oPRESIDENTE VAIMORRER PELA BOCA · qualquer perspectiva de otimismo e apoio. Não há prosperida-de...

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o PRESIDENTE VAI MORRER PELA BOCA C em dias depois, parece uma eternidade. O Brasil, nesse acomodar de novo governo, vai vivendo de desatino em desatino, levado pela verve destrambelhada do presidente Bolsonaro. O mandatário repete a via cruas de Jânio Quadros - que durou sete meses - com bizarrices em atos e palavras típicas de um menestrel de crises. Avacalha a verdade. Diverte-se em polemizar com retrocessos na área de costumes. Dá as costas para os reais e urgentes problemas da Nação (em- prego, reativação da economia e quetais). Nesse pormenor, com um agravante: o quadro está piorando muito. E rapidamente. A perspectiva de cresdmento do PIB já foi revista, para baixo, cinco vezes neste ano, um recorde de recálculos negativos. En- contra-se agora em minguados 1.9% e ninguém de firme convicção e conhecimento de causa crê em algo melhor do que o ocorrido ano passado. O desemprego voltou a crescer no período sob a égide bolsonarista (janeiro e fevereiro com dados divulgados), após dois anos consecutivos de melhora na taxa. Em outras palavras, inverteu-se a curva para pior. Já são mais de 13.1milhões de desempregados, quase 50 milhões de pessoas sem o mínimo para garantir a subsistênda. E, como se sabe, o flagelo da falta de trabalho e renda destrói qualquer perspectiva de otimismo e apoio. Não há prosperida- de visível nem no médio ou longo prazo. Culpa da tática ado- tada até aqui. Alguém apontou que o governo assumiu com aparência de pão dormido. Pesquisa mostra que empresas agora só projetam retomada para 2020 e a devastação da con- fiança fez a popularidade do "mito" derreter. São dados. Fatos. Longe da torcida dos áulicos seguidores. A indústria recuou dez anos e voltou em fevereiro ao nível de produção de março de 2009. A atividade do setor está tão ou mais emperrada que nos idos da recente recessão da fase Dilma. Aos números: em janei- ro o desempenho foi negativo, de 0,8%, o pior resultado em quatro meses. O volume produzido também ficou 0,2% menor ao de igual período do ano passado. O en- fraquecimento da manufatura no chão de fábríca é reflexo direto e vi- sível da baixa demanda. Parlamenta- res dos partidos de sustentação reco- nhecem que a sociedade está cansa- da e que mesmo aliados mais ferrenhos estão perdendo o en- canto. Ninguém de seus próximos assessores se atreveu ainda a lhe dizer, talvez por receio, mas admitem à boca pequena que o mandato do capitão reformado está sofrendo um apagão ge- rendal. Nada anda, os ministéríos funcionam a galope de polê- micas, setores como o da Educação são literalmente dilapidados. No plano da saúde, metas estabelecídas, como a da imunização da população nas primeiras semanas, não foram cumprídas. No campo externo, estragos são notados com os protestos e pro- messas de retaliações de parceiros estratégicos, chineses e árabes à frente. Não precisa nem lembrar do "golden shower" JUSTIÇA O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, diz à ISTOÉ que espera que o STF mantenha a prisão em segunda instância NO 2571 - 10 de abril 2019 ISTOE.COM.BR Entrevista Cartas Semana Brasil Confidencial Brasil Comportamento Internadon Em Cartaz Últ ma Palavra 4 10 18 18 22 48 5& 64 66 CAPA: FOTOS: REUTERS{UESLEI MARCEUNO; JARDIEL CARVAlHO!FOLHAPRESS FOTOS EDITORIAIS: EVARISTO SAI AFP; JARDIEL CARVALHO/FOLHAPRESS; CAIO GUATELU ---- Como governos movidos por ideologias criam um clima de radicalização e tiram a crença em um futuro melhor 12 ISTO~ 257110/4/2019

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o PRESIDENTE VAI MORRER PELA BOCA

C em dias depois, parece uma eternidade. O Brasil, nesseacomodar de novo governo, vai vivendo de desatinoem desatino, levado pela verve destrambelhada do

presidente Bolsonaro. Omandatário repete a via cruas de JânioQuadros - que durou sete meses - com bizarrices em atos epalavras típicas de um menestrel de crises. Avacalha a verdade.Diverte-se em polemizar com retrocessos na área de costumes.Dá as costas para os reais e urgentes problemas da Nação (em-prego, reativação da economia equetais). Nesse pormenor, com umagravante: o quadro está piorandomuito. E rapidamente. A perspectivade cresdmento do PIB já foi revista,para baixo, cinco vezes neste ano, umrecorde de recálculos negativos. En-contra-se agora em minguados 1.9%e ninguém de firme convicção e conhecimento de causa crê emalgo melhor do que o ocorrido ano passado. O desempregovoltou a crescer no período sob a égide bolsonarista (janeiro efevereiro com dados divulgados), após dois anos consecutivosde melhora na taxa. Em outras palavras, inverteu-se a curva parapior. Já são mais de 13.1milhões de desempregados, quase 50milhões de pessoas sem o mínimo para garantir a subsistênda.E, como se sabe, o flagelo da falta de trabalho e renda destróiqualquer perspectiva de otimismo e apoio. Não há prosperida-de visível nem no médio ou longo prazo. Culpa da tática ado-tada até aqui. Alguém apontou que o governo assumiu com

aparência de pão dormido. Pesquisa mostra que empresasagora só projetam retomada para 2020 e a devastação da con-fiança fez a popularidade do "mito" derreter. São dados. Fatos.Longe da torcida dos áulicos seguidores. A indústria recuou dezanos e voltou em fevereiro ao nível de produção de março de2009. A atividade do setor está tão ou mais emperrada que nosidos da recente recessão da fase Dilma. Aos números: em janei-ro o desempenho foi negativo, de 0,8%, o pior resultado em

quatro meses. O volume produzidotambém ficou 0,2% menor ao deigual período do ano passado. O en-fraquecimento da manufatura nochão de fábríca é reflexo direto e vi-sível da baixa demanda. Parlamenta-res dos partidos de sustentação reco-nhecem que a sociedade está cansa-

da e que mesmo aliados mais ferrenhos estão perdendo o en-canto. Ninguém de seus próximos assessores se atreveu aindaa lhe dizer, talvez por receio, mas admitem à boca pequena queo mandato do capitão reformado está sofrendo um apagão ge-rendal. Nada anda, os ministéríos funcionam a galope de polê-micas, setores como o da Educação são literalmente dilapidados.No plano da saúde, metas estabelecídas, como a da imunizaçãoda população nas primeiras semanas, não foram cumprídas. Nocampo externo, estragos são notados com os protestos e pro-messas de retaliações de parceiros estratégicos, chineses eárabes à frente. Não precisa nem lembrar do "golden shower"

JUSTIÇAO ministro da Justiçae Segurança Pública,

Sergio Moro, diz à ISTOÉque espera que o STF

mantenha a prisãoem segunda instância

NO 2571 - 10 de abril 2019ISTOE.COM.BR

Entrevista

CartasSemana

Brasil Confidencial

Brasil

ComportamentoInternadon

Em CartazÚlt ma Palavra

4

10

18

18

22

48

5&

64

66CAPA: FOTOS: REUTERS{UESLEI MARCEUNO; JARDIELCARVAlHO!FOLHAPRESS FOTOS EDITORIAIS: EVARISTO SAIAFP; JARDIEL CARVALHO/FOLHAPRESS; CAIO GUATELU

---- Como governos movidos por ideologiascriam um clima de radicalização e tiram a crença emum futuro melhor

12 ISTO~ 257110/4/2019

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Carlos José Marques, diretor editorial

do carnaval, das suspeitas que o mandatário lançou erronea-mente sobre o lbama, da falsa promessa de diminuir o Impostode Renda (depois desmentida por assessores), dos ataques sempropósito na articulação com o Congresso ...a lista de escorregõesé intindável. Como aprendiz de presidente, Bolsonaro revelou-se um tremendo encrenqueiro, inapto naquilo para o qual foieleito. Deveria ter trabalhado mais e falado menos. Deixado delado o proselitismo digital e ido à prática. Com um repertóriolimitado, um comportamento quase infantil e a agenda retró-grada a tiracolo, escolheu o caminho contrário. Montou umaverdade paralela, alimentada por factoides. Ele e sua daque defanáticos robotizados geraram fake news em série, despautérioshistóricos e esquisitices na velocidade da luz, sem cessar umaúnica semana. Não passa dia sem que o bolsonarismo promovaversões delirantes, como a de que não existiu a ditadura, de queo nazismo é de esquerda ou a de que o IBGE- referência mun-dial em estatisticas - erra nos seus números. Com um detalhe:ao contestar levantamentos oficiais do IBGE, por exemplo,Bolsonaro repete, palavra a palavra, a ladainha conhecida epraticada justamente por seus antecessores petistas, a quemrepudia Escolhe a pior alternativa. Na lógica vesga: se a verdadenão é boa, desconsidere a sua existência. Culpe o termômetropela febre alta, atropele as instituições, renegue critérios cientí-ficos, faça de conta que o levantamento é frágil. Bolsonaroobedece à cartilha de mandamentos dos populistas com a dis-dplina de monge tibetano. Como qualquer um, tem direito àspróprias opiniões, mas não aos próprios fatos. Bolsonaro queriaouvir do IBGE, precisava alardear, que o índice de empregoestava bombando, com ofertas de trabalho aparecendo aosmontes por mera osmose. Seria um bom cartaz de propaganda

dos 100 dias. Não conseguiu o tento e partiu à reclamação rasa.Ele tem, decerto, um relacionamento. digamos, fugaz, de quasedescaso, com as evidêndas. Busca uma visão de mundo própria,tal qual uma "Alice no Pais das Maravilhas", e nesse carnpo épossível elogiar torturadores como o coronel Ustra, genocidascomo o general Pinochet e estupradores como Stroessner. Diadesses mergulhou numa discussão bínária, absurda, sobre o viésde esquerda do mais sangrento e repugnante regime de gover-no, o nazismo alemão, que exterminou milhões de inocentes.E fez isso justamente no Museu do Holocausto, em Jerusalém,onde a lápide que homenageia os judeus mortos lembra que "aintransigente resistênda e alertas sobre a crescente ameaça docomunismo criou solo fértil para o crescimento de grupos radi-cais de direita na Alemanha, gerando entidades como o PartidoNazista". Bolsonaro relegou. Adulterou a realidade e na suaótica peculiar afrontou a história tachando o nazismo de ultra-direita como um regime com viés esquerdista. O delírio no casofoi total. O mandatário pegava carona e endossava as ilações doministro-chanceler Emesto Araújo e se pôs a alegar que portrazer a palavra "socialista" na sigla o partido de Hitler tinha ostais pendores comunistas. No redudonismo que joga para o seugrupo ideológico, tudo de ruim e errado é de esquerda As sim-plificações arbitrárias até desconsideram, por mera ignorânciaou conveniência, que o carrasco defensor de uma raça arianachegou a mandar para seus carnpos de concentração milhõesde comunistas, esquerdistas como prega Bolsonaro. Mero de-talhe, desprezível para a sua usina de interpretações. Findo os100 dias, em meio a tantas descompensadas intelectuais e ra-docínios tacanhos, só resta apelar ao novo governo com umpedido: "presidente, por que não te calas?".

POLfTICAOs primeiros cem dias de JairBolsonaro à frente da Presidência daRepública mostraram um governo sem rumoe envolvido em polêmicas vazias

62ARTES VISUAIS

Exposição retrospectiva da obra deArtur Lescher traz 120 trabalhos

escultóricos articulados em tornoda ideia da suspensão

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