Pelo Amor Ou Pela Dor - Ricky Medeiros-Txt

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Pelo Amor, ou Pela Dor... Ricky Medeiros Dedicatria Em minha opinio, a mediunidade no nem uma ddiva nem uma bno. um talento para usar da forma que o indivduo achar. Como tudo na vida, o mdium pode usar seu talento para o bem, para o mal, ou at pode ficar indiferente ao talento. Na minha vida, conheci trs mdiuns que, no meu ver, usam seu talento para o bem. A primeira, Mrs. Margaret Tice, era uma mulher fascinante. Eu a conheci aos dezenove anos. Ela era a pastora da Igreja Esprita de Syracuse, Nova York. Foi ela quem comprovou para mim, pela primeira vez, a continuao da vida. A segunda Mareia Fernandes, que conheci aqui no Brasil, mais de trs anos atrs. Mareia usa seu talento para ajudar, confortar e aliviar as pessoas que a procuram. A terceira Zbia Gasparetto, que por meio de seu talento facilita para as pessoas a compreenso do significado de nossas vidas aqui e no outro lado. Ento, dedico este livro para estas trs mdiuns. Um pouco de cada uma est nesta obra. E, alm destas mdiuns que me abriram as janelas para o outro lado da vida, gostaria de mencionar as pessoas que abrem, todo dia, as janelas para esta vida terrestre: A minha esposa Snia. Por causa dela, estes livros existem hoje. Para Fernanda e Juliana: atravs destas duas meninas eu fico em contato com tudo que h de novo no mundo. E, finalmente, para as pessoas que entram em contato comigo, falando dos meus livros. Vocs no sabem o bem que fazem para mim. Sumrio Uma histria antes do livro Uma carta do corredor da morte Introduo As histrias espritas no tm comeo nem fim Eu no quero ver mais Eu espero por uma misso A onda Os ltimos vinte minutos de Tom As rodas do carma giram Um assassino tem uma alma? Eu, Bob e o rio do tempo O fliperama csmico O hospital espiritual Oi, Harry O comeo do fim O fim do comeo Outro lugar, outra me, outro filho Alguns mitos perigosos Uma questo de vida ou morte Um sanduche de salame Uma conversa sobre carma

Uma carta para o corredor da morte O campo de estrelas Uma carta do corredor da morte Tom no jardim Ns visitamos David Uma conversa com Harry sobre o oculto Um dia no corredor da morte Uma fuga da priso David l a carta Os ecos do por que O porqu A visita Vejo voc em Huntsville, Harry Eplogo Uma histria antes do livro Os sinais esto ao nosso redor. As pessoas que leram A Passagem e Quando Ele Voltar lembra que abri o livro contando uma histria sobre meu irmo Joe, falecido mais de trinta anos atrs. Este irmo, durante estes trinta anos, sempre manifestou sua presena ao meu redor. A histria que vou contar aconteceu em 1999, logo depois que o primeiro livro, A Passagem, foi publicado. Eu estava no Shopping Morumbi, aqui em So Paulo, saindo da ginstica. Estava descendo a escada rolante do shopping e vi meu livro exibido na vitrine de uma das livrarias. O livro j tinha atingido o primeiro lugar nas vendas, o que, para dizer a verdade, foi uma grande surpresa e felicidade para mim. No bolso da camisa, eu estava carregando o disquete do segundo livro, Quando Ele Voltar. No outro lado da escada rolante, vi o anncio de um filme que eu queria ver, O Clube da Luta, com Brad Pitt. Como eu tinha sado da ginstica cedo, percebi que podia pegar a sesso que comeava as oito e pouco. Chegando ao fim da escada rolante, decido ver o filme. Perguntei mentalmente para meu irmo se o livro que estava escrevendo, Quando Ele Voltar, seria to bom quanto A Passagem. O disquete pulou do bolso e caiu no cho. Quando me abaixei para peg-lo, ouvi tocar, no sistema de msica ambiente do shopping, uma msica. Era He Ain t Heavy, He's My Brother ("Ele no pesado, meu irmo"), uma msica dos anos setenta dos Hollies, um conjunto ingls. Agora, tenho de explicar a msica. A primeira vez que fui para uma sesso esprita, em Syracuse, trinta anos atrs, haviam se passado trs meses do falecimento de meu irmo Joe. Eu tinha ido com minha me. Pouco antes de entrar na igreja, essa msica tocou no rdio do carro. Eu comecei a chorar. Minha me tambm. Naquela noite, dentro daquela igreja esprita, Joe mandou os primeiros recados para ns, por meio da mdium, Mrs. Margaret Tice. Saindo da igreja, duas horas depois, liguei o rdio no carro. De novo, a mesma cano tocou! Durante os trinta anos depois da morte dele, sempre associei essa msica ao meu irmo. Por exemplo: seis anos atrs, na avenida marginal do rio Pinheiros, em So Paulo, eu estava dirigindo meu carro em direo ao trabalho. O rdio estava desligado. No sei por que, pensei na histria dessa msica com meu irmo. Perguntei a mim mesmo: "Ser que realmente a msica tem alguma coisa a ver

com meu irmo?" Naquele instante, liguei o rdio. Imediatamente He Ain t Heavy, He's My Brother comeou a tocar. No foi no meio da msica, no foi depois de um intervalo comercial, foi no mesmo instante que liguei o rdio! Bem, agora vamos voltar ao Shopping Morumbi. Ouvi essa msica tocar segundos depois de perguntar sobre o novo livro, momentos depois que o disquete do livro caiu do bolso. Claro, fiquei emocionado. Esqueci do filme e fui para casa, onde contei a histria para minha esposa, Snia. No dia seguinte, fui trabalhar. Chegando ao escritrio, Snia me ligou e me perguntou que filme eu iria assistir no Shopping Morumbi. Falei que era O Clube da Luta. Ela comeou a chorar e me contou notcia que ela tinha acabado de ouvir na televiso: um jovem, obviamente perturbado, entrou no mesmo cinema do shopping, na sesso que eu ia pegar, com uma metralhadora, abrindo fogo nas pessoas que estava assistindo ao filme. No tenham dvida: os sinais esto ao nosso redor. Uma carta do corredor da morte Em julho de 1998, um prisioneiro do corredor da morte no Texas, Estados Unidos, escreveu esta carta para um jornal. Agncias de notcia de todo o pas a divulgaram e eu acidentalmente a achei na Internet. "A quem possa interessar. Meu nome [no publicado]. Sou um prisioneiro do corredor da morte, aqui no Texas. Minha execuo est marcada para 20 de agosto. Sou culpado dos crimes pelos quais fui acusado. No busco me desculpar pelo que fiz- Eu apenas quero um contato com algum a fora. Uma carta, um bilhete, qualquer coisa. Estou com medo de morrer sozinho. Ento, por favor, envie-me uma carta, se que existe algum a fora que se importa. O prisioneiro que escreveu esta carta foi executado por uma injeo letal. Eu no sei se ele recebeu alguma carta ou se algum estava com ele quando morreu. No entanto, uma coisa eu sei: ele um esprito e ainda vive. Introduo Ns todos fomos criados imagem e semelhana de Deus. Esta uma afirmao agradvel de se ouvir, no ? Afinal, reconfortante saber que refletimos nosso Criador. Mas, se estas palavras so verdadeiras, ento a Terra deveria ser um paraso. J que ns somos criaes de Deus, no deveria haver razes para cime, raiva, dio ou medo. Ns todos sabemos que as coisas no so assim. O que acontece? Este livro fala de raiva. De dio. De medo. E tambm fala de perdo e redeno. Um dos personagens deste livro inspirado um assassino. Seu nome David e seu personagem baseado nos crimes e nas vidas reais de homens e mulheres que estiveram no corredor da morte em vrios pontos dos Estados Unidos. Ele, tambm, foi criado imagem e semelhana de Deus, assim como todos ns. Seu esprito menos divino que o nosso? Mesmo os mais desprezados, odiosos e detestveis so espritos imortais, e, se ns no podemos ou no entendemos isso, que

esperana h? Como podemos evoluir como espritos, sociedade ou como mundos se recusaram a ver que existem laos de divindade em cada um de ns? fcil dizer que ns acreditamos em irmandade, humanidade e espiritualidade. Porm isso um ato que transcende a f. E, como o Mestre Jesus disse, "o que fizeres a um destes meus irmos, mesmo aos mais pequeninos, a mim o fars". No h nada mais desprezvel do que um assassinato. Mas o assassino nosso irmo, tambm. Como Deus permite que essas coisas aconteam? - alguns perguntam. Como Ele pde criar tais monstros? - outros dizem. Eu acho que devemos nos lembrar que "nem mesmo um pardal cair do cu sem o Seu conhecimento". Vocs iro conhecer Tom. Em uma questo de horas, David estuprou e assassinou sua esposa, matou sua filha, depois atirou no peito de Tom. Uma famlia inteira exterminada. Vocs vero a corrente crmica de ocorrncias desencadeadas por esses assassinatos. Devo confessar que este livro no foi fcil de escrever. De vez em quando, pensava em desistir dele, mas no podia. Este livro tinha de ser escrito, ainda que apenas para nos ajudar a entender um pouco mais sobre carma, perdo e ns mesmos. Enquanto escrevia, tive medo. Em determinado trecho, entrei em sintonia com as vibraes de assassinato, dio e vingana. Supliquei orientao e proteo. Foram-me concedidas. Fiquei deprimido. Sabia que era porque estava me envolvendo com a tristeza e raiva das vtimas. Mais uma vez, roguei orientao e proteo. Elas vieram. Um dia, enquanto trabalhava em um captulo deste livro, fui s lgrimas. O choro durou quase quinze minutos. Supliquei aos espritos ao meu redor: "Se querem que eu escreva, deixem-me em paz. Ajudem-me, mas no mexam comigo emocional e fisicamente". Eles me atenderam e me deixaram em paz. Este um livro inspirado. Eu, Ricky Medeiros, escrevi as palavras nestas pginas. No entanto, as palavras so trazidas at vocs por espritos de luz que esto ao nosso redor. Tudo que pedem que leia, reflita e amadurea. A priso citada neste livro Terrell, sede do abominvel corredor da morte do Texas. No entanto, tal setor nunca foi efetivamente usado at 1999. Antes disso, os condenados morte aguardavam a execuo de suas sentenas na priso Ellis, em Huntsville, Texas. Eu decidi que a histria se passaria na unidade de Terrell, mas usei como base as instalaes fsicas de um corredor da morte ainda mais odioso e aterrorizante: o da Priso Estadual de Oklahoma, em McAleister. Enquanto o Texas executa mais prisioneiros por ano do que qualquer outro estado americano, o corredor da morte de McAleister sobressai por sua crueldade. Assim, apesar de ter tomado algumas liberdades dramticas e literrias, esta uma histria verdadeira. Mas vocs j devem ter ouvido o ditado: "A verdade mais estranha que a fico". Mantenha isso em mente enquanto l este livro. Tambm mantenha em mente que nada acontece por acaso; nem mesmo um cruel assassinato. As histrias espritas no tm comeo nem fim. Um livro precisa de um autor. Algum tem de sentar e datilografar as palavras que formam as sentenas contando s histrias que fazem o livro. No fui eu quem sentou e datilografou as palavras que vocs esto prestes a ler.

Eu no posso. Sou um esprito, e, portanto sou desprovido do equipamento bsico, como dedos, para datilografar. Assim sendo, estou usando algum de seu plano terrestre. Ele tem os dedos que eu no tenho. O que fao aqui alm de escrever? Antes de tudo, meu nome Maryanne e, na realidade, este livro uma espcie de bico. Minha ocupao principal ser guia. Existem vrios tipos diferentes de guias, mas minha misso ajudar os que deixaram o plano terrestre (morreram, em outras palavras) a se ajustar dimenso espiritual ou astral. s vezes, um trabalho fcil; outras vezes, difcil. Mas sempre interessante. Como esta histria: sobre a minha primeira misso como guia. Existem alguns autores muito famosos neste plano. Quando eles descobriram que eu estava inspirando um esprito terrestre a escrever um livro, vieram cheios de conselhos. Mas, como o objetivo deste livro no o de ganhar um prmio Nobel de literatura, decidi ignorar a maioria deles. Eu e o esprito terrestre que est sendo usado queremos apresentar uma histria simples, fcil de entender, onde algumas verdades eternas possam ser explicadas. Ento, nada de prmio Nobel! No entanto, aqui est um dos conselhos que vou seguir: "Maryanne, uma histria deve ter um comeo, meio e fim", eles disseram. Bem, isso pode parecer bvio, mas no assim to fcil quanto aparenta. Este livro tem muitos comeos, porque so muitas histrias: h a minha histria e como cheguei onde estou, h a histria do mdium, a histria do assassino e a histria de suas vtimas. Quando esses escritores viveram na Terra, eles escreveram sobre o dia-a-dia e situaes comuns no plano terrestre. Este livro diferente: parte dele se passa aqui nas vibraes espirituais. As histrias terrestres tm um comeo; as histrias espirituais no tm comeo. As histrias terrestres tm um fim; as histrias espirituais so eternas. Personagens de histrias terrestres vivem em pargrafos bem organizados; personagens espritas vivem relacionamentos intimamente entrelaados com carma, que podem s vezes durar sculos. As histrias terrestres so fices baseadas em fatos; as histrias espirituais so realidades baseadas na verdade. Mas eu tenho de comear de algum lugar. Ento, a histria comea com Harry Clark. Ele um mdium que nunca quis ser um mdium. Assim eu contarei a vocs sobre mim, e vocs comearo a entender como todas as nossas vidas so inter-relacionadas. Nada por acaso, meus amigos. Finalmente, vocs conhecero Tom e David. Pode-se dizer que foram esses dois que reuniram todos ns. Mas o personagem principal no uma pessoa, nem sequer um esprito. Trata-se de uma fora chamada carma. Entretanto, diferente dos personagens de outros livros, carma no o heri ou o vilo; ele existe a partir do que ns produzimos. Enquanto o carma no tem nenhuma fala nesta histria, ele nos fala em todos os momentos de todos os dias. Pode-se dizer que o carma o personagem principal da vida de todos ns. Eu no quero ver mais

O pequeno hall acomodaria confortavelmente quarenta pessoas. Em uma noite comum de quarta-feira, apenas dez ou doze utilizavam as quarenta cadeiras de metal dobrado. Mas, nesta noite, mais de cem pessoas se acotovelavam no interior da pequena capela, a grande maioria em p, com as costas contra as paredes. Todos que estavam ali tinham marcado hora; mais de quinhentos outros foram dispensados ao longo da semana. Aqueles com sorte o bastante para caber no pequeno cmodo vieram de todos os lados da cidade, de algum modo achando o caminho para aquela pequena, desorganizada casa que sediava a Primeira Igreja Espiritualista de Houston. A maioria deles nunca havia pisado naquele lado da cidade antes e, possivelmente, jamais o faria novamente. A multido estava impaciente. Era uma noite quente e mida, mesmo para julho no Texas. A igreja, que mal tinha dinheiro para consertar suas goteiras, no tinha ar condicionado e a temperatura chegava casa dos trinta e cinco graus. Os suados espectadores rezavam para que aquela noite no fosse lembrada apenas por causa do calor insuportvel. Cada uma das pessoas sentadas ou em p no calorento e sufocante recinto estava l por uma razo: elas esperavam ansiosamente uma prova. Prova... Podia vir numa palavra, numa frase, num sinal, nome, qualquer coisa. Alguns queriam notcias do pai ou me falecidos h tempos; outros procuravam desolados um filho morto, um irmo ou amigo. Eles assavam naquele ambiente quente e apertado por causa de Harry Clark. Ele um mdium. Harry sentou-se silenciosamente na parte da frente do salo, avaliando o pblico. O mdium no apenas via o grupo ansioso, mas tambm via e ouvia centenas de espritos invisveis no cmodo, enfileirados para serem atendidos. Quero falar com minha esposa. Diga a ela que estou bem. Meu nome Billy - pressionava um esprito plantado em frente a uma moa muito bem vestida. Minha me e meu pai esto aqui - um adolescente sussurrava. Diga a eles que no foi culpa deles. Eu usava drogas. Estou bem, estou indo bem. Por favor, pea a eles que tomem conta de Donovan, meu cachorro. Se disser Donovan, vo saber que sou eu. Harry concentrou-se no esprito de um jovem e atraente rapaz com as mos apoiadas em um homem sentado na terceira fila. O nome dele Jeff. Eu era seu amigo, ns fomos namorados - disse o esprito. Conte a Jeff que ele est muito doente, mas no deve se preocupar ou ter medo. Ns estaremos juntos em breve. - O mdium anotou mentalmente: falar com Jeff em particular. Havia incontveis outros espritos trazendo mensagens, e eles, assim como os presentes, esperavam que ele comeasse. Harry faria o possvel para atender a todos. Sentado em sua cadeira e ouvindo parcialmente enquanto o pastor da igreja o anunciava, o mdium divagava atravs do tempo, voltando a quando tinha cinco anos de idade e viu e ouviu espritos pela primeira vez. Ele se lembrou de sua me contando ao seu pai, depois que o ouviram falando com um de seus "amiguinhos": Isso normal nessa idade. Minha me disse que eu tambm tinha coleguinhas imaginrios.

Os "coleguinhas imaginrios", todavia, ainda estavam com ele quando completou dez anos, e Harry aprendeu a manter suas vises e sussurros para si mesmo. Harry percebeu que um dos "coleguinhas" estava sempre ao seu lado. Esse esprito amigo se chamava Bob. Bob era seu protetor: sempre que os espritos feios e sombrios se aproximavam, Bob os botava para correr. Pense em mim como o irmo mais velho que voc nunca teve - brincava Bob. Se Harry tinha qualquer dvida, Bob as resolvia. Quando o menino fez treze anos, Bob lentamente abriu um pouco mais a janela de Harry para o mundo esprita. Ns no estamos mortos, voc sabe. Alguns de ns esto mais vivos do que voc - contou-lhe o esprito. O garoto de treze anos de idade perguntou a Bob por que alguns espritos so diferentes dos outros: Uns so amigveis, como voc. Mas existem outros tipos. Eles so sombrios e mal-humorados. Eu no me sinto bem quando eles esto por perto. Eles me assustam. Bob riu e descreveu as similaridades entre os planos terrestre e espiritual. Na Terra tambm no existem pessoas de que voc gosta e outras de que no gosta? Ns temos todos os tipos de espritos aqui. Alguns so afinados com as vibraes luminosas e outros no esto prontos ou escolheram no viver em harmonia com a luz. Bob instruiu Harry a fechar os olhos por um segundo, pedindo ao garoto que imaginasse duas faixas bem distantes entre si e de cores diferentes. Crie a maior distncia possvel entre as duas faixas - disse o esprito. Que cores elas devem ter? - perguntou Harry. Bob riu e disse ao menino que podia dar a elas a cor que bem entendesse. Isso no vai fazer nenhuma diferena - explicou. Apenas devem ser cores diferentes e as faixas devem estar bem separadas uma da outra. Quando Harry informou que a imagem j se formara em sua mente, Bob explicou: Existem espritos que vivem na faixa de cima e outros que vivem na de baixo. Est vendo todo o espao que h entre elas? Existe ali um nmero infinito de vibraes e espritos, dependendo de suas prprias escolhas e nveis de evoluo, ocupando todo aquele espao tambm. Logo voc vai aprender a lidar com os mais diferentes nveis de espritos vivendo tanto na Terra como na dimenso astral. O garoto queria saber mais, e Bob, pressionado, disse: Voc tem um talento que por vezes acha que uma maldio. No entanto, tem a chance de ajudar espritos na Terra e do lado de c. Depende de voc. O menino perguntou: Por que eu? Antes de responder, Bob lembrou que estava falando com uma criana. Muito embora o esprito de Harry tenha vivido incontveis vezes antes, agora ele estava em um corpo fsico de treze anos de idade. O guia sabia que havia algumas coisas que no podia contar a um esprito cuja personalidade terrestre ainda no estava desenvolvida emocional e intelectualmente. Nada por acaso. H uma razo para tudo. Harry, voc

viveu muitas vidas. A soma total de suas aes, pensamentos e experincias o trouxe at onde est hoje. Encare desta forma: cada encarnao uma pea de tecido, e cada pea diferente da outra. Estenda as diferentes peas uma ao lado da outra e as costure. Logo ter uma colcha. Peas nicas e separadas formam um todo. Bob fez nova pausa. Ele queria contar ao menino sobre uma determinada roupa entre todas as que Harry possua. Contudo, mais uma vez, o guia precisou preparar com exatido o discurso que ia fazer ao garoto. Alm da idade do menino, Bob estava preocupado com algo mais. Um esprito nascido na Terra precisa se libertar de seu prprio passado. Um esprito encarnado no carrega com ele nenhuma lembrana de suas vidas passadas porque um esprito tem de ser livre para escolher seu caminho diante das escolhas dirias e constantes que se apresentam a ele. O livre-arbtrio, em outras palavras, no pode ser influenciado por culpas passadas. Bob sabia que poderia apenas dar uma dica sobre certo tecido que era parte da colcha de Harry. Sabe aqueles espritos mal-encarados que voc viu, os sombrios? Voc j foi parte daquela vibrao - disse o guia gentilmente ao menino. Harry respirou profundamente, mas no disse nada. Bob continuou: No posso lhe dizer mais. Ainda no a hora. Mas o que eu posso dizer que no se incomode com o que foi um dia; comece a entender o que pode vir a ser. Seu esprito aprendeu, cresceu e evoluiu fora da escurido e das vibraes densas. Voc j no parte deles. Mas por causa de algumas de suas escolhas no passado, Harry, voc est em dvida com a Criao. Ento um talento lhe foi emprestado. Sua mediunidade no um presente; uma ferramenta. Voc a aceitou antes de nascer e pode us-la do modo que quiser. A escolha sua. Harry absorveu as palavras de Bob e exprimiu sua compreenso: Foi-me dado algo que me ajudasse a pagar por algo que fiz. O garoto ficou satisfeito ao perceber que tudo parecia se encaixar. Isso se chama carma, moleque - brincou Bob. Voc tem uma poderosa e preciosa habilidade. Foi-lhe dada no para prever o ganhador das corridas de cavalo, o resultado da loto ou qual celebridade vai se divorciar no ano que vem. Num tom mais srio, o guia disse que Harry tinha a chance de ajudar outros a encontrar seus caminhos. Use isso inteligentemente - disse Bob. A escolha sua. Voc pode usar seu talento para ajudar e pode tambm ignorlo. Depende de voc. E, sejam l quais forem s escolhas que fizer, elas tambm faro parte daquela colcha. Enquanto o garoto digeria as palavras, o "irmo mais velho" sussurrou: Leia alguns livros. Aprenda sobre mdiuns, reencarnao e carma. Descubra por si mesmo por que voc pode me ver e ouvir enquanto outros no podem. Isso no nenhum mistrio. Na verdade, Harry, para voc, to natural quanto respirar. Quando completou quinze anos, o rapaz havia devorado cada livro que encontrou sobre paranormalidade, metafsica,

fenmenos psquicos, budismo e espiritismo. Ele era um expert na vida aps a morte, no apenas pelo que leu, mas tambm pelo que viveu. Aos dezesseis, ele decidiu contar sua me. Seu cachorro, Victor, tinha morrido havia poucos dias. Harry entrou na sala de estar de sua casa, onde sua me, Sara, assistia s novelas vespertinas. Me, eu tenho de falar com voc sobre uma coisa. O adolescente tinha ensaiado aquele dilogo vrias vezes. Mil pensamentos cruzaram sua mente quando Sara, indiferente, desviou sua ateno da TV para ele. "Ela vai rir", um dos pensamentos dizia. "Ela vai pensar que est louco, ela vai chamar um psiquiatra", outro alertava. "Provavelmente dir que uma fase, ela sempre diz isso", apressou-se outro. Claro, o que voc quer? - ele ouviu sua me responder. Harry sabia que ela estava se sentindo incomodada. Sara era fantica pelas novelas da tarde, mas tinha de ser agora ou nunca. Ele tinha de contar a algum e seria bom se fosse ela. O rapaz foi direto ao assunto. Me, voc sabe o que so mdiuns? Confusa, ela disse que no tinha a menor idia, e, esperando que Harry fosse embora, manteve um ouvido e um olho pregados no televisor. Ela estava mais interessada em descobrir se John era mesmo o filho ilegtimo de Susan e se ele era o pai do beb que Clarissa esperava. Tomando longo flego, Harry respondeu o que ele mesmo havia perguntado. Mdiuns so pessoas que vem e ouvem espritos - e, indicando a TV com a cabea, continuou: Voc sabe, como quando aquela mulher foi ao programa de entrevistas e previu o assassinato do presidente Kennedy. Jeanne Dixon. Sua me, esquecendo a novela, dedicou a ele sua total ateno: Ela estava no programa de Mike Douglas, ontem. uma astrloga, mas eu acho que no a mesma coisa. De qualquer forma, isso tudo bobagem. Ningum pode prever o futuro e ningum fala com fantasmas. O que se passa com voc? perguntou, voltando a prestar ateno em John, Susan e Clarissa. O garoto respondeu: Nada. Eu andei lendo muito a respeito, s isso. Acredite, me, existem muitas coisas por a sobre as quais ns no sabemos nada. Sara perguntou por que ele estava to interessado no assunto. Ele esperou um instante, olhou nos olhos dela e declarou sem mais rodeios: Bem, porque sou um. Um o qu? - sua me quis saber. Ele tinha conseguido captar sua completa ateno. Agora, aos dezenove anos e sentado naquela igreja, Harry recordava-se de ter conversado com sua me at a noite chegar. Ele contou como viu o esprito de seu cachorro deixar o corpo ao morrer, como sabia que sua tia Betty estava morta antes do telefonema que os avisaria e como soube que sua av materna estava morrendo de cncer. Eu vejo um mundo que no sei como explicar. o mesmo, mas diferente do nosso. Eu o vejo, ouo e sinto. Me, eles falam comigo: gente que nem sequer conheo. Vejo espritos

que sofrem, eles me pedem ajuda. Depois h outros que surgem para me ensinar. Eles esto todos nossa volta. Sara comeou a chorar. Ela achou que seu filho estava tendo alucinaes. Entretanto, quando seu pai chegou, eles interromperam a conversa imediatamente, para retom-la nos dias seguintes. Sua me partiu da descrena ao medo, do medo curiosidade, e, com o passar dos anos, ela e o marido aceitaram o dom do filho, ainda que no o entendessem completamente. Harry ouviu quando o pastor terminou de apresent-lo. Em um instante, ele estaria em p e comearia a transmitir mensagens dos espritos s pessoas reunidas na pequena igreja. Ningum, nem famlia, amigos ou qualquer outro no salo, tinha idia de que aquela seria a ltima vez que Harry usaria seus dotes como mdium. Ele havia tomado a deciso um ms antes: j era o bastante. Ele estava cansado. O to aclamado dom havia arruinado seu casamento: as pessoas o chamavam altas horas da noite pedindo ajuda. Sua esposa no sabia lidar com isso: Voc vive mais para seus fantasmas do que para mim acusou, com raiva. O to aclamado dom fez dele um neurtico, segundo seus amigos: ele no tinha tempo para si mesmo. Espritos estavam sempre pairando ao seu redor, pedindo-lhe que fizesse isso ou aquilo. Ele literalmente no tinha paz de esprito. E o to aclamado dom o deprimiu: ele olhava para um estranho e imediatamente batia uma fotografia mental. No mesmo momento sabia quais eram suas intenes e se estas eram boas ou ruins. s vezes, e isso o deixava aterrorizado, via uma mortalha cinza envolvendo a aura da pessoa. Este era um sinal freqente de que a energia fsica do corpo estava se esvaindo e ele sentia que a morte estava bem prxima. Enfim, basta. "Depois desta noite, chega. Nunca mais. Vou silenciar todos eles", disse Harry a si mesmo, enquanto se punha de p. Ele no diria uma s palavra multido. Ele ia lhes dar suas esperanas, suas provas e suas mensagens do alm. No dia seguinte, ele simplesmente desapareceria. Como sempre fazia, Harry iniciou sua preleo com um pequeno discurso. Oi, meu nome Harry Clark. Antes de comear, eu normalmente digo algumas palavras. E elas so sempre as mesmas, eu no tenho muita imaginao - brincava. Aos que j estiveram em uma de minhas sesses anteriores peo um pouco de pacincia. O jovem mdium contava a eles que logo lhes abriria uma porta para um mundo que no estava escondido, apenas no era visvel. H uma diferena - ele explicava. Escondido algo que voc no pode conhecer. Mas vocs esto aqui porque tinham de conhecer este mundo. Eu espero e desejo que, uma vez que esta porta seja aberta, suas vidas jamais voltem a ser as mesmas. Harry sabia que o grupo estava preparado e pronto para comear. Mas, dramaticamente, ele fazia pausas, deixando elevar o nvel de ansiedade da platia um pouco mais antes de prosseguir. Espero que, a partir desta noite, vocs comecem a viver com a certeza de que existe uma vida depois desta, que tiveram muitas antes e tero mais incontveis ao longo de nossa jornada. E - finalizava talvez vocs comecem a ver que

nossos atos, palavras e pensamentos ecoam pelo universo. Ns somos responsveis por nossas aes. Mantenham isso em mente e suas vidas mudaro. "Bem, esta a ltima vez que fao este discursinho", Harry disse a si mesmo quando terminou. "Estou fechando a porta para sempre", acrescentou de maneira inaudvel. Mas, pelo canto do olho, Harry notou a presena de um esprito que ele no encontrava havia algum tempo. Era Bob, que conscientemente meneou a cabea, sorriu e comentou: Como eu disse, Harry, a escolha sempre sua. Voc est mais do que certo - disse silenciosamente um surpreso Harry ao seu antigo mentor e guia enquanto caminhava at o local em que um casal de meia-idade estava sentado. Harry ia falar a eles sobre um cachorro chamado Donovan. Eu espero por uma misso Eu sou uma guia. Porm, diferentemente daqueles da Disney World, eu no conduzo turistas atravs do Reino Animal. Eu sou uma guia espiritual, ajudando espritos a se libertar da esfera terrestre. H 35 anos terrestres, eu me desencarnei depois de ser morta durante uma disputa do trfico em Los Angeles, nos Estados Unidos. Eu tinha 16 anos, era pobre, negra e revoltada. Naquela poca, eu poderia resumir minha vida na Terra em unia nica frase: "Eu nasci na pobreza, vivi na marginalidade e morri em meio ao dio." Tambm tive um guia que ajudou a achar meu caminho. Seu nome Bob e eu tambm posso resumir meus sentimentos em relao a ele em uma nica frase: "Ele foi meu guia, minha luz, e meu melhor amigo." Minha passagem da Terra para o plano espiritual no foi fcil. Quando o tiro repentino brutalmente interrompeu minha vida fsica, fiquei perdida e confusa. Meu esprito pensava que ainda vivia na Terra. Essa caracterstica comum entre espritos traumatizados por uma morte violenta e inesperada ou por aqueles que, quando encarnados, jamais pararam para pensar sobre suas vidas espirituais. Eu me encaixo nas duas categorias: minha morte foi feroz e repentina, e eu nunca me importei com os porqus de minha vida. Bob mudou isso tudo. Eu no sabia, mas ele estava comigo desde o incio, e at mesmo testemunhou meu assassinato. Mas, sabendo que eu no entenderia quem ou o que ele era, Bob esperou at que eu estivesse pronta para se fazer notar. Para estar pronta demorei quase um ano terrestre. Eu j estava cansada de andar com pessoas que no sabiam que eu existia e comeava a sentir que havia perdido alguma coisa. Assim, Bob se revelou. Ainda me lembro da primeira vez que o vi: estava encostado em uma cabine telefnica a poucas quadras da casa de minha me. Ele sorriu para mim. "Finalmente", pensei, "algum que sabe que estou viva." Mas imediatamente me desapontei: A primeira pessoa que me via depois de quase um ano era um sujeito branco, barrigudo, com barba por fazer, cabelos grisalhos e uns sessenta anos de idade. Voc parecia o dono de uma mercearia decadente , ironizei mais tarde. Logo percebi que Bob era mais do que um velhote branquelo,

e ele logo me mostrou que eu era mais do que uma menina revoltada, negra, de dezesseis anos. Ele me apresentou um mundo inteiramente novo e eu descobri que o que eu pensava ser real era apenas iluso. Lembro de olhar para as ruas que eu pensava conhecer to bem. Olhando, como se fosse a primeira vez, as casas rotas com seus gramados despedaados e as lojas vazias com janelas de tbua abertas e esperanas encerradas. Foi ali que nasci. Foi ali que vivi e, finalmente, onde morri. No entanto, apesar de tudo parecer igual, tudo estava diferente. Assim como eu. Em um instante, finalmente entendi que no pertencia quelas ruas, j no vivia naquele quarteiro, nem fazia mais parte do plano terrestre. Porm no houve alegria, alvio ou felicidade nessa descoberta. O dio tomou todo o meu ser. Odiei minha morte, me revoltei por ter sido assassinada antes mesmo de ter uma chance de viver. Meu esprito no conseguia aceitar a injustia dessa curta vida na Terra. Por que - gritei - eu nasci pobre e negra? Por que fui morta aos dezesseis anos? Por qu? Eu vivi e morri na misria, enquanto outros tinham coisas com as quais eu s pude sonhar. Bob ouviu, deixando-me desabafar a fria que queimava em minha alma. Ele falou sobre aquela raiva e me ajudou, com o passar dos anos, a entender todo o meu ressentimento, revolta e dio. Muitos anos terrestres se passaram desde que perambulei pelas ruas de Los Angeles. Eu evolu da minha raiva, amadureci a partir do meu dio e transformei o ressentimento em compreenso. J no vivo mais em Watts, Califrnia. Atualmente, no vivo em lugar nenhum. No tenho um lar, porque no preciso me proteger do frio; no tenho endereo, porque vivo onde meus pensamentos e vibraes me levam. Agora mesmo, esses pensamentos e vibraes me trazem perto da esfera terrestre, porque onde meu trabalho est. Eu sou uma guia, uma luz e orientao para espritos que perderam seus caminhos. Fui guia por uns dois anos terrestres, e a histria que vou contar sobre minha primeira tarefa. Lembre-se do que vou lhe dizer, que um dia isso pode lhe servir: todos os espritos so iguais, mas cada um de ns nico. Bob disse essas palavras. Ele veio me ver enquanto eu esperava ansiosamente que aquela misso comeasse. Sempre prestei muita ateno ao que ele dizia. Ele me ensinou bastante desde aquele encontro numa esquina de Los Angeles. Espritos so nicos porque temos experincias especiais absorvidas de diferentes encarnaes - explicou ele -, mas ns somos iguais porque todos fomos criados igualmente. Voc acredita honestamente que o Criador daria alguma vantagem a algum? Eu ri. Depois de tantos longos anos de estudo, eu sabia que ele estava certo: no poderia existir equilbrio e harmonia se um simples esprito fosse feito melhor ou mais evoludo que outro. No entanto, como sempre, Bob levou sua aula adiante. Todos comeam iguais. Cada esprito escolhe se desenvolver em seu prprio caminho, evoluir em si mesmo o brilhantismo de um Einstein, a criatividade de um Michelangelo ou a harmonia inspiradora de um Ghandi. Eu entendi. Atravs da meditao e reflexo, eu soube que

todo esprito tem seu nico e importante lugar na Criao. No faz nenhuma diferena se voc um rei ou presidente em uma vida. Em outra, dependendo do carma e estgio da alma, voc pode ser um aougueiro ou uma costureira acrescentei. Isso verdade - disse Bob, mas alertando: - Logo voc estar lidando com todos os tipos de espritos. Voc cruzar com alguns que alcanaram a luz e outros que preferem a escurido. E voc vai descobrir que no h muita diferena entre os dois. Como pode no haver diferena entre a luz e a escurido? disparei. Como sempre, Bob estava me provocando. Ele adorava fazer discursos excntricos e, depois, usando seu sorriso de Buda, fazer tudo ter sentido. Normalmente, eu entrava nessa, e s conseguia rir e esperar por sua explicao. Tambm vivem dentro de ns - sua voz tornou-se profunda - a maldade de um Hitler, a crueldade de um Stlin e a desumanidade de um Charles Manson. Os chamados positivos e negativos so parte de cada um de ns. Fiz meno de protestar, mas Bob levantou sua mo: S um segundo, ainda no terminei. Pense nisso: nenhum esprito tem mais bem ou mal que outro. Se voc acredita que ns todos fomos criados identicamente, ento deve aceitar que a luz existe com a escurido. As chamadas vibraes pesadas do medo, dio, revolta e cime so reais; ns deveramos aprender com elas, e no nos tornarmos parte delas. por isso que a esfera terrestre, onde voc estar trabalhando, existe. Naquele plano, os espritos tm de aprender e escolher entre uma vasta gama de vibraes e experincias. "Viva revoltado, aprenda com a revolta. Aja com dio, viva em dio", meditei. Viva em harmonia, aprenda com a harmonia. Aja com amor, viva em amor. Cada esprito faz sua prpria escolha. Mas como poderia escolher se no houvesse alternativas? Como pode um esprito aprender se no h lies? - argumentou meu amigo. Como sempre, ele estava certo: fria, revolta, dio, medo so partes de nossa bagagem emocional. Cabe a ns saber como e quando us-los e tambm cabe a ns saber quando no precisamos mais deles. Bob me lembrou que o carma o professor imparcial, incontestvel e constante. Pensei que ele ia mudar de assunto, mas vi que estava arquitetando mais sobre o que j tinha dito. As pessoas tm uma idia errada sobre carma. - E, em tom de brincadeira, acrescentou: - Provavelmente isso tem a ver com todos aqueles filmes baratos que Hollywood fez sobre Buda. Eu s pude rir e dizer que Keanu Reeves no estava muito bem no papel, mas, afinal, quem poderia interpretar Buda? Se as pessoas ao menos entendessem - disse ele, aparentando certa frustrao - que o carma no justia ou retribuio... No h julgamento ou retribuio. Carma simplesmente a conseqncia da escolha, ao ou inteno. Ponto final, isso tudo sobre carma. Agora que tinha uma idia de onde ele queria chegar, me adiantei e o ajudei a terminar: Carma circunstncia. Um esprito, em qualquer situao possvel, pode desenvolver seu prprio brilhantismo de

Einstein, a criatividade de Michelangelo ou a harmonia inspiradora de Ghandi. Ou pode se conectar as vibraes do dio, medo e cime disse uma voz que esteve silenciosamente acompanhando nossa conversa. Uma aura branca e suave contornava o esprito que tambm viria ser um de meus mestres. Seu nome era Clara. Ela e Bob se conheciam porque Bob tambm havia sido seu guia. Ela me deu um conselho: Ajude espritos a entender essa regra bsica: semelhante atrai semelhante. Eles compreendero mais facilmente vivendo nas vibraes do amor e harmonia e no mais precisaro ou desejaro qualquer coisa relativa s vibraes pesadas que j foram parte deles. Bob lanou outra questo: E o que acontece quando voc no precisa de algo? Eu e Clara juntas respondemos: Voc se livra disso. E Clara acrescentou: Ajude-os a se livrarem das correntes de revolta, dio e medo. Se puder fazer isso, vai ajud-los a deixar a terceira dimenso da Terra para trs. Ns todos sabamos que aquilo no era assim to fcil quanto podia parecer. As vibraes inferiores seduzem porque so bvias e palpveis; as superiores so geralmente sutis, parecendo estar fora de nosso alcance. Depois de muitas encarnaes, um esprito lentamente comea a ver a infelicidade que vem associada revolta, medo, dio e cime. Apenas quando ele entende que o negativo traz o negativo e aes negativas tm reaes negativas, que o esprito avana para a harmonia das vibraes de luz. E, como ns trs dissemos, fica livre do que no precisa mais. Bob resumiu tudo dizendo: Uma vez que um esprito conhece o seu lado negativo, essas emoes j no lhe sero necessrias. O esprito rejeitando essas vibraes abre a si mesmo para a totalidade e harmonia da Criao. Clara, que tinha sido uma guia por um bom tempo, disse que eu no me preocupasse se parecesse que eu no estava progredindo com os espritos com quem trabalharia. No existe um prazo final, minha querida - disse Clara. Todos caminham em seu prprio passo. Cada alma sabe at onde pode mergulhar neste mundo, vivendo no medo ou agindo com dio e revolta. Ela sorriu e concluiu dizendo: Uma parte do nosso trabalho estar por perto quando o esprito est pronto para se esvaziar e ficar livre daquilo que no precisa mais. Eu estava pronta para a minha primeira misso, e, como mdicos, advogados e dentistas na Terra, ns guias temos nossas especialidades. A minha era a revolta, medo e raiva, porque eu havia vivido intensamente com essas vibraes. Bob e Clara se despediram e eu estava por conta prpria, aguardando que o Universo me levasse para onde eu era necessria. Meu esprito meditou, em comunho consigo mesmo e com a luz que preenche todos os cantos da Criao. Ns nos tornamos um s enquanto eu esperava que a misso comeasse.

A onda Ainda na hora mais clara do dia eu me livrei de todos os meus pensamentos. Varri de mim mesma todas as expectativas. Eu estava sozinha, esperando pelo sinal que sabia que viria. Repetidamente, eu recitava: "Eu e a Criao somos um. Todo ser vivo e eu somos partes do Universo. Ns somos sua energia e vibrao." Eu pensei em Deus. "Sua fora infalvel, inabalvel e constante. A fora est sempre evoluindo, crescendo e expandindo. Uma fasca divina de sua energia est em toda vida. A fagulha est em mim." Comecei a flutuar em brisas csmicas suaves e delicadas. Eu ouvia os pensamentos de Clara se misturarem com os meus. Minha professora estava gentilmente me lembrando de como o carma nos associa Criao. "Sem o carma", seus pensamentos sussurravam, "seria o caos. A vida no seria nada alm de acasos sem ordem ou razo. O carma traz sentido vida. Preste ateno e ver que o Universo constantemente est enviando sinais." Eu sabia tudo sobre esses sinais e at j tinha um apelido para eles: ondas. Usei essa palavra porque eles o fariam flutuar at onde voc deveria estar. E, quando o assunto era o Universo, eu j havia aprendido a seguir a correnteza ao invs de nadar contra a mar. As ondas me deram Bob, uns trinta e cinco anos atrs. E agora, dez anos depois, muitas e diferentes ondas me trouxeram aonde estou; um esprito de luz em busca de uma misso. Eu estava pronta para que o Universo me encontrasse. Ele me encontrou. A onda suave e delicada. Sutilmente me arrasta ao plano terrestre. Uma srie de rpidas imagens desfilou em minha frente, trazendo-me para uma sala pequena de blocos azulclaros. O quarto est frio e vazio, exceto por uma maca colocada no meio do cho de linleo cinza. Um fino travesseiro repousa no alto da maca e pequenos tubos de plstico transparente ondulam sobre o lenol verde-escuro da pequena cama. Meus sentidos se afinam com a sala: fria, sem vida e sinistra. Eu sigo os finos tubos que serpenteiam pela parede. Ainda na maca, vejo uma pequena e dbil depresso no travesseiro; foi formada por uma cabea humana. Atrs de mim, grossas cortinas em bege emolduram um plstico transparente entalhado na parede azul acinzentada. No h janelas nesta sala e o ar ranoso. A nica luz branca e angustiante, vinda de trs lmpadas fluorescentes zunindo bem em cima da maca. Mais uma vez, minha ateno est voltada maca. diferente de qualquer uma que j vi antes; h uma tbua reta e estreita pregada na transversal. "Parece um crucifixo", pensei. Ento eu vejo as grossas tiras de couro: cinco esto presas ao corpo principal da maca e trs esto em cada um dos braos de madeira. Tremores e calafrios percorrem meu esprito. Esta no uma maca de hospital e eu no estava em uma sala de operaes. A onda me levou a uma cmara letal, no interior profundo de uma priso. Uma execuo tinha acabado de acontecer

momentos antes e a sala azul estava quieta e sem movimento. Eu percebi na escurido densas vibraes danando nessa cmara letal. O vermelho quente de revolta, tons amarelos de medo, cores alaranjadas de remorso e listras negras de sofrimento, tudo invisvel aos sentidos terrestres, flutuavam ao meu lado no ar azedo e parado. Fui levada embora, arrastada atravs das paredes de concreto para a priso propriamente dita. O silncio era macabro e metlico, quebrado apenas pelos sons confrontantes de ao batendo e descargas de banheiro. Estou agora no meio de um grande pavilho de dois andares de concreto. Estou cercada por todos os lados por portas duplas de ao azul acinzentado acomodadas em pequenos trilhos na parte inferior. Respirando atrs daquelas pesadas portas, amontoados do outro lado das grossas paredes de concreto, esto homens que vivem em pequenas celas de cimento. O pavilho em que estou um de cinco, e em cada um h uma centena de celas. Este o corredor da morte, onde mais de quatrocentos homens aguardam sua vez de caminhar at a fria sala azul, onde estive instantes atrs. Observo as duas fileiras. Ao lado de cada porta, pintados em preto no branco, esto nmeros: HU411, HU412, e assim por diante. Cada nmero, uma cela; cada cela, um homem. Cela nmero HU345... Um homem que assassinou sua esposa e filho num ataque repentino de fria e frustrao. HU345 est cansado de mofar na gaiola de concreto solitria e sem vida, sob luz fraca. Os internos do corredor da morte passam vinte e trs horas por dia em suas celas, e HU345 j no suporta mais a interminvel mesmice de seus dias e noites. Uma vez ele disse que "viver no corredor apavorante, no apenas porque voc est aqui para morrer, mas, at que chegue o dia em que eles lhe enchem de produtos qumicos, voc sabe que amanh voc ainda estar em sua cela". Este homem j sonhava com a agulha letal que o aliviaria daqueles dias e noites sem fim. Ele j se dera por vencido. Cela nmero HU297. Ele um filho que cuidadosamente planejou o assassinato de seus ricos pais adotivos. Ele est ali h dezesseis anos, chegando quando tinha vinte. Ao contrrio de HU345, est, com seus advogados, lutando com unhas e dentes por sua vida. Mas seus apelos esto sendo em vo: a data de sua execuo est quase chegando. Durante suas noites insones e dias sem conforto, sua memria reconstri, repetidamente, as cenas de seu crime. Ele v os rostos de seus pais adotivos no momento em que atira neles, na cama. Ele ouve a nica me que conhecera, uma mulher que o incluiu em sua vida quando ele tinha seis meses de idade, gritando aterrorizada enquanto as balas do revlver do filho fazem o sangue de seu marido espirrar por todo o quarto. HU297 luta por sua vida nos tribunais porque tem pavor da morte. Ele tem medo de encontrar os rostos que v durante as noites interminveis em seu cubculo de concreto. Cela nmero HU324... Um homem no lugar errado, na hora errada. Ele inocente. Ningum ouviu seus protestos. Se voc ouvir estes prisioneiros, todos so inocentes. Ele vai se deitar na maca no quarto azul-claro e morrer. HU324 repousa em sua estreita cama, olhos vidrados no teto inacabado de concreto. Nenhuma luz solar alcana sua cela; esta priso foi construda sob o solo e coberta com dez metros de terra texana. A caminhada de HU324 pelo corredor at a

maca em forma de cruz est definida: um ms contando a partir do dia seguinte. Ele fica imaginando por qu. Ele um homem inocente na iminncia de encarar "a estaca", apelido da seringa que injetar o qumico letal em suas veias. Ele fica imaginando por qu. Eu queria poder dizer a HU324 que, enquanto ele uma vtima de um erro brutal, no existem acasos e nada acontece sem razes. Mas eu no estou aqui por causa deste homem. Posso ver que trs guias j esto a seu lado. Aceno para eles, que pesarosamente acenam de volta. Tenho certeza de que vo ajudar esse homem a ver o que estes oito anos no corredor da morte significam. As mesmas vibraes vermelhas, amarelas, alaranjadas e negras que estavam na cmara da morte habitam as filas duplas de corredores da priso. E, como traas esvoaando em volta de uma lmpada, vejo a formas sombrias e cinzentas de espritos desencarnados alimentando-se dessas vibraes. Essas sombras no so novidade para mim; elas vivem nas vibraes mais inferiores do mundo astral. Estes so espritos vivendo longe da luz, presos e atrados pelas vibraes negras da angstia, pelo vermelho quente da revolta e tons amarelos do medo. Como aqueles homens que respiram atrs das portas cinzentas em tumbas de concreto, estes espritos tambm so prisioneiros. No entanto, eles no esto trancados nas celas; seus prprios sentimentos de revolta, fria e dio os acorrentam. Outro puxo, e a onda me leva para fora da fria vibrao cinzenta de desespero. Mas sei que ainda vou voltar. A cela nmero HU245 est vazia. Um calafrio percorre todo o meu ser quando entro. No maior que um banheiro comum. No h janelas, apenas uma pequena e opaca lmpada coberta por uma rede de ao. A fraca luz ilumina vagamente a pequena sala, mas eu posso ver uma cama estreita sobre um bloco de concreto que aflora na parede cimentada. H uma privada e uma pia de ao brilhante parafusados na parede oposta porta de ao cinzento. Sobre o bloco de concreto que serve como cama, h uma estante de concreto. uma rea para guardar coisas, onde o prisioneiro pode colocar o que tiver de pertences pessoais. Isso tudo na cela HU245. Ela est espera de um novo hspede. A onda continua arrastando, levando-me para uma pequena e branca casa em uma silenciosa rua de trs faixas na cidade de Houston, Texas, Estados Unidos da Amrica. A suave mar me despeja no quarto do andar de cima do pequeno lar. O quarto est vazio, o sobrado em silncio; ningum em casa. Tudo quieto e tranqilo. Mas, distncia, vejo um redemoinho negro e vermelho se aproximando. Tudo que posso fazer esperar pelos eventos que vo ter lugar neste calmo quarto. Minha misso me encontrou. Os ltimos vinte minutos de Tom Tom Phillips era um homem racional. Talvez por isso ele amasse os nmeros. At onde ele podia se lembrar, sempre foi atrado por sua consistncia e lgica. "No importa o que acontea", ele sempre dizia, "um sempre um". Ele tambm vivia a vida "pelos nmeros". Tom era metdico, limpo e organizado. Ele se formou no segundo grau aos dezessete anos e entrou para a Universidade A&M do Texas

com uma completa bolsa de estudos com nfase, sem surpresa para ningum, em matemtica. Aos vinte e seis ele conquistou o doutorado em pesquisa matemtica aplicada. Um ano antes disso, casou-se, e nunca a mxima "opostos se atraem" foi to apropriada. O nome de sua esposa era Elizabeth Del Rio. Ela vivia conforme o nome. Sua paixo pela vida era, como em um rio, selvagem e turbulenta. A paixo e o amor de Tom por Elizabeth preencheu um vazio na vida limpa, lgica e previsvel que ele havia planejado para si mesmo. O casal tambm era o oposto fisicamente. Ele tinha mais de um metro e oitenta de altura, com cabelos louros e curtos, ossos da face proeminentes e testa larga. As pessoas raramente adivinhavam o que ele estava pensando; Tom quase nunca deixava qualquer tipo de emoo transparecer em seus olhos azuis e observadores. Elizabeth era baixa, mal chegava a um metro e sessenta, e tinha longos, fartos e lisos cabelos negros. Contudo, eram seus olhos o que mais chamava a ateno alheia. No eram sem emoo, como os de Tom; os dela eram profundos, negros, vivos, descuidados e perspicazes. Tom estava feliz. Elizabeth abriu as portas para uma vida que ele jamais ousaria iniciar sozinho. Elizabeth estava feliz. Ela amava seu belo e jovem professor que lhe trouxe estabilidade. Tom era tmido e temia suas emoes. Era difcil para ele sair da concha que cuidadosamente construiu ao seu redor, mas Elizabeth constantemente o instigava a sentir todas as emoes que a vida podia oferecer. O mundo dele era em preto-e-branco, mas o dela era um mosaico de azuis, rosas e violetas. Eles se amavam muito, e ainda se amam. Estavam casados havia cerca de dois anos quando compraram uma casa numa rua larga num calmo subrbio de Houston. Era o lar dos sonhos de Elizabeth: branco, com trs quartos, um sobrado no estilo colonial. Ela dizia que a nica coisa que faltava era uma criana. Tom achava que deviam dar um tempo antes de comear uma famlia: Vamos deixar a vida se ajeitar um pouco - disse a ela. Ele acabava de iniciar sua carreira como professor universitrio, e Elizabeth, que se graduou em artes dramticas, lecionava em um colgio local de Houston. Mas Elizabeth, sendo Elizabeth, queria uma criana o quanto antes: Assim, ns trs podemos comear nossas vidas juntos. Como sempre, Elizabeth ganhou. Jessica nasceu. E, como sempre, Elizabeth estava certa: suas vidas comearam quando a menina nasceu. Se Elizabeth era a paixo de Tom, Jessica era sua luz. Desde o momento do nascimento, a pequena garota passou a ser uma extenso dos braos do pai. A vida era boa e plena, enquanto os trs criavam razes no sobrado branco. Os anos no passavam depressa. Passavam lentamente, e cada dia era vivido e saboreado. A vida era boa. Tom estava agora com trinta e um anos, Elizabeth tinha vinte e seis, e Jessica, a queridinha de Tom, tinha trs. A criana era linda, quase angelical. Tinha cabelos louros cacheados,

bochechinhas gordas e, ao contrrio dos de seu pai, seus olhos eram profundos e sagazes. Tom era marido, professor universitrio e pai. Ele recebeu uma verba do governo para suas pesquisas, tinha artigos publicados em uma prestigiada revista acadmica e construa um nome slido nos crculos acadmicos. A vida era boa. Elizabeth tomava conta de Jessica e noite tinha voltado a estudar, fazendo aulas de criao literria. Ela queria escrever uma pea de teatro. A vida era boa. Tom era o devotado pai de Jessica. Ele sussurrava enquanto ela dormia em seus braos: Sou seu papai, seu amigo e seu protetor. Sempre estarei ao seu lado, querida. A vida era boa. Jessica tinha trs anos e seu mundo eram as flores do quintal da famlia, as borboletas que esvoaavam e fugiam quando ela corria atrs delas e sua amizade com um garotinho do outro lado da rua. A vida era boa. Ento isso acabou. Suas vidas foram interrompidas mais ou menos vinte anos atrs, naquele pequeno quarto no andar de cima, em Houston, onde, invisvel e pacientemente, eu aguardava. O relgio digital no criado-mudo de Tom marcou a hora: dez da noite, numa sexta-feira. Jessica dormia no lado da cama que era de Elizabeth. A menininha queria esperar acordada pela me, mas, como sempre, no conseguia manter seus olhos abertos. Tom, trajando bermudas e camiseta, estava sentado em uma cadeira ao lado da cama, vendo TV. Ele estava preocupado com Elizabeth. Ela devia estar em casa meia hora atrs. A faculdade onde ela fazia seu curso literrio ficava a dez minutos de carro dali. "Talvez ela tenha parado para fazer compras ou para uma cerveja com os amigos", pensou. "Ela logo vai estar em casa", acalmou a si mesmo. Os nmeros no relgio digital mostravam onze horas. Ele sabia que alguma coisa estava errada. Elizabeth no era assim. "Ela teria me ligado para avisar, se fosse ficar at tarde", afligiuse. O telefone estava quieto. Tom desligou o televisor. O quarto estava quieto. Ele escutou os sons que vinham da rua, esperando ouvir o reconfortante barulho do carro dela entrando na garagem. Nada. Os minutos se alongavam agonizantemente at quinze, vinte e trinta. O sono de Jessica ficou agitado. Os nmeros digitais silenciosamente mostravam a hora: quinze para a meia-noite. Nada de Elizabeth. As ruas estavam quietas. Assim como o quarto. Os nicos sons vinham da respirao pesada de Jessica e das batidas de seu prprio corao. Nada vinha da rua l fora. Nada vinha da garagem. Nada de Elizabeth. Tom foi at o telefone, ao lado do perturbador relgio. Ele estava prestes a chamar a polcia quando ouviu o rudo familiar do carro de Elizabeth entrando em sua garagem. A ansiedade rapidamente se transformou em alvio, to

rapidamente quanto o alvio se transformou em irritao. "Por que no ligou? Onde voc estava? Como pde nos fazer esperar?", dizia para si mesmo. Ele colocou o fone no gancho, pulou da cama e correu para a porta do quarto. Tom escutou o som das chaves na porta da frente. Porm, ainda no alto da escada, ele percebeu que alguma coisa estava muito errada. Quem quer que estivesse com as chaves, no as acertava na fechadura, colocando uma, depois outra, depois outra no buraco, at encontrar aquela que serviu. Ele se atirou de volta para o quarto. Jessica dormia, sem saber que sua me estava atrasada e que havia um estranho na porta da frente. Tom trancou a porta do quarto sabendo que suas frgeis dobradias jamais manteriam o estranho do lado de fora. Ele foi at o telefone e discou o nmero de emergncia da polcia. Ele esperou... esperou... esperou a telefonista atender do outro lado. Tom ouviu o intruso praguejar quando tropeou em algum dos mveis. Tom comeou a suar frio enquanto os passos do estranho subiam a escada para o andar de cima. Seu corao disparou esperando a polcia atender a ligao. Meia-noite e um. Seus olhos vasculharam o quarto, procurando desesperadamente por uma arma. No havia nada... Talvez um abajur para atirar em quem quer que estivesse subindo as escadas. No havia nada... Talvez ele pudesse atacar o estranho com a tesoura deixada sobre o criado-mudo de Elizabeth. Os toques cessaram. A polcia estava na linha. Arrombador... na estrada Olive Branch, 567. Ajudem agora - sussurrou depressa. Instintivamente, no desligou o telefone, mantendo a conexo ativa. Foi engatinhando at a porta do quarto, parando apenas para apanhar a tesoura. Rente porta, ouviu a respirao do homem do outro lado. O que voc quer? - Foi a nica coisa que conseguiu pensar em dizer. Tentou de todo jeito esconder o forte medo em sua voz. A resposta chegou por meio de uma voz jovem e rouca. Abra a maldita porta ou arrebento com ela, meu chapa. Espere um minuto... Eu tenho dinheiro. Deixe-me pegar minha carteira. Eu passo todo o dinheiro e os cartes de crdito por baixo da porta. Deixe-nos em paz. Tom percebeu que choramingava de medo enquanto falava. Ele sentiu o terror gelar seu estmago. Olhou para Jessica, ainda dormindo, e agradeceu a Deus por ela inocentemente ignorar o drama que se passava a pouco mais de um metro dela. Quanto voc tem? - quis saber a jovem voz. J digo a voc, me d um segundo para contar - respondeu Tom, alcanando a carteira no guarda-roupa sua esquerda. Meia-noite e quatro. Ele olhou para o telefone, ainda fora do gancho, e rezou para que o socorro estivesse a caminho. Cinqenta. Cinqenta dlares e cartes de crdito. tudo que eu tenho, verdade - informou ansiosamente. Merda, cara, voc tem de ter mais do que isso - a voz disparou de volta. Sem avisar, o intruso arrombou a porta e ento a voz passou a

ter um rosto: branco, jovem, uns vinte e cinco anos, cabelos fartos e pretos, olhos castanhos saltados. E, na mo direita, um revlver. O estranho vasculhou o quarto com seus olhos tensos, parando no criado-mudo, onde viu o fone fora do gancho. Ele riu abafado. Mantendo a arma apontada para o peito de Tom, o estranho calmamente caminhou at o telefone, tomou o aparelhou e sarcasticamente falou: Cancelem a pizza - e riu no bocal. Depois arrancou o fio da parede. Jessica acordou. Papai, o que est acontecendo? Quem ele? - grita ela, e Tom v o medo nos olhos azuis arregalados de sua garotinha. Ele olha impotente enquanto a sensao se espalha, tomando todo o ser da criana. Ainda apontando a arma para Tom, o estranho cabeludo voltou-se para Jessica. Muitos anos depois, Tom me contou que deveria ter tentado atacar o intruso naquela mesma hora: Mas apenas fiquei l, no alto dos meus um metro e oitenta e seis, de bermuda e camiseta, grudado no cho e aterrorizado. Dormindo com a menina - debochou o homem enquanto estive dormindo com sua esposa - acrescentou com um gracejo. Bem, talvez no dormindo com ela, mas comendo. Como voc acha que consegui as chaves, bundo? Ele riu quando Tom perguntou onde ela estava: Mais perto do que voc pensa - respondeu, indicando com um meio sorriso o carro de Elizabeth, pela janela. Jessica comeou a chorar e correu para Tom. O estranho a interrompeu, batendo nela com a mo esquerda. Todavia, o revlver na mo direita ainda apontava para Tom. Mantenha a menina sob controle e mande que ela cale essa maldita boca - ordenou. Tom vagarosamente ps o dedo sobre os lbios, implorando a Jessica que ficasse quieta. Ela obedeceu, trmula de pnico sobre a cama. O que voc quer? - suplicou Tom. Mais que cinqenta dlares - a resposta veio sarcstica. E melhor conseguir depressa. Eu no sou nenhum babaca. A polcia vai estar aqui j, j, ento levante o rabo da. Juro que tudo que eu tenho. - Tom comeou a chorar. seu, leve tudo, os cartes de crdito tambm - disse, apontando para sua carteira. Voc acha que cinqenta vo me deixar feliz, cara? Sua mulher, bem, ela est no porta-malas. Fez muito barulho, est morta. Eu no tenho nada a perder e no estou nem a. Meu, que perda de tempo isto aqui - disse, olhando com ansiedade pela janela. O intruso suspirou e um sorriso torto se formou nos cantos de sua boca. Ele tomou uma deciso. Tom sentiu um calor molhado descendo por suas pernas. Olhou para o cho e viu uma poa de gua a seus ps. O estranho notou uma mancha crescendo na bermuda de Tom e uma listra amarelada descendo por suas pernas at a pequena poa no cho. Ele riu prazerosamente com a humilhao de Tom. Ei, menina, olhe seu corajoso papai: ele est mijando nas calas. Seu papaizo no vai ajudar voc, garotinha. Seu papaizo no pode nem se ajudar - disse, gargalhando.

O jovem intruso quase sentiu um orgasmo com a humilhao de Tom. Ele se encheu de poder e confiana, sabendo que tinha o controle da situao. As emoes de Tom tambm se tornaram extremas. Revolta: quem este canalha? Como pode vir minha casa e fazer isso? Fria: onde est o raio da polcia? Frustrao: o que esse animal fez com a minha esposa? Medo: o que vai acontecer com Jessica e comigo? Humilhao: que tipo de homem sou eu, molhando a cueca enquanto um estranho ri? Por que no fao nada? Sabe, seu intil, eu acho que sua mulher gostou mesmo. Quero dizer, ela tentou lutar no comeo, mas, assim que enfiei nela, pedia por mais. O estranho viu a mancha na bermuda de Tom e debochou: Vai ver, s o que essa coisa boa para fazer: mijar. distncia, ouviu-se o som de sirenes da polcia. Por um breve segundo, Tom sentiu-se aliviado. Mas foi s por um segundo. A cavalaria vai chegar um pouco tarde para vocs, gente disse o estranho, imitando um cowboy. Tenho de sair daqui, no posso levar prisioneiros - acrescentou rindo. Tom estava paralisado de medo quando o estranho se virou para Jessica. Sem reagir, ele assistiu a como o assassino puxou o gatilho, apagando a luz da vida de sua filha. Um som surdo e rpido, e estava acabado. O sangue da garotinha rapidamente encharcou o lenol da cama. Sua vez, bonito - avisou friamente o matador. Deveria fazer voc cair de joelhos e implorar. Tenho a sensao de que voc gostaria disso. Mas estou sem tempo para gracinhas e brincadeiras. uma pena no podermos passar mais tempo juntos - disse, piscando e sorrindo de modo doentio. E atirou. Duas vezes. Estava tudo acabado. Uma dor intensa, primeiro no peito, depois nas entranhas. Onda de dor sobre onda de dor mutilando o corpo fsico; uma exploso branca sobrecarregando o crebro. Ento, como um curto-circuito eltrico, estava acabado. Nada. Tudo escuro. Tudo vazio. Exceto pela revolta, fria, medo e humilhao que ele carregou consigo. Durante os ltimos vinte minutos, assisti impotente a um homem matar uma criana de trs anos de idade, depois humilhar e assassinar Tom. Agora, segundos depois que o esprito de Tom quebrou o delicado cordo prateado conectado ao seu corpo fsico morto e sangrando, eu ajo. Correndo para abraar Tom, meu esprito sente toda a angstia e dor ardendo dentro dele. Eu sabia que tinha de fazer alguma coisa depressa. dio e fria se espalhariam como um cncer por toda a alma de Tom. No havia muitas opes. Eu sabia que no havia como esse esprito ser guiado calma e gentilmente pela passagem da Terra ao esprito. Nenhum guia poderia romper a turbulncia de seu esprito. No era a hora de explicar que ele, Elizabeth e Jessica ainda estavam vivos. Tom no entenderia. Ele estava tomado pela revolta, medo, fria e humilhao de seus ltimos minutos na Terra. No havia nada que pudesse ser dito ou feito para aliviar a dor. No entanto, eu sabia que no poderia deix-lo afligir-se por suas emoes. O esprito se contaminaria, tornando-se prisioneiro de suas vibraes densas e pesadas.

Apesar disso, fiz o que havia para ser feito. Coloquei o esprito em um coma profundo, em que descansaria at que eu pudesse decidir o que fazer. Esse sono suspenso no afastaria o medo, no diminuiria a fria nem apagaria de sua memria os momentos finais na Terra. Essas emoes fariam parte de seu esprito para sempre, e Tom teria de lidar com elas. Contudo, agora no era o momento. Enquanto eu trazia seu esprito entorpecido para dentro da quarta dimenso, outro guia flutuava, abraando o esprito da pequena Jessica. No plano terrestre, o relgio no antigo quarto de Tom marcava meia-noite e vinte e um minutos, e as lentas e inabalveis rodas do carma moviam-se. Os eventos no quarto em Houston emitiam suas prprias e singulares ondas atravs do Universo. Um lao fora criado entre Tom, Jessica, Elizabeth e o assassino. Aquelas ondas tocaram o plano terrestre, alcanando outras, que pela sua prpria histria espiritual estariam dispostas no drama crmico que estava para comear. As rodas do carma giram Assim que deixamos a Terra e entramos no plano astral, refleti sobre minha misso. Eu no tinha idia de que esse era o comeo de uma estranha e difcil jornada. Como o tempo e o espao no existiam e a freqncia das vibraes se intensificava, pude analisar a situao na qual fui atirada. Nossas "anlises de guias" so ensinadas para que recriemos as circunstncias de nossas misses sem nos envolver nelas. Clara, nossa instrutora, disse que era importante que estivssemos separados de nosso trabalho: Vocs esto l para guiar o esprito desencarnado, no para se envolver com seus carmas pessoais - alertou. Com o esprito de Tom desacordado ao meu lado, projetei diante de mim o que havia acontecido e repassei os fatos, como eu os compreendi. Fui levada at aquele quarto por Tom, no por Jessica ou Elizabeth. Eu estava l enquanto o pistoleiro o insultava e provocava, descrevendo sadicamente como ele assassinou e estuprou sua esposa. Eu estava l quando o jovem matador apontou friamente sua arma para Jessica, encerrando sua vida com um simples tiro em sua cabecinha. E finalmente, depois de sofrer toda a dor e humilhao que ele pde agentar, vi Tom ser atingido por dois tiros de revlver. Trazendo Tom para o plano astral, tentei cobri-lo com todas as vibraes de amor e conforto que pude agregar. Eu sabia que isso no seria o suficiente, que havia muito trabalho pela frente, pois o esprito de Tom estava atado Terra. Naqueles ltimos vinte minutos de vida fsica, seu esprito sentiu mais emoes do que a maioria de ns experimenta em toda a encarnao terrestre. Havia uma razo para isso, e eu sabia que, mais cedo ou mais tarde, eu iria descobrir qual era. Enquanto o sono anestsico perdurava, fiz um pequeno esforo para reanimar a alma torturada que eu carregava. Tom, meu nome Maryanne. Eu sou sua guia. Sou sua amiga, sou o que voc quiser que eu seja. Vou tomar conta de voc e farei qualquer coisa para ajudar. Por favor, no se desespere. Tudo que aconteceu era porque tinha de ser, e o que acontece agora s depende de voc. Ele no entendeu; no poderia. Tudo que eu queria fazer era

confort-lo. Eu me lembrei de meus tempos na Terra, quando um simples toque quente de uma mo humana podia aliviar mais dores do que o mais poderoso analgsico. Ento, acalentei seu esprito com luz, tentando desesperadamente amenizar sua angstia. Assim, o esprito dormia. Mas esse no seria um sono tranqilo ou repousante. No entanto, nem todo esprito que desencarna dorme. Tom estava em um coma para que eu pudesse, falando francamente, ganhar algum tempo para resolver o que ia fazer. Essas transies da Terra ao plano espiritual so iguais para todos, porque ns somos iguais. Ns somos feitos imagem e semelhana do nosso Criador. Todos podem achar o conforto, a ajuda e a luz de que precisam. Contudo, nossas passagens so diferentes porque somos diferentes. Cada esprito tem experincias nicas, passa por julgamentos diferentes e aprende lies diferentes. Tom no poderia viver para sempre no vcuo em que o coloquei. Ele teria, em algum momento, de retomar seu caminho na evoluo espiritual. Quando ele o fizesse, eu seria sua guia. Eu, que tambm morri por uma bala disparada, estaria com ele. Meu esprito, que morreu em revolta, medo e humilhao, ajudaria este esprito cujos ltimos momentos na Terra foram cheios de revolta, medo e humilhao. Eu estava l em Houston porque tinha de estar. Meu esprito foi atrado pelas vibraes emocionais daquele quarto. Eu no estava ali porque sou revoltada, mas sim porque j fui. Eu tive uma morte brutal e, como uma pobre e ignorante adolescente negra, vivi humilhaes no plano terrestre. O ciclo est completo porque: Da humilhao, vem a compaixo. Do medo, vem a coragem. Da revolta, vem a compreenso. Quando o corpo fsico de Tom explodiu em sangue e sua mente fsica se encheu de dor, lembrei-me de minha prpria passagem repentina e violenta. No incio, no aceitei a morte. Fiquei presa na esfera terrestre. E o mesmo aconteceu com Tom. Ele est preso pelo medo: temendo a arma apontada para seu peito. Est preso pela raiva: ouvindo a voz zombeteira de seu assassino dizer a ele que estuprou e matou sua mulher. Est preso pela humilhao: molhando as calas diante do terror e da impotncia, incapaz de proteger e defender sua filha de trs anos de idade. Ele est preso pelas ltimas emoes de sua vida na Terra. Vou dar o melhor de mim por ele, como Bob, meu guia, o fez por mim. Eu o coloquei nesse sono profundo, temporariamente congelando sua ira, fria e frustrao. Mas essas emoes no se dissolveriam. No funciona assim. Elas sero sempre parte dele, porque todos ns somos a soma total de nossas encarnaes. Ele teria de aprender. Ele no podia se purificar de sua raiva porque precisava entender a raiva. Ningum pode lhe apagar a humilhao que corri sua alma porque ele teria de amadurecer a partir da degradao. Toda esta encarnao seria em vo se uma varinha mgica fizesse desaparecer a violncia de seu esprito. Nada,

nada, nada por acaso: nem mesmo ser vtima de um crime hediondo. Eu precisava de tempo. Sabia que aquele esprito encarava o maior perigo de todos: a fixao. Ele podia ficar to possudo por suas emoes que seria atirado de volta ao seu quarto na Terra para viver e reviver incessantemente os momentos finais de sua vida. Ou poderia tentar atormentar e torturar seu assassino, compulsivamente. Se isso acontecesse, ele estaria preso; no haveria cura, progresso ou aprendizado. Agora mesmo, eu precisava de tempo para pensar e Tom precisava de tempo para se libertar do tempo. Em breve, o tique taque do tempo ainda suspenso vai libertar toda a sua revolta, humilhao e fria, que ferveriam em sua alma. E, ainda por cima, eu sabia que algo mais estava acontecendo. Comecei a entender o que o ditado "Deus age de forma misteriosa" significava. Eu no estava naquele quarto apenas por ele. Eu senti uma atrao por um outro esprito, tambm. No era por Jessica, a menina assassinada. Seu guia espiritual j a havia encontrado. No era por Elizabeth, a esposa estuprada e assassinada de Tom. Ela tambm tinha amparo ao seu lado. Era pelo assassino, o homem que estuprou Elizabeth, matou a pequena Jessica e assassinou friamente Tom. Seu nome era David. Era por ele, que, assim como Tom, Jessica e Elizabeth, tambm era um esprito formado por nosso Criador. Era por David, que tambm nosso irmo. Como pode ser? - perguntei ao Universo. Como posso eu ajudar a vtima e o assassino? A resposta veio no do Universo, mas sim l do fundo de mim mesma. Eu tambm fui assassinada, e essa era a resposta: esta misso era parte de minha prpria evoluo espiritual. fcil ter compaixo pela vtima, mas o esprito que matou e estuprou precisa de mais do que compaixo, precisa de cura e esclarecimento. Mas eu ainda estava confusa: "Como posso ajudar ambos? Por que a vtima e o assassino?" Mais uma vez, to depressa quanto a pergunta, veio a resposta: nossos destinos esto to entrelaados que, ajudando um, eu iria ajudar o outro. Assim, enquanto Tom dormia, viajei de volta pequena casa branca em Houston para dar mais uma olhada em David. Desta vez, deslizando pelo tempo e dimenso, trouxe comigo a lembrana de que, no importava o que David havia feito, ele tambm era parte do Criador, da mesma forma que todos ns. Um assassino tem uma alma? Se voc o encontrasse antes do crime, provavelmente ele se descreveria assim: Meu nome Dave Heinz. Tenho vinte e seis anos de idade. No tenho mais nada a dizer, porque tudo o mais no da sua conta. Tudo que precisa saber que sou um cara muito bonito e adoro uma festa. Se voc falasse com ele depois dos assassinatos, ele teria sido sarcstico: , eu sou o grande matador e estuprador. E da? No ligo para o que voc pensa porque no devo merda nenhuma a

ningum. Ele ria quando estava sentado com as algemas no banco de trs da viatura policial. Vocs chegaram aqui muito tarde. Logo depois que eu atirei neles, eu ouvi suas estpidas sirenes. Vocs pensam que a gente surdo? Aposto que vocs se excitam brincando com essa sua sirene. O cara achou que era esperto, deixando o telefone fora do gancho. Bom, acho que no era esperto o bastante - disse isso e gargalhou. Ele est morto, como a menina e a mulher. Cara, ela era gostosa. Tive uns bons momentos com ela, antes de apag-la. O criminoso quase escapou. Enquanto trs viaturas policiais apitavam na entrada da rua onde a famlia de Tom vivia, David j estava escada abaixo com os cinqenta dlares enfiados no bolso da cala. Mais cedo, ele havia pegado vinte e cinco de Elizabeth. O placar final foi de trs mortos e David setenta e cinco dlares mais rico. Melhor do que nada. mais do que tinha antes disso pensara, guardando o que roubou quando atravessava correndo a cozinha da famlia. David tinha comeado aquele dia como fazia quase todo dia nos ltimos trs meses: bebendo. L pelas oito da noite, depois de descansar da farra da tarde, ele estava cruzando as ruas em busca de ao e dinheiro. Por volta das dez, ele viu Elizabeth. Ela estava saindo de um pequeno restaurante da vizinhana onde encontrou amigos de sua aula literria. Ele a perseguiu. Pretendia roubar sua bolsa. Em vez disso, quando ela chegou ao seu carro, ele teve outra idia. Enquanto ela abria a porta, David surgiu das sombras e, usando seus oitenta quilos e a estatura de um metro e noventa, agarrou a pequena mulher e a jogou no cho do carro. O punguista usou um revlver para garantir silncio, e no banco da frente do carro da famlia ele a estuprou. Ele ficou excitado e no foi por estmulo sexual. O que assumiu o controle de seu corpo e mente era diferente: ele estava inebriado pelo poder, domnio e controle. Nunca antes ele se sentiu assim. Quanto mais Elizabeth se debatia, mais estimulado ele ficava e mais brutal e duramente ele penetrava. Quando ele acabou, agarrou a garganta dela, esmagando sua traquia. Duas horas depois, com Elizabeth morta e jogada no porta-malas do carro, ele tomava o rumo da casa da famlia. Vinte minutos depois ele fugia do quarto, setenta e cinco dlares mais rico e com um revlver ainda quente preso cintura. Ouvindo as sirenes se aproximando rapidamente, ele jurava que a polcia no conseguiria apanh-lo. "Posso enganar esses idiotas", disse a si mesmo. Mais tarde, depois de preso, ele disse ao advogado que lhe foi indicado pelo Estado: Pensei que poderia escapar. Foi por isso que atirei na criana e no sujeito. Eu no podia deixar ningum para trs que me identificasse. Nada pessoal, assim que as coisas funcionam. O sujeito era um fraco, apesar de tudo, mijandose todo. Ele devia ter reagido. Eu o teria matado de qualquer maneira, mas ao menos ele morreria como um homem, no como um maricas. David, tentando fugir, viu os trs carros com suas luzes azuis e vermelhas piscando parados em frente casa. Ele decidiu correr cruzando o quintal. Foi rapidamente at a cozinha e l estava a porta, como ele esperava. No estava nem sequer

trancada. "Diabo", pensou, "estes idiotas mereceram isso. Nem se preocupam em trancar a porta dos fundos com gente como eu solta por a", pensou, num sorriso forado. David correu no escuro da noite, parcamente colorida pelas luzes azuis e vermelhas piscantes das viaturas policiais. Ele estava trmulo com toda aquela ateno. Por toda a vizinhana, casa depois de casa, janelas estavam abertas, luzes acesas nas varandas e pessoas reunidas em seus gramados. A rua normalmente tranqila estava em alvoroo com as luzes e sons da polcia. "Aposto que tambm ouviram os tiros", imaginou David, vendo aquela gente em seus pijamas e camisolas fazendo fila pelo quarteiro. "Bom, pelo menos eu pus alguma emoo na vidinha estpida deles", riu o assassino. Ele sabia que a polcia iria fechar as sadas do quarteiro, sabia que teria de tomar uma atitude naquele momento. Vendo que no havia cerca separando o quintal de Tom do de seu vizinho, David decidiu se atirar em direo rua no outro lado. Tinha certeza de que ningum o havia visto. O grupo de vizinhos fora atrado pelas luzes vermelhas e azuis na frente da casa; era l que a ao estava. Ele era apenas uma sombra em meio a sombras. David percebeu que os policiais estariam com o quarteiro cercado em dois ou trs minutos. At l, ele estava certo de que estaria a trs ou quatro blocos dali. Ele planejou pegar a estrada principal, onde desapareceria na escurido da noite. Os policiais gritavam pelos megafones para o assassino que no podiam ver: Voc a na casa, saia com as mos para cima. Voc tem trinta segundos. "Que idiotas", pensou o matador. "O tal 'voc' sou eu, e estou voando to rpido quanto meus ps conseguem me levar. Ento, de repente, ele voou mesmo, e aterrissou de cara no cho na grama mida do quintal de Tom. Ele pensou que havia escorregado no gramado molhado, mas, quando tentou se levantar, sua perna direita enviou um impulso de dor para seu crebro. Ele tentou de novo, mas desmoronou no cho. O assassino, na nsia de achar uma sada, viu que uma mangueira de borracha amarela estava enroscada em sua perna direita latejante. Que droga - diria ele depois ao seu advogado , eu tropecei numa mangueira. O mijo tinha deixado a mangueira no quintal. Deslocou meu tornozelo, ainda. Eu ia conseguir escapar daqueles policiais barrigudos. Ele sabia que estava acabado. A qualquer momento, a polcia chegaria ao quintal. "Eu j devia estar longe daqui a esta hora. Eles vo me pegar porque o maldito suburbano regou seu gramado. Merda, ele merecia morrer", praguejou o matador. Com seu tornozelo inchando e doendo, ele ainda achou que podia mancar para fora do quintal. Notou que sua arma tinha cado no cho. Ele se sentiu nu. "J devia estar na estrada principal; eles nunca me achariam", rosnou para si mesmo. Ele ouviu mais sirenes: ambulncias e mais viaturas. O quarteiro estava cercado. No havia mais lugar para ir, nem para se esconder. Ele viu que a casa bem sua frente estava s escuras. Ningum l dentro. Era sua nica chance. David rastejou at a porta dos fundos. Estava desesperado. Sua arma estava em algum lugar na grama molhada, seu tornozelo

latejava de dor e aquela porta estava bem trancada. Ele se levantou, agarrando-se maaneta. A dor no tornozelo o deixava sem flego. A polcia entrou. Vieram pela frente da casa de Tom at o quintal, as poderosas lanternas cortando o escuro da noite. David amaldioou a mangueira amarela do jardim. Ele viu dois policiais vasculhando o cho com seus feixes de luz. Estavam a uns dez metros dele. A qualquer momento ele seria pego por aquelas lanternas. A sua esquerda e sua direita, a polcia apertava o cerco. Estavam to prximos que ele ouvia o chiado de seus rdios. A cada segundo que passava, a conversa nos rdios ficava mais alta e, a cada batida de seu corao, os feixes de luz chegavam mais perto. Ele no podia fugir dos bobocas da polcia, e mais uma vez amaldioou a mangueira do jardim "e o mijo que a deixou l". David perdera sua arma. Ele "j no poderia sair dessa como um homem". Sua cabea queimava e trabalhava depressa, procurando uma sada. E, como um coelho encurralado, viu que no havia nenhuma. "Que inferno, melhor desistir e continuar vivo. Melhor do que levar um tiro no quintal de um estranho." Aqui - gritou, com as mos vazias no ar. Eu sou quem procuram. Nenhum revlver, podem ver. Imediatamente, dois feixes de luz iluminaram seu corpo. Deitado no cho, braos e pernas abertos, agora - vociferou algum. Ok, no atirem. Estou desarmado - respondeu o assassino, deslizando no solo, de cara para o cho, braos e pernas abertas. Dois policiais atacaram: um puxou os braos do matador para trs, algemando rudemente seus pulsos um no outro. O outro, com o revlver pressionado contra a cabea de David, inclinou-se e gritou no ouvido do assassino: Seu canalha! - David podia sentir o hlito do homem. Foi voc quem assassinou aquele sujeito e a menininha. O policial no perguntou. Foi uma afirmao. No digo nada a vocs, bundes, sem um advogado - David respondeu. Conheo meus direitos. O policial agarrou David pelos cabelos e empurrou seu rosto contra o cho. David sentiu o gosto da poeira. Direitos. , imprestvel. Voc tem direitos. Voc vai direitinho para Terrell. David no sabia do que o policial estava falando. Ele descobriria logo. E eu, de uma dimenso invisvel, presenciei. Eu, Bob e o rio do tempo Existem coisas assim como fantasmas? Casas, florestas e cemitrios assombrados so reais? As respostas so duas: um simples sim e um simples no. No. Fantasmas no existem. Sim. O que existem so espritos desencarnados que j viveram na Terra. Estes espritos, por sejam l quais forem as razes, agarram-se ainda s vibraes terrestres, recusando-se a soltlas. Essa obsesso com suas vidas anteriores transforma esses espritos em prisioneiros do tempo e espao, assombrando os lugares onde j viveram, trabalharam ou mesmo morreram. Essa fixao chamada "anexao", e seus resultados so

trgicos. Espritos anexados so paralisados pelo passado, incapazes de encarar o futuro. Tom estava na direo da anexao e, sem trocadilhos, isso me assombrou. Como guia, meu trabalho fazer de tudo, mesmo contra minha vontade, para ajud-lo a amadurecer, aprender e evoluir. Contudo, por sejam l quais forem as razes, ele se tornou um esprito obcecado, e um trabalho que j era duro ficou infinitamente mais difcil. Teria de haver uma maneira de afast-lo da humilhao, revolta e fria que carregava desde o plano terrestre. Se eu falhasse e Tom escolhesse abraar essas emoes, ele se tornaria um prisioneiro. Em outras palavras, seria uma assombrao. Eu sei alguma coisa sobre assombrar. Depois de minha prpria morte, eu estava to atada minha velha vida que foi preciso um longo tempo at que eu entendesse que j no era mais parte da Terra. Ainda me lembro dos incontveis dias e noites sem fim perambulando pela minha velha vizinhana procurando por respostas que ho podiam ser encontradas. Eu no queria Tom assombrando seu quarto em Houston; suas respostas tambm no estavam l. Anexao uma droga, viciando a gente aos eventos e emoes, e um esprito no precisa estar desencarnado para sofrer desse vcio. Existem inmeros espritos encarnados presos no redemoinho da anexao. Eu vou provar isso. D uma olhada em si mesmo. Algum ou alguma coisa j o fez ficar to nervoso que voc continua vivendo e revivendo a experincia em sua memria repetidamente? Voc j perdeu um emprego, uma posio ou um relacionamento? Essa perda consumiu voc, tornando sua mente em um turbilho de porqus e o que poderia ter acontecido? Voc tem de fazer uma escolha: pode seguir adiante ou pode se trancar num crculo de frustrao e raiva. Agora pode comear a entender a seriedade da situao de Tom. Momentos antes de ser morto, ele descobriu que sua esposa tinha sido estuprada e assassinada, ento ele assistiu impotente a quando o estuprador disparou uma bala no crnio de sua filha. Como voc se sentiria? Eu poderia trabalhar com Tom; pelo menos ele estava em minha dimenso. Mas eu no tinha a menor idia do que fazer com David. Ele ainda estava encarnado na Terra. Como poderia alcan-lo? Eu precisava de ajuda. Simplesmente por eu estar desencarnada no me faz mais esperta, sbia ou sagrada que voc. Eu simplesmente vejo a vida de uma perspectiva diferente. Daqui, alguns de ns vem eventos antes que eles aconteam. Mas, mais importante que isso, ns vemos o que j aconteceu de uma janela enorme e universal. "Rapaz, como eu precisei dessa enorme janela universal agora", pensei. Eu procurei por conselhos. Minha primeira parada foi com outros guias "coming over". Eles no foram de muita ajuda. No h muito que possa fazer - um deles deu de ombros. Tom far suas prprias escolhas, no importa quanto tempo isso leve. David j fez a sua e - acrescentou o guia de forma preocupante - ele viver com as conseqncias de sua escolha. Outra guia me aconselhou a levar isso numa boa:

No interfira e no se envolva. Seu trabalho dar a Tom amor, compaixo e orientao. E, assim como para aquele na Terra, ele ter o que merece. Deixe-o em paz, os eventos vo se encaminhar. Sempre assim, voc sabe - acrescentou com um sorriso sabido. Outro esprito, que como eu havia se tornado um guia recentemente, quis saber se David estava muito apegado personalidade terrestre que ele criou para si mesmo. Isso, pensava o guia, dificultaria nossa ajuda: Ele fez sua escolha e criou seu carma - foi tudo que ele sugeriu. Envie vibraes de amor e compaixo - aconselharam outros. - Isso tudo que pode fazer pelo que est na Terra. Como eu dizia, ns no ficamos nem mais espertos ou sbios que voc. Francamente, eu pensei que aqueles conselhos eram inteis. Sabia que havia uma razo pela qual eu fui enviada a Tom e David. E estava certa de que isso era mais do que simplesmente enviar boas vibraes. Amor e compaixo so palavras simpticas, mas como poderia tornar palavras em ajuda a um rapaz de vinte e seis anos a caminho do corredor da morte? Como poderia transforma amor e compaixo em ao? Ainda precisando de respostas, voltei a Bob. Pensando nele, enviei ondas atravs do universo e aquelas ondas trouxeram-me um pr-do-sol em vibrantes cores rosa, azul e roxo. Na realidade, eu no ia at Bob, ele vinha a mim. Ele vive em uma esfera que no estou pronta para alcanar. Assim, para responder meu chamado, ele rebaixou suas vibraes. Ns nos encontramos s margens gramadas de um rio profundo e vagaroso. Sua gua era clara e o sol graciosamente estalava seus raios sobre a tranqila superfcie do rio. Mesmo o ponto mais profundo podia ser visto, conturbado apenas pela suave ondulao da corrente se movendo devagar. Bem agora, o rio explodia em cores, refletindo os tons rosa, prpura, dourados e alaranjados do pr-do-sol. Eu venho muito aqui, tanto sozinha como com amigos, para me refrescar na calma do espelho d'gua do rio. Bob e eu unimos nossas vibraes nestas margens. No precisvamos falar para nos comunicarmos. Comungamos pelos pensamentos, sensaes e vibraes. Todos os espritos so capazes de fazer isso, compartilhando idias e emoes com uma clareza e preciso impossveis de atingir na Terra. Ora, se no Maryanne... H quanto tempo! A vibrao de Bob era luminosa, mas apreensiva: ele sabia que eu precisava de ajuda. Quando nos encontramos pela primeira vez, ele era um guia "coming over", e agora um guia "going over". Bob, com seu jeito avoado bem tpico, uma vez explicou a diferena: Um guia "coming over" socorre espritos da Terra, ajudando-os a aprender com suas encarnaes na dimenso terrestre. Um guia "going over" ajuda esses mesmos espritos, quando prontos, a se preparar para a vida em uma dimenso mais alta. Simples e direto: por isso que vim a Bob pedir conselhos. Ele foi, quando fiz a minha difcil passagem da Terra para o esprito, meu guia "coming over". Quando morri, ele apareceu como um homem branco, de sessenta anos de idade, projetando uma imagem com a qual eu

me sentiria bem. Eu me lembro de cham-lo de "um velho peido aposentado". Eu passei a amar meu "velho peido aposentado". Apesar de duro e exigente, ele amoroso e misericordioso, tambm. Ele me ensinou a usar e aprender com a raiva e a fria que ferviam dentro de mim. Agora, a invisvel, mas constante fora universal trouxe-me um desafio similar ao que Bob teve em relao a mim. A fora me deu Tom, que neste momento estava em um sono profundo, incapaz de encarar o dio fervilhante que carregou da esfera terrestre. Mas, quando era meu guia, Bob tinha apenas eu para lidar. A fora universal tambm me deu David, a causa da morte de Tom e a razo de sua fria e humilhao. Eu sabia por que fui levada a Tom. Seu esprito estava em fria porque sua famlia tinha sido destruda por um assassino irracional. Quando eu cheguei aqui, a revolta consumia meu esprito porque minha vida tambm foi abreviada por um revlver. Eu sabia que poderia ajudar os dois. Quem sabe mais sobre revolta e dio enlaando o esprito com suas correntes fteis e inteis do que algum que j foi prisioneiro dessas mesmas correntes? Mas eu no sabia o que fazer. Foi por isso que agora eu me encontrava nas margens verdes e gramadas do rio. Estou aqui porque preciso de sua ajuda. Tenho um trabalho duro pela frente. Bob no respondeu. Ele esperava uma explicao. Descrevi os assassinatos e falei para ele sobre Tom. Fui chamada para ser seu guia. Que coisa! - observou Bob com ironia. Engraado como a vida d suas voltas, no? Entendi: vtima atrada pela vtima. Mas, quando cheguei a David, a vibrao de Bob se intensificou: Ele tambm? Tanto o assassino quanto a vtima? Agora ficou interessante, se me permite dizer. Eu no sei se vou dar conta - confessei. Ele me repreendeu severamente: Maryanne, voc j devia saber. Se no estivesse preparada, no seria chamada. Nada acontece antes do tempo. Voc est pronta. E a prova de sua prontido que voc teve a humildade de pedir ajuda. Mas ele parecia confuso, achando estranho o fato de eu no estar envolvida nem com a me nem com a menina. Mas no vamos nos incomodar com isso agora - disse Bob. As razes viro tona mais cedo ou mais tarde. Havia mais uma coisa que me preocupava, porm. O assassino est na Terra. Ele no exatamente o tipo de sujeito que est afinado com o lado espiritual da vida, se que voc me entende - brinquei. Bob chamou minha ateno para a estupidez que eu tinha acabado de dizer: No seja crtica. Ele um esprito e tem a mesma origem que todos ns. Ningum tem um passado perfeito. - E acrescentou, com uma piscadela manhosa: H algumas poucas coisas no meu que eu gostaria de esquecer. Ele estava certo, mas eu o fiz lembrar que muitas pessoas na Terra pensam que um assassino no tem alma: Alguns dizem que so menos que animais.

Bob respondeu pacientemente, explicando que muitos dos espritos encarnados na Terra tinham bastante o que aprender. E, depois de ouvir alguns dos conselhos que os outros guias lhe deram, voc tambm tem bastante para aprender. Esta uma situao excepcional. No apenas para voc, mas para os dois espritos com quem est conectada. Escolhendo seu prximo pensamento cuidadosamente, meu amigo disse: Eu sei por que voc foi escolhida. A razo mais profunda do que voc imagina. Maryanne, h mais nisso do que apenas compartilhar vibraes e experincias. Como sempre, Bob no explicou. Eu teria de entender sozinha. Vamos em frente, Robert. Eu sabia o que estava por vir. A nossa frente, o rio flua vagarosa e silenciosamente enquanto Bob falava ao meu ser interior. O rio corria e o tempo parou. Sua vibrao firme e suave seguiu me puxando, puxando e puxando para um outro tempo e lugar no infinito vcuo da Criao. Nossos pensamentos se uniram e, viajan