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O Sistema Nacional de Comércio Justo e Solidário – Balanço e Perspectivas de Construção Outubro de 2012

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O Sistema Nacional de Comércio Justo e Solidário –

Balanço e Perspectivas de Construção

Outubro de 2012

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Sumário

Introdução...........................................................................3

1 – Histórico do Comércio Justo e Solidário no Brasil...........4

3 – Demanda por um SCJS: O ponto de vista dos consumidores....................................................................12

4 -A estruturação do SCJS e os seus instrumentos............15

5 – O acesso dos EESs às políticas públicas.......................20

6 – O acesso dos EESs aos Mercados Justos e Solidários: Princípios e Critérios..........................................................23

7 – O Serviço de Certificação Solidária: formas de avaliação de conformidade...............................................................26

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Introdução

Essa publicação foi elaborada a partir da realização do Seminário: O

Sistema Nacional de Comércio Justo e Solidário: balanço e perspectivas de

construção, realizado no dia 15 de Setembro de 2012, no Pavilhão dos Povos

Indígenas em Brasília, Distrito Federal, como parte das atividades do VII

Encontro e Feira dos Povos do Cerrado.

Visamos aqui apresentar de forma sucinta o processo e o momento

atual da construção do Comércio Justo e Solidário no Brasil, especialmente para

produtores e organizações de fomento que desejam se inserir nessa proposta.

Iniciamos apresentando um histórico da construção do Comércio Justo e

Solidário no Brasil seguido por uma apresentação das motivações para a

organização em um Sistema Nacional, a partir de um perfil primeiramente dos

produtores que oferecem ou desejam oferecer seus produtos e serviços de

acordo com esses princípios e em seguida dos consumidores que acessam ou

desejam acessá-los.

Após esse preâmbulo apresentamos as principais características do

Sistema Nacional de Comércio Justo e Solidário partindo do Decreto que o

instituiu e destacando na sequência a composição do ator protagonista na

estruturação do SCJS, a Comissão Gestora Nacional, e os instrumentos que

estão em processo de implementação. Ênfase especial é dada para o aspecto

de regulamentação dos mecanismos de avaliação de conformidade para

acesso ao mercado e acesso a políticas públicas, cuja efetiva implementação

trará os primeiros resultados diretos para os Empreendimentos Econômicos

Solidários participantes do SCJS.

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1 – Histórico do Comércio Justo e Solidário no Brasil

O Brasil participa há muitos anos do movimento internacional do

Comércio Justo (CJ), produzindo e exportando produtos como café, castanha de

caju, peças artesanais, roupas, suco de laranja, brinquedos educativos, cacau

entre muitos outros produtos, representando benefícios para grupos produtivos

que passaram a acessar um mercado privilegiado, com preços e condições

únicos.

Mas o movimento brasileiro em torno da proposta do CJ não se esgotou

no apoio e na promoção do acesso ao mercado internacional Norte - Sul. Desde

2000, atores dos movimentos da economia solidária e da agricultura familiar

mobilizam-se pela construção de uma nova forma de fazer comércio também

no mercado interno (Brasil – Brasil), um comércio que busca garantir

sustentabilidade financeira e aprimorar a capacidade organizacional e

autogestionária dos empreendimentos marginalizados pelos sistemas

convencionais de produção, comercialização e consumo em nosso pais.

Desta forma, o que hoje chamamos de comércio justo e solidário, se

desenvolveu de forma articulada entre a proposta e a trajetória internacional

do comércio justo, e as demandas dos movimentos sociais brasileiros por

respostas à problemática da desigualdade social e da precariedade nas

relações de trabalho. Tal articulação se deu através do envolvimento de

milhares de atores nacionais e internacionais (interessados e interessantes ao

tema) em seminários, consultas públicas e projetos pilotos, direcionados a

construir os termos do documento base do Sistema Nacional de Comércio Justo

e Solidário – um projeto de muitas mãos, muitos anos, idas e vindas, em um

processo que convidou o público alvo a figurar como protagonista da política

que o atenderia.

O próprio conceito brasileiro demonstra isso, ao afirmar que CJS é: “o

fluxo comercial diferenciado, baseado no cumprimento de critérios de justiça e

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solidariedade nas relações comerciais, que resulte no protagonismo dos

Empreendimentos Econômicos e Solidários (EES) por meio da participação

ativa e do reconhecimento da sua autonomia”.

O documento oficial finalizado em fevereiro de 2008, e, assinado pelo

presidente Lula em 17 de novembro de 2010 como Decreto Presidencial no

7.358 (com conteúdo parcial), coloca o Brasil em uma posição pioneira no

mundo do comércio justo e dos movimentos sociais que buscam relações

econômicas inclusivas, democráticas e promotoras de desenvolvimento

equitativo. E isso por três razões:

Uma, pela combinação em uma única política, de mecanismos de

regulamentação e fomento. Ou seja, não se trata apenas de reconhecer boas

práticas (oficializando princípios norteadores destas boas práticas e

mecanismos de garantia e comunicação entre produtor e consumidor), mas

também, de fomentar que as mesmas se tornem realidade nos

empreendimentos econômicos solidários, através de projetos de apoio direto à

melhoria da capacidade organizacional, infra-estrutura, à formação e

capacitação, promoção de acesso ao mercado, ampliação de programas de

compras públicas sustentáveis, regulação de preço etc.

Outra pela proposta de levar o sentido da Justiça Social e da

Solidariedade para os métodos e instrumentos, não apenas conceitos -,

garantindo que o sentido maior da política fosse mantido na sua execução. A

linha que separa o reconhecimento e o estímulo de boas práticas da

construção de um nicho de mercado isolado e acessado por poucos é muito

tênue, sendo tarefa de todos cuidar para que o comércio justo e solidário

brasileiro não se torne um comércio de poucos e elitizados produtos. E neste

caso, são os métodos e instrumentos de aplicação prática da proposta que

podem fazer grande diferença, este é o desafio que temos pela frente no

momento.

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Linha do Tempo do Comércio Justo e Solidário

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2 – Demanda por um SCJS: o ponto de vista dos EESs

O Comércio Justo e Solidário funciona como instrumento para qualificar e

garantir o reconhecimento da sociedade e agregação de valor ao trabalho de

pequenos produtores e trabalhadores que se associam em Empreendimentos

Econômicos Solidários. Estes são formas organizativas criadas pelos

trabalhadores para enfrentar de forma coletiva e através de ações democráticas

o desafio de gerar renda. A própria formação desses empreendimentos já é um

grande avanço organizativo, com a construção de articulação social e inserção

nos espaços de debate público.

No entanto, de acordo com mapeamento realizado pela Secretaria

Nacional de Economia Solidária do Ministério do Trabalho e Emprego

(SENAES/MTE) em 2007, 50% desses empreendimentos ainda não conseguiam

remunerar seus associados e, dentre os que conseguiam, 75% o faziam na faixa

de até um salário mínimo, o que traz consequências para o bem-estar e o bem-

viver do trabalhador. A comercialização é um fator que implica fortemente

nesses resultados, sendo que ela foi apontada como grande obstáculo por cerca

de 70% dos empreendimentos estudados. Ainda dentro desse estudo, percebe-

se a limitação do alcance das vendas destes EES. Do total, 80% comercializam

no seu município através de venda direta (para intermediários locais), e apenas

2,8% conseguem alcançar o mercado nacional.

Neste sentido, a proposta do Comércio Justo e Solidário é fortalecer a

identidade com que estes empreendimentos se inserem no mercado,

contribuindo para melhorar o seu desempenho.

Em trabalho realizado com 150 EESs1 que se inscreveram como pioneiros

para fazer parte e se credenciarem no SCJS, traçamos um perfil comercial dos

1 140 Empreendimentos foram selecionados no âmbito do Projeto Nacional de Comercialização Solidária, coordenado pelo Instituto Marista de Solidariedade e 10 Empreendimentos foram selecionados em projeto executado pelo FACES do Brasil em parceria com UNISOL, ANTEAG, UNICAFES, REDE CERRADO e ACS AMAZÔNIA.

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EESs interessados, com os mercados acessados por eles e suas principais

demandas:

* (Bodegas, grupos de consumo, centrais)

Gráfico 2: Principais Demandas para Melhorar Acesso a Mercados:

8

Logis

tica *

Org

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cesso d

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endas*2

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ação

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3

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0.00%

5.00%

10.00%

15.00%

20.00%

25.00%

Feiras

Eventos

venda direta

Espaços e estratégias de economia solidária*

Empresas (como consumidor final)

Ponto próprio

Poder público

Lojas convencionais

Instituições

Supermercado

Pequenos mercados

Encomendas

O EES é um ponto-fixo

internet

Exportação

0,00% 10,00% 20,00% 30,00% 40,00% 50,00% 60,00% 70,00% 80,00% 90,00%

Gráfico 1: Mercados Acessados

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* Logistica: transporte e armazenagem

*2Organizar processo de vendas: estudo de mercado, equipe qualificada, promoção comercial, etc

*3Produção: qualificação, estrutura, eficiência e regularidade

*4 Estrutura de comercialização: espaço, barracas

*5 Conscientização do consumidor: selo, campanhas, promoção do conceito

É de se destacar que dentre as principais demandas elencadas pelos

empreendimentos aparece a necessidade de conscientização do consumidor.

Esse processo pode ser muito fortalecido pela estruturação do SCJS, conforme

veremos adiante.

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3 – Demanda por um SCJS: O ponto de vista dos consumidores

Durante uma ação de promoção comercial ocorrida na Exposustentat –

2010, o FACES do Brasil realizou uma pesquisa para conhecer o perfil do

público da feira e entender melhor as motivações dos consumidores potenciais

de produtos do comércio justo e solidário.

A Exposustentat é uma feira referência na área de produtos orgânicos e

sustentáveis, portanto, os consumidores presentes, em sua maioria tem maior

contato com o conceito de comércio justo e solidário, do que a população em

geral. Desta forma, consideramos que foi possível captar algumas tendências

dos consumidores dessa feira, que podem indicar aspectos da visão geral sobre

CJS de um público mais sensibilizado para as questões ambientais.

Começamos pela separação do público que conhece e que não conhece o

comércio justo e solidário, aonde percebemos que mesmo em uma feira

segmentada, uma porcentagem relativamente alta dos consumidores ainda

não conhece a proposta do Comércio Justo e Solidário:

Gráfico 3: Conhecimento sobre CJS (total de entrevistados)

Ademais, 100% dos entrevistados afirmaram que entre dois produtos

semelhantes e com o mesmo preço, faria a escolha baseado em critérios

sociais, trabalhistas e ambientais utilizados na produção e 94% afirmaram que

10

Não conhecem o CJS Conhecem o CJS

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estariam dispostos inclusive a pagar mais caro por uma produção que respeite

esses critérios. No entanto, apesar dessa disposição a consumir produtos do

CJS, 42% dos entrevistados ainda não o faziam, sendo que dentre estes, 38%

não não sabiam diferenciar produtos do CJS de produtos convencionais. Essa

porcentagem permite vislumbrar um grande potencial de crescimento para

esse mercado através de campanhas informativas para a população.

Gráfico 4: Motivo para não consumir produtos de CJS (universo dos que não consomem)

Corrobora essa análise o fato de que 95% dos entrevistados avaliaram

que falta informação sobre os produtos do CJS e 75% dos que já consomem

esses produtos tem dificuldades de encontrá-los à venda.

Gráfico 5: Avaliação sobre a informação disponível (universo daqueles que consomem)

Gráfico 6: Avaliação sobre o acesso aos produtos (universo daqueles que consomem)

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Falta informação sobre os produtos do CJS?

S N

Há dificuldades em encontrar produtos do CJS?

S N AV

Por que não compram produtos do CJS?

Acham caro Não sabem diferenciar

Não responderam / outras respostas

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Também foi possível perceber na pesquisa que a certificação de produtos

ainda está incipiente no Brasil, haja vista que apenas 5% dos entrevistados

souberam nomear certificadoras de comércio justo e 52% souberam nomear

certificadoras de qualidade orgânica.

Gráfico 8: Conhecimento sobre certificadoras (universo daqueles que consomem)

Por fim, os entrevistados foram questionados, de forma livre, sobre o que

associam a expressão: comércio justo e solidário. A resposta predominante foi

que relacionam o CJS com práticas de preço justo para os produtores e para os

consumidores e à ausência de exploração do trabalho, incluindo também um

grande número de respostas que mencionaram a repartição equitativa dos

ganhos na cadeia produtiva. Foram citados, ainda que em menor número, os

valores de solidariedade, igualdade, respeito ao meio-ambiente e qualidade.

De forma geral, foi possível perceber que mesmo dentre os que não

conheciam o tema do comércio justo e solidário, entre os entrevistados há uma

compreensão intuitiva do tema, que pode ser potencializada através da

estruturação do SCJS..

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de comercio justo

de orgânicos

0,00% 20,00% 40,00% 60,00%

Soube nomear certificadoras

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4 -A estruturação do SCJS e os seus instrumentos

Frente a esta demanda dos Empreendimentos Econômicos Solidários e

consumidores brasileiros, iniciou-se a estruturação do SCJS, o qual espera-se

que possa promover efetivamente os produtos dos EES e a identidade da

economia solidária.

Após o longo período de articulação e mobilização da sociedade, em 17

de Novembro de 2010 foi instituído o Decreto Presidencial no 7.358, uma

grande conquista. Mas do que trata esse Decreto? Esse documento cria o SCJS

“para coordenar as ações do governo federal voltadas para o reconhecimento

de práticas do comércio justo e solidário e à sua promoção”, e estabelece a

adesão voluntária ao Sistema de Estados, municípios, empreendimentos

econômicos solidários, organizações de acreditação e organização de avaliação

de conformidade.

Entre seus principais pontos, o texto inclui definições de conceitos

fundamentais, como: comércio justo e solidário, empreendimentos econômicos

solidários, organismo de acreditação, organismo de avaliação de conformidade

e preço justo. Apesar de não incluir os princípios e critérios do CJS construídos

historicamente, o Decreto orienta-se pela definição de comércio justo e

solidário como as práticas de comercialização pautadas em valores de justiça

social e solidariedade que promovem o desenvolvimento de empreendimentos

econômicos solidários, compreendendo-os como organizações econômicas de

caráter associativo geridas democraticamente.

O texto também esclarece a ampla abrangência do Sistema, ao destacar

que nos termos do decreto, compreende-se no conceito de comércio justo e

solidário os termos fair trade, comércio justo, comércio equitativo, comércio

equo, comércio alternativo, comércio solidário, comércio ético e comércio ético

e solidário.

A partir dessas referências, o Decreto apresenta que o SCJS tem a

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finalidade de fortalecer e promover o comércio justo e solidário no Brasil, por

meio: do fortalecimento da identidade nacional do CJS; do favorecimento da

prática de preço justo para quem produz, comercializa e consome; da

divulgação de produtos, experiências e organizações envolvidas com o CJS; do

acesso à informações sobre as práticas reconhecidas pelo SCJS, pelo Sistema

de Informação da Economia Solidária (SIES); de ações para a melhoria das

condições de comercialização dos EES; do incentivo à colaboração econômica

entre EES; e do apoio a processos de educação para o consumo responsável.

Nesses grandes objetivos, encontramos o duplo caráter: normativo e de

fomento do nosso Sistema, e a partir deles deverá ser orientada a sua

implementação.

Para dar vida e colocar em prática o Sistema foi criada a Comissão

Gestora Nacional do SCJS. Esta comissão tem como atribuições, reconhecidas

no Decreto: subsidiar o Conselho Nacional de Economia Solidária – CNES em

assuntos relacionados ao SCJS; reconhecer e monitorar as diferentes

metodologias de avaliação de conformidade de produtos, processos e serviços;

habilitar os organismo de acreditação e de avaliação de conformidade no SCJS;

promover diálogo entre as representações dos atores envolvidos no sistema;

manifestar-se sobre a habilitação de organismos de avaliação de conformidade

no SCJS; acompanhar o cadastramento de EES com práticas de CJS

reconhecidos pelo SCJS; estabelecer diretrizes e acompanhar o

desenvolvimento das ações de fomento ao CJS; e disseminar informações e

resultados.

A Comissão, em sua composição bipartite (conquistada pela sociedade

civil), é formada por representantes de três Ministérios do Governo Federal

(Ministério do Trabalho e Emprego, Ministério do Desenvolvimento Agrário e

Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome), e por três

segmentos da sociedade civil, com dois titulares, mas apenas um voto

(entidades do segmento de empreendimentos econômicos solidários,

entidades do segmento de apoio e fomento ao CJS e entidades do segmento

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das redes da economia solidária). Os representantes da sociedade civil são

indicados pelo Conselho Nacional de Economia Solidária - CNES e designados

pelo Ministro do Trabalho e Emprego.

Cabe à Comissão Gestora Nacional do Sistema Nacional de Comércio

Justo e Solidário o papel de protagonista na organização do Sistema Nacional

de Comércio Justo e Solidário para estruturar o serviço de certificação solidária

e implementar instrumentos que irão dar corpo ao SCJS. Vejamos alguns

desses instrumentos:

CADSOL (Cadastro Nacional dos Participantes do SCJS): É o cadastro

nacional dos participantes no SCJS, tanto os EESs habilitados quanto os

parceiros colaboradores. Trata-se de um instrumento que prioritariamente

garantirá a organização e o acesso à informação a respeito dos praticantes do

Comércio Justo e Solidário no Brasil. Visa contribuir para informar a sociedade

e os consumidores interessados em praticar o Comércio Justo e Solidário.

Termo de Adesão ao SCJS: Instrumento que buscará oficializar a parceria

entre Governo Federal, sociedade civil, universidades, etc. Visa garantir a

capilaridade do SCJS através do estabelecimento de parcerias com

representantes do Poder Público Municipal e Estadual que garantam a

implementação do SCJS em suas localidades.

Marca ECOS (Espaço de Comercialização Solidária): Visa dar identidade

aos estabelecimentos comerciais reconhecidos na compra e venda de produtos

ou serviços da economia solidária. Pode-se aplicar tanto a EESs de

comercialização quanto a parceiros comerciais. A construção dos parâmetros

para adesão a esta marca deve ser realizada de forma participativa, e envolve

a definição de critérios e princípios relacionados especificamente à prática de

relações comerciais justas e solidárias, os chamados critérios relacionais do

CJS, que devem ser assumidos pelos parceiros comerciais.

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Termo de Referência para Contrato Comercial de Base Justa e Solidária:

Diz respeito justamente a elaboração de um modelo de contrato a ser seguido

pelos parceiros comerciais estabelecidos pelo nome ECOS. Deve seguir os

modelos já praticados pelos espaços de referência em comercialização justa e

solidária existentes no Brasil em suas relações com consumidores e

fornecedores. Nesse processo se identificarão as cláusulas que correspondam

ou se identificam com uma relação comercial de base justa e solidária

reconhecida no SCJS, de preferência a serem aprovadas em um espaço de

encontro entre as experiências já em funcionamento.

Os últimos dois instrumentos (DCSOL e Rede Certsol) referem-se mais

diretamente ao aspecto da regulamentação e normatização do SCJS, sobre

essas questões vamos dedicar um olhar mais aprofundado:

Rede “CERTSOL” – Rede Nacional de Entidades Parceiras de Certificação

Solidária: Trata-se de uma articulação entre todas as entidades que

desenvolvem diferentes metodologias de avaliação de conformidade, com o

objetivo de desenvolver e aperfeiçoar as metodologias, além de garantir uma

padronização mínima nos processos de emissão de selos. Mesmo que as

metodologias devam responder a variedade de objetivos e situações presentes

no território brasileiro é importante que haja uma harmonização e articulação

entre as diferentes entidades emissoras.

Declaração de Conformidade da Economia Solidária - DCSOL

De acordo com as “Especificações Complementares para Apoio ao

Sistema Nacional de Comércio Justo e Solidário por meio do reconhecimento de

práticas de Comércio Justo e Solidário”, documento produzido pela SENAES, o

papel reservado à DCSOL é o de certificado final a ser recebido pelo

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Empreendimento Econômico Solidário após ter sua conformidade avaliada por

uma das três metodologias previstas no SCJS. Ou seja, um EES com prática em

Comércio Justo e Solidário terá um primeiro certificado emitido em uma das

três modalidades de garantia previstas para então receber a DCSOL e ser

reconhecido como habilitado no SCJS.

A seguir apresentamos uma contribuição para a construção dos

mecanismos necessários para garantir o acesso dos empreendimentos de

economia solidária à políticas públicas direcionadas e para construção de

mecanismos de avaliação de conformidade aos princípios do comércio justo e

solidário que sejam participativos e reconheçam as demandas e necessidades

dos empreendimentos solidários brasileiros. Para tanto foram estudados as

experiências já existentes referentes ao estabelecimento da DAP como

mecanismo de reconhecimento do agricultor familiar para acesso à políticas

públicas, aos sistemas participativos de garantia para orgânicos e a consulta

ao ponto de vista dos produtores sobre como deveria funcionar a certificação

de terceira parte no SCJS frente às dificuldades encontradas na relação com a

única certificadora existente para o Comércio Justo Internacional.

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5 – O acesso dos EESs às políticas públicas

Este percurso, da forma como está traçado no Documento da SENAES,

frustra a expectativa de que o SCJS funcione como instrumento facilitado de

acesso do EES a políticas públicas, ou, no mínimo, requer desenvolvimentos

importantes para que esta expectativa seja suprida. Essa constatação baseia-

se no entendimento de que o acesso dos empreendimentos à políticas públicas

deve ser o mais amplo e inclusivo possível, enquanto o acesso a mercados

diferenciados seria marcado pela exclusividade. A proposta corrente para a

DCSOL é justamente o inverso disso, propõe que o acesso a política pública

seja a etapa final do processo de avaliação de conformidade.

A DAP, Declaração de Aptidão ao Pronaf, que vem funcionando

relativamente bem para os produtores da agricultura familiar, é um bom

parâmetro para refletirmos sobre o acesso dos EESs às políticas públicas. Neste

sentido, a regulamentação do acesso à políticas públicas deveria responder ao

antigo desejo e reivindicação dos empreendimentos de economia solidária,

cujos critérios, tomados pela sua definição mais simples, estão expressos no

próprio Decreto do Sistema Nacional de Comércio Justo e Solidário:

organizações de caráter associativo que realizam atividades econômicas, cujos participantes sejam trabalhadores do meio urbano ou rural e exerçam democraticamente a gestão das atividades e a alocação dos resultados.

Os princípios do Comércio Justo e Solidário preveem uma série de

qualificadores para esses critérios no que diz respeito por exemplo a questão

de gênero, de respeito ao meio-ambiente, etc. Eles estão registrados nos

documentos da Plataforma de Articulação pelo Comercio Justo e Solidário FACES DO

BRASIL e também no Termo de Referência do Sistema Nacional de Comércio Justo e

Solidário2,

2 Esse termo foi elaborado por grupo de trabalho criado em Audiência Pública do MTE de 08 de abril de 2006, composto por membros do FACES do Brasil, Articulação OPFCJS e FBES, e por representantes do MTE, (SENAES) MDA (SAF e SDT), e, Sebrae Nacional.

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Princípio 1. Fortalecimento da democracia, respeito à liberdade de opinião, de organização e de identidade cultural Deve-se primar pelo exercício de relações democráticas e autogestionárias no desenvolvimento das atividades relacionadas à produção e à comercialização de base justa e solidária.

Princípio 2. Condições justas de , produção, agregação de valor e comercialização A prática do Comércio Justo e Solidário deve garantir condições dignas de trabalho e remuneração, bem como de equilíbrio e respeito nas relações entre os diversos atores, visando a sustentabilidade econômica, socioambiental e a qualidade do produto ao longo de toda uma cadeia produtiva.

Princípio 3. Apoio ao desenvolvimento local em direção à sustentabilidade A prática do Comércio Justo e Solidário deve estar associada ao compromisso comunitário, visando o bem-estar sócio-econômico e cultural da comunidade, promovendo assim a inclusão social, através de ações geradoras de trabalho e renda da manutenção e recuperação da biodiversidade.

Princípio 4. Respeito ao meio ambiente A prática do Comércio Justo e Solidário deve primar pelo exercício de práticas mais responsáveis e menos prejudiciais ao meio ambiente.

Princípio 5. Respeito a diversidade e garantia de equidade e não- discriminação A prática do Comércio Justo e Solidário deve promover, a equidade entre todas as pessoas, empreendimentos e entidades a ela ligadas e a não-discriminação baseada em sexo, raça, religião, geração, posição política, procedência social, naturalidade, escolha sexual e/ou condição de pessoa com deficiência.

Princípio 6. Informação ao consumidor A prática do Comércio Justo e Solidário deve primar pela transparência nas relações de produção, comercialização e consumo, garantindo o respeito aos direitos dos consumidores e a educação para o consumo solidário.

Princípio 7. Integração dos elos da cadeia A prática do Comércio Justo e Solidário deve estimular uma maior aproximação entre todas as pessoas, empreendimentos e entidades a ela ligadas de forma a garantir processos contínuos de reflexão, debate e difusão dos pressupostos conceituais e práticos do Comércio Justo e Solidário.

Neste ponto eles enriquecem a proposta política da economia solidária e

do comércio justo, mas há dúvidas se são critérios viáveis especialmente para

serem considerados como pré-requisitos para o acesso a políticas públicas.

Tomando como base o modelo da DAP seria possível habilitar entidades

credenciadoras responsáveis por atestar o cumprimento, por parte dos

empreendimentos, desses critérios básicos. Esses credenciadores seriam, por

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excelência, os fóruns estaduais de economia solidária ou quaisquer outras

entidades que tenham entre suas funções a de: representação social dos

empreendimentos econômicos solidários; de prestação de serviços de

assistência técnica e/ou apoio e fomento aos empreendimentos econômicos

solidários. Seu controle social seria feito a partir dos Conselhos Locais de

Economia Solidária, o que se dá em sintonia com o procedimento de controle

social da DAP, baseado nos Conselhos de Desenvolvimento Rural Sustentável.

Para efeitos documentais, no caso da Declaração do Empreendimento

Solidário, bastariam a Declaração do EES requerente e do agente emissor, a

exemplo do que ocorre na emissão da DAP e priorizando o reconhecimento da

existência de vínculos diretos entre o agente emissor e o empreendimento

requerente.

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6 – O acesso dos EESs aos Mercados Justos e Solidários: Princípios e

Critérios

Já quando nos referimos às modalidades de avaliação de conformidade

com vista ao acesso a mercado, podemos acrescentar alguns elementos para

análise. Em primeiro lugar é preciso reforçar a importância do controle social e

ter em cautela em relação ao excesso de padronização. Nesse sentido aposta-

se, com base no custo benefício, em uma maior generalização em relação aos

princípios. Se é verdade que precisar melhor tem a vantagem principal de

uniformizar entendimentos e, por consequência, procedimentos, entende-se

que os custos do labirinto de detalhes não são justificados pela possível maior

uniformidade alcançada com ele.

Isso é verdade ainda que os princípios sejam difíceis de serem operados

já que grupos, etnias ou culturas diferentes podem ter entendimentos diversos

sobre o que é democracia ou cuidado do meio ambiente, e que isto poderia ser

um impedimento para trabalhar apenas com os Princípios. Um determinado

grupo A poderia entender que não é justo que outro grupo B possa estar sendo

considerado seguidor das normas, cumpridor dos princípios. O Grupo A

entende que o Grupo B não é, por exemplo, democrático em suas decisões.

Mas o grupo B se afirma sim, um grupo que trabalha para fortalecer a

democracia interna cada vez mais.

Propõe-se que este tipo de dilema deve ser resolvido não buscando

especificar com mais detalhes o que significa exatamente fortalecimento da

democracia interna, definindo assim qual grupo tem razão. É mais conveniente

usar a lógica da auto declaração.

Uma questão diferente é a que diz respeito aos princípios e critérios

relacionais. Estes não tem qualquer relação com o acesso de EESs a política

públicas, mas sua análise é fundamental se está se discutindo a certificação de

uma relação Comercial Justa e Solidária. Neste quesito encontram-se questões

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polêmicas como o pagamento de preço-justo, os prêmios sociais para os

produtores, as práticas de consignação e de pré-financiamento. Um caminho

para debater os critérios relacionais está dado pela criação das Rede de Lojas

ECOS, afinal ao se debater quais espaços poderão usar essa alcunha está se

debatendo o cumprimento de princípios em relação às relações travadas entre

esses espaços e os seus fornecedores que são empreendimentos de economia

solidária. O procedimento estaria padronizado através dos pontos mínimos

elencados no termo de referência para o Contrato Comercial de Base Justa e

Solidária

Uma consideração importante a esse respeito, é que nem todos os

parceiros comerciais necessariamente receberiam essa denominação, pois

exigir de todos os parceiros comerciais um envolvimento mais efetivo com os

Princípios e Características do CJS poderia levar a perdas significativas de

mercados potenciais. Assim, é possível acreditar na tese que aposta em uma

espécie de contaminação positiva de espaços comerciais mais convencionais

com produtos oriundos de EES. Um produto certificado como CJS poderia ser

vendido para uma grande rede varejista, e quantos maiores forem as vendas,

maior a contaminação do espaço com a perspectiva do CJS. Esta seria uma das

razões principais para se buscar desenvolver uma metodologia de avaliação da

conformidade para o CJS. Se for para vender apenas em espaços que se

caracterizam como sendo um EES, o esforço de buscar gerar credibilidade

aos produtos do CJS poderia não se justificar.

Para conseguir uma garantia para o cumprimento de certos princípios

por qualquer parceiro comercial que venda produtos do Comércio Justo e

Solidário, seria possível partir de um atestado, emitido pelo EES de que o

parceiro vem se comprometendo com pontos mínimos elencados. O espaço

ECOS não seria “certificado”, mas ostentaria algo que demonstrasse que ele

apoia a iniciativa em alguma medida.

É necessário ainda fazer um adendo, levando-se em conta os três

parâmetros tradicionais do comércio justo internacional, o preço-mínimo,

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prêmio e pré-financiamento. Eles foram construídos para um mercado de

exportação com pouca variedade de produtos. Como o SCJS é pensado muito

mais para o mercado interno, produção diversificada e pontos locais de

comercialização, caso se opte por regular esses pontos específicos será

necessário ainda definir produtos em que esse aspecto da regulamentação se

aplica e valores mínimos para cada item de cada um desses produtos. Outra

condição seria ter esses elementos como recomendação e/ou sugestão.

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7 – O Serviço de Certificação Solidária: procedimentos de avaliação de

conformidade

De acordo com última documentação produzida pela Secretaria Nacional

de Economia Solidária, já referida acima, o SCJS prevê três modalidades de

avaliação de conformidade: Declaração de conformidade de fornecedor ou

atestação de primeira parte ou Declaração de Conformidade Coletiva (DCC);

Declaração de conformidade por avaliação de pares ou Sistema Participativo da

Garantia (SPG); Declaração de conformidade por auditoria externa ou de

atestação de terceira parte.

Grosso modo, pode ser dito que: a) a DCC remete a uma auto-

declaração por parte dos membros do empreendimento, com a realização de

uma avaliação e reflexão interna; b) o SPG remete a um processo coletivo em

que um empreendimento garante a conformidade do outro aos princípios

através de visitas e trocas de informações; e c) a declaração por auditoria

externa refere-se a contratação do serviço de uma empresa ou organização

externa especializada para verificar a adequação aos critérios de acordo com

metodologia por ela definida.

O FACES do Brasil já vem formulando e apresentando publicamente

importantes subsídios metodológicos para essa construção como: 1) o Relatório

de avaliação de normas e procedimentos para reconhecimento de

Empreendimentos Econômicos Solidários no âmbito do Sistema Nacional de

Comércio Justo e Solidário – SCJS , de Setembro de 2012; 2) o Documento-

Síntese sobre procedimentos de auto-declaração para o SCJS de Março de

2011; e 3) o Texto de contribuição ao debate da CGN, de Novembro de 2011.

No entendimento que vem sendo construído na Plataforma, as duas

modalidades de avaliação de conformidade que estão em maior sintonia com

os princípios da economia solidária pelo seu caráter inclusivo (baixo custo) e de

fomento a organização democrática e exercício da participação, de construção

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de relações de confiança entre os Empreendimentos Econômicos Solidários, de

construção de redes locais de conhecimento, além do potencial de

estreitamento de relações entre o produto e o consumidor, são a Declaração de

Conformidade Coletiva (DCC) e os SPGs (Sistemas Participativos de Garantia),

que detêm uma proximidade entre si.

Nesse sentido, a DCC, a depender da forma como for implementada,

pode se caracterizar como uma forma simplificada de Sistema Participativo de

Garantia, pois apresenta grande semelhança com o conceito mais amplo de

SPGs. Inicialmente, a proposta da DCC foi formulada com embasamento nas

normativas do Inmetro para a metodologia de avaliação de conformidade

denominada de Declaração de Primeira Parte, Declaração do Fornecedor ou

simplesmente Auto-Declaração. Posteriormente, através de um processo de

construção coletiva realizado em reuniões e seminários, formulou-se uma

proposta de procedimento mínimo para a declaração de conformidade que

envolve a participação de mais atores, e foi experimentado com 150 EESs de

todo o Brasil.

Esse procedimento está sistematizado em textos produzidos pela

Plataforma FACES do Brasil posteriormente ao Seminário Nacional de CJS,

realizado em Brasília, de 12 a 14 de Abril de 2011. Posteriormente, estudo

realizado por Laércio Meirelles, da Rede Ecovida, referência em SPGs, destacou

a proximidade entre os procedimentos então pensados e o conceito mais

amplo de Sistemas Participativos de Garantia, do Foro Latinoamericano de

SPGs: “sistemas de garantia de qualidade construídos a partir do

empoderamento das comunidades. A certificação dos/as produtores/as baseia-

se na ativa participação dos atores envolvidos e os sistemas são construídos

fundamentando-se na confiança, em redes sociais e na troca de

conhecimentos”.

Esta definição é, por sinal, também muito próxima do que na legislação

de orgânicos convencionou-se denominar de OCS (Organismo de Controle

Social), considerada uma forma de garantia apta apenas para procedimentos

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de venda direta ao consumidor. Sendo a simplicidade um valor fundamental

para processos de avaliação de conformidade de baixo custo e baseados na

confiança a recomendação seria a de que as OCSs sirvam como referência para

a organização de SPGs de Comércio Justo e Solidário.

Vejamos agora um comparativo entre os passos construídos para a

elaboração de uma Declaração Coletiva de Conformidade para o CJS e as

etapas correspondentes a um processo participativo de avaliação de

conformidade de um SPG:

Passos Etapas correspondentes

PASSO 1: O EES se reúne e faz a

auto avaliação sobre os princípios e

critérios do Comércio Justo e

Solidário (respondendo ao

Questionário de auto avaliação do

SCJS), e produz um Relato do Debate

Coletivo, incluindo uma Lista de

Presença.

ETAPA 1 – Auto avaliação (quando

for um empreendimento coletivo,

podemos considerar como uma

primeira revisão de pares)

Documentos gerados –

1) Auto avaliação;

2) Lista de presença

PASSO 2: Com base nessa auto

avaliação, o EES produz um Plano de

Conformidade ao SCJS (conforme

modelo indicado de Plano), que pode

ser elaborado de forma conjunta

com outros EESs, e uma Carta de

Declaração Coletiva de

Conformidade (conforme modelo

indicado de Carta).

ETAPA 2 – Declaração de

Conformidade

Documentos gerados:

3) Plano de conformidade*;

4) Declaração coletiva de

conformidade*;

* É importante que estes

documentos façam menção explicita

aos Princípios do CJS e descrevam

como se adequam, praticam ou

aplicam cada um deles

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PASSO 3: Reunião com uma rede

ou fórum local ou regional de

economia solidária e/ou CJS. Os

quatro documentos gerados serão

debatidos e analisados.

ETAPA 3 - Revisão de Pares

Documento gerado:

5) Carta de Referendo.

PASSO 4: Envio dos 5 documentos

para a organização parceira local

dos Projetos (futuramente, no SCJS

poderá ser a Instituição Credenciada

do SCJS ou a Comissão Gestora

Estadual) . Quem receber esses

documentos analisa se estão

completos e conformes. Com o SCJS

em funcionamento, o pedido de

reconhecimento do EES seria

disponibilizado para a Consulta

Pública por 30 dias.

ETAPA 4 – Revisão de Pares - olhar

externo

PASSO 5: Após esse prazo, se não

houver nenhum questionamento, se

elabora um Certificado ou Parecer,

habilita-se o cadastro do EES no

SCJS e notifica-se a Comissão

Gestora Nacional – CGN.

ETAPA 5 – Emissão do Certificado /

Parecer

Documento gerado:

6) Certificado / Parecer

Estes cinco passos seriam suficientes para gerar a credibilidade que se

pretende aos produtos e serviços gerados pelos EES, podendo portanto servir

de base para entidades membros da Rede Certsol tanto na modalidade DCC

quanto na modalidade SPGs. O mais importante aqui é destacar que seja qual

for a modalidade em que esse processo de avaliação de conformidade possa se

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encaixar, esses procedimentos mínimos permitem suprir a insatisfação com a

metodologia de certificação por terceira parte.

Aponta-se que esta insatisfação tem três razões principais: 1) o alto

custo, que gera preço maior para o consumidor; 2) a burocracia com excesso

de documentação; 3) o sentimento de perda de autonomia na obrigatoriedade

de contratar um serviço externo para atestar a qualidade do seu trabalho.

Ademais há uma série de questões referentes a perda das características

políticas da proposta do comércio justo, com a certificação de grandes

propriedades descaracterizando o princípio fundamental de fomento aos

pequenos produtores.

Apesar das críticas, os sistemas de certificação de terceira parte para o

comércio justo tem uma relevância importante no acesso dos produtos dos

empreendimentos ao mercado com um maior valor agregado, gerando por

vezes resultados econômicos importantes. Por isso, além de fomentar formas

alternativas de avaliação de conformidade, um Sistema que é público também

precisa propor-se o desafio de regulamentar os processos já em curso de

certificação de terceira parte em benefícios dos empreendimentos e produtores

certificados.

Nesse sentido, fazemos as seguintes recomendações para essa

regulamentação:

– Fomento a existência de diversas certificadoras que cumpram com os

critérios de credenciamento para evitar um monopólio;

– Que os procedimentos adotados sejam revisados e aceites pela CGN

do SCJS;

– Garantir que os beneficiários sejam apenas os produtores organizados

coletivamente como Empreendimentos Econômicos Solidários;

– Participação dos beneficiários nas etapas e instâncias onde serão

tomadas as decisões que irão afetar o empreendimento.

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