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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA OS EFEITOS JURÍDICOS PATRIMONIAIS DA UNIÃO ESTÁVEL NO CÓDIGO CIVIL VIGENTE Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito na Universidade do Vale do Itajaí. ACADÊMICA: MARIA CECILIA AMORIM MEDEIROS GONDRAN São José (SC), novembro de 2004.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

OS EFEITOS JURÍDICOS PATRIMONIAIS DA UNIÃO ESTÁVEL NO

CÓDIGO CIVIL VIGENTE

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito na Universidade do Vale do Itajaí. ACADÊMICA: MARIA CECILIA AMORIM MEDEIROS GONDRAN

São José (SC), novembro de 2004.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

OS EFEITOS JURÍDICOS PATRIMONIAIS DA UNIÃO ESTÁVEL NO

CÓDIGO CIVIL VIGENTE

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob orientação da Profa. Esp. Anna Lúcia Martins Mattoso Camargo. ACADÊMICA: MARIA CECILIA AMORIM MEDEIROS GONDRAN

São José (SC), novembro de 2004.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

OS EFEITOS JURÍDICOS PATRIMONIAIS DA UNIÃO ESTÁVEL NO

CÓDIGO CIVIL VIGENTE

MARIA CECILIA AMORIM MEDEIROS GONDRAN

A presente monografia foi aprovada como requisito para a obtenção do grau de bacharel em Direito no curso de Direito na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI. São José, 8 de novembro de 2004.

Banca Examinadora:

_______________________________________________________ Profa. Esp. Anna Lúcia Martins Mattoso Camargo - Orientadora

_______________________________________________________ Prof. Esp. André Luiz Sarda - Membro

_______________________________________________________ Profa. MSc. Solange H. Kool - Membro

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Dedico este trabalho:

Aos meus pais, ao meu marido e aos meus filhos, por serem

o patrimônio mais valioso e sagrado de minha vida.

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AGRADECIMENTOS

À professora Anna Lúcia Mattoso Camargo pela competência, dedicação e

incentivo na orientação desse trabalho.

Aos meus pais Santina e José, pela base sólida da minha vida e por me ensinarem

que família é aquela construída com amor.

Ao meu marido, Ademir, companheiro de todas as horas, pela paciência, estímulo

e apoio, sem o qual não teria suporte para elaborar essa pesquisa.

Aos meus filhos Leandro, Fernanda e Camilo pela compreensão pelos momentos

de convivência roubados em favor do estudo.

Às minhas grandes amigas Denise Grillo e Christina Caputo pela colaboração e

apoio dado nos momentos difíceis.

Ao meu grupo de amigos pelas horas de laser tão necessárias e pelo carinho

sempre demonstrado.

Aos meus amigos e colegas Karla, Aleomar, Maximiliano, Aline e Gustavo pela

amizade e pelo companheirismo constante.

A Dra. Maria Eloísa Neves May, Juíza Substituta do Juizado Especial Criminal de

São José, pela amizade e oportunidade de crescimento que me proporcionou.

Aos professores e colegas de turma que foram importantes companheiros nesta

caminhada.

A todos aqueles que, de alguma forma, contribuíram para a realização desta

pesquisa.

A Deus por me possibilitar concluir mais esta etapa em minha vida.

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“Agora dizei-me: que é que vedes quando vedes um homem e uma

mulher, reunidos sob o mesmo teto, em torno de um pequenino ser, que é

o fruto de seu amor? Vereis uma família. Passou por lá o juiz, com a sua

lei, ou o padre, com o seu sacramento? Que importa isto? O acidente

convencional não tem força para apagar o fato natural.”

Virgílio de Sá Pereira

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RESUMO

O presente estudo trata dos reflexos jurídicos patrimoniais da união estável no ordenamento

jurídico atual. Visa, desta forma, demonstrar a necessidade de mecanismos legais que garantam

os bens adquiridos na constância dessa união. Para tanto foi utilizado o método indutivo, sendo

estudados vários autores que tratam sobre o tema, além dos textos legais. Inicialmente fez-se uma

retrospectiva histórica da família até o advento da Constituição Federal de 1988, que a

reconheceu como entidade familiar, passando a dar-lhe proteção. Especifica-se a situação da

união estável, independente do tempo de convívio, através do seu conceito, características

essenciais e os efeitos jurídicos pessoais resultantes da relação. Também se analisou as Leis nº

8.971/94 e 9.278/96 e o Código Civil de 2002, que trouxe importante contribuição, no sentido de

regulamentar a união estável. Por fim, como objetivo principal do trabalho, foram abordados os

efeitos jurídicos patrimoniais gerados por essa união, merecendo destaque a aplicação do regime

da comunhão parcial de bens e o contrato escrito. Outrossim, nota-se um avanço na legislação

atual, e que, apesar das leis esparsas e da instituição da união estável estar no corpo do atual

Código Civil, ainda permanecem lacunas sobre o tema.

Palavras chave: entidade familiar – união estável - efeitos patrimoniais – comunhão parcial

de bens – contrato escrito

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ABSTRACT

The present study it deals with the patrimonial legal consequences of the steady union in the

current legal system. It aims at, of this form, to demonstrate the necessity of legal mechanisms

that guarantee the goods acquired in the constancy of this union. For in such a way the inductive

method was used, being studied some authors who treat on the subject, beyond the legal texts.

Initially a historical retrospect of the family became until the advent of the Federal Constitution

of 1988, that it recognized other forms of family, starting giving protection to them. It is specified

situation of the steady union raised the essential category of familiar entity, its concept,

caracteristics and the legal effect personal resultants of the relation. Also was analyzed Laws nº

8,971/94 and 9,278/96 and the Civil Code of 2002, that it brought important contribution, in the

prescribed direction of the steady union. Finally the patrimonial legal effect generated by this

union had been boarded, deserving it has detached the application of the regimen of the partial

community property of good and the written contract. Therefore, notices an advance in the

current legislation, and that, despite the excess of referring statutes to this new form of familiar

organization, still they remain many gaps on the subject.

Word-keys: familiar entity, steady union, patrimonial effect, partial community property of

good, written contract.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Apud Citado por, segundo

Art. Artigo

CC Código Civil

Cf. Confira, compare, confronte

CF Constituição Federal

Coord. Coordenador

Des. Desembargador

ECA Estatuto da Criança e do Adolescente

LICC Lei de Introdução ao Código Civil

STF Supremo Tribunal Federal

STJ Superior Tribunal de Justiça

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SUMÁRIO

RESUMO

ABSTRACT

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

INTRODUÇÃO............................................................................................................... 10

1 IMPORTANTES CONSIDERAÇÕES SOBRE A FAMÍLIA E SEU PAPEL NA

SOCIEDADE................................................................................................................... 12

1.1 DA FAMÍLIA ROMANA À FAMÍLIA ATUAL ...................................................... 12

1.2 CONCEITO DE FAMÍLIA ........................................................................................ 14

1.3 AS MUDANÇAS NO CONCEITO DE FAMÍLIA ................................................... 16

1.4 CONCEITO DE CASAMENTO ................................................................................ 18

1.5 O DIREITO DE FAMÍLIA JUNTO AO ARTIGO 226 DA CF/88 ........................... 20

1.6 A FAMÍLIA DECORRENTE DA UNIÃO ESTÁVEL............................................. 24

1.7 A FAMÍLIA FORMADA POR QUALQUER UM DOS PAIS E SEUS

DESCENDENTES............................................................................................................ 26

2 UNIÃO ESTÁVEL – ELEMENTOS CARACTERIZADORES E A

LEGISLAÇÃO VIGENTE ........................................................................................... 28

2.1 CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DA UNIÃO ESTÁVEL................................ 28

2.2 APONTAMENTOS SOBRE A LEGISLAÇÃO........................................................ 33

2.2.1 A evolução jurídica da união estável à luz das leis nº 8.971/94 e nº 9.278/96........ 33

2.2.2 A união estável e o Código Civil vigente ................................................................ 40

2.3 EFEITOS PESSOAIS DA UNIÃO ESTÁVEL.......................................................... 45

3 EFEITOS JURIDICOS PATRIMONIAIS DA UNIÃO ESTÁVEL ...................... 50

3.1 O REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS............................................... 53

3.2 O CONTRATO ESCRITO ........................................................................................ 54

CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 60

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................................................................... 63

ANEXOS.......................................................................................................................... 68

APÊNDICES ................................................................................................................... 83

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INTRODUÇÃO

O estudo ora apresentado analisa as conseqüências patrimoniais advindas do

reconhecimento da união estável, entre um homem e uma mulher, como entidade familiar, pela

Constituição Federal de 1988. Como é cediço a ocorrência cada vez maior de uniões sem

casamento civil em nossa sociedade, denota-se a necessidade de regras que garantam os bens

adquiridos durante a convivência, justificando, portanto, a escolha do referido objeto de pesquisa.

Não resta dúvida que este trabalho tem relevante significado social e jurídico, eis que

trata de situação ainda polêmica em nosso meio. E que, apesar de existirem leis esparsas e o

instituto da união estável estar no corpo do Código, permanecem divergências doutrinárias e

jurisprudenciais.

Pode-se destacar, ainda, como finalidade precípua desta pesquisa, verificar os efeitos

jurídicos patrimoniais oriundos da união estável, quanto à aplicação do regime de comunhão

parcial de bens, no silêncio das partes, e a realização de um contrato que discipline de forma

diversa da prevista em lei, a divisão de bens frente ao Código Civil vigente. Desta forma faz-se

necessário, preliminarmente, uma retrospectiva histórica da família, até o advento da

Constituição Federal de 1988, que determinou novos preceitos constitucionais, sobretudo no que

se refere a instituição da família. Ademais, para a obtenção do resultado desejado, utilizou-se,

nesta monografia, o método indutivo, empregando-se a técnica de pesquisa bibliográfica e de

textos legais.

O estudo do tema exposto deu-se em três capítulos. No primeiro capítulo fez-se uma

análise da família, haja vista as importantes alterações em seu conceito, decorrentes das

constantes transformações sociais e morais. Posteriormente demonstraram-se as inovações

trazidas pelo texto constitucional, ao reconhecer a união estável entre um homem e uma mulher

como entidade familiar, determinando que o Estado lhe desse proteção. Além do reconhecimento

da família formada por um só dos pais e seus descendentes, protegendo, por conseguinte, os

diferentes núcleos familiares.

No segundo capítulo apresenta-se o conceito de união estável e os requisitos

indispensáveis para sua caracterização, bem como se verifica a legislação aplicável, analisando

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aspectos ainda vigentes das Leis nº 8.971/94 e 9.278/96. Outrossim, faz-se um estudo mais

acurado dos artigos 1.723 a 1.727 do Código Civil atual, apresentado em seu Livro IV, Título III,

que trata especificamente da união estável. Por derradeiro, destacam-se os efeitos pessoais desse

instituto.

No terceiro capítulo são analisados os efeitos jurídicos patrimoniais da união estável,

sendo que num primeiro momento, dar-se-á ênfase ao regime da comunhão parcial de bens, ou

seja, os companheiros passam a partilhar todo o patrimônio que vier a ser adquirido na constância

da união, salvo contrato escrito. Em seguida, destaca-se o contrato como outra forma de dispor e

administrar os bens, que não a definida em lei, deixando aos conviventes liberdade para

determinarem a destinação de seus bens, do modo que melhor lhes aprouver.

É bem verdade que a farta doutrina e as controvérsias jurisprudenciais fazem este tema

ser inesgotável. Voltado para a atualidade, a presente pesquisa busca apontar os avanços

verificados neste tipo de união e as adequações jurídicas que se processam para garantir aos

companheiros maior segurança patrimonial.

Salienta-se, entretanto, que a legislação referente a essa nova forma de organização

familiar, bem como a divergência existente entre os próprios doutrinadores e a jurisprudência,

dificultam uma abordagem estática sobre tão relevante e dinâmico instituto que é a união estável.

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1 IMPORTANTES CONSIDERAÇÕES SOBRE A FAMÍLIA E SEU PAPEL

NA SOCIEDADE

1.1 DA FAMÍLIA ROMANA À FAMÍLIA ATUAL

A família é, indiscutivelmente, a base da sociedade. No direito brasileiro ela é posta sob

especial proteção do Estado, como se infere da leitura do art. 226, caput, da Constituição Federal

“A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”.1

Inicialmente cabe destacar a origem da família antiga, que segundo professa Fustel de

Coulanges, não se encontrava unicamente na geração ou no vínculo de sangue, mas sim em razão

do culto. A família como grupo era essencial para perpetuação do culto familiar sendo irrelevante

a existência de parentesco entre as pessoas. A família antiga se ligava a seus membros por um

vínculo mais poderoso que o nascimento: a religião doméstica e o culto aos antepassados.

Embora o afeto natural pudesse existir, este não servia como ligação entre os membros da

família. A família era, assim, uma associação religiosa antes de ser associação natural.2

Vamos encontrar nos romanos a referência de organização familiar, espelhando-se na

família romana como padrão de organização institucional, onde o ordenamento jurídico brasileiro

busca sua fonte.3

Nesse sentido expressa Orlando Gomes:

A evolução jurídica da família importa, entre os povos de nossa área cultural, a partir de Roma. O direito romano deu-lhes estrutura inconfundível, tornando-a unidade jurídica, econômica e religiosa fundada na autoridade soberana de um chefe. De seu acentuado caráter político, resultou a analogia entre sua organização e a do Estado.4

Impende observar que a estrutura da família romana era tipicamente patriarcal. À frente

da família encontrava-se o pater, palavra que significa mais chefe do que propriamente pai. O

ascendente mais velho reunia seus membros sob sua autoridade formando a família. A mulher

1 BRASIL. Constituição Federal, Código Civil, Código de Processo Civil. Organizador: Yussef Said Cahali. 5 ed. São Paulo: RT, 2003. p. 132. 2 Cf. COULANGES, Fustel de. A cidade antiga. Trad. Jean Melville. São Paulo: Martin Claret, 2004. p. 45. 3 Cf. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato e união estável. 6. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p.6. 4 GOMES, Orlando. Direito de Família. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 39.

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quando se casava abandonava o culto de sua família e passava a cultuar os mesmos deuses e

antepassados do marido. E como a família era um grupo de pessoas sob o mesmo lar, que

invocava os mesmos antepassados, era preciso que um descendente homem continuasse o culto

familiar, para não caírem em desgraça, caso não fossem cultuados os antepassados.5

Quanto a sua organização, a família romana, durante a Idade Média, sofreu a influência

do Direito Canônico. A igreja criou um conjunto de cânones, expressão utilizada para denominar

as suas normas jurídicas, com o escopo de diferenciá-las das leis do Estado, que seriam utilizadas

para complementar estas leis em caso de omissão. E foi sobre a família, em especial sobre o

matrimônio que a Igreja mais legislou, impondo severas penalidades, de ordem jurídica ou social,

aos membros da família, em situações de extrema gravidade.6

Consoante o tema exposto argumenta Orlando Gomes:

Na organização jurídica da família hodierna é mais decisiva a influência do direito canônico. Para o cristianismo, deve a família fundar-se no matrimônio, elevado a sacramento por seu fundador. A igreja sempre se preocupou com a organização da família, disciplinando-a por sucessivas regras no curso dos dois mil anos de sua existência, que por largo período histórico vigoraram, entre os povos cristãos, como seu exclusivo estatuto matrimonial. Considerável, em conseqüência, é a influência do direito canônico na estruturação jurídica do grupo familiar.7

No que se refere à influência do direito canônico na família moderna, segue do mesmo

autor:

Assinala-se tanto na determinação das condições para o casamento como de seus efeitos jurídicos e de sua dissolução. É de origem canônica a doutrina dos impedimentos matrimoniais [...]. Aos canonistas devem-se os princípios e as noções relativas à nulidade do matrimônio. A forma solene de celebração do casamento e o princípio do consensualismo aplicado aos nubentes decorrem das práticas adotadas pela Igreja. A posição mais favorável da mulher na sociedade conjugal [...]. A proibição de reconhecimento dos filhos adulterinos e incestuosos, mantida na maioria dos Códigos modernos, provém da condenação da Igreja às uniões sexuais de que provêm esses filhos. Por sua influição, abrandou-se, porém, a condição dos bastardos, admitida sua legitimação por subseqüente matrimônio [...]. A indissolubilidade do vínculo do casamento [...] o instituto da separação de corpos, denominado, entre nós, desquite, pelo qual se dissolve a sociedade conjugal sem quebra do vínculo matrimonial.8

Historicamente, a família recebeu elementos determinantes de outras culturas e passou

por inúmeras transformações, através dos tempos, sofrendo influências políticas, religiosas,

econômicas e sociais de outros povos, até surgir a família atual, adaptada aos novos tempos.

5 Cf. VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004. V. 6. p. 18. 6 Cf. LUZ, Valdemar P. da. Curso de Direito de Família. Caxias do Sul: Mundo Jurídico Editora, 1996. p.15. 7 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 40. 8 GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 40-41.

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O instituto da família refletiu os interesses e contingências de acordo com a época em

que elas surgiram, tendo ambos os sexos, de alguma forma, contribuído para isso, sendo assim,

homem e mulher são igualmente responsáveis pela sucessão de fatos ocorridos, no âmbito

familiar, até os dias presentes.9

Abordado sucintamente seu histórico, vale adentrar na evolução do conceito de família,

tendo em vista as modificações ocorridas com o transcorrer do tempo.

1.2 CONCEITO DE FAMÍLIA

O conceito de família, sua compreensão e extensão muito se alteraram com o passar do

tempo. Podemos observar que em determinada época, a família era concebida como um

organismo mais amplo, em outra, com tendência mais reduzida de seus membros, como ocorre

hodiernamente.

Assim preleciona De Plácido e Silva quanto à origem do vocábulo família:

Derivado do latim família, de famel (escravo, doméstico), é geralmente tido, em sentido restrito, como a sociedade conjugal. Neste sentido, então, família compreende simplesmente os cônjuges e sua progênie. E se constitui, desde logo, pelo casamento. Mas, em sentido lato, família quer significar todo ‘conjunto de pessoas ligadas pelo vínculo de consangüinidade’ (Clóvis Beviláqua). Representa-se, pois, pela totalidade de pessoas que descendem de um tronco ancestral comum, ou sejam provindas do mesmo sangue, correspondendo à gens dos romanos e ao genos dos gregos. No sentido constitucional, mais amplo, confunde-se com a expressão “entidade familiar”. É a comunhão familiar, onde se computam todos os membros de uma mesma família, mesmo daqueles que se estabeleçam pelos filhos, após a morte dos pais.10

E segue o mesmo autor discorrendo acerca do conceito de família:

Na tecnologia do Direito Civil, no entanto, exprime simplesmente a sociedade conjugal, atendida no seu caráter de legitimidade, que a distingue de todas as relações jurídicas desse gênero. E, assim, compreende somente a reunião de pessoas ligadas entre si pelo vínculo de consangüinidade, de afinidade ou de parentesco, até os limites prefixados pela lei. 11

Em diferentes épocas, vários doutrinadores apresentaram seus conceitos sobre família.

Silvio Rodrigues assim se posiciona sobre o assunto:

9 Cf. SOARES, Orlando. União estável. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 18. 10 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 347. 11 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. p. 347.

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O vocábulo “família” é usado em vários sentidos. Num conceito mais amplo poder-se-ia definir família como formada por todas aquelas pessoas ligadas por vínculo de sangue, ou seja, todas aquelas pessoas provindas de um tronco ancestral comum; o que corresponde a incluir dentro da órbita da família todos os parentes consangüíneos. Numa acepção um pouco mais limitada, poder-se-ia compreender a família como abrangendo os consangüíneos em linha reta e os colaterais sucessíveis, isto é, os colaterais até quarto grau. Num sentido ainda mais restrito, constitui família o conjunto de pessoas compreendido pelos pais e sua prole.12

Segundo leciona Clóvis Beviláqua, família, “é o conjunto de pessoas ligadas pelo

vínculo da consangüinidade, cuja eficácia se estende ora mais larga, ora mais restrita, segundo as

várias legislações. Outras vezes, porém, designam-se por família somente os cônjuges e a

respectiva progênie”.13

Na mesma esteira Caio Mário da Silva Pereira:

[...] em sentido genérico e biológico, família é o conjunto de pessoas que descendem de tronco ancestral comum. Em sentindo mais estrito, a família é considerada o conjunto de pessoas unidas pelos laços do casamento e da filiação. Durante séculos, fora ela um organismo extenso e hierarquizado, mas sob a influência da lei da evolução, retraiu-se, para se limitar a pais e filhos.14

Na lição do jurista Silvio Venosa:

[...] importa considerar a família em um conceito amplo, como parentesco, ou seja, o conjunto de pessoas unidas por vínculo jurídico de natureza familiar. Nesse sentido, compreende os ascendentes, descendentes e colaterais do cônjuge, que se denominam parentes por afinidade ou afins. Nessa compreensão, inclui-se o cônjuge, que não é considerado parente. Em conceito restrito, família compreende somente o núcleo formado por pais e filhos que vivem sob o pátrio poder.15

Para o Direito brasileiro, a idéia tradicional de família, que se constitui de pais e filhos

unidos a partir de um casamento regulado pelo Estado, foi ampliada a partir de 1988, com a

Constituição Federal (art. 226, § 4º) que reconheceu “como entidade familiar a comunidade

formada por qualquer dos pais e seus descendentes”16, a denominada família monoparental, bem

como a união estável entre homem e mulher, o que representa uma grande evolução na ordem

jurídica brasileira em relação ao conceito de família, fazendo prevalecer a aplicação do Princípio

12 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Direito de Família. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. V. 6. p.4. 13 BEVILÁQUA, Clóvis. Direito de Família. Rio de Janeiro. Editora Rio, 1976. p.16. Apud. PEREIRA, Rodrigoda Cunha.Concubinato e união estável: de acordo com o novo Código Civil. 6. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p.5. 14 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2001. v.5. p.13-14. Apud. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato e união estável: de acordo com o novo Código Civil. p.5. 15 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. p. 16 16 CF/88.

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do Pluralismo Familiar17. O Código Civil vigente (CC/2002) incorporou essas novas concepções

ao receber a união estável no corpo de seu texto.

Nesse prisma, vale transcrever o entendimento do jurista Carlos Aurélio Mota de Souza:

Respeitante à Família, e sensível à realidade cultural brasileira, o Constituinte reconheceu a necessidade de proteger e amparar socialmente outras modalidades de núcleos familiares, denominando-os de união estável e família monoparental, além do próprio casamento religioso. Poderíamos atribuir ao art. 226 da Constituição o haver instituído um “sistema familiar constitucional”, de caráter aberto, não discriminatório, que acolhe e ampara as diversidades, com os mesmos direitos: ao mesmo tempo em que aplica o princípio da igualdade, também respeita o da liberdade dos casais escolherem o tipo de vida familiar pretendido.18

Em derradeiro, é preciso considerar a família atual de maneira mais universalizada e

entender que a realidade e a dinâmica atual apresenta outras formas de constituí-la além do

casamento, que devem ser protegidas e amparadas uma vez institucionalizada pelo Estado.

1.3 AS MUDANÇAS NO CONCEITO DE FAMÍLIA

Para o legislador moderno família é o grupo constituído pelos cônjuges e sua prole,

tendo o conceito de família sofrido mudanças com relação à participação do Estado na proteção à

família.19

Neste diapasão discorre o jurista Orlando Gomes:

O Estado intervém, por sua vez, nas relações domésticas, restringindo poderes, atribuindo direitos, fiscalizando os governantes de família e se fazendo árbitro, através do juiz, dos desentendimentos entre marido e mulher. Por todos esses fatos e por todos esses motivos, o conceito de família mudou. Abandonou-se, em síntese a concepção puramente privativista da família. A sua estrutura encolheu. Remanejou-se o quadro das distintas posições jurídicas de seus membros, organizando-se um novo equilíbrio.20

Ademais a noção de família legítima resulta da instituição do casamento e envolve

aspectos jurídicos, econômicos e religiosos.

Sobre o tema em tela, ensina Orlando Gomes:

17 Cf. PEREIRA, Rodrigo da Cunha.Concubinato e união estável: de acordo com o novo Código Civil. p. 6. 18 SOUZA, Carlos Aurélio Mota de. O Casamento. In. MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva, MENDES,Gilmar Ferreira, NETTO Domingos Franciulli, coordenadores. O novo Código Civil: Estudos em homenagem ao professor Miguel Reale. São Paulo: LTr, 2003. p. 1269-1285. p. 1113. 19 Cf. GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 22-23. 20 GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 23.

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Nos Códigos, dirigem-se as regras à família legítima, que se constitui, unicamente, pelo casamento. Regulam as relações pessoais e patrimoniais entre os cônjuges, estabelecidas como efeitos jurídicos do matrimônio. A filiação, o parentesco, o pátrio poder são ordenados para a família legitimamente fundada.21

Além disso, encontramos a família natural cujo conceito encontra-se no artigo 25 do

Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)22, que dispõe: “É a comunidade formada pelos pais

ou qualquer deles e seus descendentes”. Podendo integrar a família natural mesmo os filhos

havidos fora do casamento, mediante reconhecimento dos pais, conjunta ou separadamente.23

Acrescente-se que pela importância dada à família, que é a base de toda formação do

Estado, os legisladores instituíram a família substituta.

Nesse sentido Orlando Soares argumenta:

Instituiu a Lei nº 8.069, de 13.07.1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente) a denominada família substituta (art. 28), ou seja, aquela que, como a própria expressão indica, destina-se a ocupar o lugar da considerada legítima, ou natural. A colocação da criança (até 12 anos de idade incompletos), ou do adolescente (entre 12 e 18 anos – art. 2º da Lei nº 8.069/90) em família substituta far-se-á mediante guarda, tutela ou adoção, independentemente da situação jurídica da criança ou adolescente, nos termos do referido diploma legal (arts, 28 e segs).24

Com o tempo a sociedade apresenta mudanças que alteram o comportamento, surgindo a

necessidade de modificação da legislação, pois o direito deve acompanhar a realidade social.

Vale transcrever a posição do jurista Orlando Gomes:

A Constituição de 1988 realizou enorme progresso na conceituação e tutela da família. Não aboliu o casamento como sua forma ideal de regulamentação, mas também não marginalizou a família natural como realidade social digna de tutela jurídica. Assim, a família que realiza a função de célula da sociedade e que, por isso, “tem especial proteção do Estado” (art. 226, caput), tanto é aquela que provém do casamento, como a que resulta da “união estável entre o homem e a mulher” (art. 226, § 3º), assim como a que se estabelece entre “qualquer dos pais e seus descendentes”, pouco importando a existência, ou não, de casamento entre os genitores (art. 226, § 4º).25 (grifo nosso)

Após rastrearmos alguns conceitos de família, sua importância e as alterações sofridas

pelo vocábulo, passamos a analisar o significado do casamento, tendo em vista sua relevância

social e seus efeitos.

21 GOMES, Orlando. Direito de Família.p. 42 22 ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei nº 8.069, de 13/07/1990. 23 ECA. Art. 26. Os filhos havidos fora do casamento poderão ser reconhecidos pelos pais, conjunta ou separadamente, no próprio termo de nascimento, por testamento, mediante escritura ou outro documento público, qualquer que seja a origem da filiação. 24 SOARES, Orlando. União estável. p. 20. 25 GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 34.

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1.4 CONCEITO DE CASAMENTO

Nos diversos períodos da civilização, nota-se que sempre houve uma preocupação com a

organização familiar, seja através das leis ou da religião, no sentido de haver um certo controle

sobre sua constituição, objetivando sua manutenção e proteção.26

Sobre este tema Rainer Czajkowski argumenta:

Por um longo período da história, a organização das sociedades em família foi realizada pela implantação e utilização de um instituto aperfeiçoado com o nome de matrimônio. Tal instituto, primeiro aliado à religião, como sacramento, depois ao Estado (pelo menos na civilização ocidental), passou a significar uma verdadeira instituição, pois era com o casamento que se garantia a existência, o progresso e a segurança das relações familiares. Todo o conjunto de direitos e deveres conjugais, os graves efeitos patrimoniais, a certeza dos vínculos de parentesco, notadamente da filiação, cristalizaram-se como o conteúdo do Direito de Família, a partir do casamento.27

Nessa esteira, cumpre ressaltar o que leciona De Plácido e Silva acerca do vocábulo

casamento:

Na terminologia jurídica, designa o contrato solene que, gerando a sociedade conjugal ou formando a união legítima entre o homem e a mulher, vem estabelecer os deveres e as obrigações recíprocas, que se atribuem a cada um dos cônjuges, seja em relação a eles, considerados entre si seja em relação aos filhos que se possam gerar dessa união. É, no entanto, o casamento, em tal espécie, determinado propriamente de casamento civil, pois que, em verdade, ainda podemos considerar a palavra no sentido genérico, ou na sua feição de casamento religioso.28

Prossegue o mesmo autor:

Sem que, a rigor, possa ser aplicado casamento para designar toda união voluntária de um homem e de uma mulher, que se acordem em viver junto e constituir família, não deixa essa união, em verdade, de revelar o casamento de fato, onde o estado de casado pode trazer benefícios à prole dele surgida. Por esse motivo, com justo acerto, sempre se acresce ao vocábulo, para formar a idéia de sua aprovação legal, a adjetivação civil, que indica a sanção da lei ao ato que a praticou, em conseqüência do que se formou o contrato conjugal.29

Mister se faz ressaltar a influência da Igreja com relação a esse instituto e longa é a

discussão se o casamento é um sacramento ou um contrato. Silvio Venosa aduz:

Para o Direito Canônico, o casamento é um sacramento e também um contrato natural, decorrente da natureza humana. Os direitos e deveres que dele derivam estão fixados na natureza e não podem ser alterados nem pelas partes nem pela autoridade, sendo perpétuo e indissolúvel.

26 Cf. CZAJKOWSKI, Rainer. União livre: à luz das Leis 8.971/94 e 9.278/96. Curitiba: Juruá, 2003. p. 37-38. 27 CZAJKOWSKI, Rainer. União livre: à luz das Leis 8.971/94 e 9.278/96. p. 38-39. 28 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. p. 157. 29 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. p. 157.

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Discorrendo sobre o mesmo tema assenta Orlando Soares: “Para a religião Católica

Apostólica Romana, o casamento não é um contrato e sim um sacramento (juramento, sinal

sagrado), instituído em caráter sacral por Jesus, sendo indissolúvel, até que a morte separe os

nubentes”. 30

Segue argumentando o mesmo autor:

Versando sobre a natureza jurídica do casamento, assinala Caio Mário da Silva Pereira que, independentemente da concepção institucionalista, “ainda há os que se insurgem contra a natureza contratual das núpcias, sob fundamento de que, não obstante o consentimento recíproco que os gera [...], diferem do contrato pela constituição, modo de ser, duração e efeitos”. E acrescenta: Para outros, o casamento é um contrato, tendo em vista a indispensável declaração convergente de vontades livremente manifestadas e tendentes à obtenção de finalidades jurídicas. [...]

Do ponto de vista estritamente jurídico, casamento é o contrato solene, por meio do qual o homem e a mulher se unem em comunhão de vida, de interesses e de assistência, para constituírem uma família legítima.31

Nesse prisma, vale trazer o expressivo conceito de Clóvis Beviláqua:

O casamento é um contrato bilateral e solene, pelo qual um homem e uma mulher se unem indissoluvelmente, regulando por ele suas relações sexuais, estabelecendo a mais estreita comunhão de vida e de interesses, e comprometendo-se a criar e educar a prole, que por ambos nascer.32

Ainda, no que tange a definição de casamento prevalece para o direito brasileiro atual, a

seguinte conceituação: “Casamento é o contrato de direito de família que tem por fim promover a

união do homem e da uma mulher, de conformidade com a lei, a fim de regularem suas relações

sexuais, cuidarem da prole comum e se prestarem mútua assistência”. 33

Destarte, o CC/2002, em seu Livro IV, Título I, Do Direito Pessoal, cuidando do

casamento no Subtítulo I, oferece um conceito abrangente em seu art. 1.511 “O casamento

estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direito e deveres dos cônjuges”. 34

Após algumas conceituações de casamento, de acordo com a posição de alguns juristas e a

legislação, passamos ao estudo do conjunto de regras aplicáveis às relações entre as pessoas

ligadas pelo casamento, parentesco ou afinidade, formando uma instituição social, que é mais que

um contrato, dentro das peculiaridades do Direito de Família. 30 SOARES, Orlando. Direito de Família. p. 23 31 GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 23 32 BEVILÁQUA, Clóvis. Direito de Família. § 6º.p. 35. Apud. MILHOMENS, Jônatas, MAGELA, Geraldo. Manual prático de Direito de Família. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 43. 33 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Direito de Família. p. 19. 34 CC/2002. Art. 1.511.

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1.5 O DIREITO DE FAMÍLIA JUNTO AO ARTIGO 226 DA CF/88

O Direito de Família é constituído de teorias e princípios de direito que regem os

interesses e as relações pessoais e patrimoniais dos indivíduos, entre si, na qualidade de membros

do grupo familiar. Por se tratar da entidade familiar, e sendo esta a base de toda sociedade,

assume importância fundamental em qualquer ordenamento jurídico.35

Na mesma esteira argumenta Silvio Rodrigues “[...] que o direito de família tem por

objeto a exposição dos princípios de direito que regem as relações de família, do ponto de vista

da influência dessas relações não só sobre as pessoas como sobre os bens”. 36

Quanto a natureza jurídica do direito de família, continua o mesmo autor:

Já foi afirmado acima que a família constitui a célula básica da sociedade. Ela representa o alicerce de toda a organização social sendo compreensível, portanto, que o Estado a queira preservar e fortalecer. Daí a atitude do legislador constitucional proclamando que a família vive sob a especial proteção do Estado. O interesse do Estado pela família faz com que o ramo do direito que disciplina as relações jurídicas que se constituem dentro dela se situe mais perto do direito público que do direito privado. Dentro do direito de família o interesse do Estado é maior do que o individual. Por isso, as normas de direito de família são, quase todas, de ordem pública, insuscetíveis, portanto, de serem derrogadas pela convenção entre particulares.37

É de se verificar que o Direito de Família abrange vários aspectos, entre eles as uniões

estáveis (art. 226, § 3º, da CF/88), o casamento, seus efeitos jurídicos, a dissolução dele, as

relações de parentesco, a tutela, a curatela e a ausência.38

Orlando Gomes assim se posiciona quanto ao tema em tela:

Direito de Família é o conjunto de regras aplicáveis às relações entre pessoas ligadas pelo casamento, pelo parentesco, pela afinidade e pela adoção. A tutela39 e a curatela40 não se originam de relações familiares propriamente ditas, mas por sua finalidade, conexão histórica e configuração, conservam-se no campo do Direito de Família, como institutos complementares. No Direito de Família regem-se precipuamente as relações oriundas do casamento, fonte única da família legitima, mas daí não se segue que a lei deva desconhecer a união livre entre pessoas que permanecem juntas para o mesmo fim do matrimônio. A família extramatrimonial enseja relações que também se compreendem no âmbito do direito de

35 Cf. SOARES, Orlando. União estável. p. 7. 36 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Direito de Família. p. 3. 37 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Direito de Família. p. 11-12. 38 Cf. SOARES, Orlando. União estável. p. 8. 39 “A tutela é o encargo conferido a alguém para proteger a pessoa e administrar os bens dos menores que não se acham sob o pátrio poder.” (GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 402). 40 “ Curatela, segundo a sempre citada definição de Clóvis Beviláqua, ‘é o encargo público, conferido, por lei, a alguém, para dirigir a pessoa e administrar os bens de maiores, que por si não possa fazê-lo” ( Código Civil dos Estados Unidos do Brasil Comentado, 8ª ed., Rio de Janeiro, Ed. Francisco Alves, 1950. vol.II, notas ao art. 447. Apud GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 418).

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família, notadamente as que resultam da procriação natural. Numerosos preceitos aplicam-se à família ilegítima, pois que o parentesco resulta, não da sua legitimidade, mas da consangüinidade.41

Conforme o mesmo jurista o Direito de Família acompanha as necessidades e os

sentimentos do nosso tempo, sem temor de que as modificações possam vir a destruir ou

descaracterizar o importante papel que a família desempenha.42 Acrescenta, ainda, o autor:

A Constituição de 1988 mostrou-se sensível a todas as tendências da família no mundo contemporâneo, pois proclamou a completa igualdade de direitos e deveres entre os cônjuges (art. 226, § 5º), apoiou a família natural tanto como a civil (art, 226, § 3º) e eliminou qualquer distinção entre os filhos biológicos e adotivos art. 227, § 6º).43

Sobre Direito de Família e suas peculiaridades assim discorre Silvio Venosa:

O direito de família, ramo do direito civil com características peculiares, é integrado pelo conjunto de normas que regulam as relações jurídicas familiares, orientado por elevados interesses morais e bem-estar social. Originalmente, em nosso país, o direito de família vinha regulado exclusivamente pelo Código Civil. Princípios constitucionais e numerosas leis complementares derrogaram parcialmente vários dispositivos do Código de 1916, ou indiretamente com a família. O Código Civil de 2002 procura fornecer uma nova compreensão da família, adaptada ao novo século.44

As necessidades da sociedade se alteram de forma dinâmica e como todo ser humano

tem sua origem de uma família é essencial o amparo amplo e irrestrito a esta instituição social

que é a base do Estado.

Ao caracterizar a união estável entre um homem e uma mulher como entidade familiar,

a CF/88 gerou inúmeros efeitos jurídicos e também reações contrárias de setores mais

conservadores da sociedade, que anteviam um perigo aos alicerces morais da sociedade.45

É válido expor o pensamento de José Cahali:

O nosso sistema jurídico, desde sua origem, conquanto reconhecida a existência do concubinato como fato social incontornável, sempre se mostrou extremamente resistente à outorga de efeitos positivos à relação extramatrimonial. Assim foi, pela inspiração no Direito Canônico, insistente a orientação em prestigiar, como base da sociedade, unicamente o casamento segundo as normas vigentes. Só o matrimônio criava a família legítima, e apenas esta vinha acobertada pela proteção do Estado. Com este quadro, identificada a família com a figura exclusiva do casamento, excluída a ordem jurídica qualquer outra forma de agrupamento, toda a sua regulamentação destinava-se exclusivamente ao matrimônio, tratado o concubinato como situação a latere, velada e restritiva de direitos. [...]

41 GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 1. 42 Cf. GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 14. 43 GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 15. 44 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. p. 24. 45 Cf. CZAJKOWSKI, Rainer. União livre: à luz das Leis 8.971/94 e 9.278/96. p.13.

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Mas a sociedade, na constante função criadora e recriadora de princípios e normas, motivadora das mudanças nas relações sociais, sensibilizando os estudiosos e os operadores do Direito, não se furtava a provocar o Judiciário e o Legislativo apresentando esta realidade, que, mesmo não sendo nova, passou a ser cada vez mais constante, principalmente em razão da indissolubilidade do casamento. Assim, aos poucos se verificou a evolução doutrinária jurisprudencial e legislativa, conferindo efeitos decorrentes do concubinato, já emergindo a nova jurídica aos seus partícipes – companheiros.46

Hodiernamente, com o advento da CF/88, a família ficou mais liberal e tornou-se mais

justa, pois trouxe à legalidade milhares de famílias antes marginalizadas por não terem a proteção

ou a segurança legal que a instituição do casamento oferecia.

Convém notar, outrossim, o que leciona Orlando Gomes:

Embora a Constituição tenha colocado sob proteção especial do Estado tanto a família legítima como a natural, não teve a intenção de igualar por inteiro as duas figuras jurídicas. Tanto assim que ao reconhecer, para os efeitos a tutela estatal, a “união estável”, o fez sob a advertência de que a lei deverá “facilitar sua conversão em casamento” (art. 226, § 3º). Isso revela que o ideal de organização da família é a sua sujeição ao regime civil de casamento, onde todos os relacionamentos entre os membros da comunidade familiar encontram melhor definição, maior segurança e mais adequado controle de todos os vínculos gerados pelo status familiae.47

Corroborando com o já exposto Orlando Soares assenta:

Os nossos constituintes de 1988 adotaram a expressão entidade familiar, para efeito de proteção do Estado, a união estável entre o homem e a mulher, assim como “a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes (art. 226, §§3º e 4º, da Carta Política daquele ano)”. Em outras palavras, o objetivo do preceito constitucional em exame visa a extensão da proteção do Estado às mencionadas entidades, quer através dos preceitos legais, previstos no Código Civil, com relação aos direitos e deveres do marido, da mulher e dos filhos, sob o casamento, quer no que tange à legislação especial, pertinente ao assunto. Evidentemente, as normas constitucionais em causa não equiparam a união estável ao casamento, porquanto este assume forma solene, isto é, formalidades especiais para a sua realização e validade [...].48

Há que se destacar, ainda, que a CF/88 substituiu a expressão concubinato pelo termo

união estável, que na realidade corresponde a um concubinato puro, conforme será explicado no

decorrer do capítulo. O termo concubinato, embora amplamente utilizado no meio jurídico, era

evitado pelos leigos pela carga de preconceito instalada ao longo do tempo, e pelo peso que

46 CAHALI, Francisco José. Contrato de convivência na união estável. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 2-5. 47 GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 44. 48 SOARES, Orlando. União estável. p.1.

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passou a ter, haja vista indicar um modo de vida ou um estado e não o sentido jurídico da

palavra.49

Salienta-se que antes dessa Constituição, aplicava-se ao então dito concubinato, hoje

denominada união estável, às regras relativas ao direito das obrigações e não às relativas ao

direito de família, eis que anteriormente tais relações não eram tidas como entidades familiares.

Por esse motivo, as questões judiciais advindas das relações concubinárias eram de competência

das varas cíveis, e não das varas de família.50

Registre-se, ainda, que inúmeros projetos tramitaram no Congresso Nacional, após a

Constituição de 1988, para regulamentar o parágrafo 3º do seu artigo 226. Destes, dois se

transformaram em leis, e estaremos abordando, com maior profundidade, oportunamente: são as

Leis 8.971/94 e 9.278/96.

Mister se faz ressaltar as significativas inovações legislativas e conceituais que o

CC/2002 apresenta no Livro IV, a respeito do Direito de Família, como descreve o jurista Silvio

Rodrigues:

Dedica-se, em primeiro lugar, sob o Título I – “Do Direito Pessoal”, às regras do casamento, sua celebração, validade e causas de dissolução. Desde o início preocupa-se com a proteção da pessoa dos filhos para, em seguida, dispor sobre as relações de parentesco, já adaptado à nova sistemática Constitucional de igualdade plena entre os filhos. Em um segundo título, vem normatizado o direito patrimonial decorrente do casamento, com ênfase ao regime de bens e aos alimentos entre parentes, cônjuges e conviventes. A inovação do Código, neste título, foi ter introduzido um subtítulo destinado ao bem de família, tratado no Código de 1916 no Livro II, destinado aos bens. O título III é dedicado à união estável e seus efeitos. [...] Para finalizar, a exemplo de como atualmente se encontra a matéria, apresentam-se as regras relacionadas aos institutos de direito protetivo, quais sejam, a tutela e a curatela. Inova o Código, nesse aspecto, ao não mais tratar aqui da ausência, deslocada para Parte Geral.51

Conforme se infere da leitura do parágrafo 3º, do art. 226, da CF/88, bem como das

inúmeras interpretações doutrinárias, claro está que a união estável é reconhecida pelo nosso

sistema jurídico como entidade familiar, tal qual o casamento, sendo incontestável que os

companheiros ou conviventes merecem proteção estatal equivalente à dos cônjuges.

49 Cf. CZAJKOWSKI, Rainer. União livre: à luz das Leis 8.971/94 e 9.278/96. p.59. 50 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Direito de Família. p. 300. 51 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Direito de Família. p. 14-15.

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1.6 A FAMÍLIA DECORRENTE DA UNIÃO ESTÁVEL

Em função do desenvolvimento histórico do instituto cabe fazer algumas considerações

quanto ao significado de união livre e concubinato, já que ambos referem-se as relações íntimas

entre um homem e uma mulher, sem haver casamento, ocorrendo algumas vezes a utilização da

expressão concubinato com o mesmo significado que união estável.52

De Plácido e Silva aduz quanto à origem do vocábulo concubinato:

Assim se diz da união ilegítima do homem e da mulher. É , segundo o sentido de concubinatus, o estado de mancebia, ou seja, a companhia de cama sem aprovação legal. Embora concúbio signifique coabitação, no sentido legal, concubinato não se forma pela exigência primária desta situação, ou seja, do estado de casado entre os concubinários (componentes do concubinato, homem e mulher). [...] Sendo assim, sem que possa haver distinção nos efeitos, que do concubinato se possam gerar ele se apresenta sob um duplo aspecto: a) de coabitação, em virtude de que o homem e a mulher vivem em estado de casados (more uxório) b) de manutenção da mulher por conta do homem, para que seja sua concubina, ou seja, em terminologia vulgar, sua companheira de cama, em caráter de freqüência ou habitualidade. Nesta razão, o primário elemento do concubinato é o concúbio contínuo e exclusivo da mulher com o homem com quem habita ou que a mantém, como sua amásia, ou concubina.

Na mesma esteira, se posiciona Edgard de Moura Bittencourt:

a expressão concubinato tem duplo sentido. Um é o sentido genérico análogo à “união livre”, que é toda ligação de homem e mulher fora do casamento, também chamado mancebia, amigação, barregã, amásia etc. Um sentido mais específico é o que se refere ao semimatrimônio, à posse do estado de casado, ao entrosamento de vida e interesses numa comunhão de fato53. É um casamento de fato. É a convivência more uxório, ou melhor, é o convívio duradouro de duas pessoas de sexo diferente [...], sob o mesmo teto como se fossem casadas.54

Portanto, por união livre ou união estável entende-se aquela que não se prende às

formalidades do casamento, ou seja, uniões não oficializadas, onde existe entre os companheiros

o ânimo de durabilidade, publicidade e estabilidade, e que por ter essas características recebe a

proteção do Estado, no campo do Direito de Família.

Salienta-se que no concubinato ocorre uma relação paralela ao casamento ou a outra

união estável, não recebendo este, apoio legal, haja vista, o Estado não poder dar proteção a mais

52 Cf. CZAJKOWSKI, Rainer. União livre: à luz das Leis 8.971/94 e 9.278/96. p. 53. 53 MOURA BITTENCOURT, Edgard de. Concubinato. São Paulo: Leud, 1975. p. 45-46. Apud PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato e união estável. p. 27 e 28. 54 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato e união estável. p. 28.

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de uma família ao mesmo tempo, podendo valer-se da teoria das sociedades de fato, no campo

obrigacional.55

Luiz Sérgio do Carmo assim se posiciona sobre a união estável e a Constituição pátria:

A Constituição de 1988, ao ter criado um neologismo jurídico, instituindo a união estável como entidade familiar, constituída por um homem e uma mulher. Não obstante, antes da Carta Magna de 05/10/88, já existiam as palavras união e estável, cada qual com seu significado. O que houve foi apenas a reunião, a substantivação composta, para definir a condição jurídica dos companheiros em situação peculiar, em comando normativo. Fê-lo, pois, para dar proteção e segurança jurídica à sociedade e, especialmente, para as pessoas que conviviam sem ter se sujeitado previamente às formalidades do casamento, ainda que não houvesse nenhum impedimento ou ainda que lhes faltasse apenas o acionamento da vontade para tanto. Antes da promulgação da Carta de 1988, alcunhava-se de concubinos, genericamente, aqueles que coabitavam sem que casados fossem, independentemente do estado civil, isto é, de ser apenas um, ou ambos , solteiros, casados, divorciados ou viúvos.56

Ainda com relação a utilização dos termos união estável e concubinato, Rodrigo da

Cunha Pereira argumenta:

Apresenta-se bastante esclarecedor deste conceito o texto do art. 1º do Substitutivo do Projeto de 1988/91, que resume toda a evolução dessa matéria: “Considera -se união estável o concubinato more uxório, público, contínuo e duradouro, entre homem e mulher, cuja relação não seja incestuosa ou adulterina”. Diante dos novos dispositivos legais surgidos a partir da Constituição Federal de 1988, a doutrina e a jurisprudência têm feito uma diferenciação do concubinato em puro e impuro; no entanto, prefiro as denominações adulterino e não-adulterino. O Novo Código Civil acabou incorporando essa evolução e traduziu em seus arts. 1.723 e 1.727 tal diferenciação. Assim, podemos dizer que concubinato é um gênero que comporta duas espécies: o concubinato adulterino, a que se tem denominado simplesmente concubinato, e o não-adulterino, que se pode denominar de união estável. Em síntese, união estável é a relação afetivo-amorosa entre um homem e uma mulher, não-adulterina e não incestuosa, com estabilidade e durabilidade, vivendo sob o mesmo teto ou não, constituindo família sem o vínculo do casamento civil57.

Deste modo, a distinção entre concubinato e união estável (ou livre) faz-se necessária,

para aplicar as medidas e conseqüências jurídicas cabíveis a incidência de cada um dos

institutos58, não podendo tais expressões ser confundidas, frente a vigente legislação brasileira.

55 Cf PEREIRA. Rodrigo da Cunha. Da união estável. In. DIAS, Maria Berenice, PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord.). Direito de Família e o novo Código Civil. 3 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 265. 56 CARMO, Luiz Sérgio do. Do concubinato à união estável: Doutrina – Legislação - Jurisprudência. São Paulo: Edijur. 2003. p. 11. 57 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato e união estável. p. 28-29. 58 Cf. PEREIRA. Rodrigo da Cunha. Da união estável. p. 265.

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Vistos os elementos caracterizadores dos institutos união estável e concubinato

passamos a análise sucinta de mais um grupo familiar protegido pelo Estado a partir da CF/88, a

família formada por qualquer dos pais e seus descendentes, ou seja, da família monoparental.

1.7 A FAMÍLIA FORMADA POR QUALQUER UM DOS PAIS E SEUS DESCENDENTES

A união estável e a família monoparental, composta por um dos progenitores e sua prole

são também reconhecidas na CF/88 como entidade familiar (art. 226, §§ 3º e 4º). Por serem fatos

cotidianos em nossa sociedade, os constituintes entenderam a necessidade de proteger e amparar

estes novos grupos familiares.

Desta deixa, cumpre transcrever o mencionado artigo, como segue:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. [...] § 3º Para efeito de proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre um homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento § 4º entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.59

Acerca da disposição constitucional, no citado artigo, cumpre esboçar a interpretação do

jurista Orlando Gomes:

Os preconceitos contra a família fora do matrimônio foram totalmente rompidos pela Constituição de 1988. A família que a Carta Magna considera célula da sociedade e que se acha sob especial proteção do Estado não é apenas a gerada pelo casamento, mas também a que se estabelece pela união estável entre um homem e a mulher (concubinato) e a que se forma entre qualquer dos pais e seus descendentes, pouco importando existência ou inexistência do matrimônio civil (art. 226 §§ 3º e 4º).60

Sensível a realidade brasileira, no que diz respeito à família, o constituinte reconheceu a

importância dos diferentes núcleos familiares, atribuindo ao art. 226 da Constituição a instituição

de um “sistema familiar constitucional” de caráter aberto, não discriminatório, que respeita as

diversidades, aplicando ao mesmo tempo o princípio da igualdade e o direito dos casais de

escolherem o tipo de vida familiar pretendido.61

59 CF/88. 60 GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 23. 61 Cf. SOUZA, Carlos Aurélio Mota de.O casamento. p. 1113.

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Impulsionado pela própria sociedade o conceito de família foi ampliado tornando-se

mais verdadeiro e real, e a CF/88, com seus princípios democráticos, tornou-se o marco desta

evolução .

Por derradeiro, o CC/2002 trouxe significativas inovações legislativas e conceituais no

que diz respeito ao direito de família, que serão tratadas no decorrer deste estudo.

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2 UNIÃO ESTÁVEL – ELEMENTOS CARACTERIZADORES E A LEGISLAÇÃO

VIGENTE

2.1 CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DA UNIÃO ESTÁVEL

Preliminarmente, antes de adentrarmos nos aspectos legais da união estável, relevante se

torna destacarmos seu conceito, bem como os elementos caracterizadores desse instituto, para

que se possa aferir seus efeitos, principalmente patrimoniais.

Para Maria Helena Diniz união estável “É uma união duradoura de pessoas livres e de

sexos diferentes, que não estão ligadas entre si por casamento civil”. 62

Não obstante, o nosso sistema jurídico de família ter como referência o casamento, o

qual cria a família legítima, a união estável, como outra forma de constituição de família, passa a

ter a proteção do Estado, desde que esta disponha dos elementos necessários para sua

caracterização.

Com o fim de melhor compreendermos esta entidade familiar, indispensável

destacarmos o conceito legal contido na Constituição Federal e na Lei 9.278/96: Art. 226 [...] §

3º. “Para efeito da proteção do Estado é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher

como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento” 63. O artigo 1º da Lei

9.278 complementa: “É reconhecida como entidade familiar a convivência d uradoura, pública e

contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família”. 64

É de verificar-se, para configuração da união estável, a presença de elementos

fundamentais, que integram essa relação tais como a diversidade de sexos, exigência

constitucional que afasta a possibilidade de se inserir nessa área o relacionamento de pessoas do

mesmo sexo, pois entre esta haverá tão somente uma relação homoafetiva e uma sociedade

civil.65

62 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro: Direito de Família. 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 5. p. 357. 63 CF/88. 64 Lei 9.278/96. Art. 1º. 65 “A expressão “sociedade de fato”, em si, tem significação muito mais abr angente do que aquela união de esforços nas uniões concubinárias. Genericamente, “sociedade de fato” ou “irregular” é aquela não constituída juridicamente

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Silvio Venosa argumenta:

A Constituição, assim como o art. 1.723 do Código Civil, também se refere expressamente à diversidade de sexos, à união do homem e da mulher. Como no casamento, a união do homem e da mulher tem, entre outras finalidades, a geração de prole, sua educação e assistência. Desse modo, afasta-se de plano qualquer idéia que permita considerar a união de pessoas do mesmo sexo como união estável nos termos da lei. O relacionamento homossexual, modernamente denominado homoafetivo, por mais estável e duradouro que seja, não receberá a proteção constitucional e, conseqüentemente, não se amolda aos direitos de índole familiar criados pelo legislador ordinário. Eventuais direitos que possam decorrer dessa união diversa do casamento e da união estável nunca terão, ao menos no atual estágio legislativo, cunho familiar real e verdadeiro, situando-se, acentuadamente no campo obrigacional, no âmbito de uma sociedade de fato.66

Observa-se, portanto, que a nossa Constituição protege a entidade familiar constituída

pelo homem e pela mulher, porém, há países que reconhecem esse tipo de união, permitindo o

casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Os tribunais brasileiros têm demonstrado receptividade somente quanto a atribuição de

efeitos patrimoniais às uniões homossexuais, sob a qualificação de “sociedade de fato”.

Maria Berenice Dias comenta:

[...] simplesmente encobrir a realidade não irá solucionar as questões que emergem quando do rompimento das relações quando do rompimento das relações que, mais do que sociedade de fato, constituem sociedade de afeto, o mesmo liame que enlaça os parceiros heterossexuais. Necessário é encarar a realidade, pois descabe estigmatizar quem exerce orientação sexual diferente.67

A notoriedade também é significativa, porém pode ser discreta, pois a união deve ser

conhecida no meio social em que vivem os conviventes, que deverão tratar-se como marido e

mulher.68

Corroborando o já exposto, Maria Helena Diniz assenta:

Notoriedade de afeições recíprocas, que não significa de modo algum publicidade. A esse respeito bastante expressiva é a lição de Cunha Gonçalves, segundo a qual a ligação concubinária há de ser notória, porém pode ser discreta, caso em que a divulgação do fato se dá dentro de um círculo mais restrito, o dos amigos, o das pessoas de íntima relação de ambos, o dos vizinhos do companheiro, que poderão atestar as visitas freqüentes do outro, suas entradas e saídas. A discrição seria, como pondera Caio Mário

mas que, no mundo dos fatos, se amolda ao conceito do art. 1.363 do CCB: “ Celebram contrato de sociedade as pessoas, que mutuamente se obrigam a combinar seus esforços ou recursos, para lograr fins comuns”. Assim, em princípio, sociedade de fato não pressupõe relacionamento prolongado, estável; pode existir entre parceiros antes de se falar em entidade familiar e independente dela. Sem família, a sociedade de fato é questão de direito obrigacional.” (CZAJKOWSKI, Rainer. União livre: à luz das Leis 8.971/94 e 9.278/96. p. 131) 66 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. p. 55-56. 67 DIAS, Maria Berenice. União homossexual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000. p. 87. Apud VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. p. 483.. 68 Cf. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro: Direito de Família. p. 326.

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da Silva Pereira, um meio-termo entre a publicidade ou notoriedade franca e o segredo dessas relações. Assim, não se tem união estável se os encontros forem furtivos ou secretos, embora haja prática reiterada de relações sexuais.69

É mister que a união estável encontre-se revestida de estabilidade, o que significa que

deve ser duradoura, que se prolongue no tempo. Não existe um prazo determinado de

convivência, mas um período mais ou menos longo vai demonstrar a estabilidade da união,

distinguindo-se da relação transitória, momentânea, eventual, que não passou de um

relacionamento passageiro.

Outro elemento citado na lei é a continuidade, o que pressupõe que a relação seja

contínua, sem interrupções e sobressaltos, que induzem a debilidade no relacionamento entre os

conviventes.

Orlando Gomes comenta sobre o tema:

Não há prazo mínimo, mas deve apresentar-se como “duradoura”, isto é, não haverá “união estável” quando os fatos revelarem que a convivência entre o homem e a mulher não passou de “relações passageiras” ou “fugazes”. A descontinuidade, também, induz debilidade no relacionamento entre os conviventes e afasta a tutela especial da lei. Da mesma maneira, a clandestinidade da convivência impede a configuração de entidade familiar.70

Ademais, a união estável terá que se caracterizar pelo objetivo de constituir família, que

se traduz em uma comunhão de vida e de interesses, não sendo fator determinante a existência de

filhos, podendo ser formada apenas pelo homem e pela mulher.

Neste sentido cabe destacar o que leciona Orlando Gomes:

O mais importante, porém, segundo a disciplina da Lei nº 9.278, não é o tempo de convivência (dado objetivo). É o animus dos companheiros, pois a união estável, qualquer que seja a duração da convivência, terá de caracterizar-se pelo “objetivo de constituir família”. Isto quer dizer, somente haverá a “entidade familiar” legalmente tutelada quando se configurar, por parte dos conviventes, o animus de assumir, perante a sociedade, “um status em tudo semelhante ao de pessoas casadas, concedendo-se mutuamente o tratamento, a consideração, o respeito que se dispensam reciprocamente, os esposos”. 71

Salienta-se que além dos elementos essenciais descritos em lei, há outras características

indicadas pelos doutrinadores que podem ser consideradas, tais como a vontade72 como elemento

criador dessa relação, pois somente ela pode criar e manter a união, com base no princípio da

69 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro: Direito de Família. p. 325-326. 70 GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 49. 71 GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 49-50 72 Cf. CZAJKOWSKI, Rainer. União livre: à luz das Leis 8.971/94 e 9.278/96. p. 81.

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livre manifestação da vontade entre os conviventes ou companheiros. O dever de fidelidade é

outro elemento significativo, já que revela a intenção de vida em comum, além da dependência

econômica da mulher ao homem e da coabitação73. Tendo em vista que a união deve ter aparência

de casamento, apesar de sabermos que no próprio casamento pode haver uma separação

material74 dos cônjuges.75 Todos os requisitos descritos são expressivos e num caso concreto

tomam peso e podem tornar-se decisivos para o julgador.

Diante disso, percebe-se que a união estável subsiste com base nesses requisitos, os

quais são características fundamentais dos que vivem sob a condição de companheiros, para que,

configurados os pressupostos de existência dessa união, possam usufruir os benefícios legais

inerentes a ela.

Rodrigo da Cunha Pereira preleciona:

Em síntese, os elementos caracterizadores da união estável são aqueles que vão delineando o conceito de família. Não é a falta de um desses elementos aqui apresentados que caracteriza ou desvirtua a noção de união estável. O importante, ao analisar cada caso, é saber se ali, na somatória dos elementos, está presente um núcleo familiar, ou, na linguagem do art. 226 da Constituição da República, uma entidade familiar. Se aí estiver presente uma família, terá a proteção do Estado e da ordem jurídica. 76

Deste modo, apesar de constar em nossa legislação elementos essenciais para a

caracterização da união estável, mesmo com a ausência de algum desses requisitos esta união

poderá ser reconhecida, se restar comprovado existir um núcleo familiar, conseqüentemente terá

a proteção do Estado.

Convém destacar, outrossim, as diferentes espécies de uniões estáveis que se

apresentam no ordenamento jurídico atual, podendo ser classificadas como união estável ou

concubinato puro e concubinato impuro ou simplesmente concubinato.77

Na lição de Maria Helena Diniz:

Será puro se se apresentar como uma união duradoura, sem casamento civil, entre homem e mulher livres e desimpedidos, isto é, não comprometidos por deveres matrimoniais ou por outra ligação concubinária. [...] Ter-se-á concubinato impuro ou simplesmente concubinato, nas relações não eventuais em que um dos amantes ou ambos estão comprometidos ou impedidos legalmente de

73 Cf. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro: Direito de Família. p. 327-328. 74 Súmula 382 do STF - “A vida em comum sob o mesmo teto, more uxório, não é indispensável à caracterização do concubinato”. 75 Cf. RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Direito de Família. p. 287. 76 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato e união estável. p.34. 77 Cf. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro: Direito de Família. p. 330.

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casar. No concubinato há um panorama de clandestinidade que lhe retira o caráter de entidade familiar (CC, art. 1.727), visto não poder ser convertido em casamento. Apresenta-se como: a) adulterino [...], se se fundar no estado de cônjuge de um ou ambos os concubinos[...] ; e b) incestuoso, se houver parentesco próximo entre os amantes. 78

Nessa esteira cumpre trazer o que preleciona Rodrigo da Cunha Pereira:

Assim, entendemos que a expressão união estável, adotada pela atual Constituição brasileira, veio substituir a expressão concubinato. Podemos dizer, então, que união estável é o concubinato não-adulterino. O concubinato adulterino, em razão do princípio jurídico da monogamia, não recebe a proteção do Estado como forma de família. Os direitos decorrentes do concubinato adulterino não estão no campo do Direito de Família, mas na teoria das sociedades de fato, no direito obrigacional, que encontra respaldo e fundamentação teórica para justificá-lo.Entretanto, a linguagem de grande parte de nossos tribunais, para designar as conseqüências e efeitos jurídicos de uma união estável, é ainda a de concubinato ou, quando muito, alternando uma e outra.79

No mesmo diapasão, manifesta-se Orlando Gomes:

Mas, o fato de um dos conviventes, ou ambos, serem casados não impede a configuração da “união estável” regulada pela Lei 9.278. Aliás, a jurisprudência, mesmo antes da referida lei, já havia feito a distinção entre “concubinato” e “companheirismo”. O concubinato contaminado pelo repúdio ao adultério seria aquele mantido pelo homem casado (ou mulher casada) na clandestinidade pelo cônjuge que vive simultaneamente com a esposa e a concubina. Nela é que se vê o adultério propriamente dito. Quando, porém, a pessoa casada já rompeu a convivência fática com seu cônjuge e vive unida ao companheiro de forma pública, ostensiva, em relação estável, passa perante a sociedade como participante de uma autêntica família. 80

Observa-se, portanto, que a união estável ou o concubinato puro corresponde ao

convívio duradouro de um homem e de uma mulher, com o objetivo de constituir uma família,

sem os impedimentos de outra união. Enquanto que o impuro (adulterino ou incestuoso) ocorre

quando os concubinos vivenciam situação marginal ao casamento ou mesmo à união estável,

estando desprovidos de proteção.81

Vale destacar decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo que reflete bem esta posição:

“ Concubinato – Concomitância com o casamento. A lei não contempla o concubinato adulterino, isto é, aquele mantido concomitantemente com o casamento. A tal relação não se aplica o art. 5º da LICC que determina que, na aplicação a lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que se dirige e às exigências do bem comum. O dispositivo só deve ser aplicado quando a situação de fato assim o reclamar, isto é, desde que existente uma separação de fato entre os cônjuges, a tornar o

78 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro: Direito de Família.p. 330. 79 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato e união estável. p. 2-3. 80 GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 50 81 Cf. AMIM, Andréa Rodrigues. Da união estável. In. LEITE, Heloisa Maria Daltro (Coord.). O novo Código Civil: do Direito de Família. p. 442.

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concubinato honesto, como o reconhece a nova Constituição” (3ª CCTJ – SP, Ap. n. 116.225-1, m. v. em 17/10/1989, rel. Des. Mattos Faria, RT 649/52).82

Após a conceituação de união estável e da descrição de seus principais elementos

caracterizadores passamos ao exame da legislação vigente acerca da matéria.

2.2 APONTAMENTOS SOBRE A LEGISLAÇÃO

2.2.1 A evolução jurídica da união estável à luz das Leis nº 8.971/94 e 9.278/96

Como já ficou claro e fundamentado anteriormente, a Constituição Federal de 1988 foi

um marco no direito de família. Com efeito, criou um novo conceito de entidade familiar ao

reconhecer a união estável entre um homem e uma mulher, buscando com a proteção do Estado,

legitimar estas uniões. Contudo, este reconhecimento “não constitui um estímulo ao concubinato

puro, mas um fortalecimento do casamento por haver incentivo à sua conversão em

matrimônio”. 83 Deste modo, se a Constituição estabelece que o Estado deve criar meios

facilitadores para que a união estável se transforme em casamento (art. 226, § 3º), resta

constatado, portanto, que o casamento continua sendo a base da família, e sendo a união estável

reconhecida por lei, ela não pode produzir os mesmos efeitos do casamento em termos

patrimoniais e sucessórios.

Assim, a união estável ganha respaldo legal gerando efeitos jurídicos ao instituto.

Entretanto, a jurisprudência, inicialmente, a considerava como uma sociedade de fato, e como tal,

considerada na órbita do direito obrigacional, não sendo levado em consideração o caráter afetivo

indissociável de tais relações.

Silvio Venosa aduz:

A jurisprudência, de início, reconheceu direitos obrigacionais no desfazimento da sociedade conjugal concubinária, determinando a divisão entre os cônjuges do patrimônio amealhado pelo esforço comum. Em outras situações, quando isso não era possível, para impedir o desamparo da concubina, os tribunais concediam a ela (ou excepcionalmente a ele) uma indenização por serviços domésticos, eufemismo que dizia muito menos do que pretendeu. O Supremo Tribunal Federal acentuava que esses efeitos patrimoniais decorriam de relações obrigacionais criadas pela convivência do casal, repelindo efeitos de Direito de Família. Essa posição foi sintetizada na Súmula

82 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato e união estável. p. 64. 83 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro: Direito de Família. p. 337.

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380: “Comprovada a existência da sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum”. 84

Observa-se, que com relação ao esforço comum, existe, atualmente, entendimento que

não é necessário que a contribuição de uma das partes tenha sido financeira, bastando seu suporte

doméstico para que a outra pudesse construir ou realizar o patrimônio do casal, ou seja, para

caracterização, basta a contribuição indireta.

Rodrigo da Cunha Pereira pronunciou-se sobre a matéria:

Essa concepção inovadora e revolucionária do esforço comum é de relevância ímpar, não apenas para a união estável, mas sobretudo, significa o reconhecimento jurídico das atividades domésticas, tradicionalmente exercidas pelas mulheres, tão necessárias para a estruturação e existência de núcleos familiares. Além de atribuir um cunho axiológico, significa também o reconhecimento de um conteúdo econômico a esse trabalho historicamente não valorizado.85

A partir de então houve avanços quanto aos direitos dos companheiros, tendo as

questões relativas aos conflitos decorrentes da dissolução das chamadas sociedades de fato se

deslocado para o universo do direito de família. Imprescindível o fato, haja vista a própria CF/88

ter elevado a união estável ao patamar de entidade familiar.86

Outrossim, para garantir à família criada pela união estável e disciplinar os seus efeitos

jurídicos foram criadas duas leis, a primeira delas foi a Lei nº 8.971 de 29 de dezembro de 1994,

que veio regular o direito dos companheiros a alimentos e à sucessão e a Lei nº 9.278 de 10 de

maio de 1996, que regulamenta o § 3º do artigo 226 da Constituição Federal e o vigente Código

Civil em seus artigos.

Sobre a legislação vigente assevera Orlando Gomes:

É bom notar que a Lei nº 9.278 não substituiu a Lei nº 8.971, mas apenas a revogou em parte, naquilo que instituiu alguma norma diferente e incompatível com que antes fora disciplinado pela última lei. O certo, porém, é que a Lei nº 9.278 não regulou inteiramente a matéria tratada pela Lei nº 8.971 e somente em um ou outro ponto tratou de objeto que já havia sido cogitado por esta última. Nesses pontos de conflito e incompatibilidade é que terá ocorrido a parcial revogação da Lei nº 8.971.87

84 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. p. 51-52. 85 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p.162. 86 Cf. DIREITO, Carlos Alberto Menezes. Da união estável no novo Código Civil. In. MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva, MENDES, Gilmar Ferreira, NETTO Domingos Franciulli, coordenadores. O novo Código Civil: Estudos em homenagem ao professor Miguel Reale. São Paulo: LTr, 2003. p. 1.271-1.272. 87 GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 48.

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Observa-se que há muita discussão quanto aos conflitos de normas. Para Rui Ribeiro de

Magalhães o vocábulo revogação, tanto da forma expressa como tácita, é empregado de forma

genérica, porém, quando a revogação é expressa não há conflito. O problema surge quando a

revogação é tácita, pois implica em ab-rogação88 ou derrogação.89

Especificamente em relação aos textos legais correspondentes às Leis 8.971/94 e

9.278/96, não houve ab-rogação da primeira. Observa-se, que as duas leis adotaram a mesma

cláusula genérica, expressa no artigo 11 da Lei 9.278/96, segundo a qual revogam-se as

disposições em contrário90.

Constata-se, portanto, que a Lei nº 9.278/96 não regulou inteiramente o assunto tratado

na Lei nº 8.971/94, em alguns aspectos a revoga e em outros a complementa. Resta-nos destacar

os principais pontos que serão disciplinados pelas respectivas leis, sendo que trataremos com

maior ímpeto das disposições acerca da proteção patrimonial dos bens dos que vivem em união

estável.

Oportuno se torna dizer que a expressão concubina foi substituída pelo vocábulo

companheira, na Lei nº 8.971/94, enquanto que a Lei nº 9.278/96 optou pela terminologia

conviventes.

Quanto ao perfil legal da união estável e o direito aos alimentos a Lei 8.971/94, no seu

artigo 1º exigia que a convivência existisse por tempo superior a cinco anos, ou que houvesse

prole, e, também que o companheiro fosse solteiro, separado judicialmente, divorciado ou viúvo,

ocorrendo a mesma exigência se se tratar da companheira. No parágrafo único, o direito aos

alimentos é assegurado também ao homem. Na Lei nº 9.278/96 exige-se apenas uma convivência

duradoura, pública e contínua e que tenha como objetivo a constituição de família. Apesar de

exigir uma certa duração do convívio, não há prazo determinado para caracterização da união

estável.

No tocante a conceituação desse instituto, ficou expressa no art. 1º da Lei nº 9.278/96,

bem como a estruturação de direitos e deveres, no art. 2º da mesma lei. Veja-se o disposto nos

artigos que se referem a conceito e direitos e deveres. Valendo transcrevê-los:

88 Segundo Rui Ribeiro de Magalhães “Quando as disposições da nova lei se an tagonizam totalmente com a anterior ocorre o fenômeno da ab-rogação. Quando só em parte elas são conflitantes ocorre a derrogação.” (MAGALHÃES, Rui Ribeiro de. Direito de Família: no novo Código Civil brasileiro. p. 288-289) (grifo nosso) 89 Cf. MAGALHÃES, Rui Ribeiro de. Direito de Família: no novo Código Civil brasileiro. p. 288. 90 Cf. MAGALHÃES, Rui Ribeiro de. Direito de Família: no novo Código Civil brasileiro. p. 289.

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Art. 1º. É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família. Art. 2º. São direitos e deveres iguais dos conviventes: I – respeito e consideração mútuos; II – assistência moral e material recíproca; III – guarda, sustento e educação dos filhos comuns.91

Registre-se, ainda, que o artigo 2º da Lei nº 9.278/96, prevê que os conviventes, em

plano de igualdade, devem respeito e consideração mútuos, enaltecendo o legislador a

necessidade de valorização pessoal e moral dos conviventes, não havendo referência ao dever de

fidelidade recíproca. Sobre os deveres dos conviventes Maria Helena Diniz argumenta “O que

importa é que nessa convivência haja afeição recíproca, comunhão de interesses, conjugação de

esforços em benefício do casal e da prole, se houver respeito e assistência moral e material, ou

seja, companheirismo”. 92

Segundo Marco Aurélio Viana:

O art. 2º da Lei nº 9.278/96 estabelece um complexo de direitos e deveres entre os conviventes, alçado no art. 23193 do Código Civil, deixando claro que se pretende uma equiparação entre união estável e o casamento. Deixou apenas de estabelecer o dever de fidelidade recíproca de forma objetiva, embora ele possa ser depreendido do texto legal em sua essência, estando presente no dever de respeito e consideração mútuos que a lei especial impõe.94

Situada dentro do princípio de respeito entre os conviventes o dever de fidelidade deve

estar implícito no relacionamento, onde o casal só terá confiança mútua se houver a união

exclusiva e com propósito de vida em comum.

Acerca do direito sucessório a Lei nº 9.278/96 não fez qualquer referência, estando em

seu bojo regulamentadas tão somente a meação95 e o direito real de habitação ao sobrevivente,

relativamente ao imóvel destinado à residência do casal, enquanto não constituísse nova união ou

91 Lei nº 9.278/96. Arts. 1º e 2º. 92 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro: Direito de Família. p. 325 . 93 CC/1916 - Art. 231 - CC/2002 - Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges: I - fidelidade recíproca; II -vida em comum, no domínio conjugal; III - mútua assistência; IV – sustento, guarda e educação dos filhos; V- respeito e consideração mútuos. 94 VIANA, Marco Aurélio S. Da união estável. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 31. 95 Cabe esclarecer que meação e sucessão não devem ser confundidas.Segundo Rodrigo da Cunha Pereira: “ Meação é o direito de um companheiro ou cônjuge, quando da dissolução da sociedade conjugal/marital em vida, à sua quota parte, equivalente à metade.; sucessão, por seu turno, é o direito hereditário que nasce em razão da morte”. (PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p. 164). (grifo nosso)

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casamento96. O direito à sucessão veio disciplinado na Lei nº 8.971/94, como demonstra o artigo

2º:

I - o (a) companheiro(a) sobrevivente terá direito enquanto não constituir nova união, ao usufruto de quarta parte dos bens do “de cujus”, se houver filhos deste ou comuns; II - o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito enquanto não constituir nova união, ao usufruto de metade dos bens do “de cujus”, se não houver filhos, embora sobrevivam ascendentes; III - na falta de descendentes e de ascendentes, o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito à totalidade da herança.97

No mesmo diploma legal, no artigo 3º98, o legislador reconhece o direito ao

sobrevivente de metade dos bens do companheiro falecido, quanto aos bens que resultarem da

atividade em que haja colaboração recíproca.

Quanto à questão patrimonial dos companheiros o artigo 5º e parágrafos a Lei nº

9.278/96 assim dispõe:

Art. 5º. Os bens móveis e imóveis adquiridos por um ou por ambos os conviventes, na constância da união estável e a título oneroso, são considerados fruto do trabalho e da colaboração comum, passando a pertencer a ambos, em condomínio e em parte iguais, salvo estipulação contrária em contrato escrito. Parágrafo 1º. Cessa a presunção do caput deste artigo se a aquisição patrimonial ocorrer com o produto de bens adquiridos anteriormente ao início da união. Parágrafo 2º. A administração do patrimônio comum dos conviventes compete a ambos, salvo estipulação contrária em contrato escrito.99

Ainda sobre o aspecto patrimonial Rodrigo da Cunha Pereira comenta:

O art. 5º dispõe sobre o patrimônio a exemplo das regras do regime da comunhão parcial de bens, como aliás veio fazer expressamente, mais tarde, Novo Código Civil. Presume-se que os bens adquiridos na constância da união, a título oneroso, pertencem a ambos, porque se deduz que tenham sido adquiridos pelo esforço comum. Entretanto, é importante ressaltar que esse esforço comum é tão somente uma presunção. Sendo assim, pode-se demonstrar o contrário, ou seja, provar que determinados bens não foram frutos do trabalho e/ou da contribuição de ambos. Essa é uma das diferenças básicas entre o casamento e a união estável: nesta é imprescindível o esforço comum (direto ou indireto); naquele não se discute isso.100

Com efeito, o regime de bens instituído pela Lei nº 8.971/94 não permitia disposição em

contrário, ou seja, a lei não autorizava a existência de regime diverso do expressamente previsto,

com a devida interpretação. Diante da nova lei, além da modificação quanto ao regime legal de

96 Lei nº 9.278/96. Art. 7º. 97 Lei nº 8.971/94 . Art.2º, I, II e III. 98 Lei nº 8.971/94. Art. 3º. 99 Lei nº 9.278/96. Art. 5º. § 1º e § 2º. 100 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato e união estável. p. 112-113.

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bens, há a possibilidade de opção por outro sistema que não o previsto na lei, tal como acontece

com o casamento, desde que observados certos limites.

Desta forma, ocorre um avanço na legislação, pois não se discute mais se o convivente,

colaborou ou não, para a constituição ou aumento do patrimônio. Se os bens são fruto do trabalho

e do esforço comum e foram adquiridos a título oneroso, na constância da união, pertencem aos

conviventes e devem ser partilhados em partes iguais, salvo contrato em contrário. Ademais, fica

estabelecido, que os companheiros podem através de contrato escrito derrubar a presunção legal,

estipulando por escrito a destinação de seus bens.

Na lição de Rui Ribeiro de Magalhães:

Quanto ao regime de bens, o legislador adotou os princípios da comunhão parcial de bens, estabelecendo a comunicação dos adquiridos a título oneroso na constância da união, ressalvados os sub-rogados, adquiridos com o produto de bens anteriores a ela. Esse regime prevalecia no silêncio dos conviventes, já que existia previsão legal de que eles pudessem estabelecer outro que melhor lhes aprouvesse, mas desde que o fizessem por contrato escrito. Igualmente, a lei previu a obrigação alimentar.101

A Lei 9.278/96 no seu artigo 7º trata da dissolução da união estável, como dispõe o

artigo:

Art. 7º. Dissolvida a união estável por rescisão, a assistência material prevista nesta Lei será prestada por um dos conviventes ao que dela necessitar, a título de alimentos.102 Parágrafo Único. Dissolvida a união estável por morte de um dos conviventes, o sobrevivente terá direito real de habitação, enquanto viver ou não constituir nova união ou casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência da família.103

O artigo 7º dispõe sobre os alimentos entre os conviventes, sem cogitar da culpa na

concessão desse direito, estabelece, ainda, o direito real de habitação do imóvel destinado à

residência da família ao convivente supérstite.

O mesmo diploma em seu art. 8º trata da conversão da união estável em casamento: “Os

conviventes poderão, de comum acordo e a qualquer tempo, requerer a conversão da união

estável em casamento, por requerimento ao Oficial do Registro Civil da Circunscrição de seu

domicílio”. 104

Neste sentido Orlando Gomes manifesta-se:

101 MAGALHÃES, Rui Ribeiro de. Direito de Família: no novo Código Civil brasileiro. 2ª ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2003. p. 287. 102 Lei nº 9.278/96. Art. 7º e Parágrafo Único. 103 Lei nº 9.278/96. Art. 7º. 104 Lei nº 9.278/96. Art. 8º.

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É preciso lembrar que a “união estável” tutelada pela Constituição, como “entidade familiar” é aquela que a lei ordinária deverá preparar para a “conversão em casamento” (art.226, § 3º). Dita conversão não será viável, como é natural, se os conviventes, não preencherem “os requisitos fundamentais que se materializam nos impedimentos e dirimentes, tal como previstos no art. 183 do Código Civil...Poder-se-á afastar a necessidade da autoridade celebrante, mas se exigirá a inexistência dos impedimentos decantados...a lei facilitará, mas não suprirá exigências que a lei ordinária já impõe a sua concretização” (Oscarli no Moeller, “A União Federal e seu Suporte Constitucional”, Ver. Da Escola Paulista de Magistratura, nº 2, jan/abril, pp.54/55).105

È de ressaltar-se a importância social do matrimônio e dos efeitos por ele produzidos,

sendo um ato eminentemente formal deve ater-se às prescrições formais que demonstram a

habilitação dos pretendentes.

Em seu art. 9º a Lei nº 9.278/96 expressa claramente a competência do juízo da Vara da

Família para tudo que se relacione à união estável “Toda a matéria relativa à união es tável é de

competência do juízo da Vara da Família, assegurado o segredo de justiça”. 106

Cumpre destacar, ainda, que a Constituição ao caracterizar as uniões estáveis como

entidades familiares tratou de legalizar um fenômeno social e humano, relevante para o direito.

Vindo para disciplinar essa realidade social as Leis nº 8.971/94 e 9.278/96 que definiram os

direitos e deveres dos participantes desse tipo de união. Porém, o fato de coexistirem duas leis

sobre o mesmo tema dificulta sua regulamentação, já que a lei de 96 não revogou integralmente a

anterior, sendo “majoritário o entendimento de que ambas as leis vigoram, naquilo que a Lei nº

8.971/94 não se mostra incompatível com a Lei nº 9.278/96”.107

Por derradeiro, vale salientar que o projeto de Lei 2.686, de 1996, apresentado pelo Sr.

Presidente da República , através da Mensagem 1.477/96, que visa instituir o denominado

Estatuto da União Estável, regulamentando o art. 226, § 3º, da CF/88, expressamente consigna,

em seu artigo 13, a revogação das Leis 8.971/94 e 9.278/96, representando, assim, um avanço

legislativo sobre o tema, em função as questões controvertidas suscitadas pelas leis em vigor.108

Por outro lado, o CC/2002, que estaremos analisando no próximo item, “basicamente

traduziu o atual “espírit o” jurisprudencial sobre uniões estáveis e incorporou elementos da Lei nº

8.971/94 e, principalmente, da Lei nº 9.278/96”.109

105 GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 50. 106 Lei nº 9.278/96. Art. 9º. 107 AMIM, Andréa Rodrigues. Da união estável. p. 431. 108 Cf. CAHALI, Francisco José. Contrato de convivência na união estável. p. 285. 109 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato e união estável. p. 114.

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2.2.2 A união estável e o Código Civil vigente

As Leis nº 8.971/94 e 9.278/96 trataram de delinear os principais contornos referentes a

consolidação da união estável como nova forma de constituição de família. O Código Civil atual

trouxe novas regras para regular essa forma de convivência, sendo que a principal mudança

ocorreu com a inserção no Livro da Família do Título específico sobre união estável.

O CC/2002 reafirmou o conceito de união estável disposto na Lei de 96. Vale citar o

artigo correspondente:

Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. § 1º A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente. § 2º As causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão a caracterização da união estável.110

É de salientar-se a eliminação do prazo de convivência de cinco anos para

caracterização da união estável (Lei nº 8.971/94), cabendo ao julgador os critérios para o

reconhecimento da relação, porém, essa questão não foi totalmente afastada, já que um dos

elementos essenciais é, justamente o da durabilidade da convivência. Outrossim, foi,

basicamente, mantida a redação do artigo 1º da Lei nº 9.278/96, “consagrando critérios

jurisprudenciais utilizados para definição da família estável”. 111

Impende observar, ainda, que a expressão referente aos impedimentos para constituição

da união estável é utilizada da mesma forma que os impedimentos válidos para o casamento, haja

vista a possibilidade da conversão da união estável em casamento. Portanto, só serão

consideradas uniões estáveis aquelas que não possuírem impedimentos matrimoniais. Entretanto,

“a ressalva é feita pelo próprio texto, ao exclui r a incidência do inciso VI em relação às uniões

estáveis, o que permite aos separados - de fato ou judicialmente – serem incluídos nesta classe

familiar”. 112 O que significa que os separados judicialmente são impedidos de casar legalmente,

mas podem constituir uma união estável.

Consoante as causas suspensivas Andréa Rodrigues Amim argumenta:

110 CC/2002. Art. 1.723. 111 AMIM, Andréa Rodrigues. Da união estável. p. 431. 112 AMIM, Andréa Rodrigues. Da união estável. p. 437.

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Ainda que em alguns pontos a união estável receba o mesmo tratamento que a família matrimonial, como, por exemplo, na aplicação dos impedimentos para o casamento, o mesmo não ocorre com as causas suspensivas, indiferentes na caracterização da família estável.113

Ademais, o CC/2002 faz a distinção entre união estável e concubinato no art. 1.727 “as

relações não eventuais entre o homem e a mulher impedidos de casar não são reconhecidas como

união estável, constituindo concubinato” .114

Sobre o tema comenta Rodrigo da Cunha Pereira:

Vê-se que o artigo é bem intencionado e parece que seu intuito foi mesmo o de fazer essa distinção. Entretanto, em vez de usar a palavra “ adulterino” ou outra melhor, acabou utilizado “impedidos de casar”. Tal expressão não traduz o espírito e o sentido desse artigo que quis, exatamente, diferenciar união estável e concubinato.115

Assenta, ainda, o autor:

O concubinato, assim considerado aquele adulterino ou paralelo ao casamento ou a outra união estável, para manter-se a coerência no ordenamento jurídico brasileiro – já que o Estado não pode dar proteção a mais de uma família ao mesmo tempo -, poderá valer-se da teoria das sociedades de fato e, portanto, no campo obrigacional” 116.

Deixa claro, o CC/2002, a diferença entre os termos, ou seja, “o concubinato não -

adulterino é a união estável e o concubinato adulterino continua sendo o concubinato

propriamente dito” 117, não merecendo , o último, a proteção do Estado.

No que se refere as conseqüências pessoais da união estável, o CC/2002, aproveitou a

redação do artigo 2º, da Lei 9.278/96, e reiterou os deveres e obrigações recíprocas entre os

conviventes, conforme dispõe:

Art. 1.724. As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.118

Andréa Rodrigues Amim comenta sobre a inovação da legislação que acresceu,

explicitamente, o dever de lealdade entre os conviventes:

O direito anterior já estabelecia deveres recíprocos, numa similitude com o artigo 231 do Código Civil, excepcionada a coabitação. Mutatis mutandis, os deveres foram mantidos, ressaltando-se a lealdade e o respeito como substitutos da fidelidade conjugal.119

113 AMIM, Andréa Rodrigues. Da união estável. p. 438. 114 CC/2002. Art. 1.727. 115 PEREIRA. Rodrigo da Cunha. Da união estável. p. 264. 116 PEREIRA. Rodrigo da Cunha. Da união estável. p.265. 117 PEREIRA. Rodrigo da Cunha. Da união estável. p. 264. 118 CC/2002. Art. 1.724. 119 AMIM, Andréa Rodrigues. Da união estável. p. 439.

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Cabe destacar, que apesar de análogos, os deveres são tratados de forma diversa na

união estável e no casamento. No primeiro a quebra dos deveres conjugais não importa em

qualquer sanção, dependendo exclusivamente do querer dos companheiros a manutenção ou não

da relação. No segundo a violação dos deveres enseja pedido de separação judicial litigiosa,

conforme artigo 1.572120 do Código atual.121

Sobre o tema Marco Aurélio Viana argumenta:

no âmbito da união estável a infração de qualquer um dos direitos/deveres não a atinge diretamente. O casamento pode ser atacado, mediante ação de separação judicial, mas a união estável não se altera pelo não cumprimento de qualquer um dos direitos/deveres. É permitido dissolver a união sem noção de culpa, pela simples vontade dos conviventes, ou de um deles, com efeitos patrimoniais definidos. Não é preciso sequer declinar a causa que leva um dos conviventes a pedir judicialmente a dissolução.122

O mesmo autor ensina:

Na relação entre os conviventes e a prole os direitos e deveres inerentes ao pátrio poder independem de referência expressa, porque a Lei Maior estatui que, “para efeito da proteção do Estado”, a união estável é considerada entidade familiar. E vimos que nessa expressão está presente um comando no sentido de aplicar-se a essa relação o Direito de Família. Além disso, os filhos gozam de direitos independente de o nascimento se dar dentro ou fora do casamento.123

O CC/2002 trata dos efeitos patrimoniais da união estável, em seu art. 1.725, valendo

transcrever o preceito: “Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica -se

às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens”. 124

Observa-se que esses efeitos patrimoniais se assemelham aos efeitos do casamento,

prevalecendo basicamente a comunhão parcial de bens. Entretanto, nada impede que em contrato

escrito, os companheiros disponham livremente de seus bens. Haja vista este estudo tratar, em

especial, dos efeitos jurídicos patrimoniais da união estável, o tema será oportunamente

abordado, com mais profundidade.

Registre-se, ainda, que no mesmo diploma legal o artigo 1.726125 dispõe: “A união

estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao juiz e assento

120 CC/2002. Art. 1.572. Qualquer dos cônjuges poderá propor a ação judicial, imputando ao outro qualquer ato que importe grave violação dos deveres do casamento e torne insuportável a vida em comum. 121 Cf. AMIM, Andréa Rodrigues. Da união estável. p. 439. 122 VIANA, Marco Aurélio S., Da união estável. p. 32. 123 VIANA, Marco Aurélio S., Da união estável. p. 32. 124 CC/2002. Art. 1.725. 125 CC/2002. Art. 1.726.

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no Registro Civil”, cumprindo norma constitucional (art. 226, § 3º)126, veio facilitar a conversão

em casamento, sem maiores formalidades.127

Entende-se, portanto, que basta aos conviventes endereçar petição ao juiz solicitando a

conversão da união estável em casamento. E por ordem judicial, depois de verificada a

inexistência de impedimentos matrimoniais, seja lavrado assento pelo oficial do Cartório de

Registro Civil de Pessoas Naturais128.

Convém ressaltar, outrossim, o que assevera Rodrigo da Cunha Pereira sobre a

dificuldade de aplicação prática do artigo:

Todos esses textos normativos, desde a Constituição da República até o novo Código Civil brasileiro, não têm muita aplicabilidade prática. Da forma como dispostos, mesmo as resoluções específicas sobre isso não facilitam tal conversão. Estaria facilitando se eliminasse as formalidades e impedimentos para o casamento, o que seria contraditório com a própria natureza do casamento. [...] A regra do novo Código Civil brasileiro, ao determinar que o procedimento da conversão deverá ser judicial e não administrativo , como anunciou a Lei nº 9.278/96, está dificultando o processo, e não facilitando, como prevê a norma constitucional.129

Além do mais, se levarmos em conta a nossa realidade forense, com poucos magistrados

e procedimentos lentos, a nova redação da lei representou retrocesso, com aumento da demanda

judicial, não facilitando, portanto, a sua conversão.130

No que concerne a sucessão, as leis infraconstitucionais nº 8.971/94 e 9.278/96

trataram, a primeira da sucessão entre companheiros e a segunda, em complemento, previu o

direito real de habitação do parceiro sobrevivente, sobre o imóvel destinado à residência da

família. Sendo o direito sucessório dos companheiros definido à imagem e semelhança do direito

sucessório entre os cônjuges.131

O CC/2002 regulamentou a sucessão dos conviventes no art. 1.790, conforme dispõe:

Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes: I – se concorrer com os filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho; II – se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles;

126 CF/88. Art. 226 [...] § 3º Para efeito de proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher, estabelecida com o objetivo de constituição de família. 127 DIREITO, Carlos Alberto Menezes. Da união estável no novo Código Civil. p. 1.284. 128 Cf. MAGALHÃES, Rui Ribeiro de. Direito de família: no novo Código Civil brasileiro. p. 298. 129 PEREIRA. Rodrigo da Cunha. Da união estável. p.268. 130 Cf. AMIM, Andréa Rodrigues. Da união estável. p. 442. 131 Cf. VELOSO, Zeno. Do direito sucessório dos companheiros. In. DIAS, Maria Berenice, PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord.). Direito de Família e o novo Código Civil. 3 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 279.

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III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança; IV – não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.132

Impende observar, que no artigo acima citado, na ausência de pacto entre as partes,

dispondo diferente, a vida dos companheiros será regulada pelo regime da comunhão parcial de

bens.

Saliente-se, que o CC/2002 trouxe significativa alteração quanto a sucessão hereditária,

ou seja, o cônjuge está dentre os herdeiros necessários, ao lado dos ascendentes e

descendentes133. Já os companheiros não estão mais incluídos nesse rol de herdeiros como antes.

Em relação as leis anteriores, foram duas as principais alterações a respeito da sucessão na união

estável: os bens sucessíveis serão apenas os adquiridos onerosamente na vigência da união

estável; a herança será dividida, concorrendo com parentes do falecido.134

Silvio Venosa argumenta “Por esse dispositivo, o consorte concorrerá com outras

classes de herdeiros, até mesmo com colaterais, no tocante aos bens adquiridos onerosamente na

vigência da união estável, o que representa evidente regressão e restrição de direitos com relação

à lei anterior”. 135

Ainda, quanto ao retrocesso da legislação vigente, Silvio Rodrigues comenta:

Após tantos anos de luta e evolução doutrinária e jurisprudencial objetivando resguardar os direitos decorrentes da união estável, alcançados na atual legislação vigente, embora, reconheça-se, bem audaz, certamente essa nova fórmula será objeto de significativa hostilidade as comunidade jurídica e da própria sociedade.136

Os alimentos estão previstos art. 1.694 do CC/2002, onde se observa que os

companheiros podem pedir uns aos outros os alimentos de que necessitam para sua própria

sobrevivência, inclusive para atender as necessidades educacionais. Vale transcrever o preceito:

Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou conviventes, pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação. § 1º Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada. § 2º Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia.137

132 CC/2002. Art. 1.790, I, II, III e IV. 133 CC/2002. Art. 1.845. 134 Cf. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato e união estável. p. 118. 135 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. p. 478. 136 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Direito de Família. p. 311. 137 CC/2002. Art. 1.694.

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Destaca-se neste artigo o cuidado do legislador em garantir a sobrevivência ao

companheiro, além da preocupação com a qualificação através da educação.

Assim, podemos observar que aos poucos foram sendo reconhecidos os efeitos

decorrentes da união estável, surgindo diversos diplomas legais, que foram sendo atualizados de

acordo com as transformações ocorridas na sociedade, trazendo, conseqüentemente efeitos

pessoais, sendo alguns comentados a seguir.

2.3 EFEITOS PESSOAIS DA UNIÃO ESTÁVEL

As relações pessoais entre os companheiros são semelhantes às do casamento, pois

“tudo que se regulamenta sobre união estável tem o casamento como referência 138” mas se

distinguem em alguns aspectos, tendo em vista as peculiaridades de cada instituto.

O casamento impõe aos cônjuges uma série de deveres que estão, basicamente,

enumerados no art. 1.566 do CC/2002: fidelidade recíproca; vida em comum, no domicílio

conjugal; mútua assistência; sustento, guarda e educação dos filhos; respeito e consideração

mútuos139. A violação de qualquer deles é suficiente para a dissolução da sociedade conjugal e a

ruptura do vínculo. No casamento, as normas do Direito de Família, possuem caráter cogente e

indisponíveis, impondo uma certa organização e estrutura jurídica.140

Rainer Czajkowski argumenta sobre os efeitos do casamento:

No âmbito pessoal, extrapatrimonial, os efeitos produzem-se com o ato formal válido do casamento, e dizem respeito, principalmente, à fidelidade, à vida em comum (abrangendo a moradia comum e o débito conjugal), à assistência moral (abrangendo respeito e consideração mútuos), e à guarda e educação dos filhos.141

Por outro lado, podemos dizer, que os efeitos na união estável, ocorrem de forma

distinta, pois “de um casamento informal, ou seja, de uma união está vel, estabelecem-se relações

pessoais e patrimoniais com conseqüentes efeitos jurídicos”. 142

138 PEREIRA. Rodrigo da Cunha. Da união estável. p. 269. 139 CC/2002. Art. 1.566. 140 Cf. CZAJKOWSKI, Rainer. União livre: à luz das Leis 8.971/94 e 9.278/96. p. 107-108. 141 CZAJKOWSKI, Rainer. União livre: à luz das Leis 8.971/94 e 9.278/96. p. 107-108. 142 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato e união estável. p. 48.

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Primeiramente ocorre o fenômeno da união que poderá ou não provocar reflexos

jurídicos. Com a continuidade da relação surge a entidade familiar informal que, quando

comprovada, recebe a proteção do Estado.143

Por outro lado, Rodrigo da Cunha Pereira comenta sobre a liberdade de rompimento

como um fato significativo, porém, não tão simples como se apregoa:

Objetivamente, podemos apontar como principal conseqüência, ou efeito jurídico desse tipo de casamento, a liberdade de rompimento da relação. A união estável pode ser dissolvida livremente, sem qualquer justificação e independente de processo judicial. Se considerarmos meramente o aspecto jurídico, o rompimento de uma relação concubinária talvez seja mais fácil e, conseqüentemente, menos traumático. Mas o que está no cerne dessa relação é a comunhão de afetos, e esta não se rompe sem dor, sem sofrimento. É assim nas relações com selo da oficialidade ou não. Ao contrário do que se apregoa, a separação de um casal que não tenha as regras escritas, ou preestabelecidas, é muito mais difícil de se fazer, uma vez que as relações afetivas acabem se misturando muito mais com os aspectos materiais, financeiros e patrimoniais do que aqueles que têm suas regras definidas através de um casamento civil. 144(grifo nosso)

Outra diferença é a inexistência da presunção de paternidade.145 Rainer Czajkowowski

aduz “objetivamente, na união livre não há presunção de paternidade com a força daqu ela

existente no casamento, porque não há fidelidade imposta como dever jurídico aos

conviventes”. 146

E continua o mesmo autor:

Não que se deva descartar, terminantemente, a possibilidade de presunção de paternidade nas uniões estáveis; mas ela tem que ser analisada com maiores reservas. Há uniões consolidadas por décadas de convivência, na qual houve fidelidade insuspeita entre o homem e a mulher, às vezes com casamento religioso (não civil), conferindo nítida aparência more uxório; enfim, há um conjunto de fatores que evidenciam a paternidade. Esta parece ser a tendência mais apropriada e que já se encontra em alguma doutrina e jurisprudência.147

Na mesma esteira Rodrigo da Cunha Pereira:

Presume-se nos ordenamentos jurídicos ocidentais que os filhos havidos em um casamento civil sejam daquele casal, procedendo-se, no cartório, ao registro do nascido como sendo filho deles. Na união estável, ainda que seja de muitos anos, não se aplica essa regra, pois tal relação, por si mesma, não autoriza presumir a paternidade. [...] O entendimento jurisprudencial brasileiro majoritário tem sido mesmo no sentido de que a união estável, por si só, não é prova, ao contrário do casamento civil, suficiente para a determinação da paternidade.148

143 Cf. CZAJKOWSKI, Rainer. União livre: à luz das Leis 8.971/94 e 9.278/96. p. 109. 144 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato e união estável. p. 48. 145 Cf. GOMES, Orlando. Direito de Família.p. 48. 146 CZAJKOWSKI, Rainer. União livre: à luz das Leis 8.971/94 e 9.278/96. p.112. 147 CZAJKOWSKI, Rainer. União livre: à luz das Leis 8.971/94 e 9.278/96. p.113. 148 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato e união estável. p. 50-51.

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Além disso, podemos destacar outro efeito pessoal da união estável, que é a

possibilidade do uso, pela mulher, do sobrenome do companheiro, prevista no artigo 57, § 2º, da

Lei 6.015, de 31.12.1973, que dispõe sobre os Registros Públicos.149Valendo transcrever o artigo:

Art. 57. § 2º. A mulher solteira, desquitada ou viúva, que viva com homem solteiro, desquitado ou viúvo, excepcionalmente e havendo motivo ponderável, poderá requerer ao juiz competente que, no registro de nascimento, seja averbado o patronímico de seu companheiro, sem prejuízo dos apelidos próprios, de família, desde que haja impedimento legal para o casamento, decorrente do estado civil de qualquer das partes ou de ambos.150(grifo nosso)

Rodrigo da Cunha Pereira aduz:

Acrescente-se a isto que, a exemplo das leis previdenciárias e do disposto na Lei 8.971/94, o prazo em que se caracterizará a união como estável é de cinco anos (art. 57, § 3º da Lei 6.015/77); deverá também, haver a concordância do companheiro para que proceda a tal mudança e não deve ter cônjuge ou ex-cônjuge com o seu sobrenome (§ 4º). Da mesma forma, poderá ser cancelada a mudança, a requerimento de uma das partes, ouvida a outra. O procedimento para o aditamento ou cancelamento deverá ser feito judicialmente e sempre em segredo de Justiça, como são todos os processos decorrentes do Direito de Família.151

Note-se que, para algumas mulheres esta formalidade não tem maior significado,

enquanto para outras este aspecto assume significativo valor. Silvio Rodrigues argumenta:

É inafastável o constrangimento que sente nos atos oficiais, pois seus documentos são tirados em seu próprio nome, inclusive o seu passaporte, de modo que em viagens, hotéis, escrituras etc. aparece sempre com sobrenome diverso daquele que seu companheiro de vida comum ostenta.152

Complementa o mesmo autor:

Uma sábia jurisprudência, entretanto, foi aos poucos e com alguma timidez, de início, acolhendo a pretensão da mulher, que vivia em longo concubinato, de acrescentar ao seu nome o apelido de seu companheiro, principalmente na hipótese de haver filhos comuns.153

149 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p. 150. 150 Lei nº 6.015/73. Art. 57. § 2º. 151 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p. 151. 152 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Direito de Família. p. 296. 153 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Direito de Família. p. 296-297.

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Cabe destacar que havia maior interesse sobre o tema antes da promulgação da Lei do

Divórcio (Lei nº 6.515/77), porém, a matéria ainda apresenta interesse prático, no caso de existir

algum impedimento legal para o casamento dos concubinos.154

Por outro lado, Rainer Czajkowski argumenta:

Hoje em dia, porém, o dispositivo revela um flagrante anacronismo. As uniões livres subsistem e proliferam em nossa sociedade não porque as partes precisam, mas porque querem fazer assim; e a emancipação feminina, a igualdade jurídica da mulher e do homem, tornou ultrapassada a necessidade dela adotar o nome de família dele para fazer-se respeitada perante o meio social. [...] É cada vez mais difícil imaginar uma razão excepcional, um motivo ponderável para uma concessão desta ordem. Talvez uma carreira profissional associada ao nome do(a) companheiro (a), onde a aplicação do permissivo legal teria o condão de evitar prejuízos comerciais, ou de regularizar relações societárias. De qualquer forma, a evolução dos costumes e o advento do divórcio fizeram perder, em muito, o sentido e o alcance deste artigo.155

Portanto, as disposições relativas à união estável inseridas na Lei nº 9.278/96 e no

CC/2002 alteraram, automaticamente, o prazo de cinco anos, devendo apenas ser levada em

consideração a estabilidade da relação.156

Com efeito, por interpretação analógica157 à regra do artigo 57 da Lei 6.015/77, deve-se

levar em consideração, também, o que dispõe o artigo 1.565, § 1º do CC/2002, ou seja, qualquer

dos cônjuges pode adotar o patronímico do outro, devendo ser estendida , portanto, também aos

companheiros.158

Entretanto, essa matéria foi esquecida pela legislação posterior e também pelo vigente

Código Civil, restando, pois, à doutrina e a jurisprudência a solução da questão.159

Visto de forma sucinta os principais elementos caracterizadores da união estável e a

evolução da legislação até as inovações do CC/2002, bem como alguns efeitos jurídicos pessoais

resultantes dessa relação, constata-se que os conviventes, com o passar do tempo, conquistaram

inúmeros direitos, pessoais e patrimoniais. Resta analisar com maior tenacidade os efeitos

jurídicos patrimoniais dessa união, principalmente no que diz respeito a comunhão parcial de

154 Cf. RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Direito de Família. p. 298. 155 CZAJKOWSKI, Rainer. União livre: à luz das Leis 8.971/94 e 9.278/96. p. 121-122 156 Cf. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p. 150. 157 LICC. Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito. (grifo nosso) 158 Cf. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p. 151. 159 Cf. RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Direito de Família. p. 298.

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bens e a celebração do contrato escrito como proteção patrimonial dos companheiros, tendo em

vista ser este o tema principal deste estudo.

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3 EFEITOS JURÍCOS PATRIMONIAIS DA UNIÃO ESTÁVEL

Como já se comentou, os efeitos patrimoniais da união estável se assemelham aos

efeitos do matrimônio. No casamento os cônjuges escolhem quais as regras patrimoniais serão

adotadas, com base no regime de bens escolhido, passando estas a vigorar após o ato solene da

celebração.160 Na união estável, a princípio, não ocorre nenhuma alteração patrimonial, podendo

cada parceiro administrar livremente seu patrimônio. Os reflexos vão surgir em decorrência da

estabilidade da relação, quando surge a família informal, alterando-se, aí, as relações econômicas

entre os parceiros. Convém ressaltar, porém, que antes da relação ser caracterizada como estável

podem ocorrer efeitos patrimoniais, quando ambos adquirem bens na constância da união, neste

caso é tratado como direito obrigacional.161

Como se depreende, foi a doutrina e a jurisprudência que se encarregaram de

estabelecer os efeitos jurídicos patrimoniais da união estável. Na esteira dessa evolução surgiram

as Leis nº 8.971/94 e a nº 9.278/96 reforçada no CC/2002 que consolida o regime de comunhão

parcial de bens às relações patrimoniais entre os companheiros ou conviventes, salvo contrato

escrito em contrário.162

Portanto, se comprovada a união estável, os bens adquiridos na constância da relação, a

título oneroso, pertencem a ambos os conviventes, que passam a partilhar todo o patrimônio,

como se casados fossem, nos moldes do art.1.658163 e seguintes do CC/2002. Porém, esse

dispositivo só será aplicado se em contrato escrito, não tiver sido estipulada licitamente forma

diversa.164

160 Cf. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato e união estável. p. 270. 161 CZAJKOWSKI, Rainer. União livre: à luz das Leis 8.971/94 e 9.278/96. p. 128-129. 162 Cf. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato e união estável. p. 116. 163 CC/2002. Art. 1.658. No regime de comunhão parcial de bens, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com exceções os artigos seguintes. Art. 1.659. Excluem-se da comunhão: I – os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar; II – os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares; [...] Art. 1.660. Entram na comunhão: I – os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges; II – os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior; III – os bens adquiridos por dação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges; [...] 164 Cf. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p.152.

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Outrossim, em face do tema gerar grande confusão, foi necessário que “os tribunais

começassem a expressar um entendimento, lançando aí, as bases para o desenvolvimento da

teoria do enriquecimento ilícito da sociedade de fato, e o reconhecimento da contribuição direta e

indireta”. 165

A caracterização do patrimônio comum, especialmente nas relações decorrentes da

união estável, foi, durante muito tempo, de difícil alcance. No início, na Lei nº 8.971/94 à mulher

competia provar a existência da união de fato e provar o esforço comum para a aquisição dos

bens, o que nem sempre era possível.

Bem define tal fase o professor Rainer Czajkowowski:

No Brasil, com o advento da República e a conseqüente separação entre a Igreja e o Estado, o casamento passou a ser um ato de natureza civil, deixando de ser um ato meramente religioso. Constatou-se, todavia, com o passar dos anos que, por força da tradição ou por ignorância, muitos casais compareciam apenas à cerimônia religiosa do seu casamento, sem regularizar o matrimônio no registro civil. Perante a lei, assim, eram concubinos. Essas pessoas passavam o restante de suas vidas, ou grande parte dela, acreditando-se casadas. Constituíam família e, às vezes amealhavam significativo patrimônio que, via de regra, ficava só em nome do varão. O mesmo acontecia, antes do advento da Lei do Divórcio, com casais em que um deles, ou ambos, era “desquitado”. Não havendo possibilidade de casar novamente, iniciavam uma longa e duradoura convivência. O patrimônio, construído com o esforço de ambos, ficava só em nome do varão. Nestes casos, assim como em qualquer outro onde o homem e a mulher simplesmente optavam por uma união informal, surgia um mesmo problema: rompida a união, por desentendimento ou pela morte do varão, a mulher ficava em situação econômica extremamente difícil. O patrimônio que tinha ajudado a formar, às vezes no decorrer de toda uma vida, permanecia só com seu ex-companheiro, ou com os herdeiros dele. Herdeiros estes nem sempre filhos comuns, e nem sempre compreensivos com a companheira sobrevivente do falecido.166

Assim, objetivando contornar o enriquecimento sem causa em detrimento da mulher, a

jurisprudência desenvolveu o instituto da sociedade de fato entre concubinos, ficando consagrada

a Súmula 380/STF167, tendo como referência a expressão “esforço comum”. Regida pelas regra s

do Direito Obrigacional, na sociedade de fato, para ambos terem direito a algum bem, era

necessário provar o esforço comum, ou seja, que ambos haviam dado sua contribuição

econômico-financeira.168 Com o passar do tempo os tribunais passaram a reconhecer “q ue a

165 PEREIRA. Rodrigo da Cunha. Da união estável.. p. 271. 166 CZAJKOWSKI, Rainer. União livre: à luz das Leis 8.971/94 e 9.278/96. p. 129. 167 Cf.CZAJKOWSKI, Rainer. União livre: à luz das Leis 8.971/94 e 9.278/96. p. 140. 168 Cf. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p. 153.

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contribuição indireta era o suporte doméstico e emocional dado por uma das partes, à outra que

saía para trabalhar e dava sua contribuição direta para a aquisição patrimonial”. 169

Na lição do jurista Rodrigo da Cunha Pereira, até a promulgação da CF/88 e das Leis

8.971/94 e 9.278/96, o esteio do direito concubinário-patrimonial foram as Súmulas do Superior

Tribunal Federal, conforme segue:

Súmula 35 – Em caso de acidente de trabalho ou de transporte, a concubina tem direito de se indenizada pela morte do amásio, se entre eles não havia impedimento para o matrimônio. Súmula 380 – Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum. Súmula 382 – A vida em comum sob o mesmo teto, more uxório, não é indispensável à caracterização do concubinato.170

Observa-se que foi longa a trajetória até a previsão de regime de bens para os

companheiros, tendo início com o reconhecimento jurisprudencial da união estável como

sociedade de fato, à margem do direito de família e que admitia efeitos patrimoniais, desde que

houvesse prova do esforço comum para a aquisição de bens, cujo ponto alto foi a Súmula 380.171

Sobre o avanço ocorrido a partir da CF/88, Rodrigo da Cunha Pereira aduz:

A grande mudança no direito concubinário se deu a partir de 1988 com a Constituição da República, autorizando definitivamente que questões relativas a essa forma de constituição de família fossem tratadas no campo do Direito de Família e não mais no campo do Direito Obrigacional. Essa não é apenas uma simples mudança didática na organização jurídica. Reveste-se de grande importância porque instala um outro marco teórico, mudando o ângulo de visão e o raciocínio da atribuição e distribuição de direitos decorrentes da união estável. Com isso, a concepção sobre contribuição indireta ganha mais força. Em última análise, significa uma revalorização do trabalho doméstico, atribuindo-lhe um conteúdo econômico.172(grifo nosso)

Na esteira desta evolução surge a Lei 9.278/96, que em seu art. 5º173 admitia que o

esforço comum passasse a ser presumido, não sendo mais necessária a comprovação do mesmo,

como até então era exigido.174

169 PEREIRA. Rodrigo da Cunha. Da união estável. p. 271. 170 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p. 154. 171 Cf. DIREITO, Carlos Alberto Menezes. Da união estável no novo Código Civil. p. 1.271. 172 PEREIRA. Rodrigo da Cunha. Da união estável. p. 272. 173 Lei 9.278/96. Art. 5º. 174 Cf. PEREIRA. Rodrigo da Cunha. Da união estável. p.272.

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Mister se faz ressaltar a semelhança dos artigos 1.725 do CC/2002 e o artigo 5º da Lei

9.278/96, porém não iguais. A distinção que o Código vigente trouxe foi a de eliminar de sua

redação a expressão presunção, e ao conceder aos companheiros um regime legal de bens, tornou

as regras patrimoniais dos institutos da união estável e do casamento mais semelhantes.175

Sobre o tema em tela comenta Andréa Rodrigues Amim:

A partir da entrada em vigor da nova lei, não mais se admitirá a prova de que não houve contribuição da companheira(o) na formação do patrimônio constituído durante a constância da união estável. O único ônus será a comprovação da existência da união, seu termo inicial e o patrimônio efetivamente adquirido durante este período. Feita tal prova e dissolvida a união cada companheiro terá direito à meação.176

No mesmo sentido se posiciona Rodrigo da Cunha Pereira:

O Código Civil inova, ao dispor sobre a desnecessidade de prova do esforço comum na aquisição destes bens, e dificultou a demonstração da presunção prevista no art. 5º da Lei 9.278/96. Na ausência de pacto entre as partes, dispondo de forma diferente, a vida dos companheiros será regulada pelo regime da comunhão parcial de bens. Essa disposição traz grandes mudanças para a ordem jurídica, uma vez que dificultou a aferição do critério da proporcionalidade na contribuição, direta ou indireta. A regra geral será, então, ser suficiente a caracterização da união estável, para o partilhamento dos bens, sendo este regime mais abrangente e amplo do que o estabelecido pela Lei 9.278/96.177

Pela dimensão que assumiu a união estável e o crescente amparo que vem recebendo da

lei e do poder jurisdicional, a família natural, muitas são as repercussões patrimoniais que dela

advém. O regime de comunhão parcial adotado expressamente pelo CC/2002 veio consolidar o

que a doutrina e a jurisprudência já vinham estabelecendo com relação aos bens dos

companheiros, protegidos constitucionalmente como entidade familiar.

3.1 O REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS

Com relação a questão patrimonial o CC/2002 em seu art. 1.725 dispôs expressamente:

“ Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações

patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.178

175 Cf. PEREIRA. Rodrigo da Cunha. Da união estável. p. 273. 176 AMIM, Andréa Rodrigues. Da união estável. p. 440. 177 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p. 170-171. 178 CC/2002. Art. 1.725.

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Pela interpretação do artigo citado, é cediço que os companheiros possuem duas formas

de regular suas relações patrimoniais: a primeira por contrato escrito estipulado entre os

companheiros, podendo ao livre arbítrio, amparado por lei, regular os bens pertencentes a um ou

a ambos, ou, na inexistência de um pacto contratual, aplica-se, no que couber, o regime da

comunhão parcial de bens.

Silvio Rodrigues aduz sobre o tema:

Regime de comunhão parcial é aquele em que, basicamente, se excluem da comunhão os bens que os cônjuges possuem ao casar ou que venham a adquirir por causa anterior e alheia ao casamento, como as doações e sucessões; e em que entram na comunhão os bens adquiridos posteriormente.179

Ressalte-se que para a união estável serão utilizadas as normas do regime de comunhão

parcial de bens do casamento (artigos 1.658 a 1.666 do CC/2002), haja vista não ter o legislador

especificado na lei outra forma de aplicação, o que garante aos companheiros a mesma segurança

legal direcionada aos cônjuges, na hipótese de não escolherem através do pacto antenupcial um

regime de bens específico. Podendo ser aproveitada a vasta jurisprudência já existente sobre o

regime da comunhão parcial de bens.

Em razão disso, os companheiros podem adotar qualquer outro regime, desde que o

façam por contrato escrito. A lei não impôs restrição alguma quanto a adoção do regime de bens,

deixando a critério dos conviventes a disposição de seus bens, da forma que melhor lhes

aprouver.

3.3 O CONTRATO ESCRITO

O CC/2002 estabeleceu, para os companheiros em união estável, a aplicação de normas

do regime de comunhão parcial de bens180, caso não tenham pactuado de forma diversa, em

contrato escrito, a destinação de seus bens. A finalidade é evitar demandas e estabelecer os

termos de participação e administração do patrimônio que vierem a adquirir na constância da

179 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Direito de Família. p. 206. 180 CC/2002. Art. 1.725.

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união. Francisco José Cahali conceitua contrato de convivência como “o instrumento pelo qual os

sujeitos de uma união estável promovem regulamentações quanto aos reflexos da relação”. 181

Portanto, manteve-se a previsão contida no art. 5º, caput e § 2º, da Lei nº 9.271/96, ou

seja, os bens adquiridos, a título oneroso pertencem a ambos os conviventes, em partes iguais,

não necessitando mais a prova da contribuição da companheira(o) na formação do patrimônio

constituído na constância da união, restando, porém, o ônus de comprovar a existência da união e

o patrimônio real adquirido no período. Além disso, somente um contrato escrito poderia

modificar a determinação da lei sobre a disposição e administração dos bens amealhados durante

a relação.182

Entretanto, a lei só permite a possibilidade de contrato escrito entre as partes, quando se

tratar dos efeitos patrimoniais da relação, outras questões ligadas às condições pessoais ou

duração do relacionamento, ou mesmo os direitos e deves inerentes a união, para qualquer das

partes, não irão produzir quaisquer efeitos jurídicos, por falta de suporte legal, pois as normas de

Direito de Família tem natureza coercitiva, privilegiando o bem estar social e da família como um

todo, em detrimento dos interesses particulares da cada membro familiar de modo individual.

Ensina o jurista Silvio Venosa:

O contrato de conveniência não tem de per si o condão de criar ou reconhecer a união estável. O fato dessa união nunca dependerá da existência desse contrato. Pode ser firmado antes e durante a convivência, bem como pode ser alterado no curso da união entre os companheiros, aspecto que fá-lo diferir grandemente dos princípios do pacto antenupcial. Esse contrato representa o instrumento pelo qual os sujeitos dessa relação regulamentam sua situação de fato. Nada impede, também, que seja concluído pelos interessados para atingir situações pretéritas, como definir a propriedade de um bem adquirido anteriormente pelo casal. Não tendo também o mais recente Código modificado a exigência da lei anterior, permite-se que seja formalizado por instrumento particular ou por escritura pública. Tal como nos pactos antenupciais, são ineficazes disposições que não se atenham exclusivamente à disciplina dos bens.183(grifo nosso)

No mesmo sentido, Cláudia Grieco Tabosa Pessoa argumenta:

Por sua vez, também não é correto dizer que o contrato servirá para criar a união estável, fato jurídico que se forma com o decurso do tempo e o perfazimento dos elementos que a caracterizam, nos moldes do art. 1º da Lei 9.278/96; servirá a avença, todavia, como meio de prova que permitirá estabelecer um marco temporal a partir do qual se presume o início da união estável.184

181 CAHALI, Francisco José. Contrato de convivência na união estável. p. 55. 182 Cf. AMIM, Andréa Rodrigues. Da união estável. p. 440. 183 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. p. 211. 184 PESSOA, Cláudia Grieco Tabosa. Efeitos patrimoniais do concubinato.São Paulo: Saraiva, 1997, p.118-119. Apud PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p. 175.

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Observa-se, que o contrato de conveniência não produz todos os efeitos do casamento,

mesmo que registrado em cartório, sendo válido apenas no que se refere aos aspectos legais

envolvendo patrimônio, ou seja, quanto a constituição e administração dos bens amealhados na

constância da relação. Por outro lado, poderá ser utilizado como prova de existência da união e

do tempo de convivência, já que na prática nem sempre é fácil comprovar.

Euclides de Oliveira trouxe importante contribuição ao conceito e finalidade do

instrumento:

Em suma, a formalização da vida em comum dos companheiros ou conviventes mediante contrato escrito, ainda que não essencial e com as restrições apontadas, mostra-se recomendável e útil para sinalizar as regras do tempo de vida em comum, especialmente na esfera da formação do patrimônio e sua administração. O instrumento escrito, tanto no início como no término da convivência certamente prevenirá muitos litígios, permitindo o acertamento amigável das relevantes questões resultantes dos efeitos jurídicos da entidade familiar oriunda da união estável.185

Consoante a forma para o contrato, a lei apenas determinou que este instrumento

deve ser escrito, não ficando estabelecida nenhuma formalidade para sua validade, desde que

expresse a manifestação de vontade de ambos os companheiros.186Rainer Czajkowski coaduna

com esta idéia, para ele “a lei exi ge forma escrita, só. Não exige instrumento público, nem

registro, nem testemunha, embora sejam elementos que reforçam o valor probatório do

documento”. 187

Ainda sobre o tema Andréa Rodrigues Amim argumenta “não sendo estabelecida a

forma para o contrato, este seguirá a regra da liberdade de forma, podendo ser celebrado por

escritura pública ou particular”. 188

Na mesma esteira de pensamento, Débora Gozzo:

O contrato entre os conviventes há de ser celebrado por escrito. Trata-se, no fundo, de um requisito de validade desse ato jurídico, pois a lei prevê a forma sob o qual deve ser celebrado. De qualquer modo, a lei é omissa quanto à necessidade de o documento ser público ou particular. No silêncio da lei, nada impede os conviventes de estipularem, quanto aos bens, em escrito particular. Imprescindível para ser válido é que seja escrito.

185 OLIVEIRA, Euclides Benedito. União estável. Comentários às Leis nº 8.971/94 e 9.278/96. Direitos e Ações dos companheiros. 5ª ed., São Paulo: Paloma. Curso Prof. Damásio de Jesus, 2000. p. 60. Apud PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p.172. 186 Cf. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p. 173. 187 CZAJKOWSKI, Rainer. União livre: à luz das Leis 8.971/94 e 9.278/96. p. 143. 188 AMIM, Andréa Rodrigues. Da união estável. p. 440.

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A alteração da cota ‘condominial’, portanto, não poderá ser feita oralmente por depender de forma prescrita em lei.189

Rui Ribeiro de Magalhães se posiciona de forma diversa quanto a necessidade do

registro:

A lei não estabelece forma solene para esse contrato, de modo que tanto poderá ser celebrado por instrumento particular quanto público. A bem da verdade, em ambos os casos há contrato, isso porque a convergência de vontades para um determinado fim não deixa de ser um contrato, ainda que verbalmente estabelecido. A distinção que se faz é para indicar que num caso o contrato é verbal e no outro é escrito. Se a opção dos conviventes for pelo instrumento particular é de bom alvitre cercá-lo de todas as garantias para que no futuro, se for necessário utilizá-lo como prova, não haja dúvidas sobre sua autenticidade e, principalmente, sobre o seu teor enunciativo, observando-se a respeito o que dispõe o art. 221 do Código Civil. Assim, é necessário o reconhecimento das firmas dos signatários, a presença de duas testemunhas e o subseqüente registro no cartório de Registro de Imóveis do domicílio dos conviventes, para que possa valer contra terceiros, a teor do art. 167, inciso I, n. 12, da Lei 6.015/1973, já que por analogia esse contrato se equipara à convenção antenupcial.190

Nota-se, portanto, que esse instrumento quer seja público, quer seja privado não é

indispensável para constituir a união estável, mas poderá servir como prova da união e também

para evitar conflitos relacionados aos bens ou ao patrimônio dos conviventes.

Também se impõe destacar à possibilidade dos companheiros modificarem os termos

desse contrato. Nesse sentido Rodrigo da Cunha Pereira argumenta:

Diante das novas regras sobre regime de bens, que adotou a mutabilidade como um de seus princípios, não há mais dúvida de que ele pode ser modificado. E, mesmo antes da revogação do princípio da imutabilidade do regime de bens no casamento, era possível essa alteração no contrato de convivência. Essa era uma das diferenças saudáveis entre casamento e união estável. [...]Não há nada que obste à mudança do pacto na constância da conjugalidade, vez que a lei não impõe quaisquer vedações neste sentido. Tal entendimento, repita-se, é reforçado pelo art. 1.639, § 2º do Código Civil 191 que permite a mutabilidade do regime de bens na constância do casamento, mediante apresentação perante a autoridade judicial de pedido motivado assinado por ambos os cônjuges.192

-

Portanto, na união estável o contrato poderá ser modificado, haja vista a lei não impor

quaisquer vedações neste sentido. Outrossim, era majoritário o entendimento dos doutrinadores

189 GOZZO, Débora. O patrimônio dos conviventes na união estável. Apud. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p. 178-179. 190 MAGALHÃES. Rui Ribeiro de. Direito de Família: no novo Código Civil brasileiro. p. 292. 191 CC/2002. Art. 1.639. [...] § 2º É admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direito de terceiro. 192 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p.176.

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quanto à possibilidade de modificação do contrato patrimonial de convivência, ainda na vigência

do código anterior.193

Além disso, na constância da união, o contrato de convivência poderá ser revogado,

desde que por vontade expressa de ambos os companheiros.194 Francisco José Cahali comenta:

Mas, por ato bilateral, de comum acordo entre os companheiros, pode ser revogado o contrato de convivência. Excepcionalmente, a alteração poderá ser por ato unilateral, quando promovida a expressa renúncia de um convivente a um direito patrimonial reconhecido em anterior contrato. Assim, por exemplo, se pactua a participação desigual entre os conviventes, um deles, desde que em benefício do outro, ou, sob outra ótica, em detrimento de uma vantagem prevista na versão original do contrato, pode renunciar ao direito que lhe era garantido, ensejando, embora indiretamente, a modificação do pacto.195

Ademais, o contrato poderá abranger a totalidade dos bens, ou somente parte deles.

Quando total o pacto ou a sua modificação abrange o universo patrimonial das partes, presente, passado (pretérito à celebração) e futuro, regulamentando, o destino de todos os bens, sem exceção.[...] Mas nada impede venha a ser regulamentada apenas parte das relações patrimoniais envolvendo os conviventes, hipótese em que o pacto será parcial, prevalecendo, quanto ao não convencionado, à incidência das disposições legais pertinentes.196

No entender de Guilherme Calmon os companheiros podem determinar regras somente

sobre os bens adquiridos na constância da união, a título oneroso. Os bens particulares devem ser

transacionados através de instrumento próprio, ou seja, pelo instituto da doação ou através da

morte de um dos conviventes através da sucessão197:

A disponibilidade entre os companheiros, em matéria de regime de bens, somente abrange os bens adquiridos onerosamente durante a união, estando afastados os bens adquiridos anteriormente no curso do companheirismo, a título gratuito ou por ato eventual. 198

193 Cf. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p. 176. 194 Cf. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p. 177. 195 CAHALI, Francisco José. Contrato de convivência na união estável. p. 89. 196CAHALI, Francisco José. Contrato de convivência na união estável. p. 93-94. 197 Cf. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p.179. 198GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. O companheirismo: uma espécie de família. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. p. 342. Apud PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p.179.

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A principal finalidade do contrato de convivência, para quem vive em união estável, é

dispor de regras diferentes das constantes no regime de comunhão parcial de bens, diante das

disposições do art. 1.725, criando normas próprias às relações patrimoniais e econômicas dos

companheiros.199

Destaca-se, ainda, que sendo o contrato um acordo de vontades, para que tenha validade

é necessário que estejam presentes os requisitos essenciais para sua validade descritos no art. 104

do CC/2002: o agente tem que ser capaz, o objeto lícito e a forma tem que estar prescrita ou não

defesa em lei, sob pena de ser ato jurídico nulo.

No entanto, não é uma prática muito comum a utilização dos contratos de conveniência

entre companheiros, pois em muitos casos, essa relação não foi planejada, ou as partes optaram

por uma união não formalizada. Ademais, é difícil e constrangedor discutir regras patrimoniais da

relação, não só na união estável como no próprio casamento, o que pode, mais tarde interferir

negativamente na relação.200

Impende observar, também, que várias são as denominações dadas ao contrato, Rodrigo

da Cunha Pereira chamou-o de pacto anteconcubinário, porém, outras nomenclaturas, também

têm sido largamente utilizadas, tais como pacto de convivência, contrato de convivência e

convenção concubinária.201

199 Cf. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p.179. 200 Cf. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato e união estável. p. 36-37. 201 Cf. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Comentários ao novo Código Civil: da união estável, da tutela e da curatela. p.173.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Constituição Federal de 1988 tornou-se um marco para a família brasileira ao

reconhecer em seu artigo 226 novas forma de família além do casamento, ou seja, a união estável

e a família composta por qualquer um dos pais e seus descendentes, devendo, portanto, serem

amparados, uma vez que institucionalizadas pelo Estado.

É inegável que as constantes transformações sociais modificaram o conceito de família.

Antes era considerada família legítima apenas àquela constituída pelo casamento civil. A partir

do texto constitucional não se pode mais chamar de ilegítima a família formada sem este vínculo

matrimonial, pois esta nova forma de família passou a contar com a proteção legal.

Por muito tempo a sociedade ofereceu um tratamento discriminatório para todo e

qualquer relacionamento entre um homem e uma mulher, que não estivesse revestido pelo caráter

matrimonial. Este relacionamento era, erroneamente, denominado concubinato, não importando

ser esta união duradoura ou eventual. Os dispositivos legais que surgiram posteriormente, mais

especificamente, as Leis nº 8.971/94 e 9.278/96 vieram para regulamentar a união estável. Em

ambas foram estabelecidos elementos caracterizadores dessa união, bem como concedidos

direitos anteriormente exclusivos dos cônjuges.

Mas foi o Código Civil de 2002 que expressou, de forma mais clara, a distinção entre

concubinato e união estável. O primeiro, que não recebe a proteção legal, refere-se as relações

não eventuais entre o homem e a mulher, que se encontram impedidos de casar, excluindo-se os

casos em que estejam separados de fato ou judicialmente. Já a união estável, ocorre nos casos

existentes entre pessoas que convivem de forma pública, contínua e duradoura, com o objetivo

precípuo de constituir família. Portanto, não podem mais ser confundidos, nem utilizados como

sinônimos.

A união estável conseguiu, assim, seu reconhecimento como entidade familiar dentro da

sociedade brasileira, prevendo a lei a facilitação da transformação ou legalização para o

casamento. Entretanto, sua aplicabilidade prática não condiz com a norma constitucional prevista,

haja vista nossa realidade forense.

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Além disso, constata-se que aos poucos, os conviventes conquistaram inúmeros direitos

pessoais e patrimoniais, entre eles o direito a alimentos, a sucessão, entre outros. Essas conquistas

se deram pelas constantes alterações na sociedade, que acabou por reconhecer essas relações não

convencionais. Sendo perceptível o avanço da legislação, apesar dos problemas e adequações que

se fazem necessários.

A união estável encontra-se ombreada ao casamento em termos de importância jurídica

e social. Portanto, o fato do legislador ter adotado os princípios da comunhão parcial de bens

tornou as regras patrimoniais dos institutos união estável e casamento ainda mais semelhantes, já

que por determinação legal serão aplicados os mesmos preceitos dos cônjuges, pois o legislador

não especificou outra forma de aplicação.

O regime da comunhão parcial de bens veio consolidar o que a doutrina e a

jurisprudência já vinham estabelecendo, isto é, pertencem a ambos os companheiros os bens

adquiridos a título oneroso na constância da união, exceto os subrogados no lugar dos

preexistentes, salvo contrato escrito.

Ademais os companheiros podem adotar qualquer outro regime, desde que o façam por

contrato escrito, deixando ao critério dos conviventes a disposição de seus bens. Cabe destacar,

entretanto, que a lei só permite a possibilidade de contrato escrito entre as parte quando se tratar

dos bens dos companheiros, não produzindo qualquer efeito jurídico questões ligadas as

condições pessoais do relacionamento.

Entende-se que apesar do Código Civil de 2002 ter trazido grande benefício para os

conviventes da união estável, ao mesmo tempo deixa inúmeras lacunas, requerendo intenso

trabalho interpretativo e jurisprudencial.

Aguarda-se, ainda, o resultado do Projeto de Lei nº 2.686/96 que trata do Estatuto da

União Estável. Porém, segundo Francisco José Cahali há reduzida expectativa de aprovação, não

só pelo desinteresse do Congresso Nacional com a questão, como também, em função da

aprovação do CC/2002, que regulou de forma diversa da proposta pela Comissão202. Mas, que

202 Em seu livro “Contrato de Convivência” Francisco José Cahali comenta “Quando o projeto originário da Lei nº 9.278/96 foi submetido a sanção, já se ressaltou ter sido reduzido o âmbito de sua regulamentação, deixando de revogar a Lei nº 8.971/94, criando, entre outras, também esta problemática decorrente da necessidade de conciliação dos dois diplomas. Assim, na própria justificativa aos vetos apresentados, o Presidente da República fez o seguinte registro: “tendo em vista o entendimento pleno do disposto no art. 226, parágrafo terceiro, da Constituição, deverá o Executivo oferecer, dentro de 90 dias, a sua contribuição ao aprimoramento da lei ora sancionada.”

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traria benefícios não só para o mundo jurídico como também para toda a sociedade, pois

revogaria as Leis nº 8.971/94 e 9.278/96 e resolveria problemas apresentados no Código Civil

atual, representando um grande avanço legislativo sobre o tema.203

Nasceu daí a Comissão de Juristas designada para a elaboração de diploma regulamentando de forma ampla a união estável, superando as falhas e impropriedades técnicas verificadas nas duas recentes leis editadas sobrea matéria.” (CAHALI, Francisco José. Contrato de convivência na união estável. p. 285) (grifo nosso) [...] “A Comissão foi composta, de acordo com a ordem de nomeação, pelos Ministros do Superior Tribunal de Justiça, WALDEMAR ZVEITER (Presidente) e CARLOS ALBERTO DIREITO, pelo Professor ARNOLDO WALD, Catedrático de Direito Civil da Universidade Estadual do Rio de Janeiro – UERJ (Coordenador e Relator), pelo Presidente do Instituto dos Advogados Brasileiro, Dr. HERMANN ASSIS BAETA, pelo Consultor Jurídico do Ministério da Justiça, Dr. OTTOMAR ZILLES, pela Advogada, Dra. FLORIZA VERUCCI, pela representante do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, Dra. ROSISKA DARCY DE OLIVEIRA, pela Juíza do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, Dra. ANNA MARIA PIMENTEL, e pela Professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, JUDITH HOFMEISTER MARTINS-COSTA.” (CAHALI, Francisco José. Contrato de convivência na união estável. p. 285) (grifo nosso) 203 Cf. CAHALI, Francisco José. Contrato de convivência na união estável. p. 286-287.

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ANEXOS

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A. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§ 1º - O casamento é civil e gratuita a celebração.

§ 2º - O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.

§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a

mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

§ 4º - Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos

pais e seus descendentes.

§ 5º - Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo

homem e pela mulher.

§ 6º - O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial

por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de

dois anos.

§ 7º - Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável,

o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos

educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por

parte de instituições oficiais ou privadas.

§ 8º - O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram,

criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.

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B. SÚMULAS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

SÚMULA Nº 35

Em caso de acidente do trabalho ou de transporte, a concubina tem direito de ser indenizada

pela morte do amasio, se entre eles não havia impedimento para o matrimonio.

SÚMULA Nº 380

Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, e cabível a sua

dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum.

SÚMULA Nº 382

A vida em comum sob o mesmo teto "more uxório", não e indispensável a caracterização do

concubinato.

C. LEI DE INTRODUÇÃO AO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO (LICC –

DECRETO-LEI, DE 4/09/1942)

Art. 4o Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os

costumes e os princípios gerais de direito.

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Art. 5o Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às

exigências do bem comum.

D. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (ECA – LEI Nº 8.069, DE

13/07/1990)

Art. 25. Entende-se por família natural a comunidade formada pelos pais ou qualquer deles e

seus descendentes.

Art. 26. Os filhos havidos fora do casamento poderão ser reconhecidos pelos pais, conjunta

ou separadamente, no próprio termo de nascimento, por testamento, mediante escritura ou outro

documento público, qualquer que seja a origem da filiação.

Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou suceder-lhe ao

falecimento, se deixar descendentes.

Art. 27. O reconhecimento do estado de filiação é direito personalíssimo, indisponível e

imprescritível, podendo ser exercitado contra os pais ou seus herdeiros, sem qualquer restrição,

observado o segredo de Justiça.

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E. LEI Nº 6.015, DE 31 DE DEZEMBRO DE 1973 (REGISTROS PÚBLICOS)

Art. 57 - Qualquer alteração posterior de nome, somente por exceção e motivadamente, após

audiência do Ministério Público, será permitida por sentença do juiz a que estiver sujeito o

registro, arquivando-se o mandato e publicando-se a alteração pela imprensa. (Renumerado do

art. 58 com nova redação, pela Lei nº 6.140, de 28.6.1974)

§ 1º Poderá, também, ser averbado, nos mesmos termos, o nome abreviado, usado como

firma comercial registrada ou em qualquer atividade profissional. (Renumerado do parágrafo

único do art. 58 pela Lei nº 6.140, de 28.6.1974)

§ 2º A mulher solteira, desquitada ou viúva, que viva com homem solteiro, desquitado ou

viúvo, excepcionalmente e havendo motivo ponderável, poderá requerer ao juiz competente que,

no registro de nascimento, seja averbado o patronímico de seu companheiro, sem prejuízo dos

apelidos próprios, de família, desde que haja impedimento legal para o casamento, decorrente do

estado civil de qualquer das partes ou de ambas. (Incluído pela Lei nº 6.140, de 28.6.1974)

§ 3º O Juiz competente somente processará o pedido, se tiver expressa concordância do

companheiro, e se da vida em comum houverem decorrido, no mínimo, 5 (cinco) anos ou

existirem filhos da união. (Incluído pela Lei nº 6.140, de 28.6.1974)

§ 4º O pedido de averbação só terá curso, quando desquitado o companheiro, se a ex-esposa

houver sido condenada ou tiver renunciado ao uso dos apelidos do marido, ainda que dele receba

pensão alimentícia. (Incluído pela Lei nº 6.140, de 28.6.1974)

§ 5º O aditamento regulado nesta Lei será cancelado a requerimento de uma das partes,

ouvida a outra. (Incluído pela Lei nº 6.140, de 28.6.1974)

§ 6º Tanto o aditamento quanto o cancelamento da averbação previstos neste artigo serão

processados em segredo de justiça. (Incluído pela Lei nº 6.140, de 28.6.1974)

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§ 7o Quando a alteração de nome for concedida em razão de fundada coação ou ameaça

decorrente de colaboração com a apuração de crime, o juiz competente determinará que haja a

averbação no registro de origem de menção da existência de sentença concessiva da alteração,

sem a averbação do nome alterado, que somente poderá ser procedida mediante determinação

posterior, que levará em consideração a cessação da coação ou ameaça que deu causa à alteração.

(Incluído pela Lei nº 9.807, de 1999)

F. LEI No 8.971, DE 29 DE DEZEMBRO DE 1994.

Regula o direito dos companheiros a alimentos e à sucessão.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu

sanciono a seguinte lei:

Art. 1º A companheira comprovada de um homem solteiro, separado judicialmente,

divorciado ou viúvo, que com ele viva há mais de cinco anos, ou dele tenha prole, poderá valer-se

do disposto na Lei nº 5.478, de 25 de julho de 1968, enquanto não constituir nova união e desde

que prove a necessidade.

Parágrafo único. Igual direito e nas mesmas condições é reconhecido ao companheiro de

mulher solteira, separada judicialmente, divorciada ou viúva.

Art. 2º As pessoas referidas no artigo anterior participarão da sucessão do(a) companheiro(a)

nas seguintes condições:

I - o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito enquanto não constituir nova união, ao

usufruto de quarta parte dos bens do de cujos, se houver filhos ou comuns;

II - o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito, enquanto não constituir nova união, ao

usufruto da metade dos bens do de cujos, se não houver filhos, embora sobrevivam ascendentes;

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III - na falta de descendentes e de ascendentes, o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito

à totalidade da herança.

Art. 3º Quando os bens deixados pelo(a) autor(a) da herança resultarem de atividade em que

haja colaboração do(a) companheiro, terá o sobrevivente direito à metade dos bens.

Art. 4º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 5º Revogam-se as disposições em contrário.

Brasília, 29 de dezembro de 1994; 173º da Independência e 106º da República.

ITAMAR FRANCO

Alexandre de Paula Dupeyrat Martins

G. LEI Nº 9.278, DE 10 DE MAIO DE 1996.

Regula o § 3° do art. 226 da Constituição Federal.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua,

de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família.

Art. 2° São direitos e deveres iguais dos conviventes:

I - respeito e consideração mútuos;

II - assistência moral e material recíproca;

III - guarda, sustento e educação dos filhos comuns.

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Art. 3° (VETADO)

Art. 4° (VETADO)

Art. 5° Os bens móveis e imóveis adquiridos por um ou por ambos os conviventes, na

constância da união estável e a título oneroso, são considerados fruto do trabalho e da

colaboração comum, passando a pertencer a ambos, em condomínio e em partes iguais, salvo

estipulação contrária em contrato escrito.

§ 1° Cessa a presunção do caput deste artigo se a aquisição patrimonial ocorrer com o

produto de bens adquiridos anteriormente ao início da união.

§ 2° A administração do patrimônio comum dos conviventes compete a ambos, salvo

estipulação contrária em contrato escrito.

Art. 6° (VETADO)

Art. 7° Dissolvida a união estável por rescisão, a assistência material prevista nesta Lei será

prestada por um dos conviventes ao que dela necessitar, a título de alimentos.

Parágrafo único. Dissolvida a união estável por morte de um dos conviventes, o

sobrevivente terá direito real de habitação, enquanto viver ou não constituir nova união ou

casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência da família.

Art. 8° Os conviventes poderão, de comum acordo e a qualquer tempo, requerer a

conversão da união estável em casamento, por requerimento ao Oficial do Registro Civil da

Circunscrição de seu domicílio.

Art. 9° Toda a matéria relativa à união estável é de competência do juízo da Vara de

Família, assegurado o segredo de justiça.

Art. 10. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 11. Revogam-se as disposições em contrário.

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Brasília, 10 de maio de 1996; 175º da Independência e 108º da República.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

H. CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO ( LEI Nº 10.406, DE 10/01/2002)

Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher,

configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de

constituição de família.

§ 1o A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se

aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou

judicialmente.

§ 2o As causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão a caracterização da união estável.

Art. 1.724. As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade,

respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.

Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às

relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.

Art. 1.726. A união estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos

companheiros ao juiz e assento no Registro Civil.

Art. 1.727. As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar,

constituem concubinato.

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Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos

bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes:

I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for

atribuída ao filho;

II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que

couber a cada um daqueles;

III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;

IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.

I. PROJETO DE LEI N. 2.686, DE 1996 (ESTATUTO DA UNIÃO ESTÁVEL)

(Do Poder Executivo)

Mensagem n. 1.447/96

Regulamenta o § 3o do art. 226 da Constituição, dispõe sobre o Estatuto da União Estável, e

dá outras providências

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

Capítulo I

DO CONCEITO

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Art. 1o É reconhecida como união estável a convivência, por período superior a cinco anos,

sob o mesmo teto, como se casados fossem, entre um homem e uma mulher, não impedidos de

realizar matrimônio ou separados de direito ou de fato dos respectivos cônjuges.

Parágrafo único. O prazo previsto no caput deste artigo poderá ser reduzido a dois anos

quando houver filho comum.

Capítulo II

DOS DIREITOS E DEVERES

Art. 2o Decorrem da união estável os seguintes direitos e deveres para ambos os

companheiros, um em relação ao outro:

I - lealdade;

II - respeito e consideração;

III - assistência moral e material.

Capítulo III

DO REGIME DE BENS

Seção I

Do Regime Legal

Art. 3o Salvo estipulação contrária, os bens móveis e imóveis adquiridos onerosamente por

qualquer dos companheiros, na constância da união estável, regem-se pelas disposições sobre o

regime da comunhão parcial de bens estabelecidas no Código Civil e leis posteriores, abrangendo

direitos, deveres e responsabilidades.

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Parágrafo único. As doações feitas por um dos companheiros serão computadas como

adiantamentos da respectiva meação.

Seção II

Do Regime Convencional

Art. 4o As partes poderão, a qualquer tempo, reger as suas relações patrimoniais, de modo

genérico ou específico, por escritura pública de atribuição de titularidade de bens e obrigações,

devendo o respectivo instrumento ser registrado no registro de imóveis do seu domicílio e, se for

o caso, averbado no respectivo ofício da circunscrição onde os imóveis forem localizados.

Parágrafo único. As disposições contidas na escritura só se aplicarão para o futuro, regendo-

se os negócios jurídicos anteriormente realizados pelos companheiros segundo o disposto nesta

Lei, sem prejuízo da liberdade das partes de dividirem os bens, de comum acordo, no momento

da dissolução da entidade familiar.

Capítulo IV

DAS RELAÇÕES COM TERCEIROS

Art. 5o Nos instrumentos que vierem a firmar com terceiros, os companheiros deverão

mencionar a existência da união estável e a titularidade do bem objeto de negociação. Não o

fazendo, ou sendo falsas as declarações, serão preservados os interesses dos terceiros de boa-fé,

resolvendo-se os eventuais prejuízos em perdas e danos, entre os companheiros, e aplicadas as

sanções penais cabíveis.

Capítulo V

DOS ALIMENTOS

Art. 6o Dissolvida a união estável, o Juiz poderá, considerando o disposto no art. 2o e

demais circunstâncias, determinar sejam prestados alimentos por um dos companheiros ao outro,

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que deles necessitar, nos termos da Lei no 5.478, de 25 de julho de 1968, enquanto o credor não

constituir nova entidade familiar de direito ou de fato.

Capítulo VI

DOS DIREITOS SUCESSÓRIOS

Seção I

Do Usufruto e outros Direitos

Art. 7o Desde que vigente a união estável, no momento do falecimento, e ressalvados os

eventuais direitos do cônjuge do de cujus, no caso de separação, o companheiro sobrevivente terá

direito inafastável pela vontade das partes, enquanto não constituir nova união:

I - ao usufruto da quarta parte do patrimônio líquido do falecido, adquirido durante a

vigência da união estável, se concorrer com os seus descendentes;

II - ao usufruto da metade do patrimônio líquido do falecido, adquirido durante a vigência

da união estável, se concorrer com os seus ascendentes;

III - ao usufruto da totalidade dos bens adquiridos a qualquer título, durante a união estável,

se o de cujus não tiver parentes em linha reta vivos;

IV - ao direito real de habitação ou ao direito de sucessão na locação do imóvel destinado à

família no qual ambos os companheiros moravam, desde que respeitada a herança necessária dos

parentes em linha reta.

Parágrafo único. No caso de existirem herdeiros legítimos do de cujus, se o companheiro

sobrevivente tiver sido contemplado, em testamento, com bens de valor igual ou superior àqueles

sobre os quais recairia o usufruto, em virtude desta Lei, não lhe serão atribuídos os direitos

assegurados pelo presente artigo, salvo se o testador determinar que sejam cumulados com a

verba testamentária.

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Seção II

Da Vocação Sucessória

Art. 8o Não havendo testamento, nem ascendentes nem descendentes vivos do de cujus

defere-se a sucessão ao companheiro.

Capítulo VII

DA CONVERSÃO EM CASAMENTO

Art. 9o Os companheiros poderão, de comum acordo e a qualquer tempo, requerer a

conversão da união estável em casamento, desde que cabível, mediante petição ao Oficial do

Registro Civil da circunscrição de seu domicílio, juntando os documentos previstos no art. 180 do

Código Civil, devendo as testemunhas certificar a existência da união estável e sua duração, sob

as penas da lei, dispensando-se os proclamas e os editais.

Capítulo VIII

DAS DISPOSIÇÕES GERAIS E TRANSITÓRIAS

Art. 10. O art. 167 da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973, passa a vigorar com a

seguinte redação:

"Art. 167. ..............................................................................................................................

I - ..........................................................................................................................................

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12) das convenções antenupciais e dos pactos de titularidade de direitos e obrigações

decorrentes de união estável;

II - .........................................................................................................................................

1) das convenções antenupciais e do regime de bens diversos do legal e dos pactos de

titularidade de direitos e obrigações decorrentes de união estável, nos registros referentes a

imóveis ou a direitos reais pertencentes a qualquer dos cônjuges ou dos companheiros, inclusive

os adquiridos posteriormente ao casamento ou à existência de união estável.

........................................................................................................................"

Art. 11. No prazo de noventa dias, os Tribunais de Justiça encaminharão ao Poder

Legislativo projeto de alteração da lei de organização judiciária, com as adaptações decorrentes

da presente Lei.

Art. 12. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 13. Ficam revogadas as Leis nos 8.971, de 29 de dezembro de 1994, e 9.278, de 10 de

maio de 1996.

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APÊNDICE

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CONTRATO PARTICULAR DE CONVIVÊNCIA E DEPENDÊNCIA

.........................................................., brasileiro, separado judicialmente, empresário, portador da

carteira de identidade nº ............... e CPF nº .........................., e

.........................................................., brasileira, solteira, empresária, portadora da carteira de

identidade, nº ..................... e CPF nº .......................,

ambos com endereço comum de residência na ......................., nº ........., .............., Florianópolis,

SC, pelo presente Contrato Particular de Convivência e Dependência, os quais nessa

oportunidade, nos termos e de acordo com o artigo 1.725 do Código Civil vigente e o artigo 226,

§ 3º da Constituição Federal de 1988, declaram e acordam mediante cláusulas contratuais e

condições a seguir a firme e espontânea vontade de viverem em comum com o intuito de formar

família, sob as seguintes condições:

1. DO CONVIVENTE VARÃO

1.1. O Convivente Varão é filho de .............................. e de ........................... É separado

judicialmente, por sentença transitada em julgado, desde ........................., possuindo um filho do

casamento anterior.

1.2. O Convivente Varão possui os seguintes bens e direitos patrimoniais:

a) CASA DE ALVENARIA situada na ........................,nº........., ..............,

Florianópolis/SC.

b) ..............................., localizada no mesmo endereço supracitado.

c) MOTO XL 250 / 84

d) APARELHO DE SOM PANASONIC

d) TV 14” SEMP TOSHIBA

e) VÍDEO CASSETE SEMP TOSHIBA

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f) MICROONDAS PANASONIC

g) GELADEIRA CONSUL – 280 litros

h) FOGÃO CONTINENTAL – 4 bocas

i) BICICLETA CALOI ALUMINU

2. DA CONVIVENTE VIRAGO

2.1.A Convivente Virago é filha de ......................... e de ......................., é solteira e não tem

filhos.

2.2. A Convivente Virago possui os seguintes bens e direitos patrimoniais:

a) EMPRESA: ............................................................. – CNPJ nº ......................, situada

a Rua .................................., nº ..........

b) CARRO CORSA, GL, ano 1996.

c) TERRENO, situado em Guaratuba/ Paraná.

d) TELEVISÃO PHILIPS 29”

e) TELEVISÃO PANASONIC 14”

f) APARELHO DE SOM AIWA

g) MICROSISTEM PANASONIC

h) TELEFONE SEM FIO COM SECRETÁRIA PANASONIC

i) MICROONDAS PANASONIC

j) REFRIGERADOR CONTINENTAL – 280 litros

l) REFRIGERADOR BOSH DINAMIC COOLING – 410 litros

m) FOGÃO BRASTEMP – 4 bocas

n) BICICLETA GT ALUMINUM

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3. DAS CONDIÇÕES ESSENCIAIS

3.1.Os conviventes declaram que vivem em união estável de modo público, notório e

desimpedido, sob o mesmo teto, desde maio de 2003, e até a presente data o relacionamento não

sofreu qualquer interrupção.

3.2. Os conviventes têm atividades econômicas próprias, com renda satisfatória, e não dependem

econômico-financeiramente um do outro, apenas utilizando o rendimento comum para

manutenção da entidade familiar e os bens inerentes à mesma.

3.3. Deste modo, os conviventes manterão conjuntamente a administração do lar comum, com a

divisão harmônica dos encargos financeiros na proporção que melhor atender os interesses das

partes, considerada a situação econômico-financeira individual de cada um, sempre

consensualmente mensurados e avaliadas à época.

4. DOS DEVERES RECÍPROCOS

4.1. Comprometem-se os conviventes, como já o fazem, a manterem entre si o respeito e

consideração mútuos, em especial a fidelidade recíproca, assistência moral e material, e as

obrigações de companheiros, estabelecidas não só pelo Código Civil Brasileiro, como também

pela legislação complementar ao mesmo.

5. DOS BENS COMUNS

5.1.Os bens que os contratantes adquirirem, a partir do presente contrato, serão administrados por

ambos os conviventes e pertencerão a ambos em condomínio e em frações iguais, sendo que na

falta de um deles, os bens adquiridos na vigência dessa união serão administrados e mantidos

pelo companheiro sobrevivente, inclusive entrando, exclusivamente, na herança dos filhos

comuns. São excluídos da comunhão os bens indicados nos itens “1.2” e “2.2” deste contrato.

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5.2.Os companheiros podem excluir dos bens aqüestos de algum bem específico, para em nome

próprio com cláusula de incomunicabilidade, registrá-lo.

6. DURAÇÃO DO PRESENTE CONTRATO

6.1. O presente contrato vigerá enquanto durar a união entre os conviventes, salvo a hipótese de

aditamento ou alteração de suas cláusulas mediante instrumento escrito e, da mesma forma, livre

e reciprocamente estipulado e aceito.

E por estarem justos e contratados, resolveram mandar lavrar o presente Contrato Particular que

estabelece condições supramencionadas em face da relação de convivência duradoura prevista na

legislação brasileira e protegida como Entidade Familiar pelo Estado, que assinam na presença

das testemunhas abaixo nominadas, para que produza seus jurídicos e legais efeitos.

Florianópolis, 09 de maio de 2004.

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..................................... ...............................

TESTEMUNHAS:

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