Parecer 235_2014 Alteração de Auto de Infração de Trânsito

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PARECER Nº 235/2013/CETRAN/SC Interessado: Cb PMSC Maurício Henrique de Freitas – Antonio Carlos Assunto: Alteração de Auto de Infração de Trânsito Relator: José Vilmar Zimmermann EMENTA: O auto de infração é um documento público e, como tal, uma vez lavrado não pode ter o seu conteúdo modificado. Se a informação omitida no AIT não comprometer a imputação nem prejudicar o direito de defesa do autuado, conforme o caso, a autoridade de trânsito pode julgar consistente a peça acusatória. De acordo com a jurisprudência, a irregularidade capaz de ensejar o arquivamento e julgamento da insubsistência do auto de infração é somente aquela que atinge os direitos do autuado, impossibilitando ou dificultando sua defesa. Se o auto de infração contiver o nome completo do condutor e o número do seu CPF ou RG, a ausência do número de registro da CNH não enseja a nulidade do auto, mormente nas infrações em que o condutor for autuado em flagrante. Na hipótese de o condutor não apresentar sua CNH e, no local onde ocorreu a infração, o agente não tiver acesso às informações correspondentes, o mais recomendável é transferir a retenção para local mais adequado ou para o depósito do órgão ou entidade de trânsito, e somente lavrar a autuação e liberar o veículo depois de esclarecida essa situação. I. Consulta: 1. O consulente pergunta a este Colegiado se torna inconsistente o auto de infração de trânsito acrescentar nele o número da Carteira Nacional de Habilitação – CNH somente após obter essa informação do banco de dados do DETRAN, quando se tratar de condutor que não esteja portando o referido documento no momento da abordagem. 1

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PARECER N 235/2013/CETRAN/SC

PARECER N 235/2013/CETRAN/SCInteressado: Cb PMSC Maurcio Henrique de Freitas Antonio Carlos

Assunto: Alterao de Auto de Infrao de Trnsito

Relator: Jos Vilmar Zimmermann

EMENTA: O auto de infrao um documento pblico e, como tal, uma vez lavrado no pode ter o seu contedo modificado. Se a informao omitida no AIT no comprometer a imputao nem prejudicar o direito de defesa do autuado, conforme o caso, a autoridade de trnsito pode julgar consistente a pea acusatria. De acordo com a jurisprudncia, a irregularidade capaz de ensejar o arquivamento e julgamento da insubsistncia do auto de infrao somente aquela que atinge os direitos do autuado, impossibilitando ou dificultando sua defesa. Se o auto de infrao contiver o nome completo do condutor e o nmero do seu CPF ou RG, a ausncia do nmero de registro da CNH no enseja a nulidade do auto, mormente nas infraes em que o condutor for autuado em flagrante. Na hiptese de o condutor no apresentar sua CNH e, no local onde ocorreu a infrao, o agente no tiver acesso s informaes correspondentes, o mais recomendvel transferir a reteno para local mais adequado ou para o depsito do rgo ou entidade de trnsito, e somente lavrar a autuao e liberar o veculo depois de esclarecida essa situao.

I. Consulta:

1.

O consulente pergunta a este Colegiado se torna inconsistente o auto de infrao de trnsito acrescentar nele o nmero da Carteira Nacional de Habilitao CNH somente aps obter essa informao do banco de dados do DETRAN, quando se tratar de condutor que no esteja portando o referido documento no momento da abordagem.

II.

Fundamentao tcnica:2.

Este Conselho j se pronunciou sobre a alterao ou correo do auto de infrao, mediante o Parecer n 170, aprovado por unanimidade na Sesso Ordinria n. 024, realizada em 18 de junho de 2012, nos seguintes termos:4. O auto de infrao de trnsito, enquanto ato administrativo, somente ser considerado perfeito quando materialmente no lhe faltar nada, ou seja, quando as disposies elementares atinentes ao motivo, contedo, finalidade, forma, causa e competncia do agente pblico que o confeccionou forem observadas (GASPARINI, Digenes, Direito Administrativo, 8 Ed., So Paulo, Saraiva, 2003, p. 66).

5.

Sob esta perspectiva, vale observar que o art. 280 do CTB estabeleceu o que a autoridade de trnsito e seus agentes devem averbar na pea acusatria, e o Denatran, por intermdio da Portaria n 59/07, determinou os campos de informaes que devero constar nesse instrumento. Se houver erro ou irregularidade que comprometa a consistncia do auto de infrao, no lcito modificar ou corrigir o seu contedo, devendo, a autoridade competente, julgar insubsistente o seu registro e arquiv-lo, como manda o inciso I do pargrafo nico do art. 281 do CTB.

6.

Acerca do assunto, este Conselho, mediante a Resoluo n 08/2004, prescreveu o seguinte:

Art. 7 O auto de infrao ser arquivado e seu registro julgado insubsistente:I se procedente a defesa da autuao;

II se considerado inconsistente ou irregular;

III se, no prazo mximo de trinta dias, no for expedida a notificao da autuao.

Art. 8 A anlise de consistncia do auto de infrao deve restringir-se ao exame da existncia das informaes legalmente exigidas e necessrias para que o mesmo possa surtir seus devidos efeitos.

1 Ser considerado inconsistente o auto de infrao que:

I contiver erro crasso de tipificao da infrao;

II no especificar o local, data e hora do cometimento da infrao;

III identificar incorretamente o veculo empregado na prtica da infrao;

IV omitir a identificao do rgo ou entidade e da autoridade ou do agente autuador ou do equipamento que comprovar a infrao.

2 Caso a autoridade de trnsito, atravs da descrio do fato averbada no auto de infrao, entender caracterizada infrao diversa daquela apontada por seu agente, poder, em despacho fundamentado, desclassificar a tipificao adotada sem que isso acarrete inconsistncia da pea acusatria, aplicando a penalidade cabvel.

7.

O auto de infrao um documento pblico e, como tal, uma vez lavrado no pode ter o seu contedo modificado. Seguindo essa linha de raciocnio, o Contran preconizou, no Manual Brasileiro de Fiscalizao de Trnsito MBFT, aprovado pela Resoluo n 371/10, que o AIT no pode conter rasuras, emendas, uso de corretivos, ou qualquer tipo de adulterao, sendo digno de nota que alterar documento pblico verdadeiro pode configurar o crime previsto no art. 297 do Cdigo Penal ptrio.

8.

Caso falte alguma informao ou contenha uma irregularidade formal que no comprometa a imputao nem prejudique o direito de defesa do autuado, levando em considerao as peculiaridades do caso concreto, ao examinar o auto de infrao a autoridade competente at pode julg-lo consistente, tendo em vista o princpio da instrumentalidade das formas - pelo princpio da instrumentalidade das formas, somente os atos imperfeitos que no tenham alcanado a sua finalidade precpua estaro sujeito a declarao de nulidade (TJMG, 1 Cmara Cvel, Apelao Cvel n 1.0024.03.969731-3/001 - Comarca de Belo Horizonte - Rel. Des. Geraldo Augusto, j. 01/06/2004) - porm no poder modificar o contedo desse documento. (texto original no destacado) (1)3.

Nesse contexto, fica claro que, uma vez lavrada a autuao, no lcito modificar o seu contedo, acrescentando informaes que originariamente nele no havia. A questo subjacente se a falta do nmero do registro da CNH do condutor no instrumento de autuao, quando o titular do documento for habilitado e no o estiver portando no momento da abordagem, pode invalidar a pea acusatria, levando em considerao que esse dado indispensvel para insero do AIT no sistema do DETRAN.

4.

O entendimento esposado por esta Casa, consoante exposto no parecer acima reproduzido, converge no sentido de que se informao omitida no comprometer a imputao nem prejudicar o direito de defesa do autuado, conforme o caso, a autoridade de trnsito pode julgar consistente a pea acusatria. Contextualizando essa afirmao no cenrio delineado pela consulta, de se sustentar que se o condutor foi autuado em flagrante e, alm do seu nome completo, restou devidamente identificado por intermdio de outras informaes, como nmero do CPF, RG etc, possvel considerar consistente o AIT, mesmo que lhe falte o nmero da CNH. A jurisprudncia sustenta que a irregularidade capaz de ensejar o arquivamento e julgamento da insubsistncia do auto de infrao somente aquela que atinge os direitos do autuado, impossibilitando ou dificultando sua defesa:

ADMINISTRATIVO. AO DECLARATRIA DE NULIDADE DE ATO ADMINISTRATIVO. AUTOS DE INFRAO. ALEGAO DE CERCEAMENTO DE DEFESA E VCIOS FORMAIS. NO OCORRNCIA. DUPLA NOTIFICAO. DESNECESSIDADE. CONDUTOR AUTUADO EM FLAGRANTE. AUSNCIA DE INDICAO DA ESPCIE DO VECULO. INEXISTNCIA DE PREJUZO DEFESA DO INTERESSADO. NULIDADE NO DECLARADA. SENTENA MANTIDA. 1. CONFORME ENTENDIMENTO DO C. STJ, A NOTIFICAO DE AUTUAO DO PROPRIETRIO DO VECULO DISPENSADA QUANDO IDENTIFICADO O CONDUTOR E LAVRADO O AUTO DE INFRAO EM FLAGRANTE. AUSNCIA DE OFENSA AO PRINCPIO CONSTITUCIONAL DA AMPLA DEFESA. 2. O OBJETIVO DO AUTO DE INFRAO COMUNICAR AO INFRATOR O COMETIMENTO DO ILCITO DE TRNSITO DE MODO A PERMITIR O EXERCCIO DO DIREITO DE DEFESA DO AUTUADO. 3. SE O AUTO DE INFRAO CONTM A MARCA, MODELO E PLACA DO VECULO E AS DEMAIS INFORMAES REFERENTES INFRAO, A AUSNCIA DE INDICAO DA "ESPCIE" DO VECULO NO ENSEJA A NULIDADE DO AUTO, AINDA MAIS NAS INFRAES EM QUE O CONDUTOR FOI AUTUADO EM FLAGRANTE. 4. A IRREGULARIDADE PREVISTA NO ARTIGO 281, DO CTB, CAPAZ DE ENSEJAR O ARQUIVAMENTO E JULGAMENTO DE INSUBSISTNCIA DO AUTO DE INFRAO, SOMENTE AQUELA QUE ATINGE OS DIREITOS DO AUTUADO, IMPOSSIBILITANDO OU DIFICULTANDO SUA DEFESA. 5. MERAS IRREGULARIDADES FORMAIS NO TM O CONDO DE INVALIDAR O AUTO DE INFRAO, DESDE QUE RESPEITADA A GARANTIA DE DEFESA DO AUTUADO. 6. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. (TJ-DF - APL: 1081901520058070001 DF 0108190-15.2005.807.0001, Relator: HUMBERTO ADJUTO ULHA, Data de Julgamento: 07/10/2009, 3 Turma Cvel, Data de Publicao: 16/10/2009, DJ-e Pg. 144) (original sem grifo);

DIREITO ADMINISTRATIVO. AO DECLARATRIA DE NULIDADE DE ATO ADMINISTRATIVO. INFRAO DE TRNSITO. DETRAN/DF. IRREGULARIDADES FORMAIS. AUTO DE INFRAO. AUSNCIA DE PREJUZO DEFESA. NULIDADE NO DECRETADA. RECURSO DESPROVIDO. A mera inobservncia de formalidades que visam, to-somente, padronizao de procedimento no constitui motivo hbil a justificar a anulao do ato administrativo, mormente quando inexistente qualquer prejuzo ao exerccio do direito de defesa. Somente a forma que, descumprida, venha a comprometer severamente as garantias do interessado que enseja a nulidade do ato praticado. No h falar-se em nulidade dos autos de infrao quando as incongruncias formais apontadas no ocasionaram qualquer gravame ao direito de defesa do apelante. (20060111034964APC, Relator LECIR MANOEL DA LUZ, 5 Turma Cvel, julgado em 04/06/2008, DJ 19/06/2008 p. 191) (destaque nosso);

DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAO CVEL. AO ANULATRIA. MULTA DE TRNSITO. DADOS DO FORMULRIO DE NOTIFICAO DE PENALIDADE. IRREGULARIDADE. ARTIGO 280 DO CDIGO DE TRNSITO BRASILEIRO. OBSERVNCIA. NULIDADE NO-DECRETADA. 1. passvel de anulao o ato administrativo que se concretiza em desrespeito s garantias do administrado. Assim, no h que se falar em nulidade quando o vcio nele apontado diz respeito to-somente a formalidade destinada apenas uniformizao/padronizao do instrumento de veiculao do ato. 2. Se as informaes contidas em notificao de penalidade preenchem os requisitos previstos no artigo 280 do Cdigo de Trnsito Brasileiro, invivel se mostra a decretao de nulidade. 3. Havendo o auto de infrao sido preenchido sem observncia estrita ao quanto previsto em resolues e portarias do Contran ou Denatran, tal fato por si s no rende ensejo ao decreto de nulidade. 4. Recurso desprovido. (TJDF, Apelao Cvel 20050111468236, Relator MARIO-ZAM BELMIRO, 3 Turma Cvel, julgado em 29/11/2006, DJ 22/03/007, p. 94) (texto original sem negrito);5.

No obstante, deve-se notar que se o condutor no estiver portando sua CNH, de acordo com o art. 232 do CTB o veculo deve ser retido at a apresentao desse documento. Caso o documento no seja exibido em tempo hbil, temerrio que o agente da autoridade de trnsito lavre a autuao pelo cometimento da infrao do art. 232 do CTB antes de confirmar, mediante consulta ao banco de dados, que o condutor realmente habilitado, pois, no sendo, outra ser a tipificao da conduta: art. 162, I, tambm do CTB. Isso sem cogitar o risco que seria liberar o veculo ao condutor que no esteja portando sua CNH antes de saber se ele mesmo habilitado. Sob esse aspecto, se o condutor no apresentar sua CNH e, no local onde ocorreu a infrao, o agente no tiver acesso s informaes correspondentes, o mais recomendvel seria transferir a reteno para local mais adequado ou para o depsito do rgo ou entidade de trnsito, com base no item 8.1 do Manual Brasileiro de Fiscalizao de Trnsito MBFT, Vol. 1, aprovado pela Resoluo n 371/10 do CONTRAN, e somente lavrar a autuao e liberar o veculo depois de esclarecida essa situao.

III.

Consideraes finais:

6.

luz do exposto, conclui-se que:

a) o auto de infrao um documento pblico e, como tal, uma vez lavrado no pode ter o seu contedo modificado;b) se informao omitida no comprometer a imputao nem prejudicar o direito de defesa do autuado, conforme o caso, a autoridade de trnsito pode julgar consistente a pea acusatria;c) a irregularidade capaz de ensejar o arquivamento e julgamento da insubsistncia do auto de infrao somente aquela que atinge os direitos do autuado, impossibilitando ou dificultando sua defesa;

d) se o auto de infrao contiver o nome completo do condutor, o nmero do seu CPF ou RG, a ausncia do nmero de registro da sua CNH no enseja a nulidade do auto, mormente nas infraes em que o condutor for autuado em flagrante;

e) na hiptese de o condutor no apresentar sua CNH e, no local onde ocorreu a infrao, o agente no tiver acesso s informaes correspondentes, o mais recomendvel transferir a reteno para local mais adequado ou para o depsito do rgo ou entidade de trnsito, e somente lavrar a autuao e liberar o veculo depois de esclarecida essa situao.

Contribuiu na elaborao do presente parecer o especialista em trnsito e ex-conselheiro, Rubens Museka Junior.

De Blumenau para Florianpolis, em 28 de janeiro de 2014.Jos Vilmar Zimmermann

RelatorAprovado por unanimidade na Sesso Ordinria n. 004, realizada em 29 de janeiro de 2014.

Luiz Antonio de Souza

PresidenteNotas e referncias:

(1) disponvel em < http://www.cetran.sc.gov.br/> acesso em 28 de janeiro de 2014.

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