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Movilizacao social e educacao democratica
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VII Seminário Internacional – As Redes Educativas e as Tecnologias: transformações e subversões na atualidade • 2013
MOBILIZAÇÃO SOCIAL E EDUCAÇÃO
DEMOCRÁTICA, DUAS FACES DA MESMA MOEDA
Carlos Riádigos Mosquera
ALDEIA GLOBAL?
Vivemos momentos pouco especiais e bastante normais em alguns aspectos concretos. Um
deles é a confrontação ideológica entre formas de entender a vida em sociedade, tão habitual
durante séculos. O que, como em outros momentos da história, se nos quer fazer ver como uma
"crise" do dinheiro e do sistema financeiro (como se este tivesse vida própria para além das pessoas
que o gerenciam), não é mais que a ofensiva da casta econômica e política desse 1% da população
para se fazer com, ainda, mais poder social do que já têm. O capitalismo radicaliza-se aos poucos, e
alcança um poder que não para de crescer graças a liberdade dos mercados financeiros e ao
enfraquecimento dos estados em sua função de proteção social, fraqueza que não é tal se falamos de
legislar para a desregulamentação da atividade mercantil ou bancária, por exemplo. Essa luta não é
mais, portanto, que a luta de formas de entender a sociedade e como esta deveria ser organizada.
Em nossos dias, boa parte dessa questão ideológica faz referência a chamada "sociedade da
informação" na qual três quartos do planeta não desfruta dessa informação, e que também é
chamada "aldeia global". Quando nos referimos a este termo constantemente esquecemos que essa
aldeia tem vizinhas/os de todo tipo de procedência e condição, e que olhar pelo bem da aldeia é
olhar pela cada um/a de suas vizinhas/os na que deveria ser uma família global, mundial. Barreto
(2010, pág. 3) argumenta assim:
… simplificações fundadas em pressupostos nem sempre explicitados. O principal
deles é o de que o mundo tenha mudado em função de uma “revolução científico-
tecnológica”, em cujo centro estariam as TIC. Nesta perspectiva determinista (Wood,
2003), as TIC podem ser pensadas fora das relações que constituem o contexto da sua
produção... Em outras palavras, o determinismo tecnológico hipertrofia as mudanças
introduzidas pelas TIC nas práticas sociais.
O dito anteriormente está unido às reflexões de Louis Althusser (1967). Sua obra foi de
grande importância para argumentar como a ideologia está diretamente relacionada à elaboração
teórica, o qual é uma premissa válida para qualquer momento histórico como é o atual. Portanto,
todas as sociedades elaboram seus conhecimentos em base a umas diretrizes ideológicas
habitualmente afins aos grupos hegemônicos dentro delas. Miriam Limoeiro (1978) aborda em seu
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trabalho de investigação como se articularam a ideologia e o desenvolvimento do Brasil durante as
décadas dos 50 e 60. Sustenta que as ideologias estão por trás de tudo, inclusive da economia:
Para que se possa fazer comparações teoricamente válidas para o encaminhamento de
conclusões é necessário, portanto, dispor da estrutura global da sociedade nos períodos
considerados. Para atingi-la é preciso, ainda apenas ao nível meramente ideológico: 1)
conhecer as partes diferentes do campo ideológico em diferentes períodos; 2) conhecer
o campo ideológico, com as várias correntes que o formam em um período
determinado...
Não há dúvida de que a informação ganhou muita importância nas sociedades atuais como
elemento chave das mesmas; numerosos estudos comparam-na com o dinheiro em relação a sua
enorme influência sobre a sociedade (Castells, 2005). Defende-se neles que sua posse ou carência
determina como será a vida de milhões de pessoas no mundo, mas também é verdadeiro que há
aspectos deste argumento que são importantes, não o é menos o fato de que, no sistema capitalista,
quem realmente articula a sociedade é o capital. Parece quase impossível imaginar a seres humanos
em nosso planeta com muito dinheiro ocupando posições sociais baixas, no entanto sim é possível
imaginar a outros, com muitos conhecimentos, ocupando posições sociais desfavorecidas.
Nunca antes na história a informação teve tanta relevância como mercadoria como na
atualidade. O chamado "primeiro mundo" alimenta-se deste combustível a cada vez mais para
mover a máquina capitalista. Armand Mattelart (2005) aborda em seu trabalho o conceito de
"sociedade da informação", fazendo uma análise de como esse tipo de ideia capitalista de sociedade,
que entende a informação como outra mercadoria mais, se contrapõe a outra, a "sociedade do
conhecimento", que acha que a informação é conhecimento, isto é, que todos os seres humanos
devem ser beneficiados por ele em todos os âmbitos de sua vida, fugindo do determinismo
econômico. Defende que o conhecimento está controlado e que os grandes sonhos por conformar
grandes redes mundiais de saberes têm que enfrentar sombras que provêm de interesses privados e
do controle da população por parte de governos, corporações, etc. Por tanto, a ideia de que a
tecnologia é capaz por si sola de resolver muitos dos males de nosso mundo é criticada (pág. 4):
Mas a distância permanece enorme entre as capacidades virtuais da ferramenta técnica
e a exequibilidade geopolítico-econômica de sua mobilização, a serviço da luta contra
as desigualdades sociais. Os confrontos pelo controle das utilizações macro dos
dispositivos comunicacionais, a hegemonia sobre as normas e os sistemas são
recorrentes na genealogia dos modos de implantação social das tecnologias de
comunicação à distância.
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Essa forma de entender a informação como mercadoria e não como o elemento fundamental
para melhorar o conhecimento provoca injustiças, sendo a chamada "brecha digital" uma das mais
evidentes, a que se produz quando as pessoas mais desfavorecidas a nível social ficam "fora" de
todo aquilo que está unido a internet e as novas tecnologias, bem por carecer de recursos para ter os
meios, ou bem por falta de alfabetização digital. Barreto e Leher argumentam da seguinte forma
(2008, pág. 428):
A suposta revolução é funcional à articulação dos discursos da “sociedade da
informação” e da “globalização” em três sentidos: a) permite uma abordagem
“técnico-científica” das desigualdades econômicas entre os países, reduzindo-as a uma
lacuna ou divisor digital; b) legitima intervenções para “dar assistência aos países que
aspiram a superar a lacuna que os separa dos cientificamente avançados” (World
Bank, 2002, p. 25); e c) sustenta o rearranjo geoeconômico do planeta, já que “o
espelhamento do potencial de mutação informacional no modelo econômico da
globalização selvagem converte as separações em apartheid”.
Por outro lado, nessa "sociedade da informação", internet e as redes sociais estão-se
convertendo em meios de difusão de informação com finalidades que vão para além de seu uso
mercantil, com crescentes possibilidades de coordenação e dinamização social. Os movimentos
sociais que explodiram nos últimos anos, em especial em 2011, entre os que estão a Primavera
Árabe, o 15M-Indignados em Espanha, Occupy Wall Street nos Estados Unidos, ou o 132
mexicano, são algumas provas disto. Mas novamente essa "brecha digital" dificulta a inclusão de
muitos coletivos sociais desfavorecidos nestas mobilizações, mostrando as desigualdades sócio-
econômicas no planeta, que decidem quem tem ou não informação, quem pode conhecer. A
carência de inclusão digital global bem como de "alfabetização digital" são mais mostras da falta de
justiça informacional e social. Torres Santomé (2010, pág. 21) argumenta assim:
Uma sociedade justa e democrática deve garantir que todos os países e as pessoas que
os habitam disponham de recursos para aceder à informação verdadeiramente valiosa,
relevante e significativa; e, ao mesmo tempo, que assegurassem uns sistemas
educativos e redes institucionalizadas para a difusão e divulgação do conhecimento de
boa qualidade; uma educação que facilite que cada cidadã e cidadão possa aceder,
compreender, utilizar e avaliar criticamente qualquer informação.
Assim, as tecnologias podem ser médios, por exemplo, para homogeneizar e impor a
cosmovisão dos grupos hegemônicos e do sistema capitalista, com valores como a competitividade,
dependência ou o individualismo, ou pelo contrário podem também prestar serviço a finalidades
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contra-hegemônicas para a emancipação, a cooperação e participação direta imaginando outros
tipos de realidades para além das conhecidas.
TECENDO REDES
As mudanças ocasionadas em internet a começos do século XXI foram vertiginosas. A
chamada Web 2.0 melhorou as possibilidades digitais de aproveitamento do médio,
fundamentalmente no que se refere à participação das pessoas usuárias. Alguns aspectos relevantes
destas melhorias com respeito a sua antecessora, a 1.0, são as seguintes (O'Reilly, 2005):
a) A navegação realiza-se agora em páginas de formato heterogêneo, dinâmico e de conteúdos
abertos, face à navegação homogênea, fechada e estática da 1.0.
b) A publicação de conteúdos, e em especial de som, vídeo e fotografia é agora interativa e
baseada fundamentalmente nas contribuições das pessoas usuárias, e não dependem, como o
fazia antes, da publicação por parte de administradoras/es da página.
c) Igualmente, a baixada de conteúdos esta baseada na colaboração entre pares, "de igual a
igual" ou peer to peer (P2P), e não depende só de servidores que as proporcionem.
d) A organização dos sites está baseada agora no "etiquetado" ou gostos das pessoas usuárias,
enquanto na Web 1.0 dependia dos diretórios criados pela pessoa administradora.
e) A importância das redes sociais na nossa atual web é definitiva, e já não só a nível digital; as
redes incidem diretamente no social. Esta relevância era antes limitada.
Além dos problemas apontados na primeira parte em relação à concepção puramente
capitalista da informação, internet, as tecnologias e a informação, todas elas podem também jogar
papéis do mais interessante para tentar fazer deste mundo um lugar mais justo sempre que sua
utilização seja desde todas/os, para todas/os, e com todos os seres humanos, e não o capital, como
finalidades primordiais. Uma das lindas possibilidades que nos podem oferecer a nível democrático
é a de poder aceder a muito conhecimento alojado na rede e criado especificamente por
comunidades cuja finalidade é compartilhar diferentes saberes. A cidadania autoorganizada pode
exercer de quinto poder (Ramonet, 2003) para enfraquecer os excessos dos outros quatro, com uma
utilização destas ferramentas como se está fazendo nos últimos anos, protagonistas em diferentes
revoluções sociais.
A possibilidade de estar conectadas/os com uma quantidade importantísima de pessoas, a
maioria delas afastadas espacialmente (e inclusive temporariamente, através da comunicação
diferida) tem a potencialidade de multiplicar nossas possibilidades de aprender e interaccionar
fazendo um uso responsável das mesmas. Podem ajudar-nos significativamente no atual contexto
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sócio-tecnológico para facilitar o acesso a conhecimentos para pessoas que, por outras vias, não
poderiam ter. Áreas de conhecimento tradicionalmente "vetadas" para as pessoas “leigas” tais como
a física, química, tecnologia, informática ou medicina entre outras, são agora mais abertas graças às
comunidades em rede que compartilham os mesmos com a ajuda tecnológica de internet. Por
suposto, essas mesmas ferramentas podem ser utilizadas também para estratificar e hierarquizar
mais o conhecimento e às pessoas, mas um uso democrático das mesmas pode facilitar uma
aproximação entre pessoas "expertas" e "leigas", um passo interessante para a inclusão social de
conhecimentos e comunidades (Santos, 2010).
O rápido crescimento das redes sociais em pouco mais de 15 anos é um dos acontecimentos
mais destacados na história das novas tecnologias. Merece toda nossa atenção, entre outras coisas,
pela enorme capacidade de influir nos hábitos diários de milhões de seres humanos em períodos de
tempo curtos. Nasceram na década dos 90 com a intenção de ligar a pequenas comunidades de
pessoas com algo em comum. Assim é como surgiu a rede social que hoje em dia tem maior
número de usuárias/os, Facebook. Mas são muitas as ferramentas sociais na Web 2.0 apesar de que
o nome de "redes" atribua-se-lhes só a umas poucas. Assim, além de redes populares como
Facebook, Twitter ou MySpace, outras muitas também têm detrás a comunidades inteiras de
usuárias/os interagindo, como os foros de discussão ou os wikis, páginas editáveis nas que é
possível modificar seus conteúdos para elaborar, alargar ou melhorar o conhecimento, com
Wikipédia como a grande referência, tendo-se convertido na maior enciclopédia do mundo. Os
blogs são outra dessas ferramentas; conquanto não são tão interativos como outras, sim é verdade
que em conjunto formam uma rede de conhecimentos muito interessante, dando inclusive suporte a
uma nova forma de entender o jornalismo do séc. XXI.
Mas algumas dessas redes sociais têm problemas associados que são críticas habituais às
mesmas. Algumas delas têm o lucro capitalista como finalidade principal, o que como sempre,
costuma ir unido ao tamanho que atingem, e Facebook é o melhor exemplo disso. Sua saída a bolsa
e sua orientação fundamental para a consecução de capital mediante ferramentas como a
publicidade não explícita e indireta com utilização de informação privada mostram parte de sua
natureza. Isto contrasta com outra tendência já comentada como os wikis por exemplo, relacionadas
com o software livre, Copyleft e Creative Commons, com a busca do bem cultural e social acima do
capital, na linha da consecução de "conhecimento" e não só de "informação" (Matterlart, 2005). Por
outro lado a falta de privacidade e apropriação de dados pessoais; os problemas éticos e legais
sobre a informação alojada na rede é uma questão de enorme importância. Os crescentes alertas
pela facilidade com a que se compartilha em internet informação muito privada, se unem as práticas
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de algumas redes sociais, que podem estar sendo protagonistas de atuações de duvidosa legalidade.
Por exemplo, o Facebook mudou em 2009 sua política de privacidade anunciando que passava a ser
proprietária dos dados das pessoas usuárias, independentemente de que se descadastrassem no
serviço, o que viola leis de muitos países sobre a proteção de dados. Uma posterior sentença, além
dos protestos de milhares de usuárias, provocou a retificação da popular rede.
As conexões entre pessoas e grupos através de internet estão dando lugar a essas redes
sociais com uma presença cada vez maior e mais decisiva na sociedade. Essas pessoas que fazem
parte das mesmas atuam ao mesmo tempo como nodo e lançadores das próprias redes, em primeiro
lugar interligando, e em segundo expandindo a rede em busca a mais nodos. É por esta capacidade
de crescimento viral que são centro de atenção desde todo tipo de posições ideológicas e por
interesses do mais variado. É aqui onde os movimentos sociais se fundem e interaccionan com
internet e as redes que nele se criam. Assim, as redes virtuais acabam assimilando formas e
comportamentos tradicionais do social, e o social também acaba bebendo da forma de organização
digital. Escobar (2004) faz uma análise das características do que ele denomina "malhas", as formas
que adotam os novos movimentos sociais atuais. Assinala três elementos que distinguem a uma
malha como processo gerador de estruturas (pág. 645): - convergência de um conjunto de elementos
heterogêneos mas que se complementam (nas redes sociais há pessoas do mais variado mas que
interagem com finalidades diversas), - elementos catalisadores que facilitam as relações (interesses
comuns, amor, afinidades...), - um padrão estável de comportamento, gerado endogenamente mas
que é resultado das heterogeneidades (tais como normas de comportamento na rede ou sua própria
linguagem).
Esses frutos do trabalho conjunto e a coordenação social com a ajuda de internet podem ser
vistos em nossos dias. Nos protestos do ano 2008 na Islândia pôde ser comprovado o poder que a
população pode ter para buscar um futuro melhor. Os protestos contra o gerenciamento do governo
do momento em frente à crise financeira do país começaram nesse ano e culminaram em 2009, após
a mobilização social (com a ajuda fundamental da coordenação por internet) depois de numerosas
manifestações rodeando o parlamento, e a posterior queda do governo, seguida da instauração de
uma nova Constituição a fazer por 25 pessoas não "profissionais" da política, com ampla
participação cidadã através de referendos, foros e assembleias, sempre com a ajuda das redes. Este
tipo de relacionamentos entre o "sócio-virtual" e o "sócio-real" reproduziu-se nos anos seguintes
através de movimentos sociais já apontados, como a Primavera Árabe, o Movimento dos
Indignados (15M), Occupy Wall Street ou o 132 mexicano entre outros.
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Desde a perspectiva da complexidade, Escobar (2004) elabora uma série de caraterísticas
dos Movimentos Antiglobalização, muito unidos como foi apontado anteriormente às redes sociais
e com forte presença em nossas sociedades nos últimos (pág. 650): - Sua malha é não hierárquica, é
auto-organizada e maleável. - Têm um duplo desafio: defesa do local para sua expressão e contra a
deslocalização, e a reestruturação dos mundos locais pela cultura global. - O caráter político da
malha apoia boa parte de seu peso nas interseções das identidades diversas conformantes. - Os
resultados das práticas das malhas podem ser enquadrados como a criação de configurações
alternativas de cultura, economia, natureza e identidade, que não se subordinam aos princípios
organizativos neoliberais e modernos.
Os movimentos antiglobalização, de ocupação e os gerados nas acampadas do mundo, têm
pretensões inclusivas e apartidárias, isto é, que diferentes pessoas e pensamentos têm cabida neles
sempre que seja respeitado o espaço público sem pretensões privadas e dentro dos enquadramentos
puramente democráticos sobretudo na participação, ou seja, tentar conquistar a democracia por
múltiplas e variados caminhos sem impor o eleito de forma particular na vida da cada pessoa ou
grupo. Esse caminho comum é aquele no que o 99% das pessoas têm possibilidade de convergir, as
mesmas que se têm que conformar com o 60% dos recursos mundiais porque o 1% controla o 40%
restante (Stiglitz, 2011). Esse caminho comum tem muitas vias, entre as quais está a luta contra a
corrupção, contra a destruição da natureza, contra o abuso de poder e a concentração do mesmo em
mãos do capital, contra a distribuição injusta dos bens ou contra as discriminações que, governos,
corporações, banca e instituições financeiras reforçam dia a dia.
Uma das caraterísticas que mais definem a este tipo de movimentos é a forma na que se
organizam, que é também a que propõem para o conjunto da sociedade, baseada fundamentalmente
no método assembleário e na democracia direta. Fundamenta-se em reuniões abertas nas que todas
as pessoas interessadas ou afetadas por um assunto debatem, compartilham e trocam posturas e
opiniões, para se informar ou decidir sobre o mesmo de maneira direta e sem representação. É o
maior órgão de poder e as decisões são tomadas sempre que seja possível por consenso, conquanto
debates específicos podem ser levados a cabo previamente em grupos de trabalho ou comissões
especializadas em temas, os quais transladarão suas propostas à assembleia geral para que sejam
debatidas e/ou aprovadas. A representação fica relegada a um segundo plano, servindo só para levar
a voz da assembleia a contextos que precisem deste procedimento, mas tendo em conta que essa
representação estará sempre subordinada aos ditados da assembleia e por tanto de todas as pessoas.
Portanto, outro elemento definitório deste sistema é a radical horizontalidade do mesmo, pelo que
todas as pessoas são depositarias de todo o poder.
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Este tipo de movimentos e as práticas nas que se apoiam estão tendo na tecnologia um
aliado importante. Através dela se estão abrindo diferentes vias de participação cidadã; além de que
muitas pessoas associadas a movimentos sociais se auto-organizam através de suas próprias páginas
web, foros, grupos em Facebook, Twitter... para trocar e debater, são crescentes as reclamações para
exercitar a participação direta no político-social com propostas como a criação de um parlamento
virtual ou a participação através de referendos cidadãos com a rede como aliada. Vemos novamente
como internet também pode ser empregue como espaço para o aproveitamento de outras formas de
entender a vida, a sociedade e a política, através de propostas contra-hegemônicas e a participação
real da cidadania em todos os assuntos sociais. Esta forma de entender a sociedade exige que o
privado não possa influir naquilo que é de todas/os, o que é público. Com esta forma de
horizontalidade quer ser evitado, entre outras coisas, que a direção real da sociedade esteja por trás
das figuras políticas através do capital, e que as decisões mais cruciais as estão tomando pessoas
que ninguém elegeu em processos democráticos.
TRÊS CAMINHOS QUE PODEM LEVAR A MESMA META
A educação formal, tradicionalmente fiel ao longo da história no papel de preparar mão de
obra qualificada (Marí Sáez, 2002) através da assunção de sistemas industriais tais como o
fordismo, foi a principal depositária da responsabilidade da formação cultural fundamental de todas
as gerações até a data. A estrutura de funcionamento era (e em muitos casos ainda é) muito similar à
das fábricas fordistas, piramidal (direção, professorado e alunado), rígida e estruturada, afastada em
muitos casos dos próprios discursos que nela se manejam. O perigo de focar a educação para a
prestação das pessoas como força de trabalho futura, e não para a consecução de fins mais
holísticos, é um assunto que precisa ser trabalhado em um contexto que pretenda ser realmente
democrático. Mas estamos em um contexto no que novamente é o mercado, através do manejo da
informação como mercadoria estrela na atualidade, o que exige do sistema educativo
trabalhadoras/es com imaginação, competitivas/os e que saibam resolver situações cambiantes em
pouco tempo (Torres Santomé, 2001). Precisa desta mão de obra que seja dinâmica, e tenha certa
dose de independência e criatividade em seu trabalho para se adaptar às novas necessidades dos
sistemas de produção. Um bom exemplo disto é o modelo Toyotista, para o que as caraterísticas
pessoais antes mencionadas são chave para seu adequado funcionamento. O que não muda é a
primacia do capital sobre as pessoas, ou seja, que é o sistema educativo o que se tem que adaptar às
exigências produtivistas e não ao revés.
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Barreto (2010) argumenta em sua análise que a utilização que se está fazendo das TIC na
educação superior brasileira com sua orientação para o capital, e em concreto com o que aborda a
Educação a Distância, estão provocando algumas consequências como o gerencialismo, o
isolamento do professorado ou a educação por competências, em reformas focadas para o
debilitamento do público mediante medidas de "poupança". A palavra "competências" é um
exemplo do que está significando a linguagem como estratégia deste último giro neoliberal para a
educação e as TIC. Mas ao mesmo tempo, como ferramentas que são e tal e como se defende neste
trabalho, também podem ser possibilidades boníssimas para desenvolver no alunado caraterísticas
como a imaginação, a autonomia, a cooperação, a participação, a interactividade, a capacidade
criativa, crítica, etc.
Mas se há um aspecto na que a internet e as redes nos têm que ajudar em educação é em
suas possibilidades de criar comunidades novas e potenciar as já existentes no aula ou escola. Face
às ofensivas neoliberais de educar para a competição ou o individualismo, outro tipo de focagem
educativo tem que se fazer forte. Partindo de algumas ideias de Paulo Freire (1995) e de Torres
Santomé (2001), há uma série de elementos fortes à hora de entender a potência de educar em
comunidade e de trabalhar em rede, que são defendidas neste artigo. Segundo esta forma de
entender a educação:
Todas as pessoas que fazem parte do sistema educativo trabalham horizontalmente,
aprendendo e ensinando permanentemente e em função de suas possibilidades, com
independência de sua posição dentro da comunidade escolar.
As interações e a produção de conhecimentos mudam sua forma de funcionamento desde
uma perspetiva linear a outra com natureza de rede.
A educação é entendida de forma holística e não separada em grupos, categorias ou
sistemas, para uma melhor compressão do ser humano e para a busca da justiça
epistemológica.
Todos os agentes educativos, sem exclusões, são objeto e produtores da mudança educativa
e social.
A educação pertence à sociedade e está incluída nela, de forma que se influem mutuamente;
ademais, no termo sociedade devem estar recolhidos todos os grupos e instituições com
independência de sua posição na pirâmide de poder.
Para atingir esta forma de entender a comunidade educativa é necessário facilitar a
aprendizagem de habilidades fundamentais em um momento de muitíssima informação e de não
tanto conhecimento, tais como a análise crítica do discurso e da informação, a cooperação, a
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interactividade ou a comunicação. As novas tecnologias, de não ir acompanhadas de elementos
como esses, podem chegar a ser inclusive prejudiciais na luta pela democratização social e
educativa.
Carlos Castaño (2008), destaca várias ideias do que podem contribuir as redes sociais à
educação. Entre elas estão:
O aproveitamento do poder da comunidade (valores democráticos).
O aproveitamento da arquitetura de participação da Web 2.0 (facilidade e riqueza na
participação).
O uso de ferramentas singelas, sem necessidade de conhecimentos muito técnicos (potencial
inclusivo).
Existência de comunidades de aprendizagem em relação a um tema (cooperação temática).
O efeito em rede (cooperação entre iguais).
Na mesma linha, Toni Sellas (2008) também assinala vários pontos a ter em conta sobre a
possível contribuição das redes sociais à educação desde paradigmas democráticos:
Pode ser obtido informação sobre muitos e diversos campos.
Existe a possibilidade de aprender e ensinar a pessoas muito afastadas temporária ou
geograficamente.
Podem contribuir na construção de conhecimento aberto, livre e gratuito com a
democratização do mesmo como fim.
Oferecem facilidades didáticas através de tutoriais em rede e empregando diferentes meios
disponíveis (texto, áudio e vídeo).
Oferecem a possibilidade de construir o conhecimento de maneira comunitária; podem
facilitar o trabalho cooperativo, em grupos e de investigação.
Podemos resumir assim quatro aspectos nos que a concepção democrática das redes pode
ajudar em educação: - A nível didático: podem facilitar a aprendizagem para pessoas sem
experiência nos diferentes campos de conhecimento pelo apoio da comunidade, bem como dos
diferentes tutoriais alojados na mesma, empregando para isso os meios disponíveis (texto, áudio e
vídeo). - A nível ético: aposta-se pelo conhecimento livre e gratuito para ajudar na democratização
do acesso e uso da informação. - A nível interativo: constrói-se o conhecimento de forma
comunitária; potencial como ferramenta para o trabalho cooperativo, em grupos e de investigação. -
A nível organizacional: possibilidades espaçotemporais à hora de interagir com o conhecimento e
com mais pessoas.
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Fazer deste mundo um lugar mais justo e democrático deve ser uma pretensão básica da
educação entendida como um bem comunitário e para todas as pessoas. É aí onde educação e
movimentos sociais devem se dar a mão e caminhar juntos nesta difícil tarefa, com as novas
tecnologias e as redes sociais como ferramentas que podem ajudar neste cometido. Todos os
movimentos sociais contemporâneos abordam de uma forma ou outra o assunto da educação como
esse elemento imprescindível sem o qual a mudança social não poderá ser produzida. Esta deveria
ser para isso um espaço crítico e de resistência ante comportamentos reproduzidos na sociedade e
que vão na direção oposta da justiça social. Não há possibilidade de conhecer as injustiças sem
educação e informação. Não há possibilidade de se sensibilizar ante elas se não se conhecem. E por
último, a sensibilização ante elas será bem mais afetiva e profunda se conhecemos e
compartilhamos em comunidade. É aí onde os movimentos, através das redes sociais, exercem e
exercerão um peso decisivo à hora de tentar melhorar o mundo. Um exemplo claro disto é a
"economia verde"; se não possuímos uma educação e informação satisfatórias sobre os efeitos de
determinadas práticas sobre o planeta, de qual pode ser o papel da cidadania para seu defesa ou de
como funciona o mundo dos negócios nos níveis das corporações, é difícil ver o que se esconde por
trás de algumas práticas em aparência beneficiosas para todas as pessoas e o planeta. Os
movimentos sociais jogaram um papel importantísimo à hora de desvelar práticas como esta, e a
educação não pode ficar à margem de assuntos tão transcendentais.
As formas de interação política utilizadas nos movimentos sociais dos que falamos são,
além de formas de funcionamento interno, propostas para uma alternativa social aos atuais modelos
políticos que estão criando crescente insatisfação por todo mundo. Os numerosos protestos ante
fraudes eleitorais, promessas políticas incumpridas ou a baixa participação nas eleições são só
alguns exemplos deste desencanto. Assim, são crescentes as propostas políticas alternativas, e em
concreto em educação os modelos pedagógicos críticos estão adotando a cada vez mais estas outras
formas de organização pedagógico-política em suas práticas, nas quais o método assembleário ou a
participação direta vão cobrando maior importância. A capacidade de participação pode ser
reforçada e melhorada com a utilização das novas tecnologias, e em concreto das redes sociais.
Esses espaços virtuais podem ser aproveitados para que todas as pessoas tenham mais
possibilidades de se expressar, interagir e garantir sua participação e/ou opinião.
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CONCLUINDO
Este trabalho defende que a postura que assume a possibilidade de melhorar a sociedade e a
educação colocando como ator principal às "máquinas" é equivocada. Seguimos sendo as pessoas,
mais que nunca, as encarregadas de nos ajudar delas para democratizar o conhecimento, embora é
verdade que temos aliados muito interessantes neste cometido, por exemplo as redes sociais. Junto
das novas tecnologias, podem servir à educação e à sociedade para tender pontes entre nodos de
saber, em um trabalho com um enorme potencial colaborativo. Novas formas de nos relacionar e
conhecer estão nascendo nas diferentes sociedades com o trabalho comunitário e a rede como eixos
básicos, em um processo de democratização real da informação.
O avanço produzido em internet e as novas tecnologias nas últimas duas décadas foi muito
veloz, e o aparecimento das redes sociais pode continuar e potenciar problemas sociais e educativos
já estabelecidos, ou pelo contrário podem contribuir na coordenação e o trabalho conjunto dos seres
humanos para os solucionar. Esta ambivalência deve ser uma questão a estudar e refletir em
educação, a qual é fundamental para saber como interpretaremos a evolução futura das mesmas e as
diferentes direções a tomar.
Fica ademais assinalado que a existência de ferramentas informáticas para a interactividade
e a experiência de aula não é sinônimo de bom uso das mesmas. Como nova linguagem que é, deve
ir acompanhado de ferramentas pedagógicas adequadas e de trabalho de qualidade para gerar altas
metas sócio-educativas relacionadas com a democracia e a justiça social.
Por último, os movimentos sociais estão trazendo novas formas de nos relacionar entre nós e
com o planeta, novos horizontes de justiça que devem ser aproveitados pela educação; para isso,
temos umas aliadas muito interessantes, as redes sociais.
REFERÊNCIAS
ALTHUSSER, Louis. Sobre o trabalho teórico. 2a. ed., Editorial Presença; Portugal, Martins Fontes, Brasil, 1967.
BARRETO, Raquel Goulart. A formação de professores a distância como estratégia de expansão do ensino superior.
Educação & Sociedade, vol.31, n.113, p.1299-1318, out/dez 2010.
CARDOSO, Miriam Limoeiro. Ideologia do desenvolvimento. Brasil: JK-JQ. 2a. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.
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RESUMO
As lutas pela redistribuição, o reconhecimento e a participação estão mais vivas que nunca como
consequência da chamada “crise” econômica. Diferentes movimentos sociais nascem e lutam por defender e
melhorar direitos tanto das minorias econômicas e culturais como daquela maioria de 99% da população que
padece o poder de 1%. Esta mobilização está abrindo novos conceitos, espaços e vias de entendimento
comunitário à hora de entender o mundo e os relacionamentos humanos. A educação pode aproveitar este
acordar democrático para aprender e ensinar, para tomar parte em um processo que pode melhorar nossas
experiências cívicas. Internet e as redes sociais jogam um papel tão inovador como decisivo nestas mudanças
sociais, e nossos sistemas educativos não deveriam obviar estes dois elementos dos que têm muito que
aprender e aos que têm muito que contribuir. Juntos poderiam fazer um trabalho ilusionante para imaginar
sociedades mais humanas, justas, ecológicas e participativas. Este trabalho pretende mostrar o potencial
transformador dos movimentos sociais, a educação e internet e as redes sociais à hora de trabalhar
conjuntamente. Através da análise teórica se refletirá sobre essa potencialidade, exemplificando através de
algumas práticas contemporâneas. A interação dos três, além de ser desejável, é uma consequência natural
que já se está produzindo em nossas sociedades com resultados esperançosos.
Palavras-chave: Movimentos Sociais. Educação. Democracia. Redes Sociais.