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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

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Superintendência da Educação Programa de Desenvolvimento Educacional - PDE

Universidade Estadual do Centro – Oeste (UNICENTRO)

ADRIANI BARBOSA

O presente artigo é parte integrante e

conclusiva do Programa de

Desenvolvimento Educacional PDE 2013 –

2014.

Orientador: Prof. Francismar Formentão.

Palmital, 2015

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A literatura na escola como instrumento de criticidade

Adriani Barbosa1

RESUMO:

O presente artigo é parte integrante do Programa de Desenvolvimento Educacional PDE 2013 – 2014. Tem como preocupação problematizar as temáticas sociais no gênero contístico brasileiro visando à formação leitores críticos e humanizados. A literatura possibilita o deleite, a catarse e também a reflexão, e o conto sendo arte literária tem papel importante no processo de humanização dos seres ao trabalhar com a emoção e com o senso crítico do sujeito. Faz-se necessário compreender a leitura como um fenômeno cultural, histórico, social, capaz de revelar as contradições e conflitos da realidade. Sob essa perspectiva, entre o texto literário e sua dimensão social é que se justifica escolha do gênero, devido também a sua brevidade que possibilita lê-lo na íntegra com a turma, bem como o seu cuidado estético e carga semântica. O trabalho segue as orientações das Diretrizes Curriculares do Paraná, portanto, pauta-se pela Estética da Recepção ao levar em consideração em que toda obra está sujeita ao horizonte de expectativas de um público. É um fenômeno artístico, com implicações históricas e sociais. Tem como referência a teoria de Antônio Cândido ao enfocar a literatura como um direito e uma necessidade exaltando seu caráter humanizador e ainda ao se referir a ela como arte responsável pela formação de leitores conscientes.

PALAVRAS-CHAVE: Literatura; conto; sujeito; reflexão; sociedade.

A escola, em sua singularidade, contém em si a presença da

sociedade como um todo. Edgar Morin, 2006.

1. INTRODUÇÃO

Este estudo discute a importância de enfocar a literatura nas aulas de

língua portuguesa através da interrelação com o mundo real. Para isso faz-se

necessário discutir temáticas sociais, observáveis e pertinentes no cotidiano

como forma de promover a formação de leitores críticos e humanizados.

As escolas têm enfrentado dificuldades em trabalhar com a leitura

literária na íntegra, motivo este que faz com que os alunos nem sempre a

1 Professora QPM da rede Estadual da Educação lotada no Colégio Estadual João Paulo II.

Município de Palmital, NRE de Pitanga.

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compreendam. Muitas vezes ocasionada pela preferência dada aos livros

didáticos, que abordam mais a periodização do que a literatura propriamente

dita. Tendo consciência disso, apontamos como caminho um estudo mais

abrangente com o conto, pois devido sua brevidade e concisão permite ser

analisado na sua inteireza.

Ao privilegiar textos literários e oportunizar a experiência de temas

sociais dentro do campo linguístico aguça-se o interesse do aluno pelo objeto

lido. Possibilita-se, assim, o contato com a literariedade que o gênero contístico

apresenta e criam-se condições para um alargamento de visão. Ao analisar um

código abstrato, enquanto matéria, e ao relacionar a uma dada realidade

concreta, utiliza-se para isso de múltiplos meios, faz-se a mediação entre

literatura, conteúdo e a sociedade. Nessa interligação proporciona-se um

ambiente para que o estudante se posicione criticamente.

Pensando nisso, este artigo segue o referencial teórico proposto pela

Diretriz Curricular de Língua Portuguesa para Educação Básica do Paraná, que

fundamenta o trabalho literário na concepção dialógica e social da linguagem.

O objetivo é dar à literatura uma prática que proporcione ao aluno experiências

reais de uso da língua. A Diretriz orienta que essas atividades desenvolvam-se

embasadas na Estética da Recepção e na Teoria do Efeito, elaboradas por

Hans Robert Jauss e Wolfgang Iser. A partir desses estudos, Maria da Glória

Bordini e Vera Teixeira de Aguiar elaboraram o chamado Método Recepcional

como encaminhamento metodológico para este tipo de trabalho por entender

que o leitor ao “receber” a obra a atualiza e dialoga com ela através do seu

conhecimento de mundo. Considera, ainda, o pensamento de Cândido ao

enfatizar a literatura como um direito indispensável no tocante à humanização

do ser.

A metodologia de trabalho conhecida como Método Recepcional tem por

objetivo:

“efetuar leituras compreensivas e críticas; ser receptivo a novos textos e a leituras de outrem; questionar as leituras efetuadas em relação ao seu próprio horizonte de expectativas, bem como os do professor, da escola, da comunidade familiar e social”. (PARANÁ, 2008, p.74).

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O leitor deixa de ser visto como passivo, meramente decodificador, e

passa a atualizar a obra a cada leitura, pois o conceito de horizontes de

expectativas nos aponta para um sujeito que está em mudança constante e

com ele as perspectivas de leitor. Portanto, “o processo de recepção textual

implica a participação ativa e criativa daquele que lê, sem com isso sufocar-se

a autonomia da obra”. (AGUIAR e BORDIN, 1993. p. 81) Pode-se, acrescentar,

aqui, as palavras de Candido:

a literatura é, pois, um sistema vivo de obras, agindo umas sobre as outras e sobre os leitores; e só vive na medida em que estes a vivem, decifrando-a, aceitando-a, deformando-a. a obra não é um produto fixo, unívoco ante qualquer público; nem este é passivo, homogêneo, registrando uniformemente o seu efeito. São dois termos que atuam um sobre o outro, e aos quais se junta o autor, termo inicial desse processo de circulação literária, para configurar a realidade da literatura atuando no tempo. (CANDIDO, 2000, p. 68).

Sendo assim, é inegável a importância da literatura, enquanto arte da

palavra, oral e escrita e o que ela representa na vida dos seres. Através dela

podemos nos tornar melhores e mais próximos. É preciso levar em conta a

importância do leitor enquanto ressignificador de uma obra lida em que um

interage com o outro numa ação dinâmica, pois sem essa interação, realização

de inferências, preenchimento dos vazios do texto, como chama Iser, a

interpretação é inexistente e o aluno pode decodificar, mas não terá condições

de se apropriar de fato do que leu e não terá opinião formada, capacidade de

compreensão desse organismo vivo de que é feita a literatura. Isso significa

dizer que a obra de arte vive na experiência do aluno/leitor. Caracteriza-se pela

abertura, pelas possibilidades de vários níveis de leitura, pelo grau de atenção

e consciência a que nos obriga a ter.

Na concepção de Mikhail Bakhttin a linguagem é analisada a partir da

interação entre os indivíduos dentro de uma prática social; a língua não é

apenas um amontoado de palavras, nem é individual, mas acontece através da

interação verbal, abrangendo o todo, o leitor lê, decodifica, compreende,

interpreta e apreende algo. E na escrita, o que escreve responde a alguma

coisa, confirma, discute ou propõe algo a um grupo social. Locutor e

interlocutor dialogam num sentido amplo, dialógico.

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Nessa relação interativa entre o conceito Bakhtiniano de Língua e o que

propõe a linha de pensamento teórico da DCE de língua portuguesa, o leitor

passa a ser valorizado assumindo um papel dinâmico de co-autor da obra no

processo de leitura.

Procura-se colaborar com a relação de comunicabilidade entre texto e

leitor de maneira mais abrangente, por meio de práticas de ensino que não

privilegiem somente o aspecto cronológico da obra e autor, mas com atividades

de inferências, pesquisas, análises, interpretações, exposição e reflexão de

ideias, escrita e reescrita. Tendo sempre em mente que ler é ampliar

horizontes. “Aquele que lê consegue alargar não só o seu universo, mas

também o universo da obra a partir da sua experiência cultural”. (PARANÁ,

2008, p.58) Segundo Antonio Candido em Direito à Literatura:

a literatura expressa uma necessidade universal e um direito dos indivíduos em qualquer sociedade. Ela é fundamental ao processo de humanização que confirme no homem aqueles traços que reputamos essenciais, como o exercício da reflexão, a aquisição do saber, a boa disposição para com o próximo, o afinamento das emoções, a capacidade de penetrar nos problemas da vida, o senso de beleza, a percepção da complexidade do mundo e dos seres, o cultivo do humor. (CANDIDO, 2004, p. 180)

Partindo do pressuposto acima, infere-se que ela tem a potencialidade

de nos tornar melhores e de permitir uma maior reflexão sobre a cidadania em

seu conteúdo político e social. Colabora, portanto, para a formação intelectual e

cultural. Sendo assim, o presente artigo justifica-se pela necessidade de

contribuir com o ensino-aprendizagem de forma significativa, apresentando

proposta teórica sobre práticas pedagógicas que ampliem os horizontes dos

educandos para além do texto lido, levando-os a fazer referência com o meio

no qual estão inseridos.

É interessante ressaltar que tanto Candido como Bakhtin corrobora com

a mesma afirmação, embora cada um com sua linha teórica: “a língua é algo

real, vivo e evolui historicamente na comunicação verbal concreta”. Então se

considerarmos a etimologia da palavra ler (lego, em latim) significa que aquele

que lê deve colher tudo quanto vem escrito. O que resulta relacionar textos aos

seus contextos e compreender os recursos expressivos da linguagem. “A

palavra é o produto da relação recíproca entre falante e ouvinte, emissor e

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receptor”. (BAKHTIN, 1997, p. 113). Além disso, “a própria realização deste

signo [palavra] social na enunciação concreta é determinada pelas relações

sociais”. (BAKHTIN, 1992, p.113) É através da língua que se atribui sentidos e

se cria interrelações.

Para Iser (1999) isso significa dizer que “a obra literária apresenta um

caráter emancipatório, permite que o leitor possa ter um papel atuante no

contexto social”. Nas palavras de Zilberman (2005): “tão logo criada, a escrita

assumiu um caráter distintivo, conferindo àqueles que dominavam a técnica de

escrever (...) um lugar de destaque na sociedade”. Percebe-se assim, que é

através do letramento dos sujeitos que poderá haver mudanças na sociedade,

transformações estas que podem ser no âmbito político, econômico ou social.

O que não pode acontecer é mutilar uma sociedade por falta de Educação,

conhecimento e cultura, pois é justamente onde reside o centro do

desenvolvimento humano e social como um todo. É possível dizer que através

da literatura o homem aguça seu olhar sobre a realidade. Ela contribui para a

sua formação como leitor, mas também como indivíduo historicamente situado,

é capaz de dar condições para seu desenvolvimento não apenas intelectual,

mas integral, é a emancipação em todos os sentidos. Sobre isso afirma

Candido:

a literatura corresponde a uma necessidade universal que deve ser satisfeita sob pena de mutilar a personalidade, porque pelo fato de dar forma aos sentimentos e à visão do mundo ela nos organiza, nos liberta do caos e, portanto nos humaniza. Negar a fruição da literatura é mutilar a nossa humanidade (Candido, 2004, p. 186).

O estudo em questão considera as referências acima citadas e procura

fomentar o gosto pela leitura de contos, bem como a ampliação do horizonte de

expectativas dos estudantes em relação as leitura que estão habituados. Pode

contribuir para o aprimoramento da competência linguística dos mesmos e

instigá-los a formar uma sociedade leitora, humanitária e emancipada, pois de

acordo com Candido (2004): através do aprendizado as coletividades humanas

transformam sua própria história.

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2. LITERATURA E CRITICIDADE

O conto, “A caolha” de Júlia Lopes de Almeida, narra o drama de

Antonico que sofre bullying por toda sua vida devido a um problema que sua

mãe tem no olho. Ele é vítima do preconceito, ela do estigma da sociedade,

que deixa de se sensibilizar com o problema do outro, também do filho que aos

poucos passa a renegá-la e ambos são vítimas de um sistema precário de

saúde, das condições materiais em que vivem.

“O filho não sofria menos. Quando em criança entrou para a escola pública da freguesia, começaram logo os colegas, que o viam ir e vir com a mãe, a chamá-lo: – o filho da caolha. Riam-se, chacoteavam-no, já não era só na escola que o chamavam assim. Os companheiros murmuravam injúrias, faziam caretas de náuseas! Aos onze anos pediu para sair da escola” (A caolha. In: MORICONI, 2001, p.50).

Ler o texto somente e procurar os elementos que constituem o gênero,

sem trazê-lo para o nosso contexto social é algo inútil, o conto é muito rico,

cheio de figuras de linguagem e se for trabalhado de forma a instigar os alunos

a buscar as inferências, os vazios, a comparar com as outras tantas vítimas

dos estereótipos propagados pela sociedade, das condições socioculturais em

que se encontram fará diferença no quesito análise crítica.

O fato de a personagem não ser chamada pelo nome no decorrer da

narrativa, mas caracterizada pelo apelido pejorativo, que lembra o seu defeito

físico a todo instante, nos põe diante da voz de uma sociedade estereotipada.

Se olharmos para o contexto escolar e social como não abordar a questão de

tantos alunos que também são apelidados, sofrem com isso mesmo assim

continuam sendo humilhados com brincadeiras de mau gosto? Retrato vivo da

insensibilidade de colegas que perpetuam a discriminação sem ao menos parar

para refletir que tipo de prejuízo essa atitude traz pra a vida do outro. Antonico,

cansado das chacotas, abandona a escola, sofre nos empregos que arruma,

sente-se deprimido e é obrigado a escolher entre a mãe e a futura namorada.

Os sentimentos contraditórios se intensificam de um lado sua mãe que o criara

com sacrifícios e de outro o futuro comprometido ao lado de sua namorada.

“A bela moreninha confessava consentir em ser sua mulher, se ele se separasse completamente da mãe. Ela não se poderia sujeitar a ser

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alcunhada de nora da caolha, ou coisa semelhante!”. (A caolha. In: MORICONI, 2001, p.52).

Essa ambiguidade de sentimentos de ambos os personagens é possível

notar com a antítese “Daquele filho vinha-lhe todo o bem e todo o mal”

demonstra o quanto a mãe sofre não só com o preconceito dos outros, mas

principalmente com a ingratidão do filho a quem ela mais ama.

A narrativa demostra também o preconceito velado, pois quando a mãe

interfere em benefício do filho, junto ao patrão, para que este não deixasse os

demais funcionários humilhá-lo, ele percebe e sente a “zombaria silenciosa”

através das expressões dos aprendizes. No sorriso mal disfarçado dos oficiais

ecoa a voz social da exclusão, do dedo apontado condenando.

“A infeliz mulher contou ao mestre toda a história do filho e suplicou-lhe que não deixasse os aprendizes humilhá-lo; que os fizesse terem caridade!” “Quando o mestre dizia: Sr. Antonico, ele percebia um sorriso mal oculto nos lábios dos oficiais”. (A caolha. In: MORICONI, 2001, p.51).

Antonico, diante do tratamento que recebe das pessoas, também

transfere essa carga negativa para a mãe, passa a “concordar” com as críticas

que fazem a ele em vez de lutar contra. Passa a viver um conflito psicológico.

O seu modo de agir se altera ao longo da vida, quando pequeno dava-lhe

carinho, amor: “comia, às vezes, até no mesmo prato”, “Em criança ele

apertava-a nos bracinhos e enchia-lhe a cara de beijos!”.

Para a mãe o amor do filho lhe bastava, ambos viviam solitários:

“que lhe importava o desprezo dos outros, se o seu filho adorado lhe

apagasse com um beijo todas as amarguras da existência?”, mas para ele a

falta de amigos e o completo isolamento social vão aos poucos o

embrutecendo. No decorrer da narrativa pensa e age de acordo com o que os

outros esperam dele e não mais tem autonomia de suas decisões, começa a

ver na figura materna a razão de seu fracasso escolar, financeiro e amoroso.

”os beijos foram escasseando passou a beijar-lhe a mão!” (p. 50) “A dizer a verdade eu havia de sujeitar minha mulher a viver em companhia de...uma tal criatura?” “Ela era causadora da sua desgraça! Aquela mulher perturbara a sua infância, quebrara-lhe todas as carreiras, e agora o seu mais brilhante sonho de futuro sumia-se diante dela! Lamentava-se por ter nascido de mulher tão

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feia”. (A caolha. In: MORICONI, 2001, p.52)

Como não chamar a atenção da classe para uma sociedade que preza

pela aparência física e discrimina e exclui os que não se encaixam nos padrões

da “normalidade”, da “beleza”. O “defeito” da mãe de Antonico a deixava

desprezível diante do olhar do outro, a afastou do amplo convívio social, sem

amigos como podemos perceber: “lembrou-se da madrinha, única amiga da

caolha, mas que, entretanto, raramente a procurava”.

“seu aspecto infundia terror às crianças e repulsão aos adultos... mas porque a desgraçada tinha um defeito horrível: haviam lhe extraído o olho esquerdo; a pálpebra descera mirrada, deixando, junto ao lacrimal, uma fístula continuamente porejante... que a tornava repulsiva aos olhos de toda a gente”. (A caolha. In: MORICONI, 2001, p.49).

O narrador nos apresenta a personagem central como uma mulher com

aspecto doente. O olho sempre porejante indica que mesmo tendo perdido a

visão não recebeu os cuidados necessários. Não esclarece sua idade, mas

também nos leva a crer, pela forma como é descrita, que aparenta ser mais

velha do que de fato é, mas mesmo abatida, deprimida, talvez, pela situação

em que vive consegue criar o filho a custa de seu trabalho.

“A caolha era uma mulher magra, alta, macilenta, peito fundo, busto arqueado, braços compridos, delgados, largos nos cotovelos, grossos nos pulsos; mãos grandes, ossudas, estragadas pelo reumatismo e pelo trabalho; unhas grossas, chatas e cinzentas, cabelo crespo, de uma cor indecisa entre o branco sujo e o louro grisalho, desse cabelo cujo contato parece dever ser áspero e espinhento; boca descaída, numa expressão de desprezo, pescoço longo, engelhado, como o pescoço dos urubus; dentes falhos e cariados. (A caolha. In: MORICONI, 2001, p.49)

A personagem é descrita com muitos adjetivos que não a caracterizam

quanto ao seu modo de ser, personalidade, mas de forma a evidenciar o seu

defeito, ele é mais importante que ela, a pessoa que ela é em seu íntimo não

interessa, o seu “problema físico” é perceptível em primeiro plano, é o que se

destaca.

É interessante discutir que o olhar do próximo em nenhum momento

questiona os cuidados médicos necessários que ela não deve ter recebido,

advindos da condição material precária que a deixou sendo a caolha para

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sempre, restringindo-lhe os espaços sociais, a convivência livre com os

demais.

O conto em análise foge dos padrões tradicionais que o classifica como

menos descritivo, pois nos primeiros parágrafos tanto a personagem é

descrita fisicamente como também a sua moradia. A sua escolha se da pela

riqueza da temática que através dela é possível dialogar com questões como

a falta de valores éticos e humanos, bem como a necessidade de respeito e

solidariedade com as pessoas, independentemente de cor, religião e/ou

defeitos que tenham. A importância de se lutar por políticas públicas que

atendam de forma eficaz os menos favorecidos economicamente. Porque

educar é mais que produzir ou reproduzir o conhecimento científico, é ensinar

valores, formar cidadãos mais sensíveis para com o próximo e acima de tudo

impulsioná-los a buscar a dignidade humana de forma igualitária a todos.

O desfecho do conto se dá quando a madrinha revela ao afilhado que

ele fora o algoz de sua mãe, mesmo sem ter a intenção, pois era uma criança

quando o fato sucedeu.

“- Ah, não tiveste culpa! Eras muito pequeno, um dia ao almoço, levantaste na mãozinha um garfo; ela estava distraída, e antes que eu pudesse evitar a catástrofe, tu enterraste-lho pelo olho esquerdo! Ainda tenho no ouvido o grito de dor que ela deu!” (A caolha. In: MORICONI, 2001, p. 54).

A mãe que nunca quis revelar a verdade a Antonico nesse momento nos

mostra quão grande é o amor materno capaz de suportar tudo calada para não

ver o sofrimento do filho. Mesmo sendo vítima da ingratidão aguenta em

silêncio a tantas humilhações. Podia resistir ao descaso das pessoas, mas não

conviver com a dor de Antonico por sentir-se culpado de sua desgraça. O conto

nos apresenta o amor ágape, esse amor incondicional, com entrega total, sem

cobrança que é possível somente de mãe para filho.

O conto “Clínica de repouso” traz em seu enredo uma moça que

encontrando resistência por parte da mãe em aceitar seu namorado em casa

interna a matriarca em um asilo e praticamente não a visita.

A menina (Maria) recolhe o namorado em casa mentindo para mãe que

ele era irmão de uma amiga, não conhecia ninguém em Curitiba e ficaria como

hóspede até conseguir um emprego. Mas a mãe (Dona Candinha) os

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surpreendia aos beijos no sofá, ela saia com o moço e voltava depois da meia

noite. Até que a dona da casa acorda às três da manhã com passos furtivos

no corredor e ordena que a filha mande o rapaz embora, esta a insulta. Ao ser

afrontada a mãe sente-se mal e a filha aproveita para interná-la contra sua

vontade. É dentro da suposta clínica de repouso que toda a história se

desenvolve.

Um conto escrito no século XIX, que representa os conceitos e valores

daquela sociedade, mas que perfeitamente pode ser presentificado com a

sociedade que temos hoje. Basta pegarmos jornais que dificilmente não

teremos notícias de maus tratos a pessoa idosa, mesmo depois de o Estatuto

do Idoso ter sido aprovado há onze anos pela lei n º 10.741, de 1º de outubro

de 2003.

Em “A caolha” quem sai de casa diante da possibilidade de ficar sem a

namorada é Antonico, em “Clínica de repouso” a filha é quem expulsa a mãe

de casa para ficar com o suposto namorado, tirando-lhe o direito de moradia,

família e o poder de decisão sobre sua própria vida:

“– A senhora vai por bem – intimou a filha – ou então à força”. “Às

duas da tarde, o aposento invadido pela filha, o noivo e um

enfermeiro de avental sujo”. “Eu vou se não for asilo de louco”. (Em

busca de Curitiba perdida, p. 50).

A obra em questão é muito rica em metáforas, ironias, antíteses,

adjetivações que nos remetem a um panorama de degradação do ser humano.

Começando pelo título do conto: “Clínica de repouso” até o nome do asilo

“Nossa Senhora da Luz”, não condizem com a real situação do local. Pois o

mesmo não permite nenhum tipo de descanso, repouso, muito pelo contrário as

pessoas são submetidas a maus tratos constantes, vivem em opressão, são

torturadas diariamente e submetida à crueldade do tratamento recebido no

lugar onde deveria curar-se dos nervos. O ambiente úmido, sem sol, que não

reestabelece a saúde. Ao contrário, aprisiona, angustia, abala o emocional

causando prejuízo ao sistema nervoso já tão debilitado e faz adoecer ainda

mais.

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“- Quem reclama – era o sistema do doutor Alô – ganha choque!” “Ao menor protesto ou queixume”. “Olhe o choque melindrosa! Olhe a injeção na espinha! Olhe a insulina na veia! (Em busca de Curitiba perdida, p. 51).

Novamente a situação de degradação da personagem, sem

privacidade, em total falta de higiene do local nos põe diante do descaso com

que o idoso é tratado ao ser exposto ao desrespeito, a privações, agressões

físicas e psicológicas. Tanto a exclusão da personagem Caolha do meio social

quanto a falta de possibilidade de Candinha decidir sobre sua vida e ser

submetida a viver em condições desumanas, sofrendo diversas humilhações

nos faz pensar em quantas Caolhas e Candinhas estão por aí hoje vivendo

em situação semelhante, entregues a própria sorte, vítimas do descaso alheio.

“Um banheiro só e depois de esperar na fila, aquela imundície no chão e na parede.” “servia-se da torneira no banheiro, não é que uma possessa vomitou na pia?” “guardou a impressão e sofria a sede”. (Em busca de Curitiba perdida, p. 51).

O fato de a servente fazer o papel que só caberia a enfermeiros nos

remete ao sistema da saúde falho em que a ordem é subvertida e qualquer

um “brinca” de medicar.

“A louquinha auxiliava a servente que, essa, fazia de enfermeira”. “A

servente largava o balde e o enxerga, sem lavar as mãos aplicava insulina na veia de uma possessa”. (Em busca de Curitiba perdida, p. 52).

Assim como em “A caolha” em “Clínica de repouso” também as

personagens são tratadas por apelidos pejorativos como: doida, epilética,

alcoólatra, possessa, louquinha, boba, lunática, que desindividualizam o ser

humano, inferiorizam-no e fazem com que se sinta sem importância diante do

olhar do outro. Em ambos os contos os filhos passam a agir diferente com as

mães a partir do momento em que se envolvem amorosamente. As matriarcas

são renegadas a segundo plano nos dois contos. Percebemos as antíteses

que demonstram que as mães detectam essa mudança de atitude

comportamental dos filhos para elas:

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“Daquele filho vinha-lhe todo bem e todo mal” (A caolha. In: MORICONI, 2001, p. 50). “Menina tão amorosa, hoje feroz inimiga” (Clínica de repouso. In: Em busca de Curitiba perdida, p. 52).

Cabe ressaltar que personagem Candinha foi excluída do convívio

familiar, tirada de circulação a falta de liberdade impostas a ela acrescidas às

condições precárias de higiene, o fato de não ter com quem contar, pois a

filha aparece para visitá-la vinte e dois dias depois. Fumando no quarto. Não a

liberta. Ao contrário a recrimina por suas atitudes, dizendo que não lhe falta

nada, que mais ela queria. Remetem-nos a um quadro de individualismo, em

que o ser humano para não abrir mão de uma suposta “felicidade” ou

situação, age de forma egoísta pondo o idoso em risco no momento em que

mais necessita da família.

Tudo isso coloca a personagem central na situação de vulnerabilidade,

sem o mínimo de dignidade ao ser, pois além de faltar o básico para sua

sobrevivência não há amparo, afeto, cuidados. É aí o ponto mais forte do

conto, pois a protagonista, pela miséria humana em que se encontra, passa a

se identificar com a mosca. Sobrevivendo num sistema opressivo que faz dela

bicho, pequena, insignificante. Ao passo que lhe retiram a plenitude da vida

deixando-a vegetar, sem o direito de ir e vir livremente. Presa tal qual inseto

entre os dedos. Perdeu sua individualidade. A filha vem vê-la apenas duas

vezes enquanto que o bicho, sua única companhia, por ironia permanece com

ela por três dias como quem se afeiçoou.

Ao comparar as histórias podemos deduzir que mãe de Antonico

certamente deveria sentir-se mosca ao ser olhada com repulsa por todos. E

hoje quantas pessoas perambulam pelas ruas tentando sobreviver

miseravelmente como podem. Será que em nenhum momento sentem seu ser

diminuído? Cabe aqui lembrar o poema de Manuel bandeira O bicho que é

pertinente à analogia.

Apesar de terem sido publicados há muito tempo os contos continuam

atuais. São atualizados a cada leitura. O completo desamparo em que muitos

idosos vivem é algo desumanizador e não pode ser banalizado. É preciso

chamar a atenção dos alunos para que olhem para o seu semelhante de

forma mais sensível, humana.

Os contos permitem levantar muitos campos temáticos e semânticos

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como bullying, discriminação social, descaso com o idoso, estereótipos

constatados na sociedade e que é papel da escola abordar criticamente.

Ao permitir- nos refletir sobre a sociedade e possibilitar a apropriação do

conhecimento, a literatura cumpre a sua função máxima, no entender de

Cândido. “O processo de humanização se dá através de três importantes

funções: psicológica, a formativa e a de conhecimento de mundo e do ser”.

(CANDIDO, 1972, p.803). A primeira está centrada na necessidade universal

que o homem tem de ficção e fantasia, a fruição através da arte, a catarse. A

segunda mostra o mundo, com suas luzes e sombras, as pessoas com seus

erros e acertos, em que o bem ou o mal humaniza em sentido profundo porque

faz viver apresentando o mundo como ele é. Assim põe o sujeito diante de uma

representação da realidade humana, social, impulsionando-o a pensar. Oferece

ao sujeito oportunidade de se avaliar, de se recolocar no mundo que o cerca,

de observar a representação de dada realidade social e humana, o que chama

atenção para seu o caráter humanizador e emancipador.

E sendo um direito, subentende-se que todo cidadão precisa usufruir do

conhecimento que foi historicamente construído, desfrutar-se desse Belo, que é

a Arte, que pode tocar corações, provocar reflexões e levar à mudança. É uma

das formas que temos para representar o mundo através da linguagem e

despertar possibilidades de desenvolvimento da sensibilidade, autonomia dos

educandos com o intuito de que eles melhorem-se enquanto leitores. Cada

escritor concebe o mundo de acordo com sua subjetividade, com valor estético

que nos permite reconhecer como manifestação artística do humano na

palavra.

É preciso que os estudantes entrem em contato com diferentes textos e

tenham oportunidade de se posicionar através de escolhas, comparações,

debates, questionamentos e tomadas de decisões, participando do texto de

acordo com as experiências de leituras anteriores. Diante de uma obra faz-se

necessário que haja interação no e com o texto e com a classe.

De acordo com Jauss:

a obra literária não é um objeto que exista por si só, oferecendo a cada observador em cada época um mesmo aspecto. Não se trata de um momento a revelar monologicamente seu Ser atemporal. Ela é, antes, como uma partitura voltada para a ressonância sempre

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renovada da leitura, libertando o texto da matéria das palavras e conferindo-lhe existência atual. (JAUSS, 1994.p. 25)

Percebe-se então que o texto literário não é um produto estático em um

determinado tempo histórico, não é um fato, mas um ato de recepção, que se

concretiza quando um leitor o lê, observando suas particularidades,

relacionando-o a outros textos que já tenha lido, o que o faz construir novos

parâmetros para apreciação de outras obras que venha a ler. Ele permite

sucessivas leituras, que se realizam de um modo diferenciado através dos

tempos, exigindo um relacionamento dialógico, dinâmico entre autor, obra e

leitor, e em face da natureza dessa relação, a obra literária se mantém viva,

enquanto puder interagir.

Dessa forma assegura-se a função social da leitura /escrita. De acordo

com Candido:

a fruição da arte e da literatura em todas as modalidades e em todos os níveis é um direito inalienável concebida também como fator indispensável de humanização, a literatura se constitui não somente como um direito, mas como uma necessidade de equilíbrio do homem e da sociedade. (CANDIDO, 2004, p.191)

Constatamos assim que é muito importante que a escola permita a

fruição da arte literária e procure desenvolver no aluno formas ativas de

aprendizado como aquelas que tornam o indivíduo crítico e criativo, mais

consciente e produtivo. A literatura tem papel relevante nesse aspecto porque

amplia e enriquece a nossa visão da realidade de um modo específico. Permite

ao leitor a vivência intensa e ao mesmo tempo a contemplação crítica das

condições da existência humana.

É válida a utilização de obras que conversem entre si, por mais distantes

que estejam umas das outras, e sejam de gêneros distintos continuam atuais e

contribuem para a compreensão de mundo, porque a literatura é atemporal,

vive ao passo que é lida e presentificada, pois ler é produzir significado. Ela

registra o humano que existe em todos nós. Por tal motivo, se for aliada a

práticas que venham ao encontro dos interesses da juventude suscitam

reflexão e geram aprendizado.

De acordo com Aguiar e Bordini o interesse do público poderá ser maior

dependendo da seleção que se faz das obras.

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Pesquisas na área da educação defendem que os métodos que buscam resgatar o educando para a leitura do texto literário devem partir do estudo de autores modernos ou contemporâneos, devido à “familiaridade” que lhe inspiram (AGUIAR e BORDINI, 1993, p. 188).

Embora a nomenclatura, a “classificação” de uma obra em uma

determinada escola literária não atrapalhe o sentido que ela produz, ao ser

contextualizada, preferem-se as que possuem uma linguagem mais atualizada,

conhecida para o público em questão para que se obtenha um melhor

resultado em relação à aprendizagem.

Faz-se necessário ao aluno compreender a leitura como um fenômeno

cultural, histórico, social, capaz de revelar as contradições e conflitos da

realidade. Para tornar-se um cidadão é preciso se posicionar no mundo em

relação ao que vê, aprende, discorda. Não se pode esquecer também que a

leitura faz parte do conteúdo de todas as disciplinas e para desenvolvê-la antes

é preciso buscar despertar o interesse da turma para ela. Sobre o interesse,

segundo Aguiar e Bordini, em Literatura e formação do leitor:

o ato de ler se configura, preferencialmente, como atendimento aos interesses do leitor, desencadeia o processo de identificação do sujeito com elementos da realidade representada, motivando o prazer da leitura. (AGUIAR e BORDINI, 1993, p.26)

Conforme Wolfgang Iser em O ato da leitura, o texto está aberto, não

porque não pode ser fechado, mas porque seu fechamento contém mudança

dialética. O lugar vazio induz o leitor a agir nele e preenchê-lo com suas

representações. Eles têm “relevância para o jogo interativo entre texto e leitor”,

entre conhecimento apresentado e o evocado pelo leitor. Então “o texto

converte-se numa peça essencial da obra, que só pode ser compreendida

enquanto modalidade de comunicação” é um acontecimento tanto quando é

produzida como quando é consumida pelo leitor, (ISER, 1999, p. 156-194).

Pode se dizer que é um fenômeno artístico, com implicações históricas e

sociais. Bermejo, no prefácio de Conversas com Cortázar, sobre essa questão

das implicações diz que Cortázar em sua literatura de provocação, tenta

colocar o “homem diante de seus limites, um apelo que nos faz sermos mais

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seres humanos”. Considera a literatura “exercício lúdico, antena da felicidade,

humanizadora”. (BERMEJO, 2002, p. 11,12) Portanto, em diálogo com o social.

É a interação do leitor com o objeto lido. Sobre essa interação Aguiar e Bordini

nos dizem:

A obra fornece pistas a serem seguidas pelo leitor, mas deixa muitos espaços em branco, em que o leitor não encontra orientação e precisa mobilizar seu imaginário para continuar o contato. (AGUIAR e BORDINI, 1993, p.82)

Nessa perspectiva, de um trabalho lúdico, crítico e humanizador, é

necessário instigar a realização de significações múltiplas a partir de diversas

obras, fazer associações com a realidade que nos circunda, refletir assim sobre

a sociedade de modo geral. Só então o ensino será significativo, e acredita-se,

que dará condições práticas de aprendizado e crescimento intelectual, pois de

acordo com Cortázar, na mesma obra antes referida “a temática de um conto

precisa ser significativa”. (CORTÁZAR, 2006, p. 162) Os mesmos não devem

ser analisados dentro de uma cronologia linear e sim através de temáticas, pois

a arte retrata experiências universais dos indivíduos. E pensa- se que, nessa

troca de experiência com o outro, seja esse um personagem da narrativa ou

um colega de classe, haja um processo de humanização, porque a arte faz

com que o aluno se reveja e se modifique. A falta da literatura, da arte, como

um todo, da privação do outro em nossa vida, embrutece o ser.

À medida que as civilizações foram se transformando, principalmente na

década de 70 com o desenvolvimento da ciência e da tecnologia de informação

de forma intensa o homem foi perdendo parte da capacidade de ser sujeito das

situações e se transformando em “mercadoria”. Pela lógica do capitalismo

educação e conhecimento são eixos do desenvolvimento da produção, da

economia, então o sujeito inserido nessa sociedade individualista voltada para

o consumo desumaniza-se. Isso porque os valores já não estão direcionados

para o humano, mas para os lucros. Sobre esse aspecto a educação passa a

ser vista de forma imediata a serviço do capital e da produtividade. O ser

pensante, ativo, que reflete sobre tudo a sua volta não é viável para essa

“nova” sociedade que não tem interesse na sua formação integral.

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A escola é um dos meios que possibilita ao indivíduo o acesso aos bens

culturais. Levando em consideração que muitos alunos têm a oportunidade

dessa experiência apenas no âmbito escolar, cabe, portanto, a ela oferecer os

subsídios, para a compreensão da realidade na qual os indivíduos estão

inseridos como forma de estimular o senso crítico dos alunos e a sua

humanização na vivência em coletividade. A linguagem é o instrumento que

dispomos para interagir socialmente. Poderíamos pensar que para isso

qualquer texto cumpriria essa função, mas as autoras abaixo nos esclarecem

que:

Todos os livros favorecem a descoberta de sentidos, mas são os literários que o fazem de modo mais abrangente. Enquanto os textos informativos atêm-se aos fatos particulares, a literatura dá conta da totalidade do real, pois representando o particular, logra atingir uma significação mais ampla. (AGUIAR e BORDINI, 1993, p. 13).

Conforme a citação parte-se do pressuposto de que a literatura contribui

muito nesse sentido porque retrata experiências universais dos indivíduos, é

manifestação artística, objeto de significação e exige um grau maior de

consciência e atenção, uma participação efetiva do leitor, tem papel importante

no processo de humanização dos seres humanos. Ela recorta o real, sintetiza-o

e interpreta-o através do ponto de vista do narrador. Então, por meio do fictício

manifesta um saber sobre o mundo e oferece ao leitor para que ele também o

interprete.

Por esse enfoque a literatura passa a ser verossímil na experiência do

leitor, é atemporal e vive ao passo que é lida e pode ajudar as pessoas a se

encontrarem consigo mesmas à medida que se reconhecem nas dores e

alegrias dos personagens, entrecruzam questionamentos, comparam o

individual com o coletivo e produzem conhecimento. É possível fazer dela uma

aliada nessa busca de melhoria social através da Educação, não de forma

utilitária, mas através da apropriação do conhecimento científico construído

pela humanidade porque subentende-se que sem ele não é possível o

desenvolvimento humano de forma integral e consequentemente a sua

liberdade fica comprometida. Simultaneamente podem fruir esteticamente

obras que têm na escrita a materialização de um contexto real.

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Faz-se necessário criar estratégias para que as pessoas internalizem a

leitura como prática cotidiana. Segundo Freire:

Por mais fundamentais que sejam os conteúdos, a sua importância efetiva não reside apenas neles, mas na maneira como sejam apreendidos pelos educandos e incorporados à prática. (FREIRE, 1987, p. 86)

Não podemos mais aceitar conteúdos desvinculados da vida, que

alienem o sujeito, pois educação de qualidade é condição essencial para que

se concretize o ideal de cidadania plena. Para isso a linguagem/comunicação

precisa ser eficiente e não excludente. À medida que se priva da cultura e dos

saberes sociais também se propaga a exclusão.

A escola precisa ser vista como o órgão da sociedade que permite o

diálogo entre diferentes interlocutores, sua dimensão é humanizadora e está

intimamente ligada à dignidade humana, ao exercício da conquista de direitos

e deveres do homem. É só uma parte do todo social, mas é parte importante,

professor tem que ter responsabilidade ética com o outro. A educação é

instrumento efetivo para uma atuação mais autônoma no meio em que vive.

Inclusive a consciência de que no mundo urbanizado/globalizado, as práticas

sociais que garantem parte da subsistência com dignidade supõem um sujeito

que tenha se apropriado da leitura e da escrita de maneira abrangente. Fica

evidente sua ligação com a sociedade, como nos alerta Magda Soares:

...o alfabetismo é o que as pessoas fazem com as habilidades e conhecimentos de leitura e escrita, em determinado contexto, e é a relação estabelecida entre essas habilidades e conhecimentos e as necessidades, os valores e as práticas sociais. Em outras palavras, o alfabetismo não se limita pura e simplesmente à posse individual de habilidades e conhecimentos; implica também, e talvez principalmente, em um conjunto de práticas sociais associadas com a leitura e a escrita, efetivamente exercidas pelas pessoas em um contexto social específico. (SOARES, Magda, 2003, p. 33)

Através da literatura o homem aprimora seu olhar sobre a realidade. Ela

contribui para a sua formação como leitor, mas também como indivíduo

historicamente situado, é capaz de dar condições para seu desenvolvimento

não apenas intelectual, mas integral, é a emancipação em todos os sentidos.

Sobre isso afirma Candido:

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A literatura corresponde a uma necessidade universal que deve ser satisfeita sob pena de mutilar a personalidade, porque pelo fato de dar forma aos sentimentos e à visão do mundo ela nos organiza, nos liberta do caos e, portanto nos humaniza. Negar a fruição da literatura é mutilar a nossa humanidade (Candido, 2004, p. 186).

É como se descortinasse o mundo e ao mesmo tempo deixasse o leitor

livre para estabelecer relações com ele. Situa-se tanto no campo simbólico

quanto no concreto. Marcada pela conotação, pela plurissignificação a obra

não é pedagógica no sentido de encaminhar o leitor para um único ponto de

interpretação de vida, mas ao contrário, seu discurso abrirá horizontes,

suscitará reflexões, divergências, reside aí, sua verdadeira possibilidade

educativa, pois o compromisso da educação/escola é com a liberdade.

Acredita-se que é necessário contribui para o aprimoramento da

competência linguística dos estudantes e instigá-los a formar uma sociedade

leitora, humanitária e emancipada, pois de acordo com Candido (2004) através

do aprendizado as coletividades humanas transformam sua própria história.

Sociedades que procuraram estabelecer regimes igualitários, o pressuposto é que todos devem ter possibilidades de passar dos níveis populares para os níveis eruditos como consequência normal da transformação de estrutura, prevendo-se a elevação sensível da capacidade de cada um graças à aquisição cada vez maior de conhecimentos e experiências. (CANDIDO, 1989, p. 124)

Podemos relacionar o pensamento de Candido com o pressuposto de

que a educação é o meio pelo qual se criam condições para que possamos

exercer a cidadania ativa. É onde existem os princípios de liberdade, igualdade,

portanto, vale dizer que o conteúdo teórico tem mais valor aliado a prática,

enquanto instrumento de transformação do real. Inerte em si mesmo de nada

adianta, precisa estar vinculado ao social para que o sujeito torne-se autônomo

não só na interlocução com diversos tipos de textos veiculados na sociedade,

mas nas decisões que toma coletivamente que afetam a vida do outro.

Resgatar a condição humana é sua “função”. A literatura não pode estar

satisfeita com um mundo sempre aquém da necessidade. Por isso nos

provoca, subverte o que já está estabelecido, nos faz reformular conceitos e

nos impulsiona a autonomia do pensamento. Nesse entrecruzamento de vozes

nos faz reconhecer enquanto comunidade humana em consonância com o

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semelhante. É importante esclarecer que ela por si só não tem o poder de

transformar uma pessoa em cidadão melhor e consciente, como nos alerta

Vigotski. Mas pode, sim, fazer com que o indivíduo se reveja e ao se rever

possa se modificar. Nas palavras do autor,

(...) é indispensável abrir mão da concepção segundo a qual as emoções estéticas têm alguma relação direta com as morais e toda obra de arte encerra uma espécie de impulso para o comportamento moral (...) nunca podemos estar certos do tipo de efeito moral que esse ou aquele livro irá exercer (VIGOTSKI, 2004, p. 325).

Em contrapartida ao pensamento de Vigotsky acredita-se que ser

cidadão melhor é ter conhecimento suficiente para interferir numa dada

realidade social. E o texto literário é o olhar que o artista projeta sobre o mundo

real para depois transformar no ficcional. Sendo representação artística e

cultural das experiências humanas, retrata esse ser social, com suas

experiências, anseios, medos e esperanças. É a leitura de mundo e ao mesmo

tempo o olhar voltado para dentro de si. Dessa forma, a literatura humaniza

porque faz com que sentidos sejam construídos; respostas a tantas indagações

podem vir à tona.

De acordo com Aguiar e Bordini (1993), as obras dotadas de

literariedade são capazes de conferir uma significação mais ampla ao diálogo

de um sujeito com a vida, na sua condição de ser social. E ter consciência

somente não basta é preciso ter atitude para que haja mudança, como nos

alerta Freire, “constato para mudar e não para me acomodar” (FREIRE, 2000,

p.42).

Como nos orienta Candido (2004), a literatura é de suma importância ao

processo de humanização porque faz com que alguns traços como, o

“afinamento das emoções, a capacidade de penetrar nos problemas da vida, o

senso de beleza, a percepção da complexidade do mundo e dos seres” sejam

reafirmados. E ao dar forma aos sentimentos e à visão do mundo, nos organiza

e liberta do caos. Portanto, ao trazer livremente o bem e o mal não corrompe

ou edifica, mas permite que ao se reavaliar, através dela, o sujeito se recoloque

no mundo que o cerca. O autor ainda diz que ela desenvolve em nós “a quota

de humanidade na medida em que nos torna mais compreensivos e abertos

para a natureza, a sociedade, o semelhante”. (CANDIDO, 1989, p.112-117) O

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que possibilita afirmar que a literatura nos permite viver no caos e que por tal

motivo deve estar ao alcance de todos no âmbito escolar, sendo permitida e

possibilitada a sua fruição. Em consonância com Candido, Zilberman (1989),

afirma que “a literatura pré-forma a compreensão de mundo do leitor,

repercutindo então em seu comportamento social”.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo deste estudo é discutir as potencialidades da literatura aliada

a outras artes, isto é, práticas metodológicas híbridas, diversificadas para

despertar o senso crítico dos estudantes ao relacionar o conteúdo com a

sociedade. O trabalho pauta-se nos encaminhamentos propostos pelas

Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná, as quais estão centradas na

Estética de Recepção e direcionam um ensino mais amplo que ultrapassa a

sistematização de períodos literários e fragmentos de obras.

Portanto, enfatiza-se a importância de atividades que permitam a junção

da literatura com outras artes e gêneros distintos como: conto, crônica,

notícias, música, pintura, filme, videoclipe, animações, isto é, beneficiando-a

com essa hibridização ao contemplar leitura, oralidade, reflexão e escrita.

De acordo com Freire é “nosso dever criar meios de compreensão de

realidades político-históricas que deem origem a possibilidades de mudanças”.

Há a constatação de que a literatura aumenta a bagagem cultural dos alunos e,

aos professores, cabe à dedicação de transformar o ato de leitura em atividade

de participação. Segundo Candido (2005), “Uma sociedade justa pressupõe o

respeito aos direitos humanos e se a grande massa não lê não é por

incapacidade e sim por privação”. Por isso fomenta-se o gosto pela leitura

literária e com ela a fruição da arte

O artigo desenvolvido contribui ao aproximar literatura e realidade

através do estudo de temáticas sociais que tenham relevância para a vida, e ao

oferecer uma possibilidade de trabalho para os colegas da rede pública do

Paraná, com a intenção de incentivar a leitura literária na escola, através do

Método Recepcional.

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4. REFERENCIAS BIBIOLGRÁFICAS

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