de pedido de alimentos provisórios antes mesmo da

propositura da ação definitiva.

Os títulos executivos que habilitam a execução da prestação alimentícia

são: a sentença condenatório proferida no processo cível, a sentença arbitral e a

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homologatória de transação/conciliação e a sentença penal condenatória transitada

em julgado. (RIZZARDO, 2007).

A coisa julgada é uma qualidade que os julgamentos assuem, e se

verifica quando decorreu o prazo para a interposição do recurso sem manifestação

da parte. Nesse caso, diz-se que se está diante de coisa julgada, porque a decisão é

definitiva e imutável, salvo as hipóteses cabíveis em ação anulatória ou rescisória.

(DIAS, 2006).

Assim, transitada em julgado a decisão que fixou os alimentos, resta ao

credor executá-la, caso o devedor não cumpra a ordem judicial espontaneamente.

A coisa julgada pode ser material ou meramente formal. A material

encerra quase que um absolutismo na possibilidade de rediscussão da causa, seja

na mesma demanda em que ocorreu o trânsito em julgado, seja noutra qualquer

demanda. A coisa julgada formal indica característica segundo a qual a

imutabilidade do julgado se dá apenas dentro daquele processo.

Todos os julgamentos (sentença e acórdãos) fazem coisa julgada formal,

mas nem todos implicam em coisa julgada material.

Em matéria de alimentos, as sentenças produzem apenas coisa julgada

formal, notadamente quanto aos valores arbitrados, que podem sempre ser objeto

de revisão quando eventualmente existirem mudanças econômicas na situação das

partes. É nesse sentido que a ação de alimentos produz coisa julgada formal. O

princípio está exposto no art. 1.699 no CC/2002. (RIZZARDO, 2007).

O que a norma do artigo 1.699 do Código Civil patrocina é o respeito à

natureza jurídica do instituto dos alimentos, que, como já visto, alude à relação

jurídica de trato sucessivo, que se projeta no tempo, pois, e que, no caso de

prestação de alimentos pelo artigo 1.694 do Código Civil, pode perdurar por toda a

vida do alimentado.

Ora, sendo duradoura a relação que estabelece, a coisa julgada que se

concretiza só pode mesmo ser formal.

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4 A MANUTENÇÃO/EXONERAÇÃO DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR EM FACE DA

AQUISIÇÃO DE CAPACIDADE CIVIL PELO ALIMENTANDO

Este capítulo tratará da manutenção/exoneração da obrigação alimentar,

em consequência da aquisição da capacidade civil, através da emancipação,

maioridade civil, quando cessa o dever de alimentar perante a incapacidade civil do

maior de idade, a ação de exoneração de alimentos e os efeitos da sua não

interposição.

4.1 As consequências advindas da aquisição da capacidade civil pelos filhos

O dever de prestar alimentos se extingue a partir da maioridade civil, da

emancipação do filho (pelo casamento, serviço público efetivo, sentença judicial,

concessão dos pais, colação de grau em curso superior e constituição de negócio

próprio) e pela perda do poder familiar, conforme expressa o Art. 5º do CC/2002:

Art. 5º - A menoridade cessa aos 18 (dezoito) anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil. [...] I – pela concessão dos pais, ou de um deles na falta de outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver 16 anos completos. II – pelo casamento. III – pelo exercício de emprego público efetivo. IV – pela colação de grau de curso de ensino superior. V – pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função dele o menor com 16 (dezesseis) anos completos tenha economia própria.

Para complementar, pode-se citar o Art. 1.630 do CC/2002, o qual

expressa que “os filhos estão sujeitos ao poder familiar enquanto menores”. E, a

seguir serão expostas as hipóteses de manutenção do dever de alimentar ao filho

maior de idade.

Garcez (2005, p. 165) deixa expresso seu entendimento no tocante ao

dever dos alimentos ao filho maior:

[...] a jurisprudência pátria tem manifestado entendimento de que o dever pode ser prorrogado, se provado que o filho não dispõe de meios de subsistência e recursos financeiros para manter a sua educação. Temos

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visto decisões que amparam o direito de continuar o filho percebendo a pensão alimentícia até os 24 ou 25 anos, desde que esteja cursando regularmente curso superior em universidade, e que não disponha de meios para sobreviver.

Neste sentido Cahali (2006, p. 459), expressa o dever do pai prestar

assistência após sua maioridade:

[...] Julgados, há, também, que, ainda por inspiração da eqüidade, ou por economia processual, preservam a pensão concedida para sustento do filho menor, agora sob o color de obrigação alimentícia, para além do momento inicial da maioridade, recusando a exoneração do genitor, ‘se a essa conclusão leva a prova dos autos..

E continua:

[...] Tal entendimento tem sido geralmente adotado naqueles casos em que o filho encontra-se cursando escola superior: ‘A maioridade do filho, que é estudante e não trabalha, a exemplo do que acontece com as famílias abastadas, não justifica a exclusão da responsabilidade do pai quanto a seu amparo financeiro para o sustento e estudos’. (CAHALI, 2006, p. 460).

Vale ressaltar que desde os primórdios da vida os humanos são

dependentes. Não seria diferente em relação aos alimentos e desejos de qualquer

um usufruir de uma vida digna, não podendo por acabar o dever de alimentos pelo

fato do filho haver completado a maioridade civil. Esta não significa independência

financeira, ou condições de arcar sozinho com sua manutenção. (VILLELA, 1994).

Cahali (2006, p. 461) ressalta:

O ser humano, por natureza, é carente desde a sua concepção; como tal, segue o seu fadário até o momento que lhe foi reservado como derradeiro; nessa dilação temporal – mais ou menos prolongada – a sua dependência dos alimentos é uma constante, posta como condição de vida.

Entende-se que a definição da dependência dos alimentos percorre até a

dependência financeira com sua profissão. Sendo este o caso do acadêmico de

medicina em seu período de residência, por exemplo.

No enfoque do direito, os alimentos não significam somente o que lhe

asseguram a vida. “A obrigação alimentar tem um fim precípuo: atender às

necessidades de uma pessoa que não pode prover à própria subsistência”.

(RODRIGUES, 2002, p. 375).

Ao contrário de decisões judiciais mais remotas, o Tribunal de Justiça de

Santa Catarina vem entendendo que a maioridade do filho não cessa a obrigação de

alimentar, desde que aquele comprove estar matriculado em curso

profissionalizante/colégio/universidade e não exerça atividade remunerada.

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APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS - OBRIGAÇÃO ALIMENTAR ESTABELECIDA EM ACORDO HOMOLOGADO EM JUÍZO - STATUS DE ESTUDANTE E PATOLOGIA DO ALIMENTANDO - NÃO COMPROVAÇÃO - SITUAÇÃO EXCEPCIONAL INEXISTENTE - DEVER DE PRESTAÇÃO DE AUXÍLIO MATERIAL EXTINTO - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. I - Embora a maioridade civil induza à presunção de aptidão do adulto para granjear a própria subsistência, tal circunstância, quando constituir fundamento de lide exoneratória, não enseja a automática extinção da obrigação alimentar, face à superioridade e relevância dos interesses em questão, mesmo porque, ressalte-se, o dever de manutenção e assistência mútua decorre do princípio da solidariedade familiar (CC/2002, art. 1696), vinculando-se à relação de parentesco, não se restringindo, dessa forma, ao período de existência do poder familiar. Desse modo, situações excepcionais involuntariamente conservadas, ou ainda as supervenientes, constituem razoável fundamento para autorizar o pagamento de auxílio material ao que se encontrar desprovido de condições financeiras, isso sem olvidar a imprescindibilidade da demonstração de desequilíbrio no binômio necessidade/possibilidade. II - Justifica-se o prolongamento da obrigação alimentar, excepcionalmente, em hipóteses em que evidenciada a inaptidão do alimentando para manter-se com recursos próprios, mesmo após a extinção da incapacidade civil e do poder de família, caso em que será deste o ônus de demonstrar a subsistência da dependência econômica de um ou de ambos os genitores. (BRASIL, 2010H).

No caso concreto acima retratado, o primado da solidariedade familiar

prevaleceu sobre a presunção (muito relativizada pelo tribunal) de que a maioridade

traz consigo a independência. O princípio da solidariedade atuou conjugadamente à

situação peculiar do alimentado processado naquela ação exoneratória, de forma

que o resultado foi a improcedência do pedido do autor, com a manutenção do

encargo.

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS - MAIORIDADE - FILHA UNIVERSITÁRIA - OBRIGAÇÃO DO ALIMENTANTE DE PAGAR OS ALIMENTOS - LIMITE DA OBRIGAÇÃO - IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO NÃO PROVIDO. A obrigação dos pais de prestar alimentos não cessa com o alcance da maioridade civil, fator extintivo do poder familiar (art. 1.635, III do Código Civil), se os alimentos destinam-se à complementação de estudos superiores ou profissionalizantes do filho, com idade razoável, e possa assumir a própria subsistência. (BRASIL, 2010I)

A respeito do tema, Cahali (2006, p. 692) ensina: o caso mais comum, portanto, é o do filho agora maior mas estudante, sem economia própria, em que reiterada jurisprudência afirma a não cessação da obrigação alimentar paterna diante da maioridade do filho, determinando a manutenção do encargo até o limite de 24 anos do filho, enquanto o mesmo estiver cursando escola superior, salvo se este dispuser de meios próprios para sua manutenção.

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Deste modo se o alimentado ao completar a maioridade civil, não estiver

cursando ensino superior, caberá ao alimentando pedir formalmente a exoneração

do dever de prestar alimentos, fazendo-se extinguir a obrigação alimentar.

(MUJALLI, 2006).

Rizzardo (2007, p. 764), diz que:

no pertinente aos filhos maiores, não é o poder familiar que determina a obrigação, mas sim a relação de parentesco. Quanto aos pais, de idêntica forma, sobressai tal liame, ordenado pelo sentimento de solidariedade que deve imperar no meio de certas pessoas ligadas pelo jus sanguinis.

Contrariamente, algumas doutrinas quando se referem a alimentos,

remete-nos ainda aos conceitos de alimentos necessários, como aqueles

indispensáveis a manutenção da vida da pessoa, sendo estes comida, saúde,

vestuário e moradia, outra substância que abrange são os padrões pessoais do

beneficiário, como os intelectuais, morais e de lazer. (MADALENO, 2006).

Seguindo o pensamento acima citado, Rizzardo (2007, p. 766) enfatiza:

em se tratando de alimentado em formação escolar ou acadêmica, a jurisprudência tem entendido que, independentemente da maioridade, há direito ao recebimento de alimentos civis de ordem educacional, em contrariedade ao art. 1701 do Código Civil, que limita esta natureza alimentícia a menores.

Destarte, oportuna a defesa da tese de que a maioridade, por si só, não é

causa para a extinção da obrigação de alimentar, pois há de ser levado em

consideração o contexto do alimentando, para que este não seja privado,

repentinamente, dos recursos financeiros que lhe proporcionam a satisfação das

necessidades básicas de sobrevivência.

Para tanto, mister devotar zelo à realidade do mercado de trabalho,

incluindo o grau de instrução do alimentando, saúde física e psicológica.

Assim, conclui-se que a maioridade, como fator externo, não é suficiente

para fazer cessar a obrigação de alimentar, pois é necessário observar, caso a caso,

as necessidades do alimentado e a possibilidade de se tornar economicamente

independente.

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4.1.1 Da emancipação

Aquisição da capacidade civil não ocorre somente com a maioridade

(advento dos18 anos), mas também com a emancipação.

Segundo Cahali (2002, p. 528-529)

O dever de sustento se extingue com a maioridade, ou mesmo com a emancipação do filho: ao romper-se o vínculo do pátrio poder, cessam os efeitos pessoais do mesmo, entre os quais o dever de sustento do filho, e surge como única e autônoma a prestação legal de alimentos, condicionada, agora, esta, ao estado de necessidade do filho e à possibilidade do genitor.

A aquisição da capacidade civil antes da idade legal, possibilitada pela

emancipação dos adolescentes é amparado pelo CC/2002, disposto em seu Art. 5º,

inciso I: “pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante

instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença

do juiz, ouvindo o tutor, se o menor tiver 16 anos completos.”

A respeito do assunto encontra-se o seguinte julgado do Tribunal de

Justiça do Rio Grande do Sul:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ALIMENTOS. PEDIDO PELA NETA. OBRIGAÇÃO AVOENGA. CARÁTER EXCEPCIONAL E SUBSIDIÁRIO. AUSÊNCIA DE PROVA DA IMPOSSIBILIDADE DOS GENITORES. A obrigação alimentar dos avós só tem cabimento quando esgotadas as possibilidades de prestação alimentar pelos pais. No caso, diante da ausência de tal prova, não há razão para reformar a decisão. ALIMENTOS REQUERIDOS POR FILHA MAIOR E CAPAZ. MAIORIDADE ANTECIPADA PELA EMANCIPAÇÃO. NECESSIDADE NÃO COMPROVADA. Segundo dispõe o artigo 1.694, do Código Civil, é possível aos parentes pleitearem alimentos uns aos outros. Contudo, em não se tratando de necessidade presumida, é imprescindível àquele que pleiteia os alimentos a prova da falta de condições de prover a própria subsistência. Tratando-se de filho saudável, maior e capaz, que não estuda, não há nenhuma razão para a procedência da pretensão alimentar. NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. (BRASIL, 2010J).

Deve ser notado, do caso acima retratado, que não foi a emancipação,

isoladamente, que conduziu na improcedência do pleito alimentar pela neta

emancipada, mas sim o fato de que ela não se desincumbiu do ônus de provar sua

necessidade.

A emancipação concretiza o desfecho do poder familiar, porem não

caracteriza a capacidade civil.

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Diante disso, conclui-se que a emancipação não cessa o dever do

alimentante em pagar a pensão alimentícia ao filho emancipado, haja vista que este

último, ainda que emancipado, poderá provar sua efetiva necessidade, caso em que

os alimentos serão devidos, com base na norma do art. 1.694 do CC/2002.

4.1.2 Da maioridade civil

A maioridade civil não significa a independência diretamente dita, uma

vez que traz ao maior responsabilidades por seus atos. Verifica-se, de acordo com

Dias (2006), a maioridade penal, trabalhista e previdenciário, entre outras também é

adquirida com dezoito anos, porém pode não ocorrer independência econômica, ou

seja, a pessoa ainda se encontra em situação de dependência econômica de seus

pais.

Diniz (2004) expressa que o CC/2002 antecipa a maioridade para os

dezoito anos, com isso os jovens passarão a ter responsabilidade perante terceiros,

pelos danos que lhe causarem, além de poderem, por si só, praticar validamente

atos da vida civil, sem qualquer assistência do representante legal. Pelas condições

do mundo moderno e pelos avanços tecnológicos dos meios de comunicação e da

informática, a pessoa já tem, ao completar dezoito anos, experiência de vida, em

razão de adquirir uma maior formação cultural, responsável pela precocidade de seu

desenvolvimento físico mental, ocasionando o discernimento necessário para a

efetivação de atos negociais, podendo até casar sem autorização do representante

legal.

Deste modo decidiu-se o Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS - MAIORIDADE DA ALIMENTANDA - CONCLUSÃO DO ENSINO MÉDIO - TÉRMINO DA PREPARAÇÃO PARA O VESTIBULAR - SENTENÇA QUE EXONEROU O ALIMENTANTE - JUNTADA DE DOCUMENTO QUE COMPROVA MATRÍCULA E FREQÜÊNCIA EM ESTABELECIMENTO DE NÍVEL SUPERIOR - POSSIBILIDADE - ALTERAÇÃO FÁTICA SUBSTANCIAL - INAFASTABILIDADE DO PODER JUDICIÁRIO - ECONOMIA PROCESSUAL - SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA INOCORRENTE - OPORTUNIDADE DE MANIFESTAÇÃO SOBRE O DOCUMENTO EM SEDE DE CONTRA-RAZÕES DE RECURSO - DEVER DE PRESTAR ALIMENTOS AO FILHO UNIVERSITÁRIO - TERMO FINAL AOS 24 (VINTE E QUATRO) ANOS DE IDADE - EXONERAÇÃO AFASTADA - RECURSO PROVIDO. (BRASIL, 2010K).

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Nota-se, que o caso acima retratado, prevaleceu o binômio necessidade-

possibilidade, assim deixando de exonerar o dever do pai aos alimentos ao filho com

maioridade civil, uma vez que o mesmo comprovou a necessidade.

No mesmo sentido o Tribunal do Rio Grande do Sul segue:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS. MAIORIDADE DA FILHA. OBSERVÂNCIA DO BINÔMIO NECESSIDADE/POSSIBILIDADES. Apesar da maioridade da alimentada, descabe exonerar o pai-alimentante do encargo quando persiste a necessidade, especialmente em razão da fase de estudos da apelada. Ademais, para viabilizar a exoneração é imperiosa a comprovação da modificação da situação financeira do alimentante ou da alimentada, o que não ocorreu no caso presente. NEGARAM PROVIMENTO AO APELO. (BRASIL, 2010L).

Cahali (2006, p. 663)

[...] certo é que nem sempre a simples maioridade é capaz de desobrigar os pais, pois, se por um lado, com o atingimento dele cessa o pátrio poder, isto não implica e acarreta a imediata cessação do dever de alimentar. Inicialmente, pelo simples fato de o art. 397 do CC (art. 1.696 do Novo Código Civil), que estabelece a reciprocidade da obrigação alimentar, entre pais e filhos, não deixa qualquer critério etário para a extinção da obrigação. Na verdade, devem os critérios da necessidade e possibilidade também prosperar neste particular.

A redução da maioridade civil - já incorporada ao dia a dia das pessoas,

por exemplo, ao dirigir automóveis, votar, trabalhar, casar, entre outras ações - fez

com que a inovação promovida trouxesse mais equilíbrio às relações jurídicas em

alguns ramos do direito, trazendo à tona inúmeras discussões em outros, entre estes

no direito de família a questão da pensão alimentícia. (DINIZ, 2004).

Como não significa, por si só, independência e autonomia plenas, a

maioridade civil, e segundo tratamento jurídico à ela dispensado, não configura fator

extremo de exoneração da obrigação de prestar alimentos, no que diz respeito à

imposição baseada no artigo 1.694 do Código Civil.

4.1.3 Exoneração da prestação alimentar versus incapacidade civil do maior de

idade

A incapacidade é a condição segundo a qual a pessoa, por vários fatores

que o Código Civil enumera, não está legalmente apta ou habilitada a exercer todos

(incapacidade absoluta) ou alguns (incapacidade relativa) atos da vida civil.

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O primeiro fator diz respeito à idade, de modo que é capaz aquele que

adquiriu a maioridade civil, que surge pelo advento dos 18 anos de idade completos.

Assim é que, segundo o Código Civil, os menores de 16 anos são absolutamente

incapazes, e os maiores de 16 e menores de 18 anos são relativamente incapazes

(art.3, inciso I, e art. 4°, inciso I, respectivamente).

Saliente-se que a cessação da incapacidade pode-se dar antes do

advento da maioridade, por meio da implementação dos fatos que o Código Civil

enumera no parágrafo único do artigo 5°, como, por exemplo, o casamento e o

exercício de emprego público efetivo.

Assim, nessas hipóteses, não obstante não alcançada a maioridade, pela

idade de 18 anos, a pessoa consegue a cessação da incapacidade.

Mas a incapacidade civil (relativa ou absoluta) também decorre de doença

mental (completa ou incompleta), alcoolismo e vício em tóxicos, independentemente

da idade da pessoa.

A questão aqui a ser analisada é se a enfermidade mental do maior de

idade é causa de manutenção da obrigação alimentar.

É imperioso destacar que o princípio da solidariedade familiar não se

coaduna com o dogma de que são devidos alimentos apenas em razão do filho ser

incapaz, pois se deve sempre levar em conta o caso concreto, uma vez que não se

pode admitir a invocação deste princípio, por exemplo, para instituir um encargo

desnecessário e oneroso ao pai na hipótese em que o filho incapaz não necessitar

dos alimentos pagos por este, em razão de receber pensão por morte a qual lhe

confere uma quantia suficiente para que ele possa se manter dignamente (DIAS,

2006).

O Tribunal de Justiça de Santa Catarina vem entendendo que se o filho

maior, mas incapaz, recebe pensão/benefício previdenciário suficiente para custear

a sua alimentação e despesas básicas, o alimentante fica exonerado da obrigação.

Veja-se:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS - PRETENSÃO DO ALIMENTANTE DE SER EXONERADO DO ENCARGO ALIMENTAR EM FAVOR DO FILHO EM RAZÃO DA MAIORIDADE E PERCEPÇÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO - ALIMENTANDO INTERDITADO QUE PERCEBE RENDA SUPERIOR A DO ALIMENTANTE - SITUAÇÃO DEMONSTRADA - OBRIGAÇÃO ALIMENTAR AFASTADA - EXEGESE DO ART. 1.699 DO CÓDIGO CIVIL - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Comprovado que o alimentando atingiu a maioridade e, embora seja interditado, percebe pensão previdenciária que lhe permite suportar todas

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as suas despesas necessárias ao seu sustento, imperiosa a exoneração do genitor do encargo alimentar. (BRASIL, 2010M).

Assim, a exoneração concedida pelo Poder Judiciário fica vinculada à

analise das fontes de sustento do alimentando incapaz.

4.2 Ação de exoneração de alimentos e os efeitos da sua não interposição

Para subsistir o dever de alimentos, é preciso que os pressupostos do

nascimento da pensão se mantenham.

Extintos os pressupostos, cabe revelar que a exoneração do pagamento

de pensão alimentícia ao filho que atinge a maioridade não pode ser automática, ou

seja, necessária se faz a propositura de ação de exoneração. Neste sentido decidiu

o STJ:

Não tem lugar a exoneração automática do dever de prestar alimentos em decorrência do advento da maioridade do alimentando, devendo-se propiciar a este a oportunidade de se manifestar e comprovar, se for o caso, a impossibilidade de prover a própria subsistência. Isto porque, a despeito de extinguir-se o poder familiar com a maioridade, não cessa o dever de prestar alimentos fundados no parentesco. Precedentes. (BRASIL, 2010N).

Além da decisão acima mencionada, pode-se citar também:

Com a maioridade cessa o poder familiar, mas não se extingue, ipso facto, o dever de prestar alimentos, que passam a ser devidos por força da relação de parentesco. Precedentes. 2. Antes da extinção do encargo, mister se faz propiciar ao alimentando oportunidade para comprovar se continua necessitando dos alimentos. 3. Recurso especial não conhecido. (BRASIL, 2010O).

O pensamento de BEBER (2008, p.2) sobre o assunto é diverso. Segundo

ele:

[...] pretender que a máquina do Judiciário seja ativada tão-somente para que o juiz verifique se foram observadas as formalidades extrínsecas do ato jurídico é conclusão que somente um arraigado apego ao ritualismo pode sugerir.

Verifica-se que, para o doutrinador acima, tal demanda é desnecessária,

porque ela teria a única função de analisar requisitos formais do ato jurídico –

procedimento que é contrário ao atual sistema judicial, que se encontra

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completamente assoberbado de processos com temas mais urgentes. Usando neste

ato os princípios de simplificação, agilização e diminuição de custos para

determinadas atividades jurisdicionais. (BEBER, 2008).

No mesmo enfoque Madaleno (apud BEBER, 2008, p. 3) acrescenta:

Ascendendo à adultíce, compete aos próprios filhos se auto-sustentarem e o crédito pensional passa a ser uma verdadeira exceção. Sucede neste caso, a cessação do que era obrigação alimentar absoluta, arbitrada por presunção natural de necessidade, para dar lugar excepcional, ao dever de alimentos, conquanto que o filho já maior, demonstre seu estado de miserabilidade.

Isso não deixa cessar completamente o dever de alimentar do pai ao filho,

simplesmente do fato do alimentado adquirir a maioridade civil.

Neste sentido apregoa Monteiro (apud BEBER, 2008, p. 3-4):

Há, contudo, uma transformação da obrigação alimentar pela diferenciação dos seus pressupostos, não se podendo, destarte, exigir que o alimentante ingresse com uma ação de exoneração para fazer prova negativa acerca das necessidades do filho maior, em manifesta inversão dos princípios consignados no art. 333, incs. I e II, do CPC.

Assim caberá ao alimentado entrar com ação própria para pedir alimentos

ao seu pai mediante prova da necessidade proveniente de motivos relevantes,

como, por exemplo, a superveniência de alguma doença que lhe impeça de manter

o seu próprio sustento, ou curso em escola de nível superior sem horários livres para

o exercício de atividade laboral.

Portanto, a discussão e prova em torno do binômio necessidade-

necessidade é o que prepondera.

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5 CONCLUSÃO

Como visto, o Direito de Família brasileiro tem suas bases fixadas no

Direito Romano, no qual o marido detinha poder absoluto sobre sua família, exercia

funções ditas “sagradas”, considerado como um “deus” do seu clã, era o provedor

exclusivo da família, enquanto as mulheres seguiam despojadas de qualquer

autoridade.

O Capítulo 1 tratou da evolução histórica da família. Em sua trajetória, a

família evoluiu do modelo absolutamente patriarcal, hierarquizado, para alcançar

uma concepção eudemonista, solidária e afetiva, presente nos dias atuais. Além

disso, abordou os novos conceitos de família, dentro dos quais se destaca a

predominância do indivíduo como ser de direitos próprios, e não mais os bens ou

coisas que guarnecem a relação familiar.

Tratado, depois, dos princípios do direito de família, na forma como hoje

positivado pelo ordenamento jurídico, nota-se certa preponderância dos princípios

da dignidade da pessoa humana e da solidariedade, já que tais primados têm

gozado de especial atenção, notadamente pelo Poder Judiciário, no enfrentamento

do instituto jurídico dos alimentos.

Evidencia-se que esses dois princípios são reconhecidos como elementos

cuja ponderação é pressuposto para o respeito de outros tantos direitos, como, por

exemplo, o direito aos alimentos.

Assim é que os direitos e deveres dos pais, inclusive as relações jurídicas

travadas com demais pessoas da linha de parentesco, também sofrem as limitações

que os axiomas da solidariedade e da dignidade da pessoa humana estabelecem.

Ênfase ao direito-dever de alimentos, que encontra razão de ser no direito

natural, mas se exterioriza em atenção a tais dois princípios.

Falou-se também da ação de alimentos (capítulo 2), sobre as partes,

causa de pedir e pedidos, bem como sobre a coisa julgada que dela se projeta. Foi

visto que se trata de meio para realização de um fim, o direito substancial aos

alimentos, sejam os alimentos derivados da obrigação oriunda do poder familiar,

quando o alimentando é menor, sejam os alimentos decorrentes da solidariedade

imposta legalmente pela relação de parentesco em linha reta, cuja causa de pedir

apresenta contornos próprios.

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Feitas essas incursões anteriores, chegou-se ao derradeiro capítulo, que

consubstancia o objetivo maior do presente trabalho, que é demonstrar em quais

situações permanece a obrigação alimentar dos pais em relação aos filhos maiores,

a despeito da aquisição da capacidade civil por estes.

A questão que se coloca é a seguinte: o implemento da maioridade civil,

ou, de outro modo, a aquisição da capacidade civil, servem como justificativa única e

suficiente para a exoneração da obrigação dos pais de prestar alimentos?

Como visto, a obrigação dos pais em prestar alimentos pode ter por

fundamento o poder familiar ou a relação de parentesco aliada à noção básica da

solidariedade.

Em princípio, o dever de prestar alimentos cessa com a maioridade civil,

na medida em que essa ocorrência traz em si a presunção de que o filho pode

manter-se segundo suas forças.

Contudo, e segundo se denota do tratamento que os tribunais têm dado

ao instituto, essa consequência (liberatória) tem aplicação mais costumeira somente

quando se está diante de alimentos decorrentes da relação do poder familiar,

relação jurídica na qual a presunção de necessidade é absoluta.

Ainda assim, a liberação só é possível diante de ação judicial intentada

especificamente com esse propósito, por aquele que até então venha vertendo

alimentos, situação em que a indagação, a partir de então, ficará em torno do

equacionamento necessidade-possibilidade, cujo ônus da prova passa a ser do filho.

Mas o Superior Tribunal de Justiça - acompanhado pelos Tribunais de

Justiça de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul – definiu é que a aquisição de

capacidade civil pelo filho, com a cessação do poder familiar, não implica

necessariamente na exoneração da obrigação de prestar alimentos.

Isto porque se a necessidade efetivamente perdurar, e se os pais tiverem

real possibilidade, sem detrimento das suas necessidades, pode ser manejada ação

para imposição de alimentos, agora com fundamento no artigo 1.694 do Código

Civil.

O que os pretórios têm determinado é que, diversamente do pedido

alimentar em sede de poder familiar - no qual a presunção de necessidade milita

absolutamente, sendo, pois, indiscutível -, os alimentos pelo dever de solidariedade

pautado na relação de parentesco desloca o ônus da prova para o filho, que deverá

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sobejamente provar tanto sua necessidade quanto a capacidade dos pais em

prestar.

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