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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ - UNIVALI CAMPUS DE ITAJAÍ CENTRO DE PESQUISAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
O PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO OPERARIO: UMA REFLEXÃO
THIAGO LUIZ GESSER CESCA
Itajaí, 20 de novembro de 2008
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ - UNIVALI CAMPUS DE ITAJAÍ CENTRO DE PESQUISAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
O PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO OPERARIO: UMA REFLEXÃO
THIAGO LUIZ GESSER CESCA
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Professor Silvio Noel de Oliveira Jr.
Itajaí, 20 de novembro de 2008
AGRADECIMENTO
Agradeço a Deus, que foi meu companheiro, mesmo nos momentos em que nem eu não
conseguia mais me suportar.
Agradeço ao meu Amor, que foi meu Porto Seguro, minha inspiração.
Agradeço a minha Família, que me deu todas as possibilidades de chegar até aqui, juntamente
com uma vasta bagagem de ensinamentos que me proporcionaram, que valem mais do que
qualquer coisa.
Agradeço aos Amigos e Amigas, minha turma do Chocoleite! Grande honra foi ter a sua brilhante
companhia durante esses melhores anos que eu poderia esperar passar.
Agradeço aos meus Mestres, pois me ensinaram tudo o que podiam da melhor forma que permiti.
Enfim, agradeço a todos que de alguma forma me ajudaram para a realização dessa odisséia que chamam de Monografia. Agradeço a quem por
ventura possa ter atrapalhado também, afinal o importante é participar. E ao final, apenas com as dificuldades que se aprende a viver e dar valor ao
que se tem.
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho acadêmico à bondade de Deus, que me dá força e inspiração, e que me
deu possibilidades de dedicar também ao amor incondicional da e para a Luiza. Ela é muito mais
do que eu poderia esperar de bom; mas não posso deixar de lembrar da amizade do Jefferson;
à boa conversa do Ednelson; à fidelidade da Kamila; ao sorriso da Sheila; ao olhar da Juliana; ao companheirismo do Luiz Gustavo; a gentileza
do Cleiton, do Marco Eduardo; à delicadeza da Daniela; a constância da Cíntia, da Mônica; à
seriedade do Thiago; a alegria do Ernandes; ao carinho da Aline; a certeza da Mirelle; a
integridade da Liziane; à paciência do Pascal, do Alessandro e de todos aqueles que, querendo ou
não, dividiram a companhia dos seus amores; a boa vizinhança do Jean; à segurança da família inicial e aos braços abertos da outra família; e a todos aqueles que vêm e vão, mas deixam sua
marca no fundo do coração.
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do curso de Direito, a banca examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí, 20 de novembro de 2008.
Thiago Luiz Gesser Cesca
GRADUANDO
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Thiago Luiz Gesser Cesca, sob o
título O Princípio do In dubio pro operário: uma reflexão, foi submetida em 20 de
novembro de 2008 à banca examinadora composta pelos seguintes professores:
Silvio Noel de Oliveira Jr (orientador) e Rosane Maria Rosa (examinadora), e
aprovada com a nota.
Itajaí, 20 de novembro de 2008.
Professor Msc. Antonio Augusto Lapa Coordenação da Monografia
Professor Silvio Noel de Oliveira Jr. Orientador
ROL DE CATEGORIAS
Rol das categorias que o autor considera estratégicas para a
ideal compreensão do trabalho a seguir, com os seus respectivos conceitos
operacionais:
Direito do Trabalho:
“Denominação dada ao conjunto de leis que se estatuem as normas reguladoras
dessas relações individuais e coletivas do trabalho. É igualmente assinado como
Direito Trabalhista e tem sua principal base a CLT”1
Direito Processual do Trabalho:
“Direito Processual do Trabalho é o conjunto de princípios, regras e instituições
destinadas a regular a atividade dos órgãos jurisdicionais na solução dos
dissídios, individuais e coletivos, entre trabalhadores e empregadores”.2
Empregado:
“Derivado do latim implicare (unir, juntar, ligar), é o vocábulo utilizado na
terminologia jurídica para indicar a pessoa física que, unida ou ligada à outra, por
se encontrar sob sua direção presta serviço a essa, em regra, mediante
remuneração”. 3
Empregador:
“É o ente destituído de personalidade jurídica. Não é o requisito para ser
empregador ter personalidade jurídica. Tanto é empregador a sociedade de fato,
a sociedade irregular que ainda não tem seus atos constitutivos registrados na 1 MARTINS, Sergio Pinto. Direito Processual do Trabalho. São Paulo: Atlas, ª ed., 2004, p. 315. 2 SILVA, de Plácido e. Vocabulário Jurídico. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 273. 3 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao direito do trabalho. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 17.
repartição competente, como a sociedade regularmente inscrita na Junta
Comercial ou no Cartório de Títulos e Documentos. Será também considerado
como empregador o condomínio de apartamentos, que não tem personalidade
jurídica, mas emprega trabalhadores sob o regime da CLT (lei nº 2.757/56).”4
Globalização:
“Processo de integração econômica mundial que acontece com a abertura do
comércio internacional. Significa um avanço do capitalismo, um mecanismo que
busca a redução de custos e o aumento da produtividade na fabricação de
mercadorias”.5
Princípios:
“Princípios são verdades fundantes de um sistema de conhecimento, como tais
admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por
motivos de ordem prática de caráter operacional, isto é, como pressupostos
exigidos pelas necessidades da pesquisa e da práxis”.6
Moral:
“Implica em uma tomada de posição entre o bem e o mal, do que se faz ou não,
do que é aceitável ou não em nossa sociedade, levando-se sempre em conta uma
perspectiva ética”.7
Normas Trabalhistas:
4 SILVA, de Plácido e. Vocabulário Jurídico. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 302. 5 Disponível em: http://www.portalbrasil.net/economia_glossario.htm. acesso em 12 set. 2008. 6 REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 1980, p. 299. 7 HIRIGOYEN, Marie-France. Assédio Moral: A violência perversa do cotidiano. 4. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002, p. 15.
“São estruturas proposicionais enunciativas de formas de organizações sociais e
de movimentos humanos autorizados ou proibidos na ordem trabalhista pelo
governo do grupo”.8
Proteção:
“Do latim protectio, de protegere (cobrir, amparar, abrigar), entende-se toda a
espécie de assistência ou de auxílio prestado as coisas ou as pessoas, a fim de
que se resguardem contra os males que lhe possam advir.” 9
Relação de Trabalho x Relação de Emprego:
“A relação de trabalho possui caráter genérico e abarca todo e qualquer vínculo
jurídico que tenha por objeto uma obrigação de fazer, consubstanciada em
trabalho humano.
A relação de emprego é, pois, espécie da relação de trabalho e corresponde à
prestação de trabalho de forma subordinada por uma determinada pessoa física a
um destinatário, que poderá ser pessoa física ou jurídica.”10
8 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao direito do trabalho. 6ª ed. São Paulo: Ltr, 1980, p. 47. 9 SILVA, de Plácido e. Vocabulário Jurídico. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 303. 10 TEREBINTO, Cínara Graeff. Relação de trabalho e relação de emprego. In: Curso de direito do trabalho. Jackson Chaves de Azevedo (coordenador). São Paulo: Ltr, 2001, p. 65.
SUMÁRIO
RESUMO........................................................................................... XI
INTRODUÇÃO ................................................................................... 1
CAPÍTULO 1 ...................................................................................... 3
DA CONCEITUAÇÃO DE TRABALHO, DIREITO E PRINCÍPIOS..... 3
1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DO TRABALHO:...............................3
1.2 O DIREITO DO TRABALHO EM RELAÇÃO AOS PRINCÍPIOS...................14
1.3 PRINCÍPIOS DENTRO DA CONCEITUAÇÃO DE DIREITO..........................20
CAPÍTULO 2 .................................................................................... 31
PRINCÍPIOS:.................................................................................... 31
2.1 PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO DO TRABALHO: ..................................31
2.1.1 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: .................................................32
2.1.2 PRINCÍPIO DA ISONOMIA: .................................................................................34
2.1.3 PRINCÍPIO DA JUSTIÇA SOCIAL: ........................................................................35
2.1.4 PRINCÍPIO DA EQUIDADE:.................................................................................38
2.1.5 PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE: ........................................................................39
2.1.6 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE.................................................................42
2.1.7 PRINCÍPIO DA BOA-FÉ: ....................................................................................46
2.2 PRINCÍPIOS ESPECIAIS: ..............................................................................48
2.2.1 PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE DOS DIREITOS TRABALHISTAS:........................49
2.2.2 PRINCÍPIO DA IMPERATIVIDADE DAS NORMAS TRABALHISTAS: ............................52
2.2.3 PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DA REALIDADE:............................................................53
2.2.4 PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DA RELAÇÃO DE EMPREGO: ..................................55
2.2.5 PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO E SUB-PRINCÍPIOS: ....................................................58
2.2.5.1 Princípio da Proteção: ............................................................................58
2.2.5.2 Princípio da Norma mais Favorável: .....................................................59
2.2.5.3 Princípio “in dubio pro operario”: .........................................................60
2.2.5.4 Princípio da condição mais benéfica: ...................................................62
CAPÍTULO 3 .................................................................................... 64
PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO – IN DUBIO PRO OPERÁRIO:........... 64
2.3 PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO – IN DUBIO PRO OPERÁRIO: ........................64
2.4 JURISPRUDÊNCIAS:.....................................................................................80
CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................. 84
OBRAS CITADAS – BIBLIOGRAFIA DE ACORDO COM O GUIA DA METODOLOGIA DO TRABALHO CIENTIFICO......................... 86
RESUMO
Esta é a monografia para a conclusão do Curso de Direito da
Univali de Itajaí, Santa Catarina possuindo como objetivo a pesquisa para a
compreensão do Princípio do In Dubio pro operário, que é um sub-princípio do
Princípio da Proteção do trabalhador, na esfera do Direito do Trabalho.
Para tanto, num primeiro momento se buscou encontrar uma
contextualização histórica do Direito do Trabalho, no mundo e no Brasil, além de
suas fontes, dentre elas os seus Princípios reguladores. Após se pesquisou sobre
a definição dos princípios que norteiam o Direito do Trabalho na atualidade e por
fim uma abordagem mais específica do Princípio em questão, com as definições e
discussões pertinentes, bem como a sua aplicação pelo Egrégio Tribunal
Regional do Trabalho da 12ª região.
INTRODUÇÃO
A presente monografia tem como objetivo do estudo do
Princípio da Proteção, mais especificamente do seu sub-Princípio do In dubio pro
operário, na visão daquele que é o preterido pela ação do referido, no caso, o
empregador.
O estudo do referido tema apresenta-se com grande
relevância no contexto atual de globalização e da fortificação da massa
trabalhadora por se tratar de um ramo do direito que encontra-se entre as fontes
de discussão doutrinária da atualidade, posto que visivelmente obsoleto, torna-se
necessária à observação de sua aplicabilidade.
Ainda, como objetivo institucional, tem-se a produção desta
Monografia para a obtenção do grau de Bacharel em Direito pela Universidade do
Vale do Itajaí – UNIVALI.
Para o aprimoramento dos conhecimentos no campo jurídico
e sociológico apresenta-se as duas seguintes hipóteses para estudo:
• Os princípios que regem o direito do trabalho têm mera função de sustentação
da ordem jurídica posta, não se materializando durante a consecução do
contrato de emprego ou da ação trabalhista proposta.
• O princípio do in dubio pro operário é essencial para a regulação das relações
entre empregado e empregador e tem aplicação indistinta nas demandas
trabalhistas que envolvem dúvida acerca do direito pleiteado pelo obreiro.
2
Para tal, a pesquisa fora desenvolvida pelo método indutivo,
através das técnicas do referente e das categorias, com a utilização das fontes
bibliográficas no final citadas.
Afim de melhor se fazer compreender pelo leitor, se dividiu o
presente trabalho em 3 capítulos, dos quais no 1º se destaca evolução do direito e
dos princípios no mundo e no país. No 2º capítulo se definiu alguns dos princípios
norteadores do direito moderno e na 3ª parte se delimitou especificamente o
princípio do In dubio pro operário.
Por fim, a presente pesquisa se encerra com as
Considerações finais, onde se aponta os pontos conclusivos, se destacando o
entendimento que se obteve a partir das hipóteses propostas e a estimulação a
continuidade dos estudos acerca do referido tema da Monografia.
CAPÍTULO 1
DA CONCEITUAÇÃO DE TRABALHO, DIREITO E PRINCÍPIOS.
1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DO TRABALHO:
Quanto à etimologia do que vem a ser a palavra trabalho, se
tem à primeira controvérsia a ser discutida. Contextualizando-se a criação da
palavra, encontra-se que à raiz indo-européia werg atribui-se ‘idéia de trabalho ou
ação produtiva’ e representa-se no grego érgon, inglês work, ‘obra’ e ‘trabalhar’.
Tudo leva a crer que não exista uma raiz indo-européia comum e que cada um
dos troncos ou ramos ou língua indo-europeus desenvolveu, já isoladamente, já
em pares, o conceito. Este se associa ora a uma noção de ‘ação’, ora à de
produto’, ora à de ‘sofrimento, padecimento’, ora à de ‘peso, carga’.11
O latino labor significa labor, fadiga, afã, trabalho, obra e
também cuidado, empenho, sofrimento, dor, mal, doença, enfermidade,
desventura, desgraça, infelicidade.
Em seu ensaio, Ferraz12 cita Tilgher afirmando que os
gregos conceberam o trabalho como um castigo e como uma dor (o termo grego
pónos significa trabalho, tem a mesma raiz da palavra latina poena). Depois que
Lucien Fébvre acreditava que veio do sentido de tortura (tripaliare). Para Robertis,
a antigüidade não possui uma palavra que seja equivalente à nossa trabalho, na
qual se destacam a fadiga e pena, e também força e altivez.
11 FERRAZ, Fábio. Evolução histórica do direito do trabalho. Disponível em: http://www.advogado.adv.br/estudantesdireito/anhembimorumbi/fabioferraz/evolucaohistorica.htm. acesso em: 10 ago. 08. 12 FERRAZ, Fábio. Evolução histórica do direito do trabalho. Disponível em: http://www.advogado.adv.br/estudantesdireito/anhembimorumbi/fabioferraz/evolucaohistorica.htm. acesso em: 10 ago. 08.
4
Mas Fábio Ferraz13 comenta que hoje predomina o
entendimento de que provém do neutro latino palum, através do adjetivo tripalis
(composto de três paus) de que se deduziu tripalium, designativo de instrumento
feito de três paus aguçados, algumas vezes até munidos de pontas de ferro, no
qual os agricultores batiam as espigas de trigo ou de milho e também o linho, para
debulhar as espigas, rasgar ou desfiar o linho. Era também uma canga que
pesava sobre os animais ou um instrumento de tortura, constituído de cavalete de
pau, também usado para sujeitar os cavalos no ato de lhes aplicar a ferradura.
Mais tarde, ganhou o sentido moral de sofrimento, fadiga, encargo, e depois
adquire o sentido de trabalhar, labutar.
Pensando de forma prática, ou seja, o que o direito entende
pelo trabalho, considera-se que este precisa ter um conteúdo lícito, que seja
socialmente proveitoso, assim sendo, deve ter uma remuneração para tal.
O Direito do Trabalho apenas se ocupa do trabalho
subordinado, dependente, aquele em que alguém coloca suas energias em favor
de outra pessoa, trabalhando sob as ordens dela.
O conceito jurídico de trabalho supõe que este se apresente
como objeto de uma prestação realizada por um sujeito, seja pessoa física ou
jurídica em favor de outro. Isso ocorre quando uma atividade humana é
desenvolvida por uma pessoa física, essa atividade é destinada à criação de um
bem materialmente avaliável, quando surgir de relação por meio da qual um
sujeito presta, ou se obriga a prestar, pela própria força de trabalho em favor de
outro sujeito, em troca de uma retribuição.
Mas nem sempre o trabalho foi considerado desta forma,
como uma forma de se subsistir no mundo capitalista, através de um salário justo
e para tanto, com larga proteção judicial. Quanto à evolução pode-se destacar as
sociedades antigas a seguir:
13 FERRAZ, Fábio. Evolução histórica do direito do trabalho. Disponível em: http://www.advogado.adv.br/estudantesdireito/anhembimorumbi/fabioferraz/evolucaohistorica.htm. acesso em: 10 ago. 08.
5
Desde as eras pré-históricas o homem trabalhava para se
subsistir e dar sustento aos seus protegidos, num primeiro momento de forma
mais pessoal e rudimentar. Mas mesmo naquele momento, conforme a invasão
de outras pessoas, o homem se viu necessitando defender sua prole e seus bens
e para tal foi se cooperando com que podia. Assim, naquela época o trabalho o
homem foi evoluindo socialmente e em decorrência a forma de trabalho foi junto.
Mais tarde, no Egito antigo, o homem já evoluído trabalhava
as margens do rio Nilo e produzia a riqueza necessária para manter não mais
apenas a família, mas todo o Estado que o cercava. Ali o trabalho já foi se
tornando algo mias profissional, haja vista que o homem já trabalhava para
alguém mais do que o membro mais forte. Tal situação também persistia entre
hebreus.
Com esse Estado cada vez mais dominando a sociedade,
foi-se aumentando a diferença entre as pessoas, onde surgiram os trabalhadores
escravos. Estes eram dominados, não mais por um indivíduo, mas por todo um
sistema que precisava de mão de obra para as atividades subalternas, e que
encontrava nos prisioneiros principalmente a sua função ideal.
Nesta época, mais precisamente no momento em que a
Roma republicana, neste momento já dominada por seus pensadores começou a
ter idéias de libertação social. Isso porque os impérios não tinham mais a força
que em momentos anteriores e ficava difícil vários pequenos líderes manterem
grandes massas produtivas. Com o advento e os seguidores do código de
Hammurabi, os escravos foram obtendo seus primeiros direitos e a
profissionalização dos homens livres.
Essa profissionalização se tornou mais latente na Grécia,
onde num primeiro momento os pensadores eram aclamados e os outros tipos de
trabalho eram considerados desprezados, mas foram substituídos com a
preocupação com o ser humano nas fases aristotélicas.
Mas a dignificarão do trabalho veio mesmo com o
Cristianismo. A palavra de Cristo deu ao trabalho um alto sentido de valorização,
6
que ganha justa e inegável sublimação, com o reconhecimento expresso da
dignidade humana de todo e qualquer trabalhador.
Após a escravidão, segue-se o servilismo, apesar da
escravidão não ter sido completamente abolida. A servidão é uma característica
das sociedades feudais. O trabalho servil significou uma forma mais branda do
escravagismo. Foi um tipo de trabalho organizado, em que o indivíduo, sem ter a
condição jurídica de escravo, não dispunha de liberdade, visto que seus senhores
eram os donos da terra e de todos os direitos. Sujeitavam-se a abusivas
restrições, inclusive de deslocamento, submetidos a um regime de estrita
dependência do senhor feudal. Havia muitos pontos comuns entre a servidão e a
escravidão. O senhor podia mobilizá-los obrigatoriamente para a guerra e também
cedia seus servos aos donos das pequenas fábricas e oficinas existentes.
A servidão começou a desaparecer no final da Idade Média.
As grandes perturbações, decorrentes das epidemias e das Cruzadas, davam
oportunidade à fuga dos escravos e também à alforria.
Com o êxodo dos trabalhadores vieram as corporações de
ofício onde o homem passa a exercer a sua atividade em forma organizada, mas
não gozava de inteira liberdade. As Corporações eram grupos de produtores,
organizados rigidamente, de modo a controlar o mercado e a concorrência, bem
como garantir os privilégios dos mestres. O sistema significava uma forma mais
branda de escravização do trabalhador.
As Corporações tiveram grande importância para o surto do
moderno capitalismo, mas com a Revolução Francesa as Corporações de Ofício
foram suprimidas, por serem consideradas incompatíveis com o ideal de liberdade
do homem. Outras causas de extinção das Corporações foram à liberdade de
comércio e o encarecimento dos seus produtos.
O século XVIII representou para a história da humanidade
um momento novo, no qual a primazia pela razão elegeu o homem e suas
virtudes como responsáveis pelo progresso material e técnico e pela descoberta
de que essa nova experiência só podia alcançar seus objetivos se a liberdade de
7
viver e pensar fosse o leito do novo caminho. A liberdade veio como uma reação
ao Absolutismo Monárquico. Os filósofos atacavam duramente as instituições do
Antigo Regime. Opunham-se os liberais ao Absolutismo, rejeitando o direito divino
dos Reis e a Religião de Estado. Pregaram a separação dos poderes e a
insurreição. Destacaram-se Adam Smith, Jean-Jacques Rousseau, Locke,
Montesquieu e Voltaire, entre outros.14
O trabalho livre era considerado como uma das mais
marcantes comprovações da liberdade do indivíduo. Mas a liberdade de contratar
não dava meios ao operário, premido pela fome, a recusar uma jornada que
muitas vezes se estendia durante quinze horas, tendo retribuição miserável.
Teoricamente livre, o operário tornava-se cada vez mais dependente do patrão.
Surgia uma concepção de direito contrária aos interesses do proletariado.
A Revolução Industrial acabou transformando o trabalho em
emprego. Os trabalhadores passaram a trabalhar por salários. Provocavam-se
greves, criavam-se organizações proletárias, travavam-se choques violentos entre
essas massas e as forças policiais ainda movimentadas pela classe capitalista.
Na política, a voz dos trabalhadores já era ouvida nos parlamentos. Os
trabalhadores passaram a reivindicar seus direitos através dos sindicatos. O
direito de associação passou a ser tolerado pelo Estado.
O Estado começou a legislar sobre o assunto, impondo
peias à liberdade de contratação. O individualismo contratual dá lugar ao
dirigismo contratual, à intervenção jurídica do Estado, limitando a autonomia da
vontade. O Estado passou a buscar um equilíbrio entre os sujeitos do contrato,
deixando de ser mero espectador do drama social para impor regras
confirmadoras da vontade dos contratantes. Protege economicamente o mais
fraco para compensar a desigualdade econômica, para que a relação se torne
mais igualitária. O direito do trabalho vem para igualar juridicamente a diferença
econômica, chegando até a formação jurisdicional atual.
14 FERRAZ, Fábio. Evolução histórica do direito do trabalho. Disponível em: http://www.advogado.adv.br/estudantesdireito/anhembimorumbi/fabioferraz/evolucaohistorica.htm. acesso em: 10 ago. 08.
8
No Brasil, o Direito do Trabalho engendrou-se de maneira
diversa do europeu. Enquanto na Europa a legislação trabalhista decorreu,
sobretudo, de fontes autônomas (convenções e acordos coletivos de trabalho), no
Brasil a produção de tais normas deveu-se às fontes heterônomas (normas
jurídicas impostas coercitivamente ao indivíduo). Raquel Veras Franco15 comenta
que o Direito do Trabalho começou pelo Direito Individual, não pelo Coletivo, de
modo a causar uma situação na qual “as restrições à liberdade sindical eram
trocadas pela observância dos direitos individuais do trabalhador” - embora
“houvesse também uma distância entre o ideal e o real no caso dos direitos e das
reivindicações trabalhistas individuais”.16
Sabemos que o pressuposto que inspira todo Direito Individual do Trabalho é que há, entre empregado (pessoas física) e empregador (pessoa física ou jurídica) um desnível de poder. Por causa dessa diferença de poder, a autonomia da vontade, princípio básico do Direito Civil, fica prejudicada. Nesse caso, portanto, o Estado deve intervir obrigatoriamente contra a autonomia da vontade, garantindo ao trabalhador seus direitos básicos. Isso porque, enquanto no Direito Civil as disposições legais em matéria contratual têm caráter supletivo ou subsidiário, no Direito do Trabalho têm caráter principal - de modo que eventuais abusos do empregador são coibidos, preservando-se, assim, o equilíbrio das relações de trabalho.17
A autora comenta ainda que o Direito Coletivo do Trabalho,
por sua vez, abrange os conflitos trabalhistas de fato. Ou seja: é nele que se
encontram os conflitos entre Capital e Trabalho. Como escreve Carlos Eduardo
Bosísio18: “é o Direito Sindical por excelência”. Portanto, o que deve ocorrer é o
15 FRANCO, Raquel Veras. Breve Histórico da Justiça e do Direito do Trabalho no Brasil. Disponível em: http://www.tst.gov.br/Srcar/Documentos/Historico/2-BreveHistoricodaJusticaedoDireitodoTrabal hono_Brasil.pdf. Acesso: 10 jul. 08. 16 FRENCH, John D. Afogados em leis – a CLT e a cultura política dos trabalhadores brasileiros, 1ª ed. São Paulo: Ed. Fundação Perseu Abramo, 2001, p. 17. 17FRANCO, Raquel Veras. Breve Histórico da Justiça e do Direito do Trabalho no Brasil. Disponível em: http://www.tst.gov.br/Srcar/Documentos/Historico/2-BreveHistoricodaJusticaedoDireitodoTrabal hono_Brasil.pdf. Acesso: 10 jul. 08. 18BOSÍSIO, Carlos Eduardo. “Justiça do Trabalho e Política do Trabalho no Brasil”. In: GOMES, Ângela de Castro. Trabalho e previdência: sessenta anos em debate. Rio de Janeiro: Ed. FGV/CPDOC, 1992.
9
Estado conceder, ao máximo, liberdade de atuação aos sindicatos, sobretudo
para que esses possam compor acordos com os empregadores.
No Brasil, entretanto, o Direito e a Justiça do Trabalho teriam surgido de uma matriz ideológica diversa, qual seja: a ideologia da outorga, do corporativismo, da absorção, pelo Estado, do Sindicato – o que teria neutralizado politicamente esse importante instrumento de mudança social, em especial a partir do Estado Novo. Se o Direito e a Justiça Trabalhista foram engendrados sob a ideologia da outorga, conseqüentemente seriam caracterizados pelo artificialismo – ou porque a legislação social era “avançada demais” para a estrutura produtiva e financeira da sociedade, ou porque os trabalhadores brasileiros não mereciam aquilo pelo que não teriam lutado para conseguir.
Não se pode negar completamente que tenha existido uma “ideologia da outorga” no engendramento do Direito e da Justiça Trabalhista no Brasil. Mas é preciso que se problematize tal fato. Primeiro porque as leis trabalhistas não foram uma concessão desinteressada e generosa de Getúlio Vargas. 19
Neste sentido, o sentido que foi buscado na normatização do
direito do trabalho no Brasil, foi para satisfazer o trabalhador, num primeiro
momento, e não protegê-lo de fato.
Não foram um beneplácito de um Estado forte - antes tiveram sua origem “num Estado nacional fraco que tentava desesperadamente construir uma firme base social para o seu poder”. Depois, as teses da outorga e do artificialismo acabaram por ocultar as lutas e estratégias de resistência dos trabalhadores brasileiros durante as primeiras décadas do século XX. Lutas e resistências que não se pode dizer que tenham sido a causa direta da concepção da CLT – mas que tampouco devem ser desconsideradas por não terem se assemelhado às lutas dos trabalhadores europeus. É preciso aí um esforço para se entender as especificidades das massas trabalhadoras brasileiras ao invés de simplesmente qualificá-las como submissas, desorganizadas ou desprovidas de consciência política:
19FRANCO, Raquel Veras. Breve Histórico da Justiça e do Direito do Trabalho no Brasil. Disponível em: http://www.tst.gov.br/Srcar/Documentos/Historico/2-BreveHistoricodaJusticaedoDireitodoTrabal hono_Brasil.pdf. Acesso: 10 jul. 08.
10
Um reconhecimento da fraqueza essencial dos trabalhadores perante seus patrões, especialmente em São Paulo, não implica uma ‘culpa’ dos próprios operários (a ‘ideologia do atraso’ de Weffort), mas sim aponta para o enorme poder global dos seus opositores. Nem tampouco implica – como presumem as teses da outorga e da artificialidade – que o baixo nível de poder exercido pelos operários urbanos em 1930 fosse inerente à classe ou à realidade social brasileira20
Como demonstra John French21, os operários brasileiros
souberam tirar proveito da legislação e das iniciativas políticas que iniciavam
naquele momento histórico e criaram um espaço para se reforçar e assim
organizar sua classe. A legislação trabalhista não pode ser entendida como mero
instrumento de um governo autoritário para a ‘domesticação’ dos trabalhadores -
a relação desses últimos com a lei foi mais ambígua, porque se muitos a
enxergavam como uma estratégia de dominação do Estado, outros encontraram
nela um recurso para luta e participação política.
Paulo Sergio Pinheiro22 fala ainda que muito se falou sobre a
não participação das massas populares nos movimentos políticos da primeira
metade do século XX e a ausência dos trabalhadores brasileiros desses
movimentos, mas isso porque diversos estudos foram desenvolvidos sobre seus
protagonistas, sem se considerar a estrutura de classes na qual se desenrolavam
as transformações da estrutura política. Essa carência deve-se à falta de esforço
para se entender as massas trabalhadoras brasileiras em suas particularidades.
Dever-se-ia, por exemplo, falar numa “presença política difusa” dessas massas,
tentando-se, assim, indicar a existência e a presença das classes populares e
trabalhadoras brasileiras nas lutas sociais do começo do século XX.
Portanto, não resta dúvida que o desenvolvimento do
capitalismo também influenciou na elaboração dos direitos sociais, conforme
ensina Ana Virginia Moreira Gomes:
20FRANCO, Raquel Veras. Breve Histórico da Justiça e do Direito do Trabalho no Brasil. Disponível em: http://www.tst.gov.br/Srcar/Documentos/Historico/2-BreveHistoricodaJusticaedoDireitodoTrabal hono_Brasil.pdf. Acesso: 10 jul. 08. 21FRENCH, John D. Afogados em leis – a CLT e a cultura política dos trabalhadores brasileiros, 1ª ed. São Paulo: Ed. Fundação Perseu Abramo, 2001, p. 17. 22 PINHEIRO, Paulo Sérgio. Política e trabalho no Brasil, 2ª ed. Ed. FGV, 2004.
11
A interferência do Estado possibilitou, ainda, o desenvolvimento do próprio capitalismo que se encontrava ameaçado, já que trabalhadores miseráveis não poderiam consumir a quantidade de bens produzidos nas novas fábricas. Daí se pode concluir que regulação social, decorrente desta nova postura do Estado em relação, não significou nenhuma ruptura do sistema econômico capitalista.23
Mas como destaca Tarso Fernando Genro: "Criou-se um
mito, em nossa literatura jurídica, que as leis sociais no Brasil são puro resultado
de um paternalismo estatal..." 24
No mesmo sentido Orlando Gomes e Élson Gottschalk: "Já
se disse, não sem razão, que o nosso Direito do Trabalho tem sido uma dádiva da
lei, uma criação de cima para baixo, em sentido vertical."25
Entretanto, estas afirmações nos parecem equivocadas,
sendo mais apropriada o pensamento de Tarso Fernando Genro sobre a matéria:
"Toda a legislação social, em regra, surgiu de duros combates de classe, de
violências contra a classe operária, momentos em que o Estado sempre revelou
sua essência de instrumento da dominação burguesa” ·.
Para se ter uma melhor dimensão dos fatos é propicio a
exposição de Orlando Gomes e Élson Gottshalk26 que define as seguintes fases:
1ª fase proclamação da independência até a abolição, 2ª fase da abolição até a
Revolução de 30 e 3ª fase da Revolução de 30 até nossos dias.
Na primeira fase destacam-se as normas de locação de
serviço entre brasileiros e estrangeiros de 1830, legislação sobre a locação de
serviço de colonos (1830) e o Código Comercial de 1850.
23 GOMES, Ana Virginia Moreira. A aplicação do princípio protetor no direito do trabalho, São Paulo: LTR, 2001 24 GENRO, Tarso Fernando. Direito individual do Trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 1994 25 GOMES, Orlando; Gottschalk, Élson. Curso de Direito do Trabalho. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994 26 GENRO, Tarso Fernando. Direito individual do Trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 1994
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A segunda fase apresenta a liberdade de associação de
1893, a sindicalização na agricultura e indústria rurais, normas de acidentes do
trabalho 1919 e a Lei Eloi Chaves que cria a Caixa de Aposentadoria e Pensões
Ferroviárias.
A terceira tem como ícone a Revolução de 30. Neste
momento desencadearam esse processo uma série de movimentos sociais,
dentre eles destaca-se a grande greve de 25 mil cachoeiros em 1903, no mesmo
ano a greve dos metalúrgicos da Fábrica de Pregos Ipiranga, onde se obteve
redução de jornada diária de 11h30 para 9h diárias, dentre outros movimentos
que estabeleceram um fermento ideológico para a Revolução de 1930. Esta
Revolução da origem a uma série de conquistas da legislação do trabalho, quais
sejam:
- criação da Justiça Trabalho em 1939;
- Consolidação das Leis do Trabalho em 1943;
- lei do repouso semanal em 1945;
- lei de greve e lockout em 1946;
- 13º salário em 1962;
- salário família em 1963;
A esta abordagem histórica, Tarso Fernando Genro27
acrescenta uma quarta fase a partir de 1964, onde o golpe militar desprestigia
instituições e retira do trabalhador a estabilidade através da criação do Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço pela Lei 5.107/6628.
27 GENRO, Tarso Fernando. Direito individual do Trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 1994 28 BRASIL. Lei no 5.107, de 13 de setembro de 1966. Cria o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, e dá outras providências. Altera a legislação tributária federal. Diário Oficial República Federativa do Brasil, Brasília,DF. 14 set. 1966. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5107.htm. Acesso em: 20 set. 2008.
13
Por fim, não pode se deixar de mencionar a Constituição de
198829 que inaugura uma nova fase na qual a gama de direitos individuais do
trabalho é guindada para o texto constitucional ganhando status de direito
fundamental do cidadão, merecendo este diploma uma abordagem específica em
relação à importância dos direitos tutelares na carta de 1988.
No que tange especificamente o princípio da proteção,
Halley Souza30 comenta que foi com a revolução industrial que este princípio
tomou força, considerando o advento dos direitos a mulheres e crianças
principalmente, que ate aquela época reconhecidamente trabalhavam de forma
sub-humana por serem considerados menos produtivos que os homens adultos.
Estes também não possuíam certos direitos trabalhistas que advieram daquela
época, no que se pode destacar, conforme o Tratado de Versalhes de 1919, que
instituiu a Organização Internacional do Trabalho, sendo que no seu artigo 427
consagrou mundialmente os fundamentos do Direito do Trabalho:
“1º- O princípio diretivo antes enunciado de que o trabalho
não deve ser considerado como mercadoria;
2º - O direito de associação visando a alcançar qualquer
objetivo não contrário às leis, tanto para os patrões como para os assalariados;
3º - O pagamento aos trabalhadores de um salário que lhes
assegure um nível de vida conveniente, em relação com sua época e seu país.
4º - A adoção da jornada de oito horas ou as quarenta e oito
horas semanais, como objetivo a alcançar-se onde ainda não se haja logrado;
5º - A adoção de um descanso semanal remunerado de vinte
e quatro horas, sempre que possível aos domingos.
29 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988. 30 SOUZA, Halley. Principiologia da proteção aplicada à realidade do Direito do Trabalho. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 62, fev. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3779>. Acesso em: 29 ago. 2008.
14
6º - A supressão do trabalho das crianças e a obrigação de
impor aos trabalhos dos menores de ambos os sexos as limitações necessárias
para permitir-lhes continuar sua instrução e assegurar seu desenvolvimento físico.
7º - O princípio do salário igual, sem distinção de sexo, para
um trabalho de igual valor.
8º - As leis promulgadas em cada pais, relativas às
condições de trabalho deverão assegurar um tratamento econômico eqüitativo a
todos os trabalhadores que residem legalmente no país.
9º- Cada Estado deverá organizar um serviço de inspeção
que inclua mulheres, a fim de assegurar a aplicação das leis e regulamentos para
a proteção dos trabalhadores.
... “31
Assim, o trabalho no mundo moderno deve ser seguido pelo
respeito à legislação e aos princípios formadores do direito. Para tal deve-se em
primeiro lugar entender o objetivo do direito e no decorrer deste trabalho buscar o
entendimento do objetivo da principiologia e especificamente o objetivo e a
necessidade do princípio da proteção.
1.2 O DIREITO DO TRABALHO EM RELAÇÃO AOS PRINCÍPIOS
O Direito do Trabalho como ramo autônomo do direito, é
composto por um complexo de regras ou normas, princípios e outros institutos
jurídicos que regulam as relações de trabalho. E tal ramo, desde meados do
31 TIEMANN, Marisa. Trabalho Educativo pode ser trabalho Produtivo? Revista Jurídica Virtual. Brasília, vol. 1, n. 5, Setembro 1999 Disponível em: www.planalto.gov.br/CCIVIL/revista/Rev_05/trab_educativo.htm}
15
século XIX se desprendeu da matriz civilista, originando todo o conjunto jurídico
que lhe assegura autonomia no mundo do direito.
Ao buscar a conceituação autônoma deste ramo do Direito,
deve-se ter como ponto de inicial a análise em relação aos princípios que
norteiam o ramo em questão.
No que se refere ao Direito do Trabalho, Américo Plá
Rodrigues cita Alfredo Rocco apontando três exigências para determinar a
autonomia de um ramo do direito: domínio suficientemente vasto tenha doutrinas
homogêneas presididas por conceitos gerais comuns e que possua método
próprio32.
O jurista uruguaio enfoca importante divergência entre os
autores espanhóis Eugenio Peres Botija e Gaspar Bayón Chacón, onde este
acredita que diante de um conflito entre princípio especial e princípio geral deva
prevalecer o geral sobre o princípio especial do Direito do Trabalho; já aquele
entende que deve prevalecer o princípio do Direito do Trabalho. Neste ponto, Plá
Rodriguez confirma o mesmo entendimento de Botija, pois considera que este
prima de melhor forma pelo imprescindível princípio da razoabilidade.
Os doutrinadores trabalhistas de nosso país também não
possuem opinião uniformizada sobre o assunto, porém, bem fundamentada a
opinião de Luiz de Pinho Pedreira da Silva33, o qual segue o posicionamento de
Perez Botija no sentido de que os princípios gerais do direito não se aplicam ao
Direito do Trabalho ao se contraporem com um princípio específico do ramo.
Na busca de melhor materializar a aplicação dos princípios
gerais é importante levar em consideração a definição do artigo 4º da Lei de
Introdução ao Código Civil que assim determina: "Quando a lei for omissa, o juiz
32RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000. 33 SILVA, Luiz de Pinho Pedreira da. Principiologia do Direito do Trabalho. 2.ed. São Paulo: LTr, 1999.
16
decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do
Direito".34
Se pode, ainda, perceber a mesma previsão no artigo 16 do
Código Civil, que prevê:
Art. 16. Quando ocorrer um negócio jurídico que não se possa resolver pelas palavras nem pelo espírito da lei, sobre matéria, recorrer-se aos fundamentos das leis análogas; e se, ainda assim subsistir a dúvida, recorrer-se-á aos princípios gerais de direito e às doutrinas mais acatadas, consideradas as circunstâncias do caso.35
Da mesma forma, a regra disposta no artigo 8º da
Consolidação das Leis do Trabalho36 afirma que na falta de disposições legais ou
contratuais, os casos serão decididos pela jurisprudência, por analogia, por
eqüidade e outros princípios e normas gerais de direito, mas, principalmente,
pelos princípios do Direito do Trabalho.
Por outro lado Luiz Pinho Pedreira da Silva37 informa, cabe
contestar certos elementos descritos no artigo 8º da CLT, primeiro porque a
redação da norma de princípios gerais do Direito pode inferir confusão com os
princípios gerais do Direito do Trabalho, devendo ser mais apropriado o vocábulo
"princípios especiais do Direito do Trabalho", pois este reflete melhor a autonomia
do ramo. A segunda crítica deriva da visão advinda da norma, de que os
princípios não possuem a única aplicação de preencher lacunas, mas surgem
para reajustar moldes jurídicos inadequados à proteção do trabalhador.
Assim, o comando que a norma apresenta é de
preferencialmente, tentar solucionar a controvérsia apresentada com os princípios
do Direito do Trabalho, e posteriormente, aplicar os princípios gerais do direito.
34 BRASIL. Lei de introdução ao Código Civil. Brasília, DF 35 BRASIL. Código Civil. Brasília, DF, 2002. 36 BRASIL. Decreto-lei nº 5.452 de 1º de maio de 1943. Aprova a consolidação das Leis do trabalho. Brasília, DF. 09 ago. 1943. 37 SILVA, Luiz de Pinho Pedreira da. Principiologia do Direito do Trabalho. 2.ed. São Paulo: LTr, 1999.
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Halley Souza38 comenta que tal idéia traz duas conclusões: a primeira de que os
princípios especiais do próprio ramo são hierarquicamente superiores aos demais;
a segunda que os princípios gerais do direito também podem ser aplicados ao
Direito do Trabalho.
O estudo dos princípios no Direito do Trabalho passa
necessariamente por uma abordagem que enfoque os elementos teóricos acerca
do tema, estabelecendo aquilo que Américo Plá Rodrigues denominou de Teoria
Geral, eis que o jurista tenta harmonizar o conjunto de definições presentes na
doutrina, afirmando que são "linhas diretrizes que informam algumas normas e
inspiram direta ou indiretamente uma série de soluções, pelo que podem servir
para promover e embasar a aprovação de novas normas, orientar a interpretação
das existentes e resolver os casos não previstos”.39
Na abordagem dos princípios aplicados ao Direito do
Trabalho é fundamental realizar um comparativo com outras figuras jurídicas. A
primeira comparação é em relação às normas, onde concordamos com as
afirmações do eminente doutrinador uruguaio Américo Plá Rodrigues40, no sentido
de que só os princípios exercem um papel propriamente constitucional, quer dizer,
constitutivo da ordem jurídica, sendo que existem métodos de interpretação da
norma jurídica determinando ou incumbindo aos princípios uma interpretação
mais ampla, devendo haver o necessário e primordial acréscimo dos valores que
estruturam e formam o entendimento.
Sem dúvida as regras ou normas nos impõem limites
definindo o que pode ser feito ou o que não pode ser feito, restando ao operador
do direito utilizar os princípios diante das situações imprecisas que irão ser
concretizadas. Os princípios são preceitos mais amplos que otimizam a ação se
associados a uma possibilidade jurídica e de fato.
38 SOUZA, Halley. Principiologia da proteção aplicada à realidade do Direito do Trabalho. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 62, fev. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3779>. Acesso em: 29 ago. 2008. 39 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000. 40 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000.
18
Luiz de Pinho Pedreira da Silva41 analisa a distinção entre
princípios e regras jurídicas, afirmando que a primeira diferença é relativa ao fato
de que as regras jurídicas estão sempre insertas explicitamente no ordenamento
interno enquanto que com os princípios isso não acontece.
Outra diferença é que as regras não comportam exceções,
são aplicadas por completo ou não, sendo que os princípios jurídicos conforme
ensina Eros Grau "atuam de modo diverso: mesmo aqueles que mais se
assemelham às regras não se aplicam automática e necessariamente quando as
condições previstas como suficientes para a sua aplicação se manifestam”.42
Jean Boulanger43 apud Eros Grau, afirma que embora as
regras jurídicas e os princípios jurídicos tenham em comum o caráter de
generalidade, não há entre ambos apenas uma desigualdade de importância, mas
uma diferença de natureza, pois a generalidade de uma é diferente da outra,
sendo que a regra geral se aplica quando ocorre determinado fato e o princípio é
geral porque comporta uma série indeterminada de aplicações.
Ainda, podem-se comparar princípios com as cláusulas
inseridas na Constituição. Sobre o tema, o jurista cita Roberto Garcia Martinez,
conceituando as seguintes diferenças: 44
“1.Enquanto as cláusulas provêm do constituinte, os
princípios de Direito do Trabalho não nasceram de um legislador de maior ou
menor grau, mas da consciência de uma época: podem ser plasmados em
normas legais ou constitucionais, mas não necessariamente;
2.Obrigatoriedade frente ao direito futuro. A cláusula
constitucional impõe ao legislador o cumprimento do princípio geral. Face ao
41 SILVA, Luiz de Pinho Pedreira da. Principiologia do Direito do Trabalho. 2.ed. São Paulo: LTr, 1999. 42 GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988(interpretação e crítica), São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990. 43 GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988(interpretação e crítica), São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990. 44 GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988(interpretação e crítica), São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990.
19
direito futuro, a norma constitucional é um obstáculo que impede o legislador de
se afastar de seus preceitos; se o fizer, incorrerá na violação da Constituição e a
lei poderá ser invalidada pelos juízes. Ao contrário, o princípio geral é um
obstáculo de altura regular que o legislador pode saltar;
3.Efeitos face ao direito presente. Se houver oposição entre
o direito presente ou vigente e a cláusula constitucional, prevalecerá esta última, e
a lei será inconstitucional. Em caso de oposição entre o princípio e o direito
positivo, este é que deve ser aplicado.”
Américo Plá Rodrigues45 afirma ainda, que os princípios do
Direito do Trabalho não são fontes do direito, porque integram um plano jurídico
diferente daqueles, até porque a doutrina não cria os princípios, mas sim os
descobre, identificando tendências em julgados e normas, devendo ficar adstrita,
também, a um necessário reconhecimento da jurisprudência.
Para finalizar a discussão a passagem de Gaspar Bayón
Chacón sobre princípios específicos do Direito do Trabalho:
...São simples postulados que, primeiro sociologicamente e, segundo, juridicamente depois, foram convertidos, por disposições legais ou por resoluções judiciais, em critérios de orientação do legislador e do juiz na defesa da parte julgada mais fraca na relação do trabalho, para restabelecer, com um privilégio jurídico em desigualdade social. São mandatos morais que têm sido imposto pelas vias indicadas a serviço de um ideal de justiça social. Alguns têm conseguido um reconhecimento legal; outros são apenas critérios de orientação do juiz ou do legislador. Em nenhum caso tem vigência como fontes do direito como uma forma direta, mas por meio de uma norma; mas, em compensação, sempre se revestem de um sentido moral derivado do fundamento de eqüidade de que provêm “46
45 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000. 46 CHACÓN, Gaspar Bayón. BOTIJA, Eugenio Perez. Manual de derecho del trabajo, 8ª ed. Madrid, Espanha, 1970.
20
Na concepção de Maurício Godinho Delgado47 a idéia de
proteção é inspiradora de todas as regras do Direito do Trabalho, ou seja, em tese
neste entendimento como o correto os princípios especiais do ramo laboral não
atenderiam ao empregador.
Ocorre que, na visão de Plá Rodrigues48, no sentido de que
em relação a três princípios: princípios da primazia, razoabilidade e boa-fé, até
pelo fato de serem comuns a todo direito, autorizam a utilização por parte do
empregador.
Entretanto, não se pode deixar de salientar a passagem que
se constitui em verdadeiro postulado, nas palavras de Mauricio Godinho Delgado:
"O papel decisivo dos princípios no Direito do Trabalho advém do caráter
essencialmente teleológico, finalístico, desse ramo jurídico especializado.” ·
1.3 PRINCÍPIOS DENTRO DA CONCEITUAÇÃO DE DIREITO
Maurício Godinho Delgado inicia seu livro “princípios de
direito individual e coletivo do trabalho” definindo que “Direito é o conjunto de
princípios, regras e institutos voltados a organizar situações ou instituições e criar
vantagens, obrigações e deveres no contexto social”
A importância do estudo dos princípios na ordem jurídica é
bem definida por Celso Antonio Bandeira de Mello:
Princípio – já averbamos alhures – é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição que se irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico.
47 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. 48 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000.
21
É do conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo. 49
Nesse mesmo sentido, a melhor noção apresentada pela
doutrina advém de Miguel Reale:
Um edifício tem sempre suas vigas mestras, suas colunas primeiras, que são o ponto de referência e, ao mesmo tempo, elementos que dão unidade ao todo. Uma ciência é como um grande edifício que possui também colunas mestras. A tais elementos básicos, que servem de apoio lógico ao edifício científico, é que chamamos de princípios, havendo entre eles diferenças de distinção e de índices, na estrutura geral do conhecimento humano.50
Mas a conceituação de princípio per si se torna dificultada,
pois como comenta Ana Virginia Moreira Gomes, “o termo princípio, mesmo no
seu uso vulgar, é impreciso, servindo dentre outros significados, para indicar tanto
o início ou a origem, quanto o fundamento de algo.” 51
Assim, Genaro Carrió52 enumera, sete sentidos jurídicos
para a princípio na linguagem jurídica, no que se destaca:
(I) Con las ideas de parte o ingediente importante de algo, núcleo básico, característica central;
(II) con las ideas de reglas, guia, orientación o indicación generales;
(III) con las ideas de fuente generadora, causa u origen;
(IV) con las ideas de finalidad, objetivo, propósito o meta;
49 DE MELLO, Celso Antonio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 22ª ed., 2007 50 REALE, Miguel. Filosofia do Direito. v, I. 7.ed. São Paulo: Saraiva, 1975. 51 GOMES, Ana Virginia Moreira. A aplicação do princípio protetor no direito do trabalho, São Paulo: LTR, 2001. p. 23. 52 CARRIÓ, Genaro R. Princípios jurídicos y positivismo jurídico. Argentina, Abelero-Perrot, 1970
22
(V) con las ideas de premisa, inalterable punto de pratida para el razonamiento, axioma, verdad teorica postulada como evidente, esencia, propriedad definitoria;
(VI) con las ideas de regla práctica de contenido evidente, verdad ética incuestionable;
(VII) con las ideas de maxima, aforismo, proverbio, pieza de sabiduría práctica que nos viene del pasado y que trae consigo el valor de la experiencia acumulada y el prestigio de la tradición.
Mas como continua Ana Virginia Moreira Gomes:
Deve-se ressaltar, porém, que um aspecto essencial acerca do conceito de princípio resta obscuro: a posição ocupada por eles no ordenamento jurídico, ou seja, se os princípios são postulados a partir dos quais todas as normas podem ser deduzidas e, portanto, situam-se fora do ordenamento positivo, ou se são idéias mais gerais induzidas das próprias normas, mas não são eles próprios normas, ou ainda, se podem ser consideradas normas jurídicas.53
Mas a autora adverte quanto à criação das proposições dos
princípios, desde a sua idealização:
A análise da juridicidade dos princípios, entretanto, não apresenta desenvolvimento linear, podendo ser dividida basicamente em três fases: a jusnaturalista, a juspositivista e a pós-positivista, sendo que nenhuma delas está de todo superada. O direito natural, inicialmente, concebe os princípios como idéias mais gerais, q partir das quais são deduzidas todas as normas de um ordenamento. Os princípios não são caracterizados como normas jurídicas, mas como verdades que se situam acima delas, com fundamentação, por vezes mais ética que jurídica. O princípio exprimia o valor justo, o valor conforma a natureza de um homem racional ou as determinações divinas. O princípio protetor seria, como exemplo, a idéia basilar do ordenamento laboral, pois vincularia o conteúdo de todas as outras normas. A proteção ao trabalhador seria o postulado máximo e as normas laborais deveriam ser deduzidas dele.
53 GOMES, Ana Virginia Moreira. A aplicação do princípio protetor no direito do trabalho, São Paulo: LTR, 2001. p. 25.
23
[...]
A partir do século XIX, todavia, inicia-se a construção do modelo positivista, com a crença na completude e coerência dos códigos e na qualificação da lei como única fonte do direito. Os princípios, conforme essa doutrina, já não são mais postulados anteriores ou superiores as leis, mas normas derivadas delas. O princípio, conceito mais geral, poderia ser induzido das normas isoladas, como a idéia comum a todas. [...] Em razão de serem materialmente mais indefinidos que as leias, tem sua juridicidade atingida, cumprindo uma função apenas subsidiaria as normas legais. 54
Ainda sobre a importância dos princípios, conforme bem
conceitua Mauricio Godinho Delgado,
[...] os princípios cumprem papel fundamental.
De fato compõe-se o direito, ao lado das regras e dos institutos jurídicos. Sua presença na estrutura do ordenamento jurídico é, hoje, inquestionável, embora caracterizando-se os princípios por funções múltiplas e concorrentes e não a exclusiva função normativa.55
E continua:
Princípios são proposições gerais inferidas da cultura e ordenamento jurídico que conformam a criação, revelação, interpretação e aplicação do direito.
Podem os princípios ser comuns a todo o fenômeno jurídico ou especiais a um ou alguns de seus segmentos particularizados. Desse modo, os princípios gerais são proposições gerais informadoras da noção, estrutura e dinâmica essenciais do direito, ao passo que os princípios especiais de determinado ramo do direito são proposições gerais informadoras da noção, estrutura e dinâmica essência de certo ramo jurídico.
54 GOMES, Ana Virginia Moreira. A aplicação do princípio protetor no direito do trabalho, São Paulo: LTR, 2001. p. 26. 55 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 15
24
São os princípios jurídicos diretrizes gerais induzidas e, ao mesmo tempo, indutoras do direito; proposições fundamentais induzidas e indutoras do direito. São diretrizes centrais que se inferem de um sistema jurídico e que, após inferidas, a ele se reportam, informando-o. Por isso é que se pode dizer que consubstanciam comandos jurídicos instigadores do universo do direito.”56
Da mesma forma, para se ter um entendimento do que vem
a ser os princípios de Direito, cabe citar a definição de Américo Plá Rodriguez, ao
afirmar que são:
[...] linhas diretrizes que informam algumas normas e inspiram direta ou indiretamente uma série de soluções, pelo que, podem servir para promover e embasar a aprovação de normas, orientar a interpretação das existentes e resolver os casos não previstos.57
Verifica-se, então, que os princípios são fontes subsidiárias
de direito, possuindo um caráter mais amplo que a própria norma, e que servem
na verdade para auxiliar na elucidação e fundamento do entendimento da letra da
lei, visto o próprio legislador reconhece que o sistema normativo não é suficiente
para dirimir todas as questões sociais existentes.
Desta forma, com o positivismo da justiça, os princípios em
um primeiro momento começaram a serem deixados de lado pelo julgador, que
naquele momento buscava encontrar estritamente na lei a justificação de suas
ações. E este positivismo, como a própria autora Ana Virginia Gomes58 aponta,
encontra fundamentação no fato de que o conceito de princípio dava muita
margem a discussão, o que não ocorria com a legislação positivada. Porem, essa
falta de discussão nem sempre é o meio mais justo de se decidir, ao ponto de que
valores e a certeza jurídica não tem igual valor para nenhuma pessoa, precisando
exatamente da principiologia para se apoiar na discussão sobre o assunto.
56 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 16. 57 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000. 58 GOMES, Ana Virginia Moreira. A aplicação do princípio protetor no direito do trabalho, São Paulo: LTR, 2001.
25
Sobre o tema Hans Kelsen afirma que se deve separar o
Direito e a Moral do Direito e a Justiça, pois apesar de se buscar a justiça, deve
se levar em conta que “quando apreciamos moralmente uma ordem jurídica
positiva, quando a valoramos de boa ou má, justa ou injusta, que o critério é um
critério relativo, que não fica excluída uma diferente valoração como base num
outro sistema de moral” ··
Desta forma Ana Virginia Moreira Gomes conclui que
nenhuma das vertentes desta época é suficiente, pois valores, exigências morais
e o próprio conceito de justiça são valorados pelos princípios, fazendo com que
estes nunca poderem ser deixados de lado.
Advindo o período pós-positivista, “a importância dos
princípios no ordenamento jurídico já é sublinhada especialmente pela variedade
de funções que exercer; os princípio integram o sistema jurídico, quando atuam
como verdadeiras normas. Não basta, entretanto, o reconhecimento dos
princípios como normas, sem reconhecer-lhes a juridicidade e sem que se possa
compreender que tipo de normas constituem, e para isso são oportunas às obras
dos professores Ronald Dworkin e Robert Alexy”59.
A diferença então dos princípios dar regras, é que
“diferentemente do critério do tudo ou nada das regras, os princípios são
aplicados por um critério valorativo”60
Como resume Paulo Bonavides:
As regras vigem e os princípios valem; o valor que neles se insere se exprime em graus distintos. Os princípios, enquanto valores fundamentais, governam a Constituição, o regime, a ordem jurídica. Não são apenas a lei, mas o Direito em toda a sua extensão, substancialmente, plenitude e abrangência.61
59 GOMES, Ana Virginia Moreira. A aplicação do princípio protetor no direito do trabalho, São Paulo: LTR, 2001. 60 GOMES, Ana Virginia Moreira. A aplicação do princípio protetor no direito do trabalho, São Paulo: LTR, 2001. 61 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 10.ed. São Paulo: Malheiros, 2000.
26
Assim, os princípios podem ser considerados como juízos
fundamentais, que embasam e solidificam um conjunto de juízos, ordenado em
um sistema de conceitos relativos a dada porção do mundo jurídico.
Maurício Godinho Delgado62 comenta que os princípios
podem ser comuns a todo o fenômeno jurídico, ou especiais a um ou alguns de
seus segmentos particularizados, sendo que os princípios jurídicos gerais são
preposições informadoras da noção estrutura e dinâmica essenciais do direito, ao
passo que os princípios especiais de determinado ramo do direito são
proposições gerais informadoras da noção, estrutura e dinâmica essencial de
certo ramo jurídico.
E ensina que: "Em conclusão, para a Ciência do Direito os
princípios conceituam-se como proposições gerais que informam a compreensão
e aplicação do fenômeno jurídico e que, após inferidas, a ele se reportam,
informando-o."63
Quanto à classificação, Godinho Delgado afirma que os
princípios podem ser divididos quanto a sua abrangência e a sua função.
A abrangência, por conseguinte se subdivide em princípios
gerais e princípios especiais do direito. Princípios gerais são “diretrizes gerais
informadoras da noção, estrutura e dinâmica essenciais do direito. Sua
abrangência é ampla, tendendo a atingir todos os segmentos da arvore jurídica,
independentemente das particularidades de cada ramo”64 Neste ramo pode-se
delimitar o princípio da dignidade humana, não discriminação, justiça social e
equidade. Da mesma forma que se pode exemplificar com princípios tais como da
razoabilidade, proporcionalidade e boa-fé.
62 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. 63 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. 64 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001.p. 25
27
Já os princípios especiais são “diretrizes gerais informadoras
da noção, estrutura e dinâmica essenciais de certo ramo jurídico”65. Assim, tais
princípios são relativo especificamente a cada caso, não necessariamente se
encaixando em outra condição jurídica, no qual se pode exemplificar os princípios
da imperatividade das normas trabalhistas, indisponibilidade destes direitos,
condição mais benéfica, primazia da realidade e principalmente o princípio da
proteção, com os seus sub-princípios a serem melhor delimitados na seqüência
deste trabalho.
Quanto às funções então dos princípios Godinho Delgado
apresenta duas fases próprias, onde “os princípios cumprem funções
diferenciadas no direito. Tais funções se manifestam nas duas fases próprias ao
fenômeno jurídico: a primeira, de sua construção, e a segunda, de sua realização
social.”·
No que tange a construção direito, conceitua-se então que “na fase pré-jurídica, os princípios despontam como proposições gerais que propiciam uma direção coerente na construção da regra de direito. São veios iluminadores da regra jurídica.
Os princípios gerais do direito e os específicos a determinado ramo normativo tendem a influir no processo de construção das regras jurídicas, orientando o legislador no desenvolvimento desse processo. Nesse momento os princípios atuam como verdadeiras fontes materiais do direito, na medida em que se postam como fatores que influenciam a produção da ordem jurídica.”66
Posteriormente há a segunda fase onde o “direito posto,
construído, rege as organizações e condutas sociais. Corresponde a fase jurídica
típica, já consumado o processo de elaboração das normas. Nesta fase,
certamente, os princípios cumprem seu papel mais relevante”67
65 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 27 66 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p.18 67 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p.18
28
Neste caso, como define bem Godinho Delgado, a mais
corriqueira das funções é denominada descritiva ou interpretativa ou, ainda,
informativa, ligada à compreensão do próprio direito. Esta é a função clássica,
balizando a essência do conjunto jurídico, propiciando uma leitura reveladora das
direções essenciais do ordenamento analisado. São instrumentos de auxílio na
interpretação jurídica.
Nesse sentido, cumpre lembrarmos os ensinamentos de
Hans Kelsen sobre a função descrita: "A interpretação é, portanto, uma operação
mental que acompanha o processo de aplicação do Direito no seu progredir de
um escalão superior para um escalão inferior".68
Outra função exercida pelos princípios é a de serem fontes
formais subsidiárias, onde na falta de outra regra jurídica, ser aplicável ao caso
concreto. Sua aplicação se faz como se o princípio fosse norma jurídica. Esta
função é denominada função normativa supletiva; ocorrendo a chamada
integração jurídica quando da ausência de lei aplicável ao caso concreto.
Sobre a positivação da utilização dos princípios comenta o
mestre Miguel Reale:
Na realidade, não precisava dizê-lo, porque é uma verdade implícita e necessária. O jurista não precisaria estar autorizado pelo legislador a invocar princípios gerais, aos quais deve recorrer sempre até mesmo quando encontra a lei própria ou adequada ao caso. Não há ciência sem princípios, que são verdades válidas para um determinado campo do saber, ou para um sistema de enunciados lógicos. Prive-se um ciência de seus princípios, e tê-la-emos privado de sua substância lógica, pois o Direito não se funda sobre normas, mas sobre os princípios que as consolidam e as tornam significantes.69
68 KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Traduzido por João Baptista Machado. 5.ed. São Paulo: Coimbra, 1979. 69 REALE, Miguel. Filosofia do Direito. v, I. 7.ed. São Paulo: Saraiva, 1975.
29
Entretanto Halley Souza70 lembra que, modernamente a
doutrina apresenta um novo papel para os princípios: trata-se da efetiva função
normativa própria, resultante de sua dimensão fundamental a toda a ordem
jurídica.
Sobre esta classificação comenta Mauricio Godinho
Delgado:
A função fundamentadora dos princípios (ou função normativa própria) passa, necessariamente, pelo reconhecimento doutrinário de sua natureza norma jurídica efetiva e não simples enunciado programático não vinculante. Isso significa que o caráter normativo contido nas regras jurídicas integrantes dos clássicos diplomas jurídicos (constituições, leis e diplomas correlatos) estaria também presente nos princípios gerais de direito. Ambos seriam, pois, norma jurídica, adotados da mesma natureza normativa. 71
Portanto, fica claro que os princípios, além da função
interpretativa e como fonte supletiva, possuem uma função normativa
concorrente, mas não autônoma, apartada do conjunto jurídico geral e a ele
contraposto.
Porem, como afirma Ana Virginia Moreira Gomes
É preciso reconhecer que as normas principiológicas representam um desafio por sua estrutura diferenciada das regras, podendo representar mesmo uma ameaça à seguridade jurídica. Entretanto, essa distinção serve de fundamento a uma aplicação especifica dos princípios, pois o processo de motivação do operador do direito acaba por tornar-se mais claro, mais responsável em relação aos valores, principalmente os constitucionais. A negação da juridicidade dos princípios transforma tais valores em tópicos estranhos ao mundo do direito,
70SOUZA, Halley. Principiologia da proteção aplicada à realidade do Direito do Trabalho. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 62, fev. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3779>. Acesso em: 29 ago. 2008. 71 71 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001.
30
e parte essencial da nossa constituição vê-se reduzida à mera declaração política, sem nenhuma pretensão vinculante.72
Como fundamento do ordenamento jurídico do trabalho,
deve existir entre estes princípios, coerência e compatibilidade com o direito
positivo, conforme ensinamento de Américo Plá Rodriguez, ao afirmar que os
princípios “estão acima do direito positivo, enquanto lhe servem de inspiração,
mas não podem tornar-se independentes dele”.73
À frente então, serão estudados alguns princípios
considerados inerentes ao estudo em questão, aqueles que com maior freqüência
são elencados pelos doutrinadores dos quais não se tem a pretensão de esgotar
o tema até mesmo pela falta de consenso, mas, principalmente para delinear o
estudo.
72 GOMES, Ana Virginia Moreira. A aplicação do princípio protetor no direito do trabalho, São Paulo: LTR, 2001. 73 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000.
31
CAPÍTULO 2
PRINCÍPIOS:
Após o breve estudo no capítulo anterior sobre a
conceituação dos princípios, cabe agora adentrar a suas especificidades. Para tal,
dividir-se-á esta relação de princípios em dois grandes grupos:
a) Princípios gerais do Direito do Trabalho;
b) Princípios especiais;
2.1 PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO DO TRABALHO:
Os princípios gerais do direito que se aplicam também no
direito do trabalham caracterizam-se por incorporarem diretrizes centrais que dão
a noção própria do que vem a ser o direito em si, pois tem-se na sua essência os
valores da pessoa humana em geral, as evoluções sociais, que definem a forma
inicial de agir com o direito do indivíduo como um todo.
Pode se destacar como principais direitos gerais que se
enquadram na rotina do Direito do Trabalho:
a) Princípio da dignidade da pessoa humana;
b) Princípio da isonomia;
c) Princípio da justiça social;
d) Princípio da equidade;
32
e) Princípio da razoabilidade;
f) Princípio da proporcionalidade;
g) Princípio da boa-fé;
2.1.1 Princípio da dignidade da pessoa humana:
Como ensina Godinho Delgado74, o princípio da dignidade
da pessoa humana é conquista bastante recente da sociedade democrática de
direito, haja vista a história da humanidade sempre ser recheada de líderes,
déspotas, senhores e todos os tipos de criações que se mantinham no poder a
partir da dominação total da sociedade que o cercava. Com o advento do
comércio, a conseqüente diminuição do trabalho escravo, aqueles que
dominavam os mercados se viam obrigados a contratar pessoal e este mesmo
pessoal, com o passar dos tempos começou a perceber sua importância para o
mundo, requerendo em si mais direitos que quando se começou. Mas isso é
manifesto de menos de 200 anos para cá e que começou a ter efeitos visíveis em
meados do século XX.
A noção de que o valor central das sociedades é a pessoa humana, em sua singeleza e independentemente de sua riqueza ou status social, é um dos avanços jurídicos mais notáveis na história juspolítica da humanidade.
È disso que trata o princípio da dignidade da pessoa humana, alçado hoje, ao núcleo dos sistemas constitucionais mais democráticos. Nesta posição, tornou-se de fato, o epicentro de todo o ordenamento jurídico.75
Foi, segundo Pontes de Miranda:
74 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. 75 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001.
33
[...] o resultado de avanços, ora contínuos, ora esporádicos, nas três dimensões: democracia, liberdade, igualdade. Erraria quem pensasse que se chegou perto da completa realização. A evolução apenas se iniciou para alguns povos; e aqueles mesmos que alcançaram, até hoje, os mais altos graus ainda se acham a meio caminho. A essa caminhada corresponde a aparição de direitos essenciais à personalidade ou à sua expansão plena, ou à subjetivação e precisão de direitos já existentes.76
Mas ninguém melhor que São Tomás de Aquino resumiu a
impossibilidade de encontrar uma definição para o conceito de dignidade quando
disse: “[...] o termo dignidade é algo absoluto e pertence à essência.”77 Premissa
básica do jusnaturalismo é o reconhecimento da própria dignidade pelo homem,
conscientemente evitando condutas incompatíveis com a sua ética, o que aparece
também na consideração finalista kantiniana da pessoa.
O compromisso de assegurar a dignidade humana vem
também expressa no preâmbulo da Carta da Organização das Nações Unidas
(ONU). Com essa Declaração, a ONU fixa como objetivo primordial, em matéria
de direitos humanos, que a humanidade goze da máxima liberdade e dignidade.
O mesmo objetivo estampa-se na Proclamação da Conferência Internacional de
Direitos Humanos de Teerã, em 1968; no art. 13 do Pacto Internacional de
Direitos Civis; e no art. 5º da Carta Africana.78
Por sua vez, o princípio mais importante a que se refere o
parágrafo 3º do art. 29 e o art. 30 da Declaração dos Direitos Humanos é o
princípio do respeito à dignidade do indivíduo, considerando que a liberdade, a
justiça e a paz no mundo têm por base o reconhecimento à dignidade intrínseca e
aos direitos iguais e inalienáveis de todos os membros da família humana.
No âmbito nacional deve se destacar que o presente
princípio encontra-se disposta desde o início da constituição nacional, se
76 MIRANDA, Pontes De. Tratado de Direito Privado. Parte Especial. Tomo, XLVII. 2.ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1964. 77 AQUINO, Tomás de. Suma Teológica. v. 8. Madri: BAC, 1956. 78 ONU. Declaração dos direitos humanos. Disponível em: http://www.onu-brasil.org.br/documentos_direitoshumanos.php. acesso: 15 set. 2008
34
encontrando disposto entre os princípios fundamentais da nação, no inciso III do
art 1º.
2.1.2 Princípio da isonomia:
Este princípio é a garantia que o cidadão tem de que não
receberá tratamento diferenciado em virtude de qualquer que seja o fator que
desequilibre sua igualdade com a parte oposta. Segundo Alice Monteiro de Barros79
a palavra discriminação, do ponto de vista etimológico, significa o caráter infundado
de uma distinção.
De acordo com a Convenção 111 da OIT, em seu artigo 1º, o termo discriminação compreende:
a) Toda distinção, exclusão ou preferência, com base na cor, sexo, religião, opinião política, nacionalidade ou origem social, que tenha por efeito anula ou reduzir a igualdade de oportunidade ou de tratamento no emprego ou profissão;
b) Qualquer outra distinção, exclusão ou preferência que tenha por efeito anular ou reduzir a igualdade de oportunidade ou tratamento no emprego ou profissão, conforme determinado pelo País-membro concernente, após consultar organizações representativas de empregadores e de trabalhadores, se as houver, e outros organismos adequados.
E pela a definição de Maurício Godinho Delgado:
Discriminação é a conduta pela qual nega-se à pessoa tratamento compatível com o padrão jurídico assentado para situação concreta por ela vivenciada. A causa da discriminação reside, muitas vezes, no cru preconceito, isto é, um juízo sedimentado desqualificador de uma pessoa em virtude de uma sua característica, determinada externamente, e identificadora de um
79 BARROS, Alice Monteiro. Discriminação no emprego por motivo de sexo. In: VIANA, Márcio Túlio; RENAULT, Luiz Otávio Linhares (coords.). Discriminação. São Paulo: LTr, 2000. p. 39
35
grupo ou segmento mais amplo de indivíduos (cor, raça, sexo, nacionalidade, riqueza, etc.). Mas pode, é óbvio, também derivar a discriminação de outros fatores relevantes a um determinado caso concreto específico.80
Mas da mesma forma há de se salientar que tal princípio não
necessariamente coloca em igualdade todos os cidadãos em si, apenas mantém
a igualdade aos que são iguais. Tanto que assuntos diferentes entre pessoas
diferentes tem tratamento diferenciado entre si, pois cada assunto merece o
enfoque devido e necessário para a sua organização e resolução de seus
conflitos. Há também os princípios que paralelamente auxiliam na isonomia entre
as partes, tal como o princípio da norma mais favorável, a ser explicado a frente,
na parte do princípio da proteção, onde a parte que é hiposuficiente pode se
utilizar para, mesmo que não haja visível igualdade, que esta se apresente numa
norma que se torna de mais fácil acesso àquele, em tese, mais fraco na lide.
A doutrina destaca ainda que tal princípio é a conceituação
ampla do princípio da não discriminação. Este princípio é “princípio de proteção,
de resistência, denegatório de conduta que se considera gravemente censurável.
Portanto, labora sobre um piso de civilidade que se considera mínimo para a
conveniência entre as pessoas.” 81
Já a isonomia é considerado em sentido mais amplo. “Ela
ultrapassa, sem dúvida, a mera não-discriminação, buscando igualar o tratamento
jurídico à pessoa ou situações que tenham relevante ponto de contato entre si.”82
2.1.3 Princípio da justiça social:
80 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 97 81 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 122 82 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 122
36
Como doutrina Godinho Delgado, “o princípio da justiça
social dispõe que, independentemente das aptidões, talentos e virtudes
individualizadas, cabe as pessoas humanas acesso a utilidades essenciais
existentes na comunidade.”83 Assim:
O princípio reúne em sua formula ampla e imprecisa (a qual certamente responde por seu sucesso nos últimos dois séculos) todas as vertentes que entendem, em maior ou menor extensão, que a realização material das pessoas não passa apenas por sua aptidão individual de bem se posicionar no mercado capitalista. Esta realização material depende também de fatores objetivos externos ao indivíduo, os quais devem ser regulados ou instigados por norma jurídica.84
O autor lembra ainda que o princípio da justiça social se
encontra entre os fundamentos básicos da Constituição da República Federativa
do Brasil, onde há o “título I, dos princípios fundamentais”, onde este se
destacam:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
[...]
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
[...]
83 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. 84 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001.
37
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;85
A justiça social, então, trata das relações do indivíduo com a
comunidade. É oportuno lembrar, como lembra Luis Fernando Barzotto, que para
a tradição aristotélica, a comunidade não existe para além dos indivíduos que a
constituem. Deste modo, a justiça social, ao tratar daquilo que é devido à
comunidade, não faz nada além de determinar quais são os deveres em relação a
todos os membros da comunidade. Assim, os deveres de proteção ao meio
ambiente, no direito ambiental, dizem respeito, diretamente, àquilo que o indivíduo
deve à comunidade como um todo, mas indiretamente, a os membros da
comunidade. Não faz sentido, dizer que, por um dever em relação de pessoas,
como particulares, uma floresta não pode ser destruída. Mas é perfeitamente
correto afirmar que isto é devido aos mesmos, como membros da comunidade,
pois no limite, os deveres de direito ambiental tem como sujeito titular de direitos
cada um dos membros que integram a comunidade.86
Desta forma a justiça social, por regular as relações do
indivíduo com a comunidade, em verdade acaba regulando as relações do
indivíduo com outros indivíduos, considerados apenas na sua condição social
Nesta justiça social, visa-se diretamente o bem comum e,
indiretamente, o bem deste ou daquele particular. O ser humano é considerado
"em comum", como diz Tomás de Aquino. Em uma sociedade de iguais, isto
85 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988. 86 BARZOTTO, Luis Fernando. Justiça Social - Gênese, estrutura e aplicação de um conceito. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_48/Artigos/ART_LUIS.htm. Acessado: 25 ago. 2008.
38
significa que o outro é considerado, simplesmente por sua condição de pessoa
humana, membro da comunidade. Assim, o que é devido a um é devido a todos, e
o benefício de um recai no direito ambiental, o ato de não poluir é algo devido não
a este ou àquele indivíduo, mas à comunidade como um todo ou, de um modo
mais preciso, este ato é devido a todos os membros da comunidade. O ato que
visa diretamente o bem comum alcança indiretamente o bem de cada membro da
comunidade.87
2.1.4 Princípio da equidade:
Mantendo a mesma linha de raciocínio de Mauricio Godinho
Delgado, a “equidade é o poder conferido ao juiz de adequar o comando genérico
contido na norma jurídica as peculiaridades diferenciadoras do caso concreto.”88
Desta forma:
De acordo com a primeira de tais concepções (de matriz grega, em especial fundada na teorização de Aristóteles), equidade (epiquéia) traduz a retificação das distorções da lei, corrigindo as injustiças do comando abstrato perante a situação fática concreta. Corresponde ao processo de adequação e atenuação do preceito normativo – sempre naturalmente amplo e abstrato – em face das particularidades inerentes ao caso concreto ventilado apenas genericamente pela norma. A equidade (epiquéia) emerge, pois, como critério adequador a ser observado no momento da aplicação final da norma: em síntese, um ‘critério de aplicação das leis, o qual permite adaptá-las a cada caso particular e temperar-lhes o rigor com a adequação.
De acordo com a segunda das concepções (de matriz romana), a equidade (aequitas) aproxima-se de um processo de criação de
87 BARZOTTO, Luis Fernando. Justiça Social - Gênese, estrutura e aplicação de um conceito. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_48/Artigos/ART_LUIS.htm. Acessado: 25 ago. 2008. 88 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001.
39
normas jurídicas, assumindo, portanto, caráter de fonte normativa.89
Sobre a equidade romana, Del Vecchio complementa:
O simples reconhecimento de que o direito positivo é contrario ao direito natural não basta de per si para o abolir, mas determina uma tendência para a sua reforma ou modificação, também no momento da aplicação judicial da lei mediante a aequitas. Advirta-se que o magistrado romano detinha um poder assaz mais vasto que o magistrado moderno; tanto que, ao entrar no desempenho do cargo, o pretor anunciava as máximas que informariam a sua jurisdição.90
Desta forma, tem-se, portanto que o princípio da equidade
tende a ser usado no momento que conflitos de normas estão mais latentes, afim
de o julgador poder decidir qual é mais adequado àquela situação concreta
específica. Este no momento que conclui seu entendimento deve então, não
apenas se utilizar à tipificação da norma objetiva, mas da principiologia em si e
observando os detalhes concretos específicos daquela situação, a fim de
encontrar a justiça, não apenas no que se encontra ordenamento jurídico, mas
sim um resultado adequado àquela situação.
2.1.5 Princípio da razoabilidade:
Pelo princípio da razoabilidade, o aplicador da lei deverá se
basear pelo bom senso, ponderando todos os fatos para ser razoável na
aplicação do texto legal.
Este princípio tem a função supletiva principalmente
naquelas disposições normativas que permitem ao operador do direito, um amplo
89 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 139 90 DEL VECCHIO, Giorgio. Lições de filosofia do Direito. Coimbra: Armênio Amado, 1979.
40
campo de interpretação. Nestes casos, ele atua como moderador, não permitindo
devaneios por terrenos que ultrapassam a própria razão.
Como ensina Godinho Delgado, “o princípio da razoabilidade
é também muito antigo no direito, atado ao próprio exercício da função judicante.
Sempre se manteve prestigiado no âmbito de sua matriz original, o direito Civil. A
partir daí espraiou-se para o âmbito do universo jurídico.”91
O princípio da razoabilidade não se encontrava
expressamente disposto na Constituição Pátria até o advento da emenda nº 45.
Com estas luzes, o inciso LXXVIII do Art. 5º da Carta Magna passou a vigorar
com a seguinte redação: "... a todos, no âmbito judicial e administrativo, são
assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a
celeridade de sua tramitação".92
Não se trata apenas de um acréscimo de inciso, mas,
sobretudo, representa a intenção do constituinte derivado de ratificar a extensão
da celeridade no âmbito judicial, na condição de garantia fundamental, sendo de
incontestável aplicabilidade imediata como garantia do bom recebimento da
prestação jurisdicional.
Sobre tal assunto, tem-se que na assembléia constituinte no
ano de 1988, discutiu-se sobre a disposição de tal princípio expressamente na
construção do artigo 44, que tinha como texto original:
A administração pública, direta ou indireta, de qualquer dos Poderes obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade, exigindo-se, como condição de validade dos atos administrativos, a motivação suficiente e, como requisito de sua legitimidade, a razoabilidade.93
91 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 143 92 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988. 93 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.
41
Mesmo que no final outra tenha sido a redação do
dispositivo, não se pode negar que a razoabilidade integra de forma substancial o
ordenamento constitucional brasileiro e constitui-se de um princípio imprescindível
para elaboração de normas e na atuação do Poder Executivo.
José Afonso da Silva afirma também estar o princípio da
“proporcionalidade razoável” consagrado enquanto princípio constitucional geral e
explícito de tributação, traduzido na norma que impede a tributação com efeitos
de confisco (artigo 150, IV). É vedado ao Poder Público tributar patrimônio de
modo a impossibilitar sua manutenção pelo particular ou inviabilizar o uso
econômico a que se destine, ressalvadas as exceções constitucionalmente
previstas. 94
A sua inclusão no ordenamento jurídico nacional certamente
justifica-se, pois cada dia torna-se mais freqüente a alusão do princípio em
diversos casos de nossa Egrégia Corte.
A referida emenda nº 45 então veio de encontro às
necessidades e a evolução do direito pátrio, e o Pacto de San José da Costa
Rica, que assim já assinalava no Art. 8º.
Halley Souza95 lembra ainda que regulamentação similar é
encontrada no Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, firmado em
Nova York, em 19 de dezembro de 1966, redigido da seguinte forma: “3. Toda
pessoa acusada de um delito terá direito, em plena igualdade, a pelo menos, as
seguintes garantias: (...) c) De ser julgado sem dilações indevidas" (art. 14, 3,
c).”No mesmo sentido, confira-se a Convenção européia para salvaguarda dos
direitos do homem e das liberdades fundamentais, art. 6º, 1.
94 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 18ª ed., São Paulo: Ltr, 1997. 95 SOUZA, Halley. Principiologia da proteção aplicada à realidade do Direito do Trabalho. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 62, fev. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3779>. Acesso em: 29 ago. 2008.
42
2.1.6 Princípio da proporcionalidade
O princípio da proporcionalidade, segundo Carlos Roberto
Siqueira Castro apud Pierre Muller96, se caracteriza pelo fato de presumir a
existência de relação adequada entre um ou vários fins determinados e os meios
com que são levados a cabo.
Completa Godinho Delgado:
De fato, tal princípio atua de modo direto na função judicial, em qualquer área do direito que ela se processa. Afinal, a proporcionalidade volta-se” para a justiça em caso concreto ou particular, se aparenta consideravelmente com a equidade e é um eficaz instrumento de apoio às decisões judiciais que, após submeterem ao caso a reflexões pros e contras, a fim de averiguar se na relação entre meios e fins não houve excesso, concretizam assim a necessidade do ato decisório de correção.97
A origem e desenvolvimento do princípio da
proporcionalidade encontra-se diretamente ligado à evolução da idealização dos
direitos e garantias individuais da pessoa humana, verificada a partir do
surgimento do Estado burguês na Europa.
Desta forma, como ensina Alessandro Ribeiro Couto, sua
origem remonta aos séculos XII e XVIII, quando na Inglaterra surgiram as teorias
jusnaturalistas propugnando ter o homem direitos imanentes a sua natureza e
anteriores ao aparecimento do Estado e, por conseguinte, conclamando ter o
soberano o dever de respeitá-los. Pode-se afirmar que é durante a passagem do
Estado Absolutista - em que o governante tem poderes ilimitados - para o Estado
96 CASTRO, Carlos Roberto Siqueira. A Constituição Aberta e os Direitos Fundamentais, Rio de Janeiro: Forense, 2003, p.82 97 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 142.
43
de Direito, que pela primeira vez emprega-se o princípio da proporcionalidade,
visando a limitar o poder de atuação do monarca face aos súditos.98
Assim, observa-se que o princípio da proporcionalidade
nasceu no âmbito do Direito Administrativo, como princípio geral do direito de
polícia, e desenvolveu-se como evolução do princípio da legalidade. Requereu,
para tanto, a criação de mecanismos capazes de controlar o Poder Executivo no
exercício da suas funções, de modo a evitar o arbítrio e o abuso de poder. 99
O professor Willis Santiago Guerra Filho100 destaca que se
pode apontar como marco histórico para o surgimento desse tipo de formação
política (Estado de Direito), a Magna Carta inglesa, de 1215, na qual aparece com
toda a clareza manifestada a idéia supracitada, quando esclarece: "O homem livre
não deve ser punido por um delito menor, senão na medida desse delito, e por um
grave delito ele deve ser punido de acordo com a gravidade do delito".
Logo, com a evolução da burguesia, estes tiveram papel
fundamental na inserção de tal princípio no direito constitucional, por toda a
Europa ocidental. No Brasil, o princípio da proporcionalidade chegou junto com
conceitos constitucionais portugueses, que por sua vez tem muito incrustada a
escola alemã de direito.
O princípio em estudo apresenta-se como uma das idéias
fundamentais da Constituição, com função de complementaridade em relação ao
princípio da reserva legal (artigo 5o., II). Esta afirmação deve-se ao fato de que a
ação do Poder Público deve ser conforme a lei formal, e que esta deve ter como
parâmetro a proporcionalidade, pois o legislador não está liberto de limites
quando elabora as normas, mormente quando estas tendem a reduzir a esfera de
algum direito fundamental. Uma vez que o princípio da legalidade tem como um
de seus aspectos complementares e essenciais à sua efetiva observação o
98 COUTO, Alessandro Ribeiro. Princípio da proporcionalidade e sua aplicação no Direito Tributário . Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 891, 11 dez. 2005. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7673>. Acesso em: 13 jul. 2008. 99 COUTO, Alessandro Ribeiro. Princípio da proporcionalidade e sua aplicação no Direito Tributário . Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 891, 11 dez. 2005. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7673>. Acesso em: 13 jul. 2008. 100 GUERRA FILHO, Willis Santiago. Teoria processual da constituição. São Paulo: Celso Bastos Editor: Instituto Brasileiro de Direito Constitucional, 2000.
44
princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional (artigo 5o., XXXV), mister é
notar que este se aplica a qualquer ato praticado pelo poder público que seja
considerado por aquele a quem prejudica como desproporcional ao objetivo
almejado.101
Conectam-se também ao princípio ora abordado, regendo
sua aplicação, o princípio republicano (artigo 1o., caput), o princípio da cidadania
(artigo 1º, II) e o princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1o., III). Os
direitos e garantias individuais que deles decorrem (artigo 5o.) representam
formas para o particular se defender sempre que sofrer ou se achar ameaçado de
sofrer lesão de algum direito por abuso de poder ou ilegalidade praticados por
agentes públicos. Os institutos do habeas corpus (artigo 5o., LXVIII), mandado de
segurança (artigo 5o.,LXIX), habeas data (artigo 5o., LXII), assim como o direito de
petição (artigo 5o., XXXIV, a), constituem subsídios de proteção do cidadão face
ao poder público. 102
Ao afirmar que todo homem possui uma esfera intangível de
direitos, decorrentes somente de sua existência enquanto ser da espécie humana,
a Constituição garantiu devam todos os cidadãos ser tratados de forma eqüitativa,
o que pressupõe, para além da igualdade formal, tratamento diferenciado
buscando adequar a lei às necessidades e peculiaridades de cada um. O princípio
da proporcionalidade tem, portanto, papel indispensável na consecução de um
dos principais objetivos do Estado brasileiro, qual seja, “reduzir as desigualdades
sociais e regionais”, consoante letra do artigo 3o., III, de nossa magna Carta. A
proporcionalidade é, por conseguinte, idéia ínsita à concepção de estado
democrático de Direito (CRFB/88, artigo 1o. caput).
Em relação aos direitos e garantias individuais, no inciso V
do artigo 5o., que constitucionaliza o direito de resposta proporcional ao agravo.
Em sede de Direito Penal, ao garantir a individualização das penas (artigo 5o.,
101 SOUZA, Carlos Affonso. SAMPAIO, Patrícia Regina P. Princípio da proporcionalidade. Disponibilizado em: http://www.algosobre.com.br/direito-administrativo/principio-da-proporcionalidade.html. Acesso: 30 ago 2008. 102 SOUZA, Carlos Affonso. SAMPAIO, Patrícia Regina P. Princípio da proporcionalidade. Disponibilizado em: http://www.algosobre.com.br/direito-administrativo/principio-da-proporcionalidade.html. Acesso: 30 ago 2008.
45
XLVI, caput), está implicitamente garantido que estas serão proporcionais ao
delito cometido. Quanto aos sociais, observar o que dispõe os incisos IV e V do
artigo 7o., em que explicita-se que o valor do salário mínimo deve ser compatível
com um poder aquisitivo digno, e que o piso salarial deve ser proporcional à
espécie de trabalho realizado. 103
Na organização do Estado, a proporcionalidade está
presente dentre os requisitos necessários à decretação de intervenção, uma vez
que sua decretação depende do agravo cometido, conforme observa-se a partir
da análise do § 3o. do artigo 36, que exclui a intervenção por considerá-la
desarrazoada nas ocasiões ali explicitadas. Sua existência é ainda prevista no
tocante à composição da Câmara dos Deputados (artigo 45, caput e §1o.), ao
disciplinar dever esta ser realizada em razão da população.
Na atuação do Ministério Público, o inciso II do artigo 129
assegura a tomada de medidas necessárias (proporcionais) destinadas a garantir
o respeito dos direitos constitucionais pelos Poderes Públicos e serviços de
relevância pública. O inciso IX deste mesmo artigo reza ser função do Ministério
Público o exercício de outras atividades que sejam compatíveis com sua
finalidade, juízo este que encontra-se gerido pelo princípio em questão. 104
Pode se considerar então que a inobservância ou lesão a
princípio é a mais grave das inconstitucionalidades, uma vez que sem princípio
não há ordem constitucional e em decorrência, não há democracia nem Estado de
Direito. Portanto, o princípio da proporcionalidade tem de ser considerado como o
direito positivo e a garantia de respeito aos direitos fundamentais, fluindo do
espírito do §2o. do artigo 5o., o qual, nas palavras de Paulo Bonavides, “abrange a
parte não-escrita ou não expressa dos direitos e garantias da Constituição, a
saber, aqueles direitos e garantias cujo fundamento decorre da natureza do
103 SOUZA, Carlos Affonso. SAMPAIO, Patrícia Regina P. Princípio da proporcionalidade. Disponibilizado em: http://www.algosobre.com.br/direito-administrativo/principio-da-proporcionalidade.html. Acesso: 30 ago 2008. 104 SOUZA, Carlos Affonso. SAMPAIO, Patrícia Regina P. Princípio da proporcionalidade. Disponibilizado em: http://www.algosobre.com.br/direito-administrativo/principio-da-proporcionalidade.html. Acesso: 30 ago 2008.
46
regime, da essência impostergável do Estado de Direito e dos princípios que este
consagra e que fazem inviolável da unidade da Constituição.”105
Portanto, pode-se considerar que o princípio da
proporcionalidade é certamente bem distribuído em todos os âmbitos do direito,
exatamente por ser peça fundamental em qualquer meio de relação individual ou
social, pois aqueles que se denega o poder tem de agir de forma justa com
aqueles que se tornaram, mesmo que momentaneamente seus subalternos,
buscando proporcionais atitudes com as necessidades a serem aplicadas. Desta
forma, o legislador buscou sempre prender os detentores do poder para estes
agirem apenas na amplitude de suas funções.
2.1.7 Princípio da boa-fé:
Como está implícito no próprio nome deste princípio, espera-
se que as partes, empregador e empregado, mantenham uma relação honesta,
cumprindo seus deveres. Assim, espera-se que o empregado desenvolva seu
trabalho, com rendimento e o empenho normal, enquanto que o empregador
cumpra suas obrigações, efetuando o pagamento condizente, proporcionando
condições de trabalho e outras.
Tal princípio é nada mais do que a conceituação quase
óbvia de que o indivíduo deve agir sem ausência de qualquer intenção escusa a
que aparenta seguir. Se tratando de uma relação pessoal, entre indivíduos de
direito, é uma necessidade essencial a boa atuação na sociedade. Como define
Godinho Delgado:
O conceito jurídico do princípio da boa-fé (também chamado de lealdade e boa-fé) é capturdo do próprio senso comum. É conceito derivado da experiência cotidiana entre as pessoas e grupos sociais, tendo sido absorvido e valorizado pelo direito.
105 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 10.ed. São Paulo: Malheiros, 2000.
47
Assim, princípio da boa-fé é diretriz geral que instiga a valorização, no plano das relações jurídicas, da sinceridade, retidão e honradez nas condutas dos sujeitos de direito na vida social. É princípio que valoriza, para fins jurídicos, a sinceridade, retidão e honradez das pessoas em suas relações com outrem.106
Apesar de não ser um princípio recentemente aceito, sua
positivação deu-se com o artigo 422 do Código Civil de 2002, que dispõe: “Os
contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em
sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”.107
Acerca artigo 422 do Novo Código Civil, esclarece Ricardo
Fiúza:
Cuida-se de dispositivo específico sobre os princípios da probidade e da boa-fé.
O primeiro princípio versa sobre um conjunto de deveres, exigidos nas relações jurídicas, em especial os da veracidade, integridade, honradez e lealdade, deles resultando como corolário lógico do segundo.
Sobre a aplicação desse importante princípio no direito do
trabalho, é a lição de Evaristo de Moraes Filho:
Execução do contrato – Obrigação das partes – Em com isso atingimos outro parágrafo no nosso ensaio, aquele que se refere à execução do contrato, ou explicitamente, as obrigações das partes. O princípio dominante é o da execução da boa-fé e da confiança recíproca. As principais obrigações, objeto do próprio contrato, são: do lado do empregado, a prestação de serviços, segundo sua qualificação profissional e os termos do que o obrigou; do lado do empregador, proporcionar trabalho e pagamento convencionado, sob todas as suas modalidade e complementações, quando for o caso. [...] Assim, as duas partes, executando o contrato de boa-fé, devem fazer com que se
106 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 146. 107 BRASIL. Código Civil. Brasília, DF, 2002.
48
proporcionem todos os meios, normais, para a execução das tarefas recíprocas.108
Ainda Godinho Delgado apresenta que “no ramo
juslaborativo, o princípio aplica-se principalmente no plano das relações reguladas
pelo contrato de trabalho, envolvendo empregado e empregador (embora não
exclusivamente, é claro, já que se aplica também, por exemplo, as próprias
relações processuais trabalhistas). Considerando o estrito plano contratual de sua
incidência pode esse principio se denominado também de princípio da leal
contraprestação (isto, é, boa-fé no âmbito das respectivas obrigações
contratuais)”109
Argumenta Bebber110 que de acordo com este princípio as
partes ao buscarem a solução de seus conflitos via judicial devem atentar para os
deveres de verdade, moralidade e probidade em todas as fases do procedimento,
portanto devem seguir as regras esculpidas no artigo 14 do CPC.
É um principio de ordem moral, e com intensa aplicação e
importâncias nas relações trabalhistas, posto que representa o respeito recíproco
entre os sujeitos com o intuito do fiel cumprimento da justiça.
2.2 PRINCÍPIOS ESPECIAIS:
Como previamente exposto, os princípios especiais são
aqueles que são utilizados num assunto isolado, pois apenas possuem sua
aplicação específica a esta matéria, apesar de, assim como os direitos gerais,
terem o objetivo de formar as “diretrizes informadoras da noção, estrutura e
108 MORAES FILHO, Evaristo de. Tratado elementar de Direito do trabalho, Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1960, vol. 1. 109 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 143. 110 BEBBER, Julio César. Princípios do processo do trabalho. São Paulo: LTR, 1997.
49
dinâmica essenciais de certo ramo jurídico”111, como explica Godinho Delgado.
Este continua:
Sua abrangência é, obviamente, mais restrita do que a característica aos princípios anteriores, uma vez que atingem essencialmente apenas o segmento jurídico em que firmam sua especificidade. No momento em que atuam estabelecem pontos de particularização do respectivo ramo jurídico perante os demais integrantes do ordenamento jurídico.112
Assim podem ser subdivididos:
a) Princípio da Indisponibilidade dos direitos trabalhistas;
b) Princípio da imperatividade das normas trabalhistas;
c) Princípio da primazia da realidade;
d) Princípio da continuidade da relação de emprego;
e) Princípio da proteção.
2.2.1 Princípio da Indisponibilidade dos direitos trabalhistas:
Sobre tal princípio, doutrina Godinho Delgado:
A indisponibilidade inata aos direitos trabalhistas constitui-se talvez no veículo principal utilizado pelo Direito do Trabalho para tentar igualizar, no plano jurídico, a assincronia clássica existente entre os sujeitos da relação socioeconômica de emprego. O aparente contingenciamento da liberdade obreira que resultaria na observância desse princípio desponta, na verdade, como instrumento hábil a assegurar efetiva liberdade no contexto da relação empregatícia: é que aquele contingenciamento atenua ao
111 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 27. 112 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 27.
50
sujeito individual obreiro a inevitável restrição de vontade que naturalmente tem perante o sujeito coletivo empresário.113
A CLT apresenta de várias formas o presente princípio, no
que pode se destacar:
Art. 9º - Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação.
Art. 444 - As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.
Art. 468 - Nos contratos individuais de trabalho só é lícita à alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.114
Assim, tal princípio roga pelo sentido que o empregado,
mesmo que aparentemente apóie a retirada de algum direito adquirido na relação
de trabalho, é proibido de fazê-lo por disposição legal. Isso viria de encontro com
um dos grandes medos do legislador na criação, principalmente das leis
trabalhistas, de que o empregador “force” o empregado a um contrato entre eles
diferente do que a lei determine de mínimos preceitos.
É isto de define Godinho Delgado:
Isso significa que o trabalhador quer por ato individual (renúncia), quer por ato bilateral negociado com o empregador (transação), não pode dispor de seus direitos laborais, sendo nulo o ato dirigido a esse despojamento. Essa conduta normativa geral realiza, no plano concreto da relação de emprego, a um só tempo,
113 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 47. 114 BRASIL. Decreto-lei nº 5.452 de 1º de maio de 1943. Aprova a consolidação das Leis do trabalho. Brasília, DF. 09 ago. 1943.
51
tanto o princípio da indisponibilidade de direitos trabalhistas, como o princípio da imperatividade da legislação do trabalho.115
Tal princípio ainda pode ser dividido, de acordo com a
doutrina em duas possibilidades: indisponibilidade relativa e absoluta.
A indisponibilidade é relativa “quando a vantagem jurídica
enfocada traduzir interesse individual ou bilateral simples, que não caracterize um
padrão civilizatório geral mínimo firmado pela sociedade política em um dado
momento histórico”.116
Já a indisponibilidade é absoluta “quando o direito enfocado
merecer uma tutela de nível de interesse público, por traduzir um patamar
civilizatório mínimo firmado pela sociedade política em um dado momento
histórico” ou quando “o direito enfocado estiver protegido por norma de interesse
abstrato da respectiva categoria.”117
Luiz Vicente Junior118 comenta em seu ensaio que o
princípio projeta o caráter imperativo das normas trabalhistas, bem como a sua
essência social, cujo conteúdo protetivo tem espectro de interesse público
coletivo, delimitando restritivamente a possibilidade de disponibilidade das partes,
evidentemente que colocando a salvo direitos do trabalhador, forma pela qual se
reduzem as desigualdades jurídicas que se evidenciam entre as partes na relação
de trabalho.
Percebe-se que a limitação imposta às partes tem o nítido
propósito de oferecer proteção ao trabalhador, já que o conjunto de garantias
mínimas e essenciais encontra-se assegurado pela Lei: não será objeto de
negociação para a concessão e, muito menos, com vistas à supressão ou
redução.
115 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 49. 116 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 50. 117 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 50. 118 VICENTE JUNIOR, Luiz. Princípios de direito do trabalho. Disponível em: http://www.juliobattisti.com.br/tutoriais/luizvicente/direitodotrabalho002.asp. acesso: 19 ago. 2008.
52
Tal princípio é também conhecido como “princípio da
irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas”.
Por este princípio, então, considerando que a renúncia é um
ato voluntário de uma pessoa, ao abandonar um direito que lhe assiste, fica o
trabalhador impedindo, mesmo que manifesto, de voluntariamente renunciar
vantagens e direitos concedidos na legislação.
Com relação a este princípio, vai além Mauricio Godinho
Delgado:
Para a ordem justrabalhista não serão válidas quer a renúncia, quer a transação que importe objetivamente em prejuízo do trabalhador (art. 468, CLT). Por essa razão, em face da amplitude do princípio por além do ato meramente unilateral, ele melhor estaria enunciado através da abrangente expressão princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas.119
2.2.2 Princípio da imperatividade das normas trabalhistas:
Mauricio Godinho Delgado comenta acerca deste princípio
que:
No segmento juslaborativo prevalece à restrição a autonomia de vontade, aceita como instrumento assecuratório eficaz de certas fundamentais garantias ao empregado, instituídas por ser ele hiposuficiente na relação contratual firmada. As regras justrabalhistas são, desse modo, essencialmente imperativas, não podendo, de madeira geral, ter sua regência contratual afastada pela simples manifestação de vontade das partes.120
Desta forma, devem prevalecer sobre o restante a legislação
trabalhista, sendo verdade, via de regra, seu afastamento, mesmo que mediante 119 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. 120 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. P. 47.
53
declaração bilateral de vontades. Isto caracteriza então a restrição à autonomia
das partes no ajuste das condições contratuais trabalhistas.
Das raras exceções a esta regra está o artigo 472, no seu §
2º, quando expressa que:
§ 2º - Nos contratos por prazo determinado, o tempo de afastamento, se assim acordarem as partes interessadas, não será computado na contagem do prazo para a respectiva terminação.121
Percebe-se que, neste caso, é facultada a negociação das
partes certa decisão. Como regra geral isto não pode acontecer, visto que as
normas trabalhistas, no que for incontroverso, devem ser aplicadas exatamente
da forma prescrita pela lei.
2.2.3 Princípio da primazia da realidade:
Ao ler o nome do referido princípio, claramente entende-se
que, na análise das questões relativas às relações de trabalho, deve-se observar
a realidade dos fatos em detrimento dos aspectos formais que eventualmente os
atestem. Sua aplicação no direito do trabalho vem demonstrar a maior valoração
que possui o fato real do que aquilo que consta em documentos formais.
Acerca deste princípio, ensina Mauricio Godinho Delgado:
Tal princípio amplia a visão civilista de que o operador jurídico, no exame das declarações de vontade, deve atentar mais à intenção dos agentes do que ao envoltório formal através de que transpareceu a vontade (art. 85, CC). [...] O princípio da realidade
121 BRASIL. Decreto-lei nº 5.452 de 1º de maio de 1943. Aprova a consolidação das Leis do trabalho. Brasília, DF. 09 ago. 1943.
54
sobre a forma constitui poderoso instrumento para a pesquisa e encontro da verdade real em uma situação de litígio.122
O Princípio da primazia da realidade significa que nos casos
onde haja conflito entre o contrato, documentos e acordos e o que de fato
acontece na prática, se deve dar preferência ao segundo, pois, se aproxima da
realidade fática.
Quanto ao Princípio da Primazia da Realidade para Beltran.
Constitui consenso que, em matéria de contrato de trabalho, deve preponderar à realidade fática sobre os aspectos formais da contratação, real sobre o rótulo, a verdade dos fatos sobre a ficção. Tal princípio é sempre associado à idéia de que o contrato de trabalho é, acima de tudo, um “contrato realidade”.123
Desta forma, sendo o contrato de trabalho consensual,
depende do acordo de vontades, porém, seu o conteúdo se pode moldar
diferentemente do pactuado. Por isso, apesar da forma que contratualmente lhe
seja conferida, o contrato é aquele que de fato está existindo.
Pode-se ainda destacar alguns aspectos que legitimam a
imperatividade de tal princípio, como ensina Vicente Luiz Junior:124
a) Durante a relação de trabalho, dada sua condição de
subordinação e dependência, o trabalhador não pode opor-se à formalização de
alterações contratuais e práticas que, não raro, lhe são lesivas.;
b) É bastante comum verificar alterações nas condições de
trabalho pactuadas (através de contrato escrito) ao longo do tempo, alterações
estas que, salvo raras exceções, não são incorporadas formalmente ao contrato
de trabalho e;
122 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. 123 BELTRAN, Ari Possidonio. Dilemas do trabalho e do emprego na atualidade. São Paulo: LTr, 2001. 124 VICENTE JUNIOR, Luiz. Princípios de direito do trabalho. Disponível em: http://www.juliobattisti.com.br/tutoriais/luizvicente/direitodotrabalho002.asp. acesso: 19 ago. 2008.
55
c) Como cediço, os contratos de trabalho podem ser escritos
ou verbais. Evidente que nos verbais o contrato só assume condição de efetiva
existência com o decorrer do tempo, ditado pelas práticas estabelecidas entre os
sujeitos da relação de trabalho.
De acordo com Américo Plá Rodriguez, que pode ser
considerado um dos idealizadores de tal princípio, "isto significa que em matéria
de trabalho importa o que ocorre na prática, mais do que aquilo que as partes
hajam pactuado de forma mais ou menos solene, ou expressa, ou aquilo que
conste em documentos, formulários e instrumentos de controle"125. Ou seja, "o
princípio da primazia da realidade significa que, em caso de discordância entre o
que ocorre na prática e o que emerge de documentos ou acordos, deve-se dar
preferência ao primeiro, isto é, ao que sucede no terreno dos fatos"126
2.2.4 Princípio da continuidade da relação de emprego:
Sobre tal princípio Godinho Delgado começa doutrinando:
Informa tal princípio que é de interesse do Direito do trabalho a permanência do vinculo empregatício, com a integração do trabalhador na estrutura e dinâmica empresariais. Apenas mediante tal permanência e integração é que a ordem justrabalhista poderia cumprir satisfatoriamente o objetivo teleológico do direito só trabalho de assegurar melhores condições, sob a ótica obreira, de pactuação e gerenciamento da força de trabalho em determinada sociedade.127
Assim, pode-se concluir que, em princípio tende-se a buscar
se manter a relação de emprego pelo maior tempo possível, pois o trabalhador
precisa estar empregado sempre para poder viver na sociedade. O princípio então
125 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000. 126 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000. 127 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001.
56
forma uma certa barreira formal para a despedida do funcionário, fazendo com
que, depois de sua admissão, apenas um motivo de grande relevância forçará o
empregador a despedi-lo.
Historicamente tal princípio teve tipificação desde
constituições como a de 1967 e de 1969, mas com o passar do tempo advieram
normas infraconstitucionais que inviabilizavam tal princípio, como a lei 5107/66
(instituidora do FGTS).
Porém a constituição de 1988 reinseriu tal preceito das
constituições anteriores que foram retiradas do mundo jurídico pela lei do FGTS,
tornando este uma das grandes garantias do trabalhador.
Ainda na constituição, como conseqüência deste princípio,
surge o sub-principio da proibição da despedida arbitrária ou sem causa conforme
dispõe o art. 7º, I da CRFB/88:
Art. 7.º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
I – relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos.128
Godinho Delgado lembra ainda que, “o mesmo princípio
também propôs como regra geral o contrato trabalhista por tempo indeterminado,
uma vez que este é o que melhor concretiza o direcionamento pela continuidade
da relação de emprego.”129
Assim, há dois institutos legais que bem expressam a
amplitude de utilização deste princípio: o FGTS e a indenização, também
chamada de multa, compensatória pela despedida arbitrária.
128 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988. 129 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 63
57
No que tange a CLT, são inúmeros os reflexos práticos
deste princípio, entre os quais deve se destacar a sucessão de empregadores,
nos termos dos artigos 10 e 448 da CLT:
Art. 10 da CLT – Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados.
Art. 448 da CLT – A mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados.130
Como se pode perceber, nem mesmo as alterações na
estrutura jurídica ou mudança na propriedade da empresa, colocará termo ao
contrato de trabalho.
Vicente Luiz Junior131 destaca que este princípio não destoa
dos demais. É francamente favorável ao trabalhador, na medida em que com o
passar do tempo incorporam-se ao seu patrimônio jurídico vantagens alcançadas
pelas negociações coletivas e pelas inovações legislativas e, principalmente,
aquelas de caráter pessoal.
Além de vantagens diretas, que possuem uma natureza
eminentemente econômica como as supracitadas, não resta dúvida que um
vínculo de trabalho duradouro testemunha progressos pessoais e familiares do
trabalhador, já que a estabilidade no emprego oferece uma base mais sólida,
inclusive e principalmente no aspecto social, permitindo que o trabalhador
desfrute de bem estar físico, mental e social.
Portanto, tal princípio faz com que o trabalhador, exceto se o
empregador dispor diferentemente no contrato de trabalho, deverá ser admitido
por tempo indeterminado, ou seja, o contrato apenas terminará pelas causas de
demissão, com ou sem justa causa e esta justa causa, conforme a constituição
dará ao trabalhador o direito a certa indenização (no caso, de 40% do total de
130 BRASIL. Decreto-lei nº 5.452 de 1º de maio de 1943. Aprova a consolidação das Leis do trabalho. Brasília, DF. 09 ago. 1943. 131 VICENTE JUNIOR, Luiz. Princípios de direito do trabalho. Disponível em: http://www.juliobattisti.com.br/tutoriais/luizvicente/direitodotrabalho002.asp. acesso: 19 ago. 2008.
58
FGTS depositados pelo patrão, entre outras verbas rescisórias). Assim, como
anteriormente dito, cria-se uma barreira no mínimo financeira para o possível bel
prazer do empregador de demitir algum funcionário sem motivo justo.
2.2.5 Princípio da proteção e sub-princípios:
2.2.5.1 Princípio da Proteção:
Apesar do referido princípio ser mais aprofundadamente
tratado no próximo capitulo, pode-se conceituar que trata-se de princípio que visa
atenuar a desigualdade entre as partes da lide trabalhista, o que acaba
englobando os demais princípios que favorecem o trabalhador. Na verdade esta
orientação revela-se de maneira inconfundível através da própria norma,
demonstrando que a sociedade reconhece naquele que dispõe unicamente { de
sua força de trabalho, a parte mais fraca na relação, o que bem ilustra o art. 468,
“caput”, da CLT:
Art. 468 – Nos contratos individuais de trabalho só é lícita à alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e, ainda assim, desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.132
Desta forma, este princípio demonstra que o direito do
trabalho se movimenta de forma proteger aquele considerado o hiposuficiente na
relação empregatícia, no caso, o empregado, visando desta forma atenuar ao
máximo o desequilíbrio inerente ao contrato de trabalho. 132 BRASIL. Decreto-lei nº 5.452 de 1º de maio de 1943. Aprova a consolidação das Leis do trabalho. Brasília, DF. 09 ago. 1943.
59
Como explica Godinho Delgado:
Parte importante da doutrina aponta este princípio como o cardeal do direito do Trabalho, por influir em toda a estrutura e características próprias desse ramo jurídico especializado. Esta, a propósito, a compreensão do grande jurista uruguaio Américo Plá Rodriguez, que considera que manifesta-se o princípio protetivo em três dimensões distintas: o princípio in dúbio pro operário, o princípio da norma mais favorável e o princípio da condição mais benéfica.133
2.2.5.2 Princípio da Norma mais Favorável:
Tal princípio informa ao operador do Direito que se existirem
duas ou mais normas aplicáveis ao caso concreto, dever-se-á aplicar aquela que
melhor atenda aos interesses do trabalhador.
Na aplicação deste princípio, permite-se até mesmo afastar
a aplicação hierárquica das normas, o que implica objetivamente, que
determinado dispositivo legal com prevalência sobre outros poderá ser preterido,
caso o interessado tutelado exerça força de atração à norma “inferior”, ao se
vislumbrar que apresenta condição favorável de solução à demanda proposta.
Não há dúvida, entretanto, que a aplicação de tal princípio
encontra-se subordinada aos rígidos limites estabelecidos pela ordem jurídica,
não se cogitando sua aplicação meramente empírica ou interpretativa de maneira
a despi-la da cientificidade necessária a assegurar que o encaminhamento na
solução de questões similares siga um mesmo curso ou impliquem em
133 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 41.
60
insegurança jurídica dos jurisdicionados, posto que sua aplicação deverá estar
jungida às fronteiras do sistema jurídico vigente. 134
Adverte Godinho Delgado:
Na pesquisa e eleição da regra mais favorável, o intérprete e aplicador do direito obviamente deverá se submeter a algumas condutas objetivas, que permitam preservar o caráter científico da compreensão e apropriação do fenômeno jurídico. Assim, haverá de ter em conta não o trabalhador específico objeto da incidência da norma em certo caso concreto, mas o trabalhador enquanto ser componente de um universo mais amplo (categoria profissional, por exemplo)135
Por fim, o princípio poderá ser utilizado na interpretação das
normas jurídicas, o que deverá ocorrer mediante a otimização no enquadramento
jurídico de uma da situação de fato e do exame finalístico dos dispositivos legais
aplicáveis à espécie, desde que mantidos os critérios técnico-científicos
informadores da ordem jurídica. 136
2.2.5.3 Princípio “in dubio pro operario”:
O princípio do in dúbio pro operário é, na verdade, a idéia de
que, além das normas jurídicas deverem ser mais benéficas ao trabalhador, tal
qual o princípio supra citado da norma mais favorável, também o exame dos fatos
e das provas deveriam também seguir esta premissa de pender sempre para um
maior benefício deste trabalhador, o que a torna bastante controvertida por várias
das doutrinas.
134 VICENTE JUNIOR, Luiz. Princípios de direito do trabalho. Disponível em: http://www.juliobattisti.com.br/tutoriais/luizvicente/direitodotrabalho002.asp. acesso: 19 ago. 2008. 135 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 44 136 VICENTE JUNIOR, Luiz. Princípios de direito do trabalho. Disponível em: http://www.juliobattisti.com.br/tutoriais/luizvicente/direitodotrabalho002.asp. acesso: 19 ago. 2008.
61
Apesar de que, como elucida Godinho Delgado, “o caráter
democrático e igualitário do direito do Trabalho já conduz ao desequilíbrio
inerente as sua regras jurídicas, a seus princípios e institutos, sendo que o direito
processual do trabalho também já produz a necessária sincronia entre esse
desequilíbrio e a teoria processual do ônus da prova e demais presunções
sedimentadas favoráveis ao obreiro, características desse ramo jurídico. Não se
estende, contudo, obviamente, o mesmo desequilíbrio a figura do juiz e a função
judicante – sob pena de se comprometer à essência da própria noção de
justiça.”137
Ou seja, mesmo que a sociedade e o próprio direito
influenciam na separação entre os sujeitos da relação trabalhista, não se pode
tentar buscar que estes se encontrem no mesmo patamar, sob pena de não se
estar mantendo o sentido de justiça igualitária, não apenas para o empregado,
mas também ao empregador, pois este também tem suas obrigações para com
seus empregados, mas também direitos.
Continuando, o autor afirma que “a diretriz in dúbio pro
misero tem altamente contestada uma de suas duas dimensões componentes, o
que torna inconveniente sua própria utilização como princípio informativo do
Direito do Trabalho. Ora, se sua dimensão válida e incontestável (critério de
interpretação) já se engloba em outro princípio sedimentado (o da norma mais
favorável), deixa de haver qualquer utilidade científica no uso da expressão (a não
ser que se queira insistir na tese da aplicação do princípio sobre a análise da
prova no processo judicial trabalhista). Afinal, a ciência supõe e busca clareza e
objetividade – o que melhor se alcança pelo enunciado da norma mais
favorável.”138
Assim, este princípio, também conhecido como “in dúbio pro
reo” ou “in dúbio pro misero”, acaba então absorvido pelo princípio da norma mais
favorável, que colocou à margem eventuais absurdos jurídicos que pudessem
137 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 46 138 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 46.
62
legitimar a desigualdade entre as partes através do franco favorecimento ao
trabalhador, não pelo seu direito, mas apenas pelo fato de ser empregado.
2.2.5.4 Princípio da condição mais benéfica:
Este princípio, conforme aponta Godinho Delgado, “importa
na garantia de preservação, ao longo do contrato, da cláusula contratual mais
vantajosa ao trabalhador, que se reveste do caráter de direito adquirido (art 5º,
XXXVI, CRFB/88). Ademais, para o princípio, no contraponto entre dispositivos
contratuais concorrentes há de prevalecer aquele mais favorável ao
empregado.”139
Assim o trabalhador que já conquistou um direito não poderá
ter seu direito atingido mesmo que sobrevenha uma norma nova que não lhe e
favorável. As súmulas 51 e 288 do TST dizem o seguinte:
Súmula-51 - Norma Regulamentar. Vantagens e opção pelo novo regulamento. Art. 468 da CLT. (RA 41/1973, DJ 14.06.1973. Nova redação em decorrência da incorporação da Orientação Jurisprudencial nº 163 da SDI-1 - Res. 129/2005, DJ 20.04.2005)
I - As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento. (ex-Súmula nº 51 - RA 41/1973, DJ 14.06.1973) II - Havendo a coexistência de dois regulamentos da empresa, a opção do empregado por um deles tem efeito jurídico de renúncia às regras do sistema do outro. (ex-OJ nº 163 - Inserida em 26.03.1999)140
288 - Complementação dos proventos da aposentadoria (Res. 21/1988, DJ 18.03.1988)
139 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 54. 140 BRASIL. Tribunal superior do trabalho. Súmula nº 51. Brasília, DF, 05 abr. 2005.
63
A complementação dos proventos da aposentadoria é regida pelas normas em vigor na data da admissão do empregado, observando-se as alterações posteriores desde que mais favoráveis ao beneficiário do direito. 141
Quanto a CLT tem-se o artigo 468 que expõe, in verbis:
Art. 468 - Nos contratos individuais de trabalho só é lícita à alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e, ainda assim, desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.
§ único - Não se considera alteração unilateral a determinação do empregador para que o respectivo empregado reverta ao cargo efetivo, anteriormente ocupado, deixando o exercício de fudor e impregnação de confiança. 142
Tal artigo, respeitando ainda outros princípios supra citados,
se refere ao fato de que, as disposições acordadas entre empregado em um
primeiro momento nem podem ser modificadas, mas se for o caso de serem,
podem apenas serem para melhorar as condições de trabalho do funcionário, ou
se não, ao menos as condições gerais não podem ser pioradas. Assim, mesmo
que o funcionário seja, por exemplo, colocado num cargo de mais baixo calão do
qual trabalhara antes naquele ambiente, este ainda assim manterá, no mínimo, a
mesma remuneração e outros direitos já adquiridos anteriormente. E como finaliza
Godinho Delgado:
Na verdade, o princípio da clausula mais benéfica traduz-se, de certo modo, em manifestação do princípio da inalterabilidade contratual lesiva, também característica do direito do Trabalho.143
Considerando a pacificação de tal princípio nos tribunais
superiores e sua tipificação direta na CLT, pode-se então concluir que sobre este
não há muita discussão no sentido de sua aplicação ou legalidade. 141 BRASIL. Tribunal superior do trabalho. Súmula nº 228. Brasília, DF, 05 abr. 2005. 142 BRASIL. Decreto-lei nº 5.452 de 1º de maio de 1943. Aprova a consolidação das Leis do trabalho. Brasília, DF. 09 ago. 1943. 143 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 54.
64
CAPÍTULO 3
PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO – IN DUBIO PRO OPERÁRIO:
2.3 PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO – IN DUBIO PRO OPERÁRIO:
Para se falar do princípio da proteção tem-se que delimitar o
que deve ser protegido do que. O direito do mais forte é bem definido por Jean-
Jaques Rousseau:
O mais forte nunca é suficientemente forte para ser sempre o senhor, se não transformar sua força em direito, a obediência em dever. Daí o direito do mais forte, direito tomado ironicamente na aparência, e realmente estabelecido em princípio. Obteremos, porventura, uma explicação dessa palavra? A força é uma potência física, não vejo qual moralidade poderá resultar de seus efeitos. Ceder à força é um ato de necessidade, não de vontade, é no máximo um ato de prudência. Em que sentido poderá ser um dever?144
Neste sentido tem-se então que a força é a condição social
do economicamente “mais forte”. Este entendimento é sem dúvida alguma
advindo da nova concepção de direito social do século XX, foi muito bem
delimitada por Norberto Bobbio:
Como todos sabem, o desenvolvimento dos direitos do homem passou por três fases: num primeiro momento, afirmaram-se os direitos de liberdade, isto é, todos aqueles direitos que tendem a limitar o poder do Estado e a reservar para o indivíduo, ou para os grupos particulares, uma esfera de liberdade em relação ao Estado; num segundo momento, foram propugnados os direitos políticos, os quais – concebendo a liberdade não apenas negativamente, como não impedimento, mas positivamente, como
144 ROSSEAU, Jean-Jacques. Do Contrato Social e discurso sobre a economia política. Traduzido por Márcio Pugliesi e Norberto de Paula Lima. 7.ed. Curitiba: Hemus, 2000.
65
autonomia – tiveram como conseqüência a participação cada vez mais ampla, generalizada e freqüente dos membros de uma comunidade no poder político (ou liberdade no Estado); finalmente, foram proclamados os direitos sociais, que expressam o amadurecimento de novas exigências – podemos mesmo dizer, de novos valores – como os do bem estar e da igualdade não apenas formal, e que poderíamos chamar de liberdade através ou por meio do Estado absolutista145
E como lembra Halley Souza, “então fica entendido que os
Direitos Trabalhista são, antes de mais nada, advindos da concepção de Estado
social, determinando que a proteção não está presente só no ramo específico,
mas no ideário de direito social.”146
Este é o entendimento de Ana Virginia Moreira Gomes:
Os direitos trabalhistas são direitos sociais e, além do reconhecimento e da defesa deferidos pelos órgãos políticos aos direitos individuais, exigem prestações possíveis positivas que caracterizam a própria forma de agir do Estado Social. Assim há ato de proteção sempre que o Estado interfere em certos espaços reservados antes à sociedade, a fim de amenizar desigualdades por ela própria geradas.147
No que tange o princípio da proteção e levando em
consideração os ensinamentos de Américo Plá Rodriguez, “o princípio da
proteção se refere ao critério fundamental que orienta o direito do Trabalho, pois,
este, ao invés de inspirar-se num propósito de igualdade, responde ao objetivo de
estabelecer um amparo preferencial a uma das partes: o trabalhador.”148 E
continua:
Enquanto no direito comum uma constante preocupação parece assegurar a igualdade jurídica entre os contratantes, no direito do Trabalho a preocupação central parece ser a de proteger uma
145 BOBBIO, Norberto. A era dos Direitos. 9.ed. Rio de Janeiro: Campus, 1992. 146 SOUZA, Halley. Principiologia da proteção aplicada à realidade do Direito do Trabalho. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 62, fev. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3779>. Acesso em: 29 ago. 2008. 147 GOMES, Ana Virginia Moreira. A aplicação do princípio protetor no direito do trabalho, São Paulo: LTR, 2001. 148 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 28
66
das partes com o objetivo de mediante essa proteção, alcançar-se uma igualdade substancial e verdadeira entre as partes.149
Fica claro então que o legislador não buscou em si dissipar
ou diminuir ao menos uma possível diferença sócio-econômica entre as partes do
contrato de trabalho. Apenas encontrou uma forma, que apesar de manter o
processo igualitário, de nivelar essa desigualdade, de certa forma “ajudando” mais
o trabalhador durante o processo.
Opinião esta que também segue Plá Rodriguez, que em
suas obras afirma:
Esta idéia tem sido expressa por todos os tratadistas, tanto os pertencentes a nossa disciplina como os alheios a ela, os quais a deixam entrever sobre outro ponto de vista. Radbruch anota: ‘a idéia central em que o direito social se inspira não é a da igualdade entre as pessoas, mas a do nivelamento das desigualdades que entre elas existem. A igualdade deixa assim de constituir ponto de partida do direito para converter-se em meta ou aspiração da ordem jurídica’. E Barassi afirma: ‘tanto a constituição como o código civil abandonaram o velho e bastante superado princípio da igualdade do direito em que estavam informados os códigos anteriores para acercar-se da igualdade de fato com a proteção do contratante economicamente mais débil’.150
Mas mesmo Plá Rodriguez afirma que não há unanimidade
em tal procedimento. O autor comenta o seguinte:
dois autores brasileiros manifestaram idéias discordantes e ainda que em suas exposições se referiram a interpretação mais favorável ao trabalhador (em concreto a máxima do in dubio pro operário), o que na realidade questionam é a vigência de todo este princípio protetor.
O primeiro é J. Pinto Antunes, que sustenta que, salvo nos países comunistas, prima em todos os demais Estados o sistema capitalista de produção.
149 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 28 150 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 30.
67
De acordo com esse sistema não se deve admitir a interpretação que ponha em risco o fundamento do regime capitalista de produção, que ele resume numa frase da Constituição brasileira: “na iniciativa individual, no poder de criação, de organização e de invenção do indivíduo, exercido nos limites do bem público, funda-se a riqueza e a prosperidade nacional.151
E o doutrinador uruguaio continua seu entendimento acerca
da inviabilidade do citado princípio:
No processo capitalista de produção e no sistema empresarial de concorrência, o trabalho está subordinado a iniciativa, direção e organização do capital.
Por seguinte, seria inconstitucional o princípio do in dubio, pelo empregado, porque seria contrario as bases fundamentais do regime econômico e político.
Decidir em caso de dúvida pelo trabalhador é atuar contra a letra e o espírito do regime, é julgar contra a vontade do Estado, o qual tem na empresa, e, portanto na totalidade do organismo produtivo, o interesse público por excelência. Não são as partes, mas o conjunto que constitui o objeto da preocupação pública.
O intérprete deve ter em vista, acima de tudo, a conservação da vida empresarial e não sacrificá-la aos interesses imediatos e exclusivos de um de seus elementos colaboradores, seja capital ou trabalho.152
O autor segue seus ensinamentos a partir de Alípio Silveira:
O segundo autor é Alípio Silveira, que chega a mesma conclusão de que a máxima na dúvida pelo empregado é falsa, como princípio geral de direito, baseando-se nas seguintes considerações:
1) a finalidade do direito do trabalho. Modernamente – sustenta esse autor – essa finalidade é o equilíbrio de interesses entre
151 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 33. 152 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 34.
68
empregadores e empregados, não se limitando a proteção absoluta e exclusiva do trabalhador;
2) os interesses da empresa, que são de importância fundamental. Não é possível sacrificar os interesses da empresa para salvaguardar um único empregado, mesmo que todos os outros empregados sofram;
3)o bem comum. Segundo o art 8º da consolidação das leis do trabalho, não se deve sacrificar o interesse público a qualquer interesse de classe ou particular. Coincide com o art 5º da lei de introdução ao código civil, pelo qual o juiz deve atender, na aplicação da lei, aos fins sociais e as exigências do bem comum; e
4) a equidade. Se a duvida não pode ser resolvida pelos processos comuns de hermenêutica, somente será permitido decidir a favor do trabalhador se disso não resultar grave prejuízo para o interesse da empresa (considerada em conjunto) ou para o bem comum. 153
E Plá Rodriguez continua na sua demonstração da
inadmissibilidade do princípio da proteção, pela basilar idéia do seu objetivo não
poder se encaixar na realidade atual ao explicar:
Outra discrepância se situa não no plano da admissão da idéia da proteção, porem no que concerne, a saber, se o objetivo de proteção que inspira o Direito do Trabalho se traduz em princípio único, expressado em diversas regras, ou se, pelo contrario, se concretiza em distinto princípios, que encerram conteúdos diversos em cumprem funções diferentes.
Com esse efeito, Cessari – com um critério de que parece compartilhar Rivero Lamas – distingue entre o princípio de proteção (que justifica uma disciplina uniforme da relação de trabalho tutelando o contratante mais fraco) e o princípio do favor (equivalente ao Günstigkeitsprinzip dos alemães, ou seja, em caso de divergência entre várias normas aplicáveis dá-se preferência a mais favorável).
153 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 35.
69
O primeiro tem caráter geral e pretende assegurar o respeito a um nível mínimo de benefícios e direitos, que se convertem em irrenunciáveis.
O segundo se aplica aos casos particulares e serve para elevar ou manter as vantagens, acima do nível mínimo da categoria. Não tende a concretizar uma tutela mínima, porem, a máxima, ao fazer prevalecer à posição mais favorável ao trabalhador.154
O autor ainda fala a respeito do alcance do referido princípio,
no que tange a inconveniência de sua aplicação, quando ressalta que deve-se
notar Alonso Garcia que este princípio se opõe – desde o plano de sua
formulação teórica – ao da segurança jurídica, sobretudo quando aquele implicar
a aplicação de normas que suponham violação do que este significa. A
estabilidade da norma e a estabilidade da relação constituem garantia do
ordenamento jurídico. Cremos que se trata de um risco, de um perigo, da
possibilidade de má aplicação, já que, aplicado corretamente e dentro dos limites
adequados, não há por que conspirar contra a segurança jurídica. Este princípio
não dá direito a fazer qualquer coisa em nome da proteção do trabalhador, e
muito menos a substituir-se ao criador das normas. Tem um campo de aplicação
limitado e, mantendo-se dentro dele, não conspira contra a segurança, porem
assegura a eficaz e adequada aplicação das normas.155
No sentido de reforçar tal opinião, pode-se ainda adicionar
os ensinamentos de Ari Possidonio Beltran, que afirma:
muito embora o princípio protetor apresente as peculiaridades já apontadas e tenha por escopo atingir a defesa do economicamente débil, não pode ser ele tomado em sentido absoluto ou irrestrito. Evidentemente, não como se admitir superdireitos ou direitos absolutos, na medida em que certas limitações decorrem do princípio da razoabilidade e outras apontam mesmo para valores de nível superior à própria hiperproteção do economicamente mais fraco. Em certas
154 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 36. 155 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 38
70
circunstâncias prepondera o interesse da coletividade, e não o do trabalhador em especial. inúmeras são as limitações impostas ao princípio protetor, sejam elas derivadas das próprias obrigações assumidas pelo empregado e que são ínsitas ao pacto laboral, sejam decorrentes de dispositivos legais, de clausulas normativas, sejam decorrentes de interpretação jurisprudencial. Tais limitações, com as peculiaridades de cada região são regularmente encontradas no direito comparado. Acresçam-se ainda fenômenos diversos que afetam, na presente quadra, o direito do trabalho e em conseqüência, alguns de seus direitos básicos. Em tal aspecto podem ser citados fenômenos como a crise econômica, a grande competição dos mercados, a flexibilização, a terceirização, a globalização da economia, entre outros.
De forma geral entendemos que as espécies de restrições ao princípio protetor podem assim ser classificadas: I) quanto à fonte (a) decorrentes de lei; (b) decorrentes de fonte normativa dos sujeitos coletivos, e do contrato de trabalho; (c) decorrentes de criação jurisprudencial; II) quanto à modalidade; III) quanto a fatores diversos.156
Neste sentido o autor tenta encontrar a motivação cultural
para o uso, ou desuso do princípio em questão através da teoria da flexibilização
das normas trabalhistas, conforme segue:
Muito se tem discutido sobre os reflexos da teoria da flexibilização de normas sobre os princípios do direito do trabalho, especialmente no princípio protetor, em seus vários desdobramentos.
Partindo-se do pressuposto de que uma das questões mais discutidas da flexibilização trabalhista, qual seja, a da possibilidade de alterações in pejus nas condições de trabalho, segundo entendemos, o princípio protetor, efetivamente, será afetado. Quanto aos demais princípios não parece haver influencia sensível na questão, razão pela qual a doutrina, de maneira geral, tem-se dedicado mais a análise das repercussões sobre o princípio protetor.
156 BELTRAN, Ari Possidonio. Dilemas do trabalho e do emprego na atualidade. São Paulo: LTr, 2001. p. 60
71
Admite-se ademais, que o procedimento de flexibilização de normas sendo assistida pelos entes coletivos, culminará por gerar um mecanismo de compensação, substituindo-se o sistema heterônomo pelo autônomo, dado que entidades sindicais representativas certamente farão uso da autonomia provada coletiva observados os padrões mínimos de proteção e, em verdade, trilharão o caminho da transação e não o da renuncia pura e simples de direitos.157
Tem de se ressaltar, que o princípio da Proteção,
doutrinariamente se subdivide em três vertentes: o princípio da norma mais
favorável, o princípio da condição mais benéfica e o princípio do in dubio pro
operário, este último o qual devemos dar mais ênfase em busca, por um estudo
sobre o assunto, demonstrar o quanto se torna inviável.
No que tange o princípio da norma mais favorável, como
elucida Maurício Godinho Delgado, este “dispõe que o operador do direito do
trabalho deve optar pela regra mais favorável ao objeto em três situações ou
dimensões distintas: no instante da elaboração da regra (princípio orientador da
ação legislativa, portanto) ou no contexto de confronto entre regras concorrentes
(princípio orientador do processo de hierarquização de normas trabalhistas) ou,
por fim, no contexto de interpretação das regras jurídicas (princípio orientador do
processo de revelação do sentido da regra trabalhista).”158
Quanto a sua aplicação, Plá Rodrigues recomenda que se
utilize os critérios orientadores de Durand159, que se destacam:
1) A comparação deve ser efetuada considerando o
conteúdo das normas. Não pode, entretanto, compreender as conseqüências
econômicas longínquas que a regra possa ocasionar. Pode ocorrer que uma
convenção coletiva, impondo as empresas um ônus muito pesado, seja geradora
de desemprego e provoque uma perturbação econômica aos trabalhadores. Nem
157 BELTRAN, Ari Possidonio. Dilemas do trabalho e do emprego na atualidade. São Paulo: LTr, 2001. p. 159 158 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 43. 159 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 57
72
por isso deixa de ser considerada mais favorável, se o estatuto que estabelece é,
em si mesmo, preferível ao da lei.
2) a comparação das normas deve levar em consideração a
situação da coletividade trabalhadora interessada e não de um trabalhador
tomado isoladamente. A disposição de uma convenção coletiva que prejudique
um conjunto de trabalhadores será nula ainda que, por circunstâncias especiais,
pudesse ser vantajosa para um trabalhador isolado;
3) a questão de saber se uma norma é ou não favorável aos
trabalhadores não depende da apreciação subjetiva dos interessados. Ela deve
ser resolvida objetivamente, em função dos motivos que tenham inspirado as
normas;
4)o confronto de duas normas deve ser feito de uma maneira
concreta, indagando se a regra inferior é, no caso, mais ou menos favorável aos
trabalhadores. Uma cláusula de escala móvel, admitindo a revisão dos salários,
no caso de variação do custo de vida em 10%, em elevação ou em baixa,
enquanto o coeficiente legal de revisão é de 5%, será julgada prejudicial em caso
de alta de custo de vida, posto que impede a revisão dos salários, enquanto teria
sido favorável no caso de baixa, retardando a diminuição dos salários; e
5) como a possibilidade de melhorar a condição dos
trabalhadores constitui uma exceção ao princípio da intangibilidade da regra
imperativa hierarquicamente superior, não se pode admitir a eficácia de uma
disposição inferior, embora se possa duvidar de que seja efetivamente mais
favorável aos trabalhadores. (p. 57)
Já o princípio da condição mais benéfica, na visão de
Delgado,160 importa na garantia de preservação, ao longo do contrato, da cláusula
contratual mais vantajosa ao trabalhador, que se reveste do caráter de direito
adquirido (art 5º, XXXVI CRFB/88). Ademais, para o princípio, no contraponto
160 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 54.
73
entre dispositivos contratuais concorrentes há de prevalecer aquele mais
favorável ao empregado.
Plá Rodrigues salienta ainda que “a regra da condição mais
benéfica pressupõe a existência de uma situação concreta, anteriormente
reconhecida, e determina que ela deve ser respeitada, na medida em que seja
mais favorável ao trabalhador que a nova norma aplicável.”161
Seguindo este entendimento, Alonso Garcia162 ressalta que
a aplicação desta regra implica em duas conseqüências, que são:
1) quando se estabelecer uma regulamentação ou
dispositivo de caráter geral, aplicável a todo um conjunto de situações
trabalhistas, estas ficarão alteradas em sua condições anteriores, desde que não
sejam mais benéficas ao trabalhador do que as recentemente estabelecidas; e
2) salvo disposição expressa em contrário, a nova
regulamentação deverá respeitar, como situações concretas reconhecidas em
favor do trabalhador, ou trabalhadores interessados, as condições que lhes
resultem mais benéficas do que as estabelecidas para a matéria ou matérias
trabalhadas – ou em seu conjunto – pela nova regulamentação.
Por fim, Plá Rodrigues conclui que “são condições mais
benéficas somente àquelas que tiverem sido estabelecidas com tal caráter, de
forma definitiva. Portanto, aquelas que tiverem sido outorgadas, tácita ou
expressamente, em caráter provisório, isto é, com vida limitada no tempo, não
podem ser invocadas.”163
Desta forma, ambos os sub-princípios buscam auxiliar o
empregado na busca de seus direitos, seja na elaboração das normas, seja nas
cláusulas contratuais acordadas. Assim, o julgador deverá interpretar os fatos de
que tem ciência a ponto de encontrar possíveis intenções do empregador de ter
161 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 60. 162 GARCÍA, Manuel Alonso. Derecho del trabajo. Barcelona, 1960. p. 256. 163 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 64.
74
maior proveito do que poderia do empregado, portanto, não chega a atingir o
processo, tal como o princípio a ser explicado a seguir, mas apenas garantir
justiça ao empregado que por conta de algum meio ludibrioso possa ter sido
enganado.
Quando se leva em conta o processo, e seus meios de
prova, a doutrina encontra apoio no princípio do in dubio pro operário. Tal
princípio consiste em aplicar, na dúvida, "a regra mais favorável ao trabalhador,
ao analisar regra que encerra um preceito trabalhista", conforme definição objetiva
de Sergio Pinto Martins164. É aplicar, dentre os diferentes entendimentos da
norma, aquele que mais beneficia o trabalhador. Não se trata, entretanto como
define Américo Plá Rodriguez,165 de "corrigir uma norma, nem sequer integrá-la:
somente cabe utilizar esta regra quando existe uma norma e unicamente para
determinar-lhe o verdadeiro sentido, entre os vários possíveis".
Neste sentido então, destaca-se a afirmação do professor
Sergio Pinto Martins:
o in dubio pro operario não se aplica integralmente ao processo do trabalho, pois, havendo dúvida, à primeira vista, não se poderia decidir em favor do trabalhador, mas verificar quem tem o ônus da prova no caso concreto, de acordo com as especificações dos arts. 333 do CPC e 818 da CLT.166
Desta forma, não se pode querer o julgador decidir em favor
de uma parte, neste caso o empregado, apenas pelo simples fato deste ser o
empregado e historicamente se subentender que este é mais frágil. Há todo um
processo a se seguir. O que se deve levar em conta neste processo então é o
ônus da prova, pois a este sim cabe dirimir as dúvidas quanto à veracidade ou
não dos fatos alegados.
164 MARTINS, Sergio Pinto. Direito Processual do Trabalho, São Paulo: ED. Atlas S.A., 11ª ed., 1999. 165 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000. 166 MARTINS, Sergio Pinto. Direito Processual do Trabalho, São Paulo: ED. Atlas S.A., 11ª ed., 1999.
75
No mesmo sentido, quanto aos problemas encontrados na
aplicação do princípio, tem-se ainda os conceitos de Mauricio Godinho Delgado,
que neste sentido afirma:
uma das mais antigas referencias doutrinarias a princípios justrabalhistas está na diretriz in dúbio pro misero. Trata-se o aforismo de transposição adaptada ao ramo justrabalhista do princípio jurídico geral in dúbio pro reo. Como o empregador é que se constitui em devedor na relação de emprego (e réu na relação processual trabalhista), adaptou-se o princípio a diretriz in dúbio pro misero (ou pro operário).
Tal princípio, entretanto, apresenta dois problemas: o primeiro, menos grave, essencialmente prático, consistente no fato de que ele abrange dimensão temática já acobertada por outro princípio justrabalhista específico (o da norma mais favorável). O segundo problema, muito grave, consiste no fato de que, no tocante a sua outra dimensão temática, ele entra em choque com o princípio jurídico geral da essência da civilização ocidental, hoje, e do Estado Democrático de Direito: o princípio do juiz natural.167
Quanto aos problemas que o referido sub-princípio
apresenta, o doutrinador explica seu entendimento, em primeiro lugar quanto à
duplicidade de benefícios, como segue:
No que tange sua primeira debilidade, o principio do in dúbio pro misero tornou-se redundante e, por conseqüência, inútil. De fato, uma das dimensões da velha diretriz é aquela que informa que o operador jurídico, em situações de confronto entre interpretações consistentes de certo preceito normativo, deve optar pela mais favorável ao trabalhador. Ora, essa dimensão do velho princípio pe válida e importante, sem dúvida, mas já está hoje atendida, com precisão, pelo princípio da norma mais favorável (que tem três dimensões, conforme sabido, sendo uma delas a interpretativa).
Se este fosse, porem, o único problema da velha diretriz (problema que se restringiria a um juízo de conveniência,
167 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 83
76
meramente prático, de escolha de formulas com o mesmo conteúdo), não haveria porque insistir-se no presente debate. 168
Já quanto à segunda debilidade do princípio em questão
toma um pouco mais da preocupação do autor, que define:
Entretanto a segunda debilidade do princípio é de substancia, não podendo deixar de ser enfrentada.
De fato, nesse antigo princípio estaria englobada não somente a dimensão de interpretação normativa (hoje referenciada pelo princípio da norma mais favorável), como também uma dimensão de aferição e valoração dos fatos trazidos a exame do intérprete e aplicado do direito. A luz dessa segunda e combinada dimensão do princípio in dúbio pro misero (exame de fatos e provas), propunha-se que a decisão da autoridade judicial deveria se dirigir em benefício do trabalhador em caso de dúvida no exame da situações fáticas concretas. O argumento era no sentido de que “...as mesmas razões de desigualdade compensatória que deram origem à aplicação desse princípio, justificam que se estenda a análise dos fatos já que, em geral, o trabalhador tem muito maior dificuldade do que o empregador para provar certos fatos ou trazer certos dados ou obter certas informações ou documentos”.169
Alonso Garcia considera o referido princípio até obsoleto,
quando escreve:
O princípio do in dubio pro operário pode ter tido sentido – exercido pelo juiz – nos momentos iniciais do Direito do Trabalho, quando não poucas vezes ele teve de suprir, com sua aplicação e obedecendo ao imperativo legal que o impedia recusar o caso sob pretexto de silêncio, obscuridade ou insuficiência das leis, o que estas não continham. Neste sentido, nenhuma disciplina, como a que se encontra em período de formação, é tão propícia para o desenvolvimento da iniciativa judicial. Mas, uma vez superada essa etapa inicial e transpostos os limites que assinala, o Direito o trabalho, o terreno de sua formação, incidindo já nos de sua
168 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 83 169 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 84
77
consolidação doutrinaria, jurídico-positiva e sistemática, o juiz não pode ampliar sua competência e invadir o que é privativo do legislador. Todos coincidem em estimar não ser o juiz indicado para fazer do princípio pro operário um mecanismo de criação de normas. Aplicado por via legal, inclusive, afirma-se que é princípio em crise, cuja época de máximo desenvolvimento correspondeu às ocasiões em que o direito do trabalho era disciplina em formação, mas cuja força e sentido têm decrescido acentuadamente nos tempos atuais, quando o direito laboral é já um ramo jurídico, com seus conceitos plenamente elaborados e com um conjunto normativo regulador das diversas situações possíveis dentro do mundo do direito.170
E continuando seu raciocínio, o Godinho Delgado apresenta
melhor explanação que obteve em passada publicação:
Na obra Introdução ao Direito do Trabalho, escrevíamos dever ser rejeitada essa dimensão processual do princípio in dúbio pro mísero: “...tal diretriz propositora de um desequilibro atávico ao processo de exame e valoração dos fatos trazido à análise do intérprete e aplicador do direito não passa pelo crivo de cientificidade que se considera hoje próprio ao fenômeno jurídico. Na verdade, tal diretriz correspondia a uma fase rudimentar do direito do trabalho, em que esse ramo jurídico especializado ainda não havia conseguido incorporar um arsenal técnico-científico sofisticado no conjunto de suas normas, categorias e teorizações. Hoje, a teoria do ônus da prova sedimentada no direito processual do trabalho e o largo espectro de presunções que caracteriza esse ramo especializado do direito já franquiam, pelo desequilíbrio de ônus probatório imposto às partes (em benefício do prestador de serviços), possibilidades mais eficazes de reprodução, no processo, da verdade real. Em conseqüência, havendo duvida do juiz em face do conjunto probatório existente e das presunções aplicáveis, ele deverá decidir em desfavor da parte que tenha o ônus da prova naquele tópico duvidoso e não segundo a diretriz genérica in dúbio pro operário. É que o caráter democrático e igualitário do direito do trabalho conduz ao desequilíbrio inerente as suas normas jurídicas e a compatível sincronia que esse desequilíbrio tem com a teoria processual do ônus da prova e com
170 GARCÍA, Manuel Alonso. Derecho del trabajo. Barcelona, 1960. p. 251.
78
as presunções sedimentadas características desse ramo jurídico.171
E o autor adverte quanto a este “desequilíbrio” buscado com
o princípio em questão, no que tange as possibilidades de julgamento por parte
do julgador:
Não se estende, contudo, o mesmo desequilíbrio a figura do juiz e a função judicante – pena de se comprometer à essência da própria noção de justiça. O que há de positivo, portanto, na velha parêmia (in dúbio pro operário) – sua referencia a um critério de interpretação de normas jurídicas – já se manteve preservado no direito do trabalho ( através do principio da norma mais favorável), abandonando-se, contudo, a referencia superada eu o antigo aforisma fazia a função judicante de avaliação e valoração de fatos.”172
Mais à frente o autor conclui seu pensamento sobre o seu
entendimento acerca da principiologia e em conseqüência da sua opinião acerca
do princípio do in dubio pro operário, como segue:
Ora, conforme visto, uma das qualidades dos princípios reside em sal força referencial intensa e diversificada, que faz com que atuem sobre a matriz onde surgem, dando-lhe coerência e unidade, atuando também, ao mesmo tempo, sobre as regras e institutos jurídicos específicos de seu âmbito de ação, integrando-os ao conjunto geral a que se reportam. Os princípios especiais de certo ramo jurídico demarcam a especificidade desse ramo, mas não o tornam singular, isolado, anômalo, porem apenas especial, isto, pe integrado ao conjunto geral, mas com particularidades. As especificidades do direito do trabalho o afastam dos demais ramos jurídicos existentes, mas não são hábeis a afastá-lo da essência do direito, hoje incrustada, em boa medida, nos princípios constitucionais. Nenhum principio especial justrabalhista tem o poder de afrontar princípio jurídico geral basilar da constituição – e nenhum o faz, exceto essa dimensão processual que se quer ver presente na diretriz in dúbio pro misero, que por isso mesmo, não tem mais pertinência no âmbito do direito.
171 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 84 172 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 84
79
Conforme sedimentado, princípios são grandes fachos normativos, que iluminam a compreensão e aplicação do direito e seu sistema. São um dos instrumentos assecuratórios do caráter punitivo, sistemático do direito. Por isso cumprem o fundamental papel de serem harmonizadores do conjunto jurídico geral. Desse modo, princípio que se coloque em choque aberto com o conjunto sistemático geral do direito ou com princípios cardeais do universo jurídico será, em síntese, como se expôs, uma contradição em seus próprios termos.173
No mesmo sentido o professor Rodrigues Pinto afirma que:
tal ponto de equilíbrio é rompido sempre que o órgão jurisdicional se investe, indevidamente, na função de tutor do empregado, aplicando, por exemplo, a regra do in dubio pro misero, extensiva do princípio da proteção, quando aprecia as conseqüências processuais da divisão do ônus da prova, sujeitas à norma do art. 818 da CLT, cristalizadora do princípio de que a decisão será contra a parte (empregador ou empregado) encarregado de produzi-la.174
Por fim, o Godinho Delgado utiliza-se do processo do
trabalho para fazer a sua definição do princípio:
Note-se, de todo modo, que o direito do trabalho e seu ramo processual (direito processual trabalhista) já fixam inúmeras presunções favoráveis ao obreiro; já tem uma teoria do ônus da prova significativamente favorável; já permitem ao juiz inverter o ônus probatório quando perceber que, pelas circunstancias do caso, este seja o caminho mais seguro para o encontro da verdade (art 765, CLT, combinado com 130, CPC, ab initio, e art 359, CPC). Tais condutas processuais, a propósito, não são mais peculiares ao ramo trabalhista, uma vez que incorporadas também por outros segmentos jurídicos próximos (como se percebe pelos dispositivos do código brasileiro do consumidor, lei 8078/1990, por exemplo, art 6º, VIII – inversão do ônus probatório; art 28 – desconsideração da personalidade jurídica; art 47 – interpretação favorável, etc.).
173 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 85 174 RODRIGUES PINTO, José Augusto. Processo Trabalhista de Conhecimento, São Paulo: LTr, 5ª ed., 2000.
80
Por todas essa razões nem sequer é necessário, sob a ótica estritamente protecionista, insistir-se nessa dimensão da velha diretriz censurada.175
2.4 JURISPRUDÊNCIAS:
Reforçando o entendimento, no que tange a jurisprudência
regional a respeito do assunto, pode-se concluir que os magistrados já pendem
para a mesma opinião disposta neste trabalho em suas decisões, podendo-se
destacar algumas decisões recentes, tais como:
1- ÔNUS DA PROVA. PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO
OPERARIO. Não se presta o princípio in dubio pro operario para substituir o ônus
de prova da parte (art. 818 da CLT), tampouco a que se faça favor ao empregado,
pelo simples motivo de representar o elo menos favorecido na relação litigiosa
trabalhista. Impende observar, quanto à aplicação do citado princípio, a quem
incumbia o ônus da prova, se o fez e de que forma (quais os meios utilizados),
jamais podendo servir como “desculpa” para a inércia do empregado em arcar
com o ônus probandi dos fatos constitutivos do direito postulado.
Melhor sorte não assiste ao recorrente no que refere à
aplicação, no caso em análise, do princípio in dubio pro misero, haja vista que não
se presta tal instituto a substituir o ônus de prova da parte (art. 818 da CLT),
tampouco a que se faça favor ao empregado, pelo simples motivo de representar
o elo menos favorecido na relação litigiosa trabalhista. Impende observar, quanto
à aplicação do citado princípio, a quem incumbia o ônus da prova, se o fez e de
que forma (quais os meios utilizados), jamais podendo servir como “desculpa”
175 DELGADO, Mauricio Godinho. Princípios de direito individual e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 86
81
para a inércia do empregado em arcar com o ônus probandi dos fatos
constitutivos do direito postulado.
Nesse sentido, sábias são as palavras do Professor
Manoel Antonio Teixeira Filho:
Decidir-se em favor do empregado – apenas porque
empregado o é – é atitude piedosa, de favor, que se ressente de qualquer lastro
de juridicidade. Torna a sentença frágil, suscetível de virtual reforma pelo grau da
jurisdição superior.
Nega-se, pois, provimento ao apelo no tópico.176
2- AVALIAÇÃO DA PROVA. O juiz está adstrito à
regra da persuasão racional da prova (art. 131 do CPC). Na avaliação da prova, o
juiz não deve usar singelamente a regra in dubio pro operario, mas verificar de
quem é o ônus da prova e interpretar os depoimentos de maneira unitária e não
isolada.
O juiz está adstrito à regra da persuasão racional da
prova (art. 131 do CPC). Na avaliação da prova, o juiz não deve usar
singelamente a regra in dubio pro operario, mas verificar de quem é o ônus da
prova e interpretar os depoimentos de maneira unitária e não isolada.
Sérgio Pinto Martins ensina “Se há colidência dos
depoimentos das testemunhas, pois, v.g. as do reclamante dizem um horário e as
da empresa dizem outro, prevalece o cartão de ponto, se houver. Inexistindo
cartões de ponto nos autos e havendo colidência entre os depoimentos
testemunhais, há necessidade de se verificar quem tem o ônus da prova. Se é o
autor e há colidência nos depoimentos, pode-se entender que o postulante não
fez a prova necessária, prevalecendo o horário constante da defesa.”
O ônus de provar a existência de nova relação jurídica
contratual após a jubilação competia ao obreiro e deste não se desincumbiu.177
176CONRADO, Gerson P. Taboada. Acórdão nº 03881-2005-046-12-00-5. Publicado no TRTSC/DOE em 23-06-2008. In: SANTA CATARINA. Tribunal regional do Trabalho 12ª região. Disponível em: www.trt12.gov.br. Acesso em 20 ago. 2008. 177 LOPES, Helio Bastida. Acórdão nº 00555-2006-023-12-00-3. Publicado no TRTSC/DOE em 18-06-2007. In: SANTA CATARINA. Tribunal regional do Trabalho 12ª região. Disponível em: www.trt12.gov.br. Acesso em 20 ago. 2008.
82
3- COMISSÕES. ÔNUS DA PROVA. Não havendo
documentos que permitam quantificar o valor das comissões, bem como por não
serem os depoimentos esclarecedores, inviável a aplicação do princípio in dubio
pro operario em matéria de prova processual. A regra inserida nesse princípio
basilar do Direito Laboral somente se aplica quando, existindo dúvida sobre o
alcance de norma legal, deve-se preferir a interpretação mais favorável ao
obreiro. 178
4- VÍNCULO DE EMPREGO. ÔNUS DA PROVA. O ônus da
prova da existência da relação empregatícia compete ao autor da demanda nas
situações em que a pessoa apontada como empregador rechaça a própria
prestação dos serviços. Nessa hipótese, não há presunção favorável àquele que
se diz empregado, não sendo aplicável o princípio in dubio pro operario.
[...]
Em contrapartida, as regras de direito processual são
propícias para o deslinde de tais situações. De fato, o ônus da prova da existência
da relação empregatícia compete ao autor da demanda nas situações em que a
pessoa apontada como empregador rechaça a própria prestação dos serviços.
Nessa hipótese, não há qualquer presunção favorável àquele que se diz
empregado, sendo inaplicável o princípio invocado pela recorrente.
Portanto, é do contexto probatório que deve advir o
convencimento do Magistrado. Nesse sentido, considero que a recorrente não se
desincumbiu de seu ônus.179
5- INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRETENSÃO
OBREIRA FRUSTRADA. NEXO CAUSAL NÃO-COMPROVADO. A ausência de 178 DREYER, Lourdes. Processo nº 01487-2002-007-12-85-0. Publicado no DJ/SC em 11-06-2004. In: SANTA CATARINA. Tribunal regional do Trabalho 12ª região. Disponível em: www.trt12.gov.br. Acesso em 20 ago. 2008. 179 FERREIRA, Garibaldi T. P. Processo nº 01907-2006-022-12-00-1. Publicado no TRTSC/DOE em 05-02-2007. In: SANTA CATARINA. Tribunal regional do Trabalho 12ª região. Disponível em: www.trt12.gov.br. Acesso em 20 ago. 2008.
83
prova cabal e robusta da existência de nexo causal entre a doença acometida e a
função exercida pela obreira inibe o direito à pretensa indenização por danos
morais.
[...]
Não há como aplicar ao caso o princípio protecionista (in
dubio pro operario), como pretende a autora, porquanto a condenação em danos
materiais e morais pressupõe a prova inequívoca de que foram atendidos a todos
os requisitos de que trata o art. 159 do Código Civil vigente à época dos fatos.
Dessa forma, não havendo nos autos elementos aptos a
rebater o resultado do indigitado laudo pericial, nada há para reformar no julgado
em que foram julgados improcedentes os pedidos.180
Assim, após maior aprofundamento pelo presente
estudo, percebe-se que o princípio da proteção, e mais especificamente o
princípio do in dubio por operário encontra já respeitável certeza quanto a sua
inviabilidade no direito atual. Fica claro que não pode o empregado querer se
utilizar a principiologia como subterfúgio para alcançar algum direito do qual não
pode garantir que possua com provas palpáveis. Ainda mais que se deve levar
em consideração a situação do trabalhador no que tange a sua proteção
intrínseca de seus sindicatos, cada dias mais fortes e preparados para “defendê-
los” dos empregadores, enquanto estes ainda tem de arcar com todas as
despesas para a resolução dos conflitos.
Antes de qualquer coisa o julgador deve levar em
consideração a principiologia como um todo, no que se destaca a boa-fé, a
razoabilidade e a equidade, onde antes de se ter certeza de qualquer fato, se tem
de buscar dirimir todas as dúvidas pertinentes, mas sempre respeitando ambos os
lados que, em verdade encontram-se equiparados na forca da lei.
180 CAITANO, Maria Aparecida. Processo nº 00223-2006-020-12-00-0. Publicado no TRTSC/DOE em 28-05-2008. In: SANTA CATARINA. Tribunal regional do Trabalho 12ª região. Disponível em: www.trt12.gov.br. Acesso em 20 ago. 2008.
84
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo teve como objetivo de investigar a
aplicabilidade do princípio do In dubio pro operário na atualidade.
Tal princípio demonstra-se visivelmente inaplicável, haja
vista que, com a evolução do direito moderno, a proteção que o trabalhador
precisava possuir em anos anteriores vem sendo cada vez mais substituída pelo
poderio dos sindicatos de classes, e mesmo um maior entendimento por parte do
trabalhador da legislação, o que certamente evita que por ventura algum
empregador queira se aproveitar.
Mas em se falando de princípios em si, deve-se levar em
conta, como apresentava-se a primeira hipótese que:
• Os princípios que regem o direito do trabalho têm mera função de sustentação
da ordem jurídica posta, não se materializando durante a consecução do
contrato de emprego ou da ação trabalhista proposta.
Neste ponto, não se pode confirmar a presente hipótese,
pois os princípios do Direito são sim materializados durante toda a vida do
indivíduo, pois não apenas de regras se baseia a discussão sobre as dúvidas que
possam a surgir, mas também dos princípios gerais e específicos. As lides
trabalhistas, como foi apresentado no próprio corpo do trabalho encontram-se
repletas de decisões que utilizam-se dos princípios do direito nas decisões, até
porque, tal possibilidade encontra-se disposta até no Código de Processo Civil e
na Consolidação das Leis do Trabalho, onde na falta de legislação pertinente
acerca de determinado assunto, este deve ter, entre outras formas, nos princípios
o seu fundamento decisório.
Quanto ao objeto do trabalho, ou seja, o princípio do In dubio
pro operário, tem-se a segunda hipótese:
85
• O princípio do in dubio pro operário é essencial para a regulação das relações
entre empregado e empregador e tem aplicação indistinta nas demandas
trabalhistas que envolvem dúvida acerca do direito pleiteado pelo obreiro.
Tal princípio deve ser confirmado, apesar de que com
ressalvas.
O empregado merece certa proteção, ou melhor, certo
auxílio quando na lide trabalhista, pois, possui menos recursos e maiores
dificuldades de acesso a justiça. Mas tal proteção não pode ser confundida com
pesos maiores nas decisões. Por ter proteção sindical e mesmo por ter um maior
conhecimento de causa do que em épocas anteriores, o empregado não é uma
parte tão mais fraca que o empregador e, portanto, não deve possuir peso
diferenciado na fase probatória da ação, sob pena de torná-la injusta com os
preceitos lógicos da justiça.
Este entendimento é o mesmo do Egrégio Tribunal Regional
do Trabalho da 12ª região, que considera que não pode haver diferença da
possibilidade de apresentação probatória no processo pelo simples fato deste ser
empregado.
Desta forma, encerra-se esta Monografia, pois esta
encontrou o seu propósito investigatório, ao analisar as hipóteses acima
mencionadas. Mesmo assim, após extensa pesquisa percebe-se que o tema
ainda necessita de maiores estudos para definir ainda melhor a aplicabilidade do
Princípio do In dubio pro operário.
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