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Os desafios de caracterizar e de formular a Grande Estratégia em países do Sul Geopolítico: uma análise do caso brasileiro Pablo Saturnino Braga Rubens de S. Duarte Resumo O artigo busca contribuir para a literatura sobre “grande estratégia” a partir de uma perspectiva do Sul Geopolítico, e é dividido em três partes principais. Em dum primeiro momento, propõe-se uma reflexão sobre o conceito de grande estratégia. Em seguida, analisa-se as restrições sistêmicas enfrentadas por países do Sul Geopolítico na cartografia e estratificação de poder internacional. Por fim, o estudo de caso sobre o Brasil contribui com dados empíricos, que exemplificam o debate conceitual anterior. Introdução Desde o fim da Guerra Fria, a quantidade de estudos acadêmicos sobre grande estratégia voltou a aumentar significativamente. Diante da acelerada globalização, fim do sistema bipolar e da crescente complexidade que envolvem os desafios da segurança internacional, torna-se pertinente investigar qual seria o comportamento das potências mundiais em especial o dos Estados Unidos, que atingiu o status de hegemon e como essas novas dinâmicas de poder iriam afetar a inserção internacional desses países. Por isso, essa “onda” busca entender quais são os elementos constitutivos da grande estratégia, se ela deve ser consciente e intencional, bem como qual é sua eficácia em atingir os

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Os desafios de caracterizar e de formular a Grande Estratégia

em países do Sul Geopolítico: uma análise do caso brasileiro

Pablo Saturnino Braga

Rubens de S. Duarte

Resumo

O artigo busca contribuir para a literatura sobre “grande estratégia” a partir de

uma perspectiva do Sul Geopolítico, e é dividido em três partes principais. Em

dum primeiro momento, propõe-se uma reflexão sobre o conceito de grande

estratégia. Em seguida, analisa-se as restrições sistêmicas enfrentadas por

países do Sul Geopolítico na cartografia e estratificação de poder internacional.

Por fim, o estudo de caso sobre o Brasil contribui com dados empíricos, que

exemplificam o debate conceitual anterior.

Introdução

Desde o fim da Guerra Fria, a quantidade de estudos acadêmicos sobre

grande estratégia voltou a aumentar significativamente. Diante da acelerada

globalização, fim do sistema bipolar e da crescente complexidade que envolvem

os desafios da segurança internacional, torna-se pertinente investigar qual seria

o comportamento das potências mundiais – em especial o dos Estados Unidos,

que atingiu o status de hegemon – e como essas novas dinâmicas de poder iriam

afetar a inserção internacional desses países. Por isso, essa “onda” busca

entender quais são os elementos constitutivos da grande estratégia, se ela deve

ser consciente e intencional, bem como qual é sua eficácia em atingir os

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objetivos pretendidos. Em paralelo a esse movimento acadêmico, o interesse em

países do Sul cresceu exponencialmente no início século XXI. A emergência (em

alguns casos a re-emergência) política e econômica de países e a consequente

busca de um papel mais ativo e efetivo no cenário internacional provocaram, em

certa medida, uma mudança no jogo político da nova ordem global. Ainda que

essas duas tendências de pesquisa não sejam diretamente relacionadas, há

pontos de tangência, o que abriu portas para estudos sobre grandes estratégias

de países que estejam em posição intermediária ou baixa na geometria de poder

mundial. Essas pesquisas se depararam com o desafio de adaptar conceitos,

teorias e modelos analíticos que foram feitos para investigar potências do Norte

para o estudo de caso de países do Sul.

Com base em um estudo de caso sobre o Brasil, este capítulo contribui

para a literatura sobre grande estratégia apontando lacunas teóricas e

metodológicas que dificultam a análise de particularidades domésticas e

restrições sistêmicas enfrentadas por países do Sul. Um breve panorama sobre

o conceito de grande estratégia, seus principais elementos constitutivos e

entendimentos divergentes sobre seus significados é o foco da primeira seção

deste capítulo. Esse debate introduz uma análise sobre como esse conceito é

aplicado pela literatura acadêmica, bem como os limites e obstáculos que

apresenta para o estudo de países do Sul. A terceira parte é dedicada ao estudo

de caso sobre o Brasil, de modo a ilustrar e embasar empiricamente as seções

anteriores. Por fim, um espaço é dedicado para reflexões finais e possibilidades

de pesquisa.

Uma breve análise de grande estratégia como um conceito em processo de

consolidação

Desde os primeiros trabalhos que se propuseram analisar o fenômeno da

guerra, a estratégia é um tema central. Sob inspiração de clássicos como Da

Guerra de Karl von Clausewitz (1989) e A Arte da Guerra de Sun Tzu (1963), a

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definição de estratégia remete ao estudo de técnicas para gerir e planejar o uso

da força e do emprego de recursos militares, para atingir a vitória no campo de

batalha (Mahnken, 2002). O uso do conceito de estratégia, portanto, tornou-se

frequente em análises no nível operacional militar, ainda que se relacione

dialeticamente com o jogo político-econômico em um contexto social. Esse

entendimento foi perpetuado, inclusive após o surgimento das Ciências Militares

enquanto ramo do conhecimento.

Por sua vez, a origem histórica do conceito de grande estratégia não é

clara. Milevski (2016) argumenta que, ainda que parte da literatura considere que

Liddell Hart tenha sido o primeiro a sistematizar os elementos fundamentais para

a sua definição, o processo de construção do entendimento moderno de grande

estratégia teve contribuições variadas ao longo do tempo. O uso do adjetivo

“grande” – em oposição a uma “estratégia comum” – tornou-se frequente em

estudos modernos para indicar a associação de medidas de natureza política,

econômica, social e cultural ao emprego militar da força, de modo a aumentar as

chances de vitória na batalha (Abshire, 1989). Em um segundo momento, o

conceito de grande estratégia também passou a refletir o entendimento de ações

de caráter preventivo e dissuasório eram necessárias em períodos de não-

guerra e, portanto, devem ser pensadas no longo-prazo (Earle, 1943;

Rosecrance e Stein, 1993). Entretanto, percebe-se que essas duas

características que tornam uma estratégia “grande” não representam uma

inovação significativa em termos de conteúdo. O provérbio romano "se quer paz,

prepare-se para a guerra" é revelador nesse sentido. Além disso, os citados Sun

Tzu e Clausewitz já discorriam sobre a importância de medidas diplomáticas e

econômicas associadas à campanha militar. Todavia, a diferenciação entre os

conceitos ainda é pertinente. Além da característica de ser multidimensional e

pensada no longo-prazo, a definição de grande estratégia indica uma mudança

no nível de análise: enquanto que a estratégia “comum” versava sobre o nível

operacional, estudos sobre grande estratégia priorizavam o nível estratégico.

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Apesar de certa confluência no sentido de identificar seus elementos

fundamentais, a definição de grande estratégia ainda não está consolidada.

Além da transversalidade temática intrínseca à grande estratégia, deve-se

considerar que política internacional e conflitos bélicos são temas estudados por

diversos ramos do conhecimento – como Geopolítica, Relações Internacionais,

Ciência Política, Sociologia, Filosofia, Ciências Militares, etc. O desenvolvimento

de pesquisas, baseadas em um leque de diferentes epistemologias e ontologias,

favoreceu o surgimento de interpretações proporcionalmente plurais sobre um

conceito em formação. Segundo Silove (2017), o processo de construção do

conceito de grande estratégia caminhou para ter três principais significados no

pós-guerra, que variam de acordo com o grau de formalidade, intencionalidade

e perenidade: 1- grande estratégia como um “alto” plano que articula

sistematicamente outras políticas públicas; 2- grande estratégia como princípios

gerais pouco definidos que guiam a ação do Estado; e 3- grande estratégia como

a manutenção ao longo do tempo de um comportamento internacional coerente.

Pode-se afirmar que, de modo indireto, esses significados refletem pressupostos

distintos sobre a concepção de objetivos nacionais e a antecedência de políticas

de acordo com seus temas.

Não obstante o leque de entendimentos conceituais, Layton (2012)

defende que métodos analíticos sobre grande estratégia devem versar sobre os

recursos disponíveis, os meios empregados e os objetivos1. Todavia, a

abordagem de cada um desses elementos varia de acordo com a lente teórica

adotada. Enquanto que leituras mais próximas da tradição realista tendem a

argumentar que os interesses nacionais são profundamente influenciados – se

não forem determinados – pelo sistema internacional anárquico, outras correntes

teóricas consideram que interesses nacionais podem ser construídos e

interpretados por diferentes atores, considerando a influência sistêmica. Essas

diferentes leituras também levam a uma falta de consenso sobre os meios

empregados. Não é consensual na literatura acadêmica quais áreas temáticas e

1 Nossa tradução para “means, ways and ends”.

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qual é o peso de cada política na concepção de uma grande estratégia. É

possível argumentar, por exemplo, que a política de defesa deve sobrepor-se às

outras dada uma lógica de expansão de poder e busca de sobrevivência de um

Estado. Ou então que a política econômica deve orientar as demais, sob uma

ótica de expansão global do capitalismo. Por fim, também é possível argumentar

que a antecedência de cada política é construída de acordo com a identidade

dos tomadores de decisão, com a constituency doméstica e com o contexto

internacional. Essa discussão também transborda para análises sobre os

recursos instrumentalizados pela grande estratégia. Ainda que os recursos

sejam entendidos como manifestações do poder estatal que são combinados e

articulados de modo a contribuir para atingir os interesses nacionais, o seu

estudo varia de acordo com o entendimento de poder.

Em síntese, parece pertinente definir que a grande estratégia de um

Estado diz respeito à articulação de políticas em diferentes nichos temáticos, de

modo a instrumentalizar um leque de capacidades materiais e ideacionais

disponíveis para atingir objetivos decorrentes de uma interpretação de interesse

nacional e de visão de inserção no ambiente assimétrico internacional. Ou seja,

a grande estratégia pode ser comparada com a orquestração, em que a sinfonia

é composta por uma gama de atores (músicos e seus instrumentos) em busca

de uma interpretação construída de interesses nacionais (a peça musical).

Portanto, não se deve confundir a peça musical (a interpretação de interesse

nacional) com a sua orquestração (os recursos, os meios e os objetivos que

fundamentam a grande estratégia). A grande estratégia pode, portanto, ser

pensada para atingir diversos fins, os quais são construídos por atores com

capacidades assimétricas em uma relação dialética entre o contexto político

doméstico e internacional. A grande estratégia pode refletir, por exemplo, os

interesses de uma influente elite política, que se traduzem nos mais variados

objetivos, como promoção de cooperação internacional para o desenvolvimento

ou políticas imperialistas. Do mesmo modo em que a orquestração varia de

acordo com a interpretação que deseja dar à peça musical e os instrumentos

que compõe a orquestra, a grande estratégia pode variar e não deve ser

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confundida somente com o seu resultado. Todavia, à luz das considerações

feitas nesta seção, faz-se pertinente ressaltar que cada escolha teórica ou

metodológica feita no âmbito de estudos sobre grande estratégia, implica a

escolha de ressaltar determinados fatores explicativos – e minorar outros – de

acordo com uma determinada visão de mundo. Essas distorções e suas

consequências políticas são analisadas na próxima seção.

Aplicações e limites das ontologias e epistemologias clássicas no estudo

de grande estratégia no Sul Geopolítico

Antes de iniciar o debate sobre os limites dos marcos analíticos de grande

estratégia, um passo inicial importante para viabilizar a agenda de pesquisa

proposta é a discussão sobre o conceito de “Sul Geopolítico”, bem como as

implicações teóricas e metodológicas decorrentes dessa escolha conceitual. Em

especial, o contraste entre Sul Geopolítico e o conceito de “Sul Global”, que é

difundido pelo discurso dos países do Norte na política internacional, bem como

outras categorias usadas para se referir ao conjunto dos países de posição

intermediária na geometria de poder mundial (em desenvolvimento, Terceiro

Mundo, Periferia, Semiperiferia, etc.).

A ideia de agregar o adjetivo “geopolítico” para qualificar a palavra “Sul”

denota uma ressalva sobre identidades e contextos de inserção regional, ou seja,

a existência de diversidades nas formas de produção de política a partir das

identidades culturais, históricas e materiais. O conceito de Sul Global, em nosso

entendimento, produz uma imagem homogênea sobre esse pertencimento e,

geralmente, criada pelo “outro” – ou seja, a perspectiva que os atores poderosos

têm sobre os países do Sul – ao invés de refletir uma imagem autoconstruída.

Consequentemente, o conceito de Sul Global, assim como outros que foram

criados “de fora para dentro”, além de ecoarem uma visão de mundo específica,

podem simplificar perspectivas de países que têm inserções internacionais,

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entornos regionais e dinâmicas sociopolíticas e históricas muito peculiares e

distintas.

A semântica do conceito Sul Global é vinculada ao entendimento de um

processo histórico, um telos de condições que remetem ao

colonialismo/imperialismo. Na perspectiva do Sul Geopolítico, essa história é

absolutamente relevante, mas ela tem que ser politizada pelos atores políticos

que formulam a política externa. Um exemplo que pode ilustrar a opção

estratégica é o México no pós-Guerra Fria, cujo pertencimento ao Sul Global não

se discute, porém teve na maior parte da conjuntura pós-Guerra Fria uma política

externa conformada com o posicionamento dos EUA. As razões são complexas,

mas passam inevitavelmente pelo aprofundamento da dependência econômica

do México em relação aos EUA após o Acordo de Livre Comércio da América do

Norte (NAFTA). O alinhamento do México foi uma opção de política externa que

abriu mão de uma estratégia geopolítica do Sul, mas não excluiu o país dessa

categoria mais ampla e generalizante de Sul Global.

Outro exemplo à luz das mudanças da política externa brasileira

implementada no governo Bolsonaro aponta o abandono da estratégia do Sul

Geopolítico, mas o pertencimento do Brasil ao Sul Global é praticamente

inescapável devido às suas circunstâncias históricas. Em suma, o conceito de

Sul Global diminui as possibilidades de se estudar a formulação da política

externa como escolha geopolítica e reduz a capacidade de se pensar o Sul a

partir da agência de seus integrantes. Outra limitação que nos encoraja a pensar

o conceito de Sul Geopolítico, é uma ideia de status quo quasi-imutável, uma

situação de permanência na categoria de Sul Global, ou seja, as possibilidades

de graduação não são facilmente apreendidas. Na cartografia e estratificação de

poder internacional contemporânea, muitas potências regionais associam a

estratégia do Sul Geopolítico à denúncia da concentração de poder nas agendas

internacionais, bem como o reconhecimento pelas potências mundiais como um

ator relevante e busca de maior protagonismo internacional. Ou seja, países do

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Sul Geopolítico buscam o que Milani, Pinheiro e Lima (2017) classificam como

graduação, o que, naturalmente, acarreta dilemas ao longo desses processos.

Algumas referências filosóficas e epistemológicas embasam a narrativa

do Sul Geopolítico, em especial a literatura pós-colonialista. A perspectiva

liberal-ocidental da construção do sistema internacional pode ser entendida

como mais uma faceta do mito do desenvolvimento que denuncia Gilbert Rist

(1996). Ser desenvolvido é também garantir preceitos democráticos e direitos

humanos, padrões atingidos pelos países do Norte/Ocidente, e a busca pelo

status de país desenvolvido permeia o imaginário das elites dos países do Sul.

Albert Memmi (2007), em seu clássico Retrato do Colonizado precedido do

retrato do colonizador, explica o processo de mistificação do colonizado pelo

domínio, discurso e instituições do colonizador. A identidade do colonizado é

permeada pela descrença em sua capacidade de ser condutor do próprio

destino, por sua dominação e submissão. A denúncia da continuidade dos laços

coloniais por uma linguagem mais sutil e velada, como realizam pós-

colonialistas, ou na abordagem de-colonial, que revisita a história pela ótica do

oprimido/bárbaro, é didática ao enfatizar a importância de não se ignorar o

elemento de contestação dessa narrativa hegemônica (Rivera, 2010; Mignolo,

2008; Bragatto, 2014). Essas leituras tensionam o discurso liberal-cosmopolita

reverberado pelo Norte/Ocidente, assim como também é relatado por Rao

(2010).

A defesa da democracia e dos direitos humanos ganhou espaço na

agenda de política externa dos EUA e da Europa Ocidental no pós-Guerra Fria.

A missão civilizatória do Ocidente foi ancorada na difundida crença na revolução

democrática global e na perspectiva teleológica da tese de Francis Fukuyama,

autor de O fim da História e o último homem (1992). A suposta vitória dos valores

ocidentais e o colapso do socialismo real se transformaram no insumo que

orientou a política externa das potências ocidentais. Ao universalismo das

normas originárias do Norte/Ocidente são inerentes as contradições políticas de

seletividade e de politização da aplicação efetiva das normas internacionais,

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ocasionando conflitos com a política externa de países do Sul, que ganham

maior protagonismo na política internacional no século XXI.

A agenda reformista do Sul ganha maior força política nos anos 2000 e

critica os países do Norte/Ocidente devido ao uso político de instituições

internacionais, revigorando uma terminologia terceiro-mundista que articulou

movimento que e denunciava uma divisão social e geopolítica para além da

rivalidade ideológica Leste-Oeste, questionando a divisão internacional do

trabalho e a deterioração dos termos de troca. A estratégia do Sul Geopolítica é

imbuída pelo “espírito de Bandung”. Toda essa agenda tem um alcance

multitemático, pois questiona-se a legitimidade e o processo decisório de

instituições do Sistema ONU, como o Conselho de Segurança, e as principais

instituições financeiras internacionais. Essa é uma estratégia que tem

desdobramentos para várias agendas de política externa.

A luta pelo reconhecimento enfatiza o multilateralismo e a não-indiferença

quanto às necessidades de desenvolvimento do Sul, que são metas ligadas à

luta contra a humilhação (NEL, 2010, p.951). Esse seria o "tempo dos

humilhados" (BADIE, 2014). com a maior capacidade de ação daqueles que

foram rebaixados, estigmatizados e excluídos dos clubes das potências

desenvolvidas, como o G-7. A "Revolta contra o Ocidente", como colocado por

Hedley Bull (1989), já apontava para as dinâmicas comunicativas entre os países

do Ocidente e as periferias do sistema internacional. A articulação entre países

em desenvolvimento remete ao contexto da Guerra Fria e há um léxico

fortemente vinculado ao conceito de Terceiro Mundo, ao Movimento dos Não-

Alinhados (MNA), e à atuação do G-77 na Conferência das Nações Unidas sobre

Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD). A agenda reformista do Sul

Geopolítico é uma continuação da narrativa que contesta a distribuição desigual

do poder mundial. O que muda desde a perspectiva da Nova Ordem Econômica

Internacional (NOEI) na Guerra Fria são as maiores capacidades políticas e

econômicas das potências emergentes do Sul (MAWDSLEY; JENKINS, 2013,

p.17). A diferença no contexto da economia política internacional a partir dos

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anos 2000 propicia um salto de qualidade e maior dinamismo de algumas

economias em desenvolvimento em face da crise estrutural das economias

centrais do capitalismo. Os países que constroem uma estratégia internacional

ancorada no Sul Geopolítico, com maior propulsão de seus modelos econômicos

no sistema internacional, apresentam capital simbólico e material para se

afirmarem como norm makers e adotarem políticas externas que visam a propor

alternativas às normas internacionais criadas pelo Norte em agendas da

governança global, como cooperação e direitos humanos. Esse é o cenário do

ganho de escala da projeção internacional de países que usam a plataforma

geopolítica do Sul. Tal hegemonia ocidental na construção da governança global

encontra oposição na diversidade de elementos históricos, culturais, sociais e

políticos do que não é o Ocidente. E essas particularidades identitárias podem

ser estrategicamente adaptadas a diferentes narrativas do Sul, produzindo o que

chamamos de estratégia do Sul Geopolítico.

Isso não exclui possíveis contradições nas propostas e na práxis da

política externa ancorada na estratégia do Sul Geopolítico. Ainda que existam

assimetrias inerentes nas relações Sul-Sul e, portanto, novos tipos de relações

de dominação, essas narrativas criam um regime simbólico, que sugere uma

disputa geopolítica no nível internacional. As características do discurso do Sul

Geopolítico se revestem das peculiaridades históricas, culturais, identitárias e

materiais de cada país que adota essa narrativa, bem como a realidade política

do entorno regional. Independente dessas roupagens que assumem haja vista

as inserções específicas dos países, o elemento reformista e de contestação à

ordem internacional liberal assume um sentido de denúncia e de mobilização

geopolítica. Permeados pelo jogo político doméstico, os países do Sul

Geopolítico desenvolveram um leque de políticas públicas que se articulam no

sentido de atingir seus objetivos internacionais de buscar reconhecimento pelas

potências, uma projeção internacional mais assertiva e a reforma dos processos

decisórios na ordem mundial, muito embora as contradições domésticas de

países do Sul, em especial a desigualdade, produzam desafios e

questionamentos quanto à consolidação desse protagonismo internacional.

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No plano diplomático, o crescimento da quantidade de visitas de altas

autoridades entre os países do Sul e o estabelecimento de novas embaixadas

no início do século XXI são indicativos de uma tentativa de aproximação política.

A primeira reunião do BRICS, em 2006,2 também é um marco por ser um grupo

político que reúne grandes países do Sul, sem a participação de países europeus

ou norte-americanos. Outros grupos de geometria variável compostos por países

do Sul Geopolítico também ganharam notoriedade no início do século XXI, como

o BASIC na agenda de mudanças climáticas, o G-20 nas negociações

comerciais e o Fórum IBAS no combate à fome. Essas ações, analisadas em

conjunto, sugerem um movimento no sentido de difundir a visão geopolítica do

Sul no mundo, por meio de medidas diplomáticas.

Outras medidas também contribuíram para esse esforço diplomático. A

narrativa que acompanha o crescimento quantitativo e qualitativo de políticas de

Cooperação Sul-Sul (CSS), por exemplo, enfatiza a importância de uma parceria

horizontal – em contraposição simbólica à relação entre doador e recebedor de

ajuda – além de ressaltar um passado comum de colonização, uma vez que

hodiernamente as antigas metrópoles são países do Norte. Esses elementos que

seriam supostamente diferenciais de valores da cooperação Sul-Sul em relação

às potências centrais doadoras na modalidade de Cooperação Norte-Sul (CNS).

O discurso da não-ingerência e do não uso de condicionalidades políticas

presente na CSS muito remete a uma agenda reformista que também se verifica

em relação ao regime internacional de direitos humanos. Ele denuncia a

estratégia de pointing and shaming, a qual predomina na lógica de

funcionamento dos mecanismos internacionais, e valoriza o diálogo e a

construção de confiança entre os atores envolvidos nos processos políticos para

que países violadores de direitos humanos se esforcem para contar as violações

de direitos humanos.

2 Na época, ainda sem a participação da África do Sul, que integrou o grupo em 2011.

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A troca de conhecimentos técnicos e científicos, bem como a

implementação de projetos plurinacionais, também foi a tônica em uma lógica de

cooperação Sul-Sul em defesa. Nesse sentido, a produção brasileira da

aeronave militar KC-390, em parceria com Argentina, Portugal e República

Tcheca é simbólica. Além disso, Acharya (2011) chama atenção para a

articulação de países do Sul para consolidar ordens regionais de segurança e

garantir a autonomia delas, frente a percepções de ameaça ou abuso de atores

mais poderosos, como é o caso da Organização do Tratado do Sudeste Asiático

e do Conselho de Segurança da UNASUL. A defesa da ideia de Responsibility

while Protecting (RwP), em oposição à proposta de Responsibility to Protect,

também pode ser interpretada como um esforço normativo na área de segurança

internacional, que tem como um de seus objetivos a difusão de uma percepção

negativa sobre os riscos de uma arquitetura pouco participativa em decorrência

da distribuição assimétrica de poder decisório entre os países.3

No plano econômico, a criação do Novo Banco de Desenvolvimento e o

Acordo de Reserva Contingente, ambos criados pelos BRICS no âmbito da

Cúpula de Fortaleza, em 2014, são instituições internacionais que têm funções

semelhantes ao Banco Mundial e ao Fundo Monetário Internacional,

respectivamente. Embora os países membros dos BRICS ressaltem que essas

novas organizações internacionais são complementares às de Bretton Woods e,

portanto, não têm o objetivo de competir ou esvaziar suas funções, o movimento

pode ser interpretado como uma manifestação de descontentamento quanto ao

conservadorismo das potências do Norte em atender os pleitos vindos do Sul em

busca de reformas no processo decisório.

Países em desenvolvimento atingem o status de potências regionais pela

preponderância de poder material e ideacional em suas regiões, e, como

resultado, desempenham papel relevante na governança global. Combinam

forças para compor uma agenda reformista no sistema internacional e fortalecer

3 DUARTE & DIAS, no prelo.

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sua posição no diálogo Norte-Sul (NEL, 2010, p.953). As potências do mundo

em desenvolvimento, que se prontificam a mudar as regras e práticas da

governança global e demandam um multilateralismo mais inclusivo e

transparente e reivindicação (NEL; NOLTE, 2010, p.878).. A adoção de ideias e

comportamentos de acordo com anarrativa do Sul Geopolítico não implica um

rompimento com a ordem global liberal. Não se trata da construção de uma

ordem internacional alternativa - por isso a estratégia pode ser classificada como

um reformismo moderado, já que é reformista, mas não é revolucionária. Muitas

vezes as ambiguidades entre um posicionamento político crítico quanto às

assimetrias das instituições internacionais e os interesses de participação na

economia política internacional ficam latentes.

Em vista do que foi dito, fica evidente que houve um esforço dos países

do Sul de repensar suas identidades e de adotar uma postura geopolítica em

conjunto, por meio da articulação de políticas públicas de diferentes naturezas.

Além disso, a consolidação da autopercepção do Sul Geopolítico dá um sentido

geopolítico propositivo na agenda internacional, assim como uma dimensão

identitária a um grupo que comumente é classificado pelo que não é, pela

oposição a conceitos. Com base no debate conceitual exposto na seção anterior,

esse fenômeno pode ser definido como uma grande estratégia dos países do Sul

Geopolítico. Conforme mencionado, parcela significativa dos estudos sobre

grande estratégia tem como objeto empírico grandes potências – por exemplo,

o Império Britânico, a França de Napoleão Bonaparte e os Estados Unidos no

pós-Segunda Guerra Mundial. Essas escolhas são influenciadas pela estrutura

de produção de conhecimento científico, que é concentrada em países do Norte,

mas também reflete a escolha de Estados que tenham maior capacidade de

influenciar o sistema internacional e os outros países. Além da produção de

dados empíricos ser maior, as inovações metodológicas e conceituais também

são baseadas nas especificidades desses países. A literatura atual sobre grande

estratégia, apesar de ter mérito por demonstrar um rico debate com variadas

influências teóricas, apresenta lacunas que acabam tornando analiticamente

invisível – ou ao menos problemático – o estudo de grandes estratégias de atores

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que não sejam potências. Portanto, fica latente a necessidade de diálogo entre

as teorias clássicas de Relações Internacionais com outros ramos do

conhecimento, como Ciência Política, Geografia e Sociologia, de modo a refletir

o papel da sociedade, das instituições – inclusive o Estado – e o seu intrínseco

processo político de construção que influencia o entendimento de nação, a

interpretação de interesses e as estratégias para busca-los.

Com isso, o primeiro impasse ao estudar grande estratégia no Sul é

relacionado à escala de poder. A literatura não é clara se Estados que não têm

capacidade de influenciar sozinhos podem ter uma grande estratégia.

Principalmente em comparação com potências mundiais, países do Sul tendem

a serem mais influenciáveis pelas restrições sistêmicas do que capazes de

influenciar a estrutura. É possível, entretanto, argumentar que a articulação de

um grupo de Estados do Sul para conseguirem ter mais impacto no sistema

internacional pode ser uma grande estratégia em si. Todavia, leituras mais

próximas do Realismo Estrutural podem argumentar que isso não seria uma

grande estratégia, mas um movimento natural provocado pelo sistema

internacional, este que incentiva o comportamento de balancing ou o de

bandwagon. Há uma carência de estudos que versem sobre a formulação de

grandes estratégias em situações de autonomia mais limitada.

A dificuldade teórica e metodológica de se estudar a presente temática no

Sul Geopolítico é ainda maior ao considerar grande estratégia como a

manutenção de um comportamento coerente ao longo do tempo.4 Segundo essa

leitura, o Sul seria mais objeto da grande estratégia dos outros do que capaz de

formular a sua. Ainda que não entendam que a manutenção comportamento ao

longo do tempo seja uma grande estratégia em si, as demais interpretações

também ressaltam importância de se pensar no longo-prazo como um elemento

fundamental. Por estarem em uma posição intermediária de poder, os Estados

são mais sensíveis a alterações no cenário político internacional, seja na

4 Que é, conforme já mencionado, um dos significados modernos de grande estratégia, segundo Silove (2017).

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estrutura do sistema ou mudanças no posicionamento de atores-chave. Além

disso, historicamente esses países são alvo de pressões e intervenções

(diplomáticas, econômicas e militares) externas para que alterem suas políticas

públicas de acordo com modelos e estruturas (macroeconômicas, financeiras,

sociais, organizacionais, eleitorais e culturais) indicadas pelas potências. Essa

ingerência externa dificulta o planejamento de uma grande estratégia no longo

prazo.

Também deve-se levar em consideração as singularidades quanto à

formação do Estado e à cultura social e política nos países do Sul. Em alguns

casos, os processos decisórios de políticas públicas ainda pouco consolidados

em relação a sua institucionalização, formalidade, transparência e participação.

Esses fatores podem ser agravados pela falta de accountability, que geralmente

é consequência de pouco interesse da sociedade por políticas que integram a

grande estratégia dada à falta de informação, à necessidade de conhecimento

técnico específico e à prioridade conferida a temas que afetam direitos básicos–

como saúde, educação e segurança pública. Essas características podem gerar

distorções no resultado do processo de formulação das políticas, assim como

variações mais acentuadas ao longo do tempo, o que prejudicam o pensamento

no longo-prazo.

Do mesmo modo, ao elencar a multidimensionalidade ao lado da

estabilidade como elementos constitutivos de uma grande estratégia, a literatura

precisa de maior capacidade explicativa em casos de países do Sul Geopolítico.

Não basta identificar uma vontade ou uma tentativa consciente de articulação de

políticas em busca de uma interpretação de interesse nacional para caracterizar

uma grande estratégia. Todavia, em alguns casos, os países do Sul Geopolítico

não têm recursos disponíveis suficientes – sejam eles capacidades materiais,

econômicas, políticas, tecnológicas ou sociais – para ser igualmente assertivo

em todas as políticas públicas que compõe uma grande estratégia. Frente aos

recursos limitados, não é raro que políticas em nichos temáticos considerados

estratégicas sejam priorizadas. Uma vez que não há consenso em relação a

Page 16: Os desafios de caracterizar e de formular a Grande ......os desafios da segurança internacional, torna-se pertinente investigar qual seria o comportamento das potências mundiais

quais políticas públicas compõe uma grande estratégia, também não é claro até

que ponto a priorização de nichos temáticos por países do Sul prejudica a sua

caracterização.

Percebe-se, portanto, que os métodos, conceitos e teorias que são

usados para analisar a grande estratégia precisam ser revistos, ampliados e

renovados, a fim de aumentar a capacidade explicativa e atender a estudos

sobre países do Sul Geopolítico. Com base no caso brasileiro, a próxima seção

aprofunda a reflexão sobre essas insuficiências metodológicas e conceituais,

bem como sugere alternativas com base em dados empíricos.

Sul Geopolítico como Grande Estratégia? A atuação internacional

brasileira no governo Lula?

A política externa do governo Lula da Silva (2003-2010) almejou a maior

projeção do Brasil em um cenário internacional de diluição da hegemonia norte-

americana e ascensão de novos polos de poder, em especial a China. A

“ascensão do resto" (AMSDEN, 2009) reconfigurou o cenário político

internacional em um quadro "pós-americano" (ZAKARIA, 2008). No início do

século XXI, a multipolarização do sistema internacional abriu mais chances para

a participação dos países em desenvolvimento na construção de normas. Nesse

quadro internacional de mudanças, o Brasil, por meio da narrativa oficial de sua

política externa, apresentou ao mundo as credenciais de um país que poderia

arcar com custos da ordem global, especialmente em temas como mudança do

clima, operações de paz, cooperação internacional, segurança alimentar e não-

proliferação nuclear (HURREL, 2008). Voltando ao “dilema da graduação”, a

primeira década do século XXI foi um período em que as elites políticas

brasileiras buscaram graduar o país no cenário político internacional. Para tal, o

governo brasileiro orquestrou uma gama de medidas nos campos políticos da

diplomacia, da economia e da defesa, para atingir o que era entendido como o

objetivo de inserção internacional do país.

Page 17: Os desafios de caracterizar e de formular a Grande ......os desafios da segurança internacional, torna-se pertinente investigar qual seria o comportamento das potências mundiais

Em grandes linhas, o objetivo de maior protagonismo internacional do

Brasil, balizado pela estratégia do Sul Geopolítico, perfilou três eixos de atuação

internacional, com o objetivo de buscar a graduação do país, quais sejam: 1) a

integração regional (com Mercosul, Unasul e a Comunidade de Estados Latino-

Americanos e Caribenhos (CELAC); 2) as coalizões de geometria variável (como

o G-20, G-4, IBAS, BRICS) e cúpulas inter-regionais (Cúpula América do Sul-

África (ASA) e Cúpula América do Sul-Países Árabes (ASPA); 3) e a

diversificação de parcerias estratégicas bilaterais (China, Índia, Rússia, África do

Sul etc.). Essas ações diplomáticas eram sempre acompanhadas de outras

políticas de natureza complementar, como medidas no campo da defesa ou da

economia.

A América do Sul foi projetada como conceito referencial para a inserção

estratégica do Brasil. A integração regional ganhou, por isso, uma nova

gramática para a diplomacia brasileira, e a América do Sul situada como nossa

circunstância geográfica e espaço para a uma integração comercial, política,

cultural e de infraestrutura. O Brasil articulou iniciativas diplomáticas que

aprofundaram a integração econômica, principalmente pelo acordo entre o

Mercosul e a Comunidade Andina de Nações (CAN), o qual potencializou a

integração da infraestrutura com o aperfeiçoamento do projeto IIRSA5 e

viabilizou um organismo político intergovernamental para toda a América do Sul,

com a criação da Comunidade Sul-americana das Nações (CASA) (SARAIVA,

2007, p.49). A síntese desse projeto de ampla integração foi a criação da

UNASUL, em 2008, a qual substituiu a CASA e se transformou no guarda-chuva

institucional que hoje abriga o Conselho Sul-Americano de Infraestrutura e

Planejamento (COSIPLAN), substituto da IIRSA. Também no âmbito econômico,

o governo de Lula de Silva buscou reforçar a dimensão social das instituições de

integração regional, para reduzir as assimetrias intrabloco e fomentar a

5A Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA) é um programa conjunto dos governos dos 12 países da América do Sul que visa a promover a integração física desses países, com a modernização da infraestrutura de transporte, energia e telecomunicações. A IIRSA surge de uma proposta apresentada em agosto de 2000, em Brasília, durante a Reunião de Presidentes da América do Sul.

Page 18: Os desafios de caracterizar e de formular a Grande ......os desafios da segurança internacional, torna-se pertinente investigar qual seria o comportamento das potências mundiais

economia. O Conselho de Defesa Sul-Americano, criado no âmbito da UNASUL,

foi uma tentativa de fortalecer a região, ao estabelecer um foro de diálogo sem

a presença de potências extrarregionais, o que, na prática, graduava o país em

questões de defesa e segurança internacional.

No plano multilateral, a construção de coalizões de geometria variável,

como o G-206, no âmbito da OMC, foi elemento-chave para criar novos espaços

de poder e aumentar a pressão reformista arquitetada com a narrativa do Sul

Geopolítico. O uso de um multilateralismo propositivo, que vai além da atuação

nos regimes internacionais e cria novos espaços de articulação diplomática, foi

difundido pela capacidade do Brasil expandir coalizões com outros importantes

países em desenvolvimento, como Índia e África do Sul. A PEB uma graduação

maior do País na estratificação de poder no sistema internacional. Nesse sentido,

é pertinente mencionar novamente a participação brasileira na criação do Novo

Banco de Desenvolvimento e do Arranjo Contingente de Reservas, no âmbito

dos BRICS, que criou organizações de âmbito internacional sem a participação

das potências do Norte, o que cria pressão política pela reforma do processo

decisório da arquitetura mundial. Simultaneamente, o Brasil buscou fortalecer

sua participação nas instituições de Bretton Woods, como foi o caso da

assinatura do Bilateral Borrowing Agreement com o FMI, o que, na prática, o

tornou credor do Fundo.

O histórico pleito por um assento permanente no Conselho de Segurança

foi retomado de modo mais vigoroso e, com apoio conjunto de Alemanha, Japão

e Índia, formalizado como o G-4. E esse projeto é simbólico para expressar o

reformismo moderado do governo Lula: não se trata, a princípio, de propor novas

instituições, mas reformá-las para que elas reflitam a nova distribuição de poder

6 O G-20 é um grupo de países em desenvolvimento criado em 20 de agosto de 2003 na Conferência Ministerial da OMC, realizada em Cancun. O Grupo concentra sua atuação em agricultura, o tema central da Agenda de Desenvolvimento de Doha. O G-20 tem uma ampla representação geográfica, sendo atualmente integrado por 23 Membros: cinco da África (África do Sul, Egito, Nigéria, Tanzânia e Zimbábue), seis da Ásia (China, Filipinas, Índia, Indonésia, Paquistão e Tailândia) e 12 da América Latina (Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Cuba, Equador, Guatemala, México, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela).

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mundial. A atitude do Brasil em costurar alianças diplomáticas em defesa do

multilateralismo e da ONU sinalizou para uma PEB com o ímpeto de reivindicar

espaço na discussão das principais questões do sistema internacional,

promovendo a diversificação de parcerias comerciais, o alargamento da

presença diplomática, principalmente na África, e uma diplomacia combativa às

incoerências políticas e econômicas dos países desenvolvidos. Por meio das

alianças Sul-Sul e acordos com parceiros não tradicionais de várias regiões

(Ásia-Pacífico, África, Europa Oriental, Oriente Médio), a PEB almejou diminuir

as assimetrias nas relações externas com os países mais poderosos e aumentar

a capacidade negociadora nacional (VIGEVANI & CEPALUNI, 2007, p. 283).

Por esses 3 eixos de atuação internacional, portanto, o governo Lula da

Silva expandiu a participação brasileira nos principais temas e pleitos

internacionais, aproveitando-se de mudanças domésticas e internacionais – já

que a demanda por participação também partiu de importantes organismos

internacionais muito por conta dos excelentes resultados de inclusão social e

respeito aos valores democráticos7. O discurso brasileiro, ao mesmo tempo que

defendeu o combate à pobreza e desigualdade, denunciou as condições

estruturais assimétricas de um sistema internacional que aprofunda os laços de

dependência. A estratégia do Sul Geopolítico buscou harmonizar a demanda

pelo desenvolvimento doméstico com a denúncia das assimetrias do sistema

internacional e suas formas de reprodução, e a perspectiva social foi o seu fio

condutor. A dimensão social foi incorporada ao discurso da PEB (SILVA, 2016)

e políticas sociais, como o Bolsa Família e o Fome Zero, foram articuladas

estrategicamente como exemplos da experiência brasileira que poderia ser

replicada no mundo em desenvolvimento, especialmente em África, como o

emblemático discurso de Lula da Silva em Cabo Verde, em 20108. As

7 Ver “A Nova Classe Média: o lado brilhante dos pobres” / Marcelo Côrtes Neri (coord.). Rio de Janeiro: FGV/CPS, 2010, 149 p. 8 Acesso em 10 set. 2019, pelo site: http://www.itamaraty.gov.br/pt-BR/discursos-artigos-e-entrevistas-categoria/presidente-da-republica-federativa-do-brasil-discursos/8425-discurso-durante-sessao-de-abertura-da-cupula-brasil-comunidade-economica-dos-estados-da-africa-ocidental-cedeao-ilha-do-sal-cabo-verde-3-de-julho-de-2010

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contradições domésticas de países em desenvolvimento, bem como a sua

“exportação” para outros países em desenvolvimento, não podem ser ignoradas.

A Cooperação Sul-Sul (CSS) foi importante mecanismo de política externa

para realizar essa tarefa em suas mais distintas agendas, como infraestrutura,

ciência e tecnologia, saúde, educação, segurança. Nesse sentido, a CSS foi o

mecanismo integrante de políticas e mobilização do poder nacional – recursos

militares, naturais, econômicos, com resultados variados nessas agendas. E a

narrativa do Sul Geopolítico foi a base de sustentação epistemológica dessa

grande estratégia brasileira. Mais do que isso, a CSS brasileira foi um importante

instrumento de difusão de normas criadas por atores do Sul, que ajudam a

questionar práticas e paradigmas do modelo de desenvolvimento exportado de

“cima para baixo” pelos países do Norte (DUARTE, 2019).

As estratégias de expansão e diversificação comercial do Brasil andaram

de mãos dadas com os projetos políticos, e a Cooperação Sul-Sul foi um elo para

viabilizar essa sincronia. Desse modo, a CSS tornou-se um vetor diplomático

central para o revisionismo da cartografia de poder mundial pelas lentes do Sul

Geopolítico, e foi importante nos 3 eixos de atuação destacados. O discurso do

Sul Geopolítico inspirou as práticas revisionistas, e os princípios que

fundamentaram a CSS, como a não-condicionalidade e reciprocidade, e

reforçaram a capacidade do Brasil se apresentar como um ator diferenciado no

tabuleiro político internacional. O ponto de destaque é o simbolismo de novas

práticas estimuladas por um ator que sempre se inseriu em condições de

dependência, parte de um eixo periférico do processo de formação do sistema

capitalista contemporâneo. A CSS permeou toda a ideia da política externa ativa

e altiva, e se difundiu por suas mais distintas agendas, desde temas mais

tradicionais convencionalmente imputados como high politics, como segurança,

até em agendas consideradas low politics, como os direitos humanos.

A tradição brasileira de valorizar o multilateralismo e o pacifismo foram

instrumentalizados na defesa de uma perspectiva geopolítica do Sul. A política

externa nesse período temperou o multilateralismo tradicional do Brasil com uma

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perspectiva crítica à arquitetura da governança global. E a perspectiva do Brasil

no campo dos direitos humanos foi também fundamental nessa concepção

geoestratégica – e mais um elo importante que buscou alinhar os nichos

temáticos da inserção internacional em uma grande estratégia. No campo dos

direitos humanos, a PEB formulou propostas revisionistas nas instâncias

multilaterais e crítica à hiperpolitização do regime internacional (BELLI, 2009). A

busca do diálogo para capacitação dos atores locais e fortalecimento de

instituições foi enfatizada pelo Brasil como a forma mais eficaz de proteger os

direitos humanos no campo. A perspectiva dos direitos humanos foi voltada

principalmente para a promoção da justiça social e com forte ênfase em direitos

sociais. O regime internacional dos direitos humanos também sofreu críticas

contundentes quanto ao seu funcionamento hiperpolitizado e seletivo que, em

última instância, remete aos silêncios da construção da narrativa da

internacionalização dos direitos humanos, em especial ao espaço da América

Latina na construção do conceito (CAROZZA, 2003; ESTEVEZ, 2012;

GLENDON; 2003). A PEB no campo dos direitos humanos não se prendeu aos

direitos civis e políticos, predominantes na narrativa liberal-cosmopolita.

Portanto, a crítica à politização e seletividade do regime internacional dos direitos

humanos foi central no discurso brasileiro no governo Lula (BELLI, 2009). Duas

atitudes definem o posicionamento do Brasil: a defesa mais enfática na criação

de um mecanismo de revisão universal de violações de direitos humanos9 e a

tática da ação diplomática discreta ao invés de uma diplomacia de condenação

dos países violadores – elemento que mais gerou críticas e debate sobre a

política externa de direitos humanos nos anos recentes (FONSECA JR., 2014,

p.170).

Na leitura pós-colonialista, fonte de inspiração para a narrativa do Sul

Geopolítico, o caminho apontado pela comunidade internacional dos direitos

9 O Brasil já apresentava críticas à politização da então Comissão de direitos humanos e solicitou reformas na principal instância de direitos humanos da ONU. Esse discurso reformista ganha ímpeto no governo Lula, e foi imprescindível para a reforma que criou o Conselho de Direitos Humanos e criação da RPU em 2006. Ver BELLI (2009).

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humanos reproduz uma lógica eurocêntrica plasmada por uma relação de

dominação colonial e pela ênfase em direitos civis e políticos. Os direitos

humanos violados pelos aliados do Ocidente e, inclusive, pelas próprias

potências ocidentais, são invisibilizados nessas denúncias e nas organizações

internacionais. Nesse sentido, os mecanismos do regime internacional são

enviesados e formas alternativas de engajamento devem ser criadas – e um

caminho que ganha destaque como solução estratégica é a Cooperação Sul-Sul.

A política externa “ativa e altiva” no governo Lula procurou diversificar

parcerias e propor a democratização da governança global e, nesse sentido, a

política externa de direitos humanos sofreu uma inflexão em nome das

estratégias reformistas que mudaram o critério de avaliação de violações de

direitos humanos em países em desenvolvimento. A aproximação com regimes

criticados pelo Ocidente, como China e Irã, foi justificada pelo discurso em

defesa do direito de desenvolvimento dos países do Sul (ENGSTROM, 2012;

p.17). No padrão que o ex-chanceler Celso Amorim classificou como “não-

intervenção e não-indiferença", a cooperação foi assumida como o caminho

preferencial para a melhoria dos direitos humanos nesses países. Por isso,

países em desenvolvimento mereceram sob o governo Lula, um enquadramento

político que associou a defesa dos direitos humanos à Cooperação Sul-Sul e às

potenciais transformações estratégicas da ordem internacional” (MILANI, 2012,

p.54). O governo Lula atribuiu centralidade da cooperação internacional como

estratégia de promover os direitos humanos para a solução de problemas

socioeconômicos e de assistência humanitária, sendo que ambos deveriam se

orientar pelo princípio da responsabilidade coletiva e não-intervenção em

assuntos internos, mas também acompanhada da ideia da não-indiferença.

O contraste da análise do caso brasileiro com a literatura de grande

estratégia aponta para algumas reflexões importantes. Em nosso entendimento,

a narrativa do Sul Geopolítico e a Cooperação Sul-Sul são, respectivamente, a

epistemologia e o mecanismo diplomático que viabilizaram a articulação da

política externa como peça integrante da grande estratégia no governo Lula da

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Silva. A partir das ponderações de Silove (2017) sobre modos de construir uma

grande estratégia, a PEB foi formulada com um “alto” plano, engrenagem

fundamental de uma grande estratégia que articulou sistematicamente outras

políticas públicas.

Durante o governo de Dilma Rousseff, mudanças políticas e econômicas

no plano internacional reverteram o cenário favorável à projeção brasileira no

mundo. Temas de política doméstica passaram a ganhar prioridade na agenda

da Presidência em detrimento de questões internacionais. Com isso, a

orquestração das políticas públicas em busca da graduação internacional do

país enfrentou dificuldades, prejudicando a dinâmica da grande estratégia.10

Ademais, a leitura de interesses nacionais que predominou no governo

antecessor passou a ser questionada com a crise social, política e econômica

que culminou no controverso impeachment da presidente Rousseff. A partir de

2015, as elites políticas brasileiras perderam a capacidade de orquestração

diante desse momento de revisão do entendimento do que seriam os interesses

nacionais. A leitura de que o país deveria buscar graduação no cenário

internacional foi retirado, porém não foi alçada nenhuma interpretação

alternativa, seja por falta de consenso entre as elites políticas ou por inépcia

governamental de articular e consolidar uma nova leitura. Com isso, o Brasil

deixou de ter uma grande estratégia, na medida em que não se trata da

substituição de uma grande estratégia que buscava uma interpretação de

interesse nacional por outra que tem outros objetivos.

O atual cenário de abandono da estratégia do Sul Geopolítico e

esvaziamento da Cooperação Sul-Sul pela política externa de Jair Bolsonaro

remetem à fragilidade de manutenção a longo prazo de uma grande estratégia

em cenários de forte polarização doméstica e pressões externas em países do

Sul. Dentre as três possibilidades aventadas por Silove (2017), entendemos que

um plano tem menos capacidade de se consolidar no longo prazo, pois é mais

10 Cabe questionar, portanto, qual é o peso da diplomacia presidencial na execução de um conserto político no Brasil.

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vulnerável a situações de crise. No caso particular de países em

desenvolvimento, a ambição do protagonismo internacional é, de certo, um

incômodo para os países satisfeitos com status quo do sistema internacional. A

reação de potências ocidentais, em especial os EUA, foi desarticular a grande

estratégia de graduação internacional do Brasil, buscando reforçar o padrão

histórico de dependência. Trata-se de resgatar um padrão de relação neo-

colonial, que inviabiliza uma política externa fundamentada na narrativa do Sul

Geopolítico, tal como demonstra o alinhamento automático aos EUA da política

externa do governo de Jair Bolsonaro. Não que essa assimetria de poder tenha

sido extinta, mas certamente foi afrontada pela política externa do governo Lula

da Silva. Episódios pontuais como a não aceitação pelo Conselho de Segurança

da solução turco-brasileira para a crise nuclear iraniana e a espionagem

industrial estadunidense contra a Petrobrás, revelada no escândalo dos

vazamentos da National Security Agency (NSA), denotam os esforços da

principal potência ocidental em neutralizar a busca pelo protagonismo

internacional de um ator emergente em seu entorno regional.

Considerações finais

As leituras tradicionais sobre grande estratégia e política externa olham,

quase que exclusivamente, para potências estabelecidas do Norte. O estado da

arte desta literatura demanda a construção de modelos conceituais que sejam

aplicados também em países do Sul. No intuito de contribuir para essa tarefa,

esse artigo identificou as fontes conceituais de construção de uma narrativa do

Sul Geopolítico e a relacionou a uma grande estratégia, usando como estudo de

caso a política externa brasileira formulada durante o governo Lula da Silva. A

identificação dos principais eixos de atuação internacional do Brasil revela um

projeto de graduação internacional, o qual tem sustentação epistemológica na

narrativa do Sul Geopolítico, e foi operacionalizado, em grande medida, pelas

políticas de Cooperação Sul-Sul.

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A busca de uma graduação internacional provocou reações domésticas e

internacionais, e o cenário de crise econômica e política que se desenrola no

Brasil desde 2013, agravado com o impeachment de Dilma Rousseff em 2016 e

a eleição de Jair Bolsonaro em 2018, produziu uma articulação de forças que

aniquilam qualquer possibilidade de uma grande estratégia fundamentada na

narrativa do Sul Geopolítico. Isso demonstra que, em cenários de polarização

em países do Sul, a permanência de uma grande estratégia no longo prazo é

mais difícil de ser garantida.

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