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CAPAPor Fabio [email protected]

EVASÃO

Para evitar os fortes impactos causados pela perda de alunos, a instituição deve aprimorar o levantamento de informações para tomadas mais precisas de decisão.

A criação de departamento específico para retenção de alunos pode ser uma saída

O drama da

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Uma turma começa um deter-minado curso ou nível de en-sino. Até o término, são ne-

cessários muitos anos, mas no meio do caminho alguns jovens deixam seus estudos ou transferem-se para outra instituição. A receita oriunda dessas mensalidades é perdida, mas a estru-tura e o corpo docente são os mesmos. Com pouca margem para enxugamen-to de custos, o drama da evasão é vivido por praticamente todas as instituições particulares de ensino.

Se no ensino público as desistên-cias estão mais relacionadas à inter-rupção dos estudos, na rede privada representa também a perda para um concorrente ou para as redes estatais. Nem sempre a evasão é motivada por questões financeiras, geográficas ou bullying. No ensino básico, a simples ne-cessidade de buscar um novo ambien-te também pode implicar na vontade do aluno ou das famílias pela mudan-ça. “Existe certo cansaço. Em esco-las que têm desde a educação infantil até o fundamental II, é normal o alu-no querer novos ares, mas existem ta-xas aceitáveis. Quando essa evasão es-tá acima de 10%, já é preocupante”, orienta Eugênio Machado Cordaro, só-cio-diretor da CNA Consultores, de São Paulo (SP), e membro do Conselho de Administração de várias escolas parti-culares da capital paulista. Ele conver-sou com a Gestão Educacional durante a edição de 2013 do Geduc – XI Congresso

Brasileiro de Gestão Educacional e III Congresso Internacional de Gestão Educacional, realizado no mês de mar-ço em São Paulo (SP).

A questão da evasão se complica também ao término do 9º ano do en-sino fundamental. Uma boa parte dos alunos tende a escolher o ensino técnico de ní-vel médio. Para Cordaro, há duas formas de lidar com a situação. A pri-meira é pelo convenci-mento, tratando com os pais, nos anos ante-riores, sobre como será o futuro do aluno, sua realização no trabalho, expectativas profissio-nais e as características e possibilidades do ensino técnico e da universidade. A outra forma é identifi-car oportunidades de mercado. “Numa escola na Zona Norte de São Paulo, 50% dos alunos queriam sair para um curso técnico. Então foi aberta uma série de cursos técnicos e os alunos permanece-ram”, conta.

Outro fator que tem impulsionado a troca de instituição, segundo o con-sultor, é a influência dos resultados ob-tidos pela escola no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), amplamente utilizados como peça de marketing pe-las instituições particulares. “Fizemos uma correlação de todas as escolas de São Paulo e a variação de alunos em

função da classificação no Enem. É um fator primordial da escolha dos pais”, revela.

O tema da fidelização ou re-tenção de alunos volta com força à pauta dos gestores em um momen-to em que o setor indica oscilações

para baixo. Segundo Cordaro, as escolas particulares passaram por uma crise gran-de nos anos de 1990 e, posteriormente, re-cuperaram-se. Desde 2003, havia uma ten-dência de aumento no número de alunos, “mas, em 2013, a cur-va mudou e o cresci-mento caiu muito, o

que aumenta a necessidade de con-trolar a evasão”, alerta.

Em todos os casos, a prevenção re-alizada com base no levantamento de dados precisos para identificar os mo-tivos da evasão, e com o intuito de via-bilizar a tomada de decisões corretas para contê-la, é o melhor caminho. Na ânsia de satisfazer apenas a reclama-ções pelo preço da mensalidade – sen-do que todos os pais reclamarão desse item – algumas instituições concedem bolsas de forma desordenada (Veja quadro da pág. XX). “As escolas, ge-ralmente, fazem uma pesquisa com os pais na saída, com o preenchimen-to de um questionário carente de infor-

Fidelização x RetençãoOs trabalhos para manter os alunos em sua escola podem seguir duas linhas:

“EM TODOS OS CASOS, A

PREVENÇÃO É O MELHOR CAMINHO”

Fidelização: consiste em fornecer condições de satisfação ao aluno e à família para que prossigam na mesma instituição em níveis diferentes. É o caso de estudantes que ingressam crianças na educação infantil e saem concluintes no ensino médio, for-mandos que fazem pós-graduação na mesma universidade etc.

Retenção: não deve ser confundida com a reprovação do aluno por falta de desem-penho acadêmico-escolar. Implica manter o estudante durante um determinado cur-so/nível, evitando impactos financeiros.

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mações. Adicionalmente, o responsável pelo aluno está declarando [essas infor-mações] em um momento difícil; é um dado que não deve ser utilizado para to-mada de decisões. Esses levantamentos devem ser feitos por alguém externo à instituição ou um até mesmo se pode criar um setor interno, isento e prepa-rado para saber realmente o que está acontecendo”, explica o consultor.

UM SETOR ESPECÍFICO PARA RE-DUZIR A EVASÃOUma forma comumente usada para computar o total de desistências (can-celamentos, trancamentos e abando-nos) é a coleta de números absolutos de alunos que deixaram a instituição. No entanto, quando se afere apenas um ano ou período letivo, não é possí-vel aferir a perda total de receita que es-sas desistências representam nos anos subsequentes que o estudante não esta-rá mais na instituição. Esse fenômeno é mais perceptível e preocupante no ensi-no superior, o que levou a Universidade Presbiteriana Mackenzie, de São Paulo (SP), a estudar formas mais precisas de aferir as desistências. O trabalho cul-minou na criação de um setor específi-co para prevenir a evasão e aumentar a permanência dos alunos na instituição.

Conforme explica o professor Solano Portela Neto, diretor educacio-nal da Mackenzie, que também falou sobre o tema durante o Geduc 2013, a forma mais acurada encontrada pela sua instituição de medir as desistências e o seu impacto foi computar a quanti-

dade de alunos que iniciam os cursos e compará-la com o número de forman-dos. “Essa medição não é ainda total-mente precisa, pois as transferências recebidas ao longo do curso mascaram o valor absoluto de evasão. Ainda as-sim, é a melhor maneira”, defende.

Paralelamente ao aperfeiçoamen-to estatístico, na Mackenzie foram es-tabelecidos parâmetros para saber se a instituição tem condições de atuar pa-ra evitar a evasão e de que forma isso pode ser feito. A evasão foi classificada em três categorias: a protoevasão, an-terior ao ensino superior, que é quan-do os jovens deixam o ensino médio e a possibilidade do ensino superior; a pré-evasão, que são as desistências en-tre a inscrição para o processo seletivo e a matrícula; e a evasão propriamen-te dita, que é a diferença entre calouros e concluintes, a qual gera perda absolu-ta (quantidade de alunos), relativa (per-centual de evadidos) e financeira (recei-ta que deixa de entrar até a formatura não realizada, resultante do processo de abandono).

Em 2012, foi feito um levantamen-to estatístico sobre a evasão dos três anos anteriores. A Mackenzie decidiu montar um escritório que apontasse pontos de alerta para a perda de alunos. Dois funcionários foram enviados para o Simpósio Nacional de Retenção de Alunos, em New Orleans (EUA), sen-do os únicos representantes do Brasil, e trouxeram na bagagem três pontos para estruturar o trabalho. O primeiro deles é a necessidade de desenvolver a

Funções do gestor responsável por reduzir a evasãoNas instituições privadas de ensino superior dos Estados Unidos, é co-mum a figura do gestor de retenção em nível de diretoria. A sua função, de acordo com o professor Solano Portela Neto, é colaborar com profes-sores, auxiliares educacionais e admi-nistradores para arquitetar, adaptar e

desenvolver programas, implemen-tar ações, cursos e serviços de apoio, com o intuito de incrementar o nú-mero de alunos que retornam à uni-versidade a cada ano para comple-tarem os seus cursos e se formarem.

Além de atuar com autonomia para criar e desenvolver programas,

esse profissional irá adaptar custos e administrar o escritório de reten-ção e também realizará um traba-lho que não é uma mera atividade estatística. Deve estruturar cursos e ações proativas para aumentar o número de alunos que retornam para os estudos na sua instituição

Eugênio Machado Cordaro: gran-des índices de intenção de evasão ao término do 9º ano devido à preferência pelo ensino técnico podem representar oportunidade de mercado

Segundo Solano Portela Neto, o se-tor que custa R$ 120 mil ao ano já pou-pou a Mackenzie de perder receitas anuais de R$ 750 mil devido à evasão

Fotos Andreia N

aomi N

arihisa/Geduc 2013

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percepção de quanto a experiência uni-versitária transcende as salas de aula e de que o processo de ensino e aprendi-zagem pode ser maior na interatividade com a instituição do que na sala de au-la. “Devemos verificar: Como está a vi-da do estudante da instituição fora da sala de aula? Ela está concentrada em sala de aula? Quanto mais a instituição ampliar essa interatividade e as ativi-dades extraclasse estiverem presentes, mais o aluno se sentirá ligado e maior será a possibilidade de retenção”, afir-ma Portela Neto.

Adicionalmente, seria necessário repensar políticas, programas e práticas acadêmicas, com o objetivo de manter o aluno na instituição, envolvendo da alta gestão ao acadêmico e valorizando a parte prática do ensino. “A hipercon-centração, na teoria, é um fator de des-motivação do estudante e da evasão. A ênfase na prática de pesquisa, a partir do primeiro ano, é um fator de motiva-

ção, que fica conhecido como experiên-cias pessoais de alto impacto”, acredita o diretor.

Com base no levantamento estatís-tico de quantidades e causas de tran-camentos e cancelamentos, das defi-nições conceituais e da criação de um setor específico, foi elaborado um novo roteiro para o processo de cancelamen-to. O atendimento foi transferido para um local específico, próximo à secreta-ria e à assistência financeira, operacio-nalizado por pessoas especificamente treinadas para cancelamentos e tran-camentos.

Com os dados em mãos, foi possí-vel verificar que as razões financeiras não são as principais para a evasão, fi-cando atrás de intercâmbios, proble-mas de ordem pessoal e de saúde. O trancamento feito em um setor espe-cífico facilitou, além do levantamento de informações, a reversão de casos de trancamento ou cancelamento. “Nesse setor, temos identificação mais preci-sa das causas, dos destinos da evasão, dos problemas educacionais e de re-lacionamento. [Assim,] podemos dar tratamento personalizado e interseto-rial e encaminhar soluções e resolver um a um os casos de motivos pessoais. Conseguimos 67 reversões somente em janeiro e fevereiro deste ano, que são 5% dos casos. Representa uma receita anual recuperada de 760 mil reais”, co-memora Portela, explicando que o se-tor de retenção da Mackenzie é forma-do por três profissionais que dividem os turnos, cobrindo o atendimento até as 21 horas. O custo anual do escritório é de R$ 120 mil.

O diretor explica ainda que a fina-lidade do setor responsável por redu-zir a evasão e aumentar a permanên-cia dos estudantes na instituição não é burocratizar a desistência. “É justa-mente o contrário: queremos agilizar o processo, facilitar para o aluno que desejar nos deixar, mas também da-mos a ele uma oportunidade de refle-tir”, afirma.

A literatura internacional (Veja in-formações na pág. XX) mostra que em outros países existem motivos seme-lhantes aos brasileiros para a perda de alunos em instituições privadas de en-sino: a pouca interatividade e a falta de identidade com a instituição; a mobili-dade geográfica ou social; os desenten-dimentos sociais dentro do ambiente acadêmico-escolar; a ausência de dis-ciplina própria (especialmente no ensi-no superior); as dificuldades encontra-das no desenvolvimento das atividades acadêmicas (dependências, adaptações, carências de suplementação ao apren-dizado em classe); e as dificuldades fi-nanceiras. “Quase sempre são conside-rados os principais motivos, mas não são. Em todas essas razões, a chave é classificar os motivos e as razões en-tre reversíveis e não reversíveis, tra-balhando profundamente as reversí-veis”, recomenda Portela. G

Critérios para concessão de bolsasUsar bolsas para preencher salas ociosas pode gerar efeito prejudicial na retenção. Como pais de alunos se comunicam, os não contemplados solicitarão o benefício com a amea-ça de procurar outra escola. Para que a concessão de bolsas seja eficaz, se-gundo a CNA Consultores, a insti-tuição de ensino pode tomar quatro medidas:1. Determinação de um número de

bolsas a ser concedidas por curso (preferencialmente menor do que o atual);

2. Definição de critérios objetivos pa-ra concessão de bolsa e escolha dos contemplados;

3. Sistematização do processo de so-licitação de bolsa, com formulários específicos, prazos etc.;

4. Criação de um comitê de análise formado por pessoas dos setores financeiro e pedagógico.

Recomendações de leitura sobre retenção e controle de evasãoA pouca atenção ao tema no Brasil faz Solano Portela Neto sugerir o desenvolvimento de cursos em ní-vel de pós-graduação para produ-zir conhecimento com base na re-alidade local. No exterior, alguns autores já se debruçaram sobre o tema, principalmente sobre a re-tenção no ensino superior:

Vincent TintoLeaving College: Rethinking the Causes and Cures of Student Attrition Completing College: Rethinking Institutional ActionIan A. Bunting (Cape Town University)Developing Performance Indicator for Higher EducationMantz YorkeLeaving EarlyRetention and Student Success in Higher Education

Funções do gestor responsável por reduzir a evasão

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