Monografia Scotus, o possível e o impossível e a Opinião de Henrique de Gand

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1 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA CURSO DE FILOSOFIA A QUESTÃO SOBRE O POSSÍVEL E O IMPOSSÍVEL EM JOÃO DUNS SCOTUS E A CRÍTICA A HENRIQUE DE GAND. Pablo Fernando Campos Pimentel Orientador: Prof. Dr. Roberto Hofmeister Pich

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SULFACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

DEPARTAMENTO DE FILOSOFIACURSO DE FILOSOFIA

A QUESTÃO SOBRE O POSSÍVEL E O IMPOSSÍVEL EM JOÃO DUNS SCOTUS E A CRÍTICA A HENRIQUE DE GAND.

Pablo Fernando Campos Pimentel

Orientador: Prof. Dr. Roberto Hofmeister Pich

Porto Alegre

2012

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PABLO FERNANDO CAMPOS PIMENTEL

A QUESTÃO SOBRE O POSSÍVEL E O IMPOSSÍVEL EM JOÃO DUNS SCOTUS E A CRÍTICA A HENRIQUE DE GAND.

Trabalho de Conclusão de Curso em Filosofia para a obtenção de Grau de Bacharel em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas Filosofia Medieval

Orientador: Prof. Dr. Roberto Hofmeister Pich

Porto Alegre

2012

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PABLO FERNANDO CAMPOS PIMENTEL

A QUESTÃO SOBRE O POSSÍVEL E O IMPOSSÍVEL EM JOÃO DUNS SCOTUS E A CRÍTICA A HENRIQUE DE GAND.

Trabalho de Conclusão de Curso em Filosofia para a obtenção de Grau de Bacharel em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas Filosofia Medieval

Aprovada em _28_ de _Novembro__ de 2012.

BANCA EXAMINADORA:

Prof. Dr. Roberto Hofmeister Pich (Orientador) ...................................................................................................................

.....

Prof. Dr. Urbano Zilles

........................................................................................................................

Prof. Dr. Alfredo Santiago Culleton

........................................................................................................................

Porto Alegre

2012

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A meu pai que me ensinou a ser justo, humilde e sempre foi um

herói ético para mim e à minha mãe, criatura de irrepreensível

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conduta, a qual sempre zelou por minha vida e educação.

Dedico-lhes com muito amor essas linhas.

AGRADECIMENTO

Agradeço ao querido amigo e orientador Professor Doutor Roberto Hofmeister

Pich, que ao longo de minha jornada pela graduação, foi um grande amigo e

conselheiro.

Agradeço aos demais professores, que deixaram em minha formação e

pensamento suas marcas e lembranças carinhosas de estima e amizade.

Agradeço aos colegas, que na maioria das vezes passaram de colegas a

irmãos, os quais nunca deixaram de confiar em minha paixão e potencial pela

Filosofia.

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“Efetivamente, é impossível a quem quer que seja acreditar

que uma mesma coisa seja e não seja, (...) E se não é possível

que os contrários subsistam juntos no mesmo sujeito (e

acrescente-se a essa premissa as costumeiras explicações), e

se uma opinião que está em contradição com outra é o

contrário dela, é evidentemente impossível que, ao mesmo

tempo, a mesma pessoa admita verdadeiramente que a

mesma coisa exista e não exista. Quem se enganasse sobre

esse ponto teria ao mesmo tempo opiniões contraditórias.

Portanto, todos os que demonstram alguma coisa remetem-se

a essa noção última porque, por sua natureza, constitui o

principio de todos os outros axiomas.”

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Aristóteles

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 10

2 O PROBLEMA NOS TRÊS COMENTÁRIOS DE SCOTUS 16

3 A OPINIÃO DE HENRIQUE DE GAND NOS COMENTÁRIOS – “LECTURA I”

19

3.1 A OPINIÃO DE HENRIQUE DE GAND NOS COMENTÁRIOS – “ORDINATIO I”

21

3.2 A OPINIÃO DE HENRIQUE DE GAND NOS COMENTÁRIOS –

“REPORTATIO PARISIENSIS EXAMINATA I” 22

4 “REPROVAÇÃO DA OPINIÃO” DE HENRIQUE DE GAND POR PARTE DE

SCOTUS – “LECTURA I” 24

4.1 “REPROVAÇÃO DA OPINIÃO” DE HENRIQUE DE GAND POR PARTE DE

SCOTUS – “ORDINATIO I” 27

4.2 “REPROVAÇÃO DA OPINIÃO” DE HENRIQUE DE GAND POR PARTE DE

SCOTUS – “REPORTATIO PARISIENSIS EXAMINATA I” 28

4.2.1 “Reprovação da opinião” de Henrique de Gand por parte de Scotus –

“Reportatio Parisiensis Examinata I” – Corolários 30

5 QUANTO ÀS OPINIÕES PRÓPRIAS E AS RAZÕES OU ARGUMENTOS

PRINCIPAIS – “LECTURA” 32

5.1 QUANTO ÀS OPINIÕES PRÓPRIAS E AS RAZÕES OU ARGUMENTOS

PRINCIPAIS – “ORDINATIO I” 33

5.2 QUANTO ÀS OPINIÕES PRÓPRIAS E AS RAZÕES OU ARGUMENTOS

PRINCIPAIS – “REPORTATIO PARISIENSIS EXAMINATA I” 34

5.2.1 Quanto à questão número 2 na distinção 43ª em “Reportatio Parisiensis

Examinata I” – “Se Deus poderia fazer coisas diferentes do que fez” 38

5.2.2 Quanto a questão número 1 na distinção 44º em “Reportatio Parisiensis

Examinata I” – “ Se Deus poderia produzir as coisas diferentemente do que

faz” 39

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6 CONCLUSÃO 42

REFERÊNCIAS 45

RESUMO

Este trabalho com a investigação a cerca do problema do possível e do impossível

tem como objetivo clarear em um primeiro momento, aquilo que intrincadamente se

encontra naquelas obras de João Duns Scotus que ficaram conhecidas como os

comentários aos livros das sentenças de Pedro Lombardo. Juntamente com a

interlocução de grande importância feita por Henrique de Gand, o qual, pertence ao

mesmo período de produção filosófica e teológica ao qual Scotus pertence. O que se

visa aqui é trabalhar conceitos da filosofia da alta escolástica pouco estudados

atualmente, como onipotência divina, intelecto ou ideias divinas, possível,

impossível. Conceitos tais que, nos remetem a um universo de discussão muito rico,

no qual se deve ter muita atenção e insistência, pois o modo dispensado a esse tipo

de investigação é um tanto quanto moroso e altamente reflexivo. O cunho histórico e

filosófico de tal estudo é de importância equiparada, pois, possui uma importância

história ao se referir ao período no qual florescia nas universidades medievais as

chamadas disputationes e outro fator histórico muito importante foi o de que nesse

século em questão, a saber, o século 13, exatamente no ano de 1277 Henrique de

Gand participava de algo muito importante, a condenação das 219 teses. Deste

modo, Scotus escreveu três versões aos Libri quatuor setentiarum de Lombardo, os

quais serviam de base de estudos teológicos para aqueles desejavam se ordenar e

crescer dentro das ordens religiosas. De modo que, as distinções sobre o possível e

o impossível encontram-se de modo minuciosamente trabalhados nesses

comentários de Scotus aos Quatro livros das sentenças.

Palavras-chave: Possível-impossível – Scotus – Henrique de Gand – potência divina

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ABSTRACT

This research work around the problem of the possible and the impossible aims to

lighten it at first, what is intricately those works of John Duns Scotus which became

known as the commentaries on books of the sentences of Peter Lombard. Together

with the interchange of great importance made by Henry of Ghent, which belongs to

the same production period philosophical and theological Scotus to which it

belongs. What is intended here is to work on concepts of philosophy of high

scholastic little studied today, omnipotence and divine intellect and divine ideas,

possible, impossible. Concepts such that refer us to a universe of very rich

discussion, in which we must be very careful and insistence, because so relieved this

type of research is somewhat lengthy and highly reflective. The imprint of historical

and philosophical importance of this study is equivalent, therefore, has an important

story to refer to the period in which flourished in medieval universities disputationes

calls and other important historical factor was that this century in question, namely

the 13th century, precisely in the year 1277 Henry of Ghent participated in something

very important, the condemnation of 219 theses. Thus, Scotus wrote three versions

of the Libri quatuor setentiarum Lombardo, which formed the basis of theological

study for those who wished to organize and grow within the religious orders. So, the

distinctions about what is possible and impossible are so meticulously crafted these

comments of Scotus the Four books of sentences.

Key-words: Possible-impossible – Scotus – Henry of Ghent – divine power.

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1 INTRODUÇÃO

Muitos poderiam inquirir-se quanto ao que significa dizer que uma coisa é

possível ou impossível. Quanto a esse questionamento, a saber, sobre o que são o

possível e o impossível, tentar-se-á discorrer do seguinte modo, distinguindo duas

formas de argumentação nas indagações de Scotus sobre essas questões. As

interpretações que se fazem notar nos escritos de João Duns Scotus1 e Henrique de

Gand2 que contemplam tanto uma argumentação lógica quanto uma argumentação

metafísica, as quais, por vezes se diferenciam e em outros momentos se

harmonizam.

Seguindo o questionamento de Scotus far-se-á fundamental talvez que se

faça a mesma indagação que esse se fez, se algo é impossível que seja feito,

pergunta-se então, deste modo, porque esse algo é impossível?

Acredita-se que, feita essa pergunta, a mesma venha a ser de grande auxilio

como ponto de partida a um questionamento mais profundo a cerca do problema a

ser tratado aqui. Sinal disso é como algumas respostas dadas à questão do

impossível elucidam e até mesmo mostram-se basilares para que se tenha um

melhor entendimento a respeito daquilo que Scotus entende por necessidade, ideias

divinas, onipotência, potência ativa e perfeições puras.

Evidenciam-se, de maneira muito clara, como já se havia dito, duas formas de

argumentação a respeito desses temas, a saber, uma argumentação

ontológico/metafísica e, todavia uma argumentação lógico/formal.

A pergunta sobre o possível e o impossível vai muito além do que aquilo que

podemos conceber em um primeiro momento. Mas o que se quer dizer com isso?

Algo muito simples. Todavia, quando Scotus trabalha com esses problemas em seus

comentários às Sentenças de Pedro Lombardo3, não está apenas visando uma

1 Franciscano que nasceu em Duns na Escócia em torno de 1265/66 e veio a falecer em Colônia no ano de 1308. Fez seus estudos em Oxford e Paris, também lecionando nestas duas localidades e provavelmente em Cambridge. Cf. DE BONI, 2005 (p.325)2 Nascido em Gand (Ghent em flamengo) Bélgica flamenga no ano de 1217. Pertenceu à comissão que arrolou as questões condenadas em 1277, pelo arcebispo e Chanceler E. Tempier. Mestre em Artes. Mestre de Teologia em 1275, em Paris. Lecionou ali, de 1276 a 1292. Falecido no ano de 1293. 3 Pedro Lombardo foi um filósofo escolástico do século XII nascido por volta de 1100 em Lumellogno, perto de Novara, no norte da Itália, e falecido em 20 de julho de 1160, ainda que existam algumas dúvidas sobre o ano exato de seu falecimento. Escreveu várias obras, dentre elas a que se tornou a mais célebre foi Libri quatuor sententiarum, ou, os Quatro Livros das Sentenças. As Sentenças são uma cuidadosa compilação de textos bíblicos e frases (sentenças) de Padres da Igreja e outros pensadores medievais que juntos compõem uma detalhada exposição da teologia cristã da época.

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resposta objetiva quanto àquilo que se percebe na natureza, como sendo possível

ou impossível, mas, sobretudo, quer chegar àquilo que em última instância Deus

pode ou não fazer.

Trazer questões de caráter teológico à discussão filosófica sempre foi algo

muito comum nesse período e nesse modo de se filosofar. Portanto, ao se abordar

temas como potência divina, levantar-se-ão perguntas e respostas que vão além

daquilo que se pode perceber na natureza.

Embora essa seja uma discussão um tanto quanto distante do nosso tempo,

acredita-se firmemente que, não poucos são aqueles que se flagram introspectivos

sobre as razões da possibilidade e impossibilidade que temos em nossas ações

perante a existência.

Este trabalho tem como objeto de estudo dois autores singulares da Alta

Escolástica na Idade Média, a saber, João Duns Scotus (1265/66 – 1308) e

Henrique de Gand (1217 – 1293). Por filosofia Escolástica entende-se aquele

modelo de pensamento filosófico que era ministrado nas escolas cristãs nesse

período da Idade Média, onde se fazia corrente a estadia na Universidade de Paris,

com fins de aperfeiçoamento e o intuito de conquistar posteriormente o grau de

mestre.

Sendo que, neste contexto, conforme Boehner (2009, p. 355):

(...) a Universidade constituía antes uma realidade espiritual do que um edifício ou complexo de edifícios, com institutos de ensino e pesquisas, dirigidos por funcionários do Estado. Do ponto de vista de sua organização externa poderíamos defini-la como a totalidade dos professores e alunos que participam do “studium”, distribuído em vários pontos de uma determinada cidade, e formando uma corporação jurídica de direito próprio (“Universitas magistrorum et scholarium”).

No entanto, pode se entender o termo escolástica de quatro modos

diferentes, a saber, um primeiro entendimento era quanto à etimologia, onde schola

deriva de Scholasticus, ou seja, pertencente à escola. Um segundo entendimento

seria aquele entendido pedagogicamente, do qual, por escolástica se entende a sua

técnica de ensino de expor temas e assuntos filosóficos e teológicos. Em terceiro,

quanto ao conteúdo doutrinal, o qual se dava pelo estudo filosófico e teológico

enquanto síntese do patrimônio comum do pensamento humano, orientado pelo

conhecimento da ciência, da filosofia e da teologia. Quanto a um quarto

entendimento sobre o que é escolástica é concernente ao caráter histórico que

engloba três períodos, a saber, a baixa escolástica que vai do século XI ao século

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XII, a Alta Escolástica com seu ponto culminante no século XIII e a Escolástica

Tardia, situada entre os séculos XIV e XV (ULLMANN, 2000).

O intuito de investigação nestes dois autores são as questões sobre o

possível e o impossível, questão esta que pressupõe duas noções que em certa

medida se faziam usuais no modo como os filósofos nesse período produziam e

desenvolviam seus textos, a saber, uma estrutura metafísica ou ontológica, que,

todavia, pressupõe a possibilidade e impossibilidade nos objetos ou nas criaturas,

uma vez que estes estão em relação com Deus.

E uma segunda noção seria aquela que podemos chamar de lógico/formal, pois, a

filosofia escolástica e seus grandes pensadores tinham como influência fundamental

o aristotelismo, desenvolvendo assim seus escritos inclinados fortemente pelas

várias formas da filosofia aristotélica, sendo uma delas o seu silogismo.

As questões sobre o possível e o impossível aparecem em Scotus naqueles

textos que ficaram conhecidos como os comentários aos Libri quatuor sententiarum

de Pedro Lombardo, ou seja, aos Quatro Livros das Sentenças. Faz-se importante

ressaltar que Scotus fez três comentários a essa obra conforme Honnefelder (2010,

p. 30):

A mais antiga versão foi apresentada por Scotus em Oxford (designada como Lectura), na qual ele, mais tarde, começou a retrabalhar (designada como Ordinatio); segue-se a ela a versão que apresentou em Paris e que se encontra na forma de uma transcrição por parte de alunos (designada como Reportatio).

Importante que se explique, no entanto, que as distinções das quais se irá

trabalhar estão respectivamente em lectura I, Ordinatio I e Reportatio parisiensis

examinata I. Desse modo, se faz necessário que se diga o porquê de ao final do

titulo de cada um desses comentários tenha o numeral romano “I” indicando

literalmente o número um. Ora, assim como, a obra de Pedro Lombardo é dividida

em quatro livros, os quais no próprio titulo já faz menção, a saber, Os quatro livros

das sentenças, os comentários de Scotus não deveriam ser diferentes, pois,

pretensamente este deveria comentar a obra completa de Lombardo e não apenas

uma parte dela ou a parte que mais lhe conviesse. De sorte que, as respectivas

distinções que serão analisadas estão contidas nas três versões anteriormente

citadas encontradas nos Livros I de cada uma dessas versões.

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Os problemas tratados por esses dois autores ímpares encontra-se em um

contexto entre os séculos XIII e XIV, onde era muito comum que os estudiosos das

ordens religiosas fossem para a Universidade de Paris a fim de complementar seus

estudos em teologia e filosofia, fazendo preleções de opiniões doutrinais dos Padres

da Igreja, que eram utilizadas como manuais e posteriormente preleções sobre livros

bíblicos, tendo por fim como grau máximo de estudos, atividades em disputas sob a

liderança de um mestre, as chamadas disputatio ou disputationes. A qual, uma das

mais famosas dessas disputationes quodlibetales que se tem notícia que Scotus

tenha participado foi no período entre 1306 – 1307 (HONNEFELDER, 2010).

Desta maneira, a atual investigação contempla o estudo de pontos centrais e

conceitos-chave na filosofia destes dois autores de grande significação para o

campo de pesquisa na filosofia da alta escolástica medieval.

Constata-se, assim, ser de suma importância investigar o que significa dizer

que uma coisa ou algo seja possível ou impossível de ser feita, e se o for, por que o

é? Por causa de Deus ou por causa da criatura?

Tratar as considerações de Scotus sobre o que para ele é dizer que algo seja

possível ou impossível, a saber, de uma perspectiva metafísica e, por outro lado e,

não menos importante, sob uma perspectiva lógica, são questões de grande

significação para a filosofia scotista, que, em última instancia nunca deixou de

investigar a Causa Primeira, que é Deus. O que Deus pode e não pode fazer, qual é

o tipo de conhecimento que Deus tem das coisas. Debatendo esses pontos

específicos com autores contemporâneos a ele, que por esse motivo, abordaram

quase os mesmos temas em suas obras. Um desses autores contemporâneos a

Scotus e também um de seus principais interlocutores, o não menos impactante

Henrique de Gand, que apresenta o mesmo tipo de profundidade ao de Scotus no

que diz respeito às estruturas lógico/metafísicas ao abordar a questão do que é dizer

o possível e o impossível em relação a Deus e às coisas.

Ao analisarem-se as distinções quadragésima segunda, quadragésima

terceira e quadragésima quarta, a saber, na Lectura I, Ordinatio I, e Reportatio

Parisiensis Examinata I, pode-se fazer um cotejamento e ao mesmo tempo perceber

um amadurecimento no pensamento de Scotus. Onde, para se entender aquilo que

Scotus concebe como “algo ser feito” possível ou impossível, entre uma distinção e

outra em comparação criteriosa entre uma versão a outra dos comentários,

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descobrem-se os vários conceitos-chave que Scotus usa para tentar elucidar este

problema.

Algo que, pode se perceber em atenta leitura passando de uma versão à

outra são as críticas que o autor faz a Henrique de Gand. A primeira, quanto a

sustentar opiniões opostas em dois textos diferentes quanto à impossibilidade, pois,

sobre a possibilidade constata-se que esse sustenta o mesmo. A outra, quando

Scotus argumenta contra a primeira via de Gand, de que Deus é a causa não-

precisa da impossibilidade da coisa factível.

Cumpre no momento, uma análise da exposição da argumentação, da forma

como esta está disposta nos textos de Scotus. No entanto, quanto ao que se refere

às distinções quadragésima segunda e quadragésima quarta, estas serão usadas

como recurso explicativo a algo que não tenha se estabelecido suficientemente bem

na quadragésima terceira distinção. Acredita-se que, para um melhor panorama

argumentativo, expor a progressão de um comentário a outro, seja de fundamental

importância, visto que se finalizará na última obra de Scotus, a saber, a sua

Reportatio Parisiensis Examinata I, comentário esse tido como o final sobre as

Sentenças do mestre Pedro Lombardo. O qual é o terceiro e último comentário que

Scotus realizou das mesmas, correspondendo assim, à leitura que este realizou

novamente em Paris, no ano acadêmico de 1302/1303, como requisito à obtenção

do grau de doutor e sucessivamente sua nomeação como magister regens, em

outras palavras, uma cátedra reservada à Ordem franciscana na Universidade de

Paris4.

Segundo o professor PICH R. H. no prefácio que escreveu à compilação de

textos sobre Scotus diz o seguinte:

(...) o conjunto de textos mencionado corresponde à “leitura” de distinções das Sentenças tal como “anotada” ou “reportada” (cf. a expressão “reportatio”) pelos discípulos e alunos e, nesse caso, também “examinada” (examinata) e aprovada pelo mestre Scotus para a publicação e divulgação. (PICH R. H. in SCOTUS, 2008, p. 14)

Por esse motivo, sempre dar-se-á maior saliência aos argumentos levantados

nessa última versão dos comentários, e isto, por motivos óbvios, por possuir

segundo muitos, o caráter maduro e revisado dessas preleções das Sentenças.

4 Cf. PICH, R. H. Prefácio a João Duns Scotus, Textos sobre Poder, Conhecimento e Contingência. In: João Duns Scotus. Textos sobre Poder, Conhecimento e Contingência. Porto Alegre - Bragança Paulista: Edipucrs - Edusf, 2008, p. 7-22.

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Outro fator que se faz necessário é o de que nos atenhemos ao fato de que, por

várias vezes, como anteriormente mencionado já, como recurso explicativo recorrer-

se-á às distinções quadragésima segunda e quadragésima quarta, ou seja, uma

distinção anterior e outra posterior, tendo em vista sempre o caráter sutil e detalhista

do qual Scotus sempre fora lembrado pela tradição filosófica e do qual fora

intitulado, o Doctor Subtil. Deste modo, crê-se mostrar um quadro teórico

argumentativo muito melhormente elaborado e explícito sobre o referido e proposto

tema.

Portanto, a titulo de esclarecimento apenas, a exposição se fará do seguinte

modo, analisando nas três verões do referido comentário, (I) o problema sobre o

qual se está a discutir, (II) as opiniões ou posições do interlocutor de Scotus, a

saber, Henrique de Gand, (III) as refutações dessas opiniões por parte de Scotus e

(IV) as opiniões próprias ou como aparecem nos comentários por vezes, a opinião

própria de Scotus. Com isso pode-se dizer que estão abarcados de forma completa

e sob um ponto de vista mais unificador a forma com a qual ao final desta analise

poderemos compreender melhor a solução ou soluções que vão se dar aos referidos

problemas.

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2 O PROBLEMA NOS TRÊS COMENTÁRIOS DE SCOTUS

É mister que se deixe claro, com respeito ao que concerne aos argumentos

metafísicos e lógicos se poderá notar que em vários momentos essas formas de

argumentação entram em ligação direta uma com a outra, ficando por vezes um

pouco difícil fazer a diferença entre uma e outra. Arrisca-se ainda a dizer que em

determinados momentos os dois argumentos até se complementam.

Desta maneira, volta-se à questão inicial, geradora de tal debate: O que

significa dizer que algo seja “impossível” de ser feito?

Acredita-se termos muito claro aqui qual é o problema sobre o qual Scotus e

seu interlocutor querem discorrer, ou seja, a origem do impossível e, em

contrapartida serão dadas algumas definições sobre o possível. Com efeito, no

tocante ao possível, isso é o que veremos neste embate, simplesmente elucidações

ou conceitos sobre o possível formados para que se possa discutir sobre o que é o

impossível. Portanto, definimos aqui, como problema central, em última análise o

impossível e, é sobre o mesmo que se vai fazer uma investigação mais profunda.

Assim, deste modo, far-se-á o de antemão já dito, ou seja, uma análise da

posição de Henrique de Gand, bem como a refutação dessa opinião da parte de

Scotus, subsequentemente a posição do próprio Scotus, a qual aparece logo na

sequência a refutação da opinião de Gand. Dito isso, se faz necessário que se dê o

titulo da quadragésima terceira distinção nos respectivos comentários de Scotus e,

começaremos por expor o titulo da quadragésima terceira distinção em Lectura I:

“Utrum impossibilitas fiendi sit primo ex impossibilitate factibilis vel ex parte Dei

facientis5”, depois em ordinatio I, “Utrum prima ratio impossibilitatis rei fiendae sit ex

parte dei vel rei factibilis6” e por fim em sua Reportatio parisiensis examinata I, onde

tem-se duas questões dentro da mesma distinção, onde a quaestio prima recebe o

seguinte nome “Utrum prima ratio impossibilitatis in rebus sit ex parte Dei vel ex

parte rei” e a quaestio secunda o seguinte “Utrum Deus posset alia quam fecit7”. as

quais o professor Roberto Hofmeister Pich traduziu em sua coletânea de textos de

Scotus primeiramente em Lectura I Distinção 43ª por “Se a impossibilidade de ser

5 Cf. Lectura I d. 43 q. un. p. 529. 6 Cf. Ordinatio I d. 43 q. un. p. 351.7 Cf. Reportatio Parisiensis examinata I d. 43 q. 1 p. 166 e q. 2 p. 186.

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feito provém primeiramente da impossibilidade do factível ou da parte de Deus que

faz8”. Depois em Ordinatio I Distinção 43ª por “Se a razão primeira da

impossibilidade de uma coisa a ser feita é da parte de Deus ou da coisa factível9” e

por fim em Reportatio Parisiensis examinata I Distinção 43ª dividida em duas

quaestio, as quais a primeira é denominada por “Se a primeira razão da

impossibilidade nas coisas é da parte de Deus ou da parte da coisa10” e a quaestio 2

por “Se Deus poderia fazer coisas diferentes do que fez11”

Muito claramente pode se perceber uma pequena diferença nos títulos entre

as três versões dos comentários. E poderia se fazer a seguinte pergunta: Tratariam

desse modo, do mesmo assunto ou problema? Considerando o problema em

questão pode se dizer que sim, no entanto, cumpre-se notar a ênfase que se dá em

algumas palavras no titulo das citadas distinções. Porém, contudo, no que concerne

à distinção quadragésima terceira de Reportatio Parisiensis examinata I de sobejo já

se evidencia a existência de duas questões em uma mesma distinção e, na primeira

questão a saliência de que a impossibilidade é primeiramente nas coisas

perguntando-se se a culpa dessa impossibilidade nas coisas seria da parte de Deus

ou da coisa.

Crê-se que, mesmo com leves diferenças de ênfases nos títulos dessas

distinções, as mesmas tratem do mesmo problema, a saber, do problema da

impossibilidade e da ligação desta com Deus. Ressaltando, no entanto, que na

quadragésima terceira distinção do último comentário, ou seja, de Reportatio

Parisiensis examinata I haverá duas questões sobre as quais se debruçar.

A estrutura dos seus comentários sempre se dá, ou, se dispõem do seguinte

modo: (i) argumentos a favor e contra a tese de que tal impossibilidade sim, proviria

primeiramente da parte de Deus, (ii) a exposição da opinião ou das posições de

Henrique de Gand, (iii) a reprovação dessa opinião ou posições por parte de Scotus,

(iv) a opinião própria de Scotus a cerca do problema em questão e (v) uma breve

posição quanto à razão principal.

8 Cf. João Duns Scotus. Textos sobre poder, conhecimento e contingência. Tradução de R. H. Pich. (p. 162)9 Cf. João Duns Scotus. Textos sobre poder, conhecimento e contingência. Tradução de R. H. Pich. (p. 301) 10 Cf. João Duns Scotus. Textos sobre poder, conhecimento e contingência. Tradução de R. H. Pich. (p. 465) 11 Cf. João Duns Scotus. Textos sobre poder, conhecimento e contingência. Tradução de R. H. Pich. (p. 477)

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Desse modo, exposto e delimitado o problema, ou seja, o de saber se a

impossibilidade de ser feito provém primeiramente da impossibilidade do factível ou

da parte de Deus que faz partimos para a analise dessa estrutura para que se possa

chegar a conclusões mais claras. Exposto, deste modo, o titulo da distintio já se

pode perceber o problema sobre o qual quer se tematizar, Scotus inicia sua arguição

com a defesa de que a impossibilidade de “algo a ser feito” provém primeiramente

de Deus que não daria à criatura capacidade ou como comumente utilizado,

potência para tal realização.

Assim, sempre teremos uma posição defendendo tal que tal impossibilidade

primeiramente é da parte de Deus e logo em seguida outra posição defendendo o

contrário, que primeiramente essa impossibilidade se dá devido a uma incapacidade

da criatura e não de Deus que não teria dado tal capacidade para que esse algo seja

possível.

No que tange à delimitação do problema e à exposição de sua estrutura

dentro da obra acredita-se que o que fora até aqui dito tenha sido suficiente para o

que foi proposto. Deve-se notar que, no entanto, os primeiros argumentos dessas

distinções nas três versões dos comentários, não serão tão salientados quanto o

serão às opiniões de Henrique de Gand e as subsequentes reprovações e opiniões

próprias feitas por Scotus ao mesmo. Pois, estas são aquelas teses iniciais que

sempre principiam (i) por defender a impossibilidade enquanto limitação do Poder

divino e (ii) contra a tese de que a impossibilidade seria proveniente primeiramente

da parte de Deus mas, sim da criatura.

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3 A OPINIÃO DE HENRIQUE DE GAND NOS COMENTÁRIOS – “LECTURA I”

Depois disso, quanto à exposição da opinião de Gand em Lectura I, em sua

primeira via, este diz que Deus é dito ter potentia activa, traduzindo-se por poder

ativo e esse poder é uma perfectio simpliciter, ou seja, uma perfeição pura, e o é,

segundo de Deo ad se, a saber, segundo Deus quanto a si mesmo e não na ordem

a criatura. Aqui se encontra claramente um argumento metafísico, pois vai tratar do

problema em questão enquanto ligado a Deus mesmo12. Pois, para este, visto que a

potência ativa pela qual Deus ser dito Omnipotente é uma perfeição pura, a mesma

sempre será na ordem quanto a si mesmo e nunca na ordem ou, quanto a outro

diferente de si, que não seja Deus. Por isso que, mais adiante, o mesmo fará a

diferenciação entre privações e imperfeições em contrapartida a perfeições. Mas,

antes disto, cabe demonstrar o esquema relacional do qual se vale Henrique, para

provar a inverdade em dizer que a impossibilidade proviria primeiramente de Deus.

E nessa linha, mostra-se necessário expor tal quadro relacional, onde (i) a potência

ativa pela qual Deus é dito potente é somente em relação ao sujeito no qual a

mesma é, a saber, quanto a Deus mesmo, (ii) a potência ativa em Deus é

considerada a potência passiva na criatura em si e em (iii) considera-se essa

potência passiva na ordem para com Deus e em (iv) segue-se a relação da potência

ativa em Deus com a criatura e, por isso mesmo não diz uma dignidade, porque

nada que é em Deus na relação com a criatura diz uma dignidade, dizendo que isso

é provado por Santo Anselmo no capítulo quinze de seu Monologion (SCOTUS,

2008).

Com isso, parece que aqui Scotus quer colocar a posição de Gand como

defendendo a tese de que aquela potência ativa que é considerada em Deus uma

perfeição pura, é sempre considerada quanto a Deus em si mesmo e nunca em uma

relação com a criatura, onde nada de perfeito e digno é dito. E isso é corroborado

pela própria exposição de Gand ainda no final de seu primeiro parágrafo quando

este diz que essa potência será uma perfeição pura em Deus absolutamente e não

na ordem à criatura. Posto isso, entra em cena um argumento dado por Henrique de

Gand no qual diz que “não se diria que “algo ser feito” é impossível porque Deus não

pode fazer, mas, ao contrário, Deus não pode fazer porque outra coisa não pode ser

12 Cf. João Duns Scotus. Textos sobre poder, conhecimento e contingência. Traduzidos por R. H. Pich. (p. 163).

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feita, de modo que (...)” [(SCOTUS, 2008, p. 165)]. Assim, deste modo, se nos

afigura claro que sob o aspecto metafísico da argumentação a impossibilidade de

algo provém primeiramente do factível e não de Deus que não pode no caso em

questão primeiramente pela impossibilidade exterior a si mesmo. É necessário que

aqui se pare e se reflita com bastante atenção e cuidado por um instante e possa se

perceber a sutileza no argumento exposto por Henrique de Gand, pois, o mínimo

descuido que se venha a ter se pode passar despercebidamente por algo da mais

suma importância.

Para que se entenda melhor aquilo que está sendo dito é necessário que se

entenda o argumento lentamente, pois, em se tratando do argumento

metafisicamente falando, pela argumentação feita até aqui por Gand, deve-se

admitir que a impossibilidade primeiramente é da parte da coisa, ou desse algo “ser

feito impossível”, pois, se Deus é dito Onipotente e isso, por possuir esse poder

ativo, o qual é uma perfeição pura, e essa perfeição pura é sempre com relação à

criatura na qual a mesma se dá e nunca por uma relação desta com um outro.

Dessa maneira, de fato, nunca poderá se dizer que a impossibilidade de algo está

ligada a uma não-potência da parte de Deus. Pois, a sua Onipotência é e sempre foi

com relação a si mesmo e nunca por uma relação deste com a criatura. E para que

o argumento fique de forma mais explicitamente clara destacar-se-á como está no

referido texto, SCOTUS (2008, p. 165):

(...) embora algo seja dito possível porque Deus primeiramente é potente por potência ativa, não haverá, contudo, uma ordem similar na privação e na imperfeição; donde não se diria que ‘algo ser feito’ é impossível porque Deus não pode fazer [o mesmo], mas, ao contrário, Deus não pode fazer porque outra coisa não pode ser feita, de modo que por essa imperfeição, primeiramente há uma não-potência da parte da criatura, e, em segundo lugar, segue-se uma relação de não-potência para com Deus, e em terceiro lugar uma relação negativa de Deus com a criatura em razão da qual [Deus] é dito não-potente.

Portanto, crê-se ficar bastante clara a posição de Henrique de Gand quanto

ao problema em questão, pois, colocando de modo objetivo e direto, uma coisa é

dizer que algo ser feito é impossível por que de si mesmo essa coisa é impossível e

outra coisa é dizer que é impossível porque Deus não pode. Por isso, Gand aponta

que essa impossibilidade é primeiramente na criatura, no factível, que de si não tem

capacidade para tal, para só depois através de uma relação negativa com a criatura

dar-se a não-potência em Deus. Deste modo a impossibilidade está na privação e na

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imperfeição, e só por isso Deus não pode tal coisa, porque a impossibilidade se

encontra na privação e na imperfeição dessa criatura ou desse factível. E contra

essa natureza Deus não pode ir opostamente.

No que tange à segunda via é dito justamente o contrário, a saber, que algo é

impossível porque Deus não pode e não o contrário que Deus não pode porque é

impossível. Seguindo essa linha de estruturação, tecer-se-ão as duas criticas de

Scotus a Henrique de Gand.

3.1 A OPINIÃO DE HENRIQUE DE GAND NOS COMENTÁRIOS – “ORDINATIO

I”

Quanto ao que Henrique de Gand diz na Ordinatio, Scotus se resume a

apenas mencionar as respectivas posições de Gand em seus textos quodlibetales,

conforme SCOTUS (2008, p. 302-304):

3. Aqui, é dito por Henrique, na questão 3 do Quodlibet VI, - para o oposto disto, manifestamente, procura na questão 3, Quodlibet VIII. 4. Contra essa segunda sentença, seja se ela dita corrigindo a primeira sentença desse artigo, seja se ela é dita enquanto corrigida pela primeira, - não seria preciso, contudo, argumentar contra ele a não ser pelas suas próprias palavras, que implicam manifestamente coisas opostas.

De modo que, no que diz respeito ao que Henrique expressa sobre o assunto

em ordinatio, nos resignaremos ao que brevemente foi colocado por Scotus. Pois, se

pode constatar que diferentemente do que aparece em Lectura, aqui em ordinatio

Scotus faz suas críticas à Gand dentro mesmo do tópico das posições deste. De

fato, quando Scotus cita os textos de Gand, a saber, as quaestio 3 dos Quodlibet VI

e Quodlibet VIII, no texto recém citado aparecem notas de rodapé, onde Scotus

menciona as posições de Henrique de Gand contidas nestes dois textos do mesmo.

Nos quais, em Quodlibet VI questão 3 esse afirma de maneira bem sucinta onde

aqui irá se parafrasear, que Deus não pode porque é impossível e não o contrário,

ou seja, de que é impossível porque Deus não pode algo, GANDAVO (1987, p. 49).

No entanto, quando este fala sobre o mesmo assunto em Quodlibet VIII diz segundo

interpretação de Scotus exatamente ou manifestamente coisas opostas, ou seja, de

que algo ser feito é impossível porque Deus não pode e não o contrário.

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23

3.2 A OPINIÃO DE HENRIQUE DE GAND NOS COMENTÁRIOS –

“REPORTATIO PARISIENSIS EXAMINATA I”

Contudo, quanto ao que se encontra na terceira versão dos comentários, a

saber, nas reportationes, Scotus incorpora sutilmente novos elementos dentre os

outrora mencionados. Há, porém, uma novidade aqui, juntamente com o que já

havia sido dito nessa distinctio nas versões anteriores, ou seja, aquilo que é dito de

Deus quanto a si mesmo e quanto às criaturas. No entanto, vale a resalva de que

aqui, nessa distinção parece haver uma melhor sistematização dessa opinião por

parte de Scotus para que possa melhor argumentar contra Henrique de Gand. Para

tanto, crê-se coerente referenciar o que fora dito nessa introdução por Gand através

das palavras de Scotus, conforme SCOTUS (2008, p. 466):

“(...)” aquelas [propriedades] que são ditas de Deus existem numa tríplice diferença. Algumas delas, pois dizem uma perfeição pura, como os atributos que convêm a Deus em si e não por uma relação externa. Algumas dizem uma perfeição e uma dignidade, mas não uma perfeição pura, a qual em todo e qualquer [ente] é melhor ser do que não ser, (...) e assim são aquelas [propriedades] que convêm a Deus com respeito à criatura, tal como ser senhor, criador, governador e desse tipo. Outras [ainda] são as que convêm a Deus privativamente ou negativamente, como o impossível, que priva nele a razão de potência passiva.

Dito isto, ou melhor, dizendo de forma mais explicita, os atributos de Deus são

ditos ou podem ser pensados de três formas distintas, a saber: como uma perfectio

simpliciter, uma perfeição pura, ou seja, de Deus única e exclusivamente quanto a si

mesmo, de Deus em relação às criaturas e de Deus privativa ou negativamente, a

qual em outras palavras Deus seria dito não potente perante algo.

No entanto, um pouco mais adiante nessa mesma parte, ele responde à

questão sobre “o que dizer do impossível?13”. Aqui mais uma vez, ele coloca que

quanto a essas “[propriedades] que são ditas de Deus negativamente na relação

com a criatura não tem a primeira razão da parte de Deus, mas a primeira razão de

impossibilidade é da parte da criatura”, conforme SCOTUS (2008, p. 467). E no que

diz respeito ao impossível privativamente, se faz certa hierarquização quanto a

atribuição dessa impossibilidade onde se diz que em um primeiro momento essa

impossibilidade seria passiva, num segundo momento, uma impossibilidade da

13 Cf. João Duns Scotus. Textos sobre poder, conhecimento e contingência. Traduzidos por R. H. Pich. (p. 467).

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criatura para com Deus e em um terceiro momento a impossibilidade ativa de Deus

com respeito à criatura.

Deve ser dito, no entanto, que essas coisas que até aqui, nessa distinção

foram colocadas, já foram ditas anteriormente, contudo, da forma como aqui foram

colocadas essas afirmações acredita-se terem sido mais bem elaboradas pelo

próprio Scotus, a fim de que pudesse arguir melhor contra as mesmas. E isso se dá,

ao fato, de que na próxima opinião de Henrique de Gand se repete a mesma coisa

do que anteriormente já havia sido dito por este, a saber, de que este se contradiz

em dois textos diferentes. Nos quais, em um desses textos diz uma coisa e, em

outro diz outra coisa completa e manifestamente oposta. A saber, que, conforme

SCOTUS (2008, p. 468):

“(...)” não é pura e simplesmente verdadeiro sobre o impossível que Deus não pode fazer isto pelo fato de que isto não pode ser feito, mas, ao contrário, [isto] não pode ser feito porque Deus não pode fazê[-lo]. Pois, assim como na [proposição] afirmativa não é dito que Deus pode fazer algo porque aquilo é possível de ser feito, mas, ao contrário, porque Deus pode fazer isto, por isso mesmo isto pode ser feito, seja subjetivamente, seja objetivamente, assim se dá também na [proposição] negativa.

Deste modo, Scotus pensa ter clareado bastante o problema do argumento de

Gand, quanto à sua contraditoriedade, expondo de maneira objetiva e clara a forma

como este defende coisas opostas em textos diferentes. Porém, cumpre ressaltar

que Scotus tende a concordar mais com a primeira opinião exposta e defendida por

Henrique de Gand, a saber, a de que Deus não pode algo porque esse algo de si é

impossível e, portanto, Deus não pode e não que é impossível justamente porque

Deus não pode para com esse algo.

Pensa-se ter ficado bastante clara a opinião de Henrique através dessa analise

pormenorizada exposta nas três versões dos comentários de Scotus. Dito isso,

passar-se-á à análise das improbatio opinionis, ou, à Reprovação das opiniões de

Henrique de Gand por parte de Scotus.

Page 25: Monografia Scotus, o possível e o impossível e a Opinião de Henrique de Gand

25

4 “REPROVAÇÃO DA OPINIÃO” DE HENRIQUE DE GAND POR PARTE DE

SCOTUS – “LECTURA I”

Volta-se de todo modo agora à reprovação da opinião de Henrique de Gand no

texto de “Lectura I”. Quanto às criticas que foram feitas por Scotus a Henrique de

Gand nota-se de inicio que aquele começa por criticar a opinião deste na segunda

via para só depois criticar a opinião exposta em sua primeira via. E isto, denota ao

longo dos respectivos comentários, certo tipo de critério, o qual se afigura visível no

modo como este diverge à opinião de seu interlocutor, pois, ao começar sua critica

pela opinião exposta sempre na sua última via, deixa claro querer atacar a última

opinião exposta, pois ainda está viva no texto, para depois rebater a opinião exposta

inicialmente.

Seguindo, então o curso de suas criticas, começa-se por atacar veemente a

contradição que claramente se pode perceber na opinião exposta nessa segunda

via, onde Henrique de Gand afirma justamente o contrário do que afirma em sua via

anterior. A saber, que a impossibilidade é primeiramente em Deus e só depois na

criatura. Esse posicionamento contraditório para Scotus, bem como para qualquer

estudioso atento, se faz perceber claramente, pois em um momento faz uma

afirmação dizendo que Deus não pode porque é impossível porque de si a coisa é

impossível e em outro momento afirma falando justamente o contrário, que, é

impossível porque Deus não pode para com esse factível.

E, no que diz respeito a essa segunda via, Scotus vai dizer que o dito

precedente, exposto na via anterior, é mais verdadeiro que esse segundo dito, “(...)

porque dizer que a negação e a privação são primeiramente em Deus e a partir disto

na criatura é deveras absurdo” [(SCOTUS, 2008, p. 166)]. Com isso Scotus apenas

corrobora aquilo que o próprio Henrique de Gand dizia no inicio, ou seja, que não

existe ordem similar nas privações e imperfeições e que as mesmas sempre serão

primeiramente no sujeito no qual as mesmas se dão e nunca por ação de um agente

externo14.

E, ainda, no tocante à critica feita a essa via, deve-se prestar bastante

atenção ao tipo de solução que se dá aparentemente parece colocar a esse

problema, onde, conforme SCOTUS (2008, p. 167) ele diz:

14 Cf. João Duns Scotus. Textos sobre poder, conhecimento e contingência. Traduzidos por R. H. Pich. (p. 165).

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26

(...) contra aquela [segunda] via: nada é pura e simplesmente impossível a não ser aquilo ao que repugna o existir; porém, a coisa nenhuma repugna primeiramente o existir porque não há uma relação de um com a mesma, mas a razão primeira por que a algo repugna o existir será intrínseca a partir da repugnância formal [daqueles termos] a partir dos quais é constituída: porque, pois, um daqueles [itens] formalmente repugna ao outro, por isso mesmo não podem constituir um único, mas àquele [complexo], por causa da incompossibilidade deles, repugna o existir; se, portanto, algo é impossível de ser feito, isto será da parte daquelas coisas que deveriam constituir aquilo, porque se contradizem formalmente, e não por causa de um defeito de alguma relação com o mesmo. Não deve ser dito, portanto, que, porque Deus não pode fazer, por isso mesmo é impossível que outra coisa seja feita.

Acredita-se com essa afirmação que Scotus aqui tenha introduzido pela

primeira vez em sua argumentação nessa distinção o aspecto lógico do que é dizer

o impossível. Pois, aparecem termos como, repugnância formal das partes e

incompossibilidade. Termos esses que denotam explicitamente o caráter lógico da

discussão. E isso se reveste de vital importância, pois essa forma lógica de arguição

é característica típica do silogismo aristotélico, muito utilizado pelos teólogos e

filósofos da alta escolástica. Essa é uma característica que segundo pode se

entender trazer rigor aos argumentos levantados em questão.

Portanto, nesse excerto Scotus vai entrar no mérito de que o impossível é

todo e qualquer factível que possua uma incompossibilidade, e, aqui se entende

incompossibilidade como algo que por si possível comporta uma incompatibilidade

formal entre os seus termos, ou seus extremos como o mesmo vai dizer. Pois,

pensando nessa direção pode-se notar quando se fala em repugnância formal das

partes e incompossibilidade, onde, por impossível, se entende o todo que a partir

dos seus termos ou extremos, esses termos ou extremos não podem formar esse

todo coeso por haver em sua constituição, por assim dizer, uma contradição. Dito

isso, percebe-se de maneira muito forte que para Scotus algo pura e simplesmente

impossível será em um primeiro momento aquilo ao que repugna o existir, por

comportar em sua constituição uma contradição, ficando bastante evidente nesses

termos o principio de não-contradição de Aristóteles do qual Scotus se vale para

argumentar nesse caminho. Princípio esse que segundo Aristóteles (2005, p. 145):

Nós, ao contrário, estabelecemos que é impossível que uma coisa, ao mesmo tempo, seja e não seja; e, baseados nessa impossibilidade, mostramos que esse é o mais seguro de todos os princípios. Ora, alguns consideram, por ignorância, que também esse principio deva ser demonstrado. (...) É impossível que exista demonstração de tudo (...). Se, portanto, de algumas coisas não se deve buscar uma demonstração,

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27

aqueles certamente não poderiam indicar outro principio que, mais do que este, não tenha necessidade de demonstração.

Seguramente tomando esse axioma aristotélico, a saber, o princípio de não-

contradição, João Duns Scotus desenvolve com consistência sua argumentação a

cerca do impossível, o qual mais tarde o próprio Scotus insere dentro de uma de

suas notas de rodapé algo muito semelhante ao que o próprio Aristóteles dissera, a

saber, segundo o que fora dito pelo próprio Henrique de Gand em seu Quodlibet VI

quaestio 3 citado em SCOTUS (2008, p. 303):

O não poder fazer coisas contraditórias que são ao mesmo tempo é atribuído a Deus, porque é impossível que essas mesmas em si recebam a simultaneidade; e disso tampouco deve ser procurada alguma razão da parte de Deus..., porque não há razão [para isso] a não ser uma [razão] puramente privativa, a qual não pode ser encontrada da parte de Deus segundo si.

Assim, deste modo, parece que procurar razões ou motivos do por que da

impossibilidade dos contraditórios subsistirem, segundo esses autores e desde

Aristóteles, quando este diz que o princípio de não-contradição não necessita de

demonstração, mostra-se ser de total insignificância para a discussão em questão.

Pois, o que parece ter se consignado com Henrique de Gand e Scotus é que o

princípio de não-contradição colocado como um axioma irrefutável, por ser algo tão

amplamente já aceito por outros sábios de sua época, se afigura aos autores em

questão como uma lei Divina da qual ninguém pode transgredir, nem mesmo o seu

criador, e conforme Gand e Scotus, para isto não precisaríamos procurar um motivo

da parte de Deus do por que nem mesmo Ele, Deus não pode transgredir tal regra,

tal lei, supostamente instituída como sendo constituinte da ordem do universo.

Passar-se-á agora à critica feita por Scotus à primeira via de Gand, a qual

Scotus argumenta assim, que, segundo a potência ativa pela qual Gand diz que

Deus é o produtor de todo e qualquer possível no ser de existência, isso é no

mínimo equivocado, pois, para Scotus, primeiramente o ser tem ou ganha

possibilidade sendo produzida antes naquilo que Scotus chama de ser inteligível, a

saber, obtém possibilidade no intelecto divino, pois como ele diz, segundo SCOTUS

(2008, p. 168) “(...) ademais, seguir-se-ia que em Deus haveria uma relação real

com a criatura, porque precedente a toda operação do intelecto”. Quanto ao que

Scotus critica em Lectura deter-se-á ao que até foi dito.

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28

No entanto, vale salientar que, pela primeira vez se tem mencionado por

Scotus algo muito importante, ou seja, a diferença que o mesmo vê entre a produção

ativa externa e a produção intelectiva intra-mental do ser por parte de Deus.

4.1 “REPROVAÇÃO DA OPINIÃO” DE HENRIQUE DE GAND POR PARTE DE

SCOTUS – “ORDINATIO I”

No que se refere à ordinatio, Scotus começa por atacar o dito exposto por

Gand quanto ao que diz respeito que o mesmo denomina em Deus como sendo a

potência ativa, conhecida também por onipotência. Referindo-se a essa potência

ativa pela qual Deus é dito ser onipotente como não sendo formalmente o intelecto,

mas como que pressupondo a ação do intelecto. Dizendo algo muito importante,

que, a saber, que “o intelecto divino será aquilo pelo que há a primeira razão da

possibilidade (...). Logo, não é aquela potência ativa pela qual Deus é chamado de

onipotente que é a razão primeira da possibilidade (...)”. De acordo com SCOTUS

(2008, p. 305).

De fato, no parágrafo seguinte temos uma definição sobre o possível que de

certo modo nos ajudará a entender, em parte, o que é o impossível. A saber, de que

“(...) o possível, na medida em que é termo ou objeto da onipotência, é aquilo ao que

não repugna o existir e que não pode a partir de si existir necessariamente”.

Conforme SCOTUS (2008, p. 305).

Aparece claramente mais uma vez o argumento lógico, no entanto, dessa vez

no que toca ao possível. Porém, estritamente relacionado ao impossível, pois, se

poderia dizer que algo impossível é aquilo que repugna de si o existir, e, ao que

repugna de si o existir poderíamos dizer baseados no dito anterior que é algo feito

ou constituído de partes formalmente incompatíveis entre seus extremos. Para que o

argumento se revista de força acredita-se podermos citar algo que se encontra na

distinção anterior, ou seja, na distinção quadragésima segunda, com o seguinte titulo

“Se o fato de Deus ser onipotente pode ser provado pela razão natural” e usar-se-á

o exemplo da ordinatio I, onde se podem ler os seguintes trechos, segundo

SCOTUS (2008, p. 291):

(...) distinguindo que ‘onipotente’ por um lado pode ser chamado um agente que pode para com todo o possível, mediata ou imediatamente, - e deste modo a potência ativa do primeiro eficiente é a onipotência, (...). Por outro lado ‘onipotente’ é tomado de modo propriamente teológico conforme é

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chamado onipotente aquele que pode para com todo efeito e todo e qualquer possível (isto é, para com todo e qualquer que não é, de si, necessário nem inclui contradição), (...).

Com isso, mostra-se nesse momento que se usou de uma definição já

exposta em uma distinção anterior para que se pudesse corroborar uma definição

atualmente colocada. Porém, nos parágrafos seguintes Scotus explicita de forma

clara e contundente que a potência ativa que é a onipotência em Deus é aquela

potência pela qual Deus produz as coisas, no entanto, antes que as coisas sejam

produzidas, elas devem ter ser possível, e isto significa que a coisa é produzida

primeiramente no ser inteligível. Portanto, não é através da onipotência divina que a

coisa tem ser ou existência possível primeiramente, mas, por meio de outra causa

concorrente.

Adiante nessa argumentação, Scotus traz o exemplo das causas precisas,

onde a afirmação seria a causa da afirmação e a negação a causa da negação, a

qual ele nega ser correta para o caso em questão e novamente faz menção ao

princípio de não-contradição dizendo que “(...) aquela impossibilidade na criatura é

por causa da incompatibilidade formal das partes)”. Conforme SCOTUS (2008, p.

307).

4.2 “REPROVAÇÃO DA OPINIÃO” DE HENRIQUE DE GAND POR PARTE DE

SCOTUS – “REPORTATIO PARISIENSIS EXAMINATA I”

Muito semelhante, porém, à reprovação feita em ordinatio, é o modo como

Scotus começa sua reprovação em reportatio, ou, argumentando contra a primeira

opinião de Henrique no que diz respeito à potência ativa de Deus pela qual é

chamado de onipotente. E, novamente faz referência à potência ativa de Deus como

onipotência como aquela potência executiva, que produz as coisas no ser externo de

existência dizendo reiteradamente que a coisa ou o factível tem ser possível

primeiramente por meio do intelecto divino.

Portanto, assim como na ordinatio, aqui novamente é trazida a questão de a

possibilidade estar ligada primeiramente ao intelecto divino. Scotus argumenta que

antes da criatura ser produzida no ser de existência pela potência ativa, também

denominada onipotência, a criatura tem antes de tudo ser possível. E, para isso ele

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30

diz o seguinte, conforme SCOTUS (2008, p. 468-469) “(...) quando a criatura existe

no intelecto divino, por um ato do intelecto, ela tem formalmente ser possível”.

Claramente pode se dizer que a causa do ser possível é o intelecto divino que

antes de qualquer outra causa ou potência executora dá ou gera a existência no ser

possível para daí sim passarmos ao ser real de existência externa. E para o caso em

questão dá-se o exemplo da pedra15. No qual basicamente Scotus diz que antes de

qualquer coisa, a pedra tem ser possível pelo ato inteligível do intelecto divino que

primeiramente intelige o ser possível para só depois em um segundo momento

passar ao ato de produção através da potência ativa à qual é para com todo e

qualquer possível de si não necessário que não inclui contradição.

No parágrafo seguinte, no entanto, é dito que a onipotência divina não é o

princípio da coisa senão segundo o ser de existência da própria coisa segundo as

palavras do próprio Scotus. E continua dizendo que, esse ser tem de ter sido

principiado ou iniciado por algo, porém, não pela onipotência, nem pela potência

ativa, mas, pelo intelecto. Algo curioso e interessante é que Scotus cita Avicena em

uma passagem de sua metafísica onde, de forma bem sucinta este diz, conforme

SCOTUS (2008, p. 470) “(...) que nada pode ser produzido por todo e qualquer

agente a não ser que em si anteriormente tenha sido possível”.

Por isso, é dito por Scotus que a coisa enquanto inteligida pelo intelecto divino

em essência recebe e tem possibilidade e, assim, o é antes de qualquer ação ou

poder ativo em Deus.

No entanto, um pouco mais adiante nessa distinção Scotus vai afirmar algo

que já o fizera nas respectivas distinções quadragésima terceira em Lectura e

ordinatio, onde este diz que no que se refere ao assunto em questão conforme

SCOTUS (2008, p. 471) que, “(...) o impossível pura e simplesmente inclui uma

contradição, porque tudo o que não inclui repugnância formal ou contradição é

possível a Deus”. E isto tudo no que se refere aos contraditórios16.

15 Cf. João Duns Scotus. Textos sobre poder, conhecimento e contingência. Traduzidos por R. H. Pich. (p. 469), “Ele considera, pois, que uma pedra, e isto [tudo] que é feito pelo intelecto divino como [forma] exemplar, tem entidade qüididativa firmada, e por consequência é possível que ela exista externamente. Pois [é] pelo fato de que a coisa pode ser externamente que é distinguida a entidade firmada da ficção. Mas, o intelecto divino precede formalmente a onipotência – por toda e qualquer potência que a onipotência for tomada. Logo, não [é] pela onipotência que alguma coisa é primeiramente possível. (...) a pedra tem ser possível primeiramente e principiativamente por aquilo pelo que tem ser no intelecto ou no ato divino de inteligir”.

16 Cf. João Duns Scotus. Textos sobre poder, conhecimento e contingência. Traduzidos por R. H. Pich. (p. 471) “Mas, os contraditórios têm uma repugnância formal a partir de si, e não a partir da

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31

4.2.1 “Reprovação da opinião” de Henrique de Gand por parte de Scotus –

“Reportatio Parisiensis Examinata I” - Corolários

Ademais, há uma novidade que se insere aqui, a saber, a de que Scotus

introduz três corolários para contrapor a posição de Gand e salvaguardar a sua. O

qual o primeiro corolário diz respeito à teoria de Gand acerca dos quatro instantes,

quanto à potência passiva da criatura ser referida a Deus no terceiro instante, pois

como Scotus claramente nota que o próprio Henrique de Gand já havia exposto que

a relação de Deus com a criatura se dava no quarto instante. Portanto, o problema é

o que dará termo a essa relação, ou Deus daria termo a essa relação sob uma razão

absoluta, porém, Scotus diz que isso vai contra o que ele mesmo defendera em

outro lugar citando Prepositino de Cremona corrige o dito deste conforme SCOTUS

(2008, p. 472) dizendo que “(...) Deus dá termo a uma relação da criatura com ele

mesmo segundo uma relação de razão, e não segundo uma relação real”. Pode se

perceber aqui uma clara critica de Scotus à aludida teoria dos quatro instantes de

Gand, encontradas já nas distinções das versões anteriores, o qual hierarquiza as

relações de potência e impotência de Deus com a criatura.

No segundo corolário critica a contradição existente na sustentação da

opinião de Henrique, de que a potência ativa em Deus ou a sua onipotência é

anterior à potência dita passiva na criatura, pois, segundo o próprio Henrique de

Gand a relação da criatura com Deus se daria no instante o qual, por sua vez, é

anterior à relação que Deus teria com a criatura, visto que essa se dá apenas no

quarto instante.

E, no que diz respeito ao terceiro corolário temos o seguinte problema

conforme SCOTUS (2008, p. 472-473):

(...) a partir do que foi dito por ele, é que a onipotência ou a potência ativa, enquanto é um atributo, é meramente um absoluto, e não algo que diz uma relação de razão, assim como ele mesmo afirma em outro lugar. (...) Pois, segundo ele, aqui a potência ativa é, no primeiro instante, completamente relacionada consigo mesma, e tão-somente no quarto instante há uma relação nele com um objeto.

relação com alguma negação extrínseca; antes, se fosse possível que Deus não existisse, ainda assim os contraditórios contradiriam a si mesmos. Logo, a impossibilidade pura e simplesmente, na criatura, não se dá por causa de alguma negação ou de uma impossibilidade em Deus”.

Page 32: Monografia Scotus, o possível e o impossível e a Opinião de Henrique de Gand

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E, para as colocações em questão acredita-se estarem suficientemente claras

as criticas postas nestes três corolários, de forma sistemática.

Page 33: Monografia Scotus, o possível e o impossível e a Opinião de Henrique de Gand

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5 QUANTO ÀS OPINIÕES PRÓPRIAS E AS RAZÕES OU ARGUMENTOS

PRINCIPAIS – “LECTURA”

De maneira que se possa deixar o argumento o mais claro possível, far-se-á

uma explicitação breve de cada um desses argumentos respectivamente. No que

tange à opinião própria Scotus traz a questão da impossibilidade como que ligada às

ideias divinas17. Quando se fala em ideias divinas quer se dizer aquela potência pela

qual primeiramente o ser é possível por meio de um intelecto que o concebe. Por

esse motivo é que Scotus vai criticar duramente a concepção de Henrique de Gand

quanto a sustentar que é a onipotência ou a potência ativa de Deus que é a

responsável pela produção ou pela possibilidade em algo ser feito. Pois, para Scotus

antes de uma potência executiva é necessário que haja uma potência criativa, que

pense e apresente o ser possível para que seja feito.

Por isso, com muita justiça vai ser dito pelo mesmo que a potência de Deus

pela qual é denominado onipotente seria a causa não-precisa por que alguma coisa

é produtível e factível, no entanto, em concorrência com essa potência os termos

não podem ser contraditórios ou se repugnarem. Seguindo sua linha de raciocínio

vai ser dito, conforme SCOTUS (2008, p. 169) que “(...) porque a primeira operação

divina é a do próprio intelecto, pela qual as coisas são produzidas primeiramente no

ser inteligível, e não a potência ativa pela qual algo é produzido externamente”.

Próximo a isso no texto em questão é feita por Scotus uma hierarquização de

como o factível é produzido18, colocando novamente o foco na potência do intelecto

como criativamente iniciadora do ser possível.

No que se refere à razão principal novamente é reforçada a questão de que a

incapacidade observada no factível não é por culpa de Deus que não concedeu ou

deu tal capacidade, mas a potência divina seria a causa não-precisa de tal

17 Cf. João Duns Scotus. Textos sobre poder, conhecimento e contingência. Traduzidos por R. H. Pich. (p. 168-169) “(...) digo que é dito que algo é impossível de ser feito não porque Deus não pode fazer aquilo ou por causa do não-poder divino, mas muito mais por causa do poder: pois aquilo que não pode ser na natureza das coisas, imagina-se como algo composto de muitas [partes mutuamente] contraditórias, as quais não fazem um único e nem podem fazer um único (assim como é a quimera e [coisas] desse tipo); Deus, porém, (...) pode produzir partes desse tipo, que incluem uma incompossibilidade formal, por isso mesmo aquele todo não pode ser feito. (...) Donde a primeira razão extrínseca por que [alguma coisa] desse tipo não pode ser feita é a potência de Deus, pela qual são produzidas as coisas primeiramente no ser inteligível; contudo a primeira razão formal é a repugnância formal das partes a partir das quais o composto é imaginado”.18 Cf. João Duns Scotus. Textos sobre poder, conhecimento e contingência. Traduzidos por R. H. Pich. (p. 170). “Donde primeiramente as coisas são produzidas no ser conhecido, e depois são mostradas à vontade e são produzidas no ser querido, e assim no ser de existência”.

Page 34: Monografia Scotus, o possível e o impossível e a Opinião de Henrique de Gand

34

incapacidade. Deve se notar aqui que o termo usado é “incapacidade”, ou melhor, a

não capacidade para que algo seja feito e não propriamente o termo impossível.

5.1 QUANTO ÀS OPINIÕES PRÓPRIAS E AS RAZÕES OU ARGUMENTOS

PRINCIPAIS – “ORDINATIO I”

Têm-se aparentemente de inicio, novamente menção ao poder do intelecto

divino como principiador do ser inteligível para só depois haver o ser possível,

dizendo, então, que o intelecto divino produz esse ser no ser inteligível num primeiro

instante de natureza onde este se relaciona num segundo instante de natureza com

o ser possível, e, reforçando a ideia de Scotus que Deus é conhecido ou tido por

onipotente e não pelo intelecto divino que não seria própria ou formalmente a

potência ativa de Deus.

Perseguindo essa ideia, chegar-se-á a conclusão de que a impossibilidade

sempre será da parte da coisa e isso, por causa da incompatibilidade para que seja

feita. Volta-se nesse ponto, ao impossível lógico/formal, ligado estritamente ao

princípio de não-contradição. Trazendo mais adiante um pouco que o impossível

simpliciter, ou, pura e simplesmente inclui segundo Scotus coisas incompossíveis, e,

essa incompossibilidade se dá pelas suas razões formais e, a qual seria

principiativamente por causa do intelecto divino que concebe coisas que são

formalmente incompatíveis entre si.

Portanto, é dito por Scotus que a impossibilidade primeira seria formalmente

do ou no próprio impossível e só então principiativamente em Deus que daria

inteligibilidade a tal ser através do seu intelecto, pois o intelecto divino principiaria

algo em tal ser no qual essas partes seriam incompatíveis e segundo o mesmo, em

detrimento dessa incompatibilidade formal um todo a partir dessas partes seria pura

e simplesmente impossível. Criticando assim, deste modo, àqueles que procuram a

razão ou o motivo da impossibilidade em algum ser uno. E quanto a essas coisas

ditas incompatíveis é dito que tal razão dessa incompatibilidade seria ou é a partir

das razões formais delas, e, aqui aparece o ponto chave que já vem sendo dito

anteriormente por Scotus, incompatibilidade essa que elas têm primeiramente pelo

intelecto divino.

Page 35: Monografia Scotus, o possível e o impossível e a Opinião de Henrique de Gand

35

Porém, quanto ao argumento principal, e, aqui, vale ressaltar que, na versão,

a saber, em Lectura essa parte é denominada de razão principal, no entanto, em

ordinatio é chamada de argumento principal. E, é dito então que tal coisa não pode

ter capacidade para que algo seja feito e, contudo, esse motivo estaria reduzido

única e puramente à incompatibilidade formal das partes, e, em última instância ao

intelecto divino. Pode-se notar aqui no argumento principal em ordinatio que em

último caso a incapacidade para tal coisa ser feita, ou que impossível se reduz,

entretanto ao intelecto divino que dá primeiramente possibilidade a tal ser19.

5.2 QUANTO ÀS OPINIÕES PRÓPRIAS E AS RAZÕES OU ARGUMENTOS

PRINCIPAIS – “REPORTATIO PARISIENSIS EXAMINATA I”

Em reportatio é afirmado categoricamente por Scotus que a onipotência

divina, enquanto atributo absoluto em Deus é anterior à criatura segundo todo e

qualquer ser dessa. Concluindo um pouco adiante que a possibilidade e a

onipotência, ou, a potência ativa de Deus é anterior a alguma possibilidade da parte

da criatura. Porém, no que segue este diz que a primeira razão da possibilidade na

criatura não é a potência ativa ou onipotência de Deus, mas, sim o intelecto divino

pelo qual essa coisa é constituída primeiramente no ser inteligível.

No que segue pode-se notar outra vez a argumentação em torno da defesa

do principio de não-contradição, quando é dito que nenhuma afirmação é

primeiramente uma coisa impossível nos entes, pois, afinal de contas, todo e

qualquer afirmativo, que pode ser concebido, pode ser. E desta maneira, nada é

pura e simplesmente impossível a não ser que implique contradição20. Nos

parágrafos seguintes vai ser levantada a questão que do próprio impossível haja

uma razão primeira e nisso é dito que assim como também do seu oposto que é o

necessário, e para tanto é trazida novamente a autoridade de Aristóteles no Livro IV

da Metafísica onde é dito por este que “(...) (com efeito, necessário significa não

poder não ser). Portanto, não é possível que seja verdade, ao mesmo tempo, dizer

de algo que “é homem” e que “não é homem””. Conforme ARISTÓTELES (2005, p.

151).

19 Cf. João Duns Scotus. Textos sobre poder, conhecimento e contingência. Traduzidos por R. H. Pich. (p. 313)20 Cf. João Duns Scotus. Textos sobre poder, conhecimento e contingência. Traduzidos por R. H. Pich. (p. 474)

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36

Partindo, pois, da premissa aristotélica de que necessário é aquilo que não

pode não ser, Scotus diz que é preciso que se investigue a razão primeira da

impossibilidade e da necessidade. Contudo, no parágrafo seguinte se pode

contemplar claramente a opinião e o posicionamento de Scotus frente ao problema

quando este diz que:

Quanto a isso deve ser dito que a impossibilidade, no impossível, tem de ser reduzida ao intelecto divino, [e] não que em Deus resida a primeira impossibilidade como razão e causa da impossibilidade na criatura (...) Ora, as partes do próprio incompossível são simultaneamente incompossíveis e, em si, formalmente repugnantes, tal como o branco e o negro. O primeiro ser possível que [essas partes] têm, têm[-no] pelo intelecto divino principiativamente e, por conseguinte, têm pelo intelecto divino principiativamente a sua incompossibilidade, assim como também as suas razões formais. (SCOTUS, 2008, p. 475).

Scotus faz a distinção entre o ente de ficção e o ente firmado, o qual, esse

ente de ficção conforme os exemplos dados como a ‘quimera’ e o ‘homem irracional’

só podem ser concebidos por um intelecto que erra, e enquanto concebido por um

intelecto que erra segundo ele nada é. Para Scotus esses entes de ficção e

contraditórios significam a mesma coisa, pois, ademais só podem ser pensados ou

imaginados, nunca, no entanto, como seres reais, ou melhor, entes firmados. Afirma

que tais seres fictícios ou contraditórios nem sequer teriam ideias correspondentes

em Deus, a não ser que considerássemos as suas partes contraditórias.

No entanto, é concedido por Scotus que embora este considere que o

intelecto divino seja a primeira causa da possibilidade na criatura, também concede

que esse mesmo intelecto divino seria a causa do impossível quanto às partes dele,

no que toca ao ser possível primeiramente, mas não quanto a todo o impossível ou

com respeito ao impossível todo como este diz. Pois segundo o compreendido até

então, o impossível não teria causa nem no ser e tão pouco no ser inteligível

segundo afirmação de Scotus.

Curioso é o fato de mais uma vez após a opinião própria o titulo subsequente

vir novamente levemente alterado, a saber, em lectura se lê “Quanto à razão

principal”, em ordinatio “Quanto ao argumento principal” e aqui em reportatio se lê

“quanto aos argumentos principais da primeira questão”, e aqui, pode ser levantada

a seguinte pergunta, porque primeira questão? E a resposta é muito simples, pois,

parece que Scotus viu certa necessidade em delimitar um pouco melhor nessa

última versão dos comentários o seu ponto de vista ou opinião sobre o assunto,

Page 37: Monografia Scotus, o possível e o impossível e a Opinião de Henrique de Gand

37

levantando uma segunda questão, a saber, de titulo “Se Deus poderia fazer coisas

diferentes do que fez21”.

Por isso, no que diz respeito aos dois argumentos principais expostos por

esse Doutor, no primeiro é exposta a opinião quanto à dizer algo sobre o possível é

no próprio possível a partir de si formalmente. Contudo, quanto ao impossível é dito

que não é o caso que porque Deus não tenha dado tal capacidade para os

incompossíveis, mas porque dá as partes do impossível que somente

simultaneamente se contradizem.

Em artigo escrito pelo professor Theo Kobusch da Universidade de Bonn na

Alemanha, artigo este que recebeu o seguinte titulo “Um novo caminho do

conhecimento filosófico de Deus: Henrique de Gand, Mestre Eckhart, Duns Scotus”

faz-se menção em seus estudos sobre os quodlibets VI e VIII de Henrique de Gand,

textos esses que serviram de pano de fundo para as interlocuções usadas por

Scotus sobre o que pensava Gand a respeito desses temas sobre o possível e o

impossível.

De forma a clarear alguns posicionamentos que Scotus vem defendendo em

suas opiniões próprias se faz necessário ressaltar algumas das conclusões a que

chega o professor Kobusch neste artigo, a saber:

O motivo interno, porém, para a possibilidade de algo reside, por um lado, na sua essência mesma; para a impossibilidade, por outro, na lei de não-contradição, que representa também o limite do poder de criação divino. (...) assim também a possibilidade de infração contra a lei de não-contradição significava a destruição da ordem das essências, sim, a suspensão de toda ordem. (KOBUSCH in. Veritas, 2008, p. 62).

Pode-se pensar aqui, no entanto, que Scotus poderia concordar com alguns

desses posicionamentos, principalmente no que se refere a não violação do princípio

de não-contradição, colocando em tal lei uma vital importância.

A razão ou motivo interno da possibilidade residir em sua essência mesma

parece dizer algo com o qual Scotus já concordara, ou seja, que o possível por

essência intrínseca é assim, sendo que, no que concerne à impossibilidade, esta

está puramente baseada na não violação da lei ou princípio de não-contradição, o

qual foi sem nenhuma hesitação atribuído como delimitador do poder de criação

21 Cf. João Duns Scotus. Textos sobre poder, conhecimento e contingência. Traduzidos por R. H. Pich. (p. 477)

Page 38: Monografia Scotus, o possível e o impossível e a Opinião de Henrique de Gand

38

divino. Com isso se pode perceber uma coisa, pois, que, ir contra a lei de não-

contradição seria destruir a ordem das essências e toda ordem segundo o mesmo.

O que parece haver aqui é o fato de que essa lei ou esse princípio de não-

contradição é, não somente algo perante o qual o poder de criação divino está

submetido mas, sim, muito mais uma lei estatuída por Deus mesmo para ordenar as

essências no mundo, ou melhor, pôr ordem às mesmas, a qual nem Deus de

potência ativa ou onipotência pode transgredir para que Ele não entre em

contradição com a própria lei previamente estatuída.

E isso se configura de maneira muito clara, simplesmente pelo fato de que se

Deus em sua infinita sabedoria e poder instituísse tal lei ou um princípio do qual teria

por vez ou outra de transgredir, significaria que se houvesse a necessidade dessa

transgressão por parte de Deus seria única e exclusivamente por que Ele erra e, se

Ele erra, logo, não é bom, nem perfeito. E isso acredita-se que não possa ser

concedido, e pensa-se que nenhum desses doutores concederia tal coisa, visto

haverem tantas defesas da impossibilidade mesmo da parte de Deus para que se

destrua a ordem estabelecida pela lei de não-contradição.

Perante as distinções que são feitas quanto ao ser pensado pelo intelecto

divino como ser possível e o ser real de existência externa são feitas as seguintes

considerações, conforme KOBUSCH (in. Veritas 2008, p. 63):

Portanto, todo ente criado é, ontologicamente, composto de três determinações: da coisidade mais geral, que consiste na mera concebibilidade através de um intelecto criado, da coisidade de determinação interna, isto é, da essência, e do ser de existência exterior.

Quando vemos a palavra utilizada pelo professor Kobusch “coisidade”, por

associação podemos pensar diretamente no termo latino quiditas, traduzido em

português por quididade, que significa em terminologia mais técnica a palavra

essência, a qual, por vezes também pode ser traduzida de maneira um tanto quanto

mais informal por coisidade. A coisidade de um ser ou de um ente é aquilo pelo qual

esse ser se identifica como objeto singular irrepetível, em linguagem propriamente

filosófica, idêntico a si mesmo.

Têm-se claramente uma harmonia entre aquelas coisas que Scotus pensa

acerca do mesmo e através do estudo do professor Kobusch sobre o pensamento

de Henrique de Gand pode se traçar algumas linhas semelhantes de posições

quanto a isso. Pois, concede-se que Scotus assim como Gand aceita que uma coisa

Page 39: Monografia Scotus, o possível e o impossível e a Opinião de Henrique de Gand

39

é o ser possível em potência no intelecto divino e outra é o ser real extramental de

existência. Outra máxima concedida tanto por Scotus quanto por Henrique de Gand,

que o princípio ou lei de não-contradição não deve ser transgredida, e, a mesma não

pode sê-lo nem mesmo por Deus, porque ao que tudo parece indicar Deus é o autor

desse princípio, princípio esse que mais se parece com um axioma que se refere a

ordem das coisas.

5.2.1 Quanto à questão número 2 na distinção 43ª em “Reportatio Parisiensis

Examinata I” – “Se Deus poderia fazer coisas diferentes do que fez”

Parece, muito claramente, para o momento em questão que Scotus pensara

ser oportuno introduzir uma segunda questão dentro dessa distinção em reportatio e,

isso pode ser entendido da seguinte maneira, a saber, como um modo de defender e

apresentar uma justificativa de forma mais contundente e expressiva a cerca do que

se está debatendo. Ora, inquirir-se sobre a liberdade de Deus em deliberar e mesmo

escolher fazer coisas diferentes do que tenha feito é, ao menos, em um primeiro

momento perguntar-se se Deus poderia mudar de ideia quanto àquilo que

previamente estabelecera como sendo de um determinado modo.

No que se segue, quanto à seguinte pergunta Scotus no que se refere

àquelas coisas que Deus quer, faz uma diferenciação entre proposições compostas

e divisas. Pois, Deus pode querer o que quer e não querer o quer22. Portanto, no

sentido composto Deus só pode querer uma coisa entre duas escolhas, no entanto,

no que tange ao sentido diviso Deus pode querer ou não querer algo, pois como

amplamente conhecido o sentido diviso exposto aqui por Scotus pode ser entendido

aludidamente àquelas proposições que conhecemos por disjuntivas, e uma das

máximas adotadas quanto a uma proposição disjuntiva é de que toda disjunção é

verdadeira, pois, um dos lados dessa disjunção sempre diz o mundo como ele é

embora o outro lado da mesma possa estar completamente em desconexão com a

22 Cf. João Duns Scotus. Textos sobre poder, conhecimento e contingência. Traduzidos por R. H. Pich. (p. 478) “No sentido composto, toda e qualquer [proposição] desse tipo é falsa: ‘Deus, querendo isto, pode não querê[-lo]’, seja se aqui os extremos são tomados como significando estarem unidos num mesmo [instante de] tempo ou em [instante de tempo] diferente. No sentido diviso, toda e qualquer [proposição] desse tipo é verdadeira, seja se num mesmo [instante de] tempo ou em [instante de tempo] diferente, e ela deve ser exposta por meio de duas [proposições] categóricas, por uma primeira de existência e uma segunda de possibilidade”. Claramente pode ser percebido que quanto a esses dois tipos de proposições correspondem às proposições conjuntivas a que Scotus denomina como proposição no sentido de composição e proposições disjuntivas àquelas que este denomina como divisas.

Page 40: Monografia Scotus, o possível e o impossível e a Opinião de Henrique de Gand

40

realidade. Diferentemente da proposição que Scotus chama por composta, a qual se

conhece por conjunção, e da qual se pode entender que o mesmo queira dizer que

tal proposição em si inclua termos que se contradizem e por isso mesmo são falsas

tais proposições.

Para que se reforce o que se quer dizer é dito que:

(...) ele pode fazer não somente coisas diferentes que não fez, mas, antes, coisas opostas àquelas que fez, porque é preciso que cada um dos opostos seja possível a Deus, mas não simultaneamente. (...) Pois nada que não inclui coisas contraditórias é impossível a Deus. (SCOTUS, 2008, p. 479).

Tonifica-se outra vez aqui a questão de que nada que possa vir a ferir o

princípio de não-contradição seja impossível a Deus. Pode-se também perceber que

Deus tem poder de ação sempre e em qualquer ocasião que este poder não venha a

ferir o principio de não-contradição. Parece depois de dito tudo isso até então que, o

princípio de não-contradição que vem ultrapassando desde a filosofia grega antiga

até os dias atuais, seria não apenas um dos axiomas encontrados na Metafísica de

Aristóteles, mas seria um dos axiomas divinos sob os quais a criação foi pensada e

feita a partir de então.

5.2.2 Quanto a questão número 1 na 44ª distinção em “Reportatio Parisiensis

Examinata I” – “Se Deus poderia produzir as coisas diferentemente do que faz”

De todo modo, como no princípio havia sido falado que, se utilizaria de ideia

ou tópicos encontrados em duas distinções além das respectivas distinções

quadragésima terceira nos três comentários. A saber, que como em outra parte já

fora colocado uma determinada ideia encontrada na distinção quadragésima

segunda em Ordinatio I, agora, fez-se necessário conceder um argumento ou

argumentos com ideias importantes para reforçar opiniões já expostas e

fundamentadas na quadragésima quarta distinção na questão número um.

Curioso é perceber a semelhança que há entre a segunda questão na

quadragésima terceira distinção e a primeira questão na quadragésima quarta

distinção em Reportatio Parisiensis Examinata I. Donde, claramente pode se notar

que a segunda quaestio na 43ª distinctio trata sobre a possibilidade de Deus poder

fazer diferentemente aquilo que já está ou foi feito, ao passo que, a primeira

Page 41: Monografia Scotus, o possível e o impossível e a Opinião de Henrique de Gand

41

quaestio da 44ª distinctio se trata se no momento de instante atual seria possível

que agisse de modo diferente.

No que se refere a isso entra em questão duas potências supracitadas por

Scotus, a saber, potência ordenada e potência absoluta. Onde por potência

ordenada parece que se pode entender que Scotus tem como aquela potência que

age de acordo com uma lei previamente instituída, ao passo que, segundo o próprio

Scotus embora a potência ordenada se submeta à potência absoluta, essa não se

submete à ordenada. De todo modo, é dito também que:

Deus, porém, pode agir por todo modo que não inclui contradição. Logo, dado que muitos outros modos não incluem contradição, ele pode agir diferentemente do que segundo [uma] potência ordenada. (...) Porém, a vontade pode contingentemente querer e desquerer todo e qualquer [objeto], por isso mesmo ele pode estatuir uma outra lei, tal (...). Logo, a potência absoluta dele não excede a ordenada, porque toda e qualquer lei que fosse instituída por Deus diferentemente ou que [fosse] diferente daquela que agora vale seria ordenada. (SCOTUS, 2008, p. 486).

Portanto, verifica-se novamente a questão do não ferimento do princípio de

não-contradição. Essa questão se torna uma constante no que diz respeito a poder

fazer coisas que se contradizem formalmente. Portanto, para o assunto em questão

produzir diferentemente as coisas do que atualmente faz implica em que novamente

o faça de acordo com o princípio de não-contradição. Portanto, se Deus instituísse

uma lei nesse instante que em outro momento não valia, estaria assim, deste modo,

agindo de potência ordenada, pois assim, não estaria ferindo ou indo de encontro à

lei de não-contradição.

No entanto, é dito algo muito semelhante ao que já fora dito, a saber, sobre

distinguir sobre os tipos de proposições, onde, conforme SCOTUS (2008, p. 486-

487) se diz o seguinte:

Donde esta proposição ‘Deus pode produzir as coisas diferentemente do que segundo a ordem disposta ou que dispôs’ deve ser distinguida segundo a composição e a divisão. No sentido de composição, ela é falsa e impossível, porque não se mantêm simultaneamente que aja diferentemente do que dispôs, [e o faça] em se mantendo aquela disposição e ordenação. No sentido de divisão, ela é verdadeira, porque Deus faz por este modo e, contudo, pode [fazer] pelo modo oposto, porque assim como Deus dispôs que assim deve ser feito segundo esta ordem, assim também poderia dispor diferentemente (...).

Ademais, pode-se mais uma vez fazer perceber a distinção entre proposições

conjuntivas e disjuntivas, onde a primeira é sempre falsa, porque concebe que

coisas contraditórias sejam simultaneamente e a segunda verdadeira, porque em

Page 42: Monografia Scotus, o possível e o impossível e a Opinião de Henrique de Gand

42

respeitando o princípio axiomático de não-contradição, diz que ou uma coisa ou

outra, porém, Deus pode produzir coisas diferentemente do que faz, contanto que,

não vá contra esse princípio e seja no sentido de divisão, o qual, estabelece que não

nenhum problema quanto a isso contanto que a vontade divina para produzir ou não

produzir algo não se deem no mesmo instante simultaneamente.

Ainda, quanto à questão das proposições Scotus diz que “(...) digo que na

eternidade podem ser feitos [objetos] opostos divisivamente, não conjuntivamente, e

isto no mesmo instante”. Conforme SCOTUS (2008, p.489). Colocado isto par que

seja reforçada a ideia de proposições disjuntivas, como aquela máxima que diz que

toda disjunção é verdadeira, pois, um de seus lados sempre diz o mundo, embora, a

outra parte dessa disjunção seja falsa.

6 CONCLUSÃO

Page 43: Monografia Scotus, o possível e o impossível e a Opinião de Henrique de Gand

43

Pensa-se, antes de qualquer coisa, que possa ser de grande auxilio para a

discussão em questão que se faça duas perguntas, a fim de se estabelecer melhor a

conclusão, a saber, (I) o que significa dizer que algo é possível? E (II) o que significa

dizer que algo é impossível?

Quando se volta o olhar para as opiniões próprias de Scotus e os argumentos

expostos nas razões e argumentos principais do mesmo, pode-se notar sempre uma

coisa em comum permeando as conclusões pensadas e expostas por Scotus nos

comentários que este fez ao livro das sentenças de Pedro Lombardo, a saber, que

(I) a primeira razão da possibilidade de algo está diretamente ligada ao intelecto

divino que possibilita tal ente no ser inteligível, (II) Deus é a causa da possibilidade,

quando intelige algo através de seu intelecto que, formalmente não inclua

contradição entre os seus termos, (III) Deus é a causa não-precisa do impossível

não por causa do seu não-poder para que seja feito, mas muito mais pelo seu poder

e pelo intelecto que concebe coisas diversas que se contradizem formalmente e não

podem formar um todo e (IV) dizer que algo é impossível a Deus é dizer que esse

algo primeiramente de si e a partir de si é impossível, por uma razão muito simples e

clara, porque para Deus única e puramente algo impossível é aquilo que inclui

contradição e formalmente possui uma incompossibilidade dos seus termos.

Dizendo isso, podem ser inferidas muitas coisas, a saber, que o possível tem

sua primeira razão pelo intelecto divino que principia tal coisa no ser inteligido e

mostra à vontade que o faz possível num segundo momento pelo poder ativo que

executa e produz algo no ser de existência. O poder intelectivo de Deus é anterior à

sua onipotência ou poder ativo pelo qual produz algo externamente. Porém, contudo,

esse poder do intelecto divino pelo qual faz possível o ser primeiramente intra-

mental não é aquela potência pela qual Deus é chamado de onipotente, mas essa

potência ativa que é a onipotência pode se dizer que pressupõe a ação do intelecto

como causa concorrente.

Portanto, pode se dizer que o possível é tudo aquilo com o qual Deus pode

primeiramente pelo seu intelecto divino que principia tal ser sem que haja

repugnância formal entre seus termos, ou seja, o possível tem sua razão primeira

em Deus por meio de seu intelecto divino e num segundo momento por meio de sua

onipotência ou seu poder ativo esse ser é produzido no ser real de existência e

Page 44: Monografia Scotus, o possível e o impossível e a Opinião de Henrique de Gand

44

como bem dito possível é, também, aquilo que não é de si necessário e não inclui

contradição.

Deste modo, por impossível deve ser entendido todo e qualquer que inclua

repugnância formal das partes, tornando deste modo, por incompatibilidade formal

impossível que seja formado um todo a partir disso. E quanto a isso a razão primeira

de tal impossibilidade é sempre do próprio impossível que de si e a partir de si não

se relaciona com Deus, pois, o impossível é dito de Deus sempre numa relação

onde a criatura quanto a Deus é dita não-potente. E assim, Deus é tido como a

causa não-precisa do impossível por conceber no intelecto divino coisas que não

podem formar um todo, como entes de ficção, que só podem em última instancia

serem pensados e imaginados como seres intramentais e nunca como seres de

realidade extramental externa.

Consequentemente, deve ser colocado que sempre foi deixado muito claro

por Scotus que Deus de forma alguma é a primeira razão da impossibilidade no

factível, ao passo que, para o oposto disso deve ser dito que quanto às coisas

possíveis, essas o são primeiramente porque através do intelecto divino existe a não

repugnância formal entre os termos de uma proposição tal, que quanto ao todo pode

ser pensada a sua existência exterior.

Portanto, do impossível primeiramente há uma privação e uma negação da

parte do próprio impossível que nunca é dito de Deus, mas sempre e pura e

simplesmente quanto à criatura. E, por outro lado, que poderia ser o caso que pelo

poder divino do intelecto de Deus, Deus seria a causa não precisa do impossível ao

passo que o intelecto divino cria e intelige coisas que não podem formar um todo por

haver uma repugnância formal entre os seus extremos.

E, com isso, suscita-se novamente aquilo que foi dito no princípio, a saber,

que a discussão sobre o possível e o impossível implicava dois tipos de

argumentação em torno de seu debate, ou seja, uma argumentação metafísica e

outra lógico/formal. A argumentação metafísica é aquela que liga o possível e o

impossível diretamente às relações de Deus com a criatura ao passo que a

argumentação lógica é aquela sobre a qual muito se falou até agora, a saber que o

impossível bem como o possível estão estreitamente submetidos ao princípio ou lei

de não-contradição. Princípio esse que sobrevive desde os gregos antigos.

Page 45: Monografia Scotus, o possível e o impossível e a Opinião de Henrique de Gand

45

De todo modo, em última instancia até Deus se encontra submetido ao

princípio de não-contradição, ao passo que, seria contraditório ir opostamente contra

algo que pré-determinou que fosse de determinado modo.

Page 46: Monografia Scotus, o possível e o impossível e a Opinião de Henrique de Gand

46

REFERÊNCIAS

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