Ob, o fruto sagrado dos orixs e a Bioqumica do CandomblApresento aqui alguns fragmentos de um artigo muito interessante, que discute a Lei Federal 10639/03 sob a tica da Bioqumica e do Candombl. Quem se interessar segue ao final o link para leitura, em pdf, do artigo na integra.A Bioqumica do Candombl Possibilidades Didticas deAplicao da Lei Federal 10639/03Patrcia F. S. D. Moreira, Guimes Rodrigues Filho, Roberta Fusconi, Daniela F. C. Jacobucci

Obi (Cola sp.) Foto de Reginaldo Fernandes de MeloPreservar, cuidar e manter a fauna e a flora condio fundamental para os participantes dessa manifestao cultural. Os ritos e rituais so propiciados por meio de folhas, banhos de guas naturais e por partes de animais consagrados aos orixs. Ewe orix, orix ewe sem folhas, no h orixs, e sem orixs, no h contato com o sagrado, assim como com as guas das cachoeiras, dos rios, dos igaraps, do mar; a fortaleza das pedreiras; a biodiversidade das florestas. Enfim, podemos afirmar que a religio dos orixs est ligada preservao da natureza que parte fundadora da constituio dos seres (Botelho, 2010). Esses rituais envolvem adivinhao, banhos de cura e incensos, nos quais necessrio o uso de plantas para mediar a comunicao com os guias espirituais.

Cola acuminata- Ob (Ioruba), V (Fon)/ noz de cola. Jardim Botnico do Rio de JaneiroOs negros africanos, apesar de terem perdido parte de sua cultura, introduziram no Brasil elementos relacionados sua religio e sua medicina. Entre esses elementos esto espcies de plantas consideradas pelos iorubs e pelos seus descendentes no Brasil de primordial importncia nos rituais de iniciao em cerimnias tradicionais.A noz-de-cola, que tem uso sacro na frica Ocidental, no Brasil, tem uso sagrado no candombl, na qual conhecida comoobi(seu nome iorub). Para a mitologia iorubana preservada no Brasil na cultura religiosa dos terreiros, os orixs retornam terra tomando o corpo dos devotos mortais. Nos rituais de preparao, entre outras coisas, utilizado oobi(Prandi, 2005,apudFusconi e Rodrigues Filho, 2009).Dentre as vrias espcies de plantas utilizadas nesses rituais, falaremos sobre a noz-de-cola e suas aplicaes na Qumica em aulas do ensino mdio, apontando possibilidades para o cumprimento da lei federal 10.639/03. Como exemplo, contextualizamos como a cafena est presente em nosso cotidiano classificada como estimulante em diversos produtos, que tambm est presente na noz-de-cola e que possui um significado na cultura africana e afro-brasileira.

Cola acuminata/ Florao do obiA cafena. Esta est presente em bebidas de uso comum como chs, caf e refrigerantes. Paralelamente encontrada em vrios produtos alimentcios, farmacuticos e cosmticos. Os principais efeitos fisiolgicos da cafena no organismo humano so: o efeito estimulante, o diurtico e a dependncia qumica. A cafena aumenta o metabolismo e, temporariamente, a concentrao e a energia. Seus efeitos no consumo moderado so o relaxamento da musculatura lisa dos brnquios, do trato biliar, do trato gastrintestinal e de partes do sistema vascular. Afeta tambm a reparao do DNA ao inibir a ao de protenas. A cafena pode ser detectada em todo o corpo humano cinco minutos aps o consumo e atinge a concentrao mxima aos 20-30 minutos. metabolizada no fgado e tem uma meia vida de cerca de 3-6 horas. Quando ingerida em excesso, pode causar vrios sintomas desagradveis, incluindo irritabilidade, dores de cabea, insnia, diarreia e palpitaes do corao.A cafena (1,3,7-trimetil-3,7-dihidro-1H-purina-2,6-diona) faz parte da famlia dos alcaloides, mais precisamente as metil-xantinas. Outras metil-xantinas importantes so a teofilina (3,7-dihidro-1,3-trimetil-1H-purina-2,6-diona) e a teobromina (3,7-dihidro-3,7-trimetil-1H-purina- 2,6-diona). A teobromina (encontrada tambm no chocolate) e a teofilina so duas dimetil-xantinas, com dois grupos metil, em contraste com a cafena, que possui trs grupos metil.

Metil xantinas importantesAs nozes-de-cola so as sementes das rvores do gneroCola sp., nativas das florestas da frica Ocidental. Na composio qumica, elas contm, juntamente com outros compostos, grandes quantidades de cafena e menores quantidades de teobromina, colatina e glicose. Todos esses so estimulantes: a cafena afeta o sistema nervoso central, a teobromina ativa os msculos esquelticos, a colatina atua sobre o corao e a glicose fornece energia para o corpo como um todo (Lovejoy, 1980). Segundo a ANVISA (2009), a noz-de-cola possui principalmente em sua composio cerca de 1,7% de taninos totais e 2,0% de cafena.

P de Obi (Jardim Botnico do Rio de Janeiro)A noz-de-cola foi introduzida nos pases sul-americanos na poca do comrcio de escravizados africanos no sculo XVII.Na Europa, nas Amricas e na frica Ocidental, as sementes so utilizadas na produo de diversas drogas farmacuticas, vinhos e licores (Nienmenak et al., 2008). A bebida mais famosa feita base de extrato de noz-de-cola a Coca-Cola.A noz-de-cola no Brasil pode ser encontrada na mata atlntica, assim como em casas de folhas e feiras-livres na forma de extratos e/ou desidratada. conhecida popularmente entre os pais de santo e mes de santo como obi ou orob e utilizada para fins litrgicos.Segundo Almeida (apudPires et al., 2003), a lgica do sistema etnobotnico do candombl tem fundamento num culto que associa prtica religiosa um esforo teraputico. Os babalorixs e yalorixs (sacerdotes), portadores de conhecimento etnomdico, prescrevem o uso das folhas, razes, sementes e cascas para fins medicinais, banhos e outros propsitos ritualsticos relacionados a orixs especficos.A noz-de-cola (cola acuminataR. Br.) possui ao psicoativa graas ao dos alcaloides cafena e teobromina que agem no sistema nervoso central, melhorando a fadiga, aclarando as ideias e aumentando o estado de viglia. No jogo de adivinhao (jogo de bzios), so utilizadas as nozes como mastigatrio para, segundo os informantes, dar fora s palavras (Camargo, 1999).OBS: A lei federal 10639/03 determina a obrigatoriedade do ensino de histria e cultura africana e afro-brasileira nas escolas. Essa lei foi alterada pela Lei 11.645 de 10 de maro de 2008, passando a incorporar tambm a histria e a cultura dos povos indgenas.