Obli março-maio 2014

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P. 16 P. 4 Publicação trimestral | Este jornal sai juntamente com a Edição n.º 752 do Barcelos Popular e não pode ser vendido separadamente. Edição 0.4 MARÇO 2014 MAIO 2014 Jornal Jovem Barcelense Flora Miranda, Bruno Gomes e Tiago Araújo contam ao Obli como foi participar num talent show, o antes e o depois, e ainda como foi o processo até lá chegarem. Os três barcelenses deixam também conselhos para os mais novos. Em cena| «O teatro é uma paixão, uma paixão enorme» Num concelho (re)conhecido pela tradição teatral, o teatro faz-se sobretudo de amadores. O Obli procurou perceber o que motiva quem sobe ao palco apenas por prazer e em que condições o fazem. Caça-talentos a experiência dos barcelenses no pequeno ecrã

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Edição 0.4 MARÇO 2014

MAIO 2014

Jornal Jovem Barcelense

Flora Miranda, Bruno Gomes e Tiago Araújo contam ao Obli como foi participar num talent show, o antes e o depois, e ainda como foi o processo até lá chegarem. Os três barcelenses deixam também conselhos para os mais novos.

Em cena| «O teatro é uma paixão, uma paixão enorme»Num concelho (re)conhecido pela tradição teatral, o teatro faz-se sobretudo de amadores. O Obli procurou perceber o que motiva quem sobe ao palco apenas por prazer e em que condições o fazem.

Caça-talentosa experiência dos barcelenses no pequeno ecrã

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Direção Obli

Diretor: Joaquim José Gonçalves

Diretor adjunto: Ricardo Galiza

Editor: Cristina M. Barbosa

Diretor Criativo: Sara Silva

Redação: Catarina Bessa, Emanuel Boavista, Inês

Barreto de Faria, Pedro Manuel Magalhães e Tiago

Varzim

Imagem e Design: Rafael Peixoto

e André Vilas Boas

Web e Multimédia: Pedro Pontes

Fotografia: Ana Teresa Miranda

Colaboradores desta

edição:

Armando João Santos

e Liliana Araújo

Ilustração de capa por

Pedro Carvalho

Cartaz por Pedro Carvalho

Tiragem: 10.000 exemplares

Impressão: Celta de Artes Gráficas,

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Redação e administração Jornal Obli -

Barcelos Popular, Avenida João Paulo II,

355 4750-304 Barcelos

e-mail: [email protected]

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O jornal Obli foi escrito segundo as novas regras do Acordo Ortográfico.

As crónicas e artigos de opinião são da responsabilidade dos autores.

Este jornal é um suplemento do Barcelos Popular.

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CAÇA-TALENTOS - A EXPERIÊNCIA DOS BARCELENSES NO PEQUENO ECRÃ

CRÓNICA: EMPREGO JOVEM EM BARCELOS

EMPREENDEDORISMO EM BARCELOS

PERFIL DO CONVIDADO:PEDRO CARVALHO

DANIEL SOUSA: «A MAIOR QUALIDADE [DE UM TREINADOR] É A LIDERANÇA»

EM CENA: «O TEATRO É UMA PAIXÃO, UMA PAIXÃO ENORME»

04DE BARCELOS… PARA LONDRES

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A crise, essa palavra, repetida até à exaustão, que nos acompanha desde o berço e que parece, todos os dias, querer fazer-nos baixar os braços poderá ter um lado positivo? Talvez. São contínuas as referências a jovens que, pressionados pela pouca empregabilidade, apostam nos setores tradicionais da economia portuguesa: agricultura, calçado, têxtil, artesanato!

A ponte entre a experiência de décadas, adquirida pelos mais velhos, e a criatividade e energia dos mais jovens poderá ser um ponto-chave para a recuperação da economia portuguesa e para a manutenção do saber de gerações em áreas que, por princípio, não atraem as novas gerações.

Barcelos, como “rainha do artesanato”, não é exceção e apresenta uma nova vaga de jovens artesãos. O Obli foi falar com três deles. Jovens que apostaram no artesanato de forma ativa e que serão o futuro desta nossa tão barcelense tradição. Ao “antigo”, acrescentam-lhe traços renovados, numa fresca interpretação do artesanato barcelense.

Jovens empreendedores – não do “bater punho” do afamado Miguel Gonçalves, mas empreendedores de “bater barro” –, que se aplicam num intenso processo criativo, reinterpretando tradições e recriando o nosso Galo, que de tão velho já merecia uma crista nova.

Para o Obli, hoje é também um dia ‘histórico’ na nossa curta história. Após um ano e quatro edições impressas, lançamos o nosso novo website informativo. Ao tradicional jornal impresso, o Obli alarga horizontes com uma “nova crista”, uma plataforma digital que manterá a mesma postura que sempre nos caracterizou: o desafio à juventude barcelense, para que desperte a discussão do amanhã, sem tabus.

Obrigado por nos acompanharem nesta aventura, porque o Obli é apenas uma tela que projeta a obra de cada um de vocês, jovens barcelenses.

O Obli é uma postura, o Obli és TU!

“Galo velho com crista nova”

09JOVENS (RE)INVENTAM O ARTESANATO

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EDITORIAL

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De Barcelos… para Londres

Como é que eu cheguei até aqui?Não sei bem.

Ao longo do meu percurso escolar e profissional, as minhas decisões basearam-se mais em incertezas e curiosidades do que em convicções. Licenciei-me em Psicologia e tive sempre interesses diversificados: fiz teatro, dança, voluntariado, associativismo. Mas só descobri o que realmente mexia comigo numa conferência onde falavam sobre transições de carreira e bem-estar em bailarinos, do outro lado do mundo (literalmente), na Nova Zelândia, em 2009. Não sabia como, onde ou quando, mas finalmente sabia o que queria. Entretanto defendi o meu doutoramento em Psicologia, em março de 2011, e dei-me um prazo de dois anos para investir na área em que queria trabalhar: “investigação, psicologia e artes performativas”. Ninguém percebia bem do que é que eu falava. Depois de várias tentativas em candidaturas a projetos, decidi que era altura de ver pessoas e de

me dar a conhecer pessoalmente. Contactei a equipa de Dance Science no Trinity Laban, em Londres, para fazer uma visita curta e discutir ideias. Por acaso, descobri o programa Leonardo da Vinci, promovido pela Kerigma em Barcelos, e a visita curta tornou-se num internship de seis meses. E assim, sem pensar muito, em janeiro de 2013, quase dois anos depois de defender a minha tese, estava a caminho de Londres para concretizar um sonho. Não sabia o que me esperava nem o que esperar. Mas aproveitei ao máximo Londres nos seis meses que lá estive e adorei. Entretanto concorri a uma posição de Research Associate na Royal College of Music, no maior projeto de sempre no Reino Unido em saúde e bem-estar dos músicos. Demasiado ambicioso, mas porque não arriscar? É a posição que ocupo desde setembro de 2013.

A ida para Londres resultou desta curiosidade, deste arriscar, de procurar desafios. Não foi muito refletido, mas aconteceu e agarrei a oportunidade.

Tenho aprendido muito em Londres. Aprendi a valorizar-me profissionalmente, a confiar mais nas minhas competências, a pedir menos desculpas, a focar-me no que é possível e positivo. Sinto-me desafiada diariamente. Gosto da forma pragmática de trabalhar, do tempo ser precioso e tratado como tal. Adoro observar as mil e uma formas de ser, enquanto vou no metro para o trabalho. Os nossos preconceitos, mesmo os que negamos, são postos à prova todos os dias. Tudo é possível nesta cidade com tantos habitantes como Portugal. Inclusive falar-se português a toda a hora e em todo o lugar. Surpreende-me tanto a formalidade com a informalidade, como os executivos vestidos de fato almoçarem de tupperware, sentados num pedaço de relva ao mínimo raio de sol. Não me queixo do tempo: só uso galochas em Braga, onde sinto mais frio do que aqui. O sol não é tão quente, confesso, mas também brilha. Há um escritor inglês

que diz “quem está cansado de Londres, está cansado da vida”. Londres tem tanto de inesgotável – há sempre coisas novas para ver, experimentar, conhecer – como de desgastante.

Mas foi quando voltei para Londres, em setembro, que percebi as reais dificuldades de quem emigra. Procurar casa ou quarto com requisitos mínimos de habitabilidade é um pesadelo. O mercado imobiliário é muito agressivo, os preços das casas são exorbitantes para as condições que oferecem. Os transportes são igualmente caros. Tive a sorte de ter um contrato de trabalho que me facilitou muito a vida, mas ainda assim abrir uma conta no banco, assinar um contrato de arrendamento, pedir o número de segurança social fez-me sentir criminosa e estrangeira. Aí comecei a sentir o que significa emigrar.

Também aprendi muito sobre ser português. Somos bons profissionais, temos excelente formação e não sei se é a nossa capacidade do “desenrascanço”, mas acho que somos criativos a resolver problemas. E podemos continuar a orgulhar-nos da beleza natural do nosso país, da nossa gastronomia, da nossa hospitalidade e simpatia. É inigualável. Agora, de cada vez que vou a casa, percebo como temos qualidade de vida, valorizo cada vez mais o meu país. Orgulho-me de ser portuguesa e faço questão de o afirmar.

Gosto de estar em Londres. A família e amigos são insubstituíveis e isso, sim, deixa um vazio. Quanto a Portugal, lamento que o meu país não tenha condições para concretizar o meu sonho. Nem as realidades de muitos amigos e familiares. Mas guardo esperança.

Liliana AraújoInvestigadora em Performance Science|Royal College of Musichttp://rosafog.blogspot.co.uk/

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«A maior qualidade [de um treinador]

é a liderança»

DANIEL SOUSA:

André Villas-Boas é um dos treinadores portugueses mais reconhecidos da atualidade. Por detrás do êxito do técnico que já venceu uma Liga Europa esconde-se um rosto barcelense. O de Daniel Sousa. O jovem de 29 anos logrou, há mais de cinco anos, uma vaga como observador na equipa técnica de Villas-Boas e, desde então, tem sido uma das chaves do sucesso do treinador portuense. Numa lição elucidativa sobre futebol, Daniel revela os segredos para ter chegado tão longe em tão pouco tempo e desvenda um sonho: o de se tornar treinador principal.

O papel do Daniel como observador consiste exatamente em quê? Há várias funções num observador: há a parte do recrutamento, que não é a minha área, e há a parte de preparação do jogo, onde estou inserido. Recolho e compilo informação relativa aos adversários, através de uma análise de vários jogos, ao vivo e em dvd, e depois passo para os restantes elementos da equipa técnica e jogadores.

Formou-se em Ciências do Desporto na Universidade do Porto. Para a sua tese, entrevistou André Villas-Boas. Foi através da entrevista que passou a trabalhar para o André?

Sim, foi através dessa entrevista para a tese. Na altura, entrevistei também o Van Gaal. Mas entrevistei o André pelo conhecimento que ele tem do jogo e pela experiência que foi adquirindo ao longo dos anos com o José Mourinho. Além disso, eu e o André

tínhamos algo em comum antes de nos conhecermos: a paixão pelo futebol ofensivo.

Entendeu ser uma oportunidade única de carreira ter sido convidado pelo André para a função de observador na Académica?

Foi, sem dúvida. Acredito que, nessa altura, houvesse muita gente com qualidade e até com mais experiência do que eu a fazer este tipo de trabalho, mas a oportunidade foi-me dada e dei sempre o máximo para garantir qualidade no trabalho. Nesta altura, depois de cinco anos, não tenho problema algum em considerar-me dos melhores naquilo que faço.

No espaço de seis meses, transferiu-se da Académica para o FC Porto. Como se processou a habituação a um clube tão mediático?

Eu já pertencia aos quadros do Porto e trabalhava em simultâneo na Académica. Mas a habituação foi tanto fácil como difícil. Foi fácil porque o Porto é um clube com uma ambição que se adequa àquilo que esperas no futebol e foi difícil porque não há muito espaço para falhas, a exigência é tremenda! Então, vir de um clube como a Académica, em que as aspirações são diferentes, para o Porto, em que tens três jogos por semana, a exigência, a densidade competitiva, muda completamente o plano de trabalho.

Também foi fácil pela chamada estrutura que o FC Porto tem?

Sim, sem dúvida. Aquilo que diferencia o Porto dos outros clubes é a cultura de excelência que está subjacente. Mesmo lá fora, não encontras essa cultura. No Porto, há uma coisa muito importante: é um clube preparado para ganhar, que oferece todas as condições aos profissionais para trabalhar o melhor possível.

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‘Tenho uma relação ótima com André Villas-Boas’A temporada no FC Porto foi recheada de sucesso. Na época seguinte, a equipa técnica saiu para o Chelsea. Muitos críticos afirmam que André Villas-Boas modificou a sua filosofia de jogo quando se transferiu do FC Porto para Inglaterra: passou a privilegiar a dimensão física em detrimento da técnica e da criatividade. Como comenta isto?

Quanto a mim, não faz sentido. Nos primeiros tempos do Chelsea, e há relatos de alguns jogadores a confirmarem isto, houve uma lufada de ar fresco com a nossa chegada, houve melhor futebol. No Tottenham, batemos recordes que resultavam de um futebol de ataque bastante agradável de se ver. A questão aqui é que houve uma adaptação do nosso jogo ao futebol inglês. O campeonato inglês é necessariamente diferente, até pela quantidade de jogos, que muitas vezes nem te permite treinar.

É tão diferente que Villas-Boas chegou a dizer, precisamente na entrevista feita por si, que o sistema do Barcelona não funcionaria lá, em Inglaterra.

O futebol inglês sempre foi um futebol muito intenso e característico: bola longa e correr para a frente. No entanto, a importação de treinadores e jogadores latinos, mais técnicos, misturou-se com essa cultura inglesa e vês hoje equipas a jogar muito bom futebol. A questão é que o Barcelona é um clube único e impossível de copiar. A única coisa que se pode tirar do Barcelona são algumas referências que te permitirão depois construir uma ideia de jogo. Por exemplo, e isto é fácil de ver, as saídas curtas do guarda-redes foi uma coisa que começou no Barcelona e, de repente, meia Europa tenta sair a jogar curto.

Como é a sua relação com André Villas-Boas?

É ótima. É o meu chefe, mas, ao longo do tempo, construímos uma relação profissional e pessoal com base na confiança e no respeito.

‘Apenas uma parte pequena do universo futebolístico recebe salários milionários’

Deixou Barcelos há mais de cinco anos. Nunca considerou a hipótese de ficar e, posteriormente, aguardar a hipótese de trabalhar num clube local como o Gil Vicente?

Em todas as profissões, tens de abrir um pouco os horizontes. Ainda é muito cedo para pensar em ficar, ainda sou novo para não ter os meus horizontes alargados, sobretudo no futebol. Infelizmente, a realidade é que em Portugal o futebol não é tão bem pago como as pessoas pensam. O número de pessoas que recebe salários milionários é uma parte muito pequena do universo futebolístico.

Foi então uma questão financeira?

Foi uma questão de oportunidade. É óbvio que tento fazer as minhas contas ao final do mês e guardar um pouco mais. Mas a oportunidade profissional, neste momento, é sem dúvida o mais decisivo para mim.

Mantém ainda a ligação a Barcelos?

A ligação que tenho à cidade é sobretudo familiar. Tenho cá casa, a minha base é sempre aqui, como qualquer outro emigrante.

Foto de Michael Fresco

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Vendo de ‘’fora’’, como acha que está Barcelos, agora?

É uma cidade de que eu gosto, apesar de ser pequena. Como deves imaginar, estive três anos em Londres, e Barcelos é uma realidade muito diferente. Não deixa de ser uma cidade agradável e tenho outras coisas aqui que em Londres não tinha.

Esta temporada os clubes de Barcelos estiveram na ribalta. O Gil Vicente chegou a estar no quarto lugar no campeonato e o Santa Maria eliminou o Nacional da Madeira da Taça de Portugal. Crê que Barcelos é uma cidade do futebol?

Sim, como todo o país. Em Inglaterra, por exemplo, eles não são só orientados para o futebol, também são para o cricket e rubgy. Em Portugal, é exclusivamente o futebol e Barcelos não foge à regra, ainda que aqui tenhamos também uma história e tradição muito forte no hóquei.

É possível a um jovem de Barcelos poder ter a ambição de ser treinador principal?

Claro que sim. Desde que mostre profissionalismo, como eu mostrei, é possível. Claro que eu tive uma oportunidade única, como outros da minha idade, e agarrei-a. Mas é decisivo mostrares ambição, profissionalismo e, claro, competência.

Faz parte dos seus planos tornar-se treinador principal?

Sim. É uma questão a longo termo. Tenho ainda bastante a aprender com o André. Estar com ele ao nível que ele está, poder participar nas tomadas de decisões, em todo o processo que é de liderança de uma equipa de futebol profissional a este nível, é extremamente enriquecedor. Enquanto tiver esta oportunidade, vou estar agarrado a ela.

‘A liderança passa pela gestão de pessoas’Qual a melhor qualidade de um treinador?

É uma boa questão, sem dúvida. É algo sobre o qual eu e o André costumamos falar e penso que a maior qualidade é a liderança. 95% do trabalho do treinador é à base da liderança, da gestão de pessoas. Penso ser a parte mais decisiva.

Nesse aspeto da liderança, Jorge Jesus, numa conferência recente, afirmou que o importante na liderança é o treino. Se os jogadores acreditarem no treino, o sucesso estará mais próximo. Van Gaal, um dos entrevistados do Daniel para a tese, por exemplo, tem um tipo de liderança mais ditatorial, mais ríspida.

São diferentes perspetivas. Pelas experiências que vou tendo, acredito que a liderança passa muito pela forma como geres o grupo. Imagina o que te tinha dito anteriormente: em Inglaterra, a quantidade de jogos é tão grande que há semanas em que quase não treinas. Quanto ao Van Gaal, é genial nas questões táticas e no treino. Muitas das ideias que hoje estão generalizadas no futebol tiveram origem nas suas equipas. O estilo de liderança parece-me mais uma questão

cultural, no caso dele; um estilo baseado no profissionalismo, que está muito presente no norte da Europa, à semelhança, por exemplo, do Co Adriaanse. São diferentes formas de assumir e de estar no papel de líder. No caso do Jorge Jesus – que não conheço –, acredito que seja rico no conteúdo de treino. Mas a liderança passa não só pelo treino, mas também pela comunicação, pela gestão de um grupo de pessoas, de decidir, por exemplo, quem joga e quem não joga, quem é convocado e quem não é. Tens de ter todos disponíveis e motivados, independentemente de jogarem ou não.

Qual a qualidade mais importante para um jogador no futebol moderno?

Capacidade de influenciar o jogo e de decidir bem.

Qual é, para si, o melhor futebolista do mundo?

É uma questão sensível, sobretudo porque o futebol é um desporto coletivo. No entanto, olhando friamente para os números do Ronaldo, foi incrível o que ele fez. Avaliando a performance, foi o melhor da época passada.

| Pedro Manuel Magalhães |

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elmo Macedo é, ao que tudo indica, o artesão mais jovem do concelho. Tem 21 anos e foi há um ano e meio que, «por brincadeira», «sem querer» e incentivado pelo

pai, esboçou o seu primeiro trabalho: um galo. Mas ainda não o faz como profissão.

Já Nelson Oliveira, que tem mais oito anos, tem o dístico de mais novo barcelense a fazer do artesanato a sua atividade principal. Nelson, ao contrário de Telmo, não teve familiar algum que o pusesse a mexer no barro e tudo começou com a insistência de dois colegas, durante uma feira onde participava com telas pintadas por si. Era outubro de 2008. «Houve um dia que fui a casa de um colega para ele me dizer como se fazia, porque eu nem sabia o que era barro. Estive lá duas ou três horas, no máximo, e ele disse-me como é que eu tinha de fazer e fui para casa fazer umas coisas, porque aquilo eram apenas umas coisas», explica Nelson. Não foi preciso muito tempo para se apresentar com os seus trabalhos. Em maio do ano seguinte, já tinha algumas peças no seu expositor que, desde 2005 até então, era preenchido apenas com telas. E aqui está uma semelhança encontrada também com o início do percurso de Sílvia Barbosa, ou ‘Sílvia dos Galos’, como habitualmente a conhecem agora. Dos três, é a mais velha, tem 33 anos, e é a que cria algum conflito na terminologia do artesanato. Como a própria diz, está na linha entre o artesanato e a arte plástica, mas o que faz considera ser diferente e inovador. «Eu não produzo com as mãos, eu não modelo, não faço. Eu crio na vertente da pintura. O que faço é mais artístico, eu saio da linha tradicional», comenta a jovem que, no entanto, se considera artesã.

T

Jovens (re)inventam o artesanato

«Temos de reinventar, reinterpretar e recriar»Barcelos tem o título de “Capital do Artesanato”. Mas que

papel têm os jovens neste setor que coloca o concelho

barcelense entre os principais no país? Que ideias, projetos

e problemas aponta a nova geração de artesãos? Será esta

uma forma de vingar para quem entra agora no mercado

do trabalho? O Obli foi procurar a resposta para estas e

outras questões sobre a expressão do artesanato jovem no

concelho barcelense.

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«Pseudo artesãos» banalizam o artesanato

Questionado sobre o número de artesãos em Barcelos, o vereador da Câmara Municipal que detém o pelouro do artesanato, Carlos Brito – que não recebeu a equipa do Obli, apenas prestou esclarecimentos por meio do Gabinete de Comunicação e Imagem (GCI), através de email – esclareceu que o município não tem conhecimento do número de artesãos do concelho, mas que o evento organizado pela autarquia aponta para um aumento: «os dados obtidos, por exemplo, na Mostra de Artesanato indicam claramente um aumento de artesãos, sobretudo no figurado de Barcelos e no chamado artesanato urbano».

Para Nelson Oliveira, o número de artesãos também tem aumentado, mas o jovem vê nisto um possível problema: «há um aumento, nestes últimos anos, do número de artesãos ou pseudo artesãos. Eu digo pseudo artesãos porque aparece de tudo. E isto mostra que há um lado positivo e um lado negativo nesta situação. Há pessoas que acham que fazem qualquer coisinha e que é artesanato e nem sempre o que se faz é artesanato». Por isto, o jovem de Airó acredita que o artesanato está a «banalizar-se», mas atribui a culpa aos organismos que organizam os eventos e que não fazem um controlo sobre esta matéria.

«O que deveria estar na moda era artesanato genuíno e de qualidade. Se isto estivesse na moda é que era muito bom», desabafa Nelson. Mas o jovem de 29 anos salvaguarda que, ainda assim, «aparecem artesãos novos e muito bons».

A informação avançada pelo Gabinete de Comunicação e Imagem da autarquia tem também uma justificação para este crescimento e acredita que pode ser uma forma de os jovens contrariarem o desemprego: «parte deste aumento é justificado como uma aposta dos jovens no artesanato como via profissional, constituindo-se como uma alternativa séria em termos de rendimento familiar». Também o artesão de Airó partilha desta opinião: «eu acho que será uma escapatória para a crise».

Neste propósito, e estando nesta altura a dar os primeiros passos no mundo do artesanato, Telmo Macedo admite que é «complicado» iniciar-se nesta área, não só por precisar de ganhar notoriedade, mas também pelo número de artesãos que existe. «De certa forma, é complicado, porque agora há muito tipo de artesanato e há muitas pessoas a dedicar-se a esta arte», comenta o jovem de Galegos Santa Maria.

Quando questionada se recomendaria a um jovem ingressar no meio artesanal, Sílvia Barbosa aponta o «gosto e a paixão» como o motor de decisão: «quem tiver veia artística ou ligação familiar, acho que se deve conjugar e tentar criar alguma coisa».

‘Não é normal ter no artesanato gente mais nova’

A ‘Sílvia dos Galos’ admite que, muitas vezes, o artesanato – particularmente a vertente da cerâmica – está associado a pessoas mais velhas. Conta, inclusive, uma história que ilustra isso mesmo: houve uma situação onde foi referido o nome da Sílvia como sendo uma das pessoas indicadas para fazer determinado trabalho e o cliente entrou em contacto com a artesã de Galegos Santa Maria. «Ele, quando ligou comigo, pensou que eu era muito mais velha. Não é normal [haver jovens], o pessoal da cerâmica é mais velho, não está muito aberto a ideias novas. O que é normal. Eu já sou mais de desafios, gosto de inovar e de arriscar», relata a artesã.

O dirigente da Associação de Artesãos Galo, Manuel Pimenta, acredita que a «beleza do artesanato está na fusão das idades». «Todo este cruzamento de sangues faz surgir peças extraordinárias, porque os mais novos veem com mais criatividade, mas os mais amadurecidos tratam isto com plenitude», considera.

«A minha idade dá um toque diferente ao que já existia»

Para Nelson Oliveira, o caminho do artesanato tem de ter um olhar diferente sobre o tradicional: «temos de reinventar, reinterpretar e recriar». «No artesanato, estamos sempre a pegar em temas que já os nossos colegas mais velhos estão ou estiveram a trabalhar», explica.

Foto de Ana Teresa Miranda

Foto de Ana Teresa Miranda

A primeira peça que Telmo Macedo fez foi um galo

Sílvia Barbosa é agora conhecida como ‘Sílvia dos Galos’

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O artesão considera, no entanto, que há um pormenor que já por si faz a diferença: «a minha idade dá um toque diferente ao que já existia». Mas Nelson vai mais longe e explica que, além da necessidade de recriar os trabalhos feitos pelos colegas, para que os colecionadores os comprem, é também importante recriar os seus próprios trabalhos: «mesmo dentro do meu artesanato, eu todos os anos tenho de estar a inovar e a recriar e, às vezes, adaptar o tipo de peças que faço».

Cada artesão com sua identidade

Se for na rua e vir uma peça com olhos embutidos, bochechas salientes e pés descalços, então saiba que o autor é Nelson Oliveira. Mas se, por acaso, se aperceber de um galo com patas em ferro, colorido e pintado à mão com um logótipo, retrato ou símbolo, saiba que tem a assinatura de Sílvia Barbosa. Se for do artesão mais novo, Telmo Macedo, então vai distinguir pelos olhos, pela irreverência e pelo «toque mais moderno».

Três estilos, três linhas modernas, mas todas elas pretendem dar uma nova vida ao artesanato daquela que é conhecida como a cidade rainha desta arte.

«A marca Barcelos vende»

«O artesanato como parte integrante da cultura barcelense é uma forma de expressão inspirada nos mais variados temas, necessidades e formas do quotidiano e espelho de um sentido criativo ímpar de uma comunidade artesanal muito forte que faz deste concelho – Capital do Artesanato», palavras que podem ser lidas no espaço da

Câmara Municipal de Barcelos na internet. Na prática, e para quem anda neste meio,

é uma «boa referência», segundo Sílvia Barbosa, dizer-se que se é barcelense: «é sempre uma boa referência dizer que sou de Barcelos, porque Barcelos é uma marca e está muito associado ao artesanato».

Também Nelson partilha desta experiência: «quando estamos numa feira, e quase sempre temos [no expositor] o nome e o concelho, a marca Barcelos, que é uma marca, vende. E se não tivermos, primeiro perguntam-nos se somos [barcelenses]».

Na opinião de Manuel Pimenta, «o artesanato de Barcelos é o topo do que se faz em Portugal». Apesar de o responsável pela associação de artesãos de Barcelos saber que existe artesanato em vários pontos do país, o dirigente considera que, «em Barcelos, há uma maior existência de artesãos e isso permite ver trabalhos, com mais frequência, de grande qualidade».

‘Artesanato sem formação e com falta de dinamismo’

No caderno de anotações com que se preparara para a entrevista ao Obli, estão alguns problemas levantados à organização e dinâmica do artesanato no concelho barcelense. Nelson Oliveira aponta como uma lacuna a inexistência de formação no setor artesanal.

Questionada sobre este assunto, a Associação de Artesãos Galo explicou que não tem «arcaboiço nem estrutura para isso», mas que também não estão debruçados sobre a formação, mas sim incidindo e orientando os artesãos, no sentido de evitar plágio e rivalidades desnecessárias.

Já a autarquia, através do GCI, não responde diretamente se considera importante e como se explica a inexistência de formação, apenas escreve que os artesãos deverão «recorrer à formação e a apoios vindos de outros organismos públicos, como o Instituto de Emprego e outros».

O artesão de Airó aponta ainda a falta de dinâmica da associação de artesãos barcelense como um problema neste setor. O jovem acredita que poderia ser feito mais e que as «verbas não estão a ser aproveitadas». Já Manuel Pimenta diz apenas que a associação está aberta a novas ideias.

Nelson deixa algumas dicas: «há uma lojinha, que é importante para começar, mas já lá vão três ou quatro anos de associação e precisamos de mais. Precisamos de eventos, precisamos de mais divulgação e de muito mais coisas».

‘Mini centro comercial para o artesanato’

«As pessoas no artesanato querem ver, querem sentir», afirma Nelson Oliveira, que gostaria de ver implementado, em Barcelos, um espaço onde cada artesão pudesse trabalhar individualmente, mas que, ao mesmo tempo, fosse concentrado, para que os turistas visitassem e, paralelamente,

pudessem assistir à confeção de peças e adquirir alguns trabalhos. Como apresenta o jovem de Airó, «seria uma espécie de mini centro comercial para o artesanato». Nelson vê nesta ideia vantagens para todos, mesmo confessando que, às vezes, a relação entre artesãos não é a melhor, por causa da rivalidade, mas estaria salvaguardada, diz o jovem, porque cada um «teria o seu espaço» e a sua mostra.

A autarquia não emite opiniões sobre esta ideia, apenas diz estar recetiva a «propostas vindas dos artesãos e dos seus meios associativos». Já a associação diz que esta ideia seria o «ideal», mas que é um projeto «ambicioso» e que «não é possível agora».

Um galo (re)inventado«Comecei a olhar para o galo como uma

tela em branco». É desta forma que a ‘Sílvia dos Galos’ explica a sua forma de reinventar o galo tradicional. Inicialmente escrevia a lenda do galo em vez das ilustrações, agora já não consegue ter «mãos a medir» com as encomendas para pintar uma imagem de uma empresa, um símbolo do clube ou até mesmo um retrato. Tudo isto conciliado com um trabalho no setor dos condomínios, que pondera deixar para se dedicar apenas ao que a motiva.

Tal como já foi dito, todos têm as patas em ferro e todos têm a forma do galo tradicional. A arte de Sílvia está na pintura. «É conjugar a arte arrojada com uma base tradicional», comenta.

Telmo Macedo também utiliza ferro, mas apenas nas pernas. Um galo foi a primeira peça feita pelo jovem de Galegos Santa Maria. Com uma cabeça irreverente e olhos saídos, também esta versão do símbolo barcelense promete reinventar o tradicional.

Foi com as suas versões do Galo de Barcelos e derivados que Nelson Oliveira conquistou dois prémios. Em 2011, com uma peça irreverente a retratar «o parto» do galo, onde conquistou o Prémio Revelação, em Barcelos. E, no ano passado, foi distinguido com o 1.º lugar no concurso Inovarte com a sua peça “Galo para a Europa”.

Manuel Pimenta, apesar de ver com bons olhos a entrada de novas interpretações ao galo, acredita que os mais velhos têm outro traquejo: «sem dúvida que a presença dos jovens é saudável, mas aqueles que são mais amadurecidos tratam o galo de outra forma, tratam-no por ‘sua excelência’».

| Emanuel Boavista |

Foto de © Feira de Barcelos®Duas peças de Nelson Oliveira já foram premiadas

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Gosta de desenhar, desde que se lembra. «Em pequeno, as influências vinham da TV com as séries de animação que tentava passar para o papel com lápis, marcadores, lápis de cera», recorda Pedro Carvalho. Depois, já na adolescência, diz ter-se apaixonado pela banda desenhada americana, a partir da qual começou a criar as suas primeiras BDs.

Autodidata, tem feito ilustrações para os mais diversos meios, desde vestuário, BDs para jornais e revistas locais, ilustrações para capas de livros e, com alguma regularidade, BDs para as revistas do projeto ZONA. Em breve, um livro de BD apenas com ilustrações da autoria do barcelense verá a luz do dia. «É sempre gratificante ver um trabalho destes concluído, isto em parceria com o argumentista André Oliveira. É um registo diferente de publicação, este vai ser o primeiro trabalho a solo, digamos», conta Pedro ao Obli.

Carla Rodrigues é ilustradora e também namorada de Pedro Carvalho, autor de um trabalho de que é fã, diz, mesmo bem antes de namorarem. «Ambos tínhamos – e temos – contas num site que funciona essencialmente como um portfolio de trabalhos, e foi aí que conheci e comecei a seguir o trabalho do Pedro, tanto na ilustração, como na banda desenhada», conta ao Obli. Carla destaca a «forma como o Pedro canaliza o que vê e o que gosta no dia a dia para a arte – quer seja uma música, um filme, ou uma situação do quotidiano –, que são, muitas vezes, o combustível para a criação de um ou outro trabalho». Considera-o ainda «muito criativo e empenhado». «Desenha sempre muito, não se fica pelo primeiro “rabisco” e procura que os trabalhos superem sempre as expectativas», atenta.

Pedro acredita ter um «estilo próprio». Carla diz tratar-se de um estilo «muito urbano» e não tem dúvidas: «o traço dele é único, quando se vê um desenho do Pedro sabe-se logo de quem é». E pormenoriza: «cores fortes, composições sólidas e muita expressividade. As linhas são fortes e angulares, com espessuras variadas, e fazem os desenhos do Pedro serem imediatamente reconhecíveis, quer sejam feitos com materiais tradicionais ou digitais».

biocriativo

PedroCarvalho

PERFIL DO CONVIDADO

“Numa Manhã de Outono”

Depois de ter aprendido que «ninguém vive apenas da ilustração nem da BD, pelo menos não no reduzido mercado nacional», Pedro Carvalho reconhece que gostaria que aquilo que é um hobby pudesse ser mais do que isso. Ainda assim, porém, diz-se de «pés bem assentes no chão para saber que só com esforço e persistência se pode levar a cabo os sonhos dentro deste mundo». É por isso, de resto, que Pedro Carvalho ambiciona tornar-se melhor naquilo que faz.

Carla Rodrigues descreve o trabalho de Pedro Carvalho como «original e diferente» e destaca ainda o facto de «combinar o humor e a sátira com a cultura pop». Entende, de resto, que o Pedro Carvalho «traz uma contemporaneidade e uma vida à ilustração que de certeza que vai agradar, particularmente os mais interessados na cultura pop», razão pela qual sugere que fiquem de olho no trabalho dele.

Pedro Carvalho foi já distinguido com diversos prémios, entre eles: o troféu “Central Comics”, com a Curta intitulada “Animália” (em 2012), e o 1.º prémio no concurso internacional de BD “Avenida Marginal”, da ilha do Faial, ambos em parceria com o argumentista André Oliveira. O artista expôs já os seus trabalhos em diversos locais, destacando-se o Festival BD da Amadora, o Festival Internacional BD de Beja e o Festival Anigamix.

Pedro Carvalho nasceu em Barcelos, cidade onde morou até aos 33 anos. Neste momento, com 35, reside em Famalicão, mas continua a trabalhar em Barcelos. Acompanhe o seu trabalho artístico em http://pedrocarvalho-arteblog.blogspot.pt/

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elementos é, de momento, o limite. Ainda assim, há alguma flexibilidade para cumprir aquele que é um compromisso do grupo, «uma espécie de partilha social». «Às vezes, recebemos crianças com problemas de socialização na escola; isto é libertador e temos resultados bastante positivos, bem como o feedback dos pais dos miúdos que passam aqui algum período de tempo e que são inseridos neste grupo muito unido, apesar das diferenças de idade», conta João Figueiredo.

No blogue do TPC, o mentor da criação do grupo e atual diretor artístico, José Fernandes, lembra que, com o TPC, nasceu a prática teatral de forma continuada numa «terra com fortes tradições no teatro popular». E, diz João Figueiredo – no grupo há quatro anos –, «o TPC é um grupo amador, porque ama o teatro». «Não é amador porque andamos a brincar ao teatro. Não andamos a brincar ao teatro. Divertimo-nos, mas trabalhamos a sério, porque também temos um compromisso com o trabalho que apresentamos ao público e temos essa responsabilidade que, acima de tudo, também queremos valer», explica. Além

ensaio ainda não começou e a pequena Leonor já se destaca. Apesar dos seus oito anos, é um dos elementos do TPCzinho

com mais à vontade e nem mesmo a presença de uma estranha a parece inibir. O encenador do grupo, João Figueiredo, está já habituado a trabalhar com crianças, nas aulas de Expressão Dramática, que leciona a alunos do 1.º ciclo. Em Carapeços, no TPCzinho, o trabalho é igualmente prazeroso: «com estas crianças, é muito fácil trabalhar. Eu também tenho uma paixão enorme por trabalhar com crianças e jovens. E tento incutir-lhes esse gosto, e essa energia, e essa paixão que é preciso ter, o chamado bichinho do teatro». «Estou muito satisfeito, é um grande prazer trabalhar com estas crianças e estes jovens», reforça.

Nos ensaios, o TPCzinho trabalha vários aspetos, como respiração, a improvisação, leitura ou dicção e realiza exercícios de palco, bem como de escrita criativa. No dia da ‘visita’ do Obli, depois do aquecimento, crianças e jovens continuaram o exercício do ensaio anterior: três grupos

prepararam, durante dez minutos, um texto escrito por eles, que depois dramatizaram em palco. O ritmo de ensaios, de resto, varia de acordo com as apresentações e com os trabalhos que haja para preparar. Habitualmente, é à sexta-feira.

O TPCzinho é uma das quatro secções [TPC, TPCjúnior, TPCzinho e TPoesiaC] do Teatro Popular de Carapeços (TPC). Com 20 elementos, entre os oito e os 18/19 anos – sendo que quatro deles estão já em transição para a secção seguinte, o TPCjúnior –, o TPCzinho existe desde 2000, altura em que foi criado sobretudo para «incutir o gosto do teatro nos mais pequenos». À semelhança das restantes, a secção infantil do TPC apresenta só peças de autores portugueses. Entre elas, constam, a título de exemplo, Joanão e Joaninha, Espírito de Natal, Temível Drácula e Zé das Moscas. O grupo apresenta os seus espetáculos sobretudo em Barcelos, em virtude do protocolo com a Câmara Municipal, embora aquele que é «o viveiro, o futuro» do TPC já tenha esporadicamente apresentado noutras localidades.

Apesar dos muitos pedidos de crianças para entrar no grupo, 20

Em cena | «O teatro é uma paixão, uma paixão enorme»

Subimos ao palco do teatro amador em Barcelos. Entre o drama – falta de apoios, de formação e outras dificuldades – e a comédia – o prazer de representar, uma paixão, o bichinho que corrói, no bom sentido. Abrimos o pano, acompanhámos dois grupos amadores constituídos por crianças e jovens. Duas realidades distintas. Olhámos ainda a longa tradição teatral do concelho. No final, o aplauso é merecido?

OGrupo Fora de Cena, Autoria: DRFora de Cena, grupo criado em Roriz, em 2010

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16ao nível das instalações, da produção e da formação». E, garante, «a Câmara Municipal tem mantido uma política de apoios nestes três níveis, através do estabelecimento de protocolos».

Não clarifica, porém, se as iniciativas realizadas no sentido de promover e valorizar o teatro são, de facto, eficazes e/ou suficientes, dando conta apenas de que «a Câmara Municipal não é a única entidade a apoiar estes grupos».

No pós-25 de abril, foram criados vários grupos de teatro em Barcelos, sendo que, no entender do encenador e ator barcelense, «o mais representativo tem sido “A Capoeira”, que vai já a caminho de 38 anos de atividade regular». Há, de resto, várias freguesias do concelho, além das já referidas por Pinheiro, onde a atividade teatral é conhecida e reconhecida, como Carapeços, Balugães, Pousa, Oliveira, Rio Covo Sta. Eulália, Feitos, Lama, Roriz. Nestas freguesias, o teatro faz-se sobretudo de amadores. «O que torna os grupos verdadeiramente fortes é a paixão, é o amor que possam consagrar ao teatro, e não a si próprios. Quando todos os elementos de um grupo gostam do teatro à brava, então esse grupo está no bom caminho», entende Fernando Pinheiro. Ainda assim, ressalva: «a formação é sempre importante no seio de qualquer grupo, até nos profissionais, desde que ela seja bem feita e adequada a cada um dos níveis em que se corporiza o teatro».

Fernando Pinheiro reconhece que, do ponto de vista técnico e artístico, há, em Barcelos, «grupos mais competentes do que outros». Mas, sublinha, «no teatro amador, o mais importante é fazê-lo». E, apesar de todas as dificuldades, entende que, no futuro, «não é crível uma hecatombe na atividade teatral, desde que os grupos saibam preservar a sua independência e identidade».

disso, é a paixão pelo teatro que faz resistir os grupos amadores, apesar das dificuldades que lhes surgem. «Como dizia o poeta, “Pedras no caminho? Guardo todas, um dia vou construir um castelo”… É com as dificuldades que o TPC se torna mais forte», sublinha João Figueiredo. E acrescenta: «o teatro é uma paixão, uma paixão enorme. O bichinho do teatro começa a corroer-nos, no bom sentido, e começa a prender-nos e às vezes uma pessoa está cansada ou tem uma semana mais desgastante, vem para aqui e é libertação».

É o teatro como catarse, no entender de João Figueiredo, a juntar a outras vantagens. O encenador e ator barcelense, Fernando Pinheiro, acrescentaria o teatro como «uma ótima escola de múltiplas aprendizagens». Aquelas, talvez, que o ator e formador também barcelense, Ricardo Correia (ver caixa, página 17), diz serem «marcas, que não podem ser nomeadas, que são invisíveis». E acrescenta: «para mim, são estas que perduram, que criam bases para uma sociedade pensante, democrática, que reflete, que tece uma forma de ser, uma Cultura, que põe em causa o poder instituído». «Precisamos de teatro para isso e para muito mais», sentencia Ricardo Correia.

Em Roriz, tal como em Carapeços, «o teatro sempre foi muito acarinhado». Há ainda quem recorde peças representadas nos anos 50 e 60, que marcaram a população. Depois, a partir da década de 90, Isabel Araújo (sócia-fundadora da Associação Cultural e Recreativa de Roriz (ACRR), já falecida) levou algumas peças a palco, com um pequeno grupo apelidado Oficina de Teatro. Além disso, por ocasiões festivas, também os grupos de jovens da terra encenavam algumas peças. Quem o diz são Cristiana Carpinteiro e Filipe Lima, que falam ao Obli do grupo que orientam e representam. Com 17 elementos, entre os 16 e os 24 anos, o Fora de Cena foi fundado em junho de 2010, por iniciativa de Filipe Lima. «Participava em dramatizações na minha escola e sentia-me triste por não existir um grupo de teatro dinamizado na minha freguesia», conta Filipe. Dado o primeiro passo, o historial do teatro na freguesia fez com que o grupo evoluísse rapidamente.

Cristiana e Filipe reconhecem algumas dificuldades, decorrentes não propriamente da falta de formação na área, mas sobretudo da «falta de um técnico» responsável por questões como luz e som. «Não pensamos que, por agora, a falta de formação na área seja uma condicionante», entendem, embora admitam, no futuro, dependendo dos projetos e objetivos, «um eventual investimento nesse campo». A nível monetário, Cristiana e Filipe entendem que o grupo se situa «no patamar de qualquer outro

grupo de teatro amador», ou seja, dependente dos contributos do público. A falta de fundos, de resto, «reflete-se, essencialmente, em dificuldades a nível técnico e de equipamento», consideram. Sem protocolo estabelecido com qualquer entidade, o Fora de Cena tem na ACRR, coletividade a que pertence desde 2012, o seu principal suporte.

Neste momento, o grupo está literalmente Fora de Cena, mas já com vários projetos em mãos. «Estamos a trabalhar na produção de sketches, os quais pretendemos divulgar online. Futuramente, ansiamos levar mais peças a palco e, a partir de maio, contamos participar em diversos eventos, como Feiras Medievais e Feiras Piratas», revelam Cristiana Carpinteiro e Filipe Lima.

Cai o pano. Escuta-se o aplauso merecido aos amadores. Os tais que – com mais ou menos apoio e/ou meios, mais ou menos formação – amam a arte e fazem teatro por paixão.

«Barcelos tem tido uma boa tradição teatral, que urge defender e desenvolver»

A tradição teatral em Barcelos, conta ao Obli Fernando Pinheiro, é «muito antiga», sendo que terá «atravessado vários séculos até chegar até nós nesta modalidade do teatro amador». O ator e encenador barcelense recorda a existência de companhias ambulantes que vinham apresentar os seus espetáculos ao campo da feira e a outros espaços do concelho.

«No séc. XVIII», conta, «o dramaturgo Bezerra escreveu várias peças para serem representadas em freguesias do concelho: Lijó, Roriz, Vila Cova, Carvalhal». Também por essa altura, «já o Auto da Floripes deveria estar a ser representado em Palme». Fernando Pinheiro anota, de resto, que «a tradição teatral em freguesias como a Ucha e Durrães aproxima-se já do centenário, o que é notável».

Face a isto, não parece haver grandes dúvidas de que «Barcelos tem tido uma boa tradição teatral, que urge defender e desenvolver». «É um movimento tão interessante e tão rico, que a Câmara de Barcelos deveria ter uma política mais proativa para um setor tão importante para a comunidade», sublinha Fernando Pinheiro. E questiona: «se Barcelos é o concelho mais rico em teatro amador no Minho, por que não defender esse património com unhas e dentes? Que papel vai desempenhar o Teatro Gil Vicente na defesa desta tradição, que deveria constituir um grande orgulho de todos os barcelenses?».

A autarquia, através do Gabinete de Comunicação, observa que os grupos de teatro amador «necessitam de apoio

Foto de TPCzinho

TPCzinho, secção infantil do Teatro Popular de Carapeços

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que a mensagem é bastante explícita», acabou por ser «interessante, para não cair sempre no mesmo registo», diz.

Embora não tenha qualquer formação específica na área, Tiago Varzim interessa-se em saber sempre mais sobre teatro – «fui aprendendo com as pessoas com quem me fui cruzando, leio entrevistas com atores e outras coisas sobre teatro e representação» –, até porque sente a «exigência, apesar de ser amador, de querer fazer bem». «Já experimentei um bocado e acho que ainda tenho muito para aprender, é essencial», reconhece Tiago Varzim.

Estudante de jornalismo, Tiago acredita que «isto de ser ator, mesmo que amador, até é bom para jornalistas»; ajuda-os a lidar com o improviso, a pôr-se na pele do outro, a antecipar respostas, a desprender-se de inibições. O teatro, de resto, «vive do imediato e, quando estás a representar, vive daquela troca que existe entre o público e o ator». Definir o teatro, entende, «tem que ser nessa relação».

Declaração de interesses: O Tiago Varzim pertence à redação do Obli. Foi entrevistado para esta reportagem, em virtude de ter sido distinguido com a Menção Honrosa Especial/ Revelação, no 26.º Festival de Teatro de Barcelos.

| Cristina M. Barbosa |

17«Transforma-se o amador na cousa

amada», escrevera Camões. Transforma-se Ricardo Correia, um amador, num «fazedor de teatro», como se define. O primeiro ato foi numa sala fria da Escola Primária, em Barcelinhos. Teria seis ou sete anos, quando um diálogo entre dois palhaços o fez ficar acordado, uma noite inteira, a decorar um texto. «Eram situações nas quais me empenhava; estudava aquilo, decorava e dizia, nem sempre bem, mas com alguma seriedade e paixão, e era um chato ao corrigir os colegas que diziam ou faziam mal», recorda o barcelense, de 36 anos. Mais tarde, no 9.º ano, representara com um amigo um excerto d’ O Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente. O gosto pelo teatro, garante, surgiu de um «sítio desconhecido»: «não veio da minha família, nem do contexto onde estava inserido, que eu me lembre na altura não frequentava espetáculos de teatro». «É algo mais misterioso, indecifrável», diz.

Quando ingressou no então Liceu de Barcelos, Ricardo Correia conheceu «outro mundo». Foi nessa altura, de resto, que o seu percurso se cruzou com o de Fernando Pinheiro – ali professor de Expressão Dramática e também diretor da companhia de teatro “A Capoeira” –, com quem deu os primeiros passos no teatro e a quem, também por isso, está «extremamente grato». Depois de «dois fantásticos anos de Expressão Dramática», entrou para “A Capoeira” e, mais tarde, para o Teatro Universitário do Minho. Dali ao teatro profissional foi um passo. Em 2001, fez um casting para um projeto no Teatro Nacional São João, no Porto, e foi escolhido. «Foi naquele Teatro monumental que fiz a minha primeira peça como profissional», recorda. No ano seguinte, foi selecionado para trabalhar enquanto ator n’ “A Escola da Noite”, em Coimbra, onde esteve cinco anos.

Desde então, o seu percurso não mais se desligou da atividade teatral. Em 2007, criou a “Casa da Esquina”, em Coimbra, onde tem feito alguns trabalhos de encenação. Trabalha, de resto, com várias estruturas em Portugal (O Teatrão, Teatro Oficina, Teatro Académico de Gil Vicente, Cine-Teatro Constantino Nery, etc.) e também na Inglaterra (Skimstone).

Fez ainda diversas formações de teatro em Portugal e também no estrangeiro.

Ricardo Correia vê o teatro como «um espaço para falhar, para tentativas, para nos descobrirmos sob o olhar do Outro». O ator aprecia, de resto, a entrega que o teatro exige:«tens de te entregar, de te rasgar todos os dias, tens de te descobrir».

Ao contrário de Ricardo Correia, Tiago Varzim tem, para já, um percurso bem mais modesto. Começou, «para experimentar» o teatro, no projeto “As Fitas”, da EB 2, 3 de Manhente. «Nunca tinha pisado um palco, mesmo a sério,

mas tinha curiosidade em saber o que era. Fui pela experiência», conta ao Obli, o barcelense de 18 anos. «Depois de iniciar,comecei a gostar ainda mais. O teatro acaba por ser viciante, porque queres sempre explorar mais», revela. Assim, há cerca de quatro anos, e já «mais a sério», a prática continuou no grupo de teatro da Associação Vamos a Isso (AVAI), da Lama. «Foi logo uma experiência bastante enriquecedora e mais exigente do que o que tinha feito na escola, porque eram personagens já com bastante texto e era tudo ao vivo», diz ao Obli.

A par do teatro na AVAI, também a participação na Associação Só Podia, da Pousa, com «peças mais acessíveis para todos os públicos, mais moralistas, em

PUB

TPCzinho, secção infantil do Teatro Popular de Carapeços

Ricardo Correia, um «fazedor de teatro»

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nas investigações, cedendo, assim, praticamente todos os recursos da instituição.

Questionado sobre royalties e possível repartição de lucros das start-ups com o IPCA, Nuno Rodrigues adianta que, apesar de ainda não haver respostas definitivas, acredita que tal situação não faça qualquer sentido, ressalvando a possibilidade de envolver algum profissional da casa.

Os interessados fora do universo do IPCA podem concorrer a um espaço na incubadora e estão já previstas duas situações, ainda que não formalmente. Se o projeto fizer sentido para a incubadora, pode dar-se o caso de não haver financiamento, não havendo garantias de ajuda por parte da instituição. Se, por outro lado, a empresa preferir “contratar” o IPCA, a instituição tratará da parte de I&D e tudo o que lhe estiver associado. Programas como o QREN, por exemplo, podem comparticipar o projeto.

Em suma, o que importa reter da START GLOBAL XXI é que ela não serve para «empurrar ninguém para o empreendedorismo» pois,

TART GLOBAL XXI é uma incubadora de empresas que, em parceria com o Instituto Politécnico do Cávado e do Ave (IPCA), quer incentivar

o empreendedorismo da cidade.

«Não é empreendedor quem quer, é preciso que haja uma predisposição para tal, assim como não é músico quem quer», palavras de Nuno Rodrigues, professor da Escola Superior de Tecnologia. O docente explica que a incubadora de start-ups foi idealizada para projetos inovadores e diferenciadores, deixando de fora os velhos gabinetes de contabilidade e prestação de serviços. A ideia é simples: apoiar os projetos não só com um caráter inovador, mas também com potencial de mercado efetivo que, no âmbito do ensino superior, precisem de um empurrão para começar. A ajuda é dada não só através de questões logísticas (rendas mais baixas ou isenção de pagamento de internet e eletricidade), como também pela disponibilização dos laboratórios e mesmo de professores para ajudar

Numa altura em que cada vez mais se fala de empreendedorismo jovem, o Obli foi descobrir que iniciativas decorrem neste momento em Barcelos. Descobrimos a nova incubadora de empresas START GLOBAL XXI que tem uma parceria do Instituto Politécnico do Cávado e do Ave (IPCA), e está pronta a receber novas start-ups. Na Associação do Comércio e Indústria de Barcelos (ACIB), o Obli encontrou uma linha de crédito para todos, mas focou-se numa iniciativa diferente que visa apoiar o empreendedorismo feminino.

EMPREENDEDORISMO EM BARCELOS

Fotos de Ana Teresa Miranda

S

START GLOBAL XXI: A incubadora de indústrias criativas do IPCA

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de trabalhar, de desenvolver ideias, de desenvolver projectos».

«Ao entrar neste tipo de projeto não podem desistir. É para avançar até ao final», refere ao Obli. «O feedback que tenho é que [as alunas] estão a gostar imenso», adianta Natália Costa, e acrescenta que teve cuidado para que houvesse uma abordagem prática às várias temáticas, pelo que os trabalhos que desenvolvem na formação já estão diretamente ligados ao negócio que cada uma quer construir. Isto «porque são pessoas que vão montar o seu negócio e ser gestoras e trabalhadoras». Natália Costa diz que estas alunas vão ter de saber fazer, mas também saber gerir os projetos. Para Natália Costa, o sucesso dos projetos no mercado vai depender da dedicação de cada empreendedora. «Acreditamos também que não há projetos que à partida sejam viáveis […]; se sentirmos que não há espaço, mudámos a área de negócio».

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ACIB estimula empreendedorismo no feminino

Foto de Ana Teresa Miranda

| Tiago Varzim e Inês Barreto de Faria com Joaquim José Gonçalves |

explica o professor, «sem motivação e predisposição» dos candidatos, por «muito bom e interessante» que o projeto possa ser, estará condenado ao fracasso. Os institutos de ensino superior devem «ouvir e apoiar os projectos» e não «empurrá-los apenas porque hoje vivemos de estatísticas. E parece-me errado avaliar e comparar instituições com base no número de start-ups que lança», remata.

«O micro-crédito é um programa que está no terreno a nível nacional e que apoia micro-empresas numa linha de crédito» tendo em vista a economia social – é assim que Natália Costa define, ao Obli, o programa central do empreendedorismo da ACIB. É um empréstimo de 20 mil euros «em condições muito vantajosas», diz, acrescentando que esta linha de crédito está disponível para todos os empreendedores.

Porém, há um programa de empreendedorismo que foge à tradição do poder masculino, transferindo-o para as mãos da mulher.

Tudo começou quando a ACIB concorreu a um projeto da Comissão para a Cidadania e e Igualdade de Género e, no final, a proposta foi aprovada. Este modelo de empreendedorismo no feminino não tem qualquer custo para as empreendedoras barcelenses, sendo que estas são acompanhadas pela Comissão e pela ACIB. A missão é a mesma: apoiar a criação de micro-empresas, mas desta vez só no feminino.

Após ter recebido 80 candidaturas, a ACIB só pôde selecionar 15 alunas para usufruir do programa, as quais estão agora na fase de aprendizagem de gestão empresarial. «Elas já são

empreendedoras», caso contrário não se tinham candidatado ao projeto com uma ideia concreta, refere Natália Costa.

O objetivo do curso inicial de 194 horas é preparar as alunas empreendedoras nas várias áreas de gestão, para que o negócio que têm em mente funcione. «Gestão comercial e marketing, competências interpessoais, gestão banqueira e gestão da qualidade» – são estas as principais áreas de estudo da formação inicial. Porém, a aprendizagem das Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC) são fundamentais, considera Natália Costa.

Se as alunas conseguirem o aproveitamento desejado há uma outra fase: a da constituição da empresa. «Aí têm consultadoria, finanças, […]. No total, caso as empreendedoras sejam capazes de mostrarem o valor do seu projeto, estas têm cerca de cinco mil euros para o implementar no mercado barcelense, e não só», esclarece.

«Essas pessoas são ávidas de trabalhar, de desenvolver ideias, de desenvolver projetos»

«Em Barcelos, como em todas as zonas do país, há muitas pessoas com capacidades natas para desenvolver negócios novos. As mulheres não são exceção. As mulheres, e em Barcelos em particular – também fustigadas pela questão do desemprego –, há uma necessidade de fomentar o seu auto-emprego», explica Natália Costa. Sendo esta a única solução ou via para resolver a falta de rendimento, Natália Costa afirma ainda que «há uma capacidade muito elevada em Barcelos e em toda esta região do Vale do Cávado […] de um empreendedorismo no feminino. Essas pessoas são ávidas Foto de Ana Teresa Miranda

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Os canais generalistas portugueses não fogem à tendência mundial: os programas de caça-talentos são uma presença constante nas grelhas da RTP, SIC e TVI. De todo o país partem milhares de candidatos à espera de uma oportunidade. Os barcelenses Flora Miranda, Bruno Gomes e, mais recentemente, Tiago Araújo, já percorreram esse caminho e contam ao Obli como foi a experiência.

Caça-talentos - a experiência dos barcelenses no pequeno ecrã

á 11 anos, Portugal assistiu a um dos primeiros programas de caça-talentos da

televisão que já viveu na era da internet, da transmissão rápida de informação e dos fenómenos de massa que levam a experiência do pequeno ecrã ao extremo.

Em 2003, a RTP importava o talent show espanhol Operação Triunfo (OT) que levou jovens de todo o país aos castings para garantirem um lugar entre milhares.

«Ser cantora, para os meus olhos de adolescente, era inatingível»

Entre os candidatos estava a «inocente e ingénua» jovem barcelense Flora Miranda, natural da freguesia de Roriz, de 19 anos. Tentou a sua sorte no casting do Porto, e depois de meses de espera, lá recebeu o telefonema que lhe garantiu um lugar em

Lisboa, para onde foi com uma amiga «à aventura». Agora com 30 anos, Flora diz ao Obli não ter dúvidas de que este era um sonho de criança: «quando era miúda sempre tive esse desejo de, no fundo, ser cantora». Afirma ter tido uma «ilusão de criança normal e boa» que a levou a seguir este caminho. Mesmo nas nuvens por querer viver a sua própria utopia, Flora reconhece que não se deixou ficou na estratosfera: «fui à experiência, sim, com a ilusão que tenho, mas com os pés assentes na terra ao mesmo tempo». Até porque, diz, «ser cantora, para os meus olhos de adolescente, era inatingível».

Depois de participar em concursos de talentos no concelho, nomeadamente o Barcelos para a Música, a participação na primeira edição da Operação Triunfo pareceu-lhe um «seguimento lógico»: com o espírito de aventura rumou ao Porto, onde teve ajuda

da irmã que, a par da mãe, era a única que sabia que Flora ia tentar a sua sorte. Porém, a parte arriscada chegou na fase de Lisboa, para onde foi sem conhecer ninguém, apenas com a amiga: «nós já nos conhecíamos e, então, fomos as duas todas contentes». Esteve lá a fazer castings três dias seguidos e diz que teve «sorte de ficar sempre apurada porque assim tinha sempre noite no hotel» paga pela produção. «Hoje é que eu tenho a noção da inocência… mas acho que também tinha idade para me desenrascar», confessa, 11 anos depois, ao Obli.

O Caso Fundo de Bruno Gomes e o Factor X de Tiago Araújo

Após Flora Miranda, outros barcelenses se seguiram na corrida de concursos televisivos. Três edições mais tarde, em 2010, Bruno Gomes, residente na freguesia de Remelhe, entra na Operação Triunfo, numa altura crucial do seu percurso profissional: com 26 anos acabava de sair do conservatório por dificuldades financeiras e o caça-talentos da RTP surgiu como uma oportunidade para seguir carreira. Na altura confessou que estar ali, no casting da OT4, o fez «acreditar em coisas que pareciam extintas». «A Operação Triunfo ajudou sem dúvida a concretizar o meu sonho e a evidenciar a minha carreira», diz ao Obli Bruno Gomes, agora com 29 anos. Na sua audição marcou pela diferença ao levar um tema original português: Um Caso Fundo. E ainda agora é essa a sua canção mais conhecida, onde canta «quero dar a volta ao mundo, e viver para aprender». Quando soube que ia entrar na escola de Operação Triunfo emocionou-se e não deixou dúvidas quanto à importância daquele momento. «Na altura em que participei nos casting da Operação Triunfo queria apenas participar, subir ao palco para cantar e viver aquele momento», diz-nos quatro anos depois da sua participação.

Mais recentemente foi Tiago Araújo, residente em Barcelinhos, de 18 anos, quem tentou a sua sorte num concurso de televisão. O gosto pela música nasce no clube de cavaquinho, no Colégio La Salle, com o professor de Educação Musical Gonçalo Silva, onde rapidamente ganhou «o gosto pelo instrumento e curiosidade sobre música». Seguiu-se o Grupo Folclórico de Barcelinhos, do qual ainda faz parte,

H

Foto de Ana Marlene Soares

Flora Miranda sonhava, desde criança, ser cantora

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e onde aprendeu, junto com os melhores amigos, «muito sobre a tradição [...] ensina-nos tudo!» Depois de ter participado em 2012 no Ídolos, sem chegar às galas, o jovem barcelense concorreu ao Factor X no ano passado. No entanto, a vontade nunca nasceu do próprio: «eu participei nestes programas por incentivos de outras pessoas [...] e sempre fui com o espírito de conhecer o conceito e perceber como funcionam as coisas neste tipo de programas», diz agora ao Obli, admitindo que a perspetiva inicial era ficar pelos primeiros castings.

«Eu senti que era o Zé Maria da Operação Triunfo 1»

À distância, Flora Miranda diz ter consciência de que a primeira edição da Operação Triunfo foi a que teve mais impacto. «Estávamos ali fechados. E eu não tinha ideia se as pessoas cá fora gostavam de mim, se não gostavam. Se me achavam totó ou se me achavam espetacular», diz ao Obli. Só quando saiu da escola é que percebeu a repercussão da sua participação. Uma das recordações é a de ter sido um cromo de Bollycao, uma situação «caricata» que referiu ao Obli: «eu costumava dizer que eu já sabia que era uma croma, mas saber que um dia ia ser um cromo de Bollycao já é um patamar acima [risos]». Mas nem tudo o que viu cá fora foi positivo para Flora Miranda. Numa entrevista que os pais deram a uma revista, Flora diz ter sido catalogada: «eu senti que era o Zé Maria da Operação Triunfo 1. Por vir de uma aldeia, que é uma cena altamente!», confessa ao Obli, ironizando que, se «tivesse vindo de Trás-dos-Montes, era melhor ainda». Contudo, refere que foi algo que se dissipou - «não tive problemas com isso».

Enquanto esteve na escola da Operação Triunfo pouco falou com a família. Nas galas tentava acenar e mandar um ‘olá’ quando conseguia, mas não podia falar com os familiares, e até as cartas que mandavam eram censurada para não tivesse informação do exterior. «Pouco falei com a família e isso deitou-me um bocado abaixo», confessa ao Obli, porque os dez minutos semanais ao telefone eram insuficientes para a extensa família que tem.

Diz que não conseguiu aprender tudo o que a escola da OT lhe ofereceu: «era tanta informação em tão pouco tempo que eu acho sinceramente que não consegui assimilar tudo». Os concorrentes da Operação Triunfo tinham desde aulas de música a aulas de expressão corporal, de interpretação e de dança durante uma semana - todo um trabalho que culminava nas atuações de domingo, como é habitual. Flora Miranda chegou até à gala oito, altura em que foi eliminada. Porém, numa especial nona gala foi repescada para o lote de concorrentes em concurso. Mas a sorte não estava do seu lado: na décima gala voltou a sair. «Andei ali aos trambolhões», diz entre gargalhadas.

«Os professores foram essenciais»

A experiência do autor do tema Um Caso Fundo, apesar de ter sido no mesmo programa, foi diferente. Já com uma noção mais realista das repercussões que a participação neste tipo de programa pode ter, Bruno Gomes não tem dúvidas que a Operação Triunfo 4 mudou a sua vida. «A OT mudou sem dúvida a minha vida sem dúvida, mas aquilo que hoje sou como intérprete é o reflexo do empenho e muito trabalho diário». O cantor barcelense chegou até à sexta gala tendo abandonado a escola da RTP no final de 2010. Para chegar até lá, Bruno Gomes contou com a ajuda dos professores. Quando questionado pelo Obli sobre se o professores foram essenciais, Bruno Gomes não hesita: «sem dúvida, todos eles e cada um na sua especialidade foram determinantes para mim».

«Fazem-se muitos contactos»

Tiago Araújo concorreu a solo, mas como não conseguiu passar às fases seguintes juntaram-no com mais três concorrentes em pleno Meo Arena: David Silva, Eduardo Monteiro e João Carrasqueira. Juntos formaram inicialmente os Bring Us Tomorrow que, ao serem escolhidos por Paulo Ventura para serem um dos grupos finalistas, passaram a chamar-se Aurora. Chegaram até à antepenúltima gala num percurso onde deram primazia à música portuguesa. Com esta experiência, Tiago Araújo diz que aprendeu a «lidar com o palco e a saber controlar as emoções». «Mas a maior aprendizagem foi sem dúvida musical: aprendi a fazer coisas que não sabia anteriormente e corrigi alguns erros ao nível do canto», refere ao Obli, e acrescenta que “claro, fazem-se muitos contactos” para o futuro profissional.

E depois do adeus? É ganhar… e perder

Depois de meses de atenção redobrada pelos media, sob o olhar atento de milhões de portugueses, num talent show que dura uns meses, qual o resultado pós-programa? Para Flora Miranda o «resultado imediato foi incrível» por ter conseguido profissionalizar-se na área. Questionada pelo Obli se sem a Operação Triunfo isso não teria sido possível, a cantora afirma que «talvez não de forma tão rápida». «Mas tenho a certeza que tinha seguido música», remata. A participação no programa da RTP possibilitou-lhe ir em digressão por todo o país, com os restantes concorrentes, experiência que diz ter sido mais enriquecedora do que as próprias atuações nas galas: «uma pessoa está ali a aprender com a experiência».

«Durante algum tempo quase que odiava ter participado na Operação Triunfo»

Ficou a estudar dois anos em Lisboa porque «achava que se viesse para Barcelos era assinar a sentença de morte, salvo seja», mas os convites no Norte foram sempre mais abundantes. Acabou por ir estudar representação para o Porto, uma experiência que valoriza: «acho que o curso de teatro fez-me ficar com muito mais confiança como pessoa e de encarar o público, de performance no palco». Foi aqui que encontrou a catarse necessária para descartar-se do presente envenenado da Operação Triunfo: a insegurança. «Tornei-me uma pessoa muito insegura, mesmo. Quase com medo de ir para o palco, o que é estúpido porque foi sempre a coisa que eu mais gostei de fazer», conta ao Obli. Fala ainda do preconceito relacionado com os talent show há 11 anos: «Durante algum tempo quase que odiava ter participado na Operação Triunfo. Eu sei que era estúpido pensar nisso: hoje em dia sei que foi positivo e

DRBruno Gomes lançou, em 2012, o disco Um Caso Fundo

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Obli - março/maio - 2014 23na altura também sabia que era positivo, mas em algumas coisas quase que me arrependia de ter participado».

Os projetos pós-Operação Triunfo foram dissipando-se, sendo que atualmente, «por não conseguir dizer não» a propostas que a apaixonam, integra três projetos: um infantil, o Fauna&Flora, um de música portuguesa, o Senhor Vadio, e o projeto dos seus olhos, tal como definiu ao Obli, Fado Em Trio. Com o curso de teatro transformou-se num 2 em 1 e com isso conseguiu um lugar n’Os Caricas do Canal Panda. Aliás, a presença em televisão já não lhe causa a ansiedade de há 11 anos: «uma pessoa lá vai, toda contente, como se fosse ir ali ao tasco beber um café [risos]».

A concretização da carreira foi «extremamente difícil»

Com a experiência do Conservatório de Música de Barcelos, da experiência com o seu professor Cosme Campinho na EB 2,3 de Manhente e de uma dupla vitória no Barcelos para a Música, Bruno Gomes foi construindo um percurso profissional ainda antes da Operação Triunfo. Mas depois de passar pelos holofotes da televisão, a concretização da carreira foi «extremamente difícil», só possível «com o apoio e ajuda de amigos nos custos inerentes à sua execução», referindo-se ao disco de estreia Um Caso Fundo, lançado em 2012. Antes disso ainda pertenceu aos Groove Attack, projeto que nasceu da OT. Apostou ainda na formação na Escola de Jazz do Porto, depois interrompida, mas que pretende retomar. O novo disco ainda começa a ganhar forma, mas Bruno Gomes diz que tudo fará «para lançar o single do mesmo durante este ano». «A minha carreira está numa fase de

reflexão, este será um ano em que me vou dedicar à música e à minha carreira mas a minha família será a prioridade», remata em declarações ao Obli.

O Factor X «mudou em grande parte a minha vida»

Tiago Araújo refere-se aos últimos meses como «tempos incríveis» e não duvida que o Factor X “mudou em grande parte” o rumo da sua vida: «nunca esperei calhar num grupo com o qual me identificasse verdadeiramente». Ao contrário da maior parte dos concorrentes dos talent shows portugueses, os Aurora começaram logo a trabalhar num álbum após a saída do programa, mesmo não tendo sido vencedores: «já estamos a trabalhar no nosso futuro e contamos com a ajuda do Paulo Ventura», refere Tiago Araújo confiante de que os Aurora têm um lugar na música portuguesa. Quanto à génese do trabalho de

estúdio não revela nada ao Obli, mas diz que «foi fantástica a primeira vez que entrámos no estúdio». E defende-se do estigma de boys band: «nós não somos uma boys band [...]. Seriam os Cabeças no Ar e os Rio Grande uma boys band?”. Mas a jornada pela música não será sem estudos. Atualmente em stand by devido à participação do programa e pela desistência do curso de Ciência Política, Tiago já tem uma ideia definida: «optei por seguir aquilo que realmente gosto e vou estudar música!»

Zapping: há unanimidade em considerar que estas são experiências efémeras

«Já contaste a quantidade de cantores que já saíram desses programas? Saem imensos! Depois cada um faz o seu trajeto: uns vão ficando, outros não. Depende.» É assim que Flora Miranda, a mais experiente dos três, sublinha o quão efémeras estas experiências são. O conselho para os jovens barcelenses que participem nestes programas, como é exemplo Diana Martins - 11 anos, de Arcozelo, que no dia 9 de fevereiro entrou no programa A Tua Cara Não Me É Estranha, da TVI -, é que aproveitem mas tendo em mente que «aquilo não vai durar para sempre porque é muito efémero». Flora realça ainda a força psicológica necessária, tal como Bruno Gomes que aconselha a que «agarrem a oportunidade com muita responsabilidade e sejam felizes sem nunca se deixarem invadir pela ilusão». O fundamental, para Tiago Araújo, é arriscar: «é preciso ter sorte, mas a sorte só é possível se a procurarmos, a sorte nunca nos encontra».

| Tiago Varzim |

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DR

DRTiago Araújo participou recentemente no Factor X

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À semelhança do que acontece em todos os países europeus, Barcelos tem sentido algumas dificuldades na integração no mercado de trabalho da sua população mais jovem.

O número de desempregados inscritos no centro de emprego de Barcelos (Barcelos e Esposende) desceu dos 9420, em Janeiro de 2013, para 8027, em Janeiro de 2014. Neste total, o peso dos jovens desempregados inscritos, com menos de 34 anos, em 2013 era de 36 % e em Janeiro de 2014 era de 28,5 %.

Trata-se, sem dúvida alguma, de uma descida significativa, resultante da capacidade empreendedora da região e da adequação das medidas activas de emprego que o IEFP promove face àquilo de que as empresas necessitam para responderem à necessidade de criação de postos de trabalho que a demanda económica obriga.

É a economia que cria empregos ou os destrói, todos o sabemos, mas muitas vezes não nos lembramos que é a capacidade das pessoas que determina o maior ou menor impacto dos ciclos económicos. E esta capacidade reside fundamentalmente na qualificação escolar e na competência profissional dos recursos humanos.

Portugal detém níveis de qualificação inferiores à média europeia. Trata-se de um dos obstáculos à empregabilidade da população desempregada em geral e dos jovens em particular.

O número de indivíduos com 12.º ano e Superior, em Portugal, corresponde a 36,2% da população, na União Europeia, 70%, e, na Alemanha, 79,4 %.

Resulta daqui uma falta de competitividade das nossas empresas face aos nossos parceiros europeus que nos tem colocado num patamar de crescimento muito aquém do que é desejável para a melhoria das nossas condições de vida e para a chamada coesão em termos europeus.

Devemos, por isso, manter a consciência de que a formação escolar e profissional são essenciais para a melhoria da empregabilidade, e contrariar o discurso profundamente errado de que o ingresso no ensino superior não corresponde a uma garantia para o emprego futuro. Actualmente, todos os indicadores europeus e nacionais demonstram que, quanto maior é a qualificação, maiores são as probabilidades de encontrar emprego.

Em Barcelos, os dados do IEFP reflectem isso mesmo – o desemprego tem vindo a diminuir mais entre os desempregados com formação superior.

E de entre estes, é meu testemunho o facto de que cada vez mais os empregadores atentam nas em outras componentes formativas que estão um pouco para além do chamado know-how; para além do chamado saber-fazer adquirido nas nossas escolas e academias; trata-se dos chamados soft skills.

Vários estudos levados a cabo por universidades americanas e instituições europeias (1), no sentido de identificarem as necessidades das empresas num futuro próximo, de modo a adequarem a sua oferta formativa às necessidades do mercado, evidenciam que, se por um lado as empresas desejam que os estabelecimentos de ensino desenvolvam e privilegiem conhecimentos na área da matemática, das línguas, da física e das tecnologias da informação, entre outras matérias ligadas às engenharias e afins, também é verdade que quando responde às questões relacionadas com as competências que privilegiam na admissão de candidatos ao primeiro emprego, todas elas confluem em competências relacionadas com a capacidade de liderança, comunicação, empreendedorismo, gramática, trabalho em equipa, capacidade de síntese e de conclusões retiradas de vários contextos, entre outras características comportamentais que definem o maior ou menor índice de empregabilidade – facilidade em arranjar emprego.

Conscientes da necessidade de se lavar a cabo medidas conducentes à melhoria das condições de empregabilidade da população jovem desempregada e para fazer face a esta preocupante questão do desemprego jovem, a União Europeia desenvolveu um conjunto de medidas para execução nos Estados Membros, que visam contribuir para a resolução dos problemas reais deste segmento da população.

Em resposta a este desafio, Portugal instituiu o programa Garantia Jovem (www.garantiajovem.pt).

Trata-se de um compromisso para que, gradualmente e num prazo de 4 meses após o jovem sair do sistema de ensino ou do mercado de trabalho, lhe seja feita uma oferta de emprego, de continuação dos estudos, de formação profissional ou de estágio.

A Garantia Jovem não é uma garantia de emprego. Mas tem como objectivo dar aos jovens, o mais rapidamente possível, uma oportunidade para apostar na sua qualificação e estar em contacto com o mercado de trabalho, com vista a combater a inactividade e o desemprego dos jovens.

A Garantia Jovem tem 3 grandes objectivos:

• Aumentar as qualificações dos jovens• Facilitar a transição para o mercado de

trabalho• Reduzir o desemprego jovemEm Portugal, a Garantia Jovem vai

apoiar os jovens até aos 29 anos (inclusive), que não estão nem a trabalhar nem inseridos no sistema educativo e formativo.

De acordo com as preferências e necessidades, a Garantia Jovem oferece várias oportunidades ao nível da participação em medidas de ensino, formação e emprego.

Para tal, foi montada uma rede de parceiros para apoiar os jovens nessas escolhas.

No Concelho de Barcelos fazem parte as seguintes entidades:

Centro de Emprego de Barcelos, Loja Já de Barcelos, ETG, Kerigma, ACIB, GIP - Pousa, GIP- Fão e GIP - Roriz.

É, por isso, decisivo que todos contribuamos para a diminuição do abandono escolar, para o aumento do número de pessoas com escolaridade obrigatória, para o desenvolvimento de acções de formação profissional de acordo com as necessidades do tecido empresarial, para a formação superior em áreas de maior valor acrescentado e para a instituição transversal da formação ao longo da vida.

Em nome do nosso futuro.

| Armando João Santos |Diretor do Centro de Emprego de

Barcelos

(1)Are They Really Ready to Work?”, 2006 by The

conference Board, Inc, ISBN nº 0-8237-0888-8

“Assessment and Teaching of 21st Century Skills”, 2012

P21 Framework Definitions”, 2009, The Partnership for 21st Century Skills

New Skills for the New Jobs”, 2009, EU – ISBN-978-92-79-11211-9

Emprego Jovem em Barcelos

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