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1 O sistema de saúde além de 2014 Conclusões da conferência da Escola Nacional de Saúde Pública e das Faculdades de Medicina da Universidade de Coimbra e da Universidade do Porto. 20 e 26 de fevereiro de 2013

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O sistema de saúde além de 2014 Conclusões da conferência da Escola Nacional de Saúde Pública

e das Faculdades de Medicina da Universidade de Coimbra

e da Universidade do Porto. 20 e 26 de fevereiro de 2013

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ÍNDICE 

 

Introdução ............................................................................................................ 3 

Programa da Conferência ................................................................................... 6 

1. Intervenções de abertura ................................................................................ 8 

2. Fontes de financiamento do SNS ................................................................... 15 

3. Sistema de Saúde Português ......................................................................... 21 

4. Modelos de pagamento da prestação de cuidados de saúde ..................... 32 

5. Rede hospitalar ...............................................................................................36 

6. Organização do trabalho .............................................................................. 49 

7. Qualidade e eficiência .................................................................................... 59 

 

 

   

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Introdução 

 

O  sistema  de  saúde  português  tem  sido  capaz  de  gerar  ganhos  em  saúde  importantes  nas  últimas 

décadas. A evolução positiva dos principais  indicadores de saúde permitiu atingir, e em alguns casos 

ultrapassar, os padrões internacionais, e a população portuguesa dispõe hoje de um sistema de saúde 

capaz  de  assegurar  aos  cidadãos,  sem  discriminação  de  acesso,  cuidados  de medicina  preventiva, 

curativa e de reabilitação, independentemente da sua condição económica. 

Os bons resultados em saúde foram acompanhados de crescimentos sucessivos da despesa em saúde, 

que no  final da primeira década do  século XXI  tinha  atingido  valores preocupantes. O problema da 

sustentabilidade financeira do sistema de saúde está no topo da agenda dos decisores há cerca de uma 

década,  fruto de um conjunto de pressões  internas e externas que contribuíram para o aumento da 

despesa  em  saúde.  Parte  das  pressões  resultaram  de  fatores  comuns  a muitos  outros  sistemas  de 

saúde,  como  o  ritmo  de  inovação  tecnológica,  o  aumento  da  prevalência  de  doenças  crónicas,  o 

envelhecimento da população ou o aumento das expectativas  legítimas dos utilizadores do  sistema. 

Mas fatores específicos levaram a que a despesa em saúde em Portugal fosse, em 2010, superior à de 

outros  países  com  níveis  de  vida  e  resultados  em  saúde  semelhantes.  Verificaram‐se  profundas 

alterações na demografia, com o envelhecimento da população a atingir em Portugal níveis extremos. 

Alteraram‐se  as  acessibilidades  e  a  distribuição  da  população  no  território  nacional,  com  um  peso 

crescente  das  populações  residentes  nas  zonas  urbanas,  que  tornaram  desadequada  uma  rede  de 

prestação de serviços que na essência sofreu poucas alterações desde a constituição do SNS, como por 

exemplo no excesso de maternidades, ou na falta de camas de cuidados continuados. 

As alterações nas condicionantes só por si justificariam a necessidade de reformar o sistema de saúde 

português, mas  as  dificuldades  financeiras  que  Portugal  tem  enfrentado  durante  esta  década,  e  a 

consequente  execução  do  Programa  de  Ajustamento  Económico  e  Financeiro  (PAEF),  tornaram  a 

reforma do  sistema de  saúde mais pertinente e mais urgente. As medidas  adotadas em  2011 e  2012 

visavam, naturalmente, evitar a ruptura financeira eminente. Foi possível assegurar a sustentabilidade 

económico‐financeira do SNS, ao mesmo tempo que foi reforçada a garantia de acesso a cuidados de 

saúde de qualidade a que os portugueses se habituaram.  

No entanto, a necessária reforma do sistema de saúde não se pode esgotar no conjunto de medidas 

adotadas durante o PAEF. As alterações demográficas e epidemiológicas da população portuguesa, as 

alterações  tecnológicas e a evolução dos  recursos disponíveis,  justificam uma  reforma estrutural do 

sistema de saúde português, que deverá ser concebida com um horizonte de médio prazo, muito para 

além dos constrangimentos impostos pelo PAEF. 

Quais são as reformas adicionais que deverão ser implementadas, qual a ambição da reforma da saúde 

no futuro?  

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A resposta a esta questão não é óbvia, e merece uma discussão  informada. Foi por essa razão que o 

Ministro da Saúde desafiou os Diretores da Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de 

Lisboa  (ENSP),  da  Faculdade  de Medicina  da  Universidade  de  Coimbra  (FMUC)  e  da  Faculdade  de 

Medicina  da Universidade  do  Porto  (FMUP)  a  organizar  uma  conferência‐debate  sobre  o  futuro  do 

sistema de saúde português. As três escolas, referência de qualidade no estudo da saúde em Portugal, 

lançaram‐se na tarefa de organizar uma discussão no seio da academia sobre o futuro do sistema de 

saúde,  focalizada no médio e  longo prazo, no horizonte para além de 2014, em vez de  se  limitar às 

questões  correntes e  imediatas. A discussão pretendia  ser académica na  solidez da  fundamentação, 

mas  também  capaz  de  gerar  conclusões  que  se  pudessem  materializar  em  políticas  concretas  e 

implementáveis. 

Os Diretores da ENSP, Prof. João Pereira, da FMUC, Prof. Joaquim Murta, e da FMUP, Prof. Agostinho 

Marques, com o apoio do Prof. Álvaro Almeida, da Faculdade de Economia da Universidade do Porto, 

identificaram  os  seis  grandes  temas  que  consideraram mais  relevantes  na  evolução  do  sistema  de 

saúde português, e  selecionaram um  conjunto de peritos,  académicos e/ou  com obra publicada nas 

áreas  em  discussão,  capazes  de  apresentar  contributos  relevantes  para  a  discussão. Os  seis  temas 

foram distribuídos por duas sessões de debate. 

A primeira sessão decorreu no dia 20 de Fevereiro de 2013, na Aula Magna da Faculdade de Medicina da 

Universidade do Porto, e foi dedicada aos temas relacionados com a organização do sistema de saúde, 

em especial o seu financiamento e as relações entre sector público e privado. Os trabalhos iniciaram‐se 

com uma sessão de abertura presidida pelo Ministro da Saúde, Dr. Paulo Macedo, e onde participaram 

o Diretor da FMUP, o Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar de São João, e o 

Presidente da Associação de Estudantes da FMUP. 

O primeiro debate, moderado pelo Prof. Agostinho Marques,  foi dedicado ao  financiamento do SNS. 

Daniel Bessa, Álvaro Almeida, Filipe de Almeida e Francisco Ramos debateram as perspetivas futuras do 

financiamento do SNS através do Orçamento do Estado, as evoluções possíveis do financiamento do 

SNS por outras vias, nomeadamente através de copagamentos, seguros e outros, o  tipo de serviços 

prestados  no  âmbito  do  SNS  e  a  forma  de  definir  a  carteira  de  benefícios,  e  a  equidade  do 

financiamento. 

O  segundo  debate, moderado  pelo  Prof. Álvaro Almeida,  foi  dedicado  à  estrutura  do  Sistema  de  Saúde 

Português.  José  Mendes  Ribeiro,  Constantino  Sakellarides,  Miguel  Guimarães,  José  Martins  Nunes  e 

Nascimento Costa debateram o papel dos subsistemas públicos, em especial a ADSE, e a sua relação com o 

SNS,  a  liberdade  de  escolha  e  a  concorrência  entre  prestadores  públicos  e  privados  portugueses,  e  a 

concorrência com prestadores de outros países, nomeadamente a capacidade de os prestadores portugueses 

competirem no mercado do turismo de saúde. 

O terceiro debate, moderado pelo Prof. Miguel Gouveia, foi dedicado aos modelos de pagamento da 

prestação  de  cuidados  de  saúde. Nuno  Sousa Pereira, António  Ferreira, Pedro  Lopes  e Rui  Santana 

debateram os modelos de avaliação dos prestadores, discutiram a viabilidade da adoção de modelos de 

pagamento da saúde, em alternativa aos atuais modelos de pagamento da produção, e a adoção de 

modelos  de  financiamento  por  capitação,  associado  a  processos  de  ajustamento  pelo  risco,  e 

debateram a iniquidade no financiamento dos prestadores. 

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A segunda sessão decorreu no dia 26 de Fevereiro de 2013, no Salão Nobre da Escola Nacional de Saúde 

Pública,  e  foi  dedicada  aos  temas  relacionados  com  a  organização  e  funcionamento  da  rede  de 

prestação de cuidados de saúde. Os trabalhos iniciaram‐se com uma sessão de abertura presidida pelo 

Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Saúde, Dr. Fernando Leal da Costa, e onde participaram o 

Diretor da ENSP e o Diretor da FMUC. 

O quarto debate  (primeiro da  segunda  sessão), moderado pelo Prof.  Joaquim Murta,  foi dedicado à 

reestruturação da rede hospitalar. Fernando Araújo, José Fernandes e Fernandes, Fernando Regateiro 

e  Miguel  Castelo  Branco  debateram  os  problemas  relacionados  com  a  definição  de  redes  de 

referenciação  hospitalar,  a  integração  de  cuidados  de  saúde,  em  especial  os  novos  paradigmas  de 

gestão da doença crónica, as estratégias de eliminação da oferta excedentária, e ainda os obstáculos 

que se levantam à execução de reformas, e a forma de os ultrapassar. 

O quinto debate, moderado pelo Prof. António Sousa Uva,  foi dedicado à organização do  trabalho e 

aos vários aspetos relativos aos recursos humanos. Artur Vaz, Sollari Allegro, Augusta Sousa e Carlos 

Gante debateram os modelos de remuneração e sistemas de incentivos, os modelos de organização do 

trabalho,  a  relevância  dos  conflitos  de  interesses,  e  em  especial  a  imposição  da  exclusividade  aos 

profissionais de saúde, a formação e recertificação, o planeamento e mobilidade de recursos humanos 

e a redefinição das funções das profissões. 

O  sexto  e  último  debate,  moderado  pelo  Prof.  Pereira  Miguel,  foram  dedicados  aos  temas  da 

qualidade, eficiência e  inovação na prestação de cuidados de saúde. Vasco Maria, Pedro Pita Barros, 

Teresa  Mendes  e  Manuel  Sobrinho  Simões  debateram  a  eficiência  e  qualidade  na  utilização  de 

medicamentos e dispositivos médicos, os modelos de governação das unidades do SNS adequados à 

promoção da qualidade e eficiência, as relações entre a qualidade clínica e a inovação, e a investigação 

e desenvolvimento na saúde. 

O  presente  volume  compila  os  principais  temas  apresentados  em  cada  debate  e  as  respetivas 

conclusões.  Cada  capítulo  corresponde  ao  resumo  de  um  debate,  tal  como  foi  visto  pelo  respetivo 

moderador. Haverá, por  isso, alguma variedade no estilo e na forma, mas todos os capítulos têm em 

comum o apresentarem contributos relevantes para a definição de uma estratégia de médio prazo para 

a política de saúde em Portugal. 

 

O Editor  

Prof. Doutor Álvaro Almeida 

   

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Programa da Conferência 

 

Primeira sessão: 20 de Fevereiro de 2013 

Aula Magna da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 

10h30m: Sessão de Abertura 

Paulo Macedo, Ministro da Saúde 

Agostinho Marques, Diretor da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 

António Ferreira, Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar de São João 

10h45m‐12h30m: Fontes de financiamento do SNS 

Moderador: Agostinho Marques, Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 

Daniel Bessa, COTEC 

Álvaro Almeida, Faculdade de Economia da Universidade do Porto 

Filipe de Almeida, Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 

Francisco Ramos, Escola Nacional de Saúde Pública ‐ UNL 

14h00m‐15h45m: Sistema de Saúde Português 

Moderador: Álvaro Almeida, Faculdade de Economia da Universidade do Porto 

José Mendes Ribeiro, Fundação Francisco Manuel dos Santos 

José Martins Nunes, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra 

Nascimento Costa, Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra 

Miguel Guimarães, Centro Hospitalar de São João 

Constantino Sakellarides, INODES 

16h15m‐18h00m: Modelos de pagamento da prestação de cuidados de saúde 

Moderador: Miguel Gouveia, Católica Lisbon School of Business and Economics 

Nuno Sousa Pereira, Porto Business School 

António Ferreira, Centro Hospitalar de São João 

Pedro Lopes, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra 

Rui Santana, Escola Nacional de Saúde Pública ‐ UNL 

   

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Segunda sessão: 26 de Fevereiro de 2013 

Salão Nobre da Escola Nacional de Saúde Pública 

 

10h30m: Abertura 

Fernando Leal da Costa, Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Saúde 

João Pereira, Diretor da Escola Nacional de Saúde Pública ‐ UNL 

Joaquim Murta, Diretor da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra 

10h45m‐12h30m: Rede hospitalar 

Moderador: Joaquim Murta, Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra 

Fernando Araújo, Centro Hospitalar de São João 

José Fernandes e Fernandes, Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa 

Fernando Regateiro, Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra 

Miguel Castelo Branco, Centro Hospitalar da Cova da Beira 

14h00‐15h45m: Organização do trabalho 

Moderador: António Sousa Uva, Escola Nacional de Saúde Pública ‐ UNL 

Artur Vaz, Hospital de Loures 

Sollari Allegro, Centro Hospitalar do Porto 

Augusta Sousa, ex‐Bastonária da Ordem dos Enfermeiros 

Carlos Gante, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra 

16h15m‐18h00m: Qualidade e eficiência 

Moderador: José Pereira Miguel, Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa 

Vasco Maria, Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa 

Pedro Pita Barros, NOVA School of Business and Economics 

Teresa Mendes, Instituto Pedro Nunes 

Manuel Sobrinho Simões, IPATIMUP 

 

   

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1. Intervenções de abertura 

 

Intervenção   do   Ministro   da   Saúde   na   primeira   sessão   da   conferência‐debate,   dia   20   de  

fevereiro, na  Aula  Magna  da  Faculdade  de  Medicina  do  Porto  

 

O  Estado  Português  assume,  constitucionalmente,  a  função  de  promover  a  criação  de  um  Serviço 

Nacional de Saúde (SNS) que ofereça a todos os cidadãos, sem discriminação de acesso, cuidados de 

medicina  preventiva,  curativa  e  de  reabilitação,  independentemente  da  sua  condição  económica.  A 

materialização de tal princípio constitucional implicou que na década passada o Orçamento do Estado 

tenha suportado o financiamento de cerca de dois terços das despesas de saúde, e que as despesas de 

saúde tenham representado cerca de um sexto da despesa corrente do Estado. Tal significa que há uma 

forte  interação entre as finanças públicas e a saúde em Portugal, e que o debate sobre a reforma do 

Estado só estará completo depois de discutido o sistema de saúde. 

Nos últimos dezoito meses, o Governo  implementou um conjunto de medidas que mudaram o SNS. 

Hoje  estamos  com  uma melhor  sustentabilidade  económico‐financeira  do  que  há  um  ano  atrás,  ao 

mesmo  tempo  que  foi  reforçada  a  garantia  de  acesso  a  cuidados  de  saúde  de  qualidade  a  que  os 

portugueses se habituaram. No entanto, a sustentabilidade do SNS não está ainda garantida, e medidas 

adicionais terão de ser adotadas. 

As primeiras medidas  implementadas pelo Governo, em 2011, visaram, naturalmente, evitar a ruptura 

financeira eminente. As dívidas acumuladas de cerca de 3.000 milhões de euros levaram a ameaças de 

suspensão de fornecimentos por parte dos fornecedores, que, em alguns casos, se materializaram, e 

que  se  se  generalizassem  significariam  o  fim  do  SNS  universal  e  geral  que  os  portugueses  tanto 

consideram, com consequências desastrosas em termos de saúde pública e coesão social. 

A  situação  de  pré‐ruptura  financeira  que  se  vivia  em  2011  resultou  de má  gestão  do  financiamento 

público da saúde, que não considerou devidamente as limitações dos fundos disponíveis, mas também 

de  um  conjunto  de pressões  internas  e  externas  que  contribuíram para o  aumento  da  despesa  em 

saúde  a  um  ritmo  incompatível  com  o  crescimento  dos  impostos  arrecadados  para  o  seu 

financiamento. Parte  das pressões  resultam  de  fatores  comuns  a muitos outros  sistemas  de  saúde, 

como  o  ritmo  de  inovação  tecnológica,  o  aumento  da  prevalência  de  doenças  crónicas,  o 

envelhecimento da população ou o aumento das expectativas legítimas dos utilizadores do sistema.  

Mas, fatores específicos levaram a que a despesa em saúde em Portugal fosse, em 2010, superior à de 

outros  países  com  níveis  de  vida  e  resultados  em  saúde  semelhantes.  Verificaram‐se  profundas 

alterações na demografia, com o envelhecimento da população a atingir em Portugal níveis extremos. 

Alteraram‐se  as  acessibilidades  e  a  distribuição  da  população  no  território  nacional,  com  um  peso 

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crescente  das  populações  residentes  nas  zonas  urbanas,  que  tornaram  desadequada  uma  rede  de 

prestação  de  serviços  que  na  essência  sofreu  poucas  alterações  desde  a  constituição  do  SNS,  por 

exemplo no excesso de maternidades, ou na falta de camas de cuidados continuados. 

As alterações nas condicionantes do sistema de saúde só por si justificariam a necessidade de reforma, 

necessidade que é agravada com as restrições que enfrentam as finanças públicas. A reforma da saúde 

que tem vindo a ser implementada pelo governo tem privilegiado o reforço de uma rede de prestação 

de cuidados integrada, que dê resposta aos problemas de saúde de forma integral, coordenada e inter 

e multidisciplinar, e que deverá ter o enfoque na prevenção e nos cuidados de proximidade.  

Para  tal,  temos  vindo  a  reforçar  os  cuidados  primários  e  os  cuidados  continuados,  iniciamos  a 

implementação  da  reforma  hospitalar,  reformamos  a  política  do  medicamento,  e  desenvolvemos 

sistemas  de  informação  que  assegurem  a  integração  da  informação  dos  doentes  e  a  partilha  de 

informação entre os vários prestadores. 

A estratégia da política de saúde  tem vindo a gerar   resultados positivos, mas  tal não significa que a 

reforma do sistema de saúde esteja terminada. A sustentabilidade do SNS ainda não está assegurada, 

pelo que continua a ser necessário encontrar novas formas de responder às necessidades dos cidadãos, 

de modo a prestar melhores cuidados com os  recursos disponíveis. É preciso continuar a  reformar o 

SNS, mudando o acessório para manter o essencial. 

Quais  são  as  reformas  adicionais que deverão  ser  implementadas? A  resposta  a esta questão não é 

óbvia, e merece uma discussão  informada. Foi por essa  razão que o Ministério da Saúde desafiou a 

Academia, de três escolas que são uma referência de qualidade no estudo da saúde em Portugal para 

uma conferência debate aberta à sociedade. Uma discussão organizada pela academia sobre o futuro 

do sistema de saúde, focalizada no médio e longo prazo, no horizonte para além de 2014, em vez de se 

limitar  às  questões  correntes  e  imediatas,  é  uma  discussão  necessária,  útil  e  que  o  Governo  tem 

obrigação de apoiar. Quais são as reformas necessárias, qual a ambição da reforma da saúde no âmbito 

da reforma do Estado? 

A  discussão  será  particularmente  útil  se  for  aberta,  com  contributos  diversificados,  e  se  gerar 

conclusões  que  se  possam  materializar  em  políticas  concretas,  implementáveis  pelo  Governo. 

Gostaríamos  que  as  propostas  apresentadas  acrescentem  aos  numerosos  e  sucessivos  debates  e  à 

vasta obra publicada. Seria também conveniente que as intervenções não se limitem a listar problemas 

ou  fatos, mas  avancem propostas,  identifiquem  trade‐offs  e definam prioridades  entre  as  eventuais 

propostas alternativas.  

A  utilidade  do  debate  será  ainda  reforçada  se  as  propostas  forem  consistentes  com  os  elementos 

essenciais do nosso sistema de saúde, que o Governo e os portugueses querem preservar.  

É essencial assegurar que todos os cidadãos têm acesso a cuidados de saúde de qualidade, com custos 

que sejam suportáveis pelos contribuintes e pelos utentes.  

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É essencial que o sistema de saúde continue a ter como principal pilar um SNS universal, sustentável, 

assente em prestadores públicos de dimensão e diferenciados, e financiado através dos  impostos, de 

natureza solidária e progressiva.  

É essencial a constante preocupação com o reforço do acesso dos mais vulneráveis aos cuidados de saúde. 

É essencial que todos os ajustamentos na despesa de saúde sejam equitativos, distribuindo o esforço 

pelos diferentes intervenientes do sector, e minimizando os efeitos sobre os cidadãos. 

E é essencial que todas as reformas potenciem os recursos humanos de elevada qualidade existentes 

em Portugal, reforçando as qualificações e a satisfação dos profissionais de saúde. 

   

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Intervenção  de  Fernando  Leal da  Costa,  Secretário  de  Estado  Adjunto  do  Ministro da  Saúde,  

na   segunda   sessão   da   conferência‐debate,   dia   26   de   fevereiro,   no   Salão   Nobre   da   Escola  

Nacional de  Saúde  Pública  

 

Numa altura em que muitos falam de "mudar de política", sem que nos digam de que "política", nem 

por que “política”, o Ministério da Saúde entendeu apoiar uma conferência‐debate sobre o que será e o 

que  deve  ser  a  política  de  Saúde  depois  de  2014,  terminado  o  PAEF  (Programa  de  Ajustamento 

Económico e Financeiro), e quais os caminhos para lá chegar.  

O debate em curso, sobre a Reforma do Estado, deve congregar e unir, obrigar‐nos a refletir, aproximar 

agentes e decisores políticos das pessoas e não ser  instrumentalizado para fins de carácter partidário 

que não clarifiquem nem permitam a inevitabilidade das mudanças.  

Portugal precisa de decidir por si, com todos, para onde quer ir e como deve fazer para poder lá chegar. 

Se não o  fizermos de  forma coesa e abrangente, numa altura em que a nossa soberania  financeira é 

diminuta,  corremos  o  risco  de  assistir, mais  uma  vez,  a  decisões  que  não  sejam  tomadas  só  pelos 

portugueses.  

A Academia, numa iniciativa que agradecemos e não podíamos deixar de apoiar, convidou alguns, não 

poderiam  ter  sido  todos,  dos  mais  conceituados  especialistas  nestas  temáticas,  e  escolheu  três 

reputadas  escolas  das  nossas  melhores  Universidades,  desenhou  um  programa  abrangente  e 

estimulante e vai hoje concluir uma segunda jornada de debates.  

Desejamos que destes debates saiam  indicações ─ se não chegarem a conclusões ─ sobre o que de 

mais  importante deve ser  feito e, acima de  tudo, o que  temos de  impedir que aconteça, para que o 

sistema  de  saúde  português  se  torne  inviável  e  não  possamos  ter  um  SNS  universal,  geral  e 

tendencialmente gratuito. 

A atuação do Ministério está sustentada em cinco princípios: 

1. Assegurar um SNS sustentável, assente em prestadores públicos de dimensão apreciável. 

2. Aumentar o acesso dos mais vulneráveis aos cuidados de saúde.  

3.  Ajustar  equitativamente  a  despesa  com  distribuição  do  esforço  pelos  diversos  intervenientes  e 

minimizando os efeitos sobre os cidadãos. 

4.  Manter  o  modelo  de  financiamento  do  SNS,  baseado  em  impostos  de  natureza  solidária  e 

progressiva. 

5. Discriminação orçamental positiva para a Saúde. 

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Demos provas, e seria fastidioso rever mais uma vez o que fizemos em ano e meio de governação, que 

não  nos  desviámos  destes princípios,  embora  aceitando que  nos  venham  dizer que  teremos  de  ser 

menos solidários, menos inclusivos, menos transversais na aplicação de medidas, menos apostados na 

conservação de um Orçamento do Estado que nos garante a capacidade de financiar um SNS adequado 

às necessidades das pessoas, com relevo especial para os mais carenciados. Aceitamos que nos digam 

isso, mas não será pelo que nos disserem que nos desviaremos dos nossos propósitos e dos nossos 

princípios.  

O que nos trouxe ao ponto de apoiar esta conferência não é a discussão do princípio ou da justeza da 

solidariedade. A opinião de que necessitamos é sobre os caminhos para manter uma política de saúde 

abrangente e solidária, depois de 2014, num modelo económico e de sociedade que não poderá repetir 

os erros do passado, alguns deles de um passado bem recente, penosamente repetidos até  junho de 

2011. 

O Ministério tem desenvolvido a sua ação através de um conjunto de cinco eixos estratégicos: 

1. Aumentar a eficiência na prestação de cuidados de saúde.  

2.  Aproximar  os  cuidados  de  saúde  dos  cidadãos,  reforçando  os  cuidados  primários  e  os  cuidados 

continuados. 

3. Aumentar a qualidade dos serviços hospitalares, implementando a Reforma Hospitalar. 

4. Reformar a política do medicamento para aumentar o acesso e a qualidade das terapêuticas. 

5. Internacionalizar o sector da saúde, contribuindo para o desenvolvimento da economia nacional. 

Todos estes pontos estão em linha, como não poderia deixar de ser, com o Programa do Governo. Em 

todos eles demos passos já muito significativos.  

Alguns foram discretos, outros mais visíveis. Os cidadãos mais atentos, como os que estão nesta sala, 

terão  sido  capazes  de  reconhecer  a  intenção  estratégica  e  coordenada  de  medidas  como  a 

implementação da racionalidade na prescrição, o registo de incidentes clínicos, a criação de normas de 

orientação, a criação de comissões de farmácia e terapêutica nas administrações regionais de saúde e 

no  Infarmed, o  alargamento do  número de utentes  em medicina geral  e  familiar,  a  criação de uma 

tabela  salarial  para  o  regime  de  40  horas  para médicos,  a  revisão  da  lista  de  utentes  em medicina 

familiar,  as  criações  de  unidades  locais  de  saúde  e  fusões  de  centros  hospitalares,  a  progressiva 

reorganização e expansão da urgência pré‐hospitalar, a acreditação de unidades, a reorganização dos 

agrupamentos de  centros de  saúde, a  criação e expansão de uma plataforma de dados de  saúde, a 

generalização  da  prescrição  por  denominação  comum  internacional,  as  intervenções  no  preço  dos 

medicamentos, o apoio à internacionalização do sector hospitalar público e privado, etc.  

Não precisarei, espero bem, de enumerar todas as medidas tomadas em tão pouco tempo, a maioria 

das quais  sem precedente. Precisamos do  vosso  comentário  sobre o que  fizemos e devemos  fazer. 

Faremos mais, é certo, e estaremos sempre felizes com os que nos pedirem mais, em particular quando 

os pedidos vierem de quem nada ou pouco fez quando teve oportunidade de fazer muito. 

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Caros conferencistas, 

Há certezas que não podem ser escondidas. Dívidas do presente são os impostos futuros. O Estado tem 

custos  e não  tem outras  fontes  significativas de  financiamento que não  sejam  as  contribuições dos 

cidadãos. O que temos de saber, e terão de ser os contribuintes a dizer‐nos, é quanto estão dispostos a 

pagar e para quê. Que SNS querem, de que estão dispostos a abdicar, quais são as oportunidades que 

pretendem trocar para ter um SNS mais geral e universal? 

Entendo,  é  essa  a minha opinião política, que necessitamos de um Estado  Social,  com propósitos  e 

resultados  que  garantam  a  coesão  social,  organizado  de  forma  consensual  em  que  possamos 

compatibilizar  o  desenvolvimento  económico  com  a manutenção  da  proteção  social. Mas  não  nos 

deixemos  enredar  na  demagogia  dos  “almoços  grátis”,  e  na  gratuitidade  absoluta  quando, 

simplesmente, isso não é comportável. O que é o Estado Social? Referimo‐nos à preocupação social que 

todos  temos de  ter? Ou a um Estado que captura a  sociedade e a atrofia ao ponto de a  impedir de 

crescer? Estes são exemplos de perguntas importantes a que só o consenso sobre a Reforma do Estado 

pode responder. 

Vivemos num país onde a maioria, infelizmente, não pode, quase outros tantos vão podendo menos e 

subsiste uma minoria que ainda julga que pode mais do que a realidade lhes vai mostrando. É com este 

tecido social, marcado por dificuldades das famílias e das pessoas, em que fomos despertados para um 

país que  se debate  com o pagamento das dívidas que este Governo encontrou,  com um  cenário de 

incertezas  internacionais  que  estarão  sempre  lá  e  num  contexto  de  envelhecimento  e  maior 

dependência dos serviços de saúde, que temos de manter e melhorar um SNS que responda a todos e a 

todas as necessidades. 

Por  tudo  isto,  é  a  altura  de  voltarmos  ao  básico.  Precisamos,  mais  do  que  nunca,  de  eficiência, 

efetividade, sustentabilidade, controlo de riscos. 

O programa desta conferência, agora no seu segundo dia, percorre aspetos essenciais, diria fulcrais – 

na designação física de ponto de apoio e rotação da balança – para a política de saúde. Financiamento, 

sistema, pagamentos, no dia 20. Rede hospitalar, organização do trabalho, qualidade e eficiência, hoje. 

Todos estes temas são passíveis de decomposição em assuntos específicos e sei que os intervenientes 

o saberão fazer. Esta iniciativa da Academia não será, assim o desejamos, a última. Outras se seguirão, 

numa  lógica abrangente, em que procuraremos continuar a ouvir vozes críticas, seguramente as mais 

desafiantes para um debate conclusivo, que queiram construir soluções que nos ajudem a responder 

aos principais desafios: 

Aumento da esperança de vida, diria da longevidade saudável.  

Redução de episódios de doença, que terão de ser menos frequentes e mais curtos. 

Redução do sofrimento evitável, num contexto da verdadeira medicina paliativa que não seja 

dirigida só aos doentes terminais. 

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Melhoria na qualidade de vida dos cidadãos, o que  implica uma visão global do bem‐estar e a 

aplicação sistemática de avaliação de impactos na saúde. 

Garantia de cuidados de saúde de qualidade, escrutináveis e continuadamente aperfeiçoados. 

Equidade no acesso à saúde, sem exclusões de carácter geográfico – o que não quer dizer que a 

oferta não seja adaptada às circunstâncias demográficas ou das vias de comunicação – e sem 

exclusões de carácter socioeconómico  ‐ porque os mais ricos precisam tanto do SNS como os 

mais pobres ‐ ou de carácter pessoal. 

Redução  do  impacto  económico  e  social  da  doença,  o  que  pressupõe  uma  articulação 

permanente com outros sectores do Estado. 

Nascer  com  saúde,  mas  acima  de  tudo  nascer,  porque  o  aumento  da  natalidade  é  um 

imperativo nacional. 

Crescer  com  segurança,  diria  mesmo  viver  com  segurança  em  todas  as  idades,  locais  ou 

profissões. 

Vida adulta produtiva, acima de  tudo com possibilidade de  realização pessoal num ambiente 

social. 

Envelhecimento  ativo,  independentemente  da  situação  no  mercado  de  trabalho,  já  que  a 

reforma não pode significar abandono de atividade. 

Por tudo isto, é evidente que o nosso caminho, no imediato, tem a obrigação de garantir o combate ao 

desperdício  e  à  fraude,  precisa  de  ser  capaz  de  transmitir  valor  –  no  nosso  caso,  a  saúde  – para  o 

utilizador dos serviços, não pode alhear‐se de medidas que orientem a procura e corrijam os excessos, 

por má distribuição, da oferta e da capacidade mal dimensionada – para mais ou para menos – e, mais 

do que nunca, persistir – contra quem  tiver que ser – na promoção de estilos de vida saudáveis, em 

medidas de política preventiva, na correção de determinantes nocivos – começando pela pobreza – e 

na proteção da saúde individual e coletiva. 

A minha profissão, mais do que a minha forma intrínseca de ser, tornou‐me um otimista. Mas nem por 

isso menos realista. Acredito na viabilidade do SNS, mesmo que para isso tenhamos de fazer ajustes e 

sacrifícios. Os Portugueses precisam de certezas, não nos perdoarão mentiras, ainda que piedosas, e já 

tiveram demasiadas falsas promessas.  

Entendo que existe um consenso nacional amplo e consistente que nos permitirá encontrar as soluções 

socialmente realistas, financeiramente comportáveis e tecnicamente adequadas para que o sistema de 

saúde em Portugal, necessariamente baseado num financiamento público e com um SNS abrangente, 

se desenvolva para lá de 2014, sem que tenhamos de estar sempre a discutir a sua viabilidade.   

 

   

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2. Fontes de financiamento do SNS 

 

Relator:   Agostinho Marques 

Palestrantes:  Daniel Bessa 

Álvaro Almeida 

Filipe de Almeida 

Francisco Ramos 

 

Introdução 

J. Agostinho Marques 

A situação económica e financeira em que nos encontramos exige de todos, por imperativo cívico, que 

se  faça mais  e melhor  com menos  recursos  na  generalidade  dos  serviços  públicos.  A  limitação  de 

recursos financeiros não precisa de ser sublinhada; deve ser assumida como a condição justificativa das 

discussões  a  desenvolver  nos  próximos  dois  dias  de  debate.  A  segunda  parte  da  afirmação  é mais 

problemática.  Fazer  mais  e  melhor  com  menos  recursos,  porquê?  A  razão  é  ética.  Apesar  das 

consideráveis realizações conseguidas pela comunidade no domínio da saúde, as pessoas precisam de 

mais  cuidados  por  eventuais  insuficiências  e  porque  as  alterações  demográficas  produziram 

verdadeiros contingentes de pessoas frágeis. 

E será possível, neste contexto material, fazer mais? Com certeza. É possível reduzir custos supérfluos 

que  se  avolumaram  perante  um  desenvolvimento  pouco  exigente  como  demonstra  a  enorme 

assimetria dos indicadores de gestão dos grandes hospitais públicos, mas sobretudo, quando já não for 

possível construir hospitais, centros de saúde ou estradas, ainda será possível humanizar os serviços de 

que dispomos. Elevar o nível de qualidade dos cuidados será sempre a última fronteira; a que requer 

poucos recursos e compensa muito. 

É habitual proclamar os  louros do sistema de saúde porque é  imensamente bem‐sucedido quando se 

compara a situação atual com a do ponto de partida nos idos anos 80. Quando se entra em conta com 

os custos reais e ainda quando se pensa que a construção se fez com materiais obtidos com crédito de 

longo  prazo  que  não  sabemos  como  pagar,  o  ânimo  esmorece.  Ainda  assim,  ao  comparar  com  os 

restantes serviços do estado, a saúde fica bem. Contudo, quando ouvimos a opinião dos utentes com 

dificuldades  de  obter  uma  consulta  no  ambulatório  ou  nos  hospitais  e  olhamos  as  listas  de  espera 

cirúrgicas, constatamos que as maravilhas de que falamos se esfumaram. Tradicionalmente sugerimos 

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que  as  pessoas  não  têm  razão  para  tantas  queixas,  são mal‐agradecidas  ao  Estado  generoso.  Será 

assim? 

É muito sensato ouvir o que as pessoas têm a dizer, sejam mais ou menos qualificadas. Os políticos ouvem‐nas 

porque cada pessoa representa um voto; os responsáveis da saúde devem ouvi‐las para refrear o entusiasmo 

e compreender que se houver insatisfação é porque os serviços de saúde sofisticados de que nos orgulhamos 

são  insuficientes.  De  novo  é  aqui  o  lugar  de  investir  em  qualidade.  Com  pouco  dinheiro  é  possível  dar 

satisfação a inúmeras queixas individuais. É o lugar onde se pode fazer mais e melhor. 

O  “Debate  sobre o  sistema de  saúde para  além de  2014 “  abre  com uma  sessão que pretende 

definir que recursos materiais haverá em 2014 para a saúde, para que as sessões seguintes com 

especialistas de diversas áreas possam  laborar  sobre uma plataforma  sólida. A pergunta básica 

foi:  em  2014  haverá  8‐9 mil milhões  de  Euros  para  a  Saúde?  Esta  é  a  pergunta  inaugural,  foi 

dirigida ao Professor Daniel Bessa. 

Como  tememos que não haja  tanto dinheiro perguntamos  ao Professor Álvaro Almeida  se  conhece 

outras fontes de financiamento que permitam completar o financiamento eventualmente em falta. O 

Professor  Álvaro  Almeida  discorreu  sobre  a  fonte  adicional  onde  todas  as  atenções  vão  parar,  à 

participação dos utentes através de copagamentos e taxas moderadoras. 

No mundo de incertezas onde nos movemos não podemos deixar de considerar a possibilidade de que 

o empobrecimento do país  faça regredir o sistema para níveis que não permitam satisfazer as atuais 

exigências.  Neste  momento  os  doentes  são  tratados  ainda  com  tudo  o  que  é  considerado  pela 

comunidade  científica  como  o  mais  adequado  ao  seu  problema,  sem  considerar  o  seu  passado 

contributivo, sexo ou idade. Podemos imaginar sem grande dificuldade cenários de rotura, como houve 

repetidamente na história (bélica) europeia. Convidamos o Professor Filipe de Almeida a refletir sobre 

as  vertentes  éticas  destas  situações  limite  que  desejamos  nunca  vir  a  experimentar.  Pretendemos 

compreender  como  lidar  com a  contradição virtual entre uma Constituição que assegura o direito à 

saúde e condições materiais limitativas da satisfação desse direito fundamental. 

Os custos da saúde no país têm grandes assimetrias. É geralmente citado que os habitantes da área de 

ULS de Matosinhos consomem menos  recursos para atingir níveis de  satisfação equivalentes aos do 

resto do País. Se assim for, valerá a pena refletir empenhadamente nestas assimetrias para tentar pôr 

em evidência as medidas capazes de poupar, quer nas áreas mais caras, quer em quaisquer outras, uma 

vez que nunca  se definiu o padrão organizativo  ideal. Pediu‐se este exercício ao Professor Francisco 

Ramos porque, além de ser técnico habilitado, teve experiência governativa que o confrontou com esta 

e outras realidades, esperando a organização que tenha ideias próprias claras sobre a matéria. 

 

Contributos   

Daniel Bessa 

À questão nuclear de haver ou não haver recursos financeiros para manter a dotação do Orçamento de 

Estado para a saúde nos valores atuais em 2014, o Prof. Daniel Bessa respondeu diretamente, SIM. O 

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PIB excede os 150 mil milhões de euros, de modo que o valor a destinar à saúde consiste numa decisão 

política  do  governo  que  a  pode  satisfazer  livremente.  Depois  desta  resposta  tranquilizadora, 

aprofundou o  raciocínio,  trazendo à discussão as variadas  rubricas do orçamento do estado: Defesa, 

Segurança  Social,  Educação,  Justiça,  Segurança,  para  concluir  que  a margem  de  liberdade  real  dos 

governos é muito  limitada,  seguramente  com dificuldades de  continuar a  responder ao aumento de 

custos  impostos  pelos  fármacos  e  pelos  exames  de  diagnósticos,  sempre mais  sofisticados  e mais 

caros. 

Depois de expor e discutir elementos publicados sobre a matéria, o Prof. Daniel Bessa concluiu que a 

resposta só pode ser satisfatória se o país voltar ao crescimento económico significativo e sustentado. 

A não ocorrer crescimento, a situação com que nos confrontamos é muito preocupante, justificando as 

motivações que lançaram o debate. 

 

Álvaro Almeida 

A principal fonte de financiamento do SNS é o orçamento do Estado, e no quadro atual, a possibilidade 

de recorrer a fontes alternativas é  limitada. Uma das alternativas é aumentar os proveitos através da 

prestação  de  serviços  a  utentes  não  abrangidos  pelo  SNS,  ou  seja,  estrangeiros  não  residentes,  o 

habitualmente designado “turismo de  saúde”, que  será  tratado noutro painel. A outra alternativa é 

aumentar os proveitos provenientes de copagamentos dos serviços pelos utentes do SNS. 

O  termo  “copagamento”  designa  o  pagamento,  pelo  beneficiário  de  uma  prestação,  de  um  preço 

correspondendo, ainda que parcialmente, ao custo da prestação obtida, no momento da sua utilização. 

Na área da saúde, encontram‐se vários exemplos de copagamentos, como é o caso dos encargos dos 

beneficiários na ADSE e outros subsistemas, dos copagamentos efetuados pelos detentores de seguros 

de saúde e dos copagamentos de medicamentos pelos utentes do SNS. As taxas moderadoras também 

são copagamentos, se bem que aquelas cumprem sobretudo uma função muito distinta destes, a de 

racionalização do consumo. 

As principais vantagens da utilização de copagamentos são o  incentivarem os utentes a racionalizar a 

sua procura de cuidados de saúde, permitindo maior eficiência na distribuição de recursos, e o facto de 

se  poderem  constituir  como  fonte  adicional  de  recursos  financeiros.  O  principal  inconveniente  da 

introdução de copagamentos é o risco de porem em causa o princípio da cobertura universal, isto é, a 

garantia que todos os cidadãos estão protegidos contra o risco financeiro da doença por alguma forma 

de seguro de saúde (em sentido lato), podendo aceder a cuidados de saúde quando deles necessitarem 

sem sofrerem ruína financeira (na definição da OMS). Acresce que nos moldes atuais, o seu contributo 

para  o  financiamento  do  sistema  é  reduzido,  sobretudo  depois  de  descontados  os  elevados  custos 

administrativos associados à sua cobrança. 

Na perspetiva do financiamento, a questão política relevante é se é possível alargar os copagamentos 

no âmbito do SNS para além dos níveis existentes, sem pôr em causa a cobertura universal, garantindo 

que  nenhum  cidadão  deixa  de  aceder  aos  cuidados  de  saúde  de  que  necessita  por  causa  dos 

copagamentos. 

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18 

 

Em 2012, as taxas moderadoras no SNS representaram proveitos de cerca de 160 milhões de euros, o 

que  corresponde  a  aproximadamente  2%  da  despesa  do  SNS. Os  copagamentos  pelos  utentes  dos 

medicamentos  abrangidos  pelo  SNS  representaram  quase  700  milhões  de  euros,  um  valor  mais 

importante, mas em todo o caso uma fração ainda pequena (10%) da despesa do SNS. 

O  potencial  de  financiamento  decorrente  de  um  aumento  das  taxas moderadoras  atuais  é muito 

limitado. Por exemplo, um aumento “enorme” de 50% das taxas moderadoras vigentes em 2012 (por 

sua vez muito mais elevadas que as vigentes em 2011) geraria apenas 80 milhões de euros, no máximo.  

Uma alternativa seria alargar o leque de atos sujeitos a copagamentos. O princípio dos copagamentos 

poderá  ser  aplicado  potencialmente  a  todas  as  prestações  de  serviços  de  saúde.  No  entanto,  a 

introdução de copagamentos pode atrasar a utilização de serviços,  incentivando os utentes a adiar o 

recurso  a  cuidados  de  saúde  até  à  fase  aguda  da  doença.  Assim,  parece‐nos  que  os  cuidados 

preventivos  não  devem  ser  sujeitos  a  copagamentos  (por  exemplo,  duas  consultas  anuais  com  o 

médico  de  família  poderiam  estar  isentas).  Por  outro  lado,  há  quem  argumente  que  prestações  de 

serviços determinadas pelo médico prescritor e não pelo utente deveriam estar  isentas, porque não 

foram escolhidas por este. Não nos parece que deva necessariamente ser assim, até porque no SNS já 

existem  copagamentos  pelo  utente  que  resultam  da  prescrição  do médico  (por  exemplo,  as  taxas 

moderadoras dos MCDT). 

Porém,  o  potencial  de  financiamento  associado  ao  alargamento  dos  atos  sujeitos  a  copagamentos 

também é limitado. Por exemplo, a recuperação das taxas moderadoras sobre internamentos e cirurgia 

de ambulatório que vigoraram entre 2007 e 2009, e que  foram abandonadas devido ao  seu elevado 

custo político, geraria menos de 15 milhões de euros. 

Parte da razão que  limita o potencial de financiamento dos copagamentos atualmente existentes é o 

elevado número de utentes isentos do pagamento de taxas moderadoras (cerca de 60% dos residentes 

em  Portugal).  Acresce  que  os  utentes  isentos  representam  uma  percentagem  ainda  maior  dos 

utilizadores do SNS, em parte porque o efeito racionalizador dos copagamentos não se faz sentir sobre 

estes utentes. 

A  proposta  que  trazemos  a  este  debate,  assenta  na  revisão  do  atual modelo  de  isenções  de  taxas 

moderadoras.  Concretamente,  propomos  que  se  substitua  o  atual modelo  de  isenções  totais  para 

determinados  utentes,  por  um modelo  em  que  se  limita  os  encargos  anuais  com  copagamentos  a 

valores que sejam suportáveis pelas famílias, e,  logo, não ponham em causa o princípio da cobertura 

universal. 

No  modelo  que  propomos,  cada  ato  está  sujeito  ao  pagamento  de  uma  taxa  moderadora  (por 

exemplo, com os valores atualmente em vigor). Em 1 de  janeiro de cada ano, não há utentes  isentos: 

todos  os  utentes  estão  sujeitos  ao  pagamento  de  taxas  moderadoras.  No  entanto,  a  partir  do 

momento  em  que  o  valor  total  de  encargos  com  copagamentos  no  SNS  (prestações  de  serviços  e 

medicamentos  prescritos  no  SNS)  do  agregado  familiar  atingir  um  determinado  limite,  o  utente 

passaria a estar isento, não tendo que pagar mais taxas moderadoras até ao final do ano. O limite anual 

de encargos seria diferente para cada agregado familiar, e seria definido em função das suas condições 

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económico‐financeiras. Por exemplo, o limite poderia ser correspondente a 1% do rendimento anual do 

agregado familiar. 

A  proposta  apresentada  permitiria  aumentar  significativamente  os  proveitos  do  SNS  com 

copagamentos,  mas  permitiria  sobretudo  racionalizar  a  procura,  permitindo  maior  eficiência  na 

distribuição  de  recursos,  já  que  o  efeito  racionalizador  das  atuais  taxas  moderadoras  está  muito 

limitado pelo  elevado  número de utentes  totalmente  isentos. Acresce que o princípio da  cobertura 

universal continuaria assegurado: a fixação do teto anual como uma percentagem muito reduzida do 

rendimento garante que os utentes têm capacidade financeira para suportar os encargos. Finalmente, 

neste modelo os custos administrativos continuariam  limitados aos níveis atuais, uma vez que, para o 

prestador, cada utente só assume uma de duas categorias  (isento  / não  isento) como atualmente. A 

classificação  de  cada  utente  como  isento  ou  não  isento  em  cada  momento  seria  facilitada  pela 

Plataforma  de  Dados  em  Saúde,  que  recolheria  e manteria  atualizada  toda  a  informação  sobre  os 

encargos suportados pelo utente. 

 

Filipe de Almeida 

O princípio de dar a todos os cidadãos os cuidados de saúde, em termos de diagnóstico e tratamento 

com recursos indicados pelos técnicos de saúde, de acordo com as normas internacionais, isto é, tudo a 

todos, tem sido o modelo, simultaneamente ideal e real nas sociedades modernas europeias, incluindo 

Portugal. O nosso esforço patriótico deve centrar‐se nas medidas que evitem romper a situação  ideal 

vigente. Não é impossível imaginar que o agravamento da situação económica e financeira portuguesa 

e  internacional  nos  conduza  à  subversão  deste  contexto.  Se  chegarmos  a  uma  situação  de 

incapacidade de sustentar o modelo, precisaremos de definir politicamente o que poderá ser feito, até 

onde, e a quem. Discussões desta natureza deverão envolver toda a sociedade portuguesa, apesar da 

extrema  delicadeza  e  da  dificuldade  de manter  discussões  lúcidas  em  tempos  de  regressão.  Ainda 

recentemente, a propósito de um parecer solicitado ao Conselho Nacional de Ética para as Ciências da 

Vida,  ainda  livres  destes  condicionamentos,  os  intervenientes  públicos  trataram  de  destruir  o 

documento antes de o estudar. Foi um grande exemplo das dificuldades que nos poderão esperar com 

os atores em exercício. 

Num quadro desta natureza é necessário respeitar os princípios fundamentais da ética, nomeadamente 

o princípio da justiça. Na prosperidade ou na penúria o princípio fundamental é a equidade que recusa 

distinções de idade, etnia, situação económica ou social. 

 

Notas finais 

Concluímos  que  em  2014  haverá  grandes  dificuldades  orçamentais  no  financiamento  da  saúde  que 

obrigam desde  já a um esforço tenaz de contenção e a medidas criativas de gestão de recursos para 

assegurar os cuidados de saúde sem perdas importantes. O futuro imediato é igualmente preocupante, 

dependendo  da  evolução  da  situação  económico‐financeira  nacional  e  internacional.  O  recurso  a 

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copagamentos  e  o  agravamento  das  taxas moderadoras  teria  efeitos  discretos  no  financiamento. 

Recorrer  a  estes  expedientes  poderá  ser  necessário  por  razões  distintas  dos  objetivos  em  análise. 

Quaisquer  limitações  na  resposta  aos  doentes  que  advenham  do  agravamento  das  condições 

financeiras  terão  de  ser  tratadas  dentro  da máxima  equidade. Nunca  poderá  ocorrer  diferenças  de 

cuidados  devidas  a  orientações  específicas  de  unidades  de  saúde  ou  roturas  financeiras  locais  ou 

regionais; sempre de acordo com regras universais transparentes. 

A questão nuclear da assimetria regional dos custos das unidades de saúde por utente não foi tratada 

no painel. Será retomada em painéis posteriores ao longo do debate. 

   

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3. Sistema de Saúde Português 

 

Relator:   Álvaro Almeida 

Palestrantes:  José Mendes Ribeiro 

Constantino Sakellarides 

Miguel Guimarães 

José Martins Nunes 

Nascimento Costa 

 

Introdução 

Álvaro Almeida 

O sistema de saúde português não está limitado ao SNS, contrariamente ao que pode transparecer de 

muitos debates que tendem a focalizar no SNS a discussão sobre o sistema de saúde. 

A despesa do SNS representou 55% da despesa corrente em saúde em Portugal, no período 2001‐2010, 

de acordo com os dados do INE.1 No mesmo período, a despesa em prestadores públicos representou 

42% daquela despesa. Avaliando pela despesa realizada, o SNS representa pouco mais, e os prestadores 

públicos  pouco menos,  de metade  do  sistema  de  saúde  português.  Há,  pois,  um  leque  de  outros 

financiadores e prestadores de  cuidados de  saúde que não pode  ser  ignorado nos debates  sobre o 

sistema de saúde em Portugal. 

A importância dos prestadores não públicos e do financiamento não SNS implica não só que a reforma 

do sistema de saúde terá de passar pelo resto do sistema, mas também que a reforma do próprio SNS 

poderá  beneficiar  de  uma  interligação mais  eficiente  entre  as  diversas  partes  do  sistema  de  saúde 

português. O segundo painel debateu este tema, abordando‐o sobre diversas perspetivas. 

 

                                                            

 

1 Instituto Nacional de Estatística, Conta Satélite da Saúde, 2010. 

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Contributos 

A.  A  separação  entre  financiamento  e  prestação  no  SNS  

Mendes  Ribeiro  considera  que  a  crise  financeira  internacional  colocou  um  acrescido  desafio  ao 

equilíbrio  da  economia  portuguesa mas  ajudou,  também,  a mostrar  à  evidência  como  a  indisciplina 

financeira,  consumidora  de  recursos  públicos  (impostos),  pode  condicionar  o  processo  de 

desenvolvimento  do  país  e  comprometer  a  sua  trajetória  de  convergência  de  crescimento  com  os 

países mais desenvolvidos. A conjuntura económica obriga à  reforma do sistema de saúde, que está 

condicionada por três aspetos  fundamentais: o compromisso  implícito no contrato social de garantia 

de universalidade do acesso; a sustentabilidade financeira, atual e futura, do SNS; a aplicação eficiente 

dos recursos públicos na obtenção de resultados para a população. 

A universalidade do acesso é um valor  fundamental que não deve ser posto em causa, garantindo a 

todos os cidadãos o acesso aos cuidados de saúde, de acordo com a sua necessidade, não excluindo 

ninguém em função da sua capacidade de pagar, considera Mendes Ribeiro. A aplicação eficiente dos 

recursos  públicos  implicará  a  operacionalização  plena  do  princípio,  também  já  consensual,  na  sua 

opinião, da separação entre o financiamento e a prestação. Significa  isto, em termos práticos, focar o 

papel do SNS em assegurar a provisão dos cuidados de saúde necessários à população em alternativa 

ao seu papel predominante de prestador direto. A introdução de mecanismos de mercado no sector da 

saúde  poderá  ser  o  ponto  de  partida  para  uma  reforma  estrutural,  indispensável  e  urgente,  cuja 

transição carece de tempo, progressividade e pedagogia. 

Martins Nunes recordou que todos os sectores e subsectores do Estado foram convocados a diminuir a 

despesa,  ajustando‐a  às  receitas disponíveis para minorar o défice orçamental, pelo que o  SNS  tem 

nesta fase uma preocupação emergente com os custos operacionais. Daí que as politicas do Ministério 

da  Saúde,  na  primeira  fase,  foram medidas  de  emergência,  voltadas  para  o  controlo  de  custos  em 

variadíssimas  áreas,  nomeadamente  naquelas  em  que  se  admitia  ganhos  de  eficiência  e  ganhos 

operacionais  para  com  terceiros.  Efetivamente  foi  possível  fazer  ajustamentos  na  área  do 

medicamento,  aquisição  serviços  externos, organização hospitalar,  etc., num  esforço que  ainda não 

terminou, e terá que ser acompanhado numa segunda fase por uma reorganização do SNS que relance 

o financiamento e que obtenha ganhos de saúde, em concreto, que possa gerar “valor”. A abordagem 

simplista do controlo da despesa através da diminuição dos custos operacionais tenderia a falhar numa 

fase posterior, se fosse o único instrumento de controlo dos custos. 

A finalidade de um Sistema de Saúde não é minimizar os custos, mas sim obter ganhos em saúde, logo 

“valor  acrescentado” por euro gasto, defendeu Martins Nunes. O nosso  sistema de  saúde deve  ser 

reorientado  para  esta  nova  perspetiva,  obtendo  valor  a  menor  custo.  Porter  e  Teisenberg  (2006) 

propunham a mudança do paradigma tradicional para uma redefinição de atuação na saúde assente na 

criação de  valor que geraria mecanismos de  concorrência  com base nos  resultados. Em Portugal  as 

instituições prestadoras de cuidados de saúde têm uma procura que resulta do critério da repartição 

administrativa do país para o  tratamento dos doentes, não havendo  concorrência entre  instituições 

públicas prestadoras de cuidados de saúde. Martins Nunes defende a  introdução da  livre escolha no 

SNS – através do princípio da “mochila” financeira – que  incentive as  instituições públicas a concorrer 

entre si com base no valor e na qualidade dos serviços. Recordou ainda que vários países europeus  já 

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migraram  ou  estão  a  migrar  para  a  separação  entre  prestação  de  cuidados  de  saúde  e  seu 

financiamento,  como,  a  Finlândia  (contratualização  é  responsabilidade  dos  municípios),  Suécia 

(aquisição  de  serviços  feita  por  agências  públicas),  Reino  Unido  (contratualização  com  grupos  de 

médicos  de  família),  Holanda  (contratualização  com  seguradoras)  algumas  regiões  de  Itália  e  de 

Espanha, Bulgária, Estónia, Geórgia, Hungria, República Checa, e Roménia. 

Miguel Guimarães defende que, enquanto bem público, a Saúde é um património que todos temos a 

obrigação  de  defender  e  preservar,  e  é  simultaneamente  um  bem  privado,  enquanto  necessidade 

básica  de  cada  um  de  nós.  Faz  parte  do  capital  humano,  sendo  essencial  para  o  equilíbrio  das 

sociedades. A Saúde acrescenta mais valor à economia, à educação, à justiça e ao bem‐estar social. Por 

isso, o SNS tem sido muitas vezes referido como o principal factor de coesão social e uma das principais 

conquistas  da  nossa  democracia.  Debater  o  “Sistema  de  Saúde  além  de  2014”  é  pensar  a  sua 

sustentabilidade, em face da crise económica e financeira que atravessamos, preservando o património 

genético do SNS.  

Neste contexto, Miguel Guimarães considera que vale a pena abordar o tema da liberdade de escolha e 

concorrência,  evitando  o  debate  ideológico  em  torno  da  organização  económica  das  sociedades 

modernas. Até porque a prestação de  cuidados de  saúde apresenta  características particulares, que 

tornam  discutível  definir  a  concorrência  como modelo  de  organização  a  implementar.  E  a  reflexão 

devida  sobre  a  consagração  prática  da  liberdade  de  escolha  e  concorrência  no  Sistema  de  Saúde 

Português, deve ter sempre em mente que o SNS é um bem essencial que deve ser preservado a todo o 

custo, que o  investimento em saúde nos últimos 30 anos correspondeu a uma melhoria notável nos 

indicadores de  saúde pública a nível  internacional  (veja‐se os mais  recentes  relatórios da OCDE e da 

OMS) e que os nossos profissionais de  saúde  competem em qualidade  com os melhores do mundo 

ocidental. 

Nascimento Costa lembrou que qualquer reforma do sistema de saúde terá de envolver os profissionais 

de  saúde, e que um  sistema de  saúde eficaz pressupõe a existência de uma estrutura que decida e 

planeie, realizando decisões políticas informadas, tendo defendido uma administração pública estável, 

baseada no mérito e sem partidarização. 

Constantino Sakellarides considera que o SNS é uma instituição portuguesa, com raízes históricas mais 

interessantes  do  que  possa  parecer  à  primeira  vista  –  tem  sido  a  principal  expressão  das  políticas 

públicas na saúde das últimas 4‐5 décadas. Ser uma  instituição significa, entre outras coisas, constituir 

um património comum (de cidadãos e profissionais), uma referência cultural, identitária, de proteção e 

pertença.  Naquela  Europa  que  adotou  a  solução  tipo‐Beveridge  para  o  seu  sistema  de  saúde,  é 

seguramente  na  Inglaterra que  essa  referência  cultural  é mais  forte  (our NHS). Nos países  do  sul  – 

Portugal, Espanha, Itália e Grécia (que fizeram a sua “transformação Beveridgina” entre 1978 e 1986) – 

Portugal é seguramente aquele onde esta referência é mais marcada.  

As  instituições  resultam  de  uma  vontade  coletivamente  expressa  e  vivida.  Para  Constantino 

Sakellarides não parece fazer sentido jogá‐las no “mercado”. Considera que é necessário aperfeiçoar o 

SNS,  sem  qualquer  dúvida, mas  que  isso  se  faça  através  de mecanismos  de  concorrência  entre  o 

“público” e o “privado” não  lhe parece  justificável. A alternativa ao SNS que por vezes é  formulada, 

mas nem sempre claramente explicitada, resume‐se na convergência das duas proposições seguintes: 

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(i) financiamento público a que acedem concorrencialmente o público e o privado; (ii) o Estado deve 

ser  financiador  e  regulador mas  não  prestador.  Constantino  Sakellarides  considera  que  esta  é  uma 

opção possível, mas não a opção adequada,  já que considera o SNS – uma das melhores  instituições 

públicas do país (figura 1) – dispensável, e é provável que este caminho faça com que, num futuro não 

muito distante, muita prestação de cuidados de saúde no país seja  feita através de potentes cadeias 

internacionais. Considera que nessa altura seremos muito menos cidadãos, porque reduzidos, uma vez 

mais, à simples condição de consumidores. 

 

Serviço Nacional de Saúde  

  SNS como instituição do país 

Justiça 

Educação 

Centro de saúde    reformados 

Referência cultural Proteção Pertença Propriedade comum 

Nível “médio” de desenvolvimento do país 

 

Fonte: Apresentação de Constantino Sakellarides 

   Figura 1: SNS como instituição do país 

 

B.  O  princípio  da  liberdade  de  escolha  

O  SNS  é  das  pessoas  na  medida  em  que  as  serve.  Aqui  emerge  a  questão  da  escolha,  defende 

Constantino Sakellarides. Vivemos numa “sociedade da escolha” – a escolha é hoje um valor marcante 

e o SNS não  se  atualizou neste domínio. No entanto  a escolha,  sendo muito  importante, não é um 

“absoluto”. Ao “princípio” é necessário acrescentar sempre os  resultados do “exercício” da escolha 

nas  circunstâncias  em  que  ele  ocorre  –  é  a  preocupação  séria  da  captura  de  quem  escolhe  pelo 

escolhido. 

A  consagração  legal  da  liberdade  de  escolha  configura  as  suas  próprias  limitações,  para  Miguel 

Guimarães. Em geral, a capacidade financeira, os recursos existentes e disponíveis e a organização dos 

serviços, são desde logo limitações que se podem encontrar na oferta de cuidados de saúde no sector 

privado  e, no  caso dos  recursos  e da organização  também no  sector público.  Já quando  se  fala de 

regras  de  organização  (base  XIV  da  Lei  de  Bases  de  Saúde),  a  limitação  pode  colocar  barreiras  no 

acesso  aos  cuidados  de  saúde,  que  não  são  eticamente  aceitáveis  no  SNS. A  negação  do  acesso  a 

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doentes  que  não  pertencem  às  respectivas  áreas  de  alguns  hospitais  é  disso  um  exemplo 

paradigmático. As medidas  aplicadas nos últimos  anos na  área da  Saúde  (e  em particular  a  Lei dos 

Compromissos), conduziram a uma mudança de paradigma. Os hospitais EPE têm orçamentos que são 

obrigados a cumprir, e por  isso a sua preocupação principal foi desviada da prestação de serviços de 

qualidade e na maior quantidade possível para combater  tempos de espera e  reduzir custos, muitas 

vezes de forma cega e sem qualquer preocupação com a sua principal função.  

Esta mudança de paradigma acentuou de  forma dramática a  liberdade de escolha dos doentes, que 

Miguel  Guimarães  considera  que  no  SNS  verdadeiramente  nunca  existiu.  Os  doentes  não  só  não 

escolhem o médico que os vai observar como também não escolhem o médico que os vai operar. De 

facto, muitos doentes são observados, diagnosticados e aceitam ser submetidos a uma determinada 

intervenção cirúrgica proposta por um médico (que um outro médico da mesma especialidade poderia 

não  indicar),  e  acabam  por  ser  operados  por  outro médico,  que  não  só  não  conhecem  como  não 

escolheram ou estabeleceram qualquer empatia própria da relação médico‐doente. No sector privado a 

liberdade  de  escolha  existe,  embora  condicionada  à  capacidade  económica  e  financeira  do 

doente/cliente. A concorrência entre unidades de saúde privadas existe e está regulada pelo Estado e 

pela ERS. Já entre o serviço público e o serviço privado não só não existe concorrência, como existem 

algumas disfunções que favorecem nuns casos o serviço público e, noutros, o serviço privado. 

A liberdade de escolha no âmbito do SNS foi também defendida por Martins Nunes, que sugeriu que o 

Estado poderia alargar substancialmente o campo de exercício da liberdade de escolha, pelos cidadãos, 

das  entidades  prestadoras  de  cuidados  de  saúde,  facilitando  o  acesso  a  um  seguro  alternativo  de 

saúde,  como  previsto  no  art.  24º  do  Estatuto  do  SNS.  Em  contrapartida  da  sua  libertação  da 

responsabilidade pelos encargos decorrentes da prestação de certos cuidados de saúde a beneficiários 

do  SNS, o  Estado  atribua  a  estes, uma  compensação  a  título de  contribuição para o prémio de um 

seguro  de  saúde  que  estes  beneficiários  pudessem  contrair,  seguro  este  que  cobriria  os  referidos 

cuidados. 

O  sistema  deverá  ser  guiado  pelas  escolhas  e  preferências  do  cidadão,  ou  seja,  deixar  que  seja  a 

procura a comandar a oferta e não o contrário, defende Mendes Ribeiro. Esta reforma tem estado a ser 

introduzida no SNS inglês (NHS), país onde se inspira o nosso modelo de SNS no domínio da prestação, 

e  num  contexto  diferente,  na  Holanda,  no  segmento  do  financiamento,  baseado  num modelo  de 

seguro social, que assegura idêntico caminho de liberdade de escolha. 

Mendes Ribeiro tem defendido que a  introdução de um maior grau de liberdade de escolha por parte 

dos utentes, na escolha dos prestadores de cuidados, pode  induzir um maior nível de eficiência e de 

satisfação dos utilizadores do sistema sem que  isso provoque um aumento da despesa pública com a 

saúde, antes contribuindo para a sua desaceleração progressiva face ao seu peso no PIB. O exemplo é a 

própria ADSE, como um subsistema também público, que tem conseguido compatibilizar a liberdade de 

escolha com uma capitação mais baixa por utente e melhores tempos de acesso, quando comparado 

com uma utilização  semelhante por parte de um utente do SNS. Antes de  avançar  com  a potencial 

extinção da ADSE, devemos interpretar cuidadosamente os resultados de cada sistema, em termos de 

satisfação  dos  utilizadores,  facilidade  de  acesso,  tempos  de  espera,  custo  médio  dos  episódios  e 

capitação  suportada,  para  não  sacrificar  uma  solução  que  pode  funcionar melhor  a  uma  lógica  do 

nivelamento por baixo. 

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A  liberdade de escolha é um  imperativo estratégico que conduzirá à mudança  radical do  sistema de 

saúde  português,  colocando,  de  facto,  o  cidadão  no  centro  do  sistema,  defende Mendes  Ribeiro. 

Muitos países testam novas abordagens aos desafios do futuro. Portugal tem a sua oportunidade de 

mostrar como se pode guiar uma mudança estrutural pela introdução de uma nova cultura e por novas 

formas de relacionamento entre os vários atores do sistema de saúde, atuando sobre a saúde pública, a 

prevenção  e  a  oferta  de  cuidados.  Acresce  que  a  nova  Diretiva  Comunitária  sobre  Cuidados 

Transfronteiriços  impõe  uma  nova  experiência  e  realidade  a  Portugal, mais  próxima  do modelo  de 

Bismarck. Portugal precisa de fazer evoluir o seu Sistema de Saúde para um novo patamar em que a 

escolha do consumidor será mais soberana; a concorrência  interna e externa aumentará; a decisão de 

escolha será mais informada; e a regulação será mais efetiva e exigente. 

A  entrada  em  vigor,  em  Outubro  deste  ano,  das  diretivas  europeias  sobre  cuidados  de  saúde 

transfronteiriços, também foi referida por Miguel Guimarães, que considera que seguramente poderão 

estimular a concorrência a outros níveis, e servir de mola ativadora para o chamado Turismo de Saúde. 

Nascimento Costa recordou que o exercício da liberdade de escolha pressupõe educação para a saúde, 

e uma regulação efetiva, através das várias entidades com funções reguladoras no setor da saúde em 

Portugal.  

 

C.  Propostas  de  reforma  do  sistema  de  saúde  

C.1.  Separação  do  financiamento da  prestação  (José  Mendes  Ribeiro)  

O primeiro passo para a  liberdade de escolha na saúde começa, exatamente, na decisão de separar o 

financiamento  da  prestação  e  garantir  de  forma  clara  o  conjunto  de  benefícios  que  cada  sistema 

oferece, defende Mendes Ribeiro. Daí decorrerá uma maior transparência do  investimento público na 

saúde, assegurando que o direito constitucional de acesso á saúde tem igual tratamento para todos os 

portugueses.  

Em  consequência, propõe que  sejam unificadas  as  atuais  redes  convencionadas do  SNS  e da ADSE, 

dada a sua quase total redundância de prestadores. Haveria poupança de recursos e simplificação do 

processo  de  prescrição,  contratualização  e  controlo  de  faturação  da  rede  de  prestadores  de 

medicamentos e de meios complementares de diagnóstico e terapêutica.  

Para  implementar  uma  progressiva  liberdade  de  escolha  seria  ainda  necessário  fazer  três  coisas 

fundamentais:  criar uma  tabela única e universal de preços de “compra de  cuidados”, por parte do 

Estado;  disponibilizar  um  sistema  de  informação  que  suporte  o  Registo  de  Saúde  Electrónico  e 

acompanhe todos os passos do utilizador ao longo do sistema; introduzir um sistema de planeamento, 

contratualização e monitorização de resultados, fiável, rigoroso e exigente.  

Este programa de reforma só será viável com a adopção de uma agenda de mudança muito clara, uma 

liderança firme e um plano de comunicação eficaz junto dos utentes, dos profissionais e das instituições 

que compõem o sistema de saúde.  

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Um  programa  deste  alcance  exige  um  roadmap  detalhado  e  indicadores  de  desempenho  que 

acompanhem o seu progresso, permitindo corrigir a trajetória sempre que ocorram desvios. Não é um 

programa que se faça num ano ou colha resultados numa legislatura. Mas é possível implementá‐lo ao 

longo de 3 a 5 anos, de forma progressiva, através de uma contínua optimização dos meios e de um 

ajustamento contínuo dos seus processos. 

A mudança  a  operar  deve  estar muito  para  além  da  introdução  de mecanismos  de mercado  que 

permitam  uma  competição  gerida  entre  prestadores  dos  três  setores:  público,  privado  e  social.  A 

mudança  representará  o  início  de  um  novo  ciclo  que  fomentará  a  progressiva  transformação  dos 

custos fixos do SNS em custos variáveis e conduzirá a um maior nível de transparência, para o qual será 

indispensável  um  efetivo  e  arrojado  programa  de  tecnologias  de  informação  que  simplifique  as 

operações e a burocracia.  

Garantir  a  sustentabilidade  futura do  sistema de  saúde  exigirá uma nova  arquitetura do  sistema de 

saúde centrada no cidadão; a unificação do  sistema público de  financiamento; uma provisão pública 

garantindo livre escolha do prestador; menos custos fixos, mais custos variáveis; partilha do risco com 

operadores do mercado; e utilização  intensiva das novas TIs, designadamente através do Registo de 

Saúde Electrónico. 

 

C.2. Liberdade de escolha no SNS (Miguel Guimarães) 

Miguel Guimarães defende que é possível estimular a liberdade de escolha e a concorrência mantendo 

o património do SNS, atuando em três eixos estratégicos. 

A. Centrar o sistema no cidadão 

Centrar  o  sistema  no  cidadão,  significa  dar  poder  ao  doente  e  responsabilizar  o  doente  pelas  suas 

decisões  (o  poder  da  informação:  da  informação  da  despesa  e  dos  custos  em  saúde,  do  valor,  da 

complexidade e da qualidade dos atos médicos, dos resultados, complicações e eventos adversos das 

unidades de saúde públicas e privadas). Na prática, tornar o sistema mais transparente e flexível. Dito 

de outra  forma, o doente para poder escolher de  forma  informada e  responsável deve  ter acesso a 

toda a informação sobre os resultados dos tratamentos existentes de várias patologias nas diferentes 

unidades de saúde do Sistema de Saúde. E a  informação deve obedecer a critérios de  indicadores de 

qualidade credíveis e auditáveis regularmente e de forma externa. De facto, a liberdade de escolha e a 

concorrência  significam  a  regulação  e  o  conhecimento  de  factores  como  informação  válida,  fiável, 

objetiva e transparente sobre qualidade, valor e complexidade. 

B. Organizar o trabalho dos profissionais de saúde e das unidades de saúde públicas e privadas 

Os  profissionais  de  saúde,  e  nomeadamente  os médicos,  sobretudo  aqueles  que  têm  funções  de 

direção, deveriam poder optar por trabalhar em dedicação permanente (e não em dedicação exclusiva) 

e serem remunerados de acordo com a sua dedicação e as suas responsabilidades na sociedade e em 

função  do  valor  e  da  qualidade  dos  atos  médicos.  Nas  condições  atuais  e  nos  próximos  anos,  a 

separação entre os sectores público e privado significaria um novo modelo concorrencial em saúde e o 

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fim do SNS, tal como está constitucionalmente consagrado. Por  isso, e porque defende a essência do 

SNS, Miguel Guimarães não quer que Portugal  siga os passos de países como os Estados Unidos da 

América, em que o sector público, claramente debilitado, existe apenas para servir os doentes que não 

têm possibilidade de escolher um serviço de saúde de melhor qualidade.  

Estimular  e  desenvolver  a  criação  de  Centros  de  Referência  a  vários  níveis.  “Não  podemos  nem 

devemos  fazer  tudo  em  todo  o  lado”.  Esta  reorganização  deve  envolver  o  Serviço  de Urgência,  as 

Unidades e Serviços Hospitalares, os Cuidados de Saúde Primários e os Cuidados Continuados. 

Investir ao nível dos cuidados de saúde primários e do médico de família, o centro da organização de 

todo o sistema, funcionando o médico de família como o conselheiro dos doentes. 

Para melhorar a qualidade da organização e do desempenho, é fundamental fortalecer o papel capital 

da performance individual e colectiva e do Registo Nacional de Erros e Eventos Adversos Graves, a ser 

implementado com intuito preventivo e não punitivo. 

Nesta perspetiva, é essencial avançar de forma sólida para a definição e implementação de indicadores 

de qualidade com publicação e divulgação dos mesmos (por patologia, por especialidade, por serviço, 

por unidade de saúde) e estimular a formação contínua e a recertificação de competências com base na 

estrutura da Carreira Médica. 

C. Alterar o modo / modelo de financiamento preservando a essência e o património do SNS   

Portugal não  tem  condições para  implementar  a  liberdade de  escolha da  entidade  financiadora. No 

entanto, é possível alterar o modo de  financiamento no  sentido de  tornar o  sistema de  saúde mais 

justo,  mais  flexível  e  com  mais  liberdade  de  escolha  e  concorrência.  E  o  princípio  de  que  o 

financiamento da saúde per capita deve ser  igual em todo o país é essencial, para que exista de facto 

justiça social. 

Nesta perspetiva, a possibilidade de implementar um modelo de custo por ato médico, em que o valor 

do  ato  médico  (preço)  seja  definido  com  base  na  sua  complexidade  e  raridade  (Código  de 

Nomenclatura e Valor Relativo de Atos Médicos da Ordem dos Médicos), é um caminho possível para 

corrigir as imensas anomalias que atingem o atual sistema, permitindo com mais segurança estabelecer 

um modo  diferente  de  financiamento  em  que  o  “dinheiro  deve  seguir  o  doente”.  A  concorrência 

dentro do sector público pode funcionar como estímulo positivo no sentido da melhoria contínua dos 

cuidados de saúde, e pode ser catalisadora da eficiência e da qualidade, acrescentando valor dentro do 

SNS.  Não  existem  condições  no  país  nem  organização  no  sistema  de  saúde  que  permitam,  neste 

momento e nos próximos anos, o alargamento desta concorrência ao sector privado.  

Neste modelo, é essencial preservar a natureza das  taxas moderadoras. A discussão do conceito de 

copagamentos e de  seguros de  saúde,  a  sua  integração em  todo o  sistema de  saúde, e o papel do 

Estado e dos financiadores privados, devem ser encarados com muita prudência, e sem alterar o código 

genético  do  SNS.  É  fundamental  preservar  a  justiça  social  (equidade,  acesso  e  cuidados  de 

proximidade). 

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Nestes caminhos e ideias para debate, o papel das “Centrais de Compras”, com publicitação obrigatória 

de  todos  os  resultados,  e  o  resultante  benchmarking  entre  as mesmas,  e  o  papel  de  auditorias  de 

processos, de procedimentos e financeiras (de gestão) que sejam verdadeiramente consequentes, são 

a pedra de toque que permite um caminho mais sustentável. 

C.3. Gestão horizontal dos processos de cuidados de saúde (Constantino Sakellarides) 

No  sistema  e  saúde  português  coexistem  o  público,  o  social  e  o  privado. Uma  direção  estratégica 

inteligente do sistema de saúde deve saber tirar partido desse facto. Qual é, na opinião de Constantino 

Sakellarides, a melhor forma de o fazer? 

Um dos principais desafios dos sistemas de saúde na atualidade, em todo o lado, é o de fazerem a difícil 

transição  de  sistemas  vocacionados  para  responder  a  episódios  agudos  de  doença  (incluindo  as 

agudizações da doença crónica) para sistemas capazes de responder eficiente e efetivamente à doença 

de  evolução  prolongada.  Esta  transição  requer  (i)  dispositivos  integradores  que  asseguram  a 

continuidade  dos  cuidados  (a  sociedade  da  informação  dos  nossos  dias  é  rica  em  soluções  nesta 

matéria); um maior protagonismo do cidadão‐utilizador (literacia, escolha informada, cidadania). 

Em termos muito esquemáticos, esta transição pode ser formulada da seguinte forma: acrescentar às 

organizações  verticais da  atualidade  (cuidados de  saúde primários, hospitais,  cuidados  continuados, 

saúde pública) a gestão horizontal dos processos de cuidados de saúde – criar mais valor  (melhores 

resultados/euros  gastos)  nesses  trajetos  é  o  principal  objetivo  destes  “novos”  sistemas  de  saúde 

(Figura 2). Em termos teóricos  isto corresponde às cadeias de valor na saúde formuladas por Michael 

Porter (mas não à forma com as tem procurado adaptar aos sistemas de saúde europeus). 

Das organizações de saúde aos processos de cuidados 

 

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30 

 

Das organizações de saúde aos processos de cuidados 

Processo de cuidados de saúde   RESULTADOS 

Organização virtual 

 

Das organizações de saúde aos processos de cuidados 

Comunidade 

 

Fonte: Apresentação de Constantino Sakellarides 

Figura 2: Gestão horizontal dos processos de cuidados de saúde 

 

Esta  “gestão  horizontal”  dos  trajetos  do  cidadão‐utilizador  do  SNS  corresponde  a  aquilo  que  as 

pessoas  de  facto  querem  –  percorrer  com  facilidade  os  trajetos  que  necessitam  (sem  obstáculos  e 

demoras). As pessoas são capazes de distinguir, não só bons trajetos dos maus, mas também os maus 

resultados dos bons no fim de cada trajeto. De facto só um SNS, e um SNS de qualidade, pode oferecer 

uma plataforma de  cuidados,  suficientemente  extensa,  completa  e  integrada,  capaz de  assegurar o 

essencial dos trajetos necessários. 

Neste contexto, é possível  imaginar  formas de  interação virtuosa entre os  sectores público,  social e 

privado. Em  relação ao sector social: existem comunidades no país que, pelas suas características de 

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desestruturação  social,  não  obtêm  respostas  suficientemente  flexíveis  por  parte  das  organizações 

públicas formais – aqui a inclusão de organizações de carácter social em parte dos trajetos necessários 

pode  ser muito  útil.  Em  relação  ao  sector  privado:  num  sector  em  rápida  evolução  existem  novos 

procedimentos e práticas que são, nalguns casos, rapidamente adotadas pelo sector privado. Algumas 

dessas práticas acabavam por ser avaliadas como custo‐efetivas; outras não passam de “modas”, mais 

ou  menos  populares.  A  gestão  publica  horizontal  pode  incorporar  nos  trajetos  necessários  essas 

práticas  através  do  sector  privado  numa  fase  experimental  e  partir  daí  gerir  a  forma  com  as  quer 

incorporar no sector público. É evidente que isso não se aplica a toda à tecnologia/inovação da saúde, 

um vez que o SNS deve continuar a esta na vanguarda da inovação em saúde no país.  

Existem muitas mais oportunidades de  interações deste  tipo. O que  é  importante  é que  elas  sejam 

desenhadas  pelos  “gestores  públicos/SNS”  de  acordo  com  o  interesse  das  pessoas  –  percorrer  os 

trajetos que criam valor para a saúde, e não pelas pressões, diretas ou  indiretamente associadas aos 

interesses  económicos  dos  prestadores  privados,  nacionais  e  internacionais,  da  saúde.  Os  atuais 

desenvolvimentos na área da  informação de saúde  (mais centrada na pessoas que nos serviços) e o 

projeto  do  enfermeiro  de  família,  se  bem  integrados  neste  tipo  de  transformação,  podem  ser 

“instrumentos” úteis para caminhar na direção certa. 

C.4. Turismo médico (José Martins Nunes) 

O Turismo Médico consiste na realização de viagens a outros países para procurar cuidados médicos de 

qualidade a preços razoáveis. O mercado global de Turismo Médico foi estimado em 60 mil milhões de 

dólares em 2005, sendo ainda estimado que em 2012 atingisse 100 mil milhões de dólares, de acordo 

com  Martins  Nunes.  O  Turismo  Médico  gera  uma  despesa  média  superior  ao  turismo  tradicional 

($15.000 contra $3.000), com estadias mais prolongadas. O turismo de saúde é geralmente motivado 

pela  dificuldade  no  acesso  a  cuidados  de  saúde  no  país  de  origem  (idade  e  outros motivos),  pela 

rapidez no tratamento (listas de espera), e pela privacidade e confidencialidade (reabilitação alcoólica e 

de drogas). 

O CHUC – Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, através do seu Núcleo de Internacionalização – 

International Relations Centre, tem‐se posicionado para oferecer serviços a clientes  internacionais nas 

áreas da Cirurgia ortopédica, Cirurgia cardíaca, Cardiologia de intervenção, Transplantação de órgãos e 

Reatribuição de sexo. 

Os  elementos  centrais  de  uma  estratégia  de  internacionalização  bem  sucedida  são  o  custo  e  a 

qualidade  dos  serviços  prestados.  Os  principais  destinos  do  turismo  médico  têm  preços  por 

procedimento que se situam entre 20% e 40% dos custos do mesmo procedimento nos EUA. Por outro 

lado, os clientes do turismo médico exigem níveis de qualidade  idênticos aos dos países de origem, e 

qualidade que seja reconhecida nos mercados de origem. Assim, é essencial que o prestador tenha uma 

marca  reconhecida,  e  a  marca  CHUC  já  beneficia  de  tal  reconhecimento,  pelo  menos  em  alguns 

mercados. 

   

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4. Modelos de pagamento da prestação de cuidados de saúde 

 

Relator:   Miguel Gouveia 

Palestrantes:  Nuno Sousa Pereira 

António Ferreira 

Pedro Lopes 

Rui Santana 

 

Contributos 

A.  Objetivos  finais  e  valores  de  um  modelo  de  pagamentos  

Além do valor  central da obtenção de ganhos de  saúde,  todos os participantes  referiram, de  forma 

mais ou menos extensa, que o Value  for Money seria um objetivo central do sistema. As  implicações 

referidas deste objetivo foram vastas, desde conseguir uma melhor gestão e utilização dos recursos em 

cada  unidade  de  saúde  até  ao  facto  de  um  bom  modelo  de  pagamento  dever  ter  em  conta  as 

externalidades  entre  os  vários  níveis  de  cuidados,  por  exemplo  não  incentivando  que  os  cuidados 

primários façam uma descarga de responsabilidades e de doentes nos hospitais ou vice‐versa. 

Outro valor  referido por vários dos palestrantes  foi o da equidade. Foram mostrados dados  sobre a 

distribuição das despesas públicas em  saúde por  cada  região de  saúde, a partir dos Orçamentos de 

Estado,  das  Contas  do  SNS  e  dos  relatórios  da  ADSE,  informação  que  se  revelou  difícil  de  obter  e 

compilar. As despesas públicas per capita mostram uma assimetria preocupante entre por um  lado o 

Norte  e  Algarve  com  valores  baixos  e  por  outro  o  Alentejo,  Centro  e  Lisboa  e  Vale  do  Tejo  com 

despesas  per  capita  substancialmente  mais  elevadas.  Foi  igualmente  demonstrado  que  esta 

desigualdade  nos  financiamentos  não  parece  ter  qualquer  correlação  genérica  com  uma  bateria  de 

indicadores de saúde e de produção de cuidados de saúde pelo que implicitamente tal assimetria, para 

além das iniquidades na distribuição de recursos, indicia a existência de elevados níveis de ineficiência, 

já que  regiões menos  financiadas não parecem  ter pior saúde ou produzir menos cuidados de saúde 

que regiões mais financiadas. 

Por  último,  foi  recordado  que  os  sistemas  de  pagamento,  para  além  de  se  apresentarem  como 

geradores  de  incentivos  individuais  e  institucionais,  têm  em  última  análise  de  funcionar  como 

mecanismos de sustentabilidade económica e financeira das unidades de saúde. 

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33 

 

 

B.  A  Quem  Pagar  

Uma proposta explícita apresentada foi a de o pagamento dos cuidados primários se passar a fazer por 

capitação,  proposta  esta  que  vê  tal  medida  como  estruturante  do  sistema  de  saúde  sobretudo 

aceitando‐se que a utilização da capitação deveria ser acompanhada por  liberdade de escolha para os 

utentes. De acordo com este ponto de vista, os cuidados primários poderiam  ter uma capitação que 

incluísse  recursos  suficientes  para  pagar  a  compra  de  cuidados  hospitalares,  ou  seja,  tornando  os 

médicos de família gestores da saúde e dos cuidados de saúde dirigidos aos seus utentes. 

Alguns palestrantes puseram uma tónica mais acentuada na ideia da contratualização, sobretudo tendo 

em  vista  as unidades hospitalares,  tendo  sido  apresentada uma breve histórica dos mecanismos de 

pagamento quer a nível abstrato quer na história do sistema de saúde português. A contratualização 

foi  apresentada  como  tendo  desvantagens  e  vantagens,  por  exemplo  permitindo  uma  maior 

descentralização da tomada de decisões no sistema de saúde. 

Foram abordados alguns problemas decorrentes do sistema de pagamento aos hospitais. Uma questão 

central  é  que  a  performance  financeira  dos  hospitais  parece  depender  mais  da  receita  e  de 

componentes arbitrários desta (faturação diferenciada por grupo de hospitais, etc.) do que do controle 

de custos. Referiu‐se igualmente que o perfil de admissões dos hospitais poderá ter sido distorcido por 

incentivos errados embutidos nos contratos programa. 

Finalmente, no  contexto desta  subsecção,  referiu‐se a  importância dos mecanismos de ajustamento 

pelo risco no financiamento das Unidades Locais de Saúde. 

 

C.  Quem  paga:  entidades  pagadoras  e  coerência  do  sistema  

Foi discutida conceptualmente a ideia de contratualização como meio para tentar capturar algumas das 

vantagens  inerentes a mecanismos de mercado, sendo referida brevemente a criação de agências de 

contratualização e suas precursoras e por fim a sua pouca relevância e desaparecimento efetivo. Neste 

contexto foi referido que a existência de múltiplos pagadores e múltiplas modalidades de pagamento 

levam frequentemente a descoordenações a uma fraca performance do sistema de saúde. 

 

D.  Como  pagar  

D.1. Referências no tempo 

Foi mencionado um trajeto seguido no financiamento dos hospitais desde uma época de pagamento 

retrospetivo puro, passando pela  introdução dos GDHs e pelo pagamento prospetivo baseado numa 

lógica  de  case‐mix. Na  prática,  o  financiamento  dos  défices  acabou  por  fazer  que  o  sistema  nunca 

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abandonasse  verdadeiramente  a  lógica  do  pagamento  retrospetivos  dos  custos,  pelo  menos  na 

margem. 

Uma  ideia  interessante a ter em conta é que o desenvolvimento histórico das formas de pagamento, 

particularmente aos hospitais, não pode ser desligado de tendência internacionais na área da saúde por 

um  lado e por outro das mudanças ocorridas na filosofia e gestão da administração pública em geral, 

como sejam as ideias do New Public Management. 

 

D.2. Bases de pagamento: capitações, pagamento da produção, pagamento pela qualidade. 

Como  referido, uma proposta explícita  feita  foi a de passar o  financiamento dos  cuidados primários 

para um  sistema de capitação. Foi  igualmente mencionada a  ideia de os cuidados primários  terem a 

responsabilidade de gerir recursos e tornarem‐se compradores de cuidados hospitalares. 

No  caso  dos  hospitais  o  pagamento  pela  produção  (pelo  ato,  por  diárias,  por  episódio,  etc.)  foi 

mencionado,  sendo  apontado  o  problema  de  o  pagamento  pela  produção  gerar  incentivos 

contraproducentes  ao  pagar  por mais  doença.  Por  outro  lado,  foi  igualmente  referido  que  deveria 

haver algum pagamento pela qualidade, apesar de os mecanismos para tal estarem ainda numa  fase 

incipiente. Por  fim, houve  referências  ao  facto de  existir uma  causalidade  inversa  e potencialmente 

perversa de o pagamento determinar a produção em vez do inverso, ou seja de a produção se desligar 

das efetivas necessidades de cuidados de saúde da população para ser orientada predominantemente 

por uma lógica de obtenção de receitas. 

Foram dirigidas muitas críticas ao pagamento por GDHs. Estas surgiram num contexto de discussão das 

dificuldades  em  apurar  custos  e  os  desfasamentos  destes  em  relação  aos  preços  no  contexto 

hospitalar. 

 No  painel  insistiu‐se  na  existência  de  erros  nas  estimativas  dos  valores  unitários  dos  GDHs,  sendo 

apresentados  casos  concretos de  custeio de episódios de  internamento  com base em  contabilidade 

analítica (seguindo a metodologia do Activity Based Costing) em que os valores unitários apurados eram 

substancialmente  diferentes  dos  valores  correspondentes  dos  GDHs.  A  apresentação  de  exemplos 

concreto  de  custeio  pelo  ABC  reforçou  a  ideia  de  um  bom  conhecimento  dos  custos  unitários  ser 

necessário para se conseguir não só uma gestão eficaz das unidades de saúde como para se realizarem 

exercícios de benchmarking permitindo aferir com rigor os níveis de eficiência das unidades de saúde. 

 

D.3. Ajustamento pelo risco. 

Algumas das perguntas da audiência e das  intervenções dos membros do painel debruçaram‐se sobre 

as metodologias de ajustamento pelo  risco,  tendo sido expressas críticas  intensas quanto à validade 

dos métodos adotados no passado recente em Portugal. Na medida em que a calibração de modelos 

de ajustamento pelo risco se faz a partir de dados estimados com base histórica, uma crítica seria a de 

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tais modelos  acabarem por  replicar  as distorções  e  iniquidades que  caracterizam  alguns  aspetos da 

prática e da realidade no terreno, por exemplo características desapropriadas da oferta de cuidados. 

Outras  críticas  revestiram  uma  carácter  mais  específico/técnico  pondo  em  casa  a  seleção  da 

informação/variáveis estatísticas usadas para a construção de modelos de ajustamento pelo risco. 

 

E.   Robustez   face   aos   grupos   de   interesse   e   consistência   em   termos   de   cabimento  

orçamental  

Estas dimensões da análise de modelos de pagamento  foram abordadas apenas  indiretamente e de 

forma muito breve. 

 

   

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5. Rede hospitalar 

 

Relator:   Joaquim Murta 

Palestrantes:  José Fernandes e Fernandes 

Fernando Araújo 

Fernando Regateiro 

    Miguel Castelo Branco 

 

Contributos:  

 

A reforma da saúde em Portugal é uma necessidade. Mas será possível? E como fazer?  

José Fernandes  e  Fernandes  

A crise da saúde reside em problemas funcionais (emergência de novos desafios médicos, insatisfação, 

ineficácia,  desmotivação,  limitação  financeira,  dificuldade  de  adaptação  do  Sistema  de  Saúde), 

estruturais  (hospital‐centred  e  focalizado  na  urgência,  articulação  deficiente  CP/CD/CC),  políticos 

(incremento  da  iniciativa  privada,  complementaridade  vs  competitividade,  recursos  humanos)  e 

culturais  (nova  linguagem – providers,  customers,  stakeholders, guidelines, etc. –,  empowerment dos 

doentes e suas organizações, relacionamento interprofissional). 

O sistema de saúde em Portugal é um sistema híbrido, complexo e diverso. 

A  Reforma  de  Saúde  necessita  de  uma  política  com  uma  visão  global  (não  compartimentada), 

sustentável,  regulada,  de  qualidade,  com  uma  matriz  estrutural  redimensionada  baseada  na 

responsabilidade pública e na cidadania responsável, e com a participação de todos.  

É necessário atuar a nível dos  cuidados primários:  incremento da  capacidade de  intervenção  clínica 

(unidades  intermédias  /  policlínicas),  articulação  hospitalar,  flexibilidade  horária,  empowerment  do 

cidadão – doente  (liberdade de escolha, gestão participada, plano de  saúde) bem  como a nível dos 

cuidados hospitalares com:  

1. Integração  regional e  sistémica  (hierarquização da diferenciação, hospital na comunidade via 

integrated care pathways) 

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2. Flexibilidade – carta hospitalar  

3. Experience / expertise para melhor qualidade de cuidados de saúde e economia de recursos 

4. Reorganização clínica: system / team based 

5. Cooperação multidisciplinar / pluri‐profissional  

6. Cultura de avaliação: clinical governance 

7. Competitividade 

Os Serviços de Saúde da Rede Hospitalar deverão ter: 

1. Racionalização da oferta 

2. Centralização da expertise 

3. Centros de elevada diferenciação e complexidade 

4. Financiamento realista e accountable 

5. Governação clínica 

6. Investigação e inovação terapêutica 

A  reforma  dos  Serviços  de  Saúde  exige  um  equilíbrio  entre  a  equidade  no  acesso  aos  cuidados,  a 

qualidade,  a  sustentabilidade e  a  flexibilidade. Torna‐se pois estratégico propor uma  agenda para  a 

qualidade  em  saúde  (relação médico‐doente  personalizada,  defesa  da  cidadania  da  pessoa  doente, 

política  correta de qualificação dos  recursos humanos, governação  clínica) e  reconfigurar o  sistema 

(sistema vs SNS, reorganização estrutural e financiamento).  

É pois urgente: 

1. Redefinir  a  intervenção  do  Estado  (separação  de  funções;  responsabilidade  pública  vs 

propriedade pública) 

2. Promover uma política de qualificação (meritocracia profissional; autonomia e competitividade 

institucional) 

3. Definir  um modelo  de  organização  (financiamento misto:  público  e  privado;  seguro  social 

obrigatório  e  seguros  complementares;  liberdade de  escolha  informada;  contratualização de 

serviços). 

A  Medicina  do  século  XXI  exige  uma  medicina  científica  (science‐based),  inovação  constante  e 

tecnologia,  incorporação  da  inovação  com  avaliação  da  relação  custo/benefício,  ética  (cidadania  da 

pessoa  doente,  disponibilização  judiciosa  de  recursos)  e  uma  atuação  multidisciplinar  e  pluri‐

profissional). 

 

 Redes  de  Referenciação  Hospitalar  

Fernando  Araújo  

As Redes de Referenciação Hospitalar (RRH) em Portugal, por especialidade,  independentemente de 

vários documentos e decisões ao  longo dos anos, tiveram uma existência formal, na sua versão atual, 

apenas em 2001 (com exceção da rede materno‐infantil), elaboradas na altura pela Direção de Serviços 

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de Planeamento da Direcção‐Geral da Saúde (DGS) e então aprovadas pelo Ministro da Saúde, Prof. Dr. 

Correia de Campos. 

Posteriormente, entre 2002 e 2004, foram aprovadas mais de uma dezena de RRH, pelos Secretários de 

Estado  da  Saúde  (SES),  sendo que para  além  de  se pretender  com  esta política  colmatar  um  vazio 

existente no país,  tal  constituía uma  condição  importante para que os projetos de  investimento em 

saúde  pudessem  ser  financiados  pelos  quadros  comunitários  (Saúde  XXI),  bem  como  pelo  esforço 

nacional (PIDDAC). 

Em 2008 foi aprovada uma nova RRH pelo SES, já sob a supervisão da Administração Central do Sistema 

de Saúde (ACSS), mantendo o Dr. Adriano Natário como líder da equipa, que foi fundamental em todo 

este processo. Posteriormente, em 2011,  cinco novas RRH  foram aprovadas, pela Ministra da Saúde, 

Dra. Ana Jorge.  

Estas redes, como outras que ainda não foram aprovadas, estiveram em discussão pública e tiveram o 

contributo  de  muitos  profissionais  e  instituições,  quer  hospitalares,  quer  dos  cuidados  de  saúde 

primários. 

Desde  2011  e  apesar  de  existirem  RRH  em  fases  diferentes  de  elaboração,  não  se  conhece  mais 

nenhuma aprovação, discussão ou divulgação pública. 

Desta forma, existem oficialmente aprovadas e publicadas 20 RRH, algumas com cerca de 12 anos, das 

47 especialidades médicas reconhecidas pela Ordem dos Médicos. 

Em  função  da  atual  conjuntura  económica  e  do  Memorando  de  Entendimento  de  2011,  uma  das 

condições exigidas era o ‘prosseguir com a reorganização e a racionalização da rede hospitalar através 

da especialização e da concentração de serviços hospitalares e de urgência e da gestão conjunta dos 

hospitais  (…)  cujo  plano  de  ação  detalhado  seria  publicado  em  20  de  Novembro  de  2012  e  a  sua 

implementação finalizada no primeiro trimestre de 2013.’ 

Para um adequado cumprimento deste requisito, seria necessário um plano global e regional da reorganização 

(que seria apresentado até ao mês 11 de 2012) e que deveria ser cuidadosamente articulado com as redes de 

referenciação  hospitalar  por  especialidade,  para  que  o  resultado  final  fosse  uma  estratégia  integrada  e 

alinhada, sendo que a mesma deveria esta implementada até ao mês 3 de 2013. 

Nesse  contexto  as  RRH  voltam  novamente  a  ser  alvo  de  discussão,  no  sentido  de  se  entender  a 

necessidade,  bem  como  a  sua  forma  de  operacionalização.  Assim,  de  acordo  com  a  experiência 

acumulada, as sugestões mais relevantes poderiam ser traduzidas em 10 ’Mandamentos’: 

 

1º Construir RRH para todas as especialidades 

As RRH seriam  ‘sistemas através dos quais se pretenderia regular as relações de complementaridade 

entre  as  instituições  hospitalares,  de  modo  a  garantir  o  acesso  dos  doentes  …  num  sistema 

integrado…’. 

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39 

 

A RRH de uma determinada especialidade permitiria uma articulação em rede variável em função dos 

recursos  disponíveis,  explorar  complementaridades  de  modo  a  aproveitar  sinergias,  concentrar 

experiências, permitindo a especialização dos técnicos e reunir recursos, permitindo a maximização da 

sua rentabilidade. 

A  consolidação  de  todas  estas  RRH  constituiria  uma  verdadeira  ‘Carta  Hospitalar’,  definindo 

responsabilidades e circuitos. 

Imprescindível uma estratégia por especialidade! 

 

2º Centrar as RRH nos doentes 

As RRH podem permitir tratar melhor os doentes e de forma mais económica, isto é, aliar o aumento da 

qualidade na prestação do serviço a uma redução da despesa.  

No entanto, o maior risco advém dos estudos e das propostas que olham de forma administrativa para as 

redes, ficcionando fluxogramas virtuais que conduzem inexoravelmente ao doente andar perdido no sistema. 

Deve‐se  evitar  a  tentação  de  centrar  as RRH  nas  instituições ou  nos profissionais,  esquecendo‐se  o 

objectivo final das medidas e levando à inversão do paradigma. 

As RRH devem estar centradas nos doentes! 

 

3º As RRH têm de ser regionais 

A visão das RRH deve ser nacional, em termos de política de saúde, mas a sua estruturação tem de ser regional. 

Não é possível uma RRH demorar anos a ser elaborada por um grupo nacional, anos a ser aprovada 

pelo Ministro  da  Saúde  ou  Secretários  de  Estado  e  eventualmente  nunca  ser  implementada  pelas 

Administrações Regionais de Saúde e instituições hospitalares, ou quando se pretende aplicar a mesma 

já se encontrar desatualizada.  

A  discussão  sobre  o  plano  e  a  metodologia,  deve  ser  regional,  permitindo  incluir  os  principais 

(nalgumas especialidades mesmo  todos) os serviços, na construção de uma  rede à medida das  reais 

necessidades dos doentes. 

Regionalizar as RRH!  

 

4º As RRH devem focar o carácter organizativo da prestação de cuidados de saúde 

As RRH podem ser instrumentos úteis na sistematização de conceitos e até na descrição da história de 

cada uma das especialidades em Portugal, constituindo‐se como interessantes documentos de revisão. 

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No  entanto,  esta  forma  de  construção  pode  tornar‐se  muito  lenta  e  extravasar  os  objectivos 

fundamentais  da  sua  existência.  O  pragmatismo  deveria  impor‐se,  obrigando  as  RRH  a  focar‐se 

essencialmente no carácter organizativo da prestação de cuidados de saúde. 

A  simplificação  das RRH  permitiria  também  a  sua  elaboração mais  célere,  bem  como  a  sua  revisão 

periódica, adequando as RRH às necessidades e possibilitando a sua atualização constante. 

As RRH devem evoluir de organizações piramidais a horizontais, assumindo um verdadeiro conceito de 

rede, com relações biunívocas entre as várias instituições, permitindo um fluxo fácil dos doentes. Neste 

contexto, a definição e identificação dos centros de elevada diferenciação é fundamental, mas deve ser 

acompanhada desde o início de modelos de financiamento adequados. 

Simplificar e horizontalizar as RRH!  

 

5º As RRH devem ser elaboradas de forma credível 

No  desenho  de  uma  RRH  deve‐se  considerar  as  necessidades  reais  das  populações,  bem  como  a 

capacidade  instalada  (sem privilegiar o prevaricador), de  forma a construir algo que seja exequível e 

que responda ao pretendido. 

Para esse fim, deve existir um envolvimento de todos os agentes (não só as especialidades envolvidas, 

mas  também  os  Conselhos  de  Administração  ‐  é  necessário  responsabilizar  as  instituições),  com 

discussão  e participação  ativa,  devendo  as  decisões  serem  tomadas  com  transparência  e  equidade, 

sendo depois transmitidas a todos os níveis das organizações. 

A credibilidade de uma RRH é fundamental para ser sustentável ao longo do tempo. 

Credibilizar as RRH!  

 

6º As RRH devem ser aprovadas pelas ARS 

De forma a possibilitar a celeridade das decisões e a sua atualização, as ARS deveriam ser o local ideal para a 

aprovação das RRH. Não é possível ter de se aguardar por despachos ministeriais para a sua aprovação inicial 

(existirão neste momento cerca de 6 RRH a aguardar aprovação há mais de 1 ano) ou posteriormente para 

cada uma das novas versões: este modelo tem como resultado existirem especialidades muito  importantes 

sem RRH e existirem RRH com 12 anos, baseadas em informação com 14 anos … 

Aproximar a decisão das RRH dos locais de prestação!  

 

7º As RRH devem ser aplicadas 

Esta regra não deveria sequer ser em teoria discutida (diria o bom‐senso natural), mas em função do 

histórico, deve ser expressa de forma clara: as RRH são para se cumprir! 

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Aplicar e cumprir as RRH!  

 

8º As RRH devem ser monitorizadas 

A única forma das RRH serem efetivas é serem cuidadosa e continuamente monitorizadas, implicando 

uma equipa/coordenador da especialidade e da região (auto‐regulação pelos próprios profissionais) e 

uma instância (ARS) superior que tome decisões. 

A falta de acompanhamento implica uma descredibilização do modelo e favorece as decisões pontuais 

e pessoais. Em  função da dinâmica do sector  (em  termos de  recursos humanos e  tecnológicos, bem 

como  o  contínuo  avanço  da  ciência)  este  acompanhamento  é  crítico,  de  forma  a  avaliar  o  seu 

cumprimento e corrigir os problemas identificados, promovendo a sua atualização em tempo útil. 

Monitorizar as RRH!  

 

9º As RRH como suporte de políticas 

As RRH  podem  constituir‐se  como  poderosos  instrumentos  de  gestão,  alinhando  as  várias  políticas 

regionais para o mesmo objectivo: estratégia na prestação de cuidados, financiamento das instituições 

(contratos‐programa), abertura de vagas para o  internato médico, contratação de recursos humanos, 

decisões sobre investimentos (incluindo a aplicação de fundos europeus). 

Tem de se mudar  rapidamente a  realidade atual, em que as decisões  tendem a ser centralizadas em 

Lisboa, sem conhecimento da realidade, tomadas por diferentes gabinetes que não comunicam entre 

si,  resultando  em  processos  ineficazes  e  desperdício  de  verbas  –  só  com  a mudança  profunda  dos 

modelos, aproximando a decisão da prestação, se pode ter ganhos com as RRH. 

Neste  alinhamento, o modelo de  financiamento hospitalar deveria  incorporar  as definições da RRH, 

dessa forma evitando o pagamento de atos a instituições que não os deveriam efetuar. 

As RRH no centro das decisões!  

 

10º As RRH devem ser avaliadas do ponto de vista clínico e económico 

As  RRH  podem  constituir‐se  como  factor  de  redução  da  despesa  (ex.  redução  da  necessidade  de 

recursos  humanos,  nomeadamente  em  horas‐extra,  aumento  da  taxa  de  utilização  dos  blocos 

operatórios, redução da despesa com MCDT e fármacos, diminuição da demora média e da lotação do 

internamento, redução de despesas com transportes de doentes) e factor de melhoria na prestação de 

cuidados de saúde (ex. mortalidade infantil, sobrevida oncológica). 

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No  entanto,  as  RRH  não  devem  constituir‐se  como  dogmas  de  eficiência,  pelo  que  têm  de  ser 

cuidadosamente  auditadas  e  os  resultados  tornados  públicos,  sem  esquecer  a  avaliação  efectuada 

pelos próprios doentes sobre o impacto na sua qualidade de vida.  

Avaliar as RRH! 

No  atual  contexto  de  constrangimentos  económico  e  social,  as  RRH  constituem‐se  como  peças 

fundamentais para assegurar a sustentabilidade do SNS. Não as construir, atualizar, cumprir ou apoiar é 

contribuir para a degradação do SNS.  

Uma  nota  final  para  a  ‘liberdade  de  escolha  do  doente  pela  unidade  hospitalar  da  sua  preferência’ 

versus RRH… como articular os dois conceitos? 

 

 

Integração  de  cuidados  de  saúde  (novos  paradigmas).    

Gestão  da  doença  crónica    

Fernando  Regateiro  

Um  sistema  de  saúde  integra  todas  as  organizações,  instituições,  recursos  e  pessoas  dedicados  à 

prestação e melhoria dos cuidados de saúde. 

Há ou não excesso de despesa nos países desenvolvidos? Os países da OCDE correspondem a 18% da 

população mundial. Mas  representam  86%  da  despesa  com  a  saúde  no mundo.  Segundo  o  Banco 

Mundial, não é possível manter o crescimento dos custos com a saúde na EU: em 2000 representou 8% 

do PIB, no ano 2030 representará 14% e manter‐se‐á a crescer nos anos seguintes. 

Em Portugal o  crescimento  tem  sido  de 6%/ano,  com os  hospitais  a  representarem mais  de  50%  do 

orçamento da saúde. Desde 1995, que gastamos mais do que a média dos orçamentos dos países da 

OCDE, em termos de percentagem do PIB. Temos dos melhores  indicadores de qualidade em saúde – 

v.g, na mortalidade materna, infantil, esperança de vida à nascença, taxas de vacinação. 

Temos um problema com o financiamento da saúde que advém dos factores que  levaram à medicina 

defensiva, dos aumentos de custos, do fraco crescimento económico, da crise social e económica e a 

incerteza  sobre  o  futuro.  Mas  também  da  falta  de  agilidade  adaptativa  (inércia  do  sistema,  a 

centralização de decisões  (quem manda é que “sabe”!...), a desconfiança do Estado em  relação aos 

agentes, a  inibição da autonomia vs autonomia/responsabilidade) da ausência de cultura cooperativa 

(v.g., competição entre  instituições), dos  interesses (corporações, a relação custo/efetividade elevada 

na inovação terapêutica, sem partilha de risco pelo promotor, a filosofia aditiva ‐ acrescenta oferta mas 

não corta). 

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Em Portugal, segundo o Tribunal de Contas, há  ineficiências hospitalares, conforme estudo relativo a 

2008: 27% na atividade de  internamento; 41% na atividade de ambulatório. O excesso de utilização de 

recursos humanos, medicamentos e MCDT representa 67% das  ineficiências no  internamento e 65% no 

ambulatório.  

Ilações:  é  preciso  cortar  nos  custos  operacionais, mas  também  combater  o  desperdício  e  a  cultura 

“hospitalocêntrica”. 

É  preciso  perceber  para  onde  queremos  ir  e  como  compatibilizar  a  oferta  de  cuidados  com  as 

disponibilidades  orçamentais. O  debate  deve  envolver  os  cidadãos,  os médicos,  o Governo  (Saúde, 

Segurança Social, Trabalho, Finanças, Educação), os prestadores privados e as seguradoras. 

Reformar  a  saúde  requer  suster  o  crescimento  dos  custos  e  manter  a  qualidade,  a  atração  dos 

profissionais mais qualificados, o acesso dos doentes aos melhores cuidados de saúde, a capacidade 

para  investigar  e  inovar,  a  capacidade  para  formar  segundo  os  mais  elevados  “standards”  das 

profissões da saúde. Não há bons exemplos – as reformas na Europa não têm conseguido resolver a 

insustentabilidade dos sistemas de saúde! 

Temos um conundrum que só será resolvido com transparência, accountability, supervisão e regulação 

fortes,  bom  conhecimento  das  necessidades  da  procura  e  reorganização  da  oferta,  redução  da 

burocracia, descentralização, responsabilização / liberdade do médico e envolvimento dos cidadãos. 

Para  isso  precisamos  de  novo  contrato  social,  assente  nas  seguintes  linhas  de  força:  o 

cidadão/utente/doente  no  centro  dos processos  e  sujeito  de  deveres, o  cidadão  stakeholder  da  sua 

saúde, não um consumidor ou cliente, a saúde como bem público, conhecer para confiar, contribuir e 

defender, transparência na relação financiador/prestador, racionalidade, eficácia e eficiência na gestão, 

consentimento informado, estilos de vida saudáveis. 

Em síntese, ganha‐se o futuro da saúde em Portugal, com novos paradigmas:  

1. O cidadão deixa de ser o destinatário do sistema e passa a stakeholder da sua saúde, 

2. É estabelecido um novo modelo de governação clínica que elege a centralidade do Médico de 

Família (porteiro / guardião do SNS e gestor de saúde e dos episódios de doença do utente): 

a. O Médico de Família concentra e integra toda a informação de saúde dos utentes inscritos 

na sua lista; 

b. É da sua competência a medicina preventiva e curativa; 

c. Orienta  (por  referenciação)  a navegação dos  seus utentes no  sistema de  saúde  –  Saúde 

Pública, CSP, cuidados HHs, CCI, outros prestadores de cuidados de saúde; 

d. Faz o seguimento domiciliário dos utentes; 

e. Intervém nas dimensões da educação para a saúde. 

3. É estabelecida uma nova visão da gestão e organização hospitalar: 

a. Diferenciação e complementaridade das instituições por regiões e a nível nacional; 

b. Respeito pela especificidade e a hierarquia de complexidade, na criação de “oferta”; 

c. Evitar a redundância desnecessária nas carteiras de serviços em  instituições próximas e de 

nível idêntico – intenção absurda da autossuficiência; 

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d. Combate à filosofia aditiva – não acrescentar novo sem eliminar velho; 

e. Reavaliar o custo/efetividade dos recursos terapêuticos de elevado montante; 

f. Acabar  com  a  retribuição  competitiva  entre  instituições  públicas  (“canibalização”  do 

sistema); 

g. Criar  consultas  de  alta  resolução  –  para  um  doente,  integrar  resposta  de  diversas 

especialidades; 

h. Criar  centros  de  elevada  resolução  –  concentram  a  resposta  a  determinadas  patologias 

comuns, de natureza ambulatória, tratam um grande número de doentes, para optimização 

de recursos humanos e técnicos; 

i. Criar  centros  de  elevada  diferenciação  –  elevada  sofisticação  técnica,  tecnológica  e/ou 

terapêutica, multidisciplinaridade; 

j. Privilegiar cuidados hospitalares de proximidade com a generalização das Unidades Locais 

de Saúde  (ULS)  ‐  integram CSP e cuidados hospitalares,  têm  responsabilidade preventiva, 

têm financiamento por capitação, concentram respostas de MCDT, subcontratam cuidados 

de que não disponham; 

k. Os hospitais gerais e centrais passam a  incorporar uma Unidade Autónoma de Gestão que 

funciona como ULS. 

4. Nos hospitais, para a gestão integrada centrada no doente é criado o “gestor do doente", para 

o doente  frequente, com várias patologias, com doença crónica, com doença  rara  / genética, 

para casos sujeitos a terapêuticas inovadoras (v.g., medicina regenerativa). 

5. Na gestão da doença crónica, é privilegiada:  

a. A prevenção e detecção precoce com protocolos específicos para identificação precoce de 

marcadores biológicos de risco (v.g., HTA, dislipidémia, hiperglicemia); 

b. A qualificação dos profissionais e meios; 

c. A elaboração de programas específicos; 

d. A aplicação de um modelo compreensivo integrado de cuidados; 

e. A hierarquia terapêutica e  inovação, com detecção precoce e  limiares baixos para o  início 

do tratamento; 

f. A integração de CSP, HHs e CCI; 

g. A criação de equipa interdisciplinar, cultura integrativa e disponibilidade permanente; 

h. O recurso à e‐saúde; 

i. A instituição do cuidador domiciliário; 

j. A continuidade dos cuidados; 

k. A coordenação vertical; 

l. O estabelecimento de incentivos financeiros; 

m. A avaliação de outcomes; 

n. A pró‐atividade das instituições de saúde no rastreio dos factores de risco e no seguimento 

dos parâmetros biológicos dos utentes em risco, para retardar o início da doença; 

o. O envolvimento ativo do doente no seu tratamento e cuidados. 

   

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Estratégias  de  eliminação  de  oferta  excedentária  

Miguel  Castelo‐Branco  

As estratégias de eliminação de oferta excedentária numa rede de prestação de cuidados hospitalares 

devem respeitar a especificidade de algumas funções fundamentais a cargo de algumas unidades tais 

como a função de ensino pré‐graduado da rede hospitalar do SNS, prover uma resposta adequada ao 

sistema de urgência e à procura de cuidados agudos, sem descurar que a composição de uma carteira 

de  serviços  deve  atender  a  uma  visão  sistémica  que  considera  a  evolução  da  própria  tipologia  dos 

cuidados agudos e a grande heterogeneidade das variáveis demográficas no território português. 

A monitorização da atividade hospitalar é uma ferramenta que permite melhorar a qualidade, eficiência 

e transparência do sistema e um ponto de partida para a operacionalização de uma estratégia que deve 

envolver, em todos os seus passos, os diferentes stakeholders e autoridades de saúde a nível central, 

regional e local tendo em vista a sua implementação efetiva. 

 

A função de ensino pré‐graduado da rede hospitalar do SNS 

Embora  a  função  assistencial  seja  primordial  na  rede  hospitalar  e  esta  universal, muitos  hospitais 

também desempenham outras funções de grande  importância, designadamente participam no ensino 

da Medicina  e  de  outras  profissões  que  atuam  na  área  da  saúde.  Da  função  ensino  abordaremos 

especificamente a relacionada com o ensino pré‐graduado, pois a especialização e a formação ao longo 

da  vida  são  tarefas  que  em  Portugal  incumbem  essencialmente  ao  sistema  de  saúde,  enquanto  a 

formação  pré‐graduada  depende  da  articulação  com  um  estabelecimento  de  ensino  superior  que  é 

responsável pelo programa e pela concessão do título académico. 

As  regras  de  acreditação  internacionais  de  cursos  de medicina  estabelecem  que  os  estudantes  de 

medicina devem  ter atividades de aprendizagem o mais extensas possíveis em  instituições de saúde, 

referindo‐se a hospitais,  indica que, dentro destes, devem  ser  incluídos, numa proporção adequada, 

hospitais primários, secundários e terciários. 

Este  assunto é  trazido  aqui porque,  em  sede de definição das  carteiras de  serviço dos hospitais,  se 

torna relevante por dois motivos, o primeiro é que é essencial que alguns hospitais sejam parceiros das 

Faculdades para efeitos de ensino e o segundo, é que, para estes e para o sistema de financiamento é 

essencial  que  a  função  ensino  seja  retribuída,  uma  vez  que  está  demonstrado  que  os  hospitais 

universitários  têm  custos  acrescidos  e  são menos  produtivos,  se  se  olhar  exclusivamente  à  função 

assistencial. 

 

Sistema de Urgência e Cuidados Agudos 

A possibilidade de surgirem situações agudas, por doença ou acidente, é inerente à condição humana. 

Apesar de, na atualidade, os sistemas de saúde se confrontarem com um peso crescente das doenças 

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crónicas, particularmente das não comunicáveis, as doenças agudas continuarão a ter sempre um peso 

importante e a condicionarem a organização dos cuidados de saúde. Muitas das situações clínicas das 

doenças agudas, ou das agudizações das crónicas, carecem de abordagem diagnostica e  terapêutica 

que  são  tempo‐dependente  e  revestem‐se  de  grande  especificidade  que  têm  vindo  a  justificar  a 

especialização profissional em muitos sistemas de saúde. Conjugando estes aspectos com os princípios 

éticos de equidade e  justiça, decorre a necessidade de distribuir adequadamente pontos de apoio à 

urgência.  Uma  percentagem  importante  dos  acessos  à  urgência  gera  necessidade  de  admissão 

hospitalar, com ou sem intervenções cirúrgicas ou de outra natureza, motivo que leva a que a carteira 

de serviços hospitalares tenha que ter em consideração a prestação de cuidados agudos,  incluindo os 

emergentes e urgentes. 

 

Carteira de serviços numa perspectiva sistémica 

Para  além  das  relações  dependentes  da  atividade  vocacionada  para  as  situações  urgentes  e 

emergentes, as especialidades têm, entre si, um conjunto de  interações e  interdependências. Quando 

para a produção de um determinado resultado é necessária a concorrência simultânea de duas ou mais 

especialidades é essencial um bom emparelhamento entre essas especialidades para a máxima eficácia 

(a  titulo  de  exemplo  refere‐se  a  necessidade  da  anestesia  e  uma  qualquer  especialidade  cirúrgica 

trabalharem em conjunto para a produção), o que significa que para a produção estar optimizada tem 

que  a  interação  entre  as  especialidades  também  estar,  seja  para  intervenções  que  ocorram  em 

paralelo, seja para intervenções de tipo sequencial. 

Por outro  lado, a visão, essencialmente antiga, da existência de uma possível hierarquia de  serviços 

para  cada  especialidade,  que  permitia  que  houvesse  hospitais  com  carteiras  de  serviços  básicos  e 

outros  de  níveis  diferentes,  foi  ultrapassada  no  sentido  duma maior  especialização  e  concomitante 

redução de  leque de oferta, passou a haver  serviços  superespecializados em determinadas áreas de 

ação  com  ganhos  de  produtividade,  eficiência  e  qualidade  tendendo  a  eliminar  a  estratificação 

hierárquica  do  passado.  Neste  contexto  os  núcleos  generalistas  de  cada  especialidade  são 

tendencialmente  substituídos por núcleos de maior especialização que em alguns casos poderão  ter 

contornos de excelência. 

Finalmente,  o  modelo,  que  dominou  em  Portugal,  de  hospitais  "clones",  particularmente  a  nível 

periférico  (ex:  hospitais  distritais),  há  muito  que  está  esgotado,  embora  não  completamente 

substituído,  o  que  tem  provavelmente  sido  uma  das  razões  com  peso  relevante  nas  diferenças  de 

atracão de novos médicos. 

Numa  época  em  que  o  conhecimento  científico  continua  a  progredir  continuando  a  levar  a  uma 

especialização progressiva e necessariamente parcelar, a abordagem de casos clínicos mais complexos 

requer  frequentemente  o  concurso  de  várias  especialidades,  tendo  que  ser  resolvida  a  forma  de 

permitir  a  interação  que  assegure  essa  complementaridade. Há  neste  capítulo  oportunidade  para  a 

utilização de novas metodologias de interação incluindo tecnologias de comunicação. 

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A gestão da doença crónica tem que se coordenar com a gestão da doença aguda e esta vai continuar a 

ter um peso muito relevante nos sistemas de saúde. 

 

Cuidados agudos: a evolução necessária 

À  semelhança  do  sistema  hospitalar  de  outros  países,  também  os  cuidados  agudos  em  Portugal 

necessitam evoluir de forma a garantir uma prestação adequada de cuidados, de acordo com o estado 

da arte, em tempo e eficiência. 

Para tal têm que concorrer algumas reformas indispensáveis: 

Centrar os cuidados no doente (e não nos serviços ou nos profissionais) 

Assegurar a continuidade de cuidados e resolver a fragmentação 

Garantir que a assistência aos doentes internados cobre todos os dias da semana (de segunda a 

sexta) 

Definir polos de excelência 

Assegurar os aspectos éticos do sistema 

 

Grande heterogeneidade de situações em Portugal 

Apesar  da  geografia  portuguesa  não  ter  grandes  dimensões,  comporta  em  si  grandes 

heterogeneidades. Desde  logo a distribuição demográfica assimétrica com maior densidade na região 

litoral e menor no  interior embora com algumas exceções em concelhos do  interior. Por outro e de 

forma inversa, o interior apresenta índice de envelhecimento muito superior. 

Esta situação aponta para a necessidade de o interior ter uma cobertura que responda a esses índices 

de envelhecimento, associados a maior prevalência de doenças crónicas, frequentemente associadas, e 

que determinam maior complexidade clínica. 

Por outro lado a distribuição de médicos revela algum paralelismo com a densidade demográfica com 

maior densidade no litoral e menor no interior. 

 

Qualidade, eficiência e transparência 

A  atividade  hospitalar  deve  ser  monitorizada.  Os  resultados  da  monitorização  transformados  em 

indicadores utilizados para comparabilidade e servirem para processos de melhoria contínua. É fulcral 

haver  indicadores  de  qualidade  e  segurança.  Alguns  dos  indicadores,  particularmente  aqueles  que 

disponibilizarem  informação  que  possa  ser  útil  para  o  cidadão  poder  escolher,  devem  ser  públicos. 

Também  para  assegurar  a maior  eficácia  e  eficiência  do  sistema  é  fundamental  que  a  localização  e 

atributos dos polos de atividade sejam do conhecimento dos intervenientes. 

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Rede Hospitalar Estratégias de eliminação de oferta excedentária 

Significando “excedentário” o que ultrapassa a quantidade necessária, será em primeiro lugar preciso 

identificar o que “está a mais”. Começar por uma análise baseada em premissas  técnicas assumidas, 

preferentemente evidence based e na adequação às necessidades expectáveis da população e ainda à 

evolução  científica previsível. Sabendo, desde  logo, que atualmente o ambiente é muito dinâmico e 

instável podendo requerer ajustes ao longo do período de implementação. 

Para um país de 10.000.000 de habitantes, dimensão que não implica a obrigação de subdividir e com a 

elevada  exigência  em  termos de  competência para  a  elaboração de  tal  análise  e proposta de  ação, 

parece‐me que apenas a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) estará em condições para 

poder  elaborar  uma  proposta  bem  fundamentada  equilibrada  e  uniforme  para  todo  o  País, 

identificando os potenciais ganhos em saúde e gestionários. Por outro  lado existem bons pontos de 

partida, as  redes de  referenciação elaboradas ao  longo da última década, que atualizadas e afinadas 

adequadamente,  com  incorporação  das  novas  tendências  e  conhecimentos, permitem  a  tomada  de 

decisão racional. 

A  proposta  deverá  ser  depois  submetida  a  uma  análise  regional,  com  todos  os  stakeholders, 

Administração Regional de Saúde  (ARS),  instituições de saúde, autarquias, centros de  Investigação e 

Universidades de forma a poder ser afinada. 

Após  a  afinação deverá  ser definido o projeto de  implementação  com definição  clara do  tempo de 

implementação, fase que caberá às ARS. 

Atendendo a elevada dinâmica deste ambiente é necessário definir um enquadramento temporal para 

o processo que deverá permitir atualizações periódicas, dentro dos  limites da planificação, sendo por 

outro  lado  fundamental  que  as políticas  de  saúde  tenham  suporte  de  implementação  no  horizonte 

temporal  adequado  ao  seu  pleno  desenvolvimento,  que  não  é  compatível  com  desenvolvimentos 

essencialmente conjunturais. 

Como  alguém  disse,  “analisem‐se  os  dados,  elaborem‐se  projetos,  discutam‐se,  decida‐se 

ponderadamente, mas acima de tudo, implemente‐se de forma efetiva”. 

 

   

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6. Organização do trabalho 

 

Relator:   António de Sousa Uva 

Palestrantes:  Artur Vaz 

Sollari Allegro 

Augusta Sousa 

Carlos Gante 

 

Introdução 

 

Os aspetos de organização dos hospitais que são organizações de grande complexidade envolvendo 

diversas  dimensões  de  que  se  destacam,  desde  logo,  (i)  o modelo  organizacional,  nos  nossos  dias 

caraterizado essencialmente pela “empresarialização” e (ii) os recursos humanos (RH). Claro que, entre 

outros,  também  (iii)  os  processos,  como  é  o  caso  das  tecnologias  de  informação  ou  o  modelo 

intermédio  de  prestação  de  cuidados,  mais  centrado  em  estruturas  verticais  ou  na  integração 

multidisciplinar,  (iv)  a  qualidade  da  prestação  de  cuidados  (uma  vez  que  outra mesa  abordou  os 

aspetos  de  qualidade  e  eficiência),  a  (v)  organização  baseada  numa  maior  responsabilização  dos 

cidadãos  (patient centered), designadamente na administração dos hospitais  (não executivo) e  (vi) a 

“funcionocracia” do modelo organizacional. 

A  mesa  abordou  essencialmente  aspetos  relativos  aos  recursos  humanos  e  integrou  as  seguintes 

intervenções: 

 

Contributos 

 

Artur  Vaz    

Abordou os seguintes aspetos: 

Remuneração e sistemas de incentivos 

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Para  aumentar  a  produtividade  dos  RH,  é  preferível  associar  uma  remuneração  fixa  a  uma 

variável. Isto implica que a remuneração fixa seja ajustada, reconhecendo quer a diferenciação 

das funções quer o nível habilitacional exigido para o seu desempenho. 

Existem custos, designadamente de Segurança Social, que devem ser considerados quando se 

criam  sistemas  de  incentivos  (uma  vez  que  as  pensões  não  devem  reconhecer  este  tipo  de 

remunerações, é possível que estes pagamentos possam ser isentados de desconto). 

Quando existem sistemas de incentivos é absolutamente necessário: 

o Estabelecer  claramente  o  que  se  pretende  atingir  com  o  incentivo  (produção  adicional, 

produtividade, qualidade, disponibilidade, …); 

o Criar uma métrica que seja clara e compreendida pelos seus destinatários; 

o Antecipar ou eliminar os efeitos adversos deste tipo de incentivos; 

o Diferenciar incentivo de trabalho extraordinário, cujos objetivos e lógicas são distintos; 

o Evitar  criar  sistemas  desequilibrantes  em  termos  institucionais  (por  ex.  medicinas 

/cirurgias); 

o Evitar cair na tentação de atualização constante dos valores pagos a título de incentivo. 

 

Modelos de organização do trabalho 

A organização do trabalho médico deve partir dos pressupostos das organizações em que se 

concretiza – hospitais, cuidados primários e cuidados continuados. Isto significa que os horários 

de  trabalho normal  se devem estender entre as 8 e as 22 horas nos dias úteis, que deve  ser 

estabelecido o  trabalho por  turnos  (nos hospitais) e que o  regime de  chamada deve  ser um 

pressuposto (pelo menos nos hospitais); 

Deve  ser  estimulado  o  trabalho  de  equipa,  evitando,  todavia,  o  espartilho  dos  recursos 

dedicados (i.e. os profissionais podem integrar mais do que uma equipa); 

Nas urgências deve privilegiar‐se o modelo de equipas dedicadas de Medicina Geral e  Interna, 

mantendo  a  colaboração  dos médicos  dos  outros  serviços  em  regime  de  consultoria  ou  de 

participação esporádica em alguns turnos. 

 

Conflitos de interesse/ exclusividade 

A  exclusividade  não  é  um  valor  em  si  mesmo  se  a  organização  for  bem  gerida  e  souber 

aproveitar a força de trabalho de que dispõe. A exclusividade não garante maior produtividade 

e pode dar azo a falta de dedicação e empenho (afinal o rendimento já está garantido e não há 

alternativas para o aumentar). 

Cada  vez mais  há  vantagem  em  ter  horários  desiguais  (20  horas/semana,  12  horas/semana, 

etc…), o que permite ajustar os custos com o trabalho às necessidades efetivas adicionais. 

Defenderia o princípio da exclusividade para os cargos de Direção e Coordenação, não fosse o 

facto  de  também  defender  que  estes  não  devem  integrar  as  carreiras  e,  por  isso,  a  sua 

ocupação poder ser temporária ou transitória, dependendo dos resultados obtidos. 

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O Estado deve aprofundar as noções e práticas de gestão de rede, estendendo‐as, para além de 

outras  áreas,  aos  recursos  humanos  ‐  Desenvolvimento  de  partilha  de  recursos  entre 

organizações  diferentes  pertencentes  à  mesma  rede,  centralização  de  urgências  com 

descentralização de internamento dos doentes nas instituições da sua área, etc. 

 

 Formação e recertificação 

Formação inicial específica ‐ Absolutamente necessária em todas as profissões da saúde. 

Os  curricula  das  faculdades  de medicina  devem  ser  revistos  e  acrescentadas  disciplinas  de 

economia  da  saúde,  comunicação  com  familiares  e  doentes,  gestão  de  crises,  trabalho  em 

equipa, avaliação de desempenho. 

Recertificação  profissional  (pelas  Ordens  ou  Associações  profissionais)  obrigatória  nas 

profissões sujeita a  rápida obsolescência  técnico‐científica. A  recertificação profissional pode, 

em  alternativa,  ser  realizada  pelas  organizações  onde  os  profissionais  prestam  serviço, 

mediante um programa nacional que garanta igualdade de critérios. 

 

Planeamento e mobilidade de recursos humanos 

Da escassez ao excesso. Não é desejável um excesso muito significativo de profissionais0 de 

saúde no mercado de emprego, se não houver consequências disso, designadamente ao nível 

dos custos do trabalho; 

É conveniente que, na distribuição das vagas de  internato médico de especialidade se tenham 

em conta as demografias de cada especialidade e as necessidades de substituição ou reforço 

das especialidades e das regiões ou locais; 

Um  sistema  de  responder  à  escassez  de  médicos  no  interior  poderá  ser  a  instituição  do 

princípio  de  que  o  interno,  após  acabar  a  sua  especialidade  tenha  que  prestar  serviço,  por 

exemplo durante 2 anos, num hospital público carenciado na sua especialidade. 

 

Redefinição de funções das profissões 

Os Enfermeiros e Técnicos de Diagnóstico e Terapêutica portugueses são, de uma forma geral, 

muito  bem  formados  e  diferenciados  o  suficiente  para  desempenharem  funções  de maior 

exigência técnica e autonomia. 

Ao nível dos Enfermeiros é desejável: Enfermeiros de família, realização de pequenas cirurgias, 

seguimento da gravidez sem risco, gestão da doença crónica, consultas de triagem, etc. 

Ao nível dos Técnicos de DT, possibilidade de maior autonomia na realização de exames. 

 

   

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Sollari  Alegro    

Abordou alguns aspetos relativos ao absentismo numa unidade hospitalar. 

 

Augusta  Sousa  

Enquadramento 

As  seis  áreas  temáticas propostas para  a  abordagem  do  tema  central  – Organização  do  Trabalho  – 

conduzem‐nos  a  situar  o  nosso  ponto  de  vista  sobre  as  vertentes  nas  quais  deve  assentar  uma 

perspetiva  de  organização  do  trabalho  nas  organizações  de  saúde  e  que  esquematicamente  as 

representamos do seguinte modo: 

i)  o  necessário  equilíbrio  entre  três  vértices  a  que  os modelos  organizacionais  estão  obrigados  no 

quadro do nosso Sistema de Saúde em geral e, de forma particular, o SNS como eixo estruturante do 

Sistema: a oferta de cuidados tem de garantir a qualidade dos mesmos, o acesso aos cuidados tem de 

ser universal, geral e tendencialmente gratuito no momento da prestação, e os custos devem obedecer 

a regras de efetividade e eficiência (neste sentido a atual pressão sobre os custos se não tiver em conta 

os outros vetores pode facilmente provocar desequilíbrios que poderão pôr em causa a natureza das 

próprias organizações prestadoras e do próprio SNS). Tendo como pano de fundo estes pressupostos e 

no quadro da matéria que aqui nos foi proposto assume particular relevância nas organizações e na sua 

interdependência: os recursos humanos, a matriz organizacional e o modelo de gestão. 

ii) A  centralidade no  cidadão  como eixo organizador da disponibilização de  recursos é uma questão 

central  na  abordagem  da  organização  do  trabalho  o  que  obriga  a  uma  consciencialização/ 

responsabilização partilhada de  todos os atores, nomeadamente dos diretamente  responsáveis pela 

prestação de cuidados, dos seguintes fatores: 

Das necessidades crescentes e percepcionadas aos recursos limitados 

Da gestão das expectativas à decisão partilhada 

Das respostas disponíveis ao processo de cuidados 

Constata‐se que estes três fatores continuam a não serem suficientemente abordados de uma forma 

transversal nas atuais redes de cuidados (Hospitalares, CSP, CCI, EPH) e com o necessário envolvimento 

dos prestadores de cuidados como atores essenciais na decisão sobre os cuidados que são oferecidos e 

como podem ser organizados. 

iii) Mudar o paradigma para garantir a centralidade na resposta às necessidades dos cidadãos mais do 

que das organizações  implica a  implementação de modelos de organização de  trabalho assentes em 

três  pressupostos  básicos:  a  individualização  dos  cuidados,  a  celeridade  da  resposta  adequada  e 

organizações de proximidade. 

 

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Da realidade aos desafios para a mudança 

A mudança demográfica e epidemiológica, que não é  alheia  à evolução  científica e  tecnológica,  são 

vertentes já abordadas noutros momentos desta conferência. Contudo importa convocar alguns dados 

que suportam as mudanças que se impõem na organização da oferta de cuidados e consequentemente 

nos efetivos desafios à tradicional organização do trabalho. 

Não abordando de forma exaustiva todas as vertentes, importa referir: 

i) O crescimento do nº de pessoas portadoras de doença crónica 

Se  adaptarmos  os  níveis  de  cuidados  às  pessoas  portadoras  de  doença  crónica  identificados  por 

estratificação do  risco,  feitas pelo Governo Basco em 2010, e com a definição  realizada pelo NHS do 

Reino Unido dar‐nos‐á o seguinte quadro: 

 

 

Assim  e  em  consequência  o modelo  de  cuidados  fortemente  centrado  nos  cuidados  hospitalares  e 

determinado pela organização do  trabalho médico deverá dar  lugar  à  centralidade nos  cuidados de 

proximidade e a uma organização de trabalho multiprofissional onde assume particular relevância os 

cuidados de suporte ao autocuidado e à gestão do processo de saúde‐doença que cada pessoa vivencia 

onde  os  enfermeiros  podem  ser  efetivamente  os  profissionais  mais  bem  posicionados  como  o 

elemento de referência e de coordenação dos recursos a disponibilizar. 

ii) A forte pressão das tecnologias da saúde 

Assume particular relevo na medida em que associar um efetivo valor acrescentado na  introdução de 

novas  tecnologias,  nomeadamente  de medicamentos  e  a  sua  utilização,  é  por  vezes  de  relevância 

discutível quando  tal  implica  consumo de  recursos  financeiros que  limitam  a disponibilização para  a 

introdução de melhoria de processos que o desenvolvimento das  tecnologias de  informação deveria 

suportar melhorando a rentabilização do tempo de trabalho e a melhoria da sua organização. 

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iii) A afectação desajustada dos recursos humanos 

Num quadro de transformações que marcaram a última década no que respeita à organização da oferta 

de cuidados seja pelo  forte  incremento do sector privado no mercado da saúde seja nas  instituições 

que  integram  o  SNS  –  transformação  dos  hospitais  públicos  em  EPEs  e  concentração  em  Centros 

Hospitalares mas também a criação de ULSs, a reforma dos CSP com particular ênfase para as USF com 

maior  autonomia  organizativa  e  de  gestão  de  pequenas  equipas multiprofissionais,  e  a  criação  da 

RNCCI que traz de forma estruturada o sector social para as repostas em saúde constata‐se contudo 

que os dados disponíveis demonstram a persistência num efetivo desajuste na afetação dos recursos 

humanos seja nas diferentes áreas de cuidados seja na distribuição geográfica com inevitáveis reflexos 

no equilíbrio das respostas organizadas e na forma de organização do trabalho. 

Deixamos aqui alguns dados que confirmam esta constatação: 

Nos Hospitais (dados recolhidos em 55 instituições em 399 serviços ‐ ACSS/SCDE) entre 2007 e 

2009  a  relação  entre  nº  de  horas  de  cuidados  de  enfermagem  necessários  por  dia  de 

internamento e o nº de horas de cuidados de enfermagem praticados apresenta uma crescente 

carência correspondendo em 2009 à falta de 3.335,14 enfermeiros a tempo completo; 

Nos ACES (dados das portarias publicadas em Outubro e Novembro de 2012, não contemplando 

as ULSs) o rácio médio Enfermeiro/Médico é de 1,15 e de Assistentes Operacionais/Enfermeiro é 

de 0,52. Se olharmos estes rácios por Regiões verifica‐se, respectivamente, o seguinte: Alentejo 

– 1,47 e 0,38; Centro – 0,77 e 0,38; Lisboa e Vale do Tejo – 1,13 e 0,64; Norte 1,26 e 0,63. 

Na RNCCI  temos  um  quadro  suportado  essencialmente  em  profissionais muito  jovens  e  por 

vezes  sem  terem  o  necessário  acompanhamento  e  sem  uma  vinculação  permanente  o  que 

conduz  a  uma  rotatividade  elevada  com  implicações  na  aquisição  e  desenvolvimento  de 

competências. 

 

 O valor do trabalho, incentivos e a motivação 

Não podendo ignorar que o valor atribuído ao trabalho é um fator essencial na motivação profissional e 

de como os vários atores se entendem na cadeia de valor onde os cuidados de saúde se desenvolvem, 

temos uma realidade que persiste numa desvalorização desse valor. 

Os dados do MS/ACSS – Balanço social de 2011 demonstram que os trabalhadores do MS detentores de 

curso superior correspondem a 61,6% mas 50,1% tem remunerações entre 501 e 1250€ (inclui vencimento 

de base+suplementos e trabalho extraordinário) 

Mas  se  tivermos  também presente que no atual quadro das organizações de  saúde do SNS existem 

formas diferentes de vinculação/contratação onde os Hospitais tem uma maior autonomia do que os 

CSP,  onde  está  cancelado  a  valorização  por  via  das  carreiras  e  das  competências  dos  vários 

profissionais facilmente se conclui que existem efetivas dificuldades de implementar instrumentos que 

sejam potenciadores de incentivos como forma de reconhecimento do mérito daqueles que são motor 

da organização dos cuidados. 

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55 

 

Concluindo – o que fazer 

A organização de trabalho que tem como finalidade as respostas organizadas às necessidades de saúde 

dos cidadãos deverá assentar em 3 eixos: a individualização dos cuidados, a celeridade e proximidade 

da resposta. 

Neste pressuposto e reconhecendo o nível de complexidade que a conjugação destes eixos envolve, 

consideramos prioritário: 

Promover  e  premiar  o modelo  participativo  e  de  responsabilização  assente  nos  seguintes 

princípios 

As  respostas  devem  sempre  ser  suportadas  em  abordagens  multiprofissionais  que 

congreguem  e  potenciem  competências  próprias  de  cada  profissional  e/ou  grupo 

profissional  potenciando  a  efetiva  rentabilização  dos  recursos  disponíveis  e  delimitando 

duplicação  de  intervenções  para  as  mesmas  necessidades  e  garantindo  a 

complementaridade das mesmas; 

A  organização  do  trabalho  das  equipas  deverá  responder  a  objetivos  previamente 

contratualizados  com  as  necessárias  adaptações  em  função  de  avaliações  sistemáticas  e 

obedecer a regras por si definidas tanto para as áreas de intervenção próprias como no que 

respeita à gestão do tempo de trabalho de cada profissional; 

As  lideranças/coordenação devem estar diretamente  relacionadas com o  reconhecimento 

de competências; 

O  envolvimento na partilha da decisão da pessoa/família/comunidade deve  ser  assumido 

como responsabilidade dos profissionais envolvidos 

A  implementação destes princípios deve  conduzir  ao  reconhecimento do  valor  acrescentado 

para os resultados em saúde e ser objeto de incentivos dirigidos aos serviços onde se inserem, à 

equipa e aos profissionais que nela participam. 

 

Promover e premiar com base em descriminação positiva as respostas de proximidade 

Disponibilização  de  recursos  para  o  reforço  dos  CSP,  CCI  e  Cuidados  Paliativos  com 

respostas organizadas que cubram as 24 h e os 7 dias da semana com especial ênfase para a 

promoção do autocuidado dirigido à pessoa, à família e à comunidade 

Os  recursos  a  disponibilizar  deverão  estar  suportados  na  metodologia  de  projeto  e  a 

abrangência é de natureza diversa, a saber: 

o Recursos Humanos: enfermeiros e enfermeiros especialistas das diferentes  áreas, 

médicos,  fisioterapeutas,  nutricionistas,  psicólogos  e  trabalhadores  de  apoio 

administrativo e de apoio nos cuidados 

o Recursos tecnológicos: suportes para a utilização das TI e comunicações 

o Recurso privilegiado a instituições de cuidados de maior complexidade tecnológica 

Os  reflexos  desta  vertente  devem  produzir  menos  recurso  às  urgências,  menos 

reinternamentos e menos custos globais a médio e longo prazo. 

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Promover  o  desenvolvimento  e  reconhecimento  de  novos  papéis  profissionais  assente  nas 

competências próprias à natureza de cada profissão 

Decorrente  da  natureza  dos  cuidados,  os  enfermeiros  deverão  ser  os  profissionais  que  assumem  a 

responsabilidade da gestão dos processos, prescrevendo, executando, supervisionando e coordenando 

os cuidados necessários nomeadamente: 

o às pessoas portadoras de doença crónica, 

o no acompanhamento da gravidez de baixo risco, 

o na detecção precoce de factores de risco para o desenvolvimento infantil, 

o na identificação do risco de perturbação mental, 

o na promoção da autonomia em situações de limitação ou deficiência motora. 

A  partilha  desta  responsabilidade  é  subordinada  aos  princípios  enunciados  no  primeiro  ponto  e 

salvaguardando o encaminhamento para outros profissionais sempre que a situação o exija e implica: 

o o  reforço  da  formação  especializada  e  continuada  assim  como  a  certificação  e 

recertificação de competências pelos organismos competentes; 

o as medidas  de  reconhecimento  da  prescrição  dos meios  de  suporte  à  prossecução 

destas competências. 

 

Carlos  Gante    

O exercício da medicina em regime acumulação de funções públicas e privadas é uma prática comum 

na  maior  parte  dos  países.  A  relevância  do  tema  advém  da  relação  positiva  e  negativa  que  as 

consequências  do  pluriemprego  têm  sobre  a  eficiência,  a  equidade  e  a  qualidade  na  prestação  dos 

cuidados  de  saúde  e  no  desempenho  global  dos  sistemas  de  saúde.  O  estudo  apresentado  na 

“Conferência‐debate  sobre  o  sistema  de  saúde  para  além  de  2014”  apresenta  dois  objetivos 

correlacionados: o primeiro, entender a partir da percepção dos profissionais que exercem medicina 

em regime de pluriemprego, a motivação, os valores e os  interesses presentes neste fenómeno, bem 

como  a  eventual  presença  de  efeitos  adversos  ou  benéficos  para  o  sistema  de  saúde  nacional.  O 

segundo, construir um conjunto de medidas de regulação, a fim de contribuir para a minimização dos 

eventuais efeitos adversos, e testar a sua necessidade, exequibilidade e eficácia. 

Para a prossecução do primeiro objetivo foi construído um inquérito e posteriormente distribuído a 278 

médicos que  acumulavam  funções públicas  e privadas num grande hospital universitário português. 

Para a realização do segundo objetivo foi construído outro inquérito, dirigido a um painel de 28 peritos 

que desempenham um papel importante na governação do sistema de saúde português. 

A  taxa  de  resposta  efetiva  foi,  no  primeiro  inquérito,  de  41,4%  e  no  segundo  de  71,5%. Do  primeiro 

inquérito obteve‐se um nível alto de concordância para a motivação económica como principal causa 

para o pluriemprego. 

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Os  respondentes  concordaram  que  o  sector  público  lhes  oferece  melhores  condições  de 

desenvolvimento  das  competências  profissionais  e  que  o  exercício  profissional  no  sector  privado 

proporciona maior  autonomia  na  organização  do  trabalho.  O  prestígio  é  visto  como  um  fator  de 

atracão  de  doentes  no  sector  privado  e  discordam  que  a  dupla  atividade  lhes  confere  vantagens 

competitivas estratégicas. 

Trabalhar no sector público e privado é visto como um direito inalienável e a maioria dos médicos não 

pretende renunciar ao sector público. Os participantes concordam que a maioria dos profissionais tem 

uma  conduta  profissional  íntegra  e  honesta  e  talvez  por  essa  razão  reconhecem  apenas  de  forma 

moderada  a  necessidade  de  um  código  de  conduta  para  regular  as  situações  de  pluriemprego. Os 

benefícios do pluriemprego para o  sistema de  saúde, nomeadamente a possibilidade de escolha por 

parte dos doentes e o aumento de oferta  são  reconhecidos pelos participantes enquanto os efeitos 

negativos,  para  o  sector  público,  como  o  fomento  das  listas  de  espera,  o  baixo  desempenho  e  a 

desnatação de doentes merecem a sua discordância. 

Os resultados obtidos, na consulta ao painel de peritos, quanto à necessidade, exequibilidade e eficácia 

de catorze medidas de regulação evidenciam um nível de concordância mais elevado para a introdução 

de mecanismos públicos de fiscalização, de incentivos ao desempenho, da proibição no sector público 

de  promoção  de  serviços  privados,  da  obrigatoriedade  de  dedicação  exclusiva  para  os  órgãos  de 

direção no sector público, do aumento da  transparência de  interesses e da criação de um código de 

conduta para a regular as relações inerentes à prática do pluriemprego. 

A  abordagem  prevalente  das  diversas  intervenções  envolveu  aspetos  essencialmente  relacionados 

com:  (i)  os  recursos  humanos,  designadamente  aspetos  relativos  à  remuneração  e  aos  sistemas  de 

incentivos,  (ii) os  conflitos  de  interesses  e o  regime  de  trabalho  com  ou  sem  exclusividade  e  (iii)  a 

formação  e  a  recertificação.  Foram menos  abordados  os  aspetos  relativos  ao  (iv)  planeamento  e 

mobilidade  de  RH  e  à  (v)  redefinição  das  funções  das  profissões  da  saúde  e  ainda  menos  os 

relacionados com (vi) os modelos de organização. 

Devem‐se destacar dois aspetos só superficialmente abordados que são decisivos, designadamente a 

acreditação de serviços e não exclusivamente de unidades hospitalares e a certificação e a formação e 

a  investigação clínica que constituem elementos relativos à organização, qualquer que seja o modelo 

organizacional escolhido. Também os aspetos relativos ao processo relacionados com a necessidade de 

desenvolver  e  inovar  em  tecnologias  de  informação  e  à  estrutura  organizativa  de  prestação  de 

cuidados mais baseada nas  situações concretas dos doentes do que nas especialidades médicas não 

tiveram uma abordagem suficientemente desenvolvida. 

De  facto,  a governação  clínica  e  a gestão da doença  crónica  e das  co‐morbilidades  lançam grandes 

desafios ao modelo organizativo hospitalar atual, designadamente nos aspetos relativos à resposta ao 

perfil de procura. 

Outro aspeto decisivo relativo às organizações de prestação de cuidados de saúde relaciona‐se com a 

frequente diferença entre o  trabalho prescrito e o  trabalho  real que deveria condicionar padrões de 

organização adequados a tal tipo de realidade. 

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Finalmente,  independentemente  do modelo  de  organização  a  adotar,  a  eficiência  e  os  critérios  de 

funcionalidade exigem um maior reforço de modelos de gestão mais descentralizados e participado (e 

por  isso  também  mais  contratualizados  e  regulados),  ou  dito  de  outra  forma,  com  um  maior 

investimento na governação clínica (clinical governance). 

   

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7. Qualidade e eficiência 

 

Relator:   José Pereira Miguel 

Palestrantes:  Vasco Maria 

Pedro Pita Barros 

Teresa Mendes 

Manuel Sobrinho Simões 

 

Contributos:  

 

Medicamentos e Dispositivos Médicos e Reforma dos Cuidados de Saúde Primários 

Vasco  Maria    

Pela primeira vez desde há décadas, em 2009‐2010 o crescimento da despesa com saúde e da despesa 

com medicamentos  foi  negativo  na maior  parte  dos  países  da OCDE  [OECD  Health  Data  2012].  Em 

Portugal, o preço médio por embalagem de medicamentos no mercado  total  tem vindo a decrescer 

sistematicamente nos últimos 5 anos. No quarto trimestre de 2010, o preço médio por embalagem dos 

medicamentos  genéricos  foi,  pela  primeira  vez,  inferior  ao  preço  médio  dos  medicamentos  não 

genéricos, tendo esta tendência vindo a acentuar‐se desde então [Fonte: IMS Health]. Os encargos com 

medicamentos em ambulatório no âmbito do SNS têm vindo a decrescer, depois de terem atingido o 

valor histórico mais elevado em 2010. Em 2012 os valores foram sobreponíveis aos verificados em 2002 

[Fonte: INFARMED 2013]. 

Em  2011  a  taxa  de  MG  em  Portugal  foi  de  20%  em  valor  e  de  cerca  de  25%  em  volume  [Fonte: 

INFARMED]. Estes valores são claramente superiores aos de outros países europeus, mas encontram‐se 

ainda  longe do seu potencial máximo de crescimento a curto prazo  (cerca de 40%). Relativamente à 

despesa com medicamentos em meio hospitalar, em 2012 terá sido superior a 1.000 Milhões de Euros, 

com dois grupos (imunomoduladores e antivíricos) a contribuírem com cerca de 50% para a despesa.  

Em 2012 a despesa com Medicamentos Órfãos cresceu 17% e estes medicamentos representam já 7% da 

despesa  total.  Em  todo  o mundo  desenvolvido  assiste‐se  a  um  crescimento muito  significativo  da 

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despesa com medicamentos órfãos. Os custos anuais com o tratamento de um único doente atingem 

frequentemente os 500.000 USD. Mais de ¼ dos 39 novos medicamentos aprovados pela FDA em 2012 

destinam‐se ao tratamento de doenças raras (medicamentos órfãos). Esta mesma tendência verifica‐se 

na UE e verificar‐se‐á em Portugal. As causas imediatas para os preços “proibitivos” dos medicamentos 

órfãos, radicam nos seguintes fatores:  i) modelo atual de  I&D de novos medicamentos;  ii) sistema de 

patentes;  iii)  ausência  de  uma  estrutura  conhecida  na  formação  de  preços;  iv)  valor  percebido  dos 

medicamentos para tratamento de doenças graves (“a vida não tem preço,  logo o medicamento não 

tem preço”). 

A nível Europeu há uma preocupação crescente com as  limitações do atual modelo de  introdução de 

medicamentos  no  mercado.  Algumas  autoridades  reguladoras,  grupos  de  profissionais  de  saúde, 

grupos  de  doentes  e  entidades  pagadoras  advogam,  cada  vez  mais,  a  introdução  da  eficácia 

comparativa  e  a  demonstração  de  valor  terapêutico  acrescentado  nos  critérios  para  aprovação  da 

entrada de novos medicamentos no mercado. 

Relativamente à despesa com medicamentos e produtos de saúde em Portugal, constata‐se o seguinte: 

O  decréscimo  da  despesa  com  medicamentos  em  ambulatório  deve‐se,  essencialmente,  a 

descidas administrativas do preço dos medicamentos.  

Poucas ou nenhumas medidas estruturais  têm  sido  implementadas para uma utilização mais 

racional dos medicamentos (com a notável exceção da promoção do mercado dos MG). 

O controlo da despesa a nível hospitalar não é possível apenas com medidas de controlo do 

preço dos medicamentos.  

As  intervenções direcionadas ao  controlo da despesa  com MCDT, bem  como de dispositivos 

médicos em geral, têm sido escassas ou totalmente ausentes. 

Existe  ainda  um  enorme  potencial  de  intervenção  para  a  redução  do  desperdício  na  utilização  de 

medicamentos e MCDT (quer junto dos prescritores, quer junto dos utilizadores/consumidores). 

 

Propostas 

Medicamentos e dispositivos médicos a nível hospitalar: 

Reforçar a avaliação para a entrada no Hospital 

o Demonstração de Valor Terapêutico Acrescentado 

o Avaliação Económica (custo‐efetividade) 

Avaliar/reavaliar a efetividade após determinado tempo de utilização 

Definir orçamentos anuais para a Inovação 

Estabelecer contratos anuais/plurianuais com as empresas  

o Número e tipo de doentes elegíveis (registos clínicos) 

o Tetos máximos de despesa 

o Mecanismos de compensação se teto ultrapassado 

o Partilha de risco (gestão da incerteza) 

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Vantagens deste sistema:    

Sustentabilidade do SNS (previsibilidade, gestão de recursos disponíveis) 

Previsibilidade para as empresas 

Acesso mais rápido ao mercado (empresas) 

Acesso mais rápido ao medicamento (doentes) 

Responsabilização dos profissionais  (utilização do medicamento nos doentes que 

realmente dele podem beneficiar) 

Prémio à inovação 

Caracterização e Monitorização do Mercado de Dispositivos Médicos 

o Sistema de classificação/codificação dos dispositivos médicos 

o Avaliação comparativa para entrada nos Hospitais 

Valor Terapêutico 

Avaliação económica 

o Negociação centralizada de preços 

o Definição de Protocolos de atuação 

o Redução do desperdício e racionalização (possibilidades de reutilização?) 

 

Medicamentos em Ambulatório 

Continuação da Promoção do Mercado de Medicamentos Genéricos 

o Evitar excessiva concentração em determinados grupos/escalões de preços 

o Promover alargamento a outras Substâncias Ativas 

o “Credibilizar” processo de avaliação e controlo de qualidade  

o Combater crenças e mitos (prescritores e utilizadores) 

o Incentivos a nível das farmácias 

Programas de Promoção da Utilização Racional (Profissionais) 

o Prescrição de Qualidade (“conservadora”) 

Medicamentos ineficazes 

Medicamentos desnecessários 

Interações medicamentosas 

o Recomendações / Normas de Orientação Clínica (evidência? racionalidade?) 

o Serviços de informação independente (Universidades) 

o Programas de atualização em Farmacoterapia 

o Equipas multidisciplinares no terreno (Farmacologistas clínicos) 

o Auditorias clínicas 

o Ações de benchmarking 

Definição de uma Política coerente de utilização de Antibióticos 

Programas de Promoção da Utilização Racional (Doentes/Consumidores) 

o Combate à iliteracia 

Doença 

Medicamento 

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o Promoção de comportamentos saudáveis  

o Alternativas não farmacológicas 

o Autocuidados 

o Responsabilização 

o Decisão informada e partilhada 

Promoção da Adesão à Terapêutica 

o Mais e melhor Informação para os doentes 

o Melhor definição dos Planos de Intervenção Terapêutica 

o Negociação e Responsabilização 

o Realismo 

Sistema de Comparticipação 

o Reavaliação/Refundação do Sistema de Comparticipação  

o Critérios explícitos, reprodutíveis e transparentes  

o Modelo tridimensional: i) Doença; ii) Medicamento; iii) Doente 

o Reavaliação dos medicamentos  comparticipados  e  exclusão das  alternativas de  valor 

terapêutico reduzido ou duvidoso 

o Sistema com “Entrada” e com “Saída”. 

 

MCDT em Ambulatório 

Promoção da Utilização Racional (Profissionais) 

o Redução do desperdício e racionalização 

o Benefício e Risco das medidas preventivas 

Primum non nocere 

o Competências de comunicação/educação para a saúde 

o Normas de Orientação Clínica 

Informação e Educação (Cidadãos) 

o Fatores de risco versus Doença 

o Conceito de Normalidade 

o Conceitos de Benefício e Risco 

o Decisão informada e partilhada 

o Combate à Futilidade (“já agora…”) 

o Combate à Epidemia de MEDO (medicalização da sociedade) 

 

Reforma dos Cuidados de Saúde Primários 

Passados  6  anos  após  o  início  da  sua  implementação,  as USF  cobrem menos  de  50%  da  população 

portuguesa, apesar de demonstradamente representarem um modelo de cuidados de maior qualidade, 

menores  custos  e  nível  mais  elevado  de  satisfação  por  parte  dos  profissionais  e  dos  cidadãos. 

Frequentemente, no mesmo edifício coexistem dois modelos de prestação de cuidados com resultados 

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radicalmente  diferentes,  representando  iniquidade  no  acesso  e  no  nível  de  qualidade  dos  cuidados 

prestados. Não existe qualquer justificação para permitir por mais tempo esta situação. 

Generalização do Modelo das USF 

o Maior Qualidade dos cuidados 

o Menores custos (medicamentos, MCDT) 

o Melhor acessibilidade 

o Maior satisfação dos profissionais e dos cidadãos 

Formação e Treino dos Médicos de CSP 

o Ecologia dos cuidados de saúde 

o Multimorbilidade e polimedicação 

o Gestão da complexidade terapêutica 

o Competências de comunicação 

o Gestão de recursos 

o Decisão baseada em evidência 

 

Gestão das unidades do SNS de forma a promover a qualidade e eficiência 

Pedro  Pita  Barros      

A proposta de reflexão tem como ponto de partida o sistema de saúde nas suas características a médio 

e a  longo prazo, nas vertentes de qualidade e eficiência. O tema é em si mesmo bastante vasto pelo 

que a presente intervenção se centrará num conjunto limitado de aspetos. Esses aspetos encontram‐se 

associados, por escolha, a um problema particular, a capacidade de gestão das unidades de saúde. Em 

termos de solução, colocam‐se para discussão  intervenções de carácter geral e central. A delimitação 

do âmbito deste  texto permite a apresentação de propostas para  fomentar uma melhor gestão das 

unidades do SNS e com essa melhor gestão promover quer a qualidade quer a eficiência. 

 

Princípios fundamentais 

As propostas de evolução do sistema de saúde português, e do SNS em particular, não podem deixar 

de atender aos princípios fundamentais que se pretende satisfazer com a organização do sector. 

O  primeiro  desses  princípios  é  a  proteção  em  caso  de  doença,  independentemente  das  condições 

financeiras: universal e abrangente. Os pagamentos no momento de consumo não devem prejudicar a 

componente de proteção contra despesas de saúde necessárias. O segundo princípio é o da promoção 

da saúde na população e não apenas resolução das situações de doença. 

As mudanças  a  realizar no  funcionamento do  sector da  saúde devem procurar  satisfazer  estes dois 

princípios. O SNS em particular deve ter a sua organização orientada para que sejam respeitados. 

 

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Conceitos de eficiência 

Existem  vários  níveis  e  correspondentes  definições  de  eficiência.  Há  a  eficiência  na  utilização  do 

sistema de saúde, que significa prestar cuidados de saúde apenas quando os benefícios excederem os 

custos  da  intervenção.  Temos,  por  outro  lado,  a  eficiência  na  recolha  de  fundos.  Neste  caso,  a 

preocupação é com a combinação de fontes de financiamento que tenha as menores distorções, quer 

sobre  a  utilização  do  sector  da  saúde  quer  sobre  a  economia  em  geral.  Há,  também,  a  noção  de 

eficiência na prestação, em que  se procura que os  cuidados de  saúde prestados na medida  certa o 

sejam com as combinações de recursos mais adequadas e sem desperdício de recursos. 

A procura de eficiência é, assim, uma procura de eficiências no sistema de saúde, a níveis diferentes e 

requerendo instrumentos eventualmente diferentes para ser atingida cada uma delas. 

Relativamente  à  noção  de  qualidade,  existem  muitas  definições  possíveis  e  várias  distinções  (por 

exemplo,  qualidade  de  resultados  versus  qualidade  de  processos).  Há  por  vezes  a  noção  de  que 

qualidade  e  eficiência  são  objetivos  antagónicos, mas  na  verdade mais  qualidade  frequentemente 

coincide  com  maior  eficiência.  E  maior  eficiência  não  significa  necessariamente  menor  custo,  se 

incluirmos na noção de eficiência não deixar de prestar cuidados de saúde cujo benefício excede o seu 

custo para a sociedade. 

Quando  se  falar  em  eficiência  na  utilização  do  sistema,  e  se  considera  as  várias  possibilidades  de 

definição, há que responder, para pensar no sistema a médio e a  longo prazo, a diferentes questões: 

Que tipo de doenças será mais frequente? Quais serão as mais suscetíveis de serem  influenciadas por 

decisões  relativas ao  sistema de  saúde? Que participação do  cidadão  se quer e que é possível? Que 

instrumentos podem ser usados para conhecer a “procura” e para gerar um uso adequado do sistema 

de  saúde?  Que  organizações?  Como  lidar  com  a  crescente  informação  e  sua  transformação  em 

conhecimento? 

Não será dada aqui resposta a estas perguntas, embora para se ter uma visão coerente sobre o futuro 

do  sistema  de  saúde  seja  preciso  que  respostas,  nalgum  momento  do  tempo,  tenham  de  ser 

encontradas. 

 

Eficiência na recolha de fundos 

Há um consenso generalizado sobre o financiamento solidário por impostos, com progressividade nas 

contribuições.  Não  é  opção  que  seja  contestada  de  forma  ampla.  Ainda  assim,  e  até  se  ter  uma 

discussão completa, há que responder, mesmo que seja negativamente, a algumas questões. 

Haverá  abertura  para  funcionamento  de  sistemas  alternativos?  Será  que  pode  ser  encarada  uma 

evolução da ADSE ou de sistemas como a Advance Care, Médis ou Multicare para alternativas ao SNS, 

recebendo uma capitação, eventualmente ajustada pelo risco individual, por cada beneficiário? 

Embora interessante, as preferências da população parecem descartar a oportunidade desta discussão. 

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Eficiência na prestação 

Os ganhos de eficiência  são a  resposta mais  frequentemente apontada como  solução para as atuais 

dificuldades  do  sistema  de  saúde  português.  Sem  deixar  de  considerar  relevante  reafirmar  que  a 

preocupação com a eficiência de funcionamento deve estar presente, é mais útil dar atenção ao que 

motivar, dentro das organizações do sistema de saúde, a procura dessa eficiência. 

A primeira chamada de atenção é que se deve focar os esforços na redução da taxa de crescimento dos 

custos, e não apenas no seu nível. O ter‐se uma noção da dinâmica dos custos é essencial. 

O segundo aspeto é focar na capacidade de organizar de eliminar desperdícios e de ter as combinações 

de recursos adequadas. 

Para atingir essa eficiência será provavelmente mais adequado focar nos resultados, e não tanto numa 

“normalização” exata do processo de prestação de cuidados de saúde  (exemplo: utilizar os mesmos 

medicamentos em todo o lado, ou verificar que os resultados são similares?) 

 

Propostas ‐ Como melhorar a gestão nas entidades do SNS? 

Sendo o  SNS, o  elemento basilar do  sistema de  saúde português,  e  sendo  também  a  instituição 

sobre a qual a política pública no campo da saúde  tem capacidade de atuação, apresentam‐se de 

seguida algumas ideias sobre como melhorar a gestão. Há muitos outros aspetos do funcionamento 

do  SNS  que  também  são  suscetíveis  de  melhoria,  mas  a  necessidade  de  contenção  desta 

intervenção obriga a opções. A opção deliberada é a  incidir a discussão sobre formas que  levem a 

uma melhoria do processo de gestão dentro do SNS. Essa discussão está organizada num formato 

em que se apresenta primeiro o problema identificado, e depois a proposta de solução. 

 

Problema:  A  gestão  anual  de  um  orçamento  não  é  propriamente  gestão.  Há  a  necessidade  de  um 

horizonte plurianual para que se possa planear adequadamente (3 a 5 anos) com alguma certeza sobre 

os recursos disponíveis para realizar essa gestão. 

Proposta:  Criação  de  um  fundo  de  estabilização  do  SNS,  que  funcionando  de  forma  anti‐cíclica 

consiga um perfil de financiamento do SNS compatível com estabelecimento de orçamentos a três 

anos para as instituições do SNS. Este fundo em anos de maior desafogo orçamental recebe fundos 

do orçamento do estado, em anos de menor crescimento económico, complementa o orçamento 

do SNS. A credibilidade das regras do fundo é o aspeto central para determinar o seu sucesso. 

 

Problema: Há falta de organização no funcionamento interno das instituições do SNS.  

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Proposta: Auditorias  à gestão de operações  e  identificação de melhores práticas  como  forma de 

motivar maior eficiência. Ter equipa(s) dedicada(s) a esta  tarefa,  sendo que no espaço de 5 anos 

todos  as  unidades  do  SNS  deveriam  participar.  Estas  equipas  estariam  dependentes  de  um 

organismo central e atuariam como equipas de consultoria  interna do Ministério da Saúde, criando 

um  conhecimento  acumulado  divulgado  publicamente.  Poderá  colocar‐se  a  questão  de  serem 

equipas  do Ministério  ou  ser  preferível  recorrer  a  consultoras  externas. O  recurso  a  consultoras 

externas, desejável em vários contextos, é aqui menos interessante pela importância da divulgação 

de boas práticas de forma pública e pelo custo que uma sua utilização permanente poderá envolver. 

 

Problema:  Há  grande  dificuldade  de  fazer  sair  do  sistema  prestador  do  SNS  instituições  que  não 

funcionem adequadamente. 

Proposta: Começar por perceber o que pode ser encarado como atividade standard (“commodity”) 

e sujeita a concorrência. Motivar a eficiência via concorrência e saída do que funcionar mal. Sendo 

atividade standard, conseguir substituir as unidades prestadoras de cuidados de saúde que tenham 

funcionamento  adequado  não  será  problemático.  Esta  proposta  tem  implicações  em  termos  de 

âmbito de funcionamento das atuais unidades de saúde, podendo ser desejável autonomizar partes 

e/ou concentrar atividade.  

 

Problema: Há falta de planeamento estratégico nas unidades do SNS. 

Proposta: Criação de gabinete de apoio ao planeamento estratégico (para unidades de cuidados de 

saúde  primários  e  para  unidades  hospitalares),  numa  lógica  de  serviço  partilhado  e  não  de 

centralização de gestão. Não seria um centro de emissão de normas de gestão, e sim um centro de 

recursos especializados em planeamento estratégico que seria usado pelas diferentes unidades de 

saúde,  contra  um  pagamento  que  sairia  do  orçamento  de  cada  instituição.  A  existência  de  um 

pagamento  interno  ao  SNS  é  crucial  para  promover  responsabilidade  na  utilização  dos  recursos 

partilhados. 

 

Problema:  Evitar  soluções  estáticas  para  problemas  dinâmicos.  Há  a  necessidade  de  criar  pressão 

permanente para a melhoria em vez de estar sempre a fazer a “última grande reforma” do SNS. 

Proposta: Focar as organizações em processos de melhoria contínua da qualidade como  forma de 

ter pressão constante para melhoria. Pensar em termos de melhoria da qualidade, nomeadamente 

de resultados, é claramente mais motivador do que ter um processo contínuo de redução de custos, 

além de ajudar a concentrar a atenção no médio e longo prazo e não nas contas e custos deste ano 

e quando muito do próximo ano. 

 

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Problema: Necessidade  de  envolvimento  dos  profissionais  de  saúde  no  processo  de mudança  e  no 

processo de sustentabilidade financeira do SNS. 

Proposta: Permitir mecanismos de apropriação das poupanças que sejam geradas por melhor gestão 

e melhor  desempenho  dos  profissionais  de  saúde.  Esses mecanismos  não  podem  ser  aumentos 

permanentes de  salários, e  sim benefícios  associados  com o desempenho. Devem  ser uma parte 

visível mas não maioritária da remuneração. 

 

Problema: Assumir as  implicações da  inovação ser o principal motivo para crescimento dos custos em 

cuidados de saúde. 

Proposta:  Promover  a  utilização  generalizada  dos  mecanismos  de  avaliação  económica  das 

tecnologias  de  saúde,  em  adição  à  avaliação  do  valor  terapêutico  adicional,  e  impondo  que  à 

entrada de alguma tecnologia com elevado valor deverá corresponder a saída de outra tecnologia 

com baixo valor para o custo que tenha.  

 

Problema: A  inovação – novas terapêuticas – como principal motivo para crescimento dos custos em 

cuidados de saúde. 

Proposta: Premiar a inovação organizacional e não apenas a inovação técnica ou tecnológica, virada 

para as terapêuticas e diagnóstico. Premiar a inovação de processo que para os mesmos resultados 

consiga ter menores custos; ou para os mesmos custos consiga ter melhores resultados. Onde está 

custos, leia‐se também taxa de crescimento dos custos, para não se perder a visão dinâmica. 

 

Com  o  presente  texto  procurou‐se  responder  ao  desafio  de  numa  apresentação  de  15  minutos 

apresentar  propostas  que  promovam  a  qualidade  e  a  eficiência  do  sistema  de  saúde  português  no 

médio e no longo prazo. Esta abrangência de tema obriga a uma delimitação clara, pelo que se optou 

por  focar em aspetos de eficiência e em particular problemas, e propostas de solução, que afetam a 

eficiência de funcionamento das instituições do SNS. Deliberadamente omitiram‐se referências a muitas 

outras áreas onde será possível e desejável melhorar a organização e o  funcionamento do SNS e do 

sistema  de  saúde.  A  grande  linha  de  intervenção  pública  subjacente  às  propostas  apresentadas  é 

simples: que mecanismos são possíveis usar para facilitar uma gestão mais adequada? 

 

Qualidade Clínica e Investigação & Desenvolvimento: Propostas 

C.  Manuel  Sobrinho  Simões  (IPATIMUP  e  ENSP‐UNL)  

 

Criar no Ministério da Saúde um Gabinete de Assuntos Académicos como  interlocutor às  instituições 

responsáveis pelas licenciaturas, mestrados e doutoramentos em Ciências da Saúde. 

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O problema da qualidade da formação é, já, e sê‐lo‐á ainda mais no futuro, um problema grave no que 

se refere à manutenção da solidez de Recursos Humanos no Sistema Nacional de Saúde.  

Este “Gabinete de Assuntos Académicos” deveria também servir de interlocutor, do lado do Ministério 

da  Saúde,  aos  grupos,  centros  e  institutos  envolvidos  em  atividades  de  investigação  clínica  e  de 

investigação de translação. 

 

Avaliar, através de resultados (desempenho) medidos em termos de produtividade e de qualidade, a 

atividade clínica (cuidados pré‐hospitalares, hospitalares e pós‐hospitalares)  introduzindo mecanismos 

de recompensa.  

Os modelos de avaliação deverão ser diferentes nos três escalões (pré, intra/agudos e pós‐hospitalares) 

mas terão de estimular a qualidade e a eficiência.  

Por exemplo: para os médicos de Medicina Geral e Familiar é fundamental avaliar não só o número de 

doentes “consultados”, como o número daqueles que ficam a ser seguidos nos Centros.  

Os  hospitais  centrais  devem  receber  sobretudo  patologias  diferenciadas  em  vez  de  fazer  consultas 

indiferenciadas de doentes mandados por médicos de clínica geral a desempenhar funções de polícia 

sinaleiro.  

 

Desenvolver a Saúde Publica com estímulos positivos no sentido de a tornar um pivot fundamental de 

mais literacia dos cidadãos em relação à Promoção da Saúde e à Prevenção da Doença.  

 

Diferenciar os hospitais e introduzir fórmulas de financiamento que valorizem a sua especificidade em 

termos de referenciação e de especialização.  

Nos  hospitais  de  referência  para  além  da  produtividade  e  da  qualidade,  é  fundamental  estimular  e 

recompensar a formação de alunos, internos, médicos em formação continua e de outros profissionais 

de saúde, assim como premiar a  investigação clínica e a  investigação de translação e as atividades de 

extensão à comunidade. (Os hospitais centrais e as suas personalidades podem e devem ser utilizados 

como opinion‐makers e liderar movimentos no sentido da maior literacia das populações). 

 

Estimular  a  criação  nos  Hospitais  e  Centros  de  Saúde  de  estruturas  do  tipo  Gabinetes/Centros  de 

Investigação Clínica.  

Estas estruturas deverão ter a possibilidade de guardar os proveitos financeiros, do mesmo modo que 

os  hospitais  deveriam  poder  guardar  poupanças  de  boa  gestão,  para  reinvestir  em  Projetos  de 

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Investigação  e  noutras  iniciativas  destinadas  a  I&D&I.  Esta  medida  deverá  ser  acompanhada  por 

medidas de estímulo à agilização da Investigação Clínica (ver propostas do Health Cluster Portugal). 

 

Regulamentar  (e procurar  estimular  em  termos  de  vencimento  e  de  incentivos)  a  exclusividade  em 

algumas “categorias” de profissionais.  

Por mim tornaria obrigatória a exclusividade para  Internos e Diretores de Serviço/Departamento e de 

Centros de Saúde. 

 

Estimular  a  utilização  cada  vez  maior  de  enfermeiros  e  outros  profissionais  de  saúde  (TDT,  por 

exemplo) criando equipas multidisciplinares. 

Mantendo a hierarquia  técnica. É  fundamental diminuir o envolvimento dos médicos em  tarefas que 

podem ser – e são – melhor realizadas por outros profissionais de saúde. 

 

Articular melhor as Faculdades de Medicina com os “seus” Hospitais Nucleares e Afiliados e com os 

“seus” Centros de Saúde. 

Garantindo  que  todos  os  docentes  clínicos  são  recrutados  entre  os médicos  desses Hospitais  e/ou 

Centros de Saúde (Não deve haver lugar para docentes nas disciplinas clínicas que tenham uma carreira 

independente,  isto  é,  não  deve  haver  professores  de  disciplinas  clínicas  que  sejam  apenas 

“académicos”).  A  articulação  das  duas  “carreiras”  numa  única  função/missão  exige  legislação  com 

envolvimento sinérgico do Ministério da Educação é Ciência e do Ministério da Saúde.  

 

Conclusões  Gerais 

O painel abordou as seguintes áreas: 

Medicamentos e Dispositivos Médicos 

Reforma dos Cuidados de Saúde Primários 

Gestão das unidades do SNS de forma a promover a qualidade e eficiência 

Qualidade Clínica e Investigação & Desenvolvimento 

Para cada uma das áreas os participantes do painel apresentaram propostas para o sistema de saúde, 

das quais se destacam as elencadas de seguida. 

 

   

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Medicamentos e Dispositivos Médicos 

Reforçar a avaliação para a entrada no Hospital 

Avaliar/reavaliar a efetividade após determinado tempo de utilização 

Definir orçamentos anuais para a Inovação 

Estabelecer contratos anuais/plurianuais com as empresas  

Caracterização e Monitorização do Mercado de Dispositivos Médicos 

Continuação da Promoção do Mercado de Medicamentos Genéricos 

Definição de uma Política coerente de utilização de Antibióticos 

Promoção da Adesão à Terapêutica 

Reavaliação/Refundação do Sistema de Comparticipação  

Programas de Promoção da Utilização Racional (Profissionais e Doentes/Consumidores) 

 

Reforma dos Cuidados de Saúde Primários 

Generalização do Modelo das USF 

Formação e Treino dos Médicos de CSP 

 

Gestão das unidades do SNS de forma a promover a qualidade e eficiência 

Criação de um fundo de estabilização do SNS 

Auditorias à gestão de operações e identificação de melhores práticas 

Perceber  o  que  pode  ser  encarado  como  atividade  standard  (commodity)  e  sujeita  a 

concorrência 

Criação de gabinetes de apoio ao planeamento estratégico 

Focar as organizações em processos de melhoria contínua da qualidade 

Permitir mecanismos de apropriação das poupanças geradas por melhor gestão e desempenho  

Premiar a inovação organizacional 

 

Qualidade Clínica e Investigação & Desenvolvimento 

Criar no Ministério da Saúde um Gabinete de Assuntos Académicos 

Avaliar a atividade clínica introduzindo mecanismos de recompensa 

Desenvolver a Saúde Publica 

Diferenciar  os  hospitais  e  introduzir  fórmulas  de  financiamento  que  valorizem  a  sua 

especificidade 

Estimular a criação de estruturas do tipo Gabinetes/Centros de Investigação Clínica 

Regulamentar a exclusividade em algumas “categorias” de profissionais 

Estimular a utilização cada vez maior de enfermeiros e outros profissionais de saúde  

Articular melhor as Faculdades de Medicina com os “seus” Hospitais e Centros de Saúde 

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