O Nascer da Nova Aurora

13
Círculo do Graal http://www.library.com.br/artigosdiversos/index2.htm Página 1 O nascer da nova AuroraContos & Crónicas De Aurora Serena

description

Coletânea de artigos de âmbito humanista e civilizacional

Transcript of O Nascer da Nova Aurora

Page 1: O Nascer da Nova Aurora

Círculo do Graal

http://www.library.com.br/artigosdiversos/index2.htm Página 1

O nascer da nova Aurora…

Contos & Crónicas

De

Aurora Serena

Page 2: O Nascer da Nova Aurora

Círculo do Graal

http://www.library.com.br/artigosdiversos/index2.htm Página 2

ÍNDICE

I - De que vale ser ético

II – O que realmente tem valor leva tempo

III – O tamanho de Deus

IV – Tempo que foge

Epílogo

Page 3: O Nascer da Nova Aurora

Círculo do Graal

http://www.library.com.br/artigosdiversos/index2.htm Página 3

I

DE QUE VALE SER ÉTICO?

A cada dia, novos escândalos e revelações trazem à tona a podridão ética que parece

assolar todas as instituições humanas contemporâneas. Por onde quer que se observe,

seja em ambientes profissionais ou sociais, seja atravessando a rua ou aguardando na

fila da padaria, avolumam-se os exemplos de ausência de valores básicos de

civilidade e respeito ao próximo. Até mesmo as leis, cujo descumprimento está

atrelado a sanções bem definidas, são fragorosamente infringidas em plena luz do dia,

sob o olhar indiferente dos cidadãos comuns e daqueles que as deveriam fiscalizar.

Chegamos a um ponto em que aqueles que agem eticamente são vistos com

estranheza, admiração, surpresa, e não raro como ingênuos ou “otários”. De toda

forma, como exceções perante a massa, que trafega pela vida como em meio ao

estouro de uma boiada, “muito ocupada” para atentar ao pé mais próximo...

Nesse quadro, muitas pessoas experimentam sentimentos que vão da indignação à

raiva, passando pela impotência e alcançando por vezes a total desesperança... Diante

de toda a acintosa falta de respeito, com tantos obtendo vantagens por caminhos

escusos, dando um “jeitinho” para se esforçar menos e receber mais, preocupando-se

em beneficiar a si próprios em detrimento dos demais, frequentemente surge a

Page 4: O Nascer da Nova Aurora

Círculo do Graal

http://www.library.com.br/artigosdiversos/index2.htm Página 4

pergunta, em tom de desabafo: “Afinal, de que vale ser ético?” Ou ainda: “De que

vale fazer o correto, quando todos obtêm vantagens fazendo o errado?”; “Serei eu o

único certo?”; “Por que me importar com os outros, se a maioria não parece se

importar comigo?”; dentre outras reflexões de semelhante teor.

E, afinal, de que vale ser ético?

Para alguns filósofos, a ética se baseia na questão: “Como devo agir?”, que conduz ao

estabelecimento de princípios ou valores como norte da conduta humana. A noção do

“agir correto” parece ser uma necessidade tanto individual quanto social, uma vez

que é remetida a um ideal de ser humano, bem como a um ideal de sociedade. Em

outras palavras, a consciência ética aponta para o ser humano que quero ser, assim

como para a sociedade em que desejo viver.

Por mais tímida que seja, todos possuem uma “imagem ideal” de si mesmos. Quando

se apercebem de que suas ações contrariaram, de alguma forma, esse ideal, as pessoas

vivenciam culpa ou vergonha. Na visão da psicologia, um indivíduo que atingiu um

elevado grau de consciência ética, chamado de autonomia moral, age corretamente

não pelo receio de ser punido ou buscando ser recompensado, tampouco para ser bem

visto socialmente ou por mero compromisso com os padrões de determinado grupo.

Seu agir baseia-se em princípios que intimamente aceitou como verdadeiros e

válidos, independentemente de circunstâncias externas. No mais alto grau, essa

consciência pode conduzir o ser humano a sacrificar a própria vida para defender seus

valores.

Assim, a conduta ética genuína é pautada, em primeiro lugar, por um compromisso

do ser humano consigo próprio. Por acreditar em seu próprio potencial de se

aproximar, passo a passo, da pessoal ideal que gostaria de se tornar. Pela vontade de

se olhar no espelho e sentir que está sendo fiel ao seu próprio “eu” – o que alguns

chamaram de “integridade”. Quanto vale esse tipo de satisfação?

Mesmo que envolvida pelo caos, uma pessoa em paz consigo mesma irradia uma

onda apaziguadora, que suavemente alcança os que a rodeiam. Com gestos simples e

silenciosos, é como se aplicasse um bálsamo sobre a inquietação interior que aflige a

tantos atualmente. Um olhar tranquilo e compreensivo, uma atitude gentil, perpassada

por alegria serena – manifestações que têm o poder de iluminar o dia, a semana, a

vida de alguém... Uma atitude firme, quiçá enérgica, cheia de dignidade e da ânsia de

restabelecer a justiça – manifestações que revelam comprometimento com o próximo

e com a sociedade ideal que se deseja construir... Diferentes nuances que, como

pontos de luz em meio à massa que se agita inconscientemente, podem inspirar outras

pessoas a recuperarem a crença de que vale a pena ser ético, formando uma corrente

bem-aventurada...

E eis que, quando menos se espera, o ambiente ao redor parece ter se tornado mais

ameno, mais sorrisos e gentilezas se revelam, auxílios inusitados aparecem, pessoas

simples de nobre caráter surgem aqui e ali, e vejo-me caminhando pela rua em uma

manhã ensolarada, pensando: “E não é que vale a pena ser ética...?”

Aurora Serena

Page 5: O Nascer da Nova Aurora

Círculo do Graal

http://www.library.com.br/artigosdiversos/index2.htm Página 5

II

O QUE REALMENTE TEM VALOR LEVA TEMPO...

“Tudo o que realmente tem valor na vida leva tempo para ser construído” – ensinava

o experiente profissional, de cabelos grisalhos e olhar longínquo, aos jovens

formandos. Ao final de uma longa exposição sobre assuntos profissionais, o

palestrante destacava que valores como os relacionamentos, o casamento, o

patrimônio, a saúde, entre outros, são edificados aos poucos, e não devem ser

colocados em risco irrefletidamente. Expressava, assim, a essência do aprendizado de

uma vida, na forma de conselho para a plateia composta predominantemente por

jovens, prestes a iniciarem sua vida profissional.

Embora não fizesse parte desse grupo, também eu ouvira aquelas palavras. Pus-me a

pensar na profundidade daquela mensagem, que lançava luz sobre um processo que,

nos dias de hoje, frequentemente permanece invisível. Lembrei-me do livro “O

Pequeno Príncipe”, de Saint-Exupéry, particularmente da passagem em que o

principezinho dialoga com sua amiga raposa, depois de descobrir, decepcionado, que

havia milhares de flores iguais à sua rosa de estimação, a qual julgava ser única no

mundo. Mas eis que, após algumas vivências, ele percebe que sua rosa era realmente

diferente das demais, e vai rever as rosas no jardim, dizendo-lhes:

Page 6: O Nascer da Nova Aurora

Círculo do Graal

http://www.library.com.br/artigosdiversos/index2.htm Página 6

- Vós não sois absolutamente iguais à minha rosa, vós não sois nada ainda. Ninguém

ainda vos cativou, nem cativastes a ninguém. Sois como era a minha raposa. Era

uma raposa igual a cem mil outras. Mas eu fiz dela um amigo. Ela é agora única no

mundo.

E prossegue:

- Sois belas, mas vazias, disse ele ainda. Não se pode morrer por vós. Minha rosa,

sem dúvida um transeunte qualquer pensaria que se parece convosco. Ela sozinha é,

porém, mais importante que vós todas, pois foi a ela que eu reguei. Foi a ela que pus

sob a redoma. Foi a ela que abriguei com o pára-vento. Foi dela que eu matei as

larvas (exceto duas ou três por causa das borboletas). Foi a ela que eu escutei

queixar-se ou gabar-se, ou mesmo calar-se algumas vezes. É a minha rosa.1

O relacionamento do pequeno príncipe com sua rosa fez-me lembrar de uma visita

que fiz a uma plantação de rosas, juntamente com um grupo, em uma bela cidade do

interior de São Paulo. Não havia quem não se impressionasse com a majestade

daquela visão: um campo de rosas! Todas as pessoas voltavam maravilhadas do

passeio. Da mesma forma, outras situações em nosso cotidiano, quando observadas,

despertam a admiração de muitos: um relacionamento em que reinam a harmonia e a

cumplicidade, a maestria em uma profissão, o profundo conhecimento em

determinada área, um trabalho realizado com excelência...

Entretanto, ao mesmo tempo em que despertam admiração, tais manifestações por

vezes suscitam também certa inveja: julga-se como se algumas pessoas, sem esforço,

tivessem sido “presenteadas” pela vida excepcionalmente, como se as rosas tivessem

brotado espontaneamente naquele campo!

Não se enxerga o árduo trabalho do agricultor, que, ainda que tenha sido agraciado

com um especial dom para sua tarefa, teve que empregá-lo diligentemente: retirando

as pedras e ervas- daninhas do solo, arando e adubando a terra, lançando as sementes

e protegendo-as dos excessos de sol e chuva, repelindo as pragas, monitorando as

mudas dia a dia, até que se tornassem plantas robustas e florescessem. E, após o

espetáculo da florescência, deve começar tudo outra vez... Quanta dedicação, quanta

renúncia e esperança escondem-se por trás de um campo florido!

Tenho a impressão de que tal processo lógico, subjacente a muitas realizações

humanas, tem sido frequentemente esquecido. Muitas pessoas se queixam de não

terem flores em suas vidas, mas sequer pensam em preparar a terra para semeá-las!

Talvez as facilidades da vida atual tenham contribuído para esse “esquecimento”.

Novamente, relembro um conselho dado ao Pequeno Príncipe: “A gente só conhece

bem as coisas que cativou, disse a raposa. Os homens não têm mais tempo de

conhecer coisa alguma. Compram tudo prontinho nas lojas. Mas como não existem

lojas de amigos, os homens não têm mais amigos.”2

Compramos tantos produtos enlatados nas lojas, que desaprendemos a plantá-los.

Desacostumamo-nos a esse tipo de investimento. Parece que, atualmente, tudo o que

1 SAINT-EXUPÉRY, Antoine de. O pequeno príncipe. 28. ed. Rio de Janeiro: Agir, 1985. p.72.

2 Obra citada, p. 70

Page 7: O Nascer da Nova Aurora

Círculo do Graal

http://www.library.com.br/artigosdiversos/index2.htm Página 7

leva tempo, é perda de tempo. Preferimos o prazer fácil e rápido, em todas as áreas da

existência. Vivemos em um mundo de flores de plástico, produzidas aos milhões, em

série, e rapidamente descartadas, depois de cessada a satisfação momentânea que

suscitam.

Porém, apesar de todo o avanço científico-tecnológico e da liberalização dos

costumes, as leis da vida não se modificaram. As rosas continuam germinando e

florescendo da mesma forma, assim como os relacionamentos, as capacidades, as

realizações que têm efetiva consistência... Como ensinou o palestrante citado no

início deste texto, as coisas que “realmente têm valor na vida” continuam levando

tempo para ser construídas. Mesmo que muitos olhares superficiais e imediatistas,

habituados a consumir plástico reluzente, não reconheçam esse valor...

Felizmente, cada vez mais pessoas começam a despertar para o fato de que todo o

“plástico” disseminado em nossa sociedade não nutre nem o corpo, nem a alma.

Lentamente ressurge o anseio, às vezes inconsciente, por verdadeiras flores. É preciso

resgatar o valor das coisas, é preciso reaprender a plantar! Precisamos reaprender a

cultivar e esperar, vigiar e proteger, em harmonia com as Leis da Criação, como

faziam com tanta naturalidade nossos antepassados.

Que cada um possa reconhecer o valor das rosas (ou brotos de rosas) que possui e

decidir o que ainda deseja plantar, como valente agricultor, para colher no futuro!

Aurora Serena

Page 8: O Nascer da Nova Aurora

Círculo do Graal

http://www.library.com.br/artigosdiversos/index2.htm Página 8

III

O TAMANHO DE DEUS

Quando criança, às vezes era levada à missa por meus pais ou avós e ouvia frases do

tipo: “Ele está no meio de nós!”; “O nosso coração está em Deus!”; dentre tantas

outras que integram a liturgia católica. Com o tempo, fui crescendo e passei a ouvir

outras frases, tais como: “Deus está dentro de cada um”; “Deus é uma Força

Superior”; “Deus está em todos os lugares”; “Deus é uma energia”... Hoje mesmo

recebi a mensagem eletrônica de um amigo, que destacava descobertas da física

quântica e concluía que “Deus é puro amor, é uma energia...”, e que também somos

feitos de energia, já que “somos a imagem e semelhança de Deus”.

No início, Deus era um ente abstrato, Pai de um homem que eu via pregado em uma

imensa cruz no centro do altar, sem compreender como Ele poderia ter enviado seu

próprio Filho àquele sacrifício horrível... Um Ser Superior que, diga-se de passagem,

não se conhecia muito bem, com desígnios misteriosos, para o qual, por via das

dúvidas, era melhor orar constantemente – talvez até fazer algumas promessas. O

“plano básico”, tipo classe econômica, para ir para o Céu implicava comparecer todos

os domingos à missa; já para conseguir um lugar na primeira classe era necessário

participar de muitas novenas e atividades voluntárias na Igreja...

Page 9: O Nascer da Nova Aurora

Círculo do Graal

http://www.library.com.br/artigosdiversos/index2.htm Página 9

Mais tarde, observei como para muitas pessoas Deus não era a autoridade misteriosa

da minha infância, e sim um ser diluído, quase uma substância, que se difundia como

o ar, confundindo-se com outros seres. Sem inspirar medo ou culpa, consistia em uma

entidade impessoal, às vezes o Bem Universal que perpassava tudo e todos, a cujo

fluxo os seres humanos deveriam se ajustar para viver em paz. Tal concepção não

raro caminhava para a ideia de um amor irrestrito e indolente, que permitiria e

suportaria tudo, sem qualquer tipo de parâmetro ou limite.

Na infinidade de opções religiosas e filosóficas da atualidade, concepções

semelhantes continuam sendo sustentadas, embora também sob títulos e cores

diferentes. Sem falar nas correntes que consideram Deus como mero produto de

fantasia, fruto da carência humana de buscar ordem e coerência para sua existência,

que na verdade não possuiria sentido algum – além daquele criado pelos próprios

homens a cada época...

Entretanto, diante da confusão que cada vez mais se dissemina na época presente, do

caos e mesmo do desespero que tantos vivenciam, nos planos individual e coletivo,

muitas pessoas sentem reavivar dentro de si o anseio pela Divindade... Lentamente ou

então de forma abrupta, surge o grito interior por uma nova vida, mais plena de amor

e sentido, de justiça e esperança. Nesse momento, o querer profundo do ser humano

não é pela autoridade arbitrária para a qual rendem sacrifícios tantos fiéis, nem pela

energia indefinida que se dissipa como fumaça, mas por uma imagem que não se

pode definir, uma Luz que nos acolhe e encaminha para o verdadeiro Lar... Lá dentro,

no fundo da alma, temos então a certeza de que há uma Realidade Maior, que nossos

olhos carnais não podem ver, mas à qual gostaríamos tanto de pertencer...

Manter viva essa sabedoria, despertada do fundo de nossa alma em meio ao caos pós-

moderno, é um passo decisivo para a “virada” na existência humana. Acreditar nessa

certeza íntima, a despeito de tantas tribulações e argumentos que tentam nos desviar

de nós mesmos no dia a dia, e buscar caminhar com o coração conectado a esse

anseio – uma vontade urgente de reencontrar a estrada que conduz aos braços do Pai

– impulsiona cada um a buscar um novo conceito de Deus. Um conceito que não se

restrinja ao tamanho da mente humana – que parece mais limitada a cada dia, apesar

da frenética escalada material – e às cansativas ponderações do raciocínio. Que

possua a imensidão de um Manancial Inesgotável, onde nossas almas, há tanto

sedentas, possam sorver da fonte da Verdadeira Vida...

Aurora Serena

Page 10: O Nascer da Nova Aurora

Círculo do Graal

http://www.library.com.br/artigosdiversos/index2.htm Página 10

IV

TEMPO QUE FOGE

Esta vida é uma estranha hospedaria,

De onde se parte quase sempre às tontas,

Pois nunca as nossas malas estão prontas,

E a nossa conta nunca está em dia.

(Mario Quintana)

Chegou o dia da tão esperada promoção. Finalmente, ele ocuparia o cargo com que

tanto sonhara. Os telefonemas dos amigos, o orgulho de “ter chegado lá”, após tantos

sacrifícios... O troféu a exibir para a família, que tantas vezes fora deixada em último

plano por conta de sua intensa vida profissional... É bem verdade que muitos

comemoravam sua ascensão na carreira às avessas: alegravam-se porque não

precisariam mais compartilhar seu dia a dia com essa personagem. Prepotente, diriam

alguns. “Alguém com um ego imenso”, qualificariam outros. De fato, não era dado a

ouvir opiniões divergentes das suas. Tão convencido estava de suas elevadas

qualidades, que esperava que os demais o seguissem e admirassem. Impiedoso nas

humilhações aos que o desagradassem, esmerava-se em cultivar uma imagem de

Page 11: O Nascer da Nova Aurora

Círculo do Graal

http://www.library.com.br/artigosdiversos/index2.htm Página 11

excelente profissional perante seus chefes. Envaidecia-se de sua grande resistência

física e mental, dedicando-se inteiramente ao trabalho, e exigia que seus

subordinados o imitassem. Não tolerava os simplesmente diferentes de seu ideal de

vida. Afinal, ele era forte, vitorioso e merecia reconhecimento. E, agora, as escolhas

que fizera pareciam ser pública e inequivocamente recompensadas: ele chegara a uma

situação de elevado status profissional, invejada por muitos. Quase não cabia em si

de tanta vaidade e euforia. Uma semana após receber essa festejada notícia,

sobreveio-lhe o resultado de um diagnóstico médico. Câncer. Seu auge profissional

foi subitamente interrompido.

***********

Desde criança, ela fora a melhor aluna da classe. Gostava de aprender. Tinha

facilidade em assimilar novos conhecimentos e dedicava-se com disciplina às

atividades escolares. Na adolescência, passava as tardes de sábado a resolver os

problemas-desafios de Física, vivenciando a satisfação de encontrar as respostas

certas. Colegas e professores consideravam-na “genial”. Com o passar dos anos,

acostumara-se a exigir de si própria um elevado nível em seus trabalhos, também

motivada pelo desejo do reconhecimento alheio. Ser “uma boa aluna”,“uma estudante

brilhante” ou alguém que fazia “um excepcional trabalho" eram conceitos que faziam

parte de sua autoimagem, com a qual buscava ser coerente. Em primeiro lugar,

sempre vinham tais obrigações. Relacionamentos, prazeres, sentimentos, intuições...

tinham pouco espaço na agenda. Certo dia, entre um relatório e outro, atribulada para

cumprir o prazo e apresentar um trabalho próximo da perfeição, ouviu uma pessoa

gritando. Sua cachorrinha havia sido atropelada. O que antes era prioridade, perdeu

totalmente o sentido. Naquele momento, pensou que deixaria de entregar todos os

trabalhos, de cumprir todos os prazos e obrigações, de atender a todas as

expectativas, se pudesse voltar no tempo e trazer aquele frágil animalzinho de volta...

***********

Ele se parecia com um deus grego, na opinião da plateia feminina. Belo,

saudável, inteligente, arrancava suspiros por onde passasse, o que lhe permitia se

relacionar com as mulheres que desejasse. Cultivava erudição pela leitura de

clássicos da filosofia e da literatura, e adotava uma alimentação rigorosamente

saudável. Aliás, esmerava-se em cuidar de si próprio, muito mais do que daqueles

que o cercavam. De porte atlético, praticava diversos esportes radicais na Natureza,

destacando-se pela audácia e destreza. Para ele não havia perigo. Acreditava possuir

habilidade e inteligência suficientes para enfrentar qualquer adversidade. Em sua

obstinação, mergulhou literalmente fundo demais, faltando-lhe o ar vital. De posse da

plena força da juventude, pôs fim à sua existência terrena.

***********

Histórias de cortes, interrupções no curso da existência. Pessoas que

acreditavam ter as rédeas de suas vidas nas mãos, surpreendidas por “golpes do

destino”. Julgavam ter poder para controlar o tempo, com suas tão estimadas

Page 12: O Nascer da Nova Aurora

Círculo do Graal

http://www.library.com.br/artigosdiversos/index2.htm Página 12

capacidades, e eis que este lhes escapou... Surgiram desfechos que a Senhora Razão

não conseguira prever. O que se pode concluir disso?

Abdruschin, em sua obra “Na Luz da Verdade”, ensina:

“Lamentável é ver como o ser humano terreno se empenha diligentemente

para seu retrocesso e, com isso, para sua queda, na crença errônea de que com isso

caminha para cima.” (Na Luz da Verdade, Vol. 3, p. 359).

O que buscavam essas três personagens em sua existência? Que valores

norteavam seus esforços? Haveria, essencialmente, algum ideal maior, além da

autoglorificação? Obter poder, testar capacidades, superar limites, alcançar

reconhecimento social... Não seria tudo isso fundamentalmente um exercício de

vaidade?

“Não existe palavra que possa designar acertadamente tal presunçosa

arrogância em sua ilimitada ignorância. Aprofundai-vos nesse comportamento

inacreditável; imaginai o ser humano terreno, como ele, com ares de importância,

quer se colocar acima da engrenagem da obra maravilhosa desta Criação de Deus,

para ele até agora desconhecida, a fim de dirigi-la, ao invés de ajustar-se nela

obedientemente, como uma pequena parte dela... então, não sabereis se deveis rir ou

chorar!” (ABDRUSCHIN, Na Luz da Verdade, Vol. 3, p. 359).

Os seres humanos aqui retratados vivenciaram situações-limites, em que

tiveram a oportunidade de reconhecer a legítima verdade: que são ínfimas parcelas da

Criação, extremamente limitadas, as quais não podem estabelecer as leis que irão

reger seu destino. E que há valores infinitamente superiores aos cálculos do

raciocínio, por vezes só reconhecidos em momentos de perda...

O que fizeram essas três personagens, a partir desses fatos? Não se pode dizer

com certeza. Sabe-se, sim, que a cada uma foi proporcionada, mais uma vez, a

escolha: reconhecer os valores essenciais da existência humana, buscando

humildemente integrar-se às Leis da Verdadeira Vida; ou continuar a considerar-se o

próprio centro do Universo, perseguindo objetivos egoísticos, como um cego

arrogante que, apesar das advertências, caminha obstinadamente em direção ao

abismo.

Aurora Serena

Page 13: O Nascer da Nova Aurora

Círculo do Graal

http://www.library.com.br/artigosdiversos/index2.htm Página 13

EPÍLOGO

Aurora Serena nasceu em Terras de Vera Cruz, esse imenso País que dá ao mundo

literário tantos e bons escritores, poetas… que expressando-se na lingua de Camões

lhe dão vida, calor e alegria!

É em ritmo de vida pulsante que as palavras fluem na página branca, criando

personagens e acontecimentos, acompanhados de séquito prenhe de valores,

angústias, alegrias e tristezas, próprio do ser humano, buscador de caminhos que o

conduzam a porto seguro.

Uma personalidade feminina em busca de aprofundamento sobre as questões da

existência humana,

companhia para as almas inquietas na procura pelo saber, que insistem em não se

acomodar ao sono da consciência.

A autora segue um novo caminho de valores, orientada segundo os principios éticos

do comportamento humano e da sã convivência. Escrita simples e fluída, traça ritmos

singulares do quotidiano.

Uma nova aurora… um novo dia…

Ricardo Martins