O Dilema da Dupla Institucionalização do Judiciário...

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O Dilema da Dupla Institucionalização do Judiciário: Representações da Violência e da Punição na Justiça Informal Criminal Brasileira André Luiz Faisting Doutorando do Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais Universidade Federal de São Carlos – São Paulo - Brasil Paper preparado para apresentação na XXIV International Congress of the Latin American Studies Association – LASA-2003 “Los operadores del derecho en la historia de América Latina” Dallas, Texas, March 27-29, 2003

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O Dilema da Dupla Institucionalização do Judiciário:

Representações da Violência e da Punição na Justiça Informal

Criminal Brasileira

André Luiz Faisting

Doutorando do Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais Universidade Federal de São Carlos – São Paulo - Brasil

Paper preparado para apresentação na XXIV International Congress of the Latin American Studies Association – LASA-2003

“Los operadores del derecho en la historia de América Latina” Dallas, Texas, March 27-29, 2003

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INTRODUÇÃO

Embora no Brasil a produção sociológica sobre o mundo do Direito ainda seja pequena, devido principalmente ao desconhecimento de como funcionam as instituições judiciárias, o esforço de autores insatisfeitos com as análises limitadas aos códigos processuais também têm contribuído para uma reorientação nos estudos sociológicos sobre o sistema de justiça. Tais estudos são decorrentes de vários fatores como, por exemplo, a crescente preocupação com os direitos humanos, assim como a própria Constituição de 1988 que teve como resultado a difusão de vários temas jurídicos e institucionais, dentre eles aqueles voltados para a ampliação do acesso à justiça1. Dentro desta preocupação, um dos fenômenos atuais que têm estimulado cada vez mais o interesse acadêmico por parte dos estudiosos do sistema de justiça é a informalização dos procedimentos como forma de ampliar as vias de acesso à justiça. De acordo com Richard Abel (1982, p. 2), o movimento contemporâneo de informalização da justiça parece apontar para uma grande transformação do sistema legal, embora considere que os contornos de tal mudança ainda sejam incertos e ambíguos. O importante a ressaltar, no entanto, é que as diversas características deste movimento têm em comum a preferência pela informalidade em audiências de queixas e processos de disputas.

É assim que têm surgido, paralelamente aos instrumentos convencionais e formais de administração da justiça, os novos mecanismos de resolução de conflitos a partir de instituições ágeis e mais ou menos profissionalizadas, de forma a ampliar o acesso e diminuir a morosidade. Na esfera criminal, este movimento de informalização também busca alternativas de controle mais eficaz e menos dispendioso do que o oferecido pelo sistema penal tradicional, conferindo ao acusado uma gama de alternativas como a transação nos chamados delitos de “menor potencial ofensivo”, e incorporando a participação da vítima para o encaminhamento da questão nas chamadas soluções conciliatórias, que visam promover a interação face-a-face entre vítima e acusado como forma de superar o conflito que está na origem do delito (Azevedo, 1999).

Uma questão que sempre se coloca sobre este movimento diz respeito ao âmbito do controle estatal, no sentido do mesmo estar se contraindo ou se expandindo com o processo de informalização da justiça. Na análise do que chama de “as políticas da justiça informal”, Abel organizou uma coletânea na qual o conjunto dos artigos coincide na afirmação de que a justiça informal reforça o poder estatal pela via da ampliação do controle social. Nesta perspectiva, as instituições informais permitem que o controle estatal escape das paredes fechadas dos centros de coerção oficial, expandindo-se para a sociedade como um todo. Como argumenta o autor, “tais instituições são informais para a extensão de que elas são não-burocráticas, minimizam o uso de profissionais, evitam a lei oficial em favor de normas substantivas e procedimentais que são vagas, não escritas, de senso comum, flexível e particulares”.

1 De acordo com Cappelletti e Garth (1988, pp. 31-73), o movimento de acesso à justiça no Moderno Estado Social se desenvolveu a partir de três fases: a assistência judiciária como meio de superar as barreiras existentes; as reformas necessárias para a defesa dos interesses difusos; e as transformações no processo visando a abertura das necessárias vias de acesso. Esta última fase visa tornar os procedimentos mais céleres, informais e econômicos para certas demandas. Nesta perspectiva, a justiça conciliadora têm sido o principal instrumento utilizado, pois objetiva uma justiça rápida e sem a necessidade de formalismo .

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Os ensaios que integram a coletânea organizada por Abel oferecem uma variedade de explicações para a rejeição das instituições, direitos e processos legais formais. Mas independente da perspectiva adotada restam ainda muitas indagações a respeito do significado e das conseqüências deste processo. Ou seja, caracterizar a justiça informal contemporânea não se constitui numa tarefa fácil, uma vez que as suas características estão em permanente mutação. O importante a ressaltar é que se trata de um fenômeno de âmbito internacional, sendo possível encontrar exemplos de justiça informal nas mais diversas formações sociais, bem como em diferentes períodos e sob a bandeira das mais diversas ideologias políticas. Segundo Azevedo (1999, p. 90), seja qual for o modelo adotado, os elementos conceituais que configuram um tipo ideal de informalização da justiça nos Estados contemporâneos permitem levantar as seguintes características:

uma estrutura menos burocrática e relativamente mais próxima do meio social em que atua; aposta na capacidade dos disputantes promover sua própria defesa, com uma diminuição da ênfase no uso de profissionais e da linguagem legal formal; preferência por normas substantivas e procedimentais mais flexíveis e particularistas, mediação e conciliação entre as partes mais do que adjudicação de culpa; participação de não juristas como mediadores; preocupação com uma grande variedade de assuntos e evidências, rompendo com a máxima de que "o que não está no processo não está no mundo"; facilitação do acesso aos serviços judiciais para pessoas com recursos limitados para assegurar auxílio legal profissional; um ambiente mais humano e cuidadoso, com uma justiça resolutiva rápida, e ênfase em uma maior imparcialidade, durabilidade e mútua concordância no resultado; geração de um senso de comunidade e estabelecimento de um controle local através da resolução judicial de conflitos; maior relevância em sanções não coercitivas para obter acatamento.

Diante deste quadro, o objetivo de nossa pesquisa é analisar a lógica de funcionamento do sistema de justiça informal na área criminal, entendido como uma nova instância de distribuição de justiça que está inserida num contexto mais amplo do processo contemporâneo de informalização dos procedimentos judiciais, com destaque para a estrutura social dos casos jurídicos e para as formas de representação da violência e da punição nas audiências preliminares de conciliação, base na qual opera a justiça informal criminal no Brasil. Para tanto, elegemos como estudo de caso o Juizado Especial Criminal de uma Comarca de porte médio do interior do Estado de São Paulo, partindo do pressuposto de que com a institucionalização da justiça informal criaram-se formas distintas de prática judiciária que se sustentam em normas e valores também distintos.

Além do dilema vivenciado pelos operadores do Direito no sentido da escolha da prática judiciária – mediação ou decisão -, o estudo pretende revelar a necessidade em compreender como estes agentes atuam nesta esfera de justiça ao interagirem com as partes litigantes, muitas vezes substituindo os argumentos jurídicos e normativos por argumentos sustentados em valores sócio-culturais externos ao Judiciário. Tal situação é característica da justiça informal na medida em que o espaço da mesma permite que tais manifestações sejam expressadas de forma mais livre, revelando, assim, muitos dos estereótipos freqüentemente obscurecidos pela formalidade jurídica.

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1. A Justiça Informal no Brasil: da Justiça de Paz ao Juizado Especial Criminal

No Brasil o instituto da conciliação tem sua origem no período imperial, na figura do juiz de paz como magistratura leiga ao lado da magistratura togada de direito. A Constituição de 1824 especificou que o sistema judicial brasileiro independente incluiria eventualmente inovações, como, por exemplo, um sistema de magistrados menores escolhidos localmente que se chamariam juízes de paz. Em 1827 a legislação ordenou e regulou o estabelecimento de juízes locais nas regiões do Brasil (Flory, 1986).

Enquanto alguns autores (Miranda Rosa, 1981) sustentam que a maior preocupação da justiça de paz era propiciar a conciliação entre as partes para evitar que situações conflituosas se transformassem em litígios submetidos à apreciação do Judiciário, outros (Koerner, 1992) acreditam que a justiça de paz enquanto instituição não pode ser compreendida apenas deste ponto de vista, pois nesta época as questões de natureza política certamente se sobrepunham às questões de natureza jurídica e profissional. Seriam as relações de poderes locais, por um lado, e as relações entre o poder local e o governo central, por outro, que constituiriam um dos principais elementos para compreender a origem e o desenvolvimento da justiça de paz no Brasil.

Sem entrar no mérito desta discussão o importante é que a análise do desenvolvimento histórico da justiça de paz demonstrou que ela foi se deteriorando e perdendo importância tanto no que se refere à função conciliatória, o que constituiu a explicação de sua denominação, quanto à função política, que tinha por finalidade o fortalecimento do poder local. Assim, o variável papel do juiz de paz como conciliador proporcionou um bom exemplo de uma função que foi se extinguindo ao longo do tempo. No âmbito do Poder Judiciário, a figura do conciliador passou a ter espaço privilegiado apenas na Justiça do Trabalho, na qual a lógica do acordo para resolução de conflitos trabalhistas prevalece sobre a lógica da decisão.

Isso não significa, contudo, que a lógica da conciliação tenha desaparecido totalmente do sistema de justiça com a deterioração da justiça de paz. O que ocorreu foi que, excetuando a Justiça do Trabalho, apenas na década de 1980 ressurgem, de forma institucionalizada, os métodos informais para resolução dos conflitos. Ou seja, embora o Judiciário sempre tivesse em sua estrutura algum tipo de sessão prévia – por exemplo, as chamadas Juntas de Conciliação – é apenas em 1984 com a criação dos Juizados Especiais de Pequenas Causas que se começa a institucionalizar uma nova forma de distribuição de justiça, baseada na conciliação como forma de evitar a instauração do processo formal.

Órgãos da Justiça Estadual, os Juizados Especiais de Pequenas Causas foram criados pela lei 7.244/84 para atuar em causas cíveis com valor de até 20 salários mínimos, devendo se orientar por critérios de simplicidade, rapidez, informalidade e economia. O sistema do Juizado começou a ser seriamente considerado no Brasil quando se discutiam medidas para amenizar a chamada crise do Judiciário. A falta de assistência jurídica, o congestionamento burocrático e a morosidade nos processos se constituíam na base da crise que, acreditava-se, não seria sanada a partir somente do reaparelhamento humano e material

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da justiça, mas também a partir da criação de novos mecanismos para que “pequenas causas” não precisassem seguir o percurso de causas de maior valor e complexidade2.

Os críticos da lei que criou os Juizados o comparavam ao antigo INPS (Revista OAB/SP, 1984), acreditando tratar-se de uma justiça de segunda classe, pois entendiam que os conflitos economicamente menos expressivos seriam prejudicados na medida em que a essas pequenas causas fossem atribuídas a denominação de justiça dos pobres (Carneiro, 1982) e teriam, conseqüentemente, um tratamento diferenciado. Para Dinamarco (1985), entretanto, estas críticas não se sustentavam uma vez que a intenção era justamente o contrário, ou seja, uma justiça acessível, ágil, sem burocracia e capaz de julgar conflitos referentes à modernização da sociedade.

A lei 7.244 foi incorporada pela Constituição de 1988 através do artigo 98 que estatuiu e fixou as diretrizes fundamentais destes Juizados. Contudo, segundo Herkenhoff (1994), a Constituição fala em causas cíveis de menor complexidade e não em causas de menor valor econômico. Assim, para o autor a designação “Juizados de Pequenas Causas” não foi exata em face do texto constitucional. O melhor seria “Juizado de Causas Cíveis de Menor Complexidade” e “Juizado Criminal de Infrações de Menor Potencial Ofensivo”. Isto porque causas menos complexas são diferentes de causas de pequeno valor econômico. A correção desta designação veio com a lei nº 9.099, de setembro de 1995, que manteve os fundamentos da lei anterior mas, além de aumentar o valor das causas para 40 salários mínimos e exigir a obrigatoriedade da presença de advogado nas causas entre 20 e 40 salários, também deu ao Juizado a atribuição para atuar em pequenas causas na área penal, criando, assim, o Juizado Especial Criminal.

Recebida como excelente alternativa para uma justiça ágil e menos burocrática, a lei 9.099/95 criou o Juizado Especial Criminal para se guiar pelos “critérios da oralidade, informalidade, economia processual e celeridade, objetivando, sempre que possível, a reparação dos danos sofridos pela vítima e a aplicação de pena não privativa de liberdade” (art. 62). Neste sistema, o suposto ofendido dirige-se à autoridade policial para formalizar a acusação, resultando disto um Termo Circunstanciado3. O passo seguinte é uma audiência preliminar na qual haverá tentativa de conciliação. Nesta audiência deverão estar presentes, além do juiz, o representante do Ministério Público, o autor do fato e a

2 O modelo inspirador do Juizado no Brasil foi a cidade de Nova Iorque, na qual se fez um esforço internacionalmente reconhecido no sentido de atender com presteza e eficiência pequenas causas que se acumularam durante décadas (Carneiro, 1985). Ali, os Juizados foram criados em 1934, com a denominação de Poor Man’s Court. Com a ampliação do conceito de pequenas causas, o tribunal passou a ser designado Common Man’s Court ( Moraes, 1998). 3Até a edição da Lei 9.099/95, as contravenções penais e os delitos punidos com pena de detenção eram processados pelo rito processual previsto no Capítulo V, Título II, do Livro II (art. 531 a 540) do Código de Processo Penal, denominado Processo Sumário. Pouca diferença havia entre este tipo de procedimento e o Processo Ordinário, aplicado aos delitos apenados com reclusão. A lei previa apenas a redução de alguns prazos e o abreviamento de determinados momentos processuais, mas a estrutura do processo era basicamente a mesma: inquérito policial, denúncia do Ministério Público, interrogatório do réu, defesa prévia, audiência de instrução, debates orais, julgamento. Não havia a possibilidade de reparação civil dos danos sofridos pela vítima no próprio processo penal, ficando relegada ao papel de mera informante da justiça penal. Nem tinha o réu qualquer interesse em reconhecer o fato que lhe era imputado, com a negociação em torno da pena” (Azevedo, 1999)

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vítima, que podem ou não estar acompanhados de advogado4. O defensor público de plantão também pode ser convocado pelo juiz dependendo da situação. É o caso, por exemplo, de delitos em que é obrigatório a aplicação de pena de multa ou prestação de serviços à comunidade, como nos chamados crimes contra a honra. Caso não seja possível nem a conciliação nem a suspensão do processo, o juiz deverá intimar as partes para a audiência de Instrução e Julgamento, na qual o acusado é interrogado, as testemunhas são ouvidas, os debates orais entre defesa e acusação são realizados, tudo para que o juiz possa ter elementos para proferir a sentença final condenatória ou absolutória. Em síntese, formaliza-se o processo.

2. Práticas e Representações de Agentes e Litigantes na Justiça Informal Criminal

A compreensão da lógica de funcionamento do sistema de justiça informal na área criminal passa, antes, pela compreensão do sistema de justiça criminal como um todo. Neste sentido, é ilustrativo o estudo de Sapori (1995) sobre a administração da justiça criminal, pois o mesmo a concebe como uma “comunidade de interesses” na qual o princípio da eficiência é o que move a máquina judiciária. Ou seja, o compromisso entre defensores, promotores e juízes se caracteriza pela maximização da eficiência no sentido da agilização dos processos, lançando mão de um modelo de “categorização” dos casos previamente definido, acionando com isso programas de ação também previamente estabelecidos. Como argumenta o autor,

As varas criminais brasileiras institucionalizaram um certo modo de fazer justiça, caracterizado pelo processamento seriado dos crimes. Essa justiça feita em série, que denominei justiça linha de montagem, é marcada pelo tratamento padronizado dos processos. Suas especificidades e individualidades são desconsideradas. Procura-se, antes de tudo, classificar os processos em categorias que, por sua vez, vão definir padrões de decisão e de ação (1995, p. 151).

É justamente a combinação deste modelo de categorização com os programas de ação que caracteriza, para o autor, o caráter rotineiro da “justiça linha de montagem”. Mas o problema, segundo ele, é que esta rotina se institucionalizou como um “arranjo informal” do sistema, que por sua vez deve ser entendido como modelos de comportamento cotidianos que não estão previstos pelo arcabouço normativo, e portanto têm o caráter de leis não escritas. É por estas razões que a perspectiva de Sapori nos ajuda a compreender melhor também a lógica de funcionamento dos Juizados Especiais Criminais, não apenas no trabalho de despacho e categorização dos processos que normalmente ocorrem antes das audiências preliminares de conciliação, mas também no próprio desenvolvimento destas audiências. O próprio Sapori argumenta que o compromisso entre os agentes que caracteriza esta “justiça linha montagem” também se revela nas audiências, pois espera-se que as partes sejam objetivas nos questionamentos, nas defesas e nas acusações.

4 A tentativa de conciliação é conduzida pelo juiz ou por um conciliador sob sua orientação. A função de conciliador pode ser exercida por pessoas leigas, mesmo sem formação jurídica formal, desde que não pertençam aos quadros da Justiça Criminal . Neste caso, a conciliação deverá passar pela homologação de um juiz togado (Azevedo, 1999)

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Essa idéia de “arranjos informais” também sugere uma ampliação do conceito de conciliação que as abordagens jurídicas normalmente atribuem aos Juizados Especiais, na medida em que normalmente se restringe essa lógica à iniciativa apenas das partes, na qual os agentes atuam como mediadores dos conflitos. Na perspectiva da “comunidade de interesses”, ao contrário, os acordos informais também seriam entendidos como acordos entre juízes, promotores e defensores públicos visando, sempre que possível, o abreviamento do fluxo do processo penal.

O que estamos propondo em nosso estudo é que na justiça informal, além da idéia de uma “comunidade de interesses”, que permite compreender melhor os comportamentos dos operadores do direito, é preciso considerar também as práticas e as representações também das partes litigantes, já que estamos pressupondo que as pessoas comuns, no âmbito desta instância de justiça, desempenham uma função importante nas audiências e com isso também acabam influenciando o processo ritual que, por sua vez, pode influenciar no resultado final dos processos. Quer dizer, por mais que existam programas de ação previamente estabelecidos a partir da categorização dos delitos, na justiça informal deve-se considerar também a participação das partes litigantes e de seus representantes legais, tanto para o desenvolvimento da audiência quanto para a definição do caso.

Em outras palavras, acreditamos que os modelos de categorização que caracterizam o padrão de comportamento dos agentes deve ser combinado com o padrão de comportamento das partes litigantes e de seus representantes legais, já que na justiça informal lhes é concedido espaço para manifestação de seus desejos, expectativas e desculpas. Daí, portanto, a necessidade em eleger o processo ritual das audiências para compreender a lógica da justiça informal, já que são as formas simbólicas da linguagem que melhor caracterizam o comportamento de agentes e litigantes no processo de interação. A diferença é que, enquanto os agentes desenvolvem parte de suas representações a partir dos compromissos institucionalizados nas varas criminais, as pessoas comuns trazem para o ambiente do fórum a representação de valores institucionalizados a partir de sua vida cotidiana fora do sistema de justiça.

Por estas razões, uma das maneiras de compreender esta nova instância de justiça é a partir da análise da contraposição entre os valores apreendidos pelos agentes legais, no âmbito do sistema justiça, e os valores apreendidos por processo de socialização a partir de outras instituições em sua vida cotidiana. Acreditamos, assim, que é neste encontro que caracteriza-se a lógica de funcionamento da justiça informal em geral e a justiça informal criminal em especial.

3. Representações da Violência e da Punição na Justiça Informal Criminal

Trabalhos recentes como os de Adorno (1999) ressaltam que as preocupações públicas apontam para a emergência de um novo paradigma da violência, cuja orientação procura ir para além do crime em si e se refere à mudança de hábitos cotidianos que estão marcados por novos conflitos sociais. Esse novo paradigma se sustenta no fato de que quando se examina os valores, o comportamento e as normas culturais em relação à violência, verifica-se que a mesma não se explica apenas pelas variáveis estruturais, mas também em virtude da presença e difusão de um outro conjunto de normas e valores que favorece a ocorrência de comportamentos agressivos.

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Neste sentido, a violência teria múltiplas causas, o que pressupõe a compreensão de suas várias vertentes explicativas. O importante a ressaltar, portanto, é que o fenômeno da violência não pode ser reduzido a uma única causa pois trata-se de fenômenos diferenciados. É neste sentido que Adorno (2002a) destaca três grupos característicos do comportamento violento na contemporaneidade. O primeiro se refere ao crime organizado, principalmente os relacionados aos seqüestros e ao tráfico de drogas; o segundo é o bloco que envolve ameaças aos direitos humanos como linchamentos, extermínios e violência policial; o terceiro refere-se aos crimes praticados nas relações interpessoais e intersubjetivas, como nas brigas de vizinhos e de casais. Embora esteja se referindo aos homicídios, e portanto aos crimes mais graves e de “grande potencial ofensivo”, Adorno (2002b, p. 318) ressalta a importância deste último tipo de conflitualidade social, ou seja, aquela relativa aos crimes provocados por tensões nas relações intersubjetivas, oferecendo-nos, com isso, uma melhor caracterização deste tipo de conflito. Segundo o autor,

Trata-se de um infindável número de situações, em geral envolvendo conflitos entre pessoas conhecidas, cujo desfecho acaba, muitas vezes até acidental e inesperadamente, na morte de um dos contendores. Compreendem conflitos entre companheiros e suas companheiras, entre parentes, entre vizinhos, entre amigos, entre colegas de trabalho, entre conhecidos que freqüentam os mesmos espaços de lazer, entre pessoas que se cruzam diariamente nas vias públicas, entre patrões e empregados, entre comerciantes e seus clientes. Resultam, em não poucas circunstâncias, de ressentimentos variados acerca da posse ou propriedade de algum bem, acerca de paixões não correspondidas, acerca de compromissos não saldados, acerca de reciprocidades rompidas, acerca de expectativas não preenchidas quanto ao desempenho convencional de papéis como os de pai, mãe, mulher, filho, estudante, trabalhador, provedor do lar, etc

Cabe destacar também que, assim como pudemos constatar em nossa pesquisa, o uso de bebida alcoólica bem como de outros tipos de drogas representam um fator que contribui decisivamente para este tipo de comportamento violento. Por isso, além dos espaços da rua e dos bares – onde outros tipos de crimes também ocorrem -, os lares domésticos se constituem no local privilegiado da violência interpessoal e intersubjetiva. Tal constatação torna o problema ainda mais complexo, na medida em que se supõe que muitos destes comportamentos, por várias razões, não chegam a ser conhecidos nem denunciados. Para os nossos propósitos, no entanto, o importante é que dentre os crimes que chegam à Justiça inclui-se desde os mais graves como os homicídios até os crimes de lesão corporal consideradas “leves”. Isto significa que, dependendo do grau atribuído aos mesmos, eles são tratados de maneira diferenciada dentro do sistema de justiça. Para os crimes considerados de “menor potencial ofensivo”, os casos são tratados a partir da lógica da justiça informal de conciliação nos Juizados Especiais Criminais.

Como vimos, tais comportamentos se constituem em sua maioria em crimes que envolvem relações pessoais de proximidade como relações conjugais, de familiares, vizinhos etc, sendo os mais comuns aqueles relativos à chamada violência doméstica. Esse tipo de crime, que do ponto de vista jurídico também se enquadra na categoria de “crime violento contra a pessoa” se constitui em atos que envolvem relações interpessoais entre indivíduos. Por esta razão a violência doméstica representa um tipo de crime de difícil prevenção, pois, como argumenta Scuro Neto (2000, p. 107), esses comportamentos

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“geralmente não são premeditados; resultam de sentimentos ‘irracionais’, paixões, medo. Muitas das pessoas que os executam nunca estiveram envolvidas em crimes anteriormente e não se apercebem a si mesmas como criminosas. Além disso, os crimes violentos contra a pessoa raramente refletem atividades de grupo, ou seja, a violência é dirigida pelo agente contra uma vítima específica”.

É neste sentido que se a relação íntima que caracteriza este tipo de crime permite identificar com facilidade o seu autor, por outro lado dificulta o controle preventivo deste comportamento justamente porque ele tem como motivações muitas vezes o ciúmes, a infidelidade, diferenças familiares, disputas por propriedades e, desta forma, envolve relações afetivas e de pessoas que se conhecem a muito tempo, pressupondo, assim, a idéia de relações continuadas. Este, aliás, é o principal argumento dos operadores do direito para justificar o tratamento específico de certos delitos de “menor potencial ofensivo” no que se refere à violência doméstica. Ou seja, a lógica da conciliação entre as partes seria a ideal para os casos que envolvem relações continuadas, como no caso de relações conjugais e de famílias onde na maioria das vezes as relações devem permanecer mesmo após os conflitos.

Outro problema de natureza sociológica relativa à compreensão da violência doméstica diz respeito à distinção entre a esfera do público e do privado. Como a família é considerada como pertencente à esfera privada, demorou-se muito tempo até que se tornasse crime tal comportamento. Portanto, é muito recente a disposição de reverter um quadro de “aceitação social” deste tipo de violência no sentido da sua não criminalização, evitando, assim, torná-la um delito contra o interesse jurídico da coletividade. Por esta razão muitos autores argumentam que ainda não se avançou o suficiente neste campo, pois as representações sobre a distinção entre homens e mulheres ainda correspondem a valores que se sustentam numa relação desigual de poder e dominação. Sobretudo no sistema de justiça é perceptível que a representação sobre a mulher opera numa lógica diferente em relação ao homem (Corrêa, 1983). Ou seja, a igualdade formal é muitas vezes substituída por modelos que permitem o tratamento não dos crimes mas dos papéis sociais que homens e mulheres desempenham socialmente, onde aos primeiros são associados elementos pertencentes ao mundo do público enquanto as mulheres estão associadas ao mundo do privado.

Com efeito, as práticas violentas consideradas de “menor potencial ofensivo” recebem do Poder Judiciário um tratamento diferenciado. O objetivo neste caso é tentar uma composição entre as partes se utilizando do instituto da conciliação para evitar a formalização do processo. Isso se reflete não apenas nas formas de representação da violência – neste caso considerada como menos ofensiva se comparada a outros tipos de delitos –, mas também na representação da própria punição aplicada aos réus infratores. Daí a opção em considerar, neste estudo, as formas de representação da violência e da punição na justiça informal criminal como forma de compreender um certo ritual que se estabelece nas audiências preliminares de conciliação.

Tal constatação nos leva a reconhecer que, associado ao fenômeno da violência, as diferentes respostas em termos das formas punitivas representam um aspecto essencial da vida social e, portanto, merece especial atenção no esforço sociológico em entender a dinâmica da sociedade contemporânea, sobretudo naquilo que se refere à natureza e às dimensões da conflitualidade social e os mecanismos de controle social da mesma. Uma das maneiras de compreender a natureza social da punição está, como sugere Garland

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(1990, p. 1), nas correlações possíveis entre as diferentes formas punitivas existentes e as questões políticas e morais relacionadas a elas. Um obstáculo ao melhor entendimento da punição está, assim, no fato de que os esforços empreendidos tem sido apenas no sentido de converter um assunto profundamente social em uma tarefa técnica para instituições de controle social. Para tanto, o desafio inicial, segundo o autor, estaria em construir, de fato, uma sociologia da punição legal para explicar, além das fundações históricas da punição, sua função social e seu significado cultural.

Resolvida esta questão, ou seja, reconhecendo que o fenômeno da punição legal deve ser entendida em suas dimensões e em sua natureza essencialmente sociais, bem como reconhecer a influência de valores morais no direito criminal, é possível problematizar o conceito de punição de acordo com os ambientes aos quais a mesma se refere. Daí decorre, portanto, a necessidade em compreender como está organizado o sistema penal brasileiro, que divide as infrações entre “grande potencial ofensivo”, que tem como base a pena de prisão e do devido processo legal clássico, e a de “menor potencial ofensivo”, que tratam das chamadas “pequenas causas”. Segundo alguns juristas esta última forma de tratamento judicial dos crimes desta natureza fazem parte de um novo devido processo legal, qual seja, o “consensual”, fundamentado na justiça informal conciliatória que tem como objetivo evitar a instauração do processo formal.

Para os nossos propósitos interessa compreender exatamente as formas de representação jurídica e social da punição no âmbito da justiça informal criminal, que trata dos “crimes de menor potencial ofensivo”. Ao contrário da justiça formal, onde o discurso é mais “jurídico” pois envolve apenas os operadores do direito, na justiça informal é possível apreender melhor o que pensam e sentem as partes diretamente envolvidas no conflito, já que há um espaço maior para manifestação das mesmas. Assim, ao ter maiores condições para participação direta na solução dos conflitos, as pessoas acabam também manifestando de forma mais clara seus desejos, expectativas e desculpas, e com eles os valores sociais e morais apreendidos a partir das experiências cotidianas na família, na prática religiosa, ou a partir de experiências em outros agrupamentos sociais.

A conseqüência desta realidade pode ter como resultado uma certa insatisfação por parte de alguns litigantes com a solução oferecida, que na maioria das vezes se constitui no arquivamento do processo sem qualquer punição efetiva. Ou seja, se a parte vai para a audiência buscando uma punição efetiva para o seu agressor acaba ficando decepcionada. Por outro lado, também é verdade que muitas pessoas acabam utilizando o sistema no sentido de que realmente é interessante que não haja esta punição efetiva, mas simplesmente um tipo de constrangimento por parte do agressor diante da autoridade judicial. Por exemplo, para muitas esposas que não desejam se separar dos seus conjugues é importante este “tipo subjetivo de punição”, ou seja, um simples pedido de desculpas e o conseqüente sentimento de constrangimento do marido agressor. Tal impressão pôde inclusive ser confirmada pela manifestação da representante da única delegada especializada na defesa da mulher da Comarca onde desenvolvemos a pesquisa, na qual a maioria dos processos tem origem. Segundo a entrevistada,

Na verdade, resumindo, se você analisar, se você apurar tudo, no fundo as mulheres não querem que o marido seja efetivamente punido, não querem se separar. Na verdade elas querem uma coisa meio milagrosa. Elas gostariam que eles se tornassem uma pessoa diferente, uma pessoa melhor, deixasse de a agredir, deixasse

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a amante, deixasse de beber, fosse mais preocupado com a provisão do lar no aspecto material, tudo isso, ou seja, elas gostariam de ter um marido melhor: essa é a finalidade quando elas vêem numa delegacia (...) Eu conheço caso de pessoas que só pelo fato de receber uma intimação para vir numa delegacia já é um mecanismo que coíbe o comportamento; porque se é uma pessoa que tem uma boa índole, se é uma pessoa que tem o que perder, que se preocupa com seu emprego, com a família; depende com quem você lida. Agora, tem certas pessoas aqui que o Termo Circunstanciado, que simplesmente uma audiência no Juizado Criminal não quer dizer absolutamente nada .

Tal situação descrita pela profissional no sentido do que ocorre nas delegacias pode ser transposta também para o ambiente do fórum onde são realizadas as audiências preliminares de conciliação, já que com a criação da lei 9.099/95, que implantou o sistema dos Juizados Especiais Criminais, as delegacias ficaram responsáveis apenas pelo registro da ocorrência a partir da instauração do Termo Circunstanciado, devendo encaminhar os processos para serem tratados no Juizado. Pode-se dizer inclusive que o sentimento de constrangimento por parte de alguns acusados é ainda maior diante da autoridade judicial, pois dentro do sistema de justiça o juiz representa uma autoridade maior não apenas do ponto de vista de seu poder real mas também um poder simbólico que as pessoas normalmente reconhecem e respeitam.

Nesse sentido, ao interagirem com as partes litigantes, os juízes acabam se utilizando de valores que as mesmas reconhecem e aceitam como válidos para alcançar o acordo e o encerramento do processo, evitando com isso a continuidade do litígio com a conseqüente superação do conflito. Por outro lado, o problema de natureza sociológica é que tal situação também pode caracterizar o que estamos chamando de o “dilema da dupla institucionalização do Judiciário”, na medida em que os juízes ora atuam como juízes formais e se utilizam de seu poder de decisão para decidir qual interesse deve prevalecer sobre o outro, ora lançam mão de outros valores sociais e morais para alcançar um acordo sem, contudo, abdicar da ameaça implícita de seu poder de decidir juridicamente. Este tipo de situação, caracterizada pela ameaça da punição, também aparece no depoimento da delegada. Ao se referir ao momento anterior à lei que criou os Juizados Especiais Criminais, quando as Delegacias tinham maior autonomia, ela argumenta:

Então naquela época a gente tinha esse recurso: intimava as partes aqui, tanto marido quanto a mulher, e assim tentava, usando um tom mais ameaçador, um tom mesmo de autoridade, no sentido de que se ele tentasse fazer mais alguma coisinha, qualquer que fosse, eu instauraria o inquérito, representaria pela prisão preventiva dele, e ele seria preso; que não teria escapatória, que ele não teria opção, ele seria preso. E como ele não conhecia o procedimento ele acreditava efetivamente que isso aconteceria. No caso de nós instaurarmos (o processo), que também era um número grande, tinha toda aquela tramitação demorada do rito processual anterior e isso causava até uma ansiedade no “elemento” porque ele achava que afinal ele poderia ser condenado, poderia ir para a cadeia, e isso até eventualmente melhorava um pouco o comportamento e até criava-se assim um receio, um temor de que se ele sofresse um outro processo ele não teria mais direito ao benefício; enfim trabalhava-se muito mais com a questão da expectativa, do medo e de certa forma até da ignorância.

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O que importa ressaltar é que o comportamento tanto dos operadores do direito quanto das partes litigantes em conflito na justiça informal criminal podem revelar, de maneira mais evidente, a influência de valores sociais e morais no direito criminal, principalmente se pensado em termos da ameaça de punição como forma de superar o conflito original5. Ou seja, se por um lado esta ameaça de punição revela um dilema vivenciado pelos juízes na escolha da prática a ser adotada – julgar ou mediar -, por outro lado ela acaba se constituindo num instrumento eficaz na busca da conciliação para o encerramento do processo, caracterizando, assim, um dos principais aspectos do processo ritual das audiências preliminares de conciliação na esfera criminal . A análise desenvolvida a partir do estudo de caso realizado em uma Comarca de porte médio permitiu compreender melhor estes diferentes aspectos.Vejamos, portanto, os principais resultados alcançados neste estudo.

4. O Caso do Juizado Especial Criminal de uma Comarca de Porte Médio

O Juizado que elegemos como estudo de caso iniciou suas atividades em 1995 com a promulgação da lei federal 9.099, de setembro do mesmo ano. Por não possuir cartório próprio ele funciona nas dependências das três Varas Criminais existentes na Comarca. Assim, as demandas caracterizadas como “crimes de menor potencial ofensivo” que chegam até o fórum são distribuídas entre estas Varas, as quais realizam audiências preliminares de conciliação sempre às quartas-feiras no período da tarde.

O processo criminal tem origem sempre numa Delegacia de Polícia, seja num distrito comum ou, o que é mais freqüente, numa Delegacia Especializada na Defesa da Mulher, com o registro da ocorrência a partir de um Termo Circunstanciado de Ocorrência Policial, no qual anota-se, além dos dados pessoais das partes envolvidas, o depoimento da vítima e, as vezes, também do acusado. Ressalta-se que a vítima, que é quem presta a queixa/crime, nem sempre sabe informar os dados completos do autor do fato. Quando há agressão física a vítima é encaminhada para exame pericial e, diagnosticada a agressão, o caso é encaminhado para o Ministério Público que deverá fazer ou não a denúncia e encaminha-la para audiência preliminar de conciliação no Juizado Especial Criminal.

Com exceção dos crimes de trânsito – entre os quais o mais comum é a falta de habilitação – todas as demais audiências acompanhadas referiram-se a processos que representavam algum tipo de agressão ou ameaça, distribuídos entre os seguintes crimes: lesão corporal dolosa, lesão corporal culposa, crime contra liberdade individual, perturbação de sossego, crime de usurpação (dano), crimes contra os costumes e contra a honra, crime de apropriação indébita e outras contravenções penais (vias de fato, porte de arma branca). Assim, optamos por nos concentrar nestes tipos de crimes para a descrição e análise das audiências preliminares de conciliação, pois acreditamos que os mesmos permitiam analisar de forma mais efetiva a conflitualidade social a partir das formas de representação da violência e da punição que as partes litigantes desenvolvem no âmbito do sistema de justiça informal criminal.

5 Para melhor compreender a influência dos valores morais na justiça criminal é preciso distinguir os efeitos da punição real efetivamente aplicada aos réus infratores dos efeitos de uma “ameaça de punição”. Assim, enquanto a punição real está associada a um tipo especial de intimidação, a ameaça de punição pode ser vista como uma “intimidação geral”, uma vez que está direcionada para todos os membros da sociedade.

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4.1 - Caracterização e análise dos processos a partir das variáveis quantitativas

A caracterização quantitativa dos processos cujas audiências foram acompanhadas foi realizada com referência às seguintes variáveis: resultado final, natureza do crime, tipo de relação/parentesco entre as partes litigantes, presença ou não de advogados nas audiências, e perfil sócio-econômico das partes litigantes.

Com relação ao resultado final das audiências constatou-se que em 79,2% das mesmas os processos foram arquivados após a conciliação e concordância das partes. Esta variável deve ser analisada em relação com a variável relativa à natureza das causas, já que para certos delitos como, por exemplo, crimes de trânsito ou crimes contra os costumes, é imperativo a aplicação de multa ou pena de prestação de serviços à comunidade. Ou seja, no que se refere aos tipos de delito, o crime de lesão corporal dolosa (agressão) e o crime contra a liberdade individual (ameaça) também representaram, juntos, 79,2% do total de processos, sendo que o primeiro alcançou o índice de 47,7%, revelando, assim, que a agressão física se constitui num dos principais fatores que impulsionam a busca da justiça informal na área criminal. Como em ambos os casos é possível buscar o acordo entre as partes, conclui-se que a natureza das causas é uma das razões pelas quais há um alto índice de conciliação e o conseqüente encerramento do processo sem punição efetiva.

Ressalta-se ainda que, de acordo com o que pudemos apreender das manifestações dos litigantes nas audiências, as vezes os outros crimes também incluem algum tipo de agressão. Ou seja, por alguma razão ao receber a queixa o agente policial a caracterizou como crime contra a liberdade individual ou perturbação de sossego quando, na realidade, também houve algum tipo de agressão física, caracterizando, assim, também o crime de lesão corporal dolosa. Tal situação sugere que na justiça informal criminal é possível que haja uma sobreposição entre os diferentes tipos de delitos, ao contrário do que se supõe acontecer na justiça formal onde os crimes são melhor classificados e, desta forma, também é melhor definido a forma como devem ser tratados6. 6 Neste sentido, é ilustrativo o texto de Sudnow (1965), que aponta para o fato de que as alternativas de acordo muitas vezes já estão pré-estabelecidas no sistema de justiça, permitindo avaliar até que ponto as categorias institucionalizadas se refletem nas penas aplicadas aos infratores. O autor considera a guilty plea (admissão de culpa) uma maneira de manipulação de casos criminais, nos quais o defensor público passa a ter papel essencial na forma como os acusados são representados. Para descrever o método de obtenção de uma disposição para admitir a culpa, o autor busca caracterizar o que chama de “infrações menores necessariamente incluídas”. Isto quer dizer que onde uma infração não pode ser cometida sem que necessariamente se cometa outra, a posterior é uma infração necessariamente incluída. Um acusado não pode ser condenado de dois ou mais crimes quando um deles já esteja necessariamente incluído nos outros, a menos que os vários crimes ocorram em ocasiões separadas. Na realidade de alguns estados norte-americanos, estas alterações são realizadas, segundo o autor, quando um acusado concorda em alegar-se culpado de um crime para evitar seu julgamento, e ocorre no contexto de uma negociação que consiste em uma oferta do advogado para alterar a acusação original, de modo tal que uma sentença mais leve seja proferida, ao contrário do que seria o caso se o acusado fosse condenado na acusação original. Para os nossos propósitos, o importante a ressaltar é que, embora estejamos num outro contexto, é possível dizer que a lógica da justiça informal permite, em algum sentido, uma certa sobreposição entre os vários tipos de delitos como forma de evitar a instauração formal do processo. Tal situação, no entanto, não se resume apenas ao entendimento do agente policial ao formular o Termo Circunstanciado, mas também durante a realização das audiências, nas quais os operadores do direito muitas vezes buscam minimizar a gravidade dos crimes como forma de evitar a continuidade do processo, correspondendo, assim, aos seus compromissos institucionais de rapidez e agilidade.

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A variável relativa ao tipo de relação/parentesco entre as partes litigantes demonstrou que a maioria dos processos refere-se a conflitos entre membros da mesma família, sendo 36,2% de todos os processos relativos a relações conjugais, estejam as partes juntas ou separadas. É ilustrativa nesta questão, também conhecida como violência doméstica, a referência ao trabalho da Delegacia Especializada de Defesa da Mulher7, instância onde a maior parte destes casos têm origem. De acordo com as profissionais da Delegacia, com a criação do Juizado Especial Criminal houve uma certa “desvalorização” da mesma na medida em que ela representava a única forma institucional de garantir o direito da mulher vítima de agressão. Por esta razão, a delegada responsável pela única Delegacia localizada na Comarca estudada argumenta que é preciso distinguir o momento atual do momento anterior à lei que criou os Juizados. Para a entrevistada,

Antes da lei os crimes que envolviam na maioria das vezes as ocorrências da violência doméstica que originavam o crime, que são os mesmos de hoje (lesão corporal, ameaça, os mais comuns) eram inseridos no rito processual comum do código de processo penal (...) Então instaurava-se o inquérito policial, ia para o fórum, o promotor analisava o inquérito, se oferecia ou não uma denúncia. E o que acontecia? Naquela época as delegadas tinham uma liberdade maior de trabalhar a questão do casal sem a instauração do procedimento. Então o que a gente observava é que como o agressor não tinha certeza ou não sabia exatamente o que iria acontecer com ele caso ele fosse processado, porque a gente trabalhava aqui a questão da ameaça, a gente observava um resultado nesse sentido melhor (...) Quando ficava aquela coisa no âmbito da lesão leve, do tapa, do puxão de cabelo, do pequeno hematoma, da ameaça (...) aquelas ofensas verbais, aquela conturbação familiar, problemas de bebida etc, eu me lembro que muitas e muitas vezes eu intimava o casal e aquela ameaça que a gente fazia, aquela, entre aspas, que a gente chamava de “dar uma dura” (...) Em contrapartida, depois da lei 9.099, elabora-se um número enorme, imenso de Termos Circunstanciados. Tem-se a vantagem de ser um procedimento rápido, célere, e já vai para a audiência, quer dizer, a pessoa já vai com aquela ansiedade que vai ter que participar de uma audiência na justiça e tal. Só que no meu entendimento, no final, quando apura-se tudo e que termina aquilo, eu entendo que a resposta desse procedimento judicial em função desse rito é muito menor do que aquilo que ele esperava. E aí eu creio que a possibilidade de voltar a acontecer ou a chance dessa família voltar a tentar uma nova reestruturação ficou mais difícil.

Em contraste com essa manifestação da delegada, juízes e demais defensores do Juizado Especial Criminal argumentam que esse sistema surgiu apenas para agilizar o andamento dos processos, ou seja, para “desafogar” a justiça comum e formal, o que inclusive sempre representou um anseio da população. Argumentam ainda que depende apenas do desejo da vítima – e não do sistema – dar continuidade ou não ao litígio. Além disso, alguns juízes ainda defendem que a conciliação é a lógica da justiça ideal, não havendo, assim, nenhum problema em utilizar o instituto da conciliação para evitar a instauração formal do processo. Assim como se manifestaram alguns magistrados quando questionados sobre a lógica da conciliação, 7 A primeira Delegacia Especializada de Defesa da Mulher foi implantada como uma experiência pioneira em 1985 na cidade de São Paulo. Dado o sucesso desta experiência, novas delegacias foram criadas em todo o país e em outros países que se inspiraram no modelo brasileiro. Atualmente estão em funcionamento 307 delegacias no Brasil, sendo que o Estado de São Paulo concentra 40% do total de delegacias (SILVA, mímeo)

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(a conciliação) é mais uma das formas de atuação, e, por sinal, uma que requer elevados talentos para a pacificação social através da conciliação ou transação (...) é exatamente a lógica da justiça ideal que conduz a mediação, despertando no lesante a necessidade de recompor o lesado (...) O acordo há de ser prestigiado, pois como regra é um atestado de que as partes se entenderam pela via pacífica, ou seja, compreenderam as facetas do litígio e renunciaram a uma parte de suas pretensões (...) se houve acordo é porque as partes não estão interessadas no que a lei reza a respeito

O importante para o nosso trabalho é que tal situação aponta para a necessidade de desvendar o processo ritual desenvolvido nas audiências preliminares de conciliação, já que esta provável “pressão” por parte dos profissionais se manifesta sobretudo a partir das formas de linguagem utilizadas para convencer a vítima a encerrar o processo, no qual se lança mão de argumentos cujos significados se sustentam muito mais na experiência comum e cotidiana do que nas regras estabelecidas pelo sistema normativo de justiça. Daí também decorre a importância em considerar a presença ou não de advogados representando as partes litigantes nas audiências. Esta variável nos permitiu constatar que em 56,2% dos casos ambas as partes litigantes estavam desacompanhadas deste profissional e a interação neste caso foi diretamente com o magistrado.

Além disso, constatamos também que mesmo quando os advogados estão presentes nas audiências há pouca participação por parte dos mesmos, parecendo haver um certo “compromisso implícito” entre eles e o juiz no sentido de não obstruir a agilização do processo que, neste caso, significa encerra-lo o mais rápido possível. Por outro lado, é importante ressaltar que quando este compromisso implícito não é compartilhado por um dos representantes legais, altera-se completamente a forma ritualística com que as audiências se desenvolvem. Ou seja, neste último caso aqueles argumentos que normalmente são utilizados pelos juízes para convencer as partes a encerrar o processo esbarram justamente na resistência dos advogados em aceitá-los, caracterizando, assim, uma situação de conflito profissional tanto entre juízes e advogados quanto entre os próprios advogados. Assim, a ausência deste profissional de fato acaba facilitando a conciliação e o conseqüente encerramento do processo, pois a interação neste caso ocorre diretamente entre as partes litigantes e o magistrado, facilitando com isso o trabalho deste último em alcançar um acordo e encerrar o processo.

Neste sentido, parece-nos que a principal questão a ser enfocada nos Juizados Especiais Criminais, no intuito de compreender a lógica de funcionamento deste sistema, esteja menos nas desvantagens oriundas da não representação de advogados e mais no tipo de tratamento oferecido aos litigantes por parte dos magistrados, já que estes normalmente têm o controle da situação mesmo quando os advogados se fazem presentes. Daí a importância em conhecer também o perfil sócio-econômico das partes litigantes, já que se pressupõe que tal perfil pode influenciar tanto na caracterização do conflito quanto no próprio tratamento oferecido pelos juízes.

Ou seja, embora o esforço freqüentemente seja no sentido de encerrar rápido com vistas a evitar a instauração formal do processo, o tipo de litígio associado ao perfil sócio-econômico das partes pode determinar o tipo de argumento oferecido pelos profissionais para tal objetivo, bem como a própria manifestação das partes, o que também se constitui

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em elementos importantes para compreender o processo ritual. Enfim, a estrutura social dos casos deve ser considerada na compreensão de como eles são de fato tratados.

Com relação ao gênero das partes litigantes notou-se que as vítimas preferenciais de agressão considerada de “menor potencial ofensivo” são do sexo feminino, constituindo 67,0% do total de processos. Estes indicadores complementam os dados relativos à relação/parentesco entre as partes, na qual o delito de maior percentual é aquele que envolve relações conjugais, caracterizando a violência doméstica de homens contra suas esposas ou companheiras como a principal demanda que chega à justiça informal criminal. E, segundo pudemos apurar no trabalho de observação das audiências, mesmo nos delitos que não envolvem relações conjugais as mulheres ainda assim se constituem em vítimas preferenciais, como, por exemplo, no caso de conflitos entre vizinhos, irmãos ou outro tipo de parentesco.

A variável idade revelou que a grande maioria das partes está na faixa etária que vai dos 18 aos 45 anos, representando 85,5 % das vítimas e 91,6% dos acusados. Também pôde se constatar que, dentro desta faixa, aqueles que têm entre 26 e 35 anos representam o maior índice. A principal constatação, portanto, é que a maioria de agressores e de vítimas não se constituem, em termos percentuais, em jovens, adolescentes ou pessoas mais idosas.

Com relação ao estado civil, a maioria dos litigantes se declarou casado ou amasiado, representando 40,0% das vítimas e 51,5% dos acusados. Se considerarmos que dentre o grupo daqueles que se declararam separados e o grupo dos que não declararam o estado civil também é possível que tenham relações conjugais este índice pode ser ainda maior. Nota-se, portanto, que para os conflitos de natureza interpessoal e intersubjetiva o fato de ter um companheiro ou companheira não significa ser menos agressivo. Ao contrário, são nas relações conjugais onde este tipo de delito ocorre com maior freqüência.

No que se refere à variável cor a principal constatação foi que a grande maioria das partes litigantes são pessoas de cor branca, sendo 71,5% de vítimas e 81,5% de acusados. Assim, pudemos concluir que são de cor branca a maioria daqueles que buscam na justiça informal criminal a punição para seus agressores, sendo estes também, em sua maioria, da mesma cor. Tais indicadores sugerem, portanto, que a população negra ou “não branca” – tanto vítimas como agressores – ou se envolve menos em conflitos desta natureza ou preferem não recorrer a este tipo de justiça para solução de seus conflitos interpessoais.

Finalmente, as variáveis relativas ao nível ocupacional das partes litigantes demonstram que três níveis integram a grande maioria das pessoas, quais sejam, ocupações manuais especializadas ou não, desempregados e não declarado, e aposentados e donas de casa. Somados, estes três segmentos representam 75,4% das vítimas e 76,1% dos acusados. Assim, a primeira constatação importante é que vítimas e acusados ou estão desempregadas ou possuem ocupações semelhantes de nível operacional, constituídos em sua maioria de ocupações manuais, além de donas de casa e aposentados. Em termos gerais, portanto, tanto acusados como vítimas ou fazem parte do mesmo universo profissional ou não possuem grandes distâncias em termos de status ocupacional. Assim, estes indicadores nos revelaram que o Juizado Especial Criminal da Comarca estudada, pelo menos até o presente, atuou mais na solução de conflitos entre indivíduos oriundos dos mesmos segmentos sociais do que entre indivíduos sócio-economicamente desiguais.

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A outra constatação importante, além do alto índice de desemprego observado, é com relação ao número de litigantes que se identificou como donas de casa, o que representou 21,5% das vítimas e apenas 6,1% dos acusados. Tais indicadores confirmam as hipóteses levantadas nas outras variáveis com relação à violência doméstica, onde esse segmento se destaca como constituindo as vítimas preferenciais deste tipo de agressão.

4.2 - Análise das audiências preliminares a partir do trabalho de observação

O trabalho de observação das audiências preliminares de conciliação permitiu estudar as diferentes formas de representação da violência e da punição nesta instância de justiça. Um dos principais aspectos a serem ressaltados nesta análise diz respeito justamente ao desfecho final, no qual a grande maioria dos litígios são encerrados e arquivados com a conciliação entre as partes. Assim, classificamos e analisamos as referidas audiências a partir de dois enfoques, quais sejam, a interação profissional entre os diferentes operadores do direito, e a conciliação e o arquivamento dos processos sem punição como os principais aspectos do ritual. O conceito de ritual aqui é entendido como processo, ou seja, de acordo com Victor Turner (1978) cuja concepção implica numa visão do fenômeno social como processo de mudança de um estado social para outro, dando sentido aos fatos cotidianos da vida social. Tal mudança no âmbito da justiça informal criminal operaria em termos da passagem de uma situação de conflito para uma situação de conciliação, o que permite a superação do conflito original.

Como já reiteramos em outras partes deste texto, o exemplo mais ilustrativo das audiências preliminares de conciliação que acompanhamos é aquele que se refere à violência doméstica e envolve principalmente agressão entre casais, não apenas por ser o mais freqüente mas também por oferecer os principais elementos para compreender a lógica da conciliação e a ameaça implícita do poder de punir por parte do magistrado. O mais interessante do ponto de vista sociológico era que quase sempre o juiz conseguia alcançar o objetivo de conciliar as partes e encerrar o processo, fundamentado no fato de que normalmente as esposas ou companheiras não pretendiam se separar dos maridos ou companheiros nem mesmo desejavam que eles recebessem uma pena mais severa, mas buscavam apenas uma forma de advertência verbal por parte do magistrado ao seu agressor, caracterizando, assim, um tipo “subjetivo” de punição. Vejamos o exemplo de uma audiência na qual fica explícita tal constatação:

Natureza do crime: Lesão corporal dolosa Resultado Final: Processo encerrado e arquivado com conciliação entre as partes Resumo da audiência: As partes eram amasiadas e tinham um filho de aproximadamente dois anos que também estava presente na audiência. O juiz iniciou perguntando à vítima o que aconteceu e ela disse que pelo simples fato de ter convidado o marido para ir à igreja ele a agrediu, dizendo que preferia ir ao bar com os amigos. Questionado pelo juiz o acusado disse que a mulher também tem seu lado agressivo e também já teria lhe agredido com uma faca. Ao ser olhada com espanto pelo juiz ela respondeu que só fez isso para se defender, e o marido pediu a palavra novamente para dizer que a esposa freqüentemente jogava sua refeição no lixo só para ele não comer; e ela respondeu dizendo que fazia isso por que ele estava no bar, onde costumava aceitar conselhos de amigos que diziam que “mulher é na porrada”. O juiz interveio na discussão perguntando à vítima se ela pretendia continuar casada com o acusado. Ela respondeu que gostaria de tentar novamente mas tinha

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medo já que ele a ameaçou dizendo que faria pior da próxima vez. O juiz disse a ela para não ter medo pois o acusado estava se comprometendo diante da justiça, e portanto se ele a agredisse novamente as conseqüências seriam muito piores. Ela disse ainda que, assim como o marido, tinha chegado de outro Estado recentemente e por isso não tinha nenhum parente para lhe ajudar. Neste instante, percebendo que na verdade a vítima não pretendia se separar do marido mas queria apenas que o mesmo fosse advertido, o juiz então o advertiu novamente dizendo que era preciso que ele mudasse seu comportamento. O acusado ainda tentou dizer que não faltava nada em sua casa, e o juiz respondeu dizendo que talvez o que faltava fosse o principal, ou seja, respeito. Com isso, encerrou o processo com a concordância da vítima que resolveu “dar mais uma chance” ao marido, que por sua vez se comprometeu diante do juiz que não mais agrediria sua esposa, mostrando-se bastante constrangido.

Esta audiência é ilustrativa pois representa o que ocorre com a maioria dos casos que envolve violência doméstica e agressão entre casais. Normalmente a esposa não pretende se separar do companheiro nem mesmo deseja que ele receba uma pena mais severa, mas busca apenas uma forma de advertência verbal por parte do magistrado ao marido ou companheiro agressor. Do ponto de vista da lógica de funcionamento da justiça informal criminal, portanto, o importante a ressaltar nestes exemplos é que o ritual estabelecido para o desenvolvimento das audiências passa principalmente pela atuação do magistrado, já que na maioria das audiências as partes se relacionam diretamente com este agente profissional. E mesmo quando há a presença de advogados representando uma ou ambas as partes notou-se que o juiz manteve o poder de conduzir a audiência. Contudo, apesar desta constatação, é necessário precisar melhor o tipo de interação profissional em torno do Juizado bem como caracterizar alguns casos que, contrariando essa dinâmica comum permitem avaliar algumas variantes existentes no que se refere à configuração profissional em termos das rotinas, acordos e conflitos profissionais.

No que refere à interação profissional, portanto, a observação das audiências preliminares de conciliação nos permitiu pensar a justiça informal criminal nos mesmos termos que Sapori (1995) concebe a justiça criminal de maneira geral, caracterizando as varas criminais brasileiras como uma “comunidade de interesses”. Para o autor, o princípio da eficiência no sentido da agilização dos processos é o que move a máquina judiciária na esfera criminal, a qual se sustenta num compromisso implícito entre os diferentes operadores do direito (defensores, promotores e juízes). Do ponto de vista da “comunidade de interesses” a preocupação é manter um certo nível de produtividade que evite um acúmulo indesejável de processos sob sua responsabilidade, não necessitando, como isso, despender de muito tempo na análise do conflito. Vejamos, portanto, o exemplo de uma audiência acompanhada que retrata este “compromisso implícito” entre os operadores do direito na justiça informal criminal:

Natureza do crime: Lesão corporal dolosa Resultado final: Processo encerrado a pedido do promotor público Resumo da audiência: A vítima alegou ter sido agredido pelo acusado, que era seu cunhado, após tê-lo questionado sobre os serviços de pedreiro que o mesmo teria realizado em sua residência. Como sempre, o juiz iniciou a audiência perguntando às partes o que tinha ocorrido. Como as versões eram diferentes, o juiz propôs um acordo para encerrar o processo, o que foi prontamente descartado por ambas as partes e seus advogados. Além

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das partes e seus advogados estavam presentes na audiência a esposa do acusado – que era irmã da vítima – e o filho da vítima que atuou como intérprete de seu pai que não falava português. Enquanto a vítima tentava convencer o juiz da agressão, mostrando uma camisa com marcas de sangue, o acusado dizia ter sido ameaçado pela vítima e pedia permissão para mostrar uma gravação que comprovava sua versão, o que não foi aceito pelo juiz argumentando que aquele espaço ainda não era para mostrar provas mas apenas para tentar uma composição. Diante dos ânimos totalmente alterados e convencido de que não teria sucesso em alcançar o acordo, o juiz resolveu chamar o promotor público que, ao se deter à leitura do processo novamente por alguns instantes, resolveu pedir o arquivamento do mesmo sem dar maiores esclarecimentos às partes e seus representantes legais. Tal decisão causou uma enorme inconformidade na vítima e em sua advogada, que tentaram argumentar com o juiz que por sua vez alegou estar aceitando a decisão do promotor do ponto de vista técnico, ou seja, não havia provas suficientes para prosseguir com o processo, sendo o encerramento a única decisão possível. Ainda assim, advertiu as partes para não mais se falarem e evitar novos conflitos. A vítima, inconformada e com dificuldade de se comunicar, levantou-se e tentou demonstrar ao juiz a forma como teria sido agredido – deitado no chão teria recebido um chute no rosto pelo acusado - mostrando-se não entender a razão pela qual o processo estava sendo encerrado. Tal tentativa, no entanto, não alterou o resultado da audiência, que foi encerrada mesmo com os protestos e inconformidade da vítima e sua advogada.

A principal constatação a partir deste exemplo diz respeito à atuação do promotor público que, ao apontar para a falta de provas para caracterizar a agressão, de alguma forma contribui com a sugestão inicial do juiz que era a de encerrar o processo. Como o juiz não teve sucesso na tentativa de conciliação, pois lhe faltava o principal instrumento que era a concordância da vítima e de sua advogada, recorreu ao promotor que juridicamente é o responsável pela aceitação ou não da denúncia. Assim, juiz e promotor demonstraram, neste caso, a existência de um acordo implícito entre eles no sentido de evitar a instauração formal do processo, respondendo, assim, aos seus compromissos institucionais.

Por outro lado, se este e outros exemplos permitiram constatar a existência desta “comunidade de interesses” na justiça informal criminal, também é fato que o advogado particular pode às vezes, por não compactuar com esta meta organizacional, ter sucesso na tentativa de não permitir o encerramento do processo, uma vez que seu interesse em muitos casos é o retardamento, o que pode representar um foco de conflito com os demais operadores do direito. Foi neste sentido que o próprio Sapori (1996), no intuito de compreender as diferenças na racionalidade entre defensores públicos e privados na justiça criminal brasileira, partiu do argumento de que enquanto a defensoria pública caracteriza-se pelo tratamento categorizado dos casos criminais, os advogados particulares tendem a assumir a defesa em toda a sua especificidade8. Vejamos um exemplo desta situação:

8 Segundo o autor, a racionalidade do defensor particular tende a não privilegiar o despacho célere dos processos, pois a agilidade não é uma meta que norteia a ação deste profissional. Ao contrário, a protelação é com freqüência utilizada como recurso legítimo para alcançar benefícios para o réu. Em suma, os advogados particulares proporcionam um tratamento mais individualizado aos processos que estão defendendo, diferentemente dos defensores públicos cujo compromisso é basicamente rotineiro e impessoal. Além disso, o vínculo monetário existente com o cliente faz com que o advogado particular tenda a assumir mais integralmente o compromisso com os interesses dele, e o congestionamento da justiça criminal acaba favorecendo as estratégias estabelecidas pela defesa constituída.

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Natureza do crime: Outros crimes contra os costumes Resultado final: Processo encaminhado para audiência de Instrução e Julgamento Resumo da audiência: A vítima alegou ter sido perseguida pelo acusado por várias vezes, sendo que da última vez ele teria praticado atos obscenos além de lhe dizer “palavrões”. O juiz começou advertindo severamente o acusado, dizendo que só pelo fato da vítima estar se expondo daquela maneira é porque alguma coisa realmente teria acontecido. O acusado não se manifestou e demonstrava muito nervosismo e constrangimento. Seu advogado, no entanto, disse que toda aquela história era falsa e que ele poderia provar a inocência de seu cliente, alegando que o mesmo sequer conhecia a vítima; que não desejava duvidar da versão da vítima mas que achava que ela poderia estar cometendo um engano, confundindo seu cliente com outra pessoa. A vítima interveio nesse momento e disse não haver nenhuma possibilidade de estar enganada, pois o acusado a teria seguido por várias vezes. O advogado do acusado pediu para o juiz anexar ao processo documentos que comprovavam a boa índole de seu cliente. O juiz, percebendo a complexidade do caso, propôs a pena mínima para encerrar o processo, já que para casos como este é imperativo a aplicação da pena. Mas tal alternativa foi recusada pelo advogado do acusado de forma veemente, que alegava que seu cliente fora prejudicado em sua honra e que por isso desejava provar sua inocência e reverter o processo. O juiz, mesmo demonstrando acreditar na versão da vítima, resolveu então chamar o promotor público que, ao ler novamente os autos do processo, disse que precisava ouvir os funcionários da empresa onde trabalhava o acusado, já que ele alegava estar trabalhando na hora em que o fato teria ocorrido. Assim, deu-se continuidade ao processo encaminhando-o para audiência de Instrução e Julgamento, na qual seriam ouvidas as testemunhas e analisadas as demais provas documentais. Enfim, formalizou-se o processo.

O que mais chamou a atenção nesta audiência foi a eficiência do advogado na defesa de seu cliente, convencendo inclusive o promotor, mas não o juiz, dos seus argumentos. Ou seja, o importante é que neste caso o advogado conseguiu alcançar seu objetivo ao garantir a continuidade do processo, pois acreditava conseguir provar a inocência do acusado, não compartilhando, assim, da “comunidade de interesses” integrada pelo juiz, promotor e defensor público.

Para os nossos propósitos, portanto, o importante a ressaltar é que no sistema dos Juizados Especiais Criminais, embora se trate de “crimes de menor potencial ofensivo”, pôde-se observar tanto este compromisso implícito entre os diferentes profissionais no sentido de encerrar o mais rápido possível, e assim atender aos compromissos institucionais de agilidade e eficiência, quanto a posição de alguns advogados particulares no sentido de não aceitarem passivamente este compromisso. É importante ressaltar, portanto, que quando este compromisso implícito não é compartilhado por um dos representantes legais, altera-se completamente a forma ritualística com que as audiências se desenvolvem. Tal situação ocorre principalmente nos casos como o ilustrado acima onde é imperativo a aplicação de multa ou prestação de serviços à comunidade, ou seja, onde algum tipo de punição mais concreta está prescrito pelo sistema e, portanto, há um maior interesse das partes em se defenderem de suas acusações. Contudo, estes casos são exceção e não correspondem ao que é freqüente nestas audiências. Em outras palavras, apesar desta possibilidade de conflito profissional, o trabalho de observação das audiências permitiu constatar que o “compromisso implícito” entre os profissionais em “encerrar rápido” acaba prevalecendo sobre a lógica da defesa em toda sua plenitude.

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Do ponto de vista do processo ritual, portanto, o importante é que a condução por parte do juiz é sempre no sentido da conciliação entre as partes para encerrar o processo, e com isso passar de uma situação de conflito para uma situação de não-conflito. Para tanto, o magistrado tenta evitar todos os elementos que possam porventura obstruir o andamento “normal” da audiência. Este, portanto, foi um dos focos de nossa pesquisa, ou seja, os argumentos dos juízes e às vezes também dos outros operadores do direito no sentido de que conciliar é “encerrar rápido”. Em outras palavras, os operadores do direito muitas vezes lançam mão de valores que são bem compreendidos pelas partes litigantes pois também fazem parte do universo de suas representações. Enfim, as manifestações dos profissionais e dos litigantes nas audiências preliminares de conciliação revelam as próprias representações da violência, nestes casos consideradas de menor potencial ofensivo, e das formas punitivas, que na maioria dos casos se resumem num simples constrangimento por parte dos agressores e o conseqüente encerramento do processo. É nestas manifestações, portanto, expressadas através das falas e de outras atitudes como o sentimento de constrangimento, que procuramos os principais aspectos do processo ritual das audiências preliminares de conciliação na justiça informal criminal brasileira.

SÍNTESE CONCLUSIVA

A tentativa de compreender que tipo de tratamento recebe as pessoas comuns que buscam no sistema de justiça informal criminal a solução para seus problemas permitiu, desde as primeiras observações, direcionar a ênfase para o processo ritual das audiências preliminares de conciliação, no sentido de entender como se processa a passagem de um estado social caracterizado pelo conflito interpessoal e intersubjetivo para um estado social caracterizado pela conciliação, acordo, consenso e, assim, de superação do próprio conflito original. Esta tentativa só se tornou possível a partir do entendimento também das diferentes formas de representação jurídica e social da violência e da punição desenvolvidas nestas audiências. Em outras palavras, partimos do pressuposto de que a compreensão do processo ritual, que elegemos como forma de compreender sociologicamente o funcionamento deste sistema, passa pela compreensão da representação social destes dois fenômenos de forma integrada, transcendendo, sempre que possível, os limites do fórum já que as diferentes respostas ao problema da violência correspondem aos diferentes compromissos institucionais existentes na vida cotidiana.

Da mesma maneira, as formas punitivas também aparecem como fatores importantes na análise destas representações, pois estão contidas tanto na expectativa das partes litigantes quanto na mente e nos objetivos dos operadores do direito. O mais importante, no entanto, e esta foi uma de nossas hipóteses, é que em determinadas situações o tipo de representação por parte dos operadores estaria menos relacionada com as regras estabelecidas pela instituição de justiça e mais vinculada a outros compromissos institucionais aos quais estariam os mesmos submetidos como, por exemplo, relação familiar, filiação religiosa, ideologia política etc. A idéia é que em litígios criminais é possível que o imaginário social sobre violência, punição e os fenômenos associados a eles podem influenciar a atuação profissional dos agentes mesmo considerando que os mesmos estão submetidos a uma lógica de conduta previamente estabelecida pelo sistema.

Soma-se a isto o fato de que, na justiça informal a lógica do convencimento - estratégia utilizada pelos agentes para a busca da conciliação - torna o espaço do fórum

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ainda mais propício para a manifestação de valores e estereótipos de todos os tipos. Isto porque, em contraste com a justiça formal na qual o ritual e os procedimentos seriam “melhor definidos” em termos de categorias pré-estabelecidas para cada caso tratado, na justiça informal tais procedimentos são mais “soltos” e permitem, com isso, uma maior participação de todos os envolvidos no processo. Esta lógica do acordo, no entanto, não elimina a expectativa de punição uma vez que a tentativa de conciliação normalmente se sustenta numa ameaça implícita do poder de punir por parte do magistrado. Apenas sugere que a punição deve ser entendida de acordo com o ambiente ao qual está sendo referida. Por isso é preciso contextualizar tanto as formas de violência, que no Juizado aparecem como crimes de menor potencial ofensivo, quanto as formas de punição, cujas penas não podem ultrapassar o limite de um ano de detenção, mas que na maioria dos casos são resolvidos com um simples pedido de desculpas e o conseqüente encerramento e arquivamento do processo.

Em outras palavras, para a maioria dos litigantes da justiça informal criminal a idéia de punição parece ter um outro significado. Por exemplo, a expectativa das vítimas de que a punição seja aplicada aos seus agressores em muitos casos se resume num simples constrangimento por parte destes últimos diante da autoridade judicial. Esta situação é muito comum em casos de agressões entre membros da mesma família e, dentre estes, destaca-se principalmente aqueles que envolvem agressão entre casais, cuja situação pode ser representada pela seguinte equação: o marido agressor se sente constrangido diante do juiz ao mesmo tempo que a esposa abre mão de uma punição mais severa e acaba concordando com o encerramento do processo. O importante nisto tudo é que tanto o constrangimento do agressor quanto a decisão da vítima em aceitar o encerramento do processo se fundamenta menos na expectativa da aplicação de pena normativa e mais em outras experiências cotidianas vivenciadas fora do sistema de justiça.

Em síntese, os resultados apontaram para as seguintes e principais constatações: (a) em praticamente todas as audiências observadas os juízes conseguiram encerrar o processo, convencendo as vítimas de que não valia a pena continuar com o mesmo. Esta, certamente, é uma das principais diferenças em relação à justiça comum, onde juízes e advogados priorizam, na maioria dos casos, a aplicação da punição prevista em lei para réus infratores. No Juizado, ao contrário, como o próprio juiz manifesta, “o objetivo é encerrar rápido”; (b) a maioria das audiências são relativas à violência doméstica, em sua maioria na forma de agressão de maridos contra suas esposas. Percebeu-se também que em quase todos os casos o casal apresentou-se com dificuldades econômicas e sociais, o que pode apontar também para a questão sócio-econômica como um dos fatores determinantes da agressão; (c) em várias audiências passou-se a impressão de que o mais importante para a vítima era fazer com que o réu se sentisse envergonhado diante da autoridade judicial, ou seja, o simples constrangimento do réu diante do juiz já representaria, em muitos casos, uma forma de punição pela agressão física ou psicológica sofrida.

Outra constatação importante é com relação à atuação dos magistrados, principais agentes nesta instância de justiça que busca a conciliação para evitar a instauração formal do processo. Para alcançar tal objetivo é muito comum nas audiências preliminares de conciliação os juízes se utilizarem dos mesmos valores que as partes litigantes manifestam para convencer as vítimas a desistirem do litígio, valores estes que, num cento sentido,

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se contrapõem às bases normativas do direito na medida que estas últimas prevêem penas melhor definidas para crimes e outras infrações.

Concluímos, finalmente, que é dentro desta dicotomia que deve se pensar o desenvolvimento do processo contemporâneo de informalização da justiça, ou seja, partindo das contradições existentes entre o direito formal e os valores apreendidos a partir de outras instituições mas que acabam se manifestando dentro do sistema de justiça. Os resultados alcançados a partir da análise do processo ritual das audiências preliminares de conciliação permitiram confirmar esta necessidade, no sentido de identificar o que é freqüente e simbólico nestas audiências e o que, de alguma forma, representa a possibilidade de quebra desta lógica. Ou seja, um contexto caracterizado pela tensão existente entre as duas pautas distintas da justiça contemporânea, qual seja, a justiça formal (de decisão) e a justiça informal (de mediação).

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