O SHIPPING, O AMBIENTE E A POLUIÇÃO ATMOSFÉRICA DA … · significativo do número de navios...

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O SHIPPING, O AMBIENTE E A POLUIÇÃO ATMOSFÉRICA DA COSTA PORTUGUESA. Jorge M. G. Antunes (Dr. Eng.º Marine Engineering) [email protected] 1. Introdução O Shipping encontrase, nos dias que correm, sujeito a um autêntico espartilho de regulamentos e condicionamentos de mercado, que estão a ditar o fim de muitos armadores. As razões que originam tais problemas advêm da relação tripartida: custo dos combustíveis, valor dos fretes, e eficiência energética e seu respetivo impacto ambiental. A velocidade a que a sociedade moderna tem acelerado as transações internacionais de mercadorias obriga a que mais e maiores navios sulquem os mares, com inerentes custos sobre a sustentabilidade de toda a atividade do Shipping, mas também com forte impacto na sustentabilidade do planeta. No entanto, e de momento, não existem alternativas ao transporte marítimo, pelo menos a médio prazo, sendo que aquelas razões apontadas resultam essencialmente da globalização e do deslocamento dos meios produtivos para os países asiáticos. Figura 1 Desafios do Shipping nos dias de hoje Com vista a responderem às diversas restrições, os principais armadores têm encomendado muitos e maiores navios, fazendo com que nunca como hoje a carteira de encomendas de navios novos tenha sido tão grande. Supostamente, maiores navios

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O SHIPPING, O AMBIENTE E A POLUIÇÃO ATMOSFÉRICA 

 DA COSTA PORTUGUESA.  

Jorge M. G. Antunes  

(Dr. Eng.º Marine Engineering) 

[email protected] 

 

1. Introdução  

O  Shipping  encontra‐se,  nos  dias  que  correm,  sujeito  a  um  autêntico  espartilho  de 

regulamentos  e  condicionamentos  de mercado,  que  estão  a  ditar  o  fim  de muitos 

armadores. As razões que originam tais problemas advêm da relação tripartida: custo 

dos  combustíveis,  valor  dos  fretes,  e  eficiência  energética  e  seu  respetivo  impacto 

ambiental.  A  velocidade  a  que  a  sociedade moderna  tem  acelerado  as  transações 

internacionais de mercadorias obriga a que mais e maiores navios sulquem os mares, 

com  inerentes custos  sobre a  sustentabilidade de  toda a atividade do Shipping, mas 

também com forte impacto na sustentabilidade do planeta.  

No  entanto,  e  de momento,  não  existem  alternativas  ao  transporte marítimo,  pelo 

menos a médio prazo, sendo que aquelas razões apontadas resultam essencialmente da 

globalização e do deslocamento dos meios produtivos para os países asiáticos. 

 

 

Figura 1 ‐ Desafios do Shipping nos dias de hoje 

Com  vista  a  responderem  às  diversas  restrições,  os  principais  armadores  têm 

encomendado muitos e maiores navios, fazendo com que nunca como hoje a carteira 

de encomendas de navios novos tenha sido tão grande. Supostamente, maiores navios 

têm  consumos  específicos,  por  unidade  de  carga  transportada,  mais  baixos.  Por 

consequência,  originarão  menores  emissões  por  unidade  de  carga  transportada 

(conforme  ilustrados  na  figura  2);  isto  não  contando  com  os  custos  ambientais  do 

desmantelamento e reciclagem dos navios existentes e da construção de novos.  

 

Figura 2 ‐ Um navio de 80 000 dwt requer 3,5 vezes menos energia por unidade de 

carga, para a mesma velocidade, quando comparado com um navio de 10 000 dwt (Fonte Wartsila). 

No entanto, como o consumo de bens continua a aumentar, prevê‐se um aumento 

significativo do número de navios até 2020.  

A necessária redução dos gases com efeito de estufa obriga a uma redução do consumo 

de energia e, por arrasto, aquela redução obriga ao necessário aumento da  inovação 

nas  várias  vertentes  da  engenharia  naval,  em  particular  na  área  da  propulsão.  Essa 

inovação deverá tratar sobretudo da integração de processos e conservação da energia, 

dado que cerca de 65 % da energia do combustível queimado é desperdiçada, quer para 

a atmosfera, quer para o mar. 

 

2. A localização geográfica de Portugal Continental e o Shipping 

Prevê‐se que o tráfego na costa portuguesa aumente até 2020, pois ao  longo da sua 

costa ocidental passam as principais rotas mercantes do mundo, conforme ilustrado na 

figura 3. 

 

Figura 3 ‐ Principais rotas de navegação do planeta e localização de Portugal. 

Portugal encontra‐se na confluência das principais rotas de e para a Europa, com um tráfego 

diário que oscila entre os 350 e os 400 navios. Tais números fazem da costa Portuguesa uma das 

costas mais frequentadas e congestionadas do mundo e, por consequência, uma das que maior 

poluição atmosférica apresenta. Veja‐se a figura 4, que mostra, a uma determinada data e hora, 

a quantidade de navios ao longo da costa sul e ocidental de Portugal.  

 

Figura 4 ‐ Marcação do tráfego de navios mercantes no mundo. Veja‐se na costa ocidental de 

Portugal. Pontos vermelhos são navios tanques; os verdes são outros navios de carga.  (Fonte Marinetraffic.com) 

 

3. As emissões gasosas originadas pelos navios. 

 

Figura 5 ‐ Emissão de partículas por um navio, provavelmente devida a uma combustão com 

falta de oxigénio ou má pulverização do combustível.  

 

O anexo VI é relativamente recente dentro da convenção MARPOL, e tem essencialmente como 

objetivo o controlo das emissões atmosféricas produzidas pelos navios, tais como emissões de 

CO2 e NOx, entre outras e, por consequência, a preocupação da racionalização da utilização da 

energia na atividade marítima. É genericamente aceite que uma má utilização da energia origina 

mais emissões de CO2, mas também de outras espécies poluentes, nomeadamente partículas, 

NOX e COV’s  (compostos orgânicos voláteis). Embora as emissões de poluentes atmosféricos 

estejam contempladas na Convenção MARPOL VI, só as emissões de NOX têm valores limite. No 

caso do SOx, o limite foi imposto ao teor máximo admissível de enxofre nos combustíveis, que 

deverá  ser  igual 1% até 2015  (dentro das áreas ECA),  sendo que depois de 2015 deverá  ser 

reduzido para 0,1%. A partir de 2020 esse limite passará a ser de 0,5% para as áreas não ECA, 

conforme ilustra a figura 6. Quanto ao valor de CO2, pensa‐se implementar um mecanismo do 

tipo já existente para a indústria terrestre, ou seja, um mercado de quotas de carbono aplicado 

ao Shipping. Quanto às partículas PM10 e PM2.5, nada se adianta em termos de limitação das 

mesmas.  

 

Figura 6 ‐ Escala temporal de implementação de acordo com a convenção MARPOL 73/78 

Anexo VI para os limites de emissão de SOx e de NOx. (Fonte MAN – IMO MARPOL) 

 

Nos dias de hoje, atendendo à  velocidade e quantidades de  carga que é necessário 

deslocar  de  um  ponto  para  o  outro  do  planeta,  o  Shipping  não  tem  opção  senão 

continuar a dispor de navios equipados com  instalações propulsoras de elevadíssimas 

potências, resultando por isso em três possíveis opções: combustível líquido, gás natural 

ou nuclear. Dado que a última solução, embora sem emissões atmosféricas, não reúne 

consenso  entre  os  projetistas,  o  Shipping  encontra‐se,  na  prática,  reduzido  às  duas 

primeiras  opções.  Assim,  continuando  a  queimar  combustível  líquido  residual, 

impreterivelmente ter‐se‐á que proceder à limpeza dos gases de escape dos motores e 

geradores  de  vapor,  através  de  scrubbers,  uma  vez  que  o  preço  dos  combustíveis 

destilados, tal como o gasóleo, se tornar incomportável1. Como consequência, originará 

uma  operação  economicamente  inviável,  dado  o  preço  a  que  hoje  o  mercado 

(fretadores) quer ou pode pagar os  fretes. Por outro  lado,  a  implementação de  gás 

natural  como  combustível naval ainda está  longe de  ser uma  realidade, pois não  se 

encontra  disponível  para  abastecimento  na  vasta  maioria  dos  portos  do  mundo. 

Contudo, a utilização de gás natural também não está isenta de problemas ambientais 

devido às  inúmeras descargas de gás para atmosfera  (o gás natural  tem  tipicamente 

80%, ou mais, de metano), particularmente em manobras. A solução poderá passar pela 

obrigatoriedade da  instalação de oxidadores catalíticos  (vulgarmente conhecidos por 

catalisadores), que oxidam aquelas quantidades de gás que passa para o  sistema de 

                                                            1 preços médios actuais US$600/Ton HFO (Heavy Fuel Oil) e US$1000/Ton de GO (Gasoil) 

evacuação sem ser queimada, transformando‐as em CO2. Devido ao ciclo de trabalho 

dos motores a 4  tempos e à  tecnologia de  injeção de gás empregue, haverá sempre 

passagem (slip) de gás natural durante o tempo de cruzamento de válvulas.  

Um  outro  aspeto  da  sustentabilidade  do  Shipping  prende‐se  com  os  estaleiros 

altamente subsidiados em diversos países da Ásia,  impelindo os armadores de todo o 

mundo a investir em navios supostamente mais económicos e amigos do ambiente, os 

chamados  “ecoships”.  Tais  navios  deveriam  satisfazer  simultaneamente  a 

competitividade dos mercados, os requisitos legais e as diversas restrições ambientais 

que hoje em dia existem ou estão pensadas por quase todo o mundo, nomeadamente 

as  denominadas  áreas  de  emissões  controladas  ou  ECA’s,  e  ainda  a  satisfação  da 

convenção MARPOL 73/78, anexo VI. Tal facto, no entanto, não garante que os efluentes 

gasosos  sejam  devidamente  tratados,  uma  vez  que  a  legislação  atual  é  omissa  em 

termos de imposição de limites de emissão para outros compostos presentes nos gases 

de evacuação, nomeadamente os óxidos de azoto NOX e os óxidos de enxofre SOX. 

 4. Como se formam as partículas (cenosferas).  

As emissão de partículas é, na sua maior parte, originada pela queima incompleta (por 

excesso de combustível e/ou má pulverização) de combustível de elevada viscosidade, 

tipicamente  o  combustível  mais  utilizado  pelos  navios  e  centrais  elétricas.  Estas 

partículas  denominadas  por  cenosferas  (figura  7)  resultam  da  oxidação  primária  do 

hidrogénio contido no combustível, seguindo‐se posteriormente a oxidação do carbono 

do  mesmo,  o  qual  se  liga  numa  estrutura  reticulada.  Como  referido  acima,  os 

combustíveis que normalmente dão origem a maiores formações de partículas são os 

residuais,  com viscosidades  superiores a 80  cSt@50ºC,  sendo normal a utilização de 

combustíveis até aos 600 cSt@50ºC. A formação de partículas está intimamente ligada 

a outras variáveis da combustão e funcionamento dos motores e outros equipamentos 

de combustão, tais como geradores de vapor (vulgarmente designados por caldeiras), 

sendo de salientar a temperatura, a turbulência, a concentração de O2 disponível para a 

combustão e,  logo  a  seguir,  a  velocidade do motor,  a  condição do equipamento de 

injeção, entre outras. Mesmo com combustíveis líquidos, como sejam os gasóleos, ou 

gasosos, como o gás natural, a emissão de partículas também ocorre. A produção de 

partículas  tem  aumentado  desde  o  início  da  crise  financeira,  por  consequência  do 

esmagamento dos fretes e do aumento do preço dos combustíveis, devido à prática do 

chamado “slow steaming”, dando origem à produção do chamado “black carbon”. Os 

navios  a  navegar  em  “slow  steaming”  vêem  a  potência  em  serviço  das máquinas 

propulsoras muitíssimo reduzida, originando um fornecimento de ar insuficiente por os 

turbocompressores estarem  longe do ponto de  funcionamento  recomendado para o 

qual  foram  projetados.  As  limitações  impostas  às  emissões  de  “black  carbon” 

encontram‐se atualmente em estudo pela IMO, devido à preocupação do forte impacto 

ambiental dessas referidas partículas.  

 

Figura 7 ‐ Cenosfera 

As  partículas  são  classificadas  geralmente  de  acordo  com  o  seu  diâmetro,  sendo 

normalmente  denominada  por  PM10  (diâmetro  inferior  a  10  mícrones)  e  PM2,5 

(diâmetro inferior a 2,5 mícrones), também conhecidas por nano partículas.  

As partículas arrastadas pelo vento podem percorrer distâncias superiores a 400 km, 

desde a sua  fonte de emissão, pelo que têm um  forte e  importantíssimo  impacto na 

saúde das populações costeiras.  

 

5. Como se formam os compostos orgânicos voláteis (COV).  

As emissões de compostos orgânicos voláteis, ou simplesmente COV’s (VOC’s em Inglês) 

têm  distintos mecanismos  de  formação,  a  que  interesses  comerciais  tentam  não  se 

referir, ou mesmo inverter a perceção da opinião pública. É o caso de muitos fabricantes 

de motores,  que  separam  os  COV’s metânicos  e  COV’s  não metânicos. A  legislação 

somente incide sobre os não metânicos, embora os COV’s metânicos sejam em muito 

maior escala e não de todo inócuos, quer para a saúde quer para a camada de ozono. 

Os COV’s não metânicos são geralmente originados por oxidações parciais dos óleos 

lubrificantes e dos combustíveis, entre os quais se encontram substâncias indutoras de 

cancro,  como  sejam  formaldeídos  e  furanos,  entre outros, quer  sejam  combustíveis 

líquidos ou gasosos. As  suas emissões dependem essencialmente das  tecnologias de 

injeção e  respetivos  ciclos de  trabalho. Os COV’s metânicos  também  são originados 

pelos motores diesel, pela decomposição dos hidrocarbonetos líquidos e nos motores a 

gás (mas não os que utilizam injeção direta) em maior proporção pela passagem de gás 

natural  (slip)  não  queimado  para  o  escape  dos motores  e  outros  equipamentos  de 

combustão. É sabido que o gás natural tem tipicamente cerca de 80% de metano, que 

por acaso é o gás com pior efeito sobre a camada de ozono, à parte de que também é 

nefasto para a saúde.  

 

6. Impacto das emissões gasosas devidas ao Shipping na saúde pública  

Um dos principais estudos de referência [2] foi realizado com o objetivo de caracterizar 

o  impacto das  emissões  gasosas  produzidas pelos navios  sobre  a  saúde pública das 

populações  costeiras  em  todo  o  mundo.  Como  consequência  da  intensificação  do 

transporte  marítimo,  têm‐se  registado  impactos  na  saúde  pública  das  populações 

costeiras em diversos países, tendo sido realizados alguns estudos epidemiológicos para 

tentar compreender as causas dessas ocorrências. Dos diversos estudos  já realizados, 

todos mostram de  forma consistente as concentrações de partículas  (PM Particulate 

Matter)  aos  impactes  negativos  na  saúde  pública  das  populações  costeiras, 

nomeadamente  o  aparecimento  de  cancro,  asma,  ataques  cardíacos,  e mortalidade 

prematura.  O  Dr.  James  Corbett  [2],  e  outros,  modelaram  matematicamente  as 

concentrações  geo‐espaciais  de  partículas  originadas  pela  atividade  do  Shipping. 

Utilizaram para o efeito modelos globais de dispersão de aerossóis e dois inventários de 

concentrações daqueles poluentes. Estimaram daquela forma a mortalidade regional, 

por  aplicação  de  incrementos  (inputs  do  modelo)  das  partículas  PM10  e  PM2,5 

(originadas pelas emissões dos navios) em funções (modelo) da ocorrência de cancro do 

pulmão e doenças cardiopulmonares. O Dr. James Corbett concluiu que as emissões de 

partículas emitidas pelos navios a nível mundial foram responsáveis por cerca de 60 000 

mortes  em  2007,  sendo  que  as  populações  mais  afetadas  eram  as  costeiras,  em 

particular  na  Europa  e  Sul  da  Ásia.  Dado  o  expectável  aumento  da  atividade  do 

transporte marítimo, é previsível um correspondente aumento do número de mortes 

até  2020,  devidas  essencialmente  às  emissões  de  partículas,  em  mais  de  40%, 

relativamente ao número de 2007.   

As emissões produzidas pelos navios necessitam de  ser  reguladas quer a nível  local, 

regional, e a nível internacional [8], [17], [18]. Contudo, e infelizmente, pouco tem sido 

deliberado,  dado  que  a  maioria  das  partes  envolvidas  não  tem  conhecimento  da 

gravidade desse efeito sobre a saúde pública pelas emissões originadas pelos navios. Os 

estudos levados a cabo, até à data, geralmente não segregam o efeito do Shipping das 

outras fontes de emissões terrestres, embora existam alguns estudos levados a cabo por 

alguns países europeus e estados da costa ocidental dos EUA [8], [9]. Poder‐se‐á dizer, 

no entanto, que tais estudos tendem a não chegar aos organismos políticos ou a serem 

propositadamente minimizados por terem forte impacto na atividade económica.   

 

7. Locais do mundo onde o impacto das emissões gasosas é mais relevante 

Como se pode observar pelo cruzamento das figuras 8 e 9, os locais do mundo onde ocorrem 

maiores concentrações de partículas coincidem com os locais onde a incidência de cancro do 

pulmão e outras doenças cardiorrespiratórias é maior.  

 

Figura 8 ‐ Contribuição anual média para concentração das emissões de partículas PM2,5 

devidas ao Shipping (µg/m3). 

 

 

Figura 9 ‐ Mortalidade devida a doenças cardiopulmonares. 

 

No caso de estudo 2b, que considera as emissões de partículas [2], as mortalidades por cancro 

e as doenças cardiopulmonares devidas ao Shipping têm densidades superiores a 100 casos por 

célula da grelha de amostragem2 nas regiões da Ásia, variando entre os 100 e os 200 na União 

Europeia. Como se pode verificar, o impacto do efeito das partículas é muito maior nas regiões 

costeiras que nas regiões interiores.  

Todo o território de Portugal continental pode ser considerado costeiro, atendendo à sua forma 

e localização geográfica. 

 8. Contabilização do efeito das emissões gasosas originadas pelo Shipping na saúde pública 

Europeia.  

O impacto da poluição atmosférica na saúde pública mantém‐se elevado em toda a Europa, mas 

está  a  diminuir  em  geral,  graças  à  regulamentação  europeia  para  o  controlo  das  emissões 

gasosas de fontes de emissão terrestre. No entanto, as emissões gasosas devidas ao aumento 

de  tráfego  marítimo  internacional  nas  costas  europeias  continua  a  aumentar,  originando 

                                                            2 dimensões da célula: 1° Latitude x 1° Longitude 

despesas importantes com a saúde das populações costeiras, para os estados mais afetados. A 

figura 10 ilustra a situação em 2002 [2]. 

   

Figura 10 ‐ Mortalidade anual por doença cardiopulmonar atribuída a partículas PM2.5 

emitidas por navios na Europa e Mediterrâneo, referente a 2002. 

 

Devido à aplicação de legislação sobre limitação de emissões gasosas mais apertada (incluindo 

aerossóis), as despesas com a saúde ligadas diretamente à poluição atmosférica na Europa têm 

vindo a decrescer. Tendo sido o seu valor de €803 mil milhões em 2000, deverá situar‐se nos 

€573 mil milhões de euros em 2020 [27].  

Embora  as  emissões  originadas  por  fontes  terrestres  estejam  a  diminuir,  as  emissões  de 

poluentes  atmosféricos  por  parte  dos  navios  deverão  aumentar  significativamente,  em 

consequência do aumento de tráfego no hemisfério norte, em mais 5%, até 2020.  

Calcula‐se  que  as  despesas  de  saúde  na  Europa  devidas  à  contribuição  das  emissões  de 

poluentes originadas pelo Shipping apenas, deverão aumentar dos 7% em 2000 (ou seja €58,4 

mil milhões) para 12% em 2020, atingindo um valor de cerca de €64,1 mil milhões de euros.  

Na Dinamarca, que é um país particularmente afetado pelo tráfego intenso de navios junto da 

sua costa, entre o Mar Báltico e o Mar do Norte, a redução do teor de enxofre e seus respetivos 

óxidos SOx está a resultar num decréscimo de custos com a saúde de €627 milhões em 2000 

para os esperados €375 milhões em 2020. 

No âmbito deste pequeno trabalho, foi pedida ao Ministério da Saúde informação sobre 

o número de óbitos por mil habitantes devidos às referidas doenças, nos conselhos do 

litoral de Portugal e  interior. Embora  tenham  sido disponibilizados  alguns dados, os 

mesmos não permitiram  tirar  conclusões  seguras  com base na  comparação  entre  o 

número de óbitos nas regiões do interior e o número de óbitos nas regiões do litoral, 

uma vez que os dados fornecidos não referiam a causa da morte e idade.    

 

9. As emissões gasosas originadas pelos navios na costa de Portugal continental 

Dada a  localização geográfica de Portugal Continental, permanecem em trânsito, ao  longo da 

sua costa, entre 350 a 400 navios diariamente  (não contando com os navios de recreio e de 

pesca).  Por  observação  do  tipo  de  navios  em  trânsito  ao  longo  da  costa  portuguesa 

(www.marinetraffic.com) conclui‐se que, em média, 30% são navios tanque de grande porte, 

35% são navios porta contentores e 15% graneleiros, sendo os restantes 20% de diversos tipos.  

Assumindo que os 400 navios em permanência na costa portuguesa têm um consumo médio de 

2  ton/h  de HFO  (RMK  ou  RME)  380  cSt@50ºC,  são  queimadas  diariamente  19  200  ton  de 

combustível  de  elevada  viscosidade,  resultando  nas  seguintes  emissões  para  atmosfera, 

conforme a tabela 1. 

 

Tabela  1  ‐  Principais  poluentes  e  respetivas  quantidades 

emitidas  diariamente  na  costa  de  Portugal  Continental, 

calculados com base em fatores de emissão médios e consumo 

médio de 2 ton/h por navio.  

Espécie poluente  Quantidade diária em kg

Partículas PM10*  128 640 

Metano CH4 **/*  5 760 

COV’s não metânicos *  46 080 

Dióxido de carbono CO2 ** 142 080 

Monóxido de carbono CO* 60 096 

Óxidos de azoto NOx  22 154 *Referencia CORINAIR, ** IPPC 2006 

 

10. Medidas  de mitigação  do  impacto  das  emissões  gasosas  originadas  pelos  navios  que 

passam ao longo da costa de Portugal 

No sentido de mitigar o mais  rápido possível o efeito das emissões gasosas originadas pelos 

navios em trânsito ao longo da costa de Portugal continental, enquanto a indústria do Shipping 

não tiver respostas tecnológicas cabais, apresentam‐se as seguintes medidas: 

a) Exercendo a soberania sobre o seu mar, Portugal deveria declarar  imediatamente todas as 

suas costas como Áreas de Emissões Controladas  (ECA’s),  tal como realizado pelos países da 

Europa do norte  (ver  figura  11). Com  esta medida,  as  emissões de partículas  PM10  seriam 

reduzidas em 83,58%, ou seja, passariam a ser emitidos 21 120 kg/dia em vez de 128 640 kg/dia 

atuais.  Tal  redução  traria  inquestionavelmente  um  forte  impacto  positivo  na  saúde  pública 

(redução do número de casos de cancro do pulmão e outras doenças cardiorrespiratórias) e 

consequente redução de despesas do Estado com saúde. No entanto, com a declaração de zona 

ECA, as emissões de CO2 aumentariam  ligeiramente, dado o gasóleo produzir mais CO2 que o 

HFO (Heavy Fuel Oil), passando de 60 096 kg/dia para 61 248 kg/dia de CO2, aumento este que 

é bem justificado pelos benefícios; 

b) Afastamento dos corredores de navegação para uma maior distância, idealmente seria 216 

milhas  náuticas  (correspondentes  aos  quase  400  km  de  distância).  Tal  medida,  embora 

desejável,  não  seria  certamente  possível.  No  entanto,  torna‐se  evidente  que  qualquer 

afastamento dos navios da costa, relativamente ao atual, traduzir‐se‐ia em elevados benefícios 

na saúde pública; 

c) Dever‐se‐ia obrigar  a que os navios  a navegar  ao  longo da  costa portuguesa, utilizassem 

obrigatoriamente scrubbers para os gases de escape, que possibilitassem a adequada remoção 

da maior quantidade possível de partículas.  

A limitação do teor de enxofre a 0,1% m/m implica que os navios terão que proceder à mudança 

de combustível (denominada manobra de “change over” ou troca do combustível) sempre que 

entram  numa  destas  áreas. Ora,  o  único  combustível  líquido  que  satisfaz  actualmente  este 

requisito é o gasóleo, situando‐se o seu preço por tonelada na ordem dos US$1000, contra os 

US$600 do  combustível  380  cSt@50ºC  (40% mais  barato que o  gasóleo). Assim, por  via da 

limitação do teor de enxofre,  limitar‐se‐ia também a emissão das nefastas partículas PM10 e 

PM2,5. 

 

Figura 11 ‐ Zonas ECA Europeias ‐ Mar do Norte e Mar Báltico 

 

11. Discussão 

Parece evidente que até à data não esteja ainda  sequer projetada a declaração de  zona de 

emissões controladas ECA para as costas de Portugal. Isto mostra que se trata de um eventual 

desconhecimento da situação por parte das autoridades nacionais, do seu real impacte na saúde 

pública das populações do litoral nacional, com consequente custo humano e financeiro. 

Com base no exposto, tudo indica que as populações ribeirinhas, quer da costa sul, quer da costa 

ocidental de Portugal  continental, estão  sujeitas a elevadas doses de emissão de partículas, 

originadas essencialmente pelo elevadíssimo tráfego de navios ao longo das suas costas.  

Embora o Ministério da Saúde tenha sido inquirido sobre o número de óbitos por mil habitantes 

com  doenças  do  foro  oncológico  e  cardiorrespiratório  nos  conselhos  do  litoral  e  até  50 

quilómetros da costa, não foi avançado qualquer número, embora tenham sido disponibilizados 

dados  genéricos  a  partir  do  sítio  da  DGS.  Tal  dificuldade  resultou  da  falta  de  indicadores 

estatísticos adaptados ao presente estudo, como sejam o número de óbitos relacionados com 

as patologias diretamente associadas às emissões de partículas.  

A utilização de gás natural (como combustível) ou de scrubbers (no caso do combustível utilizado 

ser gasóleo ou HFO) são as únicas formas tecnicamente exequíveis de controlar as emissões de 

partículas por parte dos navios, podendo reduzir aquelas emissões em 83,58% para o primeiro 

caso, ou em 95% para o segundo. 

Dado o elevadíssimo  tráfego de navios ao  longo das costas nacionais, e com  tendência clara  

para  aumentar  ainda mais,  pelo menos  até  2020,  e  que  tal  facto  acarreta  custos  humanos 

(óbitos) e  financeiros  (despesas de  saúde com  tratamentos)  importantíssimos para o Estado 

português, torna‐se urgente tomar uma ação que contrarie a atual situação.  

Tal ação poderá  ser  semelhante àquela que outros países do norte da Europa  fizeram para 

melhorar a qualidade do ar,  isto é a  implementação de áreas de emissões controladas ECA’s, 

onde os navios  só podem navegar a gasóleo  (com baixo  teor de enxofre) ou a  combustível 

pesado (HFO) desde que com sistemas de tratamento de gases, através de scrubbers (tail end 

technologies).  

Declarando todas as costas Portuguesas como zona de emissão controlada (ECA), mesmo que 

unilateralmente, conseguir‐se‐á uma diminuição significativa da poluição atmosférica costeira e 

um abaixamento dos custos humanos para as populações, e financeiros para o Estado.  

 

12. Conclusões 

Este estudo permitiu a caracterização real da poluição atmosférica originada pela atividade do 

Shipping nas nossas costas e seu impacte na saúde. 

O Estado Português deverá implementar urgentemente uma zona ECA ao longo das suas costas, 

com o objetivo de proteger a saúde das populações costeiras dos nefastos efeitos das emissões 

gasosas dos navios em trânsito perto da costa, pelo que se traduzirá numa redução significativa 

dos elevadíssimos custos humanos e na saúde pública em geral. 

Tal decisão, eminentemente política e urgente, servirá como forma de afirmar ao mundo que 

Portugal  está  civilizacionalmente  atento  e  administra  as  suas  águas  de  forma  soberana  e 

responsável. 

 

Referências 

(1) Antunes Jorge, Conversion of large‐bore diesel engines for heavy fuel oil and natural gas dual 

fuel operation, 2nd Gas fuelled Motorship Conference 26‐27 November 2012 Rotterdam; 

(2) Capaldo, K. P.; Corbett, J. J.; Kasibhatla, P.; Fischbeck, P.; Pandis, S. N. Effects of Ship Emissions 

on Sulphur Cycling and Radiative Climate Forcing Over the Ocean. Nature 1999, 400, 743–746. 

(3) Corbett, J. J.; Fischbeck, P. S.; Pandis, S. N. Global Nitrogen and Sulfur Emissions Inventories 

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Nelson, S. M.; Tsai, N. Y.; Wang, M. Q.; Woo, J. H.; Yarber, K. F., An  inventory of gaseous and 

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(8) Cofala, J.; Amann, M.; Chris Heyes; Klimont, Z.; Posch, M.; Schöpp, W.; Tarasson, L.; Jonson, 

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(9) Corbett, J. J.; Koehler, H. W. Updated Emissions from Ocean Shipping. J. Geophys. Res., D: 

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(10) Corbett, J. J.; Wang, C.; Winebrake, J. J.; Green, E. Allocation and Forecasting of Global Ship 

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(11) Eyring, V.; Köhler, H. W.; van Aardenne, J.; Lauer, A. Emissions from international shipping: 

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(12) Endresen, O.; Soergaard, E.; Sundet, J. K.; Dalsoeren, S. B.; Isaksen, I. S. A.; Berglen, T. F.; 

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(16)  Cohen,  A.  J.;  Anderson,  H.  R.;  Ostro,  B.;  Pandey,  K.  D.;  Krzyzanowski, M.;  Künzli,  N.; 

Gutschmidt, K.; Pope, A.; Romieu, I.; Samet, J. M.; Smith, K. The global burden of disease due to 

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(19)  California  Air  Resources  Board.  Appendix  A: Quantification  of  the  Health  Impacts  and 

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Board: Sacramento, CA, March 22, 2006. 

(20)  Cohen,  A.  J.;  Anderson,  H.  R.;  Ostro,  B.;  Pandey,  K.  D.;  Krzyzanowski, M.;  Kunzli,  N.; 

Gutschmidt, K.; Pope, C. A.; Romieu, I.; Samet, J. M.; Smith, K. R., Mortality impacts of urban air 

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(22) Wang,  C.;  Corbett,  J.  J.;  Firestone,  J. Modeling  Energy  Use  and  Emissions  from  North 

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 (23) DIRECTIVE 2012/33/EU OF THE EUROPEAN PARLIAMENT AND OF THE COUNCIL            

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http://www.atmos‐chem‐phys‐discuss.net/13/5923/2013/acpd‐13‐5923‐2013.html; 

(28) PM2.5 and ozone pollution exposure increases risk of cardiac arrest European Commission 

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(29) Shipping emissions can lead to high local ocean acidification European Commission 18 July 

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(30) Integrated pollution, climate and energy access policies needed to meet WHO PM2.5 limits 

European Commission 10 October 2013 Issue 345; 

(31) Individual non‐methane VOCs have large impacts on human health European Commission 

10 April 2014 Issue 369;