O Reconhecimento Da Fraude à Execução No Novo CPC - Artigos - Conteúdo Jurídico

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Resumo: Nos termos da Súmula 375 do STJ, criada em 2009, “o reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente”. O presente artigo tem por objetivo responder a seguinte indagação: o novo CPC se hamoniza com a regra desse verbete sumular?  Sumário: 1. Considerações iniciais. 2. O reconhecimento da fraude à execução na sistemática do CPC de 1973. 3. O reconhecimento da fraude à execução no novo CPC  . Palavras-chave: Fraude à execução. Novo código de processo civil. Jurisprudência do STJ. Direito Sumular.  1. Considerações iniciais  A fraude à execução é um instituto de natureza processual que constitui ato atentatório à dignidade da  justiça. Nas palavras do ilustre processualista Fredie Didier: [1] “A fraude à execução é manobra do devedor que causa dano não apenas ao credor (como na fraude pauliana), mas também à atividade jurisdicional executiva. Trata-se de instituto tipicamente processual. É considerada mais grave do que a fraude contra credores, vez que cometida no curso de processo judicial, executivo o apto a ensejar futura execução, frustrando os seus resultados. Isso deixa evidente o intuito de lesar o credor, a ponto de ser tratada com mais rigor” 2. O reconhecimento da fraude à execução na sistemática do CPC de 1973 Na sistemática do CPC de 1973, configura fraude à execução o ato de alienação ou oneração de bens do devedor quando o bem for litigioso ou quando, ao tempo da alienação, correr, contra o devedor, demanda capaz de reduzí-lo à insolvência (art. 593, I e II, CPC/73). Diante da possibilidade do devedor desfazer-se dos seus bens no interregno entre a distribuição e a citação, foi editado o art. 615-A do CPC/73. Este dispositivo autoriza o exequente a, no ato de distribuição, obter certidão comprobatória do ajuizamento da execução, para averbação no registro de imóveis, de veículos ou de outros bens sujeitos à penhora ou arresto. Por sua vez, o § 3º considera em fraude à execução a alienação ou a oneração dos bens após essa averbação. Por esse mecanismo, consegue-se então antecipar o reconhecimento da fraude, desde que obtida a averbação da certidão do distribuidor. [2] O Código Civil aponta expressamente (art. 161), como requisito da fraude contra credores, a má-fé do adquirente (consilium fraudis). A questão estava em saber se, para configurar fraude à execução, seria também necessário demonstrar a má-fé do adquirente, ou se era presumida. Por muito tempo, prevaleceu a orientação de que, aquele que adquiria bens do devedor, quando havia contra ele processo pendente, presumia-se de má -fé, já que lhe cumpria exigir do alienante certidão negativa dos distribuidores. Mas só a má-fé daquele que adquiria diretamente do devedor era presumida. Se ocorressem alienações sucessivas, sobre os adquirentes posteriores, não havia a presunção. Essa orientação mudou. No ano de 2009 foi criada a Súmula 375 do STJ, que estabeleceu o seguinte: o reconhecimento da fraude de execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente. [3] O enunciado deixa claro que a má-fé do adquirente não é presumida, salvo se houver registro de penhora, ao O reconhecimento da fraude à execução no novo CPC » Alice Sa ldanha Vill ar 

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Resumo: Nos termos da Súmula 375 do STJ, criada em 2009, “o reconhecimento da fraude à execução

depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente”. O presente artigo

tem por objetivo responder a seguinte indagação: o novo CPC se hamoniza com a regra desse verbete sumular?

Sumário: 1. Considerações iniciais. 2. O reconhecimento da fraude à execução na sistemática do CPC de

1973. 3. O reconhecimento da fraude à execução no novo CPC .

Palavras-chave: Fraude à execução. Novo código de processo civil. Jurisprudência do STJ. Direito Sumular.

1. Considerações iniciais

A fraude à execução é um instituto de natureza processual que constitui ato atentatório à dignidade da

justiça. Nas palavras do ilustre processualista Fredie Didier:[1]

“A fraude à execução é manobra do devedor que causa dano não apenas ao credor (como na

fraude pauliana), mas também à atividade jurisdicional executiva. Trata-se de instituto tipicamente

processual. É considerada mais grave do que a fraude contra credores, vez que cometida no curso de

processo judicial, executivo o apto a ensejar futura execução, frustrando os seus resultados. Isso deixa

evidente o intuito de lesar o credor, a ponto de ser tratada com mais rigor”

2. O reconhecimento da fraude à execução na sistemática do CPC de 1973

Na sistemática do CPC de 1973, configura fraude à execução o ato de alienação ou oneração de bens do

devedor quando o bem for litigioso ou quando, ao tempo da alienação, correr, contra o devedor, demanda capaz

de reduzí-lo à insolvência (art. 593, I e II, CPC/73).

Diante da possibilidade do devedor desfazer-se dos seus bens no interregno entre a distribuição e a citação,

foi editado o art. 615-A do CPC/73. Este dispositivo autoriza o exequente a, no ato de distribuição, obter certidão

comprobatória do ajuizamento da execução, para averbação no registro de imóveis, de veículos ou de outros

bens sujeitos à penhora ou arresto. Por sua vez, o § 3º considera em fraude à execução a alienação ou a

oneração dos bens após essa averbação. Por esse mecanismo, consegue-se então antecipar o reconhecimento

da fraude, desde que obtida a averbação da certidão do distribuidor. [2]

O Código Civil aponta expressamente (art. 161), como requisito da fraude contra credores, a má-fé do

adquirente (consilium fraudis). A questão estava em saber se, para configurar fraude à execução, seria também

necessário demonstrar a má-fé do adquirente, ou se era presumida. Por muito tempo, prevaleceu a orientação de

que, aquele que adquiria bens do devedor, quando havia contra ele processo pendente, presumia-se de má -fé, já

que lhe cumpria exigir do alienante certidão negativa dos distribuidores. Mas só a má-fé daquele que adquiria

diretamente do devedor era presumida. Se ocorressem alienações sucessivas, sobre os adquirentes posteriores,

não havia a presunção. Essa orientação mudou. No ano de 2009 foi criada a Súmula 375 do STJ, queestabeleceu o seguinte: o reconhecimento da fraude de execução depende do registro da penhora do bem

alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente. [3]

O enunciado deixa claro que a má-fé do adquirente não é presumida, salvo se houver registro de penhora, ao

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qual se pode acrescentar a averbação do art. 615-A, do CPC. Se a alienação ocorrer após a averbação ou

registro da penhora, os adquirentes — não só o primeiro mas os subsequentes — presumir-se-ão de má-fé, pois

o registro torna pública a constrição, fazendo com que tenha eficácia erga omnes.[4]

Por outro lado, se não houver o registro, o reconhecimento da fraude dependerá da prova de que o

adquirente estava de má-fé. Esta não se presume pelo fato de o adquirente poder exigir certidões do distribuidor.

Entre os direitos do credor e os dos adquirentes de boa -fé, o STJ optou por proteger estes últimos. Cumpre ao

credor diligente, que queira evitar os dissabores de uma possível fraude à execução, tomar as providênciasnecessárias para tornar pública a existência da ação ou da constrição. [5]

Em suma: consoante a jurisprudência consolidada na Súmula 375 do STJ, o reconhecimento da fraude à

execução depende do registro da penhora do bem alienado. Na falta de registro, imputa-se ao credor o ônus de

provar a má-fé do terceiro adquirente, a fim de demonstrar que este tinha ciência da ação em curso.

3. O reconhecimento da fraude à execução no novo CPC

O art. 593 do CPC de 1973, que trata da fraude à execução, foi trazido para o novo CPC (Lei. 13. 105 de

2015), em seu art. 792, que ampliou e aperfeiçoou na redação anterior. Confira:

NCPC. Art. 792. A alienação ou a oneração de bem é considerada fraude à execução: I - quando sobre o

bem pender ação fundada em direito real ou com pretensão reipersecutória, desde que a pendência do

processo tenha sido averbada no respectivo registro público, se houver; II - quando tiver sido averbada, no

registro do bem, a pendência do processo de execução, na forma do art. 828; III - quando tiver sido

averbado, no registro do bem, hipoteca judiciária ou outro ato de constrição judicial originário do processo

onde foi arguida a fraude; IV - quando, ao tempo da alienação ou da oneração, tramitava contra o devedor

ação capaz de reduzi-lo à insolvência; V - nos demais casos expressos em lei.

A nova sistemática se harmoniza com a regra na Súmula 375 do STJ? A resposta é positiva. Vejamos:

a) A 1ª parte da Súmula 375 do STJ foi reafirmada pelo art. 792 do NCPC. Segundo essedispositivo, o reconhecimento da fraude à execução depende da prévia averbação do processo ou daconstrição judicial que recai sobre o bem alienado. Por sua vez, o § 4º do art. 828 do NCPC consideraem fraude à execução a alienação ou a oneração dos bens após essa averbação.b) A 2ª parte da Súmula 375 do STJ foi reafirmada pelo § 2o do art. 792 do NCPC, verbis: “No casode aquisição de bem não sujeito a registro, o terceiro adquirente tem o ônus de provar que adotou ascautelas necessárias para a aquisição, mediante a exibição das certidões pertinentes, obtidas nodomicílio do vendedor e no local onde se encontra o bem”.

Numa palavra: não tendo havido o registro da penhora sobre o bem alienado a terceiro, a fraude à execuçãosomente poderá ficar caracterizada se houver prova de que o terceiro tinha conhecimento da ação ou da

constrição (esta ciência caracterizará a má-fé do adquirente). O terceiro adquirente tem o ônus de provar que

adotou as cautelas necessárias para a aquisição, mediante a exibição das certidões pertinentes.

NOTAS:

[1] Cf. DIDIER JR, Fredie. Leonardo José Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso deDireito

Processual Civil. Vol.5, 3ª ed., Salvador: JusPODIVM, 2011,

[2] Cf. STJ - Voto do Ministro JORGE MUSSI no REsp 1070503 PA, 5ª Turma, DJe 14/09/2009.

[3] Idem.

[4] Idem.

[5] Idem.

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