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ECONOMIA DOMÉSTICA: a formação cidadã e a garantia de direitos sociais

Janete Piffer1

Marcos Lübeck2

Resumo

Este artigo apresenta os resultados de uma implementação pedagógica que tematizou a importância da economia doméstica na formação sócio-cidadã dos estudantes, preenchendo, assim, a lacuna que havia nos seus conhecimentos, ajudando-os a compreender e incentivando-os a participar do controle econômico de sua família. Para tanto, este projeto objetivou desenvolver conhecimentos e conceitos que atendessem as necessidades das famílias dos alunos, elaborar planilhas de controle econômico, a partir do diagnóstico da rentabilidade da família, oferecer informações sobre o consumo sustentável nesse ambiente, a partir da resolução de problemas matemáticos, enfim, participar do planejamento, da execução e da avaliação de programas de economia doméstica. A fundamentação teórica dessa pesquisa pautou-se, sobretudo, no ensino de matemática, na resolução de problemas, na modelagem matemática e na economia doméstica. A estratégia de ação consistiu em elaborar e desenvolver uma planilha de controle que iniciou com o diagnóstico da economia familiar, envolvendo as famílias dos alunos, a partir da reunião de apresentação do projeto para solicitar sua colaboração, a formação dos conceitos sobre economia doméstica e o compartilhamento das tabelas para os alunos registrarem, durante um trimestre, o controle da movimentação econômica familiar. A decorrência da composição das planilhas e da resolução de problemas com base nos seus dados foi bastante satisfatória, o que demonstrou uma construção significativa de conhecimentos, fato que valeu às famílias economizar e perceber a importância de uma planilha como essa para o equilíbrio dos seus gastos.

Palavras-Chave: Consumo Familiar. Economia Doméstica. Planilha de Controle.

1 Introdução

O tema deste estudo gira em torno da importância da economia doméstica na

formação sociocultural e cidadã dos estudantes, assunto este que foi motivado pela

necessidade de se completar uma lacuna existente na construção de conhecimentos

matemáticos dos alunos que demonstram dificuldades para colocar em prática na

sua vida extraclasse os saberes matemáticos construídos no ambiente escolar, fato

que pode ser fatídico para a constituição prerrogativa dos mesmos.

Conforme Turquino (2007), “a sociedade e a cultura operam na construção do

indivíduo, a primeira organizando e estruturando os grupos humanos, a segunda

imprimindo as maneiras de viver e de pensar” (p. 504). Desta forma, é necessário

estudar o contexto em que cada cidadão expressa a sua formação cultural e social.                                                                                                                          1 Graduada em Matemática. Professora da Rede Pública de Ensino do Estado do Paraná, na cidade

de Toledo/PR.

2 Doutor em Educação Matemática. Docente na Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE – Campus de Foz do Iguaçu/PR.

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Nesta conjuntura, a educação necessita empreender a formação dos sujeitos

a fim de que adquiram uma visão de mundo adequada à cultura em que se inserem.

Para Morin (2000), a educação deve estar centrada na condição humana, fazendo

com que estes sujeitos necessitem se reconhecer em sua humanidade comum e ao

mesmo tempo considerar a sua diversidade cultural inerente a tudo o que é humano.

Assim, o papel da família na educação deve ser o de considerar as mudanças

socioculturais que alteram a estrutura e o funcionamento dos lares, pois a sociedade

atual é permeada pela tecnologia e pelos avanços no conhecimento, e as crianças e

jovens necessitam participar da organização e do funcionamento da família, zelando,

principalmente, pela sua segurança e pelo seu equilíbrio, em todos os seus âmbitos.

Diante disso, é importante que os estudantes aprendam na escola a organizar um

orçamento doméstico, para igualmente poder contribuir, de maneira consciente, para

o bom funcionamento dos empreendimentos familiares.

Com efeito, a cidadania plena implica em formar pessoas para o exercício da

liberdade e para a completa responsabilidade diante dos problemas cotidianos.

Observa-se, presentemente, que os problemas econômicos das famílias afetam a

segurança e o equilíbrio das crianças e jovens, que por serem mantidos alheios aos

problemas domésticos, acabam por ampliar tais problemas ou por sofrer as

consequências da ausência de um equilíbrio na sua vida e no seu desenvolvimento

social e psíquico.

Outrossim, incentivar a participação das crianças e dos adolescentes na

construção de conhecimentos sobre a economia doméstica vai contribuir para que a

sua formação seja mais completa e também mais eficiente. Desta forma, se delineou

como um problema deste estudo a investigação acerca da possibilidade de ajudar os

alunos a melhor compreender a economia doméstica, para com isso incentivá-los a

ajudar no controle econômico da sua família.

Logo, o objetivo estabelecido para este estudo foi desenvolver conhecimentos

efetivos de economia doméstica que atendessem às necessidades das famílias dos

estudantes. Já os objetivos específicos compreenderam estudar conceitos sobre a

economia doméstica, gerar planilhas de controle econômico (cf. Apêndice) segundo

diagnósticos de renda familiar, promover conhecimentos sobre consumo sustentável

no ambiente doméstico, a partir da solução de problemas matemáticos, e participar

do planejamento, da execução e da avaliação de programas de economia familiar.

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2 Conhecimento Matemático e Economia

As Diretrizes Curriculares de Matemática do Estado do Paraná, na busca por

superar desafios pedagógicos e potencializar meios para o ensino desta disciplina,

apresentam uma concepção de Matemática que tanto pode ser vista como uma

disciplina, com conhecimentos prontos e acabados, como os que aparecem nos

livros didáticos, quanto uma disciplina que pode acompanhar o desenvolvimento dos

alunos no que tange a elaboração, o modo de descobrir-se em hesitações, dúvidas e

proposições que levem à reflexão e à formação enquanto pessoas autônomas diante

dos problemas do cotidiano (cf. PARANÁ, 2008).

Na perspectiva docente, Medeiros (1987) apresenta uma visão reflexiva que

abre espaço para os aspectos cognitivos da Matemática e sua relevância social. Isso

implica em olhar, tanto do ponto de vista do ensinar quanto do aprender, incluindo a

formação do pensamento e da construção histórica necessária à compreensão

Matemática, pois esta possibilita equilibrar e planejar a ação docente, fundamentada

numa ação crítica que conceba a Matemática como uma atividade humana a ser

constantemente construída.

Nestas condições, portanto:

Cabe ao professor a sistematização dos conteúdos matemáticos que emergem das aplicações, superando uma perspectiva utilitarista, sem perder o caráter científico da disciplina e de seu conteúdo. Ir além do senso comum pressupõe conhecer a teoria científica, cujo papel é oferecer condições para apropriação dos aspectos que vão além daqueles observados pela aparência da realidade. É necessário que o processo pedagógico em Matemática contribua para que o estudante tenha condições de constatar regularidades, generalizações e apropriação de linguagem adequada para descrever e interpretar fenômenos matemáticos e de outras áreas do conhecimento. (PARANÁ, 2008, p. 49).

Desta forma, a construção de conhecimentos matemáticos que proponham

uma aprendizagem útil e prazerosa deve partir da resolução de problemas como

uma tendência da Educação Matemática, e este deve ser o mote central que merece

atenção do professor enquanto ponto central para o desenvolvimento de conteúdos

curriculares, uma vez que a resolução de problemas permite aos alunos investigar e

compreender os conteúdos matemáticos, desenvolvendo e aplicando estratégias

para solucionar problemas relacionando a Matemática com o cotidiano e percebendo

o quanto a Matemática pode ser atraente e desafiadora (cf. POLYA, 1998).

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O desafio na resolução de problemas é desenvolver práticas metodológicas

que exponham os conteúdos, aos quais o estudante possa aplicar conhecimentos

matemáticos que resolvam uma questão, devendo sempre ser assegurado o espaço

da discussão dos problemas, onde o aluno possa utilizar as habilidades orais, mas

também lançar mão de recursos como o desenho, ficando este à vontade para,

igualmente, utilizar sinais matemáticos (cf. PARANÁ, 2008).

Segundo Pires (2005), um problema requer que o aluno desenvolva um

sistema de organização dedados de maneira adequada e que traduza a situação

matemática a ser analisada, podendo também criar uma unidade nova de medida ou

um instrumento de maior precisão do que o que foi criado pelos modelos usuais de

medida. Assim, os problemas do cotidiano vividos pelos alunos e pelas suas famílias

podem ser pensados como problemas de ordem social que devem ser solucionados,

e um modo de fazê-lo é instrumentalizando o aluno para que este possa enfrentá-los

com propriedade e conhecimento.

Outro aspecto a ser abordado no ambiente escolar diz respeito a modelagem

matemática, pois através desta os fenômenos diários, sejam eles físicos, biológicos

ou sociais, passam a se constituir como elementos de análises críticas e percepções

diversas de mundo, e isso possibilita aos estudantes intervirem em problemas reais

do meio social e cultural em que vivem, o que também contribui para a sua formação

(cf. PARANÁ, 2008).

O conhecimento matemático possui uma estrutura aceita por muitos como

perfeita, como sendo um modelo de racionalidade humana representada por uma

linguagem simbólica que não admite erros e nem contradições. Esta objetividade

que a Matemática apresenta baseia-se na crença de origem, e de senso comum, de

que a suas estruturas e sistemas lógicos são exatos e sustentam o poder ilimitado

da ciência (cf. SANTOS, 2005).

O conhecimento científico, por sua vez, se desenvolve com o tempo, em

decorrência da ação humana sobre a realidade. Um exemplo disso é a construção

dos sistemas de numeração e a constatação de que havia necessidade de se

construir um sistema de números mais complexos e maiores do que zero. Esses

conceitos se articularam com perfeição e contribuíram para organizar a sociedade

emergente das civilizações primitivas.

Com o aparecimento do racionalismo científico, a Matemática passou a ter

uma existência sensorial, abstrata e reflexiva em torno da realidade circundante, e

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isso conduziu para uma evolução dogmática da Matemática, culminando com o

surgimento do racionalismo dogmático por volta do século XV. Durante o

Renascimento, evoluiu para uma Matemática racionalista científica, partindo da

observação dos fatos e da explicação dos fenômenos. A partir do século XVIII, a

concepção de mundo mudou radicalmente, principalmente com a ascensão da

burguesia e, somente no final do século XIX, consolidou-se a concepção científica

da Matemática, tornando-a, aqui, racionalista e metódica (cf. SOUZA, 1999).

No limiar do século XXI a Matemática apresenta uma evolução metodológica

que considera agora as diferenças individuais dos diversos grupos sociais, passando

a interpretar situações reais, de ordem social, econômica, política, ambiental, dentre

outras. Neste contexto, a Matemática torna-se outra vez prática, voltada à gerenciar

as necessidades essenciais de cada pessoa ou família. A Matemática, dessa época,

evoluiu e atualmente ela necessita estar contextualizada para se adaptar à realidade

das pessoas (cf. SANTOS, 2005).

Entretanto, segundo Ávila (1997), o conhecimento matemático está ligado à

intuição e à imaginação, alertando para a riqueza existente no pensamento

matemático. Esse processo é importante para tornar o conhecimento um meio de

solucionar questões do cotidiano, adquirindo assim um caráter social que contemple

as necessidades, motivações e interesses dos aprendizes.

Diante disso, cabe analisar as concepções para poderem ser compreendidas,

como é o caso da relação entre o ganho e os gastos de uma família, quando se

aplica a Matemática no contexto sociocultural doméstico. Neste caso, o aluno deverá

desenvolver a habilidade de calcular os gastos da família e adequar os ganhos dela

à sua realidade, e vice versa, conforme for o caso.

Antes, quando os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN’s (BRASIL, 1997)

apontam a resolução de problemas como uma maneira eficiente de se compreender

a Matemática, eles estão afirmando que os problemas apresentados não podem

estar dissociados da realidade, pois a compreensão matemática envolve a ideia de

como se relacionar com esta mesma realidade (cf. SOUZA, 1999).

Ora, o saber matemático deve ser suficiente para formar uma visão crítica da

economia desenvolvida no ambiente familiar, de forma a permitir que o aluno seja

capaz de valorizar os ganhos e projetar os gastos de acordo com a receita da sua

família, e isso só é possível mediante uma formação pautada em um conhecimento

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sociológico, analisado aí a influência à que todas as pessoas estão expostas e que

induzem ao consumo.

Note que a discussão sobre padrões de consumo, moda, mídia e tecnologia,

por exemplo, são determinantes para a formação do homem contemporâneo. Essa

formação sociológica necessita ser complementada pelo conhecimento matemático,

afim de proporcionar ferramentas que capacitem os seres sociais à reagirem de

forma adequada diante dos problemas do cotidiano (cf. PARANÁ, 2008).

Eis que o conhecimento dos valores que incidem sobre a economia familiar é

fundamental para o desenvolvimento do conhecimento matemático, pois os custos

que envolvem a moradia, a saúde, a educação, o lazer, a alimentação, enfim, a vida

com alguma qualidade, deve fazer parte da formação do aluno. E este, certamente,

é o caminho pelo qual a escola deverá seguir para conseguir vencer a alienação que

leva tantos adolescentes, moços e moças, à condições degradantes de exploração,

à revolta e à marginalidade.

Diante disso, estudar Matemática a partir das tabelas de economia doméstica,

que permitem racionalizar os gastos, o consumo e os ganhos, é uma oportunidade

de ajudar o alunado a ser eficiente e crítico, tornando-o capaz de refletir sobre as

relações de poder da família. Hoje, com o desenvolvimento tecnológico, existem

inúmeras técnicas de economia doméstica, como as que são oferecidas em tabelas

online, por exemplo, e que podem ser utilizadas para criar conceitos e solucionar

problemas do cotidiano. Então, que estas tabelas sejam utilizadas.

3 Contextualização do Estudo

O Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE, prevê a participação

dos alunos e da comunidade escolar por meio do desenvolvimento de um projeto de

intervenção abordando um assunto estudado e pela participação dos educadores

por meio de Grupo de Trabalho em Rede – GTR, analisando, discutindo e trocando

experiências sobre o projeto desenvolvido.

3.1 Projeto de Intervenção

O desenvolvimento do projeto de intervenção didático-pedagógico aconteceu

entre os meses de fevereiro e maio do ano de 2014, no Colégio Estadual Luiz

Augusto Morais Rego – Fundamental, Médio e Profissional, na cidade de Toledo/PR,

e contou com a participação dos alunos do 7º ano do Ensino Fundamental.

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Na primeira semana de fevereiro aconteceu a socialização do projeto com os

gestores e professores do colégio, e na segunda semana aconteceu a socialização

com os pais e os alunos, e a leitura e a reflexão do texto intitulado “Porque Ensinar

Habilidades Financeiras aos Estudantes”, de S. Stuart (2009). Os pais e os alunos

gostaram do projeto e houve um debate interessante sobre a importância de se

estudar economia doméstica, assim como educação financeira.

O objetivo desta primeira ação da intervenção foi discutir com os professores,

alunos e pais, se a educação financeira é uma atividade específica da educação

escolar, ou se pode e/ou deve ser realizada pelos pais. Após apresentar o trabalho e

explicar como este seria realizado, pais e alunos compreenderam a importância de

se estudar a educação financeira e passaram a pesquisar meios de pensar e refletir

como organizar o seu orçamento doméstico envolvendo os estudantes na atividade.

Na terceira semana de fevereiro os alunos assistiram ao vídeo “Planejamento

Financeiro: orçamento familiar”, de Rafael Seabra (2008), que está disponível

em<https://www.youtube.com/watch?v=VNatE-z9dU>, último acesso em 28 out.

2014. Após o vídeo houve uma conversa sobre o conteúdo apresentado, e os alunos

conversaram bastante sobre o assunto até chegarem à conclusão de que quem tem

conhecimento consegue aproveitar oportunidades. Nas atividades seguintes foi feita

a leitura de um texto intitulado “Os Ganhos e as Perdas a Partir do Consumo”, de

Tolotti (2007), depois foram resolvidas atividades relacionadas ao conteúdo do texto.

Durante as duas semanas seguintes foi apresentada a planilha e explicada a

sua finalidade. Na sequência, os alunos realizaram o preenchimento dos dados das

planilhas com a ajuda da sua família, e durante todo o mês de março, os estudantes

criaram problemas utilizando os dados dessas planilhas, e estes, por sua vez, foram

socializados com a turma, buscando-se, então, resolver todos os problemas criados.

A planilha trabalhada com os alunos teve como base a renda de cada família,

da qual foram deduzidos, mensalmente, os gastos e os investimentos. A Tabela 1

apresenta uma dimensão do resumo dos gastos em relação à renda de cada família.

Com os resultados da planilha e a organização de orçamentos, vários alunos

perceberam que é necessário valorizar mais o orçamento doméstico e o dinheiro da

família com vistas a garantir o equilíbrio financeiro dos seus membros.

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Tabela 1 – Rendimentos e Gastos Mensais da Família Total Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez Total

Rendimentos

Gastos

Saldo do Mês

Saldo

Acumulado

Fonte: Autora, 2014

Foram estudadas também as taxas de juros de lojas, supermercados, bancos,

dentre outros. Da mesma forma, foram feitos cálculos usando faturas de água, luz e

telefone e carnês de lojas, criando problemas que foram solucionados pelos alunos.

Para solucionar esses problemas, os alunos criaram roteiros para compreender e

analisar as soluções; eles socializaram os problemas com a turma e buscaram

soluções apresentando resultados.

Após a terceira semana de abril os alunos passaram a solucionar os

problemas das planilhas, discutindo como reduzir gastos. O esforço empreendido

aqui esteve relacionado à necessidade de aproximar o conhecimento da realidade

dos alunos. Cada aluno desenvolveu uma planilha individual sobre gastos pessoais

com roupas, calçados, objetos pessoais, produtos e materiais usadas por cada um,

unindo aos seus gastos com alimentação, escola, transporte, material escolar, saúde

e lazer. Esta atividade teve como objetivo central promover a reflexão entre os

alunos sobre o valor despendido pela família para mantê-lo.

Já no mês de maio foram criados gráficos a partir dos dados da planilha, e

também foram pesquisados conceitos, vantagens e desvantagens de formas de

pagamento com cheques, cartões de crédito, débito automático e dinheiro. Todos os

conhecimentos construídos foram registrados e arquivados em uma pasta própria

para isso, que contribuiu para construir um portfólio de economia financeira pessoal.

Nas duas últimas semanas do mês de maio os alunos realizaram a leitura do

texto “Cinco Mandamentos da Economia Familiar”, de (EID JÚNIOR; GARCIA, 2001,

p. 31), produzindo textos de opinião e discutindo o uso da planilha com os colegas

de sala. Após esta etapa, foram elaborados cartazes e, por fim, apresentados os

resultados do projeto para a comunidade escolar. As Figuras 1 e 2 apresentam parte

da exposição de gráficos e planilhas realizada pela professora com os alunos.

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Figura 1: Exposição de Gráficos e Planilhas

 Fonte: Autora, 2014

Figura 2: Gráficos e Planilhas dos Alunos

 Fonte: Autora, 2014

Uma atividade muito importante foi finalizar o projeto produzindo textos de

opinião sobre a importância da economia doméstica, onde os alunos escreveram

seu parecer e os pais também. Todos aprovaram o conteúdo e vários ficaram

entusiasmados com os resultados, especialmente porque vários alunos passaram a

compreender os seus gastos e a valorizar mais o dinheiro, ajudando os pais a

poupar e a planejar melhor os gastos de todos os seus familiares.

A Tabela 2 apresenta algumas opiniões muito significativas de alunos e de

pais sobre o projeto e sobre a importância da educação financeira para o futuro e a

segurança econômica das famílias. Para fins de entendimento e organização, os

alunos estão identificados pela letra A, seguida de um número, e os pais pela letra

P, seguida do mesmo número correspondente ao número do seu filho.

Tabela 2 – Opinião de Alguns Alunos e de seus Pais Sobre o Projeto OPINIÃO DOS ALUNOS OPINIÃO DOS PAIS

A1: “Aprendi que enquanto economizo fica mais

dinheiro no bolso, antes eu gastava tudo o que

sobrava, agora sei que é importante guardar.”

P1: “Com o projeto minha vida vai mudar

bastante, pois aprendi economizar mais, com a

planilha familiar, este mês economizei R$ 400,00

do cartão de crédito.”

A2: “Acho importante discutir as finanças em

família, porque assim todos ficam sabendo dos

gastos e ganhos e tratam com mais

responsabilidade.”

P2: “Achei que trabalhar as questões financeiras

em família é muito importante, envolver todos

nos gastos cotidianos é fundamental para

compreender o futuro.”

A3: “Na minha casa este projeto ajudou muito,

meus pais já tem o controle de tudo e

conseguimos melhorar o funcionamento de

P3: “O projeto ajudou bastante na nossa casa,

conseguimos controlar todas as nossas

despesas, creio que deveria virar uma matéria

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nossas contas.” na escola a economia financeira, ia ajudar muita

gente.”

A4: “Minha vida mudou depois que começamos

a controlar os gastos com a planilha. No primeiro

mês ficamos negativos, mas agora já guardamos

R$ 280,00, e vamos chegar a R$800,00 até o

final do ano.”

P4: “Estamos muito contentes, economizamos e

poderemos ir viajar no final do ano. O projeto

está ajudando a guardar o dinheiro.”

A5: “Este trabalho deveria ser passado para

todas as famílias, para minha família foi ótimo ter

participado do projeto.”

P5: “Com a ajuda do projeto conseguimos ver

melhor onde gastamos e como gastamos nosso

dinheiro, e isso foi muito bom.”

Fonte: Autora, 2014

Os comentários apresentados na Tabela 2 mostram algumas opiniões de pais

e de alunos sobre o projeto, e isto conduz à percepção do quanto é importante as

pessoas serem bem formadas para a gestão econômica da família. Muitos alunos

passaram a participar mais da organização familiar, motivando-se a economizar.

Eles perceberam que, ao conversar sobre o dinheiro com os pais, passaram a fazer

parte da solução e não dos problemas. Passaram igualmente a valorizar mais o

conhecimento matemático, pois o planejamento econômico depende da Matemática

e esta contribui muito para uma boa aplicação dos conhecimentos na prática.

Percebe-se que o objetivo do projeto foi alcançado, obtendo a aprovação dos

envolvidos, que fizeram questão de externar a sua aprovação e de adotar a planilha

para ajustar a economia familiar, passando a poupar mais e a ensinar os jovens a

poupar também.

3.2 Grupo de Trabalho em Rede

A troca de experiências durante a realização do GTR teve início ainda no mês

de março, quando professores de matemática de diferentes regiões do Estado do

Paraná se inscreveram e iniciaram o intercâmbio de experiências e a socialização do

conhecimento relacionado ao projeto de educação financeira voltada à economia

familiar.

Os professores demonstraram interesse e foram muito participativos. Nisto, o

objetivo da primeira inserção foi refletir sobre a contribuição do projeto de

intervenção pedagógica para a escola, quando os professores demonstraram que é

fundamental a participação da família, principalmente porque é uma oportunidade

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das famílias compreenderem como a escola pode atuar na vida das pessoas de

maneira mais efetiva e prática.

Foi importante perceber que os professores tiveram um parecer positivo sobre

o projeto. A afirmação feita por uma professora da cidade de Carambeí representa o

pensamento da maioria dos participantes do grupo, a qual declarou: “Apesar de

essencial, a educação financeira, hoje, não é uma realidade nas escolas públicas.

[...] Se uma criança já é estimulada a se organizar e pensar em seu futuro, terá

muito mais sucesso do que alguém que comece a planejar muito mais tarde.”

A socialização da aplicabilidade das ações de implementação do projeto de

intervenção na escola foi o segundo objetivo proposto no GTR. Os professores

aprovaram a sequência das atividades e demonstraram que ficou fácil compreender

como desenvolver o uso das planilhas em sala de aula, além de aprovar a sua

utilização como um ponto importante a ser desenvolvido na vida dos alunos.

Os professores sugeriram que fosse oportunizado aos alunos o uso

consciente de calculadoras para ajudá-los a melhor computar cálculos de juros e de

porcentagens e, a partir disso, solucionar problemas de forma mais eficiente. Os

professores afirmaram ser de grande valia desenvolver o conhecimento financeiro,

pois isto pode auxiliar não apenas os alunos mas a sociedade em geral, afinal, a

formação de cidadania não pode omitir a educação dos gastos e o equilíbrio

econômico das famílias.

Enfim, sintetizando os conhecimentos desenvolvidos pelo GTR, ficou claro

que a escola precisa atrair as famílias e ampliar a participação das mesmas, e

estudar e desenvolver projetos como este pode representar a abertura de novos

canais de comunicação entre a escola e a família, pois o dinheiro, numa sociedade

capitalista, é um dos assuntos mais interessantes para os alunos e as suas famílias.

O desenvolvimento do uso das planilhas e a busca pela consciência cidadã,

no equilíbrio financeiro das famílias, podem representar uma solução para vários

problemas que envolvem a sociedade contemporânea. Assim, este projeto abre um

leque de possibilidades sobre o assunto, o qual merece ser amplamente estudado.

4 Considerações Finais

O desenvolvimento do projeto de economia doméstica, como resultado do

conhecimento matemático, permitiu que os alunos se aproximassem mais da

realidade econômica de suas famílias, passando eles a ter uma melhor relação com

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os gastos de suas famílias, de uma maneira diferente, a qual fizeram questão de

apresentar na sala de aula aos seus pares.

O conhecimento matemático desenvolvido na escola não pode estar

dissociado das necessidades de conhecimentos dos alunos, pois trata-se de permitir

que a Matemática ocupe o seu devido lugar na vida das pessoas. De fato, o trabalho

teve como objetivo geral desenvolver conhecimentos de economia doméstica para

serem contextualizadas e colocadas em prática, e este saber/fazer demonstrou a

importância da Matemática em atividades simples do planejamento familiar

A compreensão de conceitos sobre economia doméstica, não poderia ser

realizada sem a participação da família, o que exigiu a autorização e a participação

dos familiares na idealização e na realização das planilhas, porém não se limitou a

colher dados, haja vista que o projeto ajudou as pessoas a refletir sobre a economia

doméstica e a necessidade de planejamento, havendo mesmo quem dissesse que o

projeto melhorou o diálogo familiar. Eis aqui o verdadeiro papel da escola: promover

a formação das pessoas e estender os seus conhecimentos para a sociedade.

Não se trata apenas de aprender e não usar o que se sabe em proveito da

família, porque o conhecimento da economia doméstica permite responder questões

que alavancam a compreensão das pessoas sobre gastos desnecessários, sobre o

uso sustentável dos meios de produção, sobre as necessidades reais das pessoas e

sobre como economizar e melhorar a sua qualidade de vida.

O estudo realizado permitiu compreender que a matemática não deve ser

dissociada da vivência diária das pessoas, que não há razão para se aprender uma

matemática que não possa ser utilizada para melhorar a vida e que o conhecimento

de uma matemática útil é de grande impulso para uma sociedade voltada para a

cidadania plena.

Quando a aprendizagem tem por finalidade promover a melhoria da qualidade

de vida ela tende a ser bem aceita e ajuda a melhorar também o aproveitamento de

todos os conhecimentos construídos no ambiente escolar.

Assim, a promoção de projetos educativos que possam contribuir para a

melhoria das relações sociais e humanas deve ser uma constante nas instituições

escolares e podem ser adotados nas escolas públicas visando a melhoria da

vivência e convivência social de todos.

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Referências ÁVILA, A. Um Curriculum de Matemática para a Educação Básica de Jovens e Adultos – dúvidas, contribuição e reflexão. In: JORNADA DE REFLEXÃO E CAPACITAÇÃO SOBRE MATEMÁTICA NA EDUCAÇÃO BÁSICA DE JOVENS E ADULTOS, 1, 1995, Rio de Janeiro. Anais. Brasília: MEC/UNESCO/OREALC, 1997. BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília: MEC, 1997. EID JÚNIOR, A. M.; GARCIA, F. G. Como Fazer o Orçamento Familiar. São Paulo: Publifolha, 2001. MEDEIROS, C. F. Por uma Educação Matemática como Intersubjetividade. In: BICUDO, M. A. V. Educação Matemática. São Paulo: Cortez, 1987, p. 13 – 44 MORIN, E. Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro. São Paulo: Cortez, 2000. PARANÁ. Diretrizes Curriculares para a Educação Básica – Matemática. Curitiba: SEED, 2008. PIRES, M. N. M. Prática Educativa do Pensamento Matemático. Curitiba: IESDE Brasil S.A, 2005. POLYA, G. A Arte de Resolver Problemas. Rio de Janeiro: Interciência, 1998. SANTOS, E. Fundamentos Gerais da Educação Básica. Curitiba: IESDE, 2005. SOUZA, A. C. C. O Reencantamento da Razão: ou pelos caminhos da teoria histórico-cultural. In: M. A. V. BICUDO (Org.). Pesquisa em Educação Matemática: concepções e perspectivas. São Paulo: UNESP, 1999. p. 137-149. STUART, S. Ensine seu Filho a Cuidar do Dinheiro: um guia para desenvolver a inteligência desde a pré-escola. São Paulo: Ed. Gente, 2009. TOLOTTI, M. As Armadilhas do Consumo: acabe com o endividamento. Rio de janeiro: Elsevier, 2007. TURQUINO, G. B. O Papel da Educação e da Cultura na Construção da Cidadania. In: TORRES, P. L. (org.) Alguns Fios para Entretecer o Pensar e o Agir. Curitiba: SENAR-PR, 2007. Vídeo

Planejamento Financeiro: orçamento familiar por Rafael Seabra (2008). Disponível em: https://www.youtube.com/ watch?v=vVNatE-z9dU. Acesso em 02 out. 2014.

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Apêndice PLANILHA DE CÁLCULOS PESSOAIS

Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez TOTAL RENDA Salário 13º. Salário Férias Retirada de Poupança Retirada de Aplicações

Bolsas Empréstimos Outros HABITAÇÃO Aluguel/Prestação Condomínio IPTU Luz Telefones Gás TV por Assinatura Supermercado Empregada Reformas/Consertos Outros / Ajuda em casa

SAÚDE Plano de Saúde Médico / Psicologa Dentista Medicamentos Outros TRANSPORTE Ônibus Metrô Trem Táxi Outros AUTOMÓVEL Prestação Seguro Combustível Lavagens IPVA Mecânico Multas Outros DESPESAS PESSOAIS

Higiene Pessoal Cosméticos Cabeleireiro Vestuário Lavanderia Academia Telefone Celular Pager Empréstimos Cursos Outros LAZER Restaurantes Cafés/Bares/Boates Livraria/Jornal Locadora de Vídeo CDs, Fitas, acessórios

Passagens

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TOTAIS Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez TOTAL

Rendimentos

Gastos

Saldo do Mês

Saldo

Acumulado

 

RESUMO PARA GRÁFICO %

RENDA FAMILIAR

HABITAÇÃO

SAÚDE

TRANSPORTE

AUTOMÓVEL

DESPESAS PESSOAIS

LAZER

CARTÕES DE CRÉDITO

DEPENDENTES

RENDA FAMILIAR

 

Hotéis Passeios Outros CARTÕES DE CRÉDITO

MasterCard Visa American Express DEPENDENTES Escola/Faculdade Cursos Extras Material escolar Esportes/Uniformes Mesada Passeios/Férias Vestuário Saúde/Medicamentos Outros