Planificar - Ensino Em Ciencias

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MESTRADO EM ENSINO - Didáctica da Física e da Química II - 2010/2011 Planificar O ensino das Ciências Trabalho elaborado por: Alexandre Oliveira Julho 2011

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Trabalho sobre a planificação no ensino das ciÊncias - elaborado por Alexandre de Oliveira.

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MESTRADO EM ENSINO

- Didáctica da Física e da Química II -

2010/2011

Planificar

O ensino das Ciências

Trabalho elaborado por:

Alexandre Oliveira

Julho 2011

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ÍNDICE

1. Introdução 2

2. Estratégias de ensino 3

2.1. Metodologia 4

2.2. O trabalho colaborativo 5

2.3. Perspectivas CTSA 6

3. Planificar 7

3.1. Para onde? 8

3.2. A partir de onde? 9

3.3. A quem? 10

3.4. Como? 11

3.5. Com o quê? 12

3.6. Que resultados? 13

4. Considerações finais 15

5. Referências bibliográficas 18

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1. Introdução

A planificação é um instrumento vivo da gestão curricular (Roldão, 2009)

e deve resultar de um processo sistemático de organização do trabalho.

A sua múltipla funcionalidade e a sua constante adaptação são

características que evidenciam o carácter dinâmico de um currículo

entendido como um projecto.

A planificação do ensino das ciências está, naturalmente dependente da

perspectiva de ensino de quem a faz. Tradicionalmente, e ainda hoje é o

modelo mais utilizado nas escolas, a planificação listava numa tabela de

duas entradas a sequência temporal dos assuntos escolares, conteúdos,

recursos e estratégias. Trata-se de um modelo tradicional de

planificação ligado á produtividade industrial do século XIX e

contemplada nos modelos curriculares de Bobbit e Tayler . Segundo

este modelo a planificação era uma construção linear-racional que

definia objectivos, programava acções e obtinha resultados (Arends,

2008). Este modelo entra em colapso quando a investigação aponta

para uma maior eficácia das estratégias baseadas no modelo

construtivista de Ausubel (1980) e outros.

A formação inicial de professores terá sempre de contemplar a

planificação, pois para além de estar imposta por lei é a base do

trabalho docente. Se entendermos o processo pedagógico a um nível

macro, da legislação imposta pelo ministério, a planificação será a

operacionalização do programa legalmente definido num currículo

elaborado ao nível meso do projecto de escola e dos departamentos

disciplinares. Mas para o professor é no nível micro que o trabalho se

realiza. No seu contexto de sala de aula, no seu contrato pedagógico

celebrado com a turma, dentro da especificidade da sua diferença e da

multiplicidade das suas culturas, apetências e inteligências (Arends,

2008). Só assim o professor se torna efectivamente um agente formador

de cidadãos críticos e participativos numa sociedade em que a

multiculturalidade é a mais-valia do futuro (Carneiro, 2001).

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2. Estratégias de ensino

Uma estratégia de ensino, segundo Gaspar e Roldão (2007) é definida como

“acção intencional orientada para um objectivo de aprendizagem sedeado no

aprendente, e mediado pela acção/interacção proporcionada pelo ensino” (p.

89). Para construir e aplicar uma determinada estratégia de ensino o professor

deverá: analisar (objectivos vs alunos e contexto), integrar (criando sequências

de aprendizagem), colocar hipótese (sobre a eventuais formas de

organização), seleccionar (tendo em atenção potencialidades relativamente às

aprendizagens), organizar (identificando as tarefas, as actividades, os recursos,

os tempos de execução, definindo não só o papel dos alunos mas também o

seu), decidir (regulando o próprio desenvolvimento da estratégia) (Gaspar &

Roldão, 2007). Tal como também refere Ponte (2005), de uma estratégia de

ensino sobressaem sempre dois elementos, a actividade do professor,

caracterizada pelo tipo de tarefas que ele concebe e a actividade do aluno, isto

é, o modo dominante de construção do conhecimento, o qual se refere ao

“papel que o aluno é chamado a desempenhar: procurar aprender o que lhe é

apresentado de modo já sistematizado e organizado ou explorar e descobrir

por si mesmo, apoiado pelo professor e em negociação com os colegas do

grupo-turma” (Ponte, 2005, p. 23).

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2.1 Metodologia

No ensino das ciências existe uma dicotomia entre o método indutivo e

dedutivo (Bay et al, 1992). O método indutivo baseia-se na premissa que

o conhecimento se constrói a partir dos saberes prévios do aluno, das

suas experiências e da interacção com o fenómeno. O método dedutivo

é um método de instrução directa e baseia-se no pressuposto positivista

que um estrutura altamente hierarquizada de conceitos proporciona uma

eficaz aprendizagem dos alunos (Bay et al, 1992). As teorias

construtivistas vieram por em causa um ensino baseado em conteúdos

formais que eram transmitidos sem conexão e sem contextualização. A

teoria da aprendizagem significativa de Ausubel (1980) veio dar suporte

ao modelo indutivo do ensino. No modelo indutivo o professor começa

por lançar uma questão ou problema que coloca o aluno em contacto

com o fenómeno e é do cruzamento entre o fenómeno e os

conhecimentos prévios que o aluno constrói o seu conhecimento

(Valadares, 2006).

Podemos, então distinguir estes dois métodos pelo princípio

construtivista do conhecimento – método indutivo – e pelo princípio

transmissivo do conhecimento – método dedutivo. Aulas de laboratório

de demonstração em que o conceito já foi dado aos alunos e um

protocolo rígido os conduz à demonstração do resultado esperado é

claramente de uma acepção dedutiva (Bay et al, 1992). Por outro lado

numa metodologia o aluno é introduzido ao fenómeno e é estimulado a

procurar padrões, relações, levantar questões ou fazer generalizações a

partir do observado (Bay et al, 1992), o papel do professor é criar o

cenário onde a aprendizagem significativa possa ocorrer e auxiliar o

processo sempre que necessário (Valadares, 2006).

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2.2 O trabalho colaborativo

Numa perspectiva construtivista de Valadares (2001) “o conhecimento

científico, qualquer que ele seja, é uma construção que resulta de

interacções complexas envolvendo sujeitos e objectos em que nem uns

nem outros têm a hegemonia”. Assim sendo a multiplicidade de sujeito

aprendentes é um factor importante da aprendizagem. Observando

juntos o mesmo fenómeno, dois aprendentes terão diferentes

experiencias que se as puderem partilhar facilitará o processo

(Cachapuz, 2002).

O conhecimento prévio dos alunos é um factor importante na motivação

e na persistência perante a dificuldade da tarefa a realizar e permite a

negociação entre os elementos do grupo de trabalho (Ponte, 2005). Daí

a importância da selecção dos elementos para a formação dos grupos

de trabalho, de preferência díades, que deve ter por preferência a

escolhe de elementos complementares nas suas capacidades mas não

demasiado díspares no seu rendimento escolar.

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2.3 Perspectiva CTSA

O ensino das ciências no paradigma moderno, baseado em transmissão

de conceitos científicos mostra-se ineficaz na formação de cidadãos

cultos e preocupados com as questões da actualidade (Pereira, 2002). O

desenvolvimento da literacia científica comtemplado na legislação e nas

orientações curriculares (OC) para o ensino das ciências (Galvão, 2001)

tem por fim último formar cidadão capazes de tomar decisões

relacionadas com problemas do dia-a-dia e participarem na sua

resolução. Ou seja “Questões de natureza científica com implicações

sociais vêm à praça pública para discussão e os cidadãos são

chamados a dar a sua opinião. A literacia científica é assim fundamental

para o exercício pleno da cidadania.” (Galvão, 2001, p.6). O Currículo

Nacional do Ensino Básico explicita que os alunos devem ser envolvidos

em “situações de aprendizagem centradas na resolução de problemas”

que possam promover “pensamento de forma criativa e crítica” (ME,

2004, p. 133).

A mudança de paradigma ecológico – suportada pela sociedade do

conhecimento, a rapidez da comunicação, liberdade de informação e a

Internet – é um facto presente. A crise ecológica e ambiental (Lima &

Guerra, 2004) vem pôr em causa o velho Paradigma Social Dominante

(DPS) – que defende a superioridade do homem e a sua capacidade de

dominar tecnologicamente a natureza e assim resolver os problemas – e

gradualmente vai impondo o Novo Paradigma Ecológico – em que a

Terra é vista como um organismo em equilíbrio precário, em escassez

de recursos e que deve ser respeitado em toda a sua diversidade – e a

sustentabilidade passa a ser um tema fundamental no ensino das

ciências ( ME, 2004). Os conteúdos CTSA são compreendidos em

contexto real dos alunos e a reflexão sobre os temas polémicos

promovem o desenvolvimento do Pensamento Crítico em Ciência e

como consequência imediata um aumento da literacia científica.

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3. Planificar

A legislação obriga os professores a produzir, manter e actualizar as

planificações das suas aulas. É aliás um documento que os inspectores

da IGE consultam e discutem imperativamente. Muitas vezes as

planificações são documentos sintéticos que já foram elaborados há

vários anos e que sofrem apenas ligeiros ajustes quando se afigura

necessário, por vezes a única mudança que ocorre é a troca de data do

ano lectivo.

Mas numa perspectiva de gestão do currículo – em que o currículo é

visto como um projecto, vivo e regulável – a planificação vai muito além

disso e passa a ser um documento fundamental do trabalho docente,

onde o currículo é operacionalizado e como documento escrito pode ser

consultado, reflectido, modificado numa regulação constante e

fundamentada do processo de ensino e aprendizagem (Roldão, 2009).

Um modelo de Arends (2008, p. 101) apresenta o ciclo contínuo da

educação com três etapas: Planificação – Ensino – Avaliação –

Planificação. A planificação prévia será assim a primeira etapa do ciclo

e a última uma vez que após a avaliação deve ser repensada para dar

origem a novo ciclo.

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3.1 Para onde?

O processo pedagógico tem um fim claro: que os alunos aprendam. Esse

fim é uma meta que poderá ser alcançada por etapas. Não pode ser visto

como uma corrida de velocidade, mas sim um caminhar pausado e seguro

em passos bem estruturados e bem assentes em chão firme. É, então,

necessário que se definam à partida objectivos, metas ou finalidades do

processo planificado (Roldão 2009). A correcta formulação dos objectivos –

gerais e específicos, tanto a nível dos conhecimentos como das atitudes – e

tendo em vista as competências definidas para o nível de ensino no qual o

processo vai decorrer, vai permitir criar uma grelha criteriosa de descritores

de avaliação (Rogiers, 2001). E a indicação dada aos alunos dos objectivos

da unidade planificada

Estes objectivos devem ser marcados em função das competências a

desenvolver, cognitivas, processuais, epistemológicas e ter em conta os

comportamentos e atitudes (Roldão, 2009; Rogiers, 2001; Galvão, 2001).

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3.2 A partir de onde?

Uma etapa fundamental de um processo pedagógico construtivista é o

levantamento dos pré-requisitos dos alunos, a gestão das concepções

alternativas e a verificação das competências básicas de outras áreas

fundamentais para o processo como o Português e a Matemática. É neste

campo também que se deve promover a interdisciplinaridade sabendo

antemão matérias de outras disciplinas – adquiridas que possam ser

mobilizadas para o processo planificado!

Também será útil um levantamento das estratégias utilizadas em anos

anteriores e o seu grau de aceitação junto dos alunos e o seu grau de

sucesso (Roldão, 2009)

A consciência plena dos pontos fortes e fracos da situação inicial é

fundamental para a escolha de estratégias e para a gestão do tempo de

implementação das mesmas (Roldão, 2009; Cachapuz et al, 2002; Arends,

2008).

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3.3 A quem?

Conhecer a turma, o seu contexto social, económico e cultural. Assim como

os perfis individuais, o registo biográfico, o historial do percurso escolar dos

alunos, as suas espectativas e as suas ambições. A auto-imagem, a auto

estima e a capacidade de relacionamento social são também parâmetros a

ter em conta pois serão fundamentais na criação das díades ou de outros

grupos de trabalho. É aconselhável fazer um levantamento precoce das

concepções alternativas que não sejam compatíveis com os conceitos

científicos a trabalhar de forma a organizar as tarefas e o discurso no

sentido de ajudar os aluno a clarificar os seus conceitos, questionando-o e

orientando o processo de um modo sistemático e reflexivo suficientemente

aberto e flexível para que o aluno realize uma aprendizagem significativa

(Valadares, 2006)

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3.4 Como?

As opções metodológicas, as técnicas de ensino e as estratégias a utilizar

devem ser objecto de uma escolha sustentada e crítica. O contexto inicial é

determinante na opção específica das estratégias a aplicar. Apesar de

coexistirem por vezes o método indutivo e dedutivo (Arends, 2008) o que a

investigação aponta é para um maior sucesso na aprendizagem quando o

ensino indutivo prevalece (Bay et al, 1992; Abrantes, 2000; Bybee, 2006;

Valadares, 2001 e 2006) .

Uma estratégia sugerida por Bybee (2006), Wilder & Shuttleworth (2005) e

aplicada por Cunha (2009) é a estratégia dos 5E: Engagement - motivar,

Exploration - explorar, Explanation - explicar, Elaboration - ampliar e

Evaluation – avaliar. Este modelo conduz os estudantes através de uma

sequência de aprendizagem intencional e consequente. Em que os alunos

começam por ser motivados para um assunto ou situação, reais ou

próximas, que estes exploram e para as quais procuram encontrar e

apresentar explicações, ampliando a sua aprendizagem e avaliando o seu

trabalho. Este modelo permite aos professores conhecer as concepções

prévias dos alunos, sobre os assuntos abordados, permitindo uma

adequação das experiências de aprendizagem, com o objectivo de construir

novas ideias e novos conceitos gradualmente (Bybee, 2006).

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3.5 Com o quê?

A operacionalização e implementação das estratégias planificadas em

situação real carecem que a escola possua os recursos necessários. Uma

planificação que contemple actividades de laboratório sem que o mesmo

esteja devidamente equipado para as tarefas propostas, ou uma actividade

de investigação, como um Webquest por exemplo, sem computadores com

acesso à internet são de todo impraticáveis. Mesmo a utilização de livros ou

revistas, materiais de uso corrente deve ser de todo cuidadosamente

verificada a fim de não haver surpresas desagradáveis que possam

perturbar o desenrolo da aula.

Por vezes os recursos reais da escola não são os ideais, mas a flexibilidade

e capacidade de criação e improvisação dos professores pode reorganizar

os meterias que possui a fim de conseguir realizar o que pretende, nesta

situação é de um valor inestimável a troca de experiências entre os

professores, como colegas e pares que se entreajudam e trocam entre si as

boas práticas e as tarefas de bom resultado (Roldão, 2009; Gaspar e

Roldão, 2007).

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3.6 Que resultados?

A avaliação é parte integrante do processo ensino-aprendizagem. Nele se

integra nas diferentes fases e tem como papel orientar, regular e certificar as

aprendizagens (Rogiers, 2001). A visão tradicional do ensino tende a separar o

processo da avaliação, mas a legislação preconiza e enfatiza o carácter

formativo da mesma e logo integrado e desenvolvendo-se em simultâneo

(Abrantes, 2000).

Abrantes (2000) enuncia alguns princípios orientadores que podem ajudar a

clarificar o papel da avaliação:

1. Os instrumentos de avaliação devem ser diversificados e ter em atenção

todas as aprendizagens que se pretende desenvolver.

2. O carácter essencialmente formativo da avaliação: positivo, regulador e

facilitador de ultrapassar as dificuldades dos alunos.

3. O rigor é uma exigência da certificação dos conhecimentos adquiridos e

só ele garante o reconhecimento social das aprendizagens.

A avaliação assume assim um papel crucial no objectivo principal da escola:

o sucesso de todos os alunos (Roldão, 2009).

Frequentemente a natureza construtivista das tarefas propostas necessita

de instrumentos de avaliação dinâmicos que permitam um feedback atempado

e que proporcionem as necessárias mudanças, os ajustes e os reforços nos

pontos críticos do processo. São necessários instrumentos de avaliação

simples e eficazes que permitam ao aluno fazer uma reflexão crítica do seu

trabalho e das aprendizagens adquiridas. O trabalho de grupo carece de uma

dupla avaliação: de grupo e individual. A avaliação de grupo tem por fim

certificar as aprendizagens significativamente adquiridas pelo grupo de trabalho

enquanto a individual, para além de certificadora, tem uma função reguladora

do empenho de cada aluno no trabalho colaborativo desenvolvido, neste ponto

é importante para além da heteroavaliação, uma auto-avaliação e uma

avaliação pelos pares (Rogiers, 2001).

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Este conjunto de instrumentos reguladores permite clarificar e regular o

desenvolvimento do processo em comparação com os objectivos marcados no

início da planificação e avaliados em concordância com os critérios definidos e

aceites (Rogiers, 2001). E permite também os ajustes e esclarecimentos que

se mostrem necessários. Este modelo tem a flexibilidade necessária a uma

relação didáctica em que professor e aluno podem negociar a avaliação num

processo orientador e produtor de discursos consensuais (Alaiz et al., 2003).

Assume assim a avaliação o seu triplo papel – orientador, regulador e

certificador – e é encarada como uma etapa do processo contínuo em que é

simultaneamente o fim de um ciclo e o início do seguinte, abrindo a entrada

para as concepções alternativas no sentido orientador da proposta

consequente.

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4. Considerações Finais

A revolução industrial veio marcar a mudança do locus de trabalho da família

para a fábrica (Sousa, 2007) esta mudança social e cultural com objectivos

claramente económicos caracterizou a modernidade (Sousa, 2007). No final do

século XX assiste-se a uma nova mudança: a escola para todos, instituída à luz

das necessidades de produção tecnológica da indústria, começa a ser

substituída por uma escola democrática. Esta escola democrática demarca-se

de um ensino “para todos” – em que se entendia que ensinados da mesma

maneira os alunos aprenderiam da mesma maneira – e cria-se um ensino onde

todos podem aprender. No século XIX o currículo criou-se uniforme tendo em

vista a instrução do “aluno médio” - definido à luz da cultura Europeia: europeu,

caucasiano, de classe média, cristão, do sexo masculino e heterossexual

(Gonçalves & Silva, 2005). No século XX tudo muda, todas as crianças devem

frequentar a escola (Arends, 2008), estas crianças trazem consigo uma

variedade cultural que deriva da mobilidade emigrante e da reorganização das

sociedades pós-modernas. Isto veio trazer para a escola uma população

diversificada em cultura, talentos e necessidades (Arends, 2008). Esta escola

democrática, de equidade nas oportunidades, emergente e necessária ainda

não é uma plena realidade nestes primeiros anos do século XXI, há escolas

cuja população não tem acesso a matérias didácticos nem a computadores. É,

no actual contexto social, impensável uma escola que ficar excluída da

sociedade do conhecimento por não ter acesso às TIC, mas tanto no contexto

americano (Arends, 2008) como no europeu (Carneiro, 2001) essa ainda é uma

realidade.

No contexto americano a questão étnica ligada à emigração é um factor

socializante e a escola deve ter em conta a diversidade cultural que esse facto

acarreta e assumir um papel mediador do encontro das culturas. Outra grande

novidade na escola inclusiva são as necessidades educativas especiais, por

vezes reduzidas às deficiências físicas mas que vão muito além se

considerarmos os skills individuais e as necessidades e aspirações de cada

aluno (Arends, 2008). Dar resposta a esta diversidade cultural dentro da sala

de aula exige uma preparação do professor que vai para além dos

conhecimentos científicos necessários para desempenhar as suas funções

(Roldão, 2007). A Europa que necessita urgentemente de se assumir na sua

diversidade cultural afim de preservar a sua identidade (Carneiro, 2001), tem

de largar o “pesadelo das suas angústias” e transformar-se num nova europa.

Sonhamos com uma escola europeia naturalmente intercultural e aberta à

miscigenação. Um projecto educativo que faz do encontro de culturas o seu

ponto de apoio e que elege o diálogo entre diferentes como método

fundamental (Carneiro, 2001). Fica assim claro o papel da escola que tem de ir

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além da sua estatutária obrigação de ensinar para edificar a Europa da

Multicultura, onde impera o respeito pelo outro, pela diferença e onde se

valoriza a semelhança do outro, entendendo-se esta semelhança na diferença

que nos torna indivíduos e não na igualdade que faria de nós uns clones

(Carneiro, 2001).

Outra grande herança que recebemos do modelo clássico de ensino é o efeito

de Pigmalião, ou de “profecia auto-realizável” (Arends, 2008) em que as

espectativas dos professores influenciam grandemente os comportamentos dos

alunos. Este efeito está ainda muito sustentado no modelo transmissivo das

grandes narrativas que caracterizaram a modernidade (Fernandes, 2000), em

que o bom aluno era o que captava e reproduzia o que lhe era transmitido.

Hoje, as mudanças sociais e tecnológicas, a imediata informação, as redes

sociais dotam os alunos de conhecimentos prévios que muitas vezes não se

enquadram no modelo tradicional mas que podem ser mobilizados para um

processo de ensino aprendizagem muito mais eficaz, com relações

contextualizadas que ajudarão o aluno a formar-se como cidadão participativo,

cooperante, activo e responsável (Fernandes, 2000). O afastamento do modelo

lógico-racional de Tyler vem permitir o reconhecimento pela escola, e pelos

professore, de uma diversidade de inteligências – as inteligências múltiplas –

que foram marginalizadas no ensino clássico mas que no currículo actual

servem de motor à construção de conhecimento.

Com a ruptura do modelo tradicional linear e racional de “objectivos, acções

resultados” uma nova perspectiva de planificação do processo de ensino se

torna necessária. Surge um modelo não linear que se inicia com acções das

quais se retiram resultados e esses resultados são comparados com os

objectivos prévios (Arends, 2008), esta planificação mais dinâmica admite erros

e sucessivas tentativas para completar o processo, defensores deste modelo

não vêem a acção como condicionada a um objectivo mas sim como veículo de

acesso ao conhecimento previamente planificado. Neste processo a

planificação pré-acção tem de contemplar a premissa fundamental da corrente

construtivista e considerar que a acção está condicionada à relação que o

aluno vai estabelecer entre o fenómeno observado e os seus conhecimentos

prévios (Valadares, 2006).

Conclui-se, então, que a planificação será muito mais que uma grelha de duas

entradas que se coloca num dossier no início do ano e não mais se mexe. E

nem sequer será comum uma planificação ser igual para duas turmas

diferentes, mesmo dentro da mesma escola o contexto da turma pode ser

muito variável, a existência de alunos com necessidades educativas especiais

pode ser um factor decisivo na escolha das estratégias a aplicar.

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Quando se diz que a planificação é viva, dentro da gestão do currículo

entendido como um projecto (Roldão, 2009) recorda-se a necessidade de

avaliar para a regulação do processo.

Num ensino focado na aquisição de conceitos, a utilização de um manual, de

mnemónicas, a realização de demonstrações em laboratório eram planificadas

de forma estanque. Como se ensinava os mesmos conteúdos, da mesma

maneira e utilizando os mesmos recursos materiais a planificação era, também

ela, transmissível. Chegava-se mesmo a fotocopiar a direito e a colocar no

dossier. Nada mudava, os conceitos, as teorias e as leis científicas eram

verdadeiras, universais e demonstráveis. Com a chegada das teorias

construtivistas o foco muda gradualmente afastando-se dos conteúdos e

aproximando-se do aluno. E o aluno muda todos os anos, e por vezes muda ao

longo do ano. E o aluno da geração TIC é naturalmente informado, crítico e

gosta de desafios. A estratégia dos 5E, por exemplo, dinamiza a turma numa

sequência que motiva, explora, e permite explicar o sucedido, expandir o

conhecimento relacionando os conhecimentos prévio com as experiências

realizados e elevando o processo a um nível metacognitivo (Arends, 2008).

Como professor planifico, rearranjo, improviso, adapto todos os dias, mas a

planificação que coloco em papel no dossier do departamento não sofreu

grandes variações nos últimos anos. Abordar o tema da planificação, e tê-lo

trabalhado nesta unidade curricular com uma colega com um perfil muito

diferente do meu, permitiu-me reavaliar a minha postura perante o documento.

Apercebi-me que muitas das estratégias que fui aplicando por instinto não

estão registadas em lado nenhum. Fazem parte de uma planificação mental

prévia que realizo e onde marco os objectivos e de seguida ajusto as tarefas de

sala de aula no sentido desejado, por vezes sou surpreendido por abordagens

diferentes das que havia previsto e de imediato se reconstrói a aula no sentido

de tornar mais significativas as aprendizagens que naturalmente emergem.

Consciencializei-me que estou a precisar de registar algumas das minhas

práticas, recolher instrumentos que vou usando ocasionalmente e sistematizar

a sua utilização. Como alguém disse planificar é muito mais que por umas

ideias no papel, mas se se forem colocando as ideias no papel tudo fará mais

sentido quando avaliado.

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