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1 INTRODUÇÃO Um dos shows mais noticiados pela mídia no ano de 2007 foi a apresentação do grupo paulistano Racionais MCs, na Praça da Sé, no centro de São Paulo, que levou 3 milhões pessoas á rua e acabou em confusão e quebra-quebra. Será que se esse evento tivesse ocorrido na mais perfeita ordem, se tornaria manchete no “Jornal Nacional” e na maioria das editorias de cidades por todo Brasil, na mesma proporção? Em que medida os meios de comunicação sustentam a idéia de que o rap está relacionado à criminalidade? E de que forma os hip-hoppers sustentam a cultura originada da periferia e que completa a resistência de mais de 30 anos na cultura urbana do mundo? Através da contextualização histórica que fomentam os pilares da cultura hip-hop como instrumento de militância e auto-afirmação, pretendemos analisar neste trabalho, de que forma o jornalismo trata esta cultura, principalmente o rap carioca. Partimos da premissa de que existe um silêncio midiático a respeito da cultura hip-hop no Brasil, especialmente na chamada grande mídia. Neste sentido, procuraremos mostrar a construção narrativa midiática sobre a cultura hip-hop e seu poder de gerenciar os discursos promovidos por esta. Este trabalho será desenvolvido em torno de duas vias. O discurso da mídia sobre hip-hop e a voz do rap como sinônimo de criminalização; o hip-hop enquanto movimento cultural e representante da voz da periferia. Se por um lado os media silenciam tais manifestações, em que medida os rappers negociam a relação com a mídia? Procuramos refletir as manifestações da cultura hip-hop no contexto do rap carioca com base na lógica dos estudos culturais e de teóricos como o norte-americano Douglas Kellner, o anglo-jamaicano Stuart Hall, o especialista em comunicação e hip hop, Micael Herschmann e o antropólogo Hermano Vianna. Iremos assim, desenvolver questões de mídia, cultura e identidade. Pretendemos evidenciar a forma com que a mídia gerencia os assuntos de acordo com seus interesses, e quais as principais causas de negociações dos media que,

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INTRODUÇÃO

Um dos shows mais noticiados pela mídia no ano de 2007 foi a apresentação do

grupo paulistano Racionais MCs, na Praça da Sé, no centro de São Paulo, que levou 3

milhões pessoas á rua e acabou em confusão e quebra-quebra.

Será que se esse evento tivesse ocorrido na mais perfeita ordem, se tornaria

manchete no “Jornal Nacional” e na maioria das editorias de cidades por todo Brasil, na

mesma proporção? Em que medida os meios de comunicação sustentam a idéia de que

o rap está relacionado à criminalidade? E de que forma os hip-hoppers sustentam a

cultura originada da periferia e que completa a resistência de mais de 30 anos na cultura

urbana do mundo?

Através da contextualização histórica que fomentam os pilares da cultura hip-hop

como instrumento de militância e auto-afirmação, pretendemos analisar neste trabalho,

de que forma o jornalismo trata esta cultura, principalmente o rap carioca.

Partimos da premissa de que existe um silêncio midiático a respeito da cultura

hip-hop no Brasil, especialmente na chamada grande mídia. Neste sentido,

procuraremos mostrar a construção narrativa midiática sobre a cultura hip-hop e seu

poder de gerenciar os discursos promovidos por esta.

Este trabalho será desenvolvido em torno de duas vias. O discurso da mídia sobre

hip-hop e a voz do rap como sinônimo de criminalização; o hip-hop enquanto movimento

cultural e representante da voz da periferia. Se por um lado os media silenciam tais

manifestações, em que medida os rappers negociam a relação com a mídia?

Procuramos refletir as manifestações da cultura hip-hop no contexto do rap

carioca com base na lógica dos estudos culturais e de teóricos como o norte-americano

Douglas Kellner, o anglo-jamaicano Stuart Hall, o especialista em comunicação e hip

hop, Micael Herschmann e o antropólogo Hermano Vianna. Iremos assim, desenvolver

questões de mídia, cultura e identidade.

Pretendemos evidenciar a forma com que a mídia gerencia os assuntos de acordo

com seus interesses, e quais as principais causas de negociações dos media que,

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hipoteticamente, causariam o silenciamento de muitos eventos organizados fora das

vistas da cultura da mídia. Deveremos nos basear em um tipo de pesquisa exploratória,

tendo em vista a análise a partir de um veículo de massa. Portanto, optamos por analisar

o caderno cultural “Rio Show” do jornal “O Globo”.

Escolhemos o suplemento do jornal “O Globo” por conta da sua abrangência, já

que faz parte da maior empresa de comunicação do Brasil, as Organizações Globo. Por

ser um jornal de classe média e por conta disso, com grandes chances de promover

elitismo e criminalizar articulações sócio-culturais da periferia, a exemplo do movimento

hip-hop.

Dados apurados pela Marplan, divulgados pelo IVC (Instituto Verificador de

Circulação) em pesquisa de agosto de 2007, indicam que o público consumidor do jornal

“O Globo” possui 1.154.000 leitores. Já o suplemento “Rio Show” que é publicado toda

sexta-feira no jornal “O Globo” é de 752.000 leitores em maioria classe A-B e de nível

escolar superior. 1

Esta pesquisa é voltada para a articulação do movimento hip-hop na mídia

impressa e tem como principal objeto, o evento “Hutúz” na sétima edição, realizada entre

os dias 7 e 28 de novembro de 2006. O tema do ano foi Hutúz Esporte Clube, cujas

atrações realizadas na periferia destacaram os eventos culturais, como basquete de rua

e batalhas de MCs. A fundamentação teórica na análise do suplemento “Rio Show” tem

como pilar os Estudos Culturais, em uma perspectiva que permite entender o processo

comunicativo entre o suplemento, culturas juvenis e leitores.

A partir deste objeto, buscaremos mostrar como a imprensa constrói a cultura hip-

hop em suas narrativas e de que forma ela trata os sujeitos envolvidos neste movimento

de intervenção social. Para entender este processo de construção midiática sobre aquilo

que cerca a cultura hip-hop, especialmente, as manifestações da música no prêmio

Hutúz, consideramos necessário estudar o conceito de identidade, já que para o senso

comum, e em geral, nos discursos midiáticos este conceito é utilizado apenas sob a

forma de representação e de idéias fixas que partem de uma única verdade, naturalizada

pela vida cotidiana. Por acreditar que as identidades não são fixas no tempo, mas sim

1 Ver Info Globo. Dados de Mercado. Disponível em http://:www.infoglobo.com.br/mercado_perfilleitores.asp%3Fperfil%3D1+caderno+rio+show+o+globo+ivc&hl=pt-BR&ct=clnk&cd=1&gl=br.

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múltiplas e geradoras de verdades não absolutas, buscaremos entender o processo de

construção da imprensa a respeito de um lugar polêmico e abundantemente híbrido,

como a cultura hip-hop.

Do Latim, identitate, produz a relação entre o idêntico e a coesão do grupo. Como

construção cultural, a identidade pode ser percebida através da relação com os lugares,

testemunhos, ações, memórias e outros elementos com os quais nos relacionamos e

que nos dão uma dimensão polivalente do conceito.

Interessa-nos mostrar também, como os praticantes do hip-hop promovem seus

discursos sobre o outro, aquele que não se encontra no mesmo lugar que eles, como os

veículos de mídia e a classe média. Os sujeitos que falam do lugar do hip-hop assumem

um caráter contra-hegemônico diante das negociações da cultura da mídia. Passam a

ser modalidades da cultura popular e de massa de um mundo globalizado, e assim

apropriam-se de diferentes formas de representações do mundo, que são apropriados e

consumidos, por jovens na pós-modernidade, como a maioria dos praticantes da cultura

de rua.

Mas estes, muitas vezes por falta de reconhecimento ou pela crença alheia que

se baseia apenas nos ideais de um senso comum a respeito desta cultura, acabam

sendo “demonizados” e tendo assim, suas identidades estereotipadas. Entendemos, que

a mídia tem um importante papel neste processo de cristalização dos valores da cultura

do hip-hop. Mas como isso acontece? De que forma a imprensa, especialmente o jornal

“O Globo”, contribui com a criminalização do hip-hop? O que a mídia tem mostrado

sobre a cultura hip-hop e o que ela tem silenciado?

O campo de pesquisa dos Estudos Culturais se faz academicamente importante

para os estudos de comunicação, especialmente quando tratamos de cultura hip-hop,

pois a entendemos como um modo de negociação de poder e valores de uma esfera

minoritária em nossa sociedade especialmente quando sobre o aspecto político-

econômico. Os pressupostos fundamentais dos Estudos Culturais neste trabalho são a

análises da ação da mídia, atentando sobre as estruturas sociais e o contexto histórico

como fatores essenciais para a compreensão da ação desses meios.

Ocorre o deslocamento do sentido de cultura da sua tradição elitista para as

práticas cotidianas, já que a cultura não é tanto um conjunto de obras, mas um conjunto

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de práticas. A cultura tem relação com produção e intercâmbio de sentidos, isto é, o dar

e receber sentidos entre os membros de uma sociedade ou grupo. Assim, a cultura deixa

de ser considerada algo passivo e incorpora um sujeito que pode criar e agir sobre as

coisas.

A cultura é uma região de disputas e de conflitos acerca do sentido; cultura diz

respeito aos enfrentamentos entre modos de vida diferentes devido à existência de

relações de poder. Como a comunicação é entendida dentro desse contexto? Ela é vista

como um processo simbólico através do qual a realidade é produzida, reproduzida e

transformada. Desenham-se enlaces entre texto, contexto e receptores.

Para os Estudos Culturais não existe divisão entre cultura e condições de

produção. As principais propostas de Micael Herschmann possuem abordagens

centradas na sociabilidade, no consumo cultural ou nas representações sociais que

circundam os grupamentos urbanos juvenis ligados a determinados gêneros musicais,

como por exemplo, o funk e o hip-hop do Rio de Janeiro.

Desse modo, as análises oriundas dos Estudos Culturais, nos levam a pensar a

música rap como um ponto de partida para a abordagem dos aspectos sociais e culturais

dos fenômenos juvenis, tomando como focos principais, as expressões musicais da

periferia carioca, principalmente do hip-hop, aliados aos fatores de criminalização do

mesmo, fruto das manifestações culturais da juventude das periferias cariocas.

Dentro desta análise, ao identificar esses fenômenos culturais da juventude, nos

propomos a questionar o papel dos meios de comunicação de massa para originar essa

estigmatização do hip-hop. Por que as notícias relacionadas aos eventos de rap

aparecem em segundo plano, dando ênfase a fatos da periferia ligados à violência, como

nos cadernos policiais, por exemplo? O destaque da mídia aos eventos de periferia

existe geralmente quando os mesmos estão relacionados à violência ou desordem?

Por que razão o “Prêmio Hutúz” de música, que acontece a oito anos na cena

cultural carioca – e que, mesmo com a divulgação inexpressiva é apoiado entre outras

instituições, pelas Organizações Globo - só é conhecido e identificado pelos adeptos do

hip-hop e da cultura negra em geral? O evento que acontece durante todo mês de

novembro tem uma estrutura e organização suficientes para percorrer simultaneamente

os principais espaços culturais do Rio de Janeiro, envolvendo manifestações culturais

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entre cinema, música e encontros de mesa redonda, além do basquete de rua, do centro

ao subúrbio carioca.

Para dar conta destas questões, este trabalho se originou com a seguinte

estrutura: no primeiro capítulo intitulado “Hip-Hop e o Advento do Rap”, procuramos

contextualizar os acontecimentos político-sociais que originaram as manifestações

ideológicas das periferias dos Estados Unidos, e tiveram como conseqüência o

surgimento da cultura hip-hop. Definimos e legitimamos os elementos que compõem a

cultura hip-hop, tais como a expressão musical através do Dj e do MC; a expressão

corporal do B-Boy e visual do Grafite. Os quatro elementos definem “As poderosas vigas

que sustentam o Hip-Hop”. Esclarecemos as expressões e linguagens da cultura de rua

cujos dois primeiros elementos (DJ e MC) constituem a música rap, como conhecemos

atualmente.

Mostramos como o rap é de origem pan-africana, evidencia a consciência do

gueto através do canto falado, defendendo o lugar do indivíduo no mundo. Procuramos

ao final do capítulo trazer um pouco da cena rap do Brasil, onde tratamos organizações

não-governamentais (ONGs) e selos de gravadoras micro, que acabam gerando pólos

da cultura, ou são geradas pelo próprio hip-hop, especialmente para mostrar um dos

principais aspectos que explicam a independência dos grupos de rap, através da

sustentabilidade macro por meio da cultura hip-hop, nos principais centros urbanos da

América Latina.

No segundo capítulo, como forma de compreender a sustentabilidade da cultura

hip-hop, tomamos como exemplo o fenômeno do grupo Racionais MCs que, mesmo

sendo radicalmente contra aparições e veiculações de seus trabalhos na grande mídia,

mantém um público fiel, mais de 1,5 milhões de cópias oficialmente vendidas.

Percebemos nas relações com os media posições contra-hegemônicas dos rappers,

através, por exemplo, dos espetáculos do cotidiano, relatados nas letras do vocalista

Mano Brown.

Analisamos ainda, de que forma a indústria cultural reproduz discursos que

articulam posições ideológicas que ajudam a reiterar formas de dominantes de poder

social, e que servem aos interesses de dominação da sociedade. Em virtude dos

eventos promovidos pela cultura hip-hop nos perguntamos: por que a mídia não articula

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essa manifestação da camada mais expressiva da sociedade brasileira tendo em vista o

dever ético de ser fiel aos fatos de relevância social?

A abordagem da pesquisa, além da questão cultural apontada por Kellner é

reforçada em torno da questão das identidades pelo teórico Stuart Hall. Tomando o foco

na cena carioca, o antropólogo Hermano Vianna sustenta as manifestações das galeras,

para completar a idéia de como os jovens do Rio de Janeiro continuam produzindo

incessantes símbolos de vigor cultural, que tornam-se ferramentas para contestação e

resistência da cultura de rua, além de exportar modismos para todo o país.

O último capítulo é focado na pesquisa do caderno cultural, a revista “Rio Show”

do jornal “O Globo”. Voltamo-nos para a articulação do movimento hip-hop na mídia

impressa. Temos como principal representante o evento “Hutúz”, maior festival de hip-

hop da América Latina, que acontece simultaneamente em diversos espaços culturais do

Rio de Janeiro. Tentaremos, com base nos objetivos propostos, hipóteses criadas e aqui

tratadas, promover o desenvolvimento desta monografia.

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I

Hip-Hop e o Advento do Rap

Nos Estados Unidos, na década de 60, muitas manifestações de grupos

segregacionistas estavam ganhando força, principalmente em opressão aos negros

originados dos guetos de Nova Iorque. Os imóveis se desvalorizaram rapidamente visto

que a região estava abandonada pelos negócios, pelo governo e pelos brancos. A

situação de abandono dos que ficaram no bairro do Bronx - que eram negros e

extremamente pobres - deu surgimento às gangues, que se formavam para se proteger2.

Desde então foram surgindo cada vez mais manifestações violentas, assim como

também as que pregavam a não-violência, de forma organizada e de cunho religioso por

parte dos negros de todas as camadas sociais dos Estados Unidos. Nesta época,

proliferou-se uma grande discussão sobre direitos humanos e, nesse contexto, os

marginalizados da sociedade de Nova Iorque se articularam para fazer valer suas

propostas na eliminação das suas inquietações. Assim surgiram grandes líderes negros,

como Martin Luther King e Malcom X, e grupos que lutavam pelos direitos humanos

como os Panteras Negras.

Em 4 de abril de 1967, o pastor Martin Luther King Jr. levantou-se na igreja de

Riverside em Nova Iorque e proferiu o mais violento manifesto contra a ação dos

Estados Unidos no Vietnã, incitando os negros americanos a se recusarem ao serviço

militar por motivos de consciência.3 O líder pacifista negro revelou ao povo seu poder

latente. O protesto não-violento às massas, firmemente disciplinado, capacitou-o a

avançar sobre seus opressores de forma eficiente, sem derramamento de sangue.

Em um espaço de um ano, o mais expressivo líder negro da época mobilizou

dezenas de Estados por onde passava para proferir seu discurso e sua causa em nome

de seu povo excluído, além de brancos que aderiram ao protesto não-violento, o que

provocou a ira de chefes de Estado, brancos conservadores da época.

2 Ver SILVA, Adriana Ferreira. Livro analisa origem do hip hop em NY. Folha online. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u55195.shtml

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Coincidência ou não, após Martin L. King ser morto em 4 de abril do ano seguinte,

quando se preparava para um sermão e estava hospedado no hotel Loraine, localizado

em Washington, mais de cem cidades americanas viveram conflitos, saques, explosões,

além de confrontos de radicais negros com a polícia. No final de 1968 – ano histórico de

protestos juvenis mundiais - parte do Bronx se viu tomada por gangues e traficantes.

Em meio às diversas manifestações, o hip-hop4 surgiu como mais uma forma de

contestação - e foi conseqüência dos protestos pacíficos - em Nova Iorque no início da

década de 70. Os jovens negros procuravam locais para se divertir, a exemplo das

festas do DJ (Sigla para Disk Jóquei, que instrumentaliza a música com aparelhos

eletrônicos) Kool Herc. As festas lideradas pelo DJ local se tornaram referência para os

jovens envolvidos na atmosfera da cultura black.

O discurso envolvendo os direitos civis dos negros nos anos 60 era intrínseco na

memória americana. Essa luta por parte dos afro-americanos influenciou de forma

evidente os primeiros praticantes da cultura. Dessa maneira, a partir da década de 80

está formado o cenário emergente do hip-hop, com suas três manifestações primárias –

o rap, o break e o grafite, que no decorrer deste trabalho iremos descrever.

Somado as indignas condições de vida impostas às camadas menos privilegiadas

de Nova Iorque durante o governo Reagan, a partir de 1981, a manifestação cultural do

hip-hop toma formas de resistência e auto-afirmação por parte das camadas excluídas.

Tal contexto social explica, em parte, situações de turbulência e conflito urbano.

A periferia dá um grito de guerra que, tal qual o jornalista havaiano Jeff Chang

defende a idéia que o hip-hop é a arma mais poderosa dos Estados Unidos e de todas

as capitais e periferias do mundo. Coadjuvante nessa história, Chang reuniu suas

pesquisas e o resultado está no livro "Can't Stop, Won't Stop - A History of the Hip Hop

Generation" (Não pode parar, não vai parar - Uma história da geração hip-hop). O

3 CLARET, Martin. O pensamento Vivo de Martin L. King. São Paulo. Coleção 28. Martin Claret Editores, 1988.p.12. 4 Segundo o site oficial Nação Hip-Hop Brasil, o termo foi criado em meados de 1968 pelo Dj Afrika Bambaataa, que teria se inspirado em dois movimentos. Um deles estava na transmissão da cultura dos guetos americanos, enquanto o outro estava justamente na forma de dançar que faz referência aos movimentos de coreografias: hip (quadril); hop (salto). Disponível em http://www.nacaohiphopbrasil.com.br/

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havaiano radicado nos Estados Unidos, Jeff Chang, há 14 anos escreve e milita no

movimento.

“Fuck tha Police”, uma das músicas do álbum “Straight Outta Compton” do grupo

N.W.A., segundo o filósofo norte-americano Douglas Kellner, foi uma das maiores obras

de Gangsta Rap 5 de todos os tempos, criticava a violência da policia nas ruas dos

bairros e a discriminação racial na primeira metade dos anos 90. A música deste gênero

é defendida por muitos e alguns morreram mesmo pela causa, a exemplo dos rivais

Tupac Shakur e Notorious B.I.G., que foram as maiores figuras do Gangsta Rap e

continuam a ser os ícones do gênero. Geralmente têm problemas com a lei, alguns

inclusive têm ou já tiveram envolvimento com gangues.6

De origem negra, ainda que em alguns aspectos assimilado por outras culturas de

origens intercontinentais, como européia, norte-americana e latina, segundo ele, o hip-

hop se faz presente nas grandes cidades como cultura oriunda de classes menos

favorecidas. Com o passar do tempo o gênero assumiu características de movimento,

detendo assim uma gama de desdobramentos, sendo reconhecido também como uma

“cultura de rua”, assim como o movimento punk, o rock e o heavy-metal.

A respeito do papel social do movimento hip-hop, Tatiana Galvão, afirma que o

hip-hop firma-se principalmente por parâmetros ideológicos construídos na periferia e

voltados para a reflexão da realidade em que essa maioria está imersa. Encarado ora

como cultura de rua, ora como movimento social, através de discurso político,

radicalidade e da linguagem provocativa, o hip-hop revitalizou parte das reivindicações

do movimento negro, ainda que não seja parte da estrutura do mesmo.7

1.1 - As Poderosas Vigas que sustentam o Hip-Hop

A cultura hip-hop é formada basicamente por quatro elementos. Só a música rap

detém dois desses elementos: o MC (Sigla americana para Mestre de Cerimônias, que

5 Gangsta Rap é um dos estilos do rap, com letras violentas e normalmente com orientação machista, seus temas são a violência das gangues, as drogas e os maus-tratos contra a mulher. 6 KELLNER, Douglas. A Cultura da mídia – Estudos Culturais: identidade e política entre moderno e o pós-moderno, p. 237 7 GALVÃO, Tatiana Verônica Bezerra.Hip hop e mídia: negociando interesses e ampliando conceitos. p.10.

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também pode significar rapper, para aquele que executa o canto falado) e o DJ8. Os

outros dois elementos são mais independentes entre si. São eles: o grafite (a arte

plástica, expressão visual) e o break (dança). Cada um deles com sua representação

específica, mas que juntos compõem um mosaico que corresponde à representação de

protesto, auto-afirmação, reivindicação, crítica social, diversão ou hobby.

Segundo o site “Nação Hip-Hop”, o fato é que a principal referência da cultura hip-

hop está da costa leste à oeste dos Estados Unidos. O Brooklyn é o reduto do hip-hop, e

onde tem força também na cultura do basquete de rua e atividades urbanas em geral.

De acordo com o site, o Queens, por exemplo, é conhecido como o bairro do grafite e lá

durante muito tempo residiu o DJ Kool Herc, um dos precursores do ritmo nos Estados

Unidos. Na Califórnia o break ganhou força nos anos 80. Sendo assim muitos desses

locais se tornaram referências da cultura para o resto do país e do mundo.9

1.2 - O Grafite

Graffiti ou Grafite (do italiano graffiti, plural de graffito) significa marca ou

inscrição feita em um muro10, e é o nome dado às inscrições feitas em paredes desde o

Império Romano. Trata-se de um movimento organizado nas artes plásticas, em que o

artista aproveita os espaços públicos, criando uma linguagem intencional para interferir

na cidade.

Enquanto para alguns, os grafiteiros apenas mascaram impulsos de vandalismo

com discursos de vitimização, para outros essa expressão é utilizada como veículo que

revela realidades oprimidas, sem forças perante pressões governamentais e políticas.

Ativista do movimento hip-hop carioca, há mais de 10 anos, o MC Luiz Cláudio,

conhecido como Slow da BF (Baixada Fluminense) ou Slow do Esquadrão Zona Norte

(EZN) é referência quando se fala em hip-hop no Rio de Janeiro. Seus argumentos

passam por questões que enfatizam o peso do grafite diante do sistema capitalista.

8 Ver p.2. 9 Ver site Oficial Nação Hip Hop Brasil. A história do hip-hop e seus elementos. Disponível em http://www.nacaohiphopbrasil.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=10&Itemid=76 10 Site Oficial sobre grafite. Disponível em http://www.graffiti.org.br/

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“O grafite é o único sistema que bate de frente com o sistema capitalista, de forma que ele choca esse sistema. A estrutura de um prédio vertical é o maior ícone do capitalismo, é a maior potência, um em cima e embaixo do outro. Quando você grafita esse prédio você quebra toda a estrutura do capitalismo. O grafite não é só aquela letra bonita: é a quebra do sistema imposto pelo capitalismo. Você tá botando a sua vivência, a sua cultura, que veio de latinidades, dos hispânicos de Nova Iorque. Ta botando aquilo ali na cara deles, falando assim: ‘Mermão, teu prédio é lindo, tem cinquenta andares, mas lá embaixo tem a p**** do meu tag lá.’ É o papel da pixação, num bom sentido.”11

Dos quatro elementos que compõem o hip-hop, o grafite é o mais intrigante, dada

a mistura de significações: galeria e rua; protesto e estética; artes plásticas e prática

ilegal, como mostra a reportagem especial da revista “Caros Amigos”. No mercado

formal das artes ele vem ganhando um espaço nunca previsto. A influência latina é algo

que podemos dizer que existe muito forte em toda a estética, já que os maiores artistas

são oriundos de países como Porto Rico, Colômbia e Bolívia. 12

É importante ressaltar que, como protesto, diante de uma ordem social

estabelecida, a prática de pixação de prédios é condenada, pois significa um ato de

perversão contra o sistema. Ainda que o objetivo seja burlar a lei, tal evento de protesto

se aproxima da criminalidade.

Segundo a reportagem, no início dos anos 80 uma geração surgiu entrando em

galerias de arte de renome e fazendo turnês pela Europa. Nomes como Dondi, Futura

2000, Lady Pink, Blade, Fab 5, Freddy e Lee Quiñones levaram a arte grafite para a

mídia. O cinema foi um grande impulsionador nesta época. Os filmes “Beat Street” -

musical urbano de 1984 - e “Wild Style” (documentário sobre o grafite da década de 80

lançado em 2003) de certa forma divulgaram a cultura hip-hop por todo o mundo.

O grafite foi percebido no Brasil em meados da década de 80 - segundo a repórter

Sofia Amaral - por meio de duas correntes distintas: a primeira mais ligada às artes

plásticas tinha como destaque Alex Vallauri, considerado o precursor do grafite

brasileiro; a segunda deu os primeiros passos através do impulso do início do hip-hop.

Dos brasileiros que iniciaram a arte, da galera de Vallauri à frente da prática do spray

11 BARCELLOS, Monique. Rádio Online Introdusom. Programa Som de Rua - Entrevista especial - Slow parte 2. Disponível em http://introdusom.blogspot.com/2007_03_01_archive.html

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estão até hoje Hudinilson Urbano Jr., Mário Ramiro e Rafael França. Uma das técnicas

do grafite é o estêncil (ou “máscaras” , como alguns chamam) o qual o spray é aplicado

sobre um molde vazado, modelado de acordo com a figura que se quer revelar.

Os anos 90 tiveram a influência de dois artistas brasileiros consagrados

mundialmente: os gêmeos grafiteiros Gustavo e Otávio. De acordo com a reportagem, a

partir desta época o grafite se torna um elemento independente do hip-hop, e na medida

em que esse elemento vai se desvinculando, vai também atingindo outras áreas além

das ruas. Segundo a revista Carta Capital, os Gêmeos, como ficaram conhecidos,

finalizaram uma exposição em uma galeria em Nova Iorque e viajaram a convite da Nike,

por sete países ao redor do mundo expondo seus trabalhos. Existe em São Paulo uma

galeria de arte dedicada especialmente ao grafite, a Choque Cultural, no bairro Vila

Madalena.13

De acordo com Sofia Amaral, o grafite invadiu não somente nas galerias de arte,

já que ultimamente grandes marcas querem associar a imagem do produto à proposta

da arte urbana. O mercado publicitário vem se servindo da estética do estilo do grafite

dentro da mídia. Campanhas de publicidade vêm incorporando a arte de grafiteiros para

criarem comerciais de TV, outdoors e peças do gênero, a exemplo da Nike:

“A mesma Nike vem usando o grafite em suas campanhas publicitárias no mundo todo, assim como a Brasil Telecom e diversas grifes de vestuário. O grafite esteve até em estandes no São Paulo Fashion Week, isso sem falar nas festas rave.”14

As barreiras transpostas além dos muros pelos grafiteiros através das últimas

décadas e juntamente com a abrangência do movimento são motivos de comemoração

para os artistas desse gênero, mas a maioria admite que grafiteiro que é grafiteiro pinta

na rua. A forma de lutar é grafitar e por isso, defendem a legitimidade registrada nos

muros dos becos e edifícios e não somente nas galerias de exposições.

12 AMARAL, Sofia. Caros Amigos - Especial Hip-Hop Hoje: Além dos muros. Número 24, junho de 2005, p. 31. 13 AMARAL, Sofia. Op. Cit, p. 31. 14 AMARAL. Idem. p.31

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1.3 - O Rap: DJ, MC e Poesia

Rap significa Rhythm and Poetry, ou seja, ritmo e poesia, que é a expressão

verbal da cultura hip-hop, como mostra o site “Nação Hip-Hop”. Considerado a

linguagem musical, o rap tem geralmente como base, o rhythm’n blues, intermediado por

uma fala transposta à parte musical. Com um discurso quase sempre fundamentado na

crônica urbana da diferença de classes, o texto em si é usado como uma forma de

protesto, no qual expõe o problema e discursa sobre ele. Para tanto, usa a abordagem

que provoca tensão entre as classes, colocando em choque as diferenças (culturais,

sociais, políticas) ou somente demonstra a ineficiência do poder Estatal perante aos

problemas da comunidade.

O DJ e o MC ou rapper são responsáveis pela instrumentação, isto é, o primeiro

coordena e toca o mixador e a pick-up (aparelhos que são considerados instrumentos) e

dos quais retiram sons eletrônicos, que dão o ritmo à fala do rapper ou MC, cujos termos

são sinônimos. Este é o compositor da obra e quem leva o discurso para o público. Há

quem defenda que são coisas diferentes e que o rap - ou canto falado, ou ainda fala

ritmada - não é novo e nem foi criado nos Estados Unidos. 15

1.3.1 - Surgimento do Rap: elos de uma corrente

De acordo com os autores do livro “Hip-Hop: A Periferia Grita”, o hip-hop é

basicamente, de origem afro-jamaicana. Faz parte de um híbrido da cultura negra

jamaicana mesclada a aspectos da cultura afro-norte-americana.16 Segundo os autores,

no Caribe, especificamente na Jamaica, surgiu uma cultura musical de nome ragga, uma

mescla de ritmos jamaicanos com ritmos africanos, mais ou menos na década de 60,

quando surgiram os sound systems – equipamentos eletrônicos de som – que eram

colocados nas ruas dos guetos jamaicanos para animar os bailes.

15 Ver Site Oficial Nação Hip Hop Brasil. Disponível em http://www.nacaohiphopbrasil.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=10&Itemid=76 16 ROCHA, Janaína, DOMENICH Mirella, CASSEANO Patrícia. Hip Hop: A Periferia grita, p.132.

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Essa conclusão é pensada pelos autores do livro diante do contexto sócio-cultural

que relaciona o ragga como a raiz do que se conhece como rap. Esse gênero básico

serviu como ponto de partida para a criação de novos gêneros a exemplo do reggae e o

rap. Esses bailes passaram a servir de cenário e fundo sonoro (base rítmica) para os

discursos.

De acordo com o livro, na ilha da Jamaica era uma prática popular de ritmos

regionais rolando com os toasters - que eram como os MCs (mestres de cerimônias de

hoje) que ficavam falando frases e discursando sobre as carências da população, os

problemas econômicos, a violência nas favelas, sobre a dificuldade em geral da classe

baixa dos guetos. Os autênticos mestres de cerimônia em suas intervenções

comentavam assuntos como a violência das favelas da capital, Kingston e a situação

política da ilha.

O professor da UCSAL (Salvador), ativista e produtor cultural Nelson Maca, em

entrevista para o site “Over Mundo” diz que não acredita que o hip-hop tenha surgido

unicamente na Jamaica, e defende que o hip-hop formatou-se, como cultura híbrida, nos

Estados Unidos: “É corrente a defesa da Jamaica como pai dessa cultura. Vamos dizer

que é um dos avós da criança. Vem de lá a prática coletiva criada pelos toasters”.

Porém, segundo ele, os jamaicanos já praticavam a arte de “falar” sobre uma base

instrumental.

Segundo professor Nelson Maca, outro elemento jamaicano aceito,

unanimemente, como precursor do hip-hop é o DJ Kool Herc, que traz para os Estados

Unidos a prática do sound system para a festa de quarteirão, festa de rua, a block party.

Mas o professor sustenta que há várias outras variáveis de matizes culturais não

jamaicanas, como por exemplo, a tecnologia japonesa. 17

De acordo com o “Diário de Nova York” do site Globo, Clive Campbell é o nome

de batismo do DJ que nasceu em Kingston, Jamaica em 1955 e imigrou com os pais

para Nova Iorque em 1967. Uma corrente de adeptos considera Kool Herc o primeiro DJ

do hip-hop e sua origem ilustra o elo de ligação entre o reggae e o rap. Herc começou a

tocar em festas de bairros em Bronx a partir de 1969 e, nos anos 70 introduziu o sistema

17 Ver entrevista “Em torno do Hip-Hop”. Disponível em http://overmundo.com.br

Page 15: Monografia -Monique Barcellos

15

de tocar pequenas porções rítmicas dos vinis, método este que foi batizado como

breakbeat.18

Nesta época, quando o ritmo chegou aos Estados Unidos, em vez do ritmo

jamaicano, os norte-americanos improvisavam em cima do rhythm’n blues,

principalmente do soul e do blues, desencadeando a música rap, como conhecemos. Os

autores destacam que na década de 70, o soul representou uma força unificadora que

incitava ideológica e visualmente os avanços dos negros. Esse conceito percorreu o

mundo e lançou moda: cabelo afro, calça de boca larga, sapatos multicoloridos de solas

altas, danças de James Brown e a expressão de auto-estima black. Foi nessa atmosfera

que tomou força o movimento pelos direitos civis. 19

No entanto, a reportagem especial da revista “Caros Amigos” sustenta que o rap

surgiu em local, dia, mês e ano marcados. Chegam até a dar data precisa: 12 de

novembro de 1974 no Brooklyn, em Nova Iorque20, fruto de experiência de DJs nova-

iorquinos. No bairro do Bronx, em Nova Iorque, só existiam dois deejays conhecidos: DJ

Kool Herc - o maior e mais seguido de todos os DJs do Bronx - e DJ Kool Dee.

Quanto ao primeiro registro fonográfico de rap, há divergências entre os registros

históricos, porém o livro afirma que foi o grupo Sugar Hill Gang que gravou o primeiro

registro em vinil. O Sugarhill Gang foi um trio de negros norte-americanos que

praticamente implantou o estilo rap (música falada). Em 1979 a Sugarhill Records lança

o grupo Sugar Hill Gang, vendendo mais de dois milhões de cópias no Estados Unidos.

O sucesso estrondoso “Rappers Delight”, ficou muito conhecida no Brasil como ”Melô do

Tagarela”.

O livro “Hip-Hop: A Periferia Grita”, sustenta que Afrika Bambaataa ou Kevin

Donovan nasceu e foi criado no Bronx, Nova Iorque. O DJ e também líder da Zulu Nation

é reconhecido como fundador oficial do hip-hop. A ONG Zulu Nation fundada por Afrika

Bambaataa viajou por todo o mundo, fazendo shows e arrecadando fundos para

campanhas Anti-Apartheid (Anti-Racista) e chegou a reunir 10.000 membros em todo o

mundo através da cultura. Até hoje a ONG é referência e continua sendo representada

18 Ver Diário de Nova York. Disponível em http://oglobo.globo.com/blogs/ny/post.asp?cod_Post=67065&a=283 19 ROCHA, Janaína, DOMENICH, Mirella, CASSEANO Patrícia. Op. Cit, p.129.

Page 16: Monografia -Monique Barcellos

16

pelos integrantes do hip-hop.

Segundo o livro, Bambaataa caracterizou o som sampleado – onde se utilizam

gravações já existentes de diferentes tipos de música - para criar raps. Usando sons,

que iam desde James Brown até o som eletrônico da música “Trans-Europe Express”

(da banda européia Kraftwerk), e misturando ao canto falado trazido pelo DJ jamaicano

Kool Herc, Bambaataa criou a música “Planet Rock”, que hoje é um clássico. Foi o

primeiro hip-hopper a trabalhar com James Brown, gravando “Peace, Love & Unity”.

De acordo com a escritora Janaína Rocha, esta mesma época apareceu Joseph

Saddler (Bridgetown, 11 de janeiro de 1958). Mais conhecido como Grandmaster Flash,

é um músico de hip-hop e DJ, que ajudou a reformular o jeito de rimar em cima dos

break-beats. Um discurso de corrente militante surge em primeiro plano com a gravação

de “The Message”, de Grandmaster Flash and The Furious Five. De acordo com a

autora, se existem responsáveis pela criação da música break-beat, foram Kool Herc,

Afrika Bambaataa e Grandmaster Flash, os que vieram depois somente ajudaram a

construir o que chamamos de hip-hop. Herc sofisticou cada vez mais o jeito de fazer

música trazendo técnicas inovadoras que foram cada vez mais sendo associadas ao

ritmo, com os scratchs.21

Assim como analisa o produtor musical Milton Salles, quando afirma que tanto a

música dos Estados Unidos quanto do Brasil é a soma de ramificações da cultura

africana. “Você pode falar que ele é pan-africano, porque ele é uma fusão, que vem do

reggae, que nasceu com os caras tocando na Jamaica e que ouviam rhythm 'n 'blues de

Miami” 22, podemos concluir que o rap é pan africano.

1.4 – Break: Protesto e orgulho em forma de dança

20 AMARAL, Sofia. Op. Cit, p. 31. 21 Scratch (arranhão, em português) é o movimento de vai-e-vem que os DJ’s fazem com o disco (originalmente de vinil, mas que hoje já pode ser feito em mesas – as chamadas pick-ups - com equipamento e som digitais). O movimento contrário à rotação resulta em um som arranhado ou na alteração da velocidade normal da execução da música. 22 ROCHA, Janaína, DOMENICH, Mirella, CASSEANO Patrícia. Opcit, p.133-4.

Page 17: Monografia -Monique Barcellos

17

Como mostra o livro “Hip-Hop: A Periferia Grita”, o principal artista desta época

era o Mister Dynamite (Senhor Dinamite) James Brown, conhecido não só por sua voz

ou canções, mas também por toda sua estética, que virou referência para a grande

maioria dos pop-stars que vemos depois dele, a exemplo de Michael Jackson, Prince,

Madonna, entre outros. James Brown era idolatrado principalmente nos redutos negros e

latinos das grandes metrópoles e influenciava todos os jovens com sua dança, chamada

Good Foot (Pé Bom). No Brasil essa dança é chamada de Soul, pois é o estilo de

música que Brown cantava.

Nos anos 80 com o “Boom do Break” que aconteceu mundialmente, todas as

danças independente das ramificações - se fosse locking ou b-boying ou popping -

apareciam sob o nome até hoje conhecido mundialmente pela mídia como break dance.

Para os autores do livro, vários grupos aderiram ao break, os grupos são denominados

de crew, que em inglês significa tripulação. O conceito dessas posses ou turmas - o que

hoje parece moda e é também apropriado por grupos de rap.

Segundo o site “Nação Hip-Hop”, no Brasil, o break ganha a cena urbana desde

1982, quando Nelson Triunfo e a posse Funk Cia, já mostravam o novo conceito de

dança na movimentadíssima Rua 24 de Maio, coração de São Paulo. Depois se

deslocaram para a estação São Bento, que se tornou para sempre o templo dos b-boys

de todo o Brasil. Formaram as crews como Crazy Crew, Street Warriors, Nação Zulu,

Fantastic Force, Jabaquara Breakers e Back Spin Kings.23

Podemos perceber que a cultura vai bem mais além e é, na verdade, uma

manifestação do movimento hip-hop de forma geral. Sob essa ótica entende-se que o

MC e o DJ não necessariamente necessitam aprender as técnicas do break e do grafite,

por exemplo. Os elementos são coexistentes, independentes entre si, mas que fazem

parte de movimentos unificados, separados apenas na forma elementar de expressão,

seja ela visual, corporal ou musical. O grafite existe independente do hip-hop, ao mesmo

tempo em que, em contrapartida, o hip-hop não existe sem o grafite. O rap pode ser

inserido em vários estilos musicais, mas o hip-hop só se expressa musicalmente através

do rap e assim por diante.

23 Site Oficial Nação Hip Hop Brasil. A história do hip-hop e seus elementos. Disponível em http://www.nacaohiphopbrasil.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=10&Itemid=76

Page 18: Monografia -Monique Barcellos

18

1.5 - Escala Brooklyn -Brasil: “O Mundo Inteiro é o gueto” 24

O “Black Rio” e o “Hip Hop Rio” são projetos separados por três décadas e ambos

são manifestações da periferia carioca. Ainda segundo o livro “Hip Hop: A Periferia

Grita”, o primeiro surgiu naturalmente nos subúrbios do Rio, mais especificamente nos

bairros de Catumbi, Realengo e Bangu. A influência do soul e do funk também foi

refletida na atmosfera das festas black da época. Formada a partir do Movimento Black

Rio em 1976, a banda homônima é considerada revolucionária para a música negra

brasileira. Pioneira na mistura de samba, soul e funk, com acentos de jazz e baião, a

banda tinha, como única preocupação, fazer um som dançante e autêntico.

Como mostra o site do “Dicionário Cravo Albim” de música, foi através de “Maria

Fumaça”, de 1977, que a Banda Black Rio tomou maiores proporções e invadiu de uma

vez as pistas de dança. Com a morte de um dos principais participantes da banda,

Oberdan Magalhães, em 1980, a banda terminou.25

Segundo o site, a primeira tentativa de reunir os artistas cariocas desta nova

tendência musical foi a coletânea "Tiro Inicial", surgida no início da década de 1980.

Produzida pelo CEAP (Centro de Articulações das Populações Marginalizadas) tendo

como mentor o político e ativista negro Ivanir dos Santos e como produtor musical

Mairton Bahia, “a coletânea aglutinou os primeiros valores cariocas ligados ao hip-hop:

Gabriel O Pensador, MV Bill e Artigo 288 (liderado pelo rapper Gilmar), entre outros”.26

No Brasil, de acordo com a jornalista Janaína Rocha, fim da década de 90, a base

passou do rhythm’n blues (a vertente paulista) para o samba, com Marcelo D2 e

BNegão. Porém, outros rappers, como Gabriel O Pensador, Mr. Catra e MV Bill

preferiam a cultura americanizada, fazendo uso de ritmos americanos como base de

suas falas. O hip-hop na expressão musical do rap assume características próprias em

cada região.

24 Trecho de “Gueto”. Marcelo D2. Meu Samba é Assim. Sony-BMG, 2006. 25 Em 1999 William, filho de Oberdan, recriou a BBR, com razoável aceitação da crítica. A necessidade de se pensar e expressar a cultura negra e suas aspirações se fez presente na sonoridade da banda. 26 ALBIM, Cravo. Dicionário da Música Popular Brasileira. Disponível em http://www.dicionariompb.com.br/verbete.asp?nome=Gabriel%20O%20Pensador&tabela=T_FORM_A

Page 19: Monografia -Monique Barcellos

19

No Rio de Janeiro alguns rappers usam como base o samba e em São Paulo a

preferência para a base sonora ainda são os loops americanizados. Segundo a autora,

curiosamente, a primeira mescla de hip-hop e samba de que se tem notícia se deu no

Rio Grande do Sul, feita pelo grupo de rock De Falla. O rap tem como característica

fundamental os MCs (Mestres de cerimônias), o qual detém a fala central ou a voz

centro na melodia.

Percebemos diante das práticas alternativas de sustentabilidade que o hip-hop

brasileiro de forma geral não toca nas rádios, mesmo embora já haja alguns campeões

de vendas no elenco de artistas urbanos. Os anos 90 trouxeram novos ares para o hip-

hop a exemplo do grupo Planet Hemp que - segundo o líder Marcelo D2 - na época a

banda chegava a vender em média 250 mil CDs por lançamento.

Isso sem falar do grupo de São Paulo, Racionais MCs, que desde que chegou ao

milhão de cópias vendidas do álbum “Sobrevivendo no Inferno” (1998, Zâmbia Records)

– que não apenas derrubou a barreira contra música independente das rádios FM, com

canções de oito minutos de duração – centenas de discos de rap foram lançados no país

e, com isso, o movimento passou a ocupar nichos do mercado.

Tatiana Galvão analisa que o espaço da cena cultural nos meios de comunicação

representa para muitos não só expectativa de vida, mas também uma possibilidade de

inserção social até então negada27. A grande mídia que durante tanto tempo

estigmatizou tudo aquilo que vinha da periferia, acabou se rendendo ao estilo de

irrefutável expressão e nos anos 90 passou a incluir nas pautas a nova manifestação

artística a partir da cultura urbana até os dias atuais. O hip-hop chegava para oxigenar

os outros tantos gêneros musicais já consagrados pela cultura popular.

A partir do ano 2000 à medida que a tecnologia se torna mais simples e acessível

e através de um microcomputador, onde é possível gerenciar gravações, o mercado

musical reflete a crescente facilidade de se produzir um disco. Assim, de acordo com o

site “Clique Music”, se desenvolveu uma verdadeira indústria formada por grupos de rap,

produtores de discos independentes, estilistas, revistas e programas de rádio e TV,

todos dedicados exclusivamente ao rap. Uma enxurrada de discos rompeu

27 GALVÃO, Tatiana Verônica Bezerra. Op. Cit, p. 7.

Page 20: Monografia -Monique Barcellos

20

sedimentadas barreiras de distribuição em lojas e vem alcançando expressivos níveis de

venda. A música pop incorporou definitivamente o gênero, dando popularidade a grupos

como O Rappa e os paulistas do Charlie Brown Jr.28

O Black Rio, como anteriormente citamos, foi um movimento que atualmente só

existe como nostalgia quase surrealista. Já com o hip-hop, a proposta similar tomou um

ar bastante real em 2001.

“Levinson e D2 lançaram o CD ‘Marcelo D2 Apresenta Hip Hop Rio’. O disco reúne uma dúzia de rappers, com os raps intercalados por intervenções de D2, que participa de uma faixa individual, intitulada ‘A maldição do Samba’. A ‘maldição’ do samba seria os descendentes de velhos sambistas trocarem o tamborim pelo scratch do pick-up do hip-hop? ‘O hip-hop fala a língua da galera, tem mais a ver com o que ela vive’, teoriza D2.” 29

Segundo a matéria no site “Clique Music”, essa coletânea não apenas tomou ares

de realidade, como se tornou uma referência na discografia do rap nacional e ainda na

cultura popular. Essas novas interações passam a mostrar que, na sociedade

contemporânea, o exercício da cidadania já não se dá apenas pelos direitos

fundamentais, mas também por meio do poder de consumo de bens simbólicos

possibilitado pela visibilidade midiática.

O site “Real Hip-Hop” mostra outra organização que também fala em nome do

movimento hip-hop é a Central Única das Favelas (Cufa), que criticou os rappers que

participariam do “Hip-Hop Manifesta”. As críticas a respeito da ideologia do evento

recaíam sobre o fato de ser um show de grande porte, mas que não representava o

público da periferia. O fato de ter se tornado um evento meramente comercial gerou

polêmica perante os adeptos brasileiros da cultura que começam a contestar a força do

hip-hop como movimento de resistência e cultura de rua.

“(...) Hoje, a grande discussão que vem tomando espaço nas reuniões de rappers e militantes é a banalização do movimento causada pelas programações de rádios e a grande quantidade de festas que se auto-intitulam hip-hop, quando na verdade o movimento vai além. Além da polêmica causada pelo evento Hip-Hop Manifesta que investiu 4,2 milhões de reais por grandes

28 Ver site Clique Music. Disponível em http://cliquemusic.uol.com.br/br/Retrospectiva/Retrospectiva.asp?Nu_materia=1343 29 Jornal do Commercio Recife. Disponível em http://www2.uol.com.br/JC/_2001/2010/cc2010_8.htm

Page 21: Monografia -Monique Barcellos

21

empresários, o teor político do rap o dos outros elementos do movimento podem estar perdendo a força.” 30

Como informa o site da UNE (União Nacional de Estudantes), no Rio de Janeiro

foi criada a Liga dos MCs em 2002, numa sinuca no bairro da Lapa, local onde

aconteceu a primeira batalha de rappers (batalha de rimas improvisadas, o chamado

Freestyle) a "Batalha do Real". O evento Liga dos MCs - Primeiro Campeonato Oficial de

Freestyle do Rio. L.A.P.A. (Lugar Aberto Para Amigos), reuniu alguns rappers como Aori,

Marechal, o paulista Xis, Don Negrone, entre outros. O segundo encontro, produzido

pela Brutal Crew Produções, aconteceu em outubro de 2004, no Teatro Rival Br, no Rio

de Janeiro, tendo como um dos organizadores o rapper Aori. 31

O site “Real Hip-Hop” mostra que um dos pontos culminantes do reconhecimento

da mídia convencional para com o hip-hop seria o Hutúz32, que há oito anos cria festivais

de cinema, hip-hop, batalhas de MCs, DJs, B. Boys, seminários, entre outras

modalidades de cultura. O prêmio reverencia a cultura hip-hop em uma grande festa com

entrega de prêmios em várias categorias da criação. Em 2002 o saudoso rapper

Sabotage recebeu dois prêmios Hutúz, sendo um na categoria "Personalidade do Hip-

Hop" e ou outro na categoria "Revelação".

O projeto é idealizado por Celso Athayde, produtor brasileiro, empresário do

rapper MV Bill e dos Racionais MC’s e co-autor dos livros “Falcão: Meninos do Tráfico” e

“Cabeça de Porco”. É co-produtor e co-diretor, dos filmes “Falcão - Meninos do Tráfico” e

“Falcão - O Bagulho é Doido”. Criador da primeira Liga Brasileira de Basquete de Rua

(Libbra) e das Sebar (Seletivas Estaduais de Basquete de Rua) também e fundador da

Cufa (Central Única das Favelas). Cuida ainda da agenda de nomes do hip-hop

brasileiro, como Nega Gizza e MV Bill.

As formas de organização do hip-hop no Brasil demonstram que o movimento se

mostra cada vez mais independente de indústria fonográfica e não gera lucro para

30 FIDELES, Nina. O movimento Hip Hop e a luta diária de periferia brasileira. Site Real Hip Hop, 2003. Disponível em http://realhiphop.com.br/ 31 Ver site da União Nacional dos Estudantes. Disponível em http://www.une.org.br/home3/cultura/cultura_2007/m_10226.html 32 O prêmio é parte do projeto Hutúz – que pela gíria significa “força” e ao mesmo tempo faz alusão aos tribalistas africanos.

Page 22: Monografia -Monique Barcellos

22

grande maioria dos adeptos. A reportagem especial da revista Carta Capital de 3 de

outubro de 2007 tem como tema principal a forma com que membros da cultura hip-hop

criam sustentabilidade através de organizações que trabalham fontes de renda e

emprego no Brasil e na América Latina, em suas grandes capitais e periferias. A maioria

das oficinas está nominada às respectivas redes de organização – espécies de frentes

de trabalhos organizados – tendo como matéria-prima a arte de rua e como principal

veículo o hip-hop.

Desde o pólo de confecção de camisetas – a exemplo de Recife, onde reside o

núcleo da “Rede Resistência Solidária” – que emprega artistas plásticos (em maior parte

os grafiteiros) além das costureiras das comunidades, que são contratadas. Como

mostra a reportagem, o Movimento Enraizados, da Baixada Fluminense, liderado por

Flávio Eduardo de Assis, o Dudu do Morro Agudo, tem como principal fonte a loja virtual,

com mais de 600 mil acessos mensais e o movimento hoje tem filiados em mais de 16

estados.

Afinal, dá para sobreviver do rap no Brasil? Essa é a pergunta mais intrigante ao

se pensar em música original das periferias. A maioria dos grupos possui produções

independentes, onde a renda dos shows (somada à renda das grifes e selos) chega a

capitalizar as produções de discos e também os eventos. Através de políticas

alternativas, o rap é um gênero musical, o hip-hop da periferia (que não o estilo gangsta

projetado pela grande mídia) é um movimento que continua vivo, mas que na mesma

medida não gera lucro.

A revista mostra que, ao contrário dos Estados Unidos, no resto do mundo, falar

de hip-hop é falar do povo pobre. Ao mesmo tempo, hip-hop é um termo amplo que

abrange uma subcultura associada à vida social, à dança e à moda dos jovens negros e

latinos (principalmente, mas não de modo exclusivo) urbanos dos Estados Unidos dos

anos 1980 até os dias atuais. Inclui o rap, a dança break, o grafite, os clubes, os DJs e

os trajes esportivos (bonés, tênis, etc.). O movimento hip-hop incorpora um pós-

modernismo altamente sofisticado além de uma exigente prática política consciente, uma

reciclagem e uma reiteração do passado.

Page 23: Monografia -Monique Barcellos

23

A expressão do hip-hop no Brasil e na América do Sul, principalmente, -

independente de vertentes que visam o lucro e projeção na mídia - é o estilo do gueto

que produz para o consumidor do gueto, como indica a reportagem.

“Viver de hip-hop ainda é para poucos, mas experiências como a do Recife e a de Nova Iguaçu mostram uma força econômica embrionária que pode revelar novos elementos desse movimento cultural”. 33

Podemos observar que a força do hip-hop não pode ser medida somente em

números de vendas de CDs, roupas, ingressos de shows ou empregos, mas no valor

incorporado a tudo isso, ou seja, a sustentabilidade cultural. Segundo Magalhães,

enquanto um produto de luxo incorpora valores culturais como sucesso e status, os

produtos do hip-hop – com um preço bem mais acessível – carregam uma visão de

mundo que transforma o consumidor em cidadão“ - explica.34

O Movimento Hip Hop Organizado (MHHOB) é o indício de como o Nordeste está

bem organizado politicamente. A reportagem demonstra que essa frente tem outras

várias filiadas espalhadas por todo o Brasil. O rap vira empresa e observando a

realidade ao redor, os articuladores do movimento no Brasil cada vez mais lançam mão

de montar suas próprias “siderúrgicas”. As estruturas de aço, que têm como alicerce o

rap, o break e o grafite resistem à falta de estrutura, de conhecimento de empresas que

possam patrocinar seus projetos. Tomam força através do planejamento social que os

próprios adeptos traçam para levar projetos adiante, tomando como foco principal o que

chamam circuito favela35.

Na Argentina e na Colômbia as políticas relacionadas ao movimento hip-hop têm

uma abordagem semelhante ao que se vê nas periferias do Brasil como mostra a

reportagem da Carta Capital.

“Na Colômbia, indagado se conseguia viver de hip-hop, um dos integrantes do Chinatown, o mais conhecido grupo de rap do país, responde bem humorado: ‘Sim. O rap dá muita vida. O que não dá é dinheiro’. De fato, na capital, Bogotá, hip-hop é assunto de

33 TONETO, Bernardete, LEMOS, Jaqueline e CARRARO, Renata. O hip-hop sobrevive. Revista Carta Capital. p.12 34 Idem, p.12. 35 São os eventos de hip-hop produzidos e direcionados pelas favelas e para as favelas. Uma espécie de intercâmbio cultural das periferias.

Page 24: Monografia -Monique Barcellos

24

gente pobre. Do total de 44 milhões de colombianos, os jovens que integram os 3 mil grupos locais amontoam-se entre os 70% de pobres e miseráveis.”36

Quando se fala em marcas, tanto nos condomínios de classe média, quanto nas

favelas do mundo, os autores citam como exemplo Nike, Fórum e Triton. No caso da

influência do hip-hop, uma marca original da favela Capão Redondo, Zona Sul de São

Paulo, passou a rivalizar com os gigantes das marcas. O empresário e ativista do hip-

hop Reginaldo Ferreira da Silva, vulgo Ferréz, tornou-se referência para os jovens com a

grife 1daSul.

Consciência e resistência sempre foram armas de Ferréz e coerentemente sua

marca foi pensada para valorizar e desenvolver a auto-estima aos moradores de um dos

bairros mais violentos da periferia da capital paulistana. A matéria da Carta Capital

mostra as relações que dão base a esse tipo de desenvolvimento sustentável. Ferréz em

entrevista para a revista Carta Capital, afirma que o negócio que idealizou em 1999, hoje

gera renda para mais de 80 pessoas. “O desafio era criar uma marca de periferia que

fosse usada com orgulho pelos moradores. Atualmente, mais de 70 lojistas querem

comercializar a grife 1da Sul.”37

De acordo com a reportagem, a exemplo desses grupos, o que todos eles têm em

comum é a arte com engajamento já que, além da preocupação com o âmbito social e

musical, o principal objetivo é trabalhar em coletividade. A reportagem considera que,

tendo em vista tantos trabalhos independentes, cada qual com suas organizações, em

um cenário musical onde pelo menos 70% das transações internacionais de música

ficam sob o poder de quatro grandes empresas multinacionais, os olhos dos

economistas se voltam para o hip-hop, como se enxergassem uma alternativa para dar

continuidade à promissora sustentabilidade cultural.

“(...) Colocam-no sobre o grande guarda-chuva da ‘economia criativa’, que faz circular cerca de 8% do PIB dos países desenvolvidos. No Brasil, a discussão ainda está no começo.”38

36 Idem. p.12 37 Idem. p.12-13 38 Idem. p.14

Page 25: Monografia -Monique Barcellos

25

A reportagem conclui que a mudança social só se fará expressiva a partir do

momento em que houver o reconhecimento social, ou seja, o reconhecimento como

profissional - tanto por parte do artista como um agente de mudança quanto do público.

Quando o ativista do movimento deixa de ser o que a reportagem denomina “maluco

simpático” e passa a ser encarado como um profissional sério e competente.

Segundo Gorczevski, música rap é um elemento que desenvolve um papel central

nas culturas juvenis e na formação das novas identidades. Nesse sentido, a pesquisa

serve como instrumento importante para entender a rede que conecta o rap, a cultura de

mídia e a juventude da periferia.

O que é profissionalismo e organização para uns é tido como industrial e corrupto

por outros. Ao contrário, por exemplo, dos rappers americanos 50 Cent e Ja Rule, que

para alguns hip-hoppers se camuflam no estilo gangsta rap para lucrar milhões - o que

ao mesmo tempo também é o objetivo de muitos rappers que estão no underground -

muitos adeptos vêm com a inventiva de prosperar de forma indiferente ao que se pode

categorizar como “rap industrial”, ou o conhecido “hip-hop da moda” (Há nesse termo

uma confusão sobre o significado de rap e hip-hop) que engloba artistas das gravadoras

majors. Na realidade o hip-hop nos Estados Unidos virou sinônimo de música popular e

conseqüentemente lucro nas vendas.

Os grupos de hip-hop brasileiros além de outros países da América Latina têm

mostrado seriedade na luta pela sobrevivência do hip-hop, através de um “rap

conceitual” como expõem nas suas práticas culturais com um novo tipo de

desenvolvimento sustentável dentro dos recursos tecnológicos e mídias alternativas

(Rádios Comunitárias, e Internet, por exemplo).

No entanto, essa sustentabilidade cultural deve estar associada a uma

organização competente, que atenda a voz das periferias para o mundo. Em uma

medida evolutiva, os especialistas estão atentos a tais práticas econômicas através de

políticas alternativas, o que indica socialmente, um caminho positivo para o trabalho

coletivo que a cultura hip-hop procura abraçar.

Page 26: Monografia -Monique Barcellos

26

II

Rap Carioca X Cultura da Mídia: Negociando territ órios

Para compreendermos essa sustentabilidade cultural é preciso consideramos que

o hip-hop serve-se de um complexo de expressões culturais e que estas são

alternativas. Tais expressões são construídas pela cultura que vai das periferias aos

grandes centros urbanos e se consolida independentemente da indústria cultural, por

exemplo.

Essas expressões são construídas por uma ideologia cultural que cria a auto-

afirmação do sujeito como agente social a despeito de sua identidade. De acordo com a

reportagem do livro “Hip Hop: A Periferia Grita” esta identidade é concebida

positivamente ou não pelos outros (tanto aqueles que não são da periferia como também

os representados na manifestação cultural do hip-hop). Através do discurso que costuma

questionar a sociedade contemporânea, os rappers procuram se afirmar como sujeitos,

muitas vezes com a postura avessa aos mass media. Geralmente procuram refletir o

contexto e condição social em que a população da periferia vive.

“A imagem dos Racionais não é uma parada de imitar americano, é uma cara fechada que reflete a cara de São Paulo. Aqui não é praia, não é festa o tempo todo e, por isso, a música também não é alegre como o miami bass.” 39

O produtor musical Milton Sales, considerado o “quinto homem” do Racionais

MCs, devido ao envolvimento notório ao grupo, acredita que o rap é um produto gerado

por um sistema de cultura”40. O livro reflete que o elemento musical do hip-hop se

relaciona com a indústria, mesmo que muitas vezes busque formas de produção,

divulgação e circulação alternativas, que nada mais são do que subsistemas da indústria

cultural.

De acordo com os autores do livro, percebe-se uma relação de ambigüidade

entre o rap e a mídia, na medida em que o rap no Brasil se relaciona de uma forma

39 SALLES, Milton apud ROCHA, Janaína, DOMENICH Mirella, CASSEANO Patrícia. Hip Hop: A periferia grita. Fundação Perseu Abramo, 2001, p. 134. 40 Idem, p. 136.

Page 27: Monografia -Monique Barcellos

27

particular com a indústria. Lida o tempo todo com a tecnologia que está na mídia, mas

dá um sentido específico para essa tecnologia, a adapta ao seu contexto, e acaba

dando-lhe outro significado. Dentro desse processo existem negociações entre esses

dois elementos, tendo em vista que o próprio rap é feito a partir de produtos da mídia.

“Uma parte significativa das pessoas que criam e pensam a

cultura (ou movimento) hip-hop trata tais assuntos quase como um tabu. Manos e teóricos parecem preferir ignorar que o rap vende milhões de discos pelo menos desde o estouro de “Walk This Way”, do Run DMC, em 1988; que em 2001 o rapper branco norte-americano Eminem foi o principal vencedor do ultra-conservador prêmio Grammy.” 41

O livro analisa que grande parte dos hip-hoppers prefere ficar indiferente ao fato

de que, se não fosse o poder de divulgação dos meios de comunicação de massa, as

mensagens, os símbolos e as formas artísticas do hip-hop não teriam circulado pelo

mundo e, por exemplo chegado ao Brasil. Os rappers fazem um esforço de trabalhar

com a criação de rádios comunitárias, além dos recursos da tecnologia, como por

exemplo a utilização da internet para a produção de programas em rádios online, para

divulgação dos eventos de hip-hop e produção de discos.

Um exemplo dessas práticas alternativas é o MC e produtor Iky Castilho (Café

Crime) que, em 2002, juntamente com MC Marechal, criaram a “Batalha do Real” num

bar vizinho ao estúdio. Fortaleceram a cena após as famosas festas do Zoeira Hip Hop,

também na Rua do Riachuelo – Lapa. Em 2005 foi lançada a “Iky’x Tape Vol.01” (Café

Crime), o que resultou do material gravado no estúdio em 2004, mixada por Dj Babão

(Inumanos).42

De forma a refletir e analisar teoricamente a manifestação cultural do hip-hop a

partir da premissa de que o movimento expressa a busca pela identidade de uma nação

excluída, no caso a periferia, tomamos como referência o discurso do teórico Stuart Hall.

No primeiro capítulo do livro intitulado “A Identidade em Questão” o teórico

explora a identidade cultural contemporânea, seus principais aspectos e conseqüentes

mudanças perante a história da cultura moderna. Hall defende o argumento de que a

41 Idem, p. 133. 42 Mais informações no site de Iky Castilho. Disponível em http://www.myspace.com/ikycastilho

Page 28: Monografia -Monique Barcellos

28

sociedade atual sofre constantemente transformações em sua identidade cultural,

quando afirma que:

"(...) Um tipo diferente de mudança estrutural está transformando as sociedades modernas no final do século XX. Isto está fragmentando as paisagens culturais de classe, gênero, sexualidade, etnia, raça e nacionalidade(...). Estas transformações estão também mudando nossas identidades pessoais, abalando a idéia que temos de nós próprios como sujeitos integrados. Esta perda de um 'sentido de si' estável é chamada algumas vezes de deslocamento ou descentração do sujeito.”43

A partir de um ponto central, o qual o autor se refere à descontinuidades, propõe-

se a examinar mais profundamente as mudanças no conceito de identidade. Isto implica

em explicitar como o sujeito do Iluminismo transcendeu para o sujeito sociológico e

depois para o “pós-moderno”. Tendo em vista tais transições, o autor pretende explorar o

pertencimento a uma cultura nacional, como aspecto da identidade cultural moderna e

como os processos de mudanças – uma mudança que efetua um deslocamento -

compreendido no conceito de “globalização” estão afetando isso.

Segundo o filósofo norte-americano Douglas Kellner, com o ritmo e a poesia, os

rappers colocam seus ouvintes diante de uma colagem de sons urbanos, combinando

seleções de rádio, televisão, discos populares e outros sons conhecidos que,

executados em altíssimo volume, são pontuados pelo discurso de vozes distintivas e

agressivas. Nesse elemento a voz é o recurso principal, e as letras características

transmitem experiências e, muitas vezes, mensagens.

Um exemplo claro da crítica aos mass media está no conteúdo do seguinte trecho

da música do rapper e raggaman niteroiense Gustavo “Black Alien” Ribeiro. É notável a

rima lírica envolta à auto-afirmação como sujeito, o que tem em mente e a perspectiva

da realidade cotidiana:

“(...) Enquanto o mundo muda pela música/ Preparo poesia de aço na minha siderúrgica/ Um hábito noturno inspirado em Saturno/ E seus anéis em torno, não há retorno/ Eu sempre estive aqui, no verbo cru que nem sashimi/ A verdade virá à tona pelo parto, infarto no miocárdio/ Revolução não será televisionada nem virá pelo rádio/ Metal

43 HALL, Stuart. A Identidade Cultural na Pós-modernidade. p. 9 -10.

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29

inox, instrumental e mental na jukebox/ Golpe baixo, perde ponto, é que nem no boxe/ Prepare a esquiva, informação real pro povo à deriva/ Na terra da terra improdutiva.” 44

Kellner diz que tal elemento musical do hip-hop expressa um senso bem

característico de lugar e tempo. O rap é um modo de falar - e não de cantar - que

freqüentemente utiliza rimas complexas, embora não ortodoxas. Em geral é executado

em andamento rápido, em staccato45 e a combinação complexa de rima e ritmo pode

criar tensões entre a espontaneidade da performance e a constância da letra. As

canções são freqüentemente longas e às vezes sinuosas, continuando uma tradição

afro-americana de contar histórias longas e complexas com variações individuais e

refrões em solo repetidos indefinidamente como no rag-time, no jazz e no blues.

No sentido com que o autor usa o termo “pós-modernismo”, defende que o rap é

modernista, por ser forma extremamente expressiva e os rappers têm vozes, estilos e

mensagens distintas, muitas vezes relacionadas com a política moderna. Segundo ele,

em oposição aos textos pós-modernos fragmentários, desconexos, planos e

unidimensionais, que só se referem a si mesmos ou carecem de profundidade de

significado, a colagem da maioria dos raps muitas vezes representa uma declaração

política, e não fragmentos sem sentido ou com sentido minimalista. O rap

freqüentemente se identifica com determinada política, como o radicalismo negro dos

anos 1960 ou o afrocentrismo, e não com o esvaziamento político, como em alguns

textos pós-modernos.46

Entendemos que os meios de comunicação de massa detém o poder de

gerenciamento dos sentidos, visto que a mídia trabalha com estereótipos que acabam

enquadrando a cultura hip-hop em um padrão não realista e nesta cultura, ao contrário,

não existe um padrão, ou uma fórmula, pois ela atravessa um processo híbrido. Diz que

a cultura hip-hop trata-se de uma combinação das tradições afro-americanas com estilo

contemporâneo, misturando a voz humana e tecnologia, sons existentes e fragmentos

sonoros da mídia, música e ruído dissonante.

44ALIEN, Black. Trecho de “From Hell do Céu”. Babylon By Gus Volume 1 – O Ano do Macaco: Deck Disc, 2004. 45 Técnica musical e vocal que tem uma articulação na qual as notas devem ser alcançadas com suspensões entre as mesmas, executando assim as notas em curta duração.

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30

Percebemos que o hip-hop é uma manifestação contra-hegemônica e de

hibridismo característico que a cultura de mídia tenta enquadrar, silenciando os

discursos nos padrões da ordem social. Um exemplo da resistência da cultura de rua é o

rapper Gas-PA, ativista da frente LUTARMADA, que em entrevista à revista Fazendo

Media justifica a identidade contestadora dos representantes do movimento:

“São várias cabeças pensando coisas bem diferentes. (...) O hip-hop está a anos luz de ser homogêneo. Então é bom observar o que fazem determinadas correntes. Hoje, existem 5 organizações nacionais de hip-hop e o LUTARMADA é filiada a uma delas. E o nosso objetivo é a revolução, o rompimento com essa estrutura vigente, uma sociedade sem classes. É clichê? Pode ser, mas se nossa realidade também é, qual o problema?”47

Como sustenta Kellner, há grande distinção entre os rappers e os praticantes de

rock, do soul ou da música popular comercial. Também há diferença entre os grupos

centrados nos guetos, que incitam as reformas ou à revolução nas comunidades, e os

grupos centrados na cultura africana, que incitam à criação de uma nação africana

separada. O autor defende que níveis de radicalismo diferem no rap: muitas vezes se

define mais em apresentações ao vivo, que tendem a ser mais cruas e extremadas; suas

músicas às vezes não são tocadas no rádio por serem radicais.

Debruçarmos-nos sobre a análise da juventude carioca que, de acordo com o

antropólogo Hermano Vianna, a totalidade da vida desse grupo social poderia ser

definida com palavras que identifiquem a juventude em geral, que são: “transitoriedade,

turbulência, agitação, tensão, possibilidade de ruptura, crise, conflito, instabilidade”.48

Vianna atenta para o fato de que a vida social deve caracterizar-se por sua

diversidade e não pela busca de uma uniformidade. Para ele, a “contracultura” carioca

que aprendeu táticas de guerrilha nos anos 60, hoje encontra terreno mais fértil em

cursos de teatro, manifestos musicais além de projetos sociais, que o autor denomina

“mediações intergaleras”, citando grupos como AfroReggae.

De acordo com o autor de “Galeras Cariocas”, novas identidades são colocadas a

46 KELLNER, Douglas. Op. Cit., p. 246. 47 ZORNITTA, Bruno. Entrevista: Gas-PA, do Movimento Hip-Hop. Disponível em http://www.fazendomedia.com/novas/movimentos251005.htm 48 VIANNA, Hermano. Galeras Cariocas. Territórios de conflitos e encontros culturais. p. 14-15.

Page 31: Monografia -Monique Barcellos

31

prova e que apesar dessa pouca atenção dos antropólogos, os ‘jovens’ do Rio

continuam produzindo incessantes símbolos (muitas vezes conflitantes entre si) de seu

vigor cultural e exportando ‘modismos’ (que nunca são ‘meros’ modismos) para todo o

País.

“A idéia da crise e da desorganização social foi objeto de muitas críticas pelo seu inegável compromisso com o arcabouço teórico do funcionalismo e, portanto, com uma idéia consensual de ordem e uma forma homogênea de organização”.49

Vianna argumenta que, como decorrência desses conceitos, surge o processo de

rotulação dos jovens que moravam em guetos ou bairros pobres, focalizando

principalmente as práticas governamentais, policiais e judiciais que classificavam os

jovens de etnias inferiorizadas ou camadas pobres como “delinqüentes”, ainda que

fossem simplesmente jovens vivendo os conflitos próprios da idade. O autor traz a

“teoria do rótulo”, cuja vantagem principal é lembrar que as organizações juvenis não

existem isoladas do resto da sociedade num contexto institucional com uma trama de

interações simbólicas entre os jovens que pertencem a essas organizações e os

representantes da ordem e da lei.

Tomando ainda o referencial de Hermano Vianna, todas as teorias foram

criticadas pelo seu compromisso com o positivismo que transformava as pessoas em

objetos e seu comportamento em fatalidade ou determinação, dificultando o

entendimento delas como sujeitos que participariam de forma ativa nas suas escolhas e

ações, apesar das constrições e pressões de forças de várias ordens. Como resultado

gerou-se um olhar sobre a criação, por sujeitos ativos, se práticas “desviantes”,

“delinqüentes” ou “criminosas” que estariam de algum modo articuladas com as práticas,

formas de organização e valores da sociedade mais ampla onde organizações juvenis,

criminosas ou não, apareceram.

O cenário cultural do hip-hop no Brasil com o discurso sobre a relação do rap com

cultura da mídia tende a ser mais voltado para militância. Quando chegamos nesse viés,

podemos identificar a idéia do estigma e da identidade social tal qual o teórico Erving

Goffman demonstra. Diz que “a sociedade estabelece os meios de categorizar as

49 Idem, p.18.

Page 32: Monografia -Monique Barcellos

32

pessoas e a totalidade de atributos considerados normais para os membros de cada

uma dessas categorias”50. Conseqüentemente baseando-se nessas preconcepções, nós

as transformamos em expectativas normativas em exigências rigorosas de se posicionar

socialmente.

No caso das culturas de minorias, mais especificamente, no Rio de Janeiro,

encontramos indícios da estigmatização territorial quanto à criminalização dessas

manifestações culturais periféricas, além da criminalização desses movimentos sociais

por parte dos mass media. Micael Herschmann aponta esses indícios através do

discurso das galeras cariocas sobre a realidade urbana:

“Ao invés de reforçarem a imagem de um ‘país libertário/ malandro’, as representações promovidas pelos funkeiros sugerem um país hierarquizado e autoritário. Revelam assim os conflitos diários enfrentados pelas camadas menos privilegiadas da população, como: a repressão e os massacres policiais, a dura realidade dos morros, favelas e subúrbios, a precariedade e ineficiência dos meios de transporte coletivo, o racismo e assim por diante.”51

Tanto no caso do funk carioca, como o rap, além da maioria das manifestações

culturais minoritárias o autor nota a postura da resistência e auto-afirmação, onde a

mídia, por outro lado, constitui uma arena na qual não só diferentes narrativas

concorrem engrenando diferentes sentidos, como também o discurso em si briga

perspectivas diversas e, muitas vezes, posições até contraditórias.

Herschmann no artigo “Linguagens da Violência - As imagens da galera funk na

imprensa”, busca afastar o trabalho da visão hegemônica bastante mecanicista que

encara a violência como uma situação de exceção. Classifica os acontecimentos

violentos como uma prática recorrente e fundamental para a dinâmica social sempre

presente em distintas sociedades e diferentes contextos, como um importante recurso

que vem garantindo a perpetuação e/ou a renovação social. Dessa forma, o autor

percebe a violência não apenas como expressão de dissidências ou forma de

perpetuação, mas também como fonte de renovação e de vida, considerando que a

violência é uma das peças fundamentais no dinamismo das sociedades.

50 GOFFMAN, Erving. Estigma. p. 11. 51 HERSCHMANN, Micael [et al.].Linguagens da Violência - As imagens da galera funk na imprensa. p.67.

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A questão da violência, tal como se apresenta nos espaços urbanos brasileiros,

deixa entrever, por trás de suas manifestações freqüentes, se não uma reivindicação por

ordenamentos sociais mais justos. Neste contexto marcado pelo descaso, o autor

considera a violência desencadeada pela sociedade, no Brasil, não só como indícios de

uma “desordem urbana”, mas também, como uma forma de expor a insatisfação perante

uma estrutura autoritária e clientelista que promove a exclusão social.52

De acordo com Herschmann, podemos trabalhar com a hipótese da agenda-

setting, o que nos leva a avaliar em que medida a capacidade dos media em dizer aos

seus leitores sobre que temas devem refletir”. Um exemplo prático dessas práticas

midiáticas é a produção do Hutúz, que acontece há pelo menos oito anos durante todo o

mês de novembro e circula diversos espaços culturais simultâneos pela cidade, da

periferia ao centro.

“De fato, o rap muitas vezes é um bode expiatório para os verdadeiros problemas de uma sociedade extremamente dividida, onde os conflitos entre raças, classes e sexos são por demais explosivos. (...) Vê-se que os elementos mais extremos e ofensivos do rap são sintomáticos dos reais problemas que precisam ser resolvidos, e a simples proibição do rap não trará a solução desejada”.53

Kellner identifica que, com um histórico cultural cercado de segregação e

discriminação, os hip-hoppers usam como referência líderes da luta política e armada

como Martin Luther King, Malcom–X e Che Guevara. Também por meio desses recursos

tecnológicos subsistemáticos os rappers fazem uso da linguagem política, onde falam

sobre os grandes problemas enfrentados por essa população excluída e de maioria

negra. No Brasil este discurso não interessa muito à imprensa.

Para interrogar de modo crítico a cultura contemporânea da mídia, Kellner analisa

estudos do modo como a indústria cultural cria produtos específicos. Produtos esses que

reproduzem os discursos sociais inseridos nos conflitos e nas lutas fundamentais da

época. É importante percebermos de que modo tudo isso articula posições ideológicas

específicas e ajudam a reiterar formas dominantes de poder social, servindo aos

52 Idem, p. 171. 53 KELLNER, Douglas. Op. Cit., p. 246.

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interesses de dominação da sociedade, de resistência às formas dominantes de cultura

e sociedade, ou ainda se têm efeitos contraditórios.

O autor constata, a exemplo da manifestação sociocultural do hip-hop, uma nova

forma de entender o que significa cidadania em tempos globalizados, onde o consumo

passa a ser o modo mais eficaz de existir e ser notado em uma esfera pública,

iluminada. Nesse processo a mídia passa a ser um dos importantes intercessores de

uma forma de inserção social. Portanto, através de seus veículos (audiovisuais,

impressos, entre outros), constitui-se uma estrutura que alimenta e é alimentada pelo

cenário público, onde essa dimensão midiática, para um jovem excluído caracteriza-se

como um desafio.

Page 35: Monografia -Monique Barcellos

35

III

A Voz da Periferia Carioca no jornal O Globo

No capítulo, identificaremos a cultura hip-hop representadas no jornal “O Globo”,

abordando como as identidades se configuram nos textos do caderno cultural do jornal

de maior circulação do país. Os resultados foram alcançados com a utilização das

noções de estilos de vida e cultura do consumo. Através da análise do caderno cultural,

procuramos exemplificar de que forma a cultura da mídia aborda as manifestações

culturais promovidas pela cultura hip-hop.

Em resposta ao silenciamento dos mass media a respeito das produções de

periferia, conforme afirma a doutora em Comunicação Deisimer Gorczevski, para os

produtores culturais do hip-hop, os programas nas rádios comunitárias e emissoras de

televisão, os sites, selos de gravadoras independentes, revistas e fanzines representam

uma estratégia que esperam que garanta não só a visibilidade pública, no sentido de

afirmar uma imagem diversa da estigmatizada pelos meios, mas também um relativo

controle do seu trabalho, ou seja, do sentido e significado da produção que realizam.54

3.1. Análise: Revista “Rio Show” X Prêmio Hutúz de Música

Como vimos no capítulo anterior, o discurso segue norteado pela lógica dos

estudos culturais e sociológicos de autores como Micael Herschmann para tratar a

juventude; Stuart Hall para conceituar a questão de identidade e Douglas Kellner para

ilustrar a conceituar da mídia. Ainda com base nos estudos que se seguiram,

procuramos refletir as manifestações do hip-hop no contexto do rap carioca pela mídia

impressa através da análise do caderno cultural do jornal “O Globo”. Procuraremos

ainda, evidenciar a conjuntura dos trabalhos em torno do hip-hop com alguns dos nomes

mais ativos do rap carioca, tendo como objeto principal os eventos do “Hutúz”.

Page 36: Monografia -Monique Barcellos

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O cerne da pesquisa englobou duas vias: o hip-hop e a voz do rap como sinônimo

de criminalização perante a mídia; o hip-hop enquanto manifestação cultural da periferia.

Dialogando com a relação silenciosa da cultura da mídia diante do outro (no caso dos

hip-hoppers) propomos mostrar que existem universos pouco explorados, tomando como

exemplo os trabalhos sociais e projetos musicais sustentados pelo hip-hop ao longo da

existência no cenário cultural carioca.

Durante a realização, da presente pesquisa - datada de todo o mês de novembro

de 2006 - percebemos que as matérias sobre o os eventos do “Hutúz” estavam

distribuídas como informativo de “expediente”, em um formato de “classificados”,

evidenciadas nas editorias do “Segundo Caderno”, mais especificamente da coluna “Rio

Show”, homônima à revista em questão.

Suplemento que circula semanalmente às sextas-feiras, revista “Rio Show” possui

em média 50 páginas. Voltado para a classe média, aborda temas como gastronomia, e

eventos de entretenimento e lazer, como teatro, música e cinema, por exemplo. O que

evidencia e reforça a idéia de silenciamento dos media referentes à cultura de rua. A

pesquisa baseada em no tipo exploratória, em vista da análise do veículo em questão,

evidencia as relações de destaque e silêncio da cultura de mídia.

O caderno “Rio Show” – pesquisado de 3 a 24 de novembro de 2006 - teve as

matérias prioritárias ligadas à editoria de gastronomia, lazer e consumo em geral, como

comércio e entretenimento. Das notícias ligadas ao hip-hop, entre as quatro edições

publicadas nas sextas-feiras de novembro, todas possuíam anúncio de show do rapper

Marcelo D2, na casa de eventos Claro Hall. O show data de 16 de dezembro, estréia da

turnê “Meu Samba é Assim”:

“Meu Samba é assim/ Tá bom pra mim/ Dois toca-discos e um tamborim (...)/ No batidão, chora cuíca/ Erros e acertos parceiro, coisas da vida/ Mas quem diria?/ Que engraçado hein!/ Foi pra cadeia e agora bomba no rádio/ MD2 de novo, a voz do povo/ Do tiozinho mais velho ao moleque mais novo/ Trago cultura de um jeito simples/ Corpo fechado que não aceita revide.” 55

54 GORCZEVSKI, Deisimer. Op. Cit. p.2 55 D2, Marcelo. Trecho de “Meu Samba É Assim” – Cd homônimo: Sony-BMG, 2006.

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Marcelo D2 é o primeiro rapper brasileiro a ganhar uma biografia, lançada na

Bienal do Livro do Rio de Janeiro. Intitulado “Vamos Fazer Barulho - Uma Radiografia de

Marcelo D2” (Ediouro, 2007), o livro teve como estopim o álbum “À Procura da Batida

Perfeita” (2003). Segundo o jornalista e autor do livro, Bruno Levinson, também

organizador do festival Humaitá Pra Peixe, ao ouvir o disco ele sentiu que estava diante

de um artista que merecia ser homenageado. Atualmente Marcelo D2 tem uma carreira

solo bem-sucedida, enquanto os outros integrantes do Planet Hemp (grupo que D2

liderava) se dedicam a projetos solos menos popularizados.56

Um modelo textual foi publicado durante todo o mês de novembro na coluna do

“Rio Show”, salvando-se alterações de acordo com tipos de eventos ligados ao projeto

“Hutúz”, datas, e locais ao final do mesmo. Um exemplo é a publicação de terça-feira, do

dia 14 de novembro, localizado no “Segundo Caderno”, na categoria de “Eventos” que

datava a atração:

“Hutúz Festival – A sétima edição do evento dedicado à cultura hip-hop, que ocupa diversos espaços da cidade até 28 de novembro, apresenta festival de música e shows com rappers latino-americanos, além de seminários, mesas-redondas, cinema, batalhas de MCs, grafite e demonstrações de basquete de rua. Ter, ao meio-dia e às 18h e 30m, show com o grupo Los Hombres.

-Centro Cultural Banco do Brasil: Rua Primeiro de Março, 66, Centro – 3808-2080. Livre.”57

O periódico do dia 17 trouxe na revista “Rio Show” matéria de capa com

reportagem sobre grafite, intitulada “TÁ NA RUA” que faz uma espécie de mapeamento

dos grafites pelos bairros do Rio de Janeiro. Trouxe a foto-legenda: “Pintura do coletivo

“Nação Crew” ao lado da Fundição Progresso na Lapa” 58

A única matéria explicitamente agendada é datada do dia 20 de novembro, Dia de

Zumbi dos Palmares, abolicionista negro da época da escravidão no Brasil. A foto-

legenda foi publicada na editoria de cultura do caderno principal, “Segundo Caderno”,

intitulada “Viva Zumbi!”, que deu destaque na coluna “Gente Boa” para a rapper Negra

Rê:

56 Mais informações no site Clique Music. Disponível em http://www.allbrazilianmusic.com/artistas/planet-hemp.asp 57 Ver jornal O Globo – Segundo Caderno – Eventos. Publicado em 14 de novembro de 2006. 58 BRUM, Luciana. Capa - Rio Show. TÁ NA RUA - Conheça os grafiteiros que estão dando o que falar e saiba onde encontrar suas obras pela cidade. p. 27 – 32.

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38

“No último dia 4 Negra Rê desbancou 15 marmanjos que participavam de uma batalha de MCs, em Madureira. A rapper, que canta há 3 anos, era a única mulher da disputa. Teve dificuldade. O universo é masculino com confronto verbal, as mulheres não gostam muito. Na batalha não tem cavalheirismo. Eles agridem para inibir o raciocínio – diz. Quinta-feira ela disputa uma das categorias do Prêmio Hutúz, no Canecão. Rê ensina rap para as crianças na Rocinha, integra a banda Parvat, só de meninas, e lamenta o vazio do funk: “Não querem falar dos problemas, só bobagem. (Foto – Destaque (Legenda: Negra Rê: rap para mulheres)”59

De acordo com a lógica de Micael Herschmann, tanto as manifestações do funk

quanto do hip-hop parecem expressar e sintetizar, nas letras e na diversidade de sons e

gestos, o novo ambiente cultural urbano brasileiro contemporâneo. Permitem esboçar

um mapa da multiplicidade de territórios presentes nas cidades do Rio de Janeiro e São

Paulo, ou melhor, permitem compreender um pouco da emergente dinâmica cultural

destas “cidades-vitrines” do País.60

Percebemos que, por mais que os eventos sejam de certa forma evidenciados no

jornal, não há nessa exposição um compromisso por parte dos meios de comunicação

de massa, especificamente dos cadernos de cultura do Rio em legitimar as produções

da periferia como algo que mereça destaque, ou diante de uma relevância social.

Eventos mais sofisticados a exemplo do Hutúz não aparecem com a mesma freqüência

em que são realizados e muito menos contextualizados para os mass media.

3.2. Rap na Mídia: o silêncio que potencializa o gr ito.

O hip-hop torna-se o mais complexo objeto de signos que se transformam em

ferramentas para a expressão de contestação, resistência da cultura de rua através de

manifestações pacíficas. Esses eventos vêm ajudando a cultura de rua a penetrar em

meios mais conservadores, a exemplo do rapper Marcelo D2, e MV Bill, que aparecem

59 Ver matéria – Viva Zumbi! – Conheça os personagens principais das festas que comemoram hoje o Dia da Consciência Negra. Segundo Caderno, p.3. 60 HERSCHMANN, Micael. O outro no Brasil contemporâneo - O funk e o hip-hop invadem a cena. 2. ed. Rio de Janeiro: UFRJ, 2005.

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39

em programas como o Fantástico e Domingão do Faustão, da rede Globo.

Apesar de a mídia ser um espaço com inúmeras limitações e formatos, voltada

para a elaboração de imagens normalizadoras, o teórico Micael Herschmann afirma que

ela também produz lacunas nas quais emerge o outro (excluído), constituindo também

um espaço fundamental para a percepção das diferenças. No caso dos funkeiros,

analisado pelo autor - assim como outros grupos de periferias, incluindo-se os rappers –

na medida em que a mídia os torna “visíveis”, permite-lhes, de certa forma, denunciar a

condição de excluídos e reivindicar cidadania como Black Alien explicita na música:

“Doa a quem doer/ Eu não acredito em você/ Não acredito no sucesso/ Não acredito na TV./ Não acredito no que me vem impresso/ Acredito em ordem e progresso quando o povo tem acesso ao ingresso (...)” 61.

Em seu artigo, Deisimer Gorcsevski afirma que esse tipo de discurso, que envolve

a relação do rap com a mídia e a indústria cultural, expõe um viés um tanto militante. A

ênfase no domínio de todos os estilos musicais por parte desses monopólios midiáticos

nacionais, parece ser um forte argumento que interfere e faz escola junto aos hip-

hoppers.

Segundo a autora, o modo geralmente avesso dos rappers de lidar com os

grandes monopólios da comunicação, no Brasil, resulta na admiração de uma grande

parcela de simpatizantes. Eles alteram, inclusive, o modo como a grande maioria dos

hip-hoppers age diante da mídia, seja ela grande, nacional ou regional. Envolve ainda

condutas que geram perturbações, tanto dentro da própria cultura, como em termos de

crítica do meio externo. 62

Diante dos espetáculos agendados pela mídia, poucos são os rappers que

ganham espaço, tampouco esse espaço é democratizado pela indústria cultural, mais

especificamente quando se fala em rap no Rio de Janeiro, seguem exemplos mínimos,

enquanto os demais pertencem a subsistemas de um mesmo circuito.

61 ALIEN, Black. Trecho de “Umextrapunkprumextrafunk”. Babylon By Gus Vol.1 – O Ano do Macaco: Deck Disc,2004. 62GORCZEVSKI, Deisimer. Op. Cit. p.2

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Um exemplo é o rapper carioca Aori, também conhecido como MC Lapa -

começou em 1998, e em 2000 conheceu Marcelo D2 e tornou-se seu rapper de apoio

nos shows:

“Eu me sinto fraco, longe, saudade dos Arcos e do Bonde, Lapa, bem-vindo aonde os ratos se escondem. / Espaço da cidade que pra mim é um marco, não é viagem, toda vez que eu parto, eu nasço, (...)/ Mas eu me sinto forte, perto, dos amigos, no Rio antigo, esse é meu abrigo, onde eu me identifico./ Esse é meu bairro, parceiro, da Riachuelo a Taylor,/ Todos tem que reconhecer que../ Quem faz a Lapa viver é nós!” 63

De acordo com o site do grupo, no mesmo ano, junto com o DJ Babão, Aori,

forma o grupo INUMANOS - Inteligência Natural União Maior Através de Núcleos

Originários do Subterrâneo. Aori também organiza eventos de rap, a exemplo da

segunda edição da Liga de MCs pela Brutal Crew Produções, realizada em 2004. Em

2006, os INUMANOS lançam o CD “Volume Dez” (gravado em 2002) que rendeu

“Prêmio Hutúz” na categoria de “Melhor Vídeo”.64

No caso do silenciamento do rap, a autora Deisimer Gorcsevski, destaca em seu

artigo que Mano Brown representa as classes excluídas batendo de frente com os

media, onde as formas de negociação e representação entre mídia e periferia conflitam

constantemente. Nesse sentido, a música de Mano Brown e dos racionais MCs deixa

claro o conflito entre o centro e a periferia, entre o Brasil dos incluídos e dos excluídos. O

grupo se transformou numa expressão das idéias sobre consciência negra no Brasil e

fez dessa percepção sua marca no rap brasileiro. 65

O rapper Mano Brown em uma das raras aparições na mídia, foi recentemente

entrevistado no programa Roda Viva da TV Cultura, e é um exemplo claro da postura

contra-hegemônica além do discurso do rap. Em entrevista para o portal de hip-hop

“Bocada Forte”, segundo o diretor do programa, Marcelo Bairão, o programa Roda Viva

se caracteriza pela diversidade de personalidades das mais variadas áreas, segundo

ele, Mano Brown é um representante do rap e de uma parcela da sociedade brasileira, é

a voz das pessoas oprimidas, das pessoas que vivem na periferia, uma pessoa

importante e que precisa ser entrevistada, assim como várias personalidades da vida

63 AORI, MC. Trecho de “Lapa”. Participação Aori e Marechal – Marcelo D2. Meu Samba é Assim: Sony-BMG, 2006. 64 Ver site do grupo Inumanos. Disponível em http://www.myspace.com/inumanos

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brasileira e de outros setores. 66

Devido à presença mínima do rap na mídia graças a poucos nomes como MV Bill,

Marcelo D2 e Mr. Catra – onde conseguem articular seus trabalhos para o público, a

maioria dos grupos de rap no Brasil pertencem a subsistemas, a exemplo do grupo

paulista Racionais MCs. Um exemplo no Rio de Janeiro de quem opta pela por evoluir

artisticamente sem o apoio da mídia é o niteroiense Rodrigo Cerqueira de Souza

Machado Vieira, vulgo MC Marechal:

"(...) Os Verdadeiros sabem de onde eu vim, reconhecem quando

os versos são de Coração. / Um só caminho... Mais que música é uma missão / Não rendo pra gravadora... Quer me pôr sob pressão. / Não sei fazer o som do momento, eu faço dos ‘momento’ um som / Independente! Demora ‘pra’ lançar... ‘Pra’ fazer / demora ‘pra’ ‘tu’ perceber que TAMUJUNTO! É só você! / E f***-se CD, eu tenho conteúdo Lírico / CD é só matéria...Minhas rimas ferem teu espírito(...)" 67

Apesar da potencialidade da performance dos grupos e da energia com que

fazem seus discursos, não é necessário unicamente ir aos shows para perceber a força

desses efeitos dentro do discurso do rap. Essa energia de resistência e força pode ser

notada nos discursos dos rappers, nos discos.

A única matéria da revista “Rio Show” relacionada ao Prêmio Hutúz, publicada

brevemente - e mesmo com foto padronizada apenas em formato de divulgação - é

datada do último exemplar no mês, dia 24, tendo em vista que o presente evento se

encerra dia 28 de novembro. A coluna “E Mais...” da categoria de “Eventos” trata o

“Hutúz Festival”. A mostra de cinema, levou a seguinte legenda:

“Hutúz Festival – O festival de cultura hip-hop promove de hoje a domingo, mostra no Odeon BR – entre os filmes está “Rize”(foto), de David La Chapelle – e festas de rap no Cais do Porto - Odeon BR: Praça Mahatma Gandhi, 5 - Cinelândia, Centro – 2622-5089. R$ 4,00. 14 anos.”

Ainda de acordo com o artigo de Deisimer Gorcsevski, o hip-hop constrói sua

cultura através de uma transmissão em pequena escala, mas que geralmente só tem

abrangência expressiva dentro do lugar de origem. Evidencia-se assim a forma com que

65GORCZEVSKI, Deisimer. Op. Cit. p.3 66 Site oficial Bocada Forte. Mano Brown no Roda Viva Parte 1. Disponível em http://bocadaforte.uol.com.br/site/?url=materias_detalhes.php&id=586 67 MARECHAL, MC. Trecho de “Espírito Independente”. Single, 2007.

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a mídia de massa gerencia os assuntos de acordo com seus interesses, e quais as

principais causas de negociações dos media que, hipoteticamente causaria o

silenciamento de muitos eventos organizados fora das vistas da cultura de mídia.68

Entre essa maioria praticamente anônima existem projetos alternativos onde é

notória uma atividade que podemos chamar de mega-parcerias que seria um projeto

unificando várias frentes. Sem um líder, a princípio, com um time de MCs que

representam os respectivos grupos, porém produzindo e se lançando em conjunto, ou

criando parcerias em eventos, os chamados coletivos:

O nome “Unir Versos Urbanos” foi criado pelo produtor Fábio Cintra Reis, vulgo T-

Rex, numa sessão de gravação com Psicopato e o saudoso Zé Bolinho - que além de

dar o aval foi o primeiro a citar em um som o nome da UVU na música “Nosso Império”.

O mega grupo tem como componentes: T-Rex & Psicopato (RaPress); Bocão (Maus

Elementos); Loco (Manuscritos); Slow (Esquadrão Zona Norte); Mr Break (Destroyer);

André Ramiro, Lepô & Mv Hemp (Comando Selva); Chapadão (B32); Gremilin Man

(Urbanóides); Acme & Airá (Rimas e Tintas); Dóla; Ducontra; Rico; Gil & Sheep; Beição

& Dropê; Coé (Antipáticos Crew); Shock (Vícios in Versos).69

Outros nomes que podemos destacar tanto no circuito carioca, como também em

festivais do gênero são Vozes do Gueto, Eltosh, Bob –X, Kapella PDF (Preto de Fé), De

Leve, Mahal, Shawlin, Iky Castilho, Queen Odara (Rap de Saia), Schakal(3 Preto),

Gutierrez, Damas do Rap, Original da Uruguaiana, o grupo feminino Parvat, entre outros.

Falando em festivais, estes também têm sido essenciais à consolidação do rap

brasileiro, com o luxo das mega produções das cerimônias exclusivas para o gênero,

como o “Prêmio Hutúz” (que traz o “Hutúz Rap Festival” – com as famosas batalhas de

MC), “Hip Hop Experience” e o “Troféu Hip Hop 2000”.

Como pudemos observar, essa sensação culturalmente benéfica causada pelo

hip-hop não é observada na mídia, que muitas vezes só retrata os eventos e a música

rap como notícias esporádicas, ou sinônimo de desordem e violência. Ao mesmo tempo,

sensacionalismo em torno dos eventos de rap por parte da mídia evidencia a disputa

68 GORCZEVSKI, Deisimer. Op. Cit. ,p.2 69Informações sobre o hip-hop em geral nos site: Portal Bocada Forte: http://bocadaforte.uol.com.br/site/ Nação Hip Hop 2007: http://www.nacaohiphop.net/ Portal Real Hip Hop: http://www.realhiphop.com.br/

Page 43: Monografia -Monique Barcellos

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territorial entre os interesses institucionais.

Diante da exposição das produções e de alguns artistas nesse capítulo, surge a

questão de que, se eles são premiados, reconhecidos pela cultura em si, como pelos

artistas em geral, como a mídia não os reconheceria, não os noticiaria a não ser para

fins de retratar cultura urbana associada à violência?

Para muitos rappers a forma de ler e entender o mundo não se dá unicamente a

partir dos meios de comunicação de massa. Sabem ler e interpretar suas mensagens de

forma que não se acham favorecidos ou ainda não se identificam com o que é noticiado.

Como sustentou Herschmann, a resposta ao silenciamento da mídia através do rótulo,

ou do estigma social faz com que se crie até a necessidade desses grupos originais da

periferia de se intitularem como“protetores locais” do crime organizado, já que ”os

cenários de representação da violência urbana se encontram associados de forma

reducionista a esse grupo social.” 70

Vitor “Gutierrez” Andrei, o rapper do bairro do Flamengo na letra de “Por Toda

Noite” mostra claramente a conseqüência do reducionismo apontado por Herschmann:

“(...) ‘Tô’ aqui pra provar meu valor ‘pra’ minha família/ Vou ser bem sucedido nem que seja em uma quadrilha/ Zoando (por toda noite) com ervas e bebidas, / com as ‘minas’ sem camisa suprindo minha comitiva, / os amigos sorrindo, feliz com suas vidas, / falando de alegria em cima de suas batidas/ Essa noite eu não dormi, trabalho mais do que vários/ Eu rimo ‘pra’ viver, e ‘pra’ tirar ‘os ruim’ de otário/ A cada quilômetro vejo mais que é tudo ou nada/ Por isso sigo neurótico (por uma estrada)(...)”.71

Portanto a pesquisa que tomou um teor minimalista no ponto de vista quantitativo,

em nossa perspectiva denota um caráter qualitativo que tende evidenciar o

silenciamento dos eventos culturais por parte jornal “O Globo”. Sustenta-se assim, a

hipótese de que no caderno de cultura “Rio Show” que, como exemplo de um jornal

voltado para a classe média, não é interessante pôr em evidência, ou reportar eventos

relacionados a questões culturais de classes menos favorecidas.

70 HERSCHMANN, Micael. Op. Cit., p. 173-4. 71 GUTIERREZ - Trecho de “Por Toda Noite” – Participação Jacksom e Marechal. Mixtape Corpo Fechado, 2007.

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O rap carioca não é visto como um manifesto sensacional, isto é, que desperte o

interesse de forma positiva. A mídia, pelo contrário explicita a cultura em caráter

sensacionalista, isto é, de forma pejorativa, muitas vezes associando a cultura como um

manifesto da criminalidade.

Kellner que defende os espetáculos da mídia demonstram quem tem poder e

quem não tem, quem pode exercer força e violência, e quem não. Partimos da premissa

que os media dramatizam e legitimam o poder das forças vigentes e mostram aos não-

poderosos (no caso as classes menos favorecidas e seus manifestos contra-

hegemônicos) que, se não se conformarem, estarão expostos ao risco de prisão ou

morte (no caso, o risco evidente é o silenciamento).72

Na pesquisa tomam lugar nas manchetes abordagens já naturalizados pelo

“público consumidor”, como a criminalização do rap, por exemplo. Um indício de como o

tipo de notícia sobre rap está sempre vinculado à idéia de criminalização foi o evento

“Virada Cultural” que contou com a participação do grupo Racionais MCs em um festival

na Praça da Sé, em 6 de maio deste ano, e cuja confusão foi manchete nos principais

jornais e telejornais do Brasil, incluído os veículos do objeto de nossa pesquisa:

“Acabou em confusão e quebra-quebra o show do grupo de rap paulistano Racionais MCs, realizado na madrugada deste domingo (6) em um palco montado em frente à Catedral da Sé, na região central de São Paulo. Na segunda música, parte da platéia começou a insultar policiais que reagiram com bombas de efeito moral. O show é uma das mais de 400 atrações da Virada Cultural, evento promovido pela prefeitura de São Paulo em vários locais públicos da cidade neste sábado e domingo.” 73

Como vimos, no ano de 2006, o festival de cinema do “Hutúz” foi realizado no

Odeon BR, enquanto o “Hutúz Rap Festival” aconteceu no Armazém 5. As palestras e

seminários foram promovidas no Centro Cultural Banco do Brasil. Já o “Prêmio Hutúz” de

música foi realizado no Canecão. Os eventos acontecidos do dia 4 a 28 de novembro

foram noticiados intercalados minimamente com a aproximação da data da Consciência

Negra, que no calendário, também comemora o Dia de Zumbi dos Palmares, principal

ícone da cultura africana no Brasil.

72 KELLNER, Douglas. A Cultura da mídia – Estudos Culturais: identidade e política entre moderno e o pós-moderno. p.8-9. 73 Ver site G1 Globo. Notícias - São Paulo. Disponível em http://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,MUL32020-5605,00.html

Page 45: Monografia -Monique Barcellos

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Deisimer Gorcsevski critica que a mídia vem manifestando seu poder de agendar

discursos, recebendo-os, disseminando-os, mas ao mesmo tempo, também produz

discursos e, conseqüentemente, interfere no processo social e, de certo modo, cultural

da sociedade. Nesse sentido, a autora observa que os meios são tensionados pela vida

em sociedade e não totalizam esta experiência.

De acordo com a autora, jovens declaram na mídia que esta não os faz de reféns,

no entanto, desejam os espaços midiáticos, sejam eles quais forem, para difundir as

suas mensagens e obter visibilidade. A partir dessa perspectiva, alguns grupos

passaram a reelaborar estratégias, para se fazer notar junto à opinião pública.

No Brasil, o rap, como o “produto comercial do hip-hop”, de acordo com a autora,

tem sido o carro-chefe para a divulgação da cultura de rua, ou seja, os jovens dessa

pesquisa apresentam, como ponto de referência para as suas conexões com o hip-hop,

o surgimento do grupo Racionais MCs, no cenário nacional.

O curioso é notarmos diversos eventos ligados à cultura em geral discriminados

geralmente em forma de reportagem. Não foi evidenciado em relação ao hip-hop durante

esta pesquisa, uma cobertura propícia diante do momento do “Hutúz” e ainda

oportunizado pelo dia da Consciência Negra, datado no dia 20 de novembro. O que

pudemos perceber na abordagem do “Rio Show” foi o caráter de veicular os eventos do

Hutúz sem uma continuidade notada pela agenda do evento. Não há nenhum aspecto de

reportagem, como contextualização e entrevistas, por exemplo.

Tal questão aponta para uma conseqüência do desinteresse da cultura da mídia

em reportar as manifestações culturais das classes menos favorecidas, incluindo-se o

protesto em forma de hip-hop. O poder de mídia vigente do jornal “O Globo” silencia os

eventos do hip-hop carioca cujos discursos contra-hegemônicos indiquem protesto e

resistência ao sistema no terreno das negociações midiáticas. A disputa pelo território da

existência cria um sensacionalismo propício que coloca a imagem dos rappers muitas

vezes como marginais para a mídia.

Page 46: Monografia -Monique Barcellos

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A sétima edição, do Prêmio Hutúz de Música, realizada entre os dias 7 e 28 de

novembro de 2006, evidenciou a forma com que o jornal “O Globo” agenda os eventos

de acordo com seus interesses, causando o silenciamento de muitos eventos

organizados fora das vistas da classe média.

Ao falar dessas negociações e relações de consumo entre as periferias e os

meios de comunicação de massa, o cerne da discussão envolveu o conceito de

identidade, que etimologicamente traz a idéia de pertencer a um meio igual a si mesmo.

Nesse aspecto a indústria cultural identifica sua gênese na classe média, o que explica o

motivo de termos analisado o jornal de maior circulação no país: “O Globo”, que por ter o

público de classe média como principal alvo, acaba agendando os discursos na mídia

acerca dos interesses para com seu público.

O desdobramento de identidade é nada menos do que a diferença, ou seja, o

outro. Procuramos nesse trabalho problematizar como, a partir de estigmas, expressões

culturais os jovens da periferia exemplo do hip-hop sofrem um silenciamento nos mass

media. Buscamos dar certa exposição de como esse grupo social lida com o processo

de estigmatização e glorificação, que varia através do tipo de implicação sócio-política

que esse estilo promove direta e indiretamente, dependendo do campo em que atua.

Na medida em que a pesquisa foi avançando percebemos que, para o jornal esse

tipo de manifestação não interessa muito, o que não impede que esse silenciamento

evite a propagação dessa cultura, que permanece há mais de 30 anos no Brasil, mesmo

sem o conhecimento do público em geral. No decorrer da pesquisa acabei ouvindo

comentários que iam do senso comum ao senso crítico, afirmando, em suma, que esse

tipo de manifestação cultural só é interessante e expressivo para o público de quem

produz, ou seja, para a periferia.

Custou-me interpretar tais críticas com o caráter minimalista, mas sim como o

reflexo do estigma já engessado no imaginário de uma cultura hegemônica de consumo

e segmentação. O uso das colagens e os agenciamentos até mesmo de outros

segmentos sociais que o rap utiliza potencializam um e outro, tanto dos rappers, quanto

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dos media.

Os rappers são capazes de expressar as experiências de opressão de sua

comunidade e de detectar causas e possíveis soluções para problemas expressos na

música. O que leva à questão dos efeitos do rap e da constituição de formas culturais

contra-hegemônicas e comunidades alternativas na atualidade e que continuou

produzindo grande número de declarações, em que se dizia que certos atos violentos e

criminosos eram causados por ele, havendo muitos apelos em favor de sua proibição e

censura.

Essa autoridade que gerencia os eventos, também tem o poder de silenciá-los de

acordo com seus interesses políticos, promovendo um ocultamento da cultura hip-hop e

todo seu discurso, tanto de quem produz, quanto para quem é por ela representado.

Salvos poucos nomes como MV Bill, Mr. Catra e Marcelo D2 e o rap americano, a

presença do rap na mídia é inexpressiva. Durante esta pesquisa, procurei dar

visibilidade a alguns dos articuladores do rap e do hip-hop do Rio de Janeiro, cuja

maioria pertence a subsistemas.

Mesmo que minimamente a cultura hip-hop vem se espalhando pelo mundo,

multiplicando suas produções midiáticas como dança, música, grafite, fanzines, sites,

vídeos, etc. Conscientes de sua condição social, eles organizam a denúncia na

composição de suas mídias alternativas e, principalmente, nas letras do rap, temperada

por palavras e vozes que escancaram a violência nos presídios, nas favelas e a atuação

da polícia. Contestam, resistem e negociam com setores do campo social, cultural,

político e midiático, em nosso país.

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Glossário

Atitude: Palavra indispensável no vocabulário do hip-hop. Para fazer parte do grupo é preciso não só ter consciência, mas também atitude. Termo que sintetiza a linha de conduta que o grupo espera de cada um.74 Abraçar: 1) Ir na fé; 2) Aceitar, participar, concordar, acreditar. Acerola: Muleque ligeiro, esperto. Alemão: Pessoa de fora, forasteiro, inimigo. Aliado: “Camarada”, muito amigo. Alma Sebosa: Gente ruim, repugnante. Aloprar: Incomodar; Brincar; Zoar. B. Girls: Versão feminina de B. Boys. Balão: Fazer a volta. Bala de coco: Cocaína. Balada: Festa. Ir pra balada / Sair à noite. Bagana: Bituca de cigarro maconha. Bagulho: 1) Maconha; 2) Para se referir a qualquer “coisa”. Ex. Ah, vamu fazê uns bagulho? - Igual a "coisa". Chegado: Pessoa legal, amigo. Cair: Morrer. Dar pála: Vacilar. Flow: Do inglês, fluir. Levada, cadência do MC para rimar. Gambé: Polícia militar. Hóstia: Quando a pessoa não tem mais jeito, aí só indo pra igreja pra melhorar. Irado (Da hora): Bom, ótimo. Maçarico: Arma de fogo (pistola). Maloqueiro: 1) Caricato, ou seja, o público do hip-hop e seu estilo indumentário e articulado. Possui verdadeira adoração por marcas esportivas; 2) Malandro, libertário. Mano: Amigo. Mina: Mulher Migué: Enganar, se fazer de otário. MixTape: São produções de áudio onde as faixas de um álbum são mixadas entre si, como se fosse um DJ fazendo as intervenções no intervalo das mesmas. Naipe: Estilo da pessoa. Osso: “Zuado”, ruim. Operário: Trabalhador. Quebrada: Lugar Rato/Rataria: Aquele / galera que atua no cenário urbano subterrâneo, adepto da cultura de rua em geral. Rabiscar: Desenhar; Pixar. Sagaz: Esperto, ligado, atento. Sampler: Aparelho que copia e "cola" sons para os Djs usarem nas músicas. Trecho de uma música, utilizada para produzir outra música. Subir: Morrer. Tadashi : Mentiroso. Tag: Do inglês, é o nome, pseudônimo, assinatura do artista (ou grupo, posse) que pinta o grafite. Vazar: Sair, ir embora. Véio/ Velho: Amigo, mano. Veneno: Dificuldade Verme: Safado. X9: “Caguete”, “dedo duro”. Que acusa, entrega o outro.75 Yo: Gíria americana. Grito geralmente utilizado para animar público em shows e festas.76

74 HERSCHMANN, Micael. Op.Cit. p.289-90. 75 Ver Site Bocada Forte. Gírias. Acessado em 18.11.2007. Disponível em http://bocadaforte.uol.com.br/site/?url=girias.php&letra=num 76 HERSCHMANN, Micael. Op.Cit. p.290.

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Anexos

Coletânea Hip Hop Rio –Núcleo Sucata Sound, Black Alien, 3 Preto, Inumanos,

BNegão, Negaativa, Artigo 331, Esquadrão Zona Norte (EZN), Mahal e Marcelo D2.

Foto:Divulgação.

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Prêmio Hutúz. Edição 2006. Foto: Site Rap Nacional. 77

77 Disponível em http://www.rapnacional.com.br/imagens/destaque/hutus.jpg

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Revista Rio Show. Publicada Sexta-feira, 13 de novembro de 2006.Suplemento do jornal

“O Globo”.

Page 52: Monografia -Monique Barcellos

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Bibliografia

AMARAL, Sofia. Caros Amigos - Especial Hip-Hop Hoje: Além dos muros. Edição 24.

Junho, 2005.

GALVÃO, Tatiana Verônica Bezerra. Hip-hop e mídia: negociando interesses e

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GOFFMAN, Erving. Estigma. 4ª Edição. Rio de Janeiro: LTC, 1998.

GORCZEVSKI, Deisimer [et al.]. O hip-hop e a mídia no cenário urbano. Belo Horizonte.

Intercom. XXVI Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, 2003.

HALL, Stuart. A Identidade Cultural na Pós-modernidade. 7ª edição. São Paulo: DP&A,

2003.

HERSCHMANN, Abalando os anos 90: funk e hip hop, globalização, violência e estilo

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______________, Micael [et al.]. Linguagens da Violência - As imagens da galera funk

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______________, O funk e o hip-hop invadem a cena . Rio de Janeiro: UFRJ, 2000.

KELLNER, Douglas. A Cultura da mídia – Estudos Culturais: identidade e política entre

moderno e o pós-moderno. Bauru, São Paulo: EDU, 2001.

ROCHA, Janaína, DOMENICH Mirella, CASSEANO Patrícia. Hip Hop: A

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VIANNA, Hermano. Galeras Cariocas: Territórios de conflitos e encontros culturais. Rio

de Janeiro: UFRJ, 2001.

Page 53: Monografia -Monique Barcellos

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Sites

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Disponível em http://bocadaforte.uol.com.br/site/?url=materias_detalhes.php&id=586

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http://bocadaforte.uol.com.br/site/?url=girias.php&letra=num

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em 18/11/2007. Disponível em

http://cliquemusic.uol.com.br/br/Retrospectiva/Retrospectiva.asp?Nu_materia=1343

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ALBIM, Cravo. Dicionário da Música Popular Brasileira. Acessado em 24/10/2007.

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http://www.dicionariompb.com.br/verbete.asp?nome=Gabriel%20O%20Pensador&tabela

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Acessado em 19/11/2007.Disponível em

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DUARTE, Claudio Manuel. Em torno do hip-hop: Uma entrevista com Nelson Maca.

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http://64.233.169.104/search?q=cache:9J_XdqK-

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Programa Som de Rua:

Page 55: Monografia -Monique Barcellos

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http://www.une.org.br/home3/cultura/cultura_2007/m_10226.html