O Último Teorema de Fermat- Simom Sighs

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zo o ÚL: r\ i\ IO TEOREi\ IA DE FER:\ IXr

de matemática mais difícil do mundo eu espero ter conseguidotransmitir um entendimento da matemática usada para resolvê Io

e uma percepção do motivo que levou os matemáticos a ficaremobcecados por ele durante mais de três séculos. A matemática éuma das disciplinas mais puras e profundas e minha intenção foi

dar aos leitores um vislumbre destes mundo fascinante.

o Ú T MOTEOREM

EFERM T

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  \.choque Vou Parar por Aqui

,Arquimedcs será lembradoenquanto Ésquilo foi esquecido,porque os idiomasmorrem mas as idéiasmatemáticas per-

manecem. Imortalidade pode ser uma idéiatola,mas pro-vavelmenteum matemático tem a melhor chance que podeexistir de obtê-Ia.

G. H. Hardy

23 de Junho de 1993,Cambridge

 iI

. I

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Eraa mais importante conferência sobrematemáticado nosso sé-culo.Duzentosmatemáticosestavamextasiados.Somenteum quarto

daquelaplatéia compreendia totalmente a densa mistura de sím-bolosgregos e álgebra que cobria o quadro-negro. O resto estavalãmeramente para testemunhar o que esperavamser uma ocasiãohistórica.

Os boatos tinham começadono dia anterior. Mensagens pelaInternet diziam que a palestra terminaria com a demonstraçãodoÚltimo Teorema de Fcrmat, o mais famoso problema mate-máticodomundo. Rumoresdesse tipo não eram incomuns. Con- ersas sobre o Último Teorema surgiam com freqüência na hora

~.;). ........ .I ';;1 ...~A .i

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.-\ndrcw Wiles.com a idade de dez anos, quando encontrou pela

primeira \ cz o Último Teorema de Fermat.

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24 o ÚLTI:--IUTEORE:\IADE FElnl:\T ~CHO QUE VOU PARAR POR AQUI 25

do chá.Àsvezes, comentários na sala dos professores transforma-vam as especulações em boatos de uma descoberta , mas nada sema terializava.

Dessa vez era diferente. Quando os três quadros-negros fi-caram cheios de símbolos, o conferencista fcz uma pausa. O pri-

meiro quadro foi apagado e a álgebra continuou. Cada linha pa-recia avançar um pequeno passo na direção da solução, mas depoisde trinta minutos o palestrante ainda não anunciara a compro-vação. Os professores reunidos nas fileiras da frente aguarda-vam avidamente pela conclusão. Os estudantes nas fileiras detrás olhavam para seus mestres cm busca de um indício quantoà natureza da solução. Estariam observando uma demonstraçãocompleta do Último Teorema de Fermat ou estaria o conferen-cista meramente delineando um argumento incompleto e anticli-mático?

O conferencista era Andrew Wiles, um inglês de poucas pa-

lavras que emigrara para os Estados Unidos na década de 1980.Assumira.uma cadeira na Universidade de Princeton onde con-

quistara a reputação de ser um dos matemáticos mais talentososde sua geração. Contudo, nos últimos anos, ele quase desapa-recera da programação anual de seminários e conferências. Seuscolegas começaram a pensar se Wiles não estaria acabado. Nãoera ineomum mentes jovens e brilhantes entrarem em decadênciaainda muito cedo, como comentou certa vez o matemático Alfred

. Adler: Av ida de um matemático é muito curta. Seu trabalhoraramente melhora depois da idade de vinte ou trinta. Se ele não

conseguiu muita coisa até essa idade, não vai conseguir maisnada.

Os jovens devem provar os teoremas, os velhos devem escre-ver livTos , observou G. H. Hardy em seu livroApologia do mate

mático Nenhum matemático jamais deve se esquecer de que amatemática, mais do que qualquer outra ciência ou arte, é um jogopara jovens. Para citar um exemplo simples, a idade média de elei-ção para a Sociedade Realé mais baixa na matemática. Seu alunomais brilhante, Srinivasa Ramanujan, foi eleito Membro da Socie-dade Real com a idadc de trinta c um anos, tendo feito uma série

de espantosas descobertas durante sua juventude. Apesar de nãoter recebido quase nenhuma educação formal em seu vilarejo deKumbakonam, no Sul da Índia, Ramanujan foi capaz de criarteoremas e soluções que tinham escapado à percepção dos mate-máticos ocidentais. Na matemática a experiência que vem com a

idade parece menos importante do que a intuição e o arrojo da ju-ventude. .

Muitos matemáticos tiveram carreiras brilhantes e curtas.No século XIX, o norueguês Niels Henrik Abel deu suas maio-res contribuições à matemática com a idade de dezenove anos emorreu na pobreza, oito anos depois, vítima de tuberculose. Aseu respeito, Charles Hermite comentou: Ele deixou o suficientepara manter os matemáticos ocupados durante quinhentos anos.E é verdade que as descobertas de Abel ainda exercem uma pro-funda influência sobre os teóricos dos números nos dias de hoje.Um contemporâneo de Abel, o igualmente talentoso Évariste

Galois, também realizou suas descobertas quando era adoles-cente.

Hardy comentou certa vez: Eu não conheço nenhum avançoimportante da matemática que tenha sido realizado por um ho-mem de mais de cinqüenta anos. Os matemáticos de meia-idademergulham na obscuridade e ocupam os anos que lhes restam en-sinando ou administrando e não fazendo pesquisas. Mas no casode Andrew Wiles nada podia ser mais distante da verdade. Em-bora tivesse alcançado a idade avançada dos quarenta anos, elepassara os últimos sete anos trabalhando em segredo completo,tentando resolver o maior problema da matemática. Enquantooutros achavam que ele estava acabado, Wiles fazia progressosfantásticos, inventando novastécnicas e ferramentas, tudo que agoraestava pronto a revelar. Sua decisão de trabalhar em isolamentototal fora uma estratégia de alto risco, desconhecida no mundoda matemática.

Sem ter invenções para patentear, o departamento da mate-mática de uma universidade é o menos sigiloso de todos. A co-munidade se orgulha da livre troca de idéias, e a hora do chá, à

tarde, se transforma num ritual diário onde as idéias são compar-

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26 o ÚLTIMO TEOREMA DE FER~IAT  II CI IO QUE VOU I AI {AR POR AQU I

t ilhadas e exploradas sob o estímulo das xícaras de café ou chá. Écada vez mais comum a P4blicação de trabalhos por co-autoresou mesmo equipes de matemáticos e, conseqüentemente, a gló-ria é partilhada por todos. Entretanto, se o professor Wiles tinhaconseguido realmente uma solução completa e precisa do Últi-mo Teorema de Fermat, então o prêmio mais cobiçado damatemá-tica era seu e somente seu. Mas ele devia pagar um preço por talsegredo: como não t inha uebatido ou testado suas idéias com acomunidade matemática, havia uma boa chance de que tivessecometido al~um erro fundamental.

Wilcs queria passar mais tempo revendo seu trabalho c veri-ficando o manuscrito final. Mas então surgira uma oportunidadeúnica de allunciar ~HIadescoherta 110III:-itituloI:-iaaeNewtoll, emCambridge, e ele abandonou toda a cautela. A razão da existênciado instituto é reunir os maiores intelectos do mundo, durante al-

gumas semanas, de modo a realizarem seminários sobre pesqui-sas de ponta, de sua escolha. Situado nos limites do cGmplts bemlonge dos estudantes e de outras distrações, o prédio foi projeta-do especialmente para encorajar os acadêmicos a se concentra-rem nas discussões e colaborações. Não há corredores sem saídaonde alguém possa se esconder. Todos os escr itór ios se voltampara o fórum central. Os matemáticos devem passar seu temponesta área aberta e são desencorajados quanto a fecharem asportasdos seus gabinetes. A colaboração também é encorajada entreaqueles que estão andando pelo prédio. Até no elevador, que sobeapenas três andares, existe um quadro-negro. Na verdade, cadasala do prédio tem pelo menos um quadro-negro, incluindo osbanheiros. Naquela ocasião, os seminários do Instituto Newtontinham como tema Aritmética e funções-I..; . Os maiores especia-listas do mundo na teoria dos números tinham se reunido paradebater problemas relacionados com este campo altamente espe-cializado da matemática pura, mas somente Wiles percebia queas funções-L podiam ser a chave para a solução doÚltimo Teoremade Fermat.

Emhora fO~~latraído pela oportunidade de revclar seu traba-11.\\\\1 \\\\\.\ .\\\\\i\;\\I i.\1:\\\\ l\\i\\t I\Il , i\ri\ 1:\l)prim pal de fazer 5ua

exposiçãonoInstitutoNewtoneraque eleficavaemsuacidadenatal,Cambridge. Fora em Cambridge que Wiles nascera e crescera,desenvolvendosuapaixãopelos números. E fora láque ele conhe-cera o problema que dominaria o resto de sua vida.

o Último roblem

Em 1963, quando tinha dez anos de idade, Andrew Wilesjá era fas-cinado pela matemática. Eu adorava resolver problemas na esco-la. Eu os levavapara casa e criava novos. Mas os melhores proble-mas eu encontrava na biblioteca local.

Um dia, quando voltava para casa, da escola, o jovem Wilcsuceitl iu passar na biblioteca, na rua Milton. Era uma bibliotecapequena, mas tinha uma boa coleção de livros sobre enigmas, e

isso era o que atraía a atenção de Andrew. Eram livros rechea-dos com todo o tipo de charadas científicas e problemas dematemática, e para cada problema haveria uma solução convenien-temente colocada nas últimas páginas. Mas naquele dia Andrewfoi atraído por um livroque tinha apenas um problema e nenhumasolução.

O livro era O Últimoproblema de Eric Temple Bell. Ele apre-sentava a história de um problema matemático q1.letinha suas ori-gens na Grécia antiga, mas só atingira sua maturidade no séculoXVII,quando o matemático francês Pierre de Fermat o colocara comoum desafio para o resto domundo. Uma sucessão de grandes ma-

temáticos fora humilhada pelo legado de Fermat e durante trezen-tos anos ninguém conseguira uma solução. .

Trinta anos depois de ler o relato de Bell,Wiles ainda se lembrava do que sentira ao ser apresentado ao Último Teorema deFermat: Parecia tão simples, e no entanto nenhum dos grandesmatemáticos da história conseguira resolvê-Ia. Ali estava um pro-blema que eu, um menino de dez anos, podia entender e eu sabiaque a partir daquele momento nunca o deixaria escapar. Tinha desolucioná-Io.

Geralmente, metade da dificuldade de 11mprohlcma do 1111111 -

  7

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28 o úernlO TEORE:lIA DEFER: II.-\T

mática consiste em entender a questão, mas nesse caso ela era di-

reta - provar que não existe solução em nÚmeros inteiros para aseguinte equação:

x + ) = Z para 1lmaior do que 2.

o problematem umaaparênciasimples e familiarporque é ba-seado num elemento da matemática que todos conhecem - oteorema de Pitágoras:

Num triângulo retângulo o quadrado da hipotcnusa é igual à

soma dos quadrados dos catctos.

Ou: x2 + y2 = Z2

O teorema de Pitágoras fora impresso em milhões, se não bilhões,de mentes humanas. É o teorema fundamental que toda criançainocente é forçada a aprender. Mas, apesar de poder ser compreen-

dido por uma criança de dez anos, a criação de Pitágoras serviu deinspiração para um problema que desafiou as maiores mentesmatemáticas da história.

No século VI a.C., Pitágoras de Samos foi uma das figurasmais influentes e, no entanto, misteriosas da matemática. Comonão existem relatos originais de sua vida e de seus trabalhos, Pitá-

goras está envolto no mito e na lenda, tornando difícil para oshistoriadores separar o fato da ficção. O que parece certo é que

Pitágoras desenvolveu a idéia da lógica numérica e foi respon-sável pela primeira idade de ouro da matemática. Graças ao seugênio, os nÚmeros deixaram de ser apenas coisas usadas mera-mente para contar e calcular e passaram a ser apreciados porsuas próprias características. Ele estudou as propriedades decertos nÚmeros, o relacionamento entre eles e os padrões queformavam. Ele percebeu que os nÚmeros existem independen-temente do mundo palpável e, portanto, seu estudo não é pre-

judicado pelas incertezas da percepção. Isso significava que elepodcria descobrir vcrdades que eram independentes de precon-

  ACHO QUE VOU PARAR POR AQUI 29

...Ii.

ceitos ou de opiniões, sendo mais absolutas do que qualquer co-nhecimento prévio.. Pitágoras adquiriu suas habilidades matemáticas em suas via-gens pelo mundo antigo. Algumas histórias tentam nos fazer crerque Pitágoras teria ido até a Índia e a Inglaterra, mas o mais certoé que ele aprendeu muitas técnicas matemáticas com os egípciose os babilônios. Esses povos antigos tinham ido além da simPlesçontagem e eram capazes de cálculos complexos que lhes permi-tiam criar sistemas de contabilidade sofisticados e construir pré-dios elabora~os. De fato, os dois povos viam a matemática comouma ferramenta para resolver problemas práticos. Amotivação queconduziu à descoberta de algumas das leis básicas da geometriaera a necessidade de refazer a demarcação dos campos, perdidadurante as enchentes anuais do Nilo. A palavra geometria significa a medida da terra .

Observou que os egípcios e os babilônios faziam seus cálculos

na forma de uma receita que podia ser seguida cegamente. As re-ceitas, que tinham sido passadas através de gerações, sempre pro-duziam a resposta correta, e assim ninguém se preocupava em exa-minar, ou questionar, a lógica subjacente daquelas equações. Oimportante para essas civilizações era que os cálculos davam cer-to. Por que davam certo era irrelevante.

Depois de vinte anos de viagens, Pitágoras tinha assimiladotodo o conhecimento matemático domundo conhecido. Então ele

velejou para seu lar, a ilha de Samos, no mar Egeu, com o pro-pósito de fundar uma escola devotada ao estudo da filosofia e,emparte, voltada para a pesquisa da matemática que acabara de

conhecer. Queria entender os nÚmeros e não meramente utili-zá-Ias. Pitágoras esperava encontrar uma grande quantidade deestudantes de mente aberta que pudessem ajudá-Io a desenvol-ver filosofias novas e radicais. Mas, durante sua ausência, o tira-noPolícrates tinha transformado a outrora liberal Samos em uma

sociedade intolerante e conservadora. Polícrates convidou Pitágorasa fazer parte de sua corte, mas o filósofo percebeu que o objetivoda oferta era meramente silenciá-Ia e recusou a honra. Depoisdeixou a cidade e foi morar em uma caverna, numa parte remota

,Ir

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30 o Úl; I I~1O TEOHEi\ IA I>E FEH:\ IAT

da ilha,onde podia continuar seus estudos sem medo de ser per-seguido.

Pitágoras não apreciava o isolamento e acabou subornando ummenino para ser seu primeiro aluno. A identidade do garoto é in-certa, mas alguns historiadores sugerem que ele também se cha-maria Pitágoras e que o estudante mais tarde ficariafamoso aosugerirque os atletas deveriam comer carne para melhoria da constitui-ção física.Pitágoras, o mestre, pagavaao seu aluno três ébolos paracada aula a que ele comparecia. Logo percebeu que, à medida queas semanas se passavam, a relutância inicial do menino em apren-der se transformava em entusiasmo pelo conhecimento. Para tes-

tar seu pupilo, Pitágoras fingiu que não podia mais pagar o estu-dante e que teria de interromper asaulas.Então omenino se ofereceupara pagar por sua educação. O pupilo tornara-se discípulo. Infe-lizmente este foi oúnico adepto que Pitágoras conquistou em Samos.

Ele chegou a estabelecer temporariamente uma escola conhecidacomo o Semicírculo de Pitágoras, mas suas idéias de reforma so-cial eram inaceitáveis e o filósofo foi obrigado a fugir com sua mãee seu único discípulo.

Pitágoras partiu para o Sul daItália, que era então parte daMagnaGrécia. Ele se estabeleceu em Crotona onde teve a sorte de encon-

trar opatrono ideal emMilo.Miloera o homem mais rico deCrotonae um dos homens mais fortes de toda a história. Embora a reputa-

ção de Pitágoras como o sábio de Samos já estivesse se espalhandopela Grécia, a fama de Milo era ainda maior. Tratava-se de um ho-mem de proporções hercúleas, que fora doze vezes campeão nos

jogos olímpicos e de Pít ias. Um recorde. Além de sua capacidadecomo atleta, Milo também apreciava e estudava a filosofia e a ma-temática. Ele cedeu uma parte de sua casa para que Pitágoras es-tabelecesse sua escola. E, assim, a mente mais criativa e o corpo

mais poderoso formaram uma aliança.Seguro em seu novolar,Pitágoras fundou a Irmandade Pitagórica

- um grupo de seiscentos seguidores, capazes não apenas de en-tcnder seus ensinamentos, mas também de contribuir criando idéiasnovas e demonstrações. Ao entrar para a Irmandade cada adeptodevia doar tudo o que tinha para um fundo comum. E se alguém

ACIIO QUE vot I l AltAR I OR AQUr 31

quisesse part ir receberia o dobro do que tinha doado e uma lápideseria erguida em sua memória. A Irmandade era uma escola igua-litária e incluía várias irmãs. A estudante favorita de Pitágoras era afi lha de Milo, a bela Teano, e,apesar da diferença de idade, os doisacabaram se casando.

Logo depois de fundar a Irmandade, Pitágoras criou a palavra ilóso o e, ao fazê-Io, definiu os objetivos de sua escola. Quandoassistia aos jogos olímpicos, Leon, príncipe de Pilos, perguntou aPitágoras como ele descreveria a si mesmo. Pitágoras respondeu: Eu sou um fiJósofo , mas Leon nunca tinha ouvido a palavra an-tes e pediu que explicasse.

A vida, príncipe Leon, pode muito bem ser comparada a es-

tes jogos. Na imensa multidão aqui reunida alguns vieram àprocura de lucros, outros foram trazidos pelas esperanças e

ambições dafama e daglória.Mas entre elesexistem uns poucos

que vieram para observar e entender tudo o que se passa aqui.Com avidaacontece a mesma coisa.Alguns sãoinfluenciados

pela busca de riqueza, enquanto outros são dominados pelafebre do poder e da dominação, Mas os melhores entre oshomens se dedicam àdescoberta do significado e dopropósi-

to davida. Eles tentam descobrir os segredos da natureza. Este

t ipo de homem eu chamo de filósofo, pois embora nenhumhomem seja completamente sábio, em todos os assuntos, ele

pode amar a sabedoria como a chave para os segredos da na-tureza.

Embora muitos conhecessem as aspirações de Pitágoras, ninguémforada Irmandade conhecia os detalhes ou a extensão de seu su-

cesso. Cada membro da escola era forçado a jurar que nunca reve-lariaao mundo exterior qualquer uma de suas descobertas mate-máticas. Mesmo depois da morte de Pitágoras, um membro daIrmandade, que quebrou o juramento, foi afogado. Ele revelou,publicamente, a descoberta de um novo sólidoregular, o dodecaedro,construído a partir de doze pentágonos regulares. Esta naturezaaltamente secreta da Irmandade Pitagórica contribuiu para os mi-

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32 o ÚLTIl \IO TEOREl\ IA DE FER:' IIAT

tos que se criaram em torno de estranhos rituais que seriam prati-cados. E também explica por que existem tão poucos relatosconfiáveis de suas conquistas matemáticas.

O que sesabe com certeza é que Pitágoras estabeleceu um sis-tema que mudou o rumo damatemática. AIrmandade era realmente

uma comunidade religiosa e um de seus ídolos era o Número. Elesacreditavam que se entendessem as relações entre os númerospoderiam descobrir os segredos espirituais do universo, tornando-sc, assim, próximos dos deuses. Em especial, a Irmandade voltousua atenção para os números inteiros (1,2, 3, ...) e as frações. Osnúmeros inteiros e as frações (proporções entre números inteiros)são conhecidos, tecnicamente, como nÚmeros racionais E entre ainfinidade de nÚmeros, a Irmandade buscava alguns com signifi-cado especial, e entre os mais importantes estavam os chamadosnúmeros perfeitos .

De acordo com Pitágoras a perfeição numérica depende do

número de divisares (números que irão dividi-Iaperfeitamente, semdeixar re to).Por exemplo, osdivisares de 12são 1,2, 3,4 e 6.Quandoa soma dos divisares de um número é maior do que ele, o númeroé chamado de excessivo . Portanto, 12 é um número excessivoporque a soma dos seus divisares é 16. Por outro lado, quando asoma dos divisares é menor do que o número, ele é chamado de-ficiente . É o caso de 10,porque seus divisares (1,2 e 5) somam 8.

Os números mais importantes e raros eram aqueles cujosdivisares somados produziam eles mesmos, e estes eram chama-dos de ml111eroselfeitos O número 6 tem como divisares os nú-meros 1, 2 e 3 e portanto é um número perfeito porque 1 + 2 + 3

= 6. O número perfeito seguinte é 28, porque 1 + 2 + 4 + 7 + 14= 28.

Além de ter um significado matemático para a Irmandade, aperfeição de 6 e 28era reconhecida por outras culturas que obser-varam que a Lua orbita a Terra a cada 28 dias e acreditavam queDeus tinha criado o mundo em 6 dias. Em A cidade de Deus San-to Agostinho afirma que, embora Deus pudesse ter criado o mun-do em um instante, ele decidiu levar seis dias de modo a refletir aperfeição do universo. E acrescentava que 6 não era perfeito por-

'~CHO QUE VOU PARAR POR AQUI 33

que Deus assim o quisera, e sim que a perfeição era inerente à I

naturezadonúmero. Onúmeroéperfeitoemsimesmoe nãoporque:Deus criou todas as coisasem seis dias. O inverso é maisverda-deiro,Deuscrioutodasascoisasemseisdiasporqueestenúmero I

é perfeito.E continuariaperfeitomesmoqueo trabalhode seis dias Inão existisse. . I

À medida que osnúmeros inteiros se tornam maiores,a t~refa I

de encontrar números perfeitos se torna mais difícil.O terceironúmero perfeito é 496,o quarto é 8.128,o quinto é 33.550.336e osextoé 8.589.869.056.Alémde sera somadeseusdivisares,Pitágoraspercebeu que os números perfeitos possuem váriaspropriedadeselegantes. Por exemplo,números perfeitos são sempre a soma deuma série de nÚmerosinteiros.Assim temos:

6= 2 3

28=1+2+3+4+5+6+7

496 = 1 + 2 + 3 + 4 + 5 + 6 + 7 + 8 + 9 +... + 30 + 318.128 = 1 + 2 + 3 + 4 + 5 + 6 + 7 + 8 + 9 +...+ 126+ 127

. I

Pitágoras era fascinado pelos números perfeitos, mas ele não secontentava em meramente colecionar esses números especiais, elequeria descobrir seu significado mais profundo. Uma de suas des-cobertas foi que a perfeição estava ligada a 2. Os números 4 (2:x2),8 (2x 2 x 2), 16 (2 x 2 x 2x 2), etc. são conhecidos eomo potências.de 2 e podem ser escritos como 2n onde o n representa o númerode vezes em que o 2 é multiplicado por ele mesmo. Todas estas

potências de 2 chegam perto, mas falham em ser números perfei-tos, porque a soma de seus divisares é sempre uma unidade me-nor do que o próprio número. Isso os torna apenas levemente im-

. perfeitos:

22= 2 x 223= 2 x 2 x 224= 2 x 2 x 2 x 22>= 2 x 2 x 2 x 2 x 2

=4=8= 6

= 32

Divisares 1,2Divisares 1,2, 4Divisares 1,2,4,8Divisares 1,2, 4, 8, 16

Soma= 3Soma= 7Soma=  5

Soma=  

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34 o Út: rIMO 'rEOREI \1A DE FER \ tAT't\CHO QUE VOU PARAR POR AQUI

Dois séculos depois, Euc1idesaperfeiçoaria a ligação encontradapor Pitágorasentre o 2 e a perfeição. Euc1idesdescobriu que osnúmerosperfeitos sãosempre múltiplosde dois números, um dosquais é uma potênciade 2 e o outro é a potência seguinte de doismenos 1.

Ou seja,

 hdo É úmero

6 =28 =

496 =8.128 =

21 x (22- 1)22 X (23- 1)24 X (25-1)26 x (27- 1)

Além de estudar as relaçõesentre os números, Pitágoras tambémera fascinadopela ligaçãodos números coma natureza.Ele perce-beu que os fenômenosnaturais sãogovernadospor leis, e que es-

sas leis podem ser descritas por equações matemáticas. Uma dasprimeiras ligaçõesque ele percebeu foi a relaçãofundamental'~n-tre a harmonia da músicae a harmonia dos números.

O instrumento mais importante da antigamúsicahelênica erao tetracórdi~, ou lira de quatro cordas.Antes de Pitágoras,os mú-sicos tinham percebido que certas notas, quando soavamjuntas,criavamum efeito agradávele afinavamsuas liras demodo que aotocarem duas cordas pudessem produzir tal harmonia.Contudo,os antigos músicos não compreendiam por que certas notas, emespecial, eram harmônicase não tinham nenhum meiopreciso deafinar seus instrumentos. Eles afinavamsuas llras peloouvido,até

conseguirem um estadode harmonia - um processo que Platãochamavade torturar as cravelhas.

Iamblicus,um estudiosodo séculoIv,descrevecomoPitágorasdescobriu os princípios básicos da harmonia musical.

Hoje em dia os computadores permitiram continuar a busca pelosnúmeros perfeitos e encontraram exemplos gigantescos como 2Z16,090x (2ZH o')\-1, um número de mais de 130.000 algarismos que obe-

dece à regra de Euc1ides.Pitágoras era fascinado pclos ricos padrões e as ~roprieda-dcs dos números perfeitos e respeitava sua sutileza. A primeira

vista, o conccito de perfeição é relativamente simples de enten-der, noentanto os antigos gregos foram incapazes de sondar algunsdos aspectos fundamentais deste assunto. Por exemplo, embo-ra exista uma grande quantidade de números cujos divisoressomados são uma unidade a menos do que o próprio número,

ou seja, são l igeiramente deficientes, parecem não existir nú-meros ligeiramente excessivos. Os gregos foram incapazes dedescobrir quaisquer números cujos divisores somados excedem

em uma unidade o número original e não conseguiam entenderpor que isso acontece. E para aumentar sua frustração tambémnão conseguiram provar que tais números não existiam. É com-

preensível que a aparente falta de números levemente excessi-vos não tivesse nenhuma utilidade prática, entretanto era um

problema que poderia revelar a natureza dos números e, por-tanto, valeria a pena estudar. Tais enigmas intrigaram a Irman-dade Pitagórica, e dois mil e quinhentos anos depois os mate-máticos ainda são incapazes de provar que não existem números

ligeiramcnte cxccssivos.

Certa vez ele estava dominado pela idéia de descobrir se po-deria criar um instrumento mecânico para ampliar o sentido

da audição, que fosse preciso e engenhoso. O aparelho seria

semelhante aos compassos, réguas e instrumentos ót icosprojetados para o sentido da visão. Do mesmo modo o senti-

do do tato tinha escalas e os concei tos de pesos e medidas.

Por algum ato divinode sorte, aconteceu de Pitágoras passarpor uma oficina de um ferreiro e ouviu os martelos golpeando

o ferro e produzindo uma harmonia variada, cheia de rever-berações, exceto por uma combinação de sons.

De acordo com Iamblicus, Pitágoras correu imediatamente paradentro da forja a fim de investigar a harmonia dos martelos. Elepercebeu que a maioria dos martelos podia ser usada simultanea-mcnte para gerar sons harmoniosos, enquanto qualquer eombina-

3S

IIIiI

II

\

. '\

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 ACHO QUE VOU PARARPOR AQUI 37

Figura 1.Uma corda vibrando livremente gera uma nota básica.Aocriar um nódulo, exatamente no meio da corda, a nota produ-

zida é uma oitava mais alta e em harmonia com a nota original.

Outras notas harmônicas podem ser produzidas movendo-se o

nódulo para outras posições que sejam frações simples (por exem-

plo, um terço, um quarto, um quinto) da distância ao longo dacorda.

ção contendo um martelo em particular produzia um ruído desa-

grach1vel.Ele analisou os martelos e descobriu que aqueles que eram

harmoniosos entre si tinham uma relação matemática simples -suas massas eram proporções simples, ou frações, umas das ou-

tras. Ou seja, martelos que po ssuíssem a metade, dois terços ou

três quartos do peso de um determinado martelo produziriam sonsharmoniosos. Por outro lado, o martelo que gerava desarmonia

quando golpeado junto com os outros tinha um peso que não apre-

sentava qualquer relação simples com o peso dos outros.

Pitágora~ descobrira que as relações numéricas simples são as

responsáveis pela harmonia na música. Os cientistas lançaram al-

gumas dúvidas quanto ao relato de lamblicus, mas é certo que

Pitágoras aplicou sua nova teoria de proporções musicais à lira,

examinando as propriedades de uma única corda. Tocando simples-

mente uma corda temos uma nota padrão, que é produzida pela

vibraçãoda corda inteira. Prendendo a corda em determinados pontos

de seu comprimento é possível produzir outras vibrações ou no~tas, como ilustrado na Figura 1.As notas harmônicas ocorrem so-

mente em pontos muito específicos. Por exemplo, fixando a corda

num ponto correspondente à metade do seu comprimento, ela pro-

duz, ao ser tocada, uma nota que é uma oitava mais alta e em har-

monia com a nota original. De modo semelhante, se prendermos a

corda empontos correspondentes aum terço, um quarto e um quinto

do seu comprimento, produziremos outras notas harmônicas. Já

se prendermos a corda em outros pontos que não formam uma fração

simples do seu comprimento, a nota produzida não se harmonizacom as outras.

Pitágoras tinha descoberto pela primeira vez as leis matemá-ticas que governam um fenômeno físico e demonstrara a existência

de uma relação fundamental entre a matemática e a ciência. Desde

esta descoberta, os cientistas têm buscado as regras matemáti-

cas que parecem governar cada processo físico e descobriram que

os números aparecem em todo o tipo de fenômenos naturais. Por

exemplo, um número em especial parece governar o comprimento

dos rios tortuosos. O professor Hans-Henrik St0 lum, geólogo da

Universidade de Cambridge, calculou a relação entre o compri-

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38 o ÚI: rJ i\1O TEOHEi\ lA DE FEHi\ IAT :-\CHO QUE VOUPARARPOR AQUI

39

mcnto verdadeiro deum rio, danascente atéa foz, c seucomprimen-

to em linha reta. Embora a taxa varie de rio para rio, o valor mé-

dio él igeiramente maior do que 3. Ou seja,o comprimento real é

aproximadamente o triplo da distância em linha reta. De fato, a

proporção é aproximadamente 3,14, que é próximo do valor do

número 7t,a proporção entre a circunferência de um círculo e seudiâmetro.

O númcro 7tfoi derivado, originalmente, da geometria dos cír-

culos, e no entanto ele vive reaparecendo em uma grande varieda-

de de acontecimentos científicos. No caso da proporção entre os

rios, a aparição de 7té o resultado de uma batalha entre a ordem e

o caos.Einstein foi o primciro a sugcrir que osrios possuem uma

tendência aum caminho mais serpenteanteporque umacurva menor

vai produzir correntes mais rápidas namargem oposta, que por sua

vez prouuzir;\ ) uma crm;ão maior e uma curva mais pronunciaua.

Quanto mais fechada a curva, mais rápidas serão as correntezas

na margem oposta, maior aerosão e mais o rio irá serpentear. Con-

tudo, existe um processo que irá seopor aocaos. Os meandros fa-rão o rio sevoltar sobre si mesmo, se anulando. O rio vai se tornar

mais reto, e o meandro serádeixado parao lado, formando um lago.

a equilíbrio entre esses fatores opostos leva a uma relação média

de 1tentre o comprimento rcal e a digtância cm linha reta da nas-cente até a foz. A proporção de 1té mais comumente encontrada

entre rios que fluem sobre planícies como asque existem no Bra-sil e na tundra siberiana.

Pitágoras percebeu que os números estavam ocultos em tudo,

das harmonias da música até asórbitas dos planetas, o que o levou

a proclamar que tudo é número . Ao explorar o significado da

matemática, Pitágoras estava desenvolvendo uma linguagem que

permitiria que ele e outros depois delc descrevessem a naturezado universo. Daí em diante cada avanço da matemática daria aoscientistas o vocabulário de que necessitavam para explicar melhoros fenômenos que nos cercam. De fato, o desenvolvimento da ma-temática iria inspirar revoluções na ciência.

De todas as ligações entre os números e a natureza estudadaspela Irmandade, a mais importante é a relação que leva o nome de

seu fundador.OteorcmadePitágorasnosforneceumaequaçãoque I

é verdadeira para todos os triângulos retângulos e que, portanto,também defineo ânguloreto. Porsuavez,o ânguloretodefinea I

perpendicular e a perpendicular define as dimensões- compri- I

mento,larguraealtura- doespaçoondevivemos.Emúltimaanálise,I

a matemática, atravésdo triângulo retângulo, define a próp :iaes- Itrutura do nosso mundotridimensional. I

É uma realizaçãoprofunda e, no entanto, a matemática usada

para compreender o teorema dePitágorasé relativamentesimples. .Para entendê-Ia, comece simplesmente medindo o comprimentodos dois catetos (ladosmenores) do triângulo retângulo  x ey , eentão calcule o quadrado de cadaum deles  x2,y2 . Depois someos quadrados dos dois números  X2+ y2 , o que lhe dará o número

final.Se calcular estc número para o triângulomostrado naFigura2,o resultado será 25.

Agora vocêpodemedir o lado mais comprido,z, a assim cha-mada hipotenusa, e calcular o quadrado do seu comprimento. Oresultado extraordinário é que este número, Z2é idêntico àqueleque vocêcalculou, ou seja, 52= 25.

zI

. Ii

I

II

y

x

x=3, y=4, z=5

X2+y2 =Z29 +16 =25

Figura 2. Todo triângulo retângulo obedece ao teorema de Pitágoras.

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40 o ÚLTll \IO TEORE1\ lA DE FERi\ lAT , \CIIO QUE VOU PARAR POR AQUI 41

Resumindo: rova bsoluta

x l + y l =Z l

A história do Último Teorema de Fermat gira em torno da buscapor uma prova, ou demonstração perdida. Em matemática o con-ceito de prova é muito mais rigoroso e poderoso do que o que usa-

mos em nosso dia-a-dia e até mesmo mais preciso do que o con-ceito de prova como entendido pelos físicos e químicos. Adiferençaentre prova científica e prova matemática é aomesmo tempo sutile profunda. Ela é crucial para que possamos entender o trabalhode cada matt:mático, desde Pitágoras.

A idéia da demonstração matemática clássica começa com umasérie de axiomas, declarações que julgamos serem verdadeiras ouque são verdades evidentes. Então, através da argumentação lógi-.ca, passo a passo, é possível chegar a uma conclusão. Se os axio-mas estiverem corretos e a lógica for impecável, então a conclusãoserá inegável. Esta conclusão é o teorema.

Os teoremas matemáticos dependem deste processo lógico, euma vez demonstrados eles serão considerados verdade até o final

dos tempos. A prova matemática é absoluta. Para apreciar o valorde tais provas, devemos compará-Ias com sua prima pobre, a provacientífica. Na ciência apresenta-se uma hipótese para explicar umfenômeno físico. Se as observações do fenômeno são favoráveis àhipótese, então elas se tornam evidências a favor dela. Além disso,a hipótese não deve meramente descrever um fenômeno conheci-do, mas também prever os resultados de outros fenômenos. Expe-riências podem ser feitas para testar a capacidade da hipótese emprever os resultados, e se o resultado for bem-sucedido teremos

mais evidências para apoiara hipótese. Por fim, a soma das evidênciaspode ser tão grande que ahipótese passará a ser aceita como teoriacientífica.

Contudo, uma teoria científica nunca pode ser provadado mesmomodo absoluto quanto um teorema matemático. Ela é meramenteconsiderada como altamente provável, com base nas evidênciasdisponíveis. A assim chamada prova científica depende da obser-vação e da percepção, e ambas são falíveis, fornecendo somenteaproximações em relação àverdade. Como disse certa vez Bertrand

Num triângulo retângulo o quadrado da hipotenusa é igual àsoma dos quadrados dos catetos.

Ou em outras palavras ou melhor, símbolos):

Isto é claramenteverdadeiro para o triângulo da Figura 2, mas o

que é notávelé que o teorema de Pitágoras éverdadeiropara todosos triângulos retângulos que puder imaginar. Trata-se de uma leiuniversalda matemática, e você pode contar com ela sempre queencontrar um ânguloreto.Inversamente, se tiverum triânguloqueobedeceao teorema dePitágoras,entãopode ter confiançaabsolu-

ta de que é um triângulo retângulo.Neste ponto é importante mencionarque, emboraeste teoremaestejaeternamente associadoaPitágoras,elejá e;a usadopeloschi-neses e babilôniosmil anos antes. Contudo, estas culturas não sa-biam que o teorema era verdadeiropara todos os triângulos retân-gulos. Eraverdadeiro para os triângulos que tinham testado, maseles nãotinham meios de demonstrar que era verdadeiropara to-dosos triângulosque aindanão tinham testado.Omotivopeloqualo teorema levao nomede Pitágoras é que foi ele o primeiro a de-monstrar esta verdadeuniversal.

Mas comoPitágorassabiaque o teorema é verdadeiropara to-

dosos triângulos retângulos?Nãopoderiaesperar testar a infinitavariedadedetriângulosretângulos,enoentantoestavacemporcentocerto de que o teorema era verdadeiro.A razãopara sua confiançaestá no conccito dc prova,ou demonstração matemática.A buscapelaprovamatemáticaé a busca pelo conhecimento mais absolutodo que o conhecimentoacumuladopor qualquer outra disciplina.Este desejo pelaverdadefinalatravés dométodo da prova,ou de-monstração, é o que tem impulsionado os matemáticos nos últi-mos dois mil e quinhentos anos.

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42 o ÚJ: I I i\ IO TEOHEMA DE FEHi\ IAT   CIIO QUE VOUP R RPOR QUI 43

Russell: Embora isto possa parecer um paradoxo, toda a ciênciaexata é dominada pela idéia da aproximação. Até mesmo as pro-vas científicas mais aceitas contêm um pequeno elemento de dúvidadentro delas.Às vezes esta dÚvidadiminui, mas nunca desaparece

completamente. E em outras ocasiões descobre-se que aprova estava

errada. Esta fraqueza das provas científicas leva às revoluções naciência, quando uma teoria que se considerava correta é substituídapor outra, aqual pode ser meramente um aperfeiçoamento da teoriaoriginal, ou pode ser sua completa contradição.

Por exemplo, a busca pela part ícula fundamental da matériaenvolveu gerações de físicos derrubando, ou no mínimo aperfei-çoando, as teorias de seus antecessores. A busca moderna pe-los tijolos da construção do universo começou no início do sé-culo XIX, quando uma série de experiências iniciadas por JohnDalton sugeriu que tudo era composto de pequenos átomos eque os átomos eram fundamentais. No final do século, J. J.

Thomson descobriu o elétron, a primeira part ícula subatômicaconhecida, e daí para a frente o átomo não foi mais fundamen-tal ou indivisível.

Durante as primeiras décadas do século XX,os físicos criaramuma imagem completa do átomo - um núcleo formado porprótons e nêutrons, orbitado por elétrons. Prótons, nêutrons e elé-trons foram então orgulhosamente apresentados como os ingre-dientes fundamentais do universo. Então, experiências com os raioscósmicos revelaram a existência de outras partículas fundamen-

tais - os píons e múons. Uma revolução ainda maior aconteceuem 1932 com a descoberta da antimatéria - a existência de

antiprótons, antielétrons, antinêutrons etc. A essa altura os físicosde partículas não tinham mais certeza de quantas part ículas dife-rentes existiam, mais pelo menos tinham certeza de que tais enti-dades eram fundamentais. Isso durou até a década de 1960, quan-

do surgiu a idéia do quark. O próton era aparentemente formadopor quarks com cargas fracionárias, e o mesmo acontecia com onêutron e o píon. Na próxima década até mesmo a idéia das partí-culas como objetos puntiformes pode ser substituída pela idéia departículas como cordas. A teoria é de que cordas com bilionésimo

de bilionésimo de bilionésimo de um bilionésimo do comprimen-to do metro (tão pequenas que parecem pontos) podem vibrar demodos diferentes, e cadavibração dá origem a uma partícula dife-rente. Isto é análogo à descoberta de Pitágoras de que a corda deuma lira pode dar origem a notas diferentes, dependendo de como

ela vibra. A moral da história é que os físicos estão continuamentealterando sua imagem do universo, quando não apagando-a, e co-:-meçando tudo de novo.

O futurólogo e escritor de ficção científica Arthur C. Clarkeescreveu que, s.eum eminente professor declara que alguma coisaé uma verdade indubitável, então é provável que no dia seguinte sedescubra que ele estava errado. A prova científica é inevitavelmen-te mutável e inferior. Por outro lado, a prova matemática é absolutae destituída de dúvida. Pitágoras morreu confiante de que o conhe-cimento de seu teorema, que era verdade em 500 a.C., permanece-ria verdade pelo resto da eternidade.

A ciência funciona por um sistema semelhante ao da justiça.Uma teoria é considerada verdadeira se existem evidências sufici-entes para apoiá-Ia além de toda dúvida razoável . Por outro lado,a matemática não depende de evidências t iradas de experiênciassujeitas a falhas e sim construídas sobre lógica infalível. Isso é de-monstrado pelo problema do tabuleiro de xadrez mutilado , ilus-trado na Figura 3.

Temos um tabuleiro de xadrez onde os lados opostos foramretirados de modo que restam apenas 62 quadrados. Agora pega-mos 31 dominós feitos de modo que cada dominá cobre exata-mente dois quadrados. A pergunta é: Será possível dispor os 31

dominós de modo que eles cubram todos os 62 quadrados do ta-buleiro?

Existem duas abordagens para este problema:

(1) A abordagem científicaO cientista tentará resolver o problema através da experimentaçãoe depois de tentar algumas dúzias de arranjos vaidescobrir que todoseles fracassam. Por fim, o cientista chegará à conclusão de queexistem evidências suficientes de que o tabuleiro não pode ser co-

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44 o ÚLT(; \(O TEOREi\ lA DE FER:\ IAT ':-\CHO QUE VOU PARAR POR AQUI 45

BI

. Os cantosextremos, retiradosdotabuleiro de xadrez,eram qua-drados brancos. Portanto agora existem 32 quadrados pretos esomente 30 quadrados brancos.

. Cadadominá cobre dois quadradosvizinhos, e os quadrados vi-zinhos são sempre de cores diferentes, ou seja,um brancoe um

preto. .. Portanto, não imp()rta como coloquemos os dominás sobre otabuleiro, os primeiros 30 dominós deverão cobrir 30 quadra-dos pretos c 30 quadrados brancos.. Em cons~qüência disso, ficaremos sempre com um dominá edois quadrados pretos restantes.. Mas lembrem-se, todos os dominós cobrem dois quadrados vi- .

zinhos, e quadrados vizinhos são de cores opostas. Se os qua-drados remanescentes são da mesma cor, eles não podem sercobertos pelo dominóque restou. Portanto, é impossívelcobrirtodo o tabuleiro com os dominás

(2) A abordagem matemáticaO matemático tenta resolver o problema desenvolvendo um argu-

mento lógico, o qual produzirá uma conclusão que será ao mesmotempo indubitavelmente correta e permanecerá assim para sem-pre. Um argumento desse tipo é o seguinte:

Esta demonstração prova que todos os arranjos possíveis de dominásnão conseguirão cobrir o tabuleiro mutilado. Do mesmo modo,Pitágoras construiu uma demonstração que mostra que todos ostriângulos retângulos possíveis irão obedecer ao seu teorema. ParaPitágoras a idéia da prova matemática era sagrada, e foi esse tipo.de demonstração que permitiu que a Irmandade descobrisse tantacoisa. A maioria das provas modernas são incrivelmente comple- .xas e seguem uma lógica inatingível para o homem comum. Feliz-mente, no caso do teorema de Pitágoras, o argumento é relativa-mente direto e depende apenas de matemática de nívelginasial. Sua

demonstração está delineada no Apêndice 1.A prova, ou demonstração, de Pitágoras é irrefutável. Ela mos-

tra que seu teorema é verdadeiro para cada triângulo retângulo douniverso. A descoberta foi considerada tão fabulosa que cem boisforam sacrificados num ato de gratidão para com os deuses. A des-coberta foi um marco na história da matemática e um dos saltosmais importantes da história da civilização.Sua importância foidupla.Primeiro, desenvolveu a idéia da prova. Uma solução matemáticademonstrada era uma verdade mais profunda doque qualquer outra

Figura 3. O problema do tabuleiro de xadrez mutilado.

berto. Contudo, o cientista jamais terá certeza de que isto é verda-de, porque pode existir algum arranjo ainda não testado que resol-verá o problema. Existem milhões de arranjos diferentes e só épossível explorar uma pequena fração deles. A conclusão de que atarefa é impossível é uma teoria baseada na experimentação, mas ocientista terá que viver com a hipótese de que um dia sua teoriapoderá ser derrubada.

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46o ÚLTI; \IO TEOREI\ IA DE FER~IAT

por ser o resultado de uma lógica encadeada, passo a passo. Em-bora o filósofo Tales já tivesse inventado algumas demonstrações

geométricas primitivas, Pitágoras levou a idéia muito mais adiantee foi capaz de provar idéias matemáticas muito mais engenhosas.A segunda conseqüência do teorema de Pitágoras é que ele liga o

método matemático abstrato a alguma coisa tangível. Pitágorasdemonstrou que as verdades da matemática podem ser aplicadasaomundo científico, dando-lhe um fundamento lógico.Amatemáticadá à ciência um princípio rigoroso, c sobre seus fundamentos in-falíveis os cientistas acrescentam suas medições imprecisas e suasobservações imperfeitas.

Uma nfinidade de rios

AIrmandade Pitagórica revigoroua matemática com sua busca zelosa

pela verdade através da demonstração. As notícias de seu sucessose espalharam, e no entanto os detalhes de suas descobertas con-tinuaram um segredo guardado a sete chaves. Muitos pediram paraser admitidos neste círculo interno do conhecimento, mas somenteas mcntcs mais brilhantes eram aceitas. Um dos rejeitados foi umcandidato chamado Cilon. Cilon ficou furioso com sua humilhan-

te rejeição, e vinte anos depois ele se vingou.Durante a sexagésima sétima Olimpíada (510 a.C.) houve uma

revolta na cidade vizinha dc Síbaris. Telis, o líder vitorioso na re-volta, começou uma bárbara campanha de perseguição contra os

partidários do governo anterior, o que levou muitos deles a busca-rcm santuário em Crotona. Telis exigiu que os traidores fossemm nd dosd volt p r rCl:cbcrcTll~Hlapunição cm Síbaris. MasMiloc Pitágoras convenceram os cidadãos de Crotona a enfrenta-rem otirano e protegerem os refugiados. Telis ficou furioso e ime-diatamente reuniu um exército de 300 mil homens e marchou so-breCrotona. Milo defendeu a cidade com 100mil cidadãos armados.

Dcpois dc setenta dias dc guerra, a liderança superior de Milo le-\ 0\1-0àvitória, c, num ato de vingança, ele mudou o curso do rioCmli:\:\11 11 ih:\ri:\. jlllllHlatHioe lkstruindn a cidade.

 A CHO QUE VOU PARAR POR AQUI 47

 

Apesar do fim da guerra, a cidade de Crotona ainda estava to-mada pela agi tação devido às discussões sobre o que deveria serfeito com os espólios daguerra. Temendo que asterras seriam dadaspara a elite pitagórica, o povo de Crotona começou a protestar. Jáhavia um certo ressentimento entre as massas porque a Irmanda-

de continuava a ocultar suas descobertas, mas nada aconteceu atéque Cilon surgiu como o porta-voz do povo.Ele alimentou os te-mores, a paranóia e a inveja da multidão, liderando-a num ataquepara destruir a mais brilhante escola de matemática que o mundojá vira. A cas~de Miloe a escola adjacente foram cercadas, todas asportas trancadas e bloqueadas para evitar que alguém escapasse, eentão o incêndio começou. Mito abriu caminho para fora das cha-mas e escapou, mas Pitágoras morreu com muitos dos seus discí-pulos.

A matemática tinha perdido seu primeiro grande herói, mas oespírito pitagórico permaneceu. Os números e suas verdades eram

imortais. Pitágoras tinha demonstrado que, mais do que qualqueroutra disciplina, a matemática não é subjetiva. Seus discípulos nãoprecisavam de seu mestre para decidirem quanto àvalidade de umadeterminada teoria. A verdade era independente de opiniões. E aconstrução da lógica matemática se tornara o árbitro da verdade.Esta foi a maior contribuição de Pitágoras para a civilização - ummeio de conquistar uma verdade que está além das fraquezas dojulgamento humano.

Depois da morte de seu fundador e do ataque de Cilon, a Ir-mandade deixou Crotona e partiu para outras cidades da MagnaGrécia. Mas as perseguições continuaram e muitos membros ti-

veram que se refugiar no estrangeiro. Esta emigração forçada en-corajou os pitagóricos a espalharem seu credo matemático pelomundo antigo. Os discípulos de Pitágoras estabeleceram novasescolas e ensinaram aos seus alunos os métodos da prova lógica.Além de ensinar.em sua prova do teorema de Pitágoras, eles tam-bém explicaram ao mundo o segredo de encontrar os tr ios pita-góricos.

Os trios pitagóricos são combinações de três números inteirosque se ajustam perfeitamente à equação de Pitágoras:   l+ yl = Zl

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48 o ÚI;rI:\ O TEORE:\IADE FER:\L\T

Por exemplo, a equação de Pitágoras é verdadeira se x = 3,y = 4 ez = 5:

32 + 42 = SI 9 + 16= 25.

Outro modode pensar nos trios pitagóricos é relacioná-Iosao atode rearrumarquadrados. Setemos um quadrado de 3x 3 feito de 9ladrilhose um de 4 x 4 feito de 16ladrilhos,então os ladrilhos po-dem serrearrumados para formarum quadrado de 5x 5 feitode 25ladrilhos, como mostrado na Figura4.

Os pitagóricosqueriam encontrar outros trios pitagóricos,ou-tros quadradosque pudessem ser somadospara formarum terceiroquadrado maior. Outro trio pitagórico é :x= 5,y = 12e z = 13:

5 2 + 122 = 132 25 + 144 = 169.

...~..32

9

4216

5225

=+ =

Figura 4. Podemos imaginar a busca de soluções com números in-teiros para a equação de Pitágoras como a busca de dois quadradosque possam ser somados para formar um terceiro quadrado. Por exem-plo, o quadrado feito de 9 ladrilhos pode ser somado aoquadradode 16ladrilhos e rearrumado para formar um terceiro quadrado de25 ladrilhos.

 ~CHOQUEvou PARARPORAQUI 49

Um trio pitagórico maior é x = 99,y = 4.900e z = 4.901. Ostrios pitagóricos se tornam raros à medida que os números aumen-tam, e encontrá-Ios se torna cada vez mais difícil. Para descobrirtantos trios quanto possível, os pitagóricos inventaram um méto-do d,eencontrá-Ios e, ao fazê-Ia, também demonstraram que há umnúmero infinito deles.

 o Teorema de Pitágorasao Último Teorema de ermat

O teorema de Pitágoras e sua infinidade de trios foram abordadosno livro O último problema de E. 1: Bell, que despertou a atençãodo jovem Andrew Wiles. Embora a Irmandade tivesse conseguidoum entendimento quase completo dos trios pitagóricos, Wiles logodescobriria que a equação Xl + y2 = Z2 aparentemente inocente,

tinha um lado negro. E o livro de Belldescrevia a existência de ummonstro matemático.

Na equação de Pitágoras os três números, x y e z são todoselevados ao quadrado (por exemplo, X2= x Xx ):

X2 + y2 = Z2.

Contudo, o livrodescrevia uma equaçãoparecida na qualx y e zsãoelevadosao cubo (ou seja,x3 = x Xx x x . Apotência de x naequaçãonão é mais2 e sim 3:

X3+ y3 = Z3.

Encontrarnúmeros inteiros que solucionema equaçãooriginal,ouseja,os trios pitagóricos,é relativamentesimples, masaomudar apotênciade 2 para 3 (doquadradoparao cubo) e encontrar núme-ros inteiros que satisfaçam a equação cúbica parece impossível.Geraçõesdematemáticosnãoconseguiramencontrar números quese encaixassemperfeitamente na equa'çãoelevadaao cubo.

Na equação original, quadrada , o desafio era rearrumar os

o ÚLTI; \IO TEOREi\1A DE FER:\ IAT:ACHO QUE VOU PARAR POR AQU I 51

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ladrilhos dedois quadrados para formar um terceiro quadrado maior.Na versão ao cubo o desafio é rearrumar dois cubos, feitos de

tijolos, para formar um terceiro cubo, maior. Aparentemente nãoimporta que tipos de cubos sejam escolhidos como ponto de parti-da, quando eles são combinados o resultado ou é um cubo com-pleto com alguns tijolos sobrando, ou um cubo incompleto. O mais

próximo que alguém já chegou de um arranjo perfeito foi aqueleem que sobra ou falta um tijolo. Por exemplo, se começarmos comos cubos de 63  X3) e 83() 3) e rearrumarmos os ti jolos, então che-gamos perto de construir um cubo de 9 x 9 x9, como mostrado naFigura 5.

Encontrar três números que se encaixem perfeitamente na

equação ao cubo parece impossível. Ou seja, dizemos que não hásoluções para números inteiros da equação

X3 + ) 3 = Z3.

+

63216

83512

93-1729-1

=+ =

Figura 5,Será possíveljuntar ostijolos dedois cubos demodo a formarum terceiro cubo ainda maior? Neste caso um cubo de 6 x 6 x 6 so-mado aocubo 8 x 8 x 8 não possui t ijolos suficientes para criar umcubo de 9 x 9 x9 . Existem 216 w) tijolos no primeiro cubo e 512

(83)no segundo. O total é 728 tijolos, faltando, assim, um para com-pletar 9~.

Alémdisso, se a potência for mudada de 3 (cubo) para qual-quer número mais alton (ou seja, 4, 5, 6), então a descoberta deuma solução se torna igualmente impossível.Parecemnão existirsoluçõescom números inteiros para a equaçãomais geral

X + y = Z para n maior do que 2.

Ao meramente trocar o 2 da equação de Pitágoras por qualquernúmero maior, a busca por soluções para números inteiros deixade ser um problema relativamente simples e se torna um desafioimpossível. De fato, o grande matemático francês do século XVII,Pierre de Fermat, fez a espantosa afirmação de que não existiriamsoluções para esta equação.

Fermat foi um dos matemáticos mais brilhantes e intrigantesda história. Ele não poderia ter verificado a infinidade. de números,mas tinha certeza absoluta de que não existiam combinações de .

números inteiros capazes de solucionar a equação, com base em

uma demonstração. Como Pitágoras, que não precisou checar to-tiosos triângulos para demonstrar a validade de seu teorema, Fermatnão tinha que testar todos os números para mostrar a validade doseu teorema. O Último Teorema de Fermat, como é conhecido, de-clara que

x + y = zI

não tem solução no campo dos números inteiros para 11maior doque 2.

Amedida que lia o livro de Bell ,Wiles aprendia como Fermat setornara fascinado pelo trabalho de Pitágoras e passara a estudar aforma subvertida de sua equação. Depois ele leu como Fermat afir-mara que nenhum matemático em todo omundo jamais conseguiriauma solução para a equação, mesmo que passasse toda a eternida-de procurando por ela. O menino deve ter folheado as páginas dolivro,queren.do examinar a prova do Último Teorema de Fermat.Mas a demonstração não estava lá. Não estava em parte alguma.

o ( I : J DlO TEORE~I:\ DE FER~I: \T

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Bellterminava o livro dizendo que a demonstração fora perdida hámuito tempo. Não havia nenhum indício de como poderia ter sido,nenhuma pista para a construção ou dedução daprova.Wilesse sentiufrustrado, intrigado e furioso. E não estava sozinho.

Durante mais de trezentos anos, muitos dos grandes matemá-ticos tentaram redescobrir a prova perdida de Fermat e fracassa-

ram. E à medida que cada geração fracassava, a próxima se tornavacadavez mais frustrada e determinada. Em 1742, quase um século

depoi5 da morte de Fermat , o matemático suíço Leonhard Eulerpediu ao seu amigo Clêrot para que vistoriasse a casa de Fermat, àprocura de algum pedaço.de papel que pudesse ter restado. Masnenhum indício foi encontrado.

O Último Teorema de Fermat , um problema que fascinara osmatemáticos durante séculos, capturara a imaginação do jovemAndrew Wiles. Na biblioteca da rua Milton, o menino de dez anos

olhou para o mais célebre problema de matemática sem se sentirintimidado com o fato de que as mentes mais brilhantes do plane-

ta não tinham conseguido redescobrir sua prova. O menino come-çou a trabalhar imediatamente, usando todas as técnicas em seuslivrosescolares, para tentar recriar a demonstração. Talvez ele pu-desse tropeçar em alguma coisa que todos osoutros, exceto Fermat,tinham deixado passar despercebida. Wilcs sonhava em assombraro mundo.

Trinta anos depois Andrew Wiles encontrava-se no auditório doInstitUto Isaac Newton. Ele escrevia no quadro-negro, e então, pro-curando conter sua alegria, olhava para a platéia. A palestra estava

che~ando ao cl ímax e a audiência sabia disso. Uma ou duas pes-soas tinham conseguido trazer câmeras escondidas e agora fl sh smarcavam as observações finais.

Com o giz namão,Wiles virou-se para o quadro pela última vez.

Algumas linhas finais de lógica completaram a prova. Pela primei-ra vez,em mais de três séculos, o desafio de Fermat fora vencido.Houvemais alguns clarões defl sh s tentando captar o momentohiglórico.Wiles terminou, virou-se para a audiência e disse commodéstia: Achoque vou parar por aqui.

Duzentos matemáticos bateram palmas celebrando o aconte-

 i\CIIO QUE VOU PARARPOR AQUI

cimento. Mesmo aqueles que tinham previsto o resultado sorriamincrédulos. Depois de três décadas Andrew Wiles acreditava terconquistado seu sonho, e após passar sete anos em isolamento ti-nha revelado seus cálculos secretos. Enquanto um clima de eufo-ria tomava conta do Instituto Newton, todos percebiam que a de-monstração ainda teria que ser verificada rigorosamente por umaequipe independente de juízes. Contudo, Wiles desfrutava do seumomento de glória e ninguém poderia prever a controvérsia que oaguardava nos próximos meses.

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-~~. :~::-~~~;=\-~:::-: ~.~ - ~~-=

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- n. .-. :. _ . . 2 

o Criador de Enigmas--

- ~

~

 Você sabe , admitiu o Diabo, nem mesmo os melhores

matemáticos de outros planetas, todos muito mais avançados

que o seu, conseguiram resolvê-Io.Tem um sujeito em Saturno,ele parece um cogumelo sobre pernas de pau, que resolve

mentalmente equações diferenciais parciais, e mesmo eledesistiu.

--

. -Arthur Poges em O Diabo e Simon Flagg -,

\

iI

Pierre de Fermat

Pierre de Fermat nasceu em 20 de agosto de 1601, na cidade de

Beaumont-de-Lomagne, no sudoeste daFrança. Seu pai,Dominique

Fermat, era um rico mercador de peles, e assim Pierre teve a sorte

de receber uma educação privilegiada no monastério franciscanode Grandselve, seguido por uma passagem pela Universidade de

Toulouse. Não há nenhum registro de que o jovem Fermat mos-

trasse qualquer talento especial para a matemática.

As pressões de sua família levaram Fermat para o serviço pú-blico,e em 1631ele foinomeadoconseillerauParlementde bulouse

conselheiro na Câmara de Requerimentos. Se algum cidadão local

quisesse fazer um requerimento -aoRei, sobre qualquer assunto,

primeiro ele tinha que convencer Fermat e seus colegas da impor-

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56. o ÚLTI~IO TEORE~IA DE FER:\IAT o CRIADOR DE ENIGMAS

tância dopedido. Os conselheiros formavam um elo vital entre aprovíncia e Paris. Além de servirem de intermediários entre a po-pulação c o monarca, os conselheiros também tomavam providên-cias para que os decretos reais fossem implementados nas váriasregiões. Fermat foi um servidor público eficiente, e todos os rela-

tos dizem que ele realizava seu trabalho de modo atencioso e com-passIvo.As tarefas adicionais de Fermat incluíam prestar serviço como

juiz e eleera suficientemente graduado para lidar com oscasos maisgraves. Um registro de sua atuação é dado pelo matemático inglêsSi KencIm Digby.Digby tinha solicitado um encontro com Fcrmat,mas em uma carta para seu colega,JohnWallis,ele revelaque o francêsestivera ocupado com questões do judiciário, que eliminavam apossibilidade do encontro:

várioscolegas.Mas logodepois se corrigiu numa carta para o ho-landês Nicholas Heinsius:

Eu o informei anteriormente da morte de Fermat. Ele ainda

está vivoenãotememosmaispor suasaúde, muitoemborajáo considerássemosmortohá pouco tempo.Apragajá passoupor aqUI.

É verdade que eu tinha escolhido adata damudança dos juízes

de Castres para Toulouse, onde ele Fermat) é o Juiz Supre-mo na Corte Soberana do Parlamento. E desde então ele tem

estado ocupado com casos da maior importância, e acabou de

lavrar uma sentença que causou grande comoção, mandando

queimar na fogueira um sacerdote que abusou de suas fun-ções. Esse julgamento acaba de terminar e o condenado foiexecutado.

Além dos perigos para a saúde na França do século XVII,Fermat

tinha que sobreyiver aos riscos da polít ica. Sua nomeação para oParlamento de Toulouse tinha sido três anos depois do CardeàlRichelieu ser apontado primeiro-ministro da França. Aquela era umaépoca de intrigas e tramas e todos os que estavam envolvidos nogoverno, mesmo no governo da província, tinham que tomar cui-dado para não serem envolvidosnas maquinações do cardeal. Fermatadotou a estratégia de cumprir com suas obrigações de modo efi-

ciente, mas sem chamar a atenção para si mesmo. Ele não tinhagrandes ambições polí ticas e fez o melhor que podia para evitar asdisputas do Parlamento. Fermat dedicava toda a energia que lhesobrava à matemática e, quando não estava mandando sacerdotespara a fogueira, ele cuidava do seu hobby Fermat era um verdadei-ro.estudioso amador, um homem que E. T. Bell chamou de Prín-cipe dos Amadores . Mas era tão talentoso que, quando JulianCoolidge escreveu sua Matemática dos grandes amadores ele ex-cluiu Fermat, dizendo que fora tão grande que devia ser conside-rado profissional .

No começo do século XVII, a matemática ainda se recuperava

da Idade das Trevas e não era um assunto muito respeitado. Osmatemáticos não tinham muito prestígio e a maioria tivera quecustear seus próprios estudos. Por exemplo, Galileu foi incapaz deestudar matemática na Universidade de Pisa e teve que buscar umprofessor particular. De fato, a única instituição na Europa queencorajava o estudo da matemática era a Universidade de Oxford,que criaria uma Cadeira Saviliana de Geometria em 1619. Portan-to, de certo modo, é verdade dizer que a maioria dos matemáticosdo século XVIIeram amadores, mas Fermat era um caso extremo.

Fermat se correspondia regularmente comDigby eWallis.Mais tardeveremos que essas cartas freqüentemente não eram muito amigá-veis, mas elas fornecem indícios vitais sobre avida diária de Fermat,

incluindo seu trabalho acadêmico.Fennat teve uma ascensão rápida em sua carreira de servidor

público e logo se tornou membro da elite, o que lhe permitia usaro de como parte de seu nome. Sua promoção não foi necessaria-mente o resultado de ambição e sim uma questão de saúde. A pra-ga estava devastando a Europa e aqueles que sobreviviam à doençaeram promovidos para ocupar os lugares dos que tinham morrido.Mesmo Fermat ficou seriamente doente em 1652 e piorou tantoque seu amigo Bernard Medon chegou a anunciar sua morte para

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S8 o ÚLTIJ \IO TEOREJ\ IA DE FERJ\L\T

Vivendolonge de Paris, ele estava isolado da pequena comunidadede matemáticos que existia na capital, a qual incluía nomes comoPascal, Gassendi, Roberval, Beaugrand e principalmente o padreMarin Mersenne.

Embora padre Mersenne tenha sido responsável por poucosavanços nesta ciência, ele desempenhou um grande papel na ma-temática do século XVII.Depois de entrar para a ordem Mínima,em 1611,Mersenne estudou matemática e depois deu aulas paraoutros mongcs c freiras no convento Mínimo em Ncvers. Oito anosdepois ele se mudou para Paris, juntando-se à ordem Mínima del'Annociade, perto do palácio real, um ponto de encontro dos inte-lectuais. Mersenne encontrou-se com outros matemáticos mas fi-

cou desapontado com a relutância em falar com ele ou mesmo tro-carem idéias entre si.

A natureza reservada dos matemáticos parisienses era uma tra-dição que chegara a eles a partir dos cosistas do século XVI. Os

cosistas eram especialistas em cálculos de todos os tipos, freqüen-temente contratados por homens de negócios e comerciantes pararesolver complicados problemas de contabilidade. Seu nome de-riva da palavra italiana cos que significa coisa , porque eles usa-vam símbolos para representar quantidades desconhecidas, domesmo modo como os ma:temáticos usam o x hoje em dia. Todosesses calculistas profissionais inventavam seus métodos para fa-zer cálculos, fazendo todo o possível para mantê-los secretos demodo a proteger sua reputação de serem os únicos capazes deresolver certos problemas. Esta natureza sigilosa da matemáticacontinuou até o fim do século XIX e, como veremos depois, exis-

tem até me~mlOcxcmplos de gênios secretos trabalhando no sé-culo xx.

Quando padre Mcrsenne chegou em Paris, ele estava deter-minado a lutar contra este costume de sigilo e tentou encorajaros matemáticos a trocarem idéias, aperfeiçoando os trabalhos unsdos outros. O monge organizou encontros regulares e seu grupodepois formou o núclco do que seria aAcademia Francesa. Quandoa19uérn se recusava a comparecer, Mersenne contava ao grupo oquc podia sobre o trabalho da pessoa em questão, divulgando in-

o CRIADOR DE ENIGMAS 59

clusive cartas e documentos, mesmo que tivessem sido enviadas \

para ele com pedido de sigilo. Este não era um comportamento I

ético para um homem do clero, mas ele justificava dizendo que atroca de informações beneficiaria a humanidade e a matemática.Tais atos de indiscrição causaram vários desentendimentos en-

tre o gentil monge e as taciturnas prim donn s acabando pordestruir a amizade de Mersenne com Descartes, um relaciona-mento que durava desde que os dois tinham estudado juntos nocolégio jesuíta de La Fleche. Mersenne revelou escritos filosófi-

cos de Des.cartes que poderiam ofender a Igreja, mas para seucrédito ele -defendeu Descartes dos ataques teológicos, como jáfizera no caso de Gali leu.

Mersenne viajou pela França e pelo exterior divulgando as últi-mas descobertas. Em suas viagens ele tentou se encontrar com Pierrede Fermat e acabou se tornando o último contato de Fermat com

outros matemáticos. A influência de Mersenne sobre o Príncipe dos

Amadores deve ter sido significativa, e sempre que estava impos-sibili tado de viajar o padre mantinha sua amizade com Fermat e os

outros escrevendo muito. Depois da morte de Mersenne, seu quartofoi encontrado atulhado de cartas enviadas por setenta e oito cor-

respondentes diferentes. IApesar dos esforços do padre Mersenne, Fermat se recusava a - I

revelarsuas demonstrações.A publicação e o reconhecimento pú-  

blico nada significavampara ele. Fermat ficavaplenamente satis- I

feito em criar novos teoremas sem ser perturbado. Contudo, o gê-nio tímido e retraído tinha um toque travesso, o qual, combinadocom o sigilo, levava-o a comunicar-se com outros matemáticosunicamente para zombar deles. Fermat escrevia cartas enuncian-

do seu mais recente teorema, sem fornecer a demonstração. De-pois desafiava seus contemporâneos a encontrarem a prova do seuteorema. E o fato de que ele nunca revelava suas próprias provascausou muita frustração. René Descartes chamou Fermat de fan-

farrão , enquanto o inglês John Wallisse referia a ele como aque-lemaldito francês . Infelizmente, para o inglês, Fermat parecia terum prazer especial em se divertir com seus primos do outro ladodo canal.

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60 o (q : rJ :\ IO TEORE: \\ ,\ DE FER: \\ ;\T

Além de ~ostar de aborrecer os seus colegas, o hábito deFermat de enunciar um problema e depois esconder a solução

tinha motivações mais práticas. Primeiro, significava que ele nãoteria que perder tempo descnvolvendo completamente os seus

métodos, podendo prosseguir diretamente para sua próxima con-quista. Além disso, ele não tinha que sofrer com críticas invejo-sas. As demonstrações, quando publicadas, seriam examinadase avaliadas por todos aqueles que julgavam conhecer alguma coisado assunto. Quando Blaise Pascal o pressionou para que publicassealguns de seus trabalhos, o recluso respondeu: Eu não queroque meu nome apareça em qualquer trabalho meu que seja consi-derado digno de ser publicado. Fermat era o gênio retraído, quesacrificava a fama de modo a não ser distraído por picuinhas comseus críticos.

Essatroea de cartas com Pasealfoia Únicaocasiãoem que Fermatdiscutiu idéias com outra pessoa que não Mersenne, sobre a cria-

ção de um novo ramo da matemática, a teoria da probabilidade. Oeremita matemático ficou conhecendo o assunto através de Pascal,

e assim, apesar do seu desejo de isolamento, ele se sentiu obriga-do a manter o diálogo. Juntos, Fermat e Pascal descobririam as

primeiras provas e certezas da teoria da probabilidade, um assun-to intrinsecamente incerto. O interesse de Pascal fora despertado

por um jogador profissional parisiense, Antoine Gombaud, o Ca-valheiro de Méré, que lhe apresentou um problema relacionado com

um jogo de azar chamado p l tos .Ojogo envolveganhar pontos numjogo de dados, onde o primeiro jogador a acumular certo nÚmero

de pontos é o vencedor e levao dinheiro.Gombaud estivera jogando com um colega quando foi forçadoa sair devido a um compromisso urgente. Surgiu então a questão

do que fazer com o dinheiro. A solução mais simples seria dar todoodinheiro para ojogador com maispontos, mas Gombaud perguntoua Pascal se havia um modo mais justo de dividir o dinheiro. Pascaldeveria calcular a probabilidade que cada jogador teria de vencerse ojogo tivesse continuado e presumindo-se que ambos osjoga-dores tivessem chances iguais. O dinheiro envolvido seria entãodi,idido de acordo com essas probabilidades calculadas.

o CRIADOR DE ENIGMAS

Antes do século XVII as leis da probabilidade eram definidaspela intuição e a experiência dos jogadores. Pascal começou uma

. trocade correspondênciacomFermat como objetivodedescobriras lcis matemáticas que mais precisamente descrevessem as leisdo acaso. Três séculos depois Bertrand Russell iria comentar esta

aparente contradição: Como podemos falar em leis do acaso? Nãoseria o acaso a antítese de toda lei? .O francês analisou apergunta de Gombaud e logopercebeu que

se tratava de um problema relativamente simples. Ele poderia serresolvido def.inindo-se, rigorosamente, todos os resultados possí-veis do jogo e estabelecendo-se para cada um uma probabilidade.Pascal e Fermat eram capazes de resolver independentemente oproblema de Gombaud, mas sua colaboração apressou a descobertadeuma solução e os levou a uma exploração mais profunda de ou-tras questões mais sutis e sofisticadas, relacionadas com a proba-bilidade.

Os problemas da probabilidade às vezes provocam contro-vérsias porque a resposta matemática, a verdadeira resposta, éfreqüentemente contrária ao que a intuição poderia sugerir . Ofracasso da intuição é talvez surpreendente, porque a sobrevi-vência do mais apto deveria produzir uma forte pressão evolutivaa favor de um cérebro naturalmente capaz de analisar os pro-blemas da probabilidade. Podemos imaginar nossos ancestraisseguindo a tri lha de um jovem cervo e pesando as probabilida-des de um ataque bem-sucedido. Qual seria a chance do animaladulto estar por perto, pronto a defender o seu filhote ferindo oatacante? Ou, por outro lado, qual seria a chance de surgir uma

presa mais fácil se esta for considerada muito arriscada? Umtalento para analisar as probabilidades deveria ser parte de nossaestrutura genética, e no entanto, freqüentemente, a intuição nosengana.

Um dos maiores problemas de probabilidade contra-intuitivaéa chance de partilhar com outra pessoa o mesmo dia de aniversá-rio~Imagine-se um campo de futebol com 23 pessoas, dois timesde 11jogadores e ojuiz. Qual é a probabilidade de que duas dessas23pessoas façam aniversário no mesmo dia? Com 365 dias para

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escolher e apenas 23pessoas, parece altamente improvável que duasdelas tenham o mesmo dia de aniversário.

A maioria das pessoas calcularia a chance disso acontecer emtorno dos 10 . De fato, a resposta correta é um pouco maior doque 50 - ou seja, na balança das probabilidades, é mais prová-vel que duas pessoas naquele campo façam aniversário no mes-

mo dia.A razão para esta probabilidade alta é que o número de pes-

soas envolvidas não importa tanto, o que vale é o número de paresque se pode fazer com essas pessoas. Quando buscamos um ani-versário compartilhado, estamos procurando parcs de pessoas,não indivíduos. Embora existam apenas 23 pessoas no campo,com elas podcmos formar 253 duplas difercntes. Por exemplo,a primeira pessoa pode formar uma dupla com qualquer umadas outras 22 pessoas, dando 22 duplas para começar. Então osegundo indivíduo pode formar dupla com os restantes 21 Uá

contamos o par formado pela primeira pessoa com a segunda,de modo que o número de duplas possíveis é reduzido em umaunidade). Temos então mais 21 duplas. Depois a terceira pes-soa pode formar duplas com qualquer um dos 20restantes, soman-do mais 20 pares possíveis, e assim por diante, até chegarmos a253 duplas.

Ainda restam outras etapas para se calcular aprobabilidade exata,mas com 253pares e 365dias de aniversário possíveis não nos pa-rece mais tão improvável encontrar dois indivíduos nascidos nomesmo dia. De fato a probabilidade de se compartilhar o aniversá-rio com alguém num grupo de 23pessoas é exatamente 50,7 . Isto

parece intuitivamente errado, e no entanto a matemática é impe-cável.Jogadores e agenciadores de apostas contam com essas pro-babilidades estranhas para explorar os incautos.

Fermat e Paseal determinaram as regras essenciais que go-vernam todos osjogos de azar e que podem ser usadas pelos joga-dores para estabelecerem melhores estratégias e jogadas perfeitas.Além disso, as leis da probabilidade encontraram aplicações emuma série de situações, das especulações no mercado de açõesà estimativa da possibilidade de ocorrer um acidente nuclear.

I

Pascal estava até mesmo convencido de que poderia usar s,

teorias para justificar a crença em Deus. Ele declarou quelempolgação que um jogador sente quando faz uma aposta, é ig]à quantia que ele pode ganhar multiplicado pela probabil id~de obtê-Ia . Ele então argumentou que o prêmio de uma; feli

l

ade eterna tem um valor infinito e que a probabilidade deentrar na céu, levando-se.uma vida virtuosa, não importa q~pequena, é certamente finita. Portanto, de acordo com'a defi~ção de Pascal, a religião é umjogo de entusiasmo infinito, e lijogo que vale a pena jogar, porque se multiplicarmos um

~

.

mioinfinitopor umaprobabilidade finita, teremos o infinito coresultado.

Alémde serumdos autores da teoriadaprobabilidade,Feresteve profundamente envolvidona criação de outro campo

1

matemática, o cálculo. Cálculo é a capacidade de se calcular

taxa com que uma quantidade (chamada de derivada) muda e

relação à outra. Por exemplo, a taxa com que a distância muem relação ao tempo é conhecida, simplesmente, como velocdade. Para os matemáticos, as quantidades tendem a ser coisabstratas e intangíveis, mas as conseqüências do trabalho cFermat revolucionariam a ciência. A matemática de Fermat pemitiu que os cientistas entendessem melhor o conceito de VIlocidade e sua relação com outras quantidades fundamentais coma aceleração - a proporção com que a velocidade varia comtempo.

Durante séculos se acreditou que Isaac Newton tinha inventado o cálculo independentemente e sem conhecimento do trabalhl

de Fermat. Mas então, em 1934, Louis Trenchard Moore desco~briu uma nota que decidiu a questão e deu a Fermat o crédito qU1ele merece. Newton escreveu que tinha desenvolvido seu cálcul,

baseado no método de   lo lsi urFermat para estabelecer tangentes . Desde o século XVIIo cálculo tem sido usado para descrevea lei da gravidade de Newton e suas leis da mecânica, que depenclemde distância, velocidade e aceleração.

O desenvolvimento do cálculo e da teoria da probabilidade de

veriaser mais do que suficiente para da~a Fermat um lugar nagalerij

o ÚLTIMO TEOREilL.\DE FElnIAT o CRIADOR DE ENIGMAS 65

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de honra da matemática. Mas suas maiores realizações foram em

outro campo da matemática. Embora o cálculo tenha sido usadopara enviar foguetes para a Lua e a teoria daprobabilidade seja usadapelas companhias de seguros na avaliação dos riscos, a grande pai-xãode Fermat era por um assunto geralmente inúti l- a teoria dosnúmeros. Fermat era obcecado em entender as propriedades e re-lações entre os números. Esta é a forma mais pura e antiga dematemática, e Fermat estava ampliando um conhecimento que lhefora legado por Pitágoras.

  volução da Teoria dos Números

Depoisda morte de Pitágoras, a idéia da demonstração matemá-tica se espalhou rapidamente pelo mundo civilizado. Dois sécu-los depois do incêndio de sua escola, o centro do estudo da mate-

mática tinha se mudado de Crotona para a cidade de Alexandria.No ano0332a.C., depois de conquistar a Grécia, a Ásia Menor e oEgito, Alexandre, o Grande, decidiu construir uma capital que seriaa cidade mais imponente do mundo. Alexandria foi de fato umametrópole espetacular, mas só depois se tornaria um centro deestudos. Somente quando Alexandre morreu e Ptolomeu I subiuao trono do Egito é que Alexandria se tornou o lar da primeirauniversidade do mundo. Matemáticos e outros intelectuais emi-

graram para a cidade e, embora eles fossem certamente atraídospela reputação da universidade, a atração principal era a Biblio-teca de Alexandria.

A Biblioteca fora idéia de Demétrio Falem, um orador impo-pular, que fora forçado a deixar Atenas e acabou encontrando asiloem Alexandria. Ele convenceu Ptolomeu a reunir todos os gran-

des livros, assegurando-lhe que as grandes mentes viriam atrásdeles. Depois que osvolumes do Egito e da Grécia estavam colo-cados na Biblioteca, agentes vasculharam a Europa e a Ásia Me-nor em bm~cade outros volumes de conhecimentos. Até mesmo

Ogviajantes que chegavam cm Alcxandria não escapavam do ape-tite voraz da Biblioteca. Quando chegavam na cidade, seus livros

,

eram confiscados e levadospara osescribas. Os livroseram copiados Ide modo que, enquanto o original ia para o acervo da Biblioteca, Iuma duplicata era dada ao dono. Esse meticuloso serviço de du-plicação para viajantes dá aos historiadores de hoje a esperançade que algum grande texto perdido vá aparecer um dia em algumlugar do mundo, no sótão de uma casa. Em 1906, J. L. Heibergdescobriu um manuscrito assim em Constantinopla. Trataya-sede O método volume contendo alguns dos escri tos originais deArquimedes.

O sonho de Ptolomeu, de criar uma casa do conhecimento,

sobreviveu  à suamorte.Depoisqueoutros Ptolomeusascenderamaotrono do Egito, a Biblioteca continha cerca de 600 mil livros. Osmatemáticos podiam absorver todo o conhecimento do mundoestudando em Alexandria. E lá, para ensiná-Ios, estavam os maisfamosos professores. O primeiro diretor do departamento de ma-temática foi ninguém menos do que Euclides. I

Euclides nasceu no ano 330 a.C. Como Pitágoras, ele acredita-va na busca pela verdade matemática pura e não buscava aplica-ções para o seu trabalho. Uma história fala de um estudante queindagou aomestre sobre a utilidade damatemática que estava apren-dendo. Depois de terminar a aula, Euclides virou-se para seu es-cravoe disse: Dê uma moeda aorapaz, já que ele deseja ter lucroscom tudo o que aprende. E depois o estudante foi expulso.

Euclides dedicou boa parte de sua vida ao trabalho de escrever Ios Elementos o livro-texto mais bem-sucedido de toda a história.Até este século tratava-se do segundo maior best seller mundialdepois da Bíblia. Os Elementos consistem em treze livros, alguns

dedicados aos trabalhos do próprio Euclides, e os demais sendo umacompilação do conhecimento matemático de sua época, incluindodois volumes dedicados inteiramente aos trabalhos da Irmandade

Pitagórica.Nos séculos a partir de Pitágoras, os matemáticos tinhaminventado uma grande variedade de técnicas lógicas que podiamser aplicadas em diferentes circunstâncias. E Euclides habilidosa-mente as usou todas nos Elementos Em particular, ele explorouuma arma lógica conhecida como reductio ad absurdum ou provapor contradição.

( ) ÚLTIMO I 'EOREl \IA DE FERMAT

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66 O CRIADOR DE ENIGMAS 61

Suaabordagem envolvea idéiaperversa de provarque um teoremaé verdadeiro, presumindo primeiro que ele seja falso. O matemáti-coentão explora as conseqüências lógicas do teorema ser falso. Emalgum ponto ao longo da seqüência lógica existe uma contradição(por exemplo, 2 + 2 = 5). A matemática abomina a contradição e,portanto, o teorema original não pode ser falso, ou seja, ele deveser verdadeiro.

O matemático inglês G. H. Hardy resumiu o espíri to da redu-ção aoabsurdo em seu livroApologia do matemático: Reductio ad

absurdum que Euc1ides amava tanto, é uma das melhores armasdomatemático. É um desafio muito melhor do que qualquer jogode xadrez. O jogador de xadrez pode oferecer o sacrifício de umpeão ou de uma peça mais importante, mas o matemático ofereceo jogo inteiro.

Uma das mais famosas provas de Euc1ides, por redução aoab-surdo, estabelece a existência dos chamados números irracionais.

Suspeita-se de que os números irracionais teriam sido descober-tos pela Irmandade Pitagórica séculos antes, mas a idéia era tão re-pugnante para Pitágoras que ele negou sua existência.

Quando Pitágorasafirmava que o universo é governado pornúmeros, ele se referia a números inteiros e proporções entre nú-meros inteiros (frações), tudo isto conhecido como números ra-cionais. Um número irracional é um número que não é nem in-teiro nem fração c isso é o que o tornava tão horrível para Pitágoras.De fato, os números irracionais são tão estranhos que não podemser escritos nem como decimais. Um decimal recorrente como

0,111111.. . é, de fato, um número equivalente à fração ~.O fato

de que o algarismo 1 se repete para sempre significa que o deci-mal tem um padrão muito simples e regular. Esta regularidade,embora continue pelo infinito, significa que o decimal pode serreescrito como uma fração. Mas, sevocê tentar expressar um nú-mero irracional como decimal, vai terminar com uma fileira infi-nita de algarismos que não possuem padrão regular ou consis-tente.

A idéia dos números irracionais foi um tremendo avanço. Osmatemáticos olhavam além dos números inteiros e frações e des-

cobriam, ou t lv z inventavam,novosnúmeros. O matemáticodqséculo XIX,Leopold Kronecker, disse: Deus fez os números in~teiros, todo o resto é obra do homem.

O mais famoso dos números irracionais é 1t.Nas escolas sevaloré àsvezesaproximadopara 3 T ou 3 14 Contudo, o valorver

dadeiro de 1testá próximo de 3,14159265358979323846, mas mesmo isso é apenas uma aproximação. De fato, 1t nunca poderá seescrito com exatidão porque a carreira de decimais se prolonga par

~

1

sempre sem apresentar qualquer padrão. Uma bonita característica dessa.estrutura desordenada é que ela pode ser calculada usando-se uma equação que é extremamente regular:

1t=4( _. . +. ._. .+. .-~+J.-_J.-+ .

).

1 3 5 7 9 11' 13 15 ..

Ao calcular os primeiros termos, você pode obter um valor bem

aproximado de 1t,mas, se calcular mais termos, um valor cada vezmais preciso é obtido. Embora o valor de 1taté 39 casas decimaisseja suficiente para calcular a circunferência do universo com uma

precisão equivalente ao raio do átomo de hidrogênio, isso não evi:-tou que cientistas, usando computadores, tentassem calcular 1tcom.o maior número possível de casas decimais. O recorde atual foi

estabelecido por YasumasaKanada, da Universidade de Tóquio, quecalculou 1taté seis bilhões de casas decimais, em 1996. Rumoresrecentes dão conta de que os irmãos Chudnovsky, russos radicadosem NovaYork, teriam calculado 1tpara oito bilhões de casas deci-

mais e estariam tentando chegar a um trilhão de casas decimais.Contudo, mesmo se Kanada ou os irmãos Chudnovsky continuas-

Isem a calcular, até seus computadores esgotarem toda a energiado universo, ainda não encontrariam ovalor exato de 1t.É fácil per-

Iceber por que Pitágoras conspirou para manter oculta a existência

dessas bestas matemáticas. I

Quando Euc1ides se atreveu a confrontar a questão da I

irracionalidade, nodécimo livrodosE/ementas seu objetivoera provar

I

que podem existir números incapazes de serem escritos como fra-

68 o ÚLTIMO TEOREMA DE FER~IATo CR IADOR DE ENIGIVIAS 69

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ções. No lugar de tentar provar que 1té irracional, ele examinou araiz quadrada de dois, fi - ou seja, o número que multiplicadopor simesmo é iguala dois. De modo aprovar que .J2 não pode serescrita como uma fração, Euelides usou o método da reductio ad

absurdu le começou presumindo que o número poderia ser es-crito como fração. Ele então demonstrou que esta fração hipotéti-

ca poderia ser simplificada. (Simplificar uma fração significa, porexemplo, que a fração ~, pode ser simplificada para ~, dividindo-se os números de cim~2e dc baixo por 2. Por sua vez, pode seri

simplificada para ~, que não pode mais ser simplifieada e, portan-to, se diz que a fração se encontra em sua forma mais simples.)Euclides demonstrou então que sua fração simplificada, que aindarepresentaria .J2. poderia ser simplificada não apenas mais umavez, mas um infinito número de vezes sem jamais ser reduzida àsua forma mais simples. Isto é absurdo porque todas as frações devemter a sua forma mais simples e, portanto, esta fração hipotética não

pode existir . Portanto, .J2 não 'pode ser escrita como fração e é umnúmero irracional. Uma visão mais detalhada da demonstração deEuclides pode ser vista noApêndice 2.

Aousar a prova da contradição, Euelides foi capaz de provar aexistência dos númcros irracionais. Pela primeira vez os númerosadquiriam uma qualidade nova e mais abstrata. Até este ponto dahistória todos os números poderiam ser expressos como númerosinteiros ou como frações, mas Osnúmeros irracionais dc Euc1idesdesafiavam a representação na maneira tradicional. Não existe modode descrever o número igual à raiz quadrada de dois exceto expres-sando-o como.J2, porque ele não pode ser escri to como fração, e

qualquer tentativa de escrevê-Io como decimal resulta em uma apro-ximação, por exemplo, 1,414213562373...

Para Pitágoras a beleza da matemática era a idéia de que osnúmeros racionais (frações e números inteiros) poderiam explicartodos os fenômenos naturais. Esta filosofia cegou Pitágoras para aexistência dos números irracionais e pode até mesmo ter levado àexccução de um de seus alunos. Uma história afirma que um jo- cm estudante, chamado Hipaso, estava brincando com a fi , ten-

tando encontrar uma fração equivalente. Até que ele percebeu quetal fração não existia, ou seja, era um número irracional. Hipasodeve ter ficado entusiasmado com sua descoberta, mas seu mestrenão gostou nem um pouco. Pitágoras tinha definido o universo emtermos de números racionais e a existência de números irracionais

questionava seu ideal. A descoberta de Hipaso deveria ter produ-zido um período de debates e contemplação durante oqual Pitágoraspassaria a aceitar esta nova fonte de números. Mas o mestre não'

aceitou a idéia de que pudesse estar errado e ao mesmo tempo foiincapaz de destruir a argumentação de Hipaso pela lógica. Para suaeterna vergonha, Pitágoras sentenciou Hipaso à morte por afoga-mento.

O pai da lógica e do método matemático recorreu à força paranão admitir que estava errado. A negação de Pitágoras aos núme-ros irracionais foi seu ato mais vergonhoso e talvez a pior tragédiada matemática grega. Só depois de sua morte foi que a idéia dos

irracionais pôde ser retomada em segurança.Embora Euelides estivesse claramente interessado na teoria

dos números, ela não foi sua maior contribuição para a matemá-tica. A verdadeira paixão de Euclides era a geometria, e dos trezevolumes que formam seus  lementos os Livros de I a VI concen-tram-se na geometria plana (bidimensional) e os Livros de XI aoXIII lidam com a geometria dos sólidos (tridimensional). Com umconhecimento tão completo, os  lementos foram a base do ensi-

. no da geometria nas escolas e universidades durante os dois milanos seguintes.

O matemático que escreveu um livro equivalente, sobre a teoria

dos números, foi Diofante de Alexandria, o último herói da tra-dição matemática grega. Embora as realizações de Diofante nateoria dos números estejam bem documentadas, quase nada seconhece sobre este matemático formidável. Seu lugar de nasci-mento é desconhecido e sua chegada a Alexandria pode ter sidoem qualquer ano de um período de cinco séculos. Em seus es-

cri tos Diofante cita Hipsicles, logo deve ter vivido depois de 150a.C. Por outro lado, seu trabalho é citado por Teon deAlexandria,portanto Diofante deve ter vivido antes do ano 364 de nossa era

I  I

I

I

I

I I

o CRIADORE ENIGM S

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71

J ) J () 11 r -1i\N r r~ I LEX N RINI, I' I'.' , I '   ... r ' ( 1 ( .) 1 t. o. \ (

\ . ', ' .: .\ i I I.. ..,'.', I

Uma data em torno do ano 250 é geralmente aceita como sendo,

a estimativa mais provável. De acordo com a memória de um

resolvedor de problemas, o único detalhe sobre avida de Diofante

que restou foi um enigma, que dizem ter sido gravado na lápidede seu túmulo:

~ 1 :-'~., .' ;

Deus lhe concedeu a graça de ser um menino pela sexta par-,

te de sua vida. Depois, por um doze avos, ele cobriu seu rosto'

com a barba. A luz do casamento iluminou-o após a sétima

parte c:cinco anos depois do casamento Ele concedeu-lhe um

filho. Ah criança tardia e má, depois de viver metade davida

de seu pai o destino frio a levou.Após consolar sua mágoa em

sua ciência dos números, por quatro anos, Diofante terminousua vida.

L IB RI S E X.

/. I li E R.. v N V S.

:N: .1Itrim; Crl«( (J' i...l; i IJI/i, AlqutA j.l.tiÇi 'C._IIIAnu ;: jh-A//.

 ..C 1 O 1\~ t L , \. :1 In ( .\ Sr \ i 11AC Ji [ , t,>I r Z I ' I AC o 111.' I ,\ N O.., Ç.

o desafioé calcularquanto tempo Diofanteviveu.A respostapode

ser encontrada noApêndice3.Este enigma é um exemplo dotipo de problema que Diofante

apreciava.Ele gostavade resolverquestões que exigiamsoluções

comnúmeros inteiros,e hojetais problemas sãoconhecidoscomoproblemas de Diofante. Sua carreira foi passada em Alexandria,

onde ele reunia problemas bem conhecidos e inventava novos. .

Depois reuniu tudo em seu tratado, inti tulado An'tmética. Dos

treze volumes que formavam aAn'tmética de Diofante, somente Iscis sobreviveramaotumultoda Idadedas Trevase inspiraram'matemáticos da Renascença, incluindo Pierre de Fermat. Os

outros sete livros foramperdidos numa série de acontecimentos

trágicos que enviaram a matemática de volta para a era babilô-DIca.

Durante osséculosentre Euc1idese Diofante,Alexandriacon-

tinuou sendo a capital intelectual do mundo civilizado,mas per-maneceusob a ameaçade exércitosestrangeiros.Oprimeirogran-

de ataque aconteceu no ano 47 a.C., quando Júlio César tentouderrubar Clcópatra incendiando sua frota. A Biblioteca, locali-

zadaperto doporto, também pegou fogoe centenas de milharesde livros foram dcstruídos. Felizmente, para os matemáticos,

1.' .T r TI.' : f' .\ r q o Rv ~,r.

Sumptibu\H IU;.o~n\l D ROVARr. vi.,Iacob.u.fuI,Scuto Solari.

\ I \ I '\ -'0 I

(,T.If 7' R I V il. E G J() R F.C;J I

Frot\~ti~pício da traduçi \Oda /lr;lmét;m ue Diofantc, por Claude

Gaspar Bachct, publicada em 1621. Este livro tornou-se a bíblia de

Fcrmat c inspirou muito do seu trabalho.

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72 () ÚJ;J J:\IO TEOREi\L\ DE FER:\L\T o CRIADOR DE ENIGMAS 73

Clcópatra apreciava a importância do conhecimento e ficou de-terminada em regtaurar a ~lória da llibliolcca. Marco AntÔnio

percebeu que o caminho para o coração de uma intelectual pas-sa por sua biblioteca e assim marchou para a cidade de Pérgamo.Esta cidade t inha começado a montar sua própria biblioteca,

esperando reunir a melhor coleção de l ivros do mundo. MarcoAntônio confiscou tudo e levou para o Egito, restaurando a su-

premacia de Alexandria.Durante os próximos quatro séculos, a Biblioteca continuou

a acumular livros, até que no ano 389 ela recebeu o primeiro dedois golpes fatais, ambos como resultado de intrigas religiosas.O imperador cristão Teodósio ordenou que Teófilo, bispo deAlexandria, destruísse todos os monumentos pagãos. Infelizmente,quando Cleópatra reconstruiu e reequipou a Biblioteca, ela decidiualojá-Ia no Templo de Serápis. E assim a Biblioteca foi jogada nomeio da fúria para a destruição de ícones e altares. Os estudiosos pagãos tentaram salvar seis séculos de conhecimento, mas an-tes que pudessem fazer qualquer coisa foram linchados pela hordade cristãos. O mergulho em direção à Idade das Trevas tinha co-meçado.

Algumas cópias preciosas dos livros mais importantes sobrevi-veram ao ataque dos cristãos, e os estudiosos continuaram a visitarAlexandria em busca de conhecimento. Então, no ano 642, o ata-

que dos muçulmanos terminou aquilo que os cristãos tinham co-meçado. Quando lhe perguntaram o que devia ser feito com a Bi-blioteca, o califa Ornar, vitorioso, declarou que os livros que fossemcontrários aoCorão deveriam ser destruídos. E os livrosque apoias-

sem o Corão seriam supérfluos e, portanto, também deviam serdestruídos. Os manuscritos foram usados como combustível para

as fornalhas que aqueciam os banhos públicos. A matemática gre-gavirou fumaça. Não é de surpreender que a maior parte do traba-lho de Diofante tenha sido destruída. De fato, é um milagre queseis volumes de sua  ritmétic tenham sobrevivido à tragédia deAlcxandria.

Pc10gmil anos seguintes a matemática no Ocidente ficou re-duzida ao básico. Somente alguns luminares na Índia e na Arábia

mantinham esta ciênciaviva.Eles copiaram as fórmulas dos ma-nuscritos gregos quc tinham restado e começarama rcinventar amaioriados teoremasperdidos.Tambémacrescentaramnovosele-mentos à matemática,incluindo o número zero.

Na matemática moderna o zero realiza duas funções. Em pri- ~

mciro lugar, ele nos permite fazer a distinção entre números como \52 e 502. Num sistema onde a posição de um número indica s,eu \valor, é preciso um símbolo para marcar uma posição vazia. Porexemplo, 52significa cinco vezes dez mais duas vezes um, enquanto \502 signifi.ca cinco vezes cem, mais Ove~es dez, mais duas vezes

Im, e o zero é essencial para ret irar qualquer dúvida. Até mesmo

os babilônios, no terceiro milênio a.C., apreciavam o valor do zero I

para evitar confusões, e osgregos adotaram a idéia, usando um sím- \bolo circular, semelhante aoque usamos hoje. Contudo, o zero tem Ium significadomais sutil e pr?fundo, que só foipercebido séculos I

depois pelos matemáticos da India. Os hindus reconheceramque,

o zero tinha uma existência independente, além do mero papel de  marcar espaços entre os números. O zero era um número como osoutros, ele representava a quantificação do nada. E pela primeiravez o conceito abstrato do nada recebia uma representação simbó-lica.

Igto pode parccer uma coisa trivial para o lcitor moderno, mas,

o profundo significado do símbolo zero tinha sido ignorado pelos, i

antigos filósofos da Grécia, incluindo Aristóteles. Ele chegara a .argumentar que o número zero deviaser proibidoporque pertur-bavaa consistência dos demais números - a divisão de um núme-

ropor zero levavaa um resultado incompreensível. Por volta do século

VI,os matemáticos indianos deixaram de esconder este problemadebaixo do tapete, e no século VII um estudioso chamado Brahma-gupta foi suficientemente sofisticado para usar a divisão por zerocomo uma definição para o infinito.

Enquanto a Europa abandonava a nobre busca pela verdade, aÍndia e a Arábia estavam consolidando o conhecimento que foracontrabandeado das cinzas deAlexandria. E o reinterpretavam comuma linguagem novae mais eloqüente. Além de acrescentar o zeroaovocabulário matemático, eles substituíram os primitivos símbolos

74 o ÚLTI: \IO TEOREl\ tA DE FERl\ IAT o CRIADOR DE ENIGMAS 75

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gregos e os incômodos numerais romanos pelo sistema de conta-gem agora adotado universalmente. Novamente isso pode parecerum passo à frente absurdamente humilde, mas é só tentar multi-plicar CLVpor DCI e você vai sentir a importância deste avanço.Multiplicar 155por 601 é muito mais simples. O crescimento dequalquer disciplina depende de sua capacidade de comunicar e

desenvolver idéias. Isto, por sua vez, implica uma linguagem queseja suficientemente detalhada c flexível.As idéias de Pitágoras eEuclides não eram menos elegantes em seu modo de expressãodesajeitado. Mas traduzidas para os símbolos da Arábia iriam de-sabrochar c produzir conceitos novos e mais ricos.

No século V,o estudioso francês Gerbert de Aurillac aprendeuo novosistema de contagem com os mouros da Espanha. Atravésde seu trabalho, ensinando em igrejas e escolas de toda a Europa,ele foi capaz de introduzir o novosistema no Ocidente. No ano 999,Gerbert foi eleito papa Silvestre 11,uma posição que lhe permitiuencorajar ainda mais o uso dos números indo-arábicos. Embora a

eficiência do sistema tenha revolucionado a contabilidade, sendorapidamente adotado pelos mercadores, ele fez pouco para inspi-rar um renascimento da matemática européia.

Esta retomada vital para a matemática ocidental só ocorreriadepois de 1453, quando os turcos saquearam Constantinopla. Atéentão os manuscritos que tinham sobrevivido à destruição deAlcxandria tinham sido reunidos em Constantinopla e novamenteeram ameaçados de destruição. Os estudiosos bizantinos fugirampara o Ocidente com os textos que puderam carregar. Depois desobreviverem ao ataque de César, do bispo Teófilo, do califa Ornar

e agora dos turcos, alguns poucos mas preciosos volumes da Arit-mética chegavam de novo na Europa. Diofante estava destinado aaparecer na escrivaninha de Pierre de Fermat.

vam eram dedicados inteiramente à matemática. Isso acontecia

porque os juízes na França, do século XVII, eram desencorajadosquanto a fazer amizades. Achava-se que amigos e conhecidos po-deriam um dia ser levados a julgamento e qualquer confraterniza-ção com a população local seria um convite ao favoritismo. Isoladoda alta sociedade de Toulouse, Fermat podia se concentrar no seu

hobby.Não há registros de que Fermat tenha adquirido o interes se

pela matemática graças à influência de algum tutor. Foi uma có-pia da Arit11lçticaque se tornou seu mestre. A Aritmética tentava

descrever a teoria dos números, como era no tempo de Diofante,através de uma série de problemas e soluções. De fato, Diofanteestava apresentando a Fermat cerca de mil anos de conhecimen-to matemático. Em um único livro Fermat podia encontrar todo oconhecimento dos números obtido por gênios como Pitágoras eEuclides. A teoria dos números não progredira desde o bárbaroincêndio de Alexandria, mas agora Fermat estava pronto para re-tomar o estudo da mais fundamental de todas as disciplinas ma-temáticas.

A An t11léticaque inspirou Fermat era uma tradução para o la-t im, feita por Claude Gaspar Bachet de Méziriac, que se dizia sero homem mais culto de toda a França. Além de ser um brilhantelingüista, poeta e estudioso dos clássicos, Bachet era fascinado porproblemas matemáticos. Seu primeiro livro foi uma compilação deproblemas intitulada Prob/emes plaisans et délectables qui sefont

par les n011lbresque incluía problemas sobre travessia de rios, umproblema sobre líquidos escoando e vários truques do tipo pense

num número . Havia também um problema sobre pesos:

o  ascimento de um nigma

Qualé o menor número de pesos que pode ser usado numconjunto de balanças para pesar qualquer massa variando de1 a 40 quilogramas?

As responsabilidades de Fermat como magistrado ocupavam umaboa parte do seu tempo. Os curtos períodos de lazer que lhe resta-

Bachet tinha uma solução inteligente mostrando que é possívelrealizar esta tarefa com apenas quatro pesos. A solução é dada noApêndice 4.

76 o ÚI:rI~IO TEOREMJ\DE FER~I T o CRIADOR DE ENIGMAS 77

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Embora fosse apenas um matemático diletante, o interesse deBachet por problemas foi o suficiente para ele perceber que osproblemas de Diofante estavam num nível mais elevado e mere-ciam um estudo mais profundo. Ele resolveu traduzir o livro deDiofante e publicá-Ia, de modo que as técnicas dos gregos pu-

dessem ser retomadas. É importante notar que uma grande par-tc do conhecimento matemático antigo tinha sido esquecida to-talmente. A matemática avançada não era ensinada nem mesmonas grandes universidades européias, e somente graças aos es-forços de estudiosos como Bachet é que tanto pôde ser recupe-rado tão rapidamente. Em 1621,quando Bachet publicou sua versãoem latim da Aritmética ele contribuiu para a segunda era de ouroda matemática.

A An fmética continha mais de cem problemas, e para cadaum Diofante dava uma solução detalhada. Este nível de escrúpulofoi algo que Fermat jamais aprendeu. Fermat não estava inte-

ressado em escrever um livro-texto para asgerações futuras. Elesó queria .a satisfação pessoal de ter resolvido um problema. En-quanto estudava os problemas e as soluções de Diofante, Fermatera levado a pensar em outras questões mais sutis e enfrentá-Ias. Mas limitava-se a escrever o que achava ser necessário paraconvencer a si mesmo de que tinha uma solução e então não seimportava em registrar o resto da demonstração. Freqüentementeele atirava suas anotações no lixo e passava para o problemaseguinte. Felizmente, para nós, a edição daAritmética de Bachettinha grandes margens em torno do texto, em cada uma de suaspáginas, e às vezes Fermat apressadamente escrevia comentá-

rios e fórmulas nessas bordas. Essas notas se tornariam umvaliosíssi mo registro, ainda que esparso, dos mais bri lhantescálculos deste gênio.

Uma das descobertas de Fermat estava relacionada com os

chamados 1llímeros amistosos ou nlÍmeros amigáveis. Eles estãomuito ligados aosnúmeros perfeitos que tinham fascinadoPitágoras,doismil anos antes. Números amigáveis são pares de números ondeum deles é a soma dos divisares do outro. Os pitagóricos tinhamfeito a descoberta extraordinária de que 220 e 284 são números

amigáveis.Os divisoresde 220 são 1,2,4,5, 10, 11,20,22,44,55 e110e a soma deles é 284.Poroutro lado,os divisaresde 284 são 1,2,4,71e 142e a somadelesé 220.

Dizia-se que o par 220 e 284 era um símbolo de amizade. Olivro de Martin Gardner, O show de mágica matemática eontaque talismãs com esses números eram vendidos na Idade Mé-dia. Dizia-se que o uso do amuleto promovia o amor. l)m

. numerologista árabe registrou a prática dc se gravar220 em umafruta e 284 em outra. Então eomia-se a primeira fruta e ofere-

. cia-se a segunda para um parceiro, como forma de afrodisíacomatemático. Antigos teólogos notaram que, no Gênesis, Jacó deu220 cabras para Esaú. Eles acreditavam que o número de cabras,a metade de um par amigável, era uma e.xpressão do amor deJacó por Esaú.

Até 1636não se descobriu nenhum outro par amigável. Foientãoque Fermat descobriu o par 17.296e 18.416.Embora não fosse uma

descoberta profunda, ela demonstra a familiaridade de Fermat eomos números e o quanto ele gostava de brincar eom eles. Fermatcomeçou a mania de se procurar números amigáveis. Descartesdescobriu um terceiro par (9.363.584e 9.437.056) e Leonhard Eulerprosseguiu com a lista encontrando sessenta e dois pares amigá-veis. Curiosamente eles deixaram passar um par muito menor. Em 8 um italiano de dezesseis anos, Nicolõ Paganini, descobriu opar 1.184 e 1.210.

Durante o século XXos matemáticos ampliaram ainda mais aidéia buscando pelos chamados números sociáveis, três ou maisnúmeros que formam um círculo fechado. Por exemplo, no cír-

culo de cinco números formado por 12.496,14.288,15.472,14.536e 14.264,a soma dos divisares do primeiro número dá o segundonúmero, os divisares do segundo número, somados, formam oterceiro, a soma dos divisares do terceiro forma o quarto núme-ro, os divisares do quarto número, somados, produzem o quintoe os divisares do quinto número, quando somados, geram o pri-meiro número.

Embora a descoberta de um novo par de números amigáveistenha feito de Fermat uma celebridade, sua reputação foi con-

78 o ÚLTIMO TEOREi\ IA DE FERI\ IATo CRIADOR DE ENIGMAS 79

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firmada graças a uma série de desafios matemáticos. Por exem-plo, Fermatdescobriu que 26 é o recheio de um sanduíche for-mado por 25e 27, onde o primeiro número é um quadrado 25= 52 =5 x 5 e o outro é um cubo 27 = 33 = 3 x 3 x 3 . Eleprocurou por outros números presos entre um quadrado e um

cubo, mas não encontrou nenhum, e suspeitou de que 26 fosseum casoúnico. Depois dc dias de um esforço cansativo ele con-seguiu construir uma argumentação elaborada provando, semqualqucr dúvida, que 26 é, de fato, o único númcro entrc umquadrado e um cubo. Sua demonstração, passo a passo, esta-belcccu quc nenhum outro número poderia precncher cste cri-tério.

Fermat anunciou csta propriedade única do 26paraa comuni-dade matemáticae desafiou-osa provarque elaera verdadeira.Eleadmitiu abertamente que possuía a demonstração; a pergunta era:será que os outros teriam a habilidade de reproduzi-Ia?Apesar da

simplicidadeda afirmação,ademonstraçãoé tremendamente com-plicada, eFermat se divertiu desafiandoos matemáticos inglesesWallise Digby,que acabarampor admitir que estavamderrotados.Mas a maisfamosaobra de Fermatfoioutro desafiopara o resto domundo. Contudo, seria uma charada acidental,que não era desti-nada à discussão pública.

Pitágoras, tentando descobrir alguma coisa que escapara à aten-ção dos gregos.

Subitamente, num instante de genialidade que imortalizaria oPríncipe dos Amadores, ele criou uma equação que, embora fossemuito semelhante à de Pitágoras, não tinha solução. Foi esta equa-ção que Andrew Wiles, aos dez anos de idade, viu na biblioteca darua Milton.

No lugar de considerar a equação

x2 + y2 = Z2,

Fermat contemplavauma variante da criaçãode Pitágoras:

x3 + y3 = Z3.

 notação na argem

Conforme foimencionado no capítulo anterior, Fermat tinha apenas

mudado a potência de 2 para 3, do quadrado para o cubo, mas suanova equação aparentemente não tinha solução para qualquernúmero inteiro. O método de tentativa e erro logo mostra a difi-culdade de encontrar dois números elevados ao cubo que, ao se-rem somados, produzam outro número elevado ao cubo. Poderiaacontecer desta pequena modificação transformar a equação dePitágoras, com um infinito número de soluções, em uma equa-ção insolúvel?

Fermat alterou ainda mais a equação, trocando a potência paranúmeros maiores do que 3 e descobrindo que a busca de soluçõespara estas equações era igualmente difícil. De acordo com Fermat

parecia não existir um trio de números que se encaixasse perfeita-mente na equação

Enquanto estudava o Livro 11da An lmética, Fermat encontrou todauma série de observações, problemas e soluções relacionadas como tcorema dc Pitágoras e os trios pitagóricos. Fermat ficou impres-sionado com a variedade e a quantidade de trios pitagóricos. Eleestava ciente de que, séculos atrás, Euclides t inha feito uma de-monstração aqui mostrada no Apêndice 5 provando que, de fato,existe um número infinito de triospitagóricos. Fermat deveter olhado

para a exposição detalhada que Diofante fazia dos trios pitagóricose pensado no que poderia acrescentar àquele assunto. Enquantoolhava para a página, ele começou a brincar com a equação de

x + y = z , onde n representa 3,4,5...

Na margem de sua A l1 tmética, ao lado do Problema 8, Fermatescreveu uma nota de sua observação:

 

o út:rmo TEORE:\IA DE FER:\L\To CRIADOR DE ENIGMAS 8

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80

Cubem autem i1lduos cubos aut quadratoqlladratum il1duos

qlladratoquadratos et ge1lera/iter n/lllal1l i1l il1Jinitul1l/lltra

qlladratu111otestatem i1lduos eillsde11lnominisIas est dividere.

o Último Teorema É ublicado inal

É impossível para um cubo ser escri to como a soma de dois

cubos ou uma quarta potência ser escri ta como uma soma dedois números elevados a quatro, ou, em geral, para qualquer

número que scja elcvado a uma potência maior do que doisser escrito como a soma dc duas potências semelhantes.

A notória descoberta de Fermat aconteceu no início de sua carrei-

ra comomatemático, porvolta de 1637.Trinta anos depois, enquantocuidava de seus deveres como magistrado, na cidade de Castres,

Fermat ficou seriamente doente. Em 9 dejaneiro de 1665ele assi-nou seu testamento e três dias depois morreu. Continuava isoladoda escola parisiense de matemática e não era lembrado com sau-dade pelos seus frustrados correspondentes. Havia o risco das des-cobertas de Fermat serem perdidas para sempre. Felizmente, seufilhomais velho, Clément-Samuel, percebia a importância dohobby

de seu pai. Ele decidiu que aquelas descobertas não seriam esque-cidas pelo mundo. É graças aos seus esforços que sabemos algu-ma coisa sobre os avançosextraordinários feitos por Fermat na teoriados números. E, em especial, se não fosse por Clément-Samuel, oenigma conhecido como Último Teorema de Fermat teria morrido

com seu criador.Clément-Samuel passou cinco anos reunindo as cartas e ano-

tações de seu pai e examinando os rabiscos nas margens de suacópia da Aritmética. A nota referindo-se ao Últ imo Teorema deFermat era apenas um dos muitos pensamentos inspirados ano-tados no livro. Clément-Samuel resolveu publicar estas anotaçõesem uma edição especial da Aritmética. Em 1670, em Toulouse,ele apresentou sua Aritmétt ca de Dia/ante contendo observações

de P.de Fermat. Ao lado do original grego e da tradução de Bachetpara o latim, estavam quarenta e oito observações feitas por Fermat.

A anotação mostrada na Figura 6 foi aquela que se tornou conhe-cida como o Último Teorema de Fermat.

Depois que as Observações de Fermat chegaram a uma co-munidade maior, ficou claro que as cartas que ele tinha enviadoaos seus colegas eram meras migalhas num banquete de desco-bertas. Suas notas pessoais continham uma série de teoremas. In-fel izmente, ou esses teoremas não eram acompanhados por ne-nhuma explicação ou tinham apenas indícios dademonstração queos apoiava. Mas havia vislumbres torturantes de lógica que dei-

Entre todos os números possíveis parecia não haver razão por que

pelo menos um conjunto de soluções não poderia ser encontrado.E, no entanto, Fermat declarava que em parte alguma do infinitouniverso de números existiria um trio fermatiano . Era uma afir-

mação extraordinária, mas Fermat acreditava que poderia prová-Ia.Depois da primeira nota na margem, esboçando sua teoria, o gênio

travesso colocou um comentário adicional que iria assombrar ge-rações de matemáticos: .

CUillSrei demonstrationem l1lirabilel1lsane detexi banc marginis

e.\ iguitas IlOn caperet.

Eu tcnho uma demonstração realmente maravilhosa para esta

proposição mas esta margcm é muito cstreita para contê-Ia.

Este era Fermat no seu modo mais frustrante. Suas próprias pala-

vras sugerem que ele estava particularmente satisfeito com suademonstração realmente maravilhosa mas não se daria ao incô-modo de escrevê-Ia em detalhe, quanto mais publicá-Ia. Ele nuncafalou a ninguém sobre sua prova e, no entanto, apesar desta com-binação de indolência e modéstia, o Último Teorema de Fermat,como mais tarde seria chamado, se tornaria famoso no mundo in-

tciro pelos séculos seguintes.

II

  I

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DIOPHANTIALEXANDRINI RITHMETI OR VM

LIBRI SEXE T DE NVMERIS MVLTANCVLlS

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,..i6l1l11, Q...Cunw uni.diiclarur~.t4 cCi.   '- ,i \IoI.~'In ,~loe<f<I1I11,&fimlllbus r n-   ,.1- -~ ~ ~~,IUI6..,lIo.fi,nttq,.,...quo1e.~N. ('(6. ., ~ ~ ~ ~ i...rN. 'fErilgil1ll'1I,rquodra,orum.  1 '';;1 ~ I~ Ir. ~aller... 'ti&<ttiufqu,funutllca;.(ou 7 ,11/; ,.'11 ttOI.'6.& 'qucqUa4UCUICa. oIl...,,;,..;r... J ~ ~ .....Õ;... wun7.,hu I'IrJh,ti. ..I;' hJ.y ..fJ) -

OBSERVA TIO DOMINI PETIl I DE F l \MAT.

LIBER VNVS.

C1'M COMMl:;:\(TA;RjJSC.q. 'BACHETJ Y.C.(7ohfrrutlomb,II'D. 'P:tIr PEJ\ MA.T St tonl ToJoj4ni.

C '.,. ....,, ,i.ti. ,.&, ,., ,..J A f-..,. ,.18...' ,w.,,,.-..t7.(,. .Ii,,.,..11. ,. i /.,,.. ...11r'' 'Ú' '.. , ,J . . I.M ilflill-

J... .,,,.,,,;, 1,,1,. I,,,,.,. d J:..,,]rA,i..,. .,41._'.. Mldl.n.., . 1; ,~il.;' , /, ,,

Q..YAOsTlO IX.

I. I

R . .. I opurre:r quadf2lum lte,buidcrc in alUO)~uAdrar(\'.rUIU

nll rurftR primi I:rus I N. ~Jrcriul ro'l olcunque numer,, ,..'um d.r.au coe.ni...un,. qllOl.ona.. Ia,u. diuidcndl.Elto itJ<jIlCiNo- . cnmlqu.tdr.ui,hic

quidrrn' Q...il\c,,,n~ Q -+'' '.-I N.CZlcrnm '-010\'tnnnqlfc fim»1~quarimir ;n ibu~ J~. I ri ;: :r , ~ .~ . (. - li N.zqu.t tur \n:uubu\ I to & tit lI' . ' ;crl t

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H-iij

Figura 6.A página contendo a notória observação de Fermat.

Frontispício da ediçãoda Alitmética de Diofante, edição de Clément-Samuel Fermat, publicada em 1670.Esta versão inclui as anotaçõesna margem feitas por seu pai .

8+ o Ú LT I; \I O T EO RE 1\ L\ D E F ER :\ IA T o CRI ADOR DE ENI GM AS 85

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xaram OSmatemáticos na certeza de que Fermat tivera as demons-trações. A tarefa de recriá-Ias fora deixada como um desafio paraeles.

Leonhard Euler, um dos maiores matemáticos do século XVIII,tentou demonstrar uma das mais elegantes observações de Fermat,um teorema relacionado com osnúmeros primos. Um número primo

é um n úmero q ue não tem div isares, exceto ele mesmo ou a un ida-de. Não se po de d ivi di-Ia sem deixar resto . Por exempl o, 1 3 é u mnÚmero primo, mas 14 n ào é. Nada irá d ivi dir 13 p erfeit amente,mas 14 p ode ser d iv idi do p or 2 e po r 7 .Todos os nú meros primospodem ser encaixados etn duas categorias: aqueles que são iguaisa 4 11 + 1 e aqueles qu e são i gu ais a 41 1-1,.o nde   é i gual a algumnúmero. Assim, 13pertence aoprimeiro grupo 4x 3 + 1), enquanto19 p ertence ao segu ndo 4 x 5 -1). O tcorema do s nú meros p ri mo sde Fermat afirma que o primeiro tipo de números primos é sem-pre a somade dois quadrados 13 = 21.+ 31.),enquanto o segundo

tipo jamais pode ser escrito deste modo. Esta propriedade dosnúmeros primos é bem simples, mas tentar provar que ela é verda-deira para cad a um d os números p ri mo s se torna extremamentedifícil. Para Fermat era apenas uma de suas muitas demonstraçõessecretas. O desafio para Euler era reconstruir esta demonstração.Finalmente, em 174 9, d epoi s de sete anos de trabalho e qu ase u msécul o d epo is d a morte de Fermat, Euler t eve sucesso, ob tend o aprova para este teorema dos números primos.

Os teoremas de Fermat variam d aqueles q ue são fund amen-

tais aos q ue são meramente d ivertid os. Os matemáti cos avaliama importância de um tcorema de acordo com o seu impacto para

o resto da matemática. Em primeiro lugar, um teorema é consi-de rado importante se contém uma verdade universal, isto é, seele se apli ca a tod o um conju nto d e números. No caso do teoremad os nú meros p ri mo s, ele não é verd adeiro apenas para algun s nú-mero s primos, e si m para t odo s. Em segun do lu gar, o s teoremasd evem revelar alguma v erd ade pro fu nda e sub jacent e a resp eitodo relacionamento entre os números. Um teorema pode ser otram-

polim para a produção de todo um novo conjunto de teoremas,ou até mesmo inspirar o desenvolvimento de um novo ramo da

matemática. E, finalmente, um teorema é importante se ele re-solver um problema em uma área de pesquisa anteriormenteobstruída pela ausência de uma conexão lógica.Muitos matemá-ticosjá se desesperaram sabendo que sópoderiamobter um granderesultado se pudessem estabelecer um elo perdido em uma cor-rente lógica.

Como os matemáticos usam os teoremas como degraus paraobter outrosresultados,era essencialque cadaum dosteoremas.

de Fermat fosse demonstrado. Só porque Fermat afirmavater aprovapara um tçorema não podia ser aceito como verdade.Antesde poder ser usado,cadateorema tinha que ser demonstrado comrigor implacável,senão as conseqüências poderiam ser desastro-sas. Porexemplo,imagineque os matemáticos tivessem aceitoumdosteoremas de Fermat. O teorema seria então incorporado comoelemento de toda uma série de demonstrações maiores. E no de-vido tempo essas demonstrações passariam a fazer parte de ou-tras, mais amplas ainda, e assim por diante. Finalmente, cente-nas de teoremas passariam a depender de que o teorema original,não-verificado,fosseverdadeiro. Mas e se Fermat tivesse come-tido um erro, e o teorema não-provado estivesse e~rado?Todosos outros teoremas que o tivessem incorporado estariam incor-retos e grandes áreas da matemática entrariam em colapso. Osteoremas são os alicerces da matemática, porque, uma vez quetenham sido estabelecidos comoverdade, outros teoremas podemser erguidos, em segurança, por cimadeles. Idéias não-fundamen-tadassão muito menosvaliosase recebem o nome de conjecturas.Qualquer lógicaque dependa de conjecturas é, ela mesma, uma

eonjectura.Fermat dizia ter uma demonstração para cada uma de suasobservações,assim,para ele,elas eram teoremas.Contudo, atéquea comunidade como um todo pudesse reconstruir as demonstra-çõespara cada uma delas,as observações de Fermat seriam cha-madas de conjecturas. De fato, nos últimos 350 anos, o ÚltimoTeoremade Fermatdeveriater sidochamadodeA ÚltimaConjecturade Fermat.

À medi da qu e os sécul os passavam, tod as as ob serv ações  o

.86 o ÚI:rIMO TEORDL\ DE FERi\IAT o CRIADOR DE ENIGMAS8

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ram demonstradas, uma por uma, mas o Último Teorema de Fermatse recusava a ceder seu segredo. De fato, ele é conhecido como o Último Teorema porque ficou sendo a última observação aindapor serdemonstrada. Três séculos de esforços fracassados para obteruma demonstração levaram à notoriedade do mais famoso proble-

ma dematemática. Contudo, esta reconhecida dificuldade não sig-nifica que o Último Teorema de Fermat seja um teorema impor-tante, como descrito acima.

A fama do Último Teorema de Fermat deriva unicamente datremenda dificuldade em demonstrá-lo. E um est ímulo extra é

acrescentado pelo fato de que o Príncipe dos Amadores dizia po-der demonstrar este mesmo teorema que frustrou gerações dematemáticos. Os comentários de Fermat na margem de seu exem-plar da  ritmética foram lidos como um desafio para o mundo. Eletinha demonstrado o Último Teorema, a questão era se qualqueroutro matemático poderia igualar seu talento.

O Último Teorema deFermat é um problema imensamente difícile, no entánto, pode scr enunciado de uma forma que qualquer es-tudante pode entender. Não existe problema de física, química oubiologia que possa ser enunciado de modo tão simples e direto epermanecer tanto tempo sem ser solucionado. No livro O último

problema E. 1: Bell escreveu que a civilização provavelmente aca-baria antes que o Último Teorema de Fermat pudesse ser demons-trado. Essa demonstração tornou-se o prêmio mais valioso da teo-ria dos números e não é de surpreender que tenha levadoa algunsdos episódios mais empolgantes da história da matemática.

A fama do enigma se espalhou além do mundo fechado dos

matemáticos. Em 1958,o problema acabou aparecendo num contofaustiano. Uma antologia intitulada Pactos com o demônio con-tén1 um conto escrito por Arthur Poges. Em O Diabo e SimonFlagg o Diabo pedc a Simon Flagg que lhe faça uma pergunta.Se o Demônio conseguir responder dentro de vinte e quatro ho-ras, levaráa alma de Simon Flagg, mas, se fracassar, dará cem mildÔlarc~ a Simon. Simon então pergunta: O Último Teorema de  \:-~m,\: ,~:\ I.,\'r,:,;.'~'.'~ ' ~;..1':-\' \.~(,~_l'.. .).rt'(,~5-:1;.: 'e~C mundo ab-

, ~ .................,~ .. ... .. ..... --.. ..-......... ~-'5--::--:: =-=1.~

trar o Último Teorema. No segundo dia, o Diabo retoma e admi-te sua derrota:

 Vocêganhou, Simon , disse ele quase num sussurro, olhan-

do-o com indisfarçável respeito. Nem mesmo eu posso apren-

der matemática suficiente, em tão curto espaço de tempo, pararesolver um problema tão difícil. Quanto mais eu mergulhona coisa, pior ela fica.Fatoração não-única, ideais - Bah Vocêsabe que , confidenciou o Diabo, nem mesmo os matemáti-

cos dos 0 ltros planetas, todos eles muito mais adiantados do

que o seu, conseguiram resolvê-Io? Existe um cara em Saturno,ele parece um cogumelo sobre pernas de pau, que resolveequações diferenciais parcia is de cabeça, e até mesmo eledesistiu.

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Leonhard Euler

Uma Desgraça Matemática

Amatemática não é uma caminhada cuidadosa através de uma

estrada bem conhecida, é uma jornada por uma terra selvageme estranha, onde os exploradores freqüentemente se perdem.

A exatidão deveser um sinal aos historiadores de que os mapasjá foram feitos e osexploradores se foram para outras terras.

w. S. Anglin

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 Desde que vio Último Teorema de Fermat pela primeira vez, ain-da criança, ele se tornou minha grande paixão , relembra AndrewWiles,com uma voz hesitante, que transmite a emoção que ele senteem relação aoproblema. Eu encontrara este problema que passa-

ra trezentos anos sem ser resolvido. Eu não creio que muitos dosmeus colegas de escolatenham pego amania pela matemática, assimnão comentei o assunto com meus companheiros. Mas eu tinha umprofessor que fizera alguma pesquisa em matemática e ele me deuum livro sobre a teoria dos números, com algumas pistas sobre comocomeçar a abordar o problema. Para começar eu trabalhei na su-posição de que Fermat não sabia mais matemática do que eu. E tenteiencontrar a demonstração perdida usando os métodos que ele po-deria ter usado em sua época.

I

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90 o ÚLTI; \IO TEOREl\ IA DE FERl\ IAT UMA DESGRAÇA MATEMÁTICA 91

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Wilesera uma criarlçacheia de inocência e ambição vislum-brandouma oportunidade de ter sucesso onde gerações de mate-máticostinham falhado.MasWilesestavacertoem pensar queeleum meninode escolado séculoxx sabiamais matemática do quePierrede Fermat umgêniodo séculoXVII.Talvez em sua inocên-cia ele tropeçasse em uma provaque outras mentes mais sofisti-cadas tinham deixado escapar.

Mas apesar de seu entusiasmo todos os cálculos resulta-

vam num beco sem saída. Depois de quebrar a cabeça c esgotarseus livrosescolares Wiles não conseguira nada. Após um anode fracassoelemudou suaestratégia e decidiu quepoderia apren-der alguma coisa a partir dos erros de outros matemáticos maiseminentes. O Último Teorema de Fermat tem essa históriaromântica .incrível.Muitas pessoas o estudaram e quanto maisos grandes matemáticos dopassado tentavam demonstrá-Io e fra-cassavam mais misterioso e desafiador ficavao problema. Tan-

tos matemáticos tinham tentado tantas abordagens diferentesnos séculos XVIII e XIXe eu um adolescente decidi que de-veria estudar esses métodos para entender o que eles tinhamfeito.

O jovem Wiles examinou as abordagens de todos que tinhamfeitoumatentativasériadedemonstraroÚltimoTeoremadeFermat.Ele começou por estudar o trabalho do matemático mais prolíficode todaa história o primeiroaconseguirumavançonabatalhacontraFermat.

fato verdade quando tudo era falso. Efetivamente os matemáticostêm tentado provar o impossível.

Em toda a história desta ciência somente um punhado de ma-temáticos parecem ter evitado as dúvidas que intimidaram seuscolegas. Talvez o mais notável exemplo seja o gênio do século XVIIILeonhard Euler e foi ele quem fez o primeiro avanço em direção à

prova do Último Teorema de Fermat. Euler tinha uma memória euma intuição tão incríveis que se dizia que ele poderia fazer todo.um cálculo de cabeça sem precisar colocar a caneta no papel. Emtoda a Europa ele cra conhecido como a encarnação da análise esobre elc o acadêmico francês François Arago disse: Euler calcu-la sem qualquer esforço aparente como os homens respiram e aságuias se sustentam nos ventos.

Leonhard Euler nasceu em Basiléia em 1707 filho de um pas-tor calvinista Paul Euler.Embora ojovem Euler demonstrasse umtalento prodigioso para a matemática seu pai estava determinado

que o filhoestudasse teologia seguindo carreira na Igreja. Leonhardobedeceu e foi estudar teologia e hebraico na Universidade da Ba-siléia.

Felizmente para Euler a cidade de Basiléia também era o lardo eminente clã dos Bernoulli. Os Bernoulli podiam tranqüila-mente afirmar serem a mais matemática das famílias tendo pro-duzido oito das mentes mais extraordinárias da Europa em ape-nas três gerações.

Alguns diziam que a família Bernoulli representava para a ma-temática o que os Bach eram para a música. Esta fama se espalhoualém da comunidade dos matemáticos e uma história exemplifica

bem o perfil da família. Conta-se que Daniel Bernoulli estava via-jando pela Europa e um dia começou a conversar com um estra-nho. Depois de um certo tempo ele se apresentou modestamente: Eu sou Daniel Bernoulli. E eu disse o estranho zombando souIsaac Newton. Daniel gostava de lembrar este incidente falandodele em várias ocasiões como sendo o elogio mais sincero que járecebera.

Daniel e Nikolaus Bernoulli eram muito amigos de LeonhardEuler e .percebiam que o mais brilhante dos matemáticos esta-

o íclope da atemática

Criar matemática é uma experiência misteriosa e dolorosa. Freqüen-temente o objetivo da demonstração é claro mas o caminho até elepermanece enevoado e o matemático tropeça em seus cálculosapavorado temendo que cada passo possa estar levando sua argu-mentação na direção errada. Além disso existe o temor de que ocaminho certo não exista. Um matemático pode acreditar que umaproposição é verdadeira e perder anos tentando provar que é de

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12 o Úl.:n:\W TEORDIA DE FER:\L\T UMA DESGRAÇA MATEMÁTICA 93

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-asendo transformado no mais medíocre dos teólogos. Eles fi-

  ram um apelo a Paul Euler, pedindo que Leonhard tivesse a1ermissão deabandonar o clero em favor dos números. No passa-

10,Euler, opai , tinha estudado matemática com o patriarca dos ~ernoulli, Jakob, e tinha um trcmendo respeito pela família. Re-lutantemente ele aceitou que seu filho tinha nascido para cal-

  lar, não para pregar.Leonhard Euler logo deixou a Suíça e seguiu para os palácios

leBerlim e SãoPetersburgo, onde passou o auge de seus anos cria-  ívos.Na épocade Fermatosmatemáticos eram considerados cal-ulistas amadores, mas no século XVIIIeles já eram tratados como;olucionadores profissionais de problemas. A cultura dos núme-ros tinha mudado, dramaticamente, e isto era em parte uma con-;eqüência dos cálculos científicos de Si Isaac Newton.

Newton acreditava que osmatemáticos estavam perdendo tempo,. .lesafiando uns aos outros com enigmas sem sentido. Ele queria

lplicar a matemática aomundo físico, calculando tudo, das órbitasdos planetas às trajetórias das balas de canhão. Quando Newtonmorreu, em i727, a Europa tinha passado por uma revolução cien-tíficae,no mesmo ano, Euler publicou seu primeiro trabalho. Embora

a publicação apresentasse uma matemática elegante e inovadora,seu objetivo era descrever uma solução para um problema relacio-nado com o mastreamento dos navios.

As potências européias não cstavam interessadas no uso damatemática para explorar conceitos abstratos e esotéricos. Elasqueriam a matemática para a solução de problemas práticos, com-petindo entre si para empregar as mentes mais brilhantes. Euler

começou sua carreira trabalhando para os czarcs, antcs de ser con-vidado para a Academia de Bcrlim por Frederico, o Grande, daPrússia. Mais tarde ele retomou à Rússia durante o reinado deCatarina, a Grande, onde passou os últ imos anos de sua vida. Emsua carreira Euler lidou com uma infinidade de problemas, da

navegação às finanças, da acústica à irrigação. Contudo, o mundoprático da solução de problemas não prejudicou a habilidadematemática de Euler. A abordagem de cada tarefa nova o inspira-va a criar uma matemática inovadora e engenhosa. Sua paixão O

levava a escrever vários trabalhos num único dia, e conta-se queentre o primeiro e o segundo chamados para o jantar Euler ten-tava rabiscar cálculos completos, dignos de serem publicados. Ele

. não desperdiçava nem um momento e, mesmo quando seguravaum bebê com uma das mãos, a outra estava escrevendo uma de-monstração num papel. .

Uma das maiores realizações dc Euler foi o desenvolvimentodo método dos algoritmos. O objetivo dos algoritmos de Euler eralidar com problemas aparentemente insolúveis. Um desses proble-mas era a previsão das fases da Lua com grande antecedência eprecisão - uma informação que poderia ser usada para a criaçãode tabelas de navegaçãomuito importantes.Newtonjá tinha mos-trado que é relativamentefácilprever a órbitade um corpo emtor-no de outro, mas no caso da Lua a situaçãonão é tão simples. ALua orbita a Terra,mas existe um terceiro corpo,o Sol,que com-plicaenormemente a questão. Enquanto a Terra e a Lua se atraemmutuamente, o Solperturba aposiçãoda Terra e produz um efeitobamboleante na órbita da Lua. É possívelcriar equações para de-terminar os efeitos de qualquer um desses corpos, mas os mate-máticos do séculoXVIIInão conseguiam incorporar um terceirocorpoem seus cálculos.Mesmohoje é impossívelobter a soluçãoexatado chamado problema dos três corpos .

Euler percebeu que os navegantesnãoprecisavamconhecer asfasesdaLua comabsolutaprecisão,somente comprecisão sufici-ente para determinar a própria posição com uma incerteza de al-gumasmilhas náuticas.Assim sendo, Euler desenvolveuuma re-ceitapara produzir uma soluçãoimperfeita, mas suficientemente

precisa.A receita, conhecida comoa]goritmo, funcionavaprodu-zindoprimeiro um resultado aproximado,que podia ser colocadonoalgoritmopara produzir um resultadomais preciso.Este resu]-tadomaispreciso podia ser novamenteprocessadopeloa]goritmoparaproduzir uma soluçãoaindamais precisa e assim por diante.Umacentena de cálculosdepois,Eu]er era capazde fornecer umaposiçãoda Lua suficientemente precisa para os usos da Marinha.Eleforneceuseu a]goritmoaoAlmirantadoBritânicoque, em re-compensa,pagou-lhe um prêmiode 300libras.

 i

94 o l1LTl i\ IO TEOREi\ IA DE FERi\ IAT UMA DESGRAÇA MATEMÁTICA 95

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Eulcr adquiriu a reputação de ser capaz de resolver qualquerproblema que lhe fosse apresentado, um talento que parecia seestender além dos campos da ciência. Durante uma temporada nacorte de Catarina, a Grande, ele encontrou o grande filósofo fran-cês Denis Diderot. Diderot era um ateu convicto e passava seus diasconvertendo os russos ao ateísmo. Isso deixava Catarina furiosa, e

ela pediu a Euler que fizesse alguma coisa para deter os esforçosdo agnóstico francês.

Euler pensou um pouco no assunto e depois afirmou ter obti-do uma prova algébrica para a existência de Deus. Catarina convi-dou Euler e Diderot ao seu palácio e reuniu seus cortesãos paraassistirem ao debate teológico. Euler apresentou-se diante da au-diência e anunciou:

Sem entender nada de álgebra,Diderot foiincapaz de argumentarcontra o maior matemático da El ropa e ficou sem palavras. Humi-lhado, ele deixou São Petersburgo e voltou para Paris. Euler conti-nuou apreciando sua volta ao estudo da teologia e publicou váriasprovas falsas relacionadas com a natureza de,Deus e doespírito hu-mano. .

. Um problema mais válido,que cativoua natureza excêntrica'de Euler, relacionava-se com a cidade prussiana de Kõnigsberg, que'hoje se tornou a cidade russa de Kaliningrado. A cidade foi erguidanas margens do rjo Pregel e consiste em quatro bairros separados,ligados por sete pontes. A Figura 7 mostra um diagrama da cidade.Alguns dos moradores mais curiosos se perguntavam se seria pos-sível fazer um passeio, atravessando as sete pontes, sem ter queatravessar duas vezes uma mesma ponte. Os cidadãos deKõnigsbergtentaram várias rotas, mas todas terminaram em fracasso. Eulertambém não conseguiu encontrar tal rota, mas conseguiu explicarpor que tal jornada era impossível.

 Senhor, (/ + bOI= x portanto Deus existe, refute/1

c

,D

A

Figura 8. Uma representação simplificada das pontes de Kõnigsberg.

Figura 7.O rio Pregel divide a cidade de Kõnigsberg em quatro par-tes separadas,Jl,   C e D. Sete pontes ligam asvárias partes da ci-dade, e um enigma local pergunta se é possível fazer um passeio de

modo que cada ponte seja atravessada uma vez e somente uma vez.

Euler começou com uma planta da cidade e a partir dela produ-ziu uma representação simplificada, na qual os trechos de terrasão reduzidos a pontos e as pontes são substituídas por linhas,como mostrado na Figura 8. Ele então argumentou que, de modoa fazer uma jornada bem-sucedida (ou seja, cruzando todas   s

 

i

96 o ÚI;fI~IO TEORE~IA DE FER IAT UMA DESGRAÇA MATEMÁTICA 97

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pontes sóumavez), um ponto deveser ligadopor um número parde linhas.Isto acontece porque nomeio dajornada, quando ovia-jante passapor uma massa de terra, eledevechegar por uma pontee sair poroutra. Só existem duas exceçõesa està regra, quando oviajantecomeçaou termina sua jornada. No começo do passeio oviajantedeixa uma massa de terra e sóprecisa de uma ponte para

sair, e no final chega a uma massa de terra e só precisa de umaponte paraentr~r. Sc ajornada começae termina em locais dife-rentes, então essas duas massas de terra só podem ter um núme-ro ímpardc pontes, Mas,se a jornada começa e termina nomes-mo lugar,este ponto, comotodos os outros pontos, dcvc tcr umnúmero par de pontes.

Assim,generalizando, Euler concluiu quepara qualquer redede pontes só é possível fazer um passeio completo, atravessan-do uma única vez cada ponte, se todas as massas de terra tive-rem um número par de pontes, ou exatamente duas massas deterra tiveremumnúmero ímpar depontes. NocasodeKõnigsbergexistem guatro massas de terra no total e todas elas são ligadaspor um número ímpar de pontes - três pontos possuem trêspontes e um tem cinco pontes. Euler tinha sido capaz de expli-car por que é impossível atravessar cada uma das pontes deKõnigsberg somente uma vez e, além disso, produziu uma re-gra que pode ser aplicada a qualquer rede de pontes em qual-quer cidade domundo. O argumento é bem simples e talvezfosseesse tipo de problema lógico que Euler costumava rabiscar an-tes do jantar.

Quando Euler encontrou o Último Teorema de Fermat, cIe

deve ter-lhe parecido tão simples quanto o problema das pon-tes de Kõnigsberg. Euler deve ter pensado em resolvê-Ioadap-tando uma estratégia igualmente direta. Lembre que Fermatdeclarou que não há soluções com números inteiros da seguin-te equação:

Esta equação representa um conjunto infinito de equações:

X3 + y3 = Z3

X4 + y4 = Z4

X5 + y5 = Z5

X6+y6=Z6

X7 + y7 = Z7

e assim por diante.

Eulcr imaginou,se nãopoderia provar que uma das equaçõesnãotinha solução e então extrapolar o resultado para todas as outrasrestantes.

Seu trabalho recebeuumempurrão quandoeledescobriuumapista oculta nas anotações de Fermat. Embora Fermat nunca te-nha escrito uma demonstração de seu Último Teorema,ele des-creveu, disfarçadamente, uma prova para o caso específico n = 4

em outra parte de suaAn tmética e a incorporou na demonstraçãode um problema totalmente diferente.Embora este fosseo cáleulomais completoque elejamaiscolocounum papel,os detalhes eramvagose incompletos. Fermatconclui a demonstração dizendo quea falta de tempo e de papel o impedia de apresentar uma explica-çãocompleta.MasapesardafaltadedetalhesnosescritosdeFermat,elesclaramenteilustramumaprovaporcontradiçãoconhecidacomométodo da descida infinita.

De modo a provar que não existem soluções para a equaçãoX4 + y4 = z4,Fermat começoupresumindoque existisseumasolução hipotética

x =XJ Y =~ z =ZJ

x + )I = z , para qualquer número 11maior do que 2,

Examinando as propriedades de (XI YJ Z,), Fermat poderiademonstrar que, se esta solução hipotétiea existisse, então existi-ria uma solução menor (Xz Yz Zz). E, ao analisar esta segunda so-lução, Fermat poderia mostrar a existência de uma solução aindamenor (X3,Y3,Z3) e assim por diante.

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Fermat tinha descoberto uma escadaria descendente de solu-

ções que, teoricamente, poderia continuar gerando números cadavez menores. Contudo, x, y e z devem ser números inteiros e, por-tanto,a escadaria infinita é impossível, porque deveexistir uma menorsolução possível. Esta contradição prova que a hipótese inicial, deque existe uma solução   XI }TIZI) deve ser falsa. Usando o méto-

do da descida infinita, Fermat tinha demonstrado que a equaçãocom 11= 4 não pode ter qualquer solução, porque se tivesse as con-seqÜências scriam ilógicas.

Euler tentou usar isso como um ponto de partida para cons-truir uma demonstração geral para todas as outras equações. Alémde criar uma para 11= infinito, ele teria que criar uma para 11= 3,c foi este primeiro degrau para baixo que ele tentou em primeirolugar.No dia 4 de agostode   753Euler divulgou, em uma cartaenviada ao matemático prussiano Christian Goldbach, que tinhaadaptado o método da descida infinita de Fermat e conseguira de-monstrar com sucesso o caso de 11= 3. Depoisde cem anos estacra a pritneira vez que alguém conseguia fazer algum progresso nadireção de solucionar o desafio de Fermat.

Mas para fazer com que a prova de Fermat para II = 4 cobrissetambém o caso de 11= 3,Euler teveque incorporar um conceitobizarro, conhecido como nÚmeros i11laginá17 os,ma entidade quefora descoberta pelos matemáticos europeus do século XVI.É es-tranho pensar em novos números sendo descobertos , mas isso éporque estamos tão acostumados com os números que usamos emnosso dia-a-dia que esquecemos de que houve uma época em quecstcs números não eram conhecidos. Números negativos, fraçõesc nÚmeros irracionais precisaram ser descobertos, e a motivação

por trás de cada descoberta era a resposta para perguntas que, deontro modo, não tcriam resposta.

A história dos nÚmeros começa com os nÚmcros quc usamospara contar (1,2,3, ...), conhecidos como nÚmeros naturais. Essesnúmeros são perfeitamente adequados para somar quantidadessimples e inteiras, tais como ovelhas ou moedas de ouro, chegan-do-se a um nÚmero total que é uma quantidade inteira. Além  

adição, outra operação simples, a multiplicação, age sobre núme-

ros inteiros produzindo números inteiros. Contudo, a operação dedivisão apresenta um problema complicado. Embora 8 dividido por

2 seja igual a 4, descobrimos que 2 dividido por 8 é igual a :}. Oresultado desta última divisão não é um número inteiro e sim umafração.

. Assim a divisão é uma operação simples, feita com números

naturais, que nos obriga a olhar além dos números naturais demodo a obter urna resposta. Para os matemáticos é impens~velnão ser capaz de responder a cada pergunta, pelomenos em teo-ria, e esta necessidade é chamada de completeza. Existem certasquestões relacionadas com os números naturais que seriam im-possíveis de responder sem se recorrer a frações. Os matemáti-cos expressam isto dizendo que as frações são necessárias para acompleteza.

Foi esta necessidade que levou os hindus a descobrirem osnúmeros negativos.Os hindus perceberam que embora3 subtraí-do de 5 seja obviamente2, subtrair 5 de 3 não é urna questão tão

simples. A resposta se encontra além dos números naturais e sópode ser obtida se introduzirmos o conceitodos números negati-vos.Alguns matemáticos nãoaceitavameste mergulho na abstra-çãoe se referiamaosnúmerosnegativoscorno absurdos ou fic-tícios .Embora umapessoapossa segurar umamoedada ouro, oumesmo meia moeda de ouro, é impossível ter nas mãos urna moe- .

da negativa.Os gregos também buscavama completeza, e isto os levou a .

descobrir os números irracionais.NoCapítulo 2 surgiu a questão:Quenúmero é a raiz quadrada de dois,.fi ?Osgregossabiam queeste número era aproximadamenteiguala f, mas,quandotenta-ramencontrar a fraçãoexata,eles descobriram que elanão existia.Lá estavaum númeroque nuncapoderia ser representadopor umafração,mas este novotipo de número era necessário para respon-der a urna pergunta simples: Qual é a raiz quadrada de dois?Aexigênciada completezasignificavaque outra colôniadeveria seracrescentada ao império dos números.

Durante a Renascença, os matemáticos acreditavam ter des-coberto todos os números do universo. Eles poderiam ser ima-

100 o Úl:rIJ\IO TEOREJ\I:\DE FERi\IAT UMA DESGRAÇA MATEMÁTICA 101

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ginados ao longo de uma linha de nlÍmeros - uma reta infinita-mente longa com o zero no centro, como mostrado na Figura 9.Os números inteiros eram colocados ao longo da linha, com osnÚmeros positivos sc estcndcndo à direita do zero, até o infini-to positivo, e os números negativos se estendendo à esquerdado zero, até o infinito negativo. As frações ocupavam os espaços

entre os nÚmeros inteiros e os nÚmeros irracionais ficavam en-tre as frações.

-4 -3 -2 -1 O +1 +2 +3 +4 -2 ..f2

+- I I I I I I I I I I I )

óbvios. Ao mesmo tempo a completeza exige que sejamos capa-zes de responder a pergunta.

A solução para Bombelli foi criar um novonúmero, i, chama-do de lllÍmero imagillán o, que é definido simplesmente como asolução para a pergunta: Qual é a raiz quadrada de um negativo?Isso pode parecer uma solução covarde para o problema, mas não

é diferente do modo como surgiram os números negativos.. En-carando outra questão sem resposta, os hindus meramente defi-niram -1 como a resposta para a pergunta: Qual o valor de zeromellOSum? É mais fácil aceitar a idéia de -1 apenas porque temosexperiêncià com o conceito análogo de dívida . Por outro lado,não temos nada no mundo real para simbolizar a idéia dos núme-ros imaginários. O matemático alemão do século XVII, GottfriedLeibniz, descreveu de modo elegante a natureza estranha dosnúmeros imaginários: O número imaginário é um recurso óti-mo e maravilhoso do espíri to divino, quase um anfíbio entre o sere o não-ser.

Uma vez que tenhamos definido i como sendo a raiz quadradade -1, então 2i deveexistir, porque ele seria a soma de i mai~ i (as-

sim como a raiz quadrada de - 4). De modo semelhante, T tam-bém deve existir, porque seria o resultado da divisão de i por 2.Rea-lizando operações simples é possível chegar aoequivalente imagináriodos chamados números reais. Esses são os números naturais ima-

ginários, os números negativos imaginários, as frações imagináriase os imaginários irracionais.

O problema que agora surge é que todos esses números ima-ginários não possuem uma posição natural ao longo da linha dosnúmeros reais. Os matemáticos resolveram a crise criando uma linha

separada para os números imaginários, que é perpendicular à retados números reais e a cruza no zero, como mostrado na Figura 10.Os números não estão mais restritos a uma reta unidimensional e

sim ocupam um plano bidimensional. Enquanto os números ima-ginários puros e os números reais puros ficam restritos às suasrespectivas linhas numéricas, combinações de números reais eimaginários (como, por exemplo, 1 + 2i), chamadas de númeroscomplexos, vivem no assim chamado plano dos números.

Figura 9. Todos os nÚmeros podem ser posicionados ao longo deuma linha de nÚmeros que se estende até o infinito em ambas asdireções.

Alinha dos números sugere que talveza completeza tivesse sidoconquistada. Todos osnúmeros pareciam estar no lugar certo, prontosa responderem a todas as questões da matemática - e, em todo ocaso, não havia espaço na linha dos números para qualquer núme-ro novo. Então, no século XVI ouviram-se novos murmúrios deinquietude. O matemático italiano Rafaello Bombelli estava estu-dando asraízes quadradas de vários números quando tropeçou emuma pergunta sem resposta.

O problema começou com a pergunta: Qual é a raiz quadra-

dade um, . ?A resposta óbvia é 1,porque 1x 1 = 1.Uma respostamenos evidente é -1. Um número negativo multiplicado por ou-tro número negativo gera um número posit ivo. Isto significa que-I x-I = + I.Assim, a raiz quadrada de + 1é + 1e -1. Esta abun-

dância de respostas é ótima, mas então surge a pergunta: Qual éa raiz quadrada de um llegativo, . ? O problema parece não terresposta. A soluçãonão pode ser + 1 ou - 1 porque o quadradodesses números é + 1.Contudo, não existem outros candidatos

102 o ÚLTli \1O TEOREMA DE FERi\ IATUMA DESGRAÇA MATEMÁTICA 103

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eixoreal

Uma coisa particularmente extraordinária é que os númeroscomplexos podem ser usados para resolver qualquer equação con-cebível. Por exemplo, para calcular a raiz quadrada de~ 3+4j osmatemáticos não precisaram inventar um novo tipo de número -a resposta é 2 + i outro número complexo. Em outras palavras, osnúmeros imaginários parecem ser rielemento final necessário para

tornar a matemática completa. . .Deve ser lembrado que os matemáticos não consideram os

números imaginários mais abstratos do que um número nega-tivo ou qualquer número natural. Além disso, os físicos desco-briram que os números imaginários representam a melhor lin-guagem para descrever alguns fenômenos do mundo real. Comalgumas pequenas manipulações, os números imaginários serevelam o modo ideal para analisar o movimento oscilante deobjetos como os pêndulos. Este movimento, conhecido tecni-camente como oscilação senoidal, é encontrado na natureza, eassim os números imaginários se tornaram uma parte integralde muitos cálculos da física. Hoje em dia os engenheiros elétri-cos invocam o i para analisar a oscilação de correntes enquantoos físicos teóricos calculam as conseqüências das oscilações nasfunções de onda da mecânica quântica usando as potências dosnúmeros imaginários.

Os matemáticos puros também têm explorado os númerosimaginários, usando-os para encontrar respostas para problemasantes impenetráveis. Os números imaginários literalmente acres-centam uma nova dimensão à matemática, e Euler esperava poderexplorar este grau extra de liberdade para atacar o Último Teoremade Fermat.

No passado outros matemáticos tentaram adaptar o métodode Fermat de descida infinita para resolver outros casos, além de11= 4, mas cada uma dessas tentativas de estender a prova levavaa brechas na lógica. Euler mostrou que, incorporando-se o nú-mero imaginário i em sua prova, ele poderia tapar os buracos nademonstração e forçar o método da descida infinita a funcionarpara o caso de   = 3.

Foi uma realização extraordinária, mas uma realização que ele

eixoimaginário

4i  .

3i

2i . . @ 1 2i

 4  3 2  1  1  2  3 4

 i

 2i

 3i

4i

Figura 10.A introdução dc um eixo para os números imagináriostransforma a linha dos números num plano dos nÚmeros. Qualquercombinação dc nÚmcros rcais c imaginários tcm umaposição noplanodos números.

1 4o ÚLTli \IO TEORE:\ IA DE FERi\ IAT

UMA DESGRAÇA MATEMÁTICA105

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não pôde repetir para os outros casos englobados pelo ÚltimoTeorema de Fermat. Infelizmente, todas as tentativas de Euler defazer seu argumento valer para outros números, descendo ao infi-nito, terminaram em fracasso. O homem que criou mais matemá-tica do que qualquer outro na história foi humilhado pelo desafiodeFermat. Seu único consolo era de que tinha feito oprimeiro avanço

l1asolução do problema mais difícil do mundo.Euler continuou criando uma matemática brilhante até o dia

de sua morte, uma realização ainda mais extraordinária pelo fatode que ele estava totalmente cego nos últimos anos de sua car-reira. Sua perda de visão começou em 1735, quando a Academiade Paris ofereceu um prêmio pela solução de um problema deastronomia. O problema era tão difícil que a comunidade mate-mática pediu vários meses para produzir uma solução, mas paraEuler isto não era necessário. Ele se tornou obcecado com o tra-

balho, trabalhando continuamente durante três dias, e ganhouo prêmio. Mas as péssimas condições de trabalho combinadascom a tensão intensa custaram a Euler, então com vinte e pou-cos anos, a visão de um dos olhos. Isto é mostrado em muitos

retratos de Euler, incluindo o que aparece no início deste capí-tulo.

Seguindo o conselho dc Jean Le Rond d Alembert, Euler foisubstituído por Joseph-Louis Lagrange como matemático na cor-te de Frederico, o Grande. O rei depois comentou: Devo aos seuscuidados e recomendações por ter substituído um matemático meiocego por outro com ambos os olhos, o que vai satisfazer especial-mente aos membros anatômicos da minha Academia. Euler 01-

tou para a Rússia onde Catarina, a Grande, deu as boas-vindas aoseu cícIope matemático .A perda de um dos olhos cra um problema menor - de fato

Euler afirmava que agora teria menos distrações . Mas qua-renta anos depois, com a idade de sessenta, sua situação piorouconsideravelmente, quando uma catarata no olho perfeito indi-cou que ele se tornaria completamente cego. Euler estava de-terminado a não se entregar e começou a praticar a escrita como olho afetado fechado, de modo a aperfeiçoar sua técnica antel

de ser envolvido pela escuridão. Em questão de semanas ele estavacego.

EuLercontinuou com sua produção matemática pejos dezesseteanos seguintes e conseguiu ser mais produtivo do que nunca. Seuimenso intelecto lhepermitia anaJisar conceitos sem precisar co]ocá-

]os no papel e sua memória fenomenal fazia de seu cérebro umabiblioteca mental. Os colegas chegaram a dizer que a cegueira pa.:.recia ter ampliado os horizontes de sua imaginação. Deve ser ]em-brado que as computações de Eu]er para asposições da Lua foramterminadas dur.ante este período de cegueira. Para os imperadoresda Europa, esta era a mais vaJiosa das conquistas matemáticas, umproblema que desafiara osmaiores matemáticos da Europa, incJu-ndo Newton.

Em 1776foi realizada uma operação para a retirada da catara-ta, e por alguns dias a visão de Eu]er parecia ter sido restaurada.Então ocorreu uma infecção e Eu]er mergulhou de volta na escuri-

dão. Sem se abalar, ele continuou trabalhando até 18de setembrode 1783, quando sofreu um derrame fatal. Nas palavras do filósofoe matemático, o marquês de Condorcet, Eu]er deixou de viver ede calcu]ar .

UmAvanço Lento

UmséculodepoisdamortedeFermat existiamdemonstraçõesparaapenasdois casosespecíficosdoÚltimoTeorema.Fermat deraaos

matemáticos uma boa pista com sua demonstração de que nãoexistemsoluçõespara a equação:

x4 + y4 = Z4

Euler tinha adaptado a demonstração para provar que não há so]u-ções para

x + y = Z

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Depois doavanço rcalizado por Euler ainda era necessário provarque não há soluções com nÚmeros inteiros para uma infinidade deoutras equações:

.\ ,+ .1 = zx6+ ) 6= Z6

X7 + ) 7 = Z7

x8 + y8 = Z8

C assim por diantc.

Embora o progresso feito pelos matemáticos fosse embaraçosa-mente lento, a situação não era tão ruim quanto parecia à primei-ra vista. A demonstração para o caso de 11= 4 também serve de

prova para os casos de 11 = 8, 12, 16, 20, .... A explicação é quequalquer nÚmero que possa scr escrito como uma potência de 8(ou de 12, 16, 20, ...) pode também ser reescrito como uma po-tência de 4. Por exemplo, o nÚmero 256 é igual a 28,mas é tam-bém igual a 4~.Portanto, qualquer demonstração que funcione paraa potência 4 também vai se aplicar para um número elevado a 8 epara qualquer outro que seja múltiplo dc 4.Usando o mesmo prin-cípio, a demonstração de Euler para II = 3 automaticamente pro-va as hipóteses de 11= 6,9,12,15, ...

Subitamente os números estavam rolando e Fermat pareciavulnerável. A demonstração para o caso de II = 3 é particular-

mente significativa, porque 3 é um exemplo de IlÚmero primo.Como explicado anteriormente, um número primo tem a pro-priedade especial de não ser múltiplo de nenhum número in-

teiro, exceto 1 e ele mesmo. Outros números primos são 5, 7,11, 13, ....Todos os números restantes são múltiplos de núme-ros primos e recebem o nome de não-primos ou números com-postos.

Os teóricos dos números consideram os números primos como

os mais importantes entre todos os números, porque eles são osátomos da matemática. Números primos são os tijolos da cons-trução numérica porque todos os outros números podem ser criadosmultiplicando-se combinações de números primos. Isto parece

levar a um avanço extraordinário. Para demonstrar o ÚltimoTcorcma dc Fcrmat para todos os valores de n só é precisodemonstrá-Io para valores primos de n. Todos osoutros casos serãoentão meramente múltiplos dos casos primos e serão demonstradosimplicitamente.

Intuitivamente isto deveriasimplificar bastante o problema.Agoraé possível ignorar as equações que envolvem um valor de n que nãqseja número primo. O número de equações que resta se reduzimensamente. Por exemplo, nos valores de n até 20, só é necessá-rio demonstrar. seis valores:

X5 + y5 = Z5

x7 + y7 = Z7

Xii + yll = zl1

Xl3 + y13 = Z13

Xl7 + yl7 = Z17

Xl9 + y19 = Z19.

Se for possível demonstrar o Último Teorema de Fermat somentepara osvalores primos den, então o teorema está demonstrado paratodos os valores de n. Sepensarmos em todos os números inteiros,é óbvioque existe uma infinidade deles.Mas se considerarmos apenasos números primos, que representam apenas uma pequena fraçãode todos os números inteiros, certamente o problema deveria setornar mais simples.

A intuição sugere que, se você começa com uma quantidadeinfinita e então retira a maior parte dela, o que sobra é alguma coi-

sa finita. Infelizmente a intuição não é o árbitro da verdade namatemática e sim a lógica.De fato, é possível provar que a lista denúmeros primos não termina nunca. Por isso, embora possamosignorar a vasta maioria das equações relacionadas com valores não-primos de n, as equações restantes, relativas aos valores primos de1l,ainda aparecem em quantidade infinita.

A demonstração de que existe uma infinidade de números pri-mos vem da época de Euclides, e constitui uma das argumenta-ções clássicas damatemática. Inicialmente, Euclides presumiu que

108 o ÚI:rJl\IO TEOREl\I'\ DE FER~I'\T UMA DESGRAÇA MATEMÁTICA 1091

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existisse uma lista finita de nÚmeros primos conhecidos e entãomostrou que deve existir um número infinito de acréscimos a estalista. Existem N números primos na lista finita de Euclides, quesão chamados de Pp P2,P3, ...PN.Euclides então pôde gerar umnovonúmero Q,\de modo que:

Q,\ =  P1XP2XP3X...xPS) + 1.

um exemplo de infinito conhecido comoo Hotel deHilbert.Estehotel hipotético tem o desejável atributo de possuir um núme-ro infinito de quartos. Um dia um novohóspede chega e ficade-sapontado ao ser informado de que, apesar do tamanho infinitodo hotel, todos os quartos estão ocupados. Hilbert, o gerente,pensa um pouco e então garante ao recém-chegado de que vaiencontrar um novoquarto para ele. Ele pede a todos os hóspe-

des que se mudem para o quarto adjacente, de modo que o.hós- Ipcde do quarto 1 se muda para o quarto 2, o hóspede do 2 semuda para o 3 e assim por diante. Todos que estavam no hotelcontinuam tcndo um quarto, enquanto o recém-chegado podeagora ocupar o quarto número 1,que ficouvago.Isso mostra queo infinito mais um é igual a infinito. Do mesmo modo, infinitomenos um aindacontinua sendo infinito,e, de fato,infinitomenosum milhão ainda é infinito.

Na noite seguinteHilbert precisa lidarcomumproblemaainda

maior. O hotel continua cheio quando um veículo infinitamentegrande chegacom umnúmero infinitodenovoshóspedes. Hilbertnão se deixa abalar e esfrega as mãos de contentamento pensan-donaquantidade infinitade diárias. Ele pede a todos osseus hós-pedes anteriores para que se mudem para os quartos cujos nú-merossejamodobrodonúmerodoquartoanterior.Assimohóspede'do quarto 1 se muda para o quarto 2, o hóspede do quarto Z semuda para o quarto 4 e assim por diante. Todos aqueles que se'encontravam no hotcl continuam alojados e no entanto um nú-'mero infinito de quartos, os de números ímpares, ficaramvagospara receber os recém-chegados. Isto mostra que o dobro do in-

finito ainda é infinito. E a metade do infinito continua sendo in- Ifinito. I

O Hotel de Hilbert sugere que todos os infinitos são igualmente I

grandes, porque vários infinitos podem ser espremidos no mesmohotel infinito. O infinito de números pares pode ser igualado peloinfinito de números inteiros. Contudo, alguns infinitos são de fatomaiores do que outros. Por exemplo, qualquer tentativa de fazercorresponder, a cada número racional, um número irracional, ter-mina em fracasso, e pode-se realmente provar que o conjunto infi-

 st novonÚmcroQ,\podc ser primo ou não-primo.Se for primo,cntão tcrcmos tido succsso cm ~crar um númcro primo novoe maior,e portanto nossa lista ori~inal de números primos não estava com-

pleta.Por outro lado, se Q,\ não for primo, então ele deve ser per-feitamente divisível por um nÚmero primo. Este primo não podeser um dos números primos conhecidos, porque a divisãode Q,\

por qualquer um dos primos conhecidos vai deixar, inevitavelmen-te, um rcsto dc 1.Portanto, deve existir algum novonúmero primo

quechamaremosdePN+ IAgora chegamos ao estágio onde ou Q,\ é um novo númeroprimo ou temos outro número primo novo P,, +,. De qualquerforma teremos feito um acréscimo à nossa lista original. Agorapodemos repetir o processo incluindo nossos novos númerosprimos (Ps + I ou Q,\) em nossa l ista para gerar um novo númeroprimo QB.OUeste número será um novo número primo ou teráque existir um outro nÚmero primo P,. +2que não estava em nossalista original . A conclusão é que não importa o quão longa seja anossa lista de nÚmeros primos, vai ser scmpre possívcl encon-trar um novo. Portanto, a lista de primos não tem fim, ela é infi-

nita.Mas como pode alguma coisa que é inegavelmente menor doque uma quantidade infinita ser infinita? No começo do século XXo matemático alemão David Hilbert disse: O infinito Nenhum outro

conceito estimulou tão profundamente o espírito humano; nenhumaoutra idéia est imulou o intelecto de modo tão frutífero, e no en-tanto nenhum outro conceito precisa ser mais esclarecido do quea idéia do infinito.

Para ajudar a explicar o mistério do infinito, Hilbert criou

110 o ÚLT IMO T EORE :lI A DE F ERMAT UMA DESGR AÇ A M AT EM ÁT IC A 111

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nito de números irracionais é maior do que o conjunto infinito denúmeros racionais. Os matemáticos tiveram que desenvolver todoum sistema de nomenclatura para lidar com as escalas variáveis doinfinito e lidar com esse conceito é um dos assuntos mais quenteshoje em dia.

Embora a infinidade de números primos tenha acabado com

as esperanças de se encontrar uma prova precoce para o ÚltimoTeorema de Fermat este mesmo suprimento incontável de números primos teve implicações bem mais positivas em outras áreascomo por exemplo a espionagem e a evolução dos insetos. Antesde voltarmos à busca pela demonstração do Último Teorema deFermat vale a pena dar uma olhada rápida nos usos e abusos dosnúmeros primos.

A teoria dos números primos é uma das poucas áreas da matemática pura que encontra aplicações diretas no mundo real maisprecisamente na criptografia. A criptografia envolve a codificação

de mensagens secretas de modo que elassó possam ser decodificadaspelo receptor e não por outra pessoa que possa interceptá Ias. Oprocesso de codificaçãoenvolveo uso de uma chavesecreta e tradicionalmente a decodificaçãoda mensagem simplesmente exigeque o receptorapliquea chaveaocontrário.Comesteprocedimentoa chaveé o elo mais fraco na corrente da segurança.Em primeirolugar aquele que enviaa mensagem e aquele que a recebe devemestar de acordoquanto aos detalhes da chave e a trocadesta informação é um processo arriscado. Se o inimigo interceptar a trocade chaves então ele poderá decodificar todas as mensagens subseqüentes. Em segundo lugar as chavesdevemser trocadas regu

larmente de modo a manter a segurança da operação e cadavezque isso acontece há o risco da novachaveser interceptada.O problema da chavegira em torno do fatode que sua aplica

çãode um modo codificaa mensagem enquanto aplicando a emreversodecodifica.Ou seja decodificara mensagem deve ser tãofácil quanto codificá Ia.Contudo a experiência nos mostra queexistem muitassituaçõesdiáriasonde a decodificaçãoé muitomaisdifícildoqueacodificação.É fácilmexerum ovo masfazê ooltar ao estadooriginalé muito mais difícil.

Na década de 1970 Whitfield Diffie e Martin Hellman tiveram a idéia de procurar por um processo matemático que fossefácil de realizar em um sentido mas incrivelmente difícil derealizar na direção oposta. Tal processo seria a chave perfeita.Por exemplo eu poderia ter uma chave em duas etapas. A metade codificadora eu colocaria num diretório público. Assim qual

quer um poderia me enviar mensagens codificadas mas só euteria a parte decodificadora da chave. Embora todo mundo soubesse da parte codificadora ela não teria relação com a partedecodificadora.

Em 1977Ronald Rivest Adi Shamir e Leonard Adleman umaequipe de matemáticos e cientistas de computadores do Institutode Tecnologia de Massachusetts perceberam que osnúmeros primoseram a base ideal para um processo fácil de codificar/difícil dedecodificar. De modo a fazer a minha própria chave pessoal eu usariadois enormes números primos cada um contendo cerca de 80 dígitos e então multiplicaria um pelo outro de modo a obter um nú

mero não primo ainda maior. Para codificar as mensagens tudo oque é necessário é o conhecimento do número não primo enquantopara decodificar a mensagem é preciso conhecer os dois númerosprimos originais que foram multiplicados conhecidos como fatores primos. Eu posso agorapublicar meu número não primo enormea parte codificadora da chave enquanto mantenho os dois fatoresprimos ou seja a parte decodificadora da mensagem para mim. Eo que é importante embora todo mundo conheça o imenso núme .ro não primo uma dificuldade imensa aguarda quem tentar descobrir os fatores primos.

Usando um exemplo simples eu poderia apresentar o número589 que não é primo para que todos o usassem na codificação demensagens para mim. Eu manteria em segredo os dois fatores primos de 589 de modo que só eu pudesse decodificar as mensagens.Se outras pessoas pudessem descobrir os dois fatores primos então elas também poderiam ler minhas mensagens mas mesmo paraeste número pequeno não fica evidente quais são seus fatores primos. Neste caso seriam necessários apenas alguns minutos numcomputador doméstico para calcular os fatores primos como sen

112 o ÚI;rI;\IO mORDIA DE FER;\IAT UMA DESGRAÇA MATEMÁTICA 113

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do 31e 19 (31x 19= 589) e assim minha chave não ficaria segurapor muito tempo.

Contudo, na realidade, o número não-primo que eu publicariateria mais de cem dígitos, o que torna a tarefa de encontrar os fa-tores primos realmente impossível. Mesmo que os computadoresmais poderosos domundo fossem usados para decompor este imenso

número não-primo (achavecodificadora) em seus dois fatores primos(a chave decodificadora), seriam necessários vários anos para seobter uma resposta. Portanto, para lograr os espiões estrangeiros,eu só tenho que mudar a chave numa base anual. Uma vez por anoeu anuncio meu novo número gigante não-primo e todos os quequiserem decodificar minhas mensagens terão que começar a com-putar os dois fatores primos do início.

Além de encontrar um papel na espionagem, os números pri-mos também aparecem no mundo natural. As cigarras, maisnotadamente a 1I1agicicadaseptendeci11l possuem o ciclo de vidamais longo entre os insetos. A vida delas começa embaixo da ter-

ra, onde .as ninfas sugarn pacientemente o suco da raiz das árvo-res. Então, depois de 17anos de espera, as cigarras adultas emergemdo solo e voam em grande número espalhando-se pelo campo.Depois de algumas semanas elas acasalam, põem seus ovos emorrem.

A pergunta que intrigava os biólogos era: Porque o ciclo devida

da cigarra é tão longo?E será que existe algum significado no fatodeo cicloser um número primo de anos? Outra espécie, aMagicicada

h edeci11l forma seus enxames a cada 13 anos, sugerindo que umciclo vital que dura um número primo de anos oferece alguma van-tagem evolutiva.

Uma teoria sugere que a cigarra tem um parasita com um ci-clo de vida igualmente longo, que ela tenta evitar. Se o ciclo devida doparasita for de, digamos, 2 anos, então a cigarra procuraevitar um ciclo vital que seja divisível por 2, de outro modo os ci-clos da cigarra e do parasita vão coincidir regularmente. De modosemelhante, se o ciclo de vida do parasita for de 3 anos, então acigarra procura evitar um ciclo que seja divisível por 3, para queseu aparecimento, e o do parasita, não volte a coincidir. No final,

para evitar se encontrar com seu parasita, a melhor estratégia paraas cigarras seria ter um ciclo de vida longo, durando um númeroprimo de anos. Como nenhum número vai dividir 17,a Magicicada

septendeci11l raramente se encontrará com seu parasita. Se o pa-rasita tiver um ciclo de vida de 2 anos, eles sóse encontrarão umavez a cada 34 anos, e se ele t iverum ciclo mais longo, digamos, de

16 anos, então eles só vão se enéontrar uma vez a cada 272 (16 x17) anos. ,

De modo a contra-atacar, o parasita só pode ter dois ciclos devida que vã~ aumentar a freqüência de coincidências - o ciclo anuale o mesmo ciclo de 17anos da cigarra. Contudo, é improvável queo parasita sobreviva se reaparecer durante 17anos seguidos, por-que pelos primeiros 16anos nãovaiencontrar cigarras para parasitar.Por outro lado, para alcançar o ciclo de 17anos, as gerações de pa-rasitas terão que primeiro evoluir para o ciclo de 16anos. Isto sig-nifica que, em algum estágio de sua evolução, a aparição do parasi-ta e da cigarra não coincidiria durante 272 anos Em ambos oscasos

o longo ciclo vital da cigarra a protege.Isto pode explicar por que o suposto parasita nunca foi en-

contrado. Na corrida para alcançar as cigarras, o parasita prova-velmente foi estendendo seu ciclo de vida até atingir a barreirados 16 anos. Então o aparecimento das duas espécies deixou de,coincidir por 272 anos e a ausência de cigarras levou o parasita àextinção. O resultado é uma cigarra com um ciclo de vida de 17anos que ela não mais necessita, porque seu parasita não existemaIs.

 onsi ur  e lanc

No começo do século XIX o Último Teorema de Fermat já se fir-mara como o mais famoso problema dateoria dos números. Desdeo avanço realizado por Euler não houvera outros progressos, masuma dramática revelação, feita por uma jovem francesa, iria revi-gorar a busca pela demonstração perdida. Sophie Germain viveuem uma era de preconceitos e chauvinismo. Para realizar suas pes-

114 o ÚLTIl\1O TEOREl\IA DE FERl\IAT UMA DESGRAÇA MATEMÁTICA

I

115I

estudantes. Theano foi uma das vinte e oito irmãs da Irmandade

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Sophie Germain

. - -_::.. : - - - - -~--: ~'-:. -.~~,~_.- - --. --

~= - ~~.~;~:~ =;; ~\: :~~~;~~~~~--~.~-~~~~::::~~~ ~:~ ~{ ~~ .;?~,

tudar matemática, mas apesar da discriminação boU\'e:.mulheres matemáticas que lutaram contra os precow' ::;vando seus nomes na história da ciência. A primeira 'produzir um impacto nesta disciplina foi Theano, noa.C. Ela começou sua carreira como uma das estu.Pitágoras e acabou se casando com ele. Pitágoras é conbec:idó o filósofo feminista porque ativamente encorajou ml

Pitagórica.Nos séculos seguintes, filósofos como Sócrates e Platão conti-

nuariam a convidar mulheres para suas escolas, mas foi somenteno século IVde nossa época que uma mulher fundou sua própriaescola de matemática, e se tornou muito influente. Hipáeia, filha

de um professor de matemática da Universidade de Alexandril:l.,ficoufamosapor fazer as dissertações mais popularesdo mundo conhe-cido e por ser uma grande solueionadorade problemas.Matemá-ticosque haviampassadomesessendofrustrados poralgumproble-ma emespeciales~reviamparaelapedindouma solução.E Hipáciararamente desapontava seus admiradores. Ela era obcecada pelamatemática e pelo processo de demonstração lógica.Quando lheperguntavampor que nunca se casaraela respondia que já era ca-sada com a verdade. E, finalmente, sua devoção à causa daracionalidade causou sua ruína, quando Cirilo, o patriarca deAlexandria,começoua oprimir os filósofos,os cientistas e os ma-temáticos, a quem chama\ 3 de hereges. O historiador Edward Gibbonfaz um relato \Í \ido do que aconteceu depois que CiriJo tramou contra

Hipácia e instigou as massas contra ela:

Xum dia fatal, na estação sagrada de Lent, Hipácia foi ar-rancada de sua carruagem, teve suas roupas rasgadas e foi

arrastada nua para a igreja. Lá foi desumanamente massa-

crada pelas mãos de Pedra, o Leitor, e sua horda de fanáti-

cos selvagens. A carne foi esfolada de seus ossos com ostrasafiadas e seus membros, ainda palpitantes, foram atiradosb chamas.

IIdepois da morte de Hipácia a matemática entrou num perío- I

 deestagnação e somente depois da Renascença foi que outra I'screveu seu nome nos anais da matemática. Maria Agnesi

emMilãoem 1718e, como Hipácia,era filhade um mate- .

, im. Ela foireconhecida comoum dos melhores matemáticos-..,Europae ficou particularmente famosa por seus tratados sobre

.~J:mgentes às curvas. Em italiano as curvas são chamadas versiera

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116 ( ) ú l: rJ ;\ IO TEORE:\ IA DE FER;\ IAT UMA DESGRAÇA MATEMÁTICA 117

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palavraderivada do latim  ve11ere,  virar , mas esta palavra tambémé uma abreviação de avversiera, ou esposa do Diabo . Uma curvaestudada por Agnesi (versiera Agllesi) foi traduzida erradamentepara o inglês como a bruxa Agnesi e em pouco tempo a própria.matemática era chamada. pelo mesmo título.

Embora os matemáticos de toda a Europa reconhecessem as

habilidades de Agnesi, muitas instituições acadêmicas, em espe-cialaAcademia Francesa, continuaram a lhe recusar uma vaga comopesquisadora. A discriminação institucionalizada contra as mu-lheres continuou até o século xx, quando Emmy Noether, des-crita por Einstein como o mais significante gênio matemáticocriativo já produzido desde que as mulheres começaram a cursaros estudos superiores , teve negado seu pedido para dar aulas naUniversidade de Gottingen. Amaioria do corpo docente argumen-tou: Como podemos permitir que uma mulher se torne Pn -

vatdozelll? Tendo se tornado Privatdozelll ela pode se tornar pro-fessora e membro do Conselho Universitário... O que os nossos

soldados vão pensar quando voltarem para a Universidade e des-cobrirem que devem aprender aos pés de uma mulher? Seu amigoc mentor David Hilbert respondeu:  Meille Herrell, eu não vejocorno o sexo de um candidato possa ser um argumento contra suaadmissão como Pn vatdozel1l. Afinal, o Conselho não é uma casade ba.lhos.

Depois perguntaram a seu colega Edmund Landau se Noetherera defatouma grande matemática, aoque ele respondeu: Eu possotestemunhar que ela é um grande matemático, mas se ela é umamulher eu não posso garantir.

Além de sofrer discriminação, Nocthcr.tevc muitas outras coi-sas em comum com outras mulheres matemáticas através dos sé-

culos, como o fato de que ela também era filhade um professor dematemática. Muitos matemáticos, de ambos os sexos, são de famí-lias de matemáticos, dando origem a brincadeiras sobre a e}Ústên-cia de um gene matemático, mas no caso das mulheres a porcen-tagem é particularmente alta. A explicação mais provável é que arnaioria das mulheres com potencial nunca teve contato com a dis-ciplina ou foi encorajada a estudá-Ia, enquanto as filhas de profes-

sores não podem evitar viverem rodeadas de números. Além disso,Noether, como Hipáeia, Agnesi e a maioria das outras matemáti-cas nunca se casaram, principalmente porque não era socialmenteaceitável que as mulheres se dedicassem a estas carreiras, e pou-cos homens estavam preparados a esposar mulheres com um pas-sado tão polêmico. Agrande matemática russa Sonya Kovalevskyé

uma exceção à regra já que ela arranjou um casamento de conve-niência com VIadimir Kovalevsky,um homem que concordou comum relacionamento platônico. Para ambas as partes o casamentopermitiu q~e escapassem de suas famílias e se concentrassem emsuas pesquisas. E no caso de Sonya, tornou mais fácil para ela via-jar sozinha pela Europa depois que se tornara uma respeitávelmulhercasada.

De todos os países europeus, a França era o mais preconceituosoquanto a mulheres instruídas, declarando que a matemática erainadequada para as mulheres e além de sua capacidade mental. Eembora os salões de Paris tenham dominado o mundo da matemá-

tica durante a maior parte dos séculos XVIII e XIX, somente umamulher conseguiu escapar da prisão imposta pela sociedade fran-cesa firmando-se como uma grande teórica dos números. SophieGermain revolucionou o estudo do Último Teorema de Fermat e

fez uma contribuição ainda maior do que todos os homens que aantecederam. 11: . I

Sophie Germain nasceu no dia 10de abril de 1776,filha do ne- I

gocianteAmbroise-François Germain. Fora de seu trabalho, suavida .

1

foi dominada pelas agitações da Revolução Francesa - o ano em

queeladescobriuseuamorpelosnúmerosfoiomesmoanodaQueda 1

da Bastilha, e seu estudo do cálculo foi obscurecido pelo Reinado IdoTerror.Seuspaiseramfinanceiramentebem-sucedidosmas a \famíliade Sophienão pertencia à aristocracia.

Embora as mulheres da classe socialde Germain não fossemestimuladas a estudar matemática,elas deveriamter conhecimen-to suficiente do assunto para poder debatê-Io,casoo tema apare-cesse em uma conversaeducada. Paraisso haviauma série de li-vrosescritosparaajudaremasmulheresa se inteiraremdosúltimosavançosna matemática e na ciência. FrancescoAlgarottifoio au-

118 o l JLTI :\ IO TEORE1\ IA DE FERMAT UMA DESGRAÇA MATEMÁTICA 119

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tor deA filosofia de Si Isaac Newtoll explicada para as senhoras.

ComoAlgarotti achava que as mulheres estavam interessadas ape-nasem romance, eletentou explicar asdescobertas de Newton atravésdeum diálogo entre uma marquesa e seu namorado. Por exemplo,o homem delineia a lei do inverso do quadrado da distância na atraçãogravitacionale a marquesa apresenta sua própria interpretação destalei flJllllamcntal da física. Eu não posso dcixar dc pClIsar .u) qucesta proporção dos quadrados das distâncias dos lugares u.) sejaverdadeira mesmo no amor. Assim, depois de oito dias de ausên-cia, o amor se torna sessenta e quatro vezes menor do que era noprimeiro dia.

Não é de surpreender que este gênero de livro não tenha inspi-rado o interesse de Sophie Germain pela matemática. O aconteci-mento que mudou sua vida ocorreu um dia, quando ela estava na~iblioteca de seu pai e encontrou A histó ada matemáticadeJean-Etienne Montucla. O capítulo que dominou sua imaginação foi oensaio de Montucla sobre a vida de Arquimedes. O relato das des-cobertàs de Arquimedes era sem dúvida alguma interessante, maso que a deixou fascinada foi a história de sua morte. Arquimedespassara avidaem Siracusa, estudando matemática em relativa tran-qüilidade, mas quando se encontrava no fim dos setenta anos a pazfoi quebrada pela invasão do Exército romano. Diz a lenda que,durante a invasão,Arquimedes estava tão entretido, estudando umafigura geométrica desenhada na areia da praia, que deixou de res-ponder a uma pergunta de um soldado romano. E o soldado o ma-tou com uma lança. .

Germain concluiu que, se alguém poderia ser tão envolvido por

Utuproblema de geometria a ponto de ser morto, então a matemá-tica devia ser o assunto mais interessante do mundo. Ela imedia-

tamente começou a aprender o básico da teoria dos números e docálculo e logo estava dormindo tarde para estudar os trabalhos deEuler e Newton. Este súbi to interesse em um assunto tão poucofeminino deixou seus pais preocupados. Um amigo da família, oconde Guglielmo Libri-Carrucci dalla Sommaja, relata como o paide Sophie tomou suas velas e agasalhos e removeu todo o aqueci.mento de modo a impedi-Ia de estudar. Alguns anos antes, na In-

,

glaterra, a jovem matemática Mary Somerville também teve suasvelas confiscadas pelo pai, que afirmou: Devemos colocar um fimnisto ou vamos ter que colocar Mary numa camisa-de-força um diadesses.

No caso de Germain ela reagiu mantendo um estoque secretode vclas c sc enrolando nas roupas de cama. Libri-Carrucci escre-

veu que as noites de inverno eram tão frias que a tinta conge,lavadentro do tinteiro, mas Sophie continuava a estudar, apesar de tudo~Ela foi descrita por algumas pessoas como sendo tímida e desajei-tada, mas tinha também uma determinação imensa e finalmenteseus pais foram vencidos e deram a Sophie o seu apoio. Germainnunca se casou e por toda sua carreira seu pai financiou suas pes-quisas. Durante muitos anos Germain continuou a estudar sozi-nha, já que não havia matemáticos na família que pudessem trazerpara ela as últimas idéias e seus professores se recusavam a levá-Iaa sério.

Então, em 1794, a ÉcoIe Polytechnique foi inaugurada em Pa-

ris. Ela foi fundada para ser uma academia de elite treinando cien-tistas e matemáticos para o país. Seria um lugar ideal para Germaindesenvolver seu talento matemático a não ser pelo fato de que tra-tava-se de uma instituição reservada apenas para os homens. Suatimidez natural a impedia de enfrentar o corpo de diretores daaca-demia, e, assim, Sophie passou a estudar secretamente na École.Ela assumiu a identidade de um ex-aluno, Monsieur Antoine-AugustLe Blanc. A administração da academia não sabia que overdadeiroMonsieur Le Blanc tinha deixado Paris e continuava a imprimirresumos de aulas e problemas para ele. Germain conseguia obtertudo o que era destinado a Le Blanc e a cada semana entregava as

respostas dos problemas sob este pseudônimo.Tudo correu bem até que dois meses depois o supervisor do

curso, Joseph-Louis Lagrange, não pôde mais ficar indiferente aotalento demonstrado nas respostas de Monsieur Le Blanc. Não sósuas soluções eram maravilhosamente engenhosas como mostra-vam uma transformação extraordinária em um estudante que an-teriormente fora notório por seus péssimos cálculos. Lagrange, queera um dos melhores matemáticos do século XIX, sol icitou um

]20 o L'LTI \IOTEOHE:\L\ DE FEH:\L\T

encontro com o estudante recuperado e Germain foi forçada e re-

UMA DESGRAÇA MATEMÁTICA 121

do secretamente e fracassado em conseguir algum progresso na

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velar sua verdadeira identidade. Lagrange ficou atônito mas con-tente aoconhecer ajovem e tornou-se imediatamente seu amigo ementor. Afinal Sophie Germain encontrara um professor que po-deria inspirá': 'lae com o qual ela poderia se abrir a respeito de seustalentos e ambições.

Adquirindo confiança, Germain foi além da solução de proble-mas para o curso e passou a estudar áreas inexploradas da mate-mática. E o que é mais importante, ela se tornou interessada nateoria dos nÚmeros e acabou tomando conhecimento do Último

'lcorcma de Fermat. Sophie trabalhou no problema durante váriosanos e afinal chegou aoponto em que acreditava ter feito uma des-coberta importante. Ela preeisava agora debater suas idéias comoutro teórico dos nÚmeros e resolveu ir direto ao topo, consultan-do o maior teórico dos nÚmeros de todo o mundo, o matemáticoalemão Carl Friedrich Gauss.

Gauss é reconhecido como o mais brilhante matemático que

já viveu. (Enquanto E. T. Bell se refere a Fermat como O Prínci-pe dos Amadores , ele chama Gauss de Príncipe dos Matemáti-cos .) Germain tinha tomado contato com o trabalho de Gaussao estudar sua obra-prima Disquisitiolles arithmeticae, o tratadomais amplo e importante desde os Elementos de Euclides. O tra-balho de Gauss influenciou todas as áreas da matemática, masestranhamente ele nunca publicou nada sobre o Último Teoremade Fermat. Em uma carta Gauss chega a manifestar seu despre-

zo pelo problema. Seu amigo, o astrônomo alemão Heinrich Olbers.escrevera para Gauss encorajando-o a disputar o prêmio ofereci.

do pela Academia de Paris pela solução do desafio de FermaL Parece-me, caro Ga\lss, que você devia começar a se ocupar dis-:.;u.'o Duas semana:.;depuis Gauss respomleu: .. Fico-lhe lIluilo gralOpeIanotícia referente aoprêmio de Paris. Mas confesso que oÚltimo.,Tcorcma de Fermat, como uma proposição isolada, tem muito poucointeresse para mim. Eu poderia facilmente apresentar uma sériede proposições semelhantes que ninguém poderia provar ou des--mentir.

Alguns historiadores suspeitam de que Gauss tivesse ten... .

solução do problema. Assim, sua resposta para Olbers seria me-ramente um caso de despeito intelectual. Não obstante, quan-do recebeu as cartas de Germain, ele ficou suficientemente im-pressionado para esquecer sua opinião em relação ao ÚltimoTeorema.

Euler publicara 75anos antes sua demonstração para o caso de11= 3,e desde então os matemáticos vinham tentando demons-trar, sem sucesso, os casos individuais. Germain, contudo, adotara

uma nova es~ratégia, e descreveu para Gauss a chamada aborda-gem geral para o problema. Em outras palavras, seu objetivo ime-diato não era provar um caso particular e sim dizer algosobre muitoscasos de uma só vez. Em sua carta para Gauss, ela delineou umcálculo tomando como base um tipo especial de número primo p.

de modo que  2p + I) também fosse primo. A lista de números.primos de Germain incluía 5 porque 11 (2 x 5 + 1) também é pri-mo, mas não incluía 13,porque 27 (2 x 13 + 1) não é primo.

Germain desenvolveu um argumento elegante para demons-trar que provavelmente não existem soluções para x + y = z

para valores de n iguais a esses primos de Germain. Com o pro-vavelmente ela queria dizer que era improvável existirem solu-ções porque se existisse uma solução então x, y e z seriam múl-tiplos de 11e isso colocaria um~ séria restrição em qualquer solução.Seus colegas examinaram sua lista de primos um por um, ten-tandoprovarque x, y ouz poderiamnãoser múltiplosden eaca- .

baram demonstrando que para aqueles valores part iculares de n

não havia soluções.Em 1825o método teve seu primeiro sucesso completo graças

a Gustav Lejeune-Dirichlet e Adrien-Marie Legendre, dois mate-máticos separados por urna geração. Lcgcndrc era um homem nacasa dos setenta anos que atravessou todo o período turbulento da

'. . Revoluçãorancesa.Quandoele deixoude apoiaro candidatodoI governo para o Institut National sua pensão foi cortada, e ao fazer

sua contribuição para o Último Teorema de Fermat Legendre es-. favadesamparado e na pobreza. Por outro lado, Dirichlet era umij joveme ambicioso teórico dos números que acabara de completar

 

122 0(11:1 1:\10 TEORDI,\ DE FEIU\ IAT [ UMA DESGRAÇA MATEMÁTICA 123

Sophie Germain. Gauss ficou grato mas surpreso, pois nunca ti-

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vinte anos. Independentemente os dois foram capazes de provarque o caso 11= 5 não tinha solução, mas ambos basearam sua pro-va e seu sucesso no trabalho de Sophie Germain.

Quatorze anos depois a França produziu outro avanço. GabrielLamé fez alguns acréscimos engenhosos aométodo de Gcrmain econseguiu a demonstração para o número primo 17= 7.Germaint inha mostrado aos teóricos dos números como eliminar todo umconjunto de números primos e agora cabia aos esforços combina-dos de seus colegas a demonstração do Último Teorema, um casode cada vez.

O trabalho de Gennain no teorema foi sua maior contribuiçãoà matemática, mas inicialmente ela não recebeu nenhum crédito.Quando escreveu para Gauss, Germain ainda estava na faixa dosvinte anos e, embora ti\ esse conquistado uma reputação em Paris,elatemia que o grande Gauss não a levassea sério por ser uma mulher.De modo a se proteger, Germain recorreu novamente ao seu pseu-dônimo assinando as cartas como  follsiellrLe Blanc.

Seu ,temor e admiração por Gauss é demonstrado em uma dascartas: Infelizmente a profundidade de meu intelecto não se igualaà voracidade de meu apetite e sinto um certo receio por incomodarum homem de tamanha genialidade quando não tenho nada paramerecer sua atenção exceto uma admiração necessariamente com-partilhada por todos os seus leitores. Gauss, sem conhecer a ver-dadeira identidade de seu correspondente, tentou deixar Germainà vontade dizendo: Eu fico encantado que a ari tmética tenha en-contrado em você um amigo tão hábil .

As contribuições de Germain poderiam ter sido eternamente

atribuídas ao misterioso  follsieurLe Blanc, se não fosse pelo im-perador Napoleão. Em 1806, Napoleão invadia a Prússia e o Exér-cito francês conquistava uma cidade depois da outra. Germain fi-cou commedo de que o destino deArquimedes levasseo outro grandeherói de sua vida,Gauss. Assim ela enviou uma mensagem ao seu

amigo, general Joseph-Marie Pernety, que estava no comando dasforças invasoras. Ela pediu-lhe que garantisse a segurança de Gauss,e como resultado o general tevc um cuidado especial com o mate-máticoalemão, explicando-lhe que ele deviasua vida à ademoiselle

nha ouvido falar nesta misteriosa mulher.

O jogo terminara, Em sua próxima carta a Gauss, Sophie relu-tantemente revelou sua identidade. Longe de ficar zangado com oengano, Gauss escreveu para ela encantado:

Como descrever minha admiração e espanto ao ver meu esti- .mado correspondente,   onsieur Le Blanc, se transformar na

ilustre personagem que dá um exemplo tão brilhante de algoque eu t~ria achado difícil de acreditar. O gosto pelas ciências

abstratas em geral,e acimade tudo pelosmistérios dos números,é tão raro que a admiração nunca é imediata. O charme desta

ciência sublime se revela apenas para aqueles que possuem a

coragem para nela mergulhar profundamente. Mas quando umapessoa de seu sexo, que de acordo com nossos costumes e

preconceitos, deveria encontrar dificuldades infinitamente

maiores para se familiarizar com estas pesquisas espinhosas,

consegue superar os obstáculos e penetrar nas partes maisobscuras, então ela deve, sem dúvida, possuir uma nobre

coragem, talentos extraordinários e gênio superior. De fato,

nada seria para mim tão lisonjeiro e menos equivocado doquesaber que as atrações desta ciência, que enriqueceu minha vida

com tantas alegrias, não são quimeras, e se igualam napredileção com que a tem honrado.

A correspondência de Sophie Germain com Carl Gauss inspiroumuito de seu trabalho, mas em 1808o relacionamento terminoubruscamente. Gauss foi nomeado professor de astronomia na Uni-versidade de Gõttingen e seus interesses se transferiram da teoriados números para a matemática aplicada. Ele não mais se deu o

trabalho de responder as cartas de Germain. Sem seu mentor, aconfiança dela começou a diminuir e um ano depois Sophie aban-donou a matemática pura.

Ela iniciou uma carreira frutífera na física, uma disciplinaem que novamente se destacaria apenas para enfrentar os pre :conceitos da sociedade. Sua contribuição mais importante foi a

UMA DESGRAÇA MATEMÁTICA 125

 Memória sobre as vibrações de placas elást icas , um trabalho

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, .

Gabriel Lamé

brilhante que estabeleceu as fundações para a moderna teoriada elasticidade. Como resultado de sua pesquisa e de seu tra-balho no Último Teorema de Fermat, ela recebeu uma medalhado Institut de France e se tornou a primeira mulher, que nãofosse esposa de um membro, a assistir às palestras da Acade-

mia de Ciências. No fim de sua vida, Sophie retomou sua ami-zade com Carl Gauss. Ele convenceu a Universidade de Gõttingena conceder a ela um grau honorário. Tragicamentc, antcs quc auniversidade pudesse lhe dar esta honra, Sophie Germain mor-reu de câncer no seio.

Considerando-se tudo, provavelmente ela foi a maior inte-lectual que a França já produziu. E no entanto, estranho comopareça, quando o funcionário do governo redigiu o atesta-do de óbito desta eminente associada e colega de trabalhodos mais ilustres membros daAcademia Francesa de Ciên-

cias, ele a classificou como  e1Ztiere a1Z1Zuitantmulher sol-teira sem profissão) - não como mathématicie1Z1Ze.E istonão é tudo. Quando aTorre Eiffel foi erguida, uma obra onde

os engenheiros precisaram dar uma atenção especial à elas-ticidade dos materiais usados, os nomes de 72 sábios fo-

ram gravados na estrutura . Mas ninguém encontrará nestalista o nome desta mulher genial, cujas pesquisas contri -buíram tanto para a teoria da elasticidade dos metais: SophieGermain. Teria ela sido excluída da lista pelo mesmo mo-

tivo que tornou Agnesi inelegível para a Academia France-sa - porque era mulher? Parece que sim. Se foi este ocaso

maior é a vergonha sobre aqueles responsáveis por tama-nha ingratidão para com alguém que serviu tão bem a cau-

sa da ciência. Alguém cujas realizações lhe garantem umlugar invejável na galeria da fama.

H. J. Mozans, 1913

 

UMA DESGR AÇ A M AT EM ÁT IC A 127

Os nvelopes acrados

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i\llgustin Callchy

Depois da descoberta de Sophie Germain a Academia Francesade Ciências ofereceu uma série de prêmios incluindo uma medalha de ouro e três mil francos ao matemático que pudesse finalmente terminar com o mistério do Último Teorema de Fermat.

Além do prestígio de demonstrar o Último Teorema havia agorauma recompensa valiosa ligada ao desafio. Os salões de Paris ficaram cheios de boatos sobre quem estava adotando qual estratégia e o quão perto estariam de anunciar um resultado. Entãono dia 10de março de 1847 a Academia teve a reunião mais dramática de sua história.

A ata descreve como Gabriel Lamé que tinha demonstrado ocaso dc   = 7 alguns anos antes subiu ao pódio diante dos maisimportantes matemáticos de sua época e anunciou que estava muitopcrto dc dcmonstrar o Último Teorema de Fermat. Ele admitiu quesua prova ainda estava incompleta mas delineou o método e pre

viu que dentro das próximas semanas publicaria a demonstraçãocompleta no jornal da Academia.

Toda a audiência ficou perplexa mas assim que Lamé desceudo pódio Augustin Louis Cauchy outro dos melhores matemáticos de Paris pediu a palavra. Cauchy anunciou para a Academiaque estivera trabalhando numa abordagem semelhante à de Lamé I

e que também estava a ponto de publicar uma demonstração completa.

Ambos Cauchy e Lamé percebiam que a questão do tempo setornara crucial. Aquele que publicasse a demonstração completa

primeiro receberia o prêmio mais valioso e de maior prestígio namatemática. Embora nenhum dos dois tivesse a prova completaos dois rivais estavam ansiosos por reivindicar o direito da descoberta. ARsim apenaRtrês semanas depois do anúncio eles depositaram cnvelopes lacrados no cofre daAcademia. Esta era uma prática comum naquela época que permitia aos matemáticos fazeremum registro sem revelar os detalhes exatos de seu trabalho. Se maistarde surgisse uma disputa quanto à originalidade das idéias os

128 o 1 1:1 1 :\10 T EORE i\IA DE F ERi\I:\T

envelopes lacrados forneceriam a evidência necessária para esta-

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I

belecer a prioridade.A expectativa aumentou em abril, quando Cauchy e Lamé pu-

blicaram detalhes vagos mas fascinantes de suas demonstraçõesnojornal da Academia. Embor a toda a comunidade matemáticaestivesse desesperada para ver a demonstração completa, muitostor ciam par a que fosse Lamé e não Cauchy ovencedor da corrida.Todos conheciam Cauchy como um hipócrita, fanático religioso epessoa extremamente impopular com seus colegas. Ele só era to-lerado na Academia por seu talento.

Então, nodia 24de maio, foif eito um anúncio que acabou comtodas as especulações. Mas não foi nem Cauchy nem Lamé quemse dirigiu àAcademià e sim Joseph Liouville. Liouville chocou suaaudiência ao ler o cont eúd o de uma cart a do matemático alemãoErnst Kummer.

Kummer era um dos melhores teóricos dos números de todo o

mundo, todavia, durante boa parte de sua carr eira, seu talento foi

prejudicado por um patriotismo exacerbado e um ódio contraNapoieão. Quando Kummer era criança o Exército francês invadiusua cid ade natal , Sorau. Os franceses t rouxeram com el es uma

epidemia de tifo. O pai de Kummer era o médico da cidade e empoucas semanas foi morto pela doença. Traumatizado pela experiên-cia, Kummer jurou que faria tudo ao seu alcance para defender seupaís de novos ataques. Assim que completou a universidade, eleaplicou todo o seu intelecto aoproblema da determinação datraje-tória das balas de canhão. Acabou lecionando as leis da balística no

colégio militar de Berlim.Junto com sua carreira militar, Kummer se dedicou ativamen-

te à pesquisa da matemática pura e estava ciente da disputa queocorria na Academia Fr ancesa. Ele tinha lido os anais e analisado

os poucos detalhes que Cauchy e Lamé tinham se atrevido a reve-lar. Para Kummcr ficou óbvio que os dois franceses estavam se en-caminhando para o mesmo beco sem saída da lógica. Ele delineouseu ponto de vista na carta que enviara a Liouville.

Dc acordo com Kummcr, o problema fundamental era que asdcm )m~traçÔcsde Cauchy e Lamé dependiam do uso de uma pro-

Ernst Kummer

130 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERl\L\T UMA DESGRAÇA MATEMÁTICA

\I

1\

priedade dos números conhecida como fatoração única. A fatoração Aqui (1+.[:11) é um número complexo, uma combinação de u

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única diz que só existe uma combinação de números primos que,aoserem multiplicados, produzirão determinado número. Por exem-plo, a única combinação de primos que produz o número 18 é aseguinte:

18 = 2 x 3 x 3.

número real com um número imaginário. E embora o processomultiplicação seja mais complicado do que para os números cmuns, a existência dos números complexos levaa modos adicionade sc fatorar 12. Outro modo é (2 + H) x (2 - ~). Não exismais fatoração única e sim uma escolha de fatorações.

Esta perda dafatoração única colocouas provasde Cauchye Lamem perigo grave, mas não as destruiu completamente. As demonstrações deveriam mostrar que não existem soluções para a equaçãlx + y ~ z onde1lrepresentaum númeromaiordo que 2. Comfoi mostrado no início deste capítulo, a demonstração só precisav;funcionar para valores primos de 1l.Por exemplo, o problema dfatoração única poderia ser evitado para todos os números primoaté, c inclusive, 1l= 31. Contudo, o número primo n = 37 não podser vencido de modo tão fácil.E entre os números primos menoredo que 100,dois outros, 1l= S9e 67, são também casos problemáticosoEstes, assim chamados primos irregulares, estão espalhados entrl

os restantes números primos e eram agora os obstáculos contra aidemonstração.

Kummer chamou a atenção para o fato de que nenhuma mate-mática conhecida poderia abordar todos esses primos irregularesde uma só ve~. Contudo, ele acreditava que, através de técnicascuidadosamente elaboradas para cada primo irregular, cada casopoderia ser resolvido individualmente. Mas o desenvolvimento destastécnicas seria um exercício lento e penoso. Pior ainda, o númerode primos irregulares continua sendo infinito. Lidar com eles in-dividualmente ocuparia todos os matemáticos do mundo pelo res-to da eternidade.

A carta de Kummer teve um efeito arrasador sobre Lamé. Na Imelhor das hipóteses, a suposição da fatoração única t inha sidoexcesso de otimismo e, na pior das hipóteses, uma tolice. Lamépercebeu que se tivesse sido mais aberto com seu trabalho o erroteria sido detectado mais cedo.Ele escreveu para seu amigo Dirichletem Berlim: Se aomenos você tivesse estado em Paris, ou eu esti-vesse em Berlim, tudo isto não teria acontecido.

Enquanto Lamé se sent ia humilhado, Cauchy se recusava a

Do mesmo modo, os números seguintes são unicamente fatora-

dos dos seguintes modos:

3S = Sx 7180 = 2 x 2 x 3 x 3 x S

106.260 = 2 x 2 x 3 x S x 7 x 1 1 x 2 3 .

A fatoração única foi descoberta no século IVa.C., por Euclides.Ele provou que ela era verdade para todos os números naturais e

descreyeu a demonstração no Livro IXdos seus Elementos. O fatode que a fatoração única é verdadeira para todos os números natu-rais é um elemento vital de muitas outras demonstrações e hoje échamada de te01-email1ldamental da aritmética.

À primeira vista pode parecer não existir motivo para Cauchy eLamé não usarem a fatoração única, como centenas de matemáti-

cos já tinham feito antes deles. Infelizmente, ambas as demons-trações envolviam números imaginários. E embora a fatoração únicasejaverdadeira para os números reais, ela pode se tornar falsaquandointroduzimos os números imaginários, lembrava Kummer. E em

sua opinião esta era uma falha fatal.

Por exemplo, se nos restringirmos aos números reais, então onúmero 12 pode ser fatorado apenas como 2 x 2 x 3. Contudo, sepermitirmos a entrada de números imaginários nesta demonstra-ção, então 12também pode ser fatorizado do seguinte modo:

12= (1+ ~) x (1- ..Ç11).

132 o 1J;rI~IO TEORDL\ DE FER:\IATU MA D ES GR AÇ A M AT EM ÁT IC A 133

aceitar a derrota. Ele achava que, comparada com a demonstração Alguns dos contemporâneos de Wiles começavama suspeitar

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de Larné, a sua abordagem dependia menos de fatoração única. Atéque a análise de Kumm er tivesse sido completamente verificada,havi,a a possibilidade de que estivesse errada. Por várias semanasele continuou a publicar artigos sobre o assunto, até que, pelo fimdo verão, ele tam bém sc calou.

Kumm er tinha mostrado que a dem onstração com pleta do Úl-timo Teorema de F ermat encontrava-se além de abordagens coma matemática d a época. Era uma p eça br ilh ante de l ógi ca mate-mática, mas um golpe devastador em toda uma geração de matemá-ticos que tivera esperanças de resolver o mais difícil dos problemas.

Esta sit uação fo i resumida p or Cauchy em 185 7, quand o eleescreveu o relatório final daAcademia sobre o prêmio para o Últi-mo Teorema de F ermat:

Relatório para a competição pelo Grande Prêmio em ciências

matemáticas. Competição estabelecida em  85 e prorroga-

d a ~ m 1 85 6.Onze trabalhos foram apresentados ao secretário. Nenhum

solucionou a questão proposta. Assim, depois de ser apresen-tado muitas vezes como objetivo do prêmio, o problema conti-nua no ponto em que o I ollsiellrKummer o deixou. Contudo,os matemáticos devem se congratular pelos trabalhos realiza-dos pelos geômetras em seu desejo de resolver oproblema. Emespecial o lI 7lSiellrKummer. Os comissários acreditam que a

Academia tomaria uma decisão honrada se retirasse o proble-mada competição e entregasse a medalha ao  onsiemoKummerpor sua bela pesquisa sobre os números complexos e integrais.

de que o problema era impossívelde ser resolvido.TalvezFermattivessese iludidoe a razãopor que ninguém redescobriraa demons-tração de Fermat é que tal demonstração não existia.Mas apesardo ceticismo Wiles continuou sua busca. Ele era inspirado peloconhecimento de várioscasos onde demonstrações sótinham sido

obtidas depois de séculos de esforços.E em alguns desses c~sosarevelaçãoque resolvera o problema não dependera de uma novamatemática, era algoque poderia ter sido feito há muito tempo.

Era p9ssível que todas as técnicas necessárias para demons-trar o ÚltimoTeoremade Fermatjá estivessemdisponíveise o únicoingrediente ausente fosse engenhosidade.Wiles não estavaprepa-rado para desistir.A provado Último Teoremadeixara de ser umamania de infância para se tornar uma obsessão. Tendo aprendidotudo que haviapara aprender sobre a matemática do século XIX,Wiles decidiu se armar com técnicas do séculoxx.

Durante dois séculostodas as tentativaspara redescobrira demons-tração para o Último Teorema de Fermat tinham terminado emfracasso. Durante sua juventude AndrewWiles estudara o traba-lho de Euler, Germain, Cauchy,Lamé e finalmente Kummer. Eleesperavaaprender com os erros de cada um, mas, na ocasiãoemque entrou para a Universidade de Oxford, enfrentou a mesmabarreira que Kummer.

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..

.i.

 

..\ ,~,; .:J:

.Mergulho na Abstração

A prova é o ídolo diante do qual o matemático se tortura.

,.   r Arthur Eddington

~

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Depoisdo trabalho de Ernst Kummer,as esperanças de se desco-brir uma demonstração para o Último Teorema de Fermat pare-c:dmcadavezmais débeis.Alémdisso, a matemática estavacome-çando ~ se voltarpara outras áreas de pesquisa. Haviao risco deque a novageração de matemáticos acabasse ignorandoo que pa-reciaum beco sem saída.No finaldo séculoXIXoproblemaaindaocupavaum lugar especial no coraçãodos teóricos dos números,mas eles tratavam o ÚltimoTeoremade Fermat do mesmo modo

comoosquímicosencaramaalquimia:amboseram sonhosromân-ticosde uma época que passara.Na viradado século,PaulWolfskehl,um industrial alemão de

Darmstadt, deu uma novavida ao problema.A famíliaWolfskchlera famosapor sua riqueza e pelomodo comoapoiavaa arte e asciências.Paulnãoera exceção.Ele estudara matemática na univer-sidadee, embora dedicassea maior parte de sua vidaà construçãodo império financeiro da família,também mantinha contato com

.,

.

Paul Wolf~kchl

136 o ÚL:J' JMO TEOREMA DE FERMAT

matemáticos profissi(}nai~c continuava a e~tul1ar a teoria d()~níl-

iI1,I

I

MERGULHO NA ABSTRAÇÃO 137

Ollprovar qllc sua suposição cstava errada. Quando o dia amanhc-

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meros. Em particular, Wolfskehl se recusava a desistir do Último' corcl11adc Fcrmat.

Ele não cra um matemático talentoso e não fc:cnenhuma gran-de contribuição para a descoberta da demonstração. Entretanto,graças a uma curiosa série de acontecimcntos, Wolfskehl se tor-

nou ligado para sempre ao Últirrio Teorema, inspirando milharesde outros a aceitarem o desafio.

A história começa com a obsessão de Wolfskehl por uma linda mulher, cuja identidade nunca foi determinada. Para sua depres-são, a mulher misteriosa o rejeitou e Paul foi deixado em tamanhoestado de desespero que resolveu se suicidar. Ele era um homemapaixonado, mas não impetuoso, e planejou sua morte nos meno-res detalhes. Marcou um dia para o suicídio e resolveu que dariaum tiro na cabcça exatamente à meia-noi te. Nos dias que lhe res-tavam, ele resolveu todos os seus negócios pendentes e no últimodia cscreveu RClltCRtamcnto e cartas para todos os amigos mais

chegados e a família.Mas Wolfskehl fora tão eficiente que tudo estava terminado

bem antes da meia-noite. Para passar o tempo até a hora fatal elese dirigiu para lima biblioteca onde começou a ler livros de mate-mática. Não demorou muito e se encontrou diante do trabalho

clássico de Kummcr sobre o fracasso de Cauchy e Lamé. Era umdos grandcs cálculos de sua época e uma leitura adequada paraos Últimos momentos dc um matemático suicida. Wolfskehl co-

meçou a examinar os cálculos linha por linha. Subitamente foisurpreendido pel~ que parecia um erro lógico- Kummer tinha

feito uma suposição e deixara de justificá-Ia em seu argumento.Wolfskehl se perguntou se teria descoberto um erro sério ou se asuposição de Kummer seria justif ieada. Se a primeira hipótesefosse verdadeira, então havia uma chance de que a prova para oÚltimo Tcorcma de Fcrmat fosse mais fácil do que muitos tinhampresumido.

Ele se sentou examinando o segmento inadequado da demons-tração c logo Retornou envolvido no descnvolvimento de limaminidemonstração que Olliria consolidar o trabalho de Kummer

J ceu, o trabalho estava terminado. A má notícia, no que coneerne àmatemática, é que a demonstração de Kummer tinha sido conser-tada e o Último Teorema permanecia no reino do inatingível. A boanotícia é que a hora mareada para o suicídio tinha passado. Wolfskehlestava tão orgulhoso por ter descoberto e corrigido uma falha notrabalho do grande Ernst Kummer que seu desespero e mágoa ti-nham evaporado. A matemática lhe dera uma novavontade de viver.

Wolfskehl rasgou suas cartas de despedida e reescreveu seutestamento em face do que acontecera naquela noite. Quando elemorreu, em 1908, o novo testamento foi divulgado e a famíliaWolfskehl ficou chocada aodescobrir que Paul destinara uma grandeporção de sua fortuna como prêmio, a ser entregue a qualquer umque pudcsse provar o Último Teorema de Fermat. O prêmio, de 100mil marcos, equivaleria aum milhão de dólares pelos padrões atuaise era seu modo de pagar uma dívida com o enigma que salvara suavida.

O dinheiro foi colocado sob a guarda doKihl ftliclte Gesellscltaft

der Wissellschaftell de Gõttingen, que anunciou oficialmente o inícioda competição pelo Prêmio Wolfskehl no mesmo ano:

'i~I

i

Pelos poderes conferidos a nós pelo Dr. Paul Wolfskehl, mor-

to em Oarmstadt, nós, portanto, criamos um prêmio de cem

mil marcos a ser dado à pessoa quc primeiro provar o grandeteorema de Fermat.

As seguintes regras serão seguidas:

(1) O Konigliche Gesellschaft der Wissenschaften deGõttingen, terá liberdade absoluta para decidir a quem oprêmioserá entregue. Elerecusará manuscritos produzidos comoÚnicoobjctivo dc cntrar na compctição pelo Prêmio. Só serãoconsiderados os trabalhos de matemática que tiverem apare-cido sob forma de monografia nas publicações especializadas0\1que estejam à vcndl nas livraril s. A Socicdadc pl'dc ao~alllorc~ dc tais trahalhos qllc cnvicm pclo I\ICIIOSinco excl\I-

pIares impressos.

138 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT MERGULHO NA ABSTRAÇÃO 139

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(2) Trabalhos publicados num idioma que não seja entendi-do pelos espceialistas escolhidos pelo jílri serão excluídos dacompctição. Os autores de tais trabalhos poderão substituí-

los por traduções de garantida fidelidade.(3) ASociedade declina sua responsabil idade pelo exame

de trabalhos que não foram trazidos à sua atenção ou porerros que possam resultar do fato de que o autor de um tra-balho, ou parte de um trabalho, seja desconhecido para aSociedade. .

(4) A Sociedade reserva para si o direito de decisão no casodI' viÍria: \ Iw:,: \O:l :\ (pl 11'1111:1111COII:H:j.{lIido 11111:1mlllf\ão p:lr: l o

problema ou para o caso em que a solução seja o resultado dosesforços combinados de vários estudiosos, em particular noque coneernc ao direito ao Prêmio.

(5) A entrega do Prêmio pela Sociedade não acontecerá an-

tes de dois anos depois da publicação do trabalho premiado.

O intervalo de tempo destina-se a permitir que matemáticosda Alemanha e do exterior possam dar sua opinião sobre avalidadeda soluçãopublicada. .

(6) Assim que o Prêmio for conferido pela Sociedade, o lau-reado será informado pelo secretário em nome da Sociedade.O resultado será publicado onde quer que o Prêmio tenha sido

anunciado no ano anterior . A entrega do Prêmio pela Socie-dade não será sujeita a qualquer discussão posterior.(7) O pagamento do Prêmio será feito ao laureado nos pró-ximos três meses após o anúncio, pelo Tesoureiro Real da

Universidade de Gõttingen, ou, correndo o beneficiário seus

próprios r iscos, em qualquer outro local que ele tenha esco-lhido.

(8) O capita l será entregue mediante recibo, ou em dinheiroou pela transferênda de valores financeiros. O pagamento do

Prêmio será considerado realizado pcla transmissão dessestí tu los f inanceiros, muito embora seu valor total , no final do

dia, pOssa não chegar a 100 mil marcos.

(9) Se o Prêmio nãofor entregue até 13de setembro de 2007,não serão aceitos mais trabalhos.

A competição para o Prêmio Wolfskehl está aberta, a partir dehoje, :wh as cOlldiçcicsacima.

Gõttingen, 27 de junho de 1908Die Kjjnigliehe Cesellsehaft der Wissenschaften

É interessante notar que, embora o Comitê estivesse disposto a dar100 mil marcos ao primeiro matemático capaz de demonstrar queo Último Teorema de Fermat era verdadeiro, nem um centavo se-ria dado àquele que mostrasse que o teorema era falso,

() I'r( lIio WoIrskdll foi alllllwiado «:111odas as revistas e periÚ-

dicos cspecializados em matemática e a notícia da competiçãose espalhou rapidamente pela Europa. Mas apesar da campanhapublicitária c o incentivo do enorme prêmio, o Comitê Wolfskehlnão conseguiu despertar muito interesse entre os matemáticossérios. A maioria dos matemáticos profissionais viam o Últ imo

Teorema de Fermat como uma causa perdida e achavam que nãopodiam desperdiçar suas carreiras numa busca tola. Entretan-

to, o prêmio teve o mérito de apresentar o problema a toda umanova audiência, uma horda de mentes ávidas prontas a se entre-garem ao derradeiro enigma, abordando-o com completa ino-cência.

t I.I

A Era dos Enigmas Charadas e Quebra-Cabeças,f,

tI

Desde o tempo dos gregos, os matemáticos têm buscado tempe-

rar seus livros recriando demonstrações e tcoremas na forma decharadas com n(lrncros. Durante a (1ltima metade do século XIX

esta abordagem lúdica do assunto encontrou espaço na impren-sa popular . Problemas com números eram encontrados ao lado

das palavras cruzadas c anagramas. No devido tempo formou-seum público ávido por enigmas matemáticos, amadores que ten-tavam solucionar tudo, dos mais simples enigmas até os proble-mas matemáticos mais profundos, incluindo o Último Teoremade Fermat.

140 () ÚLTIMO TEOREMA DE I ERMAT

TalvczOmais prolífico criador de enigmas tenha sido Henry

I.~MEHGUI,IIO NA ABSTHAÇAo 141

iMuitos anos atrás, quando o Circo de Barnum era realmente

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Dudcney, que cscreveu para dezenas de jornais e revistas incluin-do oStmlld Cassell s o Queen Tit-Bits o TifkeklyDispatch e oBlighty.

Outro grande criador de enigmas da era vitoriana foi o reverendoCharlesDodgson, professor de matemática na Igreja Cristã de Oxforde mais conhecido como o escritor Lewis Carroll. Dodgson dedi-

cou váriosanos à criação de um gigantesco compêndio de proble-mas e enigmas intitulado Curiosa Mathematica e, embora a sérienão fosse terminada, o autor completou vários volumes, incluindoPillow Proble11ls.

Masomaior charadista de todos era oprodígio americanoSamLoyd(1841-1911).Comoadolescenteelejá ganhavamuito dinheirocriando novascharadas e reinventando antigas.Ele lembra nolivroSa11lLoyd Qlld  z sPuzzles:AllAutobiographicalReview que algunsdos primeiros enigmas foram criados para o mágicoe empresáriocircense P.T. Barnum:

Figura 11. Uma caricatura refletindo a mania causada pelo enigma 14-15 cIe Sam Loyd

II 1

I

1I

 o maior espetáculo da Terra , o famoso empresário me pe-

diu que preparasse para ele uma série de enigmas para pro-

pósitos de propaganda. Eles se tornaram conhecidos como .~perguntas daEsfinge devido aos grandes prêmios que seriamentregues a quem conseguisse decifrá-los.

I

t Curiosamente esta autobiografia foi escrita em 1928, dezesseteanos depois da morte de Loyd. Ele passara suas habilidades aoseu filho, também chamado Sam, que foi o verdadeiro autor dolivro.Sam calculou que qualquer um que comprasse o livro iriaacreditar que fora escrito por Sam Loydpai, que fora muito maisfamoso.

A mais célebre criação de Loyd foi o equivalente vitoriano do. Cubo de Rubik,o enigma 14-15 , que ainda pode ser encontrado

em algumas lojas de brinquedos mesmo hoje em dia. Quinze pe-ças numeradas de 1a 15são arrumadas em uma moldura 4 x 4. O

objetivoé fazer deslizar as peças, rearrumando-as na ordem cor-reta. O cnigma 14-15 de Loyd era vendido com a disposiçãomostradanaFigura 11cofereciaum prêmio significativoparaquemconseguisse completar o desafio, colocandoas peças 14 e 15nas posições corretas. O filho de Loyd escreveuassim sobre o es-tardalhaço gerado peloque era, essencialmente, um problema dematemática:

I

tUm prêmio de 1.000 dólares, oferecido para a primeira solu-

ção correta do problema nunca foi pago, embora existam mi-

lhares de pessoas que afirmam ter realizado a façanha. Hou-vegente que ficou obcecada pelo enigma e histórias cômicaseram contadas sobre lojistas que deixaram de abrir suas lojase sobre um distinto clérigo que passou uma noite de inverno.~1Ohm pORtede iluminação tcntando rclembrar o modo comorealizara o feito.Mas o detalhe misterioso é que ninguém parececapaz de relembrar a Reqiiência de movimcntoR cmbora le-I Ihal ll 1 '1 '1 11 ':1. :1d(' ' 1111 '1 1 ':101\ '1 '1 '11111 ( 'l i : I I' . Fala . :1(' d(' I i ll lO

IIciros quc dcixaram SCllSnavios cncalharem c dc maquinis-

142 o ÚI: I' IMO TEOItEMA DE FEHMAT

tas que deixaram o Irem ultrapassar a estação enquanto ten-

MEHGULIIO NA AIISTnAÇÃO 143

isto serÍl sempre verdadeiro. Enquanto o quadrado va:t.ioterminar

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tavamresolver o enigma. Um famoso editor de Baltilllore contaquc saiu para almoçar e foi encontrado por seus desespera-doscmpre~ados somente após a meia-noite, movendo pequenospedaços Jc pastclnum prato

Loyd estavaconfiante de que jamais teria que pagar os mil dólares,porque ele sabia que era impossível trocar duas peças de posiçãosem destruir toda a ordem em outro ponto do quadro. Do mesmomodo como um matemático podc provar quc uma cquação em es-pecial não tcm solução, Loyd podia provar que seu enigma 14-15era insolúvel.

A demonstração de Loyd começa definindo-se uma quantida-de que mede o quão cmbaralhado está o cnigma; este parâmetrode desordem é chamado deD .O fator de desordem para qualquerdisposição das peças consisd no número de pares de peças colo-cados na ordem incorreta, assim, para a disposição correta, mos-

trada na Figura 12(a), Dp = 0, porque não existem peças na ordemerrada.

Começando-se com a dispo~ição correta e movendo-se as pe-ças é relativamente fácil chegar aoarranjo mostrado na Figura 12(b).Ai5peças estão na ordem correta até chegarmos nas peças 12 e 11.Obviamente a peça 11 deveria vir antes da 12 e assim este par depeças encontra-se na seqüência incorreta. A lista completa dos paresque estão na ordem incorreta é a seguinte: (12,11), (15,13), (15,14),(15,11), (13,11) e (14,11). Com seis pares de peças na ordem erra-

da esta disposição tem Dp = 6. (Repare que a peça 10e a peça 12estão uma ao lado da outra, o que é claramente incorreto, mas não

estão na ordem errada. Portanto, este par não contribui para oparâmetro de desordem.)

Depois de mover as peças mais um pouco chegamos à disposi-ção mostrada na Figura 12(c). Se fizer uma lista dos pares na or-dem incorreta, vocêvai descobrir que éD = 12.Oimportante aquié notar que em todosesses casos, (a), (b) ~ (c),ovalordoparâmetrode desordem é um número par (0,6 e 12). De fato, se você come-çar com a disposição correta e for mudando a posição das peças,

sempre no canto inferior direito, qualqucr mudança na posição das

peças vai sempre resultar num valor par para D O valor par noparâmctro de desordem é lima propriedade integral de qw~lqllerarranjo derivado da disposição correta. Na matemática uma pro-

priedade que se mantém sempre, não importando o que for feitocom o objeto, é chamada de illvariaule

I'.

(a) (b) (c)p =o Dp= 12p= 6

t1:\

JI.'

I,J11.;'

11

nII

.1:\tI:.

Figura 12.Aodeslocar aspeças é possível criar vários arranjos desordenados.Para cada arrumação é possível medir a quantidade de desordem atravésdo parâmetro de desordem D  

Contudo, sevocê examinaro arranjoque estavasendo vendidopor Loyd, no qual as posiçõesde 14e 15tinham sido trocadas, ovalor do parâmetro de desordem é um, Dp = 1,já que o único parde peças fora de ordem é 14e 15.Para o arranjo de Loydo parâmetrode desordem tem um valor ímpar E no entanto nós sabemos quequalquer disposição derivada da arrumação correta apresenta umvalor par para o parâmetro de desordcm. A conclusão é que a dis-posição dc Loyd não é derivada da arrumação correta e, portanto, éimpossível ir do arranjo de Loyd para o correto. Os mil dólares deLoyd ficaram, então, scguros.

O enigma de Loyd e o parâmetro de desordem mostram o po-der da invariante. Invariantes dão aos matemáticos uma estratégiaimportante para demonstrar que é impossível transformar um ob-jeto em outro. Por exemplo, uma área estudada com entusiasmo,

,i;

I';1.',

I:'i

 ~. :~

1ii

1 2 3 4

5 6 7 8

9   2

 3  14  5

1 2 3 .4

5 :6  2 7

9 [10 8  5

 3 .14  ;

I

1 2 3 4

5 :6 7 8

9   2  15

 13  4  

144 ( ) l i : I' IMo ' J'EOI (l ~M i\ I >E FEIH \1 i\ 'J ','.

atualmente, se liga ao estudo dos nós. Os teóricos dos. nós estãointeressados em provar se um determinado nó pode ser transfor-

MI\W a 11 11 NA i\IIS'I'Hi\(;AO 145

a Universidade de Gõttingen. Não é de surpreender que todas asdemonstrações estivessem erradas. Embora todos os candidatos ao

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mado emoutro, torcendo-se e dobrando-se, mas sem cortar a cor-da. De modo a responder a esta pergunta eles tentam encontraruma propriedade do primeiro nó que não possa ser destruída, nãoimporta o quanto ele seja torcido e enrolado - uma invariante de

nr. Eles então calculam a mesma propriedade para o segundo nó.Se os valores são diferentes, então a conclusão é que é impossívelse chegar ao segundo nó a part ir do primeiro.

Até que esta técnica fosse inventada, na década de 1920, porKurt Reidemeister era impossível provar que um nó não pode-ria ser transformado em outro. Em outras palavras, antes da des-coberta das invariantes era impossível provar que um nó triploé fundamentalmente diferente de um nó direito ou mesmo de

um simples laço sem nó algum. O conceito de propriedadeinvariante está no centro de muitas demonstrações matemáti-cas, e, COmoveremos no Capítulo 5, ele seria crucial para re-

despertar o interesse dos matemáticos pelo Último Teorema deFennat

Na virada do século, graças a Sam Loyd e seu enigma 14-15 havia milhões de resolvedores de problemas amadores naEuropa e na América, ávidos por enfrentarem novos desafios. Equando as notícias sobre o Prêmio WoUskehl chegaram a essesmatemáticos amadores, o Último Teorema de Fermat voltou aser o problema mais famoso do mundo. O Último Teorema era

infinitamente mais complexo do que o mais difícil dos enigmasde Loyd, mas o prêmio também era muito maior. Os amadoressonhavam em encontrar um truque relativamente simples quetivesse iludido os grandes professores do passado. Um amadorperspicaz do século XX podia se igualar a Pierre de Fermat noque se refere ao conhecimento de técnicas matemáticas. O de-

safio era igualar Fermat na criatividade com que ele m;ava suasté<.:nicas.

Embora todos os candidatos ao Prêmio Wolfskehl fossem obri-

gados a publicar seus trabalhos em revistas especializadas isso nãodcscncorajou os amadores a enviarem uma avalanehe de artigos para

\

prêmio estivessem convencidos de que tinham solucionado o se-cular problema, todos tinham cometido erros sutis de lógica, e al-guns não tão sutis assim..A arte da teoria dos números é tão abs-trata que é muito fácil alguém se desviar do caminho da lógica sem

aomenos perceber que mergulhou noabsurdo. OApêndice 6mostrao tipo de erro clássico que pode passar despercebido a um amadorentusiasmado.

Não importando quem tivesse mandado uma demonstração emparticular, cada uma tinha que ser examinada escrupulosamente,só para o caso de um amador desconhecido ter tropeçado na maisprocurada das provas matemáticas. O diretor do departamento dematemática de Gõttingen, entre 1909e 1934,era o professor EdmundLandau, sendo sua responsabilidade examinar os trabalhos candi-datos ao Prêmio Wolfskeh1.Landau percebeu que suas pesquisasestavam sendo interrompidas continuamente para examinar dúzias

de demonstrações confusas que chegavam na sua mesa todo mês.Para lidar com a situação ele inventou um método hábil de accleraro trabalho. O professor mandou imprimir centenas de cartões ondesc lia:

t:'

11.

 

,.

I,...

L:

 

,fl'

tli

1

Prezado ............................

Grato pelo seu manuscrito com ademonstração para o ÚltimoTeorema de Fermat.

O primeiro erro é:Página linha .....................

Isto torna a demonstração inválida.

Professor E. M. Landau

Landau então entregava cada novo manuscrito, junto com um car-tão impresso, a um de seus alunos, e pedia que preenchesse os es-paços em branco.

~I, 

146 o ÚI': I' lMO TEQREMA DE FERMAT

Os arl ig'os cOlllillllaralll a chq~ar dllralllc allOS, IlICSIIIO de-

MERGULHO NA AUSTI~ÇÃO 147

rcsponde r. () I r abalho de lcs abalari a os fllmlalll cll los da lIIalcl llát ica

e acabaria tendo repercussões no Último Teorema de Fermat .

  I

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pois da dramática desvalorização sofrida pelo Prêmio Wolfskehl,como resultado da hiperinflação que se seguiu à Primeira GuerraMundial. Existem boatos de que qualquer um que ganhasse oprêmio hoje dificilmente conseguiria tomar uma xícara de cafécom o dinheiro do prêmio, mas esses rumores parecem um tanto

exagerados.O Dr. F. Schlichting, que era responsável pelo exame dos tra-

balhos candidatos na década de 1970, escreveu uma carta para PauloRibenboim cxplieando que o prêmio ainda valia 10mil marcos. Vejano Apêndice 7 o texto completo da carta dc Schlichting. Ela forne-ce uma visão de como trabalha o Comitê Wolfskeh1.

Os concorrentes não se limitavam a enviar soluções paraGõttingen- e cada departamento de matemática do mundo prova-velmente tem uma gaveta cheia de demonstrações de amadores.Enquanto a maioria das instituições ignora essas demonstraçõesde amadores, outras lidam com elas de modo mais imaginativo. O

escritor Martin Gardner lembra de um amigo que enviava um bi-lhete explicando não ser suficientemente competente para exami-nar a demonstração. Ele fornecia o nome e endereço de um espe-cialista noassunto quc poderia ajudar-ou seja, o nome e endereçodo último amador que lhe escr'evera. Outro de seus amigos mate-máticos escrevia: Eu tenho uma extraórdinária contestação parasua demonstração, mas infelizmente esta página é muito pequenapara contê-Ia.

Embora os matemáticos amadores do mundo inteiro tenhampassado este século tentando e fracassando em suas demonstra-ções para o Último 'Icorema, os profissionais continuaram a ig-

norar o problema~: No lugar de avançarem com o trabalho deKummer e de outros teóricos dos números do século XIX, osmatemáticos começaram a examinar osfundamentos de sua ciênciade modo a lidar com questões mais fundamentais sobre os nú-meros.Alguns dos grandes nomes do séculoxx, como David Hilberte Kurt Gõdel, tentaram entender as propriedades mais profun-das dos números de modo a perceber seu verdadeiro significadoe descobrir que perguntas a teoria dos números pode e não pode

  1

Os undamentos do onhecimento

t

Durante centenas de anos os matemáticos estiveram ocupadosusando a demonstração lógica para criar conhecimentos a partirdo desconhecido. O progresso tem sido fenomenal com cada novageração de matemáticos ampliando a grande estrutura c criandonovos conceitos de números e de geometria. Contudo, a partir dofinal do século XIX,os lógicos matemáticos começaram a olhar paraos fundamentos da matemática em luga; de olhar para a frente. Elesqueriam verificar os fundamentos damatemática e reconstruir tudousando os princípios fundamentais, de modo a garantir que essesprincípios fundamentais fossem confiáveis.

Os matemáticos são conhecidos por serem exigentes na hora

de pedir uma prova absoluta antes de aceitarem qualquer afirma-ção. Esta reputação é claramente mostrada numa anedota contadapor Iari Stewart no livro Conceitos de matemática moderna:

.  Um astrônomo, um físico e um matemático estavam passan-

do férias na Escócia. Olhando pela janela do trem eles avista-

ram uma ovelha preta no meio de um campo. Que interes-sante , observou o astrônomo, na Ese6eia touas as ovelhas

são pretas. Aoque o físico respondeu: Não, nada disso Al-gumas ovelhas cscoccsas são pretas. O matemático olholl paracima em desespero e disse: Na Escócia exis te pelo menos

um campo, contendo pelo menos uma ovelha epelo menos umlado dela é preto

,.;

>

;,

E o matemático que seespecializa no estudo da lógica matemáticaé ainda mais rigoroso do que o matemático comum. Os matemáti-cos lógicos começaram a questionar idéias que os outros matemá-ticos consideravam certas há séculos. Por exemplo, a leida tricotomiadeclara que cada número é ou negativo, ou positivo ou enÚio~cro.

il;

148 o ÚI: I' IMO TEOREMA J)I~FERMA'J'

Isso parece óbvio e os matemáticos tinham considerado como ver-dadeiro, mas ninguém jamais se preocupara em provar esta afir-

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 i

mação. Os lógicos perceberam que, até que a lei da tricotomia fos-seprovada, elapoderia ser falsa.E se fosse este o caso, todo oedifíciodo conhecimento, tudo que dependia da lei, desmoronaria. Feliz-mente para a matemática a lei da tricotam iafoi demonstrada como

verdadeira no final do século passado.Desde os antigos gregos a matemática vem acumulando maisteoremas e verdades, e embQra a maioria dcles tenha sido rigoro-samente provada os matemáticos temiam que alguns casos, comoa lei da tricotomia, tivessem sido aceitos sem o exame. adequado.I\lgllma~ idéiag tinham $e tornado parte da traJição e ninguém ti-nha certeza de como foram originalmente demonstradas, se de fatoalgum dia tinham sido. Assim os lógicos resolveram provar todosOgteoremas, a partir dos princípios fundamentais. Contudo, cadaverdade tinha sido deduzida de outras verdades. E estas, por suavez, tinham sido deduzi das de verdades ainda mais fundamentais,

e assim por diante. Finalmente os lógicos se encontraram lidandocom algumas declarações essenciais que eram tão fundamentaisque não podiam ser provadas. Essas hipóteses fundamentais sãom;axiomagda matemática. .

Um exemplo de axioma é a lei c011lutativada adição que sim-plesmente declara que para quaisquer nÚmeros J Ie 11,

11l + n = 11 + 111.

Este e um punhado de outros axiomas são considerados auto-evi-dentes e podem ser facilmente testados aplicando a certos nú-

meros. Até agora os axiomas passaram em todos os testes sendoaceitos como os alicerces da matemática. O desafio para os lógi-cos era rccon::;1ruir toda a matcrná1ica a par1ir deRseRaxiomml. Oi\pélluicc Xdefillc 11111Olljullto UCaxiomaHaritméticus e dá umaidéia de como os lógicos começaram a reconstruir o resto damatemática.

U ma legião de 16gicosparticipou destc processo lento e dolo-roHOdc reColIHtrllçãodo corpo imcnsamente complexo do conhc-

I

1

tft

,

~

,.~.1 -':

,,.

[)avid Ililhcrt

150 o ÚLTIMO TF.ORF.MA DF. FF.RMAT I\JIo:ltta 11111 N,\ ,\mn U,\t:,\c, (SI

cimento matemático, usando somente um número mínimo de axio- Ulir müssen wissen

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mas. Aidéia era consolidar o que os matemáticos pensavam que jáconheciam, empregando apenas os padrões mais rigorosos da ló-gica. O matemático alemão Hermann Weyl resumiu o espírito doseu tempo: Alógica é a higiene que os matemáticos praticam paraIIlóllIlcra~idéias forl<.:sc saudáveis. Além dc limpar o que era co-

nhecido, a esperança era de que esta abordagem fundamentalistalança:;RCuma luz ~obre os problemas ailida lIão-solucionados, in-cluindo o Último Teorema de Fenn:at.

O esforço para reconstruir logicamente o conhecimento mate-mático foiliderado pela figuramais eminente da época,DavidHilbert.Hilbert acreditava que tudo na matemática poderia e deveria serprovado a partir dos axiomas básicos. O resultado disso deveriademonstrar conclusivamente os dois elementos mais importantesdo sistema matemático. Em primeiro lugar a matemática deveria,pelo menos em teoria, ser capaz de responder a cada pergunta in-dividual- este é o mesmo espírito de completeza que no passado

exigira a invenção de números novos, como os negativos e os ima-ginários. Em segundo lugar a matemática deveria ficar livre de in-consistências - ou seja, tendo-se mostrado que uma declaração éverdadeira por um método, não deveria ser possível mostrar queela é falsa por outro método. Hilbert estava convencido de que, to-mando apenas alguns axiomas, seria possível responder a qualquerpergunta matemática imaginária, sem medo de contradição.

No dia 8 de agosto de 1900,Hilbert deu uma palestra históricano Congresso Internacional de Matemática em Paris. Hilbert apre-sentou 23 problemas não-resolvidos da matemática que ele acre-ditava serem de imediata importância. Alguns problemas relacio-

navam-se com áreasomais gerais da matemática, mas amaioria delesestava ligada aos fundamentos lógicos desta ciência. Esses proble-mas deveriam focalizar a atenção do mundo matemático ~forne-cer um programa de pesquisas. Hilbert queria unir a comunidadepara ajudá-Io a realizar sua visão de um sistema matemático livrede dúvidas ou inconsistências - uma ambição que ele mandariagravar na sua lápide:

Wir werdeu wissell.

Nós dcvemos saher,Nós vamos saber. \

I

\iII

Na~ duas dé(:adas ~egllilltes os IllatCllláticos telltanull erguerum edifício matemático sem falhas e quando Hilbert se aposentou,na década de 1930, ele se sentia confiante de que a matemáticaestava no caminho da recuperação. Seu sonho de uma lógicaconsistente, suficientemente pode~osa para responder a qual-quer pergunta, estava, aparentemente, a caminho de se tornarrealidade.

Então, em 1931, um matemático desconhecido, de 2Sanos deidade, publicou um trabalho que iria destruir para sempre as es-peranças de Hilbert. Kurt Gõdel forçaria os matemáticos a acei-tarem que sua ciência jamais poderá ser lo gicamente perfeita. Im-plícita em seus trabalhos estava a idéia de que problemas, comoo Último Tcorema de Fermat, podcriam ser impossíveis de solu-cIOnar.

Kurt Gõdel nasceu em 28 de abril de 1906, na Morávia, en-tão parte do império austro-húngaro e agora parte da RepúblicaCheca. Ainda criança Gõdel exibiu um talento para ciência e ma-temática e sua natureza curiosa levou a família a apelidá-Ia der

Herr Warum (Senhor Por que). Ele foi para a Universidadc ueViena sem ter certeza se devia se especializar em matemáticaou física, mas uma aula inspirada sobre a teoria dos númerospelo professor P.Furtwangler persuadiu Gõdel a devotar sua vida

aos números. A aula foi ainda mais impressionante porqueFurtwangler estava paralisado do pcscoço para baixo e tinha quefalar de sua cadeira de rodas, enquanto seu assistente escreviano quadro-negro.

Quando tinha pouco mais de vinte anos, Gõdel já se estabele-cera no departamento de matemática, mas, junto com seus cole-gas, ele costumava atravessar o corredor para participar dos encontrosdo Wiener Kreis (Círculo Vienense), um grupo de filósofos que se

1/

MERGULHO NAABSTRAÇÃO 153

reunia para discutir asgrandes questões da lógica. Foi durante esteperíodo que Gõdel desenvolveu as idéias que dcvastariam os fun-damentos da matemática.

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Kurt Güdcl

Em 1931Gõdel publicou seu livro Überformal unentscheidbare

Siitze der Pn ncipia athematica und verwandter Systeme  Sobreas Proposições lndecidíveis no Principia athematica e SistemasRelacionados , que continha os chamados teorcmas da indecidi-

bilidade. Quando a notícia dos teoremas chegou aos Estados Uni-dos, o grande matemático John von Neumann imediatamente can-

celou uma séric dc aulas que estava dando sobre o programa deIlilbert e substituiu o resto do curso por um debate sobre o traba-lho revolucionário de Gõdel.

Gõdcl tinha provado ser tarefa impossível criar um sistemamatemático completo e consistcnte. Suas idéias podem ser resu-midas em duas declarações:

Primeiro teorema da indecidibilidade

Se o conjunto axiomático de uma teoria é consistente, então exis-tcm teorcmas que não podcm ser ncm provados nem negados.

\

i

Segundo teorema da indecidibilidadeNão existe procedimento construtivo que prove ser consistente ateoria axiomática.

t

Essencialmentc a primeira dcclaração de Gõdc1 di~ quc não im-porta o conjunto de axiomas scndo usado, existcm problcmas queos matemáticos não podem rcsolvcr - a completeza jamais podc-ria ser alcançada. Pior ainda, a segunda declaração di~ quc os ma-

temáticos nunca podcrão tcr certc~a dc quc sua cscolha dc axio-mas não os levará a uma contradição - a consistência jamais poderá

ser provada. GÜdcl tinha dcmonstrado quc o programa dc Ililbcrtera um exercício impossível.

Embora a segunda declaração dc GÜdcl diga que é imposRí-vcl provar quc os axiomas são consistcntcs, isto não significa,necessariamente, que eles sejam inconsistentes. Em seus cora-ções muitos matem;iticos ainda acrcditavam quc sua ciência per-

15.1 ()   :1'1Me) 'I'I-:e )ItE MA 1)1-: 1'I-:lt1\1I\'I 'MEIlGULHU NA AU8TIlAÇAu 155

mancccria consiRtentc, mas em suas mentes elcs nãu pudcriam

provar que isto era verdade. Muitos anos depois, o grande teóri-deira ela não pode ser provada, porque esta declaração (que agora

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co dos números, André Weil, iria dizer: Deus existe já que a

matemática é consistcntc c o Diabo cxistc já quc não l?odcmos

prová-Io.

Paramelhor entender o primeiro teorema de Gõdel, suas ori-

gens e implicações, é út il examinarmos um fragmento de lógica

da Grécia antiga conhecido como oparadoxo de Creta, ou o pa-

radoxo domentiroso, inventado por Epimenides, um cretense queexclamou:

 Eu sou um mentiroso

sabemos ser verdadeira) assim o diz.

Como Giidel podia trauu ,ir a dcclaração acima em notação

matemática, ele foi capaz de demonstrar que existem afirma-

ções na matemática que Rãoverdadeiras, mas que nunca pode-rão ser demonstradas como verdadeiras; elas são as chamadas

afirmações indecidíveis. Este foi o golpe mortal no programa dcHilbert.

De muitos modos o trabalho de Gõdel aconteceu paralelamente

a descobertas semelhantes feitas na física quântica. Apenas qua-

tro anos antes de Gõdel publicar seu trabalho sobre a indecidibilidadc,

o físico alemão Werner Heisenberg descobriu o princípio da incer-

teza. Assim como existia um limite fundamental nos tcorcmas quc

os matemáticos poderiam provar, Heisenberg mostrou que havia

um limite fundamental nas propriedades que os físicos poderiam

medir. Por exemplo, se eles queriam medir a posição exata de um

objeto, então eles só poderiam medir a velocidade do objeto com

uma precisão muito pobre. Isto acontece porque para medir a po-

sição do objeto seria necessário iluminá-Io com fótons de luz, mas

para determinar a 10callzação exata os fótons precisariam tcr uma

energia enorme. Contudo, se o objeto está sendo bombardeado com

fótons de alta energia, sua própria velocidade será afetada e se tor-

nará inerentemente incerta. Portanto, ao exigir o conhecimento da

posição de um ohjcto ORíRicoReriam quc dCRiRtirdo conhecimentode slla velocidadc.

O princípio da incerteza de Heisenberg só se revela nas esca-

las atômicas quando medidas de alta precisão se tornam críticas.

Portanto, uma boa parte da física pode ser realizada sem proble-

mas enquanto os físicos quânticos se preocupam com as questões

profundas sobre os limites do conhecimento. O mesmo acontecia

no mundo da matemática. Enquanto os lógicos se oc': pavam dodebate altamente esotérico sobre a indecidibilidade, o resto da co-

munidade continuava a fazer seu trabalho sem preocupação. Gõdel

tinha provado que existiam algumas afirmações que não poderiam

ser provadas, mas restava uma quantidade plena dc afirmaçõcs que

podiam ser provadas e sua descoberta não invalidava nada que ti-

O paradoxo surge quando tentamos determinar se esta declaração

é vcrdadcira ou falsa. Primeiro vamos examinar o que acontece se

presumirmos que a declaração éverdadeira. Averdade implica que

Epimenides é um mentiroso, mas estamos presumindo que sua

declaração é verdadeira e, portanto, Epimenides não é mentiroso

- temos uma inconsistência. Por outro lado, vamos ver o que acon-

tece se presumirmos que a declaração' é falsa. Uma declaração fal-

sa implica que Epimcnides não é mentiroso, mas presumimos ini-

cialmente que ele fez uma declaração falsa e portanto Epimenides

é mentiroso - e assim temos outra inconsistência. Se presumir-

mos que a declaração é verdadeira ou falsa terminamos com uma

inc()J)siRtênciae, portanto, a declaração não é nem verdadeira nemfalsa.

Gõdel reinterpretou o paradoxo do mentiroso e introduziu o

conceito de prova. O resultado é uma declaração ao longo da se-guinte linha:

Esta declaração não tem nenhuma prova.

Se a declaração fosse falsa então ela seria provável, mas isto iria

::contradizê-Ia. Portanto, a declaração deve ser verdadeira de modo

a evitar a contradição. Contudo, embora a declaração seja verda-

156 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT 157ERGULHO NAABSTRAÇÃO

vesse sido demonstrado no passado. Além disso, muitos matemá-,. ticos acreditavam quc as declarações de indecidibilidade de Gõdel

xn .+ yn = znpara n maior do que 2.

Se o Último Teorema fosse de fato falso,então seria possível pro-

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só seriam encontradas nas regiões mais extremas e obscuras damatemática e, portanto, talvez nunca tivesscm de ser enfrentadas.Afinal,Gõdel só dissera que essas afirmações indecidíveis existiam;ele não pudera apontar uma. Então, em 1963, o pesadelo teórico deGôdcl se tornou uma realidade viva.

PaulCohcn, um matemático de 29 anos de idade na Universi-

dade de Stanford, dcsenvolve~a uma técnica para testar se umaquCRtãocm particular é indccidívc1.Atécnica RÓ[unciona para certoscasos muito especiais, mas, de qualquer forma, ele foi a primeirapcsRoaa descobrir que havia questões específicas que eram de fatoilldccidívcis. lendo feito sua dcscobcrta, Cohcn imcdiatamentc vooupara Princeton, com a demonstração na mão, de modo que fosseverificada pelo próprio Gõdel. Dois dias depois de receber o traba-lho, Gõdel deu a Cohen sua aprovação de autoridade. E o que eraparticularmente dramático é que algumas dessas questões

indecidíveis estavam no centro da matemática. Ironicamente Cohenprovara -que uma das perguntas que David Hilbert colocara entreos 23 problemas mais importantes da matemática, a hipótese doCOlltil liUlll era indccidíve1. .

O trabalho de Gõdel, somado às afirmações indecidíveis deCohen, enviou uma mensagem perturbadora para todos aquelesmatemáticos, profissionais e amadores que persistiam com as ten-tativas de demonstrar o Último Teorema de Fermat - talvez oteorerna fosse indecidível E se Pierre de Fermat tivesse cometi-do um CITOao afirmar tcr encontrado uma demonstração? Se as-sim fosse cntão era possível que o Último Icorema fossc illdeeidívcl.

Demonstrar o Último lcorema de Fermat podia ser mais do queapenas difícil, poderia ser impossível. E se o teorema fosse inde-cidível, então os matemáticos teriam passado séculos procuran-do urna demonstração que não existia.

Curiosamente, sc o Ú1timo Teorema de Fermat sc revelasseindccidível então isto implicaria quc ele cstava certo. A razão é aseguinte. O teorema diz que não existem soluções eom númerosinteiros para a equação:

var isto identificando uma solução (um exemplo contrário). E as-sim o ÚltimoTeorema seria decidível.Ser falsoseria inconsisten-te com a indecidibilidade. Contudo, se o Último Teorema fosse

verdadeiro nãohaveria,necessariamente, um modo tão inequívocode prová-Io,ou seja, ele seria indecidível. Concluindo, o ÚltimoTeorema de Fermat poderia ser verdadeiro, mas não haveriameiodc prová-lo.

  ompulsão da uriosidade

Uma anotação casual fei ta por Pierre de Fermat, na margem de suaAritmética de Diofante, levou ao mais frustrante enigma da histó-ria. Apesar de três séculos de fracassos e a sugestão de Gõdel de

que poderiam estar procurando por uma prova inexistente, algunsmatemáticos continuaram a ser atraídos pelo problema. O ÚltimoTeorema era uma sereia matemática, atraindo os gênios em suadireção somcnte para frustrar suas esperanças. Qualquer matemáticoque se envolvesse com o Último Teorema se arriscava a desperdi-çar sua carreira, e, no entanto, qualquer um que pudesse fazer oavanço crucial entraria para a história como tendo resolvido o pro-blema mais difícil do mundo.

Gerações de matemáticos estiveram obcecadas pelo ÚltimoTeorcma dc Fcrmat por dois motivos. Em primeiro lugar havi~1oscntido ill lplacávcl dc desafio. () (JhiJUO Icorcll la cra o tcstc fi-

nal e aquele que pudesse demonstrá-Io teria vencido onde Cauchy,Euler, Kummer e outros tinham fracassado. Assim como o pró-prio Fermat tinha grande satisfação em resolver problemas quchavia confundido seus contemporâneos, aquele que demonstrasseo Último Teorema podcria aprcciar a glória de tcr rcsolvido \1mproblcma quc frustrara toJa a comunidade dc matemáticos du-rante centenas de anos. Em segundo lugar, quem venceRse o de-safio dc Fcrlllat podcria apreeiar a satisfação illOl cllte dt tcr c-

I

. I

158 ( ) ( lJ :nMO TE~mEMA I>E .,'EHI\1ATMEH(;ULJlU NA AIISTltA<,:Au 159

solvido um cnigma. O pra; ;cr derivado da solução de questõesesotérieas na teoria dos números não é muito diferente da ale-

todos os padrões práticos, o valor dc minha vida como mate-mático é nulo e fora damatemática ovalor desta vida também

é im;i~niricantc. Eu s6 tinha lima chance dc escapar ao vere-

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gria simples ele vencer charadas triviais COlIJOas de Salll Loyd.Um matemático uma vez me confessou que o prazer que ele temem resolver problemas de matemática é semelhante ao dcsfruta-do por viciados em palavras cru; ;adas. Preencher os úl timos es-

paços em branco de \1mjogo de palavras cruzadm; particularmentedifícil é scmprc uma cxperiêpeia agradável, mas imaginc o senti-do de realização depois de passar anos enfrentando um proble-ma que ninguém no mundo foi capaz de resolver e finalmentedescobrindo uma solução.

Estcs são os mesmos motivos que levaram Andrcw Wiles a fi-car fascinado por Fermat. Os matemáticos puros adoram um de-safio. Eles adoram problemas não-resolvidos. Quando fa; ;emosmatemática temos esta grande sensação. Você começa com umproblema que o intr iga. Não consegue entendê-Io, é tão compli-cado que você não dist ingue o começo do fim. Mas então, quan-

do finalmente consegue rcsolvê-Io, você têm esta sensação incrí-vel de como ele é bonito, de como tudo se encaixa de modo tão

elegante. Os mais enganadores são os problemas que parecem fáceise depois se mostram extremamente complexos. Fermat é o maisbelo exemplo deste tipo de problema. Ele parecia ter uma solu-ção e,é claro, é m~ito especial porque Fermat disse que tinha umasolução.

A matemática tem suas aplicações na ciência e na tcenologia,mas não é isso o que impulsiona os matemáticos. Eles são atraí-dos pela alegria da descoberta. G. H. Hardy tentou explicar e jus-tificar sua própria carreira em um livro intitulado Apologia do matemático

dicto da completa insignificância, e esta chance é a de que eu

possa ter criado alguma coisa quc valia a pena scr criada. Enão há dúvidas de que eu criei alguma coisa, a questão é seela tem algum valor.

o desejo de solucionar qualquer problema matemático é impul-sionado pela curiosidade e a recompensa é a simples mas enormesatisfação derivada da solução do enigma. O matemático E. C.Titchmarsh uma vez disse: Não existe utilidade prática em sesaberque 7té irracional, mas, se podemos saber, então certamente seriaintolerável não saber.

No caso do Último Teorema de Fermat não havia escassez decuriosidade. O trabalho de Gõdcl sobre indecidibilidade tinha in-

troduzido um elemento de dúvida se o problema era realmente

solucionável, mas isto não era o suficiente para desencorajar o ver-dadeiro fanático por Fermat. O que era mais desanimador é quepor volta da década de 1930os matemáticos tinham exaurido todasas suas técnicas e não havia mais nada à sua disposição. O que eranecessário era uma novaferramenta, alguma coisa que erguesse amoral dos matemáticos. E a Segunda Guerra Mundial forneceriaexatamente o que estava faltando - o maior avanço na capacidadede computação desde a invenção da régua de cálculo.

  bordagem da Força ruta

(;

Eu só posso dizer que se um jogo de xadrez é, num sentido

rudc, inÚtil , então isto é igualmente verdade para a maiorparte da mais refinada matemática (...).Eu nunca fiz nada útil .Nenhuma descoberta que fiz já produziu, direta ou indireta-

mente, parao bem oupara o mal a menor diferença na melhoria

do mundo. Nem é provável que venha a fazê-to. Julgada por

Quando G. H. Hardy declarou em 1940 que a melhor matemáticaé na sua maior parte inútil, ele acrescentou, rapidamente, que istonão era necessariamente algo ruim. Averdadeira matemática nãotem efeito sobre a guerra. Ninguém, até agora, descobriu qualquerutilidade bélica para a teoria dos números. Logo se demonstrariaque Hardy estava errado.

160 o ÚI :r IMO . EOREMA DE FERMAT

Em 1944John von Neumann apareceu como co-autor de um. livrochamadoA teon adosjogos e o comportamentoeconômico no

qual ele inventavao termo teon ados jogos. Esta teoria dos jogos

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era uma tentativa deNeumann usar a matemática para descrever aestrutura dos jogos c analisar comoos humanos osjogarn Ele co-meçou estudando o xadrez e o pôquer, depois tentou modelar jo-gos mais sofisticadoscomo a economia.Depois daSegunda Guer-

ra Mundial a eorporaçãoRANDpercebeu o potencial das idéias devonNeumann e o contratou para trabalhar no desenvolvimentodascslratégias da gucrra fria. E a partir destc ponto a teoria matemá-tica dos jogos passou a ser um instrun~entobásico para os gene-rais testarem suas estratégias militares tratando as batalhas comose fossemjogos complexosde xadrcz.Uma ilustração simples dasaplicaçõcsda teoria uos jogos é a história do truelo.

Um truelo é semelhante a um duelo, exeeto que existem trêsparticipantes no lugar de dois. Certa manhã o Sr. Blaek,o Sr. Grayc o Sr.White decidem resolver um conflitotruelando com pistolas

até que somcnte um deles fique vivo.O Sr.Blacké o pior atirador,acertando seu alvo,em média, uma vez em cada três tentativas. OSr. Grayé um atirador melhor e acerta no alvoem dois de cadatrêstiros.Já o Sr.White é um atirador exímioe nunca erra o alvo.Paratornar o truclo mais justo, o Sr. Black tcm a permissão de atirarprimeiro, seguido peloSr. Gray (se ele ainda estiver vivo)e depoispelo Sr.White (também se ele ainda estiver vivo).O processo serepete até que sóreste um deles.Apergunta é: Contra quem deveo Sr. Blackatirar primeiro? Vocêpode dar um palpite baseado naintuição 0\1,melhor ainda, haseado na teoria dos jogos. A.resposta(~ di~;( ,lIl id;1 110 t\p{ lIdi( ( ().

Naépuca da gucrra a lllalclllélLicada tlllebra de códigos foi ain-da mais importante do que a teoria dos jogos. Durante a SegundaGucrra Mundial os aliados perceberam q\le a teoria da lógica ma-telllática poderia ser w;ada para decifrar m;IlIcnsagens dos alemães,apenas se os cálculos pudessem ser feitos rapidamente. O desafioera cncontrar \1mmcio de automatizar a matemática, de modo queuma máquina pudcssc fazer o trabalho. O inglês que mais contri-buiu para ()esforço de quebra dos códigos FoiA.lanTuring.

Alan luring

162I

o ÚLT IMO TEOREMA DE FERMAT

Em 1938 Turing voltou para Cambridge depois de uma tem-porada lia {)l1iv(;r~idadt de Princctoll. Ele tinha tcstcmullhado o

MERGULHO NA AnSTHAÇho 163

de 1920 mas os alemães a t inham tornado mais se~ura atra-vés ue mouificações progressivas. Em 1937a Escola de Cifras

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rebuliço provocado pelos teoremas de Gõdel sobre a indecidibi-lidade e estivera envolvido na tentativa de reunir o que sobrara dosonho de Hilbert. Em especial ele queria saber se havia um meiode definir quais as perguntas .que eram ou não decidíveis e ten-

tou desenvolver um meio metódico de responder a esta pergun-ta. Naquela época os aparelhos de cálculo eram primitivos e efe-tivamente inúteis para a matemática séria. Assim Turing baseousuas idéias no conceito de uma máquina imaginária capaz de com-putação infinita. Esta máquina hipotét ica, capaz de consumirquantidades infinitas de fitatelegráfica, poderia computar durantetoda a eternidade e era tudo de que ele necessi tava para explorarsuas perguntas abstratas de lógica. O que Thring não percebia eraque sua mecanização imaginária de questões hipotéticas iria le-var a um avanço fantástico na realização de cálculos reais emmáquinas de verdade.

Apesar do início da guerra, Turing continuou suas pesquisascomo membro doKing s College até 4 de setembro-de 1940, quan-do sua vida tranqüila em Cambridge terminou abruptamente. Eletinha sido convocado pela Escola de Cifras e Códigos do Governo,cuja tarefa era decifrar mensagens codificadas do inimigo. Antesda guerra os alemães tinham devotado um esforço considerável nodesenvolvimento de um sistema superior de codificação e isto eramotivo de grande preocupação para o Serviço Secreto Britânico, queno passado conseguira decifrar as mensagens do inimigo com re-lativa facilidade. A história oficial da guerra publicada pelo HMSO,O Serviço ritânico de Informações na Segunda Guerra Mundial

descreve a situação na década de 1930:

Por volta de 1937 ficou estabelecido que, ao contrário dos ja-poneses e italianos, o Exército alemão, sua Marinha e prova-velmente sua ForçaAérea,junto comorganizações estatais como

asferrovias e a 55, usavam para tudo, exceto as comunicaçõest<ítieas, diferentes versões do mesmo sistema cifrado - amáquina Enigma tinha sido colocada no mercado na década

e Códigos do Governo t inha quebrado o código do modelomenos modificado e seguro desta máquina, que estava sendousado pelos alemães, italianos e pelas forças nacionalistas

espanholas. Mas, fora isto, a Enigma ainda resistia ao ataque

e parecia que ia continuar assim.

l

A máquina Enigma consistia num teclado ligado a uma unidadecodificadora. O codificador tinha três rotores separados e as posi-ções dos rotores determinavam como cada letra no teclado seriacodificada. O que tornava o código da Enigma tão difíci l de que-brar era o enorme número de modos nos quais a máquina podiaser regulada. Em primeiro lugar, os três rotorcs na máquina eramescolhidos de uma seleção de cinco que podia ser mudada c trocadapara confundir os adversários. Em segundo lugar, cada rotor podiaser posicionado em 26 modos diferentes. Isto significava que a

máquina podia ser regulada em milhões de modos diferentes. E alémdas permutações permitidas pelos rotores, as conexões no quadrode chaveamento, na parte detrás da máquina, podiam ser muda-das manualmente para fornecer um total de 1SO trilhões deregulagens possíveis. E para aumentar ainda mais a segurança, ostrês rotores mudavam de orientação continuamente, de modo que,cadavez que uma letra era transmitida, a regulagem da máquina, eportanto o código, iria mudar de uma letra para outra. Assim, sealguém batesse DODO no teclado iria gerar amensagem FGTB- o D e o O eram transmitidos duas vezes, mas codificadosde modo diferente a cada vez.

As máquinas Enigma foram fornecidas ao Exército, Marinhae Força Aérea da Alemanha e eram até mesmo operadas pelas fer-rovias e outros departamentos do governo. Mas, como aconteciacom os sistemas de código usados naquela época, a fraqueza daEnigma consistia em que oreceptor tinha que conhecer aregulagemda máquina que emitira a mensagem. Para manter a segurançaos ajustes da Enigma cram mudados diariamente. Um dos meios

que ostransmissores de mensagens tinham de mudar a regulagem

164 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT MERGULHO NA ABSTRAÇÃO 165

diariamente enquanto mantinham os receptores informados erapublicar as regulagens num livro secreto de códigos. O risco des-ta abordagem é que os britânicos podiam capturar um submari-

ra e eram igualmente largas, empregando relês eletromecânicospàra verificar todos os ajustes possíveis da Enigma. O constantetiquetaquear das máquinas deu-Ihes o apelido de bomb s Ape-

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no c obter o livro-código com os ajustes diários da máquina parao mês seguinte. 1\abordagem alternativa, que Coiauotada duran-te a maior parte da guerra, consist ia em transmiti r a regulagem

do dia no princípio da mensagem principal, usando o código dodia anterior.

Quando a guerra t:omeçouj a E8eola BritflIlit:a ue Códigos eradominada por lingüistas e filólogos. O Ministério do Exterior logopcrccbeu que os teóricos dos números tinham uma chancc melhordc quebrar os códigos alemães. J)ara começar, nove dos mais bri-lhantes teóricos dos números daInglaterra se reuniram na nova sede

. daEst:olaue Códigos em llIctchlcyPark,uma mansãovitoriana emBlctchley, Buckinghamshire. Turing teve que abandonar suas má-quinas hipotéticas com fitas telegráficas infinitas e tempo deprocessamento interminável, para enfrentar problemas práticos, com

recursos fini tos e um limite de tempo muito real .A criptografia é uma batalha intelectual entre o criador do có-

digo e aquele que tenta decifrá-Io. O desafio para o codificador émisturar a mensagem até um ponto em que ela seja indecifrável sefor interceptada pelo inimigo. Contudo, existe um limite na quan-tidade possível de manipulação matemática devido à necessidadede enviar as mcnsa~ens de modo rápido e eficiente. A força do có-digo alemão da Enigma consistia em que a mensagem passava porvários níveis dc codifieação a uma velocidade muito alta. O desafiopara o decifrador do código era pegar uma mensagem intercepta-da e quebrar o código enquanto o conteúdo da mensagem ainda

fosse relevante. Uma mensagem alemã ordenando a destruição deum naviobritânico tinha que ser decodificada antes que o navio fosseafundado.

Turing liderou uma equipe de matemáticos que tentou cons-truir réplicas da máquina Enigma. Ele incorporou nesses enge-nhos suas idéias abstratas anteriores à gucrra. /\. idéia era vcrifi-car todos os ajustes possíveis da Enigma até que o eóui~o fossedescoberto. As máquinas britânicas tinham dois metros ue altu-

sar de ~Hlavelocidade era impossível que as bomhas verificassemcada um dos 1SOtri lhócs de ajustes possíveis da Enigma dentrode uma quantidade razoável de tempo. Por isso a equipe de Turing

teve que procurar meios de reduzir significativamente o númerode pennutaç( )es extraindo toda a informação que pudesse dasmCllsagen8 enviadas.

Um dos grandes saltos em direção ao sucesso aconteceu quandoos britânicos pcrccberam que a máquina Enigma não podia codifi-car uma letra nela mesma. Ou seja, se o emissor tecIasse R , en-tão, dependendo do ajuste, a máquina poderia transmitir todo tipode letra, menos R . Este fato, aparentemente inócuo, era tudo deque necessitavam para reduzir drasticamente o tempo necessáriopara decifrar as mensagens. Os alemães contra-atacaram limitan-do o comprimento das mensagens que enviavam. Todas as mensa-

gens, inevitavelmente, continham indícios para a equipe dedecifradores do código, e quanto maior a mensagem, mais pistasela continha. Ao limitar as mensagens a um máximo de 250 letras,os alemães esperavam compensar a relutância da Enigma em co-dificar uma letra como a mesma.

/\. fim de quebrar os códigos, Turing frcqiientemente tentavaadivinhar palavras chaves nas mensagens. Se acertava, isto acele-rava enormemente a decodifieação do resto da mensagem. Porexemplo, se os uecodifieadores suspeitavam ue que uma mensa-gem continha um relatório meteorológico, um tipo freqüente derelatório couificauo, então eles supunham que a mensagem con-

teria palavras como neblina ou velocidade do vento . Se esti-vessem certos podiam decifrar rapidamente a mensagem e, por-tanto, deduzir o ajuste da Enigma para aqucIe dia em particular.E pelo resto do dia outras mensagens, mais valiosas, seriam de-cifradas facilmcnte.

Quando fracassavallllla adivillhaçãode palavras ligadasao telllpo,os britânicos tentavalll se colocar lia posição dos operauorcs ale-mães da Enigma para deduzir outras palavras chaves. Um opera-

1M) o (11:1 1MO l Jo:OIU :M/\ I)Jo: EH~I IMlm( ;UI.I H) N/\ /\IIS I I(I\(:,\() 167

dor descuidado poderia chamar o receptor pelo primeiro nome ou

ele poderia desenvolveridiossincrasias conhecidas pelos deeifradores.Barry,que trabalhou com l hring, nega o boato. Ele di~ que a men-

sagem relevante sobre Coventry só foi decifrada quando já era tar-

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(

Quando tudo o mais falhava e o.tráfego alemão de mensagens fluía

sem ser decifrado, a Escola Britânica de Códigos podia até mes-

mo, dizem, recorrer aorecutso extremo de pedir à RAF (ForçaAérea

Britânica) para que minasse um determinado porto alemão. Ime-

diatamente o supervisor do porto atacado iria enviar uma mensa-

gem codificada que seria interceptada pelos britânicos. Os

decodificadores teriam certeza então de que a mensagem conteria

palavras como mina , evite e mapa de referências . Tendo deco-

dif icado esta mensagem, Turing teria os ajustes da Enigma para

aquele dia e quaisquer mensagens posteriores seriam vulneráveis

à rápida decodificação. .

No dia 10de fevereiro de 1942 os alemães acrescentaram uma

quarta roda às máquin as Enigma usadas para enviar mensagens

particularmente importantes. Esta foi a maior escalada no nível de

codificação durante a guerra, mas finalmente a equipe de Turing

respondeu aumentando a eficiência das bombas. Graças à Escola

de Códigos, os aliados sabiam mais sobre seu inimigo do que os.

alemães poderiam suspeitar. O impacto da ação dos submarinos

no Atlântico foi.grandemeI}te reduzido e os britânicos tinham um

aviso prévio dos ataques da Luftwaffe. Os decodificadores também

interceptavam e decifravam a posição exata dos naviosde suprimentosalemães, permitindo que os destróieres britânicos os encontras-sem e afundassem.

Mas o tempo todo as forças aliadas tinham que ter cuidado para

que suas ações evasivas e ataques precisos não revelassem sua ha-

bilidade de decodificar as comunicações alemãs. Se os alemães

suspeitassem de que o código da Enigma fora quebrado, eles iriamaumentar seu nível de codificação mandando os britânicos de vol-

ta para a estaca zero. Por isso houve ocasiões em que a Escola de

Códigos informou aos aliados sobre um ataque iminente e o co-

mando preferiu não tomar medidas extremas de defesa. Existem

mcsmo boatos de que Churchill sabia que Coventry seria o alvode

um bombardeio devastador mas preferiu não tomar precauções

especiais para evitar que os alemães suspeitassem. Stuart Milner-

de demais.

Este uso contido da informação codificada funcionou per-

feitamente. Mesmo quando os britânicos usavam as mensagens

interceptadas para causar perdas pesadas no inimigo, os alemães

não suspeitaram de que o código Enigma fora quebrado. Eles

pensavam que seu nível de codificação era tão alto que seria to-

talmente impossível quebrar os códigos. As perdas excepcionais

eram atribuídas à ação de agentes britânicos infil trados em suasfileiras.

Devido aosegredo que cercava o trabalho realizado por Turing

e sua equipe, em Bletchley, a imensa contribuição que prestaram

ao esforço de guerra não pôde ser reconhecida publicamente por

muitos anos após o conflito. Costuma-se dizer que a Primeira

Guerra Mundial foi a guerra dos químicos   Segunua Guerra

Mundial, a guerra dos físicos. De fato, a partir da informação re-velada nas últimas décadas, provavelmente é verdade dizer que a

Segunda Guerra Mundial também foi a guerra dos matemáticos.

E no caso de uma terceira guerra mundial sua contribuição seriaainda mais crítica.

Em toda sua carreira como decifrador de códigos, Turing nun-

caperdeu devista seus objetivos matemáticos. As máquinas hipo-

téticas tinham sido substituídas por máquinas reais, mas as ques-

tões esotéricas permaneciam. Quando a guerra terminou, Turing

tinha ajudado a construir o Colossus, uma máquina inteiramente

eletrônica com 1.500válvulas que eram muito mais rápidas do queos relês eletromecânicos usados nas bombas. Colossus era um

computador no sentido moderno da palavra. Com sua sofisticação

e velocidade extra, ele levou Turing a considerá-Io um cérebro pri-

mitivo. Ele tinha memória, podia processar informação, e os esta-

dos dentro do computador se assemelhavam aos estados da men-

te. Turing tinha transformado sua máquina imaginária no primeiro

computador legítimo.

Depois daguerra, Turing continuou a construir máquinas cada

vez mais complexas tais como o Automatic Computing Engine

168 o Ú LTI MO TE OR EMA D E F ER MA T

 ACE . Em 1948ele se mudou para aUniversidade de Manchester,onde construiu o primeiro computador do mundo a ter um pro-~raJ1111ravado cletroJlicamente. Turing tinha fornecido à Grã-

M ER GU LH O N A A BS TR AÇÃ O 169

tando-o em questão de horas. Os computadores de hoje fazemmais cálculos em uma fraçãode segundo do que Fermat realizouem toda a sua carreira. Os matemáticos que ainda lutavam com o

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Brctanhaos computadoresmaisavançadosdo mundo, masnãoviveriaI)araver seus cálculos mais notáveis.

Nos anos posteriores àguerra, 1uring passou a servigiadopelo

ServiçoSecreto Britânico, que sabia ser ele um homossexual pra-ticante. Os agentes temiam que o homem que sabia mais do quequalqueroutro sobre oscódigosde segurançada Inglaterra pudesseservulnerávelà chantagem. Assim todosos seus movimentos erammonitorados. Turing já se acostumara a ser seguido o tempo todo,mas em 1952ele foi preso por violaçãodas leis britânicas sobrehomossexualidade.Esta humilhaçãotornou avidainsuportávelparaTuring, e seu biógrafo, Andrew Hodges, descreve os eventos queconduziram à morte do matemático:

A morte deAlan Turing foium choque para todos aqueles queo conheciam   ...).Todos sabiam que ele era uma pessoa tensae i nfe li z, q ue e st av a s e c on sul ta ndo c om u m p si qu ia tr a e q uesofrera um golpe que derrubaria muitas pessoas. Mas já ti-nham se passado dois anos dojulgamento e o tratamento com

h or mô ni os t in ha t er mi nad o n o a no a nte ri or . El e p ar ec ia te rsuperado tudo isso.

Ainvesti~ação, no dia 10dejunho de 1954, determinou quefora suicídio. Elc fora cncontrado dcitado lia cama. Ilavia IIlIIa

cspuma CIJIlorno dc slJahoca c os patologÍHtas quc fj;r,cnllllocxame post-nzortem idcntificaram a causa facilmente comoenvenenamento por cianeto   ...).Havia um vidro com cianeto

de potássio na casa e outro vidro contendo uma solução decianeto. Aolado da cama havia metade de uma maçã, que foramordida váriasvezes. Eles não analisaram a maçã e assim nuncadeterminaram com certcza o que parecia tão óbvio.Que a maçãfora mergulhada no cianeto.

o legadode1uring foiuma máquina que podia iniciar um cálculoimpraticavelmente longo, se realizado por um homem, comple-

I

Último Teorema de Fermat começaram a atacar o problema comos computadores,confiandonumaversãocomputadorizadadaabor-dagem de Kummer no século XIX.

Kummer tinha descoberto uma falha no trabalho de Cauchye Lamé e mostrara que o maior problema para demonstrar o Úl-timo Teorema de Fermat era lidar com os casos onde 11é igual aum número primo i rregular - para valores de n até 100 os úni-cosprimos irregularessãoos números 37,59 e 67.Aomesmo tempoKummer mostrou que, em teoria, todos os primos irregularespodem ser abordados de modo individual, o único problema sen-do a enorme quantidade de cálculo necessária. E para demons-trar seu ponto de vista Kummer e seu colegaDimitri Mirimanoffexibiramas semanas de cálculosnecessárias para provaro teoremapara os números primos irregulares menores do que 100.Contu-do, ele e os outros matemáticos não estavam preparados para li-dar com o grupo seguinte deprimos irregulares que ficaentre 100e 1.000.

. Al gumas décadas depois os problemas dos cálculos imensoscomeç aram a desaparecer. Com a che gada dos c omputadores oscasos mais di fí ceis do Últi mo Teorema de Fermat podiam ser en-frentados com rapidez. Depois da Segunda Guerra Mundial, equi-pes de matem;ítieos c cientistas dos eOJnputatlore~ tIelll )n~tm-ram o Últilllo Icorellla de FerJnat para valures dc 11até 500, depoispara valores até 1.000 e 10.000. Na década de 1980, Samuel S.Wagstaff da Universidade de Illinois elevou o limite para 25.000 emais recentemente os matemáticos já podiam afirmar que o Úl-timo Teorema de Fe rmat é verdadeiro para todos os valores de naté 4 milhões.

Embora os leigos pudessem aehar que a t ecnologia modernaestava levando a melhor sobre o Último Teorema, os matemáticossabiam que este sucesso era apenas aparcnte. Mesmo que ossupercomputadores passassem décadas demonstrando um valor den depoi s do out ro eles nunca poderi am demonstrar t odos os valo-

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170  )  11:I IMO TEOItEMA J}I~I EltMA l MEIt ;ULlIO NAAIIS l HAÇÃO 171

rcs de 11até o infinito e,portanto, nunca poderiam demonstrar todoo teorema. Mesmo que o teorema fosse verdadeiro até um bilhão,

Durante duzentos anos ninguém pôde provar a conjectura de Euler,m as por outro lado ninguém podia negá-Ia encontrando um exem-

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não há motivo para garantir que fosse verdade para um bilhão e um.E se o teor ema fosse demonstrad o até u m t rilh ão, ele poder ia serf also par a um tril hão e um e assim por d iante. Não se pode chegarao infinito através da simples força bruta dos esm agadores de nú-

meros computadorizados.Tudo que os computadores poderiam oferecer eram evidências

a favor do Últi mo Teorema de Fer mat. Par a o o bser vador casual aevidência pode parecer esmagadora, m as nenhuma quantidade deevidência é suficiente para satisfazer os m atemáticos, um grupode céticos que não aceita nada exceto a prova absoluta. Extrapolaruma teoria para cobrir uma infinidade de números baseando-se naevidência de alguns números e um jogo arriscado é inaceitável.

Há uma seqüênci a em par ticular d os n úmer os pr imos que nosmostra co mo a extr apolação é uma mulet a peri gosa de se apoiar .No século XVIIos matemáticos m ostraram, através de exames de-

talhados, que os seguinte núm eros são todos primos:

plo. Primeiro, cálculos manuais e depois anos de com putação ele-trônica não conseguiram encontrar uma solução. A ausência de umexemplo negativo era apontada como uma forte evidência a favorda co njectur a. Então, em 1 988, Naom El kies d a Uni versidade deHarvard descobriu a seguinte solução:

2.682.4404 + 15.365.6394 + 18.796.7604 = 20.615.6734.

333.333.331 = 17x 19.607.843.

Apesarde todas as evidências,a conjectura de Euler revelou-se fal-sa.De fato Elkies provou que existem infinitas soluções para aequação.A m oral dahistória é que não se pode usar a evidência dos primeirosmilhões para provar uma conjeetura referente a todos os números.

Mas a natur eza eng anadora da co njectur a de Euler não é nadacom parada com a conjectur do número primo superestim do Exa-minando-se núm eros cada vez maiores, torna-se claro que os nú-

meros primos ficam cadavezmais difíceis de ser achados. Por exem-plo, entre Oe 100 existem 25 números primo::;,ma::;entrc 10.000.000e IO. O.I00 cxi~lclll apclla~ 2 11aIIer ~ pri IlIOS.EJ.. I71 I , li 18alido

tinha apenas quatorze anos de idade, Carl Gauss previu, de modoapr oximado, a f reqüên cia com que os nú mero s p rimos diminui-r iam. A fór mul a p arecia bem p recisa, mas par ece super esti marlevem ente a verdadeira distribuição dos primos. Procurando-setod os os p rimos até u m milhão , um bilh ão o u um tr ilhão semp remostrava que a fórmula de Gauss era levem ente generosa e os m a-temáticos eram tentados a acreditar que isto aconteceria para todosos números até o infinito. Daí nasceu a conjectura do número primo

superestimado.Então, em 1914,J. E. Littlewood, um colaborador de G. I-I.Hardy

em Cambridge, m ostrou que num a série suficientem ente grandea f ór mula d e Gauss iri a subestim r o número de primos. Em 1955S . S kewes mostrou que isso aconteceria pouco antes de se chegarao número

31,331,3.331,33.331,333.331,3.333.331,33.333.331.

Os próximos números da série se tornam cada vez m aiores e o tra-b alho d e ver ifi car se cles també~ são pr imo s teri a exi gido u m es-forço considerável. Naquela época os matemáticos ficaram tenta-dos a extrapolar a partir destc padrão e presumir que todos osnúmeros da série são primos. Contudo, o número seguinte333 333 331revelou não ser primo:

Outro bom cxemplo que dem onstra por que os matemáticos se re-cusam a ser convencidos por alguns exemplos ou pela evidência doscomputadorcsé o caso da conj.ecturade Euler. Euler afirmou quenão há soluçõespara uma equação não muito diferente da deFermat:

X +y + Z = W

1010.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000

1

.,

MERGULHO NA ABSTRAÇÃO 173

Este é um nÚmeroalém da imaginação e além de qualquer apli-cação prática. llanly chamou o nÚmero eleSkcwcs de o maiornúmero que já serviu a qualquer propósito definido em mate-

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mática . Ele calculou que se alguém jogasse xadrez com todasas partículas do universo  lOH /),onele caelamovimento signifi-casse simplesmente a troca de duas partículas, então o número

possível de movimcntos era aproximadamente o nÚmero deSkewes.E nãohaviamotivopara nãose acreditar que oÚltimoTeorema

deFermat nãopudesseser tãocruel e enganadorquantoa conjeeturade Euler ou a conjectura do número primo superestimado.

o studantede Pós Graduação

Andrew Wilcs, durante seus anos como estudante.

Em 1975, Andrew Wiles começou sua carreira como estudante depós-graduação naUniversidade de Cambridge. Durante os três anos

seguintes ele trabalhou em sua tese de Ph.D. e passou por seu apren-dizado matcmático. Cada estudall te é oriell tado c estimulado porum supervisar, que no caso de Wiles foi o australiano John Coates,professor no Emmanuel College, originalmente de Possum Brush,Nova Gales do Sul.

Coates aillda se recorda de como adotou Wiles: Eulcn lbr }queum colega me disse que tinha um estudante muito bom que aca-bara de terminar a parte lU dos exames para distinção em mate-mática. Elc pediu quc o adotasse como alullo. E eu fui IIIl lito felizem ter Andrew como aluno. Mesmo como estudante pesquisadorele t inha idéias muito profundas e sempre foi elaro que como ma-

temático iria fazer grandes coisas. É evidente que naquele estágionão havia possibilidade de qualquer estudante começar a trabalhardiretamente no Último Teorema de Fermat. Era muito difícil atémesmo para um matemático experiente. .

Na década passada tudo )que Wiles fizera tivera o objetivo deprepará-Ia para enfrentar o desafio de Fermat, mas agora ele en-trara lias fileiras dos matemáticos profissionais e tinha que ser mais

. pragmático. Ele se lembra de como teve que abandonar tempora-

~IEI ( ;t I I,II I NA AW;'I 'I AI, 'A()

Ij

 

I75

riamentc o seu sonho: Quando fui para Cambridge eu realmentetive que deixar Fermat de lado. Não é que o tivesse esquecido, eleestava sempre lá - mas percebi que as únicas técnicas para se li-

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dar com o problema tinham 130 anos de idade. E não me pareciaque estas técnicas estavam chegando na raiz do problema. O riscode setrabalhar com Fermat era que sepoderia passar anos sem chegar

a parte alguma. É ótimo trabalhar em qualquer problema desde queele gere uma matemática interessante aolongo do caminho - mesmoque não consiga resolvê-Ia no final do dia. A definição de um bomproblema de matemática reside na matemática que ele produz, nãono problema em si.

Seria responsabilidade de John Coates encontrar uma novaobsessão para Andrew, alguma coisa que ocupasse suas pesqui-sas por pelo menos três anos. Eu creio que tudo que um supervisarde pesquisa pode fazer por um estudante é tentar empurrá-Io numadireção de pesquisa frutífera. É claro que é impossível ter certe-za do que será uma direção frutífera em termos de pesquisa, mas

talvez algo que um velho matemático pode fazer é usar seu sensoprático, sua intuição do que seja uma boa área ~ então dependerásÚdo estudallte decidir até ollde eIc pode ir lIa</lleladireçfLO. Fi-nalmente Coates decidiu que Wiles deveria estudar uma área damatemática conhecida como curvas elípticas. Esta decisão se mos-traria um ponto vital na carreira de Wiles e lhe daria as técnicasnecessárias para uma nova abordagem do Último Teore ma deFermat. ,

O nome curvas elípticas é de certa forma enganador porqueelas não são elipses e nem ao menos são curvas no sentido normalda palavra. Trata-se de equações com a forma:

Ji 

.

,. ,':',y2 = X3 + ax2 + bx + c, ondea, b e c são números inteiros.

Elas receberam este nome porque no passado eram usadas paramedir o perímetro de elipses e os comprimentos das órbitas dosplanetas. Para maior esclarecimento, eu vou me referir a elas como

equações elípticas no lugar de curvas elípticas.O desafio com as equações elípticas, assim como no caso do

John Caates, quc foi supcrvisar deWilcs na faculdade, na décadadc 197 pareceaqui em 1993,com seu ex-aluno.

<;

176 o ÚI:ni\IO TEOREMA DE FERMAT

Último Teorema de Fermat, é determinar se elas possuem solu-çõcs para números inteiros e, se assim for,quantas. Porexemplo,aequação elíptica

MERGULHO NA ABSTRAÇÃO 177

problemas formidáveisparaestudantes eomoWiles.'l\inda estamoslongede entendê-Ias completamente. Eu poderia apresentar mui-tas perguntas aparentemente simples sobre equações elípticas que

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,, .::.. :: .11. unde (/ = U b = U (' = -2.. ., ,

tem apcnas um conjunto de soluções para nÚmeros inteiros, quec:

52= 33_2, ou 25 = 27-2.

o que torna as cquações elípticas especialmente fascinantes é queelas ocupam um lugar curioso entre outras equações mais simples,que são quase tr iviais e outras equações, mais complicadas, quesão impossívcis de resolvcr. Simplesmente mudando-se os valoresde a b e c em uma equação elíptica geral, os matemáticos podem

gerar uma variedade infinita d~ equações, cada uma com suas ca-racterísticas próprias, mas todas elas possíveis de serem solucio-nadas.

o 3 4 5 6 7 8 9

I I I I I I I I I I ~

Figura 13.Aaritmética convencional pode ser imaginada como movimentosaolongo da linha dos nÚmeros.

As equações elípticas foram originalmente estudadas pelosantigos malcm.íli('()s ~~rq'.(}s,ncluindo Diofanlc. '1'1('d,'dicou IIlIIagranue parte de sua /lri/méLica ao estudo de suas propriedades.Provavelmente inspirado por Diofante, Fermat também aceitou odesafio das equações elípticas. Como elas tinham sido estudadas

por seu herói.Wiles ficou feliz em explorá-Ias ainda mais. Mesmodepois de dois mil anos as equações elípticas ainda apresentavam

.'

ainda nfíoforalll rt'spondi<1aR.Mt'RII\(llwrgllllla~qlll' li pr()prio F(.'nllacunsideruu ainda não foram respondidas. De eerto modo, toda amatemática que eu fiz tem suas origens em Fermat , se não no Úl-

timo Teorema de Fcnnat.Nas equações que Wiles estudou como estudante de gradua-

ção, a determinação do número exato de soluções 'era tão difícilque o Únicomodode fazer algulll progresso cra simplificar o pro-blema.

Por exemplo, é quase impossível resolver diretamente a seguinteequação clíptica:

x3 - x2 = y2 + y

o desafio é calcular quantas soluções para números inteiros exis-

tem para esta equação.Uma solução razoavelmentetrivialé x = Ocy = O:

.'

03 - ()2 = ()2 + n.. .Uma solução um poucomais interessante é x = 1ey = O:

II -- JZ. (f I li.

Podem existir outras soluções, mas, com urna quantidadc infinitade 1I( lI lIero: ; i llkiro~ para i llve:; ligar. dar \1I11al is la cIJl llplcla tor lla-

se urna tarefa impossível. Um trabalho mais simples consiste emprocurar go uÇÕCgdentro dc \1m ('~paç() fillilo ele 11I'IIlH'roS.dtall1a-do de aril1l1étiea do rcllígio.

Anteriormente nós vimos como os números podem ser ima-ginados como marcas ao longo de uma linha numérica que se es-tende até o infinito, como é mostrado na Figura 13. Para tornarfinito o espaço dos números, a aritmétiea do relógio envolve cor-tarmos a linha e curvá-Ia sobre si mesma, criando um anel de

17H I II:I I~W l E()I(EMA IIfo:1 lm~Ii\ I ME1{GULIIU NA AlI~ I RAÇÃU 179

números no lugar de uma línha de números. A Figura 14mostrao relógio 5 onde a linha de números foi cortada no 5 e emendadade novo no zcro O número 5 desaparece c se torna o equivalente

X3 - x2 = y2 + y

As soluções são:

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a 0, e portanto os únicos números que existem na aritmética dorelógio 5 são 0, 1,2,3,4.

013 2

x = 0,x = 0,

x = 1,x = 1,

y=Oy=4

y=OY = 4.

Figura 14.Na aritmética do relógio 5 a l inha dos números foi cortada nocinco e dobrada sobre si mesma. O número 5 então coincide com o Oe

portanto é substituído por ele.

Embora algumas dessas soluções não sejam válidas na ari tmé-tica normal, na aritmética do relógio 5 elas são aceitáveis. Porexemplo, a quarta solução  x = I, y = 4) funciona do seguintemodo:

Na aritmética normal nós podemos pensar na adição como um

movimento aolongo da linha ,por um certo número de espaços. Porexemplo, 4 + 2 = 6 é o mesmo que dizer que começamos no 4,avançamos UII<lHaHaHc chcgmnos no ú.

Contudo, na aritmética do relógio 5:

X3 - x2 =y2 + Yt J - t2 = 4Z + 4] - 1 = 16 + 4

0=20.

Na aritmética uu relógiu 5,2Ucquivalc a Upurque 5 será Jivididuem 20 com resto O.

4+2= 1. Como não podiam enumerar todas as soluções de uma cquaçãoelíptica trabalhando com um espaço infinito, os matemáticos, in-cluindo Wiles, se conformaram em determinar o número de solu-

ções para todas as diferentes aritméticas de relógio. Para a equa-ção clíptiea mostrada acima, o número de soluções na aritmética

do relógio 5 é quatro, e assim os matemáticos dizem Es = 4. O

número de soluções em outras aritméticas de relógio também podeser calculado. Por exemplo, na aritmética dorelógio 7 o número de

soluções é nove e assim E7 = 9.Para resumir seus resultados, os matemáticos fazem uma lista

do número de soluções em cada aritmética de relógio c chamamesta lista de série L para a equação elíptica. Qual o significado doL é algo que foi esquecido há muito tempo embora algumas pes-soas tenham sugerido que é o L de Gustav Lejeune-Dirichlet, que

Isto acontece porque se começarmos no 4 e avançarmosdois es-paços, cntãochegaremosdevoltano 1.Aaritmética do relógiopodeparecer estranha, mas de fato, comoo nome sugere, nós a usamostodo o dia quando falamos do tempo. Quatro horas depois das 11

(: horas (isto é, 11 + 4) nós geralmente não chamamos de 15 horas ,esim de 3 horas. Isto é ari tmética do relógio 12.

Como a aritmética do relógio lida apenas com espaço limitadode números, é relativamente fácil calcular todas as soluções possí-veis para uma equação elípti~a em uma dada aritmética de relógio.Por exemplo, trabalhando com a aritmética do relógio 5 é possívelenumerar todas as soluções possíveis para a equação elíptica

 

'.

180 o ÚI:nMO TEOREMA DE FERMAT MERGUI J 10 NA ABSTRAÇÃO 181

trabalhou com equações elíptieas. Paramais cIarcza cu vou usar otermo série R - a série que é derivadade uma equação elíptiea. \qui cstá uma cquaçãoc1ípticacom sua séric R:

acontecimentosque ligariaasequaçõeselípticasaoÚltimoTeoremade Fermat. Ao encorajar Wiles a cstudar as equações elípticas,Coatcs lhe dera a~ferramentas quc o capacitariam a trabalhar em

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seu sonho.

Equação elíptica x3 - x2 =y2 + Y

série I~ : I~ I = I,

E = 4R = 4JE = 8

4 '

E = 45

E6 = 16E =9

7

E =168

e assim por diante.

Como os matemáticos não podem dizer quantas soluções algu-mas equações elípticas possuem no espaço numérico normal, queSI' (':-;tclldc at(~ o infinito, a :-;éric H parce(: :-;cr o lllelhor qlle po-d('11I (,ClII:I(')',llir. I h' lato a :,éri(' L' cOllténl 11111ocado de inforllla-

ção sobre a equação elíptica que ela descreve. De mesmo modoeomo o DNA biológico eontém toda a informação necessária paraconstruir um organismo vivo,àsérie E contém a essência da equaçãoelípt ica. A esperança residia em que estudando este DNA mate-mático, a série E os matemáticos seriam capazes de finalmentecalcular tudo o que poderiam desejar saber sobre uma equaçãoclíptica,

'li abalbando junto com John Coates, Wiles rapidamente esta-bcleceu sua reputação como um brilhante teórico dos números, umapc:-;soadotada de,lIma compreensão profunda das c<]uaçÍlcselíptieasc suas séries g A medida que chegava a cada novo resultado e pu-blicava mais um trabalho, Wiles não percebia que estava reunindoaexperiência que o levaria,muitos anos depois, à beira de demonstraro Último Teorema de Fermat.

Embora ninguém estivesse ciente disso na ocasião, a mate-mática japonesa do pós-guerra já tinha iniciado uma corrente de

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1 ~.

I.. .

5. . . . . .  

Prova por Contradição

Os padrões cr iados pelo matemát ico, como os do pintor ou

do poeta, devem ser belos ; as idéias , como as cores ou as pa-lavras, devem se encaixar de um modo harmonioso.   \beleza

é o primeiro Jcsafio: não cxislc lugar pCl lnancnlc no munuopara a matemática feia.

G. H. Hardy

Yutaka làniyama

Em janeiro de 1954um jovem e talentoso matemático da Univer-sidade de Tóquio fez uma visita rotineira à biblioteca do seu de-

partamento. Goro Shimura procuravauma cópia dovolume 24do

MathematischeAnnalen Ele buscava um artigode Deuring sobre

a teoriaalgébricadamultiplicaçãocomplexadeque necessitava para

ajudá-Io em um cálculoparticularmente difícil e esotérico.Para sua surpresa e desapontamento, ovolume tinha sido em-

prestado. Quemo levaraforaYutakaTaniyama,um conhecido oca-

sional de Shimura que viviado outro ladodocampus Shimura es-

creveupara Taniyamaexplicando-lhe que precisavaurgent~mente

da revista para completar um eálculo difícil,e educadamcnte per-guntou quando ela seria devolvida.

Algunsdiasdepoischegouumcartão-postalnamesade Shimura.

PROVAPOR CONTRADIÇÃO 185

~1niyama respondeu dizendo que estava trabalhando exatamenteno mesmo cálculo e que ficara preso no mesmo ponto da lógica.Ele sugeria que compartilhassem suas idéias e talvez pudessem

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Goro Shimura

II ,,

11

colaborar na solução do problema. Este encontro casual'em tornode um volume emprestado pela biblioteca iniciou uma parceria quemudaria o curso da história da matemática.

'làniyama nascera em 12de novembro de 1927em um peque-no vilarejo, alguns quilômetros ao norte de Tóquio. O caracterejaponês simbolizando seu primeiro nome deviaser lidocomo Toyo ,mas a maioria das pessoas, fora da família, o interpretava como Yutaka e à medida que crescia Taniyama aceitava e adotava estetítulo. Quando criança Taniyama teve sua educação interrompidavárias vezes. Ele sofreu vários problemas de saúde e quando eraadolesce lte teve tuberculose, o que o levou a perder dois anos doginásio. O início da guerra provocou uma interrupção ainda maiorem seu aprendizado.

Goro Shimura era um ano mais jovem do que Taniyama c tam-

bém tivera seus estudos interrompidos durante os anos da guer-ra. Sua cscola roi rcchada c tiOlugar dc aSHjHtiràs aulas Shimuraprccisou ajuuar no csforço uc guerra, trabalhanuo cm uma fábri-ca que montava partes de aviões. A cada noite ele tentava recupe-rar seus estudos perdidos e se sentiu atraído pela matemática. Éclaro que havia muitos assuntos para estudar, mas a matemáticaera mais fácil porque eu podia simplesmente ler os livros-texto.Eu aprendi cálculo Icndo os livros. Sc tivessc dcsejado cstudarquímica ou física eu teria precisado de equipamento científico enão tínhamos acesso a tais coisas. Eu nunca pensei que fosse talen-toso. Eu cra apenas curioso. tO

Alguns anos depois do fim da guerra, Shimura e Taniyama seencontraram na universidade. Na ocasião em que trocaram pos-tais sobre o livro emprestado, a vida em Tóquio começava a voltar,ao~ormal e osdois jovens acadêmicos podiam ter alguns luxos. Elespassavam a tarde nos cafés e de noite jantavam em um pequeno,es~urante especializado em carne de baleia. Nos fins de semana

ti : passeavam pelos jardins botânicos ou pelo parque da cidade. To-dos,locais ideais para conversas sobre as últimas idéias matemáticas.

I

I

I

'I

 Ij;: '~

.k

186 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT

Embora Shimura tivesse um lado excêntrico - ainda hoje elemantém o gosto por piadas zen -, ele era muito mais conservadore convencional do que o seu parceiro intelectual . Shimura se le-

PROVA POR CONTRADIÇÃO 187

lhos a explorarem o território desconhecido e para os estudantesmais jovens agia como uma figura paterna.

Como os estudantes viviam isolados do Ocidente, os seminá-

rios ocasionalmente cobriam assuntos que eram considerados an-

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vantava com o raiar do dia e imediatamente começava a trabalhar,enquanto seu colega freqüentemente continuava dormiriao, tendotrabalhado a noite toda. As visitas que chegavam no apartamento

freqüentemente encontravam Taniyama dormindo no meio da tarde.Enquanto Shimura era obstinado, Taniyama era despreocupa-

do a ponto de ser preguiçoso. Surpreendentemente esta era umacaracterística que Shimura admirava. Ele tinha uma capacidadeespecial de cometer muitos erros, a maioria deles na direção certa.Eu o invejava por isso e tentei imitá-Ia em vão, mas descobri queera muito difícil cometer bons erros.

Taniyama era o exemplo perfeito do gênio distraído e isso serefletia em sua aparência. Ele era incapaz de dar um laço decentee assim, no lugar de ficar amarrando os sapatos dezenas de vezespor dia, ele os dcixava com os cordões soltos, dcsamarrados. Usava

sempre o mesmo terno verde, peculiar, que tinha um estranho bri-lho metálico. Era fcito de um tecido tão vagabundo quc fora rcjci-tado por outros membros de sua família.

Quando se encontraram em 1954, Taniyama e Shimura esta-vam no começo de suas carreiras como matemáticos. A tradiçãomandava, e ainda manda, que osjovens pesquisadores sejam colo-cados sob a tutela de um professor que guiaria suas mentesinexperientes. Mas Taniyama e Shimura rejei~aram esse tipo deaprendizado. Durante a guerra averdadeira pesquisa fora interrom-pida e mesmo na década de 1950as faculdades de matemática ain-da não tinham se recuperado. De acordo com Shimura, os profes-

sores estavam cansados, estressados e desiludidos . Emcomparação, os estudantes do pós-guerra estavam entusiasmadose ávidos por aprender e logo perceberam que o único caminho àfrente seria o de ensinarem a si mesmos. Os estudantes passaram  ol g ni~ rseminários regulares, se revezandopara informar unsaos outros sobre as últimas técnicas. e descobertas. Apesar de suaatitude lânguida, durante os seminários k1niyama se tornava umaforça impulsionadora feroz. Ele encorajava os estudantes mais ve-

tiquados na Europa e na América. Um tópico particularmente forade moda que fascinava Taniyama e Shimura era o estudo das for

mas modularesAs formas modulares estão entre os objetos mais bizarros emaravilhosos da matemática. Trata-se de uma das entidades maisesotéricas do mundo matemático e no entanto, no século xx, oteórico dos números Martin Eichler as considerou uma das cinco

operações fundamentais: adição, subtração, multiplicação, divisãoe formas modulares. Amaioria dosmatemáticos se considera mestre

11asquatro primeiras operações, mas a quinta ainda os deixa um;. ouco confusos.

y

x

Figura 15. Um quadrado simples exibe a simetria rotacional e refle-Xiva.

\

o fator principal das formas modulares é seu nível excessivode simetria. Emboraa maioria daspessoas estejafamiliarizada como conceito normal de simetria, ele tem um significadomuito espe-cial em matemática. Significa que um objeto tem simetria se elepuder ser transformadode um modo especiale depois disso pare-..cer o mesmo. Paraque possamos apreciar a imensa simet~ia dasformas modulares,vamosexaminar primeiro a simetria de objetosmais comuns comoum simples quadrado.

188 o Ú LTI MO 1 EO REM A D E F ER MA T

No caso do quadrado, uma de suas formas de simetria é arotacional. Isso quer dizer que se imaginarmos um pino coloca-do no ponto onde o eixodos   e o cixo dos y sc cruzam, então o

I,PROVA POR CONTRADiÇÃO 189

do eixo dos y e aolongo das duas diagonais) para os quais cadaquadrado refletido pareceria idêntico ao original.

O quadrado simplesé relativamcntesimétrico,possuindoambas

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quadrado daFigura 15poderá girar um quarto de uma volta com-pleta e parecer imutável.Rotaçõessemelhantes, de meiavolta,trêsquartos e um giro completo,vãodeixar o qÚadradocom a mesmaaparência.  

y

Figura 16.Uma superfície infinita, calçada com azulejos quadrados,exibe simetria rotacional e reflexiva, e além disso possui simetriatranslacional.

Alémda simetria rotacional,o quadrado também possui sime-tria reflexiva.Seimaginarmosum espelho colocadoao longodo eixodos   então a metade superior do quadrado vai se refletir exata-mente sobre a metade inferior e vice-versa,de modo que, depoisda transformação,o quadrado continuaria parecendo o mesmo. Demodo semelhante podemos definir outros três espelhos ao longo

as simetrias, rotacional e reflexiva,mas ele não possui a simetriatranslacional. Ela significa que, se o quadrado for empurrado emqualquer direção,um observadorperceberia imediatamentcpor que

suaposiçãorelativaaoseixosteriamudado.Contudo,se todoo espaçofosse revestido comazulejosquadrados, como mostrado na Figura16, esta infinita coleção de quadrados passaria a ter a simetriatranslacional. Se a superfície infinita de azulejosfossemovida paracima ou para baixopor um ou mais espaços,então o novoazulejopareceria idêntico aooriginal. E além disso a superfície de azule-jos ainda possui simetria rotacional e reflexiva. .

Â.I

Figura 17.Usando dois tipos diferentes de azulejos, a pipa e o dar-

do, Roger Penrose foicapaz de cobrir esta superfície. Contudo, osazulejos de Penrose não possuem simetria translaeional.

~

A simetria da superfície de azulejos é uma idéia relativamentesimples, mas, exatamente como acontece com outras idéias ~pa-rentemente simples, existem muitas sutilezas escondidas dentrodela. Por exemplo,na década de 1970o físicobritânico e matemá-tico diletante RogerPenrose começou a brincar com diferentes ti-

x

-. .-- - -

-

190 o Ú LT IMO : fEO RE MA D E F ER MA T

pos de azulejos em uma mesma superfície. Por fim, ele identificouduas formas interessantes, que chamou de pipa e dardo, as quaissão mostradas na Figur a 17. Sozinhas, nenhuma dessas formas

P ROVA P OR C ONTR ADIÇ ÃO 191

que cstc é um espaço quadridimcnsional com quatro dimensões ,x x. y  y .  .I r I

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poderia ser usada para cobdr uma superfície s em deixar fendas ousuperposições, mas juntas elas podem ser usadas para cr iar umasér ie rica de padrões de azulejos. As pi pas e os dardos podem ser

combinadas de um modo infinito, e embora cada padrão s eja s imi-lar, todos eles variam em detalhes . Um padrão feito de pipas e dar-dos é mostrado na Figura 17. .

Outra característica extraordinária sobre os azulejos de Penrose  os padrões gerados por peças como a pipa e o dardo) é que elespodem exibir um nível bem r estrito de simetria. À primeira vistapode parecer que p padrão mostrado na Figura 17possui simetriatranslacional, c no entanto qualqucr tentativa de mover a fi~ura,de mudo quc ela pareça imut{lvc1,termina em fracasso. Os aJ ,ule-jos de Penros e são enganadoramente ass imétricos e é por isso queeles fas cinam os matemáticos, tendo se tornado o ponto de partida

para todo um novo campo de pes quis as.Embora a característica fascinante sobre as superfícies azule-jadas de Penros e seja s ua simetria restrita, a propriedade mais in-teres sante das formas modulares é que elas exibem simetria infi-nita. Asformas modulares estudadas por Taniyama e Shimura podemser empurradas, trocadas, refletidas e giradas de um número infi-

  , nito de modos e ainda permanecerão imutáveis, o que as torna osobjetos matemáticos mais simétricos que existem.

Infelizmente é imposs ível des enhar ou imaginar uma formamodular. No caso dos azulejos quadrados, nós temos um objeto quevive num espaço de duas dimensões definido pelo eixo dos x e o

eixo dosy. Uma forma modular também é definida por dois eixos,mas ambos os eixos são complexos, ou seja, cada eixotem uma partereal e uma parte imaginária, tornando-se, efetivamente, dois eixos.Portanto, o primeiro eixo complexo deve ser representado por doiseixos, o eixo xr   r eal) e o cixo Xi imaginário). Já o segundo eixocomplexo é representado pelos eixosy r   rea l) ey i imaginário). Paraser maispreciso, as formas modulares vivemno meio plano supe-rior deste espaçocomplexo,mas o que é mais importante é notar

)

I

. )

Figura 18. Círculo Limite W de Mauritz Escher, transmite um pou-co da simetria das formas modulares.

l, Este espaçoquadridimensionalé chamadodeespaçoIziperbólico.

O universo hiperbólico é difícil de ser entendido pelos humanos,que estão presos num mundo convencional,tridimensional, mas oespaço quadridimensional é um conceitomatemáticoválidoe é estadimensão extra que dá às formas modulares seu nível de simetriatão imenso. O artista Mauritz Eschcr era fascinado pelas idéiasmatemáticas e tentou transmitir o conceito de espaço hiperbólico

II,

]92 o ÚI:I IMOEOREM DE FERM TPROV OR CONTR DIÇÃO 193

em algumas de suas gravurase pinturas. A Figura 18mostra o  imite CircularIV de Escher que encaixa o mundo hiperbólico, emuma página bi di mensional. No verdadeiro espaço hi perbólico osmorcegos e anjos teriam todos o mesmo tamanho e a repetição é

ca. Na verdade, elas parecem completamente desligadas do as-sunto que Wilesiria estudar em Cambridge, as equações elípticas.A forma modular é terrivelmente complicada, estudada principal-mente devido à sua simetria, e foi descoberta no século XIX.A

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.um sinaldoalto nívelde simetria.Embora parte destasimetria possaser vista em uma página bidimensional, existe uma distorção cres-

cent e em di reção à bordada figura.As formas modulares, que vivem no espaço hiperbólico, podemte r várias formas e tamanhos, mas cada uma é construída com osmesmos ingredientes básicos. O que diferencia cada forma modu-l ar é a dosagem de cada ingredi ent c cont ido nela. Os ingredi ent es

de uma forma modular são enumerados de um ao i nfinito (MI Mz,M3,M4 . ), e assim uma determinada forma modul ar pode conterIImílpor~ ã{)cioingr diClltc 11111M, =1),trÔHporçõcs do illgrediell cdoiH (Mz = 3),dllílS porções d o illgr ediellle t.rês (Moi = 2) ele. Estainformação, dcscrcvendo como uma forma modular é construída,pode ser resumida na assim chamada série modular, ou série M,

uma recei ta com i ngredientes e a quantidade neccRRária dc cadaum:

equação elíptica vem da Grécia antiga e não tem relação nenhu-ma com a simetria. Formas modulares e equações elípticas vivem

em regiões completamente diferentes do cosmos matemático eninguém acreditaria que existisse algum elo remoto entre os doisassuntos. Contudo, Taniyamae Shimura iriam chocar a comuni-dade matemáticaaosugerirem que as equaçõeselípticase as formasmodulares eram na verdade uma coisa só. De acordo com essesmatemáticos dissidentes seria possível unificar os mundos mo-dulares e elípticos.

iI

  onhando com o mpossível

Série M: M( = 1M = 3M = 2

e assim por diante.

Em sctembro dc t 955 realií ; ou-se um simpósio il lt emacional emTóqui o. Era uma oportunidade úni ca para muitos jovens pesqui -sadores japoneses mostrarem ao resto do mundo o que tinhamaprendido. Eles distribuíram uma coleção de 36problemas relacio-nados com seu trabalho, acompanhados de uma humilde introdu-ção - Alguns problemas não-resolvidos da matemática: nenhuma

atualização foi feita, assim podem existir algumas questões triviais

oujá resolvidas entre estas. Pede-se aos participantes que apresen-

tem comentários sobre qualquer um desses problemas.

Quatro problemas eram de Tani yama e sugeri am uma curi osarelação e ntre as formas modula res e as equaç ões elíptic as. Esses

problemas inocentes i ri am finalmente conduzir a uma revoluçãona teoria dos números. Taniyama est udara os primei ros termos nasérieM de uma determinada forma modular. Ele reconheceu o padrãoe percebeu que era idêntico à lista de números de uma série E deuma be m conhe cida equa ção elíptica. Ele calc ulou mais algunstermos em cada uma das séries e ainda assim a série M da forma

modular e a série E da equação elíptica correspondiam perfeita-mente.

Exatamente como a séri e E é o DNA das equações elípticas, asérie M é o DNA das formas modulares. A quantidade de cadaingre die nte listado em uma série M é crítica. Dependendo de

como você muda a quantidade, digamos, do primeiro ingrediente,você pode gerar uma forma modul ar completament e di ferente,mas igualmente simétrica, ou pode destruir toda a simetria e gerarum novo objeto que não é uma forma modular. Se a quantidadede cadaingrediente for escolhida, arbitrariamente, então o resul-tado, provavelmente, será um objeto com pouca ou ne nhuma si-metria.

Asformas modulares são muito independentes na matemáti-

194 o Ú LT IMO T EO RE MA D E FE RMA TP ROVA P OR C ONTR ADIÇ ÃO 195

que enriquece ambos ostemas. Por exemplo, originalmente os cien-tistas tinh am estudad o a eletr icidad e e o magnet ismo como doi sf enômenos co mpl etamen te sep arado s. Ent ão, no sécu lo XIX , o steóricos e os experim entalistas perceberam que a eletricidade e o

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Em 1955 Goro Shimura e Yutaka T aniyam a participaram de umsimpósio internacional em Tóquio.

magnetismo tinham uma relação profunda. Isto resultou num melhoren tendi ment o de ambos. As corr entes el étri cas ger am camp os

magnét icos e o s magn etos podem ind uzir co rr entes elétr icas emfi os que passem p erto deles. I st o lev ou à i nvenção dos dí namo s emo tor es elétr icos e fi nalmente à d esco bert a de que a p róp ria lu z éo resultado de campos elétricos e campos magnéticos oscilando emharmonia.

 Jàniyama examinou mais algumas formas modularcs c em cadacaROa Réric 111parecia eOITeRpolHlcrperfeitamcnte com a Rérie l~u e uma eq uação elí pti ea. Ele começo u a imagin ar se cada for mam odular teria uma equação elíptica correspondente. Talvez cadafo rma mod ular t ivesse o mesmo DNA de u ma equ ação elíp tica: Épossível que as formas modulares sejam equações elípticas

di sf arçadas? As per gunt as q ue el e distr ib uiu n o simpósio eramrelacionadas com esta hipótese.A idéia de que cadaequação elíptica tinha relação com uma forma

modul ar era tão extr aor dinár ia q ue aq ueles que ler am as per gun -tas de Taniyam a as trataram com o nada m ais do que uma observa-ção curiosa. Com certeza Taniyama tinha demonstrado que algu-mas equações elípticas podiam ser relacionadas com determinadasformas m odulares, m as afirm ava-se que isso era apenas uma coin-cidência. De acordo com os céticos, a hipótese de Taniyama de queexistia uma relação geral, universal, não tinha substância. A hipó-tese er a baseada na int uição e n ão em q ualqu er ev idênci a real .

O único aliadode Taniyama era Shimura, que acreditava na forçae na pr ofu ndid ade das idéias d e seu amigo . Dep ois do simpósio ,ele t rab al hou com làn iyama em u ma tentat iva p ara dese nvo lver ahipó tese até um p onto em qu e o resto do mund o n ão pudesse maisignorá-Ia. Shimura queria encontrar mais evidências para apoiar orelacionamento entre os m undos modulares e elípticos. A colabo-ração en tre os do is fo i inter ro mpi da, tempor ariamente, em 1 957,quand o Shi mur a f oi co nvid ado a estud ar no In st itut o de Est udos

 ;

Est a era uma descober ta espanto sa por que, sem nen huma ra-zão aparcn te, esta fo rma mod ular pod eria se r elacio nar com umaequaçãOelíptica atravésde suas respectivas sériesM e séries E  ambas as séries eram.idên~icas.O DNAmatemáticoque criaraessasduas entidades era o mesmo. Esta era uma descoberta duplamen-te profunda. Em primeiro lugar, sugeria que, lá no fundo, existiauma relação entre as formas modulares e as equações elípticas,objetos que estão em lados opostos da matemática. Em segundolugar,sugeriaque os matemáticos,que já conheciam a sérieM parauma forma modular, não Í)recisariam calcular a série E para umaequaçãoelíptica correspondente, porque ela seria idêntica à sérieM

Asrelações entre assuntos aparentemente diferentes são im-portantes, criativamente,tanto na matemática quanto em qualqueroutra disciplina. O relacionamento sugere algumaverdade oculta

196 o ÚI:I'lMO TEOREMA DE FERMAT PROVA POR CONTRADIÇÃO 197

Avançados de Prineeton. Depois de passar dois anos como profes-sor visitante nos Estados Unidos, ele pretendia voltar a trabalharcom 'TIlI1iyama,mas isso nunca aconteceu. Nodia 17de novembro

Na manhã da segunda-feira, 17de novembro de 1958, osíndico do apartamento o encontrou morto, com um bilhctedeixado naescrivaninha. Fora cscrito em três páginas dc um

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de 1958,Yutaka1àniyama cometeu suicídio. caderno que ele usava para seus trabalhos. O primeiro pará-grafo dizia:

 Morte de um ênio Até ontcm eu não tinha intenção de me matar.Mas muitos

notaram que ultimamente cu tcnho me sentido cansado,físicae mentalmentc.Quanto à causa do meu suicídio, eumesmo não a entendo completamente, mas não é o resul-tado dc 11111ncidcntc cm particular ou dc ullla qucstão

cspecífica . S(í POgSOdi: l.cr quc cstou nunl estado mental cm

quc pcrdi a confiança CIII l IIeu futuro. Podcm cxist ir pcs-~;oa~; I 'ara qU( '11I 111('11 \ui l' Íd io wr: í 1111a ( 'o i :a I '( 'r ll lr ll :l llora

011 d(' 1'1'110 IIlodo 11111gol pc. 1-;11 nillc('rallu'lIlc (; ;pcro que

este incidente não lance ulUasombra ncgra sobre o futuro

dcsta pcssoa. Dc qualqucr modo não posso nc~ar quc istoseja ullla cspécie dc traição, III:ISpor favor desculpc o quefiz como meu último ato em meu modo de vida, como sem-

prc, vivi ao mcu modo, cm toda a minha vida.

Shimura ainda guarda o postal que Taniyama lhe mandou quan-do fizeram o primeiro contato devido ao livro emprestado da bi-bliotcca. Ele também gua~da a última carta que Taniyama escrc-vcu para c1c quando cstava em Princctoll, lI Ias ela Hãu contém omenor indício do que ir ia acontecer, dois meses depois . Até hojeShilllura ainda não entendeu a causa do guicídio de 'Ihniyallla. Eu(' ;Iava IIIIIi10 illlrigado. I'('rplcxo pod(' H'r IIllIa palavra 11\1'111111<::

claro que fiquei triste, lHasfoi ulI\a cui~;(ltão súbita. Eu reecbi cstacarta em setembro e ele morreu em novembro e fiquei incapazeleentendcr o que acolltecera. É claro qlle depoig ollvi IIIlIitascoisasc telltci lHe reconciliar cum sua morte. Algumas pessoas di~cmque ele perdera a confiança em si mesmo, mas não matematica-In<:lIlc.

O que era particularmente confuso para os amigos de Taniyamaé que ele acabara de se apaixonar por Misako Suzuki e plancjava sccasar COIIIda 110final daquele anu. Num tributo pessual publieaduno Bulletill 1the LOlldon Mathematical Society Goro Shimurarelembra o envolvimento de Taniyama com Misako e as semanasque antecederam o seu suicídio:

Quando fui informado donamoro entre os dois , eu f iquei um

pouco surpreso, já que pensara, vagamente , que ela não eraseu tipo, mas não t ive nenhum pressent imento. Depois mecontaram que eles tinham alugado um apartamento, aparen-temente melhor, para ser seu novolar. Saíram juntos e com-praram utensílios de cozinha e estavam preparando tudo parao casamento. Tudo parecia tão promissor para eles e os ami-gos.E então a catástrofe os atingiu.

Em seguida ele passava a descrever, metodicamente, o seudescjo sobrc o que deveria scr feitocom gCW;ertcllces <.:qllelivrose registros ele tinha tomadoemprestado da biblioteca edeamigos.Especificamenteelediz: Eu gostariadedeixarmeusdiscos e a vitrolapara MisakoSuzuki desde que elanão fiqueperturbada por eu deixar isto para ela. Ele também ex.plicaaté onde tinha chegado no curso de cálculo e álgebra linearque estavadandopara osestudantes e conclui a notapedindodesculpas aoscolegas pelo incômodo que iria causar.

Assim limadasmentes mais brilhantes e arrojadasde nossaépoca acaboucom suavidapor sua própria vontade.Ele tinhacompletado 31 anos cinco dias antes.

Algumas semanas depois do suicídio, a tragédia aconteceu pelasegunda vez. Sua noiva,Misako Suzuki, também se matou. Ela tc-

198 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT PROVA POR CONTRADIÇÃO 199

que ele testava sua hipótese ela pareciaverdadeira e, em todo caso,ela pareeia se encaixarem sua ampla filosofiamatemática. Eu te-nho esta filosofia da bondade, e a matemática deve contê-Ia. As-sim, nocasode umaequaçãoelíptica,pode-sedizer que esta equação

riadeixado um bilhete dizendo: Nós prometemos um aooutro que,não importa aonde fôssemos,nunca nos separaríamos. E agoraqueele se foi eu também devome juntar a ele.

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 Filosofia da ondadeé boa se ela for definida por uma forma modular. Eu espero quetodas as equações elípticas sejam boas. É uma filosofiameio tosca,

mas sempre se pode usá-Ia comoponto de partida. Depois, é claro,eu tinha que desenvolvervárias razões técnicas para a conjectura.Eu posso dizer que a conjectura derivada minha filosofia dabon-dade. A maioria dos matemáticos fa~matemática a partir de \1mpOlllo dc vi~la c~léli co c c~la l 'iIo~ofia d:t hOlld:tdc vcm do llIel pontode vista estético.

Finalmente asevidênciasacumuladasporShimura fizeram comque sua teoria sobre equações elípticas e formas modulares se tor-nasse mais aceita. Ele não podia provarpara o resto do mundo queera verdade, mas pelo menos agora ela era algomais do que umaidéiainspirada.Haviaevidênciasuficienteparaque recebesse otítulo

de conjectura. Inieialmentefoichamadade eonjecturadeTaniyama-Shimura em reconhecimento ao homem que a inspirara e ao seucolega que a desenvolveucompletamente.

Depois André Weil,um dos grandes nomes da teoria dos nú-meros no séculoxx, adotou a conjectura e a divulgouno Ocidente.WeilinvestigouaidéiadeShimura eTaniyamae encontrou evidênciasainda mais sólidas a favordclas. Como rcsultado, a hipótese às ve-zes era chamada de conjectura Taniyama-Shimura-Weil, às vezescomoconjecturaTaniyama-Weile,ocasionalmente,comoconjecturaWeil.De fato, houvemuitos debates e controvérsias quanto aonomeoficial da conjectura. Para aqueles que se interessam por combi-nações, existem quinze permutações possíveis dados os três no-mes envolvidos,e é bem possível que cada uma dessas combina-çõestenha aparecidonos livrose revistasao longodos anos. Contudo,euvoume referir à conjectura pelo seu título original,de conjecturade l1miyama-Shimllra.

O professor John Coates, que orientou Andrew Wiles quandoele era estudante, fora ele próprio estudante quando a conjecturacomeçou a ser discutida no Ocidente. Eu comecei a fazer pesqui-

Durante sua curta carreira Taniyama contribuiu eom muitas idéiasradicais para a matemática. Os problemas que ele distribuiu nosimpósio continhàm suas maiores descobertas, mas ele estava tãoadiallte de scu tempo quc lliio viveri:t para v(.'r SII:t cnorme illfluên-

cia lia tcoria dos números. A comunidadc dos jovens cientistas ja-poneses sentiria muita falta de sua liderança e de sua criatividadeintelectual.Shimura selembramuitobem da influênciadeTaniyama: Ele era sempre gentil com seus colegas, especialmente eom oscalouros, e se importava realmente com o bem-estar de todos. Eraum apoio moral para muitos dos que entraram em eontato eom ele

durante o estudo damatemática, eu inclusive.Provavelmentenuncateve noção do papel que desempenhava. Mas eu sinto sua nobre,: generosidade mais fortemente agorado que quando ele estavavivo.

E no entanto ninguém foi capaz de apoiá-Ioquando ele preeisavadesesperadamente. Refletindosobre isto eu me sinto tomado pelamais profunda mágoa.

Depois da morte de Taniyama, Shimura concentrou todos osseus esforços para compreender a relaçãoexata entre as equaçõeselípticas c as formas modulares. À medida que os anos se passa-vamelelutavapara reunir mais evidências e conseguir uma ouduaspeçasde apoiológicopara suateoria.Gradualmente elese convenceude que cada equaçãoelípticadevia ser relacionada com uma formamodular. Os outros matemáticos ainda duvidavàm e Shimura selembra dcuma conversaqu~teve eom um eminente colega.O pro-fessor perguntou: Ouvidizer que vocêpropõe que algumas equa-ções elípticaspodem ser ligadas a formas moclulares.

Não,você não entende , respondeu Shimura. Não são ape-nas algumas equações elípticas, são to s as equações elíptieas

Shimma não podia provar que isso era verclade, mas cada   z

200 () ÚI:I'IMO TEOREM DE FERM T PROV POR ONTI~DlÇÃO 201

sas em 1966quando a conjectura de Taniyamae Shimura estavaseespalhando pelo mundo. Todos estavam admirados e começavama examinar seriamente se todas as equações elípticaspoderiam ser

Existem dúzias de tais ilhas, cada uma com sua linguagem única,incompreensível para os habitantes das outras ilhas. A linguagemda geometria é bem diferente da linguagem da probabilidade, e agíria do cálculo é incompreensível para aqueles que falam somen-

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mouularcs. Era uma épocamuito excitante, o único problemaé queparecia muito difícil fazeralgum progresso. Eu acho que é hones-to dizer que, embora bela, esta idéia parecia muito difícil de serprovada, e é isso que nos interessa comomatemáticos.

No final da década de 1960,hordas de matemáticos testaramrepetidamente aeonjeeturadeTaniyama-Shimura.Começandocomlima cquação clíptica c sua série H, eles procuravam uma forma11od 1I1ar ('0111IIlIIa s(~rje   idêllt ica . I~,CIII cada caso, a equaçãodípliea tillh:l, dc falo, lima forma IIJouular associaua. Embora cstafosse uma boa evidência a favorda eonjectura de Taniyama-Shimura,da lIão cheg-avaa scr lima prova. Os matemáticos suspeitavam ueque fosse vCI-dade,mas até que alguém pudesse encontrar uma prova16gica ela continuaria scndo meramente uma conjeetura.

Barry Mazur, professor.da Universidade de Harvard, testemu-nhou a ascensão da eonjectura de Taniyama-Shimura. Era umahiptltese maravilhosa - a idéia de que eada equação elíptiea seria

associada a uma forma modular -, mas para começar foi ignoradaporque estavamuito à frentc de seu tempo. Quando foi aprcscnta-da pela primeira vez não foi.eonsideradaporque era espantosa de-mais. Num ladovocê tinha o mundo elíptico e, no outro, tinha omundo modular. Estes dois ramos da matemática tinham sido es-

tudados de modo intenso mas separado. Os matemáticos que es-tudavam as equações elípticas não eram bem versados em coisasmodulares e vice-versa. Então chega a conjectura de Taniyama-

Shimura, com sua grande hipótese de que existe uma ponte ligan-do esses dois mundos completamente diferentes. E os matemáti-cos adoramconstruir pontes.

Ovalor das pontes matemáticas é enorme. Elas permitem queas comunidades de matemáticos, que viviamem ilhas separadas,troquem idéias e explorem suas criações. A matemática consisteem ilhasde conhecimento num mar de ignorância. Por exemplo,existe uma ilhaocupada pelos geômetras, que estudam as formas,c existe a ilha dos probabilistas, que estudam o risco e o acaso.

te estatística.

O grande potencial da conjectura de Taniyama-Shimura era ode ligar duas ilhas, permitindo que se comunicassem pela primei-ravez. Barry Mazur pensa na conjectura de Taniyama-Shimura comoum artefato tradutor, semelhante à pedra de Rosetta, quc continhaim;criçõcs cm denHítico eg-ípcio, 110antigo grego c IHISIlicf(íglifos.COIIIOo grego (~o d('II.tll i('o eralll ( 'olll\('(' idos, os arqu('c ',logos pu-dcram decifrar os hieníglifos pela prinleira vez. . .{~eOlllOse vocêconhecesse uma linguagem e esta pcdra dc Roset ta vai lhe dar umacompreellsão illtcllsa do outro idioma , uiz Mazur. Mas a cOlljecturade 'HlIliyama-Shimura é uma pedra ue Roset ta com um certo po-ucr mágico. 1\conjectllra tem uma característica agrauável no scn-tido de que simples intuições no mundo elíptieo se traduzem emverdades profundas no mundo modular c vice-vcn,a. E o que é ain-da mais illtercssallte, problemas prof 1IlIUOS10mUlluo c líptieo po-dem ser resolvidos, às vezes, simplesmente tradu:f.indo-os para omunuo modular, com esta peura ue Rosetta, e dcscobrinuo que nestemundo temos ferramentas e artefatos para enfrentar o problematraduzido. No mundo elíptieo estaríamos perdidos.

Se a conjectura de Taniyama-Shimura fosse verdadeira, elapermitir ia que os matemáticos solucionassem problemas que ti-nham passado séculos sem serem resolvidos, abordando-os atra-vés do mundo modular. Agrande esperança era no sentido destaunificação dos mundos elípt ico e modular. A eonjeetura tambémcriou uma esperança de que pudessem existir ligaçõesentre osváriostemas da matemática.

Durante a década de 1960, Robert Langlands, do Instituto deEstudos Avançados de Princeton, ficou impressionado com o po-tencial da conjeetura. Embora ela não tivesse sido provada,Langlandsaeredi tava que se tratava de apenas um elemento numgrande esquema de unificação. Ele estava confiante de que exis-tir iam elos entre todos os principais assuntos da matemática  

202 o ÚLTIMOEOREM DE FERM T PROV POR ONTR DIÇÃO 203

começou a buscar esta unificação. Em poucos anos começaram asurgir algumas pontes. Toda s essas conjecturas de unificação erammuito mais fracas e especulativas do que a de Taniyama-Shimura,mas formavam uma rede complexa de pontes hipotéticas entremuitas áreas da matemática. O sonho de Langlands era ver cada

que ninguém tinha a menor idéia de como provar as conjecturasdeLanglands.Aconjecturamaissólidadentro doprogramaeraaindaa de Taniyama-Shimura, mas mesmo esta parecia fora de alcance.A provade Taniyama-Shimura seria o primeiro passo no programaLanglands e comotal se tornara um dos maiores prêmios cobiça-

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uma dessas conjecturas provadas uma por uma, levando a umagrande matemática unificada.

Langlands discutiu seus planos para o futuro e tentou persua-dir outros matemáticos a participarem doquc ficou conhecido comoo programa Langlands, um esforço concentrado para provar suasinúmeras conjecturas. Parccia não cxistir mcio óbvio dc provar taiselos especulativos, mas, se o sonho se tornasse realidade, então arecompensa seria enorme. Qualquer problema insolúvel em umcampo da matemática poderia ser transformado num problemaanálogo em outra área, onde todo um novo arsenal de técnicas po-deria ser colocado sobre ele. Se uma solução se tornasse difícil, oproblema poderia ser transformado e transportado para outra áreada matemática e assim por diante, até que fosse resolvido. Um dia,

(, de acordo com o programa Langlands, os matemáticos seriam ca-pazes de resolver seus problemas mais esotéricos e intratáveis, sim-plesmente transportando-os através das ilhas do mundo matemá-tico. .

Havia também implicações importantes para as ciências apli-cadas e a engenharia. Seja modelando as interaçães entre quarksque colidem ou descobrindo o modo mais eficiente de organizaruma rede de telecomunicações, freqüentcmente a chave do pro-blema reside em um cálculo matemático. Em algumas áreas da ciên-cia c da tccnologia a complcxidade dos cálculos é tão grande que

eles não podem ser terminados e, conseqüentemente, o progressonestes campos é severamcntc prcjudicado. Sc os matcmáticos pu-dessem provar suas conjecturas de ligação, elas seriam atalhos pararesolver não só os problemas abstratos, mas também os problemasdo mundo real.

Na década de 1970 o programa Langlands se tornara um pro-jeto para o futuro da matemática, mas esta rota para o paraíso dosfC soJvedoresde prohlemas estava bloqueada pelo simples fato de

dos pela teoria dos números.Apesar de sua condição de eonjectura não-provada,Taniyama-

Shimura ainda era mencionada em centenas de trabalhos de pes-quisa matemática, especulando sobre o quc aconteceria se cla fos-se verdadeira. Os trabalhos começaram com a advertência clara: Presumindo-se que a conjectura de rlàniyama-ShimUl-aseja ver-dadeira... e então continuavam a delinear uma soluçãopara algumproblema não-resolvido.É claro que esses resultados poderiam serigualmente hipotéticos porque dependiam da eonjectura ser ver-dadeira. Os novosresultados hipotéticos eram por suavez incorpo-rados emoutrosresultados atéque existiaum excessodematemáticadependendo da comprovaçãoda conjeetura de Taniyama-Shimura.

Esta única eonjeetura era a fundação de toda uma nova arquitetu-ra da màtemática, mas até que fosse provada esta nova estruturaseria vulnerável.

Na ocasião,Andrew Wiles era um jovem pesquisador na Uni-versidade de Cambridge, e ele lembra a inquietação que atingiua comunidade matemática na década de 1970. Nós construímos

mais e mais conjecturas que se estendiam cada vez mais para ofuturo, masque seriam todas ridículas se a conjectura de Taniyama-Shimura não fosse verdadeira. Assim, tínhamos que provarTaniyama-Shimura para mostrar que todo este projeto que tínha-mos mapeado para o futuro era possíveL

Os matemáticos tinham construído um frágil castelo de car-tas. Eles sonhavam que um dia poderiam dar a esta arquitetura afundação sólidade que ela necessitava. Mas também tinham queviver com o pesadelo de que um dia alguém poderia provar queTaniyama e Shimura estavam na verdade enganados, reduzindo apó duas décadas de trabalhos de pesquisa.

204 o ÚI:fIMOTEOREMA DE FERMAT PROVA POR CONTRADIÇAo 205\

o lo erdido Embora este arranjo pareça muito diferente da equação original,eleé uma conseqüênciadiretada soluçãohipotética.Queremosdizerque se, e este é um grande se , existeuma solução para a equaçãode Fermat e o ÚltimoTeorema de Fermat é falso,então esta equa-

No outono de 1984 um seleto grupo de teóricos dos números se

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ção rcarrumada também deveexistir. Inicialmente a audiência de

Frey não ficou muito impressionada com a rearrumação, mas en-tão ele chamou a atenção para o fatode que esta novaequação é defatoumaelíptiea,sebem queexóticaeenrolada.Asequações elípticaspossuem a forma

reuniu para um simpósio em Oberwolfach, uma pequena cidadeno coração da Floresta Negra da Alemanha. Eles tinham se reuni-

do para discutir várias descobertas no estudo das equações elípticase naturalmente alguns dos palestrantes, ocasionalmente, relatavamalguns pequenos progressos feitos na direção da prova de conjecturada Taniyama-Shimura. Um dos oradores era Gerhard Frey, ummatemático dc Saarbrücken. Ele hão tinha nenhuma idéia novasobreC'II II \Oabllnl ;l r;1 (,ol l. ic '(' ll1ra , Il Ias rez a arirl ll ;I I. :i io ( 'x lraonli ll :í ria dI '

j IIIe' qll: c I'11'r   j I ' I \ I 'l Id('H:W prova r '1111'a ( ,l Il Ij l'd 1Ira de '1: '11iY:ll lla-:-)hilllllra era vcrdadcira tambélll dcmollHtraria illlcdiatamclltc o(J lt itno 'Icofema dc Fcrmat .

(1l1alldo Frcy sc levantoll para ralar, ele COIIICÇOUHercvclldo acquação dc Fcrmat:

 \ }  \ I I (f.\ I /1.\ I t .

lIIas sc fizcrmos

(I = I/N - UN,b = () c c = _/llllIJN,

AN +Bv = OV.

então torna-se fácilapreciar a natureza elípticada equação de Frey.Ao trallsforlllar a equação de Fennat em lima equação elíptiea,

Frey tinha ligado o Último 'lcorema de Fermat à conjectura deTaniyama-Shimura.Freyentão mostrou para suaaudiência que estacquação elíptica, criada da solução da equação de Fermal, é ven.la-deiramente bizarra. De fato,Freyafirmou que sua equação elípticaera tão estranha que as repercussões de sua existência seriam de-vastadoras para a conjectura de Taniyama-Shimura.

Quando Freychamou sua equação elíptica de estranha , esteera seu modo deexpressar a natureza única de sua série E. AsérieE continha uma seqüência tão estranha de números que seria in-

concebível uma forma modular possuir uma série M idêntica. Daíse dizia que a equação elíptica de Frey não poderia ser modular.Mas lembre-se de que a equação elíptica de Frey é apenas umaequação fantasma. Sua existência está condicionada à hipótese deoÚltimoTeoremadeFermat ser falso.Contudo, sea equação elípticade Freyde fato existe, então ela é tão estranha que seria impossívelque fosserelacionadacom uma formamodular.Todavia,a conjecturade Taniyama-Shimura afirma que toda equação elíptica deve serrelacionada com 11m:: form~ m()r I111~r. Pnr t~ntn : 'I ('' (ic: t~nr'1~ (1:1( 'c :-

X + .1 = :::; ,onde 11é maior do qllc 2.

o ÚltimoTeorema dc Fermat afirmaquenãoexistem soluções com1I(lIncrosinteiros para esta cqllação, mas Frcy exploroll o que acon-teceria se o Último 'H:orema fosse falso, ou seja, se existisse pelomenos uma solução. Frey não tinha idéia do que poderia ser estasolução hipotética e herética, assim chamou os números desconhe-cidos pelas letras A, B e C:

:Freypassou então a rearrumar a equação. Isto é um procedimentomatemático rigoroso que muda a aparência de uma equação semalterar sua integridade. Através de uma série hábil de complicadasmanobras, Frcy modclou a equação original de Fermat com suasolução hipotética para criar .

)'2 = X3 + (AN-BN) X2-ANBN.

206 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT 207ROVA POR CONTRADIÇÃO

tranha equação elíptica de Frey desafia a conjectura de Taniyama-Shimura.

mundo no auditório, exceto Frey, a percebera. O erro não pareciaser sério, entretanto, tornava o trabalho de Frey incompleto. Quemquer que conseguisse corrigir b erro receberia o crédito por ligarFermat a Taniyama-Shimura.

A platéia de Frey correu do auditório para a sala de xerox. Fre-

Em outras palavras,o argumento de Freyé o seguinte:

 i 

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qüentemente, a importância de uma palestra pode ser medida pelo

comprimento da fi la esperando para obter cópias da transcrição doque foi dito. Depois de obter uma versão por escrito das idéias deFrey, os espectadores retomaram aos seus respectivos insti tutos ccomeçaram a tentar a correção do erro.

O argumento de Frey dependia do fato de que sua equaçãoelíptica, derivada da equação de Fermat, era tão estranha que nãopoderia ser modular. Seu trabalho estava incompleto porque ele nãodemonstrara inteiramente que sua equação elíptiea era suficien-temente bizarra. Somente quando alguém pudesse provar a  bso

lut estranheza da equação elíptiea de Frey é que uma demonstra-ção da conjectura de Taniyama-Shimura implicaria a prova do Último

Teorema de Fermat.Inicialmente os matemáticos acreditavam que provar a estra-nheza da equação elíptica de Frey seria um processo razoavelmen-te rotineiro. Àprimeira vista, o erro de Freyparecia elementar e todosos presentes em Oberwolfach acharam que tudo se resumia a umacorrida para ver quem misturava a álgebra mqis rapidamente. Aexpectativa é que alguém enviaria um e m il e 'm questão de diasdescrevendo como estabelecera a verdadeira estranheza da equa-ção elíptica de Frcy.

Uma semana se passou e tal e m il não chegou. Meses se pas-saram e o que parecia uma louca corrida matemática se transfor-

mou em uma maratona. Era como se Fermat continuasse a zom-bar e atormentar seus descendentes. Frey tinha delineado umaestratégia fascinante para demonstrar o Último Teorema de Fermat,mas mesmo o primeiro passo elementar, ou seja, provar que a equaçãoelíptica hipotética de Frey não era modular, estava frustrando osmatemáticos do mundo inteiro.

Para provar que a equação elíptica não era modular, os mate-máticos estavam procurando por uma invariante semelhante àquelas

(1) Se (e somente se) o Último Teorema de Fermat está errado,então a equação elíptica de Frey existe.

(2) A equação elíptica de Frey é tão estranha que nunca poderiaser modular.

(3) A conjectura de rlàniyama-Shimura afirma que toda cquaçãoelíptica deve ser modular.

(4) Portanto, a eonjcetura de Taniyama-Shimura é falsa

Alternativamente, e mais importante, Frey podia inverter esteargumento.

(1) Se for verdade a conjectura de Taniyama-Shimura, então toda

  equação elíptica deve ser modular.(2) Se toda equação elíptica deveser modelar, então a equação deFrey não pode existir.

(3) Sea equaçãoelípticade Freynãoexiste,entãonãopodem existirsoluções para a equação de Fermat.

(4) Portanto, o Último Teorema de Fermat é verdadeiro

GerhardFreychegaraà dramáticaconclusãode que aprovadoÚltimolcorcma de Fcrmat teria como conseqüência imediata a prova deque a conjectura de Taniyama-Shimura era verdadeira. Frey afir-mava que sc os matemáticos pudessem demonstrar a conjectura

deTaniyama-Shimura, então eles automaticamente provariamqueoÚltimoTcorema deFermat estavacerto. Pelaprimeira vezem eemanos oproblema de matemátka mais difícildo mundo parecia vul-nerável.De acordo comFrey,demonstrar a conjectura de Taniyama-Shimura era o único obstáculo avencer para obter a provadoÚlti-mo Teorema de Fermat.

Embora a audiência ficasse impressionada pela visãobrilhantede F'rrv. lr ncrceheu \1merro elementar em sua lógica. Quase todo

I ROVA POR CONTRADIÇÃO 209

descritas no Capítulo 4. A invariante do nó mostrava que um nónão poderia ser transformado em outro e a invariante do enigmade Loyd mostrara que seu enigma 14-15 não poderia ser transfor-mado no arranjo correto. Se os teóricos dos números pudessemdescobrir urna invariante apropriada para descrever a equação elíptica

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de Frey, então eles poderiam provar que, não importava o que fossefeito, ela nunca poderia ser transformada em uma forma modular. .-De certo modo, a invariante seria a medida de sua estranheza.

Um dos matemáticos que tentavam completar a ligação entrea cOlljccIlira de Thlliyama-Shimllra e o ÚIIimo n~()JTlIJade Fcrmat( r a K(,II l{illl l. 11111proft-:I:H,r da IllIivn:lidadl da (~alif( JI lIia CII I

IIcrkcley. I)estie a palestra elll ()berwolfaeh. I{ibct ficanl obcecadoelll provar que a equação elípLicade Frey era estrallha uemaiH paraHermodular.

Depois de dezoito meses de esforços, ele e todos os outros nãochegaram a parte alguma. Então, no verão de 1986, um colega deJ{ibct. o professor Barry Mazur, estava visitando Berkc1cy p~lrapar-ticipar do Congresso Internacional de Matemática. Os dois ami-gos foram tomar um cappuccino noCafé Strada e começaram a trocarIlistt u ias dc IlI<ísorte, reslllulIgallllo a respeito do cstado da IlIate-mática.

Até que eles começaram a conversar sobre as últimas novida-des nas várias tentativas para provar a estranheza da equação elípticade Frey. Ribet começou a explicar a estratégia que estivera explo-rando. A abordagem parecera vagamente promissora, mas só con-seguira demonstrar urna pequena parte. Eu estava sentado dian-te de Barry contando para ele o que estivera fazendo. Eu mencioneique tinha conseguido demonstrar um caso muito especial, mas não

sabia o que fazer para generalizar e conseguir toda a demonstração.O professor Mazur tomou um gole do seu café e ouviu a idéiade Ribet. Então ele parou e olhou para Ken incrédulo. Mas vocênão percebe? Tudo que precisa fazer é somar alguns gama-zero deestrutura  M e prosseguir com seu argumento que vai funcionar.Vailhe dar tudo de que precisa.

Ribet olhou para Mazur, olhou para seu cappuccino e olhou denovo para Mazur. Era o momento mais importante da carreira de

Ken Ribet

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i ~ti

210 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT PROVA POR CONTRADIÇÃO 2

Ribet e ele o relembra nos mínimos detalhes. Eu disse: você estáabsolutamente certo - é claro - como não percebi isto? Eu es-tavatotalmente perplexo p~rque nunca me ocorrera somar os gama-zero da estrutura  IV ),embora pareça simples.

Deveser notado que, emborasomargama-zero da estrutura (M)

De fato, os matemáticos agora poderiam ataear o Último Teoremade Fermat adotando a estratégia da prova por contradição. Para provarque o Último Teorema é verdadeiro, os matemáticos começariampresumindo que ele é falso, o que implicaria ser falsa a conjecturade Taniyama-Shimura. Contudo, se Taniyama-Shimura fosse de-monstrada como sendo verdadeira, então isto seria incompatível com

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possa parecer simples para Ken Ribet, trata-se de um passo esotéricodelógicaque somente um punhado de matemáticos no mundo inteiro

teria bolado durante um café casual. Era um ingrediente crucial que eu deixara passar e estivera o

tempo todo ali, na minha cara. Eu voltei para o meu apartamento,andando no ar, pensando: Meu Deus, será que isto está correto?Eu estava completamente fascinado, me sentei e comecei a escre-ver num bloco de papel. Depois de uma hora ou duas já tinha tudopronto e verificado. Eu conhecia os passos-chave e tudo se encai-xava. Revisei meus argumentos e disse, sim, isso realmente tem quefuncionar. É claro que havia milhares de matemáticos no CongressoInternacional e eu mencionei casualmente para algumas pessoasque tinha conseguido demonstrar que a conjectura de Taniyama-

Shimura implica o Último Teorema de Fermat. A coisa se espalhoucomo fogono mato seco e logomuita gente sabia evinha me pergun-tar: É realmente verdade que você provou que a equação elípticade Frc) 1/(10{JJ//odlllar{ E cu pcnsava por um minuto c di; ia rc-pentinamente: Sim, eu provei.

O Último Teorema de Fermat estava agora inseparavelmenteligado ~lcm~ectura de Taniyama-Shimura. Se alguém puJc88c provarque toda equação elíptiea é modular, então isto implicaria que aequação de Fcrmat não teria solução e o Último Tcorcma cstariaautomaticamente demonstrado.

Por três séculos e mcio o Último Tcorcma de Fcrmat fora umproblema isolado, um enigma curioso e impossível na fronteira damatemática. Agora Ken Ribet, inspirado por Gerhard Frey, o trou-xera para o centro das atenções. O problema mais importante doséculo XVII fora ligado ao problema mais significativo do século xx.Um enigma de enorme importância histórica e emocional estavaligadoagora a uma conjectura que poderia revolucionar a matemáticaTl1nrl ('rn:1.

a fal,sidade do Último Teorema de Fermat e, portanto, o Último

'Icorema teria que ser verdadeiro. Frey tinha definido claramente atarefa a ser cumprida. Os matemáticos demonstrariam automati-camente o Último Teorema se eles pudessem provar primeiro quea conjectura de Taniyama-Shimura era verdadeira.

Inicialmente houve grandes esperanças, mas então a realidadeda situação foi percebida. Há trinta anos que os matemáticos ten-tavam provar Taniyama-Shimura e fracassavam. Por que iriam fa-zer progresso logo agora? Os céticos acreditavam que o resto deesperança que ainda havia, quanto a provar Taniyama-Shirnura, ti-nha desaparecido. Sua lógica era a de que qualquer coisa que pu-desse levar a uma solução do Último Teorema de Fermat deveria,

por definição, ser impossível.Mesmo Ken Ribet, que fizera a descoberta crucial, era pessi-

mista: Eu fazia parte da grande maioria de pessoas que acredita-vam quc a eonjectura de Taniyama-Shimura era completamenteinacessível. Nem me importei de tentar prová-Ia. Nem mesmo penseinisso. Andrew Wiles era provavelmente uma das poucas pessoas naterra que tinha a audácia dc sonhar que poderia realmente ir emfrente e provar esta conjectura.

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Em 1986,AndrewWiles percebeu que poderia ser possível demonstrar° Últin10 Teorema de Fermat através da conjectura de Taniyama-Shiml1ra.

Os Cálculos Secretos

Um espeeiali ;ta em resplver prohlcmas deveser dotado de IhlaRqllalidadcHillCOIlIpatrveiHIIllIa illlaJ{illação illlJllicta c 1111111paciente obstinação.

Howard W.Evcs

tIJ.

 Foi numa tarde, no final do verão de 1986, quando eu estava to-mando chá na casa de um amigo , lembra-se Wiles. Casualmen-te, no meio da conversa, ele me disse que Ken Ribet t inha demons-trado a ligação entre Taniyama-Shimura e o Último Teorema deFermat. Eu fiquei eletrizado. Eu sabia naquele momento que o rumode minha vida estava mudando, porque isto significava que parademonstrar o Último Teorema de Fermat eu só precisaria provar a

conjectura de Taniyama-Shimura. Aquilo significava que meu so-nho de infância era agora uma coisa respeitável para se trabalhar esabia que nunca a deixaria escapar. Sabia que iria para casa e co-meçaria a trabalhar na conjectura de Taniyama-Shimura.

Duas décadas tinham se passado desde que Andrew Wilesdesco-'brira o livro,na biblioteca, que o inspirara a aceitar o desafio de Fermat,mas agora, pela primeira vez, ele podia vislumbrar o caminho em di-reção aosonho da sua infância. Wiles diz que sua atitude em relação a

214 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT OS CÁLCULOS SECRETOS 215

Taniyama-Shimuramudouda noiteparao dia. Eume lembrei deummatemático que escreverasobre a conjectura de Taniyama-Shimurae descaradamentea sugeriracomoum exercíciopara o leitorinteres-sado.Bom,eu suponho que agoraeu estavainteressado.

Desde quc c Ompletaraseu Ph.D. como professor John Coatcs,cm Cambridge, Wilesatravessara oAtlântico e fora para a Univer-

Ele respondeu: Antes de começar eu teria que passar três anosestudando oassunto intensamente, e eu não tenho tanto tempo paradesperdiçar num provávelfracasso. Wilessabia que para ter algu-ma esperança de encontrar uma provaele teria que primeiro mer-gulhar completamente no problema, mas, ao contrário de Hilbert,elc estavapreparado para correr o risco. Leu os trabalhos mais re-

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sidade de Princeton, onde agoraera professor. Graças à orientação

de Coates,Wilesprovavelmentesabiamais sobre equações elípticasdo que qualquer outra pessoa no mundo. Mas estavaciente de quemesmo eom seu enorme conhecimento e habilidades matemáti-cas a tarefa que o aguardavaera imensa.

A maioria dos outros matemáticos acreditava que tentar urnademonstraçãoseriaum exercíciofútil.JohnCoatesdisse: Eumesmoera totalmente céticode que a bela ligaçãoentre oÚltimo Teoremade Fermat e a conjectura de Taniyama-Shimura fosse levar a algu-ma coisa.Devo confessar que não acreditavaque a conjectura fos-se acessível à demonstração. Bonito como era, este problema pa-reciaimpossívelde serprovado.Achavaque provavelmentenãoviveria

para vê-Io demonstrado,Wiles estavabem ciente das probabilidades que existiam con-

tra ele, mas, mesmo que finalmente fracassasse em demonstrar oÚltimo Teorcma de Fermat, sentia que seus esforços não seriamdesperdiçados: É claro que a conjectura de Taniyama-Shimuraestiveraabertapormuitosanos.Ninguémtinha idéiade comoabordá-Ia, mas pelo menos estavano focoda matemática. Eu podia tentare mesmo que não conseguisse uma demonstração completa esta-ria criando matemática útil. Não achavaque ia desperdiçar meutempo. E assim o romance de Fermat, que me fascinara por toda a

minha vida, estavaagora ligado a um problema que era profissio-nalmente aceitável.

o efúgio no ótão

centes e então exercitou-se nas últimas técnicas, repetidas vezes,

atéque elas setornaram naturais paraele.De modoareunir asarmasnecessárias para a batalha à frente, Wiles teve que passar dezoitomeses se familiarizandocomcada elemento damatemática que forausado ou que derivara das equações elípticas e das formas modu-lares. Este era um investimento comparativamente pequeno, ten-do emmente que ele esperava que qualquer tentativa séria de ob-ter uma demonstração iria exigir dez anos de esforço solitário.

Assim, Wiles abandonou todos os trabalhos que não fossemrelevantes para a demonstração do Último Teorema de Fermat edeixou de participar do interminável circuito de conferências ecolóquios. Mas, como ainda tinha responsabilidades para com o

departamento de matemática de Princeton, ele continuou a parti-cipar dos seminários e dar aulas para os estudantes de graduação.Sempre que possívelevitavaas distrações da faculdade trabalhan-do em casa, onde se refugiavaem seu estúdio nosótão. Lá ele pro-curavaexpandir o poder das técnicas estabelecidas, esperando de-senvolver uma estratégia para seu ataque sobre a conjectura deTaniyama-Shimura.

 Eu costumavair parameu estúdio e começavaa tentar encontrarpadrões. Tentavafazer cálculosque explicassemum pequeno frag-mento da matemática. Dcpois procurava encaixar o resultado em

alguma ampla concepção de algumaparte da matemática que pu-desse esclarecer o problema no qual pensava.Às vezes isso envol-via procurar num livroo que já forafeito,Àsvezes era uma questãode modificar ascoisas um pouquinho, fazendoum pequeno cálcu-loextra. E àsvezeseu concluíaque nadado que forafeito anterior-mente tinha qualquer utilidade. Então eu tinha que encontrar al-guma coisa totalmente novae de onde ela vinha é um mistério.

 Basicamente é apenas uma questão de pensar no assunto.  -.

Navirada do século perguntaram ao grande lógicoDavid Hilbertpor <1iC ele nunca tentara demonstrar o Último Teorcma ele Fcrmat.

216 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT

Freqüentemente você escreve alguma coisa para clarear seus pen-samentos, mas não necessariamente. Em especial quando vocêchegou num verdadeiro i~passe, quando existe um verdadeiro pro-blema que precisa superar, então a rotina do pensamento mate-mático não tem util idade nenhuma. Para alcançar esse tipo de idéia

)I

I

I

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os CÁLCULOS SECRETOS 217

com o Último 1 eorema de Fermat, mas que não havia esperançasde se provar Taniyama-Shimura. Acho que ele apenas sorriu.

Ken Ribet, que completara a ligação entre Fermat e Taniyama-Shimura, também não tinha consciência nenhuma das atividadesclandestinas de Wiles. Este é provavelmente o único caso que eu

 

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nova é necessário um longo período de atenção ao problema semqualquer distração. É preciso realmente pensar só no problema cem nada mais - só se concentrar nele. Depois você pára. Entãoparece ocorrer uma eSl1éeie de relaxamento durante o qual osubconsciente aparentemente assume o controle. E é aí que sur-gem as idéias novas.

A partir do momento em que embarcou na busca pcla demons-tração, Wiles tomou a decisão extraordinária de trabalhar em com-pleto isolamento e segredo. Os matemáticos modernos desenvol-vcnlln uma cultura uc cooperação e colaboração c assim a uccisãode Wiles parecia remontar a uma época anterior. Era como se eleestivesse imitando a abordagem do próprio Fermat, um dos maisfamosos eremitas matemáticos. Wiles explica que parte do motivode querer trabalhar em segredo estava em seu desejo de não serdistraído. Eu percebi que qualquer coisa relacionada com o Últi-mo Teorema de Fermat gera muito interesse. E eu não poderia meconcentrar durante anos com um monte de espectadores me ob-servando.

Outro motivo para o isolamento de Wiles deve ter sido o seudesejo de glória. Ele temia se ver em uma situação onde tivessecompletado o grosso dos cálculos, mas a demonstração ainda nãoestivesse completa. Nesse ponto, se os detalhes do seu trabalhovazassem, nada impediria um matemático rival de completar a de-

monstração e roubar-lhe o prêmio.Nos anos seguintes, Wiles faria uma série de descobertas ex-traordinárias, mas não publicou nem discutiu nenhuma delas atéque sua demonstração estivesse completa. Até mesmo os colegasmais chegados não conheciam sua pesquisa. John Coates se lem-bra de conversas com Wiles durante as quais ele não deu nenhumaindicação do que estava acontecendo. Até me lembro de ter faladocom ele, em a~gl1masocasiõeg, quc achava muito boa egta ligação

conheço dc alguém que trabalhou por tanto tempo scm divulgar o

que estava fazendo, sem comentar os progressos que estava con-seguindo. É completamente sem precedentes em minha experiência.Em nossa comunidade, aspessoas sempre compartilham suas idéias.Os matemáticos sc reúncm nas conferências, visitam uns aos ou-tros, dão seminários, se comunicam por e mails Freqüentementeconversam pelo tclefone, pcdcm esclarecimentos c comentários -os matemáticos estão sempre se comunicando. Quando você con-versa com outras pessoas, você recebe aquele tapinha nas costas,elas lhe uizem que o que vocêfezé importante, lhe dão idéias. Nósnos nutrimos destas coisas e sevocê se desliga de tudo isso, entãocstá fazendo algoque provavelmentcé muito estranho do ponto de

vista da psicologia.De modo a não levantar suspeitas, Wiles bolou uma estratégiapara tirar os colegas do seu rastro. No início dos anos oitenta eleestivera trabalhando em uma grande pesquisa sobre um tipo espe-cialde equações elípticas. Estavaa ponto de publicar todo este tra-balho quando as descobertas de Ribet e Freyo fizeram mudar deidéia.Wiles decidiu ir publicando este trabalho aos poucos, libe-rando pequenos artigos a cada seis meses. Esta aparente produti-vidade convenceria seus colegas de que ele ainda continuava comsuas pesquisas usuais.E, enquanto pudesse manter esta farsa,Wilespoderia trabalhar em sua verdadeira obsessão, sem revelar qual-

quer uma de suas descobertas.A única pessoa que conhecia o segredo deWiles era sua espo-

sa, Nada. Eles se casaram logodepois que Wilescomeçou a traba-lhar na prova e à medida que os cálculosprogrediam ele contavasomente para ela.Nos anos seguintes sua famíliaseria sua únicadistração. Minha mulher me conheceujá na época em que eu es-tavatrabalhando com Fermat. Eu contei para ela em nossa lua-de-mel, algl1m;dia~depois de nos cagarmog.Elajá ouvira falar no Úl-

218,

o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT

timo Teorema de Fermat, mas na ocasião não tinha idéia do signi-ficado romântico que ele tinha para os matemáticos, que fora umespinho em nosso pé por tantos anos.

uelando com o nfinito

os CÁLCULOSSECRETOS 219

Depois de um ano de contemplação,Wiles decidiu adotar umaestratégia conhecida como in ução como base para sua demons-tração. A provapor indução é uma forma poderosa de demonstra-ção porque permite ao matemático provar que uma declaração éválidapara um nllmcro infinitode casos demonstrando apenas umúnico caso. Por exemplo, imagine que um matemático quer provar

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Parademonstrar oÚltimoTeoremadeFermat,Wilestinha queprovara conjectura deTaniyama-Shimura.Cadaequaçãoelípticateria queser relacionada com uma forma modular.Antes mesmo da ligaçãocom o Último Teorema, os matemáticos tinham tentado desespe-radamente demonstrar a conjectura, mas cada tentativa terminaraem fracasso.Wilesconheciabemos fracassosdopassado. Emúltimaanálise o que as pessoas tinham tentado fazer, ingenuamente, eracontar as equações elípticas e as formas modulares e mostrar quehaviao mesmo número de cadauma delas. Sóque ninguém nuncaencontrara ummodo simples de fazer isso. O primeiro problema éque existeum número infinito de cada uma evocênãopode contarum nÚmeroinfinito. Simplesmente nãoexiste meio de fazer isso.

De modo a encontrar uma solução,Wiles adotou sua aborda-gem costumeira para resolverproblemas difíceis. Àsvezes eu ficorabiscando o papel. Não são rabiscos importantes, apenas rabis-cossubconscientes. E nunca usoocomputador. Neste caso, comoem muitos outros problemas da teoria dos números, os computa-doresseriam inúteis, de qualquer modo.Aconjectura deTaniyama-Shimura se aplica a um número infinito de equações elípticas eembora um computador possa verificar os casos individuais emalgunssegundos, elejamais poderia verfificartodososcasos. Oque

era necessário era um argumento lógico,passo a passo, que efeti-vamente apresentasse uma razão e explicasse por que cada equa-çãoelíptica teria que ser modular. Para encontrar a demonstração,Wilessó usava lápis, papel e sua mente. Eu fiz tudo isso em mi-nhacabeça, praticamente todo o tempo.Acordavacomo problemademanhã e passavao dia todo pensando nele e depois ia dormircomo problema na cabeça. Sem distrações, a coisa ficavao tempotodorodando em minha mente.

que uma declaração é verdadeira para todos os números naturais

até o infinito. O primeiro passo é mostrar que a declaração é ver-dadeira para o número 1,o que presumivelmente é uma tarefa sim-ples. Depois é preciso demonstrar que, se a declaraçãoé verdadei-ra para o número 1,então ela deveserverdadeira para o número 2.E se forverdadeira para o número 2, será para o número 3. Se forpara o 3,também será para o número 4 e assim por diante. De ummodo geral o matemático tem que demonstrar que se a declaraçãoé verdadeira para qualquer número n então ela deve ser verdadei-ra para o número seguinte, n + 1.

A prova por indução é essencialmente um processo em duasetapas:

II

I:

I: ..fi

(1) Prove que a declaração é verdadeira para o primeiro caso.(2) Prove que se a declaração é verdadeira para qualquer um dos

casos, então dcvcser verdadeira para o próximo caso.

Outro modo de pensar na provapor indução é imaginaro númcroinfinito de casoscomo uma fileirade dominós.Paraprovarcadaumdos casos é preciso derrubar todos os dominós. Derrubar um porum levariauma quantidade infinita de tempo e esforço,mas a provapor induçãopermite que osmatemáticosderrubem todosos dominós

derrubando apenas o primeiro. Se os dominós forem arrumadoscuidadosamente, então ao derrubar o primeiro dominó derrubare-mos o segundo que derrubará o terceiro e assim até o infinito.

Esta formadebrincadeiramatemática comos dominós permiteprovar um número infinito de casos, provandoapenas o primeiro.O Apêndice 10mostra como a prova por indução pode ser usadapara demonstrar uma declaração matemática relativamente sim-ples sobre todos os ntÍmeros.

o desafio para Wiles era construir um argumento indutivo,mostrando que cada uma das infinitas equações elípticas podia serrelacionada com uma das infinitas formas modulares. De algum modoele tinha que dividir a demonstração num infinito número de ca-sos individuais e então provar que o primeiro caso era verdadeiro.

220 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT

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Em se~uida cra prcciso mostrar que fei ta a prova para o primeiro

t:aHOodos os olllrOHcairiam, Finalmcnte elc dcscohri.. o Pl inlciropasso para sua prova indutiva oculto no trabalho de um gênio trá-gico da França do século XIX.

Évariste Galois nasceu em Bourg-Ia-Reinc, um vilarcjo ao sulde Pari~, no dia 25 de outubro de 1811, apenas 22 anos depois daRevolução Francesa. Napoleão Bonaparte estava no auge do seupoderio, mas o ano seguinte testemunhou sua desastrosa ca~pa-nha lia {Ússia c enl H 4 ele foi mandado para o exílio e substitu-ído pelo rei Luís XVIII.Em 1815Napolcão escapou de Elba, en- .trou em Paris c retomou o poder. Cem dias depois era derrotadoemWatcrlooe forçado a abdicar novamenteem favorde I,uísXVIII.Galois, como SophicGermain, cresceu durante um período de tre-menda agitação política,mas enquanto Germain se isolavados tu-multos daRevoluçãoFrancesae seconcentravanamatemática,Galoisrepetidamente se colocou no centro da controvérsia política,o quenão apenas o afastou de sua brilhante carreira, como também aca-bou levando-o a uma morte prematura.

Alémda agitaçãogeral, que atingiu a vida dc todos, o interessede Galoisnapolíticafoiinspiradopor seu pai,NicolasGabrielGalois.QuandoÉvaristetinha apenasquatroanosde idade,seu paifoieleitoprefeito deBourg-Ia-Reine.Istoaconteceu durante o retorno triun-fante de Napoleão aopoder, um período em que os fortes valoresliberais de seu pai estavamde acordo como clima nopaís. Nicolas-Gabriel era um homem culto e cortês e durante seu mandato comoprefeito conquistou o respeito da comunidade. Mesmo depois queLuís XVIIIretomou aopoder, ele manteve seu posto. Fora da polí-tica, seu maior interesse parece ter sido a composição de versossatíricos que ele lia nas reuniões da cidade, para a alegria de seuseleitores.Muitos anos depois, este seu talento para a sátira levariaa suaqueda.

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I~varistc Galois

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A ânsia de Galois pela matemática logo superou a capacidade doseu professor, e assim ele passou a estudar diretamente dos livrosescritos pelos gênios de sua época. Rapidamente ele absorveu oseoneeitm: mais 111()~te1 n()scom a idade de dc;r,essctc al10Hpubli-cou seu prim.eiro trabalho nos Anna/es de Gergonne Havia umcaminho claroparaojovemprodígio,todaviaseu brilho seria omaior

Com a idade de doze anos, ÉvaristeGalois foi para a escolanoLiceu de Louis-le-Grand. Era uma instituição de prestígio mastambém muito a~ltoritária.Paracomeçar,ele nãoencontrou nenhumcurso de matemática e seu rcgistro acauêmieo era rcspcit: ivcltIIasnão tevenada de extraordinário.Contudo,houveum acontecimento,durante seu primeiro período na escola, que influenciaria os ru-

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Este aluno só se preocupa com os altos campos da matemáti-ca.A loucura matemática domina este garoto. Eu acho que seria

melhor para ele se seus pais o deixassem estudar apenas is to.

De outro modo ele está perdendo tempo aqui e não faz nadasenão atormentar seus professores e se sobrecarregar de pu-nições.

obstáculo ao seu progresso. Embora soubesse mais matemática do

que seria necessário para passar nas provasdo Liceu, as soluçõesde Galois eram freqüentemente tão sofisticadas e inovadoras queseus professores não conseguiam julgá-Ias corretamente. E paratornar as coisas piores, Galois fazia tantos cálculos de cabeça quenãose incomodavadedelinearclaramenteseusargumentos no papel,deixando os professores ainda mais frustrados e perplexos.

E o jovem gênio não melhorava a situação com seu tempera-mento explosivoe uma precipitação que só conquistava a inimiza-dede seus tutores e detodos osquecruzavamseu caminho.QuandoGaloisprestou examepara aÉcolePolytechnique,omaisprestigiado

colégio de seu país, os seus modos rudes e a falta de explicações naprova oral fi~era1llcom que sua admissão fosse recusada. Galoisdesejavadesesperadamente freqüentar a Polytechnique,não sóporsua excelência como centro acadêmico, mas por sua reputação deser um centro do ativismo republicano. Um ano depois ele tentoude novoe mais uma vez seus saltos lógicos na prova oral só con-fundiram oexaminador MonsieurDinet. Sentindoque estavaapontode ser reprovadopela segunda vez, e frustrado.por sua inteligêncianão estar sendo reconhecida, Galois perdeu a calma e jogou umapagador em Dinet, acertando em cheio. Nunca mais ele voltaria aentrar nas famosas salas da Polytechnique.

Sem se deixarabalarpelas reprovações,Galois continuou con-fiante em seu talento matemático. Ele prosseguiu com suas pes-quisas, seu principal interesse sendo a busca de soluções para cer-tas equações, comoa equação quadrática.Asequações quadráticaspossuem a forma

mos de sua vida. O Liceu fora um colégio dos jesuítas e havia ru-

mores de que estavaa ponto devoltar para o controle dos sacerdo-tes. Durante este período, havia uma luta contínua entre osrepublicanos e os monarquistas que afetava o equilíbrio do poderentre Luís XVIIIe os representantes do povo.A influência cres-cente do clero era um sinal da mudança do poder em direção dorei. A maioria dos estudantes do Liceu simpatizava com os repu-blicanos e eles planejaram uma rebelião. Mas o diretor da escola,Monsieur Berthod, descobriu a trama e imediatamente expulsouuma dúzia de líderes da turma. No dia seguinte, quando Berthodexigiuuma demonstração de fidelidadedosveteranos restantes, elesse reclIsaram fifazer um brinde fiIJuísXVIII.O resultado foi quemais cem alunos foram expulsos. Galois era muito jovem para seenvolverna fracassada rebelião e assim continuou no Liceu. Masver seus colegas serem humilhados deste modo só serviu para au-mentar suas tendências republicanas.

Foi somente com a idade de dezesseis anos que Galois pôdefazer seu primeiro curso de matemática, o que iria, aos olhos deseus professores, transformá-lo de um aluno escrupuloso numestudante rebelde. Seus boletins escolares mostram que ele pas-sou a negligenciar todas as outras matérias se concentrando ape-nas em sua novapaixão:

ax2 + bx + c = 0, onde a b e c podem ter qualquer valor.

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sua época. Com a idade de dezessete anos, ele fizera progressossuficientes para submeter dois trabalhos de pesquisa à Academiade Ciências. A pessoa apontada para julgar ostrabalhos foiAugustin-Louis Cauchy, o mesmo que muitos anos depois disputaria comLamé na criação dc uma dcmonstração para o Último Tcorema deFermat que se mostraria equivocada. Cauchy ficou muito impres-

o desafio é encontrar os valores de x para os quais a equaçãoquadrática é verdadeira. No lugar de usar um processo de tentativae erro, osmatemáticos preferem usar uma receita para encontrar aresposta e felizmente esta receita, ou fórmula, existe:

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20sionado com o trabalho do jovcm e ojulgou capaz de participar na

cOlllpclil,,~ãopelo (;ralldc Prêmio dc Matcmática ua Acadcmia. Dcmodo a se qualificarem para a competição, os dois trabalhos teriamque ser reapresentados na forma de uma única memória e assimCauehy o~mallUOl de volta para Galoi~ e aguaruou que ele se ins-crevesse.

Tendo sobrevivido às críticas de seus professores e à rejei-ção pela I~:col(~'lIlylcch 11qIIC,o g~1Iio dc (;aloijo\cHtava à hci rllde ser reconhecido. Infelizmente, nos três anos seguintes umasérie de tragédias pessoais e profissionais iria destruir suasambiçõcs. Em julho ue l~2~ um novo saeeruole jesuíta chcgouno vilarejo de Bourg-Ia-Reine, onde o pai de Galois ainda era pre-

feito. O padre não gostou das simpatias republicanas do prefei-to e começou uma campanha para depô-Io, espalhando boatosdestinados a desacreditá-Io. Em especial as tramas do padreexploraram a fama de Nicolas-Gabriel Galois de escrever ver-sos satíricos. Ele escreveu uma série de versos vulgares ridicu-larizando membros da comunidade e os assinou com o nome doprefeito. O velho Galois não pôde suportar a vergonha e o em-baraço resultantes e se suicidou.

Évariste Galois voltou para assistir aoenterro do pai e viu pes-soalmente as divisões que o sacerdote tinha criado em sua vila.Quando o caixão estava sendo baixado à sepultura, começou umadiscussão entre o padre jesuíta, que dirigia a cerimônia, e os parti-dários do prefeito, que perceberam ter sido tudo uma trama paradepô-lo. O padre foi agredido e recebeu um corte na testa e logo abriga virou um tumulto com o caixão caindo sem cerimônia dentroda cova.Ver o sistema francês humilhar e destruir seu pai só ser-viu para consolidar o apoio fervoroso de Galois para a causa repu-blicana.

-bi:~ b2 -4acx=

Basta simplesmente substituir os valores de a, b e c na receita aci-ma para calcular osvalores corretos de x. Por exemplo, nós pode-mos aplicar a receita para resolver a seguintc equação:

Zx2 - 6x + 4 = O,ondea = 2, b = -6 e c = 4.

Colocando osvalores de a, b e c na receita,a solução é x = 1 ou = 2.A c<1uação<1uadrática é um tipo de equação que pertence a umaclasse muito maior conbecida como equações polinomiais. Um tipomais complicado de equação polinomial é a equação cúbica:

ax3 + bX2+ cx + d = O.

A complicação extra vem do termo adicional X3.Acrescentando maisum termo x\ chegamos ao nível seguinte de equação polinomial,conhecido como quártica:

ax4 + bX3 + CX2 + dx + e = O.

No séculoXIXos matemáticos já tinham fórmulas que poderiam

ser usadas para encontrar as soluções das equações cúbicas e dasquárticas, mas nãohaviamétodo conhecido para achar as soluçõesda equação de quinto grau:

ax5 + bX4+ cx3 + dx2 + ex + f = O.

Galois ficou obcecado com a idéia de encontrar uma receita parar('~()lw'r ::1~('mi~('i){'~ c1e (minto Q rau . um dOR J randes desafios de

226 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT OS CÁLCULOS SECRETOS 227

Voltando para Paris, Galois juntou seus dois trabalhos numsó eos enviou para o secretário daAcademia, Joseph Fourier, bemantes do prazo limite. Fourier por sua vez devia entregá-Io para ocomitê avaliaddr.O trabalho de Galois não apresentava uma so-lução para os problemas.do quinto grau, mas oferecia uma visãotão brilhante que muitos matemáticos, incluindo Cauchy, o con-

como criador de casos estava se tornando mais forte do que suareputação como matemático. Isto chegou ao auge durante a re-volução de julho de 1830, quando Carlos X fugiu da França e asfacções políticas lutaram pelo controle nas ruas de Paris. O di-retol da l~:eole,  \iJol sie ll Uuigniault, um monarquista, estavaciente de que a maioria dos seus alunos eram radicais republi-

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sideravam como o provávelvencedor. Para espanto de Cauchy e

seus amigos, o trabalho não ganhou o prêmio e nem foi oficial-mente inscrito. Fourier morrera algumas semanas antes da datada decisão dos juízes, e embora um maçode trabalhos tivesse sidoentregue ao comitê, o de Galois não estava dentre eles. O traba-lho nunca foi encontrado, e a injustiça foi registrada por um jor-nalista francês.

No ano passado, antes do 1°de março,Monsieur Galois en-tregou aosecretário do Instituto um trabalho sobre a soluçãode equações numéricas. Este trabalho deveria ter entrado nacompetição pelo Grande Prêmio deMatemática. Elemerecia

o prêmio, pai:;resolviaalgumasdificuldadesque Lagrange nãoconseguiu superar. Monsieur Cauchy fizera os maiores elo-

gios aoautor. E o que aconteceu? O trabalho foi perdido e oprêmio entregue sem a participação dojovemsábio.

Le Globe 83

canos, assim os confinou aos seus dormitórios e trancou os

portões. Galois estava sendo impedido de lutar com seus com-panheiros, e seu ódio e frustração dobraram quando os republi-canos foram derrotados. Quando surgiu a oportunidade, elepublicou um ataque sarcástico contra o diretor do colégio, acu-sando-o de covardia. Sem causar surpresa, Guigniault expulsouo estudante insubordinado e a carreira matemática formal de

Galois chegou ao seu fim.No dia 4 de dezembro, o gênio contrariado tentou se tornar

um rebelde profissional alistando-se naArtilharia daGuarda Na-cional.Tratava-se deum ramo damilícia conhecido também como

 Amigosdo Povo .Antes do fimdomês o novorei, Louis-Phillipe,ansioso em evitarnovasrebeliões, extinguiu aArtilharia da GuardaNacional e Galois se viu desamparado e sem lar. O jovem maistalentoso de Paris estava sendo perseguido sem tréguas e algunsde seus antigos colegas matemáticos começaram a se preocu-par com o seu destino. Sophie Germain, que na ocasião era umatímida e idosa representante da matemática francesa, expres-sou suas preocupações aos seus amigos dafamíliado conde Libri-Carrucci:

..

Galois achou que seu trabalho forapropositalmente perdido de-vido às orientações políticas da Academia. Uma crença que foireforçada no ano seguinte, quando a Academia rejeitou seu

manuscrito seguinte, alegando que seus argumentos não eramsuficientemente claros nem suficientemente desenvolvidos para

que possamos julgar sua exatidão . Galois decidiu que havia umaconspiração para excluí-Io da comunidade matemática. Em con-seqüência disso ele passou a negligenciar suas pesquisas em favorda lutapela causa republicana. Aessa altura ele era alunoda ÉcoleNormale Supérieure, um colégio um pouco menos consagradodo que aÉcole Polytechnique. NaÉcole Normale a famade Galois

Decididamente há uma maldição atingindo tudo o que se

relaciona com a matemática. A morte deMonsieur Fourierfoi Ogolpe final sobre o estudante Galois, que, apesar desua impertinência, mostrava sinais de um grande talento.Ele foi expulso da École Normale, está sem dinheiro, suamãe também está pobre e ele continua com seus insultos.Dizem que ele vai acabar maluco e eu temo que isto sejaverdade.

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Enquanto a paixão de Galois pela polí tica continuava, era inevitá-vel que sua sorte deteriorasse ainda mais, um fato documentadopelo grande escritor francês Alexandre Dumas. Dumas estava norestaurante Vendanges des Bourgogne quando houve um banque-te em homenagem a dezenove republicanos acusados de conspi-ração:

- levaram à sua absolvição. Mas no mês seguinte ele foi preso denovo.

No Dia da Bastilha, 14 de julho de 1831, Galois marchou atra-vés de Paris vestido com o uniforme da proscrita Guarda da Arti-lharia. Embora fosse meramente um gesto de desafio, Galois foisentenciado a seis mCRCHdc priRão c voltou para Saintc-Pélagic.

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NIII I 1111 11( 11 : \( gll il ll t lI 11 jIlV( 1I 1 nhll l{ \l lI il l I II IHII II II 11 111 1 )( 1 , i ll fhwl I-

ciado pelos malandros que o cercavam.Uma semana depois um franco-atirador, num sótão, do lado

oposto i\priHão, diHparou UIl1tiro contra a cela, fcrindo um homemque estava ao lado de Galois. Galois ficou convencido de que a balaera para ele e concluiu que existia um complô do governo paraassassiná-Io. O medo da perseguição polítiea o aterrori;t,ava. O iso-lamento dos amigos e da família e a rejeição de suas idéias mate-máticm\ o mergulharam 1111111stado dc deprcssão. Bêhado e delirante,ele tcntou sc matar eom uma faca, mas scus colegas republicanosconseguiram dominá-Io c desarmá-lo.

Em março de 1822, um mês antes do final dasentença, irrompeuuma epidemia de cólera em Paris e os prisioneiros de Sainte-Pélagieforam libertados. O que aconteceu com Galois nas semanas seguintestem motivado muita especulação, mas o que se sabe com certeza éque a tragédia foi o resultado de um romance com uma mulhermisteriosa, chamada Stéphanie-Félicie Poterine du Motel, filha deum respeitado médico parisiense. Embora ninguém saiba como ocaso começou, os detalhes de seu trágico fim estão bem documen-tados.

Stéphanie já estava comprometida com um cidadão chamadoPescheux d Herbinville, que descobriu a infidelidade de sua noi-

va. D Herbinville ficou furioso e sendo um dos melhores atirado-res da França não hesitou em desafiar Galois para um duelo aoraiar do dia. Galois conhecia muito bem a perícia de seu desafiantecom a pistola. Na noite anterior ao confronto, que ele acreditavaser a última oportunidade que teria para registrar suas idéias nopapel, ele escreveu cartas para os amigos explicando as circuns-tâncias.

Subitamente, no meio de uma conversa particular que eu es-tava tendo com a pessoa à minha esquerda, ouvio nome Louis-

Phillipc Rcglliclode cinco 011RciRaRRovioR.Virci-mc para olhare presenciei uma cena muito agitada acontecendo a umas quinzeou vinte cadeiras do lugar onde eu estava. Seria difícil encon-

trar cm toda Paris du:t.clltas pcssoaR maiH hOHtiHao govcl llodo que aquelas reunidas ali, às cinco horas de uma tarde, nograndc Halãodo andar térreo, acima do jardim.

Um jovem que erguera seu cálice cm saudação seguravaum punhal e estava tentando se fazer ouvir - era Évariste

Galois, um dos mais ardentes republicanos. Mas a balbúrdiaera tão grande que o motivo de tanto tumulto se tornara in-

compreensível. Tudo que consegui entender foi uma ameaça

e o nome de Louis-Phillipe sendo mencionado: o punhal namão do rapaz tornava tudo claro.

Isso estava muito além das minhas opiniões republicanas.

Cedi às pressões do meu amigo do assento esquerdo. Ele eraum dos comediantes dorei e não queria se comprometer. Assim

nós pulamos a janela e saímos para o jardim. Fui para casa

preocupado. Estava claro que o episódio teria sérias conse-qüências. De fato, dois ou tres dias depois Évariste Galois foi

preso.

Depois de ficardetido na prisãode Sainte-Pélagie durante um mês,Galois foi acusado de ameaçar a vida do rei e levadoa julgamento.Emborahouvessepouca dúvidade que Galoisfosse culpado,a  

natureza agitada do banquete significava que ninguém poderiarealmente confi:martê-Ioouvidofazer qualquer ameaçadireta. Umjúri simpáticoca idade do rapaz - ainda com apenas vinte anos

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W Ç) .. .. 'J: ti. . ..,.~ 4,..,~ =(fz)Wx..a)(r~

OS CÁLCULOS SECRETOS 231

Eu peço aos patriotas, meus amigos, que não me censurempor morrer por outro motivoque não pelomeu país. Eu morrivítima de uma infame namoradeira e dos dois idiotas que elaenvolveu.Minha vida termina em conseqÜênciade uma mi-serávc\ calúnia.AhlPor que tenho que morrer por uma coisatão insignificante e desprezível? Eu peço aos céus que teste-

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Figura 19.Na noite anterior ao duelo, Galoistentou colocar no pa-pel todas as suas idéias matemáticas. Outros comentários, contu-do,também aparecem nas notas.Nesta página, abaixoe à esquerdado centro, estão as palavras une femme , com a segunda palavrarabiscada, presumivelmente uma referência à mulher que motivouo duelo.

provocaçãoque tentei evitarpor todos os meios.

Apesar de sua devoçãoà causa republicana e seu envolvimento ro-mântico, Galoismantiverasua paixãopelamatemática. Um de seusmaiores temores era de que sua pesquisa, que já forarejeitada pelaAcademia, se perdesse para sempre. Em uma tentativa desespera-da de conseguir um reconhecimento, ele trabalhou a noite toda,escrevendo o teorema que acreditavaexplicaria o enigma da equa-ção de quinto grau. A Figura 19mostra uma das últimas páginasescritas por Galois.As páginas eram, na maior parte, uma trans-criçãodas idéiasque elejá enviara a Cauchye Fourier, mas ocultas

em meio à complexa álgebra havia referências ocasionais a Stéphanie , ou une femme , e exclamações de desespero -  Eunão tenho tempo, eu não tenho tempo No final da noite, quandoseus cálculosestavamcompletos, eleescreveuuma carta explicativaaoseu amigoAugusteChevalier,pedindoque, casomorresse, aquelaspáginas fossem enviadas aos grandes matemáticos da Europa:

Meu Querido AmigoEu fiz algumas novas descobertas em análise.A primeira serefere à teoria das equações do quinto grau e as outras, às

funções integrais.Na teoria das equaçõe.seu pesquisei as condições para a

solução de equações por radicais. Isto me deua oportunidadede aprofundar csta teoriac descrcvertodasas transformaçõespossíveisem uma equação, mesmo que elanão seja resolvidapelos radicais.Está tudo aqui nesses três artigos...

Em minha vidaeu freqüentemente me atrevia apresentaridéiaRHobreaRquaignão tinha certeza. MIIStudo quc cgerevi

232 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT 233S CÁLCULOS SECRETOS

aqui estava claro em minha mente durante um ano e não se-

ria demeu interesse deixar suspeitas de que anunciei teoremasdos quais não tenho a demonstração completa.

Faça um pedido público a Jacobi ou Gauss para que dêemsuas opinie)es, não pela verdade, mas devido à importância<.lessestcorcmas. Afinal, eu espcro que alguns homcns achem

Os historiadores ainda discutem se o duelo foi o resultado de

um trágico caso de amor, ou se teve motivos políticos, mas, de qual-quer modo, um dos maiores matemáticos do mundo morrera coma idade de vinte anos, tendo estudado matemática por apenas cin-co anos.

Antes de distribuir os trabalhos de Galois, seu irmão c Auguste

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valioso analisar esta confusão.

Um abraço caloroso Chevalier os reescreveram de modo a esclarecer e expandir as ex-plicações. Galois tinha o hábito de expor suas idéias apressadamentee de modo inadequado. O que sem dúvida foraexacerbado pelo fatode que ele sótinha uma noite para resumir anos de pesquisas. Emboraas cópias fossem enviadas a Carl Gauss, Carl Jacobi e outros, comofora pedido, passou-se uma década sem que o trabalho de Galoisfosse reconhecido. Então uma cópia chegou às mãos de JosephI ,iollville ( 111IX~(I.I,iollvillc n:cClnllccclI a ccnldlla do gênio lIa-queles cálculos e passou meses tentando interpretar seu significa-do. Finalmente ele editou os artigos e os publicou no prestigiosoJournal de Malhé11latiques pures et appliquées A resposta dos ou-

tros matemáticos foi imediata e impressionante. Galois tinha defato formulado uma completa explicação de eomo se poderia obtersoluções para equações do quinto grau. Primeiro Galois classifica-ra todas as equações em dois tipos: as que podiam ser soluciona-das e as que não podiam. Então, para aquelas que eram solucionáveis,ele deduziu uma fórmula para encontrar as soluções das equações.Além disso, Galois examinou as equações de grau mais alto do quecinco, aquelas que continham x6 X7e assim por diante, podendoidentificar as que tinham soluções. Era uma das obras-primas damatemática do séculoXIX,criada por um de seus mais trágicos heróis.

Em sua introdução ao trabalho, Liouvil le refletiu sobre os mo-

tivos que teriam levado ojovem matemático a ser rejeitado por seusmestres e como seus próprios esforços tinham ressuscitado o tra-balho de Galois:

E. Galois

Na manhã seguinte, quarta-feira, 30 de maio de 1832, num campoisolado, Galois e d I-lerbinville se enfrentaram a uma distância devinte e cinco passos, afInados com pistolas. D I-lerbinvil le vieraacompanhado <.Icdoin aSHistclltcH.Calois cstava su~illt.lJ. Elc lIãocontara a ninguém sobre seu drama. Um mensageiro que enviaraao seu irmão, Alfred, só entregaria a notícia depois do duelo termi-nado. E as cartas que escrevera na noite anterior só chegariam aos

seus amigos vários dias depois.As pistolas foram erguidas e disparadas. D I-lerbinville conti-

nuou de pé. Galois foi atingido no estômago. Ficou agonizando nochão. Não havia nenhum cirurgião por perto e o vencedor foi em-bora calmamente, deixando seu oponente ferido para morrer. Al-gumas horas depois Alfred chegou ao local e levou seu irmão parao hospital Cochin. Era muito tarde, já ocorrera uma peritonite e nodia seguinte Galois faleceu.

Seu funeral foi quase uma réplica do que acontecera com seupai. Apolícia acreditava que a cerimônia seria o foco de uma mani-festação polí tica e prendeu trinta amigos de Galois na noite ante-rior. Ainda assim dois mil republicanos se reuniram para o enterroe houve brigas inevitáveis entre os colegas de Galois e os represen-tantes do governo que chegaram para vigiar os acontecimentos.

Oscolegas de Galois estavam furiosos devido à crença cada vezmais forte de que d I-lerbinville não era um noivo traído e sim umagente do governo. E Stéphanie não fora apenas uma mulher volíl-vel, mas uma sedutora usada para levar o falecido a uma armadilha.

Como Descartes dizia, Quando questões transcendentais são

discutidas, seja transcendentalmente claro. Galois negligen-eiavlI fn qiit lIlt lIwlllt e:111IIIOI IIIHc IIHHim pOdCIIIOH cnlc IIdcl

como ilustres matemáticos podem ter julgado adequado, no

234 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT OS CÁLCULOS SECRETOS 235

rigor de sua sabedoria, colocar um principiante, cheio de

genialidade, mas inexperiente, de volta no caminho certo. Oautor que eles censuraram estava lá,diante deles, ardente, ativo,

podia ter se beneficiado de seus conselhos.Mas agora tudo mudou, Galois não está mais aqui Não vamos

perder tempo com críticas inúteis, vamos deixar de lado osdefeitos e olhar para os'méritos...

OSnúmeros inteiros não formam um grupo sob a operação da di-visão , porque quando dividimos um número inteiro por outro nãoteremos necessariamente outro número inteiro. Por exemplo:

. 14 + por 12 =- .3

1Afração '3 nãoé umnúmerointeiroe está forado grupooriginal.

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Meus cuidados foram bem recompensados e experimen-tei um intenso prazer nomomento em que, depois deter preen-chido umas pequenas brechas, via exatidão completa do mé-todo que Galois demonstrou, este lindo teorema.

 

Contudo, se considerarmos um grupo maior que inclua as frações,os chamadosnúmeros racionais,podemosrestabelecero fechamento: Os números racionais estão fechados sob a operação de divisão.Tendo dito isto precisamos ser cautelosos porque a divisão de umelemento por zero resultará no infinito, o que levaavários pesade-los matemáticos. Por esta razão é mais preciso afirmar que osnúmeros racionais (excluindo zero) estão fechados sob a operaçãoda divisão .De muitos modos o fechamento é semelhante ao con-ceito de totalidade descrito em capítulos anteriores.

Os números inteiros e as frações formam grupos infinitamen-

te grandes e pode-se presumir que, quanto maior o grupo, maisinteressante será amatemática queele iráproduzir.Contudo, Galoistinha uma filosofiado menos é mais e demonstrou que grupospequenos, cuidadosamente construídos, podiamexibiruma riquezaespecial. No lugar de usar grupos infinitos. Galois começou comuma equação especial e construiu seu grupo a partir do punhadode soluções daquela equação. Foram os grupos formados pelassoluções da equação de quinto grau que permitiram a Galois deri-var suas conclusões sobre estas equações. Um século e meio de- 'pois, Wiles usaria o trabalho de Galois como o alicerce para suademonstração da conjectura de Taniyama-Shimura.

O que torna a conjectura de Taniyama-Shimura tão difícil dedemonstrar é que não se trata meramente de um problema infi-nito, e sim um número infinito de problemas infinitos. Em pri-meiro lugar,para demonstrar que umadeterminada equação elípticatem uma forma modular equivalente, temos que demonstrar quecada um dos elementos da série E EpEz,E3 ...) tem que ser iguala eada elemento da série M MI Mz M3 ...). Um matemático 1'0-

 errubando o rimeiro ominó

No coraçãodoscálculosde'Galoishaviaumconceitoconhecidocomoteoria dosgrupos,uma idéia que ele transformara em uma podero-sa ferramenta, capaz de resolverproblemas anteriormente insolú-

veis. Matematicamente falando, um grupo é um conjunto de ele-mentos que podem ser combinados usando-se algumas operações,tais comoa adiçãoou a multiplicação, e que satisfazem certas con-dições.Umapropriedade definidora importante de um grupo é que,quando dois de seus cIementos são combinados, usando a opera-ção, o resultado é outro elemento do grupo. Diz-se que o grupo é

fechado sob aquela operação.Por exemplo,osnúmeros inteiros formamum grupo sob aope-

ração de adição .Combinando um número inteiro com outro, soba operaçãode adição, pro~uzimos um terceiro número inteiro. Por

exemplo:4 + 12 = 16.

Todos osresultados da operação de adiçãoestão dentro do campodos números inteiros e assim os matemáticos declaram que osnúmeros inteiros estão fechados sob a adição ou então que osn(lmcrosinteiros formam um grupo sob a adição . Por outro lado,

I

\

236 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT OScÁLCULOSSEClillTOS 237

deria tentar lidar com este problema infinito empregando uma

prova por indução, isto é,cada par da infinita série E e M seriaimaginado como um domin ó em uma infinita fileira de dominós.O trabalho seria derrubar o primeiro dominó (provar que E I =M1),e então mostrar que, s.eum dominó cair , ta.mbém vai derru-hílr C)RC~lIintc. .

estava obcecado. Eu gostava de testar meus talentos contra ele. Alémdisso, eu sempre sabia que a matemática que estava criando, mes-mo que não fosse suficientemente forte para provar Taniyama-Shimura, e portanto Fermat, iria provar alguma coisa. Eu não mer-gulhara num caminho secundário; csta era ccrtamcntc boaIlIal<~lII:ítl a c isto era verdadeiro o tempo .todo. Certamcnte era

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Si ) cHta tarefa jÚ Hcria bCIII difícil, mas para dClllolIstrar aconjectura de Taniyama-S~imura ela teria que ser repetida umnÚmero infinito de VC;f,CS,orquc cxistc um númcro infinito dcequaçõcs cIípticas e equações modulares para serem comparadas.Isto é o equivalente a um número infinito de filas de dominós, cadafila infinita cm seu cOlllprimento.

Enfrentando o infinito em cima deinfinito, Wiles percebeu que

podcria atacar o problcma usando o poder da teoria dos grupos.Enquanto os grupos originais de Galois eram construídos a partirdas soluções das equações dc quinto grau, Wites construiu scusgrupos usando um punhado de soluções para eada equação elíptica.

Depois de meses de estudos Wiles usou esses grupos elípticos paratentar igualar cada equação elíptica com sua forma modular. Alémdisso, como parte deste processo, Wiles podia demonstrar que cadaprimeiro elemento de cada série E de fato correspondia aoprimei-ro elemento da sérieM associada  E1=MJ

Graças aGalois,Wiles fora efetivamente capazde construir uminfinito número de fileiras de dominós, infinitamente compridas,e também derrubara oprimeiro dominóno iníciode cada fila.Agorao desafio era demonstrar que se o primeiro dominó caísse, em to-das asfilas,todos os demais cairiam. Em outras palavras, para to-dos ospares de equações elípticasWilestinha que demonstrar que,

se um elemento da série E igualasse o elemento correspondenteda série M, então os elementos seguintes seriam iguais.Foramnecessários dois anos para chegar até este ponto e não

havia nenhum indício de quanto tempo seria necessário para es-tender a demonstração. Wiles apreciava a tarefa a ser enfrentada.Vocêpodeme perguntar como eu podia devotar uma quantidadeilimitadade tcmpoOaUIIIproblcma quc podcria ser insolúvel.A rcs-posta é que eu simplesmente adoravatrabalhar neste problema e

possível quc cu lIunca chegassc cm Fermat, mas não havia possi-bilidade dc que estivesse desperdiçando meu tempo.

Resolvido o Último Teorema de Fermat

Embora fosseapenasoprimeiropassopara demonstrar aconjecturade rnmiyama-Shimura,acstratégiade Wiles,usandoGalois,era umaconquista brilhante, digna dc scr publicada. Mas como resultadodc scu cxílioauto-imposto, ele não podcria anullciar scus rcsulta-dos aoresto do mundo. E além disso nãotinha idéia de quem po-deria estar fazendo descobertas semelhantes.

Wiles lembra sua atitude com relação a qualquer rival em po-tencial. Bem, obviamente ninguém quer passar anos tentandoresolver alguma coisa e então descobrir que outro a solucionousemanas antes de você.Mas, curiosamente, eu estavaenfrentandoum problemaque eraconsideradoimpossívelenão tinha muito medoda competição. Simplesmente não achavaque eu ou alguém maistivesse uma idéia certa de como fazê-Io.

No dia 8 demarço de 1988,Wiles ficou chocado aoler as man-chetes na primeira página dos jornais anunciando que o ÚltimoTeorema de Fermat fora resolvido.O  WashingtonPost e oNew Thrk

Times afirmavam que Yoichi Miyaoka, de trinta e oito anos, daUniversidade Metropolitana de Tóquio, tinha descoberto uma so-lução para o problema mais difícil do mundo. Na ocasiãoMiyaokaainda não publicara sua demonstração e só descrevera seu esboçonum seminário no Instituto Max Planck de Matemática em Bonn.O matemático britânico Don Zag-ier,que estivera na platéia, rcs\)-miuootiluismoua comunidade. AdemonstraçãodeMiyaokaé muitointeressante e alp;umaspessoas acham que existe uma boa chance

238 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT

de que funcione. Isto ainda não é definitivo, mas até agora pareceótimo.

Em Bonn, Miyaokatinha descrito como ele abordara o proble-ma de um ângulo completamente novo,ou scja, a geometria difc-rencial. Durante décadas a geometria diferencial desenvolveraumarica compreensão das formas matemáticas e em particular das pro-priedades de suas superfícies.Então,na décadade 1970,umaequipe

I

II

OS cÁLCULOS SECRETOS 239

çados de Princeton, fez uma grande contribuição ao entendimen-to do Último Teorema de Fermat. Lembre-se de que Fermat afir-mou qucnãoexistiamsoluçõescomnúmeros inteirospara a equação:

x + y = zn para n maior do que 2.

Faltings acreditava que poderia fazer algum progresso na de-

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russa liderada peloprofessor S.Arakelovtentara estabelecer para-lelos entre os problemas da geometria diferencial e os problemasda teoriados números.Este eraoutroaspectodoprogramaLanglandse a esperança eradequeproblemasaindanão-solucionadosda teoriados números poderiam ser resolvidos, examinando-se questõescorrespondentes, que já tinham sido respondidas na geometriadiferencial. O que era conhecido como a ft losofiadoparalelismo.

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Figura 20. Estas superfícies foram criadas usando o programaMathematica, para computadores. Elas são representações geomé-

tricas da equação X + y = 1,onden = 3paraa primeiraimageme11= 5 para a segunda. Aqui, x e y são considerados variáveis com-

plexas.

Osgeômetras diferenciais que tentavam abordar problemas dateoria dos números ficaram conhecidos como geômetras aritmé-ticos algébricos , e em 1983eles conseguiram sua primeira vitória  .ignifieativauando Gcrd F:11t-ing .,o TnRtitutodc ERtunoRI\van-

I

monstração do Último Teorema estudando as formas geométricasassociadas com diferentes valores de n. As formas corresponden-tes a cada uma das equações eram todas diferentes, mas todas ti-nham algoem comum - eram perfuradas por buracos. As formassão quadridimensionais, mais ou menos como as formas modula-res, e avisualizaçãobidimensional de duas delas é mostrada na Fi-gura 20. Todas as formas são como rosquinhas, com vários bura-cos em vez de apenas um. Quanto maior o valorde n na equação,mais buracos existem na forma correspondente.

Faltings conseguiu demonstrar que, como essas formas sem-pre apresentam mais de um buraco, a equação de Fermat associa-da com elas só poderia ter um número finito de soluções numéri-cas.Um número finito de soluçõespoderia ser qualquer coisa entre~ero, que era a afirmação de Fennat, a um milhão ou um bilhão.

.Deste modoFaltings não demonstrara o Último Teorema, mas fora  p zdeeliminarapossibilidadedeumnÚmeronfinitodesoluções.

Cinco anos depoisMiyaokaafirmavaque poderia avançar maisum passo.Aindacomvinte e poucos anos ele criara uma conjecturarelacionada com a denominada desigualdade de Miyaoka.Torno.u-se claro que a demonstração de sua própria conjectura geométricademonstraria também que o número de soluções para a equação

de Fermat não era apenas finito, mas igual a zero.A abordagem deMiyaokaera iguala deWiles no sentido de que ambos tentavam de-monstrar o Último Teorema de Fermat ligando-o a uma conjectu-ra fundamental de um ramo diferente da matemática. No caso de

Miyaokaera a geometria diferencial enquanto, para Wiles, a provaseria via equações elípticas e formas modulares. Infelizmente paraWiles, ele ainda estava lutando para demonstrar a conjectura deri'...:..., L'1.~ t 1\11':..,.,.1... ' ... ,,; ,., ' t1 ,,.,, C'.f, (..:;,.,

 

240 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT

completa, ligando sua própria conjectura ao Último Teorema deFcrmat.

Duas semanas depois do anúncio em Bonn, Miyaoka divul-gou as cinco páginas de álgebra que detalhavam sua demonstra-ção e o cxamc escrupuloso começou. TcÓricos dORnÚmeros cgdJJI}ctrag diferenciaiH do IIIUIl<.10nteiro ex:ullinaralll a denlollH-

1

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rios CÁLCULOS SECRETOS 241

nova pichação apareceu na estação do metrô da 8thStreet, em NovaYork:

x + y = z não tem solução

EIIdCHcohrilima dCllloIIHtr:H,;ãocahllcntc cxtraordinária para

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tração, linha por linha, buscando a menor brecha na lógica ou omais leve indício de uma pressuposição falsa. Em poucos dias váriosmatemáticos dcstacaram o que parecia uma preocllpantc contra-dição dentro da prova. Parte do trabalho de Miyaoka levava a umaconclusão particular, na teoria dos números, que, traduzida paraa geometria diferencial, entrava em conflito com o que já foraprovado nos anos anteriores. Embora isto não invalidasse, neces-sariamente, toda a demonstração, entrava em choque eom a filo-sofia do paralclismo entre a teoria dORnÚmeroR e a gcometriadiferencial.

Mais duas semanas se passaram e então Gerd Faltings, cujo tra-

balho abrira caminho para Miyaoka, anunciou ter localizado a ra-zão exata para a aparente quebra no paralelismo - um erro na ló-gica de Miyaoka. O matemático japonês era principalmente umgeômetra e não fora absolutamente rigoroso ao traduzir suas idéiaspara o território menos familiar da teoria dos números. Um exér-cito de teóricos dos números tentou ajudar Miyaoka a consertar oerro, mas seus esforços terminaram em fracasso. Dois meses de-pois do anúncio inieial o consenso geral era de que a demonstra-ção original fracassara.

Como no caso de várias outras demonstrações frustradas dopassado, Miyaoka criara uma matemática nova e interessante. Frag-

mentos de sua demonstração eram válidos e permaneciam comoengenhosas aplicações da geometria diferencial na teoria dos nú-meros. Nos anos posteriores eles seriam usados por outros mate-máticos para demonstrar outros teoremas, mas nunca o ÚltimoTeorema de Fermat.

A agitação em torno de Fermat logo morreu e os jornais publi-caram notas curtas explicando que o enigma de 300 anos continuava~n{. l,-;,.(,l Q ,- r1 .:.l ~nC'T 'I1T '.,r1..,~ 1' 1nr1. . , . ..;t., ,,:;(, \ r1 m:r1;., 1U.., .,

~

isto,

mas não tenho tempo de escrevê-Ia porque meu trem está

chegando,

A Mansão Escura

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Dcsconhccido pelo resto do mundo, Wiles respirou aliviado.O ÚltimoTcorema de Fennat continuava incÓlume e ele podia prosseguir emsua batalha para demonstrá-Ia, via conjectura de 'làniyama-Shimura. A maior parte do tempo eu ficava sentado escrevendo em minha

mesa, mas algumas vezes eu conseguia reduzir o problema a algu-ma coisamuitoespecífica- um indício, alguma coisa que me pareciaestranha, algoabaixodo que estava no papel que eu não podia to-car. Se haviaalgumacoisa em especial zumbindo em minha menteeu não precisava escrever nada, nem precisava de mesa para traba-lhar. Assim eu saíapara caminhar até o lago. Quando estou cami-nhando eu posso concentrar minha mente em uma aspecto bemparticular do problema, focalizando nele completamente. Semprecarrego um papel e um lápis,assim, setenho uma idéia,posso sentarnum banco e começar a escrever.

Depois de três anos de esforços contínuos, Wiles fizera uma

série de avanços.Ele aplicara os grupos de Galois nas equaçõeselípticase asdividiranum número infinitode peças.Então demons-trara que cada primeira peça, de cada equação elíptica, tinha queser modular. Derrubara o primeiro dominó e agora estava explo-rando técnicas que pudessem levarà queda de todos os outros. Àprimeira vista, isto parecia o caminho natural para a demonstra-ção, mas para chegar até este ponto fora necessário uma imensar lr '1f 'min~H'i ln n~r~ ~lm( 'r~r n~ n(' rínr lo~ ele' in~ef l1nmC:l. Wi leR   es

242 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT OS CÁLCULOS SECRETOS 243

creve esta experiência matemática como uma jornada através deuma mansão escura e inexrlorada. Entramos na primeira saladamansão e está escuro. Completamente escuro. Caminhamos comcuidado, esbarrando na.mobília,mas gradualmente aprendemos aposiçãode   d móvel. Finalmente, depois de seis meses de ex-ploração, você encontra o interruptor da luz, acende as lâmpadas etudo é iluminado. Vocêpode ver exatamente onde está. Então você

do grande, ele se voltava para sua família. Desde o começo de seutrabalho com o Último Teorema de Fermat, em 1986, ele se torna-ra pai <.lua::;c:t.c::;.u único IIIO<.lOue cu tinha para relaxar era quandoestava com meus filhos. As crianças não estão interessadas emFermat, elas só querem ouvir uma história e não deixamvocêfazernada mais.

Noverãode 1991Wilessentiu queperdera abatalhapara adaptar

 11 1

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..

avança para o aposento seguinte e passa outros seis meses no es-curo. Assim, cada um desses períodos de iluminação, embora àsvezes sejam momentâneos, àsvezes durem um período de um diaou dois, representam o.clímax dosesforços e não poderiam existirsem osmuitos meses de tropeços naescuridão que os antecedem.

Em 1990Wiles entrou no que parecia a salamais escura de to-das. Ele a estivera explorando por quase dois anos. E ainda nãoencontrara um meio de provar que se um elemento da equaçãoelípticaeramodular,entãoo elementoseguintetambém seria.Depoisde tentar todas as ferramentas e técnicas já publicadas, ele desco-briu que eram todas inadequadas. Eu realmente acreditava estarno caminho certo, mas isto não queria dizer que alcançaria meuobjetivo.Poderia acontecer dos métodos necessários para resolvereste problema estarem além da matemática atual. Talvezos méto-dosde que eu precisavapara completar a demonstração só fosseminventados daqui a cem anos. Assim, mesmo que estivesse no ca-minho certo, eu poderia estar vivendono século errado.

Wilesinsistiu pormais um ano.Ele começou a trabalhar emumatécnicadenominadateoriaIwasawa.AteoriadeIwasawaeraummétodopara analisar equações elípticas que ele aprendera como estudanteemCambridge, sob a tutela deJohn Coates. Embora o método fosse

a princípioinadequado,Wiles esperavapoder modificá-Iopara queficassesuficientemente poderoso para gerar o efeito dominó.

a teoria de Iwasawa.Ele tinha que provarque cada dominó, ao serderrubado, derrubaria o próximo - se um elemento na série E deuma equação elíptica fosse igual a um elemento da série M de umaforma modular, o mesmo aço lteceria com os elementos seguin-tes. E precisavatambém se certificar de que isto seria verdade paratodas as equações elípticas e todas as formas modulares. A teoriade Iwasawanão pudera lhe dar a garantia necessária. Wiles com-pletou mais uma pesquisa exaustiva na literatura e eontinuou in-capaz de encontrar uma técnica alternativa que pudesse lhe dar aabertura tãonecessária.Tendovividocomoum reclusoem Princeton,pelos últimos cinco anos, ele decidiu que era hora de voltar a cir-

cularde modoaouviros últimosboatosdomundomatemático.Talvezalguém, em algum lugar, estivesse trabalhando em uma nova téc-nica,que, por algummotivo,aindanãofora publicada.Wiles foiparaBoston, ao norte, para participar de uma grande conferência sobreequações elípticas, onde certamente se encontraria com os maio-res pesquisadores do assunto.

Wilesrecebeu asboas-vindas de colegas domundo inteiro. Elesficaram contentes emvê-Iovoltarao circuito de conferência depoisde uma ausência tão longa.Ninguém sabia noque ele estivera tra-balhando, e Wiles foi cuidadoso em não deixar escapar nenhuma

pista. Ninguém suspeitou quando ele solicitou as últimas novida-des sobre equações elípticas. Inicialmente as respostas não foramrelevantes para seu problema, mas um encontro com seu antigoprofessor, John Coates, foimais frutífero: Coates mencionou queum estudante chamado Matheus Flach estavaescrevendo um belo.trabalho de análise das equações elípticas. Ele estava aperfeiçoan-do um método recente, criado por Kolyvagin,e parecia que estemétodo cnl nerfeito nara o meu problema. Parecia ser exatamente

o Método de olyvagine lach

Desde seu avançoiniciàlcom osgrupos de Galois,Wiles se torna-r~ r:ln~ V 7 m~i<: fnl 'tt-:u-1n nl1~nr1 ) ~ nr ,,,,;; ,... <' t ,...rn ' '' '' ' rI~.Y o ~;~

OS CÁLCULOS SECRETOS 245

do que eu precisava, embora eu soubesse que teria que desenvol-ver ainda mais este método de Kolyvagin-Flach. Deixei de lado aminha antiga abordagem, e me dediquei, noite e dia, ao desenvol-vimcnto de Kolyvagin-Flach.

Em lcoria estc método podcria cstcndcr o argumcnto dc Wilcs,do primeiro elemento da equação el íptica para todos os elemen-

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tos, e tinha o potencial dc funcionar para cada cquação c1ípt ica. Oprofcssor Kolyvagin tinha dcscnvolvido um método matemáticopoderoso e Matheus Flach o aperfeiçoara para ser ainda mais po-tentc. Nenhum dORdoiRRabiaquc WilcR prctclldia illcorponu' HCUtrabalho na demonstração mais importante do mundo.

Wilesvoltoupara Princeton e passou váriosmeses se familiari-~ando com csta técllica rccém-dcscobcrta. Ocpois iniciou a gigan-tesca tarefa de adaptá-Ia e implemcntá-Ia. Logo ele era capaz defa~era prova indutiva funcionar para uma cquação elíptica - con-seguiaderrubar todosos dominós.InfelizmenteométodoKolyvagin-Flaeh, quc funcionavapara uma equação em particular, nãofuncio-

navanecessariamente paraoutras equações elípticas.Wilespercebeuque as equações elípticas podiam ser classificadas emvárias famí-lias. Uma vez que fosse modificado para funcionar em uma equa-ção elíptica, o método Kolyvagin-Flach funcionaria para todas asoutras elípticasdaquela família.O desafio eraadaptar ométodo parafuncionar para cada família. E embora algumas famílias de equa-ções fossem mais difíceisde conquistar do que outras, Wiles esta-va confiante de que poderia dominá-Ias, uma por uma.

Depois de seis anos de esforço intenso, Wiles acreditava que ofim estavapróximo. Semana após semana ele estava fazendo pro-gresso, provando que famílias novas e maiores de curvas elípticas

deviam ser modulares. Parecia ser apenas uma questão de tempopara que ele vencesse as equações elípticas restijntes. Nesta fasefinal de sua demonstração, Wiles começou a perceber que toda asua prova dependia da exploração de uma técnica que ele desco-brira há apenas alguns meses. Ele começou a questionar se estavausando o método Kolyvagin-Flachde modo completamente rigo-roso.

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Nick Katz

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246 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT os CÁLCULOS SECRETOS 247

fazer o método Kqlyvagin-Flachfuncionar, mas isso envolviafer-ramentas sofisticadascomas quaiseu nãoestavafamiliarizado.Haviaumbocadodeálgebracomplexaque exigiaque eu aprendesse muitamatemática nova.Então, em janeiro de 1993,eu decidi que preci-savado conselho de alguém que fosse especialista no tipo de téc-nicas geométricas que eu estava invocando na demonstração. Eutinha que escolher com cuidado para quem contaria meu segredo,

formal de aulas semanais, de outro modo a coisa ia degenerar. Eassim dccidimos criar um curso com várias aulas.

Eles combinaram que a melhor estratégia seria anunciar umasériede palestras abertasaosestudantes graduadosdo departamento.Wiles daria ocurso eKatz estaria naplatéia. O curso cobriria a parteda demonstração que precisava ser verificada, mas os estudantesgraduados não saberiam disso. O interessante em disfarçar a veri-

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porque ele teria que ser mantido em sigilo.Resolvifalar com NickKatz.

O professor Nick Katz trabalhava no departamento de mate-,mática de Princeton e conhecia Wiles há vários anos. Apesar daproximidade,Katz desconhecia o que estava acontecendo, literal-mente, na salaao lado. Ele lerpbra em detalhe o momento em queWilesrevelou seu segredo: Um dia Andrewme procurou na horadochá e pediu que eu fosse aoseu escritório - haviaalguma coisaque ele queria me contar. Eu não tinha idéia do que poderia ser.Entreino escritório e ele fechou a porta. Então me disse que acha-vaque poderia provar a conjectura de Taniyama-Shimura. Eu es-tavasurpreso, perplexo - era fantástico.

 Eleme explicouque uma grande parte da demonstração de-pendiade sua extensão do trabalho de Flach e Kolyvagin,mas eramuito técnico. Ele realmente se sentia inseguro ncsta partc alta-mente técnica da demonstração e queria verificá-Ia com alguém,porque descjavatcr certeza de que estava correta. Achavaquc euera a pessoa certa para ajudá-Io, mas acho que haviaoutra razãopor que ele me procurou em particular. Ele estavacerto de que eumanteria a boca fechada e não falaria a outras pessoas sobre a de-monstração.

Depois.de seis anos de isolamentoWiles partilhara seu segre-do. Agoraera trabalho de Katz enfrentar a montanha de cálculosfantásticosbaseadosno método Kolyvagin-Flach.Praticamente tudoqueWilesfizeraera revolucionário,eKatz pensou muito sobre qualseria omelhormodo de exap:1iná-Ioigorosamente. O queAndrewtinha que me explicarera tão grande e longo que não daria certotentar mostrar-me em seu escritório, durante conversas informais.Para al~o tão granc ljo~() nÓR pr( cj~;ÍvamoR montm lima ( ~tTllt llra

ficação da prova deste modo é que forçariaWiles a explicar tudopasso a passo e, no entanto, não levantariasuspeitas dentro do de-partamento. Noquediziarespeito aosoutros eraapenas outro cursode graduação.

 E assim Andrew anunciou seu curso chamado Cálculos em

Curvas Elípticas , relembra Katz com um sorriso matreiro, o queé um título completamente inócuo,poderia significarqualquer coisa.Ele não mencionou Fermat nem Taniyama-Shimura, apenas mer-gulhou dircto nos cálculos.Não haviameio de alguém adivinhar oque estava acontecendo. Era feito de um modo que a menos quevocê soubesse para o que era tudo aquilo, os cálculos pareceriamincrivelmcntc tcdiosos e complexos. E quando você não sabe paraque é uma determinada matemática é impossível seguir o raciocí-nio.Já é difícil de acompanhar mesmo quando você conhece o ob-jetivo.De qualquermodo,um porumosestudantes graduados foramabandonando as aulas e depois de algumas semanas eu era a únicapessoa que restara na sala.

Katz ficou sentado na sala e ouvia cuidadosamente cada passodos cálculos deWiles.No final parecia não haver dúvida de que oKolyvagin-Flachfuncionavaperfeitamente. Ninguém mais no de-partamento percebera o que estavaacontecendo. Ninguém descon-

fiou de queWiles estavaà beira de conquistar o prêmio mais im-portante da matemática. O plano fora um sucesso.

Terminada a série de aulas Wiles devotou todos os seus esfor-

ços para completar a demonstração. Ele tivera sucesso em aplicarométodoKolyvagin-Flacha famíliaapósfamíliade equaçõeselípticase apenas uma família ainda se recusava a se submeter à técnica.Wiles descreve como ele tentou completar o último elemento dad l n ()n~l1 : \( i in T 1111:111I :11Ihi i no f i, ,:, 1 . -11 1 l1a io Nada t inha ~aíc l( )

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248 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT

com as crianças e eu estava sentado em minha mesa ptnsando so-bre a família de equações elípticas que restara. Olhava casualmen-te para um trabalho de Barry Mazur e havia uma frase ali que cha-mou a minha atenção. Ele mencionav~ um cálculo do século XIX esubitamente eu percebi que poderia usar aquilo para fa7.ero mé-lodo d(' J<oJyvagill-Fladl flll\l:iollar lia (111, a fmuília dc drptica~.

os CÁLCULOSSECRETOS 249

palestras. Mas então percebi que ele precisaria de um espaço parauma terceira palestra e assim arranjei para cancelar uma de mi-nhas palestras e ceder o horário para ele. Eu sabia que ele tinhauma coisa grande para anunciar, mas não tinha idéia do que era.

QUHndo Wiles chegoll ( '111CHlllhr idgc cI<: I i llha dll ll l-l \CIIIHIIH \

c IIIciaautc:: du Jia marcado para suas palestras e queria aprovei-

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O trabalho se estendeu pCla tarde e eu esqueci de ir almoçar. Porvolta das três ou quatro da tarde, eu estava realmente convencidode quc iHtorCHolvcriao (1ltimoproblcma. Era hora do chá c cu dc ;-ci para a parte inferior da casa. Nada ficou surpresa de me ver che-gar tão tarde. Então eu contei a ela: resolvi o Último Teorema deFermat.

A Palestra do Século

Depois de sete anos de esforçosWilestinha completado a demons-

tração da conjectura de Taniyama-Shimura. E como conseqüên-cia disso, depois de sonhar trinta anos, ele também demonstrarao Último Teorema de Fermat. Agora era hora de anunciar ao res-to domundo.

'~ssim, por voltade maio de 1993,eu estavaconvencidode quetinha todo o Último Teorema de Fermat em minhas mãos , lem-braWiles. Eu aindaqueriaverificara demonstraçãomaisum pouco,mashaviauma conferência em Cambridge no finalde junho e acheiqueseriaum lugarmaravilhosopara anunciar aprova- Cambridgeé minha velha cidade natal e eu fiz pós-graduação lá.

Aconferência seria realizadano Instituto Isaac Newton. O ins-

tituto tinha planejado uma série de palestras sobre teoria dos nú-meros com o título obscuro de Funções L eAritmética . Um dosorganizadoresera o supervisor dePh.D.deWiles,John Coates. Nósreunimospessoas de todo o mundo que estavam trabalhando nes-ta áreageral de problemas, e, é claro,Andrew foi uma das pessoasque convidamos.,.Nós planejamos uma semana de palestras con-centradas,e, originalmente, como havia uma ~rande demanda dehorários para palcstras, eu dei a Andrcw dois horários J)HfIdw\ ~

. tar aomáximoa oportunidade. Eu resolviqueverificariaa demons-traçãocomum 0\1doisespecialistas,em especialapartc dc J(olyvagin-Flach.Aprimcirapessoaparaquem deiomanuscrito foiBarryMazur.Creio que disse a ele: 'Eu tenho um manuscrito aqui com umademonstração dc um certo teorema.' Ele me olhou muito surpresopor um momcnto e então disse: 'Bem, darei uma olhada nele.' Euacho que levoualgum tempo para ele perceber. Então me pareceuperplexo.De qualquermodoeu disse queesperavafalarsobre aqueleassunto na conferência e que realmente gostaria que ele tentasseverificá-lo.

Uma por uma as mais eminentes personalidades da teoria dos

números começaram a chegar ao Instituto Newton, incluindo KenRibet, cujos cálculos, em 1986,tinham inspirado os sete anos detrabalho duro deWiles. Eu cheguei nesta conferência sobre fun-çõesL e curvas elípticas e não parecia haver nada fora do comumaté que aspessoas começaram a me falar sobre osboatos em tornodas palestras de Andrew Wiles. O boato era de que ele tinha de-monstrado o Último Teorema de Fermat, e eu achei que isso eratotalmente louco.Pensei que não podia ser verdade. Houvemuitasocasiões em que boatos começaram a circular no meio matemáti-co,especialmenteatravésdocorreio eletrônico,e aexperiênciamostraque não se deveacreditar muito nesse tipo de coisa.Masos rumo-

res eram muito persistentes eAndrew se recusava a responder per-guntas sobre eles. Ele estavase comportando de um modo muitís-simo esquisito. John Coates ~isse para ele: ~drew, o que vocêdemonstrou? Devemoschamar a imprensa?'Andrewapenassacudiua cabeçae mantevea  oc fechada.Ele realmenteestavacriandoum suspense.

 Então, IIlIIa tardc, Anurcw IIIC procurou e começou a fazernr '..,..,.' t ,,1 ~l :.,1 r 0. .. 1 \ . 4......

250 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT OS CÁLCULOS SECRETOS 251

idéias de Frey.Pensei comigo, isto é incrível, ele deveter demons-trado a conjectura de Taniyama-Shimura e o Último Teorema deFermat, deoutro modoele não estaria meperguntando isto.Eu nãolhe perguntei diretamente se era verdade porque ele estava agindode um modo muito tímido e eu sabia que não teria uma respostadireta. Assim, apenas disse: Bem, Andrew, se você tiver oportuni-dade de falarsobre este trabalho, foiassim que aconteceu... . Olhei

Meu melhor palpite é que ele vai provar que se Eé umacurva elíptica sobre Q e se a representação de Galoissobre os pontos de ordem 3 em E satisfaz certashipóteses, então Eé modular. Do que ele disse até agoraparece que ele não vai demonstrar toda a conjectura.

o que eu não sei é se isto vai se aplicar à curva de Frey

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..

para ele comose soubesse de alguma coisa,mas não tinha idéia doque estava acontecendo. Apenas supunha.

A reaçãodeWiles aos boatos e à pressão crescente era simples.~ pessoas me perguntavam o que, exatamente, eu iadizer. E eurespondia: venha à m,inhapalestra e veja.

O título das palestras deWiles era Formas Modulares, Cur-vas Elípticas e Representações de Galois . Novamente, como nocasodas aulas que ele-derano iníciodo ano,para benefício deNickKatz, o título era vago, não dando pistas sobre o objetivofinal. Aprimeira palestradeWilesfoiaparentemente simples, estabelecendo

apenas asbases para o seu ataque contra a conjectura de Taniyama-Shimura na segunda e terceira palestras. Amaioria das pessoas naplatéia não ouvira os boatos, não percebeu o objetivoda palestra edeu pouca atenção aos detalhes. Os que sabiam estavambuscandoo menor indício que pudesse apoiar os rumores.

Logo depois que a palestra terminou, o boato voltou a circularcomrenovadovigoreasmensagensvoaramaoredordomundoatravésdocorreioeletrônico.OprofessorKarlRubin,um ex-alunodeWiles,informou aos seus colegas naAmérica:

e, portanto, dizer alguma coisa sobre Fermat. Mantereivocês informados.

Karl RubinUniversidade Estadual de Ohio

Data: 5e9, 21 jun  99 13:33:06

Assunto: Wiles

Naquela tarde um dos estudantes pós-graduados, que assisti-ra à palestra deWiles, correu para a lojade apostas tentando apos-tar dez libras como o Último Teorema de Fermat seria resolvido

em uma semana. Contudo, o bookm ker pressentiu o que estavaacontecendo e recusou-se a aceitar a aposta.Aquele era o terceiro

matemático queoprocuravanaquele diatentando fazer uma apostasemelhante.Apesar-do fatode que o ÚltimoTeoremade Fermattinha confundido asmaiores mentes do planeta durante três sécu-los, até mesmo QSboolwl kers estavam começando a suspeitar deque o teorema estivesse à beira de ser demonstrado.

No dia seguinte mais pessoas tinham ouvidoos boatos e assima platéia na segunda palestra era bem maior.Wiles provocou a au-diência com um cálculo intermediário, que mostrava que ele esta-vaclaramente tentando dominar a conjectura deTaniyama-Shimura.Mas a platéia continuavaem dúvida se ele tinha o suficiente parademonstrá-Ia e, em conseqüência, conquistar o Último Teorema

de Fermat. Uma novacarga de e m ils se refletiu dos satélites decomunicação orbitando o mundo.

Oi. Andrew deu sua primeira palestra hoje. Ele nãoanunciou a demonstração de Taniyama-5himura masestá se movendo nesta direção e ainda tem mais duaspalestras. Ele está fazendo um grande segredo sobre oresultado final.

Data: Ter,22 jun 1993 13:10:39Assunto: Wiles

Não houve grande novidade na palestra de hoje.Anrlr,.. ., n m ,, I I 11m t...nr...mn n...rnl c:nhrp n IIc:n tine:

.

. .

252 o ÚLTiMO TEOREMA DE FERMAT

representações de Galois ao longo das linhas que eusugeri ontem. Elenão parece se aplicar a todas as curvaselípticas, mas o golpe final virá amanhã.

Eu não sei realmente ó que ele vai fazer ao longo destecaminho. Mas está claro que ele sabe o que vai dizer.

Ii

i.I

os CÁLCULOSSECRETOS 253

Depois de sete anos de esforços intensos, Wiles estava a pontode anunciar ao mundo sua demonstração. Curiosamente ele nãoconscgue lembrar os momentos finais da palcstra em grande de-talhe, mas se lembra do clima na sala: Embora a imprensa já ti-vesse sido notificada do que estava acontecendo, não havia compa-recido à palestra. Mas havia um bocado de gente na platéia que estava

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Este é um trabalho realmente longo no qual ele estevetrabalhando durante anos e ele parece confiante.Contarei a vocês o que acontecer amanhã.

Karl RubinUniversidade Estadual de Ohio

 No dia 23 de junho, Andrew começou sua terceira c últimapalcstra , rclcmbra John Coatcs. O mais cxtraonJilláriu é quc tu-das as pessoas que contribuíram para as idéias por trás de sua de-monstração estavam naquela sala:Ma7.\lr,Ribet, Kolyvaginc mui-tos, muitos outros.

A essa altura os boatos eram tão persistentes que todos na co-munidade matemática de Cambridge apareceram para a última pa-lestra.Osmais felizardosestavamespremidos no auditório,enquantoos outros csperavamno corredor,ficandona ponta dos pés e olhan-dopelasjaríelas.Ken Ribet se certificara de que não perderia a maisimportante declaraçãomatemática do século. Eu chegueibem ccdoe mesentei naprimeira filacomBarryMazur.Trouxerauma câmeracomigopara registrar o evento.Haviauma atmosfera carregada e aspessoas estavam muito empolgadas. Certamente sentíamos estarparticipando de um momento histórico. As pessoas exibiam sorri-

sos antes e durante a palestra.A tensão estiveracrescendo nos últi-mosdias.E então chegaraaquelemomento maravilhosoem que nosaproximávamosda demonstração do Último Teorema de Fermat.

BarryMazur já recebera uma cópia da demonstração deWiles,masassimmesmo ficouassombradocomaperformance.  Eu nuncatinha visto uma palestra tão gloriosa, cheia de idéias tão maravi-lhosas,com UJIlatensão tão dramática e tamanha expectativa.E sóhaviauma conclusão possível.

t irando fotos perto do final e o diretor do Insti tuto viera bem pre-parado, com uma garrafa de champanhe. Houve um silêncio res-peitoso enquanto eu terminava a demonstração c encerrava com adeclaração do Último Teorema de Fermat. Eu disse: Acho que vouparar por aqui , e então houve um aplauso contínuo.

As Repercussões

Estranhamente, Wiles tinha sentimentos opostos sobre a palestra.te Era OUViaJlIClltCima gral ldc ucasiãu, mmi mcus scnl imcntos cram

ambivalentes. Isto forauma parte de mim durante sete anos. Ocu-para toda a minha vida profissional. Eu me envolvcracom o pro-blema deum modoque realmente sentia que ele era meu, mas agorao estavaentregando aosoutros. Sentia comose estivessedando umaparte de mim.

O colegadeWiles,Ken Ribet, não tinha tais objeções. Foi umacontecimento realmente extraordinário. Eu quero dizer, você vaia uma conferência e assiste a palestras rotineiras, vê algumas boaspalestras, mas só uma vez em sua vidavocê assiste a uma palestraonde alguém afirma ter solucionado um problema que durou 350anos. As pessoas estavam se olhando e dizendo: Meu Deus, sabe

que acabamos de testemunhar um acontecimento histórico. De-pois as pessoas fizeram algumas perguntas sobre os aspectos téc-nicos da demonstração e de suas possíveis aplicações para outrasequações. Então houve um novosilêncio e depois novos aplausos.A palestra seguinte foi dada por seu amigo Ken Ribet. Eu dei apalestra, algumas pessoas tomaram notas, outras aplaudiram, enenhum dos presentes, nem mesmo eu, tcm idéiado que eu dissen~nl1f l~ n~l( ~tr~. 1

254 o ÚL1 IMO TEOREMA DE FERMAT OS CÁLCULOS SECRETOS 255

,I,-

declaração que esclarecesse o que era a conjectura de Taniyama-Shimura.

Aprimeira vez que oprofessor Shimura ouviufalar da demons-tração de sua própria conjectura foi quando ele leu a primeira pá-gina doNew lórll Times - ~ina1 um Grito deEureka noAntigoMistério da Matemática . Trinta e cinco anos depois do suicídiode seu amigoYutakaTaniyama,a conjectura que eles tinham cria-do juntos tinha sido provada. Para muitos matemáticos profissio-

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~

nais,a demonstraçãodeTaniyama-Shimuraera umarealizaçãomuitomais importante do que a solução doÚltimo Teorema de Fermat,porque tinha imensas conseqüências para muitos outros teoremasmatemáticos. Os jornalistas que cobriam a m::ltériatendiam a seconcentrar emFermat, e quandomencionavamTaniyama-Shimura,era apenas de passagem.

Shimura, um homem modesto e gentil, não ficou muito abor-recido pela falta de atenção dada ao seu papel na demonstração doÚltimo Teorema de Fermat, mas comentou que ele e Taniyama ti-nham sido rebaixados de pessoas para rótulos. É curioso que as

pessoas escrevam sobre a conjectura de Taniyama-Shimura masninguém escreve sobre Taniyama e Shimura.Esta era a primeira vez que a matemática chegavanas primei-

ras páginas dos jornais desde que YoichiMiyaokaanunciara suademonstração em 1988.A única diferença é que desta vez houverao dobro de cobertura e ninguém expressara a menor dúvida quan-to aos cálculos.Do dia para a noite Wiles se tornou o mais famoso,de fato o único matemático famoso do mundo, e a revista People

até mesmo o colocou na lista das 25 pessoas mais interessantesdo ano , ao ladoda princesa Diana e Oprah Winfrey.E a consagra-ção final veioquando uma griffe internacional convidou o gênio demaneiras suaves para fazer propaganda de uma novalinha de rou-pas para homens.

Enquanto o circo dos meios de comunicação continuava, e osmatemáticos aproveitavama luz dos refletores, o trabalho sério deverificação da demonstração já começara. Como em todas as dis-Ciplinascientíficas, cada novadescoberta tinha que ser examinadaminuciosamente antes que pudesse ser aceita como correta c prc- ..

No dia23de junho de 1993,Wilesdeu suapalestra noInstituto IsaaeNewton em Cambridge. Este foi o momento imediatamente apóseleanunciar sua demonstração doÚltimoTeorema de Fermat.Wiles,e todas aspessoas na sala, não tinham idéia dopesadelo que os es-perava.

Enquanto osmatemáticos espalhavàmasboas-novasvia e-mailoresto domundo teveque aguardar os noticiários daTVdurante anoite ou osjornais do dia seguinte. Equipes de televisãoe jornalis-

tas científicos desceram sobre o Instituto Newton, todos pedindoparaentrevistar o maior matemático do século . O Guardian ex-clamou: Fim doÚltimo Enigma daMatemática , enquanto a pri-meira página do Le Monde dizia:  Le théoreme de Fermat enfin

résolu. Jornalistas em toda a parte pediam aos matemáticos quedessem suas opiniões de especialistas, e os professores, ainda serecuperando do choque, deviam explicar, resumidamente, a maisrnn1nlil :ld:l d(,ln(ln~IT:1( :in 111:1I. m:í1; (111( ;., v;~f;, ri. . .

 

OS CÁLCULOS SECRETOS 257

 

cisa. A demonstração deWiles tinha que ser submetida a um exa-me de avaliação.Embora as palestras deWilesno Instituto Newtontivessem dado aomundo um resumo dos seus cálculos, isto não sequalificavacomo uma análise oficialpor especialistas. O protocoloacadêmico exige que todo matemático submeta um manuscritocompleto para exame por uma revista respeitada. O editor entãocHcolhcullla cquipc dc cxamilladorcHpara vcrificar a UCI110IlHtra-

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ção linha por linha. Wiles tcria que passar o verão esperando an-siosamente pela opinião dos avaliadores e esperando receber suaaprovação.

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Depoisda palestra deWiles, osjornais de todo o mundo relataramsuademonstra<jãodo Último Teorema de Fermat.

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Um Pequeno Problema

Um problema que valea pena ser atacadoProvaseu valor contra-atacando.

Piet Hein

Assim que terminou a palestra em Cambridge, o comitêWolfskehl

foi informado da demonstração deWiles.O prêmio, instituído pelo

industrial alemãoem 1908,não podia ser entregue imediatamente

porque as regras do concurso exigiama verificação do trabalho por

outros matemáticos e a publicação da demonstração:

Andrew Wiles e Ken Ribet logo depois da histór ica palestra no

Instituto Isaac Newton.

o  onigliche esellschaft der Wissenschaften em Gõttingen

 ... só levaráem consideração os trabalhos que aparecerem

na forma de monografia nos periódicos, ou que estiverem à

venda nas livrarias ... .A entrega do Prêmio pela Sociedade

não acontecerá antes de dois anos depois da publicação do.

trabalho vencedor.O intervalode tempo é necessário para que

matemáticos da Alemanha e do exterior possam emitir suasonjniõc~ ~ohrc :1V:1li0:10C0:1~olucão puhlic:1d:1.

260 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT UM PEQUENO PROBLEMA 261

Wiles submeteu seu trabalho à revista lnventiones Mathematicae

e seu editor,BarryMazur,começouoprocessode selecionarosjuízespara julgarem o trabalho. A demonstração de Wiles envolviaumavariedade tãogrande de técnicas matemáticas, antigas e modernas,que Mazur tomou a decisão fora docomum de nomear não apenasdois ou três examinadores,'como é normal,.mas seis. A cada ano,trinta mil artigos Rãopublicados nas rcvistas técnicas de todo ()

 Eu nãoqueria festejarantes de ter a demonstração completamentefora de minhas mãos. E enquanto isso eu tinha meu trabalho in-terrompido para lidar com asperguntas que osjuízes enviavampore-mai oEu ainda estava bcm confiantc dc quc nenhuma daquelasperguntas iria me dar muito trabalho. Ele já tinha verificado ereverificadoa demonstração antes de entregá-Ia ao comitê de ava-liação c csperava nada mais do que () equivalente matemático de

,-

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nlllJHlo,mas ()tallI<IlIhoc a importfmeia uo manuscrito ue Wilessignificavam que ele seria submetido a um nível sem precedentesde exame minucioso. Para simplificara tarefa, as duzentas páginasda demonstração foramdivididascmseis scçõese cadaum dosjuí; csassumiu a responsabilidade por um desses capítulos.

O Capítulo 3 era responsabilidade de Nick Katz, que já exami-nara a demonstração de Wiles no início do ano: Aconteecude euestar em Parisparapassaroverãotrabalhando noInstitut desHautesÍ~tudes Scicntifiqucs, e levaracomigo as du; entas páginas da de-monstração completa - o meu capítulo em especial tinha setentapáginas. Quando cheguci láeu decidi quc prceisava de uma ajudaséria e assim insisti para que Luc Illusie, que também estavaemParis, se tornasse um avaliadoradjunto daquele capítulo. Nós nosreuniríamos algumasvezes por semana, durante overão, explican-do um para o outro aquele material de modo a tentar entender ocapítulo.Não fizemos nada senão ler este manuscrito linha por li-nha e nos certificarmos de que não haviaerros. Àsvezes ficávamosconfusos e assim, todo o dia,ou até duas vezes por dia, eu enviariaum e-mail para Andrew com uma pergunta - eu não entendo oque vocêdiz nesta página ou esta linha me parece errada. Tipica-mente eu receberia uma resposta naquele dia, ou no dia seguinte,

que esclarecia o assunto e então passávamos para o problema se-.  gumte.A demonstração era um argumento gigantesco, construído de

ummodo intrincado a partir de centenas de cálculos matemáticosgrudados por milhares de elos lógicos. Se apenas um desses cál-culos estivesse incorreto ou se uma das ligações lógicas se soltas-se, toda a prova poderia se tornar inútil. Wiles, que voltara paraPrinceton, esper:avaque os avaliadores completassem sua tarefa.

erros de gramática c tipografia, problemas triviais que poderiamser corrigidos imediatamente.

 Essas perguntas continuaram sem problemas até agosto ,relembra Katz, até que eu topei com o quc parccia pouco mais doque um pequeno problema. Aípor volta de 23de agostoeu mandeium e-mail para Andrcw, cra uma cohmum pouco mais complica-da, c ele me mandou de volta um fax. Mas o fax não parecia res-ponder a pergunta e assim eu mandei outra mensagem pelo com-putador para ele e rccebi outro fax que também não me satisfez.

Wiles presumiu que fosse um pequeno erro, como os outros,mas a persistência de Katz o forçou a levá-Ioasério. Eu não podiaresolverimediatamente esta questão de aparência inocente. Porummomento pareceu que era do mesmo tipo dos outros problemas,mas lá por volta de setembro eu comecei a perceber que esta nãoera apenas uma pequena dificuldade mas uma falha fundamental.Eraum erroem umaparte crueialdoargumentoenvolvendoométodoKolyvagin-Flach,mas algo tão sutil que eu não percebera até estemomento. O erro era tão abstrato que não pode ser descrito emtermos simples.Mesmo explicá-Iopara ummatemático exigiriaqueo matemático passasse dois ou três meses estudando aquela partedo manuscrito em detalhe.

Em essência, o problema consistia em que não havia garantiade que o método de Kolyvagin-Flach funcionaria do modo comoWiles pretcndera. Ele devia estender a demonstração do primeiroelemento de todas as equações elípticas e formas modulares paracobrir todos os elementos. Era o mecanismo que faria todos osdominós tombarem. Originalmente o métodoKolyvagin-Flachfun-cionara somente sob condições especiais,masWilesacreditava queo :1dapt:1ra e rcforcar:1 sufieientemente n:1r:1func1on:1r em todm~ O 1

262,

o ÚLT.lMOTEOREMA DE FERMAT UM PEQUENO PROBLEMA 263

casos.De acordocomKatz isto nãoera necessariamente verdadei-ro, e os efeitos foram dr~máticos e devastadores.

O erro nãosignificava,necessariamente, que o trabalho deWilesnão pudesse se salvo,mas significavaque ele teria que reforçarsua demonstração. O absoiutismo da matemática exigiaqueWilesdemonstrasse, além de toda a dúvida, que seu método funcionariapara cada elemento de cada série E e de cada sérieM

concentrar de novo,mas desta vez sob circunstâncias muito maisdifíceis. Por um longo tempo achei que a solução estavabem pró-xima, que eu só estava deixando escapar uma coisa simples e quetudo se encaixariano diaseguinte. Podiater acontccido destc modo,mas à mcdida que o tempo passava o problema sóse tornava maisintransigente.

A esperança era de que ele pudesse corrigir o erro antes que a

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comunidade matemática percebesse que o erro tinha existido. Aesposa de Wiles,que testemunhara os sete anos de esforços con-sumidos na demonstração, tinha que observar agora a luta agoni-zante de seu marido com um erro que poderia destruir todo o seutrabalho.Wileslembraseu otimismo. Em setembro, Nada medisse

que o único presente que ela queria em seu aniversário era a de-monstração correta. O aniversário dela é em 6 de outubro. Eu sótinha duas semanas para completar a prova e fracassei.

ParaNickKatz aquele, também, foium período tenso: Porvoltade outubro as únicas pessoas que sabiam a respeito do erro era eu,Illusie, os avaliadoresdos outros capítulos e Andrew

-em princí-

pio isto era tudo. Minha atitude como juiz era agir confidencial-mente. Certamente não era daminha conta discutir o assunto com

ninguém, excetoAndrew,e assim eu nãodisse umapalavra.Eu creioque externamente ele parecia normal, mas neste ponto ele estavaguardando um segredo doresto domundo e ele deveter se sentidomuito desconfortável. A atitude de Andrew era de que em algunsdias ele resolveria o problema, mas o outono passou e nenhummanuscrito foi produzido. Os'boatos começaram a circular e istoera um problema.

K.enRibetemespecial,queera outro dosjuízes, começou asentir

a pressão deguardar o segredo. Porum motivototalmente acidentaleu fiquei conhecido como o Serviço de Informações Fermat. Saiuuma matéria inicial no New Thrk Times onde Andrew pedia queeu falasse com osrepórteres em seu lugar,e amatéria dizia: Ribet,que atua como porta-voz de Andrew Wiles... ou coisa parecida.Depois disso eu me tornei um magneto, atraindo todos os tipos deinteressauos no Último rIcorema de Fermat, dentro c fora da co-

o justador de apetes

Quando Katz percebeu a importância do erro que tinha localizado,ele começou a se perguntar como deixara de percebê-Io na prima-vera,quando Wileslhe dera aulassobrea çlemonstraçãocomo único

t: propósito de identificar erros. Eu acho que a resposta consiste emque existeumaverdadeiratensão quandose assiste a uma aula,entreentender tudo e deixaro 'professor prosseguir. Sevocê interrompetodo o tempo, eu não en~endiisso, eu não entendi aquilo, então osujeito nunca consegue explicar coisa alguma e você não chega alugar nenhum. Por outro lado, se você nunca interrompe acaba seperdendo. Fica lá acenando com a cabeça educadamente mas nãoestá verificando nada. Este é o problema entre fazer perguntas de-mais ou de menos, e obviamente, lá pelo final daquelas aulas, quefoiquandooproblemanosescapou,eu tinhapecadoporfazerpoucas

t  pergun as.

Há apenas algumas semanas os jornais de todo o mundo ti-nham chamado Wiles de o matemático mais brilhante do mun-do . Depois de 350 anos de frustração, os teóricos dos números

acreditaram ter vencido Pierre de Fermat. Agora Wiles tinha queenfrentar a humilhação de admitir que cometera um erro. Masantes de confessar o erro ele decidiu fazer um esforço concen-trado para consertar a falha. Eu não desisti, eu estava obcecadocomo problema e ainda acreditava que o método Kolyvagin-Flachsóprecisava de uns pequenos ajustes. Só precisava modificá-Iodeum modosutil e então funcionaria. Resolvivoltar à minha vc-lharotina c me clesli~arcompletamente ciomundo. TinhHmu' me>

.. . , ..

264 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT

de todos os lugares do mundo, e eu também dei uni grande núme-ro de palestras por um período de dois ou três meses. Nessas pa-lestras eu dizia que realização magnífica fora o teorema, delineavaa prova e falava sobre os trechos que eu mais conhecia. Depois deum certo tempo as pessoas começaram a ficar impacientes e a fa-zer perguntas embaraçosas.

UM PEQUENO PROBLEMA 265

Em cada salade chá, em cada departamento dematemática, osrumores sobre a demonstração deWiles aumentavam a cada dia.Em resposta aos boatos e às especulações no correio eletrônico,-.alguns matemáticos tentaram tranqüilizar a comunidade.

Assunto: Resposta: Brecha na prova de Wiles?

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 Wiles tinha fei to este anúncio público, mas ninguém f~ra deum peq ueno grupo dc juí~es tinha visto uma cópia do trabalho. Osmatemáticos estavam esperando pelo manuscrito que Andrew pro-metera para dentro de algumas semanas após o anúncio, em ju-nho. As pessoas diziam: Muito bem, este tcorcma foi anunciado,nós gostaríamos de ver o que está acontecendo. O que ele está fa-~endo? Por que não temos notícia nenhuma? Todos pareciam umpouco aborrecidos por estarem sendo deixados no escuro, e sim-plesmente queriam saber o que ocorria. Então as coisas começa-ram a piorar e esta nuvem negra se formou sobre a prova. As pes-soas começaram a me indagar sobre os boatos de que um erro fora

encontrado no Capítulo 3. Eles me perguntavam o quc eu sabia, eeu não sabia o qt 1edizer. .

Com Wiles e osjuízes negando qualquer conhecimento de umerro, ou pelomenos se recusando a fazer comentários, as especu-lações correram desenfreadas. Em desespero os matemáticos co-meçaram a mandar e m ils uns para os outros esperando chegarao fundo domistério.

Assunto: Brecha na prova de Wiles?Data: 18 nov 1993 21:04:49 GMT

Estão circulando boatos sobre uma ou mais brechas nademonstração de Wiles.Istoquer dizeruma rachadura,uma brecha, uma fenda, um buraco ou um abismo?Será que alguém tem alguma informação confiável?

Joseph lipmanUniversidade de Purdue

Data: 19 nov 1993 15:42:20 GMT

IIr.,

Eu não tenho nenhuma informação de primeira mão enão acho que deva discutir informações de segundamão. Eu creio que o melhor conselho para todos éficarmos calmos e deixar que os juízes competentes, queestão examinando cuidadosamente o trabalho de Wiles,

façam o seu trabalho. Elesvão relatar suas descobertasquando tiverem alguma coisa definitiva para dizer.Qualquer um que tenha escrito um trabalho ou julgadoum trabalho estará familiarizado com o fato de que

freqüentemente surgem dúvidas no processo deverificação das provas. Seria espantoso se isto nãoacontecesse para um resul tado tão importante de umademonstração tão longa e difícil .

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leonard EvensUniversidade Northwestern

ItIt.

Apesardos pedidos de calma,as mensagens continuaram. Alémde debater o possívelerro, os matemáticos começaram a discutir aética de antecipar o resultado dos juízes:

Assunto: Mais mexericos sobre FermatData: 24 nov 93 12:00:34 GMT

Eu acho que está claro que eu discordo daqueles quedizem que não deveríamos discutir se a demonstraçãode Wiles, para o Último Teorema de Fermat, possui erros011nnn. Sou tntnlm ,nt , n fnvnr rlpc;.. . r I ,hntp rI ...rI nllp

266 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT UM PEQUENO PROBLEMA 267

Peter Sarnak entrara para o Departamento de Matemática dePrinceton ao mesmo tempo que Wiles e ao longo dos anos eles ti- ,'nham se tornado amigos. Durante este período de agitação inten-sa, Sarnak era uma das poucas pessoas com quem Wiles desabafa-va. Bem, eu nunea Roube m~detalheR exatos, mas estava elaro qucele lelllava Hllperar 11111roblcma t:lério.Mas eada ve~ que c\e con-

ele não seja levado demasiado a sério. Néio acho queseja uma coisa maliciosa. Principalmente porque, estejaa prova de Wiles incorreta ou não, eu tenho certeza deque ele criou matemática de primeira classe.Assim, aqui está o que recebi hoje...

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Bob Silverman sertava uma parte dos cálculos, isto provocava um problema em outraparte da demonstração. Era como tentar colocar um tapete em umaHaIaonde o tapete é maior do que a sala.Assim, Andrew encaixavao tapete em um canto, somente para descobrir que ele ficara so-brando em outro. Se você poderia ou não ajustar o tapete na salanão era algo que c\e puuesse decidir. Mesmo com o erro Andrewdera um grande passo. Antes dele ninguém conseguira abordar aeonjeetura de ~l1l11iya11la-Shimura mcslllo agora tOdoHcHtavamcmpolgados porquc c\e nos mostrara tantas idéias novas.Havia coisasnovas, fundamentais, que ninguém tinha considerado antes. Mes-moque ademonstração não pudesse ser consertada elaera um grande

avanço - mas é claro que Fermat continuaria sem solução.Finalmente Wiles chegou à conclusão de que não poderia mantero si lêncio para sempre. A solução para o erro não estava logo ali.Era hora de acabar com as especulações. Depois de um outono defracasso desanimador, ele enviou o seguinte e mail para o quadrode informações do Departamento de Mate~ática:

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~ II. I

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Assunto: Resp.: Buraco em FermatData: Seg, 22 nov 93 20: 16 GMT

Em uma palestra no Instituto Newton, na semanapassada, Coates disse que, em sua opinião, há um errona parte da demonstração com os sistemas geométricosde Euler . Esse erro pode Iovar uma semana ou doisanos para consertar . Falei com ele várias vezes masainda não sei em que base ele fez esta declaração, já

que ele não tem uma cópia do manuscrito.

Até onde eu sei a única cópia em Cambridge está comRichard Taylor, que é um dos aval iadores do trabalho paraa Inventiones Eele tem se recusado a comentar até quetoda a banca examinadora chegue a uma conclusão

comum. Assim,a situação é confusa. Eunão vejo como aopinião de Coates possa ser considerada válida neste pontoe vou esperar a opinião de Richard Taylor.

' I

Assunto: Situação de FermatData: 4 dez 9301 :36:50 GMT

Richard Pinch Em vista das especulações sobre o estado de meu

trabalho com a conjectura de Taniyama-Shimura e oÚltimo Teorema de Fermat eu vou fazer um breve resumo

da situação. Durante o processo de avaliação surgiramalguns problemas. A maioria foi resolvida logo, mas umproblema em particular ainda não foi solucionado. Aredução-chave da (em sua maioria dos casos) conjecturade Taniyama-Shimura para o cálculo do grupo Selmerestá correta. Contudo, o cálculo final de umn frnntAirn

Enquanto aumentava a agitação sobre a enganosa prova,Wilesfazia o melhor que podia para ignorar a controvérsia e as especula-ções. Eu realmente tinha que me desligar de tudo isso porque nãoqueria saber o que as pessoas estavam dizendo a meu respeito. Eume isolei, mas periodicamente meu colega Peter Sarnak me dizia:'Sabe que há uma tempestade lá fora?' E eu ouvia, mas por mimmesmo queri~ me desligar de tudo e me concentrar no problema.

268 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT 269M PEQUENO PROBLEMA

superior precisa para o grupo Selmer no caso sem i -estável (da repr.esentação do quadrado simétricoassociapo com a forma modular) ainda não estácompleta. Euacredito que serei capaz do torminar istono futuro próximo, usando as idéias explicadas emminhas palestras de Cambridge.

demonstração deWiles estavaem frangalhos. O prazer, a paixãoea esperança que o carregaram durante os anos de cálculossecre-tos egtavamgendo guhgtituídos pelo embaraço e o desespero. Elesc lcmbracumuseusunhude infânciase tornou umpesadelo. Nossete anos em que trabalhei noproblema eu desfrutara de um com-bate na privacidade.Não importa o quão difícilfora, não importa oquão insuperáveis parecessem certas coisas, eu estava trabalhan-

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do no meu problema favorito.Era a paixãoda minha infância, eunão podia abandoná-Ia.Não queria deixá-Ianem por um momen-to. E então eu falei sobre ela publicamente e ao falar houve umsentimento de perda. Era uma emoçãomuito confusa. Foramara-vilhosover outras pessoas reagirem à demonstração, ver comoosargumentos poderiam mudar' completamente toda a direção damatemática, mas ao mesmo tempo eu perdera minha busca pes-soal.Elaestavaaberta para o mundo agora,e eu não tinha mais estesonho particular para conquistar. E então, depois que descobri oproblema comele, haviadúzias, centenas, milhares depessoas quequeriam tirar minha atenção. Fazer matemática de qualquer tipo,

superexpostoà curiosidadepública,nãoémeu estiloe eu nãoaprecioeste modo público de fazer as coisas.Os teóricos dos números de todo o mundo simpatizavamcom

a posição deWiles.Ken Ribet passara pelo mesmo pesadelo, oitoanos antes, quando tentara provar que existia uma ligaçãoentre aconjeetura de Taniyama-Shimura e o ÚltimoTeorema de Fermat. Eu estavadando uma aula sobre a demonstração no Instituto dePesquisa em CiênciasMatemáticas de Berkeleye alguém, na pla-téia, disse: Espere um instante, comovocê sabe que isto e aquiloé verdade? Eu respondi imediatamente dando minha razão e eledisse: Mas isto não se aplicaa esta situação. Eu senti um pavor

imediato. Comecei a suar frio e fiquei muito perturbado. Entãopercebi que sóhaviaumapossibilidade dejustificar aquilo, que eraolhar de novoo trabalho fundamental sobre aquele assunto e ver oque fora feito em uma situação semelhante. Olhei para o artigorelevante e vique o método de fato se aplicavaem meu caso. Emum dia ou doiseu tinha consertado tudo. E em minha aula seguin-te pude dar uma justificativa.Masvocê sempre vivecom o medo

o fato de que ainda resta um bocado de trabalho a serfeito no manuscrito o torna inadequado paraimpressão. Em meu curso em Princeton, que vaicomeçar em fevereiro, eu farei um relato completodeste trabalho.

,: Andrew Wiles

Poucosacreditaram no otimismo de Wiles.Quase seis meses já ti-nham se passado sem que o erro fosse corrigido.E não haviamo-tivopara pensar que algofosse mudar nos próximos seis meses.Dequalquermodo,seelerealmentepudesse terminar istono futuropróximo , então por que se preocupar em enviaro e mail?Porquenão manter o silênciopor mais algumas semanas e então divulgaro manuscrito completo?O curso em fevereiro,que mencionou suamensagem, não forneceu os detalhes prometidos. A comunidadematemática suspeitava de que ele estavatentando ganhar tempo.

Os jornais avançaramna história de novoe os matemáticos selembraram da fracassada demonstração de Miyaokaem 1988.Ahistória estava se repetindo. Os teóricos dos números esperavamagoraopróximo e mail que explicariapor que a demonstração erairreparavelmente errada. Um punhado de matemáticos expressa-

ra dúvidas quanto à demonstração no verão passado e agora seupessimismo pareciajustificado. Uma história diz que o professorAlan Baker,da Universidade de Cambridge, quisera apostar cemgarrafas devinho cont~auma que a demonstração seria invalidadaemumano.Bakernegaa históriamasadmite, orgulhosamente,queexpressouseu ceticismo saudável .

Menos de seismeses depois da palestra no Instituto Newton, a

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270 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT

de que, se anunciar alguma coisa importante, um erro fundamen-tal vai ser descoberto.

 Quando seencontra um erro em um manuscrito, podem acon-tecer duas coisas. Às vezes existe uma confiança imediata e a pro-va pode ser reparada com pouca dificuldade. E àsvezes acontece ooposto. É muito perturbado).' ,você se sente afundando quando per-cebe que cometeu um erro fundamental e que não existe meio de

consertá-Io. É possível que aparecendo um buraco o teorema des-

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UM PEQUENO PROBLEMA 271

que fizesse a maior parte do trabalho e sim aquela que entregassea demonstração completa. Wiles sabia que assim que seu manus-crito fosse publicado, com o erro, haveria uma torrente de pergun-tas e pedidos de esclarecimento de pessoas querendo consertar afalha, e essas distrações destruiriam todas as suas esperanças deconsertar a prova, além de dar aos outros pistas vitais.

Wiles tentava recriar o mesmo estado de isolamento que o per-

mitira montar a demonstração original, e retomou ao seu hábito

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morone completamente, e quanto mais você tenta consertá-Io, piorele fica. Mas no caso da demonstração de Wiles, cada capítulo eraum trabalho significativo e se sustentava so:'.inho.Era o resultadode sete anos de trabalho, basicamente vários trabalhos importan-tes reunidos e cada um daqueles artigos era de grande interesse.O erro ocorrera em um dos capítulos, o Capítulo 3, mas mesmoque você retirasse oCapítulo 3,o que permanecia era absolutamentemaravilhoso.n

Mas sem o Capítulo 3nãohaviaprovada conjectura deTaniyama-Shirnura e sem ela não existia demonstração du Últimu 'Icuremade Fermat. Havia um sentimento de frustração na comunidade

matemática de que a demonstração, enfrentando dois grandes pro-blemas, corria perigo. Além disso, depois de seis meses de espera,ninguém, além de Wiles e os juízes, tivera acesso ao manuscrito.Crescia o clamor por uma divulgação de modo que todos pudes-sem ver os detalhes do erro. Esperava-se que aÍguém, em algumlugar, pudesse ver alguma coisa que Wiles deixara passar, criandoum cáleulo capaz de fechar a brecha na demonstração. Algunsmatemáticos diziam que a demonstração era demasiado valiosaparaser deixada nas mãos de um único homem. Os teóricos dos núme-ros tinham se tornado motivo de piadas para os outros matemáti-cos, que perguntavam sarcasticamente se eles entendiam realmente

o conceito de demonstração. O que deveria ser o momento de maiororgulho na história da matemática estava virando uma piada.

Apesar da pressão, Wiles se recusava a divulgar o manuscrito.Depois de sete anos de esforço dedicado, ele não estava disposto aficar sentado vendo outra pessoa completar a demonstração e rou-bar-lhe a glória.Apessoa que demonstrasse Fermat não seria aquela

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de estudar intensamente no sótão. Ocasionalmente ele ia passearem torno do lago de Princeton, como tinha feito no passado. Osciclistas, remadores c as pcssoas fa:'.endocaminhadas, quc anterio-rmente passavam por ele, apenas acenando, agora paravam parapcr~untar se tivera algum sllcesso em remendar a prova.Wiles ti-nha aparccido nas primciras páginas de jornais do mundo inteiro,merece li reporta~em de destaque na revista f eojJ e e até mesmufora entrevistado pela CNN. No verão anterior ele se tornara a pri-meira celebridade da matemática e sua imagem já estava abalada.

Enquanto isso, no Departamento de Matemática, os mexeri-cos continuavam. O professor John H. Conway, matemático de

Prinectoll, rclembra o clima na sala de ehá do departamento. Nósnos reuníamos para o chá às três horas e avançávamos nos biscoi-tos. Às vezes conversávamos sobre problemas de matemática, àsvezes falávamos nojulgamento de O.J. Simpson e àsvezes conver-sávamos sobre os progressos deAndrew. Como ninguém queria lheperguntar como ele estava se saindo com a demonstração, estáva-mos nos comportando um pouco como aqueles especialistas noKremlin. Alguém dizia: 'Eu vio Andrew hoje de manhã.' 'Ele sor-riu?' 'Bom, sorriu, mas não parecia feliz.' Sópodíamos avaliar seussentimentos pela expressão em seu rosto.

f: o es delo do   mail

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O inverno chegou e as esperanças de uma notificação desaparece-ram. Mais matemáticos diziam que era dever de Wiles liberar omanuscrito. Os boatos continuaram e um jornal publicou que Wiles

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UM PEQUENO PROBLEMA 273

desistira e que a demonstração já desmoronara irremediavelmen-

te. Embora istofosse um exagero, era certamcntc verdadc queWiles

tinha esgotado dúzias de abordagens que poderiam ter reparado o

erro e não enxergava mais nenhum caminho potencial para a so-

lução.

Wiles admitiu para Petcr Sarnak que a situação estava ficando

desesperadora e que ele estava a ponto de aceitar a derrota. Sarnak

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Richard Taylor

1

sugeriu quc parte da dificuldade era que Wiles não tinha ninguém

cm qucm pudesse confiar no dia-a-dia, ninguém que pudesse ava-

liar suas idéias ou que o inspirasse a explorar ahordag-ellsparalelasdo prohlema. Ele sugeriu que Wiles conseguisse um auxiliar de

confiança e tcntasse uma vezmais consertar a demonstração. Wiles

precisava de alguém que fosse especialista elll manipular o IlIéto-do J(olyvagill-Flaeh e que IIlalltivesse em segredo os uctalhes do

problema. Depois de pcnsar longamente no assunto, ele decidiu

convidar Richard Taylor, um professor de Camhridg-e, para vir aPrillcctoll trabalhar com ele.

Taylorera um dos avaliadores da demonstração e um ex-alunod( Wilcs. sel ldo portall to de cOllf iall ,, a. No al io all tcrior ele estivera

na platéia do lnstituto Isaae Newton vendo seu supervisor apre-

sentar a demonstração do séeulo. Agora era seu trabalho ajudar a

resgatar a demonstração defeituosa.

Por volta dc janeiro, Wiles, com a ajuda de Taylor, t inha mais

uma vezexplorado incansavelmente ométodo Kolyvagin-Flach ten-

tando encontrar um meio de sanar o problema. Ocasionalmente,

depois de dias de esforços, eles entravam em território novo, mas ,

inevitavelmente, se viam de volta ao ponto em que tinham come-

çado. Tendo se aventurado mais longe do que antes e fracassadoseguidamente, eles perceberam que estavam no coração de um la-

birinto inimaginavelmente vasto. Seu medo mais profundo era de

que o labirintofosse infinitoe sem saída,condenando-os avaguearemsem fim e sem direção.

E então, na primavera de 1994, quando parecia que as eorsas

não poderiam ficar piores, o seguinte correio eletrônico apareceu

 ,

,.

,

Agora, aparentemente, ele tinha descoberto uma contraprova parao Último Teorema de Fermat, mostrando que ele também era fal-so. Isto era um golpe terrível em Wiles - a razãopara que ele nãotivesse conseguido arrumar a demonstração seria que o assim chama-do erro era um resultado direto da falsidade do Último Teorema.

Era um golpe ainda maior para a comunidade matemática, porque

274 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT

Data: 03 abril 94Assunto: Fermat de novo

Hoje ho.uve uma novidade realmente espantosa sobreo Últim~ Teorema de Fermat.

Noam Elkiesanunciou uma contraprova de que o ÚltimoTeorema de Fermat não é verdadeiro afinal Ele falou

UM PEQUENO PROBLEMA 275

2.682.4404  15 365 6394  18.796.7604 = 20.615.6734.

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se o Último Teorema de Fermat era falso, então Freyjá tinha mo~-trado que isto levaria a uma equação elíptica que não seria modu-lar, uma contradição direta da conjectura de Taniyama-Shimura.Elkies não apenas encontrara uma contraprova para Fermat, eleindiretamente encontrara uma contraprova para Taniyama-Shimura.

A morte da conjectura de Taniyama-Shimura teria repercus-sões devastadoras na teoria dos números, porque, por duas déca-das, osmatemáticos tinham presumido que elaeraverdadeira. Comofoi explicado no Capítulo 5, os matemáticos tinham escrito dúzias

de demonstrações que começavam com Presumindo que aconjectura de 'làniyama-Shimura é verdadeira , mas agora Elkiestinha demonstrado que esta suposição estava errada e todas aque-las demonstrações iam desmoronar simultaneamente. Os matemá-ticos imediatamente começaram a exigir mais informações e bom-bardearam Elkiescomperguntas. Masnãohouve resposta e nenhumaexplicação sobre por que ele estava se mantendo de boca fechada.Ninguém conseguia encontrar os detalhes exatos da contraprova.

Depois deum oudois dias de agitação,alguns matemáticos deramuma segunda olhada no e mail e perceberam que, embora fosse

datado de 2 ou 3 de abril , isto era o resultado de ter sido recebidode segunda ou terceira mão. A mensagem original fora datada de10de abril. A mensagem era uma mentira-de-primeiro-de-abrilperpretada peloteórico canadense dos números Henri Darmon. Ofalso e mail serviu de lição para os boateiros de Fermat e por al-gum tempo o Último Teorema, Wiles e Taylorforam deixados empaz.

 

sobre isso hoje no Instituto. A solução para Fermat, queele construiu, envolve um expoente primo incrivelmentegrande (maior do que 10 20) mas é construtivo. A idéiaprincipal parece ser um tipo de construção de pontoHeegner, combinada com uma descida realmenteengenhosa para passar das curvas modulares para acurva de Fermat. A parte mais difícil do argumentoparece ser demonstrar que o campo de definição dasolução (que, a priori é algum tipo de anel de um campo

imaginário quadrático) realmente se reduza até Q.

Eu não consegui obter os detalhes, que são muitocomplicados...

Assim, parece que a conjectura de Taniyama-Shimuranão é verdadeira. Os especialistas acham que ela aindapode ser salva, estendendo-se o conceito de represen-tação automórfica e introduzindo-se a noção d.as curvas.anômalas que dariam origem a uma representação

 quase-automórfica . Henri DarmonUniversidade de Princeton

Noam Elkies era o professor de Harvard que, em 1988, tinha en-contrado uma contraprova da conjectura de Euler, provando por-tanto que ela era falsa:

276 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT

Wiles estava preparado para admitir a derrota. Ele disse a Taylorque não via motivos para continuar com suas tentativas de conser-tar a demonstração. Taylorjá planejara passar o mês de setembro( 'm Prillcclon :11I1csdc rctO\:nar a C:l1nhrid~c e assinl, apesar dodcsflllinlo de Wiles, ele sug-erill que eontinuasselll por mais um mês.Se não houvesse sinal de uma solução no final de setembro, eles

dcsistiriam, reconhecendo puhlicamentc o fracasso. A prova defei-

UM PEQUENO PROBLEMA 277

defeituoso, e desde então a situação só piorara. Cada tentativa deconsertar Kolyvagin-Flach fracassara.

11)doo trabalho de Wiles, tiramlo o passo final cnvolvendo olIIétodo Kolyvag-in-Flaeh,ainda era v:Uido.fi.eonjectura dc 'lhniya-ma-Shimura e o Último 'lcorema de Fcrmat podiam não ter sidodemonstrados, 111:IS,e qualquer modo, ele tinha fornecido aos ma-

temáticos uma novasérie de técnicas e estratégias que eles podiam

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tuosa seria então publicada para permitir que outros tivessem a

oportunidade de examiná-Ia.

o Presente de Aniversário

Embora a batalha de Wilcs eom o problema mais difíeil do IIHIIH.10parecesse condenada a terminar em fracasso, ele podia olhar paraos últimos sete anos e se consolar de que o conhecimento forman-do o bojo do seu trabalho ainda era válido. Para começar, o uso que

Wiles fizera dos grupos de Galois dera a todos uma nova visão doproblema. Ele tinha mostrado que o primeiro elemento de cadaequação clíptica podia ser igualado ao primeiro elemento de umaforma modular. O desafio agoraera demonstrar que, se um elcmentoda equação elíptica era modular, então o próximo deveria ser mo-dular, e todos seriam modulares.

Durante anos Wiles lutara com o conceito de extensão da pro-va. Ele estava tentando completar uma abordagem indutiva e sedebatera com a teoria de Iwasawana esperança de que ela pudessedemonstrar que se um dominó caísse então todos cairiam. Inicial-

mente a teoria de Iwasawaparecera suficientemente poderosa paracausar o efeito dominó necessário, mas no final não corresponderaa suas expectativas. Ele dedicara dois anos de esforços num becosem saída.

No verão deoJ<J<JJ, depois de um ano de frustração,Wilesen-controu o método de Kolyvagin e Flach e abandonara a teoria deIwasawaem favor desta nova técnica. No ano seguinte a demons-tração foi anunciada em Cambridge e ele fora proc1:1maoohrrói.

 

usar para provar outros teoremas. O fracasso deWiles não fora ver-gonhoso c ele estava eomeçamlo a aceitar a idéia de tcr sido derro-tado.

Como commloele queria pelo menos entender por que tinhafracassado. Enquanto 'làylor reexplorava e reexaminava métodosalternativos, Wiles deeidiu passar o mês de setembro examinandouma última ve~a estrutura do método Kolyvagin-Flach, para ten-tar determinar, exatamente, por que ele não estava funcionando.Ele se lembra, vividamente, daqueles últi';uos dias fatídicos. Euestava sentado diante de minha escrivaninha, na manhã da segun-

da-feira, 19 de setembro, examinando o método Kolyvagin-Flach.Não é que eu achasse que poderia fazê-Io funcionar, mas achavaque pelo menos poderia explicar por que não funcionava. Achavaque estava me agarrando nos últimos fios de esperança, mas que-ria me tranqüilizar. Subitamente, de um modo totalmente inespe-rado, eu tive esta incrível revelação.Eu percebi que, embora o mé-todo Kolyvagin-Flach não estivesse funcionando completamente,ele era tudo de que eu precisava para fazer a minha teoria originalIwasawa funcionar. Percebi que tinha o suficiente do métodoKolyvagin-Flach para construir minha abordagem original do pro-

blema nos primeiros três anos de trabalho. Assim, das cinzas deKolyvagin-Flach, parecia surgir a verdadeira resposta para o pro-blema.

fi. teoria de Iwasawa sozillha fora inadequada. O métodoKolyvagin-Flachsozinho também fora inadequado. Mas juntos elesse completavam perfeitamente. Foium momento de inspiração queWiles nunca iria esquecer. Enquanto lembrava esses momentos, a.~...,..-:.  .. , - 1 '

0,0

278 o lJJ:I'IMO TEOHEMi\ DE FEHMi\T UM I'EOUENO PHOIII.EMi\ 279

..

entender como deixara de perceber aquilo e fiquei olhando, des-crente, por vinte minutos. Então, durante o dia, eu caminhei pelodepartamento e ficavavoltando para minha mesa para ver se a so-lução ainda estava lá. Não podia me conter, estava tão empolgado.Era o momento mais importante de minha vida profissional. Nadanunca mais significaria tanto.

Não era apenas a realização de um sonho de infância e o clímaxde oito anos de esforços concentrados, mas, tendo sido levadoàbeira

Propriedades teóricas de anel em certas álgebras deHecke,

por RichardTaylore Andrew Wiles

o primeiro trabalho, mais longo, anuncia uma de-monstração para, entre outras coisas, o ÚltimoTeoremade Fermat, usando o segundo trabalho para um passo

crucia .

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da derrota, Wiles reagira para mostrar sua genialidade ao mundo.Os últimos quatorze meses tinham sido os mais dolorosos, maishumilhantes, o período mais deprimente de sua carreira comomatemático. E agora,uma revelaçãobrilhante trouxera um fim paraseu sofrimento.

'~ssim, na primeira noite eu voltei para casa e dormi. Verifi-quei tudo de novona manhã seguinte e por volta das 11horas fiqueisatisfeito, desci (' contei para minha lllulher. 'Consegui Acho queencontrei ' E foi tão inesperado que ela pensou que eu estava fa-

lando Robrcum brinquedo das crianças ou alguma coisa, c ela dis-se: 'Descobriu o quê?' E eu disse: 'Eu consertei minha demons-

 traçao.

No mês seguinte Wiles pôde cumprir a promessa que não con-seguira manter no ano anterior. Estava chegando novamente oaniversário de Nada e eu me lembrei que da última vez eu não pu-dera lhe dar o presente que ela queria. Desta vez, com um atrasode meio minuto para o nosso jantar, na noite do aniversário dela,cu pude lhe dar o manuscrito completo. Eu acho que ela gostoumaisdesse presente do que qualquer outro que eu lhe dera.

Como a maioria de vocês sabe, o argumento descritopor Wilesem suas palestras em Cambridge revelou umsério erro na construção do sistema de Euler.Depois detentar, sem sucesso, consertar esta construção, Wilesvoltou-se para uma abordagem diferente, que ele tinhatentado anteriormente, mas abandonado em favor daidéia do sistema de Euler. Ele conseguiu completar ademonstração sob a hipótese de que certas álgebras deHecke são interseções locais completas. Isto, e o resto

das idéiasdescritas nas palestras de WilesemCambridge,está escrito no primeiro manuscrito. Conjuntamente,Taylore Wiles estabeleceram a propriedade necessáriadas álgebras de Hecke no segundo trabalho.

o argumento geral é semelhante ao que Wilesdescreveuem Cambridge. A nova abordagem se revelou signi-ficativamente maissimplese curtado quea original,devidoà retirada do sistema de Euler.(Defato, depoisde ver essesmanuscritos,Faltingsaparentemente conseguiu uma novasimplificaçãodesta parte do argumento.)

Assunto: Atualização do ÚltimoTeorema de FermatData: 25 out 1994 11:04:11 Versões destes manuscritos já estavam nas mãos de um

p qu o nútnero de pessoas (em alguns casos) h6algumas semanas. Embora seja prudente manter cautelapor um pouco mais, há razões para otimismo.

Karl Rubin

Nesta manhã dois manuscritos foram divulgados:

Curvas Elípticas Modulares e o Último Teorema deFp.rmot

Epílogo 

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A Grande Matemática Unificada

 hiii'/f,.c.~~fI{' ~J(í0 .J.]I ,

' .' ~ 1' ~ ~~,  ., ~- '~ , t tJ -  1t~.J~ ,f../I. ';. -~ .. Um jovem temerário de Burma

Encontrou provas para o Último Teorema de FermatEle viveu com o terror

De encontrar um erroA prova de Wiles, ele suspeitava, era firme

Fcrnando Gouvca

Andrew Wiles

Desta vez não havia dúvidas quanto à demonstração. Os dois tra-balhos, de 130páginas ao todo, eram os manuscritos matemáticosmais minuciosamente examinados em toda a história c foram pu-blicados noAnnals ofMathematics (maio de 1995).

Novamente Wiles se encontrou na primeira página doNew }1}rk

Times Mas desta vez a manchete Matemático Diz Que EnigmaClássico Foi Resolvido foieclipsada por outra matéria de ciência-  Descoberta da Idade do Universo Cria NovoEnigma Cósmi-co . Enquanto osjornalistas estavam menos entusiasmados com oÚltimo Teorema de Fermat, desta vez, osmatemáticos não tinhamperdido a noção do verdadeiro significado da prova. Em termosm~tpm:'Ít;{' ., rI,, ,~~~ 'n..:-:' r: ..1 '

'I

282 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT

demonstração de Fermat é um grande triunfo intelectual e não sedeve perder de vista o fato de que ela revolucionou a teoria dosnúmeros de um só golpe. Para mim, o charme e a beleza do traba-lho de Andrew é que ele foi um tremendo passo na teoria dos nú-ll1eros.

~IODULAR ELLIPTIC CURVES AND FERMAT'S LAST THEOREM 455

Chapter 1

Os oito anos de suplício de Wiles ligaram praticamente todas asconquistas da teoria dos números do século:xx. e as incorporaram

Th is chapt er i s d ev ot ed to t he s tu dy o f cer tn in Gnloi s r cp re sentnt io ns ,

111tlu ' (irsl, I«,<,tiollW( illtrudll(,c l\Iul stlldy Mmlllr's ddonnatiulI tllI'ory 1\1111d ismss v ar iu us r ct il lcmc ll ts u f i t, Th ese r ct il le lUcnt s w il l b e n eeded l at er t o

mak e p reci se t he cor re sp on dence b etween the u nive rs al d eforma ti on r in gs andth e Hec ke ri llgs in Chn ptcr 2, Th e mn ill res lllts ne('de cl a re Propo siti on 1 .2

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em uma poderosa demonstração. Ele criou técnicas matemáticascOIlIpletamenle lIovase as eombinou COIlltécnicas trauicionais ueum modo que nunca fora considerado possível. E ao fazer isto elecriou novas linhas de ataque para todo um conjuI1tode outros pro-blemas. De acordo com Ken Ribet, a prova é a síntese perfeita damatemática moderna e uma inspiração para o futuro. '~cho que sevocê estivesse perdido em uma ilha deserta e só tivesse este ma-nuscrito, ainda assim teria muita coisa para estudar. Veriatodas asidéias atuais sobre a teoria dos números. Virando uma página veriaa brevc aparição de um teorema fundamental de Dcligne c então,ao virar outra página, casualmente, lá estaria outro teorema deHellegouarch - todas essas coisas apenas invocadas para desem-penhar uma função momentânea, antes de se passar para a idéia

,  segumte.

Embora os jornalistas científicos elogiassem a demonstra-ção de Wiles para o Último Teorema de Fermat, poucos comen-taram a prova da conjectura de Taniyama-Shimura que estavaindissoluvelmente ligada a ela. Alguns se incomodaram de men-cionar a contribuição de Yutaka 'l1l1liyamae Goro Shimura, os

dois matemáticos japoneses que, na déeada de 1950, tinham es-tabelecido as sementes do trabalho de Wilcs. E embora Taniyamativesse cometido suicídio trinta anos antes, seu colega Shimuraestava lá para ver sua conjectura ser provada. Quando lhe per-~untaram sobre sua reação, ante a demonstração, Shim\ln\ sor-riu suavemente c de um modo eontido e digno disse: Eu tinhafalado para vocês.

whirh i'IIIS,',11.1Illl. I'I'I'C' variolls 1(('III'I'IIIi~I'c''UI.IIII , III,HPIll'I'H1111l.hm',' gl'llllpHIIl Id ( l. i) which 11I1.el 'ViII he u seu t u stu uy them. At the eu u of t he scc tiOI 1 werel at e t he se S clmer g ro up s to o nes u sed i l1 t he Bloch-Ka to con ject ur e, b ut t hi scon nect io n i sn o t l 1eed ed for t he p ro of s o fo u r ma in r csul ts ,

lu t ,h (' secolI< lsect io ll Wl' l 'x trud from tI11 .l 'I 'sul ts o f Poi t.ou 111111l lt l' UII

<:lIlois cohulllologr certnin geneml relatiol1s betwcel1 Sehner groups as E varies,a s wel l a s b etween Se lmer g ro up s and the ir d ua ls . Th e mo st impor tant o bser -v at io n o f t h e t hi rd scc ti on i sL emma 1 .1O( i) wh ich g ua rant ec s t he exi st en ce o fth e spec ial p rimes used in Ch apte r 3 a nd ITWJ .

1. Deformations of Galois representations

Let )J be al 1 o dd p rime, Let E b e n fi nite s et of p rimes in clu ding p andlet QE be the maximal extension of Q unramified outside this set and 00.

Throughout we fix an embedding of Q, and so also of QE. in C. We will also

f ix a cho ice o f decomposi tion g roup Dq for all p rimes q in Z. Supp osc th at k

is a finite field of characteristic p and tha t

(1.1) Po:Gal(QEfQ) - GL2(k)

i s an i rr ed uc ib le r ep re sent at io n, I n con tr as t t o t he i nt ro du ct io n wc w il l a .q gume

in the res t o f th e pape l' that Po comes with i ts f ield o f def in it ion k. Supposefnr thcr thnt det 1'0 i s od d. In p artic ular this imp lies t hat t he smallcs t fi eld ofddillitiou for (Jf.1s jl;ivcnby the field ko jl;enernt,ed hy the trace: hllt we willl1ot,  '1. 11111hnt I. = 1.'11.1.,,11«)illlplic's I,IIIILI~IiHIIhHolutely irredllr.ihl... We 1'1111-Hilll'l 1111' r IIIIII,i IIH1,111...C:I AA ..r I~Iill 1.1 ,H.'IIH ..rMm'.lll M I], ThUHir I\'(k) is 1.111'lll ,..r WiLl,Vt'd. I'H..rk, A is tu 1 '1, 1'111111'11'1...  el.heorillllloclIlW(k)'lIlv,..hm wiLh I esidlle lidd I. Clulllxilllnl idcnl m. 111111deforrnntion 11'1i s j ll st 1 \ s t ri et . .q ll ivnl cl )( ,e 1 '11. '1 . o f hen llUl II rph iH lI Is I : GIII(Qj;/Q)

-GL2(A)

sudl t,hllt p lIIod 711= I~.. tw sudl h mnllUlrphisllls hdlll , e..llml strict.ly eCJuiv-..h' lIl. ir lU>c' ' '' ' I , h ul ,hl.1. I.h,' 1.1 ,,,hy c'ulljllK/.LiulI hy 1111OIC'lIIolltofkm' : GL~(A) - GL~(k), We oftel1silllply write I illstend of [pl for theequivalence class, .

----- ~_.- --

( flTt),., 1)\1111 .' ,1,,,  ~/ 1f 1~/,,1,.,...,p   :. . 1..

A primeira página da c cmonRlra<:iio dI' Will 's qlll' foi puhlil 'ada. Ela

l ( ) UI ;I 'IMO ' l'EOHEMA DE FEHMA 'I ' A GRANDE MATEMÁTICA UNIFICADA 285

uma importante repercussão psicológicanosentido de queas pessoasagora scrão capa7.Csdc avançar em outros problemas que as inti-midavam antcs. O panorama mudou, agora sabemos que todas asequações elípticas são modulares e, portanto, quando você provarum teorema para uma eqt,uiçãoelíptica também estará atacando umaforma modular e vice-versa. Temos uma perspectiva diferente do

que está acontecendo e nos sentimos menos intimidados com a idéiade trabalhar com formas modulares porque, agora, basicamente,

comemorar o grande acontecimento. Um dos trahalhos escritos foieste:

 Garçom, minha manteiga está toda escritaOuviu-se o grito durante o jantar, Eu tive que escrever nela ,

Exclamou o garçom Pierre, Não havia espaço na margarina.

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estaremos trabalhando com equações elípticas. E, é claro, quandovocê escreve um artigo sobre equações elípticas, no lugar de dizerque não sabe nada e que tem que presumir averdade daconjecturade Taniyama-Shimura e ver o que pode fazer com ela, agora podedizer que sabemos que Taniyama-Shimura é verdadeira, e por isso,tal e tal tem que ser verdade. É uma experiência muito mais agra-dável.

Através da conjectura de Taniyama-Shimura, Wiles unificaraos mundos elípticos e modulares e ao fazê-Io dera à matemática

um atalho para muitas outras provas - problemas de um domí-nio podiam ser resolvidos por analogia com problemas de umdomínio pamlelo. Problemas clássicos de elípticas, não-resolvidosdesde a Grécia antiga, podem agora ser reexaminados com todasas técnicas modulares disponíveis.

E ainda mais importante, Wiles dera o primeiro passo em dire-ção ao grande esquema de unificação de Langlands. Agora existeum esforço renovado para demonstrar outras conjecturas de uni-ficação entre campos da matemática. Em março de 1996Wiles di-vidiuoscem mildólaresdoPrêmioWolf(nãoconfundir como PrêmioWolfskehl) com Langlands. O Comitê Wolf reconheceu que, em-

bora a demonstração deWiles era uma realização espantosa por sisó, ela dera novavida ao ambicioso projeto de Langlands. Aqui es-tavauma descoberta que poderia levar a matemática para a próxi-ma idade de ouro da solução de problemas.

Depois de um ano de incerteza e embaraço, a comunidadematemática podia afinal comemorar. Cada simpósio, colóquio econferência tinha uma seção devotada à demonstração de Wiles. e

E. Howe, H. Lenstra, D. Moulton

o rêm o

A demonstração deWiles para o Último Teorema depende daveri-ficação de uma conjectura criada na década de 1950. O argumentoexplora uma série de técnicas matemáticas desenvolvidas na últi-ma década, algumas inventadas pelo próprio Wiles. A demonstra-ção é uma obra-prima da matemática moderna, o que leva à con-clusão inevitável de que a demonstração de Wiles para o ÚltimoTeorcma não é a mesma de Fermat. Fermat escreveu que suademonstração não caberia na margem de sua cópia da  ritmética

deDiofante, e as cempáginas de cálculosdeWilescertamente preen-chem este critério,mas seguramente o francês nãoinventou asformasmodulares, a conjectura de Taniyama-Shimura, os grupos de Galoise o método Kolyvagin-Flach séculos antes de todo mundo.

E se Fermat não tinha a demonstração de Wiles, o que é queele tinha? Os matemáticos se dividem em dois grupos. Os céticos

acreditam que o Último Teorema de Fermat foi o resultado de umraro momento de fraqueza do gênio do séculoXVII. Eles afirmamque, embora Fermat tenha escrito eu descobri uma prova maravi-lhosa , ele de fato só tinha uma demonstração equivocada. A natu-reza exata desta prova defeituosa está aberta aodebate, mas é bem

possível que fosse um trabalho na mesma linha dos de Cauchy eLamé.

 

286 o YLTIMO TEOREMA DE FERMAT A GRANDE MATEMÁTICA UNIFICADA 287

Fermat teria uma prova genuína. O que quer que tenha sido estaprova, ela teria sido baseada na matemática do século XVIIe teriaum ar~un1ent()tão astucioso que escapou a todos, de Euler aWilcs.Apcsar da publicação, da solução de Wiles para o problema, exis-tem muitos matemáticos que acreditam que ainda podem ficar fa-mosos descobrindo a demonstração original elcFermat.

Embora Wiles tenha recorrido a métodos do século XXpararesolver o enigma doséculoXVII,ele conquistara o desafio de acordo

rante oito anos, pensava nele o tempo todo - quando acordava demanhã e quando ia dormir dc noite. Isto é um tcmpo muito longopcnsando só cm uma coisa. Esta odisséia particular agora acabou.Minha mente pode repousar.

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com as regras elocomitê Wolfskehl. No dia 27 de junho de 1997,Andrew Wiles recebeu o Prêmio Wolfskehl no valor de 50mil dóla-

res. O Último Teorema de Fermat fora oficialmente provado.Wiles compreende que para dar à matemática uma de suas

maiores demonstrações, ele teve que privá-Ia de seu maior enig-ma. ~pessoas me dizem que eulhestirei seu problema eme pedemque lhes dê alguma outra coisa. I-láum sentimento de melancolia.Perdemos algoque estavaconosco hámuito tempo e uma coisa queatraiu muitos de nós para a matemática. Talvezseja sempre assim

com os problclll:H,damatemática. Ielllos que encontrar novosparacapturar nossa atenção.

Mas o quc vaicapturar a atenção de Wilcs agora? Para um ho-mem que trabalhou em completo segredo durante sete anos, não ésurpreendente que ele se recuse a comentar sua pesquisa atual, maso que quer que seja, não há dúvida de que nunca vai substituir oÚltimo Teorema de Fermat. Não existe outro problema que sig-nifique o mesmo para mim. Esta foi a paixão da minha infância.Nãohá nada que possa substituí-Ia. Eu resolvio problema, voutentaroutros, com certeza. Alguns deles serão bem difíceis e eu terei denovoo sentimento de realização, mas não existe outro problema

namatemática que possa me envolverdomodo como Fermat o fez.Eu tiveo raro privilégio de conquistar, em minha vida adulta,

o que fora o sonho da minha infância. Sei que este é um privilégioraro, mas se você puder trabalhar, como adulto, com algo que sig-nificatanto para você, isto será mais compensador do que qualquercoisa imaginável. Tendo resolvido este problema, existe um certosentimento de perda, mas aomesmo tempo há uma tremenda ~en-

 

_.--. -- ..~;:::I;;

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II ; ~ ..

-; .I

ji...1

I~I

 pêndice 1: A emonstração do Teorema de Pitágoras

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x

x

x 1::Y

y

y y x

o objetivoda demonstração é mostrar que o tcorcrna de Pitágorasé vcrdadeiro para todos os trifmgulos rctângulos. O triângulo mos-trado acima pode ser qualquer triângulo retângulo porque o com-primento de seus ladosnão é especificado, sendo representado pelasletras x, y c z.

Também na figura acima, quatro triângulos retângulos idênti-cos são combinados com um quadrado inclinado uc modo a cons-truir um quadrado grande. É a área deste quadrado grande que setornará a chave da demonstração.

A áreado quadrado grande pode ser calculada de duas maneiras.

Método 1: Medindo a área do quadrado grande como um todo. Ocomprimento de cada lado é x + y. Portanto, a área do quadradogrande =  x + y 2.

Método 2: Medindo a área de cada elemento do quadrado grande.AáreadeeadatriHnrl'l1lop . ...,. nl1~f'i~l I. h. ..ll1 .~,., 1..

292 o ÚLTIMO TEOHEMA DE FEHMATAI'RNJ>ICES 293

área do quadrado grande =4 x (área de cada triângulo) + áreado quadrado inclinado =4 ( ixy + Z2. Apêndice 2: A Demonstração de' Euclides de

que.fi é IrracionalOs métodos 1 c 2 produzcm cxpressões diferentes. Contudo,

estas duas expressões devem ser equivalentes, porque elas repre-sentam a mesma área. Portanto,

O objetivo de Euclides era mostrar que a .fi não poderia ser escri-

ta como uma fração. Como ele estava usando o método da provapor contradição, seu primeiro passo era presumir que o oposto fossea área do Método 1 = a área do Método 2

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\'

I

I tI

\~

verdade, ou seja, que a .fi pudesse ser escrita como alguma fraçãodesconhecida. Esta fração hipotética é representada por p/q, ondep e q são dois números inteiros.

Antes de começarmos a demonstração propriamente dita, tudode que precisamos é um entendimento básico de algumas proprie-dades das frações c dos nÍlmcro pares.

 x + )')2 =4( ~ xy + :;::2.

Os parênteses podem ser expandidos e simplificados. Portan-to,

X2+ y2 + 2xy = 2xy + Z2.

( )s 2xy podclII scr callcelados elll alllhos os laum;. E a~~illl le-mos:

(1) Sevocêpegar qualquer número e multiplicá-Io por 2, entãoo novo número deverá ser par. Esta é praticamcnte a definição de

um número par.(2) Sevocê sabe que o quadrado de um número é par, então opróprio número também deve ser par.

(3)Finalmente,asfraçõespodemsersimplificadas:~~ éamesmacoisaque 1~'bastadividirapartede cimae apartede baixode ~~pe-lofatorcomum2.Portanto,. é amesma coisaque ~,e, por suavez, ~é

, 2 C12

d 2 - d ,.l'f'

da mesma COlsaque '3. ontu o, ' 3 naopo e ser mais slmp I lca oporque 2 e 3 não possuem fator comum. E impossível continuar sim-plificando uma fraçãopara sempre.

x2 + y2 = Z2,

que é o teorema de Pitágoras

o argumento ébaseado no fatode que a áreado quadrado grandedeve ser a mesma, não importa que método possa ser usado paracalculá-Ia. Quando derivamos logicamente duas expressões para amesma área, e as tornamos equivalentes, a conclusão inevitável é

que x2 + y2 = z2, ou seja, o quadrado da hipotenusa Z2 é igual à

soma dos quadrados dos catetos, x2 + y2.Este argumento se mantém verdadeiro para todos os triângu-

los retângulos. Os lados do triângulo em nosso argumento foramrepresentados por x, y e z, e portanto podem representar os ladosde qualquer triângulo retângulo.

Agora, lembre-se de que Euclides acredita que a fi não pode

ser escrita como uma fração. Contudo, como ele adota o métododa prova por contradição, ele trabalha presumindo que a fraçãop/qexiste e então explora as conseqüências de sua existência:

fi =p/q,

Sc f'1('\,r~1. \ C' . 1 1... .I .

294 o ÚI:rIMO TEOREMADE FERMAT Al,j1;NDICES 295

2 =pZ / qZ.

lil =pZ.

fração,digamose/f, será ainda mais simples. Podemos repetir oprocessoinfinitamente.Masnóssabemos,peladeclaração(3),queuma fraçãonão pode ser s~plificada para sempre. Devesempreexistir uma fraçãomais simples. Masnossa fraçãohipotética ori-ginalp/q nãoparece obedecera esta regra.Portanto,podemosdi-zer que chegamos a uma contradição. Se a fi puder ser escrita

como umafração,entãoasconseqüências seriamabsurdas e podemosdizer, com certeza, que a.J2 não.pode ser escrita como uma fra-

Esta equação pode ser rearrumada facilmente para dar:

Agora, do princípio (1) nós sabemos que pZdevc ser um nÚme-ro par.Além disso, do que foi dito em (2), nós sabemos quep tam-

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ção.Portanto, a .J2 é um número irracional.bém deve ser par. Mas se p é par, então ele pode ser escrito como2111,nde 1Jlé outro número inteiro qualquer. Isto segue o que foidito em (1). Coloque tudo de voltana equação e temos:

2qZ =  2m Z = 4mz.

Dividindo ambos os lados por 2, conseguimos

qZ= 2m2.

Ma ; , I '( 'I II \ I IIC' \ II II II I a ' ~I II II ('1 I1 1I1I11 '1 I' 1 11 \: 11 11 11 :1 :1 11 1( '1 1, I IÓ :, 1 1:11 11 '

IIlOSque t/ ueve ser par, e assim o próprio q deve ser par. Se foreste o caso, então q pode ser escrito como 2n, onde n é algum ou-tro n(lInero inteiro. Se vÓltarmos ao início, então

.J2 =p/q = 2m/2n.

o 2m/21lpode ser simplificado dividindo o numerador e o de-nominauor por 2, c assim obtemos

.J2 = m/no

Agora temos uma fração m/n, que é mais simples do que p/q.

Contudo, agora nos encontramos em uma posição onde podemosrepetir exatamente o mesmo processo em m/n e no final podere-mos produzir uma fração ainda mais simples, chamada fI/h. Esta

296 o ÚI: I IMO TEOHEMA DE FEHMATAI t::NIJlCEH 297

 pêndice 3: O Enigma da Idade de Diofante pêndice 4 : O Problema dos Pesos de achet

1/6 de sua vida,L/6, ele passou como menino,

Para pesar qualquer número inteiro de quilogramas de 1 a 40, amaioria das pessoas vai sugerir que são necessários seis pesos: I,2,4,8, 16,32 kg. Deste modo, todos os pesos podem ser obtidos

colocando as seguintes combinações em um dos pratos da balança:.

Vamos chamar de L a duração davida de Diofante. Da charada te-mos um registro completo davidade Diofante, que é o seguinte:

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L/12 ele passou como rapaz,L 7 foi o período ~ntes dele se casar,5 anos depois seu filho nasceu,L/2 foi o tempo de vidade seu filho,4 anos ele sofreu antes de morrer.

1kg=12kg=23kg = 2 + 14kg= 45kg= 4+1

A duração davida de Diofante é a soma do que foi dito acima:

T, L L [.

{ =(;+12+7+5+2 +4.

t\Okg J2 -I, X.

25L= 28L 9,

Contudo, se colocasse pesos em ambos os pratos da balança,de modo que alguns pesos pudessem ficar junto do objeto sendopesado, Bachet podia completar a tarefa usando apenas quatro pe-sos: 1, 3, 9, 27 kg. Um peso colocado no mesmo prato do objetosendo pesado assumc, efetivamente, um valor negativo. Assim ospesos podem ser obtidos como se segue:

Podemos então simplificar esta equação como se segue:

,;

3

28L =9,28

L=3x9=84.

1kg= 12kg=3 - 13kg= 3

4kg = 3 + 1Skg= 9 - 3 -1,iofante morreu com a idade de 84 anos.

40kg = 27 + 9 + 3 + 1.

~

298 ,o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT

Apêndice 5. A p emonstração de Euclides de queExiste uln N úmcro Infinito de lHos Pitag6ricos

Um trio pita~óricoé um conjunto de três nÚmeros inteiros, de modoque um número ao quadrado, somado com o outro número aoqua-

drado, seja igual ao terceiro número ao quadrado. Euclides pôdeprovar que existe um número infinito desses trios pitagóricos.

 

II

I

APtNDlCES 299

Apêndice 6: Perdendo-se no Absurdo

Eis uma demonstração clássica de como é fácil começar com umadeclaração bcm simples c depois de alguns passos aparentementelógicos e diretos mostrar que 2 = 1.

Primeiro vamos começar com uma declaração inócua

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A prova de Euclides começa com a observação de que a dife-rença entre quadrados sucessivos é sempre um número ímpar:

F 22 32 42 52 62 72 82 92 102...

1\ /4\ /9\ /16\ /25\ /36\ /49\ /64\ /8\ )00...3 5 7 9 11 13 15 17 19 ...

Em outras palavras,cada um dos infinitosnúmeros ímpares pode

ser somado a um número aoquadrado para criar outro número aoquadrado. lima fraçãodcsscH11\Ímerosmparcs podc ser eles mcsmosao quadrado, mas a fração do infinito também é infinita.

Portanto,existe uma infinidade de ímpares aoquadrado que podeser somada a um quadrado para criar outro número ao quadrado.Em outras palavras, deve existir um número infinito de triospitagóricos.

: 11,

J~

 111\

I~I~I

n

\

a = b.

Então multiplicamos ambos os lados por a, obtendo

a2 = ab.

Então somamos ll l - Zab a ambos os Ia<Jos:

02 + 02 - 20b = ob + 07.- 2ab.

Isto pode ser simplificado para

2 a2-ab) =a2-ab

Fin almentc, di vidimos ambos os lados por 02 - ab c obtemos

2 = 1.

A declaração original parece ser, e é, totalmente inofensiva,mas em algum ponto da manipulação da equação ocorreu umerro sutil, mas desastroso, que leva à contradição na declaraçãofinal.

De fato, o erro fatal aparece no último passo no qual ambos oslados são divididos por a2- ab. Nós sabemos, da declaração origi-~ t ,~ r. .,. . f. ?, , .. 4. .

JOO (I l 'II:I'II'vIO 'l'EOHEMA DE FEHMA'I' AI'Í1:NDICES 301

E dividir qualquer coisa por zero é um passo arriscado, porquezero irá aoinfinito um infinito número de vezes. E aocriar o infi-nito em ambos os lados, nós efetivamente destruímos ambas asmetades da equação, permitindo que uma contradição entrasse emnossO argumento

Este erro sutil é o tipo de coisa que pegou muitos dos concor-rentes ao Prêmio WoUskeh1.

  pêndice 7: Carta sobre o Prêmio Wo fskehl

o Dr. E Schlichting foi responsável pela avaliação dos candidatosao PrêmioWolfskehl na década de 1970.Esta carta foi escrita para

Paulo Ribenboim e foi publicada em seu livro 13Palestras sobre oÚltimo Jeoremade Fermat dando uma perspectiva única do traba-lho do comitê WoUskehl:

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<,

Prezado Senhor

O número total de soluções apresentadas até agora aindanão foi contado. No primeiro ano (1907-1908),621 soluçõesforam registradas nos arquivos daAkademie e hoje temos 3metros de correspondência armazenados sobre o problema deFermat. Nas últimas décadas, temos lidado com isso da se-~lI intc mancira: o sccre tár io da /Jluult ,it. divide OHIIHIIIIIS-

critos liue chegam CIOduas categorias:(1) Absurdo completo, que é enviado de volta imediata-

mente.

(2) Material que parece matemática.A segunda parte é enviada ao departamento de matemá-

tica e láo trabalho de leitura, descoberta deerros e resposta édelegado a um dos assistentes científicos (nas universidadesalemãs estes são indivíduos graduados trabalhando para ob-ter seu Ph.D.) - no momento eu sou avítima. Existem 3 ou4 cartas para responder todo mês e isto inclui um bocado dematerial engraçado e curioso, por exemplo, um sujeito man-dou a primeira parte da demonstração e promete a segundase pagarmos mil marcos adiantados. Outro me prometeu 1do lucro que vai ter com a publicação e as entrevistas para orádio e a TV depois que ficar famoso, desde que eu o apóieagora. Caso contrário ele ameaça enviar seu trabalho para umdepartamento dematemática da Rússia de modo a privar-nos

 

302 o ÚLTIMO TEOREMA DE FERMAT 303PÊNDICES

 u ~c todagagu~oluçõe~ ão cscrila~num nívclllluito

elementar usando noções de matemática do ginásio e talvezalguns trabalhos não-digeridos da teoria dos números), masi~ opo k ser Iwmcomj)licndodc cntcndcr. SocialmcntcOHCélll-

didatos são pessoas com uma educação técnica, mas uma car-

reira fracassada, e tentam obter sucesso com a demonstraçãodo problema de Fermat. Eu entreguei alguns manuscritos para

médicos que diagnosticaram uma esquizofrenia aguda.Uma dascondições dotestamento deWolfskehlera de que

Apêndice Os Axiomas da Aritmética

Os seguintes axiomas são tudo o que se necessita como base daestrutura elaborada da aritmética:

1.Para quaisquer números me 11

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a A/wdemie deveria publicar o anúncio do prêmio todos os

anos nos principais periódicos sobre matemática. Mas depois

dos primeiros anos,.osperiódicos passaram a se recusar a pu-blicar o anúncio, po.rqueeles ficam atulhados de cartas e ma-nuscritos malucos.

Espero que esta informação seja do seu interesse.

m + 11 = 11 + m e mil = 11m.

2. Para quaisquer números 11l,n e k

 m + 11)+ k = m + 11+ k e  ml1 k= m nk .

Sinceramente,F.Schlichting

3. Para quaisquer números m, 11e k

m n + h = 11m+ mh.

4.Existe um número Oque possui a propriedade dc quc, para qual-qucr llí ll llCro li,

11+ O= 11.

5.Existe o número 1que tem a propriedade de que, para qualquernúmero ll,

11X1 = n.

6. Para cada número n, existe outro número k tal que

n + k =O.

7. Para quaisquer números m, n e k

304 o lJl :rI \IO TEOHEMA DE FEHMAT AI'I~:NDIC'ES 305

A partir dc~sc~axiomas outras rcgras podcm scr demonstra-

das. Por exemplo,aplicando-se rigorosamente os axiomas e presu-

mindo-se nada mais, nós podemos provar rigorosamente a regra

aparentemente óbviade que

Apêndice A Teoria dos Jogos e o Truelo

Vamos examinar as opções do Sr. Black. Primeiro, o Sr. Black pode

atirar no Sr. Gray. Se ele acertar, então o próximo tiro será dado

pelo Sr.White. O Sr.White só terá então um oponente, o Sr.Blaek,

e eomo o Sr.White é um atirador perfeito, o Sr.Blaek será um ho-mem morto.

A melhor opção para o Sr. Black é atirar no Sr. White. Se cle

acertar, o próximo tiro será dado pelo Sr. Gray. Mas o Sr. Gray só

se 11l+ k = n + k, então 11l= n.

Para começar podemos declarar que

m+k=1l+k.

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11l+ O= n + O.

acerta seu alvoduas vezes em cada três, e assim o Sr. Black terá

uma chance de sobreviverpara atirar no Sr. Gray e vencer o truelo.

Pareee que a segunda opção é a estratégia que o Sr. Black deve

adotar.Contudo, existeuma terceira opção,ainda melhor.O Sr.Black

deveatirar no ar. O Sr. Gray é o próximo a atirar e elevai dispararcontra o Sr.White, porque ele é o inimigo mais perigoso. Se o Sr.

White sobreviver, ele vai atirar no Sr. Gray, porque Gray é seu ini-

migo mais poderoso. Ao atirar no ar, o Sr. Black está permitindoque o Sr. Gray elimine o Sr. White e vice-versa.

Esta é a melhor estratégia do Sr. Black.Finalmente, o Sr. Grayc o Sr. Whitc morrerão e então o Sr. Blackpoderá apontar contra

aquele que sobreviver.O Sr. Black manipulou a situação de modo

que, em vez de ser o primeiro a atirar num truelo, ele passa a ser o

primeiro a atirar num duelo.

Então, pelo axioma6, façamos I ser um número tal que k + I =0,assim

 m+ k + I =  n+ k + I.

i;I

Então, pelo axioma 2,

m +  Il+ I = 1l+  h + I .

Tendo-se ém mente que h + I = 0,nós sabemos que

E aplicando o axioma 4 nós podemos finalmente declarar o quenos propusemos a demonstrar:

11l= n.

I'I

 

306 o ÚI: rIMO TEOREMA DE FERMAT API~NDICES 307

I80ma(11) == 211 11 + 1),

A }êndice 10 Um Exemplo de Prova por Induçãoentão:

Osmatemáticos acham útil ter fórmulas que lhes dêem a somadosnÍlmeros m um lista.Neste casoo desafioé encontrar umafór-mulaque nos dê a soma dos primeiros números naturais n.

Porexemplo, a soma doprimeiro número é 1,a soma dos pri-meiros dois nÚmeros é 3 (ou seja, 1 + 2), a soma dos primeiros

t rês números é 6 (1+ 2.+ 3)e a somados primeiros quatro núme-ros é 10 (1 + 2.+ 3 + 4), e assim por diante.

Soma Il + 1) == Soma  Il +  Il + 1)I

80ma(11 + 1) == 211(11 + 1) +  1l+ 1).

Depois de rearrumarmos e reagruparmos os termos da direita,nós teremos

80ma n + 1) ==~  1l+ 1) [ 1l+ 1) + 1].

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Amelhor fórmula que parece descrever este padrão é:

180ma(11) == 2 11 n + 1).

É importante notar aqui que a forma desta novaequação é exa-tamente a mesma da equação original, exceto que cada 11foi subs-tituído por  11+ 1).

Em outras palavras, se a fórmula é verdadeira para 11,então elatambém deve ser verdadeira para 11+ 1.8e umdominócai,elevaiderrubar o seguinte. A prova por indução está completa.

Em outras palavras, se queremos encontrar a soma dos primeiros1lnúmeros, então basta colocar o número na fórmula acima e cal-

cular a resposta.A prova por indução pode mostrar que esta fórmula funciona

para cada número até o infinito.

O primeiro passo é mostrar que a fórmula funciona para o pri-meiro caso, 11==1. Isto é algo razoavelmente direto, porque nós

sabemos que a soma do primeiro número é 1, e se entrarmos com11 == 1 na fÓrm IIla ohtemos () resultado correto:

. I

Soma(11) == 2 n 1l + 1)

50ma(I)== ~xlx(1 +1)SlI lIIa(l) == ~ x I x 280ma(l) == 1.

o primeiro JOlllilló foi derrubado.

O próximo passo de uma demonstração por indução é mostrarq\ IC,se a f(írnlllla éverdadeira para qualquer valor 11,então elatamhémdeve ser verdadeira para n + 1. Se

Sugestões para Leituras Posteriores 

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Aopesquisar para este livro,usei numerosos livrose artigos. Alémdas fontes principais para cada capítulo, listei outros materiais quepodem ser de interesse tanto doleitor emgeral quanto dos especia-listas no assunto. Quando o título não indica a importância, eudescrevo seu conteúdo em uma ou duas frases.

1. Y\cho que Vou Parar por Aqui

/ lu l asl I robtcm E. I: Bcll , 19CJO,Mathcmatical Associatioll ofAmeriea. Um relato popular das origens do Último Teoremade Fermat.

Pythagoras - A Short Account of His LiJe and Philosophy LcslieRalph, 1961,Krikos.

Pythagoras-ALiJe Peter Gorman, 1979,Routlcdge e Kegan Paul.A History of GreekMathematics VaIs.1e 2,SirThomas Heath, 1981,

Dover.

Mathematical Magic Show Martin Gardner, 1977, Knopf. Umacoleção de enigmas e charadas matemáticas.

 River meandering as a self-organization proccss , Hans-HcnrikStolul1I,Scic/lce Z71 (1996), 1.710-1.713.

/

 

310 o ÚI: l' l~IO TEOREMA DE FERMAT SUGESTÕES PARALElTUIV,S POSTEIUOHES

311

2. O Criador de Enigmas  Note au sujet de Ia démonstration du théoreme de Fermat ,G. Lamé, C.R. Acad. Sei. Paris  4 (1847), 352.

 Extrait d'une lettre deM. Kummer à M.Liouville , E.E. Kummer,J. Math Pures etAppl.   (1847), 136.Reimpresso em Collected

Papers,VoI.I, editado por A.Weil, 1975,Springcr.

'/'l1eMalf/('llwLicalc..'areerof Pierre de Fermat, Miehacl Mahoney,  994Princeton Univcrsity 'Press. Uma investigação detalhadadavida e do trabalho de Pierre de Fermat.

../rchill/('de.\'R('7)('lIg('. aulTIoHman,1988,Pcnguin. 11stórias fas-cinantes que descrevem as alegrias e os perigos da matemá-tica.

4. Mergulho naAbstração

3. Uma Desgraça Matemática3.1416 andAll That, P.J. Davis e W.G. Chinn. 1985,Birkhãuser.

Uma série de histórias sobre matemáticos e matemática, in-

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cluindo um capítulo sobre PaulWolfskehl.ThePenguin Dictionary of Cun'ousand blteresting Numbers, David

Wells, 1986, Penguin.The Penguin Dictionary of Curious and Interesting Puzzles, David

Wells, 1992, Penguin.Sam Loyd and his Puzzles, Sam Loyd(II), 1928,Barse and Co.Mathematical Puzzles ofSam Loyd, SamLoyd, editado porMartin

Gardner, 1959,Dover.Riddles inMathematics, Eugene P.Northropp, 1944,VanNostrand.13 Lectures 011Fer11lat'sLast Theorem, Paulo Ribenboin, 1980,

Springer. Um relato sobre o Último Teorema de Fermat escri-to antes do trabalho deAndrewWiles c destinado aos estudan-ks dc p6s-~radllação.

 vJalllClllalic.\','/'lU'Scicl/cCo/I'allcrl/s, Kcith Dcvlin, Jl)'J4,l'cnguin.Uma visão popular e detalhada da matemática moderna, inclu-indo uma discussão sohre os axiomas da matemática.

nw COIu.:epls/Mudem Malhemalics, lan Stewart, J995,Penguin.PrincipiaMathematica, Bertrand Russell eAlfredNorthWhitchead,

3 volumes, 1910, 1912,1913, Camhrid~e University Prcss. Kllrl (;iidcl , (;. Krciscl, MCIll{II iashiográficas dos Illcmhros da

Royal Society, 1980.A Mathematician's Apology, G. H. Hardy, 1940, Cambridge UnivcrsityPrcss. Uma das ~randcs figuras da matemática do século XXdá seu relato pessoal sobre o que o motiva c aos outros matc-máticos.

Mell ofMallzematics, E.T Bell, Simon and Schuster, 1937.Biogra-fiasdosmaioresmatemáticos dahistória,incluindoEuler,Fermat,Gauss, Cauchy e Kummer:

 The periodical cicada problem , Monte,Lloyd e Henry S. Dybas,Evolutioll 20 (1966), 466-505.

Uiómen inMathe11latics,LynnM.Osen, 1994,MIT Press. Um lon-go texto, não matemático, contendo as biografias de muitas dasprincipais mulheres matemáticas da história, incluindo Sophie

Germain.Malh Equals,' Biographies of WomenMathematicians+Related

Activities, Teri Ped, 1978,Addison-Wesley.l/liólllenil1Sciellce, 11.J. Mozans, 1913,D. Arrlcton and Co. Soph ie ( ;cn liai11 /\IIIYI)ahall I)allllédico, Sci('1I1/h/lU'11/1/('11('(//1.

Dczembro 1<)1). Um artigo curto dcscrevendo a vidac o traba-lho de Sophie Germain.

'''' 'rmal [.asl TIU'()1'('lII -11 Gel/elic [lllroduclioll 10A/gebraic

NU11lberTheory, l-Iarold M. Edwards, 1977, Springer. Umadiscussão matemática sobre o Último Teorema de Fermat,incluindo detalhes de al~II,n;ls das pr,illwiras IClllativasparati c 111011 tn't-lo.

E'le1llelltary NU11lberTheory, de David Burton, 1980, AllynBacon.

 Various communications , por A.Cauehy, C.R. Acad. Sei. Paris

24 (1847),407-416,469-483.

312 o (JI :1 1MO TlmllEI\1A IIE FERMAT SUGESTÕES 1 i\1ü\LEITU(ü\S I OSTEIlIOnES 313

  //011 /}/J il/; :: / fU 1 :lIigll/lI Of J/I/l IIigcm:c 1\ndrcw lIodgcs, 1<)~3,

Unwin Paperbacks. Um relato da vida de Alan Turing, incluin-do Sua contribuição para a quebra do código Enigma.

 Ring-theoretics properties of eertain Hecke algebras , RichardTaylore AndrewWiles,A1l1wlsof Matlzematics  42 (1995),553-572.Este artigo descreve a matemática que foi usada para con-sertar as falhas na demonstração deWiles de 1993.

5. Provapor Contradição

 VutakaTaniyama and his time , Goro Shimura, Bulletin of the

Londo1l Mathematical Society 2 (1989),186-196. Um relatobem pessoal da vida e do trabalho de YutakaTaniyama. Links betwcen stable ellipctic curves and certain diophantine

Epílogo: A Grande Matemática Unificada

 ~ elementary introduction to the Langlands program , StephenGelbart, Bulletin oftheAmerican MathematicalSociety  (1984),177-219.Uma explicação técnica do programa Langlands des-

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7/22/2019 O Último Teorema de Fermat- Simom Sighs

http://slidepdf.com/reader/full/o-ultimo-teorema-de-fermat-simom-sighs 156/156

equations , GerhardFrey,Anil. Univ.Sarav.Math. Ser. 1(1986),1-40.O trabalho crucial sugerindo uma ligaçãoentre aconjecturade l1miyama-Shimura e o Último Tcorema de Fermat.

tinada a pesquisadores da matemática.

6. Os Cálculos Secretos

 Gcnius and Biographers; the Fictionalization of Evariste Galois ,1: Rothman, AmeI: Math. Monthly 89 (1982), 84-106. Contém

uma lista deialhada das fontes históricas por trás das biogra-f ias de Galois e discute a validade das várias interpretações.

.. La vie d Evariste Galois , Paul Depuy, A1l1lales Scie1ltifiques de

l Ecole Normale Supérieure  3 (1896), 197-266.Mes Mémoires 1\1exandreDumas, 1967,Editions Gallimard.Notes 011Fennat sLust Theorem Alfred van der Poorten, 1996,Wiley.

Uma descrição técnica da demonstração de Wiles destinada aestudantes de matemática não-graduados.

, I

(.7. Um Pequeno Problema

 Modular eliptic curvesand Fermat sLast Theorem , AndrewWiles,AnuaIs of Mathematics  42 (1995), 443-551. Este artigo incluia maior parte da demonstração de Wiles da conjectura deTaniyama-Shimura e do Último Teorema de Fermat.

 I