o Sistema Local de Produção de Máquinas e Implementos...

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o Sistema Local de Produção de Máquinas e Implementos Agrícolas: uma visão global* Argemiro Luís Bruttr" Tânia Marques Tybusch'" Resumo o presente artigo é uma sintese da pesquisa sobre sistemas locais de produção máquinas e implementas agrícolas, dirigida pelos autores junto à Central Internacional de Análises Econômicas e de Estudos de Mercado Agropecuário (Ceema), órgão do Departamento de Economia e Contabilidade (DECon), da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Unijui), sob demanda da Secretaria do Desetwoivimento e dos Assuntos Internacionais do Rio Grande do Sul (Sedai-RS). O mesmo trata dos mercados mundial e nacionai de máquinas e implementas agricolas, com ênfase em seu momento atual e tendências. Analisando as perspectivas que se abrem para a produção de máquinas e implementas agrícolas do Rio Grande do Sul, " A pesquisa da qual este artigo se origina contou com a efetiva colaboração dos seguintes profissionais do setor de máquinas e implementas aqrtcolas: Gerson Pohl; João Aloísio Butzke; Liane Kotz: Lourenl Turra; Marcelo Gonçalves; e Marli Veber. Além disso, faz-se agradecimen- to especial ao Sr. Jalmar Martel, Diretor-Presidente da Indústria de Máquinas Agrícolas FUCHS S/A (IMASA) e atua! Presidente da Associação Comercial e Industrial de ljui-RS. O documento completo, resultado da pesquisa, está à disposição dos interessados junto à Sedai, em Porto Alegre (RS). Convênio Unljuf-Sedai estabelecido também com outras universidades das regiões de localiza- ção dos SLPs prlorizados. visando à realização de estudos complementares aos desenvolvi- dos pelas Oficinas. ** Professor da Unijul, Doutor pela EHESS de Paris-França, Analista de Mercado, Pesquisador e Coordenador da Central Internacional de Análises Econômicas e de Estudos de Mercado Agropecuário (Ceema). U* Técnica da Central Internacional de Análises Econômicas e de Estudos de Mercado Agropecuário (Oeerna), órgão do Departamento de Economia e Contabilidade da Unijuí, Mestranda em Agronegócios na UFRGS.

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o Sistema Local de Produçãode Máquinas e Implementos Agrícolas:

uma visão global*Argemiro Luís Bruttr"

Tânia Marques Tybusch'"

Resumoo presente artigo é uma sintese da pesquisa sobre sistemas locais de

produção máquinas e implementas agrícolas, dirigida pelos autores junto àCentral Internacional de Análises Econômicas e de Estudos de MercadoAgropecuário (Ceema), órgão do Departamento de Economia e Contabilidade(DECon), da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande doSul (Unijui), sob demanda da Secretaria do Desetwoivimento e dos AssuntosInternacionais do Rio Grande do Sul (Sedai-RS). O mesmo trata dos mercadosmundial e nacionai de máquinas e implementas agricolas, com ênfase emseu momento atual e tendências. Analisando as perspectivas que se abrempara a produção de máquinas e implementas agrícolas do Rio Grande do Sul,

" A pesquisa da qual este artigo se origina contou com a efetiva colaboração dos seguintesprofissionais do setor de máquinas e implementas aqrtcolas: Gerson Pohl; João Aloísio Butzke;Liane Kotz: Lourenl Turra; Marcelo Gonçalves; e Marli Veber. Além disso, faz-se agradecimen-to especial ao Sr. Jalmar Martel, Diretor-Presidente da Indústria de Máquinas Agrícolas FUCHSS/A (IMASA) e atua! Presidente da Associação Comercial e Industrial de ljui-RS. O documentocompleto, resultado da pesquisa, está à disposição dos interessados junto à Sedai, em PortoAlegre (RS).

Convênio Unljuf-Sedai estabelecido também com outras universidades das regiões de localiza-ção dos SLPs prlorizados. visando à realização de estudos complementares aos desenvolvi-dos pelas Oficinas.

** Professor da Unijul, Doutor pela EHESS de Paris-França, Analista de Mercado, Pesquisador eCoordenador da Central Internacional de Análises Econômicas e de Estudos de MercadoAgropecuário (Ceema).

U* Técnica da Central Internacional de Análises Econômicas e de Estudos de Mercado Agropecuário(Oeerna), órgão do Departamento de Economia e Contabilidade da Unijuí, Mestranda emAgronegócios na UFRGS.

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dentro do quadro estabelecido, o trabalho considera três grandes tendên-cias - não necessariamente excludentes -, conlorme as políticas imple-mentadas: (a) permanência e expansão das empresas na região noroeste doR5, com a condição de que sejam enfrentados os obstáculos logísticos rela-cionados ao deslocamento da fronteira agrícola; (b) diversificação da linha deprodução, visando, sobretudo, aos pequenos produtores, nesse casorelacionadas a po/iticas de crédito adequadas; (c) transferência de empresaspara o Centro-Oeste do País, caso os principais problemas não sejamsuperados.

o setor de máquinas e implementas agrícolas é um dos mais dinâmicosna regiâo noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. O mesmo representa,aproximadamente, R$ 1,5 bilhão, gerando em torno de 10.000 empregos. Aimportância desse setor, na economia local, motivou um estudo mais amplo,abrangendo a anâlise dos mercados mundial e nacíonal.

Este artigo sintetiza, assim, um exaustivo trabalho de pesquisa realizadoem torno do sistema local de produção máquinas e implementos agrícolas. Omesmo buscou analisar as grandes tendências, em termos mundiais e nacio-nais, do mercado de máquinas e implementas agrícolas. Assim, o primeirocapitulo trata da realidade desse mercado no contexto do Mercosul, com ênfa-se aos casos do Brasil e da Argentina. O segundo capítulo destaca, especifi-camente, a agricultura de precisão. Já o terceiro capítulo enfatiza a situaçãoatual e as principais tendências desse mercado.

Cabe observar que, neste trabalho, se entende máquina como o conjun-to de órgãos, constrangidos em seus movimentos por obstáculos fixos ede resistência suficiente para transmitir o efeito de forças e transformarenergia, e por implemento o conjunto constrangido de órgãos que nãoapresentam movimentos relativos nem têm capacidade para transformarenergia; seu único movimento é o de deslocamento, normalmente impri-mido pela tração de uma máquina.

1 - O mercado de máquinas e implementasagrícolas no Mercosul

As transformações dos diversos sistemas econõmicos e o dinamismo doprocesso evolutivo da economia mundial mostram que a tendência das rela-ções econômicas será a consolidação do processo de globalização dos mer-cados.

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Essa globalização, além de abrir o mercado brasileiro a grandes empre-sas do setor, leva a três movimentos no ãmbito internacional. O primeiro delespode ser considerado o da construção de parcerias ou joint ventures. Ondehavia uma empresa local, principalmente buscando tecnologia, e uma empresade fora, buscando mercado, formou-se uma parceria via criação de uma em-presa comum. Outro movimento foi o de aquisição. Grandes grupos internacio-nais, com o objetivo de aumentarem suas presenças no mercado, acabamadquirindo empresas locais. Por fim, temos o movimento de extinção de em-presas. Uma série de muitas pequenas empresas, que não puderam ou nãodesejaram se associar com empresas de maior porte, acabaram fora do mer-cado, pois não conseguiram evoluir em tecnologia e capital.

O resultado desses movimentos se apresenta sob forma de uma forteconcentração de mercado - principalmente em equipamentos de maior valoragregado - e tecnologia na mão dos grandes players internacionais da área.Por outro lado, essas empresas trouxeram um maior nível de tecnologia equalidade, que resultam em equipamentos mais eficientes.

Nesse contexto, presenciamos uma evolução do Mercosul. Essa regiãoassiste a uma afirmação do Brasii como grande fornecedor de máquinas agrí-colas na América Latina. Respondendo, atualmente, por cerca de 80% dostratores agricolas comercializados na América do Sul (20.695 unidades), ocrescimento registrado foi de 40,7%, comparando as vendas de 1999 com asde 1996. Já no caso da Argentina, o que se pode perceber é uma redução dasua participação no mercado. Em 1996, foram vendidas 5.042 unidades, en-quanto, em 1999, esse volume caiu para 1.606 unidades.

A criação do Mercosul gerou um enorme mercado agrícola. Brasil e Ar-gentina representam o maior potencial de expansão agricola no mundo, e istodeve continuar no médio prazo. Este foi um dos fatores de atração dos gran-des grupos fabricantes de máquinas agrícolas. De fato, Brasil e Argentinapossuem, juntos, 84% das colheitadeiras e 90% dos tratores da América doSul.'

No caso da Argentina, informações dão conta de que, nos anos 90, osegmento de máquinas e implementos agrícolas expandiu-se consideravelmente.Grande parte dessa expansão foi em razão das políticas agricolas, notadamenteaquelas voltadas ao investimento em máquinas, com a conseqüente ampliaçãoagrícola e com elevação da produção e da produtividade, além do aumento damecanização, a tal ponto que a frota de tratores do vizinho país cresceu,

1 Devido à política de câmbio vigente na Argentina até o final de 2001 , a preferência nos últimosanos tem sido Instalar-se no Brasil, pois as facilidades do Mercosul permitem produzir a custosmenores e exportar para a Argentina.

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passando de 170.000 para 270.000 tratores em 30 anos. No entanto, nos últi-mos cinco anos da década de 90, com o desgaste que sofreu a economiaargentina, a política tem sido apenas de renovação de máquinas, em substitui-ção às antigas. Outro fator que merece destaque é o aumento na relaçãotrator/colheitadeira, ou seja, enquanto em 1970 para cada colheitadeira exis-tiam 4,5 tratores, em 1995 eram seis tratores para uma colheitadeira.

No caso do Brasil, a maior parte das indústrias de máquinas agrícolaslocaliza-se na Região Sul. Esta é a região que, além de representar o início daagricultura e da mecanização, se situa em posição estratégica em relação aoMercosul. Além disso, essa região possui três dos principais portos brasileiros(Rio Grande, Itajaí e Paranaguá). Este é um fator que proporciona, além doescoamento da produção agrícola, o recebimento de componentes para asindústrias localizadas nessa região.

2 - Evolução da mecanização agrícola no Brasil

O processo de implantação da mecanização no Brasil (Borém et aI., 2000;Balastreire, 2000; Hum, 1989) iniciou entre 1823 e 1836 com as primeirasrecomendações de utilização e fabricação, no País, de arados de tração ani-maI. O mesmo findou em 1939-40. Na ocasião, a frota brasileira era de 3.380tratores. Nessa época, com o início da Segunda Guerra Mundial e devido àsdificuldades de importação de tratores e de outras máquinas, o desenvolvimen-to da mecanização foi seriamente prejudicado, perdurando até 1945.

Após o término da Segunda Guerra Mundial, verificou-se a necessidadede impulsionar a produção do campo, com aumento da produtividade e com aexpansão das áreas. Com isso, intensifica-se o uso de insumos modernos(sementes selecionadas, fertilizantes, defensivos e, principalmente, maquina-ria). Dessa forma, a partir de 1949, houve um grande desenvolvimento damecanização no Brasil, devido à substancial quantia de tratores que passarama ser importados. No ano de 1959, foi criado, no Brasil, o Plano Nacional daIndústria de Tratores Agrícolas. Foram instaladas, com isso, seis fábricas detratores no País, sendo que a produção somente veio a acontecer em 1961.Esse processo se firmou nos 40 anos seguintes. Assim, atualmente, o Brasilconta com uma indústria de tratores e máquinas agrícolas consolidada, possi-

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bilitando aos agricultores o acesso a máquinas com elevado nível tecnológico,tanto é que o País possui, atualmente, uma frota da ordem de 450.000 unida-des de tratores' e de 51.200 colheitadeiras.'

A indústria nacional de máquinas agrícolas produz equipamentos queatendem desde as operações realizadas com tração animal até aquelas queexigem tratores equipados com elevada tecnologia eletrõnica.

3 - Agricultura de Precisão

Tanto no Brasil como em grande parte do mundo, a partir da década de60, com o advento da Revolução Verde, as técnicas agrícolas sofreram umagrande evolução tecnológica. O momento atual é de evolução desse processo,com a contribuição das áreas de eletrõnica, informática, sensoriamento remo-to, sistema geográfico de ínformações e geoestatística para o uso de altatecnologia na produção agropecuária e para a sustentabilidade da produçãomundial de alimentos, através do desenvolvimento de novas tecnologias demecanização.

O primeiro conceito de Agricultura de Precisão foi mencionado em 1929,nos Estados Unidos, quando pesquisadores tentaram fazer uma aplicação lo-calizada de calcário, como forma de minimizar o uso desse insumo durante aaplicação. Encontrou-se, logicamente, uma grande dificuldade para realizaraplicações de forma localízada, principalmente em grandes áreas, uma vezque não existiam máquinas com grande capacidade operacional e também ogeorreferenciamento (sistema de posicíonamento).

A informática e a biotecnologia serão as técnicas mais aplicadas nospróximos anos para incrementar a produtividade das culturas, principalmentequando se esgotarem novas áreas para o plantío e a população mundial conti-nuar crescendo. Além disso, estas são tecnologias que visam reduzir não so-mente o impacto ambiental, mas também os custos de produção, que passam aser cada vez mais importantes em um mundo globalizado, onde as margenstendem a se reduzir, e somente os mais eficientes se manterão no mercado.

O manejo de informações agrícolas georreferencíadas está tornando cadavez mais fácil e aplicável à implantação da Agricultura de Precisão. O menorcusto dos computadores, a proliferação de software de processamento de

2 Segundo estudo realizado pela Faculdade de Agronomia da Universidade Nacional de Brasflla(UNS), estima-se que, desse total, 144.000 tratores estão sucateados, com baixo rendimentono campo e obsoletos para o trabalho.

3 Segundo informações da SLC-John Oeere, desse total cerca de 18.000 máquinas apresentamestado avançado de sucatearnento.

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dados georreferenciados, a disponibilidade de controladores em tempo real,sistemas de navegação mais precisos e o desenvolvimento de sensores eletrõni-cos têm permitido a aquisição de dados com maior confiabilidade e de formainstantânea.

Dentro desse panorama, dois aspectos estão determinando grandes mu-danças na agricultura de hoje. O primeiro diz respeito à utilização racional dosolo, o que implica, dentre outras coisas, uma redução na utilização de fertili-zantes e agroquímicos no sentido de evitar impactos ambientais. O segundoaspecto focaliza os custos. As práticas agrícolas devem ser repensadas demodo a aumentar a produtividade e minimizar custos. Em função dessas con-siderações, surge um novo conceito de agricultura. Esse conceito leva emconta as características espaciais das variáveis consideradas no processo deprodução. A essa nova maneira de pensar deu-se o nome de Agricultura dePrecisão.

Ela está centrada na informação espacial e, para isso, necessita de fer-ramentas como o Sistema de Posicionamento Global (GPS) e os Sistemas deInformação Georreferenciadas (GIS), que são de grande importância nestemomento. O objetivo básico da Agricultura de Precisão ê aumentar a eficiênciados processos de produção com base no manejo diferenciado de áreas culti-vadas, reduzindo os impactos ambientais e aumentando a lucratividade.

Três etapas são consideradas fundamentais no processo de aplicação daAgricultura de Precisão: mapeamento da produtividade; mapeamento dos atri-butos do solo e das plantas; e a aplicação localizada de insumos.

No que diz respeito ao mapeamento da produtividade, há necessidade dese utilizarem colheitadeiras equipadas com sensor, que permitam medir a quan-tidade de material (massa) que está sendo colhida em tempo real. Ademais, umsistema de posicionamento que indique com precisão considerável (cerca deum metro) a posição da colheitadeira. Com esses requisitos acima descritos, épossível traçar o mapa de produtividade da lavoura colhida. Outros sensorespodem ser adicionados para facilitar o processamento dos dados e aumentar aprecisão da informação, como, por exemplo, sensores de umidade que medemessa variável em tempo real.

Quanto ao mapeamento dos atributos do solo e das plantas, o mesmoconsiste em definir as características que se pretende relacionar com a varia-bilidade observada nos mapas de produtividade. Todas as amostras devem sergeorreferenciadas, ou seja, cada amostra retirada de um ponto que se preten-de estudar, obrigatoriamente, deve apresentar também a latitude, a longitude ea altitude. Essas informações se obtêm utilizando o GPS, sendo um passofundamental no desenvolvimento e na utilização dos conceitos da Agriculturade Precisão.

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Já a aplicação de insumos localizados busca determinar a quantidade deinsumos a ser aplicada em cada área estudada. Isto em função da análise dosdados obtidos na tase de mapeamento dos atributos do solo e plantas,correlacionando os mesmos com o mapa de produtividade e as característicasagronômicas da cultura, considerando experiências prévias obtidas naquelecampo, nos anos anteriores. As quantidades recomendadas para a aplicaçãosão colocadas em um mapa de prescrição, armazenado em um microcom-putador, que normalmente já faz parte do sistema de controle, para a posterioraplicação localizada de insumos.

Para que se possa evidenciar as vantagens da Agricultura de Precisãoem relação à agricultura convencional, é necessário que se apontem algumascaracterísticas de cada uma delas. Na agricultura convencional, o controle deentradas e saídas do talhão ou da propriedade é feito com base em valoresmédios; faz-se uma amostragem de solo para grandes áreas; determina-seuma receita para a fertilização (kg/ha); a produção também é definida pelamédia (sacos/ha ou kg/ha); ignora-se que há variabilidade dentro dos talhões(manchas de alta produtividade e baixa produtividade recebem o mesmotratamento), fazendo com que haja uso excessivo de insumos, provocandoimpacto ambiental e econômico.

Na Agricultura de Precisão, ocorre uma preocupação com a heterogenei-dade da área, e cada ponto é tratado de acordo com seu potencial de respos-ta. Explora-se mais os pontos de maior potencial e menos os pontos de menorpotencial. Em alguns casos, inclusive, eliminam-se pontos de produtividade tãobaixa que não cobrem os custos de produção. Assim, pode-se dizer que aAgricultura de Precisão permite; conhecer as variações espaciais de umalavoura; a produtividade: as características do solo; as manchas de ervas--daninhas, dentre outras; e tomar decisões de como, quando, onde e quantoaplicar insumos.

Portanto, a Agrícultura de Precisão é um processo contínuo e dificil-mente terá um grande impacto nos primeiros ciclos após sua implementação,mas seu efeito se fará sentir ao longo dos anos, à medida que se obtém umabase de dados confíáveís, gerando um conhecimento mais consistente.

No Brasil, estão ocorrendo várias iniciativas de empresas, fundações euniversidades, com o objetivo de desenvolvimento e de implementação dessatecnología. Entretanto deve-se destacar que não basta apenas ter a colheítadeiraequipada com sensores. Talvez a geração do mapa de produtividade seja hojea parte mais fácil do processo, pois essa tecnologia está disponível em nívelmundial. Após gerado o mapa de produtívidade, vem a etapa de interpretaçãodessas informações, e aí deve-se desenvolver pessoal técnico capacitado paratal.

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Quanto à preparação dos agricultores brasileiros para a introdução dessatécnica, uma vez que o Brasil possui a mais desenvolvida tecnologia de agricul-tura tropical do mundo, pode-se imaginar que existam agricultores preparadospara o uso da Agricultura de Precisão. Entretanto é preciso considerar queesta é uma tecnologia nova em todo o mundo, com um grande potencial aindade desenvolvimento, sobretudo no que diz respeito à interpretação das infor-mações-obtidas.

4 - Situação atual e tendências"

Diversos aspectos podem ser destacados na construção das principaistendências desse mercado. Em primeiro lugar, com a agricultura extensiva, oeixo agrícola do Brasil mudou do Rio Grande do Sul para o Paraná, MatoGrosso do Sul e a região central do País. Embora a tradição de mecanizaçãoainda seja gaúcha, atualmente a produção está voltada às demandas do Paraná,de São Paulo e do Centro-Oeste do País. Além disso, com a melhoria nascondições de infra-estrutura do Brasil Central, onde as áreas são maioresfisicamente, é crescente a instalação de novas fábricas no Centro-Oeste. Istodito, o Rio Grande do Sul ainda é o maior fabricante de máquinas agrícolas doPaís, com duas indústrias de colheitadeiras e três de tratores, instaladas noEstado, além das cerca de 70 empresas de implementos, que representammais de 50% do volume comercializado pelo segmento.

Em segundo lugar, a estrutura produtiva desse segmento tende a se voltarcada vez mais para máquinas totalmente automatizadas, após uma pré-progra-mação, onde o GPS ganhará um papel de destaque. Máquinas inteligentes,guiadas por sensores, que antecipam a quebra de componentes, que mapeamas colheitas, que medem os teores de proteína e o conteúdo de óleo do grãocolhido, serão desenvolvidas. A inteligência das máquinas será a integração detoda essa rede de informação que se cria entre ela e o produtor. Esse fatolevará à organização de banco de dados on-tine aos produtores. Além disso,buscar-se-á o aumento do conforto de tratores e colheitadeiras.

Outra tendência visível é a integração das grandes empresas com empre-sas pequenas, especializadas em sistemas específicos. Ao mesmo tempo, aagricultura transforma-se em uma indústria de processos (esses processos

4 A elaboração deste item do trabalho contou com diversas fontes, dentre elas: entrevista com oPresidente e Vice-Presidente da Companhia Deere and Company (Fred Konclort e Adel A. Zakaria);Entrevista/Depoimento da Equipe da EOO Precision Farming e colaboradores SLC-JD; SiteInternet: WINW.usda.com (Departamento Americano da Agricultura).

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agrícolas deixarão de ser independentes da indústria), onde os produtoresdeverão definir um plano de produção e monitorá-lo. Particularmente, tudoindica que haverá um acompanhamento especial junto aos cultivos de produtostransgênicos (em havendo mudanças de determinadas características das plan-tas, poderão ser retirados do mercado muitos equipamentos tradicionais, comoas atuais colheitadeiras e plantadeiras).

Serão postas em prática novos sistemas de autodiagnósticos de falhas(os suportes técnicos continuarão sendo fundamentais), onde sistemasconectando clientes e concessionárias serão o eixo central do processo (al-guns problemas poderão ser detectados antes que ocorram).

A partir daí, grandes empresas tendem a oferecer aos seus clientes nãosomente um produto, mas todo um sistema mecanizado. Com isso, as empre-sas de grande porte tendem a adquirir empresas menores, especializadas emequipamentos especificos, provocando uma redução no número de fabrican-tes e um aumento da concorrência.

Nesse sentido, tudo indica que haverá formação de parcerias com fabri-cantes de insumos, para oferecer pacotes completos de produção, para aatividade agricola. Ao mesmo tempo, buscar-se-á a substituição do plantiopesado pelo plantio direto, ou cultivo mínimo (utilização de implementos paradescompactação do solo de três em três anos).

Frente a isso, as pequenas empresas de máquinas e implementos sobre-viverão nesse mercado, transformando-se em fornecedoras de componentespara as grandes empresas. Paralelamente, encontrar-se-ão, cada vez mais,associações de pequenos produtores para que os mesmos viabilizem a utiliza-ção dessas técnicas. Em isso ocorrendo, poder-se-á assistir a uma reduçãodas diferenças entre a produtividade de grandes e pequenos produtores.

Nesse sentido, os pequenos produtores direcionarão seus produtos amercados especificos de mais alto valor agregado. Isso não impedirá a redu-ção da mão-de-obra no campo (provavelmente uma frota de máquinas terá umou dois operadores no campo e vários outros operando remotamente). Assim,cada vez mais a tecnologia será sinônimo de qualidade e de confiança noproduto.

Por sua vez, a indústria tende a projetar máquinas maiores, com rendi-mentos muito superiores aos dos modelos atuais. Com isso, as colheitadeiras etratores deverão reduzir seu volume total de vendas, ao mesmo tempo em quehaverá a criação de frotas de prestadores de serviços (as modernas máquinasnão serão propriedade de um único produtor). Nesse sentido, as plantadeiraspassam a ter sistemas a vácuo e maior número de linhas, enquanto os tratoresnão deverão assistir a uma terceirização expressiva, mas, sim, terão maiorpotência (acima de 170 e 200 cv), Ocorrerá, igualmente, um avanço das má-

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quinas autopropelidas (na área dos pulverizadores, espera-se um aumento deaté 400% no uso de autopropelidos).

Isto significa, igualmente, que as máquinas serão desenhadas para ni-chos específicos, levando-se em conta a topografia, as condições de soloslocais, etc. Ou seja, haverá um aumento da capacidade de trabalho e de efi-ciência das máquinas.

Já os compradores de máquinas terão perfil parecido, onde a demandapor equipamentos de grandes rendimentos, alto nível tecnológico, com siste-mas de posicionamento global, que apliquem insumos a taxas variáveis e te-nham um eficiente suporte técnico, será a tônica do mercado futuro. Isto auxi-lia a transformar o agricultor, definitivamente, num empresário rural.

No que tange especificamente ao mercado, tem-se a fabricação de má-quinas e implementos cada vez mais sofisticados tecnologicamente. Nessesentido, o advento do Mercosul favorece as indústrias de máquinas e implementosagrícolas brasileiras. Afora isso, na medida em que boa parte da frota brasilei-ra está sucateada (32% das colheitadeiras e 34% dos tratores), a tendêncialocal é de um crescente incremento na frota de colheitadeiras no Brasil. Ouseja, existe um mercado potencial a ser recuperado no Brasil, mas há necessi-dade de uma política de crédíto eficaz.

Quanto à distribuição geográfica dessa indústria no Brasil, é forçoso des-tacar que a demanda será cada vez maior no Centro-Oeste do País. Diantedisso, a indústria gaúcha tem três alternativas:

a) permanecer na região (enfrentando o problema com a logística);

b) diversificar sua linha de produção (visando aos pequenos produtores);

c) transferir-se para o Centro-Oeste (o que é desfavorável para o RioGrande do Sul).

Por sua vez, o mercado considera que, no Rio Grande do Sul, existemtrês grupos de produtores:

a) os com mais de 200 hectares de área (fortes clientes);

b) os que possuem entre 100 e 200 hectares de área (prestadores deserviços); e

c) os que possuem entre 50 e 100 hectares de área (agricultura familiar,caracterizado como comprador de pequenas máquinas).

Em termos de mercado externo, existe uma fraca participação das pe-quenas e médias empresas regionais nesse mercado. Isto leva a concluir queas pequenas empresas regionais sobreviverão se evitarem a concorrência diretacom as grandes empresas.

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Quanto ao mercado interno, a tendência é a constituição de um mercadoforte, centrado nos grandes produtores, que procuram a evolução tecnológica.No entanto, o mesmo defronta-se com um importante gargalo: a falta de recur-sos para financiamento a taxas fixas, que venham favorecer desde o produtoraté a indústria, no acesso a novas tecnologias.

Na verdade, as pequenas e médias empresas regionais não têm recursospara investir em pesquisa, obrigando-se a concentrar seus esforços na produ-ção, com qualidade e volume, visando um rápido faturamento.

5 - Conclusões

Diversas lições e recomendações podem ser retiradas deste estudo.Em primeiro lugar, a tendência no mercado mundial aponta para a fabri-

cação de máquinas e implementos cada vez mais sofisticados tecnologicamente.A Agricultura de Precisão pouco a pouco se instala, inclusive na região noro-este do Rio Grande do Sul. O processo de globalização, no qual o Brasil estáinserido, levou o setor nacional a movimentos importantes. Dentre eles, desta-cam-se a constituição de parcerias, as fusões e aquisições e a exclusão dediversas empresas, por não terem condições de se manter sozinhas e nãoterem conseguido parceiros que lhes dessem um maior suporte financeiro etecnológico. Este último caso se deu, sobretudo, junto às pequenas e às mé-dias empresas do setor no Brasil.

Em segundo lugar, nota-se que a constituição do Mercosul favoreceu asindústrias de máquinas e implementos agrícolas brasileiras. Muitas das mes-mas, inclusive as situadas na região noroeste do Rio Grande do Sul, passarama exportar para os países-membros do Bloco, especialmente para a Argentina.Ademais, esse mercado está a demandar máquinas de maior porte. No conjun-to da América do Sul, o Brasil, em 1999, respondia por 84% das vendas detratores nesse mercado. Esse percentual se deve, em muito, á constituição doMercosul.

Em terceiro lugar, com a evolução da mecanização agrícola no Brasil,verifica-se um crescente incremento na frota de colheitadeiras nos últimos 30anos. A mesma aumentou em 206% no periodo, chegando a aproximadamente52.000 unidades em 1999. No que tange à frota de tratores, nos mesmos 30anos, houve um crescimento significativo até 1985, tendo a frota se multiplica-do por 11 até essa data, chegando a um total de 550.000 unidades. A partir demeados da década de 80, no entanto, o mercado recuou sob o impacto dascrises econõmicas. Em 1999, a frota nacional de tratores registrava um totalaproximado de 450.000 unidades.

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Em quarto lugar, boa parte da frota brasileira de máquinas e implementosagricolas está em estado de sucateamento. Estudos da Universidade de Brasíliaapontam que 32% das colheitadeiras e 34% dos tratores estão nessa situação.Uma das causas principais é a descapitalização dos produtores rurais e a faltade programas de financiamento acessíveis para a compra de novos equipa-mentos. Assim, existe um mercado potencial a ser recuperado no País, porémo mesmo necessita de uma política de crédito eficaz.

Um outro ponto a ser destacado é que a demanda nacional por máquinase implementos agrícolas está se deslocando, cada vez mais, para o Centro--Oeste do País. Embora o Rio Grande do Sul ainda seja o maior fabricante demáquinas e implementos agrícolas, ele não é mais o principal mercado dessesbens. Isto está levando as empresas localizadas no noroeste gaúcho a pensa-rem, pelo menos, três estratégias: (a) permanecer na região, tendo consciên-cia de que a produção de equipamentos de grande porte terá como mercadoprioritário o Centro-Oeste brasileiro, o que requer uma importante organizaçãode logistica; (b) pensar igualmente, se for o caso, em diversificar sua linha deprodução, priorizando pequenos equipamentos agrícolas adaptados às carac-terísticas diversificadoras da pequena propriedade rural, característica atualdo noroeste gaúcho; (c) transferir-se fisicamente para o Centro-Oeste brasilei-ro, fato que não seria a melhor solução econômica para a região noroeste doRio Grande do Sul.

Isto dito, torna-se importante destacar que a tendência do mercado cons-tituído pelos pequenos e médios produtores rurais é na linha de organizargrupos de produtores para a aquisição de máquinas e implementos agrícolas.Isto reduz o potencial desse mercado sob o ângulo dos fabricantes. O senti-mento que se tem é que o mercado existe, porém somente se recompôe comcréditos agrícolas para investimentos subsidiados. A descapitalização do setoré tanta que, mesmo com recursos a juros baratos, não há condições de repo-sição do parque de máquinas junto a esses proprietários rurais.

Hoje o mercado define três grupos de produtores na região noroeste doRio Grande do Sul. O primeiro, composto por proprietários com mais de 200hectares de área, continua integrado ao sistema de produção de grãos,profissionalizado e forte utilizador de máquinas e implementos agrícolas. Osegundo, com área entre 100 e 200 hectares, que igualmente se concentra naprodução de grãos, porém somente viabiliza sua estrutura produtiva prestandoserviços de plantio, principalmente colheita, aos produtores que possuem en-tre 50 e 100 hectares. Estes últimos compõem o terceiro grupo de produtores.Grupo este basicamente centrado na agricultura familiar, diversificado e com-prador de pequenas máquinas e implementos agrícolas.

Uma outra lição que o trabalho deixa é ainda a fraca participação daspequenas e médias empresas regionais no mercado exportador. A falta de

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conhecimento, de organização, de crédito e, às vezes, até mesmo de tecnologianão permite a essas empresas usufruirem da abertura de mercado que aglobalização, paulatinamente, vem proporcionando.

Por outro lado, fica caracterizado que as pequenas empresas de máqui-nas e implementos regionais, por terem pouco acesso a crédito e, em muitoscasos, serem obrigadas a se reportarem aos bancos das grandes empresas,somente poderão sobreviver nesse mercado evitando a concorrência diretacom essas empresas. A possibilidade que se desenha é de que as mesmas setornem fornecedoras de componentes para as grandes empresas.

Uma outra tendéncia é a constituição de um mercado forte, centrado nosgrandes produtores, que estarão constantemente buscando máquinas de gran-de porte e de alta eficiência, visando realizar um maior volume possivel detrabalho durante as safras. Esses produtores procuram equipamentos que in-corporem a constante evolução tecnológica.

Nesse sentido, surgem, constantemente, diferentes tipos, marcas e mo-delos de máquinas e implementos agrícolas. Essas inovações são determina-das pela expansão das áreas cultivadas; pela escassez ou elevação do custoda mão-de-obra disponivel, para execução, em larga escala, de determinadasoperações; pelo fato de que os métodos convencionais de exploraçãoagropecuária começam a ser substituídos por outros, mais avançados e, por-tanto, mais exigentes em operações; pela concorrência entre fabricantes demáquinas, que passam a desenvolver novos modelos, mais eficientes em ter-mos qualitativos e sconômtcos.

Um dos gargalos mais importantes que o setor aponta para o seu desen-volvimento está na falta de recursos para financiamento a taxas fixas, quevenha a favorecer tanto ao produtor, especialmente o pequeno, como à indús-tria, no acesso a novas tecnologias. O mercado deixa a entender que há ummenor interesse em investir nos produtores pequenos, porque estes têm me-nos capital e estão sujeitos, exclusivamente, à renda oriunda das safras, asquais dependem muito de fatores imponderáveis como o clima.

Um outro ponto a destacar é a elevada incidência de impostos sobre aindústria de máquinas e implementos agricolas. No atual sistema econômico,torna-se impossível repassar a totalidade desses tributos aos preços. Isto exigeuma ampla reforma do sistema tributário nacional.

Vale salientar, ainda, que as empresas, principalmente as regionais, en-frentam um sério problema no que diz respeito aos prazos de pagamento.Enquanto as vendas necessitam ser realizadas com prazos elásticos, a com-pra de matérias-primas, geralmente, tem um prazo de pagamento mais exiguo.

Como em qualquer setor da economia, sobreviverão as empresas quepossuírem maior valor agregado ao seu produto. Ora, no segmento de máqui-nas e implementos agrícolas, a tecnologia é um componente decisivo para

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agregar valor. Ocorre que as empresas, sobretudo as pequenas e médias,praticamente não têm recursos para investir em pesquisa, obrigando-se a con-centrar seus esforços na produção com qualidade e volume, visando um rápi-do faturamento.

O trabalho permite, igualmente, uma ampla visão do mercado mundial ebrasileiro de máquinas e implementas agrícolas. No entanto, embora estabele-ça relações com a região noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, seria debom alvitre a realização, a título de complementação, de um estudo aprofundadosobre a realidade específica do mercado regional desses equipamentos.

Enfim, com a realização do trabalho, pode-se evidenciar que a questãodo crédito é um fator determinante, tanto para os compradores como para osfornecedores, afetando o seu poder de negociação. Por último, a rivalidadeentre as empresas torna evidente a fragilidade das mesmas em estabeleceremparcerias e unirem-se para uma melhoria conjunta de suas atividades e resul-tados.

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