Pombos nas cidades

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41 » noticiasmagazine 20.JUL.2008 40 » noticiasmagazine 20.JUL.2008 CIDADES Pombos da discórdia Espécie cuja subsistência o homem assegura por afectos simbó- licos e tradição,os pombos citadinos entretêm mais novos e mais velhos,humanizando as cidades. ¬ Mas a dimensão excessiva das suas populações nas cidades (o que também se deve à acção clandestina de quem os alimenta) é pomo de discórdia entre vizinhos e um bico-de-obra para a maioria das câmaras munici- pais. ¬ Considerados pragas,os pombos são alvo de uma per- manente política de controlo. ¬ Uma política inevitavelmente musculada,já que se trata de enfrentar a acção e as convicções de um vasto grupo de pessoas. ¬ Fomos ver como é em Lisboa. TEXTO Sarah Adamopoulos ¬ FOTOGRAFIA Reinaldo Rodrigues

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Reportagem sobre a praga de pombos em Lisboa

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CIDADES Pombosda discórdia

Espécie cuja subsistência o homem assegura por afectos simbó-licos e tradição,os pombos citadinos entretêm mais novos e maisvelhos,humanizando as cidades.¬Mas a dimensão excessiva dassuas populações nas cidades (o que também se deve à acçãoclandestina de quem os alimenta) é pomo de discórdia entre

vizinhos e um bico-de-obra para a maioria das câmaras munici-pais. ¬Considerados pragas,os pombos são alvo de uma per-manente política de controlo.¬Uma política inevitavelmentemusculada,já que se trata de enfrentar a acção e as convicçõesde um vasto grupo de pessoas.¬Fomos ver como é em Lisboa.

TEXTO Sarah Adamopoulos ¬ FOTOGRAFIA Reinaldo Rodrigues

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cobrindo diferentes zonas da cidade. Locaisque correspondem a colónias aí fixadas pelaacção de quem alimenta os pombos. Locaisonde os serviços camarários intervêm, dis-tribuindo anualmente perto de uma cente-na de toneladas de milho simples (todos osdias com excepção dos domingos e feriados),e aí depositando também milho com contra-ceptivo (em períodos específicos, corres-pondentes às alturas de postura), fundamen-tal para o controlo de uma população sem-pre à beira do desaire ecológico.

Etelvina contra a fome Quem insiste em alimentar os pombos dizque o faz porque andam esfomeados, porqueo milho simples fornecido pela câmara nãochega, porque eles (os pombos) não gostamdo milho com contraceptivo, que não ali-menta, que tem mau sabor, porque aos ani-mais, como aos velhos e às crianças, não senega nem alimento nem carinho. Razões le-gítimas, para uns, porém delirantes, para ou-tros. Para Etelvina (nome fictício), alimenta-dora militante de pombos numa zona consi-derada problemática da cidade de Lisboa, aquestão é muito simples: os bichos têm fomee por isso é preciso agir sem reservas. Agircontra a fome (trauma português cujas vá-rias e possíveis representações simplesmen-te não se toleram), agir em nome da vida.Porque afinal, quando Deus criou a Terra,

pôs lá pombos também. Etelvina compra mi-lho com regularidade, que distribui diaria-mente, e só assim pode dormir descansada,fiando que os bichos andam nutridos.

Resistir é vencerNão quis que gravássemos nenhuma con-versa, muito menos que a fotografássemos.Prefere prosseguir a sua acção caridosa nasombra. Antes de nos despedirmos pergun-ta-me de que lado estou: se do lado dos pom-bos se do da câmara, como se falássemos deum clube ou de outro, de um ou de outro par-tido, desta ou daquela causa. Pergunta-mede que lado estou como se me perguntassese tenho coração. Respondo que a minhaopinião importa pouco, mas que seria bomque a dela, que está objectivamente implica-da, pudesse ter o seu nome e o seu rosto nes-ta reportagem, assumindo-se sem receios.Mas isso é que não pode ser, porque há mui-tos que lhe querem mal, e por isso é melhornão. Etelvina surge como uma espécie in-suspeita de terrorista, agindo em nome pró-prio contra uma política camarária que ape-sar de inevitável lhe parece a ela gravemen-te errada, merecendo por isso o seu combateperseverante.

Lisboa é um pombalNinguém duvida de que há pombos em todaa parte, embora muitos andem distraídos.

Contudo, basta olhar melhor para cima pa-ra descobrir uma cidade coberta de rede epicos dissuasores. Lisboa é para os pombosuma cidade acolhedora, de arquitecturas re-dondas, cheia de bolsas, parapeitos largos,saguões, telheiros, casas e armazéns aban-donados, janelas partidas. Mas a verdade éque actualmente a presença dos pombos ex-cede em muito esses locais, sendo possívelavistá-los em vários outros lugares, caso doterminal de autocarros de passageiros emSete Rios, onde antes da colocação de picosos pombos tomavam sem constrangimen-tos as suas refeições ao lado dos passageiros.Muitos guardarão na memória a visão da ca-fetaria do terminal constantemente invadi-da pelas aves que permanentemente se lan-çavam sobre os restos de sanduíches, bolos,iogurtes, galões, pacotes de açúcar, ali deixa-dos por passageiros apressados.

Pólos de contaminaçãoNos cursos de museologia e conservação depatrimónio, áreas distantes da veterinária,os pombos são estudados em aulas ditas deconservação preventiva. Um único pomboproduz anualmente cerca de 12 quilos de fe-zes, que larga pelo menos de vinte em vinteminutos, onde quer que se encontre, e tam-bém enquanto voa. Entre alguns dos princi-pais males provocados pela presença dospombos nas cidades contam-se febres, mial-

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São pombos da discórdia estesque partilham connosco oespaço da cidade. Discórdiaentre quem gosta deles e

quem nem por isso, entre quem clandestina-mente os alimenta e quem tem a nem semprefácil tarefa de lhes controlar os movimentos,sob pena de não conseguir controlar-lhes apopulação. Não podem ser demasiados, casocontrário transformam-se em poderososagentes patogénicos (para nós como paraeles) e destroem o património edificado e osmonumentos. Mas há muito quem não quei-ra saber disso e finte com requintes de contu-maz malvadez a acção dos técnicos camará-rios incumbidos de manter aceitáveis os ní-veis reprodutivos dos pombos – do ponto devista da higiene urbana e da saúde pública.Muitas vezes gente mais velha, nascida e cria-da no Portugal dos bons e virtuosos senti-mentos, e para quem alimentar os pombosnunca será um delito, antes um dever cristãoque não se questiona. Ou então gente desocu-pada, com tempo para gastar em causas deutilidade discutível para outros tantos.

GuerrilhaAlguns reciclam o pão duro lá de casa, quemais ou menos dissimuladamente lançamnas praças, jardins, passeios (entre estes, há

também quem – quase sempre mulheres –nem sequer se dê ao trabalho de sair de casae lance o alimento directamente da janela ouda varanda). Outros compram milho, porvezes privando-se, cometendo imprudên-cias orçamentais, porém sem reservas en-tregando-se àquela que é nalguns casos aúnica benfeitoria que a solidão lhes conce-de. Outros ainda organizam-se segundoprincípios de guerrilha, passam de carro,umas horas antes do pessoal da câmara, elançam as suas bombas de milho ou trincade arroz. Obstinam-se nos pombos comooutros na guerra conjugal, no álcool, noscomprimidos, na fé, no jogo. Fazem inimi-gos entre os vizinhos e comerciantes revol-tados com a visão dos carros e das caixas externas dos ares condicionados constante-mente conspurcados pelas fezes dos pom-bos. Regularmente abordados pela políciamunicipal, por vezes pagam multas mas, in-corrigíveis, persistem cheios de resistência.Uma coisa é certa: há entre estes oponentesuma guerrilha constante nas ruas de Lis-boa. Uma luta que se faz de perseguições edenúncias, e sempre de animosidade, comopudemos constatar pelas conversas comuns e com outros, que entretanto preferemnão aparecer (nem uns nem outros), imbuí-dos daquele medo antigo que por princípio

desconfia da liberdade de expressão. Com-portamento que também observámos porparte de comerciantes e proprietários deedifícios, que nos negaram por exemplo odireito de fotografar as redes improvisadascom que cobrem as caixas dos ares condi-cionados. Assaz eloquentemente, este tra-balho não terá por isso o rosto dos implica-dos no conflito.

Controlo de pragasUma lei proíbe que se atraiam «animais er-rantes com alimento na via pública». Masquem alimenta os pombos não quer saberdessa lei, apesar de a sua infracção estar su-jeita a coima. Não podem portanto ser dema-siados – é este o axioma irrebatível – e por is-so é preciso manter o constante equilíbrio daespécie. Desprovidos de predadores, ospombos que habitam as cidades, espécie quese reproduz com impressionante taxa de su-cesso (consequência também da disponibi-lidade constante de alimento), precisam deser controlados. Em Lisboa, os serviços mu-nicipais de controlo de pragas asseguramdiariamente um programa de alimentação,que passa também pela habituação a um tipode milho que torna as aves menos férteis.Programa que contempla mais de uma cen-tena de spots considerados problemáticos,

PerigoUm único pombo produz anualmente 12 quilos defezes que larga de vinte em vinte minutos.E podem causar febres,mialgias,carraças,ectoparasitas,meningites,esporos...

Pombal na Praça Martim Moniz. Vítor Malha comercializa

e instala em todo o país equipamentos de dissuasão

de poiso dos pombos.

CLÉMENT DARRASSECLÉMENT DARRASSE

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gias, carraças, erupções cutâneas, ectopa-rasitas, irritações cutâneas várias, meningi-te, esporos, criptococose, histoplasmose...Os ninhos dos pombos entopem canaliza-ções e condutas de água, corroem os mate-riais, atraem insectos e actuam como cha-mariz para outras pestes. Num só ninho: 10 traças, 43 aranhas Niptus hololeucus (gol-den spider beetles), 15 escaravelhos-das-des-pensas (larder beetles).

Sol, alimento e ausência de predadoresVítor Malha comercializa e instala em todoo país (continente e ilhas) equipamentos dedissuasão do poiso dos pombos desde 1997,altura em que deixou de trabalhar na áreados seguros para se dedicar em exclusivida-de a um negócio que será tanto mais flores-cente quantos mais pombos houver. E co-mo pombos a fazer estragos por todo o lado

é o que não falta, Vítor Malha parece não termãos a medir. «O que se passa em Portugalé que o número de dias de sol por ano deter-mina que os pombos se reproduzam comuma maior rapidez do que noutros países.Chegam a ter cinco ou seis posturas de ovosnum ano. Por outro lado, como as pessoasos alimentam, eles tornaram-se sedentá-rios, e por isso não saem das zonas onde es-tão. Procuram refúgio em locais onde se po-dem esconder para nidificar, fixando-se emcolónias que não param de crescer. Se aspessoas parassem de os alimentar, eles se-riam obrigados a ir à procura de alimentofora das cidades, e iriam para o campo, on-de há predadores, que mantêm o equilíbrioda espécie.»

Sistemas antipombosQuando começou a trabalhar nesta área, Ví-tor Malha começou por atender as solicita-ções de pessoas ligadas à preservação do pa-trimónio edificado, instalando sistemas dedissuasão em monumentos. «Foram as pes-soas que se ocupam do património as pri-meiras a preocupar-se com as consequên-cias dos excrementos dos pombos nos edifí-cios e monumentos. Entretanto, as outraspessoas começaram a tomar consciência deque os pombos são transmissores de váriasdoenças, doenças iguais às que são transmi-tidas pelos ratos, e começaram a querer de-fender os seus edifícios e as suas habitações.É preciso ver que os excrementos dos pom-bos, mesmo depois de secos, são transfor-mados num pó que é levado pelo vento, oqual ao ser inalado pelos humanos pode ori-ginar graves problemas respiratórios.» Ho-je em dia o técnico tem uma invejável car-teira de clientes, que contempla entidadestão diversas como câmaras municipais,grandes empresas, fábricas, hotéis, museus,mas também proprietários de edifícios oude andares, e até inquilinos. Quanto aos sis-temas, a escolha é vasta e pretende respon-der a todo o tipo de necessidades: espigõesem aço inox (como os que vemos nalgumasestátuas), sistemas electrostáticos que ligame desligam através de impulsos de baixa am-peragem (como é o caso daqueles instaladosna Igreja de São Nicolau, no Teatro NacionalDona Maria II ou na Estação do Rossio, emLisboa), fio de aço inox que evita que os ani-mais se instalem, redes de polietileno colo-cadas por exemplo em fechos de claustros,fechos de janelas de sinos nas torres sinei-ras, fechos de janelas comuns ou saguões, ul-tra-sons, sons ou ainda um sistema de pirâ-mide em espelhos, que trabalham comenergia solar, rodando e oscilando, e enca-deando as aves (usado principalmente noscampos agrícolas).

Demasiados e polígamosVítor Malha não duvida de que o nicho demercado que encontrou resulta em muito

da acção das pessoas que insistem em ali-mentar os pombos. «Na cidade de Lisboa,por exemplo, ninguém cumpre a lei munici-pal que proíbe que se alimentem os animaiserrantes. Penso que a maior parte são pes-soas de idade. Muitas acreditam que nósqueremos fazer mal aos animais, quando averdade é que nós queremos tão-somenteafastá-los, dissuadi-los. “Os pombos, coita-dinhos”, como essas pessoas dizem, trans-formaram-se num enorme problema, numapraga. Por outro lado, os pombos que erammonogâmicos deixaram de o ser e agora sãopolígamos, e há até quem acredite que al-guns são já hermafroditas – li isso numa te-se de Biologia que foi defendida na Univer-sidade de Coimbra –, auto-reproduzindo--se, portanto.»

Fazer à maneira delasPão, milho, arroz, restos de comida, tudo ser-ve para agir em nome da boa consciência dosalimentadores prevaricadores, que fazem daalimentação dos pombos uma profissão-de--fé de contornos delirantes. De tal forma queos pombais expressamente colocados pelacâmara em lugares-alvo como é o caso daPraça do Martim Moniz, em Lisboa, man-têm-se a maior parte do tempo esvaziados depombos, permanentemente atraídos quesão para milhares de outros locais, onde hásempre comida para eles. «A câmara munici-pal fez uma campanha de sensibilização jun-to das juntas de freguesia», conta Vítor Ma-lha, «pedindo às pessoas para não alimenta-rem as aves ou para irem regularmente aosserviços da câmara buscar milho anticon-cepcional. Mas não resulta. As pessoas pre-ferem fazer à maneira delas.» À sua maneiraé também o que faz Olinda (nome fictício),senhora nos seus setentas e muitos, com poi-so fixo num dos miradouros mais frequenta-

dos da velha Lisboa. Todos os dias espera pe-lo cair da tarde para ir dar de comer «aospombinhos, coitadinhos», cuja colóniamaior mora por ali perto, nos telhados de umbloco de casario degradado. Conta que des-ses telhados os pombos a vêem, convergindoem massa para junto dela, para debicar as mi-gas de pão que Olinda entretanto preparouem casa. Fala comigo enquanto segura umarosa na mão, «para oferecer à Nossa Senho-ra», confidencia cheia de contentamento.Olinda, que afirma conversar muito com «ospombinhos, coitadinhos», é apenas um pe-queno elo de uma cadeia que se organiza se-gundo princípios que, embora vagos e miste-riosos, escapam ao entendimento mais ra-cional – como aliás à acção das tutelas.

Capturas tabuMuitos apontam o dedo às câmaras munici-pais, que consideram insuficientementeempenhadas em resolver de forma cabal oproblema do excesso de pombos nas cida-des. Falta de empenho que decorrerá por-ventura de suborçamentações e pouca von-tade política. A nm quis acompanhar umabrigada de captura, possibilidade que, ape-sar de nunca ter sido refutada pela CâmaraMunicipal de Lisboa (CML), acabou por não

se concretizar, entre questões hierárquicas econtactos não-retribuídos. A CML faz evi-dentemente capturas (sem elas, não seriapossível manter aceitável o número depombos em Lisboa), segundo alguns usandométodos bárbaros (asfixia por amoníaco,fornos). Mas sobre isso ninguém se pronun-cia com clareza e objectividade, decerto te-mendo retaliações por parte de uma cama-da não-negligenciável de eleitores, peranteos quais jamais assumirão a mais impopularde todas as medidas de controlo a que sãoobrigadas: a captura e eliminação regular deaves (cerca de 16 mil aves capturadas em2007, dados do Serviço de Controlo de Pra-gas da CML). Acção oculta e brutal (noutrascidades os pombos capturados são levadospara zonas rurais suficientemente distantespara não voltarem e largados na natureza),que mereceria talvez uma outra abordageme métodos – a par de campanhas de sensibi-lização suficientemente esclarecedoras epenalizadoras, passíveis de inibir práticasculturais profundamente enraizadas em al-gumas camadas da população. As tais que aolongo desta reportagem foram lembrandoque quando Deus criou o mundo criou tam-bém os pombos. Certíssimo, porém, na Arcade Noé, que se saiba, apenas havia um casalde pombos...

Guerra de nervosNa Avenida General Roçadas, entre a PaivaCouceiro e Sapadores, que aqui serve de pa-radigma ilustrador do conflito generalizado(trata-se de uma das zonas consideradasmais problemáticas), a guerrilha é constan-te. Uma guerra de nervos que atravessa a to-talidade da rua, apesar de alguns focos demaior irritação. Os lojistas queixam-se: oscarros deles e dos fornecedores não podemficar estacionados debaixo das árvores maisde cinco minutos sem ficarem sujos, o pas-seio está sempre cheio de sacos de plásticocom alimento, as caixas dos ares condicio-nados têm de ser protegidas com rede, e háaté uma esplanada onde nem sempre se po-de estar, já que por cima alguém se obstinada varanda a lançar comida aos pombos...Perigosa de atravessar como uma estradanacional, com um tráfego automóvel cons-tante mesmo ao domingo, a General Ro-çadas surge-nos como um fosso, na cir-cunstância o de Astérix, onde de um lado ede outro se empunham argumentos incon-ciliáveis. Numa das extremidades da rua,num terreno baldio, no que resta do piso tér-reo de uma casa entretanto demolida (as di-visões da casa perfeitamente definidas nochão de mosaicos e onde ainda se podem veras bocas de canalização), várias dezenas depombos bebem água de garrafas de plásticocortadas, ali deixadas por senhoras da briga-da a que pertencem também Etelvina ouOlinda. Talvez ali morasse alguém com sig-nificado abastecedor para os pombos.

NinhosEntopem

canalizações econdutas de água,

corroem osmateriais,atraeminsectos e actuam

como chamarizpara outras pestes.

Câmara Municipal de Lisboa>Higiene Urbana e Resíduos Sólidos:[email protected]>Linha de Atendimento ao Munícipe:213253555Sistemas dissuasores de poiso [Vítor Malha] >www.dissuasoresdepombos.com.pt

Mais informação

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observámos que as pessoas são pouco sensí-veis... Procuramos identificar quem alimen-ta os pombos e fazer uma sensibilização jun-to delas, por vezes individualmente. Conse-guimos identificar essas pessoas, até por viade denúncias dos vizinhos, que muitas vezesficam aborrecidos e acabam por denunciá-las. Abordamos essas pessoas, que são de-pois notificadas, solicitando a câmara quecessem a alimentação das aves. Quando nãocumprem pedimos à Polícia Municipal paraas notificar no sentido de dissuadi-las. Porvezes conseguimos, outras não... há pessoasque são absolutamente incorrigíveis. Algu-mas fazem a distribuição de alimento de car-ro, por várias zonas da cidade. Já identificá-mos algumas, sabemos quem são. Há zonasde Lisboa em que há pessoas que todos osdias distribuem vários quilos de milho,criando pombais enormes onde não os ha-via. Nós bem tentamos fazer a habituação aonosso milho, para tentar equilibrar, mas háque m passe antes de nós, e como os pombosgostam mais do milho que elas lhes dão...A questão dos pombos nas cidades é um pro-blema que não é novo, ao qual têm correspon-dido políticas mais ou menos agressivas e or-çamentos maiores ou menores, e que contudoem Lisboa não consegue taxas de sucessoaceitáveis. O que não corre bem?

Há uma enorme falta de colaboração daspessoas. Culturalmente, as pessoas têm ohábito de alimentar as aves. É também o ca-so das pessoas que vendem nos centros co-merciais e lojas do Martim Moniz, onde aliásinstalámos um pombal, sem sucesso. Aí,quando precisamos de fazer captura, pedi-mos a colaboração da Polícia Municipal, etem de ficar um agente toda a noite, casocontrário há pessoas que os alimentam demadrugada, e quando lá chegamos os pom-bos nem chegaram a entrar, porque já co-meram noutro lugar ali ao pé. Tivemos umproblema na cafetaria do Museu de Arte An-tiga, as pessoas davam comida aos pombos,e basta dar uma vez ou duas para eles volta-rem. Tentávamos fazer a habituação ao nos-so milho no jardim ao lado, mas os pombosnão apareciam. Eles têm rações disponíveisem todos os pontos da cidade. Há depois as fezes dos pombos, muitíssimocorrosivas e danificam irreversivelmente o pa-trimónio edificado – para não falar dos carros.São corrosivas, estão cheias de microrganis-mos, e há também os ectoparasitas das pe-nas, muito prejudiciais em termos de aler-gias. Quando fazemos as capturas enviamosos animais para análise no Laboratório Na-cional de Investigação Veterinária, e não te-mos tido notícias de microrganismos preo-

cupantes do ponto de vista da saúde pública.Controlamos o estado de saúde dos pombose procuramos evitar a conspurcação do es-paço público, limpando e colocando repe-lentes de poiso (picos ou rede). Procuramosidentificar os imóveis abertos e abandona-dos, notificando os proprietários para pro-cederem à limpeza, desinfestação e à oclu-são dos vãos, janelas, por forma a evitar acriação de pombais a funcionar fora do nos-so controlo. A maior parte são edifícios par-ticulares, pelo que não lhes temos acesso. Os sistemas antipombo são da responsabilida-de da CML? Ou no caso dos edifícios particula-res essa é uma tarefa dos seus proprietários?Nós não colocamos, damos aconselhamen-to. Por exemplo, a Faculdade de Medicina ti-nha problemas de poiso, colocaram um fioelectrostático, semelhante ao que havia nasestátuas do Rossio, um fio que tem uma cor-rente electromagnética muito baixa mas queincomoda os pombos o suficiente para os dis-suadir de ali poisar. É um sistema eficaz mascaro. Não esperamos que os proprietáriosdos imóveis façam essa despesa, mas damosaconselhamento para intervenções baratas.Por vezes são coisas muito simples que po-dem ser feitas sem custos relevantes. Infeliz-mente os proprietários nem sempre são nos-sos parceiros neste programa.«

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Quais as principais medidas do programa ca-marário de controlo da população de pombosem Lisboa?Foi replicada uma metodologia já utilizadanalgumas cidades europeias e que consiste,em traços gerais, na identificação dos locaismais problemáticos, quer pelo número dereclamações que recebemos dos residentesnas respectivas áreas quer por avaliação noterreno, feita pelos nossos técnicos. Feitoum mapa desses locais, procede-se a umahabituação das aves com a distribuição diá-ria de milho, o que permite fixar os animais,fazer a sua contagem e, em função dessescensos, efectuar capturas quando tal é ne-cessário. Durante as épocas de reprodução[180 dias por ano, em duas acções de 90 dias,correspondentes às épocas de postura – nosmeses de Abril, Maio e Junho – e nos mesesde Setembro, Outubro e Novembro], o mi-lho simples é substituído por milho comcontraceptivo oral [progesterona a 0,01 porcento], para controlar a taxa de reproduçãodas aves, o que permite evitar as capturas. Quais as zonas consideradas problemáticas?Rossio, Praça da Figueira, Martim Moniz,Restauradores, Praça Paiva Couceiro, algu-mas zonas da Ajuda, Campo de Ourique jun-to à igreja, locais onde há munícipes que ha-bitualmente alimentam os pombos.

Esse é porventura o maior dos obstáculos. Re-firo-me aos munícipes que persistentementeagem por oposição às acções de controlo.Sem dúvida. Quando distribuímos milhocom contraceptivo fazemo-lo de acordocom a contagem de aves previamente feita,de maneira a assegurar que elas ingiram 30a 35 gramas de milho com contraceptivo pordia. Acontece que essas pessoas que se dedi-cam a alimentar os pombos passam antes denós, algumas de carro, e alimentam as avescom milho comum. Depois as aves não co-mem o milho contraceptivo distribuído pornós. E temos dificuldade em controlar a ac-ção dessas pessoas que alimentam as avesporque que o nosso milho não é bom paraelas. Mas esse milho não faz mal às aves, aúnica coisa que faz é inibir a reprodução. Talvez essas pessoas guardem na memória avisão de praças cheias de pombos moribundos,mortos com milho envenenado, o chamado mi-lho roxo, que em tempos idos era pontualmen-te usado para controlar o número de pombosnalguns locais de grande concentração deaves em Lisboa, caso do Largo de São Paulo,junto ao Cais do Sodré.Já não fazemos esse tipo de intervenção.Fazemos sim a habituação ao milho comcontraceptivo, com o objectivo de torná-losestéreis.

Fazem também capturas regulares de aves.Sim, de vez em quando fazemos capturas,porque é a única maneira de reduzir a popu-lação. O controlo da reprodução não chega... A que atribui esse comportamento por partedas pessoas que persistem em alimentar ospombos, apesar de saberem que isso vai con-tra a política preconizada pela câmara – e queestão inclusive sujeitas a coimas?Àquele amor desmesurado pelos animais,que acaba por ser contraproducente para ospróprios animais. Essas práticas provocamcrescimentos anómalos na população deaves, e também a não eliminação natural dosmais fracos, para não falar da conspurcaçãodo espaço público e da proliferação de mi-crorganismos, com consequências para aspessoas. Mas, por mais que se explique, es-sas pessoas não aceitam a acção da câmara.Quem são essas pessoas? A maior parte idosos, mas não no caso daspessoas que são avistadas a conduzir as via-turas. Temos um programa de captura, este-rilização e recolocação de gatos, mas há pes-soas que não aderem, porque pensam quenós queremos matar os gatos. Em conse-quência, em vez de termos gatos saudáveis,vacinados e com uma população controla-da, temos colónias enormes de gatos doen-tes, muitos não esterilizados, e que se repro-duzem descontroladamente pela cidade.Há um problema de comunicação entre a câ-mara e esses munícipes. Talvez justifique umacampanha de sensibilização agressiva, cominformação contundente sobre a questão.Talvez, sim. Não somos contra os pombosnem pretendemos acabar com os pombosem Lisboa, mas as pessoas têm de com-preender que é preciso controlá-los. Há pes-soas que nos enviam e-mailsa pedir que aca-bemos com os pombos todos, chamando-lhes ratos com asas, algumas mensagens atéagressivas. Nós não temos uma política deextermínio. Temos o cuidado de constante-mente avaliar o estado de saúde das aves ede manter a população dentro de níveis eco-logicamente aceitáveis. Mas esse trabalhonão é fácil, porque as pessoas não colaborame agem de forma a desviar os pombos dos lo-cais de poiso habituais, o que prejudicaenormemente o nosso programa. O programa prossegue independentementedas denúncias e queixas dos munícipes?Sistemática e constantemente. Diariamen-te é feita a distribuição de milho, são diaria-mente avaliados os locais, periodicamente éfeito o censo da população, é diariamenteavaliada a situação no que diz respeito aimóveis, porque todos os dias se descobremnovos locais. Acrescido a esse trabalho diá-rio, há as respostas individuais às pessoasque nos apresentam reclamações, ou de-núncias, ou sugestões. Regularmente faze-mos a distribuição de folhetos informativosnas zonas mais problemáticas. Fizemoscampanhas de sensibilização de rua, mas

LUÍSA COSTA GOMES,responsávelpela Divisão de Higiene e Contro-lo Sanitário do Departamento de Higiene Urbana e ResíduosSólidos da Câmara Municipal de Lisboa (que inclui o Servi-ço de Controlo de Pragas),explicou as linhas gerais da polí-tica de controlo de pombos em Lisboa.

«Há uma enorme falta decolaboração das pessoas»

CLÉMENT DARRASSE