Operadores de Leitura Da Narrativa

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OPERADoRES DE LEITURA DA NARRATIVA Arnaldo Franco Junior IxrnoouçÁo Neste capítulo, apresentamos um conjunto de conceitos que podem ser caracterizados como operadores de leitura do texto narrativo, ou seja, são conceitor-.hìrr. para o desenvolvimento de uma análise e interpretação do texto narrativo pautada pela tradição dos àstudos acadêmicos. Alguns desses operadores são, muitas vezes, utilizados por difeientes linhas de teoria da literatura quando do desenvolvimento do estudo de um texto literárirc a partir dos princípios e da metodologia que lhes são pertinentes. Reunimos, portanto, um conjunto do que consideramos ser os operadores de leitura mais comuns no que tânge ao estudo, análise e interpretação do texto nârrâtivo. Quando necessário, âpresentamos as variantes no que se refere a uma definição ou delimitação conceitual dos mesmos, de modo a oferecer informações que permitam ao leitor optar pela que lir. p"re.er mais adequada ou, ainda, mais ajustada às eventuais exigências práticas quanto à condúçao dodesenvolvimentâ de estudos sobre o texto narrativo. O cÊr.rnno NARRATTvo ÉJa u- lugar-comum a divisão da narrativa em três grandes blocos articulados em torno do conceito de conflito dramático, ou intriga, nos termos de Tomachevski (1976), cada um correspondente ao que poderíamos classificar como mouimentos própríos ao gênero, " r"b"ri Introduçã0, Duenuoluimento e Conclusã0. parece melhor do que outro qualquer que sugira ou qual a Introdução, o Desenuoluimento e a Conclusão devam demonstra que tais mouimentos apresentam uma grande sua posição nos textos. A conclusão, por exemplo, pode (Jso o termo mouimentos porque me pressuponha uma ordem Íìxa a partir da aparecer. A própria experiência de leitura mriabilidade no que se refere à ordem de

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OPERADoRES DE LEITURADA NARRATIVA

Arnaldo Franco Junior

IxrnoouçÁo

Neste capítulo, apresentamos um conjunto de conceitos que podem ser caracterizados comooperadores de leitura do texto narrativo,

ou seja, são conceitor-.hìrr. para o desenvolvimento deuma análise e interpretação do texto narrativo pautada pela tradição dos àstudos acadêmicos. Algunsdesses operadores são, muitas vezes, utilizados por difeientes linhas de teoria da literatura quando dodesenvolvimento do estudo de um texto literárirc a partir dos princípios e da metodologia que lhes sãopertinentes.

Reunimos, portanto, um conjunto do que consideramos ser os operadores de leitura mais comunsno que tânge ao estudo, análise e interpretação do texto nârrâtivo. Quando necessário, âpresentamosas variantes no que se refere a uma definição ou delimitação conceitual dos mesmos, de modo aoferecer informações que permitam ao leitor optar pela que lir. p"re.er mais adequada ou, ainda, maisajustada às eventuais exigências práticas quanto à condúçao dodesenvolvimentâ de estudos sobre otexto narrativo.

O cÊr.rnno NARRATTvo

ÉJa u- lugar-comum a divisão da narrativa em três grandes blocos articulados em torno doconceito de conflito dramático, ou intriga, nos termos de Tomachevski (1976), cada um correspondenteao que poderíamos classificar como mouimentos própríos ao gênero,

"r"b"ri Introduçã0, Duenuoluimento

e Conclusã0.

parecemelhor do que outro qualquer que sugira ouqual a Introdução, o Desenuoluimento e a Conclusão devam

demonstra que tais mouimentos apresentam uma grandesua posição nos textos. A conclusão, por exemplo, pode

(Jso o termo mouimentos porque mepressuponha uma ordem Íìxa a partir daaparecer. A própria experiência de leituramriabilidade no que se refere à ordem de

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RANco JuNron

ser antecipada à introdução e ao desenvolvimento - fato comum a muitas das narrativas policiais,de mistério, de terror e de suspense que se mârcâm, desse modo, por um início in ultima res, isto é,

que corresponde ao desfecho. O desenvolvimento pode prescindir de introdução e de conclusão,como ocorre, por exemplo, em certos contos e românces modernos cuja leitura nos exige uma

mudança em nossos hábitos de leitura e recepção do texto literário. E, por Íìm, vale lembrar que erauma convenção da poesia épica greco-latina iniciar a nârrativa in media res, orr seja, apresentando ao

leitor um acontecimento adiantado da história que, depois, era esclarecido com â apresentação doque ocorrera antes.

Embora pareça ponto pacíÍìco, há divergências quanto a essâ divisão da narrativa em trêsblocos. Introdução, Desenvolvimento e Conclusão do quê? Da história, dirão alguns. Danarratiua, rebaterão outros. Do texto, dirão outros aínda, já acrescentando que qualquer textopode ser assim dividido e que, portanto, tal divisão não é traço característico da narrativa. Qualseria a especificidade da narrativa, então? Eis a questão que é preciso tentar responder, mesmosabendo que a resposta é sempre precária.

A especificidade da narrativa parece ser o trâtâmento conferido ao conflito dramático que lheé intrínseco. Sem conflito dramático, não há narrativa, mas ele não é um dado exclusivo danarrativa. Estâ aí, há séculos, a poesia lírica para comprovar isso. E, além disso, a presença de

conflito dramático também em relatos - aliás, muito comum - confirma o que afirmamos.

Aidentificação do conflito dramático é, no entanto, fundamental para que se possa estabelecerum estudo detalhado da narrativa na qual ele se manifesta - o que já se apresentâ como umâpista metodológica: identificá-lo, voltar a ele quantas vezes for necessário para pensar a histórianarrada pelo texto que se está analisando, notar que a partir e/ou em torno dele circula umasérie de elementos que são passíveis de decomposição pela análise descritiva e passíveis de re-união - operada sempre com algum distanciamento crítico - pela análise interpretativa.

Note-se que a distinção entre análise descritiva e análise interpretativa é,para o que aquinos interessa, um recurso didático. Â análise descritiva é aquela voltada para a decomposição dotexto em elementos menores que o constituem e o fazem pertencer a um determinado gêneroliterário. Tâl decomposição do texto em elementos menores é, por assim dizer, algo comouma dissecação do texto de modo a facnltar a compreensão e a classificação das partes que oconstituem. A análise interpretativa, por suâ vez, volta-se para a. compreensão das possíveisrelações de sentido que se estabelecem entre tais elementos que constituem o todo textuale, também, pari. a compreensão das possíveis relações de sentido que se estabelecem entre a

ordem que preside a organizzção de tais elementos sob a forma de texto e a história ali narrada.Além disso, a análise interpretativa também diz respeito às relações entre o texto e o seu leitor,

otextoeoseuautor,otextoeaescolaliteráriaàqualsevinculaecomaqualdialoga,otextoea sociedade, o texto e a história etc.

A distinção entre â história narrada e o texto no qual ela se manifesta é fundamental. Épreciso levá-la sempre em consideração, pois não basta "extrair", após a leitura, a história narradado texto que a veicula. No caso da narrativa literária, os dois aspectos estão sempre intimamentevinculados e exigem igual atenção do leitor. É necessário observar, analisar, interpretar e avaliarcriticamente tanto a história que o texto narra como o modo pelo qual a nârra. Isso exige umaatenção púa a própria composição do texto, para o modo como os recursos linguísticos e osdemais elementos constitutivos da narrativa estão, ali, organizados de modo pârticular.

O tratamento conferido ao conflito dramático pode ser o fator de distinção entre o que

é, num determinado momento histórico, considerado literatura e o que não é consideradoliteratura, entre o que é reconhecido como um trâtâmento literário dado a uma história e o quenão chega a sê-lo. Compare os dois textos a seguir:

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Assassinato na Rua da Constituiçáo

O funcionário do Ministério da Fazenda, Misael,63, matou a tiros a ex-prostituta Maria Elvira, comquem vivia há três anos. O crime ocorreu na rua da

Constituição, Rio deJaneiro, motivado, ao que parece,

por umâ série de traições da mulher. Ao que tudoindica, os amantes mudavam-se de bairro toda vez que

Misael, avesso a escândalos, descobria uma traição de

Maria Elvira. A polícia encontrou a vítima em decúbitodorsal, com marcas de seis tiros no corpo.

Tïagédia brasileirc

Manuel Bandeira

Misael, funcionário da Fazenda, com 63 anos deidade.

Conheceu Maria Elvira na Lapa - prostituídâ, comsífilis, dermite nos dedos, uma aliança empenhada e os

dentes em petição de miséria.Misael tirou Maria Elvira da vida, instalou-a

num sobrado no Estácio, pagou médico, dentista,

manicura...Dava tudo quanto ela queria.

Quando Maria Elvira se apanhou de boca bonita,arranjou logo um namorado.

Misael não queria escândalo. Podia dar uma surra,um tiro, uma facada. Não fez nada disso: mudou de

casa.Viveram três anos assim.Toda vez que Maria Elvira arranjava namorado,

Misael mudava de casa.

Os amantes morâram no Estácio, Rocha, Catete,Rua General Pedra, Olaria, Ramos, Bonsucesso, VilaIsabel, Rua Marquês de Sapucaí, Niterói, Encantado,

Rua Clapp, outra vez no Estácio, Todos os Santos,

Catumbi, Lavradio, Boca do Mato, Inválidos...Por fim, na Rua da Constituição, onde Misael,

privado de sentidos e de inteligência, matou-a comseis tiros, e a polícia foi encontrá-la caíóa em decúbitodorsal, vestida de organdi azul.

Quadro 1. O texo jornalístico e o texto literário

1-\*.--"4x{2}Ope RADoREs DE LErruRA DA NARRÂTIvÂ\-_"/

Note que os dois textos narram a mesma história: uma mulher foi assassin da a tiros por umhomem que erâ traído por ela. No entanto, os efeitos.que cada um dos textos suscita no leitor são

diferentes, e isso afeta a própria história narrada em cada um deles.

O primeiro texto se caràcterizn- como uma notícia de jornal, marcando-se pela minimização do

conflito dramático estabelecido entre os âmantes e, também, pelo esforço de redução do grau de

ambiguidade em favor da objetividade jornalística no registro dos fatos. O segundo caracteriza-se

como uma narrativa literária, marcando-se pela exploração do conflito dramático de modo a suscitare manter o interesse do leitor e, também, pelo maior grâu de ambiguidade que âtribui a determinados

fatos e/ou elementos da história.

No texto de Manuel Bandeira, a história de amor, ciúme, traição e morte que une Misael e Maria

Elvira recebe um tretamento que torna dramático o conflito que os une (AmorxTtaição). Note que uma

série de informações, consideradas de menor importância para o relato jornalístico do fato, são muito

importantes pàr:' a crí^ção da expectativa e para a manutenção do interesse do leitor no texto de Manuel

Bandeira: a descrição do estado Íïsico de Maria Elvira quando Misael a conheceu; os cuidados que ele

dispensou à saúde e à beleza da amante; a relação dos lugares em que o casal morou, o nome da rua em

que o crime ocorreu, a posição do corpo da mulher ao ser encontrada pela polícia, a cor e o tecido do

vestido que ela usava quando foi assassinada, o número de tiros com que o assassino a mâtou.

Na narrativa literíria, tais detalhes ganham relevância exatamente porque intensificam tanto â

dramaticidade do conflito como o grau de ambiguidade que caractenz^a história narrada - o que faz com

que o texto tenha maior abertura no que se refere às suas possibilidades de interpretação pelo leitor.

Tsou,rs BonNrcr / Lúctr OsaNa Zorrru (oncnNlzaoonts) -35

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RANCO JuNron

Os opsRADoREs DE LErruRA DA NARRATTvA

O conjunto de operadores de leitura da narrativa que aqui vamos apresentar foi organizadoprincipalmente a partir das contribuições de textos de teoria e crítica vinculados basicamente ao

Formalismo Russo e ao Nex/ Criticism - não por acaso, linhas teóricas que privilegiam o estudo damaterialidade verbal do texto no desenvolvimento dos estudos literários. De certa forma o FormalismoRusso e o Neu., Criticism forneceram, dado o seu pioneirismo no que se refere à construção da teorialiterária como uma disciplina pautada por princípios e métodos embasados cientificamente, os

operadores de leitura básicos às demais linhas de teoria literária que se manifestaram no século )O(Partindo-se das contribuições dos formalistas russos, ecomplementando-as com as contribuições de

outros teóricos, a narrativa pode ser analisada descritivamente utilizando-se os seguintes conceitos:

FÁnur-e,Tnaiue, fNTRrce, Esrónra, ENnsoo

Ajíbula é um conceito que compreende os âcontecimentos ou fatos comunicados pela narrativa,ordenados, lógica e cronologicamente, numa sequência nem sempre correspondente àquela por meioda qual eles são apresentados, no texto, ao leitor. Ela exige do leitor a capacidade de realizar umasíntese da história narrada. Tàl síntese deve ser cepaz de abstrair, do texto narrativo, os elementosfundamentais que compõem a história ali narrada. Isso significâ que a {ábula deve conter os dadosfundamentais que, de maneira sumária, condensem a introdução, o desenvolvimento e a conclusão dahistória narrada, articulados a partir das relações de causalidade (causa-e-consequência):

Chama-se fábula o conjunto de acontccimentos ligados cntre si que nos são comunicados nodecorrer da obra. Ela poderia ser exposta de uma maneira pragmática, de acordo com a ordemnatural, a saber, a ordem cronológica e causal dos acontecimentos, independentemente damaneira pela qual cstão dispostos e introduzidos na obra (TOMACHEVSKI, 1976, p. 173).

Ao reconstituirmos e fâbula de uma história presente em um texto narrativo, organizamosnaturalmente a síntese da história a pârtir das relações de causa-e-consequência que facilitam a sua

compreensão por outres pessoas, sejam as que nos ouvem contar, por exemplo, a história de umromance, de um Íìlme, de um conto, de uma novela de televisão em poucas palavras, sejam as quevenham a ler os textos nos quais analisamos e interpretamos um texto narrativo.

Atrama é um conceito que corresponde ao modo como a história narrada é organizada sob a forma

de texto, ou seja, ela ê a própria construção do texto narrativo, sua "arquitetura". Tomachevski definea diferença entre Íábula e trama nos seguintes termos:

A fábula opõe-se à trama que ó constituída pelos mesmos acontecimcntos, mas que respeitasua ordem de aparição na obra e a sequência das informações que se nos destinam. [...] N"realidade, a fãbula é o que se passou; a trama é como o leitor toma conhccimcnto [do que se

passoul (TOMACHEVSI(, 197 6, p. 173).

A trama de uma narrativa revela, ao ser identificada, o trabalho de criação do escritor, as escolhastextueis que ele fez para contar a história deste ou daquela maneira, criando este ou aquele efeito,afìrmando um determinado conjunto de sentidos possíveis pàra a interpretação da história por meioda organização das palavras sob a forma de texto. Isso significa que o(s) sentido(s) e os efeitos presentes

em um texto foram construídos pelo escritor por meio dâ estruturação, da composição, da construçáodaquele mesmo texto de um modo determinado (aquele ali objetivamente registrado pela escrita soba forma de texto, e não outro), cuja especificidade deve ser levada em consideração. O leitor deve,

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portanto, aprender a construir a sua leitura (análise descritiva * análise interpretativa) a partir docodunto de possibilidades que o texto, organizado de modo singular, oferece.

A trama, diferentemente da Íãbula, não é passível de síntese. Ela é identificada quando o leitorinvestiga e define as relações que unem os diversos elementos que, ârticulados pela escritâ, compõem

o texto narrativo.O conceito de intriga difere dos de Íãbula e trama, embora seja intrinsecâmente vinculado a eles. A

intriga diz respeito ao conflito de interesses que caracteriza a luta dos personagens numa determinadanerrativâ. Tomachevski nos dá a seguinte deÍìnição de intriga:

O dcscnvolvimcnto da ação, o conjunto dc motivos que a caracterizam chama-sc intriga [...].O dcsenvolvimento da intriga (ou, no caso de um rcagrupâmcnto complexo de personagens,o dcscnvolvimcnto das intrigas paralclas), conduz ao dcsaparccimcnto do conflito ou à criação

dc novos conflitos (TOMACHEVSKI,7976, p. 177).

A intriga está relacionada, portanto, com a noção de conflito dramático, que é desenvolvido a

partir das ações das personagens - elementos esses (ação; personagem), que se vinculam à noçãode motiuo, definido por Tomachevski (1976) como "unidade temática mínima" e obtido quando,num processo analítico, a obra é decomposta em partes caracterizadas por uma unidade temáticaespecífica:

 noção de tema é uma noção sumária que une a matória vcrbal da obra. A obra inteirapodc scr scu tcma, âo mcsmo tempo que cada parte da obra. A dccomposição da obraconsiste cm isolar suas pârtes caracterizadas por uma unidadc tcmática específica.

[...] Através desta decomposição da obra em unidadcs temáticas, chegamos cnfim às

partcs indccompostas, âtó às pequenas partículas do matcrial temático: 'A noitc caiu";"Raskolnikov matou a vclha", "o herói morrcu", "uma carta chegou" etc. O tema dcsraparte indccomposta da obra chama-sc [...] motivo. No fundo, cada proposição possui scu

próprio motivo. [...]Os motivos combinados entre si constitucm o apoio temático da obra. Nesta pcrspectiva, a

fábula aparece como o conjunto dos motivos em suâ sucessão cronológica de causa e efcito;â trama aparece como o conjunto dcstes mesmos motivos, mas nâ succssão em quc surgcdentro da obra (TOMÂCHEVSKI, 1976,p.174).

Os conceitos de fábula e tramd encontrâm, de certa forma, correspondentes nos conceitosde estória (story) e enredo (plot), disseminados â partir dos estudos de Forster (1974) e do Ner.y

Criticism norte-americano. Tãl correspondência é, a rigor, imperfeita e, no limite, inadequada.No entanto, é comum encontrarmos textos em que os termos estória e enredo estabelecem umcontraste semelhante àquele estabelecido entre a fâbula e a trâma. O conceito de estória é utilizadotanto para identificar a história narrada pelo texto narrativo como, muitas vezes, para identificar

a síntese de tal história. O conceito de enredo foi originalmente criado para identiÍìcar o modocomo uma história é construída por meio de palavras e, portanto, organizada sob a forma de texto.Nesse sentido, ele corresponde, de fato, ao conceito de trama utilizado pelos formalistâs russos.No entanto, devido à sua larga e nem sempre rigorosa utilização, vamos, por vezes, encontrá-loem textos que contradizem esse sentido original, a saber: a) como termo que identifica a histórianarrada pelo texto narrativo; b) como termo que identifica a síntese da história narrada pelo textonarrativo; c) como termo que identifica a temática e/ou o gênero que caracteriza a história narradapelo texto narrativo. É preciso tomar cuidado com tais empregos, pois eles deixam escapar um dostraços essenciais da obra literária, a sua construção.

No quadro abaixo, construído a partir das contribuições de Lodge (1996, p. 4) e Aguiar e Silva(1988, p. 71,1,-712), apresentamos alguns dos termos utilizados por diversos autores e/ou linhasteóricas para diferenciar esses dois planos da narrativa. Embora redutor, este quadro visa a estabelecer

correspondências entre a terminologia teórica utilizada para distinguir a história narrada do modocomo ela é construída sob a forma de texto.

Trrouas BoNrrcr / Luctt Os,qNa Zorrru (oncaNrz,roone s1 -. 37

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Destaque-se o fato de que Genette (L979) estabelece, na verdade, uma distinção tríplice, enão binária, entre história narrada e história construída. Segundo Lodge,

ele dividiu o discurso narrativo cm tcxto mesmo (récit/narrativa) c no ato dc narrar, o qualproduz o tcxto (narração). Isso ajuda a dcfinir subcatcgorias dc narrativa tócnica mais dclicadas,mas não afeta a oposição fundamental entrc História c Discurso. Ele também, às vezes, usa otcrmo "diegese" ao invés dc histoire e isso podc ser fontc de confusão. (Em Gencttc, NanatiueDiseourse, 1980, onde hktoire é traduzida como história, récít como nârrativa e narration comonarração) (LODGE, 1996, p. 4-5).

Para o que âqui nos interessa, o terïno diegese, muito disseminado, corresponderá à noção de Íãbula,de história narrâdâ; o termo discurso, à noção de

trama, de história construída. Veja-se o quadro abaixo:

NARRATIvA FORMALISMO RUSSO NEW CRITICISM NARRATOLOGIA

História narrada Íãbula estória (story) diegese

História construída trama enredo (plot) discurso narrativo ounarração

Quadro 3. Os termos diegese e discurso

A pEnsoNecnM E suas cLASsrFrcAçóEs

A personagem é um dos principais elementos constitutivos da narrativa. É sobre ela que recai,normalmente, a maior atenção dispensada pelo leitor, dada a ilusão de semelhança que tal elementocriâ com â noção de pessoa. O que é uma personâgem? Um ser construído por meio de signos verbais,no caso do texto narrativo escrito, e de signos verbi-voco-visuais, no caso de textos de naturezahíbrida como as peças de teatro, os filmes, as novelas de televisão etc. As personagens são, portanto,representações dos seres que movimentam a narrativa por meio de suas ações e/ou estados.

As personagens podem ser classificadas a partir de dois critérios: a) segundo o seu grau de

importância parâ o desenvolvimento do conflito dramático presente na história narrada pelo textonarrativo; b) segundo o seu grau de densidade psicológica. As tabelas abaixo âpresentam a classificaçãodas personagens segundo esses dois critérios.

TEORIA/AUTOR HISTÓRIANARRADA HISTóRIA CONSTRUÍDAFormalistas russos fábula tramâ

New Crítickm (Forster) story plot

T. Todorov história discurso

G. Genette história (ou diegese) narração

]ean Ricardou ficção narrâçao

Roland Barthes rédt narrâçâo

Grupo p narrâtiva propriamente dita discurso narrativo

Claude Bremond réeit raconté rêeit racontant

Seymour Chatman história discurso

Quadro 2. Tèrminologia teórica

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PRINCIPAL

A personagem é classificada como principal quando suas ações são fundamentaispara a constituição e o desenvolvimento do conflito dramático. Geralmente,desempenha a função de herói na narrãtiva, reivindicando para si a atenção e ointeresse do leitor. Não é incomum que um mesmo texto apresente mais de uma

personagem principal.

SECUNDÁRIA

A personagem é classificada como secundária quando suas açóes não sãofundamentais para a constituição e o desenvolvimento do conflito dramático.Geralmente, desempenha uma função subalterna, atraindo menos a atenção e

o interesse do leitor. Pode acontecer, no entanto, de a personagem secundáriarevelar-se, por um artifício do enredo ou por uma reviravolta nos acontecimentosda história, fundamental para o desenvolvimento do conflito dramático presentena narrativa.

Quadro 4. Classificação da personagem por sua importância no conflito dramático

Quadro 5. Classificação da personagem segundo o grau de densidade

psicológica e suas ações (ser * fazer)

PERSONAGEM PLANAé aquela que apresenta baixograu de densidade psicológica.Em geral, tal personagemmarca-se por uma linearidade

no que se refere à relaçãoentre os atributos quecaracterizam o seu ser (a sua

psicologia) e o seu fazer (as

suas açóes) (FORSTER,1974). T^l classificação incluidois subtipos: a personagem tipo

e^

personageffi utereótipo.

TIPO é aquela cuja identificação se dá, normalmente, por meio de

determinada categoria social. A enfermeira, o pirata, o criminoso, oaçougueiro, a adolescente, o estudante... são alguns dos possíveis exemplos.Se a personagem é caracterizada a partir de uma categoria social e se suas

açóes correspondem previsivelmente a tal categoria, confirmando os valoresque socialmente lhe são atribuídos, estâmos diante de uma personagemtipo.

ESTEREOTIPO é aquela cuja identificação se dá por meio da

acumulação excessiva de signos que caracterizam determinada categoriasocial. Exemplos: o pirata com perna de pau, olho de vidro, cara de mau,barba por fazer, brinco de argola, lenço na cabeça, gancho na mão, chapéupreto com caveira, papagaio no ombro, bebedor de rum etc; a enfermeirade roupa, sapatos e touca brancos, cabelo preso, unhas curtas, bijuterias,relógio e maquilagem discretos, prancheta na mão, caneta e termômetrono bolso da camisa ou do avental etc. A personagem estereótipo é, pois,uma cristalização máxima dos lugares-comuns e dos valores socialmenteatribuídos às diversas categorias sociais. Pode-se dizer que, no texto literário,sua psicologia e suas ações são como que determinadas pela categoria socialà qual pertence - fato normalmente construído por meio da descrição dos

seus atributos Íïsicos e de seu figurino.

PLANA COM TENDENCIA A REDONDA é aquela que apresenta um grau mediano de densidadepsicológica, ou seja, embora se marque por uma linearidade predominante no que se refere à relação entre os

atributos que caracterizam o seu ser (a sua psicologia) e o seúfazer (as suas ações), tal personagem não se reduztotalmente à previsibilidade. Isso significa que suas ações podem, ainda que de maneira limitada, contrastarcom a sua caracterização psicológica - o que pode vir a surpreender o leitor (CANDIDO,1,976).

REDONDAé aquela que apresentâ um alto grau de densidade psicológica, ou seja, marca-se pela alinearidade

no que se refere à relação entre os atributos que caracterizam o seu ser (a sua psicologia) e o seufazer (as

suas ações). Noutros termos: apresenta maior complexidade no que se refere às tensões e contradições que

caracterizam a sua psicologia e as suas ações. Tàl personagem é imprevisível, surpreendendo o leitor ao longoda narrativa, pois representa de modo denso a complexidade, os conflitos e as contradições que caracterizam

a condição humana e, nesse sentido, não é redutível aos limites de uma categoria social (FORSTER, 1974).

THouas BoruNrcr / Lúcrt OsnNn ZorrN (onc,rrurz,toone s1-

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Auron, NARRADoR, NARRATÁRro n Eocar,rzaçÁo

A distinção entre autor e narrador é fundamental para o desenvolvimento do estudo do textonarrativo a pârtir de princípios e metodologia científicos. Â primeira coisa que se deve saber sobre o

narrador é que ele é uma categoria específica de personagem, e não deve, portanto, ser confundido como autor do texto, por mais próximo que pareça estar deste. Autor, para ficarmos com uma simplificaçãoextrema, é aquele que cria o texto e narrador é uma personagem que se caracteríza pela função de,num plano interno à própria narrativa, contar a história presente num texto narrativo. Aguiar e Silvaatenta, ainda, para a distinção entre autor empírico, aquele que "possui existência como ser biológico e

jurídico-social", e autor textual, aquele que

existc no âmbito de um determinado texto litcrário, como uma cntidade ficcional que tcma função dc cnunciador do texto e quc só é cognoscívcl e caractcrizâvel pelos lcitorcs dcstemcsmo texto. [...] é o cmissor que assumc imediata c cspecificamcntc a responsâbilidadc da

enunciação de um dado tcxto litcrário e quc sc manifcsta sob a forma c a função dc um cu

oculta ou cxplicitamente prcscntc c actuantc no cnunciado, isto é, no próprio texto litcrário(AGUIAR E SILVA, 1988, p. 227 -228).

É .o-n- que o narrador seja classificado a pârtir da pessoa do discurso que utiliza para narrar e,

também, segundo o seu grau de participação na história narrada. Embora relevantes, tais critérios são

insuÍìcientes para o estudo da complexidade e da importância (estética, ideológica etc.) que o narradorassume na narrativa.

lJma possível classiÍìcação do narrador segundo os critérios anteriormente citados estabelece umarelação entre â pessoa do discurso utilizada pararr rÍar e o grau de participação do narrador na históriaque narra. Assim, o narrador que utiliza a 1" pessoa do discurso (Er/Nós) seria classiÍìcado cornonarrador participante, jâ que a 1" pessoa evidenciaria a sua pârticipação na história narrada. Por sua vez, o

narrador que utilizâ a 3' pessoa do discurso (Ele/Eles) seria classiÍìcado como narrador observador, poisa 3" pessoa evidenciaria o seu distanciamento em relação à história narrada. Além disso, a dicotomianarrador participante/ narrador observador, muito disseminada nos Ensinos Fundamental e Médio,parece ter origem nos conceitos de narrador-personagem e narrador-obseruador propostos, a partir da leiturade Greimas, por Siqueire (1992).

Tâl classificação requer, no entanto, umâ boa dose de rigor no que se refere à sua utilização.Não se pode estabelecer uma relação direta entre o uso da 1." ou da 3" pessoas do discurso e ograu de participação do narrador na história que nârra. É possível imaginar, por exemplo, quea testemunha que conta em um tribunal um crime que presenciou deva elaborar a sua históriavalendo-se da 1" pessoa do discurso. Tâ1 testemunha terá de contâr aos presentes algo que viveu(presenciar um crime), mas não na condição de protagonista (posição necessariamente

ocupadapelo réu e pela vítima). Desse modo, tal testemunha será um narrador que narra em 1a pessoa,mas não participâ da história narrada, senão numa posição secundária, periférica ou, mesmo,neutra no que se refere à constituição e ao desenvolvimento do conflito dramático da histórianarrada. Do mesmo modo, pode-se imaginar que um cientista narre o conjunto de estudos e

experiências que realizou durante o desenvolvimento de uma pesquisa, valendo-se da 3" pessoado discurso. Nesse caso, ele será um narrador que participa fundamentalmente da histórianârrâda, embora minimize o seu grau de envolvimento com os fatos que constituem tal história,privilegiando a apresentação dos fatos que caracterizam a pesquisa, em detrimento de seu altograu de envolvimento na realização da mesma. Tàis exemplos, embora extremos, seryem paranos âlertar do perigo de estabelecer uma relação direta entre a pessoa do discurso utilizada pelo

narrador e o seu grau de participação na história que narra.Aguiar e Silva lembra-nos de que o narrador cumpre a função de uma voz fundamental no texto

narrativo e que, além disso, é o agente de um processo defocalização que afeta a história narrada:

40-rEoRrA LITERÀRIA

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lro"","""qFá.2)OpsR^DorìEs DE LElruRA DA NÂRRÁTlvA\.,r'

o texto narrativo implica a mediação de um narradoÍi^uoz

do narrador fala sempre no textonarrativo, aprcsentando características diferenciadas em conformidade com o estâtuto dapersona resPonsável pela enunciação narrativa, c é ela qucm produz, no te*o literário narrativo,as outras zozes existentes no texto [...]. Â voz do narrador tem como funções primárias e

inderrogáveis uma função de reprcscntação, isto é, a função de produzir intratex.tualmcntc

o universo dicgético - personagens, eventos etc. -, e umafunção de organização e controlo dasestruturas do texto narrativo, quer a nível tópico (microestruturas), quer a nível transtópico(macroestruturas). Como funções secundárias e náo necessariamcnte actualizadas, a voz donarrador podc descmpenhar uma função de interpretação do mundo narrado e podc assumiruma função de acção neste mesmo mundo (a assunção dcstas últimas funções rcpcrcute-se nas

duas primeiras e suscita problemas dc focalização [...] (AGUIAR E SILVA, 1988, p. 759).

Baseando-se em Genette, Aguiar e Silva apresenta as seguintes classificações do narrador, queorganizamos nos quâdros abaixo:

Além disso, Aguiar e Silva considera que o narrador "càÍacteriza-se, ainda, pela sua relâção,enquanto instância produtora do discurso, com o nível da diegese construídâ pelo seu discurso"(1988,p.762). Nesse sentido, o nerrador classificar-se-á como:

HETERODIEGÉTICO

É aquele que "não é co-referencial com nenhuma das personagens da diegese,

[...] não participa, por conseguinte, da história narrada. [...] Pode manifestar-se como um 'eu' explícito ou como um narrador apagado, de 'grau zero' "(1988, p. 761).

HOMODIEGETICO

É aquele que "é co-referencial com uma das personagens da diegese,participando da história narrada" (1988, p. 761).

AUTODIEGÉTICO

Subtipo do narrador homodiegético, o narradorautodiegético é aquele que "é co-referencialcom o protagonista" (1988, p.762) da narrativa,narrando a sua

própria história.Quadro 6. ClassiÍìcação do nârrador a partir de Genetre (1979)

EXTRADIEGETICOÉ aquele que ocupa a posição de narrador de primeiro grau em uma narrâtivaprimária. Seu "acto narrativo é externo em relação aos eventos narrados naquelanarrativa" (1988, p. 7 62).

INTRADIEGÉTICO

É aquele que ocupa a posição de narrador emproduzida no decurso de uma narrativa primária.em relação aos eventos narrados naquela narrativa.

uma narrativa secundáriaSeu ato narrativo é interno

HIPODIEGÉ:rICO

Subtipo do narrador intradiegético, o narradorhipodiegetfuo (on, na classificação de Genette,metadíegético) é aquele que "produz uma narrativâ quese insere na narrativa primária, interrompendo-a,

representando formal e funcionalmente umanarrativa dentro da narrativa" (1988, p.763).

Quadro 7. Classificação do nârrâdor segundo o nível da diegese construída pelo seu discurso

THovas Bonrulcr / Lúctr OsaNa ZolrN (oncnNrzaoones)-

4l

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RÂNCO JuNron

Ressalte-se que, pare Genette, os níveis da narrativa não são relativos apenas ao narrador, mas àestruture arquitetônica, chamemos assim, da narrativa e à posição que todos os personagens, e nãoapenas o narrador, ocupam em relação ao evento narrado.

O narratãrio, segundo Aguiar e Silva, se define como o "destinatário intratextual do discursonarrativo e, portânto, da história narradt" (1988, p. 698). Ele não

é universal, ou seja, não existenecessariamente em todos os textos narrativos. Manifesta-se preferencialmente naqueles textos emque o narrador é personalizedo, autonomizado, ou seja, nos textos em que a condição de personagemdo narrador é posta em destaque pela diegese, e não naqueles textos em que o narrador apresenta um"gràu zero" no que se refere à diegese e ao discurso nârrativo. Aguiar e Silva destaca o fato de que onarratário é "um 'tu' intratextualmente construído e particulârizado como entidade fìccional" cujaexistência e função "articulam-se com os diversos níveis da narração que podem ocorrer num texto"(1988, p.699).

Afocalização corresponde, como o próprio nome sugere, à posição adotada pelo narrador paranarràr a história, ao seu ponto de vista. O foco narratiuo é um recurso utilizado pelo narrador paraenquadrar a história de um determinado ângulo ou ponto de uista.A referência à visão, aqui, não é casual.

O foco narrativo evidencia o propósito do narrador (e, por extensão, do autor) de mobilizar intelectuale emocionalmente o leitor, manipulando-o parâ aderir às ideias e valores que veicula ao contar âhistória. Segundo Leite (1985), Friedman estabeleceu oito tipos de foco narrativo, a parrir das seguintesquestões:

1) Quem contâ â HISTÓRIA? ïiata-sc de um NARRÂDOR em primeira pessoa ou emterceira pessoa? de uma personagem cm primeira pessoa? não há ninguém narrando?; 2) deque PoSIÇÃo o,r ÂNGULO em relação à HISTóRIA o NARRADOR conta? (por cima? naperiferia? no cenrro? de frentc? mudando?);3) quc canais de informação o NARRAD9R usapara comunicar a HISTÓRIA ao leitor? (palavras? pensamenros? percepções? senrimenros?do autor? da personagem? ações? falas do autor? da personagem? ou uma combinação dissotudo?); 4) A que DISTÂNCIA ele coloca o leitor da história (próximo? distanre? mudando?)?

(FRIEDMÂN, 1955 apud LEITE, 1985, p. 25).

Antes, porém, de passarmos à apresentação dos oito tipos de foco narrativo identificados porFriedman, convém estabelecer uma distinção entre cena e sumário - conceitos mobilizados paraa classiÍìcação que o autor faz da focalizaçáo. Por cena entenda-se a representação do diálogo daspersonagens, efetuada por meio do uso do discurso direto; por sumário entendâ-se o relato generalizadoou a simples exposição dos eventos que ceracterizamanarrativa, efetuados por meio do uso do discursoindireto, logo, resumidos, sumarizados. A cena é um recurso que cria um efeito de proximidade entreo leitor e a história narrada; o sumário, por suâ vez, cria um efeito oposto, demarcando a dístânciaentre o leitor e a história narrada.

Segundo Friedman, o foco nârrativo pode ser assim classiÍìcado:

1) 'Autor" onisciente intruso - Esse foco narrativo caracteriza o narrador que adota um pontode vista divino, para além dos limites de tempo e espaço. Tàl narrado r cria a impiessãode que sabe tudo da história, das personagens, do encadeamento e do desdobramento dasações e do desenvolvimento do conflito dramático. Ele usa preferencialmente o sumário,suprimindo ou minimizando ao máximo avozdaspersonagens. "Como canais de informaçãopredominam suas próprias palavras, pensementos e percepções. Seu traço característico éa intrusão, ou seja, seus comentários sobre a vida, os costumes, os caracteres, a moral, quepodem ou não estar entrosados com a história narrada" (FRIEDMAN, 1955 apud LEITE,1985, p. 26-27). O narrador que utiliza esse foco narrativo se interpõe entre o leitor e osfatos narrâdos, elaborando pausas frequentes (digressões) pzra,aapresentação de sua opinião

e de seu posicionamento, seje em relação à história e aos elementos que â constituem,seja em relação aos comportâmentos e/ou valores sociais aos quais a história narrada, fazreferência e com os quais dialoga;

42-rEoRrA LrrrRÁRra

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2) Narrador onisciente neutro - Esse foco narrativo caracteriza-se pelo uso da 3" pessoa do discurso.Tènde ao uso do sumário, embora não seja incomum que use a cena paÍa. a, inserção dediálogos e para adinarnização da ação e, consequentemente, do conflito dramático. Reserva-se,normalmente, o direito àcaracterização das personagens, descrevendo-as e explicando-as parâo leitor. Distingue-se do foco narrativo anterior "pela ausência de instruçóes e comentáriosgerais ou mesmo sobre o comportamento das personagens, embora suâ presença, interpondo-se entre o leitor e a HISTÓRIA, seja sempre muito ciara" (FRIEDMAN, 1955 apud LEITE,1985, p.32);

3) "Eu" como testemunha -Esse foco narrativo caracteriza um narrador que narra de uma perspectivamenos exterior em relação ao fato narrado do que os anteriores. Faz uso da 1" pessoa dodiscurso, mas ocupando uma posição secundária eôu periÍérica em relação à história quenarra. Isso, no entanto, não impede que possâ "observar, desde dentro, os acontecimentos,e, portanto, dá-los ao leitor de modo mais direto, mais verossímil" (FRIEDMAN, 1955apud LEITE, 1985, p.37). Seu ângulo devisão, entretanto, é necessariamente limitado. Porsituar-se na periferia dos acontecimentos, esse narrador tem de restringir-se à sua condição

de testemunha, ou seja, não sabe de fato senão aquilo que presenciou, limitando-se a fazersuposições, inGrências, deduções etc. daquilo que lhe escapa. Pode utilizar tanto a cena comoo sumário para narrar;

4) Narrador protagonista - Esse foco narrativo caracteriza um narrador que narranecessariamente em 1" pessoa, limitando*se ao registro de seus pensamentos, percepçõese sentimentos. Narra, portânto, de um centro fixo, vinculado necessariamente à suaprópria experiência, já que, como o próprio nome diz, ê o protagonista da histórianarrada. Pode valer-se tânto da cena como do sumário, aproximando ou distanciando oleitor da história narrada;

5) Onisciência seletiva múhipla - Esse foco narrativo mârca-se pela utilização predominante do

discurso indireto-livre. Tàl recurso cria um efeito de eliminação da figura do narrador, queé substituída pelo registro de impressões, percepções, pensamentos, sentimentos, sensaçõesque remetem à mente das personagens. Como tais percepções, pensamentos, sensações,sentimentos etc. ganham o primeiro plano davoz narrativa e estão ligados avárias personagens,não há mais um centro fixo como responsável pela articulação da história narrada, mas umamultiplicidade de ângulos de visão e, consequentemente, múltiplos canais de informação.F{á, aqui, um predomínio quase absoluto da cena. Esse foco não deve ser confundido como foco narrador onisciente neutro, pois "o autor traduz os pensamentos, percepções esentimentos, filtrados pela mente dos personagens, detalhadamente, enquanto o narradoronisciente os resume depois de terem ocorrido" (FRIEDMÂN, 1955 apud LEITE, 1985, p.47);

6) Onisciência seletiua - Esse foco narrativo é semelhante ao ânterior, mas com a diferença deque se restringe a uma só personagem. Narra de um centro fixo, seu ângulo é central, eos canais de informação limitam-se aos pensamentos, sentimentos, percepções, sensações,memórias, fantasias, desejos etc., do personâgem central, que são apresentados diretamente esem mediação ao leitor. Marca-se, como o foco anterior, pelo predomínio do uso do discursoindireto-livre e, não raro, pelo recurso ao fluxo de consciência;

7) Modo dramállro - Esse foco caracteriza-se pelo uso exclusivo da cena, logo, pelo predomínioquase absoluto do discurso direto. A história é narrada a partir do encadeamento de cenasnas quais somos informados, pelo discurso direto, sobre o que pensam, fazem, sentem e

objetivam as personagens. A história é narrada de um ângulo frontal e fixo

-o que cria o

efeito de estarmos presenciando os fatos no momento em que eles acontec.-. É o foco quecancterize o gênero dramático, o texto de teatro e, de certo modo, o roteiro de cinema e dastelenovelas;

Tsoruas BoNNlcr / Lúctt. OsaNa ZorrN (oncarurzaoonrs)- 43

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tu FÌ\1Ì

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RANCo Jutston

8) Câmera - Esse foco é, talvez, a tentâtiva mais radical de eliminação da presença do autor

e, também, do narrador na narrativa. "Essa categoria serve àquelas narrativas que tentamtransmitif ashes da realidade como se apanhados por uma câmera arbitrária e mecanicamente"

(FRIEDMAN, 1955 apud LEITE, 1985, p.62). Tàl propósito de atingir a máxima neutralidade

no narrar faz, muitas vezes, com que a narrativa seja construída a partir de fragmentos "soltos"

que rompem com a ilusão de continuidade, que é uma das características mais tradicionaisda narrativa. É u-" ilusão, no entanto, acreditar que esse foco narrativo seja de fato neutro.

Basta fazer uma comparação com a fotografia ou com o cinema para percebermos que há,

sempre, alguém por trás da câmera, decidindo o ângulo e selecionando o que deve ou não ser

representado. Pense-se, por exemplo, no fotojornalismo, que nuncâ é neutro no trâtamento

que confere à imagens que veiculavinculadas âo texto e aos interesses dojornal. Vale o mesmo

pâra o telejornalismo.

OBSERVAÇÃO IUpORTANTE: não é um fato incomum a utilização de mais de um foco narrativopor um mesmo narrador. Thl variabilidade caracteriza, por exemplo, muitos romances. No caso da

identificação de mais de um foco narrativo em um texto narrativo, procure observar qual deles é o que

predomina sobre os demais e, também, observar que efeitos de sentidosão criados a partir de tal variação

de focos.

Tnnae, Morwos E MorrvAçÁo

Tëma -Éo assunto central abordado dramaticamente pela narrativa, ou seja, é o âssunto que abarca

o conflito dramático nuclear da história narrada pelo texto narrativo. Embora o tema se imponhapela força que adquire com o desenvolvimento da narrativa, ele pode variar conforme a posição

interpretativa adotada pelo leitor em relação ao conflito dramático. Tal variabilidade depende,normalmente, do grau de ambiguidade da narrativa. Quanto maior o grau de ambiguidade notratemento do conflito dramático da história narrada, maiores serão as possibilidades de definiçãodo tema pelo leitor;

Motiuos - Como já vimos, motiuos são subtemas ligados ao tema e vinculados ao desenvolvimento

da história e ao conflito dramático. Definem-se, normalmente, a partir das ações das personagens

e, também, das situações dramáticas apresentadas no desenvolvimento da narrativa. Podem ser

essenciais ao desenvolvimento da história e do conflito dramático e/ou ser acessórios, secundários,

não-essenciais a tal desenvolvimento. No primeiro caso, não podem ser desconsiderados quando do

estudo da motivação que caracterizaúma narrativa;

Motiuação

-Amotivaçãocompreende o conjunto de motivos que, articulados ao temâ, caractetiztm

o modo como este é trabalhado ao longo da narrativa. Sua identificação e seu estudo são importantespara que o leitor possa avaliar o posicionamento estético e ideológico do autor em relação aos assuntos

que aborda em seu texto.

Nó, crÍnaex, DESFEcHo

Nó - E o fato que interrompe o fluxo da situação inicial da narrativa, criando um problema ou

obstáculo que deverá ser resolvido. O nó é o que dá origem ao conflito dramático de uma narrativa.Ele evidencia que só há uma história a ser contada, porque uma crise se instalou em determinada

situação, exigindo que se tente resolvê-la de modo a reequilibrar o que ela desestabilizou. Isso, no

44-rEoRrA LI.rsRÁRIa

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*' "'-."F{.2)OpsRADoRES DE LErruRA DA NARR^TrvA%./

entanto, não significa necessariamente o retorno à mesma situação inicial, pois, quase sempre, odesenvolvimento do conflito dramático faz com que a situação de equilíbrio Íìnal da história seja

diferente da sua situação de origem;

Clímax -É o elemento que marca o auge do conflito dramático, momento do tudo-ou-nada entreas forças contrárias que agem e se defrontam na narrativa (geralmente representadas pelas personagense pelos valores a elas ligados), engendrando e desenvolvendo a história. Diferentemente do desfecho,o clímax caracteriza um momento em que a expectativa em relação à resolução do conflito centralda narrativa ignora qual das forças contrárias vencerá. O clímax, portanto, suspende, mantendo porinstantes em tensão máxima, a história contada na narrativa;

Desfecho -Éa resolução do conflito central da narrativa, momento em que uma das forças contráriasvence e se afirma sobre a suâ oponente. Normalmente, liga-se à situação Íìnal da narrativâ.

OB SERVAÇOES IMPORTANTES :

a) os conceitos de nó, clímax e desfecho não se ligam necessariamente às noçóes de introdução,desenvolvimento e conclusão de uma narrativa. É preciso ter sempre em mente que uma narrativa se

compõe tanto de uma história como de um texto no qual tal história é veiculada. A distinção entre os

planos da história narrada e do texto narrativo que a veicula é importante para evitar confusóes perigosas.Não há nada que obrigue que a introdução, o desenvolvimento e a conclusão da história correspondamà introdução, ao desenvolvimento e à conclusão do texto narrativo que a veicula. É preciso estar atentoa isso para que o desenvolvimento da leitura (análise * interpretação) do texto narrativo não apresenteequívocos ou distorções no que se refere à identificação de tais elementos e à leitura de sua função e deseu sentido no texto;

b) assim como uma história não tem necessariamente a obrigação de apresentar uma introdução ou umaconclusão fechada, podendo prescindir de uma delas ou, mesmo, de ambas, também não tem a obrigação deapresentar necessariamente os conceitos de nó, clímax e desfecho, podendo prescindir de algum deles;

c) o clímax e o desfecho podem, em certas narrativas, se manifestar simultaneamente, marcando ao

mesmo tempo o auge do conflito e sua resolução.

Esnaço, AMBTENTE, AMBTENTAçÁo

Espaço - O espaço compreende o conjunto de referências de caráter geográÍìco e/ ou arquitetônicoque identificam o(s) lugar(es) onde se desenvolve a história. Ele se caracteriza, portanto, como uma

referência material marcada pela tridimensionalidade que situa o lugar onde personagens, situações eações são realizadas;

OBSERVAÇAO IMPORTANTE: não é incomum que se encontre, em determinados estudos, o espaço

vinculado aos estados psicológicos da personagem por meio da expressão espaço psirologico.Tal expressão é,

a nosso ver, infeliz, podendo causar problemas e equívocos na leitura do texto narrativo. A psicologia da

personagem, que é normalmente uma representação da psicologia humana, marca-se, como esta, pela noção

de tempo - o que inclui tanto a consciência do presente como os conteúdos da memória e, também, as

projeções do desejo e da fantasia.

Ambiente - O ambiente é o que cârâcteriza determinada situação dramática em determinado

espaço, ou seja, ele é o resultado de determinado quadro de relações e'Jogos de força" estabelecidos,

Trrouls BoNNrcr / Lúctr OsaNa ZorrN (oncaNrzroonrsl-

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RANCO Juuton

normalmente, entre as personâgens que ocupam determinado espaço na história. o ambiente é,

portânto, o "climâ", a "atmosfera" que se estabelece entre as personagens em determinada situação

dremâtica.Conforme o conflito dramático se desenvolve a partir das ações das personagens, o quadro

relacional estabelecido entre elas muda, alterando a situação dramática e, portânto, o ambiente. Um

mesmo espaço pode, portanto, âpresentar diversos ambientes;

Ambientação- a ambientação compreende a identiÍìcação do modo como o ambiente é construído

pelo narrado, ., port"nto, ela identifica também o trabalho de escrita do autor do texto, as escolhas

que ele faz para construir deste ou daquele modo os ambientes. Lins (1976) define três tipos de

ambientação, a saber:

Tnupo E REcuRSos DE suBJETrvAçÁo oa PERSoNAGEM

Com relação ao tempo, parece-nos que uma das mais completas contribuiçóes vem dos estudos

feitos por Genette, que propõe uma distinção básica entre o "tempo da coisa contada e o tempo da

narrâtiva" (1979, p. 31).

Tànto a diegese (história narrada, fibula) como o discurso narrativo (a narração, história

construída, trama) estão inseridos num fluxo temporal. No entanto, a construção da narrativa torna

possível a existência de certas dístorções temporais que se tornâm importantes para o estudo do texto

narratirro. Os quadros abaixo sintetizam as contribuições de Genette (1979) parâ o estudo do tempo

nâ narrativa. Por uma questão didática, dividimos os conceitos entre aqueles pertinentes ao tempo

da diegese

-que implica os acontecimentos pertinentes à história narrada e, também, o impacto

desses acontecimentos na subjetividade de determinadas personagens, posta, por vezes, em relevo na

narrativa -, e aqueles pertinentes ao tempo da narração ou do discurso nârrativo, que compreende o

tempo dos acontecimentos, dos fatos, das ações apresentadas no discurso narrativo.

Quadro 8. Tempo da diegese (história narrada)

LrrEnÁnta

FRANCA - é a ambientação produzida por meio do discurso de um narrador heterodiegético ou um narrador que

não participa dos cventos fabulares que nârra. Esse narrador explicita, compõe o ambientc que caracteriza um esPaço e

de teiminaáa situação dramática. Esscìipo dc ambientação é bastante típico nos romance rcalistas, onde prcdominam várias

pausas dcscritivas

REFLEXA - ncsse caso, a ambientação é produzida ou composta por meio da focalização dc personagem(ns) que, a partir

de sua percepção ou ponto de vista, constrói(em) o ambiente onde se dcsenvolve a ação. O termo "ambientação reflcxa" já

denota-essa ideia de que a ambientação é um reflexo do universo de uma ou mais Personagens

DISSIMULADA ou OnfÍqUA - Nesse caso, o ambiente ó construído, por um efeito de sugestão, a partir das açõcs

da(s) pcrsonagem(ns).

Quadro 7. Classificação da ambientação segundo Lins (1976)

TEMPO OBJETTVO(cRoNoLÓGICO)

Referentc à sucessão temporal dos acontecimentos. Pode scr mensurado pela

passâgem dos dias, das estaçõcs do ano, de datas, enfim, por todo tipo de marcação

temporal objetiva.

TEMPO SUBJETTVO

(PSTCOLóGICO)

Vincula-se âo tempo cronológico, mas difcre dcste porquc se trata do tcmpo da

experiência subjctiva das personagens. Caracteriza, pois, o tempo viuencial destas, o

màdo como elas experimcntam scnsações c cmoçócs no contato com os fatos objetivose, também, com suas memórias, fantasias, cxpectativas.

46-rEoRIA

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4:h* """-{51Í 2.}OpeRADoRES DE LErruR^ DÁ NÂRRi{TtvÂ

b/

ORDEM

Compreende a relação entre

a ordem (disposição) dosacontecimentos da diegese

(história)eaordemdeapresentação desses mesmos

ANAcRoNIAS

NARRATM INMEDIARES: o discurso narrativo se inicia com a

apresentação de um acontecimento que pertence ao desenvolvimentoda diegese.

NARRATIVA IN ULTIMA R.ES: o discurso narrativo se iniciacom a apresentação de um acontecimento que pertence ao desfechoda diegese.

(história construída). Comoa ordem dos acontecimentosna diegese e no discursoraramente coincide, criam-seanacronias - desencontros entre

ANALEPSES: recuos no tempo, que permitem a recuperação de

fatos passados. Corresponde ao que em linguagem cinematográficaé chamado dejashback, mâs é anterior, como técnica narrativa, a esse

recurso.

a ordem dos acontecimentosna diegese e a ordem de sua

apresentaçáo no discurso

narrativo.

PROLEPSES: antecipações no tempo, que permitem a anteposição,no plano do discurso, de um fato ou situação que só aparecerá maistarde no plano da diegese. Corresponde ao que, em linguagemcinematográfi ca, é chamad o de flasftfonaard.

Quadro 9. Tèmpo da narração (discurso narrativo): tempo dos acontecimentos,

dos fatos, das ações no discurso narrâtivo

Quadro 10. Tèmpo da narração (discurso narrativo): tempo dos acontecimentos,

dos fatos, das ações no discurso narrativo

DURAçAO

Tiata-se de um desencontroentre a duração dos

acontecimentos no planoda diegese e a duração do

relato desses mesmosacontecimentos no planodo discurso narrativo. fu

CENA: coincidência entre os acontecimentos da diegese e o relato dosmesmos acontecimentos nâ narração. Sua marca mais evidente são os

diálogos, marcados pela presença do discurso direto.

SUMARIO NARRATM: incongruência entre os acontecimentos da

diegese e o relato dos mesmos acontecimentos na narração. O narradorresume, em nível de discurso, os acontecimentos que, na diegese, marcam-se por um tempo longo. Sua marca mais evidente é a utilização de discursoindireto pelo narrador na apresentação resumida dos acontecimentos da

diegese.

ELIPSE: o narrador exclui determinados acontecimentos da diegese noplano do discurso narrativo.

relações de duração implicama construção dos seguintes e

distintos recursos:PAUSA DESCRITM: o narrador aumenta a temporalidade narrativapor meio da inserção de descrições que "alongam o tempo", criando, desse

modo, ankocronias.

DIGRESSAO: o narrador introduzfazendo com que o tempo da diegese

(narração) se alongue.

comentários no discurso narrativo,pare e o tempo do discurso narrativo

Tnouas BoNNrcl / Lúcrt OsaNa ZorlN (oncrrurzrooxtsl-

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RANCO JuNron

Quadro 11. Tèmpo da narração (discurso narrativo):tempo dos acontecimentos,dos fatos, das ações no discurso narrativo

Os recursos de subjetivação da personagem, vinculados ao tempo,dizem respeito

a

determinadosrecursos que se vinculam à construção do tempo psicológico na narrativa. O tempo psicológicocorresponde à organização do tempo interno das personagens, construindo-se â pârtir do conjuntode referências que responde pela subjetividade das mesmas (o que inclui o narrador). Não é

delimitado nem determinado pelo tempo Íïsico, embora estabeleça relações com este. Tàmbém nãoé controlado socialmente, ou seja, corresponde aos afetos, ao imaginário, ao desejo, à fantasia e à

memória das personagens. Sua lógica, nesse sentido, pode prescindir das relações de causa-e-efeitoe da necessidade de tudo explicar ao leitor. Os três recursos de subjetivação intimamente ligados aotempo psicológico são o monólogo interior, a análise mental e o fluxo de consciência. Vejamos cadaum deles:

a\ Monólogo interior - em primeiro lugar, é preciso distinguir monólogo interior de monólogo.Este

último é um recurso característico do gênero dramático (teatro), que pode caracterizar tantoumâ cena como umâ peça teatral na qual uma personagem dialoga consigo mesma. O monólogointerior também implica o diálogo de uma personagem consigo mesma, mas tal processo nãose realiza sob a forma de um solilóquio, e sim sob a forma de um processo mental no qual a

personâgem questiona a si própria numa determinada situação dramâtica. O monólogo interiorevidencia, desse modo, que a personâgem está mentalmente dialogando consigo mesma. Isso,sem perder o controle de sua consciência ou as relações de causalidade que regem a noçãousual de lógica presente no cotidiano.

b) Anólke mental - trata-se da representação de um processo mental no qual a personagem dávazão aos seus pensamentos sem perder de vista a sua posição numa dada situação dramática.A diferença entre a análise mental e o monólogo interior reside

no fato de que naquela apersonagem articula algo como uma dupla perspectiva, por meio da qual tanto vivencia comoanalisa a sua inserção numa dada situação dramática. Isso, sem perder o controle de suaconsciência ou as relações de causalidade que regem alógscacotidiana;

c) Ftuxo de consciêrcia - tratâ-se da representação de um processo mental no qual a personagem dáliwe curso a tudo o que anima a sua subjetividade, a sua vida psíquica interior: pensamentos,emoções, ideias, memórias, fantasias, desejos, sensações. Nesse sentido, o fltxo de consciência criaum efeito de forte perrurbação, perda ou, mesmo, abolição das relações de causalidade que regema lógica cotidiana e, também, um efeito de perda do controle da consciência pela personagem. Ofluxo de consciência é um recurso utilizado para aproximar maximamente o leitor da üda interiorda personagem, composta por elementos do consciente, do subconsciente e do inconsciente. LJm

de seus trâços característicos é a fragmentariedade e a dificuldade de avaliar se as referências e asinformações apresentadas pertencem à memória, à imaginação ou à fantasia da personagem, bemcomo à imprecisão em relação à natureza real ou fictíciados fatos narrados;

FREQUÊNCIA

Refere-se à relação quantitativaentre os acontecimentos dadiegese e o número de vezes

em que esses acontecimentossão mencionados no discurso

NARRATM SINGULATIVA: é aquela que apresenta igualdadeentre o número de acontecimentos da diegese e o número deapresentações de tais acontecimentos no discurso.

NARRATIVA REPETITIVA;

discurso narrativo (narração), umplano da diegese, apresentando-o

é aquela que reitera, no plano

mesmo acontecimento pertinentevárias vezes.

do

ao

narratlvo, Ijependendo do modocomo se estrutura essa relação,produzem-se os seguinte tipos denarrativa:

NARRATIVA ITERATIVA: é aquela que apresenta uma única vez,no plano narrativo (narração), um acontecimento que aconteceu váriasvezes no plano da diegese.

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