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1 O precioso som da graça e da santidade Integrando graça e verdade Kenton C. Anderson Cresci ouvindo noticiário de rádio no receptor de AM, de apertar botões, da minha mãe, em seu Dodge 64. Quando adquiri meu próprio carro, o som era pior: um único alto-falante montado no banco de trás transmitia as minhas estações favoritas. Quando finalmente instalei um novo toca-fitas estéreo com alto-falantes com duas caixas sob a janela de trás, o som era incrível. Lembro-me de deliberadamente ir para casa pelo caminho mais longo para que pudesse continuar ouvindo o som tão precioso. Passar do som mono para o estéreo é para o ouvido o que é para o olho passar de duas dimensões para três dimensões. O efeito é o mesmo quando pregamos tanto a graça como a santidade. A pregação que tem ressonância requer que ambos os polos soem plenamente. Virar o botão do equilíbrio para um lado ou para o outro produz um som mono diminuído na melhor das hipóteses e, na pior delas, heresia. A pregação de Jesus era conhecida por ser cheia de graça e de verdade(Jo 1.14, 17). Precisamos integrar graça e verdade por três razões: (1) O pregador depende disso. Nunca sei se deveria desfrutar o púlpito ou correr de medo dele. Uma resposta bíblica provavelmente encorajaria as duas coisas. Em alguns domingos, não posso esperar para subir na plataforma e liberar a mensagem que Deus me deu. A pura alegria de alimentar com a verdade pessoas que estão à busca é uma paixão. O privilégio de pregar é emocionante naqueles dias em que não estou me sentindo esmagado pela impropriedade de tal coisa. Embora eu esteja familiarizado com a alegria, também conheço a miséria. Tenho certa apreciação pelo sentimento que Moisés certamente teve quando tirou suas sandálias porque estava em solo santo. Estou ciente de que sirvo o mesmo Deus que Arão servia, embora este vivesse sob instruções severas até mesmo quanto à sua roupa íntima ao conduzir as pessoas à presença de Deus (Lv 16.4). Quem poderá subir o monte do SENHOR? Quem poderá entrar no seu Santo Lugar?(SI 24.3). Não estou certo de que minhas mãos estão suficientemente limpas ou minha língua está suficientemente pura para falar por Deus perante as pessoas. É absurdo pensar que eu me encaixaria para representar o Todo-Poderoso. Alguns sugerem que a falha (leia-se pecado) aumenta a capacidade de um pregador de se relacionar com a necessidade da congregação. Pessoas assim precisam reler o Pentateuco. Ou talvez eu tenha de reler Romanos 8. Aprecio o fato de que quando vou ao púlpito estou deste lado da cruz. A graça de Deus me revigora mesmo quando me justifica. Entretanto, embora eu pregue à luz da verdade do Novo Testamento, sou desafiado pela minha leitura do Antigo Testamento. O Deus que sirvo era terrivelmente minucioso em Levítico. Sou teologicamente astuto para saber que ele não mudou nem cresceu. Acontece que simplesmente sou privilegiado por estar em uma posição vantajosa e diferente da daquela época. A santidade importa. Não é que Deus decidiu que ele foi muito duro conosco e que, se ele não aliviasse o peso sobre nós, não sobraria ninguém qualificado para falar em nome dele. A graça não foi um afrouxamento. A graça não foi barata. O padrão de Deus não foi suavizado; ele foi satisfeito. Fico impressionado com o fato de que Deus me deu a oportunidade de entregar sua Palavra como seu servo. Minha consciência do preço desse privilégio apenas aumenta a minha apreciação e paixão.

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O precioso som da graça e da santidade

Integrando graça e verdade Kenton C. Anderson Cresci ouvindo noticiário de rádio no receptor de AM, de apertar botões, da minha mãe, em seu Dodge 64. Quando adquiri meu próprio carro, o som era pior: um único alto-falante montado no banco de trás transmitia as minhas estações favoritas. Quando finalmente instalei um novo toca-fitas estéreo com alto-falantes com duas caixas sob a janela de trás, o som era incrível. Lembro-me de deliberadamente ir para casa pelo caminho mais longo para que pudesse continuar ouvindo o som tão precioso. Passar do som mono para o estéreo é para o ouvido o que é para o olho passar de duas dimensões para três dimensões. O efeito é o mesmo quando pregamos tanto a graça como a santidade. A pregação que tem ressonância requer que ambos os polos soem plenamente. Virar o botão do equilíbrio para um lado ou para o outro produz um som mono diminuído na melhor das hipóteses e, na pior delas, heresia. A pregação de Jesus era conhecida por ser cheia “de graça e de verdade” (Jo 1.14, 17). Precisamos integrar graça e verdade por três razões: (1) O pregador depende disso. Nunca sei se deveria desfrutar o púlpito ou correr de medo dele. Uma resposta bíblica provavelmente encorajaria as duas coisas. Em alguns domingos, não posso esperar para subir na plataforma e liberar a mensagem que Deus me deu. A pura alegria de alimentar com a verdade pessoas que estão à busca é uma paixão. O privilégio de pregar é emocionante naqueles dias em que não estou me sentindo esmagado pela impropriedade de tal coisa. Embora eu esteja familiarizado com a alegria, também conheço a miséria. Tenho certa apreciação pelo sentimento que Moisés certamente teve quando tirou suas sandálias porque estava em solo santo. Estou ciente de que sirvo o mesmo Deus que Arão servia, embora este vivesse sob instruções severas até mesmo quanto à sua roupa íntima ao conduzir as pessoas à presença de Deus (Lv 16.4). “Quem poderá subir o monte do SENHOR? Quem poderá entrar no seu Santo Lugar?” (SI 24.3). Não estou certo de que minhas mãos estão suficientemente limpas ou minha língua está suficientemente pura para falar por Deus perante as pessoas. É absurdo pensar que eu me encaixaria para representar o Todo-Poderoso. Alguns sugerem que a falha (leia-se “pecado”) aumenta a capacidade de um pregador de se relacionar com a necessidade da congregação. Pessoas assim precisam reler o Pentateuco. Ou talvez eu tenha de reler Romanos 8. Aprecio o fato de que quando vou ao púlpito estou deste lado da cruz. A graça de Deus me revigora mesmo quando me justifica. Entretanto, embora eu pregue à luz da verdade do Novo Testamento, sou desafiado pela minha leitura do Antigo Testamento. O Deus que sirvo era terrivelmente minucioso em Levítico. Sou teologicamente astuto para saber que ele não mudou nem cresceu. Acontece que simplesmente sou privilegiado por estar em uma posição vantajosa e diferente da daquela época. A santidade importa. Não é que Deus decidiu que ele foi muito duro conosco e que, se ele não aliviasse o peso sobre nós, não sobraria ninguém qualificado para falar em nome dele. A graça não foi um afrouxamento. A graça não foi barata. O padrão de Deus não foi suavizado; ele foi satisfeito. Fico impressionado com o fato de que Deus me deu a oportunidade de entregar sua Palavra como seu servo. Minha consciência do preço desse privilégio apenas aumenta a minha apreciação e paixão.

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(2) A mensagem depende disso. Amo pregar a graça. Minha dependência pessoal da graça me predispõe a uma dieta de pregação repleta de graça. Deixaria imediatamente a pregação da santidade para os pregadores da TV com seus murros no púlpito. Mas estou comprometido com um ministério bíblico. Quanto mais estudo as Escrituras, mais estou consciente de que minha afeição pela graça não permite uma aversão correspondente pela santidade. Graeme Goldsworthy expressa isso assim: “O evento do evangelho não é um repúdio da lei; é sua expressão mais perfeita”. (Preaching the Whole Bible as Christian Scripture [Eerdmans, 2000], p. 159). O tratamento aparentemente suave que Paulo dá à lei não deveria ser entendido como ambivalência. Antes, é uma função da sua localização na história da salvação. Mas Goldsworthy também descreve sermões moralistas que são dissimulados como bíblicos quando, na verdade, são apenas legalistas. Mesmo textos que oferecem instruções éticas precisam ser lidos no contexto do evangelho. A pregação que enfatiza obediência mais do que graça não é pregação do evangelho.

Dizer que devemos ser ou agir e não associar isso a uma clara exposição do que Deus fez acerca da nossa incapacidade de ser ou agir perfeitamente segundo a vontade dele é rejeitar a graça de Deus e conduzir as pessoas à lascívia depois da autoajuda e do autoaperfeiçoamento de tal forma que, se queremos chamar uma pá de pá, isso é iníquo.

(3) O ouvinte depende disso. Os ouvintes têm ouvidos para o som estéreo.

Posso ouvir um sermão pungente, mas apenas por pouco tempo. O discurso bombástico como homilética tem vida curta. Similarmente, um sermão doce pode fazer meu coração se elevar, mas apenas em moderação. O que é doce logo se torna grudento e fica além da minha capacidade de desfrutá-lo ou me beneficiar disso. Há algumas almas afetadas que vêm à igreja para que sejam surradas. Essas são aquelas que veem o sermão como penitência, que não entenderam o evangelho como graça. Há outras que preferem o pastor que acredita que se você não consegue dizer nada bonito, então nem deve se levantar para pregar. Esses ouvintes são crianças crescidas às quais falta a maturidade para valorizar o som pleno do estéreo. A maioria dos ouvintes cresceu para saber que o pecado tem suas consequências. Ajudá-los a apreciar isso como uma parte da constituição da vida sob a orientação de Deus os preparará para ouvir que o amor tem seus privilégios, e que a graça é a tônica para a nossa incapacidade de obedecer. Pregadores que preenchem a mensagem da santidade com a mensagem doadora de vida da graça encontraram a frequência pela qual os ouvintes anseiam. Texto extraído do livro A arte e o ofício da pregação bíblica, organizado por Haddon Robinson e Craig B. Larson, publicado pela Shedd Publicações.