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MARCELO BHLKE
O PROCESSO DE INTEGRAO REGIONAL
E A AUTONOMIA DO SEU ORDENAMENTO JURDICO
Florianpolis (SC), maro de 2002.
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MARCELO BHLKE
O PROCESSO DE INTEGRAO REGIONAL
E A AUTONOMIA DO SEU ORDENAMENTO JURDICO
Dissertao apresentada ao Curso de Ps-Graduao em Direito do Centro de Cincias Jurdicas da Universidade Federal de Santa Catarina, como requisito parcial obteno do ttulo de Mestre em Direito.
rea de Concentrao: Relaes Internacionais
Linha de pesquisa: O Estado e Relaes Internacionais
Orientador Prof. Dr. Luiz Otvio Pimentel
FLORIANPOLIS (SC) 2002
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
CENTRO DE CINCIAS JURDICAS CURSO DE MESTRADO EM DIREITO
REA DE RELAES INTERNACIONAIS
O PROCESSO DE INTEGRAO REGIONAL E A AUTONOMIA DO SEU ORDENAMENTO JURDICO
Marcelo Bhlke
Profa. Dra. lga Maria Boschi Aguiar de OliveiraCoordenadora do CPGD/CCJ/UFSC
Florianpolis, 2002
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Marcelo Bhlke
O PROCESSO DE INTEGRAO REGIONAL E A AUTONOMIA DO SEU ORDENAMENTO JURDICO
Dissertao aprovada como requisito parcial para obteno do grau de Mestre em
Direito (Relaes Internacionais) junto ao Curso de Ps-Graduao em Direito da
Univerisidade Federal de Santa Catarina pela Banca Examinadora formada pelos
professores:
Profa. Dra. Patrcia Kegel - Membro
Florinpolis, 18 de maro de 2002.
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V
AGRADECIMENTOS
Ao professor Dr. Luiz Otvio Pimentel, meu orientador, agradeo o constante estmulo
e o apoio realizao deste trabalho, bem como o acesso ilimitado a sua biblioteca
particular.
professora Dra. Odete Maria de Oliveira, agradeo o apoio durante todo o Curso de
Mestrado e os ensinamentos sobre relaes internacionais, direito e integrao regional.
Ao professor Dr. Welber Barrai, agradeo as importantes lies de Direito Internacional
e a amizade demonstrada ao longo dos dois anos de convivncia.
professora Dra. Adriana Dreyzin de Klor, agradeo a disposio em compartilhar seus
conhecimentos sobre Mercosul e direito.
Ao amigo Luis Fernando Correa Machado, agradeo a slida amizade e as incomparveis contribuies a este trabalho, ao ler cuidadosamente os originais e
sugerir mudanas.
amiga Cibele Schuelter, agradeo a amizade sincera, o incentivo incansvel e a
dedicao na leitura deste trabalho, sugerindo alteraes;
A minha famlia e, principalmente, a Karine Rodrigues da Luz, agradeo a compreenso, afeto e palavras de conforto durante os perodos mais difceis destes dois
ltimos anos.
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SUMRIO
RESUMO.................................................................................................................... 10
ABSTRACT............................................................................. .................................. 11
LISTA DE ABREVIATURAS E STGLAS...... ........................................................... 12
1. INTRODUO.......................................... .......................................................... . 15
2. TEORIA DA INTEGRAO.............................. .................................................. 19
2.1 Histrico da integrao...................................................................................... 192.1.1 Origens................................................................................... .................... 192.1.2 Europa................................................................ ........................................ 202.1.3 GATT.... .............................................,....................................................... 212.1.4 Amrica.......................... .......................................................................... 23
2.2 Caractersticas da integrao..................... ........................................................ 242.2.1 Integrao e interdependncia............................................................. ....... 262.2.2 Integrao: processo e estado...................................................................... 272.2.3 Fases de preparao..................... .............................-................................. 282.2.4 Etapas de evoluo...................................................................................... 29
2.2.4.1 rea de preferncias tarifrias.............................................................. 312.2.4.2 Zona de livre comrcio........................... ............................................. 322.2.4.3 Unio aduaneira...... ............................................................................ 332.2.4.4 Mercado comum........................... ................................................ ..... 342.2.4.5 Unio econmica................................................. ................................ 342.2.4.6 Unio econmica total..........................................................................35
2.2.5 Objetivos da integrao............................................................................... 352.2.6 Direito da Integrao...................................................................................37
3. INTEGRAO REGIONAL NA EIJROPA...........................................................39
3.1 Histrico............................................................................................................393.1.1 Origens........................................................................................................393.1.2 Fase da preparao........................................................ ............................. 403.1.3 Fase da cooperao.....................................................................................403.1.4 Fase da integrao.......................................................................................41
3.2 Estrutura institucional........................................................................................443.2.1 Introduo.................................................................................. ................ 443.2.2 Parlamento Europeu....................................................................................453.2.3 Conselho.....................................................................................................463.2.4 Comisso............................................................................... ..................... 473.2.5 Tribunal de Justia.......................... ........................................................... 473.2.6 Tribunal de Contas..................................................................................... 49
3.3 Direito Comunitrio................ ...................................................... ................ ...493.3.1 Introduo...................................................................................................493.3.2 Direito Comunitrio Originrio...................................................................51
3.3.2.1 Tratados constitutivos..........................................................................523.3.2.2 Tratados modificativos.........................................................................533.3.2.3 Tratados de adeso............. ................................................................. 55
3.3.3 Direito Comunitrio Derivado.....................................................................56
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3.3.3.1 Comunidade Europia do Carvo e do Ao.......................................... 563.3.3.2 Comunidade Europia..........................................................................57
a) Regulamentos.................... ..................................................................... 57b) Diretivas............................. .................................................................... 59c) Decises...................................................................................................60d) Recomendaes e pareceres.....................................................................60
3.3.3.3 Comunidade Europia do Carvo e do Ao vis--vis Comunidade Europia...........................................................................................................61
3.3.4 Outras fontes do Direito Comunitrio.........................................................623.3.5 Direito Comunitrio e soberania.................................................................643.3.6 Direito Comunitrio e supranacionalidade..................................................663.3.5 Relao entre Direito Comunitrio e Direito Internacional Pblico clssico 703.3.6 Relao entre Direito Comunitrio e direito interno................................ . 72
3.3.6.1 Autonomia...........................................................................................733.3.6.2 Primado................................................................................................763.3.6.3 Efeito direto......................................... ............................................... 783.3.6.4 Aplicabilidade direta......!........... ........................................................ 803.3.6.5 Uniformidade de interpretao e aplicao........ ................................. 81
3.3.7 Tcnica legislativa.......................................................................................823.3.8 Regime processual......................................................................................83
3.3.8.1 Recurso por incumprimento.................................................................833.3.8.2 Recurso por omisso............................................................................843.3.8.3 Recurso de anulao............ .............................. ........... ..................... 843.3.8.4 Recurso prejudicial...............................................................................85
3.4 Modelo europeu de integrao.......................................................................... 854. INTEGRAO REGIONAL NA AMRICA LATINA E CARIBE......................88
4.1 Contexto regional................................................................................... ...........884.2 Alalc.................................................................................. .............................. 92
4.2.1 Histrico.................................................................................................... 924.2.2 Tratado de Montevidu de 1960 .................................................................. 92
4.3 Caricom......................................................... .................................................. 954.3.1 Histrico................................................................... ................................ 954.3.2 Tratado de Chaguaramas............................................................................ 964.3.3 Acordo Estabelecendo a Corte de Justia Caribenha...................................98
4.4 Sistema da Integrao Centro-Americana fSICA)......................................... . 994.4.1 Histrico.................................................................................................... 994.4.2 Tratado de Mangua................................................................................. 1004.4.3 Protocolo de Tegucigalpa..........................................................................1024.4.4 Estatuto da Corte Centro-Americana de Justia ........................................1044.4.5 Protocolo da Guatemala............................................................................106
4.5 Comunidade Andina CAN)............................................................................1084.5.1 Histrico.................................................................................................. 1084.5.2 Acordo de Cartagena................................................................................ 1094.5.3 Instrumento Adicional para a adeso da Venezuela..................................1154.5.4 Protocolo Adicional de retirada do Chile..................................................1154.5.5 Protocolo de Lima.................................................................................... 1164.5.6 Protocolo de Arequipa.............................................................................. 1164.5.7 Protocolo de Quito................................................................................... 116
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4.5.8 Protocolo de Tmiilho............................................... ................................ 1174.5.9 Protocolo de Sucre........ ........................................................................... 1184.5.10 Tratado de Criao do Tribunal de Justia..............................................118
4.5.10.1 Ao de nulidade.............................................................................. 1204.5.10.2 Ao de incumprimento................................................................... 1204.5.10.3 Interpretao prejudicial................................................................... 1214.5.10.4 Recurso por omisso ou inatividade.................................................1214.5.10.5 Funo arbitrai.................................................................................1224.5.10.6 Jurisdio trabalhista........................................................................122
4.5.11 Protocolo de Cochabamba.......................................................................1224.6 Aladi................................................................................................................123
4.6.1 Histrico...................................................................................................1234.6.2 Tratado de Montevidu de 1980................................................................123
4.6.2.1 Obietivo.............................................................................................1234.6.2.2 Princpios...................................................... .................................... 1244.6.2.3 Funes e mecanismos................................................ ...................... 1254.6.2.4 Grupos de Pases Membros......................... ...................................... 1264.6.2.5 Estrutura institucional....... ................................................................ 127
4.7 Mercosul......................................................................................................... 128i- MERCOSIJL........................................................................................................ 129
5.1 Histrico......................................................................................................... 1295.1.1 Declarao de Iguau................................................................................1315.1.2 At para a Integrao Argentino-Brasileira.... .'......................................... 1325.1.3 Tratado de Integrao. Cooperao e Desenvolvimento............................1345.1.4 Ata de Buenos Aires.................................................................................1355.1.5 AAP.CEn0 14...........................................................................................1365.1.6 Tratado de Assuno.................................... ............................................ 137
5.2 Estrutura institucional......................................................................................1375.2.1 Intergovemamentalismo............................................................................1375.2.2 Classificao......... ................................................................................... 1405.2.3 Conselho do Mercado Comum..................................................................1435.2.4 Grupo Mercado Comum...........................................................................145
5.2.5 Comisso de Comrcio do Mercosul...................................................... 1495.2.6 Comisso Parlamentar Conjunta...............................................................1525.2.7 Foro Consultivo Econmico-Social..........................................................1545.2.8 Secretaria Administrativa do Mercosul.....................................................155
5.3 Objetivos......................................................................................................... 1575.3.1 Objetivos imediatos...................................................................................1575.3.2 Objetivos mediatos....................................................................................158
5.4 Princpios norteadores............................................................ ......... ............... 1595.4.1 Princpio da gradualidade..........................................................................1605.4.2 Princpio da flexibilidade.................................... ..................................... 1615.4.3 Princpio do equilbrio..............................................................................1635.4.4 Princpio da reciprocidade.........................................................................1645.4.5 Princpio do tratamento nacional...............................................................1655.4.6 Princpio da nao mais favorecida...........................................................166
5.5 Sistema de Soluo de Controvrsias.... .......................................................... 1675.5.1 Primeiro sistema...................................................................................... 168
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5.5.2 Segundo sistema........................................................................................1685.5.2.1 Etapas diplomticas e objeto do litgio............................................... 1695.5.2.2 Etapa arbitrai......................................................................................1705.5.2.3 Reclamaes de particulares..............................................................172
5.5.3 Terceiro sistema.................................. ......................................................1745.5.4 Quarto sistema..........................................................................................175
5.6 Evoluo..........................................................................................................1795.6.1 Perodo de transio e Programa de Liberalizao Comercial................... 1805.6.2 Regime de Adequao Final Unio Aduaneira....................................... 1825.6.3 Agenda de Relanamento do Mercosul..................................................... 186
6. DIREITO DA INTEGRAO..............................................................................189
6.1 Relaes internacionais e direito.................. .......................................... .........1896.2 Teoria do Direito da Integrao.......................................................................191
6.2.1 Direito da Integrao Geral.......................................................................1916.2.2 Direito da Integrao no direito interno................................................ 1946.2.3 Direito da Integrao no Direito Internacional Pblico clssico...........1956.2.4 Direito da Integrao no Direito Comunitrio......................................2016.2.5 Direito da Integrao constitui sistema normativo autnomo....................203
6.2.5.1 Conjunto de normas...........................................................................2046.2.5.2 Ordem coercitiva................................................................................2056.2.5.3 Fundamento de validade.....................................................................2066.2.5.4 Consideraes preliminares................................................................209
6.2.6 Caractersticas do Direito da Integrao..... ........................................ ......2096.3 Direito da Integrao Originrio..................................................................... 210
6.3.1 Tratado de Assuno.................................................................................2126.3.2 Protocolos adicionais ou complementares ao Tratado de Assuno.......... 214
6.4 Direito da Integrao Derivado.............. ......................................................... 2166.4.1 Decises....................................................................................................2186.4.2 Resolues................................................................................................2196.4.3 Diretrizes...................................................................................................220
6.5 Direito da Integrao e ordem jurdica interna................... ............................. 2216.5.1 Harmonizao das legislaes internas.....................................................2226.5.2 Obrigatoriedade do Direito da Integrao................................................. 2246.5.3 Necessidade de incorporao do Direito da Integrao.............................2266.5.4 Modalidades de incorporao do Direito da Integrao............................227
6.5.4.1 Teorias dualista e monista..................................................................2286.5.4.2 Teoria dualista....................................................................................2296.5.4.3 Teorias monistas................................................................................2316.5.4.4 Teorias de coordenao......................................................................2326.5.4.5 Prtica brasileira.................................................................................233
6.5.5 Incorporao e Constituio Federal.........................................................2346.5.5.1 Negociao e assinatura.....................................................................2346.5.5.2 Aprovao..........................................................................................2356.5.5.3 Ratificao.........................................................................................2366.5.5.4 Promulgao e publicao..................................................................237
6.5.7 Hierarquia do Direito da Integrao no ordenamento jurdico brasileiro.... 2376.5.7.1 Relaes internacionais e Constituio Federal.................................. 2386.5.7.2 Tratados internacionais e Constituio Federal.................................. 239
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6.5.7.3 Poder Judicirio, tratados internacionais e Constituio Federal........ 2406.5.7.4 Tratados internacionais e jurisprudncia............................................ 242
6.5.6 Sistema de vigncia simultnea................................................................. 2437. CONSIDERAES FINAIS.................................................................................246
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS....................................................................... 252
LEGISLAO. TRATADOS. NORMAS INTERNACIONAIS E JULGADOS...... 260
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RESUMO
Esta dissertao trata principalmente dos aspectos jurdicos da integrao
regional, fenmeno que adquiriu grandes propores logo aps a Segunda Guerra
Mundial. A Europa iniciou seu processo de integrao na dcada de cinqenta com base
nos Tratados de Paris e Roma. A Unio Europia desenvolveu uma ordem jurdica
autnoma, assentada em rgos comunitrios e supranacionais. Convencionou-se
chamar essa ordem jurdica de Direito Comunitrio. As principais caractersticas do
Direito Comunitrio so aplicabilidade direta, efeito direto, especificidade e uniformidade de interpretao.
Os primeiros movimentos de integrao regional na Amrica Latina e
Caribe surgiram por volta da dcada de sessenta, principalmente a partir dos estudos da
Cepal. A integrao nessa regio no avanou da mesma forma que na Europa, mas
alguns blocos tm evoludo consideravelmente, como a Comunidade Andina, o Sistema da Integrao Centro-Americana, a Comunidade do Caribe e o Mercosul.
O Mercosul dispe de estrutura institucional particular, voltada para a
integrao, mas de tipo intergovemamental. As normas emanadas dos rgos do bloco
no correspondem exatamente ao Direito Internacional Pblico clssico, nem tampouco
ao Direito Comunitrio. O Direito criado no mbito do Mercosul, chamado Direito da
Integrao, opera conforme o sistema de vigncia simultnea, que o diferencia daqueles dois ramos jurdicos.
O Direito da Integrao representa estgio especfico em processos de
integrao regional. Algumas normas devem ser incorporadas em conformidade com os
sistemas constitucionais dos Estados-Partes; outras normas podem ser incorporadas por
meio de simples atos administrativos. Uma grande quantidade de disposies do Direito
da Integrao, no entanto, no requer incorporao para adquirir validade, vigncia e,
menos ainda, para serem eficazes. As caractersticas do Direito da Integrao permitem,
dessa forma, classific-lo como sistema normativo autnomo.
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ABSTRACT
This paper deals mainly with legal aspects of regional integration, which
spread soon after the Second World War. hi Europe, regional integration started in the
fifties based upon the Treaties of Paris and Rome. The European Union developed an
autonomous legal order, originated from community and supranational institutions. This
legal order is called Community Law. Community Law's main characteristics are direct applicability, direct effect, especificity and uniform interpretation.
The first movements for regional integration in Latin America and the
Caribbean showed up around the sixties, mainly as a result of studies carried out by the
United Nations Economic Comission for Latin America (CEPAL). Even though
integration in such a region did not develop the same way as it did in Europe, a few
integration blocs have evolved considerably, such as the Andean Community, Central-
American Integration System, Caribbean Community and Mercosur.
Mercosur has a peculiar institutional structure, which is directed to
integration but with an intergovemamental orientation. Norms produced by Mercosurs
institutions do not correspond exactly to traditional International Public Law, neither to
Community Law. Mercosurs Law, called Integration Law, works on the simultaneous
force system, which differs this legal order from both previous orders mentioned
above.
Integration Law represents a new stage in regional integration. Some norms
must be incorporated in accordance with Member States's constitutional systems; other
norms might be incorporated through administrative measures. A great deal of
Integration Law provisions do not even require incorporation at all in order to be valid,
in force and efficacious. Because of its characteristics, Integration Law might be
classified as an autonomous legal system.
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AAP.CE - Acordo de Alcance Parcial em Complementao Econmica da ALADI;
ALADI - Associao Latino-Americana de Integrao;
ALALC - Associao Latino-Americana de Livre Comrcio;
BACEN - Banco Central do Brasil;
BCE - Banco Central Europeu;
BENELUX - Blgica, Luxemburgo e Pases Baixos;
CEE - Comunidade Econmica Europia;
CAN - Comunidade Andina de Naes;
CARICOM - Caribbean Community ou Comunidade do Caribe;
CARJOFTA - Caribbean Free Trde Association ou Associao de Livre Comrcio do Caribe;
CCAJ - Corte Centro-Americana de Justia (SICA);
CCM - Comisso de Comrcio do Mercosul (MERCOSUL);
CECA - Comunidade Europia do Carvo e do Ao (UE);
CED - Comunidade Europia de Defesa;
CEEA - Comunidade Europia da Energia Atmica (UE);
CEP AL - Comisso Econmica para a Amrica Latina e Caribe (ONU);
CMC - Conselho do Mercado Comum (MERCOSUL);
CONTRAN - Conselho Nacional de Trnsito do Ministrio da Justia (Brasil);
CPC - Comisso Parlamentar Conjunta (MERCOSUL);
CT - Comit Tcnico da CCM (MERCOSUL);
EFTA - European Free Trade Association ou Associao Europia de Livre Comrcio;
ENEL - Ente Nazionale per VEnergie Elettrica ou rgo Nacional de Energia'Eltrica (Itlia);
EURATOM - European Atomic Energy Community ou Comunidade Europia de Energia Atmica (UE);
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FCCP - Foro de Consulta e Concertao Poltica do CMC (MERCOSUL);
FCES - Foro Consultivo Econmica e Social (MERCOSUL);
GATT - General Agreement on Tariffs and, Trade ou Acordo Geral de Tarifas Aduaneiras e Comrcio;
GMC - Grupo Mercado Comum (MERCOSUL);
INMETRO - Instituto Nacional de Metrologia (Brasil);
MCCA - Mercado Comum Centro-Americano (SICA);
MERCOSUL - Mercado Comum do Sul;
NAFTA - North American Free Trade Agreement ou Acordo de Livre Comrcio da Amrica do Norte;
NAUCA - Nomenclatura Alfandegria Uniforme Centro-Americana;
OCDE - Organizao de Cooperao e Desenvolvimento Econmico;
OEA - Organizao dos Estados Americanos;
OECE - Organizao Europia de Cooperao Econmica;
OIT - Organizao Internacional de Comrcio;
OMC - Organizao Mundial de Comrcio;
ONU - Organizao das Naes Unidas;
OSC/OMC - rgo de Soluo de Controvrsias da Organizao Mundial de Comrcio;
PESC - Poltica Externa e de Segurana Comuns (UE);
PICE - Programa de Integrao e Cooperao Econmica;
SAI - Sistema Andino de Integrao;
SAM - Secretaria Administrativa do Mercosul (MERCOSUL);
SGP - Sistema Geral de Preferncia (ONU);
SGT - Subgrupo de Trabalho do GMC (MERCOSUL);
SICA - Sistema da Integrao Centro-Americana;
SIECA - Secretaria Permanente da Integrao Econmica Centro-Americana (SICA);
SRF/MF - Secretaria da Receita Federal do Ministrio da Fazenda (Brasil);
STF - Supremo Tribunal Federal (Brasil);
STJ - Superior Tribunal de Justia (Brasil);
TEC - Tarifa Externa Comum;
TJAC - Tribunal de Justia do Acordo de Cartagena (CAN);
TJCE - Tribunal de Justia das Comunidades Europias (UE);
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TPI - Tribunal de Primeira Instncia (UE);
TPR - Tribunal Permanente de Reviso (MERCOSUL);
UEO - Unio da Europa Ocidental;
UNCTAD - United Nations Conference on Trade and Development ou Conferncia das Naes Unidas sobre Comrcio e Desenvolvimento (ONU);
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1. INTRODUO
O fenmeno da integrao adquiriu propores significativas em meados do
sculo XX, mais precisamente aps a Segunda Guerra Mundial. Iniciaram-se, nesse
perodo, processos de integrao regional em diversas partes do mundo: primeiro na
Europa, expandindo-se, a seguir, para Amrica Latina e Caribe, dentre outras regies.
A anlise do fenmeno da integrao pode compreender distintas reas do
conhecimento. O objetivo inicial da integrao visa, geralmente, a aspectos econmicos.
So as decises polticas, no entanto, observando relaes de poder entre Estados, que
possibilitam o surgimento e o avano da integrao. Por fim, questes sociais jamais
podem ser esquecidas e tm, certamente, influncia fundamental no delineamento de
processos de integrao regional.
Alm dos aspectos econmicos, polticos e sociais, a integrao interfere
tambm em outras esferas, principalmente no direito. A regulamentao dos processos
de integrao constitui, afinal, ordem jurdica especfica, voltada ao tratamento da
integrao em face do direito interno e do Direito Internacional Pblico.
O direito produzido no mbito da integrao pode ser to diferenciado
quanto os possveis modelos de integrao existentes. A Europa optou por modelo
particular, com estrutura supranacional (Direito Comunitrio). J a Amrica dispe de
modelos intergovemamentais e outros com tendncia supranacionalidade, nos moldes
do Direito Comunitrio europeu.
O Mercado Comum do Sul (Mercosul) constitui bloco de destaque no
cenrio internacional. A estrutura adotada no Mercosul parece diferir do modelo de
cooperao internacional clssico e do modelo supranacional europeu. O direito
produzido no Mercosul, consequentemente, tende a ser distinto do Direito Internacional
Pblico clssico e do direito produzido na integrao europia com os Tratados de Paris
e de Roma.
O direito do Mercosul parece ter objeto, finalidade e mecanismos mais
abrangentes que aqueles do Direito Internacional Pblico clssico. O direito do
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Mercosul, no entanto, no dispe tampouco de caractersticas prprias do Direito
Comunitrio da Unio Europia.
Com base nessas consideraes, como se pode qualificar o direito produzido
no Mercosul? Quais so as caractersticas desse ramo do direito? Essas caractersticas
permitem a defesa de sua autonomia? Por exemplo, a exigncia de incorporao de
algumas normas emanadas dos rgos do Mercosul e a existncia de estrutura
intergovemamental no bloco so suficientes para caracterizar o direito do Mercosul
como mero aperfeioamento do Direito Internacional Pblico?
Por outro lado, o direito do Mercosul trata da integrao entre Estados, nos
seus vrios aspectos. Isso significa que se pode afirmar que o direito criado por esse
bloco corresponde ao Direito Comunitrio existente na Europa e, de forma incipiente,
em alguns processos de integrao na Amrica Latina (Comunidade Andina e Sistema
da Integrao Centro-Americana) e Caribe (Comunidade do Caribe)?
O objetivo deste trabalho exatamente esclarecer os aspectos jurdicos da
integrao, focalizando a integrao europia, latino-americana e caribenha. Grande
ateno dispensada evoluo jurdica da integrao nessas regies. O problema,
contudo, envolve a verificao, conforme mtodo indutivo, do Direito da Integrao
como parte do Direito Internacional Pblico clssico, do Direito Comunitrio ou como
sistema normativo autnomo. Se constituir sistema normativo autnomo, deve-se
investigar suas normas, fundamento de validade e unidade e sistema de aplicao.
A metodologia empregada neste estudo utiliza mtodo de procedimento
monogrfico, analtico e comparativo. As tcnicas de pesquisa utilizadas so
documental e bibliogrfica. Isso porque empreendeu-se anlise dos documentos formais
dos processos de integrao observados e a bibliografia disponvel sobre o tema.
Este trabalho foi estruturado de forma a introduzir o tema da integrao em
todos seus aspectos, apresentar a evoluo jurdica da integrao na Amrica Latina,
Caribe e Europa. Dedicam-se os captulos finais ao processo de integrao do Mercosul
em todo seu alcance, inclusive elementos histricos, estrutura institucional, evoluo e o
direito do bloco.
O segundo captulo, aps esta breve introduo, trata do histrico geral da
integrao, desde suas origens at as manifestaes mais recentes. Teorias e modelos
explicativos da integrao e alguns dos seus aspectos fundamentais so apresentados
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nesse captulo, como interdependncia, fases de preparao e etapas de
desenvolvimento. O final do captulo apresenta as primeiras consideraes sobre
questes jurdicas da integrao.
O objeto do terceiro captulo o Direito Comunitrio da Unio Europia.
Em primeiro lugar, fez-se breve relato histrico da integrao europia. A seguir, so
traadas linhas gerais acerca das principais instituies comunitrias. Analisam-se, por
ltimo, as caractersticas e conceitos do Direito Comunitrio, como sistema normativo
autnomo e representativo de processos de integrao avanada.
O quarto captulo descreve a evoluo dos processos de integrao na
Amrica Latina e Caribe com base em fundamentos eminentemente jurdicos. O estudo
dos principais blocos se desenvolve com base nos seus instrumentos normativos. Essa
anlise permitir comparar a evoluo do Mercosul em face das tendncias regionais.
Os modelos mais recentemente adotados na Amrica Latina e Caribe
recorrem ao formato constitudo previamente na Europa. A estrutura jurdica da
integrao europia serve, alis, como paradigma de ordem jurdica em processos de
integrao em geral. Apesar da estrutura jurdica apurada, os resultados obtidos na
Amrica Latina e Caribe esto muito aqum daqueles esperados pelos legisladores que
negociaram os tratados constitutivos.
Neste trabalho no se defende a simples transmutao da ordem jurdica
comunitria da Unio Europia ao Mercosul, sem questionamento ou anlise crtica. Da
mesma forma, no se considera adequado recusar qualquer estudo comparado com o
modelo europeu. Para garantir o avano do Mercosul, no suficiente copiar a estrutura
do Direito Comunitrio europeu; deve-se, na verdade, estruturar a ordem jurdica do
bloco conforme as necessidades da integrao regional. O recurso ao estudo comparado
pode servir como vaosa ferramenta na construo do direito a partir das necessidades
do Mercosul.
O quinto captulo descreve a criao, a organizao e a evoluo do
Mercosul. Aps breve histrico, analisa-se a estrutura de tipo intergovemamental
adotada no bloco. Objetivos imediatos e mediatos, princpios norteadores e sistema de
soluo de controvrsias do Mercosul tambm so objeto de estudo. O final do captulo
contm as fases de evoluo do Mercosul, desde o perodo de transio e Programa de
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Liberalizao Comercial at a Agenda de Relanamento, passando pelo Regime de
Adequao Final Unio Aduaneira.
No sexto captulo, tenta-se sistematizar o direito produzido em qualquer
mbito de integrao. Em primeiro lugar, realiza-se anlise minuciosa para verificar se o
direito emanado dos rgos do Mercosul corresponde a modelos preestabelecidos, como
direito intemo, Direito Internacional Pblico ou Direito Comunitrio. Na hiptese de se
confirmar a autonomia do direito do Mercosul, elementos especficos da normativa regional devem ser observados.
A justificativa deste estudo encontra-se na busca de maior esclarecimento
sobre o tratamento jurdico da integrao regional em face da diversidade de opinies e
do clima de incertezas e dvidas em tomo do Mercosul. Os Estados-Partes sofrem com
uma srie de fatores conjunturais que atinge vrios pases e prejudica gravemente a
realizao dos objetivos do Mercosul. Boa parte das dvidas e incertezas se origina na
estrutura intergovemamental, aparentemente frgil, escolhida para o bloco.
Pretende-se descaracterizar a viso de que integrao regional s avana
com supranacionalidade e implantao de formas prximas ao Direito Comunitrio.
Tenta-se desmistificar tambm certas caractersticas da supranacionalidade, qual so,
geralmente, atribudos efeitos nefastos sobre a independncia e soberania dos Estados.
A perfeita compreenso do Mercosul e de seus mecanismos de
funcionamento imprescindvel para realizar as adaptaes necessrias e, assim,
garantir o avano do processo de integrao. Com este estudo centrado no direito
produzido no Mercosul, visa-se a contribuir com investigao abrangente e sistemtica
sobre a ordem jurdica da integrao no Cone Sul de forma a gerar subsdios para o
aprimoramento dos mecanismos da integrao nessa regio.
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2. TEORIA DA INTEGRAO2.1 Histrico da integrao
2.1.1 Origens
O desenvolvimento de processos de integrao constitui fato relativamente
recente no cenrio internacional. A origem do ideal integracionista pode at ser
atribuda a filsofos como Immanuel Kant e sua esperana de encontrar a paz
perptua por meio de uma federao de Estados livres regulada pelo direito das gentes
e pelo direito cosmopolita1; ou mesmo a personagens histricos como Simn Bolvar,
que defendia a associao dos recm-independentes Estados latino-americanos como
fonna de evitar possvel recolonizao por parte das potncias europias2. Mas,
certamente, o fenmeno somente adquiriu expresso no sculo XX, em especial aps o
fim dos conflitos da Segunda Guerra Mundial.
A ecloso da Segunda Guerra Mundial encerrou curto perodo em que
prevaleceu uma viso idealista das relaes internacionais3, e demonstrou que o sonho
da paz negociada, por meio da Liga das Naes4, no seria facilmente conquistado. O
realismo poltico5 retomou foras nesse momento6, e os Estados ingressaram em uma longa corrida armamentista7.
1 KANT, Immanuel. paz perptua e outros opsculos. Lisboa: Edies 70,1995.2 Ver, por exemplo, SANTOS, Ricardo Soares Stersi dos. Mercosul e arbitragem internacional comercial. Belo Horizonte: Del Rey, 1998. p. 19-28.3 O idealismo nas relaes internacionais teve seu apogeu no perodo entre as Guerras Mundiais (1919- 1939). Durante quase vinte anos, lderes, como Woodrow Wilson, acreditaram que tratados e opinio pblica poderiam controlar a voracidade de governantes por novos domnios e mais poder e, assim, evitar conflitos mundiais. O colapso da viso idealista ocorreu com o avano do nacional-socialismo alemo e do fascismo italiano, que levou Segunda Guerra Mundial. Edward Carr responsabilizou principalmente a ingenuidade de Woodrow Wilson em transplantar idias de pocas distintas, sem levar em considerao as peculiaridades de cada perodo, pelo fracasso da Sociedade das Naes. Segundo esse autor, da mesma forma que Jeremy Bentham adaptou as teorias racionalistas do sculo XVIII ao sculo XIX, Woodrow Wilson apenas transplantou as idias liberais do sculo XIX-para o perodo entre as Guerras. CARR, Edward H. Vinte anos de crise: 1919-1939. Braslia: UnB, 1981. p. 35-49.4 Para Edward Carr, [a] mais importante dentre todas as instituies afetadas por este intelectualismo mope [idealismo] da poltica internacional foi a Liga das Naes. CARR. Vinte anos de crise, p. 39.5 O realismo poltico tem sua origem nos escritos de Tucdides, Nicolau Maquiavel, Thomas Hobbes, Hugo Grcio e arl von Clausewitz. VIOTTI, Paul R.; KAUPPI, Mark V. International relations theory. 3. ed. Boston: Allyn and Bacon, 1999. p. 55-64. N sculo XX, dentre os maiores defensores do realismo nas relaes internacionais esto Edward Carr, Hans Morgenthau e Raymond Aroa Para ter
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O avano do realismo poltico foi acompanhado pelo receio de que novos
conflitos de grande proporo pudessem colocar novamente em risco a segurana e a
paz mundiais. A Europa, como regio mais prejudicada pelas duas Guerras Mundiais,
empreendeu enormes esforos no sentido de firmar planos regionais de cooperao nas
reas de defesa, economia e poltica8. Os tratados celebrados e os rgos criados nessa
fase de cooperao permitiram a incurso por estgios de verdadeira integrao, com o
surgimento das Comunidades Europias.
2.1.2 Europa
A integrao tem sua primeira manifestao prtica na unificao dos
territrios aduaneiros dos Estados germnicos no sculo XIX, formando a Deutscher
Zollverein9. No incio do sculo XX, por volta de dcada de vinte, o Reino da Blgica e o Gro-Ducado de Luxemburgo passaram a adotar polticas visando integrao dos
dois Estados.
As relaes entre o Reino da Blgica e o Gro-Ducado de Luxemburgo
assumiram formas ainda mais complexas com a assinatura da Conveno Benelux, em 5
de setembro de 1944, incluindo desta vez os Pases Baixos. Essa Conveno foi
complementada pelo Protocolo da Haia, de 14 de maro de 1947, entrando em vigor em
viso mais abrangente sobre os princpios do realismo poltico, ver MORGENTHAU, Hans J. Poltica entre las naciones: la lucha por el poder y la paz. 6. ed. Buenos Aires: Latinoamericano, 1986. p. 12-26.6 A diplomata brasileira Mrcia Jabr Cansio apresenta seis pontos bsicos para onde convergem as diferentes correntes da teoria realista: (i) o Estado possui papel central no cenrio internacional; (ii) h uma situao de anarquia internacional fundada na ausncia de autoridade supranacional; (iii) os Estados procuram aumentar o seu poder-segurana; (iv) os Estados comportam-se racionalmente; (v) a ao estatal tem em vista o poder-fora comparativo frente a outros Estados; (vi) a distribuio assimtrica do poder-fora determina o comportamento dos Estados. CANSIO, Mrcia Jabr. A dupla dialtica das relaes internacionais: elementos para a elaborao de uma viso do sul. Revista Brasileira de Poltica Internacional, n. 39 (2), 1996, p. 76-77.7 O realismo envolve polticas de poder e anlise da fora para influenciar e dominar outros Estados. Conforme Malcom Shaw, after the Second World War a growing trend appeared intent upon the analysis o f power politics and the comprehension o f international relations in terms of the capacity to influence and dominate. The approach was a little more sophisticated than might appear at first glance for it involved a consideration o f social and economic as well as political data that had a bearing upon a state's ability to withstand as well as direct pressures. Nevertheless, it was a pessimistic interpretation because o f its centring upon power and its uses as the motive force o f inter-state acitivity'". SHAW, Malcom Nathan. International law. 3. ed. Cambridge: Grotius, 1991. p. 50.8 CAMPOS, Joo Mota de. Direito comunitrio: o ordenamento jurdico comunitrio. 4. ed. Lisboa: Fundao Calouste Gulbenkian, 1994. p. 51. v. 2.9 [L]a unin aduanera de los Estados alemanes Deutscher Zollverein promovida por Prusia, constituda con el tratado de 1833, [...] posibilit la posterior unidad poltica dei Estado alemn con la fmdacin del Reich en 1871. BASALDUA, Ricardo Xavier. Mercosur y Derecho de la Integracin. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1999. p. 25.
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janeiro de 1948. Dessa forma, o Reino da Blgica, o Gro-Ducado de Luxemburgo e os
Pases Baixos constituram provavelmente a primeira Unio Aduaneira de que se tem
notcia. O modelo de integrao do Benelux serviu como base para a elaborao da
estrutura comunitria europia a partir dos Tratados de Paris (1951) e de Roma (1957)10.
A estrutura utilizada no Benelux intergovemamental, baseada em
negociaes diretas e no consenso dos Estados-Membros11. Anos mais tarde, os Estados
participantes do Benelux uniram-se a outros Estados para formarem as Comunidades
Europias: Comunidade Europia do Carvo e do Ao (CECA), Comunidade
Econmica Europia (CEE), ou apenas Comunidade Europia (CE)12, e Comunidade
Europia da Energia Atmica (CEEA).
Como esclarece o Tratado de Roma (1957), no entanto, as disposies desse
Tratado no constituem obstculo existncia e aperfeioamento das unies regionais
entre Blgica e Luxemburgo, bem como entre Blgica, Luxemburgo e Pases Baixos, na
medida em que os objetivos dessas unies regionais no sejam atingidos pela aplicao
do presente Tratado13. Em termos pragmticos, contudo, o Benelux, apesar de ter
servido de modelo para a integrao europia, acabou absorvido pelas Comunidades,
uma vez que os seus objetivos so mais limitados que os da CECA, CE e CEEA14.
2.1.3 GATT
No mesmo ano em que entrou em vigor a Conveno Benelux, outro tratado
internacional de significativa importncia tambm adquiriu vigncia. Trata-se do
Acordo Geral de Tarifas e Comrcio, GATT15, conforme ttulo em ingls16. Esse
10 ALMEIDA, Paulo Roberto de. O Mercosul no contexto regional e internacional. So Paulo: Aduaneiras, 1993. p. 57-58.11 ALMEIDA. O Mercosul no contexto regional e internacional, p. 57.12 A Comunidade Econmica Europia (CEE) passou a ser denominada apenas Comunidade Europia (CE) por determinao do Tratado de Maastricht (1992), Artigo 8o. A finalidade da alterao era demonstrar que o processo de integrao europeu tinha objetivos no meramente econmicos, mas tambm sociais, polticos, culturais e outros. LOUIS, Jean-Victor. El ordenamiento jurdico comunitrio. 5. ed. rev. Luxemburgo: Oficina de Publicaciones Oficiales de las Comunidades Europeas, 1995. p. 10.13 UE. Tratado de Roma (CE). Artigo 233'."14 ALMEIDA. O Mercosul no contexto regional e internacional, p. 58.15 O GATT foi incorporado ao ordenamento jurdico brasileiro pelo Decreto n 313, de 30 de julho de 1948. LEX, 1948, p. 251-315.16 GATT a sigla utilizada para se referir ao General Agreement on Tarffs and Trade, o qual foi negociado entre 1945 e 1947 sob os auspcios da Organizao das Naes Unidas (ONU) e que, aps 1995, passou a fazer parte do arcabouo normativo da Organizao Mundial do Comrcio (OMC). WORLD TRADE ORGANIZATION. Trading into the future. 2. ed. Genve: WTO, 1998. p. 14.
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Acordo visava a uma maior liberalizao do comrcio internacional, principalmente por
meio da eliminao progressiva das barreiras tarifrias. As Partes Contratantes do
GATT assumiram responsabilidade de reduzir alquotas de tributos incidentes sobre
comrcio exterior e o compromisso de eliminar quaisquer outros obstculos ao livre
comrcio17.
O GATT encontra sustentao em basicamente dois princpios: nao mais
favorecida e tratamento nacional. De acordo com aquele princpio, qualquer concesso
ou vantagem garantida a outro pas deveria ser imediatamente estendida s demais
Partes Contratantes do Acordo18. J este impede qualquer discriminao contra produtos
importados de outra Parte Contratante aps o devido processo de desembarao
aduaneiro19. O princpio da nao mais favorecida representou, portanto, o primeiro
entrave formal aos processos de integrao regional.
O Acordo, porm, permitiu algumas poucas excees ao livre comrcio
global e ao princpio da nao mais favorecida. Uma dessas excees diz respeito
criao de reas de livre comrcio e unies aduaneiras. importante ressaltar, no
entanto, que, para estarem amparados nos permissivos do GATT, os blocos econmicos
regionais tm que observar algumas exigncias. No caso das reas de livre comrcio, o
Artigo XXIV requer a eliminao de praticamente todas as prticas restritivas de comrcio entre os Estados-Membros.
Para a configurao de unies aduaneiras, o Artigo XXIV do GATT exige a
aplicao de tarifa extema comum a praticamente todos os produtos comercializados
pelo bloco com terceiros Estados. Fica claro que o GATT probe, em princpio, a
formao de reas de preferncias tarifrias, que representam processos de integrao
bem mais simples e incipientes do que zonas de livre comrcio ou unies aduaneiras.
17 As negociaes iniciais, realizadas em meados da dcada de quarenta, estavam direcionadas preferencialmente para a eliminao de barreiras tarifrias. A seguir, com as rodadas de comrcio (trade rounds), novos temas foram sendo acrescentados, como dumping e subsdios, que receberam pouca ateno no GATT-1947.18 GATT-1947. Artigo I, intitulado Tratamento Geral da Nao Mais Favorecida, [q]ualquer vantagem, favor, imunidade ou privilgio concedido por uma parte contratante em relao a um produto originrio de ou destinado a qualquer outro pas, ser imediata e incondicionalmente estendido ao produto similar, originrio do territrio de cada uma das partes contratantes ou ao mesmo destinado.19 GATT-1947. Artigo III, intitulado Tratamento nacional em matria de impostos e de regulamentao internos, [o]s produtos originrios de qualquer Parte Contratante gozaro de tratamento no menos favorvel que o concedido a produtos similares de origem nacional no que concerne a todas as leis, regulamentos e exigncias que afetem a sua venda, colocao no mercado, compra, transporte, distribuio ou uso no mercado interno. e
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Essa situao s foi alterada na dcada de setenta, com a Rodada Tquio
(1973-1979). Na Conferncia das Naes Unidas sobre Comrcio e Desenvolvimento
(Unctad) de 1964 discutiu-se pela primeira vez a flexibilizao de algumas normas do
GATT com relao a pases em desenvolvimento e pases de menor desenvolvimento econmico relativo20.
Na segunda Conferncia da Unctad, em 1968, elaborou-se o Sistema Geral
de Preferncia (SGP), beneficiando os pases mais pobres. Mas foi apenas na Rodada
Tquio que se formalizou a clusula de habilitao21, que permitiu aos Estados menos
desenvolvidos a formao de reas de preferncias tarifrias.
2.1.4 Amrica
A Comisso Econmica para a Amrica Latina (Cepal), criada em 1948, foi
a organizao responsvel pelos primeiros estudos acerca da integrao latino-
americana . Ral Prebisch, economista argentino que desempenhou as funes de
Secretrio-Geral da Cepal, conduziu estudos para demonstrar as causas do
subdesenvolvimento latino-americano. Com base nessas pesquisas, o referido
economista defendeu polticas de industrializao, substituio de importaes e
integrao regional para possibilitar aumento do mercado interno dos Estados da regio
e, assim, alavancar o desenvolvimento econmico regional.
Como reflexo do pensamento cepalino desenvolvido inicialmente por Ral
Prebisch, foi constituda a Associao Latino-Americana de Livre Comrcio (Alalc) em
1960, a qual pretendia criar uma zona de livre comrcio na Amrica Latina. A Alalc foi
substituda pela Associao Latino-Americana de Integrao (Aladi), que abandonou o
ideal de formao de uma zona de livre comrcio imediata na regio em favor de preferncias tarifrias e acordos sub-regionais.
20 ALMEIDA. O Mercosul d o contexto regional e internacional, p. 38-41.21 SOARES, Guido F. S. O direito supranacional nas comunidades europias e na Amrica Latina: o caso da ALALC/ALADI e o Mercado Comum Brasil-Argenlina, Revista dos Tribunais, So Paulo, n. 668, p. 15.22 A Cepal foi criada pela Resoluo n 106 (VI) do Conselho Econmico e Social da ONU em 25 de fevereiro de 1948 e entrou em funcionamento nesse mesmo ano. Posteriormente, a Resoluo n 67, de 27 de julho de 1984, mudou a denominao para Comisso Econmica para Amrica Latina e Caribe. BACK, Slvia Natlia Barbosa. O Pensamento Econmico Latino-Americano: O Manifesto da CEPAL. In PIMENTEL, Luiz Otvio (Org.). Mercosul, ALCA e integrao euro-latino-americana. Curitiba:
e Juru, 2001. p. 219. v. 2.
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Durante a vigncia do Tratado de Montevidu de 1960, que criou a Alalc,
alguns Estados da regio andina firmaram o Acordo de Cartagena, fonnando o Pacto
Andino. O Pacto Andino avanou significativamente e passou a se chamar Comunidade
Andina de Naes (CAN), por meio do Protocolo de Trujilho de 199623.
Alm do Pacto Andino, outros processos de integrao sub-regionais
surgiram, como o Mercado Comum Centro-Americano (MCCA), Comunidade do
Caribe (Caricom), Acordo de Livre Comrcio da Amrica do Norte (Nafta) e Mercado
Comum do Sul (Mercosul).
Em suma, logo aps a Segunda Guerra Mundial uma srie de mudanas foi
observada no sistema internacional ocidental24: (i) regulamentao do comrcio
internacional; (ii) negociaes envolvendo a liberalizao comercial por meio de
rodadas de comrcio do GATT25; (iii) aprofundamento do processo de integrao
europeu, com a criao e expanso das Comunidades Europias (CECA, CE e CEEA), e
o surgimento de blocos de integrao na Amrica Latina; e (iv) como reflexo das
realidades anteriores, o surgimento da dialtica entre multilateralismo versus
regionalismo.
2.2 Caractersticas da integraoO fenmeno da integrao ainda no est suficientemente delimitado e
sistematizado, principalmente porque compreende temtica nova e bastante mutvel26.
23 Ver item 4.5.8.24 Partindo de uma concepo realista das relaes internacionais, Raymond Aron define sistema internacional como conjunto constitudo pelas unidades polticas que mantm relaes regulares entre si e que so suscetveis de entrar numa guerra geral. ARON, Raymond. Paz e guerra entre as naes. Braslia: UnB, 1979. p. 121. Antnio Jos Telo diferencia sistema mundial de sistema internacional nos seguintes termos: Sistema Mundial o conjunto das regras de convvio internacional entre Estados e sociedades. edificado normalmente depois de um conflito global, quando o novo poder hegemnico prope aos restantes solues para os problemas gerais que se colocam [...] Sistema Internacional uma fase do sistema mundial que no abarca a totalidade das suas vertentes. caracterizado por uma relao de fora entre os principais poderes, bem como entre estes e a periferia, que cria utna forma particular de relacionamento e muda ao fim de algumas dezenas de anos. TELO, Antnio Jos. Do Tratado de Tordesilhas guerra fria: reflexes sobre o sistema mundial. Blumenau: FURB, 1996. p. 109-111.25 Como a tentativa de criar o que viria a ser o terceiro rgo de Bretton Woods fracassou - e a Organizao Internacional do Comrcio (OIT) no foi efetivamente constituda -, o GATT tomou-se um organismo a hoc, provisrio, para discusses comerciais. Cf. BHLKE, Marcelo. Soluo de Controvrsias e Subsdios no mbito da Organizao Mundial do Comrcio: o caso Brasil-Aeronaves. In PIMENTEL, Luiz Otvio, SANTIVANEZ, Emma Nogales. Los procesos de integracin en el nuevo milnio. La Paz: UCB, 2000. p. 489.26 Jos ngelo Estrella Faria divide a integrao econmica moderna em dois tipos: integrao internacional e integrao regional. A integrao internacional se refere a caractersticas da economia capitalista global, impulsionada pela ifiterao e interdependncia. Utiliza-se, normalmente, para
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Diversos aspectos da integrao esto sendo testados e experimentados. Peculiaridades
das regies onde a integrao se desenvolve levam a alteraes na prpria definio do
termo integrao, nos estgios por que passa, na associao ao tipo supranacional ou
intergovemamental e nas conseqncias que produz nessas regies.
No existe modelo rgido a ser seguido pelos blocos de integrao. As
caractersticas de cada processo de integrao variam conforme uma srie de fatores. Os
objetivos a serem alcanados, a profundidade da integrao desejada, a velocidade
verificada no processo e a vontade poltica em obter certos resultados interferem
definitivamente no delineamento da integrao27.
Algumas caractersticas, no entanto, j podem ser percebidas com base nas
experincias integracionistas que se encontram em andamento. As principais
caractersticas a serem destacadas so: (i) estreita ligao entre integrao e
interdependncia; (ii) a integrao pode ser vista como processo e como estado; (iii)
presena de fases de preparao percorridas antes de iniciarem processos de integrao;
descrevr esse fenmeno, a expresso transnacionalizao do capital. Alm disso, apresenta-se como resultado da ao de empresas. Tal fruto de novo padro de produo eleito pelas empresas, destinado distribuio em larga escala; a integrao que ela produz , em primeiro lugar, interna, isto , se d dentro de empresas. J a integrao regional surge como resultado de acordos polticos entre pases geograficamente prximos com vistas obteno das vantagens tpicas do processo. Essas vantagens compreendem, essencialmente, cinco aspectos: (i) especializao nas economias dos pases envolvidos; (ii) explorao de economias de escala; (iii) aumento da eficincia na produo pelo incremento da competitividade; (iv) aumento das exportaes para terceiros pases; (v) expanso do mercado. FARIA, Jos ngelo Estrella. O Mercosul: princpios, finalidade e alcance do Tratado de Assuno. Braslia: MRE/SGIE/NAT, 1993. p. 25-26. Neste trabalho, utiliza-se a expresso integrao no sentido de integrao regional.27 Odete Maria de Oliveira descreve seis teorias destinadas a explicar as caractersticas, formas e funcionamento da integrao, com foco na experincia europia: (i) Federalismo: representa estratgia poltica voltada criao de unio federal entre Estados europeus. O objetivo maior garantir a paz. Os defensores desta teoria proclamam a supremacia do Direito Comunitrio; (ii) Funcionalismo: espcie de rplica ao Federalismo, pois no reduz sua estratgia ao modelo constitucional terico. O Funcionalismo visa identificao de problemas de alcance transnacional e apresentao de solues tcnicas conjuntas, por meio da cooperao funcional entre os Estados. Os funcionalistas diferenciam reas polticas e tcnicas, ou reas de alta e baixa poltica; (iii) Neofuncionalismo: aceita certo grau de constitucionalizao. Os agentes do processo de integrao passam a ser elites e grupos de interesse. O Neofuncionalismo questiona a separao entre reas de alta e baixa poltica, pois os temas se tecnificam com deciso poltica prvia. A principal contribuio desta teoria est na explicao do avano da integrao com base no mecanismo do transbordamento (spill over), por meio do qual uma etapa sucede a outra em saltos qualitativos ligados especialmente economia; (iv) Interdependncia: as falhas das teorias anteriores levaram ao estudo de esquemas tericos prprios das relaes internacionais, como interdependncia e intergovemamentalismo; (v) Intergovemamentalismo: baseado no realismo poltico. A poltica comunitria continuao da poltica domstica em outro nvel. As negociaes esto pautadas em relaes de poder entre Estados. Defende a proteo da soberania nacional; (vi) Neoinstitucionalismo: o fator primordial no a participao dos Estados, mas a atuao das instituies criadas no processo de integrao. OLIVEIRA, Odete Maria de. Unio Europia: processos de integrao e mutao. Curitiba: Juru, 1999. p. 46-56.
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(iv) semelhana nas etapas por meio das quais evolui o processo de integrao; (v) os
objetivos visados com a integrao; e (vi) o surgimento de novo ramo do direito ligado
integrao.
2.2.1 Integrao e interdependncia
A primeira caracterstica da integrao que ela est indissociavelmente
ligada ao fenmeno da interdependncia28. Os atores29 que participam do sistema
internacional esto ligados de maneira to forte que qualquer mudana que ocorra em
um determinado pas acarreta mudanas em outros pases30. A independncia absoluta,
baseada no conceito clssico de soberania, no mais adequada para descrever a
participao de qualquer Estado no sistema internacional31.
Nesse sentido, Karl Deutsch define integrao como um relacionamento
entre unidades, no qual elas so mutuamente interdependentes' e em conjunto produzem propriedades do sistema que isoladamente no teriam32 (grifou-se).
A noo de interdependncia usada para explicar as relaes entre Estados
que apresentam mtua dependncia33, gerada pelas transaes internacionais. A
interdependncia impe custos a todos, ou ambos, os lados da relao.
28 Os estudos sobre interdependncia surgiram por volta da dcada de sessenta, e avanaram com a contribuio de Karl Deutsch, Robert Keohane, Joseph Nye. Sobre o assunto, ver SANTOS JNIOR, Raimundo Batista dos. Diversificao das Relaes Internacionais e Teoria da Interdependncia. In BEDIM, Gilmar Antonio et al. Paradigmas das relaes internacionais. Iju: Uniju, 2000. p. 245-301. OLIVEIRA, Odete Maria de. Relaes internacionais: estudos de introduo. Curitiba: Juru, 2001. p. 123-134.29 Os autores realistas tendem a mencionar apenas Estados como atores das relaes internacionais. Mas autores contemporneos incluem dentre os atores das relaes internacionais, organizaes internacionais, corporaes transnacionais, organismos no-govemamentais, movimentos polticos, sindicatos e os prprios indivduos. OLIVEIRA, Odete Maria de. Relaes Internacionais: Breves apontamentos econtextualizao. In_____ (Coord.). Relaes internacionais e globalizao. Iju: UNIJU, 1999. p. 31-33 e 49 passim. O professor portugus Antnio Jos Fernandes prefere incluir dentre os atores das relaes internacionais apenas Estados, organizaes internacionais e empresas multinacionais/ transnacionais. FERNANDES, Antnio Jos. Relaes internacionais contemporneas: do mundo da Europa Europa do mundo. Itaja: UNIVALI, 1998. p. 16.30 Dois pases so interdependentes quando uma mudana ocorrida no pas A - digamos, uma elevao geral no nvel de preos - provocar um alterao previsvel no pas B, ou seja, talvez tambm um aumento de preos. DEUTSCH, Karl Wolfgang. Anlise das relaes internacionais. 2. ed. Braslia: UnB, 1982. p. 284.31 Malcom Sbaw descreve esse fenmeno" nos seguintes termos: [t]he role o f the state in the modem world is a complex one. According to legal theory, each state is sovereign and equal. In reality, with the phenomenal growth in communications and consciousness, and with the constant reminder o f global rivalries, not even the most powerful o f states can be entirely sovereign. Interdependence and the close- knit character o f contemporary international commercial and political society ensures that virtually any action of a state could well have profound repercussions upon the system as a whole and the decisions under considerationjby other states". SHAW. International law, p. 101.
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A relao interdependente, contudo, pode no ser caracterizada pelo
beneficio mtuo34, gerando a interdependncia assimtrica. Conforme Robert
Keohane e Joseph Nye, a anlise dos custos e benefcios pode ser feita de duas formas:
(i) ganhos conjuntos (joint gains) ou perdas conjuntas (joint losses); ou (ii) ganhosac
relativos (relative gains) .Nos processos de integrao, as relaes de interdependncia entre os
Estados-Membros so preferencialmente observadas a partir dos ganhos conjuntos dos
participantes do bloco. Isso implica que prejuzos temporrios, por exemplo, sofridos
por um Estado-Membro em determinado momento so compatveis com a idia de
integrao. O importante o avano do conjunto de Estados. Os ganhos relativos
voltam a ser aplicados na poltica externa dos Estados-Membros com relao a terceiros
Estados e organizaes internacionais. A cooperao se desenvolve nesses termos.
A interdependncia pode ser ainda positiva ou negativa. A interdependncia
positiva ocorre quando uma mudana desejvel verificada em determinado pas
desencadeie reao tambm desejvel em outro Estado. Ser ainda considerada positiva
a interdependncia se a mudana for prejudicial em certo Estado, gerando reaes
tambm prejudiciais em outro. A interdependncia negativa aquela que d ensejo a
conseqncias diversas em outro Estado, ou seja, uma mudana desejvel para vim
Estado que gere reaes prejudiciais em outro36.
2.2.2 Integrao: processo e estado
A integrao, no importando o local onde ocorra nem as condies em que
se desenvolva, pode ser vista tanto como processo, quanto como estado. Para Bela
Balassa, integrao como processo abrange medidas destinadas a abolir discriminao
entre unidades econmicas pertencentes a diferentes Estados Nacionais37. J integrao
como estado de coisas nada mais do que ausncia de vrias formas de discriminao
32 DEUTSCH. Anlise das relaes internacionais, p. 223.33 KEOHANE, Robert O.; NYE, Joseph S. Power and interdependence. Reading: Addison-Wesley, 2000. p. 7.34 Nothing guarantees that relationships that we designate as interdependent will be characterized by mutual benefit. KEOHANE; NYE. Power and interdependence, p. 8.35 KEOHANE; NYE. Power and interdependence, p. 8.36 [U]ma interdependncia positiva forte tende a dar sustentao solidariedade, uma interdependncia negativa forte tende a promover conflitos; e uma interdependncia fraca tende a fazer muito pouca diferena em qualquer dos casos (grifou-se). DEUTSCH. Anlise das relaes internacionais, p. 284.37 BALASSA, Bela. The theory of economic integration. Homewood: Richard D. Irwin, 1961. p. 1. *
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28
entre economias nacionais38. Portanto, a integrao vista sob um prisma dinmico
corresponde a processo, j a integrao no seu aspecto esttico constitui estado de
coisas.
Ricardo Xavier Basalda tambm defende que a integrao possa ser
observada como processo e como situao das atividades econmicas. Observada
com enfoque de processo, integrao poderia ser definida como conjunto de aes
voltadas a eliminar progressivamente a discriminao entre os distintos espaos
econmicos envolvidos39.
A integrao, portanto, representa tanto processo composto pelo conjunto de
fases por que passa qualquer bloco em constituio40, quanto o estado criado por cada
uma dessas fases41. No estado final a integrao desejada j ocorreu, por meio de
processo evolutivo, e constitui feto. O estado final depende, dentre outros fatores, da intensidade visada com a integrao42.
2.2.3 Fases de preparao
A deciso poltica de iniciar qualquer processo de integrao envolve certo
grau de complexidade, principalmente pela relevncia dos assuntos e interesses
afetados. Assim, antes de avaliar as etapas por que passam processos de integrao, no
se pode deixar de fazer algumas consideraes acerca do amadurecimento poltico do ideal integracionista.
Rarl Deutsch, ao analisar movimentos de integrao, constatou que grande
parte deles passou por trs fases sucessivas. Primeiramente, a integrao defendida por
38 BALASSA. The theory of economic integration, p. 1.39 BASALDA. Mercosur y Derecho de Ia Integracin, p. 23.40 Como fica claro na definio proposta por Oflia Stahringer de Caramuti, la integracin es un proceso multidimensional, cuya intencionalidad excede a la simple reestructuracin de mercados en busca de economias de escala y que incluye, tanto la dimension de la construccin de instituciones, como la gestacin de una autntica cultura de la integracin, asentada en el respeto y la convivncia de las culturas nacionales y locales (grifou-se). STAHRINGER DE CARAMUTI, Oflia. El Mercosur en unMundo en Bloques. I n _____ (Coord.). El Mercosur en el nuevo orden mundial. Buenos Aires:Ciudad Argentina, 1996. p. 99.41 Roberto Ruiz Diaz-Labrano d nfase ao estado final obtido com o processo de integrao: [l]a integracin econmica propiamente dichp. seria el status jurdico en el cual los Estados entregan, ceden ou trasladan alguna de sus prerrogativas soberanas con el fin de constituir un rea dentro de la cual, por la liminacin de las barreras, circulan libremente las personas, los bienes, los servidos y los capitales, mediante la armonizacin de las polticas correspondientes y bajo una gida supranacionaP'. RUIZ DIAZ LABRANO, Roberto. Mercosur: integracin y derecho. Buenos Aires: Intercontinental y Ciudad Argentina, 1998. p. 60.42 Neste trabalho, o termo integrao ser usado indistintamente como processo e como estado final.
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lideranas intelectuais e por apenas poucos representantes de outros setores. No
incio, portanto, a maioria dos defensores formada por intelectuais.
Com a divulgao do ideal integracionista, grupos de interesse cada vez
mais amplos assumem a defesa da integrao, que passa a ter o apoio de grandes
polticos. A terceira e ltima fase ocorre com a fuso dos movimentos de massa e/ou
de poltica de elite em larga escala. A partir desse momento a questo da unificao
poltica se toma intensamente prtica43.
Karl Deutsch, baseado em estudo de Richard Merrit44, sobre a unificao
das colnias americanas, sustenta que as atividades integrativas e o apoio popular
tendem a aumentar de intensidade para depois declinarem. Talvez isso se deva ao fato
de que, conforme assegura James Meade, as primeiras etapas na formao de uma
unio so provavelmente as que mais benefcios trazem45.
O estudo e o conhecimento dessas fases de preparao so de grande
importncia quando se analisam processos de integrao, como o do Mercosul, que
oscilam entre momentos de euforia e outros de esfriamento, e at certo retrocesso. A
prpria Unio Europia sofreu, e ainda sofr, com perodos de descrena e ceticismo
generalizado46, mas mesmo assim atingiu profundo estgio de integrao, gerando
grandes benefcios a todos seus Estados-Membros e cidados.
2.2.4 Etapas de evoluo
A quarta caracterstica corresponde a etapas por que normalmente passam
os processos de integrao. Essas etapas no so rgidas, nem obrigatrias, para alcanar
a integrao em qualquer nvel. O estudo das etapas geralmente percorridas em
processos de integrao mais profundos, no entanto, facilita o planejamento e a
avaliao de projetos integracionistas menos intensos.
43 DEUTSCH. Anlise das relaes internacionais, p. 278.44 MERRIT, Richard L. Symbols of american community; 1733-1775. New Haven: Yale University, 1966. Apud DEUTSCH. Anlise das relaes internacionais, p. 278.45 MEADE, James Edward. Teoria de las uniones aduaneras. Madrid: Moneda y Crdito, 1969. p. 139.46 Como se pode constatar pela leitura do texto introdutrio ao caderno especial (outubro de 2001) do Le ' - Monde Diplomatique sobre a Unio Europia, assinado por Anne-Cecile Robert: [l] 'accord minimal obtenu par la prsidence franaise au sommet de Nice, au matin du 11 dcembre 2000, traduit lessoufflement de la dynamique europenne. Aprs 50 ans dexistence, quatre largissements (de 6 15 membres), et la ralisation de l intgration conomique - poursuivie avec obstination dans la ligne du projet des pres fondateurs, les Franais Jean Monnet et Robert Schuman -, les Quinze accumulent dsaccords sur dsaccords (grifou-se). Disponvel em: . Acesso em 4 de dezembro de 2001. *
http://www.monde-diplomatique.fi-/europe/%e2%80%a8cahierhttp://www.monde-diplomatique.fi-/europe/%e2%80%a8cahier
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A elaborao terica das etapas dos processos de integrao est baseada,
fundamentalmente, em artigos do GATT referentes integrao entre as Partes
Contratantes e na experincia europia.
O GATT, firmado no dia 30 de outubro de 1947, entrando em vigor em Io
de janeiro de 1948, visava liberalizao do comrcio internacional por meio da
eliminao de barreiras tarifrias no-tarifrias entre as Partes Contratantes.
Inicialmente, um maior esforo estava dirigido reduo, e futura eliminao, das
alquotas de imposto de importao (tarifas aduaneiras). As Partes Contratantes se
comprometiam a reduzir suas tarifas aduaneiras e, pelo princpio do tratamento
nacional, a no instituir outras barreiras tarifrias que no existissem no momento da celebrao do Acordo47.
A clusula da nao mais favorecida foi includa no Artigo I do GATT-
1947. Por meio desta clusula, um Estado se compromete a estender a outra Parte
Contratante o benefcio das vantagens que ele possa vir a conceder posteriormente a
outros Estados48. Com a incluso da clusula da nao mais favorecida, as Partes
Contratantes sofreram limitao no seu poder para estabelecer concesses bilaterais u regionais.
No entanto, o Artigo XXIV do GATT estabeleceu excees ao princpio do
Artigo I. As Partes Contratantes podem fazer concesses a outros Estados, sem estend-
las automaticamente s outras Partes Contratantes e sem descumprir as regras do
Acordo, desde que observadas certas condies.
Conforme expresso no Artigo XXIV, pargrafo 4o, do GATT, as Partes
Contratantes reconhecem a importncia do aumento de comrcio ocasionado por
acordos de integrao entre Estados que fazem parte do Acordo. Mas tambm
reconhecem que o propsito de uma unio aduaneira ou de uma zona de livre comrcio
deve ser facilitar o comrcio entre os territrios constitutivos e no elevar barreiras ao comrcio com outras Partes Contratantes com tais territrios49.
Os dispositivos do GATT no sero usados de forma a impedir a formao
ou a adoo de tratados provisrios que visem formao de zonas de livre comrcio e
de unies aduaneiras. Para a aplicao deste dispositivo, os Estados-Membros do
47 GATT. Artigo III, par. Io.48 CHARPENTIER, Jean. Institutions internationales. 7. ed. Paris: Dalloz, 1984. p. 46.49 GATT. Artigo XXIV, par. 4o, in fine.
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processo de integrao no podem elevar tarifas ou criar condies mais restritivas ao
comrcio com outras Partes Contratantes do GATT. Os tratados provisrios devem
incluir, ainda, plano e cronograma com prazo razovel de tempo para formao de
blocos de integrao50.
Bela Balassa apresentou uma classificao que inclui formas explicativas de
diferentes graus de integrao. Inspirado no processo de integrao europeu, Bela
Balassa destacou cinco formas de integrao que podem representar etapas em direo a
estgios mais profundos de integrao. As formas so: (i) zona de livre comrcio; (ii)
unio aduaneira; (iii) mercado comum; (iv) unio econmica; e (v) integrao
econmica total51. A essas cinco formas alguns autores acrescentam, ainda, uma anterior
zona de livre comrcio. Trata-se de reas de preferncias tarifrias52.
2.2.4.1 rea de preferncias tarifrias
Ricardo Xavier Basalda divide as reas de preferncias em trs tipos:
tarifrias, alfandegrias e econmicas. As reas de preferncias tarifrias so as
mais simples e se referem exclusivamente s concesses relativas aos direitos
alfandegrios que gravam a importao ou a exportao de mercadorias53. Portanto,
nessas reas atingem-se apenas os tributos incidentes sobre comrcio exterior, como
imposto de importao e imposto de exportao.
As reas de preferncias alfandegrias abrangem, alm de preferncias
quanto aos tributos do comrcio exterior, outros tributos, em geral indiretos, aplicados
no comrcio. Essas reas podem, ainda, regular restries diretas, como, por exemplo,
quotas, licenas o monoplios.
Por fim, as reas de preferncias econmicas podem abranger aspectos que
no so de natureza alfandegria, mas que se constituem em um tratamento
50 GATT. Artigo XXIV, par. 5o, alneas (a), (b) e (c).51 BALASSA. The theory of economic integraton, p. 2.52 Exemplos de autores que mencionam reas de preferncias tarifrias: FARIA. O Mercosul: princpios, finalidade e alcance do Tratado de Assuno, p. 25; BASALDA. A respeito do direito da integrao. Revista de Direito do Mercosul, Buenos Aires, n. 1, p. 76-77, Fevereiro/1998; MIDN, Mario A. R Derecho de la Integracin: aspectos institucionales dei Mercosur. Buenos Aires: Rubinzal-Culzoni,1998. p. 40-41.53 BASALDA. A respeito'do direito da integrao, p. 76.
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discriminatrio em relao mercadoria estrangeira sendo esta uma vez importada54.
Podem tambm ser feitas concesses com relao tributao interna.
As reas de preferncias, sejam elas tarifrias, alfandegrias ou econmicas,
no representam ainda formas de integrao pela sua superficialidade e pequena
abrangncia. Por isso, seria correto incluir as reas de preferncias apenas dentre os
modelos de cooperao internacional55.
2.2.4.2 Zona de livre comrcio
A primeira etapa de processos de integrao, conforme diviso proposta por
Bela Balassa, corresponde zona de livre comrcio. Nessa etapa, as barreiras tarifrias e
no-tarifrias so completamente eliminadas no comrcio dentre os Estados que formam
parte do bloco.
Quando definitivamente constituda a zona de livre comrcio, encontram-se
afastadas todas as limitaes quantitativas e qualitativas ao comrcio. Isso significa que
no incidem tributos sobre comrcio exterior - imposto de importao e imposto de
exportao - , nem se aplicam medidas restritivas de comrcio, como quotas e barreiras
tcnicas56. As prticas de interveno do Estado na economia, como subsdios
exportao, so monitoradas para no prejudicar o comrcio regional.
O Artigo XXIV, pargrafo 8o, alnea b, do GATT define zona de livre
comrcio como um grupo de dois ou mais territrios aduaneiros no qual tarifes e outras
medidas restritivas ao comrcio [...] so eliminadas de praticamente todo o comrcio
entre os territrios constitutivos relativamente a produtos originrios de tais territrios.
Nessa etapa, a poltica comercial exterior de cada Estado-Membro
permanece independente. Cada Estado tem poder para estabelecer sua poltica tarifria
com relao a terceiros Estados. Cria-se, dessa forma, o problema da triangulao,
que a escolha do Estado que tenha as menores alquotas de imposto de importao
54 BASALDA. A respeito do direito da integrao, p. 77.55 BASALDA. A respeito do direito da integrao, p. 77.56 As barreiras tcnicas constituem o protecionismo regulatrio. Alan Sykes define protecionismo regulatrio como any cost disadvantage imposed on foreign firms by a regulatory policy that discriminates against them or that otherwise disadvantages them in a manner that is unnecessary to the attainment o f some genuine, nonprotectionist regulatory objective. Regulatory protectionism can result either from substantive regulatory requirements or from the mechanisms used by regulators to ensure compliance with substantive requirements (the 'conformity assessment' process)". SYKES, Alan 0. Regulatory protectionism and the law of international trade. The University of Chicago Law Review, n. 1, v. 66, p. 3, Winter 1999. *
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para servir de porta de entrada de mercadorias estrangeiras no bloco. A partir do seu
ingresso na regio, as mercadorias circulam livremente dentro do territrio aduaneiro
integrado57.
O mecanismo criado para evitar desvio de comrcio a regra geral de
origem. Por meio de uma srie de regras e condies, os produtos so submetidos
inspeo para confirmar sua origem58. queles que preencham os requisitos so
concedidos certificados de origem. O certificado permite a aplicao das alquotas
negociadas no bloco de integrao.
2.2.4.3 Unio aduaneira
A segunda etapa em processos de integrao , geralmente, a unio
aduaneira. Essa etapa surge como forma de evitar as deficincias da zona de livre
comrcio. Conforme visto anteriormente, zonas de livre comrcio permitem aos
Estados-Membros prticas isoladas de tarifas aduaneiras com relao a terceiros
Estados. Isso gera o problema da triangulao e enseja a criao de regras de origem.
As regras de origem, contudo, enfrentam diversos obstculos. Nem sempre
fcil determinar a origem de produtos, pelo fato de terem sido produzidos em diferentes
Estados ou com matria-prima e insumos provenientes de outras regies.
Para resolver definitivamente esse problema, os Estados-Membros de blocos
de integrao podem avanar para estgios mais profundos de integrao, como unies
aduaneiras. Esse estgio compreende, alm da eliminao de barreiras tarifrias e no-
tarifrias dentro do bloco, a aplicao da tarifa externa comum (TEC) e a harmonizao
da poltica comercial com relao a terceiros Estados.
Com a instituio da TEC, todas as mercadorias que ingressam no bloco
pagam os mesmos direitos aduaneiros, no importando em qual Estado-Membro se
realize o desembarao aduaneiro. Depois de nacionalizados, os produtos podem circular livremente dentro do bloco.
Ricardo Xavier Basalda diferencia unio tarifria de unio aduaneira.
Naquela haveria apenas eliminao de barreiras tarifrias e no-tarifrias no comrcio
57 Conforme definio do Cdigo Aduaneiro do Mercosul, que, apesar de no ter entrado em vigor, serve como referencial para definio de territrio aduaneiro integrado: Territrio Aduaneiro [] a totalidade do territrio dos Estados-Partes que integram o Mercosul, no qual se aplica a legislao aduaneira comunitria. MERCOSUL/CMC/DEC N 25/1994. Artigo 3o.58 Nesse sentido, ver BASALDA. Mercosur y Derecho de la Integracin, p. 31.
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entre Estados-Membros e a constituio da TEC. J na unio aduaneira haveria, alm
das caractersticas da unio tarifria, um cdigo aduaneiro comum59.
2.2.4.4 Mercado comum
O mercado comum representa estgio bastante avanado de integrao.
Nessa etapa somam-se s caractersticas da zona de livre comrcio e da unio aduaneira,
a livre circulao de todos os fatores produtivos.
Para que determinado bloco de integrao possa ser considerado um
mercado comum, portanto, necessrio que haja completa liberdade de circulao de
bens, capitais, servios e pessoas, poltica de comrcio exterior harmonizada e a
existncia de TEC aplicada por todos os Estados-Membros.
Como define Andreu Olesti Rayo, mercado comum se d com a criao de
um espao econmico, compreendido pelo territrio dos Estados-Membros, no qual os
diferentes fatores de produo esto liberalizados em condies anlogas as de um mercado interno de um Estado60 (grifou-se).
O Tratado de Assuno, firmado entre a Repblica Argentina, a Repblica
Federativa do Brasil, a Repblica do Paraguai e a Repblica Oriental do Uruguai, tem
por finalidade a constituio de um mercado comum. O Mercosul, porm, ainda no
atingiu essa etapa de integrao, como se ver adiante.
2.2.4.5 Unio econmica
A unio econmica representa estgio extremamente avanado de
integrao. A unio econmica constitui estgio superior ao mercado comum, pois
abrange as caractersticas deste e impe, ainda, harmonizao das legislaes nacionais
nas reas de poltica econmica, financeira e monetria61.
O termo unio econmica normalmente vem associado a unio
monetria, o que leva a regio integrada a contar tambm com moeda nica, poltica
monetria unificada na unio e controle, por parte da unio, das reservas e das taxas de
cmbio62.
59 BASALDA. Mercosur y Derecho de la Integracin, p. 32-43.60 OLESTI RAYO, Andreu. Las Libertades Comunitrias. In ABELLN, Victoria; VIL, Blanca (Coord.). Lecciones de Derecho Comunitrio europeo. 2. ed. Barcelona: Ariel, 1996. p. 176.61 ALVES, Jos de Jesus F. Lies de Direito Comunitrio. Coimbra: Coimbra, 1989. p. 57. v. 1.62 ALVES. Lies de Direito Comunitrio, p. 57. 6
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A unio econmica e monetria requer, portanto, a liberalizao completa
do movimento de bens, capitais, servios e pessoas, a aplicao de TEC, harmonizao
integral das polticas macroeconmicas e setoriais, a criao de Banco Central
comunitrio e de moeda comum para todo o bloco. A poltica econmica e monetria
fica sob coordenao comum.
No existe previso expressa de que o Mercosul atinja tal estado de
integrao. O nico processo de integrao que avanou at unio econmica e
monetria foi a Unio Europia, com a criao do Banco Central Europeu e do Euro,
moeda comum europia .
2.2.4.6 Unio econmica total
A unio econmica total a forma de integrao mais profunda imaginada
por Bela Balassa. Essa etapa demanda a unificao de polticas monetrias, fiscais,
sociais e contracclicas e requer a criao de uma autoridade supranacional cujas
decises sejam obrigatrias aos Estados-Membros64.
A unio econmica total prevista por Bela Balassa estaria muito prxima da
unio econmica e monetria existente na Unio Europia. A nica etapa posterior que
se pode imaginar para a Unio Europia seria uma unio poltica, confederao ou Estado federal65.
2.2.5 Objetivos da integrao
Os Estados que participam de processos de integrao tm objetivos muito claros. A integrao possibilita algo que os Estados isoladamente no conseguiriam, ou,
pelo menos, teriam maiores dificuldades em conquistar.
De qualquer maneira, existem fatores que conduzem os Estados para a
integrao. O principal fator a busca de desenvolvimento econmico. Afinal, como
afirma Eduardo Schaposnik, [a] integrao no um fim em si mesmo, mas um meio
ou um instrumento para conseguir o desenvolvimento66.
63 BASALDA. Mercosur y Derecho de la Integracin, p. 48-49.64 BALASSA. The theory of economic integration, p. 2.65 ALVES. Lies de Direito Comunitrio, p. 57-58.66 SCHAPOSNIK. As teorias da integrao e o Mercosul: estratgias, p. 161.
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Ral Prebisch e os cepalinos em geral defenderam a integrao latino-
americana como forma de expandir os mercado nacionais, o que possibilitaria
investimentos e industrializao. Como conseqncia viriam a produo em escala de
produtos manufaturados e a substituio das importaes.
Segundo os cepalinos, a causa do subdesenvolvimento regional estava na
deteriorao dos termos de troca, pois os preos dos produtos agrcolas exportados pela
Amrica Latina se encontravam em escala decrescente de valores, enquanto os preos
dos manufaturados importados pela regio encontravam-se em franca elevao. Por isso
Ral Prebisch enfatizou que o Mercado Comum [latino-americano] representa [...] um esforo impostergvel67.
Referindo-se Europa, Bela Balassa acentuou diversos fatores que levaram
os europeus a iniciarem o processo de integrao: (i) reintegrar as economias europias
aps o perodo entre as Guerras Mundiais, quando o isolamento prevaleceu; (ii)
contrabalanar os efeitos negativos da interveno estatal na economia; (iii) mitigar
flutuaes cclicas influenc