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CIBELE ADRIANA PERINA AGUIAR
O DIÁLOGO ENTRE LINGUAGENS NO ENSINO DE
LÍNGUA MATERNA: OS PERCURSOS DE UMA
PROFESSORA E SEUS ALUNOS – LEITORES EM
FORMAÇÃO - NA TESSITURA DA LEITURA
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
UNISAL
Americana
2010
1
CIBELE ADRIANA PERINA AGUIAR
O DIÁLOGO ENTRE LINGUAGENS NO ENSINO DE
LÍNGUA MATERNA: OS PERCURSOS DE UMA
PROFESSORA E SEUS ALUNOS – LEITORES EM
FORMAÇÃO - NA TESSITURA DA LEITURA
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação do Centro Universitário
Salesiano de São Paulo – UNISAL, como
requisito parcial para a obtenção do título
de Mestre em Educação, sob a Orientação
do Prof. Dr. Severino Antônio Moreira
Barbosa.
UNISAL
Americana
2010
2
Autor: Cibele Adriana Perina Aguiar
Título: O diálogo entre linguagens no ensino de língua materna: os percursos de uma
professora e seus alunos – leitores em formação - na tessitura da leitura
Dissertação apresentada como
exigência parcial para a obtenção do
grau de Mestre em Educação.
Trabalho de conclusão de curso defendido e aprovado em 27/02/2010 pela comissão
julgadora:
_____________________________________________________
Prof. Dr. Severino Antonio Moreira Barbosa (orientador- UNISAL)
_____________________________________________________
Prof. Dr. Luís Antonio Groppo (membro interno – UNISAL)
______________________________________________________
Profª. Drª. Josiane Maria de Sousa (membro externo – UNIMEP)
3
AGRADECIMENTOS
Chega o momento de agradecer aos que me conduziram para este percurso.
Agradeço primeiramente a Deus, por minha fé.
Aos que participaram da minha história.
À minha família: meu marido e filhas, por compreenderem minha ausência,
mesmo quando presente, pela paciência e a certeza de que eu iria chegar ao final
desta caminhada.
À minha mãe e irmãos, que sempre torceram por mim, em especial minha irmã,
que ficou mais próxima deste percurso, me motivando.
Ao meu pai, que junto aos meus avós, na casa eterna, retornavam a minha
memória e falavam palavras doces e imperativas ao meu ouvido.
À amiga Yara, companheira discente desde a graduação, por nossas
discussões teóricas online e pessoalmente, leitora fiel de meu texto.
À minha querida amiga, desde a graduação, Camila, que caminhou ao meu
lado na docência, que acolheu o Projeto Caçadores de nuvens, junto a seus alunos.
Ainda, por ter sido interlocutora de meu texto.
Aos amigos, que souberam entender meus momentos de reclusão, para a
leitura, e os de anseio, para compartilhar os textos lidos e a minha produção.
Aos professores que fizeram parte de minha formação. Em especial a duas
professoras, a Jô, que soube ampliar meu gosto pela leitura da literatura e de suas
vertentes; a Beth, a quem chamo carinhosamente de Mestra e que me fez debruçar
sobre os textos e me fez produzi-los amparada pela perspectiva teórica.
Aos meus alunos, que me ensinaram a ensinar e me fazem uma docente que
não deixa de buscar novas práticas.
À escritora Marina Colasanti, por sua delicadeza.
À diretora Silmara e ao coordenador Jefferson, por permitirem que este
trabalho fosse desenvolvido no lócus escolar.
4
À coordenadora Rejane, por colaborar com o Projeto Expressões idiomáticas
em artes visuais, por meio de seus conhecimentos de informática e por sempre me
incentivar nos demais trabalhos.
Ao professor Norberto, por ter me iniciado no meu amor as artes, nas suas
aulas de Educação Artística, e hoje ser meu colega de trabalho, colaborando com o
Projeto Um tigre de papel, junto a nossos alunos.
Às professoras Cláudia Beatriz, Cláudia Regina e Patrícia, que participaram e
acolheram o Projeto Caçadores de nuvens, junto a seus alunos, da série final do
Ensino Fundamental Ciclo I.
Aos demais professores e colegas de trabalho, pela convivência diária.
Aos professores e amigos de mestrado. Ao Groppo, por aceitar fazer parte de
minha banca e ser atencioso e pronto a responder aos meus questionamentos. Em
especial ao casal Paulo e Líris, o primeiro, por me questionar e assim me orientar para
a pergunta que respondi nesta pesquisa e a segunda, por seu amor à profissão e aos
amigos, e desapego à materialidade da vida. E em particular ao meu orientador, que
me fez olhar para a minha práxis e me apresentou a vários autores. Ele que me
lembra muito duas figuras literárias, o professor de Como um romance (Daniel
Pennac) e a Dom Quixote, este último por sua semelhança à personificação em
bronze, com a qual eu brincava na sala-de-estar. Ele que severinamente sempre me
diz que o meu fazer docente parece ficção.
A Josiane, por me orientar para muitas leituras que compõe este trabalho e
aceitar fazer parte de minha Banca, dando continuidade a sua participação na minha
formação docente e na minha vida.
A todos vocês, o meu apreço e amizade.
5
PERCURSOS
Vivo no universo da palavra do outro. E toda minha vida consiste em conduzir-me nesse universo, em reagir às palavras do outro (as reações podem variar infinitamente), a começar pela minha assimilação delas (durante o andamento do processo do domínio original da fala), para terminar pela assimilação das riquezas da cultura humana (verbal ou outra). A palavra do outro impõe ao homem a tarefa de compreender esta palavra (tarefa esta que não existe quando se trata da palavra própria, ou então
existe numa acepção muito diferente). BAKHTIN, M.,2000,p.383
As palavras se dividem, para cada um de nós, em palavras pessoais e palavras do outro, mas as fronteiras entre essas categorias podem ser flutuantes, sendo nas fronteiras que se trava o duro
combate dialógico. BAKHTIN, M.,2000,p.384
A intenção comunicativa de todo artista não é determinada por um sentido único; diz respeito a uma significação geral, possível de ser compreendida de modos variados pelos homens de todos os tempos e
lugares. (AGUIAR, 2004,p.16-18)
Na literatura e na escritura do texto literário encontramos o senso de nós mesmos e da comunidade a que pertencemos. A literatura nos diz o que somos e nos incentiva a desejar e a expressar o mundo por nós mesmos. E isso se dá porque a literatura é uma experiência a ser realizada. (COSSON, 2006,p.17)
A literatura pode muito. Ela pode nos estender a mão quando estamos profundamente deprimidos, nos tornar ainda mais próximos dos outros seres humanos que nos cercam, nos fazer compreender
melhor o mundo e nos ajudar a viver. Não que ela seja, antes de tudo, uma técnica de cuidados para com a alma; porém, revelação do mundo, ela pode também, em seu percurso, nos transformar a cada
um de nós a partir de dentro. (TODOROV, 2009 p. 76)
Todo retrato é, em certo sentido, um auto-retrato que reflete o espectador. Como “o olho não se contenta em ver”, atribuímos a um retrato as nossas percepções e a nossa experiência. Na alquimia do
ato criativo, todo retrato é um espelho. (MANGUEL, 2001, p.177)
Toda imagem fotográfica tem atrás de si uma história. Se, enquanto documento, ela é um instrumento de fixação de memória e, neste sentido, nos mostra como eram os objetos, os rostos, as ruas, o mundo, ao mesmo tempo, enquanto representação, ela nos faz imaginar os segredos implícitos, os enigmas que
esconde, o não manifesto, a emoção e a ideologia do fotógrafo. (KOSSOY, 2005, p.41)
Enfim, os fatos sem símbolos não preenchem os espaços do olhar, até porque nem toda imagem precisa de uma explicação. Portanto está neste interregno – entre o ver e o posteriormente mirar – a
eternidade dessa imagem criada por Charles Robinson. (OLIVEIRA, 2008 p.42)
6
RESUMO
A presente pesquisa apresenta o trabalho interlocutivo diante das várias
linguagens, destacando a iconográfica e a entretecendo com a literária, a partir
do fazer docente de uma professora junto a seus alunos, leitores em formação.
O foco do estudo é o quanto o trabalho dialógico com linguagens, no processo
de ensino-aprendizagem, auxilia na formação dos educandos, como o
despertar para a leitura promove o autor, o crítico, enfim o sujeito. Os estudos
desta pesquisa estão para a concepção sócio-interacionista de linguagem, que
marca a de sujeito, a de leitura e a de educação. Para tanto, apóia-se nos
estudos do teórico russo Mikhail M. Bakhtin e no dizer de Rui de Oliveira,
Jonhn Berger, Boris Kossoy, Alberto Manguel, Jonathan Culler, Steven R.
Fischer, Rildo Cosson, entre outros no que tange aspectos peculiares das
linguagens. O trabalho efetiva-se na observação do fazer docente no lócus
escolar, a partir de sua práxis, já que é assim que o professor revela a aliança
entre teoria e prática. Nos percursos da pesquisa tornou-se recorrente a
compreensão de que a linguagem literária colabora com outras linguagens e
estas por sua vez com a literária na constituição do sujeito leitor, que está para
e se faz pela linguagem.
Palavras-chave: Educação – Linguagens – Literatura - Sujeito – Interação
7
ABSTRACT
This research presents the interlocutive work, considering the different
languages, highlighting the ichonographical and mixing it with the literary,
starting from the day by day teaching of a teacher and her students, , readers
which are acquiring their background. The study is focused on how the dialogic
work with languages, on the learning and teaching process, helps on the
students background, how the rousing for the reading process promotes the
author, the critic, at the end, the subject. The studies of this research are linked
to the socio-interactionist of language, which contains the conception of subject,
as well as the conceptions of reader and education. To reach this goal, it
supports itself on the researches of the Russian theorizer Mikhail M. Bakhtin
and on other researchers like Rui de Oliveira, John Berger, Boris Kossoy,
Alberto Manguel, Jonathan Kuller, Steven R. Fischer, Rildo Cosson, among
others, on what concerns to the peculiar aspects of the languages. The work
effects itself on the observation of the day by day teaching on the scholar locus,
starting from her praxis, considering that it is by this way the teacher reveals the
link between theory and practice. On the courses of the research, it was
resorted the comprehension that the literary language collaborates with other
languages and these languages, by their turn, collaborate with the literary
language on the constitution of the reader subject, who is for the languages and
makes him/herself on them.
Key words: Education – Languages – Literature – Subject - Interaction
8
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 Tampo de mesa recuperado com trabalho em
mosaico, para expor trabalhos dos alunos....................
70
FIGURA 2 Mesas externas da escola............................................. 71
FIGURA 3 à 6 Fotonovela ―Uma vela para Dario‖ texto de Dalton
Trevisan adaptado para fotonovela pelos alunos.........
78
FIGURA 7 à 9 Fotonovela ―Gargalhada sinistra‖ texto produzido
pelos alunos..................................................................
78
FIGURA 10 à 14 Apresentação Projeto o livro que li................................ 81
FIGURA 15 Texto legendado para apresentação de leitura
dramatizada – 2007/5ª A – aula de Língua
Portuguesa....................................................................
84
FIGURA 16 à 17 Texto legendado para apresentação de leitura
dramatizada – 2007/7ª C – aula de
Leitura...........................................................................
85
FIGURA 18 à 21 Poema canção como referência para produção de
cenas.............................................................................
87
FIGURA 22 à 27 Projeto Lendo nas sombras.......................................... 90
FIGURA 28 à 30 De um material de divulgação à ficção......................... 91/92
FIGURA 31 Organização para exposição......................................... 109
FIGURA 32 à 38 Organização da exposição............................................ 111/112
FIGURA 39 Expressões Idiomáticas mais votadas.......................... 113
FIGURA 40 à 41 Folder de divulgação da exposição na UNIMEP.......... 115
FIGURA 42 à 44 Fotos da exposição na UNIMEP................................... 116
FIGURA 45 Dedicatória de José Luiz Fiorin..................................... 117
FIGURA 46 Capa do DVD Expressões Idiomáticas......................... 118
FIGURA 47 Relato com autoanálise aluno Richard B. Francisco..... 120
FIGURA 48 Relato com autoanálise aluna Sthephanie Rodrigues
Amaral de Moura...........................................................
121
FIGURA 49 Relato com autoanálise da aluna Jéssica Gonçalves... 122
FIGURA 50 Relato com autoanálise da aluna Elinéia P. do
Nascimento...................................................................
123
FIGURA 51 Relato com autoanálise da aluna Pollyanna Garcia
Vilarino.......................................................................
124
FIGURA 52 Relato com autoanálise Maria Carolina B. S. Ribeiro... 125
9
FIGURA 53 Relato das aulas de Língua Portuguesa/2008 do
aluno Allan Fernandes Firmino.....................................
126
FIGURA 54 Relato das aulas de Língua Portuguesa/2008 do
aluno Rafael Rodrigues Alves.......................................
128
FIGURA 55 Relato das aulas de Língua Portuguesa/2008 da
aluna Aline Cristina Felicio............................................
129
FIGURA 56 Relato das aulas de Língua Portuguesa/2008 da
aluna Bárbara F. Antônio..............................................
130
FIGURA 57 Entrevista – Projeto Caçadores de Nuvens.................. 135
FIGURA 58 à 61 Capas dos almanaques................................................. 137
FIGURA 62 Fotografia escolhida para a capa do Almanaque
Revelados os segredos das nuvens.............................
144
FIGURA 63 Fotografia escolhida para o Almanaque Descobrindo
as nuvens......................................................................
144
FIGURA 64 Fotografia da capa do Almanaque Descobrindo as
nuvens...........................................................................
145
FIGURA 65 Nuvens selecionadas para o Almanaque Descobrindo
as nuvens......................................................................
147
FIGURA 66 Nuvens selecionadas para o Almanaque Descobrindo
as nuvens .....................................................................
148
FIGURA 67 Nuvens selecionadas para o Almanaque Revelados
os segredos das nuvens...............................................
149
FIGURA 68 Nuvens selecionadas para o Almanaque Revelados
os segredos das nuvens...............................................
150
FIGURA 69 Nuvens selecionadas para o Almanaque
Desvendando os segredos das nuvens........................
151
FIGURA 70 Nuvens selecionadas para o Almanaque
Desvendando os segredos das nuvens........................
152
FIGURA 71 Nuvens selecionadas para o Almanaque Descobertas
inusitadas......................................................................
153
FIGURA 72 Nuvens selecionadas para o Almanaque Descobertas
inusitadas......................................................................
154
FIGURA 73 à 90 Entrega dos almanaques.............................................. 155/156
FIGURA 91 Texto de aluna da 4ª série B sobre o almanaque da 5ª
A....................................................................................
156
FIGURA 92 à 114 Capas das ilustrações................................................... 167/168
FIGURA 115 Capa do livro Um tigre de papel de Marina Colasanti:
interpretado por seus leitores com contornos e afeto...
170
10
FIGURA 116 à 117 Presentes para a autora Marina Colasanti.................... 171
FIGURA 118 à 124 Páginas do relicário elaborado para Marina Colasanti.. 172/173
FIGURA 125 Dedicatória de Marina Colasanti aos alunos................. 174
FIGURA 126 à 127 Dedicatórias de Marina Colasanti para a professora e
para um aluno...............................................................
174
FIGURA 128 Marcador de texto com foto e dedicatória de Marina
Colasanti.......................................................................
175
FIGURA 129 Marcador de texto - presente da professora aos
alunos............................................................................
180
FIGURA 130 à 137 Ilustração da aluna Jéssica Camargo de
Souza............................................................................
181
FIGURA 138 à 145 Ilustração da aluna Ana Paula Prestes de Almeida...... 182/183
FIGURA 146 à 153 Ilustração da aluna Lilian Matheus Costa..................... 185
FIGURA 154 à 161 Ilustração do aluno Gabriel Diego dos Santos.............. 186
FIGURA 162 à 169 Ilustração do aluno Luis Henrique Lopes Suluay.......... 187
FIGURA 170 à 177 Primeira versão da Ilustração do aluno Cayo Murilo
Casarim Cassiano.........................................................
188
FIGURA 178 à 185 Segunda versão da Ilustração do aluno Cayo Murilo
Casarim Cassiano.........................................................
189
FIGURA 186 à 193 Versão da Ilustração do aluno Cayo Murilo Casarim
Cassiano.......................................................................
190
FIGURA 194 à 201 Ilustração da aluna Priscila Borges Santos................... 191
FIGURA 202 à 209 Ilustração do aluno Wellington de Paula Rocha........... 191
FIGURA 210 à 217 Ilustração da aluna Letícia de Sousa Pereira Nobre..... 192
FIGURA 218 à 225 Ilustração da aluna Carolina Acaiah Reis dos
Santos...........................................................................
192
FIGURA 226 à 233 Ilustração da aluna Isabela Aparecida Rodrigues do
Nascimento...................................................................
192
11
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Relatos de alunos.................................................... 74/75
Quadro 2 Reescrita - De um material de divulgação a ficção.. 93/94
Quadro 3 Avaliação Crônica ―Receita para tirar cavalo da chuva‖ ......................................................................
97/98
Quadro 4 Avaliação Crônica ―Sexa‖......................................... 98/99
Quadro 5 O processo de produção de avaliação na visão dos alunos................................................................
100
Quadro 6 Cartaz ―Passarela Cultural: expressões Idiomáticas em Artes Visuais”..............................
111
Quadro 7 Perguntas para entrevista - Projeto Caçadores de Nuvens.....................................................................
134
Quadro 8 Homenageados dos almanaques - 5ª A e B............ 139
Quadro 9 Homenageados dos almanaques - 5ª C e D............ 140
Quadro 10 Apresentações dos almanaques - 5ª A e B.............. 141
Quadro 11 Apresentações dos almanaques - 5ª C e D............. 142
Quadro 12 Sumários dos almanaques das 5ª séries................. 143
Quadro 13 Texto Um tigre de Papel de Marina Colasanti......... 160
Quadro 14 Divisão do texto Um tigre de Papel de Marina Colasanti..................................................................
162/163/164
Quadro 15 Matriz para ilustração do texto ―Um tigre de papel‖. 165
Quadro 16 Apresentação, elaborada pela professora, do livro de ilustrações...........................................................
176
Quadro 17 Apresentação, elaborada por alunos da 5ª série A, do livro de ilustrações..............................................
177
Quadro 18 Apresentação, elaborada pelos alunos da 5ª série B, do livro de ilustrações..........................................
178
Quadro 19 Apresentação, elaborada por alunos da 5ª série C, do livro de ilustrações..............................................
178
Quadro 20 Apresentação, elaborada por alunos da 5ª série D,
12
do livro de ilustrações.............................................. 179
Quadro 21 O dizer dos alunos sobre leitura.............................. 193
13
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
TESSITURAS: A TRAJETÓRIA DO PROJETO DE PESQUISA E A
DISSERTAÇÃO.............................................................................................
15
CAPÍTULO I
POSICIONAMENTOS E REFLEXÕES: A PRÁXIS .....................................
20
AS LEITURAS TEÓRICAS E LITERÁRIAS; A HORA DE DIZER DA
PRÁXIS – A PÁGINA EM BRANCO..............................................................
20
O SUJEITO, A LINGUAGEM E O SENTIDO................................................. 23
A LEITURA E OS LEITORES........................................................................ 32
LEITURA NO BRASIL, NA ESCOLA, DO PROFESSOR, DO ALUNO.......... 41
AS VÁRIAS LEITURAS.................................................................................. 50
LÓCUS E OS SUJEITOS – CONTEXTOS, SITUAÇÕES.............................. 61
OS PERCURSOS VIVENCIADOS................................................................. 65
CAPÍTULO II
PERCURSOS: AS VIVÊNCIAS QUE MARCAM O ENTRELAÇAMENTO
COM OS PROJETOS ANALISADOS...........................................................
67
PROJETO MOSAICOS.................................................................................. 69
RELATO DAS AULAS DE LÍNGUA PORTUGUESA..................................... 73
PROJETO FOTONOVELA............................................................................. 77
PROJETO O LIVRO QUE LI.......................................................................... 80
PROJETO LEITURA DRAMATIZADA........................................................... 82
14
O POEMA CANÇÃO COMO REFERÊNCIA PARA PRODUÇÃO DE
CENAS ..........................................................................................................
86
PROJETO LENDO NAS SOMBRAS.............................................................. 88
DE UM MATERIAL DE DIVULGAÇÃO À FICÇÃO........................................ 91
ALUNOS AUTORES DE AVALIAÇÃO........................................................... 95
NOVOS PROJETOS TRAÇADOS E/OU DE DESEJO.................................. 101
CAPÍTULO III
PERCURSOS - PROJETOS: DO RASCUNHO AO QUE FOI
DESENHADO................................................................................................
103
PERCURSO 1
PASSARELA CULTURAL: EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS EM ARTES
VISUAIS.........................................................................................................
105
PERCURSO 2
PROJETO CAÇADORES DE NUVENS.........................................................
131
PERCURSO 3
O TEXTO ―UM TIGRE DE PAPEL‖ E SEUS DESDOBRAMENTOS.............
157
CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................... 193
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................. 195
ANEXOS ....................................................................................................... 200
15
INTRODUÇÃO
Construção de significados, mudanças de significados, atribuição de sentidos: partem sempre do texto, são trabalhos de leitura. Numa sociedade onde a leitura não é uma prática social, ler na sala de aula para construir possibilidades, construir significações, torna-se perigosa subversão. Lutar por ela é lutar, onde se está, contra o status quo. (GERALDI, 1988.p.84)
TESSITURAS: A TRAJETÓRIA DO PROJETO DE PESQUISA E A
DISSERTAÇÃO
No início, este projeto de pesquisa pretendia investigar a forma como
os professores, como formadores, tratavam as propostas de leitura
apresentadas nos livros didáticos (LDs). Sendo assim, significava também
investigar as concepções de: sujeito, língua/linguagem, texto/sentido e leitura
destes professores. Ainda, quais as concepções marcadas pelo LD, em suas
orientações para o professor, e como o manual se prontifica a tratar a leitura.
Esta investigação, intitulada “Proposta de leitura no livro didático: da
leitura do professor formador a leitura proposta para o aluno”, estava pautada
em uma anterior efetivada ainda na graduação (iniciação científica), na qual
investiguei as propostas de produção de texto veiculadas nos livros didáticos
de Língua Portuguesa.
Ao longo do mestrado, percebi que a proposta tinha dois entraves. O
primeiro passível de transposição, pois se tratava de obter colaboração de
colegas para a investigação, que se não bem dimensionada poderia mascarar
a situação. Já o segundo intransponível, pois se tratava da falta de ânimo para
tratar deste assunto, pois não o via mais como um desafio.
Ao consultar meu orientador sobre minha aflição encontrei nele a certeza
de que eu já sabia disto desde o início e que faltava aflorar o desejo pelo novo.
16
Assim, sem dar um novo rumo a minha pesquisa, ele mostrou que eu poderia
traçar muitos caminhos e tomar minha decisão.
Sempre demonstrei aos meus alunos as minhas paixões e esta aparente
ingenuidade pedagógica é o que tem me aproximado deles. Sempre escuto
meus alunos e me faço ouvir. Nesta troca, caminhamos. Em depoimentos de
ex-alunos os descubro ainda meus alunos.
Assim, decidi falar de minha prática, olhar para ela, me fazer ouvir além
dos dizeres dos meus alunos.
Para falar da prática se faz necessário focar um tema, pois essa não se
resume a um. Em primeiro lugar, me distanciei de minha prática e olhei para
ela buscando os alicerces teóricos que a abarcavam. Depois, tentei evidenciar
o que se revela nos dizeres dos alunos como aprendizagem para vida, já que
em conversas fora do âmbito escolar, estes relembram de nossas trocas de
conhecimento e demonstram para esta docente que a figura do professor é tão
importante quanto a figura da pessoa que este professor se faz na sala de aula,
já que não se pode desvincular a pessoa do professor e o professor da pessoa
que o faz profissional de ensino. Segundo Jennifer Nias“O professor é a
pessoa; e uma parte importante da pessoa é o professor” (NÓVOA, 1995, p.9).
Porém não falo em parte, mas na essência.
Um novo questionamento começou a me mover, mas sempre que
pensava em escrever, minha paixão por literatura e por linguagem me deixava
sem rumo. A decisão aconteceu quando voltei novamente meu olhar para
minha prática e percebi que o tempo todo conferia uma relação imbricada entre
linguagem e literatura.
Assim, um questionamento nasceu: Em que medida a linguagem literária
colabora para a leitura das várias linguagens? Mas no movimento do
questionamento frente à prática percebi que havia uma mão dupla. Então o
questionamento se refez: Em que medida a linguagem literária colabora para a
leitura das várias linguagens e, por sua vez, em que medida as várias
linguagens colaboram com a leitura da literatura?
Para tentar responder a esta pergunta se faz necessário traçar as
concepções que nortearam a investigação. Quando faço o levantamento
17
percebo que retomo os vocábulos levantados para o meu primeiro projeto:
sujeito, língua/linguagem, texto/sentido e leitura e acrescento literatura.
Sendo assim, fica evidente que sempre estive próxima de escolher este
caminho de investigação, mas faltava olhar para minha práxis.
Esta dissertação procurará tratar da leitura por uma leitora que busca
caminhos para a formação de leitores. A formação será a do âmbito escolar no
qual o que se pensa como educação é o que se dará em sala de aula. Para
esta pesquisadora a educação é tida como referência social e vivencial para os
educandos. É dela que estes se servirão para tecer seus percursos.
Falar de educação é falar dos sujeitos que de maneira processual,
latente, ininterrupta e sem finalização a modulam, harmonicamente ou não.
Desta forma, o sujeito não é revestido de ou pela educação, mas sim investido
e reinvestido ao longo de sua formação contínua, assim o sujeito é um
educando em tempo integral. Vista por este âmbito, a relação sujeito/educação
é vista de maneira ampla e não facetada.
Durante o discurso, sobre as atividades vivenciadas, não serão
apresentados sujeitos que se inscrevem em um ambiente arquitetônico, mas
sujeitos que na escola chegam carregando suas bagagens de vida.
A educação formal é uma das formas de educação, aqui tratarei
predominantemente desta, a que se circunscreve no âmbito escolar e
particularmente nas aulas de Língua Portuguesa e de Leitura.
Predominantemente, pois ao tratar de vivências dadas em sala de aula ou
proporcionadas na, marcarei o sujeito que caminha a partir de sua história em
seu universo/mundo, em suas relações sociais.
E será a partir das vivências com os sujeitos que participaram de minha
história, que ajudaram a escrevê-la e que continuam escrevendo pelo simples
fato de terem participado dela que esta dissertação tratará de minha práxis, no
universo da leitura, na busca da formação de leitores, autores/leitores de suas
histórias.
Assim o lócus de ação será a escola, mas o trabalho docente será para
a constituição do sujeito, não tão e somente o sujeito/aluno. Desta forma, a
18
busca por autonomia, sujeitos autônomos, sociais que se constituem por meio
de e pelo outro.
Neste lócus, atuam educador e educandos. O primeiro entende que a
real faculdade de ser professor não é aprender para ensinar ou ensinar para
aprender, mas antes de tudo não se esquecer que a vida sempre o fará aluno e
é preciso buscar conhecimento. Já que o conhecimento não é algo inerte, não
ocupa espaço, é laborioso e desta forma, não se dá por absorção. É certo que
por muitas vezes a busca por formação revele-se como um grande desafio,
mas tomar contato com as teorias, refletir e discutir a prática é necessário para
o fazer docente. A formação do professor se faz no dia-a-dia, em suas buscas
constantes para bem conduzir seu trabalho.
Como professora que está sempre buscando formação, torno meu olhar
para meus alunos como aqueles, que como eu, estão descortinando o mundo
das possibilidades.
A dissertação “O DIÁLOGO ENTRE LINGUAGENS NO ENSINO DE
LÍNGUA MATERNA: OS PERCURSOS DE UMA PROFESORA E SEUS
ALUNOS – LEITORES EM FORMAÇÃO - NA TESSITURA DA LEITURA” tem
como aporte teórico as concepções bakhtinianas de linguagem, assinaladas no
dizer do teórico russo, assim como de teóricos que dialogaram com ele, como
José Luiz Fiorin, Ingedore Villaça Koch, entre outros. Ainda traz para este
discurso Steven Roger Fischer, Alberto Manguel, John Berger, Boris Kossoy,
Rui de Oliveira, entre outros para tratar da leitura seja do verbal ou do
iconográfico. Os discursos promovem uma tessitura e colaboram para
responder a questão que move este trabalho, aqui retomada: ―Em que medida
a linguagem literária colabora para a leitura das várias linguagens e por sua
vez as várias linguagens colaboram com a leitura da literatura?‖.
No CAPÍTULO I – POSICIONAMENTOS E REFLEXÕES: A PRÁXIS,
logo de início, em AS LEITURAS TEÓRICAS E LITERÁRIAS; A HORA DE
DIZER DA PRÁXIS – A PÁGINA EM BRANCO, se desenha o temor de não
cumprir com palavras grafadas o que circundava minha práxis. Na sequência,
em: O SUJEITO, A LINGUAGEM E O SENTIDO e em A LEITURA E OS
19
LEITORES, marco o posicionamento teórico e como este posicionamento me
orienta. Já em LEITURA NO BRASIL, NA ESCOLA, DO PROFESSOR, DO
ALUNO, apresento dados estatísticos e demonstro como é importante
interpretá-los, pois estes não falam por si só, sem com isto tornar a discussão o
foco da pesquisa. Ainda apresento reflexões sobre o professor e o aluno
enquanto leitores, no âmbito escolar e na vida.
Em AS VÁRIAS LEITURAS, destaco que a leitura, neste trabalho, está
tanto para a linguagem verbal, não-verbal quanto a mista. Sendo assim, deixo
claro que este trabalho não privilegia a linguagem verbal escrita. O LÓCUS E
OS SUJEITOS – CONTEXTOS, SITUAÇÕES, apresenta o local de ação da
pesquisa, no qual os percursos foram vivenciados, junto aos sujeitos
(professor/alunos). Esta parte se faz de maneira mais pontual, pois os capítulos
seguintes retomarão o lócus e os sujeitos em suas vivências, sendo assim
serão referenciados nos próximos capítulos, a partir dos projetos e das
atividades. Ainda nesta parte marco meu entendimento sobre educação.
A apresentação de OS PERCURSOS VIVENCIADOS faz uma ponte
entre o CAPÍTULO I e os CAPÍTULOS II e III, já que em ambos trato de
vivências. A divisão das vivências se deu da seguinte forma: no CAPÍTULO II,
PERCURSOS: AS VIVÊNCIAS QUE MARCAM O ENTRELAÇAMENTO DOS
PROJETOS ANALISADOS, apresento atividades que representaram o quanto
um projeto infere nas atividades cotidianas de sala de aula, assim como em
outros projetos. E trato das vivências que ainda não pude percorrer, do que é
do anseio docente. Já no CAPÍTULO III, PERCURSOS - PROJETOS: DO
RASCUNHO AO QUE FOI DESENHADO, trago três atividades selecionadas
para análise por serem recentes e atenderem ao foco da pesquisa. Estas foram
elaboradas tendo como suporte um projeto anteriormente traçado e as analiso.
Nas CONSIDERAÇÕES FINAIS, retomo o trabalho e respondo o
questionamento que o moveu.
20
CAPÍTULO I
POSICIONAMENTOS E REFLEXÕES: A PRÁXIS
AS LEITURAS TEÓRICAS E LITERÁRIAS; A HORA DE DIZER DA PRÁXIS –
A PÁGINA EM BRANCO
O prazer do texto é esse momento em que meu corpo vai seguir suas próprias idéias – pois meu corpo não tem as mesmas idéias que eu. (BARTHES, 2004,p. 24) Sobre o prazer do texto, nenhuma “tese” é possível; apenas uma inspeção (uma introspecção) que acaba depressa. Eppure si gaude! E, no entanto, para com e contra todos, eu fruo do texto. (BARTHES, 2004,p. 42) Eu me interesso pela linguagem porque ela me fere ou me seduz. (BARTHES, 2004,p. 47)
Redefinindo meu objeto pude então retomar as leituras já feitas e buscar
novas e só então foi possível fazer as seleções das citações, organizá-las e
relacioná-las. Simultaneamente, finalizava, dava continuidade e iniciava
projetos com meus alunos, agora com uma preocupação maior de registrá-los.
Chegou a hora então de iniciar a dissertação e o temor de Amos Oz,
marcado na introdução de seu livro ―E a história começa‖, ao observar a página
em branco, me aplacou. O temor de ―encarar uma única e zombeteira página
em branco no meio de uma mesa árida, como uma cratera na face da lua.‖
(OZ,2007, p.7) As idéias povoavam minha mente, a polissemia de vozes me
deixava angustiada. Agora eu tinha que reafirmar minha convicção de que
escrever só se aprende e se faz escrevendo.
Afirmação que é corrente junto a meus alunos, a página precisa de
tessitura. Mas a escrita não fluía, pois se dava de maneira truncada, pesada e
não gostava do que escrevia. Sentia necessidade de ler mais, mais e mais e de
repente percebi que era uma fuga, pois ler era só mais uma desculpa para não
21
escrever. Após tomar consciência disto, senti desejo de enfrentar a página em
branco.
Retomando o sentimento de Oz, o terror que tinha da página em branco,
acrescento a inveja que ele sentia de seu pai e que este sentia dele. O pai da
suposta liberdade de Oz e o filho do diálogo que seu pai tinha com outros
autores, já que escrevia a partir de textos teóricos.
Meu pai escrevia livros acadêmicos. Sempre invejara a liberdade de romancista que eu tinha para escrever como quisesse, diretamente da minha cabeça para a página, sem ficar confinado por todo tipo de busca e pesquisa prévia, sem me achar oprimido pela obrigação de me familiarizar com toda a informação existente naquele campo, sem me sentir atrelado ao jugo de comparar fontes, fornecer provas, verificar citações e instalar notas de rodapé: livre como um passarinho.[...] Quem pode aparecer e desafiá-lo com informações contraditórias ou com fontes que você talvez não tenha consultado?
Eu, por outro lado, nutria certa inveja de meu pai. A cada vez que ele se sentava para trabalhar num ensaio acadêmico, sua mesa ficava tomada, de ponta a ponta, por livros abertos, separatas, referências, léxicos, uma bateria de artilharia de apoio. (OZ,2007, p.7 )
Ao dito por Amos Oz, devo revelar que ao iniciar textos teóricos ou
literários nós vemos a página em branco, tão desoladora e fria que pode nos
levar a boicotar nossos pensamentos. Seu pai tinha como fundamentação e
norte a teoria e Oz com certeza mais que isso, pois ainda tinha/tem a leitura da
literatura, tão abrangente, mas profundamente enigmática e por isso promotora
de alicerce para aquele que lavra com a palavra. Pois prolifera sentimentos e
assim como ou até mesmo com maior fruição que textos acadêmicos, faz com
que nosso conhecimento seja reelaborado.
O campo ficcional é assinalado de opostos, tão devastador, apaixonante,
surpreendente, acolhedor, insuportável... em medidas e desmedidas e suplanta
com o real quando o sobrepõe.
Após este diálogo com o dizer de Amós Oz, sinto que posso iniciar meu
discurso sobre leitura e linguagem apoiada no campo da literatura.
23
O SUJEITO, A LINGUAGEM E O SENTIDO
As línguas e a linguagem inscrevem-se num espaço real, num tempo histórico e são faladas por seres situados nesse espaço e nesse tempo. No entanto suas origens dão-se num tempo mítico, num mundo desaparecido e os protagonistas de seu aparecimento são os heróis fundadores. (FIORIN, 2003, p.10)
Há várias concepções de sujeito e estas marcam a concepção de
linguagem. Nesta dissertação, o sujeito é compreendido como co-fundador de
sua época e a linguagem representativa deste sujeito. Já que este se faz pela
linguagem e marca sua história com ela.
Sendo assim, sujeito, língua/gem neste trabalho estão para a concepção
sócio-interacionista de linguagem. E o teórico que marca esta concepção é
Mikhail Bakhtin, um homem que salientou o respeito ao sujeito marcado por
sua história em uma dada sociedade, na relação com outros sujeitos. Mas que
em sua época não teve a voz que tem hoje.
Bakhtin teve uma vida absolutamente comum, uma carreira apagada. Ele nunca teve apego a cargos e posições, nunca teve interesse pela fama e pelo prestígio. Sua trajetória foi marcada pelo ostracismo, pelo exílio e pela marginalidade dos círculos acadêmicos mais prestigiados. Teve, no entanto, ao longo de sua vida, uma intensa atividade de reflexão e escrita, que fez dele um dos grandes pensadores do século XX.(FIORIN, 2008, p.11)
Para Bakhtin, a linguagem é concebida como produção sócio-histórico-
cultural, símbolo representativo da interação entre sujeitos de uma sociedade.
A língua/gem é uma atividade que se dá em sociedade por meio da interação
entre sujeitos com suas bagagens culturais em um percurso histórico. O que
vai contra a idéia de que a língua seja um sistema abstrato de formas, pois a
língua é carregada de sentido e este se dá entre sujeitos, mesmo que não co-
presentes, em um determinado tempo e espaço, congregada de ideologia.
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Quanto ao pensamento dado no objetivo abstrato, o teórico russo salienta que
―A separação da língua de seu conteúdo ideológico constitui um dos erros mais
grosseiros do objetivismo abstrato‖ (BAKHTIN, 2004, p.96)
Bakhtin respeita a importância dos estudos de Saussure para a
linguística, no que concerne à palavra dissociada do social. Porém o teórico
russo não concebe a palavra em um tom laboratorial, em ambiente asséptico.
Ainda não considera a dicotomia entre língua e fala, excluindo a última e
tomando a primeira como objeto externo. Assim, para Saussure, a linguagem,
que é constituída da língua e da fala, não pode ser estudada por ser
heterogênea. Para este teórico, língua e fala seriam contrárias assim como o
individual e o social. Bakhtin faz um breve histórico sobre estas ideias e orienta
que
Saussure parte do princípio de uma tríplice distinção: le langage, La langue (como sistema de formas) e o ato da enunciação individual, La parole. A língua (la langue)e a fala (La parole) são os elementos constitutivos da linguagem, compreendida como a totalidade (sem exceção) de todas as manifestações – físicas, fisiológicas e psíquicas – que entram em jogo na comunicação linguística. A linguagem não pode ser, segundo Saussure, o objeto da linguística. Considerada em si mesma, falta-lhe unidade interna e leis independentes, autônomas. Ela é compósita, heterogenia. É difícil não se perder em sua composição contraditória. É impossível, se permanecermos no terreno da linguagem, fazer uma descrição dos fatos da língua. A linguagem não pode ser o ponto de partida de uma análise lingüística. (BAKHTIN.,2004,p.85)
A fala, tal como Saussure a entende, não poderia ser objeto da linguística. Na fala, os elementos que concernem à lingüística são constituídos apenas pelas formas normativas da língua que aí se manifestam. Todo o resto é ―acessório e acidental‖.
Destaquemos esta tese fundamental de Saussure: a língua se opõe à fala como o social ao individual. A fala é, assim, absolutamente individual. Nisto consiste [...], o próton pseudos de Saussure e de toda tendência do objetivismo abstrato. (BAKHTIN,2004,p.87)
Entendendo a palavra – língua/fala - como representação da carga
ideológica consubstancial, o teórico russo marca que esta, enquanto
representativa da linguagem, constitui os sujeitos nas relações estabelecidas
25
na sociedade. Para ele o produto da fala, o enunciado, marca a interação
verbal, pois
A palavra dirige-se a um locutor: ela é função da pessoa desse interlocutor: variará se se tratar de uma pessoa do mesmo grupo social ou não, se esta for inferior ou superior na hierarquia social, se estiver ligada ao locutor por laços sociais mais ou menos estreitos (pai, mãe, marido, etc.). Não pode haver interlocutor abstrato; não teríamos linguagem comum com tal interlocutor, nem no sentido próprio nem no figurado. Se algumas vezes temos a pretensão de pensar e de exprimir-nos urbi et orbi, na realidade é claro que vemos ―a cidade e o mundo‖ através do prisma do meio social concreto que nos engloba. Na maior parte dos casos, é preciso supor além disso um certo horizonte social definido e estabelecido que determina a criação ideológica do grupo social e da época a que pertencemos, um horizonte contemporâneo da nossa literatura, da nossa ciência moral, do nosso direito. (BAKHTIN,2004,p.112)
Ainda salienta que a palavra/língua carrega os valores sociais e
representa, nas diversas linguagens, os sujeitos que a tomam como
representação. Sendo assim, a dicotomia entre vida interior e vida exterior
marcada pelo subjetivismo idealista, que tem a linguagem como um ato
individual, não marcado pelo social, é contrária ao pensamento de Bakhtin que
entende a palavra como constitutiva de sujeitos sociais, que emanam seu ato
criativo ideológico. Desta forma
[...] a palavra funciona como elemento essencial que acompanha toda a criação ideológica, seja ela qual for. A palavra acompanha e comenta todo ato ideológico. Os processos de compreensão de todos os fenômenos ideológicos (um quadro, uma peça musical, um ritual ou comportamento humano) não podem operar sem a participação do discurso interior. Todas as manifestações da criação ideológica – todos os signos não-verbais – banham-se no discurso e não podem ser nem totalmente isoladas nem totalmente separadas dele. (BAKHTIN,2004,p.37-38)
A real faculdade da língua não está para objetivismo abstrato, nem para
o subjetivismo idealista, pois a língua se faz na interação verbal.
A verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema abstrato de formas linguísticas nem pela enunciação monológica isolada, nem pelo ato psicofisiológico de sua
26
produção, mas pelo fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações. A interação verbal constitui assim a realidade fundamental da língua.(BAKHTIN,2004,p.123.)
A substância da linguagem, para Bakhtin, está na interação verbal entre
sujeitos que na enunciação dialógica, característica da linguagem, a
representam e se apresentam. No dizer de Bakhtin:
O índice substancial (constitutivo) do enunciado é o fato de dirigir-se a alguém, de estar voltado para um destinatário. Diferentes das unidades significantes da língua — palavras e orações — que são de ordem impessoal, não pertencem a ninguém e não se dirigem a ninguém, o enunciado tem autor[...] e destinatário.(BAKHTIN, 2000, p.320)
O locutor não é um Adão, e por isso o objeto de seu discurso se torna, inevitavelmente, o ponto onde se encontram as opiniões de interlocutores imediatos (numa conversa, numa discussão acerca de qualquer acontecimento da vida cotidiana) ou então as visões de mundo, as tendências, as teorias, etc. (na esfera da comunicação cultural) A visão de mundo, a tendência, o ponto de vista, a opinião têm sempre sua expressão verbal. É isso que constitui o discurso do outro( de uma forma pessoal e impessoal), e esse discurso não pode deixar de repercutir no enunciado. O enunciado está voltado não só para o discurso do outro acerca desse objeto. [...] o enunciado é um elo na cadeia da comunicação verbal e não pode ser separado dos elos anteriores que o determinam, por fora e por dentro, e provocam nele reações-respostas imediatas e uma ressonância dialógica. (BAKHTIN, 2000, p.319-320)
Para Bakhtin, a linguagem se inscreve no sujeito para sujeitos, que
produzem enunciados e se revestem deles. Em uma cadeia dialógica os
sujeitos fazem suas escolhas nas quais a intenção e a execução do projeto de
dizer serão apresentadas por eles no discurso.
Todo texto tem um sujeito, um autor (que fala, escreve) (BAKHTIN,2000,p.330)
Dois fatores determinam um texto e o tornam um enunciado: seu projeto (a intenção) e a execução desse projeto. Inter-relação dinâmica desses dois fatores, a luta entre eles que imprime o caráter no texto. Uma divergência entre os dois fatores pode ser muito significativa. (BAKHTIN,2000,p.330)
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O discurso se dá a partir da situação que se inscreve entre os sujeitos e
a escolha da composição, do conteúdo e do estilo, ou seja, do gênero do
discurso que se apresente será marcado pela esfera da vida na qual o discurso
se dará. O sujeito aprende a falar a partir dos gêneros do discurso, os enuncia,
e estes darão suporte ao sujeito em suas relações sociais.
As formas da língua e formas típicas de enunciados, isto é, os gêneros do discurso, introduzem-se em nossa experiência e em nossa consciência conjuntamente e sem que sua estreita correlação seja rompida. Aprender a falar é aprender a estruturar enunciados (porque falamos por enunciados e não por orações isoladas, menos ainda, é óbvio, por palavras isoladas). Os gêneros do discurso organizam nossa fala da mesma maneira que organizam as formas gramaticais. Aprendemos a moldar nossa fala às formas do gênero e, ao ouvir a fala do outro, sabemos de imediato, bem nas primeiras palavras, pressentir-lhe o gênero, adivinhar-lhe o volume (a extensão aproximada do todo discursivo), a dada estrutura composicional, prever-lhe o fim, ou seja, desde o início, somos sensíveis ao todo discursivo que, em seguida, no processo da fala, evidenciará suas diferenciações. Se não existissem os gêneros do discurso e se não os dominássemos, se tivéssemos de criá-los pela primeira vez no processo da fala, se tivéssemos de construir cada um de nossos enunciados, a comunicação verbal seria quase impossível. (BAKHTIN,2000,p.301-302)
E é o reconhecimento do discurso que promove os turnos da fala e
estabelece a interação pela e na linguagem.
Todo enunciado [...] comporta um começo absoluto: antes de seu início, há os enunciados dos outros, depois de seu fim, há os enunciados-respostas dos outros (ainda que seja como uma compreensão responsiva ativa muda ou como um ato-resposta baseado em determinada compreensão). O locutor termina seu enunciado para passar a palavra ao outro ou para dar lugar à compreensão responsiva ativa do outro. O enunciado não é uma unidade convencional, mas uma unidade real, estritamente delimitada pela alternância dos sujeitos falantes, e que termina por uma transferência da palavra ao outro, por algo como mudo ―dixi‖ percebido pelo ouvinte, como sinal de que o locutor terminou. (BAKHTIN,2000,p.294)
Quando o locutor fala acompanha seu interlocutor buscando uma
resposta para seu enunciado, esta resposta pode se dar a partir da linguagem
verbal ou até mesmo da não-verbal. O destinatário irá pontuar o discurso do
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locutor, assim como o contexto de situação em que locutor e interlocutor se
instauram. E a constituição de ambos irá refletir na situação comunicativa, nas
escolhas feitas para que esta se dê
a escolha do gênero do enunciado, a escolha dos procedimentos composicionais e, por fim, a escolha dos recursos lingüísticos, ou seja, o estilo do meu enunciado. Por exemplo, o gênero de divulgação científica dirige-se a um círculo preciso de leitores, com certo fundo apreciativo de compreensão responsiva; é a outro leitor que se dirigem os textos que tratam de conhecimentos especializados, e é a um leitor muito diferente que se dirigirão as obras de pesquisas especializadas. Em todos esses casos, levar-se-á em conta o destinatário (e seu futuro apreciativo), e a influência dele sobre a estrutura do enunciado é muito simples: tudo se resume à amplitude relativa de seus conhecimentos especializados. (BAKHTIN,2000,p.321-322)
Assim os sujeitos, em uma relação dialógica interlocutiva, ouvem, se
fazem ouvir ou até mesmo se assujeitam. O que determinará o se fazer sujeito
na situação interlocutiva que reside será o quanto e o como este estabelece
relação com a linguagem e a situação interlocutiva em que reside. Segundo
Bakhtin:
A compreensão responsiva nada mais é senão a fase inicial e preparatória para uma resposta (seja qual for a forma de sua realização). O locutor postula esta compreensão responsiva ativa: [...] o que espera é uma resposta, uma concordância, uma adesão, uma objeção, uma execução, etc. (BAKHTIN,2000,p.291)
A totalidade do enunciado que proporciona a possibilidade de responder (de compreender de modo responsivo) é determinada por três fatores indissociavelmente ligados no todo orgânico do enunciado: 1) o tratamento do objeto do sentido; 2) o intuito, o querer-dizer do locutor; 3) as formas típicas de estruturação do gênero do acabamento. (BAKHTIN, 2000,p.299)
o intuito discursivo ou o querer dizer do locutor que determina o todo do enunciado: sua amplitude, suas fronteiras. (BAKHTIN, 2000,p.300)
O querer-dizer do locutor se realiza acima de tudo na escolha de um gênero do discurso. (BAKHTIN,2000,p.301)
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Os sujeitos se revestem de palavras, Bakhtin diz que a palavra existe
para o locutor sob três formas:
como palavra neutra da língua e que não pertence a ninguém; como palavra do outro pertencente aos outros e que preenche o eco dos enunciados alheios; e, finalmente, como palavra minha, pois, na medida em que uso essa palavra numa determinada situação, com uma intenção discursiva, ela já se impregnou de minha expressividade. (BAKHTIN,2000,p.313)
E são os enunciados e não as palavras da língua, a palavra neutra,
dados por sujeitos, que marcarão o repertório do sujeito, que ao reelaborar
trará discursos outros, ou confirmará discursos de outros. Assim responderá a
palavra dada mesmo que esta resposta esteja circunscrita em um diálogo com
seu próprio eu, o que não pode ser visto como um monólogo, mas o momento
anterior ou o próprio momento da ação responsiva.
O enunciado está repleto dos ecos e lembranças de outros enunciados, aos quais está vinculado no interior de uma esfera comum da comunicação verbal. O enunciado deve ser considerado acima de tudo como uma resposta a enunciados anteriores dentro de uma dada esfera (a palavra ―resposta‖ é empregada aqui no sentido lato): refuta–os, confirma-os, complementa-os, baseia-se neles, supõe-nos conhecidos e, de um modo ou outro, conta com eles. Não se pode esquecer que o enunciado ocupa uma posição definida numa dada esfera da comunicação verbal relativa a um dado problema, a uma dada questão, etc. Não podemos determinar nossa posição sem correlacioná-la com outras posições.É por esta razão que o enunciado é repleto de reações-respostas a outros enunciados numa dada esfera da comunicação verbal. (BAKHTIN,2000,p.316)
Assim fica claro que o outro é que torna a comunicação ativa. Mesmo
quando não está presente na situação, o(s) eco(s) de seu discurso o
representa(m) e seu enunciado terá uma resposta. Este outro pode até ser o
próprio sujeito, mas que já difere daquele que enunciou, pois pede uma nova
resposta ou uma confirmação. Assim atua diferente na arena de batalha que é
o texto. Para o teórico russo
O papel dos outros, para os quais o enunciado se elabora,[...], é muito importante. Os outros, para os quais meu pensamento real (e com isso, real para mim), não são ouvintes passivos,
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mas participantes ativos da comunicação verbal. Logo de início, o locutor espera deles uma resposta, uma compreensão responsiva ativa. Todo enunciado se elabora como que para ir ao encontro dessa resposta. (BAKHTIN,2000,p.320)
O que realmente constitui o enunciado é este estar voltado para alguém - o destinatário, o que o opõe a palavras e orações, pois as mesmas são impessoais ―não pertencem a ninguém e não se dirigem a ninguém, o enunciado tem autor [...] e destinatário.‖(BAKHTIN,2000,p.320)
O destinatário do enunciado pode coincidir em pessoa [...] Contudo, nessas coincidências de pessoas, um dos protagonistas desempenha dois papéis diferentes e o que importa é precisamente essa diferenciação de papéis: o enunciado daquele a quem respondo (aquiesço, contesto, executo, anoto, etc.) é já-aqui, mas sua resposta (sua compreensão responsiva) é porvir. (BAKHTIN,2000,p.321)
Desta forma, o dizer de Bakhtin vem confluir com a proposta de
interação verbal por meio dos discursos promovidos cotidianamente na sala de
aula, na qual professor e aluno atuam enquanto sujeitos ativos. Segundo
Brandão:
[...] um sujeito social, histórica e ideologicamente situado, que se constitui na interação com o outro. Eu sou na medida certa em que interajo com o outro. É o outro que dá a medida do que sou. A identidade se constrói nessa relação dinâmica com a alteridade. (KOCH, 2002,p.15-16)
Com relação ao sentido, este está correlacionado com a concepção de
texto, marcada aqui como o lugar de interação. Como bem retrata Koch, texto
―Trata-se, necessariamente, de um evento dialógico (Bakthin), de interação
entre sujeitos sociais – contemporâneos ou não, co-presentes ou não, do
mesmo grupo social ou não, mas em diálogo constante.‖ (KOCH, 2002, P.20) O
sentido se dá na interação entre texto-sujeitos, pois a interação promove o
sujeito de edificador a edificado na sua constituição como sujeito histórico.
Segundo Bakhtin:
[...] a experiência verbal do homem toma forma e evolui sob o efeito da interação contínua e permanente com os enunciados individuais do outro. É uma experiência que se pode, em certa medida, definir como processo de assimilação, mais ou menos
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criativo, das palavras do outro e (não das palavras da língua). (grifo meu)(BAKHTIN, 2000, p.313-314)
Trabalhar com língua/gem significa trabalhar com sujeitos. Trabalhar
com sujeitos na acepção bakhtiniana de linguagem significa ter estes sujeitos
como ativos, já que interagem na e pela linguagem. Ainda, significa caminhar
na ordem dos sentidos dados por estes sujeitos nas esferas da vida em que
atuam, em um dado momento histórico, momento este que pode dialogar com
outros momentos históricos, atuando na formação ideológica destes sujeitos.
Estes, por sua vez, promovem diálogos com outros sujeitos, em uma relação
interativa de língua/gem.
A relação interativa de linguagem, neste trabalho, será observada na
representação verbal e não verbal. Ainda atenderá à mistura destas
representações. As expressões artísticas elaboradas pelos sujeitos serão
apresentadas como leituras de mundo.
Assumindo que vivemos em um tempo histórico, marcado pela história
que o antecedeu, entre sujeitos e assujeitados, atuo na docência para a
formação de sujeitos que escrevam sua história e inscrevam-se na história,
cotidianamente. Assim o sujeito social histórico que dialoga com outros sujeitos
pela linguagem, irá representá-la e ser representado por ela nas mais diversas
formas.
E será nesta acepção que a investigação se dará, tendo como critério o
respeito ao sujeito e suas relações com o mundo, reafirmando a concepção de
língua/gem sócio-interacionista que remete a uma concepção de língua/gem
marcada pela alteridade que a constitui.
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A LEITURA E OS LEITORES
A ciência literária deve, acima de tudo, estreitar seu vínculo com história da cultura. A literatura é uma parte inalienável da cultura, sendo impossível compreendê-la fora do contexto global da cultura numa dada época. (BAKHTIN,2000,p.362) Uma obra literária, como já dissemos, revela-se principalmente através de uma diferenciação efetuada dentro da totalidade cultural da época que a vê nascer, mas nada permite encerrá-la nessa época: a plenitude de seu sentido se revela tão-somente na grande temporalidade. (BAKHTIN,2000,p.366)
A leitura, que será o foco da investigação, marcada pelo seu entrelace
com as demais concepções levantadas, é concebida como uma atividade de
produção de sentido, o que confirma Koch: ―A leitura é uma atividade interativa
altamente complexa de produção de sentido‖ . (KOCH, 2003, p.11)
No texto A leitura na vida contemporânea, Garcez relata que ―de cultura
para cultura, de época para época, tanto a função da leitura como a maneira de
ler vai se transformando‖.(GARCEZ, 2000, p. 582)
Vale dizer que a leitura se modifica porque o homem se modifica, por ser
social, sujeito impregnado de história, da história do outro que o constituiu, da
sua história e será esta que lhe dará suporte para ler. Para Garcez
A leitura é [...] o espaço de liberdade por excelência, pois lida com o pensamento e o imaginário que são, por natureza, sem fronteiras, sem limites, e proporciona uma forma de felicidade. (GARCEZ, 2000, p.583)
A experiência da linguagem, e a da leitura especialmente, não é solitária, é um produto construído na interação em que os participantes atuam de forma ativa. (GARCEZ, 2000, p.585)
E sua complexidade se dá, pois:
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Ela faz inúmeras solicitações simultâneas ao cérebro e é necessário desenvolver, consolidar e automatizar habilidades muito sofisticadas para pertencer ao mundo dos que lêem com naturalidade e rapidez. Desde a decodificação de signos, interpretação de itens lexicais e gramaticais, agrupamento de palavras em blocos conceituais, identificação de palavras-chave, seleção e hierarquização de idéias, associação com informações anteriores, antecipação de informações , elaboração de hipóteses, construção de inferências, compreensão de pressupostos, controle de velocidade, focalização da atenção, avaliação do processo realizado, até a reorientação dos próprios procedimentos mentais para a compreensão efetiva e responsiva, há um longo e acidentado percurso. GARCEZ, 2000, p.585)
[...] cada indivíduo constrói a sua própria trajetória pessoal de leitura, que é outra, diversa da do professor. (GARCEZ, 2000, p.586)
Esta trajetória particular trará à leitura sua característica interativa da
linguagem na promoção do sentido dado ao texto, pois os sujeitos só podem
considerar a leitura a partir de suas relações, já que fora delas eles não se
fazem sujeitos ativos. Caminhando um pouco no campo filosófico-teológico
contemporâneo, trago as palavras de Boff:
Cada um lê com os olhos que tem. E interpreta a partir de onde os pés pisam.
Todo ponto de vista é a vista de um ponto. Para entender como alguém lê, é necessário saber como são seus olhos e qual é sua visão de mundo. Isso faz da leitura sempre uma releitura.
A cabeça pensa a partir de onde os pés pisam. Para compreender, é essencial conhecer o lugar social de quem olha. Vale dizer: como alguém vive, com quem convive, que experiências tem, em que trabalha, que desejos alimenta, como assume os dramas da vida e da morte e que esperanças o animam. Isso faz da compreensão sempre uma interação.
Sendo assim, fica evidente que cada leitor é co-autor. Porque cada um lê e relê com os olhos que tem. Porque compreende e interpreta a partir do mundo que habita. (BOFF, 1997,p.9)
A leitura de mundo do sujeito o representará, esta experiência é
fundamental. O como a leitura entra na vida do sujeito poderá definir seu
percurso histórico tornando-o conhecedor de seu próprio curso. Aquele que lê
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efetivamente, não apenas conhece o código, observará o mundo de outra
maneira, será transportado para ―outros mundos‖ e retornará para o seu mundo
com novas bagagens podendo transformá-lo a partir do conhecimento.
Segundo Davi Arrigucci, a leitura é a busca, a aventura. Diria então que a
leitura é a conquista do que está além de qualquer valor, pois ela pode negar o
desconhecimento. Porém a sociedade não lê quantitativamente e
qualitativamente de maneira homogênea. As pessoas leem pouco, muito ou
nada. E o que leem faz muita diferença, pois a leitura é constitutiva do sujeito.
Tendo o entendimento de que ler é compreender, o sujeito que lê não
fica pura e simplesmente com o dizer do outro, mas perpassa todos os próprios
dizeres e os reelabora, para então compor o seu dizer carregado das palavras
do outro.
Com efeito, a leitura é sempre alguma coisa espantosa: passamos a vida a decifrar, de algum modo, o mundo através das letras, dos livros. Em grau maior ou menor, somos tateadores sobre letras. É por esse tateio que tentamos reconhecer o mundo que nos cerca e a nossa própria face nesse vasto mundo. Vamos dizer que a experiência da leitura é a nossa aventura, a história romanesca em que penetramos pelo simples ato de abrir um livro. Algo do encanto da descoberta infantil permanece sempre nessa experiência: "Et nunc manet in te". Como nesse verso atribuído a Virgílio, algo nos passa e fica. É que ela é, em grande parte também, nossa aventura, nossa felicidade. (ARRIGUCCI,1994.p.19)
E o que é a leitura a não ser a descoberta da vida?! A escrita é arbitrária,
já que ela não é inerente ao ser humano. Mas a leitura nos é revelada a partir
do primeiro reconhecimento do entorno. Lemos então o mundo. Cada um lê a
sua maneira, a partir de seu conhecimento de mundo. O ser humano, que vive
em uma sociedade que trava batalhas com a linguagem verbal escrita e falada,
não poderá fugir da luta, na arena irá compor seu repertório. Descobrimos na
leitura do texto verbal o desejo da permanência do sentimento de mundo
marcado por várias vozes. Não são vários mundos, mas sim muitos olhares,
atentos ou desatentos ao que os rodeia, no seu tempo, no seu espaço e que
pode ser diverso aos que compartilham um mesmo instante.
Por aí, através da leitura, se descobre a imensa rede de solidões a que estamos de algum modo presos. Por ela, nesse
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diálogo mudo, construímos a imagem do outro, e no seio da solidão e da linguagem, encaramos o universo social a que pertencemos. Pela leitura, de dentro do isolamento, podemos redescobrir fascinados o mundo e as formas fundamentais de pensá-lo. (ARRIGUCCI,1994.p.24)
Em um dado momento histórico a linguagem se revela e é impressa,
esta poderá ser degustada, assimilada, perdida, contrariada por outras
linguagens ou por uma mesma. Em se falando da linguagem verbal escrita,
podemos observar os textos que atravessam séculos e outros que não
sobrevivem nem mesmo nas mãos do autor, que pode morrer sem ser
(re)conhecido. Mas mesmo assim ambos experienciaram o trato com a
linguagem. Se o texto não chegar a um leitor, em tese, teve um como
referência.
O leitor é desejado mesmo quando aquele que escreve é o seu único e
próprio leitor. A necessidade do leitor chega a sufocar aquele que escreve. Um
texto precisa de leitor(es). A leitura sempre será a reescritura, a reelaboração,
mesmo que feita pelo escritor, pois no momento da leitura, este adquiriu outro
papel, o de leitor.
A leitura é promotora da história, desenhada por homens que a viram ou
ouviram dela falar. Não podemos nos esquecer que a história é marcada por
homens e suas visões de mundo é que são projetadas para o papel, a tela, o
bronze... Sendo assim, pontuamos a história a partir de histórias. Ora e os
documentos? Os documentos foram escritos por homens, lidos por homens e
analisados por homens que viveram ou não em um mesmo espaço/tempo.
Histórias nos cercam e nos mantêm vivos. Mais ainda quando assumem o calor
literário. A leitura em boa medida nos revigora.
As línguas morrem quando seus falantes morrem, mas seus próprios
falantes não morrem quando deixam sua arte expressa nas linguagens. A
língua como código se vai, ou fica para poucos estudiosos, mas a cultura cria
raízes, assim como hibridiza, se reorganiza e cria novas culturas. Nesta relação
imbricada podemos nem nos dar conta das facetas que carrega uma só
palavra, um só objeto, gesto, mas carrega e sua força está em sua
permanência. Sendo assim a cultura que esta língua representa/va cria raízes.
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Todos os idiomas e culturas conhecidos da história são preservados por meio da leitura. Dessa forma, eles continuam a fazer parte da narrativa humana, visto que testemunham a glória e os conflitos de nosso passado em comum: sumério, egípcio, acádio, persa, sânscrito, chinês clássico, grego, hebraico, latim, árabe clássico e centenas de outros.
Assim, terminando o milênio, a ‗testemunha imoral‘ finalmente tornou-se a voz da própria humanidade. (FISCHER, 2006, p.40)
A leitura é um ato solitário que reverbera ao leitor o seu próprio ser.
Sendo assim, o leitor, a partir das várias leituras se reveste, se constitui e pode
se descobrir.
Vale dizer que a ideia de solidão não desampara a da interlocução, já
que a primeira é física e a segunda mental. Cabe ressaltar que a interlocução e
a solidão não são estanques, elas coabitam o sujeito. Podemos perceber a
solidão mesmo em uma multidão.
O momento da reelaboração marca a mistura do físico e da mente e
talvez, por isso, provoque sensações no sujeito que se fará autor de seus
enunciados. No momento da reelaboração há a mescla da solidão e da
interlocução.
Digamos que o que a leitura é capaz de nos dar é algo que acende o desejo, mas não pode preenchê-lo. Ao acender o desejo, ela desperta a vida do espírito, mas não pode substituí-la. A leitura é algo que nos leva ao limiar da vida do espírito, mas não a constitui. Quem deve constituir a vida do espírito é o leitor; ou seja, o leitor deve, de algum modo, inventar, descobrir por si mesmo. (ARRIGUCCI,1994.p.23)
Em uma sociedade grafológica como a nossa, aquele que não sabe ler
e/ou não tem acesso a leituras variadas terá problemas para se inserir
socialmente, pois
A leitura, uma aptidão natural cumulativa, desenvolve-se e progride de modo exponencial. Cada prática resulta em aperfeiçoamento, abrindo caminho para uma experiência cada vez mais vasta. Os que têm lido com amplidão e sabedoria, os que têm dominado a palavra escrita e, assim, sua linguagem e cultura, desfrutam em geral de mais respeito da sociedade. Isso jamais mudará
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Porque na verdade, sempre houve apenas uma ‗finalidade‘ para a leitura: o conhecimento. (FISCHER, 2006, p.312)
No entanto a leitura não se impõe, ela deve se tornar necessária e para
isso precisamos nos constituir leitores. Porém não será um acontecimento
natural, no que concerne ao texto escrito, muito menos um ato que não irá
repercutir. A aquisição do conhecimento não é indolor, mas é sem sombra de
dúvida um evento. Segundo Xosé Antonio Neira Cruz,
Ler e viver lendo é uma escolha pessoal [...] Não é uma decisão espontânea, nem casual, nem inofensiva. Pelo contrário, ela vai determinar muitas outras formas de ser que derivarão da condição de leitor. Optar por ler é expor-se a caminhar pelo gume das palavras ou, o que dá o mesmo, pelo gume cortante, afiado, mas também afortunadamente curador, das idéias. Se, como dizia Nietzsche, ― as grandes idéias são os grandes acontecimentos‖, viver lendo pode considerar-se a oportunidade de existir assistindo à descoberta constante de acontecimentos fundamentais para nossa vida. E isso, mesmo sendo maravilhoso, nem sempre é reconfortante e consolador. Já dizia a Bíblia, o livro dos livros, no Eclesiastes: ―Onde abunda sabedoria abundam as penas, e quem acumula ciência acumula dor‖. (CRUZ, 2008, p. 72)
Neste sentido leitura e escrita mantêm um entrelaçamento assim como a
figura do escritor e do leitor. Ler e escrever não são tarefas fáceis, mas de
suma importância para o sujeito que se insere na sociedade, que deseja
experienciar, buscar o novo tendo como base o conhecimento do que o
antecedeu e o que lhe é contemporâneo. Assim lê o que o cerca, conhece o
que moldou seu presente e confere a leitura a sua face que é a comunicação.
Aquele que escolhe ler é um desbravador, repito, pois se diferencia dos que
não leem.
Correr o risco de ler é animar-se a viver de outra maneira, abrindo os olhos onde a maioria das pessoas fica com eles fechados. Assim, a leitura oferecia ao leitor uma espécie de segunda visão sobre a realidade, que, além de fazê-lo mais consciente, e um tanto mais sábio, o despojaria da alegria desmesurada da inconsciência. Aprender a relativizar – alegrias e penas, fracassos e sucessos – é consubstancial a aquele que sabe. Por isso aprender a ler, é talvez, aprender a relativizar. Mas essa segunda visão sobre a realidade, ou sobre as distintas e confluentes camadas com as quais se pode
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apresentar revestida a realidade, não é um exercício pessoal. (CRUZ, 2008, p. 72-73)
Como sujeitos sociais fica difícil pensar a vida sem a leitura, este
entrelaçamento não é circunstancial. A leitura é a possibilidade de vislumbrar o
mundo. Aquele que apenas decodifica o código não lê, não experiencia as
formas de observar e de viver a vida. Fica então preso no mundo de suas
circunstâncias e pode socialmente se distanciar da constituição de sujeito, ser
assujeitado.
Aprender a viver é, portanto, uma tarefa concomitante à de aprender a ler, e realmente há muitos pontos de conexão entre uma e outra aprendizagem. Mais uma vez, o binômio vida-leitura! Talvez porque, como assinala a crítica italiana Anna Maria Alignani, ―ler não quer dizer somente decodificar os signos traçados sobre o papel [...] [ler] significa viver infinitas vidas e histórias‖. (CRUZ, 2008, p.76)
Aprender a ler pode conferir ao sujeito a apropriação de sua história. E,
ao olhar para trás, ao ler sua história, este sujeito precisará se reconhecer
como um novo sujeito, o reflexo do (re)conhecimento. O julgamento do
passado pode ser pesado demais para que o presente sobreviva. O sujeito, ao
olhar para trás, deverá verificar que se faz necessário caminhar para o futuro.
O enfrentamento pode não ser fácil, pois são mundos distintos. Desta forma, a
leitura pode desvelar e produzir conflitos pessoais.
A personagem Hanna, de Bernhard Schilink, do livro ―O leitor‖ bem
representa a descoberta do próprio ser a partir da leitura. Hanna vivia sem a
leitura e a escrita, até que conheceu a leitura, mas no primeiro momento
apenas como ouvinte: ―Ela queria ouvir como soavam o grego e o latim, e li
para ela a Odisséia e o discurso contra Catilina‖ (SCHLINK, 2009, p.49) ―—
Você tem uma voz tão bonita, menino, gosto mais de ouvir você do que ler
sozinha.‖ (SCHLINK, 2009, p.50). A ingenuidade dela, perante o mundo, não foi
quebrada.
Hanna não sabia ler o mundo que a cercava e carregava um fardo, a
vergonha por não saber ler e escrever.
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Ela não tinha nenhum senso do contexto, das regras segundo as quais se agia, das fórmulas segundo as quais suas declarações e as dos outros eram computadas como culpa e inocência , condenação e absolvição.(SCHLINK,2009.p.122) —Não eu não escrevi. [...] —Minha letra? [...] —Os senhores não precisam buscar nenhum perito. Eu confesso que escrevi o relatório.(SCHLINK,2009.p.144)
Quando Hanna se insere no mundo dos que leem e escrevem, ela olha
para seu passado e não o suporta. Aquele que lia para ela, no curto tempo em
que conheceu a Hanna leitora, refletiu sobre a aprendizagem dela a partir de
leituras acerca do analfabetismo:
Li o bilhete e fiquei cheio de alegria e júbilo. ―Ela escreve, ela escreve!‖ Eu tinha lido tudo o que pude achar sobre analfabetismo durante todos aqueles anos. Sabia do desamparo diante de atividades cotidianas que exigiam a leitura, para achar um caminho ou um endereço ou para escolher um pedido no restaurante, sabia da angústia com que o analfabeto segue os moldes já dados e a rotina controlada, e da energia que é exigida para ocultar a incapacidade de ler e escrever, desperdício de energia vital. Analfabetismo é menoridade. A medida que Hanna tivera a disposição de aprender a ler e a escrever, dera o passo da menoridade para a maioridade, um passo de esclarecimento.‖ (SCHLINK, 2009, p.206)
O mundo dos que leem é diferente do mundo dos que não sabem ler,
diverso, ao olharem fixam nele outra cor. O caráter da ingenuidade,
característica da ignorância, pode ser dado como a possibilidade de encarar o
mundo. Algumas pessoas dizem que é melhor desconhecer, estas
provavelmente conhecem.
Experienciar a descoberta de novos olhares sobre o mundo causa uma
sensação inexplicável. Certa vez recebi um convite para conversar com alunos
do EJA (Educação para Jovens e Adultos). Eu não os conhecia, eles, por sua
vez, me tinham como a autora de um livro infantil. Agiram como crianças, o
olhar de cada um os revelava. Queriam saber o que me levava a conhecê-los.
Estavam aflitos.
Não fui lá falar de meu livro, preferi dar uma oficina de artesanato, assim
eles me veriam como alguém mais próximo deles. Primeiro sentiram vergonha,
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pois demoraram muito tempo para enfrentar as letras. Mas evidenciei que eles
estavam lá.
O deslumbramento foi diminuindo, marcaram então o agradecimento por
minha presença. O que talvez eles não tenham percebido, mesmo eu tendo
dito que foi importante estar lá, trocar experiência a partir de diálogos que
tivemos. Mostrar-me leitora para aqueles que estavam descortinando o mundo
da leitura, quem sabe possa ter tocado um deles, se aconteceu não sei, mas é
para isso que estive lá.
Olhar para o mundo da leitura é pensar que nunca vamos dar conta de
tantos mundos. E não vamos, pois o leitor faz suas escolhas e estas serão
decisivas para sua formação. É por isso que o professor deve ser mais que um
leitor, um apaixonado pela leitura, principalmente o professor que iniciará o
sujeito aluno no mundo das palavras, pois ele poderá marcar a história da
leitura na vida de seu educando.
Conhecer a palavra não é apenas saber como representá-la, mas sim
saber de seu valor semântico nas relações entre sujeitos. O valor da palavra
empregada nas mais diversas situações e a possibilidade de reinventá-la só
será possível se o sujeito vivenciar a palavra.
O mundo da palavra não é efêmero, pois os sujeitos se constituem dela
e com ela.
A Uva e o vinho
Um homem dos vinhedos falou, em agonia, junto ao ouvido de Marcela. Antes de morrer, revelou a ela o segredo:
-- A uva – sussurrou – é feita de vinho.
Marcela Pérez-Silva me contou isso, e eu pensei: Se a uva é feita de vinho, talvez a gente seja as palavras que contam o que a gente é. (GALEANO, 2003, p. 16)
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LEITURA NO BRASIL, NA ESCOLA, DO PROFESSOR, DO ALUNO
Muito ainda tem que ser feito para que uma grande parcela da população
brasileira deixe de ser como „Fabiano‟, de Vidas Secas de Graciliano
Ramos. (GARCEZ, 2008, p. 70)
Hubert Alquéres apresenta no Livro Retratos da Leitura no Brasil um
panorama sobre o déficit de leitura no país, a partir do perfil dos que leem e
dos que não o fazem. Salienta que a escrita é sem dúvida a grande invenção
da humanidade, que está em constante evolução. Dada sua importância
representa poder dos que a compreendem sendo então leitores.
Considera então Alquérez que a leitura seria o meio mais efetivo para
chegar ao conhecimento. E que para isso, o lugar da leitura e o estímulo a esta
se faz em práticas cotidianas, criando assim o hábito. Porém o autor lamenta
que no Brasil a construção de um bom leitor não tenha como berço
fundamental sua morada, e que a maioria dos que leem sejam jovens da classe
média.
Por sua vez, Galeno Amorin, na introdução do mesmo livro, revela que
não se pode negar que os brasileiros têm lido um pouco mais, porém isto não
faz do Brasil um país de leitores. Segundo Amorin, a falta de reconhecimento
da importância da leitura não está entrelaçada a sua relevância para a
formação do sujeito, pois não se entende o livro como estratégia para pontuar o
hoje e nem mesmo proporcionar um amanhã.
Embora Amorin reconheça que os estudos feitos em 2008 não possam
tecer um comparativo com os de 2000, por terem tido metodologias diferentes,
não se pode negar a importância deste estudo, já que ele fotografa o cenário
brasileiro da leitura e poderá ter um comparativo em 2011. Por outro lado não
podemos nos esquecer que dados revelam o quantitativo e um quantitativo que
não marca o todo e sim uma amostragem deste.
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Segundo os dados do estudo de 2008, por gênero, dos que leem, as
mulheres leem mais que os homens (55% x 45%). Já na distribuição geográfica
dos leitores do Brasil que dizem gostar de ler muito em seu tempo livre, a
região Sudeste conta com 45%, a Nordeste 25%, a Sul 14%, a Norte 8% e a
Centro Oeste 7%. Com relação a estes últimos dados, na maioria das regiões,
o maior número de leitores que gostam de ler com frequência está no ensino
superior. Sobre a taxa de penetração de leitura, por idade, esta marca a escola
como importante referência de indicação de leitura. O número de leitores cai
espantosamente quando não recebem a indicação da escola, na faixa etária
de: 5 a 10: 60% X 6%; 11 a 13 anos 73% X 12% e na de 14 a 17 63% X 19%.
Quando os dados alcançam a faixa da maioria dos universitários (18 a 24 e 25
a 29) temos um avanço na leitura não indicada pela escola, assim como nos
acima desta faixa.
Contra dados estatísticos outros argumentos parecem falhos, falar sobre
leitores no Brasil é ainda anunciar um déficit. E olhar para os dados é confirmar
que a escola é promotora de leitura e que do ensino fundamental ao médio a
preocupação deve ser com a formação de leitores. E mais, com os alunos que
leem. Estimular a leitura é importante, mas manter o estímulo é mais. Os dados
existem, nos cercam, mas não podemos deixar que os dados nos ceguem e
não nos façam olhar para o que nos cerca. Mesmo porque devemos interpretar
os dados, já que estes não falam por si só. Algumas perguntas devem ser
levantadas: Quem levantou os dados? Para que os dados foram levantados?
Como os dados foram levantados? A partir de que amostragem estes dados
foram levantados? Estes e outros questionamentos devem ser feitos, pois não
se pode apenas olhar para os dados e sim ver, o que é diferente de aceitar.
É certo que meus alunos não leem como eu gostaria, mas é efetivo que
leem muito, mas muito mais do que liam. Porém por serem leitores em
formação precisam da continuidade deste trabalho. Seria bom acreditar no
dizer de José Mindlin quando afirma que ―O vírus do amor ao livro é incurável‖,
sendo assim poderíamos inoculá-lo. Minha prática demonstra que podemos
nos apresentar como leitores e a afirmação, quando verdadeira, nutre aquele
que inicia seu caminho na leitura. Mas o leitor em formação precisa da
reafirmação da importância da prática da leitura.
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Já tive oportunidade de reencontrar alunos em situação de sala de aula
e perceber que sua formação de leitor não foi ampliada, pior, alguns até
deixaram de ler. Esta constatação não é fácil de ser elaborada, ainda causa
espanto e é bom que cause. Embora o espanto possa desarticular uma prática,
também pode fortalecer, provocar avaliação e assim novas práticas. No meu
caso, primeiro vem o desapontamento, o desalento, mas depois o arregaçar
das mangas.
Em conversa com professores, escuto e por vezes colaboro com o
seguinte dizer: ―Nossos alunos não têm repertório!‖ Para esta afirmação que
marca tanto a questão vocabular quanto a da leitura propriamente dita e que
infelizmente também acomete alguns professores só há uma receita: LER. É
preciso criar e ampliar o repertório.
Em sala de aula, se faz necessário primeiro investigar o que o aluno lê,
como lê e por que lê. A partir de uma conversa estas informações aparecem e
o professor pode então iniciar seu trabalho com leitura. É claro que não é uma
regra, pode-se iniciar com uma leitura e a partir desta buscar quem são os
leitores. O que importa é conhecer os leitores e propiciar a leitura.
Por muitas vezes os clássicos são abandonados, ou então há uma
predileção para as releituras destes, sem antes ou depois apresentar os
originais aos alunos. Sendo assim, estes não vão poder estabelecer relação
entre a obra e as que dela originaram. Os clássicos povoam o imaginário
popular, participando dos diálogos cotidianos e quem não tem esse repertório
terá dificuldade de compreender desde uma conversa informal a textos formais.
Porém, na sala de aula não devemos apenas tratar dos clássicos, ou
sempre iniciar a leitura literária a partir dos clássicos. Primeiro há de se
entender que o que há são vertentes literárias e que estas não descortinam o
mundo da mesma forma, pois têm espaços diferentes na sociedade, marcados
pela sociedade, não necessariamente a mesma sociedade que as marcou, ou
classificou. Ainda que a palavra carrega a carga cultural daquele/s que a
compõe/m e pode se apresentar nos mais diferentes gêneros. Assim não é
válido analisar todas as expressões literárias de uma mesma forma.
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A escola é o lugar privilegiado para a formação do leitor literário e não o
lugar de criar estigmas. Ler os clássicos é importante, mas não somente os
clássicos. A leitura da literatura canônica é importante, mas não e tão somente
esta. Julgar uma literatura em detrimento de outra é o que a escola não deve
propriciar.
Segundo ABREU, ―A suposta existência de valores absolutos faz que se
julguem todas as obras imaginativas com a mesma bitola. O resultado é
previsível: obras não eruditas são avaliadas como imperfeitas e inferiores. Na
verdade, elas são apenas diferentes.‖ (ABREU, 2006,p.110) E ainda diz que a
avaliação de uma obra deve ter critérios diferenciados, pois
[...] avaliando uma obra com critérios produzidos para outro tipo de composição, parece uma ideia bizarra se empregarmos valores exteriores à cultura erudita para avaliar obras consagradas. Mas é isso que se faz toda vez que se empregam juízos de valor eruditos para avaliara obras de outra natureza. (ABREU, 2006,p.110)
Salienta Abreu que seu discurso marca a importância de uma obra deve
ser avaliada ―dentro do sistema de valores em que foi criada” (ABREU, 2006,
p.111); não fugindo de outra forma de julgamento que hierarquiza, mas
entendo que não se pode avaliar todas as obras com um mesmo critério, que
vem de uma literatura canônica.
Assim, entende Abreu que as preferências de leitura dos alunos devem
ser assumidas como leitura de sala de aula, e estas devem ser discutidas em
seu o gênero e como funciona textualmente. A comparação com o canônico
seria bem vinda, não para diminuir uma literatura em detrimento de outra, mas
para analisar as diferenças. Assim
Alargar o conhecimento da própria cultura e o interesse pela cultura alheia pode ser um bom motivo para ler e para estudar literatura. A literatura erudita pode interessar a comunidades afastadas da elite intelectual, não porque devem conhecer a verdadeira literatura, autentica expressão do que melhor se reproduziu no Brasil e no mundo, como forma de compreensão daquilo que setores intelectualizados elegeram como as obras imaginativas mais relevantes para sua cultura. Do mesmo modo, pode-se estudar e analisar os textos não canonizados, o que para alguns significará refletir sobre sua própria cultura e
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para outros, o conhecimento das variadas formas de criação poética ou ficcional.
Não há obras boas e ruins em definitivo. O que há são escolhas - e poder daqueles que as fazem. Literatura não é apenas uma questão de gosto: é uma questão política. (ABREU, 2006, p.112)
O dizer de Cosson vem colaborar com o de Abreu quando diz que
Ao selecionar um texto, o professor não deve desprezar o cânone, pois é nele que encontrará a herança cultural de sua comunidade. também não pode se apoiar apenas na contemporaneidade dos textos, mas sim em sua atualidade. Do mesmo modo, precisa aplicar o princípio da diversidade entendido, para além da simples diferença entre os textos, como a busca da discrepância entre o conhecido e o desconhecido, o simples e o complexo, em um processo de leitura que faz por meio da verticalização de textos e procedimentos. É assim qye tem um lugar na escola o novo e o velho, o trivial e o estético, o simples e o complexo e toda a miríade de textos que faz da leitura uma atividade de prazer e conhecimento singulares. (COSSON, 2006,p.35-36)
A partir da literatura clássica ou não, o imaginário precisa ser despertado
a todo momento, as máquinas não precisam disto, pois não envolvem
sentimento, vivência. Elas precisam de energia, mas não a de que nós
precisamos, a nossa é dada a partir do viver. Nossa atual sociedade está tão
enfronhada com as máquinas, que por vezes se esquece de como lidar com o
ser humano.
Cosson acredita que a literatura tem ―seu papel humanizador‖ a cumprir,
mas que só será alcançado com a perspectiva do letramento literário. Mas, a
leitura literária garante o caráter humanizador? É certo que não será apenas o
contato com a literatura que garantirá a humanização da sociedade. Já que
homens cultos de refinado gosto artístico podem cometer atrocidades, é o que
a história nos revela. Homens que conheciam e apreciavam obras de arte, boa
música, literatura, homens que conduziram outros, pelo discurso, como Hittler
liderando quase toda a Alemanha. É claro que esta figura nefasta não
simplesmente acordou e resolveu tratar do massacre de milhões de judeus.
Para cumprir seus ideais de ―aprimorar a raça humana‖ ele construiu sua
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imagem e reputação ao longo dos anos, foi se enfronhando nos palcos políticos
e alcançou o poder. Destaco este personagem como exemplo do não
humanizado, para mim como leitura de suas crueldades e a percepção de que
existem leituras da história, do mundo.
Desta forma, avento que existe uma evidência de que há leituras e
leituras do mundo que temos e do mundo que desejamos. Assim não podemos
dizer que a literatura humaniza, mas que em boa medida pode colaborar com a
formação humana, já que trata das relações sociais. E que com certeza
apresenta olhares que podem despertar o leitor.
Segundo Pennac
A idéias de que a leitura ―humaniza o homem‖ é justa no seu todo, mesmo se ela padece de algumas deprimentes exceções. Tornando –nos um pouco mais ―humanos‖, entenda-se aí por um pouco mais solidários com a espécie (um pouco menos ―animais‖), depois de termos lido Tchekhov.
Mas evitemos vincular a esse teorema o corolário segundo o qual todo indivíduo que não lê poderia ser considerado, em princípio, como um bruto potencial ou absoluto cretino. (PENNAC, 1993.p.144)
Despertar o imaginário e formar leitores é preciso!
Assim como criamos estigmas, criamos obstáculos e por vezes estes
não serão ultrapassados. Aprender a ler é a possibilidade de fazer escolhas de
juízo sobre elas por si mesmo.
O dever de educar consiste, no fundo, no ensinar as crianças a ler, iniciando-as na Literatura, fornecendo-lhes meios de julgar livremente se elas sentem ou não a ―necessidade de livros‖. Porque, se podemos admitir que um indivíduo rejeite a leitura, é intolerável que ele seja rejeitado por ela.
É uma tristeza imensa, uma solidão dentro da solidão, ser excluído dos livros – inclusive daqueles que não nos interessam. (PENNAC, 1993.p.145)
Considerando que a literatura não é capaz sozinha de trazer a
humanização, mas tratar de atos humanos e voltando a importância da leitura
para a constituição do ser, que poderá fugir de ser assujeitado, por meio da
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leitura das várias linguagens, retomo os dados referentes à leitura, a questão
não é considerá-los ou não, mas olhar para eles e olhar ao nosso redor. Um
professor não dá conta do déficit de leitura do país, mas pode: se mostrar leitor,
estimular a leitura, apresentar as diversas linguagens, não negar a leitura e
negar a ignorância aos alunos. A ordem das possibilidades não é rígida e nem
tão somente as levantadas, mas se a primeira não se apresentar o fracasso
será quase certo e se todas ou mais se derem a possibilidade de sucesso será
ampliada.
Segundo o pesquisador Ezequial Theodoro da Silva, após dizer que um
professor deve saber sobre o que orienta e que deve ser antes de tudo leitor
que tenha uma relação de amor por textos e autores ou até mesmo ódio,
salienta que ―O importante é não marcar passo, esperando por uma política
oficial que nunca vem, é não deixar de buscar soluções sérias e caseiras,
evitando o assassinato do potencial de leitura de milhares de crianças e
jovens.‖ (SILVA, 2003.p.14)
De qualquer maneira, será o professor que, em boa medida, levará a
leitura para o educando e a forma como o primeiro encara a leitura será
provavelmente a forma como ele vê o segundo. Desta forma, Silva considera
que:
para o ensino e a dinamização da leitura escolar, o trabalho do professor merece maior atenção! Isso porque, sem um professor que, além de se posicionar como um leitor assíduo, crítico e competente, entenda realmente a complexidade do ato de ler, as demais condições para a produção da leitura perderão em validade, potência e efeito. (SILVA, 2003.p.20-21)
André Lázaro e Jeanete Beauchamp ressaltam
a importância da escola para as políticas de acesso ao livro e
de promoção da leitura. [...] A pesquisa evidencia que é a
escola quem faz o Brasil ler. [...] depois da mãe, a professora é
a principal incentivadora da leitura, confirmando o papel central
da escola, mas ressaltando a importância e possível correlação
entre as políticas de alfabetização de adultos e a promoção da
educação das crianças e dos adolescentes [...] é na escola que
se lê mais, os mais jovens lêem mais e é na infância que se
forma o leitor. Entretanto depois da escola o leitor lê menos. A
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escola não está formando o leitor, mas dando acesso à leitura.
A pratica da leitura continua sendo um privilégio de classe.
(LÁZARO e BEAUCHAMP, 2008, p. 73-74)
Ainda salientaram que o que a pesquisa apresentou não é novo e é o
que vozes de peso deste país, há mais de sete décadas, anunciam como
missão:
O papel da escola na formação de leitores deve ir além do domínio da leitura e do acesso ao livro. Os vários suportes e os diferentes códigos e mídias devem ser tratados no ambiente escolar, na perspectiva de democratização do acesso aos diversos bens culturais e sociais disponíveis na sociedade contemporânea. (LÁZARO E BEAUCHAMP, 2008, p. 78)
Porém o país se ressente, até mesmo nos índices, de um quadro melhor
no que concerne o número de brasileiros que não passaram pela escola ou que
desistiram da formação dada por esta. Dados revelam que ―os índices de
escolaridade das populações adultas no Brasil apontam que boa parte delas
não tem o Ensino Fundamental completo.‖ (LÁZARO e BEAUCHAMP, 2008, p.
78)
Lucília do Carmo Garcez (GARCEZ, 2008), considera que a leitura está
ligada ao nível escolar, a renda e a classe social e ratifica seu dizer com o
índice de apenas 5% de não leitores na classe A ―Isso pode levar à conclusão
de que o poder aquisitivo associado ao nível de escolarização, privilégio das
classes mais altas, é significativo para a constituição de leitores assíduos. No
Ensino Superior, há apenas 2% de não leitores.‖ (GARCEZ, 2008, p. 63) Há de
se pensar o que leem.
Na sequência de seu discurso, após salientar as exigências que o ato de
ler faz à mente do leitor, a autora apresenta o seu entendimento de uma leitura
produtiva, que vai além do ato, pois este momento é ampliado pelo ―processo
de compreensão que antecede o texto, explora-lhe as possibilidades e
prolonga-lhe o funcionamento além do contato com o texto propriamente dito,
produzindo efeitos na vida e no convívio com as outras pessoas.‖ (GARCEZ,
2008, p. 68)
49
Não desconsiderando os números, por mais confiáveis ou desoladores
que possam ser, devemos pensar em como se traduz o ato de ler. Amorin
reflete sobre isto:
O ato de ler não pode ser meramente quantificado e traduzido, por mais confiáveis possam ser, em meros números.
Ler para o outro é um ato de amor. Já ler para si próprio é, mais do que uma ação intuitiva que busca prazer, conhecimento e desenvolvimento da própria inteligência, uma atitude de cidadania. Mesmo porque um livro mais do que qualquer outro objeto que se conhece, vai muito além do significado primeiro, na medida em contém bem mais do que meras folhas de papel coladas ou costuradas e os sinais gráficos nelas estampados. É justamente além do limite dessa simplória definição que se dá seu significado pleno e tem início a produção do valor simbólico e social da leitura. (AMORIM, 2008, p.18)
Desta forma as palavras grafadas traduzem os olhares para a vida e
traduzem as formas que estes veem.
50
AS VÁRIAS LEITURAS
A função da arte/1
Diego não conhecia o mar. O pai, Santiago Kovadloff, levou-o para que
descobrisse o mar.
Viajaram para o Sul.
Ele, o mar, estava do outro lado das dunas altas, esperando.
Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas de areia,
depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos. E foi
tanta a imensidão do mar, e tanto seu fulgor, que o menino ficou mudo de
beleza.
E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando, pediu ao
pai:
-- Me ajuda a olhar! (GALEANO, 2003, p. 15)
A leitura sempre será vista como promotora de sentido, seja esta a de
um texto verbal, não-verbal ou misto. Segundo Aguiar,
O fato de existirem linguagens de duas naturezas distintas leva-nos a pensar que cada uma delas corresponde uma concepção de mundo diferente, porque sabemos que uma linguagem, mais do que refletir a realidade, cria uma realidade. Isso quer dizer que o real existe porque nós o construímos, e o mesmo fato pode ter sentidos diversos para pessoas diferentes. (AGUIAR, 2004,p.28-29)
O ser humano é marcado pela linguagem. Aguiar salienta que a
linguagem é múltipla e que está na sociedade, nos ―mais variados códigos. A
combinação desses códigos promove a interação dos seres humanos, e a
expressão de seus sentimentos mais profundos‖. (AGUIAR, 2004,p.54.) E mais
adiante diz que é na e pela linguagem que o ser humano estabelece suas
relações, no contexto da situação comunicativa enfrentada. E que mais que
intenções, a linguagem verbal e não verbal dada pelo homem o marca em sua
forma de ser e de ver o mundo.
51
Pensando em uma imagem, as pessoas primeiro leem a partir das
referências que têm, logo depois estabelecem relações entre as referências e a
imagem em questão. A imagem que remete ao novo pode despertar o desejo
do conhecimento, abatê-lo ou ainda interrompê-lo.
Segundo Manguel,
Quando lemos imagens – de qualquer tipo, sejam pintadas, esculpidas, fotografadas, edificadas ou encenadas -, atribuímos a elas o caráter temporal da narrativa. Ampliamos o que é limitado por uma moldura para um antes e um depois e, por meio da arte de narrar histórias (sejam de amor ou de ódio), conferimos à imagem imutável uma vida infinita e inesgotável. (MANGUEL, 2001, p.27)
Construímos nossa narrativa por meio de ecos de outras narrativas, por meio da ilusão do auto-reflexo, por meio do conhecimento técnico e histórico, por meio da fofoca, dos devaneios, dos preconceitos, da iluminação, dos escrúpulos, da ingenuidade, da compaixão, do engenho. Nenhuma narrativa suscitada por uma imagem é definitiva ou exclusiva, e as medidas para aferir a sua justeza variam segundo as mesmas circunstâncias que dão origem à própria narrativa. (MANGUEL, 2001, p.28)
Leituras criticas acompanham imagens desde o início dos tempos, mas nunca efetivamente copiam, substituem ou assimilam as imagens. (MANGUEL, 2001, p.29)
Cada sujeito fará a sua leitura da imagem, nesta leitura trará todas as
outras já elaboradas e reelaboradas, constituindo sentido/s ou até mesmo
indagações que o moverão para constituí-los.
Manguel ainda trata da leitura de nós mesmos, da importância de nosso
reconhecimento e de como o hoje é efêmero e já que a nossa imagem é
apenas um reflexo precisamos de um olhar interior. Tudo infere no que
refletimos: o tempo, o espaço e os sujeitos. A nossa constituição como sujeitos
sempre será retomada e redesenhada e nem sempre estamos prontos para
olhar para o nosso próprio reflexo, pois olhar para o reflexo não é
necessariamente vê-lo.
Enfrentar a leitura de si mesmo é uma das grandes fraquezas dos
sujeitos, já que muitos não observam o que Manguel chama do interior do
52
exterior, apenas buscam marcar padrões estéticos que não naturalmente ou
necessariamente irão preencher. Após olhar para o nosso reflexo este deixa de
ser o momento presente e nos faz buscar uma nova imagem, que será futura.
Assim, a leitura de nossa face, de nosso corpo, deverá perpassar pelo que
refletimos não apenas no espelho físico, que não necessariamente nos mostra
a imagem que vemos, a que não vemos ou como os outros nos veem. Nas
palavras de Manguel
Durante o nosso período de vida, nosso semblante muda. A idade, a experiência, as emoções, os acasos e as mudanças de luz alteram os traços que acreditamos serem nossos, de modo que um espelho pode constantemente nos surpreender. Não temos um rosto presente: quando pensamos ter captado as nossas feições num reflexo, elas já se transformaram em alguma outra coisa, empurrando o nosso eu para o futuro. Cada uma das nossas células renasce em ciclos de sete anos, onda após onda; nunca somos quem somos, estamos sempre no processo de nos tornarmos. (MANGUEL, 2001, p.184)
Para conhecer objetivamente quem somos, devemos nos ver fora de nós mesmos, em algo que contém a nossa imagem, mas não é parte de nós, descobrindo o interno no externo, como fez Narciso quando se apaixonou pela sua imagem no lago [...](MANGUEL, 2001, p.185)
Ainda tratando de imagens, da leitura destas, John Berger entende que
cada pessoa vê de uma forma, a partir de suas perspectivas, de sua percepção
de mundo. Berger trata da arte iconográfica a partir da fotografia, confluindo
assim com Boris Kossoy, que diz que a natureza múltipla da fotografia permite
aos seus receptores leituras, pois
Estes, já trazem embutido no espírito, suas próprias imagens mentais preconcebidas acerca de determinados assuntos (os referentes). Estas imagens mentais funcionam como filtros: ideológicos, culturais, morais, éticos etc. tais filtros, todos nós temos, sendo que para cada receptor, individualmente, os mencionados componentes interagem entre si, atuando com maior ou menor intensidade.
Sabemos que muito do que rege o comportamento de cada um diante das imagens – em termos de percepção, emoção, rejeição etc., quanto a um ou outro tema (povo, raça, país...) – está definitivamente vinculado ao repertório cultural particular. Dependendo, porém dos estímulos que determinadas imagens fotográficas causam em nosso espírito nos veremos, quase
53
sem perceber, interagindo com elas num processo de recriação de situações conhecidas ou jamais vivenciadas. (KOSSOY, 2002,p.44)
Para este estudioso (Kossoy) se faz necessário ultrapassar o que ele
chama de barreira iconográfica para que a imagem revele-se, procurando tecer
o que a imagem traz fragmentariamente.
Berger diz que a forma de ver do homem sofreu modificação no advento
da fotografia ―O visível passou a significar algo diferente para ele. Isso refletiu-
se imediatamente na pintura.‖ (BERGER, 1999, p.20) O teórico ainda discute
sobre os suportes, diz que antigamente dificilmente uma pintura poderia ser
deslocada e que sua representação também tinha ligação com o edifício que a
recebia, mesmo que esta pintura pudesse ser levada de um lugar para o outro.
O ambiente também refletia o quadro.
A fotografia permitiu o duplo, o estar em dois lugares ao mesmo tempo,
por representação, porém a fotografia de uma pintura não é a pintura e sim
uma ―cena‖, uma ―aparência‖. Há então a possibilidade de significados e
fragmentação de significados. Isto também ocorre em outros suportes, como a
TV.
quando uma pintura é mostrada numa tela de televisão. A pintura entra na casa de cada espectador. Lá ela passa a ser rodeada de parede, pela mobília, pelas lembranças das pessoas. Entra na atmosfera da família. Torna-se assunto de conversa. Empresta seu significado ao significado deles. Ao mesmo tempo, entra em milhões de outras casas e, em cada uma delas, é vista num contexto diferente. Em virtude da câmera, a pintura viaja agora até o espectador, em vez deste até a pintura. Em suas viagens, o significado se diversifica. (BERGER, 1999, p.20-22)
Este teórico ainda traz a figura do fotógrafo, o por trás da câmera e suas
escolhas de enquadramento perpetuando o que Berger chama de modo de ver.
Uma imagem é uma cena que foi recriada ou produzida. É uma aparência, ou um conjunto de aparências, destacada do lugar e do tempo em que primeiro fez sua aparição e a preservou – por alguns momentos ou séculos. Toda imagem incorpora uma forma de ver. Mesmo uma fotografia. Porque as fotografias não são, como se presume frequentemente, um registro mecânico. Cada vez que olhamos uma fotografia estamos cientes, por
54
mais superficialmente que seja, do fotógrafo selecionando aquela cena entre uma infinidade de outras possíveis. Isso é verdadeiro mesmo em se tratando do instantâneo familiar mais informal. O modo de ver do fotógrafo é reconstituído pelas marcas que ele faz na tela ou papel. Contudo, embora toda imagem incorpore uma maneira de ver, nossa percepção ou apreciação de uma imagem depende também de nosso próprio modo de ver. (BERGER, 1999, p.11-12)
Já Boris Kossoy, sobre fotografia, não fala apenas da aparência, mas
neste sentido de segunda realidade, ampliando assim o dizer de Berger.
A fotografia tem uma realidade própria que não corresponde necessariamente à realidade que envolveu o assunto, objeto registro, no contexto da vida passada. Trata-se da realidade do documento, da representação: uma segunda realidade, construída, codificada, sedutora em sua montagem, sem sua estética, de forma alguma ingênua, inocente, mas que é, todavia, o elo matéria do tempo e do espaço representando, pista decisiva para desvendarmos o passado. (KOSSOY, 2002,p.22)
Para Kossoy, a fotografia representa não simplesmente a aparência,
mas a organização desta, que é o suporte ideológico que direciona a
―construção estética da representação fotográfica.‖ (KOSSOY, 2005, p.40) Para
ele a fotografia é vista como um documento que pode servir a variados fins.
Sendo assim, a fotografia, como já dito por ele anteriormente, não revela um
olhar inocente, há objetivos.
Motivação, segundo Kossoy, é o que influirá na construção da imagem.
O fotógrafo capta com o seu enquadramento um modo de ver o que está
fotografando. A imagem não necessariamente refletirá ao receptor, que por
vezes poderá ser o próprio autor, o que o/no instante retratava. A história da
foto não naturalmente a acompanha, mas a história dos receptores sempre os
acompanhará. Assim a foto trará ao autor/receptor e aos receptores o seu
julgo.
Nos conteúdos dos documentos fotográficos se agregam e se mesclam informações e interpretações: culturais, técnicas, estéticas, ideológicas e de outras naturezas que se acham codificadas nas imagens. Essas interpretações e/ou intenções são gestadas (antes, durante e após a produção da representação) em função das finalidades a que se destinam
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as fotografias, e refletem a mentalidade de seus criadores. (KOSSOY, 2005, p.39)
A fotografia, diferentemente da pintura, não sofre o jugo continuo, pois
sua averiguação é posterior a da produção. O pincelar é diferente do clicar.
Hoje com as fotos digitais os descartes provocam sentimentos diferenciados
aos fotógrafos. Antigamente, após a foto ser tirada havia um certo ritual, o
tempo de espera para a revelação do filme. Atualmente, com a câmera digital,
o fotógrafo seleciona as imagens e faz descartes, sendo assim infere na sua
produção quase que simultaneamente. Mas é certo que não poderá trazer
novamente, o que é chamado de congelamento, aquele instante. Ocorreu aqui
também a mudança de suportes, antigamente tínhamos o filme fotográfico, o
negativo e a foto revelada. Agora, com a câmera digital a imagem que aparece
na tela desta toma o lugar do negativo e a foto não necessariamente será
impressa em papel, pois poderá tomar forma na tela do computador, na
televisão ou até mesmo em porta retrato digital. E poderá ser alterada, em um
programa de computador.
Para Kossoy, a fotografia é ambígua por natureza, não importa se
produzida a partir de uma realidade ou de uma ficção. De qualquer forma, a
fotografia documenta o instante, que embora para alguns ratifique o estático,
na verdade dinamiza, pois por meio ―da fotografia dialogamos com o passado,
somos os interlocutores das memórias silenciosas que elas mantêm em
suspensão.‖ (KOSSOY, 2005, p.35)
O diálogo com as imagens se faz necessário, Kossoy diz que
Apesar das ambiguidades, reconstituir é preciso e, para tanto, um sistemático e sensível exercício se faz necessário: devemos aprender a nos comunicarmos com as imagens, dialogarmos com elas, decifrarmos seus códigos e regatarmos suas realidades interiores, seus silêncios, isto é, seus significados, o sentido da vida e das idéias escondido sob a aparência de suas realidades exteriores, iconográficas, a realidade das aparências, aquela que encantou a Narciso. (KOSSOY, 2005, p.40)
56
Por sua vez o ilustrador Rui Oliveira salienta que a leitura de imagens
deveria atingir os bancos escolares, nos primeiros anos, antes mesmo do
aprendizado das letras. Pois
teríamos no futuro melhores leitores e apreciadores das artes plásticas, do cinema e da TV, além de cidadãos mais críticos e participativos diante de todo o universo icônico que nos cerca. A própria posterior alfabetização convencional seria muito mais agradável às crianças. (OLIVEIRA, 2008, p.29)
Assim teríamos a alfabetização visual, que segundo o autor valorizaria
os contornos das letras no curso da alfabetização. Ele ainda salienta que o
professor, tendo oportunidade, de posse de um livro deveria explorá-lo ao
máximo, dissertando objetivamente sobre ele, tornando-o uma experiência
visual dos aspectos que o compõe,
o ritmo, a linha, a textura, a cor etc., além de outros aspectos não-estruturais. Identificar unicamente sua relação ou adequação ao texto não explica todas as possibilidades e os interesses que despertam a imagem – tal pensamento faço questão de reiterar. Considero que a ilustração, quando realizada em plenitude artística, não é mais um objeto circunstancial, podendo tornar-se obra autônoma, fenômeno também observado na música. (OLIVEIRA, 2008 p.34)
Tratando da ilustração, Oliveira revela que ao ilustrar um texto precisa
antes de tudo ler, compreender. E que a ilustração terá inter-relação com o
texto, mas que não tem origem direta do texto. Assim, o que ele chama de
pessoalidade do ilustrador é marcado em sua obra, que não se sobrepõe ao
texto verbal. A leitura da ilustração é particular, pois segundo Oliveira
Vemos aquilo que esperamos ver.
Vemos a nossa ilusão e a nossa pessoal realidade a partir de uma ilustração de um texto. A mágica da ilustração é um truque que nós mesmos fazemos e revelamos. OLIVEIRA, 2008 p.32)
Algumas ilustrações suscitam mais leituras que outras, o ilustrador tem
como acepção a transformação do real em fascínio, podendo sugerir ao leitor
leituras, já que
57
um dos objetivos básicos do ilustrador é tornar incomum o comum, transformar o real em fantástico, sugerir e representar o que o leitor supõe ver. O espaço imaginário entre o visto e o não-visto é a área preferencial de atuação do ilustrador ante a sua inexorável referência a um texto. (OLIVEIRA, 2008 p.36-37)
A ilustração para este ilustrador deverá propiciar ao leitor outras leituras
e não uma leitura, um novo texto não-verbal.
A arte de ilustrar está assentada no equilíbrio e na harmonia entre a imaginação verbal e a imaginação visual. Em realidade, o que esperamos de um ilustrador é que ele seja um livre intérprete do texto, e não um médium. (OLIVEIRA, 2008 p.33)
A ilustração deve ser sempre uma paráfrase visual do texto, sempre uma pergunta, nunca uma resposta. O que é representando, mesmo com fisicismo próprio da ilustração, não deve ser de forma absoluta o objetivo descrito, mas sua sombra. O material a ser utilizado pelo ilustrador não está diretamente nas palavras, mas no espaço entre elas. É nesse espaço vazio, indefinido, nessa área crepuscular entre uma palavra e outra, que se localiza a ilustração. (OLIVEIRA, 2008 p.49-50)
A tradução de uma interpretação iconográfica pode se fazer tanto em
palavras quanto em silêncio. Para a ilustradora, Marilda Castanha, do livro O
gato no escuro, de Mia Couto, desvendou o medo dado no texto, segundo ela,
de forma poética a partir do colorido de suas ilustrações. Medo que sentia na
meninice, que foi representado pelo preto anexado ao arco-íris. Esta ilustradora
pôde ouvir a reelaboração de sua ilustração e do texto de sua filha, na época
com seis anos, e se surpreender ―ao ouvi-la dizer [...] que iria contar na escola
que não precisava ter medo do escuro. [...] ‗Porque eu também tenho um
escuro. E mora aqui dentro!‘‖ (Couto, 2008.p.39). Assim a menina traduziu a
leitura do texto literário para seu contexto, sua história de vida. Um gato no
escuro, que para Couto, é uma história contra o medo.
Neste mesmo livro, o moçambicano Couto revela o valor da narrativa
oral, que é forte em seu país, a competência do escutar e o quanto deseja que
seus filhos valorizem a voz do outro, para assim valorizarem a vida.
A maior parte dos habitantes da minha terra não sabe ler nem escrever. Mas eles sabem contar histórias. E sabem escutar.
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São pessoas que guardam essa meninice dentro de si e acreditam que esse olhar de criança é importante para ser feliz e produzir felicidade para os outros. Eu quis muito que os meus filhos aprendessem a escutar os outros a escutar a Vida.
(Couto, 2008.p.38)
Assim como a leitura iconográfica, o leitor do texto verbal, primeiro
precisa reconhecer o código para depois estabelecer relação entre o campo
vocabular de domínio e o que irá ampliá-lo. Alguns textos ainda,
simultaneamente, podem provocar a construção de imagens e até mesmo a
sensação do toque, a assimilação dos sons, odores e sabores, marcando
assim o conhecimento de mundo.
Segundo Moacyr Scliar
[...] nem só a textos a leitura se refere. Como diz Wilson
Martins em A palavra escrita [...] ‗ a escrita é apenas um –
provavelmente o mais perfeito e o menos obscuro – entre
inúmeros outros sistemas de linguagem visual: a essa mesma
categoria pertencem os desenhos, a mímica, os códigos de
sinais marinhos e terrestres, luminosos ou não, os gestos, em
particular a linguagem dos surdos-mudos etc.‘ se podemos
fazer a leitura de um filme, de um incidente, de um desenho,
isso quer dizer, na verdade, que estamos vendo esse filme,
esse incidente, esse desenho, como coisas paradigmáticas,
simbólicas. (SCLIAR, 2008, p. 31)
Scliar sinaliza o valor simbólico da leitura e que embora a fala seja
preponderante nas relações humanas é na escrita que a humanidade confere
historicamente o seu desenvolvimento. Aos leitores jovens, o autor sugere o
convite à leitura e não a leitura como cobrança, atividade, pois segundo ele
A casa da leitura tem muitas portas, e a porta do prazer é das
mais largas e acolhedoras.
O simbolismo que envolve a leitura mudou muito ao longo dos
milênios: simbolismo religioso, simbolismo mágico, simbolismo
de poder. Mas a leitura continua sendo um ato simbólico.
Simboliza aquilo que a humanidade tem de melhor. (SCLIAR,
2008, p. 40)
59
A partir da escrita e oralmente os sujeitos também ampliam suas
considerações sobre as demais linguagens. Segundo Severino Antônio, a
consciência tem a imagem como forma de se expandir e imaginar também
constitui conhecimento.
Imagens podem participar da elaboração de novos conceitos;
conceitos podem participar da gestação de novas imagens.
A imaginação é vital, para a sabedoria e a prática de
sobrevivência, assim como para a construção de
conhecimento, não só o artístico e literário, mas também o
filosófico, o científico e o cotidiano. Sem imaginação não
haveria elaboração ativa dos dados, não haveria interpretação
nem construção de teoria.
A desconsideração do pensar por imagens significa também
não considerar a literatura, e as artes em geral, como forma
genuína de conhecimento e de reflexão, especialmente sobre
nós mesmos. O pouco que sabemos de nossa condição
humana estaria vastamente empobrecido e desfigurado se não
existissem as tragédias gregas, a comédia, Dom Quixote,
Fausto, Hamlet, assim como os romances de Balzac,
Dostoievski e Machado de Assis – para citar apenas algumas
das obras e de autores mais significativos na tradição ocidental,
que são constitutivos do que sabemos e do que somos.
(SEVERINO ANTÔNIO, 2009, p.66-67)
Sobre a construção histórica da leitura e da escrita, de acordo com
Steven Roger Fischer, embora tenham uma relação imbricada, agem em partes
diferentes do cérebro. A primeira, considerada como aptidão que surgiu da
compreensão, e a segunda, como habilidade oriunda da elaboração. ―A escrita
é pública; a leitura privada. A escrita é limitada; a leitura, infinita. A escrita
congela o momento. A leitura é para sempre.‖ (FISCHER, 2006, p.8)
Quando Daniel Pennac descreve a experiência de leitura vivenciada por
um professor após ler um trecho do livro ―O Perfume‖ para alunos que não
teriam interesse por lê-lo, confere o valor da apropriação aos sentidos, a
sinestesia. Ainda avalia o leitor em um diálogo com o autor, tendo como
interlocutor real ele próprio, o professor: ―Caro senhor Süskind, obrigado! Suas
páginas exalam um cheiro bom de tempero que dilata as narinas e os baços,
60
fazendo rir. Jamais o seu Perfume teve leitores mais entusiastas que aqueles
trinta e cinco, tão pouco dispostos a lê-lo.‖ (PENNAC, 1993.p.109)
O leitor na relação que estabelece texto/leitor/autor reescreve o texto e
confere a ele o seu conhecimento de mundo e ainda o reelabora.
Para Angela Lago,
[...] o leitor é co-autor pelo simples fato de virar a página. É que a composição dos desenhos bidimensionais do livro prevê a terceira dimensão desse objeto. Assim, ao movimentar a página em diferentes ângulos de leitura, o receptor acentua a composição do desenho. Com a página em movimento, a intromissão da síndica passando de uma página a outra se torna bem mais evidente. (LAGO, 2008, p. 29)
Marisa Lajolo, ao tentar responder o que é leitura diz que esta
é a porta para variados mundos que nascem das várias leituras que dela se fazem. Os mundos que ela cria não se desfazem na última página do livro, na última frase da canção, na última fala da representação nem na última tela do hipertexto. Permanecem no leitor, incorporados como vivência, marcos da história de leitura de cada um.(LAJOLO, 2001, p.44-45)
61
O LOCUS E OS SUJEITOS – CONTEXTOS, SITUAÇÕES
Todos os dias atravessamos a mesma rua ou o mesmo jardim; todas as
tardes nossos olhos batem no mesmo muro avermelhado feito de tijolos e
tempo urbano. De repente, num dia qualquer, a rua dá para um outro
mundo, o jardim acaba de nascer, o muro fatigado se cobre de signos.
Nunca os tínhamos visto e agora ficamos espantados por eles serem assim:
tanto e tão esmagadoramente reais. Não, isso que estamos vendo pela
primeira vez, já havíamos visto antes. Em algum lugar, onde nunca
estivemos, já estavam o muro, a rua, o jardim. E à surpresa segue-se a
nostalgia. Parece que recordamos e quereríamos voltar para lá, para esse
lugar onde as coisas são sempre assim, banhadas por uma luz antiquíssima
e ao mesmo tempo acabada de nascer. Nós também somos de lá. Um sopro
nos golpeia a fronte. Estamos encantados... Adivinhamos que somos de
um outro mundo.(PAZ, 1982)
Quando escolho tratar de minha práxis o faço a partir dos educandos
que estão inseridos em um contexto. Neste caso vou tratar das atividades
vivenciadas por professora e alunos na Escola Estadual ―Pedro Moraes
Cavalcanti‖ (EEPMC), que fica em Piracicaba/SP. Marcarei aqui o período de
2006 a 2009, porém não o farei sequencialmente.
Saliento que no momento em que escrevo as escolas estaduais ainda
usam a nomenclatura série, à qual devo me referir, pois é assim que os alunos
se referenciavam.
Iniciei meu trabalho como docente na referida escola no ano de 2006,
cheguei após um processo de remoção. Estava anteriormente na cidade de
Monte Mor, onde cheguei a morar por quase um ano, lecionando na Escola
Estadual ―Maria Tonin‖. Nesta tive uma grata experiência, conheci o sentido de
partilha. Os alunos não tinham recursos financeiros, eram sedentos de afeto e
souberam retribuir mais do que realmente eu lhes pude dar em um ano.
62
Chegando na EEPMC, verifiquei que havia um grande contraste social
entre a escola de que me removia, da qual nunca vou me esquecer, e a escola
que estava me inserindo. O ambiente físico e as características dos grupos
(funcionários, professores e alunos), os valores. Ou seja, o perfil sócio histórico
cultural era diferente.
Sobre a estrutura da escola, o espaço escolar é bom: com salas amplas,
pátio bem arborizado e cuidados com a manutenção do prédio e do mobiliário,
assim como dos equipamentos (rádio, retroprojetor, TV, DVD etc)
A escola fica em uma região na qual hoje coexistem chácaras, sítios,
residências, clubes e empresas, mas que originalmente era uma região de
sítios e chácaras. Ela é conhecida como uma ótima escola e por isso muito
procurada o ano todo.
Embora a escola como um todo tenha uma forte influência nas relações
dadas em sala de aula, não tratarei aqui da escola como um todo e sim das
atividades vivenciadas em sala de aula, de Língua Portuguesa e Leitura, com
alunos do Ensino Fundamental e Médio, que por sua vez se inserem neste
contexto escolar. Porém marco aqui que as situações do espaço de sala de
aula podem ser diversas e será das vivências desta docente, junto a seus
alunos, que vou tratar.
A sala de aula é o espaço, o lócus de ação. Neste, a interlocução é
primordial. E é nele que trago a referência que tenho da importância de
trabalhar com a linguagem e reverenciar a literatura. Neste espaço, a
aprendizagem acontece em dupla vertente, as trocas são essenciais.
A docente e os educandos na atividade interativa da linguagem
marcaram esta pesquisa. Nas aulas com esta docente, os alunos trabalham em
grupo. No início de cada bimestre os grupos são formados pelos alunos, sob a
orientação da professora. E ao longo de cada bimestre, as atividades
cotidianas se estabelecem em grupos, na sala de aula ou em outros ambientes
da escola.
Esta forma de trabalho somente se ratificou a partir de meu segundo ano
na escola. No início trabalhava em grupo somente para atividades
diversificadas, mas com o passar do tempo percebi que o trabalho em grupo
63
poderia proporcionar uma resposta melhor para o processo de ensino
aprendizagem.
Hoje em dia, as atividades individuais acontecem, mas sem que o
posicionamento das carteiras na sala de aula tenha que ser em fila. Devo
salientar que o trabalho em grupo não se estabelece pelo simples fato dos
alunos posicionarem as carteiras. A organização em filas somente ocorre nas
avaliações individuais, como a Avaliação Bimestral.
Os alunos, ao longo dos quatro anos em que estou na EEPMC, já me
reconhecem como a professora que foi professora do irmão, do primo ou do
amigo. Só tive o prazer de dar continuidade ao meu trabalho por uma única
vez, duas turmas que neste ano estão na série final do Ensino Médio, com as
quais trabalhei durante 2006 e 2007 (da 8ª série ao 1º ano do Ensino Médio).
Mesmo que de longe, observo tanto os alunos com os quais estive por
maior tempo, quanto os com que só trabalhei por um ano. E quando tenho
oportunidade escuto os alunos sobre nossas vivências, assim como suas
novas conquistas e suas dificuldades.
Os alunos, de maneira geral, têm condições de acesso a leitura de
livros, jornais e revistas. Assim como ir ao teatro e ao cinema. Mas percebo
que só depois de instigados é que reconhecem o valor que a leitura e eventos
culturais agregam à constituição de suas formações. Por outro lado, eventos
como exposições ou visitas a museus são atividades que sequer são
levantadas pelos alunos como uma opção cultural fora da escola.
Quando pergunto aos alunos se possuem ou não livros em casa, boa
parte responde afirmativamente, mas não necessariamente os livros lhes
pertencem. A partir do momento que tomam gosto pela leitura, então passam a
ter o livro como objeto de desejo e se reportar a este como o que lhes
pertence.
Ao longo dos anos, sempre proporcionei e reverenciei o contato com a
cultura, fosse este a partir da leitura dos mais diversos gêneros, de visita a
exposições, assistir a peças de teatro, assistir filmes etc.
64
Minha relação com os alunos é de respeito, acredito que somente
atuando com respeito é que posso exigir o mesmo. Até o momento tenho tido
um bom resultado.
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OS PERCURSOS VIVENCIADOS
[...] ler é mais do que atribuir: é criar significados. Em uma atitude de
quem interroga e se admira, o leitor vai escrevendo, nos espaços abertos
pelo escritor, um outro texto.(DEIETZSCH, 1993, p. 40)
Para que possa trabalhar com minha práxis devo apresentar minha
prática. Após selecionar algumas que coadunam com a pesquisa, tentei
organizá-las cronologicamente, sem deixar, contudo, de marcar seus
pertencimentos.
Alguns projetos têm se reinventado, diante de seus interlocutores, já que
os projetos, mesmo quando pautados em outros anteriores, nunca são os
mesmos, a situação não é a mesma, por seus participantes e a história não se
repetirem.
A divisão dos percursos se deu da seguinte maneira: no CAPÍTULO II,
PERCURSOS: AS VIVÊNCIAS QUE MARCAM O ENTRELAÇAMENTO DOS
PROJETOS, as atividades apresentadas marcam o entrelaçamento que os
projetos promovem nas ações dadas em sala de aula, no dia-a-dia, como
produções e interpretações textuais.
Já no CAPÍTULO III, PERCURSOS - PROJETOS: DO RASCUNHO AO
QUE FOI DESENHADO serão apresentados alguns projetos desenvolvidos ao
longo dos dois últimos anos que trabalhei na EEPMC, aqui denominados:
Projeto ―Passarela Cultural: expressões idiomáticas em artes
visuais‖;
Projeto ―Caçadores de nuvens‖;
Projeto ―Um tigre de papel‖.
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Faço agora um convite que tem se repetido nos trabalhos elaborados
por meus alunos, de diversas formas, o convite à leitura. Escolho aqui uma das
formas: Caro leitor, para conhecer nossos percursos basta que você ―vire as
páginas‖. Nossos percursos, pois foram trilhados por esta docente e seus
educandos e podem agora receber novos olhares.
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CAPÍTULO II
PERCURSOS: AS VIVÊNCIAS QUE MARCAM O ENTRELAÇAMENTO DOS
PROJETOS ANALISADOS
Na esfera da cultura, todavia, não há fronteira absoluta entre a carne e o
sentido: a cultura não se edifica a partir de elementos mortos, e o vulgar
tijolo [...] entre as mãos do construtor, expressa algo através da forma que
lhe é própria. Por isso, a descoberta de novos suportes materiais do sentido
introduz correções nas concepções do sentido e pode até acarretar uma
reestruturação fundamental destas concepções. (BAKHTIN,
M.,2000,p.367)
Se não formulamos nossas próprias perguntas, não participamos de uma
compreensão ativa de tudo quanto é outro e alheio (trata-se, claro, de
perguntas sérias, autênticas) (BAKHTIN, M.,2000,p.368)
Os projetos não são mundos circunstanciados neles mesmos e sim
podem ser uma abertura para o mundo social. Ao longo dos anos de minha
docência venho trabalhando com projetos e estes orientam novas atividades,
assim como algumas atividades proporcionam a organização de um projeto.
Desta forma, no meu fazer docente projetos e atividades complementares têm
uma relação imbricada. Esta relação se faz tanto pelo tema quanto pelo
conteúdo nas situações vivenciadas e desenvolvidas diante das proposições
levantadas. No cotidiano escolar, o movimento que se forma na relação
interlocutiva professsor/aluno é que tem me norteado nas mais diversas
vivências que tive.
Os projetos e atividades desenvolvidos tomam corpo e interferem no
cotidiano das demais áreas do conhecimento, assim como os alunos acabam
trazendo o conhecimento apreendido em outras áreas para as nossas
vivências. Desta forma, os alunos acabam percebendo que o processo de
ensino aprendizagem tem em si a faculdade de construir elos. Mesmo quando
68
estes não são percebidos, tanto pelo professor quanto pelo aluno, os elos
adormecidos também movimentam o processo de ensino aprendizagem.
Neste capítulo, para dar um plano geral de algumas atividades
desenvolvidas, relato um breve histórico delas e apresento os laços que estas
tiveram com outras atividades, constantes desse trabalho ou não. A ordem da
sequência procura promover um diálogo entre as atividades quando com uma
mesma classe/turma.
A s atividades se apresentam na seguinte sequência:
Projeto Mosaico;
Relato das aulas de Língua Portuguesa;
Projeto Fotonovela;
Projeto O livro que li;
Projeto Leitura Dramatizada;
O poema-canção como referência para produção de cenas;
Projeto Lendo nas sombras;
De um material de divulgação à ficção;
Alunos autores de avaliação;
Novos projetos traçados e/ou de desejo.
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Projeto Mosaico
Breve histórico
O Projeto Mosaico tem acompanhado o meu fazer docente desde o
período da graduação. Nesta época, em 2003, o projeto voluntário Mosaico foi
realizado na EMEF ―Prof. Francisco de Almeida Kronka‖ (Piracicaba/SP), com
alunos do Ensino Fundamental do Ciclo I, como uma extensão das atividades
de Estágio Supervisionado da Habilitação de Português do Curso de Letras
Português/Inglês.
No início, o projeto contou com quatro alunas voluntárias, eu mais três
colegas do curso de Letras da Universidade Metodista de Piracicaba.
Tínhamos como objetivo contribuir para que os alunos percebessem que o
texto é trabalho, que exige planejamento. Assim, ampliando o contato com a
leitura e a escrita aliado ao fazer do mosaico, conseguimos avançar no
processo de ensino aprendizagem, com as quatro turmas. Mas por diversos
fatores, após o primeiro semestre, três voluntárias precisaram deixar o projeto
e acabei dando continuidade sozinha.
Na continuidade do trabalho, montei novas turmas e desenvolvi o projeto
por dois anos. No segundo ano, com um grupo de 4ª série, uma sala de aula
na qual estavam todos os alunos que tinham dificuldade de aprendizagem. Foi
um trabalho mais denso, no qual aprendi muito, pois as dificuldades me faziam
buscar novas estratégias.
O trabalho consistia no trato com a leitura e a escrita, no primeiro
momento do encontro, e posteriormente trabalhávamos com o mosaico.
Na construção do mosaico, a concepção do desenho, a transposição
para a placa de madeira, a atenção para as orientações, a sequência de ações
para constituir a imagem desenhada/desejada, faziam parte do processo. Este
era sempre evidenciado, eu conversava com os alunos sobre a importância de
seguir o risco do desenho para conseguirmos o resultado que desejávamos.
Assinalava como a produção do mosaico se assemelhava a do texto: o
planejamento e a construção.
70
Estabelecer relação entre o texto verbal e a produção artesanal que
estávamos construindo fez com que os alunos se aproximassem cada vez mais
da produção escrita, assim como tivessem o tempo de atenção ampliado, texto
oral mais crítico, organização na construção textual escrita, auto-avaliação,
auto-estima, percepção do valor social da escrita e percepção das faces
textuais propostas: oral, escrita e artística (mosaico).
Quando os quadros ficavam prontos, eles eram pendurados nos
corredores da escola e produziam diálogos entre aqueles que participavam do
projeto e os que não. As famílias também participavam do processo, trazendo
os alunos e observando o trabalho, assim como colaborando com materiais.
Em 2005, na Escola Estadual Maria Tonin (Monte Mor/SP), ano em que
iniciei meu trabalho como professora, em escola pública, o projeto tomou um
novo formato no que concerne o objetivo. Neste caso o Projeto Mosaico
pretendia, a partir da revitalização do espaço escolar, unir os alunos em torno
de um objetivo.
Ao juntar os cacos, produzimos laços entre os alunos e a escola. Ainda
conseguimos valorizar o trabalho artesanal e apresentá-lo como profissão,
assim como valorizar o trabalho com a construção civil, a qual era base do
sustento familiar de boa parte dos alunos.
FIGURA 1 – Tampo de mesa recuperado com trabalho em mosaico, para expor trabalhos dos alunos
Fonte: acervo da Pesquisadora
Já na Escola Estadual Pedro Moraes Cavalcanti, a partir de 2006, o
projeto teve forte ligação com o construir e valorizar o espaço escolar, ainda
71
dar oportunidade de dialogar com os alunos fora do horário de aula. O projeto
contou com a participação da professora de Arte. Com o projeto conseguimos
demonstrar que o planejar é peça primordial para o executar e que criar é
possível, além de prazeroso. Com esta atividade o espaço escolar recebeu um
colorido especial, já que as mesas externas da escola foram trabalhadas.
O entrelaçamento das áreas do conhecimento, tendo em vista que
nenhum conhecimento é facetado, foi importante para que os alunos
compreendessem como o sujeito se constitui na busca do conhecimento. Os
alunos se envolveram no projeto, durante todo evento foram exploradas as
habilidades dos participantes de forma que a atividades propiciassem a
representação estética de suas idéias. Sendo assim, foi possível despertar
para a prática aliada à técnica.
Algumas mesas produzidas pelos alunos em 2006.
FIGURA 2 – Mesas externas da escola
Fonte: acervo da Pesquisadora
Em 2007 e 2008 o projeto teve continuidade aliado ao projeto Jornal
Mural, construímos um painel para receber as colunas do jornal.
72
Ao observar as mudanças que o projeto mosaico sofreu, posso perceber
que um aspecto não mudou, foi o da união, formar grupos em torno de um
objetivo.
73
Relato das aulas de Língua Portuguesa
Breve histórico
Desde o início de minha docência tenho como prática dialogar com
meus alunos. Ainda para poder ampliar a percepção do processo de ensino
aprendizagem no qual estamos envolvidos (professor/aluno) e promover uma
autoavaliação solicito, ao final de cada bimestre, que cada aluno escreva um
breve relato de nossas aulas, a partir de sua visão. Neste relato o aluno pode
tratar livremente de suas dificuldades, das atividades de que mais gostou e das
que não gostou. Ainda pode fazer sugestões.
Antes de solicitar a produção do relato, logo no começo do primeiro
bimestre, falo um pouco sobre a forma composicional e o estilo do gênero
relato de experiência vivida. Depois informo que ao final de cada bimestre vou
solicitar um relato das minhas aulas e que este texto não será avaliado para
nota e sim lido e analisado para uma avaliação do nosso processo de ensino
aprendizagem.
Nestes relatos percebo que até mesmo alunos que normalmente têm
dificuldade de atender a outras solicitações acabam se saindo bem, no que
concerne ao atendimento à solicitação e ao gênero.
A partir da produção dos alunos posso me reorganizar para o próximo
bimestre. Procuro fazer um levantamento das dificuldades e das sugestões
levantadas por eles. Levo este levantamento para a classe para que possamos
discutir os problemas apresentados e organizo atividades procurando saná-los.
O redirecionamento dos bimestres não se faz apenas pelos relatos, mas
não posso deixar de pontuar que estes têm colaborado e muito para novas
estratégias de trabalho. Ainda têm confirmado que trabalhar com projetos nos
quais os alunos se mostram autores é de suma importância.
Uma atividade simples, que tem me ajudado muito no fazer docente,
talvez por oportunizar o dizer e o escutar, a troca, a interlocução, buscando
74
respostas. Desta forma, esta atividade se entrelaça com todas as atividades
dadas em sala, já que faz criticas, elogios e sugestões de novas atividades.
Abaixo seguem alguns relatos:
ANO/
BIMESTRE
SÉRIE/
ANO
RELATO
2006/2º 5ª No começo tudo era difícil [..] no dia da apresentação do poema O
homem e as viagens fiquei tremendo de medo e muito nervoso[...]
tinha dias que eu estava de bom humor, mas tinha dias que eu estava
muito chato ficava com a cara fechada [...] mas fique tranquila que a
cada dia que passa eu vou ficando melhor. Danilo Moreira
2006/3º 5ª Todas as aulas de português são ótimas [...] no primeiro bimestre eu
estava muito devagar, mas agora eu reconheço que estou melhorando,
minha letra nem eu mesmo entendia.[...]
No dia em que a professora marcou a prova eu pensei, se eu estudar
bastante eu posso ter um bom resultado, pois então eu estudei. Então
no dia 17/07/06 eu percebi que eu sou capaz de melhorar
Parabéns professora Cibele você é uma ótima professora.
Eu aprendi todos os significados de toda vez que a senhora falou alto,
e me chamou a atenção.
Se não fosse a sua paciência talvez hoje eu não teria aprendido tudo
isso. Danilo Moreira
2006/4º 5ª As aulas de português deste ano foram muito boas. Eu aprendi a
conviver com pessoas diferentes e aprendi muito sobre português [...]
meu desenvolvimento foi muito bom[...] meu comportamento
melhorou [...] adorei a ideia da professora de formar duplas
cooperativas. Danilo Moreira
2006/4º 8ª [...] Gostei muito de trabalhar com reescrita de texto com problemas.
Achei interessante o fato de podermos deixar alguns textos com mais
“cara” de texto (organizado, sem erros ortográficos, com elos de
coesão e coerência estabelecidos ao longo do texto, etc). Só não achei
muito interessante aprender referenciação [...]
Na minha opinião as aulas de português estão como sempre: rendem
muito (pelo fato do conteúdo apresentado) tanto por parte de nós,
alunos, quanto por parte da professora. Eduardo Antunes
2008/4º 1º EM No ano de 2008 nossa sala teve uma grande dificuldade para se
adaptar com o estilo das aulas de Língua Portuguesa, mas após um
curto tempo todos começaram a se acostumar com as aulas e se
interessar mais com o português e a literatura.
Eu sofri uma grande mudança este ano, pois passei a ler alguns livros,
coisa que era muito rara. Agora procuro sempre saber mais.
As aulas nos incentivam a ler e ser mais críticos e perceptivos, este
foi o ano que eu mais adquiri conhecimento na matéria de Língua
Portuguesa. Richard B. Francisco
2009/4º 5ª [...] aprendi a trabalhar em grupo e respeitar as idéias dos meus
colegas. [...] Letícia Nobre
75
2009/4º 5ª Neste bimestre aprendi várias coisas, entre elas: leituras e análises de
textos, oralidade, produções escritas em várias etapas, pesquisas[...]
reescrita [...]
Eu nunca vou esquecer esta aula, pois a professora Cibele [...] é
compreensiva, amiga e quando não entendemos explica + de mil
vezes [...]
Também gosto do jeito que trabalha, em grupos, com placar, com
rotina, é muito responsável, etc.[...] Júlia Teresa C. Nunes
QUADRO1 – Relatos de alunos Fonte: produção dos alunos
Os três primeiros relatos são de um mesmo aluno, que não aceitou
escrever o texto no primeiro bimestre, mas escreveu nos demais. Os relatos de
Danilo foram marcantes. Quando menciona ―falou alto‖, remete a toda vez que
ele estava na classe, mas seus pensamentos não estavam lá, assim
procurando trazê-lo de volta eu falava seu nome bem alto, e ele retornava.
Nestes momentos, eu fazia com que ele participasse da aula, pois sabia que
quando o Danilo não estava entendendo alguma coisa, não perguntava e sua
estratégia era passar a não ouvir mais.
Ele era um aluno que se escondia o tempo todo, até mesmo na forma de
se vestir, não tinha um comportamento que incomodava o andamento da sala,
mas me deixava aflita, já que ele não conseguia prosseguir. Tivemos muitas
conversas nas quais eu tentava ―levantar‖ sua autoestima. A mudança que teve
no processo de ensino aprendizagem foi enorme.
Durante os anos que não estivemos como professora e aluno me afastei
presencialmente dele, pois nossos horários não batiam, mas nos últimos
bimestres de 2009 tive oportunidade de me encontrar, não só com ele como
com as turmas das 5ª séries de 2006, e percebi que ainda havia uma forte
ligação.
Conversando com Danilo, ele me confidenciou ―sabe professora eu
nunca mais fui mal na escola‖, então sinalizei que ficava muito contente e que
sempre perguntava dele para os professores. Nosso encontro durou alguns
minutos, mas foi tempo suficiente para perceber que nós fomos importantes um
para o outro.
Estes encontros com ex-alunos têm se repetido e me levado a continuar.
76
Os demais relatos são todos do quarto bimestre, de alunos diferentes.
Escolhi este bimestre, pois no final do ano letivo, normalmente, os alunos
relatam todas as vivências.
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Projeto Fotonovela
Breve histórico
O projeto fotonovela aconteceu em 2006, na Escola Estadual Pedro
Moraes Cavalcanti, com alunos da 8ª série do Ensino Fundamental nas aulas
de Leitura e de Língua Portuguesa. Após vários trabalhos de análise de textos
literários e leituras dramatizadas destes, levei para as classes exemplares de
fotonovelas de 1960 a 1980. Observamos primeiro as mudanças que as
fotonovelas tiveram ao longo do tempo, as propagandas que as revistas
traziam, o fato das últimas fotonovelas serem coloridas e não serem revistas
apenas de fotonovela como no início, mas da fotonovela fazer parte de uma
revista, no caso das observadas, revistas que tratavam de artistas de televisão.
Por ser este um gênero de que eles nunca tinham ouvido falar, ficaram
curiosos. À medida que estudávamos o gênero, para a produção de uma
fotonovela, começaram a aparecer as dificuldades e as propostas de soluções.
Os alunos de Leitura produziram o texto para atender ao gênero
fotonovela, já os alunos de Língua Portuguesa fizeram adaptações de textos
literários para a fotonovela. As fotos foram feitas na escola, por vezes em
horário oposto ao de aula, com a minha coordenação.
Antes de tirar as fotos, os alunos, em grupo, faziam o levantamento das
cenas que precisariam produzir e das necessidades materiais que teriam para
esta produção. Na sequência, agendavam a data da foto e traziam o material
para a escola. Após as fotos serem tiradas, os alunos começavam a introduzir
o texto. Em algumas montagens de texto e cena fotografada perceberam que
faltavam fotos, ou algum elemento na foto, nestes casos, faziam adaptações no
texto ou tiravam outra foto.
Tanto os alunos que produziram o texto, quanto os que fizeram
adaptação tiveram a minha orientação por vários dias para correção dos textos,
mas só conseguiram efetivamente compreender que a imagem não era
simplesmente a repetição do que o texto dizia na montagem. E foi neste
momento que os acertos finais aconteceram.
78
Seguem trechos de duas fotonovelas produzidas pelos alunos:
O carro preto
investiu a multidão.
Registrou-se correria da
multidão...Foi pisoteado 17 vezes.
O guarda não conseguiu identificar Dario.
Na mão esquerda, restava a aliança, que nunca saia de sua
mão.
No café próximo,
observadores, que bebiam e
gozam as delicias da
noite.
Precisamos examinar os documentos que ele tem.
Ele era de outra
cidade, tinha um sinal de
nascença.
Houve correria, era
a polícia
Ele morreu!!Levou 2 horas para
morrer. Agora tinha ar de defunto. Um senhor piedoso acomodou o
morto, de boca e olhos
abertos.
Moradores observavam.
Parecia morto há muitos anos.
...uma a uma fecharam.
A vela apagou-se às primeiras gotas da chuva, que voltava a cair...
FIGURA 3 a 6– Fotonovela ―Uma vela para Dario‖ texto de Dalton Trevisan adaptado para fotonovela pelos alunos
Fonte: acervo da Pesquisadora
FIGURA 7 a 9 – Fotonovela ―Gargalhada sinistra‖ texto produzido pelos alunos Fonte: acervo da Pesquisadora
Cheia de raiva, resolve não colocar o
telefone no gancho e responder.
Seu idiota não tem o que fazer?
Estou longe do centro da
cidade, acho que devo avisar
alguém.
Ligo ou não ligo?
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O projeto possibilitou o trabalho com duas linguagens, o texto escrito e a
fotografia. Ainda, durante a montagem, cada grupo explorou seus
conhecimentos de informática para poder compor o trabalho. No caso dos dois
trabalhos apresentados, o primeiro usou recursos do Word e o segundo do
Power Point. A troca de saberes foi importante para que o trabalho fosse
concluído e, como deve ser, ao longo do percurso, aprendemos muito.
80
Projeto o livro que li
Breve histórico
O projeto o livro que li tem me acompanhado ao longo de minha
docência, já tomou vários formatos. No início levava uma caixa grande com
aproximadamente 60 títulos, de vários gêneros textuais, e permitia que os
alunos lessem e depois indicassem ou não a leitura. Os alunos recebiam uma
ficha para escrever sua impressão do livro e fazer a indicação.
Posteriormente consegui adquirir livros em quantidade suficiente para
montar grupos que leriam um mesmo livro e depois apresentariam a leitura
para a sala. Este formato tem se mantido, é o projeto que chamo de
―quadradinho‖, não parece ser um dos meus projetos, já que tem regras para a
leitura. E por que então ele tem se mantido?
No início do ano sempre faço uma pesquisa junto aos alunos para saber
o que leem, quando leem, como leem. Normalmente não recebo a resposta de
que gostaria, os alunos não têm no objeto livro o desejo de pertencimento.
Assim, começo com leituras de contos, poemas, discuto estas leituras. Depois
conto histórias pra eles. Contar histórias tem funcionado muito bem, penso que
é este o ponto, pois eles costumam ficar impressionados com a forma que
conto as histórias e este é meu mote. Então levo uma caixa de livros e
apresento o projeto para eles. Todas as salas sabem, desde o início do ano,
que cada aluno deverá ler no mínimo quatro títulos e que junto com seu grupo
irá apresentar esta leitura para os colegas da classe.
Não é um projeto inovador, mas ele tem amparado os outros projetos
que desenvolvo com as mesmas salas. Ao longo do ano, a grande maioria dos
alunos toma gosto pela leitura e as apresentações vão ganhando corpo, tendo
como amparo outros projetos e/ou atividades, por exemplo, o projeto Leitura
Dramatizada e Poema-Canção como referência para produção de cenas
colaboram muito com o Projeto O livro que li, pois os alunos passaram a criar
cenas para fazer a propaganda dos livros.
81
Outro fator importante que o projeto resgata é o da responsabilidade
para com o material. O livro é emprestado pela professora e o aluno deve
devolver no dia da apresentação. Cada grupo discute quem fará o que e depois
de definido entrega por escrito para a professora, qualquer alteração deve ser
avisada com antecedência. No momento da apresentação, um aluno apresenta
o grupo e introduz o que cada um fará, caso algum aluno não cumpra com sua
parte o grupo pode trazer a justificativa e apresentá-la.
As tarefas tratam dos elementos da narrativa (foco, enredo, tempo,
espaço e personagens), que são apresentados das mais diversas formas,
ganhando atributos no decorrer dos bimestres.
Normalmente definimos a apresentação no início de cada bimestre e os
alunos podem dar sugestões. Há liberdade no uso de cartazes e/ou da própria
lousa. Antes de apresentarem para a classe, os alunos fazem uma prévia para
a professora e são orientados.
Assim, com este projeto os alunos aprendem a organizar uma
apresentação, a se portar na frente da classe, a cumprir com o que se
comprometeram e o mais importante, que ler é compreender.
FIGURA 10 a 14 Apresentação Projeto o livro que li Fonte: acervo da Pesquisadora
82
Projeto Leitura Dramatizada
Breve histórico
O Projeto leitura dramatizada vem sendo desenvolvido desde 2006, com
alunos de todas as séries com as quais já trabalhei. Este projeto consiste no
estudo de um texto para posterior apresentação deste; não depende de
recursos ou de grandes organizações, desenvolvido em sala de aula pode ser
apresentado tanto para outras salas quanto para os próprios colegas da classe.
Normalmente inicio a leitura de um texto com os alunos, pontuando
todas as características estruturais do texto, como: número de parágrafos, se
poema número de estrofes e de versos, pontuação etc. Depois faço uma leitura
que chamo de pontuada/entonada, marcando bem a pontuação e mudando o
tom de voz dependendo do que o texto solicita. Na sequência, solicito aos
alunos que passem caneta colorida nas pontuações e numerem os parágrafos,
no caso de um texto em prosa e as estrofes e versos no caso de um texto em
verso.
Após este primeiro reconhecimento do texto, fazemos nova leitura e
montamos um glossário. Então, discutimos o texto, após o conhecermos bem
os grupos dividem a leitura. Neste momento, ensino a legendarem as partes
que conferem a cada aluno. No caso do diálogo de uma narrativa, o
personagem A terá sua fala colorida de uma cor, o narrador de outra, o
personagem B de outra e assim por diante.
Depois do texto legendado, os alunos fazem a leitura, experimentando-a,
percebendo a necessidade de marcar o como irão ler. Neste ponto, sugiro que
eles marquem na frente de suas falas com qual sentimento irão ler (raiva, ódio,
calma, tristeza, alegria, euforia, ironia etc).
Marcamos ensaios e o dia da apresentação. Durante os ensaios, que
são feitos na parte externa da escola, os grupos são separados de tal forma
que um não possa ouvir o outro, a professora assiste e dá sugestões.
As apresentações, ainda que de um mesmo texto, são muito particulares
e cada grupo recebe um parecer oral da professora e da classe, assim que
83
terminam. Neste momento, são levantados os pontos positivos e os negativos,
assim os grupos conseguem melhorar a cada apresentação.
Para a leitura dramatizada não há cenário, nem mesmo figurino. O que
marca a apresentação são as expressões corporais e a entonação de voz.
Após a primeira apresentação, faço uma por bimestre, os alunos ficam mais
soltos e começam a usar mais o espaço da sala para a apresentação. Costumo
desenhar na lousa o espaço que temos, explicando que a sala está montada
no formato de um U e que a apresentação se dará em um T, assim eles podem
desenhar como farão cada cena, onde cada personagem se posicionará.
A partir da segunda apresentação, normalmente no segundo bimestre,
os grupos é que propõem os textos e todo trabalho desenvolvido à maneira do
que foi feito anteriormente com a sala é realizado pelo grupo, com orientação
da professora, em dias estipulados.
Este projeto tem me surpreendido a cada ano, pois colabora muito com
alunos tímidos e com alunos com dificuldade de aprendizagem, tanto no
reconhecimento do grupo das potencialidades destes alunos quanto para que
eles mesmos se reconheçam como potencialmente capazes.
Os alunos gostam muito de se apresentar e acabam se identificando
com alguns textos, buscam outros do mesmo autor ou do gênero. Percebo que
a atividade é assunto de intervalo, assim como os livros que leem. Desta forma,
a atividade de sala abarca o cotidiano deles.
Um novo movimento deste projeto é a apresentação de textos dos
próprios alunos, o que confere muito trabalho na produção escrita para
posterior apresentação, mas que promove excelentes resultados.
Seguem alguns trechos de textos legendados pelos alunos para
apresentação. O primeiro Chapeuzinho Vermelho e o segundo um texto criado
por um grupo de alunos, intitulado Encontros e desencontros.
84
FIGURA 15 - Texto legendado para apresentação de leitura dramatizada –
2007/5ª A – aula de Língua Portuguesa Fonte: produção dos alunos
85
FIGURA 16 a 17 - Texto legendado para apresentação de leitura dramatizada – 2007/7ª C – aula de Leitura Fonte: produção dos alunos
86
O poema-canção como referência para produção de cenas
Breve histórico
A atividade foi desenvolvida em 2009, com alunos da 5ª série do Ensino
Fundamental, na Escola Estadual Pedro Moraes Cavalcanti. Desde 2008 a
Secretaria do Estado de São Paulo tem encaminhado um material com
sugestões de atividades. Em 2008 o material foi entregue apenas para os
professores, já em 2009 os alunos também receberam o material (chamado
Caderno do Aluno). Aqui cito o material não para discuti-lo, mas apenas para
situar que foi a partir de uma atividade proposta pelo caderno que criei esta
atividade.
A proposta era de trabalhar com letras de música que tivessem
elementos da narrativa, apontar estes elementos. Selecionei algumas das
atividades, usei os textos disponibilizados para outras atividades que levei para
os alunos e as discutimos.
Na sequência, solicitei aos alunos que trouxessem letras de música que
contassem uma história e levei algumas. Os alunos, em grupo, discutiram
sobre as letras que levaram e selecionaram uma.
A proposta foi transformar o poema canção em uma cena teatral, para
que eles pudessem apresentar para sala e os outros grupos tentarem descobrir
a música que gerou a cena.
Esta atividade teve como suporte outras que vínhamos desenvolvendo,
como o Projeto o livro que li e o Leitura Dramatizada, anteriormente relatadas.
Seu desenvolvimento ampliou as apresentações seguintes do Projeto o livro
que li, os alunos, que já se posicionavam melhor no momento das
apresentações se soltaram ainda mais. E, o Projeto Leitura Dramatizada, que
colaborou com o Projeto o livro que li, foi importante para esta atividade na
desenvoltura dos alunos no uso do espaço cênico.
Percebi neste contexto que os alunos conseguiam reconhecer que as
atividades tinham um forte entrelace, não só com a minha disciplina, pois eles
relatavam que estavam se saindo bem nas apresentações de outras áreas.
87
FIGURA 18 a 21 - Poema canção como referência para produção de cenas Fonte: acervo da Pesquisadora
88
Projeto Lendo nas sombras
Breve histórico
A atividade foi desenvolvida em 2009, na Escola Pedro Moraes
Cavalcanti, com alunos da 5ª série do Ensino Fundamental. E para este
projeto, diferentemente do Projeto O livro que li, usei livros do acervo da
escola.
Ao longo do ano, toda vez que terminávamos uma atividade individual,
ou um grupo terminava a atividade antes dos outros, eu liberava para a leitura
uma pequena biblioteca que havia na classe. Os alunos se dirigiam até o
armário, escolhiam o livro e retornavam a sua carteira para leitura, enquanto os
outros colegas terminavam a atividade. Alguns alunos levavam o livro para
casa, outros esperavam a próxima oportunidade.
No final do terceiro bimestre, já havia desenvolvido muitas atividades de
leitura com os alunos, mas queria poder propiciar a eles um momento de leitura
em um espaço mais aconchegante. Conversei com os alunos, como estávamos
bem adiantados com nossos projetos e alguns estavam terminando, disse a
eles que, uma vez por semana, iriam ler o livro que escolhessem. Para isso, eu
iria trazer mais livros para sala e no dia da semana estipulado eles poderiam
trazer almofadas e tapetes, para que pudéssemos nos organizar embaixo das
árvores da escola.
Os alunos escolheriam um livro que iniciariam a leitura na escola e
poderiam levar para casa para terminar a leitura. Na semana seguinte,
poderiam trocar o livro com um amigo ou continuariam a leitura. Ainda, tinham
a possibilidade de escolher entre os livros que tinham ficado na prateleira do
armário.
No dia da atividade, cada aluno escolheu um livro e se dirigiu para um
dos espaços externos arborizado com que a escola conta, escolhido pela
classe. Acomodados à sombra das árvores, eu e os alunos líamos.
89
Nas semanas que seguiram, os alunos começaram a fazer as trocas.
Para isto, trocavam informações sobre os livros. Com o tempo, o espaço de
leitura de uma semana se tornou longo, traziam o livro para escola, liam no
intervalo e trocavam, entre eles antes mesmo do dia da leitura. Acreditavam
que eu não percebia as trocas.
A organização de retirada dos livros era feita em um caderno, no qual
cada aluno anotava o livro que estava lendo, naquela semana. Quando percebi
que eles estavam trocando os livros antes mesmo do dia, solicitei que no dia da
leitura anotassem os livros que tinham lido, para que eles tivessem este
controle. Alguns livros chegaram a ser disputados. E foi importante ter um livro
em minhas mãos, eles sempre queriam trocar de leitura comigo, assim como
pediam minha sugestão quando estavam entre uma leitura ou outra.
Nos dias em que a grama estava muito úmida, usávamos as mesas que
ficam embaixo das árvores, em dia chuvoso, organizávamos a sala para nosso
momento de leitura.
Muitos alunos iniciaram desistindo da leitura e procurando outro texto,
seguiram assim por umas três semanas, mas acabaram se encontrando com
os livros. Outros gostavam de ler trechos, do livro que estavam lendo, para os
colegas.
Cheguei a pensar se não tinha iniciado tarde este projeto, mas percebi
que não, pois os projetos de leitura que trabalhamos anteriormente ampararam
este em sua organização e sequência.
Meus alunos estavam lendo, fazendo escolhas, falando sobre o que liam
e se sentindo leitores. O melhor deste projeto foi poder vivenciar a leitura com
eles.
As fotos do projeto Lendo nas Sombras, que seguem, tem a presença do
marcador em formato de tigre, este representativo do Projeto Um tigre de
Papel, que colaborou com a formação de leitor dos educandos. Este projeto
será descrito e analisado no próximo capítulo.
91
De um material de divulgação à ficção
Breve Histórico
Esta atividade foi desenvolvida em 2008, com alunos do 1º ano do
Ensino Médio, na Escola Estadual Pedro Moraes Cavalcanti. Já tínhamos
desenvolvido um projeto chamado O sabor da Língua, no qual trabalhamos
com a linguagem mista na produção de foto-legendas que marcassem o
sentido figurado e literal da frase título do projeto. Ainda tínhamos iniciado o
projeto com expressões idiomáticas, entre outras atividades.
Os alunos receberam o material de divulgação do livro Natureza radical,
que segue abaixo
92
FIGURA 28 a 30 - De um material de divulgação a ficção Fonte: acervo da Pesquisadora
Cada grupo teve que escolher dois animais e dizer o porquê da escolha.
Na sequência, foram orientados para levantar as características dos dois
animais escolhidos. Após esta etapa, os alunos souberam que iriam produzir
um texto, no qual dois de seus personagens teriam as características que eles
haviam levantado, não necessitando que os personagens fossem animais. A
produção deveria ser elaborada em sala de aula e apresentada para a classe,
em uma transparência. A classe, dividida em grupos, deveria dar sugestões
para o texto de cada grupo, que reescreveria e apresentaria novamente sua
produção. As sugestões poderiam ser acatadas ou não e se não fossem o
grupo deveria informar o porquê.
Os grupos reescreveram duas vezes o texto, no final, entregaram as três
versões, com uma breve apresentação do trabalho e as sugestões, em forma
de perguntas, feitas pelos grupos.
A atividade possibilitou aos alunos discutirem suas produções a partir da
análise das questões levantadas pelos colegas. O processo de reescritura teve
como norte o outro, o leitor. A articulação das ideias se deu, por vezes, no
momento da discussão do porquê de não aceitarem a intervenção dos colegas,
o que os levou a relativizar ou manter o que o grupo havia decidido.
Na sequência o trabalho de um dos seis grupos
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PREÂMBULO
A proposta apresentada pela professora de língua portuguesa “Cibele Adriana Perina Aguiar” de
produção de um conto, em grupo, deu origem ao texto “Relato de um assassino”.
Para que efetuássemos a produção, tivemos que escolher características de pelo menos dois animais
contidos em um folder do livro “Natureza Radical”. Após a escolha, decidimos qual animal seria o
protagonista e qual seria o antagonista.
Tendo feito isso, passamos para a parte de produção. A primeira versão foi apresentada para a classe,
que fez perguntas ou deu sugestões para nos orientar na reescrita do texto. Após a reescrita, a narrativa
teve recebeu sugestões da professora para uma nova reescrita.
QUESTÕES E SUGESTÕES FEITAS PELOS OUTROS GRUPOS DA SALA
Grupo 2:
1. Por que ele se entregou?
2. Por que ele matou o irmão se dependia de seu dinheiro?
Grupo 3:
1. Qual é o motivo da carta não ter um destinatário?
2. Existe algum motivo especifico por ele escrever a carta após dois anos?
3. Sugestão: Por o texto ser flash-back, achamos que deveria passar mais tempo.
Grupo 4:
1. Na cena do assassinato, como a arma some do nada?
2. Na cena do crime, como apareceu a arma? A professora de a sugestão de aparecer que há
algum objeto na cena.
3. Tudo se de a partir da discussão, como era a relação deles?
Grupo 5:
1. Por que não fez uso de “onde vou me condenar”?
2. Por que começou a sentir um ódio?
3. Por que ele falava que tinha inveja de seu irmão se ele tinha mordomia?
Grupo 6:
1. Por que não há muitas características do animal?
2. Por que ele matou o irmão?
3. Por que não caracterizou o peixe como protagonista?
LEGENDA: as perguntas aceitas estão em NEGRITO
G1 2ª VERSÃO
Relato de um assassino.
Deixo este relato para quem quer que seja.
Lembro-me daquele dia como se fosse ontem, o sangue escorrido no chão e um cadáver estendido.Suava
frio e o meu corpo tremia.
Caro leitor, percebo hoje que tudo o que fiz de nada valeu a pena, pois hoje pago pelo meu ato.O motivo
que me levou a cometer este erro foi conseqüência de um pensamento que já me dominava há tempos.
Para que possa partilhar esse desabafo peço que compreenda.
Eu e meu irmão Caranho, nunca tivemos um bom relacionamento, afinal meu pai sempre gostou mais
dele, já que ele praticava se esporte preferido, atirar, o orgulho de meu pai.
Não tenho culpa se não gostava desse esporte, nunca fui um bom atirador o que me incomodava, afinal
Caranho era melhor do que eu em tudo.
Ele se tornou rico por causa desse esporte, pois nas competições, e o melhor ganhava, além do troféu um
bom dinheiro, e meu irmão sempre foi o melhor. Vivia com Caranho esbanjando seu dinheiro, tirava
proveito de sua bondade.
Ele sempre me repreendeu por não trabalhar, e só ficar na mordomia. Comecei a ficar importunado com
aquelas críticas e o ódio, que já estava sentindo, aumentou ainda mais.
Por causa deste ódio, comecei a pensar na hipótese de matar meu irmão.
Em um dia, nossa discussão foi tão grave que ao olhar para sua coleção de armas, não pensei duas vezes,
quebrei o vidro que a protegia e peguei uma delas.
Meu irmão me pediu calma, comecei a xingá-lo e dizer tudo o que estava sentindo. Ele tentou se
explicar, não dei chance, atirei em meu próprio irmão.
Entrei em desespero e comecei a lançar palavras de fúria contra mim, “idiota,burro,estúpido,imbecil”.
Arrependi-me de ter feito o que fiz. Iria me matar, mas não tive coragem. Liguei para a polícia, me
entregaria. Algum tempo depois a policia já havia chego, e eu relatado o acontecido.
Hoje aqui estou, após 20 anos do acontecido, cumprindo pena pelo assassinato de Caranho.
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Escrevo por causa de uma grave doença, que pode me matar a qualquer momento. Gostaria então, que
você leitor, soubesse dos meus motivos.
3ª versão
Relato de um assassino
Deixo este relato para quem quer que seja.
Lembro-me daquele dia como se fosse ontem, o sangue escorrido no chão e um cadáver
estendido. Suava frio e o meu corpo tremia.
Caro leitor, percebo agora que tudo o que fiz de nada valeu a pena, pois hoje pago pelo meu ato.
O motivo que me levou a cometer este erro foi conseqüência de um pensamento que já me dominava há
tempos.
Para que eu possa partilhar esse desabafo peço que escute minha história.
Eu e meu irmão Caranho, nunca tivemos um bom relacionamento, afinal meu pai sempre gostou
mais dele, pois praticava seu esporte favorito, Tiro, o que o tornava o orgulho de meu pai.
Não tenho culpa se não gostava desse esporte, nunca foi um bom atirador, o que me
incomodava. Caranho tinha que ser melhor até nos esportes?
Ele se tornou rico por causa do Tiro, pois sempre ganhava os melhores prêmios das competições
que participava. Como vivia com Caranho, esbanjava seu dinheiro e tirava proveito de sua bondade.
Ele sempre me repreendeu por não trabalhar e só ficar na mordomia. Comecei a ficar
importunado com aquelas críticas, e o ódio que já estava sentindo, aumentou ainda mais. Por causa desse
sentimento, comecei a pensar na hipótese de matar meu irmão, assim teria tudo o que eu sempre quis, o
amor de meu pai.
Em um dia, nossa discussão foi tão grave que ao olhar para sua coleção de armas, não pensei
duas vezes, quebrei o vidro que a protegia e peguei uma delas.
Meu irmão me pediu calma, comecei a xingá-lo e dizer tudo o que estava sentindo. Ele tentou se
explicar, não dei chance, dei um tiro certeiro.
Entrei em desespero e comecei a lançar palavras de fúria contra mim, “idiota, burro, estúpido,
imbecil”. O arrependimento me levou a pensar em suicídio, mas não tive coragem. Liguei para a polícia,
me entreguei.
Algum tempo depois, a polícia chegou e eu relatei o acontecido.
Hoje após 20 anos do ocorrido, estou cumprindo pena pelo assassinato de Caranho.
Escrevo por causa de uma grave doença, que pode me matar a qualquer momento. Espero então
que para meu conforto, você leitor, tenha entendido meu sofrimento. Agora sim posso morrer em paz,
pois sei que você está ciente do assassinato que cometi.
QUADRO 2 – Reescrita - De um material de divulgação a ficção Fonte: produção dos alunos
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Alunos produtores de avaliação
Breve histórico
Esta atividade foi desenvolvida em 2008, com alunos do 1º ano do
Ensino Médio, na Escola Estadual Pedro Moraes Cavalcanti. Já tínhamos
desenvolvido um projeto chamado O sabor da Língua, iniciado o projeto com
expressões idiomáticas, feito análise de filmes, pinturas, propaganda, entre
outras atividades.
O trabalho com o gênero crônica teve início com a leitura de vários
títulos, de diversos autores e épocas, procurando discutir, analisar o texto e
perceber as características do gênero. Posteriormente, para ampliar o trabalho
com o gênero crônica e possibilitar o trato com outros gêneros escolhi trabalhar
com um tema, no caso memória, sem revelar para os alunos. E a partir do
trabalho com o tema memória, solicitar aos alunos a produção de uma
avaliação, na qual eles deveriam explorar o que até aquele momento havíamos
estudado.
Iniciamos com a leitura de dois títulos: O padeiro – Rubem Braga e
Alegrias Ímpares – Urda Alice Kluerger. Após a leitura de cada crônica,
procuramos tratar do que o texto falava e qual era a estratégia textual que o
autor havia escolhido para constituir seu texto. Posteriormente, aproximamos
os textos pelo fio condutor, no caso dos dois apresentados anteriormente, a
memória.
Na sequência assistimos a dois curtas: Dona Cristina perdeu a memória
e Três minutos, ambos disponíveis no site www.portacurtas.com.br. Assistimos
e discutimos os filmes. Ainda lemos o conto infantil Guilherme Augusto Araujo
Fernandes de Mem Fox. E estudamos algumas telas de Salvador Dali, primeiro
sem o conhecimento do contexto de produção, da história da tela e depois com
o registro histórico. As telas foram: Mulher na janela (1925); A persistência da
memória (1931) e A desintegração da persistência da memória (1952/54).
Também observamos e analisamos a escultura Persistência da memória/1980,
do mesmo artista.
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A idéia de tempo e memória foi construída a partir dos textos verbais e
iconográficos. Para compor, estudamos dois poemas: Relógio – Oswald de
Andrade e Relógio – Cassiano Ricardo.
Após o estudo do tema, levei para os alunos algumas crônicas e
entreguei um título para cada grupo. Os seis grupos receberam instruções para
a nova proposta: produzir uma avaliação para um dos grupos (o grupo um faria
para o grupo dois, que faria par o três e assim por diante).
Antes de iniciarem a produção da avaliação, eles tiveram que fazer o
estudo da crônica que receberam. Acompanhei as discussões feitas em cada
grupo e sugeri que buscassem outros textos para dialogar com o que estavam
estudando.
Após o estudo da crônica e a pesquisa de outros textos, os alunos
iniciaram a produção da avaliação. A proposta foi elaborada em sala e depois
foi preparada no computador. Informei aos alunos que a pontuação das
questões que o grupo errasse se reverteria para o grupo que elaborou a
avaliação. Mas que eles tinham que preparar uma avaliação coerente com o
que tínhamos estudado e que eu não aceitaria questões retiradas de algum
material didático.
Enquanto os alunos preparavam a avaliação, eu atendia às solicitações
de orientação e observava as discussões que os grupos levantavam sobre
cada questão. Também os questionava sobre as possíveis respostas.
No dia da avaliação, cada grupo entregou uma prova para a professora,
com as respostas e uma para cada elemento do grupo, para o qual fizeram a
avaliação. Os alunos sabiam que a avaliação seria realizada em duas aulas e
que poderiam pesquisar o material de que dispunham no caderno. Sabiam
ainda que se tivessem alguma dúvida sobre a avaliação poderiam perguntar
para o representante do grupo que a elaborou. Mas não sabiam que os
próprios grupos é que fariam a correção. Sendo assim, informei aos grupos que
eles iriam corrigir as avaliações, lembrei-lhes que avaliação se faz à tinta e que
se fizessem à lápis o grupo corretor poderia não aceitar o questionamento da
correção. Informei também que a correção seria feita na classe e que eles
poderiam solicitar a minha orientação.
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Os alunos conduziram bem a atividade de avaliação, mas tiveram muita
dificuldade para corrigir. Primeiro porque algumas perguntas permitiam mais
que uma resposta e em segundo lugar porque eles não pensavam que
algumas respostas, chamadas de superficiais, deveriam ser consideradas.
Pensaram como fazer com a pontuação, já que em nossa escola trabalhamos
com nota de zero a dez e não com conceito. Decidiram que uma resposta
superficial seria considerada, mas que não receberia a mesma pontuação de
uma resposta que mostrasse uma leitura mais aprofundada dos textos.
Tivemos que dispor de quatro aulas para a correção, assim os alunos
puderam tirar suas dúvidas. Após a correção eu recolhi as avaliações e
observei como eles a tinham feito, levantei alguns questionamentos e levei pra
a classe. As notas dos grupos foram utilizadas para compor a média do
bimestre.
Recorto aqui duas avaliações preparadas pelos alunos.
Avaliação de grupo - Crônica Grupo: ____ N°s ______________ __/__/__
Receita para tirar o cavalo da chuva / CARLOS HEITOR CONY
1) A crônica recebe como título uma expressão idiomática e a sua estrutura é de uma receita, porém o gênero crônica é mantido, pois: a- é um assunto que rapidamente é esquecido pelas pessoas. b- antes de se tornar uma crônica, tinha uma estrutura de receita. c- demonstra com ironia e de forma leve fatos do cotidiano. d- apresenta todos os requisitos estruturais de uma narrativa. 2) Observe as imagens abaixo, elas poderiam servir de ilustração para o texto, uma representando a literalidade da expressão idiomática e a outra a literalidade da ironia. Torne a linguagem não-verbal abaixo mista usando de ironia.
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I- II-
3) Na crônica o autor trata a expressão ―tirar o cavalo da chuva‖ de duas formas, quais são? Justifique. 4) ―Outro mérito de se tirar o cavalo da chuva, sobretudo para quem não dispõe de um cavalo, mais está sujeito a chuvas e trovoadas, e fazer o que deve ser feito,ou seja, tirar o cavalo da chuva e, se possível, tirar-se a si mesmo da chuva, não necessariamente em cima do cavalo, mas ―ao lado‖ ,como quer o Zé Genoíno dos funcionários da nação.‖ A ironia é o tempero desta crônica, porém nem sempre o leitor compreende esta ferramenta. Que conhecimento prévio é necessário para entender ? No caso do não entendimento da ironia o que ficaria deste trecho para o leitor?
5) Na parte ―como servir‖ da crônica, o autor diz que muitas ações podem ser feitas tanto para piora quanto para a melhoria (na política). Pensando no contexto de produção, o que poderia ser feito naquela época é muito diferente de hoje?
QUADRO 3 – Avaliação Crônica ―Receita para tirar cavalo da chuva‖ Fonte: produção dos alunos
Avaliação – Crônicas. (grupo 3)
Crônica – Sexa – Luis Fernando Veríssimo
1. Qual o acontecimento narrado na crônica de Veríssimo?
2. Para alguns editores, o uso de diálogo descaracteriza o gênero crônica. Qual
explicação se daria para que “Sexa” - Veríssimo se mantenha uma crônica, sendo que o
texto é basicamente um diálogo?
3. Em Sexa, há uma questão que causa confusão na cabeça de um dos personagens, que
modificada pode alterar o desenrolar da crônica.
a) Qual trecho do texto marca a interpretação equivocada?
b) Copie o trecho alterando e desfazendo a confusão.
c) Explique o por que da má interpretação.
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4. Leia o texto informativo abaixo e apresente a relação entre ele e “Sexa” .
(semelhanças e diferenças)
Criança pergunta cada coisa
As crianças saudáveis são ativas, curiosas e bastante exigentes para aceitarem respostas fáceis.Geralmente quando fazem perguntas, não querem receber um simples "esquece isso", "você não tem idade para entender", etc., respostas que muitas vezes damos quando somos pegos de surpresa por perguntas sérias. Quando nos faz uma pergunta, a criança além de mostrar que confia em nós, procura um sentido para as coisas que acontecem. Muitos pais que eu conheço parecem imaginar que, se ao menos fossem mais estudados, seriam pais melhores. Se tivessem mais informações conseguiriam responder de forma mais clara e objetiva às perguntas de seus filhos. Não conseguem perceber que quando o filho lhes faz uma pergunta, quer saber além da resposta, qual é a opinião deles, que é que pensam a respeito daquele assunto. Se ele estivesse só interessado na resposta, teria perguntado para qualquer pessoa, e não a eles. É mais útil responder não sei, quando não se sabe, dizer nunca pensei a respeito, se for o caso, ou dizer fico embaraçado ao falar sobre isso, do que tentar fugir de responder; ao mostrar como se sente com a pergunta, estará dando informações a respeito de sua pessoa. Estará se fazendo conhecer e ao pensar seriamente na resposta, acabará se conhecendo melhor também. Existem perguntas realmente difíceis, porém, são elas as que mais nos ajudam a transmitir através de nossas respostas, quais são nossas crenças, nossos valores, nossos medos, nosso modo de ver a vida. O que é que você responderia a seu filho se ele lhe fizesse as seguintes perguntas: Quem é Deus? E que tal essa aqui: Por que as pessoas são más? Por que meu irmãozinho morreu? Por que existem pessoas pobres e pessoas ricas? Será que há apenas uma resposta para cada uma destas perguntas? Que respostas você daria agora, a seu filho? Suas respostas seriam as mesmas há 5 anos atrás? Será que você tem pensado nas coisas realmente importantes para a formação dele? Perguntas difíceis não? As crianças nos fazem estas perguntas, desde que deixemos um canal aberto para elas. http://www.psicologavirtual.com.br/psicologa/artigos/pais/inf28.html
5 – “O Bem-Amado”é título de uma telenovela escrita por Dias Gomes, produzida pela
Rede Globo e levada ao ar em janeiro de 1973. Odorico Paraguaçu, interpretado por
Paulo Gracindo, era um dos personagens da trama, prefeito da cidade de Sucupira,
onde se deu a novela. Este personagem ficou marcado por suas pérolas, uma delas foi
sempre usar em seus discursos “Meu povo. Minha pova”.
Existe uma relação entre esta frase de Odorico e a crônica, aponte-a.
6 – Observe a imagem e, em seguida, faça uma
relação entre ela e o tema da crônica de Veríssimo.
QUADRO 4 – Avaliação Crônica ―Sexa‖ Fonte: produção dos alunos
Na avaliação bimestral, solicitei aos alunos que respondessem à
seguinte questão: O processo de produção de avaliação, além de promover um
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estudo mais intenso do gênero, possibilitou a verificação dos conteúdos
trabalhados em sala de aula? Justifique.
Recorto aqui algumas respostas:
―Sim, pois vários grupos foram resgatar tanto os estudos passados (linguagem verbal, não verbal e mista, por exemplo), como a forma de perguntas elaboradas pela professora. A prova que foi passada para o meu grupo continha uma pergunta que pedia para analisar duas imagens (linguagem não-verbal) e transformá-las em linguagem mista. Outros grupos pediram para escrever as palavras-chave, assim como nos foi ensinado no 2ª Bimestre .‖
Maria Caroline Bandoria Silva Ribeiro
―Sim, porque fazendo a produção da avaliação da crônica fez com que eu entendesse mais sobre crônica, e na produção da minha crônica eu aprendi mais sobre os tipos de crônica, então pra mim isso possibilitou a verificação dos conteúdos trabalhados em sala de aula.‖
Danilo Aguiar Gomes Da Silva
―Sim, pois como já sabíamos lidar com as linguagens verbais e não verbais, e sabíamos diferenciar os diversos textos, fizemos com mais facilidade a prova e também respondemos as perguntas com mais entendimento. Além disso, pudemos também usar os nossos conhecimentos (das outras coisas estudadas), para que pudéssemos aplicar na avaliação.‖
Stephanie Rodrigues Amaral De Moura
―Sim, pois analisa a capacidade de produção dos alunos ao produzir uma prova.‖ Caio Moreno Janoni
―Este processo permitiu, além de um estudo mais intenso do gênero crônica,
uma verificação de outros conteúdos já trabalhados em sala de aula, como:
intertextualidade, sentidos literal e figurado, entre outros, pelo fato de fazermos
uso destes conhecimentos adquiridos anteriormente ao elaborar a avaliação
para os outros grupos e para responder também.‖
Jéssica Gonçalves
Quadro 5 – O processo de produção de avaliação na visão dos alunos Fonte: acervo da pesquisadora
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Novos projetos traçados e/ou de desejo
Em breve um histórico
Tenho o Projeto Lendo nas sombras, já apresentado, como um projeto
que deve ser revisitado, assim como outros projetos e atividades que ganham
outros contornos diante dos educandos que os vivenciarão.
O ponto de partida para meus projetos é o contexto. Neste o que mais
importa são os sujeitos.
Os novos projetos normalmente se formam a partir de uma leitura que
pode ser de um gênero textual, de uma conversa, de um lugar, de uma
situação etc. Normalmente, quando tenho uma ideia e não tenho como
desenvolvê-la não tento guardá-la a sete chaves, mas sim compartilhar com
outros colegas. E às vezes posso ver a minha ideia reelaborada e vivenciada
por outros professores e alunos, o que me leva a buscar novas e novas ideias.
Dentre os vários livros que têm me despertado para novos projetos
destaco alguns, que são: Dicionário de lugares imaginários (Alberto Manguel e
Gianni Guadalupi); Cidades Inventadas (Ferreira Gular); Histórias de quadros e
leitores (Marisa Lajolo(org.));O livro das perguntas (Pablo Neruda). Outras
tantas leituras me movem, assim como as que ainda não fiz.
As situações vividas na minha história também me despertam, assim
como os vários cursos de formação de professores que venho ministrando.
Destes, um módulo em especial me chama muito a atenção, aquele em que
apresentei as várias versões do conto Chapeuzinho Vermelho e no qual
discutimos algumas questões de perspectiva histórica e teórica e as
professoras produziram versões.
Já tive a oportunidade de trabalhar com versões do texto Chapeuzinho
Vermelho na escola pública, com alunos do ensino fundamental. Destaco aqui
o trabalho com o texto de Chico Buarque – Chapeuzinho Amarelo – o qual foi
analisado, depois apresentado pelos alunos em uma leitura dramatizada e por
fim, os alunos produziram uma nova versão, tendo como ponto de partida a
102
mudança da cor, a Chapeuzinho não poderia ser Vermelho ou Amarelo. Este é
um projeto que pretendo retomar e ampliar.
Na perspectiva da leitura de imagem aliada à produção textual ainda
pretendo ter muitas vivências, traçar novos percursos no meu fazer docente.
As novas ideias ou as reorganizações de algumas latentes ou já
trabalhadas, para mim só tomam forma quando conheço o grupo de alunos
com o qual vou trilhar um novo percurso e é por isso que não ―guardo na
manga‖ projetos e nem os vejo em formas estanques, mas sim tenho sempre
em mente projetos que me dão a possibilidade de alçar novos voos, passíveis
de serem flexibilizados, de acordo com as situações enfrentadas.
103
CAPÍTULO III
PERCURSOS - PROJETOS: DO RASCUNHO AO QUE FOI DESENHADO
o nosso corpo linguagem funciona de uma maneira especial. Todos nós
exercitamos a linguagem de muitos e variados modos em toda a nossa vida,
de tal modo que o nosso mundo é aquilo que ela nos permite dizer, isto é, a
matéria constitutiva do mundo é, antes de mais nada, a linguagem que o
expressa. E constituímos o mundo basicamente por meio de palavras. No
princípio e sempre é o verbo que faz o mundo ser mundo para todos nós,
até porque a palavra é a mais definidora das criações do homem.
(COSSON, 2006,p.15)
As histórias podem nos oferecer consolo para nosso sofrimento e nomes
para nossa experiência. As histórias podem nos dizer quem somos, o que
são essas ampulhetas pelas quais passamos, como podem nos ajudar a
imaginar um futuro em que, sem finais felizes e confortáveis, possamos
continuar vivos e juntos nesta terra tão devastada. (MANGUEL,
2008.p.131)
Neste capítulo, trago três projetos que serão descritos e analisados. A
seleção destes projetos se deu por serem recentes (2008/2009), atenderem ao
foco da pesquisa e representarem, para esta pesquisadora, a expressão de
seu trabalho docente.
Pensando na relação descrição/análise, posso antecipar que os
percursos escolhidos para este capítulo têm, nesta relação, uma crescente na
interlocução que promove com aporte teórico e consequentemente, com o
leitor. Desta forma, poderá ser notado que o Percurso 3 - Um tigre de papel,
ganha destaque diante dos outros dois, nesta dissertação.
A descrição e análise não se deram de forma estanque, já que durante a
primeira faço apreciações. Neste capítulo, denominei percursos as vivências
que compartilhei com meus alunos. Estes percursos tiveram em comum um
104
longo tempo de desenvolvimento e o envolvimento dos alunos e ainda o
trabalho com a linguagem iconográfica.
Convido você, leitor, a percorrer as vivências, que dão um tom aos
percursos.
105
PERCURSO 1
PASSARELA CULTURAL: EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS EM ARTES
VISUAIS
Algumas imagens nos levam a rememorar, outras a moldar nosso
comportamento; ou a consumir algum produto ou serviço; ou a formar
conceitos ou reafirmar pré-conceitos que temos sobre determinado assunto;
outras despertam fantasias e desejos.
Por definição, as imagens visuais sempre proporcionam diferentes leituras
para os diferentes receptores que apreciam ou que dela se utilizam
enquanto objetos de estudo. Por tal razão elas se prestam a adaptações e
interpretações “convincentes” por parte desses mesmos receptores, sejam os
que desconhecem o momento histórico retratado na imagem, sejam aqueles
engajados a determinados modelos ideológicos, que buscam desvendar
significados e “adequá-los” conforme seus valores individuais, seus
comportamentos, suas posturas aprioristicamente estabelecidas em relação
a certos temas ou realidades, em função de suas imagens mentais. A
imagem fotográfica, com toda a sua carga de “realismo” não corresponde
necessariamente à verdade histórica, apenas ao registro (expressivo) da
aparência... fonte, pois, de ambigüidades.( KOSSOY, 2002,p.45)
No início do ano de 2008, começou a vigorar a nova Proposta Curricular
do governo do Estado de São Paulo. Após o professor receber o material que
apresentava o currículo a ser seguido, os alunos receberam um jornal com o
conteúdo para o início do ano. Posteriormente, os professores receberam
cadernos de atividades que contemplariam o currículo, material dividido por
bimestre. Vale dizer que os cadernos foram entregues com certo atraso e que
naquele ano os alunos não receberam o material, como em 2009, ano em que
o atraso da entrega se manteve, mas os alunos receberam o caderno.
No primeiro bimestre de 2009, para os alunos do 1º ano do Ensino
Médio, o trabalho deveria ser pautado na linguagem verbal e não-verbal. A
proposta solicitava um trabalho em grupo, com o tema ―O sabor da língua‖, que
deveria pontuar a linguagem mista no gênero foto-legenda.
106
Após o estudo do conceito de linguagem, trabalhamos com a linguagem
verbal, não-verbal e a mista, a partir de gêneros textuais. Posteriormente,
estudamos a foto-legenda e trabalhamos com a produção de legendas para
imagens.
A proposta foi adequada ao nosso contexto. Solicitei que o trabalho
fosse individual e que representasse o tema (O sabor da língua) de três
maneiras: (1) literalmente; (2) figurativamente e (3) literalmente e/ou
figurativamente. Determinamos o prazo de entrega e os atendimentos.
As aulas continuaram a acontecer em grupo e, embora os trabalhos
fossem individuais, os atendimentos se davam nos grupos. As dificuldades
eram pontuadas e os alunos recebiam orientações.
No prazo determinado, os alunos entregaram o trabalho. Embora boa
parte deles tenha atendido à proposta, percebi que os alunos ainda tinham
grande dificuldade com conceitos e uma certa resistência para compreender.
Quando recebi o segundo caderno do professor, referente ao 2º
Bimestre, a proposta com trabalho com foto-legenda se repetia. Agora era
solicitado um trabalho individual e a simulação ou montagem de uma
exposição.
Como já tínhamos elaborado o trabalho individual, sugeri aos alunos que
trabalhássemos a representação da linguagem figurada em fotos de forma
literal. Para tanto, apontei para expressões idiomáticas. Assim, trabalharíamos
com a linguagem verbal, não-verbal, literal e figurada.
No primeiro momento, os alunos resistiram dizendo que não tinham
como fotografar. Posteriormente, diante de minha insistência e continuidade no
trabalho, acabaram comprando a ideia.
Apresentei para os alunos uma reportagem da revista Língua
Portuguesa que mostrava um trabalho com imagens de expressões
idiomáticas. Assim, eles começaram a compreender o formato do trabalho.
Cada grupo deveria apresentar no mínimo três fotos e no máximo cinco. Para
tanto, iniciaram uma pesquisa de expressões idiomáticas (EIs) e fizeram a
seleção das que mais gostaram. Os grupos não podiam compartilhar as
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expressões selecionadas, pois fariam uma gincana e nela as apresentariam
para os outros grupos tentarem descobrir seu significado.
Para que nenhum grupo usasse a mesma EI, conferi as relações e
apontei quando alguma expressão se repetia em algum grupo. No total,
tivemos 35 expressões selecionadas, como potenciais, e mais cinco de
reserva, assim como seus respectivos significados.
Posteriormente, discutimos que para fotografar, antes, eles deveriam
montar a cena. Os alunos procuraram desenhar como fariam, relacionaram os
materiais que seriam necessários para que conseguissem representar as EIs.
Após tirarem as fotos, os grupos trouxeram a impressão ou a câmera
digital, para que eu avaliasse se as imagens representavam literalmente as EIs.
Algumas fotos tiveram que ser refeitas, ou a ideia abandonada, assim, outros
projetos de EIs foram apresentados e novas fotos foram elaboradas.
Para a gincana, cada grupo poderia participar com três fotos. Neste
momento não era obrigatório que as fotos fossem em papel apropriado, mas
que fossem pelo menos no tamanho de uma sulfite A4, para que os grupos
pudessem observar a imagem à certa distância.
Quando terminou a gincana, como ocorria todo bimestre, os alunos
montaram novos grupos.
A nova etapa foi a montagem da exposição. Escolhemos o espaço na
escola, depois pensamos como seria a impressão das fotos. A escolha foi por
fotos em preto e branco, cada grupo teria três fotos 20cmx30cm e duas fotos
20cm x 25cm. Ainda ficou decidido que as fotos teriam moldura e paspatur em
mosaico de papel. A cor para o mosaico foi definida como um degradê do preto
ao cinza, cada grupo ficou com uma cor. Ainda pensamos como poderia ser a
apresentação do significado das EIs. A solução veio de uma aluna que criou
um cartão-resposta.
Após definir o que faríamos, solicitei um orçamento para compra dos
materiais. Feito o orçamento, cada grupo colaborou para a produção das fotos
e a compra dos materiais para fazer a moldura.
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As fotos foram entregues em CD, por grupo e eu as organizei em um só
CD. Imprimi as fotos de cada grupo em uma sulfite e levei para que eles
escolhessem os tamanhos em que seriam impressas. Comprei o material para
fazer o paspatur e molduras de madeira, que os alunos pintaram de preto.
Os alunos escolheram de que tamanho seria cada foto. Levei o CD com
as fotos para imprimir em duas empresas e fiz algumas amostras. Ao colocar
na moldura, percebemos que a imagem ficava apagada, resolvemos então criar
uma margem branca nas fotos. Assim foi feito. Fizemos novas amostras e o
resultado foi bom, tivemos que decidir onde faríamos a impressão e a escolha
primou pela qualidade e não pelo custo.
No movimento dos trabalhos, precisávamos escolher um nome para
nossa exposição, este surgiu de uma eleição na sala de aula e o nome
escolhido foi: PASSARELA CULTURAL: EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS EM
ARTES VISUAIS.
Os alunos se organizaram para a montagem da exposição tanto em sala
de aula quanto em horário inverso. Os grupos que trabalhavam em horário
inverso se dividiam em turnos e/ou em dias, assim todos os alunos puderam
colaborar.
Durante a organização, os alunos olhavam para as fotos de maneira
diferente. Pois no início, as fotos eram apenas a imagem que a tela da câmera
ou do computador mostrava. Depois, a imagem em uma folha de sulfite
comum. Na sequência, o papel fotográfico, em sépia com borda branca. E
finalmente, cada uma destas fotos em sépia na moldura de mosaicos
idealizada e produzida pelos alunos. Assim, foi possível verem a realidade que
criaram tomar novos suportes e imaginarem como seria a recepção da
exposição, já que o ambiente escolhido para a montagem seria um novo
suporte.
A expectativa da recepção do trabalho era grande, mas ter planejado a
exposição deu muita segurança para os alunos.
109
FIGURA 31 – Organização para exposição Fonte: acervo da pesquisadora
Pensando no leitor/visitante da exposição, os alunos produziram um
texto para abri-la e com ele e uma EI, excedente às da exposição, montaram
um cartaz. Neste texto, os alunos contam, para os visitantes da exposição,
como desenvolveram o projeto. O que bem demonstra o interesse na ação
comunicativa de linguagem, no dizer de Bakhtin
Ter um destinatário, dirigir-se a alguém, é uma particularidade constitutiva do enunciado, sem a qual não há, e não poderia haver, enunciado. As diversas formas típicas de dirigir-se a alguém e as diversas concepções típicas do destinatário são as particularidades constitutivas que determinam a diversidade dos gêneros do discurso. (BAKHTIN, M.,2000,p.325)
O cartaz foi colocado na abertura da exposição, a preocupação com o
visitante era grande, pois ali teríamos várias faixas etárias, já que a escola toda
(alunos do ensino fundamental e médio, funcionários e professores) passaria
pela ―Passarela Cultural‖. Esta preocupação levou os alunos a se prepararem
para falar o que estava escrito no cartaz, principalmente para o grupo de
alunos do Ensino Fundamental I.
O cartaz ficou assim:
110
EXPOSIÇÃO
Passarela Cultural: expressões Idiomáticas em Artes Visuais
Esta exposição é fruto do trabalho dos alunos do 1º ano A do Ensino Médio da E.E. Pedro Moraes Cavalcanti (Piracicaba/SP). Abaixo vocês podem ler o relato, elaborado pelos alunos,
de como se deu esta exposição e um convite para prestigiá-la.
“Inicialmente, nos foram apresentados os conceitos de linguagem verbal (palavra - falada e escrita), não-verbal (imagens, gestos, notas musicais, placas de trânsito, língua de sinais...) e mista (linguagem verbal+ não-verbal).
Para concretizar estes conceitos elaboramos um projeto intitulado “O sabor da língua” no qual produzimos fotos-legenda as quais representavam a denominação do projeto de forma literal e figurada.
Ao término do projeto, pensamos em fazer um novo, representando a linguagem verbal
através de imagens, a fim de o expectador torná-la mista ou não. Este novo projeto resultou nesta exposição “Passarela Cultural: Expressões Idiomáticas em Artes Visuais”.
Primeiramente, em grupos, pesquisamos expressões idiomáticas e seus significados. Expressões idiomáticas são utilizadas pela sociedade no cotidiano, de geração em geração. São conjuntos de palavras cujo significado literal não pode ser identificado, para entender o seu sentido precisamos ter um conhecimento cultural implícito, ou seja, não se pode “traduzir” uma expressão idiomática de uma região para outra ou de uma língua para outra.
Após as pesquisas, cada grupo elegeu cinco expressões idiomáticas com as quais foram montadas cenas, representando-as em seu sentido literal, que foram em seguida fotografadas. Feitas as fotos, realizamos uma dinâmica entre os grupos, na qual o objetivo foi descobrir qual era a expressão representada na imagem.
Posteriormente, com a ajuda da professora Cibele A. P. Aguiar, começamos a pensar como se daria a exposição: local, estrutura disponível, distribuição de tarefas, confecção dos materiais, divulgação, entre outros.
O resultado de nosso envolvimento com o projeto “Passarela Cultural: Expressões
Idiomáticas em Artes Visuais” é o que vocês irão presenciar.”
Que expressão idiomática é essa?
EXPRESSÃO: FULANO É LARGO
SIGNIFICADO: PESSOA DE MUITA SORTE
Quadro 6 – Cartaz ―Passarela Cultural: expressões Idiomáticas em Artes Visuais”
Fonte: produção dos alunos
111
Após a montagem dos quadros e dos cartões com o significado da EI,
como era ano de eleição, decidimos produzir uma cédula para que os visitantes
votassem na melhor EI. Com todos os materiais prontos, confirmamos a data
da exposição e definimos as tarefas de cada aluno. Iniciamos com a divulgação
nos três períodos da escola. Usamos também o Jornal Mural, que neste
bimestre era de nossa responsabilidade.
No dia anterior ao da exposição, a maioria dos alunos ficou o dia todo
trabalhando nos preparativos. Neste momento, a troca de informações e a
preocupação com o que iriam apresentar pontuou o trabalho dos educandos,
que certamente concordariam com o dizer de Kossoy ―As fotografias seguem
sendo interpretadas muito depois de realizadas.‖ (KOSSOY, 2005, p.39)
A exposição começou a ser montada às 7h e somente às 9h30 é que
começou a receber os visitantes. Durante a exposição, os alunos dividiram as
seguintes tarefas: (1) chamar a classe para visitação, orientando que iriam
receber uma cédula para votar na melhor foto; (2) contar, na entrada, como se
deu o trabalho e o que os visitantes iriam ver; (3) monitorar a visitação na
passarela, entregar as cédulas; (4) receber as cédulas e colocar na urna, no
final da passarela e (5) fotografar o evento.
Algumas fotos
112
FIGURA 32 a 38 – Organização da exposição
Fonte: acervo da pesquisadora
A exposição foi desmontada às 22 horas, organizamos todos os
materiais e recolhemos os votos. O resultado da eleição foi apresentado no
Jornal Mural. As EIs que ganharam a eleição foram:
113
Apimentar a relação Água que passarinho não bebe
Falar pelos cotovelos Dar nó em pingo d‘água
FIGURA 39 – Expressões Idiomáticas mais votadas
Fonte: produção dos alunos
Os alunos demonstraram o desejo de apresentar o trabalho para outras
pessoas, em outros lugares. Assim, conversando com a coordenadora do curso
de Letras da Unimep, esta falou sobre a possibilidade de um espaço durante o
I Simpósio de Práticas Pedagógicas do Curso de Letras/Português - UNIMEP
(2008). Posteriormente, conversei com os alunos, acenei a possibilidade e, na
114
sequência, apresentei o material para coordenadora e recebi o convite para
participação.
Retomamos o trabalho e pensamos em um novo formato de exposição,
que seria em painéis. Novas estratégias foram apontadas, pois o espaço e o
público eram diferentes. Pensamos no meio de divulgação, preparamos um
banner para abrir a exposição e um folder para entregar para os visitantes,
contando um pouco sobre o projeto.
As tarefas foram divididas e durante o simpósio os alunos puderam
perceber a recepção que o trabalho teve. As pessoas demonstravam gostar e
ficavam impressionadas quando os alunos se revelavam alunos do Ensino
Médio, devido à qualidade do trabalho.
O folder preparado pelos alunos, para entregar durante o evento,
contava toda trajetória do projeto. O texto foi elaborado coletivamente, na sala
de aula. A escolha do formato foi feita após duas matrizes serem apresentadas.
A descartada foi a que se apresentava no formato de folheto. O programa
usado foi o Publisher/2007. Vale salientar que a coordenadora do Ensino
Médio, Rejane de Oliveira, colaborou apresentando e ensinando a usar alguns
programas, um deles o Publisher e na sequência o Movie Maker.
O destinatário real mais uma vez marcou o dizer dos alunos no como
dizer, até mesmo no seu aspecto estético. Assim, como toda a exposição foi
feita em escala de preto e cinza, o folder também assumiu esta forma. A
montagem das fotos e do texto contou com a colaboração da professora.
O material ficou assim:
116
Para a exposição na universidade (UNIMEP), os alunos se organizaram
em três grupos que seriam monitores do evento. Decidiram que iriam de preto
e que teriam um crachá de identificação. No dia anterior à exposição, fomos
fazer a montagem, pois o simpósio se daria durante o dia todo. O planejamento
novamente foi o grande aliado.
A exposição
FIGURAS 42 a 44 – Fotos da exposição na UNIMEP
Fonte: acervo da pesquisadora
A exposição em um meio acadêmico, um espaço arquitetônico bem
diferente da exposição anterior, exigiu dos alunos uma nova postura diante da
produção. Ainda confirmou o que foi discutido no planejamento, o novo suporte
inferia na exposição, assim como os visitantes se reportavam de forma
diferenciada a eles. Novo ambiente, para as mesmas fotos em moldura de
mosaicos, mas com uma montagem diferenciada, para o público e o ambiente
diferente.
No simpósio, os alunos receberam o agradecimento pela participação, a
professora respondeu algumas perguntas e falou um pouco sobre o fazer
docente. Os alunos receberam um certificado de participação.
O palestrante convidado do evento, José Luiz Fiorin, viu a exposição e,
assim como todos que a visitaram, disse ter gostado muito. Para esta docente,
em um de seus livros, deixou a seguinte dedicatória:
117
FIGURA 45 – Dedicatória de José Luiz Fiorin Fonte: acervo da pesquisadora
Após o simpósio, a exposição ganhou novo formato, os alunos
produziram um jogo, para alunos da série final do Ensino Fundamental Ciclo I.
O jogo trabalha com a leitura da imagem e a leitura do seu significado. A
escolha foi por trabalhar com o programa Movie Maker e gravar em DVD, para
que assim os alunos pudessem ver e jogar tanto na TV como no computador.
Neste material, os alunos também marcaram a trajetória do projeto por meio de
fotos, que registraram todo o processo.
Para gravar o DVD e fazer cópias, contamos com a colaboração da
Prof.ª Rejane de Oliveira, Coordenadora do Ensino Médio, que também ajudou
na montagem da capa e do miolo do DVD.
A capa do DVD ficou assim
118
FIGURA 46 – Capa do DVD Expressões Idiomáticas
Fonte: produção dos alunos
Após ficar pronto, cópias do DVD foram entregues para a direção da
escola oferecer à Diretoria de Ensino, para o dirigente, o supervisor da escola
e a Oficina Pedagógica. Já na Secretaria Municipal de Educação, entreguei
uma cópia para as supervisoras de ensino do Ciclo I do Ensino Fundamental.
Desta secretaria, os alunos receberam, como agradecimento, uma cópia do
DVD para cada um deles.
Um ano depois, este projeto ainda é assunto entre os alunos que
participaram dele.
Este projeto foi um dos trabalhados ao longo de 2008 com os alunos do
1º ano do Ensino Médio, o 1º A, como gostavam de serem referenciados. Com
este projeto, os alunos conseguiram perceber que o conhecimento sobre
língua/gem é necessário, para transitar nas mais diversas áreas do
conhecimento. Segundo Aguiar,
119
[...] conhecer a linguagem em suas modalidades leva-nos a um exercício enriquecedor do processo de comunicação. Devemos da ênfase, no entanto, não apenas ao objetivo imediato e pragmático de pôr em ação uma competência adquirida, mas às vantagens mais permanentes que daí advêm.Conscientes do processo que vivemos, vamos conceber o mundo de forma mais ampla e profunda, transformando a experiência do dia-a-dia em sabedoria existencial para nosso enriquecimento pessoal e o daqueles que conosco convivem. (AGUIAR, 2004,p.10)
Os alunos se sentiram sujeitos no processo de ensino aprendizagem e
construíram conhecimentos. Durante as aulas, era fácil de se perceber o
amadurecimento do grupo frente às dificuldades. Eles não agiam mais
passivamente ao que não compreendiam, ou davam respostas prontas ou
ainda procuravam desculpas, mas sim, enfrentavam as dificuldades.
No início do ano, a relação professora/alunos não se estabeleceu de
maneira fácil, pois eles diziam que eu falava de modo muito difícil, que tinha
que falar a ―língua deles‖. Tratei então de recordá-los que eu era professora de
língua materna, que meu campo vocabular, decerto, era diferente do deles,
mas que falávamos o mesmo idioma e que a barreira da idade e do nível
cultural não poderia nos afastar e sim nos aproximar a partir do estudo da
linguagem.
Com o tempo, ainda no primeiro bimestre, os alunos deixaram a posição
de enfrentamento e começaram a descobrir o universo da palavra.
Aos poucos fomos aprendendo e percebi que o que os incomodava
eram os conceitos sobre linguagem. O projeto possibilitou que os alunos
falassem sobre os conceitos sem precisar decorá-los. Eles sabiam do que
falavam, estavam trabalhando com a língua/guem.
No decorrer do projeto, tecemos outros percursos e conseguimos
percorrê-los. O ponto alto deste projeto foi a montagem da primeira exposição,
a que se deu na escola. Os alunos vibravam, diziam que nunca poderiam
imaginar que conseguiriam concretizar o que no início do ano era apenas mais
um projeto. Mas este não foi, sem sombra de dúvidas, apenas mais um projeto.
120
Seguem relatos das aulas de língua portuguesa, para assim trazer o
dizer dos alunos sobre nosso(s) percurso(s). Devo salientar que os relatos,
como apresentados no Capítulo I, neste contexto, são escritas espontâneas,
que têm por objetivo analisar o curso do bimestre no olhar de cada aluno. E
que esta análise permite retomar alguns pontos necessários para caminhar no
processo de ensino- aprendizagem.
Primeiro, os relatos referentes ao segundo e terceiro bimestre, nos quais
os alunos deveriam, além de relatar nossos trabalhos, também fazer uma
autoanálise.
1º Relato com autoanálise
FIGURA 47 – Relato com autoanálise aluno Richard B. Francisco Fonte: produção de aluno
O que mais chama a atenção no relato do aluno Richard é seu
envolvimento com a literatura e o compromisso que assumiu neste momento
de melhorar seu desempenho, o que cumpriu ao final de 2008. E tenho
conhecimento de que em 2009 tem dado continuidade à sua formação. O
universo da literatura colaborou muito para a constituição deste leitor, na
121
perspectiva que tinha da leitura de mundo. A aproximação com as várias
linguagens fez com que ele reorganizasse seu pensamento. Conhecer sua
história foi fundamental para que, como professora, eu pudesse me aproximar
deste aluno, que na época vivia conflitos pessoais por sentir muito a falta do pai
que havia falecido. Mostrar para ele que não podia se apoiar nesta referência
para somente aceitar as situações fez com que ele pudesse enfrentá-las e foi a
partir da produção de textos, falando de suas aflições, ficcionando, que ele
passou a se perceber mais como realidade.
2º Relato com autoanálise
FIGURA 48 – Relato com autoanálise aluna Sthephanie Rodrigues Amaral de Moura
Fonte: produção dos alunos
122
O texto da aluna Sthephanie apresenta um grande número de atividades
trabalhadas nos dois bimestres e dando ênfase ao percurso de cada uma, bem
demonstrando com que dinamismo trabalhamos as diferentes linguagens. Cita
a presença da professora Yara Helena de Andrade, que foi contar a sua leitura
do texto Auto da barca do inferno para os alunos. Na sequência, salienta a
possibilidade de melhorar seu desempenho e usa a apresentação da exposição
para marcar o seu olhar sobre a sua atuação. Na observação, antes de uma
frase final, aproveita para enfatizar que a professora não tem poupado os
alunos.
Ao final, registra que aprendeu e a sensação, não retomando o esforço,
o trabalho, mas sim o ―prazer‖. E é com esta sensação fecha seu texto dizendo
que só foi prazeroso porque teve de ser conquistado.
3º Relato com autoanálise
FIGURA 49 – Relato com autoanálise da aluna Jéssica Gonçalves
Fonte: produção de aluna
123
O relato da aluna Jéssica é dirigido a um leitor específico, para a
professora. Discutimos muito sobre os aspectos que circundam a produção
escrita, que o para quem e o porquê escrevemos marcarão o como
escrevemos. Uma aluna que tem um veio crítico, mas que não sabia lidar muito
bem com este seu estilo. Assim como outros alunos. A partir de discussões
orais de sala de aula, propostas de escrita e reescrita, nas mais diversas
atividades, procurei dar aos educandos a possibilidade de justificarem suas
atuações e questionarem as propostas, foi um processo realmente ―muito
produtivo‖ e ―bem sucedido‖.
A aluna termina salientando seus novos laços com a leitura.
4º Relato com autoanálise
FIGURA 50 – Relato com autoanálise da aluna Elinéia P. do Nascimento
Fonte: produção de aluna
124
O relato de Elineia marca as atividades mais relevantes para ela,
desenvolvidas no segundo e terceiro bimestre, dando destaque ao projeto da
exposição em ambos. No terceiro, também escreve sobre o estudo do conto O
enfermeiro/Machado de Assis, que foi apresentado de três maneiras (versão
original do texto escrito, a HQ e o filme).
Na sequência, a aluna faz uma crítica à sua nota do primeiro bimestre e
já ratifica que as dos bimestres seguintes foram superiores, por ter
compreendido a matéria. Retoma então, o projeto que gerou a exposição e
apenas cita a produção de um conto.
Sendo assim, o texto da aluna aponta o trabalho com uma variedade de
linguagens.
5º Relato com autoanálise
FIGURA 51 – Relato com autoanálise da aluna Pollyanna Garcia Vilarino Fonte: produção de aluna
A aluna Pollyanna, já registra ser este texto de autoavaliação, mas, em
um longo primeiro parágrafo, lista as atividades e aponta o seu fazer na
125
primeira pessoa do plural. Penso que a noção de grupo, de sala, sempre
esteve muito arraigada, assim o ―nós‖ sempre foi referência. Mais adiante, a
aluna retoma a primeira pessoa do singular e expõe sua visão diante do que o
grupo, do qual ela fazia parte, desenvolveu.
Atua no campo do gostar, pinçando da lista anterior algumas atividades,
logo depois de enfatizar para o leitor que seu desenvolvimento foi bom, ―visto
pelas minhas notas‖. É o dizer de alguém que se saiu bem nas notas; sendo
assim, ela se permite escolher entre as atividades realizadas, as que mais
chamaram sua atenção, mesmo que no campo do gostar, sem justificar ou
salientar o processo.
A produção da aluna está ligada à proximidade do escritor e do leitor
(aluna/professora) e ao fato de terem vivenciado as mesmas experiências.
Quando escrevemos para alguém próximo, acreditamos no preenchimento das
lacunas. O que a aluna não percebeu é que, embora tivesses vivenciado as
mesmas atividades, as perspectivas eram diferentes.
6º Relato com autoanálise
FIGURA 52 – Relato com autoanálise Maria Carolina B. Silva Ribeiro
Fonte: produção de aluna
126
A aluna Maria Carolina, a Carol, como gosta de ser chamada, faz um
breve resumo do ano, organizado por bimestres. Antes, intensifica as aulas de
português como únicas e finaliza o texto desejando ter aulas como estas de
2008.
Carol realmente viveu intensamente as atividades e aproveitou cada
oportunidade para, segundo ela, manter ou ampliar o ―nível‖ das aulas. Sendo
assim, a aluna demonstrava o elo que existe entre o fazer docente e o
discente.
Após apresentar os relatos referentes ao segundo e terceiro bimestre,
trago os produzidos no quarto bimestre, nos quais os alunos trataram das aulas
de Língua Portuguesa no ano de 2008.
1º Relato das aulas de Língua Portuguesa/2008
FIGURA 53 – Relato das aulas de Língua Portuguesa/2008 do aluno Allan Fernandes Firmino Fonte: produção de aluno
O aluno Allan inicia seu texto falando de superação. Sem olhar para os
problemas de concordância, observando o que o aluno diz, minha experiência
como sua professora permite afirmar que este aluno mudou muito, não
127
somente nas minhas aulas, mas no relacionamento com os colegas, na sua
expressão oral e na escrita também, pois começou a experimentar, a não
temer o novo, a enfrentar os erros ortográficos e de concordância, nas
atividades que proporcionavam isto. Ainda soube aproveitar os momentos
individuais que os alunos tinham para tirar dúvidas e se engajou como os
demais alunos nos projetos.
2º Relato das aulas de Língua Portuguesa no ano de 2008
FIGURA 52 – Relato das aulas de Língua Portuguesa/2008 do aluno Rafael Rodrigues Alves
Fonte: produção de aluno
O aluno Rafael, mesmo que em um discurso econômico em palavras,
fala da mudança de período e da surpresa logo no primeiro dia de aula com a
turma nova e a professora nova. E da tristeza que sentiu por não ter participado
desde o início do projeto, o que não diminuiu seu envolvimento com ele.
Quando fala de sua dificuldade com a leitura, também trata da
oportunidade que teve de se sair bem, por ter tido um tempo maior para se
preparar.
128
O que percebo é que o aluno teve total consciência de suas dificuldades,
e foi assim, enfrentando-as, que ele conseguiu caminhar com o grupo que já
estava desde o começo do ano em um ritmo acelerado, no processo de ensino
aprendizagem e que o acolheu.
3º Relato das aulas de Língua Portuguesa no ano de 2008
FIGURA 55 – Relato das aulas de Língua Portuguesa/2008 da aluna Aline
Cristina Felicio Fonte: produção de aluna
O relato de Aline é um agradecimento por ter sido minha aluna.
Agradecimento que retornei a ela, pois aprendemos muito juntas. A aluna
sempre buscou superar suas dificuldades.
129
4º Relato das aulas de Língua Portuguesa no ano de 2008
FIGURA 56 – Relato das aulas de Língua Portuguesa/2008 da aluna Bárbara F. Antônio
Fonte: produção de aluna
Diferentemente dos demais alunos, Bárbara fala de sua visão das aulas,
como claras desde o início e atribui a sua falta de atenção no começo do ano a
seu não envolvimento, o que mudou em função das propostas que ela chama
de ―interessantes‖. Sua mudança de postura trouxe o desejo de aproveitar ao
máximo as oportunidades.
130
Os relatos dos alunos marcam o envolvimento deles, o entrelaçamento
dos projetos e o quanto o trabalho ―diferenciado‖ com as várias linguagens
colaborou para a formação deles. O trabalho com a linguagem
iconográfica/fotografia caminhou paralelamente com o da literária, assim como
com outras linguagens, que se refletiram no padrão estético dado à exposição.
Traduzindo o imaginário na busca da representação do conhecimento. Sendo
assim, apresento o dizer de dois teóricos, que expressam seus pontos de vista
sobre a palavra literária e a imagem e aqui busco relacioná-las. Para Todorov e
em sequência para Berger,
Lançando mão do uso evocativo das palavras, do recurso às histórias, aos exemplos e aos casos singulares, a obra literária produz um tremor de sentidos, abala nosso aparelho de interpretação simbólica, desperta nossa capacidade de associação e provoca um movimento cujas ondas de choque prosseguem por muito tempo depois do contato inicial. (TODOROV, 2009,p.78)
Se a nova linguagem das imagens fosse usada de modo diferente, ela poderia, por meio de seu uso, conferir um novo tipo de poder. Dentro dessa linguagem poderíamos começar a definir nossas experiências com maior precisão, em áreas onde as palavras são inadequadas (O olhar vem antes das palavras). Não apenas a experiência pessoal, mas também a experiência histórica essencial de nossa relação com o passado: isto é, a experiência de procurar dar sentido a nossas vidas, de tentar compreender a História, da qual podemos nos tornar agentes ativos. (BERGER, 1999, p.35)
Berger reconhece o poder da palavra, mas também confere à
iconografia a possibilidade de representar a história de seus participantes. Para
Todorov a linguagem literária provoca seus leitores e abre possibilidades. Por
minha vez, digo que a linguagem literária provoca o leitor e o inscreve no reino
das palavras e no das imagens, em uma relação imbricada.
A exposição conferiu, ao material iconográfico produzido para este
contexto, o valor estético que o aproxima da literatura, mas isso não ocorreria
se o material iconográfico contasse/registrasse um momento banal destituído
de seu valor histórico.
131
PERCURSO 2
PROJETO CAÇADORES DE NUVENS
A câmara fotográfica e o relógio são instrumentos íntimos, auto-
referentes. A câmara fotográfica incorpora o tempo do relógio para seu
funcionamento e se insere, através de suas imagens, no Tempo enquanto
contingência. Com a fotografia descobriu-se que o objeto, embora ausente,
poderia ser (re) apresentado eternamente. É este o tempo da representação,
que perpetua a memória na longa duração. Com os ponteiros petrificados
temos a memória sempre disponível; uma possibilidade consistente de
recuperarmos o fato. (KOSSOY, 2005, p.35)
Ler almanaques populares seria estabelecer sentido entre o que foi “lido”,
vivido e o que se vive, mas recuperando também as memórias de leitura
vivenciadas. Lê-se o conhecimento, através de saberes anteriores. (PARK,
1999. p51)
Em complementaridade com o Percurso 1 e as questões teóricas da
iconografia/fotografia, constantes do capítulo anterior apresentarei agora o
Percurso 2.
Este projeto, que ao final tomou a forma de um almanaque, só foi
idealizado após a leitura do livro ―Guia do observador de nuvens‖ de Gavin
Pretor – Pinney, no qual o autor apresenta os tipos de nuvens, fatos e
curiosidades sobre elas. A estrutura do texto chamou muito a minha atenção,
pois parece que o autor está conversando com o leitor e como em qualquer
diálogo os cortes e retomadas são constantes.
Após ler o livro, comecei a pensar o quanto as pessoas olhavam para o
céu, ou se paravam para isso e como era olhar o céu para as crianças. Na
minha infância, era comum olhar para o céu. Observar as nuvens chegou a ser
um passatempo, uma diversão. A observação das nuvens colaborou com
132
minha constituição de leitora, a partir da construção de imagens, da percepção
do tempo e do espaço.
Como seria hoje observar nuvens? Nossos alunos vivem bombardeados
por informações e por vezes não param para observar, não constroem, não
reinventam, acabam por aceitar o pronto e instantâneo, não há então
elaboração e muito menos a reelaboração. Sendo assim, a apropriação de
ideias é falha, já que em grande parte é dada e não construída.
O projeto ―Caçadores de nuvens‖ foi desenvolvido com alunos da 5ª
série do Ensino Fundamental, teve início no 1º bimestre de 2009 e terminou no
4º bimestre. Com este projeto, pretendia resgatar o imaginário dos alunos, a
importância de observar, de fazer leituras. Além de marcar a importância do
tempo de atenção.
No início, conversei com os alunos e, logo em seguida, com os pais
deles, na primeira reunião do ano. Os pais acharam interessante o trabalho de
observação das nuvens e revelaram que não paravam para olhar, observar o
céu.
Na sequência, solicitei que os alunos observassem as nuvens e
falassem sobre a observação. Então, coletamos cones vazios de linha para
serem usados como selecionadores de imagens na observação das nuvens.
Disse aos alunos para que observassem em um ambiente interno e em um
externo, com e sem cone e que depois relatassem a observação.
Depois de observarem as várias formas de nuvens, pedi que os alunos
fotografassem nuvens que tivessem formatos que eles reconhecessem como
animais ou objetos. Quando começaram a fotografar, perceberam que as
nuvens não aguardavam que eles ligassem a câmera, pois elas perdiam a
forma ao sabor do vento.
Este reconhecimento fez com que eles criassem dicas de observação,
cada aluno comentava como tinha feito e quais as dificuldades e logo outro
aluno dava uma solução para o problema apresentado. As fotos foram
entregues de diversas formas: CD, impressão caseira, reveladas e por email.
Alguns alunos ainda desenharam as nuvens que observaram, estes disseram
133
que era bem mais difícil desenhar. Simultaneamente, os alunos iniciaram um
estudo sobre os tipos de nuvens.
Em um dado momento do ano, outro projeto tomou um corpo maior (Um
tigre de papel); sem deixar a observação de lado, os alunos passaram a
dedicar um tempo maior ao novo projeto que teve seu fechamento no terceiro
bimestre. Assim, o projeto das nuvens caminhava, mas a passos lentos.
Pensamos então como se dava a observação por outras pessoas;
elaboramos um pequeno questionário, com três perguntas, que deveria ser
aplicado a pessoas de faixas etárias bem diferentes. A pergunta número 1 era
igual para todas as salas, foi elaborada pelos alunos e eleita para ser a
pergunta matriz; já as duas seguintes, foram criadas e eleitas pelos alunos de
cada sala.
As perguntas criadas pelos alunos:
5ª série A
1. Quando foi a última vez que olhou para o céu? Por quê? 2. Qual foi a forma mais interessante de nuvem que você já viu? Descreva. 3. A figura que você viu é real ou imaginária?
5ª série B
4. Quando foi a última vez que olhou para o céu? Por quê? 5. Por que você olha para as nuvens? 6. Qual foi o formato mais engraçado de nuvem que você já viu?
5ª série C
7. Quando foi a última vez que olhou para o céu? Por quê? 8. Para você o que representam as nuvens? 9. De onde você acha que as nuvens vêm?
5ª série D
10. Quando foi a última vez que olhou para o céu? Por quê? 11. O que significa, para você, olhar para o céu e ver nuvens? 12. Que sensação você teria se estivesse nas nuvens?
Quadro 7 – Perguntas para entrevista - Projeto Caçadores de Nuvens Fonte: produção dos alunos
134
Uma das entrevistas
FIGURA 57 – Entrevista – Projeto Caçadores de Nuvens
Fonte: Produção de aluna
Após as entrevistas, demos maior ênfase às fotos.
135
Posteriormente, fizemos pesquisas sobre as nuvens e no final, no meu
retorno de uma viagem a Paraty/RJ, onde me encontrei com Marina Colasanti,
parte do Projeto ―Um tigre de papel‖, trouxe almanaques da empresa Cia
Granado e propus aos alunos que estudássemos o material, para que
pudéssemos criar um almanaque sobre nuvens, assim poderíamos organizar
as fotos e as pesquisas e então levar para leitores.
Durante as aulas, levei outros almanaques para que os alunos
percebessem a interlocução possível a partir do formato que havíamos
escolhido. Ainda salientei que os almanaques faziam parte da memória de seus
pais e avós, sendo assim, daríamos destaque ao almanaque, que atualmente
não tem a expressão que possuía antigamente.
A proposta foi bem aceita, construímos um padrão para o almanaque,
distribuímos as tarefas aos grupos e a organização do almanaque se deu, com
encontros semanais e/ou quinzenais nos quais os grupos levavam os materiais,
selecionavam e organizavam. As decisões para a montagem tiveram como
norte os leitores, alunos das 4ªs séries da EEPMC e alunos de duas 4ªs séries
de uma escola particular – o Colégio Luiz de Queiroz. Este colégio foi escolhido
por dois motivos: em primeiro lugar, porque os alunos quiseram manter a 4ª
série como seu público-alvo e na escola só havia três 4ªs séries e em segundo
lugar, por eu sugerir uma 4ª série de uma escola particular, na qual trabalha
minha parceira de projetos, a Prof.ª Camila O. D. Vitte.
Nos almanaques podemos encontrar: foto da escola, homenagem,
informações e curiosidades sobre as nuvens, imagens de nuvens registradas
pelos alunos, feriados de 2010, previsão de chuva para o trimestre (novembro
a janeiro), anedotas, cruzadinha e caça-palavras. Estes últimos contam com a
solução. Assim, a produção cumpre com o que Park chama de forma simples
de um almanaque:
O almanaque, na sua forma mais simples, mais popular, se apresenta como um pequeno calendário ilustrado com imagens, figuras e signos. Mais que informar, ambiciona que o leitor penetre num universo diferenciado e denso para o qual, quanto mais tempo dedicamos, mais se nos oferece à análise. (PARK, 1999. p.42)
136
As capas receberam as fotos tiradas pelos alunos. A 5ª A foi a única
classe em que uma aluna foi quem montou a capa, as demais planejaram
como gostariam e eu é quem montei.
As capas:
FIGURAS 58 a 61 – Capas dos almanaques Fonte: produção dos alunos
Para o final, ficou a escolha, por cada classe, do(a) homenageado(a) e a
produção escrita da homenagem a um integrante do grupo escola, assim como
137
a produção das apresentações. Vale ressaltar que produzir quatro almanaques,
e não um, foi escolha das salas.
Os homenageados foram escolhidos a partir de voto secreto, eles
poderiam escolher dentre professores e funcionários da escola.
A 5ª série A escolheu o Sr. Severino Manuel Vieira mais conhecido por
―Seu Preá‖. Ele organiza o espaço externo da escola, cuidando das plantas e
da limpeza. Ainda é ele quem abre o portão de entrada e recebe os alunos e
também abre o portão no horário de saída, se despedindo deles.
Já a 5ª série B escolheu homenagear as professoras do Ensino
Fundamental Ciclo I (1ª a 4ª séries). No início, a classe não tinha uma escolha
definida, pois os votos eram na maioria para as professoras das 4ª séries do
ano anterior. Conversando os alunos, disseram que gostariam de homenageá-
las, pois elas tinham colaborado para que eles estivessem hoje na 5ª série. A
partir desta afirmação, os alunos reelaboraram a ideia e decidiram homenagear
todos os professores que eles tiveram no Ciclo I do Ensino Fundamental.
A escolha da 5ª C foi por esta docente que escreve. Tentei fazer com
que mudassem de ideia, que votassem novamente, mas não consegui, eles
foram enfáticos: ―A professora disse que poderíamos escolher!‖. Embora tenha
relutado, não tive argumentos suficientes para fazer com que mudassem de
ideia. As outras classes reclamaram, pois segundo eles, se soubessem que
poderiam me escolher, teriam feito. Agradeci, mas elogiei as escolhas que eles
fizeram e disse que eu fazia de qualquer forma parte de todos os almanaques.
E a 5ª série D escolheu o Prof. Fabiano (História), que chegou este ano
na escola e tem uma boa relação com os alunos.
Após as escolhas, os grupos de cada classe que iriam escrever a
homenagem prepararam uma entrevista e desta produziram o texto da
homenagem.
138
As homenagens:
NNoossssoo hhoommeennaaggeeaaddoo
O homenageado
é Severino Manuel Vieira, que é o zelador da Escola Estadual ”Pedro Moraes Cavalcanti”.
“Seu Preá” é como ele é conhecido e chamado carinhosamente pelos alunos.
Nasceu em 1945 na cidade de São Vicente Ferri, em Pernambuco. Faz 38 anos que ele mora em Piracicaba.
“Trabalho na escola tem nove anos e três netos meus estudam aqui: uma na primeira, um na quinta e outro na sexta série.”, diz Seu Preá.
Ao perguntarmos o que o mantém por tantos anos na escola, respondeu que “é o respeito” que os alunos têm por ele.
Disse ele que sempre gostou de observar as nuvens e suas formas, e que as nuvens escuras, para ele, são as que chamam mais atenção por serem obras da natureza.
HHOOMMEENNAAGGEEMM
NNoossssooss hhoommeennaaggeeaaddooss ssããoo ooss pprrooffeessssoorreess
ddoo EEnnssiinnoo FFuunnddaammeennttaall ddoo CCiicclloo II ((11ªª aa
44ªª sséérriieess))..,, ccoomm eessppeecciiaall aatteennççããoo aaooss ddaa
EEssccoollaa EEssttaadduuaall ““PPeeddrroo MMoorraaeess
CCaavvaallccaannttii””,, qquuee ffoorraamm pprrooffeessssoorreess ddaa
ggrraannddee mmaaiioorriiaa ddooss aalluunnooss qquuee hhoojjee
eessttããoo nnaa 55ªª sséérriiee ddoo EEnnssiinnoo
FFuunnddaammeennttaall..
QQuueerreemm ssaabbeerr ppoorr qquuee??
GGrraaççaass aa eelleess aapprreennddeemmooss oo nneecceessssáárriioo
ppaarraa qquuee ppuuddéésssseemmooss cchheeggaarr oonnddee eessttaammooss..
EElleess ffiizzeerraamm ppoorr nnóóss aallggoo qquuee nniinngguuéémm mmaaiiss
ffaarriiaa,, nnooss aajjuuddaarraamm nnaass mmeellhhoorreess ee ppiioorreess
hhoorraass,, aalléémm ddee nnooss ““aattuurraarr”” dduurraannttee eesssseess
aannooss..
VVaammooss ccoommbbiinnaarr,, ttooddooss ooss bboonnss pprrooffeessssoorreess
ssããoo uumm ppoouuccoo dduurrõõeess,, mmaass ssee nnããoo ffoosssseemm aass
bbrroonnccaass nnããoo sseerríímmooss oo qquuee ssoommooss hhoojjee..
AAggrraaddeecceemmooss ppoorr tteerreemm nnooss eennssiinnaaddoo aa
ccaammiinnhhaarr nnaa eessttrraaddaa qquuee nnooss lleevvaarráá
ppaarraa oo ffuuttuurroo..
SSaabbeemmooss qquuee eelleess mmeerreecceemm mmaaiiss ddoo ooss qquuee
eessttaa ssiimmpplleess hhoommeennaaggeemm,, mmaass eellaa ffooii
ffeeiittaa ccoomm ccaarriinnhhoo ee ccoomm cceerrtteezzaa sseerráá
rreecceebbiiddaa ccoomm oo mmeessmmoo aaffeettoo..
AAlluunnooss ddaa 55ªª sséérriiee BB
Quadro 8 – Homenageados dos almanaques - 5ª A e B Fonte: produção dos alunos
139
NNoossssaa hhoommeennaaggeeaaddaa
CCiibbeellee AAddrriiaannaa
PPeerriinnaa AAgguuiiaarr
é a professora
de Língua
Portuguesa das
5ª séries do
Ensino
Fundamental d
nossa escola –
Escola
Estadual “Pedro Moraes Cavalcanti”. De
seus 43 anos vividos, quatro deles são
dando aula nesta escola.
Uma mulher que adora sua profissão, pois
pode contribuir para a formação de uma
pessoa.
Não se pode imaginar que essa professora,
quando criança, pensou em ser
paleontóloga. E que ainda criança
brincava de “escolinha”, ensinando seus
primos mais novos a ler e escrever.
Em sua infância já olhava para o céu, mas
agora, com o Projeto “Caçadores de
Nuvens”, passou a olhar mais ainda.
A 5ª série C escolheu a Prof.ª Cibele para
homenagear, pois ela é a responsável pelo
projeto.
Alunos da 5ª série C
NNoossssoo hhoommeennaaggeeaaddoo
O almanque da 5ª
série D dedica esta
homenagem ao Prof.
Fabiano Gava dos
Santos, que tem 32
anos e leciona
História (6 anos).
Quando perguntamos
se olhava para as
nuvens, ele revelou
que quando criança e
ainda adulto olha
para as nuvens.
Na entrevista, perguntamos o que ele achou de
nosso projeto e ele relatou:
“É um projeto que visa a leitura. Muitos
professores tem a ideia de que os alunos não se
interessam pela leitura e a escrita, quando em
muitos casos é o professor que não tem incentivo
para descobrir maneiras que façam com que os
alunos se interessem, ficando com aulas
monotonas que tem o intuito da repetição e não da
motivação.”
Logo após, perguntamos o motivo que o faz
continuar olhando para as nuvens e ele respondeu
que pelo mesmo motivo que nós alunos, pois
olhando ele pode montar, com a imaginação, que
é fertil, imagens e desenhos que dificilmente ele
poderia encontrar no cotidiano.
Para finalizar a entrevista perguntamos se o
professor gostaria de ler nosso almanaque e com
gentileza ele respondeu que não “gostaria” ler o
almanque, pois com certeza iria ler.
Agradecemos o Prof.º Fabiano por participar de
nossa formação.
Alunos da 5ª série D
Quadro 9 – Homenageados dos almanaques - 5ª C e D Fonte: produção dos alunos
140
As apresentações foram feitas pelos grupos que receberam esta tarefa e
ficaram assim:
AAPPRREESSEENNTTAAÇÇÃÃOO
AALLMMAANNAAQQUUEE ““DDEESSCCOOBBRRIINNDDOO AASS
NNUUVVEENNSS NNUUVVEENNSS””
O Projeto ―Caçadores de Nuvens‖ foi desenvolvido por alunos da 5ª série do Ensino Fundamental, da Escola Estadual Pedro Moraes Cavalcanti, orientados pela Prof.ª Cibele, de Língua Portuguesa, com o desejo de que mais alunos passem a apreciar as nuvens e suas formas.
O trabalho teve início no começo do ano e terminou no terceiro bimestre. No início, os alunos observaram e fotografaram as nuvens. Depois estudaram os tipos de nuvens. E ainda, entrevistaram pessoas de idades variadas para saber se olhavam para o céu, pesquisaram e trabalharam bastante para depois produzirem este material.
―Descobrindo as Nuvens‖ é o nome do almanaque que você vai ler agora. Nele vai ver várias coisas sobre nuvens: informações, curiosidades, imagens, dicas, tipos de nuvens, brincadeiras e suas soluções. Também poderá conhecer nossa escola e o homenageado da turma que fez este almanaque.
Com um pouco de imaginação, as pessoas podem olhar para o céu e viajar nas formas que as nuvens representam.
Continue virando as páginas e vai parecer que você está nas nuvens.
Alunos da 5ª série A
AAPPRREESSEENNTTAAÇÇÃÃOO
AALLMMAANNAAQQUUEE ““RREEVVEELLAADDOOSS OOSS
SSEEGGRREEDDOOSS DDAASS NNUUVVEENNSS””
Neste almanaque você vai desvelar os segredos das nuvens, que as 5ª séries da Escola Estadual ―Pedro Moraes Cavalcanti‖ descobriram realizando o Projeto ―Caçadores de Nuvens‖.
No começo do ano, a Prof.ª Cibele (Lìngua Portuguesa) comentou sobre o projeto, então começamos a observar melhor as nuvens.
Um mês depois, a professora nos entregou a apostila das nuvens, com os nomes de cada uma delas, as suas características, a altitulde e imagens.
Após estudarmos a apostila, percebemos que não olhavamos muito para o céu. Começamos a observar as nuvens com a ajuda de um cone, com ele nós selecionávamos as figuras que as nuvens formavam. Desejamos saber se outras pessoas, das mais variadas idades, olhavam para o céu. Então montamos perguntas para realizarmos entrevistas com nossos parentes. Nos divertimos muito com as respostas engraçadas que nos deram, quando perguntávamos sobre a observação do céu e das nuvens.
Na sequência, a professora pediu que nós tirássemos fotos de nuvens que tivessem formatos, conseguimos fotos de todo tipo, alguns alunos observaram e desenharam.
Aprendemos várias coisas engraçadas e diferentes com este projeto e queremos que vocês também aprendam, por isso leiam este almanaque que tem diversão e informção. Vocês vão aprender de um jeito super legal!!
Alunos da 5ª série B
Quadro 10 – Apresentações dos almanaques - 5ª A e B Fonte: produção dos alunos
141
AAPPRREESSEENNTTAAÇÇÃÃOO
AALLMMAANNAAQQUUEE ““DDEESSVVEENNDDAANNDDOO OOSS SSEEGGRREEDDOOSS DDAASS NNUUVVEENNSS””
Nós, alunos da 5ª série do Ensino Fundamental, da Escola Estadual ―Pedro Moraes Cavalcanti‖, orientados pela professora Cibele (Língua Portuguesa), iniciamos o Projeto ―Caçadores de Nuvens‖ as observando e este foi o primeiro passo de nosso trabalho.
O segundo foi tirar fotos de várias nuvens com formatos diversos como: cachorro, coração, camelo, etc.
Já o seguinte foi a digitalização de todas as fotos que tiramos. Depois, recebemos uma apostila que tinha dez tipos de nuvens, para estudo.
Assim que estudamos a apostila, demos um tempo neste trabalho e terminamos outro, que foi a ilustração do texto ―Um tigre de papel‖ da autora Marina Colasanti. O trabalho de ilustração foi entregue para a autora, em Paraty/RJ, pela professora.
Em Paraty, passando perto de uma loja, a professora viu uma promotora da fábrica Granado e Cia distribuindo almanaques e pediu se ela não arrumaria uma boa quantidade para seus alunos.
Foi assim que surgiu a ideia de nós fazermos um almanaque das nuvens, que é o que fizemos e vocês podem ver agora.
Desvendando os segredos das nuvens é um almanaque que tem muitas coisas, vejam: homenagem, tipos de nuvens, feriados, previsão de chuva, anedotas (piadas), nossas melhores imagens de nuvens, caça-palavras, cruzadinhas, dicas de caçadores...
Agora é com vocês, aproveitem bastante, pois nós já aprendemos e queremos dividir com mais gente.
Alunos da 5ª série C
AAPPRREESSEENNTTAAÇÇÃÃOO
AALLMMAANNAAQQUUEE ““DDEESSCCOOBBEERRTTAASS IINNUUSSIITTAADDAASS””
Este almanaque foi feito por nós, alunos da 5ª série do Ensino Fundamental, da Escola Estadual ―Pedro Moraes Cavalcanti‖, com orientação da Prof.ª Cibele (Língua Portuguesa).
Agora você leitor acompanhará como surgiu o almanaque, DESCOBERTAS INUSITADAS, que dará a você mais conhecimento e diversão.
No começo do ano, começamos o projeto ―Caçadores de Nuvens‖, neste cada aluno deveria levar a escola, por meio de fotos ou desenhos, uma imagem de nuvem com formatos de animais, objetos...
Depois de conseguidas as foto, veio a dúvida: como iríamos expor o material, as informações, as ideias? Por meio de um livro? De um texto?
Até que surgisse a ideia, começamos outro trabalho, com o texto ―Um tigre de papel‖ da autora Marina Colasanti. Os melhores trabalhos sobre o texto seriam levados a Paraty/RJ, para serem entregues a autora, mas isto já é outra história.
Paraty está ligada ao nosso almanaque, pois foi lá que aconteceu o que citamos logo abaixo:
―Certo dia, quando a Prof.ª Cibele andava pelas ruas de Paraty, viu uma moça entregando almanaques... ―
Foi assim que surgiu a ideia, a professora pensou: ― Por que não montamos um almanaque sobre nuvens???‖ Então ela conseguiu trazer almanques suficientes para todos nós e sugeriu que nosso projeto ―Caçadores de Nuvens‖ tomasse este formato.
Agora, nós alunos sugerimos a você leitor que aprimore seus conhecimentos sobre as nuvens fazendo a leitura do nosso almanaque.
Boas descobertas !
Alunos da 5ª série D
Quadro 11 – Apresentações dos almanaques - 5ª C e D Fonte: produção dos alunos
Os almanaques tiveram a mesma organização, porém nem sempre
receberam as mesmas denominações. Os sumários dos almanaques podem
ilustrar as escolhas das salas:
142
5ª série A 5ª série B
SSUUMMÁÁRRIIOO
AApprreesseennttaaççããoo ........................................................................................11
TTiippooss ddee nnuuvveennss ................................................................................22
NNoossssaass mmeellhhoorreess iimmaaggeennss .............................................. 44
CCrruuzzaaddiinnhhaa .............................................................................................. 66
CCaaççaannddoo nnuuvveess ................................................................................ 66
CCuurriioossiiddaaddeess ........................................................................................77
DDiiccaass ddee oobbsseerrvvaaççããoo ..................................................................88
AAnneeddoottaass...................................................................................................... 88
SSoolluuççõõeess:: CCrruuzzaaddiinnhhaa ee CCaaççaannddoo NNuuvveenn....99
SSUUMMÁÁRRIIOO
AApprreesseennttaaççããoo ........................................................................................11
TTiippooss ddee nnuuvveennss ................................................................................22
NNoossssaass mmeellhhoorreess iimmaaggeennss ................................................44
CCrruuzzaaddiinnhhaa ................................................................................................66
VVaammooss ccaaççaarr nnuuvveennss?? ..............................................................66
CCuurriioossiiddaaddeess ........................................................................................77
DDiiccaass ..................................................................................................................88
AAnneeddoottaass ......................................................................................................88
SSoolluuççõõeess:: CCrruuzzaaddiinnhhaa ee VVaammooss ccaaççaarr
nnuuvveennss?? ........................................................................................................99
5ª série C 5ª série D
SSUUMMÁÁRRIIOO
AApprreesseennttaaççããoo ......................................................................................11
TTiippooss ddee nnuuvveennss ..............................................................................22
NNoossssaass mmeellhhoorreess iimmaaggeennss ..............................................44
CCrruuzzaaddiinnhhaa ..............................................................................................66
VVaammooss ccaaççaarr ppaallaavvrraass?? ........................................................66
CCuurriioossiiddaaddeess ......................................................................................77
DDiiccaass ddee CCaaççaaddoorreess ..................................................................88
AAnneeddoottaass.................................................................................................... 88
SSoolluuççõõeess:: CCrruuzzaaddiinnhhaa ee VVaammooss ccaaççaarr
ppaallaavvrraass??....................................................................................................99
SSUUMMÁÁRRIIOO
AApprreesseennttaaççããoo ........................................................................................11
TTiippooss ddee nnuuvveennss ................................................................................22
NNoossssaass mmeellhhoorreess iimmaaggeennss ................................................44
CCrruuzzaaddiinnhhaa ..............................................................................................66
CCaaççaannddoo nnuuvveennss ............................................................................66
CCuurriioossiiddaaddeess ........................................................................................77
DDiiccaass ..................................................................................................................88
AAnneeddoottaass ......................................................................................................88
SSoolluuççõõeess:: CCrruuzzaaddiinnhhaa ee CCaaççaannddoo
nnuuvveennss??..........................................................................................................99
Quadro 12 – Sumários dos almanaques das 5ª séries Fonte: produção dos alunos
O tópico Tipos de nuvens, além de receber a mesma denominação foi
elaborado pelas quatro salas, sendo assim, os quatro almanaques receberam o
mesmo texto. A elaboração do texto foi feita a partir do livro Guia dos
observadores de nuvens, já citado nesta dissertação, e pesquisas feitas pelos
alunos. Por sua vez, os tópicos: Apresentação, Nossas melhores imagens,
Cruzadinha, Curiosidades são distintos em cada almanaque. Já no tópico
Anedotas, o conteúdo tem poucas variações.
Destaco aqui a linguagem iconográfica dada na fotografia das nuvens
veiculadas nos almanaques. Estas, na maioria, não estabeleceram com o leitor
a leitura do produtor, ficando para o leitor a experiência da elaboração. Como a
143
escolhida para a capa do Almanaque Revelados os segredos das nuvens, que
segue:
FIGURA 62 – Fotografia escolhida para a capa do Almanaque Revelados os segredos das nuvens
Fonte: produção do aluno Cauã Yuri Amaral
Já as fotos que receberam a interferência dos fotógrafos proporcionaram
aos leitores a reelaboração a partir da leitura dirigida pelo modo de ver do seu
produtor. Assim, há a confirmação da representação dada na foto, visto que a
imagem fotográfica proporciona uma pluralidade de leituras. A foto da aluna
Isabela Ap. Rodrigues do Nascimento não só recebeu contorno como foi
nomeada.
FIGURA 63 – Fotografia escolhida para o Almanaque Descobrindo as nuvens Fonte: produção da aluna Isabela Ap. Rodrigues do Nascimento
144
Outras fotografias, por sua vez, suscitavam quase sempre uma mesma
leitura, como a foto que foi escolhida para a capa do Almanaque Descobrindo
as nuvens, que sempre remete a figura do tubarão, não querendo aqui
condicionar ou dirigir a leitura, apenas constatando a experiência vivenciada
dos muitos olhares que ela recebeu.
FIGURA 64 – Fotografia da capa do Almanaque Descobrindo as nuvens Fonte: produção do aluno Felipe Maia Vizentin
Segundo Kossoy
A fotografia estabelece em nossa memória um arquivo visual de referência insubstituível para o conhecimento do mundo. Essas imagens, entretanto, uma vez assimiladas em nossas mentes, deixam de ser estáticas; tornam-se dinâmicas e fluidas e mesclam-se ao que somos, pensamos e fazemos. Nosso imaginário reage diante das imagens visuais de acordo com nossas concepções de vida, situação sócio-econômica, ideologia, conceitos e pré-conceitos.
Não obstante todo o conhecimento e experiência que temos acumulado ao longo de nossas vidas – que injetamos quando de nossa leitura das imagens – necessitamos ainda recorrer à imaginação.( KOSSOY, 2002,p.45)
Assim se faz necessário apresentar a você, leitor, as fotografias
selecionadas de cada almanaque, para que faça a sua leitura, recorra, como
145
diz o autor anteriormente citado, à imaginação e às experiências de vida que
tem. Já que, como leitor, constituído de suas leituras anteriores, dará às fotos
representações de realidade marcadas pela elaboração de um olhar mediado
por uma câmera e altamente influenciado pelo poder imaginativo, pelo ficcionar
na sua acepção de leitura.
Segundo Bakthin, o registro verbal dos signos não verbais caracteriza o
poder da consciência, que se faz presente no momento da compreensão. Para
o teórico russo,
Nenhum signo cultural, quando compreendido e dotado de sentido, permanece isolado: torna-se parte da unidade da consciência verbalmente constituída. A consciência tem o poder de abordá-lo verbalmente. Assim, ondas crescentes de ecos verbais, como as ondulações concêntricas da superfície das águas, moldam, por assim dizer, cada um dos signos ideológicos. Toda refração ideológica do ser em processo de formação, seja qual for a natureza de seu material significante, é acompanhada de uma refração ideológica verbal, como fenômeno obrigatoriamente concomitante. A palavra está presente em todos os atos de compreensão e em todos os atos de interpretação. (BAKHTIN, M.M.,2004,p.38)
Entrelaçando o dizer de Bakthin, com a representação da criação da
natureza por meio da fotografia de nuvens, que exprime o recorte dado pelo
fotografo, aliado ao suporte das páginas de um almanaque, sugiro que observe
as imagens e tente verbalizá-las, embora não consiga substituí-las por
palavras, mas necessite trazê-las para discursar com o que observa.
Desta forma, neste momento apresento as páginas dos almanaques que
receberam as fotografias e, em um dos almanaques, um desenho de nuvens.
Assim, você leitor, poderá reelaborar, rememorar, inferir sem o discurso desta
pesquisadora que depois tratará da recepção do leitor, da alteridade que a
imagem pode estabelecer pelo simples fato de ter como suporte um veículo de
informação – o almanaque.
Seguem as páginas dos quatro almanaques, que receberam no tópico
Nossas imagens de nuvens, selecionadas pelas quatro quinta séries.
146
Nuvens selecionadas para o Almanaque Descobrindo as nuvens,
elaborado pelos alunos da 5ª série A
NNoossssaass iimmaaggeennss
4
FIGURA 65 – Nuvens selecionadas para o Almanaque Descobrindo as nuvens Fonte: Almanaque Descobrindo as nuvens
Matheus Jacinto
Luis Henrique Lopes Sulyay
Taís Barbosa Ometto
147
NNoossssaass iimmaaggeennss
5
FIGURA 66 – Nuvens selecionadas para o Almanaque Descobrindo as nuvens Fonte: Almanaque Descobrindo as nuvens
Higor da Silva Oliveira
Prof.ª Cibele Adriana Perina Aguiar
Isabela Ferreira Miranda
Isabela Ap. Rodrigues do Nascimento
148
Nuvens selecionadas para o Almanaque Revelados os segredos das
nuvens, elaborado pelos alunos da 5ª série B
NNoossssaass iimmaaggeennss
4
FIGURA 67 – Nuvens selecionadas para o Almanaque Revelados os segredos das nuvens
Fonte: Almanaque Revelados os segredos das nuvens
Cauã Yuri Amaral
Júlia Teresa Cabral Nunes Agatha Vitória Maximo
Ana Paula Prestes de Almeida
149
Nossas imagens
5
FIGURA 68 – Nuvens selecionadas para o Almanaque Revelados os segredos das nuvens
Fonte: Almanaque Revelados os segredos das nuvens
Prof.ª Cibele Adriana Perina Aguiar
Yago Carvalho da Silva
Karina Brito da Silva
150
Nuvens e imagens selecionadas para o Almanaque Desvendando os
segredos das nuvens, elaborado pelos alunos da 5ª série C
NNoossssaass iimmaaggeennss
4
FIGURA 69 – Nuvens selecionadas para o Almanaque Desvendando os segredos das nuvens
Fonte: Almanaque Desvendando os segredos das nuvens
BÁRBARA EUGENIA PRADO
DE MOURA
ANDRÉ MENGATTO PEREGRINA
PRISCILLA BORGES SANTOS
ANANDA DA SILVA OLIVEIRA
LEONARDO HENRIQUE CORDEIRO JOSÉ MATHEUS MENEGALLI
MATHEUS
FURLAN
151
NNoossssaass iimmaaggeennss
5
FIGURA 70 – Nuvens selecionadas para o Almanaque Desvendando os segredos das nuvens
Fonte: Almanaque Desvendando os segredos das nuvens
ISABELLE JACINTHO
LETÍCIA CONSOLMAGNO DE GOIS VITÓRIA BOTTENE CASAGRANDE
MARIA EDUARDA COSTA DA SILVA
PAULO VITOR ALTOS SANTINI
PROF.ª CIBELE ADRIANA PERINA AGUIAR
152
Nuvens selecionadas para o Almanaque Descobertas inusitadas das
nuvens, elaborado pelos alunos da 5ª série D
NNoossssaass iimmaaggeennss
Thaís de Carvalho Moraes
Verônica N. Leme Machi
Yuri Domingues Claudino Matheus Maia Vizentin
4
FIGURA 71 – Nuvens selecionadas para o Almanaque Descobertas inusitadas Fonte: Almanaque Descobertas inusitadas
153
NNoossssaass iimmaaggeennss
Jéssica Camargo de Souza
Leonardo Arruda Lima
Prof.ª Cibele Adriana Perina Aguiar
5
FIGURA 72 – Nuvens selecionadas para o Almanaque Descobertas inusitadas Fonte: Almanaque Descobertas inusitadas
154
Observando a organização das fotos, a referência à autoria destas, a
opção por colocar molduras, o fato de terem como suporte um almanaque,
estamparem páginas deste material, proporciona ao leitor que as produziu ou
participou do processo que tenha uma nova leitura. Segundo Kossoy,
Através da fotografia aprendemos, recordamos, e sempre criamos novas realidades. Imagens técnicas e imagens mentais interagem entre si e fluem ininterruptamente num fascinante processo de criação/construção de realidades – e de ficções. São essas as viagens da mente: nossos ―filmes‖ individuais, nossos sonhos, nossos segredos. Tal é a dinâmica fascinante da fotografia, que as pessoas, em geral, julgam estáticas. (KOSSOY, 2005, p.35)
E o leitor, que se depara pela primeira vez com esta linguagem
iconográfica, faz a primeira das muitas leituras possíveis. Já que todo sujeito é
um leitor em formação, visto que constrói, a cada segundo, sua história. E que
toda fotografia, segundo Kossoy, revela uma certa ambiguidade.
Este projeto foi finalizado com a entrega dos almanaques para os alunos
das 4ª séries, pelos alunos das 5ª séries. Vale ressaltar que as professoras das
4ª séries receberam almanaques da Granado e Cia para apresentarem para os
seus alunos e os informaram que as 5ª séries estavam produzindo um
almanaque para eles.
A entrega
155
FIGURAS 73 a 90 – Entrega dos almanaques
Fonte: acervo da pesquisadora
A representação verbal da resposta dos alunos por receberem os
almanaques se deu tanto oralmente quanto por escrito. Em ambas as
representações, os alunos demonstraram o quanto se faz importante esta
interlocução. Sendo assim, autores e interlocutores atuaram e se expressaram
na e pela linguagem.
Segue o dizer da aluna Laura Camila Falone, que recebeu o almanaque
produzido pela 5ª série A.
FIGURA 91 – Texto de aluna da 4ª série B sobre o almanaque da 5ª A Fonte: produção da aluna Laura Camila Falone
156
O dizer da aluna Laura bem representa a compreensão de que um
almanaque é um material que se constitui de linguagens representadas tanto
na sua acepção verbal, não-verbal e mista.
Segundo Margareth Park (1999), em seu livro Histórias e leituras de
almanaques do Brasil, o almanaque é um suporte de leitura. Por minha vez,
digo um suporte de leituras. A autora ainda diz que este material teve seu
momento histórico e neste, um bom alcance junto aos leitores, isto devendo-se
a alguns fatores: à grande tiragem, à gratuidade, à distribuição e à
diagramação. Fatores estes que, reunidos, dirigiam-se não a um leitor, mas
pretendiam atingir leitores das mais diversas camadas sociais.
Os nossos almanaques foram produzidos tendo como fonte de
organização outros almanaques, em especial o da empresa Cia Granado. Este
material possibilitou a verificação do trânsito de linguagens e gêneros textuais
que ele veicula. Assim, quando decidimos produzir um almanaque, estava
implícito trabalhar com as várias linguagens e gêneros textuais que nele
coadunam.
O almanaque pôde ser percebido, tanto por seus autores quanto por
seus leitores, como um suporte de linguagens. Segundo Park, apoiada no dizer
de Bollème
Para definir almanaque, pode-se salientar o seguinte: ele não é um manual, ele não é assimilável de forma diferente do que é um romance, ele diverte sem se prender à pura fabulação, ele ensina sem ser dogmático, ele não é, de modo algum, artigo de fé, ele obedece a uma grande lei que é sem dúvida aquela de todo a leitura popular, é prazeroso e útil. (Bollème, 1969). (PARK, 1999. p.46)
Na montagem do almanaque pensou-se tanto no informar quanto no
divertir. Sempre preocupados em atender ao formato do material, atenção aos
leitores e aos aspectos de custo desta produção, para posterior veiculação,
professora e alunos procuraram concretizar as suas idealizações.
Neste percurso, o dizer dos alunos/autores marcou o lugar de onde
falavam e para quem falavam, tendo como orientação e objetivo a veiculação
de um suporte de linguagens – o almanaque.
157
PERCURSO 3
O TEXTO “UM TIGRE DE PAPEL” E SEUS DESDOBRAMENTOS
Marina quando li o “tigre” me senti confuso, mas quando senti o texto eu
entendi (Leandro de O. Lima)
No desenho, como na poesia, falamos por metáforas. Somamos as imagens
arquetípicas e ainda nossos recursos de uso da linha e da cor. (LAGO,
2008, p. 28)
A linguagem nos dá a ver por que, afinal, vivemos juntos. A maioria de
nossas funções humanas é singular: não precisamos de ninguém para
respirar, andar, comer ou dormir. Mas precisamos dos outros para falar,
para que nos devolvam o que dissemos. A linguagem, declarou Döblin, é
um modo de amar os outros.” (MANGUEL, 2008.p.17)
Vale ressaltar que um projeto só toma sua forma real a partir do grupo.
Assim, aquilo que chamo aqui de rascunho do projeto, já existia. Pretendia, a
partir de um texto, que os alunos elaborassem uma ilustração interpretativa. Já
havia trabalhado desta forma com outros educandos, mas em aulas de Leitura,
alunos de 7ª e 8ª séries. Também já havia conduzido um trabalho de ilustração
com alunos de 5ª série, mas não tinha dado ao trabalho a importância que
representava. Neste momento, a proposta se redesenhava, trabalharia com
alunos de 5ª série do Ensino Fundamental, com um texto que fosse de grande
interesse destes.
Em pauta, estava a ilustração e a ideia que tinham desta. Cabia então
dar à ilustração o seu lugar, o de uma linguagem que pode revelar a
construção elaborada e (re) elaborada de mundo que o sujeito tem. Ainda
marcar o entrelace das linguagens (verbal/não-verbal).
Outra intenção era aproximar meus alunos do texto literário e do autor,
de tal forma que pudessem tratar do texto e do autor com intimidade de quem
158
efetivamente lê. Assim, os alunos poderiam se ver como autores, já que o ser
autor não estaria marcado pelo distanciamento, que por vezes é impresso
socialmente. O autor seria então uma pessoa e o texto uma construção. E eles,
por sua vez, sujeitos leitores, autores de sua história, que, na relação com o
texto, trariam a interpretação a partir de imagens, da ilustração.
O mundo que a literatura descortina é um mundo possível, já que foi
pensado, mesmo quando no topo da fantasia. A ficção também transforma a
vida humana e pode estabelecer a mudança com maior propriedade do que a
própria realidade. Segundo Manguel:
No reino da narrativa, sinto-me um pouco mais à vontade, e uma vez que as histórias, ao contrário das formulações científicas, não esperam, e na verdade rejeitam, respostas unívocas, posso perambular por esse território sem me sentir constrangido a dar soluções e conselhos. (MANGUEL, 2008.p.13)
As palavras não apenas nos conferem realidade; elas podem ainda defendê-la para nós. (MANGUEL, 2008.p.20)
No início de 2009, para alunos de quinta série, levei dois trechos do
texto ―Um tigre de papel‖ da autora Marina Colasanti. A partir destes trechos,
discutimos os personagens e falamos um pouco de como a referência se fazia
no texto.
O trabalho com referenciação, que poderia ser considerado difícil,
tornou-se um jogo para eles. Houve tanto interesse que os alunos passaram a
mostrar as trocas feitas por outros autores, em outros textos trabalhados.
Sendo assim, o sentimento do texto ter servido como pretexto para a atividade
não se manifestou.
Os alunos gostaram do texto e ficaram instigados para conhecê-lo.
Quando levei o texto completo, ainda sem ler, acharam que era curto. A ideia
de que um texto deva ser longo foi quebrada, assim que o lemos. Segue como
os alunos receberam o texto:
159
Um Tigre de Papel - Marina Colasanti
Sabendo que a ele caberia determinar seus movimentos e controlar sua fome, o
escritor começou lentamente a materializar o tigre. Não se preocupou com descrições de
pêlo ou patas. Preferiu introduzir a fera pelo cheiro. E o texto impregnou-se do bafo
carnívoro, que parecia exalar por entre as linhas. Depois, com cuidado, foi aumentando
a estranheza da presença do tigre na sala rococó em que havia decidido localizá-lo. De
uma palavra a outro, o felino movia-se irresistível, farejando o dourado de uma
poltrona, roçando o dorso rajado contra a perna de uma papeleira.
Em vez de escrever um salto, o escritor transmitiu a sensação de movimento com uma
frase curta. Em vez de imitar o terrível miado, fez tilintar os cristais acompanhando suas
passadas. Assim, escolhendo o autor as palavras com o mesmo sedoso cuidado com que
sua personagem pisava nos tapetes persas, criava-se a realidade antes inexistente.
O quarto parágrafo pareceu ao escritor momento ideal para ordenar ao tigre que
subisse com as quatro patas sobre o tamborete de "petit-point". E já a fera
aparentemente domesticada tencionava os músculos para obedecer quando, numa rápida
torção do corpo, lançou-se em direção oposta. Antes que chegasse a vírgula, havia
estraçalhado o sofá, derrubado a mesa com a estatueta de Sévres, feito em tiras o tapete.
Rosnados escapavam por entre letras e volutas. O tigre apossava-se da sua natureza. Já
não havia controle possível. O autor só podia acompanhar-lhe a fúria, destruindo a
golpes de palavras a bela decoração rococó que havia tão prazerosamente construído,
enquanto sua criatura crescia, dominando o texto.
Impotente, via aos poucos espalharem-se no papel cacos de móveis e porcelanas,
estilhaçar-se o grande espelho, cair por terra a moldura entalhada. Não havia mais ali
um animal exótico na sala de um palácio, mas um animal feroz em seu campo de
batalha.
O escritor esperava tenso que o cansaço dominasse a fera, para que ele pudesse
retomar o domínio da narrativa, quando o viu virar-se na sua direção, baixar a cabeça
em que os olhos amarelos o encaravam, e lentamente avançar.
Antes que pudesse fazer qualquer coisa, a enorme pata do tigre abatendo-se sobre ele
obrigou o texto ao ponto final.
COLASANTI, Marina. Um tigre de papel. In. ______. Um espinho de marfim e outras
histórias. Porto Alegre: L&PM, 1999.
QUADRO 13 – Texto Um tigre de Papel de Marina Colasanti Fonte: COLASANTI, 1999, p.187-188
Depois da verificação do pequeno glossário que entreguei junto ao texto
("petit-point"/Sèvres), os alunos foram instigados a buscar outras palavras que
não conheciam e ,como de costume, ler de maneira investigativa e produzir um
glossário.
Os alunos pediram que eu lesse, do meu jeito. Ler do meu jeito é ler
dramatizando. Fiz a leitura e então observamos as pontuações no texto, as que
me guiavam na leitura, assim como a sequência de acontecimentos. Lembrei
160
os alunos que para ler dramatizando, antes de tudo, temos que conhecer o
valor que as palavras adquirem no texto, o sentido. E que, por isso, era
importante a montagem do glossário.
Com o glossário pronto, voltamos ao texto e, dado o grande interesse,
invariavelmente, retomava-o nas atividades de sala de aula, pesquisamos a
autora e outros textos dela. Até que propus aos alunos que ilustrássemos o
texto de Marina Colasanti, já que ele não tinha ilustração. Os alunos adoraram
a ideia e começamos a estudar como o texto se dava estruturalmente.
Simultaneamente, solicitei ao professor de Arte da escola (Prof. Nelson
Norberto de Souza Vieira Sobrinho1) que conversasse com os alunos sobre a
arte barroca, mas especificamente sobre o rococó. O professor me atendeu
prontamente. E ainda sugeri que ele mostrasse que, para marcar um
personagem em uma cena, não precisamos necessariamente mostrar o
personagem todo, ou até mesmo o personagem, pois por vezes suas ações
são mais importantes. Salientei que não gostaria de que eles tivessem
modelos.
Conversando com os alunos, informei que iria, no meio do ano, a
Paraty/RJ, pois lá aconteceria a FLIP (Festa Literária Internacional de Paraty) e
que a Marina Colasanti estaria lá. Ainda, sinalizei que seria uma boa
oportunidade de apresentar a ela o nosso trabalho. Ao longo das atividades
(pesquisa sobre a autora, leitura de outros textos), o caráter de apresentação
do trabalho ganhou novo corpo, não só apresentaríamos, como daríamos de
presente.
A partir do momento em que o trabalho dos alunos se tornou um
presente para a autora, eles refletiram e disseram que a forma de
apresentação deveria ser repensada. Criamos então, uma matriz que pode
bem representar o estudo da organização dos parágrafos que fizemos. Este
estudo modificou a distribuição dos parágrafos nas páginas para a ilustração,
1 Vale ressaltar que o Prof. Norberto, como era/é chamado, fez parte de minha vida escolar. Ele foi meu
professor de Educação Artística no ginásio e teve uma grande influência nas minhas escolhas. Hoje
trabalhamos juntos, somos colegas de trabalho, mas ele sempre será o Prof. Norbeto, que tenho orgulho
de dizer que foi meu professor e que se alegra a cada vez que me vê na sala dos professores comentado
das conquistas de meus/nossos alunos.
161
pois os alunos sentiram necessidade de dividir dois dos parágrafos e unir os
dois últimos, para que pudessem apresentar as cenas.
Assim, o primeiro e o terceiro parágrafo foram divididos, já o penúltimo e
o último aglutinados.
A justificativa da divisão do primeiro parágrafo foi pela mudança de
intensidade, dada pelo personagem escritor ao personagem tigre, que no início
marca a presença do tigre pelo odor e na sequência, pelo movimento deste
personagem no cenário. Já no terceiro parágrafo, o escritor/criador perde o
controle de seu personagem/tigre/criatura, que se apossa de sua natureza.
Sendo assim, os alunos perceberam que era necessário representar os
dois momentos que se apresentavam em cada parágrafo. E decidiram separá-
los. Para isso, precisavam compor o ambiente: no caso do primeiro parágrafo,
a fera que se desenhava, estava em construção e posteriormente se
apresentava como fera; já no terceiro parágrafo, a fera domesticada e a fera na
sua condição natural de fera e no caso dos últimos parágrafos, entenderam
que a tensão do escritor para com a ação do tigre e a reação ou não do tigre,
deveria ser marcada por cada aluno da forma como estes imaginavam a cena,
já que para alguns a tensão do escritor perante o tigre seria confirmada com a
natureza do tigre aflorada e para outros o autor resolveria a situação. Segundo
os alunos, uma cena seria suficiente para marcar o final.
Sendo assim, o texto passou a ter sete cenas a serem apresentadas.
Pois os alunos perceberam que era importante apresentar o momento da
criação, assim como as duas faces do personagem ―tigre‖ em relação ao
personagem ―escritor‖. Desta forma, ao montar a matriz para os alunos, fiz a
divisão do texto sugerida por eles, ficando assim:
Divisão original Divisão para ilustração
Sabendo que a ele caberia determinar seus
movimentos e controlar sua fome, o
escritor começou lentamente a materializar
o tigre. Não se preocupou com descrições
de pêlo ou patas. Preferiu introduzir a fera
pelo cheiro. E o texto impregnou-se do
bafo carnívoro, que parecia exalar por
entre as linhas. Depois, com cuidado, foi
aumentando a estranheza da presença do
Sabendo que a ele caberia determinar
seus movimentos e controlar sua fome, o
escritor começou lentamente a
materializar o tigre. Não se preocupou
com descrições de pêlo ou patas.
Preferiu introduzir a fera pelo cheiro. E
o texto impregnou-se do bafo carnívoro,
que parecia exalar por entre as linhas.
Depois, com cuidado, foi aumentando a
162
tigre na sala rococó em que havia decidido
localizá-lo. De uma palavra a outro, o
felino movia-se irresistível, farejando o
dourado de uma poltrona, roçando o dorso
rajado contra a perna de uma papeleira.
Em vez de escrever um salto, o escritor
transmitiu a sensação de movimento com
uma frase curta. Em vez de imitar o
terrível miado, fez tilintar os cristais
acompanhando suas passadas. Assim,
escolhendo o autor as palavras com o
mesmo sedoso cuidado com que sua
personagem pisava nos tapetes persas,
criava-se a realidade antes inexistente.
O quarto parágrafo pareceu ao escritor
momento ideal para ordenar ao tigre
que subisse com as quatro patas sobre o
tamborete de "petit-point". E já a fera
aparentemente domesticada tencionava
os músculos para obedecer quando,
numa rápida torção do corpo, lançou-se
em direção oposta. Antes que chegasse a
vírgula, havia estraçalhado o sofá,
derrubado a mesa com a estatueta de
Sévres, feito em tiras o tapete. Rosnados
escapavam por entre letras e volutas. O
tigre apossava-se da sua natureza. Já
não havia controle possível. O autor só
podia acompanhar-lhe a fúria,
destruindo a golpes de palavras a bela
decoração rococó que havia tão
prazerosamente construído, enquanto
sua criatura crescia, dominando o texto.
Impotente, via aos poucos espalharem-se
no papel cacos de móveis e porcelanas,
estilhaçar-se o grande espelho, cair por
terra a moldura entalhada. Não havia mais
ali um animal exótico na sala de um
palácio, mas um animal feroz em seu
campo de batalha.
O escritor esperava tenso que o cansaço
estranheza da presença do tigre na sala
rococó em que havia decidido localizá-
lo. De uma palavra a outro, o felino
movia-se irresistível, farejando o
dourado de uma poltrona, roçando o
dorso rajado contra a perna de uma
papeleira.
Em vez de escrever um salto, o escritor
transmitiu a sensação de movimento com
uma frase curta. Em vez de imitar o
terrível miado, fez tilintar os cristais
acompanhando suas passadas. Assim,
escolhendo o autor as palavras com o
mesmo sedoso cuidado com que sua
personagem pisava nos tapetes persas,
criava-se a realidade antes inexistente.
O quarto parágrafo pareceu ao escritor
momento ideal para ordenar ao tigre
que subisse com as quatro patas sobre o
tamborete de "petit-point". E já a fera
aparentemente domesticada tencionava
os músculos para obedecer quando,
numa rápida torção do corpo, lançou-se
em direção oposta.
Antes que chegasse a vírgula, havia
estraçalhado o sofá, derrubado a mesa
com a estatueta de Sévres, feito em tiras
o tapete. Rosnados escapavam por entre
letras e volutas. O tigre apossava-se da
sua natureza. Já não havia controle
possível. O autor só podia acompanhar-
lhe a fúria, destruindo a golpes de
palavras a bela decoração rococó que
havia tão prazerosamente construído,
enquanto sua criatura crescia,
dominando o texto.
Impotente, via aos poucos espalharem-se
no papel cacos de móveis e porcelanas,
estilhaçar-se o grande espelho, cair por
terra a moldura entalhada. Não havia mais
ali um animal exótico na sala de um
palácio, mas um animal feroz em seu
campo de batalha.
O escritor esperava tenso que o cansaço
163
dominasse a fera, para que ele pudesse
retomar o domínio da narrativa,
quando o viu virar-se na sua direção,
baixar a cabeça em que os olhos
amarelos o encaravam, e lentamente
avançar.
Antes que pudesse fazer qualquer coisa,
a enorme pata do tigre abatendo-se
sobre ele obrigou o texto ao ponto final.
dominasse a fera, para que ele pudesse
retomar o domínio da narrativa,
quando o viu virar-se na sua direção,
baixar a cabeça em que os olhos
amarelos o encaravam, e lentamente
avançar. Antes que pudesse fazer
qualquer coisa, a enorme pata do tigre
abatendo-se sobre ele obrigou o texto ao
ponto final.
QUADRO 14 – Divisão do texto Um tigre de Papel de Marina Colasanti Fonte: acervo da Pesquisadora
Antes mesmo de iniciarem as ilustrações, os alunos demonstraram ter
consciência das cenas que o texto suscitava. Assim, a passagem de uma cena
para outra se desenhou mentalmente, pensamento que é comum ao ilustrador,
segundo Lago
Para o criador de livro de imagens a representação da passagem do tempo é semelhante à do diretor de cinema. A passagem de página é um corte na montagem. Os momentos diferentes são divididos através das páginas. (LAGO, 2008, p. 30)
Na entrega das matrizes, os alunos perguntaram como seria avaliada a
ilustração, disse a eles que deveríamos estabelecer critérios de avaliação.
Assim fizemos, os critérios foram: pontualidade na entrega, atendimento ao
texto, limpeza, organização e originalidade. Sobre este último critério,
discutimos muito, pois a ideia de criação e não cópia teve que ser esclarecida.
Para isto, levei muitos livros e observamos suas ilustrações.
A matriz se constituiu de oito folhas A4, sendo que a primeira com o
título e um quadro para receber a ilustração e as demais, o texto e o quadro
para ilustração. Os alunos tiveram a opção de escolher a gramatura do papel.
A grande maioria deu preferência para 120 gramas e alguns que escolheram o
de 75 gramas acabaram por usá-lo como rascunho. Outros fizeram a opção de
que a capa tivesse a gramatura maior e o miolo a menor.
Possibilitar ao aluno fazer escolhas é oportunizar conhecimento, a
grande maioria dos alunos não sabia da variação de gramatura existente.
164
Conheciam a mais comum (75 grs) e a que eles chamam de sulfite 40, que na
verdade tem, dependendo da marca, entre120 e 150 grs.
A seguir, uma amostra da matriz entregue aos alunos:
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
Autora: Marina Colasanti Ilustrado por: ____________
Sabendo que a ele caberia determinar seus movimentos e controlar sua fome, o escritor começou lentamente a materializar o tigre. Não se preocupou com descrições de pêlo ou patas. Preferiu introduzir a fera pelo cheiro. E o texto impregnou-se do bafo carnívoro, que parecia exalar por entre as linhas.
Depois, com cuidado, foi aumentando a estranheza da presença do tigre na sala rococó em que havia decidido localizá-lo. De uma palavra a outro, o felino movia-se irresistível, farejando o dourado de uma poltrona, roçando o dorso rajado contra a perna de uma papeleira.
Em vez de escrever um salto, o escritor transmitiu a sensação de movimento com uma frase curta. Em vez de imitar o terrível miado, fez tilintar os cristais acompanhando suas passadas. Assim, escolhendo o autor as palavras, com o mesmo sedoso cuidado com que sua personagem pisava nos tapetes persas, criava-se a realidade antes inexistente.
O quarto parágrafo pareceu ao escritor momento ideal para ordenar ao tigre que subisse com as quatro patas sobre o tamborete de "petit-point". E já a fera aparentemente domesticada tencionava os músculos para obedecer quando, numa rápida torção do corpo, lançou-se em direção oposta.
Antes que chegasse a vírgula, havia estraçalhado o sofá, derrubado a mesa com a estatueta de Sévres, feito em tiras o tapete. Rosnados escapavam por entre letras e volutas. O tigre apossava-se da sua natureza. Já não havia controle possível. O autor só podia acompanhar-lhe a fúria, destruindo a golpes de palavras a bela decoração rococó que havia tão prazerosamente construído, enquanto sua criatura crescia, dominando o texto.
Impotente, via aos poucos espalharem-se no papel cacos de móveis e porcelanas, estilhaçar-se o grande espelho, cair por terra a moldura entalhada. Não havia mais ali um animal exótico na sala de um palácio, mas um animal feroz em seu campo de batalha.
O escritor esperava tenso que o cansaço dominasse a fera, para que ele pudesse retomar o domínio da narrativa, quando o viu virar-se na sua direção, baixar a cabeça em que os olhos amarelos o encaravam, e lentamente avançar. Antes que pudesse fazer qualquer coisa, a enorme pata do tigre abatendo-se sobre ele obrigou o texto ao ponto final.
Quadro 15 – Matriz para ilustração do texto ―Um tigre de papel‖ Fonte: acervo da Pesquisadora
Cada aluno recebeu sua matriz para fazer a ilustração e deveria trazê-la,
no decorrer das aulas, para que a professora observasse a evolução do
trabalho, que deveria ser pensado a partir de um esboço e depois levado para
a matriz. Porém, alguns alunos precisaram perceber a importância do
planejamento, do esboço e foi com o erro que aprenderam, assim foi
necessário entregar uma nova matriz.
Cento e vinte e seis alunos trabalhando, divididos em quatro salas de
aula distintas e com os mesmos propósitos. Ao longo do trabalho, os alunos
entenderam que, para ser oferecido como presente, o trabalho teria que
165
atender aos critérios. Dessa maneira, pensamos em eleger as ilustrações que
iriam compor o presente para a autora.
Assim foi feito, no dia da entrega, os alunos de cada classe elegeram os
trabalhos que iriam compor o presente para a autora. Posso dizer que foram
muito criteriosos, pois, dos mais de 120 trabalhos entregues, somente 23 foram
eleitos. Fique claro que os alunos não tinham um número limite de trabalhos
para cada classe. A 5ª A escolheu 8 trabalhos, a 5ª B escolheu 4, já a 5ª C 5 e
a 5ª D 6.
Os critérios estabelecidos foram determinantes para a escolha. A
preocupação com a apresentação se deu até mesmo com o dorso do trabalho.
Enquanto alguns alunos apenas grampearam, outros costuraram e colocaram
arremate em tecido ou laço de fita.
Ficou evidente que a situação real de produção delineou o trabalho
realizado pelos alunos e a produção foi a representação da importância que
este desenhou na vida dos participantes.
Não se tratava de buscar um desenho que representasse a leitura dos
alunos, mas de desenhos que representassem as leituras que o texto suscitou
aos sujeitos leitores. As várias leituras, o encontro e o reencontro com o texto e
as descobertas fizeram com que os alunos criassem intimidade com o texto e
falassem sobre ele, sem buscar que o outro tomasse o seu entendimento como
único, não se determinou um entendimento. Assim, não assumi, junto aos
meus alunos, o trato com o texto retratado por Silva:
Faço aqui um parêntese para mostrar como os professores eliminam os dois momentos mais ricos da leitura, quais sejam, o cotejo e a transformação. De fato, se observarmos bem, veremos que os leitores são obrigados a reproduzir os significados já constatados e cristalizados pelo professor e/ou pelo livro didático. Em outras palavras, "acertar na leitura" é se encaixar no significado consagrado e petrificado pela instituição escolar. Assim, compreender um texto é reproduzir uma idéia, na tentativa de se aproximar daquilo que o professor e/ou livro didático dá como certo e não gerar ou criar novas possibilidades de significação para os textos. Ao invés de um processo aberto e partilhado, temos pela frente um mecanismo restritivo, convergente e em total desacordo com a natureza do ato de ler. É por isso mesmo que venho me opondo radicalmente aos chamados questionários de "interpretação e
166
compreensão', que funcionam como verdadeiras camisas-de-força à liberdade interpretativa dos leitores.‖ (SILVA, 1988.p.66)
Mas sim marquei, junto aos meus alunos, a possibilidade de pensar por
imagens, um texto que já se tornava íntimo deles. Esta consideração é vista
por Severino Antônio como uma necessidade de reconsideração nas práticas
educativas.
Precisamos reconsiderar a imaginação e as imagens como práticas educativas imprescindíveis, ainda mais hoje, na sociedade do entretenimento, saturada cotidianamente de imagens manipuladas, com graves ameaças ao destino da capacidade imaginativa, tanto no sentido pessoal como no coletivo. (SEVERINO ANTÔNIO, 2009.p.68-69)
A seguir, os desenhos que ilustram as capas dos eleitos para seguir
viagem e compor o presente da autora.
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
11 22 33 44 55
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
66 77 88 99 1100
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
1111 1122 1133 1144 1155
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
167
1166 1177 1188 1199 2200
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
2211 2222 2233
FIGURAS 92 a 114 – Capas das ilustrações Fonte: produções dos alunos
Na verdade, não tivemos apenas 23 ilustrações diferentes, mas sim mais
de 120 interpretações diferentes de um mesmo texto, marcadas pela ilustração.
Sobre a seleção dos 23 trabalhos, o que mais chamou minha atenção
nas indicações foi: a firmeza e clareza no momento da escolha; a surpresa que
algumas ilustrações escolhidas causaram por serem consideradas de alunos
que não se empenhavam nas atividades; o espanto de outros alunos por seus
trabalhos terem sido escolhidos, depois de desacreditados em casa e, mesmo
assim, terem mantido o critério de originalidade; a certeza de que já tinham
visto imagem semelhante, por isso, não respondia ao critério de originalidade,
ou ainda que aquela imagem semelhante, que lembrava alguma outra, tinha
um diferencial que a tornava original.
Após a seleção, uma aluna disse: ―Nossa professora, agora vamos ficar
sem o nosso trabalho‖, e a esta colocação respondi que sim. Esta resposta me
fez pensar no ―nós‖, pois eu também não teria o registro do trabalho. Desta
forma, pensei em uma estrutura para que pudéssemos contar de nossa
experiência. Então, conversando com os alunos, pensamos em um livro que
apresentasse o trabalho realizado a partir do estudo do texto ―Um tigre de
papel‖. Assim, digitalizei os 23 trabalhos, para que pudesse usar as imagens no
livro que montaríamos. Este livro teria: uma apresentação da professora, uma
168
apresentação feita pelos alunos (o que se tornou uma por sala), os trabalhos
digitalizados, registro com fotos da entrega do trabalho e possíveis
desdobramentos, que se dessem até o final do terceiro bimestre.
Desenhava-se então a concretização do projeto em livro. E produzir um
livro para os alunos é efetivamente apresentá-los como autores à sociedade. É
tratar a educação pelo viés do letramento, neste caso atuando no letramento
literário. Segundo Cosson,
É justamente para ir além da simples leitura que o letramento literário é fundamental no processo educativo. Na escola, a leitura literária tem a função de nos ajudar a ler melhor, não apenas porque possibilita a criação do hábito de leitura ou porque seja prazerosa. Mas sim, e sobretudo, porque nos fornece, como nenhum outro tipo de leitura faz, os instrumentos necessários para conhecer e articular com proficiência o mundo feito linguagem.(COSSON, 2006,p.30)
No trato com a produção do livro de ilustrações de um texto literário, o
aluno deixa de se ver apenas como leitor, ele é um leitor/intérprete literário e
autor.
A literatura proporciona ao leitor a passagem pela história do outro e a
partir da história daquele que lê a leitura se fará, aqui tratada a leitura como
compreensão. Já que ―a literatura envolve tanto as propriedades da linguagem
quanto um tipo especial de atenção à linguagem.‖ (CULLER, 1999, p.59) e
―Interpretar uma obra literária é contar uma história de leitura‖. (CULLER, 1999,
p.66)
Quando estava chegando a data da FLIP, discuti com os alunos como
apresentaríamos o ―presente‖. Pensamos em uma caixa, na qual todos os
trabalhos pudessem ser colocados. Simultaneamente, mandei imprimir as
digitalizações em A3, de tal forma que cada ilustração ocupou duas páginas do
livro. Fiz minha apresentação a este livro e mostrei para os alunos já impressa
em A3, assim como todas as ilustrações. Eles então sugeriram que a autora
visse este outro formato. Sinalizei que o livro provavelmente não estaria pronto,
mas que então deveríamos dar um título para ele, fazer a capa.
O título foi escolhido e grafado da seguinte forma: Um tigre de papel de
Marina Colasanti: interpretado por seus leitores com contornos e afeto.
169
A imagem da capa foi pensada e eu passei para o computador.
Posteriormente, cogitamos de usar a imagem da capa na caixa que receberia
as ilustrações escolhidas.
A capa ficou assim:
FIGURA 115 – Capa do livro Um tigre de papel de Marina Colasanti:
interpretado por seus leitores com contornos e afeto Fonte: produção da pesquisadora e dos alunos
E na caixa, colocaríamos somente os trabalhos? Os alunos queriam
escrever um cartão, na verdade não apenas um, pois todos queriam escrever.
Tive então a ideia de produzirmos um relicário para a autora. Comprei um
caderno pequeno, com folhas coloridas, no qual cada aluno poderia escrever
um pequeno recado para a autora, partilhando o sentimento que tiveram ao ler
o texto. E os alunos podiam escolher escrever direto na folha do caderno ou
produzir um cartão, escrever e colar no relicário. A grande maioria decidiu
produzir um cartão.
Na produção, os alunos demonstraram o como o trabalho promovia a
interlocução com a autora, que para eles já era tão próxima. Assim, os alunos
se mostraram sujeitos da história que estavam escrevendo. Atuavam no campo
Interpretado
por seus leitores
com contornos
e afeto
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell de Marina Colasanti
Ilustradores: Alunos leitores
Organizado por: Professora leitora
170
do imaginário e do real com destreza, viveram a produção. Para Severino
Antônio,
Reconhecer a importância dos sentimentos, da criatividade, da imaginação, da cultura, é inseparável do reconhecimento dos sujeitos humanos e do seu papel.
Assim escreve Bakhtin: ‗o sujeito como tal não pode ser percebido nem estudado como coisa, uma vez que sendo sujeito não pode, se quiser continuar a sê-lo, permanecer sem voz; portanto, seu conhecimento só pode ter um caráter dialógico‘ (apud Todorov, 1981, p. 34). Escreve, ainda, que ‗ a vida é dialógica por natureza. Viver significa participar de diálogo, interrogar, escutar, responder, concordar etc.‘ (1992, 35-36) (SEVERINO ANTÔNIO, 2009.p.109-110)
E os diálogos dos alunos tomaram forma. Após a produção do relicário,
este, bem como os trabalhos de ilustração, foram colocados em uma caixa de
presente que recebeu a impressão da capa do livro.
A caixa e o relicário ficaram assim:
FIGURAS 116 a 117 – Presentes para a autora Marina Colasanti
Fonte: acervo da Pesquisadora
Recorto, em seguida, alguns dizeres dos alunos e saliento que esta
produção não recebeu nenhum tipo de intervenção por parte da professora, os
alunos tiveram liberdade para escrever o que gostariam que a autora lesse. A
intervenção foi feita entre os próprios alunos que, no momento da produção,
171
diziam que não poderiam errar, pois o interlocutor era alguém muito importante
para eles. Assim, como disse Bakhtin,
Nas esferas da vida cotidiana ou da vida oficial, a situação social, a posição e a importância do destinatário repercutem na comunicação verbal de um modo todo especial. (BAKHTIN,2000,p.322)
E foi de uma forma ―especial‖ que a produção se deu, pois ―A situação
social mais imediata e o meio social mais amplo determinam completamente e,
por assim dizer, a partir do seu próprio interior, a estrutura da enunciação.‖
(BAKHTIN,2004,p.113.) O dizer dos alunos:
172
FIGURA 118 a 124– Páginas do relicário elaborado para Marina Colasanti
Fonte: produção dos alunos
O dizer individual dado à autora foi importante para a situação
interlocutiva na qual os alunos se inscreviam, para o teórico russo ―A palavra é
uma espécie de ponte lançada entre mim e os outros. Se ele se apóia sobre
mim numa extremidade, na outra, apóia-se sobre meu interlocutor. A palavra é
o território comum entre o locutor e o interlocutor‖ (BAKHTIN,2004,p.113.)
Dar voz aos alunos, escutar os alunos é de suma importância para o
trabalho em sala de aula. As produções para o relicário foram espontâneas e
por isso, não tiveram a possibilidade de marcar a artificialidade. Todos os
alunos, que estavam presentes no dia, produziram um ―recado‖ para a autora
que já chamavam pelo primeiro nome.
O carinho na produção foi percebido pela autora no momento em que
abriu a caixa que continha as ilustrações e o relicário. A autora ficou
encantada, tocou o pequeno caderno com zelo.
Em Paraty, a caminho da palestra, inesperadamente, me encontrei com
Marina Colasanti, que seguia para o evento, conversamos durante o percurso.
Comentei que estava seguindo para ver a sua apresentação e entregar o
presente que meus alunos tinham preparado para ela. Marina Colasanti disse
que gostaria de receber o presente após a palestra, pois assim poderia me dar
mais atenção. Após o evento, a autora me atendeu e apreciou o presente, com
muito carinho. Ainda, escreveu para meus alunos o texto que segue:
173
FIGURA 125 – Dedicatória de Marina Colasanti aos alunos Fonte: acervo da Pesquisadora
Após escrever para os alunos, solicitei à autora que fizesse uma
dedicatória nos dois livros que eu havia comprado (A moça tecelã), um para
mim e outro para eu sortear entre os alunos. Prontamente, a autora passou a
escrever as dedicatórias, parou por um instante na do livro que seria sorteado e
perguntou: Como posso chamá-los? Sinalizei que os alunos, no livro de
ilustrações, na capa, tinham marcado a presença deles como ―Alunos leitores‖.
Assim, ela retomou e finalizou as dedicatórias.
As dedicatórias:
FIGURAS 126 a 127 – Dedicatórias de Marina para a professora e para um aluno
Fonte: acervo da Pesquisadora
Ao retornar a Piracicaba, em sala de aula, mostrei as fotos do encontro
com Marina para os alunos, ainda contei do como nos encontramos e a
impressão que ela teve do trabalho. Para entregar o recado de Marina aos
174
alunos, preparei um marcador de página com a foto da autora e o texto dela,
que ficou assim:
FIGURA 128 – Marcador de texto com foto e dedicatória de Marina Colasanti
Fonte: acervo da Pesquisadora
Após a entrega do marcador de página e o sorteio do livro, informei aos
alunos que já havia montado um painel de fotos para compor o livro do projeto,
assim como produzira um texto para contar sobre o encontro e a entrega do
presente. Agora que tínhamos fechado o projeto, faltava a apresentação
elaborada pelos alunos para que eu pudesse mandar encadernar o livro.
Discutimos as etapas do trabalho, cada aluno contou um pouco sobre o
processo. Depois, cada um escreveu sua apresentação. A partir de
apresentações individuais selecionadas, foram produzidas apresentações em
grupo. Os alunos não aceitaram que um grupo com alunos de todas as salas
elaborasse uma só apresentação, marcaram o pertencimento ao projeto e o
desejo de produzirem uma apresentação por sala.
Para que a produção acontecesse, cada sala elegeu um grupo da classe
que produziria a apresentação, o critério foi a seleção das melhores
apresentações individuais. No caso da 5ª série B, a apresentação foi elaborada
coletivamente, por escolha da sala, após lermos as produções selecionadas.
Nas 5ªs A, C e D, foi eleito um relator, já a B contou com seis relatores, que
puderam complementar, quando um deles não conseguia anotar o que um dos
alunos sugeria, para depois a classe reelaborar.
175
O livro recebe, em sua abertura, uma apresentação elaborada por mim
e, na sequência, as elaboradas pelos alunos. Assim, temos um livro que foi
apresentado de cinco maneiras.
A minha apresentação tomou uma forma mais ficcional, marcando o
ocorrido, porém de forma romanceada.
A minha apresentação:
“Um tigre de papel” de Marina Colasanti: interpretado por seus leitores com contornos e afeto
Na cidade de Piracicaba, no interior de São Paulo, viviam alguns leitores adormecidos. Contavam em
torno de onze anos e marcavam certa sonolência. Um dia em que o céu acordou nublado, mas decidiu
apresentar raios solares, uma professora apaixonada por leitura resolveu despertá-los.
Despertados, anunciaram reconhecer a paixão daquela que os despertou. Então, esta lia para eles, por
eles, por ela e principalmente os escutava.
Após várias leituras, pinçaram um texto e após muitas descobertas a leitura se fez. Desejaram dar a ele
outros ares e decidiram ilustrá-lo.
Sabiam que ilustrar o texto amado não seria fácil, foi necessário assumir o texto, criar intimidade
singular. E foi criando intimidade com o texto e com a autora que os alunos acordaram o ilustrador que
sempre os habitou.
Prof.ª Cibele Adriana Perina Aguiar
Escola Estadual Pedro Moraes Cavalcanti – Piracicaba / São Paulo
2009
Quadro 16 – Apresentação, elaborada pela professora, do livro de ilustrações
Fonte: produção da pesquisadora
Já as apresentações feitas pelos alunos, têm um tom de relato de
experiência.
A apresentação da 5ª série A:
“Um tigre de papel” de Marina Colasanti: interpretado por seus leitores com contornos e afeto
AApprreesseennttaaççããoo
CCaarroo LLeeiittoorr
Este livro é o resultado do trabalho de Língua Portuguesa (LP), que teve início em março de 2009.
Iniciamos nosso trabalho com o estudo do texto “Um tigre de papel”, de Marina Colasanti. Durante o
estudo, percebemos que o texto, embora fosse curto, dependia de um grande tempo de atenção para
compreendê-lo, ficamos algumas semanas trabalhando com ele.
Depois de entender as palavras desconhecidas, voltamos para o texto e compreendemos.
Então fizemos pesquisas sobre a autora e procuramos conhecer outros textos dela.
Um dia, a professora Cibele (LP) propôs que fizéssemos ilustrações para representar o entendimento que
cada aluno teve, nós gostamos da ideia.
176
O professor de Arte, Norberto, nos orientou como ilustrar as palavras do texto. Ainda explicou, com
alguns desenhos, o que era rococó e nos contou o seu entendimento do texto.
Durante a ilustração, fomos compreendendo melhor o texto.
No dia em que foi agendada a entrega do trabalho, a professora solicitou que levantássemos alguns
critérios para selecionar os melhores trabalhos que seriam entregues para Marina Colasanti, pela Cibele,
na festa literária de Paraty. Os critérios foram: limpeza, zelo, organização, imaginação, criatividade e
originalidade.
Escolhidos os trabalhos, fizemos um relicário, cheio de recados, como mimo para a autora.
Enquanto a professora estava em Paraty, nós ficamos ansiosos com a reação de Marina sobre o nosso
trabalho.
No retorno, a professora disse que a autora havia ficado impressionada com nossas ilustrações e que
tinha enviado um bilhete. No recado da Marina ela nos elogiava e dizia que o tigre fazia parte de nossa
vida, agora ele também era nosso.
Nossa professora voltou da festa literária cheia de ideias novas, mais trabalhos para nós
desenvolvermos, mas isso já é outra coisa. O que importa agora é você leitor também colocar este(s)
tigre(s) na sua vida. Para isso acontecer é só virar as páginas
Alunos da 5ª série A
Escola Estadual Pedro Moraes Cavalcanti – Piracicaba / São Paulo
2009
Quadro 17– Apresentação, elaborada por alunos da 5ª série A, do livro de ilustrações
Fonte: produção dos alunos
A apresentação da 5ª série B:
“Um tigre de papel” de Marina Colasanti: interpretado por seus leitores com contornos e afeto
AApprreesseennttaaççããoo
O trabalho que vocês vão ver foi feito por alunos de 5ª série do ensino fundamental, da Escola Estadual
“Pedro Moraes Cavalcanti”, na aula de Língua Portuguesa e teve início em Março de 2009.
O livro vai mostrar várias ilustrações do texto „‟Um tigre de papel‟‟ da autora Marina Colasanti. Você vai
perceber que o texto é sempre o mesmo, o que muda é a ilustração, pois cada aluno interpretou a história
de um jeito.
Para começar a ilustrar o texto foi necessário passar antes por muitas etapas.
A primeira etapa foi a de leitura e a interpretação do texto, os alunos precisaram fazer um glossário.
No começo não se pensou em ilustrar o texto, mas com o tempo, conhecendo um pouco mais a autora e
outros textos dela, os alunos começaram a ficar cada vez mais interessados nas histórias de Marina
Colasanti.
Certo dia, a professora Cibele comentou que iria participar de uma festa literária em Paraty/RJ e que a
autora estaria lá. Juntos, alunos e professora resolveram presentear a autora ilustrando o texto de que
mais gostaram e que não tinha ainda recebido ilustração (Um Tigre de papel)
Antes de iniciarem a ilustração, a professora pediu ao professor de Arte (Norberto) que ajudasse os
alunos com uma noção do rococó e do como montar cenas. Enquanto isso, a professora preparou a matriz
para receber as ilustrações.
Prontos para a iniciarem o trabalho, começaram a ilustrar.
A entrega foi agendada. Em junho os alunos entregaram seus trabalhos e a classe elegeu os melhores
desenhos pelos seguintes critérios: limpeza, capricho, organização, originalidade e criatividade.
Na véspera da professora ir a Paraty, os alunos fizeram um relicário para a autora com muitos bilhetes
carinhosos para entregar junto com o presente.
177
Em Paraty, a professora entregou o presente, a autora adorou e mandou um recado por escrito
agradecendo.
As melhores ilustrações são estas que você vai ver, Marina Colasanti ficou com as originais. Quando você
terminar de ver as ilustrações, também poderá verificar uma seleção de fotos e os bilhetes entregues para a
escritora, que estão digitalizados e organizados no final do livro
NÃO DEIXE DE CONFERIR!!!
Alunos da 5ª série B
Escola Estadual Pedro Moraes Cavalcanti – Piracicaba / São Paulo
2009
Quadro 18 – Apresentação, elaborada pelos alunos da 5ª série B, do livro de ilustrações
Fonte: produção dos alunos
A apresentação da 5ª série C
“Um tigre de papel” de Marina Colasanti: interpretado por seus leitores com contornos e afeto
AApprreesseennttaaççããoo
Nós somos alunos da 5ª série do ensino fundamental, da Escola Estadual “Pedro Moraes Cavalcanti”.
Realizamos este trabalho com o texto “Um tigre de papel”, da autora Marina Colasanti.
Bem, tudo começou quando a Professora Cibele, de Língua Portuguesa, leu o texto para nós. Depois ela
nos ensinou a fazer a referenciação do texto. Estudamos muito cada parte dele.
Então surgiu a ideia de fazer as ilustrações. O professor Norberto, de Arte, nos deu dicas para os
desenhos. Nós ilustramos e depois escolhemos os melhores desenhos, para dar de presente para a autora.
A professora nos comunicou que iria a Paraty/RJ e que Marina Colasanti estaria lá. E disse para nós
fazermos bilhetinhos para a escritora. A professora falou que os recados ficaram ótimos.
No final deu tudo certo.
Quando a Cibele Voltou de Paraty, disse que a Marina tinha gostado tanto do presente que até se
emocionou e nos mandou um recado. Se você quiser saber o que está escrito nos recados e ver as
ilustrações....
Leia o livro!
Alunos da 5ª série C
Escola Estadual Pedro Moraes Cavalcanti – Piracicaba / São Paulo
2009
Quadro 19– Apresentação, elaborada por alunos da 5ª série C, do livro de ilustrações
Fonte: produção dos alunos
E a apresentação da 5ª série D:
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“Um tigre de papel” de Marina Colasanti: interpretado por seus leitores com contornos e afeto
AApprreesseennttaaççããoo
No segundo bimestre do ano de 2009, nós, alunos da 5ª série da Escola Estadual Pedro Moraes
Cavalcanti, começamos um projeto com o texto “Um tigre de papel” da escritora Marina Colasanti, com
a orientação da professora Cibele (Língua Portuguesa) e ajuda do professor Norberto (Arte), para as
ilustrações.
Cada aluno teria que ilustrar a história e os melhores desenhos seriam levados para Paraty/RJ pela
professora Cibele, pois como de costume ela iria para lá na festa literária e a Marina Colasanti estria lá.
Fora os desenhos, nós mandamos recados para a escritora, por um mini-caderno. Então ficamos
esperando a volta da professora.
Quando ela chegou, perguntamos o que a escritora tinha falado sobre o nosso estudo de seu texto.
Segundo a professora, Marina Colasanti havia gostado muito e elogiado a escolha do texto, que ela acha
difícil para nossa idade.
Agora desejamos a você leitor que tenha uma agradável leitura de nosso livro, recheado de ilustrações,
que foi feito com muita dedicação.
Alunos da 5ª série D
Escola Estadual Pedro Moraes Cavalcanti – Piracicaba / São Paulo
2009
Quadro 20 – Apresentação, elaborada por alunos da 5ª série D, do livro de ilustrações
Fonte: produção dos alunos
Observando as apresentações, podemos perceber as escolhas na
ordem de estilo, a linguagem dos alunos da 5ª B é mais formal, porém a
escolha pela terceira pessoa não retirou o tom emotivo do texto. Já os alunos
das demais classes, escolheram produzir o texto em primeira pessoa. E da
forma escolhida, todas as salas marcaram a vivência, as experiências e, ao
final, convidaram o leitor para conhecer a produção.
Embora este trabalho tenha terminado logo após o retorno às aulas,
ainda faz parte de nossas conversas, ele referencia outros e os alunos têm
saudade do período em que ele estava em curso. Em outubro, os alunos
receberam, como presente meu, um marcador de páginas com o formato de
um tigre, assim, penso que de maneira simbólica dividi com eles a importância
que o projeto também teve na minha vida, como disse Marina Colasanti, que
hoje todos chamam simplesmente de Marina, este tigre agora é um pouco
―nosso‖.
179
O marcador:
FIGURA 129 – Marcador de texto - presente da professora aos alunos Fonte: Acervo da Pesquisadora
Algumas ilustrações e considerações sobre elas
Neste momento, trago algumas das ilustrações elaboradas pelos alunos
e discuto um pouco sobre como a linguagem não-verbal colaborou com a
interpretação da linguagem verbal literária. Saliento que não foi fácil escolher
entre tantos olhares sobre uma mesma obra, mas não poderia aqui tratar de
todos, já que este percurso não é o único que se inscreve neste trabalho.
As apresentações não poderiam, no entanto, ser analisadas de forma
imparcial, visto que aqui apresentarei a leitura que faço das ilustrações
elaboradas pelos alunos.
Assim, caminho no sentido contrário a constatações dadas no texto de
Silva sobre a prática pedagógica. Silva levanta três problemas:
3 problemas visíveis na prática pedagógica: A natureza perdida [...] O sentido legítimo, pronto e acabado [...]
180
A experiência descontinuada e fragmentada [...] (SILVA, 2003, p 22-24)
Minha prática se alicerça na teoria e nas atividades já experienciadas,
sendo assim, cada proposta é pensada e reavaliada. Não entendo a prática
como projetar modelos a serem seguidos ou seguir modelos já anteriormente
projetados pelo professor, ou ainda pior, por outros. A sala de aula é o lócus da
práxis no qual o profissional se revela a partir de suas escolhas. A constatação
deste trabalho pode ser observada nas ilustrações que seguem.
A ilustração interpretativa de Jéssica marca o processo de criação. O
personagem escritor elabora, em seu imaginário, a história, na qual o escritor e
o tigre são personagens e o primeiro é o criador.
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
FIGURAS 130 a 137 – Ilustração da aluna Jéssica Camargo de Souza Fonte: produção de aluna
A ilustração da capa apresenta o tigre em close, a primeira página marca
o escritor e o início de sua criação, tudo se dá no plano do pensamento, da
181
imaginação. E é para o mundo da imaginação que o escritor segue, se
tornando personagem de sua ficção, o que mostra a última página. Assim, a
autora da ilustração se posiciona como leitora literária, pois apresenta uma
possibilidade de leitura. Ainda mostra o domínio em uma das estruturas que
compõe o gênero história em quadrinhos, o balão que registra o pensamento
do personagem. Segundo Oliveira, é o sentimento de externar o texto que
move o ilustrador e não o texto, já que
A ilustração não se origina diretamente do texto, mas de sua aura.
A leitura narrativa é sempre uma compreensão dos significados antecedentes e consequentes da imagem. Com relação ao texto, é sempre um prisma, jamais um espelho. São muitos os olhares que podemos ter diante de uma ilustração. Nenhuma ilustração possui uma leitura absoluta do texto, muito menos o leitor da imagem. .(OLIVEIRA, 2008 p.32)
Para a aluna Ana Paula, a criatura rompeu com o criador e tomou conta
do espaço. Após o close da capa, o tigre vai se apresentando no cenário.
No terceiro quadro, a ilustradora faz interferência verbal para assinalar a
presença do tigre e nomear o móvel papeleira. Já no segundo quadro,
podemos perceber que o tigre absorve o ambiente pelo odor e é a partir do
quinto quadro que ele deixa sua natureza apresentar-se, a torção do corpo é o
mote. O sangue do último quadro pode representar o escritor. Sendo assim, o
tigre é o grande personagem da história.
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
182
FIGURAS 138 a 145 – Ilustração da aluna Ana Paula Prestes de Almeida
Fonte: produção de aluna
A ilustradora Ana Paula marca muito bem o ambiente e o personagem
tigre nas suas ações, dando movimento a estas com sinais gráficos que
ganham intensidade no último quadro. Sendo assim, os registros gráficos da
ilustradora caminham em uma crescente perceptível. No dizer de Oliveira
Assim como existem os códigos, as convenções de uma língua que permitem a comunicação do pensamento, a linguagem não-verbal também possui seus códigos. Ou seja, há elementos em sua estruturação interna e externa que são perfeitamente analisáveis. ―A forma é uma configuração do conteúdo‖, como bem disse o pintor e desenhista norte-americano BEM SHAHN. (OLIVEIRA, 2008 p.34)
A ilustradora consegue imprimir uma atmosfera dramática a partir da
perspectiva que apresenta as interferências do tigre no cenário. Já que para o
leitor/ilustrador
O cenário cria a atmosfera dramática através do ângulo em que a cena está sendo vista. O ilustrador utiliza fundamentalmente diversos fatores, como cor, a luz e, principalmente, a perspectiva, para construir o drama narrativo de suas ilustrações. A determinação da linha do horizonte e dos pontos de fuga possibilita o domínio de qualquer espaço, de qualquer tipo de perspectiva. A narrativa visual não se realiza apenas no tempo: a temporalidade de contar histórias depende fundamentalmente da criação do espaço. (OLIVEIRA, 2008 p.53-54)
183
A aluna Lilian assume o literal e bem o representa. O tigre vai
paulatinamente saindo do papel, no último quadro escritor e tigre disputam o
―ponto final‖. A mescla entre o verbal e o não-verbal é bem representada. A
ilustradora desenha a escrita do texto com requinte, e o tigre vai se constituindo
da/pela palavra (segundo quadro). No terceiro quadro, ela marca o texto e os
objetos. No seguinte, o tigre é retomado com uma pata sobre o tapete.
No quinto quadro, o tigre observa o leitor, envolto em palavras. Já no
sexto, o escritor tem um leve afastamento, representado pela mão que segura
o material que o grafa e o tigre está produzindo ranhuras com suas garras. No
seguinte, o afastamento do escritor é maior e o ambiente aparece de forma
fragmentada.
No último quadro, o escritor, no movimento da mão que escrevia, parece
revelar a confirmação de seu temor com a pata do tigre aberta sobre o texto,
esta, desenhada de tal forma que aparenta sinal de vigor e violência,
parecendo ecoar, assim
Pensando na sonoridade que as palavras provocam, o mesmo ocorre com a ilustração, que, apesar de seu aspecto figurativo concreto, também possui um som, um gênero de ressonância visual. (OLIVEIRA, 2008 p.41)
A aluna revela, de forma sofisticada, a sua leitura, que não tenta
concorrer com o texto ou justificá-lo, mas sim apresentar uma possibilidade de
leitura, que poderá marcar outras leituras. Segundo Oliveira
Não podemos esquecer que a imagem literária se autojustifica, ou seja, não precisa necessariamente de qualquer imagem-visual ou de recursos além de seu silêncio. Em muitos momentos do texto, a palavra possui um universo abstrato que deve ser preservado. Nem tudo pertence ao universo da ilustração. Frequentemente, os infinitos significados da literatura prescindem de qualquer imagem-visual. Da mesma forma, o discurso verbal sobre a ilustração pode ser uma associação vulgarizante e inoportuna para a imagem. (OLIVEIRA, 2008 p.33-34)
184
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
FIGURA 146 a 153 – Ilustração da aluna Lilian Matheus Costa
Fonte: produção de aluna
O aluno Gabriel apresentou, desde o início, a convicção de que o tigre
tomava conta da situação estabelecida pelo escritor. Primeiro o escritor tem o
personagem no plano do imaginário (segundo quadro), mas a partir do terceiro
quadro a história aconteceu fora do plano do pensamento do escritor, diferente
de como foi impresso pela aluna Jéssica, já que ela trabalha no plano do
imaginário. E, assim como a aluna Ana Paula, o aluno Gabriel visualizou
sangue nas cenas.
Da mesma maneira que os outros alunos, após o quinto quadro, ou seja
a partir da separação do terceiro parágrafo, o tigre traduz sua natureza. Porém,
Gabriel apresenta a nova faceta do tigre nas suas ações, pois no sexto e
sétimo quadro, o tigre não aparece, retornando no último quadro, dando
sentido à capa que apresenta garras com sangue. Esta escolha promove uma
leitura circular, ligando o final à apresentação do texto dada na capa.
185
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FIGURAS 154 a 161 – Ilustração do aluno Gabriel Diego dos Santos Fonte: produção de aluno
Segundo Oliveira, tentando comparar a organização textual à de
imagens, diz que a ilustração segue uma ―sintaxe‖ própria que exige muito do
leitor, já que não há método e nem modelos, para o ilustrador, é importante
refletir sobre a imagem.
A representação da interpretação textual do aluno Luís Henrique marcou
o espaço, os objetos e a passagem do tigre por estes. Pode-se observar que
desde a capa até o final, o escritor é marcado apenas por sua produção, ora
com o tigre, ora com a caneta e/ou o papel já grafado. Já o ponto final é dado
pela fera, na folha que marca as linhas, mas não possui texto, assim anula-se
duplamente a figura do escritor.
186
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FIGURA 162 a 169 – Ilustração do aluno Luis Henrique Lopes Suluay Fonte: produção de aluno
Refletindo sobre a imagem, ao observar o quinto quadro o tapete
também sugere outra leitura, a de um olhar hipnotizado, no qual o tigre é a
única visão. Neste sentido, o próximo quadro apresentaria o tigre fora do
campo hipnótico, porém, este campo está marcado por duas fissuras. No sexto
quadro, o tigre já atuou no cenário e, no último, sua pata dedilha as linhas que
não receberam texto, como se promovesse a ironia da situação.
O aluno Cayo, após ter seu trabalho como um dos escolhidos, solicitou a
refeitura da capa, por estar um pouco enrugada, pois tinha tentado plastificar e
não tinha conseguido um bom resultado. No ato do aceite à sua solicitação,
ficou pensativo e pediu se poderia levar o trabalho todo, se comprometendo a
entregar no prazo que fosse estipulado. O aluno teve o intervalo de uma
semana para refazer o que acreditava ser necessário.
Durante a semana, o aluno conversava sobre a produção, explicava que
estava produzindo algumas ilustrações com recorte e colagem e dobradura.
No dia da entrega, o aluno disse que alguns desenhos antigos eram
melhores do que os novos e que tinha misturado os desenhos da primeira
187
versão com os da segunda, assim como havia repensado na ordem em que os
desenhos de ambas as versões se apresentavam e tinha resolvido reorganizá-
las. Desta forma, Cayo apresentou uma terceira versão.
Vale dizer que a dobradura do armário, que compõe uma das cenas
ilustradas, permitia a abertura da porta e no interior havia livros, infelizmente
não fiz a digitalização da abertura da porta da dobradura do armário, mas não
poderia deixar de citar o requinte de detalhes que a ilustração teve. Ainda que
a opção de trabalhar com duas formas de ilustração, a partir da dobradura e do
desenho, não tenha sido uma escolha impar, pois duas alunas também tiveram
esta ideia e por sinal tiveram seus trabalhos selecionados.
Na seqüência apresento as três versões do aluno Cayo:
A 1ª versão
Sobre a 1ª versão, cabe ressaltar que a capa, que estava enrugada, não
foi devolvida pelo aluno, desta forma, não foi possível digitalizá-la. Então usei a
da segunda, que se repetiu na terceira versão, pois a diferença com a primeira
era apenas a plastificação.
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FIGURAS 170 a 177 – Primeira versão da Ilustração do aluno Cayo Murilo Casarim Cassiano Fonte: produção de aluno
188
A 2ª versão
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FIGURAS 178 a 185 – Segunda versão da Ilustração do aluno Cayo Murilo Casarim Cassiano Fonte: produção de aluno
A versão final:
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FIGURAS 186 a 193 – Versão final da Ilustração do aluno Cayo Murilo Casarim Cassiano
Fonte: produção de aluno
189
Observando as ilustrações de Cayo, percebo a manutenção da capa e a
troca do primeiro quadro da primeira versão para o da segunda. Nesta troca, o
escritor perde o comando, a fera sai do papel, enquanto na primeira versão ela
era desenhada. O terceiro quadro da versão final é o quarto da segunda versão
e o sexto desta é o quarto da final. Esta troca foi elaborada pela atenção que a
primeira versão cobrou, já que no texto, no terceiro quadro, a fera experimenta
o espaço e no quarto, pisa no tapete.
Do quinto ao sétimo quadro, a escolha é pela primeira versão. Porém, o
último quadro é da segunda versão; disse o aluno que naquele momento ficava
claro que a fera tinha atacado o escritor. Assim, confirma-se a escolha da
segunda versão para o segundo quadro, pois neste, a fera já se apresenta
como tal, rompendo com o papel, quebrando o lápis (escolho aqui dizer lápis,
pois aparentemente não tem aspecto de caneta, assim como nos demais
desenhos que apresentam o objeto que grafa, o que sem dúvidas poderia
suscitar um estudo).
As próximas ilustrações são um convite a você, leitor, para que faça a
sua leitura, desligada da minha análise.
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FIGURAS 194 a 201 – Ilustração da aluna Priscila Borges Santos Fonte: produção de aluna
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FIGURAS 202 a 209 – Ilustração do aluno Wellington de Paula Rocha Fonte: produção de aluno
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
FIGURAS 210 a 217 – Ilustração da aluna Letícia de Sousa Pereira Nobre Fonte: produção de aluna
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FIGURAS 218 a 225 – Ilustração da aluna Carolina Acaiah Reis dos Santos Fonte: produção de aluna
UUmm ttiiggrree ddee ppaappeell
FIGURAS 226 a 233 – Ilustração da aluna Isabela Aparecida Rodrigues do Nascimento
Fonte: produção de aluna
Após a sua leitura das cinco ilustrações oferecidas, retomo o meu dizer
sobre o Percurso 3.
192
Este trabalho de ilustração interpretativa proporcionou aos alunos os
muitos olhares que um mesmo texto pode propiciar e também o
(re)conhecimento de que devemos respeitar a interpretação do outro, mas que,
embora as interpretações sejam muitas, elas não são infinitas, pois devemos
olhar para o texto.
No final do terceiro bimestre, após encadernar o livro (A3/capa dura) os
alunos receberam um adesivo redondo para poder expressar, em uma palavra,
o sentimento que a produção proporcionou, também deveriam assiná-lo. No
alto da página a frase: ―Uma palavra para traduzir o nosso trabalho‖. Aqui
recorto algumas: dedicação, esforço, esperança, surpresa, realidade, amor,
responsabilidade, sabedoria, suor, alegria, trabalho, imaginação, emoção,
aprendizado, bacana, orgulho, extraordinário, significativo, espetacular,
maravilhoso, magia, criatividade, liberdade, legal, interessante, desejo,
admirável. Saliento que a opção pela digitação das palavras se deu em função
de as imagens das páginas não terem ficado boas, assim, a leitura não seria
possível.
Para finalizar este percurso trago a concepção de leitura que meus
alunos têm, considerando que no momento da produção os alunos já
compreendiam que não se faz leitura apenas do texto verbal, já que depois de
nossos percursos, se descobriram autores nas/pelas várias linguagens:
“Leitura é aprendizagem, a leitura é um ato que você se dedica a entender o que fala o assunto. Leitura é aprender mais do que já sabe, e o que não sabe, saber.” Taís Barbosa Ometto
“Ler é aprender, compreender, ampliar o vocabulário, isto resumido em uma palavra é viver.” Leandro de Oliveira Lima
“Ler é entender, compreender e de repente se ver viajando na história.” Daniel Rodrigues
“Pra mim a leitura é minha inspiração, quando leio eu imagino, eu voo na fantasia. A leitura me leva para o mundo da imaginação.” Mayra Braga Santos
“É entrar no mundo da imaginação, é um estilo de vida, porque sem leitura você não sabe nada.” Rafael Felismino Soares Borges da Costa
Quadro 21 – O dizer dos alunos sobre leitura Fonte: produção dos alunos
193
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Percursos
Certa vez segui em uma linha reta só, em duplo sentido, não cheguei a
lugar nenhum. Assim, procurei enfrentar a sinuosidade dos percursos, e,
até então, continuo caminhando, chegando e partindo no ritmo da busca.
(AGUIAR, 2010)
Nossas vozes
A língua/gem é mais que falar ao homem. É a dupla vertente, a resistência
da cultura. A palavra é a linguagem humana, a representação dela e a da
própria linguagem não se faz apenas com palavras, mas a suscita mesmo
quando emudece.
Que minhas palavras possam compartilhar com as suas e em um
movimento interlocutivo nossas vozes alcancem outras vozes, para assim
confirmá-las, defendê-las ou contrariá-las.
(AGUIAR, 2010)
Retomo aqui a pergunta que norteou a pesquisa: Em que medida a
linguagem literária colabora para a leitura das várias linguagens e, por sua vez,
as várias linguagens colaboram com a leitura da literatura?
A dissertação foi orientada por minha concepção sóciointeracionista de
linguagem, a partir do teórico russo Bakhtin, que abarca a de sujeito. Um
sujeito histórico social que é representado na/pela língua/gem e que a
representa, na sua principal característica, que é a interação entre sujeitos.
Ainda em conformidade com Bakhtin, está a minha compreensão do que seja
leitura, leitor.
A linguagem, neste trabalho, toma todas as suas vestes, dando ênfase à
não-verbal e entretecendo-se com a literária. Em uma cadeia de ideias, acabo
por desconstruir a noção de que a iconografia é uma linguagem simples ou
simplificadora.
194
O sujeito que se inscreve neste trabalho é abordado nas suas situações
cotidianas dadas no lócus escolar. Desta forma, trato deste lócus e dos sujeitos
que o tornam um lugar de sentido.
Minha concepção de educação se apresenta tanto de maneira pontual
quanto por minha práxis, nas análises.
A resposta à pergunta formulada nesta pesquisa só tomou forma após a
descrição e análise concomitante de minha prática. Dessa maneira, tecendo
teoria e prática, respondo que literatura é uma linguagem que possibilita a
leitura de/do mundo e o sujeito leitor terá sua leitura aprofundada/reelaborada à
medida que se oriente pelas várias linguagens. Em contrapartida, as várias
linguagens colaboram para a constituição do imaginário construído pela/na
literatura.
Quando cheguei ao final da pesquisa, confirmei que a observação da
práxis é um trabalho intenso que deve ser continuo. Em 2010 iniciei minha
práxis com um grupo novo de alunos e começar é sempre um desafio. O grupo
é novo, pois nele estão alunos que já foram meus alunos há alguns anos e
alunos que estiveram comigo no decurso de 2009. Ainda, é um grupo novo
porque a cada dia os educandos se reorientam e buscam o novo e vê-los neste
movimento é poder observar o voo de cada um.
Desta forma, em 2010 inicio mais um ano letivo, no qual os sujeitos
alunos farão parte de novos projetos e vão imprimir as suas vivências a partir
da linguagem.
Dois projetos já despontam. O primeiro, denominado ―Coisas de...‖,
trabalhará com a leitura de textos, escolhidos pelos alunos, de um determinado
autor, para montar uma coletânea que receberá dos alunos indicação de
leitura. Esta indicação será feita pelo aluno que selecionou o texto e trará o que
despertou o ser leitor que o habita. O grupo que trabalhará com tal projeto está
distribuído em duas salas, na 6ª série A e B, a grande maioria dos alunos
destas salas esteve comigo em 2009 e desenvolveu vários projetos. A 6ª A
inicia o primeiro bimestre com ―Coisas de Clarice‖ e a 6ª B com ―Coisas de
Drummond‖. Estamos na fase de criar intimidade com o autor a partir de seus
textos. Na sequência virá a seleção e a indicação de leitura. A intenção é de
195
montar quatro coletâneas, em cada sala, de autores distintos, criando ao todo
oito volumes.
O segundo projeto ―Envias, em vias” trabalhará com a produção de uma
narrativa a partir de cartões postais reais, que tenham sido enviados e possam
constar na narrativa como um elo, o dizer de um ou mais personagens. Ainda
estamos na fase de coleta, que de início não foi fácil. A dificuldade maior, até o
momento, foi em conseguir postais escritos, enviados e com registro.
Posteriormente faremos a seleção dos postais, para iniciar a produção escrita e
posterior reescrita. Assim, o texto impresso, já há algum tempo, ganhará vida
com contornos ficcionais. Tornar um texto adormecido vívido não será tarefa
fácil, pois os alunos deverão pesquisar para montar um contexto. A pesquisa
será geográfica e de época, contextualização imprescindível. Desta forma, para
que o enredo ganhe corpo, entretecerão realidade e ficção. Este projeto deverá
ser finalizado até o quarto bimestre, já que a pesquisa demandará tempo e a
escrita/reescrita também.
O Projeto Coisas de... foi pensado a partir do recebimento de uma
coleção de livros enviada para a biblioteca da escola, pela Editora Rocco, por
indicação de Marina Colasanti. A coleção é de textos de Clarice Lispector e tem
um volume, denominado Clarice na Cabeceira, no qual personalidades abrem o
texto que mais gostam tratando da escolha. Já o Projeto Envias, em vias
primeiro teve um olhar para a coleção Imagem & Texto, publicada pela Editora
Moderna, que trabalha com fotos, pinturas e postais reais na construção do
verbal ficcional a partir do não-verbal. E, após a organização do projeto, a
leitura de Griffin & Sabine do escritor Nick Bantock – Editora Marco Zero, que
foi muito importante para confirmar a estrutura pensada para a narrativa.
Dois projetos novos e o desejo de não parar me levam para o futuro,
neste momento, o futuro do presente.
196
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Carta recebida, que demonstra a delicadeza da autora Marina Colasanti para
com os alunos da E.E. Pedro Moraes Cavalcanti.
203
Notícia veiculada no site www.educacao.sp.gov.br sobre o Projeto Caçadores
de nuvens:
Segunda - feira, 22 de fevereiro de 2010 14h30
Alunos de Piracicaba produzem almanaque sobre nuvens
Publicação é fruto do Projeto "Caçadores de Nuvens", desenvolvido com alunos da 5ª série do Ensino Fundamental
da Escola Estadual Pedro Moraes Cavalcanti
Para a maioria das pessoas que olha para o céu, as nuvens são todas iguais, salvo algumas variações de formato e altura. Mas para alunos da Escola Estadual Pedro Moraes Cavalcanti, em Piracicaba, essas características ajudam a identificar diferentes tipos de nuvens, que podem ser o presságio de uma
simples garoa ou mesmo fortes tempestades com raios e trovões. Esse olhar diferenciado é fruto do projeto "Caçadores de Nuvens", desenvolvido com alunos da 5ª série do Ensino Fundamental, que
durante todo o ano letivo de 2009 produziram um almanaque sobre tipos de nuvens.
"A ideia foi trabalhar o senso de observação dos alunos e também os diferentes gêneros textuais, verbais e não verbais que o formato almanaque permite", explica a professora de língua portuguesa
Cibele Adriana Perina Aguiar, que coordenou o projeto.
Para produção do exemplar, os alunos pesquisaram o surgimento de nuvens, sua composição, formato e altitude. Depois, foram a campo observar e fotografar os diferentes tipos. As imagens foram registradas no almanaque e acompanhadas de textos escritos pelos próprios alunos, comentando características e
curiosidades. "Não imaginava que existissem diferentes tipos de nuvens, achava que eram todas iguais, mas conseguimos identificar e fotografar dez tipos diferentes", comenta a aluna Júlia Teresa Cabral
Nunes, 11 anos.
Participaram do projeto quatro classes de 5ª série e cada uma produziu seu próprio almanaque, composto de nove páginas. Ao todo, foram impressos 200 exemplares, parte deles destinados a alunos
da 4ª série da unidade. "Foi muito legal participar do projeto. Hoje olho para o céu de uma forma diferente, tentando identificar formas e desenhos. E pelo tipo de nuvem, sei quando é bom levar um
guarda-chuva", diverte-se a estudante Isabela Aparecida Rodrigues do Nascimento, também de 11 anos.
O projeto também faz parte da tese de mestrado desenvolvida pela professora Cibele, sobre "Diálogo entre Linguagens no Ensino de Língua Materna", que deve se tornar um livro após a conclusão. Para
fazer o mestrado, a professora contou com auxílio do Governo do Estado por meio do Programa Bolsa Mestrado, que custeou parte do projeto.
Instituído em dezembro de 2003, o Projeto Bolsa Mestrado prevê ajuda financeira a docentes da rede
estadual que tenham interesse em fazer mestrado ou doutorado. Para receber o benefício, o professor
deve inscrever o projeto no programa. O mesmo será avaliado e caso aprovado o docente receberá o
auxílio. O servidor que conseguir o benefício deverá concluir o mestrado em até 24 meses, prorrogáveis
por mais seis. A bolsa para o doutorado tem validade de 48 meses, prorrogáveis por mais seis meses.
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Notícia veiculada no Jornal de Piracicaba, no Caderno Educação (26/02/2010),
sobre o Projeto Caçadores de nuvens:
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