O Serviço Social e os seus instrumentos e técnicas

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1 Universidade de Brasília Instituto de Ciências Humanas Departamento de Serviço Social Trabalho de Conclusão de Curso O Serviço Social e os seus instrumentos e técnicas: Uma análise da percepção da Abordagem com Grupo no meio profissional do assistente social Ricardo Guimarães Amorim Brasília/DF 2013

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O Serviço Social e os seus instrumentos e técnicas:Uma análise da percepção da Abordagem com Grupo no meio profissional do assistente social

Transcript of O Serviço Social e os seus instrumentos e técnicas

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    Universidade de Braslia

    Instituto de Cincias Humanas

    Departamento de Servio Social

    Trabalho de Concluso de Curso

    O Servio Social e os seus instrumentos e tcnicas:

    Uma anlise da percepo da Abordagem com Grupo no meio profissional

    do assistente social

    Ricardo Guimares Amorim

    Braslia/DF

    2013

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    Ricardo Guimares Amorim

    O Servio Social e os seus instrumentos e tcnicas:

    Uma anlise da percepo da Abordagem com Grupo no meio profissional

    do assistente social

    Trabalho de Concluso de Curso

    apresentado ao Departamento de

    Servio Social da Universidade de

    Braslia, como requisito fundamental

    para a formao no curso de Servio

    Social.

    Orientadora: Dr. Karen Santana de

    Almeida Vieira

    Braslia/DF

    2013

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    Monografia submetida ao corpo docente do departamento de Servio Social (SER) da

    Universidade de Braslia (UnB), como parte dos requisitos necessrios para obteno do grau

    de Bacharel em Servio Social.

    BANCA EXAMINADORA

    ____________________________________________________

    Professora-Orientadora: Prof. Dr. Karen Santana de Almeida Vieira (SER/UnB)

    _____________________________________________________

    Professora Ms. Priscilla Maia de Andrade (Membro interno do SER/UnB)

    _____________________________________________________

    Professor (a)

    Professor Dr. Vicente de Paula Faleiros (Membro externo e Professor Emrito da UnB)

    Braslia, 2013

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    Dedicado aos profissionais e usurios do Servio

    Social: Que a interveno seja sempre questionada,

    ampliada e qualificada.

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    AGRADECIMENTOS

    Agradeo primeiramente aos meus pais, Maria Jos e Urivaldo, e aos meus irmos, Marcelo e

    Eduardo, que sempre me proporcionaram oportunidades e que mesmo na discordncia so o

    meu pilar de sustentao e me do a fora que sempre esperei que viesse deles.

    s minhas tias e avs, pelas risadas dadas desde a infncia, pelas vistas grossas para alguma

    arte feita e pela torcida pelo meu sucesso que sinto em cada palavra de incentivo.

    Aos meus primos, meus primeiros amigos, alm da parceria constante, agradeo pela

    diversidade de ideias, estilos de vida, comportamentos, gostos e formas de pensar. Nada

    melhor que a troca com o diferente para nos tornar tolerantes, abrangentes e respeitosos.

    Agradeo tambm Professora Doutora Karen Santana de Almeida Vieira, por toda a sua

    pacincia, compreenso e doura durante as orientaes, alm do nimo para a boa concluso

    desse trabalho e a postura tica demonstrada durante todo o processo. Agradeo ainda pelo

    apoio nos ltimos momentos deste trabalho, quando o medo tentou decidir o rumo da prosa e

    suas palavras de incentivo e crdito o impediram. Obrigado mesmo!

    Tambm registro o meu agradecimento banca avaliadora, Professora Mestre Priscilla Maia

    de Andrade e Professor Doutor Vicente de Paula Faleiros, por terem se mostrado dispostos e

    interessados no trabalho apresentado.

    Agradeo s assistentes sociais que me cederam parte do seu tempo para a realizao das

    entrevistas, sem elas esse trabalho no teria se concretizado.

    No poderia deixar de agradecer s assistentes sociais do Setor de Servio Social do Hospital

    Regional de Ceilndia, em especial s minhas supervisoras de campo, Sandra Cavalcante e

    Cludia Maria de Medeiros, por terem feito que o meu primeiro contato com a prtica do

    Servio Social, durante o estgio, se estabelecesse de forma tica, comprometida e cidad.

    Registro tambm o meu agradecimento Professora Doutora Nair Bicalho de Sousa, pela

    superviso no Projeto de Extenso: Estudar em Paz Mediao de Conflito no Contexto

    Escolar, que muito me acrescentou como pessoa e profissional. No podendo me esquecer de

    agradecer Flvia Beleza, coluna cervical do mesmo projeto, que muito me ensinou e

    acrescentou em todas as aulas dadas e nas conversas leves e informais. Sinto saudades.

    queridssima Vanessa Dunk, pela dcada de amizade, sustentao e constante presena e

    por ter sido a minha primeira inspirao para dedicar parte da minha vida prtica do Servio

    Social.

    Aos amigos conquistados durante o cursinho pr-vestibular: Amanda Medeiros, Andr

    Minas, Nayra Figueiredo, Joo Vitor, Thayane Borba, Tiuipa Farias e Potira Fabola. Por

    cada gargalhada, troca, vivncia e apoio, no s durante a angustiante fase de vestibulando,

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    mas tambm a de universitrio e as tantas outras que esto por vir. Agradeo aos outros

    amigos: Juliana Torres e Jdson Rocha pela doura, Flvio Silva pela fora, Daniella Furtado

    pelas palavras certas, Jssica Marlia pela honestidade, Gunter Ribeiro e Juliana Pacheco pelo

    humor cido, Marcos Amaral pela msica e Elisa Hoffmman pela gratuidade.

    Aos demais colegas de curso, e principalmente os do 1/2009, eu agradeo a experincia de

    termos vivenciado essa fase juntos.

    Ao Quintelas, pela constante presena, mesmo distante. Tambm pelas palavras que

    impulsionam, pela sugesto ao veto ao no consigo, pelos abraos que motivam, pelo Rio

    em uma nova e mais bonita tica e pelo sorriso: o mais aconchegante que j vi e que se

    multiplica por fazer nascer outro em mim.

    s companheiras Danille Moreira e Rafaela Ramalho, colocadas aqui em ordem alfabtica

    por pura falta de predileo, agradeo a parceria (notada por todos), a cumplicidade, a paixo,

    a fora dada involuntariamente, a presena, os graciosos momentos de mau-humor, os puxes

    de orelha, a f, os abraos cheios de ginga, as fugas desses abraos, os sorrisos fceis e

    sinceros, os sins id, os nos superego, o suporte acadmico e principalmente o fato de me

    darem a certeza de que esses quatro anos foram os primeiros de muitos que ainda esto por

    vir... Nem adianta fazer cara feia... Tira a mo da cintura!

  • 7

    RESUMO

    O presente estudo busca refletir acerca da utilizao e da compreenso de assistentes

    sociais sobre a Abordagem com Grupo, isto , buscou-se conhecer qual a percepo dos

    assistentes sociais sobre as metodologias trabalhadas pela categoria em intervenes grupais.

    E, tambm qual o entendimento que as assistentes sociais tem no que diz respeito Resoluo

    n 569/2010 do Conselho Federal de Servio Social (CFESS), que trata sobre o veto s

    prticas teraputicas. Para atender a esses objetivos, foi realizada pesquisa de campo,

    seguindo o mtodo de pesquisa qualitativa. Foram entrevistadas oito (08) assistentes sociais

    provenientes da rea de Sade e da rea da Assistncia Social. Alm disso, foi realizada

    pesquisa bibliogrfica por meio do portal eletrnico da Coordenao de Aperfeioamento de

    Pessoal de Nvel Superior (CAPES), com o intuito de ter acesso ao que produzido na

    atualidade sobre a interveno de profissionais do Servio Social com grupos. Poucos foram

    os artigos encontrados, demonstrando a existncia de uma lacuna na produo acadmica

    sobre a temtica. Dentre os resultados desta pesquisa, ressalta-se que foi observado que as

    intervenes profissionais analisadas seguiram, em sua maioria, as normativas legais da

    profisso. Contudo, a percepo da maioria das assistentes sociais entrevistadas por uma

    questo de desconhecimento das normas - diverge das resolues do CFESS no que dizem

    respeito s prticas teraputicas. Embora a conduta profissional observada, no geral, no

    caminhe para a Psicologia, em funo da percepo por parte das entrevistadas da necessidade

    de uma especializao na rea como condio para a aplicao da ditas prticas teraputicas.

    Por fim, tomando os resultados da pesquisa bibliogrfica e de campo, se torna importante que

    a temtica seja melhor discutida pela categoria profissional, uma vez que a pesquisa realizada

    aqui aponta para a utilizao da Abordagem com Grupo pelas profissionais num escopo ainda

    de intervenes grupais com metodologias essencialmente empricas e de cunho experimental.

    Alm de estarem dissociadas do conhecimento das normas da categoria e sem amparo de uma

    maior elaborao terica e metodolgica prprias da atuao profissional do Servio Social.

    Palavras-chave: Servio Social, Abordagem com Grupo, Prticas Teraputicas, Grupo,

    Instrumentos e Tcnicas.

  • 8

    ABSTRACT

    This study wants to make a reflection on Group Approach usage and comprehension

    by social workers. In other words, it wants to know the perception of the social workers on

    the methodologies used in group interventions is. And also the social workers understanding

    of the Resolution number 569/2010 of the Conselho Federal de Servio Social (CFESS), that

    manages the veto to the therapeutic practices. In order to achieve that point, a field research

    was executed with the method of qualitative research. Eight (8) interviews with social

    workers from the health's field and the social assistance were made. Furthermore, it was made

    a bibliographic research through the web portal of Coordenao de Aperfeioamento de

    Pessoal de Nivel Superior (CAPES) to have access to what is now produced in the

    intervention of professional Social Work with groups. Few articles were found, showing the

    existence of a gap in the academic production on the subject. Among the results of this

    research, we emphasize that it was observed that the professionals interventions analyzed

    followed, in most of the cases, the legal normative of the career. Nevertheless, the perception

    of most of the interviewed social workers ignoring the standards differs from the CFESS

    resolutions related to the therapeutic practices. Yet the professional conduct mostly observed,

    did not stand to a Psychology field, because of the interviewees perception of the need to

    become an expert in the area as a condition for the application of therapeutic practices.

    Finally, considering the results of the bibliographic and field research, it becomes important to

    better discuss the theme, once this research points to the Group Approach usage with

    methodologies essentially empirical and experimental. And also they are dissociated from the

    standard knowledge and helpless of theoretical and methodological development of their own

    professional practice.

    Keywords: Social Work, Group approach, Therapeutic practice, Group, Instruments and

    Techniques.

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    LISTA DE QUADROS

    Quadro 01. Autores e Livros analisados por Gelba Cavalcante

    Quadro 02. Autores, artigos e peridicos analisados por Gelba Cavalcante.

    Quadro 03. Relao de revistas e biblioteca, suas origens e a quantidade de trabalhos

    acadmicos encontrados em cada uma delas.

    Quadro 04. Perfil das profissionais entrevistadas por idade, instituio da graduao e

    formao acadmica.

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    LISTA DE SIGLAS

    CAPES Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior

    CBCISS Centro Brasileiro de Cooperao e Intercmbio de Servios Sociais

    CEAS Centro de Estudos e Ao Social

    CFESS Conselho Federal de Servio Social

    CRAS Centro de Referncia em Assistncia Social

    CREAS Centro de Referncia Especializada em Assistncias Social

    PAIF Servio de Proteo e Atendimento Integral Famlia

    TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

  • 11

    SUMRIO

    INTRODUO.......................................................................................................................12

    METODOLOGIA.................................................................................................................. 16

    Captulo I. Instrumentos e Tcnicas no Servio Social brasileiro: da gnese da profisso

    ao exerccio profissional nos dias atuais............................................................................... 20

    1.1. Os instrumentos e tcnicas e as primeiras escolas do Servio Social no contexto brasileiro............................................................................................... 20

    1.2. A Instrumentalidade no Servio Social................................................ 24

    1.3. Prtica e Teoria: A relao com os Instrumentos ................................ 26

    Captulo II. Abordagem com Grupo e Servio Social: alguns apontamentos tericos.....31

    2.1. As Intervenes com Grupos nos primrdios da profisso no Brasil:

    alguns apontamentos .......................................................................................... 31

    2.2. Bibliografia sobre Abordagem com Grupo: uma pesquisa preliminar..35

    2.3. Abordagem com Grupo e Arcabouo legal do Servio Social brasileiro:

    pontos para reflexo............................................................................................ 38

    Captulo III. A percepo da Abordagem com Grupo por profissionais assistentes sociais

    na rea da Sade e na rea da Assistncia: dvidas, dilemas e algumas

    indefinies............................................................................................................................. 43

    3.1. Questes preliminares, problemas de pesquisa e perfil dos

    entrevistados........................................................................................................43

    3.2. Percepo das assistentes sociais acerca da Abordagem com Grupo: O

    que os dados revelam? ....................................................................................... 47

    CONSIDERAES FINAIS................................................................................................ 54

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS................................................................................. 57

    APNDICES........................................................................................................................... 63

  • 12

    INTRODUO

    A interveno profissional dos assistentes sociais na contemporaneidade dispe de

    diversas possibilidades de instrumentais tcnico-operativos (como por exemplo, as Visitas

    Domiciliares e Institucionais, as Entrevistas, os Relatrios e Pareceres Sociais, a Observao

    Social, dentre outros). Instrumentos e Tcnicas estes que, alm de serem necessrios para a

    interveno do assistente social, visam tambm auxiliar na compreenso e, por sua vez, no

    enfrentamento das demandas postas para o profissional, quando se articula a utilizao desses

    instrumentos e/ou tcnicas com o arcabouo terico de anlise da sociedade1 e com a

    perspectiva profissional posta pelo projeto tico-poltico da categoria.

    Um desses instrumentos a Abordagem com Grupo2. Atualmente, ainda no existe

    consenso nem na nomenclatura, nem na metodologia acerca da utilizao de trabalhos com

    grupos. Contudo, no meio profissional se verificam intervenes profissionais a partir de

    trabalhos com grupos, isto , trabalhos com enfoque para a interveno a partir de pessoas que

    so atendidas em uma sesso coletiva e que foram ali dispostas por possurem uma identidade

    de grupo comum, seja ela: faixa etria (crianas, jovens, adolescentes, idosos), seja por gnero

    (mulher, homem) ou por alguma problemtica vivenciada decorrente das expresses da

    Questo Social3 - problemas relacionados a dependncia qumica (ex: alcoolismo), ausncia

    de planejamento familiar (ex: gravidez indesejada), orientaes acerca de acesso a direitos e

    polticas sociais (ex: pessoas que necessitam de cirurgia baritrica, acesso a benefcios

    previdencirios e/ou assistenciais) dentre outros (VIEIRA, 2012).

    Nesse sentido, para efeitos desta monografia e nas entrevistas realizadas, foi utilizada

    a nomenclatura Abordagem com Grupo para se referir a qualquer utilizao, no Servio

    Social, da metodologia exemplificada no pargrafo anterior. Optou-se aqui por esse termo,

    1 Dentre as diferentes perspectivas de anlise da sociedade pode-se citar como exemplo as Teorias de alguns

    autores que influenciam tambm a sociologia que so: Durkheim, Weber e Marx. Para uma leitura rpida sobre o

    que compreende cada uma dessas teorias, vide QUINTANEIRO, Tania at al. Um toque de Clssicos: Marx,

    Durkheim e Weber. 2. Ed. Rev. Amp. Belo Horizonte: Editora, UFMG, 2002.

    2 As aspas postas aqui so apenas para identificar os momentos que se quer chamar a ateno do leitor para o

    destaque da nomenclatura Abordagem com Grupo, escolhida nesse trabalho. Nas demais citaes a referida

    expresso aparecer sem o referido destaque.

    3 Neste trabalho, ao se referir Questo Social, ser utilizado o conceito de Iamamoto e Carvalho: [...] a

    manifestao no cotidiano da vida social, da contradio entre o proletariado e a burguesia [...]. (2009:77).

  • 13

    especialmente para tentar cercar o escopo da anlise com nfase nas manifestaes do uso

    dessa tcnica nos dias atuais e assim tentar desvincular o referido recurso das suas utilizaes

    na acepo vinculada ao Servio Social Tradicional4. E tambm para evitar associaes

    indevidas por parte dos entrevistados com conceitos do Servio Social do perodo Pr-

    Reconceituao. Nossa orientadora j vinha demarcando e estimulando o uso dessa

    terminologia Abordagem com Grupo para tentar esclarecer essa distino conceitual, em suas

    reflexes e discusses em sala de aula acerca do assunto, e em seus textos de notas de aula.

    Contudo, no foi encontrada nenhuma demarcao terica especfica que defina esse conceito

    nos moldes colocados no escopo desta monografia.

    Ademais, dentro do escopo do tema desta monografia (Abordagem com Grupo)

    necessrio demarcar a problemtica que a envolve. Partiu-se assim da reflexo acadmica

    vivenciada no curso de Servio Social da UnB de que a utilizao da Abordagem com Grupo

    nos dias atuais no Servio Social ainda considerada polmica, na medida em que, na

    atualidade, haveriam alguns indcios de que parte dos assistentes sociais ainda demonstram

    certa resistncia na utilizao desse instrumento. Uma das possveis resposta para isso seria a

    de que essa resistncia existiria em funo de uma suposta associao dessa tcnica ao

    contexto do Servio Social Tradicional e/ou s prticas teraputicas. Estas prticas

    teraputicas, especialmente aquelas caracterizadas no mbito da Psicologia, so vetadas ao

    profissional assistente social exercer, uma vez que o nosso curso no nos qualifica nesta outra

    rea do conhecimento.

    De fato, o exerccio de prticas teraputicas ou do Servio Social Clnico5 por parte

    dos profissionais assistentes sociais atualmente vedado pelo CFESS, que tem esse

    direcionamento expresso em suas resolues. Porm, essa proibio ainda alvo de fortes

    4 Para mais explicaes sobre a temtica vide o captulo 1 deste mesmo trabalho, contudo adianta-se que nesta

    poca a atuao tcnica com grupos, dentro do Servio Social Latino Americano, tinha vnculo terico com a

    psicologia social, como bem aponta Kisnerman (1978), o que contribuiu para uma sistematizao da tcnica de

    modo a abarcar conceitos desta outra rea do saber.

    5 O Servio Social Clnico, de acordo com a National Membership Committee on Psychoanalysis in Clinical

    Work, tem como propsito o: diagnstico e tratamento psico-social, intervindo em situaes de crise, excluso

    social e danos de qualquer ordem. Intervem nas desordens mentais, emotivas e incapacidades de

    desenvolvimento. Trabalha na preveno das disfunes de ordem bio-psico-social, estimulando a

    disponibilidade dos recursos sociais para a soluo dos problemas. (Parecer Jurdico N 16/08 CFESS. 26 de

    Junho de 2008) dia 17/02/2013 s 23:39

    http://www.cfess.org.br/arquivos/parecerjuridico1608.pdf

  • 14

    criticas por parte de alguns dos principais pensadores (da atualidade) do Servio Social

    brasileiro, a exemplo, Faleiros (2009) que defende:

    Na Histria do Servio Social est enraizada a prtica teraputica e a

    definio internacional a contempla. O CFESS no pode abolir a histria

    onde surge inclusive o nome da assistente social Virginia Satir fundadora da

    prtica teraputica com famlias. O Brasil quer ser uma exceo, por que?

    (FALEIROS, 2009: 1)

    A opo por um atendimento clnico uma vertente terico-prtica que

    corresponde forma do exerccio profissional previsto no inciso V do Art. 4

    da Lei 8662/93 para se fazer a interveno profissional. A ementa est

    vedando a opo terica do profissional, seu direito de escolha do mtodo e

    o direito do usurio de ser bem atendido. A ementa fere a tica profissional e

    o direito do usurio. (FALEIROS, 2009: 2)

    Ademais, o Movimento de Reconceituao do Servio Social6, ao promover uma nova

    perspectiva de como deveria se firmar a interveno profissional da categoria, possibilitou

    uma reviso crtica acerca da teoria, da metodologia e da nfase na cientificidade em relao

    ao que a perspectiva interventiva que se encontrava o Servio Social anteriormente a esse

    processo.

    Uma das constataes consideradas tradicionais, decorrentes dos primrdios da

    profisso, foi a do Servio Social ter como bases para a sua fundamentao cientfica a

    disciplinas acadmicas da Psicologia e da Sociologia, sem uma bagagem conceitual prpria

    do Servio Social (NETTO, 2005). Assim sendo, a conduta profissional do assistente social,

    segundo o referido autor, se confundia com as atribuies dos psiclogos, o que gerava

    crticas e reforava a manuteno do estigma de uma interveno profissional pautada na

    Psicologia. Ou ento a anlise do Assistente Social se baseava em explicaes generalistas

    acerca da sociedade, realizadas tomando como referncia leituras da Sociologia, e sem mediar

    as demandas que se apresentam para a interveno direta na realidade pelo Servio Social.

    Essa forte vinculao que o Servio Social Tradicional teve com a Psicologia pode

    ser uma das possveis explicaes para uma percepo pelos profissionais Assistentes Sociais,

    nos dias atuais, da Abordagem com Grupo, como uma tcnica que possui um vis

    6 Movimento de rompimento com aspectos tradicionais da profisso, que teve como marco inicial o I Seminrio

    Regional Latino-Americano de Servio Social, que ocorreu em Porto Alegre em 1965 (NETTO, 2006). Para

    mais informaes acerca dessa temtica vide o Captulo I desta monografia.

  • 15

    psicologizante e reducionista. Percepo esta que acarretaria tambm uma resistncia no uso

    da referida tcnica.

    O terico Natalio Kisnerman (1978), j no final dcada de 70 do sculo XX, aps as

    primeiras manifestaes da Reconceituao, pontua a existncia de uma confuso terica que

    envolvia as categorias Terapia de Grupo e Servio Social de Grupo. E, apesar de delimitar

    algumas diferenas, Kisnerman (1978) no desvinculou as interpretaes de contedos

    inconscientes e ntimos (prprios da Psicanlise e/ou da Psicologia) das atribuies do

    assistente social, por exemplo. Esse enlace terico, inclusive, fica explcito na obra quando o

    autor ressalta que segundo Ackerman7 (1960, p.9 apud KISNERMAN, 1978, p.93): A

    psicoterapia, inevitavelmente, diz respeito ao assistente social moderno.

    Partindo dessa contextualizao terica e percebendo a importncia de conhecer os

    limites e as possibilidades da referida tcnica, o presente trabalho pretendeu responder a

    seguinte pergunta: De que forma compreendida atualmente a Abordagem com Grupo

    dentro do Servio Social pela categoria profissional, e como isto se reflete na utilizao ou

    no dessa tcnica pelos assistentes sociais?

    Diante desse quadro de confuso terica e metodolgica em que se situou a

    Abordagem com Grupo, se faz necessria uma maior compreenso da percepo da categoria,

    na atualidade, acerca da referida tcnica. At mesmo porque, apesar do estigma, a Abordagem

    com Grupo em um escopo de atendimento mais amplo, envolvendo intervenes com

    agrupamento de pessoas (em um sentido genrico), se caracteriza com aes de prestar

    orientaes no sentido de assegurar direitos, no sendo assim vetadas, pelo Conselho Federal

    de Servio Social no documento de regulamentao da profisso (n 8.662 de 07 de Junho de

    1993). Veja, a exemplo, o art. 4 da referida lei:

    Art. 4 Constituem competncias do Assistente Social: (...)

    III encaminhar providncias, e prestar orientao social a indivduos, grupos, e

    populao; (...)

    V orientar indivduos e grupos de diferentes segmentos sociais no sentido de

    identificar recursos e de fazer uso dos mesmos no atendimento e na defesa de seus

    direitos; (BRASIL, 1993. Regulamentao da Profisso. Lei n 8.662, de 07 de

    Junho de 1993)

    Nesse sentido, a hiptese que norteia essa pesquisa a de que existe uma viso

    reducionista acerca da Abordagem com Grupo pela categoria profissional. E que est viso

    7 ACKERMAN, Nathan, Diagnstico y tratamiento de las relaciones familiares. Buenos Aires, Paids 1960.

    Registrada a citao da citao por no ter sido possvel acessar ao livro original.

  • 16

    estaria diretamente relacionada s interpretaes pessoais sobre as crticas levantadas pelo

    Movimento de Reconceituao contra os pressupostos do Servio Social Tradicional. Sendo

    assim, supe-se aqui que as crticas de uma forma de agir tradicional, vinculada ao mbito

    psicolgico na profisso, contribua para uma resistncia utilizao dessa tcnica

    (Abordagem com Grupo) na interveno profissional na contemporaneidade.

    Assim o objetivo geral da pesquisa : analisar qual a percepo da Abordagem com

    Grupo na interveno do Servio Social, a partir da anlise do discurso de assistentes sociais

    que discutem e/ou trabalham com a referida tcnica nas reas da sade e da assistncia.

    J os objetivos especficos foram divididos em trs, que so:

    1) Analisar se existe a utilizao da Abordagem com Grupo no meio profissional do

    Servio Social; e qual a concepo dessa tcnica entre os profissionais

    2) Analisar os pressupostos metodolgicos utilizados pelos profissionais que aplicam a

    Abordagem com Grupo em sua interveno profissional;

    3) Analisar o grau de compreenso dos profissionais do Servio Social em relao as

    normativas dos Conselhos de Classe no que se refere s prticas teraputicas.

    Destarte a perspectiva nesse terceiro objetivo especfico tambm conhecer o que o

    Conselho Federal de Servio Social (CFESS) discute acerca das Prticas Teraputicas e

    analisar se a Abordagem com Grupo realizada pelos profissionais se distancia do que vetado

    pelo Conselho, no que se refere s prticas teraputicas e/ou Servio Social Clnico.

    Porm em face da complexidade do tema, que no caberia a um trabalho monogrfico,

    opta-se aqui apenas por uma abordagem analtica e metodolgica que privilegie a anlise de

    dados coletados a partir da perspectiva da interveno profissional. Desse modo, espera-se

    que o presente estudo possa servir de impulso para outras pesquisas que busquem uma

    atuao profissional mais consciente dos limites e das possibilidades da Abordagem com

    Grupo. Alm de aumentar a compreenso de como utilizar a tcnica em momentos propcios

    e de forma adequada e condizente com as atribuies pertinentes aos assistentes sociais.

    METODOLOGIA

    O presente trabalho utilizou como procedimento de pesquisa e de anlise e de coleta

    de dados a metodologia qualitativa, na tentativa de trazer para o estudo aspectos subjetivos

    dos entrevistados acerca do tema proposto. Como se sabe, a funo da pesquisa qualitativa

  • 17

    responder a questes muito particulares. (...) Ela trabalha com o universo dos significados,

    dos motivos, das aspiraes, das crenas, dos valores e das atitudes (MINAYO, 2010 p. 21).

    Essa tcnica permite, ento, uma anlise mais aprofundada e particular da realidade

    social.

    A pesquisa qualitativa dividida em trs momentos: Fase exploratria; Trabalho de

    campo e Anlise de dados (MINAYO, 2010).

    A fase exploratria da referente pesquisa se delineou no levantamento bibliogrfico. O

    tema abordado escasso na literatura brasileira atual e, por isso, o levantamento bibliogrfico

    foi feito a partir de pesquisas em artigos encontrados na base de dados do site de peridicos da

    CAPES (Coordenao de Aperfeioamento do Pessoal de Nvel Superior), nos quais as

    palavras-chave para a busca foram Servio Social e Grupo8. Alm disso, tambm foram

    utilizadas diferentes fontes que abarquem o tema do Servio Social e Trabalho com Grupos,

    seja proveniente de anlise documental ou de bibliografia nacional e/ou estrangeira (citadas

    nas referencias bibliogrficas).

    E, para responder s demandas da presente monografia, foram realizadas entrevistas

    (com roteiro semiestruturado), que tiveram sua validade testada por meio da aplicao de um

    pr-teste, com o intuito de averiguar a adequao da linguagem empregada e o entendimento

    das perguntas apresentadas. Inicialmente, o nmero de entrevistas previsto era de 10.

    Contudo, em funo das dificuldades decorrentes do perodo de realizao da monografia com

    um semestre atpico se desenvolvendo entre as festividades de final de ano (Natal e Ano

    Novo), alm de meses que so mais reconhecidos como perodos de frias (Janeiro e

    Fevereiro) e do recesso de Carnaval, tornou-se invivel conseguir o nmero inicial previsto

    para as entrevistas, especialmente porque muitos profissionais no se encontravam em suas

    atividade, poca das visitas institucionais em funo dos problemas das comemoraes,

    festividades e feriados descritos. Foram, ento, entrevistadas oito (08) assistentes sociais,

    algumas delas atuantes da rea da sade, outras da assistncia social e algumas que trabalham

    na Regio Administrativa de Ceilndia e outras na de Taguatinga. O critrio para a seleo

    das participantes de pesquisa foi, alm da rea de atuao (preferencialmente sade e

    8 A maneira encontrada para a realizao do levantamento bibliogrfico foi acessar uma das bases de

    dados encontradas no site da Biblioteca Central da Universidade de Braslia. A CAPES, que fornece

    artigos de mais de doze mil revistas nacionais e estrangeiras. E as palavras servio social e grupo

    foram as palavras-chave buscadas nesses bancos de dados.

  • 18

    assistncia social), o fato de trabalharem ou j terem trabalhado com a Abordagem com

    Grupo.

    Ademais, a escolha dessas duas reas temticas, sade e assistncia, se justificaram

    pela existncia de documentos do CFESS que assinalam indicativos de que a Abordagem com

    Grupo poderia se constituir em ferramenta de interveno do assistente social, ao pontuar os

    parmetros para a atuao dos profissionais de Servio Social nas respectivas reas. Pois o

    trabalho com grupos previsto como competncia do assistente social no documento

    referente aos atendimentos na sade, no mbito das aes socioeducativas:

    [...] consistem em orientaes reflexivas e socializao de informaes realizadas

    por meio de abordagens individuais, grupais ou coletivas ao usurio, famlia e

    populao de determinada rea programtica. (BRASIL, CFESS, Parmetros para a

    atuao de Assistentes Sociais na Poltica de Sade, 2010:54 Grifo Nosso)

    A Abordagem com Grupo tambm poderia ser reconhecida no documento destinado

    aos parmetros para a atuao do assistente social na Poltica de Assistncia Social. Pois as

    competncias especficas do profissional de Servio Social possuem diversas dimenses, entre

    elas encontra-se a dimenso de:

    [...] gerenciamento, planejamento e execuo direta de bens e servios a indivduos,

    famlias, grupos e coletividade, na perspectiva de fortalecimento da gesto

    democrtica e participativa capaz de produzir, intersetorial e interdisciplinarmente,

    propostas que viabilizem e potencializem a gesto em favor dos(as) cidados(s)

    (BRASIL, CFESS, Parmetros para atuao de assistentes sociais e psiclogos na

    Poltica de Assistncia Social, 2011:20 Grifo Nosso)

    Voltando as fases da pesquisa qualitativa: quanto terceira e ltima fase tem-se aquela

    relativa anlise dos dados coletados. Foi nessa fase que a categorizao das respostas

    obtidas foi realizada, de modo que fosse possvel captar, por meio das anlises dos dados, as

    percepes e as opinies dos entrevistados acerca do tema. Evidentemente, a linguagem no

    verbal e outras reaes do entrevistado foram consideradas na anlise dos dados.

    Por fim, vale ressaltar que para a realizao das entrevistas foi imprescindvel a leitura

    e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), em anexo, que foi lido

    para as entrevistadas antes de se iniciar as entrevistas. O documento explicitava a temtica do

    projeto e seus objetivos; alm disso, explicitava tambm que a entrevista seria gravada, que

    poderia ser interrompida a qualquer instante e que o processo era sigiloso. Existia no referido

  • 19

    termo um campo para preenchimento do contato eletrnico da entrevistada, para o

    encaminhamento do resultado final da pesquisa.

    Esse trabalho est dividido em trs captulos. O primeiro pretende discorrer acerca dos

    instrumentos e tcnicas no Servio Social brasileiro, compreendendo da gnese da profisso

    ao exerccio profissional nos dias atuais.

    O objetivo do segundo captulo discutir especificamente sobre a Abordagem com

    Grupo, apresentando a sua estruturao na dcada de 60 e 70 do sculo XX e nos dias atuais.

    J o terceiro e ltimo captulo se direcionar para a anlise dos dados coletados por

    meio de entrevista semiestruturada e buscar trazer subsdios com vistas a responder questo

    da pesquisa.

  • 20

    Captulo I

    Instrumentos e Tcnicas no Servio Social brasileiro: da gnese da profisso

    ao exerccio profissional nos dias atuais

    Como explicado anteriormente, privilegiou-se aqui possibilitar a reflexo sobre os

    Instrumentos e as Tcnicas utilizadas na Interveno do Servio Social, desde a sua aplicao

    nas primeiras escolas9 de Servio Social em territrio brasileiro aos embates acerca do assunto

    nos dias atuais.

    Para tanto, ser feito uma breve retomada histrica da profisso, com o intuito de

    conhecer como o Servio Social foi implementado no Brasil, e quais os argumentos

    apresentados no processo de rediscusso profissional, que teve como marco o Movimento de

    Reconceituao.

    Ademais, verifica-se a necessidade de uma aproximao definio de

    instrumentalidade, por meio de uma breve apresentao deste conceito, e buscando diferenci-

    la tanto dos instrumentos quanto das tcnicas; contudo, ao mesmo tempo, apontando a relao

    existente entre essas duas categorias.

    Por fim, apresenta-se uma breve reflexo sobre os instrumentos e as tcnicas a partir

    da polmica existente na relao teoria e prtica profissional.

    1.1. Os instrumentos e tcnicas e as primeiras escolas de Servio Social

    no contexto brasileiro

    O resgate histrico, abrangendo a teoria e a metodologia do Servio Social, colabora

    para a compreenso de pontos que motivaram a instaurao do Movimento de Reconceituao

    e aponta a relao existente entre a profisso e a religio catlica em seus primrdios no

    territrio nacional. Refletir acerca do Movimento de Reconceituao profissional pode

    colaborar, em certa medida, para o entendimento da configurao da profisso nos dias atuais

    e para a compreenso de como se configuravam os instrumentos e as tcnicas dentro do

    Servio Social nos primrdios da profisso.

    A profisso, em seus primrdios, se relacionava com os valores cristos, na medida em

    que o objetivo da interveno do Servio Social possua relao ntima com os dogmas da

    9 Segundo Manuel Castro a primeira escolar de Servio Social brasileira data de 1937.

  • 21

    Igreja Catlica (BRANDO, 2007). Essa relao entre a Igreja Catlica e o Servio Social se

    deve a maneira de como a profisso se estabeleceu no Brasil.

    Sendo assim, importante pontuar historicamente que no comeo do sculo XX, com

    a estruturao do Capitalismo Monopolista10

    , a Questo Social se intensificou, e isso

    propiciou a revolta de trabalhadores e fortaleceu a luta destes por conquistas sociais e

    trabalhistas, devido s desigualdades provenientes da referida Questo Social. Nesse mesmo

    perodo a Igreja Catlica buscava uma forma de se fortalecer no pas enquanto influente

    instituio e para isso passou ento a buscar uma forma de enfrentar as expresses da Questo

    Social.

    Na dcada de 30 do mesmo sculo criado o Centro de Estudos e Ao Social

    (CEAS) que, pautado nos preceitos cristos, visava formar seus membros de acordo com a

    doutrina catlica (SANTOS, 2006). Em meados da mesma dcada, foram criadas as primeiras

    escolas de Servio Social, que se estabeleciam seguindo os princpios religiosos do CEAS e

    que formaram as primeiras turmas de assistentes sociais, anteriormente compostas

    fundamentalmente por mulheres.

    A ao profissional pautada nos valores cristos tinha como referencial terico, que

    respaldava a sua interveno, o funcionalismo (BRANDO, 2007). Este pode ser entendido

    como proveniente das Cincias Sociais, um ideal de organizao social que atribui a cada elemento

    da sociedade uma funo que deve ser cumprida, na medida que o no cumprimento acarreta, na

    perspectiva desse sistema, uma desordem social.

    Seguindo, ento, uma perspectiva que trabalhava na ideia de que os indivduos que

    no agissem de acordo com os papis impostos a eles, precisariam ser orientados e auxiliados

    para que pudessem voltar a atuar como o esperado, para o estabelecimento da ordem social

    (BRANDO, 2007). Seguindo essa lgica, o assistente social atuava de maneira a induzir ao

    individuo uma compreenso de que ele o responsvel pela sua condio social e que

    depende da sua fora de vontade, de suas atitudes, da sua moral e de sua f, para que sua

    realidade possa ser transformada.

    No decorrer da consolidao da profisso, a categoria passou a questionar esse tipo de

    interveno e a refletir sobre suas atribuies e a maneira que sua interveno estava

    10

    Estgio do Capitalismo onde a concentrao de renda mais evidenciada, proveniente de unio de empresas

    e/ou a utilizao de cartel (NETTO, 2005). Com essa configurao, possvel afirmar que a desigualdade social

    e os seus reflexos aumentaram.

  • 22

    configurada. Muitas crticas passaram a se fortificar o que favoreceu com que o Movimento

    de Reconceituao do Servio Social acontecesse.

    Para alm da profunda relao existente entre os dogmas da Igreja Catlica e a gnese

    da profisso em territrio nacional, outro ponto crucial para a compreenso do Movimento de

    Reconceituao do Servio Social entender quais eram as teorias que embasavam a

    interveno profissional, para alm do funcionalismo previamente citado. Netto (2005) pontua

    que a cientificidade do Servio Social estava fundamentada, alm da sociologia, na

    psicologia. A psicologia como fundamentao terica possibilitou o direcionamento do

    assistente social s prtica que so atribudas aos psiclogos. J o que diz respeito sociologia

    estava relacionado maneira generalista de se observar a sociedade e de se reconhecer as

    expresses da Questo Social como pessoais, naturais e justificveis, validando a existncia e

    a manuteno da burguesia.

    Alm disso, tendo como base terica a psicologia acadmica o atendimento ao usurio

    tambm trazia uma perspectiva de capacit-lo para a resoluo de suas prprias demandas,

    como j foi mencionado. Ou seja, o usurio como responsvel por sua condio psicossocial e

    por super-las dentro de seus prprios potenciais de resoluo. Nesse sentido possvel notar

    que a atuao do assistente social era enxergada como um meio de auxlio, onde o

    profissional atribua ao seu usurio as condies necessrias para a resoluo de sua prpria

    demanda.

    A metodologia, durante a gnese do Servio Social no Brasil, foi concebida de modo a

    corresponder s influncias europeias, que estavam intimamente ligadas s tentativas de se

    recristianizar a sociedade. Dessa forma, a tcnica deveria corresponder s doutrinas religiosas.

    Devido a essa formatao ideolgica, as tcnicas voltadas para a atuao do assistente social

    estavam submetidas aos dogmas cristos e, por isso, eram levadas de forma a valoriz-los e

    promov-los. Ou seja, como bem explicita Santos ao citar Reis11

    : (1998, p.84 citado por

    SANTOS, 2006, p.32): era empregado o mtodo da Ao Catlica: ver, julgar e agir. Assim

    possvel comprovar que no existia instrumentao tcnica especfica e sistematizada nos

    primrdios da profisso no pas. Nesse sentido as tcnicas utilizadas eram planejadas

    pontualmente de modo a reproduzir a moral religiosa.

    11

    REIS, V. T. Moura. Ensino do Instrumental Tcnico de Interveno em Servio Social: explorando

    possibilidades. Dissertao de Mestrado. PUC/SP, 1998.

  • 23

    A reproduo dos valores religiosos se dava pela formao das primeiras escolas de

    Servio Social no pas, pois a preocupao com a promoo e manuteno da moral crist

    facilmente explicitada ao pontuar as disciplinas ministradas, tais como: Doutrina Social da

    Igreja, Moral e Religio (SANTOS, 2006). Matrias como essas, a propsito, foram

    fundamentais para a oposio ao tecnicismo, e isso propiciou outra crtica do Movimento de

    Reconceituao do Servio Social, o estudo sobre as tcnicas e os instrumentos na profisso.

    Outro motivador para a estruturao do Movimento de Reconceituao est ligado ao

    desenvolvimento do Capitalismo Monopolista e a ampliao da desigualdade social, j em

    meados do sculo XX, quando os movimentos sociais passaram a se formar e lutar de forma

    mais organizada por seus direitos. Questes econmicas continuaram em pauta, mas

    movimentos especficos, como o de negros e de mulheres, passaram a lutar por direitos dessa

    parcela da populao, isso sem citar as lutas pelo direito educao, ao lazer e at defesa do

    ecossistema, por exemplo. E, apesar dos diferentes interesses, todos esses movimentos, em

    suas mais diversas expresses, negavam a ordem burguesa e os seus mais variados reflexos

    (NETTO, 2005).

    Essa organizao social, que passou a demonstrar uma conscincia coletiva mais

    crtica a respeito da realidade em que se encontrava a sociedade e que no se limitou ao

    territrio brasileiro, colaborou para a crise da ordem capitalista, o que favoreceu a

    compreenso de se repensar a profisso, agora com uma preocupao mais acentuada de

    possibilitar um rompimento com o subdesenvolvimento e enfrentar adequadamente as

    expresses da Questo Social (NETTO, 2005).

    O Movimento de Reconceituao trouxe a tona novas percepes acerca das

    atividades dos assistentes sociais e propiciou o debate sobre a tcnica e o mtodo, que

    anteriormente no era sistematizado, visto, inclusive, a prpria ausncia de literatura sobre o

    assunto (GUERRA, 1995). Contudo, se fez necessria essa sistematizao para poder

    delimitar qual o papel do assistente social e quais as formas que o mesmo tem para realizar

    suas atribuies.

    Contudo, mesmo o Movimento de Reconceituao da profisso instituindo uma nova

    forma de se pensar o Servio Social, as suas mais diversas questes no eram compreendidas

    com unanimidade. A dialtica marxista, por exemplo, teoria utilizada por muitos assistentes

    sociais para a organizao do Movimento de Reconceituao, no consistia em uma teoria

    abraada por todos os profissionais (FALEIROS, 2005). Entretanto a atribuio de ajuda e a

  • 24

    reproduo de morais religiosas foram questionadas por vrios profissionais, dos marxistas

    aos no-marxistas.

    Assim sendo, pode-se observar que o assistente social pr-Movimento de

    Reconceituao intervia de maneira desarticulada com teorias crticas e reproduzia conceitos

    religiosos e de caridade, e a interveno no se diferenciava dessa perspectiva. Contudo, o

    profissional ps-Movimento de Reconceituao passou a atuar de maneira a articular as

    polticas existentes para que os direitos de seus usurios fossem efetivados, alm de convid-

    los a pensar de forma mais crtica acerca do sistema vigente, de suas contradies e das

    expresses provenientes da Questo Social. Alm disso, buscou sistematizar, uma conduta

    tcnica e instrumentalizada, na tentativa de melhor atender s demandas apresentadas.

    1.2. A Instrumentalidade no Servio Social

    Uma discusso acerca dos instrumentos e das tcnicas do Servio Social abrange

    tambm a compreenso da categoria instrumentalidade. Em seu artigo, Guerra (2007) busca

    refletir em que consiste a instrumentalidade no Servio Social e no exerccio profissional de

    assistentes sociais e a define como a capacidade e a propriedade da profisso.

    A instrumentalidade no Servio Social elemento constitutivo para as transformaes

    alcanadas durante a interveno profissional.

    Ao alterarem o cotidiano profissional e o cotidiano das classes sociais que

    demandam a sua interveno, modificando as condies, os meios e os instrumentos

    existentes, e os convertendo em condies, meios e instrumentos para o alcance dos

    objetivos profissionais, os assistentes sociais esto dando instrumentalidade s suas

    aes. Na medida em que os profissionais utilizam, criam, adquam s condies

    existentes, transformando-as em meios/instrumentos para a objetivao das

    intencionalidades, suas aes so portadores de instrumentalidade. (GUERRA,

    2007: 02)

    Ao afirmar que a instrumentalidade imprescindvel no trabalho, visto que ,

    resumidamente, a sua propriedade e considerando o trabalho como a transformao, seja do

    meio, do indivduo ou de objetos, proveniente de uma relao entre teleologia (ou prvia

    ideao)12

    e objetivao13

    (LESSA, 1999), perceptvel a existncia de uma correlao entre

    essas categorias e a instrumentalidade. Nessa perspectiva:

    12

    A construo, na conscincia, do resultado provvel de uma determinada ao (LESSA, 1999:22)

  • 25

    Toda postura teleolgica encerra instrumentalidade, o que possibilita ao homem

    manipular e modificar as coisas a fim de atribuir-lhes propriedades verdadeiramente

    humanas, no intuito de converterem-nas em instrumentos/meios para o alcance de

    suas finalidades. (GUERRA, 2007:03)

    Em uma relao entre a teleologia e a instrumentalidade, pode-se fazer a analogia de

    que a prvia ideao consiste no planejamento em se modificar algo, contudo a

    instrumentalidade, caracterizada como conhecimento e propriedade da profisso, que

    possibilita a efetivao dessa transformao (GUERRA, 2007).

    A instrumentalidade tambm compreendida como uma mediao que possibilita uma

    interveno profissional de qualidade, que consiste na que perpassa os critrios instrumentais,

    que muitas vezes confundido com a prpria instrumentalidade, e abarca tambm conceitos

    crticos e ticos (GUERRA, 2007). Ou seja, nessa perspectiva de mediao, a

    instrumentalidade possibilita que o Servio Social se constitua na unio de alguns eixos da

    profisso: tico-poltico, terico-intelectual, tcnico-instrumental e formativo. (GUERRA,

    2007, apud GUERRA, 1997).

    Guerra (2007) tambm situa a instrumentalidade como um campo de mediaes que

    possibilita uma relao entre esses eixos de modo crtico, o que colabora para uma articulao

    na perspectiva de se criar novos meios e instrumentos para responder as demandas postas

    profisso.

    A instrumentalidade tambm campo de mediao da cultura profissional. Cultura

    esta desenvolvida cotidianamente pelos profissionais por meio de suas aes, seus valores,

    princpios, posicionamentos polticos, projetos profissionais entre outras categorias. Alm

    disso, a fundamentao profissional tambm est em contedos provenientes das cincias

    sociais e da tradio marxista (GUERRA, 2007). A mediao entre todos esses eixos

    possibilita que o profissional atenda s demandas que lhe so apresentadas com uma

    perspectiva mais crtica acerca da consolidao societria e de sua presente realidade, no se

    pautando apenas no escopo das tcnicas e dos instrumentos profissionais. Nesse sentido [...]

    [...] a cultura profissional incorpora contedos terico-crticos projetivos. Pela

    mediao da cultura profissional, o assistente social pode negar a ao puramente

    instrumental, imediata, espontnea e reelabor-la em nvel de respostas

    socioprofissionais. (GUERRA, 2007:14).

    13

    A transformao do que foi previamente idealizado em um objeto pertencente realidade externa ao sujeito.

    Transformao da realidade no sentido da prvia ideao (LESSA, 1999:22)

  • 26

    Como bem ponderado no primeiro tpico deste captulo, o Servio Social surge com

    auxlio da igreja catlica, agindo de modo caritativo e perpetuando valores cristos, tambm

    na tentativa de responder s consequncias provenientes do capitalismo monopolista. Partindo

    desse princpio e compreendendo que as polticas sociais desenvolvidas pelo Estado, oriundas

    de lutas sociais que visam melhor condio socioeconmica para os trabalhadores, propiciam

    campo profissional para assistentes sociais, importante ressaltar que essas polticas visam

    atender demandas especficas e por isso servem tambm de instrumento para manuteno da

    ordem capitalista (GUERRA, 2007).

    Guerra (2007) ainda apresenta a instrumentalidade, seguindo a perspectiva das

    polticas sociais servindo aos interesses do projeto burgus, ao posicionar o profissional como

    um instrumento para simplesmente atuar atendendo s demandas especficas que lhe so

    apresentadas, impossibilitando uma reflexo acerca de toda a estrutura social em que seus

    usurios vivem. Contudo tambm reconhece que as polticas sociais, alm de reproduzir a

    fora de trabalho, o resultado das lutas de classes.

    Dentro da perspectiva supracitada que se estabelece uma compreenso, pautada em

    um conceito individualizante, que as demandas postas so problemas particulares e no

    provenientes de uma realidade mais ampla.

    Buscar se desprender da suas origens histricas e trazer interveno profissional uma

    conduta em que no se fixe apenas no eixo instrumental-tcnico, buscando afirmar as suas

    legitimidades, diferenciando dos primrdios profissionais enriquece a instrumentalidade

    profissional, no a limitando instrumentao tcnica (GUERRA, 2007). Entretanto, a

    limitao dos instrumentos no diminui a sua importncia nas intervenes dos profissionais

    do Servio Social, essa categoria s deve ser articulada com as demais, constituindo a

    instrumentalidade: a propriedade constitutiva da profisso, que abarca suas demandas,

    objetivos, atribuies, conhecimento terico entre outras categorias.

    1.3. Prtica e Teoria: A relao com os instrumentos

    Os instrumentos e as tcnicas so elementos fundamentais na prtica profissional do

    assistente social. Contudo, convm ressaltar tambm que, no que se refere a pratica

    profissional, diversas so as discusses acerca do tema. Nesta monografia ressaltar-se- a

    ttulo de ilustrao a discusso da prtica no exerccio profissional a partir de um

  • 27

    questionamento na categoria que se refere Teoria e a Prtica do Servio Social, discutida por

    Santos (2006).

    Como bem ponderado anteriormente, a atuao do profissional de Servio Social Ps

    Movimento de Reconceituao firmou-se de maneira a questionar as realidades apresentadas

    de maneira crtica, visando, alm de atender aos direitos sociais de seus usurios, refletir as

    maneiras de se desconstruir as condies que os colocam em situao de pobreza e

    desigualdade social.

    Partindo desse princpio, onde a prtica do assistente social tambm estabelecida de

    forma a enfrentar objetivamente as realidades postas, a categoria profissional apresentou a

    seguinte questo: Na prtica profissional a teoria outra?

    Netto (1999) afirma que o Servio Social uma profisso e no uma cincia, alm de

    no dispor de teorias prprias, questes essas que levantam outro famigerado debate entre os

    estudiosos da categoria. Contudo pondera tambm que isso no impede que os profissionais

    faam estudos, pesquisas e investigaes.

    Sendo assim o Servio Social se estrutura como uma profisso que produz

    conhecimento, mesmo que a priori conte com as bagagens tericas de outras reas do saber.

    Reafirma a consolidao de uma atuao mais crtica Ps Reconceituao, confirmando que o

    assistente social deixou de atuar de maneira a reproduzir as estruturas do modelo estabelecido

    e passou a question-lo durante essa atuao. Alm disso, Netto (2006) tambm pontua que

    foi o marxismo a vertente terica que propiciou uma reflexo mais crtica acerca da ocupao

    da profisso na sociedade.

    Santos (2006) faz uma anlise sobre a relao existente entre a prtica e a teoria. Ela

    dispe essas categorias da seguinte maneira:

    O mbito da prtica , ento, o da efetividade da ao sobre o mundo, que tem por

    resultado uma transformao real desse mundo. atual, no potencial, ou seja, o que

    pode ocorrer ou fazer aqui e agora, culminando na transformao de uma matria-

    prima num produto natural e/ou social (SANTOS, 2006:137).

    Ela complementa afirmando que a prtica

    determina at onde pode se desenvolver o conhecimento, visto estar ele associado s

    necessidades materiais, produtivas, prticas do homem social. a prtica que

    oferece as formaes econmico-sociais que, por sua vez, esto diretamente ligadas

    ao tipo de produo e tcnica necessrias a essa formao. (idem, ibidem).

    A prtica compreendida, ento, como a categoria que efetiva o que foi idealizado

    pelo conhecimento, saindo de uma perspectiva intelectual e abrangendo o concreto. Alm

  • 28

    disso, a prtica se relaciona com a realidade possibilitando uma ampliao desse

    conhecimento previamente construdo.

    J sobre a teoria, Santos disserta que o mbito da teoria

    se circunscreve em propiciar o conhecimento da realidade que objeto da

    transformao; o conhecimento dos meios e de sua utilizao com os quais se

    efetiva essa transformao; o conhecimento da prtica acumulada em forma de

    teoria; a finalidade ou a antecipao dos resultados objetivos que se pretende atingir;

    e, no decorrer do processo prtico, um atendimento s necessidades que iro

    surgindo com a resistncia da matria a ser transformada, e que vai acarretando

    resultados imprevisveis. (SANTOS, 2006:139).

    A teoria ento o acmulo de conhecimentos sistematizados que visam uma

    transformao efetiva. Conhecimentos esses, muitas vezes, provenientes de prticas. Prticas,

    inclusive, que podem trazer respostas inesperadas pelo que j se tinha acumulado em

    conhecimento, mostrando a condio de constantes mutaes ao quais as teorias passam e a

    concreta relao existente entre as prticas e as teorias.

    Contudo, para refletir sobre essa questo importante relembrar que a teoria social de

    Marx a teoria crtica utilizada pela categoria profissional mais difundida e aceita na

    contemporaneidade. Tendo esse pressuposto, e levando em considerao que a teoria marxista

    enxerga que o princpio de uma organizao social mais justa, visando a equidade social, s

    ser possvel a partir da ruptura com o sistema capitalista vigente, alcanada por meio de

    participao popular e trabalhista, possvel enxergar onde se encontra o dilema existente que

    faz parecer que existe uma dissociao entre a teoria profissional e sua prtica.

    Uma situao que facilita essa compreenso de dissociao da teoria com a prtica o

    fato de a interveno do profissional tambm estar vinculada aos interesses da instituio na

    qual ele est inserido (IAMAMOTO, 2004), o que facilita reconhecer que o assistente social,

    na sua prtica profissional, se encontrar cercado por limites institucionais que o dificultar de

    exercer a sua funo da forma mais plena possvel. Isso reala o fato do Servio Social

    trabalhar em um terreno de constantes contradies, onde o profissional se v limitado a

    exercer suas atribuies pelo simples fato de no ter apoio institucional, seja por razes

    ideolgicas da instituio ou at mesmo por questes relacionadas s condies de trabalho.

    Entretanto, mesmo partindo do pressuposto dos limites impostos atuao dos

    profissionais de Servio Social, vlido reconhecer que mesmo que a prtica no alcance a

    revoluo propriamente dita, ela ainda assim interventiva, educativa e provocativa,

  • 29

    possibilitando assim uma reproduo de ideais que multiplique a conscincia revolucionria

    em seus usurios, trazendo uma viso crtica e contrria ordem capitalista (SANTOS, 2006).

    Como bem ponderado no tpico anterior, as polticas sociais, mesmo dentro da lgica

    de conquista das lutas dos movimentos sociais, so instrumentos de controle do Estado, para

    fragmentar as demandas das classes trabalhadoras. Para isso o Estado utiliza o assistente

    social como instrumento para atender demandas especficas (GUERRA, 2007). Essa lgica se

    relaciona ao fato de alguns profissionais de Servio Social intervirem de maneira a associar a

    profisso apenas a essas polticas e aos instrumentos encontrados para atender as demandas

    fragmentadas. Seguindo essa compreenso, possvel encontrar uma disparidade entre as

    funes polticas da profisso, pautadas no marxismo, e a prtica profissional, contudo, essa

    compreenso no segue uma lgica de totalidade na categoria, o que possibilita que outros

    profissionais do Servio Social se portem de maneira crtica e busquem articular os

    necessrios instrumentos no cotidiano profissional a uma postura crtica, poltica e

    emancipatria.

    Seguindo essa compreenso, os instrumentos podem ser utilizados de maneira a

    atender aos interesses do projeto burgus, associando a interveno do assistente social ao

    acesso aos direitos sociais, contudo no direcionando essa mesma interveno a uma

    ampliao desses direitos e busca de uma emancipao verdadeiramente efetivada. Vale

    ponderar que o profissional, se bem articulado, pode perpassar essa perspectiva e intervir de

    maneira crtica e comprometida com as regulamentaes da profisso, buscando atender s

    variadas expresses da questo social de forma a compreender o que as levaram a se

    apresentar.

    Levando todas essas questes em considerao, interessante ponderar que a teoria e a

    prtica so categorias complementares. Contudo, quando no h resposta direta na prtica,

    pautada na teoria, reflexo dos limites postos para a atuao do assistente social, que est

    enquadrado em uma lgica de profissional assalariado inserido em uma realidade de

    submisso s instituies nas quais intervm e/ou que no articulam sua interveno

    profissional s posturas crticas propostas pela profisso.

    Compreende-se, ento, que a utilizao de instrumentos isoladamente no compreende

    uma interveno de qualidade, contudo, ao associ-lo aos eixo tico-poltico e terico-

    intelectual e formativo, eixos que em unio compreendem a constituio no Servio Social

  • 30

    (GUERRA, 2007), a interveno passa a ser compreendida como crtica, qualificada e

    questionadora.

  • 31

    Captulo II

    Abordagem com Grupo e Servio Social: alguns apontamentos tericos.

    O segundo captulo desta monografia visa refletir acerca da Abordagem com Grupos

    no Servio Social, na tentativa de buscar compreender os limites e as possibilidades dessa

    tcnica no mbito do Servio Social especialmente no perodo imediatamente ps-Movimento

    de Reconceituao e na contemporaneidade.

    Para atender a essa proposta, o captulo foi dividido da seguinte maneira: O primeiro

    momento se direciona para alguns apontamentos acerca da compreenso dessa tcnica com

    grupos entre as dcadas de 60 e 70.

    O segundo tpico deste captulo pretende apresentar uma curta pesquisa bibliogrfica

    realizada em artigos publicados em peridicos oficialmente reconhecidos que, em alguma

    medida, apresentem dados dessa tcnica no mbito do Servio Social. Esse levantamento

    bibliogrfico visa conhecer a frequncia e de que maneira este instrumental abordado nas

    publicaes cientficas.

    J o terceiro tpico deste captulo faz o mapeamento de artigos e pargrafos de

    documentos legais do Servio Social que abordem sobre a temtica de interveno em grupo

    ou grupais, Abordagem com Grupo, na tentativa de se conhecer o que aparece sobre o assunto

    nos documentos oficiais da categoria.

    2.1. As intervenes com Grupos nos primrdios da profisso no Brasil: alguns

    apontamentos

    Para intervir com qualquer instrumento e/ou tcnica, necessrio averiguar se o

    mesmo corresponde s demandas da profisso. Por isso, ainda na dcada de 70 do sculo XX,

    Gelba Cavalcante, professora aposentada da Universidade Federal do Rio de Janeiro, fez um

    extenso levantamento sobre as obras, em lngua portuguesa e espanhola, que dissertavam

    sobre as tcnicas com grupos utilizadas naquela poca. Buscou, a partir desse resgate

    bibliogrfico, ver como elas se estruturavam e se existia um consenso entre autores. Para isso

    ela levantou os nove livros sobre a temtica que eram mais difundidos e os analisou, buscando

    uma coeso entre as tcnicas apresentadas. Tambm foram selecionados sete artigos de dois

    diferentes peridicos para essa mesma anlise. Os quadros abaixo mostram os livros

  • 32

    encontrados pela referida professora, alm dos artigos e os seus respectivos peridicos e

    autores.

    Quadro 01. Autores e livros analisados por Gelba Cavalcante

    Autores Livros

    BERNSTEIN, Saul Sondagens em Servio Social de Grupo

    KISNERMAN, Natlio Servio Social de Grupo: uma resposta ao nosso tempo

    KLEIN, Alan Servio Social atravs do processo de grupo

    KONOPKA, Gisela Servio Social de Grupo, um processo de ajuda

    NORTHEN, Helen Servio Social de Grupo

    OLIVEIRA, Rene Dupont Servicio Social El mtodo decisivo em La realidad latino-americana

    TORRES, Zlia Grupos Instrumento de Servio Social

    WILSON, Gertrude

    RYLAND, Gladys

    Prtica do Servio Social de Grupo: uso criador do Servio Social

    Fonte CAVALCANTE (1979:52)

    Quadro 02. Autores, artigos e peridicos analisados por Gelba Cavalcante.

    Autores Artigos Peridicos

    BRAGA,

    Arlette Viso atualizada do Servio Social de Grupo

    Debates

    Sociais

    BRIAR,

    Scott Roteiro de discusso de Servio Social de Grupo

    Debates

    Sociais

    DIOMEDE,

    Marilena

    Abordagens de Grupo e das tcnicas de tratamento de Servio Social de

    Grupo CBCISS

    14

    GRAVIN,

    Charles

    Servio Social de Grupo: Trs modelos metodolgicos - Modelo

    Desenvolvimentista, Modelo Interacionista, Modelo Preventivo e Reabilitador CBCISS

    GUIMARES,

    Edeltrudes Servio Social de Grupo CBCISS

    MOTTA,

    Edith

    Magalhes

    Diagnstico e Interveno a nvel de prestao de servios a grupos CBCISS

    PETIZ,

    Maria Lucia Algumas colocaes sobre Servio Social e Desenvolvimento de Comunidade CBCISS

    Fonte CAVALCANTE (1979:53).

    14

    Centro Brasileiro de Cooperao e Intercmbio de Servios Sociais

  • 33

    Um dos resultados encontrados foi a de que, em geral, os grupos refletiam diversas

    realidades individuais, caminhando por um contexto que abarcava as questes psicossociais

    usando a psicologia e a sociologia como reas do saber (CAVALCANTE, 1979).

    Cavalcante (1979) sinalizou que para os autores analisados, no que diz respeito

    transformao e a formao de conscincia, a categoria transformao no atribuda ao

    trabalho do assistente social e que a formao de conscincia se d de forma individual, por

    mais que o grupo participe como um todo no processo.

    Oliveira (1969), de acordo com Cavalcante, encarava diferente o papel do Servio

    Social de Grupo, pois associava ao assistente social uma funo de trazer ao usurio a

    reflexo sobre a sua realidade socioeconmica e faz-los, ento, desejarem mudar sua

    situao e buscarem alcanar essa nova condio. Ento a possibilidade de um crescimento

    econmico e reconhecimento social estavam relacionados s orientaes com objetivo de

    alterar a mentalidade dos usurios e provoc-los a mudar, mas no em uma perspectiva

    psicolgica e sim social. Afirma, ento, que Oliveira acreditava que o Servio Social de

    Grupo e o Desenvolvimento de Comunidade [...]

    [...] se converteriam em instrumentos essenciais de motivao e de educao social

    dos cidados e da populao que geralmente se encontra afastada dos centros

    culturais e rgos de deciso poltica. Esta educao social seria pois um exerccio

    de responsabilidade social bem como o desenvolvimento da conscincia social.

    (idem, ibidem. p. 66)

    Outro dado encontrado, agora em uma anlise que representa majoritariamente os

    demais autores pesquisados por Cavalcante, j fora da compreenso de Oliveira sobre o

    Servio Social com Grupos, o de que as demandas que surgem durante uma atividade com

    um grupo podem se apresentar de forma explcita ou permanecer latente durante a reunio,

    contudo mesmo quando essas demandas so respondidas elas no so relacionadas com

    questes estruturais da sociedade e nem com os reflexos de realidades histricas, mas sim

    perpassam, mais uma vez, por uma anlise mais individualizada ou restrita ao grupo que est

    em atividade, seguindo um vis psicolgico. (Cavalcante, 1979).

    Cavalcante (1979) aponta tambm que no encontrou, em algumas das obras

    pesquisadas, uma preocupao de seus autores, como o caso de Wilson (1961) e Konopka

    (1972), em estudar o que gerava as demandas dos grupos. Ou seja, a compreenso da

    realidade histrica e social no era reconhecida. Dessa maneira, subentende-se, segundo a

  • 34

    referida autora, que os indivduos e os seus problemas sociais eram vistos de forma isolada e

    suas demandas atendidas de maneira individual.

    A referente pesquisa tambm trouxe como dado que a atuao do assistente social visa

    a interao entre os membros do grupo de modo a possibilitar um desenvolvimento pessoal.

    Afirma tambm que os grupos funcionam como:

    [...] o meio pelo qual:

    - os indivduos alcanam satisfao pessoal e social;

    - as normas individuais e sociais so modificadas;

    - o controle social mantido;

    - a sociedade evolui em seus costumes, normas e valores. (CAVALCANTE,

    1979:73).

    Alm disso, Cavalcante (1979) pontua a questo do conflito em Bernstain (1977), que

    poderia trazer malefcios para o grupo, contudo, se bem administrado pelo profissional de

    Servio Social que conduzisse a reunio, poderia proporcionar, inclusive, um amadurecimento

    e uma unio entre os participantes da abordagem. E caso o conflito no pudesse ser

    solucionado, dentro da perspectiva de Helen Northen, pensar-se-ia em maneiras, inclusive, de

    se eliminar o participante que atuasse de forma a desorganizar o funcionamento da atividade.

    (CAVALCANTE, 1979). Ento ela observou que a atividade com grupo caminhava para uma

    abordagem funcionalista:

    [...] na qual o sistema deve funcionar com um grau mnimo de coerncia interna,

    sem permitir conflitos persistentes que venham a ameaar essa coerncia. Se a

    tendncia do sistema atingir o seu estado de equilbrio, pela sua prpria natureza

    no pode permitir que foras diversas, presses, tenses, conflitos fiquem agindo

    sobre ou dentro do sistema. (Cavalcante, 1979:70)

    Percorrendo essa perspectiva funcionalista, Cavalcante (1979) concluiu, depois de

    realizar a sua pesquisa, que cada membro do grupo tem seu papel, sua funo, que tende a

    contribuir para a estrutura desse mesmo grupo.

    Alm disso, concludo pela pesquisadora que os grupos no antepassado profissional

    e na perspectiva do Servio Social funcionam de modo a reproduzir as relaes existentes na

    sociedade. Assim sendo, o grupo possibilitaria uma melhor interao entre o indivduo e o

    meio em que vive.

    [...] a melhoria do funcionamento social, a integrao e adaptao dos indivduos ao

    seu meio constituem objetivos do Servio Social de Grupo. (...) o Servio Social de

    Grupo pretende o estabelecimento de relaes funcionais positivas e a correo das

    funes negativas ou disfunes. Como consequncia, contribui para: desenvolver e

    estimular as funes que servem manuteno da continuidade estrutural, bem

    como prevenir e atenuar conflitos, evitar o aparecimento de disfunes, corrigir

    comportamentos desviantes, que ameaam o equilbrio do sistema. Desta forma, o

  • 35

    Servio Social de Grupo situa-se na sociedade global como uma atividade

    recorrente, cuja funo se define pela contribuio que d reproduo do

    sistema como tal. (idem, ibidem:112. Grifo Nosso).

    Assim sendo, pode-se concluir que a Abordagem com Grupo nos primrdios da

    profisso caminha por uma perspectiva de ordem social funcionalista e de atendimento de

    demandas psicolgicas. Assim sendo, as tcnicas que trabalhavam com grupos, durante esse

    perodo (1960 e 70), no caminhavam para uma perspectiva que abarcasse as realidades dos

    usurios dentro de uma sociedade ou comunidade e nem a estrutura econmica, poltica e

    social em que estavam inseridos, encarando, ento, a demanda do usurio como proveniente

    de uma questo particular e individual. O que, dentro de uma viso atual sobre as intervenes

    dos assistentes sociais, no condiz com as atribuies profissionais da categoria. Para

    compreender melhor a estruturao desse instrumental na contemporaneidade, se faz

    necessrio realizar algum levantamento bibliogrfico para conhecer como o mesmo

    compreendido cientificamente e se o mesmo reproduz a compreenso levantada por

    Cavalcante.

    2.2. Bibliografia sobre Abordagem com Grupo: uma pesquisa preliminar

    Seguindo uma abordagem semelhante a de Cavalcante, foi feito um levantamento

    preliminar de artigos encontrados no portal da CAPES utilizando-se duas palavras-chave:

    Servio Social e Grupo. Ambos os termos foram utilizados entre aspas. O site foi acessado

    fora dos domnios da Universidade de Braslia, fazendo com que o seu contedo fosse restrito,

    na medida em que o acesso totalidade do acervo da base de dados deste portal integral

    apenas s universidades e a quem tem senha para acessar o contedo completo. Contudo,

    mesmo dentro dessa limitao, os artigos encontrados puderam responder, em alguma

    medida, como a Abordagem com Grupo vem sendo trabalhada a partir do que os artigos

    encontrados apontam no contexto cientfico e profissional na atualidade.

    Cabe ressaltar que um levantamento mais detalhado acerca do tema e envolvendo

    outras fontes de dados alm da CAPES; e/ou em outras lnguas (buscando bibliografia em

    outros pases) se faz urgente e necessrio. Contudo, em funo do tempo que seria necessrio

    para realizar tal pesquisa no foi possvel efetivar tal pesquisa no limitado tempo disponvel

    para a realizao dessa monografia. Nesse sentido, tal busca no foi realizada aqui, mesmo

  • 36

    porque esse no era o objetivo prioritrio de nosso trabalho monogrfico, como explicitado na

    introduo desse documento.

    A busca com as palavras-chave acima citadas rastreou 129 trabalhos cientficos. Foi

    realizada a leitura do resumo de todos e desse total, apenas 14 artigos e 01 dissertao se

    referiram a tentativa de posicionar o assistente social, em alguma medida, em uma

    interveno profissional que trabalhe com grupos.

    Para melhor compreenso de quais trabalhos acadmicos foram encontrados na

    pesquisa, um quadro com o ttulo de cada publicao, o nome e a origem do peridico, o ano

    de publicao, os autores e as palavras-chaves esto em anexo nesta monografia. Alm disso,

    todos esses artigos e a dissertao esto disponveis, em formato pdf, na internet e em um CD-

    ROM, tambm em anexo.

    Os 15 trabalhos selecionados so provenientes apenas de 04 revistas e de uma

    biblioteca virtual. A quantidade de artigos encontrado em cada uma, assim como a origem de

    cada peridico, est discriminada no quadro a seguir:

    Quadro 03 - Relao de revistas e biblioteca, suas origens e a quantidade de trabalhos

    acadmicos encontrados em cada uma delas.

    Revista / Biblioteca Quantidade. de

    Trabalhos

    Origem da

    Revista/Biblioteca

    Textos e Contextos 05 Rio Grande do Sul

    Cincia e Sade Coletiva 07 Rio de Janeiro

    Sade e Sociedade 01 So Paulo

    Psico 01 Rio Grande do Sul

    Biblioteca do Instituto Superior de Cincias Sociais e

    Polticas da Universidade de Lisboa 01 Portugal

    Fonte: Pesquisa parcial realizada no portal da CAPES (realizada entre dezembro de 2012 e fevereiro de 2013)

    Apesar de pontuar as revistas encontradas pelo portal da CAPES, vale esclarecer que

    no se pde tirar concluses gerais acerca dos peridicos, visto que a busca estava restrita, o

    que impede a previso da quantidade de artigos que seriam acessveis em outras revistas que

    no tinham acesso liberado. Por outro lado importante considerar que a pesquisa, mesmo

    no abrangendo todos os artigos que poderiam ser encontrados no portal da CAPES (uma vez

    que a busca foi restrita), pode ser avaliada como de acesso comum, na medida em que os

  • 37

    dados encontrados so os que esto disponveis para todo e qualquer pessoa interessada na

    temtica, independente de senha para acessar os artigos.

    Sobre a temtica dos artigos e da dissertao pertinente ressaltar que nenhum deles

    tem como tema central a Abordagem com Grupo, o que, em certa medida, mostra uma

    ausncia no estudo do instrumental e de suas especificidades.

    Com a ausncia de artigos que trabalhassem especificamente com o instrumental do

    Servio Social, a seleo dos 15 mencionados se deu na medida em que abordavam uma

    associao da interveno profissional do assistente social com algum grupo de usurios.

    Dos trabalhos selecionados a maioria apenas cita a existncia de assistentes sociais em

    uma equipe interprofissional ou comenta a necessidade de t-lo junto dessa equipe que atende

    a um grupo especfico de usurios.

    Vale ponderar que a questo do trabalho interdisciplinar foi tema encontrado em

    vrios dos outros 114 artigos que no foram escolhidos por no se enquadraram nos critrios

    de seleo: demarcar a participao do assistente social no grupo.

    As publicaes provenientes da revista Cincia e Sade Coletiva totalizam 07, como

    bem explicita o Quadro 01, e todos os seus artigos so relacionados rea da sade, como

    sugere o prprio nome do peridico. Alm disso, os trabalhos provenientes das revistas

    Sade e Sociedade e Psico e um dos artigos da Textos e Contextos tambm so

    centradas na mesma rea, a Sade, e a dissertao encontrada na Biblioteca do Instituto

    Superior de Cincias Sociais e Polticas da Universidade de Lisboa tambm traz questes

    relacionadas a sade como temas centrais.

    Nesse sentido, sendo que 11 dos 15 trabalhos acadmicos esto relacionados sade,

    pertinente supor que talvez a temtica de abordagem profissional com grupos vem sendo mais

    pesquisada no escopo da rea da sade.

    A ausncia de trabalhos que discutem especificamente sobre a Abordagem com Grupo

    suscita uma reflexo sobre a produo cientfica na rea, passando pela compreenso de que

    para a melhor utilizao de um instrumental, ou at mesmo para a sua desqualificao, se faz

    necessrio anlises profundas e cientficas para se atestar se o mesmo atende s atribuies do

    Servio Social ou se preciso ser revisto.

    Por fim, para ampliar o escopo da pesquisa do mbito da produo acadmica (que se

    apresentou bastante limitado) optou-se tambm por realizar uma anlise documental por meio

  • 38

    de busca no portal do Conselho Federal de Servio Social e assim mapear o que aparece nos

    documentos oficiais sobre a referida tcnica.

    2.3. Abordagem com Grupo e Arcabouo legal do Servio Social brasileiro:

    pontos para reflexo

    Por possuir conselhos profissionais, tanto na esfera federal quanto na estadual, o

    Servio Social organizado de modo a deter regulamentos que normatizam a atuao do

    profissional e que so estabelecidos e acordados pelos Conselhos. Partindo desse pressuposto

    e caminhando numa perspectiva que compreende, em alguma medida, a existncia de

    intervenes profissionais que atendam grupos e suas demandas, foi realizado um

    levantamento do arcabouo legal do Servio Social brasileiro na tentativa de conhecer se h e

    quais so os limites e as possibilidades da Abordagem com Grupo dentro da profisso (em seu

    mbito legal).

    Cabe relembrar que, embora as resolues e documentos do CFESS no definam a

    Abordagem com Grupo na acepo que est sendo empregada nesse trabalho, essas normas

    citam diversas dimenses do trabalho com grupos. Por isso cabe aqui analis-las como forma

    de elucidar o que as normativas trazem de compreenso sobre o trabalho com grupos.

    A hiptese desta monografia acredita que haja certa resistncia da categoria

    profissional Abordagem com Grupo e relaciona essa oposio com a Resoluo de nmero

    569, do dia 25 de maro de 2010, do Conselho Federal de Servio Social, que veda ao

    assistente social a realizao de prticas teraputicas em sua interveno profissional. Essa

    resistncia estaria pautada na associao da utilizao da Abordagem com Grupo aos

    procedimentos tcnicos e metodolgicos que resguardam os pressupostos dos primrdios da

    profisso. Pois, como bem pondera o primeiro tpico deste captulo, existia uma associao

    direta da Abordagem com Grupo com as teorias e os procedimentos metodolgicos prprios

    da Psicologia.

    Entretanto, interessante observar, que o documento acima citado (Resoluo n

    569/2010) no faz nenhuma associao direta e explicita do que ele denomina como prticas

    teraputicas Abordagem com Grupo. Ao contrrio, a referida resoluo, em verdade,

    preconiza e valida intervenes profissionais que atendam a mais de um usurio

    simultaneamente. Isso fica evidenciado nos Artigos 2 e 3:

  • 39

    Art. 2. Para fins dessa Resoluo consideram-se como terapias individuais, grupais

    e/ou comunitrias:

    a. Interveno profissional que visa a tratar problemas somticos, psquicos ou

    psicossomticos, suas causas e seus sintomas;

    b. Atividades profissionais e/ou clnicas com fins medicinais, curativos, psicolgicos

    e/ou psicanalticos que atuem sobre a psique.

    Art. 3. Fica vedado ao Assistente Social vincular ou associar ao ttulo de assistente

    social e/ou ao exerccio profissional as atividades definidas no artigo 2 desta

    Resoluo;

    Pargrafo primeiro O Assistente Social, em seu trabalho profissional com

    indivduos, grupos e/ou famlias, inclusive em equipe multidisciplinar ou

    interdisciplinar, dever ater-se s suas habilidades, competncias e atribuies

    privativas previstas na Lei 8662/93, que regulamenta a profisso de assistente social.

    Pargrafo segundo A presente Resoluo assegura a atuao profissional com

    indivduos, grupos, famlias e/ou comunidade, fundamentada nas competncias e

    atribuies estabelecidas na Lei 8662/93, nos princpios do Cdigo de tica do

    Assistente Social e nos fundamentos histricos, tericos e metodolgicos do Servio

    Social previstos na Resoluo CNE/CES/MEC n 15, de 13 de maro de 2002,

    garantindo o pluralismo no exerccio profissional. (BRASIL, CFESS, Resoluo n

    569, de 25 de maro de 2010. Grifo Nosso)

    Mesmo que o Artigo supracitado mencione o veto s atividades de cunho teraputico,

    ele assegura que o profissional de Servio Social pode trabalhar com grupos, na medida em

    que limite sua interveno s competncias da sua profisso. O que demonstra que a presente

    Resoluo no considera igual a Abordagem com Grupo (entendendo aqui apenas a acepo

    grupos) e as prticas com cunho teraputico.

    Alm da referida Resoluo, outros documentos legais legitimam as intervenes

    profissionais com grupos. o caso da Lei 8.662/93, citada na Resoluo 569/2010, que

    regulamenta a profisso de Assistente Social e menciona a Abordagem com Grupo de modo a

    autorizar a sua prtica15

    .

    Aps a Lei que regulamenta a profisso, a Lei de n 8.742, de 07 de dezembro de

    1993, foi aprovada e tinha como ementa a organizao da Assistncia Social no territrio

    brasileiro. No que diz respeito a organizao e gesto das aes na assistncia social, um

    artigo aponta a existncia de trabalhos realizados com grupos e a sua legalidade.

    Art. 6-D. As instalaes dos CRAS e dos CREAS devem ser compatveis com os

    servios neles ofertados, com espaos para trabalhos em grupo e ambientes

    especficos para recepo e atendimento reservado das famlias e indivduos,

    assegurada a acessibilidade s pessoas idosas e com deficincia. (BRASIL, Lei n

    8.742, de 07 de dezembro de 1993. Grifo Nosso).

    15

    O Artigo 4 desta lei trata das competncias do Assistente Social e foi previamente citado na introduo desta

    monografia. E, em alguma medida, legitima a Abordagem com Grupo na interveno profissional dos

    Assistentes Sociais.

  • 40

    Esse artigo foi includo na Lei mencionada pela Lei n 12.435, de 06 de Julho de 2011,

    que altera a anterior. Ou seja, o artigo 6-D no estava presente anteriormente na referida Lei.

    Em 05 de Setembro de 2001, o CFESS publicou a Resoluo de n 418 que aborda os

    honorrios do Servio Social, fixando o valor mnimo a ser cobrado, que servir de

    parmetro para prestao dos servios profissionais da (do) Assistente Social que trabalhe

    sem qualquer vnculo empregatcio, vnculo estatutrio ou de natureza assemelhada

    (BRASIL. CFESS, Resoluo n 418, de 05 de Setembro de 2001). Em suas disposies

    especficas, consta o seguinte artigo:

    Art. 10 - Os procedimentos alvo desta TRHSS (Tabela Referencial de Honorrios

    de Servio Social), dispostos a seguir, esto vinculados aos art. 4 e 5 da Lei

    8662/9316

    , cujos valores devem ser calculados conforme o pargrafo 3 do Artigo I

    desta Resoluo17

    ;

    01 Prestar orientao social, realizar visitas, identificar recursos e meios de acesso

    para atendimento ou defesa de direitos; encaminhar providncias junto a

    indivduos, grupos, segmentos populacionais (idem, ibidem).

    Alm de documentos formais que preconizam a utilizao de intervenes com grupos

    dentro do Servio Social, o CFESS tambm elaborou trs cartilhas que parametrizam a

    interveno do assistente social e legitimam a Abordagem com Grupo em trs reas de

    atuao: a Assistncia, a Sade e mais recentemente a Educao. Por terem sido elaboradas

    pelo Conselho Federal de Servio Social, essas cartilhas possuem carter legal e respondem

    bem s questes relacionadas interveno profissional.18

    A cartilha intitulada Parmetros para Atuao de Assistentes Sociais na Poltica de

    Sade foi a primeira da srie Trabalho e Projeto Profissional nas Polticas Sociais,

    publicada em 2010 e objetiva, portanto:

    Procura, nesse sentido, expressar a totalidade das aes que so desenvolvidas pelos

    assistentes sociais na sade, considerando a particularidade das aes desenvolvidas

    16

    O Artigo 5 desta lei trata das atribuies privativas do Assistente Social.

    17 Art. 1 - Instituir a Tabela Referencial de Honorrios de Servio Social TRHSS, com previso da hora

    tcnica, fixando o valor mnimo a ser cobrado, que servir de parmetro para prestao dos servios profissionais

    da (do) Assistente Social que trabalhe sem qualquer vnculo empregatcio, vnculo estatutrio ou de natureza

    assemelhada. (...)

    3 - O Profissional poder adotar a Hora Tcnica multiplicada pelo total de horas trabalhadas para calcular o

    valor do procedimento. (BRASIL. CFESS, Resoluo n 418, de 05 de Setembro de 2001)

    18 No Captulo III h uma retomada da discusso do tema Abordagem com Grupo apresentados nessas cartilhas

    que parametrizam a interveno do Assistente Social.

  • 41

    nos programas de sade, bem como na ateno bsica, mdia e alta complexidade

    em sade. (BRASIL, CFESS, Parmetros para Atuao de Assistentes Sociais na

    Poltica de Sade, 2010:12)

    E partindo desse objetivo, a publicao menciona a Abordagem com Grupo, ao se

    referir s aes socioeducativas quando afirma que

    [...] o profissional de Servio Social deve utilizar, segundo Vasconcelos (1993)19

    , a

    prtica reflexiva, que possibilita aos usurios a anlise e desvendamento das

    situaes vivenciadas por meio de reflexo crtica estimulada pelo assistente social,

    de forma que o usurio consiga captar, na medida do possvel, o movimento da

    realidade social e, consequentemente, participar, de forma consciente, do processo

    de transformao dessa realidade enquanto ser histrico. Esse processo deve

    priorizar a ateno coletiva, em grupo, o que possibilita a troca de experincia

    entre os sujeitos, a manifestao da fora que a organizao tem e da condio de

    classe dos sujeitos envolvidos. (idem, ibidem:56. Grifo Nosso)

    O trecho supracitado, alm de legitimar a interveno profissional por meio de

    processos que abarquem a Abordagem com Grupo, menciona uma especificidade desse

    instrumental, que a possibilidade de troca de experincias entre os prprios usurios, o que

    facilita um pensamento coletivo e fortalece e emancipa os sujeitos participantes.

    A cartilha destina