O Processo de Impregnação dos Cavacos de Madeira de Eucalipto ...

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  • Maio 2009

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    O Processo de Impregnao dos Cavacos de Madeira

    de Eucalipto pelo Licor Kraft de Cozimento

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    O Processo de Impregnao dos Cavacos de Madeira

    de Eucalipto pelo Licor Kraft de Cozimento

    Celso Foelkel

    CONTEDO INTRODUO SOBRE O PROCESSO KRAFT

    ALGUNS CONCEITOS PRELIMINARES E BSICOS SOBRE A IMPREGNAO DOS CAVACOS DE EUCALIPTO

    OS CAVACOS DE MADEIRA DE EUCALIPTO E SUA MAIS EFICIENTE IMPREGNAO PELO LICOR KRAFT DE COZIMENTO

    O LICOR DE COZIMENTO E SEU IMPACTO NA IMPREGNAO DOS CAVACOS DE MADEIRA

    A ANATOMIA DA MADEIRA DOS EUCALIPTOS AFETANDO A IMPREGNAO DOS CAVACOS

    PR-VAPORIZAO DOS CAVACOS COMO EFICIENTE MANEIRA DE MELHORAR IMPREGNAO DOS CAVACOS

    RESUMINDO E REFORANDO OS CONCEITOS APRENDIDOS SOBRE A IMPREGNAO DOS CAVACOS

    MODELANDO O PROCESSO DE IMPREGNAO DOS CAVACOS

    NOVAS OPORTUNIDADES PARA A IMPREGNAO DOS CAVACOS

    CONSIDERAES FINAIS

    REFERNCIAS DA LITERATURA E SUGESTES PARA LEITURA

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    O Processo de Impregnao dos Cavacos de Madeira

    de Eucalipto pelo Licor Kraft de Cozimento

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    INTRODUO SOBRE O PROCESSO KRAFT

    Madeira de eucalipto: uma das principais matrias-primas para a fabricao de

    celulose kraft existe muita tecnologia para se atingir o necessrio e adequado

    sucesso uma delas a impregnao dos cavacos pelo licor de cozimento

    Cavacos parcialmente penetrados pelo licor de cozimento.

    Fonte: Inalbon et al., 2009

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    Os eucaliptos conseguiram, nas ltimas dcadas, a notvel posio de

    uma das mais importantes matrias-primas para a fabricao de celulose

    kraft branqueada a nvel global. De uma madeira usada marginalmente para

    essa finalidade na dcada dos 60s, em poucos anos, as fbricas de celulose

    kraft de mercado foram surgindo vencedoras em pases como Portugal,

    Espanha, Brasil, frica do Sul, Marrocos, Chile, etc. Sua utilizao na

    fabricao de papel foi-se difundindo especialmente em fbricas no

    integradas compradoras de celulose de mercado. Tambm, a nvel de

    produo integrada, seu sucesso grande, mais especialmente na fabricao

    de papis do tipo impresso e escrita (papis para copiadoras reprogrficas e

    de computadores, papis base para revestimento, papel para cadernos,

    etc.). To rpido e importante foi a adequao e o desenvolvimento

    tecnolgico que esse tipo de produo de celulose kraft branqueada a partir

    de florestas plantadas e melhoradas de eucaliptos tem sido considerado por

    alguns autores (Lehtonen, Lindqvist) como sendo uma mudana tecnolgica

    revolucionria e disruptiva (disruptive technology), conforme o conceito

    preconizado por Clayton Christensen.

    Por inovao tecnolgica disruptiva entenda-se qualquer inovao nas

    tecnologias de processo ou de produto que aumente o valor percebido pelo

    cliente conforme uma das seguintes maneiras:

    Pela introduo de uma nova dimenso de performance ao produto, e por isso, criando mercados novos ainda no conhecidos ou explorados;

    Por providenciar uma soluo muito menos custosa para melhorar a performance de clientes que tenham dificuldades de conviver com a

    tecnologia anterior pelos altos custos da mesma ou pela sua mais difcil

    e menos eficiente performance.

    Os eucaliptos passaram a ser grandes fornecedores de madeira para a

    produo de fibras celulsicas para a indstria do papel, exatamente por

    essas vantagens para os fabricantes de celulose e para os de papel. O

    principal processo utilizado para a individualizao dessas fibras e produo

    de celulose tem sido o processo kraft, at o momento. Existem tambm

    novos caminhos sendo construdos em pastas de alto rendimento para os

    eucaliptos, mas isso ser tema de outro captulo de nosso Eucalyptus

    Online Book. Estaremos nesse captulo lhes falando sobre o processo kraft

    aplicado aos eucaliptos. Discorreremos brevemente sobre ele, no temos

    aqui o objetivo de lhes oferecer um tratado sobre o processo kraft de

    produo de celulose. Afinal, esse um livro sobre os eucaliptos e no sobre

    a qumica dos processos de produo de celulose e papel. Nosso objetivo

    com o presente captulo (impregnao dos cavacos) e com o que se seguir

    (individualizao das fibras e dissoluo de constituintes da madeira pelo

    processo kraft na fabricao de celulose) o de lhes mostrar fatores

    importantes na transformao da madeira de eucalipto em celulose kraft.

    Apresentaremos a vocs duas importantes fases desse processo de

    converso, cada qual compondo um captulo de nosso livro. Mais tarde,

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    voltaremos ao tema com outras consideraes tecnolgicas, mas no

    momento nos fixaremos em aspectos fundamentais da polpao kraft dos

    eucaliptos. Nesse presente captulo falaremos sobre a Impregnao dos

    Cavacos de Madeira de Eucalipto pelo Licor Kraft de Cozimento" fase

    importantssima e vital desse processamento industrial. O prximo captulo

    ser sobre Mecanismos de Individualizao das Fibras da Madeira de

    Eucalipto e Dissoluo de seus Constituintes Qumicos na Converso a

    Celulose Kraft. Acredito que esses temas fundamentais sero de grande

    valia para aqueles que produzem celulose de eucalipto, muitas vezes se

    esquecendo de aspectos tericos e cientficos relevantes e que possuem alto

    impacto nas operaes prticas e industriais.

    Nesse atual captulo lhes falaremos brevemente sobre o processo kraft

    e seus ltimos e recentes avanos tecnolgicos. Falaremos tambm o que

    deve ser cuidado e otimizado para que tenhamos uma eficiente impregnao

    dos cavacos de madeira de eucalipto para mxima efetividade do processo

    kraft de polpao.

    Os processos qumicos de produo de celulose se baseiam em reaes

    de dissoluo dos agentes cimentantes das fibras. Para assegurar uma

    reao eficaz, eficiente e uniforme faz-se necessrio que todos os elementos

    anatmicos da madeira sejam postos em contato com o licor de cozimento.

    Em resumo, a fase crtica e importante para o incio da produo de celulose

    kraft exatamente a entrada e ocupao da madeira pelo licor kraft de

    cozimento.

    O primeiro passo para se conseguir a entrada desse licor na madeira

    aumentar a superfcie de contato da madeira com o licor. Isso conseguido

    pela transformao das toras de madeira em cavacos. Quanto menores

    forem os cavacos, maior a superfcie para entrada do licor. Entretanto, a

    produo de cavacos de dimenses muito pequenas no totalmente

    favorvel, pois gera-se muita serragem (p de madeira), que muito

    atacada pelo licor alcalino e se trazem muitos danos mecnicos s fibras.

    Material de dimenso muita pequena no qualificado para a produo de

    celulose, pois consome muito licor alcalino, sofre extrema degradao no

    digestor e, com isso, prejudica-se o rendimento na converso em celulose.

    Por isso, os cavacos so em geral produzidos de forma a terem dimenses

    que minimizem a gerao de serragem e de mini-cavaquinhos e tambm de

    cavacos espessos e de lascas de madeira. Objetiva-se um meio termo

    favorvel ao processo. Quando os cavacos so adequadamente preparados e

    os operadores industriais cuidam para que isso acontea, teremos

    conseguido cumprir bem uma importante etapa na produo de celulose

    kraft.

    O processo kraft se baseia na utilizao de uma soluo alcalina forte

    para atacar e dissolver a lignina da madeira em vasos sob temperatura e

    presso denominados digestores.

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    Digestor contnuo tipo Lo-solids - Fonte: Valdebenito, 2009

    Os ons qumicos ativos e dominantes no licor de cozimento kraft para

    produo de celulose so: OH- (hidroxila) e HS

    - ou SH

    - (hidrosulfeto -

    http://pt.wikipedia.org/wiki/Hidrossulfeto_de_s%C3%B3dio). Alm deles, tambm

    existem em quantidades significativas: [CO3]2-

    e Na+. O on sulfeto S

    2-,

    apesar de presente no licor, est sempre em processo de dissoluo em

    condies alcalinas, gerando OH- e HS

    -. O sulfeto em si no tem papel

    importante na deslignificao, apenas se constitui na fonte contnua de ons

    ativos capazes de atuar na deslignificao que so a hidroxila e o

    hidrosulfeto.

    O processo kraft um processo bastante popular, sendo responsvel

    por mais de 95% de toda a produo mundial de celulose qumica. No caso

    da celulose de eucalipto, ele o processo quase absoluto. Existe, como j

    mencionamos, uma tendncia do eucalipto ser utilizado tambm com muito

    sucesso na fabricao de pastas de alto rendimento pelos processos CTMP

    (pasta quimitermomecnica) e APMP (pasta mecnica ao perxido alcalino). Outro bem sucedido processo sendo utilizado para a madeira dos eucaliptos

    uma variao do processo kraft que serve para a produo de polpas

    solveis: processo pr-hidrlise kraft.

    O sucesso do processo kraft se deve a alguns fatores imbatveis para

    sua aplicao, quais sejam:

    Sua versatilidade - pode ser aplicado em praticamente qualquer material vegetal fibroso;

    http://pt.wikipedia.org/wiki/Hidrossulfeto_de_s%C3%B3dio

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    A altssima recuperao e de forma muito simples dos reagentes qumicos;

    A etapa de recuperao tambm fonte de gerao trmica (biomassa combustvel do licor preto residual do cozimento);

    Rpida e eficiente despolimerizao e dissoluo alcalina da lignina; A relativa estabilidade da celulose gerando fibras de boa qualidade; A fcil degradao dos extrativos da madeira; A possibilidade de se adotar processos de deslignificao modificados e

    extendidos, tanto em digestores contnuos, como em descontnuos -

    tipo batch;

    A excelente qualidade da polpa produzida, o que lhe favorece muitas aplicaes;

    A relativamente fcil e tecnologicamente vivel branqueabilidade da polpa no branqueada, sendo possvel lev-la a altssimos graus de

    alvura.

    Como desvantagens, o processo kraft apresenta as seguintes:

    Rendimento da converso da madeira a celulose no alto devido ao ataque aos carboidratos pelo licor de cozimento, fortemente alcalino;

    A tecnologia capital intensiva e depende claramente da economia de escala;

    O odor gerado no processamento ainda no est completamente solucionado;

    As limitaes na etapa de recuperao do licor so sempre obstculos para o crescimento de produo em fbricas j instaladas.

    O setor industrial de produo de celulose e papel muito sensvel s

    crises econmicas e s dificuldades que elas trazem. Em geral, o setor

    sempre um dos primeiros a ser impactado pelas turbulncias econmicas e

    financeiras. Isso porque existe uma fortssima correlao entre o consumo

    de papel e as atividades econmicas e o consumo de bens pela Sociedade.

    Por essa razo, o setor de produo de celulose e papel est sempre

    obstinado na busca de solues para continuada eficincia em suas

    operaes e na reduo de seus custos de produo. Um tipo de presso

    constante tipo bafo na nuca interminvel. Isso se deve porque o setor

    antev dias difceis no futuro em funo basicamente de:

    Custo crescente da madeira, especialmente agora que se vislumbram utilizaes da mesma nas biorefinarias para produo de

    biocombustveis;

    Preo real decrescente dos produtos de celulose e papel nos mercados; Restries de cunho energtico e ambiental.

    Devido a essas ameaas, as fbricas e os fabricantes de novas

    tecnologias esto sempre na busca de melhorar rendimentos e

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    produtividades, em reduzir consumos especficos de madeira, em reduzir

    perdas e desperdcios, em otimizar os consumos energticos (trmico e

    eltrico) e em melhorar a continuidade ou eficincia operacional. Esses

    ganhos so buscados ao longo de todo o processamento industrial da

    celulose e do papel, e em especial na forma de se produzir a celulose kraft.

    Ganhar eficincia e reduzir custos na etapa de polpao kraft se

    consegue por:

    Aumento do rendimento da converso da madeira em celulose - ou seja, para cada tonelada absolutamente seca de madeira se

    produzir um maior peso seco de celulose, reduzindo ento a

    quantidade de material da madeira que se dissolveria para o licor.

    As fbricas de celulose at o momento so fbricas de polpas

    fibrosas e no de licor preto para enviar para a evaporao e depois

    caldeira de recuperao.

    Reduo do consumo de lcali ativo ou efetivo por tonelada de madeira (quantidade de licor branco necessrio para a polpao);

    Reduo do consumo especfico de madeira; Reduo do consumo de energia trmica (calor) ou eltrica (para

    movimentaes e fluxos);

    Ganho de produo na linha de fibras em relao ao originalmente projetado;

    Ganho de eficincia ou continuidade operacional no setor de produo de celulose (digestores e equipamentos da rea de polpa

    no branqueada).

    Os cmbios tecnolgicos no setor tm sido significativos, graas s

    muitas pesquisas desenvolvidas tanto por fabricantes de equipamentos,

    universidades, institutos de pesquisa e empresas industriais.

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    Mudanas conceituais em digestores contnuos (Outzen, Kvaerner, 2002)

    H portanto muito esforo sendo alocado pelos tecnologistas do setor

    na tentativa de melhorar a qumica e a performance do processo kraft. Os

    ganhos at que tm sido modestos, apesar das enormes mudanas

    tecnolgicas que o processo tem sofrido nos anos mais recentes. Em geral,

    as modificaes conceituais em digestores kraft e na forma de cozinhar a

    madeira tm elevado o rendimento em algo como 2 a 5% base madeira.

    Ganhos modestos, pelo tanto que se pesquisou e se modificou. Por isso, faz-

    se necessrio estudar ainda mais para manter o processo kraft vencedor e

    competitivo.

    Os ganhos modestos no rendimento do processo podem at certo

    ponto serem explicados pela interao no to favorvel entre a qumica do

    processo kraft e a fsico-qumica da madeira. O licor kraft de cozimento

    utilizado com a finalidade de deslignificar a madeira e promover a

    individualizao das fibras. Entretanto, ele no muito seletivo e causa

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    srios efeitos deletrios em carboidratos dessa madeira. Seus ons qumicos

    ativos, especialmente as hidroxilas, atacam os carboidratos da parede celular

    do vegetal, fragmentando-os, despolimerizando-os e solubilizando-os. Uma

    das formas de se ganhar rendimento exatamente pela maior proteo

    contra a degradao das hemiceluloses e da celulose, reduzindo a

    degradao que se d principalmente atravs da despolimerizao terminal

    conhecida como reao de peeling. Ao mesmo tempo que se protegem os

    carboidratos, devemos estar atentos para evitar a reprecipitao e

    condensao da lignina. Ou seja, temos tarefas altamente complicadas para

    serem ainda resolvidas pelos pesquisadores do processo kraft.

    A soda custica, fonte das hidroxilas no processo kraft, um reagente

    muito agressivo aos carboidratos da madeira, mesmo em condies de

    baixas temperaturas. Alm disso, ela provoca o inchamento da parede

    celular, o que potencializa as reaes de degradao por tornar os

    constituintes da parede celular ainda mais acessveis. Por outro lado,

    tambm a lignina fica mais acessvel pelo inchamento das paredes.

    Desafortunadamente, essas coisas acontecem concomitantemente. Da

    mesma forma que removemos lignina, removemos carboidratos. Ainda, as

    mesmas condies que favorecem a reprecipitao de xilanas no cozimento,

    tambm so boas para a reprecipitao de lignina. Ou seja, um quebra-

    cabeas difcil de ser montado e resolvido.

    Cozimento Lo-Solids na fbrica de Botnia, Uruguai (Fonte: Saarela et al., 2008)

    A melhor maneira de melhorar o rendimento seria pelo bloqueio das

    reaes de despolimerizao terminal dos carboidratos, pela maior reteno

    de hemiceluloses e eventualmente, por alguma reprecipitao de xilanas ao

    trmino da polpao. Para que as hemiceluloses possam se reprecipitar

    sobre a polpa, elas no poderiam ser extradas do digestor. Entretanto, os

    modernos digestores fazem exatamente isso: cuidam de extrair o licor preto

    residual de dentro do digestor para substitui-lo por licor menos concentrado,

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    com maior habilidade de sugar para a fase lquida os compostos dissolvidos

    da madeira. Com essa tcnica, favorece-se a difuso de substncias

    orgnicas dissolvidas de dentro dos cavacos para a fase lquida do sistema

    (licor). Os processos que repartem a carga alcalina total e a adicionam

    fracionadamente ao longo do cozimento, ao mesmo tempo que extraem

    licores concentrados e os substituem por outros menos, so denominados de

    processos alcalinos kraft modificados.

    A misso dos tecnologistas tem sido buscar tambm usar os licores

    preto extrados e ricos em compostos dissolvidos da madeira na etapa de

    impregnao dos cavacos. Isso tem permitido usar a alcalinidade residual

    ainda presente no licor preto, especialmente seus ons hidrosulfeto

    (abundantes) e hidroxilas (menos abundantes). Os HS- so catalisadores das

    reaes alcalinas e so considerados protetores dos carboidratos, sendo a

    causa do sucesso do processo kraft em relao ao processo soda (que no os

    dispe em sua qumica). Mesmo que fragmentos maiores de xilanas venham

    a se reprecipitar nessa fase de impregnao dos cavacos, restar aos

    pesquisadores descobrir formas de evitar que esses fragmentos sejam

    removidos pelo cozimento kraft subsequente impregnao. Algo nada fcil,

    concordam?

    Os pesquisadores tm procurado se valer de outros compostos

    protetores, tais como: surfactantes, antraquinonas, boridreto, polisulfetos,

    etc.. O objetivo est sempre concentrado na preveno da remoo de

    hemiceluloses e de glucanas (da celulose) da polpa. Com isso, aumentariam

    a efetividade e a seletividade da polpao kraft. Existem bons resultados

    reportados pelas pesquisas, mas em termos positivos e industriais, apenas a

    antraquinona tem tido relativo sucesso.

    Atualmente, os pesquisadores e os engenheiros desenvolvedores de

    tecnologias esto buscando otimizar as adies de licor branco virgem, as

    concentraes alcalinas e as temperaturas de cozimento, visando tornar

    maior a remoo de lignina e menor a remoo de carboidratos (seletividade

    do cozimento). Buscam dominar mais o processo de deslignificao sem

    impactar tanto sobre os carboidratos. Busca-se na verdade, dominar o

    processo de bulk delignification (deslignificao massiva ou principal da

    lignina), minimizando o impacto nos carboidratos nas demais fases da

    polpao. Estamos tambm falando na fase da impregnao dos cavacos.

    O processo alcalino kraft tem sido dividido teoricamente em 4 etapas

    magnas:

    1. Impregnao dos cavacos a mais baixas temperaturas (100 a 110C), mas que j consome cerca de 20 a 25% do lcali efetivo em reaes de

    neutralizao dos grupos cidos da madeira (grupos acetila e grupos

    urnicos). O consumo basicamente de soda custica.

  • 13

    2. Aumento da temperatura at se atingir a temperatura de mxima velocidade de remoo de lignina (bulk delignification ou deslignificao

    principal). Nessa fase de aumento de temperatura at 135 a 145C se

    consomem adicionais 20 a 30% do lcali efetivo para degradar

    carboidratos, extrativos e alguma lignina.

    Portanto, s para impregnar os cavacos e para elevar a temperatura

    dos mesmos at a temperatura de deslignificao massiva ou principal da

    lignina (135 145C), j se consomem cerca de 45 - 50% do lcali efetivo e

    se removem cerca de 25% do peso seco da madeira. Essas reaes de

    degradao de carboidratos nessa fase 2 se caracterizam por reaes de

    dissoluo de ramificaes das hemiceluloses e de despolimerizao

    terminal, tanto de hemiceluloses como de celulose.

    3. Fase de deslignificao principal ou massiva (bulk delignification), que corresponde ao incio do que se chama de tempo de cozimento na

    mxima temperatura. Aqui se d a maior remoo de lignina da madeira.

    4. Fase de deslignificao residual (final do cozimento), que se caracteriza por baixa remoo de lignina dos cavacos, mas que necessria para

    permitir a mais fcil individualizao das fibras, especialmente aquelas de

    cavacos que foram mal impregnados anteriormente. As perdas de

    rendimento continuam por despolimerizao terminal das cadeias

    principais (backbones).

    Parte do sucesso dos processos e digestores atuais se deve s

    melhores condies na etapa de impregnao dos cavacos. Tambm se deve

    difuso dos fragmentos de compostos dissolvidos da madeira para fora da

    estrutura dos cavacos, em contra-fluxo com os ons ativos de cozimento que

    continuam a penetr-los. O transporte e remoo desses fragmentos

    dissolvidos de constituintes da madeira so feitos com trocas de licores.

    Tudo indica que as velocidades de difuso dos ons ativos para o

    interior dos cavacos e a sada de constituintes dissolvidos de madeira

    (tambm por difuso) so mais vagarosas que as reaes qumicas que

    ocorrem (rapidssimas). Isso muito importante conhecer. O processo

    definitivamente dinmico. Isso precisa ser levado em conta nas otimizaes

    e modelagens.

    Hoje, acredita-se que:

    Os cavacos devem estar o mximo possvel impregnados antes de se elevar a temperatura para atingir a fase de deslignificao principal ou

    massiva. Inclusive, deve-se evitar ter cavacos mal impregnados e se

    elevar a temperatura de cozimento acima de 140C.

    As baixas temperaturas e a boa impregnao favorecem a etapa de bulk delignification e a seletividade da polpao. Boa seletividade

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    significa alta deslignificao com baixa degradao de carboidratos.

    Pode ser medida tanto pela relao rendimento depurado/nmero

    kappa ou viscosidade da polpa/nmero kappa.

    A concentrao alcalina deve ser mantida relativamente nivelada ao longo das diversas fases do cozimento. Isso se consegue fracionando

    as entradas de lcali no sistema, no se colocando todo de uma nica

    vez no comeo do cozimento, como era feito no passado.

    A concentrao elevada de ons hidrosulfeto deve ser perseguida para prevenir a degradao mais intensa dos carboidratos, especialmente

    nas fases iniciais do cozimento. Em parte isso se consegue trabalhando

    com mais alta sulfidez e tambm pela impregnao dos cavacos com

    uso de licor preto contendo constituintes dissolvidos de madeira e alta

    concentrao de ons HS-. O uso de licor verde na impregnao dos

    cavacos foi intensamente estudado para fazer essa funo, mas nunca

    conseguiu se firmar como uma operao industrial de sucesso. Em

    parte porque as fbricas sempre possuem limitaes em suas reas de

    caustificao e forno de cal. Ou ainda, pela ineficincia na filtrao

    desse licor verde.

    As concentraes do on hidroxila devem ser mantidas mais ou menos uniformes ao longo do cozimento, mas com uma concentrao tal no

    licor que mantenha rpida a difuso desse on para o interior dos

    cavacos pelo fenmeno de difuso (que fortemente dependente das

    diferenas de concentraes).

    As concentraes de ons sdio e de fragmentos de lignina devem ser continuamente reduzidas por trocas de licor, para favorecer a migrao

    de lignina fragmentada para fora dos cavacos ao longo do processo de

    cozimento.

    A temperatura do cozimento, em todas as suas fases deve ser a mais baixa possvel, sem prejudicar o tempo de cozimento e a

    produtividade, em funo das dimenses dos equipamentos

    desenhados e em uso na fbrica.

    A quantidade de lcali ativo ou efetivo consumido ao longo do

    processo vai depender de:

    Madeira: em termos de sua constituio qumica, densidade bsica, etc.;

    Dimenses e qualidade dos cavacos; Qualidade da impregnao dos cavacos; Temperatura mxima de cozimento (para baixas temperaturas em

    geral se demandam mais altas cargas alcalinas para evitar que o

    tempo de cozimento se torne demasiadamente longo. Uma

    desvantagem importante, pois representa mais investimentos no setor

    de preparao de licor branco);

    Grau de deslignificao almejado (nmero kappa objetivado);

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    Interao entre as variveis chave do processo (tempo, temperatura, carga alcalina, sulfidez, etc.).

    A quantidade de lcali efetivo base madeira afeta tanto o rendimento

    como a qualidade da polpa. Tambm afeta a economicidade do processo, as

    dimenses da unidade de recuperao de licor (caldeira de recuperao para

    queimar slidos secos), forno de cal, caustificadores). Portanto, no basta

    apenas se baixar a temperatura, pois em uma fbrica existente as demandas

    e ofertas de lcali podem ser crticas. A fbrica pode perder produo se

    quiser baixar mais do que pode a temperatura de cozimento, sem ter a

    requerida quantidade de lcali para compensar isso.

    O lcali efetivo consumido por reaes com:

    extrativos da madeira; acidez natural da madeira, causada pelos grupos cidos das

    ramificaes das hemiceluloses (acetila e urnicos);

    degradao das hemiceluloses por despolimerizao da cadeia principal;

    despolimerizao terminal das molculas de celulose; degradao da lignina; reao de carbonatao das hidroxilas pela presena de molculas

    de dixido de carbono (toda degradao de matria orgnica leva

    formao de gs carbnico em sua fase terminal);

    adsoro s fibras da polpa.

    O consumo de lcali (hidroxilas) pela madeira j ocorre temperatura

    ambiente e vai aumentando conforme aumenta a temperatura ou a

    concentrao de hidroxilas. Quanto mas lcali efetivo a madeira consumir

    antes da fase de deslignificao, maior poder ser a perda de rendimento

    que ela sofrer. Uma parte das hemiceluloses so degradadas j na fase de

    impregnao dos cavacos e posteriormente, durante a fase de elevao da

    temperatura para se alcanar a temperatura de cozimento. Em geral para os

    eucaliptos, cerca de 25% da sua madeira dissolvida at se atingir a

    temperatura de bulk delignification e praticamente a metade do lcali

    efetivo consumido antes que as reaes de intensa deslignificao tenham

    comeado. O nmero kappa da polpa/madeira ainda altssimo (mais de

    140) e j perdemos 25% em peso da madeira ao se atingir cerca de 140C.

    S a fase de impregnao dos cavacos representa uma perda de rendimento

    entre 5 a 10% base madeira original. Essa perda de rendimento tanto

    maior quanto maior for a temperatura de impregnao (por exemplo:

    120C). So compostos que se perdem por causa das reaes que

    acontecem com alguns componentes da madeira que so muito atacados

    pelas solues alcalinas. Resta o consolo de saber que esses compostos so

  • 16

    to sensveis ao lcali que se no forem removidos na fase de impregnao,

    o sero em fases subsequentes do cozimento.

    So eles:

    grupos acetila: praticamente todos so removidos (at a exausto); grupos urnicos: cerca de 20% de remoo; mananas: cerca de 20 a 40%; xilanas (backbone): cerca de 4 a 8%; glucanas (da celulose): cerca de 1%; lignina: entre 4 a 6%.

    As perdas so to maiores quanto maiores forem as temperaturas

    utilizadas no processo de impregnao dos cavacos.

    As xilanas do eucalipto (O-Acetil-4-O-Metilglucurono-Xilanas ou

    Acetato de 4-O Metil-Glucurono-Xilanas) so as mais importantes

    hemiceluloses das suas madeiras. Elas so muito sensveis degradao

    pelo licor de cozimento kraft. As xilanas podem representar 18% a 25% da

    madeira do eucalipto, especialmente quando se somam os grupos acetila e

    metil glucurnicos. Somente a remoo dos grupos acetila e metil

    glucurnicos podem representar perda de peso da madeira de 4 a 6%.

    Infelizmente, isso praticamente inevitvel - pela tecnologia kraft de hoje,

    so perdas irreversveis essas das acetila principalmente. Resta aos

    pesquisadores encontrar ento mecanismos para tentar estabilizar e impedir

    a degradao da cadeia principal da xilana do eucalipto (seu backbone).

    Caso contrrio (e isso vem acontecendo), outros 4 a 8% sero removidos.

    Isso se deve simples retirada de monmeros da cadeia principal ou ento

    da quebra de fragmentos maiores, contendo diversos e variados graus de

    polimerizao. Caso esses fragmentos maiores se mantiverem estabilizados

    ao longo do cozimento, eles podero ser reprecipitados de forma mais

    cristalina (sem ramificaes), quando o pH baixar em alguma fase do

    cozimento. O mais usual acontecer ao final do cozimento ou ao trmino da

    fase de impregnao.

    De forma mais ampla, o teor de hemiceluloses nas madeiras dos

    diferentes eucaliptos comerciais varia entre 20 a 30%, sendo os mais altos

    valores encontrados nas espcies Eucalyptus globulus, E. nitens e E.dunnii.

    So teores muito altos para no querer proteger ou aproveitar melhor,

    concordam?

    H por isso mesmo um enorme esforo colocado pelos pesquisadores

    para aumentar o rendimento do processo kraft. Para o caso dos eucaliptos,

    tem-se conseguido valores no rendimento kraft entre 49 a 57%, dependendo

    principalmente da espcie e da idade da tecnologia empregada. As espcies

    ou clones com alta relao siringil/guaiacil e mais baixo teor de lignina total

    (Eucalyptus globulus) possuem os melhores resultados para rendimentos.

  • 17

    Em funo de todos os considerandos at o momento apresentados,

    podemos estabelecer 10 fatores chaves para serem perseguidos na busca do

    aumento do rendimento kraft para as madeiras dos eucaliptos:

    1. composio qumica ideal da madeira: teor de extrativos, teor e tipo (relao siringil//guaiacil) de lignina, teor e tipo de hemiceluloses, teor de

    celulose, etc.;

    2. anatomia da madeira: teor de fibras, vasos e parnquimas; 3. dimenses, fraes e qualidade dos cavacos; 4. impregnao dos cavacos pelo licor de cozimento; 5. qumica da polpao kraft (otimizao das reaes); 6. condies da operao da polpao kraft: variveis de cozimento e gesto

    dos licores e filtrados;

    7. entendimento das causas que afetam a seletividade do cozimento kraft, ou seja, da melhor remoo de lignina e menor ao sobre os

    carboidratos (quer sejam os carboidratos removidos ou os que

    permanecem na polpa refletidos por maiores ou menores comprimento de

    suas cadeia (relacionados portanto com a viscosidade da polpa);

    8. otimizao das relaes rendimento depurado/nmero kappa e viscosidade da celulose/nmero kappa;

    9. gesto dos componentes dissolvidos da madeira (DWC Dissolved Wood Components);

    10. qualidade da polpa que sai do digestor e que alimentar etapas subsequentes (branqueabilidade, teor de pitch, resistncia da fibra

    individual, capacidade de ligao entre fibras, etc.)

    As novas tendncias em termos de cozimento kraft tm buscado atuar

    nessas 10 vertentes tecnolgicas, atravs de otimizaes e modificaes

    processuais. As principais alteraes que tm sido adotadas so as

    seguintes:

    mais eficiente remoo do ar de dentro dos cavacos; mais efetiva impregnao dos cavacos; abaixamento das temperaturas; abaixamento das presses hidrostticas (tanto pela reduo da

    presso aplicada ao topo dos digestores como pela reduo em

    altura dos digestores que hoje so menos esbeltos e mais

    encorpados);

    reduo do ciclo do cozimento pelo aumento da carga alcalina; redistribuies das cargas alcalinas e otimizao das mesmas em

    funo das matrias-primas utilizadas.

    Essas tendncias esto sendo contempladas nos mais recentes

    desenvolvimentos de digestores apresentados pelos lderes na fabricao e

  • 18

    desenvolvimento de tecnologias para o processo kraft de polpao, como por

    exemplo:

    cozimento Compact Cooking (Metso, ex-Kvaerner); cozimento Kobudo Mari ( representao Metso); cozimento Lo Solids (Andritz); Cozimentos Super Batch e Rapid Displacement Heating (RDH)

    menor populares para os eucaliptos.

    Essas novas tecnologias tm conseguido aumentar a seletividade do

    cozimento kraft para os eucaliptos, melhorando a remoo de lignina e

    oferecendo polpas no branqueadas praticamente isentas de rejeitos de

    cozimento (incozidos) e com pouqussimo palitos (shives). Apesar disso,

    como j mencionado, os ganhos at que foram modestos pelos enormes

    esforos colocados por tantos pesquisadores, tanto em laboratrios,

    prottipos e instalaes industriais. Mas existe ainda espao para mais a se

    fazer, todos acreditam nisso. E h ainda muita gente se esforando para

    encontrar novos caminhos para a tecnologia kraft, ainda a considerando

    como a melhor das alternativas tecnolgicas disponveis para se produzir

    celulose.

    =============================================

    ALGUNS CONCEITOS PRELIMINARES E BSICOS SOBRE A

    IMPREGNAO DOS CAVACOS DE EUCALIPTO

    Cavaco de eucalipto sendo impregnado pelo licor kraft

    Fonte: Inalbon et all, 2004

    1 cm

  • 19

    A grande verdade em toda essa histria que os processos de

    cozimento da madeira foram sendo alterados ao longo da histria sem que

    cuidados maiores fossem colocados na fase de impregnao dos cavacos. At

    o final dos anos 60s, praticamente toda a celulose kraft era produzida em

    digestores tipo batch, ou em bateladas. Nesses digestores, existe um ciclo

    de carga de cavacos para o interior dos digestores ajudado por uso de vapor,

    seguido de carga de licor preto e branco conjuntamente. O licor preto tinha a

    finalidade de fornecer calor aos cavacos e alguma alcalinidade residual.

    Durante toda a carga dos digestores, os cavacos eram intimamente

    vaporizados com vapor saturado para melhorar a acomodao dos mesmos

    no interior do digestor. Isso os aquecia e ajudava na expulso do ar e no

    umedecimento com gua.

    A seguir, o licor que havia sido adicionado era paulatinamente

    aquecido (ou por injeo direta de vapor, ou por aquecimento externo via

    circulao forada). Com isso, os cavacos iam sendo impregnados

    gradualmente antes que a temperatura de bulk delignification fosse

    atingida. A temperatura de cozimento em geral era acima da temperatura de

    deslignificao principal ou massiva (bulk delignification) por razes de

    velocidade de reao (velocidade relativa de reao preconizada por Vroom

    para determinao do fator H). Quando a temperatura de cozimento era

    alcanada os cavacos estavam em sua maioria impregnados.

    Quando surgiram os primeiros digestores contnuos em escala

    industrial (Kamyr, Esco) essa fase de impregnao foi praticamente

    suprimida. Os cavacos recebiam uma rpida vaporizao em um vaso que se

    chamava erroneamente de vaso de impregnao. A temperatura de

    vaporizao era de cerca de 115C e a presso de vapor de

    aproximadamente 1,5 ATA. O tempo de vaporizao era mnimo, poucos

    minutos. O objetivo era muito mais aquecer os cavacos para remover o ar do

    que impregnar com licor, at mesmo porque os cavacos no tinham algum

    contato com o licor de cozimento nesse vaso. Logo adiante, os cavacos

    encontravam o licor de cozimento que os levava ao topo do digestor a uma

    elevada temperatura (cerca de 160 a 170C). A carga alcalina era aplicada

    quase toda nesse momento. A seguir, continuavam nessas altas

    temperaturas em uma fase que se denominava, pasmem, de zona de

    impregnao. Essa zona tinha uma temperatura em geral bem acima da

    temperatura onde se iniciava a deslignificao principal ou massiva.

  • 20

    Digestor contnuo da gerao dos anos 70s. Foto: ex-Riocell Anos 80s

    No precisamos dizer que os resultados desse tipo de m

    impregnao eram dramticos, os piores possveis. Os cavacos tinham

    regies ainda no impregnadas pelo licor de cozimento e j estavam em

    altas temperaturas. Isso trazia alguma hidrlise como conseqncia, bem

    como a falta de lcali em algumas regies dos cavacos podia provocar

    reprecipitao de lignina e altos teores de rejeitos. Essas polpas dos anos 70

    at fins dos 80s consumiam muito mais cloro ativo total para serem

    branqueadas, numa clara demonstrao de lignina reprecipitada e

    condensada nas fibras, alm de fibras incozidas misturadas na polpa. Alm

    disso, onde no havia lcali nas regies superaquecidas dos cavacos, mas

    havia umidade, ocorria hidrlise cida de carboidratos. Removiam-se

    hemiceluloses e se perdia viscosidade da polpa. Um filme de terror e quem

    sofria era definitivamente a seletividade da polpao, a qualidade da polpa e

    seus usurios.

    Os cavacos quando entravam na regio de cozimento propriamente

    dita do digestor mostravam muitas desuniformidades: entre cavacos e no

    prprio cavaco individualmente. Essas desuniformidades se deviam s

    prprias irregularidades dos cavacos em suas dimenses, presena de

    bolsas de ar em seus interiores, e principalmente, muito m impregnao

    do licor de cozimento.

    Como conseqncia, a polpa final produzida era muito mais irregular

    em termos de nmero kappa das diferentes fibras individuais. Tnhamos

    muitas fibras altamente deslignificadas e com baixos nmeros kappa na

    sada do digestor (por volta de 10) e muitas fibras praticamente sem

    deslignificao (nmeros kappa acima de 100). Mais uma pelcula de terror

    que resultava em consumos de cloro ativo total acima de 50 kg/adt, mesmo

    aps a deslignificao com oxignio. Na verdade, a deslignificao com

    oxignio ficava inclusive com a misso de reduzir o teor de feixes de fibras

    da polpa, por cozimento complementar desses palitos e feixes de fibras com

  • 21

    elevado nmero kappa. Mesmo sem terem sido desenhadas para essa

    funo, tinham que acumul-la. O prprio branqueamento ficava com a

    incumbncia de deslignificar e individualizar fibras de feixes (shives); mas

    ao mesmo tempo, atacava outras com nmero kappa baixo.

    Conforme o cozimento contnuo foi sendo aperfeioado e modificado

    pela diviso da carga alcalina e reduo nas temperaturas das zonas de

    impregnao e cozimento, notaram-se ganhos que permitiram se continuar

    nessa linha de aperfeioamento tecnolgico. Finalmente, isso acabou

    resultando em corpos adicionais, tanto para a impregnao dos cavacos a

    baixas temperaturas como tambm para mais eficiente lavagem dos

    cavacos/polpas ao final do cozimento.

    O caminho do sucesso estava lanado: os investimentos podiam ser

    maiores em vasos adicionais para impregnao e lavagem, mas os benefcios

    eram tantos, que o pay-back era muito rpido.

    Digestor Compact Cooking com vaso de pr-impregnao. Fonte: Silva, 2009

  • 22

    Digestor Compact Cooking com pr-vaporizao e vaso auxiliar para impregnao

    dos cavacos. Fonte: Outzen, Kvaerner, 2002)

    A boa impregnao dos cavacos e a eficiente remoo de ar por pr-

    vaporizao conseguiram tornar os digestores mais simples e o

    branqueamento mais fcil e econmico. Observem que em passado recente

    necessitava-se de 40 a 50 kg de cloro ativo equivalente para se branquear

    uma polpa deslignificada com oxignio de eucalipto com nmero kappa 10 a

    11 at alvura 91% ISO. Agora isso atingido com cerca de 30 kg/adt. Ou

    seja, melhorar o cozimento no melhora s o rendimento da polpao, mas

    toda a fbrica de celulose kraft. Menos cloro ativo, menos efluentes, menos

    gua de lavagem, menos investimentos em estgios de branqueamento e em

    tratamento de efluentes, menores teores de organoclorados, melhor

    qualidade da polpa, menos desclassificaes, menos repolpeamento, etc.,

    etc. enfim, esses so apenas parte dos muitos ganhos.

    Relembrando ento: a pr-vaporizao e a impregnao de cavacos

    eficientes, a distribuio da carga alcalina, a extrao e troca de licores

    contaminados com constituintes ou componentes dissolvidos da madeira,

    as baixas temperaturas ao longo do cozimento e as muito eficientes lavagens

    da polpa permitem: maior reteno de hemiceluloses, menor consumo

    energtico de vapor, maiores rendimentos em produo de celulose,

    menores consumos especficos de madeira, melhor branqueabilidade e maior

    resistncia da polpa branqueada de eucalipto. Esses so apenas alguns dos

    muitos ganhos, no queremos ficar repetindo para no sermos cansativos.

    Entretanto, para fixar conceitos vamos relembrar que a mais eficiente

    impregnao dos cavacos favorece:

  • 23

    Reduo do teor de rejeitos incozidos e de feixes de fibras; Reduo do nmero kappa; Maior uniformidade do nmero kappa entre as fibras da polpa; Menor consumo de lcali efetivo; Maior rendimento de polpao; Menor consumo unitrio de madeira por tonelada de polpa seca; Menor tempo de cozimento; Menor necessidade de investimentos no branqueamento e planta

    qumica;

    Aumento de produo e de produtividade.

    Cavacos e cavacos: cabe impregnao do licor equalizar toda essa diversidade

    Atravs da adequada impregnao dos cavacos poderemos colocar os

    reagentes alcalinos mais uniformemente na matriz lignocelulsica em

    condies de mnima drasticidade para os carboidratos. Os cavacos j

    impregnados com o licor de cozimento e com a quantidade de ons hidroxila

    adequada para a deslignificao, podem ento atingir as temperaturas mais

    altas onde ocorrer a deslignificao mais intensa e principal. A partir da o

    nmero kappa cair de cerca de 140 para 20 - 25 (muito rapidamente) e

    depois para 15 a 18 (mais lentamente na deslignificao residual).

    Importante que o cavaco no esteja apenas molhado ou impregnado de licor.

    Deve haver tambm suficientes hidroxilas e hidrosulfetos para a

    deslignificao. Se faltar lcali poder haver inclusive reprecipitao de

    lignina j anteriormente dissolvida. Isso seria um desastre, pois ela ser

    muito mais difcil de ser removida, inclusive no branqueamento.

    O interesse ento de se ter cavacos com quantidades e qualidades

    de licor de cozimento adequadas, uniformes e suficientes dentro deles.

    Aquela desuniformidade de cavacos mal impregnados do passado algo a

    ser banida de nossas fbricas e de nossas lembranas. Alm disso, a

    impregnao dos cavacos permite melhor performance do cozimento em

    termos de transferncias de massa e de calor nesses fragmentos de madeira.

    Qualquer procedimento que pretenda otimizar o cozimento kraft deve

    iniciar pela otimizao da impregnao dos cavacos, caso contrrio, estar

    navegando s cegas. Isso poder ser acompanhado pelas quantidades de

  • 24

    rejeitos gerados, pelas quantidades de aglomerados de fibras presentes nas

    polpas e pelas maiores exigncias em reagentes qumicos no

    branqueamento. Tudo isso reflete o fato de termos tido cozimento

    insuficiente para alguns ou muitos cavacos. Enquanto isso, outros cavacos

    podero estar sobre-cozidos. A polpa final at que poder ter um nmero

    kappa mdio relativamente constante, mas estar com enormes variaes

    em suas fibras: algumas muito cozidas e outras pouqussimo deslignificadas.

    O nmero kappa mdio pode at ser aparentemente adequado, mas existir

    uma enorme variao que se refletir na performance da polpa logo a seguir

    no branqueamento. Polpas que branqueiam mal, consumindo muito cloro

    ativo, ou esto mal lavadas ou mal cozidas. Ou ambos, o mais comum.

    Devemos sempre ter em mente que a madeira dos eucaliptos

    relativamente solvel em solues alcalinas, mesmo em condies suaves e

    a baixas temperaturas. J falamos sobre isso, mas bom reforar. A

    solubilidade varia em funo do tipo de lcali - NaOH, KOH, Ca(OH)2 da

    temperatura, da concentrao e do tempo de reao. Em geral, a

    solubilidade em lcali da madeira do eucalipto varia entre 3 a 10%, mesmo

    temperatura ambiente. A soda custica o reagente alcalino mais eficiente

    para solubilizar esse tipo de madeira. Mesmo na temperatura amena de

    20C, as maiores solubilizaes da madeira do eucalipto ocorrem para

    concentraes de soda custica entre 6 a 10% (peso/peso). Isso eqivale a

    cerca de 65 a 110 g NaOH/litro de soluo e densidades de solues de 1,07

    a 1,09 g/cm. Em condies usuais de polpao kraft, a concentrao em

    lcali efetivo do licor de cozimento est bem abaixo dessas concentraes de

    mxima solubilizao da madeira. Em geral, as concentraes em lcali

    efetivo no cozimento kraft esto entre 10 a 30 g NaOH/litro de licor.

    Entretanto, mesmo a gua pura e ligeiramente aquecida remove entre 0,5 a

    3% do peso da madeira.

    Parte da alcalinidade consumida pela madeira se deve s reaes com

    os grupos acetila, que so os principais grupos cidos da madeira dos

    eucaliptos. A madeira dos eucaliptos possui cerca de 30 a 40 mg de grupos

    acetila por quilograma seco de madeira. Esses grupos so completamente

    destrudos e consumidos pelos ons hidroxila. O consumo estequeomtrico

    de soda custica pelos grupos hidroxila de 40 gramas de soda custica

    (NaOH) por 43 gramas de grupos acetila.

    Conforme o lcali do licor de cozimento entra para o interior da

    madeira, ele vai sendo consumido pelas reaes em que se envolve. Para

    tentar repor esse lcali consumido, mais ons hidroxila se deslocam por

    difuso para essa regio mais pobre em hidroxilas (pois elas foram

    consumidas). Ocorre ento uma difuso constante de ons hidroxila em

    contra-fluxo com os ons acetila que foram reagidos e se transformaram em

    acetatos solveis no licor.

  • 25

    Portanto, a impregnao dos cavacos algo de muito dinamismo e

    no ocorre de forma alguma passivamente. No podemos imaginar que

    esteja apenas ocorrendo uma penetrao laminar de lquido para dentro da

    madeira. Est isso sim, acontecendo reaes qumicas que vo alterando as

    concentraes nesse meio e as prprias velocidades de difuso. Alm disso,

    gera-se calor por reaes exotrmicas que tambm vo afetar a viscosidade

    a a fluidez do lquido. Tanto h consumo de reagentes qumicos, como ocorre

    gerao de novos compostos qumicos devido s reaes qumicas rpidas e

    eficientes.

    Quanto maior a concentrao de soda custica no licor de cozimento,

    at cerca de 10 a 12% (difcil de ser verificada no processo kraft), maior ser

    o consumo de soda pela madeira e maior ser a degradao das

    hemiceluloses e dos extrativos.

    As reaes dos ons hidroxila e dos grupos acetila das hemiceluloses

    estabelecem gradientes de concentraes tanto de lcali (hidroxila), como de

    constituintes dissolvidos da madeira. Conforme o licor penetra a madeira e a

    impregna, os espaos vazios vo sendo ocupados. O cavaco fica molhado de

    licor. Imediatamente aps essa penetrao, onde o licor entra para dentro

    dos vazios da madeira por diferenas de presso, passa a ocorrer um

    processo de difuso de ons na fase lquida. A difuso obedece a diferenas

    de concentraes, movendo-se os ons das regies de maior concentrao

    para as de menor.

    Portanto, no processo de impregnao dos cavacos, temos

    basicamente dois fenmenos principais:

    Penetrao:

    Entrada de licor nos vazios, na porosidade, na capilaridade da madeira. Essa

    penetrao e fluxos ocorrem por gradientes de presso. Quando a presso

    externa maior que a interna, o licor penetra para o interior dos cavacos.

    Essa presso externa pode ser aumentada pela prpria tecnologia em uso.

    Difuso:

    Entrada de ons hidroxila e hidrosulfeto para o interior de uma madeira j

    mida (com licor ou umidade natural) e que ocorre graas s diferenas de

    concentraes desses ons.

  • 26

    Impregnao de cavacos. Fonte: Costa et al., 2004

    A penetrao muito mais rpida do que a difuso. A difuso em

    cavacos encharcados e umedecidos um fenmeno de baixa velocidade,

    mas ocorre em todas as direes da madeira. Para comparar as diferenas

    de velocidade da difuso, h que se ter bastante controle das concentraes

    dos ons hidroxila e hidrosulfeto no licor. Afinal, essa velocidade funo

    dessas concentraes. Se as concentraes se eqivalem, a velocidade de

    difuso se anula. Por isso, se a concentrao desses ons ficar baixa no licor

    me, aquele que alimenta os cavacos pelo lado externo, a difuso desses

    ons para dentro dos cavacos se reduz e pode at parar.

    Conclusivamente: a difuso muito sensvel concentrao de ons

    no licor de cozimento, enquanto a penetrao no . Na verdade, a

    penetrao consiste apenas em uma entrada fsica do licor, que se torna

    dinmica pelas reaes qumicas que ocorrem. Mas ela ocorreria, mesmo se

    no tivssemos ons alcalinos e apenas tivssemos diferena de presso. Por

    outro lado, a soluo custica provoca um inchamento da madeira. Esse

    inchamento favorece tanto a penetrao (menos) como a difuso (mais), que

    se aceleram com ele. Quanto maior o inchamento (funo do maior pH),

    maior sero as velocidades de penetrao e de difuso. O inchamento

    dramaticamente afetado pelo pH do meio alcalino, baixo a pHs 10 a 12 e

    muito alto a pHs 13 a 14.

    Como a penetrao um fenmeno fsico de entrada do licor atravs

    da porosidade e capilaridade, ela mais efetiva e rpida em cavacos mais

    secos. Entretanto, quanto mais seco os cavacos, maior a quantidade de ar

    que eles contm. Conforme o licor penetra o interior dos cavacos, ele vai

    empurrando o ar, que ficar cada vez mais aprisionado no centro dos

    mesmos. O ar que vai sendo pressionado em todas as direes, vai

    oferecendo uma contrapresso que reduz a diferena de presso que

    promove a entrada do licor. Portanto, quanto mais o licor penetra, mais vai

    diminuindo a sua velocidade pela contrapresso exercida pelo ar aprisionado.

    Chega um momento em que a velocidade de penetrao anulada - isso

    ocorre quando a diferencial de presso fica igual a zero. Nesse momento, s

    se consegue colocar de novo o licor para dentro dos cavacos se

    aumentarmos a presso externa ou se tivermos uma forma de extrair o ar

    interno. Em parte, esse aumento de presso dado pela coluna de cavacos

  • 27

    que desce conforme ocorre a impregnao no vaso de impregnao. A coluna

    de cavacos faz uma presso hidrosttica que eleva a presso, comprime e

    colapsa os cavacos inchados e com isso, ajuda a penetrao do licor e a

    expulso do ar. Outra forma do ar interno ser removido pela difuso do ar

    atravs do prprio licor. O escape do ar tambm muito afetado por micro-

    fissuras e micro-fraturas que os cavacos venham a ter em sua estrutura, em

    especial em sua espessura. Cavacos com danos mecnicos so indesejveis

    no processo sulfito, mas so bem-vindos no processo kraft. Pelas micro-

    fissuras o ar escapa, j que se abrem outros capilares como via de

    transferncia de massas. Por essa razo (presena de fissuras e danos)

    que os cavacos industriais so mais facilmente impregnados que os cavacos

    de laboratrio fabricados a mo.

    J os cavacos muito secos, super secos, so mais difceis de sofrerem

    inchamento de incio. Isso devido ao fenmeno de histerese (dificuldades de

    rehidratao de material lignocelulsico devido ao de secagem).

    Entretanto, essa dificuldade temporria, pois a soda custica em pH

    elevado vence com o inchamento das paredes celulares as barreiras que a

    histerese provoca.

    As altas presses so pr-requisitos importantes para a eficiente

    penetrao do licor. Quanto maior for a penetrao do licor, melhor ser a

    difuso de ons que ocorre tambm. Importante ressaltar que a penetrao e

    a difuso ocorrem concomitantemente. Conforme o licor vai penetrando na

    madeira e os ons hidroxila vo sendo consumidos, novos ons hidroxila vo

    sendo deslocados para repor esses consumidos, graas aos gradientes de

    concentrao que se formam. Muito dinamismo acontecendo ao mesmo

    tempo, concordam?

    Muitos autores vem apresentando importantes estudos para modelar

    o processo de impregnao dos cavacos. Com isso, podem oferecer uma

    ferramenta simples e barata para o mais eficiente controle e otimizao do

    processo kraft. Dentre esses magnficos autores, que tm levado muita

    cincia aos estudos de impregnao, destacamos nossos estimados amigos:

    Miguel Zanuttini e Panu Tikka e seus usuais co-pesquisadores: Sergey

    Malkov, Maria Cristina Inalbon e M. Mttnen.

  • 28

    A seguir um quadro resumo para lhes caracterizar melhor as

    diferenas entre Penetrao e Difuso os dois mecanismos fundamentais

    para a impregnao dos cavacos com lquidos e com ons ativos de polpao.

    PENETRAO

    DIFUSO

    Ocorre preferencialmente na direo longitudinal da madeira

    Ocorre em todas as direes (longitudinal, tangencial e

    radial)

    Ocorre em madeira seca Ocorre em madeira saturada com gua (umidade) ou licor

    Ocorre por penetrao fsica atravs capilares da madeira

    (lmens de fibras, vasos,

    parnquima)

    Ocorre via fase lquida

    Bem mais rpida (5 a 15 vezes mais rpida)

    Bem mais lenta

    Consegue ser efetiva em distncias longas, desde que

    haja diferencial de presso

    efetiva apenas em distncias curtas e preferencialmente na

    espessura dos cavacos

    Tem dificuldades de ocorrer em madeiras com poros obstrudos

    por tiloses

    No toma conhecimento das tiloses e ocorre em todas as

    direes

    Pouco sensvel s concentraes do licor

    (at mesmo a gua pura penetra a

    madeira pelas mesmas leis)

    Muito sensvel s concentraes do licor

    Favorecida pelos diferenciais de presso

    Favorecida pelos diferenciais de concentraes

    No muito afetada pelo inchamento da madeira devido

    ao lcali

    Altamente afetada pelo inchamento das paredes

    celulares

  • 29

    Caminhos anatmicos para a impregnao da madeira. Fonte: Yang, 2006

    Vaso industrial de pr-impregnao de cavacos. Fonte: Outzen, Kvaerner, 2002

    =============================================

  • 30

    OS CAVACOS DE MADEIRA DE EUCALIPTO E SUA MAIS

    EFICIENTE IMPREGNAO PELO LICOR KRAFT DE COZIMENTO

    A madeira do eucalipto um material extremamente varivel, como j vimos no captulo 14 desse nosso Eucalyptus Online Book. Teremos mais

    captulos em futuro no muito distante para lhes apresentar mais sobre a

    qualidade e anatomia da madeira dos eucaliptos e sobre os processos de

    produo de cavacos de excelente qualidade.

    De qualquer forma, agora importante saber que essa variabilidade

    ocorre dentro da prpria rvore (sentido base/topo e medula/casca), entre

    rvores, entre espcies e entre gneros do que se estipula chamar de

    eucaliptos (Eucalyptus, Corymbia e Angophora).

    Nas rvores mais maduras, ainda temos a formao de um cerne

    mais impregnado de extrativos, o que acaba por causar uma variabilidade

    adicional em relao impregnao. Esse cerne tem sua porosidade

    diminuda e isso afeta a entrada do licor de cozimento, pela dificuldade do

    licor penetrar pelos capilares (lmens dos vasos, parnquimas e fibras). Os

    extrativos se acumulam nos lmens dos vasos e em bolsas tipos vacolos

    nas clulas de parnquima radial.

    Tiloses obstruindo vasos na estrutura da madeira de eucalipto.

    Elas reduzem a capilaridade e formam barreiras penetrao do licor que ficar

    retardada. O licor ter que degradar extrativos que entopem os lmens para poder

    abrir caminho sua penetrao.

  • 31

    As principais caractersticas da madeira dos cavacos e que vo afetar

    a impregnao pelo licor so as seguintes:

    Densidade bsica da madeira

    Quanto mais densa a madeira, maior a quantidade de paredes

    celulares e de substncia madeira em um mesmo volume de madeira. Com

    isso, a porosidade e a capilaridade ficaro menores e isso tem relao direta

    com a impregnao. Madeiras mais densas possuem menor espao para a

    entrada de lquidos (menos volume de vazios).

    muito fcil se calcular isso. Vejam os dois exemplos que

    forneceremos a seguir para uma determinada espcie de Eucalyptus. Vamos

    supor hipoteticamente que se trata de E.saligna. Sejam dois cavacos de

    E.saligna, cada um com uma grama seca de peso. S que um cavaco de

    uma regio prxima medula de uma rvore jovem e possui densidade

    bsica 0,4 g/cm. J o outro, de uma regio prxima casca de uma

    rvore mais velha. Por isso, mais denso e tem densidade bsica 0,55

    g/cm. Essa situao totalmente possvel de ser encontrada em nosso dia-

    a-dia fabril, no de forma alguma algo inusitado.

    Para fins de clculo, vamos admitir a densidade da substncia

    madeira ou substncia parede celular da rvore como sendo igual a 1,53

    g/cm, como diz a literatura de forma clara e abundante. Admitiremos

    tambm que a densidade da gua igual a 1 g/cm.

    Ficaramos ento com as seguintes duas situaes:

    Caso 1: Cavaco de uma grama seca absoluta com densidade de 0,4 g/cm

    Volume do cavaco = 1 g / 0,4 g/cm = 2,5 cm

    Volume de substncia madeira ou de 100% paredes celulares nesse

    cavaco = 1 g / 1,53 g/cm = 0,65 cm

    Volume de vazios desse cavaco = 2,5 - 0,65 = 1,85 cm

    Porosidade ou capilaridade nesse cavaco capaz de ser encharcada por licor =

    1,85 x 100 / 2,5 = 74%

  • 32

    Mxima umidade que esse cavaco pode reter em sua condio de saturao

    plena = 1,85 g de H2O/ (1 g madeira + 1,85 g de H2O ) = 65%

    Caso a densidade do licor de cozimento fosse 1,08 g/cm, se no ocorresse

    inchamento algum devido alcalinidade do licor, e se todo o licor estivesse

    saturado de licor em sua porosidade (sem gua livre superficial), teramos:

    Peso seco de madeira = 1 grama

    Peso total de licor ocupando vazios = 1,85 cm x 1,08 g/cm = 2 gramas

    Relao Licor/Madeira = 2 : 1

    Entretanto, graas ao inchamento da madeira, essa relao pode alcanar

    relaes de 2,5 a 2,7 : 1.

    Caso 2: Cavaco de uma grama seca absoluta com densidade de 0,55 g/cm

    Volume do cavaco = 1 g / 0,55 g/cm = 1,82 cm

    Volume de substncia madeira ou de 100% paredes celulares nesse

    cavaco = 1 g / 1,53 g/cm = 0,65 cm

    Volume de vazios desse cavaco = 1,82 - 0,65 = 1,17 cm

    Porosidade ou capilaridade nesse cavaco capaz de ser encharcada por licor =

    1,17 x 100 / 1,82 = 64,3%

    Mxima umidade que esse cavaco pode reter em sua condio de saturao

    plena = 1,17 g de H2O/ (1 g madeira + 1,17 g de H2O ) = 54%

    Caso a densidade do licor de cozimento fosse 1,08 g/cm, se no ocorresse

    inchamento algum devido alcalinidade do licor, e se todo o licor estivesse

    saturado de licor em sua porosidade (sem gua livre superficial), teramos:

    Peso seco de madeira = 1 grama

    Peso total de licor ocupando vazios = 1,17 cm x 1,08 g/cm = 1,26 gramas

    Relao Licor/Madeira = 1,26 : 1

    Entretanto, graas ao inchamento da madeira, essa relao pode alcanar

    relaes de 1,6 a 2,0 : 1.

    Observem amigos, o enorme efeito da densidade bsica da madeira

    na acessibilidade e na capacidade de reteno de licor de cozimento pelo

    cavaco de madeira de eucalipto. Lembrem-se tambm da importante

    influncia do inchamento alcalino da madeira.

  • 33

    A porosidade natural da madeira de eucalipto constituda pela

    capilaridade dos lmens de suas clulas (vasos, fibras libriformes, clulas

    parenquimatosas, etc.). Alm desses macro-capilares que so os lmens,

    existem os micro-capilares nas paredes, tais como as pontuaes e os

    pequenos canais entre fibrilas. Esses ltimos so mais freqentes quando a

    madeira se resseca. So ainda comuns as chamadas micro-fissuras e micro-

    fraturas nas paredes e entre as clulas da madeira. Esses tipos de fissuras

    so comuns nos cavacos e menos comuns na madeira em toras. Isso porque

    a ao mecnica de picar a madeira muito impactante sobre a estrutura da

    madeira.

    O importante estar sempre atento aos seguintes tipos de

    componentes na estrutura dos cavacos:

    Espaos ocupados por paredes celulares; Espaos vazios totais; Espaos vazios ou capilaridade ocupada por ar ocluso; Espaos vazios ou capilaridade ocupada por umidade (gua).

    A remoo do ar e sua substituio por gua ou licor definitivamente

    melhora a impregnao dos cavacos, mesmo que o mecanismo de

    penetrao seja desfavorecido. Isso porque a grande barreira na

    impregnao o ar e no a gua. Essa no oferece barreiras para a difuso,

    pelo contrrio favorece por ter concentrao nula em ons ativos. Mesmo

    com um pouco mais de tempo, acabaremos impregnando por difuso um

    cavaco que entra no vaso de impregnao totalmente umedecido com gua.

    J se ele entrar totalmente seco, ser muito difcil a remoo do ar de seu

    interior.

    Refora-se assim a importncia da pr-vaporizao e aquecimento dos

    cavacos para expanso do ar e reumedecimento dos cavacos de madeira.

    Essa uma etapa vital para a adequada polpao kraft. Quem no a estiver

    fazendo, deve estar pagando um preo caro. Ou ento est usando madeira

    verde recm abatida, o que muito interessante e desejvel em algumas

    situaes.

    Integridade e danos mecnicos nos cavacos

    Os cavacos industriais so ricos em micro-fissuras que so muito

    valiosas para a impregnao pelo licor. Quanto mais fissurado estiver o

    cavaco, desde que no existam danos s fibras, maior ser a facilidade do

    licor entrar dentro dele e de expulsar o ar interno. Essas micro-fissuras so

    muito comuns na espessura dos cavacos, j que nessa direo que os

    cavacos sofrem danos devido ao prprio desenho das facas e dos picadores.

  • 34

    Cavacos feitos mo em laboratrio, que muitos acreditam que sejam

    os ideais, so bem mais difceis de serem impregnados. Isso precisa ser

    conhecido pelos pesquisadores, que devem compensar com maior tempo de

    impregnao em suas pesquisas. Alm disso, nos laboratrios, comum

    secar os cavacos para evitar que se mofem no armazenamento. O resultado

    disso tambm maior dificuldade na impregnao.

    Voltando ao picador industrial, quando a faca corta uma fatia da tora

    de madeira, ela est cortando cavacos que possuem entre 1,5 a 2,5 cm de

    comprimento e largura e espessura de 1 a 8 mm. Os cavacos preferidos so

    os que possuem espessura entre 2 a 5 mm, e os acima de 8 mm so

    considerados sobre-espessos.

    A curiosidade maior a forma como essa fatia retirada. O topo dos

    cavacos sempre a seo transversal da madeira, ou seja, onde est a

    mxima capilaridade para ser penetrada. Isso na parte de cima e de baixo do

    cavaco. Acontece que existem diferenas gritantes entre a parte de cima e

    de baixo dos cavacos, quando considerados como tendo seu eixo na direo

    das fibras da madeira. Tudo se relaciona ao desenho das facas, que possuem

    um lado plano e outro em ngulo. A fatia de madeira empurrada contra

    esse ngulo e vai-se estilhaando e se danificando com essa presso. Essa

    seo de um lado de topo dos cavacos fica mascada, com maiores danos

    que a outra seo, que se mantm mais lisa. No local onde o lado liso e

    plano da faca corta, a fatia fica bem lisa, quase sem danos mecnicos. Pelo

    que j vimos, fica claro que essa seo mais danificada tem maior

    capilaridade criada por danos mecnicos do que a seo absolutamente lisa.

    Logo, a seo lisa do topo dos cavacos tem penetrao mais lenta do que a

    seo oposta mais danificada, com mais fissuras e fraturas. Isso apesar das

    duas corresponderem seo transversal da madeira, com suas

    capilaridades anatmicas se oferecendo ao licor para que esse venha a

    penetr-las.

    Observem o que dissemos na figura que est apresentada a seguir.

  • 35

    Tora

    ngulo de Queda da Bica

    ngulo Suco

    ngulo

    da Ponta Faca

    Bica

    de

    Queda

    Cama de

    Apoio da Faca

    Comprimento

    CavacoD

    isco P

    icador

    Linha de Corte em

    relao Face

    Transversal da Tora

    Seo

    Mascada

    Seo

    Lisa

    FA

    CA

    Corte do cavaco industrial mostrando que uma seo do topo dos cavacos ficar

    mais mascada que a outra que ficar mais lisa. Fonte: Smith, 1998

  • 36

    Fatia de madeira picada industrialmente mostrando a face lisa do corte

    Mesma fatia de madeira cortada pelo picador antes de virar cavacos pela ao

    mecnica, mas vista do lado mascado e comprimido

    Seo

    Transversal

    -

    Espessura

    Comprimento do Cavaco

    Topo -

    Base

    Cavaco

    Cavaco de madeira de eucalipto

  • 37

    Distribuio das dimenses dos cavacos

    Nas fbricas existe uma preocupao de se produzirem cavacos com

    espessuras variando entre 2 a no mximo 8 mm. H uma concordncia

    tcnica entre todos de que os cavacos muito finos (palitos, pin chips e

    serragem) no so muito desejados pelo excesso de danos mecnicos e

    maiores consumos de qumicos ativos na polpao. Por outro lado, os

    cavacos sobre-espessos, mais espessos que 8 mm, so muito difceis para

    serem impregnados.

    Os cavacos muito espessos so causados por madeiras de muito alta

    densidade bsica ou ento por defeitos da madeira (ns, madeira doente,

    etc.). Podem ainda serem resultados da m performance do picador, ou da

    ponta da tora quando a mesma toma o primeiro impacto com a faca do

    picador (para picadores com alimentao inclinada).

    As madeiras mais densas resultam em geral a cavacos mais espessos,

    no temos dvidas alguma sobre isso. Por essa razo, elas deveriam

    merecer picadores com ajustes de facas especiais para elas. Com a

    regulagem de facas para cavacos mais curtos, teremos cavacos menos

    espessos tambm. Algo muito simples, mas quase sempre esquecido nas

    fbricas. Com cavacos espessos, as dificuldades de impregnao sero

    inevitveis. Aumentaro: o teor de rejeitos e o consumo de lcali efetivo.

    Reduzir: o rendimento em converso da madeira a celulose.

    Nas nossas fbricas no muito comum o ajuste do comprimento dos

    cavacos em funo da qualidade da madeira. Isso feito s para situaes

    mais extremas. Como h forte correlao entre o comprimento e a espessura

    dos cavacos, o ajuste simples e poderia se mais praticado. Por

    conseqncia disso, os cavacos mais compridos so tambm mais espessos,

    para uma mesma densidade bsica da madeira.

    Os operadores dos picadores no so muito motivados a reduzir o

    comprimento dos cavacos porque podem perder produo e gastam mais

    energia para picar o mesmo comprimento linear de toras. Isso porque uma

    mesma tora ter que ser fatiada mais vezes quando convertida a cavacos de

    menor comprimento.

    Acontece que o comprimento dos cavacos a dimenso mais

    importante para a penetrao do licor via diferencial de presso. Lembrem-

    se que o licor penetra preferencialmente pela seo transversal da madeira e

    que ela est nas duas extremidades do cavaco (em seu topo superior e

    inferior, quando olhado no sentido das fibras da madeira). A seo

    transversal a seo de mxima capilaridade da madeira disponvel para

    penetrao. Nessa seo, temos entre 40 a 45% de porosidade ou poros

    livres (lmens) para penetrao, muito maior que nas outras sees

    (tangencial e radial). por isso que a penetrao to rpida pelo topo e

    pela base dos cavacos.

  • 38

    Quando a penetrao deixar de ser importante e cessar, a

    impregnao s continuar acontecendo pela difuso. nesse momento que

    a espessura dos cavacos ganha muita importncia. As regies do cavaco

    ainda no impregnadas tero que receber o licor via difuso, inclusive com a

    dissoluo e posterior difuso de algum ar ocluso para a fase lquida. Como

    as velocidades de impregnao e difuso no sentido radial e tangencial so

    baixas, a menor dimenso agora e que se torna a mais importante

    exatamente a espessura dos cavacos. Exatamente por ser a menor

    dimenso. Muito se fala na importncia da espessura dos cavacos como

    sendo crtica para a impregnao. Acontece que to importante como a

    espessura exatamente o comprimento dos cavacos. At mesmo porque

    elas so fortemente relacionadas como j vimos. Cavacos mais curtos e mais

    finos so definitivamente mais facilmente impregnados. No h necessidade

    de muita sabedoria para enxergar isso.

    Mesmo que os cavacos demandem mais energia e mais tempo de

    picagem para serem produzidos mais curtos (e mais finos como resultado

    imediato), isso definitivamente favorvel para o cozimento kraft, dentro de

    certos limites. No estamos advogando produo de palitos. Apenas ao invs

    de cortar fatias de madeira com 2,6 mm para o comprimento de cavacos,

    fazer com 2,2 - por exemplo. Vale a pena se avaliar em termos de ganhos

    em reduo de rejeitos, de aumento de rendimento, de produtividade do

    digestor, de nmero kappa, de consumo de qumicos no branqueamento,

    etc., etc. Recomendo sempre esse tipo de avaliao to simples. vezes um

    investimento no setor de preparao de cavacos se paga em pouqussimo

    tempo pela alta taxa de retorno que possa apresentar. Muitas vezes, o

    operador dos picadores acredita que est fazendo uma economia de energia

    aumentando um pouco o tamanho dos cavacos, mas na realidade ele est

    trazendo inmeros problemas para as reas de processo seguintes.

    As dimenses dos cavacos so controladas pelo operador dos

    picadores, mas tambm pelo estgio tecnolgico dessas mquinas. Investir

    na modernizao dos equipamentos da rea de preparo de madeira

    infelizmente algo no muito comum nas fbricas existentes. Parece que

    todos os gestores esto sempre motivados a investir na modernizao das

    caldeiras de recuperao, digestores, branqueamento, mquinas de

    secagem, etc. Fica ento a misso aos picadores de continuar quebrando a

    madeira em pedaos, sem que as pessoas se apercebam que exatamente ali

    nos cavacos que comea a polpao. S pela reduo do teor de rejeitos se

    pode aumentar o rendimento em cerca de 1 a 2% base madeira. Isso

    significa cerca do dobro base polpa.

    Os cavacos mais adequados facilitam a penetrao e a difuso do licor

    e conduzem a polpaes mais seletivas e eficientes. Pena que muitos

    gestores teimam em no ver essas vantagens.

  • 39

    Bom, de qualquer maneira, mesmo que no consigamos modernizar

    nossos picadores, importante manter seu estado de manuteno, ajustes e

    controles em condies otimizadas. Isso significa ter ateno para:

    Facas afiadas; Contra-facas e blocos em bom estado; Adequados ngulos das facas; Dimetros de toras relativamente selecionados para no se picar

    toras de dimetros muito diferentes;

    Idem para a densidade bsica da madeira.

    Umidade dos cavacos

    Os cavacos mais midos, que se originam de rvores com menor

    tempo ps-colheita, possuem maior facilidade de serem impregnados, apesar

    de menores velocidades de penetrao de licor. Quanto mais mido o

    cavaco, menor a velocidade inicial de penetrao do licor de cozimento.

    Esse excesso de gua torna-se uma barreira livre entrada do licor para

    dentro do cavaco. Entretanto, esses cavacos vo possuir muito menos ar em

    seu interior, que mais rico em gua da umidade. Por isso, mesmo com uma

    menor velocidade de penetrao inicial, a penetrao no to prejudicada

    pois ela pode continuar por mais tempo, j que a contrapresso pelo ar

    interno menor. Adicionalmente, a madeira verde favorece a difuso dos

    ons do licor de cozimento. Mais uma vez, importante reforar que o ar e

    no a gua a maior e pior barreira impregnao dos cavacos. Por essa

    razo que prefervel se terem cavacos mais midos e com menos ar dentro

    deles, mesmo que a penetrao inicial seja mais lenta.

    Variabilidade no tipo de madeira

    J vimos que muito importante se controlar ao mximo a

    variabilidade da qualidade da madeira e no apenas as dimenses dos

    cavacos. No caso da impregnao pelo licor, vital a densidade bsica da

    madeira, pois ela se relaciona diretamente com o volume de vazios

    (porosidade) da madeira, como j descrito.

    Alm da densidade bsica temos outras caractersticas no anatmicas

    que so importantes nas madeiras:

    Teor de extrativos; Teor de cerne e idade fisiolgica desse cerne; Teor de grupos acetila e grupos urnicos; Permeabilidade da madeira;

  • 40

    Hidrofilicidade e molhabilidade da perede celular; Presena de madeiras defeituosas; Presena de casca.

    A polpao kraft muito afetada pela presena de madeiras

    defeituosas e pela presena de casca das rvores. Dentre as madeiras com

    defeitos destacam-se: ns (regies de insero de ramos), madeiras doentes

    (cancro, insetos perfuradores, etc.), madeiras de florestas queimadas,

    madeira de reao, etc. Esses defeitos impactam na impregnao e

    prejudicam a polpao. Alm disso, costumam resultar em cavacos mais

    irregulares, que se somam sua constituio qumica diferenciada para pior.

    =============================================

    O LICOR DE COZIMENTO E SEU IMPACTO NA

    IMPREGNAO DOS CAVACOS DE MADEIRA

    As caractersticas do lquido a impregnar a madeira so tambm

    muito importantes. Nos laboratrios de pesquisa, os cozimentos so em

    geral feitos a partir de licor branco sinttico em gua. J nas fbricas, o licor

    de cozimento sempre uma mistura de licor preto residual e licor branco.

    Esse ltimo tambm no totalmente ativo, j que contem bastante

    carbonato de sdio e outros sais de clcio, magnsio, etc. Por outro lado, o

    licor preto residual contem altas quantidades de componentes dissolvidos da

    madeira, possui ainda residuais dos qumicos ativos da polpao kraft

    (hidroxila e hidrosulfeto) e outros constituintes que se formam por reaes

    no cozimento (especialmente alto teor de carbonato de sdio).

    As razes para se usar o licor preto para se ajustar a relao

    Licor/Madeira na impregnao e depois no cozimento so as seguintes:

    Aproveitamento da alcalinidade ativa residual

    Aproveitamento da alta relao inica HS- / OH

    -

    Valer-se do efeito benfico e protetor dos ons hidrosulfeto; Fechar o mximo possvel o ciclo de licores usados no processo,

    reduzindo perdas e diminuindo poluio;

    Enriquecer ainda mais o licor preto residual em slidos antes de se enviar o mesmo evaporao;

    Aproveitar o calor residual do licor preto.

    Um cuidado especial que deve ser tomado nessa reutilizao do licor

    preto o de evitar condies que possam provocar a precipitao de lignina.

    Em condies de altas temperaturas e baixa alcalinidade, as chances de se

  • 41

    ter condensao e reprecipitao de alguma lignina presente no licor preto

    so altas. Portanto, muita ateno na alcalinidade residual e no pH desse

    licor de cozimento, quer ele esteja livre ou penetrado nos cavacos.

    As principais caractersticas a serem controladas no licor de cozimento

    usado na impregnao dos cavacos so:

    Composio em termos de seus componentes ativos; pH; Tenso superficial; Viscosidade do licor; Capacidade de provocar inchamento na madeira (que funo de

    seu pH e do teor de soda custica);

    Solubilidade e saturao em ar do lquido (capacidade de absorver ou de reter o ar em soluo);

    Capacidade de reagir com o oxignio presente nos cavacos, reduzindo assim o volume de ar ocluso e que barreira

    penetrao do licor.

    So inmeros os trabalhos de pesquisa na literatura que mostram que

    a impregnao dos cavacos com licor contendo licor preto melhorada. Os

    ganhos principais so aqueles relacionados ao aumento do rendimento e s

    melhores propriedades da polpa kraft resultante (especialmente uma melhor

    proteo aos carboidratos). Esses ganhos se devem maior seletividade do

    cozimento, principalmente pela alta concentrao de ons protetores

    hidrosulfeto do licor preto residual.

    Entretanto, a penetrao do licor preto para o interior dos cavacos

    bem mais vagarosa do que uma soluo alcalina preparada s com gua.

    Isso se deve maior viscosidade do licor preto, maior densidade e maior

    concentrao em componentes dissolvidos da madeira.

    Para favorecer a mais rpida penetrao dever-se-iam adotar

    temperaturas mais elevadas. Mas elas no so compatveis com essa fase de

    impregnao. J vimos que as melhores condies para impregnao esto

    nas temperaturas de 100 a 110C. Como as reaes que ocorrem na

    impregnao so exotrmicas, a temperatura acaba se elevando alguns

    graus ao longo da fase de impregnao.

    Existem alguns procedimentos que so adotados na prtica industrial

    para acelerar a penetrao do licor para o interior dos cavacos. So eles:

    Armazenamento do licor preto a temperaturas altas, prximas a 100C. Isso provoca perda de sua viscosidade pela

    despolimerizao adicional da lignina. Entretanto, a estocagem

    provoca a reduo da alcalinidade do licor preto e isso precisa ser

    controlado pela adequada adio de licor branco. Sem isso, o perigo

    de reprecipitao de lignina nos cavacos torna-se eminente.

  • 42

    Adio de alcalinidade ativa ao licor preto. Quanto maior for a concentrao de lcali efetivo no licor, mais rpida a penetrao e a

    difuso na impregnao dos cavacos. A alcalinidade efetiva melhora

    a viscosidade do licor e provoca maior inchamento da madeira. Com

    isso, melhora-se o fluxo do licor de cozimento para o interior dos

    cavacos.

    Utilizao de aditivos para alterar a viscosidade, a fluidez e a tenso superficial do licor de impregnao. Acontece que a mudana de

    tenso superficial pode ser favorvel ao escoamento do lquido mas

    pode alterar a elevao capilar do licor nos lmens. Isso precisa ser

    bem estudado a nvel cientfico tambm.

    Utilizao de tensoativos (surfactantes) para remoo de extrativos que esto prejudicando a impregnao. Pela ao dos surfactantes

    ocorre a desobstruo de espaos ocupados pelos extrativos (por

    exemplo, liberando os lmens dos elementos de vasos). Os

    surfactantes so usados tambm para melhorar a molhabilidade das

    paredes celulares, tornando-as mais hidroflicas. Eles tambm

    ajudam a dissolver ou emulsificar extrativos hidrfobos que

    prejudicam a molhabilidade das paredes celulares pelo licor.

    O uso de surfactantes para acelerar a impregnao muito

    contraditrio. Nem todos os surfactantes possuem efeitos positivos. Os que

    tm mostrado melhores resultados para o caso dos eucaliptos tm sido os

    baseados em lcoois etoxilados, com outros componentes misturados para

    potencializar seu efeito. Os lcoois etoxilados umectam as clulas e

    solubilizam extrativos, lixiviando-os para fora dos cavacos. Como os vasos e

    os raios medulares (parnquima radial) so exatamente os constituintes

    anatmicos mais ricos em extrativos e so eles os principais canais para a

    penetrao do licor, essa desobstruo muito bem-vinda. Em alguns casos,

    utiliza-se associado o xido de eteno, que tem a capacidade de reduzir a

    tenso superficial do licor de cozimento. Isso aumenta sua capacidade de

    fluxo, mas as quantidades precisam ser otimizadas. H sempre o risco de se

    gastar com o produto, no melhorar nada, e s vezes, at piorar a operao.

    Cada caso um caso a ser estudado e otimizado.

    Os surfactantes/tensoativos so recomendados em situaes mais

    extremas, quando a fbrica est em forte gargalo operacional na rea de

    polpao. Eles so mais eficientes em casos de se trabalhar com cavacos

    secos, pois dependem de acesso mais livre aos cavacos.

    Os surfactantes podem estar associados ou no adio de

    antraquinona ao cozimento kraft. O objetivo do uso hbrido potencializar

    ganhos. H diversas situaes de sucesso tcnico e econmico, mas sempre

    se deve otimizar as dosagens caso-a-caso.

    =============================================

  • 43

    A ANATOMIA DA MADEIRA DOS EUCALIPTOS AFETANDO A

    IMPREGNAO DOS CAVACOS

    Qualquer madeira de eucalipto estruturada de forma tal que oferece

    resistncia para suportar a copa e para manter a rvore vigorosamente em

    p. Tambm engenheirada em seus constituintes anatmicos de forma a

    oferecer capacidade para o transporte da seiva bruta mineral das razes at a

    copa. Para isso, usa preferencialmente os elementos de vaso, que formam

    canais fantsticos de transporte dentro do xilema. Finalmente, a rvore

    tambm coloca em sua estrutura canais para o transporte da seiva orgnica

    elaborada pelas folhas. A maioria est na casca para o transporte vertical da

    seiva elaborada. J na madeira temos os raios medulares, que so as

    principais clulas para transporte de alimentos s clulas ativas e vivas do

    xilema (madeira).

    Em resumo, a rvore do eucalipto constri uma slida estrutura de

    paredes celulares cimentadas entre si pelas lamelas mdias, ricas e

    concentradas em lignina. Essa estrutura, alm de dar resistncia rvore,

    tem a misso de favorecer o fluxo de lquidos aquosos dentro da rvore.

    Existe portanto uma fabulosa e engenheirada rede de capilares no xilema.

    Isso pode ser notado quando se observam as diversas sees em corte das

    madeiras dos eucaliptos. Na seo transversal podem-se ver os lmens das

    clulas que se interligam entre si por placas crivadas (entre elementos de

    vaso) ou por pontuaes ou pontoaes (entre vasos/parnquima,

    fibras/fibras e fibras/parnquimas). A rede de capilares da madeira visa

    atender principalmente o fluxo ascendente de seiva mineral (gua e sais

    minerais absorvidos do solo). Lembrem-se que o fluxo principal de seiva

    elaborada ocorre em elementos crivosos no floema (casca da rvores). A

    seiva mineral circula principalmente no xilema ativo da rvore, que a

    regio do alburno mais prxima do cmbio.

    O lenho inativo ou cerne, em geral, passa a receber a deposio de

    extrativos com a finalidade de proteg-lo contra ataque por saprfitas e para

    prevenir sua deteriorao. O cerne ento mais rico em extrativos

    polifenlicos, que so hidrofbicos. Eles obstruem a capilaridade, impregnam

    os vasos, deixando-os com barreiras entrada de lquidos. Essas obstrues

    nos elementos de vaso so as j mencionadas tiloses. Tambm os raios

    medulares ou parnquima radial so ricos em extrativos, portanto tornando-

    se mais difcil a penetrao de lquidos atravs deles. Os extrativos, alm de

    causarem ocluso de capilares, tambm prejudicam a molhabilidade das

    paredes e com isso reduzem as foras capilares. Tambm prejudicam o

    inchamento, porque vo consumir alcalinidade e formar uma soluo coloidal

    que se adere s paredes, prejudicando a capilaridade e o acesso dos ons

    alcalinos.

  • 44

    CERNE

    ALBURNO

    CASCA

    Seo transversal de uma tora de madeira de eucalipto

    Em futuro prximo dedicaremos todo um captulo de nosso

    Eucalyptus Online Book para lhes apresentar o processo de formao de

    madeira e sua anatomia. Nesse presente captulo, s lhes traremos alguns

    conceitos e figuras para lhes mostrar como a anatomia pode favorecer ou

    prejudicar