Panorama de Língua Estrangeira - Prêmio Victor Civita 2011

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Prêmio Victor Civita Educador Nota 10 2011 LÍNGUA ESTRANGEIRA Relatório analítico do processo de seleção de trabalhos Selecionadora: Sandra Baumel Durazzo Por definição, todos os aprendizes de línguas estrangeiras, independente da idade em que começam, já conhecem ao menos uma língua 1 . Esse conhecimento é uma vantagem, pois os aprendizes já têm uma ideia do funcionamento das linguagens. Por outro lado, o conhecimento sobre a outra língua pode levar o aprendiz a elaborar hipóteses incorretas sobre a língua estrangeira levando-o a cometer erros que não cometeria se estivesse aprendendo a primeira língua. Essas considerações são importantes quando se pensa no processo de aprendizagem das línguas estrangeiras. Tanto na escolha da melhor idade para iniciar o aprendizado, quanto na definição de aspectos da metodologia como o tratamento do erro e as interações promovidas. Aqueles que defendem o início do aprendizado desde a educação infantil evocam a hipótese do período crítico, segundo a qual, durante os primeiros anos de vida, o cérebro humano está predisposto a adquirir línguas, sendo capaz de registrar diferentes sons. Assim, começar a aprender línguas estrangeiras quando criança garantiria uma pronúncia similar à de um nativo. Além disso, as crianças têm menor senso crítico sobre sua performance o que lhes permite arriscar mais e, consequentemente, aprender mais. Finalmente, a tolerância dos professores com os períodos de silêncio e o tempo para produção de língua diminui na medida em que os aprendizes ficam mais velhos, garantindo aos pequenos melhores oportunidades para aprender. 1 Lightbown, Patsy & Spada, Nina, How Languages are Learned, Oxford, 2006 - p.30

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Relatório da selecionadora Sandra Baumel Durazzo sobre os trabalhos da área de Língua Estrangeira enviados ao Prêmio Victor Civita Educador Nota 10 de 2011.

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Prêmio Victor Civita Educador Nota 102011

LÍNGUA ESTRANGEIRARelatório analítico do processo de seleção de trabalhos

Selecionadora: Sandra Baumel Durazzo

Por definição, todos os aprendizes de línguas estrangeiras, independente da idade em que começam, já conhecem ao menos uma língua1. Esse conhecimento é uma vantagem, pois os aprendizes já têm uma ideia do funcionamento das linguagens. Por outro lado, o conhecimento sobre a outra língua pode levar o aprendiz a elaborar hipóteses incorretas sobre a língua estrangeira levando-o a cometer erros que não cometeria se estivesse aprendendo a primeira língua. Essas considerações são importantes quando se pensa no processo de aprendizagem das línguas estrangeiras. Tanto na escolha da melhor idade para iniciar o aprendizado, quanto na definição de aspectos da metodologia como o tratamento do erro e as interações promovidas.Aqueles que defendem o início do aprendizado desde a educação infantil evocam a hipótese do período crítico, segundo a qual, durante os primeiros anos de vida, o cérebro humano está predisposto a adquirir línguas, sendo capaz de registrar diferentes sons. Assim, começar a aprender línguas estrangeiras quando criança garantiria uma pronúncia similar à de um nativo. Além disso, as crianças têm menor senso crítico sobre sua performance o que lhes permite arriscar mais e, consequentemente, aprender mais. Finalmente, a tolerância dos professores com os períodos de silêncio e o tempo para produção de língua diminui na medida em que os aprendizes ficam mais velhos, garantindo aos pequenos melhores oportunidades para aprender.

1 Lightbown, Patsy & Spada, Nina, How Languages are Learned, Oxford, 2006 - p.30

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Por outro lado, adquirir uma pronúncia similar à de um nativo não é necessariamente o objetivo principal quando se fala de línguas estrangeiras. Muitos nativos, ainda que pronunciem perfeitamente determinados fonemas, não são necessariamente falantes competentes daquele idioma. Além disso, os aprendizes mais velhos têm também maior maturidade cognitiva e consciência metalínguística, o que lhes permite refletir e buscar soluções de problemas sobre o funcionamento da nova língua. Esses fatores os levariam a uma aquisição mais rápida e elaborada do que a de uma criança. Quando se pensa no propósito dos cursos de línguas, a meta é adquirir competência linguística. Colin Baker2, citando diversos estudos, apresenta uma definição interessante descrita no esquema abaixo que descreve os componentes dessa competência:

Competência linguística:

1. Competência Organizacional

a) Gramatical - conhecimentos sobre sintaxe, morfologia, vocabulário, ortografia e fonologia – é a competência de saber colocar as palavras corretamente na frase (forte ou fortemente? Devo usar um adjetivo ou advérbio?)

b) Textual – conhecimento das convenções para juntar palavras e expressões para formar um texto, que é uma unidade de linguagem composta de duas ou mais sentenças.

2. Competência Pragmática

a) Elocucional - esta é formada por quatro funções da linguagem: ideacional (a forma como criamos significado a partir de experiências); manipulativa (usar a linguagem para alcançar objetivos); heurística (o uso da linguagem para descobrir novas coisas sobre o mundo e solucionar problemas); e imaginativa (usar a linguagem para além do aqui e agora, por exemplo, para humor ou fantasia).

b) Sociolinguística - sensibilidade ao contexto na qual a linguagem é usada, garantindo que será adequada às pessoas naquela situação. Também se refere ao uso de

2 Baker, Colin, Foundations of Bilingual Education and Bilingualism, Multilingual Matters, Bristol, 2006 - p. 15

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variantes culturais de acordo com a situação (por exemplo, expressões regionais). Finalmente, a competência sociolinguística se refere à habilidade de interpretar referências culturais e figuras de linguagem.

Chega-se então à mesma conclusão apontada no relatório de 2010: as decisões sobre o currículo de línguas estrangeiras na escola devem considerar as características dos aprendizes e, ao mesmo tempo, focar nos objetivos de aprendizagem. Que grau de proficiência se quer dos alunos? Quanto tempo eles terão para aprender, pensando em anos de exposição e frequência nas aulas?Algumas soluções interessantes foram propostas por professores que enviaram seus trabalhos para o Prêmio 2011 como iniciar o aprendizado nas séries iniciais do ensino fundamental, articular o aprendizado de LE com outros conhecimentos do currículo e buscar interlocutores reais.Outro aspecto relevante para o aprendizado promovido é a qualidade do material usado pelos professores e alunos. A internet oferece uma gama de materiais autênticos que podem ser facilmente consultados e até levados para a sala de aula. Além disso, os materiais já existentes na escola usados em outras áreas podem enriquecer os cursos de línguas estrangeiras. Por exemplo, para crianças pequenas, o professor pode contar as histórias dos livros infantis da própria escola, mas no idioma alvo. Os jornais internacionais têm sempre uma versão digital dos quais se pode extrair textos diversos, desde tirinhas humorísticas até editoriais ou artigos de opinião. Algumas editoras também oferecem muitos materiais para uso dos professores em seus sites. As atividades propostas podem ser utilizadas independentemente ou apoiadas por publicações interessantes como livros paradidáticos.

1) Quadro geral dos trabalhos encaminhados:

Foram lidos 64 trabalhos, uma pequena redução em comparação com os 76 de 2010, vindos de todas as regiões do Brasil, com concentração maior da região Sudeste.

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A maioria dos professores participantes do Prêmio é de escolas públicas (83%) e foram poucos os trabalhos vindos de escolas rurais (5%).

A maior parte dos trabalhos enviados tinha inglês como língua estrangeira trabalhada. Foi interessante receber dois trabalhos de comunidades indígenas que tinham o trabalho com o dialeto local e a língua portuguesa paralelamente.

2) Análise dos trabalhos lidos

A grande maioria dos professores relata que seus alunos não gostam das aulas de língua estrangeira e mudar essa visão é o que motiva os projetos. No entanto é preciso cuidado, pois a busca do prazer dos alunos acaba prevalecendo a tal ponto que justifica inclusive a não aquisição de proficiência na língua estrangeira. Esse ponto foi destacado no relatório de 2010 e continua presente nos trabalhos enviados em 2011: poucos professores mencionam o avanço no grau de proficiência de seus alunos, relatando somente o envolvimento e a participação nas atividades propostas. Claro que se o objetivo era fazer com que os alunos gostassem das aulas, a alegria em participar das atividades é um indicativo de sucesso. Mas não indica aquisição do idioma, propósito primeiro das aulas de línguas estrangeiras.

Outro cuidado importante é com a definição dos temas de projetos. Os professores propõem temas de “interesse” para os trabalhos de línguas. Muitas vezes esse interesse é levantado com os próprios alunos e outras vezes é o interesse pessoal do professor que prevalece. Claro que o vínculo com a temática é benéfica para o trabalho, tanto o vínculo dos alunos, como do professor, mas é preciso pesar essas escolhas para não impor valores que não se alinhem com os valores da escola e comunidade. Por exemplo, o que é considerado alimento saudável, a noção de cidadania ou de ocupação ideal de espaços públicos pode variar bastante.

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Também vale o alerta quando as propostas se alinham com gosto ou aptidão pessoal do professor. Neste ano foram enviados diversos projetos envolvendo o uso de música. Os professores, claramente apaixonados por música, propuseram saraus, prêmios simulando um Grammy e festivais. Diversos deles se envolveram tanto com a temática que descreviam seus objetivos como: “desenvolver o gosto pela música”, “trabalhar a voz”, “discriminar eventos sonoros e produções musicais”. Ainda que pessoalmente eu considere extremamente valiosa a formação musical, essa não é tarefa para os profissionais de língua. A música é uma aliada importante para o desenvolvimento de habilidades orais como a fluência e pronúncia, por isso é interessante usá-la em aulas de línguas estrangeiras, mas lembrando de estabelecer objetivos relacionados à aquisição de proficiência, como: expressar-se oralmente usando a pronúncia correta de determinados fonemas e desenvolver fluência na produção oral ao seguir o ritmo da música. As músicas também podem ser boas fontes para ampliação de vocabulário, para trabalhar gramática ou até mesmo para abordar aspectos culturais presentes em expressões idiomáticas de determinadas canções.

Outro aspecto que chama a atenção é a grande quantidade de trabalhos que usam tecnologia. Os professores já se apropriaram de muitas ferramentas da internet como sites interativos, trocas por e-mail e uso de vídeos e textos extraídos de sites como YouTube ou de revistas eletrônicas. Isso é excelente já que amplia a diversidade de variantes do idioma presente na sala de aula. Outra grande vantagem do uso da internet em particular é a possibilidade de encontrar interlocutores reais para as produções em LE dos nossos alunos. Como sugestão eu diria para explorarem mais os sites educacionais disponíveis. Há diversos jogos online ativando desde o uso de vocabulário e gramática até habilidades de compreensão e produção oral. Por serem interativos, potencializam a reflexão sobre a língua uma vez que o aluno tem uma resposta imediata e precisa buscar formas corretas para dar continuidade à atividade. Algumas sugestões para inglês são: www.eslkidsstuff.com; iteslj.org e www.eslgamesworld.com. Mas certamente é fácil encontrar esses jogos em outros idiomas.

Como já comentei em 2010, em se tratando de situações de comunicação, é difícil não propor sequências que finalizem com produtos concretos como apresentações orais para a comunidade, escrita de receitas, cartas e outros textos, elaboração de blogs etc.

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No entanto, estes são apenas fechamentos do processo de aprendizagem. O objetivo do aluno será mesmo realizar a tarefa focando na culminância, mas o objetivo do professor deve ser sempre que eles aprendam algo, que avancem na sua competência linguística. Os objetivos do professor, que serão objeto da avaliação, são os usos de língua requeridos em cada situação comunicativa. Por exemplo, na produção de um blog, os saberes envolvidos (e avaliados) podem ser: expressar ações rotineiras usando o presente do indicativo; formular e responder perguntas pessoais usando pronomes interrogativos; e assim por diante.

Um aspecto interessante deste ano foi a constatação, por parte de alguns professores, do que causa o desinteresse dos alunos ou fragilidade dos cursos de línguas estrangeiras. Eles reconhecem que sua própria falta de especialização e de estratégias de ensino diversificadas são (também) a causa da rejeição dos alunos. Essa análise corajosa tem fundamento, pois todo aprendiz se interessa quando se sente desafiado, aprendendo. Os professores devem sempre buscar se autocapacitar. E isso não necessariamente implica em estender sua graduação, ainda que seja extremamente recomendável. Pode-se investir no aprimoramento de sua própria proficiência fazendo cursos presenciais ou a distância, usando o idioma em situações cotidianas como leituras de lazer, viagens ou trocas com outros falantes via internet. Também é extremamente recomendável ficar antenado para a produção de materiais didáticos e paradidáticos que possam apoiar o trabalho na sala de aula e diversificar suas estratégias.

3) Critérios para seleção

Os trabalhos foram lidos e analisados em relação ao aprendizado da língua estrangeira descrita. Numa primeira leitura, o critério de seleção focou na descrição dos objetivos de aprendizagem referentes ao desenvolvimento da proficiência dos alunos. Em seguida, foi feita uma segunda leitura, acompanhada, em alguns casos, de telefonemas aos professores para que esclarecessem dúvidas. Desta vez o critério para seleção era a consistência entre os objetivos propostos, o desenvolvimento das atividades e a avaliação do aprendizado. O trabalho deveria demonstrar a segurança do

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professor para justificar as escolhas feitas, tanto na definição dos objetivos quanto no desenho da sequência.Entre os critérios que levaram a não seleção dos trabalhos estão:

O projeto não é de língua estrangeira. Esta é utilizada apenas em tradução de partes de textos, mas não há trabalho que promova aprendizado de idioma;

O professor não descreve a metodologia utilizada, apenas descreve etapas com títulos ou nomes das unidades do material didático;

Falta clareza na definição dos objetivos de aprendizagem – inclusão de atividades como objetivo ou de definições do currículo geral da escola, mas que não se referem ao trabalho realizado nem ao aprendizado da língua estrangeira;

A avaliação do aprendizado não remete aos objetivos e conteúdos ou o professor não descreve a avaliação do aprendizado restringindo-se a comentar a aceitação do produto final;

O foco do professor é na sua própria necessidade ou afinidade em detrimento do aprendizado dos alunos;

A temática escolhida é inadequada porque valoriza aspectos que se opõe à visão de educação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (como o papel das línguas estrangeiras para os brasileiros e a não existência de culturas superiores, mas diferentes);

Há excesso de controle da produção dos alunos por parte do professor;

O professor não domina a língua estrangeira; Há confusão entre práticas de escrita, leitura e oralidade. Por

exemplo, coloca-se os alunos para escrever como forma de praticar e desenvolver a oralidade;

Utilização de práticas equivocadas na avaliação – por exemplo, utilização de atividade de escrita para avaliar leitura ou oralidade.

4) Os projetos indicados

Três trabalhos de línguas estrangeiras foram classificados entre os 50

melhores.

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a. Profa. Cristiane da Silva Dias - Soltando a língua com um visitante estrangeiroTrabalho de inglês, realizado na cidade de Oswaldo Cruz, SP

A professora Cristiane esteve no Japão em um programa de formação para professores. Nessa viagem, além de contato com muitos professores, ela se encantou com o fato de crianças pequenas falarem inglês, ainda que apenas algumas palavras. Colocou-se então essa tarefa: promover aprendizado aos seus alunos do fundamental 1, onde a língua estrangeira não é obrigatória. Assim, o trabalho trata de promover para as crianças menores o contato com o idioma estrangeiro em uma situação de comunicação real. Ela fecha a sequência (e a nomeia) com a visita de um italiano, ou seja, um estrangeiro, conversando com as crianças em inglês.

O primeiro grande mérito da professora Cristiane foi conquistar um espaço para o aprendizado de inglês em uma escola onde isso não existia. A própria coordenadora relata que o grande ganho do trabalho foi despertar nos alunos o interesse por aprender inglês. No entanto, a professora iniciou recentemente na função de professora de inglês e ainda não é fluente, sendo este o maior problema. Com o intuito de supri-lo, Cristiane se preocupou em trazer outras fontes de língua para que seus alunos pudessem entrar em contato.

A sequência atingiu os objetivos a que se propôs. Citando a própria professora: conscientizar e motivar os alunos para a importância de aprender a língua inglesa; ser capaz de ler, escrever e falar o nome de algumas cores, animais, numerais, alimentos e partes do corpo. Além de todos estes, destaco a consciência do alcance do aprendizado de LE e inglês, em particular, pelos alunos, além da interação com um estrangeiro “de verdade”, o que deu a eles uma noção desse conceito que não tinham.

A professora faz opções sempre reguladas por seus objetivos. Quando trabalha oralidade, utiliza fontes orais e coloca os alunos para falar. Quando trabalha escrita, oferece modelos para comparar e coloca os alunos para escrever. Os materiais selecionados são extremamente adequados: histórias do repertório conhecido dos alunos, CDs e vídeos com outros falantes para que tivessem input de qualidade (já que a fala da professora é deficitária nesse aspecto). Vale comentar também a inserção do trabalho com a escrita ortográfica em inglês – a professora considera o “erro” dos alunos como indicador de que já estavam elaborando hipóteses utilizando seus conhecimentos sobre a grafia das palavras em língua materna.

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Ainda assim, consciente de que não poderiam estacionar nessa hipótese, ela elaborou atividades que os levaram a aprender a ortografia correta do inglês.

Finalmente destaco a reflexão da professora sobre sua prática. Ela está o tempo todo pensando nas razões de suas escolhas. Cito alguns exemplos: escolher uma história infantil que eles já conheciam em português; contextualizar o novo vocabulário apresentado e atender os alunos menos expansivos individualmente para que ganhassem confiança de se expressar em público e outros.

Como ponto do trabalho a aprimorar está a interação. Ainda que a interação com os materiais tenha sido interessante, nas entrevistas gravadas pudemos notar que os alunos não se escutavam, repetindo as mesmas perguntas ao entrevistado (que foi gentil ao aceitá-las e respondê-las novamente com paciência!). Uma sugestão seria inserir atividades que desenvolvam a compreensão oral, como trocas orais entre os próprios alunos que podem ser em jogos ou atividades dirigidas.

Comentários da educadora Daniela Alonso sobre a adequação para um aluno com deficiência física:

O trabalho foi desenvolvido numa turma de 4º ano com 23 alunos, da qual pertence um aluno com deficiência física - cadeirante (Paralisia Cerebral), que apresenta dificuldade na coordenação motora de membros superiores. Segundo o relato da professora, o aluno participou de todas as etapas do trabalho, de acordo com a sequência didática planejada. O aluno demonstrou interesse e facilidade na expressão oral. Para garantir sua participação efetiva nas atividades de escrita, a professora utilizou estratégias de adequação ou flexibilização já usadas pelos professores de classe (duplas para produção colaborativa, colega ou professora como escriba para registro de ideias etc.). É relevante o fato que a professora valorizou a facilidade oral com a língua estrangeira e promoveu eliminação de barreiras na participação do aluno nas atividades. Ela reconhece o desenvolvimento oral do aluno (avalia como melhor desempenho no grupo e sabe que o aluno ganhou bolsa de estudo em Curso Livre de LE - Inglês).

Como sugestão à professora: oferecer adequações e alternativas para a participação mais autônoma do aluno. Buscar parceria com a Sala de Informática ou com o Atendimento Educacional Especializado

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para o uso de recursos tecnológicos. Valorizar a competência oral do aluno como colaboração no trabalho coletivo.

b. Profa. Claudia Regina Bonotto – Let’s Go! Contar, divulgar e convidarTrabalho de inglês, realizado na cidade de Palmas, PR

Esse trabalho é uma proposta de ensino dos números em língua inglesa, tanto ordinais quanto cardinais, em contextos comunicativos: informações sobre eventos (preço, data, horário etc.). Dois aspectos desse trabalho valem ser ressaltados: (a) ela sempre inicia a sequência com uma avaliação diagnóstica muito bem elaborada e conduzida. Nesse projeto, ela inicia com uma avaliação escrita e outra oral. E (b) o foco é claro e eficaz: Claudia se propõe a trabalhar com conteúdos de língua que percebe que seus alunos não sabem. Todas as propostas se articulam no sentido de fazê-los adquirir os conteúdos escolhidos, nesse caso, aprender a falar, escrever e usar adequadamente os números. Como estes são usados em datas, horários e preços, ela propôs situações comunicativas que envolvem esses dados.

A comparação das produções iniciais e finais dos mesmos alunos demonstra o sucesso da proposta, tanto do ponto de vista da escrita quanto da oralidade. No entanto, nessa fase da escolaridade os alunos já sabem coisas sobre a língua e poderiam facilmente dar conta de objetivos mais amplos. Por exemplo, poderiam trabalhar procedimentos de escrita como a revisão e o uso do dicionário; vocabulário usado para descrição de lugares e pessoas; uso de verbos modais; e até pensar na produção oral mais formal já que ela contava com interlocutores reais.

Outra qualidade desse trabalho é que a professora acompanha a produção dos alunos de perto e oferece atividades extras àqueles que demonstram não ter chegado onde ela queria ao longo da sequência. As atividades extras são boas e realmente promovem avanço, pois reproduzem o processo de aquisição do conteúdo, oferecem modelos e garantem oportunidades de prática.

O projeto prevê diversas atividades de interação: entre alunos, dos alunos com a professora, dos alunos com materiais diversos como flyers autênticos e jogos e dos alunos com a comunidade da escola na divulgação do evento de arte.

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Como sugestões para aprimorar o trabalho, além da inclusão de outros conteúdos como mencionado acima, aponto o uso de inglês e português com os alunos. É comum que os aprendizes jovens queiram utilizar a língua materna, mas é necessário que o professor garanta o uso somente da língua alvo. Se assim o fizer, com o tempo os alunos passarão a construir significados e entender. Por outro lado, se a professora traduz suas falas imediatamente após a produção, os alunos rapidamente entenderão que não precisam ativar conhecimentos para entender LE uma vez que logo em seguida virá a tradução.

c. Professora Fernanda Cristina Puça França – Radioatividade em uma visão interdisciplinarTrabalho de francês, realizado na cidade de Recife, PE

Esta é uma proposta interdisciplinar de francês e química para trabalhar a biografia e as descobertas de Marie Curie, francesa que ganhou o Prêmio Nobel por seu trabalho na área da radioatividade. Chama a atenção o fato de haver um trabalho realmente complementar entre as áreas. Na área de língua estrangeira, os alunos lidam com fontes autênticas na língua alvo e produzem exclusivamente em francês. Nos trabalhos enviados pode-se notar o protagonismo dos alunos na produção dos textos e a apropriação do tema tratado: a vida da pesquisadora e o conteúdo dos seus estudos.

Na descrição das etapas, a professora mostra que trabalhou bastante com a escrita, fato que ficou evidente também nas produções que enviou. Destaco que todo o processo de estudo sobre esse conteúdo foi feito em francês, o que sem dúvida promove o desenvolvimento da fluência dos alunos.

Ao analisar o processo e as produções, percebe-se que os alunos têm bastante familiaridade com o idioma estrangeiro, inclusive usando-o em situações formais e informais. No entanto, não há nenhuma referência ao currículo nem aos conteúdos de língua aos quais eles foram expostos antes desse trabalho.

Nesse caso, o foco no tema se justifica por ser um projeto interdisciplinar, no qual o tema foi o gerador do projeto. Ainda assim, a professora trabalha com procedimentos interessantes como a revisão da escrita. Analisando as intervenções feitas pela professora no texto dos alunos para a reescrita, pude notar duas ações diferentes. Em um dos textos as intervenções eram somente do

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ponto de vista da gramática e ortografia. Nesse caso, a segunda versão do texto foi apenas uma cópia do primeiro corrigindo os aspectos apontados pela professora. Já no segundo exemplo enviado, algumas intervenções levaram os autores a refletir sobre o que queriam expressar e escolher outras formas mais adequadas de construir as frases além de corrigir ortografia e gramática. A segunda forma é bastante adequada, pois coloca o aluno para refletir sobre o fazer do escritor e não apenas corrigir erros.

Outra estratégia positiva desse trabalho é a valorização da interação entre os alunos. Eles trabalharam em pequenos grupos o tempo todo e as orientações os levaram a negociar significado na leitura dos textos-fonte e escrever o texto biográfico em conjunto.

Para avançar, diria da necessidade de definição clara dos objetivos de aprendizagem relativos à aquisição da língua francesa. Estes, além de orientar ações como a revisão dos textos dos alunos, também orientariam os instrumentos de avaliação. Por sua vez, estes deveriam deixar claro o avanço na proficiência do idioma.

Valorizo o fato da professora usar a língua-alvo o tempo todo, estratégia essencial para promover avanço na proficiência de seus alunos.

Finalizo comentando que os trabalhos interdisciplinares que envolvem língua estrangeira costumam usar esse idioma somente para títulos ou alguma tradução. Nesse caso, todo o estudo sobre a vida da protagonista foi realmente feito em francês, usando fontes autênticas no idioma, um excelente exemplo a seguir.