O ativismo em rede e as manifestações políticas na era digital

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Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Escola Superior de Propaganda e Marketing como requisito para obtenção do título de Bacharel em Comunicação Social. Por Clarissa Braga Pellegrini

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ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

PGE MONOGRÁFICO

CLARISSA PELLEGRINI BRAGA

O ATIVISMO EM REDE E AS MANIFESTAÇÕES POLÍTICAS NA ERA DIGITAL

São Paulo

2013

CLARISSA PELLEGRINI BRAGA

O ATIVISMO EM REDE E AS MANIFESTAÇÕES POLÍTICAS NA ERA DIGITAL

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

PGE MONOGRÁFICO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à

Escola Superior de Propaganda e Marketing como

requisito para obtenção do título de Bacharel

em Comunicação Social

Aprovada em:

Orientador: Prof. Luiz Fernando da Silva Jr.

Agradecimentos

Agradeço aos meus pais e irmãs pelo apoio.

E ao Fora do Eixo por ceder as fotografias lindas que ilustram este trabalho.

Ao Prof. Moacir, que me fez enxergar o mundo antes de partir.

Never doubt that a small group of thoughtful, committed people can change the world. Indeed, it is the only thing that ever has.

Margaret Mead.

De maneira crescente, a internet vem sendo palco para manifestações e articulações de mo-vimentos sociais. Devido ao seu formato hori-zontalizado, permite uma participação mais de-mocrática do que outros meios de comunicação e, assim, abre espaço para que novas pessoas ingressem na esfera política e para que haja a criação de novas conexões entre diferentes mo-vimentos sociais, contribuindo para o chamado ativismo em rede. Neste trabalho, procuro com-preender as novas formas de organização dos movimentos sociais em relação às características

que são próprias de seu espaço-tempo. Para isso, foi necessária a realização de uma análise sobre as dinâmicas da rede e sobre as conceituações de identidade e de comunidades na Era pós-mo-derna. Investigou-se, também, os aspectos e as inter-relações da articulação de manifestações políticas com os meios digitais. Dessa forma, foi possível compreender a importância da internet e das redes sociais digitais para os novos movi-mentos sociais e, também, enxergar os aspectos positivos e negativos do uso dessas plataformas.

Resumo

Palavras-chave: movimentos sociais, ativismo em rede, manifestações políticas, internet, redes sociais digitais

Increasingly, internet has been the stage for po-litical manifestations and social movements ar-ticulation. Due to its horizontal shape, it allows a more democratic participation than any other communication media and, thus, opens a way for new people to join the political sphere and for the creation of new connections between different social movements, contributing for the so called networking activism. For this essay, I attempt to understand these new social movements or-ganizations in relation to the features that are typical of their own space-time. Therefore, it has

Abstract

been necessary to analyze networking dinamics and identity and community conceptualizations in the postmodern era. It was also investigated the aspects and the interrelations of political manifestations and the digital media. Therefore, it was possible to understand the importance of internet and social media for the new social movements and to notice positive and negative aspects of using these platforms.

Key-word: social movements, networking activism, political manifestations, internet, social media

Sumário

1. INTRODuÇãO 14

2. ObjETIVO 20

3. PROCEDIMENTOS METODOLóGICOS 22

4. AS REDES SOCIAIS E SuA PRESENÇA NA INTERNET 26 4.1 Sites de redes sociais 28

4.2 Elementos da rede: atores, conexões e o capital social 30

4.3 Dinâmicas da rede 32

4.3.1 Cooperação 32

4.3.2 Clusterização 33

4.3.3 Adaptação e auto-organização 34

5. A REPRESENTAÇãO E CONSTRuÇãO DO Eu 36 5.1 Concepções identitárias na pós- modernidade 38

6. SOCIEDADE E COMuNIDADES

PóS-MODERNAS 46 6.1 Émile Durkheim 49

6.2 Ferdinand Tönnies 51

6.3 Zigmunt Bauman 53

6.4 Michel Maffesoli 55

7. OS MOVIMENTOS SOCIAIS E O CONTExTO ESPAÇO-TEMPO

7.1 O ativismo em rede ou a rede de movimento socia 61

7.1.1 Alcance global 63

7.1.2 Militantes Ocasionais 64

7.1.3 Crise das estruturas verticalmente integradas 68

7.1.4 Luta por valores culturais 69

7.1.5 Criação de Mídias Alternativas 71

7.1.6 Da necessidade de renovação dos movimentos sociais 72

8. ESTuDO DE CASOS: FEstIval amor sIm russomaNo Não E Fora FElIcIaNo 74 8.1.1 Festival Amor Sim Russomanno Não 75

8.1.2 Fora Feliciano 77

8.2 Relação dos casos com os principais pontos abordados 78

8.2.1 Formato da rede 78

8.2.2 Cooperação 79

8.2.3 Clusterização 79

8.2.4 Adaptação 80

8.2.5 As manifestações como comunidade temporárias 81

8.2.6 O alcance observado 83

8.2.7 Presença de valores culturais 84

8.2.8 Reflexo do enfraquecimento das estruturas tradicionais e suas consequências 85

9. CONSIDERAÇÕES

FINAIS 88

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1.INTRODUÇÃO

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Na “Era da Informação” (CASTELLS, 2003), blogs, redes sociais, portais de notícias, de entreteni-mento e, basicamente, todo e qualquer site que forneça um espaço para a escrita e o comparti-lhamento de ideias e imagens abre portas para os mais diversos tipos de discussões. Os usuários da rede dispõem-se a participar de forma ativa quando o assunto é de seu interesse, seja geran-do conteúdo, seja escrevendo comentários em conteúdo de outros internautas. Dentre a grande variedade de temas gerados na web, as ciências sociais e políticas se fazem presentes e, como tantos outros temas, estão sujeitas a discussões fervorosas com diferentes níveis de complexida-de; tal questão é perceptível para qualquer usuá-rio que esteja um pouco mais atento aos conteú-dos gerados.

Diversas questões estão ligadas às ciências políticas e sociais e são passíveis de estudo, tais como a qualidade das discussões realizadas, os

novos tipos de relações mediados pela internet, a internet como ferramenta de comunicação, entre outras. Dentre a multiplicidade de per-cursos de investigação e possibilidades de olhar para estes assuntos, destaca-se a necessidade de compreender as novas formas de organização dos movimentos sociais desenvolvidas a partir do uso de mídias sociais. Isso porque partimos da constatação empírica de que manifestações políticas inéditas – tais como o Amor sim, Russo-manno não e Fora Feliciano1 - têm ocupado espa-ços cada vez maiores nos conteúdos gerados nas mídias sociais.

Vale destacar que em estudo bibliográfico percebe-se que a formação de grupos/redes e o ativismo político tem sido alvo de discussão de inúmeros sociólogos durante toda a história da civilização – logo, a questão da relação entre as-sociativismo de pessoas e atuação política não é nova. Porém, esses estudos podem ser conside-

1. Manifestações de cunho político ocorridas na cidade de São Paulo nos anos 2012 e 2013, respectivamente.

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rados complexos no que se diz à solução de suas problemáticas, considerando que são sujeitos a diversas variáveis como: o espaço em que estão inseridos esses grupos; o tempo, ou seja, a época em que acontecem; suas inter-relações com a so-ciedade de dado momento; a situação político-e-conômica desses espaços-tempos, entre outras. Sendo assim, é possível realizar análises paralela-mente às mudanças da sociedade.

Justamente, considerando que todos esses fa-tores implicam em mudanças na relação citada, é preciso pensar como se dá essa relação no tem-po contemporâneo. Pois, dentre as variáveis que devemos considerar como influências para a for-mação e os resultados de movimentos sociais na contemporaneidade, ocupa o lugar central, como uma matriz que desencadeará dezenas de outros aspectos favoráveis, a internet. Há característi-cas na internet que constituem um “ambiente” ideal para a articulação desses movimentos. Essa

tecnologia é dona de ferramentas como propul-sionam a criação desses grupos. Como ferra-menta de informação e comunicação, ela pode mostrar-se de grande importância para a forma que as pessoas se relacionam e se agrupam, in-fluenciando a maneira que se dão esses agrupa-mentos na rede digital, e até fora dela. A isso se soma o advento das mídias sociais no cotidiano das pessoas.

Vale destacar que, para pensar essas mudan-ças, é necessário primeiramente analisar as re-lações humanas na sociedade contemporânea, para que se compreenda o novo formato desses movimentos. E, especificamente, neste estudo será focada a formação de comunidades no meio urbano, como a cidade de São Paulo.

Nesse contexto, e observando a atuação des-ses novos movimentos sociais dentro de sites de redes sociais, como o Facebook, é importante analisar suas características e compreender o pa-

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ralelo que se dá com as características e aspectos das próprias redes. Como o formato em rede que compõe esses novos movimentos pode auxiliar no processo de uma manifestação política arti-culada nos meios digitais? Quais aspectos dessa nova tecnologia têm influência direta na articula-ção e ação desses movimentos?

É imprescindível que se realize, também, uma observação e análise da maneira que os indivídu-os portam-se nessas redes. Com foco em ativis-tas mais jovens, ou seja, aqueles que tiveram sua opinião política formada paralelamente ao sur-gimento e crescimento das novas tecnologias de comunicação e informação, os indivíduos analisa-dos deverão ser os mesmos. Compreender a pos-tura dessas pessoas é importante para que seja possível entender não somente como acontece a influência da formação desses grupos sobre elas, mas também como elas influenciam na criação e crescimento desses grupos.

As redes sociais mostraram-se de grande im-portância para manifestações populares atuais, como a Primavera Árabe2 e a mais recente N143, que contaram com milhões de pessoas nas ruas protestando em prol de um objetivo em comum. E, ao contrário do que se demonstrou por muito tempo, já na pós-modernidade, em artigos jor-nalísticos e discursos políticos que difundiram ideias sobre o fim dos grandes ideais coletivos e o fim do espaço público, ainda reside e resiste na sociedade o desejo de se unir por mudanças.

Saindo do macro, ou seja, não focando em movimentos do porte desses que ocorreram no Oriente Médio e na Europa, e concentrando-se no micro, deverá ser possível observar que as desco-bertas advindas do estudo desses agrupamentos e das influências das redes sociais caberão tam-bém a comunidades menores, manifestações de pequeno porte.

Um exemplo de um movimento mais localiza-

2. Onda revolucionária de manifestações e protestos que vêm ocorrendo no Oriente Médio e no Norte da África e que usa as mídias sociais para organizar, comunicar e sensibilizar a população e a comunidade internacional em face de tentati-vas de repressão e censura da internet por parte dos Estados árabes.

3. N14 refere-se ao dia 14 de Novembro, dia escolhido para a realiza-ção de protestos e manifestações relacionadas à recessão em que se encontram grande parte dos países europeus.

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do é o movimento Festival Amor Sim Russoman-no Não, organizado por coletivos e internautas. Essa manifestação ocorreu na cidade de São Pau-lo e visava influenciar o futuro das eleições para prefeito da cidade, na qual o candidato a prefeito Celso Russomanno liderava as pesquisas de pri-meiro turno. Segundo notícia divulgada pelo site Terra, o partido do candidato, o PRB tinha “66% dos dirigentes ligados à [Igreja] Universal”. No-tícias como essa colocaram a população em um questionamento da ligação entre a Igreja e o pró-prio candidato, que, por causa dessa e de outras questões, sofreu retaliações contra sua candida-tura, que foi assunto principal das redes digitais no período que antecedeu o primeiro turno. Fo-tos, vídeos e cartazes preencheram as timelines do Facebook e do Twitter no período e esse movi-mento culminou numa passeata que percorreu a Avenida Paulista, toda a Rua Augusta, e terminou num grande encontro com artistas e shows na

Praça Roosevelt, no centro da cidade, onde milha-res4 de pessoas vestidas com roupas cor-de-rosa “festejaram o amor”.

Um dos resultados dessa manifestação, segun-do o site Brasil Econômico5 , foi uma queda gradu-al do percentual de intenção de voto no candida-to e, por fim, a sua derrota já no primeiro turno. Ou seja, o objetivo principal da manifestação foi alcançado. Um grupo de pessoas com um objetivo em comum uniu-se, manifestou-se através das re-des sociais digitais, compartilhou sua ideia, cres-ceu dentro dentro dos meios digitais, agregando milhares de pessoas, transportou-se para fora do virtual e gerou um resultado positivo dentro do que esperava.

Outro exemplo importante é a manifestação intitulada Fora Feliciano que, também partindo da união de diferentes movimentos sociais, con-tou com a participação de internautas para sua articulação nos meios digitais. A manifestação

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4. A mídia divulgou que o protesto contava com cerca de 1.000 pessoas, segundo a polícia, porém este pode ser considerado um número falso. Segundo os organizadores, 15 mil manifestantes estavam presentes. No entanto, não temos como saber o número preciso de pes-soas que participaram. É consenso entre militantes que os números divulgados pela mídia não são confiáveis, como disse Linderbergh Farias, para o iG, sobre o número de “cara-pintadas” manifestando-se em 1992: “Sempre dobrava a polícia (risos). Esse era meu critério, dobrar a polícia.” Disponível em: http://advivo.com.br/materia-artigo/haddad-diz-que-russomanno-e-serra-devem-desculpas-um-ao-ou-tro e http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2012-05-21/demorei-tres-passeatas-para-pintar-a-cara-revela-lindbergh.html - acessados em 04/11/2012

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5. Disponível em: http://www.brasileconomico.ig.com.br/noticias/facebook-foi-vilao-para-campanha-de-russomanno_123185.html - acessado em 04/11/2012

ocorreu como forma de protesto à indicação do Pastor Marco Feliciano à presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos De-putados. E, como no caso do Festival, culminou em uma reunião na Praça Roosevelt, que contou com apresentações artísticas e clima de festa. Neste caso, até o presente momento, a manifestação não atingiu o objetivo principal proposto.

Toda manifestação atinge algum tipo de resulta-do, sendo ela bem sucedida ou não. A questão é: se-ria o objetivo de tal manifestação alcançado sem a influência dos meio tecnológicos e das redes sociais digitais? Como os elementos presentes na rede po-dem facilitar a articulação e ação dessas manifes-tações?

Dadas as devidas considerações, este trabalho possui como problema de pesquisa analisar o ativis-mo em rede como articulador de manifestações so-ciais e sua relação com os meios digitais, tais como os sites de redes sociais, dentre eles, o Facebook.

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2.OBJETIVO

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Esse trabalho pretende compreender as novas formas de organização dos movimentos sociais e analisar os aspectos de manifestações políticas articuladas nos meios digitais, investigando suas inter-relações. Serão analisadas, especificamen-te, as manifestações populares Festival Amor Sim Russomanno Não e Fora Feliciano, ocorridas em 2012 e 2013, respectivamente.

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3.PROCEDIMENTOSMETODOLÓGICOS

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Este trabalho configura-se como um estudo ex-ploratório (GIL, 2007) de acordo com seu obje-tivo, Para Gil (2007, p.41), o estudo exploratório objetiva “proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a construir hipóteses”.

Considerando as interfaces desse tema, esse estudo é composto de distintas partes. Primeira-mente, foi necessário entender como funcionam as redes sociais, reais e virtuais, no que diz res-peito às suas dinâmicas e elementos. Utilizamos as teorias de Raquel Recuero (2009), Albert-Lás-zló Barabási (2003), Danah Boyd & Nicole Ellison (2007) e Richard Antoun (2004).

Além disso, para compreender as concepções identitárias dos indivíduos pós-modernos e re-lacioná-las com suas formas de manifestações dentro de suas comunidades, foram utilizados como referência estudos de Paula Sibilia (2008), de Douglas Kellner (2001) e Zygmunt Bauman (2004). As teorias e conceituações de Stuart Hall (2012) e Kathryn Woodward (2012) também auxi-liaram nesse processo de compreensão.

Para a articulação desta questão, foi realizado estudo sobre a formação de grupos e comunida-des na sociedade contemporânea. Utilizando-se teorias de sociólogos como Zigmunt Bauman (2001), Michael Maffesoli (2006), Émile Durkheim (2001), Manuel Castells (2003) e Ferdinand Tön-nies (1995), foi possível compreender não somen-te as formas como se relacionam os indivíduos, mas também os motivos que levam os sujeitos a quererem agrupar-se.

Outro ponto importante são as característi-cas desses novos movimentos sociais. Inseridos num panorama completamente novo, possuem aspectos diferentes de movimentos passados. Contrapondo-se às manifestações realizadas to-talmente fora do virtual, temos hoje movimentos – como os que serão estudados – que são articu-lados quase que unicamente dentro da internet e que nos fornecem informações preciosas para a compreensão dessas novas formas de ativismos políticos e suas relações com os meios digitais. Para isso, foram apresentados estudos de Ma-nuel Castells (2003) e Marcus Abílio (2011).

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Ademais, para a realização desse trabalho foi necessário ir além do estudo de teóricos con-ceituados. Por ser um tema muito atual e de pouca abordagem até o momento, foi preciso realizar pesquisas de campo e observações de militantes e participantes ativos dessas novas organizações, tanto no espaço online quanto no off-line. E, a partir dessas pesquisas e observa-ções, foram aplicados os conceitos teóricos nos estudos de casos. Dessa maneira, tornou-se pos-sível compreender de forma mais completa a di-nâmica desses movimentos e sua relação com os meios digitais.

3 . P R O C E D I M E N TO S M E TO D O L Ó G I C O S

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4.AS REDES SOCIAIS E SUA PRESENÇA NA INTERNET

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Quando uma rede de computadores conecta a uma rede de pessoas e organizações, é uma rede social.(Garton, Haythornthwaite e Wellman, 1997, p.1)

Clay Shirky – escritor, professor e estudioso dos efeitos sociais e econômicos da internet – de-fende em uma de suas palestras para o TED en-titulada Como a Mídia Social Pode Fazer História, proferida em 2009, que o período que estamos vivendo é de “maior crescimento da capacidade expressiva da história humana”. Ele explica sua afirmação dividindo 500 anos de história da mí-dia em quatro períodos que implicaram em mu-danças consideradas suficientemente grandes para serem chamadas de Revolução.

A primeira fase da história da mídia é marca-da pela criação da prensa gráfica, que tornou a imprensa possível. Centenas de anos depois des-se invento, no que seria o segundo período das mídias, houve a criação da mídia conversacional com o telégrafo e o telefone, que possibilitaram conversações em tempo real baseadas em voz.

No terceiro período, há 150 anos, houve o surgi-mento das fotografias e dos registros em áudio e filmes. E, finalmente, há 100 anos, surgiu o uso do espectro eletromagnético para enviar sons e imagens através do ar, do radio e da televisão, sendo esse o quarto período da história das mí-dias. Nessa palestra, Clay Shirky chama atenção para o fato de que há uma simetria na divisão desses quatro períodos de revolução midiática.

O autor aponta que “as mídias que são boas em criar conversações não são boas em criar gru-pos” e vice-versa. Ou seja, com essas mídias con-vencionais é possível somente estabelecer uma conexão entre dois indivíduos ou, então, enviar a mesma mensagem para um grupo grande de indi-víduos, sem que haja resposta.

No século XXI, vemos o surgimento de um novo tipo de mídia, que, segundo Shirky, “é o primeiro meio da história que possui suporte nativo para grupos e conversação ao mesmo tempo”; e essa é a primeira das grandes mudanças da nova revolu-ção. A segunda grande mudança ocorre porque:

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4 . A S R E D E S S O C I A IS E S UA P R E S E N Ç A N A I N T E R N E T

4.1 Sites de redes sociais

Atualmente, associamos o termo redes sociais à tecnologia. Porém, a ideia de rede social surgiu no início do século XX e, desde então, inúmeros estudiosos conceberam diferentes conceitua-ções para o termo. Para fins deste trabalho, utili-zaremos o conceito de redes sociais como grupos de indivíduos que, através de interações, estabe-lecem diversos tipos de laços sociais pelo quais são transmitidos fluxos de informação. Desta maneira, há que se fazer a diferenciação de redes sociais e sites de redes sociais, onde:

Conforme toda a mídia se torna digital, a internet também se torna o meio de condução para todas as outras mídias.(SHIRKY, 2009, TED)

Ou seja, através da internet é possível fazer ligações telefônicas, acessar conteúdos de revis-tas e canais de televisão, assistir filmes e, assim, basicamente, todos os outros tipos de mídia mi-gram para a internet. Dessa forma, o fluxo de in-formações de diferentes mídias passa pela rede.

A internet permitiu a possibilidade de difusão dessas informações de maneira interativa e rá-pida, criando novos canais e, ao mesmo tempo, inaugurando a possibilidade de uma pluralidade de novas informações circular nos grupos sociais (Recuero, 2009, p. 116). Segundo Barabási (2003), a “difusão epidêmica de informações” pode ser creditada à existência de conectores que pos-suem um grande número de conexões em várias redes sociais. A compreensão do papel deses in-divíduos e das redes sociais nas quais estão inse-ridos é de extrema importância para a análise a

ser feita no presente trabalho e, portanto, é im-portante uma observação mais minuciosa do que chamamos de rede social, bem como sua presen-ça na Internet.

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Embora sites de redes sociais atuem como suporte para as interações que constituirão as redes sociais, eles não são, por si, redes sociais. Eles podem apresentá-las, auxiliar e percebê-las, mas é importante salientar que são, em si, apenas sistemas. São os atores sociais, que utilizam essas redes, que constituem essas redes.(RECuERO, 2009, p. 103)

i) a construção de uma persona através de um perfil ou página pessoal; ii) a interação através de comentários; iii) a exposição pública da rede social de cada ator.(bOYD & ELLISON, 2007 apud RECuERO, 2009, p. 104)

Sites de redes sociais são, portanto, ferramen-tas por meio das quais os indivíduos podem ex-por suas próprias redes, de maneira que estas se-jam visíveis a outros indivíduos pertencentes às mesmas e/ou outras redes. Esses sites “possuem mecanismo de individualização (personalização, construção do eu, etc.); mostram as redes sociais de cada ator de forma pública e possibilitam que os mesmo construam interações nesses siste-mas” (IDEM).

Boyd e Ellison (2007) definiram os sites de re-des sociais como:

Após a compreensão da definição de sites de redes sociais, podemos dividi-los em duas cate-gorias: sites de redes sociais propriamente ditos e sites de redes sociais apropriados (RECUERO, 2009, p. 104). Entre os propriamente ditos estão o Orkut, o Facebook e o Linkedin, por exemplo. Estes são sites cujo foco é tornar as redes sociais (atores e suas conexões) públicas “são sistemas onde há perfis e há espaços específicos para a pu-blicização das conexões com os indivíduos” (RE-CUERO, 2009, p.104). Já os sites de redes sociais apropriados são aqueles que não foram criados originalmente com a função de publicizar as re-des sociais, mas que “são apropriados pelos ato-res com este fim” (RECUERO, 2009, p. 104). Entre

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(uma rede) é um conjunto de itens, que chamamos de vértices (nós), com ligações entre eles, chamados de conexões (arestas).(CASTRO, 2007, p. 45)

eles estão fotologs, blogs e o Twitter. Considerando que os sites de rede social pro-

priamente ditos tem sua estrutura formada para receber, apoiar e publicizar as redes sociais, será utilizado, no capítulo dedicado aos estudos de casos, o Facebook como plataforma de observa-ção da articulação desses novos movimentos.

4.2 Elementos da rede: atores, conexões e o capital social

atores serão considerados como uma representa-ção de atores sociais, ou seja, criações identitá-rias elaboradas para a interação no ciberespaço – assunto que será tratado mais adiante.

O segundo elemento da rede são as conexões, ou seja, os laços sociais construídos a partir das interações realizadas entre atores de uma mes-ma rede. Em relação a essas conexões, tem-se o conceito de capital social, que pode ser conside-rado como a qualidade dessas conexões ou um indicativo da conexão entre pares de indivíduos em uma rede social (RECUERO, 2009, p. 44). Di-versos autores divergem sobre o conceito de ca-pital social nas redes sociais, mas, numa síntese dos conceitos elaborados por Coleman, Putnam, Bourdieu e Bertolini & Bravo, podemos considerá-lo como um conjunto de recursos de um determi-nado grupo que pode ser usufruído por todos os membros do grupo, ainda que individualmente, e que está baseado na reciprocidade (RECUERO, 2009, p. 50). Desta forma, é possível compreen-der o capital social como os benefícios que certo indivíduo pode vir a receber em troca de ceder sua individualidade em prol do coletivo, ato im-

4 . A S R E D E S S O C I A IS E S UA P R E S E N Ç A N A I N T E R N E T

As redes sociais são compostas por três elemen-tos principais: os nós ou atores, as conexões e, por fim, o fluxo de informação criado por eles. Os atores, ou nós, são os indivíduos pertencentes a uma rede, e que, constituindo laços sociais, pos-suem a função de formar as estruturas de deter-minada rede. No caso de redes na internet, estes

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prescindível para a formação e articulação de uma manifestação social.

A partir dos estudos de Coleman (1988), Ber-tolini e Bravo (2001) propõem uma classificação do capital social primeiramente em dois níveis incialmente, o primeiro relacionado ao indivíduo, e o segundo nível relacionado aos ganhos que po-dem ser desfrutados somente na coletividade. Estes níveis de capital social foram posterior-mente segmentados em diferentes categorias, as dimensões do capital social:

Cada interação entre atores sociais de uma mesma rede carrega em si um capital social que, inserido no contexto da formação de um coletivo ativista, pode ser traduzido num valor percebi-do pelo(s) outro(s) participante(s) da rede, valor este relacionado à reputação, confiança, difusão de informações e credibilidade, entre outros.

a) relacional – que compreende a soma das relações, laços e trocas que conectam os indivíduos de uma determinada rede;b) normativo – que compreenderia as normas de comportamento de um determinado grupo e os valores deste grupo;c) cognitivo – que compreenderia a soma do conhecimento e das informações colocadas em comum por um determinado grupo;

d) confiança no ambiente social – que compreenderia a confiança no comportamento de indivíduos em um determinado ambiente;e) institucional – que incluiria as instituições formais e informais, que se constituem nas estruturação geral dos grupos, onde é possível conhecer as “regras” da interação social, e onde o nível de cooperação e coordenação é bastante alto.(RECuERO, 2009, p. 51)

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4.3 Dinâmicas da rede

4 . A S R E D E S S O C I A IS E S UA P R E S E N Ç A N A I N T E R N E T

Os processos dinâmicos das redes são consequência direta dos processos de interação entre os atores. Redes são sistemas dinâmicos e, como tais, sujeitos a processos de ordem, caos, agregação, desagregação e ruptura.(NICOLIS & PRIGOGINE, 1989 apud RECuERO, 2009, p. 80)

O potencial mais profundamente transformativo das ferramentas sociais de conectividade humana para a eficiência das tecnologias da informação é a chance de fazer novas coisas em conjunto, o potencial para cooperação em escalas e em modos nunca antes possíveis.(RHEINGOLD, 2002, P. 114)

Uma rede social, mesmo na internet, modifica-se em relação ao tempo (RECUERO, 2009, p. 79). Dessa forma, é importante observar as dinâmi-cas das redes sociais para que se obtenha maior compreensão das formas de relações possíveis encontradas entre o ativismo em rede e os meios digitais. Assim, considerando os propósitos des-te trabalho, serão discutidos apenas os aspectos dessas dinâmicas considerados relevantes para o estudo do tema, e estes conceitos serão aplica-dos, posteriormente, no estudo de casos.

4.3.1 Cooperação

Entre os elementos encontrados nessas dinâmi-cas da rede estão: a cooperação, a competição e o conflito. A cooperação é o processo formador das estruturas sociais (RECUERO, 2009, p. 81) e, independentemente dos motivos que a origi-nam, é essencial para a compreensão das ações coletivas dos atores que compõem a rede social. (IDEM). Enquanto o elemento definido como con-flito contribui para o desequilíbrio e a competi-ção colabora para o fortalecimento da estrutura social, a cooperação é essencial para a criação e manutenção desta estrutura e é indispensável para atingir um fim comum a todos os atores de

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uma mesma rede (RECUERO, 2009, p. 83). Desta forma, torna-se claro o motivo de compreender a importância da cooperação para este trabalho.

O processo de cooperação é necessário para originar a formação da estrutura social e para atingir objetivos comuns a indivíduos de uma mesma rede, de uma mesma comunidade. Para Antoun (2004), as comunidades virtuais podem ser traduzidas na forma de uma cooperação so-cial de modo que são baseadas em uma multipli-cação do conhecimento produzido e apropriado como um bem comum. Defende, ainda, que:

(Os) meios de comunicação também podem reduzir os custos de resolução dos dilemas da ação coletiva, possibilitando que mais pessoas possam gerar e compartilhar recursos de novos modos. Os dilemas da ação coletiva estão na base dos problemas que giram em torno da partilha do bem comum (commons) na medida em que se procure entender essa oscilação de cada um entre seu próprio interesse e o bem público.(ANTOuN, 2004, p. 11)

4.3.2 Clusterização

Outro aspecto das dinâmicas encontradas nas re-des, de extrema importância para compreensão do motivo pelo qual estas se relacionam com o processo de formação e articulação das novas for-mas de manifestações sociais, é a clusterização, ou ruptura e agregação. A clusterização, segundo Raquel Recuero (2009), é o processo formador das comunidades virtuais como consequência do agrupamento de “nós muito mais densos que o restante da rede”. A partir do modelo de Barabá-si e Albert (2009), observa-se que alguns nós das redes possuem um número de conexões muito maior que o resto dos indivíduos:

Conectores são um componente extremamente importante de nossas redes sociais. Eles criam tendências e modas, fazem negócios importantes, espalham boatos ou auxiliam a lançar um restaurante.(bARAbASI & ALbERT, 2009, p. 56).

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Dentro do contexto de formação de grupos de ativistas digitais, esses conectores possuem a importante função de difundir informações para o maior número de pessoas possíveis, ou seja, todas aquelas presentes em suas redes de cone-xões. São atores que estabeleceram, através de suas interações e laços, um capital social sólido para com os demais conectados. Possuem credi-bilidade e conseguem disseminar conhecimento de valor para aqueles que se conectam com eles por determinados fins coletivos.

4 . A S R E D E S S O C I A IS E S UA P R E S E N Ç A N A I N T E R N E T

4.3.3 Adaptação e auto-organização

Dado que os sistemas e as redes estão em cons-tante mudança, novos padrões estruturais aparecem todos os dias, daí a importância da adaptação na dinâmica das redes. Dentro de um contexto de formação de um grupo com objeti-vos em comum, a adaptação a essas mudanças e a auto-organização para enfrentá-las se fazem necessárias para que haja continuação de sua comunicação: “é preciso que haja circularidade nessa informações, para que os processos sociais coletivos possam manter a estrutura social e as interações possam continuar acontecendo.(RECUERO, 2009, p. 89).

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5.A REPRESENTAÇÃO E CONSTRUÇÃO DO eu

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Como foi observado no capítulo anterior, as redes sociais possuem elementos e dinâmicas próprias. Porém, a forma como se dão essas dinâmicas de-pende, essencialmente, do elemento principal das redes sociais: os atores. Estejam essas redes inseridas no espaço físico ou no virtual, os ato-res são os responsáveis por todas as mudanças e transformações que acontecem em uma determi-nada rede e, por isso, são o foco de atenção para os estudos acerca do tema. Assim, tanto para a compreensão de atividades nos sites de redes so-ciais, quanto para o entendimento do processo de organização coletiva de manifestação social em rede, é imprescindível que se inicie uma análi-se a respeito desses atores e, mais precisamente, sobre suas concepções identitárias.

Através de estudos de Paula Sibília (2008) e Stuart Hall (2012), pode-se afirmar que, tanto no âmbito das redes sociais online quanto nas redes construídas off-line, a identidade de um indiví-duo é uma representação de seu “eu” subjetivo. Esta representação que pode vir a ser um reflexo de várias determinantes, tais como as próprias representações culturais e midiáticas observa-

das e analisadas por Douglas Kellner (2001) ou as representações de identidade de outros indivídu-os. Representações porque talvez não definam com veracidade este “eu” subjetivo, representa-ções porque talvez se refiram a “personalidades alterdirigidas” (SIBILIA, 2008, p. 23), ou seja, “construções de si orientadas para o olhar alheio ou exteriorizadas” (IDEM).

Neste contexto, é possível compreender o mo-tivo pelo qual o conceito de identidade desses atores torna-se tão complexo nos meios digitais, tal como é observável nas redes sociais expos-tas nas telas de computadores e celulares. Estes meios “expandem o campo de visibilidade, esse espaço onde cada um pode se construir como uma subjetividade alterdirigida” (SIBILIA, 2008, p. 111).

A nova tendência de publicização do “eu” modi-ficou em várias maneiras o modo como se dão as interações entre os atores, e nisso se incluem as formações de movimentos sociais. E para enten-der o porquê e de que forma isso ocorre, será fei-to um recuo e apresentado, primeiramente, como ocorrem as conceituações acerca das construções identitárias na era pós-moderna.

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5.1 Concepções identitárias na pós-modernidade

Não é possível tratar de conceituações sobre a identidade sem se referir a um determinado es-paço-tempo, pois aquilo que é subjetivo e pesso-al sofre profundas influências do contexto em que está inserido. Segundo Stuart Hall (2012, p. 79), “todo meio de representação – escrita, pin-tura, desenho, fotografia, simbolização através da arte ou dos sistemas de telecomunicação – deve traduzir seu objeto em dimensões espa-ciais e temporais” – e isto se aplica, também, à representação do “eu”.

Através do histórico das concepções iden-titárias fornecido por Stuart Hall (2012) e Zyg-munt Bauman (2004) é possível notar a presen-ça e os efeitos espaço-temporais no conceito de identidade de três diferentes épocas, realizan-do análise sobre a identidade na pós-moderni-dade e seu papel no contexto do ativismo em rede na atualidade.

Com uma perspectiva inflexível, o “sujeito do Iluminismo” (HALL, 2012, p. 10) possuía sua

identidade como centro essencial do “eu”: um nú-cleo interior que emergia pela primeira vez com o nascimento do sujeito e desabrochava com ele, permanecendo essencialmente o mesmo – con-tínuo e idêntico (HALL, 2012, p.10). A identidade era determinada pelo nascimento e, assim, não surgiria um vazio ou oportunidade para o ques-tionamento do “quem sou eu”.

Já com o advento da modernidade essa con-cepção tomou outra perspectiva, visto que se passou a perceber que essa nova e mais complexa sociedade exercia influência no mundo subjetivo do indivíduo. Segundo Bauman (2004), a identi-dade moderna era determinada pelas classes e se fazia necessária a comprovação, por atos pró-prios, de que, de fato, o sujeito pertencia à tal ou tal classe. Ou seja, nesse momento a identidade era reflexo da interação e da relação do indivíduo com a sociedade, onde o “sujeito sociológico” (HALL, 2012, p. 10) era formado à partir de sua re-lação com o outro.

Com o fim da modernidade e a chegada de to-das as novidades da pós-modernidade, bem como suas respectivas alterações no espaço-tempo, as

5 . A R E P R E S E N TA Ç Ã O E C O N S T R U Ç Ã O D O EU

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Na medida em que os sistemas de significação e representação cultural se multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade desconcertante e cambiante de identidade possíveis, com cada uma das quais poderíamos nos identificar – ao menos temporariamente.(HALL, 2012, p.13)

concepções identitárias passaram também por transformações. O sujeito pós-moderno, segun-do Hall, é formado e transformado “continua-mente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas cul-turais”; porque vive na era líquida, como defende Bauman. O contexto em que estamos inseridos é o de um mundo fluido, onde as transformações são constantes e velozes, e isso é refletido na identidade deste sujeito que, influenciada pelo seu próprio espaço-tempo, se torna múltipla e multifacetada.

Já não existe mais a ideia de uma identidade estável. Ao contrário, o sujeito pós-moderno “está se tornando fragmentado, composto não de uma única, mas de várias identidades” (HALL, 2012, p. 12). Essa mudança dá-se pelo fato de que vivemos numa sociedade hipermidiatizada e mul-ticultural, onde:

Essas transformações significaram para o indivíduo (seja para o bem ou para o mal) o surgimento da escolha individual da identida-de, ou seja, o aparecimento de um conceito de construção da identidade, que antes não era possível. A identidade agora é fruto das esco-lhas e, como parte da era “líquido-moderna” está sujeita às constantes transformações e “permanece sempre incompleta, está sempre em processo, sempre sendo formada” (HALL, 2012, p. 38). Nesse sentido,

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A tarefa de um construtor de identidade é, como diria Lévi-Strauss, a de um bricoleur, que constrói todo tipo de coisas com o material que tem à mão.(bAuMAN, 2004, p. 55)

Neste cenário, é possível compreender o im-portante papel que sites de redes sociais, como o Facebook, possuem no auxílio à tarefa da cons-trução do “eu” – ao menos no que se trata do espaço online. Sites como estes “seriam estra-tégias que os sujeitos contemporâneos colocam em ação para responder a essas novas demandas socioculturais, balizando outras formas de ser e estar no mundo” (SIBILIA, 2008, p. 23).

A internet, de todas as ferramentas que pos-suímos em mãos para comunicação, pode ser considerada a de maior fluidez. Não é que o es-paço-tempo não esteja bem determinado em sua estrutura – afinal, tudo que acontece na web

acontece em um determinado lugar (site, espaço para comentários) e em um determinado tempo. Porém, a velocidade com a qual se dá o fluxo de informações e as interações, principalmente em sites de redes sociais, como o Facebook, permi-tem que a liquidez da identidade de dado indi-víduo dê-se de forma ainda mais fluida do que no espaço offline. Textos e imagens publicados em perfis de redes sociais tornam-se, em pouco tempo, apenas rastros de uma identidade que se optou por representar em dado momento, ou de uma de muitas identidades que representam o mundo subjetivo de determinado indivíduo.

Este fato, inserido no contexto de uma pu-blicização do “eu político”, tão importante para a análise aqui feita, pode ser traduzido como o compartilhamento de imagens e notícias de cunho político que se contradizem em sua posi-ção. Por exemplo, um sujeito pode dizer que tem uma orientação política identificada com os valo-

5 . A R E P R E S E N TA Ç Ã O E C O N S T R U Ç Ã O D O EU

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res da direita em determinada publicação e, tem-pos depois, colocar-se compartilhando posiciona-mentos políticos identificados à uma posição de esquerda em uma outra publicação.

Nem todos os atores de sua rede social perce-bem a contradição. Apesar de as TICs6 manterem um registro eterno de tudo que acontece na rede, a estrutura do Facebook permite que a informa-ção permaneça completamente exposta por um curto período de tempo, até que novas publica-ções sejam feitas e a informação saia da página principal. Devido a esse aspecto, este sujeito terá revelado uma identidade para alguns e outra completamente oposta para outros atores. Em outras palavras, não é fator importante sua posi-ção política, nem mesmo a veracidade da mesma e, sim, a representação de sua identidade em de-terminado tempo e espaço para determinada si-tuação. Esta postura observada em sites de redes sociais mostra-se relevante para a articulação de

6 .Tecnologias da Informação e Comunicação.

uma manifestação social, no sentido de que al-guns ativistas não precisam estar profundamente informados sobre a causa para juntar-se à mani-festação, o que pode trazer consequências positi-vas e negativas, como veremos mais adiante.

A situação aqui referida – a desta contradição em que os sujeitos se colocam nas redes digitais – pode ser explicada por duas razões. A primeira é que a internet é o lugar da hipermidiatização: estamos inseridos em um espaço de comunica-ção quase confuso, inseridos numa “poluição mi-diática”, termo utilizado por Andrea Semprini. A quantidade de informação que chega até nós é muito grande, e chega de forma tão abrupta e se-quencial que muitas vezes não nos dá tempo de analisar o que está sendo absorvido. Esses ruídos são causados não somente pela quantidade de informações, mas, também, pela falta de tempo para que determinado conteúdo seja recepciona-do e compreendido por quem o consome. Sendo

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assim, muitas vezes essa informação é entendida de maneira superficial por quem a recebe. E as-sim é transmitida de forma também superficial.

A segunda razão é que essa “mudança” de identidade faz parte do processo de construção identitária ao qual estamos sujeitos:

ou não, encontrar solidariedade de outros ato-res, pois “há a ânsia e as tentativas de encontrar ou criar novos grupos com os quais se vivencie o pertencimento e que possam facilitar a constru-ção da identidade” (BAUMAN, 2004, p. 30); as-sim, na busca por essa construção reside o desejo por reconhecimento.

Esse reconhecimento e a sensação de perten-cimento se tornam importantes na medida em que a tarefa de construir o “eu” foi imposta ao sujeito pós-moderno, uma vez que:

5 . A R E P R E S E N TA Ç Ã O E C O N S T R U Ç Ã O D O EU

A construção da identidade assumiu a forma de uma experimentação infindável. Os experimentos jamais terminam. Você assume uma identidade num momento, mas muitas outras, ainda não testadas, estão na esquina esperando que você as escolha.(bAuMAN, 2004, p. 91 )

Quando a identidade perde as âncoras sociais que a faziam parecer “natural”, predeterminada e inegociável, a “identificação” se torna cada vez mais importante para os indivíduos que buscam desesperadamente um “nós” a que possam pedir acesso.(bAuMAN, 2004, p. 30)

O ambiente da rede proporciona ao indivíduo a liberdade de experimentar inúmeras represen-tações de identidades diferentes em diversos momentos. E, no ato de experimentar, incluem-se as respostas e as reações às suas escolhas que, no caso de sites como o Facebook, surgem quase imediatamente. Este ambiente facilita ao sujeito a escolha da representação pela qual esse pode,

Diferentemente do que ocorria na modernida-de, na Era atual a identidade já não é mais deter-minada pelo “papel produtivo desempenhado na

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divisão social do trabalho” (BAUMAN, 2004, p. 51) e o Estado, definitivamente, não mais garante “a solidez e a durabilidade desse papel” (IDEM), tal como ocorria outrora, quando as classes e os grupos aos quais determinados indivíduos per-tenciam desempenhavam o papel de definição de identidade:

Cada classe tinha, podemos dizer as suas trilhas de carreira, sua trajetória estabelecida de maneira clara, sinalizada ao longo de todo o percurso e pontuada por acontecimentos importante que permitiam aos viajantes monitorar o seu processo.(bAuMAN , 2004, p. 56)

A identidade não é mais definida como era na modernidade, quando a identidade de um indiví-duo era, na realidade, uma identidade coletiva e única. Ao contrário, no contemporâneo:

As pessoas não identificam mais seus interesses sociais exclusivamente em termos de classe; a classe não pode servir como um dispositivo discursivo ou uma categoria mobilizadora através da qual todos os variados interesses e todas as variadas identidades das pessoas possam ser reconciliadas e representadas.(HALL, 2012, p. 20)

Com o poder de construir a própria representa-ção, emanou-se o poder de escolher identidades que reflitam os mais diversos interesses sociais e que se encaixem nos mais diversos grupos. E o poder de pertencer a diferentes grupos é muito importante para o contexto dos movimentos so-ciais, porque traz consigo uma mudança no con-ceito de “política de identidade” (HALL, 2012, p. 45) de classe para uma “política de identidade” de diferença. Isso significa que o pertencimento a um grupo na pós-modernidade é marcado prin-cipalmente pelo não pertencimento a um grupo de ideias e opiniões opostas:

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As sociedades da modernidade tardia (argumenta Laclau, 1990) são caracterizadas pela ‘diferença’ elas são atravessadas por diferentes divisões e antagonismo sociais que produzem uma variedade de diferentes ‘posições de sujeito’ – isto é, de identidades – para os indivíduos.(HALL, 2012, p.17)

Um exemplo desta colocação, observado na rede social do Facebok, refere-se a quando um determinado indivíduo publica uma matéria so-bre o orgulho de ser reacionário, sendo contra manifestações de esquerda; nesta situação, tal indivíduo não está se posicionando como “con-servador” ou “de direita”, mas, sim, através de sua identidade “anti-esquerdista”, a partir da diferença. E, ao expor sua posição, explicita que, naquele momento, necessita do reconhecimento de que não faz parte de determinado grupo ou movimento. Nessa linha, tem-se que:

5 . A R E P R E S E N TA Ç Ã O E C O N S T R U Ç Ã O D O EU

As guerras pelo reconhecimento, quer travadas individual ou coletivamente, em geral se desenrolam e duas frentes, embora tropas e armas se desloquem entre as linhas de fronteira, dependendo da posição conquistada ou atribuída segundo a hierarquia de poder. Numa das frentes, a identidade escolhida e preferida é contraposta, principalmente, às obstinadas sobras das identidades antigas, abandonas e abominadas, escolhidas ou impostas no passado. Na outra frente, as pressões de outras identidades, maquinadas e impostas (estereótipos, estigmas, rótulo), promovidas por ‘forças inimigas, são enfrentadas e – caso se vença a batalha – repelidas.(bAuMAN, 2004, p.4 5)

A “política de identidade” da diferença é de extrema importância para que certas manifesta-ções sociais tenham um grande número de adep-tos, porque é através do posicionar-se contra o “eles” que indivíduos de diferentes movimentos

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sociais unem-se em prol de um mesmo objetivo. Isso demonstra a enorme mudança no conceito de comunidade na pós-modernidade. Pois já não é necessário que todas as ideias e objetivos de in-divíduos pertencentes a um mesmo grupo este-jam perfeitamente alinhados, basta que se con-virjam na diferença com os “outros”. É possível afirmar que a fluidez que rege a identidade do in-divíduo pós-moderno e a possibilidade de diver-sas representações dessa identidade possuem uma inter-relação com as novas conceituações de comunidade surgidas no contemporâneo.

Dessa maneira, é possível comparar grupos formados para uma manifestação política com as “cloackroom communities” ou “comunidades guarda-roupa” de Bauman (2004), expressão que será explicada no próximo capítulo. Mas, para isso, é necessário primeiramente compreender o conceito de comunidade na era pós-moderna e o que ele significa para a formação dos movi-mentos em rede e articulação de novas manifes-tações políticas.

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6.SOCIEDADE E COMUNIDADES PÓS-MODERNAS

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Comunidade, segundo o dicionário Aurélio: 1) Qualidade ou estado do que é comum; comunhão ; 2) Concordância, conformidade, identidade; 3) Posse, obrigação ou direito comum; 4) O corpo social, a sociedade; 5) Qualquer grupo social cujos membros habitam uma região determinada, têm um mesmo governo e estão imanados por uma mesma herança cultural e histórica; 6) Qualquer conjunto populacional considerado como um todo, em virtude de aspectos geográficos, econômicos e/ou culturais comuns; 7) Grupos de pessoas considerado, dentro de uma formação social compleza, em suas características específicas e individualizantes; 8) Grupo de pessoas que comunham uma mesma crença ou ideal; 9) Grupo de pessoas que vivem submetidas a uma mesma regra religiosa; 10) Local por elas habitado; 11) Ecol. Conjunto de populações animais e vegatis em uma mesma área, formando um todo integrado e unforme; 12) Sociol. Agrupamento que caracteriza por forte coesão baseada no consenso espontâneo dos indivíduos.

A comunidade, como pode ser compreendida pela própria definição, é uma forma de relacio-namento entre indivíduos que possuem vínculos emocionais e implica em uma coesão social e um comprometimento moral. O espaço-tempo no qual está inserida essa comunidade é também de grande importância para sua definição, pois a proximidade espacial mostra-se tão importante quanto a emocional.

A mudança do modo de ver a comunidade na sociedade pós-moderna ocorreu pelas mudanças no modo de viver, na urbanização e em sua conse-quente individualização, o que modificou e, até possivelmente, excluiu os aspectos tradicionais da comunidade. O fim das formas tradicionais de vida (aquelas referentes ao conceito de comuni-dade ideal, com valores baseados na família e nas instituições tradicionais) foi responsável pela transformação das relações sociais comunitá-rias. A globalização expandiu territórios e extin-guiu delimitações geográficas, bem como possi-bilitou maior contato entre as pessoas; manteve, porém, um contato superficial com a diminuição da pessoalidade das comunidades e ampliação da

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individualização, como pontua o sociólogo Zyg-munt Bauman.

Porém, no momento pós-moderno há o renas-cimento da comunidade, que cria um paradoxo com o aspecto individual da sociedade atual. Procura-se, assim, entender a dicotomia entre indivíduo e sociedade e, mais especificamente, a dicotomia entre a individualização típica do meio urbano e o ressurgimento das relações comunitá-rias na pós-modernidade.

Através da análise de teorias é possível obser-var que alguns sociólogos, como Bauman, credi-tam a decadência da vida comunitária ao desen-volvimento da modernidade, enquanto outros defendem um paradoxo no qual essa decadência contrapõe-se a uma individualização total, re-criando novas formas de relacionamentos muito similares a de uma comunidade como esta é defi-nida. Ou seja, enquanto alguns acreditam que os vínculos afetivos estão tomando novas formas,

outros pensam que não, que estes vínculos são rasos e não representam o fim do individualismo da sociedade moderna.

A formação de grupos e sociedades tem sido tema de estudo de muitos pesquisadores nas últimas décadas. No campo dos estudos socio-lógicos, quatro se destacam: as teorias clássicas de Émile Durkheim e de Ferdinand Tönnies, e as teorias contemporâneas de Michel Maffesoli e de Zygmunt Bauman. Esses autores tratam das rela-ções societárias que compõem as ideias de comu-nidade e de sociedade (MOCELLIN, 2011, p. 106), e compreender as principais noções das teorias de cada autor é de fundamental importância para entendermos como hoje – no contemporâneo – podemos pensar a ideia de grupo, associativismo em rede, já que a comunidade pode ser entendida como “o lugar onde podemos encontrar os seme-lhantes e com eles compartilhar valores e visões de mundo”. Com vistas a não exceder os objeti-

6 . S O C I E D A D E E C O M U N I D A D E S P Ó S - M O D E R N A S

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vos desse estudo, mas de contextualizá-lo, serão apresentadas brevemente as principais ideias de cada autor.

6.1 Émile Durkheim

Ainda que Durkheim não explicite o que enten-de por comunidade, para realizarmos uma análise paralela à dicotomia entre sociedade e comuni-dade estuda por Ferdinand Tönnies, torna-se ne-cessário fazermos um exercício de aproximação conceitual encontrando ressonâncias da ideia de comunidade no que o autor denomina por soli-dariedade mecânica; ainda, podemos aproximar o conceito de individualidade com a sua concep-ção de solidariedade orgânica7. Vale destacar que Durkheim elabora esses conceitos a partir de sua obra sobre a divisão do trabalho social, sendo o objetivo dessa divisão gerar – além de produção e

dinheiro – solidariedade social, onde “essa solida-riedade pode ser traduzida em termos de um có-digo moral que rege a vida em grupo” (MOCELLIN, 2011, p. 113); assim, Durkheim busca pensar a pró-pria vida social e como essa acontece.

Para o autor há uma centralidade do todo so-cial sobre as partes que o compõem, onde “as representações, as emoções e as tendências co-letivas” são geradas pelas “condições em que se encontra o corpo social em seu conjunto” (DURKHEIM, 2001, p. 67 apud VARES, 2008) são maneiras de agir e pensar exteriores ao indivíduo; são maneiras presentes antes no social.

Trata-se de pensar, então, o que orienta a vida social e como a solidariedade social pode ter ora o caráter de coerção e repressão, ora de restabele-cimento de uma condição anterior em uma abor-dagem restitutiva. Para tanto, é fundamental o conceito de consciência coletiva, sendo essa um “fenômeno que constitui a base de toda e qual-

7. Tipo de soliedariedade predominante nas sociedades ditas “com-plexas” ou “modernas”. Caracteriza-se pela diferenciação dos indi-víduos e pela presença da divisão social do trabalho.

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quer vida comunitária e mesmo de qualquer exis-tência social que permaneça ao longo dos tem-pos” (MOCELLIN, 2011, p. 114).

A consciência coletiva é a consciência comum, responsável pela formação de nossos valores morais e construída pela aglutinação e intercru-zamento das consciências individuais de todas as pessoas; de outro lado, a consciência indivi-dual sofre influência da consciência coletiva. A sobreposição de ambas as consciências forma o ser social, que tem uma vida social em um grupo (VARES, 2008).

Assim, a consciência coletiva e a individual são os dois tipos de consciência da solidariedade social, sendo que a existência de uma sociedade só se torna possível quando há algum consenso entre as pessoas de uma adequação das consciên-cias individuais em relação à consciência coletiva. A partir disso é possível dois tipos de solidarieda-de: a mecânica e a orgânica (MOCELLIN, 2011).

Como já apontado anteriormente, a solidarie-dade mecânica está relacionada a uma ideia de comunidade e tem um caráter coercitivo:

6 . S O C I E D A D E E C O M U N I D A D E S P Ó S - M O D E R N A S

Em uma sociedade integrada por essa forma de solidariedade, as formas de pensar e agir e a moral que as orienta encontram grande abrangência entre os membros da sociedade, integrando cada um deles. A diferenciação entre os membros do grupo é baixa, e há um vínculo moral que os une.(MOCELLIN, 2011. p. 115)

Já a solidariedade orgânica está relacionada à possibilidade de restituição de uma situação em uma ideia de individualidade:

As formas de pensar e agir são diversas, e existe uma mais ampla liberdade na definição das orientações morais – sendo estas cada vez menos equivalentes à consciência coletiva e podendo ser definidas por disposições individuais. Aqui, a diferenciação entre os membros do grupo é elevada, e os códigos morais não encontram grande abrangência totalizante, não vindo a integrar cada um dos membros da sociedade.(MOCELLIN, 2011. p. 115)

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Assim, para Durkheim a comunidade é uma forma de apreensão do social; o indivíduo é um ser social porque depende dos demais. Os dois tipos de solidariedade - a mecânica e a orgânica – integram-se na solidariedade social, sendo que é nesta integração que está o ser social.

Desta forma, podemos compreender que, para Durkheim, a solidariedade social depende da co-existência da solidariedade mecânica (a comuni-dade) e da solidariedade orgânica (a individuali-dade). Se colocarmos o conceito de solidariedade social paralelo à dicotomia entre sociedade (o individual) e comunidade (o coletivo) aponta-da por Tönnies, como veremos, temos que, para Durkheim, a união da sociedade e da comunidade é essencial para reger a vida em grupo.

6.2 Ferdinand Tönnies

A principal contribuição de Tönnies refere-se à distinção que elaborou entre comunidade e sociedade, assinalando que ambas são tipos de organizações sociais, mas que estão em uma re-

lação de oposição. A comunidade pode ser enten-dida como um grupo que conta com

Elevado grau de integração afetiva e também com alto grau de coesão – e mesmo de homogeneização – entre seus membros, e isso inclui conhecimentos, objetivos, práticas cotidianas e formas de agir e pensar.(MOCELLIN, 2011. p. 109).

Para Tönnies, na comunidade a vontade huma-na é orgânica e tem a ver com o próprio ser, com aquilo que é essencial para as pessoas (BRANCA-LEONE, 2000); ou seja, na comunidade as rela-ções são orgânicas e naturais, e, como afirma Mo-cellin (2011, p.109), as “formas de relacionamento social são predominantemente pessoais, o que significa o compartilhamento de valores e tam-bém maior grau de intimidade”; assim, em uma comunidade “encontram-se a solidariedade, a re-lação afetiva e o compartilhamento de tradições como determinantes” (MOCELLIN, 2011, p.109) de sua estrutura.

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Grupos considerados societários (ou associativos) contam com baixo grau de integração afetiva e de coesão, possibilitando maior diferenciação e individualização de seus membros. Dessa forma, eles podem contar com conhecimentos, objetivos, práticas cotidianas e formas de agir e pensar heterogêneas, que não se integram em um todo comum.(MOCELLIN, 2011, p. 111)

Uma comunidade, segundo Tönnies (1995), pode desenvolver-se de três maneiras diferentes: pelo parentesco, com início na vida familiar, pela vizinhança, com início na vida comum, e pela ami-zade, que emerge de interesses e modos de pen-sar compartilhados.

Já a ideia de sociedade tem a ver com relações que se dão de modo mecânico e objetivo, movida por interesses particulares. A sociedade é a união de particulares, não havendo um sentimento de pertencimento como há na comunidade:

Para uma sociedade existir, é preciso um nú-mero variado de pessoas com diferentes opiniões e vontades com o predomínio da racionalidade. Para Tönnies, na sociedade a vontade é gerada pelo arbítrio das pessoas que compõe a socieda-de; assim, as pessoas unem-se por uma vontade de caráter deliberativo, propositivo e racional (BRANCALEONE, 2008).

Como síntese: “se na comunidade os homens permanecem unidos apesar de todas as separa-ções, na sociedade permaneceriam separados não obstante todas as uniões” (TÖNNIES apud BRANCALEONE, 2008, p. 101). Para Tönnies, há a emergência de uma sociedade individualista, que não apresenta maneiras de reconstruir uma vida comunitária com laços afetivos e agregado-res, presentes em sua Gemeinschaft8 , a vida na comunidade.

8. Do Alemão: Comunidade. A Gemeinschaft de Tönnies caracte-riza-se por um agrupamento de interações pessoais baseadas em valores, crenças e papéis específicos para os indivíduos. Nesse conceito de comunidade, a identidade do indivíduo é definida pela identidade do grupo.

6 . S O C I E D A D E E C O M U N I D A D E S P Ó S - M O D E R N A S

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6.3 Zigmunt bauman

Sob o pensamento de Bauman, o conceito de co-munidade não se encontra extinto na sociedade atual; porém, sua teoria opõe-se à concepção da “comunidade clássica” no sentido de que “a ‘comunidade’ do evangelho comunitário […] não é mais a Gemeinschaft pré-estabelecida e segu-ramente fundada da teoria social (e formulada por Ferdinand Tönnies), mas um criptônio para a ‘identidade’, zelosamente buscada, mas nunca encontrada” (BAUMAN, 2001, p. 196).

O autor defende que a presença da “mesmida-de” é fundamental para assegurar o formato da comunidade tradicional, ou seja, para que a co-munidade se mantenha imutável ao decorrer do tempo. Porém, na atualidade, a globalização e os pontos ampliados de comunicação não permi-tem que as comunidades permaneçam distintas e imunes a outros grupos sociais, havendo, assim,

Não acreditamos mais no mito da existência de fragmentos que, como peças de uma antiga estátua, estão meramente esperando que apareça o último caco para que todas possam ser coladas novamente para criar uma unidade que é precisamente a mesma que a unidade original. Não mais acreditamos numa totalidade primordial que existiu uma vez nem numa totalidade final que espera por nós numa data futura.(DELEuZE e GuATTARI apud bAuMAN, 2001, p. 29)

a dissolução da tradicionalidade comunitária nes-sa pós-modernidade. A decadência da vida comu-nitária tradicional é uma perda que não poderá ser recuperada ou contornada:

Esse pequenos fragmentos jamais poderão formar uma unidade sólida novamente; no entan-

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to, serão fragmentos possuintes de uma enorme habilidade de se encaixarem em outras “estátu-as”. Nesse novo contexto, a identidade torna-se substituta do conceito de comunidade no pós-modernismo. A individualidade toma espaço para que novos formatos de agrupamento surjam. Os fragmentos terão a oportunidade de pertencer a novos grupos, porém, segundo o autor, jamais formarão novamente uma comunidade em seu sentido tradicional; essa nova formação sempre será temporária e precária. Afinal, a identidade em sua definição significa ser diferente, distinto, singular, e, portanto, difere-se da comunidade e de seu poder de somar; ela possui o poder de divi-dir, de separar.

Os indivíduos, na busca solitária dessa identi-dade, passam a procurar

Esses cabides são uma metáfora de como os indivíduos lidam com seus problemas e relações na pós-modernidade. O autor desenvolveu para esse conceito o termo “cloackroom communi-ties”, ou seja, comunidades-cabide, citadas no capítulo anterior. Nessas comunidades, o indiví-duo tem a possibilidade de “vestir” os aspectos pertencentes a dada comunidade de forma tem-porária, pendurando-os no cabide quando já não mais lhe fazem sentido. Por outro ponto de vista, esta comunidade cheia de cabides serve de espaço para “pendurar” problemas, medos e aflições por um tempo determinado, como, por exemplo, enquanto durar a festa. Porém não podem e não devem ser vistas como substitutas das comunidades de “causa comum”; afinal, não são preocupações e problemas de um conjunto, mas, sim de indivíduos distintos e diferencia-dos, e, portanto, não possuem aflições idênti-cas; essas preocupações “nos dias de hoje são não aditivas, não podem ser ‘somadas’ numa ‘causa comum’. Podem ser postas lado a lado, mas não se fundirão” (Bauman, 2001, p. 44). Isso deve-se ao fato de que cada pessoa carrega

6 . S O C I E D A D E E C O M U N I D A D E S P Ó S - M O D E R N A S

Cabides em que possam, em conjunto, pendurar seus medos e ansiedades individualmente experimentados e, depois disso, realizar ritos de exorcismo em companhia de outros individuos também assustados e ansiosos.(bAuMAN, 2001, p. 21).

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um histórico próprio que foi adquirido por toda sua vida individualizada e, assim, essas aflições são moldadas de tal maneira que lhes faltam in-terfaces para combinar-se com os problemas das demais pessoas (IDEM).

Essas comunidades são chamadas, pelo autor, também, de comunidades estéticas, que, dife-rentemente das comunidades éticas discutidas por Tonnies, não são formadas por tradições e normas, pois possuem habilidades de rápida mu-tação e flexibilidade e formatos de fácil dissolu-bilidade. Essas comunidades são formadas sob influência do entretenimento e, iguais às comu-nidades-cabide, são orientadas pela “festa”, tan-to na questão de seu tempo de duração quanto na efemeridade de seus laços, os quais são “vín-culos sem consequências” e que devem ser “ex-perimentados” no ato, e não levados para casa e consumidos na rotina diária (BAUMAN, 2001, p. 67). Sendo assim, o objetivo final desse tipo de relacionamento comunitário, segundo o autor, não será o de construir uma coletividade, onde as intenções se fundem e confundem em uma só, e, sim, de compor uma identidade individual. Assim

sendo, Bauman afirma que a formação desses novos modos de vida comunitária, a comunidade estética, amplia a individualização já encontrada na pós-modernidade.

6.4 Michel Maffesoli

Observando uma similaridade com a opinião de Bauman sobre a Gemainschaft de Tönnies, Mi-chel Maffesoli defende a ideia de que as comu-nidades pós-modernas não mais se encaixam na-quela definição fundada na teoria social. Neste momento, para o autor, as relações acontecem através de proximidades por identificação. Po-rém, contrário à discussão de Bauman e a arti-gos jornalísticos que “difundem um conjunto de pensamentos convencionais, e um tanto catas-trofistas, sobre o ensimesmamento, sobre o fim dos grandes ideais coletivos ou, compreendido no seu sentido mais amplo, sobre o fim do espa-ço público” (MAFFESOLI, 2006, p. 35) e, também, sobre como essas novas relações ampliam a indi-vidualização, Maffesoli constrói a ideia de que

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há, na verdade, um declínio do individualismo e o surgimento de um hibridismo nos estilos de vida que gera vivências comunitárias, e define esses novos agrupamentos como neotribalismo:

é totalmente inadequada para descrever as di-versas formas de agregação social que vem a luz” (Maffesoli, 2006, p. 39).

Em “O tempo das Tribos”, o autor faz uma com-paração desses grupos com as comunidades emo-cionais de Weber9, que são: “o aspecto efêmero, a composição cambiante, a inscrição local, a ausên-cia de uma organização e a estrutura quotidiana.” Daí, surge a ideia de reagrupamento da sociedade através da identificação, a formação de tribos. O autor discorda de Bauman quando este acredita em como a individualização promove o ensimes-mamento das ideias dos indivíduos. Para Maffe-soli, não há ideias de tamanha especificidade que não possam ser similares e concordarem com as de outros individuos; na verdade, estas ideias são tão similares que se fundem e transformam-se na opinião de um grupo, para, posteriormente, se tornarem o pensamento dos indivíduos:

6 . S O C I E D A D E E C O M U N I D A D E S P Ó S - M O D E R N A S

Aqueles que se apóiam no princípio de individualização, de separação, estes, pelo contrário, são dominados pela indiferenciação, pelo “perder-se” em um sujeitocoletivo, o que chamarei de neotribalismo.(MAFFESOLI, 2001, p. 38)

9. Comunidade nas quais os laços se formam baseados numa emoção coletiva.

Maffesoli observa na caracterização das tri-bos uma similaridade com os aspectos presentes nos grupos sociais da contemporaneidade. Essa distinção dos indivíduos na pós-modernidade re-presenta um distanciamento do individualismo de forma que “se a distinção é, talvez, uma noção que se aplica à modernidade, por outro lado, ela

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O que nos parece ser uma opinião individual é, de fato, a opinião de tal ou tal grupo ao qual pertencemos.(MAFFESOLI, 2006, p. 132)

porque há mutabilidade e contato entre as tribos, visto que os grupos se cruzam e os indivíduos se entrecruzam o tempo todo, o que é uma caracte-rística típica das metrópoles e dos meios urbanos:

O autor entende que esses grupos acabam por orientar a identidade de seus membros, identida-de esta que não é específica a cada individuo, mas de cada grupo ao qual ele participa; ou seja, são identidades partilhadas, características de so-cialidade: “a pessoa (persona) representa papéis, tanto dentro de sua atividade profissional quan-to no seio das diversas tribos que participa. Mu-dando o seu figurino, ela vai, de acordo com seus gostos (sexuais, culturais, religiosos, amiciais) as-sumir o seu lugar, a cada dia, nas diversa peças do theatrum mundi” (MAFFESOLI, 2006, p. 133).

Dessa forma, esse novo modelo de vida comu-nitária foge completamente às tradições da Ge-mainschaft, e da comunidade ideal de Bauman,

A fusão da comunidade pode ser perfeitamente desindividualizante. Ela cria uma união em pontilhado que não significa uma presença plena no outro (o que remete ao político), mas antes estabelece uma relação oca que chamarei de relação táctil: na massa nos cruzamos, nos roçamos, nos tocamos, interações se estabelecem, cristalizações se operam e grupos se formam.(MAFFESOLI, 2006, p. 127)

Essa “união em pontilhado” e a multiplicidade de tribos, as quais se situam umas em relação às outras (MAFFESOLI, 2006, p. 138) dão sentido à

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formação da sociedade em rede, e este paradig-ma pode ser compreendido como a reatualização do antigo mito da comunidade:

Mito, no sentido de alguma coisa que, talvez, jamais tenha existido, age, com eficácia, no imaginário do momento. Daí a existência dessas pequenas tribos, efêmeras, mas que nem por isso deixam de criar um novo estado de espírito que parece destinado a durar.(MAFFESOLI, 2006, p. 239)

6 . S O C I E D A D E E C O M U N I D A D E S P Ó S - M O D E R N A S

Como pode ser observado, o ponto principal em que discordam Maffesoli e Bauman é sobre a individualização ou desindividualização gerada a partir da formação desses novos tipos de comu-nidade. Discordam também no sentido da dura-ção desses laços. Enquanto Maffesoli acredita que essas comunidades podem tornar-se consi-deravelmente sólidas, Bauman defende que não, que são efêmeras e destinadas a acabar uma vez que tenham atingido seu objetivo como comuni-dade. Ambos concordam que os novos coletivos

distanciam-se da comunidade conceituada na teoria clássica e concordam também com o fato de que as ideias e pensamentos dos indivíduos pertencentes a estas comunidades podem ser colocados lado a lado por sua similaridade; po-rém, enquanto para Bauman não há maneira de se fundirem, para Maffesoli há, e acabam por se tornarem um só pensamento, coletivo, que, só então, delimitará o pensamento do indivíduo, e, assim, permanecerá.

Se inseridas no contexto da internet, essas noções de comunidade possuintes das mesmas características aqui apontadas podem ser com-paradas ao grupos de formação temporária or-ganizados em prol de uma mobilização social ou às manifestações políticas objetos de estudo do presente trabalho.

Manuel Castells concorda com o aspecto in-dividualizante dessas novas formas de comu-nidade, e traduz a particularidade das ideias e problemas colocados lado a lado, não de maneira unificada, mas como um formato em rede. Assim, essas comunidades no cenário online, ou seja, a comunidade virtual, são o “novo padrão de socia-

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A melhor maneira de compreendê-las é vê-las como redes de sociabilidade, com geometria variável e composição cambiante, segundo a evolução dos interesses dos atores sociais e a forma da própria rede.(CASTELLS, 2003, p. 108)

bilidade em nossas sociedades (que) é caracteri-zado pelo individualismo em rede” (CASTELLS, 2003, p. 108). E afirma que:

A modo de socialização entre os indivíduos mudou, e mudaram também as formas de comu-nidade em que estão imersos, e essa transforma-ção “ocorreu com a substituição de comunidade espaciais por redes como formas fundamentais de sociabilidade” (CASTELLS, 2003, p. 107).

Partindo da definição de que essas comuni-dades “são redes de laços interpessoais que pro-porcionam sociabilidade, apoio, informação, um senso de integração e identidade social” (WELL-MAN, 2011, p. 1 apud CASTELLS, 2003, p. 107), é possível analisar as novas formas de movimentos

sociais tratando-as como comunidades, apontan-do-se nelas os aspectos principais identificados nas conceituações de comunidade na pós-moder-nidade, análise que se dará no capítulo dedicado aos estudos de casos.

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7.OS MOVIMENTOS SOCIAIS E O CONTExTO ESPAÇO-TEMPORAL

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A apresentação e discussão dos conceitos de dinâmicas das redes sociais e sua presença no campo digital, de identidade na era pós-moder-na como representação nas redes digitais, e de comunidade aplicada ao espaço-tempo contem-porâneo são necessárias para a compreensão de quem são e como agem os atores em mobi-lizações políticas articuladas na rede e do que hoje representa ser parte de um grupo, como um movimento social. Ainda, são necessárias para entender como as dinâmicas das redes sociais (online e offline) favorecem a organização de um movimento social e a difusão de informações e, nesse sentido, como o novo conceito de comuni-dade pode representar esses novos formatos de mobilização e como a liquidez da era pós-moder-na é influência nessas relações.

Considerando os objetivos deste trabalho, é preciso, ainda, compreender a razão pela qual a possibilidade de encontro pelo meio digital é de-cisiva para a articulação e ação dessas novas for-mas de ativismo.

7.1 O ativismo em rede ou a rede de movimento social

Segundo propõe conceitualmente o Centro para a Sociedade Civil da London School of Economi-cs, a “sociedade civil refere-se à arena de ações coletivas voluntárias em torno de interesses, propósitos e valores”, em que essas ações podem ser entendidas como protestos sociais, pressões políticas e manifestações a favor de políticas sociais e públicas. A doutora em Sociologia pela Universidade de Paris, Ilse Scherer-Warren, apre-senta uma divisão na organização da sociedade civil em três diferentes níveis observados na con-temporaneidade. No primeiro nível, encontra-mos o associativismo local, referente à expres-são local e/ou comunitária de organização, onde se incluem associações civis, movimentos comu-nitários e ONGs. Em um segundo nível, estão as formas de articulação inter-organizacionais, que referem-se às associações nacionais de ONGs, fó-runs e às redes de redes. Por último, no terceiro nível encontram-se as mobilizações na esfera pú-blica, que podem ser entendidas como:

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A confluência de diferentes atores, advindos do associativismo localizado, do setorizado (caso das ONGs), de simpatizantes ou de movimentos sociais de base locais, constitui o novo tipo de movimento social que emerge na sociedade pós-moderna: “rede de movimento social” (SCHERER-WARREN, 2006, p. 113). O principal fator que leva à emergência dessa nova forma de ativismo

é a existência do meio digital como fator decisivo no seu modo de organização, ou seja: “a internet tornou-se um componente indispensável do tipo de movimento social que está emergindo na so-ciedade em rede” (CASTELLS, 2003, p. 166), sen-do esse novo tipo de movimento social o ativis-mo digital. Nesse cenário, a internet não pode ser considerada somente como um meio útil que se encontra à disposição, mas sim como ferramenta que “se ajusta às características básicas do tipo de movimento social que está surgindo na Era da Informação” (CASTELLS, 2003, p. 115).

Nesse novo contexto, há dois modos possíveis de manifestações. O primeiro deve sua existên-cia por sua inserção na internet, sendo o cha-mado hacktivismo – movimento que consiste em protestos individuais ou coletivos, como é o caso do Anonymous, que através de sabotagens eletrônicas e da vulnerabilidade tecnológica age com “interferência em websites das redes eletrô-nicas de agências do governo ou de empresas, visados como representativos de opressão ou ex-ploração” (CASTELLS, 2003, p. 115). Já no segun-do modo de manifestação “a internet é utiliza-

Fruto da articulação de atores dos movimentos sociais localizados, das ONGs, dos fóruns e redes de redes, mas buscam transcendê-los por meio de grandes manifestações na praça pública, incluindo a participação de simpatizantes, com a finalidade de produzir visibilidade através da mídia e efeitos simbólicos para os próprios manifestantes (no sentido político-pedagógico) e para a sociedade em geral, como uma forma de pressão política das mais expressivas no espaço público contemporâneo.(SCHERER-WARREN, 2006, p. 112).

7. OS MOVIMENTOS SOCIAIS E O CONTEXTO ESPAÇO - TEMPORAL

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da como um apoio, de forma a fortalecer outras formas de ação política que já ocorriam fora da internet” (PEREIRA, 2011, p. 12), sendo um exem-plo notório as mobilizações políticas articuladas nos meios digitais, mas que visam suas ações no campo presencial. É este segundo modo de ma-nifestação com o uso da internet que interessa para os propósitos deste trabalho.

Assim, tem-se que a internet determina e é determinada por essas novas práticas (PEREIRA, 2011, p. 1), e para embasar essa afirmação serão apresentadas cinco razões, fornecidas por Cas-tells (2003) e Pereira (2011), que tornam o meio digital indissociável dessa nova maneira de arti-cular e agir em relação às políticas sociais e pú-blicas.

7.1.1 Alcance global

Pode-se considerar que no contemporâneo as esferas de atividades mais diversas estão pre-sentes na internet e apropriam-se dos recursos da mesma: Estado, mercado financeiro e, é claro,

a sociedade civil, utilizam-se da internet como meio de comunicação e organização.

Por conta das possibilidades de alcance do pú-blico e disseminação da informação favorecidas pelos recursos da internet, o poder de influência e gestão do Estado e do mercado financeiro tor-nam-se cada vez mais globais e, nesse sentido, parte da sociedade civil busca agir também na In-ternet em uma tentativa de equipará-los ou até superá-los. Assim, é possível notar uma reconfi-guração dos modos de relação com essas instân-cias, de forma que a sociedade civil passa a cons-truir redes interativas a partir de certos núcleos de força, aglutinando-se em torno desses com o propósito de se organizar e produzir mobiliza-ções, formando assim uma “rede de movimento social” (SCHERER-WARREN, 2006, p.113).

Para tanto, a união em torno desses núcleos mais fortalecidos é fundamental para dar visi-bilidade aos movimentos, produzir maiores im-pactos e buscar conquistas concretas. Ainda, esta união é necessária posto que para exercer um verdadeiro impacto sobre a mídia através de ações simbólicas é preciso que o alcance se dê no

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mesmo nível em que se encontram todos os po-deres hoje (Estado, mercado financeiro e etc.), o nível global. Uma vez que esses movimentos ob-tenham legitimidade e apoio locais, conseguem lutar por reconhecimento e garantir visibilidade para que possam buscar mudanças reais:

Invertendo o conhecido mote de 25 anos atrás, os movimentos sociais devem pensar localmente (respondendo a seus próprios interesses e identidade) e agir globalmente – no nível em que realmente importa hoje.(CASTELLS, 2003, p. 118)

A maneira de realizar coalizões globais e viabili-zar esse processo encontra-se nos meios digitais, e por isso as novas formas de ativismo possuem uma relação interdependente de transformação com a internet, porque ao mesmo tempo em que a convertem num recurso de transformação social, tornam-se dependentes dela.

7.1.2 Militantes Ocasionais

A transformação dos meios digitais em ferramen-tas de mudanças sociais possibilitou a emergência de novos atores no cenário das mobilizações po-líticas. O ativismo online conta não somente com os velhos conhecidos dos movimentos sociais, como os participantes de fóruns e membros de ONGs, mas faz surgir um novo ator, ou mais realis-ticamente, milhares de novos atores: os “militan-tes ocasionais” (PEREIRA, 2011, p. 15).

O personagem do militante ocasional não é uma novidade advinda do meio digital. A mudan-ça encontra-se no aumento da participação des-ses atores. Manifestações anteriores à explosão das mídias digitais, como as dos caras-pintadas10, também contaram com manifestantes ocasionais e transeuntes que se uniram ao movimento no momento da ação. A grande novidade é que ago-ra surge para esses militantes a oportunidade de

10. Caras-pintadas foi um movimento estudantil brasileiro realizado no decorrer do ano de 1992 e tinha como objetivo principal o impeach-ment do Presidente do Brasil Fernando Collor de Melo e sua retirada do posto. O movimento baseou-se nas denúncias de corrupção que pe-saram contra o presidente e ainda em suas medidas econômicas, e contou com milhares de jovens em todo o país. O nome “caras-pintadas” referiu-se à principal forma de expressão, símbolo do movimento: as cores verde e amarelo pintadas no rosto.

7. OS MOVIMENTOS SOCIAIS E O CONTEXTO ESPAÇO - TEMPORAL

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participação no processo desde seu início, dado que, pela inserção das redes sociais digitais no co-tidiano, esses atores ganham a oportunidade de cooperação real na organização, difusão de infor-mação e ação do movimento.

Ainda, sobre a militância vale destacar que o perfil dos atores em determinado movimento social está relacionado com o contexto espaço-temporal em que o ato ocorre. Por exemplo, no cenário brasileiro da década de 1960 com o regime ditatorial, a militância era formada principalmen-te por estudantes e a organização do movimento dava-se dentro das universidades, sendo que o movimento social era de caráter estudantil e clan-destino. Por sua vez, as manifestações de 1992 no Brasil foram conformadas por um contexto sócio-político-cultural distinto, onde:

A facilidade proparcionada pela cobertura ofe-recida pela mídia e pelo apoio de outras entida-des em 1992 fez com que o movimento fosse ex-pandido para além das organizações estudantis, ampliando as oportunidades de participação de militantes de diversos movimentos, bem como de cidadãos comuns e interessados.

O papel inegável que os estudantes ocuparam na campanha do “Fora Collor” deve ser, também, qualificado pelas facilidades em alocar recursos, materiais e simbólicos, que a presente conjuntura lhe proporcionou: a imprensa livre a oferecer ampla cobertura apoios importantes por parte de autoridades públicas ou entidades civis, etc. Não há dúvidas, portanto, de que o custo de participação para os estudantes de 1992 foi substancialmente menor do que nos anos 60 e 70.(RODRIGuES, 1993, p 144).

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No cenário atual, a comunicação imediata con-ferida pelas redes digitais gera uma aceleração política, tornando o processo de articulação mais veloz e acelerando a difusão da informação. Des-sa maneira, no momento em que o militante oca-sional recebe uma informação, está dada a pos-sibilidade de participação imediata (seja através da cyberdifusão desse conhecimento, da assina-tura de uma petição online ou até mesmo de um convite para ação).

Outro fator importante para o aumento de militantes não formais no pós-modernismo é o custo de participação real implicado no processo, posto que nos anos 1960 e 1970, a participação em protestos contra o regime ditatorial vigente poderia significar prisão, tortura e até morte; já em 1992, esse custo decaiu significativamente por conta do país se encontrar em um regime po-lítico democrático, mas, para a participação real e efetiva desde a articulação do movimento e nos

atos realizados, ainda era necessário um envolvi-mento em estruturas formais como a UNE11 ou em movimentos sociais institucionalizados.

Com efeito, uma das razões para o surgimento atual desses novos atores são os baixos custos de participação que o ativismo online proporciona. Se a militância institucional formatada por meio de uma estrutura centralizada e hierarquizada implica em um alto nível de envolvimento do par-ticipante, o ativismo online disponibiliza uma:

11. União Nacional dos Estudantes, na época, presidida pelo atual senador Lindbergh Farias.

Militância a la carte, pois trata-se de um engajamento periódico e algumas vezes distanciado, dado que o internauta não precisa se expor às pressões sociais que normalmente acompanham este tipo de atividades.(PEREIRA, 2011, p. 15).

7. OS MOVIMENTOS SOCIAIS E O CONTEXTO ESPAÇO - TEMPORAL

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Desse modo, basta que o indivíduo sinta-se identificado pela causa para que faça a escolha de participar, surgindo assim uma relação de caráter agregador entre atores bem informados – os que se encontram nos nós maiores, que possuem cre-dibilidade e que são os primeiros difusores da in-formação - e atores que buscam informações – os demais participantes dos movimentos.

Tendo essa possibilidade de participação em vista, um alto número de militantes “não for-mais” pode representar grandes benefícios para o sucesso de uma manifestação no formato que temos hoje, porque tanto auxiliam na propaga-ção de uma ideia como ampliam o número de par-ticipantes ativos, trazendo força e visibilidade para o movimento.

Porém, devemos nos atentar também para o fato de que, talvez, dessa participação não venha uma entrega total ao movimento, já que o indi-víduo pós-moderno traz consigo a característica

fluida que é própria de seu tempo. Isso quer di-zer que, mesmo que no meio online tal pessoa pareça fazer plenamente parte da manifesta-ção, sua participação pode vir a não ser presen-cial na ação final. Desse modo, essa força que o movimento possui online, pode não ser verda-deira no offline e, assim, “o nível relativamente baixo de compromisso pode gerar certa fragi-lidade das formas de apoio social.” (CASTELLS, 2003, p. 110). Ainda assim, naquelas articulações ocorridas somente no meio digital esses novos atores podem representar a força do movimen-to em números, como nos casos de assinatura de petições online e de divulgação de informações e convites para o ato presencial.

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7.1.3 Crise das estruturas verticalmente integradas

A opção pela participação não formal resulta de diferentes fatores. O primeiro deles refere-se aos custos da participação em organizações hierar-quizadas, como referido anteriormente. Outro fator é o enfraquecimento “das organizações ver-ticalmente integradas, herdadas da Era Indus-trial” (CASTELLS, 2003, p.116), considerando que:

líderes que outrora foram militantes comuns, podem ser alguns dos motivos da crescente des-crença nessas organizações. Porém, parece ter destaque como fator que contribui para essa crise o formato que essas estruturas possuem, porque hierarquias e configurações piramidais estão ultrapassadas, não se encaixam na pers-pectiva de horizontalidade trazida pela internet no pós-modernismo.

Ao contrário, o formato de organização pro-porcionado pelas redes sociais digitais é em rede, com estruturas mandálicas nas quais todos podem ouvir e ter a chance de serem ouvidos. E é por essa razão que as novas formas de ativismo articuladas nesses meios se afastam cada vez mais dos modelos formais de política:

Os partidos políticos de massa, quando e onde ainda existem, são conchas vazias, mal ativadas com máquinas eleitorais a intervalos regulares(CASTELLS, 2003, p.116)

Pode-se afirmar que estruturas hierarquiza-das passam por um momento de crise na atua-lidade. Esse tipo de organização se torna ultra-passado em um contexto onde a tendência é o formato em rede, o que não é novidade, mas que surge como uma explosão nos meios digitais.

As relações conflituosas de poder nessas es-truturas verticais e até mesmo a desilusão com

7. OS MOVIMENTOS SOCIAIS E O CONTEXTO ESPAÇO - TEMPORAL

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ele, já que cada um de seus nós pode reconfigurar uma rede de suas afinidades e objetivos, com su-perposições parciais e conexões múltiplas” (CAS-TELLS, 2003, p. 118).

7.1.4 Luta por valores culturais

Ao compararmos movimentos sociais de outras épocas com os da atualidade, podemos perceber grandes diferenças entre eles em razão dos movi-mentos sociais estarem intrinsecamente relacio-nados aos seus contextos de espaço-tempo. Po-rém, essas diferenças observadas não significam uma mudança no conceito de movimento social, que independentemente da época e do contexto têm como dimensões definidoras “a identidade, o adversário e o projeto” (SCHERER-WARREN, 2006, p. 133). Os movimentos não deixaram de ser movimentos, o que ocorre é uma mudança de espaço-tempo em que estão inseridos, ocasio-nando redefinições mais adequadas para os devi-dos contextos, tal como assinalado por Castells:

As redes, por serem multiformes, aproximam atores sociais diversificados – dos níveis locais aos mais globais, de diferentes tipos de organizações –, e possibilitam o diálogo da diversidade de interesses e valores. Ainda que esse diálogo não seja isento de conflitos, o encontro e o confronto das reivindicações e lutas referentes a diversos aspectos da cidadania vêm permitindo aos movimentos sociais passarem da defesa de um sujeito identitário único à defesa de um sujeito plural.(SCHERER-WARREN, 2006, p. 116).

O formato da rede permite o levantamento de questões e o debate, poupando tempo e energia para negociações – sendo que o contrário disso, o desperdício de ambos, é relacionado às estrutu-ras formais e suas reuniões. E, inserido no meio digital, permite ao movimento “ser diverso e co-ordenado ao mesmo tempo, engajar-se num de-bate permanente sem contudo ser paralisado por

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Dessa forma, é possível compreender que as transformações acarretadas pelas modificações no espaço-tempo não ocorrem somente no nas formas de articulação e de ação, mas, também, nas esferas das estratégias e dos valores em que estão inseridos os movimentos sociais. A cada novo contexto histórico-social, a partir da trans-formação dos códigos que conduzem as institui-ções e a sociedade, os movimentos sociais se ar-ticulam de modos distintos.

Na Era da Informação, por exemplo, os movi-mentos sociais “são essencialmente mobilizados em torno de valores culturais” (CASTELLS, 2003, p. 116). Essa transformação ocorre concomitante-

Movimentos da Era Industrial, o movimento operário, por exemplo, perseveram em nossos dias redefinindo-se em termos de valores sociais, e alargando o significado desses valores: por exemplo, a reivindicação de justiça social para todos, em vez da defesa de interesses de classe.(CASTELLS, 2003, p. 116).

Nas sociedades contemporâneas, baseadas no controle da informação, a intervenção para a manutenção do próprio sistema ocorre também nos domínios culturais e sociais, e não mais somente no sistema de produção material, pois nestas sociedades a produção está também baseada nas relações sociais, nos símbolos, nas identidades e nas necessidades individuais.(PEREIRA, 2011, p. 3).

mente ao surgimento de uma sociedade na qual a fonte de produtividade é baseada na geração de informação, conhecimento e comunicação de símbolos:

Neste contexto, os movimentos sociais tem a função de conquistar mudanças não somente no Estado, mas no imaginário das pessoas através da propagação de conhecimento e novos valores:

7. OS MOVIMENTOS SOCIAIS E O CONTEXTO ESPAÇO - TEMPORAL

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Assim, considerando a internet como siste-ma principal de informação e comunicação da pós-modernidade, e com o prévio conhecimento sobre as dinâmicas que regem as redes sociais di-gitais, é possível afirmar que as novas formas de ativismo possuam uma relação de dependência com esses meios neste aspecto.

7.1.5 Criação de Mídias Alternativas

Toda mobilização política segue o fluxo de um processo que se inicia com a emissão de uma in-formação que produz algum tipo de incômodo em algum grupo ou em alguém. A partir disto tem-se início a união de forças e a articulação do movimento, que pode culminar em uma ação que

Os movimentos culturais formam-se em torno de sistemas de comunicação porque é principalmente através deles que conseguem alcançar aqueles capazes de aderir a seus valores e, a partir daí, atingir a consciência da sociedade como todo.(CASTELLS, 2003, p. 116).

deverá tornar a causa conhecida e, assim, conse-guir influenciar a esfera pública. O desafio que um movimento social encontra neste processo de organização e conquista de mudanças é o de ser reconhecido no sentido de tornar-se visível. Assim, considerando o cenário das redes digi-tais, a dificuldade encontra-se no fator mídia.

Não é necessário discutir os motivos que le-vam as mídias de massa a decidirem se as ações de determinadas manifestações políticas deve-rão entrar em suas pautas ou não. Basta dizer que em grande parte das vezes isso não ocorre - o que representa um verdadeiro obstáculo aos ativistas em mobilizar a opinião pública e con-seguir força política para exercer algum tipo de pressão no sistema.

Para contornar este problema, é preciso que o movimento apele às mídias alternativas: fa-z-se necessário ao movimento “desenvolver os seus próprios meios de comunicação, na busca por definir e enquadrar suas demandas, investir nos potenciais alvos, organizar a ação coletiva e, por último, atrair a atenção dos meios massivos” (PEREIRA, 2011, p. 4).

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Estes canais de comunicação alternativos en-contram na internet as condições ideais para sua elaboração e, mais especificamente nas redes sociais digitais, as condições fundamentais para a difusão de informação e atração de novos ma-nifestantes. De fato, essas condições oferecidas por esses meios deveriam poder torná-los únicos para a influência da opinião pública devido à pos-sibilidade de interação e debate proporcionados por esses meios, porém as mídias de massa ainda possuem grande importância ao considerarmos que o acesso à Internet ainda não é democrático e que grande parte da população mundial ainda vive num contexto “um para um” de relação com as mídias.

7.1.6 Da necessidade de renovação dos movimentos sociais

Ao estabelecer um paralelo através do histórico do movimento operário na Era Industrial, Manuel Castells (2003, p. 115-116) identificou dois fatores primordiais para a articulação deste movimento:

os pubs, como meio de comunicação, e a fábrica, como a infraestrutura material para a organiza-ção do movimento. Para esse autor, do mesmo modo que não é possível isolar o movimento ope-rário dos pubs e da fábrica, não é possível isolar os novos movimentos sociais de seus meios de comunicação e de seu local de organização, a sa-ber, a internet e a rede.

Como já afirmado anteriormente, os movimen-tos sociais são indissociáveis de seu contexto es-paço-temporal, e com a mudança desse contexto os movimentos sociais precisam se renovar adap-tando-se às novas condições organizacionais, aos novos temas da agenda pública, ao novo contex-to político e às novas tecnologias desenvolvidas ao longo dessa transformação do tempo:

7. OS MOVIMENTOS SOCIAIS E O CONTEXTO ESPAÇO - TEMPORAL

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Na sociedade pós-moderna, em que os meios di-gitais são muito presentes em todas as esferas de atividades e que as redes sociais digitais possuem tanta influência nas formas de interação dos indi-víduos, “a internet torna-se um meio essencial de expressão e organização para esses tipos de mani-festação” (CASTELLS, 2003, p. 117).

Os movimentos sociais se transformam devido à necessidade de adaptação para conquistar seus objetivos, através de estratégias e ações que sejam coerentes com o contexto em que está inserido. Se isso não acontece, permanecem sujeitos ao risco de se tornarem datados, ultrapassados, e parte da crise que toda mudança no espaço-tempo acarreta.

Os movimentos sociais possuem repertórios de ação que se modificam com o tempo, entre outras coisas, em função de mudanças tecnológicas que poderão ser apropriadas de formas distintas; em função do contexto político no qual estão inseridos e também em função das expectativas que outros atores sociais terão em relação às ações que irão tomar”(PEREIRA, 2011, p. 11).

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8.ESTUDO DE CASOS: Festival amor sim russomanno não E Fora Feliciano

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Neste trabalho foram apresentados alguns con-ceitos considerados importantes para a análise das novas formas de ativismo: a rede social e suas dinâmicas visando à compreensão do formato dos novos movimentos; o conceito de concepções identitárias na era pós-moderna e seus efeitos na formação de grupos; o conceito de comunidade na pós-modernidade com o intuito de fazer a lei-tura de como novos movimentos configuram-se como comunidades; e, por fim, os aspectos dos meios digitais que influenciam na articulação do ativismo em rede.

Considerando este cenário teórico-conceitual, serão apresentados e discutidos dois estudos de caso sobre rede de movimento social. Vale desta-car que a descrição de ambos os casos parte de informações obtidas em canais de notícias, de observação das ações realizadas por indivíduos e grupos no Facebook, e da pesquisa de campo.

8.1.1 Festival Amor Sim Russomanno Não

O Festival Amor Sim Russomanno Não confi-gurou-se como um protesto realizado presencial-mente no dia 5 de Outubro de 2012, data próxima às eleições municipais da cidade de São Paulo da-quele ano, tendo sido sua articulação iniciada no Facebook no dia 1 de Outubro de 2012.

A manifestação foi realizada com a intenção de alertar os eleitores sobre quem seria Celso Russo-manno, candidato ao cargo de Prefeito. Segundo dados do Ibope12, possuía, no início da campanha

12. Disponível em: http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_no-ticia=195298&id_secao=1 - acessado em 26/04/2012

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8. ESTUDO DE CASOS

eleitoral, 34% das intenções de voto, contra 18% de Fernando Haddad e 17% de José Serra, também candidatos.

O manifesto do movimento afirmava que o candidato Celso Russomano seria um “demagogo, sem propostas, construído no sensacionalismo da TV, projetado pela Igreja Universal do Reino de Deus, visivelmente incapaz de governar” (Mani-festo, 2012). Vale destacar que, ainda que hou-vesse expressamente assinalado um repúdio a este candidato, o movimento apontou, essencial-mente, para a perspectiva de mobilizar cidadãos a fim de que se responsabilizassem por sua pró-pria cidade, caracterizando-se essa manifestação como um tipo de “festival com a participação de artistas e de todo mundo que quer ver São Paulo mais feliz.” E que tentassem, juntos, “construir uma forma de fazer política mais aberta, nova e verdadeiramente pública” (Manifesto, 2012).

Dessa forma, a manifestação possuiu um cará-ter apartidário e contou com a união de ativistas pertencentes a diversos coletivos junto a movi-mentos sociais, jornalistas, ciclistas, artistas e simpatizantes. Mas, acima de tudo, o evento pos-suiu um caráter cultural. Diferentemente do ima-ginário comum acerca de como se dão protestos, nesta manifestação não houve somente pessoas carregando cartazes e faixas: esta manifestação culminou num grande evento na Praça Roosevelt, com shows e pinturas corporais, promovendo um clima de festa à manifestação. A cor rosa foi pre-dominante na comunicação do evento, nas rou-pas dos ativistas e nas tintas que eles usavam, uma vez que as pessoas responsáveis pela mobili-zação central pediam aos manifestantes o uso da cor rosa-choque para representar o amor.

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8.1.2 Fora Feliciano

O movimento intitulado de Fora Feliciano foi uma manifestação, também, apartidária que teve início a partir do momento em que o pastor evangélico Marco Feliciano foi indicado e assu-miu o cargo de presidente da Comissão de Direito Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM). O acontecimento gerou insatisfação dos movimentos sociais que acompanhavam o traba-lho da CDHM, bem como de cidadãos defensores dos direitos humanos, visto que o pastor já havia realizado afirmações públicas consideradas racis-tas e homofóbicas, assumindo uma postura que seria incompatível com o que esse cargo exige.

As primeiras manifestações contrárias à pre-sença de Marco Feliciano como presidente da CDHM aconteceram no mesmo dia de sua indi-cação e eleição ao cargo, em 6 de Março de 2013, a partir do compartilhamento desta notícia nas

redes sociais digitais, tais como o Facebook e Ava-az. Os protestos presenciais tiveram início no dia 9 de Março de 2013 e novos protestos continuam sendo articulados até o presente momento (2 de Maio de 2013). A mobilização contou com a pre-sença de integrantes de diversos movimentos so-ciais, como o movimento LGBT, o movimento ne-gro, militantes de movimentos estudantis como a ANEL13, e militantes ocasionais.

Tal como no Festival Amor Sim Russoman-no Não, os protestos realizados culminaram em eventos maiores, contando com a participação de artistas e shows na Praça Roosevelt, que, desde o Festival Amor Sim Russomanno, passou a ser cha-mada por coletivos e pela mídia de Praça Rosa.

13. Assembléia Nacional dos Estudantes - Livre

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8.2 Relação dos casos com os principais pontos abordados

8.2.1 Formato da rede

Ao analisarmos as características das redes sociais paralelamente às características dessa nova for-ma de ativismo, é possível percebermos o formato de rede no qual se articulam essas manifestações.

O primeiro aspecto a ser observado é a hori-zontalidade desses movimentos. Ao invés do tra-dicional formato vertical das organizações, estes movimentos possuem formas mandálicas, onde seus organizadores estão no centro, criam nós e são difusores iniciais das informações, mas per-dem parte do reconhecimento de organizadores conforme o movimento se expande. Isso significa que os atores sociais que não se encontram nas proximidades das conexões desses nós centrais, não enxergam os primeiros organizadores como

sendo atores principais, e talvez sequer saibam quem são eles. Isso ocorre de maneira bem di-ferente de um formato de movimento hierar-quizado, no qual se tem um líder claro e pratica-mente absoluto.

No Festival Amor Sim Russomanno Não, por exemplo, a organização foi feita por produtores culturais do coletivo Fora do Eixo14 e do grupo Santo Forte15. Porém, esta não era uma infor-mação divulgada na comunicação do evento, sendo assim muito provável que grande parte das 15 mil pessoas presentes no ato desconhe-cesse esse fato.

O mesmo ocorreu com o movimento Fora Feli-ciano. Por ser formado por ativistas de diversas origens e movimentos sociais, possuiu diversos centros em nó, que disseminaram informações sobre a articulação para todas suas diferentes conexões, tendo como organizadoras todas as pessoas com disposição a fazê-lo.

14. O Fora do Eixo é uma rede de trabalhos concebida por produto-res culturais das regiões centro-oeste, norte e sul no final de 2005, com a ocupação atual de espaços na web.15. Produtora Cultural

8. ESTUDO DE CASOS

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8.2.2 Cooperação

A importância da cooperação em uma manifesta-ção social de qualquer natureza é bastante óbvia, como foi exposto no capítulo 4. Nos dois estudos de caso apresentados, essa cooperação se deu principalmente através do compartilhamento de imagens, informações e convites para o ato final por meio da rede digital.

8.2.3 Clusterização

A dinâmica de clusterização pode ser vista como muito importante nos dois estudos de caso. A disseminação de informações feitas por nós com múltiplas conexões e um capital social sólido, ou seja, com a participação de atores que possuiam credibilidade para abordar o assunto, foi crucial para o alto número de compartilhamentos e o

exponente número de pessoas confirmadas nos eventos criados no Facebook. São estes nós que, espalhados pela rede, são responsáveis pela di-fusão do conhecimento.

No caso do Festival Amor Sim Russomanno Não, o principal evento criado no Facebook ti-nha mais de 4 mil pessoas confirmadas para o ato presencial, sendo que o evento havia sido criado há apenas um dia. Por sua vez, o evento criado para o primeiro ato do Fora Feliciano con-tava com a confirmação de mais de 27 mil pes-soas. Isso é um reflexo da cooperação entre os ativistas e da presença desses atores multico-nectados e bem informados.

Esses grandes nós na rede podem ser repre-sentados também pelas páginas do Facebook, dado que páginas contendo um grande número de seguidores são fortes difusores de informa-ção. No caso do Fora Feliciano, uma página que trouxe força ao movimento foi a Brasil Contra

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Igreja Universal, que tem por objetivo combater a corrupção religiosa e denunciar crimes envol-vendo Igrejas no Brasil e no mundo, em particu-lar a Igreja Universal do Reino de Deus. A página possui atualmente 138 mil seguidores e, assim, ao emitir notícias e imagens contra Marco Feli-ciano pode ter atingido todas essas pessoas em uma disseminação rápida e massiva da causa.

8.2.4 Adaptação

Podemos observar a dinâmica de adaptação das redes de forma bastante clara pelo estudo de caso do Festival Amor Sim Russomano Não. Para tanto, é preciso assinalar que o Facebook conta com uma ferramenta de denúncia que consiste na possibilidade de qualquer usuário da rede op-tar por acusar determinada pessoa/página/even-to por meio de um ícone específico; esta acusa-ção é avaliada pelos funcionários do site e se o número de denúncias for muito alto, o Facebook retira do ar tal publicação denunciada.

Dada essa possibilidade, cabe analisar o ocor-

rido com a página de divulgação da manifestação Festival Amor Sim Russomano Não, que foi reti-rada do Facebook em seu primeiro dia de divul-gação da causa e do evento, no dia 01 de Outubro de 2012, muito provavelmente por conta de de-núncias recebidas. Como resposta espontânea à retirada da página e dada a indignação dos ati-vistas em relação a isso, no dia seguinte foram criadas 100 páginas de eventos para a mesma manifestação. Surgiu uma estratégia de adapta-ção realizada pelos próprios múltiplos ativistas com o intuito de dificultar a realização de um número alto de denúncias, que fosse suficiente-mente grande para que o movimento deixasse de existir no Facebook.

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8.2.5 As manifestações como comunidade temporárias

De acordo com o que já foi exposto no decorrer deste trabalho, a fluidez que rege as identidades pós-modernas tem grande influência na manei-ra de organização em grupo na atual sociedade, conferindo às novas formas comunitárias um aspecto também fluido, que pode ser observado nos estudos de caso aqui apresentados.

É possível estabelecer um paralelo entre as comunidades-cabide de Bauman e as manifesta-ções Festival Amor Sim Russomanno Não e Fora Feliciano. Em ambos os eventos, no ato presen-cial foi possível observar a participação de movi-mentos sociais mais sólidos, como o movimento LGBT, movimentos negros, estudantis, entre outros. As pessoas que participaram desses mo-vimentos possuem uma rotina de reuniões e o compromisso de estarem presente em eventos re-lacionados às suas causas. Porém, a maior parte dos participantes eram os chamados militantes ocasionais: pessoas que se identificaram com as causas e foram às ruas compor com a luta desses

movimentos sociais mais sólidos. Essas pessoas não têm o compromisso sólido de pertencer ao movimento, e se permitem participar enquanto houver indignação e disposição suficientes. Uma vez saciada a vontade de se manifestar, continu-am o cotidiano de suas vidas, ou então - utilizan-do-se da metáfora de Bauman - deixam o proble-ma pendurado e fecham a porta do armário.

No estudo de caso do movimento Fora Fe-liciano é possível perceber esse aspecto com clareza. Isso porque até o presente momento a manifestação contou com três atos, onde no pri-meiro evento havia 337.440 pessoas convidadas e 27.262 pessoas confirmadas, no segundo even-to o número de pessoas convidadas caiu para 120.524 e o de pessoas confirmadas para 7.082, já no terceiro evento o número de convidados so-freu uma grande queda com apenas 32.133 pes-soas convidadas e 1.093 pessoas confirmadas, o que reflete também uma queda na participação online do movimento em compartilhar a existên-cia do evento. A queda no número de participan-tes pode ser um reflexo tanto do alto número de militantes ocasionais, como de suas característi-

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cas fluidas, que influenciam em sua participação apenas passageira no movimento.

Vale destacar que esses números mostram as-pectos positivos e negativos dessa nova forma de manifestar-se. Por um lado, apresentam a for-ça que a articulação no espaço online pode vir a ter, com um alto número de participantes no pri-meiro momento. Por outro lado, explicitam o bai-xo compromisso que esses militantes tem com o movimento, e que é causado pelas baixas barrei-

ras de saída, somadas às características fluidas do individuo pós-moderno.

8. ESTUDO DE CASOS

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Outro ponto importante para a comparação dessas manifestações públicas com as comuni-dades-cabide, ou comunidades estéticas de Bau-man, é o aspecto efêmero, espontâneo e com laços transitórios que possuem. A união comple-ta de seus ativistas se dá somente no espaço e tempo do problema pautado e, uma vez que a mobilização termina, tendo atingido seu objeti-vo, ou não, o movimento dissolve-se e perde sua característica de exaltação do momento do ato. Nesse cenário, permanecem para os indivíduos a experiência vivida e as (novas) ideias adquiridas pela participação, que podem vir a unir-se nova-mente em outro espaço e em outro tempo, com outro objetivo, mas com os mesmo valores.

8.2.6 O alcance observado

A possibilidade de alcance global conferida pelos meios digitais pode ser observada principalmen-te no estudo de caso do evento Fora Feliciano. Além de ter o alcance global alcançado em seu microcosmo - o Brasil -, a manifestação também

obteve repercussão mundial.A par das manifestações públicas simultâneas

ocorridas em diferentes cidades de todo o país, o movimento contou com ramificações em várias outras cidades do mundo, contando com a parti-cipação de ativistas de outros países. Ao tomar conhecimento da causa, cidadãos brasileiros no exterior e cidadãos de outros países também se mobilizaram, tendo acontecido protestos pre-senciais paralelos aos ocorridos no Brasil em Pa-ris, Berlim e Lisboa.

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8.2.7 Presença de valores culturais

Nos estudos de casos abordados é possível notar o aspecto cultural que conduz as novas formas de ativismo de duas maneiras: a primeira refe-re-se ao fato de que os atos finais das manifes-tações culminaram em uma “festa”, com música e performances, e a segunda refere-se à luta por mudanças de valores na sociedade.

O manifesto do Festival Amor Sim Russoman-no Não deixou muito claro seu teor cultural, vis-to que o movimento solicitava por uma “cidade mais pública, mais humana, mais inclusiva e gentil. Uma cidade com mais amor” (Manifesto, 2012). A ideia de tornar o rosa-choque a cor oficial do evento é revelada na expressão da necessida-de de uma cidade com mais amor e menos conser-vadorismo, e também na vontade de dar cor à ci-dade – usualmente cinza, cheia de concreto que, para o movimento, significa a representação de uma cidade machista: “precisávamos de algo que marcasse, para quebrar essa rigidez, algo mais alegre, feminino. Daí a ideia do rosa-choque”

8. ESTUDO DE CASOS

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(Caio Perez, artista e participante do ato, em en-trevista para O Globo, 2012).

Os atos do Fora Feliciano também contaram com shows ao final de seus eventos. Mas o aspec-to cultural desta manifestação é expresso prin-cipalmente pela luta por mudanças nos valores sociais de parte da população considerada con-servadora. Assim, apesar de o objetivo principal do movimento ser a renúncia de Marco Feliciano ao cargo de presidente da CDHM, com a reto-mada e reestruturação dos objetivos concretos desta comissão, a manifestação pôde mobilizar cidadãos em prol da necessidade de se ter valores mais humanistas em nossa sociedade, contando com debates sobre os direitos LGBT, as questões raciais no Brasil, a situação do sistema prisional e a maioridade penal, entre outros.

Ainda, vale destacar que, talvez por causa das declarações de Marco Feliciano consideradas homofóbicas, o assunto mais comentado foi o dos direitos LGBT. Assim, o movimento contou com “beijaços” entre pessoas do mesmo sexo em Brasília, não necessariamente homossexuais, e ações como a do cartunista Laerte, que se dese-

nhou deixando um espaço para outras pessoas se desenharem beijando seu personagem, como forma de apoio aos direitos LGBT.

8.2.8 Reflexo do enfraquecimento das estruturas tradicionais e suas consequências

Tal como foi assinalado neste trabalho, o surgi-mento de um ativismo em rede pode ser relacio-nado à crise das formas institucionais de poder. Os organizadores do Festival Amor Sim Russo-manno Não creditaram essa crise a própria ascen-são de Celso Russomanno nas pesquisas eleito-rais. Ficou em evidência, também, a insatisfação com o atual sistema político e a relação com o enfraquecimento das formas institucionais, um

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dos principais catalizadores da manifestação, a qual alegou que o alto número das intenções de votos em Celso Russomanno eram “sintoma ter-minal da decadência política da cidade” e fruto “da preguiça mental diante da falência do sistema político tradicional” (Manifesto, 2012).

Já em relação ao movimento Fora Feliciano, o reflexo da crise pode ser representado pela cria-ção da Comissão Extraordinária de Direitos Hu-manos, originada a partir da iniciativa social. Essa comissão foi uma resposta à permanência de Mar-co Feliciano no cargo de presidente da CDHM ape-sar das manifestações contrárias a isso, e repre-senta a necessidade de considerar que a CDHM não é representativa de, ao menos, parte da po-pulação. Presidida pelo cartunista e ativista La-erte, a primeira reunião desta Comissão Extraor-dinária de Direitos Humanos, realizada de forma pública na Praça Roosevelt (Praça Rosa), contou também com a participação de deputados que se retiraram da CDHM, como Jean Wyllys, do Parti-do Socialista, um dos principais articuladores do Fora Feliciano, bem como a de cidadãos comuns.

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9.CONSIDERAÇõES FINAIS

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O ativismo em rede pode ser considerado uma nova forma de organização de movimentos sociais, pos-suindo, fundamentalmente, objetivos políticos e culturais. Sua maneira de inter-relacionar seu ato-res sem uma hierarquia, respeitando um formato horizontal, permite um modo democrático de or-ganização no sentido de possibilitar o acesso de di-ferentes atores, cada qual com sua própria subjeti-vidade, cada grupo com seus próprios fins, porém com, pelo menos, um ideal em comum.

Sua presença nos meios digitais, que também têm uma estrutura aberta e horizontal, amplia essa possibilidade, trazendo para dado movi-mento social os denominados militantes ocasio-nais, que impulsionam o movimento através do aumento do fluxo de informação da rede. Essa união acontece a partir do momento em que há: uma identidade, um adversário e um projeto em comum a todos os atores interessados em ingres-sar em uma única estrutura.

Inserido no contexto da era líquida-moderna, o movimento em rede, agrega os aspectos fluidos que são típicos do contemporâneo. Isso implica numa contínua transformação de sua estrutura,

“que é fruto da auto-regulação, das idas e vindas de arranjos e ajustes recíprocos”, onde “a organiza-ção é sempre um processo, nunca um estado final” (MARTINHO, 2003, p. 42). Esse aspecto pode ser percebido pela união dessas redes e militantes a partir de um objetivo em comum e/ou de manifes-tações políticas. A estrutura formada para esses eventos talvez jamais chegue a ser a mesma, uma vez terminadas as “festividades”.

Podem-se analisar essas breves manifestações como comunidades temporárias, eventos popu-lares espontâneos que quebram com a rotina. Se-gundo Hakim Bey, são como levantes, onde:

um levante é uma “experiência de pico” se comparada ao padrão ‘normal’ de consciência e experiência. Como os festivais, os levantes não podem acontecer todos os dias – ou não seriam extraordinários.(bEY, 2001, p. 16).

Como levantes, tendem a ter um fim, mas como temporários, tendem a voltar sempre que neces-sários – sempre e enquanto houver disposição e interesse em reestruturar a rede.

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Fotos

Fora do Eixohttp://www.flickr.com/photos/foradoeixo/sets/72157631699684407/with/8058163074/