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PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE l.a INSTÂNCIA

SEÇÃO JUDICIÁRIA DA BAHIA

SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE VITÓRIA DA CONQUISTA

Autos 2009.33.07.002080-0 - AÇÃO CIVIL PÚBLICA

Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

Réus: HERMES BONFIM CHELES NASCIMENTO e RICARDO ALVES SANTOS

SENTENÇA

RELATÓRIO

Trata-se de ação civil pública de responsabilização por ato de

improbidade em que o MPF, ancorado em inquérito civil público, acusa Hermes Bonfim

Cheles Nascimento de malversação de recursos do Fundef no ano de 2002, acumpliciado r

com os demais Réus. "" ^

-^

Segundo textualmente o Parquet, o Tribunal de Contas dos

Municípios do Estado da Bahia, em relação ao exercício financeiro de 2002, identificou í^

numerosas ilicitudes na emissão de cheques sem correspondência com valores dos ^respectivos processos de pagamento ou em clara violação a lei que regula aplicação dos

recursos do Fundef.

O MPF aprofundou as investigações do TCM, requisitando

informações bancárias ao Banco do Brasil, tendo concluído que o dano ao erário foi muito

maior. Em sua investigação, afirma o Parquet, descobriu que os pagamentos foram feitos

sem correlação com recursos disponíveis na conta do Fundef, além do fato de que, em

outros casos, os lançamentos dos débitos na conta de tal Fundo foram inferiores ao total

da despesa. Ademais, nasceu suspeita de pagamentos a parentes com recursos do Fundef,

além de pagamentos a profissionais com funções administrativas em lugar de profissionais

com efetivo exercício no ensino fundamental, tal como exigido pelo art. 79 da Lei

9.424/96.

Afirmou o MPF que todos os cheques foram emitidos pelo Réu

Hermes Nascimento, sendo os demais, Ricardo Alves Santos e José Conegundes Vieira,

corresponsáveis, além de terem exercido os cargos de presidente e membro da comissão

de licitação.

Depois de requerer a indisponibilidade dos bens dos Demandados,

o MPF pediu sua condenação por enquadramento nos artigos 10, IX e XI, da Lei 8.429/92.

Foi determinada a notificação dos Réus: Hermes Nacimento, no

prazo da defesa preliminar, requereu requisição judicial de documentos (fls. 20-21), o que

foi indeferido pela decisão de fls. 23, sem que tal Demandado tenha produzido qualquer

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outra manifestação à guisa de defesa. José Conegundes Vieira e Ricardo Alves Santos

apresentaram defesa preliminar conjunta às fls. 36-57.

A decisão de fls. 66-8 rejeitou as preliminares e acolheu a inicial,

determinando a citação dos Réus. José Conegundes Vieira agravou de instrumento dessa

decisão (fls. 79-96), obtendo, em decisão monocrática do Relator, efeito suspensivo para

suspender o curso da ação em relação a ele (fls. 114-115).

Hermes Bonfim Cheles Nascimento apresentou contestação às fls.

97-101, em que negou as acusações, afirmando que os pagamentos foram rigorosamente

feitos com base na Lei de Responsabilidade Fiscal. Asseverou lhe estar sendo cerceado o

direito de defesa em razão de não ter tido acesso aos documentos em que se funda a

acusação. Pediu improcedência e requereu ainda assistência judiciária gratuita.

A decisão de fls. 123 deferiu o pedido de requisição de

documentos à Prefeitura de Jânio Quadros, feito por Hermes Nascimento, o que foi

atendido às fls. 126-1.155.

Ricardo Alves Santos contestou às fls. 1.156-1.190. Em sua peça,

repetiu preliminares arguidas por ocasião da defesa preliminar e, no mérito, disse não ter

exercido funções que o ligassem a assinatura de cheques, salientando ainda que

improbidade requer má fé e dolo. Pediu improcedência.

A decisão de fls. 1.195 determinou a intimação das partes para se

manifestarem sobre os documentos fornecidos pelo Município de Jânio Quadros,

constantes de fls. 126-1.154.

Intimadas as partes a especificar provas, os Réus se manifestaram

pela produção de depoimentos testemunhais (fls. 1.208-1209; 1.211)

A decisão de fls. 1.215-16 deferiu as provas requeridas pelos Réus,

determinou a Hermes Nascimento a especificação do tipo de prova pericial e deferiu o

requerimento de quebra de sigilo bancário e fiscal dos Demandados.

O Réu Ricardo Alves Santos, intimado a apresentar rol de

testemunhas, perdeu o prazo para tanto, conforme certidão de fls. 1.227, tendo sido

decretada a preclusão temporal para fazê-lo, pela decisão de fls. 1.229, que determinou

expedição de carta precatória para oitiva das testemunhas arroladas por Hermes

Nascimento, além de fixar os honorários do Perito contábil. Na ata da audiência instalada

para inquirição da única testemunha deste Réu residente nesta Cidade, não houve

comparecimento dela nem do advogado nem da parte. Foi dispensada a produção dessa

prova (fls. 1.239). À impugnação do valor arbitrado, a decisão de fls. 1.244-5 fez

corresponder o indeferimento, sem que o Réu tenha acolhido a determinação de

produção da prova pericial, preferindo aviar agravo de instrumento (fls. 1.288-1.293).

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A requerimento do MPF, a decisão de fls. 1.297 requisitou novos

documentos à Prefeitura de Jânio Quadros, o que foi atendido (fls. 1303-1.331).

Precatória expedida à Comarca de Jânio Quadros, para inquirição

das testemunhas arroladas por Hermes Nascimento, que foram devidamente inquiridas

(fls. 1.400-1.402).

Concluída a instrução, o MPF pediu absolvição de Ricardo Alves

Santos e sustentou a acusação em relação a Hermes Nascimento (fls. 1.450-1.461). Este,

em memoriais, pugnou pela improcedência (fls.1.469-1.478), o mesmo fazendo Ricardo

Alves Santos (fls. 1.480-1.494).

É o relatório. Decido.

FUNDAMENTAÇÃO

1. Convém relembrar que o Réu José Conegundes Vieira tem

em seu favor a decisão monocrática do Relator do agravo de instrumento, que

determinou a suspensão do feito em relação a ele (fls. 114-115). Se houver modificação

posterior desse comando, cumprirá ao MPF diligenciar formação de autos apartados para

prossecução.

2. Rejeito a preliminar de inépcia da inicial arguida por Hermes

Nascimento ao fundamento de não descrição individualizada de condutas. Na verdade,

essa individualização é tornada nítida no decorrer da instrução, quando se aquilata quemfez o quê e como.

Não há sentido em tentar trazer a este tipo de ação postulados

próprios do processo penal, como bem assentou o STJ: "A petição inicial de ação civil

pública não necessita descrever o comportamento e a conduta dos acusados com todos os

pormenores requeridos pela lei processual penal, sendo suficiente a descrição genérica dos

fatos e das imputações. Preliminar de inépcia da petição inicial rejeitada" (REsp 1183719 /SP, rei. Min. Eliana Calmon, j. 22/6/2010).

3. Indefiro o requerimento de assistência judiciário formulado

por Hermes Bonfim Cheles Nascimento. É, no mínimo, um desplante que alguém de seu

coturno sócio-econômico, um advogado e chefe político de um Município, peça esse

benefício destinado a miseráveis. Vale lembrar que a assistência judiciária goza de

presunção apenas relativa (STJ, inter alia, AgRg no Ag 1101151/SP, DJe 28/10/2009; AgRg

no Ag 1115711/RJ, DJe 27/08/2009; REsp 1115300/PR, DJe 19/08/2009), sendo

recomendável, em situações como a presente, que seja apresentado algum elemento

adjutório à simples alegação.

Ao enfrentar esse tipo de questão no âmbito de ação civil pública

3

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por improbidade, o STJ ainda decidiu: "Esta Corte possui o entendimento de que o

benefício da justiça gratuita pode ser pleiteado a qualquer tempo, bastando, para

obtenção do benefício, a simples afirmação do requerente de que não está em condições

de arcar com as custas do processo e com os honorários advocatícios. Sendo assim, a

afirmação de hipossuficiência possui presunção iuris tantum, contudo pode o magistrado

indeferir a assistência judiciária se não encontrarfundamentos que confirmem o estado de

hipossuficiência do requerente" (REsp 1196896 / SP, rei. Min. Mauro Campbell Marques,

DJe 04/10/2010).

4. De início, quanto à questão de fundo, deve-se ter em mente

que os Réus Hermes Nascimento e Ricardo Alves não se desincumbiram de infirmar a

prova documental produzida pelo MPF, a partir inclusive de apuração pelo Tribunal de

Contas dos Municípios (doravante somente TCM).

Nesse particular, a decisão de fls. 1203 rejeitou a preliminar de ^\nulidade da prova apurada no inquérito civil público, formulada por Ricardo Alves Santos, \Lque não recorreu, perdendo ainda prazo para arrolar testemunhas, conforme certidão de

fls. 1.227, tendo sido decretada a preclusão temporal para fazê-lo pela decisão de fls.

1.229.

Os Réus foram também intimados dos documentos juntados pelo

Município de Jânio Quadros (decisão de fls. 1.195), sem que tenham se manifestado. Vale

ainda ressaltar que o Réu Hermes Nascimento requereu produção de prova pericial, mas

intimado a depositar os valores para suportar sua realização, desatendeu ao comando

decisório, o que gerou o indeferimento da prova (decisão de fls. 1.244-5). Por último, as

três testemunhas arroladas por este Réu não forneceram qualquer informação pertinente

com o teor da acusação (fls. 1.400-2).

Com essa fisionomia, a prova documental produzida pelo MPF, a

começar da apuração contábil pelo Tribunal de Contas dos Municípios do Estado da Bahia,

deve ser acolhida.

Tenha-se em mente, em complemento, que toda e qualquer prova

é neutra, tornando-se tanto mais aceitável quanto maior for o grau de bilateralização ou

plurilaterização na sua produção, se ela o comportar, bem entendido. Se obedece a essa

mecânica dialética e dela sai hígida, o fato de originar-se de outro processo, ainda que

administrativo, deixa de ser obstáculo para a validade de sua aceitação.

Chama-se então de judicialização da prova essa incorporação:

"Prova literal judicializada. Eficácia probante. Subsídios literais, constituídos de cópias de

inquirições testemunhais pela polícia, juntados aos autos, e ensejada vista à parte 'ex

adversa', que rebateu seus conteúdos substanciais, perfazem prova judicializada, pois

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submetida ao crivo do contraditório" (RJTJERGS 159/378, apud Theotonio Negrão, Código

de processo civil, art. 332:4).

De um modo geral, todo e qualquer documento introduzido nos

autos torna nulo o julgamento se, tratando-se de documento relevante, com influência no

julgamento proferido, a parte contrária não teve oportunidade de se manifestar após a

juntada aos autos (STJ, REsp 6.081-RJ, rei. Min. Sálvio de Figueiredo; REsp 66.631-SP, rei.

Min. Castro Meira; REsp 34.770-5-SP, rei. Min. Nilson Naves). Como se vê, os Demandados

tiveram quase três anos para pelo menos impugnarem essa prova, mas não o fizeram.

4.0 No que toca às imputações, deve-se concordar com o MPF

que aquela, concernente à iliceidade no certame licitatório vencido por Roberto Silva

Abreu, não pode ser questionada aqui, porque se trata de destinação de verbas do Fundo

de Participação dos Municípios, o que não atrai a competência da Justiça Federal,

conforme reconhecido pela decisão de fls. 1.367-8.

4.1. No que respeita às demais imputações, há plena pertinência.

É adequado destacar o que o TCM averbou, no Parecer Prévio741/2003: "Aponta o Relatório Anual, às fls. 299 e 310, indícios de movimentação

financeira irregular da conta do Fundef, contra a qual foram emitidos diversos cheques

cujos valores não guardam correspondência com os processos de pagamento. Em

conseqüência, determina-se à Coordenadoria de Controle Externo proceder à analise

detalhada do feito e, em se constatando a irregularidade, lavrar o competente Termo deOcorrência" (fls. 13 do anexo ICP, volume 1).

Em cumprimento dessa determinação, a Unidade de Controle

Externo assim assentou no "Termo de Ocorrência" (fls. 37, ICP anexo, volume 1):

"Conforme Parecer Prévio (fls. 08), verificou-se (sic) irregularidades na

movimentação financeira da conta específica do Fundef, com a emissão de

vários cheques, sem correspondência com os valores dos processos depagamento.

Segundo Relatório Anual (fls. 14 a 18), tais irregularidades ocorreram nos mesesabaixo indicados:

Agosto - emissão de 17 cheques no montante de R$ 141.927,00.

Setembro - emissão de 19 cheques no montante de R$ 75.414,00.

Outubro - emissão de 31 cheques da conta corrente 8.084-5 no montante de R$

168.999,00.

Novembro - Toda a despesa com transporte escolar, no montante de R$

28.924,00, foi paga através do Processo de Pagamento 2004 da prestação de

contas mensal 01/11/2002, entretanto, nessa data foram sacados dois cheques

no valor total de R$ 16.800,00, o que seria insuficiente para pagamento pela

tesouraria municipal e maior do que o valor pago individualmente a qualquer

dos credores.

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Em 21.11 constatou-se pagamento de pessoal efetuado através da tesouraria na

ordem de R$ 75.925,45, enquanto que os cheques sacados/compensados nesta

data foram no valor total de R$ 36.320,00.

Em 28.11 houve pagamento de pessoal através da tesouraria, no valor total de

R$ 20.797,37, todavia, nessa data não houve nenhum débito no extrato e, no

período em que não houve registro de qualquer pagamento, foram emitidos

diversos cheques no montante de R$ 52.045,00.

Nos meses de novembro e dezembro a prefeitura pagou com recursos do

Fundef a alguns profissionais do magistério despesa a título de abono salarial no

valor total de R$ 20.797,37 e R$ 50.147,38, respectivamente, onde alguns

funcionários receberam o equivalente a 50% e outros a 100% do salário base.

Outrossim, nos pagamento acima mencionados, entre outras irregularidades,

constatou-se:

a) Ausência de lei autorizando pagamento

b) Pagamento de abono não estendido a todos os servidores vinculados ao

Fundef

c) Ausência de saldo a pagar relacionada a despesa empenhada para tal

finalidade (novembro)

d) Divergências em algumas assinaturas dos servidores apostas nas folhas

referentes ao pagamento de abono (PP 2169) confrontadas com as constantes

nas folhas referentes ao pagamento do mês de novembro (PP 2169) a exemplo

do Sr. Manoel Messias. A mesma irregularidade verificou-se no mês de

dezembro (PP 2337) e nas folhas referentes ao pagamento do abono naquele

mês (PP 2364), a exemplo dos professores Rosângela Soledade Pereira e Ataíde

Teixeira Rocha

Dezembro - o total de despesa paga com pessoal em 30.12.2002 importou em

R$ 155.570,54, enquanto o total dos cheques sacados/compensados foi da

ordem de R$ 620,00, indicando assim que o pagamento de pessoal foi realizado

na tesouraria.

No período em que não houve registros de qualquer pagamento, constatou-se a

emissão de diversos cheques no montante de R$ 70.408,82.

O valor conciliado (lançamentos contabilizados e não constantes no extrato

bancário) no período foi R$ 109.620,00.

Foi solicitado (sic) ao chefe da 5^ IRCE extratos bancários e processos de

pagamento referentes às irregularidades apontadas, entretanto, apesar de

notificado pelo inspetor (fls. 18 a 20), até a presente data o gestor não enviou a

documentação solicitada".

Diante desse quadro calamitoso de saques sem correspondência

factual de despesas, o TCU condenou o Réu Hermes Nascimento, com seus recursos

pessoais, ao ressarcimento, aos cofres públicos, do valor R$ 868.335,22 (oitocentos e

sessenta e oito mil, trezentos e trinta e cinco reais e vinte e dois centavos), atualizado até

julho de 2008.

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Ademais, aquela Corte de Contas, por seu Presidente, representou

formalmente à Procuradoria Geral de Justiça, contra o então Prefeito Hermes Nascimento,

por crime de responsabilidade (fls. 53, ICP anexo, volume 1).

No âmbito do inquérito civil público, o MPF periciou os

documentos por ele requisitados em adição ao que foi fornecido pelo TCM, chegando à

conclusão de que "não foi possível associar nenhum cheque às despesas executadas

através dos recursos do Fundef" (fls. 78, ICP anexo, volume 1).

Trata-se de uma miríade de ilegalidades: saques pessoais de

recursos do Fundef, processos de pagamento falsificados, pagamentos fora da rubrica

legal do Fundef, despesas não autorizadas. Não admira que o TCM tenha condenado o

Réu, embora sem êxito prático, ao ressarcimento pessoal no valor citado. r

Como corretamente enquadrou o MPF, a Lei de Improbidade ^^

alcança de modo claro a conduta do Réu Hermes Nascimento: ^

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário

qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial,

desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das

entidades referidas no art. 1? desta lei, e notadamente:

IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou

regulamento;

XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou

influir de qualquerforma para a sua aplicação irregular;

5. No que atine ao Réu Ricardo Alves Santos, o MPF,

diferentemente do que fizera na inicial, o isentou com os seguintes argumentos:

"Destarte, após a instrução processual, não há elementos que permitam ao Ministério

Público Federal sustentar pleito condenatório contra o réu Ricardo Alves Santos. A sua

participação nos processos de pagamento foi de menor importância, sem qualquer nota de

decisividade, não se podendo mesmo descartar que ele não soubesse o que estava se

passando, ou seja, que os tenha assinado de modo burocrático, atendendo a mera

formalidade" (fls. 1.453).

Essa linha de argumentação desafeiçoa-se da prova dos autos, a

começar da expressão de que "após a instrução processual, não há elementos que

permitam ao Ministério Público Federal sustentar pleito condenatório contra o réu Ricardo

Alves Santos", pois não houve instrução alguma quanto às provas desse Réu, já que seu

advogado perdeu prazo para arrolar testemunhas e também não requereu perícia contábil

que pudesse invalidar os fatos tais como investigados pelo TCM e pela analista pericial do

MPF.

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A segunda parte do período isentivo do MPF, ou seja, "a sua

participação nos processos de pagamento foi de menor importância, sem qualquer nota de

decisividade, não se podendo mesmo descartar que ele não soubesse o que estava se

passando, ou seja, que os tenha assinado de modo burocrático, atendendo a mera

formalidade", também não tem base factual.

Com efeito, no Anexo II, volumes 1 e 2, dos autos apensos, e

também nestes autos (fls. 835, 839, 840, 859, 861, 863, 865, 887, 889-891, 893, 920, 984-

85 1007-1011; 1.134-1.151), entre muitos outros lugares esparsos, há inúmeras notas de

empenho assinadas por Ricardo Alves Santos na qualidade de diretor administrativo e

presidente de comissão de licitação, atestando, em todas elas, que "a importância supra

foi deduzida do crédito próprio" e que "a despesa relativa à nota de empenho supra está

liquidada, podendo efetuar o pagamento".

Vale lembrar que também funcionou como Secretário de

Administração, como se vê claramente da declaração nessa qualidade assinada em 25 de

outubro de 2002 (fls. 353 e 872), chegando a ter a função de atestar, como verdadeiras,

impressões digitais de pessoas beneficiárias de pagamentos feitos pelo Prefeito (fls. 666,

Anexo II, volume IV), além de ter funcionado como Presidente da Comissão de Licitação

responsável por assinatura em certo documentos como editais de licitação, em conjunto

com o Prefeito (fls. 873 e fls. 273 do Anexo II, volume II). Na qualidade de presidente da

comissão de licitação subscreveu Relatório e Parecer Final em 25 de outubro de 2002

(fls.856, 881-2)

Tratava-se de pessoa de estrita confiança política do então

Prefeito, e não um mero funcionário de carreira, ou menos ainda um passanito, como quis

ver o MPF. Ao contrário, elegendo-o como coringa para cargos permanentes e

transitórios, mostrava o então Prefeito que o secretário de administração era seu homem

a latere, seu alter ego. Não por outra razão participava da intimidade da estrutura do

poder como um factotum contábil, até nas suas deformações, o que explica que chegasse

mesmo a figurar como testemunha em contratos de prestação de serviços transporte para

fins de educação, suportados por recursos do Fundef, como o que se vê de fls. 206 do

Anexo II, volume II.

Sua presença nos múltiplos empenhos, que dava aparência de

legalidade às informações contábeis, exigia tratar-se de pessoa de confiança. Vale lembrar

que "o empenho da despesa é o ato emanado de autoridade competente que cria para o

Estado obrigação de pagamento pendente ou não de implemento de condição", como

estabelece o art. 58 da Lei 4.320/64. Por isso o empenho exerce, em contabilidade pública

e financeira, importância capital na despesa pública, já que funciona como garantia ao

fornecedor e ao mesmo tempo controle de gastos.

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Quando a perícia da analista do MPF conclui que "não foi possível

associar nenhum cheque às despesas executadas através dos recursos do Fundef" (fls. 78,

ICP anexo, volume 1), só podia estar fazer retroceder as ilicitudes para a fase anterior de

empenho, já que o TCM concluíra que tais despesas não podiam ser suportadas por

recursos do Fundef, a exemplo de gastos com pessoal sem exercício efetivo de magistério.

Quando o MPF, a respeito do Correu Hermes Nascimento, enfatiza

que ele "falsificou ideologicamente inúmeros processos de pagamento" (fls. 1.460),

necessariamente teria que fazer inserir Ricardo Alves Santos no espectro condenatório.

Da mesma forma aflora essa corresponsabilidade quando o MPF,

nos mesmos memoriais, com os olhos postos na prova documental, afirma que Hermes .

Nascimento "autorizou pagamentos, com os 60% do Fundef legalmente destinados à £v

remuneração de professores que efetivamente exerciam atividades em sala de aula, a ^

servidores que não ostentavam essa condição" (fls. 1.460), afinal, Ricardo Alves Santos,

coassinou esses pagamentos, subscreveu as folhas de pagamento e até atestou digitais de

beneficiários que não sabiam assinar o próprio nome, como se viu.

Assim, quando o MPF diz que Hermes Nascimento "descurou do

ônus imposto pelo art. 333, II, do CPC" e que "diante da eficácia probatória relativa do

inquérito civil público cumpria-lhe produzir provas, o que não logrou realizar", como que

produz um daguerreótipo da atuação processual de Ricardo Alves Santos através de seu

advogado, que negligenciou a produção de provas.

A não se ver responsabilidade do secretário de administração aí,

focando-se a unipessoalidade do prefeito, amputa-se a boa mecânica desse conventículo

montado ainda com a participação do Tesoureiro, já falecido.

Não se trata assim de responsabilidade objetiva do Secretário, que

não é admitida (STJ, Resp 734.984/SP, 1^ Turma, Rei. p/ acórdão Min. Luiz Fux, DJe de

16.6.2008; REsp 658.415/RS, 2§ Turma, Rei. Min. Eliana Calmon, DJ de 3.8.2006; REsp

604.151/RS, lã Turma, Rei. p/ acórdão Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 8.6.2006; REsp

626.034/RS, 2^ Turma, Rei. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 5.6.2006, p. 246), mas de

vínculo subjetivo e psicológico muito claro entre as pessoas que comandavam a

administração pública local.

Tem sido modernamente posta em questão a responsabilidade do

Prefeito quando se está diante de atos praticados também por subordinados. Uma

estratégia muito comum é desfocar o mandatário e assestar as baterias contra seus

secretários. No TCU - o que, como norte contábil do problema, é útil -já ficou assentada

a tese da responsabilidade de ambos: "é entendimento pacífico no Tribunal que o

instrumento da delegação de competência não retira a responsabilidade de quem delega,

visto que remanesce a responsabilidade no nível delegante em relação aos atos do

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delegado (v.g. Acórdão 56/1992 - Plenário, in Ata 40/1992; Acórdão 54/1999 - Plenário, in

Ata 19/1999; Acórdão 153/2001 - Segunda Câmara, in Ata 10/2001). Cabe, por

conseguinte, à autoridade delegante a fiscalização subordinados, diante da culpa in

eligendo e da culpa in vigilando" (Acórdão 1.619/2004-TCU-Plenário).

0 assunto já foi bater às portas do Supremo Tribunal Federal, que,

no julgamento do Al 631841/SP, Relator Min. Celso de Melo, j. 24/04/2009, assentou que

"os Secretários exercem cargos de confiança para praticarem atos delegados pelo Prefeito,

que os escolhe direta e imediatamente e tem a responsabilidade não somente pela

escolha, mas também de fiscalizar diretamente seus atos".

Essa fiscalização é recíproca, pois secretário algum deve dar amém ^>

a falcatruas, seja a que título for. Vale lembrar que, pelo princípio da simetria, um ^^secretário municipal comporta-se como o Ministro de Estado em sua relação com o "1Presidente da República. A respeito desta relação, dispõe a Constituição que cabe ao ^\

Ministro "exercer a orientação, coordenação e supervisão dos órgãos e entidades da

administração federal na área de sua competência e referendar os atos e decretos

assinados pelo Presidente da República" (art. 87,1).

Como ensina José Afonso da Silva, a probidade administrativa

consiste no dever de o "funcionário servir a Administração com honestidade, procedendo

no exercício das suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes

em proveito pessoal ou de outrem a quem queira favorecer" (Curso de Direito

Constitucional Positivo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 669).

Não é outra a orientação fixada no âmbito do Tribunal Regional

Federal da 1? Região. No julgamento do AG 0050871-20.2010.4.01.0000 / BA, rei. Desemb.

Federal Assusete Magalhães, j. 01/08/2011, a Corte assentou em relação a caso ocorrido

aqui bem próximo, no Município de Jaguaquara: "Na qualidade de Secretária de Educação

do Município de Jaguaquara/BA, à época dos fatos, a agravante participou da gestão dos

recursos do FUNDEF, que deveriam ter sido aplicados em reforma de escolas públicas

municipais, mas que, supostamente, foram desviados. Assim, é ela parte legítima para

figurar no polo passivo da ação de improbidade. Secretário Municipal, na forma da

jurisprudência do earéaio STJ e do TRF/ie Reaião. está suieito aos ditames da Lei 8.429/92.

por forca do aue dispõem o art. 2? da Lei 8.429/92 e os arts. 15. V. e 37. $ 4$. da

Constituição Federal"{sem destaque no original).

Quanto ao artifício de tentar safar-se acusando um ao outro, essa

Corte também já teve oportunidade de o reprimir, fazendo a reprimenda alcançar ambos:

"Limitaram-se os investigados em atribuir ao outro as responsabilidades pelo desvio dos

recursos: o prefeito afirma ter assinado os cheques em confiança e o secretário de saúde

no cumprimento de ordens do prefeito, o que permite suas condenações" (AC

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2005.39.00.010143-6 / PA, rei. Desemb. Federal Carlos Olavo, Juiz Federal Guilherme

Mendonça Doehler (Conv.), 05/08/2011 e-DJFl P. 25).

No mesmo sentido: "Comprovada a participação efetiva do ex-

chefe do almoxarifado, também parente do ex-prefeito e do ex-Secretário da Saúde que,

mesmo diante de evidentes irregularidades, homologava as licitações" (AC

1999.30.00.002713-5 / AC, rei. Desemb. Federal Hilton Queiroz, Juiz Federal Marcus

Vinícius Bastos (Conv.), 19/08/2010 e-DJFl P. 116).

Vale, por último, relembrar que este Réu, Ricardo Alves Santos,

nem mesmo quis contraprovar sua inocência, limitando-se aos conhecidos chavões

jurisprudenciais aqui descontextualizados: não requereu perícia contábil e perdeu prazo

paera apresentar rol de testemunhas, apesar de ter dito, num primeiro momento, que iria

produzir prova oral.

Contra sua negligência processual, há uma aluvião de documentos

por ele assinados que foram trazidos aos autos e que não podem ser aqui

desconsiderados, seja porque são oriundos da própria administração pública, seja porque,

tendo vista deles, o Réu não os impugnou ou arguiu sua falsidade. Nesse sentido, em

julgado que quadra ao caso, o STJ decidiu:

"Por fim, o inquérito civil possui eficácia probatória relativa para fins de

instrução da ação civil pública. Contudo, no caso em tela, em que a prova da

irregularidade da dispensa de licitação é feita pela juntada de notas de empenho

diversas, dando conta da prestação de serviço único, com claro fracionamento

do objeto, documentos estes levantados em inquérito civil, não há como

condicionar a veracidade da informação à produção da prova em juízo, porque

tais documentos não tiveram sua autenticidade contestada pela parte

interessada, sendo certo que, trazidos aos autos apenas em juízo, não teriam

seu conteúdo alterado" (REsp 1280321/MG, rei. Min. Mauro Campbell Marques,

DJe 09/03/2012).

Em arremate: a corresponsabilidade do Réu Ricardo Alves Santos é

patente.

6. Individuação das penas

Por amadurecimento jurisprudencial, tem sido exigida a

individuação das penas em ações de improbidade (STJ, RESP 505068-PR, RESP 713537-GO,

RESP 626204-RS, RESP 713146-PR, RESP 631301-RS, RESP 825673-MG, RESP 664856-PR,

RESP 513576-MG, RESP 794155-SP, RESP 300184-SP).

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No presente caso, ambos os Réus estão quase no mesmo patamar

de culpabilidade, pois os saques e pagamentos não poderiam ter sido feitos sem que um

deles compusesse o esquema ímprobo.

Todavia, ao então Prefeito deve ser dada maior carga de apenação,

haja vista que, como vértice da pirâmide política, lhe era exigível maior respeito à

probidade. A ele deve ser imposta, em nome inclusive dos múltiplos fatos apurados

demonstrativos de maior reprovabilidade, o máximo da sanção de suspensão dos direitos

políticos. Como dito no REsp 505.068 - PR, rei. Min. Luiz Fux, "no campo sancionatório, a

interpretação deve conduzir à dosimetria relacionada à exempiariedade e à correlação da

sanção, critérios que compõem a razoabilidade da punição, sempre prestigiada pela

jurisprudência do E. STJ" (em igual sentido: RESP 664856/PR, mesma relatoria, DJ de

02.05.2006; RESP 507574/MG, Relator Ministro Teori Zavascki, DJ de 08.05.2006; RESP

513.576/MG, Relator p/ acórdão Ministro Teori Zavascki, DJ de 06.03.2006; RESP 291.747,

Relator Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ de 18/03/2002; RESP 300.184/SP, Relator

Ministro Franciulli Netto, DJ de 03.11.2003 e RESP 505.068/PR, rei. Min. Luiz Fux, DJ de

29.09.2003).

Tirante esse diferencial na apenação a ser imposta no campo da

suspensão dos direitos políticos, quanto ao mais, ambos os Réus se igualizam em

reprovabilidade, impondo-se a cumulação das sanções, tendo em vista o dano

escandaloso, oriundo de assalto a recursos do Fundef, em desfavor de um Município

pobre como o de Jânio Quadros.

7. Indisponibilidade

Pelo que se conclui de tudo isso, houve desvio de recursos

públicos, o que dá pertinência ao pedido de indisponibilidade, já que a incerteza temporal

de quando se dará o desate definitivo da lide e seu conseqüente trânsito em julgadorecomenda a medida, que tem cunho acautelatório.

Na verdade, na mais apropriada angulação feita pelo STJ, "no caso

da medida cautelar de indisponibilidade, prevista no art. 7? da LIA, não se vislumbra uma

típica tutela de urgência, como descrito acima, mas sim uma tutela de evidência, uma vez

que o periculum in mora não é oriundo da intenção do agente dilapidar seu patrimônio e,

sim, da gravidade dos fatos e do montante do prejuízo causado ao erário, o que atinge

toda a coletividade. O próprio legislador dispensa a demonstração do perigo de dano, em

vista da redação imperativa da Constituição Federal (art. 37, §4?) e da própria Lei de

Improbidade (art. 7*)" (REsp 1319515 / ES, rei. p/ acórdão, Min. Mauro CampbellMarques, j. 22/08/2012).

Nesse mesmo julgado, a Corte assentou que "o periculum in mora,

em verdade, milita em favor da sociedade, representada pelo requerente da medida de

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JUSTIÇA FEDERAL DE 1.3 INSTÂNCIA

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bloqueio de bens, porquanto esta Corte Superior já apontou pelo entendimento segundo o

qual, em casos de indisponibilidade patrimonial por imputação de conduta ímproba lesiva

ao erário, esse requisito é implícito ao comando normativo do art. 7g da Lei n. 8.429/92".

Esse julgado se põe na linha de orientação embutida nos vários

precedentes da Corte: REsp 1315092/RJ, Rei. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Rei. p/

Acórdão Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 05/06/2012, DJe

14/06/2012; AgRg no AREsp 133.243/MT, Rei. Ministro Castro Meira, Segunda Turma,

julgado em 15/05/2012, DJe 24/05/2012; MC 9.675/RS, Rei. Ministro Mauro Campbell

Marques, Segunda Turma, julgado em 28/06/2011, DJe 03/08/2011; EDcl no REsp

1211986/MT, Rei. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 24/05/2011,

DJe 09/06/2011.

No âmbito do TRF-1^ Região, já se fixou acertadamente que "o

desvio ou venda é ato instantâneo, sem prévio aviso ou sinais exteriores, sendo que a

comprovação do elemento subjetivo (animus de dilapidar) é prova impossível de ser

produzida" (AG 2008.01.00.012011-4/PA, rei. Juíza Federal Rosimayre Gonçalves de

Carvalho (conv.)).

No AG 2007.01.00.045388-0/TO, rei. Des. Fed. Hilton Queiroz, a

Corte deixou assentado que "quanto ao periculum in mora, advém do risco que corre a

Administração Pública de nada encontrar no patrimônio do réu, com que se ressarcir

futuramente, em vencendo a demanda, considerando-se a lentidão ritual do processo".

Mesma linha de raciocínio se vê do AG 2007.01.00.038315-4/PA,

rei. Juiz Federal Klaus Kuschel (conv.), que alude ao "risco concreto, decorrente da lentidão

do rito processual de tramitação das ações de improbidade, de que não se encontrem bens

suficientes ao ressarcimento do dano caso saia o autor vitorioso em sua pretensão".

A ressalva, como se vê desses precedentes, corre à conta da

impossibilidade de a constrição recair sobre os meios de subsistência dos Réus, o que será

preservado, devendo-se dar atenção também à advertência do STJ de que "a

indisponibilidade de bens deve recair sobre o patrimônio dos réus em ação de improbidade

administrativa de modo suficiente a garantir o integral ressarcimento de eventual prejuízo

ao erário, levando-se em consideração, ainda, o valor de possível multa civil como sanção

autônoma" (REsp 1319515 / ES, rei. p/ acórdão, Min. Mauro Campbell Marques, j.

22/08/2012).

CONCLUSÃO

À vista do exposto, condeno solidariamente os Réus ao

ressarcimento integral do dano R$ 868.335,22 (oitocentos e sessenta e oito mil, trezentos

e trinta e cinco reais e vinte e dois centavos), atualizado até julho de 2008, perda de

função pública em que se achem investidos, suspensão dos direitos políticos de Hermes

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Bonfim Cheles Nascimento por oito anos e de Ricardo Alves Santos por cinco anos,

pagamento solidário de multa civil de 10% (dez por cento) do valor do dano e proibição de

contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios,

direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sóciosmajoritários, pelo prazo de cinco anos;

Ressalvados valores impenhoráveis, assim definidos em lei, decreto

a indisponibilidade dos bens dos Réus no valor de R$ 868.335,22 (oitocentos e sessenta e

oito mil, trezentos e trinta e cinco reais e vinte e dois centavos), inclusive ativos

financeiros, via Bacenjud, veículos, via Renajud, e através de ofício aos cartórios de

imóveis desta Comarca e daqueles onde estejam inscritos os imóveis do Município de

Jânio Quadros, devendo ser oficiado, quanto a este último Município, também o cartóriode títulos e documentos.

Oficie-se ao Relator do agravo de instrumento interposto pelo Réu

Hermes Nascimento (fls. 1.288-1.293), comunicando-lhe o sentenciamento do feito.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Vitória da Conquista, 3 de dezembro de 2012

r .

ao Batista de Castro Júnior

Juiz Federal titular da 1^ Vara

Subseção Judiciária de Vitória da Conquista - Bahia

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