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Cultura e identidade(s):
as disputas simbólicas sobre a identidade operária
na Primeira República
César Augusto B. Queirós1
Resumo Este artigo procura analisar o processo de construção das identidades operárias durante as greves ocorridas no Rio Grande do Sul durante a Primeira República, mais especificamente entre os anos de 1917 e 1919. Considerando a questão da heterogeneidade da classe operária e de sua postura no decorrer dos movimentos paredistas, busca analisar a luta de classificações que acontecia entre as associações operárias e seus interlocutores preferenciais – Estado e patronato. Palavras-Chave: Identidades. Classe Operária. Greves. Abstract This article tries to analyse the process of construction of the working identities during the strikes occurred in Rio Grande do Sul during the First Republic, more specifically between the years of 1917 and 1919. Considering the question of the heterogeneity of the working class and his posture in the course of the striking movements, it looks to analyse the struggle of classifications that was happening between the working associations and his main interlocutors – State and patronage. Keywords: Identities. Working Class. Strikes.
Introdução
Conflitos. Identidades. Rivalidades.
Os momentos de ascenso mobilizatório das
classes trabalhadoras estão repletos de
disputas que não se limitam às questões
meramente econômicas – como ganhos
salariais e melhora das condições de vida e
trabalho. Estão, também, permeados por
uma série de lutas simbólicas nas quais os
lados envolvidos procuram respaldar e
legitimar suas posições através de uma
verdadeira disputa simbólica pela
explicação do real. A confrontação de
posições antagônicas nesses momentos
resulta em rivalidades, em desavenças
entre os membros da classe, em disputa
pelas posições de liderança de suas
associações, na emulação pela legitimidade
de seus princípios e classificações sobre o
real. Nesse sentido, elites e operários –
além de buscarem afirmar seus interesses
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em uma disputa no campo econômico por
meio das pressões resultantes das seguidas
greves – digladiavam-se em uma
confrontação simbólica na qual
procuravam desqualificar a postura de seu
contendor perante o governo e a opinião
pública, enunciando visões de mundo e
promovendo construções identitárias entre
os envolvidos.
Assim, neste artigo pretendo analisar
os conflitos e as identidades construídas
pelos e para os operários porto-alegrenses
entre os anos de 1917 e 1919, período de
intensa agitação na história social gaúcha
no qual ocorreu a eclosão de três greves
gerais e dezenas de outras localizadas.
Contudo, antes de abordar os elementos
constitutivos do que se poderia chamar de
uma identidade operária, deve-se ressaltar
sua natureza heterogênea e multifacetada,
em função de constituir-se de elementos
variados tanto no que concerne ao gênero,
etnia e religião quanto a aspectos como
preferências pessoais e políticas. Dito isso,
atenta-se para o fato de que, como
observou Ginzburg, a dita cultura popular é
intensamente marcada pela oralidade,
fazendo com que os historiadores precisem
servir-se de fontes escritas e, em geral, de autoria de indivíduos, uns mais outros menos, abertamente ligados à cultura dominante. Isso significa que os pensamentos, crenças, esperanças dos camponeses e artesãos [e dos operários, acrescento] do passado chegam até nós através de filtros e intermediários que os deformam2.
Portanto, as fontes escritas que
chegam ao alcance do pesquisador são
mediadas por pessoas mais ou menos
ligadas à cultura dominante e a grande
maioria dos operários e camponeses não
nos deixa nenhum registro escrito, uma vez
que, como Thompson já salientara em A
Formação da Classe Operária Inglesa, “as
maiorias sem linguagem articulada, por
definição, deixam pouco registro de seus
pensamentos”3. Isso conduz o historiador –
sobretudo aquele que pesquisa a classe
operária – a trilhar o caminho que suas
fontes permitem, ou seja, o caminho que
leva ao movimento operário organizado,
institucionalizado, ao mundo dos
sindicatos, dos partidos, das federações e
de seus líderes. Esta abordagem acaba por
privilegiar um grupo restrito dentro da
classe operária – o de suas lideranças – o
que pode induzir o historiador a incorrer
em generalizações como a de tomar o
conjunto da classe apenas por intermédio
de seus líderes. Conforme Silva Jr., “as
lideranças operárias, mesmo as
anarquistas, estão também ‘em cima’ –
onde, como de costume, os pesquisadores
colocam apenas a classe dominante e/ou o
Estado”4. O autor salienta que “o sindicato
não é simplesmente uma associação, mas
uma associação de dominação, e que sua
legitimidade não é somente aferida por sua
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penetração na categoria, mas também pela
capacidade de obter obediência às ordens
produzidas”5. E para obter essa atitude de
obediência, acaba usando de mecanismos e
estratégias punitivas e coercitivas a fim de
fazer valer a sua posição. Ou seja, mesmo
entre aqueles que se encontram em uma
posição subalterna diante do capital existe
uma relação de poder, o exercício de uma
pequena – ou não – dominação exercida
por aqueles que conseguem estabelecer
uma liderança sobre o proletariado.
Desse modo, o poder não pode ser só
entendido quando relacionado à dominação
capitalista ou ao poder do Estado, o poder
encontra-se na vida cotidiana, em cada
espaço de convivência e de sociabilidade,
as relações sociais se apresentam –
freqüentemente – de modo assimétrico e
heterogêneo, a distribuição dos diferentes
tipos de capital não é igual nem mesmo
entre aqueles que se encontram em uma
posição subalterna. Essas relações de poder
encontram-se entrelaçadas a outros tipos de
relações – gênero, classe, etnia, parentesco
– e geram condições gerais de dominação
em determinados meios.
Essa concepção induz a uma
apropriação estática das relações de
produção e proporciona o que Thompson
chama de uma ‘política de substituição’ na
qual a classe é substituída por suas
lideranças, uma “vanguardia que sabe
mejor que la clase misma cuáles deben ser
los verdaderos intereses (y conciencia) de
ésta”6, considerando o ato de aderir à greve
como automático, natural, e que os
operários só não aderiam porque não
sabiam o que era melhor para eles. Há
nessa visão uma inversão do paternalismo:
os operários continuam sendo julgados
incapazes de decidir o que é melhor para
eles, mas nesse caso são as lideranças
operárias – e não o Estado – o agente de
seu bem-estar. Muitas vezes, estas
lideranças nem sequer pertenciam à classe
operária e sim a camadas médias urbanas.
Na greve de 1919 de Porto Alegre, um dos
principais oradores e articulistas dos
jornais era o advogado Álvaro Masera.
Segundo Aravanis – que no segundo
capítulo de sua tese fez uma breve
caracterização da militância gaúcha
incluindo algumas notas biográficas sobre
alguns dos principais militantes operários –
alguns membros da militância operária do
estado não eram oriundos da classe
operária e sim advogados, intelectuais e
jornalistas, membros de ‘fora’ da classe
que compunham uma minoria com
linguagem articulada7. Ocorre, desse
modo, uma expropriação da voz (ou de
outras vozes) do operariado que passa a ser
percebido somente por meio de “porta-
vozes” da classe que recebem uma
‘procuração’ para representar, quer dizer,
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para mostrar e fazer valerem os interesses
do grupo e estão habilitados a “agir como
uma pessoa moral, isto é, como substituto
do grupo”8. Nesse sentido, há uma espécie
de “antinomia inerente ao político que se
deve ao fato de os indivíduos só poderem
se constituir (ou serem constituídos)
enquanto grupo [...] na medida em que se
despossuírem em proveito de um porta-
voz”9. Os indivíduos acabam por abrir mão
de sua ‘individualidade’, de uma posição
mais ativa, para poderem sair do silêncio
atomístico ao qual são submetidos fora do
grupo. Assim, os indivíduos enfrentam o
paradoxo de terem que correr o risco da
alienação política para escapar da
alienação política e, apesar de constituir o
grupo, perder o controle sobre o mesmo10
uma vez que “quanto mais despossuídas
são as pessoas, sobretudo culturalmente,
mais elas se vêem obrigadas e inclinadas a
confiar em mandatários para ter voz
política”11.
Hobsbawm observa que “a história
operária tendeu [...] a identificar-se com a
história dos movimentos operários, se não
até com a história da ideologia desses
movimentos”12. E é natural, compreensível
que seja assim, uma vez que a maioria dos
recursos e registros disponíveis ao
historiador está ligada de alguma forma a
esse mundo associativo e sindical.
Todavia, Hobsbawm faz o alerta de que “o
mundo dos militantes e dos líderes e
ideólogos nacionais não era o mesmo
mundo da maioria”13, apontando para o
risco de se tomar a classe operária como
um todo homogêneo e para possíveis
conclusões generalizantes. Contudo, se
essa afirmação traz consigo uma reflexão
necessária, deve-se considerar que, em
grande medida, ambos os “mundos”
compartilham de um mesmo universo de
representações e práticas cotidianas
construído a partir das experiências dos
operários no campo do trabalho (e mesmo
fora dele), ou seja, de suas vivências de
classe. Não se pode pressupor uma
homogeneidade entre todos os
trabalhadores mas sim compreender que a
sua inserção no campo social lhes
possibilita uma série de experiências em
comum. Nesse sentido, “as fontes
produzidas pelo movimento operário
organizado, e qualquer estudo sobre a
militância operária, trazem informações
sobre as classes trabalhadoras, ou seja, se a
parte não pode ser tomada pelo todo, há na
parte elementos do todo”14.
Porém, a expressão escrita nos
jornais operários é restrita a uma pequena
minoria de líderes e um grande número de
operários sequer participa de sindicatos e
associações. Não há também uma
militância homogênea: existem líderes,
militantes e operários que só aparecem nos
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momentos de afluxo da organização
operária. Como afirma Batalha, “pretender
que exista uma militância operária
homogênea é um grave equívoco”15. Sobre
a heterogeneidade da militância operária, o
autor salienta que:
Apenas uma minoria chega a escrever nos jornais operários e tem uma atuação que transcende os limites de sua categoria profissional; esses podem ser considerados como as lideranças operárias. Um grupo um pouco maior participa ativamente da vida da categoria, integra direções de associações, assina manifestos, mas raramente escreve sobre sua prática e muito menos produz teoria. O terceiro, e certamente maior grupo, é composto por aqueles que apenas exercem uma militância eventual, que são a base de todas as organizações, que estão presentes nos momentos de ascenso dos movimentos e os abandonam nos momentos de refluxo.16
Assim, em volta de um núcleo central
composto nas diversas associações por
uma restrita militância operária – que
Hoggart ironicamente definiu como uma
“minoria interessada” ou uma “minoria dos
salvadores”17 – gira um corpo de
trabalhadores “flutuantes”, que não toma
parte das decisões políticas das
associações, não escreve em suas
publicações e só põe em prática seu
engajamento nos momentos de afluxo do
movimento operário, e um grupo
silencioso, do qual faz parte a maioria dos
trabalhadores, que normalmente não
participa das greves e não se envolve com
as questões dos sindicatos, considerados
aqui como um aparelho de mobilização nos
variados campos de luta que formam o
mercado de trabalho e que podem ou não
passar por um processo de unificação18. Ou
seja, os particularismos locais e os
aparelhos de luta podem vir a se unificar
em um determinado contexto,
desencadeando uma greve geral conforme
o maior ou menor valor estratégico – ou
simbólico – do setor em luta ou podem
permanecer isolados. E o grau de
unificação de uma greve – setorial,
municipal, estadual ou nacional – também
pode ser bastante variável. Rodrigues, em
um estudo sobre os trabalhadores de uma
grande empresa automobilística de São
Paulo em 1963, já problematizava a fraca
proporção de sindicalizados e o
desinteresse quase total pelas atividades
associativas entre os trabalhadores
estudados19.
Desse modo, definem-se por
oposição dois grandes grupos no seio da
classe operária: de um lado, os operários
militantes ou que nos momentos de
ascenso mobilizatório integravam os
movimentos grevistas; e, de outro, os
operários que se recusavam a aderir às
greves, uma legião de trabalhadores que
não se envolviam com os sindicatos ou
associações, que não participavam das
paredes e que deixavam poucos registros
escritos que sirvam de base para que o
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historiador possa reintroduzi-los na cena
cotidiana da história. É interessante
observar que essa posição de não adesão
por parte de um segmento da classe reforça
e confere certa legitimidade ao patronato
ao mesmo tempo em que enfraquece a
posição dos grevistas. Quanto maior o
número de trabalhadores que não cessam o
trabalho, menor será o poder de negociação
dos sindicatos e seus delegados. Para
Bourdieu, “uma das sutilezas da relação de
força dominantes/dominados é que nesta
luta, os dominantes podem utilizar a luta
que ocorre entre os dominados”20. Essa
luta se corporifica nas relações entre os
operários grevistas e os trabalhadores que
não aderiam às paredes.
A postura de não adesão ao
movimento é utilizada pela grande
imprensa – de acordo com Bourdieu,
representante da esfera ‘dominante’ – com
o objetivo de deslegitimar a posição dos
paredistas e criar heróis, modelos a serem
seguidos pelos operários, referenciais de
coragem e honestidade os quais se
recusavam a seguir as orientações de
elementos estrangeiros que estariam
abusando da ingenuidade do verdadeiro
operário. Esses corajosos operários –
enfrentando a intimidação e a coerção
exercida pelos grevistas para que parassem
o trabalho – constituem-se em uma
construção identitária instrumentalizada no
sentido de enfraquecer a posição do
movimento paredista em uma luta
simbólica pela representação do real.
Chalhoub já apontara para uma
diferença explícita entre duas concepções
sobre a relação patrão e empregado pois,
enquanto uma parcela da classe operária se
identifica claramente com a defesa dos
interesses do patronato, outro segmento da
classe revela “uma consciência nítida de
que os interesses dos patrões não são os
seus”21. A coexistência dessas duas visões
de mundo no ambiente laboral acaba por
provocar uma nítida “controvérsia entre
trabalhadores que percebem a relação
patrão-empregado basicamente como uma
relação de cooperação paternalista, e
aqueles que a concebem como uma relação
conflituosa”22, criando, assim, por esse e
outros motivos, uma cisão no seio da
classe operária, uma cicatriz que a divide
em dois grupos nitidamente antagônicos.
Contudo, é evidente que a não adesão de
uma parcela considerável dos operários às
greves não se explica somente por uma
visão de mundo que compreende a relação
patrão-empregado como uma ‘relação de
cooperação paternalista’ e que outros
fatores influem e interferem nessa posição.
Assim, é necessário que se proceda a
uma reflexão acerca da natureza do
militantismo operário. Por que razões uma
parcela da classe adere às greves, associa-
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se aos sindicatos, exerce uma militância
efetiva enquanto os demais operários
permanecem indiferentes a tudo isso? Que
motivos teriam esses operários para entrar
em greve apesar dos custos inerentes a tal
engajamento? Os custos relacionados à
decisão de engajar-se (ou não) em um
movimento grevista podem ser
excessivamente elevados, sobretudo no
período analisado neste trabalho onde
predomina o privatismo nas relações entre
capital e trabalho característico da
ortodoxia liberal da República Velha
brasileira23 quando a inexistência de uma
legislação trabalhista específica levava a
que o operário grevista ficasse totalmente
desguarnecido, arriscando-se a ser
demitido, podendo ficar sem emprego –
inclusive em outros estabelecimentos uma
vez que uma das estratégias patronais era
justamente a de não empregar
trabalhadores grevistas, havendo a
produção de “cadernetas” que
identificavam esses operários – e, nos dias
de greve, sem remuneração, o que a
tornava sempre uma opção perigosa.
Por que, então, a despeito de tudo,
tais trabalhadores aderiam às greves e
associavam-se aos sindicatos quando seria
muito mais cômodo manter-se afastados e
indiferentes? Nesse sentido,
o curso racional de ação [...] seria agir independentemente, ficar de braços
cruzados e aproveitar os benefícios gerados pela ação de outras pessoas24.
Essa postura pouparia o indivíduo
dos custos do engajamento ao mesmo
tempo em que ele usufruiria, do mesmo
modo, as retribuições materiais
conquistadas por outros uma vez que
você já é um membro do sindicato que está negociando um acordo que trará maiores salários para você, mesmo que você não entre em greve [...]”25.
Nesses momentos de greve, portanto,
ocorre uma cisão na classe operária, uma
nítida distinção entre um grupo de
operários que adere às greves e um outro
grupo que, apesar de não ter aderido,
gozará dos benefícios conquistados pelo
movimento grevista – se é que algum
resultado será atingido.
Entretanto, o resultado da ação
coletiva – em termos de êxito no
atendimento das reivindicações – é apenas
um elemento a ser considerado neste
contexto uma vez que, como afirma
Hirschman, lutar pelo bem público “não
pode ser separado claramente de possuí-
lo”26. A luta política em torno de uma
causa constitui-se por si só em um
benefício, uma conversão de signos na qual
o que normalmente seria um custo torna-se
uma experiência agradável, uma
“felicidade pela busca”, uma satisfação
decorrente de um pertencimento, de uma
pertinência a um grupo onde ocorre uma
transformação dos meios – a participação,
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o uso do que Hirschman chama de “voz” –
em um fim em si mesmo.27
A participação no movimento
grevista possui, portanto, “um valor
simbólico” e cria uma identificação entre
seus participantes, construindo uma
identidade. Essa pertinência torna-se um
resultado da ação, uma retribuição
imaterial da ação coletiva, e é uma espécie
de confirmação de identidade de operário
grevista. Segundo Pizzorno,
a participação nessa ação, e não o resultado dela, é necessária para confirmar sua identidade coletiva e a renovada eficácia do círculo de pessoas no âmbito do qual você pode continuar a agir, assim como continuar a ser visto como a mesma pessoa28.
Essa identidade, contudo, pode ou
não ser desejada como tal por seus
participantes uma vez que a identidade
coletiva não é um objetivo que a pessoa
tenha procurado conscientemente alcançar,
mas é solidificada ao longo do processo da
ação conjunta entre as partes envolvidas e
cria uma distinção identitária através de
seus “efeitos de agregação”. Nesse ponto,
cabe proceder a uma breve discussão
teórica acerca do conceito de identidade.
Polack, considera identidade como sendo
o sentido da imagem de si, para si e para os outros. Isto é, a imagem que uma pessoa adquire ao longo da vida referente a ela própria, a imagem que ela constrói e apresenta aos outros e a si própria, para acreditar na sua própria representação, mas também para ser percebida da maneira como quer ser percebida pelos outros29.
Afirmando ainda que sua construção
“é um fenômeno que se produz em
referência aos outros, em referência aos
critérios de aceitabilidade, de
admissibilidade, de credibilidade, e que se
faz por meio da negociação direta com
outros” 30. Da mesma forma, Mendes
salienta que “o indivíduo forma sua
identidade não da reprodução pelo idêntico
oriunda da socialização familiar, do grupo
de amigos, etc., mas sim do ruído social,
dos conflitos entre os diferentes agentes e
lugares de socialização”31. Portanto, as
identidades são construídas e percebidas a
partir do confronto com o diferente, com o
outro, estabelecendo distinções e atributos
que afastam e/ou aproximam. Desse modo,
ao mesmo tempo em que a identidade é
auto-atribuída mediante de um conjunto de
símbolos que integram indivíduos, são
construídas e atribuídas identidades
exteriores aos demais grupos, aos
diferentes32 uma vez que, “no processo de
construção das identidades, explicita-se a
produção destas pela diferença” pois, como
afirma Guaresci,
o processo de construção das identidades sempre se refere a um ‘outro’, ou seja, ‘eu sou algo a partir daquilo que eu não sou’, ou ‘eu não sou o que o outro é’. As pessoas constroem suas identidades a partir das diferenças do que ‘eles e elas não são’ e do que ‘eles e elas não possuem’33.
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Assim,
a formação da identidade modifica o agente individual É o resultado de um processo que, ao mesmo tempo, dá origem ao sistema de reconhecimento dessa identidade e que, portanto, possui significado para o agente, bem como para o observador34.
Desse modo, explicar a participação
na ação coletiva através de incentivos
seletivos (no sentido olsoniano) coloca a
questão de que estes possuem um caráter
de benefício individual e que podem ser
distribuídos de forma desigual, gerando
tensões e conflitos entre esses diferentes
interesses – o que poderá atrapalhar a ação
coletiva.
Se a ação coletiva durar, só pode ser porque a ação está se tornando um fim em si mesma para as novas identidades que está formando35.
Portanto, além da busca utilitária por
retribuições materiais, vemos que a
construção de uma identidade de operário
grevista retro-alimenta a ação militante,
proporcionando um reconhecimento social
e uma retribuição imaterial significativa.
Essas identidades atuam em um
círculo de reconhecimento, no qual
valores e conceitos são agregados e
reconhecidos, promovendo uma distinção
em relação ao outro grupo. Ademais, deve
se considerar que a identidade de operário
grevista – ou não grevista – é uma entre as
várias outras que constituem o indivíduo,
de modo que as identidades étnicas,
raciais, e de gênero são minimizadas para
que a identidade classista assuma uma
posição de identidade em destaque
(detached identities)36. Naquele momento,
as características de pertinência que devem
ser consideradas são as relacionadas com a
posição de classe e com a adesão ou não ao
movimento grevista.
Para Bourdieu, a visão de mundo dos
dominados pode ser caracterizada pela
imposição do princípio de realidade que se
traduz em um profundo realismo o qual
implica uma aceitação tácita de posição e
um instinto de conservação socialmente
constituído que os leva
a tomarem o mundo social tal como ele é, a aceitarem-no como natural, mais do que a rebelarem-se contra ele, a oporem-lhe possíveis diferentes [...]37.
Um realismo que se materializa em
uma “pressão conformista”, manifestada
em uma descrença generalizada e/ou em
uma “aceitação fatalista das coisas como
elas são”. Esse “profundo realismo”
identificado por Bourdieu talvez explique
em parte a postura dos operários que não
aderiam aos movimentos paredistas, um
realismo que acaba resultando em uma
resignação/aceitação frente à posição
ocupada no espaço social.
É claro que a divisão grevistas e não
grevistas é muito flexível e imprecisa, uma
vez que um operário pode optar por aderir
à greve no curso da mesma ou voltar ao
trabalho antes do término da parede ou
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mesmo aderir em uma ocasião e não
participar na seguinte. Pode-se citar, como
exemplo dessa afirmação, o caso do
operário da Viação Férrea João Guimarães
que, segundo testemunhos de seus colegas,
havia sido um dos “cabeças da greve”
anterior e que, na de 1917, não teria
aderido ao movimento, havendo inclusive
ferido um operário grevista após uma
discussão em um bar (este caso será
analisado com mais detalhes
posteriormente)38. Porém, para fins
analíticos, essa divisão torna-se válida uma
vez que, a partir dela, se constroem
identidades e rivalidades, antagonismos e
solidariedades tendo por base interesses
momentaneamente opostos.
Segundo Chartier, as identidades
constroem-se a partir de um “trabalho de
classificação e de recortes que produz
configurações intelectuais múltiplas pelas
quais a realidade é contraditoriamente
construída pelos diferentes grupos que
compõem uma sociedade”39 e, no caso da
classe operária, um dos elementos
contraditórios constituintes de identidade
passa a ser justamente a postura individual
diante das paralisações do trabalho.
Assim, existe, de um lado, uma
militância muito heterogênea, composta
tanto pelos agentes produtores dos
discursos e imagens que instrumentalizam
a luta simbólica dos trabalhadores
formando uma minoria articulada que
assume uma posição de destaque nas
associações operárias e jornais – quanto
pelo restante da militância e dos
trabalhadores que se envolvem só
eventualmente nas questões políticas de
classe; de outro lado, há uma legião de
trabalhadores que não se envolvem com os
sindicatos ou associações, não participam
das greves e acabam deixando poucos
registros escritos que sirvam de base para
que o historiador possa reintroduzi-los no
cotidiano da história.
Partindo da premissa de que as
construções identitárias emergem a partir
do confronto com o diferente, com o outro,
analisaremos a instrumentalização desta
identidade que ocorre na ocasião em que a
tomada de posição durante a emergência
de movimentos grevistas acarreta uma
cisão no seio da classe operária, quando se
constroem identidades diferentes entre
grevistas e não grevistas e essas
construções são instrumentalizadas e
utilizadas na luta simbólica – e classista
acima de tudo – entre operários e
empregadores. Deve-se salientar que a
identidade da classe é somente uma dentre
as diferentes identidades que os agentes
assumem ao longo de sua vida e, portanto,
não é definitiva. Gênero, raça, etnia,
religião, relações de parentesco, são
algumas identidades que co-existem e
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“habitam” neste sujeito fragmentado.
Entretanto, os “estudos sobre o mundo do
trabalho tenderam a ignorar os modos
pelos quais tanto o gênero como a raça
foram constitutivos das identidades de
classe”40. Em função do predomínio de
certo marxismo de viés determinista e
economicista, os estudos sobre o
movimento operário tenderam a tomar a
classe social como tendo uma existência a
priori e a identidade classista como a única
efetivamente importante. Segundo Silver,
“Marx esperava que o processo de
proletarização aos poucos produzisse uma
classe trabalhadora cada vez mais
homogênea, com experiências, interesses e
consciências convergentes”41. Contudo, o
autor considera que “Marx estava errado
ao concluir que, só porque os capitalistas
tratam seus trabalhadores como
intercambiáveis, os próprios trabalhadores
abririam mão de todas as suas bases
identitárias, exceto a de classe”42. Nesse
sentido, emergem espaços significativos
nos quais as diferentes identidades
dialogam e se inter-relacionam, podendo,
inclusive, acarretar o que podemos chamar
de “subidentidades”. É inviável e
impreciso falar de “uma” identidade de
classe. O que existem são identidades de
classe, no plural. Uma categoria fabril,
mesmo que pertencendo à classe operária,
distingue-se nitidamente de outras,
possuindo características que lhe conferem
certa peculiaridade. Somente a forma como
um sujeito se insere no mercado de
trabalho, na condição de vendedor da força
de trabalho no setor industrial, não permite
que se proceda a uma homogeneização.
Esse é um fator importante, agregador,
contudo não pode ser o único elemento
explicativo da análise.
Assim, na emergência dos conflitos
sociais, a postura de uma parte dos
trabalhadores de não aderirem às paredes
engendra uma nítida distinção entre “nós”
e “eles”, a construção de duas identidades
antipodais instrumentalizadas no processo
de luta de classes para servir como meio
legitimador e mobilizador da ação. Assim,
“os interesses diretamente envolvidos na
luta pelo monopólio da expressão legítima
da verdade do mundo social tendem a ser o
equivalente específico dos interesses dos
ocupantes das posições homólogas no
campo social”43. Essas representações
construídas a partir de uma posição
específica no espaço social destinam-se
simultaneamente ao aparato estatal e ao
patronato enquanto campo mandatário, do
qual partem as políticas de mando e onde
se situa a esfera de decisões, e à classe de
modo geral, a fim de instituir elementos de
convencimento e legitimidade que possam
produzir aceitação não só entre aqueles que
o aceitam mas também entre aqueles que o
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Identidade/ Cultura e identidade(s): as disputas simbólicas sobre a identidade operária na Primeira República
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rejeitam, sobretudo se considerar-se que a
visão de mundo dos dominados, segundo
Bourdieu, está sujeita a aceitar como
naturais as classificações sobre o real
produzidas pela esfera dominante que é
quem detém os instrumentos de produção
das representações simbólicas.
Reúnem-se, dos dois lados,
qualidades e defeitos, características
constituintes dos dois grupos em questão,
configurando uma disputa pela construção
das suas identidades. Essas identidades
entram, então em choque, em disputa.
Nesse sentido, os operários grevistas,
através de seus jornais e outros meios de
divulgação, enaltecem a figura do militante
ao passo que desqualificam a do
“carneiro”. Fica difícil analisar a recepção
dessas zombarias e ofensas por parte dos
não grevistas, uma vez que eles raramente
deixavam algum registro escrito –
conforme exposto anteriormente –
desconsiderando alguns casos
excepcionais, quando o antagonismo entre
estes dois grupos acarretava conflitos
físicos que transgrediam a ordem pública e
a ‘normalidade’ e resultavam em processos
por agressão física ou homicídio. De outra
parte, observa-se em paralelo uma
construção favorável à identidade de não
grevista por parte do Estado e da grande
imprensa que utilizavam um campo de
representações que objetivava deslegitimar
a atitude dos grevistas e, com isso, debelar
os movimentos paredistas. Desse modo,
analisar-se-á, agora, o processo de
construção identitária de grevistas e de não
grevistas tanto pelos militantes quanto pela
grande imprensa.
1.Carneiros e paredistas: uma
ambivalência intra-classe:
É necessário considerar que a greve
só faz sentido enquanto um instrumento de
luta política e/ou econômica quando
a re-situamos no campo das lutas do trabalho, estrutura objetiva das relações de força definida pela luta entre trabalhadores, de quem ela constitui a principal arma, e empregadores, juntamente com um terceiro ator – que talvez não seja um – o Estado44.
Uma greve consiste
na cessação coletiva, combinada e voluntária do trabalho, por iniciativa dos trabalhadores rompendo a relação funcional habitual entre patrão e empregado, com o objetivo de terem atendidas reivindicações não satisfeitas”45
como instrumento de luta e pressão dos
operários sobre o patronato, seja no sentido
de verem algumas reivindicações atendidas
ou no de promover uma revolução social
que vise à transformação da sociedade.
Lênin afirma que:
durante uma greve, o operário proclama em voz alta suas reivindicações, lembra aos patrões todos os atropelos de que tem sido vítima, proclama seus direitos, não pensa apenas em si ou no seu salário, mas pensa também em todos os seus companheiros, que abandonaram o
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Identidade/ Cultura e identidade(s): as disputas simbólicas sobre a identidade operária na Primeira República
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trabalho junto com ele e que defendem a causa operária sem medo das provocações46.
Entretanto, uma significativa parcela
dos operários opta pela não participação
nos movimentos grevistas, colocando em
risco as possibilidades de sucesso do
mesmo. Essa posição de não adesão por
parte de um segmento da classe reforça e
confere certa legitimidade ao patronato ao
mesmo tempo em que enfraquece a
posição dos grevistas e representando uma
forte ameaça aos seus interesses: quanto
maior o número de trabalhadores que não
cessam o trabalho, menor será o poder de
negociação dos sindicatos e de seus
delegados. A continuidade do trabalho por
parte de um grupo de operários representa
um risco que ameaça os êxitos do
movimento paredista e essa situação
acarretava um antagonismo, um conflito de
interesses. Antes colegas de trabalho e
agora rivais, encontravam-se e acabavam
levando suas diferenças para fora da esfera
em que elas foram produzidas, gerando
conflitos e altercações visíveis hoje através
de processos-crime que mostram a
intensidade dessas disputas.
Torna-se necessário, pois, para o
sucesso do movimento, que os
trabalhadores sejam convencidos ou
impedidos de continuar o serviço do
mesmo modo que se constroem imagens e
representações que visavam a mobilizar e
incentivar os grevistas, conferindo-lhes
qualidades distintivas, de honra e
dignidade, a fim de estabelecer uma coesão
simbólica ao grupo, um sentimento de
pertencimento. Essas imagens e
representações eram instrumentalizadas
com este objetivo: incentivar os grevistas a
permanecer na luta e coagir e constranger
os operários que continuavam a trabalhar,
por isso taxados de covardes, carneiros e
bêbados, pois “apesar de todas essas
calamidades, os operários desprezam os
que se afastam de seus companheiros e
entram em conchavos com o patrão”47.
Assim, cada um dos dois grupos
estudados estabelecia um conjunto de
visões explicativas sobre o real que
estivesse adequado a seus interesses sociais
ou individuais e produzia uma auto-
imagem em contraposição à imagem do
outro – também criada através dessas
representações contraditórias e
demarcatórias, repletas de insinuações
pejorativas. Essas representações
contraditórias e antagônicas sejam elas
mediadas por inscrições textuais,
imagéticas ou produzidas pelos indivíduos
oralmente, acabavam por constituir uma
“luta de classificações como luta
propriamente simbólica (e política) para
impor uma visão do mundo social ou,
melhor, uma maneira de construí-la, na
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Identidade/ Cultura e identidade(s): as disputas simbólicas sobre a identidade operária na Primeira República
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percepção e na realidade.”48 Mediante
essas representações os operários grevistas
reafirmavam sua posição e construíam uma
identidade diferente daquela dos que não
aderiam às greves (mesmo que
pertencendo à mesma classe) reivindicando
uma distinção moral sobre aqueles a quem
chamavam de traidores, covardes, canalhas
e cachaceiros.
As práticas cotidianas de diversos
grupos operários incluem, como indicam
alguns autores, a constituição de um
contexto de “relações jocosas” em que o
ato de brincar durante o serviço tem a
função de construir condições de
suportabilidade na rotina diária de labuta.
Os padrões de sociabilidade característicos
dessa subcultura operária se manifestam
em uma lógica na qual “a busca constante
de brincadeira e de gozação com os
companheiros de trabalho faz parte de um
jogo humano de trabalho vivo no contexto
do trabalho morto”49. Essa recriação do
ambiente laboral por parte dos operários
pode representar uma
microfísica da resistência que se exerce desde a reação e a resposta ao despotismo da hierarquia da administração fabril, até a reinterpretação e reambientação criativas das duras condições de trabalho50.
A própria sociabilidade de vários
segmentos das classes subalternas é
permeada por certa “agressividade
intrínseca à manifestação da capacidade
pessoal masculina”, uma relação na qual a
identidade do trabalhador está
indissociavelmente ligada à do homem51.
Mesmo as brincadeiras realizadas são
revestidas de um tom de jocosidade e
provocação. Uma agressividade derivada
de uma “sensibilidade embrutecida” que,
segundo Hoggart, seria uma das
características marcantes da cultura
operária e estaria relacionada a uma vida e
a um ambiente de trabalho pouco propícios
à delicadeza, o que gera uma relação física
agressiva52. Todavia, deve-se fazer a
ressalva de que a agressividade que
permeia o comportamento masculino não
pode ser vista como um elemento inato, de
características biológicas, uma vez que a
masculinidade é uma construção social,
portanto histórica, cultural e relacional.
Aliás, o correto seria usar a expressão no
plural – masculinidades – uma vez que
existem diferentes ‘estilos de
masculinidade’ mesmo que em
determinado momento um surja como
hegemônico subordinando os demais53.
Esta agressividade – que apresenta
uma aparência de violência latente – pode
ser entendida como uma encenação, um
jogo de cena, no qual os limites estão
subliminarmente estabelecidos por códigos
e padrões claramente definíveis de modo
que – em situações de normalidade – o
conflito latente raras vezes transforma-se
em conflito instaurado. Percebe-se uma
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Identidade/ Cultura e identidade(s): as disputas simbólicas sobre a identidade operária na Primeira República
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transposição dos limites estabelecidos
nessa representação nos momentos de lazer
em que o consumo de bebidas alcoólicas
pode reforçar ou justificar excessos.
Assim, as brincadeiras e apelidações
já estão presentes no universo operário
mesmo nos momentos de “normalidade” –
considerados aqui como os períodos em
que as greves e mobilizações não estão
ocorrendo – e representam uma atitude de
recriação do ambiente de trabalho, de
ressocialização e de transformação das
condições para tornar a rotina mais
tolerável aos olhos dos próprios operários,
simbolizando uma silenciosa microfísica
da resistência sob a ótica dos dominados.
Entretanto, no ascenso do movimento
operário, quando a greve transformava
colegas de trabalho em rivais, opondo
interesses e visões de mundo antagônicas,
esta prática – já internalizada e
reconhecida pelos operários – assumia uma
faceta diferente, uma resignificação, em
que a oposição entre “nós” e “eles”
construía-se a partir do contraste das
posições individuais assumidas durante a
greve.
A agressividade verbal e a apelidação
pejorativa eram utilizadas, nesse caso, para
deslegitimar a posição de um grupo, para
coagi-lo a aderir à atitude considerada
correta pelos operários grevistas. Aqui, a
microfísica da resistência, descrita por
Leite Lopes, dá lugar a uma nova
microfísica do poder entre os dominados,
uma hostilidade latente entre dois grupos
que construíam suas identidades, um em
oposição ao outro.
Essas construções identitárias
constituíam-se em um “fenômeno de
classificação e valoração substantivado ou
reificado em formatos ‘sociológicos’ ou
‘institucionais’”54, partiam, portanto, de
uma atribuição de valores e classificações
distintivas e subordinadas a elementos
relacionados a um nível simbólico e
estruturados por uma linguagem própria.
Nesse sentido, a greve exercia o papel de
um instrumento de violência real que tem efeitos simbólicos através da manifestação, da afirmação da coesão do grupo, da ruptura coletiva com a ordem que ela produz”55.
A imprensa operária é uma
importante fonte de análise da construção
da identidade do trabalhador não grevista
pelos paredistas e dos recursos utilizados
por eles para deslegitimar sua posição,
utilizando um arsenal de expressões
depreciativas que atacavam a dignidade e a
honra dos operários que não aderiam à
greve. Essas construções sociais
identitárias constituíam-se a partir de
elementos que transformavam o
trabalhador não grevista em um inimigo da
classe, merecedor do desprezo e da repulsa
dos demais operários – lutadores corajosos
que se entregavam a uma causa que não
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era individual apesar dos riscos e ameaças
– e que tinha sua própria vida pessoal
atacada. Deve-se considerar que a
inexistência de uma legislação trabalhista
específica decorrente da política
liberalizante adotada na República Velha56,
que preservava o privatismo nas relações
entre capital e trabalho, levava a que o
operário grevista ficasse totalmente
desguarnecido, arriscando-se a ser
demitido, podendo ficar sem emprego –
inclusive em outros estabelecimentos, pois
havia a produção de “cadernetas” que
identificavam esses operários.
Então, o grupo de trabalhadores que
não participava das greves – e que era
denominado pejorativamente de ‘fura-
greves’ ou ‘carneiros’ – passava a ser alvo
de uma série de classificações identitárias
na imprensa operária e mesmo na relação
quotidiana com os operários grevistas,
sendo motivo de escárnio, chacota e
desprezo por parte dos últimos. A
existência de operários dispostos a
trabalhar mesmo em uma ocasião de
parede, da qual eles poderiam se
beneficiar, era vista pelos grevistas como
uma ameaça ao sucesso do movimento e
como uma traição.
Furar uma greve era considerado pela esmagadora maioria dos trabalhadores um ato desonroso, covarde, deslealdade que deveria ser punida com escárnio e severidade”57.
Diversas classificações pejorativas
eram atribuídas a esses operários – o
constrangimento moral tornava-se, além de
elemento constituinte da identidade do
outro, um recurso utilizado pelos grevistas
para coagir esses trabalhadores a aderirem
à greve. Uma das formas de constranger
moralmente os operários não grevistas,
denegrindo sua imagem, era acusando-os
de beber demais. Isso também ocorria nas
polêmicas entre socialistas e anarquistas.
Em 1911, para desautorizar a posição de
Waldomiro Padilha, favorável à adoção da
greve como instrumento para conseguir a
redução da jornada de trabalho, Francisco
Xavier da Costa escreveu um artigo no
Correio do Povo afirmando que, mesmo
sabendo dos prejuízos do vício do
alcoolismo, W. Padilha “não se furtava ao
desejo natural de afogar os dissabores da
vida num copo de Pelotense ou
Pernambucana verdadeira”58.
Um exemplo representativo das
classificações pejorativas utilizadas pelos
grevistas para deslegitimar a posição dos
operários que não aderiam às greves e para
impor-lhes uma identidade antagônica é a
Canção dos ‘Fura-Greves’ ou Hino dos
‘Carneiros’, publicada no periódico O
Syndicalista – órgão da Federação
Operária do Rio Grande do Sul – durante a
greve de 1919, transcrita a seguir:
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Identidade/ Cultura e identidade(s): as disputas simbólicas sobre a identidade operária na Primeira República
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“Canalhas todos em redor
Do garrafão reunidos Os fura-greves exaltai, Os cabras destemidos.
A quem está sempre ao trabalho disposto
Oh, como esse traguinho dá gosto REFRÃO
Viva a cana!!! Viva a carraspana!!!
E com o justo apreço dar A nossa ação sabemos
Convictos vamos, já, jurar: Canalhas sempre seremos.
REFRÃO
A canalhice hoje é Tratada com afago Em sua honra, oleré
Tomemos mais um trago
REFRÃO
Canalhas somos e por tais Nós mesmos nos tivemos Desprezo e ódio gerais
Por isso merecemos
REFRÃO
Canalhas, levantai a voz, Dizei em altos brados
Que dos filhos do país sois vós Agora os mais estimados
REFRÃO
E quem nas greves se mostrou
Canalha e desbriado A benemérito passou
E é o mais amado
REFRÃO
O brinde de honra, pois, levantai À saúde da canalha
E um ‘burro porre’ apanhai Ou coisa que o valha.”59
Nessa canção, a atribuição de epítetos
pejorativos aos trabalhadores que não
aderiam às greves é a tônica. Além de
chamá-los de “canalhas” e “merecedores
de desprezo e ódio gerais”, tenta-se atribuir
aos não grevistas a pecha de bêbados,
fazendo assim uma condenação ao uso do
álcool através da articulação entre o
consumo deste tipo de bebida e a falta de
caráter e hombridade, expressa na traição
aos companheiros de classe. Aravanis
defende que a condenação ao consumo de
álcool deriva da busca pela construção de
um corpo operário fisicamente apto aos
embates da classe, sendo que o seu
consumo acarretaria males físicos e morais
que impossibilitavam uma atuação de luta
e uma consciência crítica e transformadora
do social60. Assim, é criada uma nítida
distinção moral entre os operários grevistas
– portadores de uma postura irrepreensível
em termos éticos e morais, sem vícios
como o álcool e o jogo – e os que
adotavam uma posição de meros
“espectadores mudos e inconscientes” que
agiam como uma “roda inconsciente do
mechanismo social que os outros
movem”61 e que estariam tomados pelo
vício do álcool.62
Entretanto, Batalha salienta que
“salta aos olhos de qualquer observador o
contraste entre uma postura puritana de
condenação do álcool [...] de uma parte da
militância e as formas de lazer da maioria
dos trabalhadores”63. Percebe-se que este
discurso puritano não se sustenta na prática
e um operário grevista não se distingue
tanto de um trabalhador não engajado no
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Identidade/ Cultura e identidade(s): as disputas simbólicas sobre a identidade operária na Primeira República
116
que se refere aos hábitos de lazer e à vida
cotidiana, visto que
se certamente há diferenças entre os militantes e o trabalhador comum, parece improvável que não exista nada em comum entre os primeiros e os últimos”64.
Deve-se ter em mente que
discurso e prática nem sempre caminham juntos, na maioria das vezes não caminham juntos. Artigos teóricos em jornais e muitas das resoluções de congressos têm uma função mais didática [...], são mais recomendações do que resoluções65.
Aravanis salienta o quanto o
consumo de bebidas alcoólicas era um
fator real no meio operário, inclusive entre
a parcela militante e constata que mesmo
nas festas promovidas pelas entidades de
resistência seu consumo se faz presente66.
O consumo de álcool era tão presente no
universo operário que, em alguns locais de
trabalho – como a Fundição Alberto Bins e
a Fábrica de Chapéus de Oscar Teichmann
– havia bares que vendiam bebidas
alcoólicas. O consumo de álcool pelos
operários durante o expediente de trabalho
chegou a despertar a preocupação dos
patrões que enviaram uma proposta de
regimento fabril para o ‘Sindicato dos
Marceneiros e Classes Anexas’ no qual se
tornava proibida a sua ingestão durante o
horário de expediente67.
Para Thompson, esses bares –
considerados “fortalezas de Satanás” –
constituíam-se em
espaços autônomos de sociabilidade que, embora conflitivos e plurais, possibilitavam o desenvolvimento de fortes noções de coletividade e a formulação de valores diferenciados dos padrões oficiais”68.
Nesses espaços, forjavam-se noções
de identidade, laços de solidariedade e se
desenvolvia em parte o aprendizado e a
experiência que apontavam para a
formação de uma noção de classe.
Tendo em vista a afirmação de que
na “cultura do povo o boteco é um
mundo”69, percebe-se que os operários
grevistas também faziam parte deste
mundo, a despeito da condenação ao
‘traguinho’ destacada na Canção dos
‘Fura-Greves’. Apesar de se atribuir aos
não grevistas a pecha de amantes do
álcool, as evidências demonstram que esta
era uma prática que perpassava tanto
grevistas quanto não grevistas. Um
incidente ocorrido entre um operário
grevista e os trabalhadores não grevistas da
Viação Férrea, em 1917 (que será
analisado a seguir), aconteceu na saída de
um boteco em Gravatahy, onde Vasquez e
Honorato tomavam um ‘traguinho’70. No
caso do padeiro Leopoldo Silva, na noite
anterior ao assassinato de um não grevista
durante a greve dos padeiros em 1919, o
réu estava no
Beco do Oitavo em um Cabaret, conhecido por ‘Bolevard’, bebendo com outros companheiros, saindo pela madrugada um pouco embriagado em um auto [e] na noite anterior a esta o acusado estivera em um
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Identidade/ Cultura e identidade(s): as disputas simbólicas sobre a identidade operária na Primeira República
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Cabaret à rua S. Pedro, onde bebera regularmente em companhia de outros grevistas”71.
Enfim, a prática da apelidação
pejorativa, além de ser um elemento
constituinte da cultura de certos grupos
operários, era utilizada para moldar a
identidade atribuída aos não grevistas,
estabelecendo uma distinção moral entre
“nós” e “eles”, sendo usada ainda como
um recurso para coagir moralmente os
trabalhadores a aderirem à parede. À
atribuição de expressões como ‘canalhas’,
‘covardes’, ‘traidores’ e ‘sem brios’,
somava-se a acusação de que os mesmos
mostravam-se propensos a abusos do
consumo de álcool o que, como foi
analisado, pode ser verificado tanto entre
os trabalhadores não grevistas quanto entre
os grevistas72.
2.Os grevicultores e o verdadeiro
operário
Os operários grevistas utilizavam-se
de representações sociais e construções
identitárias para distinguir grevistas e não
grevistas com a finalidade de promover e
incentivar a greve enaltecendo as
qualidades dos paredistas e, ao mesmo
tempo, coagir e constranger aqueles que
continuavam exercendo suas funções para
que aderissem às paralisações pois sua
continuidade representava uma ameaça ao
sucesso das mesmas. Enquanto isso, os
patrões e o Estado – por meio da imprensa
diária, estabeleciam um conjunto de
classificações que visava a deslegitimar a
posição dos grevistas, condenando as
paredes e elogiando a postura dos
operários que continuavam seu serviço,
pois esses seriam os ‘verdadeiros
operários’.
Desse modo, sempre que eclodiam as
greves as autoridades que representavam o
poder no Estado tratavam logo de
desqualificar estes movimentos, atribuindo
sua eclosão tão somente à “tácita e
inconsciente submissão à influência de
extrangeiros anarchistas”73 ou a um
“simples espírito de imitação”74 em relação
aos demais movimentos paredistas que se
espalhavam pelo país e pelo mundo sendo
considerado o resultado do “desvario
criminoso de elementos anarquistas,
explorando a boa fé do verdadeiro
operariado” 75. Verifica-se, então, uma
nítida distinção entre, de um lado, os
grevistas, que seriam elementos
estrangeiros com idéias anarquistas que se
aproveitavam e exploravam o operariado
nacional, e, de outro, o ‘verdadeiro
operariado’, que não se metia em greves e
que não se deixava influenciar por esses
exploradores. O jornal A Federação –
órgão oficial do Partido Republicano Rio-
Grandense – tratava os operários paredistas
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Identidade/ Cultura e identidade(s): as disputas simbólicas sobre a identidade operária na Primeira República
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como sendo “grevicultores”76, elementos
“que procuram levedar e implantar no
proletariado nacional a sua ação subversiva
e perigosa. Trata-se de anarquistas
estrangeiros professos e confessos”77.
Vistos como estrangeiros – apesar de
observarmos um predomínio do operariado
nacional no estado – eram tidos como
“elementos estranhos ao nosso meio
social” e acusados de serem “falsos amigos
e insidiosos conselheiros”78.
Este periódico, além de criticar a
atuação dos elementos estrangeiros no
movimento sindical e de condenar “o
delírio que se está apoderando das nossas
classes operárias mal conduzidas pela
espuma maximalista”, buscava ressaltar
que no Rio Grande do Sul não haveria
motivos de reclamações pois “nossa pátria
liberal e justiceira não reconhece
privilégios nem encampa injustiças
sociais”79. Não existiriam aqui, portanto,
condições que justificassem a eclosão de
greves e protestos tendo em vista que,
diferentemente do Velho Mundo, o
operariado viveria em uma situação
relativamente mais fácil. Outro periódico,
O Independente, aproveitando-se das
agruras provocadas pela guerra, chegara a
fazer, no decorrer da greve geral de 1918,
na cidade de Porto Alegre, um “appelo
patriótico” aos operários para que não se
deixassem influenciar “por espíritos
anárchicos que talvez existam em seu
seio”80, elementos estrangeiros que
defendiam “idéias baloufas geradas por
cérebros ocos, fora de senso, inimigos da
estabilidade interna”81. Apelando para o
“civismo do operariado porto-alegrense”
que, segundo o jornal, sentia um “grande
amor por este torrão bendito”. O referido
jornal orientava para que esses
trabalhadores não se deixassem “imbuir de
idéias anárquicas trazidas por inimigos de
seus ideaes e da pátria”82. Nesse sentido, o
fomento das greves foi atribuído
novamente a elementos estrangeiros que
exploravam a boa fé do operariado
nacional. Ademais, o jornal aproveitando-
se da conjuntura internacional marcada
pela participação brasileira na guerra,
acusava os grevistas de serem “camaleões,
assalariados por mãos ocultas”,
inimigos do Brasil tomados do desejo de entravar a paz interna, levantando o nobre proletariado, para a sublevação da ordem”83.
A greve geral era interpretada não
como uma tentativa de minorar a carestia
de vida mas sim como um complô
internacional arquitetado pelos inimigos da
nação, por agentes de uma “espionagem
multiforme”84, para levar à ruína a
concórdia entre o povo e o governo. Seria a
greve uma conspiração internacional
levada a cabo por agentes dos governos
estrangeiros? Enfim, O Independente
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Identidade/ Cultura e identidade(s): as disputas simbólicas sobre a identidade operária na Primeira República
119
insinuava abertamente essa possibilidade,
procurando suscitar a desconfiança e a
dúvida sobre o operariado nacional já tão
afetado pela guerra.
A prática de atribuir a eclosão de tais
fenômenos à influência do elemento
imigrante não perpassava tão somente as
autoridades gaúchas e é, segundo Pinheiro,
um fenômeno nacional uma vez que
até quando se pode retroceder na história republicana [...] se pode constatar uma insistência do Estado e das classes dominantes em pretenderem se livrar dos maus elementos das classes subalternas, em fazer desaparecer os elementos estranhos aos meios populares, naturalmente sadios85.
Segundo Fausto, principalmente nas
primeiras décadas da imigração, a
população estrangeira possuía uma série de
“características criminógenas”, por ser
constituída majoritariamente de homens
jovens e solteiros86. Ademais, ocorria
nacionalmente uma “discriminação relativa
aos organizadores do movimento operário,
através da associação das figuras do
‘alienígena’ e do ‘agitador’”87.
O próprio poder legislativo assumiu a
responsabilidade de livrar o proletariado
nacional do proselitismo revolucionário
dos agitadores estrangeiros e, em 7 de
janeiro de 1907, foi aprovada a lei nº 1.641
– conhecida como Lei Adolpho Gordo –
que regulamentava a expulsão de operários
estrangeiros envolvidos em agitações. Esta
lei em seu artigo 1º determinava que “o
estrangeiro que, por qualquer motivo,
comprometer a segurança nacional ou a
tranqüilidade pública pode ser expulso de
parte ou de todo o território nacional”.
Assim, disponibilizava ao governo os
meios para se livrar de qualquer
estrangeiro que fosse considerado
pernicioso ou prejudicial à ordem local.
Revista em 1912, revogou de seu texto os
artigos 3, 4 e 8 da lei de 1907 que
impediam a expulsão de estrangeiros
casados com brasileiras, residentes há mais
de dois anos no país ou viúvos com filhos
brasileiros. Justificando a proposta de
alteração constitucional, em discurso
proferido na Câmara dos Deputados em 29
de novembro de 1912, Gordo afirmava que
“são funções essenciais do Estado velar
pela segurança das pessoas e da
propriedade e manter a ordem pública e
para que bem possa desempenhar a sua
missão, é evidente que deve ter o direito de
remover os embaraços que perturbem a
sua ação” destacando que “o estrangeiro
que recebe a hospitalidade tem também o
dever de se conformar com as leis e
instituições do país que o acolhe e de não
se constituir um perigo para a ordem e
tranqüilidade públicas”. Segundo essa
visão, as garantias legais que permitiam a
permanência dos imigrantes no país seriam
embaraços à ação do Estado no sentido de
MOUSEION, v.1, n.2, Jul.-Dez./2007
Identidade/ Cultura e identidade(s): as disputas simbólicas sobre a identidade operária na Primeira República
120
promover as ordem pública e garantir a
segurança.
O autor da lei chega a propor “fazer
uma liga com as nações sul-americanas a
fim de termos a mesma lei e termos o
mesmo procedimento”. Esta lei teria a
finalidade de
armar o governo com um instrumento de defesa contra agitadores estrangeiros profissionais que vêm ao nosso país com o intuito exclusivo de perturbar a ordem pública, provocando desordens, conflitos e crimes”88.
De acordo com Claudio Batalha,
entre os anos de 1908 e 1921 ocorreram
556 expulsões com base nesta lei89. No ano
de 1919, por exemplo, 71 estrangeiros
foram expulsos sendo 31 portugueses, 19
italianos, 18 espanhóis, 1 polaco, 1
argentino e 1 sírio90. O próprio presidente
da República, Epitácio Pessoa, solicitava
que o Legislativo votasse leis que
“resguardem da influência maléfica dos
‘sem pátria’, dos que se insinuam em seu
seio para explorar-lhe o espírito de classe”
aprovando um projeto que regulasse a
entrada de estrangeiros em nosso território,
a fim de evitar que as portas da nação
ficassem “escancaradas à invasão do
rebutalho humano, que as outras nações
rejeitam e expellem do seu seio”91.
No Rio Grande do Sul, esta tendência
de criticar a atuação dos elementos
estrangeiros no movimento sindical e de
atribuir as greves à sua ação no meio
operário também é verificada. O governo
do Estado, além de denunciar “o delírio
que se está apoderando das nossas classes
operárias mal conduzidas pela espuma
maximalista”, buscou ressaltar não haveria
motivos de reclamações pois “nossa pátria
liberal e justiceira não reconhece
privilégios nem encampa injustiças
sociais”92. Não haveria aqui, portanto, as
condições que justificassem a eclosão de
greves e protestos tendo em vista que aqui,
diferentemente do Velho Mundo, o
operariado viveria em uma situação
relativamente mais fácil.
Para os grevistas, porém, a presença
de estrangeiros no movimento era encarada
como natural uma vez que o Brasil é um
país em que o elemento imigrante das mais
diversas nacionalidades estava presente em
todos os setores da sociedade, inclusive
entre os patrões. Para eles,
as manifestações operárias são deturpadas, mistificados os seus intuitos e não raro atribuídas a anarchistas extrangeiros e isso com o fim visível de torná-las antipáthicas aos ignorantes e justificar as ferozes repressões a que sempre estão promptos a fazer os governos contra o trabalhador que reclama o seu direito e defende a sua vida93.
Para os grevistas, apesar de deturpado pelo
governo e pela grande imprensa, o
movimento era legítimo e justificado pela
precária condição e pela exploração a que
estavam submetidos uma vez que
nenhuma collectividade obreira tenha declarado em algum tempo greve para
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Identidade/ Cultura e identidade(s): as disputas simbólicas sobre a identidade operária na Primeira República
121
luxo. Todos sabem que uma greve representa o grito de agonia em que se debate a classe operária94.
Consideravam que, ao atribuir aos
estrangeiros a responsabilidade pelas
agitações sociais, os governantes estariam
se utilizando de um artifício para justificar
sua ação coercitiva.
Analisando a greve de 1906 em Porto
Alegre, Joan Bak problematiza o uso das
imagens de gênero pela imprensa durante
este movimento paredista. Segundo a
autora, os periódicos criavam uma
identificação das atitudes das operárias
grevistas com posturas consideradas
‘pouco femininas’ – como a participação
nas greves e passeatas. Por oposição,
idealizavam as mulheres que permaneciam
em seus postos, onde a “boa mulher era
retratada como a boa trabalhadora”95. A
idealização chegava a ponto de buscar
condutas exemplares, como a de uma moça
que permanecera trabalhando em uma
fábrica têxtil a despeito das ameaças e
intimidações dos grevistas e terminara seu
relacionamento com seu namorado por ele
não aceder a seus pedidos de retornar ao
trabalho, desmanchando seus planos de
casamento. Transformada em heroína
cívica, a moça tornou-se útil aos interesses
do patronato que se utilizava de sua
“influência moral e tradicional sobre os
homens para tentar frear o comportamento
desordeiro masculino”96. Entretanto, essas
são imagens selecionadas de gênero, que se
contrapunham às das mulheres que
aderiam às greves e que enfrentavam o
patronato ao lado de seus companheiros.
Essas imagens socialmente aprovadas de
ordem e dever contrapunham-se à imagem
das operárias grevistas e eram publicadas
para servir aos interesses dos empresários,
das elites e do Estado, instrumentalizadas
no sentido de exaltar as virtudes dos
trabalhadores que não aderiam às greves.
A guisa de conclusão:
Nesse artigo, procurou-se analisar o
processo de construção das identidades
operárias durante as greves ocorridas no
Rio Grande do Sul durante a Primeira
República, mais especificamente entre os
anos de 1917 e 1919 quando ocorre um
forte impulso no movimento organizatório
da classe trabalhadora no estado.
Destacou-se que a classe operária é
constituída de modo bastante heterogêneo
e que, nas ocasiões em que ocorriam os
movimentos grevistas, a postura individual
perante os mesmos determinava uma cisão
no seio da classe, colocando frente a frente
um grupo que aderia às paredes e outro que
– por não tomar parte do movimento –
constituía uma ameaça a seu sucesso.
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Identidade/ Cultura e identidade(s): as disputas simbólicas sobre a identidade operária na Primeira República
122
Assim, ocorria uma construção
identitária instrumentalizada destes dois
grupos, na qual os grevistas, através da
imprensa operária, boletins, folhetos ou
pilhérias, buscavam desqualificar os não
grevistas e construir uma distinção moral
para o operário que entrava na luta contra o
capital, considerado corajoso e solidário –
enquanto que o não grevista (tratado como
‘carneiro’ ou fura-greve) era tido como
covarde, egoísta, traidor e bêbado.
Argumentou-se que essas construções
tinham o objetivo de agregar os militantes,
incentivando-os para o conflito e, ao
mesmo tempo, coagir e constranger
aqueles que continuavam a trabalhar.
De outro lado, patrões e Estado
buscavam, do mesmo modo, deslegitimar a
posição dos grevistas e incentivar a
permanência na labuta daqueles que não
haviam aderido às greves dando-lhes uma
demonstração de aprovação e apreço.
Assim, os paredistas eram mostrados como
sendo agitadores estrangeiros, anarquistas
aproveitadores da boa fé do operariado
nacional e este, sim, seria o verdadeiro
operariado, aquele que não se metia em
greves e que não se deixava iludir por
esses elementos. O jogo de identidades, no
qual cada agente social, segundo seus
interesses, procurava atribuir um conjunto
de características a determinado grupo em
oposição a outro, configura-se em uma
disputa simbólica pela explicação do real a
qual estabelece um confronto de
significados e significâncias, de signos e
sinais distintivos de uma mesma realidade
na qual se instrumentalizam identidades e
classificações a partir de estratégias para
conseguir alcançar o êxito em cada um dos
casos. Por fim, é a luta de classes levada ao
plano do simbólico. Corajosos e covardes.
Traidores e companheiros solidários.
Estrangeiros e nacionais. Todos eles
estavam – voluntária ou involuntariamente
– tomando parte dessa disputa, todos eles
eram – de algum modo – “nós” e “eles”.
Notas
1Doutorando em História pela UFRGS sob orientação do Prof. Benito B. Schmidt. Mestre em História pela UFRGS/2000. Graduado em História (Bacharelado e Licenciatura) pela PUC/RS – 1997. Autor do livro O Positivismo e a Questão Social na Primeira República (1895-1919), lançado em 2006, entre outros artigos e publicações. Professor da Faculdade União das Américas (UNIAMÉRICA/PR). Atualmente é professor da rede pública estadual.
2 GINZBURG, Carlo. O Queijo e os Vermes. São Paulo: Cia das Letras, 1987. p. 18.
3THOMPSON, E.. A Formação da Classe Operária Inglesa. Rio de Janeiro: Paz & Terra, 1987. vol. I, p. 57.
4 SILVA JR., Adhemar Lourenço da Silva Jr.
Contribuição a uma história dos “de baixo” do sindicalismo. Estudos Ibero-Americanos. Porto Alegre: PUC-RS, jul/1995. V. XXI. n.º 1. p. 79.
5 SILVA JR., Adhemar Lourenço da. “Povo”! Trabalhadores!: tumultos e movimento operário. In: ÁVILA, Maria de Fátima (org.). Porto Alegre: Dissertações e Teses. Unidade Editorial Porto
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Alegre: Porto Alegre, 1996. Cadernos Ponto & Vírgula 13. p. 44.
6 THOMPSON, Edward P.. Lucha de clases sin clases?. In: Tradición, Revuelta y Conciencia de Clase. Barcelona: Editorial Crítica, 1979. p. 35.
7 ARAVANIS, Evangelia. O corpo em evidência nas lutas dos operários gaúchos (1890-1917). Porto Alegre: UFRGS, 2005. Tese de Doutorado. P. 107.
8 BOURDIEU, Pierre. A Delegação e o Fetichismo Político. In: Coisas Ditas. São Paulo: Ed. Brasiliense, 2004. 189.
9 BOURDIEU, Pierre. Op. Cit. 2004. P. 189.
10 BOURDIEU, Pierre. La delegation et le fetichisme politique. Actes de la recherche en sciences sociales, 1984, n° 52-53, pp. 49-55. P. 49.
11 Bourdieu, Op. Cit. 2004. p,191-192.
12 HOBSBAWM, Eric. Mundos do Trabalho. 2ªed, Rio de Janeiro: Paz & Terra, 1988. p. 18.
13 Idem, 253.
14 BATALHA, Cláudio. Vida Associativa: por uma nova abordagem da história institucional nos estudos do movimento operário. Anos 90. Porto Alegre: UFRGS, dez. 1997. N.º 8. p. 94.
15 BATALHA, Cláudio. Op. Cit., 1997. p. 93.
16 Idem, p. 93.
17 HOGGART, Richard. As Utilizações da Cultura. Lisboa: Editorial Presença, 1973. vol. II. p. 192 e 197.
18 BOURDIEU, Pierre. A Greve e a Ação Política. In: Questões de Sociologia. Rio de Janeiro: Marco Zero, 1983. p. 195.
19 RODRIGUES, Leôncio Martins. Industrialização e Atitudes Operárias: estudo de um grupo de trabalhadores. São Paulo: Brasiliense, 1970. p, 115.
20 BOURDIEU, Pierre. A Greve e a ação política. In: ___________. Questões de Sociologia. Rio de Janeiro: Marco |Zero, 1983. p. 199.
21 CHALHOUB, Sidney. Trabalho, Lar e Botequim: o cotidiano dos trabalhadores no Rio de
Janeiro da Belle Époque. São Paulo: Brasiliense, 1986. p.105.
22 CHALHOUB, Sidney. Op. Cit., 1986. p. 107.
23 Ver VIANNA, Luiz Werneck. Liberalismo e Sindicato no Brasil. Belo Horizonte: UFMG, 1999. Segundo esse autor, na República Velha entre os anos de 1891 e 1919 “segue-se a mais rigorosa e consciente ortodoxia liberal. Com a Constituição [de 1891], isenta-se o mercado de trabalho de influências provenientes da política e da organização social”. p. 76. O modelo positivista, defendido pelos parlamentares do estado. seguia a orientação de promover o privatismo nas relações entre capital e trabalho incentivando as negociações entre patrões e empregados sem recorrer a medidas legislativas. No primeiro capítulo de minha dissertação de mestrado analisei a postura do PRR em relação à questão social. Essa postura se caracteriza pela condenação à intervenção do Estado na resolução de conflitos sociais através de “ leis compressivas” destacando o papel de conciliador em “casos de urgência decisiva”. QUEIRÓS, César Augusto B.. O Governo do Partido Republicano Rio-Grandense e a Questão Social (1895-1919). Porto Alegre: UFRGS, 2000. p. 43-61. FAUSTO também destaca a contrariedade da bancada gaúcha em aprovar alguma regulamentação estatal do campo do trabalho uma vez que “as restrições artificiosas à liberdade individual deveriam ser condenadas e a incorporação dos operários à sociedade seria feita através do processo educativo”. FAUSTO, Boris. Trabalho Urbano e Conflito Social. São Paulo: Difel, 1986. p. 231. VARGAS faz uma análise da posição da bancada gaúcha nas discussões sobre a regulamentação das relações capital/trabalho no terceiro capítulo de seu livro O trabalho na ordem liberal. VARGAS, João Tristan. O Trabalho na Ordem Liberal: o movimento operário e a construção do Estado na primeira república. Campinas: UNICAMP, 2004.
24 PIZZORNO, Alexandre. Algum tipo diferente de diferença: uma crítica das teorias da “escolha racional”. In: FOXLEY, A., McPHERSON, M. e O´DONNEL, G. (Org.). Desenvolvimento e Política e Aspirações Sociais: o pensamento de Albert Hirschman. São Paulo: Vértice, Editora da Revista dos Tribunais. P. 372.
25 PIZZORNO, Op. Cit. P. 374.
26 HIRSCHMAN, Albert. De la Economia a la Política y más allá. México: Fondo de Cultura Econômica, 1984. p. 272.
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27 HIRSCHMAN, A. Op. Cit., p. 274.
28 PIZZORNO, Op. Cit. P. 373.
29 POLACK, Michaell. Memória e Identidade Social. Estudos Históricos, 1992/1. nº 10. CPDOC/FGV. p. 5.
30 POLACK, Michaell. Memória e Identidade Social. Estudos Históricos, 1992/1. nº 10. CPDOC/FGV. p. 5.
31 MENDES, José Manuel Oliveira. O Desafio das Identidades. In: SANTOS, Boavenura de Souza (org.). A Globalização e as Ciências Sociais. São Paulo: Cortez, 2002. p. 504.
32 Em sua tese de Doutorado Bilhão faz uma análise do processo de construção identitária dos operários porto-alegrenses entre o final do século XIX e as primeiras décadas do século XX a partir das relações de reconhecimento, distinção e pela reivindicação de uma memória comum entre os operários. BILHÃO, Isabel. Identidade e Trabalho: análise da construção identitária dos operários porto-alegrenses (1896-1920). Porto Alegre: UFRGS, 2005. Tese de Doutorado.
33 GUARESCHI, Neuza et all. As relações raciais na construção das identidades. Psicologia em Estudo. Vol. 7. nº 2. Maringá.. Jul.dez 2002. p. 5
34 Idem, p. 375
35 Ibidem, p. 375
36 TILLY, Charles. Social Movements (1768-2004). London: Paradigm Publishers, 2004. p. 263.
37 BOURDIEU, Pierre. Espaço Social e Gênese das Classes. In: O Poder Simbólico. 6ª ed., Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003. p. 141.
38 ESTADO do Rio Grande do Sul. APERGS. Processo Crime nº 833. Porto Alegre: 1917. p. 75.
39CHARTIER, Roger. O Mundo como Representação. Estudos Avançados, Vol 5 Nº 11, (jan. 1991). p. 183.
40 SILVER, Beverly J.. Forças do Trabalho: movimentos de trabalhadores e globalização desde 1870. São Paulo: Boitempo, 2005. (mundos do trabalho). P. 36.
41 SILVER, B. Op. Cit. P. 37.
42 Idem, p. 37.
43 BOURDIEU, Pierre. Op. Cit. 2003. p, 155.
44 BOURDIEU, Pierre. A Greve e a Ação Política. In: Questões de Sociologia. Rio de Janeiro: Marco Zero, 1983. p. 195.
45 CASTRO, Pedro. Greve: fatos e significados. São Paulo: Ática, 1986. p, 13.
46 LENIN, Vladimir. Sobre as Greves. In: Obras Escolhidas. São Paulo: Alfa-Ômega, 1980. p, 132.
47 LENIN, Op. Cit. 1980. p, 134.
48 BOURDIEU, Pierre. Razões Práticas. Campinas: Papirus, 1997. p. 26.
49 LOPES, José Sérgio Leite. A tecelagem dos conflitos de classe na cidade das chaminés. São Paulo: Marco Zero, 1988. p. 83.
50 LOPES, Op. Cit., 1988. p, 81.
51 DUARTE, Luís Fernando Dias. Identidade social e padrões de agressividade verbal em um grupo de trabalhadores urbanos. In: LOPES, José Sérgio Leite (Coord.). Cultura e Identidade Operária: aspectos da cultura da classe trabalhadora. Rio de Janeiro: UFRJ/Marco Zero, s/d. p. 194.
52 HOGGART, Richard. As Utilizações da Cultura. Lisboa: Editorial Presença, 1973. p.110.
53CECCHETTO, Fátima Regina. Violência e estilos de masculinidade. Rio de Janeiro: FGV, 2004. p. 57.
54 DUARTE, Luiz Fernando Dias. Da vida nervosa nas classes trabalhadoras urbanas. 2ªed. Rio de Janeiro: Zahar/CNPq, 1988. p. 12.
55 BOURDIEU, Op. Cit. 1983. p. 201.
56Ver VIANNA, Luiz Werneck. Liberalismo e Sindicato no Brasil. Belo Horizonte: UFMG, 1999. Segundo esse autor, na República Velha entre os anos de 1891 e 1919 “segue-se a mais rigorosa e consciente ortodoxia liberal. Com a Constituição [de 1891], isenta-se o mercado de trabalho de influências provenientes da política e da organização social”. p. 76. O modelo positivista, defendido pelos parlamentares do estado. seguia a orientação de promover o privatismo nas relações entre capital e trabalho incentivando as negociações entre patrões e empregados sem recorrer a medidas
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legislativas. No primeiro capítulo de minha dissertação de mestrado analisei a postura do PRR em relação à questão social. Essa postura se caracteriza pela condenação à intervenção do Estado na resolução de conflitos sociais através de “ leis compressivas” destacando o papel de conciliador em “casos de urgência decisiva”. QUEIRÓS, César Augusto B.. O Governo do Partido Republicano Rio-Grandense e a Questão Social (1895-1919). Porto Alegre: UFRGS, 2000. p. 43-61. FAUSTO também destaca a contrariedade da bancada gaúcha em aprovar alguma regulamentação estatal do campo do trabalho uma vez que “as restrições artificiosas à liberdade individual deveriam ser condenadas e a incorporação dos operários à sociedade seria feita através do processo educativo”. FAUSTO, Boris. Trabalho Urbano e Conflito Social. São Paulo: Difel, 1986. p. 231. VARGAS faz uma análise da posição da bancada gaúcha nas discussões sobre a regulamentação das relações capital/trabalho no terceiro capítulo de seu livro O trabalho na ordem liberal. VARGAS, João Tristan. O Trabalho na Ordem Liberal: o movimento operário e a construção do Estado na primeira república. Campinas: UNICAMP, 2004.
57 Estudando os trabalhadores em Santos, Silva analisa dois casos exemplares: em um deles até mesmo as mulheres dos trabalhadores que se recusaram a se manterem em greve os trataram como subservientes animais; e em outro algumas crianças apedrejaram motorneiros de bonde que não haviam aderido à parede. SILVA, Fernando Teixeira da. Operários sem patrões: os trabalhadores da cidade de Santos no entreguerras. Campinas: Unicamp, 2003. p. 139.
58 ARAVANIS, Op. Cit., p. 186.
59O Syndicalista. Porto Alegre: 03/09/1919. nº7. p. 04.
60 Idem, p.186.
61O Syndicalista. Porto Alegre: 1º/04/1919. nº 1, Anno I. p, 1.
62 No primeiro capítulo de sua tese de Doutorado, Bilhão analisa os elementos constituintes de uma identidade operária marcada pela virtude, destacando a importância da instrução, da higiene e a condenação ao álcool e ao jogo para a construção desta identidade. BILHÃO, Isabel. Identidade e Trabalho: análise da construção identitária dos operários porto-alegrenses (1896-1920). Porto Alegre: UFRGS, 2005. Tese de Doutorado.
63 BATALHA. Op. Cit. 1997. p. 92.
64 BATALHA, Op. Cit. 1997. p. 94.
65 BATALHA, Op. Cit. 1997. p. 93.
66 Aravanis, Op. Cit. P. 188.
67 Idem, p. 193.
68 FORTES, Alexandre. "Miríades por toda a eternidade": a atualidade de E. P. Thompson. Tempo social. São Paulo, v. 18, n. 1, 2006. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-20702006000100011&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 13 Set 2006. doi: 10.1590/S0103-20702006000100011.
69CHAUÍ, Marilena. ‘Notas sobre Cultura Popular’. In: _______. Cultura e Democracia. 3ª ed., São Paulo: Moderna, 1982. Coleção Contemporânea. p. 68.
70 Processo-Crime n.º 833. Porto Alegre: 1917. p. 21.
71 Processo-Crime n.º 1016. Porto Alegre: 1919. p. 73.
72 crumiro
73 - RELATÓRIO apresentado pelo Chefe de Polícia Interino Eurico de Souza Leão Lustosa ao Presidente do Estado Borges de Medeiros. 1920 / Biblioteca Pública do RS. P. 355-357.
74RELATÓRIO apresentado Ao Exmo Sr. Dr. A. A. Borges de Medeiros pelo Dr. Protásio Alves em 30 de agosto de 1921.
75MENSAGEM do Presidente do Estado à Assembléia dos Representantes. Porto Alegre, 1920. p. 16.
76O Fim de Greve. A Federação. Porto Alegre: 10/03/1911. p. 01.
77- Os Anarquistas e a Ação do Governo. A Federação. Porto Alegre: 26/03/1917. p.03.
78 A Federação. Porto Alegre, 22/07/1918. p. 6.
79 A Federação. Porto Alegre, 08/09/1919. p. 3.
80 O Independente. Porto Alegre, 1º/07/1918.
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Identidade/ Cultura e identidade(s): as disputas simbólicas sobre a identidade operária na Primeira República
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81 O Independente. Porto Alegre, 03/07/1918.
82 O Independente. Porto Alegre, 03/07/1918.
83 O Independente. Porto Alegre, 03/07/1918
84 O Independente. Porto Alegre, 03/07/1918.
85 PINHEIRO, Paulo Sérgio. A gandaia e a repressão: piruetas de um chefe de polícia na Primeira República. Almanaque: Cadernos de Literatura e Ensaios. São Paulo: Brasiliense, 1979. nº 10. p. 61.
86 FAUSTO, Boris. Crime e Cotidiano: a criminalidade em São Paulo (1880-1924). São Paulo: Brasiliense, 1984. p. 60.
87 FAUSTO, Boris. 1984, Op. Cit., p.68.
88 http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/gordo.html acesso em 20/04/2007.
89 BATALHA, Claudio. O Movimento Operário na Primeira República. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2000.
90 Relatório da Secretaria da Fazenda e das Relações Interiores. 1920.
91 Mensagem apresentada ao Congresso Nacional na abertura da 3ª sessão da 10ª Legislatura pelo Presidente da República Epitácio Pessoa. Rio de Janeiro, 1920. p. 101-103.
92 A Federação. Porto Alegre, 08/09/1919. p. 3.
93 - Aos Pedreiros e Ajudantes. Anexo 16.
94 - A Voz da Razão – ao povo, aos soldados e operários. Manifesto da FORGS. 07/09/1919. Anexo 11 do Processo Crime 1016.
95 BAK, Joan. Classe, etnicidade e gênero no Brasil: a negociação de identidades dos trabalhadores na greve de 1906 em Porto Alegre. Métis. Caxias do Sul: EduCS. jul/dez 2003. , V. 2. p. 216. 96 BAK, Joan. Op. Cit. 2003. p. 216.