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O novo “status” da informação e do conhecimento na cultura digital Mirian de Albuquerque Aquino Índice 1 Introdução ........................ 2 2 Informação e conhecimento: um par intercambiàvel . . 4 3 Depurando significados da informação ......... 6 4 O que diz a ciência da informação? ........... 9 5 Depurando o potencial do conhecimento ........ 13 6 Formas de aprender o conhecimento por outras linguagens 19 7 Por onde navega o sujeito do conhecimento? ...... 26 8 Universidade: Que informação? Que conhecimento? . 34 9 Considerações finais ................... 40 10 Referências ....................... 42 Resumo O texto à luz de Otto Peters discute o significado dos termos infor- mação e conhecimento na concepção tradicional e no contexto das tecnologias da informação e comunicação. Busca perspectivas que sinalizam para uma reflexão sobre as expressões sociedade da informação e sociedade do conhecimento. Aborda o papel da universidade na formação do aprendente e, para além das abor- dagens teórico-metodológicas, que aprisionam o conhecimento à transferência através de computadores, as reflexões acenam para o argumento moriniano procurando mostrar a necessidade de edu- cadores iniciarem uma reforma de pensamento que vise ampliar

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O novo “status” da informação e doconhecimento na cultura digital

Mirian de Albuquerque Aquino

Índice

1 Introdução. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22 Informação e conhecimento: um par intercambiàvel. . 43 Depurando significados da informação. . . . . . . . . 64 O que diz a ciência da informação?. . . . . . . . . . . 95 Depurando o potencial do conhecimento. . . . . . . . 136 Formas de aprender o conhecimento por outras linguagens197 Por onde navega o sujeito do conhecimento?. . . . . . 268 Universidade: Que informação? Que conhecimento?. 349 Considerações finais. . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4010 Referências. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42

Resumo

O texto à luz de Otto Peters discute o significado dos termos infor-mação e conhecimento na concepção tradicional e no contexto dastecnologias da informação e comunicação. Busca perspectivasque sinalizam para uma reflexão sobre as expressõessociedadeda informaçãoe sociedade do conhecimento. Aborda o papel dauniversidade na formação doaprendentee, para além das abor-dagens teórico-metodológicas, que aprisionam o conhecimento àtransferência através de computadores, as reflexões acenam parao argumento moriniano procurando mostrar a necessidade de edu-cadores iniciarem uma reforma de pensamento que vise ampliar

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as funções da cognição, para modificar os discursos e as práticasque cercam a ” informação para educação” diante dos desafiosque a atual sociedade propõe aos indivíduos.

Palavras-chave:informação; conhecimento; sociedade da in-formação; sociedade do conhecimento.

1 Introdução

A contemporaneidade tecnológica engendra um contexto que pres-supõe uma profunda compreensão do tecido social com suas mu-tações que envolvem um novo modo de pensar a conexão informa-ção - conhecimento e as implicações para formação de competên-cias nos diferentes campos do saber. No âmago das análises, pesatanto o argumento de que a humanidade está experimentando ummodo de desenvolvimento em que a fonte de produtividade centrana geração, armazenamento, processamento, uso da informação ecomunicação de signos e símbolos1, quanto a certeza de que osdiscursos e as práticas perderam seus antigos referenciais parapresenciar a instauração de novos paradigmas de comunicaçãoque estão visceralmente ligados à reestruturação do capitalismoglobal, aos “sistemas de especialização flexível2” e ao avanço dastecnologias avançadas.

Dessa ótica, é possível visualizar que a dinâmica dos proces-sos socioculturais alterou as formas de vida e a relação do indi-víduo com o mundo da produção, assegurando que a informaçãoe o conhecimento converteram-se em elementos fundamentais degeração da riqueza e poder desde o final da Segunda Guerra Mun-dial. Essa idéia harmonizando-se com argumentos que conside-ram a ciência e suas aplicações tecnológicas como uma das prin-cipais forças do crescimento contínuo da produtividade duranteos últimos 50 anos3. Nessa consideração, a informação para ge-

1Castells (1999) discute essa questão em seu livro “A sociedade em rede”.2Ver Maclaren (2000)3Ver Castells (1999)

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ração de conhecimento, tornou-se a nova força de produtividade,valor e opulência dos países, das nações e dos indivíduos. Essaconfiguração demanda a inserção do indivíduo numa sociedadeque se potencializa pela velocidade, pela penetrabilidade das tec-nologias da informação e comunicação e pela lógica das redes4,em sua capacidade de produzir conhecimento, fazer ressonânciano cotidiano das pessoas, instituir novas formas de comunicabi-lidade, agilidade, interatividade e promover a sociabilidade dasrelações entre indivíduos.

Os argumentos de Daniel Bell são essenciais para entender-mos a passagem gradual da sociedade industrial à sociedade pós-industrial e a importância do conhecimento teórico e da tecno-logia, os quais foram gerados por um grupo de profissionais al-tamente especializados e capacitados para promover o desenvol-vimento da indústria numa sociedade em que a informatizaçãoalcançou as diversas áreas da vida humana. O avanço e a sofis-ticação das tecnologias da informação e comunicação despertaminteresses de diferentes profissionais pelo conhecimento, por estesperceberem que a relação mente/computador tende ao progressodas ciências, constituindo uma ciência interdisciplinar e colabo-rativa.

Estudos teóricos desenvolvidos por autores que discutem a so-ciedade da informação e a sociedade do conhecimento são unâni-mes em afirmar que a cultura digital modificou os significadosdos termos informação-conhecimento de maneira tal que ambosestão sendo amplamente utilizados, fazendo-se necessário obser-var a importância que passaram a ter não só para satisfazer aosinteresses da economia global e informacional, mas também porservir como capital humano para a formação dos indivíduos. En-tendemos, portanto, que negligenciar tal exigência implica des-considerar a possibilidade de refletir criticamente sobre os efeitosdessa nova ordem, bem como tirar proveito dela de forma produ-tiva, Assim sendo, os pesquisadores devem assumir que qualquer

4Ver Castells (1999)

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estudo sobre essa questão precisa caminhar paralelo à reformula-ção das premissas básicas da análise dos termos e a sua crítica.

A discussão, que se desenrola neste texto, procura elucidaro burburinho em que se situam a informação e o conhecimento,tentando refletir sobre o enquadramento dos termos na atual soci-edade e suas implicações, a fim de captarmos a sua aplicabilidadena formação de competências face aos desafios dos novos tempos.

2 Informação e conhecimento: um parintercambiàvel

As conexões ocultas5 em que se encontram os termos informaçãoe conhecimento, tornaram-se complexas e problemáticas. Emboracada vez mais alguns estudiosos que se filiam a diferentes tendên-cias proponham a junção dos termos. Na literatura especializada,fica claro o arranjo para que se considerem os termos como um parterminológico intercambiável, sem demonstrar o que significamde fato e em que diferem um do outro teoricamente. A distinçãoé importante porque ajuda a desenrolar a questão: se a humani-dade está situadana sociedade da informaçãoou nasociedade doconhecimento, esclarecendo o que levam alguns autores a admitirque estamos na sociedade da informação e do conhecimento.

O ponto de vista de Matelart (2004) é producente quandoajuda a entender que o uso de um termo é um meio que permitefazer referência a um fenômeno atual sem ter de descrevê-lo, masconsidera que o termo escolhido não define em si um conteúdovez que cada termo veicula um passado e um sentido, com a suaprópria bagagem ideológica. Os termos informação e conheci-mento podem ser também objetos de uma controvérsia sobre osentido, vez que confrontam com diferentes projetos da socie-dade.

Essa conexão informação-conhecimento suscita para sua com-preensão uma teoria que possa dar conta da complexidade ine-

5Ver Fritjof Capra (2002)

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rente aos termos, na novacultura imaterial6. Nesse ponto, intro-duzimos a observação de Morin (1991), que recusa a simples co-nexão dos termos por entendê-los como níveis de realidade com-pletamente diferentes e, ao justificar seu posicionamento este au-tor diz que o conhecimento é organizador e supõe uma relaçãode abertura e de fecho entre o cognoscente e o conhecido, en-quanto a informação forma unidades rigorosamente designáveisque se transformam embits. Sua contribuição serve para guiara discussão para um caminho metodológico: “a inseparabilidadedos termos não exclui a necessidade de distinção, [porque] não setrata de fusão, nem de confusão, mas de distinguibilidade [que] éuma operação necessária a todo pensamento” (MORIN, 2000, p.175).

Apesar de reconhecermos o mérito das reflexões morinianasna abordagem dessa questão, é necessário abandoná-las por ummomento a fim de incursionarmos pelas idéias do estudioso ale-mão Otto Peters (2002), que nos instiga a afirmar que inicial-mente precisamos separar os termos para depois juntá-los, vez queo poder inovador do ambiente informatizado de aprendizagem,acrescenta Assmann (2000), produziu uma reorientação lingüís-tica e ajustamento semântico para os termos informação e conhe-cimento,

A análise dessa instabilidade conferida aos termos informaçãoe conhecimento, coloca em evidência a sua importância no atualmodo de desenvolvimento global e informacional. Assim, o nossointuito é explorar essa conexão também no âmbito disciplinar, jáque a tentativa de explicitação dos termos implica quase semprea busca do sentido etimológico, da recuperação da base teórica,da origem e da evolução semântica e das articulações com outroscampos do saber, isto é, a constituição dos termos no contexto dainterdisciplinaridade, transdisciplinaridade, multidisciplinaridadee, quem sabe, da transculturalidade.

6Ver Castells (1999)

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3 Depurando significados da informação

A contribuição teórica de Peters (2002) permite considerar, emprimeiro lugar, o termo informação, cuja origem encontra-se nolatim informatio, que significa concepção, instrução, censura ecorresponde aos verbos informar, educar, conceber algo, explici-tar ou ensinar algo. No grego, equivaleria atypos, idea, morphe7,sendo que, na atualidade, os termos foram destituídos de “suasconotações ontológicas para adquirir um significado predominan-temente epistemológico ou gnosiológico, associado ao conceitode representação”, intervém González de Gómez (2002, p. 25).Essa condução analítica, que o autor se empenha em demonstrar,conduz ao desenvolvimento de estudos recentes sobre o termoinformação, que passou a incluir a relação processo e objeto, eapresenta dois significados, a saber: 1) abordagem tradicional e;2)abordagem da tecnologia da informação e comunicação.

O primeiro significado do termo, que corresponde à aborda-gem tradicional, surgiu pela primeira vez na escolástica medievalcom um duplo sentido: a) ação de dar a forma à matéria e; b)formar ou modelar a mente ou o caráter; treinar, instruir, ensinar,comunicar conhecimento instrutivo. Paralelamente a esses doissignificados ainda encontramos outros que estão restritos à açãode informar, comunicação de saber ou notícias sobre algum fatoou ocorrência e à ação de contar ou que se conte algo. Neste úl-timo significado, a informação é entendida como um saber que dizrespeito a algum fato, assunto ou acontecimento particular; sobreo qual é noticiado ou alguém fica sabendo; informação, notícias.

Na base do termo informação, está a separação processo eobjeto, que se encontra registrada, no verbeteinformation,8 e setraduz como “processo de informar ou instruir sobre um assuntodefinido quanto ao conteúdo da informação, a informação, a ex-pressão ou referência” (PETERS, 2002, p.285).

O uso do termo informação no cotidiano significa notícia, con-

7Ver Peters (2002)8Adaptado do Grosse Wörterbuch der dentschen Sprach

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selho, conhecimento, a quantidade do que se sabe e os aconteci-mentos transmitidos pela mídia. O que conta é o significado que otransmissor e o receptor vinculam à informação em que essa infor-mação atua como portadora de significado. Essa relação corres-ponde a conteúdos transmitidos de forma codificada pelos emis-sores, com a intenção definida e interpretada pelos receptores, apartir de suas próprias consciências. Nesse caso, a informação éentendida como uma notícia transmitida com significado factualpara o transmissor e o receptor. Esse é o significado que o termoadquire no uso cotidiano.

Essa versão do termo informação adquiriu diferentes signifi-cados no contexto da recepção da teoria americana de informa-ção, da ciência da informação e da comunicação e da informática,sendo que o elemento básico está vinculado aos dados transmi-tidos, sinais ou conseqüência de sinais. A diferença dos signifi-cados na abordagem tradicional e na abordagem da tecnologia dainformação e comunicação tem sua base na teoria matemática dacomunicação de Shannon e Weaver9, segundo a qual a informa-ção é um termo técnico matematicamente descritível que implicalidar com as características de ordenamento dos sinais, canais e acapacidade deles, a eficiência de codificação, o cálculo das quan-tidades de informação, isto é, as condições fundamentais do tra-balho produtivo com a informação (elaboração, processamento egerenciamento de unidade de informação).

O segundo significado do termo, que está atrelado ao con-texto da tecnologia da informação e comunicação, explica-se pelo“efeito da abundância crescente da informação e sua proliferaçãoem todas as direções” (PETERS, 2002, p. 286) e corresponde aouso inflacionário que o termo informação passou a adquirir como advento das TIC’s em que o paradigma da teoria da informa-ção passa a ser assumido pela informática para realizar sua tarefade processamento automático do conhecimento, consistindo tec-nicamente em um trabalho de busca, armazenamento, recupera-ção, transmissão, conversão e captação de unidades de informa-

9Ver Matterlart (2002)

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ção. Nessa lógica do processamento, a informação é separada emdois componentes substitutivos: os sinais e os dados.

Os sinais são dados transmitidos por meios técnicos, enviadosa distância, em que o significado é aceito por receptores que in-terpretam uma série de sinais, organizando-os em módulos paraa criação da informação. Os sinais que resultam das letras sãotransformados em imagens através da multimídia e simulações,sendo possível criar um novo tipo de codificação de informação.Os dados são sinais ou indicações, cujos parâmetros informamsobre características, processos e seqüências de procedimentos edispositivos técnicos, sem emitir informações sobre o significadodos conteúdos. Os tipos mais comuns de sinais aparecem comodados formatados10 e correspondem a textos, gráficos vetoriais,imagens, sons ou animações. Esse caráter disseminativo acele-rado, com que se recobre a informação no trabalho e no cotidi-ano dos indivíduos, tem recebido diversos nomes que não supõemsimplesmente a possibilidade de uma pluralidade de significadosda informação, mas a impossibilidade mesma de fixarmos qual-quer significado, vez que sua multiplicidade é irredutível e gene-rativa11.

Ao analisar a questão, Weizenbaum (1998 apud Peters, 2002)observa que as designações agregadas à informação são equivo-cadas porque os computadores só têm significado para indivíduosque aprenderam a interpretá-los. Com isso, o que ele destaca éque as unidades de informação de vários tipos e níveis são geradasapenas por meio do processo de interpretação. Essa informação-produto pode transmitir significado quando é pré-interpretada an-tes da codificação de dados e processada de acordo com as regrasestritas.

Em lugar de termos que descrevem a abundância de informa-ção inutilizáveis, Peters sugere as expressõesvias de dados, di-lúvio de dados e lixo de dados, e justifica que a informação emsi é criada nas mentes dos usuários individualmente e suas capa-

10Caracteres ou cadeia de caracteres.11Ver Derrida (1972)

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cidades são limitadas. Cabe uma pergunta nessa assertiva: Querelação existe entre os dados e os indivíduos? Essa questão podeser explorada a partir da idéia de interpretação dos dados, transmi-tidos e levados a indivíduos. Assim os dados apenas serão trans-formados em informação, quando os indivíduos forem capazes deselecioná-los e interpretá-los. Se os indivíduos não conseguemrealizar essa operação, certamente obterão uma quantidade de da-dos, mas dificilmente gerarão informação.

Como podemos observar, a relação que envolve os dados eos indivíduos é significativa, Em se tratando da interpretação, oresultado será diferente para cada pessoa, porque a história devida dos indivíduos influencia o processo: suas necessidades eemoções, seus conhecimentos, interesses e ideologias. A com-preensão de informação defendida por Peters (2002) considera ocontexto dos indivíduos que convertem os dados em informaçãocomo produtos da interpretação dupla, levando o indivíduo a con-fundir a informação com o conhecimento e, por essa razão, maisadiante exige uma explicação mais detalhada do termo conheci-mento.

4 O que diz a ciência da informação?

As várias tentativas de conceituação do termo informação foraminfluenciadas pela teoria da informação ou da comunicação. Di-versos estudiosos aceitam as perspectivas que associam o estudoda informação aos objetivos das telecomunicações e da ciberné-tica, que se baseiam na matemática das probabilidades, por meioda atividade de profissionais da engenharia da comunicação e dainformática.

Quando enfoca a questão da informação, Figueiredo (1999,p. 25) registra um debate continuado a respeito do significadodo termo informação e seu relacionamento com áreas afins, como“conhecimento expertise, processo de aprendizagem e psicologiacognitiva. [Nessa perspectiva, a informação é utilizada] para de-senvolver habilidades, conhecimento, sabedoria ou inteligência”.

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Observamos também que a autora constrói umapirâmide infor-macional, linear, em que separa dados, informação, conhecimentoe inteligência.

Essas diferenças traduzem níveis distintos em quedadoscor-respondem a registros simbólicos (fonêmicos ou numéricos) pormeio dos quais os fatos e os conceitos são representados, e ain-formaçãocorresponde a dados, processados e interpretados. Oconhecimentoconstitui os estoques de informação, processados etestados. Ainteligênciaé a capacidade de um indivíduo ou umaorganização social, “de adquirir nova informação e conhecimento,fazer julgamentos, adaptá-la ao meio, desenvolver novos concei-tos e estratégias e agir de maneira racional e eficiente, com basena informação recebida” (FIGUEIREDO, 1999, p. 26).

Dentre os níveis citados pela autora e representados na Figura1, destacamos o conhecimento como um termo central e intrinse-camente ligado à informação.

Figura 1 - Pirâmide InformacionalFonte: Adaptado do esquema sugerido por Figueiredo (1999)

Uma outra contribuição relevante para desvendar o termo in-formação no aspecto acadêmico é a de Cardoso (2002, p. 3), que

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ressalta o lugar decisivo que a informação adquiriu nos proces-sos sociais da sociedade da informação e do conhecimento, nãoapenas pela importância como recurso econômico e insumo pro-dutivo, mas, principalmente, como fonte de interesse para inú-meros campos de estudo e aplicações. Sua fala sugere que otermo informação oferece vantagens e desvantagens por ser polis-sêmico e prestar à aplicação de múltiplos interesses, mas tambémpor apontar uma delimitação e uma precisão quase impossíveis.Na opinião da autora, o termo demanda saberes e procedimentosmultifacetados para sua compreensão e foge ao aprisionamentopela noção de propriedade. A leitura crítica da informação incidena forma fragmentada com que é tratada, visto que cada campode conhecimento debruça-se apenas sobre as particularidades quesão interessantes para atender aos objetivos propostos.

Algumas divergências quanto à apropriação do termo são iden-tificadas por González de Gómez (2002), ao argumentar que otermo informação refere-se a múltiplos domínios: cognição, tex-tos, artefatos culturais e infra-estrutura. Alongando suas conside-rações, a autora diz que a flutuação de significado guarda um pa-ralelismo com as dificuldades da área no que diz respeito à consti-tuição de um campo científico em que a construção de seu objetoequaciona oscilações e deslocamentos nos diversos domínios cul-tural, econômico e político, manifestando-se como processo queresulta em um produto e dota-se de referenciais ontológicos e cog-nitivos. Ela coloca que os diferentes significados do termo podemresponder a diferentes pontos de partida: práticos, estratégicos oudisciplinares.

Na verdade, assume González de Gómez (2000), o papel dainformação e a tendência de expansão do termo conhecimento nasformações políticas ocidentais e suas especializações em diver-sas disciplinas12 produziram ênfases diferenciadas. O processode geração e gestão do conhecimento originou as expressõeskno-wledge, management, knowledge broking,entre outros, e as análi-

12Na Economia, Ciências da Administração, Negócios, Ciência da Compu-tação e Ciência da Informação, entre outras.

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ses de informação, conteúdos e tecnologias derivaram as expres-sões“inteligência organizacional”, “inteligência competitiva”,inteligência corporativa, inteligência econômica, inteligência so-cial, inteligência coletiva,entre outras. A informação e o conhe-cimento compõem uma temática bastante ampla que se torna ob-jeto de interesse de diferentes vertentes, com enfoques epistemo-lógicos, filosóficos, históricos e culturais, merecendo uma maioratenção dos estudiosos dos campos da informação e da educação.

A certeza de que o termo não se deixa aprisionar remete avozes que o enunciam como uma temática aberta ao debate e su-jeita a inúmeras dificuldades conceituais, acabando por criar umaenorme controvérsia com relação ao que realmente o termo infor-mação se refere (SMIT, 2003). Nessa questão, está implícito odesejo de um posicionamento de uma área: Da Ciência da Infor-mação esperamos a definição do que pode ou não se chamar in-formação[...] e tem a ver com “o caráter estratificado do conceitoe sua orientação interdisciplinar ou transdisciplinar do campo, namedida em que este se vê obrigado a trabalhar na articulação dasplurais dimensões do objeto informacional: semânticas, sintáti-cas, institucionais, infra-estruturais, entre outras” (2001, p. 1).

Nessa linha de discussão sobre a polissemia do termo infor-mação, Braman (1989 apud Macevi; Wilson, 2002) já põe emevidência quatro importantes concepções aplicáveis em diferen-tes situações do estudo:

1. Informação como recurso– a informação, os criadores, osprocessadores e os usuários são entendidos como entidadesdiscretas e isoladas. Nessa concepção, a informação vemem pedaços sem qualquer relação com organizações do co-nhecimento ou fluxos de informação.

2. Informação como uma mercadoria– o conceito aponta parauma cadeia de produção de informação por meio da qual ainformação ganha valor econômico. Esse conceito incor-pora a troca de informação entre pessoas, atividades relaci-onadas ao uso, e implica compradores, vendedores e mer-

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cado. A informação concebida como recurso não tem po-der, enquanto informação como categoria tem poder econô-mico.

3. Informação como percepção de padrões- o conceito é am-pliado pelo acréscimo do contexto, tendo a informação umpassado e um futuro, sendo afetada por uma causa e outrosfatores do ambiente; ela tem seus próprios efeitos. O con-ceito de informação pode ser aplicado a estruturas sociaisaltamente articuladas. A informação tem seu próprio po-der, mas seus efeitos são isolados. Exemplo: A informaçãocomo redutor de certezas.

4. Informação como força constitutiva da sociedade- a in-formação, além de ser afetada pelo ambiente, constitui-secomo ator que afeta outros elementos do ambiente. O con-ceito é aplicável a uma gama de fenômenos e processos naqual a informação está envolvida, podendo ser aplicada aestruturas sociais de qualquer nível de articulação e com-plexidade; seu fluxo e uso têm enorme poder na construçãode nossa realidade social.

O acesso e o uso de informação possibilitam o desenvolvi-mento de uma ação mais orientada para a formação de pesquisa-dores e cientistas da informação e, conseqüentemente, mais ob-jetiva e com maiores possibilidades de êxito, pois a informaçãogera o conhecimento. O conhecimento, que inclui a contribui-ção da ciência e da tecnologia, articula-se com os conhecimen-tos político-econômicos estratégicos e passa a ser objeto favoritode estudos econômicos, políticos e administrativos, criando novasnomenclaturas (GONZÀLEZ DE GÓMEZ, 2002).

5 Depurando o potencial do conhecimento

Os estudos realizados por Peters (2002) têm o mérito de desven-dar os segredos do termo conhecimento, afirmando que o mesmo

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aparece com muita freqüência na literatura especializada em suasmúltiplas expressões e apresenta a distinção entre o significadona abordagem tradicional de conhecimento e a popularização dosignificado na abordagem das tecnologias da informação e comu-nicação. Explicitando os significados adquiridos na abordagemtradicional, o autor assinala que, diferentemente deinformation, otermoknowledgenão é novo, porquanto aparece nas formaskno-wlage, knowledgee knowlechee na forma verbalto knowna lín-gua inglesa. Em anglo-saxão, o termo conhecimento correspondea cnawan, sendo visto como uma palavra nativa com grandes re-percussões nos dias atuais.

Ele extraiu cinco variações do significado do termo conhe-cimento no Oxford Englsh Dictionary, a saber: 1) Refere-se aofato de conhecer alguma coisa, estado ou pessoa, adquirindo umaspecto familiar por meio da experiência; 2) Conhecer um fatoou certa informação sobre uma questão, em que o indivíduo estáinformado ou consciente de alguma coisa; 3) Conhecimento inte-lectual ou percepção de uma verdade e tem a ver com o sentido deestado ou condição de compreensão, inteligência ou intelecto e;4) Um ramo do saber ou uma linguagem, podendo ser também en-tendido como compreensão teórica ou prática de uma arte, ciênciae atividade.

O autor chama a atenção para quatro acepções encontradasno Webster que estão ligadas ao significado moderno de conheci-mento. Na primeira acepção, ele deixa claro que o conhecimentosugere familiaridade por meio de experiência de fato, habilidadeprática, conhecimento técnico. Na segunda acepção, o conheci-mento corresponderia ao estado de compreender, ter a percepçãoclara do fato ou verdade. Na terceira acepção, o conhecimento éaquilo que se ganha e se preserva ao se conhecer, [significando]ainda instrução, esclarecimento e saber. A última acepção dotermo sugere “uma coisa que é ou pode ser conhecida, um as-sunto sobre o qual um conhecimento se refere” (PETERS, 2002,p. 291). É importante destacar que, dentre a variedade de signifi-cados apresentada no Dicionário Houais de Língua Portuguesa, o

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termo conhecimento mantém uma relação do conhecimento como processo cognitivo (HOUAIS, 2001).

As variações do termo são explicitadas com a existência doconhecimento adquirido pelos sentidos, capaz de gerar expres-sões como “conhecimento de relação, conhecimento imediato, co-nhecimento intuitivo, conhecimento sensível“ (PETERS, 2002, p.291). A relação do conhecimento com os sentidos tem sua origemno verboto kow,que se encontra ligado ao verbo gregogignosceine aos verbos latinos(g) nosceree cognoscere,com o sentido deconhecer, através dos sentidos, e esclarece a associação da palavraknowcom o verbosee.

Já o tempo verbalI seesignifica algo comoI understandeequivale a perceber por insight mental, formar uma idéia, com-preender, entender e ver a verdade. Nessa idéia, o conhecimentoé o resultado de uma atividade humana, um processo cognitivo.Essa afirmação coincide com o significado de conhecimento nalíngua alemã, na qual a forma verbalwissensignificava original-menteter vistoe a forma verbalwait significavaconhecer, des-crevendo uma condição que se alcança por meio da realização deatividades, tais como encontrar, reconhecer e ver.

O Dicionário de Grimm traz o verbo latinovidarecom o mesmosignificado: o conhecimento não é uma coisa, um objeto do mundoexterior, mas pressupõe atividades mentais do sujeito, tendo porconotação “subjetivamente como bens mentais”. Nesse caso, ouso corrente da palavra informação significa a totalidade de in-formação que um indivíduo adquire por meio da experiência pes-soal. Esse significado recepciona a crítica de Peters devido a esseautor entender que o sentido amplo produziu várias dimensõesde significado, passando o conhecimento a ser concebido comotransmissão; entender algo com base em impressões sensoriais eintuição; estar consciente de algo, ter familiaridade com coisas oufatos através da experiência e capacidades especiais ou habilida-des técnicas (PETERS, 2002).

Em análises clássicas econômicas, segundo Lastres e Ferraz(1999), alguns estudiosos abordam os termos informação e co-

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nhecimento, alertando que estão conectados, mas não quer dizerque sejam sinônimos. Para estes autores, as diferentes formasde conhecimento e os modos de aquisição e sua transferibilidadeapontam dois tipos de conhecimentos: 1) conhecimentos codifi-cáveis que, transformados em informações, podem ser reproduzi-dos, estocados, adquiridos, comercializados e; 2) conhecimentostácitos, cuja natureza está associada a processos de aprendizado,sendo totalmente dependentes de contextos e formas de intera-ção sociais específicas. O conhecimento tácito é adquirido pormeio de estudo, aprendizagem e conhecimento científico, refle-xão teórica, experimentação empírica, ministrado por interação,tendo como base os processos cognitivos, a infiltração intelectuale as abstrações. O conhecimento não é uma coisa, um objeto domundo exterior; pressupõe certas atividades mentais por parte dosujeito, implicando buscar, encontrar, ver e detectar.

Concordando com o pensamento de Castells (1999), esses au-tores enfatizam que a visão pós-industrial do conhecimento estácentrada na geração de novos conhecimentos e na introdução esua difusão no sistema produtivo, abrindo espaços para as ino-vações tecnológicas em que o conhecimento é utilizado “sobrenovas formas de produzir e comercializar bens e serviços [e] ino-vações organizacionais para novos meios de organizar empresas,fornecedores, produção e comercialização de bens e serviços”(LASTRES; FERRAZ 1999, p. 31), procurando associar as trans-formações econômicas, políticas e sociais.

Em sua abordagem ecológica, Davenport (2001) reconhece adificuldade de estabelecer uma definição para o termo informa-ção, porque envolve dados, informação e conhecimento e faz a co-nexão entre os dados brutos e o conhecimento adquirido. Esse au-tor define conhecimento como uma informação valiosa da mentehumana, que resiste ao gerenciamento, reconhecendo que a infor-mação diferencia-se do conhecimento porque o indivíduo tende areferi-lo a um contexto, um significado, uma interpretação, umareflexão, e agrega um saber pessoal. O conhecimento pode serincorporado em máquinas, mas é de difícil categorização e locali-

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zação e, comungando com Peters (2002), sublinha que os compu-tadores lidam bem com informações, mas são inadequados parainteragir com o conhecimento.

Ao estabelecer as diferenças entre dados, informação e conhe-cimento, Davenport considera os dados como simples observaçãosobre o estado do mundo, sendo estruturado, obtido por máquinas,quantificável e transferível; a informação é dotada de relevância epropósito, e requer unidade de análise, consenso de significado epassa pela mediação das máquinas; o conhecimento é a informa-ção poderosa extraída da mente humana e implica reflexão, sín-tese e contexto. Sua operação é de difícil estruturação e captura;é tácito e intransferível.

Na perspectiva de Peters (2002), o conhecimento difere da in-formação em pelo menos 10 camadas de significados com suascaracterísticas:

1. Demarcação– o conhecimento é diferenciado da percep-ção, impressão, opinião, crença e convicção.

2. Restrito ao sujeito– em cada caso, o conhecimento é adqui-rido por meio da atividade cognitiva do sujeito (observar,reconhecer, compreender, memorizar, lembrar, refletir).

3. Integração– A estrutura do conhecimento criada é avali-ada como conhecimento adquirido e descrita como conheci-mento integrado A informação está ligada ao conhecimentosubjetivo por meio de processos de construção e integração.

4. Dimensão do conteúdo– os conteúdos do conhecimento po-dem ser caracterizados de várias formas de acordo com asáreas de aplicação (teórico, prático, político, matemático,humano etc).

5. Empregabilidade– mede o conhecimento das áreas de apli-cação do item 4. Compreende-se a totalidade das estruturasabstratas empregadas e tidas como úteis.

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6. Relação com a ação– a forma externa do conhecimentoestá na capacidade e na ação. O conhecimento é um “fenô-meno extratificante da ação social” (STEHR 1994 apud PE-TERS, 2002, p. 294).

7. D imensão veicular– o veículo influencia tanto a produçãoquanto a natureza do conhecimento. A passagem da ora-lidade para a escrita mostra que o conhecimento tornou-secada vez mais socializado e sua disseminação acelerada.

8. Dimensão da teoria da evolução– a relação do conheci-mento com a subjetividade dos indivíduos pode ser tambémsubstancializada por sua ligação com a circunstância cau-sada pela evolução. O conhecimento passa por três fasesno desenvolvimento dos seres humanos e do indivíduo: co-nhecimento mágico, conhecimento mítico e conhecimentocognitivo refletido.

9. Dimensão sócio-histórica– O conhecimento não deveriaser visto apenas como uma simples conexão dos termosque resulta numa abstração e objetividade, porque recebeseu caráter único a cada momento histórico, em cada so-ciedade e na mente do indivíduo. Ao nascer, ele “é con-frontado, emocional e cognitivamente pelo nível mais de-senvolvido de estoque de conhecimento que se desenvolveuna humanidade” (BRACHT, 1997 apud PETERS, 2002, p.295). Então, toda a estrutura do conhecimento humano e omodo de pensar são alterados. O conhecimento é social einclui experiências, sentimentos, ações e comportamentos.No paradigma tecnológico, tanto a informação quanto o co-nhecimento não se referem ao significado tradicional nemdo ponto de vista semântico nem da sua função social.

10. Emoções– o conhecimento não é armazenado sem emoção,mas reagimos a mudanças com o conhecimento que temos.Essa subjetividade do conhecimento é elucidada quando a

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relacionamos com a sabedoria. Os indivíduos não são má-quinas inteligentes, porque conseguem manter certas atitu-des diante do conhecimento e desenvolvem hábitos indivi-duais. “O conhecimento e a atitude em relação ao conhe-cimento formam uma unidade dialética” (BRACHT, 1997apud PETERS, 2002, p. 295).

As palavras de Macgarry (1991) revelam: o indivíduo que dis-põe de sabedoria tem conhecimento e informação. Ampliandoessa idéia, Peters (2002) considera que a sabedoria recebe ele-mentos do conhecimento prático, teórico e ético e da reflexãoda experiência, enfatizando que a subjetividade do conhecimentoresplandece quando o indivíduo volta para a forma mais elevadade conhecimento: a sabedoria. Os indivíduos decidem autono-mamente qual informação deve ser utilizada e descartada ou sea sabedoria é conhecimento ou conhecimento é informação. Donosso ponto de vista, a sabedoria extrapola a informação e o co-nhecimento, porque se constitui pela experiência acumulada peloindivíduo e, por ser alimentada pelo conhecimento, não pode serestocada.

6 Formas de aprender o conhecimento por outraslinguagens

Os vários modos de apropriação do termo conhecimento nos cam-pos e áreas distintas, aproximam-se do discurso moriniano queconcebe o conhecimento como um fenômeno multidimensionalque conjuga, simultaneamente, processos físicos, biológicos, ce-rebrais, mentais, psicológicos, culturais e sociais, devendo serconcebidos com vários olhares ou níveis diferentes. O conhe-cimento adquire distintos significados dependendo do contexto,sendo impraticável restringí-lo a uma única noção.

Em suas reflexões, Peters mostra como algumas áreas ou dis-ciplinas captam o conhecimento. A sociologia do conhecimento,por exemplo, analisa o modo como o conhecimento é socialmente

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condicionado e a capacidade do pensamento humano de comunicar-se socialmente, e enfatiza que todos os conteúdos do conheci-mento devem ser reproduzidos na perspectiva social. As formasde conhecimento não são apenas determinadas por estruturas cog-nitivas, mas também portadoras do conhecimento das categorias,grupos, comunidades ou subgrupos sociais. Sua crítica consi-dera o tipo de geração e reprodução do conhecimento, o modode comunicá-lo e o contexto de aplicação como relevantes. Osestoques de informação de uma sociedade devem ser conhecidoscomo conteúdos de conhecimento e de participação dos indiví-duos.

Na perspectiva psicológica, o conhecimento refere-se ao modocomo as coisas do ambiente aparecem diretamente ou mediadopela linguagem. Os indivíduos processam as informações comvistas à aquisição de conhecimentos e de novoinsight, para resol-ver problemas difíceis. O autor cita Böheme (1981) para discor-dar do posicionamento que reduz o conhecimento à esfera cog-nitiva, por acreditar que as formas de conhecimento carregam oconhecimento de grupos ou comunidades sociais de tal modo quetodos os conteúdos devem ser reproduzidos socialmente. Em suasinterlocuções, convoca Goorhuis (1998) para advertir que o co-nhecimento é uma coleção de operações mentais que o individuogera e refina por meio de seus constantes esforços para estabilizaras perturbações do ambiente. Nessa definição, que também en-volve E. Kahle (1995), o autor capta o conhecimento como umaconstrução do cérebro, subjetiva, auto-referente e guiada pela ex-periência.

A categorização proposta por Cronbach (1963) colabora parauma subdivisão na compreensão que Peters tem sobre o conheci-mento, distinguindo o conhecimento pré-verbal e conhecimentoverbal. Essa categorização transporta o conhecimento para dife-rentes estágios de complexidade, implicando descrição, prescri-ção, princípios e conhecimento sistematizado. Desse ponto devista, o conhecimento define-se como um depósito de soluçõespossíveis e materiais em que estas podem ser criadas, reforçando

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a presença da cognição em que se assume um estoque objetivo eabstrato de conhecimento, e consiste de fatos e regras. Há tam-bém aqui uma explicação de que oconhecimento inerteexiste,mas não se aplica à solução de problemas específicos, porque ometaconhecimento necessário à sua aplicação não se encontra su-ficientemente desenvolvido ou sua estrutura não se enquadra cor-retamente numa situação dada. Em sua crítica a esse modo depensar, ele reitera seu posicionamento de que o tipo de conhe-cimento depende da individualidade do sujeito, suas histórias econtextos vividos.

Na ciência da cognição, o conhecimento é tratado em relaçãoà inteligência artificial, a informática, a cibernética, lingüística,neuropsicologia e à psicologia cognitiva. Em suas formulações,diz o autor, os produtores do conhecimento priorizam as represen-tações mentais, as funções modelares do computador e o proces-samento de informações, colocando como última opção os fatoresemocionais, históricos e culturais e seus devidos contextos. Nessaperspectiva, ele afirma que o conhecimento é uma coleção de fa-tos e regras que existem independentes do indivíduo.

Gravitando ao redor das reflexões filosóficas, situa Platão coma teoria geral do conhecimento em que os objetos e a realidadeestão constantemente em processo de mutação, porquanto o co-nhecimento (verdade) só existiria no mundo das idéias. O dis-curso platoniano nega o conhecimento como sinônimo de poder,para colocá-lo ao nível do compromisso e da obrigação, no qualos indivíduos devem observar as coisas, a fim de reconhecerem averdade nelas e assumi-las em sua plenitude. Essa percepção doconhecimento pode ser confrontada com o pragmatismo de Fran-cis Bacon, para quem o conhecimento e a capacidade seriam amesma coisa. As propriedades do conhecimento possibilitariamao indivíduo controlar e dominar a natureza, já que conhecimentoé poder. Entretanto, é Hegel que elevará o conhecimento ao maisalto nível, descrevendo-o como o pensamento puro – o conheci-mento absoluto.

Na atualidade, assevera Peters (2002), os estudos filosóficos

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tendem a interpretar o conhecimento como algo que se vincula àexperiência e aoinsight.A discussão filosófica sobre informação-conhecimento supõe uma teoria do conhecimento que investiguea problemática decorrente da relação entre sujeito e objeto do co-nhecimento e as condições do conhecimento como verdade. Essateoria busca compreender o pensamento humano em sua referên-cia objetiva, em seu relacionamento com os objetos (HESSEN,2000).

Nessa esteira do conhecimento, Capurro (1985, 1992) reme-mora as palavras de São Tomaz de Aquino e procura construir umvínculo entre a teoria do conhecimento e a Ciência da Informa-ção, buscando raízes epistemológicas que permitem refletir sobreo termo informação. O autor diz que o homem é produto da uniãoíntima entre a matéria (potência) e a alma (principio ativo) queinforma a matéria. O que resulta dessa união ou informação éum ser sensível e inteligente. O conhecimento humano baseia-seem um princípio denominadoanima intellectiva,incorporando oprincípio sensitivoou “anima sensitiva".Conhecer um objeto sig-nifica a capacidade de o intelecto passivo (ou possível) compre-ender a espécie ou a forma do objeto. A forma sensível informaa sensação e o intelecto passivo, e o intelecto ativo produz o atode compreensão através da abstração do conceito universal ad-vindo da forma representativa ou phantasma. As coisas sensíveissão compreendidas pelo sentido, representadas pela imaginação etransformadas em inteligíveis pelo intelecto. O conhecimento hu-mano não é puramente intelectual nem puramente sensível, masuma união de ambos.

Na sociedade da informação, postula González de Gómez (2002), o conhecimento tem sido interpretado a partir de duas for-mas opostas: a) um objeto, que pode ser conhecido e observadocom autonomia de seu produtor, sendo o conhecimento objetivadoe objetivo e; b) uma construção de um meta-conhecedor intenci-onal e ativo, que pode objetivar, modelar e gerir um processo deconhecimento de outros conhecedores, como também intervir noobservado. Essa oposição, segundo a autora, pressupõe dois su-

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jeitos: 1) um sujeito alienado que não conhece as condições deprodução e o uso do conhecimento do qual é produtor e; outro su-jeito intencional que se explica por ser capaz de gerir e esclarecerao conhecer seus produtos do conhecimento.

A idéia de que a apropriação da informação não é determi-nada pela simples transferência sem ter em conta que o receptorinterage com a informação e produz sentidos de acordo com di-ferentes contextos, introduz Brokes (1990) a essa discussão. Suaproposição remete ao entendimento de que a informação provocatransformações nas estruturas cognitivas. Dissecando essa idéia,presume que a informação enviada a um indivíduo familiariza-secom um determinado código e passa por um processo de interpre-tação, resultando em um novo estado de conhecimento ou produ-ção de sentido.

A partir de leituras de Brokes, situamos Le Coadic (1996, p.20), que discute a conexão informação-conhecimento, afirmandoque o estado de conhecimento do indivíduo ocorre, em determi-nado momento, sendo “representado por uma estrutura de concei-tos ligados por suas relações”, a qual é mobilizada para corrigire instaurar um novo estado de conhecimento, quando se detectauma lacuna. Desse ponto de vista, a informação serviria para oindivíduo solucionar problemas ou enfrentar situações pouco co-nhecidas.

Qualquer anomalia ou deficiência nesse estado de conheci-mento, para Belkin (1956), levaria o indivíduo a um novo estadode conhecimento. A interação do indivíduo com novas informa-ções poderia criar um novo estado de conhecimento a ser aplicadoa outras situações e contextos diferenciados e modificar as estru-turas ou criar um novo contexto. O cerne dessa questão põe emrelevo a idéia de que o conhecimento de um indivíduo sobre deter-minado tema é representado por uma estrutura conceitual ligadapor suas relações que se caracterizam pela imagem que esse indi-víduo tem do mundo.

Extrapolando a consideração que articula o papel do sujeito ea conexão informação-conhecimento, Schaff (1995) divide o pro-

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cesso de conhecimento em três partes: o sujeito que conhece –aquele que possui competências e habilidades para lidar com ainformação; o objetivo do conhecimento: a informação; o conhe-cimento como produto do processo cognitivo – transformação dainformação em conhecimento. Tal processo “ocorre numa inte-ração específica do sujeito que conhece e do objeto do conheci-mento, tendo-se como resultado os produtos mentais a que chama-mos de conhecimento“ (SCHAFF, 1995, p. 73). Este autor des-taca três modelos fundamentais do papel que o sujeito exerce noprocesso de conhecimento: modelo mecanicista, modelo idealistae modelo interativo. Iniciando pelo modelo mecanicista, identi-ficamos a origem na teoria do reflexo, segundo a qual o objetodo conhecimento (a informação) atua sobre o aparelho perceptivodo sujeito como um agente passivo, contemplativo e receptivo.Nesse caso, o produto do processo – conhecimento – é o reflexo,a cópia do objeto. A gênese desse reflexo está em relação com aação mecânica do objeto sobre o objeto. Esse modelo é represen-tado na história do pensamento filosófico e, a partir da filosofia, édisseminado para outras ciências.

O modelo mecânico concebe o sujeito como um agente pas-sivo e receptivo, cuja tarefa na relação cognitiva com a informa-ção é a de apenas registrá-la, exercendo um papel similar ao doespelho. Explicitando essa relação, o autor vai nos dizer que asrealidades entre as imagens percebidas pelos diferentes sujeitos,que conhecem, reduzem-se às diferenças individuais ou genéricasdo aparelho perceptivo. Buscando o pensamento de Popper, eledenomina a teoria do processo cognitivo deteoria da consciên-cia recipiente. Esse modelo recebe a crítica de Schaff devido àpredominância da relação sujeito-objeto que retorna ao objeto. Osujeito, o objeto e o conhecimento representam por si mesmo umconteúdo.

Nos modelos idealista e ativista, a predominância dessa rela-ção volta ao sujeito que conhece, que percebe o objeto do conhe-cimento como sua produção – Filosofia-subjetivista-idealista. Aatenção está centrada sobre o sujeito a quem se atribui o papel

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de criador da realidade. O objeto do conhecimento desaparece,mas o papel do sujeito ganha por isso mais importância. Con-trariando os dois primeiros, o modelo interacionista atribui umpapel ativo ao sujeito “assujeitado” a diversos condicionamentossociais que introduzem no conhecimento uma visão de realidadesocialmente transmitida. Essa visão, diz o autor, rompe com obinarismo da relação dos sujeitos na qual a troca de informação éharmoniosa. Nessa perspectiva teórica, os sujeitos se distanciamdo mecanicismo, idealismo ou estatismo, para agir ativamente nomovimentam da história. Sua interação com a informação e oconhecimento leva em conta os aspectos políticos, sociais, econô-micos e culturais.

A mutação sociocultural que projetou o conhecimento estáoriginalmente implicada nos trabalhos de economistas america-nos13 e dos japoneses14 produzidos na década de 60. Temos, hoje,Castells (1999), que refere um novo modo de desenvolvimento esuas implicações econômicas, políticas, sociais, culturais, infor-macionais e comunicacionais no ambiente cotidiano, nas organi-zações e nas empresas, sem um olhar mais concentrado no social.Essa preocupação também é assinalada por autores que vêem oconhecimento como uma força produtiva, recurso estratégico ebase de ação social (STEHR, 1994 apud PETERS, 2002), sali-entando para: a) a penetrabilidade da ciência em todas as árease campos de ação; b) a profissionalização culminou no esvazia-mento de outras formas de conhecimento; d) o desenvolvimentoda ciência como força produtiva direta, políticas cientificas e edu-cacionais; e) a produção do conhecimento como a formação deum novo setor produtivo; f) o debate tecnocrático repercutindonas estruturas hierárquicas; h) o poder dos especialistas como umatransformação de base para a legitimação de uma hierarquia até o

13O trabalho de Fritz Matchlup, intitulado "The prodution and distributionof knowledge in the United States” e publicado em 1962, trata da economia doconhecimento.

14O trabalho de Tadao Umesao, intitulado “The industrialization of tkemind"e publicado em 1966, já preconizava a era da informação.

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conhecimento especial e; i) o desenvolvimento do conhecimentocomo o fundamento da desigualdade social e a solidariedade so-cial e a transformação das fontes dominantes de conflitos sociais.

As críticas persistem em relação ao modo como pensamos adigitalização da informação para justificar que não funciona comouma alavanca transformadora das mentes, porque as mudançasdevem acontecer na cabeça das pessoas e, com isso, repercutem aopinião de Morin (2004, p. 20-33), ao sugerir “uma cabeça bemfeita [...] concernente a nossa aptidão para organizar o conhe-cimento”, que depura: “a transformação da sociedade de infor-mação em sociedade de conhecimento não é apenas uma questãode terminologia, mas também, vista do ponto de vista da teoriado conhecimento, uma questão fundamental” (MITTELSTRASS2000 apud PETERS, 2002, p. 324).

7 Por onde navega o sujeito do conhecimento?

Os diversos nomes utilizados pelos estudiosos para compreen-derem a atual sociedade resultam de análises de um fenômenocomplexo, cuja ênfase centra na proposta sócio-pedagógica ou deaprendizagem. Em decorrência dessas elucubrações, a literaturacorrente evidencia uma polissemia de termos que se identificamcomosociedade da informação, sociedade do conhecimentoeso-ciedade aprendente.Ao tentar identificar os significados que ostermos informação-conhecimento carregam, a discussão que secoloca é a de indagarmos se os indivíduos estão diante de umnovo tipo de sociedade. Essa conjectura recepciona as conside-rações de Lyons (1992) que assume a expressãosociedade da in-formaçãocomo algo não inteiramente novo, porque entende queessa sociedade finca suas raízes no pós-industrialismo.

Alguns autores criticam a ênfase na expressãosociedade dainformaçãopor verem nela as características tecnicistas, prefe-rindo a expressãosociedade do conhecimento. Convém aqui res-saltar as preocupações de Peters com o formato da atual socie-dade, quando questiona: A sociedade que está sendo construída

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nos levará para a sociedade da informação ou a sociedade doconhecimento? Essa pergunta, atribuída ao filósofo Mittelstrass(2000), é retomada por Peters, conjuntamente com as observaçõesde Wersig (2000), para avaliar a predominância do termo informa-ção na mídia, e reafirmar que os efeitos dessa expressão sociedadeda informação determinam a vida sociocultural, dotando-se de umpotencial para uma nova organização da reprodução material.

Na biblioteca de FernUniversitadt da Alemanha, observa Pe-ters, a produção acadêmica mostra 104 trabalhos que utilizam aexpressãosociedade da informação,e 9, a expressãosociedadedo conhecimento, além de 375paperspublicados em periódicoseletrônicos que utilizam a primeira expressão, e apenas 68, a se-gunda. Chamando a atenção para as palavras de Spinner (1994).Ele revela que na organização dessa biblioteca, de acordo como conhecimento do complexo tecnológico cognitivo, podem serencontradas atividades de conhecimento e estoques de conheci-mento, os quais, na realidade, favorecem a criação, o processa-mento, a formação em rede e a disseminação do conhecimento apartir do processamento eletrônico de dados. A repercussão dafala de Spinner, como demonstra Peters, é seguramente contes-tada por Dagele (2000), ao temer que o oceano de informaçõespossa reduzir-se a uma “ausência de conhecimento”.

A propósito dessa questão, a palestra proferida por Weizen-baum (1998 PETERS, 2002, p.321) sob o título provocativo, “Es-tamos procurando por conhecimento e estamos afogados em in-formação”, serve para mostrar que a informação difere do conhe-cimento em 27 pontos, embora defenda que os termos são inter-cambiáveis. Suas considerações expandem nas reflexões de Pe-ters, quando ele percebe a influência da sociedade da informaçãosobre as atividades humanas, que transforma o setor de informa-ção e comunicação em dados, e exercendo o controle social ca-racterizado pela impessoalidade.

Em sua observação, embute-se a crítica às configurações eaos processos técnicos peculiares à sociedade da informação, osquais, muitas vezes, exercem um enorme fascínio sobre os indiví-

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duos, levando-os a um deslumbramento frente aos efeitos das tec-nologias na sua vida individual e profissional, sem atentarem parao valor neutro que elas exercem na consciência coletiva, igual-mente como ocorreu na automatização crescente da sociedade in-dustrial. Essa ingerência, que dificilmente será dominada, poten-cializa o poder e a impotência do ser humano diante do aprofun-damento da desigualdade social em que separa os ricos de infor-mação e os pobres de informação.

O enfrentamento terminológico que cerca os termos informa-ção e conhecimento posiciona Assmann (1998, p. 282) a favor daexpressãosociedade do conhecimentoconsiderando esse autor oconhecimento como sendo a matéria-prima da nova face do capi-tal e tema imprescindível para indicar “que entramos na era dasredes de interconexão entre ecologias cognitivas”. Ele ressaltaque o conhecimento não consiste simplesmente da digitalizaçãode dados, mas, para além disso, constitui um recurso humano,econômico e sociocultural rico e determinante na nova fase dahistória humana.

Embora alguns especialistas enfatizem a expressãosociedadeda informação, ainda há outros que reforçam suas críticas à abun-dância de informações e sua dissociação do conhecimento. Pros-seguindo seu diálogo com críticos contemporâneos que discutema conexão informação- conhecimento, Peters vai mostrar que, nasociedade do conhecimento, as coisas não ocorrem do mesmomodo que a sociedade da informação, porque o conhecimento temrelação com a atividade cognitiva, e supõe que, com esse termo, épossível imaginar, antes de qualquer coisa, os indivíduos ou gru-pos de indivíduos que adquiriram o conhecimento disponível, esão peças-chaves na interação com esse conhecimento. Em suasformulações, é possível visualizar uma preocupação com as pes-soas, os desejos e os interesses.

Para explicitar a relação dos indivíduos com o conhecimento,ele busca Hilmann (1994) que resgata a noção de pessoa, enten-dendo-a como um sistema de valores e ações que o indivíduo or-ganiza. Essa concepção recusa o enfoque segundo o qual o conhe-

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cimento é disseminado por meios técnicos em detrimento da açãodos indivíduos, vez que a sua disseminação exige a participaçãode atores humanos, enquanto que a troca de informações podeacontecer automaticamente entre computadores. “As mudançassociais [resultam de] processos cognitivos individuais que desá-guam nas decisões e ações dos indivíduos” (BRUCK; GESER,2000 apud PETERS, 2002, p. 323). Deduz-se, portanto, que ainformação, para ser significativa, precisa ser produzida, disse-minada e utilizada igualmente como conhecimento por todos osindivíduos.

O efeito dessa celeuma, que envolve o termo informação, temsido tributado a Shannon que, segundo Peters, transferiu para oacesso e o uso pelos tecnocratas e visionários. Essa considera-ção explicita a preferência de alguns estudiosos pela expressãosociedade da informação com seus objetivos sociais, sendo tam-bém a expressão utilizada pela ONU, com vistas à melhoria dascondições de vida em países em desenvolvimento. Concordandocom essa posição, Materlart (2004) acentua que a expressão "so-ciedade da informação” foi consagrada como um termo hegemô-nico, não porque exprime necessariamente uma clareza teórica,mas devido ao nome que recebeu na política oficial dos paísesdesenvolvidos.

Divergindo desse alvoroço que consagrou a expressãosoci-edade da informação, há autores que utilizam mais a expressãoalternativasociedade do conhecimentopor ser mais clara e abran-gente. Para dar sustentação a essa afirmação, ele assinala umponto de vista pedagógico, convidando para cena os teóricos queconsideram “apenas os conteúdos e o processamento deles con-juntamente com o contexto apropriado é que produzem conheci-mento significativo a partir de informações e permitem a constru-ção de redes coerentes de conhecimento” (HOFLING e MANDL,1987 apud PETERS, 2002, p. 324).

Diante do posicionamento de autores que criticam a expressãosociedade da informação, Peters (2002) vai considerar a expres-sãosociedade do conhecimentocomo a mais adequada para ca-

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racterizar as mutações que vem ocorrendo no mundo. No entanto,ele destaca estudiosos que utilizam informação e conhecimento,advertindo-os para examinarem como os dois termos são conec-tados. Essa expressão é uma construção política e ideológica quese desenvolveu com a globalização neoliberal, que visava princi-palmente acelerar a instauração de um mercado mundial aberto eauto-regulado numa estreita colaboração com organismos comoa Organização mundial do comércio (OMC), o Fundo monetáriointernacional (FMI) e o Banco Mundial, pressionando os paísesmenos desenvolvidos a abandonar suas regulamentações nacio-nais ou as medidas proteccionistas, desencorajando investimentoscomo um fator de risco, abrindo um enorme fosso entre ricos epobres no mundo (MATTERLART, 2004).

Para melhor esclarecer a confusão entre os termos, ele sugereque seja observada a gênese do conhecimento no quadro hierár-quico, que readaptado no diagrama 2.

Diferenças entre informação e conhecimentoFonte: Adaptado da ilustração utilizada por Otto Peter

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Explicando o diagrama 2, o autor mostra a tendência ascen-dente que vai do simples (sinais) ao complexo (sabedoria), masdemonstra que, se o indivíduo não conseguir mobilizar sua estru-tura cognitiva para transformar a informação em conhecimento,terá que lidar com um oceano de informações, sem encontrar omodo de selecioná-las, organizá-las e interpretá-las. Adotando aspostulações de T. S. Eliot, comenta que deve haver perda de sabe-doria no conhecimento e de conhecimento na informação, resul-tando em um empobrecimento do capital intelectual das pessoasque precisariam se relacionar com “processos de despersonaliza-ção, de dessubjetivação através de crescente objetivação do co-nhecimento, [ocorrendo] uma desqualificação dos valores” (PE-TERS, 2002, p. 328). Em sua fala, ele faz uma ressalva: precisa-mos aceitar a transformação estrutural da informação e do conhe-cimento e esperar que as perdas sejam compensadas pelas novasoportunidades de termos um grande volume de informações dis-poníveis e novas formas de conhecimento.

8 Separando o joio do trigoAo tratar das semelhanças e diferenças dos termos, Peters

(2002) alerta que algumas são claramente identificadas como con-juntos de dados sistematizados, codificados e comunicados, masentende que essa concepção impede que se detecte qualquer dife-rença nas formas externas, porque inicialmente esses termos estãoalojados no cérebro dos indivíduos, e isso acaba acarretando difi-culdades para distinguí-los. Ele é contundente, ao afirmar que oaspecto formal do termo provoca equívoco, sendo necessário umexame semântico mais apurado para mostrar que se diferenciam.Nas definições de autores como Kulen, Hartman, Romiszowskie Pia Jeger, ele observa uma tendência para conceber o conheci-mento como algo que resolve problemas, revelando sua disponi-bilidade e armazenagem.

Esse autor evidencia as sobreposições e as coincidências entreos termos informação e conhecimento e se propõe a elucidá-los,apontando suas características e diferenças estruturais, a saber:

a) Referência a um sujeito: a característica mais proeminente

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é a referência a posteriores atividades cognitivas do sujeito emque apenas um indivíduo ou um grupo de indivíduos pode evo-luir e ser o portador do conhecimento, enquanto a informação éum conjunto de dados que oscila na rede e, ao ser assumido porum sujeito histórico e ativo, pode ser transformada em conheci-mento. Ao fazer uso das palavras de Don Tapscott (1977), o au-tor opõe-se à concepção que apreende o conhecimento como algoarmazenado no sujeito, esclarecendo que a informação para setransformar em conhecimento, exige a mobilização da atividadecognitiva do sujeito numa ação que envolve interpretação, síntese,atribuição de sentidos e reflexão sobre os valores implícitos;

b) Portador individual– o conhecimento é individual porqueestá restrito a um sujeito e recepciona sua característica especialem cada contexto e os fatores que o influenciam são diferentespara cada indivíduo. Essa característica começa no processo deaquisição em que o indivíduo aciona sua capacidade cognitiva edemonstra o modo como seleciona, analisa, verifica, avalia, adota,integra, sintetiza, reflete sobre a informação. O conhecimento ad-quirido interage com as diversas formas de conhecimento aindanão conhecidas, e as experiências anteriores específicas são sem-pre parte da história da aprendizagem do indivíduo. A transmis-são do conhecimento exige atores humanos com capacidades ehabilidades, enquanto a troca de informações ocorre automatica-mente entre computadores;

c) Referência ao ambiente- o produtor de conhecimento situa-se em um determinado contexto histórico-social e é afetado pordiversos fatores e os afeta também. O conhecimento produzidopor um indivíduo tem uma referência social e cultural e “terá quesatisfazer a exigências éticas, porque as pessoas envolvidas estãoorientadas conscientes ou inconscientemente para os padrões deseu grupo ou sociedade” (PETERS, 2002, p. 312-313). As insti-tuições também planejam processos de conhecimento, conduzeme controlam, exercendo um feito sobre a circulação, dissemina-ção e interpretação desse conhecimento. O produto é individual eúnico;

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d) Constância- O conhecimento tradicional é relativamenteestático, porque está ligado a estruturas individuais de conheci-mento e à memória de longo prazo que permite uma ampla sobre-vida e recebe apoio de instituições que o perenizam. Uma outradiferença é que a informação possui uma estrutura adversa do co-nhecimento, não resultando do processo cognitivo do indivíduo,estando ausentes dela as referências afetivas e histórico-sociaisque influem na gênese do conhecimento. A informação é de natu-reza fragmentária e descontextualizada e está constantemente ar-mazenada, em diferentes suportes, e empacotada para fazer comque os aprendentes de todos os grupos e culturas possam ingerí-las, enquanto o conhecimento está ligado a um contexto e depen-dente das ações do indivíduo.

Em suas críticas aos estudos que amparam o argumento damundialização do conhecimento armazenado na rede de compu-tadores, Peters reafirma que informação e conhecimento são in-terpretados de forma equivocada, e as definições que igualam ostermos, levam-no a inferir que “as redes não podem armazenarconhecimento, muito menos produzi-lo, e que o conhecimentohumano nunca pode ser eletrônico [e dificilmente] pode ser o re-sultado do processamento computadorizado de informações” (PE-TERS, 2002, p. 314-315). Se isso acontece dessa maneira, entãoo trabalho mental dos indivíduos e o seu processo de reconheci-mento da informação são automatizados. O argumento que re-força a idéia de que informação armazenada é conhecimento; éparte de uma prática disciplinar que transforma em conhecimentoa informação armazenada no computador.

A informação, segundo o autor, tem valor parcial na produçãoe retenção do conhecimento, e o computador, como um suportecomplementar, cumpre a tarefa de facilitar, localizar e selecionaressa informação. Entretanto, a máquina não funciona sozinha:precisa das funções cognitivas dos agentes humanos.

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8 Universidade: Que informação? Queconhecimento?

È fato que a universidade, em toda a sua história, assumiu diver-sas posições na sociedade, representando diferentes projetos, orareproduzindo o conhecimento ora participando de diferentes mo-vimentos para construção de um conhecimento crítico na perspec-tiva de mudanças socioculturais. Essa instituição, como um todo,dissemina, forma e produz informação, podendo ser caracterizadacomo um “complexo informacional” (MORIN, 2002), que supõea circulação e a comunicação da informação num processo que atransforma numa célula-viva.

Em sua qualidade de complexo informacional, de um lado, auniversidade preserva, memoriza e integra e, de outro, ritualiza opatrimônio cognitivo e regenera-o pelo exame, atualizando seusdiscursos e práticas, transmitindo-os aos indivíduos, com vistas àprodução do saber e cultura para as gerações. Seu caráter conser-vador fortalece, sublinha Morin, quando implica a preservação deum passado que se dispõe a salvar a força potencial de desintegra-ção cultural atuante, mas, paradoxalmente, pode tornar-se estérilquando essa preservação se torna dogmática, congelada e rígida,interditando as demandas necessárias à sua modernização e ade-quação às exigências do presente século. Se a universidade pú-blica mantém-se fechada em uma redoma, certamente, obstruiráa fluência do avanço científico, tecnológico e informacional, re-tomando um passado em que a ciência moderna formou-se, emparte, fora desses conhecimentos (MORIN, 2002). O autor ob-serva que nem sempre a universidade agiu fora do seu tempo, poisque, em sua sede de conhecimento, procurou responder ao desafiodo desenvolvimento das ciências do século XIX, laicizando-se eabrindo-se à grande problemática generalizada e fundamental doRenascimento e às suas reflexões sobre mundo, natureza, vida,homem e Deus, recolhendo nela a essência da cultura européiamoderna e inscrevendo-se em sua missão transecular. Com a lai-cização, a universidade estabelece a sua autonomia em relação à

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religião e ao poder, instaura a livre consciência e a introdução dasnovas ciências e infra-estrutura. “A universidade vai desde en-tão fazer coexistir, e não comunicar – duas culturas, a cultura dashumanidades e a cultura da cientificidade, declinando-se para aespecialização” (MORIN, 2000, p.38).

Na atualidade, escreve Morin, a universidade cumpre umafunção paradoxal: tentar adaptar-se à modernidade científica eintegrá-la ao todo, responder às necessidades fundamentais de for-mação e fornecer as novas profissões técnicas aos aprendentes.Entretanto, a construção da universidade que a sociedade desejaaproxima-se do formato de um sistema plenamente formativo eprodutivo. Mas, para que isso ocorra, é necessário que os ensinan-tes disseminem uma cultura que possa promover os valores poten-cializadores da instituição universitária: autonomia de consciên-cia, problematização, pesquisa, diversidade cultural e ética. Noentanto, essa construção somente se efetivará quando seus ges-tores, corpo docente, alunos e funcionários aderirem à “reformade pensamento” muito mais profunda que a democratização doensino universitário e a generalização da condição atual de se-rem aprendentes ao longo da vida. Trata-se de uma reforma quese diferencia da simples mudança do conteúdo, a cada semestre,desloca-se do paradigma do acervo para o paradigma da informa-ção e diz respeito à nossa atitude enquanto ensinantes e apren-dentes, diante da informação e de sua organização em conheci-mento no tecido do projeto político-pedagógico e sua concretiza-ção na prática. É nessa perspectiva do “pensar complexo” queos cursos de formação deveriam assentar os fundamentos teórico-metodológicos e analíticos de seu projeto, o qual, antes de se con-formar às demandas econômicas, técnicas e administrativas domercado, deveria auto-regenerar-se, buscando “a substância cria-tiva e inovadora” (MORIN, 2000): a informação, a organizaçãoe a interpretação para transformá-la em conhecimento, sabedoria,saber e cultura, devolvendo-lhe o sentido amplo, que é a comuni-cação de conhecimentos inteligíveis.

A inteligibilidade do conhecimento não se fixa na quantidade

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ou mensuração da informação recebida, interfere Peters (2002), e,sim, na natureza da interlocução que os indivíduos mantêm comseu contexto, que é gerado em suas mentes através da regenera-ção das estruturas de conhecimento específicas e das experiênciasacumuladas que contribuem para a individualização do conheci-mento. O conhecimento se desenvolve de forma individual por-que as precondições cognitivas são diferentes para cada indivíduoe sua história de vida de produz um efeito sobre o conhecimento.

Sem dúvida, é o contexto que influencia a construção do co-nhecimento e o desafio que a inteligibilidade aponta e a necessi-dade de pensarmos sobre o cerne da questão: não adianta mudar-mos as estruturas universitárias ou implementar sistemas de infor-mação sem mudarmos as mentes ou mobilizar adequadamente asestruturas cognitivas de gestores, docentes, aprendentes, coorde-nadores de cursos, orientadores e pesquisadores ou mudar estasestruturas sem considerar essa inteligibilidade, pois o todo estácontido nas partes e essas devem estar contidas no todo. Essa basemoriniana coloca uma impossibilidade que nos parece lógica: aeducação dos educadores. Nesse sentido, indagamos: quem oseducará, se o complexo informacional, em que estão inseridos,ainda não mudou as concepções enraizadas de educação, ensino,informação e conhecimento?

Nessa sociedade complexa, em que circulam a informação e oconhecimento, a contribuição de Morin (2000) ensina o caminhodas águas: é necessário que os educadores se auto-eduquem, seauto-regenerem, se auto-organizem, e nessa sugestão acrescenta-mos a idéia de que devem se educar prestando atenção às urgen-tes necessidades da sociedade da informação e do conhecimento,exponencialmente representadas pelas novas necessidades e con-dições de produção que a nova sociedade requer de ensinantese aprendentes. Nesse discurso, parece claro que nem todos osagentes do processo educativo estão motivados a depreender es-forços para mudar sua realidade ou suas práticas informacionais.Concordamos com ele, quando enfatiza que a reforma da univer-sidade se anunciará a partir de iniciativas marginais, ou seja, cada

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um começando a fazer a sua parte. Embora compreenda tambémque a reforma do todo é uma tarefa da própria universidade oudos sistemas de informação, ele entende que, para isso acontecer,são imprescindíveis às idéias externas, críticas e contestações e,sobretudo, a reflexão interna; devem-se problematizar a ciência ea técnica. Para ele, a perspectiva histórica para a atual sociedadeé a de que o complexo informacional deve ultrapassar-se para sereencontrar (MORIN, 2000).

No complexo informacional, focalizamos cursos de forma-ção em que autores como Cardoso (2004) considera a especifi-cidade da área na qual é imperativo o estudo das característicasconceituais da informação em sua dimensão circulante de produ-ção, captação, análise e organização, recuperação e disseminaçãopara produção, atividades necessárias às demandas do desenvol-vimento tecnológico. Essa discussão pressupõe a parceria da pós-graduação com a graduação, a qual exige o desenvolvimento deatividades de ensino e pesquisa que vise ao fortalecimento dessainteração. Nessa direção, os programas de Pós-Graduação deve-riam formular propostas de parcerias que pudessem considerar:

• Estágio-docência, envolvendo alunos da pós-graduação noensino de graduação;

• Cursos de capacitação para docentes com base nas novastecnologias;

• Incentivo da participação de docentes e discentes em even-tos científicos para comunicação de atividades de pesquisas(concluídas ou/em andamento);

• Seminários, workshops e palestras, a partir dos grupos elinhas de pesquisa;

• Inserção de discentes em atividades de iniciação científica(PIBIC, PROLICEN, PROBEX, MONITORIA etc).

Essa parceria é desejável em qualquer área de conhecimentoporque a interatividade permitida entre os dois contribui para a

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aceitação do diálogo, autonomia e reconhecimento dos limitesde cada um deles, implicando considerar a complexidade do atode informar para educar e envolve relações inter/pluri/multi/transcom discentes de cursos e/ou áreas do conhecimento similares,que visem atender ao formato tecnológico imposto pela sociedadede informação e do conhecimento à formação do indivíduo. Essaparceria é o resultado consciente do intercâmbio entre as “inte-ligências múltiplas” (GARDNER, 1999) e só pode ser vista emrelação com o contexto prático em que se realiza, o qual está mul-ticondicionado por fatores de diversos tipos e se convertem emaprendentes do diálogo entre o projeto e a realidade. Essa articula-ção aponta para novos horizontes da produção do conhecimento edo desenvolvimento local em que o profissional da informação emexercício da docência desnuda-se de seu caráter eminentementetécnico, passando a ser concebido como um indivíduo capaz defornecer as condições de produção adequadas, a fim de que apren-dentes possam tomar posse da informação para ressignificá-la etransformá-la em conhecimento com a perspectiva de contribuirpara o desenvolvimento local, regional e nacional.

Essa maneira de pensar é compatível com o contexto das tec-nologias da informação e comunicação que expressa uma nova vi-são de conhecimento, pressupondo indivíduos dotados de idéias eexperiências para emitirem opiniões, tirar conclusões e tomar de-cisões coerentes. Os imperativos que requisitam indivíduos comtais características comungam com

O desafio de adquirir a competência necessáriapara transformar a informação em um recurso econô-mico estratégico [porquanto] o conhecimento é hojeo fator essencial em todas as etapas do processo pro-dutivo [...] Novas especializações profissionais e pos-tos de trabalho surgiram, mas também diversas ocu-pações tradicionais foram ou estão sendo transfor-madas, substituídas ou mesmo eliminadas [...] Nãoé possível antecipar quais serão as novas demandas

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profissionais que irão surgir nem que rumos irão to-mar as mudanças nos padrões de trabalho e emprego[...] cada vez mais se exige dos trabalhadores contí-nua atualização e desenvolvimento de habilidades ecompetências, de modo a atender aos novos requisi-tos técnico-econômicos e a aumentar a empregabili-dade (TAKAHASHI, 2000, p.17-21).

Para isso, a atitude acadêmica adequada deve assegurar dis-cussões que visem à formulação de novas propostas de imple-mentação de um projeto político-pedagógico, sem perder de vistaa perspectiva crítica, segundo a qual a construção de uma ciênciado presente e do futuro precisaria aceitar o desafio de fortalecero discurso teórico com a mesma intensidade (MEDEIROS, 2003)com que defende a técnica. Ao priorizar exclusivamente os pro-cessos técnicos, as ciências esquivam-se de sua capacidade argu-mentativa, discursiva, reflexiva e multireferencial, que são partesconstituintes de um pensar complexo, para isolar-se, instituindoum modo de fazer conhecimento em que seus produtores, rara-mente, dialogam. O “conhecimento do conhecimento” (MORIN,2000) só poderá alcançar seus propósitos de geração e aplicação,quando reatar com o todo.

O conhecimento tornou-se um dos principais fatores de supe-ração de desigualdades, de agregação de valor, de criação de em-prego qualificado e de propagação de bem-estar, sendo que a novasituação tem reflexos no sistema econômico e político. Os discur-sos especializados atuam sobre o conhecimento e as novas formasde produção de sentido e funcionam como uma expressão dos no-vos projetos de intervenção sobre outras formas de conhecimento,comunicação e transformação (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2001).

Apoiado nas reflexões da educadora Norda (2001), que de-fende a sociedade do conhecimento, Peters observa que o conhe-cimento transformou-se em um mecanismo constitutivo das soci-edades modernas, e o conteúdo do trabalho de um grupo de pes-soas aumenta cada vez mais, de tal forma que o conhecimento

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determina a identidade delas de forma tão decisiva quanto a pro-priedade determinou as relações de produção capitalista.

9 Considerações finais

Retomando os argumentos aqui colocados e discutidos, é impor-tante amarrar algumas idéias que consideram a informação e oconhecimento como termos dotados de várias camadas e signifi-cados múltiplos que aumentam com o crescente avanço das tec-nologias da informação e comunicação, diferindo-se, assim, daabordagem tradicional. O novo papel da conexão informação-conhecimento, que responde pelos efeitos da globalização e deuma rede global de informática e comunicações baseada no usodas tecnologias da informação, é responsável pelas mudanças nasrelações da educação e do formato e conteúdo de trabalho, de-vendo este assumir cada vez mais um caráter informacional comimplicações significativas para os indivíduos e suas interaçõescom o conhecimento.

Os críticos da sociedade da informação e da sociedade do co-nhecimento, das tecnologias da informação e comunicação e suasbases de conhecimento ressaltam que o uso dos termos pressupõeo domínio da diferenciação que existe em cada um e, muitas ve-zes, anula a idéia de que a origem do volume de informações temcomo base a teoria da informação shannoniana. Essa advertên-cia supõe que gestores, educadores e profissionais da informaçãotambém estabeleçam claras linhas divisórias entre os indivíduosque estão capacitados para participar ativamente dessa dinâmicaininterrupta de inovação e aprendizado, e aqueles que não estãoincluídos nessa nova base técnico-produtiva.

A característica mais impactante do novo formato da nova so-ciedade é a inversão dos valores humanos que desencadeia fluxosinformacionais nunca antes imagináveis. Sua dinâmica assumeo controle de nossas vidas, constrange os indivíduos pela perdado emprego, em razão da versatilidade e facilidade das tecnolo-gias que transformaram as relações sociais entre capital e traba-

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lho, sendo possível substituí-las a qualquer momento e, com isso,contribuir para aumentar a pobreza e a desigualdade social e pro-duzir um amplo mapa da exclusão.

A universidade, enquanto complexo informacional, deve ge-renciar o acesso e uso da informação articulando-se com as açõeseducacionais e as condições de produção de conhecimento queenvolvem aprendentes em seus interesses e objetivos pessoais eprofissionais. Incluir é um dispositivo inteligente, a partir doqual os indivíduos de diferentes culturas e grupos sociais podemexperimentar, reinventar e agir. Embora a informação e o co-nhecimento tenham papéis fundamentais no processo de ensino-aprendizagem, os educadores, enquanto ensinantes e facilitado-res, precisam ensinar aos aprendentes que a informação proces-sada nas redes de computadores ainda não representa o conhe-cimento, porque este necessita ser trazido pelos indivíduos paraum novo contexto. Insistindo na pergunta que não quer calar, in-dagamos: O que as mutações socioculturais, que incidem sobreos significados da conexão informação-conhecimento, implicampara a formação de competências?

Para que p processo de formação que se desenvolve nos am-bientes informatizados seja significativo, é preciso que os indiví-duos sejam capazes de diferenciar as diferentes formas de conhe-cimento com vistas à educação ao longo da vida, sem esquecerque a informação formatada e produzida com ajuda dos compu-tadores em rede precisa ser trabalhada, e o conhecimento brotada interação que o indivíduo mantém com a informação e as suashistórias, emoções e experiências acumuladas. È necessário quedesconstruamos a visão que reduz a informação a um dado inerte,e a sua comunicação, a um processo unidimensional de transportee decodificação, sem atentar para o fato de que a informação eseus significados alteram-se ao se deslocar de um indivíduo aooutro e de uma rede a outra, de um tempo e espaço a outro. Essadiferenciação ajuda-nos a ter uma atitude crítica sobre a informa-ção, pois “uma sociedade sem crítica é uma sociedade morta: ocomponente humano cede lugar às relações maquínicas, aos pro-

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cessos tecnológicos marcados por inteligências artificiais e estú-pidas” (PRADO, 2002, p. 4). É importante considerar a nova ge-ração de crianças e, principalmente, adolescentes que conectamvolumosas unidades de informação, desenvolvendo habilidadespara resolver problemas, inventar estratégias para alcançar seusobjetivos e familiarizar-se com as novas formas de interagir como conhecimento e, mesmo que mobilizem o conhecimento tradi-cional, possam chegar a resultados produtivos, a partir de valorese atitudes diferentes.

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