PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana...

162
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social Desenvolvidas Pelas Empresas em Mato Grosso DOUTORADO EM SERVIÇO SOCIAL SÃO PAULO 2008

Transcript of PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana...

Page 1: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

Tânia Maria Santana dos Santos

A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social Desenvolvidas Pelas Empresas em Mato Grosso

DOUTORADO EM SERVIÇO SOCIAL

SÃO PAULO 2008

Page 2: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

Tânia Maria Santana dos Santos

A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social Desenvolvidas Pelas Empresas em Mato Grosso

DOUTORADO EM SERVIÇO SOCIAL Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutora em Serviço Social sob a orientação da Professora Doutora Mariângela Belfiore Wanderley.

SÃO PAULO 2008

Page 3: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

Banca Examinadora ________________________________________

Mariangela Belfiore Wanderley

____________________________________

________________________________________

________________________________________

________________________________________

Page 4: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

A Mariana, minha querida filha.

A minha mãe Sônia e ao meu pai Isaac (in memóriam) pelo amor e apoio de sempre.

A Odete Toni, amiga querida, que, aos 91 anos de

idade, mantém a lucidez e a disposição de aprender

coisas novas e fazer o que parece impossível.

Page 5: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

AGRADECIMENTOS

Não poderia deixar de agradecer àquelas pessoas que, de alguma forma, contribuíram para que esta tese se concretizasse.

A Mariangela Belfiore Wanderley que, de modo competente, se fez presente e não mediu esforços durante todo o processo de orientação, tendo uma paciência infinita com a minha falta de disciplina.

Às amigas Izabel Cristina Dias Lira, Samira Lotfi Rocha da Silva e ao meu amigo Gilberto Haas, que acompanharam de perto o desenvolver desta tese, apoiando estimulando e incentivando.

Às Professoras Dilséa Adeodata Bonetti, Raquel Raicheles e Eloísa Helena de S. Cabral pelas valiosas críticas e sugestões durante a qualificação.

Às professoras Carmelita Yazbek , Maria Lúcia Martinelli e ao professor Evaldo Amaro Vieira, pela disponibilidade e carinho durante todo o curso.

Às amigas Ana Paula Soubhia, Isabel Arruda, Silvina Carro, Sônia Regina Nozabielli, Áurea Eleotério S. Barroso, Milene Alves Secon., Maria Conceição Silva, Cleonice Correa Araújo, e ao Fu Wen Hsien (Renato) pela convivência acadêmica e extra-acadêmica que foram de importância fundamental.

A Elóa Lourenço, Geni Catarina, Ilza Ferraz, Vera Lúcia Pinheiro, Enir Moreira, Laíde Ferroni, Wilson Cunha, Ruben Fábio Ferreira e Virgilio Ferreira, pela amizade e estímulo de longos anos.

À minha família que, como toda “tribo” que se preza, é numerosa e significa muito em minha vida. Dela fazem parte: Sônia, minha mãe, Márcia, Consuelo, Rose Mary (irmãs) Neto, Robério e Roberto (irmãos), Beto e Marçal (cunhados) Ana Carolina e Lucinéia (cunhadas) e meus sobrinhos Ana Carolina, Daniel, Celina, Karina, Pedro Henrique, Ana Luiza, Júlia, Rafael, João Gabriel e João Paulo.

Ao Jaime Giolo, pelo jeito singular de dar apoio e estímulo.

À Universidade Federal de Mato Grosso que me forneceu condições e apoio fundamentais para a realização do doutorado.

Ao Departamento de Serviço Social da UFMT, pela liberação para o doutorado.

A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior-CAPES - pelo apoio material, sem o qual não poderia ter cursado o doutorado.

Às empresas: Rede CEMAT – Centrais Elétricas de Mato Grosso, ELETRONORTE, AÇOFER, Usinas Itamaraty, Empresa Brasileira de Correios

Page 6: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

e Telégrafos de Mato Grosso pela disponibilidade e presteza com que me receberam para a realização da pesquisa.

Aos gestores: Paulo Cogima, Jéferson Kopak, Gilmar Ivens Ribeiro, Luís Clemente, Rose Soares Souza, Cristina Souto Melo, Andréia Freitas Morais e às assistentes sociais: Maria Rosilene M. Medeiros, Inara Coga, Josiane Rita S. Dias, Jirlaine Moreira Leal, Carmem Santos e Silva, Maria de Lourdes Turbino, pela valiosa colaboração.

A Luísa Soares de Morais e a Kátia Cristina Silva pela presteza e solicitude que sempre me dispensaram.

Page 7: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABRH Associação Brasileira de Recursos Humanos

AMM Associação Mato-grossense dos Municípios

AUDIPE Associação dos Auditores Públicos do Estado

BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento

CPI Comissão Parlamentar de Inquérito

CPT Comissão Pastoral da Terra

CRESS Conselho Regional de Serviço Social

FACER Faculdade Cenecista de Rondonópolis

FAMATO Federação da Agricultura de Mato Grosso

FIEMT Federação das Indústrias de Mato Grosso

FECOMÉRCIO Federação do Comércio

FGV Fundação Getúlio Vargas

GIFE Grupo de Institutos, Fundações e Empresas.

IBASE Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IDH Índice de Desenvolvimento Humano

IES Instituições de Ensino Superior

IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

ONG’s Organizações Não Governamentais

PIB Produto Interno Bruto

PNBE Pensamento Nacional das Bases Empresariais

SEPLAN Secretaria de Planejamento

SESI Serviço Social da Indústria

SINAES Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior

Page 8: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

SINCON Sindicato de Contabilidade

UNOPAR Universidade do Oeste do Paraná

UNITINS Universidade do Tocantins

Page 9: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Mato Grosso: população – 1975 e 2005................................... 30

Tabela 2 – Investimento social privado, por região: montante de recursos investidos e comparação com o PIB, 2000 e 2004........................

93

Page 10: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

RESUMO

SANTOS, Tânia Maria Santana dos. A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social Desenvolvidas Pelas Empresas em Mato Grosso. Tese (Doutorado). Programa de Serviço Social, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo. 2008.

Esta tese tem o objetivo de analisar a atuação do assistente social nas ações de responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas de Mato Grosso. Para alcançarmos este objetivo buscamos estabelecer as devidas conexões entre os três eixos que consideramos de importância fundamental, e que são: - A questão social que, no nosso entendimento, se constitui em elemento central da relação entre a profissão de Serviço Social e a realidade, considerando que o objeto de trabalho do assistente social é a questão social nas suas múltiplas expressões; - A profissão de Serviço Social, enquanto profissão inscrita na divisão social e técnica do trabalho e o assistente social na condição de trabalhador assalariado que, como qualquer outro trabalhador, tem que vender a sua força de trabalho para sobreviver; - a responsabilidade social empresarial entendida como estratégia de gestão utilizada pelas empresas que em busca de legitimação social lançam mão de estratégias que venham incorporar novas dimensões aos seus negócios. Em outras palavras, a responsabilidade social como parte da racionalidade empresarial para manter-se no mercado globalizado. Assim, a partir desses eixos e dos depoimentos dos sujeitos (gestores e assistentes sociais) que desenvolvem sua atuação profissional em empresas no Estado de Mato Grosso, buscamos desenvolver o estudo proposto, ou seja, a análise da atuação do assistente social nas ações de responsabilidade social empresarial em Mato Grosso.

Palavras-chave: questão social, atuação profissional, responsabilidade social.

Page 11: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

ABSTRACT

SANTOS, Tânia Maria Santana dos. The social worker’s performance in the practices of social responsibility developed by the enterprises of Mato Grosso. Thesis (PhD). Programme of Social Service, Pontifical Catholic University of São Paulo, São Paulo. 2008.

This thesis aims at analyzing the social worker’s performance in the practices of social responsibility developed by the enterprises of Mato Grosso. To reach this aim we sought to establish the proper connections among the three axes that we consider of extreme importance that are: The social issue, which according to our point of view is the central element of the relation between the profession of Social Work and the reality, considering that the object of work of the social worker deals with social issues in their multiple expressions; The Social Work as a profession registered in the social and technical division of work and the social assistant in the condition of an employee that, as any other worker, has to; sell his work force to survive, The entrepreneurial social responsibility understood as a management strategy used by the enterprises that in search of social legitimization use strategies that can embody new dimensions to their businesses, in other words, the social responsibility as part of an entrepreneurial rationality to keep itself in the globalized market. So, through these axis and the individuals’ testimonies (managers and social workers) who develop their profession in Mato Grosso enterprises, we try to develop this study, that is, the analysis of the social worker’s performance in the practices of entrepreneurial social responsibility in Mato Grosso.

Keywords: social issue, professional performance, social responsibility.

Page 12: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

SUMÁRIO

CONSIDERAÇÕES INICIAIS...................................................................... 13

1. CAPÍTULO I - CONTEXTO: O ESTADO DE MATO GROSSO............... 29

2. CAPÍTULO II - A SEMPRE E VELHA QUESTÃO SOCIAL..................... 37

2.1 As transformações societárias e a intensificação da questão social no Brasil.......................................................................................

41

2.2 A questão social e suas manifestações nos tempos da globalização e do neoliberalismo...........................................................

55

2.3 A Reforma do Estado no Brasil........................................................ 58

3. CAPÍTULO III - RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL..... 63

3.1 O conceito e suas origens................................................................ 63

3.2 Responsabilidade social: contexto e percurso................................. 69

3.3 Responsabilidade social empresarial no Brasil................................ 81

3.4 Breve mapeamento da responsabilidade social no Brasil............... 88

4. CAPÍTULO IV – A ATUAÇÃO DO ASSISTENTE SOCIAL NAS AÇÕES DE RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS EM MATO GROSSO.........................................................................................

99

4.1 Responsabilidade social empresarial: o entendimento dos sujeitos 99

4.2 O porquê das ações de responsabilidade social............................. 106

4.3 O marketing...................................................................................... 111

4.4 O público - alvo das ações............................................................... 116

4.5 A avaliação das ações de responsabilidade social.......................... 117

4.6 O balanço social............................................................................... 119

4.7 As ações de responsabilidade social............................................... 120

4.8 As dificuldades encontradas pelos assistentes sociais no desenvolvimento das ações de responsabilidade social.......................

124

4.9 Há lugar para a atuação do assistente social nas ações de responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas em Mato Grosso?..................................................................................................

125

4.10 O voluntariado................................................................................ 128

4.11 O trabalho do assistente social...................................................... 132

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................... 136

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................ 141

ANEXOS...................................................................................................... 152

ANEXO I...................................................................................................... 153

Instrumental de Entrevista nº. 1............................................................. 153

Page 13: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

ANEXO II..................................................................................................... 154

Instrumental de Entrevista nº. 2............................................................. 154

ANEXO III.................................................................................................... 156

LEI N° 7.687, DE 25 DE JUNHO DE 2002 - D.O. 25.06.02................... 156

Page 14: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

13

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A idéia desta tese começa com uma questão que parece simples. Como

se dá a atuação dos assistentes sociais nas ações de responsabilidade social

empresarial desenvolvidas pelas empresas em Mato Grosso, neste momento

em que a responsabilidade social empresarial adquire lugar de destaque na

mídia e no discurso, tanto dos empresários como das pessoas em geral,

quando inclusive se ouve falar da responsabilidade social como solução para

os problemas sociais, apesar de sabermos que a realidade não é esta?

A tentativa de entender essa questão levou-nos a trilhar o caminho da

busca pelo entendimento sobre a responsabilidade social empresarial, o

contexto que possibilitou a sua emergência, e de como se dá a atuação

profissional do assistente social nas ações de responsabilidade social

desenvolvidas pelas empresas em Mato Grosso.

Encontramos, na literatura sobre responsabilidade social empresarial,

conceitos diversificados que, no nosso entendimento, evidenciam a

ambigüidade que conforma o tema. Inicialmente, recorremos às publicações do

Instituto ETHOS de Responsabilidade Social, aos documentos do Grupo de

Institutos Fundações e Empresas – GIFE- e ao Instituto Brasileiro de Análise

Social Empresarial – IBASE-, instituições que no Brasil se destacam nas ações

que se referem à responsabilidade social empresarial.

Constatamos que a bibliografia existente sobre o tema é mais extensa

na área de Administração de Empresas na qual vários autores se dedicam a

escrever e pesquisar sobre a temática. Dentre estes nos remetemos a Patrícia

ASHLEY, Fernando TENÓRIO, Adriano GOMES, SILVA & FREIRE. Não

obstante também termos encontrado importantes subsídios nas áreas das

Ciências Sociais e do Serviço Social. Na primeira, autores como Joana

GARCIA, Eloísa CABRAL, BEGHIN, foram algumas das referências

constantes. No Serviço Social, a produção sobre a temática da

responsabilidade social empresarial pode ser considerada significativa,

Carmelita YAZBEK, Carlos MONTAÑO, Nobuco KAMEYAMA, Marilda

Page 15: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

14

IAMAMOTO, dentre outros autores se debruçaram sobre o tema da

responsabilidade social empresarial que, junto com o terceiro setor, vem

merecendo uma atenção maior. Pautamos-nos também em jornais e revistas

de circulação nacional e em artigos capturados na internet. Enfim buscamos

conhecer tudo aquilo que pudemos coletar sobre o tema eleito para estudo, o

que nos leva a afirmar que é um tema que vem despertando a atenção não só

da mídia, mas também de estudiosos que têm procurado refletir e contribuir

para o entendimento da responsabilidade social empresarial, no país.

Partimos do pressuposto de que a ação social dos empresários no Brasil

não constitui novidade, como também não parece ser novidade a atuação

profissional dos assistentes sociais nessas ações. As ações das empresas na

área social remontam vários séculos a exemplo da criação, em 1543,da

primeira Santa Casa de Misericórdia em Santos-SP que já inaugurava a

presença do setor privado nesta área.

No entanto, conforme afirmado por Iamamoto (1988, p. 137), é a partir

da desagregação do Estado Novo, no final da Segunda Guerra Mundial, que

faz-se notar a preocupação do empresariado com o social. Ressalta a autora

que tal preocupação será essencialmente imobilista e controladora voltada para

o disciplinamento do tempo livre conquistado pelo proletariado, ou seja, a

preocupação era cultivar no proletariado um padrão ético-moral e uma

racionalidade de comportamento ajustada à interiorização da ordem capitalista.

Assim, os “benefícios” concedidos aos empregados, pelas empresas, eram

condicionados ao bom comportamento diante das greves e a uma vida social

regrada. A implantação e o desenvolvimento do Serviço Social no Brasil irão

acontecer neste contexto.

Disso se depreende que o que se apresenta como novo são o interesse

e a dimensão que as ações de responsabilidade social empresarial vêm

assumindo, notadamente a partir da década de 1990 com a reforma do Estado

e o seu conseqüente encolhimento em relação às políticas sociais públicas que

passam a ser incumbência da sociedade civil e do mercado, como se estes

fossem os responsáveis pela resolução dos problemas sociais. Toda essa

Page 16: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

15

situação traz à cena duas visões antagônicas em relação às respostas que

devem ser dadas para as demandas sociais.

De um lado, a sociedade civil e as empresas são conclamadas a

compartilhar com o Estado a responsabilidade pelo equacionamento ou

minimização dos problemas decorrentes das seqüelas da questão social que

se expressam de várias formas e crescem de modo jamais visto. De outro lado

é o momento em que também se faz presente a defesa de políticas públicas

universais e de qualidade que além de serem consideradas ultrapassadas, são

tidas como responsáveis pela crise que conforma o Estado, segundo a ótica

daqueles que defendem a reforma do Estado.

Mas, apesar dos antagonismos em relação às formas de enfrentamento

das seqüelas da questão social, este foi o contexto propício para o surgimento

da responsabilidade social empresarial nos moldes em que é concebida na

atualidade.

Neste sentido, pensamos que não podemos dissociar a responsabilidade

social empresarial da questão social tal qual se apresentava no país na década

de 1990. Período marcado pelo crescimento desenfreado do desemprego, que

certamente não se constitui no único problema, mas que tem conseqüências

desastrosas, aliado à precarização do emprego e à informalidade.

No caso do Serviço Social, os assistentes sociais, tanto quanto outros

trabalhadores vêem-se atingidos no processo de inserção no mercado de

trabalho. Convivem no seu cotidiano profissional com o crescimento do

desemprego, do subemprego, da informalidade, além de serem afetados no

desenvolvimento da sua atuação profissional, considerando que as políticas

sociais, que se constituem em suporte material da ação profissional dos

assistentes sociais sofrem diretamente o impacto do encolhimento do Estado

em relação à área social, tornando-se cada vez menos eficazes, mais pontuais

e focalizadas.

Presencia-se, assim, aquilo que Yazbek se refere como

“refilantropização da questão social” ou, como a constituição de uma “nova

Page 17: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

16

cultura de solidariedade”, onde os dinamismos confessionais, comunitários e

humanitários que caracterizavam as ações voluntárias há séculos são

substituídos por ações que se conformam como parte de uma cidadania ativa

ou participativa relacionada com eficiência e resultados.

Assim, torna-se pertinente considerar, como nos lembra Iamamoto

(1989, p.79) que o momento histórico social que estamos vivendo traz desafios

que devem ser enfrentados com coragem e, sobretudo, com competência.

Enfim, estes tempos novos trazem a exigência de um profissional que, além de

competente, seja capaz de decifrar as gêneses dos processos sociais, suas

desigualdades e as estratégias de ação para enfrentá-las, que não recuse as

tarefas que lhe são socialmente atribuídas, mas que lhes atribua um tratamento

teórico-metodológico e ético político diferenciado. O que requer uma nova

natureza do trabalho profissional.

O discurso viabilizado pela mídia e enfatizado pelas empresas leva a

que as seqüelas da questão social sejam abordadas de uma outra forma, ou

seja, passem a ser objeto da solidariedade tanto da sociedade de uma forma

geral, como por parte das empresas que começam a ser consideradas

importantes agentes de transformação social o que as leva a financiar ou a

participar da implementação ou viabilização das ações sociais que antes eram

da competência do Estado.

Consideramos que a responsabilidade social empresarial se constitui em

uma estratégia de enfrentamento utilizada pelas empresas para garantir a sua

permanência no mercado neste momento de ebulição econômico-social e

política que estamos vivenciando e que reflete um movimento mundial cuja

repercussão tem se feito presente em todas as instâncias da vida dos

indivíduos e, obviamente afetado as profissões que se vêem obrigadas a se

redefinirem e a se repensarem.

Foram essas reflexões que despertaram em nós a curiosidade e a

vontade de realizar um estudo sobre a atuação do assistente social nas ações

de responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas. Acreditávamos que

a ênfase que era dada à responsabilidade social empresarial poderia contribuir

Page 18: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

17

para a ampliação dos espaços de atuação dos assistentes sociais na área

empresarial, que sabemos se constituir, pelo menos no Estado de Mato

Grosso, em espaço restrito de atuação profissional. Assim, estudar este tema

seria mais uma oportunidade de refletir sobre a atuação do assistente social

face às transformações que estão ocorrendo na realidade.

Assim, várias foram as indagações que nos conduziram à aproximação

do tema, mas que podem ser resumidas em três principais:

• Em que consiste a responsabilidade social desenvolvida pelas

empresas em Mato Grosso?

• Como a responsabilidade social empresarial é concebida pelos

assistentes sociais que trabalham nas empresas em Mato Grosso?

• Como se dá a atuação do assistente social nas ações de

responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas em Mato

Grosso?

Acreditamos, como afirma Michel Thiollent (1986, p.56), que as

hipóteses funcionam como diretrizes, como fios condutores de qualquer estudo.

Assim, ao propor desenvolver este estudo, também tínhamos as nossas

hipóteses. Partimos do pressuposto de que a responsabilidade social

empresarial emerge num contexto de simultaneidade entre a redução de

políticas públicas decorrentes do ajuste fiscal imposto ao Estado e que

culminou na sua reforma, e a abertura do espaço às ações sociais privadas, o

que possibilitou ao empresariado e à sociedade civil assumirem atribuições que

antes eram da competência do Estado.

Assim, o que era garantido como direito passa a ser objeto da

solidariedade e os assistentes sociais, apesar de reconhecerem que a

responsabilidade social empresarial se configura como um espaço ocupacional

vêem com certa desconfiança a sua atuação ali, ou por não se sentirem

capacitados, ou pelo fato de não acreditarem que as ações desenvolvidas

pelas empresas possam equacionar os problemas decorrentes das diversas

expressões da “questão social” ou ainda por acreditarem que o que se tem

presenciado é a emergência de um novo tipo de arranjo que põe por terra o

contrato social e o substitui pela mediação das organizações sociais privadas.

Page 19: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

18

Foi com esse entendimento que nos aproximamos do objeto de estudo,

acreditando que a pouca inserção dos assistentes sociais nas empresas que

desenvolvem ações de responsabilidade social em Mato Grosso era decorrente

da rejeição, por parte dos profissionais em assumirem os projetos sociais

viabilizados pelas empresas.

Para o desenvolvimento deste estudo sentimos a necessidade de

estabelecer conexões entre três eixos que consideramos fundamentais:

a) A questão social, enquanto elemento central e constitutivo da relação

entre a profissão de Serviço Social e a realidade, considerando que o

assistente social tem como objeto de trabalho as suas múltiplas expressões, a

partir das quais desencadeia a sua relação com a população, a sua demanda

profissional, o seu trabalho. Nesse sentido, considera-se que a questão social

não é uma questão meramente estrutural, mas que supõe lutas e que se

expressa na vida concreta dos indivíduos1. Assim, acreditamos que a questão

social adquire novas configurações e se intensifica nos diferentes contextos

histórico-sociais, incidindo em todos os aspectos da vida social e no mercado

de trabalho do assistente social.

b) A profissão de Serviço Social, enquanto profissão inscrita na divisão

social e técnica do trabalho e o assistente social na condição de trabalhador

assalariado que tem sua inserção no mercado de trabalho mediada pela

compra e venda da sua força de trabalho, o que envolve necessariamente a

incorporação de parâmetros institucionais e trabalhistas que regulam as

relações de trabalho consubstanciadas no contrato de trabalho e estabelecem

as condições em que esse trabalho se realiza, bem como prevê a

particularização de funções e atribuições decorrentes da normatização

institucional que regula a realização do trabalho coletivo no âmbito dos

organismos empregadores, públicos e privados.

1 É pertinente lembrarmos o que aponta Iamamoto (2002, p.13) em relação ao fato de a questão social não se ater apenas à estrutura, mas se traduzir na vida cotidiana. ”Temos diferentes níveis de abstração da análise e da compreensão da questão social, diz ela. Desde esse maior (...) às particularidades nacionais regionais, culturais, sem as quais essa forma de sociabilidade se expressa nos Estados Nacionais, mas também em função da particularidade, da singularidade dos sujeitos que vivem permeados pelas suas características enquanto sujeitos únicos e singulares”.

Page 20: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

19

c) A Responsabilidade Social Empresarial: como uma estratégia de

gestão utilizada pelas empresas que, para sobreviverem no mercado

globalizado, têm que incorporar novas variáveis que as legitimem perante a

sociedade. Em busca de legitimação as empresas são impulsionadas a

incorporar novas dimensões aos seus negócios, que estão além da

organização econômica e que dizem respeito à vida social, cultural e à

preservação ambiental. 2

A realidade social contemporânea é uma recorrência obrigatória quando

se pensa em analisar o trabalho do assistente social, assim fomos buscar

respaldo, em Octávio Ianni, José de Souza Martins, James Petras, David

Harvey, Hobsbawm e outros que nos forneceram os elementos necessários

para discorrer sobre a questão social.

No que se refere à profissão de Serviço Social, ou de forma mais

específica à atuação profissional do assistente social, recorremos a Marilda

Vilela IAMAMOTO, José Paulo NETTO, Carmelita YAZBEK, Nobuco

KAMEYAMA, Carlos MONTAÑO,dentre outros autores, que se destacam no

âmbito do Serviço Social e que têm o Serviço Social como objeto de suas

análises.

Quanto à Responsabilidade Social Empresarial, nos respaldamos na

bibliografia existente sobre o tema que, conforme afirmamos anteriormente, é

mais extensa na área de Administração de Empresas, mas que vem se

expandindo em outras áreas, inclusive no Serviço Social.

Assim, a partir desses eixos de análise buscamos delinear o nosso

universo de pesquisa que seria conformado pelas empresas de Mato Grosso

que desenvolvessem ações de responsabilidade social.

2 Cappellin et alii, 2002, citado por Nathalie Beghin, in. A filantropia empresarial: nem caridade nem direito, p.9.

Page 21: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

20

O Universo da Pesquisa

Para a conformação do universo da pesquisa recorremos à listagem das

empresas premiadas com o Certificado de Responsabilidade Social do Estado

de Mato Grosso, 3 e ao levantamento realizado pela FIEMT, SESI, SENAI e IEL

objetivando a realização do “Prêmio SESI Qualidade no Trabalho”.

A partir desses dados, pudemos constatar que foram levantadas 210

empresas do Estado, atingindo um total de 30.179 trabalhadores. As empresas

contactadas foram classificadas nas seguintes categorias: Microempresa, com

até 19 empregados; Pequena Empresa, de 20 a 99 empregados; Média

Empresa de 100 a 499 empregados; Grande Empresa, acima de 500

empregados.

Das 210 empresas, 21, ou seja, 10%, classificadas como Média

Empresa e Grande Empresa desenvolvem ações de responsabilidade social.

Inicialmente, entramos em contato com as 21 empresas que haviam

recebido a certificação de empresas socialmente responsáveis, que, portanto,

desenvolviam ações de responsabilidade social empresarial para verificarmos a

pertinência das informações.

Um segundo passo foi verificarmos a presença do assistente social

nessas empresas. Para isto recorremos ao Conselho Regional de Serviço

Social-CRESS-MT, onde realizamos, no mês de julho de 2006, um

levantamento dos assistentes sociais que atuavam em empresas, através do

qual pudemos constatar que dos 1075 assistentes sociais inscritos, 15 estavam

atuando em empresas que desenvolviam ações de responsabilidade social,

mas nem todos participavam do desenvolvimento dessas ações. 3 O Certificado de Responsabilidade Social do Estado de Mato Grosso foi criado pela Lei nº.

7.687 de 25 de junho de 2002, que instituiu uma comissão formada pela FIEMT, SESI, CRESS,

SINCON, FECOMERCIO, BPW, ABRH, AUDIPE, AMM e FAMATO com a responsabilidade de

avaliar os balanços sociais publicados pelas empresas de Mato Grosso para a concessão dos

certificados de Empresa Socialmente Responsável.

Page 22: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

21

A partir desses dados entramos em contato com os assistentes sociais e

com as empresas elencadas. Foi assim que chegamos à definição do nosso

universo de pesquisa que é constituído por 5 empresas, considerando que as

outras empresas, ou não tinham o assistente social no seu quadro, ou não

contavam com a participação deste profissional no desenvolvimento das ações

de responsabilidade social empresarial.

As Empresas:

Eletronorte

Fundada em 1973 a ELETRONORTE tem como maior acionista a

Centrais Elétricas do Brasil S. A, a ELETROBRÁS, com 98,2% das ações. Tem

também como acionistas prefeituras municipais, governos estaduais, empresas

distribuidoras de energia da Região Norte, pessoas físicas e jurídicas.

A empresa conta ainda com duas subsidiárias: a Manaus Energia S.A.,

com atuação em Manaus e a Vista Energia S.A.que atua no Estado de

Roraima. A Eletronorte possui instalações nos nove Estados da Amazônia

Legal(Acre, Amapá, Amazônia, Mato Grosso, Maranhão,Pará,

Rondônia,Roraima e Tocantins).Abrange uma área de mais de cinco milhões

de quilômetros quadrados e um universo populacional de aproximadamente

22,5 milhões de habitantes, um público consumidor de energia da ordem de 17

milhões, sendo 13,4 milhões atendidos pela ELETRONORTE.4

No ano de 2003, foi criada, na empresa, a Assessoria de Ações de

Responsabilidade Social, presente nos nove Estados em que a empresa atua,

através dos Comitês Regionais de Responsabilidade Social.

Rede Cemat

Ainda na década de 1950, mais especificamente em 1958 foi criada a

Centrais Elétricas Mato-Grossenses- CEMAT- com o objetivo de evitar o

4 Dados referentes ao período de 2004/2005. Fonte: Relatório Social da Eletronorte referente aos anos de 2004/2005.

Page 23: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

22

colapso do suprimento de energia no Estado. Ao longo dos anos, a CEMAT foi

sendo ampliada passando, além da distribuição de energia, à construção e

exploração de sistemas de geração, transmissão e transformação de energia

elétrica em Mato Grosso.

Em outubro de 1994, a CEMAT abre o seu capital e, de setembro de

1996 a dezembro de 1997, foi administrada pelo Governo do Estado em

parceria com a Eletrobrás, sob a intervenção do BNDES.

A partir de novembro de 1997, a energia elétrica em Mato Grosso passa

a ser distribuída pelo Grupo Rede, que, em meio a um processo de

privatização conduzido pelo Governo do Estado, Eletrobrás e BNDES,

comprou, em um leilão, a concessionária CEMAT.

Atualmente a energia elétrica distribuída pelo Grupo Rede, em Mato

Grosso, abrange uma área de 903.358 quilômetros quadrados, beneficiando

827.762 unidades consumidoras, atendendo a uma população de 2800.000

pessoas, em 141 municípios do Estado.

Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos de Mato Grosso

Até 1890, Cuiabá mantinha-se isolada quanto aos meios de

comunicação rápidos e modernos (ALENCASTRO, 2003, p, 45). Só em 1892 é

que foi criado o Distrito Telegráfico de Mato Grosso, que administrava os

508.939 metros de linhas existentes até o Araguaia. Entre 1900 e 1906, a rede

telegráfica foi estendida de Cuiabá a Corumbá, e, a partir de 1907, o Coronel

Cândido Mariano da Silva Rondon empreendeu uma nova etapa na cidade de

Cáceres. No final de 1930, no início da interventoria de Filinto Muller foi

construído o novo prédio dos Correios e Telégrafos na Praça da República,

onde até hoje funciona a Agência Central dos Correios, em Cuiabá.

Açofer

Fundada na cidade de Várzea Grande-MT em 06 de março de 1979, a

AÇOFER era uma “pequena casa de comércio de ferros e chapas de aço para

serralheria”. Em junho de 1980, muda suas instalações para Cuiabá sendo

Page 24: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

23

transferida em 1989 para o Distrito Industrial de Cuiabá-MT onde está até hoje.

Ali são processados todos os produtos a serem remetidos para as suas 17

filiais que estão localizadas nos Estados de Mato Grosso, Rondônia e Acre.

Atualmente a AÇOFER é considerada líder de mercado nos segmentos

de produtos siderúrgicos e esquadrias metálicas.

Usinas Itamaraty

A Usinas Itamaraty está localizada em Nova Olímpia-MT, cidade que fica

a 200Km a noroeste de Cuiabá, capital do Estado de Mato Grosso.

Criada em 1980, teve a sua primeira safra em 1983. Atua na produção

de álcool, açúcar cristal e refinado, energia elétrica (co-gerada da cana de

açúcar).

Emprega 3.800 pessoas a cada safra, sendo 2.500 mãos-de-obra fixas

que são distribuídas em 7 cidades da região: Arenápolis, Barra do Bugres,

Assari, Progresso, Denise, Nova Olímpia e Tangará da Serra.

Essas são as empresas que conformam o nosso universo de pesquisa a

partir das quais pudemos eleger os sujeitos que nos prestaram as informações

que subsidiaram este estudo.

Os Sujeitos:

Nesta tese as fontes orais têm lugar privilegiado, mas sempre

considerando o que nos ensina Tereza Caldeira (1992, p.70) "é necessário

acumular informações das fontes mais variadas”. Assim, as revistas, os jornais

e os livros constituíram fontes a que recorremos, objetivando ampliar o leque

de informações sobre a temática em estudo.

O critério para a escolha dos assistentes sociais era o de que

estivessem atuando em empresas que desenvolvessem ações de

responsabilidade social. Quanto aos gestores, seriam entrevistados aqueles

indicados pelas empresas que, conforme nos referimos, deveriam desenvolver

Page 25: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

24

ações de responsabilidade social empresarial e ter o assistente social

participando efetivamente do desenvolvimento dessas ações. Assim, foram

escolhidos como sujeitos da pesquisa:

a) Assistentes sociais que estavam atuando em empresas que

desenvolvem ações de responsabilidade social.

b) Gestores de empresas que desenvolvem ações de responsabilidade

social empresarial em Mato Grosso cujo assistente social esteja participando

dessas ações.

Fizemos um primeiro contato por telefone e, posteriormente,

formalizamos a solicitação através de ofício. Inicialmente a pretensão era

realizarmos dez entrevistas, ou seja, com um assistente social e um gestor de

cada empresa, mas, no total foram treze as entrevistas realizadas.

O que pode ser justificado considerando que em uma das empresas a

responsabilidade social ficava a cargo de duas assistentes sociais (uma na

responsabilidade social interna e outra na responsabilidade social externa).

Nessa empresa, nos foi indicada a coordenadora do Comitê de

Responsabilidade Social para ser entrevistada, no entanto, em momento

posterior, o gestor se propôs a dar a entrevista. Assim, foram realizadas quatro

entrevistas na mesma empresa. Em outra empresa foram designadas, pelo

presidente, para serem entrevistadas, duas pessoas encarregadas pela

responsabilidade social da empresa e a assistente social. Assim foram

entrevistados seis assistentes sociais e sete gestores.

Trechos das entrevistas serão citados ao longo da tese e suas

referências obedecerão às seguintes convenções:

• P.1. Assistente Social graduada pela UFMT. Trabalha há trinta e um

anos na empresa, sendo cinco anos com programas de voluntariado.

• P.2. Assistente Social graduada pela UFMT, em 2001. Trabalha na

empresa há três anos.

Page 26: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

25

• P.3. Assistente Social graduada pela Universidade de Uberlândia-

MG, em 1983. Trabalha na empresa há 22 anos.

• P.4. Assistente Social graduada pelas Faculdades Integradas Toledo

de Ensino, em 1998. Trabalha há dois anos na empresa.

• P.5. Assistente Social graduada, em 2005, pela UFMT. Trabalha na

empresa desde agosto de 2006.

• P.6. Assistente Social graduada, em 1995, pela UFMT. Trabalha na

empresa há dez anos.

• G.1. Diretor de Gestão de Pessoas de uma das empresas. É

graduado em Administração de Empresas.

• G.2. Gerente de Recursos Humanos. É graduada em Psicologia.

• G.3. Superintendente Regional de uma das empresas. É graduado

em Engenharia Elétrica.

• G.4. Médico do Trabalho da empresa é um dos responsáveis pelas

ações de responsabilidade social desenvolvidas pela empresa.

• G.5. Coordenadora dos Projetos Sociais da Empresa. Graduada em

Biologia.

• G.6. Chefe da sessão de Integração Social e Benefícios de uma das

empresas. É graduado em economia.

• G.7. Assistente de Comunicação, coordenadora do Comitê Regional

de Responsabilidade Social da empresa.

O Processo de Coleta dos Dados Orais:

As entrevistas foram realizadas entre os meses de julho de 2007 e

janeiro de 2008. A demora em concluir deveu-se principalmente à não

disponibilidade de tempo por parte de alguns gestores e a mudanças na

diretoria de uma das empresas.

O contato com os depoentes deu-se através de entrevistas semi-

estruturadas que foram gravadas seguindo um roteiro previamente elaborado,5

5 Roteiro em anexo.

Page 27: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

26

que consistiu de questões abertas, possibilitando ao entrevistado dar livre

curso ao seu pensamento. O roteiro foi baseado nos seguintes itens principais:

1. Concepção de responsabilidade social empresarial.

2. Ações sociais desenvolvidas pela empresa.

3. Responsabilidade pelo desenvolvimento das ações sociais.

4. Participação, enquanto assistente social, nas ações

desenvolvidas pela empresa.

5. Perfil profissional exigido para que o assistente social possa

desenvolver as ações de responsabilidade social na empresa.

6. Dificuldades encontradas, enquanto assistente social, na

elaboração ou desenvolvimento das ações de responsabilidade

social desenvolvidas pela empresa.

7. Avaliação das ações de responsabilidade social.

8. Elaboração do balanço social.

As entrevistas foram gravadas e transcritas pela autora que considera

enriquecedor não delegar a tarefa para outras pessoas, o que, conforme é

apontado por Maria Izaura Pereira de Queiroz (1992), traz a possibilidade de

reviver ângulos não percebidos no transcorrer da entrevista ou, que tenham

sido considerados secundários, além de garantir a fidelidade por ser o próprio

investigador quem estava presente durante a entrevista.

Cada entrevista teve entre quarenta minutos e duas horas de duração.

A Análise dos Dados

A análise dos dados teve início tão logo concluímos as entrevistas. Não

obstante concordarmos com Ludke e André (1986, p.45), quando afirmam que

a análise está presente em vários estágios da investigação e que o que ocorre

é que ela se torna mais sistemática e mais formal após o encerramento da

coleta de dados. Para as referidas autoras, nós fazemos uso de procedimentos

analíticos quando procuramos verificar a pertinência das questões

selecionadas frente às características específicas da situação estudada.

Tomamos então várias decisões sobre áreas que necessitam de maior

Page 28: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

27

exploração, aspectos que devem ser enfatizados, outros que devem ser

eliminados e novas decisões a serem tomadas. Essas escolhas são feitas a

partir de um confronto entre princípios teóricos do estudo que vai sendo

“aprendido” durante a pesquisa, num movimento constante que perdura até a

fase final do relatório.

Assim, para a realização da análise formal e final das informações

colhidas através das entrevistas, lançamos mão da análise de conteúdo que é

considerada tanto como “método de tratamento e análise de informações,

colhidas por meio de técnicas de coleta de dados”, (Cf. CHIZZOTTI, 1991)

quanto como “um conjunto de técnicas” (Cf. MINAYO, 1994; BARDIN, 1977).

A opção pela análise de conteúdo pautou-se no entendimento de que é

uma técnica que se aplica à análise de textos escritos ou de qualquer

comunicação (oral, visual, gestual) reduzida a um texto ou documento,se

adequando perfeitamente à análise das entrevistas. Um outro aspecto

importante em relação à escolha da análise de conteúdo é o fato de ser uma

técnica utilizada com o objetivo de compreender criticamente o sentido das

comunicações, seu conteúdo manifesto ou latente e as significações explícitas

ou ocultas (MINAYO, 1995).

Está tese está dividida em quatro capítulos. No primeiro, discorremos

sobre o Estado de Mato Grosso, contexto no qual está inserido o nosso objeto

de estudo, Enfocamos a localização fronteiriça, a expansão desenfreada na

década de 1970, as atividades econômicas ali desenvolvidas, o

estabelecimento de latifúndios e grilagem de terras que, dentre tantos outros

problemas refletem as seqüelas da questão social no Estado e que têm

causado sérios problemas sociais e ambientais culminando na violência que

conforma o Estado.

No segundo capítulo, tratamos da questão social no Brasil. Partimos do

seu surgimento na década de 1930,quando passa a ser reconhecida como

questão política em meio aos impactos da industrialização, enfocando as várias

feições assumidas ao longo dos anos nas diferentes conjunturas até chegar à

realidade atual, quando as suas múltiplas expressões assumem proporções

Page 29: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

28

alarmantes e incontroláveis. Neste sentido as seqüelas mais evidentes são o

desemprego crescente e a precarização do emprego que repercutem

diretamente na atuação profissional do assistente social.

O terceiro capítulo traz a discussão sobre a responsabilidade social

empresarial. Começamos com as ambigüidades que conformam o conceito, a

forma como as instituições consideradas de referência na área da

responsabilidade social, como o Instituto ETHOS de Responsabilidade Social,

o IBASE, o GIFE, definem a responsabilidade social empresarial e discorremos

sobre o desenvolvimento da responsabilidade social empresarial no Brasil e em

Mato Grosso.

No quarto e último capítulo, tratamos da atuação profissional do

assistente social nas ações de responsabilidade social desenvolvidas pelas

empresas em Mato Grosso. Procuramos, a partir do que é expresso pelos

sujeitos, analisar o que pensam, em que consiste e como se dá a atuação dos

assistentes sociais nas ações de responsabilidade social desenvolvidas nas

empresas do Estado.

Finalmente, nas considerações finais procuramos pontuar alguns

aspectos que consideramos importantes e que acreditamos possam vir a

subsidiar estudos e ações futuras.

Page 30: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

29

1. CAPÍTULO I - CONTEXTO: O ESTADO DE MATO GROSSO

“Era grande a dificuldade de convencer os profissionais a virem para

Mato Grosso, à distância e a fama de ser um deserto apavoravam.” 6

O Estado de Mato Grosso fica situado na região Centro-Oeste do Brasil

e tem como capital a cidade de Cuiabá. Ocupa uma área de 903.357.908 km²,

sendo, em tamanho, o terceiro Estado da Federação, vindo após os Estados do

Amazonas e do Pará. Tem localizado no seu espaço geográfico o marco do

Centro Geodésico da América do Sul e faz limite com a Bolívia e com os

Estados brasileiros de Rondônia, Amazonas, Pará, Tocantins, Goiás e Mato

Grosso do Sul. É um estado que tem grande parte da sua área integrando a

Amazônia Legal que é constituída pelo norte de Mato Grosso, pelos estados da

região norte, exceto o sul de Tocantins, e pelo oeste do Maranhão,

compreendendo uma área que corresponde, aproximadamente, a 60% do

território brasileiro.

A localização fronteiriça, o fato de fazer parte da Amazônia e de

interligar o norte ao todo nacional fizeram com que o Estado de Mato Grosso

ganhasse evidência ao nível da nação.

É um Estado cuja importância geopolítica e econômica já era

reconhecida desde o Brasil Colônia. Teve seus períodos de decadência, mas

retomou seu crescimento no período do Estado Novo, quando o

desenvolvimento e a conquista do Centro-Oeste figuravam como idealizações

do governo de Getúlio Vargas que tinha como um dos objetivos a

implementação de uma política de desbravamento e integração da região

Centro Oeste ao resto do país, o que levou o Estado de Mato Grosso,

considerado de localização periférica em relação ao centro desenvolvido do

país, a destacar-se no cenário político nacional.

As terras férteis e baratas povoam os sonhos dos camponeses que

rumam para o estado, pensando encontrar, enfim, um lugar apropriado para a 6 Fala da professora Neuza Machado durante uma entrevista realizada em 04/08/1992 referindo-se a criação do curso de Serviço Social em Mato Grosso.

Page 31: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

30

realização de suas vidas. A decepção, porém, chega antes do final do percurso

e centenas de migrantes só conseguem chegar até Cuiabá e acabam por parar

nas periferias da cidade.

As décadas de 1960, 1970 e 1980, por conta do fluxo migratório,

definem o perfil atual do Estado de Mato Grosso em termos de ocupação.

Tabela 1 - Mato Grosso: população - 1975 e 2005

DISCRIMINAÇÃO 1975 2005 Var Abs

Número de Municípios 31 142 111

População total 764.570 2.803.274 2.038.704

Fonte: 1975 - Anuário Estatístico SEPLAN 1996; e 2005 - Estimativa IBGE

FIEMT/Assessoria econômica/dados elaborados.

Em 1975, a área geográfica do Estado de Mato Grosso era formada por

31 municípios, passando em 2005 para 142, ou seja, teve um crescimento de

358% em 30 anos.

A população total que, em 1975, era de 764.570 passa, em 2005, a ser

de 2.803.274, apresentando um crescimento de 267%.

Pode-se afirmar que a ocupação de Mato Grosso deu-se, entre outras

razões, em decorrência de políticas implementadas pelo governo que

objetivava ocupar as regiões mais remotas do país, através de projetos de

colonização, estabelecimento de agropecuárias e assentamento do homem no

campo. No entanto, há que se ressaltar que esse desenvolvimento acelerado

não ocorreu sem problemas. A estrutura urbana do Estado não suporta a

velocidade com que o processo de desenvolvimento ocorre. A rede de

equipamentos sociais não consegue suprir as demandas e as conseqüências

não se fazem esperar: falta de saneamento básico, falta de infra-estrutura

básica nos setores educacional, saúde, transporte coletivo, falta de moradia e

falta de emprego.

É pertinente a análise desenvolvida por Martins (1982) em relação ao

processo de ocupação do território brasileiro e, de modo mais específico, da

Page 32: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

31

região amazônica. Para ele a idéia de zona pioneira é ambígua e insatisfatória

porque “a rigor nós não temos autênticas zonas pioneiras”. Esse conceito, ou

essa noção,como ele se refere, provém da conhecida “Marcha para o Oeste”,

no século XIX, nos Estados Unidos da América, onde chegou mesmo a

constituir uma teoria da história americana. Ali, os pioneiros eram homens

livres que ocupavam terras igualmente livres do Oeste. No Brasil, as coisas

aconteceram de modo distinto, nem eram tradicionalmente livres os homens

que ocuparam as novas terras nem as terras eram livres. “A rigor nem temos

como contrafação, os pioneiros que lhes correspondem”.

Conforme Martins, o que ocorre na “Amazônia é, uma outra forma de

ocupação que vem de “fora”, dos centros econômica e politicamente

hegemônicos da sociedade brasileira”.7

Para ele, estamos diante de dois movimentos combinados de ocupação

territorial. O primeiro se dá através do deslocamento de posseiros, isto é, a

sociedade nacional, branca, se expande sobre territórios tribais. Essa frente de

ocupação territorial pode ser chamada de frente de expansão. Um segundo

movimento é constituído pela forma empresarial e capitalista de ocupação do

território – é a grande fazenda, o banco, a casa de comércio, a ferrovia, a

estrada, o juiz, o cartório, o Estado. É nessa frente que surge o que em nosso

país se chama hoje, indevidamente, de pioneiro, que são na verdade os

pioneiros das formas sociais e econômicas de exploração e dominação

vinculadas às classes dominantes e ao Estado. Quando se dá a superposição

da frente pioneira sobre a frente de expansão é que surgem os conflitos pela

terra.

Ao que tudo indica esses dois movimentos estão presentes no processo

de ocupação e desenvolvimento do Estado de Mato Grosso. Considerado o

maior estado da região Centro-Oeste, atraiu grandes empresas e interessados

em ocupar terras públicas o que favoreceu o estabelecimento de latifúndios e

de grilagem de terras o que tem culminado em sérios problemas sociais e

7 Conforme Martins há poucos anos os paulistas já eram proprietários de 3,3% da área cadastrada pelo Incra no Acre e Rondônia; 7,9% do Amazonas; 15,3% do Pará; 3,1% do Maranhão; 37,1% de Mato Grosso; 9,6% de Goiás. Cf. Martins 1982, p.69.

Page 33: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

32

ambientais. Nos anos de 2004 e 2005 Mato Grosso foi o campeão em

desmatamento da região amazônica. Teve quase 7 mil quilômetros quadrados

de floresta derrubada, dos 19 mil quilômetros quadrados da região amazônica.8

Também ostenta posição de destaque entre os líderes em número de

trabalhadores libertados da escravidão. Dados da Comissão Pastoral da Terra -

CPT-indicam que o Estado está em segundo lugar no ranking das libertações:

4.690 pessoas desde 1995. 9

A violência e a corrupção têm levado o Estado de Mato Grosso a

constante exposição na mídia nacional. Basta ver na imprensa falada ou escrita

o quanto o Estado esteve presente nos últimos anos e, de modo mais acintoso,

no ano de 2006 em escândalos de repercussão nacional como o “Caso das

Sanguessugas” que teve como principais protagonistas empresários de Mato

Grosso envolvidos em um esquema de compras superfaturadas de

ambulâncias que foram distribuídas em todo o país e que culminou na

instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito - CPI.

Também estão situados no extremo norte de Mato Grosso os municípios

de Colniza, Aripuanã e Juruena que figuram como os mais violentos do Brasil.

O município de Colniza é o primeiro dentre os 5.560 municípios do país no que

se refere aos índices de violência10.O que pode ser creditado à disputa pela

posse da terra e à exploração de madeira consideradas comuns, na região.

Atualmente, em 2008, o Estado conta com os mesmos 142 municípios,

podendo chegar (conforme projeção populacional do IBGE) a 3.066.046

habitantes em 2010. (Cf. Geografia de Mato Grosso p.8).

A economia do Estado se baseia na indústria extrativista (madeira e

borracha); na agricultura (cana de açúcar, soja, arroz e milho); na pecuária e

8 CF. desmatamento e Poluição seguem o rastro do agronegócio. Disponível em www.reporterbrasil.org.br.Acessado em 20/07/2006. 9 CF. Iniciativas estaduais de combate à escravidão continuam paradas. Disponível em www.reporterbrasil.org.br. Acessado em 31/01/2008. Vanusia Gonçalves 10 Dados provenientes do Mapa da Violência dos Municípios brasileiros, coordenada pelo sociólogo Júlio Jacobo Waiselfisz. Ver entrevista à Revista Ótima, p. 12-15; edição 12, abril de 2007.

Page 34: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

33

criações; na mineração (calcário e ouro); e na indústria (metalúrgica e

alimentícia).

Apesar dos aspectos, acima apontados, Mato Grosso é um estado que

vem, a cada dia, se tornando mais integrado à economia mundial. Tem-se

destacado não só como fornecedor de produtos básicos para o mercado

internacional, como também pelo fato de oportunizar investimentos em

diferentes áreas, atraindo assim investidores estrangeiros. Neste sentido, o

setor produtivo agropecuário merece destaque. Conforme dados da FIEMT,

entre 1994 e 2003, a agropecuária cresceu 1000%, com 100% de média

anual11, constituindo junto com o comércio, os segmentos mais dinâmicos na

geração de empregos formais do Estado.

O Produto Interno Bruto-PIB, um dos principais macroindicadores da

economia de uma determinada região geográfica, em um determinado período

de tempo, também traz resultados surpreendentes no que se refere a Mato

Grosso:

MATO GROSSO PIB 1975= US$ 689 milhões;

MATO GROSSO PIB 2005= US$ 4.101 milhões.

Outro aspecto que merece ser ressaltado é o Índice de Desenvolvimento

Humano (IDH) que é adotado por muitos países da América Latina e também

pelo Brasil. O IDH é calculado a partir dos indicadores de educação

(alfabetização e taxa de matrícula), longevidade (expectativa de vida ao

nascer) e renda (PIB per capita).

Mato Grosso ocupa a 9ª posição entre os estados brasileiros. Já o Brasil

está na 72ª posição no ranking dos 177 países, superando apenas o Paraguai

e a Bolívia, entre os países da América Latina. No que se refere à educação,

um dos indicadores do IDH, Mato Grosso tem avançado de modo considerável.

Conforme o Censo de 2000 realizado pelo IBGE, a população alfabetizada de

Mato Grosso, no referido ano, somava 1.761.966 pessoas, perfazendo 88,9%,

11 FIEMT 30 anos Análise de alguns indicadores macroeconômicos. Disponível em www.fiemt.com.br. Acessado em 10/01/2006.

Page 35: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

34

do total da população residente no Estado com 10 anos de idade ou mais. (Cf.

Geografia de Mato Grosso, p.15).

É em meio a esse processo de expansão do capitalismo no Estado e do

conseqüente acirramento dos problemas sociais, que o Serviço Social, como

uma das profissões requisitadas na operacionalização das políticas sociais

formuladas e implementadas pelo Estado no enfrentamento das seqüelas da

questão social, foi chamado a intervir e dar respostas às demandas da

realidade.12

Vale ressaltar que, diferente do que ocorreu em muitos Estados, em

Mato Grosso a profissão de Serviço Social nasce desvinculada da Igreja

católica. As poucas assistentes sociais que trabalhavam em Mato Grosso, à

época, eram de outros estados e tinham vindo, a convite, prestar serviços nas

instituições de Cuiabá. Segundo o depoimento de uma das primeiras

assistentes sociais a chegar ao Estado, “era grande a dificuldade de convencer

as profissionais a virem para Mato Grosso. A distância e a fama de ser um

deserto apavoravam”. (Neuza Machado, em 04/08/1992).

O Estado de Mato Grosso, (à exceção do Acre que havia sido criado

recentemente e de Rondônia que ainda era território) era, até 1970, o único

estado da federação que ainda não possuía uma universidade federal. A onda

de expansão e de intensificação do fluxo migratório da população de outros

estados para Mato Grosso forçou o governo a promover o desenvolvimento do

estado e a implementar políticas sociais. Assim, várias escolas foram

construídas, sendo ampliado o número de vagas nas escolas de primeiro e

segundo graus, facilitando a proliferação do ensino superior e construída a

Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT.

12 Conforme Maria do Socorro L.Medeiros, as primeiras assistentes sociais de Cuiabá foram contratadas pelas seguintes instituições: SESC, LBA e COHAB-MT no ano de 1965. O que, “representou a comunhão de interesses das classes patronais e do governo em prol da melhoria dos atendimentos sociais às populações economicamente menos privilegiadas (...) passaram a se utilizar do Serviço Social como forma de atenuar os conflitos, ajustar as relações sociais entre patrões e empregados e integrar os mais carentes de recursos na comunidade” (CF.Medeiros, 1984:48-49).

Page 36: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

35

A UFMT, localizada em Cuiabá foi construída pelo Governo do Estado,

em meio ao processo de expansão da rede de equipamentos sociais e doada

ao governo federal. A sua criação aconteceu no mês de dezembro de 1970,

pela Lei n° 5.647, em pleno governo Médici, com personalidade jurídica de

Fundação.

O curso de Serviço Social, em Mato Grosso, foi criado na década de

1970, no processo de expansão econômica, respondendo também à

necessidade de formar mão-de-obra qualificada, compatível com as

necessidades da região. Vale lembrar que os anos de 1970, em todo o país,

foram marcados por um processo de expansão da educação.

No final dos anos de 1980 as Instituições de Ensino Superior privadas

começam a fazer parte do cenário mato-grossense e vão ter épocas de pico de

crescimento e de descontinuidade.

Dados relativos à trajetória histórica da distribuição e crescimento das

instituições de Ensino Superior de Mato Grosso, provenientes dos Censos da

Educação Superior de 1991 a 2004 são ilustrativos. 13 Em 1991, Mato Grosso

possuía 17 (IES), 2 públicas e 15 privadas. No ano de 2006, o Estado conta

com 47(IES), cinco públicas e 42 privadas. Registra-se, no Estado, em torno de

10,06% de IES públicas e 89,0% de IES privadas. Não obstante, vale ressaltar

que no ano de 2004 o setor púbico detinha 38,4% das matrículas, isto porque

as duas universidades públicas (federal e estadual) concentravam o maior

número de matrículas das IES do Estado.

Além do curso de Serviço Social da UFMT, Mato Grosso conta com os

cursos de Serviço Social da UNIVAG (Universidade de Várzea Grande), e da

Faculdade Cenecista de Rondonópolis (FACER). Podemos ressaltar também a

existência de duas turmas de cursos a distância promovidos pela Universidade

do Norte do Paraná (UNOPAR) e Universidade do Tocantins (UNITINS) que

revelam o crescimento da tendência de oferta de assistentes sociais, oriundos

das escolas privadas, no mercado. 13 Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Censos de Educação Superior Brasileira: 1991-2004-Mato Grosso. Brasília: 2006.

Page 37: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

36

Esses dados são importantes porque, nos mostram como a privatização

ou mercantilização do ensino repercutem na formação profissional tanto dos

assistentes sociais como também de outros profissionais.

Nesse sentido, é necessário ter presente em que condições essa

formação profissional está se dando. Como também conhecer quem é o aluno

de Serviço Social, quem é o docente do curso de Serviço Social porque com

certeza todos esses aspectos vão repercutir na atuação profissional.

Page 38: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

37

2. CAPÍTULO II - A SEMPRE E VELHA QUESTÃO SOCIAL

A expressão questão social não é semanticamente unívoca; ao contrário, registram-se em torno dela compreensões diferenciadas e atribuições de sentido muito diversos (NETTO, 2001, P.41).

Conforme indicações de José Paulo Netto, (2001, p.43), a expressão

questão social começou a ser utilizada nos anos 30 do século XIX em meio aos

impactos da industrialização que teve início na Inglaterra no final do século

XVIII e trouxe à cena o fenômeno do pauperismo. Foi o momento em que se

despertou a consciência para as populações que foram, ao mesmo tempo,

agentes e vítimas da revolução industrial. Mas, como ressalta o referido autor,

a questão social, pela sua amplitude, não pode ser reduzida ao pauperismo, a

questão social está “elementarmente determinada pelo traço próprio e peculiar

da relação capital-trabalho – a exploração”.

Não é, portanto, um fenômeno recente, “ela é tributária das formas

assumidas pelo trabalho e pelo Estado na sociedade burguesa” (IAMAMOTO,

2001, p.11).

No Brasil, o aparecimento da questão social, conforme Iamamoto (1988,

p.127) está diretamente relacionado à generalização do trabalho livre. Assim,

não se pode perder de vista que o país tem o seu passado marcado pela

escravidão, cujas marcas não desapareceram como em um passe de mágica,

pelo contrário, as conseqüências ainda se fazem presentes.

O que se presenciou naquele momento foi um cenário marcado pela

extrema voracidade do capital por trabalho excedente e pela miséria crescente

da população operária constituída, em sua maioria, por imigrantes que viviam

em condições angustiantes tanto de sobrevivência quanto de trabalho.

Conforme escreveu Iamamoto (1998, p.131),

Essa parcela da população amontoava-se em bairros insalubres, junto as aglomerações industriais, em casas infectas, sendo muito freqüente a carência ou mesmo falta absoluta de água, esgoto, luz. Grande parte das empresas funciona em prédios adaptados, onde são mínimas as condições de higiene e segurança, e muito freqüentes os acidentes. (...) O preço da força de trabalho será constantemente pressionado para baixo... a pressão salarial força a

Page 39: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

38

entrada no mercado de trabalho das mulheres,e das crianças de ambos os sexos com idade extremamente prematura (...) É comum a observação sobre a existência de crianças operárias de até cinco anos e dos castigos corporais infligidos a aprendizes.14

Essas condições de trabalho e de existência impulsionaram o

proletariado a reagir organizando-se como classe em torno de interesses

comuns.

Naquele contexto, a organização consistia na única via de participação

ativa na sociedade e, conseqüentemente, adquiriu conotação política,

configurando aquilo que ficou conhecido como “questão social” e que ao longo

do tempo assumiu conformações diferenciadas em decorrência do processo de

mundialização do capital que dá “um caráter cosmopolita à produção e

consumo de todos os países e, simultaneamente, radicaliza o desenvolvimento

14 Rui Barbosa em seu discurso sobre “A Questão Social e Política no Brasil”, proferido em 20 de março de 1919 faz um chamado para a situação de miséria e pauperismo em que vivia a classe operária e já ressaltava o descaso das autoridades em relação às providências a serem tomadas.

Trechos do referido discurso nos chamam a atenção: “As fábricas devoram a vida humana desde os sete anos de idade. Sobre as mulheres pesam de ordinário, trabalhos tão árduos quanto os dos homens; não percebem senão salários reduzidos e, muitas vezes, de escassez mínima. Equiparam-se aos adultos, para o trabalho, os menores de quatorze e doze anos. Mas, quando se trata de salários, cessa a equiparação. Em emergências de necessidade todo esse pessoal concorre aos serões. O horário, geralmente, nivela sexos e idades, entre os extremos habituais de nove a dez horas quotidianas de canseira”.

Ao falar sobre a habitação dos operários, recorre ao depoimento dado pelo Dr.Alfredo Leal de Sá Pereira ao Jornal do Comércio, aos 30 de janeiro de 1919: “São habitações sem ar e sem luz, onde adultos e crianças vivem na mais sórdida promiscuidade, onde os mais pudicos, quando obedecem à lei de perpetuação da espécie, abrigam-se por trás de uma cortina rota, quase transparente; onde à noite, em um ambiente fechado, respira o triplo das pessoas que o mesmo poderia comportar; onde os gêneros alimentícios, pendentes das paredes, contribuem para perfumar o ambiente malcheiroso; onde os fogareiros, de carvão ou querosene, enegrecendo os muros, asfixiam e enjoam; onde o tuberculoso, escarrando por toda a parte, mimoseia os seus próximos com presentes gregos; onde crianças imundas e enfezadas brincam em corredores sombrios; onde; em bacias de folha, se lava a roupa dentro do próprio quarto e põe-se a secar as janelas, quando as há”.

Rui Barbosa ao se referir “A Sorte do Operário” é enfático ao afirmar que “nada se construiu. Nada se adiantou nada se fez. A sorte do operário continua indefesa, desde que a lei, no pressuposto de uma igualdade imaginária entre ele e o patrão e de uma liberdade não menos imaginária nas relações contratuais, não estabeleceu, para este caso de minoridade social, as providências tutelares, que uma tal condição exige”. Quando se refere à situação das “mães operárias”, Rui Barbosa em seu discurso faz alusão e elogia os industriais. “Ainda bem, senhores, que a consciência dos nossos industriais já se vai elevando bastantemente; e, é do seio deles que, com uma autoridade insuspeita, com uma das maiores autoridades, se ouvia, há pouco mais de um ano, em 10 de setembro de 1917, pelas colunas do Jornal do Comércio, a confissão do sentimento, já existente entre os nossos mais adiantados industriais, de ser necessário conceder à gravidação e ao parto dois meses sucessivos de folga no trabalho. O industrial que assina esta declaração é o Sr. Jorge Street. Eu os convido operários, a aplaudirdes este nome”.Cf.Rui Barbosa. A questão social e política no Brasil. In. Pensamento e Ação, p.385-389.

Page 40: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

39

desigual e combinado que estrutura as relações de dependência entre nações

no cenário internacional”.

O desdobramento da questão social está relacionado à formação da

classe operária e a sua entrada no cenário político, o que leva à necessidade

de seu reconhecimento pelo Estado através da implementação de políticas

sociais. O aprofundamento do capitalismo e o aumento numérico do

proletariado vão propiciar o deslocamento da “questão social”, que ganha

visibilidade e se torna o centro das contradições. Nesse contexto, a “questão

social” ganha uma “nova qualidade”, principalmente nos grandes centros

urbanos industriais, derivada tanto do crescimento numérico do proletariado,

quanto da solidificação dos laços de solidariedade política e ideológica que

perpassam seu conjunto, base para a construção e para a possibilidade

objetiva e subjetiva de um projeto alternativo à dominação burguesa

(IAMAMOTO, 1988, p.129).

Na primeira década do século passado aparecem outras formas de

organização que não se configuram pelos fins assistenciais, são as Ligas

Operárias que diferem dos antigos grêmios corporativos como a Associação de

Socorro Mútuo e as Caixas Beneficentes que desenvolviam atividades com fins

assistenciais e corporativos. As Ligas Operárias aglutinavam operários de

vários ofícios objetivando a defesa de seus interesses comuns.

Essas formas de agremiação, apesar da precariedade, darão origem às

Sociedades de Resistência e Sindicatos que irão se constituir na forma típica

de resistência operária organizada. É este o terreno em que as lutas operárias

vão se desenvolvendo e de onde surgirão os Congressos Operários, e as

Confederações Operárias, tidas como formas superiores de organização.

No entanto, vale ressaltar que a legitimidade dessas organizações ficará

restrita ao meio operário. Serão, quando muito, toleradas e, à medida que

foram crescendo e ganhando visibilidade, reprimidas, tendo as suas sedes

fechadas e os seus dirigentes perseguidos, presos ou mesmo deportados.

Page 41: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

40

Em outras palavras, “o Estado se negará a reconhecer a existência da

questão social”. A violência, sempre presente na trajetória de luta do

movimento operário, é o instrumento utilizado para a manutenção da paz social

tão favorável à expansão do capitalismo.

Para Cerqueira Filho (1982, p.57), antes de 1930, no Brasil, a “questão

social’ não aparecia no discurso dominante senão como fato excepcional e

episódico, não porque não existisse já, mas porque não tinha condições de se

impor como questão inscrita no pensamento dominante. Nesse sentido a”

questão social “por ser” ilegítima “não era uma questão legal”, mas ilegal,

subversiva, marginal devendo, portanto, ser tratada pelos aparelhos

repressivos do Estado. Assim, a “questão social” no Brasil é tratada

inicialmente como “caso de polícia”. 15

Posteriormente, no governo Vargas, a “questão social” será tratada de

modo diferente. Será reconhecida como legítima, o que significa, conforme o

referido autor, o reconhecimento implícito da classe operária que passa a

merecer a atenção dos poderes públicos, cujas preocupações se voltam para a

desmobilização e despolitização da classe operária. O que em 1943 vai

culminar na promulgação da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT).

A questão social se transforma em “questão eminentemente política”

requerendo, portanto, soluções mais sofisticadas de dominação, que não podia

se resumir a “chamar a polícia”16 (Cerqueira Filho,1982, p.75).

15. Especialmente na década de 1920, as medidas tendentes à integração do proletariado não podem ser, inteiramente, subestimadas. Em 1925 é criado o Conselho Nacional do Trabalho e, em 1926 uma Emenda Constitucional transfere para o Congresso Nacional a legislação sobre o trabalho, abrindo caminho para o Estado intervir na questão social, regulamentando o mercado de trabalho. Assim, nos anos de 1926 e 1927, são aprovadas leis voltadas para a proteção ao trabalho: lei de férias, acidente de trabalho, código de menores, trabalho feminino, seguro doença, etc. É importante ressaltar que tais leis terão aplicação precária e se limitarão aos setores não industriais como ferroviários marítimos e portuários (Cf.Iamamoto,1998,p.134). 16. A partir de 1930 um regime de amparo e reconhecimento de direitos começou a ser estabelecido para as nossas classes trabalhadoras em cujos horizontes se abriram novas perspectivas que se acham consubstanciadas nas leis das oito horas, da igualdade de trabalho das mulheres e dos menores, da nacionalização do trabalho, da sindicalização das classes, das convenções coletivas, do trabalho na indústria, no comércio e em numerosas outras atividades (...). Gisálio Cerqueira Filho (1982, p.83), apud Boletim do Ministério do Trabalho, nº.5, janeiro de 1935. Artigo do Sr. Heitor Muniz intitulado Justiça do Trabalho, p.131.

Page 42: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

41

É neste cenário, conforme Iamamoto, que “surgirá o Serviço Social como

um departamento especializado da Ação Social da Igreja, embasado em sua

doutrina social”.17 É o surgimento daquilo que poderia se considerar serem as

protoformas do Serviço Social no Brasil. 18(1988, p.43). No entanto, afirma a

autora: “para o aparecimento do Serviço Social, enquanto conjunto de

atividades legitimamente reconhecidas dentro da divisão social do trabalho, se

deverá percorrer um itinerário de mais de duas décadas” (idem, p. 42). Nesta

caminhada, a profissão sofreu alterações tanto no que se refere as suas

dimensões objetivas quanto subjetivas. Conquistou espaços significativos na

esfera política e está buscando dar respostas competentes aos desafios

advindos das manifestações expressivas da questão social.

2.1 As transformações societárias e a intensificação da questão social no Brasil

É no curso da década de setenta que emergem, visivelmente, as transformações societárias que - embora já sinalizadas no decênio anterior - vão marcar os anos oitenta e noventa, revelando inflexões significativas no evolver da sociedade capitalista (NETTO,1996, p.97).

É inegável que a “questão social”, em decorrência das transformações

societárias que vêm ocorrendo no mundo, nas últimas décadas, tem se

manifestado de forma diferenciada nos diferentes contextos histórico-sociais.

Os efeitos deletérios do capitalismo vão conformando novas demandas e

incitando a busca de respostas às situações que emergem a cada instante.

17Referindo-se ao recrutamento dos leigos na defesa dos interesses da Igreja, Giolo, 1997, afirma que “embora jamais confessasse, a Igreja tomou consciência (...) que o catolicismo não poderia mais falar” como se fosse a premissa necessária e universal de todo modo de pensar e de agir (...)”Diretamente ligada à mediação feita pelos leigos entre instituição eclesiástica e as organizações sócio-políticas da sociedade, foi tomando espaço, em nível de cúpula, a preocupação com as questões sociais, derivando, daí, a doutrina social da Igreja e suas respectivas encíclicas papais. Foi a maneira encontrada, para, depois de haver perdido as esperanças de qualquer possibilidade de restauração, pôr-se em acordo com o mundo moderno e abrir, no novo contexto, uma brecha para a sua recomposição institucional”. Cf. Jaime GIOLO, Estado, Igreja e Educação no RS da Primeira República. 1997.p.180-181. 18 Segundo Iamamoto o Centro de Estudos e Ação Social de São Paulo-CEAS-considerado como manifestação original do Serviço Social no Brasil surge em 1932 com o incentivo e sob o controle da hierarquia (1998, p.172).

Page 43: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

42

Assim, a década de 1970, conforme estudiosos, constituiu-se no marco

da emergência das transformações societárias que tiveram seus indícios nos

anos de 1960 e que vão se aprofundar e adquirir novas configurações nos anos

1980 e 1990. Para Mandel (citado por NETTO, 1996, p.91), foi o período em

que ocorreu a “primeira recessão generalizada da economia capitalista

internacional”.

É um período de crise quando o capitalismo se torna mais avassalador,

provocando seqüelas que se fazem sentir em todos os aspectos da vida,

interferindo, não só na dinâmica da realidade, das classes sociais, dos

governos, mas, também, no cotidiano das profissões exigindo um constante

repensar e a busca incansável de novas estratégias de enfrentamento.

Na análise de Harvey, “a crise dos anos setenta assinalou a exaustão do

padrão capitalista monopolista fundado num regime de acumulação (...). Em

conseqüência, as décadas de 70 e 80 foram um conturbado período de

reestruturação econômica e de reajustamento social e político”. É esse

contexto, ou, como diz Harvey, este “espaço social” repleto de oscilações e

incertezas, que possibilita a passagem para um “regime de acumulação

inteiramente novo, associado a um sistema de regulamentação política e social

bem distinta”, e que é marcado por um confronto direto com a rigidez do

fordismo (2003, p.140).

Harvey (2003, p.140) denomina esse novo modo de regulação de

“acumulação flexível”. A acumulação flexível, segundo ele,

Caracteriza-se pelo surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimentos de serviços financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional. “A acumulação flexível envolve rápidas mudanças dos padrões de desenvolvimento desigual, tanto entre setores como entre regiões geográficas, criando, por exemplo, um vasto movimento no emprego, no chamado setor de serviços”, bem como conjuntos industriais completamente novos em regiões até então subdesenvolvidas (...).

Harvey aponta ainda como uma nova característica da acumulação

flexível, a “compressão do espaço-tempo”. As tecnologias de comunicação

possibilitam uma mobilidade tal que encolhe as distâncias temporais e

Page 44: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

43

espaciais, favorecendo a expansão mais rápida do capitalismo que já não

encontra fronteiras e das suas seqüelas. A acumulação flexível traz também

sérias conseqüências para a classe trabalhadora que passa a conviver com a

projeção desordenada do desemprego que é, certamente, a conseqüência

mais funesta desse padrão de acumulação que deixa de ser temporária e

excepcional e aparece como desdobramento do modelo em vigor.

Para Octávio Ianni,

Aos poucos, ou de repente, conforme o caso, a grande maioria da população assalariada mundial se vê envolvida no mercado global; um mercado em que se movem compradores e vendedores de força de trabalho, mercadorias, valores de uso e valores de troca. São transações que multiplicam e generalizam os dinamismos das forças produtivas e relações de produção, propiciando uma acumulação acentuada do capital, em âmbito mundial (...). O modo pelo qual o capitalismo se globaliza, articulando e rearticulando as mais diversas formas de organização técnica da produção, envolve ampla transformação na esfera do trabalho, no modo pelo qual o trabalho entra na organização da vida social do indivíduo, família, grupo, classe e coletividade, em todas as nações e continentes, ilhas e arquipélagos (1996, p.22).

Na perspectiva de Costa,

Os partidos conservadores buscaram implementar reformas no Estado, visando cortes nos benefícios sociais, programas de privatizações, políticas liberalizantes voltadas para o mercado, desregulamentação do mercado de trabalho, com a modificação das leis trabalhistas e previdenciárias (2000, p.240).

É importante ressaltar que este novo padrão de desenvolvimento

capitalista não incorpora homogeneamente as economias que estão no seu

centro, o que fragiliza os países do Terceiro Mundo, como o Brasil.

Petras (1999, p.35), afirma que “a globalização é acompanhada pela

decadência nacional”. Para ele,

no Terceiro Mundo, entre as decadentes economias endividadas, não há mais empecilhos públicos, já que os” reguladores de Estado” são, em grande parte, aliados das Empresas Multinacionais. Quanto maior a integração externa, maior a exploração dos recursos internos para abastecer a expansão no exterior (...) Sob as pressões fiscais impostas pelos movimentos do capital, o Estado vende cada vez mais recursos públicos: florestas, províncias minerais, reservas naturais, recursos marítimos.

Page 45: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

44

O autor enfatiza ainda que “a condição fundamental para a globalização

é o êxito do capital em minar o poder popular, desmantelar o Welfare State e

converter o Estado em instrumento da expansão ultramarina, e não as

mudanças tecnológicas, os novos sistemas de informação ou os imperativos do

mercado mundial. A tecnologia e os novos sistemas de informação são tão

compatíveis com os modelos nacional-estatistas quanto com os neoliberais,

como os capitalistas asiáticos já demonstraram” (1999, p.29).

É importante se ter presente que a globalização da questão social, que

se manifesta de forma diversa e adquire significados diferentes nos mais

diversos países do mundo, envolve problemas culturais, religiosos, lingüísticos

e raciais, simultaneamente sociais, econômicos e políticos.

Juntamente com o que é local, nacional, regional, revela-se o que é mundial. Todos são levados a perceber algo além do horizonte visível, a captar configurações e movimentos da máquina do mundo. (IANNI, 1996, p.25-26).

A globalização ou mundialização financeira, como é tratada por alguns

autores, ao intensificar o movimento do capital, tecnologia e força de trabalho

cria uma nova consciência nas pessoas e traz desafios teóricos que não

podem ser descartados. A busca de mão- de- obra barata nos quatro cantos do

mundo, a substituição do trabalhador pelas máquinas, o aumento incontrolável

do desemprego que leva à formação de contingentes de desempregados

permanentes que se movimentam em escala global são fatores, dentre outros,

que fazem com que a questão social adquira significados e interpretações

diferenciados.

Assim, passamos a conviver com várias formas ou tendências de se

pensar a questão social. Uma dessas tendências, considerada a mais

marcante, é aquela que leva à sua naturalização. Nesta perspectiva, as

diversas expressões da questão social são objetos de ações assistenciais

focalizadas. Uma outra forma de se conceber a questão social é considerá-la

como expressão de violência, o que a transforma em objeto de repressão e

Page 46: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

45

segurança oficiais. Pode ainda ser concebida de forma pulverizada ou

fragmentada, o que resulta “na autonomização de suas múltiplas expressões”,

transformando-a nas várias “questões sociais”. O que, conseqüentemente, leva

a que o indivíduo seja culpabilizado por suas dificuldades, tirando a

responsabilidade da sociedade de classe pela produção da desigualdade

social, favorecendo, assim, o esvaziamento da dimensão coletiva da questão

social. (IAMAMOTO, 2001, p.18).

Acreditamos que tais tendências têm se mostrado insuficientes e

marginais para se pensar a questão social diante da magnitude e dimensão

que a mesma tem assumido na contemporaneidade. “As “soluções”

apresentadas são múltiplas, mas pecam, principalmente, por não colocarem

em pauta a questão social enquanto parte constitutiva das relações sociais

capitalistas”, ou seja, como reprodução ampliada das desigualdades sejam elas

políticas, econômicas ou sociais. Enfim, as soluções que se tem apresentado

são pontuais, focalizadas, portanto, pouco eficazes.

Nessa perspectiva, pensar a profissão de Serviço Social, na

contemporaneidade, leva à certeza de que os desafios que estão postos, e,

aqueles que vêm emergindo a cada dia, repercutem sobremaneira no cotidiano

dos assistentes sociais, tanto daqueles que estão desenvolvendo as suas

atividades nas diferentes instituições, quanto dos que se ocupam,

especialmente na academia, com a formação das novas gerações de

profissionais e com a investigação da realidade social (NETTO,2001,p.41). Não

restam dúvidas quanto ao fato de que as transformações societárias em curso

e as lutas que se travam para garanti-las ou enfrentá-las, conformam um

espaço de disputas e colocam a exigência da reconfiguração ou

redimensionamento das demandas e dos espaços sócio-ocupacionais.

Assim, não causa estranhamento a importância que a “questão social”

tem assumido no âmbito da categoria profissional dos assistentes sociais. Não

é inusitado o fato do atual Projeto Ético-Político da profissão ter suas bases de

intervenção pautadas na “questão social”.

Page 47: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

46

Aliás, é bom lembrar que a relevância que vem sendo dada à questão

social não está circunscrita ao Serviço Social. Como afirma Iamamoto, (2007,

p.172) “nesse quadro recessivo da economia internacional, a questão social

passa a ser redescoberta pelos cientistas sociais, em especial pela “Escola

Francesa”, com amplas retrações na América Latina e, particularmente, na

literatura do Serviço Social.” No Brasil é significativa a influência dos

pensadores franceses, mais especificamente, Robert Castel e Pierre

Rosanvallon no debate atual travado pela categoria profissional dos assistentes

sociais, como também na literatura produzida pelo Serviço Social no que se

refere à questão social. 19 Na concepção desses autores a “questão social” de

hoje não é a mesma questão social do passado. Estamos diante de uma “nova

questão social”.

Castel define a questão social como uma aporia fundamental sobre a

qual uma sociedade experimenta o enigma de sua coesão e tenta conjurar o

risco de sua fratura. “É um desafio que interroga, põe em questão a capacidade

de uma sociedade (o que em termos políticos, se chama uma nação) para

existir como um conjunto ligado por relações de interdependência.”

Para ele a questão social que emergiu no início do século XIX, nos

primórdios da industrialização, mais exatamente por volta dos anos de 1830,

não é a mesma questão social de hoje. Na concepção do autor, estamos diante

de uma “nova questão social” diferente, portanto, daquela representada pelos

proletários das primeiras concentrações industriais que eram constituídas por 19Iamamoto (2007:175), ao se referir à incorporação dos autores franceses pelo Serviço Social

chama a atenção para o fato de que “a tônica tem sido reproduzir resumos dos autores

franceses sem assumir o desafio da crítica”, cujo foco, segundo ela, incide sobre os supostos

teóricos da análise apoiados em Durkheim e nos fundamentos da Escola regulacionista, cujas

fontes teóricas são ecléticas, incluindo o marxismo, a Sociologia estruturalista genética

(Bourdieu), a macroeconomia Kaleckiana, a escola histórica dos Annales e a ciência política

pública. Os regulacionistas propõem outro modo de regulação do capitalismo e de suas crises

no âmbito dos aparatos institucionais, identificando os meios pelos quais os regimes de

acumulação são estabilizados no largo prazo. (BRAGA, 2003, citado por IAMAMOTO, 2007,

p.176).

Não nos compete, neste momento, aprofundar ou discorrer sobre essas questões, fugiria do foco do nosso trabalho, mas acreditamos que as análises feitas por Iamamoto são pertinentes e devem ser consideradas.

Page 48: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

47

populações flutuantes, miseráveis, não socializadas, alijadas de seus vínculos

rurais que colocavam em risco a ordem social. Como afirma o autor,

Os conteúdos concretos de noções como estabilidade, instabilidade ou expulsão do emprego, inserção relacional, fragilidade dos suportes protetores ou isolamento social são agora completamente distintos do que eram nas sociedades pré-industriais ou no século XIX. Inclusive são muito diferentes hoje do que eram há apenas vinte anos” ( CASTEL,1998,p.27).

Torna-se necessário, segundo ele, “restituir a memória”, ou seja, o

presente não é só contemporâneo. É também um efeito de herança, e, a

memória de tal herança nos é necessária para compreender e agir hoje. (Idem,

1998, p.23)

A nova questão social hoje, segundo Castel, “parece ser o

questionamento da função integradora do trabalho na sociedade”. O autor

elege a centralidade do trabalho para apreender a questão social. Aponta uma

desmontagem do sistema de proteções e garantias vinculadas ao emprego, ou

seja, a ruptura entre trabalho e proteção. Quando se refere às novas

configurações da questão social aponta a precarização do trabalho como a

situação mais alarmante, considerando ser ela que alimenta o desemprego

afetando de forma desigual as diferentes categorias sociais. Dos trabalhadores

aos executivos ninguém escapa do desemprego ou dessa “reestabilização das

situações de trabalho” (CASTEL, 2000, p.250).

Analisando a questão social, hoje, na França, o autor parte de uma

primeira constatação que é a desestabilização dos estáveis, ou seja,

trabalhadores que até então ocupavam postos sólidos na divisão do trabalho

clássica foram retirados dos circuitos produtivos.

Uma segunda constatação apontada pelo autor é a instalação da

precariedade que se constitui em um fenômeno novo e que atinge

principalmente os jovens na alternância de períodos de atividade e

desemprego; de trabalho temporário, de ajuda social contribuindo para o

crescimento da vulnerabilidade social, o que na concepção de Castel estaria

indicando a presença de uma “nova questão social”.

Page 49: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

48

Uma terceira e mais inquietante constatação, conforme o autor é a

descoberta de um novo perfil de pessoas que poderiam ser chamadas de

sobrantes, pessoas que não têm lugar na sociedade, que não são integradas e

podem não vir a sê-lo. São pessoas que foram invalidadas pela nova

conjuntura econômica e social dos últimos 20 anos, são indivíduos que estão

completamente atomizados, rejeitados de circuitos que lhes poderiam atribuir

uma utilidade social. (CASTEL, 2000, p.255).

A crescente exclusão das pessoas das proteções sociais e o

esgotamento das tradicionais formas de solidariedade social que, na

atualidade, já não se constituem em bases consistentes de resistência, levam o

autor a pensar que as alternativas para a situação da sociedade salarial só

poderão vir do Estado. Na realidade, de um “Estado Interventor”. Mas, diz ele,

“este Estado deveria ajustar o melhor possível suas intervenções,

acompanhando as nervuras do processo de individualização” (Idem, 1998,

p.610).

Rosanvallon faz a distinção entre a “velha” e a “nova” “questão social”.

Para ele a expressão questão social no final do século XX se pautava nas

disfunções decorrentes do nascimento da sociedade industrial. Porém, a partir

dos anos de 1980 o crescimento do desemprego e o surgimento de novas

formas de pobreza não remetem aos problemas do passado. “Os fenômenos

atuais de exclusão não remetem às categorias antigas da exploração”. (1995,

p.7). O fim dos “Trinta Anos Gloriosos” e o fim do Estado Providência,

marcaram o final dos anos de 1970 e toda a década de 1980, puseram fim à

utopia de uma sociedade que garantia segurança e proteção aos indivíduos

dos principais riscos da existência. A questão social mudou de natureza no

começo da década de 1990, quando, além dos problemas de ordem financeira

e das disfunções, são colocados em questão os princípios organizadores da

solidariedade e a concepção dos direitos sociais. Ou seja, o problema passou a

ser de ordem filosófica.

Rosanvallon (1995, p.8-10) distingue três etapas ou dimensões da crise

do Estado Providência: primeira, a crise financeira que marcou o final dos anos

de 1970; a crise ideológica, que marcou toda a década de 1980, e, por último, a

Page 50: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

49

crise filosófica, que teve início nos anos de 1990 e se constitui na crise atual. É

essa crise filosófica que, na concepção de Rosanvallon, conforma o surgimento

de uma “nova questão social”.

Essa “nova questão social” é marcada pela desintegração dos princípios

organizadores da solidariedade e pelo fracasso da concepção tradicional dos

direitos sociais. “Não se trata unicamente, como há dez anos, de encontrar o

caminho de uma relegitimação do Estado”. O “Estado Providência”, na sua

concepção, é insubstituível na manutenção da coesão social, mas deve ser

reinstituído na perspectiva da solidariedade.

Não imaginava nem por um instante que um homem que tivera trabalho pudesse ter um nível de ingresso tão baixo, a ponto de ser considerado quase como um indigente. Problemas que antes eram tidos com residuais ou conjunturais tomam uma dimensão massiva; “o pauperismo é um fato social massivo, dominante na classe operária” (1995, p.9).

O autor faz uma retrospectiva histórica das técnicas de seguros nos

séculos XVII ao XIX, quando tais técnicas eram reconhecidas como respostas

adequadas à gestão dos problemas sociais. Hoje, face ao desemprego e à

exclusão que deixam de ser fenômenos passageiros e passam a ser

permanentes, produzidos em grande escala, tais técnicas são consideradas

como “pouco adaptadas” ao tratamento dos problemas atuais. Tratando-se do

social, diz ele, “o conceito central atualmente é muito mais o de precariedade e

vulnerabilidade do que o de risco”. Muito embora enfatize que o conceito de

risco continue sendo pertinente. Na sua concepção, o que hoje em dia se

constitui em problema de risco catastrófico são os riscos naturais (inundação,

terremoto), acidentes tecnológicos maiores, danos de grandes amplitudes ao

meio ambiente. Riscos que já não se limitam aos indivíduos, mas a populações

inteiras (1995, p.29).

A existência de uma nova questão social se traduz, segundo

Rosanvallon, na inadaptação dos velhos métodos de gestão do social que se

encontram defasados. Para Rosanvallon, ao que tudo indica, as manifestações

da luta de classes parecem ser deslocadas para o âmbito da gestão social. A

Page 51: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

50

questão social, nesta perspectiva, deixa de ser responsabilidade da sociedade

e passa a ser decorrente ou tributária das diferenças individuais.

Para Rosanvallon a sobrevivência do Estado tem como condição a sua

refundação intelectual e moral. Neste sentido, faz-se necessário um enfoque

político da solidariedade, ou seja, é necessário reinventar as formas de

solidariedade.

A remissão a esses autores é decorrente da influência que exercem não

só nas elaborações do Serviço Social como também por se fazerem presentes

nas discussões que a categoria tem travado sobre as Diretrizes Curriculares

quando a questão social se torna tema central.

Apesar de reconhecer a importância desses autores no âmbito do

Serviço Social, consideramos pertinente que não se perca de vista que esses

autores (Castel, Rosanvalon,) desenvolveram seus estudos e pesquisas no

contexto europeu, mais especificamente, na França. Sociedade que atingiu

patamares considerados satisfatórios na universalidade da cidadania, portanto,

totalmente diferente da realidade brasileira onde a universalidade nunca foi

atingida.

Face a toda essa situação o que se tem vislumbrado é um apelo cada

vez maior à solidariedade, o que não é novo na história do país.

Como se refere Marilda Iamamoto (2001, p.21) “a velha questão social

metamorfoseia-se, assumindo novas roupagens” que aparecem sob o cunho

da novidade. O que leva determinados autores a acreditarem na existência de

uma nova questão social.

Conforme Alexandra Pastorini (2004, p.14), as discussões sobre a

existência de uma “nova questão social” começaram na Europa e nos Estados

Unidos no final dos anos de 1970 e início dos anos de 1980. Momento em que

os problemas decorrentes do desenvolvimento e expansão do capitalismo

ganham dimensão não esperada nos países centrais que viviam, até então,

sob o impacto dos “Trinta Anos Gloriosos” e que, a partir do final dos anos de

Page 52: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

51

1980 e nos anos de 1990, depararam-se com uma realidade considerada, por

alguns estudiosos, como “inimaginada”.

Para Pastorini, “a questão social” assume expressões particulares

dependendo das peculiaridades específicas de cada formação social (nível de

socialização da política, características históricas, formação econômica,

estágios e estratégias do capital). O movimento de globalização coloca

demandas diferenciadas e traz novidades nas manifestações imediatas da

questão social, o que não quer dizer que a questão social seja outra, “não

existe uma nova questão social”. Tal afirmação, segundo ela, poderia levar a se

pressupor que a questão social anterior tivesse sido resolvida ou superada. O

que não ocorreu. A “novidade” hoje, diz ela, “reside na forma que a questão

social assume” (2004, p.14).

Conforme Marilda Iamamoto a “questão social” é indissociável de uma

forma de sociabilidade que constitui a sociedade capitalista, mas que, por sua

vez, assume novas mediações históricas na cena contemporânea.

Essa “questão social”, em função das particularidades nacionais, em função do novo estágio de desenvolvimento do capital, sob a égide do capital financeiro, num contexto de mundialização e, articulado a uma profunda alteração das relações Estado-Sociedade civil, atinge diretamente o âmbito do trabalho e das políticas sociais e as formas de proteção aos trabalhadores. Conseqüentemente, vive-se um processo de radicalização da questão social, cujas raízes não se alteram, mas que necessitam uma análise particular dos fenômenos contemporâneos, de modo que nós possamos apreender não só, as dimensões estruturais da questão social, mas como elas se expressam na vida cotidiana dos sujeitos com os quais nós trabalhamos (IAMAMOTO,2007,p.144).

Para a referida autora, a questão social não é senão o conjunto das

expressões do processo de formação e desenvolvimento da classe operária e

do seu ingresso no cenário político da sociedade, exigindo seu

reconhecimento, como classe, por parte do empresariado e do Estado. É a

manifestação, no cotidiano da vida social, da contradição entre o proletariado e

a burguesia (IAMAMOTO, 1998, p.77).

Iamamoto (2001, p.11), ao analisar a questão social parte do

pressuposto de que esta é tributária das formas assumidas pelo trabalho e pelo

Page 53: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

52

Estado na sociedade burguesa. Neste sentido, aponta duas perspectivas ou

ângulos, sob os quais a questão social é abordada:

Primeiro, enquanto “disfunção” ou “ameaça” à ordem e à coesão social

levando a que o seu enfrentamento seja reduzido a uma gestão mais

humanizada e eficaz dos problemas sociais. As respostas à questão social

passam a ser atribuições dos mecanismos reguladores do mercado e das

organizações privadas, que partilham com o Estado a implementação de

programas focalizados e descentralizados de combate à pobreza e à exclusão

social.

Segundo, como expressão ampliada das desigualdades sociais. Seu

enfrentamento, neste aspecto, requer a prevalência das necessidades da

coletividade dos trabalhadores, o chamamento à responsabilidade do Estado e

a afirmação de políticas sociais de caráter universal voltadas aos interesses

das grandes maiorias, condensando um processo histórico de lutas pela

democratização da economia, da política, da cultura na construção da esfera

pública. (idem, p.10).

Na concepção da referida autora a questão social é, portanto, uma

questão estrutural que certamente não vai ser resolvida ou solucionada numa

formação econômica social por natureza excludente.

Carmelita Yazbek (2001, p.33) aborda as expressões da questão social

brasileira a partir dos seguintes aspectos: pobreza, exclusão social e

subalternidade, enquanto resultantes da questão social e que permeiam a vida

das classes subalternas em nossa sociedade”.

Para Yazbek, as seqüelas da “questão social” expressas na pobreza, na

exclusão e na subalternidade de grande parte dos brasileiros tornam-se alvo de

ações solidárias e da filantropia revisitada. A autora alerta: está em construção

uma forma despolitizada de abordagem da questão social, da pobreza e da

exclusão social fora do mundo público e dos fóruns democráticos de

representação e negociação dos efetivos e diferentes interesses em jogo (2001

p.36-37).

Page 54: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

53

José Paulo Netto (2001, p.45), parte da perspectiva de que o

desenvolvimento capitalista produz, compulsoriamente, a “questão social”.

Conforme o referido autor, não se pode dissociar a existência e as

manifestações da questão social da dinâmica do capitalismo.

A “questão social” é constitutiva do desenvolvimento do capitalismo. A dinâmica societária específica dessa ordem não só põe e repõe os corolários da exploração que a constitui medularmente: a cada novo estágio de seu desenvolvimento, ela instaura expressões sócio-humanas diferenciadas e mais complexas, correspondentes à intensificação da exploração que é a sua razão de ser. O problema teórico consiste em determinar concretamente a relação entre as expressões emergentes e as modalidades imperantes de exploração. (Netto, 2001, p.48)

Para Netto (2001, p.44), no âmbito do pensamento conservador a

“questão social”, numa operação simultânea à sua naturalização, é convertida

em objeto de ação moralizadora. E, em ambos os casos, o enfrentamento das

suas manifestações deve ser função de um programa de reformas que

preserve, antes de tudo e mais, a propriedade privada dos meios de produção.

Mais precisamente: o cuidado com as manifestações da “questão social” é

expressamente desvinculado de qualquer medida tendente a problematizar a

ordem econômico-social estabelecida; trata-se de combater as manifestações

da “questão social” sem tocar nos fundamentos da sociedade burguesa.

O que se tem presenciado, ou melhor, vivenciado com a globalização e

o neoliberalismo é que o capital não tem compromisso social. A desigualdade e

a miséria se alastram sem controle. As soluções buscadas parecem sempre

paliativas e se tem apelado, cada vez mais, à solidariedade, seja da sociedade

ou das empresas. Assim, parece mais fácil acreditar que as seqüelas do

capitalismo, expressas na questão social, sejam consideradas inusitadas ou

novas. Vivemos assim, em uma época em que tudo parece ser uma

descoberta, em que tudo parece ser novo.

Diante de toda essa movimentação que vem ocorrendo na sociedade,

seria incoerência negarmos que a questão social na atualidade apresenta

novas conformações e que se expresse de maneira diferente da questão social

que marcou os primórdios do capitalismo. A globalização financeira que se

espraiou pelo mundo impôs condições e trouxe transformações incontestáveis.

Page 55: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

54

Nesse sentido, é pertinente recorrermos a Ianni (1996, p.13) quando

afirma que

Está em curso um intenso processo de globalização das coisas, gentes e idéias. Está em curso um novo surto de universalização do capitalismo, como modo de produção e processo civilizatório. O desenvolvimento do modo capitalista de produção, em forma extensiva e intensiva, adquire outro impulso, com base em novas tecnologias, criação de novos produtos, recriação da divisão internacional do trabalho, ultrapassam fronteiras geográficas, históricas e culturais, multiplicando-se assim as suas formas de articulação e contradição. Esse é um processo simultaneamente civilizatório, já que desafia, rompe, subordina, mutila, destrói ou recria outras formas sociais de vida e de trabalho, compreendendo modos de ser, pensar, agir, sentir, imaginar.

Concordamos com aqueles estudiosos que defendem que a questão

social apesar de reformulada e redefinida nos diferentes estágios do

capitalismo, continua vinculada à exploração que conforma a relação capital-

trabalho, que vem sofrendo modificações e se expressando de formas

diferenciadas conforme as rearticulações pelas quais passa o capitalismo, mas

que continua alicerçada nas mesmas bases que lhe deram origem. Tudo isso

só vem comprovar a perenidade da pobreza e da desigualdade que conforma a

sociedade capitalista.

Neste sentido, acreditamos que pensar a questão social exige a

consideração da realidade global e das particularidades de cada contexto.

Comungamos com a tese de que é inadequado utilizar os mesmos parâmetros

para se pensar a questão social nos países centrais, de economia mais

avançada, e nos países periféricos de terceiro mundo que têm realidades

diferentes e que recebem os impactos da globalização também de modo

diferenciado. Todavia, nos cabe lembrar que a exploração não é um traço

restrito à sociedade burguesa. Os modos de produção que a precederam

também tinham esse traço só que em intensidade muito inferior àquela que

conforma a sociedade burguesa.

Antes da instituição da ordem burguesa as desigualdades e privações

eram decorrentes do baixo nível das forças produtivas que não conseguiam

suprir as necessidades. Na ordem capitalista, as desigualdades e privações

decorrem de seqüelas produzidas socialmente, de carências provenientes dos

Page 56: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

55

antagonismos que caracterizam a relação capital-trabalho, das contradições

entre as forças produtivas e as relações de produção.

A “questão social”, nesta perspectiva teórico-analítica,

Não tem a ver com o desdobramento de problemas sociais que a ordem burguesa herdou ou com traços invariáveis da sociedade humana; tem a ver, exclusivamente, com a sociabilidade erguida sob o comando do capital (NETTO, 2000, p.46).

2.2 A questão social e suas manifestações nos tempos da globalização e do neoliberalismo

Como afirma Octavio Ianni, É no contexto do globalismo que o liberalismo se transfigura em neoliberalismo”. A globalização que revolucionou a realidade mundial, e, colocou por terra as certezas e a segurança existentes até então, expressa um novo ciclo de expansão do capitalismo, como modo de produção e processo civilizatório de alcance mundial. Um processo de amplas proporções envolvendo nações e nacionalidades, regimes políticos e projetos nacionais, grupos e classes sociais, economias e sociedades, culturas e civilizações. Assinala a emergência da sociedade global, como uma totalidade abrangente, complexa e contraditória. Uma realidade ainda pouco conhecida, desafiando práticas e ideais, situações consolidadas e interpretações sedimentadas, formas de pensamento e vôos da imaginação (1996, p. 80).

No Brasil, onde não existiu um “Estado de Bem-Estar”, as expressões da

questão social aumentaram e continuam a aumentar de forma expressiva. O

que é retratado pela desigualdade que assola o país.

Alguns números ilustram bem a imagem da desigualdade brasileira: um

país que tem um PIB de 540 bilhões de dólares, ter 34,9% de sua população –

54,4 milhões de pessoas – alocadas na rubrica de pobres, ou seja, aqueles que

conseguem comer, mas não se vestir ou morar; e, 8,7% -13,6 milhões de

pessoas- na rubrica de indigentes, que não conseguem ter acesso nem às

necessidades básicas é certamente um país desigual. Não obstante, vale

ressaltar que dados das Pesquisas Nacionais por Amostra de Domicílios

(pnads) 2001/2004 do IBGE afirmam que o grau de desigualdade e renda no

Brasil declinou em 4%.A renda dos 20% mais pobres do país cresceu, no

Page 57: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

56

período, cerca de 5% ao ano, enquanto a dos 20% mais ricos diminuiu em

1%.Neste sentido, a análise desenvolvida pelo IBGE é a de que apesar da

queda recente, a desigualdade de renda brasileira permanece muito acima da

observada em países com grau de desenvolvimento semelhante ao nosso.

(IPEA-Nota Técnica. Brasília, 21 de julho de 2006).

Por outro lado, não se pode perder de vista que a desigualdade não é

atributo exclusivo do Brasil nem da América Latina, no entanto, vale ressaltar

que o Brasil é reconhecido como um dos países que apresentam os maiores

padrões de desigualdade social na América Latina e no mundo.

Analisando a pobreza e a desigualdade no mundo, no início dos anos de

1990, Erich Hobsbawm (1995, p.397) imputa ao Brasil a condição de

“candidato a campeão mundial de desigualdade”, afirmando inclusive que

nosso país se constitui em “monumento de injustiça social”. Aqui, conforme

dados citados pelo autor, referentes aos primeiros anos da década de 1990, os

20% mais pobres da população dividiam entre si 2,5% da renda total da nação,

enquanto os 20% mais ricos ficavam com quase dois terços dessa renda.

Dados mais recentes, constantes no Atlas da Exclusão Social volume 4,

apontam que “em média para cada 1 dólar recebido pelos 10% mais pobres, os

10% mais ricos recebem 65,8%, ou seja: os mais ricos se apropriam de uma

renda quase 66 vezes maior que os mais pobres”.20

Sem maiores detalhamentos, o que se pode afirmar é que o capitalismo

contemporâneo traz como conseqüências: o agravamento da pobreza e a

acentuação da desigualdade.

Como afirma Netto (2006, p.8),

Desenvolvimento capitalista é, necessária e irredutivelmente, produção exponenciada de riqueza e produção reiterada de pobreza”. Enfatiza, o referido autor, que “ainda está por inventar ou descobrir uma sociedade capitalista - em qualquer quadrante e em qualquer período histórico- sem o fenômeno social da pobreza como contra-parte necessária da riqueza socialmente produzida (idem,p.9).

20 M. Pochmann, A. Barbosa, A. Campos, R, Amorim e R.Silva(org.), Atlas da exclusão social.Volume 4. A exclusão no mundo.S. Paulo, Cortez 2004, p.62.Citado por Netto, 2006, p.5.

Page 58: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

57

Toda essa movimentação culmina na chamada “crise do Estado” que

por sua vez vai levar à Reforma do Estado. 21 Configura-se, assim, um

momento em que a ofensiva neoliberal coloca a necessidade imperativa de

redução das funções estatais e busca fazer do mercado o único regulador

societário. As medidas não se fazem esperar.

A população passa a conviver com uma crescente alteração e

despolitização dos padrões de proteção social.

No labirinto de problemas do país, a questão do reconhecimento de

direitos sociais enfrenta recuos constitucionais. Crescem os “abismos entre o

país real e o país legal” (PAOLI e OLIVEIRA, 2000).

Os anos de 1990 são conformados, segundo Eduardo Fagnani (1999,

p.155), pelo esgotamento do nacional desenvolvimentismo e pelo alinhamento

automático e passivo das elites políticas do país ao receituário de ajuste

macroeconômico e de reforma do Estado defendido pelas potências

hegemônicas e consubstanciado no que se convencionou chamar de

“Consenso de Wasghinton, que, segundo Tavares e Fiori, (apud Netto,

2006,p.15), veio coroar o “plano de ajuste” imposto aos países periféricos.

Assim,se o Brasil não logrou passar pela experiência de ter um Estado de

Bem- Estar, não vai ficar ileso das conseqüências da ofensiva neoliberal.

O Consenso de Washington, conforme Noam Chomsky (2004, p.21), é

um conjunto de princípios orientados para o mercado traçado pelo governo dos

Estados Unidos e pelas instituições financeiras internacionais que ele controla

e por ele mesmo implementadas de formas diversas geralmente nas

sociedades mais vulneráveis, com rígidos programas de ajuste estrutural.

Resumidamente as suas regras básicas são: liberalização do mercado e do

sistema financeiro, fixação dos preços pelo mercado (“ajuste de preços”), fim

da inflação.

21 No Brasil, a crise do Estado somente se tornará clara a partir da segunda metade dos anos 80(...). A reação imediata à crise, ainda nos anos 80, logo após a transição democrática, foi ignorá-la. Uma segunda resposta, igualmente inadequada, foi a neoliberal, caracterizada pela ideologia do Estado Mínimo (Cf. Cadernos MARE da reforma do Estado; v. 2).

Page 59: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

58

2.3 A Reforma do Estado no Brasil

No Brasil, a grande tarefa política dos anos de 1990 foi a reforma ou

reconstrução do Estado, cujo desmonte já havia começado antes.

A partir dos anos 70, em decorrência do “crescimento distorcido” e da

globalização,

o Estado entrou em crise e se transformou na principal causa da redução das taxas de crescimento econômico, da elevação das taxas de desemprego e do aumento da taxa de inflação que desde então ocorreram em todo o mundo (PEREIRA,1997,p.7).

As respostas a esta crise foram a onda neoconservadora, que se

pautava na redução do Estado, ou seja, na proposta de Estado mínimo e, nas

reformas econômicas voltadas para o mercado.

Como tais respostas foram consideradas inviáveis, emergiu, como

condição necessária, a reconstrução do Estado. “Aos poucos foi se

reconhecendo que o Estado não deve executar diretamente uma série de

tarefas. Que reformar o Estado significa, antes de mais nada, definir o seu

papel, deixando para o setor privado e para o setor público não-estatal as

atividades que não lhes são específicas” (PEREIRA, 1997, p.22). O que era

justificado.

Temos hoje, dentro do Estado, uma série de atividades na área social e cientifica que não lhe são exclusivas, que não envolvem poder de Estado. Incluem-se nesta categoria as escolas, as universidades, os centros de pesquisa científica e tecnológica, as creches, os ambulatórios, os hospitais, as entidades de assistência aos carentes, principalmente aos menores e aos velhos, os museus, as orquestras sinfônicas, as oficinas de arte, as emissoras de rádio e televisão educativa ou cultural, etc. São atividades competitivas, que podem ser controladas não apenas através da administração pública gerencial, mas também e principalmente através do controle social e da constituição de quase mercados (1997, p. 25).

Na concepção de Bresser Pereira, a Reforma do Estado deve ser

entendida no contexto da redefinição do Estado que, de responsável direto pelo

desenvolvimento econômico e social, passa a fortalecer-se enquanto promotor

e regulador do desenvolvimento.

Page 60: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

59

Para alcançar esses objetivos, o Estado lança mão de estratégias como

a descentralização, a privatização e a publicização. As organizações sociais

também se constituem em estratégia central do Plano Diretor da Reforma do

Aparelho do Estado.

A descentralização, que é uma tendência crescente nos processos de

Reforma do Estado constitui-se num dos eixos de reestruturação das políticas

do Estado. Embora liderada por setores progressistas, não se constitui apenas

em privilégio destes setores. O FMI e o Banco Mundial também a indicam

como um dos mecanismos de saneamento fiscal.

Não resta dúvida de que a descentralização seja importante no processo

de democratização do Estado, mas, o risco é que o financiamento dos

programas sociais seja transferido para os estados e municípios sem que lhes

sejam fornecidas as devidas estruturas. Muitos municípios não têm orçamento

para arcar com a descentralização.

Em se tratando da descentralização das políticas sociais, a ênfase recai

na municipalização, o que coloca a exigência de “novas funções e

competências” para os assistentes sociais que passam a ser requisitados para

atuar na formulação e avaliação de políticas, no planejamento e gestão, em

equipes multiprofissionais, na participação nos conselhos, (capacitação de

conselheiros), elaboração de Planos de Assistência Social, acompanhamento e

avaliação de programas e projetos, ou seja, os profissionais de Serviço Social

têm ampliado o seu campo de atuação, mas, ao mesmo tempo, vêem-se

impulsionados a buscar novas qualificações.

A privatização não é um fenômeno isolado que resulta de circunstâncias

locais em épocas determinadas.

Deve ser entendida como parte de uma estratégia global que tem suas raízes num ataque à sociedade civil e à política democrática. O que se constata é que a privatização “é voltada para o crescimento do setor empresarial, que se orienta pela lógica do mercado na aplicação dos recursos públicos” (PETRAS, 1999, p.38).

Page 61: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

60

A privatização, “no âmbito dos serviços e benefícios sociais, tem como

objetivo econômico abrir um novo campo para o investimento e os lucros

privados”. É uma privatização seletiva que pretende privatizar unicamente

aquelas atividades que possam ser rentáveis. Esta forma de privatização

requer a intervenção direta do Estado no sentido de remercantilizar os serviços

e garantir um mercado estável. Na lógica da privatização rentável, o seguro

social constitui um terreno privilegiado, porque abrange campos de grande

interesse para o capital privado, como as pensões, os serviços médicos, a

educação, envolvendo a parcela da população que potencialmente constitui um

mercado de massas (KAMEYAMA, 1995,p.15).

A “publicização” significa a transferência das responsabilidades do

Estado, ou seja, das questões públicas para o mercado ou para o “terceiro

setor”. E o mais importante é que, nessa “parceria”, “o Estado continuará a

financiar as atividades públicas, absorvidas pela organização social qualificada

para tal (...)”. A estratégia da publicização é justificada como uma forma de

“aumentar a eficiência e a qualidade dos serviços, atendendo melhor o cidadão

a um custo menor”. (Cf. Cadernos MARE da reforma do Estado; v. 2).

Tal justificativa não convence, principalmente se pensarmos nos

resultados que estão aí. Não restam dúvidas de que os custos das atividades

sociais diminuíram, estamos convivendo com a total precarização das políticas

sociais que perderam o caráter de universalidade e estão cada dia mais

focalizadas, mais localizadas. A passagem das atividades que eram

competência do Estado, portanto, de direito público, para o âmbito privado,

onde são geridos por outra lógica, que é a lógica empresarial, culminou, dentre

outras conseqüências, na crescente perda dos direitos trabalhistas sociais. O

Estado, visando garantir a “governança” e “tornar-se mais eficiente”,

desincompatibilizou-se da questão social delegando para o “terceiro setor” e

para o mercado as suas atribuições. 22

22 Pesquisa recente realizada pelo CFESS, que traça o perfil do assistente social mostra que 6,81% dos profissionais entrevistados estão inseridos no “terceiro setor”. Considero que é um dado que deve ser levado em conta, considerando que é uma demanda que está posta para a profissão.

Page 62: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

61

É em meio a todo esse processo de retraimento do Estado e das suas

políticas públicas que as organizações do “terceiro setor” entram em cena

como alternativas eficientes, flexíveis e dinâmicas na prestação de serviços

sociais.

O que se presencia é a transferência das responsabilidades do Estado

para a sociedade civil através das organizações filantrópicas tradicionais ou

modernas, onde se inclui a chamada filantropia empresarial.

Cresce o Terceiro Setor. Aparece com força a defesa de alternativas

privatistas para a questão social, envolvendo a família, as organizações sociais

e a comunidade. Esta defesa, como já afirmamos, é legitimada pelo

renascimento de ideais liberais que referendam a desigualdade.

Assim, as propostas neoliberais, em relação ao papel do Estado quanto

à questão social, são propostas reducionistas que esvaziam e descaracterizam

os mecanismos institucionalizados de proteção social. São propostas fundadas

numa visão de política social apenas para complementar o que não se

conseguiu via mercado, família ou comunidade.

É em meio a todo esse processo de ajuste econômico e da crescente

desigualdade social que ocorre,

Um deslocamento da função assistencial, que se torna um instrumento essencial de legitimação do Estado” (Netto,2006,p.15).“Os direitos sociais perdem identidade e a concepção de cidadania se restringe; aprofunda-se a separação público-privado e a reprodução [social] é inteiramente devolvida para este último âmbito; a legislação trabalhista evolui para uma maior mercantilização(e portanto, desproteção) da força de trabalho;a legitimação (do Estado) se reduz à ampliação do assistencialismo” (Soares,apud Netto, 2006,p.15).

É desnecessário expor as conseqüências catastróficas do ajuste

neoliberal para os trabalhadores e para as classes subalternas. Convive-se

com o desemprego crescente, com um processo de privatização jamais visto

na história do país, com o aumento da informalidade e a uma onda de violência

sem controle. A desigualdade social, cujos níveis são alarmantes, vem

Page 63: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

62

suscitando, tanto na sociedade como no empresariado, preocupações que

estimulam a solidariedade. 23

Este cenário, perpassado pela desqualificação do Estado e daquilo que

é público, conseqüentemente, abre espaço para que a iniciativa privada

assuma a sua face benemérita, favorecendo assim a consolidação da

responsabilidade Social empresarial. Daí consideramos ser pertinente à

remissão a responsabilidade social objetivando elucidar o seu significado, bem

como o percurso e as conformações que tem assumido desde o seu

surgimento no Brasil considerando que se constitui em espaço de atuação

profissional do assistente social.

Entendemos que a responsabilidade social empresarial se constitui em

uma estratégia ou alternativa liberal no sentido de dar respostas, aos

problemas decorrentes das seqüelas do desenvolvimento do capitalismo que

se expressam na questão social.

23 Conforme dados das Pesquisas Nacionais por Amostra de Domicílios (Pnads)2001/2004, do IBGE, o grau de desigualdade de renda no Brasil declinou em 4%.A renda dos 20% mais pobres do país cresceu no período cerca de 5% ao ano, enquanto a dos 20% mais ricos diminuiu em 1%. mas,apesar dessa queda, a desigualdade de renda brasileira permanece muito acima da observada em países com grau de desenvolvimento semelhante ao Brasil.(Cf.IPEA. Nota Técnica: A queda Recente da Desigualdade no Brasil.Brasília, 21 de junho de 2006).

Page 64: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

63

3. CAPÍTULO III - RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL

A mais nova onda no mundo dos negócios se apresenta com uma vestimenta pomposa e, talvez a mais camuflada de todas. Trata-se da empresa socialmente responsável, aquela identificada com os preceitos da responsabilidade social (GOMES, 2005).

3.1 O conceito e suas origens

Muito embora esteja em voga no vocabulário das empresas e na mídia

de uma forma geral, o termo responsabilidade social empresarial não está

plenamente definido e parece não ter encontrado um grau de estabilidade

semântica, como outros termos que também fazem parte do vocabulário

empresarial. É um termo abrangente, impreciso, que abarca significados, nem

sempre homogêneos, o que nos leva a afirmar que estamos, assim, diante de

um termo em construção, ou como afirma Bruno Garcia (2002, p.27) de um

“conceito em disputa” daí não ser tarefa fácil precisar o seu significado.

Conforme Gomes (2005), dizer que uma empresa é socialmente

responsável meramente porque realizou pretensas ações para uma

comunidade no campo da educação, da saúde ou mesmo do meio ambiente,

reconhecida com prêmios de formação de institutos de formação empresarial é,

a priori, um contra-senso. Todavia, diz ele, esse tem sido o tom,

frequentemente emanado das empresas responsáveis sociais.

Assim, consideramos pertinente ressaltar como o Instituto Brasileiro de

Análises Sociais e Econômicas-BASE, o Grupo de Institutos, Fundações e

Empresas-GIFE e o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade social-

ETHOS, instituições consideradas de referência na área da responsabilidade

social do país, concebem a temática em questão, porque as concepções de

responsabilidade social empresarial emanadas dessas instituições referenciam

o entendimento que as empresas e seus funcionários têm do que vem a ser a

responsabilidade social empresarial no Brasil.

Page 65: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

64

O IBASE - Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas, criado

em 1981 pelo sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, é uma instituição de

utilidade pública federal, sem fins lucrativos, sem vinculação religiosa e a

partido político, cuja missão é a construção da democracia, combatendo

desigualdades e estimulando a participação social. É uma instituição que tem

se destacado e impulsionado o movimento de valorização da Responsabilidade

Social Empresarial no Brasil através do Balanço Social. Foi a partir da

influência do IBASE que o Banco do Estado de São Paulo BANESPA, publicou

em 1992 um relatório completo de suas ações sociais que abriu caminhos para

que, a partir de 1993, várias empresas apresentassem os seus balanços

sociais. Assim, o IBASE desenvolve e aprimora modelos de balanço social

desde 1997 e, nos últimos anos, tem divulgado dados e análises sobre o

comportamento empresarial brasileiro.

Em linhas gerais, o IBASE tem como objetivos contribuir para uma

cultura democrática de direitos, fortalecer o tecido associativo na sociedade

civil e ampliar a capacidade de incidência em políticas públicas. Este instituto

elegeu a Responsabilidade Social e Ética nas Organizações, como uma das

linhas programáticas do seu Plano de Ação de 2007. Tal linha tem como

característica

A busca de ética, práticas responsáveis e transparência, tanto no meio empresarial como nas organizações da sociedade civil, visando contribuir para o desenvolvimento de uma sociedade cada vez mais justa e sustentável. Seu objetivo é consolidar uma cultura de organizações e instituições democráticas, a partir de práticas concretas de transparência, prestação de contas, valorização da diversidade e atuação a serviço das pessoas e da vida no planeta. 24

O GIFE surge em 1989 “objetivando a troca de experiências e o

incentivo a ações empresariais no campo da filantropia, chegando, à época, a

contar com a participação de mais de cinqüenta organizações em vários

Estados do país, que num sistema de rodízio voluntário se oferecia como sede

24 IBASE-Plano de Ação 2007, p.13. Disponível em < www.ibase.com.br>

Page 66: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

65

das reuniões técnicas”25. Só no ano de 1991, o GIFE foi fundado oficialmente e

formalizou-se como associação em 1995, instituindo-se como pessoa jurídica.

É a primeira instituição da América do Sul a reunir empresas, institutos e

Fundações de origem privada que praticam investimento social privado, ou

seja, repasse de recursos privados para fins públicos por meio de projetos

sociais, culturais e ambientais, de forma planejada, monitorada e sistemática.

Uma das atribuições do GIFE é estimular as parcerias entre o setor privado, o

Estado e a Sociedade Civil organizada. Vale ressaltar que o GIFE é o braço

filantrópico de empresas multinacionais como a Xérox e fundações como a

Bradesco (MONTAÑO, 2002, p.212). O que lhe confere importância e faz com

que seus associados tenham fama de possuir uma condição mais bem definida

no campo da responsabilidade social.

Responsabilidade Social Empresarial, na concepção do GIFE, “é uma

forma de conduzir os negócios da empresa de tal maneira que a torne parceira

e co-responsável pelo desenvolvimento social”.

O Instituto ETHOS, fundado em 1999, desenvolve atividades

basicamente de natureza mobilizatória e tem como proposta promover a

disseminação e discussão acerca de questões relacionadas à gestão

socialmente responsável, ou seja, o objetivo do ETHOS é estabelecer

parâmetros para as empresas interessadas na responsabilidade social.

Aspectos que merecem destaque é o investimento que o Instituto

ETHOS faz em campanhas publicitárias e a sua aproximação do meio político e

da universidade, principalmente através dos cursos de administração e

marketing.

Para o Instituto ETHOS,

A Responsabilidade Social Empresarial é a forma de gestão que se define pela relação ética e transparente da empresa com todos os públicos com os quais ela se relaciona e pelo estabelecimento de metas empresariais compatíveis com o

25 Luiza Mônica A. da SILVA, Filantropia empresarial: um estudo exploratório de algumas fundações metropolitanas de São Paulo. 1996, p.65. Dissertação de mestrado em Ciência Política da UNB. Citado por César Augusto Tibúrcio SILVA e Fátima de Souza FREIRE p. 21.

Page 67: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

66

desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando recursos ambientais e culturais para as gerações futuras, respeitando a diversidade e promovendo a redução das desigualdades sociais.

O Instituto ETHOS preconiza que, independente do porte, do setor em

que atua ou do número de funcionários, todo tipo de empresa pode

desenvolver ações de responsabilidade social, desde que tenha vontade

política. Nesse sentido, torna-se necessário que a empresa tenha a cultura da

responsabilidade social incorporada, pois, desenvolver programas sociais

somente para divulgar a empresa, ou como forma compensatória, não traz

resultados positivos sustentáveis ao longo do tempo.

Como afirma Grajew, um dos idealizadores, fundador e presidente do

Instituto ETHOS, não se pode confundir a responsabilidade social empresarial

com um investimento isolado da empresa, o que não deixa de ser investimento

importante, mas a responsabilidade social empresarial é um conceito muito

mais amplo, e, os problemas devem ser tratados em sua “abrangência total”.

Já foi o tempo em que as empresas imaginavam estar livres para se envolver em corrupção apenas pelo fato de destinarem uma verba para o hospital da comunidade ou fazer contribuições para organizações que cuidam de idosos, e continuavam enganando o consumidor , poluindo o meio ambiente ou remunerando mal seus empregados.26

Além de instituições como o GIFE, o ETHOS e o IBASE, vários autores,

dentre os quais assistentes sociais, têm se dedicado a analisar a

responsabilidade social empresarial.

Patrícia AHSLEI, no seu livro sobre ética e responsabilidade social nos

negócios parte da perspectiva de que a responsabilidade social se constitui no,

Compromisso que uma organização deve ter para com a sociedade, expresso por meio de atos e atitudes que a afetam positivamente, de modo amplo, ou a alguma comunidade, de modo específico na sociedade e a sua prestação de contas para com ela. A organização, nesse sentido, assume obrigações de caráter moral, além das estabelecidas em lei, mesmo que não diretamente vinculadas às suas atividades, mas que possam contribuir para o desenvolvimento sustentável dos povos. Assim, numa visão expandida,

26 Oded GRAJEW, citado por GARCIA, Bruno. In. Responsabilidade social das empresas: a contribuição das universidades, VI, p.28.

Page 68: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

67

responsabilidade social é toda e qualquer atividade que possa contribuir para a melhoria da qualidade de vida da sociedade (2002 p.6-7).

Para a autora, a responsabilidade social não se atém só aos

stakeholders27, mas, deve ter como alvo a sociedade como um todo.

Para Fernando G. Tenório, (2004, p.20),

A base conceitual contemporânea da responsabilidade social empresarial está associada aos valores requeridos pela sociedade pós-industrial. Nessa nova concepção do conceito, há o entendimento de que as companhias estão inseridas em ambiente complexo, onde suas atividades influenciam ou têm impacto sobre diversos agentes sociais, comunidade ou sociedade. Conseqüentemente, a orientação do negócio visando atender apenas os interesses dos acionistas torna-se insuficiente, sendo necessária a incorporação de objetivos sociais no plano de negócios, como forma de integrar a companhia à sociedade.

Carlos MONTAÑO realiza uma análise crítica sobre o terceiro setor e, ao

se referir à responsabilidade social empresarial, faz um alerta no sentido de

que,

A responsabilidade social do empresariado não pode ser compreendida sem fazer referência à sempre presente necessidade de aumentar a produtividade e, com ela o movimento de “relações humanas” e diversas formas de tornar o trabalho mais ameno para conquistar o trabalhador, bem como, a necessidade de conquistar o consumidor (2002, p.60).

O referido autor parte da perspectiva de que a “filantropia empresarial”

não passa de uma nova modalidade do capital objetivando incrementar a sua

lucratividade, tanto aumentando as suas vendas como diluindo seus custos. Ou

seja, a “filantropia empresarial entra nos custos da representação do capital”,

limpando a imagem da empresa, melhorando o marketing comercial, isentando

o capital de impostos estatais, conseguindo subsídios, entre outros benefícios

(idem, p. 13).

Na acepção de Nobuco Kameyama, a responsabilidade social é uma

forma moderna de camuflar as novas estratégias de exploração, negando as 27 Stakeholders, refere-se aos grupos de interesse que se relacionam, afetam e são afetados pela organização e suas atividades (público interno, comunidade, fornecedores, acionistas, proprietários e investidores, governo, concorrentes, clientes, sociedade).

Page 69: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

68

contradições, na medida em que a consciência e a sociabilidade que se

constroem na esfera da produção deslocam-se para a esfera da reprodução,

ou seja, do consumo. Nesta perspectiva, a responsabilidade social empresarial

para a autora tem como prioridade o lucro. Ou seja, os investimentos feitos

pelas empresas visam à produtividade. Também pode trazer para as empresas

vantagem competitiva por ser um elemento que atrai o mercado, gratifica seus

funcionários e reforça a boa imagem da empresa (2000, p. 210).

Maria Célia Paoli (2005, p.379), chama a atenção para o fato de que, por

mais inovadora e tecnicamente competente que seja a proposta de

investimento sistemático empresarial privado na redução das carências mais

básicas de parcelas da população pobre brasileira, a face mais conservadora

da solidariedade privada, contraditoriamente, mostra-se por inteiro na própria

instituição da filantropia empresarial: a de retirar da arena política e pública os

conflitos distributivos e a demanda coletiva por cidadania e igualdade.

Enfim, as definições são muitas, às vezes em consonância, outras vezes

permeadas por críticas ou discordâncias, mesmo entre aqueles que a

defendem. O que, sem dúvida, retrata as mudanças que estão ocorrendo no

mundo e que rebatem diretamente nas empresas. A evolução da tecnologia, a

velocidade sem precedentes do fluxo de informações e dos processos

produtivos são acontecimentos que levam as empresas e as pessoas a terem

acesso mais rápido às informações o que as torna mais exigentes levando-as,

enquanto consumidores, “a avaliar a conduta social da empresa antes de

comprar seus produtos” (Montano, 2001, p.28)

Assim, pensar a responsabilidade social empresarial implica em ir além

das concepções, em conhecer o contexto em que emergiu e os caminhos que

tem percorrido até se revestir da importância que tem adquirido ao longo do

tempo.

Page 70: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

69

3.2 Responsabilidade social: contexto e percurso

Afirmamos anteriormente o envolvimento de empresários com os

problemas decorrentes das várias expressões da questão social não é algo que

tenha começado recentemente. O que pode ser considerado novo é a

amplitude que a responsabilidade social ganhou nas últimas décadas, de forma

mais ostensiva a partir dos anos de 1990. Assim, o que não se pode negar é

que a responsabilidade social empresarial no Brasil está crescendo. 28

Basta ver que das 400 empresas certificadas pela AS 8000 (norma que

verifica o bem-estar e as condições de trabalho), 51 encontram-se no Brasil

(Carta Capital/ed.especial nº. 301, p.6) o que o coloca entre os quatro países

com mais certificações na Norma AS 8000 no mundo, atuando como

fomentador das Metas do Milênio e do Pacto Global da ONU no meio

empresarial. 29

No ano de 2003, levantamento realizado pelo IPEA aponta que 59% das

empresas com um ou mais empregados declararam realizar algum tipo de ação

social para a comunidade, ou seja, das 782 mil empresas nacionais, 462 mil

contribuem no campo social. (Carta capital n. 270, p.9). Este é um dado

ilustrativo do quanto a responsabilidade social vem se ampliando no país,

apesar das divergências, que não são poucas.

O discurso de que a ação social responsável não é assunto exclusivo do

Estado, mas tarefa de todos levou à adoção de novas estratégias empresariais

53

Ilustrativo, nesse sentido, é o aumento e a variedade das premiações existentes nesta área, no Brasil: Selo Empresa Cidadã (Câmara Municipal de São Paulo),Top Social ADVB (Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing do Brasil), Prêmio Eco (Amcham- Câmara Americana de Comércio), Prêmio Balanço Social (Fides, Ibase, Instituto Ethos, Serasa e Bolsa de Valores de São Paulo),Selo Empresa Amiga da Criança (Fundação Abrinq),entre outras premiações nacionais e regionais (Cf. ASHLEY,2006 p.72).No Estado de Mato Grosso foi instituído pela Lei Nº 7.687 de junho de 2002, o Certificado de Responsabilidade Social a ser conferido às empresas, órgãos públicos e demais entidades que apresentarem seu Balanço Social. 29 Dados provenientes da Reunião de Constituição do Conselho Internacional do Instituto Ethos, realizada em fevereiro de 2005, estimam que cerca de 150 empresas brasileiras sejam signatárias do Pacto Global da ONU.

Page 71: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

70

com grande impacto sobre a produtividade e a competitividade do sistema

produtivo.

Neste sentido, a fala de Oded Grajew, um dos idealizadores, fundador e

presidente do Instituto ETHOS, é pertinente. Diz ele:

Se você reparar bem, não há nenhum conceito novo quando se pensa em responsabilidade social. O que há, na verdade, é um novo olhar, uma nova maneira de compreender as questões que envolvem todas as relações humanas, inclusive- e especialmente - no universo empresarial. Quando se fala nesse assunto, estamos tratando de ética, da relação socialmente responsável da empresa em todas as suas ações, suas políticas, suas práticas, em tudo que ela faz, suas atitudes com a comunidade, empregados, fornecedores, com os fornecedores de seus fornecedores, com os fornecedores dos fornecedores de seus fornecedores, com o meio ambiente, com o governo, poder público, consumidores, mercado e com seus acionistas. É preciso pensar todas essas relações como uma grande rede que se inter-relaciona. 30

O depoimento de um dos sujeitos entrevistados é ilustrativo quando se

refere ao surgimento da responsabilidade social empresarial. Quando

questionado sobre o fato de a empresa ser responsável ele é enfático.

Sempre foi e não sabia. Essa é que é a questão. Quando surgiu esse negócio de moda da responsabilidade social a gente estava inventando um mundo de outras coisas por não enxergar que a gente faz esse processo na nossa atividade fim. Por exemplo: há quinze anos atrás nenhuma empresa da iniciativa privada levaria uma linha e interligaria Cuiabá-Sinop, porque não tem retorno financeiro nenhum, isso no nosso entendimento é praticar responsabilidade social. A gente está levando a energia que alavancou o desenvolvimento de toda aquela região, melhorou a qualidade de vida de todos que ali estavam.O que faltou, conforme analisa, foi “dar transversalidade a esse projeto é isso que a gente não soube fazer adequadamente.(G.3).

Para Gomes (2005), uma das facetas mais notáveis em administração

são os modismos, fenômenos de vida reconhecidamente efêmera

representados pela incorporação de determinado ponto de vista, e, não raro

designado por um discurso empolado no qual a retórica (em sua acepção de

discurso artificioso) é seu sustentáculo por excelência, embora, mesmo esta

não consiga encobrir a ausência de novidade no pretenso imediatismo das

30 Oded GRAJEW, Negócios e responsabilidade social”. In: ESTEVES, S. (org.). O dragão e a borboleta: sustentabilidade e responsabilidade social nos negócios. São Paulo: Axis Mundi.p.39. Citado por GARCIA, Bruno G. In: Responsabilidade social das empresas: a contribuição das universidades. p.27. São Paulo: Peirópolis,2002.

Page 72: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

71

teorias. Já se assistiu ao “controle de qualidade”, “produtividade”, à

preocupação com os recursos humanos, ao alvorecer da “inteligência

corporativa”, “à reengenharia” (...). E agora a novidade é a “responsabilidade

social”.

Conforme Fábio Risério Moura de Oliveira (2002, p.200), a Idéia de

responsabilidade social, por parte das empresas, pode ser creditada a um

trabalho de Charles Eliot, em 1906, nos Estados Unidos, muito embora não se

tenha noticias de que esse trabalho tenha alcançado uma repercussão maior

em relação à responsabilidade social das empresas.

No entanto, grande repercussão, se pensarmos a responsabilidade

social em termos de mundo, teve o caso Henri Ford X John e Horace Dodge

que foi julgado pela Justiça americana em 1919. De um lado Henri Ford,

acionista majoritário e presidente da Ford Motor Company, do outro John e

Horace Dodge, líderes dos acionistas da companhia, que contestavam a idéia

de Ford que decidiu não distribuir parte dos dividendos aos acionistas e

investiu na capacidade de produção, no aumento de salários e em fundo de

reserva para a diminuição esperada de receitas em decorrência da redução do

preço dos carros. A Suprema Corte de Michigan decidiu a favor de Dodge, por

entender que as corporações existem para benefício dos seus acionistas, e que

os diretores precisam garantir o lucro, não podendo usá-lo para outros fins. Ou

seja, a filantropia corporativa e o investimento na imagem da corporação para

atrair consumidores poderiam ser realizados na medida em que favorecessem

os lucros dos acionistas.

Assim, a dissolução da sociedade e a constituição das duas

organizações (Ford e Dodge) que passaram a dividir o mercado estadunidense

de automóveis foi o fim inevitável.

Mas Henri Ford, ao que tudo indica, foi um dos primeiros a entender as

transformações que estavam ocorrendo na sociedade, bem como a natureza

Page 73: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

72

dessas transformações o que o levou a instituir salário mínimo e jornada de

trabalho máxima de oito horas diárias para os empregados. 31

Quanto à sistematização, o primeiro artigo científico sobre

responsabilidade social empresarial pode ser creditado, conforme Gomes

(2005,p.51), a H.Gordon Fitch (1976). Afirma ele que os problemas sociais são

causados, em parte, pelas empresas e que caberá a elas tanto a sua resolução

no presente quanto sua previsão e respostas aos problemas no futuro. Para o

autor, as soluções devem ser encontradas de modo voluntário e não de forma

imposta, de cima para baixo como os governos costumam agir.

A França formalizou a responsabilidade social nos anos de 1975 e 1977,

a partir da iniciativa do governo num movimento junto aos sindicatos. Foi

assim, o primeiro país a obrigar as empresas a fazerem balanços periódicos do

seu desempenho social no tocante à mão - de -obra e às condições de trabalho

(SUCUPIRA, 1999).

Quanto ao Brasil, cabe ressaltar que a responsabilidade social

empresarial chega sob a influência do modelo norte-americano, o que pode ser

constatado pela análise da literatura utilizada como referência para os vários

trabalhos de divulgação da Responsabilidade Social Empresarial no país.32

No Brasil, a iniciativa em relação à Responsabilidade Social pode ser

creditada ao IBASE, uma ONG que em 1993, junto com Herbert de Souza, o

Betinho, lança a Campanha Nacional de Ação da Cidadania Contra a Fome, a

Miséria e Pela Vida, com o apoio do Pensamento Nacional das Bases

Empresariais (PNBE), que segundo Sucupira (1999), constitui-se no marco da

aproximação dos empresários com as ações sociais.

31 SROUR, citado por TENÓRIO, Fernando G. Responsabilidade social empresarial: teoria e prática, p.18. 32 Outra vertente da responsabilidade social inspirada em países como a Itália, Suécia e Inglaterra, países que implantaram modelos mais abrangentes de proteção social e, que, embora não tenham influenciado a experiência brasileira, fazem o contraponto ao modelo norte-americano, que é pautado em uma experiência cultural baseada no individualismo e na iniciativa privada, combinada a um descrédito no poder governamental. Cf.Joana GARCIA,.O negócio do social,p.27-28.

Page 74: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

73

Mas, é pertinente lembrar que antes da “Campanha do Betinho”,

existiram outras iniciativas. No ano de 1984, a Nitrofértil, uma empresa

brasileira, publica o primeiro balanço social do país. Em 1992, o Banco do

Estado de São Paulo (BANESPA) publica um relatório completo divulgando

todas as suas ações sociais; prática que começa a ser seguida por outras

empresas, a partir de 1993.

Em 1995, o GIFE representou um salto no que se refere à

responsabilidade social. Foi a primeira entidade que voltou suas preocupações,

de forma mais enfática, sobre a filantropia, a cidadania e a responsabilidade

social e utilizou o termo “cidadania empresarial” para referir-se às ações sociais

que as empresas realizavam.

Em 1997, o IBASE cria um modelo de balanço social e o seu presidente

à época, o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, se empenha na

implementação de uma campanha para estimular a divulgação voluntária do

balanço social, sendo inclusive a primeira ONG a publicar o balanço social.

O Instituto ETHOS de Empresas e Responsabilidade Social foi o

protagonista na criação e adaptação de “instrumentos que ajudam as empresas

a trilharem o caminho da responsabilidade social e do desenvolvimento

sustentável, entendido este como integrador das dimensões econômicas,

sociais e ambientais que cercam as atividades humanas”.

Para Tenório (2004), a abordagem da atuação social empresarial surgiu

no início do século XX, com o filantropismo, e, posteriormente, com o aumento

dos problemas sociais,

O conceito evoluiu, passando a incorporar os anseios dos agentes

sociais no plano de negócios das corporações. Assim, além do filantropismo,

desenvolveram-se conceitos como voluntariado empresarial, cidadania

Page 75: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

74

corporativa, responsabilidade social corporativa e, por último, desenvolvimento

sustentável. 33

Quando se refere à caracterização da responsabilidade social

empresarial, o referido autor divide a análise em dois períodos: o primeiro que

vai do início do século XX até a década de 1950 e o segundo que vai da

década de 1950 até os dias atuais, quando a ênfase maior é dada ao

desenvolvimento sustentável.

Assim, o que se pode constatar é que no primeiro período, numa

abordagem clássica, a responsabilidade social empresarial “assume dimensão

estritamente econômica e é entendida como a capacidade empresarial de gerar

lucros, criação de empregos, pagamento de impostos e cumprimento das

obrigações legais” (Idem, 2004, p.18).

Posteriormente, no segundo período que foi marcado pelo

desenvolvimento da sociedade pós-industrial, pelo pensamento Keynesiano,

que preconizava a intervenção do Estado na economia, houve redução gradual

das incertezas do mercado. As empresas passaram a investir em tecnologia e

a acumular capital. Além disso, a transição do modelo de produção industrial

para o pós-industrial resultou em mudanças nos valores da sociedade que

passou a buscar aumento da qualidade de vida, a valorização do ser humano,

respeito ao meio ambiente, a organização empresarial de múltiplos objetivos e

a valorização de ações sociais, tanto das empresas quanto dos indivíduos.

Dessa forma, a base conceitual contemporânea da responsabilidade

social empresarial está associada aos valores requeridos pela sociedade pós-

industrial. Nessa nova concepção do conceito, há o entendimento de que as

companhias estão inseridas em ambiente complexo, onde suas atividades

influenciam ou têm impacto sobre diversos agentes sociais, comunidade ou

33 Conforme Tenório no início do século XX, a responsabilidade social limitava-se apenas ao ato filantrópico, que inicialmente assumia caráter pessoal representado pelas doações efetuadas por empresários ou pela criação de fundações como a Ford, a Rockfeller e a Guggenheim. Posteriormente, com as pressões da sociedade, a ação filantrópica passou a ser promovida pela própria empresa, simbolizando o início da incorporação da temática social na gestão empresarial. TENÓRIO, F.G. Responsabilidade social empresarial: teoria e prática, p.16.

Page 76: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

75

sociedade. Conseqüentemente, a orientação do negócio visando atender

apenas os interesses dos acionistas torna-se insuficiente, sendo necessária à

incorporação de objetivos sociais no plano de negócios, como forma de integrar

a companhia à sociedade (Idem, p.20).

É importante não perder de vista que estamos diante de uma estratégia

ideológica utilizada nos marcos das saídas neoliberais face à crise estrutural do

capital que não se propaga só no Brasil ou na América Latina, mas que atinge

o mundo todo. Um outro aspecto que deve sempre se fazer presente quando

se pensa a responsabilidade social é o contexto no qual se deu a sua

emergência.

O Brasil, no período que vai de 1980 a 1994, viveu uma sucessão de

crises econômicas, políticas e sociais que se acumulavam e se

interpenetravam, o que levou determinado autor a afirmar que não se está

diante de uma crise, mas de uma “complexa transição estrutural”.34

Inúmeras são as variáveis a que se pode imputar a situação de crise que

assola o Brasil a partir de meados dos anos de 1980 e que, aqui, diferente de

outros países, assume conformações particulares. Dentre outras se pode

elencar:

a) o esgotamento do modelo econômico, o que conduziu o país a taxas

reais de crescimento mínimo, em torno de 1% ao ano;

b) o crescimento da dependência externa através da dívida e da

necessidade de exportação em volume crescente para se manter em dia com

as exigências dos bancos credores;

c) o esgotamento do poder de tributação do Estado que, somado ao seu

endividamento interno, de caráter financeiro, reduz sua disponibilidade de

recursos e, assim, de intervenção;

34 Cf. Furtado, 1992, citado por NASCIMENTO, 1997.

Page 77: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

76

d) o crescimento do corpo funcional do Estado de forma desordenada e

ineficiente, em face do esgotamento de mecanismos de legitimação e os baixos

índices de crescimento econômico;

e) maior espaço para a organização de interesses e o crescimento das

pautas reivindicativas dos atores sociais, sobretudo de cunho popular, tornando

a regulação dos conflitos mais complexa;

f) perda de consenso e de credibilidade por parte dos governantes (e

não só do governo central), partidos políticos e instituições estatais em geral;

g) as disfunções do tecido social, com o surgimento de “socializações

marginais”, diante da ineficiência das intervenções estatais e da incapacidade

de absorção da força de trabalho pela estrutura produtiva.

A essas variáveis acrescenta-se, ainda, a revolução tecnológica, com

repercussões sobre a inserção do país na nova divisão internacional do

trabalho e sobre o conceito de soberania, tornando o nacionalismo dos anos 60

obsoleto (NASCIMENTO, 1997).

Esse contexto propiciou o aumento massivo das Organizações Não

Governamentais - ONGs - que crescem na mesma proporção em que os

movimentos sociais organizados foram se retraindo ou se deslocando. Vale

lembrar que os movimentos sociais mais combativos, nos anos de 1990, se

encontram no campo e não mais nas cidades.

As ONGs surgiram no Brasil nos anos de 1970, num contexto marcado

pelo regime militar e apresentavam como principal característica a oposição ao

autoritarismo. Eram organizações que tinham total independência em relação

ao Estado e consequentemente ao poder político possuíam estreita vinculação

aos novos movimentos sociais emergentes, como os da mulher, os de direitos

humanos, ecologia, associações de bairro etc.

Porém, com o processo de democratização política na década de 1980,

não só no Brasil, mas em quase todos os países da América Latina, “muda-se

o contexto político econômico e também as instituições e a visão sobre elas”.

Page 78: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

77

Começa a confundir-se e desvanecer-se aquela percepção de um ‘Terceiro Setor’ formado por dois blocos preponderantes de instituições: um histórico tradicional e conservador ,integrado pelas instituições de caridade e beneficência, voltadas para o serviço social e, outro, as novas ONGs, guiadas por uma lógica política alternativa, opositora, moderna ,e voltada para o desenvolvimento social sustentável. É nesta fase que começa a se falar do ‘Terceiro Setor’. Além do mercado e do Estado formado por organizações dos dois blocos, ganha peso uma percepção funcional em lugar de uma percepção político - ideológica (Tompson,1999,p.44 citado por Kameyama,2001,p.26).

O aumento do desemprego, em decorrência da demissão de milhares de

trabalhadores; a flexibilização das relações de trabalho, a transformação da

relação salarial; a perda dos direitos trabalhistas são algumas dentre as muitas

conseqüências que emergem em decorrência da expansão do capitalismo.

O país avança, assim, rumo ao final do século num movimento nada

linear. “Conhece uma Constituição “cidadã”, voltará a eleger seus presidentes,

normalizará a vida democrática, domará o monstro da inflação, tomará

consciência da questão do Estado e da gestão pública, mergulhará na

globalização” (NOGUEIRA, 2004, p.24) No entanto, continuará a conviver com

índices alarmantes de pobreza e exclusão social.

É essa a herança que será deixada para os anos 90 que se constituíram

num verdadeiro desafio para os governos.

Maria da Glória GOHN (1997, p.9), refere-se ao Brasil dos anos 90

como,

Uma sociedade com características singulares, diferentes da dos anos 80, que tem criado novos espaços de interlocução e de relações sociais entre o Estado e o mercado, com reflexos positivos na cultura política do país ao colocar a questão da solidariedade como o grande eixo articulatório das ações sociais.

É o momento em que se pode constatar uma nítida desqualificação da

esfera pública universalizadora, quando se convive com a desqualificação do

Estado. Desenvolve-se, segundo Neto (1996, p.100), “uma cultura anti-Estado”.

Disso decorrem dois fenômenos:

Page 79: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

78

1) a transferência, para a sociedade civil, de responsabilidades que

antes competiam à ação estatal;

2) a minimização de lutas democráticas dirigidas a afetar as

instituições estatais.

Pode-se enfatizar que os anos 90, na conjuntura brasileira, são

marcados pela desregulamentação do papel do Estado na economia e na

sociedade como um todo, transferindo responsabilidades do Estado para as

comunidades organizadas, com a intermediação das ONGs, e para o mercado.

Neste cenário marcado pela escalada da miséria, pelo crescimento da

pobreza, das desigualdades sociais e, consequentemente, pela violência que é

reforçada a consciência da ineficácia e da insuficiência do Estado face à

questão social.

O Estado, na sua escalada rumo ao neoliberalismo, vai

desresponsabilizando-se, cada vez mais, das suas atribuições deixando de dar

respostas às demandas e aos anseios da sociedade. A ênfase é na

minimização do Estado e das suas políticas sociais. É transferida para a

sociedade civil a responsabilidade de, em nome da solidariedade, conferir aos

excluídos sociais melhores condições de vida.

Para Fernandes (1994, p.128), a grande força do terceiro setor estaria

ancorada nos valores morais da solidariedade e voluntariedade, sendo agentes

desses segmentos: formas tradicionais de ajuda mútua, movimentos sociais e

associações civis, ONGs e filantropia empresarial.

As leituras que temos feito nos levam a afirmar que as formulações

sobre o terceiro setor ainda são muito nebulosas e polêmicas. Passa-se a

desenvolver a busca de respostas fora do espaço público, da política ou do

espaço privado do mercado. .

É uma conjuntura em que predomina a instabilidade política e social,

constituindo-se em verdadeira ameaça para a sociedade e, consequentemente,

para o mundo dos negócios que vive em função do lucro.

Page 80: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

79

É nesse terreno que a responsabilidade social das empresas toma forma

e ganha espaço. As empresas passam a investir em áreas sociais,

tradicionalmente ocupadas somente pelo Estado.

Essa “nova postura” das empresas corresponde ao que alguns

estudiosos denominam de “novas configurações do social” que trazem à cena e

dão visibilidade a temas como responsabilidade social, cidadania empresarial,

comportamento cívico das empresas, entre outras denominações. São temas

que chamam a atenção e publicizam a atuação das empresas no âmbito social

e que são decorrentes, dentre outras razões, das propostas neoliberais que

têm como uma das suas características o retraimento do estado em relação às

políticas sociais.

Para Falconer, (1999, p.10),

Não se trata exclusivamente de filantropia, no sentido de caridade desinteressada, mas de enlightened self-interest ou investimento estratégico: um comportamento de aparência altruísta, como a doação a uma organização sem fins lucrativos, que atende também a interesses mesmo indiretos da empresa, como a contribuição à formação de uma imagem institucional positiva ou o fortalecimento de mercados consumidores futuros. Na defesa de seu próprio interesse de longo prazo, as empresas adotam a prática de apoiar atividades como projetos de proteção ambiental, promoção social no campo da educação, saúde dentre outros.

Para se ter uma idéia da dimensão que a responsabilidade social vem

assumindo basta ver os resultados do estudo realizado na Região Sudeste do

país onde foi constatado que 300 mil empresas, dos mais variados portes,

desenvolvem algum tipo de ação social (KAMEYAMA, 2001, p.31).

Assim o que se pode concluir é que são muitas as discussões em

relação à questão da responsabilidade social, à filantropia empresarial, ao

ativismo social, não importa a nomenclatura, pois, o que se está discutindo é a

“combinação entre interesses privados e virtudes públicas”. Acreditamos que

todas essas discussões sejam válidas face às complicadas circunstâncias que

conformam esse final de milênio, mas, como alerta Kameyama, “não penetram

no âmago da questão central que é a hegemonia”.

Page 81: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

80

Não compete às empresas elaborar ou implementar políticas sociais,

mas sim ao Estado. Acreditamos que o Estado ainda se constitua no trânsito

para a plena assunção da cidadania, mas para que isso se concretize torna-se

necessário que este reassuma suas funções, voltando-se para a construção de

um novo projeto de sociedade. Mas, isso só vai se dar a partir da organização

e mobilização da sociedade civil que, não resta dúvida, tem se movimentado,

mas que ainda não é suficiente diante dos impactos sociais advindos da

reestruturação do capitalismo.

Para Nogueira (2004, p.34)

Não pode haver Estado democrático que se afirme sem cidadania ativa e sociedade participante, mas a ausência de Estado reduz o social a mero mundo de interesses, a território de caça do mercado. O social que perde a conexão com um Estado ou o reduz à subalternidade expressa apenas um mercado desvinculado de qualquer idéia republicana, ou seja, é um espaço de interesses autonomizados, mas não de direitos.

Para Francisco de Oliveira,

Há mil formas de novas parcerias entre Estado e Sociedade civil que podem ajudar na reforma do Estado, mesmo na sua redução numérica - número de funcionários, por exemplo - sem que isso signifique sua redução social e universalizante’ (1995, p.18).

Certamente, não compete às comunidades a responsabilidade da

redefinição do Estado, haja vista que nem todas as comunidades têm recursos

para atenuar as desigualdades sociais que se constituem em verdadeiros

abismos face à onda neoliberal, cuja tônica é o desmonte dos direitos sociais

conquistados ao longo dos anos e que, por algum motivo, impedem a

acumulação de capital. Por outro lado, compete à sociedade organizada a

fiscalização da coisa pública, seja através dos sindicatos, dos conselhos ou de

outras organizações da sociedade civil o que certamente vai contribuir para a

redefinição do Estado.

A participação da sociedade é fundamental para que o Estado “transite

de uma noção de carências sociais para o terreno dos direitos sociais”

(OLIVEIRA, p.1995).

Page 82: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

81

Nesse sentido, completa Gohn (2005, p. 30), “O Estado é sempre elemento referencial definidor porque é na esfera pública estatal que se asseguram os direitos, da promulgação à garantia do acesso, e as sanções cabíveis pelo descumprimento dos direitos já normalizados e institucionalizados”.

3.3 Responsabilidade social empresarial no Brasil

A partir da industrialização, a classe operária já começa a vivenciar um

processo de degradação das suas condições de vida. No período pós-

industrialização, a situação piora e, com a globalização, atinge o ápice. A

miséria, a fome, a falta de habitação, as condições precárias de trabalho, de

higiene, são fatores, dentre muitos outros, que levaram a sociedade a se

mobilizar, pressionando o governo e as empresas a buscarem soluções para a

situação.

O discurso em voga era o de que a “ação social responsável não é

assunto exclusivo do Estado, mas tarefa de todos”. Assim, o que se propagava

era a necessidade de que fossem adotadas “novas atitudes” para enfrentar os

problemas decorrentes do acirramento da questão social.

Conforme Iamamoto (1988, p.137), a preocupação do empresariado com

o social é um fenômeno que aparece a partir da desagregação do Estado Novo

e no final da Segunda Guerra Mundial. Período que corresponde ao

aprofundamento do capitalismo, marcado pelo populismo e pelo

desenvolvimentismo, quando a repressão, por si só, já não é eficaz, trazendo à

tona a necessidade do consenso que se sobrepõe, à época, à simples coerção.

Vale ressaltar que o comportamento dos empresários em relação à questão

social será essencialmente imobilista.

A autora destaca, entre os vários elementos que compõem a prática

social do empresariado, dois aspectos que, segundo ela, estão diretamente

relacionados à implantação e desenvolvimento do Serviço Social. O primeiro,

refere-se à crítica do empresariado à inexistência de mecanismos de

socialização do proletariado. A animalidade que caracterizava o homem

comum, recrutado e recém integrado ao trabalho industrial e que só encontrava

como barreira a disciplina do trabalho. Esse homem, ao desligar-se do

Page 83: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

82

trabalho, fica perigosamente exposto aos vícios e aos baixos instintos, assim, é

preciso eliminar o desnível entre a disciplina da fábrica e a liberdade existente

no meio operário entregue à sua própria sorte. É preciso que a sociedade atue

como extensão da fábrica. A advertência do empresariado ao governo é na

direção de alertá-lo para o fato de que ao permitir o aumento do tempo livre do

operário, estará atentando contra a base de sua própria dominação. 35

Necessário se faz um disciplinamento do tempo livre conquistado pelo

proletariado contra o capital. É preciso que o operário possa cultuar o seu lar, o

que significa elevar o proletariado a um padrão ético-moral, a uma

racionalidade de comportamento ajustada à interiorização da ordem capitalista

(Cf. IAMAMOTO, 1988, p. 40).

O segundo aspecto, apontado por Iamamoto, diz respeito ao conteúdo

da política assistencialista desenvolvida pelo empresariado no âmbito da

empresa: o não reconhecimento das organizações sindicais e a não aceitação

do operariado como capaz de participar das decisões que lhe dizem respeito,

ou seja, a prática normal de usar a repressão como forma mais eficaz de apoio

aos mecanismos econômicos de dominação. É esse o comportamento mais

evidente dos empresários na Primeira República.

A partir do primeiro pós-guerra, verifica-se a existência de uma política

assistencialista, impulsionada pelos movimentos sociais. A ganância do capital

em extrair cada vez mais lucro do valor da mercadoria força de trabalho não se

choca com a implantação de mecanismos assistenciais nas empresas (as vilas

operárias, ambulatórios, creches, escolas; não descontar o tempo das

operárias amamentarem seus filhos etc., são entre outros equipamentos

cedidos pelos empresários de forma gratuita ou a preços reduzidos). Assim,

vale ressaltar que a maioria das empresas de maior porte propiciava aos seus

empregados uma série de serviços assistenciais. Entretanto, vale destacar

também que tais benefícios eram condicionados ao bom comportamento diante

das greves e a uma vida pessoal regrada.

35 Os empresários estão se referindo à imposição pela Lei de férias remuneradas e à limitação da jornada de trabalho dos operários menores que além do problema econômico, representava também um perigo para a sociedade para a própria classe operária (Cf. IAMAMOTO, 1988:140).

Page 84: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

83

O importante é ter presente que tais benefícios, apesar de aparecerem

sob uma aura paternalista e benemerente buscam realizar o controle social e

aumentar a produtividade e a exploração. “Diferem do assistencialismo

realizado pelas elites tradicionais da Primeira República, cujas atitudes de

benemerência consistiam na busca da salvação “pela porta estreita da

caridade, representa assim, um” custo derivado da sua posição social”. 36

No atual contexto econômico e político do país

[...], o conjunto destas distinções e conceitos tem permitido uma reflexão que permite conectar, concretamente, as políticas de desregulamentação ao empobrecimento do campo político anteriormente prometido pela ampliação da participação popular, bem como ao aprofundamento das desigualdades sociais correlacionadas à negligência e subalternidade a que foram relegadas as políticas públicas, especialmente as que representam vias de acesso fundamentais à sobrevivência das populações pobres do país, as quais, é bom lembrar, corporificam direitos e garantias constitucionais no campo social (Paoli, 2005,p.377).

É importante ressaltar que na Constituição de 1988 as reivindicações

feitas anteriormente, pela população, ganharam foro de direito. O direito ao

trabalho, o direito à auto-organização (os assalariados já haviam conquistado

esse direito ao criarem as centrais sindicais, proibidas legalmente até então), o

direito à saúde, o direito à educação, o direito da criança e do adolescente, o

direito a terra, [...] o direito a uma velhice digna e respeitada. 37

36 Para o empresariado se tratar-se-á de “construir e não de distribuir”.Sua benemerência está subordinada a uma racionalidade empresarial em que não entra nenhum sentido de redistribuição. A semelhança entre essas duas formas estará principalmente na aparência benemerente, em procurar aliviar as tensões sociais e em melhorar as condições em que a acumulação se desenvolve (P.142). 37Paulo E. ARANTES (2000, p. 17), faz apontamentos interessantes sobre a “torção semântica” que está ocorrendo na realidade, onde, segundo ele, “qualquer coisa quer dizer qualquer coisa,” significado” perdeu o significado.”Neste mundo das coisas trocadas e com significados intercambiáveis a ponto de não dizerem mais nada salvo o seu contrário (...). Neste sentido, escreve o autor: “direito tornou-se privilégio, destruição social, virou sinônimo progressista de “reforma”, previdência social, um mal entendido num país de imprevidentes crônicos; sindicalismo, crispação corporativista; cidadania, mera participação numa comunidade qualquer; “solidariedade”, filantropia, é claro; bem público, interesses agregados de grupos sociais; desempregado, indivíduo de baixa empregabilidade; “parceria”, sempre que a iniciativa privada entra com a iniciativa e o poder público com os fundos.Isto, na concepção de ARANTES, constitui-se em “espantoso deslizamento semântico” (...) os contendores estão empregando as mesmas palavras.

Page 85: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

84

Enfim, na concepção de Francisco de Oliveira, (1999, p. 65). “Todas as

reivindicações que significam política como o processo mediante o qual se põe

em xeque a repartição da riqueza apenas entre os que são proprietários,

ganhou uma forma, talvez a mais acabada que as condições históricas

permitiam”.

Qualquer referência à Responsabilidade Social Empresarial remete, por

certo, às noções de cidadania e de direito. Na concepção de Paoli (2005,

p.376), desde a década de 1980, o conceito de cidadania ocupa um dos

centros do pensamento social e político brasileiro. O que pode ser imputado

aos elevados níveis de exclusão social e política do país que, por sua vez,

podem levar à ampliação ou à anulação da consciência e prática de direitos de

cidadania para uma sociedade.

Para a referida autora, a relevância dada a tal conceito ,na década de

1980, configura-se como uma redescoberta e vincula-se à dupla transformação

pela qual passa o país que, de um lado, passou a pautar um primeiro desafio

histórico, a passagem das formas recorrentemente autoritárias de governo para

uma democracia ampliada. De outro, a tragédia do processo neoliberal em

curso que visa à desregulamentação público-estatal da economia de mercado,

cujo funcionamento aprofunda e sedimenta os mecanismos de exclusão social

e política presentes na história da modernização do país.

Como categoria crítica aplicada aos impasses destas duas e contraditórias passagens, a construção intelectual brasileira do que se entende por cidadania tem ido além de seu aspecto teórico normativo voltado para a avaliação dos procedimentos da democracia e da justiça social.[...] Ao mesmo tempo, a produção crítica centrada na noção de cidadania tornou-se traduzível na experiência social, especialmente a das grandes cidades, nas quais se tornavam visíveis o extravasamento dos níveis “normais” de violência, do abandono, da expropriação, do desemprego, da miséria (2005,p. 376).

Neste contexto, conforme Paoli, a palavra cidadania emerge como

alternativa de segurança e ordem que já não são garantidas pelos modos

autoritários e policiais de agir e de pensar e isso suscitou, na opinião pública,

um chamamento à responsabilidade que só secundariamente foi dirigida ao

governo. No entanto,

Page 86: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

85

[...] esta demanda foi capturada através do apelo ao ativismo social voluntário da população, e a palavra “solidariedade” tornou-se, no senso comum, a disposição altruísta voluntária de um indivíduo, uma organização ou uma empresa, um quase sinônimo de cidadania. (PAOLI, 2005, p.377).

Mas, o avanço não durou muito. Com a eleição de Color de Mello à

presidência da República, em 1989 houve um retrocesso significativo em

relação ao que havia sido conquistado até então, o que veio a culminar na

destruição das organizações populares. Collor foi eleito com a confiança das

classes dominadas e do sistema como um todo que lhe conferiram o poder de

governar o país e que, logo depois, foram surpreendidos com um seqüestro

dos ativos financeiros sem precedentes na história do Brasil.

Assim, o que se pode dizer é que o processo de desmonte e destruição

do Estado que conformou o governo Collor teve prosseguimento no governo

Fernando Henrique Cardoso, que acreditava no papel do Estado subsidiando a

formação de capital e que investiu na constituição de nova rede de relações

industriais que terminou por converter a referida dívida, em dívida interna

pública, “esgotando assim o papel de” condotiere “do Estado na expansão

capitalista”.

A crise interna do Estado colocou os holofotes sobre a despesa pública e converteu as despesas sociais públicas, no bode expiatório da falência do Estado “condotiere” quando na verdade isso se deveu à divida interna pública e ao serviço da dívida externa da simultaneidade das duas crises, com a incapacidade clássica das burguesias em abrirem-se para a política, o que significa dizer que a resolução de seus impasses não conseguia ser arbitrada, abriu o passo a que a solução burguesa viesse , uma vez mais, de fora para dentro, agora na forma de globalização .Dito de outro modo, a solução da inflação, que nada é mais que o conflito distributivo pela mais valia, foi resolvida pela abertura comercial, isto e, pela competição internacional que abocanhava partes crescentes da mais-valia produzida internamente (OLIVEIRA,1999,p.67).

Esse processo, seguindo a linha de raciocínio de Oliveira, levou a uma

subjetivação perigosa por parte da burguesia, que é o que se chama de

privatização não só das empresas, que é a sua forma mais aparente, mas

privatização do público, o que, na concepção do referido autor, significa uma

“falsa consciência da desnecessidade do público”.

Page 87: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

86

Nessa perspectiva, a privatização se objetiva pela chamada falência do

Estado, onde a forma aparente é a de que as burguesias emprestam ao

Estado, o que faz com que se acredite que o Estado só se sustenta como uma

extensão do privado. Muito embora, além das aparências, a realidade seja

inversa, ou seja, a riqueza pública, em forma de fundo, sustenta a

reprodutibilidade do valor da riqueza, do capital privado.

A falência ou crise do Estado e o conseqüente surgimento da idéia de

Estado mínimo põem em cheque a competência do Estado e traz à cena a

desqualificação da imagem dos funcionários públicos que, aliás, são

desqualificados, como tudo que é público. São taxados de acomodados na sua

mediocridade, de terem privilégios por terem a garantia de emprego, etc. É

essa a imagem que foi sendo construída e que foi sedimentando a idéia de

“desnecessidade do público”, como se refere Oliveira. É essa a imagem que vai

corroborar para o surgimento e crescimento da responsabilização privada pelo

social, que encontra na lacuna aberta pelo desmantelamento do Estado terreno

fértil para sua expansão. 38

Não se pode perder de vista, como enfatiza Netto (1996, p.98), que o

momento atual é marcado por uma “nítida desqualificação da esfera pública

universalizadora”. O cenário hoje é conformado pelo desenvolvimento de “uma

cultura política anti-Estado”. 39 O que culmina, entre outras coisas, na

transferência, para a sociedade civil, de atribuições que antes eram do Estado,

num crescente processo de privatização que relega as organizações sociais,

movimentos e cidadãos a um papel marginal. É todo um movimento de

despolitização das demandas democráticas, ou seja, das questões públicas

38 A Reforma do Estado é vista freqüentemente como um processo de redução do tamanho do Estado, envolvendo a delimitação de sua abrangência institucional e a redefinição de seu papel (p.21). É importante conhecer as alegações presentes nos documentos do MARE e no discurso do então ministro Bresser Pereira quanto à necessidade de que o Estado fosse reformado: “O Estado cresceu em termos de pessoal, e principalmente, em termos de receita e despesa [...].Aos poucos foi se reconhecendo que o Estado não deve executar diretamente uma série de tarefas. Que reformar o Estado significa, antes de mais nada, definir o seu papel, deixando para o setor privado e para o setor público não-estatal as atividades que não lhe são específicas(p.22). Cadernos MARE da Reforma do Estado;volume II.. 39 Nesta mesma direção, Oliveira (1999, p.74) afirma que [...] a desmoralização dos trabalhadores, de funcionários públicos, a desmoralização da própria função pública, o apontar tudo que é público como inimigo de cada indivíduo tem uma carga simbólica mortífera que ampliou extraordinariamente a tragédia que já ocorria.

Page 88: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

87

para o mercado ou para o “terceiro setor”. E o mais importante é que, nessa

“parceria”, “o Estado continuará a financiar as atividades públicas, absorvidas

pela organização social qualificada para tal”.

Francisco de Oliveira (1999, p.67) define tal processo como “a

privatização do público e a publicização do privado”. Na sua concepção é essa

conformação que abre o flanco para o ativismo social voluntário do setor

privado e das ONGs, que podem ser consideradas os “novos atores” da

década de 1990, numa adaptação do termo usado por Eder Sader ao se referir

à emersão dos movimentos sociais na década de 1980.

Dados do IBGE apontam que o número de entidades que formam o

terceiro setor no Brasil (fundações ou associações privadas sem fins lucrativos)

mais do que dobrou entre 1996 e 2002. Em 1996, havia no Brasil 107 mil

fundações privadas ou associações sem fins lucrativos. Em 2002, esse número

chegou a 276 mil, o que significa um aumento de 157% (Cf. Folha de São

Paulo, C.3, 11 de dezembro de 2004).

No ano de 2007, o que se viu na mídia foram denúncias em relação à

idoneidade das ONGs e aos recursos que o governo tem repassado para as

mesmas. Afirma-se, inclusive, que as instituições privadas sem fins lucrativos,

receberam nos últimos seis anos (2001-2006) R$ 12,4 bilhões do governo

federal. Recursos que superam o total dos investimentos dos ministérios da

Educação e da Saúde de 2001 a 2006. A Educação investiu R$ 3,3 bilhões e a

Saúde, R$ 7,4 bilhões. Situação com certeza preocupante. Muitas entidades

supostamente criadas pela sociedade civil dependem exclusivamente das

verbas públicas e, o que é pior, nem todas são honestas em seus propósitos e

na aplicação de recursos. 40

Como afirma Paoli (2005, p.377).

Cidadania e solidariedade são demandadas exatamente no momento em que os governos dos anos 90 eram impelidos, pelo modelo econômico adotado, a livrar-se do investimento em obrigações públicas de proteção e garantia eficazes dos direitos sociais.

40 Cf. Revista Isto É, n.1958 de 9/5/2007, p. 34-35.

Page 89: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

88

Foi neste contexto em que as elites convencidas da “desnecessidade do

público” armaram-se da ilusão de serem politicamente auto-suficientes. As

classes médias agarraram-se às idéias de estabilidade monetária e do

individualismo meritocrático, em que as políticas redistributivas no país

mostravam-se ineficazes, e que proporcionaram as condições que levaram ao

entendimento da importância do surgimento relativamente recente da

sociedade civil. Inicialmente através de movimentos sociais autônomos e

politizados e, posteriormente, através das organizações não-governamentais

profissionalizadas. Deslocando, assim, a luta em prol da cidadania e justiça

social para o ativismo social pautado na solidariedade social. Neste sentido,

explicita Paoli,

Se o caminho aberto pelos movimentos e pela população carente organizada por bens públicos, o caminho das ONGs opta por representar as demandas populares em negociações pragmáticas, tecnicamente formuladas, com os governos, dispensando a base ampliada da participação popular.Desse modo, diferentes práticas de responsabilização e compromisso desenham um conflito potencial que diferencia internamente as múltiplas organizações que constituem a emergência daquilo que se entende por sociedade civil no Brasil, e que tende a se tornar critérios cada vez mais presentes no debate sobre seu sentido (2005,p.378).

3.4 Breve mapeamento da responsabilidade social no Brasil

Como afirmamos anteriormente, apesar das controvérsias, é preciso

considerar que a responsabilidade social no Brasil está crescendo41 tanto no

que se refere às empresas, quanto ao terceiro setor e ao poder público.

Presencia-se atualmente um movimento no sentido de que seja aprovada a Lei

de Responsabilidade Social na esfera federal, mas em alguns estados o

processo está mais adiantado. Os Estados do Rio Grande do Sul, Mato Grosso

e Amazonas tiveram suas Leis de Responsabilidade Social aprovadas.

O movimento por parte das empresas em relação à responsabilidade

social no Estado de Mato Grosso é incipiente, mas crescente. A Lei nº. 7.687, 41 Apenas para exemplificar, o Instituto ETHOS de responsabilidade social, em abril de 2006 ,com menos de sete anos de existência, comemorou o seu milésimo associado e isso é significativo. Um outro dado relevante é que atualmente, mais de 280 empresas brasileiras possuem o selo do IBASE (Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas) que é considerado o marco da aproximação dos empresários com as ações sociais.

Page 90: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

89

de 25 de junho de 2002, ”cria o Certificado de Responsabilidade Social no

Estado de Mato Grosso que será conferido anualmente às empresas, órgãos

públicos e demais entidades que apresentarem seu Balanço Social”. Para isto

foi criada uma comissão formada pela FIEMT, SESI, CRESS, SINCON,

FECOMÉRCIO, ABRH, AUDIPE, AMM e FAMATO à qual caberá a

responsabilidade de avaliar os balanços sociais publicados pelas empresas de

Mato Grosso e a concessão dos certificados.

Nas Instituições de Ensino Superior a responsabilidade social também

vem ganhando espaço. Como afirma Luís Carlos Merege, coordenador do

Núcleo da FGV-SP e dos cursos de administração para o terceiro setor, “as

universidades estão cada vez mais preocupadas em agregar disciplinas e

assuntos relacionados ao tema, tanto na graduação quanto na pós e nas

pesquisas”.

A preocupação das universidades vai além da formação de profissionais

para trabalhar com questões sociais, ela produz conhecimentos e metodologias

que podem ser repassadas aos outros setores. Nesse sentido, pode-se

destacar o núcleo de estudo e pesquisa da FIA/USP e o Centro de Estudos do

Terceiro Setor que têm se destacado e vêm produzindo conhecimento e

metodologias de trabalho, destacando-se no que se refere ao desenvolvimento

de ações sociais.

O Ministério de Educação a partir do entendimento de que a educação

“é uma prática social que pode dinamizar outros processos sociais,

oportunizando a construção de uma sociedade inclusiva e cidadã”, elegeu

como um dos princípios norteadores do Sistema Nacional de Avaliação do

Ensino Superior (SINAES)42 a responsabilidade social.

Para o SINAES, a responsabilidade social da instituição,

É considerada especialmente no que se refere à sua inclusão social, ao desenvolvimento econômico e social, à defesa do meio ambiente,

42 O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), instituído pela Lei nº 10.861, de 2004, é o novo instrumento de avaliação superior do Ministério da Educação e do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira- MEC/INEP.

Page 91: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

90

da memória cultural, da produção artística e do patrimônio cultural. Enfatiza ainda que a “qualidade acadêmica não pode ser considerada de forma dissociada da responsabilidade social da educação superior, não por se tratar de um atributo abstrato, mas de juízo valorativo construído socialmente, respeitadas a identidade e a diversidade institucionais”.

Não vamos nos deter em analisar aqui a concepção de responsabilidade

social do SINAES, a referência é o sentido de ilustrar como a responsabilidade

social no Brasil vem crescendo nos últimos anos e como está sendo

contemplada não só nos discursos, mas nas propostas da educação, saúde e

outras áreas. Pensamos, ao contrário do estudioso que acredita que a

responsabilidade social está em declínio, que esta está em alta e que deve ser

melhor estudada e analisada principalmente pelas controvérsias e polêmicas

que lhe são inerentes.

Um outro aspecto que consideramos pertinente ressaltar é a procura,

por parte de profissionais que têm outra formação e que atuam no terceiro

setor ou nos programas de responsabilidade social desenvolvidos pelas

empresas, por cursos da área social. O Serviço Social é um dos cursos

demandados por esses profissionais. Tal procura pode ser justificada pela

escassez de profissionais qualificados para trabalhar na área. ”De um lado, há

bons administradores de empresa que conhecem as ferramentas de gestão,

mas têm pouca ou nenhuma vivência em questões sociais. De outro, os

profissionais do terceiro setor, com larga experiência no trabalho com as

comunidades, mas com um déficit de visão corporativa” (Marcos Kisil: Carta

Capital: Ed. Especial de dezembro de 2003, p.20). Foi a preocupação em

formar profissionais qualificados para trabalhar com responsabilidade social

corporativa que levou à proliferação de cursos de curta e longa duração,

seminários, palestras e até de programas de pós-graduação na área da

responsabilidade social. 43

Não obstante, como alerta Gonzalez,

43 Ver tabela com instituições que oferecem cursos na área de responsabilidade social no Brasil e no exterior.Carta Capital, Edição Especial. Dezembro de 2003:21.

Page 92: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

91

O terceiro setor está sendo visto por muitos como negócio para ganhar dinheiro, por isso há muita propaganda enganosa, cursos de baixíssimo nível e em locais com pouca infra-estrutura (idem: 22).

Rosa Maria Fisher, coordenadora dos cursos oferecidos pela FIA/USP,

chama a atenção para a importância de que se saiba o real objetivo de quem

procura uma formação na área. Para Fischer é uma fantasia acreditar que o

terceiro setor seja a solução para o desemprego ou para as frustrações

profissionais, pois “o trabalho no terceiro setor é tão difícil, desgastante e

conflituoso quanto qualquer outro”.

Enfim, não restam dúvidas de que a atenção que se vem dando à

responsabilidade social é crescente tanto pelas empresas, que já têm toda uma

tradição nessa área, quanto no espaço público onde as iniciativas se alastram

a cada dia.

No ano de 2000, pesquisa realizada pelo IPEA com o título: “Iniciativa

Privada e o Espírito Público – Ação Social das Empresas Privadas no Brasil”

aponta que 59% das empresas com um ou mais empregados declararam

realizar algum tipo de ação social para a comunidade, ou seja, das 782 mil

empresas nacionais, 462 mil contribuem no campo social. (Carta capital n.

270,p.9). A reedição desta pesquisa sobre a ação social das empresas, em

julho de 2006, atualiza as informações do estudo anterior e traz dados

importantes relacionados à pesquisa realizada pelo referido órgão, em todas as

regiões do país.

No ano de 2004, nota-se que a participação empresarial na área social

aumentou 10 pontos percentuais, passando para 69% o número de empresas

que desenvolvem ações sociais, o que perfaz um total de, aproximadamente,

600 mil empresas que, voluntariamente, atuam em “prol das comunidades”. 44

Este é um dado ilustrativo do quanto a responsabilidade social vem se

ampliando no país, apesar das divergências que não são poucas.

No que se refere à distribuição das empresas que atuam na área social,

por região, tem-se o seguinte perfil: 50% encontram-se no Sudeste; 29% no 44 IPEA. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. A Iniciativa Privada e o Espírito Público: a evolução da ação social das empresas privadas no Brasil. Brasília, julho de 2006.

Page 93: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

92

Sul; 10% no Nordeste; 8% no Centro-Oeste e 3% na região Norte.Estes dados

trazem algumas mudanças em relação aos resultados do estudo de 2000.Por

exemplo: em 2000, 64% das empresas do Sudeste desenvolviam ações

sociais, em 2004 houve um retraimento desse percentual. Já a região Sul que

contava com 16% de empresas que atuavam na área social, chega a 2004 com

29% de empresas que desenvolvem ações nesta área. As outras regiões não

passaram por grandes alterações. De modo geral, o que se pode afirmar é que,

apesar das diferenças regionais, houve um crescimento generalizado na

participação social das empresas. 45

Analisando-se esses dados a partir dos Estados, tanto na edição da

pesquisa de 2000 quanto na de 2004, a liderança continua sendo do Estado de

Minas Gerais. Os Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, com 72% de

participação, tiveram 20 pontos de crescimento no período.

No entanto, é pertinente ressaltar que o investimento financeiro das

empresas com as ações sociais não acompanhou tal crescimento, ou seja, só

R$ 4,7 bilhões foram investidos em ações sociais no ano de 2004, o que

corresponde segundo estatísticas mais recentes, a 0,27% do PIB do Brasil. Em

2000, essa relação correspondia a 0,43% do PIB do país. À época acreditava-

se que a tendência era de que esse percentual viesse a crescer, no entanto, o

que se constatou no estudo realizado em 2004, é que houve uma queda no

investimento financeiro. O que pode ser decorrente, dentre outras razões, do

retraimento dos investimentos das empresas do sudeste que em 1998,

investiram 0,66% do PIB e, em 2003, investiram 0,34%.

45 Conforme é apontado no levantamento realizado pelo IPEA, são as grandes empresas que se mantêm com maior taxa de participação em ações comunitárias em 2004(94%). Destaca-se, contudo, a expressiva participação das microempresas (de 1 a 10 empregados) 66% delas , ou 410 mil estabelecimentos deram algum tipo de contribuição para fora de seus muros.(A Iniciativa Privada e o Espírito Público: a evolução da ação social das empresas privadas no Brasil. Brasília, julho de 2006).

Page 94: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

93

Tabela 2 - Investimento social privado, por região: montante de recursos investidos* e comparação com o PIB, 2000 e 2004.

Recursos Investidos em 2004

Recursos Investidos em Relação ao PIB (%)

(em R$) 2000 2004

Nordeste 537 Milhões 0,2 0,22

Sudeste 3,3 Bilhões 0,66 0,34

Sul 562,7Milhões 0,19 0,19

Centro

Oeste

240,8 Milhões 0,16 0,18

Norte 93,8 Milhões 0,1 0,11

BRASIL 4,7 Bilhões 0,43 0,27

Fonte: IPEA/DISOC (2006)

Nota:* Em valores constantes de 2004. Deflacionado pelo INPC médio anual.

Um outro aspecto levantado na pesquisa realizada pelo IPEA, que

chama a atenção é o reduzido uso dos incentivos fiscais. A proporção de

empresários que utilizava os benefícios fiscais em 2000 era de apenas 6%; em

2004, esse percentual caiu para 2%, ou seja, somente 2% das empresas que

desenvolveram ações na área social fizeram uso dos incentivos fiscais.Sendo

que daquelas que se beneficiaram dos incentivos fiscais a proporção maior foi

das empresas com mais de 500 empregados.

Perguntados sobre o porquê da não utilização dos incentivos fiscais,

40% dos empresários alegaram que não recorreram aos incentivos fiscais

porque o valor era muito pequeno e que, portanto, não compensava seu uso;

16% não utilizaram porque as isenções permitidas não se adequavam às

atividades desenvolvidas, e 15% nem mesmo sabiam da existência de tais

benefícios.

Quanto aos motivos que levam os empresários a desenvolverem ações

sociais, verificou-se que os motivos humanitários mobilizam 76% dos

empresários a realizarem ações sociais. Tal índice é condizente com o discurso

dos empresários que buscam em todas as oportunidades ressaltar o lado

Page 95: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

94

humanitário da sua empresa. Já 22% são movidos por razões religiosas; o que

pode ser explicado pelo fato de que as religiões, historicamente,

desenvolveram ações humanitárias; 11% investem em ações sociais

objetivando aumentar a produtividade e melhorar a qualidade do trabalho; 25%,

das empresas buscam aumentar a satisfação dos empregados; 26% realizam

ações sociais, objetivando melhorar a imagem da empresa; 12% dos

empresários voltam suas ações para complementar a ação do governo; 17%

afirmaram que desenvolvem ações sociais para atender a solicitação de

amigos/políticos. O clientelismo, tão presente na nossa sociedade, ao que

parece, está presente também entre os motivos que levam os empresários a

realizarem ações sociais.

As ações desenvolvidas pelas empresas são diversificadas, destacando-

se a assistência social, que perfaz um total de 54% das ações; a alimentação e

abastecimento com 41% das ações.

A saúde, perfazendo um total de 17% das ações e a educação com

19%, não se constituíram em ações prioritárias. A cultura com 14% das ações,

o que pode ser considerado um percentual significativo se for levado em conta

os incentivos de que goza essa área. Também chama a atenção o percentual

de 13% das ações serem voltadas para segurança, o que talvez possa ser

imputado à crescente violência que vem conformando a realidade atual.

Em relação aos beneficiados das ações realizadas pelas empresas, as

crianças são alvo de 62% das ações, ou seja, constituem-se em uma parcela

da população que vem merecendo atenção maior por parte da sociedade.As

famílias, que perfazem um total de 42% dos beneficiados,também têm se

constituído em alvo de atenção nos últimos anos.O que nos desperta a atenção

é o fato de os portadores de doenças graves serem contemplados com,

apenas, 7% das ações.O que pode ser decorrente da relutância que as

empresas têm em apoiar projetos “mercadologicamente incorretos”, que

poderiam colocar em risco as suas marcas.

O estudo aponta, ainda, que na região Sul houve maior incremento em

relação à proporção de empresas atuantes, no período de 2000 a 2004,ou seja,

Page 96: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

95

houve um aumento de 21 pontos percentuais. As empresas localizadas no

Nordeste ficaram em segundo lugar, tendo um aumento de 19 pontos

percentuais, ultrapassando as empresas da região Sudeste (região onde está

localizada a maioria das empresas de grande porte) que tiveram um aumento

de 4 pontos percentuais. A região Norte apresentou uma expansão de 15;

pontos percentuais e, finalmente a região Centro – Oeste que teve um

crescimento de 11 pontos percentuais, no referido período, passando de 50%

para 61%.

Em relação à região Centro - Oeste, os resultados da pesquisa apontam

que 50% das empresas, com um ou mais empregados, declararam realizar

algum tipo de ação social para a comunidade em 2000. O investimento

realizado atingiu R$ 125 milhões, o que equivale a 2% do PIB regional daquele

ano.

Quanto às ações desenvolvidas destaca-se a assistência social, que

recebe atenção maior por parte dos empresários, com 62% , seguida da

alimentação com 33%.A educação é apoiada somente por 15% das empresas,

não se constituindo, portanto, em foco prioritário. O público alvo das ações

sociais na região Centro-Oeste são as crianças, contando com 74% das ações.

Um outro aspecto que demonstra ser a atuação social das empresas um

bom negócio é a proliferação de instituições mediadoras, situadas entre a

entrada de dinheiro voltada para finalidades filantrópicas e os seus

destinatários finais (os pobres) que têm aberto verdadeiros “nichos no

mercado”, e que vêm se configurando num setor importante para a realização

do lucro mercantil.

Há instituições que ensinam o empresário a doar, outras que lhe mostram como captar recursos e fazer parcerias, outras ainda a estruturar uma entidade específica para gerir o trabalho filantrópico, organizar esta entidade de modo que propicie uma ação social mais durável, desenvolver a administração financeira e contábil própria desse tipo de atividade, enfrentar o imposto de renda, pautar matérias jornalísticas, mudar de vocabulário e mentalidade, aprender a informar-se em seminários de discussão e até mesmo compatibilizar as exigências de produtividade da empresa diante de seus trabalhadores (“funcionários”, na linguagem corrente) através da adoção de programas filantrópicos. (PAOLI, 2005, p.396).

Page 97: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

96

Por outro lado, não deixa de ser curioso o fato de as empresas doadoras

de dinheiro para projetos sociais no Brasil, serem captadoras de recursos, ou

seja, não doam de seu bolso, mas, sim, através de alianças com outras

empresas ou com organismos internacionais, ou, em muitos casos, formando

redes de solidariedade.

Finalmente, os limites e possibilidades da filantropia empresarial, ou do

que se convencionou chamar de responsabilidade social só podem ser

conhecidos a partir da consideração do contexto em que se dá a redução do

Estado no que se refere às políticas públicas direcionadas para a promoção e

garantia dos direitos sociais e da conseqüente abertura do espaço às

organizações sociais privadas, o que leva parcela do empresariado a atuar de

forma ativa no campo social, conclamando seus pares à responsabilidade em

relação ao contexto onde operam seus negócios, ou seja, um cenário marcado

pelo aumento das desigualdades sociais e da pobreza no país. 46

Face à ineficiência burocrática do Estado e à politização dos conflitos

sociais é feito um apelo ao empresariado para que este assuma as ações

sociais. Tal fato que pode parecer inédito na história do país tem raízes mais

profundas e traz nuances da velha filantropia desenvolvida pelos empresários,e

que se apresenta, atualmente, como solidariedade. 47 Por outro lado, deve-se

46 Alguns números ilustram bem a imagem da desigualdade brasileira à época: um país que tem um PIB de 540 bilhões de dólares, ter 34,9% de sua população – 54,4 milhões de pessoas – alocadas na rubrica de pobres, ou seja, aqueles que conseguem comer, mas não vestir-se ou morar; e , 8,7% -13,6 milhões de pessoas na rubrica de indigentes, que não conseguem ter acesso nem às necessidades básicas é certamente um país desigual. Dados atuais do IBGE afirmam que houve uma queda recente da desigualdade no Brasil.Dados abrangidos pela PNAD referentes ao período 2001/2004, mostram que o grau de desigualdade de renda no Brasil declinou em 4%.A renda dos 20% mais pobres do país cresceu no período cerca de 5% ao ano, enquanto a dos 20% mais ricos diminuiu em 1%.Não obstante, a análise desenvolvida pelo IBGE é a de que apesar da queda recente, a desigualdade de renda brasileira permanece muito elevada , muito acima da observada em países com grau de desenvolvimento semelhante ao nosso. (IPEA- Nota Técnica. Brasília, 21 de julho de 2006). 47 Conforme Paoli (2005, p.386) No período conhecido como Primeira República (1899 – 1930), que abrigou o início e expansão das indústrias nacionais em um contexto no qual os empresários recusavam a regulação estatal do trabalho, as poucas e grandes fábricas realizavam serviços de assistência social aos seus trabalhadores na forma de creches, facilitação de moradia, como as vilas operárias, e alimentação. Essas iniciativas eram guiadas por um paternalismo autoritário e normativo explicito e baseado no padrão que Roberto Schwarz chamou de “favor”, a reciprocidade submissa e devedora dos trabalhadores pobres à benemerência de seus patrões. Durante a ditadura Vargas (1930-1945) estes serviços cresceram em número, com a ambição de ser uma ação alternativa a criação legal dos direitos mínimos do trabalhador. Poucas, mas famosas, fábricas orgulhavam-se de ter instalado

Page 98: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

97

considerar que essa filantropia desenvolvida pelos empresários se coaduna

com o lucro empresarial, ou seja, se adapta, e bem, aos preceitos neoliberais

que preconizam a iniciativa individual e privada contra a ineficiência do

Estado.48

Fala de Odeb Grajew, citada por Paoli (2005, p.393), é elucidativa:

Não tenho ilusões. A lógica empresarial é o lucro e não a solidariedade. Mas de repente há a percepção que o lucro depende de posturas mais éticas e solidárias. Esta é uma conquista da sociedade civil e as empresas estão tendo que se adaptar.

Sem dúvida, a atuação social das empresas tornou-se um “diferencial de

competitividade”. Pode-se presenciar, de modo recorrente, no discurso

empresarial a expressão “valor agregado à marca”, o que significa que a

filantropia empresarial é alavancada por outros motivos que não só a

benemerência.

O aumento crescente de iniciativas voltadas para a criação ou

implementação de programas de responsabilidade social nas empresas, que se

vem presenciando nas últimas décadas, representa empenho, para serem

reconhecidas como socialmente responsáveis.

Nesta direção as ações de responsabilidade social desenvolvidas pelas

empresas, ao que parece, são estratégias de sobrevivência face à voracidade

do mercado globalizado. Há que se pensar também que a necessidade de

legitimação perante a sociedade e a exigência de consumidores cada vez mais

conscientes se constituem em fatores que impulsionam tais iniciativas.

É neste espaço ocupacional marcado pela globalização e acirramento da

questão social, que as empresas são levadas a buscar diferentes estratégias

creches, ambulatórios médicos e dentários, refeitórios com cozinha dietética, escolas e campos de esportes, e moradias para as famílias de seus trabalhadores [ ]. É necessário, no entanto, precisar o sentido da volta, no tempo, da filantropia empresarial. Entre a antiga e nova filantropia houve o fordismo, e por esse ângulo o sentido da nova filantropia remonta ao conservadorismo arcaico na contemporaneidade. 48 Na concepção de Oliveira (1999, p.72), nesse processo, anulam-se as diferenças entre Estado e sociedade, entre Estado e Mercado e finalmente entre o governo e as empresas; mais freqüentemente, quem estava na empresa ontem, pode estar no Estado hoje e vice-versa.

Page 99: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

98

para permanecer no mercado. Nesse sentido, consideramos que as ações de

responsabilidade social fazem parte dessas estratégias, que por sua vez

também podem se constituir em espaços de atuação para os assistentes

sociais.

Page 100: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

99

4. CAPÍTULO IV – A ATUAÇÃO DO ASSISTENTE SOCIAL NAS AÇÕES DE RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS EM MATO GROSSO

“O espaço sempre há, mas o assistente social não é convidado a

participar” (P.1).

Buscamos, neste capítulo, analisar os depoimentos dos sujeitos

entrevistados: assistentes sociais e gestores, destacando as concepções de

responsabilidade social, as ações desenvolvidas e os motivos pelos quais

desenvolvem essas ações. É a partir desses parâmetros que iremos conhecer

aquilo que é atribuído ao assistente social nas ações de responsabilidade

social desenvolvidas pelas empresas no Estado de Mato Grosso.

4.1 Responsabilidade social empresarial: o entendimento dos sujeitos

Como já afirmamos no capítulo III, o próprio termo “responsabilidade

social” é carregado de ambigüidades sendo abrangente, impreciso e tendo

vários e heterogêneos significados. É um conceito em construção o que ficou

patente nos depoimentos que nos mostraram existir diferentes formas de

entendimento do que vem a ser a responsabilidade social empresarial. No

entanto, o que nos chamou a atenção foi a recorrência tanto implícita quanto

explícita à concepção de responsabilidade social empresarial adotada pelo

Instituto ETHOS de responsabilidade social.

Como define um dos entrevistados,

O conceito de responsabilidade social que nós, empresa, entendemos é o mesmo do ETHOS, que é uma forma de gestão, é como a empresa gerencia seus recursos com os seus diversos públicos que são os funcionários, os fornecedores, os clientes externos, a comunidade. Agora como eu praticamente entendo a responsabilidade social é quando a empresa, o 2º setor, investe uma parte do seu lucro na comunidade, no entorno onde está localizada, de forma que ela possa também cumprir o seu papel. (P1)

A responsabilidade social é também definida como uma opção pessoal.

Nessa perspectiva, as ações sociais desenvolvidas pela empresa partiriam de

Page 101: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

100

empresários individualmente engajados em proporcionar ajudas filantrópicas

que atendam às demandas que a comunidade apresenta, ou seja, a

responsabilidade social enquanto aspecto relacionado ao foro íntimo do

dirigente, ou à sua filosofia de vida. Nesse sentido, a história de vida do

empresário e a sua formação pessoal parecem contribuir para o seu

envolvimento com as ações sociais.

Responsabilidade social é algo que vem da própria diretoria. É uma forma como eles vêem os colaboradores. Então isso é natural, é uma questão de princípio do próprio conselho da empresa, isso flui naturalmente, não precisa ser forçado para ser implantado. (G.2)

Ele ajuda tantas pessoas na vida particular dele que não faz questão de mostrar na vida empresarial também. (....) É uma pessoa que tem essa mentalidade positiva, que não tem medo de investir no social. Ele nunca fala não para nenhum projeto. (P2)

Um outro aspecto apontado pelos entrevistados refere-se à preocupação

em desenvolver ações que extrapolem o âmbito interno da empresa e se

estendam ao seu entorno, à comunidade que lhe avizinha.

Aliás, a preocupação em realizar ações sociais nas proximidades da

sede da empresa parece não ser recente. Gomes (2005, p.58), se remete a

Barnaby Briggs que dá exemplo de uma empresa criada em 1769, chamada

Etruria, que já naquele ano construiu uma vila para operários com “condições

decentes de moradia”. Segundo o autor, esse fato seria precursor do que se

chama hoje de ação de responsabilidade social. No Brasil se nos remetermos

ao período do primeiro pós-guerra, como nos lembra Iamamoto (1988, p.137),

vamos nos deparar com as vilas operárias, com a criação de ambulatórios,

creches, situados nas proximidades das fábricas, que se constituíam tanto em

meio de controle social, já que sua concessão era condicionada ao bom

comportamento e a uma vida regulada, quanto serviam para aumentar a

produtividade, garantindo, assim, mais lucro para os empresários. Assim, a

preocupação em desenvolver ações sociais no entorno do negócio, além de

não se constituir em novidade, faz parte da racionalidade empresarial que é

voltada para garantir a produtividade da empresa e gerar lucro, mas que, sem

dúvidas, está sendo muito valorizada atualmente.

Page 102: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

101

Hoje a gente começa também a ver mais uma exigência da responsabilidade social que é a responsabilidade pela sociedade ao redor. O objetivo maior, inicial era somente com os colaboradores internos. Agora a gente está começando a ter uma visão maior que é a responsabilidade com o meio ambiente, com a comunidade. (G.2)

Responsabilidade Social Empresarial nada mais é do que a parte social, tanto interna quanto externa que a empresa desenvolve, seja para os beneficiários dela, como a assistência que ela dá aos usuários que são os empregados que são os colaboradores dela, quanto às atividades de cunho social que seriam a educação, o lazer, os incentivos voltados para o bem-estar dentro da empresa, a qualidade do trabalho. Então isso é focado na responsabilidade social empresarial. (P.2)

Ela [a empresa] tem que minimizar ao máximo os efeitos de sua planta na comunidade. (P.3)

Entendo a responsabilidade social empresarial com papéis bem definidos, o 1º setor, 2º setor e o 3º setor de forma que possam estar contribuindo, cada um de uma forma, ou, de outra, para melhorar o ambiente onde está inserido, para a transformação social do ambiente onde está inserido. (P1).

(...) Tem a ver com o local onde eu estou inserido, no nosso caso, estamos inseridos em todas as comunidades do Estado, então o que é que posso fazer para provocar uma melhoria na qualidade de vida das pessoas onde eu atuo. (G.1)

A responsabilidade social empresarial é considerada também um

requisito para a empresa estar no mercado.

É uma visão bem geral de uma gestão de todas as empresas diante da necessidade de estar no mercado atuando de modo transparente com a sociedade, com os clientes de modo geral. E, isso é postura também que a empresa tem adotado para desenvolver suas ações. Também tem ações sociais desenvolvidas pela empresa, por exemplo, essas ações que a empresa desenvolve para as comunidades circunvizinhas, para as pessoas que estão envolvidas no processo da empresa. (P.4)

Em meio à globalização da economia e aos problemas sociais daí

advindos a responsabilidade social empresarial é, certamente, um fator de

competitividade. Considerando que as “empresas socialmente ativas

promovem sua imagem junto aos consumidores, melhoram o relacionamento

com as comunidades vizinhas e percebem os ganhos de produtividade de seus

trabalhadores” (PELIANO, 2001, p.28).

Em outros depoimentos o entendimento do que é responsabilidade

social empresarial se resume a “dar apoio” ou, a “cuidar”.

Page 103: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

102

É uma coisa nova ainda. Para mim a responsabilidade social é parte da empresa, para saber que ela existe que automaticamente eu sou cliente dela, mas ela também é meu cliente. É uma via de mão dupla. Isso é que eu entendo. No nosso caso é o voluntariado junto com a responsabilidade social. (P.6)

A nossa responsabilidade social é estar dando apoio a alguém, a alguma entidade. A responsabilidade social aqui [na empresa] funciona dentro da área administrativa não na agência. No caso de Mato Grosso ela funciona aqui na gerência de RH, a gente administra, mas com o apoio de todas as agências se a gente vai fazer algum tipo de coleta, alguma doação de alimentos, tudo isso aí, a informação sai daqui, vai e volta para a gente estar administrando. A gente tem um Departamento de Ação Social em Brasília. A gente segue as metas que eles determinam para a gente. (G.6)

A responsabilidade social na empresa tem que ser vista assim como a gente tem responsabilidade com a nossa família, é cuidar. (P.3)

As assistentes sociais e os gestores das empresas pesquisadas, ao

definirem o que entendem por responsabilidade social empresarial se remetem

aos conceitos divulgados pelas entidades que vêm assessorando a

implantação e implementação das ações de responsabilidade social no país e

também no Estado de Mato Grosso. Nesse sentido o Instituto ETHOS de

Responsabilidade Social, o IBASE e o GIFE têm se destacado, sendo que no

Estado de Mato Grosso a presença maior é das duas primeiras. Em relação ao

IBASE a referência buscada é em relação à elaboração do Balanço Social.

Conforme é apontado por Melo Neto & Froes (2002, p.85), o exercício da

cidadania empresarial pressupõe uma atuação eficaz da empresa em duas

dimensões: a gestão da responsabilidade social interna e a gestão da

responsabilidade social externa, entendendo que a responsabilidade social

interna consiste em focalizar o público-interno da empresa, seus empregados e

seus dependentes. O seu objetivo é motivá-los para um desempenho ótimo,

criar um ambiente agradável de trabalho e contribuir para o seu bem-estar.

Com isso a empresa ganha a sua dedicação, empenho e lealdade. A

responsabilidade social externa tem como foco a comunidade mais próxima da

empresa ou o local onde ela está situada.

Atuando em ambas as dimensões, a empresa exerce a sua cidadania

empresarial e adquire o seu status de “empresa cidadã.” Entretanto, alertam os

autores, não é sempre que ocorre esse novo paradigma de cidadania

Page 104: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

103

empresarial e exercício pleno de responsabilidade social. Há casos de

empresas que são mais eficazes e atuantes em apenas uma das dimensões.

A maioria das empresas pesquisadas afirma desenvolver ações voltadas

tanto para o público interno quanto para o público externo. Só uma das

empresas parece priorizar as ações internas, mas admite a necessidade de

ampliar o alcance das ações. Um dos depoimentos aponta para uma distinção

entre responsabilidade social interna e externa, segundo o qual a

responsabilidade social empresarial é a externa, as ações internas são só de

responsabilidade social. Como afirmamos anteriormente, ainda é um termo em

construção, portanto, perpassado por ambigüidades e até equívocos.

Responsabilidade social empresarial (...) é só para o público externo. Responsabilidade social interna, que seria o incentivo ao esporte. Agora a externa que seria a empresarial é só para o público externo (G.6).

Quando os entrevistados descrevem as ações desenvolvidas pelas

empresas, a preocupação com os empregados se faz presente podendo-se

constatar que, em algumas, a preocupação maior é com os empregados, muito

embora apontem a necessidade de envolver a comunidade.

A referência ao meio ambiente e ao desenvolvimento sustentável

aparece de forma recorrente nos depoimentos, tanto das assistentes sociais

quanto dos gestores. O que é justificado, conforme os entrevistados, pela

necessidade de “reparar os danos decorrentes da atuação da empresa”, ou de

“minimizar, ao máximo, os efeitos da sua planta na comunidade”, ou ainda, de

“melhorar a qualidade de vida das pessoas nos locais em que a empresa atua”.

Não restam dúvidas de que a questão ambiental seja a tônica do

momento, 49 e como tal, não passou despercebida aos empresários que

49 Aliás, é pertinente não perder de vista que a preocupação com o meio ambiente não é recente, ela pode ser remetida à década de 1970, antecedendo, portanto, a preocupação das empresas em incluí-la com destaque nas suas ações de responsabilidade social. Isso pode ser demonstrado: 1970- 300.000 pessoas nos EUA participaram do “Dia da Terra”; 1971 - Programa Homem e a Biosfera, em Paris, cuja preocupação era conciliar o desenvolvimento com o meio ambiente; 1974 - Cientistas americanos divulgam uma pesquisa a respeito da destruição da camada de ozônio pelo CFC (cloro, flúor, carbono); 1980/1981 - Criação da Política Nacional do Meio

Page 105: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

104

propagam a necessidade de preservação do meio ambiente e a importância da

consciência ecológica. Acreditamos que houve, por parte dos empresários,

uma apropriação do discurso dos ambientalistas que têm se mobilizado no

mundo todo em defesa da preservação do meio ambiente e do

desenvolvimento sustentável. O que, por sua vez, também é preconizado pelo

Instituto ETHOS e por outras entidades que assessoram as empresas em

relação à responsabilidade social no país.

Também não se pode perder de vista a existência de Normas como a

ISO 14.000 e toda uma legislação que colocam a exigência de que as

empresas tenham uma relação de proteção e não de degradação da natureza.

Assim, as ações de responsabilidade social empresarial muitas vezes podem

evitar demandas judiciais futuras.

Por outro lado, as ações sociais voltadas para a preservação do meio

ambiente e para o desenvolvimento sustentável se constituem, para muitas

empresas, em mais um ingrediente de marketing, passam uma imagem de

preocupação social Como exemplifica Gomes (2005, p.56), “em linguagem

publicitária, fotos de uma paisagem bucólica, de um rio límpido e cristalino,

aliadas a frases de efeito como “compromisso com a natureza”, ou, “respeito ao

meio ambiente” são amplamente exploradas pela mídia”. Assim, pensamos que

não é sem interesse o fato de que as empresas estejam tão imbuídas em

desenvolver ações voltadas para a preservação do meio ambiente e

preconizem a tese do desenvolvimento sustentável.

Ambiente, no Brasil, que implementa e regulamenta o Estudo do Impacto Ambiental (EIA) e posterior publicação do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), através da Lei 6939/de 1979; 1985-criação de agências para regulamentação do tema meio-ambiente como o SISNAMA (Sistema Nacional de Meio Ambiente), CONAMA (Conselho Nacional de Meio Ambiente) e IBAMA (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais);1989 Documento da Assembléia Geral da ONU solicita um estudo para reverter os efeitos da degradação ambiental; 1992- Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (ECO-92), no Rio de Janeiro. Preparação da Agenda 21 que foi um plano de ação para controlar a degradação ambiental; 1996 - Adoção da ISSO 14.001 como Norma Internacional para o reconhecimento de empresas que implementem programas de gestão ambiental; 1999- A ONU lança o Compacto Global que é um apelo aos “dirigentes do mundo dos negócios” para que eles se empenhem nas questões relacionadas aos direitos humanos, trabalhistas e questões ambientais. É o prenuncio da Responsabilidade Social Empresarial com a legitimidade das Nações Unidas. (CF.Gomes, 2005, p.55)

Page 106: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

105

Como afirma Kameyama (2001, p.27), muito embora as empresas

historicamente e esporadicamente já desenvolvessem ou colaborassem com o

desenvolvimento de ações sociais, só a partir dos anos de 1990 é que essas

ações passaram a ser incorporadas à sua gestão. Para Kameyama, não se

pode conceber que as empresas continuem a ter a postura que tinham até os

anos de 1990, quando a preocupação maior consistia em oferecer produtos e

serviços aos seus clientes, ou a empreender ações sociais na comunidade,

sem incluí-las na sua estratégia empresarial. Atualmente, a responsabilidade

social se incorpora à gestão e abrange toda a cadeia de relacionamentos.

Como é enfatizado no depoimento de um dos gestores: “As empresas queiram

ou não queiram têm que se enquadrar dentro de uma política socialmente

responsável”. (G.5)

Na perspectiva dos gestores parece explícito o que entendem e o que

realmente pretendem com a responsabilidade social empresarial. Para eles a

responsabilidade social está incorporada à gestão, faz parte do seu negócio e

abrange toda a cadeia de relacionamentos: funcionários, clientes,

fornecedores, governo, sociedade, meio ambiente, acionistas.

Para nós, tem a ver com a gestão do nosso negócio. É voltada para os cuidados específicos de todos os públicos que nós temos. (...) É uma empresa privada, mas que atua na área do serviço público, então ela tem que ter a preocupação com todos esses públicos com os quais atua. É uma preocupação especial com a questão ambiental. A nossa empresa é de energia elétrica e tem muito a ver com a questão ambiental. Responsabilidade social é estar preocupada com essa situação (eficientização de energia) que tem a ver com a gestão. (G.1)

É a forma como a empresa está gerindo os negócios em relação a todos os públicos. Como ela age com os fornecedores, com os funcionários, com o meio ambiente. É uma forma ética e transparente de gerir. Na verdade é a forma como a empresa está se relacionando com esses públicos. Não são somente os projetos sociais que a empresa tem. Está relacionado com as Metas do Milênio. Quando se fala de RS é tudo: é pagar os impostos, cumprir os contratos etc. Na verdade uma empresa para crescer tem que ser socialmente responsável. Tem que pensar nas pessoas, nos investimentos econômicos, nas questões políticas. Se ela for pensar só no econômico ela vai quebrar. Ela tem que aprender as várias legislações tanto nacionais como internacionais. É uma necessidade para continuar atuando. (G.4)

Na fala de um outro gestor, a concepção de responsabilidade social

aparece revestida por um discurso humanitário, marcado pela preocupação

Page 107: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

106

com os colaboradores, pelo compromisso com a comunidade e com o meio

ambiente, sem perder de vista que a postura assumida pela empresa repercute

no seu reconhecimento por parte da sociedade.

Eu vejo o seguinte, a gente tem um credo, nesse credo a nossa visão é com a energia que a gente transporta. Temos o comprometimento de ser uma empresa sustentável sob o ponto de vista social, econômico e ambiental, referencial de excelência e, em função disso tudo, ser reconhecida e valorizada pela sociedade. (G.3)

Este gestor parece ter uma forma diferente de gerir os negócios e de

entender a responsabilidade social. Para ele a grande dúvida é em relação às

intenções que levam a empresa a desenvolver ações de responsabilidade

social. Até que ponto, pergunta ele, a empresa na defesa dos seus interesses

está usando a comunidade?

4.2. O porquê das ações de responsabilidade social

As ações de responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas

pesquisadas são decorrentes de uma gama de razões que divergem em

termos do entendimento e do que é pretendido, em termos de resultado.

Por exemplo, duas das empresas pesquisadas vinculam os motivos

pelos quais foram levadas a desenvolver ações de responsabilidade social às

Metas do Milênio50.

(...) atribui essa possibilidade desde que foram criadas as Metas do Milênio. Então dentro disso é que está começando. Ainda estamos engatinhando. (G.6)

(...) das ações que a empresa tem estão relacionadas com as Metas do Milênio. (G.5, G.4).

O que nos leva a questionar até que ponto as ações desenvolvidas por

essas empresas contemplam aquilo que é preconizado pelas Metas do Milênio 50 Os Objetivos de desenvolvimento do Milênio (ODM) foram adotados em 2000 pelos governos de 189 países - incluindo o Brasil - como um compromisso para diminuir a desigualdade e melhorar o desenvolvimento humano no mundo. Ele prevê oito grandes objetivos, a serem cumpridos, em sua maioria, até 2015: erradicar a extrema pobreza e a fome; atingir o ensino básico universal; promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres; reduzir a mortalidade infantil; melhorar a saúde materna; combater o HIV/Aids, a malária e outras doenças; garantir a sustentabilidade ambiental e estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento.

Page 108: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

107

ou ainda, de que forma tais ações vão contribuir para o fim da desigualdade e

melhorar o desenvolvimento humano no mundo, conforme é preconizado pelas

Metas do Milênio. Não estamos querendo dizer que as ações sociais

desenvolvidas por essas empresas ou por outras quaisquer não tenham

importância. O que consideramos complicada é a forma como os discursos

globalizados servem para justificar ações muitas vezes pontuais, que

certamente vão ter pouca ou nenhuma ressonância em relação àquilo que é

definido como objetivo das “Metas do Milênio.” No nosso entendimento o que

está ocorrendo é a apropriação dos discursos globalizados sem que haja, de

fato, uma assimilação que leve à sua concretização, até porque, extrapolaria os

objetivos da empresa.

Em outra empresa as ações de responsabilidade social tiveram início a

partir de problemas concretos enfrentados por ela no desenvolvimento dos

seus negócios. As empresas, num país capitalista como é o nosso certamente

só vão desenvolver qualquer ação social a partir da operação custo-benefício.

Como nos alerta Gomes (2005) “as ações praticadas pelos empresários são de

caráter racional, elas são praticadas visando a um objetivo no futuro, são

embasadas no conceito da reflexividade”. Reflexividade, tal como é concebida

por Anthony Giddens (1991), é uma propriedade da ação humana. Pessoas ou

grupo de pessoas realizam determinadas ações para obter outras ações a

partir da primeira. Assim, não parece surpreender o fato de as ações sociais

desenvolvidas pelas empresas objetivarem um retorno, por fazer parte da

lógica empresarial que reafirmamos é sempre racional, é sempre voltada para

a otimização do negócio e para a garantia do lucro.

A preocupação com a questão ambiental faz parte do meu negócio 365 dias do ano. A questão da eficientização energética também tem a ver, porque não adianta pensar em vender energia. Eu tenho que pensar em vender energia e que o meu cliente tenha condições de pagar. Parte dos meus clientes são de baixa renda, aí eu tenho que buscar fazer com que eles possam me pagar para que eu possa continuar investindo. (G.1)

Um outro gestor apesar de ter clareza da lógica empresarial que

perpassa o seu negócio, questiona o fato de que as ações de responsabilidade

social desenvolvidas pela empresa sejam por interesse ou não. No entanto, é

Page 109: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

108

honesto em admitir que a empresa sempre sai ganhando quando realiza ações

sociais.

A gente tinha um problema de desligamento de linhas, porque os meninos quebravam os isoladores, desligavam as linhas e aí a gente perdia em confiabilidade no nosso sistema e tinha um grande risco das pessoas se acidentarem, aí começamos a desenvolver um projeto, com a gente atuando na área do entorno onde estava tendo o problema, sem atacar diretamente a questão da quebra dos isoladores. Aí que surgiu o Caratê com Energia. (...)

A gente tem uma dúvida. Essa é que é a grande dúvida minha mesmo. Se estou fazendo com segundas intenções, porque, a gente está resolvendo um problema da gente, evitando acidentes a terceiros, evitando que as linhas desliguem , que joguem lixo debaixo da linha. Ta reduzindo custo porque a gente não precisa mais limpar esse lixo, na verdade, a gente tem agora defensores da gente lá, porque eles não sujam mais a faixa de servidão, evitam os acidentes e nos defendem. É uma dúvida que eu tenho, se a gente não está usando as pessoas na sutileza das coisas. (...)

Eu tenho assim, que não é interesse, que a gente ta fazendo isso pelo próprio histórico nosso. A gente era muito tecnicista, ia lá limpava e acabou. A gente tem crescido como gente, os colaboradores, por isso eu acho que não é só interesse, mas sempre tem esse pontinho de interrogação aí. Mas a gente está ganhando algo em troca. Eu não sei se conceitualmente a gente está errado com relação a isso. (...)

Aí eu tenho essa dúvida enquanto gestor. Num primeiro instante eu confesso não sei se certo ou errado era dar algo sem estar recebendo nada em troca, que é mais ou menos a lógica do voluntariado. (G.3)

Em um outro trecho da entrevista, ao se referir a uma das ações sociais

desenvolvidas pela empresa, afirma que:

Esse é um projeto 100% puro, sem segundas intenções nossas ou que vai ter alguma contrapartida. (G.3)

Como já afirmamos anteriormente, os gestores parecem ter muita

clareza do que é e do que querem alcançar com as ações de responsabilidade

social empresarial, apesar de nem sempre recorrerem à mesma forma de

atuação.

Pesquisa realizada pelo IPEA no ano de 2000 (atualizada em 2004)

sobre a ação social das empresas privadas no Brasil, aponta, dentre outros

indicadores, os motivos que levam os empresários a desenvolver ações

Page 110: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

109

sociais. Conforme a pesquisa, os motivos humanitários mobilizam 76% dos

empresários a realizarem ações sociais. Já 22% são movidos por motivos

religiosos11% investem em ações sociais objetivando aumentar a

produtividade e melhorar a qualidade do trabalho; 25%, das empresas buscam

aumentar a satisfação dos empregados; 26% realizam ações sociais

objetivando melhorar a imagem da empresa; 12% dos empresários voltam suas

ações para complementar a ação do governo; 17% afirmaram que

desenvolvem ações sociais para atender a solicitação de amigos/políticos.51

Rosa Maria Fischer (2002) afirma que os es udos qualitativos realizados

ressaltam a grande diversidade de formas de atuação com as quais as

empresas buscam concretizar sua concepção de responsabilidade social, e

permitem identificar, também, dois tipos básicos: a empresa que concebe tais

ações como um investimento social, como um bem em si mesmo, gerador de

resultados para a comunidade ou a população-alvo e a empresa que concebe

tais ações como investimento negocial cujo retorno efetiva-se na imagem da

marca e no desempenho do produto. Ressalta a autora: esses tipos não se

opõem necessariamente. As dúvidas em relação ao fato de as ações

desenvolvidas estarem ou não permeadas por interesses do próprio negócio,

ao que parece,relacionam-se à concepção que se tem da responsabilidade

social empresarial pautada na ótica do voluntariado, cujo preceito básico é

fazer o bem sem receber nada em troca, sem outros interesses, senão o de

ajudar o próximo.

Assim, conforme afirmam Karkotli & Aragão (2004, p.16), manter-se num

mercado altamente competitivo e sem fronteiras, tem se constituído em desafio

para as empresas que têm que utilizar estratégias que levem em conta a

melhoria da qualidade de vida, a valorização do potencial humano, o equilíbrio

ecológico e a equidade social, ou seja, dentro das novas expectativas do que

51 Cf. pesquisa realizada pelo IPEA no ano de 2000 com o título: “Iniciativa Privada e o Espírito Público – Ação Social das Empresas Privadas no Brasil”. Em julho de 2006, foi lançado um novo documento do IPEA que dá continuidade aos estudos anteriores sobre a Ação Social das Empresas, mas, que procura “atualizar e aprofundar o conhecimento sobre o envolvimento do setor empresarial na área social”. Cf. A Iniciativa Privada e o Espírito Público: a evolução da ação social das empresas privadas no Brasil. Brasília, julho de 2006.

Page 111: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

110

seja uma empresa socialmente responsável as empresas tem que cumprir uma

nova agenda de responsabilidades.

Não obstante, torna-se pertinente lembrar que, mesmo com a vigilância

que a sociedade e os organismos públicos nacionais e internacionais vêm

exercendo, a lógica do mercado não mudou. O objetivo das empresas continua

a ser o lucro. Nesse sentido, a atuação responsável nem sempre é um ato

voluntário das empresas. Comportamentos socialmente responsáveis têm sido

balizados, em parte, pelos mecanismos de controle da sociedade civil, por

ações fiscalizadoras e, também pela imagem da empresa que – para o bem ou

para o mal - se projeta para os diferentes públicos.

A empresa tem que ser transparente ética e tem que atuar de forma socialmente responsável porque senão não vai se enquadrar nos padrões comerciais, internacionais e mundiais. Não tem como ser diferente. Mato Grosso, não tem tantas empresas grandes então a gente por mais que não quisesse agir de forma responsável, a gente recebe fiscalização direta, se não quiser fazer por bem, tem que fazer por mal. A empresa segue as normas de trabalho. (...) Quero deixar claro que mesmo que a empresa não quisesse teria que fazer, por questões das normas, da fiscalização, porque esse negócio da responsabilidade social e do desenvolvimento sustentável, isso aí é mundial e quem não se enquadrar não vai ter como vender seus produtos. (G.4)

Nós temos uma agência reguladora forte, que fiscaliza que acompanha que monitora. Avaliam tudo que nós fazemos, e, se não estiver de acordo nós somos notificados. Estamos sujeitos a multas. Existe toda uma evidência de tudo que é feito, inclusive na área de responsabilidade social. (G.1)

Os depoimentos refletem essa realidade, os gerentes entrevistados

parecem ter a convicção de que os novos tempos exigem que as empresas

tenham posturas que se coadunem com o movimento da realidade, e que

considerem também os interesses daqueles que consomem seus produtos.

Em nenhum dos depoimentos foi mencionado explicitamente que a

realização das ações de responsabilidade social tivesse como alvo melhorar a

imagem da empresa, ou o Marketing, apesar de serem reconhecidos pelos

sujeitos entrevistados, a visibilidade e os ganhos que a empresa obtém com o

desenvolvimento das ações sociais.

Page 112: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

111

Uma coisa que a empresa não faz é o marketing da responsabilidade social, isso ela não faz, nunca fez. Agora é que ela está começando a despertar para essa questão. (P.2)

A gente tem um monte de ações voluntárias que a gente nem divulga, não faz matéria, não faz nada porque é um principio nosso, uma regra de transito dos próprios voluntários, não estar explorando isso. (G.3)

Este ano estamos substituindo 3000 geladeiras. As geladeiras antigas além de terem um alto consumo de energia, são equipamentos antigos, a borracha da porta já não faz a vedação correta, isso aumenta o consumo. Então estamos trocando 3000 geladeiras antigas por geladeiras novas de baixo consumo. Elas chegam a representar 30% do consumo. Já substituímos pelo menos 2000 geladeiras em Mato Grosso. Então responsabilidade social é estar preocupado com essa situação que tem a ver com a gestão. (G.1)

Além da questão ambiental, a questão econômica, a geração de energia da sobra do bagaço da cana, principalmente em Mato Grosso, por questão da logística, porque fazer só açúcar e álcool não é viável. A geração de energia é que vai tornar a empresa viável. (...) A gente tem esse controle ambiental. As empresas queiram ou não queiram têm que se enquadrar dentro de uma política socialmente responsável. O mundo necessita disso, nessas comunidades a gente sente a alegria deles de ver o município progredindo. A usina está sendo responsável, ta gerando emprego, gerando renda. (G.4)

4.3 O marketing52

O marketing é definido por Joana Garcia (2004, p.46), como um

componente necessário da campanha pela responsabilidade social. É, assim,

uma das estratégias mais utilizadas para a sobrevivência das empresas em

ambientes competitivos e hierarquizadas. Afirma Garcia que diante de um

modo de produção altamente fragmentado e internacionalizado e de um

mercado consumidor globalizado, a finalidade do marketing passa a ser a de

construir e fortalecer as marcas não em torno de produtos, mas de uma

reputação. O marketing social constitui-se, justamente, não apenas em torno

da qualidade física dos produtos, mas do conjunto de valores éticos agregados

à marca (SIMÕES, 2007, p.425).

52 O berço do Marketing, segundo, Richers (2003), se encontra indiscutivelmente nos EUA e sua difusão pelo mundo foi relativamente lenta. Na Europa, o marketing só começou a ser aceito depois da Segunda Guerra e, no Brasil, a introdução do conceito de marketing deu-se em meados de 1954 com a organização dos primeiros cursos de administração da Escola de Administração da Fundação Getúlio Vargas. Para o referido autor, o marketing tem uma dupla finalidade, ou seja, a de detectar e de preencher oportunidades de mercado com um mínimo de recursos.

Page 113: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

112

Isleide Fontenelli no seu livro o Nome da Marca, faz uma análise do Mac

Donalds, afirma que quando uma empresa consegue construir e consolidar um

nome de marca no mercado pelo estabelecimento de um padrão, significa que,

de um lado, a marca oferece ao consumidor a garantia de repetição de uma

experiência, cada vez que ele a consome; por outro lado (...) ela permite ao

capitalista que a possui a possibilidade de expandi-la rapidamente,

acrescentando maior riqueza ao seu patrimônio (2002, p.88).

Assim, o marketing social tem por prioridade produzir a imagem

institucional de empresas socialmente responsáveis, mais do que benefícios

sociais concretos. Nesse sentido, não restam dúvidas quanto ao ganho que o

marketing traz para as empresas: além de fortalecer a sua marca e consagrar

um novo padrão de relacionamento entre os consumidores, o marketing social

humaniza a imagem da empresa.

É interessante lembrarmos daquilo que é conhecido como “cause –

related marketing”, que livremente traduzido, significa “Marketing de Causa

Social”, que é uma forma da empresa mostrar ao público consumidor que ela

tem compromisso com as “causas sociais”. Todos nós já ouvimos falar do “Dia

Feliz” realizado pelo Mac Donald’s que destina os recursos provenientes da

venda do seu sanduíche (Big Mac) para instituições que tratam de crianças

com câncer.Vale ressaltar que o evento ocorre durante um único dia ao longo

dos 365 dias do ano e são conclamados voluntários para aderir à causa e

vender os sanduíches, o consumidor desembolsa o dinheiro para comprar o

sanduíche e o Mac Donald’s é o promotor da benemerência.

É ainda Garcia quem afirma estar a mudança de mentalidade

empresarial muito ligada à mudança no padrão de exigência do consumidor53.

Nesse sentido, escreve ela, a divulgação das ações empresariais no campo

social tem sido feita em larga escala , objetivando diferentes públicos.

53 A perspectiva dos consumidores, apesar de ser um aspecto pouco explorado na divulgação do marketing social, vem tomando corpo no Brasil. Nesse sentido podemos nos remeter ao Código do consumidor, promulgado por lei federal em 11 de julho de 1990, que instituiu também o Procon e os Juizados Especiais Cíveis.

Page 114: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

113

Apesar de nos depoimentos a questão do marketing não ter sido

abordada de forma direta, pelo menos pelos gestores ela aparece (utilizando

um termo recorrente na fala de um dos sujeitos entrevistados) ”na sutileza das

coisas”.

A gente nunca usa. Isso a gente tem claro, a responsabilidade social para marketing. A gente tem um monte de ações voluntárias que a gente nem divulga, não faz matéria, não faz nada porque é um princípio nosso, uma regra de trânsito dos próprios voluntários, não estar explorando isso. (G.3) Às vezes (a empresa) não tem muito interesse nessa divulgação, quer que seja um trabalho de fundo social, não é comercial. O que leva (a empresa) a desenvolver essas ações não é o marketing é a responsabilidade (G.6) É uma empresa de credibilidade no mercado (...). A gente aqui é testemunha de que a empresa está fazendo de tudo para que a coisa aconteça senão não vai se enquadrar nos padrões comerciais internacionais, mundiais. Você tem que ter produtos de qualidade. (G.4)

Não existe consenso em relação à divulgação das ações sociais

desenvolvidas pelas empresas. Conforme Peliano, (2001, p.72), alguns

empresários chegam a condenar qualquer divulgação, outros entendem que

divulgar é importante para mobilizar a participação de outras empresas, para

tornar público o compromisso com a ação social e para melhorar a imagem

diante dos clientes, consumidores, governo. Os argumentos sobre se se deve

ou não divulgar são diversificados.

Em relação às ações sociais desenvolvidas pelas empresas um aspecto

que merece ser ressaltado é o local onde estão situadas essas ações. Em uma

das empresas as ações de responsabilidade social estão no Setor de

Comunicação Social, o que certamente é indicativo dos objetivos que a

empresa tem em relação ao marketing.

Na maioria das vezes os programas ficam na comunicação social, pela questão do marketing mesmo. Como utilizar isso favoravelmente à imagem da empresa e nisso eu vejo pouco de responsabilidade social, é mais o marketing (P.1)

Por outro lado, o fato de as ações de responsabilidade social estarem

localizadas no Serviço Social não vai garantir aos assistentes sociais mais

acesso ou autonomia na elaboração ou implementação das ações de

Page 115: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

114

responsabilidade social, ou que a localização vá garantir a ampliação do

número de assistentes sociais na empresa.

Exemplo disso pode ser visto em uma das empresas pesquisadas onde

as ações sociais ficam centralizadas no Serviço Social, porém, sob a

coordenação de um médico e de uma bióloga.

Aqui no Serviço Social (da empresa) existe uma pessoa específica para a coordenação desses programas sociais. Ela não é assistente social, a formação dela é de bióloga. Ela veio para cá a pedido da diretoria para poder coordenar os projetos sociais. (P.4)

Chamou-nos a atenção o fato de profissionais de outras áreas, (no caso

o médico e a bióloga) se apropriarem da área social e do próprio Serviço

Social, sentindo-se, inclusive, “invadidos por outras áreas”. Os depoimentos

podem explicitar melhor o que queremos dizer.

A gente que ta mais ligado à área social teve que entender que se a gente sente que está sendo invadido por outras áreas, foge um pouco do controle, na verdade a gente tem que aprender a trabalhar de forma conjunta e global, envolvendo todos os segmentos da empresa, porque se a gente for fazer uma coisa só não vai funcionar. (G.4) e (G.5)

Os nossos projetos (...) está escrito na política de responsabilidade social, Aqui a gente chama de Serviço Social, não de assistência social. Está escrito na política de responsabilidade social que a (empresa) não trabalha com projetos assistencialistas, são projetos diferentes. (G.5)

Remetemo-nos àquilo que é explicitado por Garcia (2004, p.42), quando

afirma que o perfil de quem compõe a gerência dos programas de filantropia

empresarial atende ao que se pode chamar de “gestão de resultados”,

caracterizada pela preocupação com o retorno do investimento, pela utilização

de padrões de planejamento e avaliação próprios do mundo empresarial e

finalmente pelo marketing das ações e de seu desempenho. Os profissionais

são predominantemente das áreas de administração, comunicação e

marketing, o que caracteriza uma novidade no campo da intervenção social

tradicionalmente ocupado por profissionais com formação na área das ciências

humanas. A tendência de incorporação de novos profissionais evidencia,

portanto, a importância do “social” como mercado de trabalho nem tanto em

Page 116: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

115

expansão, mas certamente em reorientação quanto à direção política dada

pelas disciplinas mais tradicionais.

Na pesquisa coordenada por Peliano (2001) foi feito um levantamento

das principais profissões encontradas na equipe responsável pela ação social

da empresa. Destas, 8% eram assistentes sociais; 5% engenheiros; 10%

profissionais da área de comunicação; 11% psicólogos; 19% administradores

de empresas. Afirma a autora que, “apesar da predominância de

administradores de empresas, a diversidade de profissões é grande e está

longe de configurar equipes multidisciplinares de profissionais do campo social,

a formação desse quadro depende mais dos setores ou departamentos das

empresas que acumulam a responsabilidade pelas atividades sociais”.

Um outro aspecto apontado por Peliano refere-se à questão de gênero,

a constatação de que, na área privada, homens e mulheres dividem meio a

meio o envolvimento nas atividades sociais. (O que difere do serviço público

onde as ações sociais ficam, em sua maioria, a cargo das mulheres) muito

embora o comando se encontre nas mãos masculinas (o que se deve ao fato

do poder de decisão das empresas encontrarem-se nas mãos dos diretores,

gerentes, altos executivos, cargos ocupados majoritariamente por homens no

mercado de trabalho).

Nesse sentido, uma questão que se faz presente refere-se ao espaço

que é conferido ao assistente social nas ações sociais desenvolvidas neste

momento pelas empresas quando, conforme apontado por Montaño (2007,

p.151), a divisão técnica do trabalho é cada vez mais difusa mais interligada e

interdependente. Onde já não há compartimentos estanques rígidos e plenos

de visibilidade. Onde profissionais como os sociólogos, psicólogos,

antropólogos, agrônomos, médicos e tantos outros realizam atividades outrora

específicas do Serviço Social.

Page 117: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

116

4.4 O público - alvo das ações

O público-alvo das ações de responsabilidade social desenvolvidas

pelas empresas pesquisadas é diversificado vai de crianças a adolescentes e

idosos às ações voltadas para ao meio ambiente ou ainda a formação de

cooperativas nas comunidades que ficam no entorno da empresa.

O que pudemos verificar a partir das entrevistas é que a maioria das

empresas pesquisadas não tem um público alvo definido, o público ao qual se

destinam as ações parece ser rotativo. A preocupação maior é com as ações a

serem realizadas.

Temos ações belíssimas de meio ambiente, que também é um dos indicadores de responsabilidade social, só que são coordenadas pela assessoria do meio ambiente.

Nós temos um trabalho forte dentro da empresa na área do voluntariado. Nós temos mais de 2oo funcionários (dos 1500 funcionários da empresa) que são voluntários, dão apoio a creches, crianças e a pessoas idosas.

Por enquanto ainda não tem definido isso. A gente tem muitas solicitações de auxílio então isso vai conforme as necessidades ( )... Agora o nosso foco a questão da comunidade a gente ainda não tem definido. A nossa maior preocupação são os nossos colaboradores que são carentes ao nível operacional. A responsabilidade social é mais interna. (G2).

Estamos desenvolvendo esses projetos de centros comunitários. Não basta levar energia lá naquela comunidade distante, é preciso envolver a comunidade e criar um projeto de sustentabilidade (P.1)

Outro aspecto que consideramos pertinente estar pontuando em relação

ao público ao qual essas ações se destinam é que esse público já é

conhecido do assistente social. Não devemos perder de vista que o fato de ter

a questão social em suas múltiplas expressões como objeto de trabalho faz

com que os assistentes sociais tenham “contato direto e cotidiano com as

questões da saúde pública, da criança, do adolescente, da terceira idade, da

violência, da habitação, da educação etc.”. (IAMAMOTO, 1998, p.41). Assim, o

que muda para o assistente social quando passa a intervir na questão social

dentro da perspectiva da “responsabilidade social” não é o público alvo das

ações sociais, mas as bases em que são efetivadas tais ações. O que exige

Page 118: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

117

por parte do assistente social reflexões profundas não só no que se refere à

qualidade dos serviços prestados, mas também à seletividade, à prioridade e

às escolhas que permeiam tais ações que se configuram como substitutas das

ações viabilizadas através de políticas públicas e da garantia da

universalidade no acesso.

4.5 A avaliação das ações de responsabilidade social

Entendemos, conforme nos alerta Carvalho (2004) que, apesar do

modismo e da hipervalorização que foi dada a avaliação nos dias atuais não se

pode negar a sua importância no sentido de indicar acertos e equívocos e de

sugerir correção de rumos. Assim, a avaliação constitui-se em um processo

contínuo que deve estar presente nos programas, projetos e ações durante a

sua concepção, implementação e resultados.

Como escreve Gatti (2004) citada por Carvalho, (2004) “Programas

sociais clamam por um modo de avaliar que se referencie para além do que se

convencionou chamar de eficácia ou eficiência (...)” Assim, avaliar programas

sociais não é tarefa simples. Possuem objetivos que são por sua natureza

complexos, ganham uma tessitura sócio relacional e contextualizada. Não se

limitam a apreender sua “engenharia institucional” e resultados imediatos.

No entanto é necessário não se perder de vista que, dentre outras

vantagens, a avaliação produz conhecimentos necessários à proposição de

soluções e avanços responsáveis pelo desempenho da prática social

(CARVALHO, 2004).

O que pudemos verificar a partir das respostas dos sujeitos

entrevistados é que as avaliações parecem não ocupar um lugar de destaque

nas empresas pesquisadas. São avaliações pontuais e sem sistematização.

Conforme o gestor de uma das empresas pesquisadas,

Existe a avaliação, por exemplo: Pega o projeto de voluntariado que nós temos, nós temos reuniões mensais do grupo do voluntariado e eles têm tudo o que é movimentado, o que é feito às instituições que são visitadas, os apoios que são dados. Fazemos

Page 119: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

118

também uma doação de alimentos, os funcionários se mobilizam e fazem doações de alimentos para algumas instituições, essas doações são levantadas e apresentadas. Isso é divulgado na empresa toda. Mensalmente é feito um balanço daquilo que é feito.

A (AS) apresenta um balanço de todas as ações realizadas durante o ano, isso acontece na área do voluntariado e nas outras áreas. Os investimentos, os valores, as comunidades atendidas tudo aquilo que é feito é avaliado.

Na gestão ambiental, os empreendimentos que foram feitos os investimentos, os valores, as comunidades atendidas. Na gestão do programa de eficientização de energia, o projeto além de ser um projeto da CEMAT ele é um projeto apresentado à ANEL que é a agência reguladora nacional, então ele só passa a existir a partir do momento em que a ANEL dá ok.... A ANEL fiscaliza também, vem aqui para ver se eu realmente investi naquilo que eu propus, se substitui geladeiras , ela faz essa fiscalização o tempo todo. Os projetos têm o seu acompanhamento. (G.1)

Para a assistente social,

Não há uma avaliação. Cada um de nós tem as nossas ferramentas de avaliação, de controle, mas não há um instrumento de avaliação. Não tem um departamento estruturado de responsabilidade social, então fica mais difícil para estruturar essas avaliações. (P.1)

Em uma outra empresa gestor e assistente social afirmam que,

Isso é feito de maneira informal (G.2)

A avaliação ela é feita em cima do desempenho do planejamento. Quando a gente chega ao final do ano a gente faz um levantamento, primeiro reúne a equipe para ver o que foi bom, o que não foi, o que precisava mudar, o que é que a gente vai continuar.Eu já fiz uma pesquisa de opinião para mensurar todos esses aspectos. (P.3)

“ Ultimamente estamos fazendo visitas às entidades cadastradas e fazemos o acompanhamento , não é uma rotina mas fazemos as visitas (G.6)

A gente busca verificar se ações estão tendo resultado ou não. (P.4)

Cada projeto desses tem um ciclo de avaliação, tem os indicadores. São todos avaliados (G.3)

Page 120: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

119

A gente faz a avaliação através de pesquisas. Através do Balanço Social a gente vai verificando o que esta acontecendo (P.5)

Os depoimentos são elucidativos e, acreditamos, explicitam como se dá

a avaliação dos programas ou das ações de responsabilidade social

desenvolvidas pelas empresas.

4.6 O balanço social

O balanço social, conforme Garcia, (2004, p.50) constitui-se em

estratégia de divulgação relevante e qualificada das empresas, tornando

transparente o montante e a destinação dos recursos aplicados.

Todas as empresas pesquisadas elaboram o balanço social o que não

quer dizer que a maioria das empresas do Estado de Mato Grosso tenham

essa prática. Na escolha do universo de pesquisa, a opção foi pelas empresas

certificadas como socialmente responsáveis. Ocorre que, para serem

certificadas a exigência fundamental feita pela Federação das Indústrias do

Estado de Mato Grosso – FIEMT é o balanço social.

Considerado um dos principais indicadores de responsabilidade social, o

balanço social é considerado como instrumento de avaliação do desempenho

da empresa no campo da cidadania empresarial, pois demonstra todas as

ações sociais desenvolvidas por ela em determinado período. No balanço

social, conforme MELO NETO & FROES (2002), as ações sociais são

discriminadas quanto à sua natureza, seja de responsabilidade social interna

ou externa, a sua especificidade (doações, investimentos) e ao valor gasto.

Uma das questões da entrevista versava justamente sobre o balanço

social. Queríamos saber como era feito, por quem, qual era a participação do

assistente social na elaboração, por ser estabelecido em uma lei estadual que

o balanço social fosse assinado por um técnico em contabilidade e por um

assistente social54.

54 No Estado de Mato Grosso, a Lei nº. 7.687, de 25 de junho de 2002, criou o Certificado de Responsabilidade Social a ser conferido anualmente às empresas, órgãos públicos e demais entidades do Estado que apresentassem seu Balanço Social. A referida Lei estabelece ainda

Page 121: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

120

Na maioria das empresas pesquisadas, o que se constatou é que o

balanço social é elaborado pelo setor de contabilidade.

Os depoimentos mostraram que não existe a participação do assistente

social na elaboração dos balanços, como também não encontramos indícios de

que a Lei que traz a obrigatoriedade da assinatura do assistente social nos

Balanços Sociais das empresas de Mato Grosso esteja sendo cumprida, o que

nos leva a confirmar aquilo em que já acreditávamos, ou seja, que o balanço

social na maioria das empresas pesquisadas se restringe aos dados contábeis.

Repassamos os dados para a contabilidade. Não há um envolvimento maior. (G.1) O Balanço Social, a empresa faz, agora foi entregue para a certificação. Isso é feito pelo setor de contabilidade (G.2) O balanço é assim é só com eles mesmos (contabilidade). (P.2) É feito pela assessoria de planejamento, que fica em Brasília. Mandamos todas as in formações e, normalmente, o balanço sai já no ano seguinte. (G.6) Vai ser realizado através de uma consultoria, para elaborá-lo de uma forma mais detalhada. (p.4)

Fazemos. É o terceiro ano. O Balanço Social começou assim: a gente entendeu que seria um relatório, onde a gente colocaria tudo que estava fazendo em relação à responsabilidade social. Num primeiro instante ficou muito como obrigação e depois, com o passar do tempo é como um álbum de fotografia da gente. Então no balanço social a gente está vendo como está progredindo, enquanto gente, enquanto profissional. Isso a gente consegue perceber no balanço, até na forma como ele está sendo escrito. (G.3)

4.7 As ações de responsabilidade social

As ações sociais desenvolvidas pelas empresas são de natureza

diversificada, vão desde palestras sobre saúde do homem, saúde da mulher,

dependência química, plano de saúde, plano odontológico, bolsa farmácia,

bolsa de estudos, ticket alimentação, ticket supermercado, aniversariante do

mês, palestras para gestantes, acompanhamento durante o período

gestacional, horta comunitária, distribuição de kits para recém-nascidos,

que o balanço social deverá ser assinado por contador ou técnico em contabilidade e por um assistente social devidamente habilitado.

Page 122: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

121

palestras para adolescentes nas escolas, educação financeira, coral, formação

de bandas, aulas de judô e caratê, montagem de brinquedotecas, de

bibliotecas nas escolas, doação de leite, doação de uniformes usados, doação

de computadores, plantio de mudas de arvores; até doação de geladeiras,

criação de cooperativas, associação, mutirão para construção de casa para

funcionário.

Como nos referimos, anteriormente, a intervenção das empresas na

área social não é recente. Histórica e esporadicamente as empresas

desenvolviam ou colaboravam com o desenvolvimento de ações sociais, no

entanto, a preocupação era voltada para a oferta de produtos e serviços aos

seus clientes. Seus acionistas, quando se dedicavam à filantropia, faziam-no

de forma individual, dependendo da sua visão e de seus recursos.

Posteriormente, as empresas também passaram a empreender ações

sociais na comunidade sem, no entanto, incluí-las na sua estratégia

empresarial. Só a partir dos anos de 1990, seguindo uma tendência mundial,

originada nos países desenvolvidos, essas ações passaram a ser incorporadas

à sua gestão e a ser parte dos “negócios da empresa”.

Assim, gradativamente, as doações tradicionais vão sendo trocadas pelo

trabalho social das empresas, seja em atividades imediatas como (organizar

eventos beneficentes, participar de campanhas para arrecadar alimentos,

promover festa de aniversário de funcionários ou das entidades parceiras,

motivar pessoas a doar presentes no Natal, doar bens e fazer campanhas de

vestimentas), seja em atividades de longo prazo que consistem em

implementar programas de educação alimentar, ensinar a entidade assistencial

a administrar recursos; treinar pessoas para desenvolverem programas de

comunicação; promover planejamento estratégico para melhoria da gestão da

entidade; dar cursos de gestão para os dirigentes da entidade e introduzir

programas de informática na educação (SIMÕES, 2007, p. 420).

Os depoimentos nos oportunizaram conhecer as ações de

responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas, o que consideramos

Page 123: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

122

importante, por nos fornecer elementos para conhecermos as ações que são

da competência do assistente social na responsabilidade social empresarial.

Agora estamos com um projeto para a semana da árvore, em setembro que é a distribuição de mudas para a comunidade próxima que é o Bairro Pedra 90. São algumas ações dispersas não têm foco definido. (G.2)

O outro projeto que é muito valorizado pela diretoria é o aniversariante do mês, onde eles participam juntamente com a equipe que organiza, os colaboradores no final do mês tem o dia deles, eles podem trazer a família e vem tomar o café da manhã junto com ele, pode conhecer a indústria, tiram foto com o colaborador no seu local de trabalho. Tem o vídeo institucional que é passado para a família, para que possa conhecer a empresa, conhecer os trabalhos que a gente desenvolve. Aí eles recebem o presente que é entregue pela presidência, tiram uma foto junto com o nosso presidente. A gente encerra essa parte, vai para o almoço, tem o bolo junto com os familiares, depois a gente envia essas fotos para o colaborador. Então essa é uma forma da gente trazer a sociedade, o amigo, a família para dentro da empresa. (G.2)

Nós temos alguns projetos: “Correios Solidariedade de Espécie”, é quando existe o caso de emergência (chuvas), as agências recebem roupas e alimentos que são embalados, transportados e, direcionados para o local. Temos o “Programa Mutirão” que é a arrecadação de alimentos,de forma mais programada. Temos um projeto chamado “doação de Bens”. A gente cadastra algumas entidades do Governo (escolas e creches) e repassa esse material para eles. Isso também entra na “Inclusão Digital” Quando a empresa troca os computadores e os disponibiliza para escolas, creches, bibliotecas. (P.6)

As ações de responsabilidade social tiveram iniío, de forma mais sistemática, há quatro ou cinco anos. Foi com o projeto “Caratê com Energia”. (G.3)

Recentemente também a gente tem um projeto em Pedra Preta e esse é mais ambiental (formação de moçorocas) que são grandes aerosões que estavam caminhando em direção às nossas linhas, iam derrubar as linhas, então a gente tinha duas alternativas; ou desviava as linhas ou atacava a causa principal do problema. (...) Aí a gente resolveu atuar de maneira diferente, organizar cooperativas, organizar esses sitiantes e mostrar a importância da preservação ambiental e aí o projeto ficou maior, destacou a causa principal do problema e o legal desse projeto é que a gente criou um espírito de corpo na comunidade, conseguimos montar uma associação. (G.3)

Tem outros projetos como o alfabetizar, que não tem essa contrapartida. Nesse estamos nós, uma associação de moradores, o SESI e a Universidade popular. A clientela são pessoas do bairro Osmar Cabral e redondeza, são pessoas que estão sendo alfabetizadas. (G.3) Hoje um projeto que nós temos “Construindo um futuro sólido” que é a escola que nós temos na própria empresa, onde tem a facilidade

Page 124: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

123

dos trabalhadores saírem do seu local de trabalho e poderem estar voltando a estudar. (...) Algumas ações já são comuns aqui como por ex. no dia da criança tem uma creche que a gente auxilia. Tem algumas instituições e, projetos que a (empresa) tem colaborado há alguns anos já, por exemplo: o Projeto Flauta Mágica, incentivo à cultura, isso já é também formalizado. Agora o nosso foco, a questão da comunidade a gente não tem definido. Agora nossa maior preocupação são os nossos colaboradores que são carentes ao nível operacional. A responsabilidade social é mais interna. (G.2),

Estamos começando a desenvolver várias ações que vêm a ser o resgate, a recuperação do reaproveitamento do material, a reciclagem do lixo, fazemos com que isso se transforme em ação para a comunidade. Temos a reciclagem do papel, que está sendo implantada em Mato Grosso, as outras regionais já implantaram (...) Fazer a conscientização da reciclagem, de materiais que seriam, a princípio, lixo, mas que não é lixo. Depois o segundo processo é a destinação. Os uniformes, as bolsas que não podem ser aproveitados como são. Eles têm que ser transformados. (G.6)

Tem um projeto que eu queria comentar que é um projeto chamado CCP-Centros Comunitários de Produção. (...) Esse projeto leva energia elétrica para as comunidades mais isoladas do meio rural para que essas comunidades tenham acesso à energia para que, através da energia, possam se fixar e produzir naquele local. (G.1)

Para a efetivação das ações, conforme consta nos depoimentos, são

importantes as parcerias. Recorremos mais uma vez aos dados provenientes

da pesquisa coordenada por Peliano (2001) quando se refere às parcerias

feitas pelas empresas privadas no Brasil. Segundo ela, as empresas nem

sempre estão sozinhas no financiamento de seus projetos principais, mais da

metade delas compartilha os gastos com terceiros. Além de outras empresas

privadas, participam do financiamento dos projetos sociais apoiados pelo setor

privado: governo, associações ou entidades de classe, empregados,

voluntários, as próprias comunidades, ou ainda, entidades executoras, como

universidades, ONGs, sindicatos e organizações internacionais.

Nas empresas de Mato Grosso essas parcerias também são buscadas.

A gente não trabalha sozinha, a gente faz as parcerias (...) dentro da empresa mesmo, com os funcionários, esposas e filhos. (P.6) Então aí entra também a prefeitura municipal, fabricantes de laticínios, a prefeitura dando apoio, às vezes criando a edificação, a comunidade se unindo em torno da compra de equipamentos, a companhia de energia e a Eletrobrás se unindo. (G.1) Por ex. tem programas que são super interessantes, mas poderia ter uma adesão maior dos envolvidos com parcerias. A nossa parceria

Page 125: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

124

com as comunidades vizinhas é muito boa. Existe essa abertura, existe esse laço, você tem contato, você tem autonomia. (P.4)

4.8 As dificuldades encontradas pelos assistentes sociais no desenvolvimento das ações de responsabilidade social

Nenhuma das assistentes sociais entrevistadas disse ter qualquer

dificuldade em relação ao desenvolvimento das ações de responsabilidade

social. No entanto, afirmam que é um espaço no qual o assistente social tem

uma inserção restrita, não está conseguindo se fazer presente. O que é

justificado por tratar-se de “algo muito novo e por ser novo ainda não buscou

envolver muito os profissionais de Serviço Social, buscou-se envolver os

profissionais do marketing porque é uma forma de dar visibilidade a

empresa”(P.1).

Não encontro dificuldades. Não é que não encontre as dificuldades que

aparecem são trabalhadas, porque, como já disse, nós estamos

estruturando esse programa então o que vem para a gente vem como

diretrizes, com orçamento para isso então temos que administrar esse

orçamento de forma que ele possa ser utilizado. É mais ou menos

assim. ( P.1)

Não tenho dificuldades. (P.2) Eu, nenhuma ( P.3) Dificuldade mesmo, acho que não tenho ( P.5)

Quanto à exigência de determinado perfil profissional para desenvolver

as ações de responsabilidade social nas empresas, o que ficou patente é que

por ser um “conhecimento específico” traz a necessidade de “correr atrás” “de

Conhecer”. Num dos depoimentos a assistente social afirma inclusive as

dúvidas que alguns profissionais têm em relação à atuação do assistente social

na responsabilidade social empresarial.

Eu recebo ligações (de assistentes sociais) quase semanalmente para saber como atuar na área da responsabilidade social (P.2)

Page 126: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

125

4.9 Há lugar para a atuação do assistente social nas ações de responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas em Mato Grosso?

Veja só, eu acho que não há esse espaço. Não que eu ache que não haja o espaço, mas que o assistente social não é convidado a participar. Como você sabe, em algumas empresas, raríssimas, inclusive, que a responsabilidade social fica no RH que é onde fica o assistente social. (P.1)

Que estamos preparados eu acredito que sim. Agora eu não sei se é interessante para a organização que a função do assistente social seja em programas de responsabilidade social, porque o assistente social na organização é contratado para implementar, para que ele possa planejar, para que ele possa criar programas de saúde para o colaborador interno e no atendimento à família também. Mas ele é mais focado no cliente interno. Quando você fala em responsabilidade social cliente interno é mais um indicador. (P.1)

Perspectivas: Enquanto não se mudar um pouco a visão de responsabilidade social por parte da classe empresarial. É uma visão muito particular. Para a empresa o foco tem sido o marketing. (P.1)

Eu vejo que as profissionais de Serviço Social estão perdendo espaço. Não estão conseguindo se colocar presentes na responsabilidade social em Mato Grosso. Não porque não queiram, mas por questão de espaço mesmo. Acho que é um posicionamento que está deixando de lado o assistente social por esse lado do marketing. (P.2)

O assistente social está preparado, mas o espaço da empresa é contraditório não deixa de ter orçamento, de ter valores pessoais da empresa para você direcionar, não deixa de ter uma política interna para você encaminhar. É uma demanda nova? Até a terminologia é nova. É um foco que você trabalha não pensando no status. Às vezes você fica pensando puxa vida eu estou fazendo na empresa a obrigação do Estado, mas o que a empresa pode fazer?Complementar e auxiliar não tomar como responsabilidade dela. (P.2).

As considerações tecidas por Montaño (2007, p.101) são elucidativas.

Lembra-nos ele que o Serviço Social não é visto como uma profissão que toma

decisões, que participa “produtivamente” na divisão do trabalho, que participa

na definição dos objetivos gerais das políticas sociais ou do seu desenho com

autonomia para definir os recursos a empregar e os beneficiários da sua ação,

que possui um conhecimento teórico universal sobre o social (apesar de

diversos assistentes sociais atuarem, sim, nesses níveis). Pelo contrário, o

Serviço Social é em geral identificado (...) como uma profissão que executa as

decisões dos outros (os políticos), que conhece a realidade social por meio dos

Page 127: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

126

olhares dos outros (os cientistas sociais) e que assiste às populações carentes,

mas como auxiliar de outros profissionais (médicos e advogados).

Dentro dessa perspectiva pode-se ressaltar como fazem Iamamoto,

(1998) e Neto, (2005; 1986) os traços que conformam o perfil social e histórico

do assistente social, e, que trazem implicações importantes. O fato de ser uma

“profissão feminina”, atravessada, portanto, pelas relações de gênero é, em

parte, responsável pelos traços de subalternidade que conformam a profissão

diante de outras de maior prestígio e reconhecimento social e acadêmico. Um

outro traço forte e recorrente é a herança da tradição católica, proveniente das

origens da profissão, responsável pelas posturas e comportamentos

messiânicos e voluntaristas55. Nesse sentido, Netto (2005, p.88) afirma que a

ruptura com o regime do voluntariado, que marcou a profissionalização do

Serviço Social, não equivaleu à ruptura com a subalternidade técnica (e social)

a que se destinava e alocava a força de trabalho feminina.

Outro elemento que vem reforçar o estigma de subalternidade que

conforma a profissão como foi apontado por Netto, refere-se à mudança no

perfil socioeconômico do alunado do curso de Serviço Social. Diferente das

origens da profissão,quando os estudantes/profissionais eram pessoas que

pertenciam às classes abastadas, a profissão passa a ser demandada por

alunos das classes baixa e média-baixa, o que pode ser creditado, entre outras

razões, à necessidade de expansão das profissões sociais que conformou as

décadas de 1960/1970 e prosseguiu nos anos de 1980. O que veio favorecer

também a expansão da categoria profissional dos assistentes sociais.

Como diz Savianni (1989, p.146) “a modernização da economia fazia da

escolarização, senão a única, pelo menos a principal via de ascensão social”.

Nesse período, segundo Maria Lúcia Martinelli (1989, p.134-135), o

aumento do número de profissionais brasileiros se deu de forma mais intensa

que em qualquer outro momento. Pautando-se em dados do Conselho Federal

55 Referindo-se à presença feminina na profissão de Serviço Social, Netto (1986:74) nos lembra que, na nossa cultura, o assistencialismo é predominantemente feminino, só nos seus pontos de direção é que há a presença masculina. Essa presença feminina massiva no Serviço Social está vinculada a um estatuto subalterno de mulher, a um estatuto de dominação.

Page 128: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

127

de Assistentes Sociais, essa autora afirma que até o início da década de 1970

não havia mais de dez mil assistentes sociais no território brasileiro; em 1988 o

número de profissionais inscritos nos Conselhos, portanto aptos a exercer a

profissão, ultrapassava cinqüenta e quatro mil. O que não se sabe é até que

ponto essa expansão do número de profissionais garantiu a qualidade em

termos de competências, de habilidades, de conhecimentos que o exercício da

profissão requer. No entanto não se pode afirmar que isso não tenha

repercutido no perfil dos profissionais de Serviço Social.

O depoimento de um dos gestores nos chamou a atenção pela lucidez

com que analisa o Serviço Social, ou o assistente social. A sua fala nos alerta

para a forma como as pessoas que estão fora da profissão, no caso o gestor,

vêem o assistente social. A análise que ele faz é muito pertinente, remetendo,

no nosso entender, à necessidade de nós assistentes sociais, como outros

profissionais, estarmos atentos ao movimento da realidade e à compreensão

do significado social da profissão na ordem social contemporânea. Assim,

apesar de ser extenso, pensamos que vale a pena transcrevê-lo na íntegra.

O que eu entendi assim, (...) é que entre os assistentes sociais há uma linha assistencialista e outra não assistencialista. Eu entendo muito ela com esses conflitos entre assistencialismo e não assistencialismo e ela é declaradamente de uma linha não assistencialista, mais ou menos eu entendi assim que as pessoas têm que andar com as próprias pernas e tal. Na época da implantação dos projetos de responsabilidade social, no primeiro mandato do Presidente Lula, eu estou falando isso porque é uma tese sua, muito focada na área de vocês, a (AS) enxergou que pela questão política do governo, o projeto era assistencialista e não se engajou no processo. Eu enxerguei assim que ela perdeu uma grande oportunidade de estar defendendo princípios dela, a lógica dela se é que tem. Não existia essa questão interna porque eu, enquanto gestor e, os próprios empregados, não temos essa questão de assistencialismo como o fome zero e outros, também não enxergo que sejam tão assistencialistas assim. O que eu enxergo é que num primeiro momento está recompondo a condição muito crítica, se a gente for olhar na essência, até para dar condições básicas para a pessoa ter condições de pensar. Então eu acho que perdeu daí o projeto estar com a (...) que é uma pessoa que não é assistente social e que a gente teve que ter todo um remendo para que ela pudesse trabalhar e ter uma assistente social subordinada a ela. (...) Eu vejo que a assistente social perdeu a oportunidade de ocupar espaços por uma questão de política partidária. Eu vejo que poderia estar ocupando os espaços, defendendo , achando o ponto de equilíbrio, nem extremamente assistencialista nem ao contrário disso, algo no meio. Eu vejo assim, para qualquer profissional enquanto gerente, engenheiro, coordenador, assistente social, é conhecer as pessoas e

Page 129: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

128

para isso a gente tem que conviver com elas, tem que adquirir a confiança delas e eu não vejo isso como assistencialismo. Estar presente nos momentos difíceis dos empregados, no momento em que a pessoa perde um pai, uma mãe ou a esposa, num momento de doença. Ta muito na sutileza das coisas, no interior de cada um. Eu vejo que isso abre o caminho não só do assistente social, mas de qualquer profissional. Eu particularmente trabalho muito assim, aí como engenheiro tudo bem, não é a atividade fim da profissão. A assistente social confunde muito essas coisas porque é atividade fim, aí passei a entender essa coisa de assistencialismo ou não (PAULO COJIMA).

Netto,56 ao se referir à solução para as problemáticas inerentes e

próprias da ação profissional aponta para uma dupla exigência: compreender o

significado social da profissão e compreender a dinâmica do capitalismo

contemporâneo. É essa compreensão que vai permitir ao profissional

reconhecer os limites e as possibilidades da intervenção profissional. Diz ele,

limites e possibilidades estão inextrincavelmente ligados, e os limites, desde

que explicitados, não invalidam ou deslegitimam a ação profissional. Nenhuma

ação profissional (e não só dos assistentes sociais) suprimirá a pobreza e a

desigualdade na ordem do capital. Mas seus padrões podem variar e esta

variação é absolutamente significativa se sobre ela incidir a ação profissional,

incidência que porta as possibilidades da intervenção que justifica e legitima o

Serviço Social. O conhecimento desses limites e dessas possibilidades fornece

a base para ultrapassar o messianismo, que pretende atribuir à profissão

poderes redentores e o fatalismo, que a condena ao burocratismo formalista.

Assim vale ter presente que não se deve compreender o Serviço Social a partir

de si mesmo.

4.10 O voluntariado

Indagados sobre o que lhes compete desenvolver nas ações de

responsabilidade social empresarial, os sujeitos entrevistados respondem que

é o voluntariado.

O que fica a cargo do Serviço Social é o voluntariado. O que eu quero estar colocando é que eu sou a coordenadora. Não sei como isso acontece nas outras empresas. (P.1)

56 Cf. José PAULO NETTO, A ordem contemporânea é o desafio central. Texto da 33ª Conferência Mundial de Escolas de Serviço Social. Santiago do Chile, 28/31 de agosto de 2006.

Page 130: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

129

Todas as nossas ações de responsabilidade social estão integradas ao programa de voluntariado e cidadania, que é um programa nacional. (P.6) Eu trabalho com el a(com a coordenadora do Comitê de Responsabilidade Social)Aí tem os voluntários que são os próprios funcionários da empresa.(P.5).

A tônica no voluntariado é confirmada pelos gestores.

Nós temos um trabalho forte dentro da empresa, na área de voluntariado. Nós temos mais de 200 funcionários, dos 1.500 que a empresa emprega que são voluntários. Então temos um trabalho de voluntariado para atender a essas comunidades (crianças, pessoas idosas, creches). (G.1)

Queremos montar um grupo de voluntários para nos auxiliar com o plantio das mudas na semana do meio ambiente. Mas nós temos total apoio e incentivo da alta direção para isto. (G.2)

Nos tempos atuais, a ênfase no trabalho voluntário é notória. Não

obstante, se deva considerar que a ação dos voluntários se remete há vários

séculos, sempre vinculada a ações religiosas ou à área da saúde, sob o cunho

da benemerência (merecimento) ou da filantropia (caridade-altruísmo). Ocorre

que, em face da agudização da questão social e, consequentemente, das suas

seqüelas, nos deparamos como bem explicita Yazbek (2002), com um

processo de constituição de uma nova cultura de solidariedade, que se

expressa através de um grande número de pessoas e organizações que se

dispõem a prestar serviços sociais ou para ajudar pessoas em dificuldades. Tal

trabalho, conforme a autora é considerado como sendo parte de uma cidadania

ativa e participativa relacionando-se com eficiência e resultados.

Recorremos a Kameyama (2001, p.34) quando afirma que o voluntariado

corporativo, além de contribuir com a sociedade traz algo que toda empresa

moderna afirma buscar, ou seja, proporcionar satisfação pessoal e motivação

verdadeira para o trabalho. Constitui-se, portanto, em estratégia para obter a

participação dos funcionários, para a incorporação e disseminação dos valores

culturais empresariais e para a construção de uma imagem positiva da

empresa junto à sociedade onde atua.

Page 131: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

130

Uma primeira constatação que tivemos, a partir dos depoimentos, é que

as ações de responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas são, em

sua grande maioria, alicerçadas no trabalho voluntário. E o que compete às

assistentes sociais, na maioria das empresas pesquisadas, são as atividades

vinculadas ao voluntariado, seja na execução ou mesmo na coordenação das

ações sociais.

Tal constatação pode não ser surpresa se considerarmos aquilo que é

apontado por Yazbek (2002) em relação à forma como as ações sociais do

Estado estão ocorrendo nas últimas décadas57, tem colocado entre as

alternativas às seqüelas da questão social, as ações no campo da filantropia e

o trabalho voluntário que, na atualidade, se apresentam mais organizados

atraindo um número crescente de profissionais que estão buscando se

capacitar para desenvolverem trabalhos voluntários. Assim, o que se tem hoje

em grande parte das organizações, é um voluntariado constituído por um

contingente assalariado e profissionalizado que dirige, executa e garante a

qualidade dos serviços.

Em relação à Profissão de Serviço Social, ainda buscando respaldo em

Yazbek, quando faz referência ao confronto entre profissionalidade e

voluntariado, não conseguimos constatar nos depoimentos das assistentes

sociais nenhuma referência a provável mal estar, recusa ou queixa por estarem

desenvolvendo práticas voluntárias. Também não conseguimos localizar

nenhuma referência ao Projeto Ético-Político da Profissão. Em um dos

depoimentos fica explícito o modo como uma das entrevistadas refere-se às

ações voluntárias.

É o auxílio pra gente. A gente pensa que está ajudando o outro, na verdade os grandes ajudados somos nós mesmos. (P.6)

O voluntário, hoje, diz Yazbek, é o cidadão que motivado pelos valores

da solidariedade e da participação social, doa seu tempo, seu trabalho e seus 57 Conforme Yazbek, o redesenho das ações sociais do Estado caracteriza-se pela municipalização, descentralização e transferência para a iniciativa privada de serviços prestados por órgãos estatais, contexto em que ganham força alternativas privatistas para a questão social, crescem as ações no campo da filantropia e o trabalho voluntário. (2002, p. 182)

Page 132: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

131

talentos, de modo espontâneo e não remunerado, para causas de interesse

comunitário, humanitário e social. A construção da cidadania apresenta-se

como parte das motivações para que os cidadãos assumam responsabilidades

sociais na vida em sociedade (2002, p.178).

Acreditamos ser necessário destacar alguns aspectos que julgamos

relevantes. O primeiro refere-se à abrangência que o trabalho voluntário vem

assumindo e o seu tendencial crescimento. Nesse sentido, vale ressaltar que o

voluntariado é reconhecido e estimulado em todos os países pelos organismos

internacionais e governos nacionais.

Ressalta Yazbek (2002,p.173) que, no Brasil, a ação do voluntariado

envolveu, no final de 2001, quase 20 milhões de pessoas que vêm colaborando

com as instituições de solidariedade social, dedicando parte de seu tempo e/ou

recursos ao atendimento às necessidades das populações de baixa renda , o

que equivale, afirma ela, a “333 mil empregos de 40 horas semanais cada”

(Jornal O Estado de São Paulo, 21/10/2001). Ou ainda, conforme dados da

Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais – ABONG, de

que 40% das empresas do país investem no trabalho voluntário para

desenvolver seus projetos (KAMEYAMA, 2001, p.34).

Um outro aspecto relacionado ao trabalho voluntário refere-se ao tempo

livre que “no contexto atual permeia não somente o discurso empresarial, como

também do Estado, das organizações do ‘terceiro setor’ e demais segmentos”

(ABREU, 2006).

Internamente a gente tem também o voluntariado que somos nós mesmos, que organizamos o evento e ficamos à noite. A gente tem muitos empregados que fazem o voluntariado final de semana, à noite. (P.6)

Nós somos liberados para fazer esse trabalho, inclusive em horários de expediente, o que não significa que façamos esse trabalho só no horário de expediente. Mas o que caracteriza esse programa é o fato de a gente ter a liberação da empresa. O que significa que tem o apoio da alta direção, para a gente realizar aquilo que vem sendo planejado. (P.1)

Os voluntários não só do comitê, são de toda a força de trabalho: motorista, o pessoal da limpeza, engenheiro, todos são voluntários. (G.7)

Page 133: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

132

O trabalho voluntário, na concepção de Abreu (2006), representa um

mecanismo significativo na materialização da chamada responsabilidade social

compartilhada entre indivíduos e organizações da sociedade e o Estado, nos

atendimentos sociais e controle sobre a pobreza. Sendo assim, constitui-se em

um elemento de exploração da força de trabalho e de controle na medida em

que se funda na propagada utilização do tempo livre do trabalhador.

As ações consideradas de maior porte ou aquelas que demandam

patrocínios e envolvem um volume maior de recursos, além de darem mais

visibilidade à empresa ficam em outros setores.

Temos ações belíssimas de meio ambiente, que também é um dos indicadores de RS só que ficou coordenado pela assessoria do meio ambiente. Patrocínios pela Comunicação Social. (P.1)

Vou apresentar o que é o Serviço Social da Itamaraty. Hoje o setor de SS compreende ações diretamente ligadas ao benefício do plano de saúde a todos os empregados das Usinas Itamaraty. A parte relacionada a questões previdenciárias, ao INSS. A relacionada aos projetos sociais ficou com a (...) Ela veio para cá. A formação dela é bióloga, ela veio de Belo Horizonte. O marido dela é diretor. (P.4)

4.11 O trabalho do assistente social

É através do trabalho, segundo Marx, que o homem transforma a

natureza ao mesmo tempo em que transforma a si próprio. O trabalho é, pois

uma atividade fundamental do homem, pois é através do trabalho que o

homem satisfaz suas necessidades. Pelo trabalho o homem se afirma com um

ser social, diferente da natureza. É por meio do trabalho que o homem se

afirma como um ser que dá respostas prático-conscientes aos seus

carecimentos, às suas necessidades. É por meio do trabalho que o homem se

afirma como ser criador, não como indivíduo pensante, mas como indivíduo

que age consciente e racionalmente. É uma atividade que tem uma necessária

dimensão ética, como atividade direcionada a fins, que tem a ver com valores,

com o dever ser, envolvendo uma dimensão de conhecimento ético-moral

(IAMAMOTO, 1998).

Page 134: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

133

O assistente social, como qualquer outro trabalhador participa do

processo de trabalho através da venda, por tempo determinado, da única

mercadoria que possui que é a sua força ou capacidade de trabalho. Como não

detém os meios de trabalho 58 necessários para a efetivação de seu trabalho

ele vai depender, para realizá-lo dos recursos materiais, financeiros e

organizacionais fornecidos pelas entidades empregadoras59. É a sua condição

de trabalhador assalariado que não só enquadra o Assistente social na relação

de compra e venda da força de trabalho, mas molda sua inserção sócio-

institucional na sociedade brasileira (IAMAMOTO, 1998, p. 63).

O fato de ser um trabalhador assalariado faz com que o assistente social

se depare com alguns limites no desenvolvimento de suas ações profissionais.

A relativa autonomia de que o assistente social dispõe é um desses limites que

fazem com que o direcionamento de suas atividades não dependa

exclusivamente da sua vontade. O assistente social deve submeter-se às

exigências de quem comprou o direito de utilizar a sua capacidade de trabalho.

Por outro lado é essa relativa autonomia que lhe abre a “possibilidade de

redirecionar o sentido das suas ações para rumos sociais distintos daqueles

esperados por seus empregadores.” Como sabemos o objeto de trabalho ou a

matéria prima de trabalho do assistente social é a questão social, ou seja, a

ação social do assistente social dar-se-á junto às várias expressões ou

manifestações da questão social que, na contemporaneidade, têm como

seqüelas mais evidentes o desemprego crescente, a perda dos direitos sociais,

a precarização do emprego, fatores, dentre outros, que incidem em todos os

58 Além das coisas que permitem ao trabalho aplicar-se a seu objeto e servem de qualquer modo para conduzir a atividade, consideramos meios de trabalho em sentido lato todas as condições materiais seja como for necessárias à realização do processo de trabalho. “Elas não participam diretamente do processo, mas este fica sem elas total ou parcialmente impossibilitado de concretizar-se”. Karl Marx. O capital, livro 1.v.I, p.205. 59 Em relação aos meios de trabalho do assistente social, Iamamoto (1998, p. 63), aponta o conhecimento como um meio de trabalho, sem o que esse trabalhador (o Assistente Social) especializado não consegue efetuar sua atividade ou trabalho. O conhecimento é um meio pelo qual é possível decifrar a realidade e clarear a condução do trabalho a ser realizado. Nessa perspectiva, o conjunto de conhecimentos e habilidades adquiridos pelo Assistente Social, ao longo do seu processo formativo, são parte do acervo de seus meios de trabalho. Por não deter todos os meios necessários a efetivação de seu trabalho (financeiros, técnicos e humanos) características das profissões liberais, o assistente social, mesmo reconhecido como profissional liberal, não atua como tal.

Page 135: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

134

aspectos da vida em sociedade e incidem também na profissão de Serviço

Social e nas outras profissões que atuam na área social.

Sem desconsiderar a gravidade da situação, deve-se levar em conta

que esse mesmo processo, de agudização da questão social, descortina novas

possibilidades de trabalho que “necessitam ser apropriadas, decifradas e

desenvolvidas. Porque se os assistentes sociais não o fizerem, outros farão,

absorvendo progressivamente espaços ocupacionais até então a eles

reservados (IAMAMOTO, 1998).

É ainda Iamamoto (1998, p.107) quem nos alerta no sentido de não

perdermos de vista que um dos desafios maiores para decifrar o exercício

profissional está em apreender as particularidades dos processos de trabalho

que em circunstâncias diversas vão atribuindo feições, limites e possibilidades

ao exercício da profissão, ainda que esta não perca a sua identidade. Nesta

linha de raciocínio, faz-se necessário considerar alguns requisitos que são

fundamentais para entender o trabalho do assistente social:

• O assistente social é chamado a desempenhar sua profissão em um

processo de trabalho coletivo, organizado dentro de condições

sociais dadas.

• O processo de trabalho em que se insere o assistente social não é

por ele organizado e nem é exclusivamente um processo de trabalho

do assistente social, ainda que dele participe de forma peculiar e com

autonomia técnica.

• O assistente social não dispõe de um poder mágico de “esculpir” o

processo de trabalho no qual se inscreve, o que ultrapassa a

capacidade de ingerência de qualquer trabalhador assalariado

individualmente. É função do empregador organizar e atribuir unidade

ao processo de trabalho na sua totalidade, articulando e distribuindo

as múltiplas funções e especializações requeridas pela divisão social

e técnica do trabalho entre o conjunto dos assalariados.

No entanto, há que se ressaltar que, apesar das limitações que

conformam a atuação profissional, o assistente social deve buscar as

Page 136: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

135

possibilidades que são inerentes às contradições que conformam a profissão e

a própria realidade social.

Nesse sentido, Montaño (2007, p.107) é provocativo quando afirma que

um profissional qualificado, comprometido e crítico procura ir além das

demandas imediatistas e rotineiras e desenvolver um outro tipo de prática que

incorpore as demandas do (empregador), mas que as transcenda (atingindo a

compreensão das verdadeiras causas das necessidades/ demandas da

população e intervindo nesta perspectiva de totalidade).

A fala de José Paulo Netto, na 33ª Conferência mundial de Escolas de

Serviço Social, realizada em Santiago do Chile, em agosto de 2006, é um

alerta no sentido de nos chamar a atenção para o fato de que os desafios

colocados para o Serviço Social “não se situam no âmbito de técnicas ou

procedimentos interventivos, não se inscrevem no circuito instrumental.

Inscrevem-se no âmbito da compreensão do significado social da sua

intervenção, e este significado só é inteligível se se elucidarem as condições

em que as relações sociais se processam (vale dizer: se produzem e se

reproduzem) na sociedade contemporânea”. Assim, diz ele: a ordem

contemporânea é o desafio atual.

Page 137: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

136

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pensamos que neste momento o nosso ponto de chegada seja este.

Contudo, acreditamos que não existe chegada definitiva, o ponto de chegada é

sempre um indicativo da partida. Acreditamos que outras reflexões possam vir

a ser desenvolvidas a partir daqui.

Não temos dúvidas de que este estudo não cobre todas as questões

sobre a atuação do assistente social na responsabilidade social das empresas

de Mato Grosso, bem como, de que muitas das afirmações ou aspectos foram

abordados apenas de passagem. Contudo, esperamos que, de alguma forma,

seja mais uma contribuição no sentido de desencadear reflexões sobre o

trabalho do assistente social nas ações de responsabilidade social

desenvolvidas pelas empresas, não só em Mato Grosso, mas nas empresas de

um modo geral, considerando que embora seja motivo de controvérsias e

desconfianças, não se pode negar que a responsabilidade social empresarial

atravessa o trabalho do assistente social e como tal enseja respostas

competentes.

Uma primeira constatação que tivemos a partir dos depoimentos é que a

responsabilidade social empresarial é concebida de diferentes formas pelos

sujeitos entrevistados. “A responsabilidade social empresarial é definida como:

“apoio a alguém ou a alguma entidade”;” faz parte do meu negócio”, ou ainda,

“tem que ser vista assim como a gente tem responsabilidade com a nossa

família”; “vem da própria diretoria (..) é algo natural”.

Entendemos que a heterogeneidade encontrada quanto ao

entendimento do que seja a responsabilidade social empresarial decorre da

ambigüidade de sua própria concepção. Ainda em relação a esse aspecto o

que também chamou nossa atenção foi a recorrência, muitas vezes implícita, à

concepção adotada pelo Instituto ETHOS, o que no nosso entender demonstra

a influência que esse instituto tem em relação a responsabilidade social

empresarial em Mato Grosso.

Page 138: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

137

Vale ressaltar também a preocupação dos sujeitos com o

desenvolvimento sustentável e com a preservação do meio ambiente, o que

além de constar nos princípios defendidos pelo Instituto ETHOS, faz parte de

um movimento mundial de defesa do meio ambiente e de um desenvolvimento

sustentável.

Quanto as ações de responsabilidade social desenvolvidas pelas

empresas, pudemos ver que são diversificadas. Vão, desde palestras sobre

saúde do homem, saúde da mulher, dependência química, à doação de

geladeiras, criação de associações, e cooperativas. Vale ressaltar que as

ações, conforme relataram os sujeitos, são quase sempre motivadas por um

problema enfrentado pela empresa. Ou seja, a maioria das ações de

responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas se constituem em

respostas aos problemas que emergem em decorrência da própria atuação da

empresa.

O marketing é um outro aspecto que merece ser enfatizado. Apesar de

não aparecer como motivo que leva as empresas a desenvolver ações de

responsabilidade social se faz presente de modo inquestionável e pode ser

explicitado no reconhecimento que os gestores têm dos ganhos que advém das

ações sociais desenvolvidas pelas empresas. Isso ficou patente nos

depoimentos quando os gestores se referem a imagem da empresa, ou a

credibilidade que a empresa tem diante dos consumidores. Um outro aspecto

que denota a preocupação, ainda que não confessada, com o marketing é a

localização da responsabilidade social na empresa, por exemplo, no setor de

comunicação, o que deixa antever o que a empresa pretende com a

responsabilidade social.

Uma das hipóteses que tínhamos quando começamos este estudo é a

de que havia rejeição do assistente social à responsabilidade social

empresarial por entender tratar-se de estratégia neoliberal surgida a partir da

desresponsabilização do Estado em relação ao desmonte dos direitos sociais

universais, ou por representar um novo tipo de arranjo que viria substituir o

contrato social pela mediação das organizações privadas, ou ainda , por não

acreditar que as ações sociais desenvolvidas pelas empresas pudessem

Page 139: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

138

solucionar os problemas decorrentes das diversas expressões da questão

social. No entanto, os depoimentos dos sujeitos entrevistados nos mostraram

outra realidade.

As ações de responsabilidade social empresarial ficam sob a

responsabilidade de profissionais de outras áreas, como médico, bióloga,

engenheiro, psicóloga. O assistente social parece não ser um dos profissionais

mais requisitados para desenvolver as ações de responsabilidade social nas

empresas. Na maioria das empresas pesquisadas, o que compete aos

assistentes sociais são as ações do voluntariado, não só enquanto

coordenadores dessas ações, mas os próprios profissionais enquanto

voluntários indicando que o voluntariado é um dos aspectos que vem

atravessando o trabalho profissional (IAMAMOTO, 2002). É uma realidade

preocupante e que não pode ser desconsiderada pelas graves conseqüências

que podem advir para a profissão.

É necessário se ter presente que a ênfase no voluntariado faz parte da

estratégia neoliberal de desresponsabilização do Estado em relação ao

desmonte dos direitos sociais universais, que transforma esses direitos em

benefícios e leva aqueles que os recebem a se sentirem favorecidos e

agradecidos. Ter presente que no momento em que o desemprego e a

precarização do emprego aparecem como marcas maiores dos

desdobramentos da questão social, o voluntarismo repercute na vida dos

trabalhadores incluindo os assistentes sociais, que passam a sofrer a

concorrência do trabalho gratuito, e, o que é pior, como se refere Iamamoto

(2002), com sérias incidências na vida dos indivíduos sociais e dos sujeitos

coletivos que passam a ser objeto da ação desinteressada e solidária de

diferentes classes sociais, em especial daquelas articuladas ao bloco do poder

ou vinculadas ao seu projeto para a sociedade.

Como nos referimos na análise, não encontramos, nos depoimentos,

nenhum aspecto que pudesse indicar que as assistentes sociais entrevistadas

se sentissem desconfortáveis ou que fizessem alguma reflexão sobre o fato de

participarem como voluntárias, nas ações desenvolvidas pelas empresas. Isso

nos remete à hipótese levantada por Batista (2002, p.279) na sua tese de

Page 140: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

139

doutorado, de que “os assistentes sociais, em seus espaços sócio-

ocupacionais e no trabalho profissional, face às dificuldades encontradas para

colocar em movimento procedimentos teórico-metodológicos, ético-políticos e

técnico-operativos que conduzam a uma intervenção inclusiva, ontológica e

critica, estão restaurando práticas conservadoras”.

Por outro lado, é pertinente nos remetermos também ao que nos é

trazido por Iamamoto (2002, p.45) quando nos chama à atenção para o fato de

que esses “voluntários” não são necessariamente conservadores, podendo ser

absorvidos em um projeto social de outra natureza articulado pelas forças

sociais progressistas e populares, que lhes permita transitar da condição de

“cidadão de boa vontade” ao efetivo exercício da cidadania social e política. O

que requer capacitação teórica e formação política estimuladora de uma cultura

pública democrática. No entanto, a referida autora é cautelosa ao dizer que a

relação do Serviço Social com o voluntariado é uma questão que merece ser

melhor debatida e amadurecida.Trata-se, segundo ela, de um tema em aberto.

Concordamos com as considerações feitas por Iamamoto, mas

reafirmamos que consideramos preocupante o fato de não termos vislumbrado

nos depoimentos a disposição, por parte das profissionais entrevistadas, de

desencadearem qualquer reflexão a respeito da relação da profissão com o

voluntariado, parece que essa é uma situação dada que não suscita

questionamentos ou inquietações. A utilização do tempo livre nas atividades

voluntárias também não é questionado pelas assistentes sociais.

Assim, longe de ter respostas o que fica é a indagação no sentido de

querer explicitar o que realmente significa essa adesão do assistente social ao

voluntariado no atual momento histórico-social? Quais conseqüências podem

advir dessa relação e qual vai ser a repercussão na profissão daqui há algum

tempo?

Nesse sentido, a afirmação feita por Guerra (2008, p.11) é

esclarecedora. Segundo a autora, a prática profissional que não se diferencia

de ações de leigos, filantropos e voluntários ainda permanece na intervenção

profissional muito mais pela ausência de um claro referencial teórico-

Page 141: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

140

metodológico e ético político crítico, ausência esta que limita a sociedade e o

assistente social a perceberem que na sua condição de assalariado encontram-

se as premissas reais que diferenciam a prática profissional de intervenções

assistencialistas, assistemáticas e filantrópicas.

Consideramos finalmente que esta pesquisa não tem a pretensão de

esgotar a discussão sobre a atuação do assistente social nas ações de

responsabilidade social desenvolvidas pelas empresas em Mato Grosso.Pelo

contrário, consideramos este estudo como uma primeira aproximação

investigativa que deve ser continuada e refletida a partir das novas

conformações e demandas que a realidade traz a cada momento e que nos

coloca diante de desafios que devem ser desvendados.

Page 142: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

141

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABREU, Marina Maciel. A questão da solidariedade na atual reestruturação das

relações capital X trabalho: cooperativismo e filantropia como elementos

estratégicos. Comunicação do X Encontro Nacional de Pesquisadores em

Serviço Social realizado em Recife-PE, o período de 04 a 08 de dezembro de

2006.

ACOTTO, Laura. Las organizaciones de la sociedad civil: un camino para a la

construccion de cidadanía. Buenos Aires: Espacio, 2003.

AHSLEI, Patrícia A. (Coord) Ética e responsabilidade social nos negócios. 2.ed.

São Paulo: Saraiva 2006.

ANDRÉ, Marli E.D.A. LUDKE, Menga. Pesquisa em educação: abordagens

qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.

ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho? Ensaios sobre as metamorfoses e a

centralidade do mundo do trabalho. São Paulo: Cortez, 1997.

_________________. Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a afirmação e a

negação do trabalho. São Paulo: Boitempo Editorial, 1999.

ARANTES, Paulo Eduardo. Esquerda e direita no espelho das ONG’s.

Cadernos ABONG, São Paulo: Abong/Autores Associados, nº 27, maio, 2000.

BARBOSA Rui. A questão social e política no Brasil. In. Pensamento e Ação.

Março, 1919.

BARDAN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1979.

BATISTA, Alfredo. A questão social e as refrações no Serviço Social Brasileiro

na década de 1990. Tese de doutorado em Serviço Social. Puc-SP. 2002

BEGHIN, Nathalie. A filantropia empresarial: nem caridade nem direito. São

Paulo: Cortez, 2005.

Page 143: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

142

BONETTI, Dilséa Adeodata. Serviço Social e ética: convite a uma nova práxis.

São Paulo: Cortez, 1996.

BRASIL. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado/Secretaria

da Reforma do Estado. Organizações sociais. Secretaria da Reforma do

Estado. Cadernos MARE da Reforma do Estado; v. 2, Brasília, 1997.

CABRAL, Eloísa Helena de. Terceiro setor: gestão e controle social. São Paulo:

Saraiva 2007.

___________ Espaço público e controle para a gestão social no terceiro setor.

Serviço Social & Sociedade, 86. São Paulo: Cortez, 2006.

CALDEIRA, Tereza. A escuta do outro. Revista do Arquivo Municipal. São Paulo, DPH, nº. 200, 1992.

CARTA CAPITAL. Edição Especial, 301, p. 6, dezembro de 2003.

CARVALHO, Maria do Carmo B. Avaliação de Projetos Sociais. Texto

produzido para o Seminário de Avaliação Econômica de Projetos Sociais.

Novembro de 1994.

CASTEL, Robert. As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário.

Petrópolis, RJ: Vozes, 1998.

___________ As armadilhas da exclusão. In. Desigualdade e questão social.

São Paulo: Educ, 2000.

CERQUEIRA FILHO, Gisálio. A questão social no Brasil: crítica ao discurso

político. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1982.

CFESS. Código de ética profissional do assistente social e Lei n. 8.662/93, que

regulamenta a profissão de assistente social. Conselho Federal de Serviço

Social, 1994.

CHAROUX, Adriana, Guazzelli. A Ação Social das Empresas. Quem Ganha

com Isso? TCC. Fundação Armando Álvares Penteado-FAAP. Faculdade de

Page 144: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

143

Comunicação Social/FACOM. Curso de Relações Públicas. São Paulo, junho

de 2005.

CHESNAIS, François. A mundialização do capital. São Paulo: Xamã, 1996.

CHOMSKI, Noam. O lucro ou as pessoas? Neoliberalismo e ordem global. Rio

de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004.

COSTA, Lúcia Cortes. A Reforma do Estado no Brasil: uma crítica ao ajuste

neoliberal. Tese de Doutorado em Serviço Social. PUC-SP, 2000.

COSTA. Maria Alice Nunes. Mudanças Empresariais no Brasil Contemporâneo;

o investimento social privado na saúde é uma nova forma de solidariedade?

Tese de Doutorado. IPPUR-UFRJ. Rio de Janeiro. março de 2006.

DAGNINO, Evelina et alii (orgs). A disputa pela construção democrática na

América Latina. São Paulo: Paz e Terra, 2006.

DIÁRIO OFICIAL do Estado de Mato Grosso. Ano CXI nº 23.400, terça feira, 25

de junho de 2002.

DIEESE. Nota Técnica, n. 29. Normas de Responsabilidade Social da ISSO e

da ABNT: subsídios para o movimento sindical. Julho, 2006.

_______.Nota Técnica, n.40. Responsabilidade Social Empresarial e

Financiamento Público para Empresas. Dezembro, 2006.

DUPAS, Gilberto. Economia global e exclusão social: pobreza, emprego,

Estado e o futuro do capitalismo. São Paulo: Paz e Terra, 2001.

ETHOS. Instituto Ethos de Responsabilidade Social. Disponível em

http://www.ETHOS.org.br.

FAGNANI, Eduardo. Ajuste econômico e financiamento da política social

brasileira: notas sobre o período 1993/98. Economia e sociedade, Campinas

(13): 155-178, dez.1999.

Page 145: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

144

FALCONER, Andrés Pablo. As promessas do terceiro setor: um estudo sobre a

construção do papel das organizações sem fins lucrativos e do seu campo de

gestão. Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação

em Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo. São Paulo,

1999.

FIEMT. Federação das Indústrias de Mato Grosso. Disponível em

http://www.fiemt.com.br.

FECOMERCIO. Federação do Comercio de Mato Grosso. Disponível em

http://www.fecomercio-mt.com.br/impressao.asp?id=360&tipo=not.

FERNANDES, Rubem César. Privado, porém público – o terceiro setor na

América Latina. Rio de Janeiro: Civicus, 1994.

FISCHER, Rosa Maria. A responsabilidade da cidadania organizacional. In.

FLEURY, Maria Tereza. As pessoas na organização. São Paulo: Gente, 2002.

FOLHA DE SÃO PAULO, Caderno 3,11de dezembro de 2004.

FONTENELLI, Isleide Arruda. O nome da marca: McDonald’s fetichismo e

cultura descartável. São Paulo: Boitempo Editorial, 2002.

FURTADO, Celso. A análise do “modelo brasileiro”. Rio de Janeiro: Civilização

Brasileira, 1982.

GARCIA, Bruno Gaspar. Responsabilidade social empresarial, Estado e

sociedade civil: o caso do Instituto ETHOS. In: Responsabilidade social das

empresas: a contribuição das universidades. São Paulo: Petrópolis, 2002.

GARCIA, Joana. O negócio do social. Rio de janeiro: Jorge Zahar. Ed. 2004.

GIFE. Grupo de Institutos, Fundações e Empresas. Disponível em

http://www.gife.org.br.

GIOLO, Jaime. Estado, Igreja e educação no RS da primeira República. Tese

de Doutorado. São Paulo: Feusp, 1997.

Page 146: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

145

GOHN, Maria da Glória. Os sem-terra, ONGs e cidadania :a sociedade civil

brasileira na era da globalização. São Paulo: Cortez, 1997.

______.O protagonismo da sociedade civil: movimentos sociais, ONGs e redes

solidárias. São Paulo: Cortez, 2005. (Coleção questões da nossa época;

v.123).

GOMES, Adriano. A (ir)responsabilidade social das empresas e seus

desmembramentos.Pesquisa realizada junto às empresas do setor financeiro,

associadas ao Instituto Ethos de Responsabilidade Social no período de 2001 a

2002.Tese de Doutorado, PUC-SP,2005.

HARVEY, David. Condição pós-moderna. Edições Loyola: São Paulo, 2003.

HOBSBAWM, Eric. Era dos extremos: o breve século XX: 1914-1991. São

Paulo: Companhia das Letras, 1995.

IAMAMOTO, Marilda V. Relações sociais e serviço social no Brasil: esboço de

uma interpretação histórico-metodológica. São Paulo: Cortez; [Lima, Peru]

CELATS,1988.

________________O serviço social na contemporaneidade; trabalho e

formação profissional. São Paulo: Cortez, 1998.

_________________Projeto profissional, espaços ocupacionais e trabalho do

Assistente Social na atualidade. Texto base da palestra proferida no XXX

Encontro Nacional do CFESS – CRESS, realizado em Belo Horizonte/MG, 03

de setembro de 2001.

____________.A questão social no capitalismo. In. Temporalis. Ano 2, n.3.

jan/jul. Brasília: ABEPSS; Grafline, 2001.

_____________. Projeto Profissional: espaços ocupacionais e trabalho do

assistente social na atualidade. Texto base da palestra sobre a política nacional

de fiscalização do exercício profissional e os espaços ocupacionais: avanços e

Page 147: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

146

desafios, proferida no XXX Encontro Nacional do CFESS/CRESS realizado em

Belo horizonte-MG no dia 03 de setembro de 2001.

____________. Algumas das particularidades históricas que redimensionam a

produção/reprodução da questão social na atualidade. Texto utilizado na

Atividade Programada: Questão Social na Contemporaneidade, do Programa

de Estudos Pós Graduados em serviço Social da PUC-SP, em 25 de abril de

2002.

____________.Atribuições privativas do (a) assistente social. CFESS,

fevereiro, 2002.

____________. Os caminhos da pesquisa no Serviço Social. Texto base da

conferência proferida no IX Encontro Nacional de Pesquisadores em Serviço

Social: os desafios da pesquisa e da produção de conhecimento em Serviço

Social. Porto Alegre, 03 de dezembro de 2004.

____________. Serviço Social em tempo de capital fetiche; capital financeiro,

trabalho e questão social. São Paulo: Cortez, 2007.

IANNI, Octavio. A era do globalismo. 2ª ed. Rio de Janeiro: Civilização

Brasileira, 1996.

INEP. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira.

Educação Superior Brasileira: 1991-2004 Mato Grosso. Brasília, 2006.

IPEA. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Disponível em

http://www.ipea.gov.br/asocial.

IPEA/DISOC. A iniciativa privada e o espírito público: a evolução da ação social

das empresas privadas no Brasil. Brasília, julho de 2006.

_________Nota Técnica: A queda recente da desigualdade no Brasil. Brasília,

21 de julho de 2006.

INSTITUTO AKATU. Pesquisa 2005: Responsabilidade social das empresas:

percepção do consumidor brasileiro. São Paulo: Instituto Akatu, 2005.

Page 148: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

147

ISTO É, 1958, de 09/05/2007, p.34-35. São Paulo: Ed. Abril, 2007.

YAZBEK, Maria Carmelita. A política social brasileira nos anos 90: a

refilantropização da questão social. In: Cadernos ABONG. São Paulo, 1995.

___________________Os fundamentos do Serviço Social na

Contemporaneidade. Modulo IV do Curso de Capacitação em Serviço Social e

política social. CFESS/ABEPSS/CEAD/UNB, 2000, v.4, p.19-34.

___________________ Terceiro setor e despolitização. Revista Inscrita,

CFESS, v.6, p.13-19, 2000.

___________________Pobreza e exclusão social: expressão da questão social

no Brasil. In. Temporalis. Ano2, n.3, jan/jul. Brasília: ABEPSS, Grafline, 2001.

___________________ Voluntariado e profissionalidade na intervenção social.

In. Actas do Seminário “info-exclusão, info-inclusão e novas tecnologias:

desafios para as políticas sociais e para o serviço social.” Intervenção Social, n.

25/26, Lisboa, Novembro 2002.

__________________ Classes subalternas e assistência social.São

Paulo:Cortez,2003.

KAMEYAMA, Nobuco. A nova configuração das políticas sociais. Praia

Vermelha. n. 5. UFRJ. Programa de Pós-Graduação da Escola de Serviço

Social. Rio de Janeiro, 2001.

KAMEYAMA, Nobuco. Notas introdutórias para a discussão sobre

reestruturação produtiva e Serviço Social. In. A nova fábrica de consensos:

ensaios sobre a reestruturação empresarial, o trabalho e as demandas ao

Serviço Social. Ana Elizabete Mota (organizadora). São Paulo: Cortez, 2000.

KANITZ, Stephen. Responsabilidade social. Disponível em

http://www.filantropia.org/artigos/kanitz_responsabilidade_social.htm.

Page 149: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

148

KARKOTLI, Gilson & ARAGÃO, Sueli Duarte. Responsabilidade Social: uma

contribuição à gestão transformadora das organizações. Petrópolis, RJ: Vozes,

2004.

LUKÁCS, George. As bases ontológicas do pensamento e da atividade do

homem. Temas de Ciências Humanas. No. 4 Tr. C.N. Coutinho: Livraria Ed.

Ciências Humanas. São Paulo, 1978.

MARTINELLI, Antônio Carlos. Empresa cidadã: uma visão inovadora para uma

ação transformadora. In Ioschipe, Evelyn [et.al]. 3º Setor: desenvolvimento

social sustentado. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 2005.

MARTINELLI, Maria Lúcia. Serviço Social: identidade e alienação. São Paulo:

Cortez, 1989.

__________. (org). Pesquisa qualitativa: um instigante desafio. São Paulo:

Veras Editora, 1999.

MARTINS, José de Souza. Sobre o modo capitalista de pensar. São Paulo:

Editora Hucitec, 1978.

______________________.Frente pioneira: contribuição para uma

caracterização sociológica. In: Martins José de Souza. Capitalismo e

tradicionalismo. São Paulo: Pioneira, 1975.

______________________Expropriação & violência: a questão política no

campo. São Paulo: Editora Hucitec, 1982.

____________________. A sociedade vista do abismo. Novos estudos sobre a

exclusão, pobreza e classes sociais. Petrópolis/RJ: Vozes, 2002.

MEDEIROS, Maria do S. Lopes. A história do ensino de Serviço Social em

Cuiabá, de 1970 a 1982. Dissertação de Mestrado. Departamento de Serviço

Social. PUC-RJ. Rio de Janeiro,1984.

MELO NETO, Francisco de Paulo; & FROESZ, César. Responsabilidade social

& cidadania empresarial: a administração do terceiro setor. Rio de Janeiro:

Page 150: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

149

Qualitymark, 2002.

MINAYO, Maria Cecília de Souza. O desafio do conhecimento: pesquisa

qualitativa em saúde. 5ª ed. São Paulo/Rio de Janeiro: HUCITEC/ABASCO,

1998.

_____________(org.) Pesquisa social: teoria, método, criatividade.

Petrópolis/RJ: Vozes, 1994.

MODESTO, Marly Morbeck da Silva. Serviço Social e gestão de recursos

humanos: reflexões sobre a escassa absorção do profissional assistente social

nos pólos industriais da grande Cuiabá. Dissertação de Mestrado, Puc-RJ, Rio

de Janeiro, 1992.

MONTAÑO, CARLOS. Das “lógicas do Estado” as “lógicas da sociedade civil”.

Estado e “terceiro setor” em questão. Serviço Social & Sociedade. n. 59. São

Paulo: Cortez, 1999.

_________. Terceiro Setor e questão social: critica ao padrão emergente de

intervenção social. São Paulo: Cortez, 2002.

MORENO, Gislaine & HIGA, Tereza C.de Souza (orgs.) Geografia de Mato

Grosso: território, sociedade e ambiente. Cuiabá: Entrelinhas, 2005.

NASCIMENTO, Elimar Pinheiro do. Estado e sociedade no Brasil; novos

padrões de relacionamento? Brasília: Conselho da Justiça Federal, 1997. (Série

monografias do CEJ, vol.4).

NETTO, José Paulo. Notas para a discussão da sistematização da prática e

teoria em Serviço Social. Cadernos ABESS: A metodologia no Serviço Social.

São Paulo: Cortez, n.3,1989.

_______. Capitalismo monopolista e Serviço Social. São Paulo: Cortez,1992.

_______. Transformações societárias e Serviço Social: notas para uma análise

prospectiva da profissão no Brasil. Serviço Social & Sociedade. n. 50. São

Paulo: Cortez, 1996.

Page 151: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

150

_______. Cinco notas a propósito da “questão social”. In. Temporalis. Ano 2,

n.3. jan/jul. Brasília: ABEPSS/Grafline, 2001.

_______. A ordem social contemporânea é o desafio central. Texto da palestra

proferida na 33ª Conferência Mundial de Escolas de Serviço Social. Santiago

do Chile, 28/31 de agosto de 2006.

NOGUEIRA, Marco Aurélio. Um Estado para a sociedade civil: temas éticos e

políticos da gestão democrática. São Paulo: Cortez, 2004.

OLIVEIRA, Fábio Risério de. Relações públicas e a comunicação na empresa

cidadã. In: Responsabilidade social das empresas: a contribuição das

universidades. São Paulo: Petrópolis, 2002.

OLIVEIRA, Francisco & PAOLI, Maria Célia (orgs). Os sentidos da democracia:

Políticas do discenso e hegemonia global. Petrópolis/RJ: Vozes; Brasília:

NEDIC, 1999.

PAOLI, Maria Célia. Empresas e responsabilidade social: os enredamentos da

cidadania no Brasil. In. Democratizar a democracia: os caminhos da

democracia participativa. Boa Ventura de Sousa Santos, organizador. 3ª ed.

Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005.

PASTORINI, Alejandra. A categoria questão social em debate. São Paulo,

Cortez, 2004.

__________. Quem mexe os fios das políticas sociais? Avanços e limites da

categoria “concessão-conquista”. Serviço Social & Sociedade, n. 53. São

Paulo: Cortez, 1997.

PELIANO, Anna Maria T. Medeiros. A iniciativa privada e o espírito público: um

retrato da ação social das empresas no Brasil. Brasília: IPEA, 2003.

PELIANO, Anna Maria T. Medeiros; SILVA, Enid Rocha Andrade. Bondade ou

interesse? Como e porque as empresas atuam na área social. Brasília: IPEA,

2001.

Page 152: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

151

POCHMANN. Márcio... [et. al]. Atlas da exclusão social. v. 4: a exclusão no

mundo. São Paulo, Cortez, 2004.

RAICHELIS, Raquel. Esfera pública e conselhos de assistência social:

caminhos da construção democrática. São Paulo: Cortez, 2000.

RICHERS, Raimar. O que é marketing. São Paulo: Brasiliense, 2003. (Coleção

Primeiros Passos).

ROSANVALLON, Pierre. La nueva cuestión social-repensando el Estado

providencia. Buenos Aires: Manathial, 1995.

SAVIANI, Dermeval. Educação: do senso comum à consciência filosófica. 9.

ed., São Paulo: Cortez/Autores Associados, 1989.

SILVA, César Augusto Tibúrcio & FREIRE, Fátima de Souza. Balanço social:

teoria e prática. São Paulo: Atlas, 2001.

SILVA, Ivone Maria Ferreira da. A formação histórica da questão social no

Brasil e sua vinculação com o Serviço Social: uma viagem incompleta, mas

repleta de emoções. Tese Doutorado em Serviço Social, PUC São Paulo, 2005.

SIMÕES, Carlos. Curso de direito do Serviço Social. São Paulo: Cortez, 2007.

(Biblioteca básica de serviço social; v.3).

SOUZA, Herbert de. Balanço Social nas Empresas Públicas. Gazeta Mercantil,

São Paulo 6/5/97.

SUCUPIRA, João. A responsabilidade social das empresas. 1999. Disponível

em www.balançosocial.org.br . Acesso em 04/09/2005.

TENÓRIO, Fernando Guilherme. Responsabilidade social empresarial: teoria e

prática. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2004.

TRAGTENBERG, Maurício. Administração, poder e ideologia. Rio de Janeiro:

Editora Moraes, 1980.

Page 153: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

152

WANDERLEY, Luiz Eduardo. A questão social no contexto da globalização: o

caso latino-americano e o caribenho. In. Belfiore-Wanderley. Desigualdade e a

questão social. São Paulo: Educ, 1997.

WANDERLEY, Mariângela Belfiore (org). Desigualdade social e questão social.

São Paulo: Educ, 1997.

ANEXOS

Page 154: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

153

ANEXO I

Instrumental de Entrevista nº. 1

I.ROTEIRO DA ENTREVISTA PARA O RESPONSÁVEL PELA EMPRESA (gerente ou diretor).

1. O que é responsabilidade social para esta empresa? 2. O que levou esta empresa a desenvolver ações de responsabilidade

social?(motivações)

3. Quais as ações sociais que essa empresa desenvolve? 4. Quem é o público alvo dessas ações? 5. Quem desenvolve as ações sociais na empresa? 6. Como os diferentes setores da empresa se envolvem nas ações de

responsabilidade social desenvolvidas pela empresa? 7. Como a empresa se posiciona diante:

• dos funcionários, • dos consumidores/clientes • da comunidade • dos acionistas

8. Como as ações sociais desenvolvidas pela empresa são avaliadas? 9. A empresa faz o balanço social? 10. Você considera esta empresa socialmente responsável?Por que?

Page 155: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

154

ANEXO II

Instrumental de Entrevista nº. 2

II. ROTEIRO DA ENTREVISTA PARA O ASSISTENTE SOCIAL 1. Concepção de responsabilidade social empresarial.

2. Ações sociais desenvolvidas pela empresa:

3. Público alvo das ações:

• crianças/adolescentes • idosos • meio ambiente • cultura • esporte • lazer e recreação • educação/alfabetização • assistência social • alimentação • segurança

4. Responsabilidade pelo desenvolvimento das ações sociais:

• gerência • pessoal do RH • voluntários • assistente social

5. Envolvimento dos diferentes setores da empresa no desenvolvimento

das ações sociais.

6. Avaliação das ações de responsabilidade social:

• Como é feita? • Por quem?

7. Elaboração do balanço social:

• quem elabora; • finalidade • participação do assistente social

8. Como a empresa se posiciona diante:

• dos funcionários,

Page 156: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

155

• dos consumidores/clientes • da comunidade • dos acionistas

9. Participação enquanto assistente social nas ações desenvolvidas pela

empresa.

• elaboração • implementação • avaliação

10. Perfil profissional exigido para que o assistente social possa

desenvolver as ações de responsabilidade social na empresa. • (existe? Não? Qual?).

11. Dificuldades encontradas, enquanto assistente social, na elaboração ou

desenvolvimento das ações de responsabilidade social desenvolvidas pela empresa.

12. Perspectivas em relação à responsabilidade social em Mato Grosso

Page 157: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

156

ANEXO III

LEI N° 7.687, DE 25 DE JUNHO DE 2002 - D.O. 25.06.02

Autores: Deputados Humberto Bosaipo, Riva e Eliene Cria o Certificado de Responsabilidade Social no Estado de Mato Grosso e dá outras providências. O GOVERNADOR DO ESTADO DE MATO GROSSO, tendo em vista o que dispõe o art. 42 da Constituição Estadual, sanciona a seguinte lei: Art. 1º Fica instituído o Certificado de Responsabilidade Social - MT a ser conferido, anualmente pela Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso, às empresas, órgãos públicos e demais entidades com sede no Mato Grosso que apresentarem seu Balanço Social do exercício anterior. § 1º Para fins do disposto no caput as empresas e demais entidades deverão encaminhar à Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso o seu Balanço Social até o dia 30 de março do ano seguinte referente ao Balanço anterior. § 2º O prazo de avaliação dos Balanços fica estipulado até o dia 30 de abril. § 3º Poderá a comissão de avaliação solicitar documentos para averiguação ou ir in loco conferir as informações contidas no Balanço Social. Art. 2º Para fins desta lei considera-se Balanço Social o documento pelo qual as empresas e demais entidades apresentam dados que permitam identificar o perfil da sua atuação social durante o exercício contábil, a qualidade de suas relações com os empregados, o cumprimento das cláusulas sociais, a participação dos empregados nos resultados econômicos e as possibilidades de desenvolvimento pessoal, bem como a forma de interação das empresas e de demais entidades com a comunidade e sua relação com o meio ambiente. § 1º O Balanço Social de que trata o caput será assinado por contador ou técnico em contabilidade e um assistente social devidamente habilitado ao exercício profissional. § 2º Os dados financeiros constantes no Balanço Social deverão ser extraídos das respectivas demonstrações contábeis elaboradas na forma da legislação vigente. Art. 3º A Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso tornará pública a relação das empresas que apresentarem o Balanço Social, nos termos da lei, outorgando-lhes Certificado de Responsabilidade Social – MT. Parágrafo único O Certificado de Responsabilidade Social – MT, de que trata o caput deste artigo, será entregue em Sessão Solene do Poder Legislativo Estadual, onde serão divulgados os resultados. Art. 4º Dentre as empresas certificadas, a Assembléia Legislativa elegerá os projetos mais destacados, os quais agraciará com o Troféu Responsabilidade Social – Destaque MT. § 1º Os troféus serão divididos por categoria da seguinte forma: 1. micro e pequena empresa; 2. média empresa;

Page 158: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

157

3. grande empresa; 4. ONG’s que desenvolvem projetos sociais; 5. ONG’s que desenvolvem projetos culturais; 6. ONG’s que desenvolvem projetos de turismo e meio ambiente; 7. ONG’s que desenvolvem projetos educacionais; 8. órgãos públicos. § 2º Dentre os aspectos a serem considerados por ocasião da escolha, constarão: 1. SETOR PRIVADO E ONGS: I - impostos: taxas, contribuições e impostos federais, estaduais e municipais; II - folha de pagamento bruta: valor total da folha de pagamento, incluídos os encargos sociais; III - condições de pagamentos: higiene e segurança do trabalho, número de acidentes de trabalho e número de reclamatória trabalhista; IV - alimentação: restaurante, tíquete-refeição, lanches, cestas básicas e outros gastos com a alimentação dos empregados; V - saúde: plano de saúde, assistência médica, programas de medicina preventiva, programas de qualidade de vida e outros gastos com saúde; VI - educação: treinamento, programa de estágio, reembolso de educação, bolsas de estudos, creches, assinaturas de revistas, gastos com educação e treinamento de empregados e seus familiares; VII - aposentadoria: planos especiais de previdência privada, tais como fundações previdenciárias, complementações de aposentadoria e outros benefícios aos aposentados; VIII - outros benefícios: participação nos resultados econômicos, seguros, empréstimos, gastos com atividades recreativas, transportes e outros benefícios oferecidos aos empregados; IX - contribuição para a sociedade: investimentos na comunidade nas áreas de cultura, esportes, habitação, saúde pública, saneamento, segurança, urbanização, educação; X - defesa civil, pesquisa, obras públicas e outros gastos sociais na comunidade e preservação do meio ambiente, discriminando, inclusive, o número de horas destinadas por seu quadro funcional ao trabalho voluntário; XI - investimentos em meio ambiente: reflorestamento, despoluição, gastos com introdução de métodos não poluentes e outros gastos que visem à conservação e melhoria do meio ambiente, inclusive com educação e conscientização ambiental; XII - número de empregados: número médio de empregados no exercício (registrados no último dia do período); XIII - número de admissões: admissões efetuadas durante o período; XIV - políticas adotadas visando a diminuir a exclusão de determinados segmentos sociais: descrição sintética de políticas adotadas pela empresa no sentido de diminuir a exclusão social através da admissão social dos idosos, deficientes e outros, no seu quadro funcional; 2. ÓRGÃOS PÚBLICOS: - Deverão ser considerados os itens acima, devendo ainda acrescentar os seguintes dados: I - qual o tempo de espera do contribuinte para ser atendido;

Page 159: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

158

II - ambiente de trabalho e sala de espera dos contribuintes; III - prazo médio de retorno às consultas, requerimentos ou solicitações feitas pelos requerentes; IV - espaço reservado para a comunidade fazer suas sugestões, críticas, anúncios, etc.; V - pesquisa acerca das necessidades de cada bairro junto à sua comunidade, a fim de constar do orçamento como prioridades; VI - se há guarda municipal, quantos estão lotados, onde estão localizados os postos de atendimento; VII - quantos veículos atendem à guarda municipal, tipo; VIII - quantas horas/aula de treinamento/aperfeiçoamento foram ministradas aos guardas municipais; IX - número de telefones à disposição da comunidade para contato com a guarda; X - número de empregados no final do período, discriminando os efetivos, comissionados e temporários; número de admissões durante o ano; XI - número de empregados por sexo, idade, escolaridade, procedência; XII - número de trabalhadores deficientes; XIII - composição familiar dos servidores (número de membros da família, número e idade dos filhos), tipo de moradia (própria, aluguel, financiado); XIV - existência de creches para filhos de servidores; XV - programa preventivo de saúde física e mental para os servidores; XVI - programas de estímulo para o lazer, esporte, cultura, através de associações ou clubes recreativos; XVII - plano de saúde, previdência, assistência médica e odontológica para os servidores, inclusive terapias alternativas; XVIII - seguro de vida atividades arriscadas; XIX - alimentação (restaurante ou tíquete), transporte e educação para o trabalho; XX - ambiente de trabalho: recursos humanos e materiais, com horas de trabalho aceitável e acesso às novas tecnologias; XXI - capacitação, treinamento, reciclagem, aperfeiçoamento, com a conseqüente valorização salarial; XXII - remuneração condigna, informando o valor bruto da folha e encargos decorrentes; XXIII - outras formas de desenvolvimento humano para os servidores e sua família; 2.1. Secretaria de Saúde: I - número de hospitais municipais, com atendimento pelo SUS, indicando local, número de servidores (médicos, enfermeiros, técnicos, auxiliar de enfermagem, coordenadores, diretores, motoristas, etc.), número de leitos, número de leitos por quarto, tipos de equipamentos, tipos de serviços prestados, quantas especialidades médicas; II - número e endereço de postos de saúde; se há postos em bairros da periferia; quais especialidades médicas oferecem; se há atendimento odontológico, fisioterapia; vacinação permanente (quais); III - quanto de medicamento foi distribuído pelos postos, quantos beneficiados; IV - quantas pessoas atendidas (dia/mês) em cada unidade de saúde, discriminando o número de remoções para centros mais avançados;

Page 160: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

159

V - quais as campanhas de vacinação foram realizadas; quantas crianças e adultos foram vacinados; quantas pessoas são vacinadas por dia nos postos de saúde (permanente); VI - número de unidades móveis de saúde (médica e odontológica); valor de cada uma; quais serviços oferecem; quantas pessoas atendidas; VII - número de ambulâncias, valor, quantos motoristas por veículo, quantas pessoas beneficiadas; VIII - quantidade e tipos de equipamentos à disposição da saúde (máquinas de Raios-X, endoscopia, ultra-sonografia, etc.); IX - Programa de Saúde Familiar: quantas casas foram visitadas e quantas pessoas beneficiadas; qual o período da visita; X - campanhas de saúde preventiva, banner’s e palestras de orientação sobre doenças contagiosas e outras, tais como: DST, Aids, Cólera, Dengue, tabagismo, Alcoolismo, Drogas, etc.; XI - qual o percentual (%) aplicado na saúde; XII - número de estação de tratamento de água, endereço; XIII - quantas residências e famílias têm acesso à água tratada; XIV - quantas campanhas de esclarecimento para não poluição dos rios e economia de água tratada pelos usuários; XV - ações de prevenção e/ou limpeza de rios que abastecem a cidade; XVI - quantos metros de esgoto sanitário foram executados, onde, quantas famílias beneficiadas; XVII - implantação e atuação do Conselho de Saúde; XVIII - outros; 2.2. Secretaria de Educação: I - número de escolas municipais, com o endereço de cada uma (urbanas e rurais); II - quantas salas de aula e a capacidade de cada uma, totalizando quantos alunos foram atendidos, por faixa etária; III - se as escolas atendem à chamada, ou seja, quantos alunos procuram vagas e quantos foram matriculados; IV - Censo Escolar: quantas crianças matriculadas, quantas repetiram e quantas evadiram, por faixa etária; V - número de professores, discriminando por sexo, idade, os leigos, a habilitação (magistério, licenciatura plena, pós-graduados); VI - número de professores por aluno (relação); VII - se a remuneração é condigna e atende ao piso básico e ao Plano de Carreira do Magistério; VIII - qual o percentual da receita do FUNDEF aplicado na remuneração do magistério; IX - se foi oferecido curso de capacitação para professores efetivos leigos, quantos foram beneficiados, quais cursos; valor; X - cursos de aperfeiçoamento/reciclagem para professores; quantos foram beneficiados; valor; XI - qual o percentual (%) da receita de impostos e transferências aplicados na educação;

Page 161: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

160

XII - salas de aula com condições adequadas de trabalho e aprendizado: temperatura, luminosidade, móveis, equipamentos, materiais pedagógicos, quadro de giz e seus complementos; XIII - prédio escolar em condições adequadas para prestar atendimento aos alunos: salas, bibliotecas, quadras de esporte, campos esportivos, água tratada, sanitários, etc.; XIV - número de equipamentos de audiovisual por escola: computadores, retroprojetores, televisão, vídeo, etc.; XV - quantos ônibus servem ao transporte escolar; quais rotas; quantos alunos foram atendidos; XVI - quantas bibliotecas, endereço, acervo; XVII - quantas crianças são atendidas diariamente com a merenda escolar; XVIII - quantos quilos e tipo de alimentos foram oferecidos na merenda escolar; XIX - alimentação escolar: indicar valor dos recursos federais e próprios; XX - quantas unidades executoras receberam recursos do PDDE; o que foi adquirido com esses recursos; XXI - quantos convênios foram realizados; objeto e valor de cada um; execução; XXII - Bolsa-Escola: quantas famílias foram beneficiadas, quantos alunos foram atendidos; XXIII - implantação e atuação dos Conselhos (de Educação, do FUNDEF, do PNAE); XXIV - outros; 2.3. Obras e Serviços Públicos: I - quantos metros de asfalto foram executados; quais ruas e avenidas; quantos beneficiados; II - quantas casas populares foram construídas, quantas foram entregues; informar local; quantas famílias beneficiadas; III - quantos caminhões de lixo são utilizados na limpeza pública; quantas famílias beneficiadas com a coleta de lixo; IV - quantos servidores trabalham na limpeza pública (ruas, praças...); V - quantas empresas e suas respectivas frotas (número de ônibus) atendem ao transporte coletivo; se atendem à demanda; número de usuários; rotas (bairros atendidos); VI - se há abrigo em todos as paradas de ônibus; VII - se há rodoviária e aeroporto; VIII - quantos quilômetros de estradas vicinais foram abertos ou mantidos; quais (onde); IX - quais obras foram realizadas: local, área construída, valor, objetivo, quais e quantos foram beneficiados; X - espaço para feiras, beneficiados; XI - manutenção da iluminação pública; quais ruas não foram atendidas; XII - outros. 2.4. Assistência Social: I - quantas famílias comprovadamente carentes são cadastradas; II - quantas foram beneficiadas; que tipo de assistência social foi prestada; III - quantas e quais campanhas foram desenvolvidas, quantos beneficiados; IV - quantas cestas básicas foram entregues;

Page 162: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP … Maria Santan… · Tânia Maria Santana dos Santos A Atuação do Assistente Social nas Ações de Responsabilidade Social

161

V - quantos litros de leite foram distribuídos; VI - atendimento a deficientes: centro de reabilitação equipado; VII - quais os tipos de deficiência são atendidos; quantos foram atendidos diariamente; VIII - centros comunitários, de convivência de idosos, com atividades como: trabalhos manuais, danças, pinturas, terapias e outros; IX - programas de assistência à criança de rua: quantos foram encaminhados a escolas, grupos de recuperação que desenvolvem ações através do esporte, dança, teatro, música; quantas famílias foram atendidas/orientadas; X - atuação do Conselho Tutelar na orientação de crianças e adolescentes; quantas crianças qual o trabalho realizado junto às famílias; quais os resultados. Art. 5º A Mesa Diretora da Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso, no prazo de 60 (sessenta) dias, a contar da data de publicação desta lei, constituirá uma comissão mista, composta por: um representante da Assembléia Legislativa, um representante da classe contábil, um representante do comércio, um representante da industria, representantes das ONGs, sendo um por seguimento para análise da responsabilidade social das empresas, organizações não governamentais e órgãos públicos. Art. 6º As despesas decorrentes da presente lei serão cobertas pelos recursos orçamentários próprios, à conta do orçamento da Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso. Art. 7º Esta lei entra em vigor na data da publicação, revogadas as disposições em contrário. Palácio Paiaguás, em Cuiabá, 25 de junho de 2002.

JOSÉ ROGÉRIO SALLES

Governador do Estado