O Desafio Da Escalabilidade à Teoria Estética

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44 O DESAFIO DA ESCALABILIDADE À TEORIA ESTÉTICA E A COMPREENSÃO DO CONCEITO “ARTE” A PARTIR DO MODELO WITTGENSTEINEANO DE SEMELHANÇAS DE FAMÍLIA Jean Rodrigues Siqueira* Resumo – Apesar de alguma imprecisão envolvendo a determinação do seu significado, o termo “escalabilidade” pode ser utilizado para designar a capacidade que um sistema qualquer deve possuir de modo a permanecer funcional em face da ampliação constante de sua base de dados. Nesse sentido, a vertiginosa proliferação e a intensa diversificação dos objetos artísticos no seio da arte contemporânea podem ser vistas como fonte de um problema de escalabilidade envolvendo a eficácia de sistemas definicionais na teoria estética (em particular no que diz respeito à questão da definição clássica do conceito “arte”). Uma possível superação desse desafio da escalabilidade à teoria estética é o abandono do modelo definicional clássico em favor de um modelo explicativo baseado na concepção wittgensteineana de “semelhanças de família”. Trata‑se aqui, pois, de explorar criticamen‑ te essa possibilidade. Palavras‑chave: Arte. Definição clássica. Escalabilidade. Semelhanças de família. Teoria estética. INTRODUÇÃO Já há alguns anos os termos “escalabilidade” e “escalável” vêm sendo empregados com certa recorrência nas discussões sobre tecnologia da informação, engenharia de software e/ ou de hardware, economia, administração e gestão de negócios, além de ocasionalmente também aparecerem na literatura produzida no âmbito das chamadas humanidades. Esse uso frequente, bastante abrangente e, consequentemente, impreciso, levou o pesquisador Mike D. Hill, um membro do Departamento de Ciências da Computação da Universidade de Wisconsin, a questionar a utilidade da noção de escalabilidade na sua área de especialização, concluindo um de seus artigos com o ultimato de que “ou a comunidade técnica define ri‑ gorosamente a escalabilidade ou para de usá‑la” (HILL, 1990, p. 18). * Doutorando do Programa de Pós‑Graduação em Educação, Arte e História da Cultura da Universidade Presbiteriana Macken‑ zie (UPM). Mestre em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC‑SP). Professor dos cursos de graduação e pós‑graduação em Filosofia do Centro Universitário Assunção e da Universidade Camilo Castelo Branco. E-mail: jeansiq@ hotmail.com

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Autor: Jean Rodrigues Siqueira

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    O DESAFIO DA ESCALABILIDADE TEORIA ESTTICA E A COMPREENSO DO CONCEITO ARTE A PARTIR DO MODELO WITTGENSTEINEANO DE SEMELHANAS DE FAMLIA

    Jean Rodrigues Siqueira*

    Resumo Apesar de alguma impreciso envolvendo a determinao do seu significado, o termo escalabilidade

    pode ser utilizado para designar a capacidade que um sistema qualquer deve possuir de modo a permanecer

    funcional em face da ampliao constante de sua base de dados. Nesse sentido, a vertiginosa proliferao e a

    intensa diversificao dos objetos artsticos no seio da arte contempornea podem ser vistas como fonte de um

    problema de escalabilidade envolvendo a eficcia de sistemas definicionais na teoria esttica (em particular no

    que diz respeito questo da definio clssica do conceito arte). Uma possvel superao desse desafio da

    escalabilidade teoria esttica o abandono do modelo definicional clssico em favor de um modelo explicativo

    baseado na concepo wittgensteineana de semelhanas de famlia. Tratase aqui, pois, de explorar criticamen

    te essa possibilidade.

    Palavraschave: Arte. Definio clssica. Escalabilidade. Semelhanas de famlia. Teoria esttica.

    IntRoduo

    J h alguns anos os termos escalabilidade e escalvel vm sendo empregados com certa recorrncia nas discusses sobre tecnologia da informao, engenharia de software e/ou de hardware, economia, administrao e gesto de negcios, alm de ocasionalmente tambm aparecerem na literatura produzida no mbito das chamadas humanidades. Esse uso frequente, bastante abrangente e, consequentemente, impreciso, levou o pesquisador Mike D. Hill, um membro do Departamento de Cincias da Computao da Universidade de Wisconsin, a questionar a utilidade da noo de escalabilidade na sua rea de especializao, concluindo um de seus artigos com o ultimato de que ou a comunidade tcnica define rigorosamente a escalabilidade ou para de usla (HILL, 1990, p. 18).

    * Doutorando do Programa de PsGraduao em Educao, Arte e Histria da Cultura da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM). Mestre em Filosofia pela Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo (PUCSP). Professor dos cursos de graduao e psgraduao em Filosofia do Centro Universitrio Assuno e da Universidade Camilo Castelo Branco. E-mail: [email protected]

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    Mas, apesar das evidentes diferenas que perpassam as reas do conhecimento j mencionadas, no seria nenhum disparate acreditar que as definies de escalabilidade apresentadas em cada uma delas seriam suficientes, caso mostrassem pontos de convergncia, para garantir alguma coerncia em seu uso. Assim, mesmo respeitando a exigncia feita por Hill de que o termo escalabilidade, na ausncia de uma definio rigorosa, deveria ser abandonado deciso que eventualmente poderia se mostrar acertada para os debates envolvendo os cientistas da computao , nada nos impediria, em princpio, de empreglo de maneira teoricamente frutfera e com algum grau de efetividade em outros tipos de discusso. E o que uma busca por definies do termo escalabilidade nessas diversas matrizes disciplinares nos revela justamente a presena de claras confluncias, conforme atesta a pequena amostragem a seguir obtida em uma rpida busca pela internet:

    uma caracterstica desejvel em todo o sistema, em uma rede ou em um processo, que

    indica sua habilidade de manipular uma poro crescente de trabalho de forma uniforme,

    ou estar preparado para crescer (http://pt.wikipedia.org/wiki/Escalabilidade);

    a capacidade de um componente de hardware ou software de ser expandido para aten

    der a futuras necessidades de processamento (http://technet.microsoft.com/ptbr/library/

    cc776523(v=ws.10).aspx);

    propriedade de um sistema qualquer que lhe confere a capacidade de aumentar seu de

    sempenho sob carga, quando mais recursos (esp. hardware, no caso de computadores) so

    acrescentados a esse sistema (http://aulete.uol.com.br/nossoaulete/escalabilidade);

    a habilidade que cmbios, bancos e instituies financeiras tm de lidar com demandas

    crescentes, como a de grandes volumes de negociao. Em sentido corporativo, uma com

    panhia escalvel aquela que mantm ou aprimora as margens de lucro medida que o

    volume de vendas cresce (http://www.investopedia.com/terms/s/scalability.asp);

    o potencial de um negcio ou parte de um negcio para continuar funcionando efeti

    vamente na medida em que seu tamanho aumenta (http://www.investorwords.com/4398/

    scalability.html);

    a habilidade de aumentar o tamanho de qualquer sistema de uma maneira linear sem mo

    dificar suas propriedades fundamentais (http://www.inc.com/encyclopedia/scalability.html).

    Desse diversificado apanhado de definies (ou talvez simplesmente caracterizaes) podemos, pois, observar e destacar como traos comuns maioria delas as ideias de que: 1. a escalabilidade uma propriedade, atributo ou qualidade desejvel em certos sistemas, sendo, portanto, no uma propriedade que os sistemas efetivamente apresentam, mas algo que eles devem apresentar; e 2. a escalabilidade, enquanto propriedade desejvel, est ligada capacidade de um sistema permanecer funcionalmente eficaz quando confrontado com a am

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    pliao contnua de dados/informao e, consequentemente, em face da inevitvel modifi

    cao de sua estrutura prvia1.

    Embora a mera indicao desses traos comuns esteja longe de atingir as demandas de

    uma definio formal e rigorosa, ela me parece suficiente para os propsitos deste artigo.

    Tomando essas caractersticas como elementos constitutivos do sentido da noo de escala

    bilidade (e tambm da expresso adjetiva escalvel), pretendo apresentar e discutir o que

    denominei em seu ttulo de o desafio da escalabilidade teoria esttica. Nesse sentido,

    comearei explicando o que est sendo chamado aqui de teoria esttica e em que consiste

    o tal desafio da escalabilidade que se erige perante ela. Em seguida, apresentarei uma pro

    posta de compreenso do conceito arte baseada na ideia de semelhanas de famlia, a fim

    de explorar uma possvel superao desse desafio. Mas, conforme argumentarei, embora a

    compreenso do conceito arte a partir do modelo de semelhanas de famlia mostrese

    adequada para lidar com aspectos centrais do desafio da escalabilidade, essa abordagem traz

    consigo uma srie de dificuldades internas que acabam por colocar em questo seu poder

    terico e explicativo.

    A TEORIA ESTTICA E O PROjETO DEFINICIONAL CLSSICO

    Conforme anuncia o ttulo deste artigo, o que se prope ao longo das pginas a seguir ,

    fundamentalmente, uma contribuio ao domnio da investigao filosfica tradicionalmen

    te conhecido como esttica, e tambm uma discusso sobre a natureza e uso do conceito

    arte. Ainda que a associao entre os termos esttica e arte possa parecer bastante bvia

    queles que tm algum conhecimento da histria da filosofia e da histria das artes, o fato

    que em tempos mais recentes essa aproximao quase automtica passou a ser forte

    mente contestada2, de tal maneira que hoje muitos autores preferem distinguir as questes

    1 O termo sistema, que aparece intimamente ligado noo de escalabilidade nessas definies, embora muito mais claro e consolidado em sua significao, talvez tambm seja digno de algum esclarecimento: por essa palavra podemos entender qualquer conjunto de elementos interligados de tal maneira a constituir um todo organizado. Nesse sentido, um organismo biolgico um sistema tanto quanto uma lngua natural ou uma teoria cientfica.

    2 O filsofo estadunidense Arthur Danto, por exemplo, ao considerar que existem obras de arte que possuem propriedades sensveis qualitativamente idnticas s de objetos reais (isto , no obras de arte) como a Fonte de Marcel Duchamp ou a Caixa Brillo de Andy Warhol, conclui que os aspectos sensoriais de um objeto so irrelevantes para sua considerao enquanto obra de arte ou no: Na minha opinio, uma obra de arte tem um grande nmero de propriedades muito diferentes das que caracterizam um objeto que, apesar de materialmente indiferencivel dela, no uma obra de arte. Algumas dessas propriedades podem muito bem ser estticas, tendo a faculdade de provocar experincias estticas ou a possibilidade de ser consideradas preciosas e valiosas. Mas para reagir esteticamente a essas propriedades preciso antes saber que o objeto em questo uma obra de arte, de modo que para reagir de modo diferenciado a essa diferena de identidade preciso que j tenha sido feita a

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    levantadas pelos estetas daquelas trabalhadas pelos filsofos da arte3. Essa contestao, no

    entanto, de modo algum apaga a associao histrica originria4 entre ambos, o que inques

    tionavelmente autoriza o emprego da expresso teoria esttica ao se conduzir uma discus

    so sobre o conceito arte. Inclusive, levando em considerao essa associao que o arti

    go do filsofo estadunidense Morris Weitz, chamado O papel da teoria na esttica (1956),

    ser agora trazido baila. As ideias propostas por Weitz nesse texto basilar da esttica ana

    ltica5 permitiro o esclarecimento da noo de teoria esttica e tambm uma aproximao

    acerca do desafio da escalabilidade.

    Logo no primeiro pargrafo do artigo, Weitz (1956, p. 27) explicita em que consiste o

    projeto central de uma teoria esttica:

    A teoria tem sido central esttica e ainda a preocupao da filosofia da arte. Sua prin

    cipal preocupao declarada continua sendo uma determinao da natureza da arte que

    possa ser formulada por meio de uma definio. Ela constri a definio como um enuncia

    do de propriedades necessrias e suficientes do que est sendo definido, e pretendese que

    esse enunciado seja uma afirmao verdadeira ou falsa acerca da essncia da arte, acerca

    daquilo que a caracteriza e a distingue de todo o resto.

    distino entre o que arte e o que no . [...] Consequentemente, no se pode recorrer a consideraes estticas para chegar

    a uma definio de arte, pois precisamos de uma definio prvia para identificar as reaes estticas apropriadas a obras de

    arte em contraste a meras coisas reais (DANTO, 2005, p. 151). Posio semelhante defendida por seu conterrneo Joseph

    Kosuth; de acordo com esse importante artista e pensador da arte conceitual: necessrio separar a esttica da arte porque a

    esttica lida com opinies sobre a percepo do mundo em geral. [...] Consideraes estticas so de fato sempre estranhas funo de um objeto ou sua razo de ser. A menos, claro que a razo de ser desse objeto seja puramente esttica. Um exem

    plo de um objeto puramente esttico um objeto decorativo (KOSUTH, 2002, p. 1617).

    3 O conceito de arte certamente se relaciona de importantes maneiras com o conceito de esttica, mas a esttica no pode

    absorver completamente o conceito de arte (DICKIE, 1971, p. 2); [...] esttica uma coisa, a filosofia da arte outra, embora

    isso no signifique negar que alguma concepo do valor esttico desempenhe um papel importante, ainda que no definidor,

    na filosofia da arte (STECKER, 2005, p. 2).

    4 O termo esttica foi cunhado pela primeira vez pelo filsofo alemo Alexander Baumgarten em 1735, em sua publicao

    intitulada Meditationes philosophicae de nonnullis ad poema pertinentibus (Consideraes filosficas sobre alguns aspectos pertinentes ao poema), a fim de designar a cincia de como as coisas so conhecidas pelos sentidos. Mas o termo assume seu sentido hoje comum em filosofia e no estudo das artes a partir de 1750, por conta da publicao da obra Aesthetica; nesse texto, Baumgarten caracteriza a esttica como sendo a teoria das artes liberais, uma espcie de cincia da cognio sensvel (cf.

    GUYER, 2008, p. 27).

    5 Morris Weitz um filsofo formado na tradio filosfica do pensamento contemporneo conhecida como filosofia ana

    ltica da o uso da expresso esttica analtica. A abordagem das questes estticas por parte das outras tradies da filo

    sofia contempornea, como a fenomenologia e a hermenutica, por exemplo, difere consideravelmente da abordagem lgico

    lingustica dos filsofos analticos isso no s no mbito da esttica e do pensamento sobre a arte, mas tambm em todos

    os demais domnios da investigao filosfica. Para uma compreenso das diferenas entre a filosofia analtica e as demais

    abordagens da filosofia, bem como sobre o afastamento histrico ocorrido entre elas, vale a pena consultar o detalhado (e

    extenso) estudo de DAgostini (2003).

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    Teorias estticas so, portanto, basicamente uma busca por definies, mas no por simples definies lexicais, quer dizer, alguma simples determinao do sentido corrente de certas palavras, mas uma busca por definies rigorosas supostamente capazes de revelar a natureza ou essncia das coisas referidas no discurso esttico por meio de expresses como belo, sublime, experincia esttica e outras, mas, principalmente, as denotadas pelo conceito arte. Esse tipo de definio, descrito na citao acima como um enunciado de propriedades necessrias e suficientes do que est sendo definido, chamado por Weitz de definio verdadeira ou, na maioria das vezes, de definio real. Tentemos, ento, entender melhor os procedimentos envolvidos na elaborao desse tipo de definio, estreitamente ligado s teorias estticas tradicionais.

    Uma definio real um tipo clssico de definio que consiste na determinao de um conjunto de condies necessrias que sejam conjuntamente suficientes para a correta aplicao de um conceito a suas respectivas instanciaes, ou seja, as coisas referidas por tal conceito. Ao explicitar as condies necessrias e suficientes de aplicao de um conceito, uma definio real revela as propriedades que constituem a natureza ou a essncia daquilo referido por ele da esse tipo de definio estar intimamente associado a concepes essencialistas da linguagem. Historicamente, a origem dessa concepo essencialista das definies (e da linguagem) pode ser rastreada ao mtodo empregado por Scrates nos chamados dilogos socrticos de Plato6 e, de um modo mais explcito, ideia de definio por gnero e diferena especfica, devida aos trabalhos de Aristteles7 da sua qualificao como clssica. De acordo com esse modelo de definio, as condies necessrias de aplicao de um conceito dizem respeito a certas propriedades que todo objeto referido pelo conceito tem de possuir para ser considerado uma exemplificao do conceito (o que caracterizaria o seu gnero o genus); condies suficientes, por sua vez, remetem s propriedades que bastam a um certo objeto possuir para que ele caia sob o conceito em questo (o que caracterizaria sua diferena especfica a differentia). Por exemplo, para que certo ser humano x possa ter o conceito pai biolgico adequadamente aplicado a ele necessrio que x seja um homem, mas ser um homem no condio suficiente para a aplicao desse conceito (afinal, h homens que no so pais); ter filho(s) outra condio necessria para

    6 comum entre os intrpretes de Plato dividir a obra do filsofo em trs perodos. O primeiro o dos chamados dilogos socrticos centramse em debates acerca das virtudes ou excelncias humanas e uma metodologia determinada pela pergunta o que ? acompanhada de estratgias de refutao exemplos so Eutfron, Laques, Lsias e on. O segundo explora os pressupostos metafsicos e epistemolgicos dessa metodologia, centrandose na apresentao e discusso da chamada Teoria das Ideias (ou Formas) exemplos so os dilogos Mnon, Repblica, Crtilo, Banquete e Fedro. O terceiro envolve uma avaliao crtica da prpria Teoria das Ideias exemplos so os dilogos Parmnides, O Sofista, Filebo e Timeu. Posteriormente, os dilogos socrticos tornaramse um gnero de texto filosfico, tendo seu estilo refutativo de busca por definies utilizado por diversos autores posteriores.

    7 No h nenhum escrito de Aristteles especialmente devotado teoria das definies, apenas observaes sobre o tema espalhadas em diversos textos do filsofo, principalmente nos Segundos Analticos (livro II), nos Tpicos (livro VI) e na Metaf-sica (livro Z).

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    que x seja considerado um pai biolgico, mas tambm no uma condio suficiente dos objetos que caem sob esse conceito (afinal, h mulheres que tm filhos biolgicos). Nem mesmo a conjuno dessas duas propriedades ser homem e ter filhos uma condio suficiente para a aplicao do conceito, uma vez que um homem com filhos adotivos no deveria ser considerado um pai biolgico. Assim, o conceito pai biolgico ser adequadamente aplicado a um ser humano x se, e somente se, x tiver como propriedades conjuntas ser um homem com filhos no adotivos. Teramos a, ento, a definio real do conceito pai biolgico, uma definio que permite no apenas identificar quando certo ser humano x um pai, mas determinar o que que, essencialmente, faz com que x seja tal coisa.

    Conforme dito, as primeiras elaboraes tericas envolvendo as definies reais podem ser encontradas j nos primeiros dilogos de Plato. Nesses textos, o que habitualmente est em jogo na troca de argumentos, objees e contraargumentos a procura por qual a natureza ou a essncia (a ousa, em grego) de alguma disposio humana. No dilogo Teeteto, por exemplo, o que est em pauta o conceito de conhecimento; na Repblica, o que a justia; no Eutfron, o que a piedade; no Mnon, o que a virtude. Nesses textos, portanto, a pergunta que conduz toda a discusso subsequente uma questo do tipo o que aquilo de que se pretende falar. Ou seja, antes de discutir se os ensinamentos dos sofistas podem ser chamados de conhecimento, preciso antes saber o que o conhecimento; antes de se responder se a virtude pode ou no pode ser ensinada, preciso saber o que a virtude; antes de se saber se a piedade boa porque os deuses a aprovam ou se os deuses aprovam a piedade porque ela boa, preciso saber o que a piedade. Buscar essa essncia, isto , a definio de um conceito, implicaria, segundo a estratgia delineada nesses dilogos de Plato, apresentar alguma propriedade (ou propriedades) que todas as coisas que fossem conhecimento ou virtude, por exemplo, possuam e, ao mesmo tempo, alguma propriedade (ou propriedades) que apenas as coisas que fossem conhecimento ou virtude poderiam apresentar. Nessa conjuno de todas e apenas as propriedades referidas por um termo de uma lngua natural qualquer teramos a definio rigorosa de um conceito, isto , uma clara delimitao de suas fronteiras, uma restrio formal que nos impediria de confundir um copo com uma taa ou com uma caneca, apesar das bvias semelhanas entre esses trs tipos de objetos. O procedimento proposto por Plato fica claro, por exemplo, nesta passagem do dilogo Mnon, em que Mnon tenta responder questo o que a virtude recorrendo ao uso de exemplos de tipos de pessoas virtuosas e satirizado por Scrates:

    Scrates: Uma sorte bem grande parece que tive, Mnon, se, procurando uma s virtude,

    encontrei um enxame delas pousando junto a ti. Entretanto, Mnon, a propsito dessa

    imagem, essa sobre o enxame, se, perguntando eu, sobre o ser da abelha, o que ele , dis

    sesses que elas so muitas e assumem toda variedade de formas, o que me responderia se

    te perguntasse: dizes serem elas muitas e de toda variedade de formas e diferentes uma

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    das outras quanto ao serem elas abelhas? Ou quanto a isso elas no diferem nada, mas sim

    quanto a outra coisa, por exemplo, quanto beleza, ao tamanho, ou quanto a qualquer

    outra coisa desse tipo? Dize: que responderias, sendo interrogado assim?

    Mnon: Eu, de minha parte, diria que, quanto a serem abelhas, no diferem nada uma das

    outras.

    Scrates: Se ento eu dissesse depois disso: nesse caso, dizeme isso aqui, Mnon, aquilo

    quanto a que elas nada diferem, quanto a que so todas o mesmo, que afirmas ser isso?.

    Poderias, sem dvida, dizerme alguma coisa?

    Mnon: Sim, poderia.

    Scrates: Ora, assim tambm no que se refere s virtudes. Embora sejam muitas e assu

    mam toda variedade de formas, tm todas um carter nico, que o mesmo, graas ao qual

    so virtudes, para o qual, tendo voltado seu olhar, a algum que est respondendo per

    feitamente possvel, penso, fazer ver, a quem lhe fez a pergunta, o que vem a ser a virtude.

    Ou no entendes o que digo? (PLATO, 2001, 72a72d, grifo nosso).

    Ora seguindo agora o exemplo lanado h pouco , para algo ser um copo (quer dizer, ser referido pelo conceito copo, mesmo diante de todas as diferenas existentes entre tudo que um copo), esse algo necessariamente deveria possuir uma propriedade (ou propriedades) que tudo o mais que fosse copo tambm tivesse, independentemente de suas peculiaridades (de vidro ou de plstico, maior ou menor, liso ou com inscries, mais leve ou no etc.) o tm [todos] um carter nico enfatizado no fragmento de texto acima; e, alm disso, definir copo tambm exigiria a indicao de uma propriedade (ou propriedades) que apenas os objetos que fossem copos poderiam possuir assim, caso uma tal propriedade tambm se fizesse presente em uma caneca, sua considerao deveria ser descartada o aquilo quanto a que so [todos] so o mesmo, aquilo a quanto [eles] nada diferem, da mesma passagem. Assim, definir rigorosamente, isto , apresentar uma definio real, seria apresentar uma conjuno de propriedades necessrias e suficientes para a aplicao de um conceito a certos objetos. Seria, em outras palavras, descrever a natureza de algo, aquilo que a coisa , seu ser, qual sua essncia.

    Uma teoria esttica, portanto, pode ser reduzida tentativa de apresentar uma definio real para o conceito arte, ou, colocado de outra maneira, de responder rigorosa e adequadamente questo o que arte? se esta estivesse sendo levantada em algum tipo de dilogo socrtico8. Mais contemporaneamente, a persecuo desse projeto essencialista de apresentar uma definio real do conceito arte poderia ser facilmente identificada no artigo do filsofo De Witt Parker (1939, p. 684), que traz o sugestivo ttulo de A natureza da arte:

    8 Claro que se a questo o que arte? tivesse sido colocada realmente em algum dilogo socrtico, a pergunta seria a respeito de um conjunto diferente de objetos, j que o terno grego techn (e seu equivalente latino ars) aplicavase a uma srie de artefatos e atividades que hoje no chamaramos de arte no sentido em que aqui estamos explorando esse conceito.

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    A suposio que subjaz a toda a filosofia da arte a da existncia de alguma natureza

    comum presente em todas as artes [...] Admitese que cada obra de arte possui um sabor

    nico, um je ne sais quoi que a torna incomparvel com qualquer outro trabalho; no entan

    to, h alguma caracterstica ou conjunto de caractersticas que, ao se aplicarem a cada obra

    de arte, aplicamse a todas as obras de arte, e a nada mais um denominador comum, por

    assim dizer, que constitui a definio de arte [...].

    No entanto, a partir da segunda metade do sculo XX, essa tentativa de apresentar uma definio real de arte e levar adiante a agenda da teoria esttica passou a ser desacreditada e desencorajada por vrios pensadores. Dentre eles, um dos pioneiros, e possivelmente o mais influente, estava Weitz, que props como objetivo principal de seu artigo sobre o papel da teoria na esttica mostrar a impossibilidade lgica e no uma mera contingncia histrica de se apresentar qualquer tipo de definio real para o conceito arte:

    A teoria esttica toda ela est errada em princpio ao pensar que uma teoria correta poss

    vel [...] Sua afirmao central de que arte passvel de uma definio real ou de outro tipo de

    definio verdadeira falsa. Sua tentativa de descobrir as propriedades necessrias e suficien

    tes da arte logicamente ilegtima pela simples razo de que tal conjunto jamais aparecer,

    nem, consequentemente, alguma frmula dele. A arte, como mostra a lgica do conceito, no

    tem nenhum conjunto de propriedades necessrias e suficientes; assim, uma teoria acerca dela

    logicamente impossvel e no apenas factualmente difcil (WEITZ, 1956, p. 2728).

    Conforme veremos a seguir, o principal argumento de Weitz para provar seu ponto ancorase em sua compreenso de que o mundo da arte como um conjunto de dados em constante e imprevisvel expanso e, sendo assim, poderamos dizer e o que ser destacado mais adiante que somente um sistema conceitual escalvel (algo que a concepo definicional clssica certamente no ) poderia assimillo adequadamente. Vejamos antes, porm, como a argumentao de Weitz, partindo de algumas ideias retomadas do filsofo austraco Ludwig Wittgenstein, veio a se colocar frontalmente em oposio ao projeto tradicional das teorias estticas.

    A CRTICA DE WEITz AO PROjETO DEFINICIONAL CLSSICO E O PROBLEMA DA ESCALABILIDADE

    Segundo o texto das Investigaes filosficas, a mais importante e conhecida obra da segunda fase do pensamento de Wittgenstein9, a tarefa da filosofia consiste basicamente na

    9 O pensamento de Wittgenstein tradicionalmente dividido em duas fases bastante distintas. O que parece existir de comum em ambas a ideia de que a principal contribuio da filosofia ao conhecimento est em entender como funciona a lgica da

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    elucidao da relao que h entre o uso da linguagem (seu uso de fato) e as condies sob as quais ela adequadamente utilizada, e no na busca de essncias ocultas por trs de seu uso pelos falantes das lnguas naturais. E exatamente sob influncia desse modelo de investigao filosfica que Weitz (1956, p. 30) vai sugerir que o conceito arte e sua lgica devem ser pensados e explorados:

    Se me permitido parafrasear Wittgenstein, no devemos perguntar qual natureza de

    um certo x filosfico [...] devemos antes perguntar Qual o uso ou funo de x?, Qual

    a funo que x desempenha na linguagem? [...] Desse modo, nosso primeiro problema na

    esttica o da elucidao do emprego efetivo do conceito arte, de modo a fornecer uma

    descrio lgica da funo do conceito, incluindo uma descrio das condies sob as quais

    o usamos corretamente [...].

    Guiado por essa perspectiva, Weitz ressalta que a ateno aos usos efetivos do conceito arte, especialmente na composio da expresso obra de arte, mostra que ele pode ocorrer tanto como um termo meramente descritivo quanto como um termo avaliativo10. Em seu uso descritivo, arte tem unicamente uma funo taxonmica, de classificao de objetos. assim, por exemplo, que empregamos as expresses arte ou obra de arte para dizer que um objeto considerado arte independentemente de o apreciarmos ou no, independentemente de ser boa arte ou no. J quando dizemos a respeito de um trabalho que apreciamos que ele uma obra de arte, ou que ele que arte, a ocorrncia desses termos envolve um juzo de valor. A diferena que a anlise de Weitz destaca entre o uso descritivo e o uso avaliativo do conceito arte fundamental para sua argumentao, j que ele entende que todas as tentativas de apresentar uma definio real desse conceito confundem esses dois usos, sempre privilegiando seu uso avaliativo. Mas, em seu uso avaliativo, as condies de aplicao do conceito arte no podem ser adequadamente descritas, uma vez que tal uso remete apenas a certas preferncias estticas, o que acaba por excluir outras propriedades relevantes para a identificao de objetos artsticos.

    No existe nada de errado com o uso avaliativo; [...] Mas o que no pode ser mantido

    que teorias do uso avaliativo de arte sejam definies reais e verdadeiras das proprieda

    linguagem; no entanto, a maneira como a compreenso dessa lgica articulada em cada uma dessas fases mostra a radicalidade do afastamento do segundo Wittgenstein com relao ao primeiro. Na primeira fase, associada principalmente obra Tractatus Logico-Philosophicus, publicada em 1921, o autor defende que a linguagem tem uma essncia nica e que ela uma espcie de espelho da realidade. Na segunda, por sua vez, associada a textos como as Investigaes filosficas, publicado postumamente em 1953, Wittgenstein prope que a lgica da linguagem nada mais do que uma pluralidade incomensurvel de jogos, isto , de prticas sociais que condicionam todo e qualquer significado lingustico.

    10 Essa distino tambm aceita por George Dickie (1971, p. 43).

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    des necessrias e suficientes da arte. Em vez disso, elas so, pura e simplesmente, defini

    es honorficas nas quais o conceito arte foi redefinido a partir de um critrio escolhido

    (WEITZ, 1956, p. 35).

    No entanto, quando tomado em seu sentido meramente descritivo, o que se observa que o conceito arte revelase extremamente flexvel, mutvel e abrangente. Novos gneros artsticos e obras de arte absolutamente inovadoras surgem de tempos em tempos, ressalta Weitz. E mesmo diante dessa grande variao e transformao, o conceito arte continua sendo empregado significativamente e abarcando esses novos objetos e atividades. Assim, mais uma vez a ateno ao uso do conceito arte, agora especificamente em seu sentido descritivo o nico sentido que pode apontar adequadamente suas condies de aplicao conduz compreenso de uma importante caracterstica de sua lgica: arte um conceito aberto, isto , um conceito cujas condies de aplicao so reajustveis e corrigveis (WEITZ, 1956, p. 31). em virtude dessa caracterstica empiricamente apreensvel do conceito arte que decorre, entende Weitz, a impossibilidade de qualquer definio que feche o conceito e estabelea condies necessrias e suficientes para seu uso. Da sua tese, j citada, de que A teoria esttica, toda ela, est errada [...] uma vez que adultera radicalmente a lgica do conceito arte (WEITZ, 1956, p. 2728). E o principal argumento de Weitz (1956) para fundamentar essa tese consiste exatamente em chamar a ateno para o fato de que o conceito arte exige abertura, exige a possibilidade de se ajustar ao surgimento de situaes no previstas, a situaes que independem de qualquer tipo de regra ou restrio, sob pena de um fechamento desse conceito excluir as prprias condies de criatividade na arte:

    Novas condies (novos casos) surgiram e certamente continuaro a surgir; aparecero

    novas formas de arte, novos movimentos, que exigiro uma deciso [...] de se o conceito

    deve ou no ser alargado. [...] O que estou argumentando, ento, que o prprio carter ex

    pansivo e empreendedor da arte, sua sempre constante mudana e novas criaes, tornam

    logicamente impossvel garantir qualquer conjunto de propriedades definidoras (WEITZ,

    1956, p. 32).

    A argumentao de Weitz evidencia, pois, uma conscincia bastante clara por parte do filsofo no que diz respeito s grandes e, em muitos casos, radicais transformaes ocorridas na arte a partir das ltimas dcadas do sculo XIX e incio do sculo XX. J os trabalhos de Vincent Van Gogh, Henri Matisse, Pablo Picasso, Wassily Kandinski, Paul Klee, Marcel Duchamp e tantos outros na pintura e na escultura, alm das contribuies de James Joyce, Virginia Woolf, John Dos Passos na literatura, de Bertolt Brecht no teatro, de Igor Stravinski e Arnold Schnberg na msica, de Walter Gropius na arquitetura, haviam proporcionado episdios de verdadeira revoluo nas artes at a primeira metade do sculo XX. E, nos anos

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    que viriam a seguir, o fazer artstico enveredaria por caminhos ainda mais imprevisveis e diversificados, assim descritos pelo historiador da arte Hershel B. Chipp (1996, p. 509): O perodo contemporneo, iniciado por volta de 1945, vem assistindo a transformaes excepcionalmente drsticas, mesmo num sculo caracterizado por revolues em todas as reas da cultura, da sociedade e da poltica. Ou, mais recentemente, nas palavras do historiador da arte Terry Smith (2011, p. 176):

    [A] arte contempornea no mais um tipo de arte, nem apresenta um conjunto limitado

    de propriedades de alguma maneira distinto daquelas da arte dos perodos passados da

    histria da arte, ainda que contnuo em relao a esta. Ela no supe um desenvolvimento

    histrico inevitvel; ela no tem expectativa de que a presente confuso virtualmente vai se

    constituir em um estilo representativo deste momento histrico. Se voc est esperando pe

    la prxima grande narrativa, provavelmente voc est fazendo isso em vo. A arte contem

    pornea mltipla [...] e imprevisvel (quer dizer, diversa) como o prprio contemporneo.

    Portanto, justamente a compreenso que Weitz tem dessa dimenso extremamente mutvel e expansiva da arte que o leva a considerar o modelo clssico de definio estril para dar conta do irrefrevel aumento quantitativo e qualitativo das produes artsticas. Em outras palavras, o que Weitz pe em relevo por meio de sua argumentao o fato de que o sistema de conceitos especificamente o conceito arte construdos a partir do modelo definicional clssico no um sistema escalvel e, assim sendo, sua incapacidade de permanecer funcional inevitavelmente vem superfcie diante da constante e acelerada ampliao dos dados artsticos, isto , as obras de arte.

    Mas se, conforme defende Weitz, a teoria esttica tradicional altera a lgica do conceito arte, em que consiste essa lgica, isto , qual a concepo correta de como esse conceito efe tivamente opera em nossos processos de categorizao? Essa concepo correta seria capaz de dar conta do desafio da escalabilidade teoria esttica, ou seja, a necessidade de elaborao de uma teoria definicional capaz de abarcar o fenmeno da ampliao e variao imprevisvel das obras de arte? Nesse mesmo artigo, Weitz prope, outra vez retomando o pensamento do segundo Wittgenstein, que, para se lidar adequadamente com essa irrefrevel expanso do domnio da arte, a lgica do conceito arte deve ser concebida a partir da noo de semelhanas de famlia (family resemblances) e no mais a partir do modelo clssico, isto , da conjuno de condies necessrias e suficientes de sua aplicao. Mas em que consiste essa noo de semelhanas de famlia? De que maneira ela pode evitar as limitaes da concepo clssica orientada pela busca de definies reais? Ou ainda, de que maneira o recurso lgica das semelhanas de famlia poderia se apresentar como uma alternativa vlida ao modelo clssico e, desse modo, superar o desafio da escalabilidade colocado pelo mundo da arte? No que segue, exploraremos essas questes.

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    A PROPOSTA DE WEITz PARA A SuPERAO DO DESAFIO DA ESCALABILIDADE

    Segundo as Investigaes filosficas de Wittgenstein, a linguagem no possui uma estrutura formal subjacente aos fenmenos lingusticos; desse modo, o que explica o fato de um mesmo termo se aplicar aos mais variados casos especficos no uma essncia por trs desse uso, mas sim a presena de cadeias de semelhanas entre os vrios objetos aos quais se espera que um certo conceito se aplique. Dito de outro modo, para ele a lgica que governa as relaes entre os conceitos e os objetos referidos pelos conceitos no aquela proposta por Plato nos dilogos, segundo a qual os conceitos (linguisticamente instanciados por meio dos nomes gerais) remetem a algo essencial, mas sim uma lgica determinada pela relao de semelhanas de famlia e decorrente do uso efetivo desses conceitos pelos usurios das lnguas naturais. Como ilustrao dessa ideia, o filsofo austraco prope uma reflexo a respeito do emprego do conceito jogo:

    Considere, por exemplo, os processos que chamamos de jogos. Refirome a jogos de ta

    buleiro, de cartas, de bola, torneios esportivos, etc. O que comum a todos eles? No diga:

    Algo deve ser comum a eles, seno no se chamariam jogos , mas veja se algo comum

    a eles todos pois, se voc os contempla, no ver na verdade algo que fosse comum a

    todos, mas ver semelhanas, parentescos, e at uma srie deles. [...] No posso caracterizar

    melhor essas semelhanas do que com a expresso semelhanas de famlia; pois assim se

    envolvem e se cruzam as diferentes semelhanas que existem entre os membros de uma

    famlia: estatura, traos fisionmicos, cor dos olhos, o andar, o temperamento, etc., etc. E

    digo: os jogos formam uma famlia (WITTGENSTEIN, 1979, p. 3839).

    Assim, aquilo que os essencialistas acerca da linguagem acreditam ser um conjunto de propriedades necessrias e suficientes existentes em todos os objetos que caem sob um conceito nada mais , segundo Wittgenstein, do que uma rede de semelhanas constituda de caractersticas que se sobrepem e se entrecruzam de maneiras variadas, em maior ou menor grau. Pifpaf, por exemplo, um jogo de cartas, assim como pacincia; mas um jogado por uma nica pessoa e o outro no. Futebol um jogo, assim como pifpaf e pacincia, mas no um jogo de cartas. Futebol se joga com uma bola, assim como o polo aqutico; mas este se joga dentro de uma piscina, enquanto o outro no. H, pergunta Wittgenstein, algo visvel comum a todos eles, a todos os jogos de que possamos nos lembrar ou imaginar? Segundo Wittgenstein, por mais que observemos, no encontraremos nenhuma propriedade comum existente em todos os jogos, mas sempre a ocorrncia (e recorrncia) de certas semelhanas e a ausncia de outras.

    Isso que Wittgenstein afirma ocorrer com o conceito de jogo ocorre tambm, enfatiza Weitz, com o conceito de arte: se olharmos para todos os gneros e objetos artsticos, ja

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    mais encontraremos uma natureza comum, uma nica propriedade presente em todos eles, mas apenas semelhanas de famlia, cadeias de similaridades. Portanto, a classificao de um novo objeto como arte exige apenas que ele apresente certas semelhanas com casos de objetos j considerados como arte casos paradigmticos de arte. Uma nova atividade pode ser considerada um jogo se ela apresentar semelhanas com aquelas atividades que j consideramos como jogos. Assim:

    [A] semelhana bsica entre esses conceitos [arte e jogo] sua textura aberta. Ao elu

    cidlos, alguns casos (paradigmticos) podem ser dados, casos acerca dos quais no pode

    haver dvidas ao serem descritos como arte ou jogo; mas nenhum conjunto exaustivo

    de casos pode ser apresentado (WEITZ, 1956, p. 31).

    Portanto, ao recorrer noo wittgensteineana de semelhanas de famlia, Weitz parece deixar registrado que nenhum mistrio com relao identificao e reconhecimento de objetos como obras de arte surge em decorrncia de sua refutao do projeto definicional da teoria esttica clssica: Saber o que arte no apreender uma essncia manifesta ou latente, mas ser capaz de reconhecer, descrever e explicar aquelas coisas a que chamamos arte em virtude de certas similaridades (WEITZ, 1956, p. 31). A definio real do conceito arte impossvel de ser obtida, mas o reconhecimento de quais objetos so obras de arte (em sentido descritivo) perfeitamente realizvel. A lgica do conceito arte, assim a anlise de Weitz pretende destacar, apresenta uma estrutura aberta ou seja, sem quaisquer condies necessrias e/ou suficientes pressupostas em sua aplicao , cujo emprego adequado se orienta pela presena de semelhanas de famlia entre os objetos por ele referidos. Em virtude dessa estrutura aberta, o alargamento ou no do conceito de modo a abarcar novos casos sempre o resultado de uma opo pragmtica, de uma considerao a respeito de se um novo conjunto de propriedades deve ser acrescentado rede de similaridades j mais consolidada ou no. Nas palavras de Weitz (1956, p. 32):

    Com [o conceito] arte, suas condies de aplicao jamais podem ser exaustivamente

    enumeradas, uma vez que novos casos sempre podem ser considerados ou criados pelos

    artistas, ou at mesmo pela natureza, o que demandaria por parte de algum uma deciso

    de estender ou de fechar o conceito antigo e inventar um novo conceito (p. ex.: Isto no

    uma escultura, um mobile).

    Em sntese, vimos que o principal argumento de Weitz em favor da impossibilidade de se definir o conceito arte (definio clssica) repousa principalmente sobre a constatao de que a atividade artstica absolutamente mutvel e imprevisvel e que, por conta dessas caractersticas do fazer artstico, no possvel apontar condies necessrias e suficientes

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    de sua aplicao sem que isso restrinja a originalidade da prpria criao artstica. A soluo que o autor apresenta para se pensar a possibilidade de uma teoria esttica passa, ento, pela introduo da noo de semelhanas de famlia: podemos dar conta dessa mutabilidade da arte ao abrir mo das definies reais e reconhecer que a identificao e descrio do que arte e o que no depende de conjuntos de propriedades semelhantes compartilhadas pelos objetos artsticos. Assim, ao recorrer ideia de semelhanas de famlia, o filsofo apresenta uma explicao de como opera o nosso sistema conceitual, especificamente no que diz respeito ao uso do conceito arte. E esse uso escalvel? Tudo indica que sim, na medida em que qualquer novo objeto artstico, por mais inusitado que seja, pode se assemelhar em alguns aspectos a outros objetos reconhecidos como arte e assim ser abarcado pelo conceito arte. Sendo aberto, como diz Weitz, esse conceito pode se ajustar a quaisquer novas demandas, sempre com base nas similaridades entre casos j existentes e, em ltima instncia, a casos paradigmticos, ou seja, casos a respeito dos quais no paira qualquer tipo de dvida acerca da aplicabilidade do conceito em questo.

    No entanto, a ideia de que o uso efetivo das expresses arte e obra de arte exige uma abertura conceitual que impossibilita qualquer tipo de definio real tem sido, j h algumas dcadas, presa de vrios tipos de objees. Essas objees, porm, no sero abordadas aqui11. Mas, alm das crticas ao argumento do conceito aberto, tambm a utilizao da ideia de semelhanas de famlia e semelhana a casos paradigmticos para explicar a aplicao do conceito arte (isto , o sucesso na identificao das obras de arte) tem sido amplamente questionada. Como justamente o recurso noo de semelhanas de famlia o que mais nos interessa aqui, j que o desafio da escalabilidade parece aproximarse de uma soluo quando levamos em conta essa abordagem, apresentarei a seguir algumas objees a essa abordagem que certamente colocam em xeque o rigor formal dessa abordagem.

    Arthur Danto (2005), por exemplo, insistiu sistematicamente que a simples presena de semelhanas sensorialmente perceptveis, independentemente de seu grau ou quantidade, no poderia ser adotada como um critrio seguro para nos ajudar a decidir se um certo objeto ou no uma obra de arte. E isso porque muitas vezes obras de arte e meros objetos reais como os chama Danto revelamse pares perceptualmente indistinguveis entre si. Nesse sentido, os ready-mades de Marcel Duchamp so colocados em destaque ao longo de sua argumentao: ora, obras como A Fonte so semelhantes em todos os aspectos a outras peas sanitrias oriundas da mesma linha de produo que ela, mas apenas uma delas foi e uma obra de arte. Da a curiosidade de Danto (2005, p. 39) em entender por que essa obra passou de mera coisa a obra de arte, porque aquele urinol especfico mereceu to impressionante promoo, enquanto outros urinis obviamente idnticos a ele continuaram relegados a uma categoria ontologicamente degradada. Mas entre os exemplos prediletos do

    11 Para um apanhado dessas objees, ver Davies (1991, p. 1422) e Carroll (2000, p. 89).

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    autor est o das Caixas Brillo de Andy Warhol, trabalho que praticamente indistinguvel de um conjunto de caixas utilizadas para o transporte de barras de sabo. Sobre essa obra, Danto (1964, p. 581) afirmou:

    Pouco importa se as caixas Brillo no so boas, menos ainda se so grande arte. O que

    impressiona que elas sejam arte. Mas, se so arte, por que as caixas Brillo que esto no

    armazm e so indiscernveis daquelas tambm no so? Ou ser que a distino completa

    entre arte e realidade desmoronou?

    Alm desses exemplos retirados da histria da arte do sculo XX, Danto prope uma srie de experimentos de pensamento que mostram a possibilidade de criao de objetos comuns indistinguveis de obras de arte tidas como paradigmticas, mas que simplesmente no so obras de arte (como, por exemplo, a possibilidade de criao de uma tela visualmente idntica pintura O cavaleiro polons, de Rembrandt, mas produzida ao acaso por um lanador de tintas mecnico cf. DANTO, 2005, p. 7172). Vale notar que esses experimentos de pensamento elaborados por Danto e suas observaes sobre a arte contempornea vo de encontro a um outro experimento de pensamento, j famoso na literatura sobre o assunto, que apresentado em favor da rejeio do projeto definicional caracterstico da teoria esttica clssica. Tratase do experimento proposto pelo filsofo William Kennick (1950), outro autor reconhecidamente influenciado pelo pensamento antiessencialista de Wittgenstein12, envolvendo a situao de um armazm repleto de objetos variados e uma pessoa instruda a retirar de l apenas as obras de arte. Segundo Kennick (1950, p. 322), essa pessoa seria capaz de fazer isso com um sucesso bem razovel, apesar do fato de [...] no possuir uma definio satisfatria de arte. [...] ela conheceria uma obra de arte quando visse uma. Mas a verdade que, diante de obras de arte contempornea, dificilmente essa pessoa poderia se guiar com xito em sua tarefa mediante um apelo ideia de semelhana a casos paradigmticos; para descobrir quais objetos do armazm seriam obras de arte e quais no, semelhanas simplesmente no bastariam, mas seria necessrio um conhecimento de algo que, para citar Danto (1964, p. 580), os olhos no podem encontrar uma atmosfera de teoria artstica, um conhecimento de histria da arte: um mundo da arte.

    Outro problema relacionado ao modelo explicativo baseado na noo de semelhana a casos paradigmticos que a ideia de semelhana muito vaga, j que, em certo sentido, qualquer coisa semelhante a qualquer coisa. Uma estrela semelhante a uma lesma, na medida em que ambas so objetos materiais; um vagalume semelhante a uma lesma, j que ambos so animais, e o vagalume tambm semelhante estrela, pois ambos possuem

    12 Alm de Morris Weitz (1956) e William Kennick (1950), Paul Ziff (1953) tambm deve ser mencionado como um dos principais proponentes do antiessencialismo em esttica.

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    luz prpria. Desse modo, chamar a ateno para a existncia de semelhanas entre objetos algo estril a menos que se indiquem especificamente quais semelhanas so relevantes. No entanto, ao se fazer isso, novamente o projeto definicional clssico de buscar condies necessrias e suficientes de aplicao para a aplicao de um conceito volta a ocupar um lugar central na teoria esttica.

    Em George Dickie (1984) podemos encontrar outra objeo bastante incmoda para a argumentao positiva de Weitz: a quais obras de arte so semelhantes as primeiras obras de arte? Como elas puderam ser classificadas como obras de arte independentemente do recurso a casos paradigmticos anteriores? Nas palavras de Dickie (1984, p. 32): [a teoria de Weitz] requer um regresso ao infinito das obras de arte, isto , ao assumir que o reconhecimento e a identificao de uma nova obra de arte dependem da constatao da presena de semelhanas em relao a outro objeto anteriormente admitido como obra de arte, a teoria tambm teria de assumir que este objeto anterior s pde ser reconhecido como arte em virtude da constatao de suas semelhanas com outro caso de objeto artstico, o qual, por sua vez,... e, assim, ad infinitum. Teramos ento que, a fim de bloquear o regresso, assumir a existncia de obras de arte primeiras, originrias. Mas que outra caracterstica, alm do fato de existirem semelhanas de famlia, poderia nos levar a reconheclas como obras de arte? Se Weitz respondesse que a identificao das primeiras obras de arte como tais s pode ser realizada posteriormente, isto , comparando essas obras primitivas com casos posteriores, ainda assim ficaramos com o problema de determinar a quais obras de arte aqueles objetos reconhecidos como os primeiros casos paradigmticos (ainda que historicamente posteriores) puderam ser comparados para ter reconhecido seu estatuto de obras de arte.

    Portanto, a sugesto de Weitz de que a lgica do conceito arte deve ser pensada a partir da ideia de semelhanas de famlia, apesar de evitar as aparentes limitaes da concepo clssica diante do desafio da escalabilidade, ao incorrer em uma srie de problemas envolvendo sua coerncia terica revelase bastante frgil. Permanece, ento, a necessidade de formulao de uma teoria esttica capaz de lidar com o desafio da escalabilidade de maneira formalmente mais rigorosa.

    ConSIdeRaeS fInaIS

    O desafio da escalabilidade teoria esttica, vimos h pouco, envolve dificuldades considerveis, principalmente quando dirigimos nosso olhar para o fazer artstico contemporneo. O universo das artes cresce de maneira exponencial, empregando os mais variados tipos de materiais, linguagens, abordagens e legitimando os mais diversos gneros de atividades. De que maneira, ento, a linguagem terica, entendida como um sistema conceitual, poderia dar conta dessa expanso vertiginosa e diversificada? No seria a escalabilidade algo dese

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    jvel tambm a esse sistema? Certamente. Mas como a linguagem terica poderia empregar de maneira eficaz e ao mesmo tempo rigorosa o conceito arte de modo a garantir sua funcionalidade (quer dizer, aplicabilidade sem trivializao) mesmo quando confrontada com constante ampliao e mudanas completamente inesperadas nesse domnio?

    Apesar da grande quantidade de crticas dirigidas teoria esttica antiessencialista de Weitz muitas delas sequer mencionadas aqui , em anos recentes suas inspiraes wittgensteineanas receberam um novo olhar, destacando um aspecto tangencialmente presente em seu texto e tambm em algumas das crticas que ele recebeu e um aspecto certamente presente no trabalho do segundo Wittgenstein. Tratase da noo de conceito agregativo (cluster concept)13. A ideia de conceito agregativo foi objeto de importantes reflexes por parte do filsofo John Searle, principalmente no desenvolvimento de sua teoria acerca da semntica dos nomes prprios no artigo Nomes prprios, publicado em 1958. Mas foi Berys Gaut (2000) que apresentou, pela primeira vez de modo explcito, a possibilidade de compreenso do conceito arte a partir do modelo de conceito agregativo. Esse modelo se apresenta como uma teoria mais rigorosa e, desse modo, bem mais promissora do que a abordagem baseada na noo de semelhanas de famlia. Examinlo criticamente tornase, portanto, um passo importante na explorao das relaes entre escalabilidade e teoria esttica. Porm, em virtude da limitao dos objetivos que este artigo se props a perseguir aqui, esse passo ter de ser dado em outra oportunidade.

    the scalability challenge to aesthetic theory and the comprehension of concept art through wittgensteinean model of family resemblances

    abstract Despite some imprecision involving the determination of its meaning, the term scalability can be

    used to denote the ability that a system must have in order to remain functional in the face of its constant da

    tabase expansion. In this sense, the dizzying proliferation and intense diversification of artistic objects within

    contemporary art can be seen as a source of a scalability problem involving the effectiveness of definitional

    systems in aesthetic theory (in particular with regard to the issue of the classical definition of the concept art).

    One possible way to overcome this scalability challenge to aesthetic theory is the abandonment of the classic

    definitional model in favor of an explanatory model based on the wittgensteinean conception of family resem

    blances. The goal of this work is, therefore, to critically explore this possibility.

    Keywords: Art. Classic definition. Scalability. Family resemblances. Aesthetic theory.

    13 Apesar de associada a John Searle, os rtulos de conceito agregativo e teoria agregativa para designar o tipo de concepo desenvolvida pelo filsofo em seu artigo de 1958 no surgem em seus trabalhos. Muito provavelmente as expresses se originam nas crticas de outro filsofo estadunidense, Saul Kripke, o qual dirigiu duras crticas a essa teoria semntica em seu Namning and necessity, originalmente publicado em 1972.

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