Poemas I
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Ara
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os
pu
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cad
os
no
blo
g
“Palavra
s...”
Poesia
Poesia Idéia vaga Presente, ostensiva
Grata. Vertente literal primária
Inconsolavelmente refratária Poesia Grata inerte Verte
Refrata A lítera morte que lhe tecem!
Dos cânones da língua, pioneira,
poemassiva. Poesia,
forma tão ativa Híbrido cânone,
linguitísica Bossal,
cinestésica total Cafetina,
teleeletroniconcretina.
Efeméride
Do alto dos seus últimos andares
A cidade passeia tranquilamente.
Sob as cortinas,
sobre os altares,
Em seus vales, - silos de serpentes -
Repousam frios em seus azares
Generais intransigentes,
Bundas e bustos,
infernos capilares,
Bostas de pombo – renitentes -
Salpicadas no bronze esverdeado dos Cézares.
Braços de boneca,
Bola de gude no asfalto,
Alguém morreu ali na esquina colega!
Um cafezinho por favor!
Táxi!
E esse ônibus que não vem,
que horror
Catarro nas frestas de uma avenida ensolarada.
No chão da cidade,
A cidade passeia tranquilamente!
Splat Plek
Splat
plek
tam tam tam
a máquina
comeu a poesia ao óleo
Você sonha
dissonha
e atarraca o dedo
na CATRACA
Plek
Splat
Tam tam tam
castração
castra ação do dedo
que não mais indica
codifica
Mas
saque do coldre empoeirado
um poema
Q U E N T E L O M É T R I C O
para ler
entre limalhas
cuidado
Levanta e corre correcorrecorrecorrecorrecorre
que a esteira não morre
PARA!
PEGA!
PAGA!
Splat!
Plek!
A máquina
comeu!
A contragosto
A contragosto,
Desgosto dos traços e troços
Da minha vida útil.
Desinventando memórias,
Destroçando histórias,
Malamanhado em terras alheias.
Sons inaudíveis movem e renovam
A volatilidade da minha alma vasta
Redesenhando trilhas,
Segredando versos nas margens do dia.
Um poema
Um poema
Não nasce do nada
É tempo e espada
Um poema
Nasce na rua
Que não é minha
Nem sua
É pau e pedra
Na vida do poeta
XXXII
Deixarei
Que os espaços
Todos preenchidos
Sejam solavancos
Em meu corpo de avestruz
E em minhas pernas
O que reluz
Nestes espaços,
espaços todos
Sejam espaçopernas
Que perneem
Preenchendo mundos.
Recife
Por cima
uma ponte
Por baixo
S
a
l
t
a
m
Cocas tamanho família
E entopem
Com tampinhas
As malhas da rede
Enredada
E atada
Por nervos ponte-agudos
Enquanto
foge por ali
Um casal de apitos
Na avenida boa vista
Saqueadores de caldo de cana
E um velho poste
No ponto da torre cinza arcaica
Daí em diante
Ausente
O sol
De par a par
Pardo
Pardeja
Em lívidos olhos de janela.
Fria
Como a água matinal
(a janela da casa verde)
pinga
cacos de vidro fosco.
O menino
Em vagas manhãs
Por onde o tempo recorta silhuetas de papel
Nuvens jovens
Percorrem os caminhos dos pássaros.
Em tardes infinitas
O menino sonha
Os sonhos de vento
Rasgando as copas das árvores
Numa melodia anônima.
Numa noite intensa
O poeta vê o invisível código
A trama íntima
Ao desenhar manhãs
Com tintas de tarde
E noites profundas.
XXI
Volver aos arcos do nó
Revirar
As tralhas
Respirar
Entulho
Tronco
Trambolho
Inocente certame do olho
Na fria agonia
Da
Q
U
E
D
A.
A lua e a estrela
A lua e a estrela
Não cabem num ponto
Nem alfa
Nem ômega
Apenas o tempo
Como as cartas de um baralho
Embaralhado
Embaralha tudo
Num ponto
Entre a lua e a estrela
Navegantes
Senhores navegantes,
Parem o barco!
O perfil cinético das borboletas azuis
Circunavega seus corações intranquilos.
Adeus
Cordas soltas à maré!
Atlas, contas do mar, sol, anzol
Rebrilham nos olhos de peixe
E óleos ancestrais.
Canibal à praia!
Âncora veloz ao fundo azul.
Senhores navegantes,
Olhai o fundo fosco da maré azul e
Rasgai papiros ilustrados,
Mapas
E restos semânticos
De bulas pós-ardidas.
Senhores navegantes,
Libertai as palavras-coisas
E surgirão versos andantes e rimas-remo
Na cara suja da normalidade.
IX
De todos os ventos daquela tarde,
um era tímido
e o outro
velava a morte do sol
nas sombras de um muro branco.
Um cachorro vadio
dava voltas em torno de si
enquanto um vento não trouxesse
o odor das latas de lixo.
Era um perfeito dia de sol e sombras.
Dia do vento libertador
e seu pégaso afoito,
agitador,
infalível em sua missão
de escancarar portas e janelas
esquecidas pela rotina dos dias.
Vento que arrasta consigo
a luoca dança da poeira dos cantos
que impávida
como a sombra de uma árvore
projetada nas escadas vazias,
retorna espalhada sobra a calçada lisa.
Foi assim em todos os espaços
que os ventos conquistavam.
Nas esquinas,
correndo e cantando
entre ruas e buracos de parede
até partir,
para retornar agora suavemente
e contar as histórias
das tardes e dos ventos.
Rápido
Lá está,
em meio à multidão
e eu a vejo
como num tape,
com seu sorriso ensolarado.
Rápido me perco
e te encontro
a passar...
Acho que foi naquele automóvel
novinho em folha
e lá se foi
mastigando
bichinhos de açúcar.
Salinas
Vida de sal e sol
que adentra a aurora
e o mar sereno.
Vida que imprime o rumo,
que infla o pano,
que apruma o leme
e deixa ao vento
as sinas soltas sobre a espuma.
Vida de pescador
que na bruma leve
carrega o barco ligeiro
nas águas plácidas das Salinas.
Vida de coragem, orgulho e fé;
de ver no mar a mãe que ensina,
mãe que cuida, mãe menina.
Vida de pescador.
Vida de todos os sonhos e conquistas,
Vida vivida, atrevida
Docevida,
Margarida.
Verdades e mentiras Assim como o tempo que não esconde os restos dos dias, eu não uso óculos escuros para ver os trolhas com seus trapos divinos e suas teses truculentas traçando o destino dos cordeiros empastelados no rush sanguinário, metropocêntrico. Assim como a história que se repete, carrasca. Eu vou de bonde pra não ver os becos em que te escondes. Assim como o gene ancestral eu passo mal de ver a cara suja de um peixe podre a proclamar mentiras glaciais, a acender fogueiras virtuais que não queimam os ossos mas abrem fossos. Mr. Bishop, tenha dó. Assim não dá. Eu não te aguento mais!
Metáforas Enquanto a faca do horizonte, Distante, Corta a carne crua De uma estrela nua, O dia sorri na neblina Estonteante Como um copo de blues A transbordar sonoro, Metáforas soltas Na transparência efêmera Que o dia I r r a d i a.
Meninos invisíveis Quando chove na rua dos meninos invisíveis Um galo canta ao meio-dia Fazendo arrelia do vigia das madrugadas. Eles sabem que as flores mais bonitas São as margaridas das queridas irmãs Marias. Saltam, correm, Buscam borboletas nos bosques E os postes são palitos pelados que brilham nas noites frias. Quando brilha o sol nos bicos dos bules Nas manhãs gulosas das mães Marias, Os meninos invisíveis Saltam dos chinelos Comem, bebem E guardam restos de mesa para o vigia do dia. Quando a noite chega Com suas meias e ceias, Os meninos invisíveis se apagam Em sonhos de gigantes, Zé-come-lata, Homem meleca, Unha do cão, Rapa tição.
Nietzscheanas nº 1
Eu olhava para aquelas sombras Que constantemente dançavam em torno de mim
E o conforto que sentia Era a solidão,
A distância que de mim se fez constante E me conservava intacto,
Delirante. Por muito tempo eu olhei para o abismo
E enfrentei seus monstros itinerantes Salpicados de realidade
E pesados Sobre os ombros dos atores ideais. E aquilo era mau.
Transbordava o peso das correntes E asfixiava como um nó na garganta.
A voz calada, A palavra não dita,
A desdita. Em torno de mim
Selvagens discursos; Profusão de olhos laterais.
Escolhos, Que nada viam, eram vistos.
Há luz... Há luz... E no solstício o solo primeiro percebe
Quem desce para matar a sede de liberdade E libertando-se Ainda há tempo
De tocar a réstia, De dizer a frase,
De ascender infante A tatear rotinas.
Nietzscheanas nº 2
Estupefata a civilização de pátrias molestadas Reclama que do alto dos picos
E das cinzas dos abismos Ouça-se a voz intempestiva a apontar barbáries.
Eis o cálice ditirâmbico! Quem ousa ultrapassar o círculo ilusório
Que aprisiona, intimida e fere? Quem, dentre as ovelhas reticentes
Vê o demiurgo que sangra Em incomensuráveis convicções
E apriorismos imberbes? Lá está o homem novo!
Eu o vejo Num dèjavu embriagado de séculos
A irradiar potência numa espiral infinita, Impregnada das páginas de Kafka,
Nietzsche, Dostoiévski E Augusto dos Anjos.
Mestres da modernidade, Dilacerados em seu tempo,
Anjos e demônios, Ventres abertos para o infinito.
Bar Continental De quanto tempo disponho Para viver congelado na íris estreita Desta janela vesga? Pouco me resta obter Sem optar por constrangedora aquarela Pateticamente posta Sobre a marquise de ferro fundido Do bar continental. Não sei por onde anda aquela disponibilidade sempre presente. Não sei dispor de um tempo Fundido em aquarelas, janelas e íris de marfim. Não sei Se louco ou santo É o sonho abissal Congelado sobre a marquise Do bar continental.
Qualquer dia Quando sair na chuva Qualquer dia Desses dias de sair Dia de ser Dia desses... Eu então direi O que ouço O que sei Direi da estante Cheia de livros Dos ingressos antigos Daquele bilhete de viagem Já te falei da carta? (que não enviei) Do cartão da turma? Tua foto no panfleto Um manifesto Meu poema de protesto Volta e meia Ainda saio na chuva Quem sabe Te vejo de novo Olho no olho Escrevendo versos silábicos Incertos Secretos Concretos.
Teu tema Parece que foi ontem O teu braço em minhas mãos O relógio E você sorri O teu rosto Uma rima O teu oposto Você ainda me vê? Eu ainda sou o teu dilema O teu tema Ainda te vejo Breve Nas luzes coloridas Na noite que te esconde Num bilhete Onde?
Minha mão poética Minha mente concreta Não desliza no papel, Salta. Saculeja indomável Sobre pautas paralelas. Minha pena discreta Sobrevoa palavras Já escritas Bafejadas pelo tempo, Desvendando ritmos e dimensões. Minha mão poética Tem vontade própria, Gosta de espaços infinitos E tinta preta.
Na porta
Parada Na Porta Suporta Ereta Beija O Vento Que Te Lança Pra Dentro Suposta Seja A Porta Que A Lança Não Importa Ventania Adentra Suplica Que Te Beije Na Porta
À sombra do vento
Fala dessa história Que gira o sol do girassol. Diz que à sombra do vento, Como um espelho de duas faces Um ser é um nada, Clandestino! Com a cabeça na terra E os pés no espaço. E nos lábios, Um sorriso descontrolado. Dia-a-dia À procura de um raio de sol Numa esquina, Num disco de rock Ou num livro de Jack London. Conta em que janela se passa essa história, Para que eu possa dizer-te Que danças sobre pedras quentes Com braços e pernas de serpente. E a felicidade É um pêndulo, Pendente Como a espada de Dâmocles.
Versos novos Perdão pelo poema que não escrevi! Quem sabe, seja a noite Com suas sombras esquálidas, Talvez seja o dia que me prende Em seus espaços retalhados. Perdão! Pois navego como tantos No mar de fragmentos, Frases, fontes e formas. Perdão, enfim, Por antever que amanhã Poderão perdoar-me Pelo não dito E que, apesar disto, Nascerão livres de toda a tristeza, Versos novos e sonoros Salpicados de fantasia.
Decifra-me ou devoro-te
Vê essas tardes? Que desprezo exalam Nestas folhas sonolentas, oscilantes; Neste céu, Metálico céu. Ouve estes sons? Quão falsos soam. Que terrível prisão Nos acolhe em seu seio de pedra. Quisera Voar Com os pássaros E, súbto, precipitar-me ao chão Para num sorriso De corpo inteiro Fundir-me à terra Numa manhã de sol.
Silêncio
O tempo escoou
E eu estou longe
Não te observo mais
Andando descontraida pela calçada
Ou deitada no chão
Com um olhar perdido
Imaginando utopias
Silenciosa ilha.
O tempo passou
E eu estou sozinho
Pensando em você
Sonhando, deitado no chão
Observando
O quadro na parede
Minha utopia.
Pensei num tempo
Andando com você
No caminho do mar
Na trilha das pedras
Sem tempo
E sem espaço
Descalços no fim do dia.
Súbito
Súbito Surge assim
Como quem rouba Um pedaço de dia
Num instante qualquer Rasgando fantasias sonorizando frases
Vociferando melodias Para mostrar-se
Claro Como um poema de Emily Dickinson
Atravessando séculos Num Daguerreótipo country
Com pássaros E gotas de chuva
A tilintar Na cobertura espessa
da minha cabeça Assim Súbito
Palavrascoisas
Nada
Um vazio
Onde outrora havia palavras
Palavras coisas
Cantantes
Sonoras
Como uma flauta doce
Saltitante
Palavras moventes
Movediças
Palavras lisas
Cordilheiras lexicais
Transmentais
Nada
Um vazio
Vaso
Um Verbo
Ao acaso!
36º
Um papel
Um recado
Um recibo rasgado
Quinze mil cruzeiros
Em outubro de 84
Um cigarro
Um cinzeiro
Populares de Cuba
(Fumar daña su salud)
Rio de Janeiro
Eu não fui pra Aruba!
Li Artaud e Baudelaire
Chutei urna no palco
Meu poema silábico
Você lê se quiser
Sua voz embargada
Na hora marcada
Você diz o que quer
Dança e protesta
Manifesta!
Lê aquela brochura
Ainda há Ditadura
Nós queremos diretas!
Mas ficou no papel
Agora rasgado
Um recibo solitário
De um sonho sonhado
Registrado
No CPF e RG
Cadê Você?
Quem sabe um dia
Quem sabe um dia
Eu te mostro a lua
Com sua luz metálica
Numa noite fria.
Quem sabe amanhã
A estrada é deserta
A noite é prata
A relva é vasta
E tua voz é leve
Como uma navalha
Cortando o silêncio.
Quem sabe não esqueço
Teu endereço
E a luz da lua
Nos teus cabelos.
Talvez!
Num desespero de solidão
Na escuridão
Eu possa te ver
Como na primeira vez
Naquela noite
Na imensidão prateada da lua.
Cavaleiro torto
Um cavaleiro torto
De silhueta neogótica
Percorre o caminho, sorrateiro
Na lama putrefatalenankin
Filho da arca pulga tricha
Esbilte pilotron sanguessuga
Mimética solução humanóide
Lesa-forma vil vivente
Um cavaleiro de longa esfera
Filho da arca sila troncha
Caminha indeciso
Na prima lama dicotômica
Cata tenso, na orla empolada
Finos fios de palavraspontes
Para dizer fundante
O que nunca fora antes.
Um cavaleiro torto
Pouco
Só
Intrépido arcanjo rococó
Arremata a vida num poema
Como laço ou como nó.
Tempo curto
O tempo é curto
O tempo é mudo
O tempo não cabe no meu mundo.
Eu curto o tempo
Mudo num segundo
Meu mundo não cabe no tempo.
Esquina
Agora que estamos sós
Juntos, mas distantes
Como numa esquina
Sem um ponto de encontro
Vejo passar o tempo
Olho pro céu
Gotas de memórias
Molham meu rosto
E não há nada que eu possa fazer
Nem ontem
Nem hoje
Eu quero estar com você
Naquela praça
Depois da esquina
Eu não sei...
O tempo diz não
E mesmo que o desejo
Seja a bola da vez
Eu não te enconto
Depois da chuva
Com o sol no rosto
Naquela esquina.
Elisa
Parou no meio da ponte.
Elisa!
Chicoteou-le uma lembrança.
Por que ela?
Logo ela, tão fugaz...
Embrulhado na chuva fina,
As mãos flácidas,
O olhar perdido.
Flutua.
Não sente o chão,
Não sente o corpo,
A mente ausente,
Apenas repete: Elisa!
Elisa!
Estrangeiro
Eu bebo o futuro
Como um copo de água fresca
No calor intenso do presente.
Não me apetece o sorriso fácil
Do aqui e agora.
Falsa saída,
Panacéia improvável.
O futuro me pertence
Nos versos silábicos que escrevo.
Eu canto
E minha canção tem pernas longas.
Ela verá os próximos séculos
E mostrará meu espanto,
Não do futuro
Que ainda é distante a cada momento.
Mas do presente
Que nunca existiu.
Cantando sigo
Indecifrável, perdido de mim,
Estrangeiro em minha terra.
O olho de Sócrates
Foi no silêncio da noite,
No lapso do tempo
Que toda a dor se foi.
Do pensar,
Do ser como sou,
Da natureza de mim
Refletida no fundo plano
Da rocha.
Uma tocha!
Inglória figura arquetípica.
De resto, o vazio
O dia é eterno
No tempo que o consome
E some!
Um caminho nas nuvens
Na estrada
Uma pergunta escondida
Juntos buscando um caminho nas nuvens
Num céu dourado
Numa chuva colorida
Que só eu vejo
Mas entendo o seu jeito
De me dizer com os olhos
Nós somos pura história!
Com os pés descalços
Com o sol no rosto
Uma inteligência de óculos
D. Juan, Lobsang,
Aonde estamos indo?
Não importa
Eu não fechei a porta
Ainda sonhamos
Que somos crianças
Brincando com o vento
Dançando sem tocar os pés no chão
Invisíveis, eu juro!
Rock and Roll
Pétalas
Piras
Sim!
Sabe quando você tem certeza?
Sabe quando você tem certeza E ninguém parece se importar com a solução? Quando todos emperram E só você é ação? Quando dizem acabou Você ignora porque sabe alcançar? Entende o motivo da estranheza Mas caminha, mesmo que devagar? Ontem me disseram não haver amanhã. Não da forma como eu queria. Janelas não se abrirão para um céu azul, João não beijará Maria, Canteiros inteiros, estilhaços no chão. Sabe? Hei de apurar minha visão, Conspirar, conjurar, subverter, revolucionar; Lançar palavras num balão, Letras inteiras num muro intocável. Sabe, quando você tem certeza Não está só. Há uma rede clandestina Esperança, confiança Seja qual for o nome da trama, A gente não se engana Se suja, se fere, aposta tudo E sorri pro céu azul Sorri pra Maria, sorri pra João...
Monólito
Eu reconheço este perfume que, de tão íntimo,
Abre janelas na minha previsível singularidade.
Vagando em nuvens de palavras,
Rostos e pedaços amorfos,
Estruturas e monólitos,
A saudade indecifrável.
Teu rosto no rosto de pedra,
Minhas mãos no teu rosto de seda.
Tristeza e alegria.
Parcos ângulos obtusos
Silêncios redondos
Rodopiam na valsa confusa da memória.
Pinçar retalhos de certezas completas
Que já não valem mais
Brinquedos, são o que são.
Afasto agruras,
Deixo passar o beijo, o olhar de desejo,
A noite eterna
E o dia submerso na maciez da pele.
Falas,
Amigos,
Um futuro distante que hoje é presente
E a gente nem sente.
Deixo aberto o portal antropofágico,
A desordem,
O exatamente inverso do que sou
Para soar humano
Na natureza caótica do meu corpo
E na coerência do sonho.
Nuvem
O código expresso
Impresso
Virtual
Sem identidade
Só me reconheço
No discurso possível
Passível
Inautêntico corpus
Generalizador
O que eu tenho a dizer
Arranha o disco rígido
do meu computador
Eu me estranho
Eu não sou eu
Sou aquilo que me generaliza
Nuvem
Neblina
Perspectiva.
No meu caderno O brilho das cores, festival. A garota bonita e sua sobra no muro. Aonde vai? O cadarço do meu sapato, O Cérebro do poeta, A tabuleta que anuncia: Compro, vendo, troco, Não me importo. Ligue pra mim! O telefone caminha a seu lado. Hoje voaremos sobre a avenida Repleta, solene na valsa dos rostos, em cubos. Quero te achar Depois da partida sem despedida, Dando voltas com os olhos E tudo o que gira Está sob o céu de ontem, Dentro do meu caderno de capa verde Que agora é seu. É meu pretexto Pra continuar te encontrando Nos textos que escrevo.
Leste
Extenso e estático pórtico
Genérico, caótico.
Guardião do mar, insular.
Do leste o vento
dourado.
Céu mais lindo,
Matutino na primavera.
Barro secular
Escravo no tempo e no lugar.
Erodido em arquitetura evolutiva,
Cativa,
Cooperativa.
Ostra, astro rasteiro
Certo,
Na incerteza dos dias.
Inventando a esperança
Ontem sonhei com uma criança Que na sua dança Inventava a juventude. Sonhei com a terra que, amiúde, Era toda a gente do mundo. O mar não era profundo E o céu era o teto da casa Pingando estrelas esparsas. Sonhei contigo A procura de um abrigo Sonolenta na relva fresca. Sonhei que ontem era amanhã Que toada doença era sã. Sonhei que era criança Inventando a esperança.
Paisagem
Tarde quente de outubro: Silenciosa, Ácida. Sem sombras na rua deserta e abrasiva. Acolá, O azul marinho pinta o horizonte E revela uma poesia de bossa nova. O vento liberta um pássaro veloz, Ascendente Que respinga gotas sutís No meu rosto Quente como a tarde.
Sem lei e sem ordem
Não seria nenhum pesadelo Perdido, sem lei, Sem ordem, Só com minhas lembranças E pretensões. Andando no meu caminho, Ou Parado De frente para mim. Assim... Com coração e mente. Apenas um, Que, de tão contente, Bastasse o vento. Sem tempo Sem.
Homens Simples
Homens simples
Homens que nascem com o sol
Todos os dias,
Que brilham e ficam tristes,
Pedem paz e olham-se nos espelhos de casa
Todas as manhãs.
Com que caras irão para as ruas molhadas pela chuva?
Amam o sol da tarde morna,
Sonham sob um céu de claras contas.
Homens simples!
São crianças, o que eu vejo
Por trás da cortina fria da melancolia,
Além do olhar grave,
Da incerteza esperta,
São crianças sem brinquedos.
Simples crianças;
Aprendizes itinerantes
Com seus olhos rasos.
Não se enxergam na simplicidade do dia.
Homens simples!
Como talvez seja o mundo,
E o tudo e o nada,
O Subterfúgio
E a gota d'água que hora pinga
[Insistente]
No meu rosto sorridente.
Silenciosamente
Como slides sem as cores vivas do presente,
Eu os vejo, rostos que nunca envelhecem.
Sensações perdidas, sorrisos francos.
Sombras na memória, deslizam velozmente
E me aquecem
Suavizando meu pranto.
Preciso de tudo isso, mas por enquanto,
Vê se me esquece!
Perdido e inconsequente,
Vou aos trancos e barrancos,
Revivendo as cores que esmaecem
Silenciosamente.
Correnteza
Na estrada, seguindo estrela
Caminhando devagar
Cruzando a vida, feiticeira
Com vontade de ficar
De todo feito pra vingar
Nessa estrada sorrateira
Siso pouco, muito amar
Solução se faz primeira
Construí casa de cera
Castelos à beira mar
Muros, ponte, ribanceira
Para ver tudo passar
E o que passa vai voltar
Quer queira ou não queira
Tudo tem o seu lugar
No meio da correnteza
Polaroid
Aqui, onde estou, Posso diluir-me num verso Para caber no espaço do teu riso. Posso colher mil maneiras de te amar, Sonhar em cinemascope Nosso beijo lírico de domingo. Rabiscando agora, Nesse velho caderno colegial, Sou ciência humana transitória. Sou saber perdido na tua memória, Fotografia em preto e branco Da minha antiga Polaroid. Aqui, onde estou, Posso construir meus versos em silêncio Para exibir estático numa tela, Posso fazer uma fotonovela E colher o teu sorriso breve Para fazer figura leve No espaço cênico do poema.
Singular
Apenas um instante
E condensado todo o amor gerado na vida
Explodir no infinito
Sobre o futuro
Além do tempo e do espaço.
Um momento singular
Um salto e solto no ar
Flanar
Com meu corpo inteiro
Minhas sílabas certas
E meu sorriso de criança.
Devaneio
Acordou cedo.
Olhou em volta e não viu ninguém.
Não viu a nova máquina,
O olho que lhe vê.
Sua conta na rede,
Seu retrato na parede.
Ele não viu você.
Não viu o dinheiro dos outros,
O sangue na cidade;
Ele não viu a maldade.
Não viu os cabelos dela,
Seu visual progressivo,
A conta em cima da mesa,
A lata de cerveja.
Não viu o herói da tela,
As algemas no bandido;
Não viu a fita amarela,
Nem o choro, nem a vela.
Não viu que não via algures,
Enfiou-se na escuridão do sono
E sonhou contente.
Sonhou com aguardente,
Recitou seus poemas de cor e salteado,
correu sobre os telhados.
Não viu que podia ver,
Onde está você,
Aonde vai o rio
E sua correnteza.
Não viu que, deveras, a sua riqueza,
Era agora a sua cegueira,
Sua nobre visão no devaneio.
Utopia
Eu quero a utopia!
Não a ilha,
Mas a certeza do incerto,
A prova do improvável.
Eu quero Vênus, Marte e Júpiter,
Quero a Terra no futuro
Sem leis e sem grades,
Sem fome, crime e dinheiro;
Sem políticos, sem trapaça,
Sem a ilusão da religião.
Eu quero esta utopia.
Sem início e sem fim;
Sem crença e sem esperança.
Eu quero uma utopia
Como um poema de Emily Dickinson,
Como um pássaro que se equilibra num fio.
Eu quero utopia,
Literatura,
Poesia.
Quero sentir a tez da tela,
O odor das formas
E a cor do vento.
Quero Heráclito, Nietzsche e Foucault,
Quero a historia do porvir
Tatuada pela máquina de kafka
Numa esquina da Névski.
Macunaíma na Bahia,
Castro Alves e John Donne
Numa Lanhouse de periferia.
Eu quero o aço, o vidro e o carbono,
Supermáquina,
Gadgets, widgets e applets.
Quero androide na minha porta
Com a pizza da madrugada.
Andar se pagar passagem,
Sem o meu, sem o teu,
Leaves of grass!
Quero os loucos na praça,
E os generais como privada de pombos.
Eu quero o ócio criativo,
A escolha digitada.
Eu quero o silêncio
E o barulho do vento nas copas das árvores.
Quero Rock, Blues
E um samba de Batatinha.
Quero utopia, texto, melodia
E não me incomoda a tua censura.
Se “é proibido sonhar…”,
Eu escrevo pra me vingar.
Soneto
Não serei meu vulto na janela, emoldurado,
Quando a clara lua derramar seu leite.
Prefiro ser nas tardes dos campos dourados
Com os olhos pálidos e as mãos silentes.
Como num suspiro célere, num lamento,
Como em noite crua de beijos e abraços,
Num instante é brisa, no outro evento
Espargindo luzes na solidão dos espaços.
Eu, na vastidão mecânica do meu corpo,
Sou nada aflito na superfície, solto
Na imaterialidade efêmera do pensamento .
Silêncio! Agora que a luz se esvai em flocos
No vazio intenso dos meus sonhos loucos,
Sou pluma envolta no lençol dos ventos.
Casamata
Esta noite na casamata
Toda branca, enfeitada:
O céu iluminado,
O chão silencioso,
Espumas e risos.
Sangue e gritos
Na fumaça delgada.
Pão enfiado goela abaixo,
Circo mambembe para a mente crente.
Ninguém aguenta!
Prefiro uma ressaca de vodka
Na segunda-feira.