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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO O PÚBLICO E O PRIVADO NA SAÚDE O processo de mudança da prestação de serviços de saúde no Brasil num contexto histórico e comparativo Propostas e reflexões para o futuro ANTONIO CORDEIRO FILHO Doutorado em Serviço Social PUC SÃO PAULO 2012 I

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

O PÚBLICO E O PRIVADO NA

SAÚDE

O processo de mudança da prestação de serviços de saúde no Brasil num contexto histórico e comparativ o

Propostas e reflexões para o futuro

ANTONIO CORDEIRO FILHO

Doutorado em Serviço Social

PUC

SÃO PAULO

2012 I

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

O PÚBLICO E O PRIVADO NA

SAÚDE

O processo de mudança da prestação de serviços de saúde no Brasil num contexto histórico e comparativ o

Propostas e reflexões para o futuro

Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial à obtenção do Título de Doutor em Serviço Social sob a orientação da Professora Dra. Regina Maria Giffoni Marsiglia.

São Paulo

2012

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Banca Examinadora:

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Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e ci entíficos, a reprodução, total ou parcial, desta tese, por proce ssos de fotocopiadoras ou eletrônicos.

Assinatura: ______________________________________________________

São Paulo, Dezembro / 2011.

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Agradecimentos e dedicatórias,

À minha esposa Vera, aos meus filhos Fábio, Rodrigo fico agradecido pela força espiritual fornecida para elaborar esta obra.

Aos meus netos, em ordem alfabética, Ana Laura, Gabriel, Mariana e Vinícius, todos de sobrenome “ Cordeiro “, que – eu por estar bem mais velho e com visão social

muito mais abrangente - me abriram os olhos para o quanto devemos cuidar das nossas crianças deste imenso Brasil e o quanto é importante a atividade do Serviço

Social.

Fica aqui mais uma contribuição do vovô para o futuro que será de vocês.

Um agradecimento muito especial àquele que sempre me apoiou e fez com que acreditasse que um dia ainda seria um Mestre Titulado e posteriormente Doutor: Prof.

Mestre e Doutor, Silvio Nececkaite Sant’Anna.

À Professora Dra. Aldaíza Sposati, nas primeiras orientações pela paciência que demonstrou em todas as nossas reuniões e posteriormente, a iluminação da Dra.

Maria Regina Giffoni Marsiglia, no Núcleo de Saúde, na continuidade da Orientação, que com sua inteligência, idéias e sua visão plena da importância do Serviço Social no

Brasil me mostrou o caminho que deveria seguir neste trabalho.

Agradeço pelo carinho e amizade que ambas têm por minha pessoa.

Dedico esta tese ao amigo inesquecível e quase irmão, Prof. Antonio Carlos Lopes Álvares, o qual, sempre terá a minha eterna amizade.

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A palavra Saúde se origina do latim salute que significa “salvação, conservação da vida, cura, bem-estar”. A OMS – Organização Mundial de saúde definiu como um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência da doença ou enfermidade. 1

Os direitos de cidadania e particularmente os direitos sociais, são um parâmetro fundamental da vida civilizada e refletem

conquistas importantes do movimento democrático e das lutas sociais dos séculos XIX e XX.

São provas cabais de que a humanidade tem sabido construir, ao lado da exacerbação do mercado, da competição, da

violência, da exploração capitalista, formas mais dignas de convivência. Os direitos, porém, não são uma dádiva, nem uma concessão. Foram arrancados por lutas e

operações políticas complexas. Além disso, também têm funcionado como um importante fator de reprodução social e de reposição da força de trabalho: não foram

doações dos poderosos, mas um recurso com o qual os poderosos se adaptam às novas circunstâncias histórico-sociais, dobrando-se com isso, contraditoriamente, as

exigências e pressões em favor de mais vida civilizada. (Nogueira, 2005).

Tais direitos adquiridos ao longo dos séculos, conforme se observa no presente trabalho, mostra que as pessoas não estão chegando próximos à terra do Shangri-lá conhecido, mas, perdido, todavia, mostra que a luta civilizatória deve acompanhar a

modernidade tecnológica e a globalização. A fila caminha... (O autor desta tese - 2011)

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1 Fonte: Enciclopédia Mirador Internacional – SP. Enciclopédia Britânica do Brasil Publicações, 1975 v.18 p. 10.271

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Glossário de siglas:

Abepss – Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa de Serviço Social

ACS - Agentes Comunitários de Saúde

Aids - Síndrome da Imunodeficiência Adquirida

AIH - Autorização para Internação Hospitalar

AIS – Ações Integradas de Saúde

Anas – Associação Nacional dos Assistentes Sociais

ANS/MS - Agência Nacional de Saúde Suplementar do Ministério da Saúde.

Anvisa/MS - Agência Nac. de Vigilância Sanitária do Min. da Saúde

Apac - Autorização para Procedimentos de Alta Complexidade e Alto Custo

Apassp – Associação Profissional de Assistentes Sociais de São Paulo

BCG - Bacilo de Calmette e Guérin (vacina contra a tuberculose)

Bemfam - Sociedade Civil Bem-Estar Familiar no Brasil

BPA - Boletim de Produção Ambulatorial

CAP – Caixa de Aposentadoria e Pensão

CAT - Comunicação de Acidente do Trabalho

Cbas – Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais

Cefor – Centro de Formação de Trabalhadores da Saúde

Ceneas – Comissão Executiva Nacional de Entidades Sindicais de Assistentes. Sociais

Cenepi/Funasa - Centro Nacional de Epidemiologia da Fundação Nacional de Saúde

Cepal – Comissão Econômica para a América Latina

CES – Conselho Estadual de Saúde

CF – Constituição Federal

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CIB – Comissão Inter-gestores bi-partite

CID-10 - Classificação Internacional de Doenças, 10a revisão. OMS, 1993.

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CIH – Comunicação de Internação Compulsória

CIT – Comissão Inter-gestores Tri-partite

CLT – Consolidação das Leis do Trabalho

CMS – Conselho Municipal de Saúde

CMS – Conselho Municipal de Saúde

CN-DSTs/Aids/MS - Coordenação Nacional de Doenças Sexualmente Transmissíveis e Aids do Ministério da Saúde

CNS – Conselho Nacional de Saúde.

COMUDA – Conselho Municipal de Políticas de Drogas e Álcool

Conasems - Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde

CONASP – Conselho Consultivo de Administração de Saúde Previdenciária

Conass - Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde

CPO-D - Dentes Permanentes Cariados, Perdidos e Obturados aos 12 Anos de Idade

Cras - Conselho Regional de Assistentes Sociais

DATAPREV/MPAS - Empresa de Processamento de Dados da Previdência Social.

DATASUS/MS - Departamento de Informática do SUS

DN - Declaração de Nascido Vivo

DO - Declaração de Óbito

DS – Distritos de Saúde

DST – Doença sexualmente transmissível

Enesso – Encontro Nacional de Ensino de Serviço Social

FAE – Fator de Apoio ao Estado

FAM – Fator de Apoio ao Município

FAS – Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social

Fideps – Fator de Incentivo ao Desenvolvimento do Ensino de Pesquisa em Saúde

FNS – Fundo Nacional de Saúde

GED – Grupo Especial para a Descentralização

IAP – Instituto de Aposentadoria e Pensão

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INAMPS – Instituto Nacional de Previdência Social

IVH – Índice de Valorização Hospitalar

IVISA – Indice de Valorização do Impacto em Vigilância Sanitária

LBA – Legião Brasileira de Assistência

LOAS – Lei orgânica da Assistência Social

LOS – Lei Orgânica da Saúde

MAS - Pesquisa de Assistência Médico Sanitária

MPAS – Ministério da Previdência e Assistência Social

MS – Ministério da Saúde

NOB – Norma Operacional Básica

ONU – Organização das Nações Unidas

PAB – Piso Assistencial Básico

PACs – Programa de Agente Comunitário de Saúde

PBVS – Piso Básico de Vigilância Sanitária

PEC – Proposta de Emenda Constitucional

PIB – Produto Interno Bruto

PPA – Plano de Pronta Ação

Pros – Programação e Orçamentação da Saúde

PSF – Programa de Saúde da Família

PSF/Qualis – Programa de Saúde da Família

RCA – Recursos para Cobertura Ambulatorial

SAI – sistema de informações Ambulatoriais

SDS – Secretaria de Desenvolvimento Social

SESP – Serviço especial de Saúde Pública

SIH – Sistema de Informação Hospitalar

SINPAS – Sistema Nacional de Previdência Social

Sisvan – Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional

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SNAS – Secretaria Nacional de Assistência & Saúde

SUDS – sistema unificado e Descentralizado de Saúde

SUS – Sistema Único de Saúde

TFA – Teto Financeiro de Assistência

UMPS – União dos Movimentos Populares de Saúde

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Palavras chave:

1)- Público e Privado no Direito; 2) História da atenção à saúde no Brasil; 3) SUS e Saúde Suplementar no Brasil; 4) Mudanças demográficas e saúde; 5) Compartilhamento público e privado.

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Resumo

Cordeiro Filho, Antonio.

O Público e o Privado na Saúde:

“o processo de mudança da prestação de serviços de saúde no Brasil num contexto histórico e comparativo; propostas e reflexões para o futuro”.

Esta tese discute as relações entre o setor público e o setor privado de saúde no Brasil. O assunto é extenso, vem sendo discutido há várias décadas e as análises apontam para vários ângulos da questão.

O mercado de saúde suplementar no país é composto por mais de 45 milhões de beneficiários. Apesar do seu tamanho, o setor se desenvolveu à margem de um regramento oficial até 1998, com a promulgação das Leis 9.656/98 e 9.961/00.

Os agentes mais presentes nas discussões foram e vem sendo os prestadores privados de serviços na saúde. Houve alguns consensos quanto à Reforma do Estado, e na saúde, sobre o papel das agências reguladoras, no que se refere à efetividade dos contratos, pré-regulação e participação ou interferência do Judiciário no processo.

Os objetivos do trabalho foram:

a) discutir o que é conceituado como público e privado na área do direito;

b) as relações entre o sistema público e o setor privado no Brasil, desde a Colônia, até os dias atuais, após a implantação do SUS no país;

c) as implicações das mudanças demográficas para o sistema de saúde;

d) e apresentar uma proposta de compartilhamento futuro entre os setores público e o privado no sistema de saúde.

Metodologia:

recorreu-se a várias fontes e instrumentos: pesquisa bibliográfica, pesquisa documental, bancos de dados existentes, textos originários da área de história da medicina e da saúde no Brasil, artigos sobre as mudanças demográficas e sistemas de saúde em vários países e duas entrevistas com o responsável pela Associação Brasileira de Medicina de Grupo- ABRAMGE, e um ex-Diretor da Agencia Nacional de Saúde Suplementar- ANS.

Após a análise do material encontrado nas fontes pesquisadas, apresentou-se nas Considerações Finais, uma proposta de Compartilhamento futuro entre os dois setores no Brasil.

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Abstract

Cordeiro Filho, Antonio.

The Public and the Private in Health:

"The process of changing the provision of health services in Brazil in a historical and comparative context; proposals and ideas for the future."

This thesis discusses the relationship between the public and private health segment in Brazil. The matter is extensive, has been discussed for several decades and the analyses pinpoint several views of the issue.

The supplementary health insurance market in the country is made up by more than 45 million beneficiaries. Despite its size, the segment grew at the edge of an official ruling until 1998, with the enactment of Law 9656/98 and 9961/00.

The ever present agents on these discussions have been the private providers of health services. The State Reform achieved a small degree of consensus, and so did health concerning the role of regulatory agencies regarding the effectiveness of agreements, pre-regulation and involvement or interference of the Judiciary in the process.

This work was intended to:

a) discuss what is regarded as public and as private according to the legal field;

b) the relationship between the public system and the private segment in Brazil, since the Colonial Period until today, after the introduction of the Single Health System (SUS) in the country;

c) the implications of demographic changes in the health system;

d) and present a proposal for future sharing between the public and private segments in the health system.

Methodology:

several sources and tools were used: bibliographic research, document research, existing databases, texts from the areas of history of medicine and health in Brazil, articles on demographic changes and health systems in several countries, and two interviews with the head of the Brazilian Association of Group Medicine (ABRAMGE) and a former Director of the National Agency of Supplemental Health (ANS).

After examining the material found in the sources researched, a proposal for future sharing between the two segments in Brazil was presented in the Final Considerations.

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Indice

Introdução ..................................................................................................................01

Capítulo 1 – O público e o privado no Direito ........................................................08

O público e o privado na Saúde ............................................................18

A Saúde Pública e a história..................................................................22

Doenças preocupantes / A febre amarela e assemelhadas .................23

O agregado do saber médico e as escolas ...........................................25

Espaço do Terceiro Setor e cidadania – Orbitando entre o Público e

o Privado ................................................................................................26

Políticas públicas, ONG’s e PPA’s. ..................................................... 28

O aprendizado com a Igreja e a Universalização ..................................34

Capítulo 2 – Saúde no Brasil : da Colônia ao Pacto pela Saúde (2006) ..............36

Brasil – Monarquia e Saúde ..................................................................40

Criação das primeiras Escolas Superiores ...........................................41

Desenvolvimento e aumento das Escolas Superiores .........................43

A República e a Saúde .........................................................................47

As Caixas de Aposentadoria e Pensões – CAP’s ................................53

O apoio da Igreja Católica; a Filantropia e outras Instituições ..............65

O início das integrações Públicas, Privadas, ONG’s e PPA’s ...............68

Novos e antigos dados comparativos ....................................................79

O processo de unificação da Saúde Pública e a criação do SUS .........81

A descentralização do SUS ...................................................................84

O financiamento da Saúde e seus aspectos políticos e gerenciais /

Fontes, fundos e procedimentos ............................................................86

Receitas dos municípios / Próprias estabelecidas pela Constituição.....91

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Pactos / Saúde / 2006 – apresentação / Pacto pela vida – Exemplo.....93

O Pacto em defesa do SUS e o Pacto de Gestão ..................................94

Capítulo 3 – Saúde Supletiva no Brasil: relações c om a Saúde Pública ............95

Marco Regulatório – Lei 9656/98 ..........................................................105

A criação da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS ...........105

Segmentos na Saúde Privada ..............................................................111

Comentários e Avaliações gerais .........................................................123

Judicialização da Saúde .......................................................................125

Dados e reflexões ................................................................................129

A alta complexidade e as aproximações Público / Privada..................145

Convergências complementares...........................................................150

Capítulo 4 – Mudanças demográficas: repercussões no setor saúde. .............151

A construção e estudo de indicadores ................................................152

Mudanças sociais e epidemiológicas no Brasil...................................153

Mensurações demográficas gerais .....................................................153

Os idosos e a longevidade ...................................................................157

Tecnologias, genética e futuro – no caminho da Saúde Pública e

Privada ................................................................................................164

Controle das populações nos vários países e Saúde .........................167

Controle no Brasil ................................................................................167

Home Care e a A Telemedicina ..........................................................169

Custos e riscos envolvidos ..................................................................171

Análise e prospecção ..........................................................................171

A invalidez ...........................................................................................173

XV

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Capítulo 5 – Sistemas de Saúde no Mundo: custos da atenção à saúde ........174

Doenças, epidemias nos séculos XVIII e XIX ......................................176

A criação da OMS – Organização Mundial de Saúde ..........................178

Novos rumos para a Saúde no Brasil e em outros países ...................180

Gastos em Saúde .................................................................................181

Sistemas de Saúde em diferentes países – Austrália ..........................183

Nos EUA ...........................184

No Reino Unido ............... 191

Na China ...........................193

No Canadá ...................... 194

No Chile ........................... 196

Em França ....................... 198

Na Alemanha ....................199

No Japão ...........................202

Na Holanda........................203

Visão no Brasil ..................205

Cobrança do Estado para os planos de Saúde.....................................207

O Direito do consumidor no estrangeiro ...............................................208

Considerações finais – As propostas

Compartilhamento entre o Público e o Privado .....................................211

O Compartilhamento na alta complexidade ..........................................216

Outras propostas – o Capitation ............................................................218

Poupança Saúde ou Previdência Saúde ...............................................225

Padronização de Normas e Formulários ...............................................226

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Programas de Acreditação e Qualificação...............................................................227

Capitation odontológico ..........................................................................................228

Propostas para a ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar ..................... 229

O Brasil e os modelos do futuro ..............................................................................232

Anexo I – A Genética e a Declaração do Milênio ...................................................234

Anexo II – Entrevista - Dr. Arlindo de Almeida (Presidente da ABRAMGE)..........237

Anexo III – Entrevista com Dr. Fábio Fonseca – ex-Diretor da ANS .....................252

Tabelas:

Tabela I

ONG’s brasileiras / relações / agências de Cooperação / País de Origem...............30

Tabela II - Tipo de Agente financiador na composição da Receita das ONG’s........30

Tabela III – Quantidade de AIH’s por Estados ..........................................................88

Tabela IV – Grupos de interesse na Saúde ............................................................103

Tabela V – Antes da Lei 9656/98 e após a Lei ......................................................115

Tabela VI – Distribuição dos planos por segmento ................................................122

Tabela V – Distribuição de operadoras ..................................................................136

Tabela VI – Concentração de beneficiários ............................................................138

Tabela VII – Operadoras registradas / Região .......................................................147

Tabela VIII – Gasto anual per capita / Saúde .........................................................181

Gráfico:

Gráfico 1 – Fluxo Financeiro / SUS .........................................................................92

Bibliografia .............................................................................................................257

Webgrafia ..............................................................................................................267

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Introdução As mudanças na área de saúde não param, na perspectiva de atender às necessidades, oferecer melhor acolhida e solução aos problemas da população. Afinal, “saúde não tem preço”, mas não se pode esquecer que ela “tem custo”. No Brasil também muitas foram as mudanças nas últimas décadas: várias delas contempladas nas Diretrizes Operacionais dos Pactos pela Vida, em Defesa do SUS e de Gestão, firmados entre os três níveis de governo em 2006. A regionalização é diretriz do Sistema Único de Saúde e um eixo estruturante do Pacto de Gestão, devendo orientar a descentralização das ações e serviços de saúde e os processos de negociação e pactuação entre os gestores no Brasil. Os principais instrumentos de planejamento da regionalização são o Plano Diretor de Regionalização – PDR –, o Plano Diretor de Investimento – PDI – e a Programação Pactuada e Integrada da Atenção à Saúde – PPI –, detalhados no corpo daquele documento. Constitui, portanto, um processo de aprimoramento do SUS. Ele deverá expressar o desenho final do processo de identificação e reconhecimento das regiões de saúde, em suas diferentes formas, em cada estado e no Distrito Federal, objetivando a garantia do acesso, melhoria no atendimento e acolhimento, a promoção da eqüidade, a garantia da integralidade da atenção e o que é mais importante: a qualificação do processo de descentralização, a racionalização de gastos e otimização de recursos.1 Também em relação ao setor privado de saúde, o processo vem mudando, e nesse sentido, a ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, vem alterando processos, controles, cobertura de novos procedimentos, adequações de planos, e exigindo maior abrangência, acolhimento dos usuários e promoção da saúde no setor privado. Como exemplo dessa dinâmica, a partir de 28 de julho de 2011 os milhões de usuários de planos de saúde do setor privado, podem trocar de operadora sem precisar cumprir novos prazos de carência. O prazo de 90 dias estabelecido pela ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar - para que as operadoras se adaptassem à nova regra terminou no mês de julho de 2011. Há também mais de 50 procedimentos médicos novos que deverão ser atendidos pelos planos de saúde individuais. Esses movimentos nos setores - público e privado - da saúde levam a entrelaçamentos que serão apresentados neste trabalho, e que podem apontar para futuros compartilhamentos, alguns dos quais até já estão existindo, mas por meio de processos ainda não visíveis a todos. Na atividade pública de saúde essa dinâmica caminha também a passos largos. O SUS não pode ser invisível pela população, meios acadêmicos e outros conjuntos da sociedade. A revista inglesa The Lancet registrou para a comunidade internacional a experiência brasileira de construção de um sistema único e universalizado de saúde. Há diversos artigos de pesquisadores que analisam a situação epidemiológica do Brasil, ressaltando os avanços na saúde materno-infantil, os sucessos e desafios no combate às doenças infecciosas e crônicas, os impactos individuais e coletivos da

1 - Série - Pactos pela Saúde – 2006 - volume 1

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violência. O desafio da saúde brasileira é político, de articulação entre governos e sociedade e de revisão das relações que subordinam o público ao privado, alertam os pesquisadores ingleses. 2 Os projetos de pesquisa já envolvem analises e preocupações com as relações entre a saúde e o meio ambiente, como pode ser conformado pelos trabalhos apresentados no 5.º Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde (USP, abril de 2011). Os estudos realizados pelo capital sobre as áreas sociais, como é o caso da saúde, devem também conter uma visão humanista e social e seus resultados aplicados com o objetivo de proporcionar melhores condições de trabalho, higiene, saúde e segurança às pessoas que enfrentam diariamente jornadas de trabalho. As obras da Usina de Jirau, em Rondônia, é um exemplo recente de como as mega empreiteiras brasileiras são capazes de submeter trabalhadores a condições indignas de vida e trabalho: alojamentos inadequados, falta de equipamentos de segurança, tempo para refeições, jornadas extenuantes sem pagamento de horas extras e agressões físicas, estão entre as irregularidades encontradas pelo Ministério Público. Isso também é problema de saúde a ser enfrentado. Tudo, socialmente, está entrelaçado. 3 Essas discussões ocorrem em muitos países. Um exemplo é do hospital privado australiano que irá compartilhar serviços com o setor público, tendo em vista reduzir as lacunas de atendimento na região de Queensland. É de certa forma um compartilhamento por regionalização. Outro hospital está em construção em Kawana, na Austrália, um hospital privado no qual haverá um compartilhamento do corpo clínico com hospitais públicos. A obra é estimada em 20 milhões de dólares australianos, cujo valor se aproxima de 33,5 milhões de reais e deverá estar terminado em 2014. A troca de profissionais irá reduzir a lacuna por serviços em Queensland, melhorará o atendimento e vem ao encontro das necessidades da crescente população idosa. Este é um exemplo de inovação e criatividade que passa por cima de convenções, ideologias e situações criadas, provando que a necessidade das partes interessadas é o que importa e que deve comandar as decisões políticas e administrativas.

A preocupação e discussão sobre a área de saúde é constante e vem de longe. A Administração em Saúde é um assunto muito discutido hoje no Brasil, e as bases de sua prática têm raízes nos Estados Unidos, na visão norte-americana de como os recursos para a saúde devem ser planejados e distribuídos, embora os americanos, na atualidade não possam ser espelho de saúde para a sua população. A primeira fase teve seu início em 1923, quando um pequeno número de médicos brasileiros voltou ao país após graduarem-se em saúde pública na renomada universidade norte-americana de John Hopkins.

Nesse mesmo ano, um grande congresso médico reuniu especialistas em saúde pública de todo o país em Belo Horizonte. Nessa ocasião, os conceitos trazidos do exterior foram divulgados nacionalmente. Um dos principais conceitos divulgados foi o

2 - Fonte: Revista Radis – número 107 – julho de 2011 – Editorial. 3 - Fonte: Revista Radis – número 107 – julho de 2011 – Editorial.

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do "health center", adotado e traduzido para a nossa realidade como o "Centro de Saúde", que dominou a saúde pública brasileira durante cinqüenta anos, a partir de então. Dentre os brasileiros ilustres que estudaram nessa universidade destacava-se o médico Marcolino Candau4 um dos mentores da criação e o primeiro diretor-geral da Organização Mundial da Saúde, cargo que ocupou durante 25 anos, até meados da década de 1970.

Mas até então médicos de várias especialidades dedicavam-se, de forma superficial e não especializada, ao trabalho administrativo, que muitas vezes era diretamente relacionado à prática médica, como por exemplo, os médicos coordenadores dos antigos Institutos de Aposentadoria e Pensões nos anos 30. O primeiro curso universitário para formação de administradores hospitalares foi criado nos Estados Unidos no ano de 1934, na Universidade de Chicago. Desde então, mais de duas centenas de cursos de graduação e pós-graduação surgiram nos Estados Unidos, movimento que se ampliou globalmente.

Por outro lado, na atualidade, existe uma preocupação dos médicos e de suas entidades representativas, como a Associação Médica Brasileira (AMB), em reavaliar constantemente os procedimentos e terapêuticas, substituindo-os por outros de maior eficácia e com menor possibilidade de efeitos adversos. Isso justifica a retirada da prática clínica de equipamentos obsoletos e a incorporação de outros mais modernos e eficientes. A AMB e o CFM trabalham num rol de procedimentos, batizado de Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos, com o objetivo de informar e disponibilizar para os cidadãos a integralidade da medicina moderna. A elaboração dessa lista segue parâmetros técnicos e científicos. São critérios como estes que norteiam decisões públicas que interferem na saúde da população.

Com base na minha experiência de muitos anos como profissional Atuário e Diretor de empresa do setor de prestação de serviços na saúde - operadora – detectamos as necessidades presentes e futuras dos setores abrangidos, quais sejam as operadoras ou empresas de assistência médica, e buscamos compreender o que pensam os gestores do setor privado sobre os vários aspectos da regulamentação da ANS atualmente em vigor. Muitas foram as discussões a respeito e algumas delas foram apresentadas previamente aos gestores das empresas operadoras de assistência à saúde, o que enriqueceu o debate, sobre os seguintes aspectos:

4 Para evitar a falsa impressão de que o Brasil não contou com importantes figuras nas organizações relacionadas com as Nações Unidas, mencionam-se algumas que exerceram um papel relevante neste cenário internacional, destacando-se outros que também prestaram importantes serviços para todo o mundo. O que se lamenta é que só recentemente vem se reconhecendo que o Brasil, como um dos países emergentes, deve assumir maiores responsabilidades, pois dispõe de profissionais que vinham se concentrando em assuntos brasileiros, mas que podem ampliar suas influências internacionais. Um dos primeiros brasileiros foi o Dr. Marcolino Gomes Candau, ex- diretor geral da Organização Mundial de Saúde em Genève, na Suíça, que ficou no seu comando por longos vinte anos de forma que a instituição ficou conhecida pela participação dos brasileiros. (Fonte: site da Ásia comentada por Paulo Yakota). http://www.asiacomentada.com.br/2011/06/brasileiros-importantes-nos-organismos-das-nacões-unidas/ (Acessado em 02/08/2011).

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a) Possibilidades de assegurar ao beneficiário, cobertura integral e regular às condições de acesso aos planos de saúde; como reagem os operadores relativamente ao aumento do alcance da ANS em relação a sua interface de trabalho com a população e o Ministério da Saúde; o que pensam as operadoras sobre a definição e o controle das condições de ingresso, operação e saída das empresas e entidades que operam no mercado; b) Verificação da validade e do funcionamento dos mecanismos legais de garantias assistenciais e financeiras, como as provisões obrigatórias, que assegurem a continuidade da prestação dos serviços de assistência à saúde contratados e os que poderão advir de novas contratações; c) Transparência e garantia da integração do setor de saúde suplementar ao SUS de forma compartilhada e o ressarcimento de gastos gerados por beneficiários do sistema público que são portadores de planos de saúde; d) O que pensam os operadores sobre o estabelecimento de mecanismos de controle e abuso de preços e a satisfação das necessidades do sistema de regulamentação, normatização e fiscalização do setor de saúde suplementar; e) Posicionamento da ANS face aos problemas de prestação de serviços em saúde no geral e sua posição em relação a saúde das camadas de maior poder aquisitivo, e discussões sobre o duplo pagamento, ou seja, recolhimentos ao INSS e, ao mesmo tempo, pagamento de um plano ou seguro de saúde; f) Alta complexidade, seus custos e suas implicações de impacto no sistema geral de assistência à saúde e verificação da perspectiva de aumento da quantidade de beneficiários, fazendo alterações no status quo; g) Discussão das possibilidades de apresentar “fatores moderadores”, flexibilização de coberturas, na utilização de planos via empresas com o objetivo de reduzir preços finais; h) Verificação das relações de compartilhamento entre o que acontece na saúde suplementar e o que acontece na saúde pública e análise do posicionamento da ANS em relação à prestação de serviços de saúde aos brasileiros; i) Reflexão sobre o atual estágio da saúde suplementar e sobre os atores corporativos para que se possa tomar novas decisões de direcionamento e rediscussão das possibilidades de reduções consideráveis nos preços dos planos de saúde em vista de novas estratégias que possam ser adotadas, aumentando o mutualismo com planos empresariais coletivos - na forma do capitation - oferecidos para as micros, pequenas e médias empresas; j) Considerações se a alta complexidade é um entrave comercial para o desenvolvimento do mercado e das pequenas operadoras de planos de saúde ou é benéfica.

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k) Modelos econométricos mais sofisticados para obtenção de precificações de planos, conforme histórico do usuário e tempo de exposição ao risco. l) Questionamento sobre a necessidade ou não de um índice econômico somente para o setor de saúde com o objetivo de deixar claro aos consumidores os problemas gerados por aumento ou reajuste das mensalidades. As Políticas de saúde, por sua vez, não podem passar apenas por negociações políticas nem merecer tratamento meramente econômico. Se não houver critérios técnico-científicos, não se consolidará um SUS integral e de qualidade. O processo de discussão entre o público e o privado e sua visão no Direito, com destaque para a saúde, é tema fundamental de discussão e debate nas políticas de saúde. Eles são identificados como relativos à bioética e suas formas de enxergá-los, de tratá-los, da saúde das pessoas e de como viver melhor. Pesquisar e refletir sobre essas relações públicas e privadas faz parte do processo de todas as sociedades. As mudanças demográficas, as aglomerações nas grandes cidades, o processo de saúde versus doença estão na pauta das discussões também. A Constituição Federal de 1988 definiu claramente o conceito de saúde e estabeleceu o Sistema Único de Saúde – SUS - ampliando as ações que tiveram como meta a promoção e proteção social da saúde, equidade, maior visão sanitária e com isto, promover a justiça social. mas chegar até aí foi um caminho árduo, difícil. Quanto ao setor privado na Saúde, a Constituição de 1988 também deixou claro que ele poderia conviver com o setor público. Juntos poderiam melhorar o quadro de saúde no Brasil. Vinte e cinco anos depois há ainda muitas arestas para serem aparadas, mas o eixo central está contemplado. No Brasil, o aumento da população e consequentemente das famílias, por exemplo, foi uma necessidade contemplada pela NOB/96, mas as experiências começaram a desenvolver-se a partir de 1994, com objetivos de ampliar o que se denominava de Atenção Básica em Saúde. Destinaram-se mais recursos federais para implantação de equipes de um novo programa, que se denominou Programa de Saúde da Família. Considerando-se as mudanças demográficas no país e seus reflexos na saúde, percebe-se que será necessário dar atenção ao envelhecimento, não só sobre os aspectos de saúde, mas também emprego, proteção, previdência, seguros, bens de consumo, qualidade de vida e hospitais especializados. Enfim, uma estrutura de saúde, pública e privada, bem diferente da atual, será necessária nos próximos 30 anos. A profissão de “cuidador”, com certeza, será bem vinda, e brevemente deverá contar até com sindicatos, piso mínimo e outros elementos vinculados a estrutura do trabalho de ocupações especializadas.

A longevidade é um fenômeno que está acontecendo há algumas décadas. É um processo que se destaca em vários países. Nota-se, nos estudos de Demografia, que a cada censo, opera-se uma taxa de mortalidade diferente e que está havendo óbitos mais tardiamente. Os estudos levam a crer e convém frisar que os critérios para caracterização da estrutura etária de uma população são bastante variados para efeito

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de análise. Um destes critérios é o que caracteriza a população em progressiva, estacionária e regressiva, cujas descrições mais completas fazem parte do capítulo 3 deste trabalho. O índice de envelhecimento de uma população é apresentado como a relação entre o número de pessoas com mais de 60 anos ou mais e o de jovens, com menos de 20 anos. Segundo a ONU uma população está envelhecendo quando 7% de seus habitantes passam de 65 anos. De resto o que é permitido em termos de comparações entre o Brasil e outros países, aponta para novos ideários, políticas, controles, também fazem parte das considerações finais. Fica claro, todavia, que o assunto é inesgotável e em todos os países do mundo a Saúde, tanto pública, como privada são partes do processo de idealização que todos desejam, mas difíceis de atingir. Os objetivos deste trabalho foram: Geral: discutir o que é conceituado como público e privado; Específicos: a) o que a história do setor saúde no mundo e no Brasil apontam sobre a questão; b) quais os desafios que se apresentam para o desenvolvimento do setor privado no país; c) discutir a regulamentação que a Agência Nacional de Saúde Suplementar- ANS vem desenvolvendo em relação ao funcionamento do setor privado; d) apresentar uma proposta para as relações entre esses setores no futuro. Para tanto, desenvolveu-se a seguinte Metodologia: a) pesquisa bibliográfica: discussões filosóficas originárias da área do Direito, a respeito do que é definido como Público e Privado e, suas análises na saúde e na sociedade; b) acesso a bancos de dados e pesquisas qualitativas sobre o tema; c) pesquisas sobre o crescimento populacional e envelhecimento da população, bem como de suas repercussões sobre o sistema de saúde, como referência complementar; d) resgate histórico sobre a atenção à saúde no Brasil, desde o período Colonial até a definição do Pacto pela Vida, Saúde e SUS (2006), considerando as várias Constituições Federais do país até a Constituição de 1988; e) referências sobre como outros países vêm enfrentando as consequências das mudanças demográficas da população e dos custos crescentes da atenção à saúde; f) duas entrevistas semi-estruturadas: uma com o Diretor da ABRAMGE – Associação Brasileira das Empresas de Medicina de Grupo, uma das modalidades de atenção à saúde do setor privado no país, e outra com um ex-Diretor da ANS Agência Nacional de Saúde Suplementar. No capítulo 1: abordagens e as discussões filosóficas sobre a questão do Público e do Privado na área do Direito. No capítulo 2: contempla-se a trajetória histórica do sistema de atenção à saúde no Brasil, desde o período colonial, até os dias atuais, considerando a definição e

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implantação do Sistema Único de Saúde em 1988 e a aprovação do Pacto intergovernamental pela Vida, em defesa do SUS e pela gestão do sistema, em 2006. No capítulo 3: concentram-se as discussões e informações sobre o Sistema Supletivo de Saúde no país, especialmente no que se refere aos processos de regulamentação de suas atividades pela ANS. No capítulo 4: ressaltam-se as mudanças demográficas que estão ocorrendo no mundo e no país, especialmente com o envelhecimento da população, e as repercussões desses processos na atenção à saúde e nos custos financeiros do sistema de saúde. No capítulo 5: apresentam-se os sistemas de saúde dos diversos países e como estão enfrentando as mudanças demográficas, epidemiológicas e os custos crescentes de assistência à saúde. Considerações Finais: partindo das discussões apresentadas nos capítulos anteriores, apresentamos uma proposta de compartilhamento entre o setor público e o privado no Brasil, denominado de Captation.

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CAPÍTULO 1 O público e o privado no Direito Qualquer que seja a reflexão ou discussão a mesma deve ser dirigida ao ser humano, centro natural de tudo que se objetiva. O foco deve ser em seu sentido mais amplo, considerando suas necessidades, alegrias, angústias e principalmente seus direitos. Numa breve abordagem histórica, vamos encontrar traços das declarações de direito nos forais e até em cartas de franquia da idade média. A opressão do absolutismo sempre foi mola mestra dessas declarações. Existem algumas como a Declaração do Estado de Virgínia em junho de 1776, todavia a mais conhecida é a dos Direitos do Cidadão de 1789, editada pela Revolução Francesa. 5 Os direitos fundamentais ou direitos dos homens são os direitos subjetivos dos indivíduos que vinculam e limitam o exercício do poder do Estado e dos particulares. O entendimento maior é o de direitos civis, políticos e de cidadania. Direito à vida, direito à privacidade, a integridade moral e cívica. Tais direitos são pressupostos elementares de uma vida humana livre, tendo por objetivo a autonomia das pessoas que é a liberdade face ao Estado para se ter uma vida digna. Esses são os paradigmas institucionalmente garantidos e limitados no espaço temporal independentemente se isto ocorre em virtude da atuação de um poder privado ou do público. Os Direitos Fundamentais estão inseridos dentro daquilo que o Constitucionalismo denomina de princípios constitucionais fundamentais, que são os princípios que guardam os valores fundamentais da Ordem Jurídica. Bobbio (1987) diz que o problema da discussão e dialética dos Direitos Fundamentais teve sua solução atual na Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada em Assembléia Geral das Nações Unidas em 10/12/1948, onde se lê a proclamação dos direitos pessoais dos indivíduos. Numa parte o direito à vida, à liberdade e à segurança. Em outra parte encontram-se expostos os direitos do indivíduo em face das coletividades: direito à nacionalidade, direito de asilo para todo aquele perseguido com exceção de crime de direito comum, direito de livre circulação e de residência, tanto no interior como no exterior e finalmente o direito de propriedade. Mais à frente em outro grupo são expostas a liberdade pública e os direitos públicos: liberdade de pensamento, de consciência e religião, de opinião e de expressão, de reunião e de associação, princípio na direção dos negócios públicos e finalmente figuram os direitos econômicos e sociais: Direito ao trabalho, à sindicalização, ao repouso, à saúde e à educação.

5 Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 – Os representantes do povo francês, constituídos em assembléia nacional, considerando que a ignorância, o esquecimento ou o desprezo dos direitos do homem são as únicas causas das desgraças públicas e da corrupção dos governos, resolveram expor em declaração solene os Direitos naturais, inalienáveis e sagrados do Homem, a fim de que esta declaração, constantemente presente em todos os membros do corpo social, lhes lembre sem cessar os seus direitos e os seus deveres; a fim de que os atos do Poder legislativo e do Poder executivo, as instituições políticas sejam por isso mais respeitados; a fim de que as reclamações dos cidadãos, doravante fundadas em princípios simples e incontestáveis, se dirijam sempre à conservação da Constituição e à felicidade geral. http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/legislacao-pfdc/docs_declaracoes/declar_dir_homem_cidadao.pdf (acessado em 15/05/2009).

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Havendo subordinação de alguma das partes seu poder de autodeterminação resta aniquilado, não havendo como se cogitar de aplicação do princípio da liberdade. (Guimarães 2006) Como é que se poderia imaginar que qualquer pessoa teria sua dignidade garantida se não lhe fosse assegurada por Direito, decente qualidade de vida? Por isso o Direito é o principal objetivo – instrumento normativo – de concretização do discurso e das promessas políticas. O Direito serve à Política, mas o Direito é o limite da Política. 6 Se não lhe fosse garantida sadia qualidade de vida, como é que se poderia afirmar a dignidade? A dignidade humana é um valor já preenchido a priori, isto é, todo ser humano tem dignidade só pelo fato de já ser pessoa, pois como se diz, é difícil a fixação semântica do sentido de dignidade, mas isso não implica que ela possa ser violada. Os direitos fundamentais nasceram para a defesa de uma esfera de liberdade dos particulares em face do Estado. Toda a teoria geral dos direitos fundamentais se construiu em torno deste paradigma. Entretanto, com o desenvolvimento da sociedade, esta, cada vez mais, passa a ter uma participação ativa no exercício do poder, antes adstrito ao Estado. Nessa esteira, passa a liberdade individual a ser ameaçada não só pela ingerência estatal, mas também pelos entes privados detentores de uma parcela deste poder. A partir desta constatação, passaram a doutrina e a jurisprudência a se ver defrontadas com casos em que um ente particular invade a esfera de liberdade individual de outro, trazendo à baila a questão de se verificar até que ponto também os particulares estão vinculados aos direitos fundamentais de uns em relação aos outros. Casos há em que tal vinculação se demonstra mais cristalina, como a questão dos direitos dos trabalhadores, que a Constituição expressamente apresenta. Em outros casos, tal vinculação não se mostra tão clara, exigindo maiores reflexões para a sua configuração.7 Os direitos fundamentais constitucionais são tão importantes que Guimarães (2006), citando Paulo Bonavides,8 diz: “Os direitos fundamentais são a bússola das Constituições e a pior das inconstitucionalidades não deriva, porém, da inconstitucionalidade formal, mas da inconstitucionalidade material, deveras contumaz nos países em desenvolvimento ou subdesenvolvimento, onde as estruturas constitucionais, habitualmente instáveis e movediças, são vulneráveis aos reflexos que os fatores econômicos, políticos e financeiros sobre elas projetam.” A teoria dos deveres de proteção, de forma geral, reconduz os problemas da tutela dos direitos fundamentais às relações entre indivíduo e Estado, entre o Público e o

6 Idem 1 7 Dr. Luis Carlos Martins Alves Jr. Resumo de artigo na revista do site: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=11853 ( acessado em 15/05/2009) 8 Curso de Direito Constitucional – 13ª. Edição - Malheiros Editores, pág. 601

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Privado e entre o Cidadão9 e o Privado. O Estado não tem apenas o dever de respeitar os direitos fundamentais dos cidadãos, mas tem o dever de fazer com que os outros cidadãos os respeitem, e quando não impede a lesão de um direito fundamental por um particular, na verdade, está a permiti-la, participando assim da violação. (Guimarães 2006). Marshall, (1967) sociólogo britânico, que analisou o desenvolvimento da cidadania como desenvolvimento de direitos civis, seguidos dos direitos políticos nos séculos XVIII, XIX, introduziu o conceito de direitos sociais, sustentando que a cidadania só é plena se é dotada de todos os três tipos de direitos e esta condição está ligada à classe social. 10 Segundo o autor, a cidadania seria composta pelos direitos civis e políticos – direitos de primeira geração – e pelos direitos sociais, direitos de segunda geração. Na segunda metade do nosso século, surgiram os chamados direitos de terceira geração. Trata-se dos direitos que têm como titular não o indivíduo, mas grupos humanos como o povo, a nação, coletividades étnicas ou a própria humanidade. 11 Numa ampliação do Direito, no Brasil, houve a inserção dos Direitos da Personalidade na “Carta Magna” de 1988 que consagra o instituto jurídico em que: os direitos da personalidade, devido ao seu caráter não patrimonial, têm por objeto bens integrantes da interioridade da pessoa, isto é, aquilo que é inato à pessoa e deve ser tutelado pelo Direito. Justamente por serem inerentes à pessoa, caracterizam-se tais direitos por serem absolutos. Os Direitos de personalidade constituem um ramo do Direito Privado que protege, na esfera jurídica, os objetos de Direito que pertencem à natureza humana, tais como a vida, a inteligência, a moral, a autoestima, a dignidade. Nessa mesma linha de raciocínio estão outros juristas, os quais defendem que a terminologia correta no Código Civil deveria ser Direito da humanidade e não Direitos da personalidade, já que o objeto desses direitos refere-se à humanidade, não ao indivíduo isolado. Devem ser acrescidos ainda os direitos atinentes ao próprio homem, em seus aspectos moral, intelectual e físico. 12 A análise não é muito simples. Quando se deseja posicionar o Direito em relação ao Público e ao Privado, principalmente sob o ponto de vista Constitucional entra-se em seara mais complexa. O processo de evolução é contínuo e já existem os Direitos de quarta geração. Esses direitos são identificados como relativos à bioética, dessa forma tentam impedir a destruição da vida e regular a criação de novas formas de vida em laboratório. Eles podem consistir no direito à autodeterminação, direito ao patrimônio comum da humanidade, direito a um ambiente saudável e sustentável, direito à paz e ao desenvolvimento. Necessário pesquisar e refletir sobre essas relações públicas e privadas. 9 Sugere-se ler “Citizenship and Social Class and Other Essays” – ensaio de 1950 de Thomas Humphrey Marshall – sobre cidadania – Cambridge Cup. 10 Marshall e os direitos da cidadania – A cidadania tem assumido historicamente várias formas de função nos diferentes contextos culturais. O conceito de cidadania, enquanto direito a ter direitos, tem se prestado a diversas interpretações. Entre elas, tornou-se clássica a concepção de T.H. Marshall, que, analisando o caso inglês e sem pretensão de universalidade, generalizou a noção de cidadania e de seus elementos constitutivos. (Marshal, 1967). 11 Marshall, T.H. (1967) – Cidadania, Classe Social e Status. RJ – Zahar Editores. 12 Dr. Thiago Baldani G. de Filippo em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=11853 ( acessado em 15/05/2009)

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O que é Público? O que é Privado? Ambos no contexto da Saúde, por exemplo – objeto deste trabalho. Qual a natureza do trabalho em Saúde? Pelas suas características deve ser somente Pública ou podem existir compartilhamentos? Há limite para a Saúde Privada? Até onde deve ir a Saúde Pública? Como essas relações econômicas e políticas na saúde aconteceram nos séculos passados? Não há como desvencilhar esse novelo histórico sem pesquisar e desenvolver dados e retrospectivamente às sociedades ocidentais de várias épocas as quais vão desde o século XVII até o século XX e chegando à atualidade, com clareza de objetivo final, para que tenhamos uma visão ampla e dialética da formação do que é o público e do que é o privado. Para se ter uma visão abrangente dos embates e discussões sobre o Público e o Privado é fundamental acompanhar a história dos Estados antes e depois das revoluções, desde o século XVII, com sentido democrático ou não, acontecidas no mundo, principalmente e retrospectivamente, na Europa. A abordagem inicial deve privilegiar a história das instituições, atores, coadjuvantes e protagonistas. Na definição de Jepperson (1991)13 , instituições são sistemas de regras socialmente construídas e reproduzidas rotineiramente que operam como ambientes limitadores e são acompanhadas de eventos tidos como dados. É na perspectiva mais ampla das instituições como regras do jogo ou como limites que estruturam a interação humana que o conceito de instituição é incorporado à análise de políticas públicas e é dessa forma que foi considerado no estudo da política de assistência à saúde.14 Menecucci (2007). É necessário conceituar e definir também o que é território público e território privado, pois ele é elemento de partida. Tal situação está ligada ao que é particular e ao que é coletivo. Duas instâncias distintas devem ser as opções para análise: o Estado e a sociedade civil, que de forma representativa, constituíram a efetiva aplicação do processamento jurídico. A sociedade civil poderá ser encarada como a instância das necessidades sociais em que a gênese aos antagonismos econômicos pode gerar conflitos que poderão acontecer em várias áreas. No caso específico, um desses conflitos é a Saúde. O termo privado, em oposição a público, foi associado a idéia de mercado: lugar dos produtores privados, individuais, desprovidos da função ou da dimensão pública (estatal). Privado assume desse modo, um forte vínculo com a produção e circulação de mercadorias e serviços, como o espaço em que operam produtores e consumidores, individuais e ou coletivos, atuando em seus interesses mais imediatos e diretos. (Aciole 2006)

13 Apud – Menecucci (2007) – Telma M.G. – pág. 24 14 Menecucci (2007) – pág. 25 e Apud Pierson, 1993, 1994.

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Romano (1979) aponta que existem três matizes na análise para as questões que envolvem a sociedade civil e o Estado. A marxista, a liberal e a foucaultiana.15 No caso, a marxista, diz Liguori (2009)16 que o tema da sociedade civil tornou-se o centro do debate cultural e político no âmbito da chamada revolução neoconservadora ou neoliberal. Opondo-se radicalmente à concepção do Estado enquanto sujeito ampliado, para usar uma expressão gramsciana, essa discussão sustenta uma supremacia da sociedade civil, significando tal supremacia uma forte reivindicação do não estatal, de sua maior atuação na vida econômica, no mercado, em contraposição ao Estado do bem-estar social. O conceito de sociedade civil também foi fundamental para o processo de redefinição, antes de tudo cultural, por parte de uma determinada esquerda – que, por sua conta demonstrou a necessidade de abandonar o paradigma interpretativo ligado ao conceito de classe. Em suma, as concepções que se impõem majoritariamente dentro da esquerda são de matizes liberais e sinteticamente indicamos como sendo a supremacia da sociedade civil sobre o Estado; a superioridade do econômico sobre o político; do privado sobre o público; do mercado sobre a programação estatal e podemos dizer ainda, conjuntamente com Marx, do burguês sobre o cidadão. Tais tendências triunfaram no ano de 1989, com a crise dos modelos hiperestatistas e autoritários do socialismo real e com os limites de gestão governamental apresentados pelos países social democratas do Welfare State sob o foco liberal. A cultura da política da direita tornou-se preponderante em forma e conteúdo, sobre a esquerda. Na verdade, para fugir do conceito de classe, a idéia de cidadania desde então se tornou central para essa determinada esquerda liberal. Na teoria do indivíduo – também entendido como ser humano – que faz parte de uma comunidade política nacional, proveniente do liberalismo clássico, o cidadão aparece fortificado enquanto portador dos direitos aparentemente iguais e inalienáveis. Por outro lado, segundo Foucault,17 o Estado é algo imaginário. Não existe a macro-realidade, mas sim a fragmentação do poder localizado. A família, as instituições, agremiações e nos dias de hoje poderíamos citar as organizações não governamentais, empresas. Nos modelos mais próximos do neoliberal essas visões são um pouco atenuadas. Na antiguidade, a separação entre o público e o privado nasce na sociedade grega e se manifesta sob o ponto de vista da privacidade. O cidadão grego pertencia a duas ordens de existência rigorosamente separadas: sua vida privada, própria do indivíduo, e a sua vida política, comum a todos. A esfera privada estava ligada a casa, tanto pelo nome quanto pela posse de bens de produção como terra. (Aciole – 2006).

15 Michel Foucault critica o pensamento liberal, seguindo modelos do positivismo ou teorias produzidas por marxistas. Ele afirma que o poder é fracionado. Depreende-se de seus textos que: existe uma fragmentação institucional e alguns seguidores dizem até que “o Estado não existe” – é um “ser imaginário”. (Romano – pág. 24) Sugere-se ler também a Microfísica do Poder de Michel Foucault. 16 Apud - originalmente em G. Petrônio & M.P. Musitelli – (orgs.), Marx e Gramsci: memória e attualitá (Roma) – Manifesto libri – 2001 – PP.69-80 – tradução de Tatiana Fonseca Oliveira – acessado em 01/07/2009. 17 Apud – Romano – pág. 24 – O Público e o Privado – Edit. Hucitec - 2005

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J. Habermas (1984) apresenta pensamento semelhante à Foucault (1994), no que se refere ao público como aquela instituição – estatal formada pela burguesia – e que – pressionando o Estado, promove políticas que sejam de interesse da sociedade civil – limitando assim, o Estado. A instituição estatal teria como contrapartida a chamada opinião pública, a qual se define pelo conjunto dos cidadãos burgueses que pressionam as decisões políticas por meio do diálogo na sociedade civil e nos parlamentos, o que resulta em limitar o Estado. As propostas de Habermas (1984) ligam-se à universalização trazida pelo século XVIII e não por acaso um dos autores mais freqüentados por ele é Kant, sobretudo nas distinções entre o público e o privado, apresentadas pelo filósofo crítico. (Romano – 1979). A partir daí é que se consolidam duas forças: o mercado ou o capitalismo, e a imprensa. Romano, (1979), destaca que Habermas (1984), diz que o termo “público”, é um semeador de polissemias, com grande número de significados. Há outros autores como, por exemplo, Dorner (1974)18 citado por Romano (1979) que modifica as proposições de Foucault (1994) e Habermas (1984). Ele torna o debate mais equilibrado. Os termos “recepção pública”, “opinião pública”, “renome público”, “prédio público ou estatal”, operam o sentido de comum, de interesse geral, coletivo. A idéia do coletivo, daquilo que é comum, nos remete, na Saúde, principalmente ao princípio de universalização do direito. Recordemos que se, para os gregos, a função de legislar não pertencia à esfera pública, na sociedade moderna essa função não só não adquire tal caráter, como acaba por perdê-lo. A solução dada para a vida em comum nas sociedades capitalistas ocidentais passa pela separação entre a sociedade e os espaços institucionais que se vão corporificando em grandes estruturas. Assim os modernos parlamentos, embora adquiram ares de representação para a sociedade, na verdade, sequer parecem reais para a maioria dos cidadãos comuns. (Bobbio, 1987).19 Aciole (2006) complementa que a partir das idéias de coletivo, de pertencimento comum, e de opinião pública, podemos emprestar a uma coisa ou a um indivíduo uma força de significação, quando lhe ressaltamos uma atribuição de caráter público, ou de importância para o coletivo (Habermas, 1984). Essa significação dá lugar, força e valor intangível a bens, como a saúde, que adquire importância pública, coletiva, mas que não leva, necessariamente, à supremacia da saúde pública. Ao empregarmos a palavra “público” em expressões como serviço público ou saúde pública ela se sobrepõe, quase que imediatamente, à idéia de pertencimento coletivo, que carrega significados implícitos. Correlato da idéia de que se é de todos não é de ninguém, em particular, todos indistintamente possam gozar da sensação de que a possuem, ou seja, a materialidade do pertencimento coletivo está também na privacidade do gozo e usufruto não só como sensação, mas como consumo de serviços e ações concretas que poderão ser compartilhadas por todos,

18 Dorner , Klaus – Psiquiatra – Livro “Cidadãos e Loucos” – Editora Taurus – Ano 1974 19 Apud em Aciole – pág. 61

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simultaneamente. Há vários exemplos. Estádio Municipal do Pacaembu, Hospital das Clínicas e outros. Relativamente aos investimentos em infraestrutura podemos destacar a grande demanda existente para prover a sociedade de serviços como educação e saúde, por exemplo. Essas são algumas aberturas de licitações públicas em que o sistema privado de serviços aproveita - nem que sejam de forma parcial – para ajudar a resolver inúmeros problemas em áreas em que os governantes não têm como dar velocidade às demandas dos países. Isso acontece na Educação, na Saúde, na Infra Estrutura e muitas outras áreas, inclusive a da comunicação com as populações. Conforme Aciole (2006), tal situação acontece no momento em que se encerra a etapa liberal do desenvolvimento do capitalismo, revelando seus principais defeitos: a sua incapacidade para proporcionar o pleno emprego, e a sua arbitrária e desigual distribuição de riqueza e das rendas. Nesta etapa, as formulações keynesianas revelam a compreensão de que o Estado deve cooperar com a iniciativa privada, embora jamais justifiquem um socialismo do Estado abrangendo a maior parte da vida econômica da nação. Para Keynes (1996)20, não é a propriedade dos meios de produção que convém ao Estado assumir. Suficiente é que seja capaz de determinar o montante agregado de recursos destinados a aumentar esses meios e a taxa básica de remuneração aos seus detentores e terá realizado o que lhe compete.

A Saúde – nosso objeto - é um bordado de tudo isso como uma teia complexa e talvez o mais evidente seja de urgência coletiva. São muitos os exemplos que acontecem e muitos serão os descritos que já se sucederam no passado. Sader (2000)21 afirma que:

“uma das características das transformações do campo teórico sob a hegemonia neoliberal foi a da centralidade do debate em torno do par Estatal-Privado. Como quer que sejam definidas as esferas públicas e privada, a diferenciação entre elas pode ser interpretada como refletindo o que pertence ao grupo enquanto tal, à coletividade, e o que pertence a seus membros individuais ou, de forma mais geral, entre a sociedade global e eventuais grupos como a família, por exemplo, ou ainda entre um poder central superior e poderes periféricos inferiores, que tenham relativa autonomia em relação àquele”.

Na saúde como questão de caráter social, com exigências de serviços, prestadores, profissionais, hospitais, empresas para diagnósticos envolvendo o mercado de bens e serviços para a coletividade, isso tudo tem um soar de Público e também de Privado.

Partindo de um pressuposto democrático, presumem-se os conceitos de Público e Privado, os quais não se limitam ao âmbito do Estado, mas incluem a cidadania.

20 Apud – Aciolle – Keynes J.M. – A teoria geral do emprego, do juro e da moeda. SP – Nova Cultural – 1996 – 352 pp. (Coleção os Economistas). 21 Sader , Emir Simão

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Entende-se que a vida pública não é feita apenas de atos de governo, mas também da atividade cidadã.22 23

Em todo caso, a participação cidadã não pode circunscrever-se apenas à expressão de interesses setoriais. A primeira pergunta que abre esse ponto assinala a condição de cidadania como algo que concerne diretamente à res pública. Apela, pois, aos sujeitos sociais, enquanto cidadãos, ocupados na promoção e defesa de interesses públicos. Experiências como a do “orçamento participativo” ou dos “comitês municipais de Saúde”, em vários municípios do Brasil, assim como múltiplas práticas em outros países, ilustram intervenções orgânicas nesse sentido. (Pereira, Grau – 1999). É preciso saber onde a sociedade está nessa mistura de relações. Com a Internet, o cidadão torna-se mais ainda distante daquilo que ele poderia pensar como espaço público, pois há um novo elemento: o virtual. A confusão para o homem comum e distante de maiores elucidações acadêmicas torna-se ainda maior quando ele opera o computador para fazer uma série de atividades. Antes desse espaço virtual que nos acompanha atualmente a vida era aparentemente mais simples.

Normalmente as redes de televisão privadas são concessões do Público.24 E como ficam as privatizações nesse contexto de Público e Privado? A colocação é de um conceito bem mais amplo, pois o que muitas pessoas desejam como objetivo é a diminuição do Estado, outras, aumentar, mas não se pode esquecer que, para diminuir o Estado é necessário desregular, que é o fato de mitigar a intervenção do próprio Estado. Deve-se desmonopolizar e se for o caso ou ainda, vender ações de empresa que pertence ao Estado ao setor conhecido como privado ou fazer algum tipo de concessão pública. São várias as formas e inclusive a terceirização é uma delas. Foram necessidades liberais numa época em que se desejava diminuir o tamanho do Estado. Os princípios do liberalismo que tinham como objetivos proteger a igualdade de direitos foi incipiente para mitigar a desigualdade gerada. Daí as discussões em torno de privado, público, coletivo, privatização, interesse público, espaço público. São temas que estão presentes na atualidade. Restam ainda muitas discussões que envolvem outro tipo de relação entre Público e Privado. É a privatização daquilo que era estatal.

22 A associação de moradores que se mobiliza para arborizar as ruas do bairro cumpre uma função pública perfeitamente adequada às suas dimensões e ao seu mandato institucional. Não apenas o governo, mas também pessoas que se aglutinam ao bem comum, organizações e iniciativas privadas, são funções públicas. Essas organizações não estão no governo agora e não levam normalmente suas idéias ao governo no futuro. Diferem, neste sentido, dos partidos políticos, cuja função consiste justamente em estabelecer veículos institucionais de passagem da sociedade para o governo e vice-versa. 23 Imagens de ecologistas amarrados à árvore diante da serra elétrica, de mães expostas à sanha policial na Praça de Maio, daquele estudante solitário que interrompe o rolar dos tanques numa Avenida de Pequim, da fragilidade de uma madre Teresa de Calcutá, de jovens fazendo a dança do protesto contra o racismo nos bairros pobres de Johannesburgo, do milionário que estipula uma vasta doação em seu testamento são emblemáticas entre o público e o privado. (Fernandes 1994). 24 As concessões de exploração das estradas com cobrança de pedágio são concedidas pelo Poder Público. No Brasil, Empresas como a Petrobrás e o Banco do Brasil – são um mix de Público, pois 50% das ações são do governo e o governo é Público. É do contribuinte. Essa dicotomia pode levar a simplificações do tipo: “se é público, por exclusão, não é privado” ou é não-público e não é bem assim, pois somente fica lógico – como definição – se houver a contraposição.

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A palavra privatização é relativamente complicada para ter uma definição simplista. Ela está situada muito próxima das Ciências da Administração, perto das Ciências Políticas e de caráter econômico. Há um grande advogado argentino, de nome Cassagne25 (2001) que faz uma definição até interessante com algumas observações. Ele diz que: “A chamada privatização era, até pouco tempo, uma daquelas palavras exóticas que os dicionários se omitiam de incluir até num certo momento da história. Apenas no início da década de 80 as novas edições de dicionários e léxicos da América do Norte, começaram a dar conta de uma definição que fosse satisfatória: popular e embaraçoso jargão com o objetivo de desintoxicar e desembaraçar o Estado de funções próprias do setor privado”. Há outras definições e princípios, por exemplo, na subsidiariedade, no linguajar de juristas famosos. O princípio da subsidiariedade, embora bem anterior à nova concepção do Estado de Direito Democrático, assume num certo momento da história, importância fundamental na definição do papel do Estado. Ele foi formulado, em fins do século XIX e começo deste século passado, dentro da Doutrina Social da Igreja, principalmente pelas Encíclicas Rerum Novarum (1891), de Leão XIII, Quadragésimo Anno (1931), de Pio XI, Mater Et Magistra (1961), de João XXIII e, mais recentemente, a Centesimus Annus (1991), de João Paulo II. (Di Pietro – 1999). As discussões sobre o princípio da subsidiariedade nos leva ao socialismo e ao liberalismo. O socialismo faz intervenções, via Estado, em todos os aspectos da vida social, enquanto que o liberalismo, ao contrário, faz com que o Estado intervenha o menos possível na vida das pessoas. O catolicismo – como contexto religioso – possui uma doutrina intermediária a respeito do assunto. Ele encoraja as sociedades que nascem da livre iniciativa e nesse aspecto aproxima-se mais do liberalismo fomentando associações, instituições e reuniões sociais para discussão de assuntos diversificados. 26 O Direito Público como normas, leis, controles, nasceu depois do Direito Privado. O Direito Público é decorrente da criação dos Estados no processo histórico. A expropriação ou desapropriação como utilidade pública é um modelo posterior – a partir do século XV - ao privado,27 por isso, muito antigo. Antes do final do século XIX, onde a política clássica tinha seu poder bem determinado e as classes sociais tinham no seu inconsciente uma atividade para o espaço de liberdade das pessoas, onde a 25 É uma das figuras do Direito Público argentino. Foi eleito por uma revista inglesa em 2001 como um dos cem advogados mais destacados do mundo. 26 Porém, a doutrina católica reconhece o Estado com responsabilidades na vida social, principalmente como árbitro e regulador, preenchendo os vazios deixados pela iniciativa privada. A iniciativa do Estado deve ser guiada pelo princípio da subsidiaridade. A socialização também oferece perigos. Uma intervenção sem exageros do Estado pode constituir-se de ameaças à liberdade e às iniciativas das pessoas ou de uma comunidade. Por isso a Igreja elaborou algo que é intermediário, ou seja, o princípio da subsidiaridade.

27 Nem por isso podemos entrar em qualquer rede de TV e fazer um discurso, negar o pagamento de pedágio, discutir a validade de cobrança de alguns impostos ou entrar nos meandros das plantas industriais da Petrobrás – que é cinquenta por cento pública - ou exigir atitude unicamente pública do Banco do Brasil. As lógicas e o direito de cidadania, no sistema estatal, do direito do consumidor no campo do sistema privado devem ser analisadas com critérios e cuidados.

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praça era – muitas das vezes o local da discussão e da participação crítica e do desabafo – para vários tipos de assuntos, o largo ou o espaço público tinham, no coletivo, comunidades, a influência do poder. Quando há algum desequilíbrio, o que o Estado faz? O Estado intervém. Essa intervenção, de forma genérica, num certo momento, dar-se-á pela constitucionalização de uma esfera pública politicamente ativa, o que corresponde a transferência de competências públicas ou recursos para entidades privadas. A ampliação da autoridade pública a setores privados está ligada ao processo de substituição de poder público por poder social. (Aciole – 2006). O espaço público é a fonte das funções de crítica e controle que a sociedade exerce sobre a coisa pública. Está plasmado, em primeira instância, nos parlamentos, nos partidos políticos e na imprensa, através dos quais se configura a vontade e a opinião política. Mas, nos umbrais do século XXI, adquire máxima importância a ampliação do espaço público, tanto porque tais instituições atualmente se revelam insuficientes para o exercício da cidadania, como porque, na medida em que a esfera pública transcende cada vez mais os limites do Estado, requer modalidades de controle social que também se exerçam sobre a sociedade e, em particular, sobre as organizações públicas não estatais. Tudo isso certamente, não supõe o desconhecimento da importância das instituições tradicionais para o desenvolvimento da democracia. (Pereira e Grau – 1999). Pierre Bourdier (2002) 28 diz que o Estado, é por definição nem público e nem privado. Ele é um espaço de disputa entre os dois. Não é um espaço vazio. Sua estrutura burocrática-repressiva condiciona a luta entre os dois. Nesse meio está a política. O aparecimento do social, com significado diferente do de política, é contribuição Romana para a modernidade, pois, para os gregos, nem mesmo havia por que e como estabelecer tal distinção, mercê da relação que instituíam nas fronteiras entre ambas, a partir do reconhecimento de que o homem possuía duas condições de existência: aquilo que lhe pertencia – sua vida e sua casa e aquilo que era comum com os outros homens, e que se exercia e era vivido na praça pública. (Aciole 2006). Interessante notar observações destacadas por Aciole, (2006), comentando o fato de que nessa discussão entre o público e o privado, as divergências de pensadores como Arendt (1999) 29 e Marx (1993 e 1998) decorram de que observaram a realidade de perspectivas diferentes, salientando que nenhum dos dois jamais acreditou nas leis do mercado como solução para os problemas do homem moderno. Diz Aciole (2006) que afinal não se pode confiar que o mercado se mova sempre tendente ao equilíbrio e seja capaz, por si próprio, de resolver os problemas atuais da sociedade. 30

28 Apud – Sader, Emir Simão – Interventions (1961-2001) – Paris Agone, 2002. 29 Apud – Aciolle 2006 – pág. 39 30 Tais reflexões mostram que de fato, na atualidade, se analisarmos a crise americana que se espalhou pelo mundo a partir de 2007 necessitou, quase que sem exceção, do Estado para intervir nas relações da sociedade, ou seja, sem o Estado provavelmente a crise poderia ter tentáculos extremamente perigosos para todo o mundo. Resta ainda, salientar o esforço do novo presidente americano, eleito, em 2008, Barack Obama com intervenções jamais imaginadas por pensadores presentes ou do passado. Tal subsidiariedade – sob a forma efetiva de subsídio ao capitalismo – com objetivos sociais - aconteceu também na Europa, América do Sul e Países Asiáticos.

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Percebemos de antemão o mix entre o que é individual e o que é coletivo.31 Para melhor entendimento, necessário se torna a delimitação de espaço. Haver regras e constituírem-se instituições e estatutos. No público, muitas das vezes há grandes privatizações ou individualidade de interesses. Isso se observa na condução de algumas políticas públicas. As autoridades são as que mais conduzem essas relações de aproximações entre o público e o privado. Público e Privado na Saúde Aciole (2006) destaca que no caso específico de Saúde, é de fundamental importância distinguir esse processo. A compreensão do processo saúde-doença e das práticas médico-sanitárias, por sua vez, tem sido predominantemente inserida no paradigma explicativo dos determinantes sócio-históricos. A Saúde fica compreendida como uma política social resultante das relações históricas entre capital e trabalho, a exemplo do que apontam, por exemplo, Donnangelo (1976), Fleury (1994, 1997), Merhy (1992) e Schraiber (1993). Os estudos do setor Saúde têm reconhecido a Medicina e a Saúde Pública como campos de organização das ações de saúde, que utilizam saberes tecnológicos distintos e, portanto expressam uma dada compreensão do que é, para cada uma, o processo saúde-doença e, ao serem práticas sociais que operam saberes tecnológicos distintos, são práticas produzidas e produtoras de ideologias. Não é suficiente, portanto, serem distinguidas em aspectos valorativos. Nem por isso a Saúde deve ser encarada diferentemente pelo fato de ser Privada ou Pública. Ideologias à parte, ambas são distintas na forma, mas únicas na necessidade. Em seu livro a Saúde no Brasil – cartografias do público e do privado, Aciole (2006) afirma que a Saúde tem acompanhado a história do homem ao longo de sua existência como espécie e, enquanto tal, tecida em uma historicidade peculiar e reveladora. As práticas da saúde estão dentro da história de como uma das várias condições de sobrevivência das pessoas diante das vinculações existentes entre condições materiais de sobrevivência e a produção do mundo real pela ação dos homens. As preocupações com a manutenção de um dos recursos materiais mais fundamentais, o corpo humano – antes e depois de ser transformado em mercadoria no modo de produção capitalista moderno – constituíram elemento central na sobrevivência da espécie e no desenvolvimento do ser humano. 32 31 Hoje o espaço público serve mais para apelos mediáticos, bancos da praça com nomes de lojas – em cidades do interior isso é muito comum – às vezes, discursos e muitas vezes com distribuição de algum tipo de folder consumista. Em São Paulo, Capital, há lei contra toda essa poluição mediática, visual, todavia, nas cidades à volta de São Paulo o que existe é uma grande explosão da mídia nas avenidas, praças e onde for possível instalar alguma placa ou mensagem publicitária. Os locais são públicos, mas as placas, anúncios e out-doors são todos – ou quase todos – privados. Tudo com o objetivo de atingir o coletivo.

32 Para os antigos hebreus, a doença não era devida à ação de demônios ou de maus espíritos, mas representava, de qualquer modo, um sinal de cólera divina diante dos pecados humanos. Diz a Bíblia: “Eu sou o senhor, e é saúde que te trago”. (Êxodo 1526). “De Deus vem toda a cura” – Eclesiastes, 38,19). (Scliar – 1987).

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As preocupações eram tão grandes com saúde pública, que Donnangelo, (1976), baseada em Foucalt (1994), mostra a Polícia Médica na Alemanha e a Medicina Social na França referindo-se a higiene ou sanitarismo e, mais tarde, a saúde pública na Inglaterra. Para Foucault33 (1994), a polícia médica que é programada na Alemanha em meados do século XVIII, e que foi efetivamente posta em prática no final do século XVIII e começo do século XIX, consiste em um sistema muito mais completo de observação da morbidade do que os simples quadros de nascimento e morte. Observação da morbidade pela contabilidade pedida aos hospitais e aos médicos que exercem a medicina em diferentes cidades ou regiões e registro, ao nível do próprio Estado, dos diferentes fenômenos epidêmicos ou endêmicos observados. Ele diz ainda que: 1.º - Tratava-se de um fenômeno importante de normalização médica, que é programada na Alemanha, em meados do século XVIII, sobre diferentes fenômenos epidêmicos ou endêmicos. Era um tipo de normalização médica colocada pelo Estado para os diferentes fenômenos epidêmicos ou endêmicos observados. 2.º - Um fenômeno importante é o de normalização da prática e do saber médicos, procurando não deixar só para as universidades e, sobretudo para a própria corporação dos médicos, o encargo de decidir em que consistirá a formação médica e como serão atribuídos os diplomas. Aparece a idéia de uma normalização do ensino médico e, sobretudo de um controle, pelo Estado, dos programas de ensino e da atribuição dos diplomas. A medicina e o médico são, portanto, o primeiro objeto da normalização. Antes de aplicar a noção de normal ao doente, se começa por aplicá-la ao médico. O médico foi o primeiro indivíduo normalizado na Alemanha.34 Esse movimento de normalização na Europa é algo a ser estudado por quem se interessa por história das ciências. Segundo Foucault (1994), houve a normalização dos médicos na Alemanha, mas na França, por exemplo, a normalização das

33 Apud Romano – Foucault, M. O nascimento da clínica. 4. ed. Rio de Janeiro : Forense Universitária, 1994. Foucault, M. O nascimento da medicina social. In : Foucault, M. Microfísica do poder. 14 ed. Rio de Janeiro : Graal, 1999a, p. 79-98. Foucault, M. A política da saúde no século XVIII. In : Foucault, M. Microfísica do poder. 14 ed. Rio de Janeiro : Graal, 1999b, p. 193-207.

34 Na mesma linha o filósofo, cientista e político alemão Gottfried Wilhelm Von Leibniz (1646-1716) propõe a criação de uma repartição administrativa central para assuntos de polícia, incluindo-se nela um conselho de saúde. Em sua proposta para uma Autoridade Médica, Leibniz insiste, provavelmente pensando na Bill of Mortality (1662) de John Graunt, na importância do registro de nascimentos e óbitos e dos dados de morbidade. A proposta de polícia sanitária continuou sendo desenvolvida. Em 1800 aparece Franz Anton Mai (1742-1814), educador, que submete um código de saúde com vários tópicos. Os doentes mentais, que até a idade Média eram tolerados e encarados com religioso respeito e temor pela população, agora são recolhidos aos hospícios. No início da Renascença a Nau dos Insensatos (Nef dês Fous, Narrenschiff) percorre rios europeus, levando os loucos que são expulsos das cidades e dos quais os barqueiros são encarregados de se livrar. Há uma história parecida em Histoire de La Folie à l’Age Classique. Paris, Plon, 1961. O século 17, diz Rosen, vê uma mudança na percepção social da loucura. Predomina agora a visão de Blaise Pascal (1623-1662): pode-se conceber um homem sem as mãos, sem os pés, sem a cabeça, até, mas não sem a razão. O doente mental tornou-se uma criatura exótica. Na América, as pessoas visitavam o hospício de Bedlam como quem vai a um zoológico; a entrada custava um penny e dava ao visitante o direito de atiçar os loucos. Os loucos tinham a cabeça raspada e eram sistematicamente submetidos à purga, à emese, à sangria e ativados sem aviso a água gelada – o choque do frio que precedia a eletrochoque, terapia de Cerletti. O gesto dramático de Philippe Pinel (1745-1826), durante a Revolução Francesa, libertando de seus grilhões os loucos da Salpetrière e da Bicètre, alterou em parte este tipo de conduta. Somente no século 20 com a psicanálise e nos novos medicamentos a psiquiatria viria a ter novos conceitos para seus pacientes. Depois, Sigmund Freud (1856-1939) deu inestimáveis contribuições também.

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atividades, ao nível do Estado, dirigiu-se, a princípio à indústria militar. Normalizou-se em primeira instância a produção dos canhões e dos fuzis, em meados do século XVIII, a fim de assegurar a utilização por qualquer soldado de qualquer tipo de fuzil, a reparação de qualquer canhão em qualquer oficina, etc. Depois de ter normalizado os canhões, a França normalizou seus professores. As primeiras Escolas Normais destinadas a dar a todos os professores o mesmo tipo de formação e, por conseguinte o mesmo nível de qualificação apareceu em torno de 1775, antes de sua institucionalização em 1790 ou 1791. A França normalizou seus canhões e seus professores, a Alemanha normalizou seus médicos. 3.º - Uma organização administrativa para controlar a atividade dos médicos, tanto na Prússia quanto nos outros Estados alemães: ao nível do Ministério ou da Administração central, um departamento especializado é encarregado de acumular as informações que os médicos transmitem, ver como é realizado o esquadrinhamento médico da população, verificar que tratamentos são dispensados, se reage ao aparecimento de uma doença epidêmica, e finalmente, emitir ordens em função dessas informações centralizadas. Subordinação, portanto, da prática médica a um poder administrativo superior. 4.º - A criação de funcionários médicos nomeados pelo governo com responsabilidade sobre uma região, seu domínio de poder ou de exercício da autoridade de seu saber. E assim que um projeto adotado pela Prússia, no começo do século XIX, implica uma pirâmide de médicos, desde médicos de distrito que têm a responsabilidade de uma população entre seis e dez mil habitantes, até oficiais médicos, responsáveis por uma região muito maior e uma população entre trinta e cinco, e cinqüenta mil habitantes. Aparece, neste momento, o médico como administrador de saúde. Com a organização de um saber médico estatal, a normalização da profissão médica, a subordinação dos médicos a uma administração central e, finalmente, a integração de vários médicos em uma organização médica estatal, tem-se uma série de fenômenos inteiramente novos que caracterizam o que pode ser chamada a medicina de Estado. Essa medicina de Estado que aparece de maneira bastante precoce, antes mesmo da formação da grande medicina científica de Morgani e Bichat,35 não tem, de modo algum, por objeto a formação de uma força de trabalho adaptada às necessidades das indústrias que se desenvolviam neste momento. Não é o corpo quem trabalha, o corpo do proletário que é assumido por essa administração estatal da saúde, mas o próprio corpo dos indivíduos enquanto constituem globalmente o Estado: é a força, não do trabalho, mas estatal, a força do Estado em seus conflitos, econômicos, certamente, mas igualmente políticos, com seus vizinhos. É essa força estatal que a medicina deve aperfeiçoar e desenvolver. Há uma espécie de solidariedade econômico/política nesta preocupação da medicina de Estado. Seria, portanto, falso ligar isto ao cuidado imediato de obter uma força de trabalho disponível e válida.

35 Este modelo tem sua origem no século XVIII, através de Morgani e Bichat com o aparecimento da anatomia patológica e se afirma a partir da Revolução industrial, pelas necessidades do capitalismo, que organiza a instituição médica, estabelecendo o conceito de normalidade para atender as necessidades da produção e operariado da época.

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O exemplo da Alemanha é igualmente importante por mostrar como, de maneira paradoxal, se encontrava no início da medicina moderna, o máximo de estatização. Desde esses projetos que foram realizados em grande parte no final do século XVIII e começo do século XIX, desde a medicina de Estado alemã, nenhum Estado ousou propor uma medicina tão nitidamente funcionarizada, coletivizada, estatizada quanto a Alemanha desta época. Vê-se, por conseguinte que não se passou de uma medicina individual a uma medicina pouco a pouco e cada vez mais estatizada, socializada. O que se encontra antes da grande medicina clínica, do século XIX, é uma medicina estatizada ao máximo. Os outros modelos de medicina social dos séculos XVIII e XIX são atenuações desse modelo profundamente estatal e administrativo já apresentado na Alemanha. Essa é a primeira série de fenômenos a que Foucault (1999) se refere no episódio que os historiadores da medicina em geral negligenciam totalmente, mas que foi estudado de perto por George Rosen36 na série de estudos sobre as relações entre o cameralismo37, o mercantilismo e a noção de polícia médica. Ele escreveu em 1953 um artigo sobre o problema no Bulletin of history of medicine, intitulado Cameralism and the Concept f Medical Police e o estudou posteriormente em seu livro History of Public Health, de 1958. A saúde pública trouxe muitas preocupações na modernidade e em suas feições é explicada pela necessidade do Estado capitalista, num processo que apresenta uma trajetória que vai de longínquos séculos à vários países até as intervenções sanitárias de país a país para higiene pública do século XX. A OMS – Organização Mundial da Saúde é resultante dessa internacionalização da medicina. Todas representam um conjunto de práticas que, além de terem em comum o fato de serem práticas alocadas como tarefa do Estado, são antecessoras da visão bacteriológica que se torna hegemônica ao final do século XIX. E é na Alemanha que surge em 1779, a idéia da intervenção do Estado na área de saúde pública. Neste ano é publicado o primeiro dos seis volumes do System einer Vollstandigen medicinischen Polizei, obra monumental com a qual Johan Peter Frank (1745-1821) lançava o conceito de polícia médica ou sanitária. Um conceito eminentemente autoritário e

36 Livro de George Rosen – Uma história da saúde pública – livro detalhando a história da medicina desde o Egito antigo – Editora Hucitec. – 36 - Expressão econômica do século XVIII. Na Europa central, especificamente nas nações germânicas que enfrentavam crises econômicas, os estudiosos e os técnicos da política e da administração financeira preocupados em encontrar soluções práticas para as questões financeiras formaram o Cameralismo. Nas universidades alemãs e austríacas houve a formação da cátedra das ciências camerais e os conselhos Kammern, que significa local onde são depositados os tesouros reais, criados para prestar assistência sobre os assuntos de política financeira e econômica, de técnicas de administração e de direito aos príncipes. 37John M. Last. A Dictionary of Epidemiology - Nova Iorque Oxford University Press, 1983. (Apud – Scliar – 1987).

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paternalista, preocupado, sobretudo com os aspectos legais das questões de saúde. (Scliar – 1987). Preceitos bíblicos são citados38 para prevenir doenças e proteger a saúde pública. Animal com tuberculose – mal de Pott – não poderia ser abatido para consumo; alguns moluscos, que poderiam transmitir a hepatite também. De certa forma esses preceitos tinham a ver com o ambiente natural. O antropólogo Marvin Harris (1968), (1978) 39 vê, por exemplo, a origem da restrição a carne de porco e a criação de suínos no Oriente Médio, como um contrassenso: é uma região árida, sem a água que estes animais necessitam como forma de manter seu equilíbrio térmico. Além disso, povos nômades, teriam dificuldades em manter um animal que se move pouco, como o porco. A circuncisão40, por exemplo, previne o câncer do pênis, o herpes genital, o câncer de colo de útero e as doenças venéreas de maneira geral. Atualmente, todavia, não há consenso sobre o assunto. As razões mais freqüentes dadas pelos pais são: higiene, proteção à saúde e o costume (Scliar – 1987). Isso tudo têm a ver com saúde pública. A saúde pública e a história Mas o que é saúde pública? O que era saúde pública nos séculos passados ? Conceituar saúde é um problema que só surgiu recentemente e surgiu exatamente em função das necessidades de planejar ações de saúde, individuais ou coletivas. Em 1947, a Organização Mundial da Saúde formulou o seguinte conceito: “Saúde é o estado de mais completo bem-estar físico, mental e social e não apenas ausência de enfermidade”. Esse conceito entrou em vigor no dia 7 de abril de 1947. Xavier Bichat (1771-1802),41 médico francês, dizia que a saúde é o “silêncio dos órgãos”. A doença se faz ouvir. John Last (1988), 42 menciona dois outros conceitos segundo os quais a saúde é: “um estado de equilíbrio entre o ser humano e seu ambiente, permitindo o completo funcionamento da pessoa e ou um estado caracterizado pela integridade anatômica do ser humano e pela capacidade de desempenhar todas suas funções, livre da ameaça imediata da doença e da morte.”43

38 Torá ou Pentateuco 39 Marvin Harris (Nova Iorque, 18 de agosto de 1927 - 25 de outubro de 2001) foi um antropólogo dos Estados Unidos, principal teórico do "materialismo cultural". Entre as influências de seu trabalho pode-se incluir a repercussão na teoria do comportamento e na antropologia cultural. (Fonte Wikipédia – acessada em 25/08/2011). 40 Ato de cortar o prepúcio.

41 Marie François Xavier Bichat (Thoirette, 14 de novembro de 1771 — Paris, 22 de julho de 1802) foi um anatomista e fisiologista francês.Bichat é melhor lembrado como o pai da moderna histologia e patologia. (Fonte: Wikipédia – acessada em 25/08/2011).

42 Autor, organizador, do: O Dicionário de Epidemiologia – 1988.

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No início do século XX havia muitas doenças que ainda causavam grande preocupação para os Estados. Os EUA através da Fundação Rockfeller e outros organismos interessados em ampliar seus objetivos econômicos desejavam eliminar essas epidemias, pois elas se disseminavam pelas portas do mundo. Eram elas: febre amarela, varíola, tuberculose e a peste bubônica que atingiu os países através das fronteiras. As relações do Estado com a Medicina da época deu início a correlação público e privada e a retrospectiva que segue. Doenças preocupantes / a febre amarela e assemelhad as Muitos foram os fatos e decisões sobre saúde pública. A febre amarela era um dos grandes empecilhos para negócios principalmente com os países tropicais nos séculos XIX e XIX. Goldim,44 (1999) relata em artigo que o controle da febre amarela,45 devido a sua morbidade e mortalidade, foi um dos grandes desafios da medicina que preocupava os Estados – saúde pública – e as instituições de trabalho – empresas privadas. Vários foram os pesquisadores em várias épocas que colocaram até suas vidas em risco para descobrir suas causas e efeitos. Ele informa em seu artigo que os primeiros relatos dessa doença remontam a 1700. Antes disso não há nenhuma citação.

Informa ainda, Goldim (1999), que foi o médico escocês, Dr. Patrick Mason que demonstrou, em 1878, pela primeira vez, que um inseto podia transmitir uma doença, ainda que de modo não definitivo. Neste caso foi a transmissão da Wuchereria bancrofti, causadora da filariose.46 Posteriormente, em 1894, o Dr. Mason descobriu que era a mosca tsé-tsé que transmitia uma tripanossomíase, denominada de febre n'gana ou doença do sono. Ele também orientou o trabalho do Dr. Donald Ross que, em 1896, estabeleceu a transmissão da malária por mosquitos.

Em suas pesquisas, Dr. Goldim relata a primeira evidência irrefutável de que um inseto podia transmitir uma doença, isso em 1892 e complementa que o Dr. Theobald Smith, microbiologista e o Dr. Fredrick L. Kilborne, veterinário, demonstraram a transmissão por meio de insetos da chamada febre do Texas, uma doença bovina. O Dr. Carlos

44 José Roberto Goldim concluiu o doutorado em Medicina (Clínica Médica) pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul em 1999, com tese sobre Consentimento Informado. (Fonte: Lattes). http://www.ufrgs.br/bioetica/finlay.htm (acessado em 04/07/2009). 45 O nome de febre amarela surgiu de uma epidemia em Barbados em 1715. Acreditava-se que ela se propagava pelo contágio direto com o vômito dos pacientes. Muitos foram os médicos que até provaram vômitos e se submeteram aos seus terríveis testes, mas não desenvolveram a doença. Desde 1800 muitos foram os tipos de pesquisa efetuados para identificar como era a transmissão. A primeira proposta de que o mosquito era o transmissor da doença foi feita pelo Dr. John Crawford, de Baltimore/EUA, em 1807. Antes dessa data aqueles que contraíam a doença eram colocados em quarentena.

46 A filariose ou elefantíase é a doença causada pelos parasitas nematóides Wuchereria bancrofti, Brugia malayi e Brugia timori, comumente chamados filária, que se alojam nos vasos linfáticos, causando linfedema. Esta doença é também conhecida como elefantíase, devido ao aspecto do(s) membro(s) afetado(s) elefante do paciente com esta doença. Tem como transmissor os mosquitos dos gêneros culex e algumas espécies do gênero Anopheles, presentes nas regiões tropicais e subtropicais. Quando o nematóide obstrui o vaso linfático, o edema é reversível, no entanto, é importante prevenção com mosquiteiros e repelentes, além de evitar o acúmulo de água parada em pneus velhos, latas, potes e outros. (Fonte: Wikipedia).

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Juan Finlay, médico cubano, com formação feita nos EUA, apresentou, em 14 de agosto de 1881, um trabalho sobre "O mosquito hipoteticamente considerado como agente transmissor da febre amarela".

Somente em 1891 uma comissão americana resolveu discutir com Dr. Finlay o assunto dos insetos transmissores. Após vários testes na própria comissão e em alguns voluntários a proposta de Finlay teve força para continuar. No Brasil muitos médicos não aceitavam a proposta de transmissão por mosquito. Os Drs. Emílio Ribas e Adolfo Lutz propuseram a realização de novos experimentos. Em 1894 o Dr. Finlay propôs, em um congresso médico em Budapeste, que a melhor maneira de erradicar a febre amarela seria através da eliminação dos mosquitos. Não convenceu a todos. Anos se passaram e muitos voluntários se submeteram a vários tipos de testes.

Em 1900, o Departamento Médico do Exército dos Estados Unidos nomeou duas comissões para estudar as doenças tropicais, a primeira nas Filipinas e a segunda em Cuba. Entre 1898 e 1901, Gorgas47, médico do Exército, havia tentado erradicar a febre amarela, sem êxito, com base na limpeza do porto de Havana, de acordo com o pensamento da época. Em março de 1901, Gorgas mudou a estratégia, ao levar em conta a quarta comissão norte-americana que havia confirmado a teoria de Finlay, segundo a qual o mosquito transmitia a febre amarela, conseguindo em seis meses a erradicação da doença. (Iyda – 1994). 48

Entre dezembro de 1902 e janeiro de 1903, Dr. Reed, outro médico e mais quatro voluntários deixaram-se picar por mosquitos sabidamente contaminados. Dos seis, três, incluindo os dois pesquisadores, não desenvolveram sintomas. Os demais ficaram doentes. O Dr. Emílio Ribas confirmou, posteriormente em 1909, que não tinha dúvida alguma sobre a forma de transmissão da febre amarela e que somente repetiu os experimentos de Reed em Cuba, pois considerava útil a sua realização. O Dr. Reed morreu em 1902, de uma causa não relacionada com a febre amarela. A causa foi apendicite. Em 1906 os Drs. Carroll e Agramaonte receberam o Prêmio Nobel pelos trabalhos desenvolvidos em Cuba. 49

Em 1906 o impaludismo atrapalhava todos os planos de desenvolvimento do governo como Usinas Hidroelétricas, Estradas de Ferro Central do Brasil, Noroeste e aquela que nunca terminou de fato, a Madeira Mamoré no Pará, já na República. A primeira vacina para febre amarela foi desenvolvida na França, em 1928.

47 Major-médico William Gorgas, do exército norte-americano. 48 Curiosamente, Sorocaba foi considerada a primeira cidade do mundo a erradicar a febre amarela. Tal conhecimento do fato modifica um pouco a história de que tudo se passou inicialmente em Havana na erradicação da doença. O início de fato, foi determinado por Emílio Ribas no município de Sorocaba um mês antes, precisamente em janeiro de 1901 com base nas pesquisas existentes de Cuba e também de um outro major americano, médico, de nome Walter Reed.

49 Com o objetivo de estudar a mecanismo de contágio da Febre Amarela o Departamento Médico do Exército Norte-Americano, em maio de 1900, criou uma comissão para realizar uma pesquisa a este respeito. O Dr. Walter Reed, major do exército e professor de medicina na Universidade Johns Hopkins, em Baltimore/EUA, foi nomeado seu coordenador. Os Drs. James Carrol, Jesse W. Lazear e Aristides Agramonte, todos médicos e majores, eram os demais membros desta comissão. (fonte: www.ufrgs.br/bioética/finlay/htm - acessado em 26/12/2009).

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Outra vacina de febre amarela foi desenvolvida pela Fundação Rockfeller, em 1931. Ela foi desenvolvida pelos Drs. Sawyer, Wray Lloyd e Kitchen. Em 1935, o Dr. Max Theiller e seus colaboradores desenvolveram uma nova vacina que é utilizada até os dias de hoje. 50 51

O agregado do saber médico e as escolas

Com esses conhecimentos sobre algumas doenças iniciou-se um processo de agregar tais saberes e as velhas escolas da Bahia e do Rio de Janeiro integraram-se nas universidades da Bahia e do Brasil, respectivamente. A última denomina-se Nacional de Medicina.

Outros estabelecimentos surgiram no século XX. O mais completo deles é a Faculdade da Universidade de São Paulo, que começou a funcionar em 1913, sob a direção de Arnaldo Vieira de Carvalho (1867-1920). Alguns de seus laboratórios foram construídos pela Fundação Rockefeller. Houve contratações de professores, inclusive, italianos e franceses. Possui um monumental hospital de clínicas, outros hospitais especializados incluindo institutos complementares. Dela nasceu, em 1945, a Faculdade de Higiene e Saúde Pública, cujo primeiro diretor foi Geraldo Horácio de Paula Sousa (1889-1951).

Situam-se ainda, em São Paulo, a Escola Paulista de Medicina (1933) e a Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de Misericórdia fundada em 1913. No interior do Estado localizam-se a Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (1951), da USP, a de Sorocaba (1950) da PUC, a Faculdade de Ciências Médicas e Biológicas de Botucatu (1962) e a Faculdade de Medicina da Universidade de Campinas, que iniciou seus trabalhos em 1963.

No RJ, além da Faculdade Nacional de Medicina há a Faculdade de Ciências Médicas (1936), da URJ, cujo primeiro diretor foi Antonio Cardoso Fontes e a Escola de Medicina e Cirurgia (1921), que pertenceu ao Instituto Hahnemaniano e seu fundador foi Licínio Atanásio Cardoso. Era homeopática e hoje contém também o curso de medicina oficial. Há ainda em Belo Horizonte a Faculdade de Medicina da Universidade de MG. (1911), cujo primeiro diretor foi Eduardo Borges da Costa (1880-1950).

Há outras como a Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais. Em Juiz de Fora também há uma faculdade de Medicina e outra em Uberaba, que se denomina Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro. José Otávio de Freitas (1871-1919) higienista e microbiologista, foi o principal idealizador da Faculdade de Medicina (1920) da Universidade do Recife. Em Pernambuco, está ainda a Faculdade de

50 Os experimentos iniciais foram feitos em macacos. A primeira aplicação em seres humanos foi feita nos Drs. Theiller, Lloyd e Bruce Wilson, que se ofereceram como voluntários. O Dr. Theiller ganhou o Prêmio Nobel de 1951 por esta sua contribuição à saúde das populações

51 Fonte: Vieira S, Hossne WS. A experimentação em seres humanos. São Paulo: Moderna, 1987:21. Altman LK. Who goes first ? Berkeley: California, 1998:134-158.

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Ciências Médicas. Antonio Emiliano de Sousa Castro, organizou e dirigiu a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará (1919), sediada em Belém.

Em Niterói, encontra-se a Faculdade Fluminense de Medicina (1929), cujo principal fundador e diretor, Antonio Pedro Pimentel e em João Pessoa a Faculdade de Medicina da Universidade da Paraíba (1951). No Paraná, Vitor do Amaral foi o primeiro diretor da Faculdade de Medicina da Universidade do Paraná (1912), em Curitiba. Protásio Antonio Alves, dirigiu a Faculdade Livre de Medicina e Farmácia de Porto Alegre, a qual, fundada em 1898, começou a funcionar em 1899 e foi reconhecida pelo governo em 1900.

No interior do RGS fica a Faculdade de Medicina de Santa Maria. Diversas outras escolas surgiram, como a de Vitória, no ES em 1961, a de Fortaleza da Universidade do Ceará, a de Natal, do Rio Grande do Norte, a de Alagoas (1951), em Maceió, a de Goiás, em Goiânia (1960), a de Santa Catarina (1960) em Florianópolis, a Escola Baiana de Medicina e Saúde Pública, em Salvador e a Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília. Em 1961, quando havia no Brasil, 25 escolas de medicina, o número de diplomados foi de 1.787. (Santos Filho – 1980).

Naquela altura, no início do século XX no Brasil, já funcionava regularmente o Instituto Oswaldo Cruz o qual recebia muitas solicitações e também atendia entidades públicas e privadas além do acompanhamento do Ministério das Relações Exteriores tendo em vista as questões de caráter internacional e interesses econômicos. Tais doenças da época atrapalhavam e muito negociações entre o Brasil e outros países.52 Médicos e pessoas da atividade eram procurados. Havia relações de governo e de instituições comunitárias na época com médicos denominados como típicos autônomos. Eles também colaboravam. Era - de certa forma – o médico particular contribuindo com a Saúde Pública. A descoberta da bactéria e o conhecimento do mundo dos microorganismos podem ser considerados como o estopim de esperança para a cidadania, tamanho o temor e tensão que vai provocar nos corações e mentes. Torna-se necessário então a intervenção de uma estrutura mais forte: o Estado. A emergência de atitudes, da medicina preventiva também guarda correlação importante com o fato de que o saneamento vai ser uma das marcas da ação Estatal, a qual gerará outras providências. As preocupações com o “status quo” do comunitário, do coletivo, aglomerações urbanas como cortiços, falta de saneamento básico – água e esgoto - e outras comunidades assemelhadas desenhavam debates acalorados de agentes de saúde. Espaço do Terceiro Setor e cidadania / Orbitando en tre o Público e o Privado Nas últimas décadas, a cidadania dilatou-se de forma inédita e inusitada. O campo dos direitos está hoje definido pela reiteração de antigas conquistas de direitos civis e políticos, pela oscilação dos direitos sociais e pela afirmação incessante de novos

52 No Brasil, como exemplo, destaca-se que no último ano da Monarquia os recursos reservados para a Saúde era 0,4% do total enquanto para os Ministérios da guerra e da Marinha 19,6%, as vias férreas 35% e a imigração 7%. Em alguns países europeus o tratamento sanitário era diferente. Fonte: A.R. Netto, op. Cit. 1942 – pág. 24

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direitos que recobrem territórios tão vastos quanto o meio ambiente, a sexualidade e a bioética. A vida moderna ficou inseparável de um progressivo, tenso e irregular reconhecimento jurídico dos direitos de cidadania. Os direitos estão complicados também, porque temos hoje no mundo, e, portanto também no Brasil, uma espécie de crise da idéia de cidadão. A idéia de cidadão parece que está em crise, sobretudo porque tende a se afirmar quase que exclusivamente no plano dos direitos, deixando para trás o plano das obrigações. Há também uma crise de idéia de República, ou seja, o cidadão republicano está hoje gravemente reduzido ou à condição de consumidor ou à condição de eleitor, de alguém que é chamado a referendar decisões que são tomadas em âmbitos aos quais ele não tem acesso. Os cidadãos reclamam, protestam, fazem plebiscitos, votam regularmente, mas não conseguem entrar no ventre em que são geradas as decisões. (Nogueira, 2005). Na saúde, por exemplo, essas discussões caminham para soluções variadas. Uma delas é a possibilidade de um Terceiro Setor vir a ser uma das portas de entrada que podem ajudar na minimização dos problemas na saúde, além das relações de compartilhamento da saúde privada e da pública que acontecem há anos e poderão ser maiores como veremos à frente deste trabalho. Isso já se enxerga na educação, por exemplo, onde ONG’s tomam as rédeas de creches e outros tipos de instituições ou serviços. Na saúde isso é evidente. O médico tem seu consultório particular,53 mas fornece seus saberes para hospitais públicos. Muitos dentistas trabalham para instituições públicas, todavia, atendem também no seu consultório. Muitos hospitais e empresas privadas de atividade em saúde atendem também os usuários do SUS via convênios com o Estado. Tudo no mesmo território. Como exemplo – pontual – dentre milhares, temos a Beneficência Portuguesa em São Paulo – Capital – cujas divisões internas se confundem e há momentos em que não se sabe se estamos no lado particular, privado ou no público para atendimento dos casos oriundos do SUS. O setor produtivo público não estatal é também conhecido por “terceiro setor”, “setor não governamental” ou “setor sem fins lucrativos”. Por outro lado, o espaço público não estatal é também o espaço da democracia participativa ou direta, ou seja, é relativo à participação cidadã nos assuntos públicos. Pode ser chamado de público não estatal, que define com maior precisão do que se trata: são organizações ou formas de controle “públicas” porque voltadas ao interesse geral; são “não estatais” porque não fazem parte do aparato do Estado, seja por não utilizarem servidores públicos, seja por não coincidirem com os agentes políticos tradicionais. Em outras palavras, supõe-se a existência de quatro esferas ou formas de propriedades relevantes no capitalismo contemporâneo: a propriedade pública estatal, a pública não estatal, a corporativa e a privada. (Pereira e Grau – 1999).

53 Denominado por alguns autores como “Liberal típico”.

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Políticas públicas, ONG’s e PPA’s Essa nuance entre o público e o privado nos leva a um espaço que surgiu no mundo e consequentemente no Brasil – por exemplo – que é o Terceiro Setor. Já é consenso na América Latina que nem o mercado nem o Estado têm condições de responder por si sós, aos desafios do desenvolvimento com equidade. (Fernandes – 1994). Na década de 80 foram as ONGs que, articulando recursos e experiências na base da sociedade, ganharam alguma visibilidade, enquanto novos espaços de participação cidadã, principalmente com relação à saúde e necessidades básicas mínimas de alguns grupos da sociedade. Hoje percebemos que o conceito de Terceiro Setor é bem mais abrangente. Inclui o amplo espectro das instituições filantrópicas dedicadas à prestação de serviços nas áreas de saúde, educação e bem estar social. Compreende também as organizações voltadas para a defesa dos direitos de grupos específicos, como mulheres, negros e povos indígenas, englobando as experiências de trabalho voluntário para a melhoria das comunidades. 54 São as organizações não governamentais – ONG’s55 que não são governo, não são lucrativas, mas pretendem – via associações civis – ser organizações da sociedade de interesse público. São iniciativas privadas que não visam lucro. Um terceiro setor – não lucrativo e não governamental – que coexiste hoje. As ONG’s tornaram-se rotina sob a liderança das agências multilaterais que compõem o Sistema da ONU. Dentre suas muitas funções a saúde também foi colocada como necessidade no seu contexto. Banco Mundial, FAO, Unicef, OMS, Pnud e tantas outras são programadas para pensar em escala global. (Fernandes - 1994).56 Nesse bojo entra também a filantropia empresarial. Laura Tavares57, (2003), fornece elementos para o debate sobre as percepções do local, que resume: comunitário, moderno, mecanismos societários, parcerias e mais atualmente do terceiro setor. Verificamos em discursos das décadas de 90 e 2000, referências a parcerias e necessidades de união entre Estado e o poder privado em algo que podemos relacionar com o compartilhamento entre o Público e o Privado. Segundo Bresser Pereira e Cunil Grau, (1999), Ruth Cardoso, (1997-1998) descreve o conceito de terceiro setor como um espaço de participação e experimentação de novos modos de pensar e fazer sobre a realidade social. É um campo marcado por uma irredutível diversidade de atores e formas de organização. No Brasil, há ainda em parte, um grande desconhecimento, por parte do governo federal, das ações desenvolvidas por esses atores, tanto em termos de abrangência e diversificação, como da eficiência dos métodos e da eficácia dos resultados em conformidade com os recursos humanos e financeiros mobilizados em dimensões

54 Fonte: http://empreende.org.br/pdf/ONG's,%20OSCIP'S%20e%20Terceiro%20Setor/Evolu%C3%A7%C3%A3o%20s%C3%B3cio-pol%C3%ADtica%20das%20ONGs%20no%20Brasil.pdf (acessado em 13.03.2011). 55 Decreto Presidencial de junho de 1999. 56 Fernandes – pág. 15 57 Tavares, Laura

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também desconhecidas. Todavia, há dados internacionais, que denunciam o potencial de mobilização de recursos. Nos EUA, por exemplo, onde há uma cultura do voluntariado, os volumes anuais de recursos mobilizados estão por volta de 601 bilhões de dólares, dos quais 70 bilhões são doados por cidadãos. Sabe-se, ou estima-se lá, que 94,2 milhões de adultos, num total de 180 milhões de pessoas com mais de 18 anos, doaram 4,2 horas de trabalho voluntário semanal, o que equivale a 15,2 bilhões de horas anuais. A saúde está integrada nesse volume de horas. O valor anual desse trabalho voluntário está estimado em 176 bilhões de dólares e equivale ao emprego, em tempo integral, de nove milhões de pessoas. Sabe-se ainda, que o percentual de geração de emprego remunerado no Terceiro Setor tem sido muito superior ao dos setores governamental e privado.58 Os Diretores das primeiras ONG’s59 - surgidas entre 1960 e 1970, na América Latina, por exemplo, têm agora entre 45 e 70 anos. Eram jovens na década de 60 – adolescentes que chegaram à idade adulta aprendendo através dos jornais sobre personagens como Kennedy, Krushtchev, Mao, Fidel, Guevara e João XXIII. Como a maioria das pessoas esclarecidas de então, cresceram pensando de si mesmas que eram partícipes de um vasto processo de transformação histórica; acreditavam que justiça e liberdade seriam alcançadas, para todos, ainda no decorrer de suas vidas. A política era carregada de conteúdos messiânicos que condicionavam até mesmo a imaginação dos mais sisudos planejadores.60 (Fernandes – 1994). O crescimento da quantidade de ONG’s é notável.61 Todos esses aspectos refletem as mudanças e reformas que o Estado estava passando. Eram as reengenharias de idéias e de gestão.

A grandeza dos números que tornaram possível a existência das ONG’s no mundo, em geral, e no Brasil, em particular, faz refletir que o fenômeno nativo ONG tem como um dos condicionantes da sua multiplicação “lógicas que vieram do Norte”. Fernandes (1991), relacionou os países que têm colaborado com as ONG’s brasileiras, a partir das informações fornecidas por dirigentes que participaram de uma reunião no Hotel Glória, em agosto de 1991 e responderam à questão sobre relações com agências de cooperação internacional. O quadro possibilita visualizar a grande concentração de ajuda provenientes da Europa, com destaque para Alemanha e Holanda, 62 países com os quais mais da metade das ONG’s nacionais se relacionam.

58 Fonte: http://empreende.org.br/pdf/ONG's,%20OSCIP'S%20e%20Terceiro%20Setor/Evolu%C3%A7%C3%A3o%20s%C3%B3cio-pol%C3%ADtica%20das%20ONGs%20no%20Brasil.pdf (acessado em 13.03.2011). 59 Como condição de existência, necessária para quem estava descobrindo as particularidades de atuação desenvolvidas, as ONGs vão redefinindo seu papel numa conjuntura de reorganização da sociedade civil. Dessa forma é que constroem seus discursos de “autonomia face ao Estado, às Igrejas, aos movimentos populares, partidos e à Universidade”. Desta rearticulação surgiu em 1990 a Associação Brasileira das ONGs - a ABONG. (Fonte: acesso a http://www.comunicacao.pro.br/artcon/movsocong.htm) em 13.03.2011 60 Fernandes – pág. 30. 61 Segundo Fernandes e Piquet Carneiro, (1991), a denominação ONG passou a ser empregada por volta dos anos 80, para designar várias entidades que, originárias dos vários movimentos sociais dos anos 70, vinham agregando quadros de matrizes ideológicas diversas, como o marxismo e o cristianismo, e passaram a contar com uma estreita cooperação com entidades não-governamentais internacionais. (Artigo de Mário Aquino Alves – Anpad – maio de 1999).

62 Os Estados Unidos, segundo depoimentos obtidos na pesquisa de campo desenvolvida para este trabalho (abril a setembro de 1996), têm ampliado, para alguns segmentos, a colaboração com as ONG latino americanas, com ênfase

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Os recursos que captaram, segundo pesquisa realizada em 1991 entre 102 ONG’s brasileiras, ainda que modestos, provêm em sua maioria de fontes não governamentais, religiosas e organismos multilaterais, em sua maioria de cooperação internacional, conforme resumido na Tabela II a seguir. 63 Tabela I ONG’s brasileiras que mantém relações / agências de Cooperação / País de Origem. Países / agências Número de ONG’s Países/agências Número

Alemanha 57 Suécia 9

Holanda 53 Áustria 7

EUA 42 Dinamarca 4

Inglaterra 31 Espanha 4

Canadá 28 Portugal 3

Suíça 20 Finlândia 3

França 17 Noruega 2

Irlanda 14 Luxemburgo/Escócia 1

Bélgica 10 Itália 10

Fonte: Fernandes & Piquet Carneiro. (1991) Tabela II Importância / Cada Tipo de Agente financiador na composição da Receita das ONG’s

Tipos de Agências Importância relativa em %

Ecumênicas/Evangélicas 45,10%

Católicas 25,50%

Fundações privadas 23,50%

Multilaterais 8,80%

Governamentais 2,90%

Fonte: Fernandes & Piquet Carneiro.(1991) A reforma do Estado que ocorreu desde os anos 90, segundo seus autores (Pereira e Grau, 1999), “ deverá conduzir a um Estado fortalecido em 20 a 30 anos, com suas finanças recuperadas e sua administração obedecendo a critérios gerenciais de eficiência. Mas a reforma também deverá alcançar a garantia, pelo Estado, de que as atividades sociais, que não são monopolistas por natureza, possam ser realizadas competitivamente pelo setor público não estatal e por ele controladas ainda que com

em projetos de pesquisa e na área ambiental, equilibrando, em geral, a retração de recursos das agências européias, nos últimos anos. (Fonte: Autoria: Artigo na Anpad - Mário Aquino Alves – maio 1999).

63 Fonte: artigo publicado em “Seminários de Reforma do Estado” - São Paulo 26-28 março 1998 – As ONG’s na Reconstrução da sociedade civil no Brasil – de Ricardo Toledo Neder – Apoio Fapesp.

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seu apoio financeiro, de maneira a conseguir a ampliação dos direitos sociais. Assim, inclusive como condição para o desdobramento de suas outras dimensões, a reforma visa renovar o sistema político incorporando a própria participação cidadã mediante o controle social. Um Estado assim reconstruído poderá resistir aos efeitos perturbadores da globalização e garantir uma sociedade não somente mais desenvolvida, mas também menos injusta. “. (Pereira e Grau – 1999).

De fato, temos observado a hegemonia de discursos, que por um lado reforçam a centralidade do mercado e que – de certa forma – prescindem da ação dos governos como regulador, ordenando juridicamente os atores e com isso tentando minimizar os problemas daí decorrentes. Muito conhecimento do que acontece na prática é de fundamental importância, pois temos que analisar também como são financiados os dois sistemas: público e privado. Se o privado é decorrente do capital o público também precisa de recursos para atender o coletivo. Conforme Pereira e Grau (1999), a partir de tais considerações, pode se deduzir que um dos nós críticos para a transformação social é o deslocamento do foco de análise, de espaços predeterminados a práticas sociais, partindo de duas premissas. Primeiro, a democratização das instituições políticas e da sociedade são processos interdependentes nos quais é fundamental ampliar as possibilidades de realização do que concerne a todos e interessa a todos: o público. Segundo, o Estado não monopoliza nem necessariamente realiza o interesse público, mas a sociedade em abstrato tampouco. Trata-se em suma, de abrir a discussão sobre a institucionalidade, que tanto pode favorecer a satisfação de necessidades públicas a partir da sociedade, como pressionar a partir dela para que a esfera pública estatal se faça real e efetivamente pública, ou seja, esteja aberta à participação de todos e possa assim regular adequadamente os centros de poder social e econômico, respeitando concomitantemente os espaços de liberdade que são crescentemente reclamados. Por outro lado, assim como não é possível conceber mercado sadio sem Estado que não abdique de seu papel de regulação econômica, também é impossível imaginar sociedade democrática sem Estado que controle os centros de poder privado e opere sobre as desigualdades sociais. Os recursos públicos muitas das vezes acontecem conforme as necessidades públicas, todavia, para que tais metas - via impostos - sejam atingidas necessita fundamentalmente do privado. Discursos e recados para que haja uma mistura de relações são fatos. Não faz muito tempo, o ex-presidente do BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento – Enrique Iglesias - fez a seguinte declaração numa reunião sobre destinação de recursos do BNDES: "A acumulação de recursos no mercado de investimentos institucionais oferece uma oportunidade tanto para o setor público, quanto para o setor privado. Temos que explorá-la, e o BID está trabalhando muito analisando as possibilidades de criação de fundos de infraestrutura locais que permitam promover a captação de recursos e

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contar, para isso, com a participação dos organismos internacionais, da CAF, do BID, do Banco Mundial.” 64 Obviamente as referências são os assuntos de todas as esferas como Saúde, Educação, Transporte e Lazer.65 Sob a visão retrospectiva e com foco na política e interesses mais variados estão as campanhas públicas, principalmente as de saúde, que se iniciaram há muitos anos atrás, pois as condições péssimas de saúde da população e as possibilidades de transmissões endêmicas atrapalhavam o dia a dia das sociedades locais – embora absolutamente necessárias. Esses arroubos de soluções dos governos e políticos referem-se a fase da “higienização” e das várias reformas sanitárias do passado. Foram muitas e serão quase todas citadas em suas épocas e respectivas datas. A dialética do por que isso acontece na atualidade não importa, pois sempre – em todos os tempos - foram fatos reais, ou seja, do privado prestar serviços ao Estado, todavia, estudar suas causas e efeitos é relevante. Nessas intervenções ditas modernas e decorrentes da ortodoxia liberal com os atores da política pública e os protagonistas do privado, além das ONG’s, começam a surgir outros grupos de fornecimento de bens e serviços, muitos na área de saúde. Em alguns momentos houve até substituição do Estado. Bancos como o Mundial e o Fundo Monetário Internacional apóiam programas sociais, ações filantrópicas e de benemerência tomam espaço na Saúde. Esses Bancos sugerem parcerias em todas as áreas. Com isso as ONG’s proliferaram. A atividade associativa ganhou impulso nos anos 70 e acelerou dos 80 para a atualidade. Isto é notório no movimento de mulheres, minorias étnicas, ecologia. Segundo estimativa do Pnud, as ONG’s beneficiariam cerca de 250 milhões de pessoas nos países em desenvolvimento. No Brasil, cidades como Rio de Janeiro e São Paulo, segundo pesquisa em 1986, revela que 65% das entidades haviam sido criadas a partir de 1970. 66 Fernandes (1994) informa que na França, o número de associações deu um salto igualmente expressivo. Mais de 54.000 associações foram criadas somente no ano de

64 Discurso em 13 e 14/11/2003 – no Seminário de Parceria público privada na prestação de serviços de infra-estrutura. 65 Nesse caminho estão a Educação Pública e a das Entidades Privadas; o transporte público que deve ser pago – ônibus, trem, metrô, e o transporte privado – lotações, avião, ônibus, automóveis. Espetáculos de Circo no Sesc – gratuitos ou extremamente baratos e o “Cirque de Soleil” como exemplo de privado e caro e por aí inúmeros outros exemplos. Sob a visão de modernidade, shows de final de ano, inaugurações, showmícios, comemorações de datas importantes, pagos pelo poder público – com dinheiro do contribuinte – mas quase todos executados pelo privado são costumeiras para a sociedade. Empresas privadas de eventos são as mais favorecidas por esses espetáculos, artistas, empresas de segurança, de iluminação e tudo o mais.

66 Entre 1960 e 1980 houve um crescimento de 68% na ajuda externa para o “Terceiro Mundo”, através de agências não governamentais de países europeus, do Canadá e dos EUA: passou-se de 2,8 bilhões de dólares para 4,7 bilhões de dólares. Uma das razões importantes do aumento foi o crescimento dos subsídios governamentais para NGOs (Non-Governamental Organizations): quanto aos países membros da OECD (Organization for Economic Cooperation and Development), por exemplo, eles subiram de 778,2 milhões de dólares em 1973 para 1,5 bilhões, em 1980. Com respeito à comunidade européia, se em 1976 dava às ONGs européias 4,8 milhões de dólares, em 1982 essa quantia chegou a 22,7 milhões. (Fonte: http://empreende.org.br/pdf/ONG's,%20OSCIP'S%20e%20Terceiro%20Setor/Evolu%C3%A7%C3%A3o%20s%C3%B3cio-pol%C3%ADtica%20das%20ONGs%20no%20Brasil.pdf (acessado em 13.03.2011).

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1987 em contraste com 10.000 a 12.000 por ano na década de 60. Entre 1980 e 1986 a arrecadação das organizações filantrópicas – charities - britânicas cresceu cerca de 221%. Estimativas mais recentes da década de 90 registram em torno de 275.000 charities na Grã-Bretanha, com um ingresso equivalente a mais de 4% do PIB. Na Itália, pesquisas indicam um forte impulso na formação de organizações voluntárias nos anos 70 e 80. Assistíamos a uma formidável expansão das iniciativas civis em cujo ventre também estava a Saúde. O fenômeno não é novo, com certeza. A tese do sacerdócio universal, proclamada pela reforma protestante no século 16, abriu as hierarquias sagradas para a participação dos fiéis. O ingresso das classes trabalhadoras na vida pública é tema constante da modernidade e compõe um capítulo obrigatório das histórias sociais a partir do século 19. (Fernandes - 1994) Após aprofundamentos no tema, é possível traçar a mesma temática de análise e retrospectiva para o Brasil no sentido de que essa distinção entre a idéia do Público e a idéia do Privado nos remete até as revoluções americanas e a revolução francesa, pois, são nesses períodos que o poder do Estado se impunha e proporcionou as possibilidades de se desenvolverem políticas de Estado e políticas de pressões da sociedade civil. As visões são as mais variadas entre definições do que é Estado e do que é Privado. Do que é política pública e política privada e terceiro setor. Conforme descreve Carlos Antonio Morales67, (1999), não estamos nos referindo apenas a quantidades significativas, mas da qualidade socialmente reconhecida e de importância cultural inquestionável. Tomando alguns exemplos esparsos, podemos alinhar, no caso do Brasil, algumas instituições de grande prestígio nacional que se enquadram como Fundações, com braço filantrópico, produzindo serviços sociais, como as Pontifícias Universidades Católicas, a Fundação Getúlio Vargas, na área de ensino e as Santas Casas de Misericórdia, o Hospital Sírio Libanês de São Paulo e sua benemerência e a Beneficência Portuguesa, na área de Saúde, diferentes entre si, mas convergentes na saúde. Nos países desenvolvidos, existe larga tradição de instituições sem fins lucrativos organizadas pela sociedade civil. A partir dos anos 80, entretanto, vimos nascerem novas organizações públicas não estatais a partir de organizações estatais transformadas. Esse é o caso, na Inglaterra, dos Quangos, quasi non-governmental organizations – sociedades civis que passaram a receber recursos orçamentários do governo inglês; dos museus nacionais, na Holanda; das charter schools, escolas comunitárias gratuitas, financiadas com recursos públicos, nos EUA, todos eles exemplos de organizações públicas não estatais que assumiram papel institucional de grande relevância social. 68 Isso, com certeza, poderá também acontecer na saúde, embora seja mais complicado e custoso.

67 No livro “O Público não-estatal na reforma do Estado” – de Luiz Carlos B. Pereira e Nuria Cunill Grau (org). – pág. 51 68 Algumas escolas charter são fundadas por professores, pais e ativistas que se sentem limitados pelas tradicionais escolas públicas. O Estado autoriza. São muitas sem fins lucrativos.

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No Brasil, o Parque Nacional da Serra da Capivara, o maior e mais importante sítio arqueológico brasileiro, onde se encontram indícios da presença humana no continente americano há mais de 40 mil ano é administrado por uma organização não governamental, a Fundham – Fundação Museu do Homem Americano. Finalmente, as experiências têm demonstrado que, apesar de esses programas serem financiados com recursos públicos, o caráter público de suas ações não tem sido preservado, levando a uma espécie de privatização. Nesse modelo, portanto, os critérios públicos são substituídos por critérios privados de organização e de acesso a bens e serviços sociais. “A filantropia substitui o direito social. Os pobres substituem os cidadãos. A ajuda individual substitui a solidariedade coletiva. O emergencial e o provisório substituem o permanente.” (Laura Tavares – 2003). O aprendizado com a Igreja e a Universalização Para fazer políticas públicas é necessário analisar – sob o ponto de vista da dialética marxista – que o Estado é a fonte universal da vida ética da nação, pois ele tem a norma jurídica, tem a cobrança dos impostos e têm a força para impor sua capacidade de monopolizar eventuais dúvidas de decisão. O Estado é detentor daquilo que dá visão de público. A força, as normas jurídicas e os impostos. Para conquistar a saúde é necessário intervir, de maneira deliberada e programada, para mudar as relações sociais, não bastando modificar a relação direta, sob a visão da saúde, entre o homem e a natureza. A saúde, justamente, porque exige uma mudança das condições de vida, isto é, uma remoção das causas morbígenas criadas pelo homem, exige democracia, comporta participação direta da comunidade. Portanto, as instituições de saúde para atingirem seus objetivos devem ser democraticamente geridas pelos técnicos e pelos cidadãos. Giovanni Berlinguer, (1978) 69·, afirma que as doenças de hoje e de amanhã se não se intervier a tempo, têm como causas fatores artificiais, isto é, fatores não preexistentes na natureza, mas criados, estimulados ou reforçados pela intervenção do homem. J. Habermas (1994), mais próximo da concepção de Foucault, naquilo que se refere ao público como aquela instituição - formada pela burguesia - e que – pressionada por ela promovem políticas que sejam de interesse da sociedade civil – limitando assim, o Estado. A instituição estatal teria como referência a chamada opinião pública, a qual se define pelo conjunto dos cidadãos burgueses que pressionam as decisões políticas por meio do diálogo na sociedade civil e nos parlamentos, o que pode resultar em limitar o Estado. Quase todos esses referenciais teóricos não vão a antes do século XVIII. É a partir desse período que um desses atores, a Igreja, mostra sua força como instituição e fonte de saberes e de conceitos de seu interesse.

69 Em seu livro, Medicina e Política- 1978

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Tais questionamentos demonstram que o público tem ligações próximas ao privado e vice-versa. Afinal, não se pode esquecer que é a sociedade civil que paga os impostos para que o público produza ações sociais e políticas. Pode-se correlacionar com a igreja que capta recursos das pessoas na forma de coletivo para atender o individual – situações emergenciais – ou o privado da comunidade – casos de extrema necessidade do indivíduo ou da família. A análise de todo esse quadro estrutural nos leva a conceber a difusão existente entre o público e privado em vários setores da economia e na sociedade, com suas limitações de tamanho, contradições e paradoxos quando comparadas suas imbricações com o Estado e o mercado. Trata-se de uma aferição difícil quando nos aprofundamos no tema. A fronteira entre o público e o privado confunde muito o cidadão comum. Essa discussão teórica quer parecer, tem relação prospectiva nas revoluções Americana e Francesa, todavia, conforme afirma Romano (1979) ela é proveniente e recorrente de séculos anteriores com forte influência da Igreja Católica. E novos pensamentos sobre o Protestantismo e o Ateísmo? Como ter novamente e com maior abrangência o mando sacral? Necessário então ter mais detalhadamente os registros dos fiéis. Há extensa biografia à respeito do mundo sacral. A Bula Clericis Laicos de 1296 foi escrita para proibir os reis de taxar impostos, por exemplo.70 Dessa forma a igreja toma corpo e define um mapeamento de sua região, paróquia, conhecendo os que efetivamente dela participam e a temem, sabendo quem vai à missa ou quem deixa de ir. De certa forma a igreja era – no passado – muito mais organizada e mais forte que o próprio Estado, pois se adiantou em informações e definiu sua linha de conduta para o futuro que se avizinhava. Houve momentos na história da Igreja em que ela se confunde verdadeiramente com o Estado local. 70 Romano sugere a leitura do Livro “Os dois corpos do Rei” de Ernest Kantorowiz sobre o assunto do mando sacral – tradução de Cid Knipel Moreira – Companhia das Letras – SP – 1998.

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CAPÍTULO 2 A saúde no Brasil Da Colônia ao Pacto pela Saúde (2006). Assim foi no Portugal de 1500, onde os encarregados da saúde do povo eram os almotacéis, aos quais competia verificar os gêneros alimentícios, apreendendo e destruindo os que não estivessem em boas condições. Ao Brasil-Colônia eram extensivas a legislação e práticas vigentes na Corte. D. Manuel, em 1521, o Regimento do Físico-Mor e do Cirurgião-Mor do Reino, instituindo-se os Comissários-Delegados nas Províncias, inclusive no Brasil. 71Os brasileiros ainda eram os selvagens. Os selvagens brasileiros eram de robusta constituição física. Segundo historiadores escasseavam as moléstias quando do descobrimento. Segundo descrições deixadas pelos sacerdotes do século XVI as doenças que existiam e que atacavam os selvagens era a bouba ou piã, caracterizada pelo aparecimento de lesões cutâneas. O bócio, também conhecido como papeira, algumas parasitoses e dermatoses, reumatismo, gripe e disenterias. Situações também como mordeduras por animais venenosos, cegueira e perda de membros. Quanto a sífilis e a malária, a questão é controvertida. Quer parecer que não existiam. O selvagem tinha nojo e horror pela doença. Apartava-se logo daquele que enfermava. Nos partos a mulher paria com a maior facilidade, seccionando ela mesma o cordão umbilical e carregava o recém-nascido para o banho no rio. Quando o doente estava desenganado pelo pajé, o indígena via-se abandonado à própria sorte e morria sem assistência nenhuma. Morto, era enterrado de cócoras, com a cabeça entre os joelhos de frente para o nascente. Algumas tribos mumificavam os corpos pelo fogo e outras conservavam o esqueleto, untado com óleos vegetais e enfeitado com penas de pássaros. Como plantas medicinais, usava-se o caju, o ananás e o jaborandi como diuréticos; o guaraná nas disenterias; a copaíba, a pariparoba e a cabriúva na bouba e em ferimentos e outras afecções. O maracujá nas febres, a poaia e a batata-de-purga como purgativos, a contra erva e o pau-cobra nas mordeduras de serpentes, o tabaco e o jataí nas doenças pulmonares. Utilizava ainda a urina, a saliva, o sangue humano e de animais, gordura de onça, bicos, garras, chifres, osso e cabelos e ainda sapos queimados e reduzidos a pó. Os dentes, quando careados, eram arrancados com instrumentos de madeira. Para se preservar das picadas dos insetos untavam-se com fruto do jenipapeiro e do urucuzeiro. 72 Nos tempos da catequese, os jesuítas moveram campanha de descrédito aos pajés. Com isso, muitas plantas medicinais brasileiras incorporaram-se à farmacopéia brasileira e mundial. Embora não se tenha conhecimento de qual é o relatório médico mais antigo do Brasil, sabe-se que, nos três primeiros séculos de colonização, as

71 Santos Filho (1980) – Este capítulo 2 – foi baseado em grande parte neste autor. 72 Santos Filho (1980)

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únicas formas de assistência médica e hospitalar disponibilizadas à população eram as enfermeiras jesuítas e as Santas Casas de Misericórdia73 .Elas precedem a própria constituição jurídica do Estado brasileiro. Uma vez criadas, a primeira em 1543, por Tomé de Souza, que era o mandante geral da colônia, passaram a se dedicar ao atendimento de enfermos, amparo à velhice, à criança, aos hansenianos e a educação entre outros trabalhos. A assistência médica foi uma das formas de catequisar o indígena. Contava-se então, na época, com a Companhia de Jesus para atender além do indígena, os colonizadores e outros. (Santos Filho – 1980). Chegados à Bahia em 1549, no séquito do governador geral Tomé de Sousa, os filhos de Santo Inácio aqui permaneceram até 1759, quando foram expulsos por determinação do Marquês de Pombal. Nesses dois séculos que permaneceram, ajudaram o indígena, foram os professores das primeiras letras e de artes e ofícios. Seus colégios espalharam-se por todo o território. Desses irmãos jesuítas, sabidamente, Manoel de Nóbrega e José de Anchieta. Fizeram de tudo. Medicavam, lancetavam, sangravam e até partejavam. As cartas enviadas sobre o Brasil do século XVI, endereçadas aos superiores da Companhia de Jesus na Europa, encerram preciosos dados e observações sobre a patologia e terapêutica da época. As doenças da época e seus remédios. Já naquela época epidemias apavorantes de varíola e de sarampo, malária, disenterias, dizimavam adultos e crianças. Não poupava ninguém. A todos socorriam os jesuítas com seus parcos conhecimentos médicos e de enfermagem. Sangraram variolosos e os sarampentos. Receitavam cará nas disenterias. Contra a maleita aplicaram a quina do Peru. A quina do Peru ficou conhecida na Europa como o pó dos jesuítas. Contra o cálculo de vários tipos, receitavam caldo de ananás verde. Obtiveram êxito com a poaia, ou ipecacuanha, como purgativo. (Santos Filho – 1980). Uma das atribuições principais de autoridades na Colônia era conceder graduação aos físicos, licenciar boticas e autorizar o exercício de atividades auxiliares da arte de curar. E em 1744, já no reinado de D.João V, foi reiterada ao então Vice-Rei do Brasil, Conde de Galvêas, em ordenação real, quanto à imposição de inspecionar as boticas de três em três anos, com percepção de taxas, bem como a apreensão e destruição de drogas alteradas. Em 1782, por lei da Rainha D. Maria I, foi reformada a organização estabelecida, instituindo-se a Junta do Protomedicato, constituída de sete deputados com mandato de três anos. A primeira organização nacional de saúde pública no Brasil,

73 No Brasil, a necessidade de internação de pacientes destituídos de recursos ou recém-chegados, sem família e sem moradia, acarretou logo no século XVI a criação das Santas Casas da Misericórdia, segundo os moldes da estabelecida em Lisboa. O surgimento dessas coincidiu com uma nova política de ocupação de terras inaugurada pela Coroa Portuguesa, promovendo a intervenção direta dos empreendedores europeus na esfera da produção conforme a legislação das sesmarias e o estabelecimento de capitães-donatários, todos fidalgos da pequena nobreza, segundo a prática feudal lusa. Em 1548, a Coroa portuguesa resolveu intervir mais diretamente na questão do povoamento do território brasileiro, nomeando como primeiro governador-geral Tomé de Souza, fidalgo e rico aventureiro da carreira das Índias. Esse se estabeleceu na Bahia, fundando a cidade de São Salvador, capital do Brasil colonial até 1763. O governo de Tomé de Sousa (1549-1553) foi sucedido por outras quatro administrações gerais até a União Ibérica, em 1580, quando o reino de Portugal se uniu ao da Espanha. O domínio espanhol sobre o Brasil foi importante na formação das várias das nossas instituições - entre elas as Santas Casas - que se disseminaram ao longo dos séculos pelas principais cidades e vilas, com fins de dotar a colônia de estabelecimentos para a assistência hospitalar, ou seja, visando entre outras obras piedosas e de caridade também curar os enfermos. http://www.sbhm.org.br/ - acessado em 19/05/2005. (sbhm: sociedade brasileira da história da medicina)

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propriamente em 1808, quando D. João VI, transferia a Corte para o Brasil, restabeleceu as funções de Físico-Mor e Cirurgião-Mor, além dos Juízes-Comissários, Delegados do Físico-Mor, com a exigência de que fossem formados por Coimbra. No mesmo Ato de 27 de fevereiro de 1808 foi criado o cargo de Provedor-Mor de Saúde da Côrte e do Estado do Brasil, embrião da Diretoria de Saúde dos Portos, com delegados nos Estados.74 Nas boticas dos colégios havia uma farmacopéia manuscrita intitulada Coleção de Receitas, onde se alinhavam drogas simples e compostas, as mais indicadas para diversas doenças. Quando sobrevinham epidemias de bexigas, os padres cediam as suas próprias casas para internação e tratamento dos variolosos. Pode-se afirmar que a medicina predominante no Brasil no século XVI foi a dos jesuítas. Depois de instaladas as Misericórdias é que se passou a assistência com as enfermarias e boticas através do irmão-enfermeiro e do irmão-boticário. Assim, as Santas Casas de Misericórdia se espalharam pelo território brasileiro. Atualmente, via CMB - Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas, são mais de 2.000 em todo o território brasileiro. São responsáveis por mais de 175.000 leitos hospitalares do País e em muitos deles são verdadeiros centros de referência e excelência médica. As Santas Casas foram responsáveis pela criação das primeiras Escolas de Medicina e de Enfermagem.75 76 Nos três primeiros séculos a medicina e a saúde praticada no Brasil basearam-se nos princípios e ensinamentos da ciência ibérica, de Portugal e Espanha. A partir do século XIX percebe-se que ela seguiu a medicina e os métodos de saúde da França. Outras teorias também tiveram seu período de moda. A homeopatia, por exemplo, doutrina lançada em Dresde (1810) por Samuel Hahnemann, foi introduzida por Benoit Jules Mure (1809-58), João Vicente Martins (1808-54) e outros que nela acreditavam. No século XIX, a doença infecciosa gastrintestinal provocada pelo vibrião colérico, descoberto em 1883, veio acrescer o quadro patológico brasileiro. A primeira epidemia começou no Pará, onde desembarcaram coléricos e por dois anos (1855-56) acarretou a morte de umas duzentas mil pessoas. (Santos Filho – 1980) Durante o período colonial, a medicina também era exercida por pajés, feiticeiros africanos, jesuítas, cirurgiões portugueses, hispânicos e holandeses. A forma de administração, na época, dificultava a criação de ensino superior de medicina, pois isso seria uma ameaça à dependência de Portugal. Havia alguns médicos brasileiros, formados na Europa e alguns europeus que vinham exercer aqui a sua profissão. A partir do século XVIII e foi em 1773 que o Marquês de Pombal decretou a abolição das expressões diferenciadoras de “cristão-novo” e “cristão-velho” a todos igualando, e 74 Santos Filho (1980) 75 http://cmb.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=16&Itemid=30&limit=1&limitstart=2 76Cerca de 2.100 Santas Casas e Hospitais sem fins lucrativos fazem a diferença para a saúde no Brasil e todas elas estão ligadas a Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas – CMB. Estima-se que 800 são Santas Casas de Misericórdia. Quase 7 milhões de internações hospitalares em 2008, das quais quase 5 milhões pelo SUS. As Santas Casas respondem por 41% das internações do SUS. Há 104 Operadoras Filantrópicas de Planos de Saúde. Empregam quase 500 mil empregos diretos e mais de 140 mil médicos autônomos. (www.cmb.org.br)

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isso proporcionou que os médicos passaram a usufruir de melhor consideração social e ocupar posição social de relevo em vista de suas origens de centros europeus como Edimburgo e Montpellier. Já haviam também médicos brasileiros formados em centros europeus. Ser médico era ser destacado na sociedade colonial. Desfrutavam de boa situação financeira e tinham grande respeitabilidade pela burguesia citadina. Alguns destacam-se. A Academia dos Felizes, fundada no RJ em 1736, teve a presidência do cirurgião-mór Mateus Saraiva. A Academia Científica de 1771, e a Sociedade Literária, de 1786-94, ambas no Rio de Janeiro, contavam em seu seio profissionais dos mais destacados do Vice-Reino. Foram eles, José Henriques Ferreira, Ildefonso José da Costa Abreu, Maurício da Costa, Luís Borges Salgado, Vicente Gomes da Silva e Manuel Joaquim Henriques de Paiva. Este último, conceituado clínico em Lisboa, publicou várias obras medicas e retornou ao Brasil. Em 1829 faleceu no cargo de professor da Academia Médico-Cirúrgica, José Pinto de Azeredo e Francisco de Melo Franco, naturais do país, fizeram fama na metrópole. Muitos foram os físicos no Brasil entre os séculos XVI a XVII, portugueses, espanhóis, franceses, holandeses, mas merece, entretanto, um destaque a figura do médico holandês Willem Piso (1611-78), senhor que foi de cultura humanística, adquirida nos Países-Baixos, o autor da primeira parte da História Naturalis Brasilae, Amsterdam, 1648, denominada de Medicina Brasiliense. Permaneceu em Recife de 1637 a 1644. Tal obra é um verdadeiro tratado da patologia brasileira de então. Quem o trouxe para o Brasil foi o conde de Nassau. (Santos Filho – 1980) Cirurgiões-barbeiros, cirurgiões-aprovados e cirurgiões-diplomados, tais foram os que praticaram a arte da medicina e da saúde nas populações do século XVI a princípios do século XIX. Foi um grande período. Os cirurgiões-aprovados seguiram um curso teórico-prático em hospitais. Antes disso não havia no Brasil escola para o ensino médico e isso foi o propósito para a formação de cirurgiões-barbeiros em algumas Santas Casas de Misericórdia e Hospitais Militares no século XVIII. Em 1803 o capitão-general de São Paulo, Antonio José de Franca e Horta, instituiu oficialmente no Hospital Militar uma “Aula de Cirurgia” que foi freqüentada por seis estudantes, os quais, em março de 1804, passaram por exames e foram aprovados. No início do século XIX, se não havia condições para a administração do ensino médico, já para o de cirurgia, muito menos complexo, achavam-se aptos certos hospitais e mestres. (Santos Filho – 1980). Durante todo o período Colonial no Brasil, os problemas de saúde e higiene ficavam sob a responsabilidade das localidades. Elas tomavam medidas contra a imundície das ruas e quintais. Era necessário criar também escolas de nível superior para as inúmeras necessidades que, com uma nova corte, o país iria necessitar.

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Brasil – Monarquia e Saúde No Brasil a Constituição de 1824, primeira carta Magna,77 estabeleceu os socorros públicos. Havia alguma preocupação com a seguridade social, sendo criado o primeiro Montepio cujo nome era montepio Geral dos Servidores. A data de 1889 foi a dicotomia entre Reinado – Monarquia – e a República.78 Nesses idos do final do século XIX, a igreja já tinha suas articulações estabelecidas em territórios em que o Estado ou a República nem imaginavam que existiam. A penúria era geral. Não havia nenhum tipo de atendimento público às populações que se encontravam em São Paulo, Capital, Rio de Janeiro, Salvador e interior desses Estados. Doenças debilitantes como a Ancilostomíase79 e a Malária eram comuns em todas as províncias. Outras regiões como o sertão brasileiro, estados longínquos como Mato Grosso, Mato Grosso do Sul,80 Piauí, Roraima, Amazonas e outras regiões consideradas distantes do governo central, não eram ainda territórios de serviços de Saúde. Higienização ainda era uma palavra pouco conhecida. Não se pode esquecer que relações com escravos e o domínio português, foram atividades durante quase três séculos, acompanhando ciclos econômicos do açúcar (1550-1570) e do café entre 1820 e 1870.81 Nesse período não havia nenhum desenvolvimento econômico e a miséria, doenças, invalidez, indigência prevaleciam sob o mando dos exportadores de madeira, café, açúcar e da Igreja Católica que abarcava a evangelização através de mecanismos de controle e apoio do Reinado e depois da República. No Brasil, desde a colônia até o século XX, a Igreja cumpriu funções na área da saúde e de todas as demais áreas que atendiam a população. As Santas Casas são exemplos marcantes na filantropia de saúde no Brasil. De resto, a benemerência das pessoas. Na tese de Doutorado de Aldaíza O. Sposati,82 ela retrata alguns episódios da época- 1803 - um dos quais, em que o vigário de São Miguel informava ao governador da Capital de São Vicente (São Paulo) sobre a “impossibilidade d’elle poder existir com a insignificante porção que os moradores oferecerão a sua

77 A elaboração da Constituição do Brasil de 1824 foi bastante conturbada. Logo após a Proclamação da Independência do Brasil, em 7 de setembro de 1822, ocorreu um conflito entre radicais e conservadores na Assembleia Constituinte. A Independência do Brasil não havia se consolidado com a aclamação e coroação do Imperador, mas sim com sua Constituição. A Assembleia Constituinte iniciou seu trabalho em 3 de maio de 1823, quando o imperador Dom Pedro I discursou sobre o que esperava dos legisladores.

78 O Estado brasileiro – de certa forma - surgiu contra a Revolução Francesa, como uma tentativa de prevenir nos trópicos os supostos desmandos democráticos das Revoluções Americana e Francesa, mas com bastidores de comitê privado das classes dominantes. (Aciole – 2006).

79 Transmite-se através do solo pelos ovos depositados nas fezes e daí tornam-se embrionados. Nas crianças causa amarelão, enfraquecimento e conseqüente anemia. Na década de 50 era chamada doença do Jeca Tatú. Recomendava-se higiene. Lavar as mãos e usar sapatos. 80 Nessa época eram um único Estado. 81 Yida – pág. 25 82 Sposati, Aldaiza– livro “História da Pobreza assistida em São Paulo” – 1987 – pág. 65

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subsistência e não devendo ser obrigados a contribuir com mais pela pobreza a que se vêem reduzidos”. Com a super concentração de todas as decisões no poder central e com a maior força dos poderes do Executivo tem um federalismo que não permite diversidade nos ordenamentos legais e nas políticas públicas principalmente de Saúde dos estados e municípios. Criação das primeiras escolas superiores Depois da transferência da Corte Portuguesa para o país, em 1808, duas escolas de medicina foram criadas por D. João, uma em Salvador, na Bahia, em fevereiro de 1808, e outra no Rio de Janeiro. Quem foi nomeado para cuidar da fundação das escolas foi o cirurgião-mor do Reino, o brasileiro Dr. José Correia Picanço (1745-1823). A realidade da Saúde no Brasil precisa ser vista como um grave problema que esteve latente antes da vinda de D. João VI ao Brasil e que foi sendo curada somente e lentamente ao longo das últimas gerações. No caso do Brasil aquela vinda de D. João VI, que fugia de Napoleão na Revolução Francesa deu início ao Estado brasileiro e a Saúde brasileira. Um Estado de decisões centralizadas, monárquico num território tão grande e uma diversidade de culturas e de população que nem o rei conhecia. É necessário ter uma visão do que era a população na época. Em 1822, o Brasil tinha 4,5 milhões de habitantes – menos de 3% de sua população atual – divididos em 800.000 índios, um milhão de brancos, 1,2 milhões de escravos, africanos ou seus descendentes e 1,5 milhão de mulatos, pardos, caboclos e mestiços. 83 Bem depois, em 1884, faltando cinco dias para a Proclamação da República, ainda havia no Brasil 1.240.806 escravos. De cada três brasileiros, dois eram escravos, negros, forros, mulatos, índios ou mestiços. Era uma população muito pobre e carente de tudo. A atual Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro foi criada por D.João VI, por meio de Carta Régia assinada em cinco de novembro de 1808, que determinava o estabelecimento de uma Escola de Anatomia, Medicina e Cirurgia no Hospital Morro do Castelo. Posteriormente, em três de outubro de 1832, durante a Regência,foi sancionada a lei que transformava as academias médico-cirúrgicas das cidades do Rio de Janeiro e de Salvador em Escolas ou Faculdades de Medicina. As duas escolas transformaram-se anos depois em Academias Médico-Cirúrgicas, obedecendo ao plano apresentado pelo Dr. Manuel Luís Álvares de Carvalho, que em 1812 foi nomeado diretor dos estudos médicos e cirúrgicos da Corte e do Estado do Brasil. Uma característica desse período foi o predomínio das chamadas doenças pestilenciais, notadamente varíola, febre amarela, malária e tuberculose. A Academia no Rio de Janeiro instalou-se em 1813, na Santa Casa de Misericórdia,84 83 Laurentino Gomes – 1822 – Nova Fronteira – RJ – 2010 – (também em história demográfica do Brasil em: http://historia_demografica.tripod.com/pop.pdf).

84 Atualizando, de 1988 a 2008, realizou 11,8 milhões de consultas, 746 mil internações e 704 mil cirurgias para os pacientes do SUS de Porto Alegre e de todo o Rio Grande do Sul – como exemplo do volume de atendimentos.

(Fonte: http://www.santacasa.org.br/revista/vermateria.asp) (acessado em 13.03.2011).

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e a da Bahia, também sediada na Santa Casa, só funcionaria em 1815. Havia aulas e concediam o diploma de cirurgião-aprovado ao aluno que em cinco anos cursasse as diversas cadeiras de anatomia, química, fisiologia, higiene, etiologia, patologia, terapêutica, operações, obstetrícia e clínica médica. Recebia o título de cirurgião diplomado, aquele que repetisse em mais um ano as disciplinas lecionadas nas duas últimas séries. Essas academias perduraram até 1832. Santos Filho,(1980) destaca, que nesse ano, que era Regência, o futuro D. Pedro II, transformou-as em Faculdades de Medicina. O curso passou então para seis anos. No final do curso após defesa de tese, o aluno obtinha o diploma de doutor em medicina. Essas faculdades passaram também, até o século XX, ministrar cursos farmacêuticos em três anos, curso de obstetrícia para parteiras em um ou em dois anos e o curso odontológico, em três anos. Este último foi instituído em 1884 por uma reforma. Foi nesse período, entre o fim da Monarquia e início da República Velha, que a sociedade brasileira iniciou a constituição do seu Estado moderno, marcado pelo predomínio dos grupos sociais vinculados à agro exportação cafeeira. Após a Independência foi promulgada aos 30 de agosto de 1828 a lei de municipalização dos serviços de saúde, que conferiu às Juntas Municipais, então criadas, as funções exercidas anteriormente pelo Físico-Mor, Cirurgião-Mor e seus Delegados, todavia, foi retirado das mesmas Juntas o direito de cobrar tributos sanitários. A Inspeção de Saúde Pública do Porto do Rio de Janeiro, subordinada ao Senado da Câmara, foi criada ainda em 1828, sendo duplicado em 1833 o número de seus integrantes, com a divisão das atividades em serviços de terra, inclusive a quarentena em Jurujuba, e o serviço de mar, com sede na então Ilha de Villegagnon, além da criação de Inspetorias em todas as províncias marítimas. Obedecendo ao mesmo critério de luta contra as epidemias criava-se o Instituto Vacínico do Império em 1846 e tornava-se obrigatória a desinfecção terminal dos casos de morte por doença contagiosa, a critério da autoridade sanitária, em 1878. Até 1850 as atividades de Saúde Pública, em resumo, estavam limitadas aos seguintes itens observáveis: a) Delegação das atribuições sanitárias às Juntas Municipais, b) Controle de navios e saúde dos portos e c) Autoridades vacinadoras contra a varíola. (Rodrigues – 1967). Em 1851 era regulamentada a lei que criara a Junta Central de Higiene Pública. Essa Junta era composta de um Presidente, nomeado pelo Governo, dos Cirurgiões-Mores da Armada e do Exército, além do Provedor da Saúde do Porto e do Inspetor Geral do Instituto Vacínico. Esse colegiado criou as funções de médicos efetivos das Paróquias, para atender a polícia sanitária e ao saneamento. O primeiro Hospício de Pedro II, para os alienados, inaugurou-se somente em 1852. Os doentes mentais, antes do hospício, eram recolhidos às cadeias públicas e isso transcorreu ainda durante muito tempo. Em 1854 surgiu o Imperial Instituto dos Meninos Cegos, o primeiro que se sabe para propiciar assistência especializada aos destituídos de visão. (Santos Filho – 1980) Em 1856, a Faculdade de Medicina foi transferida para o antigo prédio do

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Recolhimento das Órfãs, na Rua Santa Luzia, ao lado da Santa Casa de Misericórdia. Três nomes importantes relativamente às ações empreendidas na medicina e saúde em Salvador, foram publicadas na Gazeta Médica da Bahia, a partir de 1866: Oto Edward Henry Wucherer (1820-73), de ascendência alemã, mas nascido em Portugal, formou-se na Alemanha e veio para Salvador em 1843 que fez pesquisas sobre o amarelão, uma parasitose e a “Wuchereria” que era a causa desencadeadora da Elefantíase. Outro notável, foi José Francisco da Silva Lima (1826-1910), natural de Portugal, formado em Salvador e o terceiro pesquisador, foi John Ligertwood Paterson (1820-82), natural da Escócia e falecido em Salvador, aonde chegou em 1842. Esses três é que deram início ao que era chamado de Medicina Tropicalista. Nesse período podem ser destacadas algumas realizações importantes que marcaram profundamente a sociedade brasileira da época: a) reforma urbana do Rio de Janeiro; b) reforma urbana da cidade portuária de Santos em São Paulo; c) criação do Instituto Oswaldo Cruz no Rio de Janeiro; d) criação do Instituto Vital Brasil; e) leis e códigos que davam vida à política de saúde. (Oliveira & Teixeira, 1989). Uma Constituição, a de 1824 em quase nada muda o cenário, principalmente na Saúde. Províncias foram criadas, governadores nomeados, era a Monarquia hereditária e os deputados eram eleitos por quem possuía renda superior a cem mil réis por ano. O Senado era vitalício.85 Esse novo Estado cria algumas leis como a Lei de Terras, em 1850, lei número 601, autoriza-se a vinda de mão de obra do exterior, o tráfico de negros foi extinto efetivamente em 1850 e a discussão da Abolição da Escravatura vai até 1888. (Yida - 1994). Em 1902 iniciou-se o governo Rodrigues Alves e, com ele, a saúde pública federal foi entregue à lucidez e capacidade de Oswaldo Cruz, que iria inaugurar uma nova era para a higiene brasileira, ao mesmo tempo em que São Paulo surgiam os trabalhos desenvolvidos pela equipe onde se destacariam entre muitos Emílio Ribas e Vital Brasil. Na reforma, Oswaldo Cruz, introduzida com o Decreto Legislativo n.º 1151, de 5 de janeiro de 1904, foi criada a Diretoria Geral de Saúde Pública, para atender as capitais do país e a cuidar da defesa sanitária dos portos brasileiros. Desenvolvimento e crescimento das escolas superiore s Em 12 de outubro de 1918, foi inaugurado, então, o primeiro prédio próprio da Faculdade de Medicina da Praia Vermelha. Essa construção funcionou como escola até 1920,86 quando foi criada, por decreto, a Universidade do Rio de Janeiro. Outro marco importante da evolução sanitária brasileira foi a reforma Carlos Chagas que, reorganizando os serviços de saúde pública pelo Decreto Legislativo 3.987, de 2 de janeiro de 1920, criou o Departamento Nacional de Saúde Pública. A regulamentação desse diploma legal sofreu substituições e modificações até a publicação do Decreto 16.300 de 31 de dezembro de 1923, que vigorou como Regulamento Sanitário Federal por muitos anos. (Rodrigues – 1967).

85 Caio Prado Jr. – “Evolução política e outros estudos” - de 1957 86 Devido a epidemia da Gripe Espanhola.

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Muitas mudanças ocorreram a partir de então: criação de Diretorias grupando atividades então mais numerosas e diversificadas. Introdução de propaganda e educação sanitárias na técnica rotineira de ação, ao contrário do critério policialesco; criação de órgãos especializados de luta contra a tuberculose, a lepra e as doenças venéreas, visando alcançar os êxitos que o já extinto Serviço de Profilaxia da Febre amarela proporcionara; deu assistência hospitalar, infantil e a higiene industrial; expandiu as atividades de saneamento em âmbito nacional, cuidando-se, pelo que se sabe, pela primeira vez, de assistir e dar cooperação aos Estados mediante ação executiva do governo federal; criação da Escola de Enfermeiras Ana Nery, abrindo o caminho para essa importante profissão integrar a equipe de saúde pública. Referências dos últimos 150 anos da Saúde no Brasil têm seus alicerces que transcorria nas grandes capitais como São Paulo e Rio de Janeiro. Antes desse período o que acontecia fora de São Paulo, Rio de Janeiro era desprezível como informação, com exceção das Santas Casas de Misericórdia. (Santos Filho – 1980). Mais de 90 anos se passaram até que outra escola fosse criada. Até 1960, havia 26 Faculdades de Medicina no Brasil. De 1930 a 1970, foram criadas 43 Escolas Médicas, a maioria de iniciativa privada. Em 1996, havia 82 Instituições de Ensino de Medicina autorizadas a funcionar e, com isso, teve início uma visão contextual geral de uma identidade própria da saúde dos brasileiros. 87 Apesar dos percalços houve grandes reformas na saúde dos brasileiros. Houve reformas no tempo do Brasil-Colônia e Brasil Reinado, Brasil Império, criação da Diretoria Geral de Saúde Pública com Oswaldo Cruz, em 05/01/1904, a Organização do Departamento Nacional de Saúde Pública com a reforma Carlos Chagas, pelo Decreto 15.003 de 15/09/1921, a criação do Departamento Nacional de Saúde, efetivamente, com Barros Barreto, em 02/04/1941. O Departamento Nacional de Endemias Rurais e a Escola Nacional de Saúde Pública passaram a integrar o Ministério da Saúde, respectivamente por força da Lei 2.743, de 06/03/1956 (Decreto 40.870 de 07/02/1957) e da Lei 2.312 de 03/09/1954 (Decreto nº 43.926, de 26/06/1958).88 A identidade da saúde brasileira passou por vários estágios. Ainda está presente a mística, que coexiste com o saber técnico e com a questão do benefício social. O fato de a Igreja Católica ter participado de nossa colonização e de ter aqui desenvolvido o culto e a crença no passado entre a população e os indígenas, promovendo a idéia de salvação pela fé jesuítica, gerou muitas fortalezas místicas e religiosas para a cura das doenças. Muito mais adiante, nos anos 60 essa mistura de identidades e uma saúde desacreditada e com problemas graves de solução levantou uma identidade vinda do setor privado: Na visão dos governantes da época, uma saúde suplementar seria bem-

87 Fonte: http://www.medicina.ufrj.br/notíciasAntDet.asp. Acessado em 22/01/2006. 88 Em virtude da Lei 5.019, de 7 de junho de 1966, a Escola Nacional de Saúde Pública foi incorporada à Fundação Ensino Especializado de Saúde Pública. A Fundação Serviço Especial de Saúde Pública (F. SESP) foi criada pela Lei 3.750 de 11/04/1960.

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vinda para ajudar a desafogar a pública. Começam a surgir então os planos de seguro saúde e os convênios de saúde com empresas embora houvesse uma corrente absolutamente contrária a abertura da Saúde para a atividade privada. Em resposta ao Concílio Vaticano II, os bispos latino-americanos reuniram-se em Medellin, Colômbia, em 1968 e proclamaram a doutrina de que a boa nova do Evangelho implicava uma opção preferencial pelos pobres. O aggiornamento na América Latina colocou a Igreja Católica num novo caminho. Foram os agentes pastorais que deram origem as Comunidades Eclesiais de Base. 89 As paróquias permaneceram poucas e imensas. Tabela IV - Rede Paroquial no Brasil por Século

Século 15 17 18 19 20 Total

Número de Paróquias 22 76 282 1210 5.282 6.872

Dados até 1985 – Fonte – Bartholo, 1991 Traços deste passado histórico restaram na própria definição de “Público” e “Privado” e geraram, por exemplo, a permanência e a influência da Igreja Católica nas políticas públicas. 90 A análise da formação histórica mostra com clareza a Igreja participando das decisões do Estado nas políticas públicas. Apesar da visão que temos na atualidade, é inegável a forte permanência e cumprimento da Igreja Católica nas áreas de Saúde e de muitas outras tarefas que caberiam ao Estado. Por isso o Clero era chamado pelos políticos em todas as ocasiões importantes. Isso aconteceu desde a Colônia, Monarquia e até o século XX. Nesses casos resta uma pergunta: A Igreja era pública por prestar inestimáveis serviços públicos ou era privada como as instituições por ela administradas, tais como as como as Santas Casas de saúde? Na Saúde Pública pouco se discutia até então.91 A benemerência era o que contava e já estava arraigada na sociedade da época. Homens ligados ao Império e mulheres benemerentes, todos com títulos, participavam de comissões para a Saúde Pública e isso lhes fornecia prestígio e celebridade. A tuberculose, a febre amarela,92 varíola93 e

89 Ainda que o ímpeto inicial tenha passado e que o impacto seja diferenciado, não há dúvida de que - nos últimos tempos - introduziram um novo capítulo na história das associações formadas nas igrejas locais no continente. As comunidades puseram as pessoas para falar. Difundiu-se nos meios católicos a crença genuína de que se as pessoas pensarem juntas serão capazes de transformar a si próprias, a Igreja e o mundo. (Fernandes – 1994).

90 O Público e o Privado na Saúde. - Orgs. Luiza Sterman Heimann, Lauro César Ibanes e Renato Barboza - Editora Hucitec - OPAS/IDRC São Paulo, 2005 pág. 23 - 41. 91

Em São Paulo, criou-se o Serviço Sanitário em 1892, com um orçamento de 300 contos de réis, que correspondia a 1/6 do orçamento estadual em 1891.

92 A febre amarela que era endêmica nas costas do golfo do México e nas Antilhas, propagou-se à Europa e à África após a descoberta da América. Negros infeccionados teriam trazido para o Brasil. A primeira epidemia data de fins de novembro de 1685. Principiou-se no Recife onde desembarcaram negros doentes. Durou cerca de dez anos. Há um Tratado único da Constituição Pestilencial de Pernambuco, Lisboa, 1694, de João Ferreira da Rosa, segundo livro, em vernáculo, da literatura médica brasileira. Somente em 1849 é que irrompeu outra epidemia e sabe-se que uma das vítimas foi o senador e ex ministro Bernardo Pereira de Vasconcelos. O Rio de Janeiro livrou-se desse mal em princípios do século XX, pelo saneamento levado por Oswaldo Cruz, conforme já comentado. 93 Importada da África onde era endêmica. Havia também na Europa. Denominação popular “bexigas”. Matou centenas de milhares de indígenas e é apontado como o maior exterminador dos índios brasileiros. Segundo os jesuítas, os

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a malária andavam à solta. Essas informações que temos da história retratam cidades como as do Rio de Janeiro, São Paulo, algumas cidades de Minas Gerais e outras onde se situavam as pessoas de forte opinião pública e de alguma influência política. Imagine-se o resto do País com os problemas de Saúde Pública. Foram apurados alguns dados que seguem em tabela abaixo. No Vale do Paraíba, por exemplo, os municípios ficaram cem anos sem os serviços públicos essenciais como cemitério, hospital e escola. Sem os serviços, eles recolhiam os impostos que seguiam para o poder central, que distribuía os recursos segundo o apoio político que recebiam das províncias. Em 1820 constatou-se aumento do número de leprosos e em 1846 uma epidemia de febre amarela em Salvador.94 Tabela V - Mortalidade para cada 100.000 habitantes

Períodos Tuberculose Febre amarela Malária Varíola

De 1860 à 1870 11.303 1.706 801 620

De 1871 à 1880 7.902 5.225 3.149 2.513

De 1881 à 1890 5.648 2.274 2.640 1.964

De 1891 à 1900 4.952 4.369 3.410 1.866

A tabela foi resumida pelo autor da tese. Fonte: B.A. Rodrigues – pág. 112. O surgimento das Irmandades de Misericórdia a partir do século XVI, com suas hospedarias e com os seus hospitais, foi dando início às Santas Casas. Além das enfermarias jesuíticas, as Santas Casas, destinadas principalmente à pobreza, contava ainda com os hospitais militares, destinados à tropa, os lazaretos para os morféticos e os isolamentos para as quarentenas e para os portadores de doenças contagiosas e epidêmicas como a varíola. Imagine como isso era pouco para a vastidão do nosso território brasileiro. Hospitais militares datam de fato a partir do século XVIII. Não se falava ainda como atender doenças mentais. Os morféticos95 proliferavam e eram encaminhados aos lazaretos. A lepra torna-se doença de notificação compulsória em 1911 – na forma como é determinado na atualidade e é assumida pelo governo, passa para os cuidados da Santa Casa em São Paulo em 1917 e oito anos depois é criada a Inspetoria de Profilaxia da lepra. (Yida –1994). primeiros variolosos chegaram à Bahia em 1561 e a primeira grande epidemia ocorreu em 1563. Não havia remédio. Durou quatro séculos. A principal arma contra a doença, que é devida a um vírus, foi a vacina anunciada ao mundo em 1796 pelo médico inglês Edward Jenner. Em 1798, o médico Francisco Mendes Ribeiro iniciava no RJ a vacinação. O povo era temeroso e fugia da vacinação. O primeiro vernáculo sobre o assunto e o sarampo intitulava-se Tratado único das bexigas e sarampo, Lisboa, 1683 e o autor foi Romão Mosia Reinhipo. Fonte: Santos Filho, pág. 45 e 50. 94 A.R. Netto – “O caminho para formação do Serviço Sanitário de São Paulo” – 1942 – pág. 18/21 95 De acordo com o decreto federal 6.168, de 24 de julho de 2007, os pacientes internados compulsoriamente e isolados em hospitais colônias de todo o País, até o ano de 1986, terão direito à pensão vitalícia mensal no valor de R$ 750,00. Para receber o benefício, os pacientes precisam apresentar documentos que comprovem a internação compulsória e preencher um requerimento de pensão especial. Outro dado importante, é que o Estado de São Paulo, mantém um arquivo microfilmado de documentos, fichas de internação e prontuários de vítimas de hanseníase desde 1924. São 83 anos de informações sobre a doença. Outras informações sobre o benefício podem ser obtidas pelo site da Secretaria de saúde no link definido como “hanseníase”.

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O modelo agroexportador vigente na economia brasileira, no período, exigia basicamente uma política de saneamento dos espaços de circulação das mercadorias exportáveis e o controle de doenças que prejudicassem a exportação. As municipalidades tinham autoridade para legislar e tomar providências, todavia, percebe-se pela leitura da época, uma aversão dos negócios públicos para evitar confrontos políticos. Sposati,96 em sua descrição, revela que “os fiscais da Câmara também deveriam realizar inspeções e sugerir medidas adequadas, como por exemplo, em relação aos cortiços. Uma das situações urgentes em São Paulo era solucionar a precariedade das moradias. Contudo, como consta de jornal da época, os fiscais temiam que as medidas mais efetivas comprometessem seu compadrio com os vereadores e que isso levasse a perda do seu emprego...” A República e a Saúde A República já contava com alguns notáveis como Oswaldo Cruz97 e Emílio Ribas98 que sob a notoriedade conseguida, de forma privada, eram abraçados pelos intelectuais republicanos. Outras doenças maltratavam a população brasileira. As mais simples eram a Sarna e a Escabiose. As mais complicadas eram a Bouba,99 o Papo,100 o Sarampo, Sífilis, Filariose, Dracunculose, Macula, Escorbuto, doenças venéreas e produtos contaminados. Algumas datas são interessantes para reflexão: 1895 – decreto de Floriano Peixoto sobre a carne de charque e contágio. Em 1895, por pressões da burguesia, criou-se a Diretoria Geral de Saúde Pública. 1889 – surgiu a peste bubônica em Santos – que se espalhou para o Rio de Janeiro. Isso gerou a criação de laboratórios como Butantã e Manguinhos e entre 1899 e 1910 começaram a surgir as primeiras campanhas sanitárias em Santos, São Paulo, Rio de Janeiro e Recife.101 A varíola dizimava grandes contingentes de todas as raças e classes sociais. (Iyda - 1994). Os períodos que merecem informações retrospectivas na saúde e suas relações público-privadas são aqueles entre 1889 – a instalação da República até 1930 – getulismo – de 1930 a 1950, de 1950 ao início do golpe militar em 1964, de 1964 até final da década de 70 e até os dias atuais. Obviamente nesses períodos, à exceção das décadas de 60 em diante, serão abrangidos os processos históricos, políticos e

96 Sposati, A. de O – “História da Pobreza Assistida em São Paulo” – 1987 – Tese de Doutoramento – PUC-SP. 97 Oswaldo Cruz – Era filho do médico Bento Gonçalves Cruz e de Amália Taborda de Bulhões. Nasceu em 1872 e viveu em sua cidade natal, São Luís do Paraitinga até 1877. Seu pai transferiu-se para o Rio de Janeiro. Ingressou na Faculdade aos 15 anos e interessava-se muito por microbiologia. Especializou-se em Paris no Instituto Pasteur de Paris em bacteriologia. Em 1902 assumiu postos de direção na Saúde e teve muitas vozes contra quando tentou fazer uma campanha de vacinação no Rio de Janeiro. Ele insistiu e depois venceu a batalha, pois em 1907 a febre amarela foi considerada erradicada no RJ. 98 Emilio Ribas – Nasceu em Pindamonhangaba em 11/04/1862 e faleceu em 19/02/1925. Sanitarista. Formou-se pela Faculdade de Medicina do RJ. Fundador do Instituto Butantã, implantou sanatórios em Campos do Jordão. 99 Os primeiros que versaram sobre essa doença foram André Thevet e Jean de Lery. Era endêmica no Brasil e atingia os selvagens, que a chamavam de piã e miá e começou a atacar brancos e negros principalmente no Nordeste. São lesões pustulosas na pele e mucosas. O primeiro ensaio a versar sobre o mal, Memória sobre as boubas, foi o manuscrito de 1797, do Dr. Bernardino Antonio Gomes (1768-1823) – Santos Filho, Lycurgo – pág. 44. 100 Detectada pelos naturalistas viajantes entre os indígenas e seus descendentes mestiços, nas regiões do Sul, o papo ou bócio, chamava a atenção pelo volume enorme atingido pelo pescoço. Sabe-se hoje que é uma hipertrofia da glândula tireóide. Curioso é que naturalistas como Spix e Martius anotaram que elas consideram o papo mais embelezamento do que deformação. 101 Iyda – pág. 36

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sociais da Saúde Pública, pois a privada até então era incipiente e utilizada pelas classes mais favorecidas via médicos particulares. Apesar do longo período, observa-se que a sociedade vai se articulando sobre as questões de saúde e doença e historicamente – numa luta permanente – demonstra a necessidade de seus direitos, isso legitimado na forma de seguridade em longo futuro na Constituição de 1988, ou seja, um século depois. A Saúde Pública passa para a responsabilidade estatal quando da implantação da República em 1889. A miserabilidade era o quadro nesse período. A República não aconteceu por acaso. A deterioração do poder que reinava espalha-se. As classes dominantes apavoram-se com o abandono e o descaso em todos os níveis, educação, o saneamento básico, as doenças transmissíveis. Nesse ponto é que se pode afirmar que a gênese da Saúde Pública se formou como objeto de consciência pública. Nesse período o Nordeste nem fazia parte do mapa da República ainda. Durante muitas décadas a questão social foi caso de polícia para o novo Estado, pois somente por volta de 1930 é que se referia à ele nos discursos à trabalhadores brasileiros. Pode-se afirmar que até essa época o Estado brasileiro ainda não existia. O que havia de fato eram coalizões de poder de interesses privados daqueles que exportavam. Eram as classes dominantes. A força do privado sobre o público fraco. Eram de extrema urgência na República recém instalada, práticas sociais, regras, sanções, ou seja, tornou-se um elemento político muito forte. Necessário institucionalizar a Saúde Pública e para isso serão exigidos os recursos para tal. O Estado, então, estabelecido e tentando uma hegemonia de poder inicia com uma série de práticas burocráticas e nesse processo cria algumas medidas positivas para o proletariado na época. Pode-se também afirmar que as relações sociais – nelas envolvendo a Saúde Pública – tiveram seus primeiros conflitos de classes. Merhy, (1985), observa que na etapa da República houve uma emergência institucional das práticas sanitárias. A legitimidade do Estado estava definida e a burocracia terá que buscar as forças e os recursos financeiros para contratar as forças de trabalho para a Saúde e ir de fato de mãos à obra. Constituirá então ao Estado a tarefa de controlar algumas doenças que poderiam ser transmitidas à população na época, inclusive às classes dominantes até então. Relativamente à saúde das populações pode-se afirmar que somente as regiões dotadas de maiores aglomerados e nas capitais é que havia trabalhos em Saúde Pública. Com pouquíssimos hospitais e a preocupação maior dos governos era a higienização. Tais preocupações em realidade eram pressões das burguesias locais que temiam a progressão da tuberculose, rubéola, sífilis e outras doenças consideradas na época, infeciosas. Ao capitalismo reinante interessa apenas pagar a força de trabalho e não pagar paralisações por motivos de doença ou disseminação dela pela sociedade.

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Iniciavam-se os primeiros movimentos por melhores condições de trabalho e de vida mais digna. Engrossavam então as fileiras de pessoas sem qualificação profissional e de pobres que proporcionavam ainda mais o aumento de doenças por décadas em vista de crescimento urbano ser maior que a industrialização. Algum tipo de ruptura estava próxima. A gênese da saúde e de outras necessidades básicas da população estava na forma e influência do colonialismo sob pressão do capital na época. A situação da população continuava a mesma. No caso de novos brasileiros que nasciam pelas mãos das parteiras curiosas, a vida e a saúde – quando não prematuros ou com problemas neo-natais - os mesmos estavam nas mãos ainda de homens bons102 e a benemerência da Igreja ou associações de bondosas senhoras. A cirurgia obstetrícia no passado foi eminentemente mutiladora. Quanto a outras cirurgias cortava-se o membro doente. Extirpava-se o órgão afetado. Lancetava-se a tumor ação. Nessa época era perigoso intervir no corpo humano, pois a infecção pós-operatória era quase certa. A quantidade de casos fatais eram impressionantes. Somente após o advento da anestesia e da assepsia, em pleno século XIX é que a cirurgia se expandiu. 103 A cirurgia104 principiou a tomar incremento no Brasil, no século XIX, já então exercida pelos doutores em medicina e pelos professores das duas escolas do RJ e da Bahia. Foi em 1842 que Cândido Borges Monteiro, realizou na Côrte a ligadura da aorta abdominal, num caso de aneurisma da artéria ilíaca externa. (Santos Filho – 1980). Nessa época ainda queixavam-se os profissionais de falta de instrumentos. Os ferros, como foram chamados compreendiam tesouras, pinças, serras, cautérios, agulhas, lancetas, escalpelos, bisturis e cânulas. Existiam ainda as sondas de prata, evacuadoras da bexiga e seringas de metal para lavagem de feridas e da uretra. Atendimentos às parturientes por médicos é assunto a partir do século XIX. 105

102 Não confundir com homem cordial. Em “Raízes do Brasil” de 1936, Sérgio Buarque de Holanda criou o conceito de homem cordial – uma crítica à promiscuidade entre o Público e o Privado na vida brasileira. Revista Veja – pág. 131 de 21/01/09 – Edição 2096 – ano 42 – número 3. ““... A vulgarização de que foi acometido o conceito de “homem cordial” me faz lembrar-se das dores de cabeça que já me causaram as interpretações equivocadas da teoria da dependência. Sérgio tomou a expressão de empréstimo a Ribeiro Couto. Ao contrário do defendido por muitos, como Cassiano Ricardo, a cordialidade em tela nada tinha a ver com os ritos de polidez. Na verdade, opunha-se a eles. Se a polidez era definida por normas impessoais, de aplicação geral, a cordialidade tinha o timbre pessoal, dizia respeito ao comportamento ditado pelo coração, a lhaneza no trato, a hospitalidade, mas também a inimizade, o favor. Enfim, identificava-se com os padrões de sociabilidade inerentes à família... (Fernando Henrique Cardoso – Acervo de O Globo). 103 A instalação da sala de cirurgia, nos hospitais, data de fins do século XIX, depois das pesquisas de Louis Pasteur (1822-95), em França, sobre os micro-organismos, depois da adoção da assepsia ou da desinfecção das mãos do operador e dos instrumentos, preconizadas por Joseph Lister (1827-1912), depois da descoberta dos micróbios contaminadores da ferida operatória. Nessa data, ou pouco antes, o operador fazia intervenções vestido como estava, nem um avental usava e muito menos luvas. Os instrumentos eram apenas lavados em água e serviam para uma operação ou para uma necropsia. 104 Praticou-se pela primeira vez nos EUA, em 1846, uma operação indolor através da inalação do éter. No ano seguinte a experiência repetida no Hospital Militar do RJ. O clorofórmio foi usado na Europa em 1847, e em 1848, empregando a máscara de Souberain, o cirurgião Manuel Feliciano Pereira de Carvalho efetuou a primeira cloformização. 105 Há uma relíquia de obra de 1790 que o médico brasileiro, Francisco de Melo Franco, publicou o Tratado da educação física dos meninos, para uso da nação portuguesa, em Lisboa, na oficina da Academia Real das Ciências, onde se constata teorias e ensinamentos sobre a assistência à parturiente e sobre os cuidados com o recém-nascido. O ensino da obstetrícia para mulheres iniciou no Brasil em 1832. No Rio de Janeiro diplomou-se a mais célebre das parteiras, francesa de nascimento, Maria Josefina Matilde Durocher (1808-1893) que passou para a história sob o nome de madame Durocher. Ela partejou a imperatriz D. Teresa Cristina

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Se pensarmos que o Estado brasileiro firmou-se num território do tamanho de um continente e nele os municípios se situavam numa enorme distancia em relação ao poder central, os mesmos municípios viveram durante toda a colônia e a maior parte do século XIX, entrando para século XX , na mais triste penúria de recursos públicos. A década de 1920 – como já comentado - pode ser fixada como marco para se afirmar que a partir dessa referência é que o processo histórico de Saúde se iniciou de fato. Antes disso era um salve-se quem puder. Nesse sentido o sanitarismo brasileiro, do início do século, guarda uma relação muito próxima com a idéia de polícia médica desenvolvida na Alemanha e com a medicina urbana desenvolvida na França. Braga e Paula (1981) mostram que na década de 20, especificamente no ano de 1923, com a “Lei Eloy Chaves”, surge a Previdência Social no Brasil com a criação das Caixas de Aposentadoria e Pensões (Cap’s). A partir de 1926 a assistência médica é incorporada como uma atribuição das Cap’s. A descentralização republicana é meramente executiva, uma vez que os recursos orçamentários, provenientes de taxas de importação, de selo e de consumo, estabelecidos pela Constituição de 1891,106 beneficiaram apenas os estados economicamente mais poderosos. Consequentemente, grande parte dos estados dependia do governo federal, não se concretizando os ideais republicanos de autonomia estatal. Uma maior interferência do governo federal encontrará maior aceitação após 1920, em virtude da crise econômica cafeeira desde o início do século e agravada com a Primeira Guerra Mundial. Essas oligarquias – muitas regionais – tiveram seu modelo rompido na Revolução de 1930. Nesse momento getulista o Estado mostrou-se como esfera Pública forte em novos conceitos econômicos e sociais. Nesse momento, no Brasil, o Público e o Privado começam a ter rostos diferentes. A expansão da assistência médica individual no Brasil como política pública faz parte do processo de montagem e desenvolvimento da Previdência Social. A estruturação do sistema previdenciário, de forma incipiente a partir dos anos 20 e mais intensamente a partir dos anos 30 é o marco básico do sistema de proteção social montado no Brasil, por meio do qual se desenvolveu a sustentação pelo Estado dos direitos sociais. 107 108 Essa forma de se definir o público no Brasil seguiu para estabelecer uma ética política peculiar. Como os municípios não possuíam recursos para as obras, como pontes, estradas, prédios oficiais, “os homens bons”, os ricos fazendeiros que eram

e foi a primeira mulher a ser recebida, como membro titular, na Academia Imperial de Medicina, em 1871. (Santos Filho – 1980).

106 Foi na República de 1891 que foi utilizado pela primeira vez na ordem jurídica brasileira o termo Aposentadoria. Pela lei, Carta Magna, artigo 75 a aposentadoria por invalidez cobria apenas os funcionários públicos (Giusti, 2008). No ano seguinte, a Lei 217 de 29/11/1892 instituiu a aposentadoria por invalidez e a pensão por morte para os operários do Arsenal de Marinha do RJ. 107 Menicucci – pág. 61 108 No século XX o sistema de saúde brasileiro transitou do sanitarismo campanhista para o modelo médico-assistencial privatista, até chegar nos anos 80, ao projeto neo-liberal (Villaça-Mendes-1999).

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vereadores ou prefeitos, emprestavam seu dinheiro, seus escravos, e compravam materiais para as obras. A contrapartida era emprestar do cofre público quando estavam com dificuldades. É a partir daí que se inicia, um longo processo pelo qual a pobreza começa a ser identificada como incômoda e até perigosa e associada a valorização do trabalho e a uma esfera de maior atuação do Estado no mercado de trabalho. É também nessa década que se delineia a fragmentação de uma política social dirigida aos trabalhadores em geral e aos trabalhadores urbanos ativos, via previdência social. “O liberalismo, do qual que se serviram os independentes para libertar-se de Portugal, sempre foi sensível às pressões dos interesses privados pelo aumento da capacidade regulamentadora do poder público”. 109 Um tema correlato às relações entre público e privado que estamos investigando é o da forma de governo. Os motivos pelos quais incluímos esta discussão a respeito do tema são três. O primeiro é que o pensamento predominante tem elegido a democracia como a forma de governo ideal para o Estado moderno. O segundo é que os movimentos de Reformas Sanitárias110 brasileiras desde cedo abrigaram a idéia de relações intrínsecas entre democracia e saúde, chegando a brandir o lema de democracia na saúde como um de seus temas, e como bandeira central de sua luta para a reforma pretendida, numa abrangência que tanto implicava participação ampla da população quanto extensão da assistência ao maior contingente possível da população brasileira. O terceiro é que o desenvolvimento da sociedade moderna está marcado, como vimos, pela separação entre o Estado e a Sociedade, isto é, entre a esfera pública e a privada. (Aciole - 2006). Nesse momento, demarca-se, com maior nitidez, o Público e o Privado, a saúde pública e a assistência médica privada de caráter liberal – liberalismo, diga-se de passagem, incipiente – ligada ao setor público, por auxílios e subvenções estatais, que manterão a maioria dos serviços médico-hospitalares, de caráter filantrópico, dominantes na época, e onde se desenvolve grande parte da atividade da medicina liberal. As relações na medicina e saúde geral entre o público e o privado, com recursos estatais, já caminhavam na Europa e nos EUA no século XVIII, todavia, no Brasil, pesquisas efetivas de cunho científico só se iniciaram com o médico Oswaldo Gonçalves Cruz (1872-1917) e com os seus discípulos do Instituto de Manguinhos no RJ. Em São Paulo, Adolfo Lutz (1855-1940) e Vital Brasil (1865-1950) interessaram-se por investigações da patologia brasileira.

109 Yida – pág. 48 110 No Brasil do começo do século, a partir do Código Sanitário de 1918, observam-se outras Reformas Sanitárias em 1925, 1931 e 1938 que suprimiu as Delegacias de Saúde e foi criada a Inspetoria de Higiene dos Municípios, a Inspetoria de Educação Sanitária e os Centros de Saúde para a profilaxia geral e o controle das doenças transmissíveis como a lepra, a tuberculose, a sífilis, doenças venéreas, a febre amarela e a assistência dentária. Artigo de Joyce Mendes de Andrade Schramm ett all – Revista Ciência e Saúde Coletiva – vol.9 – número 4 – RJ – Oct/dez/2004.

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Em fins do século XIX, graças aos recursos econômicos oriundos das plantações de café, permitiu-se o surgimento de laboratórios e contratação de pessoal na área de saúde. Data de 1888 o aparecimento do Instituto Pasteur no Rio de Janeiro para o preparo da vacina contra a raiva ou hidrofobia. Quem instalou foi Augusto Ferreira dos Santos (1849-1903), que era lente de química da Faculdade do RJ e aprendera a técnica no Instituto Pasteur de Paris, enviado pelo imperador D. Pedro II. A esse centro sucederam-se outros. O de São Paulo é de 1903 fundado por um grupo de médicos dirigidos por Ulisses de Freitas Paranhos (1880-1954). Após a proclamação da República, foi criado em São Paulo em 1892, o Instituto Bacteriológico para estudos de microbiologia e confecção de vacinas. O primeiro diretor, que foi trazido da França foi o parasitologista Félix Le Dantec (1893), que logo foi substituído por Adolfo Lutz. 111 Com o advento dos trabalhos de Pasteur, a luta contra as doenças transmissíveis destacou-se como das mais importantes atividades em saúde pública, surgindo a necessidade dos laboratórios especializados como elementos indispensáveis na elucidação diagnóstica, assim como na descoberta e libertação de portadores, fabricação de soros e vacinas, orientação científica do tratamento médico, além da avaliação da imunidade prevalente na população, antes e após surtos aparentes ou não de epidemias. O Instituto Pasteur de Paris serviu durante muito tempo de paradigma aos laboratórios integrantes de organizações administrativas governamentais de grande número de países, incluindo-se o Brasil, desenvolvendo-se rapidamente em todo o mundo as pesquisas aplicadas ao diagnóstico, prevenção e tratamento daquelas doenças. Posteriormente outros laboratórios foram surgindo e incentivo à pesquisa científica foi estimulado na Alemanha, EUA e na Dinamarca. No Brasil, a criação em 1907, por Oswaldo Cruz, do Instituto de Patologia Experimental de Manguinhos foi marco importante na luta contra as doenças transmissíveis com base na orientação científica, destacando-se entre outras, as pesquisas de alto interesse sanitário desenvolvidas por Carlos Chagas sobre a doença que posteriormente tomou o seu nome, de Gaspar Vianna na leishmaniose e de Adolfo Lutz na epidemiologia da esquistossomose. Nessa mesma época verificou-se uma relação entre doenças e o meio rural. É comum nesse meio ambiente, no caso brasileiro, se construir os currais ao lado das habitações, com todas as desvantagens decorrentes como invasão maciça de moscas, poeira e mau cheiro. Também a promiscuidade do homem rural com galinhas, porcos, carneiros e outros animais é habitual, tornando-se tanto mais comum 111 Adolfo Lutz, nasceu e faleceu no Rio de Janeiro. Formou-se em medicina em Berna, Suíça (1879). Fez muitos cursos em escolas européias. Em 1886, associado a Unna, em Hamburgo, descreveu as granulações de Lutz, do bacilo da morféia. Em 1892 dirigiu o leprosário de Honolulu. De 1893 a 1908 foi diretor do Instituto Bacteriológico de São Paulo, onde fez inúmeras pesquisas. Em 1889 irrompeu em Santos, uma epidemia provocada por ratos. Tratava-se da peste bubônica. Lutz enviou o seu assistente Vital Brasil para verificação. O governo federal enviou também Oswaldo Cruz. Ambos investigaram e diagnosticaram que, de fato, era peste bubônica. Cogitou-se então, rapidamente, de se instalar estabelecimentos para fabricação da vacina e do soro contra a peste. Fundou-se então em São Paulo, por iniciativa de Emílio Marcondes Ribas (1862-1925), diretor do serviço sanitário o Instituto Seroterápico, na fazenda Butantã. Indicado por Lutz, Vital Brasil assumiu a chefia e nela ficou até 1919, quando se retirou depois para o RJ. A cólera e a escarlatina foram investigadas e comprovadas por Lutz em São Paulo. Junto com Alfonso Splendore, descreveu a esporotricose (1907) e no ano seguinte, apontou a blasto micose sul-americana. Em 1908, convidado por Oswaldo Cruz para o Instituto Manguinhos, Lutz foi para o RJ e lá ficou até sua morte. (Fonte: Instituto Adolfo Lutz - http://www.ial.sp.gov.br/).

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quanto menos educado o indivíduo, exposto assim às mais variadas zoonoses. (Rodrigues - 1967). No interior ou meio rural utilizava-se o médico ou farmacêutico mais próximo da região. Em muitas regiões não havia atendimento público. Essa passagem entre o publico e o privado integra a ética do cotidiano dos políticos e da população se pensarmos que além dessa praticas e da presença da Igreja garantindo os serviços, existia a concentração do poder na capital do País. Em 1918, o governo estabelece convênio com a Fundação Rockfeller para ministrar cursos de Higiene aos estudantes de Medicina em moldes modernos, sendo enviados para o Brasil dois sanitaristas, Darling e Smillie. O primeiro foi chefe dos Laboratórios da Missão Gorgas no Panamá, Malaia e zonas tropicais e foi diretor do Laboratório de Higiene, de 1918 a 1920. As Caixas de Aposentadoria e Pensões – CAPs Outro marco histórico da assistência médica no Brasil data de 1923: por iniciativa do Estado, foram criadas as Caixas de Aposentadoria e Pensões, conhecidas como CAPs, sendo que, depois, algumas empresas também disponibilizaram esse benefício a seus trabalhadores 112 O objetivo era, então, atender ao binômio - saúde e aposentadoria - por meio de uma forma tripartite de financiamento - governo, empregadores e empregados. Tratava-se, pois, na época, de um compartilhamento triplo entre o público e o privado. As primeiras instituições previdenciárias surgidas por iniciativa estatal para os trabalhadores do setor privado, uma vez que já existiam diversas iniciativas voltadas para funcionários públicos, são as Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAP’s), criadas nas empresas a partir de 1923 por determinação governamental e com a participação de recursos públicos.113 A partir de 1926 a assistência médica é incorporada como uma atribuição das Cap’s. Nessa ocasião, as CAPs se desenvolveram e levaram à criação dos Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAPs), em 1930, que eram ainda destinados a categorias profissionais. Na década de 30, o sistema previdenciário brasileiro passa por profunda reformulação, com a criação dos Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAPs), que sucederam e foram absorvendo as CAPs.114 Em vez de serem vinculados a uma empresa como as caixas, os IAPs incorporam cada um deles, uma categoria profissional e passam a ser de caráter nacional. 115 Existiam, por exemplo, os IAPI dos industriários, os IAPC dos comerciários, o IAPM dos Marítimos, o IAPB dos bancários e o IAPTEC daqueles que trabalhavam com transportes e cargas. Tais institutos adquiriram um poder muito forte, decorrente de

112 A primeira empresa a oferecer assistência dessa natureza, somente para seus empregados e dependentes foi uma empresa ferroviária - (CF. Bahia, Ligia & Nunes, 2000, p. 10). 113 Menicucci – pág. 62 114 Em 1930, existiam 47 CAP’s e davam cobertura para 142.464 beneficiários (Villaça Mendes 1999). 115 Menicucci – pág. 63

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seus tamanhos, e passaram a deter força de pressão política. O maior problema que enfrentavam, porém, era a grande diferença entre eles. De certa forma, alguns eram mais elitizados que outros, gerando diferenças no atendimento à saúde e nas pensões, com taxas diferenciadas na folha de pagamento. Assim, o IAPB dos bancários era considerado um dos melhores institutos - a estabilidade era de dois anos, a aposentadoria ocorria depois de vinte e cinco anos e os serviços médicos eram de padrão superior, criando certo descontentamento em outras classes de trabalhadores. Além disso, quando precisavam mudar de emprego, os bancários, bem como seus familiares eram prejudicados com a perda desses benefícios. Apesar desses problemas, o sistema público se cristalizou. Dentre às evoluções da legislação, destaca-se uma antiga que vale a pena ser rememorada. Em 1919, por exemplo, foi criado o Seguro de Acidentes do Trabalho para atender um número muito grande de acidentados nas fábricas que começavam a proliferar em São Paulo e Rio de Janeiro. A partir daí, houve uma ligação muito forte entre saúde pública/privada e previdência, que foi sendo mais bem definida a partir da década de 20, época de crise mundial que levou a intensas mudanças. Na privada eram apenas ensaios de apoio de médicos, embriões de convênios ou algo do gênero. Na década de 30, o crash da Bolsa de Nova York também afetou o Brasil, levando à necessidade de se fazer adaptações e mudanças no sistema geral de saúde e previdenciário. Em 1926 foram criadas as Prefeituras Sanitárias das quais a de Campos de Jordão (lei 2140 de 01/10/1926) nomeando seus Prefeitos. Com essas decisões abrem-se também inúmeras oportunidades de compartilhamento entre o Público e o Privado. Nos países onde atuava a Fundação Rockefeller já referida, buscava fomentar localmente as atividades das empresas norte-americanas, seja por meio de suporte operacional, estudos de campo ou outros meios ao seu alcance. Em abril de 1915, Wickliffe Rose enviou carta ao seu compatriota Percival Farquhar, magnata e empreendedor, considerado o último dos robber barons, participando-lhe a possibilidade de realizar no Brasil um convênio para fazer estudos sobre a ancilostomose, ou ainda qualquer outra investigação que fosse de seu interesse. O Sindicato Farquhar fundara, entre outras, a Amazon Land Colonization Co., empresa constituída para explorar a borracha na Amazônia (Moniz Bandeira, 1973:193). A borracha assumia relevância crucial e estratégica em tempos de guerra, daí a oferta de Rose para garantir a salubridade aos trabalhadores nos campos de produção. A política do “dollar diplomacy” do governo Taft (1921-1930) concorreria para completar o controle financeiro até o início da década de 1930. Aponte-se também o contrato obtido por Percival Farquhar do Legislativo para a Itabira Iron em 1928, empresa nominalmente inglesa e precursora da atual Companhia Vale do Rio Doce, com 60% de capital controlado pelos norte-americanos (Moniz Bandeira, 1973:214). Ressaltem-

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se ainda os esforços das empresas petrolíferas dos EUA visando obter o monopólio brasileiro de petróleo. 116 O convênio acima citado possibilitou a criação desse laboratório, subordinado a cadeira de Higiene da Faculdade de Medicina, e, em 1924, transforma-se em Instituto de Higiene. No mesmo ano, 1918, indicados pelo International Health Board of the Rockfeller Foundation, fazem parte da primeira turma de Johns Hopkins School of Higiene and Public Health (instituída e subvencionada por aquela fundação) os doutores Francisco Borges Vieira e Geraldo Paula Souza. Em 1927, Paula Souza e Borges Vieira escrevem ao doutor Strode,117 solicitando auxílio da Fundação Rockefeller para defender a autonomia do instituto. E, em 1930, Paula Souza sugere a transformação do instituto em organização internacional, que posteriormente transformou-se na Faculdade de Saúde Pública – USP.118 Definitivamente – podemos afirmar – está institucionalizada a Saúde no Brasil. A década é a de 30 e a crise que já se aproximava desde 1929 bate às portas. O período Vargas que se inicia em 1930 marca um momento de reorganização das relações Estado/Sociedade de forma corporativista, que teve como um de seus objetivos: incorporar os trabalhadores urbanos ao jogo político, embora de forma subordinada ao Estado. Isso se deu pelo reconhecimento do trabalho organizado e de políticas sociais. A ordem política é o ser humano, a paz, a felicidade de quem trabalha e quer prosperar. O ideal é a justiça social. Iniciam-se os mecanismos de centralização de poder a partir de 1930 com a progressiva ocupação do espaço organizacional e decisório das agências burocrático-estatais, às quais o Departamento Nacional de Saúde (DNS) se integra. No Brasil, o ensino e a pesquisa científica no campo da administração começaram logo após a revolução constitucionalista de São Paulo, em 1932, com a criação da Fundação IDORT, 119 - Instituto de Organização Racional do Trabalho - cabendo a Roberto Simonsen, Armando de Salles Oliveira e Clóvis Ribeiro a liderança desse movimento. A administração Sanitária começou a ser ensinada nos Estados Unidos da América do Norte durante a década de 20, embora de modo um tanto empírico, pois constituía tal ensino pouco mais que uma exposição da prática da Administração de

116 Documento 011 da Coleção Rockefeller, Rio de Janeiro: Fundação Oswaldo Cruz. 117 Diretor da Fundação Rockefeller 118 “Histórico do Instituto de Higiene” – datilografado (arquivo) – Yida – pág. 53 119 A crise de 1929 evidenciou as falhas da estrutura econômica brasileira, principalmente a má organização e a falta de controle eficiente da produção; o abalo revolucionário indicou a necessidade inadiável de mudança. Nesse contexto, novas idéias, como a organização científica do trabalho, eram mais do que bem-vindas. O industrial Roberto Simonsen foi um desses pioneiros, ao imprimir em suas organizações as idéias de racionalização, promovendo na indústria paulista uma nova mentalidade no tratamento das empresas e nas relações de trabalho. A Associação Comercial de São Paulo também agiu efetivamente para a divulgação dos princípios da racionalização. Em 1929, a entidade convidou o professor suíço Léon Whalter, que realizava estudos e experiências no campo da psicotécnica, para ministrar cursos e conferências na sua sede. A ação foi tão bem sucedida que deu origem à criação de uma comissão de especialistas, composta pelos professores Geraldo de Paula Souza, Monteiro de Camargo, Lourenço Filho e Roberto Mange, que estudaram o projeto de criação de um Instituto que cuidasse da organização científica do trabalho. (Fonte: http://www.idort.com/History.aspx?subjectId=743F81AF-E4BE-DC11-9D7D-0014220BC504&langId=1&fatherId=1) acessado em 29/06/2011.

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Serviços de Saúde Pública do país, sem obedecer a uma metodologia científica: era como que um relato do trabalho de administradores sanitários. Somente na década de 50 é que apareceu naquele país, escrito por J.J. Hanlon, um livro de Administração Sanitária baseado em princípios e métodos de administração geral e pública. Em 1955 veio à luz o livro de Molina e Adriasola – Princípios de Administración sanitária.120 (Rodrigues – 1967) A ocupação do espaço é demonstrada pela Constituição de 1934 em seus vários artigos. (Campello e Yida - 1994).121 Foram tempos difíceis na nova Constituição de 1934 com Revolução Constitucionalista e a formação do Partido Integralista. Essa Constituição é a que definiu os rumos da Saúde em geral, dando-lhe a importância que precisava. Pode-se afirmar que nem a Constituição de 1946 foi tão destacada para a Saúde como a de 1934. A partir de 1930, e dentro desta estratégia federal, a Saúde Pública ocupa um maior espaço institucional e, inclusive, como assinalam alguns historiadores “por pressão dos intelectuais e militares na criação de novos serviços... num período de dificuldades financeiras... em que a administração federal não se propõe a grandes esforços de aprimoramento”. Havia também grande preocupação com os problemas decorrentes da toxicomania. Ela já era conhecida como problema na China do século XVII, agravando-se no século XVIII quando os seus habitantes aprenderam a fumar o ópio, por intermédio dos javaneses. Havia pressões de várias naturezas.122 Esta pressão resultou em 1931, na criação do Ministério de Educação e Saúde e, em nível estadual, das Secretarias de Educação e Saúde Públicas. Essa institucionalização da Saúde torna-se mais forte a ponto de, em 1943, ter sob sua égide a Saúde Mental, a Medicina Social, o Instituto Butantã, o Departamento de Profilaxia da Lepra e posteriormente o Departamento Estadual da Criança. O Dia da Criança que foi instituído em 12/10/1924 através do Decreto 4867 foi considerado data importante, todavia, as crianças só obtiveram a atenção devida a partir de 1937

120 Esses dados constam do Prefácio de Rodolfo dos S. Mascarenhas no livro de Adm. Sanitária de Dr. Bichat de Almeida Rodrigues. 121 M.C. Campello de Souza em “O Estado e partidos políticos no Brasil – (de 1930 a 1964 ) pág. 84 e citação do mesmo autor em Yida - página 56. 122 O grande mercado que era a China, a qual chegou a consumir em 1906 cerca de 22.000 toneladas de ópio, determinava lutas por interesses financeiros internacionais, visando assegurar o uso e os mercados – tornou-se sede em 1909, na cidade de Xangai, da primeira reunião para estudar o problema, sob o patrocínio dos EUA. Na conferência de Haia em 1912, também convocada pelos EUA, procurou-se também limitar a produção desses alcalóides. No Brasil, medidas legais de controle de Entorpecentes passaram a vigorar desde 1921, quando o Decreto Legislativo n.º 4.294, de 6 de Julho, estabeleceu penalidades para os contraventores da venda de cocaína, ópio, morfina e seus derivados. Nessa época cria-se um estabelecimento especial para internação dos intoxicados pelo álcool ou substâncias tóxicas. O Decreto n.º 14.969 de 3 de setembro de 1921 é que aprova o regulamento para entrada no país das substâncias tóxicas, impõe penalidades aos contraventores e cria sanatórios para os toxicômanos. O Decreto 20.930, de 11 de janeiro de 1932 delegava às autoridades de saúde pública a fiscalização e controle dos entorpecentes, criando uma Inspetoria, mas o passo mais importante foi a criação da Comissão Nacional de Fiscalização de Entorpecentes, estabelecida pelo Decreto n.º 780, de 28 de abril de 1936. (Rodrigues -1967).

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quando foi criado o Instituto Nacional da Criança e já nesse período havia conhecimento dos espantosos índices de mortalidade materna. 123 Uma análise da incorporação de problemas, que constituirão áreas tradicionais de Saúde Pública, mostra a relação do Privado/Público e como o aparelho estatal vai incorporando-os, desenvolvendo atividades, destinando-lhes recursos iniciais e estruturando-se em organizações burocráticas mais complexas. Conforme já comentado, a tuberculose,124 a lepra e a mortalidade infantil já aparecem no cenário nacional como fenômenos relevantes do século anterior,125 ficando a responsabilidade de seu controle, basicamente para as Santas Casas. A mortalidade infantil126 era insustentável como índice e informações. Em 1952 iniciaram-se a instalação de centenas de postos de puericultura por todo o Brasil. Nas capitais juntamente com a LBA – Legião Brasileira de Assistência127 e as Pastorais da Igreja Católica foram instalados postos volantes.128 Igreja e Estado demarcaram as bases e os horizontes da sociedade civil organizada, ela mesma tendendo a estruturar-se em crescentes conglomerados associativos. (Fernandes – 1994). Essas instituições ao adquirirem maior transparência com as aglomerações urbanas, dão origem a movimentos civis que congregam médicos da área privada e leigos, basicamente, e mulheres que se dedicam à filantropia, em associações ou ligas. Estas ligas contra a lepra e a tuberculose e que também dão proteção e alimentação à infância, servem-se da divulgação e propaganda, arrecadam recursos da população em geral, criam taxas de contribuições, buscam auxílios governamentais fundando sanatórios, leprosários ou casas de proteção aos órfãos e até hospitais. Organismos da ONU, como FAO e UNICEF estavam nessa rede de proteção. De certa forma já era algum tipo de compartilhamento Público e Privado.

123 Conceito: é o número de óbitos maternos, por 100 mil nascidos vivos de mães residentes em determinado espaço geográfico no ano considerado.

124 Ela era inexistente antes da descoberta do Brasil. Veio com os brancos e negros. A tísica ou febre héctica desenvolveu-se com a falta de higiene e o fácil contágio. Indígenas morreram aos milhares. Os brancos também não foram poupados. Poetas como Castro Alves e muitos outros morreram doentes do peito. (Santos Filho – 1980). Para combater preconceitos e conscientizar a população sobre detecção precoce e tratamento da tuberculose, há no bairro da Rocinha, RJ, o Grupo de Apoio a ex-pacientes, pacientes e amigos do combate à Tuberculose. Com cerca de 111 mil casos novos e 6 mil mortes anuais no Brasil, a situação é agravada por más condições de vida. Para a especialista Margareth Dalcolmo, o SUS também tem sua responsabilidade: “Não existe paciente difícil de ser tratado, existe serviço ineficiente”. Fonte: Radis número 69 – maio/08. 125 O advento da era microbiana, com os trabalhos iniciais de Pasteur, permitiu a substituição de medidas empíricas, embora corretas em muitos casos. Estabelecido o princípio fundamental da especificidade do agente etiológico, fixado por Koch, nos seus postulados outros aspectos foram sendo esclarecidos. 126 A mortalidade infantil era extremamente preocupante. Os coeficientes chegavam a assustar em alguns municípios. Por exemplo, em 1960, em Maceió o índice era de 225,7, em Goiânia, 258,0, em Fortaleza 263,2, em Teresina 298,8, em Natal 263,4, em Japoatã, 385,0, em Bezerros (PE) 409,0, em Caruaru 455 e em Canhoba 460,0. (Rodrigues – 1967 – pág. 262).

127 A Legião Brasileira de Assistência (LBA) foi um órgão brasileiro fundado em 1942 pela então primeira-dama Darcy Vargas, com o objetivo de ajudar as famílias dos soldados enviados à Segunda Guerra Mundial.

Com o final da guerra, se tornou um orgão de assistência a famílias necessitadas em geral. A LBA era presidida pelas primeiras-damas. Em 1991, sob a gestão de Rosane Collor, foram feitas denúncias de esquemas de desvios de verbas da LBA. A LBA foi extinta durante o governo de Fernando Henrique Cardoso.

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Nesse período a benemerência da sociedade civil e o Estado ainda terão fortes ligações durante muito tempo. Sposati (1987) lembra que as associações filantrópicas sempre tinham um representante governamental ou eram presididas pelo próprio governador do Estado. Em 1929, a Associação de Socorro aos Tuberculosos, é presidida pela senhora Clementino Fraga, esposa do diretor do Departamento Nacional de Saúde. As relações entre o Público e o Privado davam passos largos, infelizmente, via benemerência, colaborando na falta de um Estado mais forte. O modelo implantado pelas entidades privadas que dava ênfase ao atendimento pelos sanatórios particulares deu grande resultado. Protocolos para tratamento da doença foram apresentados na 1ª. Conferência Nacional de Saúde em 1941. Detectou-se que havia necessidade de aumento do número de leitos públicos e privados, fato que se tornou realidade após essa data. O tratamento da tuberculose não teve a eficiência que se esperava. O tempo de hospitalização era alto: entre 250 e 300 dias em média. Custos altíssimos. Seria necessário detectar a doença no início. Era a estratégia mais lógica para aquele momento. Houve então a exigência legal da Abreugrafia na CLT já em aplicação.129 Dentro da mesma política para os casos de internações e dentro da política de cooperação com entidades assistenciais privadas, procurou-se ampliar os números de leitos em convênios que já atingiam 900 em 1961. Em 1965, a Divisão de Serviço de Tuberculose contava com 4.358 leitos, contando, ainda, a Secretaria com 3607 leitos particulares e 645 de convênios, no controle da doença. 130 Em ambos os casos, os serviços são favorecidos. Não conseguindo os dispensários atender a demanda legal, a canalizaram para os serviços privados que proliferavam junto às Delegacias de Trabalho e que, provavelmente, deveriam ser compostos por elementos do próprio serviço público. A canalização da clientela dos serviços públicos para os privados constituirá uma prática incorporada, não só em termos de prestação de serviços médicos como no de serviços de diagnóstico, com a introdução e expansão daqueles métodos baseados em exames complementares, considerando-se inclusive, a precariedade na manutenção de equipamentos dos serviços públicos de saúde.131 Em 16 de maio de 1931 a lei 2169 de Dezembro de 1926 foi modificada pelo decreto 5027 e permite a “médicos clínicos, devidamente habilitados, examinar, tratar em seus consultórios particulares ou em domicílio, as pessoas atacadas por lepra.” Esse mesmo decreto autorizou os hospitais gerais a fundarem dispensários, cria subvenção aos sanatórios privados. A década de 30 mostrava ainda crescimento da tuberculose e num Congresso da época sugeria-se a criação de um seguro contra a doença. Era o Estado desejando

129 Wilhelm Conrad Rontgen (1845-1923), físico alemão que inventou o Raio-X. 130 Yida – pág. 76 131 Yida – pág. 76

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sair da obrigatoriedade de cuidar do doente e de seus familiares em vista da quantidade de aposentadorias por invalidez. Com base nos variados tipos de impostos sobre jogos, aguardente, cassinos132 criou-se um “funding” específico e os serviços de saúde Pública e também e juntamente a Privada ampliam-se. Na sequência institucional da Saúde Pública, mas com grande apoio de profissionais da atividade privada, entre 1938 e 1941 duas decisões foram marcantes. Uma delas foi o início do Hospital das Clínicas, em São Paulo e de uma só vez a construção – com auxílio do governo - de vários sanatórios privados para auxiliar o governo nos casos de tratamento para tuberculose.133 Mostra-se a relação intrínseca entre o Público e o Privado na Saúde novamente. Voltando alguns anos, curiosamente, Mascarenhas134 135 (1949) em sua tese de Livre Docência na USP informa que alguns anos depois, em 1933 a Secretaria de Educação e Saúde cria e regulamenta “uma comissão de assistência social do Estado de São Paulo” composta de senhoras e cavalheiros sob a presidência do Diretor Geral do Serviço Sanitário, todavia, com o passar de alguns anos os custos de Assistência tornam-se altos e é necessário incorporar, tais atividades ao aparelho do Estado. Isso necessita recursos e outro braço da Saúde Privada foi chamado. Os conceitos de Saúde Pública ampliam-se. Mas o que vem a ser Saúde Pública? É preciso defini-la. Em 1949, Winslow ofereceu a seguinte definição: “Saúde pública é a ciência e a arte de evitar a doença, prolongar a vida, e promover a saúde física e mental, e a eficiência, através de esforços organizados da comunidade, visando o saneamento do meio, o controle das infecções comunitárias, a educação do indivíduo nos princípios da higiene pessoal, a organização dos serviços médicos e de enfermagem para o diagnóstico precoce e o tratamento da doença, e o desenvolvimento dos mecanismos sociais que assegurarão a cada pessoa na comunidade o padrão de vida adequado para a manutenção da saúde. Last, diz que é a prevenção da doença e a manutenção da saúde na população como um todo... Saúde pública é pois uma prática, uma disciplina e uma instituição social”.136 No período de 1938 a 1941 tendo como interventor no Estado de São Paulo o senhor Adhemar de Barros a Saúde cresceu em sua institucionalização, mas começou a ser criticada pelo populismo de Jânio da Silva Quadros, todavia, assim mesmo Adhemar conseguiu ser prefeito de São Paulo e posteriormente já na década de 60, governador. A criança passou a ser atendida pela criação de serviços de puericultura – Departamento Estadual da Criança. Nos últimos anos de pós-guerra a população crescia e saía do campo para as cidades. Era 1942 e foi o ano da criação da ONU e os organismos mundiais tais como OMS –

132 Houve liberação do jogo nas Estâncias Balneárias com taxação voltada para aplicação na Saúde. 133 Dados da FGV – Centro de Documentos de 1984 134 Sergio Mascarenhas - Professor da USP. 135 Rodolpho Mascarenhas ainda afirma que a Saúde pública tem as fases que vão do Saneamento empírico do meio ambiente, que vai de 1840 a 1890, o período de controle científico de doenças infecto-contagiosas, que vai de 1890 a 1910 e o período moderno que se iniciou por volta de 1910. 136 E.A. Winslow, “The Evolution of Public Health and its Objectives”, in Public Health in the World Today. Simmons, J.S. Ed. Cambridge, Harvard University Press, 1949.

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Organização Mundial de Saúde, OIT – Organização Internacional do Trabalho, CEPAL – Comissão Econômica para a América Latina, FAO – Organização das Nações Unidas para a Agricultura foram todos, cuidados dos americanos para que os países da América Latina, inclusive o Brasil, não caíssem nas malhas do comunismo internacional. Esses cuidados dividiram o mundo em capitalistas e comunistas e um bloco de Terceiro Mundo no qual o Brasil estava incluído. Era efetivamente o sintoma da guerra fria. Durante o primeiro governo Vargas que foi de 1930 até 1945, o Brasil passa por inúmeras transformações, tanto econômicas, quanto sociais, mas as de maior destaque são as mudanças relativas ao trabalhador, sua organização, saúde e relação com o Estado. O princípio da unidade sindical foi restabelecido e apenas os sindicatos poderiam defender os direitos da categoria que representavam perante o Estado e o Decreto 1402, de julho de 1939, define em detalhes a nova organização sindical. O imposto sindical foi criado em 1940, correspondente a um dia de salário pago ao sindicato. Essa política do presidente estimula o surgimento dos institutos de previdência separados por categorias. Seguindo o curso da história, os funcionários públicos de São Paulo, tinham seu Instituto de Previdência, o IPESP que, com a promulgação de um decreto de número 12.762, de 16/06/1942, passa a ser responsável pela prestação de assistência médica hospitalar aos servidores públicos estaduais, diminuindo a angústia daqueles que precisavam do serviço médico e não tinham recursos suficientes para obtê-los com a mínima qualidade. A Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada em 10.12.1948, pela ONU, resgatou os ideais da Revolução Francesa de igualdade, liberdade e fraternidade, tornando-se um marco de grande relevância, por promover o reconhecimento universal dos direitos humanos e das liberdades fundamentais. A Declaração delineia tanto os direitos civis e políticos (artigos 3.º a 21) como os direitos sociais, econômicos e culturais (artes. 22 a 28). Em São Paulo, instalou-se uma caixa de aposentadoria e pensões que é a dos funcionários públicos do Estado de São Paulo: o DAMSP. Assim, representantes do funcionalismo na Câmara resolvem tomar providências e, desse modo, em 1948, o deputado e funcionário público Pinheiro Júnior, apresentou um projeto de lei criando o Serviço Social e de Assistência Médica aos Servidores Estaduais. Em São Paulo, no bojo de uma efervescência onda de retomada de alguns focos de resistência trabalhadora, os funcionários públicos reafirmam a disposição legítima de reivindicar, através de sua associação a instalação, na capital de São Paulo, um hospital que atendesse aos servidores estaduais. A idéia era construir o HSPE para atender, na época, 98.000 servidores públicos e suas famílias num total aproximado de 400.000 pessoas. O plano prevê a construção de um conjunto hospitalar com cerca de 1.000 leitos, compreendendo um pavilhão geral com 850 leitos, um pavilhão de convalescentes e outro de moléstias crônicas, tendo respectivamente 100 e 50 leitos. Previa ainda um grande ambulatório. O projeto seria erguido no Ibirapuera, na Rua Pedro de Toledo, em terreno de 47.000 metros

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quadrados. Comissões foram criadas e aprovadas com desconto de um percentual em folha de pagamento dos servidores. A pedra fundamental da construção aconteceu em 25 de janeiro de 1957 com a presença do governador, na época, Jânio Quadros. O hospital foi inaugurado em 1961. Em 11 de março de 1966, o DAMSPE mudou de nome e de status jurídico passando a se chamar Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual – IAMSPE, conforme a Lei de número 9.323. Deixou de ser subordinado ao Ipesp, permanecendo sob a tutela financeira da Secretaria da Fazenda. Atualmente o IAMSPE é uma autarquia especial. O Iamspe137 é uma autarquia ligada à Secretaria Estadual de Gestão Pública que presta atendimento médico aos funcionários públicos estaduais, seus dependentes e agregados. Atua na promoção da saúde, prevenção de doenças, assistência e reabilitação aos doentes garantindo o acesso à rede de serviços, contribuindo para a melhoria de vida de seus contribuintes e beneficiários. Atualmente o Instituto possui o Hospital do Servidor Público Estadual Francisco Morato de Oliveira (HSPE-FMO), o Departamento de Administração e o Departamento de Convênios e Assistência Médica (Decam), que coordena 18 centros de assistência médica ambulatorial (Ceamas) espalhados pelas principais cidades do interior paulista.138 Os conflitos sociais e a nova Constituição de 1946, a criação de organismos mundiais sob a proteção americana no Brasil como a Aliança para o Progresso, Conferência Interamericana para Manutenção da Paz e o Tratado de Assistência Recíproca, traziam em seu bojo americano o receio do comunismo ao terceiro mundo. Nesse contexto de época a Educação, a Agricultura e a Saúde geral tomam corpo e acende-se a democratização no Brasil, na qual está embutida a Saúde, a Atenção às crianças e a Assistência rural. Estávamos, então, por volta de 1950. O processo de industrialização acelerada que o Brasil viveu a partir da década de 50 determinou um deslocamento do pólo dinâmico da economia para os centros urbanos e gerou uma massa operária que deveria ser atendida pelos serviços de saúde. A partir desse período passa a configurar-se o denominado modelo médico-assistencial privatista, que vigorará hegemônico de meados dos anos 60 para frente. Em 1959 eclode a Revolução Cubana.139 Os Estados Unidos também influenciavam muito na política da Ilha, que apoiava sempre os presidentes pró-Estados Unidos. Do

137 Dentro do esquema geral de saúde no Brasil, esses hospitais de Servidores Públicos são totalmente diferenciados do que institui a legislação vigente. Outros institutos nesse ínterim, também foram criados, como no Piauí, o Iapep, em Goiás, o Ipasgo, no Rio de Janeiro, o Iaserj, os quais após a Constituição de 1988 e adaptações da Lei, atualmente, muitos passam por dificuldades, pois não são SUS, não são Privados, não são ONGs, não são Beneficentes e não recebem, pela Lei, fundos do governo federal, pois são autárquicos e com identidade atualmente difusa.

138 Coelho – (2009) 139 Em 1957, Fidel Castro e um grupo de cerca de 80 combatentes instalaram-se nas florestas de Sierra Maestra e iniciaram estratégia para derrubar o governo. Com mensagens revolucionárias, os guerrilheiros conseguiram o apoio de muitas pessoas. Isto ocorreu, pois havia muitos camponeses e operários desiludidos com o governo de Fulgêncio Batista e com as péssimas condições sociais. No primeiro dia de janeiro de 1959, Fidel Castro e os revolucionários tomaram o poder em Cuba. Fulgêncio Batista e muitos integrantes do governo fugiram da ilha. O governo de Fidel Castro tomou várias medidas em Cuba, como, por exemplo, nacionalização de bancos e empresas, reforma agrária, expropriação de grandes propriedades e reformas nos sistemas de educação e saúde. O Partido Comunista dominou a

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ponto de vista econômico, Cuba seguia o capitalismo com grande dependência dos Estados Unidos. Era uma ilha com grandes desigualdades sociais e muitos casos de malária, febre amarela e outras doenças tropicais.140 Institucionalmente, os IAP’s são substituídos em 1966, por um único e poderoso Instituto Nacional da Previdência Social – INPS – o que significou a uniformização dos benefícios numa Previdência Social concentrada e um crescimento da demanda por serviços médicos em proporções muito superiores à capacidade de atendimento então disponível nos hospitais e ambulatórios dos antigos Institutos da Previdência. Saúde pública era prioridade e vacinar era a ordem primeira em tudo na saúde. As campanhas de vacinação iniciaram-se da Carta de Punta Del Leste. Nos arquivos de higiene de 1962, Yida (1994) 141 informa que com a contribuição da OPAS – Organização Panamericana de Saúde foi realizada uma vacinação contra algo inexoravelmente perigoso como doença: a poliomielite.142 Eram vacinações-piloto e o lugar escolhido inicialmente foi em São Paulo – Santo André. Depois na Capital, São Bernardo, São Caetano, Mauá, Ribeirão Pires e Diadema. Seguiu-se depois para o Interior e outros Estados. 1966, 1967, 1968 foram anos – a título experimental – das vacinas como Sarampo, Varíola e quase todas acompanhadas da Tríplice. (Difteria, Tétano e Coqueluche). Quanto à questão de que era necessário planejar a Saúde, em geral, muitas vozes se levantavam contra e a favor de interesses públicos e privados devido a Convênios desde o Estado novo. Relativamente aos problemas de Saúde na área rural destaca-se a doença de Chagas causada por um inseto comumente chamado de barbeiro.

vida política na ilha, não dando espaço para qualquer partido de oposição. Com estas medidas, Cuba tornou-se um país socialista, ganhando apoio da União Soviética dentro do contexto da Guerra Fria 140 No Brasil, sob a visão atualizada dos casos de malária, o Ministério da Saúde anunciou que dados sobre a malária apontam queda de 24,7% no número de casos nos últimos dois anos. Em 2007 foram notificados 457.659 casos de malária, contra 607.827 em 2005 – ou seja, 150.168 pessoas doentes a menos. As internações caíram em 46,3% de 12,542 em 2005 para 6.736 em 2007. Os óbitos foram 59 em 2007 contra 122 em 2005. Na Amazônia Legal, que concentra 99% dos registros de malária, a redução foi de 54,4%: 52 mortes em 2007 contra 114 em 2005. 140 Para o Ministro, José Gomes Temporão, 2010, isso é resultado da integração da vigilância epidemiológica com a atenção básica, o meio ambiente e outros setores nas três esferas de governo. Os Estados que mais reduziram os casos de malária: Acre (-45,4%) e Maranhão (-30,5%). Roraima reduziu os casos em 26,2%; Pará, 25,3%, Amapá 25,1%, Tocantins 24%; Rondônia, 19,5%. Houve aumento no Amazonas (6%) e em Mato Grosso (1,5%). O que mais contribuiu para a redução de óbitos está a expansão em 172% da rede de laboratórios para diagnóstico de malária, de 1.182 em 1999 para 3.217 em 2007. Os agentes comunitários colheram quase meio milhão de lâminas para exames, informou o secretário de Vigilância em saúde do ministério, Gerson Penna. 141 – Yida - páginas 93-4

142 W.S. Prado – “Aplicação da vacina Sabin ...(1962). Albert Bruce Sabin nasceu a 26 de agosto de 1906 em Bialistock-Rússia, hoje Polônia. Formou-se doutor em medicina pela Universidade de Nova York (1931) e foi médico interno do Hospital Bellevue (1932-34). Fez curso no Instituto Lister de Medicina Preventiva de Londres (1934-35), foi associado do Instituto Rockfeller para pesquisas médicas (1935-37) e professor de pesquisas pediátricas da Universidade de Cincinnati (1939). Dedicou 25 anos de sua vida ao estudo da poliomielite e desde 1952 voltou-se especialmente à obtenção de uma vacina de vírus vivo atenuado, para uso oral, o que conseguiu realizar por volta de 1960. A primeira vacina contra a poliomielite foi a vacina Salk, injetável, desenvolvida com vírus morto, por Jonas Edward Salk. A vacina Sabin, lançada no mercado em 1961-62, é a mais usada atualmente porque permite imunidade intestinal e corporal, enquanto que a vacina morta só oferece imunidade corporal. Além disso, a vacina Sabin produz imunidade vitalícia, sem a necessidade de injeção ou vacinação auxiliares.

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Esse inseto habita casas de pau-a-pique. Havia, desde 1958 uma Comissão Especial de Combate à Moléstia de Chagas foi criada. Outras campanhas foram acontecendo como o combate à Esquistossomose, BCG, Varíola. Desse período em diante e na era JK as condições de vida nas grandes cidades ficaram difíceis face à queda dos salários e a inflação no governo de Juscelino Kubischek. Os sindicatos pararam muitas categorias por aumentos salariais e contra a carestia. Nesse embalo de reclamos para aumentos salariais e carestia a Saúde Pública deteriorava-se e com isso a Saúde Privada já enxergava outros horizontes e parecia florescer. Em 1959 os governos dos Estados precisavam de algum plano. A Saúde Pública piorava a cada ano. Por volta de 1960 situava-se – na participação orçamentária da época - em torno de 2% a 5% do PIB. Nesse plano geral, um dos itens – nas considerações gerais – dizia que: em população de baixo nível econômico, não pode o Estado deixar de atender às necessidades de assistência médico-hospitalar das classes menos favorecidas. Cumpre não esquecer, entretanto, que nesta atividade extremamente onerosa, é imperativo empregar criteriosamente, recursos disponíveis, no sentido de obter o máximo rendimento. Neste sentido, a experiência tem comprovado que os melhores resultados são obtidos através do estímulo e auxílio às instituições privadas, ao invés do próprio Estado assumir diretamente o encargo por meio de fórmula mais onerosa e, mesmo, muitas vezes menos eficiente.143 (Yida – 1994) Neste sentido, salienta-se a “corajosa mudança na orientação governamental que se vinha desenvolvendo no último decênio, com a construção de hospitais oficiais de clínica geral – uma vez que – o desenvolvimento da iniciativa estatal direta nesse setor condiciona, por decorrência, o retraimento da participação privada, mais apta a proporcionar assistência mais eficiente e menos onerosa...” 144 (Yida – 1994).145 Atualmente, em 2010, o controle é quase perfeito, mas ainda surgem surtos.146 Consequentemente, a diretriz do plano era canalizar os recursos previstos no sentido de auxiliar e estimular a assistência hospitalar privada. Tais recursos serão empregados, não só em auxílio para construção de novos hospitais de iniciativa privada, mas ainda em reformas e ampliações, assim como melhorias de equipamentos, visando a elevação do padrão técnico da assistência privada. Assim, em relação à tuberculose,147 como já foi dito, além de intensificar o diagnóstico

143 Yida – pág. 109 144 Yida – referindo-se a F. Carlos – op. Cit., 1958/1959 145 Atualmente, em 2010, o controle é quase perfeito, mas ainda surgem surtos. 146 O Brasil registrou nos últimos dois anos, 489 surtos e emergências em saúde pública, segundo dados inéditos do Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde, desde doenças transmitidas por insetos, como dengue, febre amarela e mal de Chagas, até enfermidades provocadas por alimentos contaminados, como beribéri, informou o Estado de São Paulo em 06/04. (Fonte: Revista Radis número 69 – maio/08). 147 O médico Júlio de Moura, proferiu em seu discurso no 2.º Congresso Brasileiro de Medicina e Cirurgia – em 1889, discurso esse recuperado pela pesquisadora Dilene Raimundo do Nascimento em “As pestes do século XX – Tuberculose e Aids no Brasil, uma história comparada” – revela que a preocupação com a doença, infelizmente, não é recente. Mais de 100 anos depois, mesmo com tratamento de comprovada eficácia, a tuberculose é reconhecida como emergência global pela OMS desde 1993, por ser a maior causa de morte de adultos por doença infecciosa. Ela integra o rol das “doenças negligenciadas”, ainda que um terço da população mundial – cerca de 2 bilhões de pessoas – esteja infectado pelo bacilo de Koch, seu agente causador, o que representa 100 milhões de casos registrados por ano em todo o planeta. (Radis número 69 – maio/08).

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precoce pela abreugrafia maciça, com aquisição de doze equipes móveis e estimular a imunização, mediante vacinação de BCG, o Plano de Ação amplia o número de leitos hospitalares públicos e, em convênios com entidades de leitos privados. Estava, portanto, aberto o campo de pouso ideal para uma grande participação do Privado na Saúde Pública. Nesses anos seguintes, até 1949, criam-se nos Estados os estabelecimentos oficiais de Saúde. Para combater a malária, proteção à maternidade,148 proteção à infância, doenças tropicais, lepra, tracoma, cursos de saúde e higiene são desenvolvidos, nos níveis Federal, Estadual e Municipal como centros polivalentes e distritais de Saúde.149 e muitos privados na mão da Igreja Católica. A articulação de tantas instituições e projetos no interior da Igreja é objeto de uma organização especializada, chamada Caritas. Estruturada em 1950 como uma instância mundial, a Caritas Internationalis150 acompanha a estrutura complexa da Igreja, abrindo escritórios em cada país e quando possível em cada diocese. Possui 120 escritórios só no Brasil. Tabela VII Unidades Sanitárias criadas151

Acre 7 - Amazonas 6 - Pará 7 - Maranhão 6 - Piauí 3 - Ceará 4 R.G. Norte 11 - Paraíba 0 - Pernambuco 10 - Alagoas 10 - Sergipe 7 - Bahia 10 - Espírito Santo 7 - Rio de Janeiro 11 - Distrito Federal 15 - São Paulo 93 - Paraná 6 - Santa Catarina 7 - Goiás 7 - Total : 350 unidades. (ano: 1940).

Resumindo, de 1918 a 1946 foram criados 1008 estabelecimentos de Saúde Pública, dos quais 186 eram unidades federais, 733 estaduais e 89 municipais. 152 Yida, (1994), afirma que o predomínio da assistência médico-hospitalar privada mostra o equívoco de alguns autores brasileiros que afirmam que esta se expande após 64. Realmente, neste período, verifica-se uma nova expansão, cujo caráter mais empresarial corresponde às novas condições da sociedade brasileira, contudo, a rede Privada sempre foi dominante e privilegiada pelos regimes governamentais. De outro modo, parte dos recursos destinada à Saúde Pública, na Secretaria Estadual de São 148 Muitas tentativas vêm sendo feitas desde muitos anos visando obter medidas que permitissem ter dados da Saúde Pública. O coeficiente de mortalidade geral e infantil, os índices vitais e vários outros foram igualmente adotados. No Brasil, Carlos Sá, em 1926, apresentava critério a ser adotado na avaliação do trabalho de Postos de Higiene em cidades providas de abastecimento de água e esgotos. Barros Barreto e Fontenelle organizaram, igualmente, no ano de 1931, tabela para avaliação das atividades dos Centros de saúde da então Capital Federal. 149 Tais dados em detalhes constam do Anuário Estatístico do Brasil (1949) – (1950) – pág. 442 / 5. A Igreja Católica e outras igrejas, de observação nas mudanças políticas resolvem também aumentar o braço da benemerência eclesiástica. A Roda da Santa Casa de Misericórdia, que funcionou até 1950, criavam as crianças até os sete anos de idade e depois eram encaminhadas para diferentes seminários. 150 É uma entidade cuja confederação abrange mais de 200 países e tem objetivos sociais e tentar fomentar uma vida melhor. Atende principalmente os pobres e os oprimidos. A primeira conhecida foi em Freiburg, Alemanha, em 1897, outras aconteceram na Suíça em 1910 e nos EUA em 1910. (Fonte: Wikipédia). 151 Fonte: Barros Barreto – arq. Hig. RJ – v.10, n.1, p. 7-79, 1940 – citação detalhada em (Yida - 1994).

152 Fonte: Anuário Estatístico do Brasil - 1949

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Paulo, é canalizada para entidades privadas sob o rótulo de “Auxílio e Subvenções” , inclusive para expansão da rede hospitalar privada, na qual se desenvolverão as atividades ligadas à assistência médica previdenciária, sendo, portanto, aparente a divisão entre Saúde Pública e Medicina Previdenciária. (Yida – 1994). A Reforma Sanitária entre 1964 e 1966 – gestão militar - criava três superintendências: Saúde da comunidade, Hospitais e Pesquisa. Empresas particulares participaram do planejamento. Era o Privado dando seu braço para o Público. Outra discussão passou a fazer parte da agenda de gestão, onde após anos de dificuldades foi vitoriosa a discussão que a Saúde Pública não deveria só estabelecer aspectos preventivos, mas também de recuperação. Havia, de certa forma, receio de que tal decisão poderia prejudicar a iniciativa da Medicina Privada. A Odontologia sanitária também já era preocupação reinante nos meios públicos e privados da saúde. O conceito polivalente de saúde e saúde pública e privada condicionou que todas as possibilidades que levassem a essa meta fossem mobilizadas, daí resultando que a Odontologia sanitária aparecesse como um dos componentes mais importantes e necessários para se atingir os objetivos. O retardamento da incorporação da Odontologia sanitária aos programas sanitários foi possivelmente influenciado pelo conceito superado, de que a saúde pública estava restrita quase que exclusivamente aos assuntos de doenças transmissíveis a cujo risco estava exposta a maioria da coletividade. A saúde da boca sendo considerada principalmente um problema individual, seus danos prováveis a outros membros da comunidade seriam remotos, daí resultando a inexistência de pressão sobre os governos para resolvê-los. Nestes casos da saúde bucal, a Igreja e os trabalhos de benemerência em pouco ajudavam embora tivesse grande força e influência política sobre a saúde das comunidades. O apoio da Igreja Católica, a filantropia e outras instituições No caso da Igreja, sobretudo no período da ditadura militar, ela sofreu uma expropriação de seus serviços pelo Estado. O golpe de 1964 assumiu fortes elementos do Estado preexistente e lhe deu contornos novos, que o diferenciaram na sua essência do modelo hegemônico anterior. (Sader – 2000). Fernandes (1994) menciona alguns números relativos à diocese do Rio de Janeiro para que se tenha uma noção das dimensões deste gênero de trabalho. Esta diocese é particularmente significativa, entre outras razões, pela liderança conservadora exercida pelo seu bispo nos anos 70 e 80. Havia 228 paróquias na cidade do Rio de Janeiro, cada uma delas abrigando ao menos um projeto de cunho assistencial. Havia também ainda 47 ordens religiosas masculinas e 92 congregações femininas. Enquanto os homens concentram-se no apoio às obrigações paroquiais, grande parte das irmãs trabalhavam em obras de

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caridade. Existe ainda, uma instituição denominada de Banco da Providência153 que organiza campanhas anuais de captação de recursos para o trabalho social, com ampla cobertura da mídia.154 Cerca de 265 instituições com estatuto legal distinto dos projetos paroquiais distribuem-se da seguinte maneira: 41 creches, 113 escolas, 22 centros para a distribuição de roupas e alimentos, 51 centros de saúde, 4 centros para grupos marginalizados, 5 centros de formação profissional, 3 casas para mulheres jovens, 6 asilos para velhos, 6 centros comunitários, 9 orfanatos, 3 centros para meninos de rua, 2 centros para apoios legais, 1 centro para pessoas inválidas. A Pastoral do Menor na cidade do Rio de Janeiro oferecia apoio de saúde e outras campanhas a 4.259 crianças e adolescentes em 1992. 155156 Todos esses processos de mudanças se refletiram na saúde geral. Mostrou a força do Privado versus Público-estatal. Veio então a descentralização. O governo de um lado, fornecendo as unidades locais da administração e estimulará o seu aperfeiçoamento, aumentando a eficácia; de outro, criará as condições para que o setor privado possa desempenhar, a contento, sua missão, criando facilidades para os investimentos, orientando-o sobre o sentido geral do desenvolvimento e intervindo supletivamente quando as condições o recomendarem.157 As empresas dentro do cenário geral também se preocupavam com a filantropia, pois era assunto latente. A par de criar uma seguridade social à brasileira, no final do governo Kubitschek promulga-se a Lei Orgânica da Previdência Social que garantiria a uniformização dos benefícios aos trabalhadores urbanos e, em 1963, surge o Estatuto do Trabalhador Rural. O Estatal ou o Público tornou-se então diferente com o período militar. Era outro Estado, era outro Público. A visão estatista deu lugar à estatista-militar. O Público se enfraquece como participante diante do militar e o Privado nacional e internacional vão se estabelecendo. Após o golpe militar e a entrada de grande volume de capital estrangeiro, empresas multinacionais e empréstimos vultosos agiam no desenvolvimento econômico e social e nisso inclui-se a Saúde da população. Em 1967 é promulgada a nova Constituição e apenas dois partidos representativos. Movimentos grevistas e estudantes nas ruas geraram o conhecido Ato Institucional número 5. Nessa altura da Saúde, as doenças mentais e lepra são consideradas doenças de segundo plano para a nova Secretaria de Estado de Saúde de São Paulo,

153 Criado em 1959 por Dom Helder Câmara, o Banco da Providência é o maior e mais antigo projeto social da Arquidiocese do RJ, cuja missão é colaborar para transformar o indivíduo socialmente excluído em um cidadão capaz de alcançar condições necessárias a uma vida digna. Ele atua com recursos próprios captados através da Feira da Providência, do Arraial da Providência, do Programa Amigos do Banco com contribuições mensais de pessoas que apadrinham uma família e de parcerias economicamente sustentáveis. O Balanço social registra que através do programa social, atendeu-se já mais de 39.000 famílias. (ver site na Bibliografia). 154 (Fernandes – 1994) 155 Fonte: Anuário 1993 – Arquidiocese do Rio de Janeiro. 156 Ainda hoje, em 2011, e há muitos anos a PUC – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, possui o DERDIC, que dá apoio de Fonoaudiologia a mais de 4.000 crianças com problemas de audição. 157 Yida – pág. 113

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enquanto se aumentou consideravelmente o número de leitos mantidos por meio de convênios com entidades privadas. 158 Tabela VIII O Desenvolvimento da Filantropia Empresarial no Brasil159

Década Número de organizações %

1930 2 6,25

1950 4 12,50

1960 3 9,38

1970 4 12,50

1980 13 40,63

1990 6 18,74

Total 32 100,00

Os problemas da saúde, educação, políticos e de fluxos de caixa dos governos militares fez com que essa crise tornasse urgente novas decisões, pois com o tempo, críticas ao Estado, então autoritário, emergiram. As propostas neoliberais, como privatização, diminuição do Estado, desregulamentação da economia e aberturas ao mercado internacional foram surgindo. Era necessário encontrar soluções. A Saúde Pública era um verdadeiro caos nacional e a saúde privada já olhava esse modelo com olhos de negócio. Faltavam médicos, todavia, para atender a demanda de doentes. No novo planejamento era necessário criar mais Escolas de Medicina – públicas e também privadas. Percebe-se esse aumento na graduação à partir de 1967. Apesar desses dados, havia 74.543 leitos privados no País e em 1984 eles chegaram a 348.255, ou seja, num período de 24 anos, dá-se um aumento da rede privada em 465%, possibilitada, sobretudo, pelas políticas da Previdência Social. (Villaça – 1999), mas com grande insuficiência de profissionais médicos e distribuídos de forma fragmentada pelo País. O Estado resolve então renunciar – em parte - as suas funções sociais e abre mão para o Privado que prometia colaboração com o governo em seus inúmeros problemas de várias naturezas: Saúde, Educação. Outros movimentos de massas como o previdenciário, o rural seriam revistos posteriormente. Havia um ministro desse período militar que afirmava que “antes de repartir o bolo era necessário fazê-lo crescer”.160 Embora militar as embrionárias células do neoliberalismo, desqualificando o Estado começavam a se multiplicar. Era a década dos anos 70. Sob o ponto de vista da Saúde, parte do bolo – na visão da época - poderia ser dividido algum dia através de Convênios na Educação Médica.

158 Yida – pág. 115 159 Fonte: Fonte: Fundação Emílio Odebrecht, 1993. - (Por data de fundação dos membros do Grupo de Institutos e Fundações).

160 Ministro Delfim Netto.

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Em 1971/1972, instituiu-se o Programa de assistência ao trabalhador rural (Prorural), já comentado, gerido pelo Funrural e, em 1972, incluíram-se, na Previdência Social, os empregados domésticos e autônomos. (Villaça, Mendes – 1999). Até 1973, ressaltava-se que a Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, colaborando com o ensino médico, celebrou convênios com a Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa, Escola Paulista de Medicina, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Fundação Regional do Ensino Superior Araraquarense, Fundação Luzíadas, Faculdade de Ciências Médicas e Biológicas de Botucatu, Fundação municipal de Ensino Superior de Marília, Fundação Universitária do ABC, Faculdade de saúde Pública da USP, objetivando o funcionamento dos Centros de Saúde-Escola, na Barra Funda, Vila Mariana e nos Centros de Saúde de Paulínia, São José do Rio Preto, Peruíbe, Botucatu, Marília e Santo André. Estas unidades serviram à instrução de alunos de medicina no campo da medicina preventiva e ao treinamento de pessoal auxiliar da Secretaria.161 O governo militar não se esqueceu de suas relações com a Igreja, pois sabia que ela teve papel preponderante nessas últimas três décadas na saúde e na educação privada e benemerente. O início das Integrações Públicas, Privadas, ONG’s e PPA’s A presença de instituições, como a Igreja, define uma idéia bem diferente da que imperou no mundo democrático a partir das Revoluções Francesa e Americana. Observe-se que durante bom tempo foi dito que as PUC’s – Pontifícias Universidades Católicas seriam instituições públicas não-estatal. As PUC’s seriam públicas porque eclesiástica e, ninguém fez mais serviços públicos no Brasil do que a Igreja Católica. (Romano - 1979). No aproveitamento dos serviços da Igreja à favor do Estado há um liame de óleo e água que não se misturam com o público estatal. A Igreja – freiras e padres – sempre ou quase sempre deram palavras de peso. Trabalho comunitário é uma expressão das mais usadas por aqueles que transitam por organizações da Igreja e atualmente do Terceiro Setor. Em todas as práticas nacionais, médicas, educacional, encontra-se esta realidade da não-fusão plena entre o público e o estatal. Acontece ainda um outro fenômeno chamado de “terceirização” na contratação de pessoas e serviços privados. O caso das Universidades ou Faculdades particulares para cuidar da Educação e do florescimento de corporações para a venda de Planos Privados de Saúde são exemplos notórios. O nosso Estado é tudo, menos federativo e democrático e as políticas públicas que ele determina não passam pelas três faces (Executivo, Legislativo e Judiciário) e menos ainda pela sociedade civil. A integração entre o Público e o Privado na Saúde, se observa antes de 1973 – como exemplo - todavia, formalmente, através do Decreto 52.182 de 16/6/1969, a atribuição da Secretaria de Saúde era estudar, planejar, orientar, coordenar, supervisionar em

161 Yida – pág. 125

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todo território do Estado de São Paulo, medidas visando a melhoria das condições sanitárias da população, promovendo a saúde, prevenindo a doença, bem como participar das medidas de recuperação de saúde. Iniciam-se então possibilidades de convênios com empresas/clínicas para controle de saúde. Por volta de 1974, com o fim do período de expansão econômica e iniciada a abertura política lenta e gradual, novos atores surgem na cena política, como os movimentos sindicais, profissionais e intelectuais de saúde, questionando a política social e as demais políticas governamentais. Neste ano duas medidas destacam-se no campo da saúde: 1) a implementação do chamado Plano de Pronta Ação (PPA), com diversas medidas e instrumentos que ampliaram ainda mais a contratação do setor privado para a execução dos serviços de assistência médica sob responsabilidade da Previdência Social; 2)- a instituição do Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social (FAS), destinado a financiar subsidiariamente o investimento fixo de setores sociais. (Braga & Paula, 1981). Em 1975, com base nas diretrizes do II Plano Nacional de Desenvolvimento e tendo como referencial doutrinário a teoria de sistemas, surgiu a Lei 6.229, que institucionalizou o modelo médico-assistencial com forte presença do setor privado, definindo as competências das instituições públicas e privadas e propondo mecanismos de integração e coordenação. A ação combinada do PPA e do FAS representou, na verdade, um poderoso mecanismo de alavancagem do setor privado na área da saúde, o primeiro abrindo mercado cativo e, o outro, garantindo uma expansão física adicional, com recursos subsidiados, especialmente na área hospitalar. Com isso houve substancial crescimento do número de consultas, internações, exames, no período de 1971 a 1977, sobretudo no setor contratado pela Previdência Social. As internações cresceram 322% as consultas médicas 638% e o serviço de apoio diagnóstico 434% (Lima & Pucú, 1981).162 A partir da década de 70, o milagre brasileiro, como ficou conhecido, levou o país ao crescimento. Houve inúmeros financiamentos do exterior, além da criação dos projetos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), de Bancos de Investimentos e do Sistema Financeiro da Habitação (SFH). Também foram iniciadas as obras de imensas hidrelétricas e de estradas importantes para a época, tais como a Transamazônica, Trans-Pantaneira, absorvendo um grande número de trabalhadores e de mão de obra não qualificada163. Tais informações são relevantes para a atualidade, pois demonstram a forma de utilização dos recursos, cujo mérito as gerações futuras julgarão. Eram reflexos daquilo que se denomina de crescimento, decorrente das políticas de desenvolvimento do Ministro Roberto Campos164.

162 Em: Direitos Humanos no Brasil – Apud: Cláudio Moser e Daniel Rech (1984). 163 Em 1973 ocorre a crise internacional de petróleo que foi extremamente danosa para o Brasil, cujo percentual de consumo de petróleo importado era de 80% de seu total. Quando Geisel tomou o poder em 74, ainda persistia aquela idéia de milagre brasileiro. Fica encarregado o economista Mário Henrique Simonsen pela linha política econômica substituindo Delfim Neto. É verdade que o PIB cresceu, mas a inflação subiu em média 37,9 % ao ano. 164http://www.econ.puc-rio.br/gfranco/a126.htm - Gustavo Franco sobre o neoliberalismo, criação do BNDES, FGTS, Bancos de Investimentos, Sistema Financeiro da Habitação. Acessado em 22/04/2005.

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Porém, ainda havia muitos problemas a resolver. A máquina do INPS era imensa, e os recursos ainda eram grandes; com isso, sobrava dinheiro no caixa. Conforme comentário em parágrafo anterior, o Seguro de Acidentes do Trabalho completava nessa época 50 anos de criação e tornou-se um apêndice de gastos consideráveis nos balanços da Previdência Social. Os números tornaram-se enormes, gerando grande saída de recursos. Foram constatados, na época, abuso e fraudes na utilização pelos trabalhadores e empregados, pois os acidentes do trabalho eram arcados pelo Instituto do governo e não havia controle e nem transparência.165 Houve, então, a mudança na lei, e as empresas passaram a ser responsáveis pelos primeiros quinze dias do acidentado. Com isso, os acidentes diminuíram 40%. Já era, pois, uma forma de compartilhar o público e o privado, tendo vencido a eficácia de controle do segundo. Era a medicina nas empresas, de certa forma compulsória, iniciando suas primeiras manifestações de preocupação com a saúde dos empregados, ao mesmo tempo em que se preocupavam com as saídas de seu caixa. Todo esse aparato regulatório deu início à criação, nas empresas, das CIPAS - Comissões Internas de Prevenção, Assistência e Segurança no Trabalho, que promoviam, por conta própria, cursos de prevenção de acidentes. As empresas passaram então a fornecer equipamentos profissionais especiais, como capacetes, luvas e outros para proteger os trabalhadores de costumeiros riscos da atividade, e também passaram a promover a medicina ocupacional. Uma das primeiras exigências foi que todos os empregados fizessem obrigatoriamente a popular chapa do pulmão com os exames de raios-X. De certa forma, essas primeiras legislações eram também embriões de compartilhamento entre o público e o privado: atualmente as NRs - Normas Regulamentadoras - da saúde ocupacional são rotina, e essa legislação específica levou à criação de empresas prestadoras de serviços de monitoramento das atividades dos empregados e do tipo de trabalho conforme o ramo de atuação - se químico, construção civil e outros. Em 1975 a Lei 6.229, já referida, organiza o Sistema Nacional de Saúde e estabelece as principais competências às distintas esferas de governo, Federal, Estadual e Municipal envolvendo regulação em vários Ministérios que tinham relação direta com o trabalho, epidemiologia, formação de profissionais, saneamento básico. Essa Lei é a que realmente deu todo o eixo para o sistema de saúde atualmente existente, que foi sendo aperfeiçoada ao longo do tempo até os dias atuais. Uma das formas de saída de recursos estava sob controle, que eram os acidentes do trabalho; todavia, saber quanto se deveria ter no caixa para pensionistas e para assistência médica e tal situação orçamentária continuava a ser um desafio ao governo. Para tanto, em 1977, foi criado o SINPAS – Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social, que era composto do INPS - Instituto Nacional de Previdência Social - cuja função era conceder e controlar a manutenção dos benefícios, do

165 Fonte: Cordeiro, Antonio Filho – Tese de Mestrado – PUC-SP.

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INAMPS - Instituto Nacional Assistência Médica e Previdência Social, cuja função era prestar assistência médica, do IAPAS- Instituto da Administração Financeira da Previdência e Assistência Social, cuja função era arrecadar, fiscalizar e cobrar contribuições, do DATAPREV - (Empresa de Processamento de Dados da Previdência Social) - da LBA - Legião Brasileira de Assistência, que foi criada para prestar assistência às pessoas carentes, do FUNABEM (Fundação para o Bem Estar do Menor) e do CEME (Central de Medicamentos do governo). Essa lei de número 6.439 criando o SINPAS, juntamente com a Constituição de 1967/69 e a Lei 6.229 formaram a base Jurídica Legal do Sistema de Saúde na década de 70. Essa estrutura se manteve até a Constituição de 1988. Observa-se que eram muitos os órgãos que consumiam os recursos disponíveis, além de haver muita disputa política entre eles, mas esses órgãos levaram à separação entre o que hoje chamamos Assistência Médica e Pensões de Aposentadoria. Os recursos eram imensos, mas as despesas de burocracia consumiam muito dinheiro misturando receitas e despesas de duas situações diferentes e que necessitavam de monitoramento cada uma de per si, quando então houve uma declaração pública bombástica para a época, do SINPAS, onde se informou que não haveria mais dinheiro no caixa e que seria necessário aumentar as contribuições de empresas e trabalhadores. Dentro dessa atribuição e ao estabelecer sua política de saúde, assinalava como um dos objetivos: melhorar o rendimento do sistema de assistência médica, aperfeiçoando o sistema de colaboração técnica e financeira com instituições privadas, ampliando e melhorando a assistência médico-hospitalar, definindo adequadamente as condições que tornaria necessária a atuação de Regulação supletiva do Estado, coordenando atividades oficiais e privadas.166 Aciole (2006) diz que: “... a realidade social brasileira, aqui será vista como duplamente cindida: é tanto uma sociedade desigual na qual se insere a Saúde, como esta apresenta uma assistência ofertada em dois modos distintos: um público e outro privado ou um, pelo Estado, e outro, pelo mercado. A Saúde torna-se assim, um dos setores no qual, estrategicamente, se desenha a luta entre o que constitui interesse público e iniciativa privada, portanto, entre interesses sociais antagônicos, espaço real de ação e disputa de projetos de diferentes estratos sociais, por eles gestados e/ou a eles dirigidos. Luta que repercute as profundas raízes ideológicas emprestadas ao que é público e ao que é privado. Diante disso, torna-se necessário perseguir para estes dois termos o sentido imanente à ideologia que as cerca. Para tanto, buscamos estudar as raízes em que residem os significados atribuídos ao termo público e ao termo privado. “ 167 Nossa federação é regida por uma uniformidade normativa que reúne povos, culturas, situações diversas de modo igual. Uma portaria sobre educação, saúde, segurança, rege o País de norte a sul, sem variações. As políticas públicas são monopólio eficaz

166 Apud – W. Leser - Massako 131 167 Aciole, Giovanni Gurgel – (2006) - A Saúde no Brasil – Cartografia da Saúde - pág. 23

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do Executivo federal.168 Essas condições impedem a emergência de práticas sociais e políticas transparentes e democráticas. Além do braço estatal e do mercado, há um terceiro setor não governamental e não lucrativo, embora atualmente muitas ONGs, sejam braços do Executivo federal e não organismos livres. Os recursos são fornecidos pelo Executivo que pratica uma política fiscal tirânica, sem retorno em serviços públicos dignos deste nome. Sugere-se ler Carvalho, Isabel (2001) sobre o assunto. Para uma visão bem definida no caso dos embates entre o público e o privado no Brasil, é necessário analisar a história do Estado antes e depois das grandes revoluções democráticas mundiais. Além disso, é importante ter dados comparativos para que não se faça abstrações distantes da realidade. Os números chamam a atenção e precisam de análise profunda. A Organização Mundial de Saúde sinaliza que as doenças crônicas corroem quase a metade dos recursos utilizados nos sistemas de saúde, ocasionando a grande maioria das internações nos serviços públicos e dos sinistros das operadoras de planos de saúde. O excesso de peso afeta dezenas de milhões de indivíduos, a hipertensão, o diabetes mellitus e as doenças cardíacas apresentam crescimento exponencial nos países em desenvolvimento, enquanto o infarto agudo do miocárdio (IAM), mata milhões de pessoas todos os anos. Em nosso meio prevalece a hipertensão arterial, líder inconteste no ranking de doenças, relacionando-se diretamente com a maioria absoluta dos acidentes vasculares cerebrais e IAM. 169 Depois, para efeito comparativo, é importante conhecer o quanto e como o nosso Estado se instaurou contra as conquistas daquelas revoluções. No Brasil, pode-se afirmar que após a fase de desgaste do militarismo um novo momento histórico se iniciou e com ele houve uma evolução na política ideológica com fortes tendências ao liberalismo. Collor, o ex-presidente deixou o País na década de 90 com uma situação para reformas no Estado que foram iniciadas posteriormente por Itamar Franco e implementadas em sequência, por Fernando Henrique. Iniciou-se a desregulamentação da economia. Um plano Diretor então foi gerado e um dos tópicos importantes foi a Saúde como um todo. Menecucci (1993 / 1994), afirma que diversos incentivos fornecidos pelo modelo de assistência delineado pela política de saúde das décadas de 60/70 favoreceram, por exemplo, o desenvolvimento da assistência médica de caráter empresarial em detrimento da assistência pública, afetando, dessa forma, o desenvolvimento de diversos segmentos empresariais e propiciando o surgimento de instituições e organizações, como a medicina de grupo, as cooperativas médicas e os sistemas de auto-gestão vinculados a empresas empregadoras. Saúde, então é uma das vertentes

168 Não se trata de pretensão acadêmica, mas devem ser descentralizadas muitas ações médicas, na medida da complexidade dos procedimentos. Locais primários para alta complexidade e hospitais secundários para cirurgias mais simples como, por exemplo: apendicites, retirada de vesícula, debridamento do pé diabético, herniorrafias, ferimentos superficiais, compensação diabética, hipertensão arterial e outros tratamentos de doenças mais prevalentes. (Waldemir W. Rezende) – Apud – (Amorim – 2008 - pág. 174). 169 Artigo de Waldemir Washington Rezende no livro de Amorim, Maria Cristina Sanches e Perillo, Eduardo Bueno da Fonseca (org) – pág. 169

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fortes nesse novo mundo civil e democrático e o cuidado médico começa a deixar de ser – digamos – artesanal. (Menecucci – 1993/1994). Não se pode esquecer que nessa fase o país passava por aguda crise fiscal. Tais situações abriram fortemente as possibilidades de abertura da economia, gerando convergência de propostas neoliberais. Há uma tendência de encerramento do Estado autoritário e centralizador e foco no mercado nacional e internacional. Privatizações e descentralizações eram palavras na moda. O objeto era esgotar a estratégia estatizante, fórmulas encontradas no governo militar. Numa fase recessiva como a de 1976, o governo abriu as portas para empreendimentos privados nos setores mais diversos. Nesses empreendimentos havia as metas do II PND – Plano Nacional de Desenvolvimento e contratações dos serviços privados em várias áreas e primordialmente da Saúde. Foram nítidas as correlações público-privadas e o crescimento embrionário de uma nova modalidade assistencial que surgia – a medicina de grupo – viabilizada a partir do convênio-empresa. O primeiro foi realizado entre o IAPI e a Volkswagem em maio/64. Esse modo de relação destinava-se a uma clientela específica, isto é, à mão de obra das empresas maiores e, portanto, atingia um operariado mais qualificado e com melhor padrão organizativo. O crescimento dessa modalidade deu-se progressivamente, atingindo em 1977, 4.699 convênios que cobriam 10% do total da população previdenciária da época. Pode-se afirmar então que o convênio-empresa foi o modo de articulação entre o Estado e o empresariado que viabilizou o nascimento e desenvolvimento do subsistema que viria a se tornar hegemônico na década de 80 que é a da atenção médica supletiva. Em 1977, através da Lei 6.439, criou-se o Sistema Nacional da Previdência Social – SINPAS, que, conjuntamente com a Constituição de 1967-69 e a Lei 6.229, conformaram a base jurídico-legal do sistema de saúde vigente nos anos 70. (Villaça – 99). Yida (1994), afirma que dentre as várias exigências e reclamos da população, na época, havia os pedidos de creches, melhores salários, anistia, habitações e nesse contexto a Saúde, pois em 1970/72 uma epidemia de meningite assustava a população civil e até os militares. Recursos da Loteria Esportiva foram destinados ao FAS – Fundo de Assistência Social – e ajudou ao setor privado na expansão da rede de assistência Médico/Hospitalar privada. Entre 1974 e 1977 de U$ 240 milhões aplicados em saúde, quase 66% foram destinados à saúde privada no Estado de São Paulo). (Yida – 1994)

Muitos são os discursos no Brasil à respeito do Público e do Privado. Muitos desses discursos datam do início de governos como de Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso. Pode-se afirmar ainda que as décadas de final dos anos 80 e de 90 deram o toque expressivo à essa hegemonia política – privatizações, regulações, parcerias público/privadas - e percebe-se isso quando do lançamento das parcerias público/privadas e das idéias das Agências Reguladoras que transformariam Autarquias e Fundações em Agências Autônomas e nesse bojo as idéias de organizações sociais que deram origem – de forma mais organizada - posteriormente

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as ONG’s – Organizações não Governamentais – com dotação de orçamentos estatais na década de 90.170 Há até discursos sobre o assunto. Nesse período, década de 90, as CEB’s - Comunidades Eclesiásticas de Base – puseram-se a questionar situações de caráter social junto às comunidades, com o objetivo de convencê-las a exigir direitos, fazer manifestações e falarem dos seus problemas. Inicia-se então, fortemente uma corrente de diminuição do Estado – pois havia um sentimento de que ele não funcionava bem - e muito se falava em privatizações. Discursos e entrevistas de ministros dão ênfase a esse liberalismo que aportava. Por outro lado, a Demografia torna-se necessária e emergente disciplina para colher dados sobre crescimento populacional, urbanização, pesquisas em saúde e educação tornam-se absolutamente importantes para conhecer as realidades do Brasil com o objetivo de fazer comparações com o resto do mundo. Por exemplo, o Rio de Janeiro.171 A América Latina passa por um processo dramático de urbanização, comparável apenas a alguns casos do Sudeste Asiático. A população da América Latina, cresceu de 210 para 450 milhões entre 1960 e 1990. Enquanto isto, o percentual de habitantes das cidades aumentou de 49% em 1960 para 72% em 1990. Ou seja, as cidades do continente tiveram de absorver um excedente superior a 221 milhões de almas e corpos em apenas 30 anos. A população urbana mais que triplicou no período. Muita saúde precisava então ser cuidada. Educação era também prioridade. Áreas de proteção social do tipo Saúde e Previdência são exemplos de saltos rápidos citados acima. 172 Outros discursos de fato, podem ser citados, como exemplos de preocupação recente em consagrar atividades públicas e privadas como compartilhamento em todos os níveis. Tito Ryff, (2001) 173 que foi Secretário Estadual de Desenvolvimento Econômico e Turismo, em 2001, dizia: "Não existe projeto nacional bem sucedido sem alguma forma de parceria público-privada. E essa parceria, evidentemente, ganha em todos os sentidos quando é explicitada, regulamentada, quando tem regras estabelecidas previamente e os seus objetivos são discutidos ampla e democraticamente. É isso que nós estamos fazendo aqui, nesse processo que estamos iniciando. Acredito que as discussões e os desdobramentos dessa reunião e desse seminário certamente terão um resultado

170 O intitulado “terceiro setor” alimenta-se da opinião, mais ou menos notória, da necessidade de aprimorar a gestão da política social. Nele se buscam resultados, participação, eficiência, eficácia nos programas sociais, por intermédio da atuação conjunta do Estado e de “setores” da sociedade. Com o “terceiro setor”, retomam-se as antigas práticas da filantropia e do voluntariado, agora com trajes empresariais, decretando um novo mundo, livre de antagonismos e de conflitos entre classes sociais, mesmo com a injustiça, a desigualdade e a miséria que nos olham. (Vieira, 2007). 171 Os especialistas sempre se perguntam por que o Rio de Janeiro é o campeão de tuberculose no Brasil? É uma tendência histórica secular. O Rio foi o porto de entrada da tuberculose no Brasil com os primeiros jesuítas, no século 16, transmitida a uma população indefesa por razões provavelmente étnicas e imunológicas. Além disso, o Rio tem geografia muito particular, com riqueza e pobreza muito próximas numa faixa mínima de terra entre montanha e o mar, onde sempre houve favela, uma população escrava maior, fora fatores recentes como imigração, exclusão social e deterioração da rede de serviços de saúde pública. Isso atravessou séculos. Ainda hoje, “Considero inadmissível que ainda morram cerca de seis mil brasileiros por ano de tuberculose”, diz Margareth, que numa entrevista à Radis, onde faz balanço do estágio da doença no país e enumera algumas recomendações aos profissionais que lidam com pacientes de tuberculose. (Revista Radis – artigo de Margareth Dalcolmo – maio/2008). 172 Mais detalhes populacionais e demográficos devidamente atualizados no capítulo 3 deste trabalho. 173 Fonte: Revista Inteligência Empresarial – número 08 – julho / 2001.

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muito positivo, no sentido de nos beneficiarmos com experiências de outros países e podermos implantar aqui uma parceria público-privada, duradoura, um instrumento efetivo para retomada dos processos de desenvolvimento econômico, de geração de emprego e de renda em nosso país." Pode ser citado ainda, Paulo Sérgio de Oliveira Passos, que foi Secretário de Gestão do Ministério dos Transportes e depois Ministro dos Transportes (2006), que em discurso também se referia a esse compartilhamento entre o Público e o Privado: “Hoje, nós temos o convencimento de que quando se reúnem aqui especialistas, profissionais e os diversos interessados nessa questão, quando estamos diante de um debate que seja positivo e enriquecedor e quando o governo está às vésperas de encaminhar ao congresso nacional um projeto de lei de PPP – Parceria Público/Privada, a nossa expectativa é de que de tudo isso resulte num instrumento: ...uma base normativa que possa, de maneira clara, objetiva e com regras estáveis, abrir um novo flanco para que diversos empreendimentos - que ainda não podem ser realizados pelas limitações do Estado - possam ser executados pela iniciativa privada e colocados à disposição do usuário..." Demian Fioca – (2004/2006), Secretário de Assuntos Internacionais do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, representando o senhor Guido Mantega, Ministro do Planejamento: "...Há dois grandes vetores que nos parecem importantes e que fazem com que as Parcerias Público-Privadas sejam promissoras. Por um lado, permitem ao estado retomar ou avançar na sua perspectiva de planejamento, ou seja, elas ajudam o Estado a contribuir para delinear o horizonte de médio e longo prazo, algo necessário e desejável para o desenvolvimento de qualquer país, inclusive para a própria atividade estritamente privada. E outro vetor é que elas combinam essa capacidade de planejamento com uma perspectiva de eficiência..." Marcio Fortes de Almeida, (2003/2004), como Secretário Executivo do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior: "...Basta olhar a dimensão continental do Brasil, e ver a desigualdade econômica das várias regiões, para saber que alguns projetos serão atrativos para o setor privado. Em outras o interesse vai ser médio, em outras vai ser difícil o setor privado aparecer. Temos que achar meios de estimular esta presença e, dentro deste contexto, o marco legal, jurídico, necessário; a modificação de legislação, constituição de fundos; saber como nós vamos administrar tudo isso e, sobretudo como ter uma visão geral do nosso país quase que continental, e do próprio continente sul americano..." Os últimos anos, especialmente as duas décadas que encerraram o segundo milênio, têm sido marcados pelo candente debate em torno da natureza do Estado capitalista, ainda mais diante das profundas transformações por que passa o próprio capitalismo nos países industrializados, seja pela intervenção estatal na economia e no desenvolvimento de sistemas de proteção social, seja pela queda das experiências

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socialistas no Leste europeu e o advento de um período hegemônico para o capitalismo. (Aciole, 2006). Wallestein (2000) afirma que, após todos os argumentos contidos em seu livro, depreende-se que ser Estado não é nada fácil. Além disso, percebe-se um distanciamento das populações em relação ao Estado e que se todos ou quase todos pudessem viver sem ele, assim seria. “...Há uma desistência hoje generalizada da crença nos Estados...” 174 Na realidade, observa-se que tais discursos estão diretamente preocupados com os movimentos sociais que aconteciam por todo o País, na época, ou seja, décadas de 80 / 90. Muitos movimentos sociais urbanos se iniciaram sobretudo no âmbito dos bairros. Bairro é um conjunto de casas e a casa é um território de ampla intervenção feminina. Temas como água, lixo, segurança, saúde geral e saúde das crianças, creches, escolas, alimentação e outros fizeram a substância de grande parte das mobilizações na época.175 Nessa trajetória de inclusão, os governos, através das políticas sociais ainda estabeleceram no Plano de Pronta Ação (PPA), com o objetivo de tornar os serviços mais acessíveis aos previdenciários, determinando que os casos de urgência deveriam ser atendidos tanto na rede privada como na estadual, independente de vinculação com a Previdência. Esta medida possibilitou não só que parte da população excluída tivesse acesso a um mínimo de consumo de serviços de saúde, como também a expansão da iniciativa privada aos serviços de caráter ambulatorial. (Yida – 1994) O que se apresenta no contexto histórico é que a Saúde – como um todo público e privado – foi estruturado a partir dos anos 60. Essa referência, é considerada como marco e dicotomia entre passado, presente e futuro para este trabalho como pesquisa e história de todo o contexto da Saúde no Brasil a ser considerado. O Sistema Nacional de Saúde, criado pela lei 6.229 de 17 de junho de 1975, estabeleceu, de forma sistêmica, o campo de ação na área de saúde dos setores público e privado. 176 Poucos anos depois, Villaça observa que dá-se uma coincidência entre a proposta internacional dos cuidados primários, acordada em Alma-Ata, 177 em 1978, e a necessidade de desenvolver e expandir uma modalidade assistencial de baixo custo para os contingentes populacionais excluídos pelo modelo médico-assistencial privatistas, especialmente os que viviam nas periferias das cidades e nas zonas rurais.

174 I. Wallestein – “A Reestruturação capitalista e o sistema mundo. In: P. Gentili. (Org) – “Globalização excludente. Desigualdade, exclusão e democracia na nova ordem mundial. Vozes – 2000 – pág. 243 175 Fernandes – pág. 52 176 Apud – Ministério da Saúde – Evolução institucional da Saúde Pública, 1979 - p. 22 – (Yida) 177 DECLARAÇÃO DE ALMA-ATA - CONFERÊNCIA INTERNACIONAL SOBRE - CUIDADOS PRIMÁRIOS DE SAÚDE - Alma-Ata, URSS, 6-12 de setembro de 1978 - A Conferência Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde, reunida em Alma-Ata aos doze dias do mês de setembro de mil novecentos e setenta e oito, expressando a necessidade de ação urgente de todos os governos, de todos os que trabalham nos campos da saúde e do desenvolvimento e da comunidade mundial para promover a saúde de todos os povos do mundo, formulou a conhecida Declaração de Alma-Ata.

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Assim, começa a desenvolver-se no Brasil, a proposta da atenção primária seletiva, concebida na sua concepção estreita de um programa, executada com recursos marginais, dirigidos a populações de regiões marginalizadas através da oferta de tecnologias simples e baratas, providas por pessoal de baixa qualificação profissional, sem possibilidades de referência a níveis de maior complexidade tecnológica, incluindo a retórica da participação comunitária. (Villaça – 99). Redes prestadoras de serviço, empresas com regimes próprios para seus funcionários e uma rede pública precária e incipiente é que fortaleceu o braço privado e se prestou como início para a construção das pilastras de mudanças daí em diante. As pessoas e entidades formadas denominadas de comunidades, associações, forçavam e exigiam mudanças. Uma pesquisa feita em 1986 no Rio de Janeiro e em São Paulo concluiu que 90,7% das associações de moradores existentes haviam sido criadas nos últimos 16 anos. 178 Contudo, não só o momento é outro, como em torno da Saúde e da Previdência giram interesses diversos, mais complexos, como bem colocados pelo documento do Conselho Estadual de Saúde de São Paulo (1986), que teve grande influência em todo o País, ao abordar o problema da implantação de programação integrada de saúde. Apesar disso, o que prevaleceu – anos 80 - no Brasil, foi o entendimento reducionista da atenção primária seletiva, especialmente através dos programas de medicina simplificada ou das estratégias de sobrevivência de grupos de risco. (Villaça – 1999). Considerou-se como opção política já estabelecida o caráter multiinstitucional e não-monopolistico do setor saúde, compreendendo órgãos subordinados a vários Ministérios, várias Secretarias de Estado e de Municípios – composto ainda, por agências de caráter beneficente ou filantrópicas, por profissionais liberais e por empresas de caráter lucrativo. As dificuldades institucionais em conseguir a integração decorreram, principalmente, dos obstáculos políticos às diferentes alternativas de subordinação entre as instituições. Vários foram os documentos tentando a integração. 179 Nesse período, começava a esboçar-se uma entrada no aparelho de Estado de técnicos provindos do movimento sanitário, o que viria a ser um ponto importante nas políticas públicas dos anos 80. Para dar suporte a esses programas, o governo criou o Programa de Preparação Estratégica de Pessoal de saúde (PPREPS) através de um convênio MS/MEC/OPAS e, em 1977, as carreiras de Sanitarista e Agente de Saúde Pública. Em 1979, o PIASS180 foi estendido para todo o território nacional adaptando-se o modelo adotado no Nordeste às peculiaridades das outras regiões, o que resultou numa grande expansão da rede ambulatorial pública. No período de 1975/1984, o número dessas unidades passou de 1.122 para 13.739, num crescimento de 1.225%. Por outro lado, no lugar do pensamento dicotômico, dividido entre interesses particulares e públicos, recupera-se o valor da tríade, afirmando-se a presença

178 Santos – 1993 e Boschi 1987 179 Citação SES, op. Cit. 1978 – p. 3 em Yida - pág. 136 180 Programa de Interiorização das Ações de saúde e Saneamento no Nordeste.

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constante e eficaz de uma terceira possibilidade.181 que poderiam ser as Parcerias Públicas Privadas, as Organizações não Governamentais ou outras possibilidades de compartilhamento entre o Público, o Privado e o não Estatal. Em termos de modernidade, quando Luiz Fernando Furlan (2003 / 2004 / 2005) era Ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior o qual participava de seminários sobre as Parcerias Público-Privadas, sempre se referia a projetos ligados à área de infraestrutura - setor rodoviário, setor ferroviário, portuário, energético, de aeroportos. Projetos para a irrigação eram muitos, uma vez que o Brasil vai crescentemente sendo um produtor eficiente na área de produtos irrigados. Nunca se referiu ele, as possibilidades de Parcerias Público- Privadas no setor de Saúde. Talvez porque não desejasse entrar em seara alheia, pertencente ao Ministério da Saúde, todavia é uma verdade que precisa ser enfrentada dentro de uma visão mais ampla das necessidades da população, pois ela também é – com certeza – uma parceria do Público e do Privado há muito tempo. A discussão de oponentes na Saúde é complexa. Há defensores de políticas de prevenção e outros de políticas curativas, saúde totalmente pública e não unidades básicas de saúde, mas hospitais gerenciadores da saúde da população. São muitas nuances premissas e afirmações e que também dão frutos de muito conhecimento. Há muita dúvida e discussão à respeito. Mendes, 1994, acrescenta que estruturalmente o modelo médico-assistencial privatista constitui-se de quatro subsistemas: a) o subsistema estatal, representado pela rede de serviços assistenciais do Ministério da Saúde, Secretarias Estaduais e Secretarias Municipais de Saúde, onde se exercia a medicina simplificada destinada à cobertura de populações não integradas economicamente; b) subsistema contratado e conveniado com a Previdência Social, para cobrir os benefícios dessa instituição e setores não atingidos pelas políticas de universalização excludente; c) o subsistema de atenção médica supletiva, que buscava atrair mão-de-obra qualificada das grandes empresas; d) o subsistema de alta tecnologia, organizado em torno dos hospitais universitários e alguns hospitais públicos de maior densidade tecnológica. Todos esses modelos receberiam críticas severas, mas construtivas, durante as décadas de 70 e 80 dos meios acadêmicos, universidades e órgãos de saúde pública, além do próprio setor civil. É inimaginável para as novas gerações que a tão ambiciosa Reforma Sanitária que pudesse dar atenção universalizada à população brasileira, só teve alguma materialidade a partir da Constituição de 1988 que propiciou a criação do SUS – Serviço Único de saúde. Essa promessa veio de longe. Estas são as referências ao caos existente nas capitais e grandes cidades. E o resto do Brasil? Aciole, 2006, afirma que a Saúde Pública naquele período – década de 80 - era um aglomerado imenso de instituições públicas e privadas que lhe prestavam serviço. Mais de 60% dos hospitais/leitos –na época - eram conveniados. Há, por outro lado,

181 Fernandes – pág. 20

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atualmente, instituições privadas com comportamento estatutário de públicas. Noções embaralhadas pela ideologia que cerca estes termos; que se alimenta e alimenta esta incompatibilidade de gênios entre o que é público e o que é privado: reforça, sugere e produz distorções nos significados dos dois termos. Há muitos debates.182 Novos e antigos – dados comparativos Neste início do século 21, está de novo no ar a discussão em torno da necessidade de estabelecer um Estado forte no Brasil. Essa discussão envolve também a saúde tanto pública como privada. Índices de controle estão por toda parte e na saúde temos até a possibilidade de utilizar o DALY, o YLL e o YLD, conforme sugere dados e estudos.183 184 Até 1940, havia um nítido predomínio das doenças infecciosas185 e parasitárias como principal causa de morte. Representavam 43,5% do total de óbitos. As doenças cardiovasculares correspondiam a 14,5% e as neoplasias malignas a apenas 3,9% dos óbitos com causa definida. Trinta anos depois, inversões nas causas, pois em 1970, as doenças cardiovasculares já surgiam como a primeira causa de morte. A taxa de mortalidade por doenças cardiovasculares apresentou aumento de cerca de 20%

182 O estímulo para o debate foi a crise econômica que recentemente aconteceu em 2006/2007 e sucedâneos. Esse argumento é forte para não deixar que problemas tão sérios assim continuem ocorrendo. Os menos ambiciosos se contentam com uma situação em que a liberdade econômica é tolerada, mas na qual sempre caberá ao governo dar a palavra final (e a inicial, também) em tudo o que julgar de alguma importância.

183 - O DALY é um indicador que procura medir simultaneamente o impacto da mortalidade e dos problemas de saúde que afetam a qualidade de vida dos indivíduos. O DALY mede os anos de vida perdidos seja por morte prematura (YLL –Years of Life Lost – Anos de vida perdidos por morte prematura) ou incapacidade (YLD – Years Lived with Disability – Anos de vida vividos com incapacidade) em relação a uma esperança de vida ideal cujo padrão utilizado foi o do Japão, país com maior esperança de vida ao nascer do mundo (80 anos para homens e 82,5 anos para mulheres). A metodologia propõe a utilização da tábua de mortalidade desenvolvida por Coale & Guo (1989), na qual a esperança de vida é calculada para cada idade exata. A utilização de um mesmo padrão para todos os países é importante para garantir a comparabilidade dos resultados. Para que os anos perdidos por morte prematura e anos vividos com incapacidade possam ser adicionados é preciso criar uma escala associando pesos à mortalidade e às doenças e seqüelas. Neste sentido, o DALY está ancorado em uma escala de saúde que varia entre zero e um, onde zero significa o estado de plena saúde e um é a morte, o pior estado de saúde possível. A metodologia do estudo da Carga de Doença propõe dois ajustes no cálculo de cada um desses componentes (YLL e YLD). O primeiro ajuste é feito por meio da incorporação de uma função de ponderação de idade que atribui pesos menores aos anos perdidos no início e fim do ciclo da vida – crianças e idosos (Murray & Lopez, 1996ª; 1996b), considerando-se as críticas que têm sido feitas ao uso da ponderação de idade, principalmente em relação à equanimidade do método (Arnand & Hanson, 1997; Bobadilla, 1996). O segundo ajuste refere-se à incorporação de uma taxa de desconto em relação aos anos perdidos no futuro, objetivando estimar os anos de vida perdidos no presente. Esta prática tem sido muito comum nos estudos em economia da saúde (Dasgupta, 1972; Layard & Gleister, 1994). O desconto de futuros benefícios é praticado de forma padrão em análises econômicas e refere-se a uma prática de atribuir um valor maior ou menor no futuro quando comparado ao presente. (Lind ET al., 19082). No Estudo de Carga de Doença no Brasil optou-se por incorporar a taxa de desconto de 3% ao ano, taxa definida em painel de experts em economia e saúde. (Gold et al., 1996). (Apud - Artigo de Joyce Mendes de Andrade Schramm ett all – Revista Ciência e Saúde Coletiva – vol.9 – número 4 – RJ – Oct/dez/2004). 184 Como dados mais recentes sabe-se que as doenças cardiovasculares são as responsáveis por 33% dos óbitos vindo em segundo lugar as causas externas com 15% e em terceiro as neoplasias malignas com 12%. No passado os dados eram bem diferentes. 185 Brasil registrou perto de 85 mil novos casos de tuberculose por ano, e o Estado do Rio tem as piores estatísticas: 16 mil novos casos anuais, que chegam a 20 mil se somados os não-curados do ano anterior. De 30% a 33% das mortes por tuberculose – a maior taxa de mortalidade do país – ocorre na emergência dos hospitais terciários, o que revela a baixa eficácia da rede básica no diagnóstico e no tratamento da doença. No bairro de Curiacica, zona oeste do Rio de Janeiro, fica o Centro de referência Hélio Fraga, transferido em abril à Fiocruz. Sua experiência de mais de 20 anos em pneumologia sanitária permitiu que, a partir de 1995, desenvolvesse protocolo clínico para validação de um tratamento das formas multirresistentes da tuberculose (TBMR) – quando o paciente não responde a remédios como Rifampicina e Isoniazida. O objetivo: dar resposta aos chamados casos crônicos da doença. (Fonte: Margareth Dalcolmo – Adriano de Lavor e Karine Thames de Menezes - Revista Radis – número 69 maio/2008).

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nos últimos 50 anos. Entretanto, na cidade de São Paulo houve um declínio importante nas taxas de mortalidade, em média de 28% para as doenças isquêmicas do coração e 16% para as doenças cerebrovasculares nos últimos anos. Nas regiões Sul e Sudeste, a obesidade atinge mais de 5% das crianças menores de cinco anos, mesmo em famílias de baixa renda. A partir dos 18 anos de idade, o sobrepeso e a obesidade tornam-se cada vez mais freqüentes. Na média, mais de 32% dos brasileiros adultos apresentam algum grau de excesso de peso. A hipertensão arterial é um dos maiores problemas de nutrição pública no Brasil e a terceira causa mais comum de incapacidade temporária para o trabalho. Atinge entre 12 a 18% da população. 75% do total de hipertensos ignoram a sua condição e apenas 16% fazem tratamento dietético. Os níveis de colesterol acima de 240 mg/dl, variou entre 5 a 12%. Os dados do Registro Nacional de Patologia Tumoral indicam um ligeiro predomínio de neoplasias malignas em mulheres, na ordem de 53%. Nos homens, pele, 28%, estômago 11%, próstata 7%, pulmões 6% e esôfago 4%. Nas mulheres, pele 24%, colo uterino 20%, mama 17%, estômago 4%, corpo uterino 4%. A porcentagem média de baixo peso ao nascer que é de 2.500 g ou menos, é de 11%. Em crianças brasileiras menores de cinco anos, 31% apresentam déficit de peso em relação às respectivas idades, sendo que em 5% delas, o quadro é moderado ou grave. (Oliveira, 1996). Na atualidade, o Ministério da Saúde destacou o guia para médicos “Dengue – Decifra-me ou devoro-te”. A idéia é ótima, já que não poucos médicos do Rio falharam no diagnóstico, em especial com crianças. Há um comentário de Maulori Cabral, do Instituto de Microbiologia da UFRJ, deu à revista Radis a explicação desse fenômeno inadmissível em país tropical: virologia é praticamente ausente no currículo de Medicina, e por isso a maioria das mazelas de natureza infecciosa é considerada virose. 186 187 Nessa análise admite-se três modelos de políticas sociais, sendo um modelo institucional-redistributivo que concebe o sistema de bem-estar como elemento importante e constitutivo das sociedades contemporâneas, voltado para a produção e distribuição de bens e serviços sociais extra mercado, os quais são garantidos a todos os cidadãos universalmente cobertos e protegidos; o modelo residual, onde as políticas sociais intervêm ex-post quando os canais naturais e tradicionais de satisfação das necessidades, que são as famílias e os mercados, não estão em condições de resolver determinadas exigências do indivíduo e o modelo meritocrático-particularista que se fundamenta na premissa de que cada um deve estar em condições de resolver suas próprias necessidades, em base a seu trabalho, à performance profissional, à produtividade. Como exemplo, temos a antiga República Federal Alemã. (Mendes, 1999). Ainda dentro dessa análise, deve ser lembrado o caos reinante na Saúde dos EUA, neste ano de 2009 e a luta do novo presidente em tentar viabilizar um plano de saúde

186 Revista Radis - número 69 – maio/08. 187 Há cursos médicos que, em seu currículo de disciplinas, dão duas horas de aulas sobre tuberculose. (Fonte: Radis – 69 – maio/2008).

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que seja, próximo da Universalidade de Direitos, algo assemelhado ao que temos no Brasil. Todos esses dados nos leva a questionar no Brasil qual é a mais adequada situação. O processo de unificação da saúde pública e a criaç ão do SUS Se considerarmos que o volume de recursos financeiros dos IAPs era grande, tanto em dinheiro como em títulos públicos, pois milhões de trabalhadores contribuíam mensalmente, e observando as diferenças entre os benefícios oferecidos às categorias profissionais, o governo começou a pensar na possibilidade de unificar esses institutos. Nessa época, ainda o assunto de saúde privada ou planos privados de assistência à saúde era incipiente. Com o golpe militar de 1964, a idéia de unificação já era latente, pois os institutos estavam com muita força política. Em 1967, o governo militar resolveu, então, criar o INPS - Instituto Nacional da Previdência Social, unificando todos os institutos. Essa centralização e o grande volume de recursos financeiros levaram à aplicação desses valores vultosos tanto em empreendimentos já existentes, como na Cia. Hidrelétrica do Vale de São Francisco ou em novos, como a Siderúrgica Nacional, a Petrobrás, parte da construção de Itaipu e até a construção de Brasília188. Mas essa unificação trouxe muitos problemas. A máquina do Estado cresceu, assim como a burocratização. Surgiram os famigerados favores políticos, os cabides de empregos e esse mecanismo fragmentado de poder criou uma atividade política exacerbada189. O processo de industrialização acelerada que o Brasil viveu a partir da década de 50 determinou um deslocamento do pólo dinâmico da economia para os centros urbanos e gerou uma massa operária que deveria ser atendida pelos serviços de saúde. A partir desse período passa a configurar-se o denominado modelo médico-assistencial-privatista, que vigorará hegemônico de meados dos anos 60 até meados dos anos 80 (Luz, 1979). Em vista da grande máquina criada pela unificação dos institutos, surgiu, então, um novo perfil assistencialista para a saúde dos brasileiros, e para isso era necessário trazer os serviços privados para cumprir os objetivos de melhor atendimento à população. Tem início a utilização de serviços de terceiros para atender a essa gigantesca máquina de saúde e pensões. Clínicas, médicos, laboratórios e hospitais foram sendo credenciados para prestar serviços ao governo. Essa mentalidade assistencialista estendeu-se a outros benefícios, sendo criados em 1967, o salário-família e, posteriormente, o salário maternidade. Também as empregadas domésticas e os autônomos passaram a poder utilizar o INPS para a saúde e a aposentadoria, desde que fossem contribuintes, isso tudo a partir de 1972. A declaração bombástica de que não havia mais recursos foi feita ainda na década de 70 – pelo SINPAS - e advertia que haveria muitos problemas, pois o INPS e demais órgãos estavam quebrados e o rombo financeiro já existia há anos. Havia se passado uma década e

188 http://www.apape.org.br/fs290703.htm - acessado em 20/05/2005 189 http://www.dhnet.org.br/direitos/sos/assist/acpromotor.html - acessado em 14/04/2004

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era previsível a necessidade de unificar a saúde pública de forma diferenciada. Novamente, era preciso mudar. O que fazer então para cobrir o imenso déficit? Duas soluções foram discutidas: aumentar as receitas ou diminuir as despesas. Houve então o aumento das alíquotas de contribuição conforme já comentado.

Empregadores e empregados passaram a pagar mais e houve uma emissão de ORTNs - Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - compulsoriamente adquiridas pelos bancos para cobrir o caixa do governo relativamente a despesas de assistência médica e pensões. Podemos observar então que, compulsoriamente ou não, as mudanças e inovações sempre aconteciam. Ao mesmo tempo, foram criados o F.A.S. - Fundo de Assistência Social - e o FINSOCIAL. Novamente, há o compartilhamento, compulsório, entre o público e o privado. Adaptadas às condições da época e empregando técnicas modernas de administração hospitalar, graças, ainda, à obrigação da aplicação de seus eventuais resultados positivos na própria instituição - para o aperfeiçoamento e melhoria da qualidade dos serviços que presta à sociedade -, representam a grande opção que o Governo tem para consolidar a implantação do Sistema Único de Saúde em todo o território brasileiro.190 Segundo Amorim, (2008), dados da Organização Mundial de Saúde mostram que o Brasil está entre os dez países do continente americano com maiores gastos em saúde. Desse total, 45% foram oriundos de fontes públicas e os outros 55% de fontes privadas. Próximo à década de 80, o governo resolveu fazer uma grande extensão da assistência médica, ou da saúde para toda a população e, de acordo com a Constituição de 1988, que já previa a unificação da previdência à saúde, foi criado o SUDS, Sistema Unificado e Descentralizado da Saúde, posteriormente denominado apenas SUS - Sistema Único de Saúde, como o conhecemos até nos dias atuais. Em 1986 realizou-se em Brasília a VIII Conferência Nacional de Saúde, cujo principal objetivo foi o da Reforma Sanitária. No ano seguinte surge o SUDS - Sistema Unificado Descentralizado de Saúde, que recebeu as unidades do INAMPS que era mantido através de convênios firmados entre União, entre os Estados e Municípios e se defrontou com sérios problemas políticos. No movimento da crise financeira da Previdência social, manifesta-se mais fortemente como resultado da política econômica recessiva imposta ao País no período de 1981-82. Pinotti (1986), já dizia que dinheiro na crise da década de 80 na saúde existia e sempre existiu. A distorção estava na sua fragmentação, a começar pela coexistência pouco lógica de dois Ministérios – o da Saúde e o da Previdência Social – para cuidar da mesma coisa. Essa crise leva à identificação da assistência médica – o lócus das despesas compressíveis – como um dos focos geradores dos problemas financeiros da Previdência Social e acirra o fracionamento dos diferentes interesses no interior da arena política da saúde.

190 http://cmb.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=16&Itemid=30&limit=1&limitstart=2

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É necessário que se mencione, pela importância que viria a adquirir posteriormente na modelagem do projeto neoliberal, as posições diferenciadas da Federação Brasileira de Hospitais, acuada pelas denúncias de fraudes, e a Associação Brasileira de Medicina de Grupo que procurava colocar-se como alternativa de custo zero para a crise da atenção médica. Ou seja, começava a delinear-se um processo de mudança de hegemonia no setor privado pelo confronto entre um setor Estado-dependente e outro mais dinâmico e que não mantinha relações diretas com a Previdência Social. Era necessário um órgão para regular todo esse aparato até 1981 e foi criado em 2 de setembro de 1981, pelo Decreto 86.329 o Conselho Consultivo da Administração de Saúde Previdenciária (CONASP), composto por notáveis da medicina, representantes de vários ministérios, de trabalhadores, do setor patronal e dos prestadores privados de serviços, com o objetivo de reorganizar a assistência médica no país, reduzindo seus custos e controlando seus gastos. 191 Esse órgão inicia então com uma série de medidas de curto prazo e de caráter emergencial, visando a redução de gastos, especialmente em atenção hospitalar. Houve concentração da normatização no INAMPS, saindo do Ministério da Saúde tais regulações. É aí que se constata a importância desse órgão na reversão gradual do modelo médico assistencial. O plano do CONASP tinha, na época, apoio no movimento sanitário, na medicina liberal e na Abramge e grande oposição, obviamente na FBH – Federação Brasileira de Hospitais. Iniciam-se então os grandes encontros nacionais de Secretários Municipais de Saúde em 1982 o primeiro e o segundo em São José dos Campos, o terceiro em Montes Claros, e em 1987, o quarto em Londrina. É no período de 1985 a 1987 com a proposta institucional da Nova República, que parte considerável de atores políticos do Movimento de Reforma Sanitária tem acesso ao aparelho do Estado. Foi nesse momento que MPAS/Inamps passou a ser um grande alavancador da política de descentralização e desconcentração das ações de saúde. Há um aprofundamento da estratégia das Ações Integradas de Saúde – AIS – e em 1987, após a VIII Conferência Nacional de Saúde (1986), a sua transformação em Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde – SUDS – em 20 de junho de 1987. (Fleury – 1991). Nesse período foi criado também o Conasems – Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde, (10 de julho de 1987) que se torna a Plenária das entidades de Saúde no Brasil. A Constituição brasileira de 1988 criou o conceito de Seguridade Social, composto por um tripé: Saúde, Previdência e Assistência Social. A promulgação da Carta Magna em seu artigo 196 foi a pedra que faltava para a criação do SUS. Na saúde foi instituído o Sistema Único de Saúde. Criaram-se as bases legais para garantir saúde como direito de cidadania e dever do Estado. Com a Seguridade Social estaria garantida a universalidade dos cidadãos às ações e aos serviços de saúde. Diferenças significativas demarcaram o SUS do sistema anterior. Uma delas é a garantia da existência de um sistema articulado em todas as

191 Apud – Andrade – pág. 25.

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esferas do governo. União, Estados e Municípios. Outra mudança significativa foi a introdução de princípios doutrinários, em que se destaca o princípio da universalidade, rompendo radicalmente com o sistema anterior, excludente, que dava acesso ao atendimento só aos contribuintes do sistema. O princípio da integralidade foge da lógica de ter todos os serviços funcionando com base na assistência médica individual-curativa, uma prática introduzida pelo antigo INAMPS. É importante notar que a Lei do Sistema Nacional de Saúde de 1975, definia como atribuições do Ministério da Saúde a assistência coletiva e do Ministério da Previdência Social as ações de caráter individual. Com o surgimento do SUS, todas as atividades consideradas de saúde coletiva e individual são unificadas no Ministério da Saúde, ficando o Ministério da Previdência Social apenas com as atividades de Previdência e Assistência Social, (Andrade, 2001). De 1988 até hoje, vários processos foram estabelecidos com a finalidade de operacionalizar a adequação da máquina pública da União, dos Estados e dos Municípios para implantação do SUS. 192 O SUS foi regulamentado em 1990, em decorrência e necessidade de se dar materialidade a Constituição de 1988. As leis foram 8080 e 8142 definindo o Direito Constitucional de cidadania em relação também à saúde e o dever do Estado de fornecê-la de alguma forma. O processo envolveu todas as esferas de poder, desde o Municipal, Estadual e Federal. Houve a extinção, já comentada do Inamps. Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, o então chamado Movimento Sanitário passou a estabelecer como prioridade a regulamentação do Sistema Único de Saúde no âmbito da União. 193O grande embate colocado pelas Leis 8080 de 19 de setembro de 1990 e 8.142 de 28 de dezembro de 1990 passou a constituir a Lei Orgânica da Saúde – LOS. São Leis infraconstitucionais que disciplinam o cumprimento do mandamento constitucional da proteção e da defesa da saúde. (Andrade, 2001). A descentralização do SUS Até a sua regulamentação os serviços de saúde à população em geral era extremamente – e de forma desordenada – fragmentado e quem tinha maior poder na saúde era o governo federal.

192 Ao tratar do SUS, a Constituição enumera, em seu artigo 200, as seguintes atribuições: controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e substâncias de interesse para saúde e participar da produção de medicamentos, equipamentos imunobiológicos, hemoderivados e outros insumos; executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador; ordenar a formação de recursos humanos na área de saúde; participar da formulação da política e da execução das ações de saneamento básico; incrementar em sua área de atuação o desenvolvimento científico e tecnológico; fiscalizar e inspecionar alimentos, compreendido o controle de teor nutricional, bem como bebidas e águas para consumo humano; participar do controle e fiscalização da produção, transporte, guarda e utilização de substâncias e produtos psicoativos, tóxicos e radioativos; colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o trabalho. Os serviços de assistência á saúde, a cargo do SUS, abrangem toda a área médica, ambulatorial e hospitalar, odontológica e os serviços auxiliares de apoio a diagnóstico e tratamento, prestados segundo as necessidades da população. A descentralização da prestação dos serviços é outro marco na forma da prestação pública da assistência à saúde. 193 (Apud Andrade – Rodrigues Neto, 1991 – pág. 29).

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O Brasil gastou em 2007 o valor total de 219 bilhões de reais em Saúde pública e Saúde Privada. A divisão é de 56,8% pelo setor público e 43,2% pelo setor privado. Isso quer dizer que, os gastos médios anuais por pessoa em planos privados ficou em torno de R$ 1428,00 reais e no SUS em torno de R$ 675,00194 Amorim, (2008), afirma que havia contraposições à descentralização e não se limitavam ao plano interno e ao passado; o relatório Hospital Performance in Brazil, The Search for Excellence, de 2008, - vinte anos depois da Constituição de 1988 - patrocinado pelo Banco Mundial, critica o modelo descentralizado do SUS, sobretudo a autonomia – considerada excessiva – dos municípios, apontando-a, entre outras, como uma das causas da ineficiência do sistema de saúde brasileiro. 195 (Amorim – 2008). Embora não haja consenso, Júlio de Moura (1889), afirma que todo esse aparato desperdiçou recursos e ações em duplicidade e triplicidade. Os Municípios cuidavam de calamidades, urgências e os Estados eram responsabilizados por grandes ações como vacinação, imunizações, vigilância a epidemias e algumas doenças específicas eram preocupantes, como por exemplo, a tuberculose. 196 As ações foram se alterando após a ativação do SUS e o fato de que a descentralização esteja sendo discutida no espaço institucional não quer, de nenhum modo, deixar entender que ela se exclui dos dois outros espaços de transformação: o jurídico-legal e o operativo. Ao contrário, neles, também, manifesta-se adquirindo, em cada qual, uma conotação própria. No espaço institucional, sua dimensão mais marcante irá expressar-se no processo de municipalização da saúde, contudo, a municipalização – na perspectiva da discussão que se fez sobre a descentralização – não deve buscar uma autonomização, o que leva, por consequência, ao qualificá-la, concomitantemente, identificar novos papéis para as instâncias federativas de nível estadual e municipal. A opção aqui colocada, pela descentralização, não pode ser exercitada num país federativo, grande e complexo, separadamente da municipalização. Isso se justifica, pelas razões, de que a democracia exige obediência às leis, e a Constituição Federal diz, no seu art. 30, item VII, que compete aos municípios, com a cooperação técnica e financeira da União e dos estados, prestar serviços de atendimento à saúde da população; porque os cidadãos nascem, crescem, vivem, adoecem e morrem no município; porque é no espaço social, definido pelo município que a autoridade 194 Levantamentos efetuados pela Revista Exame em 2009 – revista de Nov\2009\pág.174 195 Apud – Amorim, Maria Cristina Sanches – pág. 185 196 A tuberculose ainda é uma doença negligenciada. “Tratando-se de uma enfermidade que assola o Brasil, com a teimosia inexorável de uma endemia que não tem paradeiro, há quem afirme que a situação de tal enfermidade encontra-se na mesma lamentável contingência dos nossos antepassados, lutando tanto ou mais do que eles por um lado com a indiferença pública, por outro, com a ineficácia ou mesmo ausência dos meios aconselhados para preveni-la ou debelá-la”. (Palavras em discurso do médico Júlio de Moura proferido no 2.º Congresso Brasileiro de Medicina e Cirurgia – em 1889. (Recuperação pela pesquisadora Dilene Raimundo do Nascimento) em: “As pestes do século XX – Tuberculose e Aids no Brasil, uma história comparada”, revela que a preocupação com a doença, infelizmente, não é recente. Mais de 100 anos depois, mesmo com tratamento de comprovada eficácia, a tuberculose é reconhecida como emergência global pela OMS, desde 1993, por ser a maior causa de morte de adultos por doença infecciosa. Ela integra o rol das ‘doenças negligenciadas’, ainda que um terço da população mundial – cerca de 2 bilhões de pessoas – esteja infectado pelo bacilo de Koch, seu agente causador, o que representa 100 milhões de casos registrados por ano em todo o planeta. (Radis – maio/2008 – pág. 69).

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sanitária tem endereço certo e sabido e outros motivos que não são necessários citá-lo um a um. (Mendes, 1999). O SUS detém o controle atualmente de algo em torno de 60 mil unidades de saúde para atendimento ambulatorial espalhadas pelo Brasil e 6.500 hospitais públicos, privados contratados e privados filantrópicos197. (Negri, 2003). O sistema público de saúde foi responsável, em 2003, por mais de 12 milhões de internações hospitalares e por quantidade superior a isso de atendimentos ambulatoriais envolvendo milhares de profissionais 198. Os números são grandes, mas na medida em que se considera a destinação dos recursos para a Saúde em comparações com o pagamento da dívida pública brasileira, tanto a interna quanto a externa, percebe-se que se trata de uma corrida onde o pagamento de juros para os órgãos internacionais torna-se quase uma ditadura financeira. Aciole (2006) ainda observa que não se vê uma luz de mudanças na medida em que a Reforma tributária nem saiu de discussões no Congresso. Há boas idéias, simplificação de todo o bojo tributário, o CVA – Contribuição sobre Valor Adicionado, substituição de outros impostos para promover melhor distribuição, mas as forças contrárias ainda são muito conservadoras. Desde a sua criação, o SUS199 enfrenta críticas contínuas quanto à qualidade, insuficiência e iniqüidade da atenção prestada. Problemas existem muitos, de ordem financeira e, principalmente, gerencial. As soluções desses problemas são desafios que têm sido enfrentados sob alguns focos: estabilização do financiamento, ampliação da descentralização, mudança de modelo assistencial, redução das desigualdades e ampliação da atividade reguladora. 200 Ainda há muito por fazer. O financiamento da saúde e seus aspectos políticos e gerenciais Fontes / fundos e procedimentos O acesso e o domínio da informação sobre o orçamento e os gastos na assistência à Saúde são fundamentais, para garantir a consolidação de seu financiamento. Os recursos orçamentários garantem a implantação e custeio de programas, serviços, benefícios e projetos contidos nos planos municipais, estaduais, federal e nacional de assistência social. As perguntas são muitas e poderão ser respondidas. O financiamento para a assistência social tem sido suficiente para o atendimento das necessidades sociais da população que demanda esta política? A interiorização da assistência à saúde caminha de modo significativo, nos três

197 Negri, 2003, p. 31. 198 Assistência de média e alta complexidade no SUS - Secretaria da Assistência à Saúde - Brasília - Min. da Saúde - 500 páginas - ISBN-85-334-0494-8 - Anuários organizados por João Gabardo dos Reis e outros. (2003). 199 Os princípios da Reforma Constitucional que criou o SUS, são: descentralização (trabalhos operacionais pelos Municípios), democratização – participação do cidadão nos serviços prestados; integralidade e sistema misto de integração entre a área pública com a atuação privada não lucrativa e lucrativa. (Fonte: construção do SUS – 2006) – Ministério da Saúde. 200 Negri, 2003 - p. 3

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estágios descentralizados, Federal, Estadual e Municipal. Quatrocentos e noventa e quatro municípios tiveram coragem política de assumir, de forma integral, a gestão dos serviços de saúde em sua área geográfica, enquanto outros 4.849 estão no estágio intermediário de integração com o sistema. Os resultados são de 1997, mas são interessantes: mais de um bilhão de procedimentos no ano, entre os quais 300 milhões de consultas médicas, 50 milhões de vacinações, 12 milhões de internações, 2,8 milhões de partos, 3,8 milhões de hemodiálises. O calcanhar de Aquiles do desenvolvimento do SUS ainda é a insuficiência e inconstância de seus orçamentos. O Brasil gasta pouco com saúde ainda. (Gouveia, 2000). Sabe-se já então que a Constituição brasileira de 1988 criou o conceito de seguridade, criado pelo tripé Saúde, Previdência e Assistência Social. Essas são as bases legais para garantir saúde como direito de cidadania e dever do Estado. Está garantida a universalidade dos cidadãos às ações e aos serviços de saúde. As diferenças entre o que existia e o que existe atualmente são bastante significativas. Uma delas é a garantia da existência de um sistema articulado em todas as esferas do governo. Outra é a construção de suas bases em princípios norteadores únicos, pois, anteriormente, cada esfera de governo tinha a sua política e muitas vezes, dentro de um mesmo nível, instituições desenvolviam políticas de saúde desarticuladas. Outra mudança foi a introdução de princípios doutrinários, em que se destaca o princípio da universalidade, rompendo radicalmente com o sistema anterior, excludente, que dava acesso somente aos contribuintes ao sistema. De 1988 até hoje, vários processos foram estabelecidos com a finalidade de operacionalizar a adequação da máquina pública da União, dos Estados e Municípios para implantação do SUS. Nesta perspectiva destaca-se a Lei Orgânica da Saúde que é composta das Leis 8.080/90 e 8.142/90. Em relação ao financiamento do setor, o artigo 35 da Lei 8.080 de 19/09/1990, estabelece critérios claros para definição de uma política alocativa. A edição das Normas Operacionais Básicas – as NOB’s vem sendo utilizadas como mecanismo regulador do processo de estadualização e municipalização das ações e serviços de saúde. Uma dessas adequações foi como pagar os Estados e qual o critério a ser adotado. Apesar de ser o critério populacional considerado melhor que o anterior, este ponto na época provocou bastante polêmica, especialmente entre os dirigentes dos Estados que historicamente produziam maior quantidade de serviços. Apesar de estarem dadas as condições jurídicas para a mudança da lógica de ter um governo que compra – no caso a União – e governos que vendem serviços – os Estados e Municípios – por meio da Lei Orgânica da Saúde, mais precisamente do artigo 35 da Lei 8.080/90, este dilema relacionado ao financiamento das atividades hospitalares iniciou-se com a NOB-01/91 e permanecerá presente nas Normas Operacionais subseqüentes. O que essa norma determina é que, diferente do que existia como convênio, apenas, estabeleceu-se um teto, que é a Unidade de Cobertura Ambulatorial (UCA), valor que multiplicado pela população produzia o valor máximo – chamado de teto – de cada Estado para implementação de ações ambulatoriais.

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A trajetória de financiamento das ações e serviços de saúde evoluiu do pagamento por procedimentos aos prestadores de serviços, característica da década de 70, passando na década de 80 para as Ações Integradas de Saúde (AIS) e em 1987, para o Sistema Único de Saúde e Descentralização da Saúde (SUDS). Mecanismos reguladores então foram criados para estabelecer critérios e regulações. Todos esses aspectos deram origem as Normas Operacionais Básicas. São Parte de um forte processo político de pactuação entre gestores. As normas inicialmente criadas editadas pelo Ministério da Saúde foram respectivamente: em janeiro de 1991, a NOB-SUS-01/91, em fevereiro de 1991, a NOB-SUS, 01/92, em maio de 1993, a NOB-SUS-01/93 e em agosto de 1996, a NOB-SUS-01/96. As NOB’s regularam então os Controles das Autorizações de Internações Hospitalares. Tabela I

Quantidade de AIH’s por Estados definidas pela Portaria 19 de 08/01/91 do MS

Acre 2.898 Paraíba 28.503

Alagoas 18.916 Pernambuco 57.024

Amazonas 14 759 Piauí 20.999

Amapá 1.783 Paraná 77.846

Bahia 81.166 Rondônia 7.500

Ceará 49.999 Rio de Janeiro 117.181

Distrito Federal 12.023 Roraima 906

Espírito Santo 19.764 Rio Grande do Norte 16.340

Goiás 35.737 Rio Grande do Sul 78.749

Maranhão 39.561 Sergipe 11.370

Minas Gerais 140.456 Santa Catarina 38.346

Mato Grosso 17.656 São Paulo 279.301

Mato Gr do Sul 15.677 Tocantins 9.843

Pará 35.945

Fonte: Andrade – pág. 35 A NOB-SUS-01/91, constituiu-se de um conjunto de Portarias (15,16, 17, 19, e 20) da SNAS/MS, de 8 de janeiro de 1991 e da Resolução 158, anexo 2, que aprovou a NOB-01/91 do Inamps, publicadas pelo Diário Oficial da União em 10/01/1991. Destacam-se a criação do SIH (SUS) – Sistema de Informação Hospitalar como forma de pagamento a prestadores de serviços hospitalares e ambulatoriais. Definiram-se ainda nesta NOB as quantidades de AIH – Autorização de Internação Hospitalar e UCA – Unidade de cobertura ambulatorial – a serem distribuídas mensalmente a cada Estado. Acima a tabela. Ela sofreu reformulações com valores ajustados no tempo. As AIH’s, foram alocadas por Estado pelo critério populacional. A NOB-SUS 01/92, segundo Andrade, (2001), pode ser considerada um avanço em relação à NOB-SUS-01/91, pois nela já aparece o reflexo do movimento municipalista.

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Pode ser considerada como precursora de um documento denominado: Ousadia de Cumprir e Fazer cumprir a Lei que foi publicada pelo Ministério da Saúde. Ela é composta de um conjunto de portarias e que em última análise procurava assegurar o poder do Inamps dentro do Ministério da Saúde no processo de Reforma Sanitária. (Santos, 1991). Do ponto de vista da gestão e do planejamento a NOB-SUS 01/92, avançou procurando definir o conceito de integralidade quando tenta explicar as definições de promoção, proteção e recuperação da saúde. Ela também propôs dois mecanismos de estímulo à municipalização e a estadualização: criou o FEM – Fator de Estímulo à Municipalização – e o FEGE – Fator de Estímulo à Gestão Estadual. Isso até hoje não saiu da teoria. Na IX Conferência Nacional de Saúde que aconteceu em Brasília, de 9 a 14 de agosto de 1992, o tema central foi: “Saúde: municipalização é o caminho”. Com a destituição do governo federal, impeachment do Collor, em final de 1992, cria-se a expectativa de avanço democrático. Assume então a gestão da saúde um grupo técnico/político do Movimento Sanitário vinculado á vertente de descentralização/municipalização. É neste momento que é publicada a Norma Operacional Básica SUS-01/93, que se expressa no documento a Ousadia de Cumprir e fazer cumprir a Lei, de 24 de maio de 1993. (Andrade, 2001). Com o fim de assegurar a descentralização foi criado um grupo, no início de 1993, o GED – Grupo Especial para a Descentralização. A situação de habilitação dos municípios ao final de 1997, de acordo com a NOB-SUS- 01/93, pode ser observada em tabela do Banco de Dados de Habilitações/SPSA/MS. Pode-se constatar que, dos quase 5.000 municípios brasileiros, apenas 3.127 estavam enquadrados em algum tipo de gestão. Ressalte-se que destes, 2.367, achavam-se em gestão incipiente, 616 na parcial e somente 144 em gestão semi-plena. Esse cenário gerou a NOB-SUS 01/96. Essa nova NOB teve como princípio básico estabelecer a responsabilidade do município sobre o cidadão. Ela definiu o município em três áreas: o da Assistência, o das Intervenções ambientais e o das Políticas externas do setor de Saúde. De certa forma, foi introduzida a idéia do SUS Municipal. Há ainda o PAB – Piso Assistencial Básico de acordo com um per capita nacional pela população de cada município. Essa nova NOB-01/96, foi a primeira Norma Operacional a fazer referência ao reembolso das despesas realizadas em função de atendimentos prestados por unidades públicas a beneficiários de planos privados de saúde e isso é muito interessante pois a legislação específica da atividade privada dos Planos de Saúde e Convênios somente seria aprovada e fortalecida pela Lei 9656 em 1998, ou seja, dois anos depois cuja regulação foi destinada a uma agência específica para o assunto que foi a ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar. Foi aquela NOB – 01/96, que estabeleceu também os tetos financeiros abrangendo todos os recursos que fazem parte do processo saúde/doença. As regulações aos Programas de Saúde da Família (PSF) e de Agentes Comunitários de Saúde (Pacs) estão integrados e com acréscimos sempre que estiverem atuando – os municípios integradamente. (Andrade, 2001).

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Quanto as fontes de financiamento, a Constituição Federal de 1988, estabelece em seu artigo 195, que a seguridade social será financiada por toda a sociedade, com recursos do orçamento da União, Estados, DF e municípios e das seguintes contribuições sociais: dos empregadores incidente sobre folha de salários, o faturamento e o lucro; dos Trabalhadores; Sobre a receita das loterias. Cria a Contribuição Sobre o Lucro Líquido das Pessoas Jurídicas – CSLL – Lei 7.698/88; COFINS - Contribuição Social para o financiamento da Seguridade: contribuição federal, sobre a receita das empresas; Contribuição dobre a Receita de Concursos de Prognósticos (Decreto lei 204/67 – FAS lei 6.168/74) ;Parte do PIS e Outras receitas da União, dos Estados e municípios. Segundo Aciole201 (2006) a quase totalidade dos recursos destinados à Saúde é originária das chamadas Contribuições Sociais. São elas: Contribuição para o financiamento da Seguridade Social, conhecido como COFINS cujo percentual incide sobre o faturamento bruto das empresas, a Contribuição sobre o Lucro Líquido das empresas, também chamado de CSLL, a já falecida CPMF até 2007 a qual foi agregada em 94, suspensa em 95 e 96, retomada em 97 e extinta. Há ainda a Contribuição dos empregados e dos empregadores para a Seguridade Social, cujo percentual incide sobre a folha de pagamentos. Há ainda recursos do orçamento do governo federal e outras arrecadações em cada nível de poder político. Os valores dos recursos são notáveis, todavia, insuficientes para os problemas que o Brasil enfrenta. Em 2002, o Ministério da Saúde, por exemplo, transferiu valores altíssimos (Radis, 2008), para Estados e Municípios – onde quase 63% se deveram a gastos com assistência médica hospitalar e ambulatorial - e o restante em programas de atenção básica, ações coletivas ou assistência médica de baixo custo e programas especiais como DST/Aids,202 Exames de próstata, Cataratas, Deficiência auditiva e outras como Dengue.203 Resumindo para um entendimento básico, pode-se afirmar que a Saúde do modelo brasileiro tem pontos positivos e negativos. Uma agenda deve ser sempre discutida não esquecendo que Saúde existe pública e existe saúde privada.

201 Giovanni G. Aciole – pág. 249 202 O Globo em 30/03/08, publicou a reportagem “Aids: sem medo da morte, jovens se descuidam”, apontando o crescimento do número de casos entre homossexuais de 13 a 24 anos. Segundo o Ministério da Saúde, que lançou várias campanhas de conscientização o percentual de jovens gays contaminados pelo HIV cresceu 26% em 1996 para 41% dos 32 mil novos casos registrados em 2006. Entrevistados algumas pessoas de sites gays se não tinha medo, respondeu: “hoje em dia tem o coquetel de graça. Ninguém morre de Aids no Brasil, não”. A verdade é outra. Entre 1991 e 2007, 2.916 pessoas com mais de 60 anos contraíram o HIV. Os medicamentos para a disfunção erétil têm encorajado a população idosa a ter mais relações sexuais, muitas vezes, desprotegidas. O número de mortes está estabilizado em torno de 11 mil anuais desde 1998. Mas a Aids permanece uma das maiores causas de morte por doença no Brasil. Em 2006 o índice foi de 17,5 óbitos para cada 100 mil habitantes. Foram 474 mil casos notificados desde 1980, mas a estimativa de contaminados chega a 600 mil. O infectologista David Ulip, diz acreditar que o fenômeno é fruto da banalização da epidemia. Ele diz por exemplo que está desanimado. A população homossexual aceitou bem a prevenção no primeiro momento, talvez tenha sido a que mais aderiu, mas, neste momento está baixando a guarda. (Fonte: Radis, número 69 – maio/2008). 203 No meio da disputa entre governos, municipal, estadual e federal, a população do Rio de Janeiro enfrentou em 2008, desde o mês de janeiro, grave epidemia de Dengue. Somente nos quatro primeiros meses , foram notificados 93.498 casos, sendo 16.573 em janeiro, 22.355 em fevereiro, 46.780 em março e 7.790 em abril (até o dia 16/04/08). Essa epidemia está matando cinco vezes mais que a anterior de 2002. A epidemia só aconteceu em função da omissão do poder público, critica o presidente do sindicato, o médico Jorge Darze. Todas as esferas falharam, diz ele. Os números de 2011 mostram nova iminência da epidemia. (Radis, número 69 – maio/08).

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Há imperfeições de mercado e regulação. Há custos da própria regulação. Esses custos podem impactar de forma positiva ou negativa. Não se deve esquecer em nenhum momento que hoje existe o Direito da pessoa e há um dever do Estado, constante do artigo 196 da CF. Que existe um Sistema Único de Saúde, no artigo 198 e que há também a permissão de que se execute a Saúde privada, na forma do artigo 199 e que há ainda os princípios do SUS, que são universalidade, integralidade e equidade. Esses direitos, geram, segundo o Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS)(2009), um Estado paternalista e ignora os deveres do indivíduo para com a sua saúde. O financiamento necessário para toda essa gama de direitos envolve os tributos da União, as contribuições à Seguridade, tais como a COFINS, CSLL, CPMF (extinta) e por tributos dos Estados e do Distrito Federal na base de 12% e Municipais, 15%. Há ainda a Filantropia que deve ser considerada em todo esse Sistema complexo e o Sistema Privado que tem pagamentos diretos dos usuários aos Planos e seguros saúde. 204 Vejamos mais detalhadamente. Receitas gerais dos municípios Próprias estabelecidas pela Constituição IPTU, ISS. ITBI ; Taxas – localização estabelecimentos, anúncios ; Contribuições de melhorias – pavimentação ruas ; IR na fonte - de funcionários públicos e prestações de serviços aos municípios - ; Operações de crédito – IOF – dinheiro internacional ou BB CEF BNDES. Todo esse aparato de recursos obedece a uma distribuição, para capitais, interior, conforme limites populacionais, necessidades, contingências e conseqüências.

204 - Fonte: IESS – Instituto de Estudos de Saúde Suplementar – 13/02/2009.

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Gráfico 1

Transferências: FPM estabelecido constitucionalmente (cerca de 70% dos recursos dos municípios PP e MP e do norte e nordeste: FPM e demais transferências). Constituído de: 23,5% IPI / 23,5% IR / 50% do ITR arrecadado pela União ; Lei Kandir – Estado repassa 25% para os municípios – 1996 desonerada exportação ICMS produtos semi-elaborados e básicos. A União compensou os Estados que deixaram de recolher. As regras nas transferências são as seguintes: FPM Regra de distribuição: Capitais: 10% total rateio proporcional a população e inversamente proporcional a renda per capita. Interior: 90%. Critério populacional com limite inferior e superior. Transferências vinculadas: Parte do salário-educação que vai para o Estado e ele repassa para os municípios. Transferências voluntárias: Entrega de recursos a outro ente, a título de cooperação, auxílio ou assistência financeira, não decorrente de determinação constitucional ou legal. Convênios, outros. Receitas dos Estados: ICMS – representa cerca de 83% da arrecadação do Estado. Transfere 25% e fica com 75% ; IPVA ; imposto de Transmissão Causa Mortis e Doações ; Taxas ; Imposto de Renda. Transferências da União: FPE: 21,5% do IPI ; 21,5% do IR - 10% do IPI exportação para compensar as desonerações das exportações e mais recursos da Lei Kandir,

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negociados ano a ano no Congresso Nacional. Receitas do Estado para os municípios: 25% do ICMS. Regra para SP: 75% do que é gerado de valor pelo município e 25% é decidido pela ALESP. Algo próximo a: 13% população; 5% receita própria ; 1% questões bacias ; 80% pelo valor adicionado ; Metade IPVA – carros licenciados no município ; 25% da lei Kandir e do IPI exportação. Critério semelhante a ICMS. Pactos pela saúde – Exemplo de 2006 Apresentação O documento das Diretrizes do Pacto pela Saúde em 2006 – Consolidação do Sistema Único de Saúde, publicado na Portaria/GM nº 399, de 22 de fevereiro de 2006, contempla o Pacto firmado entre os gestores do SUS, em suas três dimensões: pela Vida, em Defesa do SUS e de Gestão. 205 Esse Pacto apresenta mudanças significativas para a execução do SUS, dentre as quais ressaltamos: a substituição do atual processo de habilitação pela adesão solidária aos Termos de Compromisso de Gestão; a Regionalização solidária e cooperativa como eixo estruturante do processo de Descentralização; a Integração das várias formas de repasse dos recursos federais; e a Unificação dos vários pactos hoje existentes. É o resultado de um intenso trabalho de discussão de cerca de dois anos, envolvendo os técnicos e a direção das diversas áreas do Ministério da Saúde, do Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde – CONASEMS e do Conselho Nacional de Secretários de Saúde – CONASS e foi aprovado na reunião da Comissão Inter gestores Tripartite, de 26 de janeiro de 2006, e na reunião de 9 de fevereiro de 2006, pelo Conselho Nacional de Saúde. Esta publicação é o primeiro volume de uma série que detalhará diferentes dimensões do Pacto, ajudando a qualificar o seu processo de implementação que considere as diferentes realidades loco-regionais. Assim, a partir de agora, a implantação do Pacto dependerá da adesão dos muitos atores que, em cada parte deste nosso imenso e diverso País, constroem o cotidiano da Saúde Pública Brasileira.206 O Pacto pela Vida Transcorridas quase duas décadas do processo de institucionalização do Sistema Único de Saúde, a sua implantação e implementação evoluíram muito, especialmente em relação aos processos de descentralização e municipalização das ações e serviços de saúde. O processo de descentralização ampliou o contato do Sistema com a realidade social, política e administrativa do país e com suas especificidades regionais, tornando-se mais complexo e colocando os gestores à frente de desafios que busquem superar a fragmentação das políticas e programas de saúde por meio da organização de uma rede regionalizada e hierarquizada de ações e serviços e da qualificação da gestão.207

205 Fonte: Ministério da Saúde. 206 Idem 196 - 207 Idem 197 -

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Frente a esta necessidade, o Ministério da Saúde, o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e o Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (Conasems), pactuaram responsabilidades entre os três gestores do SUS, no campo da gestão do Sistema e da atenção à saúde. O documento a seguir contempla o Pacto firmado entre os três gestores do SUS a partir de uma unidade de princípios que, guardando coerência com a diversidade operativa, respeita as diferenças loco-regionais, agrega os pactos anteriormente existentes, reforça a organização das regiões sanitárias instituindo mecanismos de co-gestão e planejamento regional, fortalece os espaços e mecanismos de controle social, qualifica o acesso da população à atenção integral à saúde, redefine os instrumentos de regulação, programação e avaliação, valoriza a macro função de cooperação técnica entre os gestores e propõe um financiamento tripartite que estimula critérios de eqüidade nas transferências fundo a fundo. A implantação deste Pacto, nas suas três dimensões – Pacto pela Vida, em Defesa do SUS e de Gestão –, possibilita a efetivação de acordos entre as três esferas de gestão do SUS para a reforma de aspectos institucionais vigentes, promovendo inovações nos processos e instrumentos de gestão que visam alcançar maior efetividade do desempenho.208 Esse Pacto envolve uma série de Controles e Diretrizes e se inicia pelo Pacto pela Vida, divididos em: Saúde do Idoso ; Controle do câncer do colo do útero e da mama; Redução da mortalidade infantil e materna ; Fortalecimento da capacidade de resposta às doenças emergentes e endemias, com ênfase na dengue; hanseníase; tuberculose; malária e influenza ; Promoção da saúde, com ênfase na atividade física regular e alimentação saudável ; Fortalecimento da Atenção Básica.209

O Pacto em Defesa do SUS e o Pacto de Gestão Na sequência as Diretrizes a serem seguidas, as iniciativas e ações do SUS no âmbito geral ; Diretrizes para a gestão e Descentralização ; Regionalização;Financiamento; Planejamento ; Programação Pactuada e Integrada ; Regulação ; Participação e Controle Social ; Gestão do Trabalho ; Educação na Saúde ; Responsabilidade sanitária das instâncias gestoras do SUS ; Responsabilidades Gerais; Regionalização; Planejamento e Programação; Regulação, Controle, Avaliação e Auditoria; Participação e Controle Social; Gestão do Trabalho; Educação na Saúde, com todos esses itens e monitoramento e articulação do SUS. 210

208 Idem 198 - 209 Idem 199 - 210 Idem 200 – Fonte: Transcrição: Pactos pela Saúde 2006.

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CAPÍTULO 3 Saúde supletiva no Brasil: relações com a Saúde Pú blica. Na saúde essa dualidade entre Público e Privado tem a ver também com as situações coletivas e aquelas individualizadas. Planos de Saúde já foram considerados benefícios muito distantes da condição financeira de grande parte da população brasileira, porque é pago de forma individualizada, enquanto a Saúde Pública é de todos – principalmente dos pobres – ou aqueles que não podem participar – pagando um convênio ou grupo segurado de Saúde Privada. Porque então saúde pública e saúde privada. Há diferenças? A inflação foi um dos fatores para o grande desenvolvimento do mercado em seguros e planos de saúde na década de 80 e 90. Seu crescimento desordenado, longe dos olhos do governo, e suas conseqüências de caráter lesivo aos usuários foram os maiores motivos que forçaram o governo, via Congresso, a aprovar a Lei 9656/98 para disciplinar o setor, até então sem regulação e sem rumo definido. Antes da lei 9656/98, era necessário apenas um médico portador de CRM para abrir uma empresa de assistência médica. Não havia necessidade de reservas financeiras e nem capital mínimo para garantia futura dos adquirentes e usuários. Assim, surgiram as cooperativas de medicina, os planos administrados e as empresas que criavam sua própria auto-gestão para dar assistência médica aos seus funcionários. Porém, a saúde suplementar necessita ser muito criteriosa, pois cuida de dois assuntos extremamente delicados: um é a saúde e o outro é a poupança das pessoas, pois um plano de saúde familiar, vendido no passado e cujo contrato foi mal intencionado em suas cláusulas, condições e exclusões, pode destruir anos e anos de poupança amealhada e levar o usuário a um desastre financeiro. Por exemplo, uma doença cardíaca não coberta pelo plano, mas sem que o usuário o soubesse, pode fazer uma família perder seu patrimônio em meses. Na década de 80 havia uma liberação geral para venda de planos de saúde. Milhares de planos foram criados e milhares de empresas foram se desenvolvendo até final da década. Com o passar de mais de uma década, percebeu-se que a atividade precisava de regulação, pois as reclamações contra os planos de saúde aumentavam de forma assustadora 211. Contratos com letras minúsculas, cláusulas leoninas ou unilaterais, riscos não cobertos e também não bem definidos nos contratos foram o estopim para que a liberdade e a falta de credibilidade dos planos de saúde fosse comprometida junto à população e aos governos. A essa altura, o judiciário recebia milhares de ações de usuários descontentes e exigindo tutela. O projeto de lei aprovado pela Câmara de deputados ao final de 1997 mostrou claramente as dificuldades dessa regulamentação à posteriori, que teria de agir sobre 211 “Evolução e Desafios da Regulação do Setor de Saúde Suplementar - Série ANS-4 - Januário Montone - Diretor Presidente da ANS - 2003 - RJ - ISBN-85-334-0730-0 - p. 12. p. 38

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uma atividade que já atingia mais de 30 milhões de brasileiros profundamente descontentes com os serviços recebidos de centenas de empresas dos mais diversos tipos, sendo que pouco se sabia de fato a respeito da questão 212. Jornais, rádios, televisões, em programas dos mais variados, traziam problemas gerados pelos planos de saúde. Os contratos eram vendidos e assinados na aquisição por pessoas de boa fé. Assim, antes da lei 9656/98, os titulares de planos de saúde só saberiam quais as reais coberturas assistenciais nos momentos de utilização do plano para diagnósticos e internações hospitalares, quando é grande a aflição e a necessidade de atendimento, configurando-se em surpresas, na maior parte das vezes, desagradáveis. Os corretores desses planos de saúde, com o objetivo único de vendê-los, forneciam informações contraditórias, e o usuário mudava de plano sempre que aquele outro adquirido gerava problemas de cobertura. Processos judiciais de contenciosos variados, de empresas e clientes acumulavam-se. Milhares de reclamações amontoavam-se junto a delegacias e ao Ministério Público. Iniciou-se, então, um processo instável, já que as pessoas não tinham segurança na aquisição de um plano complementar de saúde. Havia empresas que já estavam no ramo há vários anos, muitas das quais ligadas a estruturas bancárias. Eram empresas conceituadas, todavia, apresentavam muitas exclusões de riscos em seus contratos, o que levava o cliente em desespero com seu plano a utilizar o SUS quando a enfermidade não era coberta pelo plano adquirido, em muitos casos, há anos. Quando não se utilizava o sistema público, a internação em um hospital particular causava ao usuário grandes prejuízos de ordem financeira. Acrescente-se a isso as muitas fases econômicas pelas quais o país passou, governos que não deram atenção ao assunto, inflação de 0% a 80% ao mês na década de 80, levando o valor das mensalidades a níveis absurdos, o que gerava discussões de toda ordem. O ambiente e o clima em geral nos sistemas de saúde brasileiros tanto público como privado foram, e ainda são, de muitas incertezas quanto ao que deverá acontecer em um futuro breve. Singularmente, podemos defini-lo como um sistema muito jovem – se comparado à Europa - e com muitas variações que deverão, com o devido tempo, ser ajustadas à realidade. A legislação do lado privado ainda é inacabada e está em permanente mudança,213 pois, inicialmente, toda a regulamentação foi desenvolvida e criada, aprovada pelo Câmara e pelo Senado e imposta às empresas da atividade. Não havia mais tempo para discussões. Os problemas se acumulavam no setor.214

212 Idem ref. anterior - página 12. (Montone, 2003). 213 Fonte: Ver site ANS – mudanças na legislação – só medidas provisórias foram mais de 45. 214 Uma poderosa energia transformadora abre novos caminhos para a nossa sociedade. Nessa onda está o drama, mas também a possibilidade de outro desfecho. Está o nó e a faca. O grito é o desafio. A morte, mas também a vida. No limite é que ocorrem os partos. Já passamos muitas vezes do limite. A vida está com pressa de nascer. (Herbert José de Souza – Betinho em Gouveia, 2000).

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É necessário algum esforço para entender essas inovações e adaptações, pois essa regulação é apontada como o início das mudanças e devem considerar o que aconteceu em um passado recente para absorver o aprendizado e em seguida, sugerir algumas reformulações, pois a identidade da saúde brasileira é uma mistura de capital, técnica/ científica e de Direito Social. Todavia, devido aos níveis de educação de grande parte da população, aspectos religiosos e crenças interferem na saúde, promovendo também um caráter místico na saúde.215 Sob a visão científica e de capacidade tecnológica, a identidade técnica é também muito presente, pois contamos atualmente com instituições cujo apelo é a competência de Hospitais como: Albert Eistein, Sírio Libanês e Incor - Instituto do Coração, Hospital de Clínicas, Universidade de São Paulo, Unicamp, Ribeirão Preto, Instituto Dante Pazanezzi. Há também outra identidade, foco do presente estudo: a de negócio. De fato, a saúde privada cresceu, chegando a 2.700 operadoras216 registradas e nem todas estavam em atividade até 1999/2000. Os planos de assistência médica que foram oferecidos à população são muito variados e estima-se que, em passado recente, atenderam, aproximadamente, 35 milhões de usuários, gerando, com isso, uma identidade comercial na saúde particular - suplementar - bastante fortalecida e quando de sua regulação, em 1998, contava com perto de 30 milhões de usuários. Resta, ainda um enorme contingente e há que se expor que o SUS tem mais de 140 milhões de pessoas dependendo de sua estrutura, gerando, com isso, de forma compulsória, uma identidade muito forte de Direito social (benefício social). Podemos verificar, portanto, que há uma grande mistura de identidades no Brasil no que tange à saúde, o que acaba se refletindo no plano legal. Apesar dos descasos até final do século XIX a saúde brasileira teve um processo dinâmico à favor. A evolução do mercado de saúde privada ou suplementar no Brasil se dá a partir de uma relação público privado no setor da saúde em que a demanda por serviços é direcionada pelo Estado enquanto sua oferta é privada. Esse modelo de relação público/privado perdura até o momento em que o Estado tem capacidade financeira para a compra dos serviços produzidos pelo setor privado e até que este setor crie as condições necessárias para se autonomizar com relação ao próprio Estado, através da oferta direta de serviços para compradores privados, dando assim força e consistência aos planos privados de saúde. Em vista dos inúmeros problemas na saúde pública, tem início um nicho de negócio no ramo, levando ao surgimento dos primeiros planos de saúde particulares. A primeira empresa de medicina de grupo no Brasil, com as características de empresa operadora como as atuais, foi a Policlínica Central, fundada em São Paulo na 215 De um lado parte da população ainda sofre influências místicas, tanto da Igreja Católica como de outras igrejas, mais intensamente da Igreja Universal. Por um lado, há ainda a mistura de crenças, como candomblés, santos, promessas para Nossa Senhora Aparecida, com milhares de romeiros viajando todos os anos até Aparecida do Norte, cirurgiões não diplomados como José Arigó, médicos diplomados e espíritas, médiuns e mães de santo, que criaram uma identidade mística muito forte na população.

216 Ver site - www.ans.gov.br

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data de 1960 217. Nesse período, foi criado o convênio empresa, gerando um grande impulso às atividades de prestação de serviços em saúde na época. 218 Outra iniciativa pioneira ocorreu em 1967, na cidade de Santos. Tratava-se da criação da primeira cooperativa de serviços médicos e hospitalares - UNIMED – formada, em sua maioria, por sócios médicos219. Atualmente, há discussões a respeito da formação societária dessas cooperativas, pois o médico é sócio e, ao mesmo tempo, é o atendente do usuário. São, portanto, interesses antagônicos. Todavia, foi uma iniciativa pioneira e de mérito como embrião de saúde suplementar. Em seguida, em 1972, surge a primeira cooperativa odontológica, conhecida como UNIODONTO220. Tudo isso acontecendo porque na esteira da criação do SINPAS – Lei 6.439/77 e da Lei 6.229 deram início ao desenvolvimento de um subsistema, que se tornou hegemônico na década de 80, o da atenção médica privatista. (Mendes, 1994). O mesmo autor acrescenta que estruturalmente o modelo médico assistencial privatista constitui-se de quatro subsistemas: Um subsistema, de atenção médica supletiva, começava a delinear-se e a implantar-se, aproveitando-se dos incentivos do convênio-empresa, é o subsistema de atenção médica complementar que buscava atrair a mão-de-obra qualificada das grandes empresas. Seu principal interlocutor político era a Associação Brasileira de Medicina de Grupo - (Abramge). Contudo, esse subsistema, que veio hegemonizar-se nos anos 80, não chega a atingir uma massa significativa de beneficiários na década de 70, mas o modelo médico-assistencial privatista teve como subsistema hegemônico o setor privado contratado e conveniado como ator social mais significativo a FBH – Federação Brasileira de Hospitais e como núcleo ideológico a burocracia previdenciária, desde os anos 80. (Mendes – 1999) A idéia de planos de saúde começou a ser concebida por pessoas físicas da atividade empresarial, como auto-gestão e por clínicas que já operavam nas grandes cidades, que viram, então, a possibilidade de oferecer serviços nas áreas de assistência médica para as empresas e seus funcionários. Iniciava-se a saúde com a identidade de negócio, impulsionada para o mercado como assistência à saúde. A região do ABC também foi uma das pioneiras em empresas com essas características na década de 60/70. Havia uma crise orgânica do Estado, exacerbada pelas desigualdades que vinham desde a década de 70. O Estado que sustentou as elites nacionais até final de 70, passa a ser, especialmente no final da década, o grande vilão, abrindo espaço a propostas neoliberais que conduzam a um Estado mínimo. (Mendes, 1999). É a era da re-engenharia, cortes de custos e espírito reducionista do Estado.

217 Cf. BAHIA, Ligia & Nunes, Roberto F.V. 2000, p. 10. 218 Convênio celebrado entre as empresas e o governo que permitia deduzir da cota devida ao INPS, 2% da folha de pagamento. 219 UNIMED - http://www.unimed.com.br 220 UNIODONTO - http://www.uniodonto.com.br

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Com a proliferação das entidades de Medicina de Grupo e Seguradoras em vista das constantes crises do Sistema Estatal, foi aprovada a Lei 6.839 de 30/10/1980, que obrigou essas empresas a se registrarem junto aos órgãos competentes da época para a fiscalização do exercício profissional, no caso o Conselho Federal de Medicinas e Respectivos Conselhos Regionais de Medicina de cada Estado. Atualmente, os planos privados de assistência à saúde são operados por pessoas jurídicas, constituídas sob a modalidade de sociedade civil ou comercial, em que se encaixam as medicinas de grupo, odontologias de grupo, seguradoras especializadas em saúde, denominadas operadoras, separadas das seguradoras normais, as cooperativas médicas, odontológicas e as instituições que possuem auto-gestão221. O setor de saúde suplementar, segundo dados de dezembro de 2006 da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, atende a um total de 44,7 milhões de beneficiários entre consumidores de planos de saúde com ou sem cobertura odontológica e de planos exclusivamente odontológicos (Brasil, 2007b). Expurgando-se os planos exclusivamente odontológicos o mercado de saúde suplementar atende 36,9 milhões de usuários. Este contingente representaria uma cobertura de 19,6% da população brasileira, considerando a base populacional estimada pelo IBGE, 2007 (Brasil, 2007a), embora não seja possível garantir uma relação entre beneficiários e a população total, pois podem existir mais de um plano por usuário cadastrado. Para dar conta dessa cobertura, o cadastro da ANS em dezembro de 2006 indica a existência de 2070 empresas operadoras de planos de saúde, das quais 1.255 estão ativas e atuando no segmento não exclusivamente odontológico. A receita total gerada por estas operações é estimada em R$ 39,3 bilhões para 2006 (Brasil 2007b), representando aproximadamente 1,8% do PIB. Apesar da quantidade de operadoras oferecerem indícios de este ser um mercado altamente concorrencial, uma análise mais aprofundada dos dados aponta para uma forte concentração de beneficiários em um pequeno número de operadoras: 12% dos beneficiários são atendidos por somente três operadoras, enquanto 79,5% dos beneficiários restantes são atendidos por 217 operadoras, indicando a presença de grande número de operadoras com pequena massa de beneficiários ou usuários. A estrutura que conforma este setor compreende além das operadoras e consumidores, prestadores de serviços médicos, odontológicos, laboratoriais, de diagnóstico por imagem, indústria farmacêutica, de materiais e insumos, de equipamentos médicos, governo, órgãos de defesa do consumidor, judiciário, profissionais da área da saúde, órgãos de defesa destas categorias, entre outros, formando um emaranhado de interesses e posicionamentos quanto ao alcance, limites e abrangência da regulação. A saúde privada no Brasil divide-se hoje em duas vertentes. As empresas chamadas não lucrativas, que são as Santas Casas de Misericórdia, e outras entidades filantrópicas que têm contrato com o SUS, e as lucrativas, que não têm nenhum

221 Cf. Inciso II do artigo 1° da Lei 9656/98, alterada pela Medida Prov. 1908-20, de 25/11/1999.

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vínculo com esse sistema definidas como de saúde suplementar, que são as Medicinas de Grupo. Essas empresas utilizam serviços próprios e credenciados e compram serviços de terceiros. Como exemplos, temos a Golden Cross, a extinta Interclínicas, a Amil, a Blue Life, a Bradesco Saúde, as Classes Laboriosas e centenas de outras. Dentro desse grupo existem sub-grupos – considerados como especializados – como a empresa Prevent Sênior – que é considerada especializada em Medicina para a terceira idade. 222 Há também as denominadas de Auto-Gestão. 223 Este subsistema tem como objeto a doença e suas seqüelas. Como seu próprio nome indica, é um sistema de atenção médica e não de saúde e estrutura-se em uma base social, vez que seu acesso depende da capacidade de pagamento de indivíduos, famílias e empresas. Por isso mesmo, vai compor-se de diferentes modalidades e sub-modalidades ofertadas a distintas clientelas. Somente as modalidades de pré-pagamento, ocupam-se, induzidas pela racionalidade dos gastos e não por uma preocupação com a saúde, com algumas intervenções de natureza preventiva que sirvam de barreira à utilização de serviços de mais alto custo. As cooperativas médicas são aquelas geridas ou que têm como sócios médicos cooperados que participam com cotas, como é o caso das Unimeds, as quais têm a atuação bastante discutida, pois o médico é, ao mesmo tempo, atendente e associado da operadora, conforme já comentado. Existem, ainda, outros segmentos na área de auto-gestão, que operam com serviços de terceiros, utilizando-se de tabelas de honorários médicos, e têm administração própria. São exemplos: o Banco do Brasil (Cassi), a Petrobrás (Petros), a Volvo, a Villares, a Cofap, entre outras. E há também os planos de administração que operam a prestação de serviços com tabelas para reembolso, tanto para serviços ambulatoriais como hospitalares,

222Pioneiro no atendimento dedicado para a terceira idade no Brasil, o plano de saúde Prevent Sênior ingressou no mercado há 14 anos, fundamentando-se em um novo conceito de atendimento médico: "a medicina preventiva". Prevent Sênior inovou não apenas nos serviços voltados especialmente às pessoas da terceira idade, mas também no segmento de mercado que atende, acreditando que a medicina preventiva, além de propiciar melhor qualidade de vida e longevidade, ainda possibilita a redução de custos no atendimento à saúde. Os planos de saúde - Prevent Sênior - foram criados para desafiar o paradigma de que apenas a medicina curativa, normalmente relacionada a grandes hospitais, sofisticados procedimentos e custos elevadíssimos, poderiam ter sucesso neste país. Enfrentando o desafio de demonstrar que esse conceito poderia dar lugar a uma nova concepção de atendimento à saúde, os planos da Prevent Sênior revitalizou a tradicional medicina preventiva, oferecendo aos seus beneficiários não apenas os tratamentos curativos, mas também a possibilidade de prevenir, cuidar e retardar o aparecimento de problemas relacionados à idade.

(Fonte: institucional da Prevent Sênior). http://www.preventsenior.com.br/paginas/institucional.htm

223 As Organizações Militares, apesar de manterem sistema próprio de assistência à saúde, convivem pacificamente com a presença de operadoras de planos privados que oferecem, subsidiariamente, cobertura assistencial aos militares e seus dependentes. No entanto, essa atividade suplementar centra-se nos objetivos corporativos e capitalistas das empresas que exploram comercialmente o segmento. Opostamente a essa filosofia, surgem os sistemas de autogestão em saúde, sem fins lucrativos e paradigma das ações de gerenciamento da atenção à saúde neste setor. O que se mostra é que a auto-organização de recursos com o objetivo de oferecer, internamente, um sistema mais social e solidário de coberturas de saúde, traz para as Organizações Militares oportunidades estratégicas relevantes no gerenciamento de seus recursos humanos. Há também as Auto-Gestões privadas como os planos da Volkswagem, por exemplo. (Fonte: artigo acessado em 04/07/2011 - http://www.administradores.com.br/informe-se/artigos/autogestao-em-saude-suplementar-um-modelo-estrategico-de-assistencia-a-saude-privada-em-organizacoes-militares/11334/).

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mediante vales de procedimentos. São modelos a Sul América, Med-Service e outras. Há aquelas que operam com o seguro saúde, que difere dos planos de saúde, pois utilizam o sistema de reembolso, não têm rede própria e cobrem, somente, despesas hospitalares. É o caso de planos da Omint e da Bradesco Seguros Saúde. Nos casos de seguro saúde a rede referenciada é apenas sugestiva e indicada, porém, o usuário utiliza o serviço que desejar - livre escolha - e pede posteriormente o reembolso. O tratamento regulatório dado a essas operadoras é o mesmo para qualquer segmento médico assistencial, com exceção das empresas de auto-gestão, em que não há interferência da ANS no que diz respeito aos aspectos de valores de cobrança (pré-pagamentos) e nem ao tipo de gestão médica existente e rede de credenciamento. Todas, no entanto, são obrigadas a prestar contas para a ANS, com relatórios, estatísticas, informações de balanços, cálculos atuariais - notas técnicas - de novos planos, auditoria externa e contabilidade. Há as operadoras de assistência odontológica, que também devem se enquadrar como operadoras, mas sem o detalhamento de exigências que existe para as empresas de assistência médica hospitalar. Empresas que já estavam vinculadas - antes da lei 9656/98 - aos Institutos de Aposentadoria e Pensões, ou seja, aquelas entidades que já possuíam sua própria “caixa” (designação de atendimento médico ou afastamento do trabalho por doença de alguma categoria) aproveitaram o ensejo para criar suas próprias administrações de assistência médica, sendo a primeira no país a CASSI - Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil, fundada em 1944 e que funciona até os dias de hoje. O seguro saúde ou seguro de assistência médica e hospitalar como o conhecemos atualmente, foi criado a partir da Resolução CNSP (Conselho Nacional de Seguros Privados) de número 16, de 20/12/1988, que autorizava as companhias seguradoras que operavam seguros de vida a trabalhar com essa nova modalidade de seguro, que se destinava, originalmente, ao reembolso a seus segurados de despesas com assistência médica e hospitalar, a qual foi se desenvolvendo e incorporando as características que conhecemos dos planos de saúde. Antes da implantação da Lei 9656/98, as seguradoras que tinham Planos de Saúde, se reportavam à SUSEP - Superintendência dos Seguros Privados que era subordinada ao Ministério da Fazenda. Por iniciativa particular, foram criadas as medicinas de grupo para atendimento de empresas, mas não havia nenhum órgão regulador para elas a não ser o órgão representativo das inúmeras operadoras na época. As ações eram norteadas por um órgão de classe, chamado ABRAMGE (Associação Brasileira das Empresas de Medicina de Grupo), conforme já comentado acima, fundado em 8 de agosto de 1966 224, com o objetivo de unir, organizar, regular, disciplinar, defender e representar as empresas privadas que já estavam atuando e as

224 História da Abramge: tal evento se deu em uma sala do Hospital São Luiz, na Avenida Santo Amaro, em 1966, onde se reuniram os representantes de onze grupos médicos, constituídos por empresas de medicina de grupo, pioneiras do setor. Vide site: http://www.abramge.com.br

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que desejassem se organizar na atividade de prestação de serviços de atenção à saúde. De fato, a Abramge tem o seu papel na saúde suplementar, pois as empresas a ela associadas – grupos de interesse - têm atendimento de assistência médica em qualquer lugar do país. Atualmente há muitos grupos além da Abramge, conforme mostra a Tabela XIII. Basta ligar para o telefone da empresa que opera esse tipo de serviço e informar a cidade onde a pessoa está. Funcionários treinados indicam, então, o local onde o paciente poderá ser atendido. Os casos de urgência e emergência são os que mais permitem essas facilidades. A tendência à cartelização e o medo de uma regulação estatal gerou um movimento de auto-regulação das empresas de Medicina de Grupo que criaram, em 1988, o Conselho das Empresas de Medicina de Grupo (Conange) e um Código de Ética. Constitui um mercado de alta concentração todo esse subsistema privado. Em 1987 havia doze empresas no mercado. Apesar disso, em termos de arrecadação, a Bradesco Seguros detinha 56,59%, seguida da Itaú e da Sul América Nacional, com, respectivamente, 16,69% e 14,65%. Essa modalidade é exercitada por seguradoras em estreita ligação com o capital financeiro bancário. (Mendes, 1999). A tabela em sequência demonstra que há interesses dos mais diversos no setor de Saúde, tanto do privado quanto de Entidades sem fins lucrativos, Associações, Conselhos Federais, Força Sindical de Trabalhadores na área de Saúde, Entidades especializadas em alguns tipos de patologias e mais o governo via Ministérios, Secretarias e órgãos de regulação. O sistema vem sendo montado há muito tempo, e sob o ponto de vista da visão privada, a história vem se montando desde a década de 60 mais precisamente. Data de novembro de 1966 a instituição legal no Brasil do seguro privado de saúde. Isso ocorreu por meio do decreto-lei n° 73/66, que, em seus artigos 129 a 133, estabeleceu condições para que operações dessa natureza fossem empreendidas por parte das companhias de seguros, possibilitando o pleno desenvolvimento desse setor no mercado, conhecido como setor de saúde complementar ou suplementar. Já o artigo 134 do mesmo decreto proibiu a venda pelas sociedades civis ou comerciais de títulos, contratos, garantias de saúde, segurança de saúde, benefícios de saúde, títulos de saúde ou seguros sob qualquer outra denominação, para atendimento médico, farmacêutico e hospitalar, integral ou parcial225 .

225 Caderno de Seguros - Coletânea de 1981 a 2001 – Funenseg, p. 64.

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Tabela II – Grupos de interesse e Entidades representativas na Saúde (2011) ANS Diretorias da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar

Autogestões UNIDAS – União Nacional das Instituições de Autogestão em Saúde

Compradores CNC – Confederação Nacional do Comércio

CNI – Confederação Nacional da Indústria

Consumidores Entidades de Defesa do Consumidor

PROCON – SP – Fundação Procon

PROCON – SJC – Fundação Procon

Associações de Consumidores de Planos Privados de Saúde

IDEC – Instituto de Defesa do Consumidor (até 11/2002).

PRO TESTE – Assoc. Bras. de Def. do Consumidor (desde 06/2003)

ADUSEPS – Assoc; de Def. dos Seguros, Planos e Sistema de Saúde.

Cooperativas UNIMED – Confederação Nacional das Cooperativas Médicas

UNIODONTO – Cooperativas de Serviços Odontológicos

Gest. Públicos CNS – Conselho Nacional de Saúde

CONASEMS – Conselho Nacional de Secretários Municipais / Saúde

CONASS – Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde

Governo MF- Ministério da Fazenda

MJ – Ministério da Justiça

MPAS – Ministério da Previdência e Assistência Social

MS – Ministério da Saúde

MT – Ministério do Trabalho e Emprego

Operadoras

De Grupo SINANGE – Sindicato Nacional das Empresas de Medicina de Grupo

SINOG – Sindicato Nacional das Empresas de Odontologia de Grupo

Prestadores CNS – Confed. Nac. de Saúde, Hospitais, Estabelecimentos e Serviços

CMB – Confed. das Santas Casas , Hospitais e Entidades filantrópicas

FBH – Federação Brasileira de Hospitais

Profissionais AMB – Associação Médica Brasileira

CFM – Conselho Federal de Medicina

CFO – Conselho Federal de Odontologia

COFEN – Conselho Federal de Enfermagem

Seguradoras FENASEG – Feder. Nac. / Seguros Privados e de Capitalização

Trabalhadores CUT – Central Única dos Trabalhadores

Força Sindical

SDS – Social democracia sindical

Usuários Entidades de Portadores de Deficiência e de Patologias Especiais

FARBRA – Feder. das Assoc. de Renais e Transplantados do Brasil

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Associação Franco Basaglia

Os artigos 134 e 135 continham duas exclusões - uma para cada artigo - que forneciam a possibilidade de entrada de entidades na atividade da saúde. Uma era relativa a entidades filantrópicas e a outra, a associações sem fins lucrativos, mediante pré-pagamento de associados. Posteriormente, em vista do silêncio relativo ao decreto acima, o Conselho Nacional dos Seguros Privados (CNSP) baixou uma resolução de número 11/76 sobre as normas do seguro saúde, pois, na época, havia uma discussão interminável sobre o assunto.226 Esse subsistema, que é o da atenção médica supletiva é o que manteve, na época, a hegemonia. Ele, pelas razões consideradas anteriormente, beneficia-se do processo de universalização excludente e cresce vertiginosamente na década de 80, de tal modo que, no ano de 1989, cobriu 31.140.000 de brasileiros, correspondentes a 22% da população total do País. Somente no período 1987-1989 incorporam-se a esse subsistema 7.200.000 beneficiários. Em termos de volume de faturamento, o subsistema vai de US$ 1,85 bilhões em 1987 para US$ 2,42 bilhões em 1989. A atenção médica supletiva é vendida pelos seus representantes como um conjunto de modalidades assistenciais que funcionam a custo zero para o Estado, aliviando as despesas da Previdência Social. (Mendes, 1999). Tal aumento de beneficiários deu-se pelo medo exacerbado das pessoas em ter problemas de saúde e ter de ficar no caos existente do INAMPS até então. Porém, a efetiva regulamentação do setor de saúde suplementar, exigida pela Constituição de 1988, ocorreu apenas em 1998, sendo formada pelo conjunto da lei 9656/98, de 03/06/1998, da MP-2177-44 e da lei 9961/00, que criou a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Posteriormente, em 2001, é que foi aprovada a Lei 10.185, que instituiu a figura da seguradora especializada em saúde. As demais empresas estão atualmente reguladas pela ANS, que são as operadoras de saúde privadas, as administradoras e as de auto-gestão. O surgimento, no ordenamento brasileiro das Agências Reguladoras tem guarida constitucional. A Constituição Federal de 1988, ao dispor sobre a ordem econômica, fixou o papel do Estado como agente normativo e regulador e como executor subsidiário de atividades econômicas com forte influência norte-americana, na época. Haveria então, após a promulgação da Carta Magna uma grande Reforma do Estado. 227 Então, até 1998, por falta de uma ação regulatória, a saúde suplementar no Brasil passou por estágios de grandes dificuldades no que se refere a aspectos jurídicos, operacionais e de recursos - nessa ordem - sendo que somente após esse ano a atividade tornou-se um segmento empresarial regulamentado. 226 O ponto de partida para o entendimento do processo de regulação da saúde suplementar é uma abordagem histórica da formação do sistema de proteção social brasileiro, com particular ênfase no sistema de saúde, na participação do setor capitalista na produção de serviços de saúde e no modelo de saúde suplementar, dinamizado a partir da década de 80. 227 A Reforma do Aparelho do Estado foi capitaneada pelo então ” Mare “ – Ministério da Administração e Reforma do Estado, no governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso.

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Marco regulatório - Lei 9656/98 A lei 9656/98, que regulamenta os planos privados de assistência à saúde, foi sancionada em 03 de junho de 1998, depois de mais de seis anos de discussões e diversos projetos apresentados na Câmara e no Senado Federal. Historicamente a discussão só tomou forma e saiu do papel em fevereiro de 1994, quando o Senado aprovou o projeto 93/93 do então Senador Iram Saraiva, contendo apenas três artigos. O projeto seguiu para a Câmara dos Deputados sob o número 4.425/94. Em setembro de 1996, após longo tempo ausente da pauta das discussões e debates, a Câmara criou uma comissão especial para examinar o assunto e dar seqüência aos trâmites legais. O Governo criou, inclusive, um grupo de trabalho interministerial – saúde, justiça e fazenda – que apresentou uma versão preliminar para discussão. A história da aprovação da lei é longa e merece detalhamentos, alguns dos quais são aqui comentados. Objetivamente, em 12 de maio, o plenário do Senado aprovou, por unanimidade, o parecer 235, de 1998. Em 03 de junho, o projeto tornou-se lei 9656, com a sanção, sem nenhum veto, pelo Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso. A criação da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS Posteriormente foi criada a ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar, pela lei 9961. A partir dela, o governo resolveu centralizar e gerenciar todo o sistema de saúde suplementar no Brasil, criando a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), regulamentando as empresas que operavam no setor e legislando para as novas operadoras228 do sistema, fornecendo, inicialmente, por meio de medidas provisórias, as regras para operação e desenvolvimento, consideradas nada democráticas pelos empresários do setor. Iniciou-se, daí em diante, um verdadeiro cabo de guerra entre governo, seguradoras e operadoras de planos de saúde. Através da lei número 9.961, foi definida a finalidade da ANS, sua estrutura, atribuições, funções, sua receita e a vinculação ao Ministério da Saúde. A estrutura organizacional simplificada da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar - ficou formatada. Em seguida, iniciou-se o processo de regular, então, as operadoras setoriais, inclusive quanto às suas relações com prestadores e consumidores, contribuindo, com isso, para o desenvolvimento das ações de saúde no Brasil. Assim, a Medicina de Grupo tomou corpo e forma e cumprindo seu papel constitucional dando continuidade as atividades que já vinha cumprindo desde as décadas passadas. A ANS é um órgão criado por técnicos que vieram da SUSEP e vislumbraram as operadoras de saúde como se fossem empresas já existentes, de longa vida e tradicionais; mas, ao contrário disso, elas estavam apenas surgindo. 228 Instituições que – devidamente registradas na ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar – podem operar Planos de Saúde na forma da Lei 9656/98.

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Esses técnicos estavam acostumados a lidar com antigas empresas seguradoras, devidamente instaladas há mais de 50 anos no Brasil e que receberam, a princípio, ajuda de governos passados, por sistemas de repartição de resseguros do próprio governo - as primeiras receitas – e, com isso, desenvolveram seus ativos ao longo do tempo. As operadoras, por outro lado, por si só, muitas das quais não ligadas a bancos, são empresas jovens, não tiveram as benesses governamentais do passado e sofreram uma regulação de certa forma abrupta em vista das rotinas de regulamentação, normas de seguradoras no passado, critérios e formas de fiscalização da SUSEP nos últimos anos. A ANS foi criada para disciplinar o setor de saúde suplementar e teve a ela transferida, por meio da lei 10.185, de 2001, a competência para controlar e normatizar o seguro-saúde, o que antes era de obrigação da SUSEP, bem como dos planos de saúde. Em vista disso, as operadoras tiveram de se adaptar a normatizações de grande volume, fazendo com que investissem pesadamente em recursos de pessoal e recursos técnicos. A cronologia da criação da ANS é a que foi citada, de forma sucinta e teve como objetivos: a) Assegurar ao beneficiário a cobertura integral e regular as condições de acesso; b) Definir e controlar as condições de ingresso aos planos, operação e saída das empresas e entidades que operam no mercado; c) Definir e implantar mecanismos de garantias assistenciais e financeiras que assegurem a continuidade da prestação de serviços de assistência à saúde dos contratados; d) Dar transparência e garantir a integração do setor de saúde suplementar ao SUS e o ressarcimento dos gastos gerados por beneficiários do sistema público; e) Estabelecer mecanismos de controle de abuso de preços; f) Definir o sistema de regulamentação, normatização e fiscalização do setor de saúde suplementar.229 Porém, regular seguros do patrimônio, tais como roubo, incêndio, multirriscos é bem diferente de regular a saúde financeira e administrativa das operadoras na área de saúde, atitudes que interferem em seus custos, gerando consequências no tratamento de saúde dos adquirentes de planos assistenciais. Há distorções que afetam todas as pessoas que desejam rediscutir o papel das agências reguladoras no Brasil: quais os seus verdadeiros limites, obrigações e 229 Assim é que, em se tratando de atividade de natureza econômica, os serviços privados de saúde estão submissos aos primados da dignidade da pessoa humana, da livre concorrência e da defesa do consumidor. (Gregory, 2007).

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funções. As agências foram criadas para fiscalizar e regular, definições de precificações, funções estas a serem exercidas por um corpo técnico, a partir de controles e ordens do Estado. A ex ministra das Minas e Energia, hoje Presidente do Brasil, enfatizou de forma contundente em sua proposta, à época, a necessidade de corrigir distorções nas agências reguladoras de sua área: “A definição da política de preço, da política de petróleo, da política de energia elétrica, não é papel de agência, mas sim do Ministério, do Estado...” 230 Evidentemente ela se referia também à política de preços e custos na Saúde. Há outros pontos de instabilidade entre a regulação e as operadoras, sendo necessário e urgente sublimar essa situação. Algumas dessas arestas do setor serão descritas, para maior entendimento. Há problemas das mais variadas classes: desde criação de massas críticas atuariais convenientes para operação de planos individuais, os quais estão em extinção, empresas irregulares e que ainda operam na clandestinidade, cooperativas absolutamente ingerenciáveis, grandes corporações pressionando o governo por maior margem de lucros e empresas que se ‘deixam’ quebrar para tentar obter as benesses do governo, como acontece no sistema bancário. Será necessário flexibilizar o sistema e, ao mesmo tempo, ampliar a base de clientes nas áreas suplementares de saúde, pois esse mesmo sistema, apesar de muitas arestas, encontra-se no ponto para mudanças técnicas e administrativas. Muitas foram as mudanças imediatamente à promulgação da lei 9656/98. A primeira ocorreu logo no dia seguinte a 03 de junho de 1998 por meio de uma Medida Provisória - MP. De lá para cá, o número de MPs já chega a mais de 40. Tantas resoluções geraram muitos problemas e reclamações dos operadores. São problemas atuais e, por esse motivo, é necessário alimentar o setor suplementar dando-lhe possibilidades de crescimento na forma, mudança de segmentações e apoio normativo. Muitas empresas do setor de seguros de saúde tiveram de se adaptar às exigências da lei 9656/98, e aquelas que não o conseguiram foram obrigadas a entregar seus ativos ou a se associarem a outros grupos nacionais ou estrangeiros, como poderemos verificar mais adiante. Acredita-se que após 12 anos de sua aplicação, funcionamento e amadurecimento seja o momento de se pensar em formas de compartilhar esses conhecimentos adquiridos. No artigo de Amorim e Perillo, na Gazeta Mercantil de 05/04/2004, diz que: “Até hoje o Brasil não conseguiu atender as necessidades básicas de saúde de vastas parcelas da população, bem como proteger adequadamente os usuários dos serviços

230 Revista ABRAMGE - Ano XVI - n°. 181 - Abr/Mai/Jun/2 003 - pág. 09 - Dilma Rousseff.

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privados. As causas repousam nas características peculiares do setor e, mais recentemente, na política econômica pós-Plano Real, que, se de um lado obteve o controle da inflação, de outro jogou os brasileiros na armadilha da recessão eterna. A recessão (o PIB cresceu 0,1% em 2003) e a decorrente queda de renda do brasileiro (perda de 12,5% do rendimento médio em 2003) retiraram 5 milhões de pessoas dos planos de saúde, pressionando ainda mais o SUS. ” 231 (2004). A legislação na época surgiu, inicialmente, com o objetivo de cadastrar as empresas, definir um plano de saúde padrão, denominado Referência, com um mínimo de atendimento obrigatório à saúde para todas as empresas, e daí iniciar a regulação entre a ANS, as seguradoras e operadoras. A legislação demonstrava que as empresas deveriam se preparar para o que viria pela frente. 232 A Medicina de Grupo chegou a deter em 2001/2001 a participação de 46,15% do mercado de planos e seguros de saúde. As cooperativas 24,79%, auto-gestão 14,81% e Seguros 14,25%. As pessoas atendidas caíram de 18,4 milhões para 17,6 milhões em 2001 e para 16,2 em 2002.233 Também foi necessária a separação por segmentos na atividade. As operadoras de saúde então foram organizadas na forma da lei 9656/98 com um organograma de segmentação, sendo divididas com a seguinte classificação: Administradora - de planos; Medicina de grupo - segmento médico hospitalar; Cooperativas médicas - segmento médico hospitalar; Filantropias - segmento médico hospitalar; Odontologias de grupo - segmento odontológico; Cooperativas Odontológicas - Segmento Odontológico; Auto-gestão - que poderá ser Patrocinada ou Não patrocinada; A Patrocinada poderá ser ainda singular ou Multipatrocinada. Provém dessas separações, as arestas, algumas das quais já comentadas, a serem discutidas, tais como, reajustes de preços, criação de Rol de procedimentos médicos, confecção das Normas e Procedimentos, já disponibilizando bens de administradores e dezenas de resoluções, portarias, medidas provisórias, com imposição, quase que tutelar, como deveriam proceder as empresas da atividade, conforme o seu segmento. A atividade é extremamente regulada, com determinações de coberturas de procedimentos médicos, hospitalares e ambulatoriais muito extensas234 as quais provocam repercussões de grande peso nos custos de operação final, levando a discussões severas sobre como proceder. Com a obrigatoriedade de coberturas mínimas - pois, antes eram muitas exclusões de procedimentos médicos - houve conseqüentemente aumento da sinistralidade. Afinal, trata-se de um tema sério e importante, que envolve milhões de segurados e o seu bem-estar físico: a saúde.

231 Gazeta Mercantil - 05/04/2004 - Maria Cristina S. Amorim e Eduardo Perillo. 232 Conforme dados e projeções do Ministério da Saúde, o Brasil ocupará em 2025 a posição de sexto lugar entre os países que possuem uma população acima de sessenta anos de idade. Imaginemos o ônus que isso acarretará ao governo. Por isso, propõe-se uma ação conjunta e mais abrangente entre o público e o privado. A história mostra que a dinâmica das mudanças está agindo novamente. 233 Fonte - ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar - acessado em 12/04/2004. 234 Toda a legislação desde a origem no site: www.ans.gov.br

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Dentre as primeiras alterações propostas na lei, foram vedadas quaisquer restrições quantitativas e de prazos para internação, tornou-se obrigatória a cobertura para todas as doenças CID (Controle Internacional de Doenças), foram reduzidos os prazos de carência, foi instituída a obrigatoriedade de cobertura para doenças preexistentes após dois anos de contrato, além de ser garantida, também, a assistência ao recém-nascido. O aumento de preços desenfreado acabou 235 e quaisquer mudanças nas tarifas dos planos de saúde somente podem acontecer com autorização da Agência reguladora. Isso vale para contratos individuais, pois os empresariais ou coletivos são acertados de comum acordo, anualmente. Também foram proibidas suspensões de serviços e cancelamentos de contratos de forma unilateral antes dos 60 dias de inadimplência, sendo que, para tanto, o cliente deve ser devidamente informado e a medida, protocolizada.

Os contratos coletivos, embora prevejam a possibilidade de o funcionário afastado por pedido de demissão ou demitido - desde que não seja por justa causa - continuar pagando seu plano por prazo de até seis meses depois de sua saída da empresa, deverão ser muito discutidos em futuro breve, pois, após esse prazo limite, esse funcionário ficará desprovido de qualquer assistência médica. Uma das hipóteses para resolver esse problema é a possibilidade de o plano ter uma portabilidade236 - liberdade de transferência - ou seja, deveria ser possível transferi-lo para outra operadora por ocasião do novo emprego, se assim desejar o funcionário. Caso a nova empresa não tenha plano coletivo de saúde, esse funcionário continuaria pagando para a operadora anterior, via emprego antigo, por um prazo maior a ser definido. Tais situações ainda são obscuras e deverão ser resolvidas em médio prazo. Os usuários com 60 anos de idade e dez anos de plano não podem ter aumento de sua contribuição de pré-pagamento por mudança de faixa etária, e as coberturas são obrigatórias para transplantes de rim e córnea. O Estatuto do Idoso 237 veio trazer essa obrigatoriedade, embora tardiamente, pois alguns planos já previam essa possibilidade em seus contratos bem como a remissão por morte.238 239

235 Fonte: ANS. - www.ans.gov.br. A ANS divulgou em 28/06/2000 o índice de reajuste por variação de custos. O primeiro índice foi de 5,42%. Houve pequeno resíduo para aquelas empresas que estavam sem reajuste há mais de 12 meses. 236 Já existe, todavia, conforme entrevista com o Presidente da Abramge – a portabilidade foi um fiasco. (Entrevista anexa). 237 Após sete anos tramitando no Congresso, o Estatuto do Idoso foi aprovado em setembro de 2003 e sancionado pelo presidente da República no mês seguinte, ampliando os direitos dos cidadãos com idade acima de 60 anos. Mais abrangente que a Política Nacional do Idoso, lei de 1994 que dava garantias à terceira idade, o estatuto institui penas severas para quem desrespeitar ou abandonar cidadãos da terceira idade. 238 Remissão: os beneficiários têm direito de permanecer no plano – sem pagamento – por mais 5 anos após o falecimento do titular. Há variações nos contratos antigos – antes da Lei. 239 Após período de gratuidade, viúvas têm convênio extinto. (Estado de S.Paulo de 26/09/2010). Casos já chegam aos tribunais e para a área de fiscalização da Agência Nacional de saúde Suplementar, que promete para os próximos dias uma súmula para vetar o fim dos contratos, com previsão de multas. Há casos concretos. Logo depois de perderem seus maridos, Diva e Josee souberam que teriam direito a um aparente benefício de seus planos de saúde, mantidos por anos pelos companheiros: ficar sem pagá-los durante cinco anos. Mas depois perceberam que não era bem assim. Após o período de gratuidade, chamado de “Remissão” os contratos mantidos por décadas seriam extintos. E, para continuar com a mesma cobertura, teriam de fazer um novo plano e pagar mais, muito mais. “Me pediram R$ 6,5 mil pelo plano novo. Para mim, sozinha. Fiquei desesperada”, relata a professora aposentada Josee Diamant Lisbona, de 62 anos, viúva há cinco e que pagava R$ 1,4 mil junto com o marido. Já Eunice Cicuto, de 81 anos, tem usufruído do benefício da remissão nos últimos três anos, mas sabe dos riscos.

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As carências foram alteradas para 24 horas nos casos de urgência e emergência e de seis meses para outros procedimentos. No caso de partos a carência passou para dez meses. Antes da lei as carências eram mais convenientes para os operadores. 240Dentre as alterações gerais, outras de caráter administrativo e de controle foram incorporadas para uma maior transparência da atividade. A Lei criou ainda elementos de controle, contabilização e uma padronização do plano de contas, que permite análise do desempenho de uma mesma operadora ao longo de sua existência, sua solvência, padronagem de dados de custos dos produtos, além da consolidação de ativos, passivos e resultados de um determinado segmento. Esses dados têm como objetivo comparar uma operadora com outras e agilizar o trabalho de fiscalização, além de, com isso, se obter informações gerenciais. Ademais, após a lei, são necessários provisões técnicas 241 e a determinação de um capital mínimo para se criar e desenvolver uma operadora de saúde. As garantias financeiras são obrigatórias, devendo haver provisão de risco, provisão para eventos ocorridos e não avisados - IBNR242, chamada de PEONA - elaborada por Atuário registrado no IBA - Instituto Brasileiro de Atuária - análise de margem de solvência e provisão de operação para aquelas operadoras sem fins lucrativos. Por outro lado, a lei determina que as operadoras sejam classificadas conforme a área de atuação, que são chamadas de Regiões de Abrangência, com a seguinte ordem: Região 1: em todo o território nacional ou em grupos de pelo menos três Estados dentre os seguintes: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná e Bahia; Região 2: No Estado de São Paulo ou em mais de um Estado, excetuando os grupos definidos no critério da Região 1; Região 3: Em um único Estado, qualquer que seja ele, excetuando-se o Estado de São Paulo; Região 4: No município de São Paulo, do Rio de Janeiro, de Belo Horizonte, de Porto Alegre ou de Curitiba; Região 5: Em grupo de municípios, exceto os definidos na região 4; Região 6: Em um único município, excetuando os definidos na região 4; A lei tentou enquadrar todos os tipos de contratos, mas houve pressão das operadoras para saber como ficariam aqueles usuários que estavam nos planos antigos, ou seja, em vigor antes da lei. Assim, são definidos como planos antigos os contratados antes de 02/01/1999, ou seja, antes da lei 9656/98. As coberturas são exatamente aquelas que constam no contrato, e as exclusões estão nele expressamente relacionadas.

240 Tais carências estão descritas no decorrer do trabalho. 241 Provisões são Reservas Técnicas em função de faturamento de prêmios de contra-prestações pecuniárias. 242 Incurred but not reported

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Esses contratos, porém, não têm uma linguagem clara e se referem a muitas exclusões. Haviam muitas cláusulas abusivas. O usuário só saberá das surpresas no dia em que precisar utilizar o plano. 243 São definidos como planos novos os contratados a partir de 02/01/1999 e comercializados de acordo com as regras da lei 9656/98, que proporcionam aos consumidores a cobertura assistencial definida pela ANS relativa a todas as doenças reconhecidas pela Organização Mundial de Saúde (OMS), além de outras garantias. É um trabalho de regulação contínuo. Após a decisão do STF em final do ano de 2003 (21/08/2003) e eficácia a partir de 03/09 de que os contratos antigos deveriam ser mantidos na forma como foram contratados inicialmente e que deveriam ser ajustados ou adaptados na forma da nova legislação, Bradesco Saúde e Sul América, por exemplo, após várias liminares de órgãos representativos de consumidores, enviaram a todos os seus clientes de contratos antigos reajustes de 82% no valor de suas mensalidades ou pré-pagamentos, o que gerou grande confusão em 2004. Depois de intensas discussões jurídicas no STF, sobraram - por decisão do Supremo - os planos antigos que, conforme resolução da ANS, poderiam ser adaptados, ou seja, os consumidores que têm um plano antigo podem adaptá-lo à lei, bastando solicitar isso a sua operadora, que é obrigada a oferecer uma proposta de adaptação que, obviamente, acarretará em um aumento de preço. O consumidor, porém, não estará obrigado a aceitá-la, podendo, caso seja mais conveniente, permanecer com seu plano antigo. Segmentos da Saúde Privada As regras da legislação definem coberturas obrigatórias em função do tipo de assistência médica. Há segmentos específicos conforme o caso. Os planos foram divididos com a segmentação abaixo: Segmento ambulatorial Com direitos a consultas, exames, tratamentos e procedimentos ambulatoriais. Segmento hospitalar Sem obstetrícia: Com direito a internações. Segmento hospitalar Com obstetrícia: 243 O STF, após mais de quatro anos de discussões, decidiu manter as cláusulas dos contratos antes da Lei 9656/98 e o governo lançou mão de MP para a regulação das migrações.

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com direitos a internações e partos. Segmento odontológico: Com direito a tratamento odontológico. Segmento referência: Com direitos a consultas, exames, tratamentos e procedimentos ambulatoriais, internações e partos em ambiente de enfermaria. Com esses segmentos definidos em lei, as operadoras podem oferecer diferentes combinações, como cobertura ambulatorial e hospitalar com obstetrícia ou cobertura ambulatorial com cobertura odontológica. Outras situações que estavam à deriva foram regulamentadas também. Como situação específica, podemos citar que não há mais possibilidades de aumento de preços de forma unilateral. Esse aumento, denominado técnico, só é autorizado na forma prevista em lei para planos individuais e familiares. Uma vez por ano é determinado qual será o aumento dos valores de pré-pagamento das mensalidades com base na inflação e no aumento do preço de insumos e outros elementos complementares. Deve ficar claro, ainda, que os planos podem ser coletivos por adesão ou não. Esse é o caso de uma empresa fazer um plano coletivo em que todos os funcionários sejam participantes. Caso não seja obrigatória a participação de todos os funcionários, haverá apenas a adesão daqueles que tenham interesse em participar do grupo. Com certeza, a legislação estará sempre sob alterações, contudo, é hora de focar e ampliar sua abrangência a fim de dar sua contribuição à sociedade que esperou muito tempo, de forma resignada e paciente, para chegar este momento. Ao longo dos anos, as saúde pública e privada atravessaram períodos conturbados. Essa dicotomia entre público e privado na saúde deve ser mais tênue e encarada com serenidade, já que a saúde e as enfermidades atingem a todos que têm ou não planos. Após a regulamentação, foi limitada a liberdade de definição do produto a ser oferecido à população e a liberdade de preço, não podendo mais ser negada a entrada de quem quer que seja em planos de saúde, isto é, a seleção de risco foi proibida, não podendo também haver rompimento unilateral de contrato com o usuário 244. Em seguida, criado o Plano Referência, o qual é o mínimo em atendimento que a operadora deve oferecer. Dentre outros planos aprovados, este é o mais simples que toda operadora tem de possuir para oferecer aos seus clientes obrigatoriamente. Esse plano oferece enfermaria e CTI, cobertura de doenças infecto-contagiosas, transplantes de córnea, renal, cirurgia de miopia maior que sete graus, psiquiatria, terapia de crise com alguns limites de internação, urgências, emergências, garantia ao

244 A seleção de risco entende-se como a “não aceitação de pessoas com doenças ou com idade avançada”.

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recém-nascido e filho adotivo menor de 12 anos, carências de no máximo seis meses, parto com dez meses, doenças pré-existentes com prazo de 24 meses de carência. A criação do agravo245 no preço para doença Pré-Existente está ainda um pouco confusa, pois não há base técnica para precificação. No caso do Plano Referência não há limitações quantitativas e a operadora não pode descredenciar o hospital, pois é muito complicado. Foram criadas inicialmente sete faixas de idade, atualmente alteradas para dez, sendo a última faixa no máximo seis vezes o preço da primeira, e valem a partir de primeiro de janeiro de 2004.246

Faixa I - de 0 a 18 anos Faixa II - de 19 a 23 anos

Faixa III - de 24 a 28 anos Faixa IV - de 29 a 33 anos

Faixa V - de 34 a 38 anos Faixa VI - de 39 a 43 anos

Faixa VII - de 44 a 48 anos Faixa VIII - de 49 a 53 anos

Faixa IX - de 54 a 58 anos Faixa X - de 59 anos ou mais.

Em preços, o reajuste só pode ser técnico247, anual e excluindo a possibilidade de cancelamento do plano do usuário pela operadora por esse motivo. Como exemplo histórico, podemos dar os números dos reajustes entre maio de 2003 e abril de 2004: 9,27% (IPCA 5,14%). Tal número, para reajuste, deixou as operadoras de saúde insatisfeitas em seus objetivos de aumentos de preços. O reajuste de 2004 /2005 ficou em 11,75% (IPCA 7,79) e o de 2005/2006 em 11,69%248. Caso o cliente esteja internado, também não é possível o cancelamento do plano. A lei 9656/98 criou um enlace difícil para as operadoras cancelarem os planos de saúde individuais. Esse foi o limite máximo de reajuste autorizado pela ANS para as operadoras e seguradoras de planos de saúde nas épocas citadas. Nenhuma operadora foi autorizada a reajustar as mensalidades de seus consumidores acima daquele percentual nas renovações automáticas dos contratos. Essas projeções feitas pela ANS mostraram que esta metodologia é mais vantajosa para o consumidor, já que, antes, grande parte dos contratos de planos de saúde foi indexada ao IGP-M. Nesse mesmo período, o IGP-M variou 32,48% e o ICV 17,38%. O índice de 9,27% foi a média ponderada dos reajustes de 145 mil contratos coletivos de um total de 10,8 milhões de usuários. Esses contratos representavam, na época, 448 operadoras que atenderam a mais de 22 milhões de usuários249. As empresas preferem, portanto, vender planos com contratos empresariais coletivos;

245 É um aumento do valor da contra-prestação pecuniária pelo fato de declarar doença pré-existente. 246 Essa regra estabelece que da última faixa etária pudesse ser cobrada uma mensalidade no máximo seis vezes superior à cobrada da primeira. Posteriormente definiu-se – por decorrência do Estatuto do Idoso – a variação entre a 1ª. e a 7ª. faixa etária deveria ser igual à variação entre a 7ª. e a 10.a. faixa etária. Esse é o princípio da solidariedade Inter geracional. Há um projeto de lei no Congresso Nacional que propõe que a diferença máxima seja de quatro e não de seis vezes. É um assunto tecnicamente complexo sob o ponto de vista de riscos atuariais. 247 É obrigatório que a operadora demonstre os níveis de sinistralidade para solicitar quaisquer aumentos de preços. 248 Mensagem do Presidente da Abramge - Arlindo de Almeida - Editorial da Revista Medicina Social - número 188 - de jan/fev/mar/2005. ANS - RN-99 de 27/05/2005. 249 Fonte: Folha de São Paulo em artigo publicado em: http://www.cprcorretora.com/noticias_038.asp - acessado em 21/05/2005.

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todavia, quando o empregado sai da empresa, tais planos criam problemas futuros para ambas as partes, ou seja, se o funcionário for demitido sem justa causa, ele terá direito de permanecer no plano, no mínimo, durante seis meses e no máximo dois anos, desde que ele pague as suas mensalidades. De certa forma, o vínculo com o ex-empregado permanece. Atualmente, os planos de saúde individuais são minoria no mercado, correspondendo a 25% do total250. A outra fatia é contemplada pelos planos empresariais ou coletivos que precisam também de novas reflexões, pois, se as operadoras não desejam vender planos individuais e somente aquelas pessoas com carteira assinada podem ter um plano de saúde via empresas, haverá um cerceamento para quem está desempregado ou ganha pouco. Quando encontrar outro emprego, a pessoa verificará, muitas vezes, que a empresa não tem condições de registrá-la - os empregos formais estavam em declínio, na época, quanto mais instituir um plano de saúde para seus empregados. As empresas operadoras de saúde já perceberam que a prevenção é o melhor para seus usuários e para a própria empresa em termos de custos. Por isso já há muitas empresas operadoras que preferem fazer uma Medicina preventiva do que curativa. Tais informações mais detalhadas estão na sequência. No caso do Brasil, a informação na mídia, tem sido um dos vetores que aumentam a intensidade da utilização. Dizem os veículos: “faça exame da próstata, examine seu colesterol, faça exame de prevenção do câncer de mama, faça check-up anualmente e outras chamadas em jornais, revistas, TV e outras mídias. ” Entre 1995 e 2003, o percentual de sinistros ou de utilização do setor aumentou cerca de 17%, passando de 73,4% para 86,22%. Enquanto, o número de segurados, que era de 4,8 milhões, em 1996, passou para 6,3 milhões em 2000 e declinou para 4,9 milhões em 2003, praticamente o mesmo de 1996. Se compararmos o ano de 1996 com o ano de 2003, verificaremos que o número de usuários é quase o mesmo, mas duplicaram a freqüência e o custo de utilização.251 “Quer você seja um prestador de serviços de Assistência Médica ou um usuário, não precisa ser relembrado de que o aumento dos custos assistenciais é um desafio nacional. De forma conservadora já representam 14% do PIB norte-americano e significam 1,4 trilhão de dólares anualmente, e, por volta de 2008, esta quantia está projetada para alcançar 2,2 trilhões de dólares...” 252

250 Fonte: Abramge - Associação Brasileira de Medicina de Grupo. acessado em 22/10/2005. 251 Miranda, 2005 252 Traduzido e condensado por Dr. Ieraldo Rubo, presidente da Conange - Revista Medicina e Saúde - pág. 21 - artigo publicado pelo The Official Newsmagazine da Associação Urológica Americana de março/2004.

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Tabela III Antes da lei e após a lei - quantidade de beneficiá rios

Faixa Plano Anterior Plano Posterior Total

Etária a Lei 9.656/98 a Lei 9.656/98

Anos Quantidade Quantidade Quantidade

Beneficiários % Beneficiários % Beneficiários %

0 a 17 6.034.377 26,92 2.223.896 28,92 8.258.273 27,43

18 a 29 4.780.424 21,32 1.813.511 23,59 6.593.935 21,90

30 a 39 4.123.535 18,39 1.364.758 17,75 5.488.293 18,23

40 a 49 3.266.155 14;57 1.075.159 13,98 4.341.314 14,42

50 a 59 1.980.958 8,84 584.789 7,61 2.565.747 8,52

60 a 69 1.205.085 5,37 335.560 4,36 1.540.645 5,12

70 e + 1.026.619 4,59 290.809 3,79 1.317.428 4,38

TOTAL 22.417.153 100,00 7.688.482 100,00 30.105.635 100,00

Fonte: Abramge - 2001 - 9.o Congresso (Hotel Inter-Continental - RJ). Como se pode observar (Tabela XVI), a quantidade de beneficiários antes e depois da lei 9656/98 é de pouco mais de 30 milhões. Para que um cliente de contrato antigo, ou seja, antes da lei tenha direitos adquiridos por meio dela é necessário que ele pague diferenças de pré-pagamento para ter direito a novas coberturas, não previstas em seu plano antigo. Observe-se que as faixas etárias de maiores de 60 anos até 69 anos e mais de 70 anos, não representam 10% da população atendida.

Isso gerou um grande volume de pessoas que desistiram de ter um novo plano devido ao aumento de preço e fez com que as operadoras tivessem uma queda considerável das aquisições já efetuadas e perdas daqueles que pagavam seus planos mensalmente.

As conseqüências tiveram duplo resultado negativo para todos: operadoras, governo e consumidores, pois estes, na medida em que não têm mais planos de saúde, recorrem ao SUS. Os consumidores deixaram de ter um plano particular, as operadoras perderam um cliente e o governo ganhou um novo usuário via SUS.

Em 2003, o PIB teve recuo no primeiro semestre quando comparado com o igual período anterior e isso teve repercussão negativa nos planos em andamento e na venda de novos planos. Houve ainda o racionamento de energia e a liquidez real caiu 15%. O salário médio das famílias sofreu perda não inferior a 5%. Era um período recessivo. O consumo das famílias foi diminuindo, indicando que o mercado interno se

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retraiu até início de 2004.253 Nos anos seguintes houve retomada econômica e afetou positivamente a venda dos planos de saúde Conforme já afirmado, essas perdas de clientes nas operadoras de 2001 até 2005 se aproximam de seis milhões. Tais dados estão nas tabelas constantes da ANS de vários anos. Observe-se, então, que a ANS, em vez de promover maior acesso da população aos serviços de saúde complementar, promoveu, de forma indireta e involuntariamente, um esvaziamento do setor ampliando a procura pelos serviços do SUS.254 A partir da lei 9656/98, as operadoras devem ter seu registro de operação e atender várias regras. Os planos a serem lançados e os em andamento devem também ter seus registros. As operadoras devem pagar também uma taxa de saúde suplementar – para garantir a subsistência da ANS - ao órgão controlador - para efetuar quaisquer registros, sejam de renovação de planos já existentes ou de novos planos.

É previsto, ainda, nas normativas, que caso algum cliente de plano de saúde utilize-se do SUS, por quaisquer motivos, a operadora deve efetuar o ressarcimento ao órgão.255 Se isso não for feito, o SUS, mediante o RG e o CIC do usuário, faz a devida cobrança. Já houve muitos casos de pagamentos e outros estão sendo discutidos na ANS pelas operadoras.256 Sob o aspecto administrativo, é obrigatório um plano de contas específico para a contabilidade e um controle de registros auxiliares. A média de planos por operadora no Brasil é atualmente de quinze, e a região mais abrangida é a Sudeste. No livro de Bayma e Iasznar, lançado pela Fundação Getúlio Vargas há observações interessantes sobre o que se pensa e o que acontece com os planos de saúde.257 “...Há problemas urgentes a serem analisados para o futuro da saúde no Brasil que envolvem também as empresas que trabalham com saúde privada. De um lado, são eles: estrutura organizacional inadequada; falta de entrosamento entre os diversos setores, estrutura gerencial causando morosidade nos processos, ausência de indicadores, baixos salários, pouca qualificação, inexistência de descentralização, inexistência de um sistema de análise de custos, assistência farmacêutica, faltam

253 Revista Medicina Social - n.° 182 – jul/ago/set/200 3 - pág. 10 - Artigo de Wagner B. de Castro. 254 As tabelas estão no site da ANS: http://www.ans.gov.br/portal/site/perfil_operadoras/index.asp 255 Após ficar quase um ano sem pedir de volta às seguradoras de saúde – operadoras - ressarcimento das internações de conveniados em hospitais públicos, a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) bateu recorde de cobrança e arrecadação neste ano. Relatório feito a pedido da Folha revela que a agência voltou a emitir notificações para as operadoras em julho. Nos cinco primeiros meses de 2011, a agência arrecadou R$ 25 milhões. O valor é superior à soma dos anos de 2008, 2009 e 2010. Neste ano, 2011, o valor efetivamente cobrado dos planos (sem direito a recurso administrativo) é de R$ 97 milhões, também superior à soma dos três anos anteriores. A diferença não foi paga ou está sendo contestada judicialmente. Apesar dos recordes, os valores continuam pequenos em relação à dívida dos planos com o SUS. E devem crescer. Isso porque as últimas notificações da ANS são de atendimentos feitos no segundo semestre de 2008. As notificações são usadas pela ANS para informar a operadora, que tem duas instâncias de recursos na própria agência para negar que o paciente atendido na unidade pública tenha plano de saúde válido. (Fonte: http://www.plurall.com.br/novo/noticia.php?noticia_id=4400) – acessado em 07/07/2011. 256 Tais dados podem ser verificados no si t e da própria agência reguladora – ANS - que controla essas cobranças.

257 Fundação Getúlio Vargas - Saúde e Previdência Social - Desafios para o Terceiro Milênio - Editora Pearson Education - 2003 - Organizadores: Fátima Bayma e Istvan Kasznar.

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ações nas áreas materno-infantil, insuficiência das atividades de promoção e prevenção à saúde, falta programas de saúde das famílias, insuficiência no atendimento à demanda de sangue, componentes e derivados...” 258. Amorim (2006), ainda faz comparações interessantes entre o que acontece na Saúde Pública e na Saúde Privada, mostrando os paralelismos que existem. No SUS a população ainda enfrenta um grave problema, a dificuldade de acesso evidenciado pela sobrecarga nas emergências e pela longa espera para se conseguir realizar determinados procedimentos. No que se refere a Saúde Suplementar, existem hoje no Brasil cerca de 50 milhões de brasileiros dependendo desta alternativa de saúde, uma complexa engrenagem que envolve usuários, prestadores, hospitais, clínicas, laboratórios, serviços de imagem e médicos e cerca de 1.400 operadoras, entre cooperativas médicas, odontológicas, seguradoras, empresas de medicina de grupo, de auto-gestão, odontologias de grupo e filantrópicas. (Amorim, 2006). Ainda hoje, os associados de planos reclamam dos preços e aumentos praticados e das restrições contratuais; os prestadores de serviços estão com seus valores profundamente defasados; as operadoras alegam dificuldades advindas da obrigatoriedade de ampliação das coberturas – determinadas pela ANS – e dos reajustes concedidos, sempre menores que os custos médico-hospitalares, impactados pelos elevados valores dos materiais e medicamentos; e os médicos, por sua vez, vêm sofrendo com reduções em seus honorários. Vale destacar ainda a total falta de incentivos por parte do governo e a pesada carga tributária que incide sobre o setor, que hoje é em torno de 38%. 259 Pode-se assim resumir os principais problemas vivenciados atualmente pelos estabelecimentos de serviços de saúde no país; alto grau de endividamento; fluxos de caixa negativos; pendências nos pagamentos de fornecedores e tributos; dificuldades de obtenção de linhas de crédito próprias para o setor, a fim de que estes estabelecimentos possam acompanhar o desenvolvimento e atualização que o setor de saúde requer. Os financiamentos ainda hoje disponíveis são aqueles de 2006, de duas ordens: crédito rotativo com garantia de recebíveis e financiamento para investimentos pelo BNDES a juros de mercado, não havendo, portanto, qualquer subsídio ou alongamento de prazos diferentes de pagamento com relação àqueles aplicados ao mercado em geral. (Amorim, 2006). Em virtude do cenário da época, de crise, evidenciou-se uma diminuição da rede credenciada o que gerou uma restrição no número de atendimentos. Isso, por sua vez, ocasionou um desequilíbrio ético profissional e levou a um significativo aumento das demandas judiciais do setor.

258 FGV, 2002/2003 - páginas 10 e 11. 259Somente de forma direta estudo divulgado em (06/04/2010) pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) mostrou que a alíquota média de impostos e tributos cobrados sobre bens e serviços na área de saúde no Brasil é de 33%. Sobretudo para alguns itens específicos, como o de muletas (39,59%), termômetros (38,93%) e xarope contra tosse (34,80%). Esse percentual é maior do que, por exemplo, o que incide sobre medicamentos veterinários, de 14,5%. (Fonte: http://oglobo.globo.com/economia/mat/2010/04/06/estudo-do-ibpt-revela-que-aliquota-media-de-impostos-na-area-de-saude-de-33-916262452.asp) – acessado em 07/07/2011.

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A área de saúde em geral demanda pesados investimentos em recursos humanos e tecnologia de ponta. A atualização dos profissionais, dos equipamentos e técnicas aplicadas tem de ser permanente e, portanto, requer a destinação de cifras vultosas. Há ainda que mencionar que a inflação na área de saúde é muito maior do que a de outros setores da economia em qualquer parte do mundo, uma vez que boa parte dos equipamentos, medicamentos e materiais utilizados é importada, cara e logo necessita de substituição frente aos avanços científicos e tecnológicos.260

De outro lado, sabe-se que haverá um aumento considerável de idosos nos próximos anos, o que denota o envelhecimento da população. Essa visão demográfica do assunto será detalhada mais adiante e um artigo à respeito será publicado. Do lado privado ainda há reclamações sobre a grande interferência do Estado nos serviços da saúde privada261 e uma tendência de elevação dos custos de assistência médica nos preços dos remédios, equipamentos e administração, embora ser o regulador o Estado.

Ao longo destes poucos anos, o sistema de saúde foi se adaptando e regulamentando todos os entraves e chaves de segurança que, aos poucos, apareceram nos vários pontos do país. Daí, com o objetivo de melhorar todas as relações do setor, regulamentos não faltaram. Criaram-se definições de planos de saúde, repactuações, definições na área odontológica e médica, formas de liquidação de operadoras, modelos de contratos, definição de segmentações, faixas etárias, abrangências geográficas, mas faltava, na hierarquia, um órgão que administrasse e resolvesse as pendências que até essa data ainda persistiam. Foi necessário regular e controlar, já que a lei 9656/98 – dos planos de saúde - não era suficiente. Muitas foram as discussões à respeito e algumas delas foram elaboradas previamente especialmente aos gestores das empresas operadoras de assistência à saúde, que enriquecem o debate, sobre os seguintes aspectos: a) Possibilidades de assegurar ao beneficiário, cobertura integral e regular às condições de acesso aos planos de saúde e como reagem os operadores relativamente ao aumento do alcance da ANS em relação a sua interface de trabalho com a população e o Ministério da Saúde e o que pensam as operadoras sobre a definição e o controle das condições de ingresso, operação e saída das empresas e entidades que operam no mercado; 260 Segundo dados da FIPE, a variação do INPC no período de janeiro de 1995 a janeiro de 2006 foi de 135,6%, enquanto a dos índices de inflação saúde foi de 196,4%. O economista Cláudio Salm, do Laboratório de Economia Política da Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), diz que os gastos do governo com saúde são inferiores ao desembolso privado. De cada R$ 100,00 destinados ao setor, R$ 45 saem do orçamento público, dados compatíveis com os da OMS. Segundo o professor, 55% dos gastos brasileiros com saúde são privados. Significa dizer que há uma parcela expressiva de brasileiros mal servidos, porque não tem dinheiro nem para pagar planos de saúde, nem para custear remédios. Para ele, o que chama a atenção nos gastos privados é a enorme participação das despesas diretas. “São exames e intervenções não cobertos pelos planos de saúde, pagos também por particulares, e, principalmente medicamentos. Esses gastos, quando dependem do nível de renda, podem ter conseqüências catastróficas para quem é pobre”, diz Salm. Apesar de todos os conflitos trata-se de um setor de fundamental importância, uma vez que atende a população, que, de uma forma ou de outra (pública ou privada), tem de ter acesso a uma assistência digna e de qualidade. (Amorim, 2006 – O Globo/Coluna Panorama Econômico, de 07/01/06). 261 Mas também na saúde privada trata-se de um “Direito do cidadão e um dever do Estado” – CF/1988).

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b) Verificação da validade e do funcionamento dos mecanismos legais de garantias assistenciais e financeiras, como as provisões obrigatórias, que assegurem a continuidade da prestação dos serviços de assistência à saúde contratados e os que poderão advir de novas contratações; c) Transparência e garantia da integração do setor de saúde suplementar ao SUS de forma compartilhada e o ressarcimento de gastos gerados por beneficiários do sistema público que são portadores de planos de saúde; d) O que pensam os operadores sobre o estabelecimento de mecanismos de controle e abuso de preços e a satisfação das necessidades do sistema de regulamentação, normatização e fiscalização do setor de saúde suplementar; e) Posicionamento da ANS face aos problemas de prestação de serviços em saúde no geral e sua posição em relação a saúde das elites e ainda, discussão sobre o duplo pagamento, ou seja, recolhimentos ao INSS e, ao mesmo tempo, pagamento de um plano ou seguro de saúde; f) Alta complexidade, seus custos e suas implicações de impacto no sistema geral de assistência à saúde e verificação da perspectiva de aumento da quantidade de beneficiários, fazendo alterações no status quo; g) Discussão das possibilidades de apresentar “fatores moderadores” , flexibilização de coberturas, na utilização de planos via empresas com o objetivo de reduzir preços finais; h) Verificação de estabelecimento de relações de compartilhamento entre o que acontece na saúde suplementar e o que acontece na saúde pública e análise do comportamento da ANS e sua coerência em relação à prestação de serviços de saúde dos brasileiros; i) Reflexão sobre o atual estágio da saúde suplementar e sobre os atores corporativos para que se possa tomar novas decisões de direcionamento e rediscussão das possibilidades de reduções consideráveis nos preços dos planos de saúde em vista de novas estratégias que possam ser adotadas, aumentando o mutualismo com planos empresariais coletivos - na forma do capitation - oferecidos para as micros, pequenas e médias empresas; j) Considerações se a alta complexidade é um entrave comercial para o desenvolvimento do mercado e das pequenas operadoras de planos de saúde ou é benéfica. k) Modelos econométricos mais sofisticados para obtenção de precificações de planos, conforme histórico do usuário e tempo de exposição ao risco. l) Questionamento sobre a necessidade ou não de um índice econômico somente para o setor de saúde com o objetivo de deixar claro aos consumidores os problemas gerados por aumento ou reajuste das mensalidades.

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Posteriormente, em 2002, o Congresso Nacional, provocado por instituições de Defesa do Consumidor e entidades médicas, instaurou uma CPI a pedido do deputado Henrique Fontana. Argumentava-se, nessa CPI, que os planos de saúde eram verdadeiras caixas pretas, pois se desconheciam os números da sua atividade.262 Essa CPI encerrou-se em dezembro de 2003, gerando um longo relatório de 24 deputados com as sugestões de alterações na lei e supressão de artigos relativos aos assuntos: 1) Proibição do cheque caução - os hospitais exigiam cheque de garantia quando da internação de um usuário; 2) Criminalização dos falsos planos e cartões de desconto - existiam planos falsos, ou seja, não registrados na ANS e também foi definido que os cartões de descontos263 não seriam aceitos como planos de saúde; 3) Contratos obrigatórios entre operadoras e prestadores - a partir da lei todos os prestadores de serviços e credenciamentos deveriam ter contrato bilateral de direitos e obrigações; 4) Redução da carência para doenças preexistentes - as carências variavam de empresa para empresa e não havia uma padronização das carências; 5) Fiscalização de planos coletivos pela ANS; 6) Foram estudadas formas, na época - ainda não aplicadas - do direito do usuário trocar de plano, sem cumprir novas carências; 7) Foram discutidas formas de aplicação da assistência à saúde privada junto aos institutos de assistência a servidores; 8) Discutiu-se as ações de prevenção e direitos dos usuários após liquidação de operadoras; 9) Os procedimentos estéticos foram objeto de reflexões na atividade do setor de saúde suplementar; 10) Discutiu-se a bi-tributação do ISS; 11) As formas de migração de planos antigos para novos; 12) Normatização e fiscalização dos contratos antigos com base do CDC; 13) Formatação de reajustes com critérios regionais e planilhas de custos; 14) Repasse automático de reajustes a prestadores e mais rigor no registro das operadoras, registro nos Conselhos de medicina e odontologia; 15) Formas de transferência e arrendamento de carteiras e melhoria do controle social; 16) Formatação do concurso público na escolha de diretores da ANS e definidas metas referenciais, núcleos regionais de fiscalização; 17) Definição das formas de verificação de glosas abusivas; 18) Central de atendimento a usuários, central de atendimento a prestadores, melhoria

262 Editorial da Revista Abramge - 1a. página - número 182 – ano 2003 263 Trata-se de empresas que fornecem um cadastro de médicos, dentistas e hospitais – do qual eles fazem um convênio para descontos – e ganham um percentual dos atendimentos pagos pelos usuários. Não é Plano de Saúde, não está previsto em Lei e por isso ainda existem. Se for Operadora não pode ter esse tipo de operação, conforme a RN-40 de junho de 2003. “Art. 1º Fica vedada às operadoras de planos de assistência à saúde e às seguradoras especializadas em saúde a operação de sistemas de descontos ou de garantia de preços diferenciados a serem pagos diretamente pelo consumidor ao prestador dos serviços, bem como a oferta de qualquer produto ou serviço de saúde que não apresente as características definidas no inciso I e § 1º do art. 1º da Lei n.º 9.656, de 1998”.

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do ressarcimento ao SUS, banco de preços, incorporação de tecnologia e protocolos médicos; 19)- Sanções para propaganda enganosa; 20)- Definições de urgência e emergência, rol de alta complexidade e problemas relativos a falsos planos coletivos; 21)- Definições de reajustes por faixa etária e problemas resultantes de contratos antigos mantendo inúmeras restrições, exclusões para casos de graus de miopia, exclusões em casos de planos odontológicos, reclamações de médicos. Ao se ler o relatório tem-se a impressão de que falta tudo no sistema de saúde suplementar e que a ANS não estava cumprindo o seu papel. Não era o caso. A conclusão que se chegou é a de que essa agência não conseguiu ampliar a quantidade de usuários de forma considerável, tendo em vista seus rigores e controles, e que crises econômicas, baixos salários e muitas reclamações geraram condições para que a CPI fosse criada. Quase tudo foi rediscutido. Porém, o aumento da base na pirâmide social, relativamente ao atendimento das operadoras para a população, não foi atingido nessa discussão, deixando, mais uma vez, que um plano de saúde seja ainda um “sonho distante” para muitos brasileiros. Se verificarmos as informações mais atualizadas do PNAD / IBGE / 2008 e as comparações de aumento ou diminuição do contingente da população que tem planos de saúde, concluímos que: a) Em 1998, havia na região Norte 17% de pessoas com planos de saúde, em 2003 caiu para 14,8% e em 2008 caiu novamente para 13,3%. b)-No Nordeste eram 12,4%, caiu para 12,1% e subiu pouco para 13,2%. c)- Na região sudeste, 33,3% em 1998, caiu para 32,9% em 2003 e em 2008 subiu para 35,6%. d)- No Sul, 25,3%, aumentou para 27,9% em 2003 e em 2008 aumentou para 30,0%. e) No Centro-Oeste, a situação é de 1998, 22,5% da população tinha plano de saúde, aumentou para 24,7% em 2003 e em 2008 houve pequeníssima redução para 24,6%. f)- Se analisarmos, no Brasil como um todo, em 1998, em média, havia 24,5% de pessoas com planos, aumentando pouco para 24,6% em 2003 e pouco também para 2008, mas mantendo um percentual de 25,9%. Tais colocações não se referem aos segmentos populacionais mais pobres ou excluídos. O que se tenta elucidar são as possibilidades de pessoas, cuja renda familiar se situe entre três e seis salários mínimos, serem atendidas em redes particulares administradas pelas operadoras de saúde. Esse é um dos vetores que poderão se tornar reais como resultados das mudanças propostas, principalmente, considerando que uma nova classe C está surgindo no Brasil.

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Obviamente, o atendimento poderia ser melhor e ainda trazer economia ao governo. Não é um sonho, é uma realidade plausível. O crescimento só será possível quando se aumentar a base de atendimento privado de saúde com planos empresariais mais baratos e produtos para população de renda mais baixa. Torna-se necessário, portanto, que governo, via ANS e operadoras, criem mecanismos de aproveitamento da imensa estrutura existente na rede privada para atendimento dessa população que está empregada, com carteira assinada em pequenas, médias e micro empresas. Além disso, necessário é também atender àqueles que não estão empregados, todavia, têm renda e podem pagar planos mais baratos que são os autônomos ligados a alguma associação legalmente constituída. Nos dois casos, são milhões de pessoas. Claro que tais mudanças e ampliação dessa base de clientes deverá ser compartilhada entre governo e iniciativa privada com flexibilização fiscal ou outras formas de troca de interesses. Esse é o momento social adequado, pois a população não pode ficar só à mercê do atendimento no SUS. A materialização dessa troca de interesses é assunto de discussão e reflexão entre milhares de operadores, prestadores de serviços na saúde privada, ANS e o Ministério da Saúde, não cabendo neste trabalho seus detalhamentos operacionais. Tabela IV

Distribuição dos Planos de Assistência à Saúde Regi strados na ANS por Segmentação Assistencial - 2002

SEGMENTAÇÃO QTDE DE PLANOS %

Ambulatorial 2603 8,19%

Hospitalar com obstetrícia 333 10,49%

Hospitalar sem obstetrícia 159 5,01%

Odontológico 3968 12,49%

Referência 986 3,10%

Ambulatorial+hospitalar com obstetrícia 12915 40,64%

Ambulatorial+hospitalar sem obstetrícia 4225 13,30%

Ambulatorial+odontológico 308 0,97%

Hospitalar c/ obst+odontológico 141 0,44%

Hospitalar s/ obst+odontol. 125 0,39%

Amb+Hospit+obst+odont 1357 4,27%

Amb+Hospit s/ obst+ odont 223 0,70 %

TOTAL 31776 100,00% Fonte: ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar – 2002 Em fórum da Abramge264 - (2006) - já foi discutida a necessidade de criação de produtos para atendimento da população de renda mais baixa: estima-se atualmente

264 Associação Brasileira de Medicina de Grupo – Abramge.

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que haja um total próximo entre 50 e 52 milhões de pessoas nos planos particulares como conhecemos, dos quais, entre 10 e 12 milhões são planos odontológicos. Vale salientar, que havia, antes da Lei 9656/98, uma variedade imensa nos tipos de planos, conforme se verifica na tabela IV. Comentários e avaliações gerais A modalidade de seguro-saúde ou planos de saúde, vinculada ao segmento do qual se espera um alto grau de racionalidade do capital, produziu em 1993, como exemplo, 3 milhões de internações, responsáveis por 10,8 milhões de diárias hospitalares. Isso significa, em média, uma internação para cada 12,9 usuários/ano com duração média de 3,7 dias.265 As informações do SUS são que, no mesmo período, há uma internação por 9,6 usuários habitantes266, mas há uma diferença de 25% a menos a favor do setor privado; ou seja, ou o setor privado é mais eficiente, ou as internações do setor público foram mais complexas. A comparação entre os números fornecidos pelo SUS e os dos seguros ou planos de saúde, a despeito de restrições à comparação entre habitante e usuário, mostra que eles estão relativamente próximos. Há quase 30 anos, isto é, até 1976, quando o Seguro de Acidente no Trabalho era pago totalmente pelo governo, a Previdência Social arcava com todas as despesas dos acidentados, cujo número chegou a comprometer os seus recursos, causando saídas de caixa que alertavam para o problema. Essa questão foi resolvida por meio do compartilhamento entre o público e o privado e de mudanças na legislação acidentária, ou seja, de forma compulsória. Não havia, nessa época, agência regulatória e/ou normas específicas. Tal mudança teve aprovação do Congresso Nacional. Desde então, a responsabilidade do pagamento ao acidentado passou a ser da Previdência somente após o 16° dia de afastamento do trabalhador. Com isso, conseguiu-se uma redução de 40% nos acidentes em um período de oito anos de análise - 1975 a 1982.267 Após a mudança na legislação dos acidentes do trabalho, as empresas procuraram criar as CIPAS, que eram organizações dentro da própria empresa, para dar cursos de segurança, além de fornecer aos trabalhadores roupas, material adequado para seu trabalho e cartilhas para o caso de desenvolvimento de trabalhos considerados perigosos.

265 Fonte: - Abramge - Associação Brasileira de Medicina de Grupo – 2006. 266 Fonte SUS - Sistema Único de Saúde - Anuário 2000. 267 Cadastro da Comunicação de Acidente de Trabalho – CAT - A Comunicação de Acidente do Trabalho – CAT foi prevista inicialmente na Lei nº 5.316/67, com todas as alterações ocorridas posteriormente até a Lei nº 9.032/95, regulamentada pelo Decreto nº 2.172/97. A Lei nº 8.213/91 determina no seu artigo 22 que todo acidente do trabalho ou doença profissional deverá ser comunicado pela empresa ao INSS, sob pena de multa em caso de omissão. Cabe ressaltar a importância da comunicação, principalmente o completo e exato preenchimento do formulário, tendo em vista as informações nele contidas, não apenas do ponto de vista previdenciário, estatístico e epidemiológico, mas também trabalhista e social. Portaria número 5051 de 26 de fevereiro de 1999.

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Tais cuidados permanecem até os dias atuais, de forma mais bem regulada, na empresa através da medicina ocupacional, e deram origem a muitas outras empresas especializadas no setor, inclusive, fazendo exames admissionais e demissionais. São as conhecidas Normas Regulamentadoras - NRs, cuja legislação atualmente é abrangente e têm vida própria. Tais fatos demonstram que o compartilhamento é possível e pode ser solução para muitos problemas em várias áreas. De certa forma, o salário-maternidade que passou a ser pago pela empresa a partir de 1.° de setembro de 2003 não deixa também de ser um compartilhamento entre o público e o privado. Em decorrência do pagamento do benefício pela empresa à empregada gestante, as empresas compensarão o referido valor quando dos recolhimentos das contribuições incidentes sobre as folhas de salários e demais rendimentos pagos ou creditados. É o caso realmente de compartilhamento efetivo, no qual todas as partes envolvidas ganham, quando essa alternativa é possível e funcional. Verifica-se também, como exemplo, o compartilhamento entre o público e o privado na inclusão digital. A esse respeito, afirma Gonzáles (2005). Após a Lei 9656/98 a situação é praticamente a mesma, com a diferença de que a saúde suplementar atualmente está regulada. É preciso evoluir. A atividade agora está em outro momento, por isso é preciso mudar o repertório ou no mínimo, refletir sobre ele. “Vamos ter de compartilhar o trabalho da maneira mais ampla possível...” .268 Keynes, 1930 - (Apud Dowbor 2004). Enfim, há muito que se fazer ainda, mas grandes foram os avanços. De fato, houve muita pressão, principalmente da classe média, a grande consumidora da saúde suplementar, e a legislação - extensa, complexa e que vem sofrendo inúmeras alterações - veio para ficar e tem sido discutida nesses últimos anos em vários fóruns públicos e privados, cada qual com seus interesses. De um lado, as operadoras tendem a supor que essa lei pode levá-las à falência; de outra, o governo, via ANS tem se mantido firme em suas resoluções. Com raras exceções, há um consenso de que o sistema de saúde suplementar, como vimos, hoje regulado pela ANS, em muito ajudou a saúde brasileira269. 270 Essas afirmações estão contidas em pesquisas. Segundo Montone (2001), houve profundas transformações no segmento, agregadas a um grande esforço de eficácia, representando sua inserção na esfera do novo aparato de intervenção do Estado brasileiro: o das agências reguladoras,

268 Referindo-se as palavras de Keynes ainda em 1930. Dowbor – (2004) - pág. 51 269 Assim é que, em recentes pesquisas encomendadas pela ANS ficou constatado que 84% dos milhões de consumidores estão satisfeitos com seu plano de saúde. Em outra pesquisa do IBGE mostrou que entre os 20,1 milhões de pessoas atendidas nas duas semanas anteriores à entrevista, por encomenda do Ministério da Saúde, 35,5% delas haviam usado plano de saúde nos últimos 30 dias e 86,2% avaliaram como “Bom” ou “Muito bom” o atendimento recebido. Pelo Data-Folha o percentual foi de 84%, por pesquisa da Fiesp/Ciesp juntamente com o Sindicato dos Metalúrgicos foi de 80% de bom o nível de satisfação dos empresários e trabalhadores. (Revista Medicina Social de Grupo - Abramge - out/nov/dez/2004 - n.° 187 - página 4). As reclamaç ões nos órgãos de defesa do consumidor prendem-se, em sua maioria, a problemas de reajustes de preços e não de atendimentos. 270 Há ainda outras pesquisas da R.A.E. – Revista Eletrônica – de Pesquisa de satisfação, um modelo para Planos de saúde de Gabriel Sperandio Milan, UCA e de Guilherme Trez, Unisinos. (2005). RAE-eletrônica, v. 4, n. 2, Art. 17, jul./dez. 2005

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potencializando a efetividade da regulamentação.271 De fato, aprovada, a lei 9656/98 trouxe muitos benefícios, mas também paralisou parcialmente o sistema de saúde suplementar. Há ainda muito que se regulamentar, pois o conteúdo da legislação em vigor traz em seu bojo o acompanhamento técnico e impõe às seguradoras e operadoras de assistência médica a necessidade de avaliações anuais, revisões de provisões técnicas, acompanhamento de auditoria independente e normas para precificação dos planos em andamento e daqueles que serão lançados. Todavia, a alarmante elevação da sinistralidade é a atual maior preocupação dos gestores operadores de saúde, segundo Miranda (2005). 272 Os planos prevêem ainda três tipos de reajustes: por faixa etária, por custo financeiro - devido a inflação e custos médicos, e, e por sinistralidade. Os dados sobre sinistralidade estão diretamente ligados a contratos coletivos e dependem da quantidade de usuários da apólice. Sinistralidades acima de 75% chamam a atenção para renegociações.273 Embora jovem, o sistema parece tender ao amadurecimento, pois se observa que, apesar das dificuldades, há interesse de grandes empresas na atividade e de outras, menores para entrar no setor, algumas delas ligadas aos bancos e empresas estrangeiras estritamente dessa atividade. Enfim, o setor deseja crescer.274 A configuração do mercado em 2010 comparando-se com 2000, ou seja, doze anos após a legislação de 1998, é a seguinte: há ainda os sistemas de Auto-gestão, o aparecimento de Administradoras especializadas na prestação de serviços em saúde e outras, de prestação de serviços gerais, trazendo novas tecnologias para o meio. Os hospitais, por sua vez, desenvolvem novas técnicas e aplicam softwares para consecução de protocolos hospitalares, sistemas de controle, técnicas avançadas de diagnósticos de grandes laboratórios e de sistemas de administração. Judicialização da Saúde Percebe-se a necessidade de reestruração. Arranjos institucionais podem ser revistos sob aspectos de legislação, comerciais e de gestão. Nota-se a necessidade de mudar alguns focos da ANS, sendo que um deles é a urgência de trazer de volta os usuários que desistiram dos seus planos de saúde ou migraram para outros de preços mais acessíveis. Isso é necessário, pois, aumentando o mutualismo, pulveriza-se o risco, dizem as operadoras e os técnicos. Outro legado que gera muitos problemas na área de saúde suplementar são as ações contra as Operadoras e/ou as Medicinas de Grupo. O advogado e professor de Direito Comercial da UFRJ, Luiz Felizardo Barroso, (2010),

271 ISBN85-334-0374-7 - Série ANS - número 2 - Januário Montone - Diretor Presidente da ANS - 2001 - pág.18. 272 Entre 1995 e 2003, o percentual de sinistralidade aumentou em 17%, passando de 73,4% para 86,22% (Miranda, 2005). 273 Fonte: http://www.segurado.com.br/saude_reajuste.asp - acessado em 28/02/2006. 274 Com o neoliberalismo em pauta e a conseqüente abertura econômica, agora é a vez das empresas estrangeiras de seguros de saúde, que já dominam 11% do mercado, que iniciam sua entrada no país. Algumas já chegaram e outras já saíram do Brasil, como a Cigna, Golden Cross, Amico, AIG (Unibanco), Aetna (Sul América) e Hartford (Icatu). Coerentemente com suas práticas, todas elas são ligadas a instituições financeiras. Fonte: Revista Espaço Acadêmico - Ano II - número 20 - ano 2003 - Mensal - ISSN-15196186.

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afirma que, a princípio a “desjudicialização” das questões da saúde, ou seja, a trégua das ações judiciais é o caminho mais racional para reduzir a sobrecarga de processos avaliados, repetidas vezes pelas varas cíveis da justiça brasileira. Os atores da cadeia são bastante antagônicos entre si; a receita, considerando-se os ingredientes dos representantes de cada parte, exigirá novas leis para corrigir as imprecisões do sistema, um Estado de fato disposto a oferecer serviços mais adequados à população, de modo a desafogar a excessiva gama de serviços transferidos, por bem ou por mal, à iniciativa privada e um consumidor consciente dos seus direitos e deveres. Em vez de Justiça, também as cortes arbitrais, podem ser muito úteis, desde que obedecendo a legislação vigente, poderão ter uma participação proativa, impedindo que as disputas convertam-se em futuras ações judiciais. 275 É o momento da estrutura conseguida no privado, hoje comprovadamente eficiente, conforme pesquisas da ANS e Data-Folha 276 (2004 / 2005) atenderem a outras necessidades da sociedade, via planos empresariais mais acessíveis, através das pequenas, médias e micro empresas e atendimento daqueles que não estão ligados a nenhum CNPJ como arranjo complementar, como veremos adiante. A desjudicialização da saúde é um assunto muito complexo e delicado: há um avanço na longevidade que trouxe e vai trazer outros impactos para o seguro de vida, previdência e para os planos de saúde. O País deverá lidar ainda com questões éticas, morais e de envolvimento da família. Há também a questão do avanço tecnológico, que prolonga a vida de uma pessoa em alguns casos por mais de um mês na UTI.277 Apesar da Constituição Federal de 1988, garantir a participação da iniciativa privada de forma complementar na assistência à saúde, conflitos ainda perduram. Não raro vemos manifestações práticas dessa situação, que em vez de atuar em prol dos usuários, dificulta a implantação de um Sistema de Saúde Brasileiro, que poderia ter dois grandes sub-sistemas: o Estatal, representado pelo Sistema Único de Saúde - SUS e o Sistema Suplementar de Saúde, sob a coordenação e fiscalização da ANS - 275 Nos planos antigos, os usuários convivem com maior insegurança jurídica e precisam recorrer ao Judiciário em resposta às negativas de coberturas e cláusulas abusivas, mesmo nos casos em que há jurisprudência pacificada, destacam órgãos de defesa do consumidor. Já os planos novos têm menos controvérsias porque atualizam seu Rol de Procedimentos médicos por exigência da ANS. Mas há centenas de casos em planos antigos, em que a tecnologia oferece, por exemplo, condições de se colocar um “stent” , numa situação em que evita-se a cirurgia coronariana, todavia, a Operadora se nega a pagar o Hospital, tendo em vista que tal procedimento não está previsto em contrato e a denomina como uma prótese. É óbvio, que não há previsão. O plano foi assinado há 20 ou 30 anos e é claro que a colocação do “stent”, na época, nem era previsto como procedimento médico. O certo é que, até alcançar o modelo ideal, parece claro que as negativas de coberturas, a demora em conseguir consultas em algumas especialidades e exames mais complexos continuarão a impor um estado de tensão permanente na relação entre as operadoras e segurados de planos de saúde, em posicionamentos antagônicos. (Fonte: Revista Apólice, ano 15, número 141 – julho/2010). 276 Assim é que, em pesquisas encomendadas pela ANS ficou constatado que 84% dos milhões de consumidores estão satisfeitos com seu plano de saúde. Em outra pesquisa do IBGE mostrou que entre os 20,1 milhões de pessoas atendidas nas duas semanas anteriores à entrevista, por encomenda do Ministério da Saúde, 35,5% delas haviam usado plano de saúde nos últimos 30 dias e 86,2% avaliaram como “Bom” ou “Muito bom” o atendimento recebido. Pelo Data-Folha o percentual foi de 84%, por pesquisa da Fiesp/Ciesp juntamente com o Sindicato dos Metalúrgicos foi de 80% de bom o nível de satisfação dos empresários e trabalhadores. (Revista Medicina Social de Grupo - Abramge - out/nov/dez/2004 - n.° 187 - página 4). As reclamaç ões nos órgãos de defesa do consumidor prendem-se, em sua maioria, a problemas de reajustes de preços e não de atendimentos. 277 Este é um tema que ultrapassa o âmbito brasileiro, como mostra Michel Porter e Elizabeth Teisberg no livro “Repensando a Saúde”. (Bibliografia). Precisamos rever a questão da trégua nas ações judiciais com muita seriedade. (Palavras de Ariovaldo Bracco – Presidente da Acoplan – Associação dos Corretores de Planos de Saúde e Odontológicos do Estado de São Paulo – Revista Apólice, pág. 29 – ano 15, número 141 – julho/2010).

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Agência Nacional de Saúde Suplementar e das operadoras de planos privados de assistência à saúde. Há espaço para a atuação de ambos os sistemas e eles se complementam. Eventuais erros e/ou problemas existentes em um dos sistemas, não justifica a negação do outro. O caminho adequado é a adoção de medidas corretivas para cada situação e dosadas a cada circunstância, nos termos da legislação vigente, desonerando o SUS. Há espaço para um apêndice de parceria, e tais gastos poderiam ser reembolsados às operadoras de acordo com uma tabela de remuneração com base nos preços praticados no mercado de serviços de saúde. Segundo Cata Preta (2004), “ estimular e facilitar a adesão das pessoas e das empresas aos planos privados de saúde é, pois, uma forma de parceria público-privada, que viabilizará o Sistema Único de Saúde, permitindo que se estruture e se passe a prestar à população, que efetivamente dele necessita, um serviço de qualidade, assegurando a plenitude da cidadania às classes menos favorecidas...”278 No 7.° Simpósio dos Planos de Saúde, (2004), promov ido pela Abramge, foi defendida a viabilidade de se criar sub-segmentações, conforme a região e o poder aquisitivo da população, para aumentar o número de usuários de renda menor na medicina privada para desafogar o SUS.279 A idéia comum é a da criação de novos rumos e, nesse caso, são válidas discussões de rotas diferenciadas, no sentido de aumentar o volume de atendimento privado, compartilhar a saúde empresarial com a saúde pública e detectar em que aspectos podem ser efetuadas mudanças que minimizem os problemas da saúde em geral. É válida essa discussão no sentido de sempre melhorar a qualidade de atendimento da Saúde em geral, tanto privada quanto pública, embora tais sub-segmentações estejam – como alguns defendem – na contra-mão da política da própria ANS. No plano macro-institucional é fundamental rediscutir o papel do Estado e da iniciativa privada na saúde. Cláudio Rocha Miranda, (2005) do MBA – Gerência da Saúde da FGV, afirma que o Estado quer um sistema complementar forte e, para isso, tem um entendimento de que a saúde privada pode reduzir milhões de atendimentos em órgãos públicos e, com isso, aliviar a quantidade de pessoas que procuram o SUS. No plano micro, das operadoras, é importante a redefinição do conceito de rede de prestadores. É necessária a sua reestruturação, o estímulo às parcerias e à rede própria. 280 A rediscussão do Rol de Procedimentos da atividade de saúde complementar é muito dinâmica e sempre haverá necessidade de novos atendimentos além de atividades diferenciadas na linha médica e de exames complementares. Os planos de saúde já incluíram 70 novos procedimentos médicos e odontológicos a partir de 7 de junho de 2010, segundo determinação da ANS, publicado no Diário Oficial da União. Entre um dos procedimentos fundamentais na discussão está a inclusão do transplante de medula óssea.281 A nova norma atualiza os procedimentos

278 Funenseg - Fundação Escola Nacional de Seguros - Fundación Mapre Estudios - Madrid - Espanha - Horácio L.N. Cata Preta - “Gerenciamento de Operadoras de Planos Privados de Assistência à Saúde” - ISBN 85-7052-453-6 - Edição de 2004, p. 21-22. 279 Revista Medicina e Saúde - n.° 187 - out/nov/dez/20 04 - Palavras do Dr. Arlindo Almeida - Presidente da Abramge, 280 Revista Abramge - Assoc. Brasileira de Medicina de Grupo - p.28 - Revista 188 - jan/fev/mar/2005 - Cláudio Rocha Miranda - prof. MBA - gerência de Saúde - Fundação Getúlio Vargas e Diretor de Saúde da Fundação Cesp. 281 Trata-se de transplante alogênico – de uma pessoa para outra – de medula óssea.

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inclusos na cobertura mínima obrigatória oferecida pelas Operadoras de Planos de Saúde a todos aqueles que possuem contratos celebrados a partir de 29 de janeiro de 1999 – data em que entrou em vigor a Lei de regulamentação do setor de saúde. Além do transplante de medula óssea, também passam a estar inclusos nos planos básicos o exame de Pet-Scan, usado para diagnosticar câncer,282 além de outros, implante de marca passo multissitio, oxigeno terapia hiperbárica e mais de 20 tipos de cirurgias torácicas por vídeo. Ao todo, cerca de 40 milhões de pessoas que adquiriram ou adaptaram planos de saúde a partir de janeiro de 1999, serão beneficiados pelas mudanças. Além da inclusão desses novos procedimentos, também passam a valer outras normas como a cobertura pelos planos coletivos aos acidentes de trabalho e aos procedimentos de saúde ocupacional 283 e atendimento em hospital – dia – para necessidades em saúde mental. Miranda (2005), diz que tradicionalmente, sabe-se qual é o papel das agências ou órgãos responsáveis, no caso, a ANS e o Ministério da Saúde. Um deles é ter sempre como estratégia o aumento da quantidade de atendimentos à população, pois a evasão da saúde suplementar aumentou de forma considerável até 2006 os atendimentos e problemas do SUS 284. A partir daí surgem necessidades de apresentar alternativas por meio de novas premissas. Uma delas é ter como meta, alternativas para proporcionar planos coletivos de assistência médica junto as micros, pequenas e médias empresas a preços mais acessíveis. No plano da regulação e fiscalização, a ANS mostra-se disposta a sair do casulo, ainda que sob a desconfiança dos que são porta-vozes dos consumidores. Em agosto de 2010, por exemplo, a Agência planeja estrear um novo mecanismo de mediação de conflitos entre operadoras de planos de saúde e consumidores que tiverem pedidos de cobertura negados. Trata-se da Notificação de Investigação Preliminar (NIP), cujo objetivo é confirmar denúncias dos pacientes com mais rapidez e exigir que as operadoras revejam as decisões e permitam os procedimentos médicos.285 O aumento na quantidade de usuários deve ser a meta da ANS e de seus agentes, pois, aumentando o mutualismo, ou massa crítica, via planos coletivos empresariais, com descontos em folhas de pagamento, haverá uma tendência de redução de custos e preços finais Finalmente, confirma-se que essas reflexões continuam, da parte das Operadoras, pois, no seu 9.º Congresso em (2001) 286 patrocinado também pela Abramge, foram levantados e discutidos alguns importantes itens, tais como: 282 Além de mais 16 novos procedimentos no plano odontológico e aumento de consultas para nutricionistas, fonoaudiólogos, terapeutas e psicólogos. As Operadoras tiveram 5 meses para adaptarem-se às novas regras. 283 Outra mudança é o fim da limitação de 180 dias de atendimento em hospital-dia para pacientes com necessidade de acompanhamento da saúde mental. De acordo com a ANS, a medida visa substituir as internações psiquiátricas. (Arte Folha On Line – 12/01/2010). 284 Ver Revista Abramge - pág. 28 - Revista 188 - Medicina Social - Artigo de Cláudio da R. Miranda - 2005. 285 “A NIP é uma oportunidade de avanço na regulação do setor. Neste caso, o regulador procura ir além da sua função de normalização e fiscalização para mediar conflitos. Sendo bem sucedida, é uma boa iniciativa para reduzir os custos de transação no mercado, tornar mais ágil o atendimento da demanda contratual quando for o caso e evitar-se o litígio. A autarquia está normatizando a NIP precisamente porque o projeto-piloto implantado há mais de um ano mostrou resultados positivos” (Palavras de Márcio Coriolano da Fenaseg. ) (Fonte: Revista Apólice ano 15, número 141, julho/2010). 286 Congresso de 2001 - “Estratégias para o crescimento sustentado” - Realização Abramge em 22 e 23 de novembro de 2001 - Hotel Inter-Continental - Rio de Janeiro - RJ.

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1) Desenvolver produtos para a população de renda mais abaixo daquela a que estamos acostumados a operar como planos de saúde e ir atrás de outras questões; 2) Como fornecer mais cuidados à saúde para o máximo de pessoas possíveis? 3) Como financiar o Sistema? 4) Quem ganha com a saúde? a) a indústria farmacêutica? b) é a indústria do fumo? c) São as seguradoras? d) São as operadoras? e) Outros? 5) Como estabelecer diretrizes e controle? 6) Qual a melhor forma de gestão? 7) O mercado de mais de 100 milhões de pessoas no Brasil existe de fato? 8) O capitation seria uma alternativa? 9) Será possível atender as pequenas, micro e médias empresas de até no mínimo, por exemplo, 5 funcionários? 10) Será possível um multi-patrocínio para saúde dos trabalhadores de pequenas empresas? Dados e reflexões

O setor saúde representa atualmente no Brasil em torno de pouco mais de 7% do PIB e gera dois milhões de empregos diretos e outros cinco milhões, indiretos. A previsão orçamentária para o setor em 2006, segundo dados do Ministério da Saúde / IPEA / Abramge /Fenaseg de março desse ano, foi de um total de R$ 136 bilhões, assim divididos: R$ 35 bilhões para o sistema suplementar; R$ 43 bilhões para o SUS/MS; R$ 20 bilhões para o SUS/Estaduais; R$ 19 bilhões para o SUS/Municipais e outros R$ 19 bilhões para gastos pessoais. Os dados atuais, do CNS, e agosto de 2011, informam que: os serviços de saúde no Brasil, cadastrados no MS, municipais são 63.043, estaduais 2.640, federais 264 e privados 170.279, ou seja, resumindo, o total de públicos é 65.947 e o de privados 170.279.

Quanto a leitos hospitalares no Brasil, os dados do CNS de agosto/2011, informam que existem para Cirurgia do SUS 76.180 leitos e não SUS 41.126; quanto a clínica geral 83.148 do SUS e 31.698 não SUS; quanto a Psiquiatria 38.228 do SUS e 10.674 não SUS; de Pediatria 50.178 são do SUS e 11.740 não SUS; para Obstetrícia do SUS 45.064 do SUS e não SUS 14.260. Há ainda outros, de caráter geral, do SUS 50.080 do SUS e 13.372 não SUS. Em resumo, há 342.878 de leitos do SUS e 122.870 do não SUS, fornecendo um total de 465.748 leitos entre SUS e não SUS.

Dados da OMS (WHO), revelam que enquanto no Brasil em 2004, gastou-se US$ 256 per capita com saúde, a Argentina, investiu US$ 352; o Canadá, US$ 2.992; os

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Estados Unidos US$ 6.103 e a França, US$ 3.359. Em 2005, enquanto o Brasil teve um orçamento de R$ 121 bilhões de reais, cerca de US$ 52 bilhões, nos EUA a verba para a área foi de US$ 1 trilhão e 800 bilhões. (Amorim, 2006). Com relação aos serviços de saúde cadastrados no MS, tínhamos em 2006 um total de 80.120 privados; 50.570 municipais; 2.169 estaduais e apenas 211 federais, de acordo com os dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), divulgados em junho de 2006. Em resumo, dispomos de um total de 51.950 serviços públicos de saúde no Brasil frente a 80.120 privados, totalizando 133.070 serviços do gênero no país. 287 (Amorim, 2006). Uma pesquisa realizada pelo IBGE/MS, e divulgada em março de 2005, revelou que o SUS realizou quase 12 milhões de internações; mais de 2 milhões e 400 mil partos; 40.496 transplantes; quase 9 milhões de sessões de terapias renais substitutivas; mais de 1 trilhão de procedimentos ambulatoriais e quase 350 mil exames laboratoriais. Segundo pesquisa feita pela Abramge/Unimeds/Fenaseg, referente aos procedimentos realizados em 2005 pelo sistema suplementar, foram registrados 154 milhões de consultas médicas; 4,93 milhões de internações e 258 milhões de exames complementares/procedimentos. 288 São dados que mostram a evolução do privado em relação ao público e que podem ser compartilhados no futuro. Fazendo-se uma retrospectiva das avaliações Público/Privado na Saúde, com base em Massaro (2001), da Stra Consultores, sabe-se que na mesa redonda “Saúde Brasil - 1999” 289 já se discutia essa idéia de compartilhar o público e o privado. Seguem abaixo, frases que fizeram parte das palestras sobre o assunto. “...a única maneira de se conseguir progresso relevante na área de saúde é criar incentivos para o setor privado fazer a maior parte do trabalho ...” “definir o pacote mínimo de serviços, que a partir dos recursos disponíveis, possam atingir qualidade e confiança...” “Definir as funções do Estado e do setor Privado, mudando, se for necessário, provisões constitucionais para a viabilização de novas estruturas...” “Definir os critérios pelos quais a população será dividida de acordo com sua capacidade de pagamento, para ajudar a direcionar o gasto público” “... Estabelecer as relações funcionais entre os setores público e privado, as quais poderão incluir mais contratos com o setor privado, para prestar serviços de melhor qualidade dentro do sistema público...

287 Segundo o CNES, do total de 6.474 hospitais hoje no Brasil, 70% deles são privados; 21% são municipais; 8% estaduais e apenas 1% federais. Após todos os percalços enfrentados em seu processo de implantação, o SUS dispõe atualmente de mais de 5.800 hospitais credenciados no Brasil, entre públicos e privados, com e sem fins lucrativos, que juntos respondem por um total de cerca de 400 mil leitos. (Amorim, 2006). 288 Os dados do INEP de junho de 2006 revela que existem 163 faculdades de Medicina no país; 552 faculdades de Enfermagem; 93 cursos de Administração em Serviços de Saúde e 610 cursos de Pós-Graduação em Saúde. (Amorim, 2006). 289 César Massaro pertence a Stra Consultores e escreve sobre assuntos de Saúde. Revista Medicina Social de Grupo - out/nov/dez/2001 - pág. 01.

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“... Criar incentivos para a expansão do setor privado, fornecendo aqueles que podem pagar a oportunidade de uma opção fora do sistema público e alocando parte de suas contribuições de impostos para um fundo solidário de assistência àqueles de menos posses...” “... Continuar o processo de descentralização com a implementação de instrumentos apropriados de gerenciamento e, se necessário, novas instituições para assistir na criação, gerenciamento e avaliação de projetos...” “... implementar um processo competitivo de licitação pelo qual o governo possa reduzir custos...” “... integrar as organizações filantrópicas e as ONG’S no processo de reforma...” “... a crescente participação do setor privado trouxe a visão de negócios para a saúde e, sem dúvida, possibilitou avanços importantes...” O entrave está - como já discutido - nos procedimentos de alta complexidade que aumentam os riscos das operadoras. Mesmo sem uma precisão técnica, há um consenso de que esses procedimentos apresentam custo elevado, condutas e equipamentos cuja operacionalidade é específica. No 6.° Simpósio de operadoras de assist ência à saúde290 a médica nefrologista do Hospital Osvaldo Cruz, gerente comercial e membro do comitê de relação com fontes pagadoras da ANAHP,291 examinando o relacionamento comercial entre hospitais e operadoras, afirmou que: “o maior custo do atendimento hospitalar é a sua má hospitalização. Fora isso, alta complexidade e permanência elevada, ou os dois, são os responsáveis pelos altos custos”. Não há uma fórmula que defina o valor que cada sociedade deve gastar para ter um atendimento de saúde de qualidade. As despesas dependem do modelo definido e da capacidade de administrar a estrutura de saúde. Há ainda um vazio nos sistemas. A Constituição diz que o atendimento gratuito tem de ser universal, mas os sucessivos governos não foram capazes de criar meios de fazer a lei valer. A revista Exame em edição especial sobre a Saúde brasileira, diz que, através das palavras de Carlos Alberto Suslik: “A primeira providência de uma reforma séria é encarar o fato de que não é possível dar tudo a todos.”. 292

290 Promovido pela Abramge - Associação Brasileira das empresas de Medicina de Grupo. 291 Associação Nacional dos Hospitais Privados. 292 Revista Exame – página 174 – Especial de Saúde – Palavras de Carlos Alberto Suslik. São perguntas obrigatórias: até que estágio de cada doença devemos investir em tratamento

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As empresas operadoras de prestação de serviços na saúde privada têm fins lucrativos e, como tal, buscam minimizar os custos e maximizar os ganhos. Assim, historicamente as operadoras têm procurado fornecer serviços à população de baixo risco e deixar a clientela de alto risco sem cobertura, dependentes do SUS. Isso era mais evidente antes da lei 9656/98, quando os segurados que sofriam de enfermidades crônicas ou de alto custo - alta complexidade - como as doenças mentais e muitas outras enfermidades de tratamentos considerados dispendiosos eram excluídos dos planos de saúde. A alta complexidade envolve patentes, profissionais altamente técnicos, equipamentos de ponta em termos de tecnologia, medicamentos caros, itens esses que têm grande ligação com valores em dólares, yens ou moeda européia.293 Diz-se que o procedimento, ao tornar-se rotineiro, deixa de ser de alta complexidade, ou seja, sai da lista da ANS. Isso é relativo e pode ser perfeitamente determinado como outros temas controversos e que estão na regulação da ANS. Tome-se, como exemplo, o agravo e as doenças pré-existentes. É controverso porque algumas operadoras consideram procedimentos que se tornaram rotineiros como de alta complexidade. Tais fatos não devem ser considerados como complicador, desde que sejam efetuados protocolos de trabalho para cada tipo de procedimento e definido seu tempo de complexidade. Há bastante discussão a respeito disso que findará quando os procedimentos de alta complexidade forem anualmente revistos em sua lista, da qual sairão alguns procedimentos e entrarão outros em vista dos avanços tecnológicos. Nada impossível de ser gerenciado. As demandas por informações de saúde cresceram nos últimos anos. Através da ANS, o governo passou a assumir, com mais ênfase, seu papel de regulador do processo e as operadoras passaram a ser obrigadas a enviar os cadastros de usuários e a catalogar procedimentos para conseguir uma base estatística294do setor dentro de suas classificações. No caso de um plano individual/familiar, o mesmo conduz a valores maiores, uma vez que não há grande diluição do risco: experience ratio. Da mesma forma, os prêmios dos planos coletivos por adesão podem se aproximar dos individuais/familiares, por motivos de fraude ou de uma natural anti-seleção de risco 295, ou seja, a natureza dos planos fora dos planos empresariais é de difícil administração e de alta concentração de risco.

293 Artigo de Eleonora D’Orsi - Biblioteca da ANS - “Doenças e lesões pré-existentes e alta complexidade: situação atual e papel da ANS 294 Nessa fase, foi necessário conhecer e analisar algumas formas de contratação e, assim, ter referências para propor medidas e alterações. Sabendo como elas funcionam maior será o esclarecimento para entender a proposição da implementação do capitation. Ele pode ser considerado como um community ratio.

295 Fenômeno que ocorre quando há a inclusão de pessoas com doenças pré-existentes ou na iminência de uma internação hospitalar.

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Já nos planos empresariais, ou seja, quando existe a empresa no meio da contratação, que é a proposição do capitation, há uma maior diluição do risco, pois há uma massa grande de empregados que poderão ser de várias empresas (PMEs) com seus dependentes, e as empresas, como já acontece atualmente, procurarão sempre educar e controlar a utilização. O controle não abusivo e desnecessário dos procedimentos é fator fundamental na economia para a saúde em geral, tanto nas privadas, em que há maior controle, como no SUS, mas é difícil o controle. Como já acontece, fatores moderadores serão necessários para que não haja abusos na utilização, sem critérios do plano de assistência médica para os usuários das empresas. Dentro dos formatos de gestão privados, podem estar previstas, por exemplo, premiações aos usuários por bons resultados na utilização, descontos nas mensalidades e outras promoções.

Um controle adequado poderá até gerar bônus nas novas contratações futuras - renovações de apólices. Todas essas premissas são fundamentais e, à medida que o capitation possa ser aplicado para as pequenas, micro e médias empresas, isso trará grandes benefícios sob a forma preventiva e educativa, conseqüentemente ao SUS e ao Estado. No aspecto de utilização, as empresas que possuem serviço próprio, principalmente as medicinas e odontologias de grupo, ou seja, donas dos próprios hospitais, ambulatórios, leitos, exames diagnósticos, tendem a ter os valores de prêmios menores, pois são prestadores e o pagadores dos serviços. As segmentações assistenciais estão devidamente atreladas aos preços dos prêmios, e a abrangência geográfica é fator importante na precificação. Obviamente, um plano que tenha abrangência em todo o Brasil deverá custar mais caro do que um plano que só possa ser utilizado no Estado de Minas Gerais, por exemplo. No caso do capitation as aplicações sempre seriam regionais. No INSS, quanto aos descontos em folhas de pagamento, deveriam ser previstos, também como proposta deste trabalho, algum desconto para quem tem plano particular. Isso poderia ser resolvido com um Cadastro Único de Saúde para todos os brasileiros. Seria como um CPF de saúde. Tal número de registro geral já está em andamento. 296 De 2002 em diante houve um controle regulatório muito forte da ANS com relação às empresas que operam no setor privado de saúde. Até bem pouco tempo, não havia estatísticas sobre esse setor, mas atualmente já se apuram dados que em breve futuro serão importantes para a tomada de decisões.297

296 A nova carteira de identidade, chamada de RIC (Registro de Identidade Civil), passará a ser emitida com chip em novembro deste ano. O documento reunirá em uma única carteira o RG, o CPF e o título de eleitor. A Receita Federal determinou ainda regras para facilitar a obtenção imediata do CPF. Com formato semelhante ao do cartão de crédito, o RIC terá foto, impressão digital, assinatura do portador, código e um número de dez dígitos com um dígito verificador que será registrado numa central nacional de dados, controlada pelo Ministério da Justiça. 297 Há algumas: 22% das queixas no Idec eram contra Operadoras de Saúde. No ano de 2009 as reclamações aumentaram 54,23% . Em 2009 foram 7.656 denúncias contra 4.964 em 2008. É a intermediação feita pela ANS – pela NIP – Notificação de Investigação Preliminar já comentada. Pelo novo sistema, as companhias notificadas terão cinco dias úteis para responder. Caso contrário, a ANS – abrirá processos que podem resultar em multas de até R$ 800 mil. Para se livrar da penalidade, as operadoras podem voltar atrás na decisão de negar os procedimentos e atender o paciente ou usuário. O diretor de Fiscalização da ANS, Leandro Reis Tavares, destacou que o sistema é testado como

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Não há dúvidas: a saída é justamente o que as companhias já estão fazendo. Investir em contratos coletivos, buscar quantidade de clientes e atrair a confiança das empresas e de seus funcionários. O capitation só vem favorecer essa política de negócios. Do lado da informação, os hospitais privados, até bem pouco tempo - isentos de encaminhar dados - com exceção das doenças de notificação compulsória - ao gestor local do SUS, passaram a enviar, desde agosto de 1999, a CIH - Comunicação de Internação Hospitalar. Na medida em que cresce a quantidade de informação em saúde, expande-se também a possibilidade de avaliação da qualidade da assistência na área privada e seu constante aprimoramento e evolução. O processo de desenvolvimento está aí, diante de nós, e tende, cada vez mais, a proporcionar maior controle no sentido de diminuir despesas e aumentar a base de atendimento. É o caso, por exemplo, de empresas que vendem o serviço de Home Care. Atualmente, existem nos EUA mais de 20.000 organizações de Home-Care e, em 2007, a quantidade de pessoas atendidas nesse sistema chegou a mais de 7 milhões. A queda nos custos pode variar entre 20% a 60%, conforme a enfermidade. 298 No Brasil, os dados não são oficiais, mas estima-se que existam mais de 80 empresas de Home-Care. Será preciso, brevemente, criar associações dessas empresas, pois muitas delas ainda só fazem tratamentos geriátricos e outras só cuidam de pacientes com pneumopatias e cardíacos. Talvez, o Home-Care poderá ser, em breve futuro, uma forma de desafogar os leitos hospitalares. Tudo começou com um plano denominado Referência, que foi o principal instrumento para controlar o pólo assistencial privado. O Plano Referência, como conceito de plano de assistência integral à saúde, passou a ser o único modelo aprovado para comercialização de mínima cobertura de procedimentos, sendo proibida a redução ou exclusão de coberturas assistenciais previstas em Lei. Mesmo a permissão de comercialização de planos exclusivamente ambulatoriais ou hospitalares não abdicava da cobertura integral no segmento 299. Legislações posteriores complementares à lei 9656/98 e normativas causaram grandes alterações em toda a estrutura já existente dos planos privados de assistência à saúde. De um lado, regulavam as operadoras já definidas, mas por outro traziam muitas dificuldades de adaptação e incertezas às empresas do setor. No entendimento dos representantes do setor de planos de saúde essa ebulição regulatória de adaptações e conjuntura de baixo crescimento econômico levou as empresas privadas - muitas delas pequenas e médias - a consideráveis esforços para atender às regras mutantes. Ainda hoje, desviam recursos que deveriam ser destinados ao gerenciamento de custos operacionais e atendimento aos usuários para projeto piloto desde 2008. Nesse período, 56% das reclamações foram solucionadas. (Diário de S.Paulo, sexta feira, 13 de agosto de 2010). 298- Fonte: História do Home-Care - http://www.portalhomecare.com.br/pagina.php?pagina=6 - acessado em 04/02/2006. 299 Evolução e Desafios da Regulação do Setor de Saúde Suplementar - Série ANS - 4 - Rio de Janeiro - RJ. p. 13.

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um monitoramento administrativo e de controle para atender às inúmeras exigências da ANS, com a implantação de cadastros eficientes, relatórios estatísticos, contábeis, atuariais e toda a sorte de controles, inclusive para o combate à fraude300. Em um segundo momento foi criada a ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária e a ANA – Agência Nacional de Água, a ANTT – Agência Nacional de Transportes Terrestres, a ANTAQ – Agência Nacional de Transportes Aquaviários, ANCINE – Agência Nacional de Cinema e a ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil. A cronologia é a que segue.301

ANEEL – criada pela Lei 9.427 de 26/12/1996

ANATEL – criada pela Lei 9.472 de 16/07/1997

ANP – criada pela Lei 9.478 de 06/08/1997

ANVISA – criada pela Lei 9.782 de 26/01/1999

ANS – criada pela Lei 9961 de 28/01/2000

ANA – criada pela Lei 9.984 de 17/07/2000

ANTT – criada pela Lei 10.233 de 06/06/2001

ANTAQ – criada pela MP-2228 de 06/09/2001

ANAC – criada pela Lei 11.182 de 27/09/2005.

Arlindo de Almeida, presidente da Associação das Empresas de Medicina de Grupo (Abramge) já dizia em 1999 que: “... neste contexto a nossa atividade - a medicina de grupo - terá de confrontar-se com prováveis gigantes da área econômica, tanto na de operadores de planos de saúde, como de seguradoras, algumas delas advindas de outros países...”. Na visão de periódicos representativos do setor, nessa medida, mesmo que se dê às autoridades governamentais o crédito da boa-fé e do seu empenho em acertar nas suas normativas, visando regulamentar um setor extremamente heterogêneo, a verdade é que se nota pouca experiência e condição de compreender a realidade nacional e, em especial, as peculiaridades que caracterizam o mercado operador de planos e seguros privados de saúde no Brasil 302. (Lima, 1999). O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), ao analisar detalhadamente treze contratos de - Plano Referência - de empresas de planos e seguros-saúde bastante conhecidas, lançados no mercado logo após 2000 – por exemplo - portanto logo após a lei, constatou que os textos eram confusos, além de conter abusos contratuais, semelhantes aos encontrados nos contratos antigos, ou seja, antes da lei 9656/98 303. Discussões legais entre operadoras e o próprio governo, via ANS, foram invocadas no

300 Horácio L.N. Cata Preta - p. xiii - do Prefácio de Cláudio R. Contador - Diretor Executivo da Funenseg. 301 O PROCON/SP tornou-se a Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor. Lei Estadual 9.192 de 23/11/1995.

302 Revista Medicina Social - número 152 - janeiro/1999 - Artigo de Dagoberto J.S. Lima. 303 Idec - Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor - Guia do Consumidor - São Paulo, 2000, p. 3.

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Supremo Tribunal Federal (STF - ADIN-1931)304 durante vários anos até que o Judiciário considerou legal a não obrigatoriedade de os planos antigos - de antes da lei 9656/98 - serem adaptados à nova lei. Tal fato criou uma dicotomia na legislação que rege os planos privados de assistência à saúde entre os contratos assinados antes de janeiro de 1999 e aqueles que foram assinados após esse ano. A análise das informações econômico-financeiras fornecidas por 1514 administradoras de planos de saúde - operadoras - à ANS, no ano de 2002, mostrava que, até setembro, 314 delas operavam no vermelho e outras 145 estavam com patrimônio líquido negativo. Ou seja, 30% das operadoras atravessavam dificuldades financeiras. Em um setor que faturava cerca de 26,4 bilhões anuais no Brasil, esses focos de infecção financeira recomendam cuidado aos usuários, que somavam, nessa época, 34,5 milhões305.306 Os aumentos de preços dos contratos antigos, a recessão e o desemprego após esse período fizeram com que o mercado perdesse, de 2001 até 2004, quase seis milhões de usuários. Outra observação interessante é analisar a concentração de beneficiários em relação a quantidade de Operadoras – vide tabela XIV - do sistema privado de Saúde Suplementar. Percebe-se que mais de 50% dos usuários concentram-se em aproximadamente 50 Operadoras de Serviços de Medicina de Grupo. Por outro lado, empresas pequenas, ou seja, com 2.000 usuários até 10.000, são mais de 2.000 empresas. Ou seja, há grande perigo de cartelização embora todo o cuidado da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar. Tabela V

Distribuição de Operadoras // População de Benefici ários Ativos

Quantidade de Quantidade de % Quantidade de %

Beneficiários Operadoras Beneficiários

acima de 500.000 5 0,29 6.020.195 20,84

100.001a 500.000 47 2,68 9.117.539 31,56

50.001 a 100.000 58 3,31 3.937.215 13,63

10.001 a 50.000 312 17,79 6.719.793 23,56

2.001 a 10.000 536 30,56 2.555.731 8,85

Até 2.000 796 45,38 541.280 1,87

Fonte: Abramge - Associação Brasileira de Medicina de Grupo – 2004 Sem perda de qualidade, a ANS deve – constantemente - encontrar formas não onerosas de controlar as pequenas e médias empresas de prestação de serviços na

304ADIN - Ação Direta de Inconstitucionalidade no STF. 305 Dados da Folha Dinheiro, 03 de fevereiro de 2003, p.B1- Jornal Folha de São Paulo. 306 Segundo a fonte – ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar – o sistema privado está atualmente, em 2009 com 46 milhões de usuários, considerando-se os planos odontológicos, que estão por volta de 10 milhões.

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saúde, pois do contrário, o controle governamental funciona como elemento de concentração do segmento. Nos últimos anos, passando pelas dificuldades econômicas que conhecemos, o setor iniciou um processo de cortes de despesas e, com isso, as irregularidades também foram mostrando o seu lado perverso, qual seja, recusas de atendimento e reajustes ilegais de mensalidades. Como exemplo, temos o caso da Unimed - São Paulo, com dívidas, na época, de 13,3 milhões no mercado e atrasos nos pagamentos a hospitais e laboratórios 307 . Por outro lado, o governo destaca que “... no passado essas empresas ganharam muito com os reajustes de preços e agora as regras mudaram e elas deverão se adaptar...” 308. Tornou-se necessário, portanto, encontrar novos caminhos de trabalho e criatividade para que essa base quantitativa de pessoas que possuíam um plano de saúde não fosse perdida, o que se tornou um desafio para o setor. Um desses caminhos dizia respeito à busca de definições para cada tipo de procedimento médico. Destacamos aqui aqueles que podem causar grandes perdas às operadoras, tais como transplantes em geral e utilização de equipamentos cuja operação eleva excessivamente os custos de assistência médica, como tomografia computadorizada, e que são definidos na legislação própria como de alta complexidade. Gastar melhor também requer mudança na maneira de remunerar os prestadores de serviços. “É preciso mirar o resultado, não o procedimento”, afirma Cláudio Lottenberg, presidente do Hospital Albert Einstein, de São Paulo. 309 Como se verá mais adiante, detalhamentos da Alta Complexidade são passíveis de formatação técnica em termos de procedimentos e custos, o que tem sido denominado protocolos de procedimentos. Inclusive, as prováveis intercorrências e seus custos são previsíveis, tornando de extrema dificuldade, portanto, fraudar esses procedimentos. Considerando tal situação técnica e de custos, torna-se viável compartilhar os riscos das situações de Alta Complexidade entre governo - via ANS, Sistema Único de Saúde (SUS) e Ministério da Saúde - e operadoras, no sentido de diminuir as possibilidades de perdas financeiras das pequenas empresas que trabalham com saúde e com isso criar mais empregos, aumentar o volume de impostos e principalmente - a médio prazo - desafogar o SUS. De fato, uma operadora que detém em sua carteira apenas alguns milhares de usuários poderá comprometer perigosamente seus resultados e até mesmo falir se tiver de arcar com custos inesperados de Alta Complexidade de alguns poucos transplantados, por exemplo.

307 Isto é Dinheiro / 170, 29/11/2000. 308 Palavras do Diretor da ANS, João Barroca no artigo: A Saúde na UTI - Guerra entre governo e operadoras de planos de saúde. Risco de colapso para o setor, Folha de S. Paulo, 29/11/2000. 309 Hoje, tanto os planos particulares quanto o SUS remuneram cada procedimento realizado, não o resultado do atendimento. Portanto, quanto mais exames um laboratório fizer, mais ele receberá. Esse modelo estimula o desperdício, diz Lottenberg. Uma mudança exige, sobretudo, eficiência de gestão tanto da operação quanto das informações dos pacientes. (Revista Exame Nov\09 – pag. 176).

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Tabela VI Concentração de Beneficiários por Operadora (2001)

Número de

Operadoras / Número de Usuários /

1728 \\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\- 27.473.258 (100%)

435 \\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\- 24.725.847 (90%)

231 \\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\- 21,877,434 (80,02%)

133 \\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\- 19.256.073 (70,05%)

78 \\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\- 16.502.087 (60,02%)

45 \\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\- 13.794.390 (50,01%)

25 \\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\- 11.148.683 (40,49%)

12 \\\\\\\\\\\\\\\\\\- 8.280.859 (31,12%)

6 \\\\\\\\\\\\\\\- 5.981.250 (21,63%)

2 \\\\\\\\\- 3.416.657 (12,19%)

Fonte: 310 - ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar - 2001

Esses procedimentos – de Alta Complexidade - representam em torno de 1% dos custos hospitalares311, mas, para pequenas empresas do setor, se o risco atuarial for quase simultâneo, podem levar ao desastre financeiro. São procedimentos médicos e hospitalares que, não raramente, trazem contingências no tratamento e que exigem equipamentos de alta tecnologia e alto custo na sua utilização, além de atendimento por profissionais preparadíssimos. 312 310 Fonte: ANS - “Integração do Setor de Saúde Suplementar ao Sistema de Saúde Brasileiro” - Januário Montone - Presidente da ANS / RJ / julho de 2001 - Palestra proferida no Conselho Nacional de Saúde.

311 Percentual que faz parte do Anuário Qüinqüenal do Ministério da Previdência e Assistência Social de Média e Alta Complexidade - anos de 1995 a 2000 do Ministério da Saúde. ISBN 85-334-0494-8 - 500 páginas - Secretaria de Assistência à Saúde - Brasília - Ministério da Saúde - ano 2001. 312 A análise de utilização mostra que pequena queda na freqüência de consultas realizadas. Entre 2005 e 2007 houve uma redução de 2,8% passando de 5,3 consultas por beneficiário para 5,15 (Jornal Atuar – IBA – Julho/

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E não se pode esquecer que a grande maioria das operadoras de assistência médica não se compara aos gigantes do setor e que administram carteiras de clientes com rede credenciada de pequenos hospitais no interior, sendo que situações idênticas acontecem pelos estados brasileiros. A Alta Complexidade, que tem sua cobertura assegurada pela lei, representa, portanto, um perigo constante para suas operações. Na medida em que os riscos das operadoras menores aumentam em vista de procedimentos de Alta Complexidade, o crescimento do setor fica impossibilitado e comprometido, pois, como mostra a Tabela VI acima, apenas 50 empresas operadoras - respondem por 50% dos usuários tendo os mesmos riscos - em função da lei - do que os pequenos do setor 313.

No Brasil, dentre as grandes oportunidades que o governo oferece às entidades privadas, destaca-se as parcerias público-privadas propostas com grande alarde nos anos de 2005 e 2006. Não é tudo tão simples quanto parece: há relações muito próximas e que se fundem naquilo que muitos chamam de simples estatismo e privatismo. No caso das relações da Saúde Pública com a Privada os entrelaçamentos são complexos e entranhados há décadas no contexto da saúde geral.

Trata-se de um contexto social, econômico e político em que acontecem as práticas dos serviços de saúde, sejam públicos ou privados. Como é feito tudo isso? Como é que se produzem esses serviços e produtos? Quem está envolvido? Há muitas parcerias? Quem tem interesses no âmbito de pequenas ou macro empresas?

Não se trata apenas de parcerias, mas de produção de serviços na saúde que – muitas das vezes – dependem dos hospitais e agentes privados. As reformas políticas envolveram nossa atualidade em empresas de telefonia privada com controle da Anatel; passaram por privatizações com controle – no caso da eletricidade – da Eletrobrás e outros exemplos podem ser dados. Eram setores considerados estratégicos para todos os governos até a década de 90. Na área de Saúde, atualmente temos uma dualidade ou mix.

Há o sistema público com redes de hospitais, leitos, ambulatórios, medicamentos, centros de diagnósticos, internações que deveriam atender os mais de 145 milhões de brasileiros e de outro lado um sistema privado, sem haver privatizações ou favores diretos – pelo menos na atualidade - e que atende aproximadamente 45 milhões de pessoas. Como favores diretos entenda-se, nunca houve privatização de nenhuma entidade de saúde ou hospital – ou estatização.

Como veremos adiante, historicamente, a prestação de serviços na saúde no Brasil passou por grande crescimento e total liberdade de coberturas e de preços até 1998. Daí em diante, a atividade - após anos de adaptações e ajustes - tornou-se um apêndice empresarial de saúde suplementar de grande experiência e desenvolvimento. Tal situação, então, sob a égide da Superintendência dos Seguros

Ago/2007 – Ano XII – número 86).

313 Tabela XV- Concentração de Beneficiários por Operadora.

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Privados (Susep) e posteriormente da ANS, justifica os debates surgidos envolvendo os entes que participam de toda essa hierarquia empresarial e pública. Os atores envolvidos em uma hierarquia primária são as empresas de assistência médica e as operadoras de saúde, envolvendo também as odontológicas, o MTPS, a ANS e o SUS. Os atores envolvidos numa hierarquia secundária são quaisquer empresas micro, pequenas ou médias e associações que desejam ter um plano coletivo de saúde, os hospitais, as clínicas, consultórios e os profissionais da medicina em geral. Os números mostram que houve crescimento expressivo até 1998, sendo que milhares de empresas vendiam planos de saúde com as mais variadas coberturas ambulatoriais e hospitalares. Até o advento da lei 9656/98, o número de instituições cadastradas como empresas operadoras no ramo de saúde era de 2700, aproximadamente 314. Atualmente, em 2011, estão por volta de 1400 operadoras, abrangendo em torno de 45 milhões de consumidores, sendo 37,9 milhões de planos médico-hospitalares e 9,4 milhões de planos odontológicos.315 Há, ainda, aqueles titulares que detêm planos em suas regiões para consultas e outros procedimentos simples, mas são também titulares de planos mais completos em regiões como a sudeste, para eventuais situações mais complexas de atendimento e cirurgias. O que mais chama a atenção no que diz respeito ao papel atual da ANS é a quantidade de titulares de planos. São números discutíveis que merecem análise mais profunda, pois parecem reduzidos em se tratando de uma agência nacional. Somente a leitura real desses dados justificaria uma discussão mais pormenorizada a respeito. Dados atuais, de pesquisas efetuadas pelo IBGE mostram que 24,5% dos brasileiros eram adquirentes de planos de saúde 316, movimentando anualmente 20 bilhões de reais 317, serviços esses que, atualmente, respondem por quase 2% do PIB brasileiro 318. Atualmente, o número de usuários de planos de saúde chegou a 52 milhões em 2010. O montante - revela o estudo - “Quem é Quem no Mercado de Saúde no Brasil” organizado pela Austin Asis, 319 (2010) representa aproximadamente 30% da população brasileira.

De acordo com o estudo, os planos coletivos foram um dos grandes responsáveis pelo número expressivo, já que passaram de 12 milhões de beneficiários em 2001 para quase 40 milhões em junho de 2008. Dentre os motivos para a evolução, está o bom desempenho econômico, especialmente a evolução do emprego formal. No geral,

314 Site da Abramge - ano de 2005 - acessado em 20/05/2005. 315 Fonte: Caderno de informações da Saúde Suplementar – ANS/Dez/2008 316 PNAD - Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio (1998 p.20) - IBGE - no qual se estima que 38,7 milhões de brasileiros cobertos por pelo menos um Plano de Saúde (...) destes 29 milhões vinculados a planos de saúde privados e 9,7 milhões vinculados a planos de institutos ou instituição patronal de assistência ao servidor público civil ou militar. 317Globo.com. Saúde, in: Clipping sobre Planos de Saúde - acessado na edição de 26/12/2000. 318 Jornal Valor Econômico (31/03/2001) - Pib brasileiro corresponde a R$ 1.089,7 trilhões, o equivalente a US$ 595 bilhões. 319 Fonte: Austin Asis – 01/03/2010 – http://ricardomontu.wordpress.com/2010/03/01/ (acessado em 04/07/2011).

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ainda conforme o levantamento da Austin, 59% dos beneficiários estão concentrados nas modalidades de Medicina de Grupo e Cooperativas médicas, que respondem por 17 milhões e 14 milhões de usuários, respectivamente.

A Odontologia em grupo, 6,8 milhões de clientes, e as seguradoras especializadas em saúde, com 6,2 milhões de beneficiários, vêm em seguida. No que diz respeito ao número de operadoras, a divisão é a seguinte: 445 estão no setor de Medicina de Grupo, 338 atuam em Cooperativas médicas, 275 em Odontologia de grupo e 13 são Seguradoras especializadas. Existem ainda as filantrópicas.320

Não é um número representativo de grande valor social, pois, nos Estados Unidos, cujos serviços em saúde são ruins - por exemplo, os dados levantados em saúde respondem por quase 15% do PIB e o povo pobre americano não tem um sistema - nem de longe – estruturalmente parecido com o SUS. Não se trata de comparar esses países, pois as discrepâncias econômicas e sociais entre eles são muito grandes; todavia, esse percentual justifica, em uma rápida correlação, o quanto será necessário ainda desenvolver a atividade de prestação de serviços de saúde no Brasil, observando os números apresentados atualmente, pois, com esses dados, percebe-se o tamanho do espaço a ser ocupado pelo poder público ou pelo privado. O crescimento setorial permitiu uma forte expansão e progresso de empresas operadoras especializadas em odontologia, atraindo, inclusive novos investidores, mediante processos de abertura de capital e venda de ações ao público na Bovespa. Contudo, dentro do atual cenário econômico e dependência da expansão e comercialização de contratos coletivos empresariais, a assistência médica não consegue enxergar com o mesmo otimismo o seu horizonte de crescimento de apenas 19% nos últimos sete anos. (Amorim, 2008). Há muito que evoluir na prestação de serviços à saúde. Ao longo dos últimos cinqüenta anos, dentre as políticas setoriais no Brasil, a preocupação com esse setor foi um dos pilares de reivindicações junto aos governos devido às necessidades da população e aos interesses envolvidos. Daí as constantes inovações e adaptações. 321 Apesar das colocações conflitantes e dos problemas existentes, as companhias

320 Fonte: http://economia.uol.com.br/ultimas-noticias/infomoney/2010/02/26/numero-de-beneficiarios-em-planos-privados-de-saude-chegou-a-52-mi-em-2009.jhtm

321 Há atualmente, o mais moderno conceito de tele assistência (tele care) do mundo: TeleHelp - um serviço exclusivo que funciona através de um aparelho instalado em sua residência e que, com um único toque, solicita auxílio no caso de uma emergência. Além disso, também oferece um botão de emergência pessoal, sem fio e à prova d’água, que pode ser utilizado em forma de colar ou pulseira para que você possa circular por todos os cômodos da casa. Caso necessite de ajuda, basta apertar qualquer um dos botões para avisar a Central de Atendimento 24h, que possui atendentes capacitados que poderão avisar pessoas escolhidas por você e também profissionais especializados. Esse serviço já é utilizado por milhares de pessoas em mais de 19 países no mundo, e a razão é muito simples: com ele você garante a sua independência, sem abrir mão da sua saúde, do seu bem estar e da sua segurança. Você pode ficar sozinho, no conforto de sua casa e, mesmo assim, estar muito bem acompanhado. (Um exemplo é: http://www.helpsaude.com/sobre-Help-Saude/).

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estrangeiras estão interessadas no mercado sul-americano e na renda dos hispânicos. Há cifras para vários produtos, inclusive planos de saúde, para 2010, de um trilhão de dólares322. Autônomos e profissionais liberais devidamente associados a entidades de classes representativas seriam mais um alvo a ser atingido com o objetivo de atender, também, a essas categorias de classes de profissões. Como exemplo, podemos indicar as associações de advogados autônomos, barbeiros, feirantes, contadores, arquitetos, dentistas, entre outras. No caso da prestação de serviços na saúde, justifica-se que o Estado possa ter participação também na saúde privada não só como regulador, mas como facilitador na cristalização de mudanças. O Estado pode ser do tipo empreendedor, ou realizador, ou ainda oferecer o mínimo à saúde suplementar e, com isso, incentivar os mercados. Em parceria com a iniciativa privada, pode desenvolver atividades compartilhadas e, com isso, se solidarizar com a sociedade em trabalhos das mais variadas naturezas. De fato, transformações estruturais estão acontecendo e é necessário considerá-las. O próprio Estado, à medida que as economias se globalizam, também precisa se adaptar às novas realidades, pois não consegue atender às inúmeras atividades da sociedade. No caso da saúde, observa-se também que o contexto global dessa atividade mudou. Nas áreas privadas muitas mudanças aconteceram. Os termos e modismos dessas novas realidades sob o prisma privado são downsizing, reengenharia, entre outros. Parcerias também se tornaram comuns. As transformações acontecem numa velocidade impressionante e os avanços da tecnologia e da informação afetam toda a sociedade. A globalização força os países e as empresas a não parar no tempo e, na área de prestação de serviços na saúde, devemos enfrentar os novos desafios que estão à nossa frente todos os dias. Sempre houve avanço nesse campo no Brasil, e à medida que o Estado atual consiga fazer com que os entes envolvidos participem desse avanço, teremos melhores condições de atender a população como um todo. O Estado deve ser regulador, mas também participativo. Houve um grande esforço também na redução da mortalidade infantil. O nosso país é muito grande e cheio de paradoxos. Temos dados interessantes e que fornece visão otimista do nosso futuro. Apesar de todos os problemas na saúde, o país tem crescido.323 Até 2009, conforme dados do IBGE, a população brasileira quase atingiu 193 milhões de pessoas,324 ficando na quinta posição entre os países chamados de populosos. China, evidentemente, os Estados Unidos, a Indonésia. Houve uma taxa de crescimento, no passado, em torno até de 2,5% ao ano, chegando a 1,69% e atualmente está em torno de 1,5% ao ano. Todos esses fatores nos levaram a um aumento extraordinário na expectativa de vida

322 Revista Exame - número 4 - Edição 837 - março/2005. 323 Aciole – pág. 223. 324 Fonte - Wikipédia

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– “Expectation of life” 325 – que, por volta de 1920 essa expectativa de idade era em torno de 40 e atualmente estamos com 68,3 anos para os homens e 76,38 anos para as mulheres.326 O SUS, nos últimos anos, aumentou o acesso às altas tecnologias para a população e os governos têm dados complicados e preocupantes com relação à distribuição e tratamento de águas e esgotos. Há muito a se fazer principalmente no Norte e Nordeste brasileiro. O mundo está mudando rapidamente. Os conceitos sobre o que acontece em várias atividades também estão sendo alterados e é preciso realocar novas reflexões a respeito. Observem-se as discussões – algumas mais antigas e outras mais recentes - sobre prestação de serviços em saúde apresentadas em simpósios, e que apresentam as necessidades imensas possibilidades de mudanças nesse setor. Um mais antigo: O 6° Simpósio promovido pela Abramge-SP aconteceu em maio de 2003, dias 28, 29 e 30 e promoveu seguidos debates sobre: 1) A Integração do atendimento à saúde entre os setores público e privado com foco na melhoria dos argumentos para legitimar o financiamento das operadoras por um fundo público; 2) O sucesso na parceria entre operadoras e hospitais; 3) A gestão de risco na relação entre operadoras e provedores de serviços; 4) As relações entre vários tipos de prestação de serviços e a importância da TI - Tecnologia de Informação - como ferramenta na relação entre operadoras e prestadores; 5) As perspectivas futuras das relações entre operadoras e prestadores; 6) A participação do setor de saúde suplementar no atendimento à população e suas relações com as políticas de saúde do Estado. A Abramge-SP realizou o seu 7° Simpósio de Planos d e Saúde e a Health Business Fair 2004, nos dias 19 e 20 de maio, tendo por foco vários assuntos da área de prestação de serviços em saúde:327 1) Um deles foi o direito e a obrigação do consumidor - usuários - dos planos de saúde e foi definida como a lei mais extraordinária do século XX, revolucionária pela avançada técnica legislativa e porque acabou influenciando todo o sistema jurídico nacional.328 ; 2) O Estatuto do Idoso329 e as preocupações de caráter geriátrico, além de assuntos relacionados à prevenção; 3) Realinhamento de preços, pois ainda persistem diferenças consideráveis de preços finais nos mesmos procedimentos médicos para diferentes operadoras e hospitais; 4) PROCON; 5) Remuneração médica; 6) Agravo330, franquia, coparticipação do usuário; 7) Aplicações da robotização nas cirurgias por comando de voz. Na medida em que o mercado se concentra em poucas empresas, conforme mostram as Tabelas XIV e XV, pois, tais situações transitam pelo quase monopólio, fazendo com que os preços dos serviços sejam cada vez mais fechados, não permitindo que

325 Trata-se de um cálculo atuarial que soma todos os sobreviventes de uma tábua de mortalidade e divide pelo total inicialmente analisado. É um número que pertence a todas as tábuas. 326 Fonte: IBGE – Já existe em 2010 uma nova tábua de mortalidade da Experiência das Seguradoras Brasileiras. 327 Wilson Gomes no Informe da Revista Medicina Social da Abramge - jul/ago/set/2004 - p. 1 328 Palavras do Desembargador Sérgio Cavalieri Filho no 7°. Simpósio da Abramge. 329 Lei 10741 de 1°/10/2003 - é instituída, fornecendo os direitos das pessoas com mais de 60 anos. 330 Valor que se cobra a mais por detecção de doença pré-existente, ou seja, na aquisição do plano de saúde.

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empresas pequenas ou prestadores de qualidade façam parte das redes credenciadas. Na prestação de serviços em saúde, no entanto, é importante a fragmentação. A legislação complexa, de certa forma, propiciou essa concentração. “A saúde oscila entre esforços de privatização que estão gerando não mais políticas de saúde, mas uma indústria da doença, com controle cada vez mais assumido por empresas financeiras da área de seguros; outros segmentos buscam a racionalidade na descentralização e municipalização, com idéias como o Sistema Único da Saúde (SUS); outras propostas tentam viabilizar um sistema cooperativo; outras resgatam as mais antigas tradições com políticas como o médico da família, por exemplo, e assim por diante...” 331 (Dowbor, 2004). De fato, a maior empresa de saúde privada no Brasil pertence a um grupo financeiro, o Bradesco. Outros grupos, também muito fortes e que dominam quase 50% do mercado de saúde nacional, forçam políticas de baixos preços para os procedimentos médicos, desde consultas até exames diagnósticos, cirurgias e trabalhos periféricos de apoio. Reflexões sobre esses temas já justificam dissertar extensamente sobre eles. Nesses casos é que se justifica a relação entre operadores, médicos e hospitais, a qual deve ser cuidadosamente observada para não se fazer do prestador de serviços à operadora um executor de procedimentos médicos a preços aviltantes. Tal situação é perigosa e por isso preocupante. Aí deve entrar também a ANS, regulando essas relações através de tabelas, análises de custos e pesquisas de mercado. O poder das grandes operadoras pode gerar sérios problemas ao mercado. “Sabe-se que um médico raramente consegue se sustentar hoje se não pertencer a um plano de saúde. Dessa forma, muitas vezes, ele se sente humilhado e inútil em termos de trabalho” 332 (Dowbor, 2004). Uma consulta chega a custar para a operadora entre R$ 25,00 e R$ 30,00, que efetua o pagamento após 30 dias, ou seja, é necessário que a consulta tenha rapidez para sobrar tempo de se fazer outras. Isso foi muito condenado, mas poucas vezes discutido em passado recente. Atualmente, já se trabalha com tabelas que, embora defasadas, dão referências para cobrança. “O corporativismo médico foi desarticulado por esse amplo supermercado da doença que representam os planos privados de saúde, controlados por grandes instituições financeiras, cujo corporativismo é ainda maior”.333 (Dowbor, 2004). Outros aspectos discutidos e que justificam a preocupação com a saúde privada é que as operadoras deveriam se concentrar, também, em planos que sejam mais baratos para conseguir penetrar nas faixas de população de renda mais baixa e nas pequenas empresas com planos coletivos por adesão ou não. Observe-se nos simpósios citados acima que tal discussão já é reinante na atividade da saúde suplementar.

331 Dowbor, 2004, p. 25. 332 Dowbor, 2004, p. 44. 333 Dowbor, 2004, p. 65.

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“É necessário traçar políticas para diminuir as desigualdades e estimular crescimento. É necessário que governo e sociedade não criem um mundo de prosperidade tecnológica acoplada a uma miséria medieval” 334. (Dowbor, 2004). A resultante do trabalho proposto, no caso, deverá conter no futuro um mercado mais fragmentado em número de empresas de saúde para evitar o que mostra a tabela III, ou seja, pouquíssimas empresas operadoras dominam mais de 50% do mercado de saúde suplementar. Não deve ser esquecido o poder que, muitas das vezes, pode suplantar o mercado, e isso na prestação de serviços à saúde não é bem vindo. “Esta concepção acadêmica dos mercados de trabalho tende a ser insuficiente, pois deixa de lado o poder. Presume que os arranjos que resultam são simplesmente o resultado de forças de mercado e não da luta política sobre como as relações de mercado e as que não são do mercado devem se estruturar, e em benefício de quem...” 335 (Kuttner, 1998). “De forma simplificada, mas realista, os novos paradigmas de gestão social que surgem, concentram-se na descentralização e participação”.336 (Dowbor, 2004). De fato, o compartilhamento da saúde suplementar com o SUS vêm ao encontro de políticas sociais mais descentralizadas, porém, tendo o Estado como regulador. O terceiro setor ainda não chegou ao ramo da saúde de forma direta, pois são muitas as entidades sem auxílio governamental, mas, certamente, devido à necessidade e pressão da sociedade, em breve futuro, com auxílio do governo e das entidades privadas, terão início compartilhamentos e serão dados os primeiros passos no sentido de melhorar hospitais e criar até redes pára-hospitalares de atendimento. Hospitais de grupos, como o Nipo-brasileiro e a Beneficência Portuguesa e outros, foram, num certo momento, uma forma indireta de ONGs num passado em que nem se falava em Terceiro Setor. Assim, já se observam entidades de prevenção e combate às drogas, alcoolismo, AIDS, hepatite C, câncer infantil, saúde bucal de crianças, nutrição, atendimento a idosos, pastorais de igrejas e centenas de outras.

Note-se ainda que a ANS regulamentou as operadoras sem diferenciá-las pelo porte, o que em nosso ponto de vista técnico e profissional é injusto. A regulamentação provocou a concentração do segmento, o que prejudica o usuário e cria problemas para o governo no controle de verdadeiros oligopólios.

A alta complexidade e as aproximações público/priva do Se não bastasse, aqueles altos custos, já mencionados na área de Saúde, tais valores e riscos, impedem a entrada de muitas outras operadoras menores que têm interesse

334 Dowbor, 2004, p. 63. 335 Citação de Robert Kuttner no livro “Tudo à Venda: virtudes e limites dos mercados” - São Paulo: Companhia das Letras, 1998, p. 82. 336 Dowbor 2005, p. 85.

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no negócio, conhecem a atividade, desejam ser registradas, mas vivem como clínicas comuns e hospitais menores, atuando apenas como simples prestadores. Outros até hoje permanecem na clandestinidade com seus antigos planos de saúde de antes da lei 9656/98. Não há estimativa a respeito. É nesse aspecto que a ANS e o Ministério da Saúde podem modificar o atual estágio da saúde suplementar. Esse será o ponto principal de análise e reflexão entre o público, o privado e seus agentes num possível compartilhamento. Essa já era a visão do ex-presidente da ANS, Januário Montone, apresentada em seu discurso de julho de 2001, parcialmente citado a seguir: “... é desejo da Diretoria da ANS que o Conselho Nacional de Saúde examine duas proposições: 1.° Aprofundar a discussão sobre a interface SUS - Saúde Suplementar, não apenas a partir do sistema comprador, mas do sistema produtor dos serviços de saúde. A produção de serviços de assistência à saúde em nosso País é essencialmente privada ou pública não estatal. Tanto o SUS como o setor de saúde suplementar compram a maioria dos seus serviços, principalmente os de média e alta complexidade, de prestadores privados ou públicos não estatais. Recente apresentação do INCA337 apontava que 80% dos serviços comprados pelo SUS nesta área são de prestadores privados ou público não estatais. Creio que este é um dos eixos importantes na organização da saúde pública brasileira, envolvendo estratégias de alocação de recursos públicos e privados - para investimento na ampliação e regionalização dos serviços; e ... 2.° Convocar semestralmente a ANS para prestar cont as e debater a evolução da regulamentação do setor de saúde suplementar e sua integração ao SUS” 338. Lamentavelmente, o que se verifica é uma discussão em torno de preços de planos e reajustes, criando pressões entre governo, operadoras, médicos, hospitais e outros atores envolvidos que não levará a uma melhoria dos planos, não aumentará o número de usuários, ficando o consumidor,339 após os inevitáveis reajustes, na mesma situação, embora os mandamentos constitucionais da década de 80. Somem-se a isso as estratégias de marketing das empresas médicas, o interesse das empresas do sistema produtivo no desenvolvimento de formas de assalariamento indireto através da atenção médica e as pressões dos sindicatos mais organizados. Observe-se a grande concentração de Operadoras na Região Sudeste (mais de 50% delas lá estão), enquanto pouquíssimas Instituições têm interesse em desenvolver suas atividades no Norte e Nordeste. Isso vem confirmar a necessidade proposta do

337 Instituto Nacional do Câncer - http://www.inca.gov.br/ 338 Palavras de Januário Montone - Diretor Presidente da ANS - Agência Nacional da Saúde Suplementar - RJ -Palestra proferida no Conselho Nacional de Saúde em julho/2001. Tema: Integração do Setor de Saúde Suplementar ao Sistema de Saúde Brasileiro. Ficha catalográfica: Brasil. Ministério da Saúde. 35 p.il. ISBN-85-334-0374-7 - Série ANS - CDU-614.2 (81), constante do site ANS - www.ans.gov.br (Home Page). pág. 32 339 O Código de Defesa do Consumidor foi materializado pela Lei 8078 de 11/09/1990 e regulado pelo Decreto 2181 de 20/03/1997 e considera o plano de saúde como uma relação de consumo.

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Compartilhamento entre o Público e o Privado nas Altas Complexidades para as empresas menores do setor de Saúde Suplementar. A afirmação de que existem possibilidades de alterações significativas no ramo da assistência à prestação de serviços na saúde suplementar é válida, desde que os rumos sejam de inovações, que, à médio prazo, possam fazer crescer a seguridade do sistema. Tabela VII

Operadoras registradas segundo região e classificaç ão / 2003

Tipo de Operadora Norte Nordeste Sude ste Sul C. Oeste Total

Administradora

de Planos 0 1 6 2 0 9

Administradora

de Serviços 1 4 19 4 1 29

Auto Gestão não

Patrocinada 3 21 70 23 15 132

Auto Gestão Patroc.

Multipatrocinada 1 3 15 10 6 35

Idem / RH 0 0 1 1 1 3

Auto Gestão Patroc.

Singular 0 7 17 2 11 37

Idem/RH 5 5 98 21 9 138

Cooperativa Médica 18 66 183 67 36 370

Coop. Odontológica 6 26 99 30 12 173

Filantropia 2 9 95 19 1 126

Medicina de Grupo 26 100 495 130 39 790

Odontol. de Grupo 8 67 268 86 19 448

Seguradoras Espec.

em Saúde 0 0 13 1 0 14

TOTAL 70 309 1.379 396 150 2.304

Fonte: Cadastro das operadoras - ANS/MS - 03/09/03 Censo demográfico / estimativa 2002 - IBGE340 A situação existente após adaptações da lei que regula o assunto e regulamentações posteriores não deixa aberturas que possam vir a proporcionar novas estratégias comerciais em sua missão de criar situações com o objetivo de aumentar a base da pirâmide no atendimento particular ou privado da assistência à saúde.

340 Nota: Operadoras que não foram descredenciadas continuam registradas.

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Foi necessário, pois, fazer ajustes na lei 9656/98 e não só padronizar procedimentos. Ajustes de conduta, adaptações de contratos antes da Lei e após a Lei, definição de Alta Complexidade, novas carências, doenças pré-existentes, descredenciamento de hospitais e clínicas, abrangências, mudanças de faixas etárias, mudança e atualização de Rol de Procedimentos, atualizações de caráter tecnológico e muitas outras alterações. As reflexões e discussões de novas proposições de estratégias de trabalho nas áreas de saúde complementar, em revistas sob a forma de artigos, jornais, periódicos, livros, seminários, fóruns são apenas indicações de que existem saídas, as quais, adaptadas a outras realidades, poderão ser caminhos inovadores no ramo de assistência médica. Há subsistemas se formando em todas as atividades, e o ramo de saúde suplementar não é diferente. “O mundo está mudando e essa atividade está passando por um verdadeiro taylorismo sanitário” 341 . A Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS – discute com empresas do mercado a criação de novos tipos de planos de saúde, baseados em um sistema de capitalização. Uma das idéias em debate e que dependerá de mudança na legislação, é criar um modelo que cobraria um pequeno valor, adicional ao da mensalidade, e serviria para abater custos quando os usuários ficassem mais velhos, momento em que os valores dos planos sobem. Entidades do mercado, no entanto, pressionam para a criação de um produto independente e não complementar ofertado por empresas da área previdenciária. Com isso, o consumidor usaria o valor poupado para custear despesas de saúde, mas teria um limite. 342 Tal tipo de plano se aproxima, na forma, da Poupança-Saúde, já comentado.

Há atualizações quanto aos planos de saúde. A ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar - publicou no "Diário Oficial da União" em 29/07/2011 uma resolução que define regras para adaptação e migração de contratos firmados até 1º de janeiro de 1999 com planos de saúde. A resolução deve facilitar a mudança de usuários de planos anteriores a 1999 para novos. Segundo a ANS, alterar os contratos dará segurança e garantias oferecidas pela regulamentação do setor (que se deu com a lei nº 9.656/98), tais como regras de reajuste, garantia às coberturas mínimas obrigatórias listadas no rol de procedimentos e eventos em saúde e portabilidade de

341 Um médico, por exemplo, raramente consegue se sustentar hoje se não trabalhar para planos de saúde. Os pagamentos são extremamente baixos e o ritmo de trabalho nos leva a lembrar os filmes de Charles Chaplin com a diferença de que, no lugar dos parafusos, estão os pacientes. (Dowbor, 2004, p. 44). 342A proposta tramita na Câmara dos Deputados, por meio de emenda a uma medida provisória e propõe que esses produtos possam ser isentos de cobrança de tributos. “A idéia é que o novo produto não rompa com a visão mutualista dos planos”, afirma o diretor-presidente da ANS, Fausto Pereira dos Santos até 2009. (Matéria completa no Jornal da Tarde – 16/04/2009).

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carências. O rol de procedimentos e eventos é a referência básica --estipulada pela agência-- para cobertura mínima obrigatória da atenção à saúde nos planos privados de assistência à saúde contratados a partir de janeiro de 1999.343

Na adaptação --feita por meio de um aditivo contratual--, a operadora deve apresentar proposta ao beneficiário, demonstrando o ajuste do valor a ser pago pela ampliação das coberturas. Este ajuste deve ser de, no máximo, 20,59%. Antes, os planos decidiam a diferença que deveria ser paga pelo usuário, o que muitas vezes era muito alto. A resolução entra em vigor em 3 de agosto de 2011 e é resultado de uma consulta pública, além da contribuição de entidades representativas do setor. 344

A ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) também publicou na primeira quinzena de agosto de 2011, uma resolução que atualiza a cobertura assistencial obrigatória para os planos de saúde. Os convênios terão que custear, a partir de janeiro de 2012, 50 novos procedimentos --entre eles, cirurgia de redução de estômago via laparoscopia, terapia ocupacional e a tomografia especial PET Scan, usada no diagnóstico de câncer. 345

A regulação veio também de encontro ao respeito a forma de trabalhar das operadoras, inibindo a concorrência desleal, aumentando a confiabilidade nos planos, e também organizou a diversidade de produtos e um leque de escolhas muito difícil de ser absorvido pelos usuários, todavia, tudo isso, aumentou os custos. Os impactos foram positivos, mas criou algumas falhas no mercado.346 A regulação trouxe seriedade ao mercado na medida em que promove a eficiência, segurança e qualidade, faz com que haja a manutenção de uma agência reguladora, através da taxa de saúde suplementar e exige garantias de reservas, provisão de informações e cria a TISS. Estima-se que os investimentos existentes entre 2003 e 2012, serão de ANS – 6,9 milhões, investimentos das operadoras, 1,8 bilhões e investimentos de prestadores de serviço em torno de 9,5 bilhões.347 Propostas para novas regulações não faltam. Realmente é necessário flexibilizar os desenhos de novos produtos de saúde suplementar, sejam no âmbito de planos individuais bem como dos empresariais. Devem existir proposituras novas para cobertura para demitidos e aposentados, na forma do artigo 30 e 31 da Lei 9.656/98. Há sugestão também de planos mistos – em que possa ser agregada uma Poupança Saúde e deve ser regulado o perfil comportamental e prêmios para os usuários, em

343 Fonte: Folha on line de 29/07/2011 - 344 - Idem 622 345 - Idem 623 346 A ausência de normas e a complexidade envolvida na troca de informações entre operadoras de planos privados de assistência à saúde e prestadores de serviços de saúde, assim como o investimento pouco expressivo em Tecnologia da Informação (TI) estimularam a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) a elaborar o Padrão TISS (Troca de Informação em Saúde Suplementar). Esse padrão foi desenvolvido com base em normas nacionais e internacionais, e visa melhorar a qualidade do atendimento, racionalizar custos e otimizar recursos existentes. O Padrão TISS tem como premissa a interoperabilidade com os sistemas de informação em saúde preconizados pelo Ministério da Saúde. O Padrão TISS foi estabelecido, em 2007, como um padrão obrigatório para Troca de Informações na Saúde Suplementar – referente a troca de informações administrativas e de atenção à saúde, entre operadoras de planos privados de assistência à saúde, prestadores de serviços de saúde, beneficiários de planos de saúde e a ANS. (Fonte: http://www.ans.gov.br/index.php/planos-de-saude-e-operadoras/tiss) - acessado em 10/09/2011. 347 Palestra de José Cechin – em fev/2009 – na Abramge – Associação Brasileira empresas de Medicina de Grupo.

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que o indivíduo deve ter maior responsabilidade sobre o seu plano e utilização. Tais situações podem ser alinhadas aos incentivos do tipo que forneça menores mensalidades conforme hábitos do usuário. Sob o ponto de vista fiscal e custos, a regulação deve conter isenção sobre a Poupança-Saúde, caso venha acontecer no futuro. (Checin, 2009). 348 Isto não quer dizer que todos estão perfeitamente cobertos de todos os procedimentos médicos, cirúrgicos ou ambulatoriais, possíveis de acontecer a alguém, pois existem as mais variadas situações: desde aqueles que só cobrem parte das moléstias, outros só cobrem hospitalizações, outros apenas procedimentos ambulatoriais, ou seja, estima-se que apenas entre 10 milhões, de fato, têm uma cobertura razoável, pois não se pode esquecer que há ainda milhares de contratos antes da Lei 9656/98 que não foram adaptados. Estima-se em 4 milhões. Convergências complementares / Cooperativas de usuá rios Há um processo de inovação nas profissões relativas à saúde e nas Instituições. Necessário é criar escolas e cursos que promovam tais tipos de atividades profissionais e de novos técnicos na saúde em vista do processo tecnológico que abrange o setor. A visão deve ser mais ampla tanto no que se refere à saúde na área privada como na saúde pública. Após toda essa visão geral da saúde pública, privada, possibilidades de ONG’s, compartilhamentos, podemos citar os autores BRESSER e GRAU (1999) no que se refere as possibilidades de criação de Cooperativas de Saúde, mas não aquelas formadas por médicos, mas sim aquelas formadas por gestão cooperativa de usuários. Houve apresentação no I Congresso do CLAD 349 sobre a Reforma do Estado e da Administração pública, celebrado no Rio de Janeiro em 1996, um trabalho de Gustavo Zilocchi 350que expõe o caso da gestão cooperativa de serviços públicos urbanos na cidade de Córdoba, Argentina, mostrando que ele é uma opção legítima de autogestão ou de cogestão com o governo local e inclusive compartilhar seus trabalhos com as empresas privadas, contra a imperante tendência à privatização. Conclui que as cooperativas de usuários, ao reduzir custos e incrementar as possibilidades financeiras de setores sociais baixos e médios terem acesso a determinados serviços públicos, ampliam o número de demandantes solventes desses serviços e, por essa via, realizam o sentido da participação social: estender a distribuição de bens públicos a uma porção maior da população. Destaca, no entanto, que os possíveis avanços dependem, entre outras coisas, de que se reconheça ser este ainda um campo em disputa, dados os interesses econômicos que se enfrentam.

348 Cechin – palestra proferida em fev/2009 – Abramge – SP). 349 Congresso Latino Americano de Administración. 350 Que expôs seu artigo do Livro “Público Não-Estatal na Reforma do Estado” – Luis Carlos Bresser Pereira e Nuria Cunnil Grau – (Organizadores) – 1996 – no Primeiro Congresso do Clad – em Córdoba – Argentina.

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CAPÍTULO 4 Mudanças demográficas: repercussões no setor saúde Maurício Lima Barreto e Eduardo Hage Carmo, em Monteiro (2000), comentam que houve intensas modificações de alguns indicadores de morbimortalidade da população brasileira nas últimas décadas, particularmente o aumento significativo da expectativa de vida e a redução acentuada nas taxas de mortalidade infantil e de mortalidade por doenças infecciosas. 351 Isso induz a que houve melhorias significativas nos padrões de saúde da população no Brasil, mas elas precisam ser analisadas conforme a situação, bem como suas implicações para as políticas de saúde. As definições do que é doente ou de duração de uma doença são em grande parte convencionais. É necessário, todavia, para os seguros contra doenças que haja uma definição. O diagnóstico médico é em parte subjetivo e pessoal e é a subjetividade que acaba servindo para definir uma doença. A relação de cada uma das enfermidades com os dias em que elas permanecem em relação aos valores totais fornece as taxas de morbilidade ou morbidade. Esses padrões de mudança de morbimortalidade têm sido objeto de estudos desde a década de 60, com base em alterações demográficas em todo o mundo e não só no Brasil. Esse processo tem sido denominado de transição demográfica e está relacionado com a redução das taxas de mortalidade e das taxas de fertilidade. A evolução de uma sociedade tradicional para uma sociedade moderna, seria acompanhada de uma redução na morbidade e mortalidade por doenças infecciosas, passando a haver um predomínio das doenças crônico-degenerativas. No entender de Frederiksen (1969) 352 no contexto contemporâneo os determinantes dessas modificações nas sociedades menos desenvolvidas estariam relacionados à incorporação de novas tecnologias. (Monteiro, 2000). Posteriormente, Omran (1971) 353 denomina de transição epidemiológica este processo de modificação nos padrões de morbimortalidade, que se daria em estágios sucessivos e seguindo a trajetória de um padrão tradicional para um padrão moderno. Ele identifica três tipos básicos de processos de mudanças dos padrões epidemiológicos: a)- o modelo clássico, ou ocidental, caracterizado por uma progressiva redução da mortalidade e fertilidade, acompanhada de um predomínio das doenças degenerativas e das doenças causadas pelo homem. Este foi o modelo seguido pelos EUA e pelos países da Europa Ocidental. b)- O modelo acelerado, caracterizado por rápida e acentuada queda da mortalidade e fertilidade e pela rápida inversão nas causas de óbitos. O caso típico deste modelo é o Japão, na segunda metade do século passado.

351 Apud – Em Monteiro (2000) - Bayer Et al, 1982, Bayer & Paula, 1984, IBGE, 1984, Kalache ET al, 1987, World Bank, 1990). 352 Apud – Monteiro (2000) 353 Apud – monteiro (2000)

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c)- O modelo tardio ou contemporâneo, característico dos países subdesenvolvidos, em que a queda da mortalidade, mais lenta e recente que a observada nos países desenvolvidos, não é seguida de redução na fertilidade na mesma proporção. Em todos esses modelos haveria em comum a existência de três estágios fundamentais, que seriam a idade das pestilências e da fome, a idade do declínio das pandemias e a idade das doenças degenerativas aliadas às doenças criadas pelo homem, os quais se sucederiam, em qualquer sociedade, variando apenas quanto á velocidade das mudanças. Posteriormente, foi acrescentado um quarto estágio a este processo – a idade do declínio das doenças degenerativas. 354 A construção e estudo de indicadores Uma vez que o processo saúde-doença se insere na complexidade dos fenômenos sociais, o seu estudo tem que levar em conta as limitações e divergências conceituais e metodológicas próprias do estudo desse campo do conhecimento. Se existem limitações ao conceituar saúde ou doença, é evidente que também surgem limitações quando se busca a mensuração dos eventos relacionados a estes dois conceitos. (Schroeder, 1983). 355 Se considerarmos um tratamento estatístico, relacionando doença e quantidade de dias relativos a ela e o seu tempo, poderemos calcular a sua duração média bem como as características da dispersão relativas a essa média. A isso denominamos como expostos. A análise dos dados e a gráfica são fundamentais. Muitos anos antes de Shortliffe356 e dos computadores, John Snow (1813-1858), 357 deve ter percebido a conveniência deste tratamento de caráter estatístico. Médico britânico que liderou o uso da anestesia se dedicou muito à higiene como área precursora da epidemiologia. E aí, notou que a representação dos agravos à saúde é mais eficaz quando apresentada sob a forma de elementos gráficos que mostrem com clareza as probabilidades dos fatos, como os índices de ocorrência, os percentuais de surgimentos e as taxas de mortalidade. É célebre o trabalho de Snow apresentando sobre um mapa da cidade de Londres, a ocorrência dos casos de cólera durante a epidemia de 1854. Essa representação permitiu-lhe ver que alguns casos se aglomeravam em classes – clusters – os quais coincidiam com a área que fazia uso de água proveniente de uma mesma fonte pública. Essa era a fonte de disseminação da doença para a população.

354 Apud – Monteiro (2000) - Olshansky & Ault, 1986 355 Apud – Monteiro – (2000). 356 Pioneiro em inteligência artificial. Edward (Ted) Hance Shortliffe, MD, PHD, nascido em 1947, em Edmondo, Alberta, é um canadense com formação biomédica norte americana e cientista da computação. Ele foi o principal desenvolvedor do sistema MYCIN. 357 Mostrou o Dr. John Snow os estudos de grupamentos de casos de cólera na epidemia de Londres (1854).

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Mudanças sociais e epidemiológicas no Brasil Há um trabalho de Leser (1975) 358 que mostra de forma contundente que na década de 1960, em São Paulo, a tendência decrescente da mortalidade infantil se tinha invertido imediatamente após a queda observada no salário real da população trabalhadora. Nessa linha, um grande número de trabalhos, com diferentes níveis de sofisticação analítica, tem mostrado o papel das mudanças sociais e econômicas e das intervenções médicas sobre os padrões de mortalidade no Brasil. Em São Paulo, Monteiro (1982)359 em análise mais detalhada, comprovou as observações de Leser, ao mostrar que a queda da mortalidade infantil na década de 50 e o seu ascenso na década seguinte estão fortemente correlacionados a tendências inversas do salário mínimo real ocorrido nas duas décadas consideradas. Já na década de 70, o autor conclui que a tendência decrescente observada nesse indicador está associada com o aumento na cobertura do abastecimento de água. Por isso devemos levar – sempre - em consideração no debate demográfico, sempre as políticas sociais, a estrutura econômica e as condições de saúde da população. Monteiro (2000). São muitas as análises e estatísticas demográficas que podem ser analisadas. As mensurações demográficas gerais Diversas medidas podem ser tomadas de um indivíduo em diversos locais. No serviço militar, nos hospitais, nas maternidades, são ótimas fontes dessas medidas. A natalidade é um dos importantes fatores, ao lado da mortalidade e da migração, para o estudo da população. 360 A mensuração é um elemento que serve de fator indicativo até da situação econômica de um determinado país. Um país em crise tende a ter queda em sua taxa de natalidade. Na recuperação ou melhora da situação econômica este país se recupera e a taxa de natalidade tende a voltar ao patamar anterior à crise ou até maior. É a natalidade que trata da relação entre o número de nascidos vivos e o total da população. Porém temos que ter em mente o que significa nascido vivo. Considera-se como criança nascida viva, para o IBGE, aquela que, após a expulsão ou extração completa do corpo da mãe, independentemente do tempo de duração da gravidez, manifestou algum sinal de vida. Esses sinais são: respiração, choro, movimentos de músculos de contração voluntária, batimento cardíaco, ainda que tenha falecido em seguida.361 A população do planeta aponta para uma tendência de queda. É o que afirma Joseph Chamie, diretor da Divisão de População da ONU. Segundo Chamie, a fecundidade

358 Apud – Monteiro (2000). 359 Apud – Monteiro (2000). 360 Universidade estadual de Campinas. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Roberto Luiz do Carmo e Alberto Jakob (orgs.) Disponível em: < http://cendoc.nepo.unicamp.br/iah/textos/aulas/roberto/Site/Curso603.html > Acesso em: 17 julho 2002 361http://ibge.net/home/estatística/população/censo2000/fecundidade_mortalidade/conceitos - acesso em 28/07/2002.

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humana, desde 1965, está se reduzindo.362 A taxa bruta de natalidade, ou simplesmente natalidade, é obtida relacionando-se o número de nascidos vivos ao número de habitantes. 363 Podemos obter a taxa de natalidade a partir da seguinte relação: número de nascidos vivos / população absoluta x 1000. Com os dados de taxa de natalidade em mãos podemos concluir em que grau de desenvolvimento encontra-se um determinado país. É um indicador de IDH364. Em países considerados avançados essa taxa é baixa, com média de 5 por mil, enquanto que nos países menos favorecidos é mais alta com média de 30 ou mais por mil. Essas relações têm a ver diretamente com a fecundidade. A fecundidade 365 é um dos fenômenos demográficos mais importantes, pois mostra e serve para identificar o grau de uma nação, já especificado. A fecundidade é definida como o fenômeno relacionado aos nascimentos vivos considerados do ponto de vista da mulher, do casal ou, mais raramente, em relação ao homem. 366 Em comparação à fecundidade, a taxa de natalidade é ineficaz para se mensurar a fecundidade de uma população. As idades das pessoas desta população deverão ser analisadas. Numa população em que haja um índice, preponderante de adultos entre 20 e 40 anos, sua taxa de natalidade, será maior que numa população onde haja outros elementos preponderantes, como por exemplo, populações com idades avançadas ou muito jovens. 367 Em face desta possível anomalia, a primeira retificação a ser feita é relacionar o número de nascimentos não com o total da população simplesmente, mas com o número de mulheres em idade fecunda, isto é, mulheres entre 12 e 49 anos obtendo aí sim a taxa de fecundidade geral.5 Entretanto, como a fecundidade varia muito de acordo com a idade da mulher, calcula-se então, as taxas de fecundidade segundo a idade. Quando analisamos uma população ou se quer demonstrar a composição de uma população graficamente, como é o caso da pirâmide das idades, duas características 362 As mulheres estão tendo menos filhos com o decorrer dos anos.3 (3 Fisk, Robert. ‘Visão’ da ONU ignora questões cruciais. Folha de São Paulo, São Paulo, 14 mar. 2002. Mundo, p. 18) 363 Souza, Manoel de Mello. Apostila – Processo de Formação Sócio-espacial do Brasil Urbano e Industrial. Disponível em: < http://www.inx.com.br/~manoel/resumat3.html > acesso em: 14 julho 2002 364 Índice de Desenvolvimento Humano. 365 Nos EUA há um hospital que é considerado o segundo em maternidade. É o Winnie Palmer, em Orlando. Essa maternidade é a mais movimentada do país. Uma exceção entre os países industrializados, os EUA têm taxa de fecundidade relativamente alta, devido em parte à proporção de mães adolescentes e ao afluxo constante de imigrantes. Até 2050, a previsão é de que nos EUA haverá 400 milhões de pessoas. (National Geographic – pág. 61 – jan/2011 - John Stanmeyer). 366 De acordo com a projeção média da ONU, a população da Índia vai aumentar para mais de 1,6 bilhão até 2050. É inevitável que a demografia indiana supere a da China até 2030. (Fonte: A.R. Nanda, ex-responsável pela ONG Fundação População Índia. A esterilização é a principal forma de controle de natalidade na Índia e a maioria das operações é realizada em mulheres. O governo vem se empenhando para mudar isso. Uma vasectomia sem bisturi é bem mais barata e fácil de ser realizada no homem do que uma ligadura de trompas na mulher. O operado tem até incentivo do governo. Recebe um valor equivalente a uma semana de trabalho de um trabalhador normal. Na China a fecundidade despencou. Há a política rigorosa de filho único. A educação das mulheres também faz com que elas sejam mais receptivas a contraceptivos e tenham filhos mais tarde. (Fonte – National Geographic – jan/2011). 367 (Sauvy, 19 e pág. 49) 5 Souza, Manoel de Mello. Apostila – Processo de Formação Sócio-espacial do Brasil Urbano e Industrial. Disponível em: < http://www.inx.com.br/~manoel/resumat3.html > acesso em: 14 julho 2002

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normalmente estarão presentes: a idade e o sexo dos indivíduos que compõem a população estudada. Estas duas características determinam o crescimento de uma população, pois, estão diretamente relacionadas àquelas. Convém ressaltar que as estruturas por idade e sexo, de diferente países, ou mesmo aquelas que se refiram à regiões dentro de um único país diferem entre si.368 Numa estrutura populacional por sexo são demonstradas quais implicações que uma sociedade tende a ocorrer em decorrência dessa formação. A situação quanto a possíveis matrimônios, acontecerão de acordo com o equilíbrio entre os sexos. Desta forma, para um país com cultura monogâmica, por exemplo, o equilíbrio entre os sexos será ideal quanto mais próximo for de 1. Para um país onde predomina uma cultura poligâmica, onde os homens podem ter várias esposas, a proporção de homens poderá ser menor do que a de mulheres. A fórmula simples que demonstra este equilíbrio entre os sexos é chamada de razão de sexo. Ela é a relação entre o número de homens em relação ao número de cem mulheres. O resultado obtido com tal formula é também conhecido como índice de masculinidade. Poderemos inverter, na fórmula, o número total de homens pelo de mulheres, porém o índice de masculinidade é o convencionalmente aceito. Quanto ao índice obtido, caso seja maior que 100 teremos então um predomínio de homens; se for menor que 100 haverá predomínio de mulheres. Um índice próximo de cem, mostra que há um equilíbrio de gêneros. Estuda-se também a mortalidade. É um dos fenômenos demográficos mais importantes, quando falamos de demografia, pois funciona conforme definição da OMS, em 1950, de que ela deveria corresponder à cessação dos sinais de vida em um momento qualquer após o nascimento. 369 A mortalidade é o evento demográfico relacionado ao óbito370 e tem implicações diretas com a saúde de uma população. A taxa bruta de mortalidade é obtida a partir da divisão do número total de óbitos pelo número total da população, durante um determinado período. Se for ano a ano,

representa-se por - xl - que quer dizer população de idade x. A título de exemplo, a

taxa bruta de mortalidade, ou simplesmente mortalidade, de uma população de 5.400.000, cujo total de óbitos num determinado ano foi de 75.000, é de 13,88 por mil habitantes – ou seja, para cada mil habitantes há um índice de 13,88 mortes no ano. Aí analisam se os motivos da mortalidade e suas relações ou não com a saúde. É desta forma mais apurada de cálculo envolvendo a taxa de mortalidade que obteremos a chamada tábua de mortalidade e a partir desta deduzir as taxas de sobrevivência e a tabela de sobrevivência. No Brasil, as causas de óbito são sempre analisadas por tipo de mortalidade e por profissão, pois, há controles sobre o assunto

368 Santos, Jair L.F.; LEVY, Maria Stella F.; Szmrecsanyi, Tamás (orgs). Dinâmica da População - teoria, métodos e técnicas de análise. São Paulo: T.A. Queiroz. 21. 1991 369 Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Roberto Luiz do Carmo e Alberto

Jakob (orgs.) - Disponível em:

< http://cendoc.nepo.unicamp.br/iah/textos/aulas/roberto/Site/Curso603.html > Acesso em: 17 julho 2002 370 O conceito de morte estabelecido pela Organização Mundial de Saúde - OMS em 1950 foi o de que ela deveria corresponder a cessão dos sinais vitais em um momento qualquer depois do nascimento.

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e também as relações com a sazonalidade. O aspecto da sazonalidade também deve ser considerado quando da análise das causas de morte, pois pode ser importante saber que em determinada época do ano ocorra aumento do número de mortes. Um exemplo que podemos dar é o aumento de mortes num inverno rigoroso. As tábuas de mortalidade são instrumentos estatísticos destinados a medir as probabilidades de vida e de morte das pessoas, em cada idade. Para cada idade ou grupo de idade, nestes casos são apresentadas as quantidades de falecimentos, a taxa de mortalidade específica, a probabilidade de falecimentos, a probabilidade de sobrevivência e a esperança de vida. A esperança de vida, que é obtida a partir uma tábua de mortalidade, tende a aparecer junto com esta porque é da mortalidade que se deduz seus dados. (Cordeiro, 2010). Este assunto é longo e vale por uma dissertação. Trata-se de um dos mais importantes instrumentos para se conhecer a mortalidade de uma população e é chamada de tábua de mortalidade ou também de sobrevivência. Muitas empresas, governos e seguradoras que se dedicaram a confecção de tábuas de mortalidade o faziam por necessidade própria. A idade média de uma população é a relação da soma de todas as idades e o total da população e conforme Alfred Sauvy (1946) não pode ser confundida com a vida média do habitante dessa mesma população.371 A fórmula para obtenção da idade média é representada pela seguinte relação: somatória de todas as idades / total da população, enquanto a idade mediana é a idade que divide o contingente populacional total de uma população em duas partes iguais resultando que 50% da população está acima da idade mediana ou são mais velhos e 50% está abaixo desta idade ou são mais jovens que a idade mediana. Outro tipo de mensuração existente sobre a vida humana, é a Vida média ou Esperança de vida ao nascer: Da tábua de sobrevivência se chega à fórmula do cálculo. Este cálculo é feito da seguinte forma: soma-se o número de sobreviventes no primeiro ano ao total de sobreviventes do segundo ano, e assim sucessivamente e divide-se o total obtido pelo total de vivos inicial. Por fim, ao resultado desta operação, soma-se ½ . Com base nesta informação e analisando uma hipotética tábua de sobrevivência do Brasil num determinado ano pode-se afirmar que a vida provável do brasileiro é de 65 anos porque nesta idade estão 50% dos indivíduos, os quais nasceram há 65 anos. Ou seja, 65 anos depois, o número inicial de indivíduos que era de 10000 caiu para 5000, revelando assim que, hoje, a possibilidade de um recém-nascido chegar a 65 anos é de 50% por cento. Portanto, a vida provável deste recém-nascido será de 65 anos.

371 Sauvy, 19, pág.35

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Os idosos e a longevidade Todos os elementos citados acima têm direta ou indiretamente relações com a saúde das pessoas para que, dentro das expectativas, se consiga uma maior longevidade das populações. O envelhecimento saudável é desejado. Todos, sem exceção, desejam viver mais e fatos dessa natureza levam a outras análises sobre o envelhecimento populacional372 e que são relevantes. Convém frisar que os critérios para caracterização da estrutura etária de uma população são variados. Um destes critérios é o que caracteriza a população em progressiva, estacionária e regressiva O índice de envelhecimento de uma população é apresentado como a relação entre o número de pessoas com mais de 60 anos ou mais e o de jovens, com menos de 20 anos. Segundo a ONU uma população está envelhecendo quando 7% de seus habitantes têm mais de 65 anos.373 Deve-se observar que um método de pesquisa para que apresente resultado seguro sobre os fenômenos, devem compreender um prazo de 5 anos, como no caso da mortalidade, ou natalidade. Com isso os resultados de variados cálculos que devam ser feitos terão finalização mais confiável. Um índice que deve ser constantemente monitorado é o índice de envelhecimento da população brasileira, pois, esse aumento da longevidade, caminha silencioso e crescente, influenciará no futuro nos dispêndios da previdência pública e na Saúde Pública, Privada, Serviços sociais e seus correlatos. Segundo dados apresentados por Elza Berlquó, (1977) 374 no Seminário Internacional sobre envelhecimento Populacional, uma agenda para o fim do século XX, é de fato incontestável as previsões de aumento da população idosa no país: esperava-se chegar ao final do século com 8.658.000 idosos, ou seja, um em cada 20 brasileiros terá 65 anos e mais. Este número crescerá para 16.224.000 em 2020, quando 1 em

372 Responsável por tratar dos rumos do mercado de planos de saúde no País, que hoje atende a mais de 40 milhões de brasileiros, o novo diretor de Desenvolvimento Setorial da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), o médico Maurício Cechin, apontou o risco de os convênios tornarem-se inviáveis para idosos e defendeu o estímulo ao desenvolvimento de produtos específicos para essa faixa etária. Os mais velhos vêm sendo expulsos do setor em razão de aumentos das mensalidades e da ausência de oferta de planos individuais. Ele que trabalhou para a Medial e foi indicado pelo MS, assumiu o cargo há uma semana sob protesto de entidades de defesa dos direitos dos consumidores. Abaixo assinado referendado por 62 organizações apontou que sua indicação e a de Leandro Tavares, novo diretor de Fiscalização e ex-funcionário da Amil, faria da Agência, que tem cinco diretores, um órgão dominado por pessoas ligadas aos planos. Também o atual diretor de Normas e Habilitação, Alfredo Cardoso, trabalhou para a Amil. (Jornal Vida & Saúde – Estado de São Paulo, sexta feira, 11 de dezembro de 2009). 373 É importante questionar a visão de saúde na velhice devido a relação que se estabelece entre doença e envelhecimento: um passa a ser sinônimo do outro. O idoso, ao sinalizar – ou negar – sintomas do organismo em processo de envelhecimento, reflete influências sociais (...) isso evidencia a questão social a ser enfrentada pelos poderes públicos (...) Como a velhice não é mais atendida somente pela família, deixando de ser preocupação exclusivamente individual e pessoal, há que se pensar nos subsídios necessários aos profissionais que passam a assumir essa função... (Costa, 2000). É preciso ouvir os velhos!! Este é um tema presente e que envolve novas profissões a serem desenvolvidas em breve futuro: os cuidadores.

374 Pesquisadora Sênior - Professora titular aposentada da Faculdade de Saúde Pública da USP, foi Coordenadora do Programa de Saúde Reprodutiva e sexualidade da Unicamp.

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cada 13 pertencerá à população idosa. (Costa, 2000). Vejamos se as previsões estavam corretas. 375 376 Há vários itens a serem explorados a partir de pontos levantados aqui. Um deles é a questão da violência, em grande parte resultante de fatores como superpopulação ou de imigrações. Vimos que a urbanização desintegrada é geradora de bolsões de pobreza em grandes centros, incluindo neste, a cidade de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Calcutá, Tókio e muitos outros grandes conglomerados de pessoas.377 Se há relação entre essa urbanização e os níveis de violência, esses fatores merecem especial atenção. Este é um tema que convém ser estudado em medida que cresce cada vez mais o número de mortes devido à violência, influenciando inclusive as despesas públicas e privadas com hospitais, saúde em geral, os preços de seguros, como o de vida, automóveis, roubos, furtos, de casas, apartamentos, empresas, escolas e conseqüentemente afeta os orçamentos de segurança levando a aumentos de impostos. Há países europeus que estão experimentando o processo inverso. 378Está havendo uma diminuição de sua população, ou seja, um aumento das pessoas com idade mais avançada devido ao controle mais eficiente da morbidade e menos nascimentos. Essas situações são quase inusitadas, pois os países têm experimentado, no geral, nos últimos séculos um aumento contínuo das populações. Quais serão os fenômenos que existirão na medida em que as populações diminuem e há um aumento significativo das pessoas com idade mais avançada? 379 380

375 Os idosos são hoje 14,5 milhões de pessoas, 8,6% da população total do País, segundo o IBGE, com base no Censo 2000. Considera-se pessoa idosa as com 60 anos ou mais, mesmo limite de idade considerado pela OMS para os países em desenvolvimento. Em uma década, o número de idosos no Brasil cresceu 17%, em 1991, e ele correspondia a 7,3% da população. (Fonte: IBGE – censo de 2000). 376 O quadro é um retrato do que acontece com os países como o Brasil, que está envelhecendo ainda na fase do desenvolvimento. Já os países desenvolvidos tiveram um período maior, cerca de cem anos, para se adaptar. A geriatra Andrea Prates, do Centro Internacional para o Envelhecimento Saudável, prevê que, nas próximas décadas, três quartos da população idosa do mundo esteja nos países em desenvolvimento. (Fonte: IBGE). 377 Algumas regiões talvez fiquem infernais para se viver. Existem hoje 21 cidades com mais de 10 milhões de habitantes e a quantidade delas só vai aumentar até 2050. As cidades de Daca, em Bangladesh e Kinshasa, na República Democrática do Congo, cresceram nada menos que 40 vezes desde 1950. Suas favelas estão lotadas de gente desesperada que fugiu de áreas rurais em que a miséria era ainda pior. Além disso, há a ameaça de mudanças climáticas, como a elevação dos mares, Bangladesh é um exemplo provocando deslocamento de populações inteiras. O massacre de 800 mil ruandeses foi conseqüência de vários fatores, não só de conflitos étnicos, mas também da superpopulação – um excesso de agricultores – repartindo a mesma área em lotes cada vez menores que se tornaram insuficientes à subsistência de suas famílias. Os cenários de Malthus podem começam a se concretizar. (Fonte: Livro Colapso – de Jared Diamond). 378 Na Espanha, os imigrantes indianos fazem até comemorações, pois que em Barcelona estão reanimando o estagnado crescimento demográfico na Europa. Ao decidir a quantidade de filhos, as mulheres jovens definirão o crescimento ou a estabilização da população global. Quanto mais escolarizada é uma mulher, menor a quantidade de filhos que ela provavelmente terá. (Randy Olson – Revista NG – jan/2011). 379 Don José Medina parou de beber aos 106. De vez em quando, ainda toma "um puro" (aguardente), mas não mais de um por dia. Fuma, mas muito menos do que quando "era jovem" , em torno dos 70 anos. Aos 112, não conseguiu largar o chamico, cigarro feito com uma erva alucinógena. Medina vive em Vilcabamba, um povoado com cerca de 4.000 habitantes no interior do Equador (650 km ao sul da capital, Quito) que a paranóia pela vida saudável ainda não encontrou. As condições sanitárias do local são verdadeiros desastres pois, na maioria das casas, não há esgoto nem água encanada. Seus habitantes fumam, bebem álcool, comem muito sal, tomam muito café, usam drogas. É um dos povos com maior proporção de pessoas centenárias no mundo com cerca de dez vezes mais do que a média. Centenários e saudáveis. Por ali, é comum encontrar idosos de 110, 120 anos. Lêem sem óculos, conservam os dentes originais. A maioria ainda trabalha e tem vida sexual ativa. Os cabelos ficam brancos quando chega a idade, mas depois voltam à cor natural, sem explicação. E, ao contrário da maioria dos lugares do mundo, os homens vivem mais do que as mulheres. "Alguma coisa estranha acontece em Vilcabamba", diz o médico e escritor argentino Ricardo Coler, um entre tantos profissionais que foram à cidade em busca de uma explicação. Sobre o mistério, ele escreveu "Eterna Juventud - Vivir 120 Años" (editora Planeta) sem previsão de lançamento no Brasil, em que relata histórias como a de José Medina. São várias as teorias que tentam explicar a longevidade saudável dos habitantes de

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Esses processos demográficos fazem parte do que os especialistas chamam de transição demográfica. Em um país que completou a transição, ou seja, está no período em que se chama de país desenvolvido, as pessoas retomam da natureza pelo menos algum controle sobre a morte e o nascimento. A explosão da população381 é um efeito colateral inevitável. No entanto, a taxa de crescimento estava no ápice bem na época em que Ehrlich soou o alarme. No início dos anos 1970, as taxas de fecundidade em todo o mundo haviam começado a despencar – com maior rapidez que o previsto. Desde então, a taxa de crescimento da população já caiu mais de 40%. Conforme o país, uma distinção de processo demográfico diferente. A França foi uma das primeiras. Até o começo do século 18, as mulheres nobres na corte francesa desfrutavam dos prazeres carnais e nunca tinham mais de dois filhos. Para isso recorriam ao mesmo método anticoncepcional usado por Leeuwenhoek para realizar seus estudos: a interrupção do coito. 382 Em Portugal, por exemplo, homens e mulheres entre 1987 e 2006 duplicaram aqueles que chegaram até os 80 ou mais anos de idade. O aumento da população idosa, considerando-se todos com mais de 65 anos ou mais em relação a população total é bastante evidente naquele país. A proporção de pessoas com 80 ou mais anos de idade duplicou passando de 2% em 1987 para 4% em 2006. Entre 1987 e 2006 subiu de 19 para 26 o número de pessoas com 65 ou mais anos de idade por cada 100 pessoas em idade ativa.

Nos próximos 25 anos o número de idosos poderá ultrapassar o dobro do número de jovens. Calcula-se que 300 mil idosos vivam isolados. Por isso é necessário envelhecer com saúde. Incapacidades, doenças crônicas, solidão e exclusão tendem a retirar vida aos anos de vida aumentados conseguidos pelas sociedades com tanto esforço nessas últimas 30 décadas. No caso do Brasil, o envelhecimento da

Vilcabamba. Cientistas americanos afirmaram que era a composição da água que bebem. Franceses atribuíram o fato ao clima da região. Outros dizem que é o ar, a alimentação saudável à base de milho, batata, vegetal, e pouca carne ou a vida tranqüila. Nenhuma explicação foi comprovada até hoje."Estudei a água de Vilcabamba, e sua composição se parece bastante com a água que se bebe em Buenos Aires", diz Coler, que também exclui a possibilidade de a longevidade ser genética. "Até os cachorros vivem mais, cerca de 25 anos. Ninguém descobriu a causa, senão já estaria rico." Há também algumas teorias pseudocientíficas, que vinculam os efeitos benéficos de Vilcabamba à eletricidade no ar ou à possível presença de óvnis e extraterrestres. Seja qual for a explicação, a fama de Vilcabamba atrai todo tipo de gente. O comediante mexicano Cantinflas (1911-1993) passou o ano de 1968 na cidade, onde teria se curado de problemas cardíacos. Uma ex-executiva da Nasa fundou ali uma espécie de spa “new age” que promove hábitos saudáveis. Um ex-astronauta e um general do Exército americano também estão entre os que circulam pela avenida Eterna Juventud, a principal da cidade. Todos, acredita Coler, vão atrás dos 40 anos a mais de vida. "Por isso, além dos cientistas, chegam os multimilionários, os crentes, os políticos, os messiânicos. Vêm por esses 40 anos como antes se ia por ouro ao velho Oeste ou por petróleo ao Oriente Médio", conta. Fonte: Folha de S.Paulo. http://www1.folha.uol.com.br/folha/equilibrio/noticias/ult263u467278.shtml 380 A importância dos idosos para o País não se resume à sua crescente participação no total da população. Boa parte dos idosos hoje são chefes de família e nessas famílias a renda média é superior àquelas chefiadas por adultos não-idosos. Segundo o Censo 2000, 62,4% dos idosos e 37,6% das idosas, são chefes de família, somando 8,9 milhões de pessoas. Além disso, 54,5% dos idosos chefes de família vivem com os seus filhos e os sustentam. (Fonte: IBGE). 381 A escassez de alimentos poderá provocar um colapso da civilização. Os seres humanos estão vivendo do capital natural, erodindo o solo e esvaziando os aqüíferos com maior rapidez do que eles podem ser recuperados. Isso começará a prejudicar a produção de alimentos. (Fonte: Lester Brown, fundador do Instituto Worldwatch), 382 A inovação crucial era de natureza conceitual e não anticoncepcional, como diz Gilles Pison, do Instituto Nacional de Estudos Demográficos em Paris. Até a época do Iluminismo, “a quantidade de crianças que se tinha era algo que estava nas mãos de Deus. As pessoas não se davam conta de que poderiam tomar as rédeas do fenômeno”. Outras nações ocidentais acabaram seguindo o caminho da França. No início da segunda guerra, houve declínio da fertilidade, mas após o término houve um idéia de que a fecundidade subiria novamente, mas ledo engano dos demógrafos, continuou caindo. (Nacional Geographic - pág. 62 – Robert Kunzig – jan/2011).

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população é reflexo do aumento da expectativa de vida, devido ao avanço no campo da saúde e a redução da taxa de natalidade. Prova disso é a participação dos idosos com 75 anos ou mais no total da população – em 1991, eles eram 2,4 milhões (1,6%) e, em 2000, 3,6 milhões (2,1%).

Os idosos são hoje 14,5 milhões de pessoas, 8,6% da população total do País, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com base no Censo 2000. O instituto considera idosas as pessoas com 60 anos ou mais, mesmo limite de idade considerado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para os países em desenvolvimento. Em uma década, o número de idosos no Brasil cresceu 17%, em 1991, ele correspondia a 7,3% da população. A população brasileira vive, hoje, em média, de 68,6 anos, 2,5 anos a mais do que no início da década de 90. Estima-se que em 2020 a população com mais de 60 anos no País deva chegar a 30 milhões de pessoas (13% do total), e a esperança de vida, a 70,3 anos.

É necessário que os países intervenham articulando centros de saúde, hospitais, cuidados continuados e instituições de apoio social. Promover a criação de serviços comunitários sob a forma de parcerias, ONG’s e outras instituições. 383Desenvolver hospitais de reabilitação, cuidados continuados e incentivando o idoso a participar da vida ativa de outras pessoas também. Necessário reativar atividades em domicílio e reforçar apoio à família, fornecendo rápida internação temporária em caso de necessidade. Afinal, em Portugal, dentro de alguns anos eles serão maioria. Inúmeros outros países estão no mesmo caminho. Há países europeus que têm incentivado o nascimento de filhos pagando ao casal valores consideráveis por criança e dão até outras regalias como garantia de estudos e saúde. Há antigos estudos demográficos em épocas ou períodos em que não se consideravam esses elementos como de importância para análises demográficas e que pudessem envolver estudos de projeção de saúde pública e até da privada. Existem muitos processos em Demografia para estudos de crescimento e decrescimento das populações. Os primeiros estudiosos do assunto foram Wappaus,384 Malthus, C.H. Carey,385 Paul Leroy-Beaulieu,386 Adam Smith, Doubleday Verhulst,387Raymond Pearl,388 Yule,389 Pearl-Reed,390 Paul Douglas. 391No Brasil os

383 Essa preocupação de 8 bilhões – estimativa otimista da ONU – para 2050 de habitantes do planeta, faria com que Bangladesh teria uma taxa de fecundidade de 1,35 em 2050, mas ainda 25 milhões de habitantes a mais que hoje. A taxa de fecundidade em Ruanda também seria inferior ao nível de reposição, mas sua população atingiria o dobro do que era antes do genocídio. Se esse é o cenário mais otimista, podemos afirmar que o futuro é de fato deprimente. Talvez essa preocupação com os números populacionais não seja a melhor maneira de se confrontar o futuro. As pessoas amontoadas em favelas necessitam de ajuda, mas os problemas a serem resolvidos são a pobreza e a falta de infraestrutura, não a superpopulação. Proporcionar a todas as mulheres acesso aos serviços de planejamento familiar é uma boa idéia. No entanto, o mais agressivo programa de controle populacional que se possa imaginar não vai salvar Bangladesh da elevação no nível do mar, nem Ruanda de outro genocídio e nem todas as pessoas dos enormes problemas ambientais que estão à nossa frente. O aquecimento global é um exemplo. A emissão de carbono é outro. (Fonte: National Geographic – jan/2011).

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estudos demográficos até então efetuados e os trabalhos científicos elaborados pela Unicamp são inestimáveis e todos estão relacionados com as tábuas de mortalidade ou sobrevivência. Todos esses aspectos são precedentes ao estudo das populações que geraram as análises e confecção de dados que denominamos de tábuas de sobrevivência, chamadas também de tábuas de mortalidade que veremos mais adiante. A demonstração da quantidade de pessoas vivas e a quantidade de falecimentos conforme as idades, o tempo decorrido ou à decorrer, a vida média e provável, é o que chamamos de tábua de sobrevivência ou de mortalidade. Com essa tábua podemos medir as probabilidades de sobrevivência e morte das populações num determinado período. Os primeiros estudos dessa natureza foram efetuados por empresas de seguro que tinham interesse direto no assunto, e já existem há muito tempo. As análises estatísticas mais antigas que se conhece sobre esses estudos foram de John Graunt à respeito da mortalidade em Londres. Há também estudos de Halley, Smart, Deparcieux, Duvillard, Wargentin, Price, Sussmilch, Farr, Finlaison, Quetelet, Kersseboon, Wittstein, de empresas francesas, americanas, inglesas e alemãs. No Brasil temos uma tábua brasileira do IBGE e acreditamos que em breve futuro haverá outras até mais bem elaboradas.392 Se por hipótese, partirmos de um grupo observável de 10.000 crianças nascidas, a cada ano, os sobreviventes serão função do tempo, ou seja, o gráfico dessa população é uma função contínua, depois de sua retificação e ajuste, cuja curva representa a sobrevivência do grupo considerado.

392 Uma mudança na forma de mensurar a expectativa de vida da população anunciada hoje pela Superintendência de Seguros Privados (Susep) e pela Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (FenaPrevi) vai permitir que os brasileiros paguem menos na hora de comprar seguros de vida. Por outro lado, terão que contribuir por mais tempo em planos de previdência para manter o mesmo benefício. A mudança, calculam as entidades, deve baratear em 10% a 15% o preço do seguro de vida para homens e mulheres na casa dos 40 anos, segmento que mais consome esse tipo de produto no País. Já no caso da previdência, as mulheres saíram mais prejudicadas porque terão de contribuir por mais seis meses, enquanto os homens vão precisar de apenas um mês de contribuição para garantir o mesmo benefício. O ajuste é fruto do aumento na expectativa de vida diagnosticada pela primeira tábua atuarial desenvolvida especialmente para o mercado brasileiro. Antes, o segmento adotava como parâmetro para seus produtos dados da população dos Estados Unidos. "É um marco histórico para o setor que passará a ter produtos adaptados à nossa realidade", afirmou o presidente da Susep, Armando Vergílio. A nova tábua toma como base apenas os consumidores de planos de previdência e seguros no País, um universo de 32 milhões de pessoas. Com a mudança, a previsão de vida desses brasileiros na faixa de 40 anos subiu em sete anos. Na média geral, a tábua elevou a expectativa de vida dos homens em quase dois anos e de mulheres, em 1,2 ano. (Fonte: 18/03/2010 às 18:25 – agência o Estado).

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Todos esses aspectos relativamente a morbidades, saúde e consequências estão diretamente relacionados com os estudos das funções de sobrevivência. Intuitivamente sabemos como a função de sobrevivência se comporta. Os falecimentos são relativamente fortes nos primeiros anos de vida e depois decrescem quando meninos ou meninas, crescendo em seguida na adolescência até a meia-idade e inicia um processo de aceleração com a aproximação do limite pressuposto para o ser humano. Os motivos que influenciam a mortalidade são tantos e de várias origens que não podemos analisar de per si e somente sob a ótica quantitativa. As leis que a natureza fornece para sobrevivência não podem apenas ser representadas, friamente e somente como uma simples equação, todavia, é preciso sempre estar atento e monitorando suas conseqüências. Influências como sexo, clima, alimentação, fatores genéticos, hereditários, condições materiais, qualidade de vida, fumo, bebidas, DST393 são elementos que tem ligações na enorme teia de mortalidade ou sobrevivência. As ciências sociais, portanto, trabalham com tábuas que, de certa forma, representam o afunilamento de todas essas situações, resumindo dados quantitativos aproveitáveis para conclusões sobre Saúde e a vida humana. Tendo em vista então os primeiros ensaios de Demografia sua multidisciplinaridade, funções básicas, conceitos estatísticos e probabilidades devem ser preparadas para a introdução de conhecimentos acadêmicos e técnicos das tábuas de sobrevivência. Muitos técnicos, cientistas sociais e/ ou estatísticos do Brasil e do exterior, que exercem funções na atividade demográfica, devem tentar percorrer os caminhos de inúmeros estudiosos da Geografia demográfica e sua abrangência multidisciplinar relativamente às tábuas de sobrevivência. Sabe-se que uma das mais antigas tábuas conhecidas com as características atuais foi de Edmund Halley.394 no século XVI. Ele colheu dados sobre os óbitos e nascimentos na cidade de Breslaw na Alemanha em 1693. Tais levantamentos levaram a conclusão de que problemas sérios de saneamento básico existiam na cidade e por isso muitas crianças não passavam do primeiro ano de vida. Por outro lado, deslocando-nos no tempo, podemos imaginar as dificuldades, por exemplo, um século atrás ou menos, para trazer informações. Necessário seria ir ao início de 1900, época ainda muito difícil para se obter, catalogar e processar um volume grande de informações. Não se pode esquecer que os dados eram processados manualmente e não havia programas do tipo Excel, SPSS, Mini-tab e outros para processamento do banco de dados. Um dos problemas mais difíceis é o acompanhamento das migrações, pois, nasce alguém em São Paulo, Capital, vai morar em Belo Horizonte, casa em Roraima, mora em Manaus durante quarenta anos e morre em Corumbá no Mato Grosso do Sul. Essas migrações também são estudadas para efeito de ajustes das tábuas. O estilo de

393 Doenças sexualmente transmissíveis 394 O mesmo que descobriu o cometa que levou o seu nome.

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vida das pessoas observadas também é fator importante no ajuste. Ele deve obedecer um certo padrão que acompanhe a dinâmica da própria vida que seria a educação, conhecimento, saúde e acompanhamento dos progressos de saneamento, da medicina e tecnologia. Em resumo, deve ter elementos com possibilidades de ajuste para o futuro. Outra relação demográfica interessante é aquela que compara a mortalidade com a Densidade Demográfica. Onde há muitos indivíduos ocupando espaços (A), cada vez menores, a relação ∆ (delta) é proporcional (Densidade) e população (P). Em resumo:

∆ = p

a , chamado de fator Densidade. É claro que para os dias atuais tal relação

deve ser revista, mas a possibilidade da morbidade se alastrar em ambiente cada vez mais populoso é uma verdade apurada até nos dias de hoje. 395 Doenças contagiosas, gripes normais ou H1N1, AIDS, hepatites, se disseminam nos locais mais populosos além dos problemas ambientais. Prédios superlotados, elevadores, metrôs, ônibus e locais de grande quantidade de habitações, como cortiços, são exemplos de fatores de densidade elevados. Se fizermos tais comparações, de forma empírica, em populações carcerárias ou em penitenciárias, por exemplo, verificaremos sua veracidade. Em estudos Demográficos há ainda muito que se fazer no Brasil. Como exemplo, pode-se verificar que dados de morbilidades em geral ainda são incipientes. Por isso, as estatísticas em Saúde são de fundamental importância. Aspectos ambientais devem também ser levados em conta. Com o aumento da quantidade de planos de saúde e dos seguros saúde, os atendimentos no SUS, Hospitais e demais órgãos que processam dados estatísticos como a ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar, tendo em vista os progressos da tecnologia, deverão fornecer em breve futuro, estatísticas confiáveis para estudos demográficos e de morbidade quase próximos da perfeição que muito ajudará nas análises das morbidades. Em sequência há estatísticas interessantes do PNDS – Plano Nacional de Demografia e Saúde – no caso específico, da saúde da mulher, por exemplo, e da saúde infantil. É óbvio que outras moléstias aparecerão para tumultuar a nossa espécie, pois a história mostra que o homem sempre está atrás de uma nova cura para uma doença que nos atormenta e para centenas de outras que atacam a raça humana. O processamento de dados para esses estudos, e para o Demógrafo, Geógrafo ou

395 Claro que a quantidade de pessoas faz diferença. Mais relevante ainda é o modo como as pessoas consomem os recursos. O principal desafio para o futuro das pessoas e do planeta é tirar da pobreza o máximo de gente e ao mesmo tempo reduzir o impacto de todos nós sobre o planeta. O Banco Mundial prevê que até 2030 mais de um bilhão de pessoas nos países em desenvolvimento vão passar a fazer parte da classe média global. Em 2005 eram apenas 400 milhões. Embora isso pareça muito bom, não será nada fácil para o planeta se essas pessoas passarem a comer carne e a circular em carros movidos a gasolina. É tarde demais para evitar que nasça a classe média de 2030, mas não para mudar a maneira como ela e todos nós produzimos e consumimos alimentos e energia. Há alertas apocalípticos e há alertas otimistas. A controvérsia já existia na época do reverendo Thomas Malthus. Ele escreveu: o homem é preguiçoso e avesso ao esforço, a menos que seja obrigado pela necessidade. A necessidade é a mãe da esperança. Os esforços que os homens se vêem obrigados a fazer, a fim de se sustentar ou à suas famílias, despertam faculdades que de outro modo teriam ficado para sempre dormentes, e é uma observação corriqueira que situações novas em geral dão origem a mentes adequadas para enfrentar as dificuldades nas quais estão envolvidas. Sete bilhões de pessoas logo mais 9 bilhões em 2045. Espera-se que Malthus esteja certo a respeito da engenhosidade do ser humano. Fonte: National Geographic – Brasil – janeiro / 2011 – pág. 75 – Artigos de Robert Kunzig.

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Estatístico chama-se Nosografia. Não há ainda tábuas de morbidade completas. O que existem são tábuas de invalidez. Necessário será para o futuro que os técnicos e os Demógrafos se unam, com o auxílio dos governos, para desenvolvimento de tábuas de morbidade baseadas nas moléstias constantes da Tabela da AMB396 e CID397 fazendo-se ajustes reais para futuras determinações de preços para planos de saúde e projeções de mais longo prazo para a Saúde Privada e Assistência Social Pública e com isso tirar conclusões. No mínimo, esses preços deveriam ser nivelados. É uma revolução nos conceitos. As separações por faixas etárias existentes no caso da saúde suplementar somente prejudicam aqueles que têm idade mais avançada. Exatamente, aqueles que estão em fase não produtiva e normalmente com mais dificuldade de obter recursos. Faixas etárias é nivelamento simplista e não muito técnico. Ao invés de ajudar a população, prejudica. Aumentos por sinistralidade também são formas obscuras de se determinar reajustes ou preços em morbidades, pois, com exceção dos planos empresariais de saúde, os demais, com milhares de usuários, não têm acesso efetivo a sinistralidade da companhia. São dados que jamais escapam das próprias entidades operadoras de saúde e seguradoras. Não há transparência ainda, mas o futuro pode prometer muito à Saúde, tanto pública quanto privada. Tecnologias, genética e futuro No caminho da saúde pública e privada O desenvolvimento da Genética398 deve levar as ciências sociais a considerar aspectos muito interessantes sobre a curva de sobrevivência da raça humana, morbidades e suas aplicações futuras e também da Saúde. Tais conceitos modificarão comunidades inteiras, populações e consequentemente os seguros, a previdência pública e a privada, seguridades em geral, saúde pública, planos de saúde, seguros saúde e necessariamente levará a um “managed care” rotineiro e obrigatório. Enquanto isso talvez, a ciência aprenderá no tempo, a congelar órgãos para usos médicos. Seria excelente avanço para transplantes, pois doadores e recipientes nem sempre estão próximos ou preparados para uma cirurgia. Seria bom também que se aprendesse como congelar tecidos de ovário para a saúde da mulher. Sem eles, ela entra na menopausa. O tecido ovariano obtido e congelado da mulher ainda jovem poderá ser usado para adiar ou controlar os efeitos da menopausa, quando ela estiver

396 AMB - Associação Médica Brasileira. 397 CID - Classificação Internacional de Doenças. 398 O projeto Genoma Humano passou por vários treinos antes de ser finalizado. Desde 1995, cerca de 40 organismos tiveram seus genes decifrados. Há várias razões para isso. A princípio, os genomas completos de vírus e bactérias serviram para testar a técnica do seqüenciamento de genes, que exige a ação conjunta de computadores poderosos, sendo, portanto, dominada por poucos países. A Xylela fastidiosa, praga que provoca amarelinho em laranjais, foi o primeiro fitoparasita – que ataca plantas – a ser seqüenciado no mundo. A proeza se deve a 35 laboratórios de pesquisa e cerca de 300 cientistas brasileiros patrocinados pela Fapesp – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo.

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perto dos 50 anos.399. Outros aspectos da Genética,400 é que os primeiros estudos já verificam as possibilidades de se saber por antecipação, quando do nascimento ou até mesmo na fase intrauterina, se uma pessoa terá diabetes, câncer ou até mesmo desenvolvimento das doenças conhecidas como mal de Parkinson e outras enfermidades, através dos exames do DNA.401 Artigos em periódicos sobre o assunto já fazem parte da literatura futurista do que será a seguridade geral e em especial a Saúde em geral, nos próximos anos. Além disso, a popularização da Internet vai alterar as práticas de prestação de serviços de saúde, com diminuição da morbidade em todos os elos da cadeia de valores que compõem este setor afetando diretamente a Demografia. Deverá gerar produtos compatíveis e mais criativos. Deverão reduzir custos e agregar diferenciais. Fazer uma medicina multidisciplinar, tais como, acompanhamento diário de clientes on-line com problemas de diabetes, hipertensão, para evitar males maiores como internações, fazer monitoramento de doenças via “Home-Care” em formato digital. As pesquisas nacionais de demografia e saúde demonstram esses avanços de informação e tecnologias. É o caso da saúde da mulher, cujos dados atualizados até 2008 demonstram que está havendo grande evolução sob os aspectos de prevenção. Luciano Gois,402 pesquisador, baseado na PNDS/2006, fez várias observações que seguem em 24 de outubro de 2008.

399 Mais de 80 corpos humanos estão hoje congelados em cápsulas especiais, a maioria nos EUA. São de pessoas que esperam os avanços científicos do futuro. São ricas o bastante para bancar os 150 mil dólares que algumas empresas cobram para fazer um picolé humano. A experiência não é simples. Quando o sangue começa a congelar, aumenta a concentração de substâncias dissolvidas no plasma. A água escapa das células dos tecidos que ficam perigosamente desidratados. À medida que a temperatura cai, as células viram uma peneira. A água congelada transforma-se em cristais pontiagudos, danificando as membranas e outros componentes celulares. Os lipídeos, que formam as membranas celulares, solidificam como nódulos que deixam buracos pelos quais o conteúdo celular escapa ainda mais. (Artigo na Revista Galileu, de fevereiro de 2001 – de Andréa Kauffmann-Zeh – que é bióloga e editora sênior da revista inglesa Nature. Nascida em Conceição do Mato Dentro, em Minas, é formada pela UFRJ. Fez doutorado no Instituto Ludwig para a Pesquisa do Câncer e pós-doutorado no Imperial Câncer Research Fund, de Londres). Será que teremos direito à imortalidade? 400 A princípio, a notícia da criação de uma ovelha clonada em laboratório causou sensação pelo inusitado. Parecia que o homem, mais especificamente, Ian Wilmut e os cientistas do Instituto Roslin, na Escócia, estavam brincando de inventar a vida, ao anunciarem ao mundo o nascimento da ovelha Dolly, em 1996. Mas Dolly foi apenas o começo. O que os pesquisadores queriam realmente era o que veio depois de Dolly. Em 1997, os mesmos cientistas criaram uma segunda ovelha, chamada Polly, que além de clonada, era transgênica. Ela continha genes que não eram de sua espécie. O material genético dela havia recebido um gene humano. Isso tornava a ovelha capaz de fabricar o chamado fator XI humano, que os hemofílicos não possuem. Quando uma pessoa se corta, são os fatores de coagulação, entre eles o fator IX, que fazem o sangramento parar. Polly é capaz de produzir o fator IX e fornecê-lo pelo leite. A possibilidade de usar animais e plantas para fornecer substâncias essenciais ao homem é um dos resultados da pesquisa genética. (Fonte: Revista Galileu, 2001 – fev.º). 401 Problemas de saúde freqüentes na sociedade, como o diabetes, poderão ser diagnosticados com antecedência no futuro. Todos poderão, no futuro, ter um código de barras como identificador. Quando observamos um ser vivo, o identificamos por seu corpo, sua morfologia, que é a expressão de um código que pode ser usado literalmente como um código de barras: o DNA, o código genético. O projeto The Barcode of Life Data systems (Bold, na Universidade de Guelph, em Ontário, Canadá), que registra sequências curtas dos segmentos de DNA que distinguem uma espécie de outra, para poder saber que ser vivo é esse que temos diante de nós não pelo seu aspecto, mas comparando seu DNA com uma biblioteca de DNA de 65 mil espécies, a qual se pode acessar online. Foi usando o Bold que Brenda Tan e Matt Cost, dois estudantes da Trinity School, de Manhattan, mantida pela Universidade Rockefeller, descobriram que 11 de 66 produtos comprados aleatoriamente enganavam os consumidores. Um deles foi o leite de ovelha, que na realidade era leite de vaca, troca mais grave ainda se o consumidor for indiano. Em futuro não muito distante aparelhos portáveis para detecção do DNA serão possíveis. A indústria alimentícia que se cuide. (Revista América Economia – março de 2010\ pág. 81). 402 http://www.saudemulherdf.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=8:pesquisa-nacional-de-demografia-e-saude-pnds-2006-&catid=2:noticias&Itemid=7 (acessado em 25/07/2009)

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A Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde financiada pelo Ministério da Saúde e realizada pelo Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, por intermédio de um conjunto de instituições de notório saber, demonstra que são inegáveis os avanços na cobertura das ações de atenção à saúde da mulher. O Brasil está definitivamente colocado diante do desafio de acelerar a qualificação dessas ações, consolidando os direitos sexuais e direitos reprodutivos desse segmento populacional e reafirmando os compromissos assumidos nas Conferências Internacionais de População e Desenvolvimento 403

Outro espectro da visão futurista na atividade de saúde é a Nanotecnologia. Laboratórios universitários e empresariais levam a nanotecnologia à indústria farmacêutica regional, posicionando a região na vanguarda tecnológica e prometendo reduzir enfermidades e custos sanitários.

No artigo da revista América Economia, de março de 2010, Juan Pablo Dalmasso, de Córdoba, informa que já faz dez anos que na Argentina Eder Romero concluiu seu pós-doutorado no exterior e se instalou na Universidade Nacional de Quilmes, na Grande Buenos Aires. Aproveitou, nesse período, para desenvolver sua prática em transferência tecnológica para pesquisar o transporte de remédios com base na nanotecnologia, que é a introdução de medicamentos no corpo humano trabalhando em uma escala equivalente a milionésima parte de um milímetro.

Se a escala era pequena a aposta era grande. No ano 2000, a nanotecnologia sequer tinha alcançado o status de emergente. Mundialmente, registravam-se mais papers do que pesquisas de fato, e os grandes laboratórios acabavam de fazer seus primeiros anúncios, com mais prospectivas do que produtos. Mesmo assim, Eder Romero e a Universidade de Quilmes criaram o Laboratório de Projeto de Transporte de Remédios, o LDTD. 404 Há inúmeros estudos e constatações, inclusive quanto à reprodução e fecundidade das mulheres.

403 Cairo - 1994) e da Mulher - Pequim 1995 404 Eder e seu grupo escolheram atacar o Trypanosoma cruzi, causador do Mal de Chagas. Sua particularidade é a de que, quando provoca sintomas, já está alojado dentro das células do coração. Essa localização é inalcançável pelas drogas conhecidas. A doença é uma endemia latino-americana que, apesar de atingir 90 milhões de pessoas, não está entre as prioridades da indústria farmacêutica. Descobriu-se que transportar com base em polímeros biodegradáveis e descobrir que droga conhecida poderia funcionar melhor. As provas in vitro mostraram que, com uma dose 200 vezes inferior à habitual, era possível eliminar 100% da colônia de parasitas. Isso muda muitos resultados, inclusive os custos em saúde. O impacto nos custos é enorme. Alguns estudos da Organização Panamericana de Saúde ilustram o impacto. Somente a Bolívia tem de gastar mais de US$ 30 milhões anuais para atender os infectados por esse mal. No Brasil, o custo é estimado em US$ 1 mil por doente, considerando somente medicamentos e 20 dias de internação anuais. Se forem somados a isso os custos com marca-passos e outros intangíveis, como a invalidez parcial, os números tornam-se mais altos. Isso quer dizer que estudos como esse, na última década, as aplicações nanotecnológicas na medicina passaram de uma potencialidade teórica para uma promessa tangível. (Revista América Economia, março\2010 – pág. 76 e 77).

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Controle das populações

Vários países e saúde

A taxa de fecundidade total (TFT) 405 , na Rússia, manteve a tendência à queda, tendo diminuído os diferenciais entre os locais de residência - urbana e rural. A praticamente ausência de variação dos níveis estaria indicando comportamento reprodutivo consolidado em patamares próximos do equivalente aos níveis de reposição da população.

A TFT passou de 2,5 filhos por mulher, no período 1993 - 1996, para 1,8 filhos por mulher, no período de 2003 – 2006. A diferença entre a TFT de mulheres da área rural e de área urbana de 1,2 (3,5 e 2,3 filhos por mulher respectivamente) tornou-se de 0,23 (1,99 e 1,76 filhos por mulher) em 2003-2006.

No que concerne à anticoncepção os resultados encontrados demonstram os inegáveis avanços alcançados pelas políticas públicas de planejamento reprodutivo, particularmente no que diz respeito à ampliação do leque e do quantitativo de métodos anticoncepcionais distribuídos gratuitamente. 406

O conhecimento de métodos anticoncepcionais estendeu-se universalmente e apresentou um aumento no número de métodos modernos conhecidos, que passou de 7 para 10. A maioria das mulheres em idade fértil já fez uso de algum método anticoncepcional, sendo este percentual de quase 100% entre as mulheres sexualmente ativas.

Controle no Brasil

Houve um aumento de 12,4 pontos percentuais na proporção de mulheres em idade fértil que estão fazendo uso de algum método no período de 1996 a 2006 (de 55,4% para 67,8%) e de 3,9 entre as mulheres em idade fértil (de 76,7 para 80,6%). No Brasil a prevalência por método anticoncepcional entre mulheres em idade fértil (MIF) demonstra uma mudança profunda em relação à situação revelada pela PNDS 1996, quando a anticoncepção estava praticamente restrita a dois métodos, quais sejam: 40% das mulheres laqueadas e 20,7% fazendo uso de pílulas. Nesses aspectos a ANVISA torna-se indispensável para controle de medicamentos injetáveis ou não.

Destaca-se o uso de injetáveis que triplicou passando de 1,2 para 4% das MIF unidas.

405 Na Rússia, em Novotishevoye, um dos milhares de vilarejos russos cuja população vem se mudando para as cidades e tendo menos filhos, o governo comprometeu-se a pagar 11.500 dólares às mulheres que tiverem um segundo filho. (Randy Olson – revista National Geographic – jan/2011). 406 O fim do “baby-boom” costuma ter dois efeitos importantes na economia e consequentemente na saúde das pessoas de um país. O primeiro é o “dividendo demográfico” – algumas poucas décadas afortunadas durante as quais os membros dessa geração inflam a força de trabalho, ao mesmo tempo em que se mantém baixa a quantidade de dependentes jovens e idosos; em conseqüência, sobra mais dinheiro para outros gastos. Mas em seguida vem o segundo efeito, quando todos esses trabalhadores envelhecem e começam a se aposentar. O que antes parecia uma situação demográfica perene agora virou uma festa prestes a acabar. Um problema se apresenta hoje a todo mundo desenvolvido: o de achar meios para sustentar uma população cada vez mais idosa. A pergunta que não cala de Frans Willekens, do Instituto Demográfico Interdisciplinar dos Países Baixos é se em 2050 vai haver trabalhadores em quantidade suficiente para assegurar o pagamento das pensões?. (National Geographic - pág. 62 – janeiro/2011 – artigo de Robert Kunzig). 407 Sugere-se ler – “A verdade sobre os laboratórios farmacêuticos” – Angell, M. RJ – Record – 2007.

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Também o uso das pílulas e do DIU apresentou acréscimos, respectivamente, de 20,7 para 24,7% e de 1,1 para 1,9%. Entre as MIF 12% já tiveram experiência de uso da pílula do dia seguinte, 23,2% no grupo das não unidas sexualmente ativas e 11% das MIF.

Digno de nota é o fato de que no universo de mulheres em idade fértil o uso da pílula superou a porcentagem de mulheres laqueadas. As farmácias continuam a ser a maior fonte de obtenção de métodos hormonais (pílula e injetáveis) e da camisinha, enquanto os serviços do SUS o são para a esterilização feminina, e os serviços privados para a esterilização masculina. Na PNDS/2006 o SUS passou a ser a maior fonte de obtenção do DIU (de 47,4 para 59,4%).

A PNDS/2006 mostra ainda que no Brasil foi alcançada a cobertura universal da atenção ao pré-natal e ao parto institucional atendido por profissional de saúde qualificado. A PNDS/2006 evidenciou um grande avanço no acesso de gestantes do meio rural ao pré-natal.

Em 1996, 31,9% dessas mulheres não se submetiam a nenhuma consulta pré-natal. Em 2006, esse número caiu para 3,6%. No meio urbano, a redução foi de 8,6% para 0,8% de mulheres sem nenhuma consulta. Houve um aumento em 17 pontos percentuais das gravidezes em que a primeira consulta pré-natal ocorreu no primeiro trimestre da gestação (de 66 para 83%) com relação à PNDS realizada em 1996. Também a realização de quatro consultas ou mais de pré-natal sofreu um aumento em 13% , (de 77 para 90%).

A PNDS/2006 demonstra que no mínimo seis consultas de pré-natal, conforme estabelecido pelo Ministério da Saúde, ocorreu em 77% das gestações. Vale ressaltar que a Organização Mundial de Saúde considera um programa de saúde pública implantado quando atinge cobertura de 80% dos/das beneficiárias. Comparando aos resultados da PNDS/1996 houve um grande aumento na adesão ao cartão de pré-natal que passou a ser utilizado por 94,5% das gestantes.

O Plano introduziu ainda variáveis que permitem avaliar alguns aspectos relativos à qualidade da atenção prestada. Demonstrou que a determinação da pressão arterial seguida da tomada de peso são procedimentos praticamente universais, pois foram realizados em mais de 98% das gravidezes, independentemente das características sócio-demográficas avaliadas. Dentre a natureza dos exames realizados, o exame de urina foi realizado em 86,3% das gestantes e os exames de sangue em 91,3%.

As pesquisas mostram que o Brasil quase alcançou a cobertura universal da atenção ao parto institucional atendido por profissional de saúde qualificado significando um aumento em 7% em dez anos. Os partos assistidos por parteiras leigas mantêm presença nas regiões Norte e Nordeste, onde representam respectivamente 5,8% e 3,6% dos nascidos vivos.

Esse plano introduziu variáveis que permitirão avaliar alguns aspectos relativos aos procedimentos preconizados pelo Ministério da Saúde para garantir uma atenção humanizada ao parto, quais sejam: 28% das gestantes tiveram acesso a medidas

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farmacológicas407 e não farmacológicas para o alívio da dor; 16% à presença de acompanhante no momento do parto; e quase 90% dos nascimentos ocorreram no primeiro serviço procurado, apesar de só 40% das gestantes terem sido informadas do local do parto durante o pré-natal.

Home Care Com relação a outros atendimentos muito se fala do médico de família e do Home Care. As possibilidades de “Home-Care” surgiram nos Estados Unidos por volta de 1947 logo após o pós-guerra. Várias enfermeiras se reuniam para atender os milhares de pessoas com problemas de saúde em suas casas. Trata-se de uma desospitalização. Os hospitais não tinham leitos suficientes e as filas para internação aumentavam consideravelmente. Por volta de 1960 é que se percebeu que era algo sério e caro. Surgiram então as “Nursing Home”, que eram as enfermeiras que atendiam pacientes em sua própria casa para diversos tipos de patologias. Evidentemente os custos para todos baixavam e verificou-se que o “Home-Care” poderia ser uma realidade que interessava a todos. Atualmente nos EUA, existem mais de 20.000 organizações de “Home-Care” e até 2000 a quantidade de pessoas atendidas nesses sistemas, chegou a mais de 7 milhões de americanos. As quedas nos custos poderão variar entre 20% a 60% conforme a enfermidade. Há estudos já bem avançados de pagamentos de plano – enquanto jovem – para garantir os cuidados em idade bem avançada. Evolução das casas de repouso atuais. No Brasil os dados não são oficiais, mas, estima-se que existam mais de 80 empresas dessa natureza de “Home-care”. Muitas delas ainda, só fazem tratamentos geriátricos e outras só cuidam de pacientes com pneumopatias e cardíacos. Em resumo, o “Home-Care” será, em breve futuro, uma forma de desafogar os leitos hospitalares e dar maior longevidade às pessoas. Esse fenômeno também afetará o estado de saúde da população e da demografia no futuro. A Telemedicina Entre outros benefícios futuros está a Tele-Medicina e mais, dentro de alguns anos, muitas doenças poderão ser diagnosticadas ou tratadas com sucesso. É o caso do câncer.408 Ela possibilitará levar assistência médica com rapidez aos lugares mais longínquos. As aplicações mais imediatas são os correios eletrônicos proporcionando trocas de informações entre o médico e o hospital a grande distância. Todos esses elementos farão parte dos estudos das morbidades afetando também diretamente dados sobre a Saúde e a Demografia. Profissionais do ramo já fazem palestras sobre o novo tipo de atendimento na área de saúde que a tecnologia possibilitará aproximando os serviços médicos do paciente, onde quer que ele esteja. Estima-se que: "90% das necessidades da Tele-medicina 408 A batalha contra o câncer, doença que mata mais de cem mil brasileiros por ano, está acontecendo nos hospitais, nos laboratórios, nas nossas casas, corpos e nos núcleos de todas as células. O câncer é insidioso. É difícil de detectar enquanto as células proliferam sem controle. Algumas vezes, ele é provocado por mutações no DNA herdado dos pais, acionadas pelas condições pouco saudáveis ao longo da vida, como exposição à radiação, ingestão de substâncias químicas danosas, vírus, cigarro e outras.

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serão supridas pela Internet, que permite, por exemplo, que um médico especialista acesse, em qualquer lugar do mundo, o prontuário do paciente, verificando o laudo de exames ou funções vitais." 409 A utilização da Tele-medicina tem também como vantagem, segundo coordenadores médicos dos projetos de Tele-medicina do Instituto de Cardiologia do Triângulo Mineiro, uma redução de investimentos e informam que: "Interligar um computador à Internet é muito mais barato do que montar uma unidade hospitalar", afirmam. 410 Implantação do chip de controle sob a pele também é elemento futuro, bem como dos genes humanos. Tais estudos e ainda o resultado futuro do Projeto Genoma Humano, serão estatisticamente possíveis dentro de alguns anos, os quais com ética e considerando novos aspectos jurídicos específicos de cada caso, deverão dar novo rumo às precificações de seguros, planos de saúde, seguros saúde, previdência privada e os fundos de pensão que deverão talvez - até levar em conta - quando da contratação de uma pessoa por uma empresa - quais são as chances dela ter alguma doença que possa comprometer sua saúde para os seus próximos anos. No caso da Previdência Privada, as pessoas que, eventualmente tenham possibilidades de contrair determinadas morbidades que possam comprometer seu futuro, poderão antecipar seus depósitos futuros no sentido de aumentar suas contribuições e chegar mais cedo ao valor do montante que permitirá uma aposentadoria complementar que possa permitir uma renda razoável quando de seu afastamento da vida produtiva. No caso dos seguros, as companhias poderão exigir um seguro maior ou menor em função dessas probabilidades futuras, bem como as empresas de assistência médica e outros negócios que envolvam morbidades, longevidade e conseqüentemente pagamentos ou despesas futuras. Tudo dependerá evidentemente da ética e da legislação competente que estiver vigorando na época. Estudos mostram que dobrar a longevidade não é algo tão distante assim mas terão conseqüências que ainda estão em fase de análises, cuidados e especulação. O caminho já foi aberto. Os cientistas geneticistas – estão modificando genes de insetos e dobrando a longevidade deles. 411 É apenas o início. Custos e riscos envolvidos

409 Roberto Botelho - Diretor e coordenador dos médicos do projeto de Tele-Medicina do Instituto de Cardiologia do Triângulo Mineiro. 410 Idem 472 411 – por exemplo, a mosca Drosophila melanogaster. - Conhecida como mosca das frutas. Curiosamente, o gene da longevidade foi batizado de INDY, sigla para “I am not Dead Yet” (Eu ainda não estou morto). O nome é inspirado numa piada do filme de Monty Python em Busca do Cálice Sagrado.

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Não se pode esquecer que em todos esses aspectos deverão sempre, ser considerados aspectos econômicos no tempo. Os índices inflacionários decorrentes de altas e baixas da inflação, mudanças de governos, administrações econômicas irresponsáveis e todos os riscos sistêmicos possíveis de acontecer. Todos esses aspectos poderão levar os valores de planos de saúde, previdência e seguros a se tornarem insustentáveis quanto maior o prazo de aplicação ou valores segurados. Sob os aspectos de custos envolvidos nas áreas de saúde, ainda há dados e informações não muito precisas. No Brasil, na área privada, tendo em vista as exigências da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar em exigir os dados estatísticos de todas as operadoras a partir de Dezembro de 2002 e também informações ao SUS, dos hospitais e clínicas, serão obtidas informações mais precisas dos atendimentos hospitalares, morbidades acontecidas, doenças de alta complexidade e informações de idade, sexo e outras. O que se sabe é que os seguros e planos de saúde, ainda até os dias que iniciaram o século 21, fazem seus cálculos com base em “Bench Mark” de concorrentes, os quais também assim o fizeram, ou seja, utilizando-se de métodos cientificamente ou estatisticamente não muito confiáveis, cujas demonstrações fazem parte de Notas Técnicas não muito precisas estatisticamente, até para os especialistas, principalmente de empresas que iniciam suas operações e pouco têm de base de dados. Em resumo, é necessário que se desenvolvam estudos de sobrevivência e morbidades baseados em tábuas de morbidade reais, considerando que as leis biológicas alteram-se ao longo do tempo na proporção em que são aumentados os serviços de saúde pública, privada, saneamento, prevenção e desenvolvimento da medicina e medicamentos. Análise e prospecção Numa viagem ao futuro, a história se passa daqui a 30 anos e o impacto é quase o mesmo. Uma pessoa descobre que tem câncer de cólon, uma doença gravíssima. A notícia abala a família. Ela vai ao médico e começa o tratamento. Mas então, seu sofrimento não será tão terrível. O Oncologista tira algumas células do tumor da pessoa e as coloca em um microchip. Em minutos, são identificados os genes mutantes que provocam a doença. Graças ao Projeto Genoma, os cientistas desenvolveram remédios que funcionam de maneira muito eficiente. O Oncologista seleciona as drogas relacionadas aos genes, danificados do paciente, mas que não atacam as suas células saudáveis. Além do entusiasmo com os enormes benefícios que poderão advir das descobertas genéticas, está a preocupação com algumas de suas conseqüências sociais. Não se fala aqui da criação de seres reengenheirados para não apresentarem doenças, ou ainda, para terem características de comportamento e aparência considerados ideais. O problema que já se apresenta em alguns países onde os testes genéticos estão mais disseminados é a possível manipulação das informações sobre a saúde das pessoas.

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Nos EUA, por exemplo, são realizados cerca de 4 milhões de testes genéticos por ano. Graças a eles, se pode tratar problemas graves, como anemia falciforme 412, fenilcetonúria 413 e doenças de tiróide congênita, desde o nascimento. Além disso, os testes indicam predisposição a males como o câncer de mama, que a pessoa terá no futuro, possibilitando o tratamento preventivo. Infelizmente, há doenças de origem genética que ainda não têm cura. No ano passado, por exemplo, o Reino Unido colocou à disposição das seguradoras dois testes genéticos para “coréia de Huntington” 414 uma doença grave que afeta o raciocínio e a locomoção. A decisão causou controvérsia. Outros especialistas temem o uso que as seguradoras poderão fazer dos exames genéticos. “Com a facilidade de se obter uma amostra do DNA de uma pessoa, muitos vão querer cruzar a linha e invadir a privacidade alheia” , alerta do diretor do Instituto Whitehead para Pesquisas Genômicas dos EUA, Eric Lander, no The New York Times. As seguradoras brasileiras e de outros países já cobram o que chamam de agravo em caso de doenças pré-existentes. Com as possibilidades abertas pelos exames genéticos, ele poderá ser mais elevado ainda, mas, no caso de pessoas saudáveis de fato, os valores de seguros poderão cair. O tempo vai mostrar o que de fato acontecerá, pois, por enquanto, temos estudos e especulações. A invalidez

412 Anemia falciforme é uma doença hereditária (passa dos pais para os filhos) caracterizada pela alteração dos glóbulos vermelhos do sangue, tornando-os parecidos com uma foice, daí o nome falciforme. Essas células têm sua membrana alterada e rompem-se mais facilmente, causando anemia. A hemoglobina, que transporta o oxigênio e dá a cor aos glóbulos vermelhos, é essencial para a saúde de todos os órgãos do corpo. Essa condição é mais comum em indivíduos da raça negra. No Brasil, representam cerca de 8% dos negros, mas devido à intensa miscigenação historicamente ocorrida no país, pode ser observada também em pessoas de raça branca ou parda. Quando descoberta a doença, o bebê deve ter acompanhamento médico adequado baseado num programa de atenção integral. Nesse programa, os pacientes devem ser acompanhados por toda a vida por uma equipe com vários profissionais treinados no tratamento da anemia falciforme para orientar a família e o doente a descobrir rapidamente os sinais de gravidade da doença. Também é detectada com o exame Teste do Pezinho. (Fonte: http://bvsms.saude.gov.br/html/pt/dicas/127anemiafalci.html) – acessado em 14/07/2011.

413 A fenilcetonúria é uma doença genética, em que alguns alimentos podem intoxicar o cérebro e causar retardo mental irreversível. As crianças que nascem com esta doença tem um problema digestivo em que um aminoácido presente na proteína dos alimentos, a fenilalanina, seja “venenoso para o cérebro”. A ausência da enzima responsável pela digestão e eliminação da fenilalanina não é eficiente e assim, faz com que ela se acumule no organismo tornando-se tóxica. A doença afeta principalmente o cérebro e tem efeitos irreversíveis, como retardo metal permanente. O diagnóstico da fenilcetonúria pode ser feito no recém-nascido por meio de triagem neonatal muito simples, conhecida como “Teste do Pezinho“, geralmente ainda na maternidade. O diagnóstico precoce da fenilcetonúria permite que os cuidados necessários com a alimentação sejam tomados desde o princípio, evitando uma série de efeitos indesejados, que se apresentam logo no primeiro ano de vida do bebê, mas que podem ser todos evitados embora nunca possam ser revertidos. (Fonte: http://www.tuasaude.com/fenilcetonuria/) – acessado em 14/07/2011.

414 A coréia de Huntington é uma afeção degenerativa progressiva do sistema nervoso com padrão de herança autossômico dominante de penetrância completa. A síndrome foi descrita por George Huntington em 1872. Tem uma incidência estimada de 5 a 10 casos por 100.000 indivíduos. Os pacientes apresentam uma expansão da trinca CAG presente na porção 5’ do gene IT15 no braço curto do cromossomo 4, resultando na formação de uma proteína funcionalmente alterada. O quadro sindrômico caracteriza-se por movimentos involuntários coreiformes e alterações cognitivas que se desenvolvem em torno dos 40 anos de idade, progredindo até a morte em um período de aproximadamente 10 a 15 anos. Fonte: Artigo dos acadêmicos em medicina Fernando Andersson Chemale et all – Porto Alegre de 30/10/2000. http://genetica.ufcspa.edu.br/seminarios%20textos/Huntignton.pdf (acessado em 14/07/2011).

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Invalidez é uma forma de decremento da população estudada. Seus estudos mais profundos pertencem aos Seguros Sociais. A invalidez de um segurado poderá ser total ou parcial. Poderá ser invalidez permanente ou temporária. Poderá ser provocada por fatores de saúde naturais, como, por exemplo, a senilidade, alguma moléstia que venha causar a invalidez ou ainda, por acidente. A senilidade ou velhice leva o segurado à aposentadoria por idade. Poderá ser indenizada na forma de pagamento único ou transformada em rendas. A invalidez faz parte contratual de seguros de vida em grupo como complemento ou não de cobertura do evento morte por causas naturais ou acidentais. Historicamente, o seguro que trata da invalidez surgiu no período da revolução industrial, cujas condições de trabalho e maquinaria expunham os operários a perigos e riscos constantes para a sua saúde, conforme a atividade. Casos de parcial ou total incapacidade para o trabalho, bem como auxílio funeral, foram objeto de seguro nos países europeus mais avançados desde o final do século XVIII e XIX especialmente na Alemanha, Inglaterra e Áustria.415 Muitos levantamentos e estudos do SUS no Brasil existem sobre o assunto. Existem também as experiências de invalidez das próprias seguradoras que podem ser utilizadas com aval do órgão normativo oficial. 416 No Brasil não se utiliza taxa de invalidez para pessoas menores de 14 anos. Há uma relação direta entre os estudos de invalidez e a morbidade. Nestes apontamentos técnicos, os aspectos relativos a morbidade são estudados em capítulo à parte nos seguros de saúde, planos de saúde e convênios, os quais foram regulamentados a partir da Lei 9656/98 e a criação posterior da Agência reguladora - ANS - Agencia Nacional de Saúde Suplementar, embora haja também muitos estudos interessantes resultado de levantamentos efetuados das áreas de atendimento á saúde pública. Trata-se de estudos que envolvem as moléstias que atacam o ser humano levando-o à incapacidade e / ou à morte. O estudo da morbidade é vasto sob o ponto de vista estatístico e precedem as análises - que consideramos - ainda incipientes sobre o assunto e deveriam sofrer ajustes para atualização de seus valores tendo em vista uma série de medidas preventivas – principalmente na área trabalhista - como a utilização de equipamentos especiais, manuais de prevenção, comissões de prevenção de acidentes - CIPAS nas mais diversas atividades, como, por exemplo, na construção civil, usinas, indústrias químicas, eletricidade, nuclear e muitas outras. As CIPAs e a Medicina Ocupacional vieram para ficar. CAPÍTULO 5

415 Na década de 30 tal assunto já era preocupação dos sindicatos e governos no Brasil. Um Atuário brasileiro de nome Clodoveu de Oliveira, executou estudos à respeito que foram adotados pelo governo brasileiro em 1935 através de Decreto. (Weber - pag. 266 - vol. 4)). Antes disso, outro Atuário de nome E. Hamza, apresentou um desenvolvimento de exaustivos estudos de acidentes no trabalho, no III Congresso Internacional de Paris em junho de 1900. 416 SUSEP - Superintendência dos Seguros Privados, IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, SPC - Secretaria da Previdência Complementar, SUS – Sistema Único de Saúde.

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Sistemas de Saúde no mundo: custos da atenção à saúde Como os gregos, os antigos Romanos tinham conhecimento da influência ambiental sobre a saúde. Com os Etruscos aprenderam a construir esgotos e a drenar pântanos. A Cloaca Máxima foi construída no século 6.º a.C. De início, drenava pântanos para o Tibre; mais tarde, foi adaptada para ser esgoto. O primeiro aqueduto trazendo água para a cidade foi concluído em 312 a.C., possibilitando a construção de banhos públicos. Havia um esboço de administração sanitária com leis que dispunham sobre a inspeção de alimentos e os locais públicos. Leprosários também já existiam e chegaram à Europa, a aproximadamente vinte mil unidades. 417 (Scliar – 1987). No Bhagvata Purana, livro sagrado dos hindus referido por Stallybrass418 está a observação de que “a peste é iminente, quando um rato cai do forro, salta desordenadamente no solo e morre em seguida”. São conhecidas as referências de Heródoto de que a peste que dizimou 175.000 soldados de Sennacherib era tida, àquele tempo, como associada ao rato, assim como o contágio da lepra e da gonorréia constantes do Levítico.419 A idéia de transmissão das doenças remonta aos primórdios da civilização atual, quando já eram recomendadas pelos hebreus medidas de isolamento para os leprosos, levadas até à impiedade em algumas circunstâncias. A associação da peste com os ratos era igualmente suspeitada pelos chineses, hindus, hebreus e gregos. No período das Cruzadas, entre 1095 e 1270, e posteriormente no rastro da invasão dos hunos e tártaros, apareceu a peste e a sua transmissão se fazia de forma epidêmica na Europa, progredindo de país a país e recrudescendo sempre que havia novos suscetíveis a vitimar. O fechamento das portas das cidades e sua evacuação, por todos os que tinham condições de fazê-lo, nos surtos pestilenciais, demonstravam a noção de contágio já existente no passado, antes mesmo da descoberta dos micróbios. A observação de que a invasão se processava inicialmente pelos portos, era a noção corrente. No fim da Idade Média a situação começa a mudar. A medicina leiga torna a se desenvolver, particularmente em Salerno, Itália, em 1240 com a criação de uma Escola Médica nesse ano.

417 Fonte: Guia do Estudante - http://guiadoestudante.abril.com.br/estudar/historia/lepra-doenca-estigma-434502.shtml - artigo na revista de Moacir Scliar – 01/01/2006. 418 Livro de C.O. Stallybrass – “Principles of Epidemiology”. (Apud – Rodrigues) – pág. 11

419 Levítico é o terceiro livro da Bíblia. Faz parte do Pentateuco, os cinco primeiros livros bíblicos, cuja autoria é, tradicionalmente, atribuída a Moisés e um dos livros do Antigo Testamento da Bíblia e possui 27 capítulos. Os judeus chamam-no Vayikrá ou Vaicrá. Basicamente é um livro teocrático, isto é, seu caráter é legislativo; possui, ainda, em seu texto, o ritual dos sacrifícios, as normas que diferenciam o puro do impuro, a lei da santidade e o calendário litúrgico entre outras normas e legislações que regulariam a religião. (Wikipédia).

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Ao tempo em que florescia o comércio das cidades de Gênova e Veneza, com suas agências distribuídas nos empórios do Oriente próximo e na Criméia,420 a Europa foi devastada pela chamada peste negra, em 1347, cuja invasão se deu por Gênova, onde a doença se manifestou poucos dias depois da chegada de um navio procedente de Caffa, na Criméia. Nasceu então a idéia de proteção contra situações semelhantes no futuro e no ano seguinte, em 1348, Veneza estabeleceu a primeira providência de defesa coletiva de saúde, instituindo a trintena, posteriormente ampliada para quarentena, destinada a proteger sua cidade contra a invasão da peste, trazida por viajantes chegados de regiões assoladas. No século XVI a lista das doenças que atemorizavam a Europa, sofre um acréscimo: a Sífilis. O nome vem do poema publicado em 1530 por Girolano Fracastorius (1478-1553) – Syphilis Sive Morbus Gallicus – Sífilis ou doença francesa).421 (Scliar – 1987).Os navios eram procedentes de áreas onde existia a peste e eram obrigados a permanecer por espaço de trinta a quarenta dias, isolados e ao largo. Gênova, Ragussa e todas as demais cidades assim passaram a proceder. As cartas de saúde passaram então a ser instituídas a partir do século XVII, para entrada de navios em portos estrangeiros. No Ocidente, a Idade Média ficou conhecida como a Era das Trevas, e do ponto de vista dos cuidados à saúde a denominação é exata. A queda do Império Romano e a ascensão ao regime feudal proporcionaram profundas e desastrosas conseqüências na conjuntura de saúde, na prevenção e no tratamento das doenças. A Idade Média pode ser considerada como uma época de pestilências. Os movimentos populacionais, a miséria, a promiscuidade e a falta de higiene dos burgos medievais, os conflitos militares. Tudo isso criou condições para explosivos surtos epidêmicos. Repetidas epidemias de peste, causada por uma bactéria.422 Todo esse estado de doenças e epidemias atravessou séculos. A partir do século XVII, os Estados tentavam de algumas formas, resolver os graves problemas de saúde pública até então. Houve a necessidade então urgente de proteger as populações, principalmente as classes menos favorecidas economicamente que, pela falta de assistência e recursos, sofriam o impacto mais forte da morbidade e da letalidade.

420 Atual Ucrânia 421 A obra de Fracastoro sobre o contágio - De Contagione - foi escrita numa época em que o misticismo da Idade Média não havia ainda desaparecido e a ciência moderna não havia nascido. A noção de contágio, sim. Tanto que as pessoas fugiam da peste, ou isolavam-se, como narra Boccacio no Decameron. Aliás, a peste inspiraria não só contos, ou a novela de Camus, mas também uma canção famosa. Aconteceu em 1679, em Viena. Quando a peste chegou, a população, em pânico, abandonou a cidade. Uns poucos ficaram; entre eles, o cantor de baladas Max Augustin, que na ocasião compôs a conhecida Ach, Du lieber Augustin. Depois bebeu tanto que ficou em coma. Dado por morto foi jogado numa vala comum com cadáveres de vítimas da peste. Mas escapou de pegar a doença; as pulgas transmissoras de Pasteurella pestis abandonam os cadáveres – de homens e ratos – tão logo esfriam. (Scliar, 1987). 422 Pasteurella pestis que é transmitida pelas pulgas dos ratos. (Scliar, 1987).

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Doenças, epidemias nos Séculos XVIII e XIX A revolução industrial, iniciada na segunda metade do século XVIII, iria determinar profunda repercussão na estrutura social da humanidade e sobre a saúde coletiva. (Rodrigues – 1967), todavia, muitos fatos e descobertas relativas à saúde foram acontecendo. Todo esse problema repercutia na produção industrial que se ressentia da escassez da mão de obra necessária. Os governos não poderiam ficar indiferentes a tal estado de coisas, ignorando o problema e deixando-o aos cuidados de instituições religiosas, para que o resolvessem dentro das suas características de misericórdia. Coube à Inglaterra liderar o equacionamento da saúde pública no século XIX, quando, no reinado da Rainha Vitória, foram organizadas comissões para investigar as condições de saúde das classes trabalhadoras, assim como das grandes cidades e seus distritos. Como resultado de tais investigações foi criado em 1848, o primeiro Conselho de Saúde, considerado por William Welch, 423 como o marco inicial da saúde pública moderna, ao afirmar que pela primeira vez na história da humanidade a saúde do povo era integralmente reconhecida como importante função administrativa do Estado. Deve-se muito a Edwin Chadwick, 424 advogado e ministro inglês, nesse trabalho pioneiro. Nos EUA, a partir da publicação do relatório da Comissão de Saúde de Massachusets, em 1850, como resultado da atuação decisiva de Lemuel Shattuck, professor e estatístico, iniciou-se a administração sanitária oficial. Os programas de valorização de áreas subdesenvolvidas, em todo o mundo e no Brasil, em saúde, educação, saneamento básico, por exemplo, sentiram a importância de recuperar o homem como uma das metas mais importantes a atingir e os economistas passaram a incorporar tal concepção, como se comprova na Ata de

423 A trajetória de William Welch Deloitte está diretamente ligada à história da auditoria independente. Nascido na Inglaterra, Deloitte começou sua carreira muito cedo. Aos 15 anos foi trabalhar como assistente do Síndico da Corte de Falências de Londres, onde adquiriu todas as bases necessárias para a profissão de auditor, atividade que começara a tomar impulso devido ao lucrativo negócio de administração de massas falidas. Em 1845, aos 25 anos, abriu seu próprio escritório, em frente à Corte de Falências, na Basinghall Street. Nessa época foram aprovadas importantes leis que formaram o alicerce para as modernas sociedades por ações. Deloitte foi consolidando seu nome à medida que o setor de transporte ferroviário se expandia.

Fonte: http://www.deloitte.com/view/pt_BR/br/nossaempresa/historia/168a8d21091fb110VgnVCM100000ba42f00aRCRD.htm - (acessado em 14/07/2011).

424 Sanitarista britânico nascido em Longsight, nas proximidades de Manchester, pioneiro da saúde pública e incansável apóstolo da higiene, o primeiro a compreender a enorme importância da purificação da água e dos sistemas de esgotamento. Filho de um comerciante e influente político, James Chadwick, estudou advocacia em Londres e juntou-se a Unilitarian Society, onde encontrou Jeremy Bentham, James Mill, John Stuart Mill e Francis Place. Naquela época sua pátria achava-se em pleno desenvolvimento industrial e as condições de higiene haviam-se agravado, principalmente com o lançamento indiscriminado dos efluentes industriais líquidos nos arroios e rios. Fonte: http://www.dec.ufcg.edu.br/biografias/EdwiChad.htm (acessado em 15/07/2011).

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Bogotá 425 (1960)426 e na Carta de Punta Del Leste, 427 (1961) em cujas recomendações os programas de saúde pública aparecem vinculados aos planos de desenvolvimento recomendados. 428 Um exemplo dessa nova concepção é o olhar de Louis Pasteur onde a arma é o microscópio. A trajetória de Pasteur é um exemplo clássico de como o desenvolvimento depende da demanda das forças econômicas.429 Com o grande movimento científico devido a Pasteur, Koch, Lister, Semelweis, Villemin e tantos outros, o conhecimento humano e a técnica se aprimoraram, modificando conceitos e rotinas e revolucionando o panorama sanitário. Assumiu tamanha importância o papel do governo nesse campo que o presidente Franklin Roosevelt proclamou ao tempo em que foi governador do Estado de Nova York, que o sucesso ou fracasso de um governo seria medido pelo bem-estar de seus cidadãos, e que o mais importante para um Estado deve ser sua saúde pública. As reuniões, conferências e convenções internacionais, desde a de Alexandria, em 1831, visando a estabelecer medidas de saúde – comuns - a serem aceitas e cumpridas pelos diversos países, como a de Paris em 1851, subscrita por 12 nações que se comprometiam a estabelecer acordos em bases razoáveis, a fim de uniformizar as medidas.

425 As mudanças na orientação da diplomacia norte-americana já se fizeram sentir em fevereiro de 1960, quando o presidente Eisenhower visitou o Brasil e buscou o diálogo, inclusive em relação à ruptura entre o Brasil e o FMI. E ficaram ainda mais patentes durante a reunião de Bogotá, onde as propostas brasileiras encontraram plena ressonância junto à delegação norte-americana, o que acabou por produzir um extenso documento – a Ata de Bogotá – preconizando detalhadas e concretas medidas de desenvolvimento econômico e social.

426 Em setembro de 1960, o Conselho da Organização dos Estados Americanos (OEA) realizou, através da convocação de uma comissão especial, uma reunião em Bogotá, que resultou na Ata de Bogotá, onde se reafirmava a noção de que o desenvolvimento econômico e o progresso social estão indissoluvelmente ligados, e que, somente poderão ser alcançados em ambiente que permita às Repúblicas Americanas preservar e fortalecer suas instituições livres e democráticas. Nesta reunião, os governos latino-americanos aceitaram a proposta, do Governo dos Estados Unidos da América, em estabelecer um fundo com o objetivo de fortalecer recursos de capital e assistência técnica, em termos e condições flexíveis, para apoiar os países que estivessem dispostos a iniciar, ou expandir melhoramentos institucionais efetivos. Fonte: http://cac-php.unioeste.br/projetos/gpps/midia/seminario2/trabalhos/educacao/medu01.pdf = (acessado em 16/07/2011). 427 Segundo a ordem estabelecida na Carta de Punta del Este, o modelo educacional proposto aos países latinos e particularmente ao Brasil, deveria ter como elemento primordial o desenvolvimento integral de cada ser humano, onde o espírito individual do homem se fortaleceria como parte decisiva na manutenção do pleno desenvolvimento social e econômico. 428 Um exemplo dessa nova concepção é o olhar de Louis Pasteur onde a arma é o microscópio. A trajetória de Pasteur é um exemplo clássico de como o desenvolvimento depende da demanda das forças econômicas.428 429 O microscópio tinha sido inventado no início do século 17, mas a microbiologia só começou a se desenvolver quando Pasteur, a pedido de industriais de vinho, estudou em 1863, o processo de fermentação, evidenciando a presença das leveduras que o causam. Demonstrou vários processos pela ação de microorganismos. No ano seguinte, a pedido do Ministério da Agricultura, isolou os germes causadores da doença em bichos-da-seda. Estudou depois o carbúnculo do gado e a cólera aviária e só a partir de 1880 começou a investigar doenças afetando seres humanos. Em 1880, Alphonse Laveran, que viveu entre 1845 e 1922, descobriu, em serviço na Argélia, o plasmódio causador da malária e Ronald Ross, que viveu entre 1857 e 1932, mostrou, na Índia, que a malária era transmitida por mosquito. Em 1798, Edward Jenner, que viveu entre 1749 e 1823, um médico rural da Inglaterra, constatou que as pessoas que ordenhavam vacas com vacina, não contraíam a varíola humana e resolveu usar o líquido das pústulas da vacina como agente imunizante. Em 14 de maio de 1796, inoculou um menino, James Phipps, com o líquido extraído de uma pústula de vacina adquirida por uma moça chamada Sara Nelmes, que, ordenhando vacas, adquirira a lesão. O garoto desenvolveu uma reação vacinal. Em primeiro de julho, Jenner inoculou-o então com o pus de um varioloso. Phipps não adoeceu. Estava imune à varíola.(Fonte: Apud Scliar – Donald R. Hopkins, Prince and Peasants, Smallpox in History. Chicago - The University of Chicago Press, 1983).

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A abertura do Canal de Suez, a introdução da navegação a vapor, diminuindo o tempo de viagem e os deslocamentos de grandes parcelas da população, especialmente, peregrinações religiosas à Meca, propiciando condições ideais para as infecções entre indivíduos provenientes de áreas endêmicas de peste, varíola, febre recorrente e cólera, agravavam a situação sanitária internacional, com riscos supervenientes, uma vez que haviam sido precários os resultados práticos das medidas propostas e aceitas pelos países convenientes. Os fracassos das conferências e convenções firmadas resultavam da ineficiência dos conhecimentos epidemiológicos da época e impossibilitavam medidas profiláticas positivas, apesar de, em 1829, Bretonneau de Tours,430 haver evidenciado a invasão de uma cidade pela febre tifóide e sua posterior transmissão de indivíduo a indivíduo. Houve também um estudo sobre a epidemia de sarampo ocorrida nas Ilhas Faros em 1846 e a evolução da cólera que se desenvolveu em Londres, pela contaminação de um poço, já citado, em Broad Street, Birmingham City, no ano de 1849. Era urgente resolver o problema e outros relativos também à higiene e efluentes decorrentes de urina e excrementos humanos. 431 A criação da Organização Mundial da Saúde - OMS Os esforços continuaram por parte das nações mais diretamente interessadas em encontrar um caminho. Assim, em 1894, foi firmada a Convenção de Paris, regulando os aspectos sanitários das peregrinações religiosas ao Oriente Próximo, em virtude das facilidades de invasão da peste pelo Canal de Suez. Em 1903 se consolidavam na Convenção Sanitária Internacional, outras convenções parciais assinadas de 1892 a 1897 e o século XX iria iniciar-se com o aparecimento das Organizações Sanitárias Internacionais. Surgiu no início de 1900, a primeira Organização Internacional da Saúde com a criação da Organização Sanitária Pan-Americana, instituída durante a segunda Conferência da União Pan-Americana, realizada na cidade do México. As Américas têm o privilégio de contar com a mais antiga organização sanitária mundial, funcionando ininterruptamente desde a sua criação. Essas foram as razões que determinaram, que quando da criação da Organização Mundial da Saúde - OMS, os países americanos forçaram o não desaparecimento da organização Pan-Americana da Saúde, passando a mesma, mediante acordo com a OMS, ser, concomitantemente, o seu Órgão Regional para as Américas. 430 Um hospital da França - (Hôpital Bretonneau (Tours) 431 O excremento era muito utilizado no campo. O water closet já era conhecido na Europa desde a era Elizabetana, mas não havia sistema de coleta de efluentes. A maior utilização de água para banho agravou o problema, porque as fossas sépticas passaram a transbordar. A solução era drená-las para o rio. O rio Tâmisa tornou-se um esgoto a céu aberto. Por outro lado, como havia uma taxa sobre janelas, as casas ficavam com pouca luz e ventilação, o que agravava os efeitos da poluição ambiental. Assim, a investigação sobre o cólera – que parecia uma doença dos pobres, dos habitantes de bairros miseráveis – só ocorreu depois que o surto de 1848 atingiu os moradores do aristocrático Albion Terrace. A tuberculose exalta os sentidos, fala-se em ‘ouvido de tuberculoso’ para significar uma audição apurada e as paixões, daí a mórbida atração que exercia sobre os românticos, evidenciada nos heróis e heroínas tuberculosos: Mimi, de La Bohème, Marguerite Gautier de A Dama das Camélias. Não poucos poetas românticos foram tuberculosos. Shelley e Keats, no Brasil, Castro Alves, Álvares de Azevedo. A doença era por vezes atribuída à eclosão de emoções. Franz Kafka, que morreu tuberculoso aos quarenta e três anos, negava-se a se aceitar como doente. Ele achava que era uma infelicidade por não conseguir se casar com sua noiva, Felícia Bauer. (Scliar, 1987).

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Como resultado da Conferência de Paris em 1903, outro órgão internacional, o Office International d’Hygiene Publique, surgia, por proposta da França. Seu funcionamento efetivo começou em 1909, dois anos depois de sua ratificação por 54 nações na Conferência de Roma, em 1907. Em abril de 1920, a Sociedade das Nações, criada após a primeira guerra mundial, instituía o Serviço de Informações Epidemiológicas, núcleo da Seção de Higiene daquela sociedade, o qual chegou a contar com 148 governos, como participantes de informes sistemáticos sobre ocorrências epidêmicas. (Rodrigues – 1967). Os dados relativos a todos esses países eram recolhidos por vários escritórios regionais que os retransmitiam para Genebra. Na época a Organização Sanitária Pan-Americana, com sede em Washington, recolhia dados da América e o Escritório de Cingapura, criado em 1924, recolhia os informes da Ásia, retransmitindo-os semanalmente pelo rádio para Genebra. O Escritório de Saúde do Sul do Pacífico, com sede em Melbourne, criado em 1926, cujos dados eram enviados a Genebra, via Cingapura e o Conselho de Quarentena de Alexandria, é quem tinha a missão específica de enviar os dados relativos ao estado sanitário dos peregrinos destinados aos lugares sagrados. Interessante, é que durante a Segunda Guerra Mundial 432 as convenções internacionais ficaram a cargo da UNRRA (United Nations Relief Rehabilitation Administration), que na época, foi a única entidade internacional de proteção sanitária, apesar de incipiente como auxílio médico-sanitário. A Segunda Guerra Mundial apressou o desenvolvimento dos antibióticos, o primeiro dos quais foi a penicilina, surgida a partir de uma observação casual de Alexander Fleming, que viveu entre 1881 e 1955, em 1926, e que a partir de 1943 se tornou disponível para uso clínico graças à colaboração de Howard Florey e Ernest Chain, que aperfeiçoaram o método de produção da droga.433 Apesar dos grandes resultados que as organizações sanitárias anteriormente existentes tinham representado para a economia dos países que detinham o comércio marítimo, as nações aliadas, ao se reunir e propor em Dumbarton Oaks 434 a criação da Organização das Nações Unidas – futura ONU - não fizeram qualquer menção explícita sobre qualquer agência especializada de saúde pública. Esse fato foi apreendido muito bem e contra ele lutou e conseguiu resultados, o assessor de saúde da Delegação Brasileira àquela reunião, Geraldo Horácio de Paula 432 A Segunda Guerra Mundial ou II Guerra Mundial foi um conflito militar global que durou de 1939 a 1945, envolvendo a maioria das nações do mundo – incluindo todas as grandes potências – organizadas em duas alianças militares opostas: os Aliados e o Eixo. Foi a guerra mais abrangente da história, com mais de 100 milhões de militares mobilizados. 433 Em 1944, Selman A. Waksman descobriu a estreptomicina que, combinada com outras drogas, revolucionou o tratamento da tuberculose e esvaziou os sanatórios que Thomas Mann descrevera em A Montanha Mágica. 434 Dumbarton Oaks Conferência - (21 agosto - 7 outubro, 1944), reunidos em Dumbarton Oaks, uma mansão em Georgetown, Washington, DC, onde os representantes de: China , o União Soviética , o Estados Unidos e o Reino Unido formulou propostas de uma organização mundial que se tornou a base para a Das Nações Unidas – futura ONU. Fonte: Enciclopédia Britânica - http://translate.google.com.br/translate - (acessado em 18/07/2011).

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Sousa, que apresentou as necessárias emendas ao projeto, consubstanciando nesse documento, o mínimo que se poderia incluir relativamente à saúde internacional, a começar pela inclusão do termo “ Saúde “, na própria carta das Nações Unidas. Depois de discussões continuadas, foi, afinal, apresentada a declaração brasileira relativa à saúde, à qual se associou a China. Daí resultou um Organismo Sanitário Internacional, para o qual foi apontada uma comissão técnica preparatória. A constituição da Organização Mundial da Saúde – OMS, foi aprovada em Conferência realizada em Nova York, no período de 19 a 22 de julho de 1946 e após muitas discussões foi aprovada e ratificada por 26 membros das Nações Unidas e Genebra foi escolhida para sede permanente da Organização e a primeira Assembléia Mundial de Saúde, validando vários princípios, foi realizada no período de 24 de junho a 31 de julho de 1948.435 Atualmente, o entendimento acerca desses princípios na área da saúde são tão relevantes que no Fórum Social Mundial, realizado em Porto Alegre em janeiro de 2005, houve a realização do I Fórum Social Mundial da Saúde. Nesse caso, os indivíduos envolvidos compreenderam a importância de pensarem a Saúde como um direito humano – e não um negócio - que transcende os entendimentos de governos. (Dantas, 2006). Novos rumos para a saúde no Brasil e em outros país es No Brasil as repercussões econômicas das doenças demonstram que, em conseqüência da elevada mortalidade entre os brasileiros que se acham em plena idade de produção, isto é, entre 15 e 60 anos, o tempo médio de vida de trabalho é quase sempre inferior ao dos habitantes de outras nações que conseguiram se libertar das doenças responsáveis pela situação reinante na época. Uma característica notável é o sentido da solidariedade, comum aos sistemas europeus. A comunidade e o governo suportam fortemente, tanto ideologicamente quanto com suporte financeiro, a noção de que o acesso universal á saúde é um direito do cidadão. Para o governo ser o principal fornecedor dos cuidados da saúde, depende de cada país, todavia, os valores subjacentes que estruturam os vários sistemas são similares. Tratamento de doenças crônicas, informações da mídia, envelhecimento das suas populações, custos de pesquisas farmacêuticas, requer conciliação de objetivos que se antagonizam, provocando conflitos.

435 Vale saber que a Organização Mundial de Saúde – OMS – vinculada ao Conselho Econômico e Social constitui-se uma das agências especializadas das Nações Unidas, cujas estruturas, com algumas modificações são formadas, conforme artigo 9.º da Constituição, pela Assembléia Mundial de Saúde, integrada por delegados representantes dos Estados-Membros e se reúnem uma vez por ano. Há também o Conselho Executivo, composto inicialmente por 18 pessoas designadas também pelos Estados-Membros, que se reúnem, pelo menos duas vezes no ano. O mandato é de três anos. Todo esse aparato gerou as Resoluções, o Regulamento Sanitário Internacional, o Programa de Trabalho e Orçamento e tem como missão a promoção e melhoria do padrão de saúde internacional, a elaboração de normas técnicas sobre os mais variados assuntos, tais como, trabalhos em portos aéreos e marítimos, atestados de vacinações conforme modelos internacionais, orientação para viajantes, expurgo de embarcações e outros cuidados. (Fonte: Humberto Dantas, 2006).

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Gastos em saúde São muitos os problemas que se tornaram debates constantes no mundo inteiro. Um deles é o crescente custo de saúde. Os outros são: o envelhecimento da população, conforme descrito no capítulo anterior, a prevalência de doenças crônicas e os custos farmacêuticos também crescentes. Todo esse aparato de problemas requer convergência de interesses no sentido de se lidar com um antagonismo que seja a menor possível. Esses objetivos conciliatórios envolvem o acesso igualitário, o objetivo de fornecer cuidados de boa qualidade, o objetivo econômico de conter custos e o objetivo político de garantir escolha do paciente e de obter informações dos profissionais médicos. Outras formas de análises em todo mundo, são os gastos anuais como proporção do PIB que poderá ser observado numa relação interessante: nos países de alta renda, 11,2% do PIB é aplicada em saúde, a média do planeta é de 8,5% e há dados citados do Brasil de 7,5% do PIB.

Gráfico 2

1ª. coluna – Brasil – 2ª. coluna – Argentina – 3ª. coluna – Japão – 4ª. coluna – França

– 5ª. coluna – Canadá – última coluna – EUA.

No Brasil, o gasto per capita com saúde passou de USD PPP 473 em 1996 para 765 em 2006; nos EUA, de 3.656 para 6.714. Nesse país, desde 1980, os gastos per capita em saúde cresceram 669%, enquanto que a inflação foi de 186%. Por que os gastos per capita em saúde crescem? Os gastos com saúde crescem mais do que a

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inflação e as rendas, principalmente por três motivos: o envelhecimento populacional, a incorporação de tecnologia e o aumento da renda. A revista Exame, em sua edição de novembro de 2009, afirma que apesar de o gasto brasileiro em saúde estar próximo da média global em termos relativos ao PIB, as despesas ainda são baixas em valores absolutos. Em termos per capita, a situação é a que consta da tabela na sequência. Tabela VIII Gasto anual per capita com saúde em US$ (Público e Privado) - 2006

Estados Unidos ...................................................................6.719

Canadá................................................................................3.673

Alemanha............................................................................3.465

França.................................................................................3.420

Inglaterra.............................................................................2.815

Argentina............................................................................1.205

México..................................................................................778

África do Sul ........................................................................715

Índia .....................................................................................86

Rússia..................................................................................698

Brasil....................................................................................674

China...................................................................................216

Fonte: OECD – and World Health Organization - 2006

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Sistemas de saúde em diferentes países Austrália O sistema de saúde australiano é considerado um dos melhores do mundo e combina fornecedores públicos e privados usando a tecnologia e o conhecimento científico para prevenir, diagnosticar e tratar as doenças. Enquanto o governo nacional se ocupa de criar as políticas, regulamentos e tipos de financiamento, cada um dos estados e territórios é responsável pela gestão de serviços públicos e pelo gerenciamento das relações com os profissionais de saúde e estabelecimentos hospitalares. A peça chave desta engrenagem é o Medicare, o serviço universal de saúde disponível para todos os cidadãos e residentes permanentes. Como agência do governo australiano, o Medicare é parcialmente financiado pelo Medicare Law, um imposto de 1,5% da renda para indivíduos de rendimentos intermediários, e de 2,5% para aqueles que tenham rendimentos altos e não sejam associados de seguros de saúde particulares. Ele engloba acesso a consultas médicas gratuitas em todos os hospitais públicos e cobre a maior parte dos honorários médicos por serviços de ambulatório. Este sistema básico de financiamento é complementado com o Pharmaceutical benefits scheme, que contribui com as despesas relacionadas com a compra de medicamentos. Através deste sistema, o estado australiano subsidia os medicamentos para fazer com que seu custo seja mais acessível. Existem ainda planos e subsídios especiais para áreas rurais ou, de uma ou outra forma, mais necessitadas. Além disso, Private Health Insurance gera incentivos para adquirir sistemas de cobertura de saúde privados, alternativos ao Medicare. Através deste mecanismo, famílias e indivíduos que pagam um seguro de saúde privado podem obter uma redução de 30% do prêmio do seu plano. Este subsídio é uma parte importante das iniciativas que o governo da Austrália está tomando para aumentar a percentagem de pessoas que fazem uso de sistemas particulares de financiamento. Isto permite uma maior direção de recursos para a medicina pública e contribui para garantir o acesso universal à saúde. Este tipo de incentivo por parte do governo faz com que a opção por planos particulares seja mais atraente. Alguns australianos preferem afiliar-se a um seguro de saúde privado para aproveitar uma cobertura mais ampla. Além disso, associar-se a um serviço particular acarreta, na maioria dos casos, menor tempo de espera na obtenção de horários para as consultas, especialmente para procedimentos médicos não essenciais. Desta forma, o estado federal australiano garante serviços de saúde confiáveis, de alta qualidade e acessíveis universalmente. Ao mesmo tempo, descentralizando o gerenciamento dos centros de saúde e a relação com os profissionais, deixa sob a responsabilidade dos governos estaduais e territoriais as decisões que possam ser afetadas por particularidades locais. Os esforços realizados a partir das políticas

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públicas para envolver organizações particulares, tanto organizações sem fins lucrativos como iniciativas e empreendimentos comerciais, fazem com que os serviços de saúde na Austrália sejam parte de um sistema sustentável e integrador dos diferentes setores da sociedade.436

Nos Estados Unidos da América - EUA

A cobertura para a saúde de forma universal está novamente sendo a bola da vez na linha de frente dos debates que envolvem políticos nos EUA. Há ainda mais de 45 milhões de americanos sem cobertura de saúde e isso é muito complicado, pois os custos de saúde são crescentes e o número de segurados não mostram sinal de redução. Os americanos gastam quase 16% do PIB com a saúde e ainda assim seus resultados têm baixa classificação quando comparados a outros países com economias desenvolvidas. O debate da criação de um modelo de cobertura universal norte-americano, e o exame de sistemas de saúde de outros países permite reflexões úteis sobre o que funciona e o que não funciona. Uma característica importante é o da solidariedade comum aos sistemas europeus. Atualmente, comunidade e o governo suportam fortemente, tanto ideologicamente quanto com suporte financeiro, a noção de que o acesso universal à saúde é um direito do cidadão.437 O sistema americano tem muita liberdade de contratação. Foi considerado o país mais avançado em sistemas de saúde empresarial, pois, sua identidade em saúde sempre foi de negócio, todavia, é considerado o pior na Saúde Pública. O Estado protege os idosos com mais de 65 anos pelo “Medicare” e os paupérrimos pelo “Medicaid”. Todo o resto da população está na cobertura privada com uma gama de planos e variedades de preços, atingindo perto da metade de toda a população ativa dos EUA. Houve e ainda há muitos problemas em decorrência da crise econômica porque passa os EUA. O excesso de liberdade em atividade estratégica como na saúde também não é a solução ideal, conforme mostra a história. É necessário um sistema híbrido e regulado. Talvez o Brasil esteja no caminho correto. A história dirá. É interessante notar que nos EUA, todos os produtos têm um fator moderador de utilização. O plano de saúde, seja individual, seja empresarial, não podem ser utilizados de forma indiscriminada. Trata-se de uma questão de consciência de custos e de cidadania. O sistema de saúde americano é extremamente liberal. 438 O filme de Michael Moore439 “Sicko - $O$ Saúde” – foi indicado ao Oscar em 2008 como melhor documentário e

436 Fonte: Intranet – Cassi – São Paulo. 437 O governo quer ser o fornecedor principal dos cuidados da saúde. Depende de cada país, no entanto, os valores subjacentes que estruturam os vários sistemas que são notavelmente similares. Todos os sistemas são afetados por desafios semelhantes ou similares. Estes desafios estão se tornando, rapidamente universais a todos os sistemas de saúde, incluindo aquele dos EUA e do Brasil. (Palestra Paulo Hirai – Milliman do Brasil – fev/2009 – na Abramge – SP). 438 Apud – Scliar – Mas fornece ao mundo muita pesquisa.

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mostra como funciona o Sistema de Saúde do Tio Sam. O vídeo está disponível nas locadoras. As palavras “sistema de saúde” e “comédia” não são facilmente encontradas na mesma frase, mas no mais recente filme de Michael Moore elas podem ser vistas lado a lado. Para mostrar como as coisas funcionam lá nos EUA, Moore ouve as histórias de vários americanos comuns cujas vidas foram despedaçadas, ou arruinadas pelo sistema de saúde americano. O filme mostra que a crise não somente afeta os milhões de cidadãos que não possuem seguro de saúde, mas também milhões de outros que pagam religiosamente suas prestações e que estão sempre lutando com a burocracia e com suas regras oficiais obscuras. Para provar que nem tudo está perdido, o cineasta compara outros sistemas de saúde visitando, o Canadá, a Inglaterra, a França e Cuba onde todas as pessoas recebem um bom atendimento médico de forma gratuita. Se gasta mais nos EUA com a saúde, por habitante, incluindo gastos públicos e privados, que em qualquer outro país do mundo, e o total de gastos está acima de 15% do PIB e, sem reforma, deverá chegar a 19,5% em 2017. 440 Starr (1982) 441 vê na ascensão da medicina norte-americana um esforço organizado, que transformou uma profissão que até o começo deste século gozava de escassa confiança do público num poderoso grupo técnico-profissional. Isto aconteceu, em primeiro lugar pela vinculação da medicina ao estabelecimento científico e tecnológico; em segundo lugar, pela peculiar relação entre médicos e pacientes, baseada numa ascendência do profissional sobre o cliente e no pagamento de honorários – fixados pelos profissionais – por serviços prestados. Em terceiro lugar, os médicos americanos conseguiram controlar seu próprio número. Em 1910, Abraham Flexner, comissionado pela Fundação Carnegie, publicou um relatório mostrando as más condições de ensino nas escolas médicas americanas; muitas faculdades foram então fechadas, reduzindo drasticamente o número de profissionais formados. Numa análise do livro de Starr (1982), Relman (1984) mostra que muitos destes aspectos são inerentes ao exercício da medicina; de um lado, o médico exerce o papel de protetor de seu paciente, e por isso tem relativa autonomia para decisões – embora esta seja contestada – por vezes em tribunais; de outro, o paciente precisa confiar no médico. Mas Relman (1984) 442 está de acordo com Starr (1982) no registro de um fenômeno preocupante: a ascensão das corporações que

439 Michael Moore dirigiu também “Fahrenheit - 11 de setembro e venceu no Oscar com “Tiros em Columbine” - Europa Filmes. 440 Em 2007, foram gastos US$ 2,26 trilhões, ou $7.439 por pessoa, com crescimento médio anual projetado de 6,7% entre 2007 e 2017. É o único país rico, industrializado que não assegura acesso à saúde de todos os cidadãos. Os cuidados com a saúde nos EUA são fragmentados e proporcionados por muitas entidades distintas. Os EUA são líderes em inovação médica, com um gasto per capita 3 vezes maior que a Europa. Os EUA também têm a maior taxa de sobrevivência que a maioria dos países principalmente para certas condições como o câncer. A OMS classificou o sistema americano como o primeiro em capacidade de resposta, o mais caro, 37º lugar em desempenho geral e 72.º lugar por nível geral de saúde, entre as 191 nações membros incluídas no estudo. Em 2008, a Commonwealth Fund classificou os EUA em último na qualidade dos cuidados da saúde entre os 19 países do estudo. (Fonte: Milliman – Palestra proferida por Paulo Hirai – 13/02/2009 – Diretor Superintendente e IESS – Instituto de Estudos de Saúde Suplementar). 441 Apud – Scliar – “The social Transformation of American Medicine” – NY – Basic Books, 1982. 442 Apud – Scliar - Arnold S. Relman – “The Power of the Doctors” – NYRB – 29/03/1984

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entraram no mercado da saúde com o objetivo declarado de obter lucros através do que é hoje uma vasta indústria. O futuro da medicina dependerá, diz Relman (1984) da escolha dos médicos. Terão de optar entre defender o interesse de seus pacientes ou se associar de forma empresarial às corporações. As questões colocadas por Starr (1982) e Relman (1984) remetem diretamente ao problema dos custos da assistência médica. O que se tem constatado em vários países é que, deixados sem controle, os custos da assistência médica tendem a subir num ritmo muito maior que o do processo inflacionário porventura existente. Pode-se dizer que, havendo dinheiro, há assistência médica e quanto mais dinheiro houver, mais assistência médica haverá. Este é um fato conhecido há muito tempo e que se traduz às vezes por situações curiosas. Nisso estão incluídos os produtos farmacêuticos e equipamentos tecnológicos. Na Jamaica, havia, em 1832, um médico para cada 1.822 habitantes, enquanto que em 1975 a proporção era de um médico para cada 3.509; e a Jamaica estava, obviamente, mais desenvolvida. Como se explica então, a diminuição da proporção médico/paciente? A razão é simples. Em 1832 os proprietários de escravos pagavam aos médicos uma quantia por cada escravo que eles tomassem sob seus cuidados, o que tornava lucrativa a prática médica nas fazendas e atraía profissionais. A Gazeta Mercantil reproduziu artigo do economista Paul Krugman, publicado no New York Times, de 04/07/2009, sobre os programas de saúde pública dos pré-candidatos à presidência dos Estados Unidos, assunto que dominava a campanha na época. A mulher do democrata John Edwards, que desistiu da disputa, botou lenha na fogueira ao afirmar em março que pelo projeto do republicano John McCain ficaria sem cobertura das seguradoras de saúde – e o próprio candidato também Elizabeth Edwards tem câncer incurável nos osso e McCain recuperou-se de um tumor. 443 Durante a realização de estudo sobre a saúde nos EUA, os autores Michael Porter e Elizabeth Teisberg (2007), formularam a hipótese de a crise da saúde naquele país dever-se a falhas na forma de competição, pois, objetivando a minimização de custos, esta acontece pela via de restrições de coberturas, procedimentos, limitação de serviços, gerando baixa qualidade e tratamento insuficiente, não agregando valor para o paciente. Segundo esses mesmos autores, nessa competição de soma zero, só um ganha, todos os demais envolvidos perdem. Para aprimorar a qualidade e reduzir os custos, Porter e Teisberg (2007) propõem um novo modelo competitivo, a competição de soma positiva, centrada na figura do paciente, baseada em valor e focada em resultados. Segundo os autores norte-americanos, valor na assistência à saúde é o resultado obtido na qualidade de vida por dólar gasto, considerada a condição de saúde do paciente, ou seja, a competição deve ser integrada em toda a linha de cuidado, desde

443 “Já estava na hora de alguém dizer isso e, em geral, salientar que a visão de McCain em matéria de assistência médica se baseia em economia vodu”, diz o texto, “de que a mágica do mercado” pode oferecer assistência médica barata a todos. É que o projeto de McCain não impede que as seguradoras neguem cobertura aos que, como ela e McCain, têm problemas de saúde pré-existentes. (Fonte: A Gazeta Mercantil de 07/04/2009 )

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o monitoramento e prevenção, passando pelo tratamento, estendendo-se até a reabilitação e acompanhamento do paciente. Dessa forma, as informações sobre o paciente e a família vão sendo acumuladas e compartilhadas podendo os resultados serem mensurados, analisados e relatados. Esse novo modelo, onde todos os envolvidos podem se beneficiar possibilita um controle sobre os custos e uma melhor qualidade da saúde dos cidadãos. Muito tem à ver com a questão do planejamento familiar também. 444 Quanto a políticas públicas e gestão, 84,7% dos cidadãos têm algum tipo de seguro saúde, seja através do empregador (59,8%), individual (8,9%) ou de programa governamental (27,8%) – há evidentemente sobreposição. 445 446 Os estudos de Porter e Teisberg (2007) é inovador ao sugerir uma série de estratégias possíveis para a crise dos serviços de saúde nos EUA, as quais podem implicar o aprimoramento da qualidade da atenção, aliada à redução de custos. Nesse sentido, ele poderá nos auxiliar como ponto de partida para se construir o significado de valor na assistência à saúde para que tenha como paradigma o princípio constitucional maior, que é a dignidade da pessoa humana como imperativo de justiça social, pois saúde é uma atividade onde o valor social se sobrepõe ao econômico. (Amorim – 2008). Ainda quanto a política e gestão americanos, considera-se elevado o custo administrativo, maior que nos países com sistema de pagador único. Harvard Medical School e Canadian Institute for Health Information: 31% do dinheiro da saúde, mais de U$1.000 por pessoa/ano, vão para gastos administrativos, quase o dobro do que o do Canadá.447 No caso do sistema privado americano comprar um plano de saúde não é tão simples como parece. 448

444 De acordo com a teoria da transição demográfica, as populações passam por três fases: na primeira, fecundidade e mortalidade evoluem paralelamente, e a população mantém-se estável; numa segunda fase a mortalidade diminui – pelas melhores condições de vida, atividades da saúde e assistência médica, a população aumenta, às vezes rapidamente – e é o que se chama de “explosão demográfica”; finalmente a fecundidade diminui e a população volta a ficar estável ou até diminui, como acontece com países europeus. A fecundidade o mais das vezes é espontânea, mas em muitos países – a China é o exemplo mais notável – resulta de programas governamentais. Questiona-se a validade desses programas como uma forma de, reduzindo o número de pobres também diminuir a pobreza, ou pela forma autoritária com que muitas vezes são impostos ou pelos altos custos, ou pelos interesses obscuros que muitas vezes os movem. A controvérsia vai até para a semântica, cujas expressões têm conotação distinta: controle da natalidade, planejamento familiar; dimensionamento da prole, espaçamento gestacional, etc. (National Geographic – pág. 58 – janeiro/2011). 445 Os programas do governo americano têm elegibilidade restrita e não há sistema nacional que garanta acesso a todos os cidadãos. Americanos não cobertos por saúde em 2007 somavam 15,3% de toda a população ou 45,7 milhões de pessoas. O sistema de saúde americano tem um grande número de atores. Há centenas de seguradoras e operadoras. Há grandes limitações para cobertura de saúde mental. (Fonte Milliman Brasil – Palestra Paulo Hirai – 13/02/2009 e IESS – Instituto de Estudos de Saúde Suplementar). 446 Na Abramge, em palestra de 13/02/2009, informa que um quarto dos pacientes acredita que seus médicos os expuseram a riscos desnecessários. Os clínicos gerais já não vêem seus pacientes quando estão no hospital. Médicos do hospital são em geral utilizados e não conhecem o histórico do paciente, pois, não tiveram relação prévia com ele, o que fragmenta os cuidados e em certos hospitais de especialidades, o uso de especialistas é requerido pelas seguradoras como medidas de redução de custos. 447 America’s Health Insurance Plans: gastos administrativos para planos privados são em média 12% dos prêmios; CBO (2008): gasto administrativo de seguradoras privadas é equivalente a 12% dos prêmios. Essas variações são atribuídas a economias de escala. Planos para grandes empregadores têm o menor gasto administrativo e os planos individuais têm o maior gasto. Tem havido muita reclamação dos provedores de serviço pela baixa remuneração; pacientes com seguro do governo tem dificuldade de encontrar provedores próximos para certos serviços médicos; Caridade para os que não podem pagar está às vezes disponível em qualquer facilidade médica e é em geral custeada por fundações sem fins lucrativos, ordens religiosas, subsídios governamentais e outros. Alguns Estados como

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O Estado de Massachusetts adotou um sistema de cobertura universal de saúde em 2006. 449Todos os residentes que tem poder de compra devem comprar seguro saúde. Isso se verifica pelo imposto de renda. O Estado provê planos subsidiados tal que quase todos possam ter um seguro saúde. Provê também um Fundo de Segurança da Saúde para pagar pelos tratamentos necessários daqueles que não podem comprar seguro ou são inelegíveis. Quanto ao aspecto público, as organizações de serviço público não estatais que já existem há muito tempo, mas que recentemente se originaram principalmente por causa da publicitação, transformação em organizações públicas não estatais – de organizações estatais ou de entidades constituídas voluntariamente por particulares - aos quais se atribui uma relação formal com o Estado, se expressa em fomento e fiscalização. A discussão é antiga e há muitas controvérsias. Implementar um sistema universal de saúde ou apenas melhorar o atual sistema americano é uma dúvida que paira sobre as cabeças dos norte americanos. Há muita divisão. Os defensores dizem que os custos dos não cobertos são, de alguma forma, arcados através de custos ocultos absorvidos por todos e que estender a cobertura reduziria custos e melhoraria a qualidade. Os oponentes defendem o direito das pessoas de optar pelo seu seguro saúde e que programas governamentais irão requerer aumento de impostos, trazer ineficiências administrativas, maior utilização e redução da qualidade. 450 A Lei de Tratamento Médico de Emergência obriga que todos os hospitais aceitem todos os pacientes, independentemente da capacidade de pagar, para cuidados em pronto socorro. 451 Usualmente estruturadas em forma de fundações de direito privado e associadas ao movimento de reforma da administração pública, elas representam a recuperação da prática antiga de ver as universidades e os hospitais como organizações públicas de direito privado. As universidades americanas, por exemplo, ainda que sejam divididas em universidades privadas e provinciais ou estatais, na verdade são todas públicas não estatais. Não são privadas porque não visam ao lucro, não são estatais porque não tem servidores públicos em seus quadros, nem estão subordinadas diretamente ao governo. Por outro lado, quanto aos hospitais, existe uma longa tradição de organizá-los como sociedades beneficentes. Essas novas instituições atuam no campo social, em particular educação e saúde, com recursos assegurados pelo Estado, submetidas a

Massachusetts e New Jersey e cidades como São Francisco já têm programas de subsídios e outros estudam programas similares. 448 O Underwriting médico é requerido para se comprar um plano de saúde. As seguradoras mitigam a seleção adversa de risco e gerenciam a diluição de risco através de análise de cada aplicação para ver condições pré-existentes. Há um pensamento geral que os proponentes do underwriting afirmam que isso assegura prêmios individuais o mais baixo possível e críticos argumentam que isso impede que pessoas com condições pré-existentes possam ter seu seguro-saúde. (Palestra Abramge – 13/02/2009 – Paulo Hirai – Milliman Brasil). 449 Nos EUA os Estados podem fazer suas leis próprias. 450 (IESS – 13/02/2009 – palestra na Abramge – Paulo Hirai). 451 Tal Lei não dá acesso a cuidados não emergenciais se o paciente não puder pagar. Prontos Socorros estão no limite da capacidade. Filas de espera se tornaram um problema nacional e ambulâncias redirecionam pacientes a outros locais. (Fonte: 396, 397, 398 – Milliman – Brasil – 13/02/2009 – Abramge – São Paulo – SP).

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uma relação contratual com ele e a certas exigências a respeito da conformação de seus órgãos deliberativos. (Pereira, Grau – 1999). Os EUA gastavam até recentemente entre 14% e 15% do PIB com saúde e sabemos que mais de 40% da população americana não tem plano de saúde. Interessante ainda é saber que na Inglaterra se gasta entre 6% e 7% do PIB e o sistema é público e universal. Se os sistemas funcionam ou não veremos em análises detalhadas em outros momentos. 452 453

De acordo com Barbara Starfield, as principais características da atenção primária à saúde (APS) são:

Constituir a porta de entrada do serviço — espera-se da APS que seja mais acessível à população, em todos os sentidos, e que com isso seja o primeiro recurso a ser buscado. Dessa forma, a autora fala que a APS é o Primeiro Contato da medicina com o paciente. Continuidade do cuidado — a pessoa atendida mantém seu vínculo com o serviço ao longo do tempo, de forma que quando uma nova demanda surge esta seja atendida de forma mais eficiente; essa característica também é chamada de longitudinalidade. Integralidade — o nível primário é responsável por todos os problemas de saúde; ainda que parte deles seja encaminhada a equipes de nível secundário ou terciário, o serviço de Atenção Primária continua corresponsável. Além do vínculo com outros serviços de saúde, os serviços do nível primário podem lançar mão de visitas domiciliares, reuniões com a comunidade e ações intersetoriais. Nessa característica, a Integralidade também significa a abrangência ou ampliação do conceito de saúde, não se limitando ao corpo puramente biológico. Coordenação do cuidado — mesmo quando parte substancial do cuidado à saúde de uma pessoa for realizada em outros níveis de atendimento, o nível primário tem a incumbência de organizar, coordenar e/ou integrar esses cuidados, já que freqüentemente são realizados por profissionais de áreas diferentes ou terceiros, e que, portanto têm pouco diálogo entre si.··.

O governo americano contribui com cerca de US$200 bilhões por ano, assegurando um sem-número de atividades sociais e contribuindo não só para a solidariedade e coerência do tecido social, mas para a produtividade econômica. É interessante ver que esses US$$ 200 bilhões são gastos essencialmente na área de saúde, não como contribuição filantrópica, mas como pagamento a instituições, inclusive muitas do

452 O governo americano subsidia o gasto com saúde pago pelo empregador isentando esses benefícios do imposto de renda. O valor desse subsídio é estimado em US$ 150 bilhões por ano. As despesas médicas qualificadas dos indivíduos são dedutíveis. Programas diretos do governo cobrem 27,8% da população que são 83 milhões, incluindo idosos, inválidos, crianças, veteranos e parte dos pobres. Programas do governo respondem por 45% dos gastos com saúde fazendo do governo o maior segurador de saúde do país. Quanto aos pagadores, hospitais e médicos negociam com seguradoras e operadoras para definir os níveis de reembolso. Algumas tarifas são definidas por lei. O valor pago a um médico por um serviço a um segurado é em geral menor que o pago do bolso por um paciente não segurado. 453 A propriedade do sistema de saúde está quase toda nas mãos do setor privado, embora os governos federal, estadual e municipal também tenham suas próprias instalações, mas 65% dos hospitais são privados e sem fins lucrativos. Existem também hospitais com fins lucrativos, bem como os pertencentes ao governo, sobretudo os municipais. Não há um sistema de instalações médicas de propriedade do governo e aberta ao público em geral. O Departamento de Defesa opera hospitais – Sistema de Saúde Militar – para o pessoal militar ativo. Veteranos e índios têm também sistema próprio. Os clínicos gerais são o ponto de entrada para a maioria dos pacientes, mas em um sistema fragmentado muitos pacientes e seus provedores têm problemas de coordenação dos cuidados: de cada 4 em 10 médicos reportam que seus pacientes têm tido problemas com a coordenação de seus cuidados, que 60% dos médicos reportam que seus pacientes às vezes ou frequentemente têm longas esperas para testes de diagnósticos e finalmente, 20% reportam que seus pacientes repetem testes devido a inabilidade de localizar os resultados já obtidos.

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terceiro setor que ganham as concorrências, pois são as mais eficientes nessa área do que o setor privado ou as administrações públicas tradicionais 454 Nesse conjunto de instituições americanas estão também as universidades e empresas de ponta em tecnologia que pesquisam tudo sobre saúde, bem estar, robotização e longevidade. Sabe-se que há muito tempo discute-se o impacto nos custos de um sistema misto público-privado nos EUA. Há defensores do mercado livre e eles dizem que gastos do governo com a saúde aumentam os seus custos, e a intervenção do governo cria um sistema distorcido de pagamentos a terceiros, tirando o paciente da escolha do financiamento e dos serviços médicos, o que afeta os custos. 455 456 457 Atendimento melhor à totalidade da população com acesso a novos remédios e tecnologias médicas, tudo isso é desejável, mas a pergunta que não cala é como ter isso sem tornar os custos insustentáveis e com a tecnologia avançando numa velocidade incrível. Numa reportagem efetuada por Roberta Paduan, na revista Exame (2010). Ela destaca que o cientista americano Raymond Kurzweill, 458 considerado uma das mentes mais brilhantes da atualidade, provocou espanto e ceticismo recentemente ao anunciar que estamos prestes a atingir um objetivo tão antigo quanto a própria vida – a imortalidade. Formado em ciências da computação pelo Massachusetts Institutute of Technology e detentor de alguns dos mais importantes prêmios de inovação, Kurzweil diz que o ritmo de avanço tecnológico é tão intenso que bastarão mais duas décadas para tornar o homem imortal. De um lado, novas gerações de remédios vão sufocar as doenças. De outro, a nanotecnologia e outras tecnologias serão utilizadas para construir órgãos vitais que substituirão os biológicos gastos pelo tempo. O fato é que ele afirma que existe um arsenal disponível para prolongar a vida que nunca foi tão robusto. Em muitos casos não é um médico que se debruça para operar o paciente – mas um robô. O cirurgião, sentado numa cabine ao fundo de uma sala, comanda quatro braços robóticos que se movimentam no interior do abdome do

454 Dowbor, 2005, p. 88. 455 A Sobre-Utilização é um dos principais fatores do aumento de custos nos EUA. O baixo nível de reembolso do Medicare e Medicaid aumenta a pressão de desvio de custo para o setor privado para compensar, o que aumenta o valor dos prêmios. Os defensores do sistema de pagador único, existente em outros países, indicam que nesses casos os resultados dos tratamentos são superiores e com menor custo. Os estudos mostram que se as reformas do sistema baseado em mercado não forem implementadas em uma base sistêmica e com salvaguardas, podem trazer mais problemas do que soluções. 456 Em 2007, 45,7 milhões de pessoas não tiveram cobertura de nenhum plano nos EUA. Desses, 37 milhões eram adultos em idade de trabalho, entre 18 e 64 anos e mais de 27 milhões trabalharam pelo menos em tempo parcial. 38% dos não-segurados vivem em família com renda de US$ 50.000 ou mais. Quase 36 milhões dos não-segurados são cidadãos legais no país. 9,7 milhões não são cidadãos americanos, incluindo os imigrantes ilegais. (Fonte : Instituto de Estudos de Saúde Suplementar – IESS – 2009). 457 O sistema de saúde americano é regulamentado a nível federal e estadual, com o governo federal delegando aos Estados maior responsabilidade. Estados regulam o conteúdo das apólices e requerem que a cobertura de tipos específicos de serviços médicos. A regulação em geral não se aplica aos planos de grandes empregadores, devido a uma cláusula da Lei “Employee Retirement Income Security”. Os planos são financiados pelos empregadores, empregados e governos financiam o custo da saúde. Os planos normalmente são contributários. O empregador negocia com as operadoras/seguradoras. As coberturas odontológicas e oftalmológicas são vendidas separadamente, e remédios prescritos são benefícios com processamento distinto. Esses benefícios são pagos pelos empregadores e /ou empregados e/ou governo. 458 Raymond Kurzweil (Nova Iorque, 12 de fevereiro de 1948) é um inventor e futurista dos Estados Unidos, pioneiro nos campos de reconhecimento ótico de caracteres, síntese de voz, reconhecimento de fala e teclados eletrônicos. Ele é autor de livros sobre saúde, inteligência artificial, transumanismo, singularidade tecnológica e futurologia. (Wikipédia).

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paciente. Três deles manobram bisturis, pinças e agulhas. O quarto leva uma câmera que mostra tudo o que se passa na operação e produz imagens ampliadas 12 vezes. Elas guiam o cirurgião, que opera com os olhos grudados em um monitor, como se jogasse videogame.

No Reino Unido

A Inglaterra tem sido o objeto privilegiado para as análises que, dos mais variados ângulos, têm como objetivo compreender o nascimento das relações sociais capitalistas e não tem sido diferente naquelas que se têm preocupado com o surgimento das práticas de saúde. É o fato de ter sido o pólo hegemônico do desenvolvimento do capitalismo que lhe tem dado este destaque, o que se tem traduzido na riqueza de informações, dados e análises disponíveis. O século XVIII, na Inglaterra, é o momento de grandes transformações sociais e institucionais. Já em 1640 dá-se a revolução burguesa naquele país, após a fase de acumulação primitiva do capital que, diferentemente da França e da Alemanha, não se assenta na organização política do Estado Absolutista.

O período que vai do século XVII até o XVIII, economicamente se caracteriza como aquele em que se dá passagem da fase de capitalização da renda fundiária para a de revolução urbano-industrial, sendo que, no começo do século XIX, temos a consolidação da fase industrial. No plano institucional verifica-se em 1601, na era Elizabetana, a instituição da Lei dos Pobres, na qual a pobreza era vista como consequência do “não trabalho”. A partir de 1934, com a forma desta Lei, a pobreza passa a ser vista como uma expressão das condições de vida do trabalhador, e como tal se torna uma questão social. A Saúde virá nessa esteira da Lei.

Por esta Lei, uma das maneiras de combater a pobreza era através das “casas de trabalho”, de cunho paroquial, a forma administrativa imperante na Inglaterra da época, é onde cada paróquia era responsável por seus pobres.459

São no interior destas instituições, as casas de trabalho, que se instala o cuidado médico ao pobre, o qual se constitui no início do processo de medicalização da pobreza. A perspectiva destes serviços de saúde, assim como a separação dos pobres do resto da sociedade, tinha em vista criar barreiras para que a pobreza não contaminasse, com seus perigos, os outros grupos sociais, diretamente relacionados à produção material ou à gestão social.

No fim do século XVIII e começo do XIX há um grande aumento da pobreza e das dificuldades sociais para enfrentá-la, só que agora a mesma é assumida, como já se viu, como resultado das novas relações sociais, que haviam amadurecido na Inglaterra – as relações sociais do capitalismo industrial. Os pobres não eram fruto do não trabalho, mas eram os próprios trabalhadores empobrecidos pelas relações de exploração. É dentro desta nova situação social, a do século XIX, com a industrialização e a urbanização, que ocorre a medicalização do ambiente, a qual, 459 Sugere-se ler, para uma abordagem mais completa, Dobb, M. – “A Evolução do Capitalismo” – Zahar Editores – RJ, 1973, capítulos VI e VII e mais: “Esse controle muito direto exercido pelas comunidades locais implicava mesmo um princípio de retenção geográfica do pobre, o qual ‘pertencia’ à paróquia ou freguesia. (Donnangelo, M.C.F. – op. Cit., p. 63).

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segundo Rosen, se dá sob a forma de um projeto de Reforma Social, que, posteriormente, se transforma em um programa de reforma sanitária. (Menicucci, 2007).

Em 1834, com o novo Parlamento inglês, forma-se uma comissão para estudar e propor soluções para a Lei dos Pobres Elizabetana, dadas a nova realidade da sociedade inglesa. Esta Lei tinha se tornado um obstáculo para a livre relação entre o capital industrial e a força de trabalho, porque, devido ao seu caráter paroquial e pré-capitalista no trato da pobreza, impedia o livre vem-e-vem do trabalhador, segundo a dinâmica do mercado da força de trabalho, amarrando-o a uma localidade específica, que era o município da Paróquia. Em 1842, Edwin Chadwick realizou uma investigação, que se tornou clássica: é o “Inquérito Sanitário das Condições da População Trabalhadora da Inglaterra”, no qual mostra a relação entre a presença das doenças e as péssimas condições de moradia, a falta de esgotos, a ausência de água limpa, erros na remoção e tratamento do lixo entre outros problemas. Assim, percebe-se a relação entre a pobreza e a doença. A Saúde Pública, enquanto Sanitarismo, configurará aquilo que serão as práticas sanitárias, restringindo-as a um conjunto de ações sobre os fatores que serão encarados como os responsáveis pelo aparecimento da doença coletivamente. O cuidado médico individual não teria a saúde como objeto, mas a doença, e por isso é tido como limitado, dentro da visão miasmática – de sujeira, de imundície - tendo certo valor para mostrar ou apontar o problema. Mas, assinale-se aqui que algumas doenças de massa, como a tuberculose, tiveram seu comportamento epidemiológico alterado também à custa de melhorias das condições de vida. É necessário, portanto, investigar de que forma as práticas sanitárias participaram dos processos sociais em curso na época. O processo inglês, mas também o francês ou o alemão, de emergência das práticas sanitárias é um exemplo bem rico para a compreensão das práticas sanitárias como práticas sociais estruturadas infra e supra estruturalmente nas sociedades capitalistas. Com essas sumárias referências ao processo histórico, no qual se institucionalizou o Sanitarismo na Inglaterra, pretendeu-se indicar como as práticas sanitárias podem ser caracterizadas como práticas constitutivas da sociedade capitalista. Muitas ainda são as perguntas e questionamentos. As respostas as diversas perguntas em saúde devem ser respondidas por um comitê especializado que reúna médicos e especialistas em economia da saúde. Para definir prioridades, é preciso saber quanto custa cada coisa e seu real benefício, afirma Bryan Stoten, presidente do conselho do Sistema Nacional de Saúde britânico, o NHS, que equivale ao SUS brasileiro e referência de qualidade. No Reino Unido, o Ministério da Saúde tem um departamento que se dedica a analisar o custo-benefício de cada nova droga ou técnica cirúrgica para, só então, decidir se ela deve ser incorporada aos protocolos do NHS. Médicos e enfermeiros têm de obedecer aos protocolos, uma espécie de guia de atendimento para cada doença. “O

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comitê verifica se o tratamento é capaz de oferecer um ano a mais de vida com boa qualidade ao paciente a um custo que não ultrapasse 50.000 dólares”, diz Stoten.460 Na China As doenças transmissíveis sempre foram a grande preocupação de todos os países que participam da Organização Mundial de Saúde, mas, deixando um pouco de lado esses aspectos, é bom lembrar que naquela época em que a surge a necessidade global de uma saúde pública monitorada globalmente, surge também o conceito de puericultura,461 de proteção à infância. Até certa época, não determinada, mas de passado recente, não havia condições de controle das doenças da infância. A sobrevivência de vidas jovens era tão duvidosa que os pais – muitas vezes – evitavam apegar-se às crianças para não sofrerem com a morte destas. Na China, por exemplo, a criança só recebia um nome – só era contada entre os vivos – se sobrevivia à varíola. Além disto, o infanticídio não era raro; era praticado entre as antigas civilizações, na Inglaterra, tanto antes como depois da Peste Negra e foi uma das causas que fez cessar o crescimento da população japonesa entre 1750 e 1850, durante a Era Tokugawa. 462 A maternidade e a infância, tais como as conhecemos, são uma invenção da modernidade. Na sociedade tradicional, as mães eram indiferentes ao bem-estar e ao desenvolvimento das crianças de menos de dois anos. A Idade Média européia e no Oriente, via mal a criança e pior ainda o adolescente. A duração da infância era reduzida ao seu período mais frágil, enquanto a criança era ainda “engraçadinha”. As pessoas se divertiam com a criança pequena, como se fosse um animalzinho. Se morresse, o que era freqüente, alguns pais podiam ficar desolados, mas esta não era a regra, pois outra criança logo chegaria igual à primeira: infância era anonimato. Na Idade Moderna dissemina-se o hábito de entregar a criança às amas-de-leite, principalmente na Europa, às vezes uma camponesa com a qual a criança passava seus dois primeiros anos de vida. A terrível pobreza que fazia uma família camponesa aceitar os filhos de outros gerava um ambiente inteiramente hostil ao bem-estar da

460 Esse tipo de prática ajudou o sistema de saúde britânico a se tornar um dos mais eficientes da atualidade. No ano passado, o NHS gastou 168 bilhões de dólares e obteve superávit de 2,5 bilhões. No Brasil, há poucos protocolos e só agora o Ministério da Saúde está criando um grupo para analisar drogas e tipos de tratamento que devem ser cobertos pelo SUS. Segundo Helton Freitas, presidente da Unimed de Belo Horizonte, a maioria dos planos privados também não segue esse tipo de política, mas terá de adotá-la para se sustentar no longo prazo. (Revista Exame \nov-2009\pág. 176). 461 A palavra puericultura foi criada pelo médico francês A.C. Caron em 1865; o título de seu manual era “ La Puéri-culture ou La Science d’Élever Hygiéniquement ET Physiologiquement lês Enfants.” Surge daí uma nova disciplina que depende em grande parte da educação. (Apud - Scliar, pág. 66).

462 Os samurais eram como soldados da aristocracia do Japão entre 1100 e 1867. Com a restauração Meiji a sua era, já em declínio, chegou ao fim. Suas principais características eram a grande disciplina, lealdade e sua grande habilidade com a katana. Os Samurais existiram por quase oito séculos (século VIII ao XV), ocupando o mais alto status social porquanto existiu o governo militar nipônico denominado Shogunato. As pessoas treinadas desde pequenos para seguir o Bushido, o caminho do guerreiro.

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criança e até mesmo à sua sobrevivência. 463 No começo da Idade Moderna, ocorre aquilo que Philippe Ariès,464 chama de revolução do sentimento.465 Canadá O acesso à saúde no Canadá fornece cobertura universal livre de custo. A Lei de Saúde faz com que todos os residentes de uma província ou de um território sejam elegíveis para serviços médicos necessários de livre custo. Os serviços aos segurados incluem virtualmente todos os hospitais, médicos e serviços de diagnóstico bem como os serviços de clínicos gerais cobertos pelos planos Medicare da província. O sistema de pagador único ainda é um problema no Canadá. Ele criou um gargalo para o fácil acesso aos serviços. Embora as barreiras financeiras aos cuidados médicos tenham desaparecido com a eliminação da maioria das taxas aos usuários do Medicare, o acesso rápido aos cuidados é um problema com o qual os governos provinciais e territoriais ainda continuam a batalhar. Por um lado, um sistema de pagador único é muito mais eficiente administrativamente do que o sistema de pagadores múltiplos. Por outro, pode criar um gargalo para o acesso aos serviços. 466 No Canadá o sistema de saúde é muito descentralizado. Existem Províncias e Territórios que definem boa parte de suas próprias políticas de saúde e controlam sua própria entrega dos serviços, embora o Governo Federal supervisione os serviços para determinados componentes e populações. 467 O acesso à saúde é universal para a população de 33,2 milhões de canadenses através de combinação de sistemas públicos, mistos e privados de saúde.468

463 Estatísticas de Rouen, na França, durante o século XVIII, mostram que um terço destas crianças morriam antes dos dois anos, contra um quinto de óbitos em crianças cuidadas por suas próprias mães. (Apud Scliar – Edward Shorrer, op. Cit). 464 Philippe Ariès – “ História Social da Criança e da Família “ – Rio de Janeiro – Zahar, 1978 – Tradução de Dona Flaksman. 465 Muda por exemplo, a atitude em relação à morte: encarada com fatalismo na Idade Média, dá lugar à sensação de que a separação do outro já não é mais tolerável do ponto de vista emocional. E muda a atitude em relação à infância. A família moderna nasce no meio da burguesia européia por volta de 1750. Localiza-se principalmente em zonas urbanas; seu perfil demográfico progride gradualmente para um padrão de baixa mortalidade infantil e baixa fecundidade. (Apud Scliar – página 65). 466 O Canadá está procurando melhorar a eficiência administrativa e a qualidade dos serviços. As listas de espera são um ponto do descontentamento e corroem a confiança pública no sistema. O país deve atacar os custos crescentes da saúde para continuar assegurando a sustentabilidade de seus programas. Províncias e Territórios fornecem cuidados de longo prazo e outros serviços sociais a suas populações, e as opções variam de cuidados residenciais, que fornecem alguns serviços de apoio ao dia-a-dia, a cuidados a doentes crônicos, com serviços intensivos para pacientes com elevada necessidade. Sabe-se também que o Home-Care está também disponível nos setores público e privado. (Fonte: Millimam Brasil – palestra Abramge – fev/09). 467 O pagador é único, ou seja, o governo para seus serviços hospitalares e médicos, pagam aos hospitais diretamente ou através de fundos globais para as autoridades de saúde regionais. 468 No sistema público, que obedece a Lei da Saúde do Canadá para serviços hospitalares e médicos, considerado como saúde pública, o financiamento tem contrapartida nos impostos, a administração de todo esse sistema é provincial de pagador único sob a estrutura legislativa da província e os serviços são executados por profissionais privados, por privados sem fim lucrativo, privado com fins lucrativos e há facilidades públicas. No sistema Misto, onde os bens e serviços, por exemplo, medicamentos, home-care, cuidados de caráter institucional, são financiados pelos impostos, pelos seguros privados de saúde e pagamento dos planos individuais. A administração no sistema misto, é de serviços públicos objetivados, em geral com base na seguridade social. Há também os serviços privados regulados pelo governo e os serviços entregues são por profissionais privados, privados sem fins lucrativos, privados com fins lucrativos e outras facilidades públicas. No privado, existe, por exemplo, bens e serviços de odontologia, oftalmologia, remédios, medicina alternativa, cujo financiamento acontece pelo seguro privado, pagamento dos usuários – que pode ser total, co-participação e dedutíveis do imposto de renda. Nesse caso, a propriedade e o controle é das entidades privadas, profissionais privados, a regulamentação é pública e há uma auto-regulamentação. Os serviços entregues, no caso do sistema privado são todos profissionais privados e privados com fins lucrativos.

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O governo e as províncias negociam tabelas de remuneração médica com associações médicas. É raro, todavia, que as províncias assumam diretamente o provimento dos cuidados da saúde. O Governo Federal no Canadá tem jurisdição sobre determinados aspectos do sistema, regulando a prescrição de remédios e o financiamento e a administração dos benefícios de saúde para indígenas, forças armadas e Polícia Montada, veteranos e presidiários federais.469

O Canadá financia seu sistema da saúde basicamente através dos impostos, mais coparticipações e reembolsos do seguro privado têm contribuição significativa. Impostos dos governos provinciais, territoriais e federais representam quase 70% de despesas totais da saúde.

O financiamento canadense para a saúde em 2004, somente para referência anual em dólares deste trabalho, foi de US$ 104 bilhões, sendo: 43% em serviços hospitalares (30%), e médicos (13%), 23% foram em programas de serviço social provinciais, 30% em serviços privados de saúde e 4% em serviços federais diretos, atualizando um pouco mais, houve um gasto per capita, de US$ 3.638 em 2006, com algumas variações conforme a província. 470

O Seguro Saúde Privado canadense cobre bens e serviços não cobertos pelo Medicare. Em 2004 o Seguro Privado cobriu 33,8% dos remédios, 21,7% dos cuidados com visão e 53,6% dos odontológicos. As províncias proíbem seguro que tenta fornecer acesso alternativo ou mais rápido aos cuidados cobertos pelo Medicare. A maioria dos seguros saúde é empresarial, patrocinado pelos empregadores, por sindicatos ou outras organizações. O seguro baseado no empregador é parte dos benefícios, mas é mandatário e as províncias não taxam tais benefícios. Os recursos para hospitais vêm dos orçamentos das autoridades de saúde regionais. 471

As autoridades de saúde regionais controlam a entrega dos cuidados médicos; empregam equipe de funcionários remunerada na maioria das unidades de tratamento intensivo e contratam com alguns provedores privados para serviços ambulatoriais especializados. A maioria, dos 1,5 milhão de médicos e especialistas trabalha em uma base fee-for-service. 472

469 O departamento federal de saúde, também tem um papel crítico na pesquisa dos serviços de saúde, na própria saúde e na proteção pública. Recursos vêm de impostos sobre renda, consumo e impostos corporativos. Governos provinciais e territoriais ajustam os impostos em suas respectivas jurisdições. Co-participações e reembolsos de seguros privados cobrem 15% e 12%, respectivamente. Os 3% restantes vem de fundos de seguridade social e doações de caridade. (Paulo Hirai – Palestra – Abramge – 13/02/2009). 470 No Canadá as autoridades de saúde regionais compram a maioria dos serviços de saúde, mas o seguro privado paga pelos serviços que o Medicare não cobre. Os principais pagadores de serviços de saúde são as autoridades regionais, que organizam serviços e alocam orçamento global para a população da região, cujos métodos de financiamento variam entre províncias e territórios. As províncias têm liberdade para alocar – se necessário – fundos para servir melhor às necessidades particulares de sua população. (Fonte: Abramge – Paulo Hirai – fevereiro/2009). 471 Embora historicamente hospitais sejam privados, ou instituições sem fins lucrativos, criou-se um relacionamento integrado entre hospitais e governos provinciais. A maioria dos hospitais confia quase inteiramente nos recursos orçamentários alocados pelas autoridades de saúde regionais. (Fonte: Milliman do Brasil – palestra proferida em fev/09 – Abramge). 472 O Fee-for-service – (Taxa por serviço) - responde por 79,5% da renda dos médicos. Os prestadores são desencorajados de executar serviços nas esferas pública e privada, embora não seja ilegal.

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Chile

O problema da organização dos serviços de saúde pública arrastava-se no Chile desde fins do século XIX, sendo parcialmente resolvido em 1918, quando é publicado o primeiro Código Sanitário que criou a Dirección General de Sanidad. Poucos anos depois, foi criado o Seguro Social Operário Obrigatório (1924) e promulgada a Constituição liberal moderna (1925) que estabeleceu o dever do Estado de manter um serviço nacional de saúde pública graças, aliás, à influência do assessor do governo chileno, John Long, médico higienista da Fundação Rockefeller, criando-se ao mesmo tempo o Ministério da Salubridade, Previdência Social.

O sistema de saúde é um retrato da própria história do desenvolvimento nacional do Chile. Nele se apresentam tanto a via pública, seguida por tantos anos, quanto a via privatista característica essencial do período Pinochet. Mais que isso, a própria diversidade econômica da sociedade chilena traduz-se num sistema que abre portas distintas para seus cidadãos segundo características de capacidade de pagamento e riscos envolvidos no seu atendimento. 473 Vale lembrar que a trajetória de constituição deste sistema teve seu caminho caracterizado pelo descompromisso para com as instituições públicas ou mesmo a regulação estatal. O mercado, no caso chileno, foi soberano como em poucas outras situações pode se registrar, a despeito de ter sido criado pelo Estado ao transformar a contribuição para saúde em compulsoriedade para o trabalhador. A riqueza da avaliação do caso chileno repousa justamente na forma de composição dessa ruptura entre público e privado. O Auge chileno é um direito de todos em saúde. É um benefício garantido por Lei na qual não há discriminação de nenhum tipo e que foi implementado para melhorar a qualidade de vida da população chilena e para impactar de forma positiva a família de todos os chilenos. 474 Os esforços dos últimos anos têm-se dirigido justamente no reforço à capacidade de regulação do sistema como um todo, tanto no campo do financiamento quanto no campo da efetividade do atendimento. O estabelecimento do fundo virtual que distribui recursos captados pelas instituições públicas e privadas,segundo os riscos assumidos, tendo em conta os percentuais de clientela, é um mecanismo poderoso de organização sistêmica. A marca do setor saúde chileno é a convivência de um setor público, que teve êxito nos mais importantes problemas de saúde pública e ostenta bons indicadores, e de um setor privado organizado na forma de seguros, com expressiva adesão das camadas de renda média e assalariada da população.O objetivo contínuo é avaliar os elementos dessa convivência, a abrangência das instituições privadas, as formas regulatórias e as questões postas pelo Plano Auge para o futuro do setor saúde chileno.475

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O comprometimento das unidades de saúde com padrões de atendimento por protocolos e patologias representam a face da responsabilidade efetivados pelos prestadores de serviços de saúde públicos ou privados. A inovação desenvolvida pelas seguradoras privadas, no âmbito do Fundo Catastrófico, já enunciava este caminho, vinculando recursos privados, prestadores públicos e oferta gerenciada. Todos os casos comprovam a tendência estrutural do sistema a uma tentativa de integração entre os sistemas público e privado, sem dúvida difícil, em decorrência das grandes divergências de poder contributivo vigentes na sociedade, mas uma necessidade absoluta, em decorrência tanto da necessidade de atendimento de direitos básicos da cidadania em sociedades democráticas quanto da enorme tendência ao aumento de custos e riscos na administração de sistemas públicos e privados em assistência à saúde.476 Há distribuições de contribuição por faixas de renda e a forma de organização das relações entre o cotista e a instituição seguradora sempre foi extremamente complexa, tanto que todo o desenrolar da legislação citada anteriormente remete a tentativa de estabelecer regras que melhor protegessem o beneficiário. Um aspecto de enorme importância para a análise do setor privado de saúde no Chile é que não existem noções de poupança de longo prazo por parte dos cotistas nem de fidelização do afiliado por parte das seguradoras. Na medida em que não há nenhum tipo de comprometimento de longo prazo da seguradora para com o beneficiário, a troca de seguradora é usual, e a prática da seleção adversa está consagrada na própria lógica da montagem do rol de beneficiários. Como os preços são ditados pelas seguradoras segundo as condições de saúde dos beneficiários, podendo ser alterados anualmente, mulheres em idade fértil, idosos e portadores de doenças crônicas são altamente prejudicados na formação de preços de contrato do setor.477 A existência de uma disciplina legal sobre a contribuição de saúde e a possibilidade de escolha entre atendimento privado e público acabam por construir uma sólida inter-relação entre seguradoras e Estado. Por um lado, há um mercado garantido para as seguradoras, justamente porque a contribuição é compulsória e o atendimento tende a ser melhor no setor privado que no setor público. Por outro, a migração do contribuinte para o Fonasa 478 sempre é possível, o que dá plena liberdade às seguradoras para praticar a expulsão dos usuários de alto custo ou de alto risco ao final do período de vigência de contrato. 476 - Fonte: idem 537 – 538 - 539 – 541 476 O Fundo Nacional de Saúde, FONASA é o organismo público responsável pela cobertura de cuidados de saúde, tanto dos 7% listados de sua renda mensal para a saúde FONASA, e àqueles devido à falta de recursos próprios, fundos estatais a através de um imposto direto. Ele também oferece cobertura de saúde a todos os beneficiários, sem exceção de idade, sexo, nível de renda, número de dependentes legais e condições de doenças pré-existentes, recuperando a totalidade ou parte dos benefícios de saúde que são concedidos por instituições profissionais do setor setores público e privado.

(Fonte:

http://www.fonasa.cl/prontus_fonasa/antialone.html?page=http://www.fonasa.cl/prontus_fonasa/site/edic/base/port/que_es_fonasa.html ) - acessado em 27/07/2011).

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Essas considerações indicam que há uma espécie de subsídio público ao funcionamento das seguradoras. Esse subsídio começa no estabelecimento de um mercado cativo comprador de seguros e termina na oferta de pontos de fuga para a empresa seguradora, com a possibilidade de alteração contratual e conseqüente transferência do segurado, e das despesas a ele relativas, para o Fonasa. Em França O governo Francês provê cobertura de saúde a todos os quase 65 milhões de residentes do país e das províncias. A França implementou várias mudanças no sistema de saúde. Houve uma reforma em 1996 que mudou o esquema de financiamento alterando o imposto sobre a renda para financiar a saúde. Essa reforma veio aumentar a supervisão do Parlamento, que estabeleceu a política de objetivos financeiros e criou as agências regionais hospitalares. A França provê – agora – cobertura universal de saúde a todos os residentes. Quanto à parte política e de gestão, a França distribuiu a responsabilidade pelos serviços de saúde da população em níveis nacional, regional e departamento do Governo. O Parlamento define a cada ano o teto para gastos com saúde no país e adota novas provisões sobre benefícios e regulamentação. No nível regional, agências regionais hospitalares são responsáveis pela alocação de recursos a hospitais públicos, ajustando tarifas para hospitais privados com fins lucrativos, e planejando outras unidades hospitalares. Reportam-se ao Ministro da Saúde. Há Conselhos gerais que provêm serviços sociais, de saúde e saúde pública no nível do Departamento. 479 Na França o esquema de seguro é organizado por tipo de empregador. Há os fundos de Seguro Saúde – denominado de Fundo Nacional de Seguro Saúde – para trabalhadores assalariados – Caisse nationale d’assurance maladie dês travailleurs salariés – CNAMTS. Há ainda o esquema agrícola, que é o Mutualité sociale agricole – MAS - e o Fundo Nacional de seguro saúde para profissionais independentes – CANAM. Cada fundo nacional de seguro saúde distribui recursos aos fundos regionais e locais. Os fundos contratam serviços com provedores auto-empregados e negociam o nível dos honorários. 480 481

479 A regulamentação da política e da gestão é efetuada pelo Ministério da Saúde em quase 100% das situações. O Ministério da Saúde francês aloca fundos nacionais entre os setores e as regiões, fixa preços, aprova tarifas negociadas, estabelece padrões de segurança em hospitais, controla a oferta, tal como o número de estudantes que ingressam nas escolas médicas todos os anos e define, por antecipação, as prioridades nacionais na saúde. Todo esse financiamento é decorrente de receitas tributárias de várias fontes. Em 2000, somente como exemplo para este trabalho, 88,1% da receita de seguros veio da contribuição social geral e contribuições de empregadores e empregados. As contribuições ao sistema de seguridade social diferem de acordo com a fonte de renda. Cada residente paga a contribuição social geral com base na renda total. Há o imposto sobre renda de 5,25% e sobre as pensões de 3,95%. Os demais valores de fundos necessários vêm de subsídios do Estado e tributos sobre uso de carro e consumo de tabaco. Companhias farmacêuticas contribuem também via imposto sobre propaganda. (Fonte: palestra de Paulo Hirai – fev/2009 – Abramge). 480 As receitas para o Seguro Saúde Francês, chegou em 2000/2001 – em torno de 126 bilhões de dólares, considerando todos os impostos, acertos entre Estados, compensações e ajustes. 481 Os pagadores na França, são as entidades já citadas e respectivamente o CNAMTS – cobre cerca de 85,6% da população e residentes franceses, incluindo empregados no comércio, na indústria e suas famílias, bem como os elegíveis pela Lei da Cobertura Universal da Saúde que é estimado em torno de 1,6% da população. Esses dados são de 2001/2002. Quanto ao esquema agrícola, já comentado, MAS, cobre fazendeiros e empregados rurais, com

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Quanto aos pagadores, no plano de seguro saúde, o reembolso dos custos sobre 84,9% das despesas totais. Os restantes 15,1% são pagos para maternidade, doenças e ferimentos relacionados ao trabalho e invalidez. Os reembolsos são efetuados ao paciente que pagou de seu bolso ou ao provedor. Cada vez mais, benefício farmácia e laboratórios são pagos diretamente pelos seguradores. Para cobrir a co-participação, 86% da população compram seguro saúde por vontade própria. Somente 43% compram voluntariamente – empregadores compram a maioria das coberturas através de apólice em grupo. 482 Quanto aos provedores de serviço, eles poderão ser hospitalares, de reabilitação ou fisioterapia. Os cuidados pós-hospitalares com clínicos gerais, especialistas, dentistas e enfermeiras. Há também os serviços de diagnósticos prescritos e os cuidados. Os remédios prescritos e elegíveis ficam disponíveis. Há transporte relacionado à saúde prescrita e várias práticas de cuidados preventivos. Os residentes podem consumir os serviços com saúde à vontade, todavia, para aumentar a sensibilidade aos preços, os pacientes pagam pelo serviço prestado e não recebe reembolso total, pagando uma co-participação de 30% para médicos e dentistas e de 40% para serviços auxiliares e de laboratório. Para situações diferenciadas, como pacientes crônicos, há isenções também para casos de saúde muito debilitada e para gravidez. 483 O acesso francês à Saúde aos residentes cuja renda tributável anual abaixo de um mínimo de 11.200 dólares484 é garantida de forma gratuita. O sistema é bastante liberal e os pacientes podem escolher ser atendidos por qualquer médico licenciado a qualquer tempo e sem limite. A média francesa é de 4,7 contatos com clínicos gerais base ano. Alemanha A Alemanha é um país de quase 83 milhões de pessoas com expectativa de vida em torno de 81,9 anos para mulheres e 78,7 para os homens. 485 Os problemas alemães que existem no sistema de saúde são todos conhecidos e o governo está sempre atento a eles. A qualidade é comparativamente baixa em relação à expectativa dos usuários. Os custos são altos.

aproximadamente 7,2% da população e nos últimos, os auto-empregados, cerca de 5% da população estão cobertas pelo CANAN. 482 Os hospitais recebem diárias e os serviços cobertos por tais tarifas variam conforme o tipo de hospital. No caso dos hospitais públicos, eles recebem uma diária que cobre todos os serviços prestados. No caso de hospitais privados com fins lucrativos faturam os honorários médicos e outros itens, tais como próteses, separadamente. Há uma participação, por paciente, que contribuem com - em torno de - US$ 13,71por dia de permanência hospitalar. Em 2000 e 2001, pesquisam indicavam que o número de clínicos gerais e de especialistas na França estava equilibrado, pois 194.000 médicos, representavam 51% de especialidades e 49% eram clínicos gerais. Metade dos especialistas e 29% dos clínicos gerais recebem salário, trabalhando boa parte em hospitais e em torno de 25% dos clínicos gerais, ainda fazem visitas domésticas em suas atividades. Os prestadores de serviços recebem pagamento dos pacientes ao prestar serviço. Os provedores negociam o valor unitário à ser aplicada a tabela para determinar a tarifa de cada procedimento. 483 Os pagamentos individuais na França correspondem a aproximadamente 11,1% dos gastos totais com saúde. A França tem sido considerada pela OMS – o melhor serviço de saúde no mundo, todavia, luta com relação ao financiamento sustentado e atendimento a crescente demanda pela população que envelhece. Há ainda, cobertura para doenças mentais e dependentes químicos, bem como para idosos e inválidos. (Millimam – Brasil – fev/09 – Abramge). 484 Base 2008 / 2009 485 Essa “Expectation of Life” da Alemanha é a definida em Atuária como a que inicia desde a idade zero, ou seja, ao nascer e é aquela contida nas tábuas de mortalidade normalmente conhecidas.

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Sob o ponto de vista de gastos, há dados de 2004/2005, que servem como referência, pois estão em dólares.onde a Alemanha gastou em torno de US$ 3.635 com a saúde de cada pessoa. Os US$ 300 bilhões gastos representam 10,6% do PIB alemão. Sabe-se que antes de 2007 o sistema Social de Seguro Saúde (GKV) cobria 88% da população, que era, na época, em torno de quase 73 milhões de pessoas e 9,7% compraram seguro saúde privado (PVK). Os demais cidadãos eram cobertos por programas estaduais especiais tais como planos para militares. Na Alemanha existem perto de 200.000 residentes que não estão segurados. O sistema alemão, conhecido desde os velhos tempos como modelo Bismarck, é o mais antigo do mundo e foi estabelecido em 1883. 486Houve muitas alterações ao longo do tempo, mas sua estrutura básica tem se mantido através das décadas. Houve uma reforma em 2007 que tinha quatro objetivos principais: cobertura universal de seguro saúde obrigatória, melhoria dos cuidados médicos, modernização do Fundo Enfermidade e a Reforma do Fundo Saúde, a base do financiamento da saúde na Alemanha. 487 Quanto ao financiamento, o empregador e o empregado pagam suas contribuições diretamente a um Fundo Enfermidade aplicável. As contribuições são calculadas com base em percentual do salário e pode ser diferente dependendo do Fundo Enfermidade. Empregados, empresários e empregados dividem as contribuições igualmente. Em média, empregados contribuem com 7,6% do salário e empregadores com 6,6%. Para aqueles que não têm condições financeiras, ou que ganham abaixo que US$ 60.000 por ano, para aposentados, estudantes, desempregados, inválidos ou sem teto há subsídios disponíveis. Os subsídios federais são pagos diretamente ao fundo, que distribui os recursos aos planos de seguro em uma base de capitação, que é definido como por cabeça ou per capita. Nos casos de seguros privados bem gerenciados e eficientes podem até devolver dinheiro ao segurado ou prover benefícios adicionais não incluídos no pacote padrão. No caso de planos de seguro que tenham déficit devidamente comprovado, há a opção de requerer um prêmio adicional do segurado, mas limitado a 1% da renda bruta. São os casos em que a sinistralidade ultrapassa a capacidade de pagamento da Operadora ou Seguradora. Se caso o plano imputar um segundo prêmio, o segurado ficará livre para mudar de plano. É como se fosse uma portabilidade, como no caso

486 Sob os pontos de vista de política e gestão, o governo alemão controla a política de saúde e a entrega dos cuidados com a saúde. O Ministério da Saúde desenvolve e executa política de saúde e administra o fundo solidário de saúde. Principais políticas requerem aprovação das duas casas do Congresso. Há uma atual política de solidariedade, onde todos os cidadãos devem ter acesso igualitário a cuidados médicos de alta qualidade, independente da capacidade de pagamento. O sistema de Seguro Social para a Saúde, um grupo de fundos denominados de enfermidade, provêm um pacote padrão de benefícios, sujeitos a regulamentação do governo. A parte de financiamento, que é o sistema de subsídio do modelo alemão atualmente está em reorganização. Consumidores pagam tanto o seu “imposto solidariedade” quanto o prêmio de seguro diretamente ao fundo correspondente. Governo subsidia os prêmios para residentes de baixa renda ou de classe especial, mantendo o princípio da solidariedade. Todo esse esquema é chamado de subsídio interno. 487 Fonte: Abramge – Associação Brasileira de Medicina de Grupo – palestra proferida por Paulo Hirai – Diretor da Milliman do Brasil – fevereiro/2009.

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brasileiro, onde o usuário pode não desejar mais ficar naquela seguradora ou operadora. Os objetivos da Reforma de 2007 tiveram como alvo aumentar a transparência para os consumidores, padronizar a taxa de contribuição para os programas de seguros mandatórios, assegurar o equilibrado compartilhamento de risco através de pagamentos em capitação ajustado a risco, aumentar a concorrência entre as seguradoras, cujos instrumentos foram implantados como adicionais de direitos de negociação de desconto e taxas de contribuição adicional. Restou ainda, o objetivo de aumentar a possibilidade de escolha pelo consumidor com a possibilidade de mudança imediata de planos se a companhia impuser custos adicionais.488 Conclui-se então que o sistema é Público e Privado com relação aos cuidados médicos. Os serviços hospitalares estão aí incluídos. A maioria dos hospitais participa de planos hospitalares, que implicam no recebimento de fundos através dos mesmos mecanismos independentemente do esquema de propriedade – exceto cuidados psiquiátricos, que são reembolsados em uma base diária. Quanto às resseguradoras,489 sabe-se que a Munich-Re tem um braço de saúde muito forte na Alemanha. Os dois canais principais de financiamentos hospitalares são: o Fundo Enfermidade, que provê em torno de 93% do total cobrindo despesas recorrentes e custos de manutenção e os governos estaduais planejam investimentos em hospitais e cobrem os 7% restantes. Os reembolsos hospitalares são baseados no DRG – que é uma moeda de base - para reembolso no sistema alemão. 490

488 Quanto aos pagadores, além do sistema padrão, residentes têm a opção de comprar seguro privado suplementar. Havia, até 2007, 253 Fundos Enfermidade sem fins lucrativos contra 1.200 em 1991. Em 2004 o Seguro Social de Saúde gastou US$ 168 bilhões, ou 56,3% do gasto total do ano. Os maiores gastos conhecidos são os de Hospitalização, em torno de US$ 70 bilhões, correspondente a 34,1%, o de Visita Médica, que foi de US$ 27,7 bilhões, que girou em torno de 15,3% e os remédios que custaram US$ 26 bilhões, correspondente a 14,7% do total gasto no ano. Há 49 seguradoras privadas de saúde que fornecem cobertura suplementar ou chamada de substituta. Essas seguradoras cobram prêmio baseado em risco e podem ser ou não ser mais custo-efetivo para alguns consumidores. Para segurar custos, pacientes podem arcar com custos em adição aos prêmios e contribuições aos Fundos Solidários. Há co-participações e pagamentos diretos não são incomuns e permitidos após a reforma de 2007. (Fonte: Milliman – Paulo Hirai – fev/2009). 489 São entidades jurídicas, que efetuam o Seguro do Seguro para uma diluição do risco. 490 Relativamente aos provedores privados, com fins lucrativos, só eles que prestam serviços ambulatoriais. São 133.000 médicos dos quais 118.000 são provedores autorizados no sistema oficial de Seguro Saúde. Metade destes são clínicos gerais e metade especialistas. Há 17 associações médicas regionais que negociam contratos anuais para cuidados ambulatoriais. Sabe-se que cada associação recebe um valor total, que é dividido em dois fundos – um para clínicos gerais e outro para especialistas. Médicos individuais recebem pagamento baseado em uma fatura total de serviços prestados e calculados de acordo com uma escala de valor relativo. A reforma de 2007 obriga a cobertura universal, mas considera a cobertura anterior. Certas classes de cidadãos são seguradas por lei. Todos os segurados têm acesso igual aos benefícios e os planos não podem recusar qualquer aplicação. Benefícios incluem cuidados hospitalares e ambulatoriais, todos os remédios necessários, terapia de reabilitação e tratamento odontológico. Os planos incluem a família, tal que , esposas desempregadas e filhos são também segurados sem custo adicional. Acesso a seguro privado é limitado. Indivíduos que ganharam mais de US$60.000/ano, por três anos consecutivos ou os auto-empregados podem sair do seguro social e adquirir seguro privado. Funcionários públicos são elegíveis a um reembolso de 50% em seus custos de saúde se comprarem seguro privado para cobrir o restante, todavia, escolher seguro privado pode ser desvantajoso. Os prêmios são baseados no risco de todos os membros da família e voltar para o seguro social fica difícil. Os ideais de solidariedade mantiveram-se ilesos após a reforma alemã na saúde. Os médicos são obrigados a tratar de todos. Se o indivíduo não for capaz de pagar seus prêmios, o sistema de seguridade social cobrirá os pagamentos. Os prêmios de seguros privados estão limitados à contribuição média máxima no sistema Social. Há problemas atuais no sistema alemão. A transição para a cobertura universal impõe alguns desafios ao sistema. A Organization of Economic Cooperation and Development (OCDE) tem criticado o plano alemão por não fazer o suficiente para aliviar os custos crescentes da saúde na Alemanha em detrimento da população. (Paulo Hirai – palestra proferida em fev/2009 – Abramge).

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Japão A população do Japão está em torno de 128 milhões de pessoas e é considerada a segunda economia do mundo. O gasto médio per capita, foi de US$ 2.358 em 2004/2005. A Lei de Seguro Saúde é antiguíssima – desde 1922 – definiu pela primeira vez o seguro de saúde público para empregados do setor privado. A cobertura, na época, era muito limitada em escopo e duração. Atualmente, o Japão tem uma ampla cobertura de seguro saúde, com um sistema de entrega privado e financiamento público. O sistema japonês é bastante centralizado e favorece o papel do Governo Nacional tanto na política da saúde quanto na sua administração. O Ministério da Saúde, Trabalho e Bem Estar executa funções relacionadas à elaboração de políticas, coleta de dados e monitoramento do “status” da saúde e do setor. Ainda assim, o Ministério administra alguns dos fundos de seguro saúde e assume o controle de qualidade e custo. Uma das funções mais importantes é regulamentar o sistema de financiamento do seguro social. O Ministério facilita as negociações do nível de reembolso. Um programa nacional de reembolso fixo é um dos pontos centrais das medidas de contenção de custo no Japão. Quase todos os serviços de saúde são pagos com a mesma taxa de honorários por serviço, independentemente de quem presta ou onde são prestados. Certos hospitais, na maioria de cuidados de longo prazo ou geriátricos, são reembolsados de acordo com Tabela de Honorários e Grupo de Combinação Diagnóstico – Procedimento – DRG – japonês. O sistema japonês é de cobertura universal da saúde e seu financiamento é oferecido em decorrência de combinações de fundos públicos e privados. O sistema consiste em um tripé de seguros. O Seguro Saúde gerenciado pela Sociedade (SMHI) e Associação de Mútua Ajuda (MAA), que cobrem empregados de grandes companhias e do setor público, respectivamente. O Seguro Saúde Gerenciado pelo Governo, que é o GMHI, cobre empregados de pequenas e médias empresas. Há ainda o Seguro Saúde do Cidadão (CHI), que incluem os planos municipais que cobrem os auto-empregados e aposentados. 491 Existe a co-participação e ela varia conforme a idade, renda e doença. Os prêmios variam de 6 a 9,5% da renda mensal e as co-participações podem iniciar em 10% e chegam até a 30%. Todas as pessoas, exceto as crianças, idosos e portadores de doenças determinadas em lei – crônicas - tem 30% de participação.

491 Consumidor não tem escolha de plano. Prêmios variam com base na renda mesmo que as coberturas e reembolsos sejam padrões. Somente os planos GMHI e CHI recebem subsídios do governo. Todos os planos, contudo, contribuem para a diluição do risco dos idosos. As receitas são de Impostos, que é a fonte dos subsídios, há a co-participação de pacientes, na média, em torno de 30%, os empregados contribuem no SMIHI e no MAA com cerca de entre 6% e 9% da renda mensal e o empregador paga pelo menos 50% e o empregado paga o restante. No caso do GMHI, os prêmios giram em torno de 8,6% do salário, sendo que 50% pagos pelo empregador e 50% pagos pelo empregado havendo 14% de subsídio do governo e no caso dos não empregados, o CHI, há um prêmio municipal baseado na renda, tamanho da família, ativos e há 50% de subsídio do governo. Em todos os casos há a diluição, já comentada, de risco para os Idosos. (Fonte: Abramge – Milliman – Paulo Hirai – palestra / fev/09).

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Os idosos com 70 anos ou mais de idade contribuem com 10% do que recebe. Crianças de até 3 anos, pagam 20% e pacientes de custos excessivos tem um teto para a co-participação. Não há variação nacional para pagamentos de procedimentos e reembolsos. Eles são estabelecidos nacionalmente sem variação regional. O governo define uma tabela de preço para os serviços e revê a cada 2 anos. Mais de 3.000 preços são revisados individualmente para controlar a utilização. Os honorários de alta tecnologia ou serviços sobre-utilizados são reduzidos para desencorajar seu uso, e tarifas para serviços necessários e subutilizados são aumentados.492 O sistema japonês de saúde é universal e não tem controles de entrada, como um gatekeeper, por exemplo. Pacientes têm livres acessos a qualquer prestador e a qualquer tempo. O sistema de reembolso padrão permite aos pacientes procurarem hospitais e clínicas privadas mais convenientes ou que tenham mais confiança do paciente. Financeiramente, contudo, o acesso é menos equitativo. Pacientes de menor renda pagam uma maior porcentagem de sua renda com prêmios e co-participações, mesmo com a assistência do governo. A natureza regressiva do sistema pode fazer a assistência a medicamentos menos fácil na medida em que os custos sobem. 493 O envelhecimento da população está afetando a economia japonesa e em conseqüência, todo o processo de saúde muito mais do que em outros países. Há uma grande população idosa. Mais de um terço dos gastos com saúde vai para os idosos. Os valores de co-participação já chegaram ao limite e não há como aumentar mais do que 30% previsto em lei. Haverá mudanças em breve futuro. Holanda Relativamente à saúde, a Holanda iniciou um processo de mudanças recentemente e que está sob a mira e o olhar contínuo de outros países, atualmente. A população está em torno de 17 milhões de habitantes e a última lei sobre saúde é a Lei do Seguro Saúde de 2006 e foi o último elo de uma reforma com base no mercado e que vem desde o início dos anos de 1990. O sistema Holandês é de pagador único. O governo fez uma série de reformas494 para evoluir do sistema baseado no fornecimento para um sistema de competição gerenciada. A Holanda é o primeiro país a implementar plenamente sua reforma e está

492 Quanto aos pagadores, nos remédios, por exemplo, os preços são revisados para refletir o preço médio ponderado do mercado, o que criou uma espiral descendente de preços. As novas drogas são reembolsadas de acordo com sua inovação e efetividade. Devido a padronização, os benefícios e taxas de reembolso são padronizadas no país, seguradoras não competem por pacientes para qualquer dos benefícios considerados padrão. Os médicos são o elemento chave no lado dos prestadores de serviço. Um terço deles trabalha em clínicas, onde 94% delas são privadas. Os médicos, raramente, têm acesso a hospitais e tendem a focar o atendimento considerado primário. Dois terços dos médicos trabalham em hospitais e recebem um salário fixo, não tendo assim incentivos para buscar produtividade. Os donos de hospitais são na maioria, médicos. O Presidente de um hospital, por lei, deve ser médico. A grande maioria dos hospitais – 80% - é privado - embora os de maior prestígio sejam públicos ou de universidades. O reembolso com tabela fixa de honorários é o único método disponível. Cuidados que não fazem parte do histórico do paciente ou não listados, são integralmente pagos pelos pacientes. 493 O Seguro Saúde é apenas uma parte do programa geral de seguro social no Japão. Pelo que se sabe há também suporte para maternidade e aposentadoria e auxílio doença. 494 As reformas foram mais no sentido de mudanças nas formas de arrecadação.

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sob observação pelos demais países, pois esse assunto é objeto de tensão no mundo de hoje.495 As funções principais do Conselho de Seguro Saúde na Holanda, são as de controlar o orçamento baseado em risco, alocando pagamentos equalizados por risco às seguradoras. Dar atenção de cuidados para grupos especiais, implementando as provisões e regulamentações para os cidadãos holandeses que vivem fora do país e residentes que se recusam a participar do seguro saúde ou recusam pagar suas contribuições. Todo o ajustamento do pacote de benefícios e o monitoramento é obrigação também do Conselho de Saúde. A reforma de 2006 redefiniu a forma de financiamento das despesas da saúde na Holanda. O financiamento do novo sistema vem de duas fontes. Uma delas é a dos empregados. Eles aportam metade das receitas direcionadas ao fundo de equalização através de contribuição de 7,2% da renda ou 4,4% para auto-empregados ou idosos, para os primeiros 31.200 Euros da renda anual – base 2008. Empregadores deduzem as contribuições dos salários.496 Os adultos, todos, com algumas exceções, têm uma co-participação de 150 Euros por ano, excluindo serviços de clínicos gerais e maternidade. Quem desejar assumir mais riscos pode pagar prêmios menores, assumindo co-participações maiores limitadas a 640 Euros por ano. Para famílias de baixa renda, o Estado provê subsídios. Cerca de dois terços das famílias recebem esse subsídio, que é disparado quando o prêmio médio excede um percentual da renda, como exemplo, 4% para adultos solteiros. O Estado também financia os prêmios para crianças, adolescentes e quase adultos até os 18 anos.497 Em 2006, houve a privatização do seguro de saúde na Holanda. Todas as 14 seguradoras de saúde da Holanda são privadas. As seguradoras podem negociar descontos com determinados prestadores e usar incentivos para encorajar pacientes a procurar provedores preferenciais, pois, não são mais obrigadas a contratar com todos os provedores. Os níveis de cobertura do esquema de benefícios podem também ser ajustados. As seguradoras podem oferecer também descontos de até 10%. Porém, não podem 495 O governo nacional trabalha em conjunto com um Conselho independente para alocar e distribuir recursos para a saúde. O Ministro da Saúde, Bem Estar e Esportes supervisiona o esquema de seguro compulsório e os cidadãos holandeses devem adquirir dois tipos de seguro saúde: o Seguro de acordo com a lei de saúde de 2006 e o Seguro sob a lei “Exceptional Medical Expenses”. O Conselho de Seguro Saúde é responsável por assegurar que cada um dos dois esquemas ofereça um pacote básico de cuidados e que os mesmos sejam acessíveis. O Conselho age de forma independente como um órgão não governamental, embora o Ministério da Saúde aponte os três membros do Conselho Executivo. Uma das tarefas básicas do Conselho é calcular e alocar os pagamentos às seguradoras com o fundo de equalização de risco de 15 bilhões de Euros. Os pagamentos são ajustados ao risco e baseados na idade, sexo, invalidez e estado sócio-econômico, bem como nos custos de grupos baseados em remédios, grupos de custo por diagnóstico e auto-empregados.(Fonte: Abramge – palestra de fev/09). 496 Indivíduos adultos contribuem também com 45% dos custos do sistema na forma de prêmios médios por grupo fixado de acordo com a região, que deu em média 1.100 Euros por ano em 2008. (Fonte: Abramge – palestra de fev/09). 497 As Seguradoras privadas podem tanto receber fundos ou pagar ao fundo de equalização de risco. O Conselho de Saúde aloca fundos às seguradoras com base em um mix de severidade, alocando mais fundos para os segurados de maior risco. Se, todavia, as seguradoras têm um perfil de segurados de baixo risco, então devem pagar um valor de equalização ao fundo. As seguradoras podem dar descontos a consumidores que gastam menos de 255 Euros por ano, excluindo visitas a clínicos gerais. Em 2005, quase 4 milhões receberam um desconto. (Paulo Hirai – palestra na Associação Brasileira de Medicina de Grupo – Abramge – 09).

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ajustar os prêmios ao risco dos consumidores nem negar aceitação para a cobertura básica. 498 Os médicos, principalmente aqueles que atuam como clínicos gerais, tiveram expansão de sua atividade como controladores de acesso. Há um cadastro profícuo. Cada consumidor deve se registrar a um único clínico geral para ter acesso aos especialistas e para que o clínico coordene cuidados entre especialidades. Clínicos gerais contratam diretamente com seguradoras, buscando crescentemente, cuidados integrados. Essa integração com os planos de saúde busca controlar custos, com formas de integração que vão desde ser parte de um centro clínico de atendimento primário a participar de incentivos financeiros, tais como prescrever genéricos em lugar de remédios de marca e mesmo participar do risco. Mais de 90% dos hospitais são privados. Os públicos, em sua grande maioria, são hospitais universitários de aprendizado. Um método de equalização de casos substituiu valores do orçamento anterior. Houve adaptações após a reforma. Hospitais podem agora definir preços e contratar seletivamente com seguradoras para serviços categorizados como Combinações de Tratamentos Diagnosticados, que representam em torno de 20% de toda a receita do hospital, isso em 2008. 499 Assegurar a cobertura obrigatória é problemática. Cerca de 1,5% dos segurados não paga há seis meses – (base fevereiro de 2009). 500 Os problemas relativos à seleção de risco, ou equalização de risco, é uma grande preocupação na Holanda. Caso a fórmula de equalização de risco seja inadequada, seguradoras tentarão selecionar somente os consumidores saudáveis, de baixo risco. Finalmente, agora que o país tem uma estrutura institucional englobando tanto a cobertura universal quanto a concorrência gerenciada, a Holanda deve desenvolver redes de entrega integradas e de qualidade para atender as preferências dos consumidores. Necessário será dar tempo ao tempo, pois os outros países estão mirando seus olhares sobre essa reforma Holandesa na Saúde. Visão no Brasil

O relatório do IBGE, Economia da Saúde – Uma perspectiva macroeconômica 2000/2005 apontou que o Brasil despende 8% do PIB com a rubrica saúde, cabendo

498 Os clínicos gerais provêm atendimento primário e atuam como “gatekeeper” – que é um controlador de acesso – para especialistas e cuidados hospitalares. São pagos tanto com base em capitação e taxa por consulta. Especialistas recebem um salário, uma taxa de serviço ou as duas. A maioria dos especialistas trabalha em hospitais e são auto-empregados. (Fonte: Millimam Brasil – palestra proferida por Paulo Hirai – fev/09). 499 Ninguém, na Holanda, pode ter a cobertura negada. Para os que não podem pagar os prêmios, o governo oferece um subsídio para ajudar a cobrir os custos. Para cobrir os benefícios excluídos do plano básico, como assistência odontológica para adultos, óculos, medicina alternativa, cirurgias plásticas, 90% dos consumidores compram apólices suplementares que não precisam ser compradas da mesma seguradora da cobertura básica, mas clientes em geral compram uma combinação de pacotes. Para aumentar a concorrência entre seguradoras, pacientes podem mudar seu plano a cada início de ano. É um sistema de portabilidade. O grande desafio da Holanda, após a implementação das reformas em 2006 são os próximos anos para o futuro que se aproxima rápido. Controlar custos foi uma das maiores razões da reforma. A Lei de 2006, espera reduzir os custos crescentes e mesmo reduzir os gastos com a saúde. 500 No caso de não pagamento, as seguradoras podem cancelar a apólice e recusar a cobertura nos próximos 5 anos, porém, outras seguradoras devem ainda aceitar o inadimplente. O governo espera, com a reforma de 2006, combater a inadimplência permitindo que prêmio sejam deduzidos diretamente dos salários e benefícios, da mesma forma que as contribuições relacionadas a renda. A penalidade por disparar tal mecanismo consistirá no pagamento de um prêmio maior que qualquer outro no mercado. (Paulo Hirai – palestra em fev/2009 – Abramge).

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às famílias mais de 60% desse dispêndio, representando, em 2005, 8,2% de seus gastos totais.

As despesas governamentais montaram a menos de 40% do total dos gastos com saúde, contrapondo-se a valores oscilando entre 70-85% nas economias desenvolvidas, exceto nos Estados Unidos (45%). Com relação aos demais países do BRIC, os gastos brasileiros foram superiores aos da Índia (19%) e China (39%), porém inferiores aos da Rússia (62%). 501

No Brasil, o tema saúde é particularmente delicado. Apesar de a Constituição assegurar atendimento gratuito a todo cidadão, na prática a maioria da população tem acesso, depois de muita espera, a um serviço que chega a desejar e muitas vezes precário, todavia, comparativamente com alguns países houve grande evolução no atendimento público. Uma das grandes preocupações é com o envelhecimento.

A situação tende a piorar – e muito – com as mudanças demográficas. A projeção é que a proporção e pessoas com mais de 60 anos passe dos atuais 10% para 30% da população até 2050. Serão 64 milhões de idosos, ante 19 milhões atuais. Trata-se de um cenário complicado. Os gastos com idosos equivalem a seis vezes as despesas com crianças no Brasil.

Diante desses dados, o único desfecho possível parece ser o colapso. O entanto, estudiosos sustentam que é possível não só evitar a piora como também melhorar o atendimento. “Teremos de aumentar um pouco mais os gastos, mas, sobretudo, gastar com muito mais qualidade do que hoje”, afirma Carlos Alberto Suslik, coordenador do curso de gestão em saúde da escola de negócios Insper. 502

Para muitos usuários, a alternativa de utilizar os planos privados não existe, já que mesmo os mais baratos estão acima das possibilidades da maioria. Trata-se de um mercado complexo, pois as empresas do setor são reguladas pela Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, que precisa mediar um conflito entre o paciente, que quer todas as conquistas da medicina, o médico, que indica os procedimentos, e o plano, que paga a conta do hospital e precisa zelar pelo equilíbrio financeiro.

Segundo as empresas do setor, seria possível cobrar menos pelos planos – e ampliar o mercado – caso a ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar, permitisse a venda de opções menos abrangentes. A agência, por sua vez, alega que a saúde não é uma mercadoria como as outras e que não é possível reduzir muito o rol de procedimentos que podem constar nos planos.

501 Idem – Paulo Hirai – palestra na Abramge – fevereiro de 2009). 502 Na comparação internacional, o Brasil ainda gasta pouco. Em proporção do PIB, os investimentos com saúde somam 7,5% pouco abaixo da média global de quase 9%. A diferença é maior em termos de valor absoluto – nosso gasto per capita é inferior, por exemplo, ao de Chile, Rússia, África do Sul, México e Argentina. Há também enorme a diferença entre o gasto público e o privado. Mais da metade dos 219 bilhões de reais desembolsados com a saúde no Brasil em 2008 foi para pacientes do sistema privado, que atende apenas em torno de 40 milhões de pessoas. É como se os pacientes dos planos privados ficassem com 1.428 reais por ano e os do Sistema Único de saúde com 675. Na realidade, o valor destinado aos pacientes da rede publica é ainda menor. Embora ofereça um serviço básico sofrível, o SUS é referência em muitos procedimentos complexos e caros, como transplantes. Por isso, nesses casos, os hospitais públicos também são procurados por pacientes de convênios privados. É aí que o modelo se revela mais perverso. Como não há recursos para todo mundo, quem chega antes consegue melhor atendimento. Normalmente, os desassistidos são os que dependem de transporte público e têm mais dificuldade para negociar faltas no trabalho e acabam no fim da fila. (Revista Exame, 18\11\2009).

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O risco é exagerar na regulação e terminar por expulsar mais gente para o já sobrecarregado SUS. Há, portanto, um difícil paradoxo nesse campo – quanto mais a regulação favorecer as famílias em detrimento do plano, menos pessoas terão condições de pagar por ele.

O gasto das famílias não é homogêneo; o gasto médio mensal com saúde da parcela da população constituída pelos 10% mais ricos é de R$ 376,00 contra R$ 28,00 gastos pelos 40% mais pobres, despesas mais de treze vezes superior e concentrada nos planos de saúde, medicamentos e atenção odontológica. (Amorim, Perillo – 2008).

O país possui mais de 7.000 hospitais, refletindo tanto densidade de leitos como utilização de cuidados hospitalares em níveis superiores aos verificados em economias de renda média semelhantes, mesmo possuindo uma população mais jovem, relativamente aos demais países do BRIC, com perfil epidemiológico que não depende tanto do emprego intensivo de hospitalização. Como explicar então que a maior parcela dos gastos estatais com saúde destine-se aos hospitais? Antecipando parte da resposta, sabemos que a porta do pronto-socorro tornou-se via de acesso aos cuidados de saúde. (Amorim, Perillo – 2008).

A cobrança do Estado irá para os planos de saúde

Uma medida entrará em vigor em 30 dias, a partir de 12 de julho de 2011, no Estado de São Paulo, onde o governo estadual informa que pacientes de planos particulares não serão privilegiados no atendimento à saúde. Os hospitais estaduais paulistas gerenciados por OSs (Organizações sociais) passarão a cobrar diretamente dos planos de saúde o atendimento feito a seus conveniados.

Esses hospitais, porém, não poderão reservar leitos ou dar tratamento diferenciado a pacientes particulares. É o que diz o decreto do governador Geraldo Alckmin publicado no “Diário Oficial” do Estado, que regulamenta lei que permite a oferta de até 25% dos seus atendimentos a doentes particulares. 503

O governo deve publicar ainda uma resolução em que identificará as unidades de saúde que poderão firmar contratos com os convênios. A Lei passará a vigorar em 30 dias. Levantamento da Secretaria Estadual da Saúde aponta que um em cada cinco pacientes atendidos em hospitais estaduais na capital paulista têm algum tipo de convênio ou plano de saúde, mas quem paga essa conta, avaliada em R$ 468 milhões anuais é o SUS. Um exemplo disso é o Instituto do Câncer do Estado Octávio Frias de Oliveira. Hoje, 18% dos pacientes atendidos no hospital têm planos de saúde, que nada pagam. 504

Há uma legislação federal que já permite o ressarcimento ao SUS. Todavia, o governo estadual alega que a lei entrou em vigor antes de um modelo de OSs ser implantado, o que inviabiliza a sua aplicação nessas unidades. Há contestações. Por exemplo, a advogada Lenir Santos do Instituto de Direito Sanitário Aplicado, diz que hospitais

503 - Folha de São Paulo – 12 de julho de 2011 – C1 – Reportagem de Cláudia Collucci e Talita Bedinelli 504 - Idem

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administrados pelas OSs continuam sendo SUS. A lei federal poderia estar sendo usada em São Paulo para esse ressarcimento.

Segundo ela, os planos de saúde poderão contestar na Justiça a constitucionalidade da nova lei porque só uma legislação federal pode agir sobre os seguros-saúde. Há quem diga que estão abrindo dupla porta de entrada nos atendimentos. Para o promotor da área de saúde Arthur Pinto Filho, o decreto que regulamenta a cobrança dos planos de saúde contraria a regra do SUS que determina que o atendimento público de saúde deva ser igualitário para todos. A cobrança, segundo ele, criará nos hospitais públicos uma “dupla porta” onde pacientes de convênios terão atendimento mais rápido. Isso viola a lógica do SUS. São Paulo não pode ter um SUS diferente do resto do Brasil. Estão entregando patrimônio público às Operadoras de Saúde. Já houve manifestação de cerca de 50 entidades de saúde e de defesa do consumidor.

A maior mudança que alterou o rumo do funcionamento de planos de saúde no Brasil ocorreu em 1998, com a entrada em vigor da lei 9656. Empresas de medicina de grupo e seguradoras tiveram de se adequar as novas medidas elaboradas à luz do Código de Defesa do Consumidor já em vigor desde 11 de setembro de 1990 – lei 8078. Planos mais completos, sem exclusões, com a obrigatoriedade de atender a todas as necessidades do paciente passaram a ser incorporados pelas operadoras que não tiveram escolha.

O direito do consumidor no estrangeiro É expressivo o desenvolvimento do direito do consumidor relativamente aos planos de saúde e outros serviços, considerados como relação de consumo, no último século e nos primeiros anos deste. Alguns países já deram tratamento sistematizado ao tema com a edição de Códigos consolidando o entendimento vigente, outros optaram por leis tópicas. Assim é que, ao fazer um breve apanhado do universo legislativo no estrangeiro, pode-se destacar a evolução do tema no ordenamento jurídico dos seguintes países. Os Estados Unidos foram os pioneiros na difusão do movimento consumerista em todo o mundo. Não há um conceito geral e uniforme sobre a figura jurídica do consumidor, uma vez que o sistema norte-americano baseia-se nos leadings cases e statutues sobre o tema. As normas sobre a proteção do consumidor estão previstas de forma esparsa, de acordo com a abrangência da Lei específica e a constituição. 505 A Suécia se destaca por ter sido a pioneira ao criar a figura do Ombudsman e o Juizado de Consumo, em 1971, no que foi seguida pela Noruega em 1972, Dinamarca em 1974 e Finlândia em 1978. Todos têm textos legais sobre consumidores.506

505 Gregori, Maria Stella, 403 – Idem, 404, Idem, até 411

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Na França, desde a edição do Código Civil de 1806, legisla-se sobre temas relacionados com a defesa do consumidor, mas, somente a partir dos anos 70 é que começam a surgir leis esparsas para proteger os consumidores. A mais conhecida foi a Lei Royer de 1973, que dispunha sobre a proteção aos pequenos comerciantes contra os grandes e também sobre a proteção aos consumidores por meio da regulamentação de publicidade enganosa e a legitimidade processual conferida às associações de consumidores no exercício da ação civil. Foi também aprovada a Lei 78-23, de 10.01.1978, que especificamente tratava da proteção contratual do consumidor contra cláusulas abusivas, inseridos em contratos entre profissionais e não profissionais – consumidores. A partir de 1993, o legislador francês optou por consolidar as leis existentes criando o Code de La Consommation, Lei 93-949, de 16.08.1993.507 Na Alemanha, a antiga Lei, AGB-Gesetz, de 09.12.1976, dispunha sobre as condições gerais dos contratos. Alcançava não só a regulamentação das negociações entre consumidores e grandes empresas. Em Portugal, a Constituição Portuguesa, de 1976, revista em 1982, consagra o direito do consumidor. Foi aprovada a Lei 29, de 22.08.1981, alterada pela Lei 24, de 31.07.1996, que dispõe sobre a defesa dos consumidores. 508 Na Espanha, a Constituição espanhola, de 1978, consagrou o direito do consumidor e em 1984, foi aprovada a Lei 26, de 19.07.1984, Ley General para La Defensa de los Consumidores Y Usuários, para proteger os consumidores. 509 No México, foi aprovada a Ley Federal Del Protección al Consumidor, de 05.02.1976, que define consumidor como quem contrata para sua utilização a aquisição, usos ou desfrute de bens ou a prestação de serviço.510 Na Argentina, foi aprovada a Lei. 24.240 de 22.09.1993, Ley de Defensa Del Consumidor, modificada em 1998, pelas Leis 24.568 e 24.999, de 01 de 07 de 1998, que tratam da proteção jurídica do consumidor. Quando da aprovação desta Lei não havia na Constituição Argentina nenhuma previsão sobre a defesa do consumidor, que somente passou a ser tratada na Constituição de 1994.511 O Chile não trata da proteção dos consumidores em sua Constituição, mas tem uma lei específica que é a Ley Del Consumidor, de número 19.496, de 07.03.1997. 512

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No Paraguai, a Constituição trata do tema da proteção dos consumidores e foi aprovada a Lei 1.334/1998, que define consumidor como toda pessoa física ou jurídica nacional ou estrangeira que adquira, utilize ou desfrute como destinatário final bens ou serviços de qualquer natureza.513 No Uruguai, foi editada a Lei de Relaciones de Consumo, Lei 17.189, de 07.09.1999, que trata da proteção do consumidor. 514

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Considerações finais

As propostas

Compartilhamento entre o Público e o Privado Outras óticas para mudar e para melhorar algumas estratégias da prestação de serviços na saúde privada só serão possíveis desde que haja uma reestruturação entre o público e o privado, de forma compartilhada, o que poderá proporcionar melhor atendimento e dignidade de trabalho a milhares de médicos, profissionais do ramo e usuários. Um dos vetores dessas mudanças está concentrado nas pequenas, micro e médias empresas - PMEs, onde há um grande potencial a ser explorado. A estrutura existente da saúde privada tem forte espaço para atender a um percentual muito grande da população que continua utilizando os serviços estatais e que poderá ser atendida pelos operadores privados. Segundo Almeida (2011), presidente da Abramge – Associação Brasileira das Empresas de Medicina de Grupo, Dr. Arlindo Almeida: “O Brasil tem grande chance de ter metade da população na saúde pública e metade na iniciativa privada” 515. É necessário que haja uma política, das entidades privadas, conforme recomenda a Cartilha da Abramge e da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar (2008) 516para se conhecer o perfil epidemiológico dessa grande quantidade de pessoas de planos e de seguros saúde, seus custos e principalmente, que elas desenvolvam programas voltados à promoção da saúde, com ações mais preventivas do que curativas. É muito melhor tanto para as entidades privadas quanto para os usuários, que uma pessoa vá todos os meses fazer consultas/exames do que ser internada em estado grave, após todos esses meses. Serviços que podem ser prestados por essas empresas desde que haja abertura para discussão de algumas premissas inovadoras, num papel distribuidor de funções e de alterações das normas atuais para prever a transferência de algumas responsabilidades, ou o que será chamado de compartilhamento entre o público e o privado. Esses detalhamentos estão mais à frente nas proposições. A vacinação, por exemplo, já foi oferecida aos governos – pela Abramge - com ajuda em toda a logística de vacinação, mas os órgãos públicos envolvidos se negam a compartilhar ou aceitar tais colaborações.517 Não ao compartilhamento só poderá piorar os objetivos da Saúde em geral, como ocorreu no passado: a tendência à deterioração real dos valores pagos pelo INAMPS a produtores privados – houve perda real de 50% no período 1977-83, tendência que continuou na segunda metade da década. (Mendes, 1999). Em 1986, para uma 515 Informação constante da entrevista com o Presidente da Abramge em 15/03/2011. 516Na realidade são várias cartilhas sendo a primeira de 2008 da ANS e outras da Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge). Quanto à cartilha lançada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar, a mesma traz orientação sobre a aplicação do Decreto 6523 – SAC – Sistema de Atendimento ao Cliente em 02/02/2008). 517 Edson Godoy – Presidente da Amil em entrevista concedida ao Jornal “O Globo” em 29/12/2010.

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inflação de 65% ao ano, esses reajustes atingiram 20% e, em 1987, para uma inflação de 416%, chegaram a, apenas, 30%. Ademais, os gastos do INAMPS com o setor privado caíram em 50% em valores reais, no período de 1981-89, decrescendo de 2.379,6 bilhões de dólares em 1981 para 1.225,6 bilhões de dólares em 1989. (Mendes, 1999).

O abandono, pelo INAMPS, da tabela própria e o uso do porcentual de 30% da tabela da AMB para pagamento dos procedimentos médicos aumentaram as dificuldades do setor privado. A portaria publicada pelo MPAS, em dezembro de 1986, tornando livre a complementação de honorários e serviços, pelo uso de dependências especiais, terminou por expulsar a classe média e os trabalhadores formais da medicina previdenciária. (Mendes, 1999).

Outras propostas privatistas aconteceram. Temos como registro o Plano de Atendimento à Saúde (PAS) da Prefeitura de São Paulo nos anos 90; as Fundações privadas de apoio às instituições públicas, nesses casos, desde os anos 90 também, podem ser citadas, e dentre elas, o Hospital das Clínicas de São Paulo. A proliferação dessas Fundações tem levado à crescente privatização dos serviços por elas intermediados, especialmente através de contratos com empresas de Medicina de Grupo e de Seguros de Saúde. Tais organizações, além de passarem a utilizar instalações e equipamentos públicos, ocupam vagas e procedimentos antes destinados à população em geral, criando discriminação com relação aos pacientes do SUS, porque os beneficiários dessas organizações encontram menos filas e agendamento facilitado, o que também tem ocorrido no setor filantrópico conveniado. Tais situações não são de todo sem solução: devem ser realizados ajustamentos, porque afinal, a dinâmica da saúde sempre foi observada de forma positiva. Na Saúde Pública ainda há situações sui-generis que permanecem. Elas escapam totalmente do previsto na Constituição de 1988 para o SUS e para as empresas privadas. Um dos exemplos é o caso do IAMSPE – Instituto Assistência Médica de Servidores Públicos do Estado de São Paulo, voltado apenas para os servidores estaduais e seus dependentes. E há outros Institutos que permanecem e insistem em desenvolver seu próprio sistema, como os funcionários do Piauí e de Goiás, sem citarmos os Hospitais das Forças Armadas. A integração entre Estado e empresas privadas, sob forma de compartilhamento, ícone atualíssimo do papel social das corporações, vem quebrar um antigo paradigma, de que a saúde da população é problema só do governo. Na década de 80 esta questão já era observada, mas houve resistência dos sanitaristas. 518 Tal assunto constituiu um dos principais temas do Congresso da ALAMI – Associação Latino Americana de Sistemas Privados de Saúde, realizado em 12 e 13 de Maio de 2005 em Cartagena – Colômbia: “Integração - público privada - na cobertura da atenção à saúde”, ao lado de outros como “Legislação e regulação dos sistemas de assistência à

518 Palavras do Presidente da Abramge – Dr. Arlindo Almeida em entrevista concedida a qual faz parte deste trabalho em anexo.

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saúde”, “O avanço tecnológico da medicina” , “Política de fornecimento de medicamentos à população” e “Demandas judiciais”. Rubo519(Abramge), nesse Congresso, confirmou que estava havendo uma grande evasão dos planos particulares. Nas empresas de medicina de grupo, os beneficiários de planos empresariais recuaram de 14,3 milhões, em 2000, para 12,1 milhões, em 2002. Os planos individuais e familiares, que em 2000 atingiam um marco de 4,1 milhões, aumentaram em 100 mil, em 2002, recuando a seguir, em 2002, para os mesmos 4,1 milhões.520 Casos de compartilhamento entre o setor público e o privado, serão saídas estratégicas para muitas situações no futuro, principalmente na saúde, uma vez que o Estado no setor de saúde cresceu muito, está lento e sempre com dificuldades financeiras ou operacionais. O compartilhamento pode resultar positivamente numa situação de crise do Estado, em questões que envolvem o bem-estar social, muitas das vezes com grandes prejuízos para ele mesmo. Entender o que se passa com a saúde no Brasil envolvendo as empresas operadoras privadas de assistência médica, governo, hospitais, clínicas, SUS, órgãos reguladores, significa um desafio do qual o Brasil não pode escapar. Nessa área, além do plano pessoal, aqui tematizado, há a questão da cidadania, uma vez que a nossa Constituição considera a saúde como estatuto do direito universal, na forma do artigo 196 que diz: “A saúde é um direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. Nesse texto, de obrigações e interesses, está inserido o objetivo principal: garantir a saúde da população brasileira. E, embora apenas o Estado seja citado, observa-se de forma indireta a participação do setor privado com um grande volume de recursos e de riscos envolvidos. 521

519 Informação no artigo de Reunião preparatória da Alami - Associação Latino Americana de Sistemas Privados de Saúde. Revista Medicina Social - 188 - pág. 29. 520 Estes números podem ser encontrados no site: www.abramge.com.br/download/assessoria.htm - em informe de imprensa. 521 Esse modelo, bastante útil para mostrar as interações entre um sistema público e um privado de saúde numa economia, apresenta algumas limitações analíticas para o caso brasileiro, que devem ser consideradas. No que se refere às similaridades, pode-se dizer que no Brasil coexiste um sistema público e um privado de saúde, ambos de tamanho significativo. O primeiro se caracteriza pela existência de um tempo de espera positivo para a obtenção de tratamentos, dada a sua pequena capacidade de produção e a garantia de acesso universal a todos os agentes da economia. Entretanto, o tempo de espera positivo para a obtenção do tratamento público não é ótimo para todos os tipos de tratamentos de saúde no Brasil. Pois o sistema privado de saúde, através de planos de saúde, gera um esquema em que - para alguns tratamentos de alta complexidade – os agentes mais ricos acabam tendo melhores condições de acesso aos bens públicos de saúde que os menos abastados, sem que isso se reverta para uma redução de custos para o setor público, inclusive piorando a situação dos agentes com menor propensão a pagar pelos bens privados de saúde. A explicação para esse fenômeno é descrita a seguir. Os indivíduos com maiores rendas e, portanto, com maiores propensões a consumir o tratamento privado, compram seguros de saúde do setor privado8. Quando ocorre a eventualidade de uma doença ou mal, tais indivíduos são atendidos pela rede privada de serviços de cuidados médicos. Todavia, essa rede possui escassez de capacidade produtiva especificamente de cuidados médicos de alta complexidade. A sustentação desta hipótese se dá pela existência de grandes instituições de excelência neste tipo de tratamento, tais como INCOR, Santas Casas e Hospitais Universitários, que ou são públicas ou são financiadas pelo setor público. Além disso, por tradição, no Brasil, apenas o setor público financia pesquisas em quantidade significativa, capazes de gerar conhecimentos de fronteira sobre os assuntos de medicina, principalmente na forma de

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Rigorosamente, se o princípio constitucional fosse cumprido pelo Estado, os planos e seguros de saúde não existiriam. Deve-se rememorar também que a Carta Magna estabelece o sistema de custeio, mantido por impostos e contribuições tanto dos trabalhadores como dos empresários. O Estado, portanto, não consegue dar a assistência necessária à saúde da população, obrigando-o a recorrer à iniciativa privada. A situação não é tão ruim quanto parece. “...foi um grande avanço. Saímos das páginas policiais para entrar nas páginas destinadas a assuntos econômicos... “ 522 Como se vê, as entidades privadas já participam do sistema. Em muitas regiões elas são contratadas do SUS e no Sudeste e Centro Oeste há uma grande integração com o setor suplementar como, por exemplo, as Santas Casas de Misericórdia e inúmeros outros hospitais. Quanto aos meios para se conseguir tal objetivo, necessário será definir a participação proporcional de cada um dos operadores, as tabelas a serem utilizadas, a forma contábil de movimentação dos recursos, os prazos de recebimento, a área geográfica de abrangência, a criação de um programa de esclarecimento às empresas, funcionários e a população em geral através da mídia. Será necessário, também, esclarecer a sociedade acerca da disponibilidade desses novos serviços, projetar os orçamentos financeiros, criar o órgão centralizador dos recursos a serem repassados, estabelecer tabelas para pagamento dos procedimentos médicos e hospitalares de alta complexidade e iniciar a operação começando pelo capitation de forma gradual e modesta. Atualmente, funcionam em torno de 1.400 operadoras de saúde em todo o País, empresas particulares e outras que, naturalmente, serão criadas - com certeza pequenas - ao longo do tempo, pulverizando toda essa massa de consultas, exames, internações para milhões de pessoas, com atendimento particular, digno e de forma estratificada, sob as vistas do governo. Com certeza, haverá mais eficiência e economia para os governos, federal, estadual e municipal. Alguns dos números das operadoras precisam ser analisados. Hoje, pouco mais de 25% da população brasileira ou 45 milhões de pessoas – aproximadamente - têm planos de saúde. A ANS informa que 34% delas tiveram prejuízo em 2003, 28% tiveram rentabilidade patrimonial negativa e 38% faturaram menos em 2003 em comparação com 2002.523 O Brasil tem, atualmente, mais de 190 milhões de habitantes, ou seja, se retirarmos os capital humano. (Fonte: Artigo: Análise econômica da interação entre saúde pública e privada no Brasil: tratamentos de alta complexidade ). Autor01: Profa. Dra. Marislei Nishijima (FEA-USP) / Autor02: Prof. Dr. Geraldo Biasoto Junior (IE-Unicamp) / Autor03: Profa. Dra. Denise Cavallini Cyrillo (FEA-USP) – (acessado em 07/07/2011)). 522 Revista Medicina Social - jul/ago/set/2003 - Antonio Jorge Gualter Kropt - Diretor técnico da AMIL - pág. 03 e Revista número 182. 523 Site de informações estatísticas da ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar.

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45 milhões já descritos sobra uma população que depende dos serviços públicos de saúde (SUS) de 145 milhões. Desses, uma parte, empregados de pequenas, micro e médias empresas com carteiras profissionais assinadas poderão ser atendidos nas formas apresentadas nesse estudo pelas quase 1400 operadoras existentes e mais aquelas que poderão ser criadas, dentro de critérios a serem regulados pela ANS e sempre com participação orçamentária do SUS nos casos de doenças de alta complexidade, ou seja, tudo muito bem controlado. As ações para solucionar os problemas nos serviços de saúde privado eram urgentes e as pressões para prevenção e promoção de saúde até 1999, eram questões de sobrevivência do setor. As soluções para o setor privado deveriam resultar das medidas normativas da ANS, fundamentadas em pesquisas efetuadas e reuniões com os agentes operadores. Este trabalho observa, de fato, que após 12 anos de operações, o sistema privado de saúde continua acessível apenas às classes de maior renda, que podem, mesmo com dificuldades, adquirir planos de saúde; todavia, aqueles que não têm condições mínimas de possuir um plano - a grande massa - inclusive da classe média, atualmente empobrecida, estão diariamente nas filas do SUS. Por isso, é preciso mudar, via ANS, inicialmente, não de forma compulsória, todavia flexibilizando outros aspectos como: fiscais e normativos, que possam ser vantajosos e interessantes para as operadoras, como o compartilhamento entre o público e o privado. As operadoras precisam analisar mais profundamente qual é o perfil epidemiológico da suas clientelas e com isso tomar providências nesse sentido. Observa-se, então, que uma estrutura para atender o público e o privado já existe e funciona, bastando, apenas, adequá-la e adaptá-la para o que se deseja. É neste sentido que a alta complexidade é o ponto que pode aproximar mais ainda a Saúde Pública e a Saúde privada. O que se propõe não é uma descentralização de serviços, mas um compartilhamento efetivo. Sobre esse assunto Cordeiro, (2011), diz que: “Há três décadas, quando se hasteou as bandeiras da Reforma Sanitária, existia uma condição bastante adversa durante a Ditadura Militar, com muitas lutas a serem travadas. Os princípios de que a Saúde é um direito de todos e um dever do Estado apontaram para a universalidade da atenção e para a equidade: o direito de todos a tudo que o avanço do conhecimento e da terapêutica pode oferecer e a Constituição Federal de 1988 definiu que para assegurar esses direitos, o Estado deve garantir a atenção e o setor privado participar como complementar. Atualmente, em uma conjuntura politicamente mais favorável, quais deveriam ser as bandeiras da saúde? Hoje, a bandeira central vai além do acesso aos serviços: exige-se qualidade no cuidado em saúde, o que envolve também decisões em relação à educação permanente, à educação continuada e à remuneração dos profissionais de saúde. Não é só uma questão simbólica, é uma questão material. As bandeiras da saúde deveriam direcionar-se para a qualidade de saúde e pela construção de um sistema

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brasileiro voltado para a qualidade do cuidado. Um sistema em que o público e o privado se articulassem, com uma convivência entre o setor dos planos de saúde privados e o setor público de uma forma mais inteligente, de forma complementar e não ao contrário. Não o público complementando o privado, mas uma complementaridade mútua entre os dois setores. Isso depende de se assumir um consenso na sociedade, especialmente entre os profissionais de saúde, para que se discutam de novo as propostas de saúde a partir da ótica da igualdade.” 524 (Cordeiro, 2011). Se a alta complexidade é o grande desafio para o desenvolvimento e o crescimento da saúde suplementar em vista do fator custo, embora seja um direito de todos que dela necessitem, vamos eliminá-la, de forma parcial ou total dos custos das operadoras atualmente existentes, principalmente das pequenas e médias, conforme detalhamentos à frente. Muito pode ser estudado e compartilhado. É o caso das OPME’s. 525 enfatiza um membro da MMS - Saúde, Frederico Magalhães (2011). Almeida, presidente da ABRAMGE, na entrevista para esta tese (2011), referindo-se a um curso de atualização sobre OPME’s, ocorrido em julho de 2011 em São Paulo, Capital, observou que no Brasil as Próteses, Órteses e Materiais Especiais estão com os preços absurdamente altos, comparativamente com os levantamentos efetuados no exterior. Necessário também que a ANVISA dê seus pareceres sobre a questão e dê atenção a esse assunto também. Tudo isso em questão, são formas de compartilhamento. Não se trata apenas de saúde pública ou privada, é necessário que a qualidade dos equipamentos e materiais necessários à saúde tenham convergência comum e respeitosa. Quem ganha com isso é a população. Explicitamos abaixo nossa proposta. O Compartilhamento na alta complexidade O Ministério da Saúde deve reembolsar às operadoras quanto ao Rol de procedimentos de alta complexidade, exigindo em contrapartida soluções na criação de apólices de planos coletivos para atender à saúde dos trabalhadores das micros, pequenas e médias empresas. Há ainda milhares de pequenas e médias empresas

524 Entrevista com Hésio Cordeiro - Revista Radis – número 102 – pág. 20/21 – fev/2011.

525 Órteses, Próteses e Materiais Especiais – OPME - Com cerca de R$ 8 bilhões gastos por ano em volume de equipamentos, órteses e próteses, o Brasil tem se preocupado cada vez mais com o uso do material cirúrgico especial (OPMEs). As informações da Associação Brasileira de Importadores e Distribuidores de Implantes vêm de frente com a preocupação à liberação do produto solicitado, sem qualquer tipo de avaliação quanto à necessidade e qualidade. “Cada caso pede um material cirúrgico específico. Muitas vezes, uma técnica não condiz com o produto solicitado. As compras desestruturadas e sem a homologação de especialistas para o procedimento prescrito geram aumento de custos em sinistros e perda da qualidade necessária para o melhor tratamento do paciente”, enfatiza um membro da MMS Saúde, Frederico Magalhães. De acordo com ele, os altos custos refletem a falta de controle na aquisição desses produtos. Além disso, a má indicação gera transtornos para os pacientes. “Muitas vezes, mesmo os materiais registrados pela Avisa têm qualidade duvidosa, por isso o melhor a fazer é buscar por materiais que tenham indicação, e essa busca tem que fazer parte do procedimento a ser realizado. São materiais de alto custo e tem que ter racionalidade para se fazer o uso deles. A saúde não tem preço, mas tem custo! Está todo mundo preocupado e por isso devemos racionalizar o uso e o valor desses materiais cirúrgicos”. (Fonte: http://saudeweb.com.br/12156/instituicoes-de-saude-alertam-para-regulacao-dos-opmes/ (acessado em 07/07/2011).

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que por serem pequenas não oferecem aos seus funcionários planos de saúde. Nesses casos o compartilhamento para a alta complexidade seria um grande avanço para as PME’s. De certa forma, a alta complexidade já é atendida pelo setor público mas, pode ser compartilhada com o setor privado. O que se observa e também atrapalha a visão mais holística do problema é que muito se critica o papel da iniciativa privada, ainda que seja complementar na saúde, como sendo um grande problema. Hésio Cordeiro, por exemplo, comenta: “Muitas vezes, essa saúde dita suplementar se vale do serviço público para os procedimentos de alta complexidade. No fundo, o serviço público de saúde é que trabalha complementarmente à iniciativa privada, quando a concepção inicial é que a iniciativa privada complementaria as ações do setor público. A gente vê o contrário em transplantes renais, de fígado, de coração. Os pacientes preferem ser operados no serviço público, que desenvolveu estes procedimentos de alta complexidade, do que no setor privado, mais caro e nem sempre com a qualidade mais adequada. Houve uma inversão. O que se chama de suplementar, na realidade, está se valendo do serviço público, que acabou se tornando suplementar à iniciativa privada. E não o inverso. “ 526 Verifica-se que, comentários à parte, os assuntos são discutíveis, dependendo do lado em que se ouve e se analisa. Esse é um ajuste, se assim podemos dizer, de grandes proporções, sendo que o objetivo não deve ser, apenas, fazer crescer o sistema de saúde suplementar, mas alicerçá-lo para crescer consistentemente. Críticas por críticas apenas não levam a nada. Crescer por crescer é a lógica da célula cancerosa.527 Mas, afinal, o que são procedimentos de alta complexidade? Alguns exemplos são: transplantes renais, de fígado, de coração e outros como, radioterapia, quimioterapia, implante de marca-passo, revascularização do miocárdio, cateterismo cardíaco e colocação de “stent”, hemodiálise, ressonância magnética. Há outros ainda como transplante de córnea, Ortopedia - coluna, Ortopedia - ombro, Ortopedia - mão, Ortopedia - quadril, Ortopedia - joelho, Ortopedia - tumor ósseo, Tratamento de Aids - infantil, Videolaparoscopia, Neurocirurgia II, Gestação de alto risco, Central de captação notificação e distribuição de órgãos, Hospital amigo da criança - UTI: Nível III - Adulto, UTI-NeoNatal, UTI – materna-ambulatorial: - Centro de terapia renal, Centro de oftalmologia e de tratamento da retinopatia diabética, Litrotripsia, Audiometria, Hemodinâmica, Tomografia helicoidal. Os procedimentos de alta complexidade são definidos na resolução da ANS na RDC-68, de 08/05/2001, e na RN/82 e podem ser o ponto de concórdia que poderá promover o crescimento da saúde suplementar, beneficiando também a saúde pública, considerando-se as situações e exposições das questões até então e a possibilidade de compartilhamento entre a saúde pública e a saúde suplementar na forma e

526 Hésio Cordeiro – Revista Radis – número 102 – pág. 18/19/20 – Entrevista em fev/2011. 527 Dowbor, 2004, p. 50.

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aplicações expostas na sequência. Devem ser cobertos, também, exames, medicamentos, anestésicos, oxigênio e transfusões referentes aos procedimentos acima, desde que o tipo de plano ou o atendimento parcial temporário não exclua alta complexidade. Não há uma definição ampla e técnica sobre os procedimentos de alta complexidade; todavia, no caso de ser premissa para discussão e implantação de algum tipo de rotina, os mesmos são perfeitamente identificáveis e podem ser definidos sob protocolo, conforme a RN/82, mencionada. Deve-se ter sempre em mente a perspectiva de atingir a maior quantidade possível de pessoas, que, a partir de um determinado momento, venham a ser participantes de um plano de saúde para o titular e sua família, via micro, pequenas e médias empresas, com desconto em folha. Em resumo, a idéia é recuperar os usuários perdidos, desafogar o SUS e aumentar a base de novos adquirentes. Outra proposta poderia ser o capitation estudado dentro das nossas necessidades brasileiras. Outras propostas O capitation No geral, atualmente o procedimento médico é pago de forma individualizada, ou seja, para cada procedimento, um valor é determinado. Existe, porém, outra forma de administração financeira desse aspecto e a respectiva gestão dos procedimentos. Trata-se do pagamento a hospitais – ou agente operador - por quantidade de usuários, ou seja, de um contrato de trabalho que se ajusta em bloco e não a tabelas de

procedimentos. Por exemplo, o hospital receberia mensalmente R$ 100,00 por beneficiário ou per capita. Se a operadora fosse detentora, naquela carteira, de 4.000 usuários, então o hospital – ou agente operador - receberia todo mês R$ 400.000,00, e, com esse valor, arcaria com todos os riscos. Atendendo ou não, o hospital sempre receberia o valor “per capita”. É, pois, um acordo comercial entre a operadora e o hospital – ou agente operador - por pacote de clientes. Os riscos nos casos de alta complexidade, portanto, ficariam para o hospital. A esse tipo de negociação em saúde denominamos capitation, sistema que já vem sendo muito utilizado na área odontológica. Para riscos gerais hospitalares o capitation pode ser utilizado, todavia, onde ele é mais utilizado no Brasil é na Ortopedia, Oftalmologia e outras especialidades conforme adiante descrito. Tal proposição também poderia ser estendida a Associações de Autônomos, como apenas uma extensão dos benefícios do capitation para grupos de associações, em vez de atender apenas grupos de trabalhadores de micros, pequenas e médias empresas - PMEs. O que existe na verdade, são os planos coletivos - por adesão ou não - que não são formas de capitation. O atendimento por parte dessas pequenas empresas e hospitais aos casos de alta complexidade e o reembolso pelo governo desses procedimentos às operadoras e, se for o caso, aos hospitais que queiram correr os riscos diretamente, pode permitir a

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eliminação de um risco financeiro, proporcionando condições para que outras empresas se formem num crescente e constante desenvolvimento para o setor de saúde suplementar. Com isso, teríamos a redução de preços em vista da redução dos riscos e futura concorrência entre as próprias operadoras. Uma das formas para implantação desse reembolso da alta complexidade, do governo, via Ministério do Trabalho e Previdência Social (MTPS), SUS e ANS, seria através da classificação das operadoras por quantidade de usuários, região de abrangência geográfica e tipo de rede de atendimento, se própria ou não, sendo que os gigantes do setor poderiam participar sob condições específicas, pois o que é fundamentalmente importante para a saúde privada é o desenvolvimento das pequenas e médias operadoras do setor e não deixar o mercado na mão de operadoras monopolistas. O reembolso somente existiria nos casos enquadrados dentro das premissas propostas de compartilhamento adiante descritas, planos em capitation, usuários que trabalham em PMEs e associações. Torna-se necessário, portanto, encontrar novos caminhos para aumentar essa base de pessoas que poderiam ter, mas não têm, um plano privado de assistência à saúde tendo a empresa onde trabalham como instituidora. Esses procedimentos de ajustes entre operadoras e a ANS, aqui denominados de compartilhamento entre o público e o privado, são detalhados nos parágrafos seguintes. Ressalta-se, porém, que este trabalho apenas introduz a discussão promovendo muitos debates sobre o assunto, não tendo pretensões de materializar a solução. Para tanto, há propostas, que envolverão empresas, governo e operadoras. Uma delas é a aplicação do capitation para essas empresas e a ampliação desse benefício para as associações em geral. O capitation é um compartilhamento de riscos. É um pacote per capita que é oferecido de uma operadora para um hospital ou clínicas por exemplo. Esse compartilhamento do risco com fatura cheia recebida todo mês, independente dos custos de procedimentos médicos, como vimos, é denominado capitation.528 No Brasil ele ainda é incipiente na área de saúde, todavia, é muito utilizado na odontologia. As healthcare529 americanas estão continuamente procurando sócios para desenvolvimento de capitation para seus clientes. É claro que suas taxas atualmente são muito discutidas nesse país, pois tal tipo de operação também está passando por estágios de amadurecimento. Dessa forma, são previstos gatekeepers, promoções de

528 A saúde nos Estados Unidos movimenta anualmente cerca de US$1 trilhão. Boa parte deste imenso dinheiro é empregado no health business e paga dividendos, reparte-se em ações bonificadas. Boa parte desta soma entra também sob a forma de subscrições de novas ações, Procedimentos de saúde estão deixando de ser autorizados porque interferem na lucratividade. No ano de 1997, os estados americanos passaram 182 leis sobre o managed care para dar vazão às já volumosas e crescentes queixas dos usuários. Muitos planos HMO - Health maitenance organization - pagam aos médicos uma taxa fixa por usuário independente da quantidade de tratamento que venha a precisar. Geralmente nos planos de cuidados clínicos mais simples, o paciente é "cotado" a US$ 150 por ano. (artigo de João Hélio Rocha é médico em Nova Friburgo, Caixa Postal 97267- RJ -cep 28601-CRMRJ 52-07205-7). http://www.datasus.gov.br/cns/temas/tribuna/tribuna.htm - acessado em 10/11/2005.

529 Understanding Capitation - Patrick C. Alguire, MD, FACP. Director, Education on Career Development. http://www.acponline.org/counseling/understandcapit.htm - acessado em dez/2005. Capitation is a fixed amount of money per patient per unit of time paid in advance to the physician for the delivery of health care services.

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prevenção à saúde, formas de reembolso, franquias e outras possibilidades de controle dos custos comentadas neste trabalho. Nos Estados Unidos existem formas de capitation até para clínicas de atendimento médico. Mas não é o que se recomenda neste estudo, mesmo porque, os EUA - atualmente - não são nenhum exemplo de boa saúde e boa medicina para a população em geral. De fato, cada país tem sua cultura, tamanho, estrutura de saúde já desenvolvida ou não. No caso brasileiro, é necessário fazer adaptações na formatação de um capitation, 530 pois há um grande sistema de saúde público e um sistema de saúde suplementar e este pode novamente entrar em ascensão, se ousar e partir para inovações e caminhos alternativos empresariais na saúde.531 Nos EUA trata-se de um contrato de risco. Se no período – por exemplo - o usuário estiver sempre sadio, o médico recebe integralmente os US$ 150. Mas, se adoecer, o médico ou o hospital deverá arcar com as despesas e poderá ter prejuízo. O sistema denomina-se capitation. Como os americanos são saudáveis e bem nutridos - tirando atualmente a obesidade - a maioria dos médicos não tem prejuízo. Mas o usuário corre o risco de ter menor assistência porque quanto mais o paciente consome, menos o médico ganha, e o sentido do lucro pode passar a presidir as relações médico/paciente. 532 Não é o que se propõe como capitation brasileiro. Os benefícios que a assistência médica traz a seus funcionários através dos planos empresariais, é muito grande. É um dos aspectos mais valorizados pelos trabalhadores de qualquer nível hierárquico de uma empresa. Não importa se ela é grande, pequena, média ou micro. As grandes empresas já contam com tais benefícios, mas de forma diferente daquela proposta aqui, que vai mais ao encontro das PME’s. E elas são milhões. Segundo uma pesquisa da consultoria de recursos humanos, Towers Perrin, 100% das companhias de médio e grande porte instaladas no Brasil já oferecem a seus funcionários o benefício de assistência médica. O custo para a empresa na folha de pagamento varia de 6% a 8% em média. São despesas inevitáveis533 para as grandes empresas. As premissas básicas para implantação do capitation complementando outras propostas deste trabalho são as seguintes: a) Só podem participar desse sistema: micros e pequenas empresas.534 O objetivo é as operadoras montarem apólices de capitation empresariais - coletivas - para

531Mais informações do capitation nos EUA: - A collection of articles from Managed care magazine. http://www.managedcaremag.com/capitation.html - acessado em 22/12/2005. 532 O usuário, um ser humano, começa a ser tratado como uma commodity da Bolsa de Cereais de Chicago. 533 Revista Exame / 1.° de outubro de 2003 - pág. 98 a 100. 534 O critério escolhido para a classificação do porte de empresas utiliza o número de empregados, conforme conceito adotado pelo SEBRAE: considera-se como microempresa aquela com até 19 empregados na indústria e até 9 no comércio e no setor de serviços as pequenas empresas são as que possuem, na indústria, de 20 a 99 empregados e, no comércio e serviços, de 10 a 49 empregados: as médias empresas de 100 a 499 empregados na indústria e de 50 a 99 no comércio e serviços.

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oferecê-las aos trabalhadores das PMEs, que são aquelas empresas que têm maior dificuldade de fornecer assistência médica a seus empregados. As médias empresas deverão ter seus limites na quantidade de empregados, que sugerimos sejam classificados conforme os parâmetros do Sebrae - Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas. Essa determinação ficaria a cargo da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar. b) O SUS deve reembolsar às operadoras - que desenvolverem apólices de capitation - os custos com tratamentos de doenças consideradas de alta complexidade. Se esse reembolso ocorrer devidamente, ou seja, de acordo com as tabelas da Associação Médica Brasileira - AMB, Tunep535 ou outras a serem consensualmente definidas, os agentes dos setores privados poderiam atender mais alguns milhões de beneficiários, além de propiciar o crescimento e/ou surgimento de milhares de novas empresas operadoras de assistência médica no mercado. Esse é o compartilhamento entre o público e o privado que complementa o capitation neste trabalho e procura colocá-lo como uma alternativa para o futuro da saúde no Brasil. Embora o nome seja o mesmo adotado em outros países, o formato é diferente. c) Negocia-se qual o valor per capita para certo número de usuários com o hospital. A operadora recebe por cabeça e repassa ao hospital também per capita, retirando apenas suas despesas administrativas, de vendas e margem de contribuição. São pacotes formados para grandes grupos ou adesões à apólices de muitos funcionários agregados. Os riscos são inteiramente do hospital que aceita o capitation, não são da operadora. Como a alta complexidade, inviabiliza ou aumenta os riscos para o Hospital, a operadora - somente em procedimentos de alta complexidade - recebe do Ministério da Saúde e repassa ao Hospital. d) Outro grande grupo que pode ser atendido é aquele que se refere a não empregados, ou seja, aqueles que pertencem a alguma associação profissional e tem seu trabalho como autônomo. Nesses casos, a associação é apenas instituidora do plano coletivo por adesão e o processo de gestão é o mesmo do capitation. Exemplo: Associação dos Carrinheiros de Santos. Assim, com essa proposta - capitation -, atingiríamos àqueles que têm carteira assinada ou o empregado formal; e com a segunda, através das Associações, aos seus associados, que não têm carteira assinada por nenhum empregador. São associações de profissões de menor expressão. Wagner Barbosa (2004), empresário da atividade há muitos anos, comentava: “Na medida em que começamos a imaginar parcerias, alianças, fusões, temos de estar abertos para uma nova convivência”.536 e) É claro que uma das consequências decorrentes das propostas é que o compartilhamento da alta complexidade viabilizará um grande número de operadoras de saúde que não se desenvolvem ou não existem porque o risco da alta

535 Tabela Única Nacional de Equivalência de Procedimentos TUNEP, aprovada pela. Resolução - RDC nº 17 da ANS. 536Artigo de Wagner Barbosa de Castro - Economista, técnico em saúde privada e coordenador da comissão econômica da Abramge e do Sinange. Revista Medicina Social n.° 187 - out/nov/dez/2004 - pág. 05.

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complexidade inviabiliza as operações sob o ponto de vista de riscos. Dessa forma, a Saúde Privada não continuará na mão de poucos gigantes do setor, abrindo espaço para outras pequenas empresas pelo Brasil afora. f) O compartilhamento entre o público e o privado já é muito discutido no governo atual para a resolução de vários assuntos. Na saúde, não deverá ser diferente, pois se assim não for, a criação da ANS ficará sem sentido prático e social, já que ela continuará, apenas, a regular a saúde das elites ou da parte socialmente mais importante dos trabalhadores do mercado formal As implicações, no tecido social, relativamente à assistência à saúde estão bem além do que conhecemos como missão institucional. Há, de fato, incomensuráveis chances de corporações privadas contribuírem, de forma proporcional aos seus tamanhos e de acordo com suas possibilidades, na atividade de saúde dos brasileiros, tendo em vista a obrigação social do empresariado brasileiro para o futuro do país, ícone que marcará o novo século da visão corporativa. g) A proposição do compartilhamento entre o público e o privado, inicialmente, poderá ser aplicado, não de forma compulsória, mas por opção da operadora. Basta que esteja regulado. Aquelas que optarem pelo compartilhamento, terão suas apólices, nos planos de capitation, cobertas pelo Ministério da Saúde no caso de despesas de alta complexidade, e com isto, seus riscos serão menores. Tal diminuição do risco fatalmente trará ao mercado muitas outras empresas que operam no ramo de saúde. Trata-se de uma troca de interesses em benefício da sociedade; ou seja, gradualmente as apólices de capitation chegarão, via operadoras, às pequenas e micro empresas que não têm condições de ter plano de saúde para seus poucos empregados, atendendo, assim, de forma gradual, milhões de empresas e milhões de pessoas ao longo dos próximos anos. h) Complementando, uma empresa faz a parte comercial e recebe as contra-prestações mensais totais e outra faz o recebimento da fatura parcial, controla seus procedimentos e corre os riscos da utilização ou não do grupo. Não há caracterização de pagamento de parte a parte para procedimentos isolados. É tudo como pacote, no caso exemplificado de odontologia. Aparentemente é tudo muito simples. Atualmente, há empresas que só administram planos de saúde e cobram por cabeça. São apenas gestoras administrativas. Elas não são operadoras de serviços na saúde e nem executam procedimentos médicos. Hospitais interessados no capitation poderiam utilizar os serviços dessas empresas para administrar os contratos de adesão das PMEs, conforme proposições. Nesses casos, com devido acordo de ambos os lados, os procedimentos relativos a tratamentos de alta complexidade seriam pagos pelo Ministério da Saúde, via SUS, às operadoras que desenvolveriam planos de capitation na assistência à saúde. Até o ex-presidente da ANS sugere uma aproximação na interface do SUS com o sistema privado.537 (Montone, 2001). As respostas mais positivas referem-se a estrutura funcional do setor privado, que se utilizada na forma proposta, desafogará o setor público trazendo-lhe economia e velocidade e quem ganhará com isso será grande parte da população que antes não 537 Januário Montone - ex-presidente da ANS - Agência Nacional da Saúde Suplementar. (Site ANS). Série ANS - número 2 - ISBN-85-334-0374-7 - 2001 - página 18.

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poderia adquirir um plano de saúde, mas que, com o desenvolvimento do capitation poderá ter seu plano, via empresa onde trabalha, com valores que poderão chegar a R$ 50,00 para uma família de até quatro pessoas. Não é utopia.

j) Existem muitas operadoras que desejam crescer, têm estrutura, mas têm grande receio dos riscos de alta complexidade. Se o governo cria condições para fortalecer e até subsidiar Bancos e Montadoras de veículos, porque não compartilhar a capacidade operacional e importante para a sociedade, da saúde complementar? O ramo de saúde suplementar tem milhares de operadoras pequenas desejosas de crescimento, enquanto muitas já desistiram. A implementação da proposta é urgente, antes que elas se auto-extingam. Eram 2304 em 2002 e atualmente estão funcionando em torno de não mais que 1400: houve uma queda em torno de 26%, aproximadamente. É um percentual expressivo. O ex-presidente da ANS – Montone (2001) comentou que: “...O mercado de saúde suplementar tem uma alta taxa de concentração de grandes operadoras. São mais de 1728 operadoras atuando no setor, mas neste quadro verifica-se que apenas 45 delas são responsáveis por metade dos usuários e que 80% destes são atendidos por apenas 231 operadoras.”.538 k) Os modelos de capitation para procedimentos do compartilhamento entre o público e o privado não são complexos em sua formatação, desde que obedecidos alguns critérios e premissas. É necessário que se abram portas para essas possibilidades sob vários ângulos. A visão de passado permite essa análise e impõe, necessariamente, algum tipo de renovação. A partir da abertura do portal da ANS na Internet, "http://www.ans.gov.br", constatamos que sua missão vem ao encontro, aparentemente, do que se conhece como novas estratégias, inovações e competências: “A ANS tem por finalidade institucional promover a defesa do interesse público na assistência suplementar à saúde, regular as operadoras setoriais - inclusive quanto às suas relações com prestadores e consumidores - e contribuir para o desenvolvimento das ações de saúde no País.” 539 Essa é, portanto, a missão da ANS, propondo a defesa do interesse público, relação com prestadores e usuários e contribuição para o desenvolvimento das ações de saúde no país. Apesar de todas as mudanças nos últimos anos, a saúde privada já está preparada para agir de forma independente, mas dentro da lei, fornecendo elementos que possam vir a melhorar, de fato, todo o sistema de saúde suplementar e, conseqüentemente, a pública, pois, afinal, o objetivo de ambas deve ser convergente e cada vez mais, minimizar os problemas existentes no atendimento à saúde.

538 Palestra de Januário Montone - Presidente da ANS - série ANS 2 - Jul/2001 - RJ. 539 Site ANS - www.ans.gov.br (Home Page).

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O que se percebe, após todas essas possibilidades, análises de alternativas e dificuldades é que nenhum país tem um sistema de saúde perfeito. O sistema de pagador único permite a cobertura universal mais facilmente, mas gera problemas de filas de espera e de falta de tratamento diferenciado de acordo com o desejo do usuário. Países com sistema de pagador único estão buscando alternativas de mercado para o controle dos custos. Por outro lado, os sistemas de saúde orientados para o mercado provêm melhor resposta às necessidades distintas dos vários consumidores, mas tem dificuldade em garantir cobertura a toda a população. Os sistemas de saúde são complexos, amplos e mudanças devem ser sempre graduais e muito bem estruturadas.540 A humanização nos serviços de saúde passa pela percepção, por parte de todos os envolvidos na prestação desses serviços, de que o doente necessita sempre de atenção e que pode existir alguma alteração que é mais ou menos importante no seu fluxo de vida. Ele não é um objeto ou um produto de prateleira, que paga o valor devido para ser bem atendido como ser humano, preferencialmente sem filas intermináveis, data de exames muito distantes de suas necessidades para a sua enfermidade. Muito se tem falado e escrito sobre os sistemas de saúde, gerando contribuições e ideias para mudanças nas estratégias de atendimento, de entrelaçamento ou compartilhamento entre o público e o privado nos sistemas de saúde, e em especial, no sistema brasileiro. Isso não era, ou não seria possível há 10 ou 20 anos atrás, por exemplo. Atualmente, há um amadurecimento do próprio sistema suplementar e, por que não dizer, do sistema público também. As dificuldades e vicissitudes da atividade trouxeram luz ao problema. Desenha-se, com isso, possibilidades de se clarear mais ainda o ambiente da saúde. Nesse entrelaçamento, os medicamentos podem ser incluídos como complemento dessa atenção à saúde, por exemplo. Como recomendações, ainda, é importante a incorporação tecnológica na gestão da saúde para a melhoria da qualidade e diminuição dos custos: a concorrência e economia de escala são importantes em qualquer sistema e com adequados incentivos, a livre concorrência é uma boa forma de controlar e reduzir custos.541

540 Em quase todos os sistemas de saúde de pagador único tem componentes de mercado e os orientados à mercado tem componentes de pagador único. Interessante tal observação, pois os compartilhamentos existiram, existem e continuarão existindo. O Público depende do privado e vice versa. Tanto os sistemas de pagador único quanto os sistemas orientados ao mercado têm mostrado problemas que em princípio podem ser solucionados ou melhorados. O sistema deve proporcionar a cada consumidor os cuidados que ele deseja e pode pagar. O sistema de saúde depende das condições sócio-econômicas e dos usos e costumes da população, dos provedores de serviços, da capacidade dos agentes – governos federal, estadual, municipal, seguradoras, hospitais, ONG’s, etc., de bem administrar a saúde. (Paulo Hirai – palestra proferida em fev/09 – na Abramge – Associação Brasileira de Medicina de Grupo). 541 No caso do Brasil, o Governo tem promovido pequenas e contínuas alterações no sistema de saúde suplementar às vezes sem atentar que “Reformas do sistema baseado em mercado que não forem implementadas em uma base sistêmica e com salvaguardas, podem trazer mais problemas do que soluções”. Há a necessidade de discutir conceitos e modelos para a Saúde Suplementar e melhorar o entendimento geral sobre riscos, pois isso, é importante para o aperfeiçoamento do modelo, bem como gastos improdutivos devem ser atacados e aumentar enormemente a escala das operações. É imprescindível implantar um sistema robusto de cobertura universal, com cuidados de qualidade e de bons serviços a toda a população, e isso é um projeto gigantesco, de muitos anos, e um desafio fiscal da maior grandeza. Necessário também entender os objetivos sociais da população com relação à saúde, corrigir distorções do atual sistema e melhorar a sua eficiência são a melhor atitude dos atuais agentes, bem como o desenvolvimento coletivo da visão do sistema como um todo, tanto da parte do governo quanto das operadoras e outros agentes, desenvolvendo conceitos e clarificando objetivos será fundamental para se ter um sistema viável e estável para o futuro. (Fonte: Cechin – palestra de 13/02/2009 – Abramge)

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Esses aspectos econômicos são interessantes, todavia, sob o ponto de vista de acesso ao mercado, verificamos a desigualdade nas classes sociais. Dentro da cadeia de valores, a ANS deveria contar com essas estruturas empresariais no processo de parcerias. A doença é exatamente a mesma para as classes rica, média e pobre, mas a perversidade e a diversidade no tratamento são enormes no tocante ao acesso aos medicamentos. Tendo em vista que o funcionamento atual do sistema privado de saúde não prevê o compartilhamento entre o público e o privado no caso de riscos de alta complexidade, e supondo que este aspecto dificulta a expansão de pequenas operadoras no setor, este trabalho cumpre seu objetivo de propor alternativas para o desenvolvimento das pequenas operadoras na prestação de serviços de saúde no país. Também se pretendeu no presente estudo refletir como as médias e as pequenas operadoras de prestação de serviços em saúde encaram os temas que mais causam polêmica, especialmente no que diz respeito à regulação da ANS. São eles: Exigências regulatórias; b) Alta complexidade e suas variações; c) Atual papel da ANS no contexto de prestação de serviços de saúde do país; d) O capitation e sua aplicação; e) Outros pontos polêmicos do setor, tais como: preços, reembolso ao SUS pela operadora, descontos em folha de pagamento à Previdência Social, daqueles que pertençam a um plano coletivo ou individual de saúde.

Considera-se fundamental, ainda, refletir sobre o futuro da regulação imposta pela ANS, questionando seu posicionamento no passado e no presente e a possibilidade de serem efetuadas mudanças, no mínimo pontuais, no setor. Cabe ainda discutir onde se localizam as competências que identificam os pontos do compartilhamento entre a saúde pública e a saúde privada, tendo em vista que há no Brasil uma estrutura privada de operadores e prestadores de serviços altamente sofisticados. Se frente a tais realidades e afirmações se verificar, de fato, a possibilidade de implantação das premissas descritas, e tudo isso gerar preços de planos mais acessíveis do que os atualmente praticados, boa parte do objetivo deste trabalho terá sido cumprido, embora não caiba aqui essa ação de mudanças. Poupança Saúde ou Previdência Saúde Há ainda outras propostas bem atuais como, por exemplo, a Poupança Saúde ou Previdência Saúde. Essa proposta surgiu devido ao Estatuto do Idoso e a relação de diferenças de preços dos planos entre as faixas etárias, definidas na Lei 9656/98 e posteriores alterações. Conforme Amorim, (2008), 542 seria necessário rever a regra que estabelece a relação de seis vezes entre preços cobrados para a assistência a usuários da primeira faixa etária até os da última faixa etária. O aumento dessa proporção permitiria preços mais acessíveis aos jovens e pessoas em idade ativa, possibilitando o crescimento da

542 Em artigo assinado por Cechin e Badia,

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população coberta pelas operadoras com importantes efeitos positivos de escala e diluição de risco. Na análise, contudo, a elevação da proporção entre as faixas etárias elevaria o preço dos planos para os idosos, agravando um problema já existente. Essa situação poderia ser contornada pelo desenvolvimento de produtos que permitissem a formação de Poupança-Saúde, produtos que não substituiriam os atuais, mas que seriam ofertados como mais uma opção. Seriam atrativos para aqueles que são mais jovens, que ainda tivessem tempo suficiente para acumular reservas para custear seu plano de saúde na idade avançada. 543 Independentemente do modelo de financiamento adotado para o cuidado com a saúde, público através de tributos ou privado através do custeamento direto pelos usuários, os países mais desenvolvidos têm se deparado com o fato de que os custos para manutenção da saúde têm sido crescentes nas últimas décadas, tanto em termos absolutos, como em termos relativos, quando verificada sua participação no PIB.544 No caso então da alta complexidade em que o uso da tecnologia é fundamental, associada às inovações, as patentes, a concentração dos poucos fabricantes e prestadores de serviços, os custos tornam-se perigosos à atividade que ainda luta com aspectos como aumento do dólar, inflação, envelhecimento da população e uso da medicina preventiva. Segundo o IBGE, os ricos gastam, com saúde e medicamentos - em média - dez vezes mais do que os pobres. 545 Isso nos leva a crer que as classes menos favorecidas só consomem medicamentos quando estão, de fato, sofrendo demais e muitos nem chegam a adquiri-los para tratar de suas enfermidades. As alternativas para melhorar o cenário atual dos serviços de saúde no país incluem, necessariamente, a readequação do relacionamento entre todos os agentes envolvidos: prestadores de serviços, operadoras de planos de saúde, fornecedores, órgãos governamentais, Ministério da Saúde, Agências, Judiciário e usuários do sistema. Padronização de normas e formulários Entre outras propostas complementares, pode-se destacar: 1) A assinatura de contratos entre as partes, conforme preveem as resoluções normativas da ANS, números 42, 54 e 71, além de contratação com os prestadores do SUS, visto que somente 12% dos conveniados ao SUS possuem contrato com os gestores segundo dados do próprio MS; 546 2)- Padronização eletrônica das informações e formulários, como prega o recém-lançado TISS – Troca de Informações em Saúde Suplementar, da Agência Nacional de Saúde Suplementar. Isso poderá representar uma evolução para o setor, uma vez

543 Segundo a Revista Exame (27/04/2005) a General Motors gastou cerca de US$ 5,3 bilhões em 2003 com plano de saúde para 1,1 milhão de funcionários, aposentados e dependentes. O montante representava 5% de todas as suas vendas no mercado norte-americano. (Pág. 48 – Amorim – 2008). 544 Maria Helena Leal Castro - UFJF/ IMS-UERJ - artigo pág.1 - acessado em 28/02/2006 - http://www.abres.cict.fiocruz.br/docs/2.pdf 545 Segundo o IBGE. 546 Amorim, Maria Cristina – “Para entender a Saúde no Brasil” – 2006.

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que pretende reduzir a burocracia e os erros atualmente existentes; 547 3)- Desenvolvimento do processo de acreditação para os serviços de saúde, calcado nas normas da Organização Nacional de Acreditação (ONA). 548 Programas de Acreditação e de Qualificação Trata-se de outro pilar fundamental na gestão e no incremento dos serviços de saúde do país. Portanto, apóia-se os Programas de Qualificação e Acreditação, como os que vêm sendo implantados na saúde suplementar, voltados tanto para as operadoras, quanto para os prestadores, visando a melhoria dos serviços e do atendimento oferecido 549 , criando um Código Nacional de Saúde. Mudanças são urgentes e possíveis. O compartilhamento entre o público e o privado e seus complementos comerciais e administrativos podem proporcionar saídas na prestação de serviços à saúde para evitar o recrudescimento de um antagonismo social entre a saúde privada e pública. Os princípios do seguro podem ajudar muito: imprevisibilidade individual de eventos futuros e incertos, previsibilidade coletiva, favorecendo a quantificação, mutualismo e solidariedade, dividindo igualmente os riscos que se materializam desigualmente, boa fé para que muitos paguem pouco para os poucos afetados terem o patrimônio preservado e aos infortunados, a esperança. Apesar da Constituição de 1988 tentar quebrar a exclusão das ações e o não acesso aos serviços de saúde para grande parte da população, o problema continua desafiando as autoridades. A distância entre o que dizem a Carta Magna, o Ministério da Saúde e a ANS como instituições, e a realidade cotidiana, é muito grande. O reembolso às operadoras dos serviços de alta complexidade, as inovações para as PME’s e adaptações sugeridas neste trabalho, além de outras, podem contribuir para minimizar essa exclusão. É necessário insistir que as reflexões aqui levantadas têm como objetivo o compartilhamento das experiências já obtidas, nos últimos quinze anos, pelos setores privados da saúde com o sistema público,550 inclusive nas pesquisas. Não existe uma verdade estanque, mas é necessário refletir, procurar o lado mais realista e promissor para a saúde da população. Apresentar dúvidas e eventuais soluções nesta discussão,

547 Idem 32 -

548 Processos de avaliação e certificação de serviços de saúde. (Enfermeira Lilian Lestingi Labbadia - Palestra proferida em Maio/2010) - http://www.nascecme.com.br/conferencias (acessado em 13/10/2011).

549 - Um Código Nacional de Saúde, devidamente respaldado pelo Novo Código Civil, a fim de estabelecer diretrizes para responsabilidades civis. Hoje o setor encontra-se ainda atrelado ao Código de Proteção do Consumidor, todavia, saúde é do ser humano - sua própria vida - e isso não dá para repor, nem dá para fazer troca. Isso dará maior funcionalidade à relação médico/paciente. Outro aspecto a ser considerado é a bi-ou-tri-tributação e as elevadas alíquotas que incidem sobre os estabelecimentos e treinamento de pessoal constante em nível nacional. (Amorim, 2006). 550 “Os exames laboratoriais e o diagnóstico vão melhorar”, prevê o professor de clínica médica Marco Antônio Zago, da Faculdade de Medicina da USP, em Ribeirão Preto, interior de São Paulo. Hoje, contam-se nos dedos os testes de laboratório específicos para determinadas doenças, como o PSA, que aponta a presença de uma proteína no sangue indicativa de irregularidades na próstata.

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é obrigação daqueles que estão no dia a dia da atividade. A situação financeira das pequenas empresas de saúde, ou seja, daquelas cujos prêmios anuais, não ultrapassam 20 milhões de reais, apresenta uma preocupante combinação de: baixa rentabilidade, volatilidade e baixo nível de capitalização e impossibilidade de constituir as provisões e/ou reservas e o capital mínimo requerido para operar. Por outro lado, elas apresentam despesas administrativas extremamente altas. Completando, há um alto requerimento de capital para solvência dessas empresas. Muitas empresas estão operando há algum tempo com um patrimônio líquido negativo, havendo uma grande volatilidade dos resultados nesse segmento. A dinâmica do mercado mostra que, mesmo sem as novas regras da ANS, o futuro será igual ou pior do que já estamos vivenciando, e, que as grandes operadoras ficarão maiores ainda, pois, muitas empresas pequenas e médias não conseguirão cumprir as novas regras de garantias financeiras exigidas pela ANS e isso fará com que muitas poderão desaparecer ou deverão mudar a sua forma estratégica. Pelos motivos acima expostos, é que se sugere novas políticas operacionais para as pequenas e médias empresas operadoras e também novas regras para seu enquadramento: não se pode usar as mesmas regras para uma operadora – por exemplo - que tem seis mil usuários – e atende grande parte do interior da Bahia - e para outra, com um milhão e meio de usuários.551 (Hirai, 2009). Capitation odontológico Na área odontológica, tendo em vista os poucos procedimentos e as possibilidades das sinistralidades serem mais controláveis, o capitation é perfeitamente possível de ser aplicado. Seria o Bolsa Dentista.552 Segundo os profissionais do ramo: a saúde começa pela boca. Fato que não acontece no caso da assistência à saúde por serem os procedimentos de alta complexidade extremamente perigosos sob o ponto de vista de sinistralidades. Tirando-se a alta complexidade, todos os demais procedimentos são passíveis de controle de risco principalmente para operadoras de pequeno porte. Uma possibilidade de aliviar o sistema público estaria também na grande quantidade de consultas, exames, pequenas internações e cirurgias de rotina. Essas inovações deverão ser divulgadas pelos órgãos envolvidos. O que falta, hoje, para aumentar a base da pirâmide no atendimento à saúde? Bahia, (2000), em Cadernos de Saúde - ANS - informa que faltam modelos assistenciais com base em valores mais populares e intermediários: planos básicos, com enfermaria padrão C; planos intermediários para empregados de nível gerencial e utilização de quarto em hospitais classe B, e, planos executivos, para sócios de

551 Fonte: Paulo Hirai – Milliman do Brasil – Consultoria – palestra proferida na abramge – em fev/2009. 552 Talvez não seja prioritário, alguns podem afirmar, todavia, imagine-se as conseqüências favoráveis para a população. O pagamento seria efetuado diretamente ao Dentista ou Clínica no capitation.

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empresas ou executivos empresariais, com utilização de livre escolha e hospitais classe A. 553 No Brasil, a partir dos dados dos Suplementos de Saúde da PNAD, é possível acompanhar vários indicadores relacionados ao acesso a serviços de saúde. A população idosa e aquela que não têm um plano de Saúde recorrem a serviços regulares. Claro que existem problemas, mas a população, em geral, tem sido atendida. Alguns dados podem ser consultados para os três anos da série, tais como os percentuais de pessoas que contam com serviço de uso regular ou que consultaram médico e dentista nos últimos 12 meses. Há também a possibilidade de calcular os percentuais de mulheres que realizaram mamografia e citologia do colo do útero – exame de Papanicolau nos três anos que antecederam as entrevistas, em 2003 e 2008. Tais dados podem gerar informações de capilaridade dos sistemas, uso, freqüência, mostrando a performance dos níveis de atenção. Ter um serviço de saúde ao qual normalmente se recorre é considerado um indicador de acesso aos serviços de saúde em muitos países, especialmente, nos casos em que o sistema de saúde é hierarquizado e tem na atenção básica a porta de entrada e referência para níveis mais especializados e de maior complexidade. O mais importante a destacar é que os postos ou centros de saúde são os serviços cada vez mais referidos pelas pessoas como serviço de uso regularmente procurado: 42% em 1998, e quase 57%, em 2008. 554 Uma das vantagens para se cristalizar o assunto em questão é que o sistema de saúde empresarial brasileiro ou sistema de saúde suplementar ainda é muito jovem e necessita de inúmeros ajustes de caráter regulador; contudo, está montado, estruturado e dotado de equipamentos e profissionais do mais alto nível. Em compensação, o sistema de saúde público está regulado, porém tem muitas deficiências devido a sua grandiosidade e dificuldade de gestão. É mais fácil moldar o sistema empresarial de saúde suplementar enquanto jovem ainda. Há argumentos de que a fraude poderia aumentar, todavia nos casos de alta complexidade ela é muito difícil de ser executada, tendo em vista as possibilidades de se controlar quem foi o usuário, pois todos os procedimentos de alta complexidade são passíveis de protocolos hospitalares.555 Propostas para a ANS – Agência Nacional de Saúde Su plementar Neste ponto, devem então ser refletidas as ações da ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar, não só pelo que já fez, mas também pelo que poderá fazer para controlar e regular a saúde suplementar no Brasil.

553 Fonte: Cadernos de Saúde - ANS - Ref. Prof. Ligia Bahia – (2000) - 554 Isso se verifica nos gráficos da revista Radis número 69. (2008) . 555 O Protocolo Hospitalar é um manual passo a passo de todos os procedimentos médicos possíveis, inclusive com intercorrências, num determinado tipo de situação de internação ou de ambulatório, onde são previstos todos os custos por antecipação.

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Da forma e no ritmo em que desenvolve suas atividades atualmente, a ANS tornar-se-á, ao longo do tempo, um órgão apenas regulador e não participante dos problemas que mais comprometem todo o setor: aumento da massa de usuários, comportamento passivo ou contemplativo, novas estratégias e falta de recursos. Trabalhando assim, pontualmente com cada operadora apenas, a ANS saberá sempre com muito atraso, ou nunca terá em mãos, os números que precisam ser analisados detalhadamente para tomar decisões amplas e de macro-saúde, conforme exige todo o sistema suplementar. Tais objetivos não podem ficar distantes da ANS. A palavra “complementar” em sua definição e no caso da Agência Nacional de Saúde Suplementar deve contemplar outras atitudes mais amplas. Nos Estados Unidos, os gastos com serviços com saúde chegam a mais de 15% do PIB e há um compartilhamento entre o público e o privado, principalmente em relação ao atendimento de idosos e dos menos favorecidos economicamente. É claro que os EUA em hoje, após essa crise econômica americana, não é nenhum espelho. Antes da crise já existia mais de 40 milhões de americanos sem assistência de planos de saúde, mas pouco se comentava à respeito. Nas crises os problemas afloram.556 Não é o caso do Brasil que tem uma situação de saúde que, comparada com os EUA, é privilegiada e pouco se aproxima, na estrutura e na qualidade, da dos americanos. Num sistema, em que as operadoras, cada qual considerando seu faturamento, dentro de sua proporcionalidade de atendimento aos seus usuários - clientes pagantes - possam oferecer atendimento a um outro contingente da população, via empresas, através do capitation, atendendo a esses segmentos de forma justa e digna, será possível detectar e resolver os problemas crônicos de saúde de grande parte dos brasileiros. Com isso, teremos um atendimento com performance de plano particular, com eficiência privada e olhos do setor público, prevenindo-se enfermidades e, conseqüentemente, economizando para o governo e a sociedade, milhões de reais. Por que hospitais com padrão de excelência de atendimento e operadoras de saúde como Bradesco, Sul América, Amil, Intermédica, Unimeds além de outras de regiões como Sul, Sudeste, Nordeste, por exemplo, não podem administrar e acrescentar ao seu trabalho operacional, mais consultas, atendimentos ambulatoriais às PMEs empresas cadastradas em capitation, as quais possuem trabalhadores que não podem adquirir um plano de saúde em condições normais? E por que não poderiam fornecer parte de sua estrutura para atendimento daqueles que não tem carteira assinada, mas têm vínculos sérios com a sociedade ou uma Associação? E com isso aumentar a quantidade de usuários? Necessário será, ao longo do tempo, que as empresas operadoras tenham possibilidades de atender as classes mais favorecidas, o que já acontece, oferecendo, também, planos mais baratos e coberturas na forma da lei, com condições de atender às pequenas, médias e micro empresas e seus funcionários, aumentando, assim, a 556 Para completar, o sistema de saúde é uma bomba-relógio para as contas públicas. O Medicare, muito criticado, por exemplo, vai se tornar deficitário em oito anos. Os gastos com saúde crescem a uma taxa superior à inflação. Os EUA são o país que mais gasta com saúde – US$ 7 per capita, ou 16% do PiB, mas está em 37º lugar em qualidade de atendimento, ao lado da Eslovênia, segundo o ranking da Organização Mundial de Saúde – OMS. (Fonte: O Estado de São Paulo – 09/09/2009).

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base da pirâmide de pessoas atendidas em planos privados de saúde. Com essas várias premissas básicas, e outras reflexões que possam se materializar, diminuirá fortemente essa população que hoje é atendida pelo SUS. Ela deverá paulatinamente ser direcionada para operadoras via planos empresariais através de micro, pequenas empresas, associações. Existem posicionamentos que insistem em que o sistema de saúde suplementar passa por uma profunda crise. Os atores que compõem esse segmento – usuários, médicos, governo e prestadores de serviços de maneira geral – não se entendem. Operadoras e prestadores, que deveriam ser parceiros no sentido mais puro e nobre da palavra, mantém um péssimo relacionamento comercial, no qual a desconfiança impera. A persistir o atual modelo, caminharemos para o estrangulamento de toda a cadeia, com sérios prejuízos para médicos, usuários, hospitais, clínicas, laboratórios e até para o governo, pois na esfera estatal, já se presencia o aumento das filas no SUS. É necessário, portanto, a adoção urgente de um novo modelo de relacionamento. Até 1993, as empresas trabalhavam e ganhavam da forma mais fácil, aplicando suas receitas no mercado financeiro. Com o advento do Plano Real, os prestadores de serviços tiveram que remodelar a sua estrutura empresarial, procurando produtividade com maior resolutividade. O mercado nessa época agia livremente.557 É claro que todos os aspectos gerenciais e jurídicos de projeto de capitation, poupança-saúde,558 outras propostas e premissas constantes deste trabalho e com tal magnitude, deverão ser desenvolvidos sob sérias disposições de gestão, com responsabilidades e controle de ambas as partes e passíveis de cassação, multas e outros dispositivos que podem ser pormenorizados de forma gradual e debatidos para se tornarem projetos definitivos para possível aplicação e cristalização. Muitos desejam regras para quaisquer situações; outros querem liberdade para desenvolver suas empresas e seus planos em segmentos específicos. Há inclusive, profissionais do ramo que defendem a possibilidade de criação de planos de saúde específicos, tais como, planos somente para as possibilidades de câncer ou transplantes. Após esses anos e depois da Lei 9656/98 a experiência tem demonstrado que atualmente a saúde empresarial está muito melhor para o público em geral do que no passado, pois há muitas coberturas obrigatórias que antes da lei não existiam, todavia há muito por fazer. Por parte da ANS, é necessário que seja estudado um mecanismo

557 Como representante dos prestadores de serviços de saúde privados, o Sindicato dos Hospitais, Clínicas e Laboratórios do Estado de São Paulo (SINDHOSP) também teve de se adequar às mudanças impostas pelo mercado. A primeira medida adotada foi a descentralização. Atualmente o Sindicato conta com nove escritórios regionais distribuídos em pontos estratégicos do Interior do Estado, munidos de toda infra- estrutura para a realização de cursos, seminários e reuniões. Há também um escritório político em Brasília. Objetivando um panorama geral do relacionamento entre prestadores de serviços e operadoras de planos de saúde, o SINDHOSP realizou duas pesquisas, cada uma com objetivos específicos. A primeira foi realizada pelo Datafolha, em 2003, junto a 82 hospitais da Capital e Grande ABC, e demonstrou o resultado: relacionamento é péssimo. Problemas variados, como falta de contratos, ou contratos com cláusulas leoninas, unilaterais, falta de pagamento, pagamentos com atrasos, glosas totais ou parciais, desconfiança de parte a parte, pagamento no vencimento mas, com cheque pré-datado, falta de reajustes, redução do CIH – Coeficiente de Honorários, demora na emissão de autorizações para atendimento, transferência de pacientes em tratamento para hospitais próprios ou para aqueles de custo menor. (Dante Ancona Montagnana – artigo – Amorim – 2006). 558 Um misto de Previdência Privada com Plano de Saúde.

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de ressarcimento do passivo das operadoras de planos de saúde com o prestador de serviços, quando uma operadora for liquidada. A Unimed São Paulo e a Interclínicas deixaram ambas um passivo de, aproximadamente R$ 180 milhões, segundo levantamento do SINDHOSP. 559 A proposta de Emenda Constitucional (PEC-29), que prevê, entre outros pontos, a aplicação de porcentagens mínimas dos orçamentos públicos em cada nível, 10% do federal, 12% dos estaduais e 15% dos municipais, só não vem sendo aplicada por falta de vontade dos gestores públicos, conforme afirmação do deputado federal e presidente da Frente Parlamentar de Saúde, Rafael Guerra, que esteve em Curitiba participando de um encontro com gestores de saúde. Votada em 2000, a PEC está na Câmara Federal para ser aprovada e muitos governos usam o argumento da falta de regulamentação para a aplicação dos recursos.560 O Brasil e os modelos do futuro É necessário olhar e projetar-se para o futuro. Os modelos do futuro serão aqueles que trabalham e acreditam no “Managed Care”. A tele-medicina será uma realidade, tendo em vista a internet, a televisão via internet com canais específicos dos próprios hospitais para acompanhamento de muitas enfermidades. A popularização da Internet vai alterar as práticas de prestação de serviços de saúde em todos os elos da cadeia de valores que compõem esse setor, pois deverá gerar produtos compatíveis e mais criativos. Há que se reduzir custos e agregar diferenciais fazendo-se uma medicina multidisciplinar com procedimentos tais como: acompanhamento diário de clientes on-line com problemas de diabetes, hipertensão, para evitar males maiores como internações, isto é, monitoramento de doenças via Home-Care. 561 Já há empresas de saúde, que fazem cobranças de performance dos seus usuários quanto a medicamentos, consultas, exercícios físicos e outras necessidades clínicas. Quanto a tele-medicina, dentre os seus benefícios está a possibilidade de levar assistência médica com rapidez aos lugares mais longínquos. Para alguns especialistas, a aplicação mais imediata da tele-medicina é o correio eletrônico. Ele proporciona, por exemplo, trocas de informações entre o médico rural e um hospital tutor, localizado em um grande centro do País, com agilidade e eficiência. Fóruns sobre o futuro da medicina já expõem sobre o novo tipo de atendimento na 559 A subsegmentação do plano ambulatorial é outro aspecto imprescindível, pois proporcionaria ao usuário escolher a assistência mais adequada ao seu poder aquisitivo. O SINDHOSP defende uma ampla revisão de todo o sistema de saúde suplementar. A Lei 9.656/98 engessou o mercado, pois inviabilizou os planos individuais, dificultou a entrada de idosos no sistema, diante do alto custo e impôs um relacionamento baseado na pressão entre operadoras e Ancona Montagnana – Médico, presidente do SINHOSP. (Amorim, 2006). 560 Para o deputado, isso faz com que muitas prefeituras e municípios acabem utilizando as verbas da saúde em outras áreas, como saneamento e meio ambiente. Justificam que isso também é saúde. O deputado entende que o mau exemplo vem do próprio governo federal, que aplicou o dinheiro em programas como o “Fome Zero”, “Bolsa Família”, Hospital das Forças Armadas e Plano de Saúde dos servidores. Se o próprio governo cria um plano especial para os servidores é porque não acredita no SUS, disse Guerra. Entre os Estados que menos aplicam recursos na saúde, segundo Guerra, o Paraná aparece em terceiro lugar, atrás apenas do Rio Grande do Sul e Minas Gerais, com um percentual próximo de 7%.(Fonte: artigo de Rosângela Oliveira – Internet). 561 O Home-Care é bem abrangente como tratamento. Trata-se de cuidar do paciente em sua residência. Significa atendimento de enfermagem ambulatorial ou internação domiciliar durante 24 horas, se necessário.

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área de saúde que a tecnologia possibilitará, aproximando os serviços médicos do paciente, onde quer que ele esteja; "90% das necessidades da Tele-medicina serão supridas pela Internet, que permite, por exemplo, que um médico especialista acesse, em qualquer lugar do mundo, o prontuário do paciente, verificando o laudo de exames ou funções vitais." 562 Consultas domiciliares, sorteios para lazer para quem se monitora com regularidade e promoção de estudos para pacotes hospitalares para não haver surpresas tanto para a operadora, como para o cliente, são opções complementares no futuro da saúde. Isso será uma realidade brevemente.563 Cada hospital terá o seu próprio “www” com seu canal de TV-internet para que o cliente acesse diariamente ou semanalmente do computador de sua casa para fazer o seu monitoramento. Será a tecnologia a favor da saúde das pessoas, diminuindo custos e aumentando as possibilidades do acesso à cidadania para milhões de pessoas. Não se pode esquecer e deixar de lado a visão não tão futurista na medicina/saúde da Inteligência Artificial e dos protocolos com as árvores de probabilidades. A Saúde no Brasil está fazendo fronteiras e é considerada atualmente uma referência mundial, não só no lado privado como também no público. Hospitais brasileiros e outras organizações médicas acabam de fechar acordo para atrair pacientes estrangeiros. O consórcio foi firmado no mês de junho de 2010, com a Agência de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), órgão ligado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. O Brasil faz parte hoje dos roteiros internacionais nos catálogos de empresas especializadas em algo novo, chamado de Turismo Médico. Por possuirmos hospitais de ponta, profissionais de alto nível e ainda termos custos, se comparados com os do exterior, relativamente mais baratos: por isso somos alvo de pessoas que vem fazer seus tratamentos e cirurgias no Sírio-Libanês, Einstein, Incor, 9 de Julho e outros. Pesquisas de ponta já são desenvolvidas nessas entidades. As Células-Tronco são um exemplo. Conforme os autores, Amorim e Perillo, (2006), as estimativas do Banco Mundial revelam que o Brasil despende hoje com assistência à saúde, tanto em termos absolutos quanto relativos, mais do que países de renda média comparável, embora obtenha resultados relativamente menores quanto ao montante despendido. A mesma fonte declara que os hospitais brasileiros respondem pelo emprego de 56% da mão-de-obra utilizada na saúde, representando ainda 67% das despesas totais e 70% dos gastos públicos com saúde. 562 Roberto Botelho - Coordenador médico dos projetos de tele-medicina do Instituto de cardiologia do Triângulo Mineiro. 563"http://www.hospital.com.br"

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Anexo I A Genética e a Declaração do Milênio Quanto à tele-medicina564 dentre os seus benefícios está a possibilidade de levar assistência médica com rapidez aos lugares mais longínquos. Para alguns especialistas, a aplicação mais imediata da tele-medicina é o correio eletrônico. Ele proporciona, por exemplo, troca de informação entre um médico rural e um hospital tutor, ambos localizados num grande centro do País com agilidade e eficiência. E o que se espera para os próximos anos, talvez 20 ou 30 anos? Muitas inovações acontecerão. Sabemos, por enquanto, que a Genética é um caminho a ser percorrido com muitas notícias e gerará muitos debates sob o ponto de vista de futuro da saúde, coberturas por operadoras/seguradoras e muitas discussões de ética e aspectos jurídicos. Nos últimos anos, a Genética tem sido a vedete das notícias. O Projeto Genoma Humano promete revolucionar a medicina, curar muitas doenças, proporcionar uma longa vida, bebês mais bonitos e inteligentes. Entretanto, tudo isso parece muito distante de nós. Como isso ocorrerá? Os novos conhecimentos vão nos ajudar a entender como nossos genes interagem entre si e com o ambiente, o que vai ser fundamental para o desenvolvimento de terapias. Recentemente, descobriu-se que células sanguíneas ainda imaturas, presentes, por exemplo, na medula óssea ou no cordão umbilical de um recém-nascido, podem manter a capacidade de diferenciação em outros tecidos, como o muscular ou nervoso. Abre-se assim a possibilidade de tratar doenças degenerativas, pois se poderá usar células normais de um doador, ou células modificadas do próprio paciente, para substituir tecidos doentes. Outra área que promete revolucionar a medicina será a fármaco genética, que estuda o porquê temos reações tão diferentes a drogas. É o caso, por exemplo, da hipertermia maligna, uma reação violenta a certos anestésicos que causa uma morte rápida se não houver uma intervenção imediata. 565

564 Com aparelhos eletrônicos como câmeras e celulares, os cientistas Gordon Bell e Jim Gemmell registraram exaustivamente dez anos de vida e armazenaram o material no disco rígido de um computador. São equipamentos utilizados para monitoramento da saúde. Eles são responsáveis pelo projeto My LifeBits, da Microsoft Research, e autores do Livro Total Recall (Memória total), lançado em setembro de 2009 nos EUA. Ele diz: “Eu me tornei portátil. Me livrei de pilhas e pilhas de papéis. Toda a minha vida está arquivada num disco rígido. Ela ocupa 160 gigabytes. Posso ir para qualquer lugar do mundo contanto que esteja com um computador por perto. Ter tudo digitalizado me deixa muito seguro. Aliás, no futuro nossas memórias digitais poderão ser transformadas em Avatares. Eles conversarão com nossos descendentes. Veremos uma explosão – no futuro – de sensores e equipamentos de armazenamento de dados. Os mais incríveis sensores serão implantados no nosso corpo. Aparelhos cardíacos, como marca-passo, já usam comunicação sem fio. Podem ser conectados à web. Há pouco tempo comprei uma balança com tecnologia Bluetooth. Ela envia informações sobre o meu peso à memória digital do meu computador. Aparelhos que controlam a respiração serão adaptados à roupas. Sinais vitais serão monitorados 100% do tempo. Você poderá recorrer a dados do passado para fazer cirurgias no futuro. Qualidade de sono, pelo Sleep Coach analisa, por exemplo, se o período de descanso foi leve e quanto tempo alguém realmente dormiu desde que se deitou. Se quiser monitorar seus dados conecte o Google Health. (www.google.com/health) e há também o da Microsoft (www.healthvault.com) recebe dados por Bluetooth (conexão sem fio). Fonte: Na entrevista de Veja de 18/11/2009 – Edição 2139 pág. 149 /150 e 182) com Lia Luz, 565 No futuro, em vez de sermos cobaias cada vez que experimentarmos uma medicação nova, teremos remédios receitados de acordo com o perfil genético de cada um. Além disso, a identificação precoce de genes que aumentam a nossa predisposição para doenças, como certos tipos de câncer, hipertensão ou males cardíacos, será importante para futuros tratamentos e, com certeza, a medicina será muito mais preventiva do que é hoje.

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Enquanto se procura a cura para essas doenças, busca-se também prevenir o nascimento de bebês afetados por males graves e irreversíveis. Nesse sentido, o número de testes genéticos disponíveis vem aumentando dia a dia. Hoje, casais ou famílias que já tiveram filhos ou parentes afetados por uma doença genética podem saber se correm o risco de vir a ter parentes com o mesmo problema e planejar a sua prole de acordo com essa informação. No futuro próximo, será possível identificar e excluir centenas de mutações graves, em um estágio cada vez mais precoce da gestação. Entretanto, é fundamental que a legislação acompanhe os avanços científicos e apóie a interrupção médica da gestação em casos de fetos com doenças genéticas graves incuráveis para os casais que assim o desejarem. Finalmente, a possibilidade de testar um número cada vez maior de genes traz questões éticas que devem ser discutidas por toda a sociedade. Já é um consenso internacional que não se devem testar crianças assintomáticas para doenças genéticas de início tardio para as quais não há tratamento. E em relação aos adultos? Qual é a vantagem de sabermos que somos portadores de uma mutação para uma doença grave ainda sem cura? As empresas de seguro-saúde certamente gostariam de saber de antemão qual é o nosso perfil genético. Cabe a sociedade, lutar para preservar os aspectos éticos e o direito de decidir se queremos ou não ser testados, 566 todavia, parte do que queremos já se encontra na “Declaração do Milênio na ONU. Nem todos sabem os oito compromissos assumidos para o desenvolvimento humano que formam a Declaração do Milênio567 e que foram estabelecidos, no ano 2000, por 191 Estados membros das Nações Unidas, por isso, seguem abaixo:

1. Erradicar a fome e a pobreza extrema: reduzindo pela metade, entre 1990 e 2015, a proporção de pessoas cuja renda é inferior a um dólar ao dia e a proporção de pessoas que padecem com fome;

2. Alcançar a educação primária universal: assegurando que, em 2015, as crianças de toda parte, meninos e meninas, sejam capazes de completar a escolaridade primária;

3. Promover a igualdade de gênero e o “empoderamento” das mulheres: eliminando a disparidade de gênero na educação primária e secundária, preferentemente até 2005, e em todos os níveis de educação no mais tardar até 2015;

4. Reduzir a mortalidade de crianças com menos de cinco anos: em dois terços, entre 1990 e 2015;

5. Melhorar a saúde materna: Reduzindo em três quartos a razão de mortalidade materna, entre 1990 e 2015;

6. Combater HIV/Aids, malária e outras doenças: reduzindo a metade e começando a reverter a disseminação até 2015;

7. Assegurar a sustentabilidade ambiental: integrando os princípios do desenvolvimento sustentável nas políticas e programas dos países e

Artigo de Mayana Zatz – que é coordenadora do Centro de Estudos do Genoma Humano da USP. (Revista Galileu, Fevereiro de 2001). 567 Fonte: HTTP://www.un.org/millennium/

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revertendo a perda de recursos naturais; reduzindo pela metade, até 2015, a proporção de pessoas sem acesso sustentado a fontes seguras de água potável; alcançando, por volta de 2020, uma significativa melhora nas vidas de pelo menos cem milhões de moradores de favelas e cortiços;

8. Desenvolver uma parceria global para o desenvolvimento: que viabilize um sistema de comércio e financeiro aberto, baseado em regras claras, previsível e não discriminatório; que seja direcionada para as necessidades especiais dos países menos desenvolvidos, dos países sem fronteiras marinhas e das pequenas ilhas que são Estados em desenvolvimento; que seja compreensiva com a dívida dos países em desenvolvimento e que, por meio de medidas nacionais e internacionais, vise torná-la sustentável no longo prazo; que, em cooperação com os países em desenvolvimento, formule e implante estratégias para assegurar oportunidades de trabalho decente e produtivo para os jovens; que, em cooperação com as grandes empresas farmacêuticas, assegure o acesso sustentado a medicamentos essenciais nos países em desenvolvimento; que, em cooperação com o setor privado, torne disponíveis os benefícios das novas tecnologias, especialmente de informação e comunicação.

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Anexo II Entrevista com Dr. Arlindo de Almeida, Presidente d a Associação Brasileira das Empresas de Medicina de Grupo do Brasil, realizada na sede da Abramge, na Avenida Paulista, 171 – 11.º andar. Antonio Cordeiro: Olá Dr. Arlindo, permita fazer a minha breve apresentação. Sou professor da PUC-SP e de outras Instituições. Sou Mestre e optei pela vida acadêmica após os 50 anos. Sou Atuário por formação de graduação e já fui empresário da construção civil e tive também uma empresa na área de saúde – Medicina de Grupo. Quando eu ficar mais velho e com saúde desejo ser pesquisador, daí o meu Doutorado. Dr. Arlindo de Almeida : o que é isso ? Você está se achando velho? Quantos anos você tem ? Antonio Cordeiro: Quantos anos você acha que eu tenho? Isso mesmo... acertou! Dr. Arlindo de Almeida: Eu tenho 10 anos mais que você. Antonio Cordeiro: Tenho acompanhado sua luta pelas Empresas de Medicina de Grupo e evidentemente pela representação da Abramge no Brasil. Leio e recebo a Revista Medicina Social onde, você, normalmente faz o Editorial. É uma luta também. Eu acompanhei bem a sua parte porque eu entrei em 2000 no ramo, tempo em que ainda a Medicina de Grupo estava começando sob a égide da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar. Nessa época eu era dono da Real Saúde Ltda., uma pequena empresa que iniciou com Odontologia e pretendia entrar em Medicina de Grupo. Eu e o meu sócio não nos demos bem sob o ponto de vista comercial e algum tempo depois eu vendi minha parte da empresa para o meu próprio sócio. Em 2000 ainda havia uns resquícios de que o mercado de vendas de planos de saúde ainda seria como eram na década de final de 80 e início dos anos 90. Enganaram-se. Era uma época que se vendia plano de saúde demais! Dr. Arlindo de Almeida: Nesse período acabaram morrendo empresas que você nem imaginava. Havia muitas pessoas – que tentaram ser empresários da saúde na época, – e que se aproveitavam dos incautos. Mentiam as coberturas de planos e outras falcatruas. O “futuro” empresário de saúde abria o escritório, fazia convênios com algumas clínicas, hospitais, vendia milhares de planos e depois...desaparecia. Depois que foi criada a ANS é que surgiu a possibilidade de se fazer controles efetivos da saúde privada no Brasil. No início foi bom, até que a Agência começou a fazer ingerências em tudo nas Operadoras. Além da saúde, na administração das empresas também. A idéia inicial da ANS é que ela se dedicasse somente a aspectos técnicos, de recursos, controle das reservas, controle das empresas sob o aspecto médico e odontológico, mas não foi isso que aconteceu. Ela iniciou agindo no mercado, na gestão das empresas, na garantia aos usuários e até na parte econômica.

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Antonio Cordeiro: Você acha que a ANS sofreu muita influência da Susep – Superintendência de Seguros Privados, na época, principalmente na área econômica? Arlindo de Almeida: Naquela época da criação da Agência Nacional de Saúde Suplementar, surgiram duas correntes de caráter político e econômico. Inicialmente a idéia e que uma parte da gestão ficaria com o Ministro da Saúde e a parte econômica e financeira, ficaria com o Ministro da Fazenda. Havia uma dicotomia de gestão. Mas o Ministério de Saúde passou a responsabilidade da parte econômica para a Susep, tendo em vista os conhecimentos dos técnicos daquela Entidade face aos controles de Seguros e Previdência aberta, incipientes ainda naquela época. Entendia-se que os controles econômicos relativos aos aumentos de preços de planos de saúde e reajustes seriam efetuados pela Susep tendo em vista que a Entidade estava sob a égide do Ministério da Fazenda. Funcionava assim: Os reajustes eram controlados e diferenciados pela Susep. A empresa apresentava seus custos, suas planilhas, seus números, projeções e ela contra argumentava, se fosse o caso, chegando a alguma conclusão e aprovava ou não o reajuste. Mas nessa época, iniciou-se uma rusga política e o José Serra, tinha mais força política do que o Ministro da Fazenda e aí iniciaram-se as interferências. Num certo momento, a Susep apresentou um reajuste e isso gerou uma guerra entre o Ministério da Saúde e o Ministério da Fazenda. Uma confusão de Ministros. E o Serra conseguiu, junto ao governo suspender aquele aumento autorizado pela Susep. Daí prá frente a Susep não quis mais cuidar do assunto e a Agência Nacional de Saúde sentiu que deveria montar seus próprio departamento econômico e de análise de custos. Nessa época, sim, aí, vieram técnicos da Susep para ajudar na ANS – Agência nacional de Saúde Suplementar. Antonio Cordeiro: O pessoal do ramo, na época, em 2.000 falava que a ANS era Susepada. Talvez por causa da conseqüência desses conflitos políticos que acabaram trazendo pessoas da Susep para a ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar. O pessoal que assumiu a Agência Nacional de Saúde Suplementar tinha uma pé no sanitarismo brasileiro ? Arlindo de Almeida: A ANS sempre pendeu para o lado do sanitarismo. Foi contaminada pelos Sanitaristas de plantão. E o Serra conseguiu ganhar essa briga e foi atrás dos seus objetivos. Antonio Cordeiro: Você é da Intermédica ? Arlindo de Almeida: Eu não ! Atualmente eu somente dou consultoria para a Samcil. Antonio Cordeiro: Essa empresa teve alguns problemas, não é ? Arlindo de Almeida: Sim. Teve alguns problemas sérios no passado e hoje está sob intervenção fiscal. Chama-se sob Direção fiscal. Tem muitos ativos. Precisa desmobilizar um pouco, vender alguns imóveis, tem muitos hospitais. Seria bom para capitalizar a operadora. É um problema, você sabe. Hospital não é fácil. Hospital é complicado, um problema. Houve uma época boa, em passado não muito recente, na qual as operadoras começaram a comprar hospitais. Sabe como é: havia muito

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dinheiro. Atualmente, eles precisam desmobilizar ativos para viabilizar a operadora. As coisas mudaram. Antonio Cordeiro: A Intermédica mudou a filosofia de ataque ao mercado e de trabalho, não é verdade ? Arlindo de Almeida: Atualmente eu faço mais uma representação funcional da Samcil. Ela está ainda sob intervenção fiscal e alguém precisa representá-la. Antonio Cordeiro: Na PUC-SP temos duas Operadoras: a Intermédica e a Sulamérica. Uso a Intermédica para assuntos de Exames Diagnósticos e algumas emergências ambulatoriais, mas plano mesmo, hospitalar para outros casos mais complexos eu tenho o Bradesco Saúde. Há muito tempo. Eu sou do tempo do Plano Pai do Bradesco, que era um Plano internacional e familiar. Por reembolso. Só hospitalar. Eu, minha mulher e meus dois filhos homens. Nunca optei por mudança nenhuma. Nenhum tipo de migração. O que você acha ? Arlindo de Almeida: Acho que você não deve mudar nada. Tem sorte. É um contrato antigo e eram feitos de forma diferente dos de hoje. Hoje tem o Código do Consumidor e planos familiares são mais complicados para as Operadoras. Tanto é verdade que as operadoras eles pararam de vender esse tipo de Plano. Isso não existe mais há muito tempo, e isso também por causa da interferência exagerada da ANS. Ela não deixou fazer os reajustes que eram interessantes para as Operadoras na época e agora os Planos ficaram baratíssimos. Se quiser brigar com a Operadora e só ir à justiça e o usuário ganha todas. Desde o começo, quando a ANS começou a regular os preços desses planos antigos – individuais e familiares - ficaram ótimos para quem não fizer nenhuma alteração e nem migrar de plano. Antonio Cordeiro: Neste trabalho, como muitos outros de Academia, em alguns há uma certa objetividade técnica, mas também, os questionamentos levantados podem promover uma dialética interessante sobre os temas elencados. Há todo um andamento sobre o que é o Público e o que é o Privado, trabalhos assemelhados, aproximações constantes e convergências inexoráveis e há premissas que procuram analisar os compartilhamentos do passado e do presente entre Saúde pública e Saúde privada. Uma das várias perguntas, por exemplo, é se será possível uma maior aproximação entre o governo e a iniciativa privatista da saúde. Será que não seria este o momento ? Considero o trabalho interessante, porque ele mostra todo esse andar no tempo da Saúde Pública e suas relações com a Privada. Apesar dos problemas, estamos muito melhor do que os americanos. Temos todo um sistema montado, complexo, mas é uma teia de saúde e das grandes. Bem, vou precisar iniciar algumas perguntas. Podemos dar andamento? Arlindo de Almeida: Sim, podemos dar continuidade. Faça a pergunta. Antonio Cordeiro: Então, por exemplo, em sua opinião, você evidentemente conhece o Iamspe – que é o Instituto e Hospitais para Servidores Públicos Estaduais. Há um em São Paulo para os funcionários públicos estaduais, que contribuem mensalmente e há também um outro em Goiás. Dentro dessa rede ou teia de Saúde

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brasileira temos ainda esse lado que não é privado, mas também não é público – Iamspe é Autarquia – e também não é ONG. Mas o que é ? Arlindo de Almeida: O Iamspe – Instituto e Hospitais para Servidores Públicos Estaduais é uma situação realmente esquisita. Eles estão fora até da Constituição. Porque não são públicos, não são privados, não são operadora, não são ONG, enfim, não sei onde eles se classificam. Quem está lá o Abrão Latif Júnior, que é uma pessoa extremamente competente. Ele era da Intermédica. Ele foi prá lá com o espírito de Operadora de convênio mesmo, a idéia dele na época, que eu lembre, era de fazer uma rede credenciada no Estado. Não sei como está esse assunto atualmente. O serviço público é muito das vezes problemático por situações de gestão e de um olhar mais administrativo. Minha sogra ficou 15 dias internada para esperar consertar um aparelho de raios X. Em muitas situações, por aspectos políticos e de gestão, o negócio desses hospitais públicos, é encher o hospital para ninguém falar nada, prá deixar os leitos lotados, prá pedir mais médicos, enfermeiros. É um absurdo você manter pessoas internadas para dizer: agora não tem mais vagas. Antonio Cordeiro: Neste trabalho de Doutorado há colocações interessantes e que colocam, por vários motivos, a necessidade de haver compartilhamento entre as empresas públicas e as privadas principalmente para os casos de alta complexidade. Há, por exemplo, referências ao capitation, mas por quê ? Porque o capitation é uma forma de desenvolver a saúde privada principalmente para as pequenas e médias empresas. Por exemplo, se formos analisar uma empresa do interior da Bahia, com 10.000 usuários – que é a média pouco acima das pequenas empresas Operadoras em número de usuários – e se essa Operadora tiver o azar de ter uma dúzia de cardíacos, num mesmo mês, ela quebra. Porque ela quebra: porque assuntos de alta complexidade deveriam ser compartilhados entre Operadoras e Governo, no caso a Agência Nacional. Por isso é que a TESE – sugere – em um dos seus itens de premissa que o governo pague as Altas Complexidades para as pequenas operadoras de forma técnica, mediante protocolos, tabelas médicas e outros controles. Arlindo de Almeida: Interessante notar que 80% das pequenas empresas estão nesse tipo de quantidade de usuários que foi comentado. A idéia do compartilhamento é perfeita. É óbvio, pois as pequenas empresas não conseguem conviver sob o fantasma de sinistros de alta complexidade. Pergunto para você: Onde o SUS é bom ? Eu mesmo respondo: é bom na Alta Complexidade, porque em Exames Diagnósticos, Consultas, Terapias é um desastre. Eu falei isso para a presidente Dilma. Ela chamou todas as empresas privadas e as Medicina de Grupo lá no Planalto e eu falei que a Saúde Publica e Privada poderiam dar as mãos, numa forma que seja inteligente! Vamos aproveitar onde o governo é bom que é na Alta Complexidade e muito do que o governo faz, poderia ser feito por nós da rede privada. O SUS é bom onde, pergunto novamente? Ele é muito bom em transplantes, cirurgias cardíacas, e coisas do gênero. Todos que precisaram sabem onde é que o SUS é bom, acabaram sabendo: Nos hospitais universitários. A porta da alta complexidade está no governo, está no SUS.

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Antonio Cordeiro: A pequena Operadora, por exemplo, lá do interior do Paraná tem um paciente com um problema grave e ela tem que mandar para o SUS. O SUS atende e depois manda a conta para a Operadora. Como pode acontecer isso ? Arlindo de Almeida: Agora está aí um dos problemas. Por isso é que nós estamos defendendo uma modulação diferenciada. Dividir em módulos essa parte dos convênios. Abrindo uma maior flexibilização das coberturas. Assim, tudo ficaria mais fácil. Antonio Cordeiro: Em sua opinião, deve existir qual relação pública/ privada na Saúde? Essa relação é benéfica ou problemática? Qual deve ser o grau de integração ou separação ? Poderiam ser “Sistemas combinados” ou compartilhados? Ou isso é utopia, que pode provocar desvios, discriminação e a regulação excessiva que pode interferir em consumidores e operadoras ? Arlindo de Almeida: Eu acho que a relação entre governo e entidades privadas é interessante e necessária. Veja bem. O SUS foi criado no sistema universal, atende a todos - na teoria – porque na prática não é bem assim. E se atende, muitas vezes, atende mal. A porta de entrada do Público não funciona, mas na nossa, a privada, atualmente não tem dado problemas, não. No Brasil, assim como nos EUA não há atendimento para mais de 40 milhões de pessoas. Para fazer uma pequena cirurgia no SUS é um desastre, no sistema privado é muito melhor. Porque acontece isso ? Eu acho que deveria haver menos preconceito ao empresário de saúde no nosso país. Há um preconceito muito grande, principalmente pelos sanitaristas. Quando queremos compartilhar eles dizem que o sistema privado tem que fazer tudo igual ao SUS. Isso é impraticável. O SUS foi criado para atender a todos. Nós queremos ajudar a porta de entrada do sistema publico. Ela é uma desgraça ou um desastre. A nossa porta é boa, é muito melhor. Exames no SUS é complicado, demorado, tem que marcar com um mês de antecedência. Enfim, é um desastre. Mas, em compensação, o público é bom na alta complexidade. Isso nós temos que admitir. Antonio Cordeiro: Vocês associados das Empresas de Medicina de Grupo, têm idéia sobre essa disposição da Abramge e de outras Operadoras, que nem fazem parte da Abramge, em debater as possibilidades do compartilhamento entre o governo e as empresas privadas, ou seja, entre o Público e o Privado? O que pensa a Abramge? Arlindo de Almeida: A Abramge pensa de forma positiva. Existe sim. Claro que sim. Só não aconteceu porque há ainda um grande preconceito entre aqueles que estão na linha de frente da Saúde no Brasil. Há muitos sanitaristas, você sabe. Eles, os sanitaristas, consideram que a iniciativa privada deve agir como o SUS. Eles acham que a iniciativa privada tem que ter também universalidade, equidade, etc., e isso é impraticável. Na iniciativa privada, tudo igual ao SUS é impossível. Em primeiro lugar são palavras que não tem muito sentido sob o ponto de vista prático, não funcionam... Os sanitaristas estão contra a colaboração da iniciativa privada, mas isso não quer dizer que não é possível cada um dar a sua contribuição. Universalidade e equidade, são palavras que sob o sentido prático não funcionam.

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Outro dado interessante, é que, dentro dessa linha de colaboração, as parcerias Público Privadas estão dando muito certo, é um sucesso tremendo, isto porque, na área hospitalar, já se provou que o tempo de ocupação é muito menor na área privada e que os resultados são melhores... e o que é mais importante, o público aprova. É claro que dá para colaborar. Poderiam ser utilizados hospitais de primeira linha para fazer transplantes de fígado, por exemplo, como no Hospital das Clínicas, Hospital São Paulo, Sírio Libanês. Esse compartilhamento deve ser inteligente, bem preparado e discutido em todos os detalhes. Nós da Abramge, nos dispomos a sentar, mas eles, os sanitaristas não têm muito interesse. Daria para minimizar custos também, porque toda vez que você faz ações repetitivas, ou seja, O estado faz uma ação e a iniciativa privada faz a mesma ação, o custo fica maior. É um negócio absurdo... os dois estão concorrendo no mesmo campo para fazer a mesma coisa. Porque então não compartilhar? Prá você ter uma idéia, nos colocamos à disposição para o Ministério da Saúde no sentido de ajudar a partir para os movimentos de vacinação. O que aconteceu? Nós temos – a Abramge - e outros operadores que nem fazem parte da Associação, são milhares de clínicas, hospitais, enfim, é um grande aparato técnico de espaço e logística de saúde. A Abramge, então se colocou à disposição com toda a sua estrutura e partir para a vacinação. Como já foi informado, nós temos à disposição milhares de clinicas, hospitais e atingimos cerca de 30 milhões de pessoas, mas eles não aceitam a nossa colaboração. Eles querem fazer tudo sozinhos. Porque o governo quer fazer sozinho? Tudo bem, porque vai fornecer a vacina? Só por isso? E a logística toda de vacinação? A mão de obra qualificada, etc.? Tudo pago pelos milhares de Associados que temos e milhares de clínicas, hospitais, que prestam serviço para nós. Imagine a efetividade da campanha, o sucesso que seria, se a rede privada pudesse oferecer graciosamente tal serviço. Imaginem o resultado ... seria fantástico. Uma vez isso foi conseguido em São Paulo, nós oferecemos e eles aceitaram, pois havia uma greve de funcionários públicos da saúde e a Abramge colocou tudo à disposição do público em geral. Sabe o que aconteceu? Em 24 horas estava pronta toda a nossa estrutura e foi um sucesso numa dessas campanhas de vacinação. Antonio Cordeiro: Os meus netinhos, por exemplo, eu levaria na Intermédica! Porque eu levaria num Posto de saúde, se eu conheço a clínica, o endereço e até – conforme o caso – os médicos, enfermeiros, funcionários. Arlindo Almeida: Imagine o sucesso que seria com toda a nossa rede privada. Outra coisa que é fundamental é a Abramge participar da discussão dos problemas, conversar. Eles do Ministério da Saúde, precisam também nos ouvir. A nossa Presidenta falou isso recentemente. Foi uma das coisas que a Dilma insistiu. De nada adianta nós da Abramge, recebermos pacotes prontos, com tudo definido a qualquer preço. É preciso conversar. A Dilma ventilou isso. Queremos participar do planejamento de saúde no Brasil também. Podemos ajudar e muito. Antonio Cordeiro: Vocês participam do Consu?

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Arlindo de Almeida: Não do Consu não ! Ele é um Conselho de Ministros: Ministro da Saúde, Ministro da previdência, Ministro da Fazenda, Trabalho, etc. Do Conselho nacional de Saúde, CNS, Conselho Estadual de Saúde e o Conselho Municipal, a Abramge pode participar. Antonio Cordeiro: Mas a Abramge participa? Dá sugestões ? É consultada? Arlindo de Almeida: A Abramge pode participar, mas é muito complicado. Pode participar, mas pela Lei esses conselhos devem ser paritários, a população tem que ter 50% das vagas e ninguém consegue fazer 50% das vagas ! É muito difícil. Ninguém consegue fazer gestão em saúde por causa disso. 50% é povo – CUT, CGT, e o resto somos nós – a Abramge - e os hospitais. É muito difícil. O Conselho Nacional de saúde, por exemplo, é um órgão superior ao Ministro e manda no ministro... quem manda no CNS é a Conferência Nacional de Saúde, órgãos máximos, abaixo tem outros órgãos de votação paritários e aí você vai lá ... é complicadíssimo. Muita discussão. Nós somos insignificantes perto de todo esse conjunto. Antonio Cordeiro: E olha que vocês representam, na Saúde, mais de 50% do volume de recursos em saúde, considerando tudo, não é? Arlindo de Almeida: Segundo dados que eu tenho: 57% Antonio Cordeiro: Pergunta: O órgão regulador proporá um teto, a medida poderá atingir 21% dos contratos não adaptados ou os contratos de planos antigos. Com isso a tendência é que haja uma certa pacificação. No caso ele se refere a aumentos nos últimos anos, usuários que foram á justiça. Isso é verdade? Ou seja: se tem um Rol maior do que existia, onde está a relação com a garantia de cobertura para os planos antigos? Por exemplo, o “stent” coronário. Como fica? Tem cobertura? Arlindo de Almeida: O “stent” coronário, por exemplo, não está no contrato antigo.É óbvio. Não existia esse tipo de procedimento há dez, vinte anos atrás. Não existe um Rol de procedimento para contratos antigos. Antonio Cordeiro: A ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar, não deveria também fazer um rol de procedimentos para contratos antigos? Ficou ao Deus dará ? Arlindo de Almeida: Não... não pode ! O Supremo Tribunal Federal considerou os contratos antigos válidos. Considerou o princípio do Direito adquirido que está na nossa Constituição. A ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar, queria que todo mundo migrasse e os órgãos de Defesa do Consumidor, brigaram na justiça, dizendo que não eram obrigados e realmente acabou vencendo essa idéia. Os aumentos ou reajustes ficariam fora de propósito. Antonio Cordeiro: Qual a estimativa de aumento? Arlindo de Almeida: Eles já puseram 21 % e tiraram o produto do mercado.

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Antonio Cordeiro: O meu contrato é antigo não tem esses novo Rol de procedimentos. Como é que fica ? Arlindo de Almeida: Vou te dar outro exemplo. Antigamente não tinha o exame de Pet Scan ...ora, nem existia, é tecnologia recente. Não dá para fazer nada. Não se pode mexer em nada por causa do ADIN. O Supremo Tribunal Federal considerou os contratos antigos válidos... por quê ? É um princípio básico da Constituição... a lei não volta prá trás. Há uns tempos passados a ANS queria que todo mundo migrasse, mas os reajustes fizeram com que os órgãos de defesa dos consumidores, se insurgissem e acabou vencendo essa idéia. Mas se pensar bem, alguém tem interesse de mudar ? Você com o seu Plano Internacional, hospitalar, antigo da Golden Cross e que depois virou Bradesco, tem interesse de mudar, por exemplo? Antonio Cordeiro: Não, porque o Bradesco pediu na época 82% de aumento... Arlindo de Almeida: E agora – atualmente - eles vão pedir 300%. Se voltar a ter o produto você acha que ele vai te dar 21% de aumento? O Bradesco nem tem mais o produto. Havia uma variedade muito grande de contratos. Havia contratos que se chamavam de compreensivo - que era de seguradora – e que cobria todo tipo de transplantes e havia contratos que só cobriam exames. É muita diversidade. É impraticável, é impossível ajustar tudo isso. Quem tinha que migrar já migrou. As operadoras, nesses anos ofereceram as migrações e algumas vantagens. Agora acabou. Antonio Cordeiro: Será que acabou o interesse? Arlindo de Almeida: Todo ano as operadoras oferecem algumas vantagens, como por exemplo, o cliente não ter que cumprir carências, etc. Quem não migrou é porque não quer mesmo ou tem um contrato como o seu que é especial e diferenciado. Você não quer migrar, com certeza. Tente procurar um contrato igual ao seu e você vai ver quanto custa. O seu contrato por exemplo, na Omint, que é uma excelente empresa, vai custar R$ 4.000,00 por mês. Eles têm interesse em migrações, afinal, nenhuma operadora quer ficar toda hora no Fórum discutindo Rol de procedimentos. Antonio Cordeiro: Será que a ANS vai fazer outras tentativas de migração? Arlindo de Almeida: Acho que não. Não vai dar o resultado que eles pretendem. Da outra vez já não deu. Vai ser muito pequena a adesão embora seja de uma concentração de risco muito grande. Sabe como foi feito ? Por grupo familiar. É uma pessoa só que vai migrar. Isso não dá certo. Só quem estiver na rua da amargura é que vai migrar. Antonio Cordeiro: Quantas pessoas ainda constam com planos antigos? Com contratos antes de 1999.? Arlindo de Almeida: 10% do total – estimativa de quatro milhões de pessoas na física, os planos empresariais tem poucas pessoas.

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Antonio Cordeiro: Os planos coletivos continuam liberados de ambas as partes para conversar, discutir, fazer reajustes também de acordo com a sinistralidade? Arlindo de Almeida: Sim. A ANS elaborou uma Resolução, na qual só pode ter reajuste uma vez por ano. Foi bom e foi ruim, porque hoje, as empresas não querem correr riscos e partem de aumentos maiores nos planos empresariais, principalmente. Antigamente, as empresas estimavam e depois, quando chegava próximo do mês de julho fazia um outro reajuste por sinistralidade. Agora não! Agora as empresas tem que fazer um único reajuste para o ano inteiro. Antonio Cordeiro: Você acha justo esse sistema com faixas de idade para planos de saúde ou isso poderia ser mais nivelado? Arlindo de Almeida: Já está caro prá pessoa entrar no sistema! Se houver nivelamento eu acho que complica. Esse negócio de pacto Inter geracional para a saúde não é simples, é mais difícil. Em minha opinião, se nivelar, então você pode impedir que a pessoa entre no sistema. O ideal é que ele entre numa idade jovem. Assim ele vai cuidando e aprendendo a se cuidar na saúde. Antonio Cordeiro: Falo isso porque o seguro de vida, por exemplo, é nivelado. Há uma idade, porém, o pagamento é nivelado pelo prazo existente do seguro. Arlindo de Almeida: mas paga mais caro e também depende da idade... Antonio Cordeiro: Me responda o seguinte: qual é a sua opinião,até onde deve ir o controle estatal sobre a saúde? Você acha que tem limite ? Arlindo de Almeida: Penso da mesma forma que o Ministro da Fazenda do tempo do Fernando Henrique. Ele dizia o seguinte: toda a sua regulamentação do setor privado tem que ter embutido com ela uma bomba - de efeito programado - de tal maneira que em alguns anos ela explodirá e deixará o sistema se acertar, daí prá frente sozinho. Vai ter que se virar. A idéia era que, criando uma agência, como foi criada, com o tempo, ela criará vida própria e andará com as próprias pernas. O Fernando Henrique, dizia que ela, a ANS, no tempo iria se ajeitar naturalmente. Toda a regulamentação do setor privado deve ter embutido esse tipo de bomba para estourar num certo tempo. Traça o objetivo do caminho e deixa andar. No caso da legislação pública, há uma tendência a criar tentáculos. No nosso caso, é necessário que haja uma flexibilização, uma desregulamentação. O governo está interferindo demais! Antonio Cordeiro: Se eu quiser, por exemplo, fazer um seguro só contra câncer numa operadora de saúde, legalmente não é possível? I Arlindo de Almeida: Não. Isso não é possível. Antonio Cordeiro: Mas isso é um absurdo ...! Arlindo de Almeida: Prá você interessa planejamento familiar ? É claro que não! Prá que você quer cobertura de parto com a idade que você tem ? E sua mulher vai usar

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DIU? Vai fazer laqueadura de trompa? Prá você interessa planos de planejamento familiar? É claro que não. A ANS cresceu e complicou tudo. Nos EUA tem 7 pessoas para controlar a saúde, que é a Entidade que controla todo o Sistema. No Brasil, a ANS tem mais de 1.000 pessoas, e o governo quer cada vez mais ...Tem que fazer um negócio customizado. Há coisas que não tem sentido! Esse rol de procedimentos novos que foi embutido em junho do ano de 2010, por exemplo, são mais de 70 procedimentos novos de cobertura e isso foi imposto. As operadoras vão poder cobrar no plano coletivo, mas não no individual e as operadoras só terão condições de cobrar nos planos coletivos, isso somente quando vencer o contrato. A ANS diz: depois a gente ajusta.No individual não poderá cobrar nunca essas diferenças. E quanto aos custos? Eles impõem o valor percentual e não discutem, não debatem. A interferência exagerada do Estado acaba atrofiando a Saúde Privada. Atrofia todo o sistema. Você sabia que nós somos o único país do mundo em que a saúde privada participa com 55% e o governo 45%? Os estudos estão aqui comigo. Não foi a Abramge que fez não. É um estudo que envolve tudo que tem algum tipo de relação com saúde. Desde hospitais, empresas fabricantes, medicamentos, odontologia, clínicas, equipamentos, etc. É um estudo completo. Em outros países a média é de 70% do volume de recursos é do estado e 30% iniciativa privada. Se pegar todo o dinheiro que circula no Brasil de saúde, indústrias de medicamentos, farmácias que vendem o produto, porque o governo não tem fábricas, vacinas, laboratórios, a área particular está com mais de 50%. Antonio Cordeiro: É muito interessante essa informação. É relevante! Ou seja, a área privada tem uma força muito grande. Considerando tudo que circula de dinheiro em saúde, a área particular abarca mais de 50%. Arlindo de Almeida: É um número considerável não acha? Antonio Cordeiro: São números que representam a potência que é a saúde privada. Deveriam ter mais força política. Aliás, politicamente Como vocês estão no Congresso. ? Arlindo de Almeida: No congresso é difícil. É complicado. Há sobre a saúde privada, mais de 1.000 projetos, alguns que mexem com as Operadoras de plano de saúde, mas a grande maioria é aquele projeto que quer dar algo no plano de saúde. Plano de Saúde daqui prá frente vai dar isso, aquilo, etc. Esse negócio, essa mentalidade e o apetite dos políticos para fazer projetos é brutal, querem dar tudo. É o mesmo que acontece com a cultura, ticket, disso, ticket daquilo, meia entrada, transporte grátis, ... vai dar isso, aquilo e mais não sei o quê. Precisamos é de projetos decentes, porque o custo da assistência médica está a subir, mas um projeto sério para resolver muitas pendências, ninguém faz. Isso nos leva estar sempre atentos lá no Congresso, lutando para que não sejam aprovadas determinadas medidas que possam ser prejudiciais ao nosso sistema. Olha, quando nós não funcionamos direito, pode crer que o resto também não funciona. Antonio Cordeiro: Arlindo, me diga uma coisa: e a portabilidade é uma utopia ?

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Arlindo de Almeida: É uma idéia furada. É uma utopia. Não dá resultado. E tanto provou que é uma utopia porque desde a Resolução só 1.100 pessoas mudaram. Só 1100. Entre mais de 40 milhões e isso porque havia um problema da Unimed e se você juntar esse pessoal que chega-se a mais de 100.000 usuários eles poderiam optar para onde quisessem e aí eles aprovaram a resolução. Mas, por iniciativa própria é uma barca furada. Para você mudar de um plano de saúde para outro é muito complicado. Há quanto tempo você tem o seu plano? Mais de 30 anos ? Por exemplo, no seu caso, você está no Bradesco e já sabe quem é o seu clínico, seu pediatra, como funciona, como pega a guia, como faz o reembolso, onde levar a carta de pedido de reembolso, a rede, os hospitais que você freqüenta, você vai mudar ? Só se for um caso muito específico, alguém que realmente precise trocar de Operadora ou coisa assemelhada. Parece simples, mas não é. Isso me faz lembrar uma vez que o nosso ex-presidente Lula, disse que quem não estava contente com as taxas de juros dos bancos, deveria mudar de banco. É piada. Quem é que quer mudar de Banco ? Trocar talão de cheques, mudar o endereço de agência, cartão de crédito, débito em conta, pagamento agendado de contas de luz, água, telefone e outros débitos e créditos, que os seus clientes já conhecem, etc... é bobagem!! E imagina os laços criados entre o ginecologista, pediatra, sua mulher vai ficar nervosa, estressada com as mudanças. Eu cansei de falar isso. Vai dar problema. Ninguém vai mudar de plano. É muito difícil. Isso só vai acontecer se alguém estiver muito doente e que, por algum motivo, talvez jurídico, precise mudar de plano. Antonio Cordeiro: E o outro é o obrigado a aceitar ? Arlindo de Almeida: Sim... é obrigado !! Antonio Cordeiro: Arlindo, você conhece o sistema de capitation de odontologia, que é por cabeça, não é? Você acha isso viável? Por exemplo, recebe 40 e repassa 14 para o consultório que corre o risco de atendimento de vários pacientes. Esse é o capitation na área Odontológica. Tudo bem? Gostaria de saber a sua opinião, se você acha possível fazer o capitation para a Saúde ou na Medicina de grupo? Digamos, por exemplo, que eu tenho uma operadora que recebe por cabeça e quer repassar para algum hospital, por exemplo, por cabeça. Digamos 10.000 clientes e recebo R$ 1.500,00 por cabeça e vou enviar R$ 1.000,00 para quem corre o risco de atendimento. Entendeu? Você considera isso viável na Saúde Suplementar ? Arlindo de Almeida: Sim, acho que é possível! Antonio Cordeiro: Porque então não tem capitation no Brasil? Eu pelo menos não conheço nenhum. Arlindo de Almeida: Tem sim! O que não existe é uma capitation total. Nos EUA eles fazem um capitation total. Eles congregam um grupo de médicos e a Operadora repassa para um grupo de médicos 70% do que nós – os operadores – por exemplo, recebermos. É uma negociação. As empresas ou o grupo de médicos topam o negócio. Aqui não chegamos a fazer isso. Lá nos EUA existe esse tipo de negócio. Nos EUA a Medicina de Grupo é exatamente isso. Aqui não dá para fazer esse tipo de negociação, por causa da forma em que a Saúde Privada está organizada. Aqui no

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Brasil nós não temos isso, mas dá para fazer o capitation por especialidade. Aí sim, o negócio fica bom prá todo mundo. Antonio Cordeiro: Mas como é que se faz isso ? Arlindo de Almeida: Por exemplo, nós tínhamos uma empresa que tinha 50.000 usuários e obviamente tem o histórico de quanto você gastou em Pediatria e ortopedia. Digamos que o Operador deixa essa clínica como responsável por essa população de 50.000 pessoas para correr os riscos de Ortopedia. Por exemplo: tudo que acontecer aqui na Operadora de Ortopedia é problema dessa clínica. Os pacientes serão indicados para ir lá. Isso funciona. Antonio Cordeiro: E foi boa a experiência ? Arlindo de Almeida: Sabe o que aconteceu? Resultado excelente! Caiu violentamente o custo. A Operadora gastou a mesma coisa e o médico ganha muito mais porque há uma concentração de risco e de trabalho, clínico, de traumatologia e cirurgia. Antonio Cordeiro: poderia ser, por exemplo, no ramo de Neurologia? Arlindo de Almeida: Sim, é possível. Quando se faz o capitation são necessários alguns cuidados. Um dos cuidados é com a qualidade dos serviços. Negar atendimento, por exemplo, para ganhar mais é um erro. Deve-se fazer uma pesquisa constante no setor, pois, se um inescrupuloso começa a dar falhas no atendimento aí dá problema sério. Tem que fazer pesquisa constante com relação ao atendimento, verificar se os clientes estão aprovando, se os usuários estão felizes com os serviços. O capitation faz a clínica trabalhar bem, porque ele participa do risco. Toma cuidados, etc...negar atendimento para ganhar mais dá pane no sistema. Os casos que conheci para clínicas de Ortopedia e Pediatria, foram sucesso. Aprovação foi formidável. Antonio Cordeiro: Então ‘em tese’ o capitation dá para fazer em todas as áreas? Arlindo de Almeida: Em tese não, dá para fazer em qualquer área. A Intermédica trabalha assim... Antonio Cordeiro: Eu não sabia. Em Oncologia, por exemplo dá para fazer ? Arlindo de Almeida: Bem, aí é um negócio complexo... é fogo! Antonio Cordeiro: Por quê ? Arlindo de Almeida: Por exemplo, nesse ramo, o que os Operadores devem fazer é o seu serviço próprio de Oncologia e eles mesmos comprarem os medicamentos, pois isso é um problema. Oncologia e Ortopedia os preços são absurdos. Paga-se de 7 a 10 vezes o que se paga lá fora do Brasil. O Brasil paga muito caro. Antonio Cordeiro: Qual outra especialidade que dá para fazer o capitation?

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Arlindo de Almeida: Pediatria, cirurgia específica, hospitais infantis especializados, é bom para fazer capitation... Dá para fazer uma rede de médicos, clínicas, hospitais especializados Quando você pega um cirurgião infantil, vai incluir tudo. Desde a consulta, exames e se necessário até a cirurgia, pós-operatório. Agora, pensar em negociar com um hospital para pegar tudo, no Brasil, é complicado. Antonio Cordeiro: Concordo, eles ainda não estão preparados... Continuando nossa conversa, gostaria de saber o que você achou da implantação do Estatuto do Idoso. Isso foi mais um complicador? Ou foi benéfico para a população? Arlindo de Almeida: Na minha opinião foi a coisa mais perniciosa que existiu para os idosos! Antonio Cordeiro: Por quê ? Arlindo de Almeida: É simples. Quando ele tinha 60 anos ele pagava x e com 65 ele pagava x+y e com 70 ele pagava um pouco mais. Era muito mais lógico. O que as operadoras fizeram? Preço máximo a partir de 59 anos. Agora as seguradoras cobram por antecipação, ou seja, a partir de 59 anos. Foi todo mundo para cima em termos de preço. Claro que isso acontece nos Planos Coletivos. No individual para o Idoso o negócio ficou melhor, mas para quem já tinha o Plano. Pegue os dados de outros países. O Chile, por exemplo, dá desconto para a empresa que fornece planos de saúde aos seus funcionários. No Chile a saúde privada é fantástica. No Brasil, ele paga os dois, o INSS, o plano de Saúde e utiliza um só na grande maioria das vezes. Eu sugiro, por exemplo, um desconto no INSS para quem tem Plano de Saúde. No Chile eles pagam x% da folha salarial e ele sabe para onde vai o dinheiro dele. Ou vai para a iniciativa privada ou vai para o Estado. E aí a pessoa põe mais um pouco se for necessário. Por outro lado, os juízes estão julgando os contratos antigos de pessoas idosas com base no Código de Defesa do Consumidor, com base também no Estatuto do Idoso. Os juízes estão proibindo também de fazer reajustes. Antonio Cordeiro: Pelo que observo, você vê perigo de concentração de preços a partir de 50 anos então? Arlindo de Almeida: Sim...claro! Os custos não são muito diferentes até 59 anos. A partir dos 60 anos os custos aumentam muito. Antonio Cordeiro: Muitos sanitaristas acham que saúde não tem preço. Aliás, todo mundo acha. Mas não se pode esquecer que saúde também tem custos e custos altos porque, atualmente, 23% da população, ou um pouco mais, dependem de Planos de Saúde, ou da Saúde privada. O que você acha então do artigo 196 da Constituição? Arlindo de Almeida: O artigo 196 da Constituição é uma utopia também. Aconteceu logo depois da queda do muro de Berlim, havia uma visão comunista sobre o assunto. É o maior absurdo de que a saúde é um direito do cidadão e do dever do Estado. O Estado têm obrigações sim e muitas, mas dessa forma você tira do cidadão a obrigação de cuidar da sua saúde e da saúde dos outros. Essa é que deveria ser a visão, na época, do Mário Covas, do Fernando Henrique e do Ulysses Guimarães que

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foram os pais da Carta Magna. Chega de direitos. Vamos também dar obrigações. A população tem o dever de cuidar da sua saúde e também da saúde dos outros, filhos, netos, genros, enfim, de toda a família. Todos devem se preocupar, de forma coletiva, para não se drogar, comer moderadamente, fazer exercício, não fazer sexo sem segurança. Isso é aderência da população. Pegue um exemplo simples de epidemia, por exemplo. No combate à Dengue, por exemplo, a população têm que participar, caso contrário, não dá resultado. Isso sim é Dever do Estado e da população. Não jogar lixo na rua, por exemplo, pois vai provocar inundações. Antonio Cordeiro: O meu cardiologista comenta, que se houvesse água fluoretada para toda a população ou água tratada você acabaria com 80% das doenças. São coisas básicas que o Estado deveria fornecer e ainda não fornece a todos, mas a Constituição prevê, não é verdade? Arlindo de Almeida: E não é só isso..! O esgoto? De quem é a responsabilidade? Se o governo se preocupasse em fazer só isso, ou seja, Saneamento Básico, que é a colheita do esgoto e água encanada para todos, resolveria milhares de problemas da saúde pública. Antonio Cordeiro: Bem, estamos no final da entrevista. Gostaria de saber, como está o clima geral da atividade privada na saúde, das Empresas de Medicina de Grupo. Há consenso, há tranqüilidade, houve alguma pacificação, o que realmente acontece atualmente? Arlindo de Almeida: Nós achamos que o ano passado, 2011, a atividade de Medicina de Grupo, cresceu 6,2% em relação a população de 2009. Isso foi um dado histórico porque o crescimento estava em torno de 5%. Isso aconteceu devido ao crescimento do país, não se pode negar isso. O Brasil passou pela crise muito mais suave do que os outros países (Brics) e esse aumento do poder aquisitivo do povo, programas sociais implantados pelo governo Lula, aquele programa: de Bolsa família. Tudo isso foi bom para o nosso País. Mas temos ainda alguns problemas que precisam ser analisados mais a longo prazo, como por exemplo, o envelhecimento da população. Nós da Abramge, temos uma visão que, fazendo uma customização, havendo mais compartilhamento, o governo participando, melhorando o SUS nós consideramos que tudo irá bem. Nós sabemos que não adianta haver melhora só na área privada, tem que existir uma melhora como um todo. Temos que acompanhar a alta tecnologia e cuidar dos medicamentos. Estão cada vez mais caros. É preciso resolver essa equação e fazer uma customização. O Estado tem que ter vagas, leitos, isso não pode faltar. Antonio Cordeiro: Qualquer hora vou convidá-lo a fazer uma palestra lá na PUC-SP. Pode esperar. Arlindo de Almeida: Eu fui muito na USP, eu tinha essa rotina, para mostrar como estava e como será o mercado, mas faz tempo que eu não sou convidado... Antonio Cordeiro: Muito obrigado pela entrevista.

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Anexo III Entrevista com Dr. Fábio Fonseca, ex-Diretor da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar, realizada por e-mail. Comentário antes da pergunta:

A regulação de Saúde Suplementar vem sendo, desde o final dos anos 80, objeto da produção acadêmica. As relações entre o Público e o Privado na saúde, intermediadas direta ou indiretamente pelo Estado, desde a constituição das primeiras instituições previdenciárias têm sido estudadas sob vários enfoques. As áreas de saúde coletiva, economia, direito, sociologia e atuaria iluminam sob diversos enfoques o tema da regulação na saúde. A UFRJ, que possui um convênio com a ANS para desenvolver investigações sobre a regulação de saúde suplementar, pretende permanecer como um ator relevante no debate sobre a saúde, envolvendo interesses diversos ou conflitantes, através da produção de conhecimentos de fronteira, que exigirão, cada vez mais, óticas plurais de análise.

Nesse sentido, o seminário “Relações entre o Público e o Privado: o Caso da Saúde Suplementar”, nucleado pela apresentação para debate de parte da produção acadêmica do Laboratório de Economia Política da Saúde da UFRJ, contribui para aprofundar e estimular a reflexão sobre o tema.

01)-Pergunta: Dado a natureza social dos serviços de saúde como poderá haver integração entre as ações de saúde do sistema público e do sub-sistema privado. a)- É possível o compartilhamento entre Saúde Pública e Saúde Privada? Quais são as proposições, caso elas existam. Houve sugestões em passado recente? Lembra-se de alguma? b)- Em resumo, como às ações governamentais - representadas pela ANS - podem auxiliar na cooperação do sistema publico e privado em prol do financiamento, da prestação e da utilização dos serviços de saúde.? c)- Quais os fatores de convergência e divergência entre o sistema publico e privado ? d)- Como promover a Universalização com ampliação de coberturas, financiamento público e diferentes arranjos organizacionais integrando sistema publico e privado. Há saídas ? Resposta: Não concordo necessariamente com o compartilhamento entre Saúde Pública e Saúde Privada. Se assim o fosse estaríamos “não concordando” com a Constituição e criando duas classes de brasileiros. Assim, entendo de que a Saúde promovida pelo Estado, como obrigação Constitucional tem de se aprimorar e, de fato, atender os ditames da Constituição Brasileira. A Suplementar deve focar especialmente nisso, ser suplementar e quem quiser -sem precisar de - que a adquira e pague por ela. 02)- Pergunta:

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Qual a percepção do mercado de Saúde Suplementar diante do modelo de substituição do Estado pela iniciativa privada como muitos desejam. Não seria mais eficiente e bom para a sociedade em geral uma relação de complementaridade? Resposta: Novamente voltamos aos assuntos da Constituição Brasileira. A Saúde, por força da constituição é universal. Assim o sendo, a iniciativa privada poderia exercer algumas - ou muitas - das atividades de saúde contratada por ou em nome do Estado Brasileiro. Não entendo de que a eficiência surge por que é privado (temos muitos exemplos disso), mas também reconheço de que o público tem de ser exercido com muito mais eficiência (em todos os sentidos) do que vem sendo exercido. 03)- Pergunta: Como o sistema privado pode contribuir ainda mais para aprimorar a gestão geral da Saúde no Brasil? Você conhece proposições, premissas e idéias a respeito? Resposta: O sistema privado pode contribuir estudando e implementando ações de gestão que podem, em seguida, serem utilizados pela gestão pública. 04)- Pergunta: Como lidar com a Evolução da tecnologia / inflação médica e o controle de preços impostos pelo Estado na iniciativa privada.? Resposta à 3 e à 4 (complementos) Ao Estado não cabe controlar preços, mas sim manter concorrência e fiscalização. São esses dois pontos que mantém preços razoáveis. Veja: o Estado brasileiro não faz direito nenhuma das duas coisas. Não trabalha para manter a concorrência na Saúde Suplementar, nem tampouco fiscaliza de forma minimamente decente o exercício da atividade (pelo menos essa foi a minha percepção enquanto estive na ANS). Inflação médica e tecnologia: sempre qualquer tecnologia no início é cara, mas com a maior disseminação de sua utilização e com a concorrência, sempre acaba ficando mais barata. 05)- Pergunta: A regulamentação de planos de saúde têm produzido para o setor privado um desinteresse por planos individuais no médio e longo prazo isso: a)- poderá ocasionar uma maior dificuldade de integração do publico e privado? Não é a regulamentação que causa isso, mas a camisa de força dos reajustes de preços. Novamente a parte da Saúde que a ANS existe para cuidar é e deve continuar sendo suplementar enquanto que a saúde universal deve ser provida pelo Estado. Se

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isso acontecesse de forma eficiente os controles de preços se dariam de forma harmônica. b)- Como harmonizar os interesses da população brasileira no modelo assistencial de universalidade (publico), financiado por impostos e a iniciativa privada. Na forma jurídica - constitucional - de hoje não cabe harmonização nenhuma. Ao Estado, com as formas clássicas de financiamento, cabe prover a assistência. O resto é suplementar e quem quiser compra e recebe esses serviços suplementarmente. c)- Em sua opinião, a relação público/ privado é: - Benéfica ou problemática Resposta: Pode ser muito benéfica desde que o Estado brasileiro exerça seu duplo papel (i) prover a saúde na forma da Constituição e (ii) fiscalizar e garantir a concorrência da suplementar. - Pode ter um bom grau de integração ou de separação ? Acho que as respostas anteriores eliminam essa questão. - Podem ser Sistemas combinados ? Novamente. As respostas anteriores cobrem essa questão. - Há muitos desvios, discriminação e a regulação excessiva interfere em consumidores e Operadoras ? Um emaranhado deles, alguns explícitos e outros escondidos ou não plenamente escritos ou informados. A regulamentação é excessiva? Em alguns casos sim. Em outros não. A discriminação é atentatória aos bons costumes e as boas práticas de gestão pública. Há muito que fazer e muito mais o que fazer melhor. Muito há também o que deve deixar de ser feito. Comentário antes da pergunta. O deputado José Linhares (PP-CE) pediu aos participantes da audiência da Comissão de Seguridade Social e Família que apresentem sugestões ao seu parecer sobre os projetos de lei que ampliam a cobertura de transplantes pelos planos privados de saúde (PLs 2642/03 e 4164/04). Linhares lembrou que incluiu uma emenda segundo a qual a amplitude da cobertura de transplante deverá respeitar os contratos ou convênios pactuados com os usuários. 06)- Pergunta: O que foi proposto pelas Operadoras sobre o assunto acima ? Resposta:

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Desconheço. Mas acredito que uma vez contratado entre partes - operadoras e beneficiários - a inserção de nova disposição contratual deve ser concomitante com a discussão da remuneração prevista nesse contrato. Comentário antes da pergunta. As empresas de Planos de Saúde não podem restringir o tipo de tratamento necessário ao consumidor, mesmo que a restrição esteja prevista em contrato. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), por uma decisão unânime dos cinco ministros da Terceira Turma, considerou que a cláusula que limita a terapia é abusiva. A decisão refere-se a uma ação movida em 1998 por contratante do plano, já falecido, contra a Seguradora contratada. A empresa fora condenada em primeira instância, mas recorrera. 07)- Pergunta: O que você considera importante nessa decisão ? É válido limitar terapias ? Resposta: No mínimo serve para exemplificar a confusão reinante. Se a cláusula é abusiva talvez a totalidade do contrato tenha de ser revisto. Aí entra o Estado dando o tom dessa nova contratação e ofertando a saúde universal prevista na constituição. Comentário antes da pergunta. É necessário repensar o modelo de sistemas de saúde para se obter bons resultados. Isso é o que defende o guru em estratégia competitiva e professor da Harvard Business School, Michael Porter. Porter, autor do livro "Repensando a Saúde", defende um novo jeito de olhar o setor, tendo a competição baseada em valor como princípio. "O valor tem que ser baseado nos resultados obtidos na melhora do paciente em relação ao dinheiro investido. Enquanto o foco não for esse, todo o sistema de saúde terá soma zero", afirma. 08)- Pergunta: Quais os pontos de vista das Operadoras, ou seu pessoal, face à visão de Michael Porter. ? Resposta: Totalmente afeta a situação americana que é integralmente diferente da brasileira. 09)- Pergunta: Você considera que o Capitation pode ser aplicado em Planos de Saúde no Brasil ?

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Resposta: Inexiste dificuldades na aplicação do captation que até hoje não foi aplicado exclusivamente por conta da falta de percepção de ganho financeiro sobre o que se pretende.

10)- Pergunta:

Na sua opinião a ANS será bem sucedida nos próximos anos ? O que se espera dela em termos de decisões fundamentais ?

Resposta:

As condições para que a ANS seja bem sucedida não estão presentes. Primeiramente precisamos perguntar “para quem” ela será bem sucedida. Nos moldes atuais com certeza não é para os beneficiários.

Em segundo lugar é essencial que a ANS veja e atue sobre sua dupla função (i) promover a concorrência (como forma de “normalizar” preços e (ii) promover a efetiva fiscalização do sistema de saúde suplementar. Não podemos sair de uma percepção da Diretoria anterior onde a ANS é um braço do Estado e as Operadoras são más e tem a “obrigação” de prover serviços cuja contratação não aconteceu, e cair na percepção da Diretoria atual que pelo menos “parece” não agir, mas tão somente esperar que os maiores assimilem os menores.

11)- Pergunta:

Você considera que o tratamento dado pela ANS a grandes empresas, médias e pequenas Operadoras deve ser o mesmo ?

Resposta:

O Brasil é um país muito grande, heterogêneo e complexo para que tratamento igual para todos seja feito. Ao mesmo tempo tratar diferentemente é muito difícil e demanda extrema competência espírito público. Acho sim que operadoras pequenas em cidades pequenas e médias onde inexista a ação de outras operadoras devem ser “vistas” com muito cuidado e atenção. Ao mesmo tempo a forma jurídica das operadoras deve ser levada em consideração pois, na prática, a ação de cada tipo (seguradoras, medicina de grupo, cooperativas é completamente diferente.

12)- Pergunta:

O que você considera viável na Saúde Filantrópica ?

Resposta:

Tendo certeza de que a Filantropia é importante e tem papel essencial a exercer. Entretanto em temos numéricos tem de ser alguma coisa residual e pontual e não uma forma de agir. A principal filantropia tem de ser feita pelo Estado.

Grato pela entrevista:

Prof. Antonio Cordeiro Filho

Abril/2011

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