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A importância da UE como protagonista da política internacional foi ontem sublinhada por Cavaco Silva EUROPEIAS 2014 A incógnita da abstenção domina eleições portuguesas para Estrasburgo As urnas estão abertas hoje para a eleição dos deputados ao Parlamento Europeu. Os níveis de participação dos eleitores em Portugal são uma das principais expectativas São José Almeida

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A importância da UE como protagonista da política internacional foi ontem sublinhada por Cavaco Silva

EUROPEIAS 2014A incógnita da

abstenção domina

eleições portuguesaspara EstrasburgoAs urnas estão abertas hoje para a eleição dos deputados aoParlamento Europeu. Os níveis de participação dos eleitoresem Portugal são uma das principais expectativasSão José Almeida

Oapelo do Presidente daRepública, através das tele-visões (ver pág. 6), a que os

portugueses não deixem de

se pronunciar sobre a esco-lha dos seus representantes

no Parlamento Europeu foi uma ten-tativa de prevenção de que haja umaelevada abstenção nas europeias quehoje se realizam. Isto tendo em contao histórico da abstenção nestas elei-

ções que atinge percentagens de maisde 50%, com o recorde de 64,46%,nas europeias de 1994, mas que hácinco anos atingiu 63,22%.

É imprevisível o que pode aconte-cer hoje em termos de participaçãoeleitoral dos cidadãos. O facto deserem eleições para uma instituiçãodistante e supranacional, num mo-mento de crise financeira e ao fimde três anos de intervenção directade instituições europeias, depois deuma campanha em que mal se dis-cutiram os assuntos europeus, são

algumas das razões que criam a ex-

pectativa de que a abstenção aumen-te. Essa é a opinião dos especialistasque têm estudado a abstenção e os

comportamentos eleitorais ouvidos

pelo PÚBLICO, André Freire, Fernan-do Farelo Lopes, José Manuel Leite

Viegas e Pedro Magalhães.Pedro Magalhães, sociólogo inves-

tigador do Instituto de Ciências So-ciais da Universidade de Lisboa e res-

ponsável pela base de dados Pordatada Fundação Francisco Manuel dos

Santos, é dessa opinião e explica queo tipo de eleições acentua a falta deinteresse dos eleitores. "A percepçãodos eleitores é a de que conta poucoa sua decisão de voto e a relação comos órgãos que decidem sobre a UniãoEuropeia", sustenta, acrescentando

que, "das eleições nacionais, resultaum governo ou um Parlamento, nas

europeias, do ponto de vista do elei-

tor, não é evidente a relação".O sociólogo considera que, à parti-

da, "nestas eleições em concreto, hámais dois factores que poderiam fazercom que cidadãos votassem mais".Por um lado, disputa-se "a eleição do

presidente da Comissão Europeia,que tem dois candidatos assumidos".Por outro lado, "são as eleições so-bre temas europeus, em que estestemas como o curo surgem como

assuntos de política doméstica".Mas acrescenta que, na prática, "a

presença dos candidatos à presidên-cia da Comissão Europeia tem sidoreduzida" e "na campanha portugue-sa os temas europeus, que deviam serdomésticos, não existem", já que "oPS apresenta um programa de Gover-no e a coligação fala de José Sócrates",

por exemplo, "a discussão sobre o tra-tado orçamental que Portugal assinounão é feita, ninguém fala nisso".

O peso dos emigrantesO investigador considera assim quenão há "nenhuma razão para quea abstenção diminua". E sublinhaque existem "factores que podeminfluenciar" o aumento: "Os cader-nos eleitorais contêm cidadãos quese encontram fora e ainda estão re-censeados no local onde já não vi-vem, são pessoas que não estão emsituação de votar." E considera queo crescimento da emigração nos úl-timos anos "faz com que essa absten-

ção técnica possa aumentar".Também José Manuel Leite Viegas,

sociólogo investigador do Centro de

Investigação e Estudos de Sociologia,partilha a ideia de que "o aumentodos emigrantes é claro que afecta",mas adverte que esta questão "tem deser analisada para perceber em quepercentagem afecta a abstenção".

Leite Viegas insiste na ideia de queé do domínio comum que as euro-peias "têm maior abstenção". E ques-tiona-se: "Será ainda maior agora?"Para admitir que "a hipótese é essa,embora haja razões para o contrá-rio", já que, "nas últimas eleições,tem havido consenso sobre temaseuropeus, isso não era mobilizador,agora há polarização em relação aocuro e à dívida, por exemplo".

E salienta que "os níveis de con-fiança na União Europeia baixaramna Europa e em Portugal", já que"as pessoas pensam: eu confiei, as

expectativas não vão no sentido daminha confiança, viro costas".

Já Fernando Farelo Lopes reafirmaa ideia de que "a abstenção nas eu-ropeias é um fenómeno estrutural,mantém-se elevada sem grande varia-

ção", uma comportamento que "tem

que ver com o facto de as instituiçõeseuropeias se encontrarem distantesdos cidadãos de cada Estado". Uma

das razões pelas quais, "em Portugale não só, muitas vezes as campanhaseleitorais acabam por redundar emcampanhas para as próximas legisla-tivas". Isto porque "a população nãoestá motivada para ouvir questõeseuropeias e os partidos do arco do

poder não têm diferenças entre si."Mas Farelo Lopes lembra ainda

que "a crise trouxe a desistência, o

conformismo, em Portugal a presen-ça da troika leva a que a abstenção se-

ja maior". Já André Freire, sociólogoinvestigador do Centro de Investiga-ção e Estudos de Sociologia, admite

que esse possa ser o resultado da po-lítica de austeridade, mas consideratal atitude eleitoral "paradoxal nummomento tão grave, os cidadãos não

expressarem o seu sentir".André Freire admite também a

proximidade dos partidos em rela-

ção aos temas europeus: "As questõeseuropeias são muito actuais mas os

partidos não as politizaram." Mas su-

blinha que um factor de peso podeser o facto de "a formação do poderexecutivo na Europa não dependerdo voto", pois o Conselho e a Comis-são são nomeados pelos governosnacionais.

Por sua vez, "os governos nacio-nais não são eleitos com base em pro-gramas eleitorais para a Europa" e

não têm propostas políticas para as

questões que se colocam. "As demo-cracias amarraram-se ao mercados e

criaram uma situação de dependên-cia e de limitação", conclui.

Este investigador salienta aindaem relação a Portugal a existênciade "uma desconfiança em relação à

política". E frisa: "A desconfiança do

poder atingiu o paradoxismo com es-

te Governo, isso desvaloriza o perfildas eleições e da política."

Durante a campanha eleitoralfoi mais uma vez ventilada a

ideia de que uma solução pa-ra combater a abstenção seria tornaro voto obrigatório. Uma ideia quenão seduz os especialistas ouvidospelo PÚBLICO.

André Freire limita-se a afirmar:"Não sou simpatizante, embora sejaum instrumento importante nos paí-ses onde as sanções são grandes."

Farelo Lopes considera que estasolução "ofende a liberdade dos

cidadãos". E perante o argumentode que "a crise dos partidos e dos

regimes democráticos podia ser ate-nuada com o instrumento do votoobrigatório", responde que "a in-trodução do voto obrigatório comesperança do aumento de interessenão suscita aumento de participa-ção", num eleitorado em que "háuma certa frustração".

Leite Viegas sublinha que "o voto

obrigatório existe nalguns países,mas tem sido abandonado", e quese é um facto que "aumenta a partici-pação, isso depende das sanções", econclui peremptório: "Não sou mui-to a favor, pois tende a esconder ointeresse dos cidadãos. Isso não é

atacar a doença, mas deitar os ter-mómetros fora."

Também Pedro Magalhães rejeita a

hipótese, mas adverte: "Não gosto dediscutir o voto obrigatório do pontode vista dos princípios, quando se diz

que não se pode obrigar a votar, nós

na vida somos obrigados a muita coi-

sa, temos de ter os filhos nas escolas,temos de pagar impostos."

Magalhães argumenta que "o queinteressa é perceber para que serveo voto obrigatório". E acrescenta que"há quem considere que, ao seremobrigados a votar, os cidadãos se in-formam mais, para decidirem". Mas

argumenta: "Os estudos não revelammaior interesse por política. As pes-soas que na Bélgica votam porque são

obrigadas não estão mais informadasnem mais interessadas." E acrescen-

ta: "Não me parece que os sentimen-tos de identificação com a Europasejam maiores na Bélgica, onde hávoto obrigatório, do que entre nós."

E sublinha ainda que na Europanão há grande relação entre o votoe o estatuto social, "na Europa a rela-

ção sociológica com a abstenção é ada idade, os idosos não votam".

E lembra que, "para que o votoobrigatório seja eficaz, é precisoque haja sanções e estas sejam efi-cazmente aplicadas". Ora, concluiPedro Magalhães: "Receio que nãofuncione com a nossa administração,que não é capaz sequer de ter os ca-dernos eleitorais actualizados, nãocreio que fosse viável."

Cavaco: "Não votar é abdicar de um direito"São José Almeida

ij ¦ão votar amanhã [hoje]I é abdicar de um direi-to, do direito funda-I aH mental de participarI nas escolhas que in-I ™ fluenciam o futuro da

Europa." Com esta declaração de

princípio democrática, o Presidenteda República, Aníbal Cavaco Silva,dirigiu-se ontem ao país, atravésdas televisões, apelando a que oscidadãos não deixem de ir votarhoje.

O receio de que a abstenção se-

ja grande, e até maior do que emoutras europeias, foi assumido peloPresidente. "Apelo a todos os eleito-res a que, amanhã, não deixem de

exercer o seu direito de voto", disseCavaco Silva, sublinhando a expec-tativa de que a abstenção seja galo-pante: "Estou bem ciente de que,no passado, já se registaram eleva-dos níveis de abstenção nas eleições

para o Parlamento Europeu e queas previsões indicam que tal podevoltar a acontecer amanhã."

Na tentativa de persuadir os elei-tores renitentes, o Presidente op-tou por enumerar as razões pelas

quais considera importante que os

portugueses votem. Afirmando queesta "é uma eleição muito impor-tante para Portugal", lembrou que"a União Europeia é vital para o de-senvolvimento económico e socialdo país e para a nossa projecção einfluência internacional", uma vezque "as decisões tomadas nas insti-

tuições europeias têm um impactomuito directo no dia-a-dia dos por-tugueses".

Frisando que "o Parlamento Eu-

ropeu é a única instituição europeiacom representantes directamenteeleitos", afirmou que "a União Euro-

peia, esta união de democracias de

que fazemos parte, só se realiza ver-dadeiramente com a participaçãodos cidadãos". E salientou que, "ao

longo de quatro dias, cerca de 380milhões de eleitores dos 28 países daUnião elegem os seus deputados eu-

ropeus, naquela que constitui umaeleição única no mundo".

A importância da União Europeiacomo protagonista da política inter-nacional também foi sublinhada pe-lo Presidente: "Nos últimos sessen-ta anos, a Comunidade Europeiacontribuiu de forma decisiva paraa paz e para o desenvolvimento naEuropa. A paz é um bem preciosoque nunca deve ser descurado nemtomado como adquirido."

E não deixou de referir a impor-

tância que tem tido para Portugal oser membro da União. "Países comoPortugal beneficiaram, nas últimasdécadas, de programas europeusque em muito contribuíram para amelhoria das condições de vida das

populações e para o progresso do

país nos mais diversos domínios -como a educação e a qualificaçãodos portugueses ou a moderniza-ção das actividades económicas edas infra-estruturas nacionais e lo-cais", disse, concluindo: "A eleiçãodos deputados para um Parlamentoonde estão representados cerca de500 milhões de cidadãos europeusconstitui um aspecto fundamentalda nossa participação na construçãoeuropeia e da própria defesa do in-teresse nacional."

E insistindo na importância desta

eleição, o Presidente sustentou que"a Europa tem cada vez mais impac-to no quotidiano dos portugueses, e

o Parlamento Europeu, sublinhe-se,tem cada vez mais poderes na União

Europeia".Na argumentação do Presidente

houve ainda espaço para lembrara conquista da democracia. "Háquarenta anos, com o 25 de Abril,os portugueses conquistaram o di-reito de votar em eleições livres e

democráticas. Sonhámos viver numpaís mais próximo da Europa, dosseus padrões de bem-estar, dos seus

valores de democracia e liberdade.Temos de cumprir esse desígnio",afirmou.